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REINVENÇÃO

SOCIAL
O PROTAGONISMO DAS PROFISSÕES
DO SISTEMA CONFEA-CREA EM
TEMPOS DE PANDEMIA
Giancarlo Lastoria
Juliana Casadei
coordenadores

REINVENÇÃO SOCIAL
O PROTAGONISMO DAS PROFISSÕES
DO SISTEMA CONFEA-CREA EM
TEMPOS DE PANDEMIA

Editora Majupá
2022
A impressão deste livro foi viabilizada com o apoio do Conselho Federal de
Engenharia e Agronomia - Confea, oriundo de projeto da Associação Campo-
Grandense de Engenheiros Agrônomos - ACEA

Projeto gráfico, editoração, diagramação: Editora Majupá


A capa utilizou recursos do Freepik.com
Revisão: dos autores

Lastoria, Giancarlo; Casadei, Juliana (coord.)

L349r Reinvenção social: O protagonismo das profissões do Sistema


Confea-Crea em tempos de pandemia / Giancarlo Lastoria; Juliana
Casadei ─ Campo Grande: Majupá, 2022.
284 p.

ISBN 978-85-67572-12-3

1. Pandemia. 2. Covid-19. 3. Profissões. 4. Crea. 5. Engenharia.

CDD - 607
Conselho Editorial e Científico
Prof. Dr. Giancarlo Lastoria (Coord.)
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, UFMS

Prof. Dr. Antônio Corrêa de Oliveira Filho


Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, UEMS

Profa. Dra. Dolores Pereira Ribeiro Coutinho


Universidade Católica Dom Bosco, UCDB

Prof. Dr. José Carlos de Oliveira


Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP

Profa. Dra. Maria Teresa Casadei


Universidade Católica Dom Bosco, UCDB

Prof. Dr. Renato da Silva Queiroz


Universidade de São Paulo, USP

Profa. Dra. Rosângela Villa da Silva


Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, UFMS

Comissão Organizadora
Profa. Me. Juliana de Mendonça Casadei (Coord.)
Profa. Esp. Amanda Fernandes Santos
Profa. Me. Elaíne Britto de Castro
Prof. Me. Felipe Buller Bertuzzi
Prof. Me. Jason Brais Benites de Oliveira
Prof. Me. Luiz André de Carvalho Macena
Prof. Esp. Orildes Amaral Martins Júnior
PREFÁCIO
UM VERDADEIRO REGISTRO CIENTÍFICO

Eng. Civ. João Carlos Pimenta


Presidente em exercício do Confea

A valorização das entidades de classe e, principalmente, dos


profissionais era o principal objetivo do Confea quando instituiu sua Política
de Patrocínios. O alinhamento desse objetivo com a publicação de obras que o
aproximem de seu atingimento é o que se busca quando da execução de cada
edital. Não seria diferente neste momento: mais do que uma ilustração, a
publicação "Reinvenção social: o protagonismo das profissões do Sistema
Confea/Crea em tempos de pandemia" é um registro científico desse papel
primordial das nossas profissões frente às situações-limite da nossa sociedade.

Desde 11 de março de 2020, vivemos uma pandemia. Até o fechamento


deste texto, o coronavírus havia ceifado mais de seis milhões de vidas, sendo
dez por cento dessas no Brasil. O mundo registrou mais de 500 milhões de
casos. Foram dois anos de colapsos nos sistemas de saúde, muita dor e medo.

Por outro lado, vimos a tecnologia dar as mãos aos profissionais da


saúde. A rápida confecção dos testes, por exemplo, diagnosticou populações e
municiou agentes públicos de dados para que pudessem tomar decisões
referentes a lockdowns e construção de hospitais de campanha. O
desenvolvimento da vacina foi recorde: um processo que usualmente demora
dez anos foi executado em dez meses. Esse é o resultado que se tem quando
profissionais da saúde, da ciência e tecnologia do mundo inteiro se unem e se
coordenam em estruturas de governança para a busca de soluções conjuntas.

Uma vez o imunizante desenvolvido, sua produção em massa, seu


transporte e seu armazenamento exigem diversos estudos de capacidade nos
laboratórios, organização de cronogramas com base nas previsões das
chegadas dos insumos, adaptação das áreas de produção e armazenamento,
controle de qualidade que garanta as condições necessárias, ao mesmo tempo
que não limite a produção, entre diversos outros passos. Todo esse processo
demanda verdadeira gestão de operação industrial. Em outras palavras: há
muita engenharia envolvida nesse processo.

Desenvolvido pela Associação Campo-Grandense de Engenheiros


Agrônomos (Acea), o livro "Reinvenção social: o protagonismo das
profissões do Sistema Confea/Crea em tempos de pandemia" conta essa
história. E é motivo de orgulho para o Confea patrocinar esta obra.

Boa leitura!
APRESENTAÇÃO

Geol. Giancarlo Lastoria


Enga. Agra. Juliana Casadei

É indiscutível o papel das profissões ligadas às engenharias,


agronomia, geologia, geografia, meteorologia e afins, para o desenvolvimento
socioeconômico e sustentável em domínio brasileiro, a partir da segunda
metade do século passado. Ainda que timidamente posto, há uma gama de
estudos e publicações, de diversos tipos, reconhecendo a presença e a
contribuição dessas profissões, valorizando seu protagonismo ao intervir nas
comunidades, nos territórios, nos recursos naturais, na produção e
transformação de bens e serviços.

Parte fundamental desses processos de desenvolvimento está


intimamente atrelada a projetos, públicos ou privados, que têm sua origem em
escritórios e empresas lideradas por profissionais do Sistema CONFEA-
CREA, ainda que, muitas vezes, seus esforços sejam anônimos frente aos
efeitos positivos na sociedade. Também é marcante a presença desses
profissionais coordenando ou impulsionando significativas ações no âmbito
do serviço público e nas instituições de pesquisa e ensino. Destaca-se, como
exemplo, a representatividade do agronegócio para o PIB brasileiro e a
reconhecida atuação dos profissionais nesta atividade. É inquestionável a
importância dos geólogos e engenheiros de minas, garantido a exploração de
petróleo e inúmeras comodities minerais. Outro aspecto relevante diz respeito
ao próprio desenvolvimento das cidades, onde a construção civil deve
respeitar áreas verdes e zonas de risco, demandando soluções inteligentes e
sustentáveis de infraestrutura e saneamento básico.

O cenário pandêmico, desde 2020, provocou revoluções no modo de


viver das pessoas, com atuação determinante e exaustiva dos profissionais de
saúde, colocando em risco suas próprias vidas. Face a este indiscutível gesto
humanitário que vivenciamos, pouco se destacou sobre o conjunto de ações
das áreas tecnológicas nesse mesmo propósito. A pandemia de Covid-19
instigou o desenvolvimento e aperfeiçoamento de sistemas de comunicação à
distância, equipamentos médico-hospitalares, transformações na área de
biossegurança, ensino, mobilidade urbana, entre outros. A repentina mudança
de cenário exigiu respostas rápidas no campo das tecnologias amparando as
ações de saúde, a partir da construção ou ampliação de estruturas hospitalares,
no mapeamento de informações geográficas, em processos de engenharia
química, para citar algumas. Ressaltamos também a continuidade das
atividades essenciais, tais como a produção de alimentos e matéria-prima
essenciais.

Por certo que essas transformações positivas e a magnitude da


contribuição dos profissionais do Sistema CONFEA-CREA, em tempos de
crise, convertem-se em legado para toda a sociedade e merecem ser
registradas. Por meio desta obra, composta por 23 capítulos, distribuídos nas
mais diversas áreas de atuação, coletados a partir de chamada aberta,
apresentamos nossa singela contribuição.

Por fim, agradecemos aos autores por compartilharem um conteúdo tão


valioso e diverso, o qual, além do registro, servirá de incentivo aos
profissionais, gestores e à academia, na construção desse protagonismo.
SUMÁRIO
PANORAMA GERAL DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA NO PERÍODO
PANDÊMICO: A CONTRIBUIÇÃO DAS ENGENHARIAS, AGRONOMIA E
GEOCIÊNCIAS .........................................................................................................13
Amanda Fernandes Santos, Elaíne Britto de Castro, Felipe Buller Bertuzzi,
Israel Vitor Bonfim Rodrigues, Juliana de Mendonça Casadei, Dolores
Pereira Ribeiro Coutinho

VIRTUALIZAÇÃO E DIGITALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE


ACESSIBILIDADE E INCLUSÃO NO RIO DE JANEIRO: ACESSO, DIFUSÃO
E DESAFIOS NO CONTEXTO DA PANDEMIA DE COVID-19 .....................................30
Ricardo Massao Nakamura Nasser

ENGENHARIA MECÂNICA E SUA PARTICIPAÇÃO EFETIVA CONTRA O


VÍRUS COVID-19 NA APLICAÇÃO DOS VENTILADORES MECÂNICOS
PULMONARES ........................................................................................................40
Douglas Ribeiro Pinto, Denis Bruno Ferreira Chaves, Rodrigo Reis Mendes

MULHERES NA GESTÃO DE TECNOLOGIAS E ENGENHARIA CLÍNICA: O


CASO DOS VENTILADORES PULMONARES NA COVID-19 .....................................52
Fotini Toscas, Léria Rosane Holsbach, Ana Paula Lemes Jesus dos Santos

GEOTECNOLOGIAS APLICADAS NO MAPEAMENTO DA COVID-19 NA


REGIÃO NORDESTE DO BRASIL .............................................................................61
José Lindemberg Bernardo da Silva, Franklin Roberto da Costa

USO DE VANT PARA GESTÃO TERRITORIAL NA PANDEMIA DE COVID-


19 E SEU POTENCIAL PÓS-PANDEMIA ....................................................................79
Tatiane Ferreira Olivatto, Fábio Noel Stanganini, Felipe Facci Inguaggiato

GEOTECNOLOGIAS COMO SUBSÍDIO NA GESTÃO PÚBLICA DA


PANDEMIA DE COVID-19: O CASO DE ARARAQUARA-SP ......................................89
Tatiane Ferreira Olivatto, João Mateus Marão Domingues, Bruno Joaquim
Lima, Felipe Facci Inguaggiato

PROJETOS URBANOS DE DESENVOLVIMENTO EM TEMPOS DE


PANDEMIA: UM RELATO A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DO URBANISMO
TÁTICO .....................................................................................................................99
Catiana Sabadin Zamarrenho, Cleonice Alexandre Le Bourlegat, Felipe Buller
Bertuzzi, Juliana de Mendonça Casadei

IMPACTO DA PANDEMIA NAS ATIVIDADES DOS AGRICULTORES


FAMILIARES DA FEIRA MUNICIPAL DE CASCAVEL – PARANÁ, BRASIL ..............108
Elaine de Oliveira Zanini, Luciana de Oliveira Fariña

IMPACTOS DA PANDEMIA DA COVID-19 SOBRE A PRODUÇÃO E


COMERCIALIZAÇÃO DE ALIMENTOS ORGÂNICOS EM CHAPECÓ - SC ...............120
João Guilherme Dal Belo Leite, Jéssica Thaís Agnoletto

O IMPACTO DA PANDEMIA DA COVID-19 NA ATIVIDADE LEITEIRA NA


REGIÃO DE LAGOA DA PRATA – MG .....................................................................129
João Guilherme Dal Belo Leite, Sandro Maílson Fernandes
IMPACTOS E INOVAÇÕES NO SETOR DE FRUTAS, LEGUMES E
VERDURAS NO CONTEXTO DA PANDEMIA DE COVID-19 E
PROPOSIÇÕES TEÓRICAS PARA UMA MELHOR GESTÃO DA CADEIA .................137
Lucas Mendes de Oliveira, Luciel Henrique de Oliveira

STARTUPS E NEGÓCIOS DE IMPACTO NO SETOR AGROALIMENTAR:


UM NOVO CAMINHO PARA OS SISTEMAS ALIMENTARES? .................................155
Lucas Mendes de Oliveira, Luciel Henrique de Oliveira

A FEIRA DA AGRICULTURA FAMILIAR DE ITURAMA-MG FRENTE À


PANDEMIA DA COVID-19 .......................................................................................164
João Lucas Soares Sanches, Julia Piethra Martins, Ariane Fernandes da
Conceição

A INSERÇÃO DA AGROECOLOGIA EM UM NOVO SISTEMA ALIMENTAR


PÓS-COVID-19 ........................................................................................................176
João Henrique Constantino Sales Silva, Alex da Silva Barbosa

A DINÂMICA DA COVID-19 NO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO E A BUSCA


DE SOLUÇÕES BASEADAS NA NATUREZA: A IMPORTÂNCIA DOS
ESPAÇOS LIVRES E PARQUES PÚBLICOS NA SAÚDE NO CONTEXTO
PÓS-PANDEMIA .....................................................................................................185
Magda Adelaide Lombardo, Amanda Lombardo Fruehauf, Paulo Renato
Mesquita Pellegrino

PANDEMIA E REINVENÇÃO METODOLÓGICA: PROCEDIMENTOS DE


BIOSSEGURANÇA NA CONTAGEM DE BITUCAS DE CIGARROS ..........................196
Dolores Pereira Ribeiro Coutinho, Felipe Buller Bertuzzi, Juliana de
Mendonça Casadei, Maira Fernanda dos Anjos Santos

IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS EM BIOMAS FLORESTAIS E AS LIÇÕES


DO INVESTIMENTO SOCIAL PRIVADO
Mouana do Socorro Sioufi Fonseca, Rodrigo Ladeira, Jorge Emanuel Reis
Cajazeira, Maria Teresa Grimaldi Larocca .............................................................208

MONITORAMENTO DO ESGOTAMENTO SANITÁRIO NO COMBATE À


COVID-19 ...............................................................................................................225
Maria Teresa Casadei, Juliana de Mendonça Casadei, José Carlos de Oliveira

PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM TEMPOS DE PANDEMIA DE


COVID-19 ...............................................................................................................235
Patrícia Aguiar de Oliveira dos Santos, Ana Paula Oliveira Becker Alvarenga,
Lauriê Fernanda Silva, Máriam Trierveiler Pereira

ORGANIZAÇÃO DE LIVRO DURANTE A PANDEMIA: RELATO DE


EXPERIÊNCIA DE PROJETO DE ENSINO-PESQUISA-EXTENSÃO
TRANSDISCIPLINAR SOBRE URBANISMO ............................................................249
Máriam Trierveiler Pereira, Juliana Cavalaro Camilo

DESENVOLVIMENTO DE ATIVIDADES DE ESTÁGIO SUPERVISIONADO


NO AMBIENTE DA CONSTRUÇÃO CIVIL DURANTE A PANDEMIA .......................259
Ana Cláudia Marques, Rocheli Carnaval Cavalcanti

O CONHECIMENTO HIDROGEOLÓGICO NO ESTADO DE MATO GROSSO


DO SUL: LINHA DO TEMPO A PARTIR DA DÉCADA DE 1970 .................................267
Giancarlo Lastoria, Sandra Garcia Gabas
PANORAMA GERAL DA PRODUÇÃO
CIENTÍFICA NO PERÍODO PANDÊMICO:
A CONTRIBUIÇÃO DAS ENGENHARIAS, AGRONOMIA
E GEOCIÊNCIAS

Amanda Fernandes Santos (1)


Elaíne Britto de Castro (2)
Felipe Buller Bertuzzi (3)
Israel Vitor Bonfim Rodrigues (4)
Juliana de Mendonça Casadei (5)
Dolores Pereira Ribeiro Coutinho (6)

RESUMO. A crise sanitária sem precedentes ocasionada pela pandemia da COVID-19


também impactou as mais diferentes áreas de atuação. O uso da tecnologia que já
vinha em uma crescente, foi ainda mais intensificado nos últimos dois anos,
ocasionando a alteração da rotina destes profissionais. Ao longo de um período
pandêmico que ainda se encontra vigente pela Organização Mundial da Saúde (OMS),
muitos trabalhos acadêmicos foram realizados considerando as especificidades de
cada área em um momento em que foram exigidas adequações pontuais e/ou
estruturais em suas respectivas finalidades. Com base nisso, o presente capítulo tem
como objetivo apresentar um panorama geral dos principais assuntos abordados,
estudos realizados, tecnologias, produtos e métodos desenvolvidos durante o período
pandêmico no âmbito das engenharias, agronomia e geociências. A pesquisa consiste
em uma revisão bibliográfica com foco em dados qualitativos das áreas de atuação
mencionadas, a fim de sintetizar as temáticas desenvolvidas pelos mais diferentes
autores das áreas correspondentes. Pôde-se verificar um massivo uso de tecnologias
digitais em prol de soluções inovadoras que viabilizassem a manutenção das relações
humanas e de trabalho.

Palavras-chave: Produção científica. Pandemia. Engenharias. Agronomia.


Geociências.

(1) Pós-Graduada em Gestão em Segurança Pública - Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
(UFMS), e-mail: fernandes.amandaadv@gmail.com (2) Mestre em Epidemiologia, Doutoranda em
Desenvolvimento Local, Universidade Católica Dom Bosco (UCDB), e-mail: konyl@terra.com.br (3)
Mestre em Arquitetura e Urbanismo, Doutorando em Desenvolvimento Local na Universidade Católica
Dom Bosco (UCDB), e-mail: arq.felipebertuzzi@gmail.com (4) Mestrando em Desenvolvimento Local,
Universidade Católica Dom Bosco (UCDB), e-mail: israelvbr@hotmail.com (5) Mestre em Saneamento
Ambiental e Recursos Hídricos, Doutoranda em Desenvolvimento Local, Universidade Católica Dom
Bosco (UCDB), e-mail: ju.casadei@gmail.com (6) Doutora em Ciências Sociais, PPGDL da Universidade
Católica Dom Bosco (UCDB), e-mail: 3002@ucdb.br.
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1 INTRODUÇÃO
A pandemia da COVID-19 contribuiu para a alteração de inúmeros processos que
vinham sendo realizados nas mais diferentes áreas como as engenharias, a mobilidade e
infraestrutura, a habitação, a construção civil, as tecnologias digitais, a energia, as áreas
verdes, a educação, a preocupação com os resíduos sólidos, a agricultura e a pecuária,
entre outros. Esses são alguns dos importantes ramos e áreas que estão diariamente
relacionados ao desenvolvimento das mais diferentes localidades.
Durante o período pandêmico, muitos trabalhos científicos tentaram elucidar os
problemas advindos deste cenário e também apresentar soluções de mediação que serão
devidamente pontuados neste trabalho. Sendo assim, o presente capítulo tem o objetivo
de apresentar um panorama geral dos principais assuntos abordados, estudos realizados,
tecnologias, produtos e métodos desenvolvidos durante o período pandêmico no âmbito
das engenharias, agronomia e geociências.
Além da introdução, metodologia e das considerações finais, o capítulo apresenta,
no desenvolvimento do trabalho, a revisão bibliográfica dos principais pontos
observados das áreas estudadas, de forma a apresentar os resultados analisados em cada
uma delas.
2 METODOLOGIA
A pesquisa consiste em uma revisão bibliográfica com foco em dados qualitativos a
partir de uma base de dados realizada em portais de busca de artigos acadêmicos online.
Com palavras-chave relacionando “pandemia” com as respectivas áreas de atuação
(engenharias, agronomia e geociências) e com o filtro de busca pré-definido para os
anos 2020, 2021 e 2022 (anos correspondentes ao período da pandemia da COVID-19),
encontraram-se resultados qualificados para a inclusão e a estruturação desde capítulo.
3 A CONTRIBUIÇÃO DAS ÁREAS DE ATUAÇÃO AO LONGO DA PANDEMIA DA
COVID-19
De acordo com Devezas (2020), a obrigatoriedade imposta pela crise sanitária em
âmbito global fez com que a economia fosse impactada principalmente pela
desaceleração de uma “conectividade excessiva” (DEVEZAS, 2020, p. 1) de um mundo
em constante evolução e rapidez. Nessa seara, o impedimento do trânsito de aviões
devido à possibilidade de contaminação ao longo das viagens impactou negativamente
na manutenção de empregos de inúmeras companhias de aviação. Além disso, a
proliferação de casos infectados foi impulsionada por meio do transporte de pessoas de
diferentes locais do mundo (DEVEZAS, 2020).
Essa integração que o transporte aéreo permite entre áreas distintas também pôde ser
vista nas questões voltadas à mobilidade urbana. Isso porque estudos constatam que as
regiões que possuíam maiores índices de contaminação pelo vírus da COVID-19
estavam próximas a rodovias de maior integração (MONTENEGRO et al., 2021). Os
autores observaram que o isolamento social foi importante, porém precisava estar aliado
ao controle de fluxos externos, a fim de evitar a proliferação dos que se aproximavam de
outros locais (MONTENEGRO et al., 2021).
Devido a essas mudanças bruscas necessárias para combater o vírus, Borchers,
Ferreira e Ribeiro (2021) apontam que houve uma grande diminuição de passageiros na
utilização dos serviços de transporte público. Por outro lado, sucedeu um aumento na
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utilização de transportes que fomentam a mobilidade ativa, como é o caso da bicicleta.
De acordo com as pesquisas desenvolvidas durante a pandemia, as pessoas se sentiram
mais confiantes e deram preferência à bicicleta do que ao uso do transporte público, o
qual ainda possui muitos problemas de superlotação e baixa qualidade nas cidades
brasileiras (ARAÚJO; RIBEIRO, 2021).
Como pôde ser visto, a relação entre o indivíduo e a cidade pode ocorrer de várias
formas e por meio de diferentes intensidades. O transporte é um dos elos que contribui
para isso. Outros que também foram bastante fomentados durante a pandemia tratam-se
do ato de pensar o ambiente urbano sob uma ótica imediatista, de forma a promover
ações urgentes. O chamado “urbanismo tático” é um deles e procura envolver a
sociedade na construção da cidade a partir de estratégias que correspondam às
necessidades locais (FRANÇA; FARIA, 2021).
Além das áreas públicas, as mudanças de comportamento impostas pela pandemia
também impactaram diretamente a ocupação dos espaços construídos. De acordo com
Siqueira e Montenegro (2021), devido as regras de isolamento inseridas durante os
momento de ápice da contaminação, muitas áreas comerciais ficaram vazias para dar
espaço ao trabalho home office. Devido a essa circunstância, os colaboradores foram
obrigados a destinar o espaço de suas residências para o trabalho.
Apesar de parecer mais confortável o fato de as pessoas trabalharem em casa durante
este período, essa forma de trabalho pode ser prejudicial. Isso porque é possível que
problemas de ordem física e mental surjam, o que exige a necessidade de uma
prevenção estratégica para a garantia da qualidade de vida dessas pessoas (SILVA;
GALLARDO, 2020). Esses problemas também pode ser consequência das condições
físicas da residência, a qual pode estar deteriorada ou desprovida de uma iluminação
natural e ventilação cruzada adequadas, o que contribui para os problemas citados
anteriormente.
No âmbito da construção civil, a crise sanitária fez trazer à tona outras discussões
paralelas que também implicam diretamente na saúde dos indivíduos. Medidas foram
tomadas para evitar a proliferação do vírus, mas percebeu-se que outras medidas são
ignoradas, como é o caso do manuseio do cimento da marca Portland de forma
incorreta, o que pode incidir em riscos como dermatites, inalação de poeiras,
consequências renais, neurológicas, entre outras (SILVA, 2021).
Essa foi uma das preocupações que passaram a ser consideradas no dia a dia da
construção civil. Aliado à garantia da saúde, também está a sustentabilidade econômica,
a qual se volta para a garantia do emprego e da renda. Nesse quesito, a pandemia
também contribuiu de forma enfática para a reestruturação de metodologias e do rodízio
de trabalhadores para a garantia da segurança de todos (SILVA, 2020). Por isso, é
importante estabelecer um compromisso com soluções inovadoras para a obtenção de
ganhos na área da construção civil de forma que se garanta a sustentabilidade e a
redução dos impactos gerados (MASUERO, 2021; MENDONÇA et al., 2021).
Dentre os novos desafios que surgiram no âmbito da construção civil também houve
a criação dos hospitais de campanha que, segundo Silva e Soares (2020), tinham o
intuito de suprir os atendimentos específicos aos contaminados pela COVID-19.
Já na área da engenharia mecânica, o estudo realizado por Braga (2021) comparou
os tipos de ventilação mais adequados e dos quantitativos das massas de ar de renovação
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quanto ao custo benefício em relação ao aumento da renovação de ar, enquanto Mariani
et al. (2021) realizaram uma avaliação experimental de processos de varrição
pneumática em relação à concentração de poluentes presentes no ar interno e externo
através de equipamentos do sistema de climatização e ventilação para renovação do ar.
Hernandez Neto e Camargo (2021) analisaram o impacto da carga térmica latente
em serpentinas de resfriamento de expansão direta e indireta, localizadas em climas
quentes e úmidos, propondo alternativas para mitigação desta carga e seus impactos no
desempenho energético do sistema de climatização. Já Mendes (2021) avaliou o
conforto térmico adequado no ambiente de trabalho segundo a legislação e as normas
técnicas vigentes e aponta evidências que sugerem que o Plano de Manutenção
Operação e Controle (PMOC) é uma ferramenta eficaz na descaracterização de
percepção de adicional de insalubridade.
Pimenta e Bortolaia (2021) analisaram a distribuição de ar em ambientes
hospitalares através do método de Dinâmica dos Fluidos Computacional (CFD) com
objetivo de reduzir a contaminação cruzada. Chaves et al. (2021) buscaram
compreender a importância da engenharia mecânica quanto ao uso dos ventiladores
mecânicos pulmonares na pandemia de COVID-19, pois o uso de equipamentos de
suporte ventilatório esteve em alta demanda durante a pandemia causada pelo
coronavírus.
Scarabelli, Machado e Sartori (2021) conduziram um estudo de casos múltiplos por
meio de entrevistas com objetivo de averiguar estratégias de inovação frugal e de baixo
custo no desenvolvimento de ventiladores mecânicos durante a pandemia de COVID-
19, enquanto que Suzumura et al. (2020) averiguaram os desafios para a pesquisa e o
desenvolvimento de ventiladores mecânicos de baixo custo durante a pandemia de
COVID-19 no Brasil, analisando os estudos clínicos e os processos regulatórios da
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
Em um relato de experiência produzido por Toscas, Holsbach e Santos (2021), foi
analisada a participação de mulheres em atividades primordiais para lidar com as
demandas geradas pelas emergências sanitárias causadas pela pandemia de COVID-19.
Campos et al. (2021) avaliaram os impactos ambientais gerados pelo filamento de
plástico ABS usado na fabricação de máscaras de proteção facial utilizadas para o
combate do COVID-19 feitas em impressora 3D através de uma análise comparativa
dos impactos gerados pelo uso do plástico virgem e reciclado.
No campo da engenharia biomédica, Viana et al. (2020) projetaram leitos com
pressão negativa em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de um hospital como
estratégia de minimização do fluxo de partículas de ar contaminadas para áreas fora do
leito de UTI, gerando benefícios para os pacientes e uma percepção maior de segurança
para a equipe de profissionais atuante no setor. Já Basile, Araújo e Smaniotto (2020)
desenvolveram um protocolo de limpeza de modo a realizar a desinfecção das alas
COVID de um hospital utilizando práticas de higienização usando um robô e de outros
equipamentos tecnológicos para verificar a eficácia da higiene e descontaminação do
ambiente hospitalar.
Celuppi et al. (2021) analisaram experiências de uso das tecnologias digitais em
saúde com objetivo de minimizar os impactos da COVID-19, identificando o
desenvolvimento de soluções tecnológicas de manejo clínico, diagnóstico por imagem,
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aplicativos de geolocalização, ferramentas de análise de dados e relatórios, uso de
inteligência artificial, entre outros recursos.
Pode-se notar que muitas foram as contribuições dos ramos das engenharias durante
o período pandêmico, de modo que alguns projetos e pesquisas encontram-se aqui
elencados. Quanto ao desenvolvimento de estudos no setor energético relacionados à
engenharia de produção, com o apoio do Ministério de Minas e Energia (2021),
constatou-se a iniciativa da pesquisa intitulada Profissões do Futuro na Área de Energia
e Implicações para a Formação Profissional, relacionada a transição energética, possui
foco em analisar o desenvolvimento de energias renováveis, mobilidade elétrica,
eficiência energética, redes inteligentes de transmissão e distribuição e resposta da
demanda. Cujo objetivo consiste em realizar uma investigação entre a demanda por
formação profissional do setor produtivo e a oferta de qualificação por instituições de
ensino, visando a área de energia.
De modo que o cenário pandêmico ocorrido corrobora a relevância de políticas
públicas vigorosas no sentido de consolidar a transição energética de modo a alcançar os
objetivos econômicos, ambientais e sociais (MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA,
2021).
Sob a ótica ambiental, uma pesquisa realizada com foco na relação do meio
ambiente em face do cenário pandêmico de COVID-19 no Município de São Paulo por
(LOMBARDO; FRUEHAUF; PELLEGRINO, 2021) trouxe análises quanto as
distinções socioespaciais da ante a pandemia, estudando a correlação quanto ao papel
dos espaços abertos em combate a pandemia, em face da desigualdade na distribuição
de renda e qualidade de vida dos habitantes. Com efeito, buscando ponderar a forma de
utilização dos referidos espaços no sentido de evitar aglomerações e riscos sanitários.
No mais, Melo, Melo e Melo (2021) aborda a vegetação como instrumento de modo
a melhorar relações sociais e sua influência positiva para temas psicológicos, físicos, tal
como o bem-estar em centros urbanos e em especial ante o agravamento em decorrência
do período pandêmico de 2020. No sentido de tratar do necessário debate quanto a
utilização de elementos de vegetação interna e sua relação com diversos benefícios
experimentados relativos à saúde e bem estar das pessoas presentes.
Em pesquisa realizada por Amaral, Silva e Nascimento (2020), buscou-se
argumentar quanto à conexão entre a propagação do COVID-19 e os impactos
socioambientais, ao passo que proliferação do vírus guarda relação não apenas com a
degradação do meio ambiente, como está interligado com a circulação de pessoas no
mundo globalizado. De outro norte, Albuquerque, Campos e Simioni (2020) trataram de
estudar quanto ao impacto sofrido ao meio ambiente durante o cenário pandêmico,
diante da diminuição da dinâmica das indústrias, destacando quanto ao efeito positivo
ao meio ambiente em face da pandemia, tendo em vista a diminuição de poluição gerada
pelo ser humano.
Com efeito, Oliveira (2021), em análise aos efeitos do período pandêmico
relacionados ao centro do Rio de Janeiro, evidenciou o claro abando das estruturas do
centro da cidade tendo em vista a crescente utilização da modalidade do trabalho
remoto, o que ocasionou por vez o declínio da região.
Em revisão promovida por Duarte e Rocha e Dias (2021), foram observadas e
destacadas diversas mudanças ocorridas diante das medidas restritivas advindas da
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pandemia de COVID-19, provocando impactos positivos no meio ambiente sobretudo
no ar e recursos hídricos, tal como o aumento de resíduos contaminantes da fauna
aquática. De igual forma, Bainy et al. (2021), ao realizar estudo na área buscou analisar
os efeitos das medidas restritivas como o confinamento quanto a qualidade do ar em
cidades no Estado de São Paulo, verificaram o aumento de contaminantes no ar, tendo
em vista a ocorrência de incêndios na região.
Segundo Mendonça, Chaché e Barbosa (2021), ao analisar a relação entre o início da
pandemia do COVID-19 associada às medidas de confinamento e isolamento social
detectou-se claro efeito positivo na diminuição da poluição atmosférica,
compreendendo o quanto condutas sustentáveis geram impactos positivos ao meio
ambiente.
Conforme dispõe Protasio, Morais e Ventura (2021) em estudos direcionados à
relação e efeito associados a resíduos sólidos em âmbito domiciliar, compreendeu-se a
ocorrência de adaptações emergenciais resultando na diminuição de resíduos sólidos
durante o período pandêmico.
Por outro lado, no campo da educação, Arruda, Silva e Bezerra (2020), em pesquisa
de revisão bibliográfica qualitativa, buscaram relatar as dificuldades enfrentadas por
professores e alunos diante de tempos de isolamento social e concluíram que a realidade
de práticas de Ensino À Distância (EAD) ficou ainda mais acentuada e no período pós-
pandemia um processo evolutivo se faz necessário com a presença de agentes públicos,
tanto na esfera federal, estadual e municipal. Para as autoras é preciso entender esta fase
pandêmica como uma revolução que acelerou diversos processos, no qual a sociedade
acabou sendo forçada a entrar de uma vez por toda na era digital. E aqueles que não
estiverem inseridos dentro deste processo de percepção, aprendizagem, ensino digital
ficará marginalizado do ponto de vista da aprendizagem.
Dotta, Pimentel, Silveira e Braga (2021), em ensaio com objetivo de discutir
aspectos a serem considerados no contexto da Educação mediada por tecnologias, em
um cenário emergencial, convidam a uma reflexão sobre as práticas pedagógicas e as
possibilidades de mediação da aprendizagem com o uso das Tecnologias da Informação
e Comunicação (TIC), na forma de um conjunto de ferramentas, via internet. Concluem
então, que mesmo com o final da pandemia, que é ainda imprevisível a grande formação
de professores em ação precisa continuar. Agora, não mais partindo do zero com todos
eles. Repositórios de boas práticas precisam ser construídos, organizados e divulgados.
Bem como novas soluções computacionais para a Educação como fruto de resultados de
investigações em campo, poderão surgir.
Silva e Gomes Filho (2020) apresentaram um panorama das publicações a partir da
sociologia da educação com os novos processos e modelos de educação surgidos no
decorrer da pandemia. O estudo buscou apresentar e debater os desafios e possibilidades
que a pandemia trouxe para a educação, com base na literatura publicada no ano de
2020. Com base nos estudos selecionados para análise, pode-se evidenciar que as TICs
adentraram de modo mais enfático nos espaços educacionais, em especial, os espaços
educacionais de nível superior. Pôde-se também perceber que muitas disciplinas que
antes da pandemia ocorriam de modo presencial, e no momento de pandemia
necessitaram se reconfigurar. Destaca-se que, o uso das ferramentas tecnológicas
contribuiu para a efetivação das atividades educacionais de modo remoto e a distância
em todos os níveis educacionais. Os estudos apontam que a pandemia por COVID-19
18
(SARS-CoV-2) também desvelou as desigualdades sociais no Brasil que envolvem o
acesso à educação e as TICs. Com o avanço da pandemia as escolas e o corpo docente e
técnico em sua maioria não estavam preparados para o ensino remoto, e também para
novas metodologias e didáticas diretamente atravessados pelas tecnologias.
Apresentando assim novas demandas de formação de professores/as, reorganização do
espaço escolar, e ampliação das estruturas físicas das escolas, universidades e outros
espaços educacionais para o ensino remoto e a distância.
Em estudo de revisão sistemática da literatura conduzido por Vieira e Silva (2020),
conclui-se que a pandemia por COVID-19 obrigou as instituições educacionais e os
professores, em nível mundial, alterarem drasticamente as suas práticas educativas. As
circunstâncias nem um pouco ideais que cercaram a transição para o ensino remoto tem
permitido a professores e estudantes experimentar contextos comunicativos
emergentes. A adaptação a esta nova realidade não foi um processo fácil nem o mais
adequado, pelo menos em alguns níveis de ensino, mas foi o possível face aos
acontecimentos. Com base nos resultados desta RSL, pode-se afirmar que a tendência
que deriva do ensino remoto é ainda mais desigual, mais frágil na profissão docente,
mais desestruturação da educação pública, haja vista as limitações docentes quanto à
sua competência digital e habilidade para a transposição É preciso repensar a concepção
de aprendizagem, da ação pedagógica, do currículo e dos próprios sujeitos do processo
educacional; é preciso fomentar a tendência do ensino online aliado ao ensino presencial
na educação básica e secundária, em prol de uma educação transformadora,
emancipatória, inclusiva e de qualidade. E competência traduz-se, para além da
competência técnica em relação ao uso de plataformas e dos recursos digitais, na
capacidade de organizar e orientar didaticamente o processo de ensino-aprendizagem à
distância, na presença virtual constante e na habilidade para ler e escrever com fluência
em ambientes digitais.
Para Oliveira, Dreissig e Wedekin (2021) as transformações da pandemia da
COVID-19 afetaram as rotinas e os estilos de vida das pessoas em escala global,
principalmente em relação à intensificação do uso da tecnologia. Isso fica evidente
quando se dá luz à educação, é importante ter uma visão crítica do momento vivido, uma
vez que o Capitalismo de Vigilância prospera na falta de conhecimento da sociedade
sobre este tema e pela falta de regulamentação de medidas que limitem e punam ações
inadequadas por parte das detentoras de nossos dados. As empresas que compõem a
GAFAM¹ representam o que, talvez, seja a forma mais pujante com que o
neoliberalismo contemporâneo se expressa pela vigilância de modo aprofundado e que
põem em risco não só a educação, mas também os meios políticos e governamentais.
Esse cenário representa solo fértil para a expansão de uma economia baseada no
mercado de dados pessoais e de uma disputa pelas empresas que retém esses dados.
Seria possível uma maneira de descolonização desses meios tecnológicos? Quais
seriam os caminhos futuros? E como se daria a educação, sabendo que hoje a
dependência desses meios tecnológicos está em ascensão, ocasionando desafios e
potencialidades? Não há dúvidas de que as aulas presenciais no período pós-pandemia
deverão ser reformuladas. A vivência dos alunos, familiares, professores e gestores de
instituições com educação remota deverá provocar, no mínimo, uma discussão
construtiva e instigante sobre esse tema, onde a visão transformadora da educação deve
sair fortalecida. As potencialidades aparecem nas quebras de distâncias físicas e
geográficas, pelas quais os estudantes passaram a participar de diversos cursos, lives,
disciplinas, palestras e outros eventos digitais que corroboram com a disseminação do
19
conhecimento, a redução de despesas e o estabelecimento de vínculos com outros
estudantes, professores e pesquisadores. Este debate levou ao entendimento de que os
desafios são mais numerosos e têm um maior impacto do que as potencialidades
encontradas até então. Ainda assim, há outros desafios a serem pensados quanto ao
impacto das aulas on-line ou híbridas na interação social e no tocante à saúde mental
através do desgaste do ambiente remoto criado, bem como a necessidade de adequação
quando na inserção do sistema para crianças, visto que seu processo educacional e de
aprendizagem requer uma interação física que vá além do núcleo familiar. Para os
jovens adultos que estão na graduação, as dificuldades derivam da necessidade de
contato com o outro, formação de pensamento crítico e debates que só o espaço físico da
universidade proporciona para o desenvolvimento profissional. Essas questões abrem
caminhos para novos trabalhos e requerem a visão de profissionais de outras áreas
também.
Santos et al. (2022) consideram de grande relevância a prática de Educação
Ambiental incorporada em unidades curriculares, proporcionando a formação de
estudantes reflexivos quanto às ações que possam promover uma contribuição para a
preservação ambiental por meio de práticas cotidianas de correta separação do lixo.
Com do uso da metodologia ativa Aprendizagem Baseada em Projetos observou-se o
protagonismo juvenil por meio do envolvimento dos estudantes na realização das
atividades propostas. Indiferente das instabilidades causadas pelo cenário de pandemia
da COVID-19 é necessário refletir sobre questões que envolvem a atuação do ser
humano no mundo e suas consequências. Foi possível pensar uma mudança de
comportamento sobre práticas corretas de reciclagem de resíduos.
Guedes (2021) em pesquisa exploratória discute que na pandemia de COVID-19, o
ensino regular em ambiente escolar presencial deixou de existir ou quando
realizado, não abarcava toda a comunidade de estudantes profissionais, dessa
forma afetando as dinâmicas dos escolares. As aulas de campo, muito utilizadas pela
Geografia, deixaram de ser realizadas devido ao isolamento social necessário nesse
período. Para minimizar esse problema, as imagens disponibilizadas pelo Google Earth
ajudam na identificação de feições naturais e artificiais encontradas no espaço
geográfico. Sua gratuidade e, às vezes, atualidade da imagem são fatores positivos para
o uso no ambiente escolar permitindo, portanto, conhecer feições do ambiente na forma
de um voo virtual.
Albuquerque e Costa (2021) apresentam uma discussão acerca da urgência da
formação humanista em tempos de pandemia na engenharia e dos aspectos que
reforçam esta premência. Para isso, foi realizada uma entrevista semiestruturada com o
professor Walter Bazzo (UFSC) referência no estudo da formação humanista em
engenharia. A análise do material discursivo foi realizada por intermédio da Análise de
Conteúdo (AC) proposta por Bardin (2016). Dentre os principais aspectos que
perpassam a urgência da referida formação no contexto pós-pandemia, contempla-se a
desigualdade social como a questão contemporânea mais importante. Nesse sentido,
reforça-se a necessidade de se implementar uma educação em engenharia fomentadora
da democratização do processo tecnológico em sinergia com o enfoque humano. Assim,
será possível pensar em uma educação em engenharia que trabalhe em benefício de uma
sociedade mais justa, fraterna e igualitária. Assim, a técnica adquirida na Universidade
pode e deve contribuir para a solução, ou ao menos, o abrandamento dos problemas
sociais. Nesse contexto, e de maneira imbricada com o conhecimento técnico, cabe a
20
cada área do conhecimento da Humanidade uma parcela importante para a
transformação deste mundo segmentado em uma “Humanidade Nova” pautada pelos
valores humanos (RAIA JR., 2004). Em suma, pode-se dizer que é incerto o mundo pós-
pandemia, mas é muito provável que uma formação humanista integral exija além de
altas competências digitais, um elevado senso de responsabilidade e consciência social
acentuadas em um mundo de desigualdades crescentes.
No caso da engenharia de segurança do trabalho, campo de atuação das engenharias
mediante especialização, volta-se o olhar para a proteção do trabalhador em todas as
unidades laborais, e se incumbe de observar questões atinentes à segurança e higiene do
trabalho, conforme Resolução n. 359/1991 do Confea. A pandemia trouxe consigo
mudanças significativas nos modos de exercer as atividades laborais e até mesmo no
local deste exercício, que em muitos momentos passaram a ocorrer nas próprias casas,
que nem sempre dispõe dos meios mais adequados e ergonômicos para as tarefas, além
de tantos outros obstáculos.
Elementos protetivos individuais, como as máscaras, e coletivos, como dispositivos
de desinfecção, assim como a adoção de novas práticas de biossegurança, até então não
praticadas ou desconhecidas, passaram a ser incorporados no cotidiano dos
trabalhadores, com o mesmo rigor sobre seu uso tal como os equipamentos de proteção
individual e coletivos (EPI e EPC).
As repercussões da pandemia nas relações de trabalho e saúde foram abordadas por
Bernardes Santos et al. (2020), sob a ótica do risco e vulnerabilidade de trabalhadores, e
levantaram apontamentos sobre a dificuldade da manutenção de estratégias de
distanciamento social para atividades informais ou menos estáveis, alertando para os
entraves na adoção de estratégias de proteção devido à precarização do trabalho. Os
autores identificaram que os profissionais de saúde foram os mais acometidos pela
doença, contudo, tiveram mais acesso ao diagnóstico, de modo que pouco se sabe com
certeza sobre as demais categorias profissionais e os respectivos determinantes sociais
que implicam em maior vulnerabilidade.
As condições para o trabalho em casa também não são iguais para todos. O conceito
de home office há pouco era praticamente desconhecido pela maioria da população, e
acabou sendo internalizado com o início da pandemia (FARIA, 2021). Schneider,
Sugahara e Silva (2021) alertam que o teletrabalho, apesar de se apresentar como um
medida temporária, tomou contornos de perenidade no pós-pandemia, indicando que
uma preocupação com a melhor compreensão dessa nova realidade e a necessidade de
regulamentação em diversos aspectos, sob a preocupação de incorrer na precarização
das relações de trabalho.
Na perspectiva dos profissionais da Engenharia de Segurança do Trabalho, o
teletrabalho foi investigado por Faria (2021), que identificou desafios e vantagens, pois
afeta desde a produtividade, a redução de despesas, a melhoria da qualidade de vida e a
adaptabilidade; questões estas que são relacionadas diretamente com a saúde dos
colaboradores, a fim de evitar doenças ocupacionais. Em seu ensaio reflexivo, a autora
identificou estudos que relatam o papel do projeto ergonômico do ambiente laboral, com
o propósito de promover melhorias na eficiência do serviço desempenhado,

¹ GAFAM é o acrônimo de gigantes da Web, Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft que são cinco
grandes empresas dos EUA.
21
assegurando a saúde, segurança e satisfação do trabalhador. Porém, via de regra,
“percebe-se no trabalho remoto que as residências ou os cômodos não eram apropriados
para o trabalho em casa e em tempo integral” (FARIA, 2021, p. 9).
Mesquita e Soares (2020) reforçam essa discussão, argumentando que essas
dificuldades vão desde a falta de espaço, mobiliário inapropriado ou mesmo pela
multiplicidade de funções em um mesmo ambiente. E complementam, abordando a
necessidade de aplicação dos conceitos de ergonomia, sendo necessário que os agentes
de saúde e segurança do trabalho se adaptem às novas condições e utilizem a
criatividade para propor ações eficazes e viáveis para garantir que o ambiente de casa
também ofereça condições seguras e saudáveis de trabalho.
De outro norte, identificamos alguns trabalhos a respeito do uso de EPIs no período
pandêmico, especialmente na construção civil, considerada atividade essencial, que
teve sua continuidade mantida mesmo em períodos que outras foram suspensas, dada a
importância na manutenção de itens básicos. Hahn e Longen (2020) mencionam que o
surto de COVID-19 trouxe dúvidas quanto ao uso de máscaras e o apoio logístico para
cumprir as indicações de higiene, e que o canteiro de obras deve ser revisado, pois, por
característica, trata-se de uma instalação improvisada e temporária. Cardoso e Soares
(2020) destacam que há necessidade de aprimoramento destes aspectos, especialmente
nas obras realizadas em cidades de pequeno porte, enfatizando métodos eficazes
capazes de atingir uma alta produtividade e também resguardar a integridade física do
colaborador.
Especificamente sobre as máscaras, Hahn e Longen (2020) observam que as
máscaras caseiras, de tecidos, não podem ser considerados equipamentos de proteção
respiratória, tais como algumas tarefas da construção civil, por norma, exigem.
Adicionalmente, quando o distanciamento entre pessoas não pode ser atingido, os
autores concluíram que a máscara a ser utilizada deve ser a cirúrgica ou máscara médica.
No âmbito da Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), em pesquisa
realizada por Detoni et al. (2020), aborda quanto a função das TICs diante das políticas
públicas de planejamento urbano visando entender a conexão entre acesso à informação
digital e propostas de planejamento urbano, atestando que as políticas públicas ante o
cenário pandêmico de crise sanitária possuem relação com uma decadência social.
Ao passo que Ferreira (2021) busca analisar a utilização efetiva da modalidade do
home office em decorrência do surgimento da pandemia da COVID-19, no sentido de
destacar os efeitos promissores em diversos setores demonstrando-se eficiente e
positivo. Logo, constatou que a proposta de mudança do trabalho remoto reportou um
conjunto de recomendações com o intuito de auxiliar as empresas de maneira saudável e
eficiente.
Quanto ao uso das geotecnologias a serviço da saúde pública, a literatura nos trouxe
relatos e experiências principalmente sobre análises espaciais da dispersão de casos
positivados e óbitos em razão da COVID-19. A leitura da disseminação dos casos a
partir do mapeamento dos casos, utilizando-se de ferramentas de geoprocessamento,
possibilita uma análise de como a doença se difunde pelo território, tornando-se
estratégico para o gerenciamento da doença.
Assim, identificam-se importantes trabalhos para os estados do Maranhão,
Amazonas, Rio de Janeiro (LIRA et al., 2020; NETO; ALEIXO, 2020; FERREIRA;
22
SOUZA; MARINO, 2021), bem como no Município de Marechal Deodoro - AL
(CAVALCANTE et al., 2020) ou em toda a Região Nordeste (SILVA; COSTA, 2021).
São trabalhos que envolvem a elaboração de mapeamentos da difusão espacial da
doença utilizando o software QGIS ou o software livre para produção de mapas
anamórficos ScapeToad, ou ainda que analisaram a forma de disponibilização das
informações institucionais acerca do novo coronavírus concluindo não haver uma
padronização em função do uso de distintas metodologias e ferramentas
geotecnológicas.
Em outro aspecto, sob um olhar da Engenharia Agronômica, destaca-se que a
pandemia trouxe impactos sobre a produção, a distribuição e a oferta de alimentos. Uma
análise de Schneider et al. (2020) concluiu que a pandemia pode aumentar a oferta da
produção e inserção internacional do agronegócio brasileiro, considerando o aumento
da demanda por alimentos e a conjuntura econômica global, ao mesmo tempo que são
indicados problemas potenciais no abastecimento do mercado interno, associado a
aumentos de preço e inflação.
Neste sentido, Morais (2021) destaca o aumento dos custos de produção e insumos
agrícolas e pecuários, como a consequência mais relevante do período pandêmico e
Zúñiga et al. (2021) menciona a interrupção da cadeia de suprimentos em escala
imprevisível e de longo prazo. Há estudos do Instituto de Economia Agrícola (IEA) do
Estado de São Paulo correlacionando os impactos da pandemia no mercado do pescado
e na cadeia produtiva da cana-de-açúcar, o qual se soma as oscilações da cotação do
barril de petróleo (CHALITA, 2020; TORQUATO; SACHS; NACHILUK, 2020).
De um modo geral, o agronegócio é um dos grandes players mundiais, e por ser de
alta essencialidade, teve certa estabilidade e continuidade em suas atividades no período
pandêmico. Na Brasil, o agronegócio apresentou resultados quantitativos oficiais que
demonstram um crescimento, mesmo em um cenário de crise nos demais setores da
economia, demonstrando sua potencialidade para a reconstrução da economia brasileira
e contribuindo com o abastecimento internacional (LOPES et al., 2022; VIEIRA
FILHO, 2020).
Contudo, à luz da produção científica, percebe-se grande preocupação por parte dos
pesquisadores em compreender os impactos gerados na agricultura familiar, onde
poderia guardar maior vulnerabilidade, além de alguns nichos específicos, tais como a
agricultura orgânica, investigada por Almeida (2020) e Agnoletto (2021).
Assim, Basso (2021) investigou os reflexos na comercialização de
hortifrutigranjeiros em Taquaruçu do Sul-RS, e identificaram impactos para um dos
agricultores investigados por conta da falta de abastecimento dos mercados locais.
Claudino (2020), em uma análise nas cidades do interior do Pará, percebeu implicações
às redes de comercialização que envolve aglomerações, tais como feiras de produtores,
cujo cenário de restrições e controles de circulações ocasionou efeitos negativos,
movimento mais acentuado no início da pandemia, conforme apresentou Schneider et
al. (2020). Da mesma forma, as restrições de funcionamento das feiras diminuíram as
vendas em até 70% dos agricultores familiares em Cascavel-PR (ZANINI; FARIÑA,
2021) e, afetou drasticamente os produtores de Iturama-MG e região (SANCHES;
MARTINS; CONCEIÇÃO, 2022). Além do fechamento de feiras livres e a diminuição
na demanda por parte da população, o setor foi significativamente afetado pela
interrupção no fornecimento dos mercados institucionais, especialmente o Programa
23
Nacional de Alimentação Escolar – PNAE (SOUSA; JESUS, 2021) e o Programa de
Aquisição de Alimentos (PAA) (ARAÚJO; CANTERI; BITTENCOURT, 2021).
Esses impactos, segundo Futemma et al. (2021), são multidimensionais, no campo
da produção, comercialização, renda, saúde humana, além das formas de comunicação,
mas que puderam ser em parte superados a partir de um conjunto de fatores. Breitenbach
(2021) identificou e descreveu estratégias e ações direcionadas à minimizar esse
impactos, percebendo o envolvimento de diversos setores nesse processo, contribuindo
de maneira estratégica e mesmo humanitária, categorizando-os em: ações
governamentais e políticas públicas emergenciais; e ações da sociedade civil, incluindo
os agricultores e suas organizações representativas e demais atores da sociedade. Um
exemplo de solução no campo da gestão contingencial efetiva, considerado de sucesso
por Diverno, Passador e Marco (2020), foi o adotado pela Cooperativa de Agricultores
Familiares de Itararé, que optou pelo investimento em um novo nicho de mercado, com
a venda de cestas verdes, para garantir continuidade em suas operações.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base em uma revisão bibliográfica voltada às áreas das engenharias, agronomia
e geociências, observou-se uma crescente utilização de tecnologias digitais em prol de
soluções inovadoras que viabilizassem a manutenção das relações humanas e de
trabalho.
No quesito sustentabilidade, foram discutidos os impactos gerados pela utilização
do plástico nas máscaras de proteção facial e também das formas de mobilidade urbana,
evidenciando a preocupação da população frente a utilização do uso da bicicleta para o
transporte. Questão essa que também está relacionada à redução de deslocamentos pela
cidade devido à utilização do modo de trabalho home office de modo a evitar as
contaminações pelo vírus da COVID-19. Nova forma de trabalho que ainda traz
questionamentos sob a ótica das condições de trabalho, da produtividade e da saúde dos
colaboradores.
A utilização de ferramentas tecnológicas voltadas ao ensino e à educação em um
cenário emergencial também foi abordada, a ponto de promover reflexões acerca de
práticas pedagógicas que vinham sendo tomadas até então.
Todas essas temáticas, e desenvolvimento de soluções para os novos problemas que
surgiram ao longo desta crise sanitária faz vir à tona a necessidade cada vez maior de
apostar na tecnologia como mediadora, mas sem esquecer de compreendê-la e
incorporá-la sob uma visão holística, humana e sustentável.
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29
VIRTUALIZAÇÃO E DIGITALIZAÇÃO DAS
POLÍTICAS PÚBLICAS DE ACESSIBILIDADE
E INCLUSÃO NO RIO DE JANEIRO:
ACESSO, DIFUSÃO E DESAFIOS NO CONTEXTO DA
PANDEMIA DE COVID-19

Ricardo Massao Nakamura Nasser (1)

RESUMO. Este trabalho pretende analisar o recentíssimo processo de digitalização e


virtualização das políticas públicas de acessibilidade e inclusão da pessoa com
deficiência no município do Rio de Janeiro a partir dos meta-resultados obtidos por
uma pesquisa de campo que se encontra em fase de conclusão. Tem-se como objetivo
promover uma discussão sobre os aspectos políticos e sociais dessa transformação
emergencial e a necessidade de reflexão, pelo Estado, pela sociedade civil e pela
iniciativa privada, sobre a necessidade de estratégias de inclusão e difusão digital,
além da valorização da democracia no âmbito das tecnologias assistivas. Nesse
sentido, a preocupação com as desigualdades de acesso, as barreiras sociotécnicas e a
hipervulnerabilização da pessoa com deficiência no contexto da pandemia de
COVID-19 são elementos centrais ao trabalho e devem qualificar uma discussão a
respeito da equidade no ambiente virtual e a garantia dos direitos desse grupo
populacional. Por meio de observação participante, realizada em dois Centros de
Referência para Pessoas com Deficiência no Rio de Janeiro – principais instrumentos
da política municipal no segmento – foi possível coletar dados qualitativos sobre a
apropriação e efetividade das ferramentas tecnológicas que vem substituindo o
atendimento presencial do público alvo da política, cujo objetivo é promover o acesso
à saúde, transporte, educação, assistência social, entre outros direitos. A falta de
conectividade, dificuldades na aquisição e adaptação de smartphones e similares e a
ausência de uma rede de suporte remoto foram alguns apontamentos recorrentes na
consulta e que anunciam um cenário de grandes desafios para a municipalidade.

Palavras-chave: Deficiências. Políticas públicas. Inclusão social. Virtualização.


Digitalização.
(1) Mestrando em Políticas e Planejamento Urbano e Regional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
(PPGPUR/IPPUR/UFRJ). Pesquisador Associado ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia
Laboratório Estado, Sociedade, Tecnologia e Espaço (INCT/LabEspaço/IPPUR/UFRJ). Advogado e
Assessor Jurídico em Direitos Humanos (OAB/RJ nº 235.313). Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais
pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (FND/UFRJ). Bolsista CNPq (2020-2022). E-mail:
ricardonasser@adv.oabrj.org.br; ricardonasser@ufrj.br.
30
1. BREVE HISTÓRICO E EVOLUÇÃO DA POLÍTICA SOCIAL DE ACESSIBILIDADE E
INCLUSÃO NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO
Inaugurada no ano de 2003, a política social de acessibilidade e inclusão no
Município do Rio de Janeiro nasceu a partir da introdução do conceito de integração
estrutural de serviços públicos – ou macrofunções na gestão pública¹, com objetivo de
promover a atuação conjunta de cinco Secretarias Municipais da área social (Educação,
saúde, trabalho e renda, assistência social, esporte e lazer) por meio de equipamentos
urbanos destinados à abordagem multidisciplinar da inclusão social, com foco na pessoa
com deficiência e seus núcleos familiares e comunitários.
Todavia, apesar do intento em avançar na disseminação da acessibilidade no tecido
urbano, por meio da implementação de unidades que protagonizam o acesso à bens
sociais e direitos, os Centros Municipais de Referência da Pessoa com Deficiência, ao
tempo de sua inauguração, se faziam compostos por um conjunto de concepções e
práticas de atuação fortemente influenciadas pelo modelo médico-reabilitador de
deficiências, que, em linhas gerais, as consideram como lesões ou impedimentos que
reduzem a qualidade de vida do indivíduo e, portanto, devem ser atenuadas ou ajustada
por meio de intervenções biomédicas, ignorando as estruturas sociais externas que
excluem a participação vital desse segmento populacional na dita “sociedade sem
deficiências”. Dessa forma, até o ano de 2009, a proposta inicial se manteve, com o
desenvolvimento de equipes voltadas ao atendimento médico, psicossocial e de
facilitação ao acesso à emprego e renda.
Com a Convenção da ONU sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, de 2006,
que foi ratificada e internalizada pelo direito brasileiro², alcançando status de Emenda
Constitucional em 2009, uma grande mudança de paradigma ocorreu, sendo
consagrado juridicamente o modelo social de deficiência, que ao contrário do citado
paradigma médico inverte as concepções sobre normalidade, lesão e ajustes atitudinais
e ambientais, centrando atenções na necessidade de mudança das estruturas que
propiciam a exclusão social, a diferenciação negativa e a discriminação de corpos,
mentes e modos de existir diversos.
Conforme preceitua Barbosa-Fohrmann:
A positivação do modelo social de inclusão, em sua plenitude, viria
apenas em 2006, com a Convenção Internacional sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência (CDPD). A Convenção é o primeiro tratado
internacional do século XXI e também é o primeiro que versa
especificamente sobre as pessoas com deficiência no âmbito do sistema
de proteção de direitos humanos da ONU, marcando a mudança de
paradigma na trajetória do seu tratamento jurídico, agora focado no
exercício dos direitos humanos. Ela fixa os direitos humanos e as
liberdades fundamentais básicas e universais, como o direito de ir e vir, o
direito à acessibilidade, à educação, ao lazer, à cultura, à saúde, à
moradia, dentre outros, contemplando instrumentos jurídicos que dão
eficácia a eles. Na verdade, não houve criação de novos direitos, mas sua

¹ “Em sua administração anterior, o prefeito César Maia introduziu o conceito de macrofunção, buscando
uma visão integrada da gestão pública.” Cf. Projeto voltado a portadores de deficiência comemora um ano
no Rio. Folha de São Paulo. São Paulo, 10 de novembro de 2004.
² Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009, que promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007.

