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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ARTES

JULIANA MELLEIRO RHEINBOLDT

PREPARO VOCAL PARA COROS INFANTIS:


CONSIDERAÇÕES E PROPOSTAS PEDAGÓGICAS

CAMPINAS
2018
JULIANA MELLEIRO RHEINBOLDT

PREPARO VOCAL PARA COROS INFANTIS:


CONSIDERAÇÕES E PROPOSTAS PEDAGÓGICAS

Tese apresentada ao Instituto de Artes da Universidade


Estadual de Campinas como parte dos requisitos
exigidos para a obtenção do título de Doutora em
Música.

Área de concentração: Música: Teoria, Criação e Prática

Orientador: Prof. Dr. Angelo José Fernandes

Este exemplar corresponde à versão final da tese defendida pela aluna Juliana Melleiro
Rheinboldt, e orientada pelo Prof. Dr. Angelo José Fernandes

CAMPINAS
2018
BANCA EXAMINADORA DA DEFESA DE DOUTORADO

JULIANA MELLEIRO RHEINBOLDT

ORIENTADOR: PROF. DR. ANGELO JOSÉ FERNANDES

MEMBROS:
1. PROF. DR. ANGELO JOSÉ FERNANDES
2. PROFA. DRA. ADRIANA GIAROLA KAYAMA
3. PROFA. DRA. ADRIANA DO NASCIMENTO ARAÚJO MENDES
4. PROFA. DRA. MARIA JOSÉ CHEVITARESE DE SOUZA LIMA
5. PROFA. DRA. JOSANI KEUNECKE PIMENTA

Programa de Pós-Graduação em Música do Instituto de Artes da Universidade Estadual


de Campinas.

A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros da banca examinadora


encontra-se no processo de vida acadêmica da aluna.

DATA DA DEFESA: 27.02.2018


Com carinho e gratidão, dedico este trabalho aos meus
pais, Carmen e René (in memoriam), às minhas irmãs,
Aline e Marcella, e aos meus avós Zuleica (in memoriam)
e Reginaldo (in memoriam)
AGRADECIMENTOS

A Deus, pela vida e por nunca me desamparar.


À minha mãe, Carmen, por não medir esforços e amor para me educar e me apoiar.
Às minhas irmãs, Aline e Marcella, pelo amor, cumplicidade e incentivo de sempre.
Aos familiares que já partiram, meu pai René e meus avós Zuleica e Reginaldo, pelos
valores que me ensinaram.
Aos meus tios e primos, pelo carinho, torcida e apoio.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Angelo Fernandes, por sua generosidade, por todos os
ensinamentos e realizações profissionais proporcionados nos anos de orientação de TCC,
Mestrado e Doutorado, e por me tornar uma regente-cantora.
À CAPES, por fomentar meus estudos.
Ao pianista Otávio Piola, pela disponibilidade e generosidade em compor os
acompanhamentos dos meus vocalises e torná-los mais musicais e divertidos.
Ao meu coro infantil, Allegretto, do Canarinhos da Terra, por me ensinar a ser uma regente
melhor e pelo recital inesquecível que realizamos. Aos seus familiares, pelo grande
incentivo.
Ao pianista e amigo Tiago Roscani, pela parceria musical, carinho e dedicação.
À equipe do Canarinhos da Terra, em especial, ao Luiz Pedro Simoni, à Vastí Atique, ao
Leandro Cavini e à Cleo Branco, pelo incentivo, parceria e oportunidade de crescimento
profissional.
Ao programa “Coral na Escola”, do Canarinhos da Terra, pela oportunidade de viabilizar o
canto coral a tantas crianças.
À Silmara Drezza, por seu grande exemplo e por me apresentar ao mundo do coro infantil
com tanta generosidade e paixão.
A todos os cantores, regentes e colegas de trabalho que tanto me ensinaram em minha
trajetória profissional.
À Profa. Dra. Adriana Kayama e à Profa. Dra. Adriana Mendes pelas valiosas considerações
nos exames de Qualificação e Defesa, pela presença nos Recitais I e II e por todo o
incentivo, nos anos de pesquisa na UNICAMP.
À Profa. Dra. Maria José Chevitarese e Profa. Dra. Josani Pimenta, pela honra de tê-las em
minhas bancas de Recital II e de Defesa e por seus preciosos apontamentos.
Ao Coro Contemporâneo de Campinas, à Classe de Canto e ao Opera Studio da UNICAMP,
pela oportunidade de fazer música de qualidade artística inestimável.
Aos alunos e amigos da UNICAMP, por todos os conhecimentos e bons momentos
partilhados.
Aos queridos Daniel Duarte, Gustavo Caires, Rafaela Haddad, Clóvis Português, Fernanda
Reimberg, Bruna Uerlings e Claudia Cruz, pelo apoio e inestimáveis amizades.
Aos amigos Guilhermina Lopes e Marcelo Elme, pela parceria durante o curso de
Doutorado.
Aos amigos que tanto me ajudaram na realização do Recital II, pela dedicação, carinho e
disponibilidade.
Aos professores e funcionários do Programa de Pós-graduação em Música e do Instituto
de Artes da UNICAMP, pelos aprendizados e convivência.
RESUMO

Esse trabalho objetiva contextualizar a prática coral infantil e compartilhar propostas de


preparo vocal para este tipo de coro. No primeiro capítulo são apresentadas
considerações acerca do coro infantil, de seu preparo vocal, do perfil de seu regente e das
características da voz da criança. No segundo capítulo, contextualizamos os elementos
trabalhados no preparo vocal de coros infantis (postura, respiração, ressonância,
articulação, extensão vocal e afinação) e apresentamos algumas propostas pedagógicas,
através de exercícios revisados de materiais de pedagogia vocal e coral e de exercícios de
nossa autoria. Nossos exercícios foram criados com base nas necessidades técnico-vocais
de nossos coros infantis e em nossa prática como regente, preparadora vocal e cantora. O
trabalho se faz relevante pela falta de publicações em português sobre a temática e almeja
contribuir com a produção de novos materiais e pesquisas, bem como a melhora da
qualidade vocal de coros infantis brasileiros. Fundamentamos essa pesquisa em
bibliografias das áreas de Canto Coral, Canto, Regência e Educação Musical, tendo como
principais referenciais Carnassale (1995), Fernandes (2009), Sesc (1997), Leck (2009) e
Phillips (1992).

Palavras-chave: Preparo vocal; Coro infantil; Canto coral; Voz infantil; Técnica vocal.
ABSTRACT

This work aims to contextualize the children’s choir and to share proposals of vocal
techniques for this type of choir. In the first chapter we present some considerations
about children's choirs, their vocal preparation, the profile of their conductor and the
characteristics of the child's voice. In the second chapter, we contextualize the elements
worked on the vocal preparation of children's choirs (posture, breathing, resonance,
diction, vocal range and choral tone) and present some pedagogical proposals, through
revised exercises of vocal and choral pedagogy materials and exercises of our own. Our
exercises were created based on the vocal needs of our children's choirs and our
experience as conductor, vocal coach and singer. The work is relevant due to the lack of
publications in Portuguese on the theme and aims to contribute to the production of new
materials and researches, as well as the improvement of the vocal quality of Brazilian
children's choirs. We base this research on bibliography in the areas of Choir, Singing,
Conducting and Music Education, having used as main references Carnassale (1995),
Fernandes (2009), Sesc (1997), Leck (2009) and Phillips (1992).

Keywords: Vocal techniques; Children's Choir; Choral singing; Children's voice; Warm-
ups.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Girafa de madeira ....................................................................................................................... 50


Figura 2. Flauta de êmbolo ........................................................................................................................ 50
Figura 3. Bola em formato de átomo ..................................................................................................... 50
Figura 4. Dedoches de vogais ................................................................................................................... 51
Figura 5. Bolinha de tênis .......................................................................................................................... 51
Figura 6. Mola de brinquedo .................................................................................................................... 52
Figura 7. Mandíbula de brinquedo ......................................................................................................... 52
Figura 8. Dedoche de borboleta .............................................................................................................. 53
Figura 9. Pios dos pássaros ....................................................................................................................... 53
Figura 10. Exercício de respiração 1 ..................................................................................................... 62
Figura 11. Exercício de respiração 2 ..................................................................................................... 62
Figura 12. Exercício de respiração 3 ..................................................................................................... 63
Figura 13. Exercício de respiração 4 ..................................................................................................... 64
Figura 14. Exercício de respiração 5 ..................................................................................................... 64
Figura 15. Exercício de respiração 6 ..................................................................................................... 65
Figura 16. Padrões melódicos maiores menores e cromáticos para aquecimento vocal
.............................................................................................................................................................................. 69
Figura 17. Exemplo de vocalise de vibração de lábios com boca chiusa ................................. 70
Figura 18. Exemplo de vocalise com expirações intercaladas .................................................... 70
Figura 19. Vocalise 1 .................................................................................................................................... 71
Figura 20. Vocalise 2 .................................................................................................................................... 71
Figura 21. Vocalise 3 .................................................................................................................................... 72
Figura 22. Vocalise 4 .................................................................................................................................... 73
Figura 23. Vocalise 5 .................................................................................................................................... 73
Figura 24. Vocalise 6 .................................................................................................................................... 74
Figura 25. Vocalise 7 .................................................................................................................................... 75
Figura 26. Vocalise 8 .................................................................................................................................... 76
Figura 27. Vocalise 9 .................................................................................................................................... 77
Figura 28. Vocalise 10 ................................................................................................................................. 78
Figura 29.Vocalise 11 .................................................................................................................................. 78
Figura 30. Vocalise 12 ................................................................................................................................. 79
Figura 31. Vocalise 13 ................................................................................................................................. 80
Figura 32. Vocalise 14 ................................................................................................................................. 81
Figura 33. Vocalise 15 ................................................................................................................................. 81
Figura 34. Vocalise 16 ................................................................................................................................. 82
Figura 35. Vocalise 17 ................................................................................................................................. 83
Figura 36. Vocalise 18 ................................................................................................................................. 83
Figura 37. Vocalise 19 ................................................................................................................................. 84
Figura 38. Vocalise 20 ................................................................................................................................. 85
Figura 39. Vocalise 21 ................................................................................................................................. 85
Figura 40. Vocalise 22 ................................................................................................................................. 86
Figura 41. Vocalise 23 ................................................................................................................................. 87
Figura 42. Vocalise 24 ................................................................................................................................. 88
Figura 43. Vocalise 25 ................................................................................................................................. 88
Figura 44. Vocalise 26 ................................................................................................................................. 89
Figura 45. Vocalise 27 ................................................................................................................................. 90
Figura 46. Vocalise 28 ................................................................................................................................ 90
Figura 47. Vocalise 29 ................................................................................................................................. 91
Figura 48. Vocalise 30 ................................................................................................................................. 92
Figura 49. Vocalise 31 ................................................................................................................................. 93
Figura 50. Vocalise 32 ................................................................................................................................. 94
Figura 51. Vocalise 33 ................................................................................................................................. 94
Figura 52. Vocalise 34 ................................................................................................................................. 98
Figura 53. Vocalise 35 ................................................................................................................................ 98
Figura 54. Vocalise 36 ................................................................................................................................. 99
Figura 55. Vocalise 37 .............................................................................................................................. 100
Figura 56. Vocalise 38 .............................................................................................................................. 100
Figura 57. Vocalise 39 .............................................................................................................................. 101
Figura 58. Vocalise 40 ............................................................................................................................. 102
Figura 59. Vocalise 41 ............................................................................................................................. 103
Figura 60. Vocalise 42 .............................................................................................................................. 104
Figura 61. Vocalise 43 .............................................................................................................................. 104
Figura 62. Vocalise 44 .............................................................................................................................. 105
Figura 63. Vocalise 45 .............................................................................................................................. 106
Figura 64. Vocalise 46 .............................................................................................................................. 107
Figura 65. Vocalise 47 .............................................................................................................................. 107
Figura 66. Vocalise 48 .............................................................................................................................. 108
Figura 67. Vocalise 49 .............................................................................................................................. 109
Figura 68. Vocalise 50 .............................................................................................................................. 110
Figura 69. Vocalise 51 .............................................................................................................................. 110
Figura 70. Vocalise 52 .............................................................................................................................. 111
Figura 71. Vocalise 53 .............................................................................................................................. 112
Figura 72. Vocalise 54 .............................................................................................................................. 113
Figura 73. Vocalise 55 .............................................................................................................................. 114
Figura 74. Vocalise 56 .............................................................................................................................. 115
Figura 75. Vocalise 57 .............................................................................................................................. 115
Figura 76. Vocalise 58 .............................................................................................................................. 116
Figura 77. Vocalise 59 .............................................................................................................................. 117
Figura 78. Vocalise 60 .............................................................................................................................. 118
Figura 79. Vocalise 61 .............................................................................................................................. 119
Figura 80. Vocalise 62 .............................................................................................................................. 120
Figura 81. Vocalise 63 .............................................................................................................................. 121
Figura 82. Vocalise 64 .............................................................................................................................. 121
Figura 83. Vocalise 65 .............................................................................................................................. 122
Figura 84. Vocalise 66 .............................................................................................................................. 123
Figura 85. Vocalise 67 .............................................................................................................................. 124
Figura 86. Vocalise 68 .............................................................................................................................. 125
Figura 87. Vocalise 69 .............................................................................................................................. 126
Figura 88. Vocalise 70 .............................................................................................................................. 127
Figura 89. Vocalise 71 .............................................................................................................................. 128
Figura 90. Vocalise 72 .............................................................................................................................. 129
Figura 91. Vocalise 73 .............................................................................................................................. 132
Figura 92. Vocalise 74 .............................................................................................................................. 133
Figura 93. Vocalise 75 .............................................................................................................................. 134
Figura 94. Vocalise 76 .............................................................................................................................. 135
Figura 95. Vocalise 77 .............................................................................................................................. 135
Figura 96. Vocalise 78 .............................................................................................................................. 136
Figura 97. Vocalise 79 .............................................................................................................................. 137
Figura 98. Vocalise 80 .............................................................................................................................. 138
Figura 99. Vocalise 81 .............................................................................................................................. 139
Figura 100. Vocalise 82 ........................................................................................................................ ...140
Figura 101. Vocalise 83 ........................................................................................................................... 146
Figura 102. Vocalise 84 ........................................................................................................................... 146
Figura 103. Vocalise 85a ......................................................................................................................... 147
Figura 104. Vocalise 85b ......................................................................................................................... 147
Figura 105.Vocalise 86............................................................................................................................. 148
Figura 106. Vocalise 87 .......................................................................................................................... 149
Figura 107. Vocalise 88 .......................................................................................................................... 150
Figura 108. Vocalise 89 ........................................................................................................................... 151
Figura 109. Vocalise 90 ........................................................................................................................... 152
Figura 110. Vocalise 91 ........................................................................................................................... 152
Figura 111. Vocalise 92 ........................................................................................................................... 153
Figura 112. Vocalise 93 ........................................................................................................................... 154
Figura 113. Vocalise 94a ......................................................................................................................... 155
Figura 114. Vocalise 94b ......................................................................................................................... 156
Figura 115. Brincadeira cantada .......................................................................................................... 157
LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Possibilidades de agrupamento coral infantil e infantojuvenil, segundo Sesc


(1997, p. 12).................................................................................................................................................... 27
Tabela 2. Sugestões de agrupamento coral infantil e infantojuvenil ........................................ 27
Tabela 3. Sugestão de agrupamentos corais de acordo com faixa etária, série escolar, nível
de desenvolvimento musical e repertório .......................................................................................... 28
Tabela 4. Número de cantores, duração e frequência de ensaio considerados ideias para
Pré-coral e Coro infantil iniciante, intermediário e avançado .................................................... 29
Tabela 5. Estrutura considerada ideal para coros infantis escolares e não performáticos
de Ensino Fundamental I. .......................................................................................................................... 30
Tabela 6. Sugestão de roteiro de ensaio para pré-coral, coro infantil iniciante e
intermediário ................................................................................................................................................. 38
Tabela 7. Sugestão de roteiro de ensaio para coros infantis escolares e não performáticos
de Ensino Fundamental I .......................................................................................................................... 39
Tabela 8. Extensão e tessitura vocal infantil, segundo Phillips (CARNASSALE, 1995, p. 86)
.............................................................................................................................................................................. 45
Tabela 9. Extensão dos registros da voz infantil, segundo Jacques (1963) e Phillips (1992)
(CARNASSALE, 1995, p. 90) ...................................................................................................................... 45
Tabela 10. Extensão dos registros vocais infantis segundo Williams (2010). (GABORIM-
MOREIRA, 2015, p. 255)............................................................................................................................. 46
Tabela 11. Tessitura, extensão e registros vocais infantis, conforme autores revisados. 46
Tabela 12. Níveis de dificuldade dos vocalises e parâmetros norteadores............................ 57
Tabela 13. Sugestão de roteiro de preparo vocal para coro infantil ...................................... 159
SUMÁRIO

Introdução ..................................................................................................................................................... 20

Capítulo 1: Considerações sobre o coro infantil e seu preparo vocal ............................ 25


1.1. O coro infantil .................................................................................................................................... 25
1.1.1. Faixa etária e possibilidades de agrupamento ............................................................. 25
1.1.2. Bases pedagógicas ................................................................................................................... 30
1.1.2.1. Preparo vocal .................................................................................................................... 31
1.1.2.2. Repertório .......................................................................................................................... 32
1.1.2.3. Musicalização .................................................................................................................... 35
1.1.3. Roteiro de ensaio...................................................................................................................... 37
1.2. O regente de coro infantil.............................................................................................................. 39
1.3. A voz infantil ...................................................................................................................................... 43
1.4. Preparo vocal para coro infantil ................................................................................................. 47

Capítulo 2: Preparo vocal de coros infantis: considerações e propostas


pedagógicas ................................................................................................................................................... 55
2.1. Postura ................................................................................................................................................. 57
2.2. Respiração........................................................................................................................................... 59
2.2.1.Contextualização ....................................................................................................................... 59
2.2.2. Exercícios .................................................................................................................................... 61
2.2.2.1. Exercício de respiração 1 ............................................................................................. 62
2.2.2.2. Exercício de respiração 2 ............................................................................................. 62
2.2.2.3. Exercício de respiração 3 ............................................................................................. 63
2.2.2.4. Exercício de respiração 4 ............................................................................................. 64
2.2.2.5. Exercício de respiração 5 ............................................................................................. 64
2.2.2.6. Exercício de respiração 6 ............................................................................................. 65
2.3. Desenvolvimento de ressonância e aquecimento vocal através das vogais .............. 65
2.3.1.Contextualização ....................................................................................................................... 65
2.3.2.Exercícios ..................................................................................................................................... 68
2.3.2.1. Vocalise 1 ............................................................................................................................ 70
2.3.2.2. Vocalise 2 ............................................................................................................................ 71
2.3.2.3. Vocalise 3 ............................................................................................................................ 72
2.3.2.4. Vocalise 4 ............................................................................................................................ 72
2.3.2.5. Vocalise 5 ............................................................................................................................ 73
2.3.2.6. Vocalise 6 ............................................................................................................................ 74
2.3.2.7. Vocalise 7 ............................................................................................................................ 75
2.3.2.8. Vocalise 8 ............................................................................................................................ 75
2.3.2.9. Vocalise 9 ............................................................................................................................ 76
2.3.2.10. Vocalise 10 ...................................................................................................................... 77
2.3.2.11. Vocalise 11 ...................................................................................................................... 78
2.3.2.12. Vocalise 12 ...................................................................................................................... 79
2.3.2.13. Vocalise 13 ...................................................................................................................... 80
2.3.2.14. Vocalise 14 ...................................................................................................................... 80
2.3.2.15. Vocalise 15 ...................................................................................................................... 81
2.3.2.16. Vocalise 16 ...................................................................................................................... 82
2.3.2.17. Vocalise 17 ...................................................................................................................... 83
2.3.2.18. Vocalise 18 ...................................................................................................................... 83
2.3.2.19. Vocalise 19 ...................................................................................................................... 84
2.3.2.20. Vocalise 20 ...................................................................................................................... 85
2.3.2.21. Vocalise 21 ...................................................................................................................... 85
2.3.2.22. Vocalise 22 ...................................................................................................................... 86
2.3.2.23. Vocalise 23 ...................................................................................................................... 87
2.3.2.24. Vocalise 24 ...................................................................................................................... 87
2.3.2.25. Vocalise 25 ...................................................................................................................... 88
2.3.2.26. Vocalise 26 ...................................................................................................................... 89
2.3.2.27. Vocalise 27 ...................................................................................................................... 90
2.3.2.28. Vocalise 28 ..................................................................................................................... 90
2.3.2.29. Vocalise 29 ...................................................................................................................... 91
2.3.2.30. Vocalise 30 ...................................................................................................................... 91
2.3.2.31. Vocalise 31 ...................................................................................................................... 92
2.3.2.32. Vocalise 32 ...................................................................................................................... 93
2.3.2.33. Vocalise 33 ...................................................................................................................... 94
2.4. Aprimoramento da dicção ............................................................................................................ 95
2.4.1.Contextualização ....................................................................................................................... 95
2.4.2. Exercícios de articulação e inteligibilidade do texto .................................................. 97
2.4.2.1. Vocalise 34 ......................................................................................................................... 97
2.4.2.2. Vocalise 35 ......................................................................................................................... 98
2.4.2.3. Vocalise 36 ......................................................................................................................... 99
2.4.2.4. Vocalise 37 ...................................................................................................................... 100
2.4.2.5. Vocalise 38 ...................................................................................................................... 100
2.4.2.6. Vocalise 39 ...................................................................................................................... 101
2.4.2.7. Vocalise 40 ...................................................................................................................... 102
2.4.2.8. Vocalise 41 ...................................................................................................................... 102
2.4.2.9. Vocalise 42 ...................................................................................................................... 103
2.4.2.10. Vocalise 43 ................................................................................................................... 104
2.4.2.11. Vocalise 44 ................................................................................................................... 105
2.4.2.12. Vocalise 45 ................................................................................................................... 106
2.4.2.13. Vocalise 46 ................................................................................................................... 106
2.4.2.14. Vocalise 47 ................................................................................................................... 107
2.4.2.15. Vocalise 48 ................................................................................................................... 108
2.4.2.16. Vocalise 49 ................................................................................................................... 109
2.4.2.17. Vocalise 50 ................................................................................................................... 109
2.4.2.18. Vocalise 51 ................................................................................................................... 110
2.4.2.19. Vocalise 52 ................................................................................................................... 111
2.4.2.20. Vocalise 53 ................................................................................................................... 112
2.4.2.21. Vocalise 54 ................................................................................................................... 113
2.4.2.22. Vocalise 55 ................................................................................................................... 114
2.4.2.23. Vocalise 56 ................................................................................................................... 114
2.4.2.24. Vocalise 57 ................................................................................................................... 115
2.4.2.25. Vocalise 58 ................................................................................................................... 116
2.4.3. Exercícios para pronúncia de outros idiomas .......................................................... 117
2.4.3.1. Vocalise 59 ...................................................................................................................... 117
2.4.3.2. Vocalise 60 ...................................................................................................................... 118
2.4.3.3. Vocalise 61 ..................................................................................................................... 119
2.4.3.4. Vocalise 62 ...................................................................................................................... 120
2.4.3.5. Vocalise 63 ...................................................................................................................... 120
2.4.3.6. Vocalise 64 ...................................................................................................................... 121
2.4.3.7. Vocalise 65 ...................................................................................................................... 122
2.4.3.8. Vocalise 66 ...................................................................................................................... 123
2.4.3.9. Vocalise 67 ...................................................................................................................... 124
2.4.4.10. Vocalise 68 ................................................................................................................... 124
2.4.5.11. Vocalise 69 ................................................................................................................... 125
2.4.6.12. Vocalise 70 ................................................................................................................... 126
2.4.7.13. Vocalise 71 ................................................................................................................... 127
2.4.8.14. Vocalise 72 ................................................................................................................... 128
2.5. Equalização de registros e ampliação da extensão vocal .............................................. 129
2.5.1. Contextualização ................................................................................................................... 129
2.5.2. Exercícios ................................................................................................................................. 132
2.5.2.1. Vocalise 73 ...................................................................................................................... 132
2.5.2.2. Vocalise 74 ...................................................................................................................... 133
2.5.2.3. Vocalise 75 ...................................................................................................................... 133
2.5.2.4. Vocalise 76 ...................................................................................................................... 134
2.5.2.5. Vocalise 77 ...................................................................................................................... 135
2.5.2.6. Vocalise 78 ...................................................................................................................... 136
2.5.2.7. Vocalise 79 ...................................................................................................................... 137
2.5.2.8. Vocalise 80 ...................................................................................................................... 138
2.5.2.9. Vocalise 81 ...................................................................................................................... 139
2.5.2.10. Vocalise 82 ................................................................................................................... 140
2.6. Preparo vocal e desenvolvimento de musicalidade......................................................... 141
2.6.1. Contextualização ................................................................................................................... 141
2.6.2. Exercícios para afinação .................................................................................................... 146
2.6.2.1. Vocalise 83 ...................................................................................................................... 146
2.6.2.2. Vocalise 84 ...................................................................................................................... 146
2.6.2.3. Vocalises 85a e 85b ..................................................................................................... 147
2.6.2.4. Vocalise 86 ...................................................................................................................... 148
2.6.2.5. Vocalise 87 ...................................................................................................................... 149
2.6.2.6. Vocalise 88 ...................................................................................................................... 150
2.6.2.7. Vocalise 89 ...................................................................................................................... 150
2.6.3. Exercícios para canto em vozes ...................................................................................... 151
2.6.3.1. Vocalise 90 ...................................................................................................................... 151
2.6.3.2. Vocalise 91 ...................................................................................................................... 152
2.6.3.3. Vocalise 92 ...................................................................................................................... 153
2.6.3.4. Vocalise 93 ...................................................................................................................... 154
2.6.3.5. Vocalises 94a e 94b ..................................................................................................... 155
2.6.4. Brincadeiras cantadas ........................................................................................................ 156
2.7. Roteiro de preparo vocal para coros infantis ..................................................................... 158

Considerações finais .............................................................................................................................. 160

Referências ................................................................................................................................................. 163

Anexos ........................................................................................................................................................... 168


20

INTRODUÇÃO

Refletindo sobre a natureza da prática coral, podemos afirmar que ela consiste na
somatória de quatro aspectos: a atividade do canto coletivo, a performance artística, a
educação musical e a integração social. O canto coletivo acontece através da prática e de
seu aperfeiçoamento no cantar em grupo, considerando-se aspectos da pedagogia,
fisiologia, higiene e saúde vocal. A performance artística está relacionada com a
interpretação dos inúmeros repertórios musicais, desde sua minuciosa preparação até a
apresentação pública. A educação musical está presente o tempo todo no processo de
musicalização dos indivíduos e no desenvolvimento de habilidades de percepção e leitura
musical. Já a integração social se apresenta de forma extramusical, unindo pessoas de
diferentes realidades socioeconômicas e culturais, em prol de um objetivo comum, seja
ele musical ou não, como, por exemplo, o lazer e o puro prazer de cantar. A integração
social também ocorre na construção de valores (respeito, tolerância, cidadania,
afetividade, responsabilidade, etc.) e na formação de plateias, com a ampliação das
vivências culturais e do senso crítico, tanto dos cantores, quanto do público que prestigia
o coro (CHEVITARESE, 2017, p. 02, 03 e 05; LAKSCHEVITZ in FIGUEIREDO et. al., 2006, p.
90; FUCCI AMATO, 2007, p. 83 e 84; SCHIMITI, 2003, p.15).
Presente em diversos países e culturas, a prática coral, geralmente, é multietária,
inclusiva e destinada a crianças, jovens, adultos e idosos, amadores ou profissionais. Com
distintos objetivos e configurações de agrupamento, no Brasil, existem vários tipos de
coros: infantis, masculinos, femininos, adultos mistos, comunitários, sacros, de empresas,
profissionais, universitários, [jovens], infantojuvenis, líricos, sinfônicos, cênicos, de
câmara ou madrigais, de terceira idade e grupos vocais (JUNKER, 2002, p. 39 e 40). Tendo
a voz como principal instrumento, o canto coral depende de infraestrutura e
investimentos financeiros bem menos onerosos que outras práticas musicais coletivas, o
que torna sua implantação econômica e viável. Desta maneira, o canto coral pode ser
encontrado em contextos variados, como em escolas regulares, escolas de música, teatros,
ONGs, instituições religiosas, empresas etc.
Dentre tantas possibilidades de pesquisa na área da música coral, escolhemos
abordar, nesta tese, o coro infantil amador e suas especificidades no tocante ao preparo
técnico-vocal. Esta escolha foi pautada em nossa experiência profissional, em nossas
21

inquietações sobre a qualidade artística – ou a falta dela – em coros infantis brasileiros e,


por fim, na constatada escassez de materiais em português sobre pedagogia coral e vocal
infantil.
Nossa formação musical iniciou na infância, no Coral Infantil Pio X, em Jundiaí-SP,
sob regência da maestrina Silmara Drezza. Seguimos cantando em vários coros, dentre
eles, o Coral Juvenil da OSESP, Coro Jovem do Estado de São Paulo e Coro Contemporâneo
de Campinas, sob regência de Victor Hugo Toro, Naomi Munakata e Nibaldo Araneda, e
Angelo Fernandes, respectivamente. Nossa formação acadêmica se deu na graduação em
Licenciatura em Educação Musical, na Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita
Filho”, UNESP, e no mestrado e doutorado em Música, na Universidade de Campinas,
UNICAMP, sob orientação do Prof. Dr. Angelo José Fernandes. Também complementamos
nossa formação nos seguintes festivais de música: Semana Santa Teatro Del Lago (Chile),
San Juan Festival Coral (Argentina), Canto em Trancoso (Mozarteum Brasileiro e
Chorakademie Lübeck – Alemanha), Creating Artistry (Estados Unidos), Gran Finale:
Festival Nacional de Corais Infantis e Jovens, Festival de Corais de Catanduva, dentre
outros.
Durante o curso de doutorado, nossa atuação profissional foi como cantora,
regente de coros infantis e preparadora vocal. Como cantora, estudamos canto lírico, com
Andrea Kaiser, na Escola Municipal de Música de São Paulo, e com Angelo Fernandes; e
participamos como solista e corista de óperas e concertos com repertórios variados como:
“A Flauta Mágica” (Mozart), “Dido e Aeneas” (Purcell), Requiem (Mozart), Missa
(Stravinsky), Paixão Segundo São João (Bach), etc. Como regente, ressaltamos os
trabalhos no Canarinhos da Terra, com Grupo Allegretto e com os coros escolares
(Campinas e Jundiaí-SP), e no Coral da Gente do Instituto Baccarelli (São Paulo-SP). Como
preparadora vocal, trabalhamos com nossos coros e os coros jundiaienses “Coral Cênico
Infantil Dons e Tons” e “Coral Jovem Pio X”, além de ter realizado o estágio de docência
nas disciplinas de técnica vocal e tópico especial sobre preparo vocal para coro infantil,
destinadas aos alunos de Licenciatura em Música e Regência da UNICAMP. Toda a
experiência descrita influenciou e foi inestimável para a elaboração desta tese.
No nosso entender, a qualidade artística deve ser um dos objetivos principais de
um coro, seja ele infantil ou não. Ela pode ser mensurada pela sonoridade, afinação,
expressividade musical e performance, de maneira geral, graças à orientação vocal
consistente, ao planejamento de trabalho, à didática efetiva etc. Alcançar tal qualidade
22

demanda tempo, persistência, qualificação profissional e investimentos, e deve ser um


compromisso assumido pelo regente, com seus cantores e público.
Duas citações nos instigaram a pesquisar mais a fundo a qualidade artística de
coros infantis. A primeira delas é do maestro americano Henry Leck, que reconhece que
“crianças não são apenas ´graciosas’, ‘fofas’ ou ‘precoces’. Elas podem ser
verdadeiramente artísticas – muito mais do que a London Philharmonic ou o Metropolitan
Opera”1 (LECK, 2009, p. 06). Apesar de se tratar de algo motivador, nos questionamos
sobre o quanto esta afirmação é verdadeira para crianças brasileiras, uma vez que,
raramente no Brasil, se pode contar com a estrutura de trabalho existente em outros
países (equipe de profissionais especializados, local de ensaio acusticamente planejado,
crianças culturalmente musicalizadas, investimentos financeiros garantidos, etc.), em
especial aquela com a qual o citado maestro conta em sua prática à frente de coros
infantis.
Ao buscarmos referências nacionais, nos deparamos com a segunda citação. Neste
caso, uma afirmação bastante provocativa do maestro Oscar Zander:

Os meninos cantores distinguem-se dos coros infantis (formados por


crianças de ambos os sexos). Estes últimos, de caráter menos sério, não
têm literatura propriamente especializada, recorrem geralmente a
arranjos que vão ao encontro de tais agrupamentos. São coros, às vezes,
bastante bons e interessantes, mas sob o ponto de vista artístico não
atingem a altura, em beleza e capacidade, dos meninos cantores. Isto não
significa que devemos desprezá-los. É preciso estimular toda educação
musical, e sua função é de educação e formação geral da criança sem visar
a grandes pretensões artísticas. (ZANDER, 2008, p. 175 e 176)

Os meninos cantores são coros de tradição europeia, geralmente, formados


exclusivamente por meninos ou meninas (embora também possam ser coros mistos), que
enfocam o repertório litúrgico e os valores cristãos. Na realidade brasileira, existem
apenas “doze coros federados, oriundos dos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas
Gerais, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul” (http://puericantores.com.br/
institucional/), o que aponta que a maior parte dos coros infantis nacionais não têm essa
natureza. Embora a afirmação de Zander (2008) seja bem mais antiga que a de Leck, o
autor generaliza equivocadamente a respeito da qualidade artística dos coros infantis,
partindo do pressuposto de que, nestes grupos, não há preocupação com a performance

1 Children are not just “pleasant”, “cute” or “precocious”. They can be truly artistic – even more than the London

Philharmonic or the Metropolitan Opera. (LECK, 2009, p. 06)


23

musical. Isto nos parece ser muito mais uma escolha de trabalho do regente do que um
aspecto, obrigatoriamente, inerente ao coro infantil.
O autor também vê o potencial formativo de coros infantis como menos valioso do
que o potencial artístico. De fato, em nosso país, se faz necessário que muitos coros
infantis priorizem o viés social e educativo, em vez da performance artística, mas
acreditamos que seja possível conciliar ambos os potenciais. A respeito disto, Grau (2005)
afirma que nenhuma criança deve ser excluída da prática coral e que o envolvimento se
faz necessário, em um primeiro momento, para que, gradativamente, a interpretação
musical possa ser aprimorada (GRAU, 2005, p. 06 e 07). Chevitarese ainda complementa
dizendo que “é preciso pensar o coro como um espaço onde a formação e a performance
acontecem de forma indissolúvel, onde toda ação é educativa, onde a qualidade artística
é buscada a cada instante” (CHEVITARESE, 2017, p. 2 e 3).
Vemos no preparo vocal uma grande oportunidade de aprimoramento artístico,
por dialogar com elementos de repertório e musicalização, presentes na rotina de ensaios
de um coro infantil. Leck elenca os seguintes elementos que o regente deve pautar seu
ensino coral para crianças: concentração, postura, respiração, extensão vocal,
ressonância, afinação, colocação vocal, leitura e compreensão musical, comunicação do
texto e repertório de qualidade2 (LECK, 2009, p. 2). Podemos notar que a maior parte
deles está relacionada ao preparo vocal, reforçando sua relevância.
Muitos regentes reconhecem a importância da instrução vocal e, embora busquem
se capacitar em canto, se deparam com outro obstáculo: a escassez de materiais sobre
pedagogia para vozes infantis brasileiras, com todas as suas peculiaridades de fonética,
emissão e preparo vocal. Gaborim-Moreira e Ramos (2014) retratam bem esta situação:

(...) há poucos estudos que apresentam uma metodologia de trabalho


para o coro infanto-juvenil adaptada à realidade brasileira, levando em
conta as possibilidades vocais desse público. Assim, faltam estudos que
apresentem análises de procedimentos aplicados e apresentação de
resultados alcançados no coro infanto-juvenil, ou seja: o que fazer, como
fazer e o que se espera do trabalho de preparação vocal ao longo dos
ensaios. (GABORIM-MOREIRA e RAMOS, 2014, p.7)

Gois (2015) ainda vai além e aponta que a escassez de materiais não é apenas de
pedagogia vocal, mas de repertório, atividades didáticas e acesso a tudo isto:

2 Mental focus, posture/breathing, vocal range, resonance, intonation, buoyancy, reading, musical
understanding, text communication and quality literature. (LECK, 2009, p. 2)
24

Encontram-se escassos no Brasil, documentação e materiais disponíveis


sobre coro infantil. Referente a essa temática, há pouco material impresso
tanto no que se refere a publicações de composições e arranjos
específicos para voz infantil, quanto à produção bibliográfica e acadêmica
que possam auxiliar no levantamento histórico da trajetória e prática da
atividade de canto coral infantil no país.
Isso não significa que não tenha havido produção nacional na área de
composição e arranjos, mas grande parte do material produzido é de
difícil acesso. Muitos materiais de apoio para ensaios são produzidos
pelos próprios regentes, não para publicação, mas como suporte para sua
prática. (GOIS, 2015, p. 20)

A falta de acesso a bons materiais influi diretamente na capacitação do regente e


na qualidade do trabalho coral, no Brasil. A elaboração desta tese vem, pois, de encontro
com a necessidade de produção de materiais sobre coro e preparo vocal infantil.
Desejamos auxiliar, de forma significativa, os regentes brasileiros em suas práticas corais.
Além da produção de novos materiais, esta tese tem como objetivos: a
contextualização de aspectos e sujeitos envolvidos no trabalho coral e vocal infantil; o
incentivo a novos estudos sobre a temática; e, a longo prazo, a contribuição com a melhora
da qualidade artística de coros infantis brasileiros, através do treinamento vocal efetivo e
coerente com a inteligibilidade e a fisiologia da voz da criança.
Como metodologias de pesquisa realizamos um levantamento e uma revisão da
bibliografia, o relato de experiências, além da criação musical pautada em nossa prática
pedagógica. Nossos referenciais teóricos são autores que abordam a regência e a
pedagogia coral e vocal, dentre eles, destacamos Fernandes (2009), Carnassale (1995),
Sesc (1997), Leck (2009), Phillips (1992), Gaborim-Moreira (2015) e Lakschevitz (2006).
O trabalho encontra-se dividido em dois capítulos. No primeiro, apresentamos
contextualizações e considerações sobre a estrutura deste trabalho, o regente e o preparo
vocal de crianças. No segundo capítulo, apresentamos propostas de preparo vocal para
coro infantil, através de exercícios que utilizamos em nossa prática profissional. Alguns
deles foram revisados de materiais diversos da pedagogia vocal e coral, mas a maior parte
é de nossa autoria e foram criados com base em nossa experiência como regente,
preparadora vocal e cantora. Todos os exercícios estão escritos em partitura e detalhados
com cifras, transcrições fonéticas, extensão vocal, sugestões de tonalidade inicial,
andamento e nível de dificuldade, além de estratégias didáticas.
25

1. CONSIDERAÇÕES SOBRE CORO INFANTIL E PREPARO VOCAL

1.1. O CORO INFANTIL

No primeiro capítulo, nossa intenção é contextualizar a estrutura de trabalho de


um coro infantil segundo a nossa visão, bem como o perfil do regente, além da organização
do trabalho de preparo vocal. Estas contextualizações se fazem necessárias para que se
possa entender os pressupostos que embasaram nossa proposta pedagógico-vocal
apresentada no segundo capítulo. No texto que segue procuramos dialogar com
importantes estudiosos do Canto Coral, da Regência, do Canto e da Educação Musical a
partir de sua bibliografia e de relatos de experiências.

1.1.1. Faixa etária e possibilidades de agrupamento

Podemos definir “coro infantil” como a prática de canto coletivo com crianças e
pré-adolescentes que ainda não passaram pela muda vocal3. O termo “infantil” está mais
relacionado ao amadurecimento vocal do que à exclusividade de abranger crianças. Como
veremos, o coro que, hoje, é denominado infantil também tem sido formado por pré-
adolescentes e até adolescentes, em alguns casos.
Dentre os autores revisados, notamos que não há consenso sobre a faixa etária de
um coro infantil. Phillips (1992) e Bartle (1993), em seus livros, delimitam o coro infantil
de acordo com as séries escolares - do 1º ao 6º ano do Ensino Fundamental, ou ainda, dos
06 aos 12 anos de idade. Bartle também subdivide seus coros em School primary choir
(dos 06 aos 08 anos de idade) e School Junior choir (dos 09 aos 12 anos de idade)
(PHILLIPS, 1992, p. 59; BARTLE, 1993, p. 8 e 9). Já Sesc (1997) não recomenda a prática
coral com crianças com idade inferior a 06 anos e considera dos 07 aos 15 anos a faixa
etária ideal para um coro infantil (SESC, 1997, p.12 e 13).
Chevitarese (2017) considera a faixa etária ideal dos 08 aos 15 anos, ressaltando
que ela “traz em si uma ampla heterogeneidade em termos de amadurecimento

3 A muda vocal é o processo de amadurecimento vocal, que acontece na puberdade. Nesta fase, a fisiologia,

a extensão e o timbre da voz são alterados. As mudanças são mais aparentes nos meninos, mas as meninas
também passam por este processo. Nesta pesquisa não abordaremos as vozes em muda e suas
especificidades de trabalho, mas recomendamos a leitura de Leck (2009), Costa (2017), Carnassale (1995)
e Phillips (1992) para compreender melhor esta temática.
26

emocional, capacidade de concentração e de abstração, desenvolvimento intelectual,


entre outros” (CHEVITARESE, 2017, p.3). Ao configurarmos um coro infantil, devemos
considerar estes aspectos que estão diretamente relacionados com a faixa etária, como o
tipo de repertório, a dinâmica de ensaio, a capacidade de concentração, a coordenação
motora, as possibilidades vocais, o vocabulário e a abordagem usada pelo regente (SESC,
1997, p.12). Quanto maior for a faixa etária do grupo, mais desafiador será desenvolver
as necessidades específicas e tornar o trabalho acessível a todos os cantores.
Alguns coros infantis têm adotado a terminologia “infantojuvenil”, para ampliar a
faixa etária do grupo e porque, cada vez mais cedo, os próprios cantores não se
consideram e não gostam de ser chamados de “crianças”, pela conotação de pouco
amadurecimento e pouca autonomia que esta palavra pode ter (GABORIM-MOREIRA,
2015, p. 83). Também percebemos este comportamento em nossos cantores e os
respeitamos, tentando usar vocabulário e temáticas de repertório mais condizentes com
suas preferências. Não podemos esquecer que o termo “infantojuvenil” também está
relacionado à transição da infância à adolescência, fase de tantas particularidades, como
a muda vocal, que interfere e modifica a prática coral.
Costa (2017) considera que o coro infantojuvenil abarca a faixa etária dos 10 aos
14 anos, composta por alunos do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental II (COSTA, 2017, p.
22). A autora pauta esta classificação em diversos estudos e nos lembra que “a
Organização Mundial de Saúde (OMS) considera adolescência o período entre 10 e 20
anos de idade, sendo denominado pré-adolescência o período de 10 a 12 anos” (COSTA,
2017, p.18 op. cit. OLIVEIRA, 1995; SCHOEN-FERREIRA, 2010). Ela também enfatiza as
mudanças vocais, psicológicas e sociais que são enfrentadas por esta faixa etária e
recomenda que existam coros específicos de crianças, pré-adolescentes, adolescentes e
jovens adultos.
Considerando as informações supracitadas e a nossa própria experiência
profissional, nesta tese, adotaremos a terminologia “coro infantil” para a prática destinada
a crianças e pré-adolescentes que não mudaram de voz, na faixa etária de 6 a 11 anos,
estudantes do 1º ao 6º ano do Ensino Fundamental I e II. Utilizaremos “coro
infantojuvenil” para pré-adolescentes e adolescentes de 12 a 15 anos4, estudantes do 7º
ao 9º ano do Ensino Fundamental II.

4 Nossa classificação de coro infantojuvenil diferencia-se de Costa, ao iniciar aos 12 anos, no 7º ano, porque

acreditamos que o 6º ano é uma série de transição do Ensino Fundamenta I ao II e que os pré-adolescentes
27

Sesc sugere três possibilidades de agrupamento coral infantil e infantojuvenil, da


mais restrita à mais ampla formação:

Opção A Opção B Opção C


• De 7 a 9 anos • De 7 a 10 anos • De 7 a 12 anos
• De 10 a 12 anos • De 11 a 15 anos • De 9 a 15 anos
• De 13 a 15 anos

Tabela 1. Possibilidades de agrupamento coral infantil e infantojuvenil, segundo Sesc (1997, p. 12)

Na época em que o livro do Sesc foi editado, o Ensino Fundamental I iniciava aos 7
anos de idade. Hoje, ele inicia aos 6 anos e é preciso incluir esta faixa etária na prática
coral. Com base nos autores que já citamos e em nossa experiência docente, adaptamos e
sugerimos as seguintes possibilidades de agrupamento coral infantil e infantojuvenil:

Opção A Opção B Opção C


• De 6 a 8 anos • De 6 a 10 anos • De 6 a 12 anos
• De 9 a 11 anos • De 11 a 15 anos • De 13 a 15 anos
• De 12 a 15 anos

Tabela 2. Sugestões de agrupamento coral infantil e infantojuvenil

A opção B foi realizada com base na delimitação de Ensino Fundamental I e II. A


opção C, com base no amadurecimento vocal. A opção A, é a que consideramos ideal em
relação à faixa etária e à maturidade vocal e musical e a detalharemos, a seguir.
Além da faixa etária, o nível de desenvolvimento musical também pode influenciar
na configuração de um coro. A maturidade musical dos cantores define o tipo de
repertório a ser executado e, neste sentido, não é só a idade que delimita o nível do coro,
mas a experiência e o desenvolvimento dos cantores. Por exemplo, um cantor de 10 anos,
musicalizado desde pequeno, poderia integrar, com facilidade, um grupo intermediário
ou avançado, ao passo que um cantor de 12 anos, sem experiência musical prévia, embora
mais velho, em geral teria dificuldade em acompanhar estes grupos e se adaptaria melhor
a um grupo iniciante. A classificação e divisão dos coros por níveis de desenvolvimento

desta série já lidam com diversas adaptações escolares, assim, mantê-los no coro infantil pode poupá-los de
mais uma mudança. Além disso, em geral, a maior parte dos meninos de 10 e 11 anos ainda não iniciou a
muda vocal e pode continuar cantando com tranquilidade no registro agudo infantil.
28

pode proporcionar crescimento musical aos cantores e ao coro e, na medida do possível,


deve ser considerada pelos regentes.
Dentre os níveis de desenvolvimento, consideramos “Pré-coral” o nível iniciante
composto por crianças de 06 a 08 anos de idade, no qual, o principal objetivo é o de
musicalizar através do canto coral, com repertório e brincadeiras cantadas em uníssono,
com poucos textos e de fácil memorização. Os coros infantil e infantojuvenil podem
apresentar três níveis de desenvolvimento: “Iniciante”, “Intermediário” e “Avançado”. O
“Iniciante” também executa repertório em uníssono, com textos mais elaborados e com a
meta de se alcançar uma afinação mais refinada, para a futura performance de peças
polifônicas. O “Intermediário” deve ter conquistado a afinação mais precisa e pode cantar
a duas vozes iguais ou mistas5. O “Avançado” pode cantar afinado a 3 ou mais vozes iguais
ou mistas. Sintetizamos nossa proposta abaixo:

Nomenclatura Faixa etária Série escolar Nível de Repertório


desenvolvimento
Pré-coral 6 a 8 anos 1º e 2º ano Iniciante Uníssono
Coro infantil 9 a 11 anos 3º ao 6º ano Iniciante Uníssono
Intermediário 2 vozes iguais
Avançado 3 ou mais vozes
iguais
Coro infantojuvenil 12 aos 15 7º ao 9º ano Iniciante Uníssono
anos Intermediário 2 vozes iguais ou
mistas
Avançado 3 ou mais vozes
iguais ou mistas

Tabela 3. Sugestão de agrupamentos corais de acordo com faixa etária, série escolar, nível de
desenvolvimento musical e repertório

Outras questões pertinentes ao se planejar a configuração de um agrupamento


coral são a quantidade de cantores e a frequência e duração dos ensaios. Sesc aponta que

5 Caso o coro seja infantojuvenil e os meninos tenham começado o processo de muda vocal, se torna
necessário criar um naipe de vozes masculinas em amadurecimento, que pode ser denominado de
“barítono”, mas que não possui a mesma extensão e características vocais de barítonos adultos e de muda
completa. Neste naipe de barítonos juvenis o regente deve adaptar os arranjos à tessitura vocal de seus
cantores, lembrando que tal tessitura pode ser bem restrita, instável e desafiadora nesta fase de mutação.
29

um coro infantil deve ter pelo menos 20 cantores e que o número ideal é de 30 a 50
cantores, considerando, dentre outros aspectos, o espaço físico do local de ensaio, o
número de profissionais que atuam e a divisão de vozes, pois é mais difícil afinar e soar
com grupos pequenos (SESC, 1997, p. 11). Desta forma, o número de cantores deve ser
levado em consideração ao se executar as subdivisões corais supracitadas. É mais
produtivo um grupo mais numeroso e com faixa etária mais ampla do que um grupo
menos numeroso e com mais subdivisões por idade.
Com relação à frequência e duração dos ensaios, Lakschevitz (2006) aponta como
ideal ensaiar duas vezes por semana, durante uma hora e meia (LAKSCHEVITZ, 2006, p.
74). Sesc também recomenda ensaios duas vezes por semana, tendo a duração de uma
hora e quinze minutos para a faixa etária dos 07 aos 10 anos e uma hora e trinta minutos
para a faixa etária dos 11 aos 15 anos de idade. No período de apresentações, a
periodicidade e duração dos ensaios pode ser maior, conforme a necessidade de cada coro
(SESC, 1997, p. 123).
De acordo com nossa experiência com coros infantis de performance, concordamos
que o número mínimo deva ser o de 20 cantores e que a frequência dos ensaios deva ser
de duas vezes por semana, em dias alternados. Abaixo, sintetizamos aspectos que
consideramos ideais para pré-corais e coros infantis6:

Tipo de coro Número de cantores Duração e frequência de ensaio


Pré-coral 30 a 40 1h15, 2 vezes por semana
Infantil iniciante 40 a 50 1h30, 2 vezes por semana
Infantil intermediário 40 a 50 1h30 a 2h, 2 vezes por semana
Infantil avançado 40 a 60 2h a 2h30, 2 vezes por semana

Tabela 4. Número de cantores, duração e frequência de ensaios considerados ideias para Pré-coral e Coro
infantil iniciante, intermediário e avançado

Ao se falar de coros escolares, não necessariamente performáticos e com objetivos


pautados em musicalizar através do canto coral e ampliar as vivências artísticas dos
alunos, a tabela 3 não se aplica, pois a estrutura de trabalho é diferente da de coros que
priorizam a performance. Em coros infantis escolares, é importante considerar o que é

6 Nossa maior experiência profissional é com coros infantis, então, ousamos opinar a respeito deles. Os
dados apresentados podem ser aplicados em outros tipos de coros (infantojuvenil, juvenil, jovem, adulto,
terceira idade etc), caso o regente ache coerente e pertinente.
30

produtivo com o espaço físico disponível (pátios, quadras, salas de aula, etc.), a acústica
ruidosa e a grande quantidade de cantores que se pode ter por turma. Com estas
condições de trabalho é muito importante o regente usar microfones e amplificação
adequada para não cometer abusos vocais. Sintetizamos os aspectos que consideramos
ideais para coros infantis escolares e não performáticos:

Séries Faixa Nível de Repertório Número de Duração e


escolares etária desenvolvimento cantores frequência de
ensaio
1º ao 3º ano 6a8 Pré-coral Uníssono 40 a 100 30 minutos, 1
anos vez por semana
4º e 5º ano 9 a 10 Iniciante Uníssono 40 a 100 30 a 45
anos minutos, 1 vez
por semana

Tabela 5. Estrutura considerada ideal para coros infantis escolares e não performáticos de Ensino
Fundamental I.

Cada regente pode adaptar a configuração de seu coro infantil de acordo com suas
realidades e possibilidades, sempre refletindo sobre a produtividade de seus ensaios e a
qualidade artística do trabalho desenvolvido. Sabemos que nossas propostas, por razões
diversas, podem não ser aplicáveis, mas desejamos que elas possam ser norteadoras e
contributivas.

1.1.2. Bases pedagógicas

O coro infantil é uma das práticas atuais da Educação Musical, com saberes e
especificidades que dialogam com outras áreas como o canto, a regência, a percepção
auditiva, a expressão corporal e a teoria geral da música. Rao (1993) afirma que “a
habilidade de cantar em um coro é uma forma de conhecimento”7 (RAO, 1993, p. 48). A
autora contextualiza esta prática da seguinte maneira:

A educação musical através da performance coral é um meio de ensinar


as crianças como fazer e como compreender música; um meio de
pesquisar com profundidade os elementos musicais, forma e estilos

7 The ability to sing in a choir is a form of knowledge. (RAO, 1993, p. 48)


31

expressos nas obras que estão sendo estudadas; um meio de ensinar


habilidades vocais, habilidades de leitura e conhecimentos musicais, e um
meio de apreciar a música em si mesma (...) A educação musical realizada
nos ensaios enfatiza o desenvolvimento da musicalidade – a
compreensão musical e a prática vocal combinada com a performance
artística. (RAO, 1990, p. 6 apud GABORIM-MOREIRA, 2015, p. 102)

Na citação acima, podemos perceber a preocupação da autora em enfatizar que a


prática coral desenvolve, ao mesmo tempo, o canto e a musicalidade. O canto, através do
preparo vocal e do repertório, enquanto que a musicalidade, além do repertório, pode ser
desenvolvida em atividades de musicalização, através da prática e da sistematização de
conhecimentos musicais. Assim, podemos delimitar três bases pedagógicas para o coro
infantil: o preparo vocal, o repertório e a musicalização, as quais abordaremos em
detalhes.
Vale ressaltar que as bases pedagógicas devem desenvolver os cantores de forma
global e integrada, tal como Lakschevitz (2006) descreve:

[O regente deve] procurar proporcionar experiências sociais, musicais e


artísticas, que façam com que ela [a criança] se torne parte de algo
importante, valorizado. A criança [deve se sentir] (...) à vontade para se
expressar, ao mesmo tempo em que respeita o espaço do colega. Há um
crescimento social, cultural, cognitivo, criativo, espacial, lógico etc. E se
aprende brincando. (LAKSCHEVITZ, 2006, p. 52)

Nesta citação, podemos notar que, além da ludicidade – que viabiliza a


aprendizagem infantil – a autora também aponta habilidades extramusicais envolvidas na
prática do coro infantil. Dentre estas habilidades, podemos apontar o prazer de cantar, o
crescimento pessoal, a integração social, a criatividade, a autoexpressão, o respeito, o
gosto pela arte, a formação de plateias, a ampliação das vivências musicais e da visão
crítica e a elevação da qualidade de vida (RAO, 1993, p.45 e SCHIMITI, 2003, p.2). Estas
habilidades extramusicais devem ser desenvolvidas e consideradas, para que o coro
infantil seja uma prática educativa ampla e diversificada.

1.1.2.1. Preparo vocal

O trabalho de preparo vocal, costumeiramente, acontece nos minutos iniciais do


ensaio e durante o trabalho com o repertório. Com base em Sesc (1997, p.35) podemos
dizer que sua importância se dá pelo aquecimento da musculatura corporal e fonatória;
pela manutenção da saúde vocal, com a prática de hábitos saudáveis de canto; pelo auxílio
32

ao estudo e montagem do repertório, resolvendo possíveis dificuldades musicais e


buscando a sonoridade coral adequada à cada peça; e pelo aprimoramento da afinação e
percepção auditiva.
Ele é composto por exercícios de alongamento, conscientização e postura corporal;
respiração; e vocalises para aquecimento e desenvolvimento técnico-vocal específico, que
podem englobar aspectos como ressonância, dicção, registração, afinação, musicalidade,
dentre outros.
Por integrar elementos de repertório e musicalização, acreditamos que o preparo
vocal possa influenciar diretamente a qualidade artística da performance coral e o
escolhemos como objeto de estudo a ser aprofundado, nesta tese. Iremos detalhá-lo
melhor, em tópicos ulteriores.

1.1.2.2. Repertório

O repertório de um coro diz muito sobre as preferências musicais, estéticas e


interpretativas de seu regente, seus cantores e seu público. Ele é o resultado final
apresentado e também reflete os elementos de preparo vocal e musicalização que
compõem o trabalho coral.
As possibilidades de repertório são diversas, abarcando gêneros musicais
populares, eruditos e folclóricos; de origem nacional e internacional; com
acompanhamento instrumental ou a capella8; em uníssono ou em vozes; e com temáticas
e estéticas específicas ou variadas (SCHIMITI, 2003, p. 15; VERTAMATTI, 2008, p.27;
SESC, 1997, p.68). Ele também pode ser escolhido com base no crescimento musical e
técnico-vocal que pode ser oferecido ao coro, através da prática e teorização de elementos
como pulsação, fórmulas de compasso, andamentos, rítmica, tonalidades, harmonia,
percepção auditiva, leitura e escrita musical, história da música, estética, colocação vocal,
tessitura, respiração, sonoridade coral, dicção, afinação etc. Além destes, o repertório
também pode proporcionar saberes extramusicais, como o contato com outros idiomas, a
aquisição de novos vocabulários, a interpretação de texto, a ampliação da formação
cultural e social, o estímulo à criatividade e à autoexpressão, dentre outros.

8 Termo italiano que significa “sem acompanhamento instrumental”.


33

Embora as possibilidades de trabalho sejam amplas, dependendo do contexto de


trabalho e da maneira como determinados repertórios são propostos, alguns regentes
podem encontrar dificuldades como a predileção musical e a falta de envolvimento dos
cantores. Isto ocorre devido à vivência musical limitada e ao repertório que, muitas vezes,
é distante do que é veiculado pela mídia e é consumido por estes cantores.
A respeito da predileção, Ilari (2009) aponta que há uma diferença entre
preferência e gosto musical. A preferência é passageira e mutável. O gosto é criado com a
experiência e o tempo, e é permanente:

Para alguns cientistas, como o educador musical Albert Leblanc (1981),


as preferências musicais são temporárias e, como vários modismos
musicais, desaparecem com a mesma velocidade que aparecem (...). Já o
gosto musical é mais estável, pois levou tempo e experiência para ser
formado. (...) A força da experiência é inegável! Ela é fundamental para a
transformação das preferências musicais em um gosto estável e fixo.
(ILARI, 2009, p. 55 e 56)

A autora também ressalta que pais, mães, cuidadores e educadores – inclusos


regentes – são importantes fomentadores de experiências musicais e têm grande
responsabilidade na ampliação do gosto musical de crianças e adolescentes (ILARI, 2009,
p. 55). Sobre esta responsabilidade, Sesc afirma que “a criança pode, a princípio, cantar
tudo. Mas a atividade coral deve buscar oferecer aquilo que dificilmente será vivenciado
por ela em outro lugar” (SESC, 1997, p. 69). Vertamatti (2008) complementa, dizendo que
“um dos objetivos importantes do processo educacional é promover a multiplicidade de
experiências [que contribuem] para a constituição do sujeito musical”. Assim, cabe ao
regente viabilizar repertórios variados que possam ampliar as experiências artísticas e
criar novas predileções musicais a seus cantores e plateia.
Quanto ao envolvimento dos cantores, ele é essencial para o sucesso do trabalho e
o repertório pode ser um chamariz e um forte aliado para isto. Ao escolher o repertório,
o regente deve ser cauteloso, avaliar as possibilidades vocais e musicais de seu coro e,
além de suas próprias preferências, também levar em consideração as preferências dos
cantores, para que haja um equilíbrio na escolha. Costa relata que assume esta postura de
equilíbrio em seus coros infantojuvenis, juvenis e jovens e nota que, conforme os coros se
desenvolvem musicalmente, mais receptivos a novos repertórios eles ficam, pois veem
estas novidades como desafios que promovem crescimento ao grupo. Assim, o regente
acaba tendo maior autonomia e pode propor repertórios mais complexos que, na maior
34

parte das vezes, não estará nas mídias. (COSTA, 2017, p. 24 e 25). Em nossa experiência
com coros infantis iniciantes e intermediários notamos o mesmo. Por exemplo, no início
do trabalho, realizamos a maior parte do repertório em português, com temáticas do
universo infantil (cotidiano, filmes, desenhos etc.). No decorrer do trabalho, músicas em
outros idiomas e consideradas folclóricas e eruditas também são inseridas e passam a ser
apreciadas pelos cantores.
A respeito da escolha de músicas midiáticas, além de não ampliarem, efetivamente,
o repertório dos cantores, elas podem possuir vocabulário e temáticas inapropriadas a
crianças, extensões vocais muito amplas e difíceis de serem adaptadas em arranjos corais,
e conterem modelos vocais que usam portamentos, ataques vocais bruscos e outros
recursos prejudiciais à voz infantil. A respeito destes modelos vocais, Assef alerta que:

(...) mesmo que as canções sejam transpostas para uma tonalidade


adequada, o referencial de escuta, o modelo sonoro permanece forte. (...)
a prática da linguagem sonora de seu meio cultural traz vícios e padrões
de emissão difíceis de serem modificados. (...) o professor deve sempre
procurar sonoridades que não causem nenhum tipo de dano à saúde
vocal da criança. (ASSEF in SOBREIRA, 2013, p. 57)

O zelo à saúde vocal9 dos cantores é uma responsabilidade do regente e deve ser
um aspecto considerado. Assef nos encoraja a buscar novos repertórios para evitar tais
modelos equivocados, mesmo que eles causem certo estranhamento, no início. Ele define
que “novo” não precisa ser repertório estrangeiro, pois “nosso rico manancial musical
[também] deve ser revisitado com foco na sonoridade infantil” (ASSEF in SOBREIRA,
2013, p.57). Ao executarmos repertórios folclóricos e populares brasileiros, resgatamos
nossa cultura, o que torna a prática coral mais educativa e significativa.
Incentivamos a atualização e aquisição de novos materiais, porém, sabemos que o
acesso a partituras e arranjos destinados a coros infantis pode ser uma problemática
enfrentada por regentes brasileiros. Em países da América do Norte e Europa, por
exemplo, há um mercado específico de editoração e venda de partituras, no qual as cópias
e os direitos autorais são tratados com maior rigor, do que no Brasil, onde tudo é
fotocopiado. Para amenizar esta situação, sugerimos o contato e a troca de materiais com

9 Dentre outros aspectos, consideramos como zelo à saúde vocal a priorização do preparo vocal e da emissão

sem tensões e esforços vocais desnecessários, como cantar “gritando”, com posturas corporais incorretas e
respiração torácica, por exemplo. Além da conscientização do processo fonatório, a viabilização de dicas de
cuidado com a voz etc.
35

outros regentes, a confecção de arranjos e composições autorais e a criação de acervos


físicos e virtuais em que o regente possa ter fácil acesso a peças corais, de forma gratuita
ou a preços acessíveis. A internet é uma excelente ferramenta de pesquisa, na qual muitos
materiais já estão disponibilizados. Devemos tê-la como aliada para viabilizar novos
repertórios e diminuir fronteiras culturais.