31
especificação, para que as pessoas com deficiência pudessem deles gozar
em igualdade de condições com as demais. Já em seu preâmbulo, a
CDPD reconhece expressamente que, apesar dos instrumentos e
compromissos existentes até então, as pessoas com deficiência ainda se
deparavam com problemas relativos à participação na sociedade e à
violação de seus direitos. Assim, a Convenção reforça a visão de
proteção e garantia da eficácia desses direitos, com superação da
segregação ou exclusão, reconhecendo, pois, a qualidade de sujeito de
direito das pessoas com deficiência. Em suma: protege e promove os
direitos que fazem parte do sistema geral dos direitos humanos, mas que
têm sido desrespeitados sistematicamente quando se trata de pessoas
com deficiência. (BARBOSA-FOHRMANN, 2016, p. 739-740).
Dessa forma, um processo de reorientação da política carioca foi iniciado. Era
necessário dissociar a atuação dos Centros de Referência das práticas reabilitadoras e
medicalizantes, alçar os usuários desses equipamentos a um patamar razoável de
autonomia e independência em suas decisões sobre o acompanhamento psicossocial,
revertendo o quadro de verticalidade das atividades e serviços prestados, deflagrando
um estado de imanência inédito nas “políticas intra-muros”, de modo a compreender a
acessibilidade enquanto elemento essencial à vida social e que deve ultrapassar os
limites espaciais das unidades de referência.
Em tal sentido, por meio da criação da Secretaria Municipal da Pessoa com
Deficiência, buscou-se emancipar tal política já estabelecida, dos domínios da saúde e
do trabalho, ressignificando a experiência dos assistidos. Nessa fase foi idealizada e
implantada a Central Carioca de Intérprete de Libras, reorganizada a Educação de
Jovens e Adultos (EJA) com a inserção de alunos com deficiência em salas de aula não
segregadas, criação do serviço de atendimento presencial à Central de Relacionamento
com a Municipalidade (Central 1741), a prestação de assistência jurídica gratuita por
meio de parcerias com a Defensoria Pública do Estado e da União, atividades de
capacitação e desenvolvimento pessoal abertos à população em geral, além de novas
estruturas para facilitação no cadastramento de benefícios sociais, incluindo o passe-
livre nos transportes.
A valorização das identidades – individuais e coletiva, da diversidade corporal,
cognitiva e existencial, a concepção de equipamento urbano aberto a todos, a
intensificação de práticas de interação com os núcleos familiares e com as comunidades
para além do espaço dos Centros, e a disseminação da cultura de direitos constituem os
pilares da nova concepção dos Centros de Referência, que hoje somam sete unidades,
localizadas em bairros de alto adensamento urbano, grande número de favelas e
comunidades carentes, cujos indicadores sociais sinalizam para a necessidade de
especial atenção do Estado nas questões do bem-estar social.
Muito embora imprescindível o conjunto de mudanças operadas na política carioca,
de forma a superar paradigmas ultrapassados, falsamente inclusivos, necessário
registrar uma crítica no que se refere à insuficiência ou limitação do modelo de
centralidades ou macrofunções na construção de um espaço urbano universalmente
acessível, tendo em vista que a função social da cidade e o direito à fruição integral do
espaço desta, compreendidos na Constituição da República de 1988, no Estatuto da
Cidade de 2001 e em diversas leis esparsas, exige um complexo de ajustes razoáveis no
espectro ambiental e humano. A mobilidade, o acesso aos direitos, bens e serviços, a
possibilidade de inserção política, de sociabilidade, de fruição da natureza e dos
32
ambientes construídos, da apropriação do trabalho, da cultura, da linguagem, e
sobretudo, a construção da condição subjetiva de pertencimento à humanidade e ao
espaço compõem o significado da acessibilidade e suas múltiplas dimensões –
atitudinal, instrumental, arquitetônica, comunicacional, metodológica, programática
(SASSAKI, 2006) e que por sua vez devem ser propiciadas pelo Estado e pela sociedade
numa perspectiva mais ampla, territorializada, especializada, e que compreenda a
cidade como uma totalidade de bens, serviços e direitos, como argumenta Harvey
(2014).
2. COVID-19: O DESAFIO DA VIRTUALIZAÇÃO E DIGITALIZAÇÃO DOS
SERVIÇOS PÚBLICOS NOS CENTROS DE REFERÊNCIA PARA A PESSOA COM
DEFICIÊNCIA
Tendo em vista que os Centros realizam uma extensa programação de atividades,
serviços e projetos, envolvendo equipes multidisciplinares, instituições parceiras,
dentro e fora dos limites da atuação da Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência,
a rotina de atendimentos comumente é intensa. Dados obtidos por meio da Lei de
Acesso à Informação (LAI)³ revelam uma média de 2.012 registros de atendimento/dia
no primeiro semestre de 2019, efetuados no âmbito das sete unidades municipais.
Levando em consideração que os atendimentos são eletivos, e contam com diversos
fluxos, formatos e durações, o número de registros diários de atendimento deve ser
analisado com base na rotatividade de assistidos e nos movimentos de entrada e
conclusão nas atividades. Assim, podemos concluir que o número de pessoas
efetivamente atendidas pelos Centros é expressivamente maior que o registro oficial,
por este desconsiderar as especificidades do sistema de atendimento efetuado pela
política. Em outras palavras, a atuação concreta dos CR's no Município do Rio de
Janeiro extrapola os limites apresentados pelo dado numérico informado pela própria
municipalidade.
A diversidade de deficiências - física, auditiva, visual, intelectual, múltipla,
sensorial, psicossocial, além dos Transtornos do Espectro Autista (TEA), Transtornos
Globais do Desenvolvimento (TGD) e síndromes como a de Down, Asperger, Williams
e de Rett – trazem uma gama de singularidades e necessidades que definem o esquema
de atuação da equipe multidisciplinar . Como exemplo, as atividades de
psicomotricidade desenvolvem habilidades permitem maior autonomia corporal às
pessoas com deficiências físicas e síndromes com reflexos físico-motores. As oficinas
nos Laboratórios de Tecnologia Assistiva, por sua vez, promovem a interação entre
pessoas com deficiências e síndromes com reflexos intelectuais e sensoriais com a
realidade virtual e as oficinas artísticas, que envolvem a utilização de materiais
audiovisuais atuam no despertar da curiosidade, do desenvolvimento da concentração,
da cognição e da interação familiar nos processos de inclusão da criança com
deficiência.
Como é possível perceber, a tarefa de condensar uma totalidade de projetos e
atividades habitualmente realizados na forma presencial, com intenso contato humano e
uso de equipamentos, estruturas físicas específicas, materiais de apoio e instrumentos
técnicos, e transformá-los, funcionalmente, em um serviço inteiramente virtual,
realizado de forma remota, tornou-se uma tarefa que não logrou êxito de forma

³ Protocolo RIO-23421530-7 registrado pelo autor em 29/06/2021 e finalizado com as informações


solicitadas, conforme Lei de Acesso à Informação (LAI) em 07/07/2021.
33
instantânea.
A concretização de um cenário pandêmico que impeliu à população o isolamento
social compulsório e procedimentos de quarentena, com fechamento de atividades de
toda ordem, incluindo estabelecimentos comerciais, escolas, universidades, templos
religiosos, fóruns, aeroportos, portos e rodoviárias, aliado à demora na resposta das
esferas governamentais, em especial a federal, na determinação e coordenação de
medidas eficazes no combate ao COVID-19, a disseminação de fake news e campanhas
de desinformação, além das malogradas empreitadas do Executivo Federal em investir
em tratamentos cientificamente ineficazes contra o vírus provocou um estado de
excepcionalidade nunca antes visto, que se iniciou em 2020, dominando a realidade
nacional, e ceifando – até o momento de fechamento da escrita deste artigo, em 28 de
outubro de 2021 – mais de 607 mil vidas no país.
Na esfera municipal o Decreto Rio nº 47.246 de 12 de março de 2020 determinou a
interrupção das atividades presenciais nas repartições públicas, causando o fechamento
dos sete Centros de Referência em comento. Cronogramas de atividades foram
interrompidos, planejamentos foram necessariamente rifados e um estado de
desassistência se instaurou, com registro de grande insatisfação dos usuários, tendo em
vista a essencialidade das atividades realizadas nos CR's, especialmente aquelas
vinculadas à facilitação na obtenção de benefícios sociais como Cadastro Único, BPC –
Benefício de Prestação Continuada, Bolsa Família e Passe-Livre dos transportes
públicos, além de encaminhamentos para serviços especializados de saúde e assistência
social, em unidades federais, estaduais e municipais.
Mais do que nunca vulnerabilizada, a comunidade de pessoas com deficiência
assistida pelos CR's sentiu o impacto – psicossocial, econômico, sanitário – trazido pela
Pandemia de COVID-19 e sua desastrosa gestão pela esfera pública federal. A reclusão,
imposta pela necessidade de distanciamento social, provocou sensível abalo no
desenvolvimento psicossocial dos assistidos, que em primeiro momento sofreram com
o processo de desagregação das estruturas da política de inclusão em comento.
Com o passar dos meses e a ultrapassagem do pico pandêmico no país, em abril de
2021, e o lento retorno das atividades essenciais paralisadas ou mitigadas desde março
de 2020 (marco do início da Pandemia no país), um movimento pela ressignificação das
atividades desenvolvidas pelos CR's, agora no esquema remoto, deu seus primeiros
passos, com a organização de profissionais de diversas equipes em grupos de redes
sociais, no intuito de desenvolver estratégias de resgate e adaptação dos atendimentos
para o contexto virtual. Nesse sentido, em segundo momento, lideranças populares
foram incluídas nos grupos virtuais de trabalho, trazendo importante contribuição no
sentido de informar os profissionais envolvidos sobre as condições psicossociais,
econômicas e sanitárias nas comunidades e até mesmo em núcleos familiares
específicos, em que se encontram várias pessoas com deficiências ou com síndromes e
deficiências múltiplas e severas em contexto de vulnerabilidade social. Da interação
entre profissionais do cuidado e lideranças comunitárias, por meio das associações de

Conforme Orientação Técnica sobre o serviço de proteção social para pessoas com deficiência e suas
famílias, emitida pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, em 2015.
Informações obtidas através do Consórcio de Imprensa formado pelo Jornal O Estado de S. Paulo, portal
G1, Jornais O Globo, Extra, Folha de São Paulo e portal UOL em 19/10/2021. Disponível em:
https://g1.globo.com/saude/coronavirus/. Acesso em 19/10/2021.
34
moradores, igrejas e movimentos locais formou-se uma rede sociotécnica, centralizada
na comunicação por meio das redes sociais e que, enfim, foi capaz de viabilizar e
capilarizar a ideia original de virtualização, mesmo que de forma ainda precária, das
atividades dos CR's.
Conforme o pioneirismo de Egler:
O desafio do nosso estudo é exatamente essa possibilidade, compreender
que a técnica aumenta a capacidade humana de organização e interação,
possibilitadas por formas alternativas de conectividade que definem
novas identidades e institucionalidade políticas. Resta ainda questionar
suas possibilidades de contemplar o bem-estar social.
[...]
É inerente às novas tecnologias a possibilidade de articular redes sociais
que possam a se unir, visando um objeto de trabalho em comum. A
mesma natureza dos espaços de tecnologia informática, lógica numérica
e arquitetura em rede respondem por possibilidades de união e
organização social que não encontramos nos espaços hierarquizados da
sociedade industrial. Está claro que a constituição de redes sociais auto-
organizadas pode se constituir em um espaço de integração social que
abre caminhos para a realização de experimentos que, por sua vez, aliam
inovação tecnológica ao desenvolvimento social. (EGLER, 2012, p.
179).
Dessa forma, a ação social imanente, independente da atuação governamental,
desenvolvida numa perspectiva horizontal e dialógica, estabelecida entre diversos
atores e por meio das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC's) deu forma à
uma insurgência política originada no compromisso ético com a defesa dos direitos da
população com deficiência no território da cidade. Nessa toada, imprescindível
mencionar o pensamento de Ana Clara Torres Ribeiro, que ilumina a compreensão sobre
a origem e a potência da ação social na transformação do cotidiano, frente a conjunturas
de crises:
É neste contexto, e frente à crise societária, que as forças políticas que se
opõem à fragmentação e à exclusão sociais são confrontadas com o
desafio representado pela unidade básica da vida social que, como
propôs Norbert Elias (1994), é constituída pelo “eu-nós”. Com esta
unidade, que valoriza os vínculos sociais, rompe-se a clássica
perspectiva dicotômica indivíduo-sociedade, também tão acionada nos
estudos da modernização. O “eu-nós” dialoga com os mistérios da ação
espontânea e da gratuidade dos gestos (Godelier,1996), permitindo o
confronto tanto do individualismo - esta ideologia que impede a
individualidade - quanto do coletivismo que impossibilita a afirmação de
sujeitos sociais plenos, autônomos, com projetos e papéis protagônicos
na transformação da vida urbana. (RIBEIRO, 2006, p. 26).
Os desafios da digitalização e da virtualização das políticas públicas no Brasil, a
exemplo da política social especialmente abordada neste artigo, perpassa
precipuamente por duas barreiras encontradas na organização das políticas públicas
nacionais lato sensu, a saber, a persistência da exclusão digital de considerado segmento
populacional, ausência de assessoramento sociotécnico e a dificuldade de
implementação, manutenção e efetividade de sistemas informatizados de acesso e
controle de dados e processos, de modo a integrar a atuação estatal às tecnologias da
35
informação e comunicação (TIC's) e solidificar um panorama de inovação,
descentralização e desburocratização de gestão capaz de imprimir soluções mais céleres
e eficazes em momentos de crise ou crescimento vertiginoso da demanda por
determinado serviço, programa ou política.
A questão da exclusão digital, apontada pela literatura nacional desde o início da
década de 2000, refere-se ao processo de impossibilidade de obtenção de instrumentos
(smartphones, tablets, notebooks, computadores) e/ou a inexistência de conexão com
internet de razoável qualidade, além da falta de acessibilidade instrumental (SASSAKI,
2006), no caso da pessoa com deficiência. Mesmo antes da conjuntura pandêmica, a
intensa desigualdade no acesso à internet no Brasil já era objeto de métrica por pesquisas
especializadas, a exemplo da “TIC Domicílios”, realizada pelo Centro Regional de
Estudos para Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic), cujos resultados
divulgados ainda em 2019 apontavam para um cenário em que apesar de 70% dos lares
brasileiros, localizados em áreas urbanas, terem acesso à internet, a análise dessa média
perante a categoria classe social, apontava para enorme desigualdade de acesso: Se
entre as classes A e B, 96,5% das residências possui acesso à sinal de internet, nas
classes populares (D e E) esse índice cai para 59%. Na população de baixa-renda (cuja
renda familiar é inferior à 1 salário mínimo), 78% das pessoas só possuem acesso à
internet por meio de celulares, ou seja, em condições insatisfatórias para atividades que
demandam amplitude superior de dados, como acesso à plataformas de vídeo, de
educação, telemedicina, trabalho remoto e uso de ferramentas governamentais, entre
outros, tão importantes no contexto da Pandemia de COVID-19.
É adequado ressaltar, nesse ínterim, que grupos populacionais como idosos, pessoas
com deficiência, moradores de favelas, cortiços e comunidades carentes, ribeirinhos,
indígenas e residentes nas zonas rurais enfrentam desafios ainda maiores na obtenção de
recursos tecnológicos e no acesso à conexão de internet estável e de qualidade.
No que diz respeito ao assessoramento técnico compreende-se a dotação, pelas
instâncias gestoras da política social de quadros especializados em desenvolver e aplicar
novas tecnologias de armazenamento, gestão e integração de bases de dados de
indivíduos e de novas plataformas para prestação de serviços públicos, além de criação
de processos de aperfeiçoamento do trabalho, introdução do corpo funcional ao manejo
das tecnologias e criação de uma cultura de inovação, progresso e capilarização, em
outras palavras, “levar a política pública” ao seu público alvo de forma ágil, acessível e
por meio das TIC's.
A questão da implementação, manutenção e efetividade de sistemas informatizados
(VEALE e BRASS, 2019) vem em sequência: É necessário adotar estratégias de
planejamento digital no sentido de incorporar efetivamente o papel das tecnologias na
melhoria contínua da oferta do serviço público, valorizando a adoção de sistemas que
promovam novas experiências aos usuários, com possibilidade de controle e avaliação,
prima-facie, pelos beneficiários diretos da política pública e também pelas organizações
da sociedade civil, movimentos populares, órgãos de fiscalização e demais poderes
estatais como o legislativo e o judiciário. Frise-se que a obtenção de maior lisura nos
processos de trabalho e possibilidade de acompanhamento externo das ações
governamentais são vantagens do processo de digitalização e auxiliam na composição
de legitimidade e aderência popular, elementos tão importantes para a consecução de
efetividade e longevidade à uma política social.

36
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É possível afirmar que a conjugação de estratégias de digitalização de políticas
públicas e de difusão de serviços públicos virtualizados, juntamente à preocupação com
a inclusão, no processo de gestão dessas políticas, dos vários atores que compõem o seu
cotidiano – usuários, servidores, trabalhadores terceirizados, cuidadores, familiares,
membros das comunidades, lideranças locais, representantes de movimentos populares
– implica no fortalecimento e na capilarização da ação estatal que se dirige ao
atingimento do bem-estar social. A necessidade de incorporação das TIC's,
acompanhada de elementos de planejamento digital como a dotação de assessorias
sociotécnicas, investimento em formação de uma cultura de serviços públicos digitais,
inovação em sistemas de gestão de dados e processos e formalização dos instrumentos
de observação e fiscalização das políticas sociais produz um cenário de inovação com
responsabilidade, equidade e legitimidade social, que se apoia na sinergia entre ação
estatal, ação social e sociabilidades (TORRES, 2005). Conforme Milton Santos (1994),
“a questão, para nós, seria descobrir e pôr em prática novas racionalidades, em outros
níveis e regulações mais consentâneas com a ordem desejada, desejada pelos homens, lá
onde eles vivem”. (SANTOS, 1994, p. 154). Para Torres Ribeiro (2012) “trata-se da
necessidade de desencantar acordos tácitos; de conceber novos objetos de estudo e de
criar áreas mais sólidas para a reflexão intersubjetiva e ética das condições de vida da
maioria”. (RIBEIRO, 2012, p. 60).
O presente artigo, cujo nascimento se deve à utilização de parte dos meta resultados
de uma pesquisa empírica realizada a partir do ano de 2018 nos Centros de Referência
para Pessoa com Deficiência no município do Rio de Janeiro, utilizou-se da prática da
observação participante no interior dos espaços de realização da política pública de
inclusão e acessibilidade, o que possibilitou contato extensivo com usuários – que
revelaram suas demandas, percepções, críticas, necessidades, ou seja, seu “olhar em
primeira pessoa”. O contato com tal rede de atores também se estendeu ao longo de toda
a conjuntura pandêmica. Dessa forma, nuances reveladas pelos próprios usuários
estruturaram os eixos de argumentação, no sentido da necessidade de estabelecimento
de novas estruturas virtualizadas que superem os desafios impostos pela conjuntura
societária, desvelando outras possibilidades de capilaridade da ação estatal no sentido
de promoção do bem-estar social e do direito à cidade para a pessoa com deficiência.
Conforme Octavio Ianni (2001), trata-se de adequar a atuação pública no sentido
mais aguçado da globalização, imposta pelo avanço dos meios técnicos e científicos na
qual se incluem as TIC's, cuja aceleração se viu vertiginosa na conjuntura pandêmica; e
para além dessa tarefa, como ressalta Ana Clara Torres Ribeiro (2014), destacar os
sentidos e a essencialidade da ação social, como aglutinação entre o pensado e o
concreto, entre o desejado e o disposto, de forma a ofertar esquemas de produção social
que ultrapassem os limites da crise, da malograda experiência governamental atual e dos
muros – visíveis e invisíveis – que cercam as políticas públicas, sobretudo as de natureza
social, obstaculizando a permeabilidade, capilaridade e universalidade, desígnios
democráticos que deveriam ser refletidos na práxis pública.
Como inspiração final do escrito, resgatemos as indispensáveis palavras de Ianni:
As noções de espaço e tempo, fundamentais para todas as ciências
sociais, estão sendo revolucionadas pelos desenvolvimentos científicos e
tecnológicos incorporados e dinamizados pelos movimentos da

37
sociedade global. As realidades e os imaginários lançam-se em outros
horizontes, mais amplos que a província e a nação, a ilha e o arquipélago,
a região e o continente, o mar e o oceano. As redes de articulações e as
alianças estratégicas de empresas, corporações, conglomerados,
fundações, centros e institutos de pesquisas, universidades, igrejas,
partidos, sindicatos, governos, meios de comunicação impressa e
eletrônica, tudo isso constitui e desenvolve tecidos que agilizam relações,
processos e estruturas, espaços e tempos, geografias e histórias. O local e
o global estão distantes e próximos, diversos e iguais. As identidades
embaralham-se e multiplicam-se. As articulações e as velocidades
desterritorializam-se e reterritorializam-se em outros espaços, com
outros significados. O mundo se torna mais complexo e mais simples,
micro e macro, épico e dramático. (IANNI, 2001, p. 249-250).

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39
ENGENHARIA MECÂNICA E SUA
PARTICIPAÇÃO EFETIVA CONTRA O
VÍRUS COVID-19 NA APLICAÇÃO DOS
VENTILADORES MECÂNICOS
PULMONARES

Douglas Ribeiro Pinto (1)


Denis Bruno Ferreira Chaves (2)
Rodrigo Reis Mendes (3)

RESUMO. A necessidade diante de um momento tão delicado, se fez única no que se


diz respeito ao engajamento de diversas áreas de atuação, onde a engenharia mecânica
por sua vez contribuiu em parceria com áreas pertinentes para que tornássemos ainda
mais fácil a utilização e desenvolvimento dos ventiladores mecânicos pulmonares.
Este trabalho conta com uma natureza de pesquisa qualitativa descritiva que busca
compreender e interpretar as características do ventilador mecânico pulmonar e sua
colaboração no contexto da pandemia da COVID-19, a utilização de equipamentos
que dão suporte respiratório, as pessoas com estado grave e que dependem do mesmo
se fez necessária e a utilização de tais equipamentos se faz uma alternativa altamente
viável para os pacientes com insuficiência respiratória, tornando uma máquina de
suma importância e visivelmente requisitada no cenário atual. Portanto, conclui-se
que o uso do ventilador mecânico pulmonar é de essencial importância no auxilio
contra os sintomas respiratórios graves associados ao Covid -19, tornando-os menos
maléficos ao paciente.

Palavras-chave: Ventilador Pulmonar, Engenharia mecânica, COVID-19.

(1) Engenheiro Mecânico, douglasribeiro.dr@hotmail.com. (2) Engenheiro Mecânico,


denis.chaves11@gmail.com. (3) Engenheiro Mecânico, roodrigo.mendes@outlook.com.br.

40
1. INTRODUÇÃO
Ao longo de todo o contexto ao qual todos estão inseridos, frente às demandas
apresentadas pelo corona vírus (SARs-COV-2), a utilização de equipamentos que dão
suporte respiratório, a pessoas com estado grave e que dependem do mesmo se fez
necessário e a utilização de tais equipamentos se faz uma alternativa, altamente viável
para os doentes. Desde os primeiros sinais de agravamento da doença, que se iniciou
em dezembro de 2019, na cidade de Wuhan, na China, os ventiladores ou respiradores
mecânicos são amplamente utilizados (CRESTO, 2021).
O primeiro caso confirmado de COVID-19 no Brasil ocorreu em 26 de fevereiro
de 2020. Desde então, o número de novos casos e óbitos causados por COVID-19
aumentou de uma forma rápida e significativa no país. Aproximadamente 20% dos
pacientes com COVID-19 requerem hospitalização, principalmente devido à
dificuldade respiratória. Destes, cerca de 15% requerem cuidados em unidade de
terapia intensiva (UTI). UTI é onde existem recursos para suportar disfunções
orgânicas, principalmente onde há insuficiência respiratória, ventilador mecânico,
também conhecido como ventilador pulmonar (SUZUMURA, E. A. et al. 2020).
Em virtude de tamanho poder de transmissão, a doença tomou contornos mundiais
muito rapidamente e fez com que as fronteiras dos países se fechassem, pois, o vírus
ataca vias aéreas superiores de forma inicial, impactando de maneira direta no seu alto
poder de replicação e contaminação. Agências de saúde, a nível mundial relatam que
aproximadamente de todos os pacientes que se contaminam com COVID-19, a grande
maioria apresenta sintomatologia leve e a minoria dos pacientes apresentam estes de
forma grave, fazendo com que eles necessitem de tratamento intra-hospitalar, e na
grande maioria dos casos, estes pacientes precisam de suporte respiratório invasivo,
que ocorrem com o auxílio dos respiradores mecânicos (CRESTO, 2021).
Para que a ventilação mecânica ocorra de maneira efetiva é necessário que
critérios fisiológicos sejam respeitados e que a hipoxemia seja corrigida por estes
aparelhos, que devem ser ciclados de acordo com a necessidade de cada pessoa
hospitalizada, pois, sabe-se que muitas pessoas sofrem barotraumas em virtude do
excesso de oxigenação pulmonar, outro fator de suma importância, é a febre, pois, se
este fator não for respeitado o efeito da ventilação mecânica ao paciente passa a ser
prejudicial (CRESTO, 2021).
Sabe-se que a pandemia trouxe diversos contornos a demanda hospitalar,
entretanto, sem sombra de dúvida a que mais sofreu modificação foi referente a
utilização dos ventiladores mecânicos, pois, o aparelho é responsável pelo suporte
avançado de vida, em conjunto com as demais técnicas realizadas em ambiente de
assistência avançada à saúde. Portanto, o estudo, justifica-se pela necessidade de
compreender não somente a doença, haja vista, que ela depende do mesmo, mas como
funciona a montagem do presente aparelho e como é realizada a sua utilização. O
objetivo geral do estudo é compreender como é a aplicação do ventilador mecânico,
frente a necessidade da sua utilização em decorrência da Covid-19. Como objetivos
específicos tem se conhecer a dinâmica da doença, compreender o que é o ventilador
mecânico, qual a sua montagem e como o aparelho deve ser utilizado.
1.2. O COVID
Em 31 de dezembro de 2019, a Organização Mundial da Saúde (OMS) tomou
41
conhecimento de vários casos de pneumonia em Wuhan, província de Hubei,
República Popular da China. É uma nova cepa (tipo) de coronavírus que nunca foi
encontrada em humanos antes (Histórico da pandemia de COVID-19 - OPAS / OMS,
2021).
Uma semana depois, em 7 de janeiro de 2020, as autoridades chinesas
confirmaram que haviam descoberto um novo tipo de coronavírus. Eles são a segunda
causa de resfriado comum (depois do rinovírus) e, até as últimas décadas, raramente
causam doenças humanas mais graves do que o resfriado comum. Um total de sete
coronavírus humanos (HCoV) foram identificados: HCoV-229E, HCoV-OC43,
HCoV- NL63, HCoV-HKU1, SARS-COV (causando síndrome respiratória aguda
grave), MERS-COV (causando síndrome respiratória Oriente Médio) e o novo
coronavírus mais recente, inicialmente denominado temporariamente 2019-nCoV e
renomeado SARS-CoV-2 em 11 de fevereiro de 2020. Este novo tipo de coronavírus é
o responsável pela doença COVID-19. Conforme ilustrado na Figura 1 pode-se
analisar os números de casos relatados de Covid-19 em países em todo o mundo a
partir da confirmação das autoridades chinesas. (Histórico da pandemia de COVID-
19 - OPAS/ OMS, 2021).

Figura 1: Número de casos relatados de Covid-19 em países em todo o mundo

Fonte: Christou, Adamos; Ntagios, Markellos; Hart, Andrew, Dahiya, Ravinder.


GlasVent - O Ventilador de Emergência Rapidly Deployable. Wiley Online Library,
06 de setembro de 2020. Acesso em: 08 de dez. de 2021

A OMS tem trabalhado com autoridades chinesas e especialistas globais desde o


dia em que ouviu o briefing para aprender mais sobre o vírus, como ele afeta os
pacientes, como tratá-lo e quais medidas os países podem tomar para responder
(Histórico da pandemia de COVID-19 - OPAS / OMS, 2021).
Dentre o levantamento da OMS, 80% dos afetados com o vírus mostram sintomas
leves, 15% apresentam sintomas mais graves onde necessitam de hospitalização com
oxigenoterapia, os 5% restantes precisam de atendimento na Unidade de Terapia
Intensiva (UTI), favorável para quadros de insuficiência respiratória (NORONHA et al.,
2020; ROBERTO et al., 2020).
A respiração tem como objetivo prover oxigênio aos tecidos e remover o dióxido de
42
carbono, isto é, realizar o transporte de oxigênio do ar atmosférico até as células do
corpo e, em sentido contrário, transporte de dióxido de carbono das células para forma
do corpo (CRESTO, 2021). Nesse sentido, o sistema respiratório é capaz de
desempenhar duas fases deste processo: ventilação mecânica, ou seja, a movimentação
do ar entre a atmosfera e o alvéolo; e a difusão do oxigênio e dióxido de carbono entre o
ar alveolar e o sangue (CRESTO, 2021).
O ar entra no sistema respiratório pelas cavidades do nariz ou boca, passa pela
faringe, laringe e traqueia até atingir os brônquios. Os brônquios se subdividem nos
bronquíolos que se estendem até os alvéolos, estruturas que ocorrem as trocas gasosas
com o sangue. O sistema de condução gasosa consiste entre a traqueia e os bronquíolos
terminais, enquanto a zona respiratória, que é onde ocorre as trocas gasosas, é
constituída pelos bronquíolos respiratórios, os ductos e sacos alveolares (CRESTO,
2021).
Durante a inspiração, a contração do diafragma puxa as superfícies inferiores do
pulmão para baixo, criando uma pressão negativa no tórax e promovendo a entrada do ar
atmosférico. Enquanto que durante a expiração, o diafragma relaxa e a retração elástica
dos pulmões, da parede torácica e das estruturas abdominais comprime os pulmões, cria
uma pressão positiva e expele o ar (CRESTO, 2021).
Portanto, deve se compreender que a Coronavírus Disease 2019 (COVID-19), é
conhecido por ser uma infecção que se instala em vias aéreas principalmente superior, e
o quadro da Síndrome Respiratória Aguda Grave 2 (SARS-CoV-2), traz números males
aos pacientes que estão afetados pela doença. Os primeiros delineamentos da doença
tiveram origem ao final do ano de 2019, sendo de forma inicial uma pneumonia que se
agrava de forma rápida e levava os infectados ao óbito em poucas horas ou dias, após a
contaminação (DE CARVALHO, DA SILVA, OLIVEIRA, 2020).
A partir do momento que a doença começa de fato ser percebida pelos mais diversos
profissionais, ela começa a ser descrita mais letal em pessoas com processo de
adoecimento crônico, que estão acima de seu peso ideal. Em contrapartida, notou- se
que pessoas que têm o hábito de praticar algum tipo de esporte de forma regular os
agravos do adoecimento são menores (SCHUELTER-TREVISOL, 2020).
É notório que a atividade física dentro das academias, traz múltiplos e inúmeros
benefícios à saúde do indivíduo, pois, por meio dela o sistema imunológico sofre
processos de mudanças aos quais conseguem combater processos de adoecimento de
forma mais eficaz. Pesquisas guiadas por Diniz e colaboradores (2020) mostraram que
as práticas de atividade física, dentro das academias promovem uma maior proliferação
de mecanismos defensivos do organismo humanos (Diniz, et al., 2020).
1.3. VENTILAÇÃO MECÂNICA PULMONAR
Com a ajuda de aparelhos, a ventilação mecânica insufla as vias respiratórias com
volumes de ar, este movimento de ar para os pulmões ocorre através da geração de
diferenças de pressão entre as vias aéreas superiores e o alvéolo (AGÊNCIA
NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2008; CARVALHO; TOUFEN
JUNIOR; FRANCA, 2007). Buscando um objetivo, alguns parâmetros podem indicar a
necessidade do suporte ventilatório, assim aplicando o uso da ventilação mecânica.
(CARVALHO; TOUFEN JUNIOR; FRANCA, 2007). Resumidamente, a ventilação
mecânica aplica um método ventilatório capaz de ventilar e oxigenar adequadamente o
43
paciente, assegurando a necessidade apropriada de oxigênio aos órgãos vitais, remoção
do dióxido de carbono, diminuir a toxicidade do oxigênio e limitar as pressões trans
alveolares de 25 a 30cm H O, o que normalmente corresponde a pressões platô de 30-35
cm H O. (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2008; CALIL; ET
AL, 2002; URIBE, 2011).
O ventilador mecânico como demonstrado (Figura 2) é um equipamento projetado
para dar o suporte ventilatório pulmonar artificial parcial ou completo ao paciente que
tem dificuldade respiratória devido a doenças, defeitos congênitos, coma, anestesia,
dentre outros. Também tem a finalidade de permitir o descanso dos músculos
respiratórios até que o paciente esteja apto a reassumir a ventilação espontânea
(AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2008; CALIL; ET AL,
2002; URIBE, 2011).

Figura 2: Ventilador pulmonar mecânico.

Fonte: Ventiladores Pulmonares Mecânicos. Alibaba, 2020. Acesso em: 21 de abr. de 2022.

Nos dois casos, o gás desloca para dentro dos pulmões fazendo que os mesmos e a
caixa torácica se expandam em virtude das suas elasticidades, assim denominado de
respiração ou ventilação (URIBE, 2011). Este movimento de respiração ocorre através
de uma variação de pressão entre as vias aéreas superiores e o pulmão, podendo ser
realizado por um equipamento que diminua a pressão no pulmão (ventilação por pressão
negativa) ou que aumente a pressão da via aérea proximal (ventilação por pressão
positiva) (CARVALHO; TOUFEN JUNIOR; FRANCA, 2007).
Assim, diferente da respiração espontânea, o ventilador mecânico usa de pressão
positiva para forçar o ar para dentro dos pulmões durante a inspiração. O objetivo
fisiológico tem a se manter ou modificar as trocas gasosas, intervindo na ventilação
alveolar (hiperventilação ou hipoventilação de maneira controlada), porém utiliza-se
esta ferramenta para normalizar a ventilação alveolar, manter valores aceitáveis de
oxigenação arterial, aumentar o volume pulmonar, aperfeiçoar a capacidade residual
funcional e diminuir trabalho respiratório. Já os objetivos clínicos são focados na
reversão da hipoxemia com aumento da ventilação alveolar e do volume pulmonar,
permitir sedação, anestesia ou uso de bloqueadores neuromusculares, dentre outros e
44
reversão da acidose respiratória aguda e a fadiga da musculatura respiratória (CRESTO,
2021).
1.4. VENTILAÇÃO MECÂNICA INVASIVA
Os suportes ventilatórios são classificados em dois grupos: a ventilação mecânica
invasiva e não invasiva, em ambas as situações a ajuda com a ventilação artificial
acontece aplicando uma força nas vias aéreas. Sendo assim as duas situações
apresentam uma diferença na aplicação da pressão: nas ventilações invasivas usa-se
próteses adentradas nas vias aéreas (chamado tubo oro ou nasotraqueal ou cânula de
traqueostomia), já na ventilação não invasiva usa-se mascara como ligação entre o
respirador e o paciente. Conforme ilustrado na Figura 4 na qual pode-se analisar o
esquema de ventilação mecânica não invasiva (a) e invasiva (b) realizado no paciente de
forma adequada (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2008;
CARVALHO; TOUFEN JUNIOR; FRANCA, 2007).
Os sistemas de controle variam de acordo com o equipamento, mas constituem o
cérebro do equipamento, sendo programados pelo profissional e dirige o funcionamento
do ventilador (CALDERON ROMERO, 2006). Os equipamentos modernos contam
ainda com conjunto de sensores e interface para computador, para monitoramento e
controle de diversos parâmetros, além do envio, armazenamento, análise de medidas,
alarmes e dados sobre os procedimentos e evolução do paciente (AGÊNCIA
NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2008; CRESTO, 2021).

Figura 3: Diagrama de um ventilador pulmonar básico

Fonte: Abordagem de Vigilância Sanitária de Produtos para Saúde Comercializados


no Brasil: Ventilador Pulmonar.

45
A alimentação dos ventiladores mecânicos acontece por rede elétrica ou baterias
internas com uma duração pequena para locomoção dos pacientes, e uma bateria
externa para casos esporádicos de quedas de energia da rede elétrica, cada máquina tem
um sistema de controle variado, mas em geral são todos similares com funções iguais,
mudando a programação pelo profissional que opera a máquina, nas máquinas mais
sofisticadas possuem interfaces e displays para melhor entendimento e monitoramento
do paciente, além do enviar, armazenar e analisar uma série de medidas e parâmetros
com a ajuda de alarmes e dados sobre os procedimentos e evolução do paciente
(AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2008; CALIL; ET AL,
2002).
Nesse contexto, pode-se analisar que os ventiladores são classificados de várias
formas de acordo com o tipo de ventilação mecânica, ambiente de sua utilização e
a p l i c a ç ã o ( C A L D E R O N R O M E R O , 2 0 0 6 ; C A RVA L H O ; TO U F E N
JUNIOR;FRANCA, 2007).
E as classificações mais utilizadas são:
● Ventilação por pressão negativa: No processo de
inalação, o dispositivo aplica pressão subatmosférica à cavidade
torácica do paciente para expandi-la e criar um gradiente de
pressão negativa, movendo assim o ar para os alvéolos. Ao
mesmo tempo, no processo de expiração, a pressão ao redor do
tórax tende à pressão atmosférica, fazendo com que a cavidade
torácica se contraia e o ar seja expelido dos alvéolos
(Cresto,2021).
● Ventilação por pressão positiva: Uma pressão positiva
acima da pressão atmosférica é gerada e aplicada às vias aéreas
superiores do paciente. Portanto, o gradiente de pressão
necessário para o movimento do ar para os pulmões é
estabelecido (Cresto, 2021).
1.5. VENTILAÇÃO MECÂNICA NÃO INVASIVA
A ventilação mecânica não invasiva (VNI) com pressão positiva como tratamento é
considerada o grande avanço das últimas décadas. Por ser um tipo de suporte
ventilatório parcial, e estar sujeito a interrupções, deve ser direcionada a pacientes
selecionados. A cooperação do paciente é um fator importante para obter sucesso neste
tratamento, essa técnica não deve ser utilizada naqueles que se encontram totalmente
dependentes da ventilação mecânica (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA
SANITÁRIA, 2008).
Os ventiladores específicos para VNI têm como característica principal a presença
de um circuito único, por onde ocorrem tanto a inspiração como a expiração. Um
orifício localizado na porção distal deste circuito é obrigatório para minimizar a
reinalacão de dióxido de carbono CO durante a inspiração apneia, a insuficiência
respiratória decorrente da doença pulmonar intrínseca e a hipoxemia, falência mecânica
do aparelho respiratório, prevenção de complicações respiratórias e redução do trabalho
muscular respiratório (CALIL; et al, 2002).
Nesse procedimento se pode oferecer um suporte ventilatório ao paciente através de

46
uma interface sem que necessite de procedimentos invasivos como IOT, reduzindo
gastos e complicações associadas. Esse método oferece algumas vantagens como
decréscimo do trabalho respiratório, melhoria da ventilação alveolar e padrão
respiratório (CALIL; et al, 2002). Na teoria todo ventilador pode ser utilizado para
aplicação de VNI, entretanto se deve ter em vista que seu desempenho não seja lesado
pela presença de vazamentos. Contudo existem ventiladores específicos para VNI,
caracterizado por um circuito único que realiza os ciclos inspiratórios e expiratórios. É
imperativo que na área distal desse circuito haja um orifício, para minorar a reinalação
do CO (SCHETTINO, et. Al. 2003).
Através desse orifício há um escape de ar constante, auxiliando na eliminação do
CO expirado. Os ventiladores específicos para VNI são projetados para desempenhar
sua função na presença de vazamentos. A boa sincronia, a complacência a vazamentos e
os custos reduzidos são os principais prós para a aquisição desses ventiladores.
(VITACCA et. Al. 2015). Um dos pontos mais importantes na VNI é a escolha da
interface adequada para cada paciente. Há inúmeras interfaces disponíveis atualmente:
máscaras nasais, faciais (oronasais), facial total, capacetes, peças bucais e almofadas
nasais (CALDERON ROMERO, 2006).
Em situações agudas é preferível a utilização das máscaras faciais, mas assim como
as máscaras faciais totais e o capacete, estas são por muitas vezes mal toleradas, por criar
sensação claustrofóbica e suscitam maiores riscos de aspiração de vômitos. Na
ventilação domiciliar as máscaras nasais são preferíveis por todas suas comodidades
como comunicação e a alimentação oral, quando há escape de ar pela boca pode-se
utilizar apoio no mento (parte inferior do rosto), contornando assim a problemática
(CALDERON ROMERO, 2006).
Não existe evidência que recomendem a utilização da máscara oronasal, ao invés da
nasal para pacientes com insuficiência respiratória aguda. Assim, as máscaras que
possuem um orifício de exalação podem diminuir a reinalação de CO , tudo isso se
comparado ao uso de orifícios de exalação no circuito de ventiladores de VNI, capacetes
e as alternativas (CAMPOS; COSTA, 2020).
Os capacetes eliminam o contato da interface com a face do paciente evitando
possíveis complicações da VNI. Além do paciente poder falar, comer ou beber
utilizando o VNI, também ocorre a diminuição de intubações, normalmente utilizado
em pacientes intubados, e o mesmo fornece suporte respiratório sem intubação,
diminuindo a possibilidade de ocorrer infecções hospitalares como pneumonia e a
sinusite (CALIL; et al, 2002).
Para melhores resultados, o uso da VNI requer conhecimentos específicos a fim de
ser eficaz, observando antes o tamanho correto da pronga ou da máscara e o
posicionamento correto para evitar extensiva ou extensão. Nas contraindicações a
utilização da VNI está a instabilidade cardiopulmonar grave, episódios apneicos
intratáveis, anormalidades faciais ou das vias aéreas congênitas e a incapacidade de
proteger uma via aérea (SPADARI; GARDENGHI, 2020). A VNI também não pode ser
usada em pacientes com cirurgia recente do trato gastrointestinal superior e com
traumas ou queimaduras faciais (CALIL; et al, 2002).

47
Figura 4: Esquema ventilação mecânica não invasiva (a) e invasiva (b).

Fonte: Ventiladores e Respiradores Mecânicos. Ministério da Economia, 2021.


Acesso em: 08 de dez. de 2021.

1.6. INSPIRE: VENTILADOR MECÂNICO PULMONAR DE BAIXO CUSTO


DESENVOLVIDO POR ENGENHEIROS DA ESCOLA POLITÉCNICA DA USP
O INSPIRE é um equipamento de suporte respiratório emergencial que atende os
requisitos da ANVISA para oferecer uma alternativa e suprir uma possível demanda
hospitalar causada pela pandemia da covid-19. O equipamento foi projetado e
desenvolvido por pesquisadores da Escola Politécnica da USP (Jornal USP, 2020).
Diferenciais do INSPIRE:
· Equipamento de baixo custo.
· Rápida produção.
· Utiliza tecnologia brasileira.
· Equipamento portátil.
· Possui autonomia de até 2 horas em caso de falta de energia elétrica.
· Não precisa de uma linha de ar comprido para o funcionamento.
· Ideal para a utilização em hospitais de campanha, ambulâncias e regiões
remotas (Poli USP, 2020).
Pesquisas da Escola Politécnica da USP se destacam com três projetos de
ventiladores pulmonares de baixo custo, todos pensados para serem fabricados de forma
rápida e projetados com peças simples, que podem ser adquiridas no País. O objetivo é
abastecer em tempo recorde a demanda no pico da epidemia caso os fabricantes
nacionais não consigam atender aos pedidos de respiradores. O INSPIRE, por exemplo,
permite produzir o equipamento em até duas horas com valor em torno de R$ 1 mil
(Jornal USP, 2020).
Como um projeto emergencial, o Inspire virou realidade em parceria com a Marinha
Brasileira e contou com o apoio de mais de 60 instituições e voluntários, por meio da
Associação de Engenheiros Politécnicos (AEP). Os docentes contaram sobre o processo

48
de criação dos ventiladores, bem como o funcionamento técnico do equipamento, que
teve o funcionamento apresentado aos alunos durante a transmissão; eles ressaltaram a
importância do papel do Engenheiro como agente de mudança e auxílio na sociedade
em momentos de grandes desafios (Poli USP, 2020).
Segundo os professores, por conta do diálogo firmado ao longo de 20 anos com
médicos, matemáticos e físicos, a aplicação dos conceitos em Engenharia se tornou uma
fonte fundamental para resolver impasses inseridos na área da Saúde. “A pandemia não
surgiu apenas como um problema a ser resolvido pela Saúde e, para isso, a Engenharia
deveria se mobilizar e auxiliar a sociedade”, comentou Zuffo. Com grupos de pesquisa
que acompanham a evolução dos computadores ao longo de 50 anos, os responsáveis
desenvolveram as tecnologias necessárias para a fabricação do ventilador pulmonar
(Figura 5) durante um cenário de contingência, ou seja, enquanto enfrentavam a falta de
equipamentos, alta demanda de recursos sanitários e a alta precificação do mercado
(Poli USP, 2020).

Figura 5: Equipamento de Suporte Respiratório Emergencial e Transitório Projeto


INSPIRE.

Fonte: Projeto INSPIRE USP, 2021.


Os professores contam que após a validação dos conceitos, design e aplicação feita
com profissionais da Saúde em serviço à hospitais, a Poli adquiriu o consentimento da
ANVISA para poder distribuir os aparelhos Inspire pelo País. Tendo sido finalizado no
momento em que o Brasil enfrentava a 2ª onda da doença, os primeiros 50 ventiladores
pulmonares foram enviados para Manaus, onde o professor Gonzalez se dirigiu como
voluntário para treinar os profissionais que receberam os aparelhos. “Cidades que
solicitaram auxílio ventilatório à Poli foram atendidas e, no Estado de São Paulo, cerca
de 500 aparelhos foram enviados à hospitais”, comenta (Poli USP, 2020).
Segundo Zuffo, a maioria dos ventiladores doados permanecem até hoje nas
unidades de saúde em que foram destinados, mesmo com a baixa nos casos graves em
leitos de UTI por conta do avanço da vacinação. Os professores contam que o retorno
dos aparelhos à Escola foi baixo porque mesmo antes da pandemia de covid-19, muitos
desses hospitais sequer tinham ventiladores pulmonares, ainda que tivessem de lidar
com doenças que necessitassem de seu uso (Poli USP, 2020).
Segundo Gonzalez, todos os processos que resultaram no projeto final do Inspire
49
partiram do exercício da ética e da multidisciplinaridade, aprendidos desde o começo da
graduação como uns dos conceitos básicos para o exercício da profissão do engenheiro
(Poli USP, 2020).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O tema abordado se remete a um dos principais métodos usados para diminuir os
efeitos do vírus Covid-19 que afetou o mundo ao longo de 2020 e persiste pelo ano de
2021. Efeito este que se refere às complicações que afetam o pulmão dos enfermos,
causando uma insuficiência respiratória, que por meio dos ventiladores pulmonares traz
uma nova chance ao paciente de continuar com as funções básicas de respiração.
Como mencionado, este dispositivo dá a possibilidade da troca de gases que servem
para manutenção dos tecidos dos pulmões, além de retirar a pressão no mesmo por meio
da expiração, assim funcionando como o próprio órgão do paciente. Incansavelmente
usado durante a pandemia, mas não menos importante para pessoas que já sofrem algum
tipo de insuficiência respiratória, este dispositivo teve notoriedade pela alta eficiência
em sua função, possibilitando a recuperação de pacientes com alto grau de debilitação
por conta do vírus.
Pela alta demanda pelo aparelho ao longo da pandemia, várias instituições privadas
e públicas uniram forças para trazer novidades e principalmente reduzir os custos do
aparelho, a fim de tornar o mesmo mais eficiente e mais presente nos hospitais que
agiram na linha de frente do combate ao vírus Covid-19. Esta busca caiu diretamente a
junção de várias áreas onde cada doou uma parcela importante para tais melhorias, com
destaque neste a Engenharia Mecânica, que buscou materiais com menores custos, mas
não menos eficientes e inovações nas formas de manejar e utilizar os ventiladores
pulmonares.
Durante esta adversidade que assolou o mundo, ficou explícito a importância do
estudo das mais variadas áreas, que juntos enfrentaram de forma rápida e eficiente
problemas que seriam bem maiores sem tais propósitos.
REFERÊNCIAS
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em: 08 de dez. de 2021.

51
MULHERES NA GESTÃO DE
TECNOLOGIAS E ENGENHARIA CLÍNICA:
O CASO DOS VENTILADORES PULMONARES NA
COVID-19

Fotini Toscas (1)


Léria Rosane Holsbach (2)
Ana Paula Lemes Jesus dos Santos (3)

RESUMO. O risco iminente do desabastecimento de ventiladores pulmonares nos


serviços de saúde acarretou diversas frentes de trabalho para disponibilizar o maior
número possível desses equipamentos para o tratamento dos pacientes acometidos. O
agravamento da crise sanitária colapsou serviços de saúde com busca isocrônica por
leitos. Em meio ao colapso, foi detectada nova variante da linhagem Sars-CoV-2 e
confirmado o primeiro caso de reinfecção. Entre os pontos críticos, foi destaque a
escassez caótica de oxigênio e taxas de ocupação de leitos em hospitais acima de 90%.
O capítulo relata a participação das autoras nas iniciativas para o enfrentamento da
pandemia de relevância internacional. Também destaca a participação de mulheres
em atividades que são cruciais para responder, em tempo oportuno, às demandas
oriundas de emergências sanitárias. Por meio de método de pesquisa de abordagem
descritiva e exploratória, buscou-se verificar o perfil das mulheres atuantes na gestão
de tecnologias no enfrentamento da pandemia. Destaca-se a pesquisa de 2020 da
Associação Brasileira de Engenharia Clínica (ABEClin) que verificou que apenas
19% dos associados respondentes eram mulheres, enquanto 81% eram do sexo
masculino. Assim, divulgar e dar amplo conhecimento das ações de mulheres nessa
área pode colaborar para o alcance da igualdade de gênero e empoderar todas as
mulheres e meninas.

Palavras-chave: Aprovação de equipamentos. Acesso a medicamentos essenciais e


tecnologias em saúde. Pandemias. Gestão em saúde.

(1) Especialista, Centro de Tecnologias para o SUS – São Paulo (SP), fotini.toscas@isaude.sp.gov.br
(2) Doutora, Associação Brasileira de Engenharia Clínica (ABEClin), leriaholabach@icloud.com
(3) Especialista, Informática em Saúde, Engenharia Biomédica, anapaula.ljsantos@gmail.com

52
1 INTRODUÇÃO: ESCASSEZ DE VENTILADORES PULMONARES
A crise sanitária imposta pela pandemia da Covid-19 tem exigido esforços hercúleos
dos sistemas de saúde. Nesse enfrentamento, veio à tona das discussões a oferta e a
disponibilidade de ventiladores pulmonares, equipamento médico-assistencial crucial
para o atendimento dos casos graves da doença. A assimetria entre a disponibilidade
desses equipamentos ante a demanda histórica mundial gerou disputas entres os países,
com restrições e vedações de exportação, como a Lei nº 13.993/2020, que proibiu a
exportações de ventiladores pulmonares e outros produtos essenciais ao combate à
epidemia de coronavírus no Brasil.
O ventilador pulmonar é um equipamento utilizado para proporcionar a ventilação
pulmonar e artificial. O objetivo é prover suporte ventilatório completo ou parcial em
pacientes que não conseguem respirar por vias normais.
O risco iminente de desabastecimento de ventiladores pulmonares nos serviços de
saúde acarretou diversas frentes de trabalho e forças-tarefas para manter e disponibilizar
o maior número possível desses equipamentos à disposição para o tratamento dos
pacientes acometidos pela doença.
Os esforços foram empregados na escalada da produção nacional, em iniciativas
para realizar manutenção e recuperar o maior número possível de ventiladores
pulmonares, e iniciativas de projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação de novos
equipamentos. Tendo em vista a complexidade tecnológica e operacional desses
equipamentos, surgiu a necessidade de destacar a importância da atuação dos
profissionais de gestão de tecnologias em saúde e da engenharia clínica.
O agravamento da crise sanitária, em janeiro de 2021, colapsou serviços de saúde
com busca isocrônica por Unidades de Terapias Intensivas (UTI). Em meio ao colapso,
a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) detectou nova variante da linhagem Sars-CoV-2 e
confirmou o primeiro caso de reinfecção pelo novo coronavírus no estado do Amazonas.
Entre os pontos críticos, foram destaque: a escassez caótica de oxigênio e as taxas de
ocupação de leitos de UTI acima de 90%, Lobato (2021).
A extrema urgência no abastecimento das unidades de saúde provocou ações
conjuntas entre a sociedade civil e o poder público. Entre elas, destacou-se, inclusive em
âmbito nacional, a “SOS AM” - SOS Amazonas. A ação proveu retorno ágil à população
(individual, com fornecimento e abastecimento de cilindros) e prioritariamente à rede
de saúde, Mansueto (2021). Um diferencial na ação foi a agilidade dos processos e a
mobilização já no início de profissionais de engenharia clínica. Esses profissionais
participaram de todo o processo, desde a aquisição até a instalação de equipamentos
médicos, principalmente ventilador pulmonar, além da atuação na análise contingencial
para suprir o oxigênio, prestando suporte técnico na aquisição e gestão tecnológica de
concentradores e usinas de oxigênio.
2 GESTÃO DE TECNOLOGIAS E ENGENHARIA CLÍNICA
A gestão de tecnologias em saúde é definida na Política Nacional de Gestão de
Tecnologias em Saúde (PNGTS), publicada em 2011 pelo Ministério da Saúde, como
um conjunto de atividades gestoras relacionadas com os processos de avaliação,
incorporação, difusão, gerenciamento da utilização e retirada de tecnologias do sistema
de saúde. Esse processo deve ter como referenciais as necessidades de saúde, o

53
orçamento público, as responsabilidades dos três níveis de governo e do controle social,
além dos princípios de equidade, universalidade e integralidade, que fundamentam a
atenção à saúde no Brasil.
Já a engenharia clínica pode ser definida como o ramo da engenharia dedicado a
auxiliar e mesmo interferir na área da saúde, com o intuito de alcançar bem-estar,
segurança, redução de custos e qualidade nos serviços disponíveis aos pacientes e à
equipe multidisciplinar do hospital, por meio da aplicação dos conhecimentos
gerenciais e de engenharia à tecnologia da área de saúde. Esses profissionais agem em
todo o ciclo de vida das tecnologias da saúde, desde a Pesquisa, Desenvolvimento e
Inovação (PD&I), gerenciamento da tecnologia médico-hospitalar, avaliação de
tecnologias em saúde, incorporação e aquisição de tecnologias, gestão regulatória e
acesso de mercado.
3 O PAPEL DAS MULHERES NA ENGENHARIA CLÍNICA
A atuação das mulheres na área de gestão de tecnologias e engenharia cresce
paulatinamente. No que tange à engenharia, principalmente nas atuações em campo e
cargos de alta gestão, ainda é correlacionada com atuações masculinas; o que torna a
abordagem do tema de maior relevância ao destaque das mulheres na área de engenharia
clínica, Lombardi (2017).
Para discutir o tema, realizou-se uma pesquisa, por meio de formulário eletrônico
detalhado na seção de Métodos, para conhecer e compreender a participação das
mulheres nas áreas de ciência e saúde, com foco em engenharia clínica. Foram
respondidos 102 formulários, em que após refinamento, foram validados 88 destes.
Após novo refinamento, obtiveram-se 81 formulários de mulheres com curso superior
que estavam atuando com o uso de tecnologias para a saúde no apoio à pandemia de
Covid-19. Destas, apenas 56 realizaram o Curso de Especialização em Engenharia
Clínica.
Em 2020, a Associação Brasileira de Engenharia Clínica (ABEClin) realizou
pesquisa com o objetivo de conhecer o salário de seus associados (todos que trabalham
com engenharia clínica). Um dos questionamentos foi o sexo, e apenas 19% dos
associados que responderam o formulário eram mulheres, enquanto 81% eram do sexo
masculino, de um universo de 261 formulários respondidos. Isso permite dizer que o
número de mulheres na engenharia clínica, ou seja, que atuam com tecnologias da saúde
é inferior de forma significativa ao sexo masculino, ABEClin (2020).
Na atuação direta para o enfrentamento da pandemia, a ABEClin, em parceria com o
Ministério da Saúde, o Ministério da Economia e o Serviço Nacional de Aprendizagem
Industrial (Senai), realizou um levantamento de voluntários para atuar na força tarefa
para manutenção de ventiladores pulmonares, SENAI (2020) e ABEClin – Links e
documentos Covid-19 (2020), em que, do total de 118 voluntários profissionais,
somente 20% eram mulheres.
É de suma importância destacar a participação de mulheres em atividades que são
cruciais para responder, em tempo oportuno, às demandas oriundas de emergências
sanitárias. Registrar e evidenciar a atuação de mulheres na gestão tecnológica com
vistas ao alcance, estímulo e recrutamento de maior participação de mulheres nas
atividades de engenharia clínica e gestão de tecnologias em saúde.

54
PESQUISAS REALIZADAS
O método de pesquisa escolhido para o levantamento dos dados foi descritivo e
exploratório para atender a uma questão específica por meio de buscas na literatura.
Nesse caso, a questão à qual se pretende responder corresponde à Covid-19.
A busca na literatura foi feita na base de dados disponíveis no sítio eletrônico do
Ministério da Saúde, com os dados da resposta brasileira ao enfrentamento do novo
coronavírus, e da página eletrônica da ABEClin, com as atividades de suporte à Covid-
19. Foram verificadas as ações registradas, além de pesquisadas cinco perguntas
fechadas entre abril e julho de 2020 utilizando os descritores combinados pelo operador
lógico “Covid-19” e “ventilador pulmonar”. O símbolo de asterisco foi empregado para
incluir na pesquisa o termo no plural. Os termos foram buscados no campo que inclui na
pesquisa os trabalhos que possuem o termo no título, resumo ou palavras-chaves,
possibilitando a localização de um maior número de documentos. Foi encontrado um
total de cinco documentos. O quadro 1 mostra a distribuição dos artigos encontrados, e o
quadro 2, as referências das buscas realizadas.
A pesquisa foi limitada para apenas artigos científicos, em que foi obtido um total de
13 documentos. Após, foi realizada a leitura do título, do resumo e das palavras-chave
de todos os trabalhos, em que foram selecionados cinco artigos, classificando-os
conforme o objeto de estudo. A pesquisa pode ser classificada como de natureza
aplicada, pois tem por objetivo gerar conhecimentos para aplicação prática. Quanto à
abordagem, a pesquisa é tanto qualitativa quanto quantitativa, pois envolve um
aprofundamento da compreensão de uma organização ao mesmo tempo que recorre à
linguagem matemática para descrever as causas de um fenômeno. A utilização conjunta
das pesquisas qualitativa e quantitativa permite obter mais informações do que se
fossem feitas de forma isolada, corroborando as experiências práticas das autoras nos
processos de gestão de tecnologias. O objetivo é proporcionar maior familiaridade com
o problema com vistas a torná-lo explícito ou a construir hipóteses, e de procedimento
bibliográfico, elaborada com base em material já publicado, Fonseca (2002) e Gil
(2010).

Quadro 1. Lista dos artigos utilizados no estudo.


Título Referência
Dispõe sobre a proibição de exportações de produtos médicos, Brasil. Lei nº 13.993, de
hospitalares e de higiene essenciais ao combate à epidemia de 23 de abril de 2020.
coronavírus no Brasil.
Política Nacional de Gestão de Tecnologias em Saúde (PNGTS). Brasil (2011).
Mulheres em carreiras de prestígio: conquistas e desafios à Lombardi (2017).
feminização. Cadernos de Pesquisa v. 47 n. 163 p.10-14
jan./mar. 2017.
Assessing the impact of coordinated COVID-19 exit strategies Ruktanonchai et al (2020).
across Europe.
Deep immune profiling of COVID-19 patients reveals distinct Mathew et al (2020).
immunotypes with therapeutic implications.
Fonte: Elaboração própria.
55
Quadro 2. Levantamentos de dados
Levantamento de Dados Referência
Ministério da Saúde – Brasil https://coronavirus.saude.gov.br/resposta-
brasileira-a-emergencia
Associação Brasileira de Engenharia http://www.abeclin.org.br/post.php?p=213
Clínica (ABEClin)

Fonte: Elaboração própria.


O relato (quadro 3) apresenta as recentes experiências das autoras em iniciativas
para o enfrentamento da pandemia da Covid-19, na gestão tecnológica do ventilador
pulmonar considerado equipamento essencial para o combate da pandemia.
De maneira complementar, foi realizada pesquisa entre 15 de julho 2020 e 15 de
agosto 2020, aplicada por meio da plataforma Google Forms, com o propósito de
conhecer e compreender a atuação das mulheres nas áreas de ciência e saúde, com foco
em engenharia clínica e a atuação na pandemia de Covid-19. O formulário foi elaborado
por meio da ferramenta on-line Google Forms, com perguntas semiabertas. O link foi
encaminhado às profissionais da área de engenharia clínica e divulgado nas mídias
digitais (Instagram, Facebook, LinkedIn, WhatsApp e Telegram) da ABEClin, grupos
de engenharia clínica no Facebook e WhatsApp, nos links
https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSdpvD8fy8MZ0jyP0Uc6r0z5CshvdkvD
Agt7x9KRRjYCWVJ03A/viewform?usp=sf_link e https://forms.
gle/CzRVWEe1gtYepcrM8.
A pesquisa foi limitada a 102 formulários. Após, foi realizado um refinamento em
que foram selecionados 88 formulários, classificando-os conforme o objeto de estudo.
Os demais formulários foram excluídos da pesquisa por não tratarem de informações
consistentes.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os relatos relacionados referem-se às atividades realizadas na esfera do governo
federal, nos serviços de saúde e em associação de classe de engenharia clínica. Na esfera
federal, para subsidiar e contribuir para a escala produtiva da indústria nacional de
ventiladores pulmonares, foi realizado estudo inicial do mercado com o mapeamento
dos registros sanitários válidos de fornecedores nacionais e internacionais com
configurações técnicas requeridas para o tratamento da Covid-19, contendo o
levantamento dos dados com os principais gargalos no processo de produção nacional e
a identificação dos componentes críticos, além das informações sobre a capacidade
produtiva.
A escala produtiva exigiu esforços governamentais, arranjos empresariais e
industriais, arranjos financeiros e estudos de situações patentárias. O objetivo da
escalada é promover o aumento exponencial da produção mensal das indústrias
nacionais, com registros sanitários válidos de ventiladores pulmonares, para atender à
demanda assistencial em crescimento exponencial.
Além das iniciativas envidadas para a escala produtiva dos ventiladores pulmonares
já consagrados no mercado nacional, a atuação na gestão de tecnologias amparou as
ações governamentais para apoiar projetos de PD&I de novos ventiladores pulmonares.

56
Destaca-se a importância desse processo, já que o projeto de desenvolvimento requer
especificações técnicas e dados de entradas específicos, além da gestão de riscos com as
análises dos componentes, em atenção à gravidade pulmonar dos pacientes em
tratamento da Covid-19. Os projetos devem obrigatoriamente observar os aspectos de
regularidade sanitários, porém, dada a complexidade do equipamento, outros aspectos
devem ser analisados para disponibilização nos serviços de saúde, como características
do gerenciamento da tecnologia durante todo o ciclo de vida, como treinamento,
manutenção, assistência técnica, peças de reposição, fornecimento dos consumíveis,
desativação e descarte. Ressalta-se que o ventilador pulmonar é tecnologia operador-
dependente, cujas características de usabilidade, treinamento, interface são
consideradas para minimizar a curva de aprendizado. A fim de otimizar os recursos
públicos, são observadas as versatilidades das configurações para que os ventiladores
pulmonares possam ser aproveitados nos serviços de saúde em outras condições clínicas
no período pós-pandemia. Assim, foram realizadas análises dos projetos com prontidão
tecnológica e passíveis de escalonamento tendo como desafio transformar os protótipos
viáveis e funcionais, com as orientações de aspectos regulatórios, e técnico-
operacionais, com os critérios mínimos que assegurem a qualidade e segurança dos
ventiladores pulmonares.

Quadro 3. Relatos de experiência na pandemia


Relatos de experiências na Pandemia com o
suporte técnico das engenheiras clínicas Observação
R1 – Relato 1 – A engenharia clínica proveu As montadoras automobilísticas e a Rede
s u p o r t e t é c n i c o p a r a a s m o n t a d o r a s Senai estão realizando o trabalho de
automobilísticas montarem os laboratórios para forma voluntária
consertar os ventiladores pulmonares e consultoria
técnica voluntária para os processos de consertos e
reparos.
R2 – Relato 2 – Participação de engenheiros Mídias digitais da ABEClin
clínicos (pessoa física e jurídica) no conserto de (Instagram/Facebook/LinkedIn/Grupo
ventiladores pulmonares. Captação de voluntários oficial do WhatsApp e Telegram
com o conhecimento técnico sobre ventiladores. Ministério da Saúde – Brasil
Ministério da Economia – Brasil
R3 – Relato 3 – Participação da Gestão de Ministério da Saúde – Brasil
Tecnologias para mapear o mercado e estudo Ministério da Economia – Brasil
setorial de ventiladores pulmonares para subsidiar
ações de escalada produtiva
R4 – Relato 4 – Participação da Gestão de Ministério da Saúde – Brasil
Tecnologias no acompanhamento de projetos de Ministério da Ciência, Tecnologia e
pesquisa, desenvolvimento e inovação de novos Inovação – Brasil
ventiladores pulmonares Ministério da Economia – Brasil
Agência Brasileira de Desenvolvimento
Industrial – ABDI
Agência Nacional de Vigilância Sanitária
– Anvisa

Fonte: Elaboração própria.

57
Segundo Ruktanonchai et al (2020), a atuação da gestão de tecnologias também
colaborou nos processos para avaliação comparativa das especificações técnicas dos
ventiladores pulmonares, cujo corroborado por meio de referências técnicas como o
documento Technica lspecifications for invasiveand non invasive ventilators for Covid-
19 Interim guidance, publicado em 15 de abril de 2020, pela Organização Mundial da
Saúde (OMS). A avaliação se estendeu aos projetos de desenvolvimento de ventiladores
pulmonares com prontidão tecnológica com o objetivo de apoiar avaliações precoces de
novas tecnologias, além de contribuir tecnicamente nas análises referentes às medidas
tributárias para alterações tarifárias, restrições às exportações dos equipamentos críticos
para enfrentamento da pandemia.
Outro considerável fato foi a análise técnica de ventiladores desenvolvidos em
parceria entre indústria e poder público. A indústria buscou relação custo x benefício
para produção em escala, o que demonstrou o notório diferencial na avaliação por um
especialista na área de engenharia clínica. Nesse exemplo, a análise confirmou que o
equipamento desenvolvido não teria mercado para consumo em médio e longo prazo.
Outra participação em destaque é na força-tarefa para manutenção dos ventiladores
pulmonares, que reuniu mais de 500 engenheiros e técnicos capacitados voluntários,
mais de 21 parceiros, e foi distribuída por toda a federação pronta para prestar o suporte
necessário para recolocar em operação o maior número de ventiladores pulmonares.
Estima-se que estavam fora de operação 3,6 mil ventiladores pulmonares que impactam
nos serviços de saúde, sendo mais de 2 mil equipamentos recuperados por essa
iniciativa, SENAI (2020) e ABEClin – Links e documentos Covid-19 (2020).
Na ação da força-tarefa, a ABEClin participou com duas relevantes linhas de frente:
na captação de voluntários profissionais (pessoa física e jurídica) e na orientação às
entidades responsáveis na preparação do local para a realização da manutenção dos
ventiladores pulmonares. A orientação ocorreu em toda a cadeia de processo, desde o
recolhimento dos equipamentos nos Estabelecimentos Assistenciais de Saúde (EAS),
recebimento no local da manutenção, higienização, manutenção, calibração até o
retorno. Já foram devolvidos mais de 1.500 ventiladores pulmonares.
A captação de voluntários ocorreu totalmente on-line por meio das mídias digitais da
ABEClin (Instagram/Facebook/LinkedIn/ Grupo oficial WhatsApp e do Telegram). A
relação dos voluntários foi encaminhada ao Ministério da Saúde e ao Ministério da
Economia para operacionalização da força-tarefa, ABEClin – Links e documentos
Covid-19 (2020).
Os comunicados de orientação para as empresas terceirizadas para serviços de
engenharia clínica e profissionais no manejo do ventilador pulmonar, a busca de troca de
experiência internacional com os demais colegas da área e a atuação constante no
combate à desinformação também foram destaque.
Entre tantas trocas de experiências internacionais, ressalta-se a entrevista realizada
com a Associação Italiana de Engenharia Clínica (Associazione Italiana Ingegneri
Clinici – AIIC) em março de 2020. A realização das manutenções preventivas e
corretivas dos equipamentos médicos, principalmente utilizados na UTI, foi uma das
principais orientações de nossos colegas italianos. Outro ponto de relevância na
entrevista foi a orientação para a engenharia clínica brasileira aproveitar a oportunidade
de informação antecipada em um momento com dados escassos para a tomada de
decisão, sendo um diferencial para a preparação dos profissionais no enfrentamento da
58
Covid-19.
O estado emocional foi uma das preocupações; parcerias com entidades por meio de
projetos como a escuta ativa colaboraram para proporcionar alívio aos profissionais nos
serviços de saúde.
Na análise e no tratamento dos dados da pesquisa realizada com os 88 formulários
válidos, foi possível verificar que 81 mulheres possuíam curso superior e estavam
atuando na gestão de tecnologias para a saúde no apoio à pandemia de Covid-19.
Quanto à formação acadêmica, observou-se que 56 responderam que tinham o Curso de
Especialização em Engenharia Clínica, 2 com formação em cursos técnicos de nível
médio e 5 não informaram. Em relação ao tempo de formação, menos de 1 ano foi
17,11%; já entre 1 ano e 5 anos de formada, foi obtido 14,47%; e acima de 5 anos,
28,95%. Em relação ao tempo de atuação até 1 ano, 15,91%; entre 1 ano e 5 anos,
28,41%; e acima de 5 anos, 46,59%. Os locais de atuação mais significativos foram em
serviços de saúde, 56,03%; empresas privadas, 21,28%; área pública, 9,22%; e área
acadêmica, 5,67%.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A crise causada pela pandemia do novo coronavírus humano despontou as
discussões para a necessidade de profissionais que atuem na gestão de equipamentos
médico-hospitalares em todas as esferas de gestão – e, especialmente, nos serviços de
saúde. Esses profissionais, operantes em gestão de tecnologias e engenharia clínica,
ainda são, em sua maioria esmagadora, homens. A participação das mulheres nesses
cenários é altamente relevante, muito embora ainda tímida pelo pouco espaço ocupado.
Divulgar e dar amplo conhecimento as ações de mulheres nessa área, criar ambientes
favoráveis e estimular para que os espaços das engenharias de saúde e cargos de gestão
possam ser ocupados por mulheres em posição de igualdade colaboram para o
cumprimento do Objetivo 5 da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável:
alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas.
REFERÊNCIAS
Associação Brasileira de Engenharia Clínica. Links e documentos covid-19. Disponível em:
http://www.abeclin.org.br/post.php?p=213. Acesso em: 15/06/2020.
Associação Brasileira de Engenharia Clínica. Pesquisa Salarial 2020. Disponível em:
http://www.abeclin.org.br/post.php?p=160. Acesso em: 19/05/2021.
Brasil. Ministério da Saúde. Política Nacional de Gestão de Tecnologias em Saúde. 1. ed., 1.
reimpr. Brasília, DF: MS; 2011. 48 p.
Brasil. Lei nº 13.993, de 23 de abril de 2020, que dispõe sobre a proibição de exportações de
produtos médicos, hospitalares e de higiene essenciais ao combate à epidemia de coronavírus
no Brasil. Diário Oficial da União. 24 Abr 2020.
Fonseca JJS. Metodologia da pesquisa científica. Fortaleza: UEC; 2002.
Gil AC. Como elaborar um projeto de pesquisa. São Paulo: Atlas; 2010.
Lobato F. Amazonas: Fiocruz detecta nova linhagem da Sars-CoV-2 e estado sofre com falta de
oxigênio. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/noticia/amazonas-fiocruz-detecta-nova-
linhagem-da-sars-cov-2-e-estado-sofre-com-falta-de-oxigenio. Acesso em: 19/05/2021.
Lombardi MR. Mulheres em carreiras de prestígio: conquistas e desafios à feminização. Cad.
Pesq. 2017; 47(163):10-14.

59
Mansueto LF. Cecon inaugura usina de oxigênio doada pelo SOS AM. Disponível em:
http://www.saude.am.gov.br/visualizar-noticia.php?id=6009. Acesso em: 19/05/2021.
Mathew D, Giles JR, Baxter AE, et al. Deep immune profiling of COVID-19 patients reveals
distinct immunotypes with therapeutic implications. Science. 2020; 369(6508): eabc8511.
Portal da Indústria. Senai e indústrias fazem manutenção de respiradores mecânicos.
Disponível em: http://www.portaldaindustria.com.br/canais/industria-contra-covid-
19/iniciativas/senai-e-industrias-fazem-manutencao-de- -respiradores-mecanicos/. Acesso em:
15/06/2020.
Ruktanonchai NW, Floyd JR, Lai S, et al. Assessing the impact of coordinated COVID-19 exit
strategies across Europe. Science. 2020; 369(6510):1465-1470.
World Health Organization. Technical specifications for invasive and non-invasive ventilators
for COVID-19: Interim guidance. Genebra: World Health Organization; 2020. Disponível em:
https://apps.who.int/iris/handle/10665/331792. Acesso em: 15/06/2020.

60
GEOTECNOLOGIAS APLICADAS NO
MAPEAMENTO DA COVID-19 NA REGIÃO
NORDESTE DO BRASIL

José Lindemberg Bernardo da Silva (1)


Franklin Roberto da Costa (2)

RESUMO. O uso das Geotecnologias vem tornando-se mais presente para obtenção
de informações visando a elaboração de pesquisas voltadas para a representação
espacial dos variados temas, para diversas áreas do conhecimento. O objetivo central
desse trabalho é apresentar a utilização das geotecnologias, especificamente a
representação cartográfica, no mapeamento e divulgação dos casos de Covid-19 na
Região Nordeste do Brasil. Nesse sentido, realizamos um levantamento de base
bibliográfica referente aos temas propostos, além de construirmos um Banco de
Dados Geográficos – BDG com informações disponibilizadas pelas Secretarias de
Saúde de cada estado da região Nordeste, bem como do Ministério da Saúde, referente
aos casos suspeitos, descartados, confirmados e óbitos, e, ao final, apresentamos as
formas de divulgação dessas informações pelos governos estaduais da região em
estudo. A pesquisa evidenciou que não há uma padronização da disponibilização das
informações acerca do novo Coronavírus, pois cada Estado, na Região Nordeste, faz
uso de metodologias e ferramentas geotecnológicas distintas. Diante disso, observou-
se que a transparência e a compreensão dos dados, em alguns casos, não se dão por
completo. Por fim, entende-se que o uso das geotecnologias, quando utilizadas de
forma padronizadas, auxiliam gestores públicos e privados na tomada de decisões
coletivas. Nesse sentido, propôs-se um modelo de divulgação de dados e informações
sobre os casos de COVID-19.

Palavras-chave: SIG. Mapas. Pandemia. Nordeste. Cartografia.

(1) Mestre em Planejamento e Dinâmicas Territoriais no Semiárido (PLANDITES/UERN), Faculdades


Integradas do Ceará (UniFIC), bergbernardo.s@gmail.com.
(2) Doutor em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA/RN), Universidade do Estado do Rio
Grande do Norte (UERN), franklincosta@uern.br.

61
1 INTRODUÇÃO
No decorrer dos últimos meses, o mundo vivencia um surto de um vírus que tem
provocado enormes prejuízos socioeconômicos, em especial aos sistemas econômicos e
da saúde, decorrente do alto índice de mortalidade, principalmente em países
desenvolvidos, como é o caso da Itália, da China e, recentemente, da Espanha, se
estendendo para os países localizados em outros continentes, a exemplo do Brasil.
Segundo o Ministério da Saúde no Brasil (2020), o Coronavírus se apresenta como
um grupo familiar de vírus que provocam infecções respiratórias. Sendo que um novo
agente desse grupo foi descoberto em 31 de dezembro de 2019, depois de casos
registrados na China, especificamente na cidade de Wuhan, província de Hubei. Para
essa doença denominou-se novo coronavírus (COVID-19).
O Centro de Ciências e Engenharia de Sistemas (CSSE) da Universidade Johns
Hopkins, nos Estados Unidos (2020), até a data do dia 13 de abril de 2020, apresentou
dados que mostraram o número de 1.850.220 casos confirmados e o número de óbitos
chegavam a 114.185 em todo o globo terrestre. No Brasil, em relação a mesma data,
segundo o Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública do Ministério da
Saúde (2020), o número de casos confirmados chegava a 22.169, onde houveram 1.223
óbitos.
Nesse contexto, procuramos delimitar o espaço de análise para a Região Nordeste
brasileira, já que o objetivo principal do trabalho é apresentar o uso das geotecnologias
no mapeamento da COVID-19 para essa região, expondo as formas de aquisição e
disponibilização dos dados a partir de cada estado que a compõe. A partir de então,
caracterizamos a região, de forma sucinta, para compreendermos o objeto da pesquisa,
ou seja, as 09 (nove) Unidades Federativas, considerada a segunda maior região do
Brasil, representando 18% do território nacional (IBGE, 2010).
Em relação a distribuição territorial de casos confirmados da COVID-19 e óbitos
causados nessa região até o dia 27 de abril de 2020, encontra-se com o número de 19.427
casos confirmados e 1.200 óbitos, onde o primeiro número representa 29,3% e o
segundo representa 28,5% do total de casos e óbitos confirmados a nível nacional,
segundo o último Boletim Epidemiológico divulgado no dia 27 de abril de 2020, pelo
Ministério da Saúde.
Sabendo que os dados e informações citados acima são atualizados diariamente,
torna-se necessário a utilização de ferramentas que permitam a rápida manipulação e
plotagem dessas informações. Assim, o uso das geotecnologias é imprescindível para
tal, já que, de acordo com Ferraz (et al 2015), “são um conjunto de tecnologias para
coleta, processamento, análise e disponibilização de informações”, ou seja, são
ferramentas que possibilitam a análise da realidade que “está sujeita a contínuas
mudanças que modificam, rapidamente, a projeção territorial dos fenômenos
econômicos e sociais” (MOURA, 2014, p.12). Através disso, a realidade espacial pode
ser representada cartograficamente, facilitando o entendimento e compreensão das
informações, de acordo com objetivos traçados pela pesquisa.
O artigo apresenta a estrutura como segue. Após essa introdução, a próxima Seção
aborda a metodologia traçada e as técnicas utilizadas para a construção do artigo. A
Seção 3, expõe os resultados obtidos da pesquisa e, logo, a discussão articulada a um
referencial teórico. A Seção 4 traz as considerações finais e, por fim, a Seção 5 traz as
62
referências bibliográficas utilizadas durante o percurso da construção desse trabalho.
2 METODOLOGIA
A pesquisa foi entendida e elaborada a partir de uma metodologia capaz de
promover e desenvolver uma discussão quanti-qualitativa. Para tanto, realizamos um
levantamento de base bibliográfica referente aos temas propostos, além de construirmos
um Banco de Dados Geográficos – BDG com informações disponibilizadas pelas
Secretarias de Saúde de cada estado da região Nordeste, bem como do Ministério da
Saúde, referente aos casos suspeitos, descartados, confirmados e óbitos, e, ao final,
representamos cartograficamente as informações coletadas.
Para a elaboração dos mapas foi utilizado o software QGIS 3.4 Madeira. O Sistema
de Informações Geográficas - SIG possui um Banco de Dados Geográficos – BDG que
foi alimentado com os dados supracitados e a base cartográfica vetorial foi obtida no site
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2017). O BDG e o arquivo
vetorial foram estruturados no SIG, com o Sistema de Projeção Geográfica, Datum
horizontal SIRGAS 2000, com Meridiano Central 39ºW.
Após estruturação do projeto, fez-se uma classificação intervalar (graduada) em
ambiente SIG, utilizando o método quantil, que permite agrupar os dados pelo número
de classes pré-determinados que contém um número igual de observações. Nesse
método de classificação, os dados à serem classificados foram, inicialmente, ordenados
e foi encontrado o valor da mediana. Logo após, os subconjuntos acima e abaixo da
mediana foram subdivididos.
Os dados foram agrupados para a elaboração final do mapa. Para tanto, seguimos
para o compositor de impressão para inserir os elementos básicos do mapa (escala,
coordenadas geográficas, legendas, fonte, título e norte geográfico).
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
O novo Coronavírus (covid-19) e a sua rápida disseminação
Nos últimos meses, o mundo foi pego de surpresa com a descoberta de casos de uma
contaminação viral, cujo o vírus está ligado a família Coronavírus (Cov). A
denominação do novo Coronavírus foi algo que possibilitou determinadas discussões
entre cientistas e autoridades em todo o mundo.
Os primeiros casos dessa contaminação se deram na cidade de Wuhan, província de
Hubei, na China. A partir disso, segundo o Panorama Farmacêutico (2020), o vírus ficou
denominado como “2019-nCov”. No entanto, devemos levar em consideração que o
termo já não é mais utilizado por cientistas. De acordo com a Organização Mundial da
Saúde (2020), para evitar confusão dentre a compreensão dos vírus que compõe a
família Coronavírus, o descoberto é taxado como Sars-Cov-2, uma sigla inglesa que
significa “Severe acute respiratory syndrome coronavirus 2”, sendo traduzida para o
português com a seguinte definição: Síndrome Respiratória Aguda Grave do
Coronavírus 2. O numeral 2 (dois) é atribuído pelo fato de que já existe um vírus
semelhante, o Sars-Cov-1 (ou apenas Sars). Esse que foi responsável pela epidemia na
China no ano de 2002, além do Mers (também integrante da dessa família viral), que
atingiu o Oriente Médio no ano de 2012.
O termo COVID-19 é o nome oficial do novo Coronavírus, utilizado por toda

63
população ao designar-se ao vírus que se remete ao Sars-Cov-2. Nesse contexto, de
acordo com Ferreira (et al 2020), a rápida e momentânea disseminação do vírus pelo
mundo, em conjunto à sua gravidade, levou o Diretor-Geral da Organização Mundial da
Saúde (OMS), o Dr. Tedros Adhanom Ghebreyesus, em um dos seus discursos, no dia
11 de março de 2020, a caracterizar a situação como uma Pandemia.
De acordo com o Ministério da Saúde do Brasil (2020), a forma de contaminação é
através do contato físico direto ou indireto com pessoas ou objetos infectados. Os
sintomas desenvolvidos pela COVID-19 podem variar por um simples resfriado até o
desenvolvimento de uma pneumonia severa. Os sintomas mais comuns são: tosse,
febre, coriza, dor de garganta e, em estados mais críticos, uma persistente dificuldade
respiratória. Além disso, Strabelli e Uip (2020) nos diz que 5% dos casos acometidos
pelo novo Coronavírus, dentre os sintomas observados, podem persistir-se a dispneia, o
sangramento pulmonar, a linfopneia grave e a insuficiência renal.
A partir do dia 31 de dezembro de 2019, após pronunciamentos do governo chinês,
ao relatar os primeiros registros da COVID-19, novos casos começaram a ser
notificados e o processo de disseminação ocorreu de forma intensa para países europeus,
tais como a França, a Itália, a Espanha, entre outros. Países considerados
economicamente desenvolvidos, mas, que sofreram grandes impactos dentro dos seus
sistemas econômicos e de saúde, além do alto número de óbitos registrados, no caso da
Itália, onde no dia 27 de março de 2020, atingiu o número de 919 óbitos chegando a
recorde em um único dia, seguida pela Espanha que, em 24 horas, contabilizou o total de
769 óbitos (Portal G1, 2020).
Devido aos avanços da globalização, o fluxo de entradas e saídas de pessoas e
mercadorias em países, além do contínuo progresso do capital econômico ligado ao
turismo e até mesmo as pontes de interligação continental unindo espaços, outrora
segregados (SANTOS, 2012), permitiram que a propagação do vírus atingisse todos os
continentes do planeta, preocupando autoridades e toda população mundial.
Nesse contexto, ao tratarmos sobre o Brasil, país que, de acordo com Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatísticas (2020), apresenta uma população de
aproximadamente 211,4 milhões de habitantes, o fluxo de entrada e saída de pessoas no
país é considerável e, logo, o primeiro caso da COVID-19 no país foi confirmado.
Segundo o Ministério da Saúde (2020), foi no estado de São Paulo, no dia 26 de
fevereiro de 2020, onde um senhor de 61 anos de idade, com histórico de viagem para
Itália, apresentou alguns dos sintomas e, procurando ajuda hospitalar, fizeram os
devidos exames. Esse exame se dá através de biologia molecular, capaz de mostrar se
indivíduo está contaminado pela COVID-19 ou outras doenças, como a Influenza ou a
presença de Vírus Sincicial Respiratório (VSR), e o exame Imunológico (conhecido
como teste rápido), que pode detectar, ou não, a presença de anticorpos em amostras
coletadas. Porém, pode ser feito apenas após o sétimo dia de início dos sintomas.
Com a rápida movimentação de pessoas entre as diversas regiões do país, além da
chegada de várias outras advindas de países com casos confirmados, o número de casos
suspeitos e confirmados da COVID-19 no Brasil vai aumentando dia a dia. De acordo
com o Painel “CORONAVÍRUS//BRASIL” (2020), criado pelo Ministério da Saúde
para disponibilização de informações acerca do novo Coronavírus e outras doenças
virais, entre o dia 26 de fevereiro e 15 de abril de 2020, o número atingido foi de 28.320
casos confirmados. Apenas no 14 de abril, o Brasil registrou o total de 3.058 novos
64
casos. Sendo, que, o primeiro óbito causado pelo vírus no Brasil, foi registrado no dia 17
de março de 2020. Para essa variável, até o dia 15 de abril do mesmo ano, o número de
óbitos chegou a 1.736, sendo esses números distribuídos em todo o território nacional.
A região Nordeste do Brasil, segundo o IBGE (2010), representa cerca de 18% do
território do país, com uma população de aproximadamente 53,1 milhões de habitantes,
distribuídos em 9 (nove) estados, que são: Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do
Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia. Nela, o primeiro caso
confirmado da COVID-19 foi notificado e registrado pela Secretária de Saúde do estado
da Bahia (Sesab, 2020), no dia 06 de março. A partir de então, o número de casos
confirmados vem aumentando diariamente. Até o dia 15 de abril de 2020, a Região
Nordeste totalizava, segundo o Ministério da Saúde (2020), 5.831 casos confirmados
(20,6% do total nacional) e, dentre esses, o total de 377 óbitos causados pelo vírus, onde
o primeiro registrado ocorreu no dia 25 de março de 2020, no estado do Pernambuco
(SES-PE, 2020).
Com o alto índice de propagação de casos suspeitos, confirmados e óbitos
desencadeados pelo novo Coronavírus, o Ministério da Saúde e as Secretarias Estaduais
de Saúde buscaram desenvolver meios e técnicas para facilitar a divulgação de dados e
informações referentes a COVID-19, seja através de sites governamentais oficiais ou
redes sociais, buscando conscientizar a população, atualizar os números de casos e
óbitos e, apresentar a distribuição territorial do vírus através de representação
cartográfica ou apenas pelo Boletim epidemiológico.
No entanto, veremos como os estados que integram a Região Nordeste do Brasil
utilizam-se das geotecnologias para disponibilizar as informações coletadas acerca da
COVID-19.
Distribuição e divulgação das informações acerca da Covid-19 no Nordeste do Brasil
A rápida disseminação da COVID-19 fez com que instituições internacionais, como
a Organização Mundial da Saúde (OMS), grupos de pesquisas científicas e Órgãos do
Poder Executivo Federal e Estadual, como é o caso do Ministério da Saúde e as
Secretarias Estaduais de Saúde, buscassem desenvolver métodos para aquisição e
apresentação de informações sistematizadas, proporcionando a facilidade de
compreensão do exposto para a sociedade geral, além de manter a transparência dentro
dos portais de informações.
Segundo Ministério da Saúde do Brasil (2017), a estrutura do sistema de saúde do
país está subdividida. O órgão maior, o Ministério da Saúde, que formula, normatiza e
fiscaliza a nível nacional; em seguida vem as Secretarias Estaduais de Saúde (SES), que
participa do planejamento, controle e execução de ações nos serviços de saúde de cada
estado e, por seguinte, vem as Secretarias e Conselhos Municipais de Saúde.
Cada repartição ligada a estrutura do sistema de saúde do Brasil tem sua autonomia e
incumbências. No caso do tema exposto, cabe a cada estado da região Nordeste, assim
como as demais regiões, através da sua Secretaria de Saúde, informar e apresentar a
distribuição do novo Coronavírus dentro do seu território, além de outras informações,
para a sociedade.
Para compreendermos melhor a distribuição territorial dos casos e óbitos
desencadeados pela COVID-19 na região Nordeste, construímos representações
cartográficas a partir de informações disponibilizadas pelo Ministério de Saúde e
65
Secretarias Estaduais de cada estado que compõe a região. Isso foi possível a partir da
utilização de ferramentas geotecnológicas de mui valia para o estado, sociedade
técnico-científico e sociedade em geral.
A partir do uso e manipulação de qualquer informação espacial, levando em
consideração os objetivos propostos, juntamente com o uso das geotecnologias, torna-
se possível revelar elementos de conhecimento e novas sugestões de interpretação
relacionadas a particularidades de qualquer fenômeno em determinado espaço-tempo.
Um dos benefícios e adequação do uso das ferramentas geotecnológicas é a
possibilidade de aperfeiçoar o uso de dados espaciais, levando em consideração a sua
forma rápida de manipulação, permitindo uma análise intrínseca das subjetivas e
contínuas mudanças que ocorrem dentro da sociedade, investigando determinismos
antrópicos e da própria natureza.
Nesse caso, entende-se que as geotecnologias são tidas como ferramentas essenciais
para o gerenciamento de informações espaciais, proporcionando a organização em
produtos gráficos e/ou cartográficos, além de permitir a tomada de decisões feita por
qualquer ser ou entidade com um maior conhecimento da causa em análise,
proporcionando a facilidade da transparência na divulgação de dados nos sistemas
governamentais.
No início do mês de março de 2020, começamos a observar os primeiros casos de
COVID-19 no Nordeste e, ao passar do tempo, a região se torna uma das que
apresentam o segundo maior índice de casos confirmados do novo Coronavírus no país,
atrás, apenas, da Região Sudeste. Podemos ratificar essa afirmativa, ao analisarmos,
através do cartograma apresentado na Figura 1, a disseminação do vírus em um período
de apenas 18 dias, deixando o número de 06 casos confirmados no dia 13 de março e
chegando ao total de 1.399 casos confirmados em 03 de abril de 2020, segundo dados do
Ministério da Saúde (2020).
O rápido contágio na região Nordeste esteve atrelado, primeiramente, a
movimentação inter-regional. Mas, a partir de medidas tomadas por governos estaduais,
estabelecendo o Distanciamento Social Ampliado (DSA), impôs-se a diminuição do
fluxo de entrada e saída na região. Assim, a disseminação passou a acontecer,
principalmente, pela movimentação intrarregional de fluxos (MIRANDA, 2013) e
(Portal G1, 2020).
Observa-se que, no dia 13 de março, apenas 03 (três) dos 09 (nove) estados da região
Nordeste apresentaram casos confirmados da nova doença. Porém, já no dia 03 de abril,
apenas 20 dias depois, todos os estados da região apresentaram casos notificados e
confirmados do novo coronavírus, tornando possível observar o rápido avanço de casos
confirmados na região.
Ao analisarmos o Gráfico 1, vemos de forma mais detalhada o aumento expressivo
dos casos confirmados de COVID-19. Em alguns estados da região Nordeste, a exemplo
do estado do Ceará, que na data do dia 13 de março ainda não se tinha nenhum caso
confirmado, no dia 25 do mesmo mês, apresentava-se como o estado com o maior
número de casos confirmados da Região.
O aumento do número de casos confirmados dentre os estados da Região Nordeste,
apresenta-se expressivamente crescente até o dia 24 de março de 2020. Os estados,
através da Secretaria de Saúde, buscando dinamizar, facilitar e conscientiza a sociedade,
66
criou sites ou links de acesso rápido dentro dos seus sites governamentais, que
possibilita o acesso direto às informações dos boletins epidemiológicos diários, além da
atualização da distribuição territorial dos casos confirmados, suspeitos e óbitos
causados pelo novo vírus. A exemplo da Secretaria de Estado de Saúde do Ceará
(SESA-CE), onde criou um Portal de atualização diária acerca dos casos do novo
coronavírus, o Portal é denominado como “Painel Epidemiológico”, alimentado e
mantido pelo Governo do Estado do Ceará e o IntegraSUS, sistema de transparência de
saúde no estado.
Figura 1: Casos confirmados da COVID-19 na Região Nordeste do Brasil, entre os
dias 13 a 03 de abril de 2020.

Fonte: Autores, 2020.


Gráfico 1: Evolução do número de casos confirmados da COVID-19 na Região
Nordeste do Brasil, entre os dias 13 e 26 de março de 2020.

Fonte: Ministério da Saúde e Secretarias Estaduais (2020). Organização: Autores, 2020.

67
A cada dia, na Região Nordeste, surgem novos casos e, diante disso, são necessárias
ferramentas que possibilitem a rápida manipulação e plotagem dos dados que são
inseridos nos portais e plataformas digitais. Os dados são apresentados diariamente e
podem ser vistos a partir dos links disponibilizados no Quadro 1.
Quadro 1: Estados e sites informativos
Estados Sites
Alagoas http://www.saude.al.gov.br/coronavirus/
Bahia http://www.saude.ba.gov.br/temasdesaude/coronavirus/
Ceará https://indicadores.integrasus.saude.ce.gov.br/indicadores/indicadore
s-coronavirus/coronavirus-ceara
Maranhão http://www.saude.ma.gov.br/boletins-covid-19/
Paraíba https://paraiba.pb.gov.br/diretas/saude/coronavirus
Pernambuco https://dados.seplag.pe.gov.br/apps/corona.html
Piauí http://portal.saude.pi.gov.br/2020/inf_saude/epidemiologia/covid-
19/boletim/result_covid-19.asp
Rio Grande do Norte http://www.saude.rn.gov.br/Conteudo.asp?TRAN=ITEM&TARG=2
23456&ACT=&PAGE=&PARM=&LBL=MAT%C9RIA
Sergipe https://todoscontraocorona.net.br/
Organização: Autores, 2020.
Pôde-se observar nos sites de cada Estado, que as apresentações se dão de forma
diferenciada. Os Estados do Ceará e de Pernambuco são considerados os mais
transparentes na divulgação das suas informações, de acordo com o Open Knowledge
Brasil (OKBR, 2020), que vem avaliando a qualidade dos dados e informações sobre o
coronavírus publicados pela União e pelos estados brasileiros, em seus portais oficiais.
Como exemplo, o site do Estado do Ceará apresenta todas as informações necessárias
logo no início, sendo possível buscar informações em diversos links disponíveis na
página (Figura 2).
Figura 2: Site do Estado do Ceará para a divulgação dos dados sobre a COVID - 19

Fonte: https://indicadores.integrasus.saude.ce.gov.br/indicadores/indicadores-
coronavirus/coronavirus-ceara
Por outro lado, os Estados de Alagoas e Sergipe apresentam meios de comunicação
que foram considerados uns dos mais fracos pela Organização (OKBR). No site da
Secretaria de Saúde de Sergipe, eles apenas citam quais os municípios apresentam casos
68
e óbitos confirmados. Há um site paralelo ao da Secretaria da Saúde, que apresentam os
dados um pouco mais organizados (Figura 3).
Figura 3: Site do Estado do Sergipe para a divulgação dos dados sobre a COVID - 19

Fonte: https://todoscontraocorona.net.br/

Além dos dados alfanuméricos disponibilizados, alguns estados também se


preocuparam em transformá-los em informações espacializadas, apresentando-os a
partir de mapas temáticos.
O primeiro exemplo vem do Estado de Alagoas, como pode ser visto na figura
abaixo, referente ao dia 24 de abril de 2020 (Figura 4).
Figura 4: Mapa da distribuição dos casos notificados, confirmados e de óbito pela
COVID - 19 no Estado de Alagoas para o dia 24 de abril 2020

Fonte: http://www.saude.al.gov.br/wp-content/uploads/2020/04/Informe-COVID-19-
n%C2%BA-49-24-DE-ABRIL-16h45.pdf
Observou-se que o mapa apresenta casos notificados com representação graduada,
representado em áreas, utilizando a metodologia dos mapas coropléticos para dados
quantitativos, escolhendo a variação das tonalidades em azul. As informações referentes
a óbitos e casos confirmados foram apresentadas em representações pontuais, indicando
os municípios com os casos citados. É nítido que os pontos foram colocados
69
posteriormente, após a produção do mapa em ambiente SIG, ou em algum editor de
imagem, uma vez que o mapa só apresenta a legenda elaborada em ambiente SIG.
No Estado da Bahia, o mapa é apresentado no boletim epidemiológico, divulgado
diariamente, como pode ser visto na figura 5.
O documento é publicado em arquivo *.pdf e o mapa apresentado está representado
utilizando-se da técnica coroplética, indo do bege claro ao vermelho. Percebe-se os
locais onde ocorrem os maiores casos confirmados no Estado, bem como o cinza,
mostrando os municípios que não apresentaram casos confirmados.
Figura 5: Mapa da distribuição dos casos notificados, confirmados e de óbito pela
COVID - 19 no Estado da Bahia para o dia 25 de abril 2020.

Fonte: http://www.saude.ba.gov.br/wp-
content/uploads/2020/04/BOLETIM_ELETRONICO_25-04-2020.pdf
Apesar disso, como vemos apenas o território baiano, quando lemos os municípios
limítrofes com apenas 01 caso confirmado, perdemos a noção do real território do
Estado, além das cores dos limites dos municípios não ficarem nítidos, devido o cinza
muito escuro apresentado na representação. Além disso, não podemos identificar os
municípios pois não temos uma referência textual, como, por exemplo, a identificação
da capital, Salvador.
O Boletim epidemiológico do Estado do Ceará apresenta um mapa interativo, em
que pode ser observado a quantidade de casos confirmados, em investigação e óbitos
(Figura 6).
Há uma régua gradativa de cores, que vai do branco ao vermelho, sendo a zona
intermediária em amarelo. Nesse caso, o branco parece estar mal utilizado, pois dá a
entender que não a casos. No entanto, assim como no Estado da Bahia, os municípios
que não possuem os casos supracitados estão na cor cinza. Poderia ser utilizado um tom
de amarelo mais claro, ou seguir a tons de vermelho, já que o branco dá ideia de ausência
de informações.
Já no Estado de Pernambuco, o boletim epidemiológico apresenta um mapa inserido
70
em um arquivo PDF, representando os casos confirmados de COVID-19 por municípios
(Figura 7).
Figura 6: Mapa da distribuição dos casos notificados, confirmados e de óbito pela
COVID - 19 no Estado do Ceará para o dia 24 de abril 2020.

Fonte: https://indicadores.integrasus.saude.ce.gov.br/indicadores/indicadores-
coronavirus/coronavirus-ceara
Figura 7: Mapa da distribuição dos casos confirmados de COVID - 19 no Estado do
Pernambuco.

Fonte: https://www.cievspe.com/novo-coronavirus-2019-ncov
É possível observar que as cores utilizadas para apresentação dos casos estão na
tonalidade azul, com os tons mais claros para menores casos e os mais escuros para
maior quantidade de casos. Nesse caso, deixaram a cor branca para municípios sem
registros de casos confirmados. A tonalidade do intervalo entre 01 e 50 está muito fraco,
o que dificulta na análise espacial da informação a ser repassada.
No Estado do Piauí, a divulgação das informações é chamada de painel
epidemiológico, apresentando um mapa com dados referentes a municípios sem
registros confirmados, com casos confirmados e casos confirmados e óbitos (Figura 8).
71
O mapa apresenta uma representação qualitativa, com o uso de cores
complementares, que permitem uma diferenciação nítida da informação. No entanto,
não é possível ter a noção dos municípios que possuem as maiores quantidades de casos
confirmados e de óbitos, uma vez que a representação é generalizada.
Figura 8: Mapa da distribuição dos casos confirmados e óbitos causados pela
COVID - 19 no Estado do Piauí.

Fonte: https://cidadeverde.com/coronavirus/105862/piaui-tem-58-pacientes-com-
covid-19-e-registra-primeiro-caso-no-sul-do-estado
O Estado da Paraíba, nos últimos meses, atualizou o seu site governamental, na
oportunidade introduziu um link de direcionamento rápido dentro da área que pertence a
Secretaria Estadual de Saúde, que possibilita a verificação do boletim epidemiológico
diário e a distribuição territorial dos casos de Covid-19 no estado, essas informações são
apresentadas a partir de uma plataforma vinculada com o google, mais exatamente o
openstreetmap (Figura 9).
Nessa plataforma é possível observar o uso da técnica de representação pontual,
com a quantidade de casos representados no interior do círculo produzido no centróide
de cada área do município. A vantagem é a dinamicidade em observar as informações
individualmente. Mas só é possível ver a dimensão quantitativa dos casos na capital do
Estado (João Pessoa) e em Campina Grande. Para os demais municípios é necessária
uma ampliação do mapa, o que não permite uma visão geral do Estado, pois os pontos
possuem o mesmo tamanho, ou seja, não é usado a técnica dos círculos proporcionais.
O boletim epidemiológico do Estado do Rio Grande do Norte apresenta dois mapas,
diariamente, sendo o primeiro tratando sobre a taxa de notificação de casos
(casos/100.000 habitantes) e o segundo sobre o coeficiente de incidência de casos
confirmados (casos/100.000 habitantes) e óbitos no Estado (Figura 10).
72
Figura 9: Mapa da distribuição dos casos confirmados da COVID - 19 no Estado do
Paraíba.

Fonte: https://superset.plataformatarget.com.br/superset/dashboard/55/
Figura 10: Mapas de taxa de notificação de casos de COVID-19 e coeficiente de
incidência de casos confirmados e óbitos por município no Estado do Rio Grande do
Norte.

Fonte: http://www.adcon.rn.gov.br/ACERVO/sesap/DOC/DOC000000000229792.PDF
Observa-se, nos mapas, o uso do método quantitativo, com duas tonalidades
diferentes de cores, o primeiro com cores azuis e o segundo com cores vermelhas. Para o
segundo mapa, que trata, também, dos casos de óbitos, o mapa apresenta um segundo
método, denominado círculos proporcionais, com cor amarela. Uma das vantagens dos
mapas apresentados é a possibilidade da análise geral do Estado, sendo colocado 02
(dois) recortes espaciais (municípios e unidades regionais de saúde), o que permite
entender a distribuição espacial das 03 variáveis a serem representadas, não apenas com
número de casos, mais utilizando-se de taxas e coeficientes (casos /100.000).
No entanto, não há como identificar os municípios e associá-los aos casos. A última
variável dos casos confirmados, no segundo mapa, ficou preto, o que dificulta sua
interpretação e divisão entre municípios; os óbitos foram apresentados em círculos
proporcionais, e percebe-se que há uma diferenciação de tamanhos, provavelmente,
pela quantidade em cada município. Nesse caso, deveria vir apresentado na legenda.
O estado do Maranhão, igualmente ao estado da Paraíba, apresenta o número de
casos confirmados através da plataforma OpenStreetMap, ferramenta ligada
diretamente ao google e no boletim epidemiológico (Figura 11a e 11b).

73
Figura 11 a e b: Mapa da distribuição de casos confirmados da COVID-19 no Estado
do Maranhão.

Fonte: http://www.saude.ma.gov.br/painel-atualizado-covid-19/

Fonte: http://www.saude.ma.gov.br/wp-content/uploads/2020/04/nota46.pdf
A principal diferença entre os mapas apresentados na plataforma google do
Maranhão e da Paraíba, é que no Estado do Maranhão, a plataforma faz um
agrupamento dos dados, apresentando símbolos diferentes, à medida que aumenta a
escala do mapa, pois os dados vão se desagregando por município. Na Figura 11a
observa-se pontos azuis, que representam 01 (um) caso, os verdes são até 10 (casos), os
amarelos acima de 10 casos e o vermelho, com 1914 casos, representa a capital São
Luís.
Já a figura 11b apresenta um mapa quantitativo com cores que vão do azul ao
vermelho. Nesse formato de representação, as cores com tons azuis estão relacionadas a
menos casos e os mais próximos do vermelho são os maiores casos. Entende-se que a
escolha de cores está inadequada, pois dá ideia de áreas com pouco risco, risco médio e
alto risco, quando, na verdade, deveria indicar uma ordem, entre os que possuem menos
e mais casos confirmados. Além disso, não tem como identificar os municípios, nem
mesmo a capital.
No Estado de Sergipe, a Secretaria Estadual de Saúde construiu um site paralelo ao
74
site governamental, onde possibilita que a sociedade possa visualizar, de forma geral, o
boletim epidemiológico diário, com as atualizações dos números de casos confirmados,
curados e óbitos causados pelo vírus. O boletim epidemiológico diário é apresentado a
partir de uma tabela com os dados alfanuméricos e, ao lado, representado a partir de um
mapa temático (Figura 12).
Figura 12: Mapa da distribuição de casos confirmados e óbitos pelo novo
Coronavírus no Estado de Sergipe.

Fonte: https://todoscontraocorona.net.br/
O mapa visto na figura 12, trata-se de um mapa temático simples, de estilo graduado
que permite a identificação dos números de casos obedecendo a uma de escala de cor. O
método quantitativo foi o utilizado para a construção do mapa, onde, que, fazendo uma
interligação com a coloração, os municípios com os menores números de casos são
destacados em cores mais claras/suaves, ao contrário dos que contêm os maiores
números de casos, que são representados por uma cor mais escura/forte. Nesse sentido,
tendem a seguir um padrão gradativo.
Observa-se que todos os estados da Região Nordeste buscaram apresentar os dados
relacionados a COVID-19 e a distribuição desses, utilizando ferramentas
geotecnológicas, especificamente, ligadas a conceitos e representações cartográficas.
Alguns dos estados fazem uso de softwares específicos, a exemplo do QGIS, ArcGIS,
entre outros, possibilitando a plotagem final de uma representação mais detalhada e
uniformizada. Outros, porém, destacam e espacializam as informações inerentes do
novo coronavírus, a partir de bases cartográficas já disponíveis em páginas da web,
como é o caso do OpenStreetMap, não disponibilizando informações e elementos,
como a legenda, que proporcionem a fácil compreensão, por parte do leitor, do que é
exposto. Nota-se que cada estado se utilizou de metodologias distintas para aquisição,
manipulação e disponibilização das informações e dados em estudo.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do exposto, vemos que o uso das Geotecnologias, progressivamente, vem
ganhando espaço como recurso técnico-metodológico utilizado pelas/para diversas
áreas do conhecimento. Todavia, é perceptível, ultimamente, o seu uso em grande escala
pelas Ciências da Saúde.
A pesquisa evidenciou que as dificuldades para a catalogação e aquisição de dados e
75
informações, por não haver uma eventual padronização de divulgação desses, impõe a
sociedade a uma compreensão incompleta do exposto, ou seja, em alguns dos mapas
avaliados é perceptível sabermos, através da representação cartográfica, apenas os
municípios com casos confirmados da nova doença. Todavia, não descreve a quantidade
existente, sendo necessário que o leitor busque informações em documentos
complementares para completar a compreensão objetivada.
Nesse contexto, sugerimos a uniformização/padronização para organização e
divulgação das informações, sabendo que, quando se há a organização dos dados em
ambiente SIG, possibilita o manuseio dinâmico nos softwares, possibilitando a
construção de produtos cartográficos (Figura 13), que permitam uma divulgação das
informações de forma que se entenda os resultados obtidos com as metodologias e
técnicas empregadas para a divulgação das informações, de maneira espacializada.
Figura 13: Mapa da distribuição de casos confirmados de Covid-19 no Estado do Rio
Grande do Norte até o dia 23/04/2020

Fonte: Autores, 2020


Observa-se que, na Figura 13, existe a preocupação em apresentar, de forma
interativa e de fácil compreensão, a espacialização dos números de casos confirmados
da Covid-19 no estado do Rio Grande do Norte.
Utilizou-se de uma metodologia que proporcionou uma aplicação de cores, sendo as
informações associadas diretamente a uma análise quantitativa, além de apresentar
legendas que permitem ao leitor uma leitura didática das informações apresentadas, que
outrora instiga a discussão qualitativa dos dados.
Não diferente, a Figura 14 utilizou-se da mesma metodologia anterior, para divulgar
as informações e espacializá-las na Região Nordeste, ou seja, construir uma forma
padrão para divulgação dos dados, facilitando, assim, a análise do que é exposto, sendo
76
que o que difere é, apenas, a escala física e temporal.
Figura 14: Mapa da distribuição de casos confirmados e óbitos causados pela Covid-
19 na Região Nordeste até o dia 25/04/2020

Fonte: Autores, 2020


Conclui-se que, a partir do proposto, pesquisadores, gestores e qualquer autoridade
governamental, possam utilizar-se das Geotecnologias, especificamente dos produtos
cartográficos, para análises quanti-qualitativas, além de possibilitar uma análise
comparativa entre períodos (espaço-tempo) pré-estabelecidos, no intuito de elaborar e
implementar políticas públicas que permitam tomadas de decisões coletivas, mantendo
a transparência na divulgação de qualquer informação relativa aos objetivos propostos
que, nesse caso, permitam o controle e diminuição dos casos de COVID-19 em todos os
estados federativos.
REFERÊNCIAS
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78
USO DE VANT PARA GESTÃO
TERRITORIAL NA PANDEMIA DE
COVID-19 E SEU POTENCIAL
PÓS-PANDEMIA

Tatiane Ferreira Olivatto (1)


Fábio Noel Stanganini (2)
Felipe Facci Inguaggiato (3)

RESUMO. Após mais de um ano desde o primeiro caso de COVID-19 no Brasil,


alguns setores públicos ainda buscam ferramentas para adaptar suas atividades às
recomendações epidemiológicas que exigem distanciamento social. O planejamento
urbano e a gestão territorial são atividades indispensáveis às dinâmicas das cidades e,
portanto, não podem ser interrompidas. Neste contexto, este artigo tem como objetivo
investigar o uso de Veículos Aéreos Não Tripulados (VANTs) como ferramenta de
gestão territorial, com foco no Cadastro Técnico Urbano e Regularização Fundiária
Urbana. A partir da metodologia de estudo de caso, verificou-se nas experiências e
legislações vigentes que feições relacionadas à propriedade (como construções e
tipologia vertical), infraestrutura urbana (por exemplo, poços de visita, calçadas,
postes, hidrantes, etc) e aspectos ambientais (principalmente relacionados à
vegetação e recursos hídricos) precisam ser mapeadas para tais finalidades. Atentou-
se também para a possibilidade de aquisição de dados georreferenciados e
altimétricos. Por fim, o uso de ortofotos provenientes de VANTs se mostrou viável
para a aplicação na gestão territorial pública no contexto das restrições
epidemiológicas de isolamento e distanciamento social impostas pela pandemia de
COVID-19. Esta ferramenta também se mostrou promissora no cenário pós-
pandemia, pois se apresenta como uma solução menos invasiva ao mapeamento da
propriedade.

Palavras-chave: Cadastro Técnico Urbano. Regularização Fundiária Urbana.


Drone.

(1) Doutoranda, Programa de Pós Graduação em Engenharia Urbana, tatianeolivatto@yahoo.com.br


(2) Doutor, Programa de Pós Graduação em Engenharia Urbana, fnsgeo@gmail.com.
(3)Doutorando, Programa de Pós Graduação em Engenharia Urbana,
felipe.inguaggiato@ifsuldeminas.edu.br.
79
1 INTRODUÇÃO
O surgimento do novo coronavírus (COVID-19) em dezembro de 2019 fez emergir
questões acerca do uso de diferentes tecnologias para monitorar o avanço do vírus ao
redor do mundo, inclusive das geotecnologias (BOULOS E GERAGHTY, 2020). Essas
tecnologias já se mostraram eficazes para subsidiar a gestão de outras pandemias,
principalmente, no que tange o acompanhamento da situação epidemiológica e o
andamento de campanhas de vacinação (BEZERRA et al., 2018; OLIVEIRA et al.,
2013).
Apesar do foco na gestão da pandemia e nas medidas de distanciamento social,
outros processos que compõe as dinâmicas das cidades não podem ser interrompidos,
como por exemplo, o planejamento urbano e a gestão territorial como um todo. Villaça
(2001) destaca que estes processos são indispensáveis, pois tratam de questões de
essenciais como infraestrutura urbana e saneamento básico, cabendo poder público
articulá-las. Dentre as tarefas que compõe a gestão territorial urbana destacam-se o
Cadastro Técnico Urbano e a Regularização Fundiária Urbana, as quais se deixadas de
articuladas podem interferir negativamente na arrecadação de impostos municipais
(PESSOA et al., 2019; RAMIRES, 2020).
De acordo com Gripp Júnior et al. (2011), o Cadastro Técnico Urbano teve maior
visibilidade após a Lei de Responsabilidade Fiscal, onde ficou estabelecido que todos os
municípios deveriam manter atualizado o mapeamento das feições da sua área urbana,
para uma cobrança de impostos justa e para a melhor gestão territorial, uma vez que o
espaço a ser monitorado seria melhor conhecido (GARCIA, 2008). Isso acabou tendo
repercussão na Regularização Fundiária Urbana, uma vez que imóveis irregulares
ficavam excluídos desta cobrança por sequer constar no cadastro.
De acordo com a Lei 13.465 de Regularização Fundiária Urbana (BRASIL, 2017) o
processo de regularização fundiário urbano requer um levantamento planialtimétrico
georreferenciado completo, incluindo construções e limites de propriedades, sistema
viário (calçada e leito carroçável), indicação de áreas públicas, acidentes geográficos e
outros elementos que caracterizem o núcleo urbano em questão.
O cadastro técnico urbano, por sua vez, não possui regulamentação específica,
sendo que foi recentemente instituído o Sistema Nacional de Gestão de Informações
Territoriais (SINTER) como uma:
[...] ferramenta de gestão pública que integrará, em um banco de dados
espaciais, o fluxo dinâmico de dados jurídicos produzidos pelos serviços
de registros públicos ao fluxo de dados fiscais, cadastrais e geoespaciais
de imóveis urbanos e rurais produzidos pela União, pelos Estados, pelo
Distrito Federal e pelos Municípios (BRASIL, 2016).
Contudo, o mesmo ainda não se encontra implementado, ficando por conta de cada
município a gestão do seu próprio Cadastro Técnico Urbano. Uma das consequências
desta descentralização é a falta de padrão, por não existir uma diretriz única de requisitos
mínimos para este cadastro. De acordo com Blatchut e Vilasana (1974), o Cadastro
Técnico Multifinalitário deve ser entendido como um sistema de registro da
propriedade, feita de forma geométrica e descritiva.
Além disso, o Estatuto da Cidade (BRASIL, 2001), em seu Artigo 50, estabeleceu a
obrigatoriedade de alguns municípios pelo desenvolvimento e aprovação de planos
80
diretores participativos. De acordo com Cunha et al. (2019), as diretrizes previstas no
plano diretor, bem como outros instrumentos referentes à política urbana da previstos no
Estatuto da Cidade, necessitam de dados que só podem ser viabilizados a partir da
organização do cadastro territorial do município.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 95% dos
municípios brasileiros e 100% dos municípios acima de 500 mil habitantes possuíam
Cadastro Imobiliário Urbano em 2015 (IBGE, 2017). Mas esses dados não revelam a
fragilidade e a falta de tecnologia desses cadastros, principalmente o fato de a maioria
não se tratar de informações georreferenciadas (PEREIRA, 2009; CUNHA et al., 2019).
Tradicionalmente, em municípios de pequeno e médio porte onde a disponibilidade
de recursos financeiros é limitada, a gestão territorial é realizada com base em
extensivos trabalhos de campo ou, alternativamente, com o uso de imagens de satélite
de baixa resolução (como Landsat ou Bing) (PINTO FILHO et al., 2020). Contudo, para
planejamento local, grandes escalas são necessárias (1:500, 1:1000 ou 1:2000,
dependendo da finalidade), tornando o uso destas imagens de satélite de baixa resolução
tecnicamente inviáveis. A possibilidade de adquirir imagens de satélite ou aerofotos (de
aviões, por exemplo), as quais possuem escala e acurácia posicional aceitáveis, torna-se
financeiramente inviável (KLEMAS, 2015; TOPOUZELIS et al., 2018).
Apesar disso, com o avanço a pandemia, as técnicas de sensoriamento remoto se
mostraram mais adequadas frente à extensivos trabalhos de campo que envolvem
contato entre pessoas, tornando-se um risco epidemiológico tanto aos profissionais,
quanto aos moradores. Estas técnicas, com produtos de alta resolução espacial e baixo
custo apresentam-se como uma demanda emergente para soluções de gestão urbana e
territorial no contexto da pandemia e, considerando o cenário promissor, pós pandemia
também. Os Veículos Aéreos Não Tripulados (VANTs), ou Aeronaves Remotamente
Pilotadas (RPAs), também popularmente denominadas drones, atendem à estas
demandas (CURETON, 2020).
Isso se confirma frente ao aumento do número de cadastros de drone no Brasil nos
meses de quarentena, que cresceu 13% de janeiro a junho de 2020. Segundo a Agência
Nacional de Aviação Civil (ANAC), o maior crescimento foi no número cadastros de
equipamentos de uso profissional com um aumento de 15% (MATSUI, 2020). Além
disso, no âmbito da administração municipal pública, já é possível observar exemplos
de adoção de estratégias de gestão territorial em tempos de pandemia com base em
imagens resultantes de VANT, como por exemplo, para atualização de cadastro
imobiliário (SANTOS et al., 2020), regularização fundiária urbana (PEDERNEIRAS,
2020) e continuidade no desenvolvimento do plano diretor (PINTO FILHO et al.,
2020). A tecnologia também está sendo utilizada na gestão territorial de terras indígenas,
evitando assim pesquisas que necessitem da presença em campo e aumentem o risco
epidemiológico de COVID-19 (TNC, 2021).
Todos estes aspectos considerados, este trabalho propõe investigar o uso de
ortofotos de drone (VANT) para subsidiar a gestão territorial pública no contexto da
pandemia e avaliar seu potencial pós-pandemia com base nos prós e contras observados.
O texto pode ser fragmentado em partes, com subtítulos próprios, mas mantendo
uma lógica de escrita que contemple uma introdução, um desenvolvimento e as
conclusões.

81
2 MÉTODO DE ANÁLISE
A fim de verificar a viabilidade do uso de VANTs para fins de gestão territorial
pública no contexto epidemiológico do novo coronavírus utilizou-se o método de
análise de Estudo de Caso, pois o mesmo possibilita relacionar aspectos teóricos a
questões experimentais (YIN, 2015).
Para tal, realizou-se um levantamento das principais feições a serem mapeadas para
fins de atualização de cadastro técnico urbano e regularização fundiária urbana, com
base em nas principais legislações vigentes, principalmente a Lei de Regularização
Fundiária Urbana (BRASIL, 2017). Foram então analisadas as seguintes feições: (i)
resolução espacial e acurácia posicional; (ii) delimitação de propriedades e construções;
(iii) identificação da quantidade de pavimentos; (vi) identificação do uso do solo; (v)
identificação de infraestruturas urbanas; e (vi) mapeamentos de feições ambientais.
Considerando estas feições selecionadas, foram estudadas as possibilidades de
identificação das mesmas por meio de ortofotos resultantes de levantamento por VANT
em comparação a outras metodologias como topografia tradicional, pesquisa de campo
ou imagens de satélites de baixa resolução (gratuitas). Além disso, foi levantado um
debate acerca das características do uso desta ferramenta considerando restrições
epidemiológicas impostas pela pandemia de COVID-19.
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
A ortofoto utilizada neste estudo possui pixel de tamanho de 6 cm². Quando
realizado georreferenciamento com pontos de apoio no solo, a acurácia posicional das
ortofotos resultantes de VANTs se enquadram nas Normas Técnicas da Cartografia
Nacional (BRASIL, 1984).
Na Figura 1 é possível observar dois aspectos relacionados à qualidade das ortofotos
resultantes de VANTs: resolução espacial e acurácia posicional. À esquerda é
apresentado um fragmento de ortofoto e à direita uma captura de tela do Google Earth
(imagem de satélite), sendo possível notar o deslocamento do polígono vetorizado na
ortofoto, além de se constatar o quão impreciso seria vetorizar alguma feição na imagem
de satélite de baixa resolução.
Figura 1 – Percepção de acurácia posicional pelo deslocamento de feição vetorizada
em escala 1:250. À esquerda ortofoto e à direita Google Earth (imagem de satélite)

Fonte: Os autores (2022).


A Figura 2 apresenta um exemplo que se aplica tanto ao Cadastro Técnico Urbano,

82
quanto à Regularização Fundiária Urbana e trata da vetorização das feições relacionadas
à propriedade: divisa, construções e locais com cobertura. A partir da vetorização destas
feições é possível extrair e calcular informações relevantes como áreas construída, área
de cobertura, percentual de área construída. Em municípios onde se aplicam o IPTU
verde, por exemplo, também pode-se extrair as informações necessárias para o cálculo
do mesmo.
Figura 2 – Vetorização de feições do imóvel em escala 1:500

Fonte: Os autores (2022).


Além da vetorização das feições, outra informação relevante para abastecimento de
banco de dados de espaciais referentes a propriedades urbanas trata da tipologia vertical.
Neste caso, como ilustrado na Figura 3, apesar da ortofoto (topo da Figura 3)
proporcionar uma noção geral, o produto mais adequado é o Modelo Digital de
Superfície (MDS) (parte inferior da Figura 3). A partir do MDS, também é possível
extrair o Modelo Digital de Terreno (MDT) e as curvas de nível do terreno.
Figura 3 – Vetorização de feições do imóvel em escala 1:500

Fonte: Os autores (2022).


83
Na Figura 3, as cotas do sistema viário variam entre 730 a 742 metros, sendo que em
(a) é de aproximadamente 745 metros, em (b) 741 metros e em (c) varia entre 779 e 790
metros. Comparativamente, (b) possue menos pavimentos em relação a (a), que possue
menos pavimentos em relação a (c), sendo que (a) varia 14,5 metros em relação ao
sistema viário; (b) 7 metros e (c) 52 metros. Uma limitação quanto ao uso desta
metodologia encontra-se no cálculo da quantidade exata de pavimentos, pois a altura do
pavimento varia dependendo do uso (por exemplo um barracão, que se difere de uma
residência).
No caso do uso do solo, a ortofoto pode ser utilizada como base para delimitação
(vide Figura 4), contudo, o trabalho de campo ainda é essencial para verificação exata
dos usos, principalmente, em caso de usos mistos e usos institucionais. Outra etapa que
não pode ser realizada através da ortofoto, mas que pode ser realizada paralelamente ao
trabalho de campo de verificação dos usos, é a coleta de dados referentes ao número de
identificação das propriedades. Cabe ressaltar que estes processos não requerem contato
entre prestadores de serviço e moradores.
Figura 4 – Uso e Ocupação do Solo

Fonte: Os autores (2022).


O mapeamento de infraestruturas urbanas básicas está representado na Figura 5.
Nesta figura foram mapeadas as feições referentes à arborização das vias, hidrante,
postes, poços de visita (PV), rampas para usuários de cadeiras de rodas e semáforos.
Alguns dados podem ser mais detalhados, como no caso dos poços de visita, que a partir
de visita a campo ou mapa da companhia prestadora de serviço, podem ser identificados
como poços de água, esgoto ou galeria. Além das feições identificadas na Figura 5, a
partir de ortofotos podem ser mapeados ainda os passeios públicos, leitos carroçáveis,
ciclovia/ciclofaixa quando for o caso, faixa de pedestres, boca de lobo/leão, praças,
caixas elevatórias para abastecimento de água, entre outros.
Adicionalmente, o mapeamento das características ambientais de um local,
exigência da Lei de Regularização Fundiária (Brasil, 2017), pode ser considerada outra
vantagem do uso de ortofotos, como demonstrado na Figura 6, que apresenta um
fragmento de vegetação inserido em área urbana.

84
Figura 5 – Mapeamento de Infraestrutura Urbana

Fonte: Os autores (2022).


Figura 6 – Feições Ambientais

Fonte: Os autores (2022).


De forma geral, através das ortofotos pode-se identificar recursos hídricos, faixas
extensas de vegetação e fragmentos isolados de vegetação, permitindo inclusive o
diagnóstico de impactos ambientais como áreas com ausência de área de preservação
permanente, erosão e risco de deslizamento. A identificação de nascentes também é
viável através de ortofotos, contudo, requer posterior verificação em campo.
Os resultados indicaram que os produtos obtidos a partir de VANT são promissores
para fins de gestão territorial pública no contexto epidemiológico do novo coronavírus,
no qual adentrar as propriedades para realização da medição das construções
85
ocasionaria o contato entre prestadores de serviço e moradores e, eventualmente,
propagação do vírus. Extensivos levantamentos de campo nas vias públicas também
poderiam expor os trabalhadores a um maior risco devido ao maior tempo de exposição.
A partir da aquisição dos dados em campo, o restante dos processos se dá em
escritório, permitindo inclusive o trabalho remoto (home-office) dos profissionais.
Considerando estes aspectos, considera-se a possibilidade da crescente demanda pela
utilização de VANTs nos últimos meses tornar-se permanente. Isso se deve às diversas
vantagens destacadas, dentre as quais pode-se acrescentar custo e tempo reduzidos de
aquisição de dados e qualidade dos produtos. Outra vantagem é a não necessidade de
adentrar propriedades, agilizando o procedimento de coleta de informações.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O uso de ortofotos proveniente de VANTs se mostrou uma ferramenta viável para
subsidiar a gestão territorial pública no contexto das restrições epidemiológicas de
isolamento e distanciamento social impostas pela pandemia de COVID-19. Além disso,
a alta resolução espacial e acurácia posicional resultantes e as diversas possibilidades
dentro da fotointerpretação desenvolvidos neste estudo mostram que esta ferramenta
também é promissora mesmo após a pandemia.
Quando comparadas com soluções disponíveis gratuitamente, como por exemplo o
Google Earth, as ortofotos apresentaram eficácia superior tanto na vetorização de
feições, quanto na localização das mesmas. Ainda é possível acrescentar vantagens
associadas à rápida coleta de dados e processamento dos produtos, adaptação a áreas de
difícil acesso e baixo custo de aquisição.
A ortofoto, quando aliada à trabalhos de campo que preservam o
distanciamento social entre trabalhadores e moradores, permitiu mapear as
características mínimas para atendimento da Lei de Regularização Fundiária e
identificar as feições desejadas ao Cadastro Técnico Urbano, permitindo inclusive a
obtenção de resultados num tempo reduzido quando comparado exclusivamente à
levantamentos de campo e topografia. As escalas resultantes também atendem as
necessidades, permitindo o mapeamento geral na escala 1:1000 e detalhamento de
construções, infraestruturas e feições ambientais nas escalas 1:250 e 1:500. Além disso,
os produtos altimétricos também podem ser destacados como vantagens da experiência
VANT, uma vez que também são exigidos pela legislação.
Apesar da aquisição de dados precisar da presença em campo, o tempo de execução
é reduzido em relação à levantamentos de campo tradicionais (topografia), além da
possibilidade da realização das etapas que o sucede (processamento e vetorização) no
formato home-office. A principal característica que tornou o uso do VANT viável na
pandemia é a possibilidade de não contato entre moradores e prestadores de serviço, o
que torna esta alternativa viável também no cenário pós-pandemia, uma vez que se
apresenta como uma solução menos invasiva ao mapeamento da propriedade.
Considerando que a tarefa de Regularização Fundiária Urbana e Cadastro Técnico
Urbano no Brasil ainda tem um longo caminho a ser percorrido e que estas tarefas são de
extrema relevância à gestão das dinâmicas territoriais, conclui-se que a aquisição de
dados através de VANT é uma demanda emergente no cenário de pandemia e tem
potencial para se fortalecer no pós-pandemia.

86
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88
GEOTECNOLOGIAS COMO SUBSÍDIO
NA GESTÃO PÚBLICA DA PANDEMIA
DE COVID-19:
O CASO DE ARARAQUARA-SP

Tatiane Ferreira Olivatto (1)


João Mateus Marão Domingues (2)
Bruno Joaquim Lima (3)
Felipe Facci Inguaggiato (4)

RESUMO. Desde o surgimento do novo Coronavírus em dezembro de 2019, as


geotecnologias vêm sendo incorporadas no monitoramento do avanço do vírus.
Apesar de evidência do emprego das geotecnologias para fins epidemiológicos desde
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interativo desenvolvido pelo Grupo de Inovação e Extensão em Engenharia Urbana
(Urbie) como subsídio para a gestão pública transparente da pandemia de COVID-19
no município de Araraquara-SP. Como produtos cartográficos, foram elaboradas as
séries temporais de mapas de número de casos confirmados de COVID-19 por bairro e
concentração de casos (mapa de calor). Destacou-se o método proposto para a
geocodificação dos bairros e tratamento dos dados brutos recebidos, bem como a
inclusão dos municípios contíguos que se integram ao município em questão. Além
disso, foram explorados o uso de recursos gratuitos da ferramenta online de mapas
AcrGIS, como personalização de simbologia, ferramentas de interatividade e
incorporação de pop-ups detalhando as informações no mapa. Os produtos resultantes
possibilitaram o monitoramento contínuo da situação epidemiológica no município,
viabilizando a gestão e planejamento direcionado das ações. O fato do mapeamento
ficar acessível para a população e de estar integrado à universidade através de um
projeto de extensão, enfatiza o potencial de fortalecimento da resiliência nas cidades a
partir da integração entre a comunidade, meio acadêmico e gestão pública.

Palavras-chave: Novo Coronavírus. COVID-19. Mapeamento Interativo.