1.1.2.3. Musicalização

Sesc define musicalização como “processos que preparam a criança para a


iniciação musical”, considerando como processos de musicalização “percepção do
esquema corporal, coordenação motora e relaxamento, orientação espacial e temporal,
atenção e reação, discriminação pelo ouvido da altura, intensidade, duração, ritmo e
formas musicais” (SESC, 1997, p. 13). Schimiti e Chevitarese destacam que o canto coletivo
é um excelente instrumento de musicalização, ao propiciar a vivência concreta de
diversos parâmetros musicais (SCHIMITI, 2003, p. 15; CHEVITARESE, 2017, p. 2).
A musicalização através do canto coral ocorre durante todo o ensaio: no preparo
vocal, no repertório, em atividades de desenvolvimento de habilidades de percepção,
leitura e escrita musical e em brincadeiras musicais, que incentivam a integração social e
a aprendizagem lúdica. Compreendemos a musicalização como um termo amplo e
integrado, porém, nesta tese, consideraremos a base pedagógica “musicalização” voltada
a atividades que possuam o objetivo específico de desenvolver tais habilidades.
Atividades de musicalização podem abarcar conhecimentos como pulso, figuras
rítmicas, pausas, tonalidades, intervalos, claves, dinâmicas, andamentos, estruturação,
harmonia etc., sendo relevantes porque o canto coral é uma prática de Educação Musical
e pode ser a única possibilidade de aprendizagem musical de muitos indivíduos. É
importante que eles tenham contato com noções básicas e não se sintam leigos em Música.
Estas atividades também podem ser nomeadas de “alfabetização musical”. Nesta
tese, não adotaremos este termo, pois nos parece que nele está implícito o enfoque teórico
e acreditamos que os processos de musicalização são mais recorrentes e significativos
quando têm sua origem na prática. Chevitarese aponta que, na atualidade, o trabalho coral
tem a função de sensibilizar musicalmente a criança [e outros indivíduos de faixas etárias
distintas], partindo da prática para desenvolver os conhecimentos já citados
(CHEVITARESE, 2017, p.2). Lakschevitz reforça esta ideia, afirmando que a ela: “parece
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um caminho mais lógico que uma criança tenha a oportunidade do fazer musical e, a partir
daí, comece a demandar o conhecimento e o apuro técnico, e não o inverso”
(LAKSCHEVITZ, 2006, p. 68).
A priorização da prática ante a teoria musical é um dos princípios das pedagogias
ativas de Educação Musical que surgiram no século XX e perduram até hoje, tendo como
importantes representantes Émile Jaques-Dalcroze (1865-1950), Zoltán Kodály (1882-
1967), Edgar Willems (1890-1978), Carl Orff (1895-1982), Shinichi Suzuki (1898-1998),
Murray Schafer (1933), Keith Swanwick (1937), dentre outros. Recomendamos que os
regentes conheçam melhor as pedagogias musicais ativas e as tenham como aliadas para
o desenvolvimento da percepção, leitura e escrita musical.
Em nossa experiência profissional, adotamos algumas propostas pedagógicas de
Dalcroze e Kodály para trabalhar leitura rítmica e melódica e costumamos usar partituras
para aprender o repertório e contextualizar os elementos musicais encontrados nas peças
executadas. Notamos que nossos cantores se sentem estimulados e desafiados a aprender
música com estas propostas pedagógicas.
Sabemos que, muitas vezes, a estrutura das salas de ensaio, a falta de materiais, o
tempo restrito e a agenda de concertos são impedimentos para a realização de atividades
de musicalização. Mesmo assim, incentivamos que o regente planeje e inclua na rotina de
ensaios algumas destas atividades, as quais podem ser trabalhadas em paralelo com o
repertório, para otimizar o tempo de ensaio. Elas podem conter níveis diferentes de
dificuldade e o desenvolvimento musical do coro deve ser respeitado.
Por lidarmos com crianças, a ludicidade deve estar presente em todas as bases
pedagógicas. Atividades de musicalização podem ser aplicadas em forma de brincadeiras;
brincadeiras cantadas podem ser empregadas como vocalises; e o ensaio pode ser
planejado como um grande jogo, com regras e “competições” desafiadoras e saudáveis,
por exemplo.
Através do brincar a criança se desenvolve e aprende de forma mais prazerosa e
adequada às suas necessidades cognitivas, tal como afirma Sesc:

Todas as crianças têm inclinação natural para o jogo e a brincadeira.


Quando brincam, elas nos transmitem, na maioria das vezes de uma
forma não verbal, seus pensamentos, sentimentos e desejos. A criança
processa a informação, aprende como aprender e constrói o significado
de seu dia-a-dia, naturalmente, quando brinca. (SESC, 1997, p. 09)
37

No contexto coral, através de brincadeiras e jogos musicais podemos trabalhar


integração social, esquema corporal, coordenação motora, lateralidade, expressão
corporal e cênica, espacialidade, criatividade, improvisação, resgate cultural etc. Brincar
pode ser um dos momentos preferidos do ensaio e pode estimular os cantores a serem
assíduos, participativos e envolvidos com a prática coral.
O repertório de brincadeiras musicais pode ser pesquisado em materiais de
Educação Musical, em nosso cancioneiro folclórico e, até mesmo, em atividades de outras
áreas de conhecimento como Educação Física, Dança, Teatro etc. Recomendamos que o
regente destine alguns minutos do ensaio para este momento lúdico e que as outras bases
pedagógicas sejam igualmente divertidas para os cantores.

1.1.3. Roteiro de ensaio

O ensaio coral deve ser planejado, objetivo e dinâmico. Nele acontecem os


processos educativos e interpretativos cujos resultados são apresentados ao público.
A organização do ensaio engloba o planejamento dos exercícios vocais, do
repertório, das atividades de musicalização e das brincadeiras, bem como os materiais
(arranjos, partituras, bilhetes, etc.) e o espaço físico que serão utilizados. O espaço físico
deve ser amplo, limpo, com cadeiras móveis, sem interferência de ruídos externos, com
boa acústica, iluminação e ventilação (SESC, 1997, p. 122). Também deve contar com
instrumentos afinados e de boa qualidade para acompanhar o coro.
Ao planejar o ensaio, é importante levar em consideração a minutagem de cada
atividade, a quantidade de cantores, a faixa etária e seu respectivo tempo de concentração,
os compromissos futuros do coro e o desenvolvimento vocal e musical almejado. O ensaio
deve ser produtivo. A respeito da concentração, os cantores costumam estar mais focados
no início do ensaio, então, é interessante que as atividades que exigem maior atenção
sejam realizadas neste momento. O silêncio é fundamental para a concentração do grupo
e ele deve ser retomado sempre que preciso. As repetições dos vocalises e do repertório
devem ser lúdicas e objetivas para que se evite a monotonia, o desinteresse e a
desconcentração dos cantores. Jogos de atenção e com desafios também contribuem para
o bom rendimento dos cantores e podem ser aplicados entre as atividades.
Incentivamos que os regentes sempre prepararem seus ensaios com antecedência,
porém, sabemos que, por diversos motivos, às vezes, o planejamento não pode ser
38

seguido. Quando isto acontece, o regente deve ser flexível e tentar aproveitar ao menos
alguns dos elementos já programados. A organização dos ensaios com metas a serem
cumpridas e com reflexões constantes sobre o que foi, de fato, efetivo, propicia
crescimento ao regente e ao coro.
Com base em Sesc (1997, p. 125), Mathias (1986, p. 28 e 29) e em nossa própria
experiência, elaboramos uma sugestão de roteiro de ensaio, contendo as bases
pedagógicas detalhadas e ordenadas, e o tempo aproximado de trabalho de cada uma
delas, para o pré-coral e os coros infantis iniciante e intermediário, com os quais estamos
mais habituados a trabalhar. O avançado pode seguir os mesmos parâmetros do
intermediário. Nossas sugestões não são fixas e imutáveis, o regente pode adaptá-las à sua
realidade e necessidade, afinal, cada coro é singular e cada ensaio, também.

Atividade Pré-coral Iniciante Intermediário


Preparo vocal:
• Alongamentos
• Postura 15 minutos 20 minutos 30 minutos
• Respiração
• Vocalises
Repertório:
• Música nova ou trechos
com dificuldades 35 minutos 45 minutos 65 minutos
• Música recém-aprendida
• Músicas conhecidas
Musicalização:
• Atividades de
musicalização 20 minutos 20 minutos 20 minutos
• Brincadeiras musicais
Avisos finais 05 minutos 05 minutos 05 minutos
Duração do ensaio 75 minutos 90 minutos 120 minutos
(1h15) (1h30) (2h)

Tabela 6. Sugestão de roteiro de ensaio para pré-coral, coro infantil iniciante e intermediário

Para coros infantis escolares e não performáticos do Ensino Fundamental I,


sugerimos o seguinte roteiro de ensaio:
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Atividade 1º ao 3º ano 4º e 5º ano


Preparo vocal:
• Alongamentos
• Postura 10 minutos 15 minutos
• Respiração
• Vocalises
Repertório:
• Música nova ou trechos com dificuldades
• Música recém-aprendida 15 minutos 20 minutos
• Músicas conhecidas
Musicalização:
• Atividades de musicalização
• Brincadeiras musicais 05 minutos 10 minutos
Duração do ensaio 30 minutos 45 minutos

Tabela 7. Sugestão de roteiro de ensaio para coros infantis escolares e não performáticos de Ensino
Fundamental I

1.2. O REGENTE DE CORO INFANTIL

Para reger um coro infantil não basta apenas gostar de crianças e de cantar. Como
visto, as bases pedagógicas deste coro dialogam com áreas e saberes diversos e seu
regente deve investir em uma formação profissional igualmente ampla e contínua. Dentre
as funções que o regente pode exercer, podemos elencar, como principais, a de intérprete
e educador musical e vocal.
Como intérprete, o regente tem a missão de transmitir ao ouvinte a mensagem
musical contida na partitura e idealizada por seu compositor (GRAU, 2005, p. 77).
Segundo Fernandes (2009):

Uma composição coral é uma proposta do compositor na qual, a partir de


um texto, ele propõe o ritmo, o andamento, as diferentes frequências das
vozes, a dinâmica e a expressão. Sua execução vai depender da realização
correta da afinação, da articulação inteligível do texto, além de outras
qualidades técnico-vocais do coro administradas pela competência do
regente que, assumindo sua função de intérprete, deve moldar sua visão
da obra expressando-a através da sonoridade resultante deste processo.
(FERNANDES, 2009, p. 197)

Para expressar-se de forma embasada e artística, ao regente-intérprete compete o


pleno domínio da linguagem musical (teoria, harmonia, análise, contraponto, arranjo,
40

história da música, estética, instrumentação e organologia), de técnicas de regência, de


conhecimento de literatura coral (pesquisa, seleção, execução e apreciação de repertórios
variados) e de uma rotina de estudos (gestual, leitura à primeira vista, treinamento
auditivo, canto, instrumentos, idiomas estrangeiros etc.) (AMATO, 2008, p, 16 e 18; SESC,
1997, p. 19; GOIS, 2015, p. 33-37; GRAU, 2005, p. 78-81; MATHIAS, 1986, p.20).
D’Assumpção Junior (2010) afirma que “nem todo professor de música, enquanto
educador, precisa ser um regente de coros, mas todo regente de coros, precisa ser um
educador” (D’ASSUMPÇÃO JUNIOR, 2010, p. 10), o que reflete o potencial pedagógico do
canto coral e a necessidade de se ter um regente que atenda este perfil. O regente,
enquanto educador musical, viabiliza a aprendizagem de todos os aspectos musicais e
interpretativos já mencionados; para tal, é recomendado que ele tenha conhecimentos
básicos de psicologia infantil e pedagogias musicais, corais e vocais, além de,
constantemente, planejar e avaliar seus ensaios, almejando o processo de
desenvolvimento contínuo de seu coro (SESC, 1997, p. 19; GOIS, 33-37). Como vimos, o
regente também pode ser um agente social, que musicaliza cantores e plateia, em seus
concertos. Como intérprete e educador, ele deve ter tal preocupação formativa e estética.
A maioria dos coros amadores brasileiros (infantis, infantojuvenis, juvenis, jovens,
adultos e de terceira idade) possui restrições orçamentárias, o que impossibilita a
contratação de profissionais especializados e faz com que seus regentes tenham que atuar
também como preparadores vocais, instrumentistas, produtores, administradores,
arquivistas, montadores, faxineiros etc. Sobre ser preparador vocal, Herr (1998) aponta
que, muitas vezes, o regente será o único professor de canto de seus cantores e, portanto,
precisa ser responsável com as vozes confiadas a ele (HERR in FERREIRA et al, 1998, p.51
e 56). Fernandes complementa:

Brandvik (1993, p.149) afirma que uma estimativa aproximada revelou


que pelo menos 95% dos cantores corais de todo mundo (14.250.000 em
1992) não estudam canto com um professor particular, de onde se conclui
que o preparo vocal desses milhões de coralistas está nas mãos de seus
regentes. (FERNANDES, 2009, p. 197)

Embora os dados não estejam atualizados, eles servem para dimensionar a


abrangência da prática coral e a importante função que o regente exerce como educador
vocal. Entendemos que este educador não precisa ser um exímio cantor, mas acreditamos
ser imprescindível que ele estude canto, conheça as suas possibilidades vocais e as de seus
41

cantores (com todas as particularidades da faixa etária do coro), tenha noções básicas de
fisiologia vocal e corporal, e, ao realizar o preparo vocal, utilize uma terminologia
apropriada e uma pedagogia eficaz (FERNANDES, 2009, p. 200).
A falta de familiaridade com o canto limita o regente como intérprete e coloca em
risco a saúde vocal e a qualidade artística de seu coro, impedindo, por exemplo, a execução
de variações de dinâmicas e de sonoridades corais, que podem ser um diferencial
interpretativo do grupo (FERNANDES, 2009, p. 198). O domínio do canto possibilita ao
regente perceber, diferenciar e corrigir as dificuldades vocais (técnicas e fisiológicas) que
o coro venha a ter (DRAHAN, 2008, p. 02), o que nos leva a incentivá-lo, novamente, a
estudar canto e/ou integrar outros coros, para que possa praticar, ampliar sua percepção
vocal e praticar e desenvolver suas capacidades vocais.
Outra justificativa plausível para o estudo de canto e o acompanhamento
profilático com especialistas em saúde vocal (otorrinolaringologistas, fonoaudiólogos,
etc.) é que o regente de coro amador (independente da faixa etária de abrangência) é o
principal modelo vocal de seus cantores. Leck recomenda que a voz do regente de coros
infantis seja afinada, ressonante, musical e livre de tensões (LECK, 2009, p. 32). Sugerimos
ainda que, em seus exemplos vocais, o regente evite cantar com portamentos
desnecessários, respirações e pronúncias incorretas e esteja ciente de que o coro imitará
com exatidão as referências vocais e musicais que receber. Os exemplos vocais e a
condução do preparo vocal devem ser fiéis aos ideais sonoros almejados e a proficiência
em canto possibilita ao regente esta coerência.
Quando abordamos o modelo vocal do regente em coros infantis, duas polêmicas
podem surgir: o canto com vibrato e o uso do falsete pelo regente homem.
O vibrato natural da voz é fruto de um processo técnico-vocal que inclui a boa
administração da respiração, o equilíbrio do ataque vocal e a sensação de liberdade na
região da laringe, proporcionando mais harmônicos e uma emissão vocal livre de tensões,
aspectos positivos para um modelo vocal. Desta forma, acreditamos que o uso do vibrato
não deve ser evitado, desde que seja utilizado de forma natural, sem afetar a boa
inteligibilidade do texto e a precisão da afinação. Vale lembrar que uma criança não
conseguirá soar como um adulto, pois seu trato vocal, pulmões e pregas vocais são
menores, o que a impede de cantar com o vibrato de uma voz madura.
Quanto ao uso do falsete, no caso de regentes homens, recomendamos que eles o
desenvolvam e o utilizem para que as crianças não precisem se preocupar com
42

transposições e escutem uma voz mais semelhante às suas. Caso o falsete não possua boa
qualidade sonora e boa afinação, é preferível que o regente homem cante em sua tessitura
confortável. Em síntese, defendemos que o regente, como modelo vocal de seus coros,
deve cantar com sua melhor voz, seja ela com vibrato, em falsete ou plena.
Além de intérprete, educador musical e vocal, outras habilidades extramusicais são
recomendadas a um regente de coro, como liderança, responsabilidade, disciplina,
organização, ética, senso de humor, afabilidade, humildade, gestão de pessoas, trabalho
em equipe, preparo físico, equilíbrio psicológico, boa comunicação, etc. (GOIS, 2015, p. 33
a 37; SESC 1997, p. 19; GRAU, 2005, p. 78-81; MATHIAS, 1986, p.18 e 19). Propor-se a
reger um coro infantil deve ser uma decisão tomada após uma reflexão sobre o perfil
profissional relatado e na certeza de que um trabalho com crianças não deve ser medíocre.
Elas merecem a melhor prática musical e têm plenas condições de serem artísticas,
cabendo ao regente objetivar e trabalhar em prol disto.
Grau afirma que a qualidade artística de um coro está diretamente relacionada à
qualidade do profissional que o conduz (GRAU, 2005, p. 103). Em teoria, já sabemos quão
ampla deve ser a formação de um regente, porém, como, de fato, ela tem acontecido, no
Brasil? Em que contextos ela é realizada? Existem materiais de apoio relevantes e em
português? Onde encontrá-los?
No princípio de nossa pesquisa chegamos a fazer um levantamento sem maiores
aprofundamentos sobre alguns cursos livres, grades curriculares de universidades de
Música, publicações acadêmicas e materiais em português, sobre regência e pedagogia de
coro infantil. Encontramos pouca divulgação e oferta de cursos livres, os quais estão
centralizados em apenas alguns estados brasileiros. Analisamos grades curriculares dos
cursos de Regência, Licenciatura e Canto de universidades públicas do estado de São
Paulo, os quais podem originar potenciais regentes de crianças, e constatamos que
disciplinas sobre coro infantil, quando existem, são, em geral, eletivas e não oferecidas
anualmente. Também são poucas as universidades brasileiras que possuem projetos de
extensão com coro infantil, que viabilizam esta formação profissional. As publicações
acadêmicas (artigos, dissertações, teses) e materiais que encontramos sobre a temática
também não são muito numerosos. A maioria dos materiais ainda é de origem estrangeira
e, quando disponíveis para compra, não são tão acessíveis.
A formação e capacitação contínua de um regente de coros infantis também pode
ser realizada através do contato e troca de materiais com outros regentes e da apreciação
43

musical de materiais audiovisuais e em concertos corais, por exemplo. Porém, ao


considerarmos o tamanho de nosso país e as vastas possibilidades de trabalho de coros
infantis, percebemos que todas estas ações ainda não são suficientes. Este cenário nos
alerta e incentiva a pesquisar; ampliar o acesso a conhecimentos; sugerir a criação de
cursos e disciplinas específicas sobre pedagogia coral infantil (na universidade e fora
dela); reativar, efetivamente, as associações de regentes; e a viabilizar materiais em sites
e publicações especializados nesta área. Precisamos pensar no legado que queremos
deixar ao canto coral infantil brasileiro e nos articular para fomentar saberes aos futuros
regentes.

1.3. A voz infantil

Ao lidarmos com vozes infantis que estão em plena formação, é recomendável que
conheçamos algumas de suas características fisiológicas e sonoras, para que o potencial
artístico destas vozes seja explorado com cuidado e eficácia.
Embora existam exceções, a voz infantil, geralmente, é aguda, leve, clara e, por
questões fisiológicas, não deve soar como a voz de um adulto. A laringe da criança difere-
se da adulta, dentre outros aspectos, por sua posição e tamanho. Ao nascermos, a maior
parte das estruturas cartilaginosas da laringe não está ossificada e um longo processo de
desenvolvimento se inicia, sendo que somente por volta dos 65 anos de idade é que ela
fica completamente ossificada, em posição fixa. A laringe de um recém-nascido está
posicionada na parte superior do pescoço, atrás da mandíbula, entre as vértebras
cervicais C2 e C4. Aos 5 anos, ela posiciona-se na vértebra C6 e entre os 15 e 20 anos, na
C7. Com o passar das idades, a laringe cresce, se desenvolve e abaixa. Assim, as extensões
vocais graves passam a existir, interferindo no timbre e na extensão da voz. (SATALOFF,
2005, p. 50 e 51; PRAKASH E JOHNNY, 2015,
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4439709/)
As pregas vocais são bem pequenas e, no processo de fonação, junto com o ar
advindo dos pulmões e os ressonadores e articuladores (cavidades nasais e orais), são
responsáveis pela produção da voz falada e cantada. Sataloff (2005) mensura o
comprimento total das pregas vocais infantis de 6 a 8 mm, da mulher adulta de 12 a 17
mm e do homem adulto de 17 a 23 mm (SATALOFF, 2005, p. 51). Prakash e Johnny (2015)
complementam, afirmando que no recém-nascido o comprimento total das pregas vocais
44

é de 2,5 a 3 mm, na mulher adulta de 11 a 15 mm e no homem adulto de 17 a 21 mm


(https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4439709/).
Conforme estes dados, podemos perceber que as pregas vocais de uma criança têm
menos de um centímetro. Por serem tão delicadas, esforços e abusos vocais devem ser
evitados para que não lesionem, por exemplo, o ligamento das pregas vocais, o qual está
em formação. Ao imitar a voz de adultos, a criança pode lesionar este ligamento, o que
pode ser irreversível. Portanto, não se deve incentivar crianças cantem como cantores
populares e líricos adultos, uma realidade bastante comum em concursos e programas de
televisão e outras mídias. Criança deve soar como criança.
Até passar pela muda vocal, meninos e meninas têm extensão e características
vocais semelhantes, o que impede uma classificação restrita e imutável entre soprano,
mezzo soprano e contralto. Em nossos coros, utilizamos a nomenclatura “voz um”, “voz
dois” e “voz três”, para cantar das linhas mais agudas às mais graves, respectivamente.
Porém, dependendo da peça, mudamos a configuração e alguns cantores vivenciam todos
estes naipes. Para tal divisão, também consideramos o timbre, o desenvolvimento
musical, a tessitura, extensão e registros vocais de cada cantor.
Tessitura, extensão e registros vocais são aspectos variáveis, de acordo com a
idade, o desenvolvimento técnico-vocal e a estrutura fisiológica de cada indivíduo. A
tessitura “pode referir-se à extensão de notas que um cantor é capaz de produzir com o
maior conforto e sem preocupação com limitações técnicas” (REID, 1983, p.372 apud
CARNASSALE, 1995, p. 85) e pode determinar a região em que se canta com maior
qualidade. A extensão vocal pode ser definida como “a quantidade de notas ou distância
[intervalar] entre a nota mais aguda e a nota mais grave que uma pessoa pode cantar”
(PHILLIPS, 1992, p.55). Extensão é mais ampla e engloba a tessitura, porém, nem todas as
notas alcançadas são cantadas com conforto e realçam as maiores potencialidades do
cantor. Ela também pode ser dividida em três regiões ou registros: agudo ou voz de
cabeça; médio ou voz mista; grave ou voz de peito.
A respeito destes parâmetros, Carnassale afirma que os estudos são contraditórios.
Alguns autores recomendam que o repertório infantil seja executado na limitada tessitura
de Dó a Lá centrais. Outros dizem que crianças têm extensão grande como a de adultos,
mas que ela não pode ser aplicada por inteiro no repertório, já que este contém palavras
e saltos intervalares maiores do que os que são trabalhados em vocalises (CARNASSALE,
1995, P. 85). Phillips concorda com Carnassale quanto ao repertório e aponta que crianças
45

podem cantar mais de duas oitavas, quando estão cantando e brincando


espontaneamente (PHILLIPS, 1992, P. 57). Em nossa prática docente, já vimos crianças
cantarem na extensão de Sol 210 a Dó 5 em vocalises, porém, de fato, as notas extremas
não são utilizadas no repertório. Recomendamos que coros iniciantes cantem o repertório
na tessitura de Dó 3 a Dó 4, evitando as notas graves e estimulando o uso da voz de cabeça.
Coros com mais experiência e sólido trabalho vocal podem cantar repertórios com a
tessitura sugerida de Lá 2 a Sol 4, a ser ampliada gradativamente.
Gaborim-Moreira, embasada em Wurgler (1990), realça que a extensão vocal
infantil varia de Láb 2 a Sol 4 e que a tessitura varia de Sib 2 a Ré 4. (WURGLER, 1990 apud
GABORIM-MOREIRA, 2015, p. 255). Leck cita Cooper, o qual afirma que a extensão vocal
de meninas e meninos sem muda vocal é de Sib 2 a Fá 4. (COOPER apud LECK, 2009,
p.180). Já Phillips descreve a extensão e tessitura, de acordo com a faixa etária, na seguinte
tabela traduzida por Carnassale:

Faixa etária Extensão Tessitura


7 anos Dó 3 a Dó 4 Ré 3 a Lá 3
8 anos Si 2 a Ré 4 Ré 3 a Si 3
9 anos Sib 2 a Mib 4 Ré 3 a Dó 4
10 anos Lá 2 a Mi 4 Ré 3 a Ré 4
11 anos Láb 2 a Fá 4 Ré 3 a Ré 4
12 anos Sol 2 a Sol 4 Dó 3 a Ré 4

Tabela 8. Extensão e tessitura vocal infantil, segundo Phillips (CARNASSALE, 1995, p. 86)

Na tabela 8, podemos notar que há um aumento de extensão e tessitura


proporcional ao aumento da faixa etária. Carnassale também compara os registros da voz
infantil, segundo Jacques (1963) e Phillips (1992):

Registros Jacques Phillips


Grave Sib 2 a Mib 3 Sol 2 a Dó 3
Médio Mi 3 a Dó 4 Dó 3 a Dó 4
Agudo Dó# 4 a Sol 4 Dó 4 a Sol 4

Tabela 9. Extensão dos registros da voz infantil, segundo Jacques (1963) e Phillips (1992) (CARNASSALE,
1995, p. 90)

10 Consideramos o Dó 3 como o Dó central do piano.


46

Gaborim-Moreira complementa os dados segundo Wurgler, o qual afirma que o


registro grave da voz infantil se situa entre Láb 2 e Láb 3 e o agudo entre Lá 3 e Sol 4.
Wurgler considera o registro médio como uma “região de passagem”, entre Ré 3 e Lá 3.
(WURGLER apud GABORIM-MOREIRA, 2015, p. 255). Assim, podemos concluir que ele
considera o registro grave de Láb 2 a Ré 3, o médio de Ré 3 a Lá 3 e o agudo de Lá 3 a Sol
4. A autora também detalha os registros médio e grave (voz falada e de peito) e agudo
(voz de cabeça) de três faixas etárias, na seguinte tabela adaptada de Williams (2010):

Faixa etária Voz falada e de peito Voz de cabeça


6 a 8 anos Lá 2 a Dó 4 Sol 3 a Sol 4
9 a 11 anos Sol 2 a Dó 4 Mi 3 a Lá 4
12 a 14 anos Fá 2 a Lá 3 (Meninas) e Mi 2 a Ré 3 a Lá 4 (podendo chegar a
Mi 3 (Meninos) Dó 5 – Meninas) e Ré 3 a Sol 4
(podendo emergir o falsete –
Meninos)

Tabela 10. Extensão dos registros vocais infantis segundo Williams (2010).
(GABORIM-MOREIRA, 2015, p. 255)

Ambas as tabelas possuem semelhanças. Segundo Jacques, Phillips e Wurgler, o


registro grave pode variar entre Sol 2 e Mib 3; o registro médio entre Dó 3 e Dó 4; e o
registro agudo entre Lá 3 e Sol 4 (opinião unânime dos autores). Na tabela de Williams
não é considerado o registro médio e é interessante notar que as crianças de 6 a 11 anos
têm registros mais semelhantes do que as de 12 a 14 anos, as quais, geralmente, estão em
muda vocal e se caracterizam como vozes infantojuvenis. De 6 a 11 anos, segundo
Williams, o registro grave varia de Sol 2 a Dó 4 e o registro agudo de Mi 3 a Lá 4. Os
meninos de 12 a 14 anos costumam ser mais graves do que as meninas. O registro grave
desta faixa etária encontra-se entre Mi 2 e Lá 3 e o registro agudo entre Ré 3 e Lá 4,
podendo ser alcançado até um Dó 5.
De fato, não há um consenso entre os autores sobre as exatas tessituras, extensões
e registros vocais infantis. Unindo as informações apresentadas, podemos sintetizá-las da
seguinte maneira:

Tessitura vocal Sib 2 a Ré 4


Extensão vocal Sol 2 a Sol 4
Registro agudo Lá 3 a Sol 4
Registro médio Dó 3 a Dó 4
Registro grave Sol 2 a Mib 3
Tabela 11. Tessitura, extensão e registros vocais infantis, conforme autores revisados.
47

É importante ressaltar que estes dados não são absolutos. Uma criança mais velha
e sem instrução vocal pode ter a extensão e tessitura menores do que uma criança mais
nova e que tenha instrução vocal, por exemplo. Outro aspecto a ser ressaltado é que os
coros infantis, geralmente, são multietários, então, a mesma tessitura do repertório será
cantada por indivíduos de idades diferentes. O regente não deve limitar suas
possibilidades de trabalho baseado nesta tabela, afinal, nosso intuito é ilustrar o alcance
vocal infantil e ampliar conhecimentos, em vez de interferir negativamente na prática
coral de nossos leitores.
Ao conhecer as características, qualidades, extensões, tessituras e registros das
vozes infantis, o regente pode desenvolvê-las com mais consciência e direcionar o preparo
vocal para atingir suas melhores potencialidades, embora o trabalho técnico-vocal seja
gradativo e muitos resultados sejam notados em longo prazo.