(1) Doutoranda em Engenharia Urbana, Departamento de Pós-Graduação em Engenharia Urbana


(PPGEU), UFSCar, tatianeolivatto@yahoocom.br. (2) Mestre em Engenharia Urbana,
jmmarao@gmail.com (3) Doutorando em Engenharia Urbana, PPGEU, UFSCar,
bjoaquimlima@gmail.com (4) Doutorando em Engenharia Urbana, PPGEU, UFSCar,
felipe.inguaggiato@ifsuldeminas.edu.br
89
1 INTRODUÇÃO
Em dezembro de 2019, o surgimento de um novo vírus, denominado SARS-CoV-2
(COVID-19 ou novo Coronavírus) reacendeu as discussões acerca do uso de
geotecnologias para monitorar o avanço do vírus ao redor do mundo (KAMEL E
GERAGHTY, 2020).
Em um contexto epidemiológico, que trata de uma emergência em Saúde Pública
(CARMO, 2008), é esperado que essas ferramentas de subsídio sejam bastante
exploradas, principalmente na composição de uma gestão transparente, que integre
todos os setores de um município ou região. Contudo, acompanhar a situação
epidemiológica ainda representa um desafio para diversos municípios brasileiros, pois
esta tarefa demanda disponibilidade de dados e recursos (humanos, financeiros,
tecnológicos) (BEZERRA et al., 2018; OLIVEIRA et al., 2013).
O desenvolvimento de indicadores, índices e taxas a partir de dados estatísticos são
tradicionalmente as principais ferramentas utilizadas para monitorar e avaliar a situação
de saúde (MERCHÁN-HAMANN, 2000). Por outro lado, além de observar padrões
estatísticos, compreender a distribuição espacial dos fenômenos pode constituir outra
importante ferramenta (DRUCK et al., 2004). Neste sentido, exemplos de aplicações de
Sistemas de Informações Geográficas (SIGs) para investigar epidemiologias podem ser
encontradas desde meados do século XIX, num dos estudos mais conhecidos neste
campo de conhecimento, no qual o mapeamento de casos de cólera e de pontos de coleta
de água possibilitou correlacionar a contaminação de água na ocorrência da doença
(CARVALHO E NOBRE, 2001).
Partindo deste princípio de compreensão da distribuição espacial dos fenômenos, as
ferramentas de subsídio à gestão de saúde pública passaram então a utilizar as
geotecnologias, incorporando aspectos de coleta, geoprocessamento, análise e
compartilhamento de informação com referência geográfica (ROSA, 2011). Um
exemplo é o modelo desenvolvido por Buczak et al. (2014), capaz de predizer a
ocorrência de novos casos de dengue nas Filipinas com base no histórico de dados
socioeconômicos, ambientais, climáticos e epidemiológicos.
Outro exemplo foi o trabalho desenvolvido pela Fundação Bill e Melinda Gates, que
identificaram que a erradicação da poliomielite em alguns locais estava sendo
inviabilizada devido ao fato do não mapeamento de todas as vilas existentes e,
consequentemente, falta de planejamento quanto aos locais em que as crianças ainda
não haviam sido vacinadas. Esta mesma base de dados de mapeamento foi utilizada na
gestão epidemiológica do Ebola, em 2018 (WHO, 2019).
No caso específico da COVID-19, a Organização Mundial da Saúde mantém uma
plataforma de mapeamento interativo global dos casos e óbitos de coronavírus, o
mesmo acontece com diversos governos ao redor do mundo (WHO, 2020). No Brasil, a
referência oficial é o “Painel Coronavírus”, o qual contém dados, estatísticas e
mapeamentos. Estes mapeamentos vão além do número de casos e óbitos, abrangendo
mapas de coeficiente de incidência e de mortalidade. No âmbito nacional é possível
mencionar outras iniciativas de mapeamento como o “Painel Brasil”, “Painel Conass” e
o “SanarMed” e no âmbito estadual o Governo do Estado de São Paulo e do Rio de
Janeiro (CEBES, 2020). Estes exemplos reforçam outro aspecto relacionado à
facilitação da divulgação de dados e informações de utilidade pública através destas

90
plataformas (SANTOS E MOTA, 2020).
Tratando-se de propagação de epidemias e transmissão de doenças, Carvalho e
Souza-Santos (2005) destacam a importância de uma abordagem que considere espaço
e tempo. Logo, mapeamentos que contemplem séries temporais de dados mostram-se
promissores nesta tarefa e, de acordo com os mesmos autores, subsidiam métodos de
análise espacial na saúde coletiva, monitoramento ambiental e planejamento de serviços
de saúde. Este monitoramento temporal se torna ainda mais importante em casos como
o novo Coronavírus, em que ainda não há vacina ou medicamento específico para
tratamento da doença, exigindo monitoramento contínuo.
Rizzatti et al. (2020) atentam ainda para a importância do mapeamento intraurbano
para a compreensão da espacialização dos casos confirmados de COVID-19 numa
escala local. Este tipo de mapeamento possibilita a identificação de áreas de maior
ocorrência de casos e, no caso de séries temporais, áreas de maior crescimento de casos,
fornecendo subsídios para a identificação de contextos vulneráveis. Boulos e Geraghty
(2020) reforçam ainda que este tipo de mapeamento pode direcionar medidas de
isolamento ou flexibilização e atual na conscientização quando publicados em forma de
mapas interativos.
O objetivo deste estudo foi apresentar uma iniciativa de subsídio à gestão
transparente da pandemia por meio do uso de geotecnologias, especificamente o
mapeamento interativo, realizada pelo Urbie (Grupo de Inovação e Extensão em
Engenharia Urbana) através do projeto Urbie Maps, no município de Araraquara-SP,
Brasil.
2 MATERIAIS E MÉTODOS
O mapeamento interativo proposto foi desenvolvido pelo Urbie, grupo de extensão
vinculado à Universidade Federal de São Carlos, que busca a aproximação junto à
comunidade externa à universidade através de ações de intervenção pautadas nas
pesquisas desenvolvidas no PPGEU (Programa de Pós-Graduação em Engenharia
Urbana). Uma destas ações resultou no projeto denominado Urbie Maps¹, visando
oferecer estatísticas e mapeamentos para subsidiar a elaboração e planejamento de
políticas públicas na área da Engenharia Urbana.
O trabalho aqui descrito refere-se à parceria específica para mapeamento de casos de
coronavírus firmada junto à ao município de Araraquara, localizado na região central do
Estado de São Paulo, Brasil, estando à aproximadamente 273 km da capital São Paulo. A
população estimada é de 238.339 habitantes, com uma densidade demográfica de
237.62 hab./km2 (IBGE, 2020).
Visando garantir uma maior efetividade no monitoramento, foram incluídos no
mapeamento os casos registrados de moradores que residem em municípios contíguos e
que, de alguma forma, mantém um relacionamento de integração frequente com
Araraquara (por exemplo, trabalham ou estudam em Araraquara). A Figura 1 apresenta
a localização do município de Araraquara, bem como dos outros municípios
incorporados ao mapeamento.

¹ Inscrito no Edital ProEx COVID-19 com no 23112.009332/2020-40.

91
Figura 1 – Identificação da Área de Abrangência do Mapeamento

Fonte: Elaborado pelos Autores (2022).


Os dados para mapeamento são enviados semanalmente pela Vigilância
Epidemiológica do Município de Araraquara, contendo as seguintes informações:
nomenclatura do bairro e número de casos por bairro.
Uma vez recebidos pelo Urbie, os dados passam pela etapa de tratamento de dados,
viabilizando assim a elaboração do banco de dados geográfico que, após processado,
resultará nos produtos para subsidiar a gestão da pandemia de COVID-19 no município
em questão. O fluxograma da Figura 2 resume as etapas desenvolvidas desde o
recebimento até a disponibilização final dos mapas.
Figura 2 – Fluxograma das Etapas do Método Adotado
Tratamento de dados

Padronização da nomenclatura dos bairros

Elaboração do Banco dos Dados Geográfico

Georreferenciamento dos bairros Georreferenciamento do n° de casos da semana

Processamento e Disponibilização dos Mapas

Mapa de Números de Casos Mapas de Concentração de Casos (mapa de calor)


Fonte: Elaborado pelos Autores (2022).
92
2.1 TRATAMENTO DOS DADOS
Esta etapa se justifica pela necessidade de padronização da nomenclatura dos bairros
contida nos dados recebidos, os quais nem sempre se apresentam de forma regular.
Foram identificadas alternâncias de termos e abreviaturas, além de erros de digitação e
variações com e sem acentuação. Visando automatizar esta etapa, foi elaborada uma
Planilha Macro (do Microsoft Visual Basic), vide Figura 3.
2.2 ELABORAÇÃO DO BANCO DE DADOS GEOGRÁFICO
Um dos procedimentos necessários para se determinar os bairros de ocorrência de
COVID-19 é o georreferenciamento das ocorrências, para tal é necessária uma base de
dados que contenha os dados georreferenciados do município. Considerando que não
foi fornecido nenhum mapa base contendo os bairros do município de Araraquara e que
não foi possível encontrar esta informação concentrada em nenhum banco de dados
geográfico específico, optou-se pela elaboração do mesmo.
Figura 3 – Layout da Planilha Macro de Padronização dos Bairros

Fonte: Elaborado pelos Autores (2022).


De forma bem simplificada, georreferenciar é o ato de associar as coordenadas
geográficas de um evento (RIZZATTI et al., 2020). Para o georreferenciamento dos
bairros, optou-se pela feição vetorial do tipo pontual, sendo que foi alocado um ponto na
região central de cada bairro, com base em informações coletadas em diversas fonte de
dados, dentre as quais destacam-se: Google Maps; OpenStreetMap; WikiMapia; entre
outros (como sites de imobiliárias, estabelecimentos comerciais e CEP Correios).
A edição da camada vetorial de pontos foi realizada no software QGIS², utilizando o
sistema de coordenadas geográficas WGS84, uma vez que este é compatível com as
fontes de informações descritas acima, bem como com a ferramenta que será utilizada
para exibição final dos mapas. Por se tratar de uma camada de pontos com referência em
coordenadas geográficas, cada ponto é identificado pelo respectivo nome do bairro e
relacionado à uma latitude e uma longitude.
Semanalmente, os dados resultantes da etapa de tratamento de dados - contendo o
número de casos por bairro - são então associados aos dados que contém a localização
geográfica dos bairros, resultando no produto final da etapa de elaboração do banco de

² QGIS é um Sistema de Informação Geográfica livre e aberto, disponível para download em


<https://qgis.org/en/site/forusers/download.html>.
93
dados georreferenciado: um arquivo de dados contendo “nome do bairro”, “latitude”,
“longitude” e “número de casos”.
2.3 PROCESSAMENTO E DISPONIBILIZAÇÃO DOS MAPAS
A plataforma escolhida para disponibilização dos mapas foi o ArcGIS Online. Esta
plataforma permite a criação de mapas interativos a partir da importação de planilhas e
dados vetoriais num ambiente preparado com mapas base pré-definidos, ferramentas de
processamento para tornar os dados interessantes visualmente, incluindo desde
configuração da simbologia à personalização de pop-ups (Imagem, 2020). Foram
utilizadas duas ferramentas que compõem a opção gratuita da plataforma,
denominadas: Web Map (para elaboração dos mapas) e StoryMap (para a exibição e
compartilhamento com o público).
Semanalmente foram elaborados dois produtos: Mapa de Concentração de Casos e
Mapa de Número de Casos por Bairro. No Mapa de Concentração de Casos foi
desenvolvido um mapa de calor, visando facilitar a visualização dos locais com maior
ou menor concentração de casos confirmados de COVID-19 (maior ou menor
densidade de casos).
No Mapa de Número de Casos por Bairro a simbologia adotada foi a classificação
dos dados em intervalos os quais foram representados por círculos com diâmetros
variados, sendo que os menores se referem aos bairros com menos casos e os maiores
aos bairros com mais casos. Para facilitar a diferenciação entre os intervalos, foram
utilizados círculos de cores diferentes. Neste mapa também foi habilitada a exibição de
pop-ups, exibindo os atributos “Número de Casos” e “Bairro” para determinado círculo
quando o mesmo é selecionado.
Uma vez que as simbologias e legendas foram configuradas no Web Map, os mapas
foram organizados no StoryMap de forma a manter a série histórica dos dois produtos
propostos. Em outras palavras, um mapa novo é adicionado semanalmente, contudo,
todos os outros mapas das semanas epidemiológicas anteriores ficam disponíveis para
consulta na plataforma.
3 RESULTADOS
A primeira etapa do método proposto, tratamento de dados, se mostrou essencial
para viabilizar a elaboração do banco de dados do projeto, evitando, principalmente, a
duplicidade de dados. A ocorrência de termos como “Jardim”, “Jd.”, “Parque”, “Pq.”,
“Vila”, “Condomínio” e “Residencial”, que frequentemente se alternavam entre os
dados recebidos a cada semana, acarretava o registro segregado de casos que se referiam
a um mesmo bairro. Caso a etapa de tratamento de dados não fosse executada, estes
dados seriam representados separadamente, impactando o resultado final do
mapeamento. Além disso, esta etapa evita inconsistência na série temporal dos dados,
como por exemplo, bairros que apresentavam casos em uma determinada semana e, na
semana seguinte, não apareciam na lista com casos confirmados, ou então apresentavam
um número menor de casos.
Na etapa de elaboração do banco de dados geográfico, uma das primeiras limitações
enfrentadas foi a escassez de informações quanto ao limite de cada bairro, dificuldade
esta superada ao escolher o uso de pontos no lugar de polígonos para representação dos
mesmos. Quanto ao procedimento de localização do bairro, no início no

94
desenvolvimento do projeto, não se tinha conhecimento de todos os bairros existentes
no município, bem como o tempo necessário para levantar esta informação poderia
atrasar a disponibilização dos primeiros resultados. Logo, tratando-se da natureza
emergencial do mapeamento de casos de COVID-19, optou-se pela localização dos
bairros de acordo com a demanda semanal de novos bairros, o que exige atualização
contínua por conta da equipe de trabalho. Por outro lado, esta decisão antecipou a
divulgação dos primeiros resultados.
A Figura 4 apresenta o mapa de Número de Casos por Bairro em fase de
desenvolvimento no Web Map. À esquerda, pode-se verificar a lista de mapas
adicionados à plataforma ao longo das semanas. À direita consta a simbologia escolhida
para representação dos dados, com círculos de tamanhos e cores diferentes de acordo
com a faixa de número de casos. No centro da Figura 4, os dados são exibidos conforme
o usuário final terá acesso.
Figura 4 – Layout de Edição do Mapa de Números de Casos por Bairro no Web Map

Fonte: Elaborado pelos Autores (2022).


Devido ao rápido crescimento do número de casos ao longo das semanas
epidemiológicas, é necessário alterar periodicamente os intervalos de representação do
número de casos da simbologia adotada, visto que plataforma Web Map permite o
número máximo de 11 intervalos por camada de dados adicionada.
A Figura 5 apresenta o mapa de Concentração de Casos em fase de desenvolvimento
no Web Map. À esquerda, pode-se verificar a lista de mapas adicionados à plataforma ao
longo das semanas, bem como a simbologia escolhida para representação dos dados,
com variação de cores de acordo com a concentração de número de casos (mapa de
calor). Na parte inferior da figura é exibida a tabela de atributos dos dados. Na barra em
destaque, ficam alocadas as principais ferramentas de manipulação dos dados,
inclusive, conforme exibida na janela ilustrada na figura, ferramentas de configuração
de pop-up, transparência da camada e simbologia.
O acesso aos mapas resultantes é livre aos gestores públicos e à população através do

95
endereço eletrônico <https://arcg.is/neO5H>. A página disponibiliza estatísticas sobre a
situação epidemiológica no município de Araraquara e, em seguida, exibe os mapas de
Número de Casos por Bairro e Concentração de Casos. Ambos os mapas são
contemplados com ferramentas de interatividade (Figura 6).
Figura 5 – Layout de Edição do Mapa de Concentração de Casos no Web Map

Fonte: Elaborado pelos Autores (2022).


Figura 6 – Ferramentas de Interatividade Utilizadas

Fonte: Elaborado pelos Autores (2022).


96
Na Figura 6, em “a”, destaca-se a data a que o mapeamento se refere, sendo que o
botão “b” possibilita a navegação através da série histórica, recuando para datas das
semanas anteriores. Em “c” o usuário consegue visualizar os dados em tela cheia, em
“d” é possível fazer uma busca por um endereço ou nome de bairro e em “e” pode-se
utilizar a função de localização do dispositivo de acesso para encontrar o local que o
mesmo se encontra. Os botões em “f” viabilizam a navegação através do mapa pela
aproximação (zoom in) e afastamento (zoom out), bem como em “g” retorna-se à
visualização inicial. Em “h” é exibida a legenda referente aos dados exibidos na tela.
Nesta mesma figura, é exemplificada a ferramenta de pop-up, através da qual tem-se
acesso às informações detalhadas de um bairro específico, a partir do clique em tela. No
caso no mapa de Número de Casos por Bairro, ao clicar num círculo na tela (Figura 6,
“i”), surge uma janela exibindo o nome do bairro e o número de casos referente àquele
bairro. Nesta janela de pop-up o botão “zoom” aproxima para o local de ocorrência dos
casos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De forma geral, o mapeamento da situação epidemiológica, como no caso do mapa
de número de casos por bairro e mapa de concentração de casos, podem ser importantes
ferramentas para subsidiar a gestão da saúde pública no município. Cabe ressaltar que o
acompanhamento semanal da localização da ocorrência dos casos confirmados permite
identificar regiões críticas de aumento nos casos, possibilitando o planejamento
direcionado de ações específicas de conscientização, testagem, fiscalização e/ou reforço
das unidades de pronto atendimento locais.
A série temporal de mapas também tem função relevante no acompanhamento da
evolução epidemiológica no município, podendo indicar regiões em que as ações de
gestão de saúde pública não têm alcance ou não estão produzindo os efeitos esperados.
Outro aspecto interessante é o monitoramento dos casos de trânsito com municípios
contíguos que, eventualmente, buscam atendimento nas unidades de saúde de
Araraquara.
O fato do mapeamento ficar acessível para a população compactua com o processo de
gestão transparente e, adicionalmente, o fato do projeto estar integrado à universidade
através de um projeto de extensão, agrega credibilidade à informação que está sendo
transmitida e compõe, portanto, uma interessante ferramenta de conscientização. Neste
contexto, os mapas interativos têm papel fundamental, pois permitem ao usuário
interagir com a informação de forma a compreendê-la mais facilmente.
Considerando que o projeto foi desenvolvido por um grupo de extensão vinculado a
uma universidade federal, observa-se também a supressão da demanda emergencial por
recursos humanos especializados, os quais não exigiram recursos financeiros
adicionais, uma vez que a iniciativa do projeto é voluntária e utiliza recursos gratuitos de
uma ferramenta online. Esta característica fortalece a importância da interação entre
instituições de ensino e pesquisa e gestores e formuladores de políticas públicas,
contribuindo para a efetiva aplicação do conhecimento nas ações visando cidades mais
resilientes.
As próximas etapas do projeto envolvem análises espaciais visando compreender a
correlação entre a ocorrência e localidade de casos de COVID-19 e outras
características socioeconômicas e de infraestrutura urbana.
97
REFERÊNCIAS
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emergência em Saúde Pública: O caso da síndrome congênita do Zika vírus, em Pernambuco,
Brasil. In: Anais do Instituto de Higiene e Medicina Tropical, 2018, v.16, p.47-56.
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syndrome (SARS) on the Internet. International journal of health geographics, v.3, n.1, 2004.
BOULOS, Maged N. Kamel; GERAGHTY, Estella M. Geographical tracking and mapping of
coronavirus disease COVID-19/severe acute respiratory syndrome coronavirus 2 (SARS-CoV-2)
epidemic and associated events around the world: how 21st century GIS technologies are
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Geographics, v.19, n.8, 2020.
BUCZAK, et al. Prediction of high incidence of dengue in the Philippines. PLoS neglected
tropical diseases, v. 8, n. 4, p. e2771, 2014.
CARMO, Eduardo Hage et al. Emergências de saúde pública: conceito, caracterização, preparação
e resposta. Estudos Avançados, v.22, n.64, p.19-32, 2008.
CARVALHO, Marilia Sá; NOBRE, Flavio Fonseca. Editorial. Cadernos de Saúde Pública, v.17,
n.7, 2001.
CARVALHO, Marilia Sá; SOUZA-SANTOS, Reinaldo. Análise de dados espaciais em saúde
pública: métodos, problemas, perspectivas. Cadernos de Saúde Pública, v.21, n.2, p.361-378,
2005.
CEBES. 2020. Dados e sites de referência sobre o Covid-19. Centro Brasileiro de Estudos de
Saúde. Disponível em: <http://cebes.org.br/2020/04/dados-e-sites-de-referencia-sobre-o-covid-
19/>. Acesso em: 10 set. 2020.
DRUCK, Suzana et al. Análise espacial de dados geográficos (eds.), Brasília: Embrapa, 2004.
ISBN: 85-7383-260-6.
IBGE. Cidades: Araraquara. 2020. Disponível em: <https://www.ibge.gov.br/cidades -e-
estados/sp/araraquara.html>. Acesso em: 24 out. 2020.
Imagem. ArcGIS Online - Mapeamento e análise: inteligência de localização para todos. 2020.
Disponível em: <https://www.img.com.br/pt-br/arcgis/produtos/arcgis-online/visao-geral>. Acesso
em: 01 set. 2020.
MERCHÁN-HAMANN, Edgar et al. Terminologia das medidas e indicadores em epidemiologia:
subsídios para uma possível padronização da nomenclatura. Informe Epidemiológico do SUS, v.
9, n. 4, p.276-284, 2000.
OLIVEIRA, Juliana Silva et al. Os instrumentos de gestão e a epidemiologia: ferramentas do
controle social. Revista de Enfermagem UFPE, v. 7, n. 1, p.192-198, 2013.
RIZZATTI, Maurício et al. Metodologia de geolocalização para mapeamento intraurbano de
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ROSA, Roberto. Geotecnologias na Geografia aplicada. Revista Do Departamento De Geografia,
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SANTOS, Jaedson Gomes dos; MOTA, Flávio Perazzo Barbosa. A Transparência Governamental
em Tempos de Covid-19: Reflexões do Quadro Brasileiro”. Gestão e Sociedade, v.14, n.39,
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WHO. As Cinco Principais Soluções de Índole Tecnológica que Ajudaram a Erradicar o Poliovírus
na Região Africana. Polio Global Eradication Initiative. 2019. Disponível em:
https://pt.africakicksoutwildpolio.com/ >. Acesso em: 10 set. 2020.
WHO. Coronavirus Disease (COVID-19) Dashboard. 2020. Disponível em:
<https://covid19.who.int/>. Acesso em: 10 set. 2020.

98
PROJETOS URBANOS DE
DESENVOLVIMENTO EM TEMPOS DE
PANDEMIA:
UM RELATO A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DO
URBANISMO TÁTICO

Catiana Sabadin Zamarrenho (1)


Cleonice Alexandre Le Bourlegat (2)
Felipe Buller Bertuzzi (3)
Juliana de Mendonça Casadei (4)

RESUMO. O Município de Campo Grande experimentou mudanças nos


procedimentos metodológicos de concepção, planejamento e gestão de projetos
urbanos durante o período da pandemia de Covid-19, em âmbito de um programa de
desenvolvimento integrado que está em curso visando a revitalização da área central,
por intermédio de financiamento de um organismo multilateral. Sendo assim, além
das adaptações nas tarefas cotidianas do programa, foi desenvolvido um projeto
específico para o corredor gastronômico, turístico e cultural da Rua José Antônio,
importante via da cidade. A iniciativa permitiu a realização de um piloto de
intervenção na via, através do urbanismo tático, objetivando a qualificação de usos da
via durante e pós-pandemia, bem como o traçado de diretrizes definitivas para a
concepção do projeto executivo de requalificação. A experiência foi considerada
exitosa e inovadora para Campo Grande, possibilitando a abertura para novas
maneiras de concepção de projetos, a partir da construção coletiva com a população.

Palavras-chave: Requalificação urbana. Intervenção temporária. Cocriação.

(1) Mestre em Agronegócios. Subsecretaria de Gestão e Planejamento Estratégico / Prefeitura Municipal de


Campo Grande. E-mail catiana.sabadin@terra.com.br.
(2) Doutora em Geografia. Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Local, Universidade
Católica Dom Bosco. E-mail clebourlegat@ucdb.br.
(3) Mestre em Arquitetura e Urbanismo. Doutorando em Desenvolvimento Local. Universidade Católica
Dom Bosco. E-mail arq.felipebertuzzi@gmail.com.
(4) Mestre em Saneamento Ambiental e Recursos Hídricos. Doutoranda em Desenvolvimento Local.
Universidade Católica Dom Bosco. E-mail ju.casadei@gmail.com.

99
1 INTRODUÇÃO
A pandemia de Covid-19 trouxe consigo a necessidade de reconstruir as bases de
planejamento e gestão de projetos urbanos, com o propósito de promover o
desenvolvimento integrado do território. Adaptar as metodologias de trabalho
tradicionalmente utilizadas na gestão pública tornou-se, em primeiro plano, uma
necessidade premente para garantia da continuidade das tarefas no período de crise
pandêmica. Mas, ao mesmo tempo, permitiu também uma oportunidade de novas
leituras metodológicas, abrindo-se a um leque de possibilidades no campo da
experimentação, da cocriação e da inovação social.
A experiência vivenciada no Município de Campo Grande, Mato Grosso do Sul,
demonstra os desafios enfrentados e as soluções adotadas pelas equipes
multidisciplinares de engenharia de projetos, à luz de um laboratório urbano vivo que
consolidou o desenvolvimento dos projetos executivos de requalificação de uma via
pública, atualmente em finalização das obras civis e de paisagismo.
O presente capítulo pretende compartilhar essa experiência, bem como apresentar os
procedimentos metodológicos desenvolvidos para o desenvolvimento do projeto de
requalificação de um corredor gastronômico, turístico e cultural, a partir do urbanismo
tático.
2 CONTEXTUALIZAÇÃO E ANTECEDENTES
O Município de Campo Grande têm uma larga experiência na concepção e
implantação de programas de desenvolvimento integrado do território urbano.
Conforme Castro et al (2021), nas últimas duas décadas foram experimentados projetos
com fomento internacional, a partir do apoio de organismos multilaterais creditícios,
totalizando oito iniciativas de financiamento, além diversas outras cooperações técnicas,
cujo enfoque voltou-se inicialmente à urbanização de áreas de fundos de vales, associado
a programas habitacionais, recuperação de áreas degradadas e saneamento básico,
culminando com recentes investimentos voltados à revitalização de área central e
melhorias da mobilidade urbana na cidade.
Paralelamente a execução sistemática dos programas de investimento, o Município
assistiu um crescimento dos indicadores socioeconômicos, especialmente o Índice de
Desenvolvimento Humano municipal – IDH, além de outros avanços significativos, tais
como os esforços para erradicação das favelas, os chamados aglomerados subnormais,
nas áreas de fundos de vale onde houve intervenções, e um aumento expressivo nos
indicadores de oferta de serviços públicos voltados ao saneamento básico, o que inclui a
cobertura da rede de água e esgoto, coleta de resíduos sólidos e sua destinação final em
aterro sanitário, além da expansão das redes de macro e microdrenagem, evidenciando
melhorias na qualidade de vida local (CASTRO et al, 2021).
2.1 REQUALIFICAÇÃO DO CENTRO DE CAMPO GRANDE
Atualmente, está em andamento um programa de desenvolvimento integrado, com
início em 2017, cujo objetivo principal é contribuir com a revitalização da região central
de Campo Grande. Neste sentido, buscou-se fomentar a ocupação de áreas com vazios
urbanos e a revitalização do comércio na Zona Especial de Interesse Cultural, por meio
da melhoria da infraestrutura e dos espaços públicos, bem como aumentar a eficiência do
sistema de transporte coletivo e a acessibilidade ao centro (CAMPO GRANDE, 2018).

100
Preliminarmente, entre os anos de 2008 a 2013, o Município de Campo Grande
executou o Programa Viva Campo Grande I, produto do Contrato de Empréstimo n.
2960/OC-BR estabelecido entre a Prefeitura e o Banco Interamericano de
Desenvolvimento – BID, tendo como objetivos a revitalização da área central da cidade,
a melhoria dos sistemas de mobilidade da população, bem como da gestão administrativa
do Município (CAMPO GRANDE, 2018).
Dando prosseguimento aos trabalhos iniciados nesta primeira etapa, foi elaborado o
Programa de Desenvolvimento Integrado do Município de Campo Grande – Viva
Campo Grande II, objeto de um novo Contrato de Empréstimo (n. 3630/OC-BR) entre o
Município e o BID, com início em 2017 a 2023. Neste caso, os objetivos foram: melhorar
as condições de urbanização e ampliar a rede de equipamentos sociais; reestruturar e
revitalizar o sistema viário, de transporte público e de mobilidade da região; integrar as
intersecções com vias transversais à Rua 14 de Julho e melhorar suas condições de
urbanização; padronizar a sinalização vertical e horizontal da via; promover a integração
do projeto urbanístico, paisagístico e de infraestrutura; ampliar as áreas de uso exclusivo
para pedestres, com alargamento dos passeios públicos e aumento de áreas úteis,
padronização de paginação, considerando as Leis de Acessibilidade vigente; e
implantação de mobiliários urbanos; implantar projetos paisagísticos; implantar rede
subterrânea de energia e telecomunicações de acordo com a Lei Complementar n.
161/2010 e de acordo com as normas dos órgãos competentes; implantar projeto de
arborização de calçadas; estimular a padronização de publicidade nas fachadas do
comércio local, reduzindo a poluição visual e promovendo um ambiente mais harmônico
e aconchegante; contribuir e estimular a valorização e a preservação de imóveis listados
pela Fundação Municipal de Cultura, como de interesse de preservação histórico-
cultural, localizados ao longo da Rua 14 de Julho, de acordo com a Guia de Diretrizes
Urbanísticas – GDU n. 21/2014, emitida em 27 de março de 2014; e fortalecer a
capacidade de planejamento e gestão urbana da Prefeitura (CAMPO GRANDE, 2018).
2.2 IMPACTOS DA COVID-19 NO PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO E PRINCIPAIS
SOLUÇÕES ADOTADAS
Importante salientar que Campo Grande vivenciou os impactos da pandemia por
Covid-19, passando o Município a tomar medidas de caráter geral com a finalidade de
prevenir a disseminação do coronavírus na cidade. A segunda quinzena do mês de março
de 2020, uma série de decretos foi editada pelo chefe do executivo, tendo em vista
minimizar a circulação e a aglomeração de pessoas.
Todas essas medidas afetaram a dinâmica dos trabalhos, de um modo geral, e alterou
substancialmente a metodologia normalmente adotada para o desenvolvimento das
atividades referentes ao gerenciamento do programa e a implantação das tarefas
finalísticas. Também algumas das ações já programadas para serem realizadas e outras
do cotidiano da execução do Programa foram interrompidas ou alteradas, tendo em vista
a pandemia.
De um modo geral, dentre as medidas adotadas, pode-se considerar a adoção do
home office nos períodos mais críticos da pandemia; a substituição de reuniões
presenciais por reuniões virtuais; o uso de medidas protetivas, tanto individuais quanto
coletivas, para as atividades presenciais nas instalações da sede da Unidade Gestora do
Programa e nas obras em andamento.
Nos períodos de impossibilidade das atividades presenciais, foram potencializadas as
101
atividades de planejamento, em conjunto com as equipes de supervisão ambiental, tais
como os preparativos para as obras de requalificação do segundo trecho da Rua 14 de
Julho (na extensão da Av. Mato Grosso à Rua Eça de Queiroz), a análise de projetos das
obras do quadrilátero central, o planejamento da adaptação dos programas ambientais do
Plano de Gestão Ambiental e Social - PGAS para as obras futuras, dentre outras ações.
Com a liberação das atividades essenciais, incluindo as obras de construção civil,
acerca do escopo do monitoramento das medidas socioambientais já realizadas houve a
inserção do acompanhamento específico da adoção e, consequente cumprimento, de
protocolos de biossegurança nas obras de partida e contrapartida que compõem o
Programa.
Para as demais atividades em curso, foram suspensos os eventos culturais,
denominados “Reviva Cultura”, realizados no trecho requalificado da Rua 14 de Julho;
além da suspensão de algumas ações objeto de uma parceria com o Sebrae, tais como
treinamentos presenciais de comerciantes, além da adaptação da metodologia
inicialmente proposta para a realização de um estudo de impactos cumulativos pela
Fecomércio.
Contudo, para os preparativos projetuais das obras futuras, destaca-se todo o
processo de concepção da Rua José Antônio, detalhado adiante.
3 O CASE DA RUA JOSÉ ANTÔNIO
A Rua José Antônio Pereira é um importante corredor viário que interliga distintas
regiões da cidade, no sentido norte-sul (Figura 1). O nome é uma homenagem ao
mineiro, desbravador brasileiro, que fundou Campo Grande em 1875. O encontro desta
rua com a principal avenida da cidade, a Av. Afonso Pena, é marcado pelo obelisco, um
monumento construído em memória aos fundadores da cidade, idealizado pelo general
Newton Cavalcante, então Comandante da Circunscrição Militar, e inaugurado em 1933,
atualmente tombado pelo patrimônio cultural (IPATRIMÔNIO, 2022).
Figura 1 – Rua José Antônio.

Fonte: elaborado pelos autores


A rua ganhou evidência quando em 28 de maio de 2020 foi publicada a Lei
Municipal n. 6.457/2020 autorizando o Poder Executivo Municipal a criar o Corredor

102
Gastronômico, Turístico e Cultural da Rua José Antônio Pereira (CAMPO GRANDE,
2020), que se estende da Rua Abrão Julio Rahe até a Rua Rodolfo José Pinho (Figura 1).
Segundo o Perfil Socioeconômico de Campo Grande, esses corredores têm por
finalidade incentivar a promoção e o ordenamento do local, promover apresentações
musicais, poéticas e artísticas, realizar festivais e encontros gastronômicos e culturais
para divulgação do próprio corredor (PLANURB, 2021).
Na sequência, uma cooperação técnica do Município com o Banco Interamericano
de Desenvolvimento - BID permitiu a realização de um piloto de intervenção na via,
tendo em vista a qualificação de usos da via durante e pós-pandemia de coronavírus, bem
como o traçado de diretrizes definitivas para a concepção do projeto executivo de
requalificação futura da via. Em síntese, as etapas do projeto englobaram a implantação
de táticas urbanas in loco, e efetivamente a sua entrega para uso e teste da população,
contemplando a fase de ativação cultural. Ao final, foi realizada uma avaliação com os
atores envolvidos no processo, antes da sua desmontagem (CASADEI, 2020).
O projeto promoveu quatro intervenções na via em especial, contemplando: as
esquinas do cruzamento com a Rua Marechal Rondon; as esquinas do cruzamento com a
Rua Barão do Rio Branco; um “bolsão de permanência” entre as Ruas Marechal Rondon
e Dom Aquino, no protótipo de um parklet; e outro entre as Ruas Barão do Rio Branco e
Av. Afonso Pena (Figura 2).
As intervenções de urbanismo tático realizados na Rua José Antônio foram
implantadas em um processo que considerou a organização de diferentes atores, tais
como equipes de consultores de laboratório urbano e inovação social, do Banco
Interamericano de Desenvolvimento, de diferentes órgãos e setores da Prefeitura de
Campo Grande, da Associação de Empresários da via, fornecedores externos e
população em geral (MÁRQUES; CUNHA, 2021). A articulação iniciou desde junho de
2020 (Figura 3), com mobilizações de diversos segmentos para compreender as
demandas locais e o início da cocriação das propostas (CASADEI, 2020).
Um especial destaque neste processo foi o engajamento da população local, uma vez
que a vizinhança recebeu visitas durante a pré-produção e nas etapas de execução, sendo
comunicada sobre o projeto e convidada a participar (Figura 3).
Figura 2 – Rua José Antônio após a execução das etapas de intervenção

Fonte: Casadei (2020); Márques e Cunha (2020)

103
Figura 3 – Envolvimento das partes interessadas: reunião com empresários da via (1),
capacitação sobre biossegurança para a abordagem de campo (2), cadastramento de
comunicação (3) e levantamentos de campo (4)

Fonte: Casadei (2020)


Inicialmente, foram realizadas reuniões com a associação de empresários da via. Na
sequencia, após capacitações das equipes de campo sobre a metodologia dos trabalhos,
comunicação social e biossegurança, foi realizado um levantamento de todos os imóveis
existentes em âmbito do trecho de intervenção, com uma abordagem individual e um
cadastramento dos contatos ocupantes desses imóveis, para facilitar a interação e
comunicação durante as demais etapas. Também foram realizados levantamentos de
diversos aspectos em campo, desde levantamentos topográficos, até contagem de fluxo
de veículos e pessoas (Figura 3).
Ao longo do percurso do projeto, foram realizadas reuniões virtuais periódicas, com
muitos órgãos da prefeitura, responsáveis pelas questões de trânsito, de urbanismo, meio
ambiente, planejamento urbano, desenvolvimento econômico, cultura e turismo, dentre
outros, visando à articulação de todas as temáticas em uma abordagem multidisciplinar.
Criou-se um grupo de trabalho específico para garantir a fluidez dos trabalhos.
Os levantamentos iniciais permitiram a compreensão da dinâmica de uso da via, suas
reais necessidades, assim como a elaboração de uma proposta inicial de intervenção,
esta lapidada a partir de consultas abertas e oficinas públicas para coletar os desejos da
população e cocriar o projeto de intervenção tática. Também foram realizadas reuniões
especificamente com os empresários da Rua José Antônio, seguidas de apresentação dos
resultados colhidos no processo de escuta de toda a proposta de intervenção. Com os
servidores municipais, em um convite ampliado, a intenção foi compartilhar as
metodologias utilizadas visando difundir o processo de construção coletiva de desenho
de projetos e testagens a partir do urbanismo tático, permitindo que o aprendizado a
partir desta experiência pudesse ser reproduzido no futuro. Um webinar foi organizado,
sob o tema “Inovação Social e Urbanismo Tático” para compreensão do arcabouço
teórico com a comunidade científica, a imprensa e a população em geral.
Adicionalmente, em momentos estratégicos de implementação das pinturas
coloridas, foram feitas convocatórias públicas para a população participar, que teve
104
contribuição ativa (MÁRQUES e CUNHA, 2021). Efetivamente ao final de novembro
de 2020 foram iniciadas as ações de montagem da intervenção e execução das obras
leves na via, e, na sequencia, as pinturas da via com voluntários (Figura 4).
Figura 4 – Etapas da intervenção na José Antônio:
(1) implantação, (2) diretrizes e (3) projeto.

Fonte: Márquez & Cunha (2020) e UGP (2021), adaptado pelos autores (2022).

Quanto às etapas de implementação do projeto, foi necessário: aquisição de


materiais; reaproveitamento ou adaptação de materiais dos depósitos da prefeitura;
transplantio de mudas do viveiro da prefeitura em vasos; fechamento dos trechos;
limpeza das áreas; marcação e pinturas; chegada dos materiais pesados e leves;
montagem e ambientação dos espaços; acabamentos, sinalização e entrega; ativações e
monitoramento.
Foram instalados mobiliários, tais como bancos de concreto, equipamentos de
ginástica e paraciclos, bem como um parklet em um dos trechos de intervenção. Os
cuidados com a biossegurança foram adotados com a disponibilização de totem com
álcool gel e painéis informativos sobre Covid-19.
Diversas atividades culturais marcaram o processo de lançamento dos espaços e
ativação do uso, oferecendo à população novos espaços públicos, antes ocupados
indistintamente pelos veículos automotores, tanto no percurso, como no estacionamento
(Figura 5).
Na segunda quinzena de janeiro, após um mês de testagem, foi realizada a
desmontagem dos espaços. Com base na avaliação, foram estabelecidas diretrizes para
melhor qualificar os projetos executivos de intervenção definitiva da Rua José Antônio, a
partir do que foi testado com a população.
O laboratório vivo estabelecido na via permitiu verificar a funcionalidade e aceitação
das intervenções pela população, com materiais leves e provisórios, o que permitiu
extrair ao final as diretrizes a serem incorporadas nos projetos executivos. As
intervenções definitivas iniciaram com as obras civis de requalificação da área central,
no segundo semestre de 2021, que incorporou a ampliação dos passeios nas esquinas,
criando condições de maior segurança aos pedestres, diminuindo as travessias e
exigindo a diminuição das velocidades dos veículos nas manobras realizadas nos
cruzamentos. Há uma regulamentação específica para os parklets no Município, sendo
105
que a testagem desse mobiliário despertou o interesse de bares e restaurantes locais para
fazerem uso deste dispositivo, a partir de sua autorização prévia na prefeitura.
Ao todo, a iniciativa foi desenvolvida no período de novembro de 2020 a janeiro de
2021. Um dos desafios foi realizar as atividades em um contexto de pandemia. O
impacto se fez ressentir desde a jornada reduzida nos órgãos municipais e nos
estabelecimentos comerciais do entorno, até a disponibilidade de materiais para as
intervenções no mercado regional (MÁRQUES; CUNHA, 2021).
Figura 5 – Ações de ativação do território que contribuem para o fortalecimento da
convivialidade dos espaços públicos

Fonte: Casadei (2020)


Contudo, ao mesmo tempo em que a pandemia dificultou os processos de execução
do projeto, foi possível constatar que as atividades ao ar livre e oferta de novos espaços
públicos não confinados ampliaram as possibilidades de uso e ocupação da cidade pela
população. Outras iniciativas realizadas no período pandêmico corroboram com essa
premissa. É o caso da implementação de ciclofaixas temporárias no município de Belo
Horizonte, Minas Gerais, dando solução às dificuldades enfrentadas no transporte
público e a necessidade de garantia de meios promotores da mobilidade urbana, tal como
relatado por França e Faria (2021).
Para Rodrigues et al. (2021), a aplicação do urbanismo tático vai além do estímulo à
mobilidade ativa, com a criação de ciclovias temporárias e a ampliação de calçadas. A
demarcação do distanciamento, orientação de fluxos e pontos de permanência, em
espaços públicos e privados, pode ser considerada medida importante para o controle da
pandemia, a partir de pequenas intervenções de uso universal e baixo custo.
Essas medidas foram adotadas no case da José Antônio. Esta experiência foi
considerada exitosa e inovadora para Campo Grande, possibilitando a abertura para
novas maneiras de concepção de projetos, a partir da construção coletiva com a
população.

106
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A experiência de urbanismo tático na Rua José Antônio, em Campo Grande,
apresentou instrumentos e metodologias inovadoras de concepção de projetos de
requalificação do espaço público.
Somando-se todas as adaptações à dinâmica de trabalho realizada pelas equipes
envolvidas no gerenciamento e execução do Programa de Desenvolvimento Integrado
em andamento no Município, pode-se afirmar que o período pandêmico trouxe
inúmeros desafios, dentre estes, a possibilidade de reinventar as maneiras de conceber,
planejar e gerenciar projetos urbanos na cidade.
REFERÊNCIAS
CAMPO GRANDE. Plano de Mitigação. Componente I: Revitalização do Centro. Campo
Grande: PMCG/BID, 2018.
CASADEI, J. M.. Relatório Técnico: Consultoria Socioambiental. Ed. 13. Campo Grande:
Programa Reviva Campo Grande, 2020.
CASTRO, E. B. de; CASADEI, J. M.; MACENA, L. A. de C. Desenvolvimento e Organismos
Financeiros Multilaterais: Experiências do Município de Campo Grande, MS. In: Congresso
Internacional de Direitos Humanos, 18 ed., 2021. Anais [...] Campo Grande: UFMS, 2021. p.571-
582.
FRANÇA, T. N. F. L.; FARIA, T. C. de A. Covid-19 e Urbanismo Tático: novas possibilidades de
uso do espaço público em tempos de pandemia. Fórum Ambiental da Alta Paulista, v. 17, n. 5,
p.1-11, 2021.
IPATRIMÔNIO. Campo Grande: Obelisco. Disponível em: http://www.ipatrimonio.org. Acesso
em: 24 mai 2022.
MÁRQUES, L.; CUNHA, M. Corredor José Antônio: Urbanismo Tático CG II, Relatório Final.
Campo Grande: TransLabUrb/Reviva Campo Grande/BID, 2021.
PLANURB, Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano. Perfil
Socioeconômico de Campo Grande. 28. ed. Campo Grande: PLANURB, 2021.
RODRIGUES, H. R.; SILVA, Á. D. C. da; FARIA, T. C. de A. As transformações do espaço
urbano em cenários epidêmicos: da modernidade ao pós-pandemia. Rev. Oculum Ensaios, v.18,
p.1-21, 2021.

107
IMPACTO DA PANDEMIA NAS
ATIVIDADES DOS AGRICULTORES
FAMILIARES DA FEIRA MUNICIPAL
DE CASCAVEL – PARANÁ, BRASIL

Elaine de Oliveira Zanini (1)


Luciana de Oliveira Fariña (2)

RESUMO. A agricultura familiar é a principal responsável pela alimentação do País e


está ligada diretamente à segurança alimentar e ao desenvolvimento do local onde está
inserida. Assim, este trabalho teve como objetivo geral compreender e analisar as
dificuldades dos agricultores familiares participantes da feira. municipal de Cascavel
– PR para venderem seus produtos na pandemia COVID-19. Em relação à
metodologia, esta pesquisa caracteriza-se como bibliográfica, exploratória
equalitativa. A coleta de dados ocorreu por meio da aplicação de questionários com os
agricultores familiares da feira municipal. Os resultados da pesquisa identificaramque
novos canais de divulgação como estratégia para aumentar a visibilidade dos
agricultores familiares e as vendas dos produtos são muito importantes, pois na
pandemia os agricultores da feira municipal de Cascavel tiveram suas vendas
diminuídas em até 70%, em decorrência dos decretos municipais, impedindo a
abertura da feira, diminuindo a quantidade de ônibus circulando, o que limita o acesso
à feira, principalmente, dos idosos que utilizam esse meio de transporte e por conta do
fechamento das escolas, afetando os participantes de programas como o PAA
(Programa de Alimentação Escolar) e PNAE (Programa Nacional de Alimentação
Escolar). Conclui-se que a pandemia COVID-19 repercutirá de várias formas na
agricultura familiar, em relação aos agricultores familiares da feira municipal, a
pesquisa revelou que são necessárias estratégias locais para amenizarem os seus
efeitos negativos.

Palavras-chave: Agricultura familiar. Mercados digitais. Pandemia-COVID-19.

(1) Doutora em Desenvolvimento Rural Sustentável. Universidade Estadual do Oeste do Paraná,


elainezanini@gmail.com.
(2) Doutora em Ciência e Tecnologia de Alimentos. Universidade Estadual do Oeste do Paraná,
luleal32@yahoo.com.br.
108
1 INTRODUÇÃO
Tanto na abordagem prática quanto na teórica, não há uma unanimidade em relação a
definição de agricultura familiar, o que se observa é muita discussão. De forma mais
genérica, o que permanece em várias vertentes é a base familiar da unidade de produção,
sendo diferenciados pelos estabelecimentos familiares e estabelecimentos não
familiares (MELICZEK, 2003). Para Schneider (2016) sob o viés social, os agricultores
familiares atuam de forma peculiar em relação ao trabalho e produção. Esse modelo
“consiste na interação de um grupo familiar, ligado por laços de parentesco, com a terra e
aos outros meios de produção, do mesmo modo que com outras unidades familiares e
grupos sociais (SCHNEIDER, 2016, p. 03)”.
De acordo Guanziroli e Cardim (2000), até os anos 90, a agricultura familiar possuía
carácter de subsistência, ou seja, o produtor produzia poucos alimentos para fins de
consumo próprio e vivia em pobreza rural (ESQUERDO-SOUZA; BERGAMASCO,
2015). Para Paula (2017), a agricultura consistia na relação entre produção e consumo de
alimentos, depois ela foi incorporada a uma complexa estrutura, devido ao aumento da
população urbana, uso de tecnologia no campo e a uma integração entre mercados,
transformando o alimento em mercadoria.
Após a década de 90, ela foi considerada importante para o desenvolvimento do País
e teve reconhecimento, inclusive com a elaboração de políticas públicas para o setor, no
entanto, elas eram focadas em médias e grandes propriedades rurais (ESQUERDO-
SOUZA; BERGAMASCO, 2015). Pode-se afirmar que a agricultura familiar se
consagrou com a consolidação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura
Familiar (PRONAF) e depois do projeto Fome Zero, aonde o setor passou ser vista como
estratégia, frente ao seu papel no fornecimento interno de alimentos e a sua capacidade
de resposta, mesmo com crises globais de alimentos e ainda gera emprego e renda para a
população (STOFELL, 2004; SCHNEIDER, 2009; PLANSAN, 2011; GUILHOTO et
al., 2005).
De acordo as Nações Unidas (2015) “500 milhões de pequenas fazendas no mundo
todo, fornecem até 80% da comida consumida numa grande parte dos países em
desenvolvimento”. No Brasil, segundo os dados do censo agropecuário de 2006,
4.367.902 estabelecimentos de agricultores familiares foram identificados, 84,4% dos
estabelecimentos brasileiros, os quais abrangem uma área de 80,25 milhões de hectares,
esse número representa 24,3% da área ocupada pelos estabelecimentos agropecuários
brasileiros, os quais são responsáveis por 38% do Valor Bruto da Produção (MDA, 2006;
PLEIN, FILIPPI, 2011), assim, o agricultor familiar condiz a 10% e 38% do Produto
Interno Bruto (PIB) e do Valor Bruto da Produção Agropecuária, respectivamente
(PORTAL BRASIL, 2014).
A agricultura familiar é a principal responsável pela alimentação no País (Plansan,
2017) e está ligada diretamente ligada à segurança alimentar (Fao, 2015) e ao
desenvolvimento do local onde está inserida (Alfatin, 2003), gerando renda para os
municípios e assim, promovendo o desenvolvimento local (ALMEIDA et al., 2007).
Como foi apresentado, a agricultura familiar tem participação significativa no
contexto econômico do País, no entanto, eles enfrentam muitos desafios no dia-a-dia das
atividades rurais, como: pouca terra para produção, dificuldade de assistência técnica,
logística, dificuldades de acesso ao mercado, os quais restringem os pequenos
produtores, principalmente em relação à competitividade.
109
Neste âmbito, algumas ações são acionadas pelos agricultores familiares com o
propósito de abrir novos canais de comercialização e, consequentemente, melhorar a
renda, como investir na diversificando da sua produção, utilizar tecnologias e adotar
novas técnicas de manejo visando a sustentabilidade (BASSO; SILVA; DAVID, 2019).
Dentre os canais de comercialização da agricultura familiar que têm crescido, temos as
feiras livres que são espaços de comércio e também de relacionamento entre consumidor
e produtor. Esse tipo de comércio se enquadra nos circuitos curtos de comercialização
(CCC) e para Schneider (2016, p. 127) é um canal de comercialização do mercado de
proximidade. As feiras livres/locais facilitam acesso aos produtos agrícolas e artesanais
(MDS, 2018).
Para Scarabelot e Schneider (2012), esse tipo de comercialização ajuda na resolução
de dois desafios enfrentados pelos agricultores rurais, o custo de produção, com a adoção
de tecnologias, custos com logística, dependência de insumos externos, entre outros e a
produção de alimentos saudáveis e seguros.
Segundo Schneider et al. (2020, p.11) “equivocadamente, no início da pandemia
diversos mercados e feiras locais foram suspensos ou tiveram seu funcionamento
restringido por autoridade locais e sanitárias. Ainda, a quantidade de consumidores não
acompanhou a reabertura das feiras, ora por estarem evitando deslocar-se para esses
mercados, levando muitos agricultores a diminuírem a produção. Nesse contexto, este
artigo tem como problema identificar o impacto da pandemia nas atividades dos
agricultores familiares da feira municipal de Cascavel – PR, Brasil. Para responder ao
problema têm-se como objetivo geral, compreender e analisar as dificuldades dos
agricultores familiares participantes da feira municipal de Cascavel – PR para venderem
seus produtos na pandemia COVID-19.
2 MATERIAIS E MÉTODOS
Esta pesquisa caracteriza-se como bibliográfica e exploratória, em relação aos seus
resultados se trata de um estudo qualitativo. Para responder ao problema de pesquisa:
impacto da pandemia nas atividades dos agricultores familiares da feira municipal de
Cascavel–Paraná,Brasil. E para atender ao objetivo geral: Compreender e analisar as
dificuldades dos agricultores familiares participantes da feira municipal de Cascavel –
PR para venderem seus produtos na pandemia COVID-19, foi realizado um
levantamento de dados por meio de entrevistas e posteriormente foi aplicado um
questionário para os agricultores familiares participantes da feira local do município de
Cascavel – PR, para identificarmos quais as dificuldades enfrentadas por eles para a
venda dos produtos na pandemia.
Em relação aos respondentes, participaram 39 dos 75 agricultores familiares da feira
municipal atualmente, responderam ao questionário somente os agricultores familiares
que comercializam produtos oriundos da agricultura familiar, assim, os vendedores de
lanches, espetinhos, bombons, artesanatos e vendedores de produtos obtidos de terceiros
não foram questionados por conta do viés da pesquisa e no momento 10 agricultores
familiares idosos também não foram questionados por estarem afastados por conta de
pandemia.
A seleção das pessoas a serem entrevistas e para responderem ao questionário foi
realizada utilizando a técnica Delphi, na qual especialistas são selecionados conforme o
seu grau de experiência e conhecimento no assunto. Assim, opta-se pela escolha dos
agricultores familiares da feira municipal e gestores associados a ela, como a
110
Extensionista do município de Cascavel, a Coordenadora estadual de agroindústria, a
Coordenadora do PMAE e do PAA do município.
Em relação a feira, ela acontece semanalmente no município de Cascavel – PR em
dois lugares, um deles é dentro do estacionamento do Teatro Municipal Cultural
Gilberto Mayer (às 3a e 5a, das 12h às 19h) e o outro lugar é em frente a prefeitura
municipal de Cascavel (aos sábados e domingos, das 6h às 12h).
3 RESULTADO E DISCUSSÃO
Para atender ao problema da pesquisa e ao objetivo geral foram estudadas as
dificuldades dos agricultores familiares participantes da feira municipal de Cascavel –
PR para venderem seus produtos na pandemia COVID-19, as quais serão detalhadas a
seguir.
O primeiro dado (Figura 1), apresenta o endereço das propriedades, ela permite
observarmos que a maior parte dos produtos vendidos são produzidos no distrito de São
Salvador (11), assim a logística, principalmente por conta do aumento do combustível é
um fator que foi citado por alguns agricultores com um fator de dificuldade na pandemia,
impactando em menor renda para esses agricultores.
Figura 1 - Endereço das propriedades

Fonte: Elaborado pela Autora com o auxílio do Microsoft Excel (2021)


Neste âmbito, uma ajuda de custo por parte da gestão municipal e a redução ou
abono do preço cobrado pelo pedágio, no caso de agricultores que passam por ele para
levarem a produção até a feira, é uma boa estratégia a ser elaborada pela gestão
municipal, para que eles não tenham seu lucro reduzido e também, para que o repasse
deste custo ao consumidor seja menor ou não aconteça.
Em relação aos produtos produzidos pelos agricultores familiares, a maioria produz
legumes (22) e verduras (16), o que corresponde, respectivamente a 56,4% e 41%
(Figura 2).
Vários agricultores familiares da feira afirmaram que o aumento no custo da matéria-
prima, como mudas, sementes, ração o gado, farinha de trigo, fez com que a produção
fosse reduzida e os investimentos na produção fossem suspensos, alguns tem receio de
investirem e não ter para quem vender, devido ao fraco movimento.
A Figura 3 apresenta por quais canais os agricultores familiares vendem os seus
produtos, os mais citados foram: a própria feira, o PAA com 17 agricultores (43,6%) e o
PNAE e a venda na propriedade com 8 agricultores cada canal (20,5%).
111
Figura 2 - Produtos produzidos nas propriedades

Fonte: Elaborado pela Autora com o auxílio do Microsoft Excel (2021)


Figura 3 - Canais de comercialização dos produtos

Fonte: Elaborado pela Autora com o auxílio do Microsoft Excel (2021)


De acordo com as entrevistas concedidas pela coordenadora do Programa Aquisição
de Alimentos (PAA) e pela coordenadora do Programa Municipal de Alimentação
Escolar (PMAE) no município, a venda para esses programas fortalecem a agricultura
familiar e também a segurança alimentar e nutricional do município (MARCA; TONIN,
2020). Em 2021, a compra dos produtos dos agricultores familiares aconteceu por meio
do PAA, via chamada pública, a Cooperativa de orgânicos do município Cores da Terra
em parceria com a Cooperativa Apropal de Palmas-PR atendeu a demanda de produtos
orgânicos para a merenda municipal (MARCA, 2021).
É importante frisar que apenas um dos dois agricultores produtores de orgânicos da
feira entregam para tais mercados institucionais, tal fato demonstra que há pouca relação
com a segurança alimentar, no sentido de alimentação segura e saudável, o que pode ser
incentivado estrategicamente pela gestão da feira e pela gestão municipal. Esses
alimentos também são essenciais para os adultos que precisam de uma alimentação
saudável para aumentar a imunidade e terem os sintomas menos graves da COVID-19 e
para pessoas com sobrepeso e obesidade que precisam ter uma alimentação balanceada,
uma vez que, essas doenças são um sério fator de risco, no caso de uma infecção pela

112
COVID-19, pois, a obesidade está associada ao risco de sofrer efeitos piores caso seja
contaminado (OPS, 2020).
A coordenadora do PMAE compra os produtos dos agricultores familiares para a
merenda das escolas municipais por meio de recursos livres provenientes da prefeitura
do municipal. Segundo ela, em 2019 foram utilizados em torno de R$ 11 mil reais para
essas compras e em torno de 3 mil reais foram utilizados do PNAE Federal para compras
para a merenda das escolas estaduais. Ela complementa que, o uso do PNAE Federal em
2019 foi de 67% e no ano de 2020 foi de em média 40%. No fim de 2020 todos os
produtos para a produção da merenda vinculados ao bolsa família estavam previstos
para serem comprados com recursos livres, já para os alunos da rede estadual a previsão
era o uso de recursos federais do PAA. O cadastro no bolsa família (CADÚnico) para
acesso aos kits escolares teve início em maio de 2020, mas as entregas aconteceram em a
partir de agosto de 2020 (TONIN, 2020), o que evidencia o fomento à agricultura
familiar no município de Cascavel.
De acordo com a FAO (2015), quando a agricultura familiar é trabalhada em
conjunto com outras políticas, ela pode contribuir com o desenvolvimento local,
avivando as economias locais e ajuda diminuir os índices de insegurança alimentar, uma
vez que, para Alfatin (2003), ela está ligada à segurança alimentar. Percebe-se por meio
das entrevistas, que esse trabalho conjunto está sendo feito no município.
Para Ploeg (2011), os mercados institucionais são essenciais para a redução da
pobreza e para a inclusão dos agricultores familiares no mercado e apenas 1 agricultor
citou como dificuldade para se inserir neste mercado, a quantidade de papéis e o pouco
tempo para envio para participação dos editais e 5 deles disseram que o fechamento das
escolas teve impacto na redução das vendas.
Diante do importante papel que a agricultura familiar exerce para o País, também foi
entrevistada a extensionista municipal, Teresina Barron, ligada diretamente aos
agricultores familiares da feira municipal, assim como os agricultores familiares da feira
municipal foram questionados sobre as dificuldades enfrentadas neste momento da
pandemia COVID-19. Em relação a elas, para a extensionista, os agricultores que
vendem para os mercados institucionais não sentiram tanto as dificuldades da pandemia,
o que foi confirmado pela também coordenadora estadual de agroindústria “O mercado
institucional é forte em Cascavel, então foram poucas as dificuldades”.
Barron acredita que tal fato é devido eles venderem para outros locais como o
exército, quartel e hospital universitário, por exemplo, mas, no entanto, os resultados da
pesquisa mostram que apenas dois agricultores questionados entregam para o exército e
nenhum deles citaram o quartel ou o hospital. “Os produtores de mercados institucionais
sofreram pouco com os cortes institucionais por conta dos programas municipais,
parcerias para vendas inclusive para o quartel e para o HU, no entanto, com a pandemia
as escolas fecharam e esses agricultores estão entregando os kits” (BARRON, 2021).
A coordenadora estadual de agroindústria, relatou que no cenário estadual uma das
dificuldades foi a adaptação cardápio feita pelos nutricionistas para atender o plano de
segurança alimentar e nutricional, por conta da necessidade de uma dieta balanceada.
Ela completa que, quando perceberam os cortes nas compras de alguns produtos e maior
incerteza perante maior concorrência (cooperativas) - pois muitos agricultores se unem
em cooperativas para participarem de editais - para que os agricultores sentissem menos
o impacto desses fatores, eles incentivaram os agricultores a não dependerem somente
113
deste mercado, alguns deles já tinham agroindústria e aqueles que já tinham um perfil
empreendedor, principalmente, os que tinham o negócio como fonte de renda principal,
passaram a produzir produtos minimamente processados, como a mandioca, que era
lavada, descascada e rotulada para entregarem para os mercados institucionais e o
incentivo foi para venderem para os mercados locais (mercadinhos, padarias...).
Segundo ela, os agricultores que tinham uma idade avançada, que produziam em menor
escala e não dependiam da agroindústria - o negócio era para um complemento de renda
- foram os que mais sentiram devido aos fatores citados anteriormente (SILVA, 2021).
No município de Cascavel, a Figura 4 apresenta algumas dificuldades enfrentadas
pelos agricultores familiares da feira municipal durante a pandemia.
Figura 4 - Dificuldades enfrentadas para as vendas dos produtos

Fonte: Elaborado pela Autora com o auxílio do Microsoft Excel (2021)


As dificuldades mais citadas por eles são: restrição de horários para abertura do
comércio por conta dos decretos e a mudança do local de entrega ou venda, as quais
ambas contemplaram 25 agricultores (64,1%), a restrição dos horários de circulação dos
ônibus foi citada por 13 agricultores (33, 3%), 9 agricultores relataram que as vendas
diminuíram significativamente (23,07%), 2 deles disseram que diminuíram em torno de
70%.
Para a extensionista municipal Teresinha Barron, os agricultores familiares,
principalmente, os participantes da feira municipal, tiveram redução da renda devido aos
decretos municipais, os quais impedem a abertura da feira, reduzem o tempo de abertura,
por conta do toque de recolher e também restringem a quantidade de ônibus circulando,
limitando o uso do transporte coletivo, e assim consequentemente, limita o acesso dos
consumidores à feira, Barron cita o exemplo dos idosos que utilizam esse meio de
114
transporte para irem até a feira (BARRON, 2021), o que foi confirmado por parte dos
agricultores familiares questionados.
Em relação a mudança do local de venda, apesar de não ter relação direta com a
pandemia, os agricultores e a extensionista municipal disseram que foi algo que
aconteceu durante a pandemia e intensificou a queda nas vendas, segundo eles, devido
ao local ser afastado do centro e, principalmente, por conta de os consumidores terem
dificuldades de encontrarem o novo local da feira, o qual mudou duas vezes neste
período e teve pouca divulgação.
Alguns agricultores relataram, dentre às dificuldades, a ausência de políticas
públicas municipais e a pouca assistência por parte da prefeitura municipal, a qual tem
condições de ajudá-los mais, principalmente, em relação à mudança de local da feira, por
conta da reforma no local antigo. Neste contexto, a divulgação é uma oportunidade que
pode ser explorada tanto pelos agricultores familiares de forma individual ou
coletivamente, com o apoio da gestão da feira e da gestão municipal, atualmente a feira
local possui uma página coletiva na rede social Facebook, a qual é gerida pela gestão
municipal, no entanto, nela a divulgação não foi suficiente para os consumidores
encontrarem o novo local da feira.
Tal fato também limita o fomento aos circuitos curtos. Para Leite e Teles (2020), esse
tipo de auxílio por parte da prefeitura é imprescindível, ele contribui para demonstrar os
benefícios que ela traz à cidade, dando maior visibilidade às feiras e aumento de
consumidores, essencial diante da diminuição das vendas que chegam a 70%, de acordo
com alguns agricultores da feira.
Dentre as dificuldades mais citadas, destaca-se a queda significativa nas vendas.
Essa constatação é preocupante, pois para Reis (2018, p. 31), esse setor é “participante
do processo de desenvolvimento das regiões onde está inserido”. Assim, a importância
dos agricultores familiares tem sido enfatizada, devido aos seus produtos serem
destinados a venda direta a consumidores em vários mercados, gerando renda e o
desenvolvimento local (ALMEIDA et al., 2007).
Essa redução das vendas, segundo Schneider (2020), ocorre devido a quantidade de
consumidores não ter acompanhado a reabertura das feiras, ora por estarem evitando
deslocar-se para esses mercados, levando muitos agricultores a diminuírem a produção e
a usarem outras formas de comercialização e divulgação, por meio de plataformas
digitais e do uso de redes sociais, aumentando significativamente as compras virtuais.
Neste sentido, alguns agricultores questionados na pesquisa, disseram que os
clientes ainda têm medo e não se adaptaram a dinâmica da feira na pandemia, como por
exemplo, a obrigatoriedade do uso de máscaras e a não poderem tocar nos produtos, um
dos agricultores cita ainda que o local da feira é afastado do centro da cidade e há poucas
vagas de estacionamento para os clientes. Tais fatos, segundo eles, têm diminuído o
movimento na feira.
Em relação a esse cenário, o recém eleito presidente da feira Sr. Jeferson Bonatto
disse que pretende firmar parcerias com as universidades locais para ajudá-los,
principalmente, num primeiro momento, a entender qual o perfil dos clientes da feira
para assim, adotar uma estratégia para atingi-los, a fim de aumentar o movimento e,
consequentemente, as vendas.
Parte dos agricultores familiares da feira (12,8%), citaram dentre as dificuldades
115
enfrentadas por eles, o alto custo da matéria-prima, como por exemplo. o custo das
mudas, das sementes, da ração para alimentação do gado e da farinha de trigo. O
aumento desses custos na pandemia impactou negativamente na produção e no
investimento na produção. Os agricultores ainda relataram que não conseguiram
repassar esse aumento para o consumidor, eles têm receio de venderem menos se
aumentarem os preços dos produtos e justificam que não o fazem devido à crise
financeira da população, dificuldade também citada pelos questionados, o que para eles,
fez com que a produção fosse reduzida e os investimentos na produção fossem
suspensos.
Tal momento é oportuno para investir em novas tecnologias, as quais podem reduzir
o custo de produção, e se inserir em um novo mercado, o mercado digital. A EMBRAPA
(2020), afirma que a facilidade de comunicação e de acesso à informação, proporcionada
pela internet, são a porta de entrada hoje para introduzir o agricultor nessas novas
tecnologias e aplicações capazes de ampliar o acesso a mercados, reduzir custos ou ainda
agregar valor à produção.
Dentre as estratégias utilizadas pelos agricultores familiares do município de
Cascavel para aumentarem a renda está a consolidação de agroindústrias e a agregação
de valor. Com a aplicação dos questionários foram identificadas 10 agroindústrias na
feira municipal, contemplando 10% dos empreendimentos (Figura 5). Os segmentos são
doces, salames e queijos.
Figura 5 - Tipos de empreendimentos rurais

Fonte: Elaborado pela Autora com o auxílio do Microsoft Excel (2021)


Os agricultores familiares veem na agroindústria uma oportunidade para
diversificação da produção, venda do excedente e, consequentemente, terem mais uma
fonte de renda na propriedade, assim, o processo de agregar valor aos produtos é
fundamental para que o resultado esperado por eles seja alcançado.
Segundo Maluf (2004) a criação de novos canais de comercialização está associada à
valorização de produtos com diferenciados atributos de qualidade. Para Reis (2018, p.
31), a agricultura familiar ganha representatividade quando tem uma propriedade
diversificada, que possa lhe garantir a participação em feiras do produtor e ainda
transformar a matéria prima em empreendimentos agroindustriais.
A agregação de valor contribui para a inclusão em novos mercados, ela também
tende a evitar o êxodo rural com a promoção do desenvolvimento rural e local, uma vez
que, gera mais renda e proporciona uma melhor qualidade de vida ao agricultor, é o que
afirma o SEBRAE (2012), para esse órgão, a agregação de valor possibilita a inserção
116
em novos mercados com um preço mais competitivo, proporcionando maior renda ao
produtor e uma melhor qualidade de vida, além de inibir o êxodo rural, promovendo o
desenvolvimento rural e o desenvolvimento local.
Sob a ótica da segurança alimentar e nutricional no município também foi possível
observar que há pouca relação com a segurança alimentar e nutricional, no sentido de
alimentação segura e saudável. Os resultados revelam que apenas um dos dois
agricultores familiares produtores de orgânicos da feira municipal, entregam para os
mercados institucionais do município de Cascavel, o que pode ser incentivado e melhor
explorado tanto pela gestão da feira quanto pela gestão municipal, pois é uma boa
oportunidade para produzirem para esse nicho de mercado e assim, aumentarem as
vendas, as quais muitos deles relataram que diminuíram muito com a pandemia
COVID-19, chegando a 70%.
Entretanto, no contexto geral, a relação com a segurança alimentar e nutricional do
município é muito forte, além de atenderem os consumidores com a venda na feira, eles
atendem restaurantes e refeitórios de empresas, vendem porta a porta, entregam para o
Programa do Leite da Criança (PLC) entre outros, grande parte dos agricultores da feira
também vendem para os mercados institucionais Programa Aquisição de Alimentos
(PAA) e Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), dos 39 questionados, 17
(43,6%) e 8 (20,5%) agricultores familiares vendem para esses mercados,
respectivamente, totalizando 25 agricultores (64,1%), apresentando a importância do
incentivo deste setor para a segurança alimentar e nutricional do município.
Com essas informações se torna possível tomar decisões e desenvolver políticas e
estratégias mais assertivas e condizentes com a realidade e com as dificuldades citadas
pelos agricultores familiares da feira municipal, possibilitando ainda, atender às
oportunidades vislumbradas, como a divulgação por meios digitais.
É evidente que a pandemia da COVID-19 desnudou nossas fragilidades e
vulnerabilidades e ocasionará mais efeitos negativos do que positivos, no entanto, é uma
séria oportunidade de reflexão sobre como produzimos, processamos e distribuímos os
alimentos e estando no século XXI temos tecnologia e conhecimento suficientes para
que ninguém passe fome ou viva em insegurança alimentar (Schneider, 2016), neste
viés, é importante que parcerias sejam firmadas e oportunidades sejam vislumbradas
para que os efeitos negativos da pandemia sejam amenizados em relação aos
agricultores familiares da feira de Cascavel – PR.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base no objetivo proposto de compreender e analisar as dificuldades dos
agricultores familiares participantes da feira. municipal de Cascavel – PR para
venderem seus produtos na pandemia COVID-19, foi possível constatar que a pandemia
COVID-19 repercutirá de várias formas na agricultura familiar, abrangendo todas as
etapas do processo de produção até a oferta de alimentos.
Os agricultores familiares da feira municipal, relataram dentre outras dificuldades
enfrentadas neste momento de pandemia, que tiveram suas vendas diminuídas em até
70%, os clientes ainda têm medo e não se adaptaram a dinâmica da feira na pandemia,
ainda houve a mudança de local da feira para um local mais afastado do centro da cidade
com poucas vagas de estacionamento para os clientes, esses fatores somados à crise
financeira da população, revelam que são necessárias estratégias locais para
117
amenizarem os seus efeitos negativos.
Neste viés a gestão da feira está procurando parcerias com universidades, mas
também é imprescindível um maior apoio da gestão municipal, frente a importância da
agricultura familiar e aos benefícios das feiras para os municípios, gerando renda e
fomentando o desenvolvimento local.
Neste sentido, acredita-se que a investigação das dificuldades enfrentadas pelos
agriculores da feira municipal de Cascavel – PR possibilita que estratégias sejam
formuladas pela gestão da feira e municipal, a fim de fomentar as vendas e assim,
contribuirá com o fortalecimento e desenvolvimento da agricultura familiar na
pandemia e no pós-pandemia, bem como para reduzir os índices de insegurança
alimentar e nutricional do município e ainda avivará o desenvolvimento local.
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119
IMPACTOS DA PANDEMIA DA
COVID-19 SOBRE A PRODUÇÃO E
COMERCIALIZAÇÃO DE ALIMENTOS
ORGÂNICOS EM CHAPECÓ - SC

João Guilherme Dal Belo Leite (1)


Jéssica Thaís Agnoletto (2)

RESUMO. A produção e comercialização de alimentos orgânicos em Chapecó SC têm


evoluído impulsionada pela procura da população por produtos mais nutritivos,
saudáveis e livres de agrotóxicos. O principal meio de comercialização desses
produtos são as feiras locais, as quais movimentam a economia e são uma alternativa
de renda aos agricultores familiares. O objetivo deste trabalho é caracterizar e
identificar os principais impactos da pandemia da Covid-19 sobre a produção e
comercialização de produtos orgânicos nas feiras livres de Chapecó-SC. A pesquisa
foi realizada no período de janeiro a fevereiro de 2021, no município de Chapecó-SC.
A coleta de dados foi realizada através de entrevistas remotas com produtores de
alimentos orgânicos que atuam nas feiras livres do município. Os resultados indicam
que a produção orgânica é uma alternativa para geração de renda e o fortalecimento da
relação com os consumidores. O estudo identificou tendência de aumento da demanda
por produtos orgânicos, puxada pela procura por alimentos mais saudáveis e livres de
agrotóxicos, particularmente durante a pandemia da COVID-19. A expansão do
mercado de orgânicos, no entanto, depende de estratégias e políticas públicas para
promover a produção, com foco na assistência técnica e eficiência produtiva. Por
outro lado, a pandemia afetou agricultores que comercializavam seus produtos em
mercados locais e institucionais, com prejuízo às vendas e a renda familiar.
Consequentemente, alguns se reinventaram através da adoção de novas formas de
comercialização.