1.4. Preparo vocal para coro infantil

No âmbito deste trabalho técnica vocal e preparo vocal são sinônimos. Adotamos
a terminologia “preparo vocal”, por acreditarmos que a palavra “técnica” pode sugerir
aprimoramento por repetição e rígida disciplina, enquanto que “preparo” nos remete a
desenvolvimento gradual e permite processos de aprendizagem mais pedagógicos, os
quais priorizamos em nossa prática docente.
Contudo, preparo vocal e aquecimento vocal são diferentes. O aquecimento,
geralmente, é realizado no início dos ensaios e tem como objetivos preparar o corpo e os
mecanismos respiratórios e fonatórios para o canto. No aquecimento estão envolvidos
itens que detalharemos em tópicos seguintes como, por exemplo, alongamentos
corporais, conscientização da postura e respiração, vocalises com ressonâncias nasais e
orais (boca chiusa11 e vogais) e articulação. O preparo vocal, além de englobar os
exercícios de aquecimento, aborda também os vocalises para desenvolvimento técnico-
vocal específico (dicção, registração, extensão vocal, afinação, musicalidade, etc.) e pode
ser realizado no início e durante os ensaios, sanando dificuldades encontradas no
repertório (ritmo, melodia, harmonia, etc.), buscando, ainda, a sonoridade mais adequada

11
Termo em italiano que significa “boca fechada”. Refere-se ao canto de consoantes nasais como “Nh”
[ɲ], ”N” [n], ”M” [m] e ”Ng” [ŋ].
48

a ele. Tanto o aquecimento quanto o preparo visam a saúde vocal dos cantores e a
performance musical, tornando-a mais artística e expressiva. Smith e Sataloff (2006)
relatam o cotidiano de preparo vocal infantil da seguinte forma:

Todo ensaio de coro infantil começa com um período de aquecimento,


ajustando o uso da voz, da falada à cantada, e ensinando as bases do canto.
A ordem das atividades de aquecimento é a mesma de um coro adulto:
relaxamento, postura, respiração e ressonância. Os exercícios e suas
durações são modificados para que a criança tenha atenção e energia, no
coro. Exercícios para crianças podem ser baseados em sons de seu
cotidiano como risadas, suspiros e roncos. Ao se contar histórias pode-se
incluir a imitação de animais ou personagens imaginários que darão às
crianças o senso de confiança, enquanto exploram uma variedade de sons
e cores vocais. Selecionar modelos apropriados é o segredo do sucesso
neste processo de ensino. Usar recursos visuais como brinquedos, fitas,
pinturas e cartazes deixam o período de exercícios mais animado (...) O
espírito da brincadeira fará o aprendizado divertido e a concentração que
o regente terá de seu coro será maior. (SMITH e SATALOFF, 2006, P.
142)12

Na citação, podemos notar que, assim como no coro adulto, no coro infantil são
trabalhados os mesmos roteiros e princípios técnico-vocais, porém, com abordagens e
expectativas diferentes. Também são descritos recursos auditivos, visuais, corporais e
lúdicos, que viabilizam o ensino de canto a crianças. Leck chama estes recursos de âncoras
de aprendizagem, as quais podem ser auditivas, visuais e sinestésicas (físicas e com
movimento corporal). Ele baseia toda a sua metodologia de preparo vocal nas âncoras,
dada sua eficácia no trabalho com crianças. (LECK, 2009, p.20).
Tal como afirmam outros estudiosos da psicologia do desenvolvimento, Carnassale
(1996) explica que existem três tipos de pessoas quanto a forma de aprender e perceber
o mundo. Segundo a autora, algumas pessoas são visuais, outras auditivas e outras
sinestésicas. Todos os indivíduos possuem as três sensibilidades, porém, têm mais

12 Every children’s choir rehearsal opens with a warm-up period, adjusting the use of the voice from speaking

to singing and teaching the basics of singing. The order of the warm-up period activities is the same as with an
adult choir: relaxation, posture, breathing, and resonance. The exercises and their duration are modified to
meet the attention span and physical strength of the children in the choir. Exercises from children should be
based in sounds already available through life experience such as laughing, giggling, sighing, and snoring.
Story-telling that includes the imitation of barnyard animals or well-known imaginary characters will give the
children a sense of confidence while exploring a variety of vocal sounds and colors. Selecting appropriate
models is the secret to success in this approach. Using visual tools like puppets, ribbons, pictures, and banners
enlivens the exercise period. (…) The spirit of play will make the learning fun and will extend the length of time
the conductor can expend concentration from the choir. (SMITH e SATALOFF, 2006, P. 142)
49

tendências a uma delas. O regente pode abordar elementos que facilitem a aprendizagem
destas pessoas, em sua prática coral (CARNASSALE, 1995, p. 80 e 81).
Em nossa pesquisa, adaptaremos o termo “âncoras” de Leck para “recursos” de
aprendizagem. Podemos considerar recursos auditivos: sons, imitação vocal, histórias,
poesias, etc. Recursos visuais podem ser objetos, imagens, cartazes, cores, partitura e a
própria regência. Podem ser recursos corporais a manipulação e sensibilização de partes
do corpo, gestos, movimentações, encenações do cotidiano infantil, etc. Além de utilizar
no preparo vocal a imaginação, os jogos, as brincadeiras, a integração social e as
metáforas, que interferem na apreensão de conceitos abstratos, na percepção sonora e
corporal e na memorização (CARNASSALE, 1995, p. 80 e 81; GABORIM-MOREIRA, 2015,
p. 54). Nas figuras que seguem, exemplificamos um pouco destes recursos e algumas
estratégias de aplicação que usamos. Estes recursos foram comprados em lojas de
brinquedos e utensílios em geral e podem ser facilmente encontrados, adaptados e, até
mesmo, criados.
Para trabalhar a postura utilizamos a girafa de madeira (figura 1) e a flauta de
êmbolo (figura 2). A girafa possui um botão em sua base que, ao ser pressionado, faz com
que ela se fragmente em várias partes, como se estivesse “desmontando a postura”. De
forma silenciosa e visual, as crianças podem brincar de executar a postura correta e
incorreta conforme a manipulação da girafa. O uso da flauta de êmbolo é bastante
semelhante, porém, mais do que visual, a utilizamos como um recurso auditivo. Quando
as crianças escutam o som ascendente, executam a postura correta. Quando escutam o
som descendente, executam a postura errada. Esta brincadeira com a flauta também pode
auxiliar na percepção de sons agudos e graves, auxiliando na afinação.
50

Figura 1. Girafa de madeira Figura 2. Flauta de êmbolo

Para auxiliar na compreensão das crianças sobre o mecanismo respiratório


podemos usar a bola em formato de átomo13 ou “bola maluca”, como costuma ser
comercializada (figura 3). Ao inspirar, podemos abrir a bola, que fica redonda e expandida
como os pulmões cheios de ar e a musculatura respiratória. Ao expirarmos, a bola volta
ao formato de átomo e se contrai como os pulmões e a musculatura respiratória.
Recomendamos que o regente utilize o recurso visual da bola na frente do abdômen, para
evitar a respiração torácica e estimular a respiração diafragmática e intercostal.

Figura 3. Bola em formato de átomo

13 Aprendemos este recurso com a preparadora vocal e regente Claudia Cruz (São Paulo-SP).
51

Para tornar o trabalho com as vogais mais atrativo e significativo, podemos utilizar
os dedoches (figura 4), solicitando as vogais a serem cantadas nos vocalises e em
determinados trechos do repertório, para aprimorar a colocação vocal. O ideal é que o
regente não fale a vogal, apenas a mostre, mantendo, assim, os cantores mais atentos às
mudanças de vogais. Com crianças em processo de alfabetização, este recurso auxilia no
letramento.

Figura 4. Dedoches de vogais

Outro objeto para auxiliar a abertura da boca na execução de vogais como o


[o], [ɔ] e [ɑ]14 é a bolinha de tênis (figura 5), que pode ser decorada com cabelo e olhos e

cortada para que, quando a apertarmos, ela “abra a boca”. 15

Figura 5. Bolinha de tênis

A mola de brinquedo (Figura 6) também pode ser utilizada para a percepção da


colocação vocal vertical e em exercícios destinados à ampliação da extensão vocal, ao
expandir a mola verticalmente, conforme notas agudas forem entoadas.

14
Em nossa pesquisa, utilizamos símbolos fonéticos para descrever vogais e consoantes. Detalhamos tais
símbolos nos anexos. De qualquer maneira, as vogais descritas no parágrafo em questão são “O”, “Ó” e “A”.

15 Este recurso visual foi aprendido com a regente Silmara Drezza e construído pela pesquisadora.
52

Figura 6: Mola de brinquedo

Um recurso visual que pode estimular a articulação de forma lúdica é a mandíbula


de brinquedo (figura 7), a qual abre e fecha conforme manipulação. O regente pode
brincar que quem não articular o texto, levará “uma mordida” da mandíbula. Esta
brincadeira torna o ensaio mais divertido.

Figura 7. Mandíbula de brinquedo

Para o coro cantar com suavidade e em menor volume sonoro utilizamos o dedoche
de borboleta (figura 8). A leveza do vôo da borboleta pode ser um recurso visual para
ajudar as crianças a cantarem sem força e com grande volume. Também é possível
trabalhar a concentração se o regente caminhar em diferentes direções e pedir para as
crianças cantarem olhando para a borboleta.
53

Figura 8. Dedoche de borboleta

Para distinguir sons graves e agudos e melhorar a afinação podemos comparar os


sons dos pios dos pássaros (figura 8). O regente pode tocar dois ou mais apitos e solicitar
que o coro diga se os sons são mais graves ou mais agudos, em relação aos outros. Este
exercício de percepção também pode ser realizado com outros instrumentos musicais. No
caso do piano, por exemplo, as crianças podem observar que a tessitura grave se localiza
à esquerda e a aguda à direita. Assim, o reconhecimento das alturas pode não ser guiado
pelo som, mas pela localização das notas no instrumento. Ao realizar a atividade com o
piano é recomendável que as crianças não o vejam, para que esta seja efetiva.

Figura 9. Pios dos pássaros

Além dos objetos, costumamos associar gestos e movimentos corporais na


execução do preparo vocal. Sesc aponta que “sempre que possível devem ser utilizados
movimentos corporais associados aos exercícios. A analogia entre o som e a sensação
física da voz torna o aprendizado da técnica vocal menos abstrato” (SESC, 1997, p. 37).
Concordamos totalmente com esta afirmação. Muitos dos gestos que utilizamos em
vocalises também são incorporados em nossa regência, o que influi na sonoridade de
54

nossos coros. Empregamos diversos gestos e movimentações, que exploram leveza,


lateralidade coordenação motora, interação social e o cotidiano infantil. Muitos destes
gestos constam em nossa pesquisa de mestrado “Preparo Vocal para coro infantil: análise,
descrição e relato da proposta do maestro Henry Leck aplicada ao “Coral da Gente” do
Instituto Baccarelli”, defendida em 2014, pela UNICAMP. Recomendamos que a pesquisa
seja consultada, pois lá existem recursos corporais e sinestésicos amplamente detalhados.
Em nossa prática notamos, muitas vezes, o desinteresse das crianças na repetição
dos vocalises e do repertório. Ao incorporarmos a ludicidade e os recursos comentados,
podemos tornar o canto coral mais interessante e criativo. Sesc afirma esta ideia
comentando que “o aperfeiçoamento da voz ocorre com a repetição de certos
procedimentos (exercícios). Isso gera monotonia, falta de envolvimento. Então, cabe ao
regente inventar variações. (...) O regente, além de paciente, deve ser criativo! ” (SESC,
1997, p. 33 e 34). Gaborim-Moreira também apresenta uma instigante reflexão sobre a
importância da motivação no trabalho pedagógico:

[Motivar] é encontrar significados e valores que deem sentido ao esforço


– físico e mental – que o aluno realiza. Em reverso, a falta de motivação
ou desmotivação previsivelmente leva ao desinteresse e à indisciplina, e
muitas vezes, dificulta – ou até mesmo bloqueia o aprendizado.
(GABORIM-MOREIRA, 2015, p. 75)

Às vezes, um coro indisciplinado e com uma sonoridade pouco aprimorada pode,


na verdade, estar desmotivado. Tornar o preparo e os ensaios lúdicos e divertidos pode
ser uma possibilidade de envolvimento e mudança de comportamento. A metodologia
adotada pelo regente deve ser sempre repensada e adaptada às particularidades de seu
coro.
55

2. PREPARO VOCAL PARA COROS INFANTIS: CONSIDERAÇÕES E


PROPOSTAS PEDAGÓGICAS

No preparo vocal de nossos coros, costumamos seguir um roteiro. Iniciamos com


atividades de prontidão e atenção, alongamentos, postura correta e exercícios de
respiração, ativando a musculatura diafragmática e intercostal. Começamos a vocalizar
com exercícios de vibração de lábios e língua ([r16, tr, r]), consoantes fricativas sonoras
([îI= òI= w]) e/ou boca chiusa ([ɲ17, n, m e ŋ]). Em seguida, entoamos a nota Dó 4 (uma
oitava acima do Dó central do piano) de memória e a cappella (tal como aprendemos com
o maestro Henry Leck18), ativando a voz de cabeça e buscando a colocação correta das
vogais, que homogeneízam e embelezam a sonoridade do coro. Trabalhamos, “sem
preguiça”, a articulação que propicia a inteligibilidade do texto. Depois, executamos
exercícios de desenvolvimento técnico-vocal específico, com base no repertório que será
ensaiado e em outras dificuldades que precisam ser abordadas. Por fim, trabalhamos a
afinação com exercícios com saltos melódicos, nomes de notas e canto em vozes. Este
trabalho inicial perdura por todo ensaio e é aplicado no repertório, em correções
constantes de sonoridade, colocação vocal, dicção, afinação, etc.
Neste capítulo, descreveremos os tópicos deste roteiro de preparo vocal, através
de contextualizações e de propostas pedagógicas, apresentando uma série de exercícios
que usamos com nossos coros infantis. Os exercícios foram revisados de materiais da
pedagogia vocal e musical que não foram, necessariamente, destinados ao público infantil
em um primeiro momento. Muitos também foram por nós criados com base nas
dificuldades e necessidades de nossos coros19, bem como em nosso estudo particular de

16
O símbolo fonético [Br] não é usual na normatização de pronúncia do português brasileiro cantado,
porém, o adotamos nesta tese para representar a vibração de lábios com a consoante “b” sucedida de “r”
vibrante.

17
Em idiomas como o Espanhol existe a ressonância nasal [ɳ], que aparece na palavra “señor” e, embora não
seja idêntico, se assemelha ao “Nh” [ɳ] do português brasileiro. Embora não o abordemos neste trabalho,
fonema também pode ser trabalhado no preparo vocal coral.

18
Aqui nos referimos ao nosso contato com o trabalho do maestro Henry Leck, em cursos livres no Brasil e
nos Estados Unidos e em nossa própria pesquisa de mestrado.

19
Como já citado na introdução, os coros que trabalhamos, durante o curso de doutorado, e que
possibilitaram a criação dos exercícios apresentados foram: “Coral da Gente” do Instituto Baccarelli, Grupo
Allegretto e coros escolares do “Canarinhos da Terra”, “Coral Cênico Infantil Dons e Tons” e “Coral Jovem
Pio X”. Nos dois primeiros, trabalhamos como regente e nos últimos como preparadora vocal.
56

canto e solfejo. A falta de materiais acessíveis nos motivou à criação. Não somos
compositores, somos reflexivos, curiosos e criativos, isto nos levou a criá-los. Esperamos
que possam contribuir com muitos coros infantis e motivem outros profissionais a
realizar novas composições e adaptações. Nosso desejo maior é contribuir com a melhora
da qualidade vocal, artística e educativo-musical de coros infantis brasileiros, mesmo que
a longo prazo.
Os vocalises de outros autores possuem os devidos créditos. Nossos vocalises
foram compostos pela presente pesquisadora com supervisão de seu orientador. Também
contamos com a valiosa colaboração do pianista Otávio Piola20 que compôs os
acompanhamentos e cifrou os vocalises com base nos objetivos pedagógicos e vocais que
foram idealizados por nós. As composições dos acompanhamentos foram realizadas em
nossa presença, em cinco encontros que tivemos, no segundo semestre de 2017. Otávio
Piola possui bastante experiência como pianista colaborador de coros infantis e seus
acompanhamentos não só auxiliam a execução vocal e musical, como também criam
texturas específicas para as temáticas dos vocalises, tornando-os mais atrativos,
divertidos e artísticos. Recomendamos que os instrumentistas utilizem os
acompanhamentos e cifras que apresentamos, para que nossa proposta seja colocada em
prática de forma mais completa.
Todos os exercícios foram editados no programa Sibelius 8 e os textos contém a
transcrição fonética com base no Alfabeto Fonético Internacional, ou International
Phonetic Alphabet (IPA). Em cada vocalise descrevemos a extensão vocal abordada e
sugestões de tonalidade inicial, andamento e nível de dificuldade. As tonalidades
priorizam o uso dos registros médio e agudo, ideais para a voz infantil e os andamentos
são os que costumamos realizar com nossos cantores. Quanto ao nível de dificuldade,
consideramos as exigências vocais e musicais de cada exercício e sua aplicabilidade para
o tipo de coro e seu o repertório, conforme descrito na tabela 12.
Vocalises destinados ao aquecimento vocal (ressonância e alguns de dicção)
costumam ser executados no início do preparo e devem ser realizados com todos os tipos

20Otávio Piola é bacharel em Música (modalidade Piano erudito), pela Universidade Estadual de Campinas,
sob orientação do Mauricy M. Martin. Atua como pianista colaborador do “Coral da Gente” do Instituto
Baccarelli (São Paulo-SP), Coral Infanto-juvenil do Centro Cultural Krupp (Campo Limpo Paulista-SP) e
Coral Cênico Infantil ‘Dons e Tons’ (Jundiaí-SP). Como regente, dentre outros, atuou frente ao Coral Jovem
Pio X e Grupo Vocal Gomes Cardim (ambos de Jundiaí-SP) e participou de diversos workshops de canto
coral, destacando-se o curso Creating Artistry em Indianapolis, Estados Unidos, sob a orientação de Henry
Leck. (http://institutobaccarelli.org.br/o-instituto/professores/)
57

de coros. Já os vocalises para desenvolvimento e aprimoramento técnico-vocal e musical


(dicção, extensão e registros vocais, musicalidade e afinação) são mais complexos e visam
as especificidades de cada trabalho coral. Em geral, eles são aplicados em coros com
afinação precisa e com certa experiência musical. Deve haver uma gradação quanto à
extensão vocal trabalhada nas melodias e modulações dos vocalises, ampliando-a no
transcorrer dos exercícios e de acordo com a qualidade e desenvolvimento apresentados
pelo coro. Na tabela seguinte, sintetizamos os parâmetros norteadores dos níveis de
dificuldade que propomos em cada vocalise:

Nível Tipo de coro Repertório Aplicabilidade


1 Iniciante Uníssono Aquecimento e desenvolvimento técnico-
vocal e musical
2 Iniciante e Uníssono e em Aquecimento, desenvolvimento e
intermediário vozes aprimoramento técnico-vocal e musical
3 Intermediário e Em vozes Desenvolvimento e aprimoramento técnico-
avançado vocal e musical

Tabela 12. Níveis de dificuldade dos vocalises e parâmetros norteadores.

Ao final dos vocalises também apresentamos breves comentários com estratégias


didáticas que utilizamos com nossos coros e/ou aspectos técnico-vocais a serem
considerados. O regente deve avaliar cada vocalise e refletir sobre sua aplicabilidade em
sua realidade. Nossas classificações são apenas sugestões que podem ou não ser seguidas.
O mais importante é que os exercícios sejam efetivos e propiciem aos coros sonoridades
de qualidade vocal e artística.
Subdividimos as contextualizações e exercícios nos tópicos: postura; respiração;
desenvolvimento de ressonância e aquecimento vocal através das vogais; aprimoramento
da dicção; equalização de registros e ampliação da extensão vocal; e preparo vocal e
desenvolvimento de musicalidade.

2.1. POSTURA

A postura é determinante para um bom controle respiratório, o qual influencia,


diretamente, a qualidade da emissão sonora. Manter uma postura adequada pode exigir
bastante paciência e persistência da parte do regente, mas é preciso que os cantores
58

sejam, constantemente, corrigidos e estimulados, até que tal postura se torne um hábito.
Smith e Sataloff (2006) afirmam que:

A manutenção da postura disciplinada é importante para o crescimento


vocal da criança e do coro. Além disso, um bom treinamento de postura
aumenta a capacidade das crianças de se concentrar e permanecer alerta,
durante os ensaios e performances21. (SMITH e SATALOFF, 2006, p. 144)

Para se alcançar a postura disciplinada ou correta, é preciso, primeiramente,


preparar a mente e o corpo. Após cumprimentarmos e acolhermos os cantores e
introduzirmos os objetivos do ensaio, iniciamos o preparo vocal do coro com atividades
de prontidão e atenção como, por exemplo, a exploração e imitação de padrões
respiratórios, rítmicos, melódicos e percussivo-corporais. É importante que o silêncio seja
alcançado ao final destas atividades e que os cantores estejam concentrados. Por esta
razão é fundamental a pontualidade, para que as crianças não atrapalhem a atenção
coletiva e se concentrem também.
Para preparar o corpo para cantar, alongamentos podem ser feitos. A função dos
alongamentos é a de conscientizar, liberar e evitar tensões que podem influenciar,
negativamente, na produção vocal (CARNASSALE, 1995, p. 97). Os alongamentos podem
ser realizados de diversas maneiras: seguindo uma determinada técnica corporal
(Técnica de Alexander, Yoga, Lian Gong, etc.), associando-os a falas ritmadas ou
sonorização de histórias, através de uma música específica para alongar, entre outras. Em
nossa prática, costumamos fazer movimentos de rotação para ambos os lados e para cima
e para baixo, enfocando as seguintes partes do corpo: pescoço, ombros, tronco, quadril,
cotovelos, pulsos, dedos, joelhos e tornozelos. Caso o coro possua um preparador
corporal, ele pode conduzir este momento, de acordo com as coreografias e
movimentações cênicas a serem trabalhadas.
Após o alongamento, a postura correta pode ser recordada. Em pé, os pés podem
ficar paralelos, na largura do quadril e voltados para o regente; joelhos, levemente
flexionados; coluna ereta, mas, sem rigidez para não ocasionar outras tensões; ombros
para trás e para baixo; peito aberto, esterno para frente; cabeça erguida, sem colocar o
queixo e o pescoço demasiadamente para frente ou para trás; e mãos e braços para baixo,

21 Maintenance of disciplined posture is important for the vocal growth of the child and the choir. Furthermore,

good posture training enhances the ability of children to concentrate and remain alert during rehearsals and
performances. (SMITH e SATALOFF, 2006, p. 144)
59

ao longo do tronco. Sentado da metade para a frente do assento, mantemos a mesma


postura, porém, com os pés completamente apoiados no chão (CARNASSALE, 1995, p. 97
e 98; FERNANDES, 2009, p. 212).
No decorrer do ensaio, pode-se alternar as posturas corretas em pé e sentado com
uma postura incorreta, para que os cantores entendam suas diferenças e as incorporem
com mais facilidade. Podemos fazer um jogo de posturas, associando o número um à
postura correta em pé, o número dois à postura correta sentada e o número três à postura
incorreta, por exemplo. Apontando os números, as crianças executam as posturas
correspondentes. O regente também pode propor explorações e imitações posturais, ou
ainda, utilizar os recursos de aprendizagem que já foram citados, anteriormente,
tornando a aquisição da postura própria ao canto uma atividade lúdica e divertida.

2.2. RESPIRAÇÃO

2.2.1. Contextualização

A respiração empregada no canto não é a mesma da fala. Na fala, costumamos


utilizar uma respiração mais peitoral ou clavicular, na qual a expiração e inspiração são
rápidas, os pulmões armazenam pouco ar e os ombros e tórax se elevam, causando
tensões desnecessárias (LECK, 2009, p. 19; PHILLIPS, 1995, p. 31). Por estas razões, este
tipo de respiração não é recomendado para cantar. No início da instrução vocal,
geralmente, as crianças apresentam esta respiração mais torácica e evitá-la deve ser uma
das primeiras preocupações do regente.
No canto, utilizamos a respiração abdominal-diafragmática-intercostal22
(PHILLIPS, 1995, p. 31), a qual engloba diferentes músculos da caixa torácica, abdômen e
diafragma. Simultaneamente, estes músculos controlam os movimentos inspiratórios e
expiratórios, administrando de forma eficiente a máxima capacidade de ar (CARNASSALE,
1995, p. 110). Nesta respiração, a inalação do ar pode ser rápida, pelo nariz e pela boca,
ao mesmo tempo, ou longa, profunda e lenta, apenas pelo nariz (LECK, 2009, p. 19 e 20).
Na inspiração, o diafragma faz um movimento descendente, os músculos intercostais se
expandem e os abdominais relaxam. Na expiração do ar, o diafragma faz um movimento

22 Abdominal-diaphragmatic-costal breathing. (PHILLIPS, 1995, p. 31)


60

ascendente e relaxa. Os músculos intercostais e abdominais se contraem, criando uma


pressão interna no pulmão, a qual permite a administração de uma espécie de coluna de
ar que passa pelas pregas vocais e origina o processo de fonação (PHILLIPS, 1992, p. 195,
199 e 208; FERNANDES, 2009, p. 206 a 210).
Segundo Phillips, aprender a administrar a pressão colocada sob a coluna de ar é
um requerimento básico para se cantar, pois tal pressão determina a qualidade do som
produzido. O autor reforça que emissões vocais com excessiva pressão de ar resultam em
sonoridades com “pouca qualidade, ausência de liberdade vocal e afinação, e quase
sempre machucam as pregas vocais”23 (PHILLIPS, 1992, p. 30 e 31). Davids e LaTour
complementam dizendo que, dentre outros aspectos, a correta administração respiratória
pode proporcionar a execução de notas agudas, frases longas e variação de dinâmicas,
além de evitar tensões no trato vocal, inclusive perceptíveis na voz. Em adultos, também
deixa o vibrato estável (DAVIDS e LATOUR, 2012, p. 23). Quando dizemos que um coro
canta “de garganta” ou “gritado”, além de não fazer a passagem de registros vocais,
possivelmente, o coro não está usando bem o mecanismo respiratório e está cantando
com a pressão excessiva da qual relatamos acima, o que é bastante prejudicial à saúde
vocal.
Chamamos de appoggio, ou apoio, ou “suporte” respiratório a pressão das vísceras
internas, a qual “consiste na ação prioritariamente muscular abdominal [que mantém] o
diafragma e a musculatura intercostal externa acionados, relaxando-os de forma mais
lenta e gradativa, do princípio ao fim da frase [musical cantada]” (FERNANDES, 2009, p.
210). Fernandes também relata que o conceito de “apoio” nem sempre é bem simples de
ser explicado e colocado em prática:

Apesar da administração da respiração ser um aspecto fundamental do


canto, na prática coral, muito pouco se sabe ou, em alguns casos, muito
pouco se ensina sobre o processo respiratório. Fala-se em “apoiar a voz”;
fala-se em “usar o diafragma”, mas, na verdade, pouco se orienta e,
consequentemente, pouco se consegue dos cantores no tocante à
administração da respiração, em particular ao uso eficiente do diafragma
e de toda a musculatura inspiratória. (...) Em geral, por não sentirem tais
músculos, os cantores não sabem exatamente onde se localizam, nem
tampouco como se movimentam. Além disso, quando o processo
respiratório é mal-entendido, principalmente no tocante à real
participação do diafragma e demais músculos inspiratórios, os cantores

23(...) poor quality, lack of vocal freedom and accuracy, and often injury to the vocal folds. (PHILLIPS, 1992, p.
31)
61

tendem a exigir um esforço exagerado desses músculos, causando vários


tipos de distorções vocais (FERNANDES, 2009, p. 205 e 206).

Esta citação realça que, de maneira geral, a pedagogia vocal não consiste, apenas,
em adotar um vocabulário coerente, mas também em saber aplicá-lo na prática,
modificando, de fato, a qualidade sonora do coro e evitando confusões e tensões
indesejadas. Carnassale aponta que “o fato da criança tomar consciência da respiração
correta, não significa que daí em diante ela respire corretamente. (...) É necessário que se
repita muitas vezes os exercícios para que o novo padrão de comportamento torne-se um
hábito” (CARNASSALE, 1995, p. 111). Explicar o mecanismo respiratório e condicionar os
cantores a ele não é uma tarefa fácil. É preciso praticá-lo em todos os ensaios e, em nossa
opinião, mais do que teorizar a respiração, é importante sensibilizá-la, aguçando a
percepção corporal das crianças, através de exercícios diversos. Também vimos que
recursos de aprendizagem podem complementar as explicações verbais, tornando-as
mais claras e eficazes.

2.2.2. Exercícios

Após localizar, sentir e direcionar a respiração para a caixa torácica, abdômen,


diafragma e intercostais, costumamos usar algumas metáforas para auxiliar o ensino da
respiração a crianças. Por exemplo, sugerimos imitar o som de um spray (desodorante,
mata-moscas, etc.) e de um trem, e “congelar” os colegas e a si mesmo, como a Elsa,
protagonista do filme Frozen. Todas estas metáforas consistem em expirar com os
fonemas “s” [s], “f” [f] e “x” [ʃ], brincando com elementos do cotidiano infantil. Após estas
explorações respiratórias, também executamos alguns dos exercícios seguintes, que
foram criados por nós e adaptados de exercícios da tradição de preparo vocal que
vivenciamos em nossa trajetória coral.
62

2.2.2.1. Exercício de respiração 1

Figura 10. Exercício de respiração 1

Com uma bexiga, realizar a seguinte sequência, nas durações rítmicas propostas
no exercício:
1) Inspirar;
2) Expirar enchendo a bexiga;
3) Inspirar e manter bexiga cheia;
4) Expirar e murchar bexiga, ao mesmo tempo.

O regente pode escolher e alternar as consoantes “s” [s], “f” [f] e “x” [ʃ], na
expiração. A bexiga é um recurso visual que auxilia o cantor a perceber a expansão das
costelas e a administrar a expiração, esvaziando os pulmões e a bexiga, coordenada e
simultaneamente. Ao conduzir esta atividade, é preciso manter a concentração e
disciplina, para que o exercício não seja em vão e o ensaio fique tumultuado. Sugerimos
que se explique a proposta do exercício, antes das bexigas serem entregues. O nível de
dificuldade do exercício é 224.

2.2.2.2. Exercício de respiração 2

Figura 11. Exercício de respiração 2

24
A descrição dos níveis de dificuldade estão na tabela 12.
63

Inspirar, reter o ar e expirar nas durações rítmicas propostas. Na expiração, o


regente pode escolher e alternar as consoantes [s], [f] e [ʃ] e também trabalhar com
outras durações. Este exercício pode ser utilizado para ilustrar conteúdos de
musicalização como proporções e valores de figuras rítmicas e fórmulas de compasso, por
exemplo. Para manter a pulsação e conduzir as etapas dos exercícios, podem ser usadas
canções gravadas ou tocadas ao vivo, pelo instrumentista colaborador. As canções são
recursos auditivos que podem ser aplicados em todos os exercícios de respiração que
estamos propondo e ainda possibilitam a apreciação musical e a ampliação do repertório
dos cantores. O nível de dificuldade do exercício é 1.

2.2.2.3. Exercício de respiração 3

Figura 12. Exercício de respiração 3

De forma contínua, expirar em [s] e [f] e depois, em [ʃ] e [x]´ , dez vezes cada
fonema, assoprando os dedos das mãos como “velas” (recurso visual e corporal). Uma
variação deste exercício é não o executar com as durações propostas, mas assoprar os
dedos, conforme a rítmica de canções conhecidas, como “Parabéns a você”, “Cai, cai, balão”
e trechos do repertório do coro. Se o instrumentista colaborador puder tocá-las, enquanto
o coro expira, também é possível trabalhar a escuta ativa, resolvendo possíveis
dificuldades musicais encontradas no repertório (afinação, correção da melodia, ritmo,
etc.). O nível de dificuldade do exercício é 1.

25
O “H”, foneticamente transcrito como [x], deve ser executado como um “r” vibrante, na abertura da boca
da vogal “A”. Podemos ensinar este fonema como se fossemos bafejar. Outro recurso que também
costumamos utilizar é a imitação do comercial da bala Halls, no qual o sabor refrescante da bala “congelava”
a garganta do ator. O “H” almejado é o mesmo deste antigo comercial.
64

2.2.2.4. Exercício de respiração 4

Figura 13. Exercício de respiração 4

Expirar com os fonemas e durações propostas no exercício. O regente pode variar


o exercício, começando pela figura rítmica de menor duração, trabalhando também,
progressões de expirações curtas a longas. É possível, ainda, realizá-lo com outras
fórmulas de compasso e figuras rítmicas, musicalizando o coro, como citado no exercício
de respiração de número 2. O nível de dificuldade do exercício é 2.

2.2.2.5. Exercício de respiração 5

Figura 14. Exercício de respiração 5

Expirar conforme proposto. Neste exercício, o regente pode associar semínimas,


colcheias, tercinas e semicolcheias aos números um, dois, três e quatro, respectivamente.
Pode mostrar os números com os dedos e alterá-los, criando novas sequências, em
uníssono ou em vozes sobrepostas. Se o coro já canta em vozes, o regente pode dividi-lo
em naipes e lhes propor este desafio respiratório e rítmico. Os cantores também podem
ser os “regentes”, estimulando a criatividade e a autoexpressão. O exercício pode, ainda,
ser considerado uma atividade de musicalização para praticar e teorizar tais figuras
65

rítmicas e iniciar o coro no canto em vozes. Em uníssono, o nível de dificuldade é 1, em


vozes, 2.

2.2.2.6. Exercício de respiração 6

Figura 15. Exercício de respiração 6

Cada cantor, individualmente, improvisa padrões rítmicos e respiratórios no


primeiro compasso, variando os fonemas [s], [f], [ʃ] e [x]. Em seguida, o coro responde ao
improviso com o ostinato26 descrito com alguma destas consoantes conforme for
convencionado. Recomendamos que este exercício seja realizado em roda para que todos
possam se olhar e interagir e que a pulsação seja marcada pelos cantores batendo,
alternadamente, os pés no chão. Alguns alunos tímidos podem ter vergonha de improvisar
na frente de outros colegas. Neste caso, sugerimos que o regente, “com tato”, procure
contornar e respeitar cada situação. Além de improvisos respiratórios, o regente pode
usar o mesmo exercício para brincar com diversas explorações vocais. Outras fórmulas de
compasso e ostinatos rítmicos podem ser criados para a execução deste exercício que
também é uma brincadeira musical. O nível de dificuldade é 2.

2.3. DESENVOLVIMENTO DE RESSONÂNCIA E AQUECIMENTO VOCAL ATRAVÉS DAS


VOGAIS

2.3.1. Contextualização

A fonação, processo de produção vocal, se inicia com a inspiração do ar que é


armazenado nos pulmões. Este ar passa pelas pregas vocais (situadas na laringe), as quais
vibram e produzem um som praticamente inaudível. Este som é transformado no trato
vocal e amplificado pelas cavidades de ressonância: cavidade nasal, boca, palato duro e

26 Repetição convencionada.
66

mole, laringe, faringe, traqueia e pulmões (DAVIDS e LATOUR, 2012, p. 66). A terminologia
“máscara”, bastante usada por professores de canto e preparadores vocais, refere-se a
manter a colocação vocal ideal, direcionando, imageticamente, o som para regiões de
ressonância da face, como os seios frontais e as cavidades nasais (GABORIM-MOREIRA,
2015, p. 233).
Carnassale complementa as informações, explicando que:

(...) o som produzido na laringe é transformado no trato vocal através do


fenômeno chamado ressonância. Uma mesma frequência de som pode
assumir timbres diferentes graças à modificação do trato vocal pela ação
dos articuladores (por exemplo, língua, palato, mandíbula, lábios). Cada
configuração do trato vocal – posicionamento dos articuladores –
proporciona ressonâncias de certas faixas sonoras que chamamos de
formantes. (CARNASSALE, 1995, p. 127)

Formantes são harmônicos produzidos na vibração das pregas vocais que são
amplificados. A frequência dos formantes varia conforme os ajustes realizados nas
cavidades de ressonância e nos articuladores. Os formantes impactam na percepção
auditiva do volume e na qualidade da emissão vocal (DAVIDS e LATOUR, 2012, p. 67).
Aprimorar e controlar a ressonância possibilita ao cantor de coro e ao solista não apenas
uma maior projeção vocal, mas também, uma sonoridade mais afinada, com variação de
dinâmicas e nuances de expressividade e uma voz mais homogênea do registro grave ao
agudo (DAVIDS e LATOUR, 2012, p. 63).
A respeito do volume de voz das crianças, é importante ressaltar que suas
fisiologias vocal e corporal são diferentes do adulto e que cantar muito forte sobrecarrega
algumas estruturas vocais que ainda estão em formação. É necessário desenvolver a
ressonância para a saúde e expressividade artística, porém, não se pode esperar de uma
criança o mesmo volume e resultado sonoro de um adulto.
Diferentemente de outros instrumentos musicais que são manipuláveis, a voz é
intangível, e regentes, preparadores vocais e professores de canto se munem de diversas
metáforas para ensinarem a cantar de forma apropriada e saudável. No preparo de coros,
além de exploração vocais de sons do cotidiano (mosquito, carro, sirene, buzina,
mastigação), alguns exercícios são utilizados para aquecer a voz, desenvolver e tornar
perceptível a ressonância. Dentre eles, vibração de lábios e língua, com os fonemas [r],
[tr] e [r]; sons fricativos com as consoantes fricativas sonoras [v], [z] e [Ȣ]; sons nasais
67

com as consoantes [ɲ], [n], [m] e [ŋ]; e as vogais que são ressonâncias orais. No português
brasileiro, além de ditongos e vogais nasais, possuímos sete vogais orais a serem
utilizadas neste tipo de trabalho, seguindo a ordem de ressonância da mais frontal à mais
posterior.: “I” [i], “E” [e], “É” [ε], “A” [a] (cantado como [ɑ], para manter uma colocação
vocal mais apropriada ao canto), “Ó” [ɔ], “O” [o] e “U” [u].
A vibração de lábios e língua tem como objetivos “mobilizar a mucosa das pregas
vocais, equilibrar a coordenação pneumofonoarticulatória [respiração, fonação e
articulação], reduzir o esforço fonatório e proporcionar aquecimento vocal”
(VASCONCELOS, GOMES e ARAÚJO, 2016, p. 582), o que relaxa e prepara o corpo e a voz
para a prática do canto.
Dentre outras funções, os sons fricativos podem reduzir tensões fonatórias, evitar
ataques vocais bruscos, auxiliar na coordenação pneumofônica, no apoio respiratório e
no controle do fluxo de ar (D’AVILA, CIELO e SIQUEIRA, 2010, p. 916). Além de serem
utilizado no aquecimento, aumentam a resistência vocal, o que permite os cantores
participarem dos ensaios sem cansaço e esforços desnecessários.
Quanto à boca chiusa, Fernandes diferencia os sons nasais citando Miller e
afirmando que o [ɲ], que aparece na palavra “manhã”, “permite ao cantor a sensação
frontal da ressonância no seu ponto mais alto, localizada exatamente no centro da
“máscara”, atrás do nariz ou dos olhos” (FERNANDES, 2009, p. 251). O [n] costuma ser
sentido na região do maxilar superior e da “máscara”, o que auxilia a colocação vocal
frontal. O [m] elimina tensões da língua e do palato mole, sendo possível sentir sua
ressonância nos lábios e na área dos seios nasais. Já o [ŋ], presente na palavra “manga”,
ao mesmo tempo que reforça a sensação da “máscara” mantém a abertura da região
nasofaríngea, trabalhando o espaço do fundo da boca e um som mais “arredondado”.
Todos estes sons nasais podem ser utilizados para desenvolver a ressonância e a
sonoridade que o regente deseja em cada peça do repertório. Estes sons também podem
anteceder as vogais, auxiliando a colocação vocal das mesmas (FERNANDES, 2009, p. 250
e 251).
O trabalho com as vogais propicia ao coro uma sonoridade consistente e
homogênea, além de uma maior inteligibilidade do texto. Cada vogal possui uma
configuração diferente da língua, mandíbula e lábios (DAVIDS e LATOUR, 2012, p. 87).
Costumamos cantar as vogais com os lábios mais arredondados e a boca mais aberta
68

verticalmente, o que difere da maneira como as falamos27. Isto acontece para que o coro
possa timbrar com mais facilidade e mantenha o som mais “focado”.
Em nossos coros, tomamos como referência a proposta do maestro Henry Leck,
para abordar as vogais. Nela, o [u] é cantado com os lábios bastante arredondados e o
recurso de aprendizagem utilizado para que esta vogal seja melhor executada pode ser o
gesto de segurar uma cesta de basquete imaginária, na frente do corpo. O [i], [e] e [ε]
também são arredondados, com abertura vertical gradativa, na respectiva ordem.
Colocamos os indicadores nos cantos dos lábios para auxiliar na redondeza e verticalidade
destas vogais. [o], [ɔ] e [ɑ] são as vogais com a maior abertura de boca, gradativa e
respectivamente, mantendo os lábios arredondados também. O gesto do [o] e do [ɔ] pode
ser o de segurar uma bola de praia grande, acima da cabeça, e no [ɑ] o gesto de desenhar
uma linha com o indicador, partindo da testa até o queixo, passando pelo nariz e boca
(LECK, 2009, p. 24 a 28; RHEINBOLDT, 2014, p. 45 a 48). Outros gestos28 podem ser
utilizados para que a colocação e sonoridade das vogais sejam melhor compreendidas e
realizadas pelo coro e o regente tem total liberdade para adaptar as sugestões acima.

2.3.2 Exercícios

Com vibração de lábios ([r]) e de língua ([tr] e [r]), consoantes fricativas sonoras
([v], [z] e [Ȣ]) e boca chiusa ([ɲ], [n], [m] e [ŋ]), podemos iniciar a parte cantada do
preparo vocal de nossos coros, variando-as conforme modulações e necessidades técnico-
vocais. Propomos alguns padrões melódicos básicos, recorrentes na tradição da
pedagogia vocal, para o desenvolvimento da ressonância. O regente pode escolher alguns
destes padrões melódicos para aplicar a vibração de lábios e língua e os sons fricativos
e/ou nasais no aquecimento de seus coros.

27 A configuração dos lábios arredondados e a boca aberta verticalmente altera a qualidade acústica
(formantes e harmônicos) do som emitido. Neste trabalho não entraremos em detalhes sobre estas questões
acústicas.

28 Em nossa prática, recriamos alguns gestos propostos pelo maestro Henry Leck, os quais relatamos em

nossa pesquisa de mestrado. Recomendamos que ela seja consultada nas páginas 50 a 54.
69

Figura 16. Padrões melódicos maiores, menores e cromáticos para aquecimento vocal

Os padrões de número 1 a 9 são em modo maior, com extensão vocal entre uma 2ª
Maior e uma 6ª Maior. Os padrões de número 10 a 13 são em modo menor, com extensão
vocal entre a 3ª menor e a 5ª Justa. O padrão 14 é cromático, com extensão de 3ª Maior.
Em todos os padrões a tonalidade inicial sugerida é Ré Maior ou Ré menor e o andamento
é de . Os níveis de dificuldade são 1 para os exercícios 1 a 7 e 10 a 13, e 2 para os
exercícios 8, 9 e 14, por serem mais desafiadores quanto a afinação. Vale ressaltar que
nestes primeiros exercícios de aquecimento, não se faz necessário alcançar amplas
extensões vocais nas modulações e no material melódico dos vocalises. Estes exercícios
devem se concentrar no “aquecimento da ressonância” nos registros médio e agudo,
priorizando o uso da voz de cabeça.
Para otimizar o tempo de preparo vocal, também podemos misturar vibração de
lábios e língua com sons fricativos e nasais, como no exemplo:
70

Figura 17. Exemplo de vocalise de vibração de lábios com boca chiusa

Ainda é possível se intercalar expirações em [s], [f] , [ʃ] e [h] com vibração de
lábios e língua e sons fricativos e nasais, como exemplificado ou com outros padrões
melódicos já descritos:

Figura 18. Exemplo de vocalise com expirações intercaladas

Este modelo pode ser aplicado com os seguintes pares de expiração e canto:

F - Br F – Tr F-R F-V F-Z F-J F – Nh F-N F –M F-Ng


S - Br S – Tr S–R S-V S-Z S-J S – Nh S-N S –M S-Ng
X - Br X – Tr X –R X-V X-Z X-J X – Nh X- N X –M X-Ng
H-Br H-Tr H-R H-V H-Z H-J H-Nh H-N H-M H-Ng

Estas variações podem acontecer entre uma modulação e outra ou a cada aula,
tornando o preparo vocal mais dinâmico e as repetições menos enfadonhas. Recursos de
aprendizagem como a imaginação de sons e situações do cotidiano, gestos e objetos
podem ser utilizados na execução destes padrões melódicos básicos e em todos os
exercícios que seguem.

2.3.2.1. Vocalise 1

Neste primeiro vocalise, misturamos todos os tipos de vibrações de lábios e língua,


nas frases musicais. Alguns cantores podem ter dificuldade de realizar algumas delas e o
regente pode adaptá-las. Mesmo assim, recomendamos que o coro seja desafiado a
articular as vibrações conforme proposto.
71

Figura 19. Vocalise 1

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 2

2.3.2.2. Vocalise 2

Figura 20. Vocalise 2

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


2ª menor Mi menor 1

Neste vocalise, unimos o trabalho de ressonância do [r] com a articulação do


texto. Gestos de frio podem tornar este exercício mais expressivo e divertido. Cantar o
semitom da modulação auxilia no aprimoramento da afinação.
72

2.3.2.3. Vocalise 3

Figura 21. Vocalise 3

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 1

Em uma extensão vocal um pouco mais ampla, trabalhamos a ressonância do [tr],


com articulação do texto e a modulação cantada. Nas semínimas pontuadas, o regente
pode optar por prolongar os fonemas [r], [i] ou [m] - encontrados na palavra “trim” -
conforme as especificidades técnico-vocais que podem ser trabalhadas em cada um deles.
Um gesto para representar o telefone e propor a ligação de pessoas variadas (pai, mãe,
irmãos, avós, amigos, etc.), a cada modulação, deixam o exercício mais lúdico e dinâmico.

2.3.2.4. Vocalise 4

Neste vocalise, intercalamos expirações em [ʃ], com vibração de língua [tr] e


articulação do texto. Variações de andamentos podem ser feitas para tornar o exercício
mais desafiador e para criar histórias sobre o percurso do trem. Se houver espaço físico,
o coro pode se deslocar, coletivamente, como um trem, enquanto vocaliza.
73

Figura 22. Vocalise 4

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 1

2.3.2.5. Vocalise 5

No vocalise 5, decompomos a palavra “frio” em “rio” e “fio”, alterando-as a cada


modulação. A palavra “rio” pode ser pronunciada com “r” fricativo [x] ou
vibrante [r] (para trabalhar a vibração de língua). Gestos que representem cada palavra
podem ser explorados.

Figura 23. Vocalise 5


74

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 1

2.3.2.6. Vocalise 6

Figura 24. Vocalise 6

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 2

Nas consoantes fricativas sonoras ocorre a vibração das pregas vocais e a produção
sonora. Nas consoantes fricativas surdas não há vibração das pregas vocais e,
consequentemente, não há som. Neste exercício, utilizamos os pares de consoantes
fricativas sonoras e surdas – [z] e [s], [v] e [f], [Ȣ] e [ʃ] – os quais lábios e dentes possuem
a mesma configuração e se diferem apenas pela vibração das pregas vocais. Sugerimos
alternar os pares a cada modulação, para dinamizar o exercício, mas é possível realizá-lo
somente com um dos pares. Como envolve expirações com sons fricativos também pode
otimizar o preparo vocal, unindo respiração e canto.
75

2.3.2.7. Vocalise 7

Figura 25. Vocalise 7

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 2

Neste vocalise, utilizamos os sons fricativos em excertos melódicos com graus


conjuntos e saltos de 5ª Justa. Estes saltos aprimoram a afinação e realizados com as
consoantes fricativas, suavizam ataques vocais bruscos e portamentos, que mascaram a
afinação e estão mais presentes no canto solo do que no canto coral, por razões estéticas.
Os sons fricativos podem ser variados a cada modulação.

2.3.2.8. Vocalise 8

Alternando articulação e ressonância, a melodia com texto é repetida com a


consoante fricativa [z], imitando o som do mosquito. O [s], par surdo do [z], está presente
em palavras do texto, seguindo a mesma proposta do vocalise 6. Antes de cantar este
exercício, o regente pode propor ao coro explorar o som do mosquito, associando sons
graves a movimentos para baixo e sons agudos a movimentos para cima, explorando os
76

registros vocais. Os movimentos também podem ser incorporados na execução do


vocalise.

Figura 26. Vocalise 8

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


7ª menor Dó Maior 1

2.3.2.9. Vocalise 9

No vocalise 9, trabalhamos os sons fricativos associados às letras iniciais das


palavras zebra, voz e jacaré. Esta proposta de associar letras pode ser bastante
significativa a crianças em fase de letramento e o regente pode criar outros vocalises,
partindo deste princípio. Em nossos coros infantis, gostamos de trabalhar a expressão
cênica neste vocalise, imitando a zebra cantando e o jacaré assustado, estimulando a
autoexpressão de nossos cantores.
77

Figura 27. Vocalise 9

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Dó Maior 1

2.3.2.10. Vocalise 10

Neste exercício, exploramos palavras com [v] e [z], juntando articulação com
ressonância. Com nossos coros, usamos gestos para auxiliar a memorização do texto,
como o de convidar outras pessoas para ver a tal viseira, colocar as mãos na testa para
representá-la, apontar o colega do lado para mostrar a vizinha e unir as mãos na forma do
telhado da casa azul. Outros gestos podem ser criados em conjunto com os cantores,
deixando a criatividade fluir. Este exercício também propicia a exploração de expressões
faciais de surpresa e/ou espanto e a intenção de transmitir o texto a outras pessoas, isto
pode ser utilizado na interpretação do repertório.
78

Figura 28. Vocalise 10

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Dó Maior 1

2.3.2.11. Vocalise 11

Figura 29.Vocalise 11
79

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 2

No presente vocalise, propomos a alternância de boca chiusa em [m], [n] e [ŋ],


explorando-os nos excertos melódicos em modo maior, modo menor e em saltos de 5ª
Justa, respectivamente. A mudança de consoante nasal também delimita as mudanças
melódicas, assim oportunizando a contextualização destes elementos musicais. O vocalise
pode ser realizado com só um tipo de boca chiusa ou com outras variações, incluindo
também o [ɲ].

2.3.2.12. Vocalise 12

Figura 30. Vocalise 12

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


4ª Justa Mi Maior 2

Neste exercício, exploramos o trabalho de ressonância com as consoantes nasais


[m], [ɲ] e [n] com as palavras humm (mastigação), mamma mia, nhoque e nonna,
respectivamente. Como ele contém palavras em italiano, é interessante explicar aos
80

cantores a tradução: “minha mãe” ou “minha nossa” (mamma mia) e “avó” (nonna).
Imaginar o nhoque saboroso ajuda na interpretação do texto e na ressonância frontal.

2.3.2.13. Vocalise 13

Figura 31. Vocalise 13

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Ré Maior 1

Acima, outro exercício que associa comidas saborosas à boca chiusa com [m]. A
cada modulação o alimento pode mudar. O regente pode propor temáticas específicas
como frutas, verduras, comidas de festas, doces, salgados etc., e os cantores também
podem dar sugestões, tornando o exercício mais criativo e estimulante.

2.3.2.14. Vocalise 14

Este é um exercício do maestro Henry Leck (LECK, 2009, p. 43) que trabalha a
ressonância do [ŋ] e a articulação das palavras “ping pong”. Os cantores podem executá-
lo em duplas, imitando um jogo de ping pong, com bolinha e raquetes imaginárias.
81

Figura 32. Vocalise 14

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 1

2.3.2.15. Vocalise 15

Figura 33. Vocalise 15

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Sol Maior 1

“Bambalalão” faz parte do cancioneiro folclórico brasileiro. Além do resgate


cultural, esta canção em forma de vocalise aborda palavras com as consoantes nasais [m]
[ɲ] e [n] e a vogal nasal [ɐ̃ ]. Neste exercício, costumamos balançar o tronco de um lado
para o outro e para frente e para trás, em sequências variadas, trabalhando a lateralidade,
a espacialidade e a atenção, quando os cantores são desafiados a imitar os movimentos do
regente como se fossem o “espelho” dele. Outro aspecto interessante a ser abordado é
explicar às crianças o significado de palavras que podem ser desconhecidas. Segundo Tatit
e Loureiro, “bambalalão” é uma onomatopeia que representa o badalo dos sinos e “ginete”,
82

apesar de ser referente a cavaleiro, na canção, é sinônimo de adaga (TATIT e LOUREIRO,


2014, p.71).

2.3.2.16. Vocalise 16

Figura 34. Vocalise 16

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 2

Em mais este exercício do livro do maestro Henry Leck (LECK, 2000, p. 49) é
possível trabalhar a ressonância através do [z] e [ŋ] com as vogais [i], [ɑ] e [u]. O maestro
propõem a percussão corporal com pés e estalos, alternando-os nos tempos fortes e
fracos, respectivamente. Para uma melhor coordenação, a percussão pode ser ensinada
aos poucos: só os tempos fortes, primeiro, depois só os fracos e juntá-los, em seguida. Este
também é um excelente exercício para moldar abordar a colocação de cada vogal.
83

2.3.2.17. Vocalise 17

Este é um exercício do nosso orientador, o maestro Angelo Fernandes


(FERNANDES, 2009, p. 397), que trabalha articulação com [z], [ŋ] e [m] e ressonância com
as vogais [i] e [ɑ]. Em português brasileiro, a vogal “a” é foneticamente escrita como [a],
representando um som mais horizontal e “aberto” do que o que costumamos utilizar no
canto coral, por ser mais difícil de timbrar e por facilitar o uso do registro de peito,
empregado na fala. Por esta razão, utilizamos o [ɑ] como na palavra inglesa “father”. Em
nossa experiência com vozes infantis brasileiras percebemos que a colocação do [ɑ] é
mais trabalhosa e requer nossa atenção para o aprimoramento das sonoridades corais.
Uma estratégia que utilizamos é primeiro trabalhar o [ɔ] e depois o [ɑ]. Recomendamos
que no presente vocalise esta adaptação seja realizada de início.

Figura 35. Vocalise 17

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Dó Maior 2

2.3.2.18. Vocalise 18

Figura 36. Vocalise 18


84

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


9ª Maior Dó Maior 2

Neste exercício da tese de Angelo Fernandes (FERNANDES, 2009, p. 397) também


trabalhamos articulação com [z] e [m] e ressonância com as vogais [u] e [ɑ], em uma
extensão vocal mais ampla do que a abordada no vocalise 17. Para evitar a acentuação da
vogal [ɑ] dos finais de frase, escrita em semínima e mínima, solicitamos que nossos
cantores coloquem as mãos nas bochechas - para estimular a abertura vertical da boca –
ou que “estiquem” esta vogal com o gesto de puxar uma linha vertical com os dedos.

2.3.2.19. Vocalise 19

Figura 37. Vocalise 19

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Dó Maior 2

Em mais este exercício da tese de Angelo Fernandes (FERNANDES, 2009, p. 398),


exploramos os sons nasais [m] e [n] com as vogais [i], [e] e [ɑ], reforçando a colocação
vocal ressonante e a articulação. Para manter a pulsação, propomos que os cantores
marchem enquanto cantam este vocalise. A cada modulação, giramos, de forma a cantar
85

com o corpo virado para frente, para a direita, para trás e, por fim, para a esquerda. Tal
movimentação auxilia o coro a se acostumar com a acústica de salas de ensaio e de
concertos e a escutar melhor os que estão à sua volta.

2.3.2.20. Vocalise 20

Figura 38. Vocalise 20

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 2

Através da ressonância do [n], objetivamos trabalhar a ressonância e colocação do


[i]. Outros sons nasais e vogais podem ser trabalhadas também. Para sentir a ressonância
do [n] e direcionar o som para a “máscara”, pedimos aos nossos cantores que coloquem
os dedos indicadores em cima do osso do nariz ou no meio da testa, como um “terceiro
olho”.

2.3.2.21. Vocalise 21

Figura 39. Vocalise 21


86

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª menor Ré Maior 2

Semelhante ao vocalise 20, este vocalise também trabalha a ressonância nasal com
[n] e com as vogais [i] e [e]. Nas tonalidades mais graves utilizamos “ni-e-i” e nas
tonalidades agudas alteramos para “nu-a-u” e / “na-o-a”, explorando vogais com
aberturas de boca mais verticais. Também pedimos para o coro cantar com a sensação de
espirrar, mantendo a sensação da colocação frontal.

2.3.2.22. Vocalise 22

Figura 40. Vocalise 22

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 1

Neste vocalise do maestro Henry Leck (LECK, 2000, p. 45) as vogais


[ɑ], [e], [i], [o] e [u] são articuladas e antecedidas pelo [m], que estimula a ressonância
nasal. Solicitamos que nossos cantores cantem com os lábios arredondados com o gesto
de “puxar” o bico, esticando-o para frente em todo o exercício. O gesto auxilia a evitar
tensões e desafinações na repetição das notas iniciais e na escala descendente.

2.3.2.23. Vocalise 23

No vocalise que segue, brincamos com sonoridades que consideramos incorreta e


correta, com a abertura da boca horizontal e vertical, respectivamente. Com cautela e em
tonalidades não muito agudas, brincar com o erro pode, muitas vezes, ser um caminho
fácil para as crianças entenderem uma colocação vocal correta. Exploramos a colocação
87

errada e depois a “jogamos fora” adotando a colocação ideal como nossa sonoridade
padrão. No acompanhamento do piano, as dissonâncias e consonâncias também reforçam
este jogo de erro e acerto.

Figura 41. Vocalise 23

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª Maior Fá Maior 1

2.3.2.24. Vocalise 24

Este é o primeiro vocalise que o maestro Henry Leck (LECK, 2009, p. 27) realiza no
preparo vocal de seus coros, associando gestos já relatados para trabalhar as “fôrmas” de
cada vogal. O maestro trabalha, individualmente, o [u], [i], [e], [o] e [ɑ], sem modulações,
e depois une-as na sequência da partitura. O exercício também estimula o legato, exigindo
dos cantores uma boa administração da respiração. Com coros iniciantes, pode-se aplicar
tal exercício com a respiração intercalada entre os cantores (respiração coral) ou em um
andamento mais rápido. Antes de cantar as vogais, o regente pode propor explorações
vocais no registro agudo e com glissandos, brincando com a colocação correta e incorreta
e estimulando o uso da voz de cabeça. Nos vocalises 25 e 26, propomos duas adaptações
deste exercício.
88

Figura 42. Vocalise 24

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Fá Maior 1

2.3.2.25. Vocalise 25

Figura 43. Vocalise 25


89

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Fá Maior 1

Na primeira adaptação, mudamos a métrica do vocalise de Leck, tornando as


quatro primeiras notas mais curtas (em semínimas) e a quinta nota mais longa (em
semibreve), repetindo o mesmo padrão na frase seguinte. Também acrescentamos graus
conjuntos ascendentes, na segunda parte do exercício. Descendemos com as vogais
[u], [i], [e], [o], [ɑ] e ascendemos com as vogais [ɑ], [ε], [i], [ɔ] e [u], de maneira a
trabalhar as sete vogais orais do português brasileiro. Os gestos que usamos são a cesta
de basquete em frente ao corpo para o [u]; indicadores nos cantos dos lábios para [i],
[e] e [ε], mãos unidas formando um círculo na frente dos lábios para o [o] e o [ɔ]; e uma
linha vertical esticando para o [ɑ].

2.3.2.26. Vocalise 26

Figura 44. Vocalise 26

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 2

Na segunda adaptação do vocalise 24, do maestro Henry Leck, também alteramos


a métrica do exercício original, variamos a melodia final com graus conjuntos ascendentes
e descendentes e abordamos a mesma sequência com as sete vogais orais do vocalise 25:
[u], [i], [e], [o], [ɑ], [ε], [i], [ɔ] e [u]. Como a figuração rítmica é mais curta (colcheias, na
sua maioria), não usamos um gesto para cada vogal, mas outras movimentações que
auxiliem a emissão vocal correta.
90

2.3.2.27. Vocalise 27

Figura 45. Vocalise 27

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 1

Partindo da colocação frontal do [i], cantamos as vogais [e] e [ɑ]. Estas duas
últimas vogais têm se mostrado um desafio de colocação vocal em nossa prática de
preparo vocal com crianças, por serem emitidas facilmente sem a ressonância focada.
Costumamos manter os dedos indicadores nos cantos dos lábios, para mantê-los
arredondados e evitar a abertura de boca horizontal. Para melhorar a afinação, também
pensamos em uma escada com três degraus. O primeiro degrau é apontado sempre que
se canta a tônica, o segundo degrau, a terça, e o terceiro degrau, a quinta. As mãos podem
se intercalar para “tocar” cada degrau da escada imaginária.

2.3.2.28. Vocalise 28

Figura 46. Vocalise 28

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 1
91

No vocalise 28, cantamos as vogais [i], [e], [ɑ] e [ɔ] e fazemos um glissando em
[u], para explorar a voz de cabeça. Nas pausas dos três primeiros compassos, fazemos três
poses para fotos, sozinhos ou interagindo com os colegas. No glissando associamos um
gesto com o indicador, que pode ser descendente como a melodia ou ascendente para uma
melhor afinação. No quinto e sexto compassos, dançamos livremente. Na modulação,
paramos e nos preparamos para novas poses. As poses podem explorar a livre-expressão
dos cantores, com temáticas específicas e elementos do repertório. Consoantes podem
anteceder as vogais para aprimorar a colocação vocal.

2.3.2.29. Vocalise 29

Figura 47. Vocalise 29

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 2

Da vogal mais frontal à mais posterior, trabalhamos as sete vogais orais na seguinte
sequência: [i], [e], [ε], [ɑ], [ɔ], [o] e [u], modelando as “fôrmas” de cada uma delas. A fim
de auxiliar a colocação vocal e o fraseado musical, movemos os braços, suavemente, como
se estivéssemos movendo bexigas no ar.

2.3.2.30. Vocalise 30

Seguindo a mesma sequência de vogais do exercício anterior


([i], [e], [ε], [ɑ], [ɔ], [o] e [u]), firmamos a colocação de cada vogal e as aplicamos em
ampla extensão vocal. Buscamos direcionar a ressonância na “máscara”, contornamos os
olhos com os indicadores partindo do meio da testa até os zigomáticos (ossos acima das
92

bochechas), quando cantamos [i], [e] e [ε] do início. Com as mãos nas bochechas,
mantemos a verticalidade da boca, movendo as mãos dos lábios ao fundo da boca, nas
vogais [ɑ], [ɔ] e [o]. Na sequência completa das vogais, contornamos os olhos, partindo
do meio da testa, passando pelos zigomáticos, desenhando um círculo acima da cabeça,
descendo pela frente do rosto e apontando os lábios arredondados do [u], no final. A
amplitude do círculo acima da cabeça pode variar conforme a extensão vocal da melodia,
sendo o primeiro círculo menor e o segundo maior. Os gestos ajudam a manter a colocação
vocal correta das vogais e interfere na melhora da qualidade sonora.