Palavras-chave: Feiras livres. Agricultura familiar. Renda Agrícola.

(1) Doutorado em Sistemas de Produção Agrícola, Universidade Federal da Fronteira Sul,


joao.leite@uffs.edu.br
(2) Graduação em Agronomia, Universidade Federal da Fronteira Sul, jessicagnoletto@gmail.com
120
1 INTRODUÇÃO
O consumo de orgânicos em todo mundo cresce com a busca por alimentos que
propiciam saúde e bem-estar associado ao menor risco de contaminação alimentar com
agrotóxicos (DIAS, 2015).
O Brasil ocupa a quinta maior área com produção orgânica do mundo, com
aproximadamente 1,77 milhão de hectares cultivados (HLEBOSKI, 2018). Segundo
dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA, 2019), o número
de propriedades orgânicas cresceu 300% entre 2010 e 2018. No ano de 2019, foram
registrados 17,7 mil produtores de alimentos orgânicos, com 22 mil unidades produtivas.
Neste grupo, aproximadamente 90% são da agricultura familiar e a maioria está
concentrada na região Sul do país (BORGUINI e TORRES, 2006). E Santa Catarina é o
quarto produtor nacional de orgânicos, com 1.275 unidades de produção orgânica
(EPAGRI, 2019).
Em 2020, o consumo de orgânicos no Brasil cresceu aproximadamente 30%
(ORGANIS, 2021). O aumento da demanda está associado a mudança de hábitos
alimentares e busca por alimentos mais saudáveis durante a pandemia da Covid-19.
Durante o período de isolamento social, muitas pessoas que costumavam se alimentar
fora do lar passaram a preparar suas refeições, o que promoveu o consumo de alimentos
in natura (frutas e legumes) e produtos orgânicos (PASQUALOTTO, 2020).
Porém, o aumento do desemprego no Brasil resultou na diminuição do poder de
compra dos consumidores e o fechamento de mercados tradicionais de comercialização.
Os agricultores familiares foram afetados diretamente pois dependem da venda de seus
produtos em cadeias curtas de comercialização e em mercados locais (FAVARETO e
CAVALCANTE FILHO, 2020). De acordo com Schneider et al. (2020) as principais
dificuldades enfrentadas pelos agricultores durante a pandemia da Covid-19 estão
relacionadas ao estoque de produtos (falta de local para armazenamento e dificuldades
na logística), o impedimento da comercialização e distribuição, além das dificuldades
econômicas como acesso a capital financeiro e diminuição de vendas e da renda familiar
e o acesso a insumos necessários para a produção.
O principal objetivo deste estudo foi caracterizar e identificar os principais impactos
da pandemia da Covid-19 sobre a produção e comercialização de produtos orgânicos
nas feiras livres de Chapecó-SC. O trabalho está estruturado em quatro partes principais.
A primeira apresenta elementos introdutórios, objetivos e revisa a literatura sobre o
tema. A segunda parte apresenta a metodologia, indicando o percurso metodológico
para o desenvolvimento da pesquisa e a tramitação no Conselho de Ética em Pesquisa.
Na terceira são abordados os resultados e a discussão sobre os impactos da pandemia da
Covid-19 sobre a produção e comercialização de orgânicos em Chapecó-SC.
Finalmente, a última parte apresenta as considerações finais do estudo.
2 MATERIAL E MÉTODOS
A pesquisa foi realizada no período de janeiro a fevereiro de 2021, no município de
Chapecó-SC. O estudo considerou uma população de dez produtores rurais (100% dos
feirantes com certificação orgânica ativa em Chapecó). O acesso aos agricultores
certificados se deu através da Associação de Pequenos Agricultores do Oeste
Catarinense (APACO). Desde a sua criação em novembro de 1989, a APACO atua como
uma organização não-governamental com foco no desenvolvimento rural sustentável e
121
solidário da agricultura familiar (BADALOTTI, 2003). Através de seu projeto de
certificação, a APACO capacita os agricultores familiares com novas técnicas, manejos
de solo e de cultivo agrícola voltados para a produção orgânica (MATTOS, 2019).
Adicionalmente, a APACO coordena o núcleo do Oeste Catarinense da Rede Ecovida
de certificação participativa (APACO, 2021).
A amostra foi composta por agricultores que produzem e necessariamente
comercializam produtos orgânicos certificados nas feiras livres do município de
Chapecó (SC). Conforme dados da APACO, das 10 famílias com certificação orgânica,
duas não comercializam seus produtos nas feiras livres do município. Portanto, a
amostra final foi de oito famílias (n = 8).
Um questionário semiestruturado, contendo dezessete questões, foi utilizado para
coleta de informações sobre produção e comercialização de produtos orgânicos,
processo de certificação, assistência técnica e os impactos da pandemia da Covid 19.
As entrevistas foram realizadas de forma remota (online). Todos (n = 8) aceitaram
participar do estudo após convite feito por aplicativo de mensagens. As entrevistas
iniciaram após leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e
confirmação dos entrevistados aceitando participar da pesquisa de forma voluntária.
As respostas foram registradas em arquivos de áudio para posteriormente serem
transcritas e transferidas para planilhas eletrônicas utilizadas no processo de
sistematização e análise das informações coletadas.
O projeto de pesquisa, bem como as questões para a coleta de dados foram
previamente aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da
Universidade Federal da Fronteira Sul (CAAE: 12529719.4.0000.5564). Os nomes dos
participantes foram ocultados, sendo identificados, quando necessário, por letras e/ou
números para preservar a sua identidade, conforme a orientação do Comitê de Ética.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
As feiras livres de produtos coloniais e agroecológicos de Chapecó foram criadas a
partir de um projeto público voltado para a agricultura familiar na década de 1990, com
o intuito de assegurar a permanência dos pequenos agricultores familiares na atividade
agrícola (SEDEMA, 1997). O projeto foi criado com a parceria do poder público através
da Secretaria de Desenvolvimento Rural e Meio Ambiente (SEDEMA) de Chapecó, os
agricultores com cadastro na prefeitura e os consumidores da cidade (PAVAN e
JUNIOR, 2017). A partir de sua criação, as feiras livres se consolidaram como o
principal canal de comercialização aos agricultores com certificação orgânica em
Chapecó (CAVALLET, 2015). Conquanto, os feirantes têm custos com aluguel e
divulgação da feira (marketing) (FOSSÁ, et al., 2018).
Entre os agricultores entrevistados, os produtos orgânicos são comercializados em
três locais: dois localizados no Centro da cidade e um no bairro São Cristóvão. Os
agricultores também comercializam seus produtos em outros locais como: fruteiras,
casa do orgânico e supermercados da cidade. Além da distribuição de alimentos para
escolas através do PAA e PNAE e entregas através do delivery.
Os principais produtos com certificação orgânica comercializados nas feiras livres
são olerícolas, frutas e sucos. Com destaque para alface, almeirão, agrião, batata-doce,
banana, bergamota, caqui, suco de laranja, caldo de cana e suco de uva.
122
Em Santa Catarina o número de produtores de alimentos orgânicos cresceu 12,9%
entre 2017 e 2018. Destaque para os produtos hortícolas, que correspondem por grande
parte valor total da produção. A alface é o principal produto comercializado, com um
valor total de R$ 2,8 milhões, representando 22,4% do total (ZOLDAN e MIOR, 2012).
Todos os feirantes entrevistados acreditam que a oferta de produtos orgânicos está
aumentando em resposta ao aumento da demanda. Segundo Gottschalk e Leistner
(2013), o aumento da demanda por produtos orgânicos é uma tendência mundial
associada a qualidade de vida e preservação ambiental. Adicionalmente, no período de
pandemia, foi notável o aumento no consumo de produtos orgânicos puxado pela
preocupação com a alimentação saudável e o fortalecimento do sistema imunológico
(PASQUALOTTO, 2020).
Em termos quantitativos, 75% dos feirantes responderam que sua produção
orgânica atende à demanda da feira e 25% responderam que não (por falta de mão de
obra). A escassez de mão de obra é uma reclamação comum entre os feirantes, mesmo
entre aqueles que atendem à demanda da feira. De acordo com Koswoski e Cericato
(2016), a falta de mão de obra é uma das principais limitações para a produção orgânica.
Essa limitação faz com que muitos agricultores desistam ou não expandam a atividade.
A produção orgânica demanda maior quantidade de mão de obra, quando comparada
com a produção convencional. Na maioria dos casos está associada ao controle manual
de plantas espontâneas e o aumento da frequência de práticas de manejo fitossanitário
(p.ex. monitoramento, controle, rotação de culturas) (PERON et al., 2018).
Para 87% dos feirantes entrevistados a falta de mão de obra é o principal empecilho à
expansão da produção orgânica, seguida de limitações climáticas e pragas (13%).
Similarmente, Silva (2007) encontrou em sua pesquisa que 44% dos agricultores
relatavam a falta de mão de obra como principal limitante na produção agrícola familiar.
Os feirantes também são unânimes quanto a expectativa de aumento da demanda
por produtos orgânicos. Novamente foram citados como principais causas a pandemia e
a tendência pelo consumo de alimentos saudáveis, incluindo produtos frescos e livres de
agrotóxicos. O relato a seguir demonstra tal afirmação.
Eu acho que a tendência é aumentar, porque conversando com várias
pessoas, tem aqueles que ainda não tem conhecimento sobre produtos
orgânicos e não tem o hábito de consumo, mas devagarinho estão
conhecendo e comprando. Pois a saúde (da população) não está boa, e
vendendo produto orgânico estamos vendendo saúde também, é um
produto natural, utilizamos apenas adubo orgânico. Então temos um
cuidado extremo na produção, porque o que não quero pra mim não
quero pro cliente, então temos que ter consciência” (Entrevistado A -
Produtor).
Quando questionados sobre as vantagens da comercialização de produtos orgânicos
na feira, os feirantes destacaram a entrega do produto fresco direto ao consumidor e a
construção de uma relação de confiança. De acordo com Fonseca et al. (2009), ao
comercializar na feira o produtor orgânico se sente mais valorizado, pois os
consumidores criam uma relação de fidelidade, sentindo-se seguros ao comprar um
produto de qualidade, conhecendo a origem do alimento e sabendo da preocupação dos
agricultores em relação ao meio ambiente e bem-estar humano.
As principais desvantagens estão nas perdas de produtos não comercializados ao
123
final da feira (com impacto sobre a renda da produção orgânica), e o pagamento do
aluguel pelo espaço onde a feria é realizada. Conforme declaração abaixo:
Olha agora como desvantagem a gente teve que pagar o aluguel na feira
né, do espaço agora, porque a prefeitura não liberou mais o local, daí
estamos pagando aluguel agora” (Entrevistado C - Produtor).
O processo de certificação não é reconhecido pelos feirantes como custoso. No
entanto, o grupo se divide quanto aos desafios para adequar-se as normas para
certificação orgânica. Cerca de 50% dos feirantes não utilizavam fertilizantes sintéticos
e agrotóxicos e, para este grupo, o processo de certificação foi relativamente fácil. Para
os demais, a transição para o manejo orgânico foi mais desafiadora e demorada, levando
até 5 anos para conseguir adequar a propriedade de acordo com as exigências da
certificadora. O processo de certificação foi realizado através do sistema de certificação
participativo, que é uma alternativa aos agricultores que não conseguem pagar os custos
dos sistemas privados de certificação.
A pandemia da Covid-19 resultou em importantes impactos sobre aspectos
produtivos e, principalmente, na comercialização dos alimentos produzidos. Os
feirantes foram unanimes quanto a redução das vendas, principalmente pelo fechamento
das feiras livres durante os períodos mais restritivos do isolamento social (Figura 1). No
Brasil, as primeiras medidas para combater a disseminação do Covid-19, incluíram o
fechamento de feiras e comércios de venda direta (SCHNEIDER et al., 2020). Um dos
feirantes também vendia seus produtos para a alimentação escolar, o que também foi
suspendido em vista do cancelamento das aulas presenciais.
Figura 1 - Redução das vendas durante a pandemia.

Fonte: Elaborado pelos autores.


O impacto sobre a redução das vendas dos feirantes variou entre de 10% a 50%
(Figura 1). A maior redução ocorreu entre os feirantes que, além da feira, dependem da
comercialização em restaurantes, cantinas e do Programa Nacional de Alimentação
Escolar (PNAE). O fechamento abrupto de restaurantes e a suspensão das aulas teve
impacto direto sobre a demanda de alimentos. Feirantes que comercializam sua
produção exclusivamente nas feiras e nas unidades de produção foram menos

124
impactados. Segundo Schneider et al. (2020), o cancelamento das aulas afetou
significativamente o PNAE, causando impacto negativo no sistema de abastecimento
alimentar local e de agricultura familiar.
A renda dos feirantes também foi afetada pela pandemia (Figura 2). Alguns feirantes
adotaram medidas sanitárias para continuar a comercialização em suas propriedades,
mas a grande maioria adotou novos canais de comercialização, como a distribuição nas
redes varejistas (supermercados), delivery com cestas de produtos e criação de redes
sociais para divulgação dos produtos. Com tais estratégias de adaptação, dois feirantes
não observaram diminuição na renda. Complementarmente, os consumidores
aumentaram o consumo de produtos orgânicos e isso contribuiu para a mitigar os efeitos
sobre a redução das vendas. De acordo com Schneider et al. (2020), a pandemia da
Covid-19 modificou a comercialização de alimentos, aumentando o número de compras
virtuais. As novas formas de comercialização transformaram o modo como os
agricultores ofertam os produtos, diminuindo os impactos da pandemia na economia
local. Segundo Organis (2021), em 2019 apenas 1% das vendas eram feitas online e,
com a pandemia da Covid-19, esse percentual chegou a 20%.
Figura 2 - Redução da renda dos feirantes durante a pandemia da Covid-19.

Fonte: Elaborado pelos autores.


Com o retorno das atividades nas feiras, os feirantes adotaram medidas sanitárias
para poder atender o público de maneira segura. Dentre as medidas no atendimento aos
consumidores, todos os feirantes citaram o uso de máscara, álcool em gel e lavar as
mãos frequentemente. Além disso, os idosos que atendiam na feira foram afastados das
atividades temporariamente, para evitar a exposição no contato com o público.
Todos os feirantes pretendem manter os cuidados sanitários introduzidos durante a
pandemia, pois acreditam que assim vão evitar o contágio por outras doenças, como a
gripe por exemplo. E a maioria dos feirantes (6 de 8) acredita que novas pandemias vão
ocorrer no futuro. De acordo com eles, o enfrentamento dos novos desafios deve ser
construído a partir de cuidados sanitários e novas formas de comercialização, como
cestas, vendas online e distribuição nas redes varejistas, como os supermercados da
cidade. Desta forma, ampliando os canais de comercialização e se aproximando dos
consumidores, principalmente em cadeias curtas de comercialização.

125
4 CONSIDERAÇÃOES FINAIS
A partir dos resultados obtidos, pode-se concluir que os produtores de alimentos
orgânicos que comercializam nas feiras livres do município de Chapecó são agricultores
familiares motivados pela produção de alimentos saudáveis, a agregação de valor
(renda) e o fortalecimento da relação com os consumidores através da venda realizada
nas feiras.
Os resultados apontam para o fortalecimento da demanda por alimentos orgânicos,
estimulada pela busca por saúde, a partir da pandemia da Covid-19, e a preocupação
com o uso de agrotóxicos. A expansão do mercado, no entanto, também depende de
estratégias e políticas públicas para promover a produção orgânica, com foco na
assistência técnica e eficiência produtiva (escassez de mão de obra).
A pandemia da Covid-19 afetou diretamente os agricultores familiares,
principalmente aqueles que comercializavam seus produtos nas feiras livres, mercados
locais e institucionais, pois com o fechamento do comércio e o cancelamento das aulas,
os feirantes perderam parte de sua produção, resultando em diminuição de renda. Em
alguns casos, os feirantes se reinventaram através da adoção de novas formas de
comercialização (p.ex. venda online, cestas de produtos), capazes de amenizar perdas
econômicas observados durante o período de isolamento social, as quais tendem a
serem mantidas após o período pandêmico.
A pandemia da Covid-19 também apresentou muitos desafios aos profissionais da
agronomia. O isolamento social destacou a importância da assistência técnica remota
(online) e da busca por formas alternativas de comercialização, particularmente àquelas
capazes de conectar os produtores rurais aos consumidores finais. Sobretudo, a
premência pelo desenvolvimento de plasticidade profissional, a partir da formação de
capacidades para identificar tendências e implementar as adaptações necessárias em seu
ambiente de trabalho.
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e da certificação de produtos coloniais na Região do Oeste Catarinense. Chapecó, 2021.
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127
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http://docweb.epagri.sc.gov.br/website_cepa/publicacoes/agriculturaorganica.pdf Acesso em: 25
jul. 2021.

128
O IMPACTO DA PANDEMIA DA COVID-19
NA ATIVIDADE LEITEIRA NA REGIÃO DE
LAGOA DA PRATA – MG

João Guilherme Dal Belo Leite (1)


Sandro Maílson Fernandes (2)

RESUMO. Este trabalho explora o impacto da pandemia da Covid-19 no custo de


produção de leite na região de Lagoa da Prata - MG. A pesquisa foi realizada a partir da
coleta de dados de sete propriedades rurais produtoras de leite nos municípios de
Lagoa da Prata, Arcos, Luz e Japaraíba no Centro-Oeste do estado de Minas Gerais.
Os dados foram coletados a partir da combinação de observações diretas feitas em
2021 e o banco de dados da MF Consultoria, localizada em Lagoa da Prata. O estudo
conta com dados de volume da produção leiteira, área cultivada, tamanho do rebanho,
sistema de produção, receita total da atividade e custo de produção referentes aos anos
de 2019 (pré-pandemia), 2020 e 2021 (pós-pandemia). A atividade leiteira na região
de Lagoa da Prata possui grande diversidade, o que pode representar desafios de
diferentes magnitudes às famílias rurais, na medida em que são confrontadas com as
incertezas e oscilações do mercado de leite. As propriedades menores tendem ser as
mais vulneráveis, pelas dificuldades para investir e manter-se competitivas. Apesar do
desempenho econômico positivo entre 2019 e 2021, particularmente em 2020, o
cenário econômico para a atividade leiteira tem se mostrado desafiador.
Principalmente, pelo aumento dos custos de produção e relativa estagnação do preço
pago pelo leite ao produtor rural a partir de 2021.

Palavras-chave: Renda agrícola. Produção de leite. Custo de produção.

(1) Doutorado em Sistemas de Produção Agrícola, Universidade Federal da Fronteira Sul,


joao.leite@uffs.edu.br
(2) Graduação em Agronomia, Universidade Federal da Fronteira Sul, sandromailson@gmail.com
129
1 INTRODUÇÃO
A pandemia da Covid-19 é um evento com graves consequências sobre a economia
global. E repercute de inúmeras formas sobre a produção, a distribuição e a oferta dos
alimentos (SCHNEIDER et al., 2020).
Apesar da dimensão dos impactos da pandemia, informações sobre seus efeitos na
pecuária leiteira ainda são escassos. Particularmente, quanto aos custos de produção,
preço do leite e renda agrícola familiar. A falta de conhecimento pode limitar a
construção de estratégias capazes de mitigar seus impactos sobre a instabilidade de
preços (principalmente insumos agrícolas), assim como medidas adaptativas para o
desenvolvimento de sistemas produtivos mais resilientes no médio/longo prazo.
Os custos de produção são chave a competitividade da pecuária leiteria e
historicamente, juntamente ao preço recebido pelo leite, são causa do sucesso assim
como do fracasso de pecuaristas em todo país. Particularmente da agricultura familiar,
que enfrenta maiores dificuldades para acessar capital, informação (p.ex. assistência
técnica) e possui menor poder de barganha associado a escala de produção (CEPEA,
2022; MARTINS, 2018).
Nesse sentido, o presente trabalho discute o impacto da crise decorrente da Covid-19
na atividade leiteira na região de Lagoa da Prata – MG através da análise sobre o custo
de produção do leite e a variação do preço do leite recebido pelos pecuaristas nos anos
de 2019, 2020 e 2021.
2 MATERIAL E MÉTODOS
A pesquisa foi realizada a partir da coleta de dados de sete propriedades rurais
produtoras de leite nos municípios de Lagoa da Prata, Arcos, Luz e Japaraíba no Centro-
oeste do estado de Minas Gerais (Figura 1). Os dados foram coletados a partir da
combinação de observações diretas feitas durante o ano de 2021 e o banco de dados da
MF Consultoria, localizada em Lagoa da Prata.
Em 2021, as propriedades selecionadas para o estudo foram visitadas mensalmente
(uma visita por mês por fazenda), totalizando 84 visitas no âmbito do projeto de
Assistência Técnica e Gerencial sob responsabilidade da MF Consultoria. O
conhecimento adquirido durante tais visitas foi complementado com a cessão, pela MF
Consultoria, dos dados socioeconômicos de sete propriedades rurais, dedicadas à
atividade leiteira na região de Lagoa da Prata. As informações compartilhadas são
anônimas, o que impede a identificação dos gestores das propriedades.
A seleção das fazendas para o estudo considerou dois critérios: i) representatividade
das fazendas para a região de estudo (i.e., fazendas representativas quanto ao tamanho,
desempenho econômico e agropecuário, atividades desenvolvidas e sistemas de
produção, e ii) disponibilidade de informações para levantamento de dados.
As informações foram organizadas em planilhas digitais para calcular indicadores
de desempenho técnico e econômico, como produtividade de leite, custos de produção
(fertilizante, mão de obra, ração concentrada), tamanho do rebanho em lactação, renda
bruta total da atividade leiteira e lucro de janeiro a dezembro de 2019, 2020 e 2021.
O desenvolvimento deste trabalho também contou com informações bibliográficas,
principalmente dos Boletins do Leite do Centro de Estudos Avançados em Economia

130
Aplicada (Cepea) da Universidade de São Paulo (USP).
Figura 1 – Localização dos municípios e das propriedades estudadas.

Fonte: Elaborado pelos autores.


A metodologia proposta foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisas da
Universidade Federal da Fronteira Sul (CEP-UFFS), através do parecer
consubstanciado do CEP número 3.929.457 (CAAE: 29324920.2.0000.5564). Os
nomes dos participantes foram ocultados, sendo identificados, quando necessário, por
letras e/ou números para preservar a sua identidade, conforme a orientação do Comitê
de Ética.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
As fazendas estudadas são caracterizadas por estabelecimentos agropecuários onde
predomina a atividade leiteira combinada, em alguns casos, com pecuária de corte e
produção de bezerras/novilhas leiteiras (genética; Tabela 1). Os sistemas de produção
são semi-intensivo e confinamento.
No sistema semi-intensivo os animais são criados a pasto (piquetes rotacionados) e
suplementação volumosa na época de maior escassez forrageira. Este sistema exige
planejamento, pois a disponibilidade de volumoso é uma realidade que não pode ser
alterada no curto prazo. Neste caso a oferta de forragem requer controle sobre a
quantidade e densidade de forragem por unidade de área, competição entre animais,
suplementação alimentar, horário e tempo de pastejo e época do ano são controlados
com maior precisão (CAMARGO & NOVO, 2009).
No confinamento (duas fazendas; Tabela 1), a criação é realizada pelo método
compost barn. Segundo Silano e Santos (2012), o compost barn visa primeiramente
melhorar o conforto e bem-estar dos animais e, consequentemente, melhorar os índices
131
de produtividade do rebanho. Esse sistema consiste em um galpão retangular que possui
uma grande área comum, normalmente formada por maravalha ou serragem, separada
do corredor de alimentação por um beiral de concreto. O diferencial deste sistema é a
compostagem que ocorre ao longo do tempo com o material da cama e a matéria
orgânica dos dejetos dos animais que são alimentados só no cocho.
Tabela 1 – Caracterização das fazendas estudadas (médias calculadas a partir dos
dados coletados em 2019, 2020 e 2021).
Atividade Sistema de Produção média Produtividade Renda bruta média
#
principal produção por vaca (L/dia) média anual (L/ha) anual (R$/ha)

1 Leite semi-intensivo 17,25 9.741,48 19.715,01


2 Leite semi-intensivo 15,56 10.186,58 21.665,83
3 Leite confinamento 24,19 9.829,48 19.371,36
4 Leite semi-intensivo 14,27 7.189,20 12.730,29
5 Leite confinamento 20,03 18.363,20 35.492,03
6 Leite/corte semi-intensivo 11,53 4.329,07 8.304,26
7 Genética/leite semi-intensivo 14,23 1.886,75 3.401,12

Fonte: Elaborado pelos autores.


Os custos de produção são um grande gargalo ao pecuarista leiteiro. Isso porque os
preços do milho e do farelo de soja se mantiveram altos em 2021, sustentados pelas
aquecidas demandas interna e externa por grãos. Diante disso, a dieta do rebanho leiteiro
foi comprometida e dificultou possíveis incrementos na produção (CEPEA, 2022). A
Figura 2 apresenta a evolução dos custos com alimentação para o rebanho leiteiro na
região de Lagoa da Prata, fortemente afetados pela pandemia. As fazendas produtoras
de leite na região sentiram o impacto da primeira maior alta desses insumos no mês de
junho de 2020 (Figura 2), quando alcançou R$ 15.000,00. Depois disso, o custo com
alimentação se manteve em elevação atingindo o maior valor em janeiro de 2021 (R$
25.000,00; Figura 2), 150% superior a janeiro de 2019.
Os resultados são coerentes com pesquisas da Embrapa Gado de Leite, a qual
constatou que o custo do alimento concentrado para o rebanho leiteiro vinha
apresentando forte elevação internacional. A mistura concentrada (milho mais farelo de
soja na relação de 70% e 30%) chegou a US$ 0,34 por kg em maio de 2021. E a cotação
da moeda américa a época não favorecia os pecuaristas brasileiros (EMBRAPA, 2021).
Consequentemente, o Índice de Custos de Produção de Leite - ICPLeite/Embrapa
contabilizou uma alta de 39% em 12 meses, de junho/2020 a junho/2021 (EMBRAPA,
2021). Neste período, o valor da ração concentrada subiu 68%. Além do mais, a falta de
chuva no Centro-Sul do país comprometeu a produção do milho safrinha, agravando
ainda mais a situação.
Condições climáticas desfavoráveis também comprometeram a produção de milho
safrinha na região de Lagoa da Prata em 2021, o que resultou em silagem de baixa
qualidade bromatológica pela baixa produção de grãos.
O reajuste sobre o preço dos fertilizantes também contribuiu para o aumento do
custo de produção do leite, principalmente para produção e compra de alimento
volumoso, cujos preços variaram significativamente na região de Lagoa da Prata. Até
2019 a tonelada de silagem costumava ser comercializada com preço abaixo de R$
132
200,00, segundo os pecuaristas entrevistados. O impacto do preço dos fertilizantes
sobre o custo de produção ocorre de forma retardada, pois a produção de volumoso
ocorre no final do ano anterior para ser armazenada em janeiro e fevereiro do ano
seguinte, logo, a silagem de milho fornecida aos animais em 2020 foi produzida com
fertilizantes adquiridos em 2019. A Figura 3 apresenta a evolução do custo com
fertilizantes, destaque para 2021 quanto as despesas tiveram a elevação mais
pronunciada, 157% superiores àquelas realizada em 2019.
Figura 2 – Custos médios mensais, por fazenda, com alimentação (ração comercial,
concentrado proteico, concentrado energético e sal mineral) para o rebanho leiteiro.

Fonte: Elaborado pelos autores.


Figura 3 – Custos médios anuais, por fazenda, com fertilizante (adubação formulada
NPK, ureia e calcário) destinado a produção leiteira.

Fonte: Elaborado pelos autores.


O custo do fertilizante é particularmente importante em sistemas de produção
intensivo e semi-intensivo. No primeiro, o único alimento volumoso fornecido para as
matrizes lactantes é a silagem de milho. No segundo, além da silagem, a alimentação
volumosa é complementada com pastagem em sistema rotativo. Neste sistema, a
pastagem precisa ser adubada após a saída dos animais, logo, se os animais ficam um dia
em cada piquete, o consumo de adubo é diário.
133
Os pecuaristas estudados relataram descontentamento com o custo dos fertilizantes,
principalmente nitrogenados, comprados mensalmente para realizar as adubações de
cobertura nas pastagens de verão rotacionadas, no período das chuvas. A pressão sobre
os custos de produção levou alguns produtores a reduzir a dose recomendada. Esta
decisão compromete a produtividade e qualidade do alimento volumoso produzido na
propriedade. A pastagem para ser palatável aos animais e produtiva precisa estar bem
nutrida, conforme as exigências das plantas e análise de solo.
Similarmente ao fertilizante e alimentação, o custo médio com mão de obra também
aumentou entre 2019 e 2021 (Figura 4). Neste período, o custo com mão de obra
inflacionou 70%.
Figura 4 – Custos médios anuais, por fazenda, com mão de obra contratada.

Fonte: Elaborado pelos autores.


Os pecuaristas relatam que uma das maiores dificuldades da atividade leiteria é a
disponibilidade de mão de obra, a maioria conta com mão de obra familiar para realizar
as atividades da fazenda. Grande parte do leite produzido na região de Lagoa da Prata é
de origem familiar, em quantidades relativamente pequenas, mas com importante
contribuição para geração de emprego e renda na região (ZOCCAL et al., 2005).
Por outro lado, a pandemia também provocou o aumento do preço recebido pelo
leite. Minas Gerais lidera a formação de preços do leite pago aos produtores de todos os
demais estados da federação, principalmente pela sua condição de maior produtor de
leite do país (COINTER, 2016). O preço do leite sofreu alta histórica em 2020,
ultrapassando o patamar dos R$ 2,00 pagos por litro aos produtores no campo, tanto na
“média Brasil” (BA, GO, MG, PR, RS, SC e SP), quanto na média da região de Lagoa da
Prata (principalmente de agosto a dezembro de 2020; Figura 5). Tal elevação é
consequência da relação entre oferta restrita e demanda elevada por lácteos, esta última
ancorada nos programas de auxílio emergencial do governo federal (CEPEA, 2022).
Apesar dos maiores custos de produção (i.e., alimentação, fertilizantes e mão de
obra), o reajuste sobre o preço do leite recebido pelos pecuaristas resultou em melhores
margens de lucro (Figura 6). Principalmente em 2020, quando o custo de produção foi
composto, em parte, por insumos comprados em 2019 (p.ex. fertilizantes), quando o
efeito inflacionário da pandemia ainda não existia. Com isso, entre 2019 e 2020 o lucro

134
por litro de leite aumentou 130%. No entanto, entre 2020 e 2021 a situação é bastante
diferente principalmente pela elevação dos custos de produção. Neste período o lucro
por litro reduziu 11% e preocupou muitos pecuaristas, principalmente pela relativa
estagnação dos preços recebidos pelo leite, apesar da contínua elevação dos custos de
produção. Entre outros fatores, a estagnação da economia nacional em 2021 reduziu o
poder de compra da população, o que dificulta a transferência dos custos de produção
para o preço final dos produtos lácteos, consumidos majoritariamente pelo mercado
interno.
Figura 5 – Preço médio mensal do leite recebido pelos pecuaristas na região de
Lagoa da Prata entre 2019 e 2021.

Fonte: Elaborado pelos autores.


Figura 6 – Lucro (R$/L) da atividade leiteira na região de Lagoa da Prata.

Fonte: Elaborado pelos autores.

4 CONSIDERAÇÃOES FINAIS
A pandemia da Covid-19 gerou impactos importantes sobre a economia mundial e
com a atividade leiteira não foi diferente. O custo de produção, assim como o preço do
leite recebido pelos pecuaristas aumentou de forma significativa.
135
A atividade leiteira na região de Lagoa da Prata possui grande diversidade, o que
pode representar desafios de diferentes magnitudes às famílias rurais, na medida em que
são confrontadas com as incertezas e oscilações do mercado de leite. As propriedades
menores tendem ser as mais vulneráveis, pelas dificuldades para investir e manter-se
competitiva.
Apesar do desempenho econômico positivo entre 2019 e 2021, particularmente em
2020, o cenário econômico para a atividade leiteira tem se mostrado desafiador.
Principalmente a partir de 2021, quando o preço recebido pelo leite estabilizou apesar da
contínua elevação dos custos de produção.
A pandemia da Covid-19 também apresentou muitos desafios aos profissionais da
agronomia. O isolamento social destacou a importância da assistência técnica remota
(online) e da busca por formas alternativas para construção de sistemas de produção
mais resilientes às oscilações econômicas, principalmente de preço. Promover
autossuficiência e reduzir dependência por insumos externos são alguns exemplos. E a
importância do desenvolvimento de plasticidade profissional, a partir da formação de
capacidades para identificar tendências e implementar as adaptações necessárias em seu
ambiente de trabalho.
REFERÊNCIAS
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ZOCCAL, R.; DE SOUZA, A. D.; GOMES, A.T. Produção de leite na agricultura familiar. Juiz
de Fora: Embrapa Gado de Leite, 2005.

136
IMPACTOS E INOVAÇÕES NO SETOR DE
FRUTAS, LEGUMES E VERDURAS NO
CONTEXTO DA PANDEMIA DE COVID-19
E PROPOSIÇÕES TEÓRICAS PARA UMA
MELHOR GESTÃO DA CADEIA

Lucas Mendes de Oliveira (1)


Luciel Henrique de Oliveira (2)

RESUMO. O artigo tem como objetivo caracterizar e compreender os impactos da


crise pandêmica e as reações e inovações apresentadas como resposta pelas cadeias
produtivas de Frutas, Legumes e Verduras (FLV) no Brasil, utilizando os conceitos de
sistemas alimentares, ciclos adaptativos, cadeias curtas de alimentos e resiliência
como alicerces para a análise. Tomamos como ponto de partida o cenário local de uma
cidade brasileira de aproximadamente 170.000 habitantes e expandimos a análise
para cenários nacionais e internacionais, derivando um modelo simplificado para uma
típica cadeia produtiva de FLV no Brasil. A pesquisa pode ser classificada como
qualitativa, descritiva e exploratória, combinando análise documental (dados
secundários) com entrevistas e visitas (dados primários). Observou-se que novos
modelos de negócios surgiram ou se consolidaram em meio a um cenário altamente
dinâmico, mas a demanda tem se concentrado nas classes A e B, contribuindo para
aumentar a insegurança alimentar da população brasileira. Além disso, enquanto um
pequeno grupo de atores conseguiu expandir seus lucros durante a crise, atores
menores e/ou informais enfrentaram grandes desafios ou pereceram. O estudo chama
a atenção para a necessidade de abordagens mais sistêmicas e sustentáveis para a
gestão de riscos e resiliência das cadeias de abastecimento de alimentos, que são
semelhantes às práticas e métodos já adotados empiricamente por muitos atores e
podem contribuir para o avanço em direção aos ODS. Sugere-se para pesquisas
futuras a aplicação de frameworks práticos de ciclo adaptativo e testes de atributos
específicos para resiliência de sistemas alimentares.

Palavras-chave: Sistemas Alimentares; Cadeias de Suprimentos; Resiliência; Ciclo


Adaptativo; ODS.

(1) Bacharel em Engenharia de Produção, lucas.mnds.olvr@gmail.com


(2) Doutor em Administração, PUC Minas, luciel@pucpcaldas.br

137
1 INTRODUÇÃO
A pandemia de COVID-19 iniciou a partir de 2020 uma crise multidimensional em
todo o mundo – especialmente nos países em desenvolvimento –, freando o ritmo já lento
de progresso em direção aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Organização
das Nações Unidas (FAO, 2021). Enormes dificuldades foram criadas para muitos
setores que já sofriam de fragilidades estruturais. Pode-se dizer que um dos casos mais
flagrantes é o setor de alimentos perecíveis, mais notadamente Frutas, Legumes e
Verduras (FLV), pela sua essencialidade, multiplicidade de agentes envolvidos, impactos
socioambientais gerados e peculiaridades logísticas (BÉNÉ et al., 2021). Partindo dessas
premissas, a Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas) designou
2021 como o Ano Internacional das Frutas e Vegetais (ONU, 2020).
No Brasil, o setor de FLV envolve desde pequenos produtores rurais até grandes
redes varejistas, incluindo também distribuidores autônomos (ou, no jargão popular,
“atravessadores”), operadores logísticos diversos, feiras livres, “sacolões”, pequenos
estabelecimentos comerciais (hortifrútis ou quitandas) e organizações de apoio à
agricultura familiar e de subsistência, dentre muitos outros. Apesar da importância
estratégica para a saúde humana e a economia nacional, o setor padece de grandes
fragilidades que foram evidenciadas e intensificadas pela pandemia. Isso gerou
oportunidades e lacunas de mercado que estão sendo prontamente exploradas por novos
negócios.
Registra-se que grande parte dos empreendimentos envolvidos na oferta de Frutas,
Legumes e Verduras (FLV) são de pequeno porte e cunho familiar, trabalhando com
margens estreitas e uso intensivo de mão de obra. Isso se verifica tanto a nível global,
com 70% do setor alimentício compondo-se de pequenas e médias empresas (ALI et al.,
2021; NORDHAGEN et al., 2021), quanto a nível nacional, com 70% dos alimentos
consumidos no Brasil provindo da agricultura familiar (IBGE, 2020). Embora haja
alguns questionamentos quanto à metodologia para se chegar a tal número no Brasil
(HOFFMANN, 2014), é inegável a importância da agricultura familiar no segmento de
Frutas, Legumes e Verduras para a alimentação dos brasileiros e geração de impactos
socioambientais (FIGUEIREDO et al., 2017).
Os produtos do setor caracterizam-se por serem altamente perecíveis, com demanda
inelástica e dependentes das condições climáticas e sazonalidade (WALQUIL, MIELE e
SCHULTZ, 2010). Frente a esses desafios intrínsecos, os produtores geralmente carecem
de ferramentas e princípios administrativos básicos, o que acarreta baixa eficiência das
atividades e baixa lucratividade do negócio (BUAINAIN et al., 2021; DEPONTI, 2014).
Esse cenário é especialmente relevante quando se considera que a maior parte dos
produtores pertencem a classes sociais mais baixas e têm na atividade agrícola sua
principal fonte de renda. Além disso, observam-se baixíssima escolaridade, reduzido
acesso ao crédito e baixa conectividade entre os produtores (BUAINAIN et al., 2021;
IBGE, 2020).
A logística de distribuição de FLV reflete a desorganização do setor produtivo e o
poder das grandes redes atacadistas e varejistas. Com o progressivo desmantelamento
das Ceasas (Centrais de Abastecimento) – outrora com maior atuação do poder público –,
não há muitos agentes focais que auxiliem na comunicação e coordenação da cadeia de
forma socialmente responsável, ocasionando falta de previsibilidade para os produtores,
desperdícios ou distorções nos preços, entre outros efeitos deletérios (BELIK e CUNHA,
138
2018). Um fator agravante para o quadro é a própria característica de perecibilidade dos
itens, restringindo medidas anticíclicas como aumento de estoque. A cadeia de
suprimentos deve ser ágil e extremamente eficiente para suprir a demanda e ainda
proporcionar boas margens de lucro para os seus agentes.
Finalmente, tratando-se do consumo, tais produtos, mesmo que considerados
essenciais, ainda não são amplamente consumidos pela população brasileira, situação
que foi agravada pela pandemia. A insegurança alimentar no Brasil vem crescendo desde
2017/2018, de acordo com a Pesquisa de Orçamentos Familiares (IBGE, 2020) e, em
2020, conforme Galindo et al. (2021), 59,4% dos domicílios brasileiros relataram estar
vivendo algum nível de insegurança alimentar, com consumo reduzido de alimentos
saudáveis e/ou frequência irregular de refeições.
Dessa forma, o estudo dos efeitos da presente pandemia sobre um sistema complexo
e com tais fragilidades pode permitir uma compreensão aprofundada de seus pontos mais
sensíveis e sua resiliência para resistir a enormes choques externos, bem como a
verificação de eventuais inovações estruturais, com potencial de melhorar a saúde e a
renda dos brasileiros, bem como a preservação ou regeneração do meio-ambiente.
2. PROBLEMA DE PESQUISA E OBJETIVO
O artigo enfoca a seguinte questão: quais foram as mudanças no fornecimento e
demanda de FLV a nível nacional e regional (a partir da cidade de Poços de Caldas -
MG), incluindo eventuais inovações, ocasionadas ou catalisadas pela pandemia de
COVID-19? O objetivo principal é, a partir dos dados secundários e evidências
empíricas, encontrar experiências e abordagens promissoras para a estruturação e gestão
das cadeias de suprimentos alimentares, de maneira a promover governança eficiente e
impactos socioambientais positivos. Especificamente, discutem-se a consistência teórica
e viabilidade prática de abordagens e conceitos como resiliência e cadeias curtas de
alimentos para uma gestão de riscos mais eficaz no âmbito dos sistemas alimentares,
incluindo sua vinculação com o surgimento e agravamento da pandemia.
3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
3.1. Gestão de Riscos das Cadeias de Suprimentos
A gestão de riscos associada às cadeias de suprimentos é tema de particular interesse
desde o atentado ao World Trade Center em 2001 (TANG, 2006), chegando a sua
relevância máxima com a presente crise pandêmica. Manuais para modelagem de
cadeias de suprimentos com ênfase na gestão de riscos e continuidade dos negócios têm
sido publicados durante esse período. Christopher e Peck (2003) consideram 4 níveis
principais de risco à operação das cadeias de suprimentos, inextricavelmente
interligados: Processo/Fluxo de Valor (Nível 1), Ativos e Dependências da Infraestrutura
(Nível 2), Organizações e Redes Interorganizacionais (Nível 3) e Ambiente (Nível 4).
Para os autores, o setor alimentício é um dos setores críticos para análise em relação à
cadeia de suprimentos.
Nesse sentido, diversas estratégias de gestão de riscos são apresentadas na literatura,
englobando características como agilidade, robustez, flexibilidade e resiliência, de forma
pouco consensual e, por vezes, conflitante. Wieland (2013) procura diferenciar essas
quatro características para as cadeias de suprimentos na gestão de riscos. Segundo o
autor, a cadeia pode ser resiliente ou rígida, ao usar ou não recursos para responder à
mudança, respectivamente; por outro lado, no uso dos recursos, pode alterar ou não sua
139
situação inicial – configurando-se como ágil ou robusta, respectivamente.
Em particular, a característica de resiliência tem sido objeto de numerosos estudos,
podendo ser vista sob o prisma de abordagens mais determinísticas e reducionistas ou
mais sistêmicas (STONE e RAHIMIFARD, 2018; WIELAND, 2021). Wieland (2021)
advoga pela necessidade de se ver as cadeias de suprimentos como sistemas dinâmicos e
abertos, sugerindo a metáfora da “dança da cadeia de suprimentos”, tendo-se em vista a
crise ocasionada pela COVID-19.
3.2. Sistemas Alimentares e COVID-19
Para o setor agroalimentar, as cadeias de suprimentos podem ser tratadas no âmbito
dos sistemas alimentares, definidos na intersecção das dimensões segurança alimentar,
ambiente alimentar, saúde e bem-estar, pegada alimentar e contexto macroeconômico.
Segundo a ONU, “o termo sistema alimentar se refere à constelação de atividades
envolvidas na produção, processamento, transporte e consumo de alimentos” (ONU,
2021). A Figura 1 apresenta este modelo teórico conforme Béné et al. (2021), que
realizaram uma análise criteriosa de 337 documentos – englobando 62 países da África,
Ásia, Europa, Oceania e Américas – para avaliar os impactos da pandemia na segurança
alimentar pelo mundo e quais os melhores atributos para o fortalecimento da resiliência
dos sistemas alimentares.
Figura 1 – Caracterização de “Sistema Alimentar”

Fonte: Adaptado de Béné et al. (2021)


Segundo os autores, as dimensões de segurança alimentar mais afetadas pela
pandemia foram o acesso (físico) e acessibilidade (econômica), em particular em áreas
urbanas e em países de renda baixa e média. A ruptura no acesso físico afetou também a
proximidade e conveniência, o que também contribuiu, junto com a redução das rendas,
para a degradação da escolha e da diversidade alimentar. Não houve evidências claras de
que a disponibilidade (oferta) de alimentos tenha sido afetada, além de algumas rupturas
iniciais temporárias em função de compras por pânico e para estocagem. Todos esses
impactos podem ser interpretados como distúrbios na dimensão de estabilidade da
segurança alimentar.
Contudo, deve-se ter em mente que as cadeias de suprimentos alimentares
apresentam uma grande complexidade de agentes e configurações. Em especial, as
cadeias de FLV destacam-se pela perecibilidade dos insumos, consistindo
principalmente de cadeias curtas e exigindo maior organização dos atores. Muitos
autores advogam pelos impactos positivos da estruturação do setor agroalimentar em
termos de cadeias curtas.
140
3.3. Cadeias Curtas de Alimentos como resposta à crise pandêmica
Marsden (2004), em estudo sobre cadeias de suprimentos alimentares na Europa e
suas interfaces com a qualidade percebida pelos consumidores, destaca as cadeias de
suprimentos alimentares curtas (CSAC) como alicerces para o desenvolvimento de um
conceito de qualidade relacionado a maior proximidade física e/ou simbólica entre
consumidores e produtores. O autor classifica as cadeias curtas em três tipos: “face-a-
face” (interações diretas entre produtores e consumidores), “próximas” (interações por
meio de um terceiro agente ou formas especiais de articulação como cooperativas, rotas e
feiras temáticas, programas de alimentação nas escolas, etc.) e “estendidas” (acessíveis a
maiores distâncias, por meio de selos de certificação, por exemplo).
Autores como Cappelli e Cini (2020), à luz da presente crise pandêmica, levantam as
possibilidades e potencialidades de se investir no fortalecimento das cadeias curtas. Eles
argumentam que estas representam um “salva-vidas” em casos de restrições severas ao
comércio a longas distâncias e também reforçam os laços com a comunidade local,
aumentam as oportunidades de emprego e melhoram a qualidade de vida da população
local.
Algumas pesquisas apoiam tais hipóteses, como a desenvolvida por Bui et al. (2020)
junto a 338 pequenos agricultores do Vietnã no terceiro trimestre de 2020. A análise
estatística realizada indicou que a maioria dos agricultores se mostravam satisfeitos com
a renda, trabalho, respeito social e tipos de cultivo, sendo apenas o tamanho do mercado
consumidor um motivo de queixa. A queixa em relação ao tamanho do mercado
consumidor leva justamente em direção à fragilidade desse tipo de cadeia.
Conforme David e Guivant (2020), tais cadeias podem reproduzir desigualdades
alimentares entre as classes sociais, não elevando substancialmente a acessibilidade de
uma alimentação saudável. Chapman e Perkins (2019) também alertam para a armadilha
de se supor as cadeias curtas sempre superiores a circuitos mais longos, demonstrando o
paradoxo da região de Appalachia, no estado americano de Ohio: considerado um
exemplo regional de sistema alimentar local, seus residentes apresentam um elevado
grau de insegurança alimentar para os padrões estadunidenses. Os autores concluem que
problemas locais criados por dinâmicas de longo alcance no tempo e no espaço também
devem ser resolvidos de maneira sistêmica, envolvendo diversos níveis de análise e com
a participação ampla da sociedade e do Estado.
3.4. Análise crítica do conceito de Resiliência
Pode-se inferir, a partir de Béné et al. (2021), que os sistemas alimentares globais em
geral resistiram ao choque causado pela pandemia, com nenhum episódio de falta severa
de alimentos observado. Contudo, reiterando-se o exposto na seção anterior, pode-se
dizer que a aparente resiliência (pelo menos a curto prazo) dos sistemas alimentares veio
simultaneamente ao aumento da insegurança alimentar em inúmeros países, incluindo o
Brasil (GALINDO et al., 2021), penalização dos atores menores e/ou informais (ALI et
al, 2021; BÉNÉ et al., 2021; NORDHAGEN et al., 2021), aumento dos desperdícios e da
pegada ambiental (ALDACO et al., 2020; FAO, 2021), dentre outros efeitos adversos.
Grande parte dessa resiliência origina-se da classificação das atividades envolvidas
nos sistemas alimentares como serviços essenciais pela maioria dos governos – de fato,
na região de Poços de Caldas, as maiores restrições foram observadas no âmbito das
feiras, tão-somente (POÇOS DE CALDAS, 2020). Enquanto um grupo mínimo de
141
atores conseguiu expandir seus lucros durante a crise (grandes redes de supermercados,
por exemplo), os atores menores e/ou informais tiveram de trabalhar para reduzir
impactos severos em suas atividades ou simplesmente desapareceram das cadeias de
suprimentos (BÉNÉ et al., 2021).
Tais constatações reiteram a necessidade de se melhor definir o conceito ou atributo
de “resiliência” e estratégias para se atingi-lo, que são também temas ainda ambíguos na
literatura, especialmente para cadeias agroalimentares e pequenas e médias empresas
(ALI et al., 2021; NORDHAGEN et al., 2021). Assim, cumpre questionar quais as
abordagens teóricas mais adequadas para a complexidade e importância das cadeias
agroalimentares, preferencialmente de forma a alavancar sua resiliência no âmbito do
sistema alimentar mais amplo.
Em linha com as premissas dos sistemas alimentares e fundamentando-se no trabalho
seminal de Holling (2001) com sistemas sociais-ecológicos, bem como em
desenvolvimentos e revisões posteriores desta e outras abordagens sistêmicas similares
(FIGUEIREDO et al., 2017; WORSTELL, 2020) surge como possibilidade a "gestão
panárquica" ou baseada em “ciclos adaptativos” da cadeia de suprimentos, conforme
Fath et al. (2015), Adobor (2020) e Wieland (2021), dentre outros.
Fath et al. (2015) definem resiliência como a capacidade de sistemas complexos
“navegarem” com sucesso pelos estágios do chamado ciclo adaptativo, metáfora
desenvolvida por Holling (2001). O Ciclo Adaptativo consiste de transformações pelas
quais os sistemas devem passar para subsistirem e se aprimorarem, indo além de somente
resistir a choques e mudanças, mas usarem-nas como incentivos para o próprio
desenvolvimento.
Figura 2 – Ciclos adaptativos para análise das cadeias de suprimentos.