Figura 48. Vocalise 30

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Ré Maior 2

2.3.2.31. Vocalise 31

Com melodias com maior grau de dificuldade de afinação e em ampla extensão


vocal, desenvolvemos as vogais [i], [ɑ], [o] e [u], mesclando a frontalidade do [i] com o
espaço de ressonância das demais vogais. No [i] e no [ɑ] iniciais, colocamos o dorso das
mãos nas bochechas. No [o], juntamos as mãos em círculo, na frente da boca. No [u],
“puxamos o bico” para frente. No staccato imaginamos estourar bolinhas de sabão no ar,
93

com gestos curtos. No [i] final, colocamos os indicadores nos cantos dos lábios,
modelando, assim, as vogais trabalhadas. Como este é um vocalise destinado a coros mais
avançados, após vivenciar os gestos descritos, sugerimos que se cante sem nenhum gesto,
para perceber as diferenças sonoras e, aos poucos, incorporar a sonoridade ideal. Pode-
se intercalar o uso e o não uso dos gestos a cada modulação, até que o coro alcance a
sonoridade almejada sem os gestuais.

Figura 49. Vocalise 31

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


9ª Maior Fá Maior 3

2.3.2.32. Vocalise 32

Este exercício de Leck (LECK, 2000, p. 45) explora as diferenças de articulação em


staccato e legato, com a vogal [i]. Em nossos coros o ensinamos com uma consoante
antecedendo a vogal (por exemplo, [v] ou o [b]), para uma melhor compreensão da linha
melódica. Usamos gestos curtos e longos para representar a diferença articulatória, como
tocar piano e passar nutella no pão. Além do [i], outras vogais podem ser aplicadas.
94

Figura 50. Vocalise 32

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª Maior Ré Maior 2

2.3.2.33. Vocalise 33

Figura 51. Vocalise 33

Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


Mi Maior 2

Este exercício é destinado a coros intermediários e avançados, pois, além de


trabalhar a colocação de vogais, também aprimora a afinação e a administração da
respiração. Os cantores devem entoar as notas de forma afinada e sustentada (sem
respirar), enquanto o instrumentista colaborador varia os acordes e funções harmônicas.
95

Sugerimos alguns encadeamentos harmônicos, mas os instrumentistas têm liberdade de


improvisar e criar novos acompanhamentos. Utilizamos o gesto de estender a palma da
mão e “segurar” cada nota e vogal no meio dela. A cada modulação, variamos as vogais
orais na seguinte ordem: [i], [e], [ε], [ɑ], [ɔ], [o] e [u]. O regente também pode trabalhar
uma vogal em específico ou variar a sequência, como preferir.

2.4. APRIMORAMENTO DA DICÇÃO

2.4.1. Contextualização

Phillips define dicção como a maneira que uma língua é falada e aponta que seu
estudo é subdividido em três áreas: pronúncia, enunciação e articulação. A pronúncia
abrange como são faladas as palavras. A enunciação aborda como são faladas as vogais e
sílabas, as quais conduzem a ressonância vocal. E a articulação diz respeito a como são
faladas as consoantes, que dão sentido ao idioma (PHILLIPS, 1992, p. 305).
A pronúncia envolve tanto a língua vernácula, quanto idiomas estrangeiros, o que
requer do regente pesquisas, estudos e noções básicas de fonética, para que ele possa
ensinar seu coro a cantar e transmitir o significado correto das palavras. A enunciação e
o trabalho com vogais foram detalhados no item “Ressonância”. Fernandes reforça a
relevância deste trabalho afirmando que, para se atingir uma dicção coral eficiente, é
preciso que os cantores estejam cientes e produzam de forma correta e unificada as vogais
e a articulação das consoantes (FERNANDES, 2009, p. 236).
A articulação das consonantes se faz importante por elas serem mais numerosas
que as vogais e por propiciarem a precisão rítmica, a expressividade e, principalmente, a
inteligibilidade do texto (LECK, 2009, p. 33; FERNANDES, 2009, p. 249). Sem o texto,
precisão rítmica e expressividade perdem o sentido. Em nossa prática docente, notamos
que muitas crianças demonstram “preguiça” para abrir a boca para cantar, o que
compromete a projeção vocal, a qualidade sonora e o entendimento do texto. Tal preguiça
pode ser justificada pela desmotivação e falta de identificação com o trabalho coral, as
quais podem ser melhoradas através de mudanças de repertório, de atividades didáticas
e do vocabulário empregado pelo regente, por exemplo. Outra justificativa também pode
ser a falta de domínio dos articuladores – lábios, dentes, língua, maxilar, palato duro e
mole, gengiva e glote (PHILLIPS, 1992, p. 307) –, pois, eles dificultam “a passagem
96

respiratória, a uniformidade da linha vocal e a enunciação das vogais, [exigindo do coro]


a busca por uma articulação clara, rápida, flexível e sincronizada” (CARNASSALE, 1995, P.
140). Esta articulação pode ser aprimorada no preparo vocal e deve ser uma prioridade.
Segundo Fernandes:

As consoantes são fonemas caracterizados pela obstrução ou constrição


do ar proveniente dos pulmões em um ou mais pontos do trato vocal. Tais
obstáculos podem ser totais ou parciais dependendo da posição e da
movimentação dos lábios e da língua. Os vários tipos consonantais são,
pois, classificados e descritos segundo os seguintes critérios: o ponto ou
local onde a consoante é articulada, o modo como a consoante é
articulada e o comportamento das pregas vocais durante a produção da
consoante. (FERNANDES, 2009, p. 247)29

Estas classificações de consonantes, junto com as vogais, estão descritas no


Alfabeto Fonético Internacional (IPA)30. Ele foi criado por volta de 1886, por uma
associação internacional composta por estudiosos de Fonética e sempre objetivou
associar um símbolo para cada som dos diversos idiomas e dialetos existentes, mantendo
uma constância de símbolos entre uma língua e outra (FERNANDES, 2009, p. 238). O IPA
e a proficiência em seu uso diminuem fronteiras idiomáticas e culturais, possibilitando o
canto de repertórios estrangeiros com dicção apropriada. Durante o curso de doutorado,
tivemos a possibilidade de cursar a disciplina “Dicção”, a qual foi muito útil para
interpretar materiais que contêm transcrições fonéticas e para viabilizar a estrangeiros
os vocalises que compõem esta pesquisa.
No português brasileiro cantado possuímos as seguintes consoantes com seus
respectivos símbolos fonéticos: B [b]; C [s], [k], [ʃ]; D [d], [dȢ]; F [f]; G [DZ], [Ȣ]; H mudo; J
[Ȣ]; K [k]; L [l], [ʎ]; M [m]; N [n],[#]; P [p]; Q [k]; R [r], [ɾ], [x]; S [s], [z]; T [t], [tʃ]; V [v];

29
As consoantes podem ser classificadas como bilabiais, labiodentais, linguodentais, alveolares, palato-
alveolares, palatais, velares, uvulares, faríngeas e glotais ou glóticas, de acordo com seu ponto de
articulação, ou seja, o lugar do trato vocal onde o ar é obstruído. O modo de articulação da consoante varia
conforme o obstáculo que ocorre no trato vocal, na passagem de ar, e as possíveis classificações
consonantais são: plosivas, fricativas, nasais, africadas, glides ou semivogais e laterais. O comportamento
das pregas vocais durante a produção das consoantes classifica-as em sonora ou surda, caso haja a vibração
das pregas vocais (FERNANDES, 2009, p. 247 e 248). Em nossa pesquisa, não detalharemos estas
classificações, mas, para mais informações, recomendamos a consulta das teses de MATTOS, 2014 e
FERNANDES, 2009, e do site http://www.fonologia.org/fonetica_consoantes.php , que, de forma interativa,
possibilita ouvir o som de consoantes e vogais transcritas em símbolos fonéticos.

30A tabela completa do Alfabeto Fonético Internacional (IPA) está nos anexos e foi retirada de MATTOS,
204, p. 197. Também sugerimos consultar https://www.internationalphoneticassociation.org
97

W [v], [w]; X [ʃ], [s], [z]; Y [i], [j]; Z [s], [z] (KAYAMA et al, 2007, p. 33 a 37)31. Conhecer
suas configurações de articulação e usos ajudam o regente a direcionar e otimizar seu
trabalho de preparo vocal.
A seguir, abordaremos vocalises para a articulação e inteligibilidade de textos em
português e para o aprimoramento da pronúncia em outros idiomas. Agrupamos os
vocalises em português que têm nível de dificuldade 1 (vocalises 34 a 38) e nível 2
(vocalises de 49 a 58), e os vocalises de níveis variados que são em latim, italiano,
espanhol, inglês, francês e alemão (vocalises de 59 a 72). Seguimos os mesmos critérios
de classificação e análise dos vocalises de ressonância e lembramos que as modulações
devem ser realizadas conforme a extensão, tessitura e qualidade vocais de cada coro
infantil, sendo aprimoradas e ampliadas, gradativamente. Em vocalises com grande
extensão vocal, o regente pode escolher se serão realizadas modulações. Consideramos
mais importante a qualidade da colocação vocal do que quantidade de notas alcançadas,
e isto deve ser levado em consideração pelo regente.

2.4.2. Exercícios de articulação e inteligibilidade do texto

2.4.2.1. Vocalise 34

Este vocalise é uma junção do exercício de Diana Goulart e Malu Cooper (GOULART
e COOPER, 2002, p. 25) – com algumas alterações na métrica e nas notas – e de um vocalise
de nossa autoria. Os três alimentos não costumam ser consumidos diariamente por
crianças, o que pode remeter a bons momentos e estimular o canto. Além da articulação,
na primeira parte, a ressonância nasal com [m] é viablizada. Ao final da segunda parte,
podemos realizar estalos de língua ou outras explorações vocais, para sonorizar as
pipocas e brincar com os articuladores. Os gestos utilizados podem ser: mastigação,
polegar positivo, “tomar” coca e “comer” pipoca.

31Nos anexos, consta a tabela com os símbolos fonéticos das vogais e consoantes do português brasileiro
utilizados no canto erudito. Esta tabela foi nossa referência para as transcrições fonéticas em português e
integra o artigo de KAYAMA et al, 2007, p. 33 a 37.
98

Figura 52. Vocalise 34

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


3ª Maior Mi Maior 1

2.4.2.2. Vocalise 35

Figura 53. Vocalise 35

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 1
99

Neste exercício também de Diana Goulart e Malu Cooper (GOULART e COOPER,


2002, p. 20)32, acrescentamos as expirações em [ʃ] para caracterizar o pedido de silêncio.
O staccato inicial estimula o apoio respiratório e a precisão da afinação, aliado à
articulação que está presente em todo o vocalise. Também podemos usá-lo como um
“combinado de silêncio”, o cantando a qualquer momento do ensaio em que seja
necessário pedir a atenção e disciplina do coro, sem que o regente cometa abusos vocais.

2.4.2.3. Vocalise 36

Figura 54. Vocalise 36

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 1

O vocalise 36 é um padrão melódico maior, em que muitas articulações são


possíveis de serem cantadas. Henry Leck utilizou “dubi dubidu” e Sesc sugere “dabli
dabliu”, “iaba dabadu” (referência ao filme “Os Flintstones”) e “pula canguru”, conforme
escrito na partitura33 (LECK, 2009, p. 29; SESC, 1997, p. 51). Em nossa prática também
adotamos “Scooby Doo” e “lua lu” (RHEINBOLDT, 2014, p. 56). A vogal [u] ajuda a ativar a
voz de cabeça e é uma vogal cantada com facilidade por crianças brasileiras. A cada ensaio
ou a cada modulação as variantes textuais podem ser empregadas, tornando o preparo
vocal mais dinâmico. Alguns gestos podem ser associados durante o canto ou nas

32 As cifras descritas não são as propostas por Goulart e Cooper, mas sim as que costumamos utilizar em

nossa prática coral.

33
Para que a partitura do vocalise não ficasse muito extensa, optamos pela transcrição fonética apenas no
primeiro texto. As variações com “Scooby Doo e “lua lu”, encontram-se escritas em nossa dissertação de
mestrado.
100

modulações, como segurar o bico do [u], fazer um “w” com os dedos, uma pose, pular,
imitar um cachorro ou pegar a lua no céu.

2.4.2.4. Vocalise 37

Figura 55. Vocalise 37

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 1

Neste vocalise, brincamos com a articulação da palavra “jabuticaba”. Alguns coros


podem erroneamente cantar o salto final de 5ª Justa com portamento, o que não
recomendamos para que não haja prejuízo da qualidade do timbre e da afinação coral.
Para evitar o portamento, o regente pode executar o salto em staccato e depois em legato,
sem portamento. O gesto que usamos é o de pegar jabuticabas no tronco da jabuticabeira.

2.4.2.5. Vocalise 38

Figura 56. Vocalise 38

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª Maior Ré Maior 1
101

Este exercício propõe, principalmente, a articulação da consoante [s]. Durante o


canto, gestos manuais e percussões corporais podem marcar os tempos fortes e, no
compasso de modulação, os cantores podem imitar um sapo pulando.

2.4.2.6. Vocalise 39

Figura 57. Vocalise 39

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


4ª Justa Mi Maior 1

Explorando a articulação da consoante fricativa [Ȣ], os cantores podem imitar


movimentos de judô e de outras artes marciais e, na parte falada, em duplas, brincar de
“jo ken po”, também conhecido por “tesoura, pedra e papel”. A brincadeira consiste em
apontar, aleatoriamente, gestos destes objetos e ver quem ganha este jogo de sorte. O
gesto da tesoura são dois dedos em “v”, a pedra é representada pela mão fechada e o papel
pela mão esticada. A tesoura corta o papel e é quebrada pela pedra, o papel embrulha a
pedra. Assim, a tesoura vence o papel, a pedra vence a tesoura e o papel vence a pedra.
Associar esta brincadeira infantil ao preparo vocal o torna mais divertido e estimulante.
102

2.4.2.7. Vocalise 40

Figura 58. Vocalise 40

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª Maior Fá Maior 1

Neste vocalise em ritmo de rock, desafiamos os cantores a cantar tocando guitarras


imaginárias, dançando e se expressando livremente, porém, sem “descolocar a voz”. Em
atividades empolgantes ou que enfocam o corpo e a autoexpressão, alguns cantores
podem ter a tendência de deixar de cantar ou o fazer gritando, o que prejudica a
sonoridade e a saúde vocal. Este exercício e sua proposta também são aplicáveis a
realidades de coro cênico, nas quais os cantores devem ser estimulados a se expressar,
corporalmente, sem perder a qualidade vocal e a inteligibilidade do texto.

2.4.2.8. Vocalise 41

Intercalando saltos de terça e graus conjuntos, iniciamos o vocalise 41 no registro


agudo, priorizando a voz de cabeça. Imaginar o voo da borboleta e/ou fazê-lo com gestos
manuais pode ajudar a conquistar uma sonoridade leve e ressonante. Cantar todo o
103

exercício sem respirar, em legato, proporciona melhora no controle respiratório, na


equalização de registros vocais e no fraseado musical. No compasso de modulação, os
cantores também podem inspirar profundamente, para “sentir” o perfume da flor e se
prepararem para recomeçar o vocalise.

Figura 59. Vocalise 41

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª menor Ré Maior 1

2.4.2.9. Vocalise 42

Este é outro vocalise para trabalhar a administração da respiração e o legato. O


ideal é que não se respire durante o exercício e propô-lo em forma de uma “competição
de fôlego” pode ser estimulante às crianças. Caso seja preciso, recomendamos que a
respiração coral (intercalada) seja adotada. Imaginar ou, de fato, esticar tecidos elásticos,
gradativamente, enquanto se canta também pode auxiliar a dosar o fluxo de ar. A boa
articulação das consoantes torna a administração da respiração mais desafiadora e os
cantores devem ser incentivados a coordenar respiração, articulação e ressonância, sem
gerar tensões desnecessárias. Os andamentos podem variar, conforme a capacidade
respiratória e o desenvolvimento técnico-vocal de cada coro.
104

Figura 60. Vocalise 42

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


2ª menor Fá Maior 1

2.4.2.10. Vocalise 43

Figura 61. Vocalise 43

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª Maior Dó Maior 1

Com base em um dito popular, cantamos contrastando staccato e legato,


estimulando, assim, o apoio respiratório e a boa articulação. Em duplas, os cantores
105

podem colocar as mãos em torno da boca (gesto de cochichar) e, a cada modulação, se


alternarem para cantar no ouvido do colega. Assim, além da integração social, também
trabalhamos a escuta ativa. Para desenvolver a afinação, é possível formar duplas de
alunos afinados com alunos que ainda não afinam com precisão. É importante notar se o
coro, ao tentar “cochichar”, canta com escape excessivo de ar e a voz “descolocada”. Isto
invalida o exercício e precisa ser corrigido.

2.4.2.11. Vocalise 44

Figura 62. Vocalise 44

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


3ª Maior Ré Maior 1

No presente exercício, alternamos o modo maior e o modo menor a cada


modulação. Podemos dramatizar o rei Raul como alguém de bom humor e com a risada
em [u], explorando o espaço de ressonância posterior da boca, sem comprometer a
articulação do texto. Já a rainha Ni, além de má e brava, pode possuir uma risada em [i],
enfatizando a ressonância frontal. Outros tipos de risadas e nomes de reis e rainhas (por
exemplo, “ha ha ha, riu a rainha má”) podem ser cantados para trabalhar as sonoridades
106

de outras vogais. O exercício também pode ser uma possibilidade de vivenciar e teorizar
os conceitos dos citados modos, ampliando, assim, a musicalidade do coro.

2.4.2.12. Vocalise 45

Figura 63. Vocalise 45

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré menor 1

Com um trava-língua de nossa cultura popular, vocalizamos em modo menor,


enfocando a articulação das consoantes [t] e [r] vibrante. Em nossos coros, notamos que
há mais confusão para falar do que para cantar este e outros trava-línguas que musicamos.
Além da associação de melodia, gestos também podem ser efetivos na execução do trava-
língua. Para este vocalise, usamos os seguintes gestos: número 3 com os dedos, mãos
abertas para simbolizar pratos, “polvilhar” a farinha de trigo, cara de triste e a imitação
de um tigre. Mostrar os dentes caninos do tigre ajuda a manter a ressonância frontal. Após
memorizado o texto, os gestos podem ser suprimidos, dificultando a execução do
exercício.

2.4.2.13. Vocalise 46

Em mais um trava-língua musicado, trabalhamos a articulação do “r”, que pode ser


cantado como [x] ou [r]. Com nossos coros, exploramos interpretações cênicas e
sonoridades vocais, neste exercício. Propomos, por exemplo, que cantem “chorando”,
como se fossem o funcionário responsável pelas roupas do rei e que levará bronca pela
roupa roída; que cantem enfurecidos como o rei; ou, ainda, que cantem felizes como o rato
que, finalmente, conseguiu roer a roupa que tanto queria. Outras situações podem ser
sugeridas e encenadas pelos cantores, de forma criativa, oportunizando a dramatização e
autoexpressão.
107

Figura 64. Vocalise 46

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Mi Maior 1

2.4.2.14. Vocalise 47

Figura 65. Vocalise 47

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


7ª menor Ré Maior 1
108

Este vocalise de Diana Goulart e Malu Cooper (GOULART e COOPER, 2002, p. 31)
possui rico material melódico e rítmico, sobretudo para coros iniciantes e pode ser
executado em ritmo de salsa. Aos nossos cantores, propomos a movimentação de girar os
braços na frente do corpo e inclinar o tronco para frente e para trás, dançando e cantando,
ao mesmo tempo. Costumamos trabalhar este exercício após o vocalise 34, para também
incentivar hábitos alimentares saudáveis.

2.4.2.15. Vocalise 48

Figura 66. Vocalise 48

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª Maior Mi Maior 1

Este empolgante exercício de Kitty Driemeyer, presente no livro “Coro em


movimento”, de Maíra Martins (DRIEMEYER in MARTINS, 2016, p. 16), explora a
articulação das consoantes [p] e [k] e pode ser realizado de maneiras diversas. Quanto à
finalização do exercício, no livro, constam as possibilidades de entoar a modulação com a
palavra “poc” (como na partitura) ou de repetir a tônica, antes de modular, acrescentando
um “poc” a cada nova tonalidade. Por exemplo, na primeira vez, canta-se um “poc”, na
tonalidade seguinte, dois, e assim por diante. Com nossos coros, misturamos ambas as
possibilidades, ou seja, modulamos entoando “poc” e acrescentamos um “poc” a mais nas
tonalidades subsequentes. Para a articulação ficar ainda mais desafiadora, aumentamos o
andamento a cada repetição do exercício.
109

2.4.2.16. Vocalise 49

Figura 67. Vocalise 49

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 2

Em mais um vocalise de Diana Goulart e Malu Cooper (GOULART e COOPER, 2002,


p. 28), é proposta a articulação dos seguintes fonemas: “mare mire”, “zí-u zí-u”, “lalo lilo”,
“vivo, vivo”, “nano nino”, “gago, gago”, “creme, creme” e “bipo, bipo”. Os fonemas podem
variar a cada ensaio ou a cada modulação. Também podem ser inovados, conforme as
especificidades de preparo vocal almejadas. Em nossos coros, não usamos gestos para
realizar este exercício, para que os cantores possam se concentrar melhor na articulação
das palavras e na afinação. Às vezes, gestos podem confundir o canto, portanto, o regente
deve estar atento à efetividade dos mesmos e saber dispensá-los, quando preciso.

2.4.2.17. Vocalise 50

O vocalise 50 foi criado com base em um exercício de Leck (LECK, 2009, p.52). A
segunda parte (compassos 4 a 8) é idêntica ao exercício do citado maestro, e a palavra
original era “vivo”. Acrescentamos a melodia inicial – um arpejo da Dominante – e
alteramos o texto para trabalhar a articulação da consoante [p], a ampliação da extensão
vocal e a ressonância frontal. Inicialmente, para diferenciar as melodias ascendente e
descendente, levantamos os braços, na primeira parte, e os abaixamos, na segunda parte.
Em alguns casos, o movimento oposto ao direcionamento da melodia pode auxiliar na
precisão da afinação. Podemos experimentar ambos os movimentos e também estalar os
dedos nos tempos fracos, tal como é proposto no vocalise de Leck.
110

Figura 68. Vocalise 50

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


9ª Maior Dó Maior 2

2.4.2.18. Vocalise 51

Figura 69. Vocalise 51


111

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Mi Maior 2

Neste trava-língua popular musicado abordamos a articulação das consoantes [s]


e [b], em ampla extensão vocal. Além de explorar assobios, sons e o vôo dos pássaros,
antes ou durante o vocalise, também podemos desenvolver a articulação e a integração
social cantando com a intenção de contar o texto aos colegas. Como no vocalise 10, esta
proposta pode ser aplicada na interpretação do repertório, tornando-a mais expressiva e
convincente.

2.4.2.19. Vocalise 52

Figura 70. Vocalise 52

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª Maior Ré Maior 2

Em mais este vocalise com trava-língua, articulamos as consoantes [s] e [p] e


trabalhamos as tercinas. Com percussões corporais, sugerimos marcar os tempos fortes
dos quatro compassos iniciais e as tercinas que aparecem nos compassos seguintes,
associando um tipo de percussão para cada parte. Por exemplo, bater os pés no chão, no
112

começo, e palmas, no final. Alguns cantores podem confundir a tercina com a síncopa e,
propositalmente, o acompanhamento do piano e a percussão corporal sugerida podem
auxiliar na execução da rítmica correta.

2.4.2.20. Vocalise 53

Figura 70. Vocalise 52

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 2

No vocalise acima exploramos frutas e palavras que possuem a letra [m], para
trabalhar articulação e ressonância nasal. Também propomos a marcação com percussão
corporal em todo vocalise, no início de cada compasso, alternando os lados direito e
esquerdo e seguindo a sequência: pé, pé, coxa, coxa, barriga, barriga, ombro, ombro. Na
tonalidade seguinte, inverter a sequência: ombro, ombro, barriga, barriga, coxa, coxa, pé,
pé. Esta movimentação trabalha coordenação motora, lateralidade e esquema corporal.
Para facilitar a imitação e compreensão das crianças, o regente deve fazer todos os
movimentos de forma espelhada, ou seja, seu lado esquerdo equivale ao direito dos
cantores, e seu direito, ao esquerdo deles. Este espelhamento deve perdurar por todas as
atividades do coro infantil.
113

2.4.2.21. Vocalise 54

Figura 72. Vocalise 54

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


9ª Maior Sib Maior 2

Com base na melodia do exercício de Fernandes (FERNANDES, 2009, p. 412)


cantamos legumes e verduras, incentivando hábitos alimentares saudáveis, mais uma vez.
Este vocalise é desafiador por sua extensão vocal e pela memorização do texto. Sem
modular e para auxiliar tal memorização, podemos brincar de acrescentar os alimentos
um a um, de forma que só seja permitido cantar “na feira tem” e “o que vai levar?”, todas
as vezes. Por exemplo, na primeira vez, além destas frases fixas, só cantar “rúcula” e ouvir
o pianista tocar a melodia que segue. Na segunda vez, além das frases e da palavra
“rúcula”, acrescentar “alface”, e assim segue o jogo até que todas as palavras sejam
cantadas. O exercício pode ser realizado com acréscimo e supressão de palavras, no
decorrer das modulações. Esta proposta também estimula a escuta ativa, a afinação e a
concentração dos cantores.
114

2.4.2.22. Vocalise 55

Figura 73. Vocalise 55

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


9ª Maior Mi Maior 2

Este é um exercício de Maíra Martins (MARTINS, 2009, p.9) que aborda a


articulação e a ressonância de palavras que contêm as vogais nasais [ɐ̃ ] e [ĩ]. Aos nossos
cantores, propomos que marchem, batam palmas no quarto compasso (como indicado na
partitura) e façam um gesto de sustentação na palavra “fim” dos compassos 9 e 11
(semínima pontuada e mínima). O salto de 8ª (compassos 8 e 9) merece atenção quanto à
afinação e à passagem dos registros. Embora os graves também precisem ser trabalhados,
é importante não forçá-los, pois, como já vimos, as maiores potencialidades das vozes
infantis se encontram nos registros agudo e médio.

2.4.2.23. Vocalise 56

Este vocalise de Letícia Carvalho também compõe o livro de Maíra Martins


(CARVALHO in MARTINS, 2016, p.15) e enfatiza a articulação das consoantes [p] e [k] e o
salto de 8ª Justa, em especial. Como em outros vocalises, também exploramos a expressão
cênica e a interação social. Solicitamos que nossos cantores se espalhem e caminhem pela
sala de ensaio, no andamento proposto. Nos saltos de 8ª (“papaia pra quê”), pedimos que
eles parem na frente do colega mais próximo e cantem interpretando o texto. Ao parar, as
crianças se concentram e afinam melhor estes saltos melódicos. A movimentação também
propicia a escuta e o aprimoramento do timbre coral.
115

Figura 74. Vocalise 56

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 2

2.4.2.24. Vocalise 57

Figura 75. Vocalise 57

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Mi Maior 2
116

Retirado do livro “Desafios musicais” de Ana Tatit e Maristela Loureiro (TATIT e


LOUREIRO, 2014, p. 76 e 77), o exercício aborda a afinação de saltos melódicos variados
e a articulação do texto com exploração de vogais específicas. Após executar o texto
apresentado, pode-se cantar todas as sílabas com apenas uma vogal. Por exemplo, tudo
com [a], depois tudo com [e], [i], [o] e [u]. Para que o coro preste atenção no desafio
articulatório, o único gesto que utilizamos é o de “vestir” um paletó, quando
pronunciamos tal palavra. Antes de vivenciar a variação do exercício original, é
importante que a memorização do texto e a afinação estejam corretas. Para que a prosódia
fique mais correta, também podemos usar a variante “o Rei Fernando Sétimo”, ao invés
de “quando Fernando Sétimo”.

2.4.2.25. Vocalise 58

Figura 76. Vocalise 58

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


3ª menor Ré Maior 2

Neste outro exercício encontrado no livro de Ana Tatit e Maristela Loureiro (TATIT
e LOUREIRO, 2014, p. 66 e 67), enfocamos a articulação das consoantes [t], [ɾ] e [k], a
variação de andamentos e a ampliação de vocabulário. Primeiramente, explicamos o
significado de palavras que podem ser desconhecidas, como “treme traco”, “tramoia”,
117

“traquina”, “balaio”, “zoia” e “de soslaio”34. Em seguida, ensinamos a melodia com a


associação de gestos simples que representem algumas palavras do texto (por exemplo,
tremedeira, jiboia, olhares, balaio, etc.), para auxiliar em sua memorização. Por fim,
quando o coro já domina o exercício, o desafiamos a cantar em andamentos variados, do
lento ao rápido, sem perder a boa articulação.

2.4.3. Exercícios para pronúncia de outros idiomas

2.4.3.1. Vocalise 59

Figura 77. Vocalise 59

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª Maior Ré Maior 2

O português originou do latim e, por suas semelhanças linguísticas, crianças


brasileiras costumam cantar este idioma estrangeiro sem muitas dificuldades. No vocalise
59, são abordadas a ressonância das vogais [ɑ], [ε]35, [u] e do ditongo [jˇ], a articulação

34 Significados: “treme traco”: tremedeira; “tramoia”: plano maldoso; “traquina”: pessoa arteira, levada;
“balaio”: cesto; “zoia”: olha; “de soslaio”: olhar desviado, desconfiado.
35 O latim utilizado no canto coral é o litúrgico e, no Brasil, em geral, adotamos a pronúncia eclesiástica

romana. Na pronúncia eclesiástica todas as vogais são abertas, ou seja, não existe [e], nem [o]. As vogais
118

da consoante [l] e a pronúncia correta. Um erro comum na pronúncia da palavra alleluia


é a acentuação do [jˇ]. Neste exercício, os acentos ajudam a realçar a prosódia adequada,
bem como a articulação clara do [l] e o fraseado musical proposto. Nos exercícios de
aprimoramento da prosódia em idiomas estrangeiros nos ateremos a explicar nuances de
pronunciação, mas recursos de aprendizagem (gestos, metáforas, movimentações, etc.)
podem ser empregados, conforme preferências dos regentes e necessidades dos coros.

2.4.3.2. Vocalise 60

Figura 78. Vocalise 60

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 2

Outro erro de pronúncia bastante comum pode ser encontrado na palavra excelsis.
Muitos a pronunciam o “xc” com som de “tch” [tʃ], porém, no latim utilizado para o canto,
o “x” tem som de [k] e o prefixo “ex” seguido por “ce”, “ci”, “cae” “coe” ou “cy” deve ser

latinas devem ser trabalhadas da maneira que já descrevemos, com ressonância frontal e abertura vertical
da boca, priorizando, assim, a homogeneidade coral. A abertura vertical pode nos passar a impressão de que
as citadas vogais são fechadas, mas não são.
119

pronunciado com som de [kʃ]36. Desta forma, a pronúncia correta de “excelsis” é


[εk (ʃεl sis]. Em latim, o [l] também precisa ser bem articulado para que não soe como
[υ] e este vocalise propicia o treino desta articulação. Nos compassos 1 e 3, articular as
consoantes [n] e [k] nas pausas de colcheia. Sugerimos um crescendo e decrescendo nos
quatro últimos compassos para conduzir a pronúncia e fraseado musical apropriados. Os
quatro primeiros compassos esmiúçam a dicção de cada sílaba e, nos compassos finais, os
cantores devem executar in excelsis Deo de maneira fluída e com a pronúncia correta
incorporada, tal como lhes será exigido no repertório.

2.4.3.3. Vocalise 61

Figura 79. Vocalise 61

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª Maior Ré Maior 2

36 Informações retiradas do material desenvolvido pela Prof. Dra. Adriana Kayama para a disciplina “Dicção”

da graduação em Música da UNICAMP.