Fonte: Adaptado de Buchan (2011)


Assim, diferentemente da resiliência tal como vista pela engenharia, em que se
procura retornar a um estado de equilíbrio após dada perturbação, a propriedade de
resiliência sugerida por Wieland (2021) e Fath et al. (2015) habilita a cadeia de
suprimentos, enquanto sistema social-ecológico, a “dançar” ou “navegar” conforme o
contexto, buscando aproveitar as oportunidades que surgem com as perturbações,
mesmo alterando radicalmente sua trajetória originalmente idealizada.
3.5. A abordagem da Gestão Panárquica para cadeias de suprimentos alimentares
Conforme o exposto anteriormente, a cadeia de suprimentos não seria caracterizada
como um sistema imutável, mas em permanente evolução ou mudança. A diferença para
um sistema ecológico estaria no papel mais ativo dos agentes sociais, que não são
selecionados passivamente pelas pressões do meio, de acordo com os princípios
142
clássicos da evolução. Esses agentes devem entender que a estabilidade, previsibilidade
e possibilidade de controle não são os atributos cruciais para cadeias de suprimentos
bem-adaptadas ao contexto global atual (WIELAND, 2021).
Na abordagem dos sistemas sociais-ecológicos, a cadeia de suprimentos é um
sistema em ciclo adaptativo que interage com outros sistemas, maiores ou menores, na
chamada “panarquia” – em que, diferentemente da hierarquia, não existem apenas
mecanismos simples de comando e controle. Cada sistema afeta um ao outro de acordo
com o estágio em que se encontram no ciclo adaptativo. A Tabela 1 traz uma comparação
entre essas duas abordagens de gestão da cadeia de suprimentos: a tradicional, baseada
na Engenharia clássica; e a “panárquica”, vinculada aos sistemas sociais-ecológicos.
Tabela 1 – Características da Gestão Tradicional e Panárquica da Cadeia de
Suprimentos
Tradicional Panárquica
Premissas Estática; reducionista Dinâmica; holística
Abordagem Modernismo; positivismo Holismo; interpretivismo
Cadeia de Fechada; sistema baseado na Aberta, sistema social-ecológico
Suprimentos Engenharia (“ser”) (“vir-a-ser”)
Gestão Comando e controle; otimização; Dança; navegação;
científica experimental
Integração Interfuncional; interorganizacional Interníveis
Objetivos da gestão Crescimento; estabilidade Transformação; variedade
Tomada de decisão Objetivo Subjetivo
Fonte: Adaptado de Wieland (2021)
Stone e Rahimifard (2018) propõem a exploração do ciclo adaptativo em relação a
escalas temporais e espaciais; adicionalmente, Westley apud Wieland (2021) propõe
também uma dimensão de significado, em referência à realidade virtual e narrativas que
os seres humanos constroem a partir de suas percepções. Cada um dos sistemas
aninhados na panarquia operaria em diferentes escalas de tempo, espaço e sentido.
Exemplificando em relação a uma cadeia de suprimentos qualquer, Wieland (2021)
estabelece pelo menos mais dois sistemas em escalas mais amplas e abrangentes de
tempo, espaço e significado: político-econômico e global. Em relação ao sistema
político-econômico, pode-se ter presentemente uma narrativa de maior valorização de
cadeias produtivas locais substituindo a grande ênfase dada à globalização,
especialmente desde a década de 1990, haja vista os grandes transtornos que a excessiva
especialização e DIT (Divisão Internacional do Trabalho) ocasionaram no contexto da
pandemia – especialmente nos setores das indústrias farmacêutica e biomédica.
Fundamentalmente, a própria vinculação da gestão panárquica com o arcabouço
teórico dos sistemas sociais-ecológicos legitima sua consideração pelos atores das
cadeias de suprimentos agroalimentares, situadas na intersecção de várias dimensões
sociais e ecológicas, conforme o conceito dos sistemas alimentares. A própria COVID-
19, conforme Friedrich et al. (2021) tem sido vista como uma sindemia por alguns
autores, considerando-se que “a doença se une de modo interdependente e interage com
comorbidades como as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), em contextos
permeados por desigualdades sociais estruturais” (HORTON, 2020 apud FRIEDRICH
et al., 2021, p. 80).
Nesse sentido, Friedrich et al. (2021) vinculam as cadeias agroalimentares
143
atuais ao surgimento e agravamento da pandemia pela facilitação de novas zoonoses
(admitindo-se esta como a natureza mais provável da COVID-19), uso intensivo de
agrotóxicos (que afetam o sistema imunológico), e a produção de alimentos
industrializados (fator para emergência de DCNTs). Os autores concluem que “o
impacto de pandemias subsequentes poderia ser mitigado ao tornar a agricultura mais
sustentável”, mas “diversas mudanças nas políticas brasileiras de saúde, agricultura e
meio ambiente (...) mostram que a situação atual caminha em direção oposta”
(FRIEDRICH et al., 2021, p. 81).
4. METODOLOGIA
A pesquisa pode ser classificada como qualitativa, descritiva e exploratória, partindo
da análise documental (dados secundários) e complementando com entrevistas e visitas
(dados primários), utilizando-se tanto da lógica dedutiva quanto da indutiva. O objeto de
estudo é a interface entre produtores, distribuidores e varejistas da cadeia de suprimentos
de FLV.
A pesquisa visa levantar dados primários sobre as mudanças na demanda e oferta
por/de FLV resultantes da pandemia da COVID-19 e as inovações que surgiram (e estão
surgindo) nas cadeias de suprimento de FLV para garantir o abastecimento. A estratégia
mais adequada para este projeto é o estudo de caso, que trata de questões do tipo “como”
e “por quê” (TRIVINOS, 1987; VERGARA, 1998), examinando o fenômeno de
interesse em seu ambiente natural pela aplicação de diversas metodologias de coleta de
dados e informações junto a múltiplas entidades (YIN, 2015, 2016).
Para abordar essas questões sobre o mercado de FLV, inicialmente foram priorizados
dados secundários, de amplitude nacional e regional/municipal, obtidos de fontes como
CONAB, Ceasas (Centrais de Abastecimento), plataformas de inovação, dentre outras.
Os dados primários foram então obtidos por meio de visitas e entrevistas presenciais ou
remotas (gravadas sob autorização dos entrevistados) com participantes diretos e
coordenadores da cadeia de FLV de Poços de Caldas e região, além de alguns agentes
atuantes em outras regiões, com o objetivo de se ampliar a visão sobre tendências e
inovações do setor.
Trinta e uma entrevistas foram realizadas entre abril e setembro de 2021, fornecendo
mais de 18 horas de gravações de vídeo ou áudio. Os agentes envolvidos estão listados na
Tabela 2. As organizações participantes concordaram com sua identificação, contanto
que detalhes de suas operações não fossem divulgados.
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO
5.1. Dados Secundários
Na investigação da demanda de FLV, houve dificuldades no acesso a dados públicos;
assim, recorreu-se principalmente à pesquisa realizada por Galindo et al. (2021), com
metodologia inspirada no levantamento VIGITEL (Vigilância de Fatores de Risco e
Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico), do Ministério da Saúde.
Em um levantamento por conversas telefônicas de alcance nacional, realizado entre
novembro e dezembro de 2020 com amostra de 2000 pessoas (relativa à população de
eleitores pelo TSE), observam-se números de frequência medianos para frutas (50,8% de
consumo regular) e hortaliças e legumes (59,3%) e números reduzidos para tubérculos

144
(24,4%). Considerando-se o cenário pandêmico, houve redução de consumo de frutas
para 40,8% dos entrevistados, de hortaliças e legumes para 36,8% e de tubérculos para
32,9%. Aumento no consumo foi registrado apenas para 9,4%, 8% e 5,7% dos
entrevistados, respectivamente.
Tabela 2 – Agentes abordados durante pesquisa primária
Agente Descrição Breve Localização Abrangência
5 indivíduos Feirante produtor Poços de Caldas - MG Municipal
6 indivíduos Feirante revendedor Poços de Caldas - MG Municipal
Citropoços Hortifruti com e-commerce Poços de Caldas - MG Municipal
EMATER-MG Setor público - Empresa de Assistência Técnica e Poços de Caldas - MG Municipal
Extensão Rural de Minas Gerais
Fonte de Vida Hortifruti Poços de Caldas - MG Municipal
Hashtag Hortifruti Hortifruti Poços de Caldas - MG Municipal
Hortah Hortaliças Pequeno produtor de FLV Poços de Caldas - MG Municipal
Especiais
Hortah Quitanda e Varejista especializado em FLV responsavelmente Poços de Caldas - MG Municipal
Empório produzidos e produtos artesanais/naturais
Hortifruti Moraes Hortifruti com e-commerce, aberto a parcerias com Poços de Caldas - MG Municipal
feirantes
NHU Orgânicos Varejista de orgânicos - pedidos semanais por Poços de Caldas - MG Municipal
WhatsApp
SEDET Setor público - Secretaria Municipal de Poços de Caldas - MG Municipal
Desenvolvimento Econômico e Trabalho
Brunório Atacadista sediado no Ceasa Poços de Caldas Poços de Caldas - MG Regional
Lellis Atacadista sediado no Ceasa Poços de Caldas Poços de Caldas - MG Regional
Papayas Negócio de impacto - vale-alimentação e refeição Porto Alegre - RS Regional
sustentável
San Michel Rede varejista/supermercadista Poços de Caldas - MG Regional
Santa Food Negócio de impacto - desenvolvimento de CSAC São Paulo - SP Regional
sustentáveis
Sumá Negócio de impacto - desenvolvimento de pequenos Balneário Camboriú - SC Regional
produtores
Amachains Foodtech - compliance via blockchain Belém - PA Nacional
Produtor Grande produtor de frutas cítricas Campanha - MG Nacional
Vila Nova / Vila Sul Centro de distribuição, Atacadista e Varejista Poços de Caldas - MG Nacional
NetWordAgro Agtech - Agricultura de precisão e digital Palotina - PR Internacional

Fonte: Elaborado pelos autores


De forma mais abrangente, Galindo et al. (2021) observam que 59,4% dos
entrevistados relataram algum grau de insegurança alimentar em seus domicílios.
Identificou-se a ocorrência de um consumo irregular de hortaliças/legumes e frutas entre
67,2% e 66,5%, respectivamente, das/dos entrevistadas/dos em situação de insegurança
alimentar, mesmo antes da pandemia. Com a pandemia, houve redução de mais de 85%
do consumo de alimentos saudáveis nesta segmentação. Os autores ainda assinalam que
a insegurança afeta sobretudo as seguintes segmentações da população brasileira:
mulheres, pessoas de cor ou raça preta e parda, moradores das regiões Norte e Nordeste e
de áreas rurais, domicílios com crianças e com menor renda per capita.
Pelo lado da oferta nas Ceasas (Centrais de Abastecimento), conforme relatório da
CONAB (2021), houve de 2019 para 2020 uma queda de 2,85% no quantitativo
comercializado e um aumento de 3,05% no valor transacionado de FLV. Segundo a
entidade, a comercialização de hortaliças nas Centrais de Abastecimento ficou 9,88%
abaixo do verificado em 2019; contudo, “a retração na comercialização das hortaliças
não foi uniforme para todos os subgrupos e, de forma geral, manteve as características de
sazonalidade próprias de cada cultura” (CONAB, 2021, p. 13). Trata-se de uma
tendência que já havia sido identificada entre 2019 e 2018, quando a queda foi de 1,42%.

145
Em um olhar regional, tomou-se como referência o cenário da cidade de Poços de
Caldas (MG), que possui aproximadamente 170.000 habitantes, sendo a maior cidade da
Mesorregião do Sul/Sudoeste de Minas e 15ª maior de Minas Gerais (IBGE, 2021).
Registrou-se uma sensível mudança no comportamento dos preços de Frutas, Legumes e
Verduras comercializadas na Ceasa de Poços de Caldas entre os anos de 2019 e 2020-21,
conforme a Figura 3 – ressalta-se que a Ceasa continuou em funcionamento durante toda
a pandemia.
Figura 3 – Preços médios mensais por categoria na Ceasa Poços de Caldas

Fonte: Poços de Caldas (2021)


Percebe-se que no período pandêmico os preços das hortaliças do tipo rizoma
apresentaram a maior volatilidade, contrastando fortemente com os outros itens e com o
período pré-pandêmico. É um fato digno de nota especialmente por se tratarem de itens
passíveis de armazenamento por longos períodos. Com base nas pesquisas secundárias e
entrevistas, é lícito afirmar que pode ter sido um efeito de compras por pânico no início
da pandemia, visando à estocagem. Os preços iniciaram uma trajetória de alta em março
de 2020 (exatamente quando as primeiras medidas restritivas começaram a ser
anunciadas), atingiram o pico em maio e desceram ao nível mais baixo em agosto. Desse
patamar, voltaram a subir até novembro (possivelmente influenciados pelos pagamentos
do Auxílio Emergencial, a partir de 22 de julho), atingindo preço ligeiramente abaixo do
registrado em maio (pico). Desde então, voltaram a se abaixar e apresentam
comportamento mais estável.
Em relação aos outros itens, as frutas brasileiras apresentaram preços com
comportamento ligeiramente atípico a partir de julho de 2020, subindo um pouco mais
que o registrado no ano anterior. Os preços dos legumes apresentaram comportamento
mais estável durante a pandemia, com tendência de queda durante o segundo semestre de
2020. Por fim, as hortaliças apresentaram preços com comportamento similar ao do ano
anterior, apenas ligeiramente mais estáveis durante a pandemia.
5.2. Dados Primários
As entrevistas com os agentes da cadeia têm corroborado os dados secundários e as
inferências. Varejistas diversos de FLV relataram as compras por pânico, mencionando
inclusive tentativas de estocar alimentos altamente perecíveis (alface) e a necessidade de
limitação na venda dos itens. Contudo, houve apenas casos pontuais e pouco relevantes
de escassez de itens, com rápida normalização da demanda. À luz dos ciclos adaptativos,

146
não se pode classificar tal comportamento, a nível macro, como uma destruição criativa –
não chegaram a ocorrer rupturas drásticas de políticas, processos e arranjos formais.
Por outro lado, confirmando o observado a nível global por Béné et al. (2021), alguns
players menores, como feirantes (produtores ou revendedores) e pequenas lojas de
hortifrúti, já não apresentavam grande nível de organização e articulação com a cadeia.
Entre 23 de março e 4 de abril foram aplicadas as restrições mais severas ao comércio e
movimentação, suspendendo-se todas as 11 feiras livres realizadas no município
(POÇOS DE CALDAS, 2020). As feiras foram gradualmente retomadas em seguida,
com a adoção das medidas de distanciamento e higiene recomendadas pelas autoridades
sanitárias e já em vigor junto aos outros players do setor agroalimentar (POÇOS DE
CALDAS, 2020). Os relatos dos feirantes atestam grande dificuldade para se adaptarem
a esse momento e continuarem a comercialização, devido à queda do fluxo de clientes,
havendo entre os feirantes produtores relatos de consideráveis perdas de itens mais
perecíveis como folhosas.
Cabe ressaltar que a maioria dos frequentadores das feiras livres, segundo todos os
relatos, são idosos – justamente a faixa de maior risco para infecção por COVID-19. Isso
levanta questionamentos sobre o futuro do fenômeno social e da longa tradição das feiras
livres no Brasil. Feirantes que fornecem para restaurantes também foram severamente
impactados, pela redução drástica ou total nos volumes adquiridos. Quanto aos pequenos
lojistas de hortifrúti, o cenário é ligeiramente mais favorável, com melhor uso da entrega
a domicílio (delivery) e maior resiliência do movimento presencial em meio às
restrições.
Conforme já levantado por outros autores, como Galindo et al. (2021), sugere-se que
grande parte dos beneficiados pelo Auxílio Emergencial utilizaram-no para compras de
itens essenciais, como gêneros alimentícios frescos, tendo-se em vista os relatos dos
feirantes de aumento das vendas, ao menos durante a primeira rodada do auxílio. Esse
fenômeno, combinado a outros relatos de diversos players da cadeia, fundamenta a
percepção de que as feiras atingem classes menos favorecidas com maior força que
outros canais de vendas.
Apesar da ausência de características claras da fase de Destruição Criativa, observa-
se nitidamente a ocorrência das fases de Reorganização e Crescimento Rápido do ciclo
adaptativo, a nível macro. O fenômeno da aquisição de gêneros alimentícios por
delivery, mesmo que suavizado posteriormente, pode sinalizar uma mudança duradoura,
com consolidação deste canal de entrega nas empresas que já o utilizavam, rápida adoção
por empresas ainda reticentes em utilizá-lo e a emergência de novos agentes e modelos
de negócio nele baseados. Porém, conforme expresso anteriormente, o sucesso desse
modelo varia consideravelmente entre os atores, estando os menores e mais informais
em condições desvantajosas. Em termos dos itens demandados, observou-se entre as
classes A e B um expressivo aumento na procura por alimentos saudáveis e com maior
valor agregado – sem agrotóxicos e orgânicos, especialmente –, o que contribui para a
viabilidade das entregas a domicílio.
Alguns atores, principalmente feirantes e lojistas em regiões socialmente periféricas,
também enfocam clientes com menor poder aquisitivo, priorizando o oferecimento de
bons preços. Uma prática adotada por alguns feirantes, já há algum tempo, é oferecer
pacotes fechados de itens com menor valor comercial e/ou próximos do ponto de
descarte. Alguns atores maiores também realizam doações esporádicas para entidades
147
sociais como ONGs e o Banco de Alimentos de Poços de Caldas. É fundamental destacar
a atuação do Banco de Alimentos e do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) para
o suporte alimentar às populações mais vulneráveis. Em Poços de Caldas, o Banco de
Alimentos registrou doações recordes durante os 4 primeiros meses de 2021, tendo o seu
vínculo com o PAA fortalecido (POÇOS DE CALDAS, 2021).
Dentre as novas empresas que surgiram, observa-se grande proatividade e um ímpeto
empreendedor que transcende o mero oportunismo, com ações de planejamento
(segmentação dos clientes, projetos de novos investimentos, projeções financeiras, etc.)
e experimentos diversos, tanto em termos de processos (métodos e ferramentas de
gestão, com uso de aplicativos freemium, softwares sob demanda, etc.) quanto de
proposta de valor (produtos diferenciados, ações de promoção em canais digitais, etc.).
Alguns deles também já identificaram outras oportunidades e têm expandido seu escopo
de ofertas, mas sem perder de vista seu core business. A maior parte dos agentes
entrevistados tem perseguido, mesmo que de forma inconsciente, princípios de gestão
enxuta e ágil da cadeia de suprimentos, como estoque mínimo e estreita cooperação com
parceiros da cadeia. Também apresentam senso de responsabilidade socioambiental,
preocupando-se com a destinação de sobras ou doação de excedentes, por exemplo.
5.3. Caracterização Geral das Cadeias de FLV
As cadeias de suprimentos adotadas para atender aos clientes em Poços de Caldas são
bastante variadas e podem ser extrapoladas para grande parte das regiões do interior do
Brasil. Um dos casos extremos presente no município é o de um grupo empresarial
atacadista, distribuidor e varejista, que se beneficia de uma grande rede de fornecedores
por todo o país, englobando principalmente grandes produtores e revendedores nas
Ceasas (notadamente em Campinas e São Paulo – CEAGESP). Com o giro do estoque
em 3 vezes por semana, esse grupo sequer registrou carências pontuais de itens devido a
compras por pânico. Um outro caso é o de uma grande rede varejista local, com
fornecimento próprio baseado na Ceasa local e, simultaneamente, parcerias com outros
fornecedores que administram pontos de venda nas diversas lojas espalhadas pelas
regiões da cidade. Esta rede teve de limitar temporariamente as compras de itens
perecíveis pelos clientes, mas logo conseguiu normalizar a oferta.
O restante dos atores, em sua maioria, baseiam-se em produção própria, algumas
compras diretas com produtores locais ou regionais e, principalmente, transações na
Ceasa local. Os novos modelos de negócio remetem em grande parte a cadeias curtas,
nos 3 tipos sugeridos por Marsden (2004), especialmente as cadeias próximas e
estendidas, com as empresas atuando como intermediários entre os consumidores e os
produtores, muitos dos quais situados a maiores distâncias, mas munidos de selos de
certificação orgânica (por empresa certificadora ou cooperativas de certificação
coletiva). Parte desses arranjos são inevitáveis, principalmente para orgânicos, devido à
forte regionalização da produção – produz-se apenas o que é naturalmente adaptado para
cada região. As transações face a face ainda não perfazem uma parcela considerável dos
circuitos curtos, consistindo principalmente em alguns produtores de hortaliças e
leguminosas.
Em Poços de Caldas, não há ainda uma preocupação explícita generalizada com os
atributos de qualidade mencionados por Marsden (2004). A maior preocupação se dá em
relação à presença de agrotóxicos; aspectos como manejo dos recursos naturais (uso
inadequado de fertilizantes e consequente eutrofização de corpos de água, por exemplo),
148
vínculo com agricultura familiar ou mesmo a origem local ou regional dos produtos
ainda constituem atributos de valor ou qualidade apenas para alguns nichos. De fato, é
consenso entre os novos negócios que há muito o que se avançar na educação do
consumidor, como por exemplo em relação à inevitabilidade da sazonalidade no
mercado de orgânicos, mesmo quando o fornecimento se dá a longas distâncias.
5.4. Inovações em outras regiões
O contexto local-regional supracitado ainda não registra a efervescência registrada
em maiores centros, onde agtechs e foodtechs têm impulsionado com força modelos
alternativos, mais saudáveis e mais responsáveis de consumo, fortemente baseados no
uso da Internet. De acordo com um levantamento da plataforma de inovação Liga
Ventures (2021), já existem mais de 400 empresas categorizadas nesses setores. Muitas
dessas iniciativas se destacam como negócios de impacto social, que respondem ao
desafio de garantir o acesso a alimentos balanceados e com preço justo para
consumidores e produtores, perseguindo não apenas lucros e uma missão institucional
restrita, mas também o impacto social de uma maneira mais sistêmica.
De forma mais focada na própria produção de hortifrutigranjeira, merece destaque a
Hortify, uma startup especializada no setor cujo objetivo é “possibilitar ao produtor rural
e parceiros a gestão de seu negócio, prezando sempre pela qualidade da produção e pelo
impacto na qualidade de vida do planeta e das pessoas que os consomem” (HORTIFY,
2022). A empresa oferece demonstração gratuita de seu aplicativo e diversos planos de
assinatura, com diferentes preços e funcionalidades, abrangendo rastreabilidade, gestão
de pessoal, gestão de produção e gestão financeira. Os recursos oferecidos para tais
funcionalidades incluem desde registros dos plantios, caderno de campo, controle de
colheita e rastreabilidade alimentar com QRCode, na versão mais básica, até
previsão/planejamento de faturamento e lucro por plantio, na versão mais completa.
Outras startups se dedicam a conectar os diversos agentes das cadeias de FLV,
aprimorando sua governança e eficiência. Para isso, constroem parcerias estreitas para
escalar e alcançar um mercado mais amplo. Um desses casos é o Muda Meu Mundo, que
provê assistência para pequenos agricultores orgânicos e os conecta a grandes redes
varejistas, fechando negócios e executando a logística, para garantir uma renda maior e
mais regular. Um caso semelhante é o Sumá, que tem como foco o desenvolvimento de
agricultores familiares para garantir-lhes contratos de compras públicas ou privadas,
operando em cooperação com o SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e
Pequenas Empresas).
Na porção final das cadeias de suprimentos, encontram-se algumas das abordagens
de negócio mais difundidas, como o farm to table (“da fazenda à mesa”) e D2C (direct to
consumer, “direto ao consumidor”), que propõem o contato direto entre os
produtores/fornecedores e consumidores. Nesses dois setores, podemos citar negócios
como: Raizs, Nutriens, Orgânicos In Box, Fazendinha em Casa, que possuem ativos
logísticos e de processamento próprios para realizar a logística do campo ao consumidor,
com um modelo de negócio baseado em compras individuais ou assinatura de cestas.
A comodidade e conveniência das ofertas aos consumidores , e l e m e n t o s d o s
ambientes alimentares dentro dos sistemas alimentares, é ainda mais explorada por
empresas como Beleaf e LivUp, que possuem centros de processamento de FLV e outros
gêneros para a produção de diferentes modalidades de refeições congeladas e prontas
para o consumo após rápido aquecimento. Beleaf, em particular, foca no atributo de
149
qualidade plant-based, não utilizando proteína animal nas preparações, e LivUp também
comercializa cestas dos alimentos in natura. Os produtos são oferecidos de forma avulsa,
combinada (combos) ou planos de assinatura.
Tabela 3 – Negócios Inovadores nas Cadeias de Frutas, Legumes e Verduras
ATUAÇÃO SEDE ORGANIZAÇÃO DESCRIÇÃO BREVE
Plataforma de gestão para
SP Holambra/SP Hortify
hortifrutigranjeiros
Desenvolvimento de pequenos
CE e SP Fortaleza Muda Meu Mundo
agricultores e conexão com
compradores regulares (públicos
SC Balneário Camboriú/SC Sumá
e/ou privados)

R. M. São Paulo São Paulo Raizs Marketplace de produtos orgânicos,


Osasco/SP Nutriens minimamente processados ou
R. M. Rio de Janeiro e São Paulo São Paulo Orgânicos In Box artesanais; itens produzidos
R. M. Belo Horizonte Ibirité/MG Fazendinha em Casa responsavelmente

R. M. São Paulo São Paulo Beleaf Fornecimento de alimentação


saudável (cestas e/ou refeições)
Regiões Metropolitanas / Brasil São Paulo LivUp com geração de impacto positivo

(*) R. M.: Região Metropolitana


Fonte: Elaborado pelos autores
Complementando as descrições dos negócios, a Tabela 3 traz informações gerais
sobre os casos mencionados. Além disso, resumindo as informações coletadas na
pesquisa de campo e tendo como ponto de partida o diagrama de cadeia de FLV proposto
por Parajuli et al. (2019), elaborou-se um diagrama simplificado das cadeias de FLV que
alcançam Poços de Caldas, registrando-se também os negócios inovadores que foram
encontrados durante pesquisas secundárias e/ou foram alvo de entrevistas.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a crise pandêmica, novos modelos de negócio surgiram ou foram consolidados
no setor de FLV, mas a demanda tem se concentrado especialmente nas classes A e B,
com diminuição do consumo de alimentos saudáveis e aumento da insegurança
alimentar no conjunto da população brasileira. Observa-se que as cadeias curtas de
alimentos por si só não permitem aprimorar a efetividade e sustentabilidade do setor
agroalimentar, confirmando a hipótese levantada por David e Guivant (2020). Enquanto
um grupo pequeno de atores conseguiu expandir seus lucros durante a crise, os atores
menores e/ou informais, principalmente se ligados à base da pirâmide, têm enfrentado
grandes desafios para se consolidarem ou se reestabelecerem após a emergência da crise
pandêmica.
Além disso, diversos especialistas e entidades, incluindo a própria ONU, já relatam
retrocessos no atingimento dos ODS, com aumento dos desperdícios alimentares e
pegada alimentar das cadeias de suprimentos. Tal cenário provavelmente contribuiu para
a ocorrência e agravamento da pandemia (ou sindemia), principalmente nos países de
renda média e baixa, como o Brasil.
Destarte, o estudo chama atenção para a necessidade de considerações mais
holísticas e sistêmicas acerca das cadeias de suprimentos alimentares, especialmente
FLV. Sugere-se o uso de metodologias sistêmicas, como a gestão panárquica,
priorizando-se alcançar a resiliência em termos de “ciclos adaptativos”.

150
Figura 4 – Cadeias de FLV no Brasil - arranjos e inovações

Fonte: Autores, com base em Parajuli et al. (2019)

151
Essa abordagem ou filosofia de gestão das cadeias de suprimentos alimentares,
especialmente FLV, revela-se afim com as práticas e métodos já adotados empiricamente
por muitos atores que estão conseguindo transformar a crise pandêmica em
oportunidade. Expandindo-se o entendimento das abordagens sistêmicas e desdobrando-
as em metodologias práticas, será possível avançar de forma qualificada caminhos já
abertos pelos empreendedores e empresários pioneiros, além de permitir o advento de
outras possibilidades que contribuam para o avanço em direção aos ODS.
O mundo pós-COVID-19 terá de se organizar de forma a evitar novas pandemias,
responder às mudanças climáticas, proteger e regenerar recursos naturais em situação
dramática e avançar em direção a modelos socioeconômicos viáveis. As abordagens
sistêmicas aqui apresentadas revelam grande potencial para iniciar esse movimento, pela
sua aplicabilidade ao mais essencial dos setores – o da alimentação saudável. Sugere-se
para pesquisas futuras a aplicação de frameworks sistêmicos práticos e testes de atributos
específicos de resiliência para as cadeias de FLV.
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154
STARTUPS E NEGÓCIOS DE IMPACTO
NO SETOR AGROALIMENTAR:
UM NOVO CAMINHO PARA OS SISTEMAS
ALIMENTARES?

Lucas Mendes de Oliveira (1)


Luciel Henrique de Oliveira (2)

RESUMO. A pandemia de COVID-19 e seus desdobramentos fragilizaram ainda mais


o setor agroalimentar global e nacional, mas também aceleraram o desenvolvimento
de inovações, muitas delas vinculadas a startups conhecidas como agtechs ou
foodtechs, em um movimento conhecido como Agricultura 4.0. Pela sua
essencialidade e complexidade, o setor pode ser analisado no âmbito dos sistemas
alimentares e, nesse sentido, o potencial da Agricultura 4.0 apenas será justamente
revertido para a sociedade nacional se os pequenos agricultores também puderem se
beneficiar e os recursos naturais forem preservados ou regenerados. Assim, muitas das
organizações deste ecossistema já procuram desenvolver abordagens de negócio,
conhecidas como negócios de impacto, que endereçam de forma explícita muitas
problemáticas socioambientais, relacionando-se aos ODS e a pautas ESG. A pesquisa
que subsidiou o artigo é qualitativa, descritiva e exploratória, partindo da análise
documental (dados secundários) e usando-se em seguida de entrevistas virtuais
semiestruturadas (dados primários) sobre alguns negócios de impacto e startups
selecionados. Os resultados sustentam que a abordagem dos negócios de impacto na
agricultura pode colaborar para a construção de sistemas alimentares mais resilientes,
possibilitando-lhes melhor resposta a novas rupturas e, principalmente, evolução ao
longo do tempo, com melhores resultados sociais e ambientais.

Palavras-chave: Sistemas Alimentares; ODS; ESG; Agricultura 4.0; Resiliência.

(1) Bacharel em Engenharia de Produção, lucas.mnds.olvr@gmail.com


(2) Doutor em Administração, PUC Minas, luciel@pucpcaldas.br

155
1. INTRODUÇÃO
A pandemia de COVID-19 iniciou a partir de 2020 uma crise multidimensional em
todo o mundo – especialmente nos países em desenvolvimento –, freando o ritmo já lento
de progresso em direção aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Organização
das Nações Unidas (FAO, 2021). Uma das situações mais alarmantes ocorre no setor
agroalimentar, pela sua essencialidade, multiplicidade de agentes envolvidos, impactos
socioambientais gerados e peculiaridades logísticas (BÉNÉ et al., 2021).
Simultaneamente, os desafios oriundos da crise pandêmica aceleraram uma grande
emergência de inovações no meio agroalimentar brasileiro, muitas delas vinculadas a
startups conhecidas como agrifoodtechs, agtechs ou foodtechs (BAMBINI e
BONACELLI, 2019). Muitas das organizações deste ecossistema procuram
desenvolver abordagens de negócio que endereçam de forma explícita muitas
problemáticas socioambientais que foram dramaticamente evidenciados pela
pandemia, alinhando-se aos ODS (CAMPOS e COMINI, 2019) e a pautas ESG
(Environmental, Social and Governance – “Ambientais, Sociais e de Governança”)
(PIPE SOCIAL, 2021a).
Dessa forma, objetiva-se com esse trabalho mapear o ecossistema de organizações e
inovações que procuram maximizar não apenas o retorno ao investidor, mas aos
stakeholders e à sociedade em geral, de forma a aprimorar os sistemas alimentares em
um cenário de crescimento da insegurança alimentar no Brasil e no mundo.
2. DISCUSSÃO TEÓRICA
O agronegócio tem se firmado como um dos principais motores da economia
brasileira, registrando trajetória constante de crescimento mesmo em meio às recentes
crises econômicas por que o Brasil passa desde meados da década de 2010. Prova disso
é que o Produto Interno Bruto (PIB) do agronegócio teve expansão recorde de 24,31%
em 2020, representando hoje 26,6% do PIB brasileiro (CEPEA, 2021). A estimativa
considera não apenas a produção agrícola em si, mas também insumos, indústria e
serviços que são englobadas pelo conceito de agronegócio.
A inovação dentro do agronegócio e indústria agroalimentar surge a partir da
interface entre vários atores, como EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária), universidades e empresas, tendo desempenhado papel crucial para que
esses setores conquistassem o atual protagonismo econômico (SANTOS et al., 2021).
Contudo, a profundidade dos impactos da inovação no setor agroalimentar depende
muito do nível de instrução e familiaridade dos atores em aspectos gerenciais e
tecnológicos (VIEIRA FILHO e SILVEIRA, 2011), além de envolver também “traços
da personalidade, como aversão ao risco, disciplina e ambição do agricultor, o acesso ao
conhecimento, ao crédito e aos serviços de extensão rural” (ALVES et al., 2013 apud
BUAINAIN et al., 2021).
Em específico, quando se consideram os pequenos agricultores (podendo ser
considerados os imóveis com menos de 50 ha, que representam 81,4% dos
estabelecimentos rurais), nota-se um grande abismo tecnológico em relação ao
agronegócio, mais voltado à exportação de commodities (BUAINAIN et al., 2021). No
aspecto crucial das tecnologias de informação e comunicação, tem-se que em 2017
apenas 12,1% dos estabelecimentos rurais contavam com internet, 31,2% contavam
apenas com rádio e 52,5 dispunham de TV (IBGE, 2020).
156
2.1. Agricultura 4.0 e Negócios de Impacto
A presente onda de inovação tecnológica e organizacional no meio rural, baseada em
tecnologia da informação e ferramentas da Indústria 4.0 (como Big Data, computação
em nuvem, Internet das Coisas, sistemas automatizados de produção) é frequentemente
denominada Agricultura 4.0 (FRANÇA, 2021). Conforme Buainain et al. (2021), são
cinco os pilares para o ecossistema da Agricultura 4.0 no Brasil: grandes empresas
produtoras de insumos e bens de capital; pequenas empresas emergentes de base
tecnológica (startups ou agtechs); universidades e centros/institutos de pesquisa;
agências do estado, da sociedade civil e organizações corporativas; investidores, em
geral privados.
O potencial da Agricultura 4.0, porém, apenas será justamente revertido para a
sociedade nacional se os pequenos agricultores também puderem se beneficiar e os
recursos naturais forem preservados ou regenerados. Nesse sentido, muitos dos
negócios inovadores atuantes neste ecossistema estão adotando e desenvolvendo
abordagens de negócio que têm por missão ajudar a solucionar problemáticas
socioambientais que foram dramaticamente evidenciados pela pandemia, alinhando-se
aos ODS (CAMPOS e COMINI, 2019) e a pautas ESG (Environmental, Social and
Governance – “Ambientais, Sociais e de Governança”) (PIPE SOCIAL, 2021a). Tais
negócios são conhecidos no Brasil como “negócios de impacto” e, conforme a Aliança
pelos Investimentos e Negócios de Impacto, são 4 as suas características centrais
(SENSE LAB, 2019):
“Propósito (Explicitam na sua missão o propósito de gerar impacto
socioambiental positivo); Avaliação de impacto (Conhecem, mensuram
e avaliam seu impacto periodicamente); Receita própria (operam com
geração de receita oriunda da venda de seus produtos e serviços;
Governança (estabelecem um modelo de governança que considera as
várias partes interessadas, não apenas investidores e clientes, mas
também a comunidade).”. (SENSE LAB, p. 10, 2019).
Conforme o relatório nacional sobre negócios de impacto da Pipe Social, em 2021 as
preocupações despertadas pela crise pandêmica impulsionaram as pautas ESG nos
negócios e investimentos em todo o mundo, inclusive no Brasil. Além de ações
emergenciais para mitigar os impactos dramáticos da pandemia no Brasil, grandes
empresas, instituições, fundações, governos e outros agentes começam a situar as pautas
ESG no centro de seus discursos e ações institucionais e também a sondarem
possibilidades de atuação no ecossistema de apoio aos negócios de impacto. Dessa
forma, pode-se dizer que a atuação empresarial com foco em impacto está deixando de
ser um nicho de mercado (PIPE SOCIAL, 2021a).
2.2. Sistemas Alimentares e Impactos da Pandemia de COVID-19
No contexto pandêmico e pós-pandêmico, é interessante tratar as cadeias de
suprimentos no âmbito dos “sistemas alimentares”, definidas pela ONU (2021) como “a
constelação de atividades envolvidas na produção, processamento, transporte e
consumo de alimentos” (ONU, 2021). Essa abordagem é reiterada pela análise de
Friedrich et al. (2021), que veem a própria COVID-19 como uma sindemia,
considerando que “a doença se une de modo interdependente e interage com
comorbidades como as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), em contextos
permeados por desigualdades sociais estruturais” (HORTON, 2020 apud FRIEDRICH

157
et al., 2021, p. 80).
A Figura 1 apresenta este modelo teórico conforme Béné et al. (2021), que
realizaram uma análise criteriosa de 337 documentos – englobando 62 países da África,
Ásia, Europa, Oceania e Américas – para avaliar os impactos da pandemia na segurança
alimentar pelo mundo e quais os melhores atributos para o fortalecimento da resiliência
dos sistemas alimentares. Segundo os autores, as dimensões de segurança alimentar
mais afetadas pela pandemia foram a “acessibilidade (econômica)” e “acesso (físico)”,
em particular em áreas urbanas e em países de renda baixa e média.
Figura 1 – Caracterização de “Sistema Alimentar”

Fonte: Adaptado de Béné et al. (2021).


A nível nacional, observa-se que a insegurança alimentar vem crescendo desde
2017/2018, de acordo com a Pesquisa de Orçamentos Familiares (IBGE, 2020) e, em
2020, conforme Galindo et al. (2021), 59,4% dos domicílios brasileiros relataram estar
vivendo algum nível de insegurança alimentar, tendo-se como referência a Escala
Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA).
A EBIA classifica os domicílios em quatro categorias: com segurança alimentar ou
com insegurança alimentar leve, moderada ou grave (IBGE, 2004) e “tem a capacidade
de mensurar a dificuldade de acesso familiar aos alimentos e também as dimensões
psicológicas e sociais da insegurança alimentar” (MDS, 2014). Conforme Hoffmann
(2014), um domicílio está em situação de segurança alimentar se todas as pessoas deste
domicílio têm, permanentemente, acesso a alimentos suficientes para uma vida ativa e
saudável.
A pesquisa de Galindo et al. (2021), com metodologia inspirada no levantamento
VIGITEL (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por
Inquérito Telefônico) do Ministério da Saúde, ainda estima uma redução de mais de
85% do consumo de alimentos saudáveis entre os brasileiros que já estavam em um
quadro de insegurança alimentar. Verifica-se a grande influência da dimensão de
“acessibilidade (econômica)” (BÉNÉ et al., 2021) na ocorrência da insegurança
alimentar, devido à diminuição das rendas das famílias – apenas atenuada pelo Auxílio
158
Emergencial. Os autores ainda assinalam que a insegurança afeta sobretudo as seguintes
segmentações da população brasileira: mulheres, pessoas de cor ou raça preta e parda,
moradores das regiões Norte e Nordeste e de áreas rurais, domicílios com crianças e
com menor renda per capita.
3. METODOLOGIA
Conforme Vergara (1998), a pesquisa pode ser classificada como qualitativa,
descritiva e exploratória, partindo da análise documental (dados secundários) sobre
inovações catalisadas por startups no setor agroalimentar e usando-se em seguida de
entrevistas virtuais semiestruturadas (dados primários) sobre alguns casos de destaque
dentre as inovações mapeadas que possuam comprometimento explícito com os ODS e
pautas ESG. Foram priorizados dados secundários de amplitude nacional, obtidos de
relatórios sobre o meio rural brasileiro e plataformas de inovação. Na pesquisa primária,
trinta e uma entrevistas foram realizadas entre abril e setembro de 2021, fornecendo
mais de 18 horas de gravações de vídeo ou áudio.
4. ANÁLISE DOS RESULTADOS
Segundo o Radar AgTech Brasil 2019 (DIAS et al., 2019), já antes da pandemia o
Brasil contava com 1.125 startups atuantes no agronegócio, sendo 532 na pós-produção
agropecuária (47%), 397 em atividades dentro das fazendas (35%) e 196 com atuação
antes da fazenda (18%). Dados recentes da plataforma Liga Ventures (2021) apresentam
um ecossistema brasileiro de foodtechs com 469 startups (de um universo de mais de
16.000 startups) fundadas desde 2012 e distribuídas por 23 categorias e 109 cidades.
Chama a atenção o fato de que mais de 50% das startups cadastradas são do estado de
São Paulo e mais de 34% apenas de sua capital. Um outro levantamento, da Associação
Brasileira de Startups (ABSTARTUPS) apresenta 13.774 startups cadastradas, dentre as
quais 493 (3,58%) com foco no agronegócio (ABSTARTUPS, 2021).
Relativamente ao setor agroalimentar, o relatório da Pipe Social traz um ecossistema
de impacto bastante representativo. De um total de 1272 negócios autodeclarados “de
impacto” e “operantes” via formulário online, 13% alegam alinhamento ao ODS 2
(“Fome zero e agricultura sustentável”), 34% ao ODS 11 (“Cidades e comunidades
sustentáveis”) e 39% ao ODS 12 (“Consumo e produção sustentáveis”) – objetivos
considerados mais afins ao setor agroalimentar (PIPE SOCIAL, 2021a). Segundo a
mesma organização, existem no Brasil 69 organizações que se apresentam como
negócios de impacto atuantes no setor agropecuário (PIPE SOCIAL, 2021b).
4.1. Exemplos de startups e negócios de impacto nos sistemas alimentares
A pesquisa encontrou negócios de impacto atuantes em diversas dimensões dos
sistemas alimentares, em consonância com o levantamento geral de foodtechs realizado
por Dias et al. (2019). Muitos dos empreendimentos seguem filosofias mais sistêmicas e
se dedicam a conectar os diversos agentes das cadeias de FLV, aprimorando sua
governança e eficiência. Para isso, constroem parcerias estreitas para escalar e alcançar
um mercado mais amplo. Um desses casos é o Muda Meu Mundo (atuante em São Paulo
e Ceará), que provê assistência para pequenos agricultores orgânicos e os conecta a
grandes redes varejistas, fechando negócios e executando a logística, para garantir uma
renda maior e mais regular. Um caso semelhante é o Sumá (estado de Santa Catarina),
que tem como foco o desenvolvimento de agricultores familiares para garantir-lhes
contratos de compras públicas ou privadas, operando em cooperação com o braço
159
estadual do SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas).
Ambos os negócios desenvolvem e gerenciam plataforma digital e aplicativo para
agilizar e otimizar as interações na cadeia.
Uma empresa que merece destaque pela profundidade da inovação na integração
das cadeias é a Santa Food, negócio de impacto paulistano e atuante na região
metropolitana. A empresa pretende explicitamente revolucionar o próprio conceito de
cadeia curta de abastecimento alimentar, desenvolvendo e implementando a
“microeconomia verde circular”. A ideia é que os pequenos agricultores abasteçam as
cozinhas comunitárias (ou dark kitchens sociais, que preparam e despacham as
refeições, sendo operadas principalmente por populações desfavorecidas) e ambos
atendam aos clientes. Em seguida, as sobras das cozinhas e dos clientes são convertidas
em adubo natural por processos de compostagem nas cozinhas. Por fim, o fertilizante é
fornecido aos agricultores, fechando a cadeia de abastecimento alimentar local. A
empresa, contando com diversos parceiros, assume o trabalho de desenvolvimento e
treinamento dos agentes e estruturação de toda a cadeia, tanto virtual quanto
fisicamente.
Outros negócios atuam em pontos mais específicos dos sistemas alimentares. Na
porção final das cadeias de suprimentos, encontram-se algumas das abordagens de
negócio mais difundidas, como o farm to table (“da fazenda à mesa”) e D2C (direct to
consumer, “direto ao consumidor”), que propõem o contato direto entre os
produtores/fornecedores e consumidores. Nesses dois setores, podemos citar negócios
de impacto como Raizs, Nutriens e Orgânicos In Box, que possuem ativos logísticos e
de processamento próprios para realizar a logística do campo ao consumidor, com um
modelo de negócio baseado em compras individuais ou assinatura de cestas.
A comodidade e conveniência das ofertas aos consumidores , e l e m e n t o s d o s
ambientes alimentares dentro dos sistemas alimentares, é ainda mais explorada por
empresas como Beleaf e LivUp, que também aderem a princípios dos negócios de
impacto. Ambas possuem centros de processamento de FLV e outros gêneros para a
produção de diferentes modalidades de refeições congeladas e prontas para o consumo
após rápido aquecimento. Beleaf, em particular, foca no atributo de qualidade plant-
based (“baseado em plantas”), não utilizando proteína animal nas preparações, e LivUp
também comercializa cestas dos alimentos in natura. Os produtos são oferecidos de
forma avulsa, combinada (combos) ou planos de assinatura.
Finalmente, cabe destacar o negócio de impacto Papayas, cujo foco é o
desenvolvimento e gestão de um vale alimentação e refeição responsável, um dos meios
de pagamento mais utilizados no Brasil para as compras de FLV. A empresa dedica-se à
implementação do voucher (sem qualquer obrigação de exclusividade) para empresas
que pretendam oferecer uma vida mais saudável aos seus colaboradores,
simultaneamente ao registo de agricultores agroecológicos, restaurantes orgânicos e
pequenos artesãos de alimentos. Conforme determina a legislação brasileira, a empresa
também implementa um programa ativo de educação nutricional para os funcionários
que recebem o benefício Papayas.
As empresas mencionadas, na maioria das vezes, explicitam a geração de impacto
social e ambiental como pilares institucionais e apresentam diversos indicadores de
impacto (como renda dos parceiros e uso de recursos naturais) e credenciais,
certificações e parcerias vinculadas a esse propósito. Além dos certificados de produção
160
orgânica para os itens comercializados, presentes na maioria dos negócios, como IBD e
Orgânico Brasil, outros exemplos incluem a certificação Eu Reciclo (compensação
integral dos resíduos das embalagens), assegurada por Raizs, Beleaf, LivUp e Santa
Food.
Beleaf e Raizs, por sua vez, são certificadas como Empresa B, certificação global
que promove “um novo tipo de negócio que equilibra propósito e lucro, considerando o
impacto de suas decisões em seus trabalhadores, clientes, fornecedores, comunidade e
meio ambiente” (SISTEMA B BRASIL, 2022). Credenciais vinculadas aos Objetivos
de Desenvolvimento Sustentável da ONU parcerias com organizações diversas, como
Comida Invisível (plataforma para doação de alimentos sem valor comercial, porém
próprios para o consumo, às ONGs cadastradas), também são apresentadas como
atributos de qualidade para as propostas de valor.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a crise pandêmica, os desafios já enfrentados pela sociedade global para
avanço em direção aos ODS foram agravados – especialmente no caso do ODS 2
(“Fome zero e agricultura sustentável”), devido à forte elevação da insegurança
alimentar em países subdesenvolvidos e emergentes, incluindo o Brasil. Globalmente,
foi registrada significativa deterioração das dimensões de acessibilidade econômica,
diversidade de itens alimentares e estabilidade dos sistemas alimentares. Em
consonância com esse contexto, estima-se que mais da metade da população brasileira
se encontre em situação de insegurança alimentar.
Tal cenário contrasta com a pujança usualmente apresentada pelo agronegócio
nacional e o avanço exponencial de inovações tecnológicas e gerenciais para o setor, em
um movimento que tem sido denominado Agricultura 4.0. Marcado por grande
presença de investidores privados e startups denominadas agtechs (BUAINAIN et al.,
2021), a Agricultura 4.0 é voltada a grandes e médios produtores; dessa forma, existe
uma grande lacuna no mercado, referente aos pequenos produtores.
Essa oportunidade de mercado vem sendo explorada por negócios explicitamente
comprometidos com a geração de impacto social e/ou ambiental positivo, muitos deles
vinculados à abordagem dos negócios de impacto. Com as preocupações ligadas aos
ODS e pautas ESG recrudescidas pela pandemia, muitas organizações privadas se
aproximam destes negócios e ensejam novos caminhos para os pequenos agricultores –
que garantem a maior parte da oferta de FLV ao país.
No país já se verifica uma crescente comunidade de negócios de impacto ou startups
com compromissos ESG, que oferecem um rico referencial de como desenvolver
soluções multidimensionais para o avanço em direção aos ODS. Sendo os pequenos
produtores rurais um dos segmentos mais afetados pela insegurança alimentar
(GALINDO et al., 2021) e, ao mesmo tempo, o principal fornecedor dos alimentos
consumidos no mercado interno (IBGE, 2021), entende-se que a abordagem dos
negócios de impacto na agricultura poderia colaborar enormemente para a construção
de sistemas alimentares resilientes. A resiliência, nesse contexto, estaria vinculada à
capacidade do sistema não apenas resistir, mas também evoluir a partir de choques
externos, com melhores condições de vida para populações vulneráveis e melhor
gerenciamento de recursos naturais – quesitos que serão fundamentais na inibição e/ou
mitigação de novas crises originadas por fatores ambientais.

161
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162
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163
A FEIRA DA AGRICULTURA FAMILIAR
DE ITURAMA-MG FRENTE À
PANDEMIA DA COVID-19

João Lucas Soares Sanches (1)


Julia Piethra Martins (2)
Ariane Fernandes da Conceição (3)

RESUMO. Um dos principais mercados acessados por agricultores familiares é


materializado por meio das feiras livres, essas constituem como um canal de
comercialização a qual produtores e consumidores possuem um local para troca não
apenas de produtos, mas também de informações, conhecimento e experiências rico.
Portanto, é notório que as feiras da agricultura familiar têm crescido
significativamente com o passar dos anos, fortalecendo a importância dos circuitos
curtos de comercialização para o desenvolvimento rural e driblar algumas facetas
atribuídas ao homem do campo. Entretanto, no ano de 2020, com o acometimento de
uma pandemia causada pelo COVID-19, agricultores familiares se viram diretamente
atingidos por conta da proliferação do vírus. E o acesso à internet, por meio da
utilização de redes sociais tem colaborado no processo de comercialização dos
agricultores. Então esta ferramenta obteve sobrelevada demanda de acesso devido a
pandemia, destacando-se a divulgação e vendas por meio das redes sociais, sendo
possível as entregas via delivery. E devido a esta procura por qualificação nas redes foi
criada a página CAFITUR (Apoio à comercialização da agricultura familiar de
Iturama e região), com o intuito de coletar informações e fazer a divulgações desta em
mídias sociais como Instagram e Facebook. Frente a esse contexto, a pesquisa buscou
compreender de que forma os agricultores e agricultoras familiares de Iturama-MG e
região estão comercializando seus produtos, a partir das dificuldades encontradas
perante a pandemia, com a adoção de tecnologias para proporcionar maior
visibilidade dos produtos vendidos na feira através do mercado digital.

Palavras-chave: Comercialização. Pandemia. Agricultura Familiar.


Desenvolvimento Rural.

(1) Graduando em Agronomia, Bolsista de Iniciação Científica, Universidade Federal do Triângulo


Mineiro/UFTM, Campus Universitário de Iturama - MG, e-mail: jlsoaressanches@hotmail.com.
(2) Graduanda em Agronomia, Universidade Federal do Triângulo Mineiro/UFTM, Campus Universitário
de Iturama - MG, e-mail: julia.pethra1@gmail.com.
(3) Prof. Dra. do Curso de Agronomia, Universidade Federal do Triângulo Mineiro/UFTM, Campus
Universitário de Iturama – MG, e-mail: ariane.conceicao@uftm.edu.br.
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1 INTRODUÇÃO
Famigerado devido a produção agrícola mundial, o Brasil destaca-se quando o
assunto é produção e exportação de alimentos. Conforme o Censo Agropecuário
(2017) foi registrado que 351 milhões de hectares representa a área de
estabelecimentos agropecuários brasileiros, sendo que 77% desses estabelecimentos
rurais são classificados como agricultura familiar, cerca de 3,9 milhões de
estabelecimentos, equivalendo a 23% de toda a produção agropecuária nacional
(IBGE, 2017).
Para fins de conceituação, podemos entender por agricultura familiar a descrição
dada por Wanderley (1999, p.23) que afirma que
“É entendida como aquela em que a família, ao mesmo tempo em que é
proprietária dos meios de produção, assume o trabalho no
estabelecimento produtivo. É importante insistir que esse caráter
familiar não é um mero detalhe superficial e descritivo, ou seja, o fato
de uma estrutura produtiva associar família-produção-trabalho tem
consequências fundamentais para a forma como ela age econômica e
socialmente.”
Ademais, o meio rural vem passando por diversas transformações que afetam
aspectos sociais, econômicos e culturais que tendem a influenciar diretamente
cotidiano e a vida dos ali residentes. Isso, resultante do processo expansivo industrial,
principalmente no século XVIII, com o surgimento da revolução industrial, que gerou
transformações em diversos países, uma vez que acelerou o processo de produção,
modernizou as práticas agropecuárias e aumentou a exploração de recursos naturais.
A inserção dos agricultores nos mercados de trabalho agrícola torna-se de grande
importância no processo de desenvolvimento rural e as feiras, apresentam-se como
uma das principais formas de acesso a mercados pela agricultura familiar. Para além
disso, Ploeg (2008) ressalta que a capacidade de reprodução da agricultura é
influenciada pela forma como os agricultores tendem a administrar as estratégias
organizacionais na propriedade, a forma como as decisões são tomadas em seu
processo produtivo, bem como se dá a dinâmica de acesso e a inserção nos mercados
socialmente construídos
Um dos principais mercados acessados por agricultores familiares é materializado
por meio das feiras. As feiras da agricultura familiar, como bem descrevem Lima e
Fontana (2019) podem ser entendidas como mercados socialmente construídos com a
finalidade de troca. No tocante à feira, pode se considerar como um importante
dispositivo de construção de capacidades econômicas uma vez que funciona como um
potencializador do empoderamento dos atores participantes, fazendo com que eles se
sintam reconhecidos pelo trabalho que estão realizando (CONCEIÇÃO, 2016).
De acordo com Mascarenhas e Dolzani (2008, p. 75), “a feira livre no Brasil
constitui modalidade de mercado varejista ao ar livre, de periodicidade semanal,
organizada como serviço de utilidade pública pela municipalidade e voltada para a
distribuição local de gêneros alimentícios e produtos básicos”. Dessa maneira, o autor
ressalta a funcionalidade da feira, além de demonstrar o papel da mesma frente ao
abastecimento urbano de alimentos saudáveis.
As feiras livres constituem um canal de comercialização a qual produtores e

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consumidores possuem um local para troca não apenas de produtos, mas também de
informações, conhecimento e experiências rico. Quando se fala em feiras, é possível
atrelar tal forma de comercialização ao conceito de cadeias curtas de comercialização.
Schneider e Gazolla (2016, p.12), ressaltam que “a definição de cadeias curtas resgata
uma dimensão central das economias de proximidade e de escopo que refere ao papel
da geografia e da interação entre espaço e atividade econômica”.
Portanto, é notório que as feiras da agricultura familiar têm crescido
significativamente com o passar dos anos, fortalecendo a importância dos circuitos
curtos de comercialização para o desenvolvimento rural e driblar algumas facetas
atribuídas ao homem do campo. Entretanto, no ano de 2020, com o acometimento de
uma pandemia causada pelo COVID-19, agricultores familiares se viram diretamente
atingidos por conta da proliferação do vírus.
Segundo informações do Ministério da Saúde (2020), COVID-19 é uma doença
causada pelo coronavírus, denominado SARS-CoV-2, que apresenta um espectro
clínico variando de infecções assintomáticas ou sintomáticas a quadros graves. De
acordo com a Organização Mundial da Saúde (2020), tal vírus se espalha
principalmente através de gotículas de saliva ou descarga do nariz quando uma pessoa
infectada tosse ou espirra, por isso é importante tanto o distanciamento social quanto a
utilização de máscaras e álcool em gel. Sendo assim, observa-se que a transmissão
pode acontecer de uma pessoa doente para outra ou simplesmente através do contato
direto ou por meio do toque em alguma superfície contaminada.
É sabido que a partir de março de 2020, a situação de pandemia causada pelo
Covid-19 chegou ao Brasil, e pegou todos de surpresa trazendo diversos
inconvenientes, principalmente no quesito saúde e economia. Quanto aos agricultores
familiares, tem-se que estes tem dificuldade na comercialização de sua produção bem
como de acesso a novos mercados. No início de todo esse cenário pandêmico, a
instrução de grande parte dos governos foi o isolamento social, e em Iturama-MG não
foi diferente. A principal iniciativa da prefeitura foi o isolamento da cidade e o
fechamento dos pontos de comercio, restaurantes e feiras, cujo qual afetou
diretamente os agricultores e agricultoras da região que expunham seus produtos na
feira da agricultura familiar que ocorria as quartas feiras. Houve também a redução
dos editais e compra de alimentas da agricultura familiar via programa PNAE
(Programa Nacional de Alimentação Escolar), e muitos agricultores familiares que
participavam do projeto tiveram uma drástica redução na sua renda.
Diante deste cenário, os agricultores e agricultoras familiares viram seus
principais canais de comercialização paralisados, além dos próprios, em sua grande
maioria serem considerados do grupo de risco, fazendo com que eles ficassem, assim,
à mercê de sua própria sorte, uma vez que tanto as feiras foram proibidas de
funcionarem quanto as compras institucionais, principalmente as voltadas para a
alimentação escolar, também pararam de serem realizadas.
Com a impossibilidade da realização das feiras e vendas para programas
governamentais, os agricultores e agricultoras familiares precisaram se reinventar,
buscando novas formas de comercialização que não os expusessem de forma perigosa
ao vírus, mas que garantisse sua sobrevivência financeira. Sendo assim, observa-se
que na conjuntura da pandemia causada pela COVID-19, as dinâmicas de produção e
comercialização dos agricultores familiares têm sido forte mente afetadas. E a
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comunicação torna-se uma saída potencial para minimizar os efeitos observados.
E em busca de novas oportunidades, as tecnologias de informação e comunicação
(TIC), principalmente à internet, passam a ser adotados por agricultores no meio rural,
influenciando as atividades dos moradores e colaborando, inclusive, para acesso
mercados antes inacessíveis. Ocorre, então, o surgimento não apenas de uma mudança
cultural, mas sim uma modificação nas atividades rotineiras através de busca por
novas práticas, novos mercados e experiências que podem ser vivenciadas com o
advento da comunicação.
Há uma necessidade de novas tecnologias que transformem e auxilie o rendimento
de produção e traga um maior contentamento aos compradores, sendo assim, esta
nova perspectiva demanda dos produtores modos eficientes de gerenciamento e
produção, isto leva as TIC uma importante atribuição para este novo viés produtivo
(ASSAD & PANCETTI, 2009).
Frente a esse contexto, a pesquisa buscou compreender de que forma os
agricultores e agricultoras familiares de Iturama-MG e região estão comercializando
seus produtos, a partir das dificuldades encontradas perante a pandemia gerada pelo
novo coronavírus, com a adoção de tecnologias para proporcionar maior visibilidade
dos produtos vendidos na feira através do mercado digital.
2 ASPECTOS METODOLÓGICOS
Para a realização do presente estudo, optou-se por uma metodologia de pesquisa
de natureza descritiva e exploratória. Ademais, foram utilizadas algumas técnicas de
coleta de dados.
Inicialmente fora realizado um levantamento bibliográfico, que ocorreu através de
um aprofundamento na revisão de literatura acerca da temática da agricultura familiar
e a pandemia causada pelo SARS-COV-19, afim de ampliar os conhecimentos acerca
da realidade de Iturama-MG, município o qual a feira em questão é realizada.
Como também, foram selecionadas informações secundárias, adquiridas junto a
dados da Prefeitura Municipal, ao Centro de Tecnologia de Informação e
Comunicação (Cetic), Comitê Gestor da Internet (CGi) e dados referentes à pandemia
junto ao Ministério da Saúde.
Posteriormente, com o objetivo de resguardar a segurança dos entrevistados e dos
autores deste artigo, optou-se por realização de uma pesquisa semiestruturada junto
aos agricultores familiares e suas lideranças locais, com o objetivo de diagnosticar e
conhecer a realidade dos agricultores familiares participantes da feira da agricultura
familiar frente a pandemia. Foram realizadas entrevistas por meio de questionários
semiestruturados gerados com o auxílio do formulário Google, que constou de
questões quantitativas como qualitativas, além de questões referentes a fatores
socioeconômicos dos agricultores, sendo este realizado por contato por meio do
aplicativo WhatsApp o qual foi encaminhado o formulário para preenchimento.
A título de exemplificação, foram coletadas informações sobre o perfil social e
econômico dos feirantes familiares: gênero, idade, escolaridade, se possui aparelho
celular/smartphone e redes social entre outros. No âmbito da pandemia em curso do
COVID-19, pergunta-se o conhecimento sobre e se algum familiar já contraiu a
doença, se já foi contaminado entre outros.
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Além das entrevistas com os produtores, o presente estudo utilizou de métricas
fornecidas pelas redes sociais do perfil no Facebook e Instagram do projeto de
extensão denominado Cafiturama, hoje contando com 606 seguidores no Instagram e
706 no Facebook, foi analisado os dados do período de março de 2020 à julho de 2021,
estes perfis que foram criados afim de divulgar os produtores da região através de
postagens informativas contendo as mercadorias e contatos de cada produtor com o
propósito de atingir um maior número de consumidores na cidade. Métrica essa
definida através de algoritmos das próprias plataformas, como número de pessoas
alcançadas, público com interesse, dias com maior acesso a página.
Assim, foi realizada a tabulação dos dados quantitativos que serão organizados e
gerado pela própria plataforma de formulário Google, que utiliza a estatística
descritiva por meio de gráficos e figuras. Nesse programa, os dados e as fórmulas
serão reunidos, facilitando a sistematização das informações. Os dados qualitativos
foram transcritos e apresentados de acordo com o discurso dos entrevistados, numa
perspectiva fidedigna de compreensão e descrição dos fenômenos observados durante
as entrevistas. Ademias, as identidades dos entrevistados serão totalmente
preservadas.
2 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Sendo um dos municípios de Minas Gerais, Iturama situa-se no Triângulo
Mineiro, mais precisamente na região do pontal do triângulo mineiro, localizado na
Microrregião de Frutal. Trata-se de um município de pequeno porte, contando com
uma população de 39.263 habitantes e área de 1.404,7 km² de cerrados, campos e
matas, lavouras e pastagens (IBGE, 2019).
Iturama conta com grandes plantações de cana-de-açúcar e soja, e ao mesmo
tempo conta com um grande número de assentamentos e acampamentos
circunvizinhos. Sendo assim, a agricultura familiar da região torna-se forte e
proeminentes, com uma diversidade de produtos que são oferecidos nas feiras tanto da
agricultura familiar, que ocorre às quartas-feiras no período da noite, quanto na feira
de diversos agricultores que ocorre aos domingos pela manhã.
A FAFIR (Feira da agricultura familiar de Iturama e região) teve sua criação e
inauguração no dia onze setembro de dois mil e dezenove, com o intuito de contribuir
na organização e união dos agricultores familiares do município e região Sendo assim,
em 2019, a feira foi inaugurada com dez barracas que comercializavam diversos
produtos oriundos da agricultura familiar, proporcionando aos feirantes e
consumidores uma dinâmica social e econômica de interação e integração, mediante a
um nicho mercadológico regional gerador de capital e fluxo da economia local,
favorecendo assim, as cadeias curtas de produção, tornando possível o contato entre
produtor e consumidor. Outrossim, as feiras acontecem nas quartas-feiras, das 17 até
22 horas (horário de Brasília). Atualmente, a FAFIR conta com mais de 40
agricultores e agricultoras familiares que tem a feira como sua principal fonte
geradora de renda da propriedade.
Assim como no país e no mundo, em Iturama o cenário pandêmico não fora
diferenciado. Foi necessário que a Prefeitura Municipal tomasse uma série de medidas
de segurança com o objetivo de minimizar tanto o número de casos quanto o número
de óbitos no município. Sendo assim, embora o primeiro caso no país fora constatado

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no dia 26 de fevereiro de 2020, o município confirmou o seu primeiro caso apenas no
dia 04 de junho de 2020.
Um dos motivos desse retardo na confirmação do primeiro caso no município pode
ter como motivo o fato de o prefeito da época, Anderson Golfão, por meio do decreto
nº 7564 de 23 de março de 2020 que suspendia a realização de qualquer evento, seja
público ou privado, inclusive as feiras livres do município, sendo este prorrogado por
inúmeras vezes. Além do decreto, foi criado o Hospital do Covid para receber casos de
suspeitos da doença. Durante o período de 2020, houve diversos decretos
endurecendo e afrouxando as medidas, o que fez com que a situação fosse controlada.
Com a eleição municipal, houve a troca de prefeito, levando o Cláudio Burrinho
para a prefeitura. Mudando a administração, houve também a alteração de decretos,
assim como houve aumento de casos principalmente devido a abertura de comércio no
município e os festejos natalinos e de ano novo.
Consoante ao decreto nº 7.859, de 18 de fevereiro de 2021, da Prefeitura
Municipal de Iturama – MG, este dispunha que Art. 1º Como medida excepcional,
para conter a propagação do Novo coronavírus (COVID-19), fica determinado, para
os próximos 07 dias as seguintes medidas: VI- Ficam proibidas as feiras livres dos dias
21 e 24 de fevereiro.
Em esfera nacional, uma pesquisa inédita realizada pela Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz) mostra que o número de mortes por COVID-19 no Brasil em 2020 foi 18,2%
maior do que o registrado. A análise indicou que foram 230.452 óbitos pela doença no
ano passado e não 194.949 (FIOCRUZ, 2021). Como também, perante a atualização
epidemiológica semanal no COVID-19 (13 de abril de 2021), por meio de dados
recebidos pela OMS das autoridades nacionais, a partir das 10h (horário de Brasília)
de 11 de abril de 2021, que:
Globalmente, os novos casos de COVID-19 subiram pela sétima semana
consecutiva, com mais de 4,5 milhões de novos casos notificados na
última semana. O número de novas mortes aumentou pela quarta semana
consecutiva, aumentando 7% em relação à semana passada, com mais de
76 mil novas mortes notificadas. Nesta edição, uma atualização especial
de foco é fornecida nas variantes SARS-CoV-2.
Vale ressaltar que, uma pesquisa do Instituto Interamericano de Cooperação
Agrícola (IICA) alega que a maioria dos agricultores familiares da América Latina e
do Caribe tem trabalhado com a ausência de equipamentos de proteção e protocolos
sanitários durante a pandemia, além de enfrentar limitações e uma crescente
preocupação no setor da agricultura familiar em relação às possibilidades de
comercialização de alimentos em mercados locais, devido à redução no fluxo de
consumidores por medo de serem infectados (GLOBO RURAL, 2020).
Nesse sentido, um pensamento complementar que contribui para a noção do
impacto dos primeiros meses da pandemia para a agricultura familiar, é o de Claudino
(2020) que em seu dossiê, constata que o setor da produção e comercialização
agropecuária foi duramente afetado nesse período, havendo perdas econômicas
expressivas, muito mais intensas entre aquelas famílias ou grupos mais vulneráveis, e
aqueles que diversificaram seus meios e canais de comercialização, ou que tinham
produtos que não dependiam de colheita imediata puderam superar ou driblar aquele
determinado momento.
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Para efeitos de resultado da presente pesquisa, coletadas informações sobre o
perfil social e econômico dos feirantes tais como gênero, localização da propriedade,
idade, escolaridade de acordo com o citado na metodologia deste trabalho, foram
analisados os perfis socioeconômicos e escolaridade dos agricultores e agricultoras
que expõem seus produtos na feira.
Quanto ao gênero dos agricultores familiares, 60% dos respondentes declararam
ser do sexo feminino enquanto 40% são do sexo masculino. Tal informação pode ser
corroborada com a pesquisa realizada por Conceição (2016), a qual pode-se perceber
que as mulheres vêm tomando posições de contato com o público para
comercialização dos produtos, enquanto os homens cada vez mais estão na
propriedade cuidando da lida no campo.
Quanto a faixa etária dos entrevistados, parâmetro muito importante visando o
cenário de pandemia, pois pessoas acima de 60 anos são consideradas grupo de risco
do vírus. Logo, pode-se observar que maioria dos feirantes correspondem a um grupo
de idade superior a 40 anos, sendo 35% com idade entre 41 a 50 anos, 50% de 51 a 60
anos e 5% acima de 60 anos.
Ambos os dados citados acima, como faixa etária e gênero, se reforça a
importância desses dados, através de um estudo publicado pela revista Veja Saúde
(2020), o qual mostra um artigo que aborda a influência de idade e sexo na gravidade
do coronavírus, pois de acordo com análises descritas no artigo, a infecção pelo Sars-
CoV-2 em indivíduos de 13 a 60 anos se mostrou associada a alteração em diversos
parâmetros laboratoriais de maneira muito mais frequente em homens do que em
mulheres.
Quanto a escolaridade, é possível observar que entre os entrevistados, 15%
apresentam ensino superior completo, 20% Ensino médico completo, 30% ensino
médio incompleto, 10% ensino fundamental completo e 10% ensino fundamental
incompleto. Não houve relatos de analfabetos ou em alfabetização.
Apesar da logística ser um dos principais entraves para a realização de feiras e
entregas de produtos da agricultura familiar do município, é possível observar que as
propriedades não distam muito do local de realização, além de boa parte das
propriedades terem acesso a estrada principal asfaltada.
Corroborando com o objetivo do presente artigo sobre os efeitos da pandemia na
feira, foi levado em consideração na pesquisa se o agricultor familiar participante da
feira sabe o que é o COVID-19, chegando ao resultado da ciência dos mesmos em
porcento (100%) dos entrevistados que sabiam e tinham conhecimento acerca da
doença. Ademais, foi abordado junto aos entrevistados se ele ou algum familiar já
havia sido infectado com a doença respiratória citada. Observa-se que metade dos
entrevistados contraíram ou tiveram algum familiar acometido pelo vírus, o que pode
ser um indicador que o fechamento da feira guiou os produtores a se informar sobre a
situação em que se encontram, a fim de se manterem saudáveis e produtivos dentro das
possibilidades.
E perante a temática das TICs, fora perguntado aos agricultores acerca da
utilização de celular ou smartphone, e de acordo com os entrevistados, 95% utilizam
celulares ou smartphones. E quanto ao acesso à internet, 95% dos respondentes
afirmaram possuir acesso à internet na propriedade. E segundo dados do Cetic (2019),
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51% da população rural brasileira apresenta acesso à internet em suas propriedades.
Outrossim, quando questionados sobre a utilização das redes sociais, 80% apontarem
terem perfis em redes sociais. Por redes sociais, entende-se como utilização de
Facebook, Instagram, WhatsApp, Twitter, TikTok).
Em virtude ao pensamento de Del Grossi (2020), citado por Schneider (2020) que
metade dos agricultores familiares brasileiros (51%) sentiram uma queda na receita
no mês de julho no ano de 2020, notando um retrocesso de 35% da renda bruta orçadas
pelas famílias mensalmente, é possível observar que essa queda também acometeu os
agricultores familiares em nível municipal em Iturama-MG. Também houve quedas
expressivas e perda da produção durante a pandemia, como o notório relato no
formulário de queda de menos da metade das vendas.
Fora perguntado aos entrevistados acerca das dificuldades enfrentadas atualmente
na pandemia, a opinião sobre o fechamento da feira por conta da pandemia, Como
você está vendendo seus produtos durante a pandemia e quanto estão conseguindo
comercializar em média nesse cenário.
A grande maioria dos agricultores entrevistados afirmaram ter uma perda grande
de valor comercializado, principalmente com a não autorização do funcionamento da
feira. Segundo um dos entrevistados, “Antes da pandemia entre R$1.500,00 à
R$1.600,00. Mas agora em média de R$500,00”. Essa é a realidade de muitos
feirantes não somente em Iturama-MG. Acaba que as feiras constituem um dos
principais, se não o principal local de comercialização dos pequenos agricultores que
relatam que “Caiu muito por não ter a feira no momento”; “A metade do que vendia.”;
“Menos da metade”; “200 reais por semana”.
É notório salientar que, ainda que fora proporcionados momentos de autorização
da realização da feira FAFIR, devido a pandemia e o temor da população em contrair o
vírus, o público da feira reduziu drasticamente, fazendo que mesmo com seu
funcionamento, os agricultores não conseguissem comercializar suas mercadorias
como no período anterior ao COVID-19. Além disso, essas falas corroboram para a
certeza de que o fechamento da feira da agricultura atingiu desastrosamente os
agricultores familiares de maneira econômica e social.
Ao serem questionados sobre a forma sobre como estão realizando as vendas
durante a pandemia, apesar de um dos entrevistados afirmar que “Quando a feira está
fechada, não vendemos”; alguns entrevistados afirmaram estarem usando suas redes
sociais, seja “Divulgando nas redes sociais”; “Através do contato com os clientes” e
“Entregando de porta em porta pedidos feitos pelo zap”.
O acesso à internet, por meio da utilização de redes sociais tem colaborado no
processo de comercialização dos agricultores da FAFIR. E diante dessa situação,
alguns agricultores procuraram novas formas de divulgar seus produtos, e um desses
meios, destaca-se a comercialização dos produtos na internet, por meio das redes
sociais, e entregas via delivery.
Neste sentido, uma iniciativa realizada foi a criação da página CAFITUR (Apoio à
comercialização da agricultura familiar de Iturama e região), que tem o intuito de
divulgar os produtos e agricultores da agricultura familiar de Iturama e região, estando
disponível publicações no Facebook e Instagram. Sendo assim, buscou-se com a
CAFITUR alcançar como objetivo a diminuição da perda, tanto de produtos quanto
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financeiras dos agricultores familiares de Iturama e região a fim de criar um grupo de
pessoas com o intuito de apoiar e divulgar a comercialização dos produtos advindos da
agricultura familiar, possibilitando ampliar as possibilidades de comercialização dos
produtos dos agricultores e agricultoras familiares criando um mecanismo de compra
direta entre agricultor e consumidor.
Concomitante a esse objetivo, buscou-se ampliar a rede de comercialização local,
e como consequência, buscar uma melhor distribuição de alimentos, visto que
adquirir alimentos direto do produtor tende a colaborar com o desenvolvimento da
economia local. Em pouco tempo, a quantidade de acessos as páginas do Facebook
contavam com 551 curtidas e 558 pessoas seguindo, o perfil no Instagram com 485
seguidores; números interessantes para uma cidade de 39 mil habitantes. Não foi
possível dimensionar o alcance dos grupos do WhatsApp devido ao
compartilhamento das imagens e mensagens. Quanto aos links de acesso direto de
mensagem, esses encaminham mensagens diretamente para o aplicativo do agricultor
ou agricultora e em apenas três dias de divulgação, a página contava com mais de 350
acessos em 2 semanas de disponibilidade.
E por meio das métricas da plataforma social do Instagram foi possível
dimensionar que 73% do público consiste ser do sexo feminino e 27% do sexo
masculino, no Facebook a média mostra que as mulheres são o público alvo
predominante da página com 63,7% contra 36,3% do público masculino. Sobre a faixa
etária dos seguidores, nota-se uma grande variação, sendo entre 18 a 24 anos (10,6%
do público no Facebook e 12,4% no Instagram), entre 25 e 34 (27,5% no Facebook e
31,7% no Instagram), idades de 35 a 44 anos (32,7% no Facebook e 31,4% no
Instagram), de 45 a 54 (8,1% no Facebook e 16% no Instagram) e findando as idades,
entre 55 a 64 anos (8,1% no Facebook e 6,1% no Instagram).
Figura 1 – Média de visualizações mensais (2020 – 2021).