120

A expressão Laudate Dominum, cujo significado é “Louvai ao Senhor” contém todas


as vogais latinas, [ɑ], [ε], [i], [ɔ] e [u]. Além de trabalhar a colocação vocálica, o exercício
também possibilita o aprimoramento da pronúncia e do fraseado musical. Como expresso
na partitura, o coro deve ser estimulado a cantar acentuando as sílabas fortes [dɑ] e [dɔ].
Na sílaba [num] propomos um decrescendo para que a prosódia e o fraseado sejam
respeitados. Também é importante articular claramente o [m] final desta sílaba.

2.4.3.4. Vocalise 62

Figura 80. Vocalise 62

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 2

Na frase Ave Maria, ora pro nobis – que significa “Ave Maria, rogai por nós” –
trabalhamos a ampliação da extensão vocal, a equalização dos registros, a colocação das
vogais e a pronúncia. Outro aspecto a ser priorizado é o legato, lembrando que os cantores
devem articular as consoantes sem perder a ressonância das vogais, manter a prosódia
correta e não respirar durante o vocalise. O corte do [s] da palavra “nobis” deve ser
realizado por todo coro, no início do quarto compasso, de forma curta e precisa.

2.4.3.5. Vocalise 63

Em latim, diferentemente do português, a sílaba forte da palavra Amen é “a” e não


“men”. Este exercício tem como objetivo praticar esta pronúncia correta, bem como
buscar a colocação das vogais [ɑ] e [ε], a articulação das consoantes nasais [m] e [n] e o
fraseado musical em legato, com a efetiva administração da respiração. Coros que cantam
a duas vozes podem executar as linhas melódicas propostas nos compassos 3 e 4,
enfocando a afinação e o equilíbrio do timbre coral.
121

Figura 81. Vocalise 63

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª menor Dó Maior 2

2.4.3.6. Vocalise 64

Figura 82. Vocalise 64

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª Maior Dó Maior 2

O italiano é um dos principais idiomas abordados nas pedagogias do canto e pode


contribuir, efetivamente, com a colocação vocal ressonante e a articulação consistente do
texto. Ao cantar neste idioma, um dos aspectos que precisam ser priorizados é a
articulação das consoantes duplas. No vocalise 64, trazemos as palavras bella e notte, que
122

têm as consoantes duplas [l*l] e [t*t]. Com nossos coros, trabalhamos a articulação destas
consoantes cantando rapidamente as vogais que as antecedem e antecipando sua
articulação. Cantar sem as consoantes duplas descaracteriza o italiano e o significado de
suas palavras. O significando de bella notte é linda noite.

2.4.3.7. Vocalise 65

Figura 83. Vocalise 65

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª diminuta Mi Maior 2

No vocalise em questão, praticamos algumas pronúncias características do


italiano, as quais crianças brasileiras podem apresentar dificuldades ao cantar como, por
exemplo, a palavra “io”, o fonema “gl” [ʎ]e o som das consoantes [n], [r], [t] e [d]. Na
palavra “io”, a acentuação deve ser no “i” e não no “o”. O fonema “gl” equivale ao som do
“lh”, em português, devendo ainda soar como consoante dupla ([ʎʎz) e quando as crianças
o lerem em partituras devem saber sua pronúncia correta. Nos finais das palavras, as
consoantes devem ser sonoras e bem articuladas, como nas palavras “non” e “scordar”,
cujos [n] e [r] finais devem ser enfatizados. O [t] e [d] não podem soar como “tch” [tʃ] e
“dj” [dȢ]. Recomendamos que, antes de cantar, os cantores falem o texto, para perceber
todas as nuances de pronunciação que relatamos. O significado de “io ti voglio bene, non
ti scordar di me” é “eu te quero bem, não se esqueça de mim”.
123

2.4.3.8. Vocalise 66

Figura 84. Vocalise 66

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª Maior Ré Maior 2

A frase do presente vocalise foi retirada da canção “Gracias a la vida”, de Violeta


Parra e sua tradução pode ser “à vida, que tem me dado tanto, obrigada”. Em espanhol o
“c” da palavra “gracias” pode ser pronunciado como [θ] ou [s]. Neste exercício, propomos
o trabalho com [θ]. Para ensiná-lo, pedimos que os cantores coloquem a ponta da língua
para fora (como a língua de uma cobra), a segurem, delicadamente, entre os dentes
frontais superiores e inferiores e, com esta configuração dos articuladores, soltem o ar.
Após praticar algumas vezes, separadamente, o aplicamos na palavra “gracias”, falando-a
e cantando-a. Outros aspectos inerentes ao espanhol são a consoante “v” soar como [β] e
o fato de que não existe vogais nasais. Assim, a palavra “tanto” deve ser pronunciada com
o [a] aberto e separado do [n]. O [n] também é articulado com ênfase. A melodia deste
vocalise propicia o refinamento do fraseado musical, ela pode ser interpretada com
legatos, rubatos, accelerandos, variações de dinâmicas e demais recursos expressivos.
124

2.4.3.9. Vocalise 67

Figura 85. Vocalise 67

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Mi Maior 2

Neste vocalise, praticamos outras características da pronúncia espanhola, como o


“j” da palavra “pajarito”, que soa como [x]; o “r” de “rojo”, que é sempre vibrante [r]; e o
“l” de “ciel” que deve ser pronunciado com a língua “enrolada”. Como no vocalise 66,
também encontramos o “v” com som de [β], em “vuelan”, a vogal [a] que não é nasal, em
“blanca”, e a ênfase do [ŋ], no meio da palavra “tengo”. O texto significa “eu tenho um
passarinho vermelho e uma pombinha branca que voam pelo céu”. Novamente,
recomendamos o treino falado, antes de se cantar, para que a pronúncia seja executada
com mais sucesso.

2.4.3.10. Vocalise 68

Este é um vocalise que auxilia a prática de palavras em inglês que podem ser
encontradas no repertório tradicional de natal. Sua tradução é “feliz natal, Papai Noel está
125

chegando em breve”. Em nossa prática, notamos que crianças brasileiras têm dificuldade
em cantar o [r] retroflexo da língua inglesa. A pronúncia das palavras “merry” e
“Christmas” podem auxiliar nesta dificuldade e usar a metáfora de imitar o “r de caipira”
pode ser efetivo à compreensão infantil. Outro aspecto a ser notado é a pronúncia de
vogais abertas curtas e átonas, que não existem no português como, [ə], [æ] e [ʌ], presente
nas palavras “Christmas”, “Santa” e “coming”. Recomendamos que cada palavra seja
repetida com calma, sílaba a sílaba, para que as crianças percebam e consigam executar
tais vogais. A modulação acontece na palavra “soon”, o canto do semitom reforça a
“ansiedade” da chegada do Papai Noel e deixa o exercício mais fluído. Ao passo que a
pronúncia e a melodia forem apreendidas, pode-se aumentar o andamento, para a
articulação ser mais desafiadora.

Figura 86. Vocalise 68

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 2

2.4.3.11. Vocalise 69

Este vocalise é destinado a coros intermediários e avançados e propõe o canto em


uníssono no início e o canto a três vozes com a entonação da tríade Maior no final. Quando
realizado a cappella – inclusive as modulações – ele é ainda mais efetivo no tocante ao
aprimoramento da afinação e do timbre coral. Em inglês, o “the” antes de uma vogal soa
como [ði] e antes de uma consoante, como [ðə]. Aqui, abordamos os dois tipos de
pronúncia e as vogais curtas e átonas também, como no vocalise anterior. O significado do
texto é “os anjos cantam uma canção de ninar, no céu”.
126

Figura 87. Vocalise 69

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Dó Maior 3

2.4.3.12. Vocalise 70

As palavras deste vocalise são cumprimentos em francês que significam “olá”,


“bom dia” e “boa noite”. Nele almejamos trabalhar a pronúncia das vogais [ózI=x¦z=É[ɔ̃] e
da consoante [r], que aparece no final das palavras “bonjour” e “bonsoir”. Em francês, a
vogal “u” pode ser pronunciada de diversas formas. Antes de consoantes (por exemplo,
em “salut”), costuma ser pronunciada como [óz=Éantes de uma vogal forte (por exemplo,
em “nuit”), ela soa como [¦z37. Em ambos os casos, os lábios devem ser arredondados,
como se falássemos “i” com a boca de “u”. O idioma francês também possui vogais nasais,
que devem ser trabalhadas. Ao cantá-las com crianças brasileiras, exercícios com boca

37Informações retiradas do material viabilizado na disciplina “Dicção” da graduação em Música da


UNICAMP.
127

chiusa podem ser úteis. É importante ressaltar que, no francês cantado, o [r] pode ser
vibrante em muitos casos, como no final das palavras. Na fala, além de ser fricativo, pode
não ser sonoro na finalização de alguns verbos, substantivos e adjetivos. Em nossos coros,
explicamos a diferença entre a fala e o canto e adotamos o [r] no final das palavras
“bonjour” e “bonsoir”. Além da pronúncia correta, o exercício também visa a precisão da
afinação, sobretudo nos saltos melódicos, e ela não deve ser desconsiderada.

Figura 88. Vocalise 70

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Mi Maior 2

2.4.3.13. Vocalise 71

No alemão, existem dois sons fricativos com “ch”, que se diferenciam conforme as
vogais que os antecedem. Após “i” e “e” o som é mais frontal e o símbolo fonético é o [`zI=
após “a”, “o” e “u” o som é mais fricativo e o símbolo fonético é o [x]. O principal propósito
deste vocalise é entender as diferenças dos sons fricativos com “ch”. Para pronunciar a
palavra ich pedimos que as crianças imitem o som de um “gato bravo”, que falem “i”,
mantenham os articuladores usados na produção desta vogal e soltem o ar, sentindo-o
passar pelo palato duro, atrás dos dentes superiores frontais. O mesmo princípio, de
128

manter a articulação das vogais e soltar o ar, se aplica às palavras ach e auch, porém, as
sentiremos no palato mole, no fundo da boca. O nome das gatas “Lili” e “Lala”, bem como
o latido do cachorro (au au), ajudam a formar a articulação das vogais e a realizar seus
respectivos sons fricativos. É importante notar que tais sons não são como “ch” em
português, [ʃ], o que é um erro de pronúncia recorrente em cantores brasileiros sem a
devida instrução de dicção. As palavras “ich”, “ach” e “auch” significam “eu”, “ó” (como
uma lamentação / exclamação) e “também”.

Figura 89. Vocalise 71

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 1

2.4.3.14. Vocalise 72

Este é um vocalise de Jens Rohwer que consta no método alemão de preparo vocal
para crianças e jovens, de Paul Nitsche (ROHWER em NITSCHE, 1969, p. 53). No alemão,
de maneira geral, todas as consoantes devem ser bem articuladas e elisões de palavras,
evitadas. Neste exercício, podemos trabalhar, principalmente, a articulação das
consoantes “z” e “s”, as quais possuem o som de [ts] e [z], respectivamente. Musicalmente,
o exercício apresenta desafios rítmicos e melódicos, por meio de variações de fórmulas de
129

compasso e de saltos melódicos com maior grau de dificuldade de afinação assim trazendo
crescimento musical a coros intermediários e avançados.

Figura 90. Vocalise 72

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Ré Maior 3

Existem muitas outras especificidades de pronúncia que não conseguimos abordar


nesta tese, mas que devem ser minimamente conhecidas pelos regentes. Encorajamos o
estudo de outras línguas, bem como o domínio do IPA, pois aprender a dicção de
repertórios estrangeiros apenas pela audição não é suficiente, muitas nuances de fonética
são perdidas e a dicção dos coros fica defasada.

2.5. EQUALIZAÇÃO DE REGISTROS E AMPLIAÇÃO DA EXTENSÃO VOCAL

2.5.1. Contextualização

No capítulo 1, detalhamos as tessituras, extensões e registros das vozes infantis.


Agora, abordaremos como trabalhar estes registros e extensões, a fim de equalizá-los e
ampliá-los, gradativamente.
O termo “registros” faz alusão ao órgão, instrumento musical que possui tubos de
diversos comprimentos e formatos, os quais podem produzir notas com diferentes
qualidades sonoras, como de flauta e de cordas, por exemplo. (SMITH e SATALOFF, 2006,
p. 172; DAVIDS e LATOUR, 2012, p. 145). O conceito de registros vocais surgiu no século
130

XIX, quando o professor de canto Manuel Garcia, em uma laringoscopia, observou que as
pregas vocais vibravam de forma diferente em notas graves e agudas (DAVIDS e LATOUR,
2012, p. 145 e 146). A partir desta observação, Garcia passou a defender a existência de
três tipos de registros, denominados de: grave, médio e agudo, ou, voz de peito, voz mista
e voz de cabeça. Estudiosos da voz divergem no que diz respeito à terminologia e às
opiniões sobre os registros vocais, sendo que alguns até mesmo desconsideram o registro
médio, mas, nesta tese, consideramos os três registros com suas citadas termologias.
Fernandes e Carnassale apontam que os registros são caracterizados não apenas
pelo padrão de vibração das pregas vocais, mas também, pela ação e predominância de
certas musculaturas vocais, pela extensão vocal envolvida e pelo timbre produzido, que
podem variar conforme com o sexo, a idade e a fisiologia de cada indivíduo (FERNANDES,
2009, p. 254 e 256; CARNASSALE, 1995, p. 89).
Entre os registros, existem zonas de adaptação da musculatura laríngea,
denominadas de “passagem”. Segundo Fernandes, “a transição da voz de peito para a
mista é chamada de primeira passagem e a transição da voz mista para a de cabeça é
chamada de segunda passagem” (FERNANDES, 2009, p. 256). Quando o cantor não
domina estas passagens de registro, podem ocorrer as “quebras” vocais, que são
mudanças abruptas na qualidade sonora e na afinação, e podem gerar tensões e
desconfortos vocais. O trabalho de preparo vocal de cantores solistas e de coro deve
ensiná-los a realizar hábeis ajustes laríngeos para que, durante o canto, estas quebras não
aconteçam, as passagens não sejam evidenciadas e a extensão vocal soe de forma
equilibrada e consistente (DAVIDS e LATOUR, 2012, p. 145 e 146; FERNANDES, 2009, p.
265).
No tocante às vozes infantis, Carnassale elenca alguns aspectos importantes do
trabalho com registros. A autora afirma que crianças, geralmente, falam no registro grave
e que, quando não possuem instrução vocal, tendem a cantar neste registro não apenas as
notas graves, mas as notas médias também, o que limita a expressividade musical, faz
oscilar a afinação e pode ser prejudicial e permanentemente danoso à saúde vocal. É
possível detectar o uso da voz de peito no registro médio quando as crianças cantam uma
escala ascendente e, nas notas agudas, ocorrem quebras, tensões desnecessárias e perda
da qualidade sonora (CARNASSALE, 1995, p. 89 e 90). Nesta situação, podemos notar que
as crianças tensionam partes do corpo à toa (veias do pescoço ressaltadas, queixo para
frente, testa franzida, etc.) e parecem “gritar” enquanto cantam.
131

Por outro lado, existem algumas abordagens de preparo vocal para crianças que
supervalorizam os agudos e desprezam a voz de peito, o que resulta em notas graves (do
Mi3 para baixo) sem peso, volume e riqueza de timbre (CARNASSALE, 1995, p. 90).
Carnassale, com base em Phillips, recomenda que:

(...) as crianças devem exercitar-se em toda a extensão vocal, respeitando


o tipo de sonoridade de cada registro. Entretanto, deve ser buscada uma
transição imperceptível no registro médio, cuja qualidade de voz
caracteriza-se por uma combinação de voz de peito e voz de cabeça, por
isso chamada de voz mista. A nota Fá # é o centro do registro médio; as
notas acima dela devem ter cada vez mais qualidades de voz de cabeça,
enquanto que abaixo desta nota, devem ter cada vez mais qualidades de
voz de peito. (CARNASSALE, 1995, p.90)

Concordamos com a autora e acreditamos que o ideal com vozes infantis é


trabalhar as especificidades dos três registros, enfocando mais os registros médio e agudo
e suas passagens, a fim de tornar toda a extensão vocal homogênea e ressonante. Este
trabalho pode ocorrer tanto no preparo vocal, quanto na escolha de repertórios com
tessituras variadas. Vale ressaltar, ainda, que a ampliação da extensão vocal, ou seja, do
alcance de notas extremas graves e agudas, está diretamente relacionada ao domínio dos
registros vocais (FERNANDES, 2009, p. 256). Tal ampliação deve ser realizada com
cautela, de forma gradativa e paulatina.
Além dos exercícios que apresentaremos a seguir, a exploração vocal por meio de
glissandos pode ajudar na percepção e no domínio dos registros vocais. Ao brincar com os
registros, os conceitos de alturas (grave, médio e agudo) e timbres podem ser vivenciados,
contribuindo para a musicalidade dos cantores. Costumamos explorar os glissandos com
sons fricativos e com todas as vogais, mas temos certa preferência pelo [u], por parecer
homogeneizar mais a sonoridade em toda a extensão.
Os exercícios que seguem abarcam todos os registros, na amplitude de 7ª a 10ª
Maior. Recomendamos que alguns vocalises de aquecimento com ressonância e
articulação sejam praticados antes deles. O regente pode optar por modular ou não,
guiado pela qualidade da emissão sonora e pelos limites vocais de seus cantores. Como
visto, cantar notas extremas sem o devido preparo técnico-vocal pode ser danoso, e não
podemos nos esquecer que os alcances vocais são variáveis em cada indivíduo. O regente
também deve instruir seus cantores a pararem de cantar, caso sintam desconforto. A
ampliação de extensão vocal não deve ser encarada como uma “competição”; os limites e
características vocais devem ser respeitados.
132

2.5.2. Exercícios

2.5.2.1. Vocalise 73

Figura 91. Vocalise 73

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 1

Este é um vocalise que integra o livro de Leck (LECK, 2009, p. 41), porém, com uma
adaptação na segunda nota. Na proposta de Leck, a nota em questão é um intervalo de 2ª
Maior. Esta adaptação encontra-se na tese de Fernandes (FERNANDES, 2009, p.381) e
também está justificada em nossa dissertação de mestrado (RHEINBOLDT, 2014, p. 72).
Optamos por cantar a 3ª Maior, pois ela proporciona a construção gradativa da tríade
Maior. No primeiro compasso, se canta até o terceiro grau; no segundo compasso, até o
quinto grau; e, no terceiro compasso, a tríade completa com o acréscimo da 8ª. A
articulação da consoante fricativa [v] auxilia a manter ressonância frontal e no registro
agudo, geralmente, substituímos “viveva” por “vivuva”, para aumentar o espaço de
ressonância, no fundo da boca. Os recursos de aprendizagem que costumamos empregar
neste vocalise são a manipulação da mola de brinquedo e a metáfora de “atirar” o som na
plateia. Em ambos os casos, os movimentos se tornam mais amplos, conforme a extensão
da melodia, ou seja, esticamos a mola pouco a pouco, e imaginamos o som “atingindo” a
primeira fileira (no primeiro compasso), o meio do teatro (no compasso seguinte) e o
fundo do teatro (no último compasso). Ao usar a ideia de “atirar” o som é preciso ser
cauteloso com ataques vocais bruscos e prejudiciais. Em vez de cantarem com tensão, as
crianças devem ser orientadas a administrarem melhor a respiração (apoio), a abrirem a
boca verticalmente e a direcionarem a ressonância, medida que o vocalise for ficando
agudo.
133

2.5.2.2. Vocalise 74

Figura 92. Vocalise 74

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 1

De autoria de Laura Lagub e presente no livro de Maíra Martins (LAGUB in


MARTINS, 2016, p.11), este vocalise trabalha saltos de oitava e a equalização dos registros
grave e agudo. Para aprimorar a afinação e a colocação vocal, batemos o pé ou tocamos o
peito, quando as notas graves são cantadas, e batemos palmas ou tocamos o topo da
cabeça ou o centro da testa, quando as notas agudas são cantadas. O exercício pode se
tornar mais desafiador, ao solicitarmos que, antes de executar o exercício completo, os
cantores entoem as notas graves e agudas separadamente, ou ainda, que a voz 1 cante
apenas as notas agudas e a voz 2 as graves, e vice-versa38.

2.5.2.3. Vocalise 75

O material melódico deste vocalise é o arpejo da tétrade Maior com 7ª Maior.


Vocalmente, os cantores são desafiados a cantar as vogais [i], [e] e [ε] nas notas mais
agudas. Estas vogais são mais frontais e possuem menor espaço de ressonância no fundo
da boca, o que exige um balanceamento das ressonâncias anterior e posterior, para uma
emissão correta. Em princípio, alguns coros podem ter dificuldade em cantar a sílaba
“mel” com a tônica, por isso, colocamos a opção de cantarem a quinta, para evitar tensões

38Conhecemos o material da Maíra Martins, por indicação do preparador vocal Danilo Frederico (Rio de
Janeiro-RJ), durante o Festival de Corais de Catanduva (FESCC), em 2017. Alguns dos recursos de
aprendizagem que relatamos foram ensinados por ele, em seu curso sobre preparo vocal para crianças,
jovens e adultos. Gostaríamos de lhe dar credibilidade por isto.
134

e uma sonoridade de pouca qualidade vocal. Cada regente pode escolher qual nota é
melhor para seu coro cantar. Para auxiliar na sustentação das notas em semibreve,
pedimos que nossos cantores realizem um gesto manual contínuo, partindo do lado
direito para o esquerdo, como se desenhassem no ar o arco-íris. A afinação refinada é
fundamental para a execução deste vocalise e deve ser priorizada.

Figura 93. Vocalise 75

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


7ª Maior ou 8ª Dó Maior 2
Justa

2.5.2.4. Vocalise 76

Presente na tese de Angelo Fernandes (FERNANDES, 2009, p. 397), adaptamos este


exercício com a sugestão de executá-lo com swing – como se fosse um jazz – e estalando
os dedos nos contratempos. Além de cantar em ampla extensão, o vocalise também
propõe a pronúncia em inglês, a articulação clara das consoantes e a colocação, sobretudo,
da vogal [ɑ] que, geralmente, precisa ser aprimorada em coros infantis brasileiros. Variar
os andamentos a cada modulação torna o vocalise mais instigante e divertido. A tradução
do texto é “cante um pequeno falala” ou “cante um “falalazinho””.
135

Figura 94. Vocalise 76

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 2

2.5.2.5. Vocalise 77

Figura 95. Vocalise 77

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 2

Este é um vocalise de Christian Lahusen, que se encontra no material de Paul


Nitsche (LAHUSEN in NITSCHE, 1969, p.59). O exercício propõe alguns contrastes de
136

articulação consonantal e musical, na extensão de 8ª Justa. No primeiro compasso,


apresenta sons curtos e destacados. No segundo compasso, staccato opondo-se ao
tenuto39, o que auxilia a afinação dos saltos melódicos. A partir do terceiro compasso,
notas de curta duração em graus conjuntos, para desafiar a articulação clara e flexível, e
um salto de 5ª Justa, ao final. Na modulação, uma saudação / comemoração falada. Como
o exercício consta em um método alemão, é importante salientar que o som do “j” da
palavra “jupp” é o de “i”, representado pelo glide [j] do ditongo [ju]. Assim, cantaremos
esta sílaba como “iup”. O “ei” da palavra “hei” deverá soar como “ai” [ɑ*] e não [e*], como
a palavra inglesa hey. Gestos que auxiliam a execução musical podem ser: polegares e
indicadores se unindo para representar os sons curtos do compasso inicial; “desenhar” a
melodia e suas respectivas alturas no compasso seguinte; mãos nas bochechas para
manter a articulação vertical da vogal [ɑ]; e levantar um dos braços na comemoração
falada. As palavras não têm um significado específico. Os números acima dos compassos
indicam as entradas de um cânone a quatro vozes.

2.5.2.6. Vocalise 78

Figura 96. Vocalise 78

39 Acento musical que mantém a nota sustentada.


137

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


9ª Maior Ré Maior 3

Musicamos este dito popular com base na melodia do exercício de Angelo


Fernandes (FERNANDES, 2009, p. 415), a qual aborda a afinação de intervalos não
elementares e oportuniza a equalização dos registros grave, médio e agudo. Ao ensinar
este vocalise, o regente deve ser bem criterioso quanto à afinação das notas, para que não
sejam aprendidas erradas. Nossa sugestão é que as crianças imitem o regente nota a nota,
em pequenos excertos e só então cantem o exercício inteiro. Em nossos coros,
inicialmente, não associamos gestos específicos para executar este vocalise, pois
priorizamos a concentração na afinação. Quando já estiver bem aprendido, recursos de
aprendizagem podem ser empregados, conforme necessidades de cada coro.

2.5.2.7. Vocalise 79

Figura 97. Vocalise 79

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 3
138

Este é mais um trava-língua popular que musicamos, com enfoque na afinação de


saltos melódicos variados, na equalização dos registros vocais e no fraseado musical. Com
maior grau de dificuldade de afinação e sonoridade homogênea, o vocalise pode ser
cantado em legato, com apenas uma respiração antes da anacruse do 5º compasso (“o
lustre”) trabalhando, assim, a administração da respiração. Para explorar a fluidez e as
dinâmicas, pedimos que os cantores rejam o vocalise para si mesmos e, depois, para todo
o coro, caso sintam-se confortáveis com tal exposição pessoal. Costumamos convencionar
gestos amplos para cantar em dinâmica forte (sem gritar), gestos pequenos e leves para
cantar em piano, gesto de sustentação para notas longas e possíveis fermatas e cortes para
finalizar o exercício. Todos estes gestos vivenciados, de forma lúdica, podem ser
incorporados à regência do repertório, tornando a performance musical mais significativa
e artística. É possível trocar “Luiza” por “Luzia”, uma variação deste trava-língua que
propicia o uso da palavra “luzia” como substantivo próprio e verbo, no mesmo exercício.

2.5.2.8. Vocalise 80

Figura 98. Vocalise 80

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Fá Maior 2

Este é um estribilho da música “Balaio, meu bem”, de Paixão Côrtes e Barbosa


Lessa, que foi retirada do livro de canções de Isolde Mohr Frank (CÔRTES e LESSA in
FRANK, 2009, p. 110). No original, o primeiro Dó é agudo (Dó 4), mas aqui,
propositalmente, o alteramos para trabalhar o salto de 8ª Justa e a homogeneização dos
registros vocais. Com este excerto musical em forma de vocalise, buscamos aprimorar a
afinação de intervalos variados e ampliar o conhecimento dos nossos cantores sobre
139

repertório musical brasileiro. Para tornar esta ampliação de repertório ainda mais válida,
propomos cantar este exercício com percussões corporais e acompanhamentos
instrumentais característicos de ritmos brasileiros, como o baião e o samba, por exemplo.

2.5.2.9. Vocalise 81

Figura 99. Vocalise 81

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 3

Além de ser mais um exercício de aprimoramento da afinação de saltos diversos,


do domínio dos registros vocais e da administração da respiração em frases em legato, o
presente vocalise também propicia ao coro a prática do conceito de intensidade e suas
nuances de dinâmica, associando-os às fases da lua. Na lua nova, podemos cantar em
dinâmica mezzo piano; na lua crescente, iniciar um crescendo; na lua cheia, adotar a
dinâmica forte; e na lua minguante, decrescendo e piano, ao final. Sugerimos reproduzir
com as mãos os símbolos gráficos de crescendo e decrescendo, para auxiliar na
compreensão da variação de dinâmicas e ampliar os saberes de notação musical dos
140

cantores. As variações vivenciadas podem ser aplicadas ao repertório do coro, ampliando,


assim, suas possibilidades interpretativas.

2.5.2.10. Vocalise 82

Figura 100. Vocalise 82

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


10ª Maior Sib Maior 3

Este exercício de Paul Nitsche (NITSCHE, 1969, p.21) foi originalmente escrito para
se cantar em com a palavra “dua” (sem significado específico) e o autor também sugere
que outras vogais sejam trabalhadas. Tomamos a liberdade de adaptar os fonemas,
refletindo sobre as características da voz infantil e os registros abordados em cada excerto
melódico. Nos quatro primeiros compassos, há a predominância dos registros médio e
agudo. A consoante fricativa [v] e a vogal [i] ajudam a manter a ressonância frontal,
suavizando possíveis tensões de emissão das notas graves, as quais não são tão sonoras
em vozes infantis e podem ser forçadas com o uso indevido do registro de peito. Nos
compassos de número 4 a 8, os registros médio e agudo são priorizados e adotamos a
consoante [n] e a vogal [u] para equilibrar as ressonâncias anterior e posterior,
possibilitando a colocação focada na “máscara” e o espaço orofaríngeo, ideal para notas
agudas. Nos compassos restantes, as colcheias são mais recorrentes e, por exigir
articulação mais precisa e a exploração do registro médio, adotamos a consoante [p] e a
vogal [ɑ]. Não recomendamos que este exercício seja modulado até que todos os registros
e fonemas estejam bem homogeneizados e a afinação esteja precisa. Outras sílabas podem
ser cantadas e diversos recursos expressivos (dinâmicas, andamentos, etc.) e de
141

aprendizagem podem ser aplicados, conforme o gosto do regente e o desenvolvimento


técnico-vocal dos coros. O autor também sugere que se cante em cânone e as entradas
estão numeradas, na partitura.