Fonte: MARTINS, J. P. (2021)


Como elucidado na figura 1, é notório o alcance mensal da página durante maio de
2020 até julho de 2021 nas redes sociais Facebook e Instagram, assim, sendo visível
uma constância de visualizações com poucas variações. Portanto é visível que as redes
socias se mantiveram ativamente durantes esses meses pandêmicos, se apresentando
como uma ferramenta de acesso dos consumidores e de divulgação dos produtores.
Ademais, os entrevistados afirmaram a importância da página CAFITUR no

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processo de comercialização afirmando que: “Nossas vendas Graças à Deus estão nos
ajudando muito com a ajuda da CAFITUR uma rede social muito bem-feita que nos
ajuda a vender nossas mercadorias”.
Assim, concretiza-se a suma importância dessa página como um veículo de
comércio online em prol dos agricultores familiares, auxiliando nas vendas através do
marketing digital, buscando retornar à possibilidade de venda direta dos produtores, e
principalmente gerando renda. No entanto, Niederle, Schneider e Cassol (2021, p. 42)
afirmam que “permanece a dúvida, todavia, sobre os riscos dos pequenos
empreendimentos se aventurarem nessa odisseia digital, e sobre os riscos talvez ainda
mais expressivos de serem completamente excluídos dela”.
No âmbito referente ao decreto municipal, que proíbe e inviabiliza o
funcionamento da feira da agricultura familiar, observa-se que ao mesmo tempo em
que há agricultores com posicionamento a favor ao fechamento da feira da agricultura,
afirmando que “Se for para acabar com a aglomeração acho correto. Infelizmente
estamos passando por momentos difíceis”; há uma grande insatisfação dos feirantes,
de acordo com as respostas a seguir: “Eu acho que é injusto, porque se não abre, não
temos aonde vender já que os mercados não compram nossas verduras, e nossa feira
tem menos aglomerações do que os supermercados, lanchonetes, atacadão. Se os
bancos continuam abertos, nossas contas, continuam chegando, e os juros continuam
correndo, porque quer nós tirar nosso meio de ganhar nosso dinheiro para
continuarmos cumprindo com nossos deveres e obrigações”. “Eu acho que na feira
livre é um ambiente aberto que tem o menor risco de contrair o vírus”.
“Desnecessário, pois a feira da agricultura familiar sempre atendeu as normas de
higiene e não causa aglomeração”.
Entretanto, mesmo com toda ciência acerca dos prejuízos causados pelo decreto
suspendendo o funcionamento da feira, é necessário prudência e cuidado devido a
situação pandêmica a qual estamos vivendo desde março de 2020.
Em nota, a Prefeitura Municipal de Iturama (2020) visando apoiar o pequeno
produtor do município, perante ao decreto nº 7.606, de 30 de abril de 2020, impôs a
flexibilização de determinadas medidas na comercialização de produtos, no entanto,
os feirantes e o público deveriam seguir normas sanitárias de prevenção, como o uso
de máscaras de proteção, disponibilidade de álcool em gel, distanciamento social e
esterilização dos produtos. Frente à discussão, a realidade então é que a reabertura dos
mercados locais não prosseguiu a demanda da volta dos números de consumidores.
Sendo assim devido aos diversos fatores, a população tem preferido não se deslocar
para estes mercados, fazendo com que os agricultores avaliassem os volumes de
produção, adotando novos métodos de vendas através de mídias digitais e redes
sociais, garantindo um alavanque na comercialização digital (SCHNEIDER, S. et al.,
2020).
Então para driblar as adversidades impostas pela doença, uma maneira seria a
venda das mercadorias, que antes eram vendidas presencial nas feiras-livres,
atualmente poderiam ser comercializadas online, por meio de divulgações em redes
sociais. Além de ser um recurso para escoar o produto e obter lucro, também o
agricultor familiar evita de uma maneira menos exposta de contrair a doença. Assim, é
necessário que os agricultores adotem as tecnologias que podem figurar como um
fator a mais para a produtividade na propriedade.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Consoante a discussão do trabalho apresentado, entende-se a importância da feira
para os agricultores familiares da região, como um gerador de renda e subsídio para
essas famílias. Entretanto, esta está sendo drasticamente afetada devido ao fato da
pandemia em curso do novo coronavírus.
Sendo assim, podemos observar que apesar de os fechamentos da feira da
agricultura familiar ter causado grande impacto econômico, foi de extrema
importância a fechada da mesma, devido aos perigos do contágio por aglomeração, o
município de Iturama tem uma densidade populacional pequena, porém ainda
mantém uma rotina interiorana na qual ainda se observa a exposição de pessoas em
locais públicos sem utilização de máscaras, o que acarretaria um maior nível de
contaminação, que agravaria a situação do hospital de campanha do município que
tem números baixo de leito para internação se comparado ao número populacional
contando com poucos leitos disponíveis para os habitantes da cidade e dos municípios
vizinhos.
O CAFITUR tem importância substancial, trabalhando no campo dos e-comerce
em prol dos agricultores familiares, auxiliando nas vendas por meio do marketing
digital, ampliando as possibilidades de venda direta dos produtores. Cabe ainda
destacar a contribuição dessa página como uma garantia de segurança alimentar e
nutricional através de processos melhorados para o acesso e troca de informação
baseada no uso das TIC em meio ao caos gerado pela pandemia do COVID-19, que
está atingindo a oferta e distribuição de alimentos em diversas formas e intensidades.
Percebemos a necessidade do funcionamento das feiras, mas também
presenciamos a inevitabilidade do fechamento das mesmas, a divergência de
pensamentos também se encontra na dificuldade da adaptação de novos meios de
produção, apesar do número de comércio on-line ter tido um progresso suntuoso,
notamos ainda uma dificuldade de alguns agricultores de se adaptarem a estas novas
fórmulas.
Mas em vias de fatos, é importante reafirmar a necessidade de isolamentos sociais
para a restrição da propagação do novo coronavírus, e também denotamos a
dificuldades encontradas pelos produtores, onde podemos dizer que é uma classe que
tem batalhado diariamente a fim de se manterem firmes em suas lutas diárias de
produção e escoamento de suas mercadorias.
REFERÊNCIAS
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175
A INSERÇÃO DA AGROECOLOGIA
EM UM NOVO SISTEMA ALIMENTAR
PÓS-COVID-19

João Henrique Constantino Sales Silva (1)


Alex da Silva Barbosa (2)

RESUMO. A lógica do atual sistema alimentar tem sido incapaz de gerar saúde
respeitando os limites do planeta. Assim sendo, o presente trabalho propõe uma
reflexão acerca da inserção da agroecologia em um novo sistema alimentar pautado na
construção de sociedades sustentáveis em tempos de crise ambiental e de saúde
global. A pandemia provocada pelo vírus SARS-CoV-2 está profundamente associada
com a ruptura ecológica produzida pelo sistema convencional de produção de
alimentos. A atual crise mundial ressalta a necessidade de um sistema agroalimentar
mais sustentável, e a agroecologia, que além de atender as demandas das famílias
rurais, garantindo benefícios sociais, econômicos e ambientais, também se apresenta
como solução viável para atender as demandas urbanas.

Palavras-chave: Alimentação Saudável. Pandemia. Sistema Agroalimentar.

(1) MSc. em Ciências Agrárias (Agroecologia), Universidade Federal da Paraíba, Bananeiras – PB, Brasil;
joaohenriqueconst@gmail.com.
(2) Doutor em Agronomia, Universidade Federal da Paraíba, Bananeiras – PB, Brasil;
aldasibarbosa@cchsa.ufpb.br.
176
1 INTRODUÇÃO
A maior parte dos nossos problemas globais, a exemplo da escassez de água e
energia, poluição ambiental, mudanças climáticas, desigualdades socioeconômicas,
insegurança alimentar, dentre outros, não podem ser vistos de forma dissociada, uma
vez que um desiquilíbrio no sistema causa uma reação em cadeia, afetando as demais
esferas desse sistema. Nesse sentido, a atual crise mundial provocada pelo vírus SARS-
CoV-2, causador da enfermidade Coronavirus disease 2019 (COVID-19), faz-nos
compreender o quão frágil e vulnerável é o nosso planeta, numa perspectiva
sócioecológica; e que a agroecologia pode ajudar a explorar o elo existente entre
agricultura e saúde (ALTIERI; NICHOLLS, 2020).
A declaração de pandemia da COVID-19 fez com que muitas pessoas ao redor do
mundo mudassem suas rotinas de forma drástica. Mas, poucos são os que questionam as
causas reais que levaram ao surgimento do vírus e ao fato de que, enquanto governos
trabalham para contê-lo, outros vírus e pandemias continuam surgindo (Ribeiro 2020a).
Ribeiro (2020b) menciona três possíveis causas, concomitantes e complementares, que
produziram todos os vírus infecciosos que se propagaram mundialmente nas últimas
décadas, sendo elas: 1) a criação de animais em confinamento; 2) o desmatamento da
vegetação nativa, principalmente com finalidade de criação de pastos e monocultivos; e
3) o crescimento descontrolado da urbanização e das indústrias.
A pandemia do coronavírus mostrou que o homem e sua maneira inconsciente de
consumir são um dos maiores culpados pelo que estamos vivenciando hoje (GLETTE,
2020). As restrições causadas pela pandemia da COVID-19 – devido ao necessário
cumprimento do isolamento social, na expectativa de postergar a velocidade de
contaminação do vírus – passaram a impor dificuldades para promover o abastecimento
alimentar no Brasil. Multidimensional, a alimentação sempre refletiu as prioridades
políticas e de desenvolvimento presentes na sociedade, e não seria diferente nesse
contexto com o coronavírus (PORTO; GRISA, 2020).
O isolamento preventivo nos levou a repensar a nós mesmos, consumir estritamente
o necessário, valorizar o trabalho dos camponeses e esperar que o mercado de frutas e
verduras esteja disponível nas quitandas mais próxima ou venha à nossa porta. O
trabalho digno do feirante camponês, que há muito foi subordinado e marginalizado
pelo agronegócio, está sendo reavaliado gradativamente neste período de
distanciamento social, uma vez que as pessoas estão dando preferência a procurar
suprimentos nas quitandas, pequenos mercados ou armazéns mais próximos, em vez de
ir a centros comerciais lotados (LEAL, 2020).
Se uma ida ao mercado precisa de uma série de precauções e medidas de segurança,
as compras online nunca se mostraram tão essenciais. No entanto, é preciso mais do que
nunca saber de quem estamos comprando e valorizar pequenos produtores locais
comprometidos com o meio ambiente (GLETTE, 2020). Nesse sentido, a agroecologia,
mais do que uma alternativa, é uma necessidade para enfrentar a atual crise
civilizacional, uma vez que ela é capaz de entrelaçar conhecimentos das ciências
naturais e ciências sociais, rompendo assim a dicotomia cultura-natureza, visto que a
agroecologia concebe o mundo a partir de uma perspectiva sócioecológica, onde tanto
as desigualdades sociais como as ambientais fazem parte do todo (VALDERRAMA,
2020).

177
Ante ao exposto, a presente pesquisa bibliográfica propõe uma reflexão acerca da
inserção da agroecologia em um novo sistema alimentar pautado na construção de
sociedades sustentáveis em tempos de crise ambiental e de saúde global.
2. O SISTEMA CONVENCIONAL DE PRODUÇÃO DE ALIMENTOS E A COVID-19
Inúmeros estudos têm apontado para a insustentabilidade do atual sistema
agroalimentar com produção em larga escala (ALENTEJANO, 2020). De acordo com
alguns especialistas, enormes quantidades de animais de criação confinados, vacinados
e imunodeprimidos fazem com que os vírus tenham mutações de forma mais rápida.
Esses animais consomem antibióticos e antivirais continuamente, propiciando
rusticidade e adaptação aos novos vírus. Além disso, os vírus podem passar de uma
espécie à outra e embora possam originar-se em espécies silvestres, como aves e
morcegos, é a destruição dos habitats naturais que fazem esses animais migrarem de
suas áreas de ocorrência natural, onde as cepas dos vírus estavam controladas dentro de
sua própria população (RIBEIRO, 2020a; RIBEIRO, 2020b). Ou seja, o avanço do
desmatamento, por sua vez, leva animais silvestres que antes se encontravam nas
florestas a se deslocar para outras áreas, inclusive urbanas, transformando-se também
em vetores da disseminação de doenças.
Causas estruturais, assim como outros vírus (gripe aviária H5N1, gripe suína H1N1
e a doença da vaca louca), estão relacionadas a um sistema agroalimentar que se sustenta
na ideia antropocêntrica de que certos animais (porcos, vacas, galinhas) são meros
objetos para a exploração (VALDERRAMA, 2020). De acordo com este autor, o
problema vai muito além do que suscita uma visão sanitarista, centrada na saúde
pública, mas, sim, está em questionar um sistema de vida atual, que declarou guerra à
mãe natureza, ao acreditar estar acima de seus limites. O modelo de produção de
alimentos proposto pelo agronegócio, espalha vírus selvagens mortais para organismos
adoecidos por alimentos cheios de açúcares, gorduras e agrotóxicos.
Esse sistema convencional de produção tem uma grande contribuição nas
morbidades crônicas, a exemplo da diabetes e hipertensão arterial, que colocam muitas
pessoas no grupo de risco, aumentando as chances de complicação pela COVID-19
(OLIVEIRA, 2020a). Além disso, o agronegócio tem como um dos principais pilares o
uso de agrotóxicos e, atualmente, vários estudos relatam os malefícios destes à saúde
humana e ambiental, como os trabalhos descritos por Carneiro et al. (2019), Mello et al.
(2019), Pereira et al. (2019) e Haddad et al. (2019). Contudo, a pandemia de COVID-19
não foi motivo suficiente para que o atual governo brasileiro contivesse a liberação de
novos agrotóxicos no país, visto que em março do decorrente ano foi dado aval para
mais 53 agrotóxicos (leia atos 17 e 22 no Diário Oficial da União). Somando-se os 101
liberados apenas no primeiro trimestre de 2020 aos 503 liberados em 2019, tem-se o
total de 604 novas liberações em 15 meses (OLIVEIRA, 2020a).
De acordo com Loureiro e Zarref (2020):
Por um lado, o envenenamento massivo da natureza estimula a seleção
natural no sentido de surgirem variedades de vegetais, vírus, bactérias
cada vez mais resistente. Por outro lado, vegetais, animais e seres
humanos que estão subordinados à lógica alimentar das grandes
transnacionais vão se tornando cada vez mais vulneráveis, com menos
imunidade e resistência a essas doenças. O francês Francis Chaboussou,
ao desenvolver a teoria da trofobiose para as plantas, afirmou que “solo
178
doente, planta doente”. Podemos reproduzir isso para todo o
metabolismo socioecológico: alimento doente (ultraprocessado, pouco
diverso, envenenado), ambiente doente (escassez hídrica, ausência de
biodiversidade, poluições diversas), seres humanos doentes.
Pinheiro (2020) aponta o momento atual como oportuno para reconhecermos o
impacto das escolhas alimentares sobre a saúde humana, ambiental e planetária, como: a
iminente escassez dos recursos naturais, o desmatamento das florestas, a poluição do ar
e dos solos, o aumento de doenças crônicas provocadas pelo uso e consumo excessivo
de agrotóxicos, alimentos transgênicos e ultraprocessados, o extermínio das
comunidades tradicionais e suas práticas ancestrais de respeito e preservação da
natureza, o acúmulo de lixo reciclável e não reciclável sem tratamento e
reaproveitamento correto, dentre outras questões ético-políticas que violam os direitos
humanos, destroem a biodiversidade e ameaçam a sobrevivência do planeta.
As grandes metrópoles brasileiras são marcadas por profundas desigualdades, com
trânsito caótico, falta de saneamento, ilhas de calor e poluição, ambientes mais do que
favoráveis à disseminação de epidemias e pandemias ligadas aos mais diferentes
agentes infectocontagiosos. A desconcentração espacial da população brasileira através
de uma ampla reforma agrária agroecológica permitiria ao mesmo tempo combater
essas mazelas. Uma vez que há no Brasil 247,7 milhões de ha sob o controle do
latifúndio, dos quais 175,9 milhões de ha são de terras improdutivas. Por outro lado, a
área plantada com alimentos básicos (arroz, feijão e mandioca) diminuiu 5 milhões de
ha nos últimos 30 anos. Portanto, reverter esse cenário é urgente e só uma reforma
agrária agroecológica pode fazê-lo. Antes que se ampliem ainda mais a fome, a miséria e
as doenças geradas por esse modelo agroalimentar dominado pelas grandes corporações
do agronegócio (ALENTEJANO, 2020).
3. A AGROECOLOGIA PERANTE AS ATUAIS CRISES SOCIOAMBIENTAIS
Em meio ao contexto de pandemia que se instaurou no mundo e no Brasil, muitas
aldeias indígenas, quilombos, ribeirinhos e outras comunidades tradicionais que têm o
turismo e o artesanato como uma fonte de renda, tiveram que limitar o acesso de pessoas
vindas de fora de seus territórios. Assim sendo, muitas redes de solidariedade têm
reforçado ações nas áreas de soberania e segurança alimentar, direito à terra e economia
solidária para evitar que a fome e a falta de recursos essenciais cheguem às pessoas que
estão em maior situação de vulnerabilidade (OTSS, 2020).
A crise causada pela pandemia do novo coronavírus veio alertar os países
dependentes de importações de alimentos sobre o risco que essa dependência pode
trazer à segurança alimentar nacional, fazendo-se necessário rever o abastecimento
interno das importantes olerícolas (NASCIMENTO, 2020). De acordo com este autor,
essa crise está sendo uma grande oportunidade para o governo, empresas, produtores e
para a sociedade geral repensarem a sua atuação e a sua forma de organização em busca
de caminhos alternativos.
Leal (2020, p.1) afirma que:
É hora de acreditar no campesinato, apoiá-lo, em vez de aplausos
invisíveis por meio das redes sociais, com políticas públicas que lhes
proporcionem benefícios para melhorar sua qualidade de vida, para que
mantenham a disponibilidade de alimentos e para que nosso país possa
oferecer sua própria comida.
179
Stedile (2020) ressalta que a agricultura familiar cumpre um papel importante na
alimentação saudável da população e pode ser a saída para essa crise que se aprofunda.
Ainda segundo Stedile (2020), defender a soberania alimentar e utilizar a agroecologia
para produzir alimentos sadios, se mostrou não apenas como uma política pontuada pelo
MST ou de algum governo, mas, sim, uma necessidade real de sobrevivência das
sociedades atuais. Além disso, no contexto de isolamento social das cidades, com o
fechamento de fronteiras e as restrições ao comércio, é a Agroecologia e a produção
camponesa que estão mantendo o abastecimento alimentar das cidades, fornecendo
alimentos saudáveis e fortalecendo o comércio justo e solidário (LOUREIRO;
ZARREF, 2020).
No momento da pandemia do coronavírus, inúmeros problemas têm dificultado o
acesso aos alimentos. No entanto, a sociedade vem gerando outras estratégias de acesso
à alimentação saudável, como os grupos de consumo. Estes grupos reúnem famílias,
amigos ou indivíduos que, em parceria com assentados da reforma agrária, povos
originários e comunidades tradicionais, planejam e financiam sistemas de produção de
alimentos agroecológicos locais, de forma colaborativa, coletiva e solidária. Fortalecer
estas aproximações em tempos de quarentena pode ser uma alternativa saudável para a
sociedade e o meio ambiente (PINHEIRO, 2020).
No Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, vários produtores agroecológicos se
organizaram e expandiram sua clientela durante o avanço da pandemia. Diante da
determinação de medidas de isolamento social, os pedidos por cestas de frutas, legumes,
verduras e outros itens derivados da tradicional feira ecológica, quadruplicaram através
de aplicativos e redes sociais, exigindo rapidez dos agricultores na revisão de suas
estratégias de atuação para atender às demandas sem sobrecarregar os processos de
produção (OLIVEIRA, 2020b). Acredita-se ainda, que esta tendência de consumo se
firme, após a superação do isolamento preventivo, em reconhecimento à contribuição
dessas práticas produtivas para a proteção ambiental e a saúde de produtores e
consumidores.
Nessa perspectiva, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor criou a
plataforma “Comida de Verdade”, com o apoio de diversas organizações, para divulgar
iniciativas que comercializam alimentos saudáveis durante a pandemia do COVID-19.
A ferramenta tem o objetivo de apoiar a economia local e aproximar quem produz de
quem consome. Nela, o usuário pode encontrar iniciativas da agricultura familiar, de
pequenos produtores e dos sistemas de produção orgânica e agroecológica em todas as
regiões do Brasil. Essa plataforma é um importante meio de informar às pessoas que,
além dos mercados, existem canais alternativos para o abastecimento, seja em pontos de
venda físicos ou na modalidade de entrega a domicílio (IDEC, 2020). Outra
característica da plataforma é que os produtores, ou quem quiser contribuir, podem fazer
novos cadastros.
Para escoar a produção de assentamentos da zona rural de Teresina – PI, produtores
rurais e entidades ligadas à agricultura familiar realizaram um projeto piloto de venda de
produtos como hortaliças, legumes e frutas via Drive Thru. Sem descer do carro,
consumidores recolhem as cestas de produtos encomendados previamente pelo
WhatsApp. Estas cestas variam de R$ 10 a R$ 130 reais, dependendo da quantidade de
produtos que vão desde legumes a produtos manuseados como farinha e goma e a
entrega é feita pelos próprios produtores, evitando o máximo de contato com os

180
consumidores (MACÊDO, 2020). No Estado do Espirito Santo, alguns agricultores
também comercializaram seus produtos nesta modalidade, como reportado por
Nascimento e Esteves (2020). Essas iniciativas tiveram uma repercussão positiva, uma
vez que são alternativas diante da suspensão das feiras livres e das aulas nas escolas,
onde muitos agricultores comercializam produtos via Programa de Aquisição de
Alimentos (PAA).
Outra iniciativa que ganhou notoriedade foi a criação do Portal dos Produtos da
Agricultura Familiar pela Secretaria do Desenvolvimento Agrário do Governo do
Ceará. O portal consiste numa ferramenta capaz de fortalecer a agricultura familiar,
diminuir a vulnerabilidade e criar a perspectiva da renda, através da segurança
alimentar. Pelo espaço de pesquisa da nova plataforma, compradores podem procurar
pelo produto, região ou cidade de preferência e até mesmo a cooperativa responsável
pelo gênero. Assim, ofertar alimentos como frutas, hortaliças e verduras de maneira
dinâmica pode ajudar ainda na movimentação da economia (CELEDÔNIO; GURJÃO,
2020).
De acordo com Porto e Grisa (2020) o desafio nesse momento será o de assegurar
diferentes mecanismos que contribuam para garantir o Direito Humano à Alimentação
Adequada e Saudável (DHAAS), de um lado acelerando os repasses de transferência de
renda e, de outro, potencializando diferentes estratégias de abastecimento alimentar.
Ainda de acordo com esses autores, essas estratégias devem ser estabelecidas tanto por
meio da ação do Estado quanto por iniciativas que promovam a construção social dos
mercados, fortalecendo as relações diretas entre produtores e consumidores. Importante
que essas estratégias considerem o papel multidimensional da alimentação e suas
repercussões no desenvolvimento. Além de lidar com o contexto emergencial, essas
medidas podem deixar um legado para novas ações estruturantes, contribuindo para
colocar a alimentação no centro dos processos de desenvolvimento e das prioridades
políticas, onde deve estar.
4. AGROECOLOGIA, SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL: UM DIÁLOGO
NECESSÁRIO
De acordo com Moreira (2020), o momento histórico e conjuntural que vivemos é
privilegiado para analisar mecanismos e tendências sociais em funcionamento há
muitos anos, a exemplo das práticas agroecológicas e sustentáveis. Segundo este autor,
manter um estilo de vida saudável e sustentável remete-nos a uma alimentação
equilibrada e heterogênea, uma vez que os alimentos recomendados pelos
imunologistas são, em maior ou menor medida, encontrados em abundância na
natureza, e, sobretudo nos quintais, hortas familiares ou comunitárias, assentamentos da
reforma agrária e feiras de produtores familiares e agroecológicos, o que ressalta os
aspectos eminentemente sociais e ambientais da saúde e da medicina.
Nessa mesma linha de raciocínio, Melo et al. (2017) evidenciam o elo existente entre
a agroecologia e nutrição e como esses dois pilares coexistem e caminham juntos na
promoção da saúde ambiental e humana, nos seus mais complexos contextos. Para esses
autores, não há como dissociar essas duas temáticas, visto que elas estão intimamente
relacionadas à soberania e segurança alimentar e nutricional, à medicina popular e
dietoterapia; e à promoção da saúde através de uma dieta heterogênea.
Loureiro e Zarref (2020) afirmam que:
181
Se compararmos a China com os EUA nessa pandemia atual, já podemos
tirar algumas lições. Uma é que dentre os tratamentos utilizados na
vitoriosa ação chinesa contra a doença, estão um conjunto de mais de
uma dezena de plantas da medicina tradicional do país. Outra é o perfil
epidemiológico da doença: enquanto na China o grupo de risco era quase
exclusivamente idosos, nos EUA pessoas de 20 a 50 anos já representam
40% dos internados. Isso se deve à diferença de alimentação e práticas de
saúde entre os dois países.
Segundo Altieri e Nicholls (2020), a agroecologia tem o potencial de produzir
localmente grande parte dos alimentos necessários para as comunidades rurais e
urbanas, particularmente em um mundo ameaçado pelas mudanças climáticas e outros
distúrbios, como as pandemias de doenças. Ainda de acordo com esses autores, a
ingestão de alimentos nutritivos à base de vegetais produzidos em propriedades
agroecológicas locais pode ajudar a fortalecer nosso sistema imunológico,
possivelmente melhorando nossa capacidade de resistir a várias ameaças, incluindo os
vírus contagiosos como o SARS-CoV-2.
Nesse sentido, romper com o sistema alimentar hegemônico que potencializa a
produção e comercialização dos produtos ultraprocessados, baseados em açúcares,
gorduras, sódio, aditivos químicos e cada vez mais restritos a poucas culturas (como
soja e milho), significa dar passos para reverter o quadro de agravo da saúde da
população, refém das doenças crônicas como diabetes, hipertensão, obesidade, cânceres
(LOUREIRO; ZARREF, 2020). Segundo esses autores, é na soberania alimentar
proposta pela agroecologia que estão as chances de garantir às comunidades o acesso
aos recursos naturais dos seus territórios, como água, terra, sementes, insumos e a
biodiversidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pandemia provocada pelo vírus SARS-CoV-2 está profundamente associada com
a ruptura ecológica produzida pelo sistema convencional de produção de alimentos.
Embora se acredite numa origem zoonótica para a COVID-19, o problema de fundo
passa pela destruição dos habitats naturais dos animais silvestres pela agricultura
industrial aliada ao uso abusivo de antibióticos em animais confinados, o que gera as
condições adequadas para as aceleradas mutações virais.
A atual crise mundial ressalta a necessidade de um sistema agroalimentar mais
sustentável e diante da segurança e da soberania alimentar que a Agroecologia propõe,
acredita-se que esta tendência de consumo se firme, após a superação do isolamento
preventivo, em reconhecimento à contribuição dessas práticas produtivas para a
proteção ambiental e a saúde de produtores e consumidores.
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184
A DINÂMICA DA COVID-19 NO MUNICÍPIO
DE SÃO PAULO E A BUSCA DE SOLUÇÕES
BASEADAS NA NATUREZA:
A IMPORTÂNCIA DOS ESPAÇOS LIVRES E PARQUES
PÚBLICOS NA SAÚDE NO CONTEXTO PÓS-PANDEMIA

Magda Adelaide Lombardo (1)


Amanda Lombardo Fruehauf (2)
Paulo Renato Mesquita Pellegrino (3)

RESUMO. Esta pesquisa tem como objetivo analisar as diferenças socioespaciais da


ocorrência da pandemia no Município de São Paulo. Assim como, verificar o papel
dos espaços abertos, como a ocorrência de parques na cidade para o combate da
pandemia COVID-19, associado a desigualdade na distribuição de renda e avaliar a
qualidade de vida dos habitantes frente à necessidade de aumentar as áreas verdes,
destacando a arborização urbana, no contexto pós-pandemia.Com base em vários
mapas que oferecem a distribuição espacial da ocorrência da COVID-19, como:
Acesso da população a estabelecimentos de saúde em São Paulo (2020): população
de baixa renda acima de 50 anos de idade que não consegue acessar nenhum
estabelecimento de saúde em menos de trinta minutos de caminhada; população que
mora a uma distância maior do que 5 km do hospital mais próximo, com pelo menos
um leito de UTI e um respirador; razão entre o número de leitos de UTI adulto com
respirador disponíveis no SUS para 10 mil habitantes na zona de captação de cada
hospital – São Paulo (2020), totalizando 53 hospitais com leitos de UTI ; mortes
suspeitas ou confirmadas de coronavírus. Estes mapas foram relacionados com o
mapa de Cobertura vegetal do Município de São Paulo, SP. Também foram analisados
os Parques públicos e áreas de proteção. Este trabalho conclui que deve-se repensar a
adequação desses espaços para que o seu uso não ocorra com aglomerações, criando
riscos sanitários. Deste modo, o desafio é aumentar a criação de novos espaços abertos
vegetados.

Palavras-chave: COVID-19. Espaços Abertos. Qualidade de Vida.

(1) Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo,


magdalombardo@yahoo.com.br.
(2) Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo, amandalombardo@usp.br.
(3) Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, prmpelle@usp.br.
185
1 INTRODUÇÃO E OBJETIVOS
Este capítulo visa realizar uma reflexão socioespacial, com base em mapeamento
com análise da ocorrência da epidemia no tecido urbano e verificar o papel dos espaços
livres e áreas verdes, como os presentes em parques nas cidades para o combate da
pandemia COVID-19, tendo como base o Município de São Paulo.
Foram analisados os benefícios que as áreas verdes trazem para os habitantes,
especialmente na questão da saúde, destacando sua importância no período da
pandemia e pós COVID-19.
Estes dados foram relacionados ao mapeamento das condições sociais e econômicas
da população a fim de sinalizar as áreas de maior vulnerabilidade socioambiental.
O trabalho tem como objetivo analisar a ocorrência da pandemia COVID-19 no
Município de São Paulo, SP, Brasil e com base na distribuição espacial dos espaços
livres e áreas verdes, com ênfase nos parques urbanos associado a desigualdade na
distribuição de renda, avaliar a qualidade de vida dos habitantes frente a necessidade de
aumentar as áreas verdes, destacando a arborização urbana, no contexto pós-pandemia.
1.1 HISTÓRICO SOBRE A PANDEMIA DE COVID-19 NO BRASIL
A dinâmica do espraiamento do coronavírus no Brasil mostra um contorno
sinuoso e desigual.
Em dezembro de 2019, começou a pandemia de COVID-19 na China em Wuhan,
província de Hubei e rapidamente a doença se espalhou para outras províncias chinesas
e se expandiu para todos os continentes.
Devido à sua alta disseminação, a China nomeou a COVID-19 uma doença
infecciosa de segunda classe, com medidas de manejo para uma doença infecciosa de
primeira classe (a categoria mais perigosa de infecção). Assim, certifica-se que a
pandemia em curso é arrasadora, sendo que em 30 de janeiro de 2020, a Organização
Mundial da Saúde (OMS), classificou a doença como pandemia, de importância
internacional na Saúde Pública (SOUSA et al. 2020).
No Brasil, o primeiro caso de COVID-19 foi diagnosticado em 25 de fevereiro de
2020 em São Paulo. No dia 3 de fevereiro, foi decretada emergência pública no país e no
dia 20 de março do corrente ano foi anunciada transmissão comunitária da doença no
país.
Vale ressaltar, que o país apresenta grande desigualdade socioeconômica e de saúde.
Sendo que as divergências geográficas tocam as questões socioeconômicas, no tocante
do nível de riscos à saúde ou no acesso aos recursos disponíveis no sistema de saúde. As
endemias, epidemias e pandemias têm raízes históricas e sociais onde as más condições
de vida da população e as diferentes formas de uso e ocupação da terra e falta de acesso
aos serviços determinam este cenário (SOUSA et al. 2020).
O mesmo autor destaca que os dados no Brasil são alarmantes e pesquisas são
necessárias e urgentes para verificar o risco da pandemia nas regiões metropolitanas.
Assim, devem-se acompanhar as mudanças na epidemiologia e o efeito da saúde
pública como aceitação social, de forma que a COVID-19 prejudica os países
desenvolvidos e em desenvolvimento, sem distinção social.

186
Porém, apenas uma pequena porção da população brasileira tem acesso aos serviços
da saúde, a grande maioria encara a dificuldade no suprimento de leitos hospitalares.
Isto vinculado a expansão pandêmica da COVID-19, associado a falta de um
gerenciamento no nível federal e a dificuldade de reação dos serviços de vigilância
epidemiológica e pouca aderência ao distanciamento social tornou o Brasil o centro das
atenções mundiais com intenso aumento de contaminações e aumento significativo de
mortes no primeiro trimestre de 2021. Assim, é cada vez mais evidente a necessidade de
medidas abrangentes para diminuir a transmissão interpessoal da COVID-19.
1.2 URBANIZAÇÃO E ANÁLISE SOCIOAMBIENTAL
Nas capitais dos Estados, bem como no Distrito Federal, as desigualdades
socioeconômicas e ambientais são agudas e evidenciam o descompasso entre o
tratamento da saúde pública e a distribuição dos habitantes com rendas diferenciadas no
tecido urbano.
Destaca-se o aumento da temperatura nas áreas urbanas, devido à intensa expansão
da área construída e supressão da vegetação, propiciando a formação da Ilha de Calor,
afetando assim, a saúde dos habitantes e evidenciando a desigualdade social.
Segundo Lombardo (1985), a urbanização interfere significativamente na atmosfera
urbana, onde aos materiais da construção civil absorvem calor e removem as áreas
verdes. Além disso está intensa urbanização propicia surgimento de novas doenças,
como o novo coronavírus e ressalta as diferenças socioeconômicas.
A expansão urbana da Região Metropolitana de São Paulo, assim como do
Município de São Paulo, SP, ocorreu de forma periférica e com processo de
periurbanização, envolvendo a dispersão espacial de dois grupos, os de baixa renda,
incluindo autoconstrução e por loteamentos irregulares e comunidades e os de renda
média a alta, onde existem os condomínios fechados.
A Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) possui 8000 km2 de área, é composta
de 39 municípios (Figura 1). A área urbanizada é de aproximadamente 2500 km2. A
população atual é de aproximadamente 19 milhões de habitantes, com densidade
demográfica de 2.361 hab/km2 e PIB que representa aproximadamente 45 % do PIB do
Estado e cerca de 15% do PIB país (IBGE, 2017).
O clima na RMSP pode ser definido como seco no inverno e úmido no verão.
Durante os meses de setembro a abril, a região, é caracterizada pela ocorrência sucessiva
de sistemas frontais, com ventos úmidos do Sul, resultando em precipitações. No
inverno pode ocorrer inversão térmica de subsidência e céu claro, com pouca ocorrência
de precipitação (TARIFA; ARMANI, 2001).
A área de estudo deste projeto será o Município de São Paulo, SP. O município de
São Paulo, com 31 subprefeituras (Figura 2), possui 11.253.503 habitantes e uma área
de 1521 km2, com densidade demográfica de 7898, 2 hab/km2 (IBGE, 2010).
1.3 SAÚDE E MEIO AMBIENTE
No âmbito da saúde, há vários estudos na literatura médica que relacionam
doenças respiratórias e clima, destacando a ocorrência em cidades grandes,
sendo a poluição do ar uma das causas destas patogêneses. Assim, os efeitos da
degradação ambiental, incluindo as ondas de calor, ilha de calor e frio afeta a
187
saúde humana, fazendo que algumas doenças se manifestam ou evoluem
(NATALINO, 2011).
Figura 1 – Região Metropolitana de São Paulo.

Fonte: LOMBARDO et al, 2016


Figura 2 – Mapa do Município de São Paulo, SP.

Fonte: LOMBARDO et al, 2016


A OMS (1986) destaca que as condições sociais em que as pessoas vivem e
trabalham influenciam na ocorrência de problemas de saúde na população, sendo
determinantes sociais de saúde.
A população geralmente, mais vulneráveis a estes problemas de saúde, são os muito
jovens ou idosos, pois dependem de terceiros para realizar algum deslocamento
necessário, buscar ajuda médica/farmacêutica e fazer uso de medicamentos
(GUERREIRO, 2011).
O primeiro registro do caso de COVID-19 no Brasil foi dia 25 de fevereiro de 2020
na metrópole de São Paulo – SP (CVE-SP, 2020) e em poucas semanas o vírus se
188
disseminou pelo território paulista, configurando estado de emergência em saúde
pública no estado de São Paulo. O novo coronavírus denominado Sars-Cov-2, é
classificado como uma Síndrome Respiratória Aguda Grave – SRAGs (WHO, 2020a).
A pandemia COVID-19 trouxe em evidência as tensões de desigualdades existentes
no mundo. Destacando, o elevado número de vítimas pela pandemia, deterioração da
economia, maior desigualdade na distribuição de riqueza e a demanda por fim do
racismo, permanecerá (COLACRAI, et al, 2020).
Assim, a pandemia da COVID-19 apresenta um desafio para que haja o
planejamento territorial, a fim de criar metodologias que desprendem das estruturas
administrativas vindas da regionalização da saúde, analisando as interações entre os
municípios, de forma a discutir o acesso mais igualitário aos brasileiros de qualquer tipo
de cidade aos equipamentos de alta complexidade em situações de emergência em saúde
pública (GUIMARÃES; SIMON; LIMA, 2020).
Segundo Gomes; Busato e De Oliveira (2020) é importante à função que vêm
desempenhando para o combate da COVID-19. Assim, deve-se ter uma coordenação
mundial da saúde humana no âmbito da política da saúde, que deve estar atenta à
ocorrência de doenças emergentes, ainda desconhecidas e sem possibilidade de
tratamento.
As áreas verdes contribuem para melhorar o meio ambiente e seu equilíbrio,
promove o desenvolvimento social, bem-estar, benefícios à saúde física e psíquica
dos habitantes. Com infraestrutura adequada, segurança e equipamentos, torna-se
atrativo para a população frequentar em busca da saúde física e mental (LONDE;
MENDES, 2014).
A vegetação absorve o calor por meio dos processos de evaporação e
evapotranspiração, regulando as temperaturas extremas do ambiente. Também, a
vegetação armazena a radiação solar, oferecem sombra e melhoria do microclima, um
dos serviços ambientais mais apreciados pela sociedade hoje (ARAVENA; MENDES,
2020).
O serviço ecossistêmico da vegetação é fundamental para o ecossistema urbano e
qualidade de vida. Como sua instalação e manutenção demandam alto custo, eles
praticamente não existem nos bairros de baixa renda, sendo que as áreas verdes se
concentram nas partes mais ricas da cidade. Demonstrando assim como há uma
segregação sócio ambiental nas paisagens urbanas (ROMERO, 2019).
Na periferia do Município de São Paulo, é dinâmico o fluxo de pessoas de baixa
renda em loteamentos irregulares sem infraestrutura, enfatizando assim o ciclo
vicioso da pobreza. Essas ocupações irregulares, ocorrem especialmente nos
contrafortes face sul da Cantareira e na região das represas ao sul da cidade de São
Paulo, e atingem áreas de mananciais.
Como exemplo de áreas verdes nas cidades, e encontram os parques com finalidade
de preservar o meio ambiente e a qualidade de vida das populações que habitam no
entorno dessas áreas. Na Lei n. 9.985/00, do Sistema Nacional de Unidades de
Conservação (SNUC), a definição de parque está relacionada ao conceito de Unidades
de Conservação (UC) de proteção integral, seja em perímetro urbano ou rural, seja de
gestão federal, estadual ou municipal (BRASIL, 2000).

189
A verificação da qualidade ambiental das cidades é cada vez mais evidente e
importante, pois é no espaço urbano que os problemas ambientais geralmente atingem
maior amplitude, notando-se concentração de poluentes no ar e na água, a degradação
do solo e subsolo, em consequência do uso intensivo do território pelas atividades
urbanas (LOMBARDO, 1985).
1.4 DISTRIBUIÇÃO DO SISTEMA DE SAÚDE
No nível das metrópoles, as desigualdades socioambientais são extremas e refletem
a má distribuição do sistema de saúde.
Na pandemia, o Ministério da Saúde e os gestores locais recomendam que as
pessoas com suspeita de COVID-19 fiquem em casa. Aquelas com sintomas leves,
podem se dirigir a Unidade de Saúde mais próxima que fara a primeira entrevista com o
paciente e a notificação a equipe de vigilância. Os casos graves devem ser
encaminhados para internação com demanda de leitos gerais e leitos de UTI (Brasil,
2020).
Segundo Pereira et.al. (2020), no caso do Município de São Paulo, foram mapeadas
onde moram as pessoas mais vulneráveis (menor renda e com mais de 50 anos de idade)
que não conseguem acessar a pé em menos de 30 minutos, um estabelecimento que
atende pelo Sistema Unificado de Saúde (SUS), que poderiam fazer triagem e que
moram a uma distância maior que 5 km do hospital com capacidade de internar
pacientes em estado grave de insuficiência respiratória (Figura 3).
Figura 3 – Acesso da população a estabelecimentos de saúde em São Paulo (2020).

Fonte: PEREIRA et al. (2020)


Sendo que o mapa A, representa a população de baixa renda acima de 50 anos de
idade que não consegue acessar nenhum estabelecimento de saúde em menos de trinta
minutos de caminhada; e o mapa B, a população que mora a uma distância maior do que
5 km do hospital mais próximo, com pelo menos um leito de UTI e um respirador.
O mapa (Figura 4) mostra a razão entre o número de leitos de UTI adulto com
respirador disponível no SUS para 10 mil habitantes na zona de capitação de cada
190
hospital no Município de São Paulo (2020), totalizando 53 hospitais com leitos de UTI.
A distribuição espacial apresenta uma extrema desigualdade entre o centro e a periferia,
concentrando o número de leitos de UTI adulto na zona central, entre os rios Tietê e
Pinheiros.
O mapa de óbitos por COVID-19 (Figura 5), ressalta a concentração de mortalidade
nos distritos administrativos de residência na periferia, onde as condições
socioeconômicas são precárias.
Figura 4 – Razão entre o número de leitos de UTI adulto com respirador disponíveis no
SUS para 10 mil habitantes na zona de captação de cada hospital – São Paulo (2020)

Fonte: PEREIRA et al. (2020)


Figura 5 - Mortes suspeitas ou confirmadas de coronavírus se concentram na
periferia da cidade de São Paulo

Fonte: Secretaria Municipal de Saúde


191
Sendo que os dados de 24 de março de 2021, apontam no município de São Paulo,
média de 3324 casos diários; média de 114,7 óbitos diários, 590885 casos, 20700 óbitos
em uma população de 12325232, tendo letalidade de 3,5% (relação de casos com
óbitos), com incidência de 4794.1 casos a cada 100 mil habitantes e com mortalidade de
167,9 óbitos por 100 mil habitantes.
1.5 ÁREAS VERDES
O mapa de Cobertura vegetal destaca a desigualdade espacial da cobertura da
vegetação no Município de São Paulo (Figura 6) e estas podem ser relacionadas com os
óbitos da COVID-19. Na área central e leste do Município onde há falta de árvores e
grande aglomeração urbana o índice de óbitos foi maior, enquanto que as Subprefeituras
com mais verde, como no sul Parrelheiros, no norte e no oeste o Butantã apresentaram
menos óbitos.
Figura 6 - Cobertura vegetal do Município de São Paulo, SP

Fonte: LOMBARDO et al, 2016


O município de São Paulo, SP, abrange os seguintes áreas verdes e parques urbanos
(Figura 7): Jardim da Luz (zona central), Aclimação (zona oeste), Carmo (zona leste) e
Lions Clube Tucuruvi (zona norte).
De uma maneira geral, os Parques Urbanos estão distribuídos no tecido urbano do
Município de São Paulo.
Segundo Mello-Théry (2011), deve-se atentar para o planejamento e
sustentabilidade urbana, considerando e ressaltando os Parques urbanos do Município
de São Paulo, que devem atender os serviços de lazer e recreação, proteção de
patrimônios naturais e culturais e também proteção de paisagens naturais e estéticas.

192
No estágio da pandemia, os gestores devem planejar o uso dos parques pela
população, de modo a preservar a saúde dos habitantes. Neste sentido, as regras de
ocupação devem ser únicas, evitando aglomeração e estabelecendo uma dinâmica de
organização diária.
No período pós-pandemia é urgente repensar o uso e ocupação desses espaços
urbanos, implementando uma maior cobertura vegetal e intensificando assim a
integração com a população, na busca da saúde e qualidade de vida.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho apresenta uma discussão com referencial teórico sobre os serviços de
lazer e recreação dos parques do Município de São Paulo, destacando-se sua função e
seu relacionamento com seu entorno, na busca da Solução Baseada na Natureza,
contribuindo para a saúde e qualidade de vida da população.
Figura 7 - Parques públicos e áreas de proteção localizada no Município de São
Paulo, SP

Fonte: Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente (2011)


Neste sentido, no período da pandemia e pós-pandemia deve-se repensar o uso dos
parques pela população, incentivando o uso desses espaços de forma sustentável. Deve-
se repensar a adequação desses espaços para que o seu uso não ocorra com
aglomerações, criando riscos sanitários. Deste modo, o desafio é aumentar a criação de
novos espaços abertos vegetados que ajudem a dispersar os usos por toda a malha
urbana, evitando o acúmulo em determinados pontos.
Assim, cabe aos gestores uma governança eficaz no sentido de contribuir para a
saúde e qualidade de vida dos habitantes, oferecendo os serviços ecossistêmicos que
ocorrem nos parques urbanos.
193
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195
PANDEMIA E REINVENÇÃO
METODOLÓGICA:
PROCEDIMENTOS DE BIOSSEGURANÇA NA CONTAGEM
DE BITUCAS DE CIGARROS

Dolores Pereira Ribeiro Coutinho (1)


Felipe Buller Bertuzzi (2)
Juliana de Mendonça Casadei (3)
Maira Fernanda dos Anjos Santos (4)

RESUMO. A utilização de princípios de biossegurança na coleta de dados de


pesquisas científicas contribui para evitar possíveis riscos que possam emergir de
substâncias nocivas à saúde. Além disso, conhecer e compreender diferentes formas
metodológicas também coopera para o alcance de resultados relevantes nas pesquisas.
Com base nisso, o presente capítulo tem por objetivo apresentar a metodologia
utilizada para a aplicação dos procedimentos de biossegurança utilizados na
contagem de bitucas de cigarros na Rua 14 de Julho de Campo Grande/MS/Brasil,
bem como os resultados advindos da coleta de dados. Esse resíduo, detentor de
toxidades nocivas ao ambiente e às pessoas, contribui para a redução da qualidade de
vida e a transmissão de doenças se manuseado de forma incorreta. Os procedimentos
de biossegurança descritos neste foram desenvolvidos e executados em virtude das
condições da pandemia da COVID-19. Mesmo assim, sugere-se que essa metodologia
possa ser replicada em outras localidades nas mais diferentes escalas, a fim de garantir
a biossegurança do(s) pesquisador(es) e evitar a contaminação do resíduo descartado
irregularmente.

Palavras-chave: Biossegurança. Metodologia. Pandemia.

(1) Doutora em Ciências Sociais, PPGDL da Universidade Católica Dom Bosco, e-mail: 3002@ucdb.br
(2) Mestre em Arquitetura e Urbanismo, Universidade Católica Dom Bosco, e-mail:
arq.felipebertuzzi@gmail.com
(3) Mestre em Saneamento Ambiental e Recursos Hídricos, Universidade Católica Dom Bosco, e-mail:
ju.casadei@gmail.com
(4) Mestre em Desenvolvimento Local, Universidade Católica Dom Bosco, e-mail: mairafas@gmail.com

196
1 INTRODUÇÃO
Após o primeiro caso confirmado de coronavírus (Covid-19) no território brasileiro
em 26 de fevereiro de 2020, com a entrada de um homem de 61 anos no Hospital Albert
Einsten, na cidade de São Paulo, segundo dados do Ministério de Saúde (BRASIL,
2020), o país entrou em alerta e as noções de biossegurança, tornaram-se cruciais não
apenas para resguardar a saúde da população, mas também, no desenvolvimento da
atividade investigativa, como ferramenta para assegurar uma rede de atenção à saúde
dos pesquisadores.
Ultrapassando procedimentos determinados por especialista ou um conjunto de
trabalhadores, podendo-se ampliar e envolver uma rede de atores preocupados em
aplicar boas práticas, a biossegurança tem a finalidade de reduzir a gravidade e
majoração de riscos acessíveis ao meio ambiente, sendo portanto, caracterizada como
inovação quando pensada e executada em rede multidisciplinar, e centrada, cada vez
mais, em sujeitos atentos aos problemas das práticas sociais, abarcando governos,
empresas e a sociedade como um todo.
De acordo com Teixeira e Valle (2010, p. 19, grifo nosso):
a Biossegurança é o conjunto de ações voltadas para a prevenção,
minimização ou eliminação de riscos inerentes às atividades de pesquisa,
produção, ensino, desenvolvimento tecnológico e prestação de serviços,
riscos que podem comprometer a saúde do homem, dos animais, do
meio ambiente ou a qualidade dos trabalhos desenvolvidos.
Na busca de soluções compatíveis e necessárias para preservar a saúde de todos, a
implementação dos princípios da biossegurança reverenciam uma pesquisa com
protocolos mais seguros e de qualidade. Diante das informações de gerenciamento dos
riscos de contágio do novo coronavírus (Covid-19), medidas de proteção, bem como a
necessidade da prática segura das amostras da pesquisa, o esforço do grupo do trabalho
atuou para os riscos biológicos, expondo-se por menor aos agentes patógenos
respiratórios e as substâncias tóxicas oriundas das bitucas de cigarro.
Almejando eliminar os riscos que envolviam a coleta de dados (pesquisa de campo)
em um projeto piloto com resíduos sólidos de elevada toxicidade, é que os
pesquisadores, atuando em rede, elaboraram metodologia capaz de proporcionar a
execução da coleta de dados envolvendo bitucas de cigarro descartadas em uma via
pública durante a realização de um evento de ativação no território.
Nesse sentido, o presente capítulo tem por objetivo apresentar a metodologia
utilizada para a aplicação dos procedimentos de biossegurança utilizados na contagem
de bitucas de cigarros, bem como os resultados advindos da coleta de dados. Por se
caracterizar como inovação, a presente metodologia poderá ser aplicada em outros
contextos, evitando-se contato direto entre o pesquisador e o resíduo tóxico,
contribuindo para a biossegurança e alcance de resultados relevantes.
Além da introdução, discussão dos resultados e conclusão, o texto se divide em duas
partes: uma breve revisão de literatura para a contextualização da temática que envolve
o resíduo sólido, bem como o desenvolvimento do trabalho de coleta por meio dos
procedimentos metodológicos elaborados pela equipe de investigadores.

197
2 REVISÃO DE LITERATURA
A Agenda 2030 é a expressão das metas globais pactuadas de modo participativo no
ano de 2015 dentre 193 países (ONU, 2015), em âmbito da Organização das Nações
Unidas. Considerado um plano de ação universal, ela manifesta preocupações com
diversas questões, as quais estão materializadas nos 17 Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável (ODS), convergentes com a necessidade de se repensar as formas
sustentáveis de se viver. Dentro desse conjunto de metas, destaca-se a garantia da
disponibilidade e manejo sustentável da água e a oferta de saneamento básico para todos
(ODS 6); a busca por transformação das cidades em lugares inclusivos, seguros,
resilientes e seguros (ODS 11); os padrões de produção e consumo sustentáveis (ODS
12); e a adoção de medidas urgentes para combater a mudança do clima e seus impactos
(ODS 13).
Em que pese os inúmeros benefícios, o domínio humano acerca do desenvolvimento
industrial e tecnológico contribuiu também para a formação de um ideário coletivo de
infinidade dos recursos naturais, ou ainda que a descoberta de novas tecnologias
pudesse ser suficiente para suprir necessidades ou remediar consequências dos avanços
desmedidos (MACHADO; GARRAFA, 2020).
Contudo, a partir dos anos 1970, em tímidos passos, ampliou-se o conceito de
desenvolvimento sustentável, tendo sido cunhado e disseminado em diversos setores da
economia, de modo que a atenção da sociedade se voltou para a questão ambiental com
mais intensidade, pela percepção das consequências dos impactos das intervenções
antrópicas sobre o meio ambiente (LACERDA; CÂNDIDO, 2013).
Os autores anteriores, citando Rattner (1991), propõem uma abordagem pragmática
para que os conceitos de sustentabilidade sejam incorporados, associados ao uso de
tecnologias apropriadas, educação e conscientização ambiental permanente e promoção
de um modo de produção mais harmônico.
As dinâmicas de transformação individuais e coletivas, em perspectiva relacional,
são moldadas a partir de intervenções educacionais, que conferem novos sentidos às
práticas cotidianas, as quais, por sua vez, passam a ser transformadas (GUIMARÃES,
2005). Além disso, o fomento à conscientização ambiental pode contribuir para a
redução do descarte incorreto ou indevido de resíduos como forma de combater as
toneladas de lixo produzidas diariamente (PESTANA, 2021).
A preocupação com o descarte responsável está muito alinhada a um processo de
reeducação no estilo de vida de cada indivíduo. De acordo com Simão, Nebra e Santana
(2020), é preciso que haja sensibilidade por parte do consumidor de forma que isso
responda às necessidades de toda a sociedade de modo conscientizador. A Figura 01
retrata como a sustentabilidade deve ser entendida a partir de vários fatores que se
interseccionam.
As relações apresentadas na figura anterior demonstram que a sustentabilidade não
se trata de abordagem unilateral, sendo resultante de um único fator isolado. Trata-se,
portanto, de um conglomerado de ações que resultam na garantia da resiliência do meio
ambiente (segurança ambiental), equidade econômica e justiça social geridos por um
pensamento mais próximo das perspectivas das ODS o que resulta, segundo Simão,
Nebra e Santana (2020), em uma Gestão da Mente Sustentável (GMS).