2.6. PREPARO VOCAL E DESENVOLVIMENTO DE MUSICALIDADE

2.6.1. Contextualização

Alguns relacionam musicalidade a um dom inexplicável, uma facilidade inata e/ou


um privilégio para poucos. Com base em estudos nas áreas de Educação Musical, Filosofia
e Psicologia da Música, Cuervo afirma que, na verdade, a musicalidade é uma
característica humana e um conhecimento que pode ser desenvolvido e potencializado,
por exemplo, em aulas de música e em ambientes que oportunizem experiências
artísticas, culturais e sociais, a expressão musical e a criatividade (CUERVO, 2008, p. 1, 2,
3 e 6; CUERVO, 2010, p.4). Concordamos com a autora e vemos na prática coral e,
especificamente no preparo vocal, uma oportunidade de desenvolver a musicalidade dos
cantores, através da vivência de elementos de musicalização e de recursos expressivos e
do aprimoramento da qualidade sonora do coro.
Nos exercícios já abordados, ressaltamos aspectos de musicalização e recursos
expressivos que podem ser trabalhados, concomitantemente, ao desenvolvimento de
ressonância, dicção, extensão e registros vocais. Quanto ao timbre, podemos dizer que as
possibilidades de sonoridades são várias e podem ser exploradas conforme o repertório
e as concepções musicais e vocais do regente. Basicamente, suas diferenciações estarão
no direcionamento da ressonância e na configuração dos articuladores. Dentre outros
exemplos, um som mais “brilhante” precisará de mais ressonância frontal, enquanto que
um som mais “escuro” precisará de ressonância posterior e lábios mais arredondados.
Nesta tese, não abordaremos em detalhes as nuances de sonoridade e seus
desenvolvimentos específicos, mas um pré-requisito básico para que os timbres possam
ser variados: a afinação.
Em nossa prática como regente e participante de festivais e encontros corais, já
assistimos muitos coros infantis brasileiros que não possuíam orientações consistentes
de preparo vocal, mas que, mesmo assim, aparentavam ter um grande potencial artístico
e vocal. Nestes eventos, o que mais nos chamou a atenção foi o fato de que, muitos coros
142

que mal alcançavam uma afinação precisa em uníssono e já ousavam executar repertórios
a 2 ou 3 vozes, resultando em uma performance inadequada e pouco musical, o que
expunha tanto os cantores quanto os regentes. Acreditamos que qualquer trabalho
musical de qualidade deve partir de uma boa afinação. É preferível que o coro cante por
um bom tempo repertórios em uníssono e dentro de suas possibilidades vocais e musicais,
do que repertórios em 2 ou 3 vozes de forma desafinada e pobre de musicalidade, para
meramente “impressionar” a plateia pela dificuldade da polifonia. Pela necessidade de
ampliação de conhecimentos e pela relevância da temática afinação no canto coral infantil,
discutiremos este assunto com mais detalhes.
Um coro soa homogêneo quando não se escuta vozes isoladas se sobressaindo. É
sabido que padronizar a configuração dos articuladores (“fôrmas”) na produção das
vogais pode contribuir com tal homogeneidade, mas, além de adotar uma abordagem
técnico-vocal comum, também é primordial que os cantores cantem com a mesma
afinação, para não destoarem no todo.
A afinação é, antes de tudo, um fator cultural. Em geral, no ocidente, adotamos um
sistema de afinação temperado, de origem europeia e organizado em doze sons
(semitons). No oriente também podemos encontrar outros sistemas de afinação, que
incluem mais sons (quarto de tons, microtons, etc.). Assim, o que soa “desafinado” ao
ocidental, pode soar perfeitamente “afinado” ao oriental (SOBREIRA, 2003, p. 171;
ANDRADE, 2010, p. 77). Como estamos no Brasil, adotamos tal sistema temperado e
fazemos a distinção do que soa afinado – na mesma frequência acústica – e desafinado.
Silvia Sobreira, referência nacional na pesquisa sobre desafinação vocal,
contextualiza que “cantar afinadamente envolve mecanismos ligados à percepção
auditiva, ao controle motor (produção vocal), à compreensão dos esquemas da música
tonal e à memória” (SOBREIRA, 2017, p. 72). Além destes aspectos, em nossa revisão
bibliográfica, também encontramos outras justificativas para a desafinação infantil, como:
desatenção, temperamento/comportamento da criança, ambiente, metodologia de ensino
e distúrbios orgânicos (SOBREIRA, 2017, p. 73 e 74; SOBREIRA, 2016, p. 131; GIGA, 2004,
p. 71 a 76; ANDRADE, 2010, p. 77 a 80; SESC, 1997, p. 41).
A percepção auditiva deficiente pode estar relacionada à dificuldade da criança de
se ouvir e se perceber no todo (SOBREIRA, 2017, p. 73), e à inexperiência em lidar com
estímulos sonoros diversos e simultâneos, como naipes com linhas vocais distintas,
acompanhamento instrumental harmônico, modelo vocal adulto com impostação
143

inapropriada à voz infantil ou modelo adulto masculino que não canta em falsete e requer
a transposição de oitavas etc.
Com relação ao desenvolvimento técnico-vocal, as crianças podem não afinar por
terem uma extensão vocal limitada, por não saberem usar os mecanismos de respiração,
colocação vocal e registração vocal, por cantarem repertórios em tessitura inapropriada
e por apresentaram “voz rouca, com excesso de ar, estridente, anasalada, não compatível
com a idade cronológica (...), resultantes de maus hábitos vocais e alergias” (ANDRADE,
2010, p. 77). Nestes casos em que indícios de que a saúde vocal do cantor possa estar
comprometida, o regente deve encaminhá-lo a especialistas, como otorrinolaringologistas
e fonoaudiólogos para que, em conjunto, possam cuidar e reabilitar a voz dele.
A falta de compreensão dos esquemas tonais e de memorização podem ser
justificadas por pouca vivência musical e pela desatenção. Uma criança inerte e com pouca
capacidade de concentração, pode comprometer sua percepção e memória auditiva
(ANDRADE, 2010, p. 77). Giga relata que existem os “monótonos” – crianças que não
conseguem discriminar e reproduzir as alturas corretas – e os “falsos monótonos”, que
apresentam tais características por pura distração. Através de atividades motivadoras e
de foco mental, propostas pelo regente, elas podem superar estas dificuldades e afinar
(GIGA, 2004, p. 75 e 76). A percepção auditiva, o domínio técnico-vocal, a compreensão
de esquemas tonais e a memória musical são habilidades treináveis e aprimoráveis.
(SOBREIRA, 2017, p. 74).
Alguns fatores extramusicais também interferem na desafinação infantil, dentre
eles, o ambiente, o temperamento da criança e distúrbios orgânicos. Ambientes que
estimulam a musicalidade podem interferir na afinação. Andrade aponta que, segundo
Bartle (2003, p. 8):

(...) crianças podem nunca ter escutado alguém cantando com voz de
cabeça ou não foram ainda encorajadas a cantarem sozinhas (...). Elas
podem vir de lares cujos pais não têm tempo de cantar com elas e para
elas. Ou, simplesmente, não estão interessadas porque o professor não
possui um estilo envolvente, não oferecendo estímulos por meio de
atividades interessantes. (ANDRADE, 2010, p. 78)

Giga ainda complementa a exemplificação destes ambientes pouco estimulantes,


embasada em Naidich (1994), relatando que: “a falta de estímulo sonoro na primeira
infância, a falta de jogos musicais, a falta do canto da mãe ao adormecer o bebê [pode
144

negar às crianças] a aprendizagem inconsciente” (GIGA, 2004, p. 72). A escolha certeira


do repertório musical e de atividades didáticas pode propiciar a ampliação de vivências
musicais dos cantores. Em concertos, viabilizar novas estéticas e opções musicais pode
estimular novos gostos e hábitos musicais para o coro e seu público (familiares, amigos,
comunidade em geral). O regente pode assumir tal responsabilidade profissional e, a
longo prazo, ver os resultados desta ampliação de musicalidade em aspectos educacionais
e sociais.
Além da desatenção que já abordamos, a timidez também pode causar a
desafinação. A criança tímida pode apresentar pouca ou nenhuma autoconfiança, se
sentindo exposta para cantar sozinha em exercícios de correção de afinação, tendo medo
de sua voz soar demais na massa sonora e até mesmo abrir a boca para cantar, o que
dificulta a emissão vocal e também torna o canto desafinado. Respeitar a timidez e
trabalhar para se estabelecer uma relação de confiança entre regente, cantor e coro é
muito importante. Uma vez que esta criança se sinta confortável, começará a ser mais
participativa e menos retraída.
Segundo Sobreira, a causa da desafinação ainda pode ser por distúrbios orgânicos
(danos cerebrais, por exemplo), de ordem física e neurológica, genéticos ou adquiridos.
Um deles pode ser a amusia, na qual, em linhas gerais, a pessoa é incapaz de reconhecer,
discriminar, memorizar e executar várias tarefas musicais (SOBREIRA, 2013, p. 27;
SOBREIRA, 2016, p. 136). A autora comenta que este é um caso extremo e raro que, como
professores de música, não temos capacidade de diagnosticá-lo. Também não seria
correto alarmar os pais para levarem seus filhos a médicos especialistas a qualquer sinal
de desafinação. O regente não deve ser negligente quanto à afinação de um cantor, mas,
antes de suspeitar um problema orgânico e encaminhar a especialistas, abordagens
pedagógico-musicais devem ser tentadas para resolver a desafinação. (SOBREIRA, 2013,
p. 27 e 28). Apesar da afinação ser fundamental para o trabalho musical, não podemos
esquecer que ela é alcançada em um processo que requer tempo e paciência. O coro
também é uma prática social e nenhuma criança deve ser excluída. De acordo com
Sobreira, embasada em Demorest; Pfordresher, 2015; Knight, 2010; Welch,2001; Wise,
2009:

(...) as crianças que se sentem excluídas nas atividades de canto, e que


guardam lembranças dolorosas a respeito de suas habilidades, podem
desenvolver traumas que as levem a atitudes de negação relacionadas ao
145

ato de cantar. Esse comportamento pode contribuir para que elas se


sintam incapazes de afinar por toda sua vida adulta. (SOBREIRA, 2016, p.
131)

Com tato, ternura e uma postura de encorajamento e acolhimento, os regentes


devem lidar com os cantores desafinados, ponderando suas reais possibilidades musicais
e artísticas para estruturar o trabalho coral. Andrade relata que, Bartle diz o seguinte
quando uma criança desafinada é rechaçada por colegas: “alguns de nós possui voz grave
e outros, voz aguda; alguns têm mãos grandes e, outros, mãos pequenas. Que chato seria
se nós fôssemos iguais! ” (BARTLE, 2001, p.9 in ANDRADE, 2010, p. 80). O respeito e a
empatia são valores a serem desenvolvidos e que contribuem efetivamente para um
ambiente positivo de ensino-aprendizagem.
Ao revisarmos as metodologias de afinação infantil de Welch, Bartle e Ward, pelas
óticas de Sobreira (2017), Andrade (2010) e Giga (2004), encontramos a opinião comum
de que a afinação é um processo contínuo e pode ser desenvolvido em diversos estágios.
Dentre as estratégias didáticas descritas, há algumas que consideramos efetivas e
utilizamos em nossos coros, tais como exercícios de exploração de sons do cotidiano e das
vozes falada e cantada; imitação sonora de excertos melódicos nos três registros vocais;
escolha do repertório em tonalidades adequadas que privilegiem o uso da voz de cabeça;
trabalho de percepção auditiva individual ou em pequenos grupos de cantores, para uma
atenção mais direcionada; estímulo da escuta ativa e do senso crítico; o próprio preparo
vocal com enfoque na qualidade sonora e com associação de recursos de aprendizagem;
e o treino do repertório com gravações, em casa (SOBREIRA, 2017, p. 72 e 73; ANDRADE,
2010, p. 80; GIGA, 2004, p. 77).
Neste último aspecto, relatamos que, em nossos coros, usamos a tecnologia a nosso
favor, solicitando que os cantores gravem as linhas melódicas do repertório trabalhado
em seus celulares, para estudar em casa. Em determinado momento do ensaio a regente
canta sozinha tais linhas e solicita as gravações. Também indicamos vídeos de referência
em plataformas como o Youtube, para que os alunos os apreciem e ampliem o senso
estético e crítico. É muito importante que as gravações tenham bons modelos vocais. Com
estes recursos tecnológicos a leitura, memorização e manutenção do repertório são
viabilizadas com mais rapidez e consistência.
Os exercícios que seguem abordam a afinação através do canto de saltos melódicos,
escalas maiores e menores, com nome de notas, em vozes e brincadeiras cantadas, com o
146

intuito de timbrar as vozes e integrar o coro. Os parâmetros de classificação são os


mesmos dos exercícios anteriores e, novamente, sugerimos que exercícios com ampla
extensão vocal sejam avaliados quanto à necessidade de serem modulados. A qualidade
vocal deve ser a preocupação primordial.

2.6.2. Exercícios para afinação

2.6.2.1. Vocalise 83

Figura 101. Vocalise 83

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 1

Neste exercício, trabalhamos a afinação na escala maior descendente e no salto de


8ª Justa. A relação da escada com a escala musical pode ser abordada e o exercício também
pode ser cantado com o nome das notas. O salto de oitava pode apresentar portamento
indesejado. Caso as crianças o façam, trabalhá-lo em staccato e, depois, em legato.
Costumamos bater uma palma na pausa de colcheia inicial como se estivéssemos
“fechando a porta de casa” e, ao cantar, alternando as mãos, vamos desenhando degrau
por degrau da escada. No final, apontamos a base e o topo da escada imaginária, conforme
a melodia grave e aguda.

2.6.2.2. Vocalise 84

Figura 102. Vocalise 84

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré Maior 1
147

Este vocalise contrasta as tríades maior e menor, podendo ser uma introdução à
contextualização de modos maior e menor. Embora óbvio e considerado inapropriado por
algumas propostas de Educação Musical, abordamos a tríade maior com expressões
faciais de surpresa e felicidade e a tríade menor com expressões de preocupação e
tristeza. Outros gestos e movimentos antagônicos também podem ser empregados. O
regente deve se atentar, em especial, à afinação do terceiro compasso, no qual aparece a
terça maior seguida da terça menor. Sugerimos que se façam fermatas nestas notas, para
conferir a afinação.

2.6.2.3. Vocalises 85a e 85b

Figura 103. Vocalise 85a

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 2

Figura 104. Vocalise 85b

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó menor 2
148

Com enfoque na afinação dos intervalos melódicos de 2ª a 8ª Justas / Maiores e


menores, ascendentes e descendentes, podemos realizar este exercício explorando as
escalas maior e menor40. Associamos a amplitude dos intervalos com a amplitude
geográfica, variando da casa (intervalo de 2ª) até o mundo (intervalo de 8ª Justa). Para
memorizar texto e entender tais amplitudes podemos usar o recurso visual de escrever e
desenhar em um cartaz as palavras e símbolos que representem cada etapa do exercício.
Após aprendido, é possível variá-lo atribuindo nomes de notas e números que
representem os graus da escala. Em nossa prática, costumamos trabalhar a escala maior
primeiro, afinando-a com exatidão para, em seguida, abordar as escalas menores. Este
vocalise também pode ser uma introdução à teoria de modos e escalas maiores e menores.

2.6.2.4. Vocalise 86

Figura 105.Vocalise 86

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 1

40 Escrevemos em partitura o vocalise 85b com base na escala menor natural, mas as escalas menores

harmônica, melódica e bachiana também podem ser trabalhadas.


149

Em nossos coros, utilizamos a manossolfa da metodologia do educador musical


húngaro Zoltan Kodály (1882-1967), para introduzir a leitura melódica e trabalhar a
afinação coral. A manossolfa é um sistema de solfejo relativo, no qual cada nota possui um
gesto manual correspondente (ver anexos). Tais notas não são nomeadas
necessariamente de acordo com as alturas reais, mas, seguindo a estrutura intervalar de
determinadas escalas41. Quando exploramos este sistema, primeiramente entoamos as
notas e seus gestos, como na partitura, na gradação da figura de maior duração
(semibreve) à figura de menor duração (semínima), coordenando os respectivos gestos.
Com pré-corais, adaptamos a movimentação às habilidades motoras da faixa etária.
Assim, costumamos fazer este vocalise associando o Dó grave ao ajoelhar e o Dó agudo ao
ficar nas pontas dos pés. O corpo se estica e se retrai gradativamente conforme a escala é
entoada. Com coros mais desenvolvidos musicalmente é possível cantar o exercício a
capella e em cânone, sem a repetição do Dó agudo do 9º compasso. Este exercício e os
próximos com nomes de nota podem ser realizados com modulações em Dó móvel, ou
seja, sempre chamando de Dó a tônica da tonalidade, e substituindo os nomes das notas
pelos graus da escala.

2.6.2.5. Vocalises 87

Figura 106. Vocalise 87

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 2

41 As alturas reais permanecem sempre as mesmas, porém, as escalas maiores são nomeadas conforme a escala de Dó

Maior e seguirão a estrutura típica de uma escala maior (tom, tom, semitom, tom, tom, semitom). As escalas menores
serão nomeadas conforme a escala de Lá menor e sua estrutura correspondente e os modos também serão chamados
com base em suas respectivas escalas e estruturas (Dórico, escala de Ré; Frígio, Mi; Lídio, fá; Mixolídio, Sol; Lócrio, Si).
Por exemplo, em Fá Maior, a tônica “Fá” soará em sua altura real, mas será chamada e gesticulada como “Dó”; o segundo
grau, “Sol”, será o “Ré”; o terceiro grau, “Lá”, será o “Mi”, e assim por diante.
150

Os materiais melódicos deste exercício são a tríade, a escala e a relação de


Dominante-Tônica da tonalidade de Dó Maior, aspectos que podem ser contextualizados
em atividades de musicalização, posteriormente. Almejamos o refinamento da afinação,
então, trabalhamos o exercício aos poucos, nos certificando de que todas as notas foram
aprendidas corretamente. Também associamos alguns gestos para tornar a execução mais
fluída. Nos dois primeiros compassos, batemos os pés no chão nos tempos fortes: nota mi
com o pé direito e nota sol com o pé esquerdo. Nos compassos 3 e 4, fazemos um gesto
descendente com os braços, partindo da cabeça até a cintura. Nos compassos 5 e 6,
estralamos os dedos, alternando as mãos, na rítmica de colcheias. O exercício também
pode ser realizado em modo menor.

2.6.2.6. Vocalise 88

Figura 107. Vocalise 88

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 3

À melodia do exercício de Fernandes (FERNANDES, 2009, p. 412) atribuímos


nomes de notas. Este é um vocalise ideal para trabalhar a afinação dos saltos de terça e da
tríade maior acrescida da 8ª. Com nossos coros, costumamos apontar as notas no ar, como
se estivéssemos apertando botões de um elevador, de acordo com as alturas e as relações
intervalares que são cantadas. Notas agudas e saltos ascendentes são apontados para
cima, notas graves e saltos descendentes, para baixo. Para precisar melhor a afinação é
possível realizar fermatas em algumas notas.

2.6.2.7. Vocalise 89

O exercício que segue é um exercício de Leck (LECK, 2009, p. 63) que trabalha a
afinação de cada intervalo melódico das escalas ascendente e descendente de Dó Maior. O
regente pode ensiná-lo em partes, para garantir uma melhor afinação e compreensão.
Nossa sugestão é trabalhar a escala ascendente, primeiro, de Dó a Sol, e depois de Dó a Dó.
151

Quando o coro cantar com segurança a escala ascendente, trabalhar a descendente até o
Sol e, na sequência, até o Dó grave. Para tornar o exercício mais desafiador, pode-se variar
os andamentos, bater palmas cada vez que se canta a nota Dó e/ou fazer um cânone,
começando, por exemplo, onde tem um asterisco, na partitura (terceiro tempo do
primeiro compasso). É possível, ainda, cantá-lo em modo menor.42

Figura 108. Vocalise 89

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 3

2.6.3. Exercícios para canto em vozes

2.6.3.1. Vocalise 90

Adaptamos para duas vozes iguais o exercício de Heffernan, presente na tese de


Fernandes (HEFFERNAN, 1982, p.68 in FERNANDES, 2009, p. 445). Nele é possível
aprimorar a afinação por meio de cromatismos e notas sustentadas. A voz 1 canta os

42 Ver mais detalhes deste exercício em RHEINBOLDT, 2014, p. 103 a 105.


152

cromatismos no início e sustenta o 5º grau em seguida. Já a voz 2 sustenta a tônica no


começo e realiza os cromatismos no final. O regente pode escolher qual fonema será
cantado. Costumamos cantar em [ni] ou [vi]. Associamos aos cromatismos gestos curtos
com os dedos e às notas longas, as palmas das mãos abertas, “segurando” tais notas. O
coro pode ser desafiado a cantar e modular a cappella quando dominar bem este exercício.

Figura 109. Vocalise 90

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


5ª Justa Ré 3

2.6.3.2. Vocalise 91

Figura 110. Vocalise 91

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 3
153

Também retiramos este exercício da tese de Fernandes (FERNANDES, 2009, p.


377) e o adaptamos para três vozes iguais. Ele é composto por um salto de 8ª justa
ascendente, pela escala Maior descendente e pelo canto em vozes que a partir da escala
forma a tríade Maior. Além de trabalhar a afinação destes aspectos melódicos e
harmônicos, através dele, ainda é possível aprimorar o timbre do coro, equilibrando a
sonoridade de cada naipe e do todo. Como no exercício anterior, também se pode cantar
e modular a capella e escolher o fonema. Em nossos coros, cantamos com [no] ou
[lu]. Quando o coro já estiver executando este vocalise com facilidade, pode-se propô-lo
em modo menor.

2.6.3.3. Vocalise 92

Figura 111. Vocalise 92

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


9ª Maior Mi Maior 2
154

Esta é uma sobreposição de canções, ou quodlibet, que encontramos no livro de


Ana Tatit e Maristela Loureiro (TATIT e LOUREIRO, 2014, p. 70 e 71). As autoras
apresentam quatro canções folclóricas brasileiras que podem ser sobrepostas:
“Bambalalão”, “Lua luar”, “Boi da cara preta” e “Marcha soldado”. Escolhemos trabalhar
apenas as duas últimas, mas é possível abordar todas elas. A sobreposição de melodias é
uma maneira de começar o canto a duas vozes com coros infantis. Neste exercício,
primamos pela afinação, o timbre coral e o domínio dos registros vocais. “Boi da cara
preta” explora os registros médio e grave, “Marcha soldado”, os registros médio e agudo.
Sugerimos que as vozes 1 e 2 se alternem e vivenciem ambas as canções para ampliar a
percepção e cantar em todos os registros. O regente pode propor variações de dinâmica
para explorar sonoridades e densidades sonoras e pode, ainda, sugerir que cada voz crie
sua movimentação própria. Assim, acontecerão contrastes de melodias e de movimentos,
tornando a vivência artística mais criativa e significativa.

2.6.3.4. Vocalise 93

Figura 112. Vocalise 93

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª Maior Ré Maior 2
155

Criamos este cânone associando a melodia e o texto ao movimento das ondas. Seus
principais objetivos musicais são aprimorar a afinação e explorar o modo mixolídio. Para
tornar o exercício mais expressivo, é possível variar dinâmicas que delineiem a entrada
das vozes e o movimento ondular. Trabalhar este cânone com a criação de paisagens
sonoras e a escuta do som das conchas do mar e do oceandrum (instrumento de
percussão), por exemplo, pode oportunizar uma interpretação musical mais expressiva e
uma experiência artística mais rica.

2.6.3.5. Vocalises 94a e 94b

Figura 113.Vocalise 94a

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


8ª Justa Dó Maior 1 (uníssono)
2 (cânone)
3 (arranjo)

Tendo como base a escala pentatônica e o refinamento da afinação, este exercício


pode ser trabalhado de diversas formas: em uníssono, em cânone ou como o arranjo vocal
apresentado na sequência. Para abordar o arranjo, o coro pode ser dividido em quatro
grupos e o regente pode criar texturas e sobreposições vocais com as quatro linhas
propostas. Os alunos também podem ser regentes e cada grupo pode criar sua
movimentação própria. É possível, ainda, convencionar o arranjo de forma que todos os
grupos se alternem para executar todas as linhas vocais. Além de cantado, o exercício e
suas variantes também podem ser tocadas com instrumentos pentatônicos (xilofones,
metalofones, teclas pretas do piano, etc.), ampliando ainda mais as possibilidades de
aplicação deste exercício.
156

Figura 114.Vocalise 94b

2.6.5. Brincadeiras cantadas

Em nossa prática, incorporamos algumas brincadeiras cantadas ao preparo vocal,


para torná-lo mais divertido. São muitas as possibilidades de brincadeiras que podem ser
encontradas em materiais de Educação Musical e Canto Coral, as quais não detalharemos,
neste trabalho. Mesmo assim, finalizaremos nossas propostas de preparo vocal para coro
infantil com uma brincadeira cantada de nossa autoria.
157

Figura 115. Brincadeira cantada

Extensão vocal Tonalidade inicial Andamento Nível de dificuldade


6ª Maior Fá Maior 1

Nos compassos 3 e 4, o coro canta o nome do cantor que deverá improvisar nos
compassos 9 a 12. O improviso pode ser com explorações vocais, melódicas percussivas
etc. O importante é que as crianças se expressem criativamente. Nos compassos 13 a 16,
o coro realiza um ostinato de percussão corporal coletiva e o exercício recomeça com a
chamada de um novo cantor. Para que a brincadeira não fique cansativa, principalmente
em coros grandes, é possível dividi-la em vários ensaios. Assim, temáticas e desafios
podem ser propostos. Por exemplo, só explorar improvisos vocais com determinadas
sílabas ou solicitar que só improvisem crianças com idades específicas ou que façam
aniversário em um mês convencionado. Esta atividade também ajuda na memorização
158

dos nomes e na integração do grupo, afinal, além de estar musicalmente afinado, o coro
também deve estar afinado quanto à importância da coletividade, da empatia, da
solidariedade e de tantos outros valores que o canto coral pode proporcionar.

2.7. ROTEIRO DE PREPARO VOCAL PARA COROS INFANTIS

Apresentadas todas as propostas pedagógicas que temos desenvolvido ao longo de


nossa experiência profissional à frente de coros infantis, gostaríamos de encerrar este
capítulo com uma sugestão de roteiro de preparo vocal. Recomendamos que ele comece
com exercícios de postura e respiração, para preparar o corpo e a mente à prática coral.
Os vocalises iniciais têm a função de aquecimento e podem ser de ressonância e dicção.
Os exercícios que seguem visam o desenvolvimento técnico-vocal específico, como dicção,
extensão e registros vocais, musicalidade, afinação e/ou brincadeiras cantadas, conforme
as necessidades de cada coro. As necessidades são delimitadas pelas exigências do
repertório e pelos aspectos musicais e vocais que precisam ser trabalhados.
Vale lembrar que os vocalises de aquecimento devem ter melodias com extensões
vocais não muito amplas e que as modulações não necessitam abarcar os extremos grave
e agudo. Inicialmente, privilegiar os registros médio e agudo, o uso da voz de cabeça e a
boa administração da respiração. Nos vocalises de desenvolvimento técnico-vocal
específico, pode-se ousar um pouco mais quanto às modulações e extensões, sempre
respeitando os limites vocais infantis e a qualidade da sonoridade. A associação de
recursos de aprendizagem (visuais, auditivos, corporais, lúdicos) viabiliza o ensino de
canto para crianças e também deve ser utilizada.
Indicamos as quantidades de exercícios que consideramos ideais, porém, elas não
são fixas e podem ser adaptadas ao tempo de ensaio, à faixa etária, ao tipo de coro e aos
objetivos de trabalho de cada realidade coral.

Etapa Descrição
Postura e respiração • Concentração
• Alongamentos corporais
• Posturas em pé e sentado
• Respiração (1-2 exercícios)
Aquecimento vocal • Vocalises com vibração de lábios e língua, sons
fricativos e nasais (1-2 exercícios)
• Vocalises com vogais (2-3 exercícios)
159

• Vocalises de ressonância e articulação (2-3)


Desenvolvimento • Vocalises de dicção em português ou outros idiomas,
técnico-vocal extensão e registros vocais, musicalidade e /ou auxílio
específico ao repertório (2-3 exercícios)
• Vocalises de afinação, canto em vozes e/ou
brincadeiras cantadas (1-2 exercícios)

Tabela 13. Sugestão de roteiro de preparo vocal para coros infantis


160

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta tese, contextualizamos as premissas de um coro infantil, apontando a faixa


etária, as possibilidades de agrupamento e as bases pedagógicas que consideramos ideais.
Descrevemos o perfil do regente deste tipo de coro, realçando suas funções como
intérprete, educador musical e vocal e agente social que fomenta cultura aos cantores e à
plateia. Também detalhamos o preparo vocal de coros infantis, apontando sua
importância na construção da qualidade sonora coral e apresentando seus elementos
(postura, respiração, ressonância, articulação, extensão e registros vocais, afinação, canto
em vozes e musicalidade) e algumas propostas pedagógicas, com base em revisões de
materiais de Canto Coral, Canto, Regência e Educação Musical e, principalmente, em nossa
experiência como regente, preparadora vocal e cantora.
Ao iniciar a pesquisa nossos objetivos eram minimizar a escassez de materiais em
português e, através do preparo vocal, criar propostas que pudessem contribuir,
efetivamente, com a melhora artística de coros infantis brasileiros. Nossa preocupação
era a de elaborar um material que não fosse embasado apenas em teoria, mas que
refletisse as necessidades das realidades que encontramos atualmente nos palcos e nas
salas de ensaio. O material que criamos partiu de muitas reflexões e práticas pedagógicas
com crianças e pré-adolescentes de variados contextos socioeconômicos, educativos e
culturais. Os principais objetivos deste material são: viabilizar o ensino de canto para
crianças; zelar pela saúde de vozes em formação; explorar a musicalidade, criatividade e
autoexpressão dos cantores; e propiciar mais qualidade vocal à performance musical.
O desenvolvimento da pesquisa e escrita desta tese nos possibilitou constatar que:

1. Muitos coros infantis brasileiros apresentam algumas dificuldades vocais


comuns, como, por exemplo, o pouco uso da voz de cabeça, a má inteligibilidade do texto,
o canto com portamentos, a afinação imprecisa e a sonoridade coral pouco uniforme.
Julgamos que, no preparo vocal de tais coros, estes aspectos devem ser aprimorados com
prioridade.
2. As maiores potencialidades da voz infantil encontram-se no registro agudo,
porém, muitas vezes, a fala do português brasileiro e os modelos vocais veiculados pela
mídia e consumidos por nossos cantores priorizam o canto no registro grave (voz de
peito). Assim sendo, se faz necessário ampliar a escuta, o repertório musical, as
161

tonalidades e a percepção vocal das nossas crianças e adolescentes, visando oferecer


novas referências e recursos de colocação vocal.
3. Uma voz infantil não deve soar como uma voz adulta, então, não podemos
esperar os mesmos volume e timbre das vozes maduras. Solicitar ao coro infantil que
cante “mais forte”, certamente, o incentivará a gritar e a não usar a colocação vocal
considerada adequada e saudável. É preciso respeitar as limitações e caraterísticas das
vozes em formação.
4. A prática coral infantil não deve ter sua qualidade artística subestimada por sua
faixa etária de abrangência. Crianças e adolescentes são totalmente capazes de alcançar
uma afinação precisa e uma emissão vocal ressonante e refinada.
5. O preparo vocal deve perdurar por todo ensaio. O regente precisa estar
constantemente atento à sonoridade coral e dominar estratégias que possam melhorá-la,
tanto nos vocalises, quanto na interpretação das obras. As repetições devem ser objetivas
e pouco enfadonhas. O coro não deve aprender e / ou seguir cantando de forma incorreta,
sem a intervenção do regente.
6. A motivação dos cantores é primordial para que se desenvolva um trabalho coral
envolvente, prazeroso e de excelência.

Embora tenhamos direcionado nosso trabalho a coros infantis, acreditamos que


ele pode ser aplicado a outros tipos de coro, com adaptações e inovações que se façam
necessárias. Talvez as propostas apresentadas sejam mais significativas a regentes em
formação do que a regentes experientes, mesmo assim, esperamos que elas possam ser
úteis e contributivas a todos. Desejamos que este material seja amplamente utilizado e
que fomente novas pesquisas, composições e discussões sobre a temática.
Almejamos que o coro infantil, enquanto objeto de pesquisa, esteja mais presente
em ambientes acadêmicos, oportunizando a formação mais consistente e atuante de
novos regentes. Que grupos de pesquisa, projetos de extensão universitária, cursos livres,
publicações permanentes e outros veículos de comunicação e interação sejam criados e
possam proporcionar o aperfeiçoamento dos profissionais da área e a formação cultural
de toda a comunidade.
Acreditamos no potencial artístico das crianças, da prática coral e de um preparo
vocal lúdico, divertido, educativo-musical e saudável. Acreditamos, também, que a
qualidade e futuro do canto coral infantil do Brasil está sob a responsabilidade de seus
162

profissionais e desejamos que eles não esmoreçam perante as dificuldades, sigam


estudando e inovando, se mantenham unidos e generosos e possam fortalecer cada vez
mais o canto coral de nosso país.
Finalizamos citando a maestrina Doreen Rao, a qual diz que “uma revolução da
Educação Musical deve começar por garantir que toda criança tenha a oportunidade de
fazer música com a voz cantada, de praticar sua musicalidade e interpretar com
habilidade e conhecimento”43(RAO, 1993, p. 48). É nisso que acreditamos. É este o nosso
compromisso e é por ele que seguimos trabalhando.

43
A revolution from within music education must begin by ensuring that all children have the opportunity
to produce music with the singing voice, practice musicianship, and perform with skill and understanding.”
(RAO, 1993, p. 48)
163

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ANEXOS
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169
170
171
172
173
174
175
176
177

Tabela Alfabeto Fonético Internacional – IPA (MATTOS, p. 197, 2014)


178

Manossolfa de Kodály
Fonte: http://pedagogiasmusicais.blogspot.com.br/2013/11/kodaly.html

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