198
Figura 1 – Gestão da Mente Sustentável.

Fonte: MMA (2013)


Um resíduo, de elevada toxicidade, que acomete muitos desses problemas e que
exige uma preocupação pontual é a bituca do cigarro. O descarte incorreto no meio
ambiente de uma única bituca pode comprometer cerca de 50% dos microorganismos
de água doce e contaminar 1,5 litros de água (MOERMAN, 2009). Isso porque esse tipo
de resíduo possui milhares de substâncias nocivas à saúde, alocadas nas pontas de
cigarro, além de substâncias químicas oriundas da combustão, com potencial para
contaminarem a água, o solo e também os lençóis freáticos (RIOS; OLIVEIRA, 2018).
Além da contaminação direta das águas superficiais e dos solos, a diluição dos
poluentes podem atingir indiretamente as águas subterrâneas, seja pela exposição dos
resíduos sólidos no solo, seja por processos de interação entre as águas superficiais e
subterrâneas (MANOEL FILHO, 2008).
As características das bitucas de cigarro são determinantes para que sejam
considerados resíduos perigosos, ainda que as normas técnicas da Associação Brasileira
de Normas Técnicas (ABNT) quer seja, a NBR 1004:2004, não menciona
especificamente este tipo de resíduo (RIOS; OLIVEIRA, 2018). Contudo, além dos
riscos ambientais pela toxicidade, em razão do contato direto com a saliva dos usuários,
podem apresentar risco biológico durante as atividades de coleta. Isso porque esses
detritos, em especial às bitucas de cigarro, são pertencentes à classe dos Resíduos de
Serviços da Saúde (RSS) e podem contribuir para a redução da qualidade de vida e a
transmissão de doenças se manuseado de forma incorreta (CAFURE; PATRIARCHA-
GRACIOLLI, 2014). As bitucas, se coletadas e administradas de maneira errada, podem
expor substâncias cancerígenas e radioativas (ECYCLE, 2013; JUNG; TOCHETTO;
GONÇALVEZ, 2014).
Dentre as várias tentativas de reciclagem, desse resíduo, existentes no Brasil a única,
que até o ano de 2022 elimina a totalidade dos componentes tóxicos das bitucas, advém
da empresa Poiato Recicla. A recicladora que está situada na cidade de Votorantim/SP é
conhecida como a primeira usina de reciclagem de bitucas do Brasil a transformar todo
esse resíduo em papel.
A empresa utiliza tecnologia, com patente registrada, oriunda de um processo de
199
reciclagem desenvolvido na Universidade de Brasília (UnB) e busca sempre aprimorar
os seus serviços, aliando-o a boas práticas na promoção da conscientização ambiental. A
Poiato Recicla tem como principal objetivo garantir a proteção do meio ambiente, junto
com o controle e minimização dos impactos ambientais advindos da bituca de cigarro,
ao coletar cerca de 600 mil bitucas todo o mês (POIATO RECICLA, 2022). No
município de Ilhabela/SP, a Poiato Recicla implantou, de forma pioneira, o Programa
Municipal de Coleta de Resíduos de Cigarros, fortalecendo a responsabilidade da
empresa com a sustentabilidade ambiental e a execução prática do objetivo 11 dos ODS.
O processo de reutilização do material reciclado para outras finalidades pode ser
chamado de Economia Circular (EC). De acordo com Oliveira, Silva e Moreira (2019),
trata-se de um modelo focado na reinserção do resíduo no ciclo de produção, a fim de
reduzir os impactos gerados pelo destino inadequado do resíduo no ambiente. Além
disso, a transformação desse resíduo também contribui para o equilíbrio entre o meio
ambiente, a economia e a sociedade (WEBSTER, 2015).
Segundo Pomponi e Moncaster (2017), a Economia Circular pode ser entendida
como uma nova forma de garantir a sustentabilidade, ao contribuir para que se evite a
dicotomia existente entre os aspectos ambientais e econômicos. Por esse motivo, a
Economia Circular deve caminhar de forma concomitante com a sustentabilidade, de
modo a apresentar propostas estratégicas de racionalização do sistema ambiental e, ao
mesmo tempo, a correta utilização dos recursos ambientais (TIOSSI; SIMON, 2021).
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS UTILIZADOS NO PIBITUCA
A coleta de dados da Pesquisa Interdisciplinar de Bitucas de Cigarro, designada
pelos pesquisadores de PIBITUCA é uma investigação piloto, cuja metodologia
inovadora apresenta-se neste texto, e foi levada a termo, durante o período em que o
Brasil vivenciava a pandemia causada pelo vírus SARS COV 2, em julho de 2021,
momento esse que demandou cuidados redobrados para se evitar o contágio e
adoecimento dos pesquisadores durante a pesquisa de campo.
Com a crescente progressão da Covid-19 e os dados epidemiológicos divulgados
pela comunidade científica, a população mundial foi colocada diante de um novo
cotidiano social. Sendo que atipicidades dessa pandemia conduziram a Organização
Mundial da Saúde (OMS), o Ministério da Saúde (MS), a Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (ANVISA) e demais órgãos competentes a determinarem ações de
prevenção à saúde da população e controle da doença, objetivando alcançar um melhor
gerenciamento das medidas preventivas e profiláticas no controle da disseminação da
doença.
As recomendações, para o enfrentamento e prevenção da Covid-19, incluíram
restrições ao convívio social, dimensionando medidas para se evitar a disseminação do
vírus e reduzir o contágio de mais pessoas. Dentre os principais procedimentos, a
imposição de distanciamento social, o uso de máscaras, a utilização de álcool em gel e a
frequente higienização das mãos foram os mais preconizados e antecederam o início da
vacinação.
Desse modo, a construção de um plano metodológico para a coleta dos dados da
pesquisa em curso, contagem das bitucas descartadas, também se fez necessário, para
que não colocasse em risco de saúde os pesquisadores envolvidos na atividade e outras
pessoas que indiretamente teriam contato com o resíduo sólido, que mesmo fora do
200
cenário pandêmico, já apresenta elevada toxicidade e riscos outros se manuseado.
A necessidade de práticas de biossegurança foi, portanto, condição sine qua non da
investigação, e teve seu start a partir de uma reunião remota, realizada via meeting, para
divisão das tarefas e atribuições a serem desempenhadas na data da aplicação da
pesquisa em campo, antes de se iniciar a coleta de bitucas de fato, entendendo-se que:
Cabe ao pesquisador realizar a avaliação de risco para cada
procedimento, protocolo ou rotina, prevendo os cenários possíveis e as
medidas de mitigação dos riscos a serem adotadas em cada situação, bem
como ações de prevenção e treinamento da equipe (MARKOSKI;
BICA, 2020, p. 42, grifo nosso).
Na reunião via meeting, para planejamento da coleta de dados em campo, foi feita
entre a equipe multidisciplinar de pesquisadores, formada por 01 arquiteto com
mestrado em Arquitetura e Urbanismo, 01 fisioterapeuta/bacharel em Direito mestre em
Desenvolvimento Local, 01 agrônoma mestre em Saneamento Ambiental e Recursos
Hídricos e coordenada por uma doutora na áreas de Ciências Sociais, e os estudantes de
graduação da Universidade Católica Dom Bosco-UCDB que participam do Programa
Institucional de Iniciação Científica. Nela abordou-se o protocolo de biossegurança da
pandemia sugerido pela OMS, com detalhamento das medidas de higiene necessárias
para uma ação protetiva e preventiva do grupo de trabalho. Também, apresentou-se o
espaço físico da pesquisa de campo e os equipamentos de proteção individual-EPI, que
seriam aplicados, de acordo com as especificidades e características, bem como
detalhamento da estratégia a ser seguida durante a coleta de dados.
A recomendação do uso de EPI e aceitação por parte dos pesquisadores em utilizar o
material foi determinante para a participação na pesquisa de campo. Elaborou-se uma
lista de materiais para serem entregues aos participantes, contendo: luvas descartáveis,
máscara individual N95, avental impermeável e descartável de manga longa, álcool em
gel 70% para uso individual. E, para compor o conjunto de medidas técnicas da saúde,
os participantes foram orientados a utilizar sapatos fechados, calça comprida, cabelo
preso (se fosse longo), e uma garrafa de água individual.
Atendo-se aos cuidados relacionados à biossegurança foram estabelecidos demais
regras preventivas, aplicando-se o disposto na Nota Técnica nº04/2020 da ANVISA e o
Protocolo de Biossegurança para retorno das atividades nas Instituições Federais de
Ensino (2020), como:
1. Mantenha o distanciamento social recomendado pela OMS de 1,5 metro,
principalmente das pessoas que estiverem tossindo ou espirrando;
2. Lave as mãos antes de colocar a máscara ou higienize com álcool em gel
70%, assim como, antes e depois de retirar a máscara e sempre que tocar nela;
3. Certifique-se de que a máscara cobre o seu nariz, boca e queixo;
4. Enquanto estiver em uso, evite tocar na máscara;
5. Não toque nos olhos, no nariz ou na boca;
6. Remova a máscara usando a técnica apropriada (ou seja, não toque na
frente, mas remova sempre por trás);
7. Após a remoção ou sempre que tocar inadvertidamente na máscara em uso,
201
deve-se realizar a higiene das mãos;
8. Ao colocar as luvas, evite tocar desnecessariamente superfícies e
materiais, como celular, chave de carro e outros;
9. Proceder à higiene das mãos imediatamente após a retirada das luvas
10. O uso de luvas não substitui a higiene das mãos.
Considerando as precauções indicadas para a realização dessa pesquisa a campo,
além das orientações relatadas, foi ressaltado a importância dos cuidados necessários e a
sequência correta na ordem de paramentação e desparamentação dos EPIs a fim de
garantir a segurança.
Todas as providências elencadas na metodologia foram ajustadas às atividades, e
levadas ao conhecimento da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo (SECTUR), que
na data escolhida para a coleta de dados, desenvolveria um evento de ativação no
território.
A coleta de dados com aplicação da metodologia descrita neste trabalho foi realizada
em uma via pública na área central de Campo Grande, município da região Centro-
Oeste brasileira. A Rua 14 de Julho possui uma importância histórico-cultural para a
cidade, além de destaque econômico, com intenso comércio e fluxo de pessoas.
Ao longo dos anos, a 14 de Julho sofreu com a perda da qualidade urbanística e
ambiental, a obsolescência das infraestruturas, e, consequentemente, a diminuição da
vitalidade econômica. Por essa razão, passou por um processo recente de requalificação
urbana, na qual foram substituídas e modernizadas todas as infraestruturas existentes,
alterando as características originais da via, além da oferta de mobiliários e paisagismo
(OLIVEIRA; CASTILHO, 2022).
Parte das transformações ocorridas incluiu a ampliação significativa dos passeios
públicos, priorizando a caminhabilidade dos pedestres, com a instalação de áreas de
descanso para a permanência de pessoas, além de transplantio de árvores e espaços
ajardinados em canteiros e vasos. Na concepção do projeto, a acessibilidade foi
planejada com calçadas quase no mesmo nível da área de circulação de veículos, de
modo que as águas superficiais são drenadas por grelhas de concreto que interligam os
pavimentos do passeio e do leito carroçável. Foram instaladas lixeiras seletivas para a
coleta de resíduos, mas não dispositivos específicos para coleta de bitucas de cigarros,
sendo perceptível ao longo da via o descarte irregular desses resíduos ao longo das
calçadas, grelhas de drenagem e canteiros de árvores e plantas.
Desse modo, foi selecionado um trecho da via da Rua 14 de Julho para aplicação da
metodologia de coleta de dados (Figuras 02 e 03), composto pelas três quadras de maior
atração de pessoas e fluxo de pedestres, entre a Av. Afonso Pena e a Rua Marechal
Rondon. Cada quadra foi analisada nos dois sentidos (lado esquerdo e lado direito).
O processo de contagem das bitucas valeu-se da observação do grupo de pesquisa ao
longo das três quadras centrais da Rua 14 de julho, já descritas anteriormente, com
registros a olho nu e através das capturas de imagens fotográficas e da câmera filmadora
dos smartphones e iphones. A escolha por esse método de investigação se deu pela
facilidade e eficiência na geração dos dados, sem onerosidade, praticidade para
transportar os aparelhos e principalmente, por ser um método não invasivo, em que não
existe a necessidade do pesquisador ter contato direto com seu objeto de coleta.
202
Figura 2 – Fichas de análises das quadras com o intuito de identificar e padronizar os
locais das fotografias.

Fonte: Autores (2022)


Figura 3 – Imagens da coleta de dados sendo realizadas nas respectivas vias.

Fonte: Autores (2022)


O levantamento de dados das bitucas de cigarro com a utilização de um método não
invasivo é um dos pontos chaves desta pesquisa, uma vez que não houve manuseio,
acondicionamento ou mesmo transporte dos resíduos, condição que envolve risco
potencial de contaminação.
O registro fotográfico de cada árvore foi composto de uma foto geral, enquadrando-
se todo o contexto, e fotos específicas de cada um dos quadrantes dos canteiros. As
filmagens foram utilizadas para os elementos contínuos, como as grelhas de drenagem
de água pluvial, que são localizadas longitudinalmente ao eixo da via. Deste modo, um
único vídeo contemplou a filmagem linear de toda a extensão da grelha em cada face de
quadra (Figura 04).
O grupo de trabalho foi dividido em dois grupos para cada um acompanhar um lado
da via, assim, o grupo A trabalhou nos registros do lado esquerdo da rua e o grupo B
203
ficou responsável pelo lado direito. Tomou-se o cuidado de identificar os registros
fotográficos de cada grupo, de modo a conhecer a face da via referente a coleta do dado.
Figura 4 – Imagens das árvores e da grelha paralelas às ruas estudadas.

Fonte: Autores (2022)


Ao longo das vias observamos arredores das árvores plantadas no canteiro e no meio
fio, locais mais sugestivos de encontrarmos descartes de lixo de modo inadequado. Com
o suporte dos smartphones e iphones para coleta de imagens, foi possível contabilizar as
bitucas posteriormente ao trabalho de campo, em ambiente seguro, sem qualquer
manuseio do resíduo tóxico e com risco biológico de contaminação. A contagem das
bitucas encontradas foram registradas pelos grupos e depois foi realizada uma auditoria
com as fotos e filmagens feitas a campo para assegurar e dar mais credibilidade ao
resultado da contagem de bitucas.
A auditoria foi interna, entre os pesquisadores do grupo, e teve-se o cuidado para os
auditores escolhidos não serem as mesmas pessoas que fizeram o registro a olho nu.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Dentre os resultados obtidos pela pesquisa aplicada, puderam ser observadas bitucas
sendo descartadas pelos motoristas nas sarjetas da Rua 14 de Julho. Além disso,
observou-se que os buracos existentes nas sarjetas favoreciam a entrada da bituca e a
possível contaminação da água. Observou-se que a quantidade de bitucas encontradas
foi de 654 unidades, o que corresponde a 250g. Se relacionado com o que diz Moerman
(2009), essa quantidade pode contaminar cerca de 981 litros de água.
Esse trabalho de campo permitiu observar a existência de uma grande quantidade de
bitucas próximas aos semáforos, o que indica um descarte incorreto por motoristas que
aguardam a abertura do sinal verde no trânsito, fato que indica a necessidade de uma
ação de educação ambiental com foco nesse resíduo.
Como limitações da pesquisa, descobriu-se que a Rua 14 de Julho havia sido varrida
na noite anterior à ação cultural. A limpeza da via pública pode ter deixado um
remanescente do resíduo, um quantitativo não contabilizado, disposto nas sarjetas e
canteiros. Contudo, foi possível concluir que a maior quantidade do resíduo fora
depositado na via entre o horário da varrição feita no dia anterior e o horário da
contagem final das bitucas na última quadra, por volta das 10h30min do dia 10 de julho
de 2021.

204
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As metas globais voltadas à conscientização ambiental contribuem para discussões
permanentes acerca da manutenção do meio ambiente e do bem estar humano. O
cuidado e a correta destinação de resíduos nocivos à saúde podem contribuir para
alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das
Nações Unidas (ONU).
Os procedimentos de biossegurança aqui descritos foram desenvolvidos e
executados em virtude das condições da pandemia da COVID-19. No entanto, essa
metodologia demonstrou-se como forma inovadora e segura de se realizar levantamento
de dados para a investigação do PIBITUCA e de outras pesquisas que poderão ser
inspiradas nesta pesquisa. Sugere-se que essa metodologia possa ser replicada em outras
cidades de diferentes escalas, garantindo-se a biossegurança do(s) pesquisador(es) a fim
de evitar a contaminação do resíduo descartado irregularmente.
Algumas das formas de contribuir a todo esse processo, na consecução de
reeducação individual e coletiva, poderá ser a inclusão de bituqueiras nas calçadas e
informativos/lembretes na via, como o fito de promover a conscientização ambiental,
até que um ecossistema de inovação, alicerçado em resultados desta e outras pesquisas,
possa se instalar.
AGRADECIMENTOS
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.
O processo de contagem das bitucas de cigarro por meio dos procedimentos de
biossegurança foi realizado pelo Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Territorial
Sustentável vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Local da
Universidade Católica Dom Bosco – UCDB. O trabalho teve as parcerias do Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID) e da Prefeitura Municipal de Campo
Grande.
O trabalho foi coordenado pela Profa. Dra. Dolores P. R. Coutinho, Me. Juliana
Casadei, Me. Maira Fernanda dos Anjos Santos e Me. Felipe Buller Bertuzzi. Os
estudantes pesquisadores de Iniciação Científica envolvidos foram Adenésio Mariano
da Silva Junior, Bruno Almeida Albertini, Gabrielly Dias Petersen, Juliana Oleques
Pradebon, Luciano Albuquerque Silva, Mariane Jimenez Franco, Silvana Romanini
Monti, Sara Jordana Cabral Peixoto e Nubia de Oliveira Brito.
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207
IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS EM BIOMAS
FLORESTAIS E AS LIÇÕES DO
INVESTIMENTO SOCIAL PRIVADO

Mouana do Socorro Sioufi Fonseca (1)


Rodrigo Ladeira (2)
Jorge Emanuel Reis Cajazeira (3)
Maria Teresa Grimaldi Larocca (4)

RESUMO. O objetivo deste estudo foi efetuar uma análise e diagnóstico territorial
voltado para a gestão do Investimento Social Privado (ISP), considerando os
interesses entre empresas e atores sociais locais, legitimando o atendimento às
necessidades do território, nos impactos sobre a devastação florestal. Tendo como
abordagem o estudo de casos múltiplos, duas corporações foram estudadas: a
BRACELL, empresa de reflorestamento para produção de celulose com impacto em
31 municípios e 300 comunidades, situada no Litoral e Agreste baianos; e a VALE,
uma mineradora com atuação no Pará, onde está a maior planície mineral do mundo.
Os casos foram selecionados por estarem em territórios completamente distintos e
possuírem impacto significante na transformação do território onde estão localizados.
A coleta de dados se deu por meio da observação direta, análise documental e
entrevistas semiestruturadas. As empresas estudadas vêm realizando aportes de
recursos, planejando programas e projetos para atender a demandas do território. Foi
possível analisar com base nos dados do Indice deDesenvolvimento Humano
municipal que as ações socioambientais da VALE e da BRACELL em seus territórios
possuem impacto positivo no aumento da qualidade de vida das comunidades no
entorno de áreas afetadas, colaborando com a pressão ambiental contra o
desmatamento e a caça predatória. O Marketing Social estruturado é necessário para
demonstrar os perigos do desmatamento e o contato indesejado com espécimes da
fauna local,provocando mudanças de hábitos e atitudes e prevenindo eventuais novas
pandemias.

Palavras-chave: Biomas Florestais. Investimento Social Privado.


Responsabilidade Social Corporativa.

(1) Mestre, mousioufi@hotmail.com. (2) Pós Doutor, Universidade Federal da Bahia,


Rodladeira@yahoo.com. (3) Doutor, Universidade Estadual de Feira de Santana, jercajazeira@uefs.br.
(4) Doutora, grimaldilarocca@gmail.com.
208
1 INTRODUÇÃO
É inquestionável o papel da floresta Amazônica no equilíbrio do clima mundial. A
preservação da Amazônia é uma necessidade científicamente comprovada. Um verde e
gigantesco mundo de águas e florestas, onde ocorrem a reprodução e morte de mais de
um terço das espécies que vivem sobre a Terra. No Brasil, também, a Mata Atlântica,
outra floresta, constantemente agredida e desmatada, desde a colonização, vive sob
constante ameaça. De fato, uma análise dos dados indica que a destruição do meio
ambiente não tem ocorrido apenas na Amazônia. E o fato é preocupante, já que restam
apenas 12,4% da Mata Atlântica – o bioma é o que mais perdeu floresta no país até hoje,
como afirma a SOS Mata Atlântica (2018).
A Bahia foi o estado brasileiro que mais desmatou florestas de Mata Atlântica no
período entre 2015 e 2016. O dado é do Atlas da Mata Atlântica, estudo da Fundação
SOS Mata Atlântica e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que verifica
as taxas de desmatamento no bioma desde 1985. Segundo o último relatório, divulgado
em 2017, foram desmatados em terras baianas 12.288 hectares do bioma entre 2015 e
2016, quase o triplo do número registrado no período anterior, que indicou quase quatro
mil hectares devastados.
Com efeito, é preciso reconhecer que as parcelas mais vulneráveis das populações
rurais são fortemente dependentes da pecuária, uma das atividades que mais impactam e
causam o desmatamento. Há indícios que existe uma relação causa e efeito entre pobreza
e desmatamento. Dados levantados por Dantas e Fontelle (2004) alertam que os 5% mais
pobres tiveram uma queda de 14% na renda, em média. Isso coincidiu com o aumento do
desmatamento na Amazônia de um patamar de 4.500 km² ao ano para um patamar quase
50% superior.
O nosso estudo visa analisar as iniciativas empresariais que buscam melhorar a
situação de entorno ao mesmo tempo que previne os ecossistemas de situações de
extrativismo predatório, muitas vezes visto como uma solução para a fome e para a
miséria. Escolhemos uma organização com atuação na Região Amazônica e outra na
Região da Mata Atlântica. A intenção da pesquisa foi identificar práticas organizacionais
que por meio do Investimento Social Privado busquem envolver as comunidades
circunvizinhas, melhorando seu IDH, e assim minimizem os impactos no meio
ambiente, em especial, atuando na redução efetiva da pobreza e assim mitigando a
relação causa e efeito entre pobreza e devastação florestal. Hábitos tradicionais de caça e
consumo da carne das mesmas, aprizionamento e comercialização de animais silvestres,
levando ao contato indesejado destas populações com estes animais, podem causar o
contagio com virus já conhecidos, e outros ainda não, e tais atitudes podem ser
modificadas por meio de campanhas de Marketing Social.
Dito isso, a pesquisa buscou aprofundar questões ainda não inteiramente
respondidas em trabalhos anteriores que tratam o Investimento Social Privado (ISP) e
seu papel no desenvolvimento socioambiental. A escolha das organizações estudadas foi
baseada na inserção das suas atividades em ambientes com ecossistemas ameaçados.
Estamos interessados em avaliar se as organizações estão efetivamente contribuindo
para a redução da pobreza por meio do envolvimento das partes interessadas nos seus
ISPs? Ademais, investigamos se existe interesse ou há consciência da relevância da
formulação e implantação de programas de Marketing Social, que previnam o
desmatamento e suas consequencias ao meio ambiente e à saúde mundial?
209
Partindo das perguntas de pesquisa, o objetivo do estudo é efetuar uma análise e
diagnóstico territorial voltado para a gestão do Investimento Social Privado que leve em
consideração o encontro de interesses entre empresa e atores sociais locais, legitimando
o atendimento às necessidades do território, em especial na mitigação dos impactos
sobre a devastação florestal, como estratégia para a transformação. Paralelo a isso,
verificar entre os casos estudados se há consciência da necessidade de campanhas de
Marketing Social junto às populações envolvidas.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Há de se notar a relevância da preservação e respeito aos biomas das florestas, no
intuito de se manter o habitat natural de espécimes silvestres, e evitar que por
necessidade ou hábito de apropriação indevida de animais pertencentes às mesmas seja
desrespeitado e colocado de forma indevida em contato com seres humanos. Nota-se
que vários dos vírus causadores de pandemias como a que vivemos hoje, a do Covid-19,
veio do contato ou uso indevido para comercialização, aprisionamento ou alimentação
advinda desses animais. Previamente a esta tivemos o Ebola. Os primeiros casos de
morte registrados pelo vírus Ebola surgiram na África Central no ano de 1976, quando
humanos foram contaminados por meio do contato com cadáveres de macacos, alerta
Hinrichsen (2021).
Dessa maneira, a importância de campanhas de Marketing Social, no sentido de
mudança de hábitos e costumes é relevante, pois, é fato que comer 'carne de caça' e ter
contato com morcegos que podem estar contaminados com o vírus, sendo reservatórios
naturais, levará a transmissão (HINRICHSEN, 2021).
É fato notório que o aumento do IDH leva a uma melhoria da qualidade de vida e da
possível consciência socioambiental, com a ajuda de campanhas de Marketing Social.
Utilizando-se critérios científicos foram identificadas algumas relações entre
desigualdade e problemas ambientais. Um exemplo é a descoberta de que níveis mais
elevados de desigualdade de renda correspondem a patamares mais baixos de
sustentabilidade. Da mesma forma, o desmatamento e a poluição levam a piores índices
de IDH – uma vez que metade da subnutrição mundial é atribuível a fatores ambientais
(UNDESA, 2011).
Empresas social e ambientalmente responsáveis e o poder público também deveriam
se engajar em promover e divulgar campanhas de Marketing Social, direcionado aos
públicos que diretamente ou indiretamente causam estes efeitos indesejados do
consumo de carne de caça ou da manutenção ou contato com animais silvestres
desalojados de seu habitat natural. De acordo com Ladeira et al. (2017, p. 146) “[...]
social marketing is clearly related to using marketing tools to change the behavior of a
target market, aiming to enhance quality of life or improve social conditions for that
segment of society”, ou seja, mudar hábitos das comunidades próximas as áreas de
florestas, no sentido de preservá-las e evitar o contato e consumo com os referidos
animais silvestres, portadores potenciais de vírus causadores das pandemias atuais e de
novas pandemias, e a preservação das mesmas como reservas ambientais.
2.1 INVESTIMENTO SOCIAL PRIVADO
As teorias sobre o Investimento Privado no Brasil, difundidas pelo mundo, indicam
que no mesmo são abarcadas por duas organizações sem fins lucrativos sediadas em São
Paulo: o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE, 2018) e o Instituto para o
210
Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS, 2020). Um dos motivos do tema ter
ganhado repercussão mundial foi a grandeza dos números envolvidos nas ações
realizadas por meio desses investimentos. Desde 2007, a Comunitas, organização que
trabalha com o tema do Investimento Social, realiza a pesquisa Benchmarking do
Investimento Social Corporativo (BISC, 2019), uma ferramenta que traça parâmetros e
comparações sobre o perfil do investimento social privado no Brasil, acompanhando a
evolução dos compromissos sociais das empresas participantes, as quais acreditam na
sua parcela de responsabilidade na proteção do meio ambiente e geração de
solidariedade social. Igualmente, o GIFE (2018), para compreender melhor as
características das organizações associadas e suas prioridades de investimento social,
realiza pesquisa bianual entre seus associados – o Censo GIFE (2018). Em termos de
recursos, 50% do orçamento total dos respondentes do censo são destinados à execução
direta de projetos próprios, o que representa R$1,6 bilhão (GIFE, 2018). Apenas 14%
dos projetos e programas são desenvolvidos com outras organizações, no sentido de
compartilhamento de autoria, governança e tomada de decisão. Ou seja, segundo o
levantamento, existem indícios de que os parceiros sociais são mais considerados para
executar iniciativas com foco nas prioridades dos investidores sociais (empresas
privadas) do que em suas próprias prioridades ou necessidades.
Uma tendência apontada pelo GIFE (2018) é a de que cresce o alinhamento entre o
Investimento Social Privado e o negócio em si. Isso é explicado por 43% dos
respondentes que orientam seu planejamento e atuação pela percepção de que há um
aumento de cobrança na sociedade sobre o papel e atuação das empresas, relacionando o
ISP á imagem Institucional. Nesse cenário, não há indicativos evidentes de que o ISP de
fato contribua com o desenvolvimento do território, visto que no censo não fica claro se
as necessidades/prioridades do público impactado são levadas em consideração no
direcionamento desses investimentos sociais em prol da melhoria da qualidade de vida, e
consequente redução de impactos da sociedade sobre a fauna e a flora.
O conceito de Investimento Social Privado é caracterizado pela transferência
voluntária de recursos de entes privados para comunidades por meio de projetos (GIFE
2018). No Brasil, o ISP é realizado por meio de projetos sociais, geralmente executados
por organizações do Terceiro Setor (FISCHER, 2002). Essas organizações, por sua vez,
possuem a expertise em metodologias para desenvolvimento de tais projetos. Para
Brown et al. (2006), o ISP pode se estender à transferência de recursos para entidades de
assistência social, sem o compromisso do ente privado em monitorar os resultados. O
GIFE (2018) traz o conceito de ISP aliado à transferência de recursos de pessoas
jurídicas ou físicas, sem a necessidade de um preposto, porém, com o comprometimento
de que os projetos executados sejam avaliados e não ocorram em ações assistencialistas.
2.2 RESPONSABILIDADE SOCIAL CORPORATIVA
O conceito de Responsabilidade Social ou “Cidadania Empresarial” pode ser
entendido como uma relação de direitos e deveres entre empresas e seus públicos de
interesse. Tem a ver com a “boa vontade” que as empresas devem ter em contribuir para
as questões das comunidades onde atuam. É um fazer que aproxima os interesses do
negócio com os seus stakeholders (SCHOMMER; FISCHER, 1999). Ladeira et al.
(2017) trazem referências sobre a Responsabilidade Social Corporativa (RSC) alinhada
ao Marketing Social. Para os autores, a Responsabilidade Social Empresarial (RSE) é o
mais amplo de todos os termos pesquisados, relacionados ao próprio Marketing Social,

211
aspectos ambientais e financeiros relacionados à estratégia ou plano. De acordo com os
autores, a RSE é utilizada pelo Marketing Social como estratégia para alavancar a
marca, visto que o conceito traz a premissa de parceria na qual a empresa pode ter
resultados hibridamente emocionais e racionais, sendo também sustentáveis . Em
seguida, benefícios como a fidelidade dos clientes, também atraindo novos
consumidores e proporcionando um maior volume de vendas, bem como, tendo foco
principal, a mudança de comportamentos e atitudes. Também, é uma ferramenta
importante para criar vantagem competitiva; desenvolvendo a lealdade dos
colaboradores e atraindo novos talentos; novos parceiros de negócios, e investimentos
financeiros na marca , melhorando o relacionamento entre a empresa e as comunidades
locais, e a imagem da marca , consequentemente aprimorando o posicionamento
mercadológico da mesma.
Porter e Kramer (2006) mostram que, em muitos casos, a filantropia é usada como
forma de relações públicas para promover a imagem ou a marca da empresa.
Pressionadas por demandas crescentes da sociedade, os executivos sentem que suas
empresas devem realizar ações filantrópicas, mas sentem dificuldades para justificá-las
do ponto de vista dos resultados financeiros que elas possam proporcionar. A filantropia
apresentará uma conotação estratégica quando representar uma melhor relação custo-
benefício num contexto competitivo, assim aproxima-se do conceito de ISP. Os autores
entendem que é possível sair da armadilha dos extremos: a filantropia pura que se realiza
por meio de doações diretas em dinheiro ou prestação de serviços sem fins lucrativos e o
interesse comercial puro. Desse modo, questões revestidas de caráter filantrópico, de um
lado, e econômico, de outro, podem se combinar, fazendo com que as empresas se
insiram de maneira mais harmônica e solidária em questões de interesse da sociedade
com benefícios tangíveis e intangíveis para o negócio.
A combinação de interesses comerciais com benefícios sociais não amesquinha a
filantropia, desde que esses interesses sejam orientados por uma prática de gestão
responsável coerente com os princípios diretivos aqui apresentados. Uma filantropia
praticada nessas condições difere radicalmente da filantropia feita apenas para melhorar
a imagem pública da empresa. Com efeito, a gestão do ISP para a transformação das
localidades onde os empreendimentos se instalam ainda carece de produção acadêmica,
havendo uma série de desafios na sua implementação, os quais vão desde o investimento
à gestão, perpassando por várias situações, tais como: muitos investimentos realizados
por diversas empresas, num mesmo território, na maioria das vezes, estão concentrados
nas mãos das organizações sociais mais conhecidas, o que dificulta a possibilidade
desses recursos serem distribuídos para outras regiões e diversificar seu alcance,
ademais os seguintes aspectos são observados: (a) baixo grau de participação dos atores
sociais locais envolvidos no processo de tomada de decisão; (b) não se discute com a
comunidade as necessidades locais; (c) não consideração da necessidade mudança de
comportamentos e atitudes, através de campanhas de Marketing Social. Sendo assim, as
chances de o investimento ter o impacto na transformação positiva da localidade ficam
cada vez mais distantes.
2.3 TERRITÓRIOS
Saquet (2003) referencia território como relação social e de conflitos. Ele coloca que
para existir território é preciso haver algum tipo de poder, de relações sociais e de escuta
e conversação entre as partes . Neste estudo, trazemos como territórios o Litoral Norte

212
baiano, onde atua uma empresa de reflorestamento para produção de celulose, a
BRACELL, e a região sudeste do Pará, onde está localizado o maior complexo de
minério de ferro do mundo operada pela VALE. Ambas as organizações atuam em um
território marcado pela disputas sociais e exploração dos ecossistemas.
No Norte da Bahia, até a década de 70, com um processo lento de ocupação e uma
base econômica consolidada em torno da agricultura de subsistência e de atividades
extrativistas de produtos vegetais e animais, o Litoral Norte da Bahia não tinha sofrido
grandes mudanças socioeconômicas. No entanto, a partir das três últimas décadas, vem
se observando modificações fundamentais na estrutura produtiva da região com a
introdução de novas atividades econômicas, vinculadas, principalmente, ao segmento
do turismo e a plantação de eucaliptos para a fabricação de celulose. As atividades
agropecuaŕias tradicionais e de produção extrativa vegetal e animal são bastante
importantes na região, sendo responsav́el pela absorção de aproximadamente 15% da
população nativa dos municípios de Mata de São João e Entre Rios. São pessoas que
asseguram sua sobrevivência e reprodução mediante o trabalho autônomo informal
relacionado ao uso, beneficiamento ou comercialização direta dos recursos naturais:
pequena produção de coco, coleta de frutas, pesca, mariscagem, artesanato da palha de
piaçava etc.
No entanto, a percepção atual e futura desses artesãos sobre o seu negócio não é
promissora. A construção da Linha Verde (BA-099), a especulação imobiliária ocorrida
ao longo desta rodovia que corta a região e de complexos turísticos, como o da Costa de
Sauípe, abriu oportunidades de trabalho e renda para a população mas, simultaneamente,
desestruturou sistemas locais de produção social, como o artesanato de palha de piaçava,
e avanço do desmatamento na região. Esta desestruturação está relacionada à
privatização da base de recursos naturais, até então, 'livre' ao acesso de todas as
populações nativas da região e, particularmente, às mulheres artesãs da região de Sauípe.
Segundo os resultados da pesquisa sobre empreendimentos formais e informais nas
áreas da Mata de São João e Entre Rios, 54,4% dos empreendedores ligados à
exploração de recursos naturais mencionaram a crescente distância e as dificuldades de
acesso em relação às fontes de matéria-prima. Assim, a restrição ao acesso das
comunidades tradicionais da área de influência às reservas naturais de Mata Atlântica
para a extração de palha da piaçava, matéria-prima para o artesanato local, é o objeto de
um significativo conflito socioambiental como alertam Loiola et al. (2000).
Já no Estado do Pará, desde os anos 1970 a região de Paraubepas/Carajás tem sido o
local de conflitos socioambientais. Palco da guerrilha do Araguia, em 1960, paralela a
história agrária, surge o lançamento dos grandes projetos de mineração, iniciado em
Serra Pelada, no Complexo de Carajás, no fim dos anos 70 e que dura até os nossos dias.
Justamente nessa zona montanhosa, ao pé da qual se situa Parauapebas, se encontra a
maior reserva mineralógica brasileira, sob a batuta da VALE, muito provavelmente a que
contem a maior concentração mundial de minério de ferro de alto teor, além de
manganês, cobre, ouro e minérios raros. O aumento da atividade acirrou os ânimos sobre
a posse da terra entre os produtores e as comunidades o que levou ao conhecido
“massacre de Carajás” no qual um conflito entre militantes do Movimento do Sem Terra
e a Polícia Militar deixou 21 camponeses mortos, 19 no local do ataque, e outros dois que
faleceram no hospital (SCOTTO; LIMONCIC, 1997).
Assim, em ambos os territórios impera a informalidade dos negócios quer sejam dos
pequenos artesãos, na Bahia, quer seja dos pequenos produtores rurais, no Pará. Com
213
efeito a informalidade é aliada da ilegalidade. O debate sobre a extração ilegal de
madeira aparece como um efeito colateral da falência dos instrumentos tradicionais do
Estado para garantir o cumprimento das políticas públicas abrindo espaço para os ISP.
3 METODOLOGIA
Utilizamos nesta pesquisa o estudo de casos múltiplos como abordagem
metodológica (YIN, 2015), sendo estudado dois casos que permitiram um melhor
entendimento dos processos e práticas (“como” e “por que”), utilizados por duas grandes
corporações no que se refere ao Investimento Social Privado. São elas: a gestão do
Investimento Social Privado da BRACELL, uma empresa de reflorestamento para
produção de celulose, com impacto em 31 municípios e mais de 300 comunidades,
situada no Litoral e Agreste baianos; e da VALE, uma mineradora com atuação no Pará,
onde está a maior planície mineral do mundo, e em Minas Gerais, sendo este último local
não considerado neste estudo. Ambos os casos foram selecionados por terem muitos
insumos para a pesquisa e por estarem em territórios completamente distintos e
possuírem impacto significante na transformação do território onde estão localizados. A
coleta de dados se deu por meio das seguintes técnicas: dados secundários existentes
sobre o tema e os casos escolhidos para pesquisa; observação direta; análise documental
de dados colhidos nos sites; declarações e documentos publicados pelas duas
organizações e entrevistas com responsáveis pelos setores de Investimento Social e
Ambiental.
O primeiro passo foi mapear e selecionar experiências significativas de Investimento
Social Privado como ferramentas de gestão social de ambas as empresas. A partir da
pesquisa de dados secundários, buscou-se artigos de periódicos, sites das empresas
referidas e demais documentos referentes a gestão social, Investimento Social Privado e
Responsabilidade Social e Ambiental. Posteriormente, buscou-se dados publicados
acerca dos empreendimentos estudados. Nessa etapa, foram analisados documentos
institucionais e produtos técnicos, publicados pelas organizações mencionadas, bem
como informações sobre os projetos sociais desenvolvidos, relatos de reuniões, dentre
outros. A partir daí, foi realizada a interpretação e análise dos dados levantados na
pesquisa. A fim de complementar as informações, realizou se de forma remota,
entrevistas com sos responsáveis pelos referidos setores.
Para a análise da efetividade dos ISPs escolheu-se uma abordagem quantitativa.
Foram coletados dados ex-post facto de indicadores de qualidade de vida e de
desenvolvimento (IDH) de 407 cidades do Estado da Bahia e de 142 cidades do Estado
do Pará. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é uma unidade de medida
utilizada para aferir o grau de desenvolvimento de uma determinada sociedade nos
quesitos de educação, saúde e renda. Quanto mais próximo de zero, menor é o grau de
desenvolvimento de um território. Utilizou-se a base dados do ATLAS DO
DESENVOLVIMENTO HUMANO DO BRASIL de 2011.
Para a verificação do tipo de análise foi aplicado o teste de aderência à normalidade
de Kolmogorov-Smirnov revelando que todas as variáveis se mostraram aderentes a
distribuição de Gauss, indicado valores da significância (p-valor >0,100) e portanto
também maiores que o valor do nível de significância adotado de 0,050. Por fim, para a
comparação dos grupos empregou-se o intervalo de confiança com os limites de
equivalência. Se o intervalo de confiança estiver completamente dentro dos limites de
equivalência, pode-se afirmar que a média da população do teste é equivalente à média
214
da população de referência. Em todos os tratamentos de dados foi utilizado o software
Minitab 19.2020.2.0.
Quadro 1 - Entrevistados dos estudos de caso da pesquisa
Função/Cargo Empresa Organização
Gerente Sênior de Relações Corporativas, Comunicação,
Bracell
Digital e Sustentabilidade
Gerente de Relações Institucionais e Responsabilidade
Bracell
Social
Gerente de Meio Ambiente e Certificações Bracell
Vice-presidente
Associação Comunitária do Cangula
Diretora
Cooperativa de Trabalho das Costureiras de Inhambupe e
Presidente
região - COOPECIR
Gerente de Relacionamento com Comunidades Vale
Diretor de Geotecnia Vale
Associação de Moradores da Vila Planalto, município de
Presidente
Canãa dos Carajás
Associação dos Moradores da Vila Bom Jesus, município
Presidente
de Canãa dos Carajás
Consultor Consultor externo de sustentabilidade da Vale
Associação de Pequenos Produtores Rurais da Vila Ouro
Presidente
Verde, município de Canãa dos Carajás
Associação dos Agricultores do Projeto de Assentamento
Presidente
União Américo Santana, município de Canãa dos Carajás
Agência de Desenvolvimento Econômico de Canãa dos
Diretora Executiva
Carajás

Fonte: elaborado pelos autores


As entrevistas com gestores socioambientais e consultores das empresas do estudo
de caso e também atores sociais do território abrangido pelos casos pesquisados, em
consequência das restrições de viagens e orientação para o distanciamento, em função da
pandemia, foram realizadas de forma remota, por videoconferência. A lista com os
dados sobre os entrevistados está ilustrada no Quadro 1.
4 ANÁLISE DOS RESULTADOS
4.1 A GESTÃO SOCIOAMBIENTAL DA BRACELL
Na Bahia, a empresa Bracell, com atuação nas regiões do Litoral Norte e Agreste,
tem como atividade a produção celulose e reposição de florestas de eucalipto para
abastecer sua fábrica, situada no Polo de Camaçari, região metropolitana de Salvador. A
empresa, a qual atua no Brasil há 17 anos, é uma das maiores produtoras de celulose
especial do mundo. A visão da multinacional é ser uma das maiores, mais bem
administradas e sustentáveis empresas no setor de recursos renováveis, gerando valor
para a comunidade, o país, o meio ambiente e os clientes (BRACELL, 2020).
O plantio de florestas para fins comerciais no Brasil iniciou-se na década de 1970,
com o incentivo ao reflorestamento pelo Governo Federal através de programas de
fomento das atividades de silvicultura. Na Bahia, os plantios foram realizados na
microrregião do litoral norte baiano, estimulados pelo preço atrativo da celulose no
mercado internacional e, sobretudo, pela proximidade do recém criado Polo
Petroquímico de Camaçari, do Centro Industrial de Aratu (CIA) e da capital do Estado
(ANDRADE; OLIVEIRA, 2016). Segundo a Associação Baiana das Empresas de Base

215
Florestal (ABAF, 2020), a falta de pesquisas que subsidiassem um maior conhecimento
sobre a atividade, aliada ao planejamento inadequado do uso da terra, escolhas
equivocadas das espécies a serem plantadas, utilização inadequada de fertilizantes, uma
frágil legislação e ineficiente fiscalização culminaram no surgimento de correntes
contrárias à cultura do eucalipto. Dentre mitos e verdades estão afirmações de que o
eucalipto seca e empobrece o solo, gera um deserto verde e que resulta em poucos
benefícios sociais, econômicos e ambientais para os municípios e a região, além de não
ser um local apropriado a fauna, desalojada de seu habitat natural. Para a entidade, a qual
reúne as principais empresas florestais da Bahia, o Brasil possui 7,74 milhões de
hectares plantados de eucalipto, pinus e outras espécies, em uma área correspondente a
0,9% do território nacional. O setor brasileiro de árvores plantadas é responsável por
91% de toda a madeira produzida para fins industriais no País − os demais 9% vêm de
florestas nativas legalmente manejadas. A utilização de madeiras certificadas e
produzidas de forma sutentável levou a uma melhor aceitação das atividades desta
empresa, agregando valor à marca da mesma.
Em decorrência de uma forte pressão negativa e críticas de seus principais
stakeholders, e também para conhecer melhor seu território de atuação, em 2012, a
Bracell Bahia contratou uma consultoria externa especializada para elaborar um
diagnóstico socioeconômico. O documento, disponibilizado pela empresa para essa
pesquisa, trouxe subsídios que possibilitaram a elaboração e implementação de sua
Política de Responsabilidade Social e Ambiental, com quatro principais pilares:
educação, empreendedorismo, agronegócio e diálogo permanente. Este último foi
necessário, visto que o diagnóstico apontou, depois de ouvir as comunidades vizinhas,
que a empresa era ausente e não havia ações de parceria para o desenvolvimento da
região. Oito anos depois do diagnóstico, a empresa vive outro cenário: são 26 programas
e projetos socioambientais estruturados, alcançando 65 mil pessoas nas mais de 300
comunidades vizinhas aos plantios de eucalipto, nos 31 municípios onde atua. No
organograma da empresa, o setor de Responsabilidade Social faz parte de uma Gerência
Sênior que também reúne Relações Institucionais e Sustentabilidade, e está ligada
diretamente à alta gestão da empresa, o que possibilita que a tomada de decisão de seu
investimento social esteja alinhada às estratégias de negócio. Outro passo importante
dado foi a implementação de sua Política de Sustentabilidade, em 2016, a qual está
publicada no site da empresa e que traz como base a filosofia de que tudo que a empresa
realiza “deve ser bom para a comunidade, bom para o país, bom para o clima e bom para
os clientes. Só então será bom para a empresa” (BRACELL, 2020). A política está
dividida em sete temas, ou assuntos, dentre eles, o desenvolvimento de comunidades
locais. Nesse trecho, o documento dá as orientações para o trabalho que a empresa
realiza nas mais de 300 comunidades vizinhas. No passo a passo estão: conhecer o
contexto local e realizar o engajamento das partes interessadas; elaborar e implementar
os projetos com o envolvimento das comunidades na tomada de decisão; apoiar o
desenvolvimento da região por meio do fortalecimento dos arranjos produtivos locais;
investir na educação; proteção ambiental; estabelecer parcerias; dar preferência a
projetos estruturantes em detrimento aos filantrópicos; estar engajada com os Objetivos
do Desenvolvimento Sustentável, sendo signatária do Pacto Global das Nações Unidas;
monitorar indicadores sociais; e priorizar comunidades tradicionais além das que estão
na área de sua atuação (BRACELL, 2020). Sobre o processo de conhecer o contexto
local a percepção da organização está refletida na fala:
[...] No caso dos projetos de investimento social privado, esse diálogo é
216
permanente e realizado desde o início da definição de qualquer projeto.
As comunidades apresentam muitas demandas que são de
responsabilidade do governo, assistencialistas, que entendem que a
empresa tem condições de assumir. Nossa empresa procura sempre se
distanciar desta linha de atuação. Nosso objetivo é, nesse caso, ser um
articulador no território. A empresa acredita que, desenvolvendo as
pessoas, elas podem estar aptas para lutar por mais e não ficarem
dependentes de nenhuma organização pública ou privada (GERENTE
SÊNIOR DE RELAÇÕES CORPORATIVAS, COMUNICAÇÃO,
DIGITAL E SUSTENTABILIDADE NA BRACELL).
Tal argumentação é validada pelo representante da organização social atendida pela
empresa, conforme depoimento abaixo registrado em entrevista:
“[...] a empresa sempre ouve a gente. Perguntou qual nossa demanda, se
havia algum projeto que queremos fortalecer ou se existe algum
conhecimento que pode ser trabalhado para gerar renda, como foi o caso
do Farmácia Verde” (ASSOCIAÇÃO DO CANGULA).
Dentre os projetos sociais desenvolvidos pela Bracell Bahia, elencamos aqueles com
destaque maior e foco na proteção dos ecossistemas:
Projeto de Coleta de Resíduos de Madeira: o desmatamento da Mata Atlântica
tem várias vertentes. Dentre elas a cultural, onde pequenos produtores rurais retiram
madeira nativa para uso em fornos de carvão, atividade ilegal, ou para subsistência. Na
operação florestal, após a colheita da floresta de eucalipto, as ponteiras, partes mais finas
que ficam no topo das árvores, são descartadas. No solo elas viram adubo que reforça a
saúde da terra para o próximo ciclo de plantio no local. Durante muitos anos houve o
conflito entre empresa e os pequenos produtores por causa dessa madeira. Em retaliação
à empresa, havia altos índices de incêndios as pilhas de eucalipto, furto de madeira,
principalmente de áreas de florestas nativas da empresa, bloqueios do transporte de
madeira nas estradas, dentre outros. Após muitas situações de conflito a Bracell
entendeu que poderia transformar aquele cenário negativo em oportunidade. Dessa
forma a empresa conseguiu validar junto a Superintendência do Ministério do Trabalho
um projeto social para que aquelas pessoas, pequenos produtores rurais, pudessem
coletar os resíduos da madeira de eucalipto para uso próprio ou até mesmo para venda
para cerâmicas, por exemplo, a partir de um procedimento elaborado pela Bracell com o
aval da Superintendência do Trabalho. Nele, comunidades organizadas em associações
ou cooperativas são capacitadas e precisam seguir uma série de protocolos antes de
entrar nas áreas da empresa para realizar a coleta dos resíduos, por exemplo o uso de
EPI´s, áreas de vivência para os momentos de descanso, dentre outros. O projeto tem
reduzido significativamente os conflitos e a pressão por madeira nativa, e o melhor, tem
contribuído com a geração de renda dessas comunidades. Apenas em 2020, cerca de 2
mil pessoas que participaram do projeto geraram mais de R$ 6 milhões de reais de renda.
Além disso, os índices de incêndios cairam pela metade (BRACELL, 2020)
Artesanato de Cipó e Piaçava: também é cultural que os artesãos do Litoral Norte
baiano coletem o cipó e piaçava da Mata Atlântica. Nas florestas preservadas pela
Bracell foram mapeados 130 artesãos que precisam entrar em área privada para
realizarem a coleta. Com o intuito de preservar a floresta e manter a sustentabilidade
dessa atividade a Bracell juntamente com os mesmos elaborou o Plano de Manejo da
Piaçava. No documento estão registrados os saberes dessas populações, ou seja, quais as

217
maneiras de realizar a coleta sem esgotar a matéria-prima. Além disso, os artesãos foram
cadastrados e hoje podem circular livremente nas áreas de mata nativa da empresa desde
que munidos com a identificação do projeto. Todos receberam capacitações de
empreendedorismo para ampliar a geração de renda com o artesanato.
Apicultura: para utilização sustentável da Mata Atlântica nas dependências da
Bracell, foi implementado o Projeto Polinizadores. No passado era comum as operações
se depararem com caixas clandestinas com abelhas, deixadas sem nenhuma ordenação
dentro das áreas da empresa. O que pelo risco de acidentes, precisavam ser retiradas. Na
maioria das vezes as caixas não possuíam nenhum registro de propriedade o que
dificultava o contato com o apicultor. A partir de 2015, a empresa implementou o projeto
de apicultura onde dentre as ações estava o ordenamento das atividades nas áreas de
nativa da empresa, mediante a um cadastro e organização das atividades. Hoje, o projeto
evoluiu e junto a 160 apicultores a empresa está em fase final da implantação da primeira
unidade de criação de abelhas rainha do Litoral Norte, o que vai fazer com que a
produção seja ampliada.
O Projeto de Educação Continuada iniciou em 2014, com a parceria da rede
pública e execução do Instituto Chapada de Educação, com o objetivo de não apenas
levar formações para os professores do território, mas, também, buscar articular um
arranjo de desenvolvimento regional em prol da educação, estabelecendo a mobilização
e cooperação, além de consolidar as políticas públicas de formação continuada desses
educadores. Participam do projeto cerca de 2.300 professores da rede pública de oito
municípios, com impacto em 36 mil alunos. Os principais indicadores de evolução do
projeto são o IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e o índice de
alfabetizados. No início do projeto, tanto o IDEB quanto o índice de alfabetizados dos
municípios onde o projeto era executado configuravam entre os menores da Bahia. Após
seis anos de implementado, pode-se perceber o aumento do IDEB e também do índice de
alfabetizados, sendo que, em alguns municípios, já atingiu os 100%. Além dos projetos
de geração de renda com cunho ambiental realizados pela reflorestadora, foi também
necessário reforçar a comunicação para a preservação. Para isso a empresa tem em seu
portfólio projetos de Educação Ambiental onde são trabalhados temas que tem como
objetivo proteger as florestas e contribuir para criação de uma cultura prevencionista.
Um exemplo é o projeto Ecomunidade. Após um diagnóstico ambiental realizado pela
empresa, que atestou que as comunidades depositavam lixo em áreas de preservação.
Dessa forma foi preciso iniciar um trabalho de conscientização. Dentre as atividades
estão: formação de ecoagentes, gincanas ecológicas, oficinas de reciclagem,
implantação de projetos ambientais nas comunidades; produção de vídeos sobre temas
ambientais para apoiar a atuação dos agentes ecológicos; e premiação de ações
ambientais desenvolvidas pelos Ecoagentes. Também é realizada articulação com o
Poder Público para garantir que a coleta do lixo esteja regular. As comunidades que
conseguem manter o ambiente das áreas preservadas sem lixo recebem uma área de
lazer com um parque de eucalipto que também é mantido pela comunidade. As
alternativas criadas pela empresa possuem efeito positivo na geração de renda,
reduzindo a pressão sobre os ecossistemas e à caça predatória como ilustra o seguinte
depoimento do presidente de uma organização social:
[...] A empresa solicitou uma reunião com a comunidade, mobilizou todo
mundo, porque o viveiro tinha sido desativado e havia muitas mulheres
desempregadas. A proposta da empresa era desenvolver um projeto onde

218
as pessoas tivessem uma renda, mas não tinha carteira assinada. A
comunidade aceitou o projeto. Foi discutido sobre termos um curso de
costura. Aceitamos. Foi um curso de um ano e meio de costura industrial
(PRESIDENTE DA COOPECIR).
Verificou-se que o uso das ferramentas do Marketing Social se dão indiretamente. Os
programas de geração de renda, por exemplo, reduziram o impacto da caça predatória e
do roubo de madeira nativa.
[...] As certificações florestais, em especial o selo CERFLOR do
INMETRO/ABNT promoveram um redirecionamento da empresa com
foco no diálogo com as comunidades. Com os programas de
complementação de renda observou-se uma redução significativa nas
queimadas criminosas nas regiões de nativa. Houve uma expansão de
36% vegetação nativa em estágio avançado (GERENTE DE MEIO
AMBIENTE E CERTIFICAÇÕES.
Há iniciativas que correlacionam-se em direção ao Marketing Social como os
projetos de educação ambiental, o monitoramento de recursos hídricos e o programa de
“Amigos da Floresta”, de combate a incêndios florestais. Mas essas iniciativas não
compõem ainda um arcabouço lógico que possam conscientizar dos problemas que
podem ocorrer, com reflexos em escala planetária, com a alimentação de animais
silvestres.
4.2 A GESTÃO SOCIOAMBIENTAL DA VALE NO PARÁ
Em 1967, nascia o Projeto Carajás e a história da Companhia Vale do Rio Doce no
Pará, quando foi descoberta a primeira jazida de minério de ferro da região, onde está
localizada a maior planície mineral do planeta. Mais precisamente no município de
Canaã dos Carajás, sudeste do estado, está o Complexo S11D Eliezer Batista, maior
investimento privado realizado no Brasil na segunda década do século 20. O minério de
ferro é o carro chefe da empresa no Brasil, e o encontrado em Carajás é considerado o
melhor do mundo. A VALE atua em 105 municípios no país e mantem relacionamento
com 1.149 comunidades, destas, 443 são prioritárias, onde estão seus maiores esforços.
Em 2019, a empresa lançou o Portal “ESG Environmental, Social and Governace”, um
canal onde é possível encontrar dados ambientais, sociais e de governança. Segundo o
portal, a empresa investe em ações potencializadoras, preventivas, e compensatórias,
relacionadas a impactos socioeconômicos de operações, projetos ou pesquisa mineral.
Além de ações que contribuam para o desenvolvimento e a melhoria da qualidade de
vida nos territórios onde atua (VALE, 2020).
A história da VALE é acompanhada de grande desconfiança sobre sua ação
socioambiental, em especial, após a sua privatização durante o governo FHC (Fernando
Henrique Cardoso) em 6 de maio de 1997. Coelho et al. (2016) pesquisaram a relação
entre mineração e desenvolvimento em municípios onde a VALE opera. Eles avaliam
que uma das principais mudanças entre a gestão pública e privada da empresa é a
imposição de um modelo de mineração mais predatório e antidemocrático.
Em janeiro de 2012, por exemplo, a mineradora foi eleita como a pior empresa do
mundo,no que refere-se a direitos humanos e meio ambiente, pelo Prêmio Public Eye,
premiação realizada desde o ano 2000 pelas ONGs Greenpeace e Declaração de Berna.
O motivo: uma “[...] história de 70 anos manchada por repetidas violações dos direitos
humanos, condições desumanas de trabalho, pilhagem do patrimônio público e pela
219
exploração cruel da natureza” (ESTADO DE SÃO PAULO, 2012).
Entretanto, a postura da empresa tem outras vertentes mais socialmente
responsáveis. Por exemplo, segundo a Fundação Vale, braço social da empresa, em
2019, cerca de 770 mil pessoas foram beneficiadas por seus projetos sociais em 68
municípios, nos seis estados onde atua: Pará, Maranhão, Minas Gerais, Espírito Santo,
Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro. A empresa realiza sua gestão social por meio da
Diretoria de Investimento Social integrada com a Diretoria Executiva de
Sustentabilidade e Relações Institucionais, a qual reúne os projetos e programas
socioculturais e ambientais da empresa de cunho Obrigatório e Voluntário, incluindo a
Fundação Vale. A empresa também é mantenedora do Fundo Vale, uma Organização da
Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), criada em 2009.
Para realizar o Investimento Social, a empresa traz como diretrizes, entre outras:
alinhamento à Estratégia de Sustentabilidade do Sistema Vale; implementação em
territórios impactados pelos negócios ou de interesse para a empresa; prioridade para
comunidades em situações de vulnerabilidade; e ações estruturantes, com resultados
mensuráveis e prazo de conclusão definido (VALE, 2020). Com 50 anos de atuação, a
Fundação Vale coloca-se como uma referência do país em desenvolvimento territorial.
Inclusive, detém a autoria do conceito de Parceria Social Público-Privada (PSPP), o qual
trata da integração entre governo, iniciativa privada e comunidades para maximizar os
impactos positivos do Investimento Social Privado (VALE, 2020). A empresa afirma,
em suas publicações, que não realiza investimentos em ações que sejam de obrigação do
Poder Público, porém, pode complementá-las no caso de calamidades públicas, como no
atual cenário de pandemia. A Fundação Vale apoia a gestão de espaços culturais e
mantém estações de conhecimento (espaços socioeducativos que promovem atividades
com foco na formação integral de 4.500 crianças e adolescentes de 6 a 17 anos e suas
famílias). As atividades buscam ampliar as oportunidades educativas no contraturno
escolar, nos eixos de esporte, cultura, cidadania e multiletramento (VALE, 2020).
Segundo a empresa, apenas na região de Canaã dos Carajás, existem 4.288 famílias
beneficidas diretamente, com investimento de R$4,2 milhões. Também são realizadas
articulações com entidades financiadoras. Em 2020, foram mapeados 437 stakeholders,
em 131 comunidades, com a realização de 133 reuniões do comitê gestor. “O foco é na
agricultura familiar, mas são trabalhadas as cadeias produtivas, o empoderamento das
mulheres, capacitação de jovem, todos os temas fazendo a ligação com os ODS”,
conclui a gerente de sustentabilidade da VALE. A organização atua não apenas em
Canãa dos Carajás, mas também em outros municípios da região sudeste do Pará, como
Paruapebas e Marabá, com projetos de geração de emprego e renda e proteção
ambiental. São 19 associações cadastradas e 12 projetos em execução. Além da empresa
e Poder Público, há também os convênios para desenvolvimento de projetos. Um deles é
utilizado para a Sala de Apoio ao Desenvolvimento Econômico, um núcleo com
estrutura formada por um gerente de projetos, dois analistas e um gerente financeiro, que
tem como atribuição apoiar as comunidades na elaboração e gestão dos projetos sociais
desenvolvidos. Há sinais de que a VALE atua em constante diálogo com suas
comunidades e tais diálogos são desdobrados em ações de cunho socioambiental como
ilustram os depoimentos.
[...] Depois que viemos para o Assentamento, foi criada uma associação.
Começamos a ter reuniões do comitê para discutir as necessidades e os
projetos foram construídos assim. O principal é o de agricultura familiar.
220
Mas já iniciamos também os projetos de avicultura, suinocultura,
piscicultura e fruticultura. Além disso, têm alguns pras mulheres, de
costura, serigrafia, saboaria (PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DOS
PRODUTORES DO ASSENTAMENTO AMÉRICO SANTANA).
[...] A empresa sempre consulta a associação para elaborar os projetos. Nas reuniões
discutimos tudo, sobre saúde, educação [...] (PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO
COMUNITÁRIA OURO VERDE).No território estudado de Carajás existe o Parque
Zoobotânico Vale que tem características bem próximas de um programa de Marketing
Social.
[...] Nos últimos 10 anos, mais de 1 milhão de pessoas viveram a
experiência de conhecer um pedacinho da Floresta Amazônica visitando
o Parque Zoobotânico Vale (PZV), considerado referência em
conservação e preservação da biodiversidade amazônica. Localizado em
Parauapebas, sudeste do Pará, o espaço fica no coração da Floresta
Nacional de Carajás, Unidade de Conservação Federal fiscalizada pelo
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio),
com o apoio da Vale. O passeio pelo Parque possibilita ao visitante
conhecer mais sobre espécies da fauna amazônica a partir de um plantel
de aproximadamente 270 animais, com destaque para aves e mamíferos.
Entre elas, espécies ameaçadas de extinção, como o Harpia (gavião-real),
onça-pintada, suçuarana, macaco-aranha-da-testa-branca, macaco-
aranha-da-cara-vermelha e o macaco cuxiú (VALE, 2018).
Durante o passeio no parque o visitante recebe instruções e acessa informações sobre
a necessidade de preservação da fauna e flora amazônica. Nos últimos anos, a
mineradora vem atravessando uma fase conturbada de sua história, após acidentes em
sequência em suas instalações, resultando em centenas de vítimas fatais, explicam
Fernandes et al (2020). O Relatório de Sustentabilidade 2019 da empresa traz as ações
desenvolvidas para enfrentar e minimizar os efeitos dos últimos acontecimentos.
Independentemente do impacto à imagem e reputação da marca, a empresa mantém seus
investimentos sociais na região do Pará (VALE, 2018). Há, entretanto, sinais positivos
de uma nova postura para o enfrentamento de situações críticas como o acontecido no
rompimento da barragem de Brumadinho.
[...] É senso comum que a mineração tem um importante papel social e
cria um impacto de proporções significantes onde atua, tanto positivo
quanto negativo. A empresa entende que faz um bom trabalho e tem a
comprovação desse entendimento, uma vez que mede o seu índice de
reputação. Antes de Brumadinho era bom, depois caiu com o acidente e
depois subiu na pandemia. A Vale tem hoje 48% de reputação positiva.
Isso se deve ao fato do protagonismo que teve diante a pandemia
(DIRETOR DE GEOTECNIA DA VALE).
5 VERIFICAÇÃO DA EFETIVIDADE DOS ILP DOS TERRITÓRIOS AFETADOS PELA
BRACELL E PELA VALE
Estudou-se a base da dados do PNUD (2013) com 417 cidade da Bahia e 142 cidades
do Pará. Excluiu-se da base de dados as capitais do Estado (Salvador e Belém) por serem
outliers com impacto na análise e interpretação dos fenômenos. O teste de normalidade
Kolmogorov-Smirnov efetuado sobre o indicador de IDH das cidades do Estado do Pará
e do Estado da Bahia e apresentam distribuição normal (p-value > 0,100) ilustra a Figura
1.
221
Figura 1 – Teste Kolmogorov – Smirnov sobre dados IDH Estado do Pará

Fonte: elaborado pelos autores com base nos dados do PNUD (2013)
Efetuou-se testes de hipóteses (two samples equivalence tests) para as duas
populações comparando-se as áreas de influência da VALE e da BRACELL com as
demais cidades dos Estados do Pará e da Bahia, respectivamente. O quadro 2 ilustra os
dados retirados do Minitab. Pode-se inferir então que em ambos os casos a amostra de
cidades sob influência da VALE e da BRACELL nos projetos estudados têm uma
influência positiva no IDH municipal.
Quadro 2 – Testes Estatísticos

Fonte: Elaborado pelos autores com base na saída do Minitab.


Os diagramas box plot com os dados pesquisados ilustram bem os resultados
apontados pelos testes estatísticos:
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Trazer à análise a convergência entre Investimento Privado e a necessidade efetiva
do território contribuiu para compreender não apenas como a gestão socioambiental de
grandes corporações é orientada, mas, principalmente, como é realizado o envolvimento
dos atores sociais no processo. É possível verificar que o envolvimento dessas
populações na tomada de decisões e o atendimento ao que de fato é necessidade legítima
222
do território impactado são o processo mais assertivo para sua transformação.
Figura 2 – diagrama box plot

Fonte: elaborado pelos autores com base nos dados do PNUD (2013)
Ambas as empresas estudadas neste trabalho vêm não apenas realizando aportes de
recursos, mas planejando seus programas e projetos para atender a demandas do
território. Porém, entende-se que o protagonismo desempenhado pela iniciativa privada
no desenvolvimento local não é apenas para expor a “boa vontade em contribuir”, mas,
sim, por ser necessário à sustentabilidade de seus negócios, um melhor posicionamento
de suas marcas e melhoramento de suas imagens e reputações organizacionais,
sobretudo, a partir de pressão de investidores estrangeiros.
Foi possível analisar com base nos dados do IDH Municipal que as ações
socioambientais da VALE e da BRACELL em seus territórios possuem impacto positivo
no aumento da qualidade de vida da sociedade no entorno, o que colabora com a pressão
ambiental sobre o desmatamento e a caça predatória.
Além da melhora do IDH, faz se necessário a formulação e divulgação de Marketing
Social, no intuito da eventual modifiação dos comportamentos atuais, demonstrando os
perigos do desmatamento, em termos do Aquecimento Global e o contato indesejado
com espécimes da fauna local, no intuito de se prevenir eventuais novas pandemias.
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224
MONITORAMENTO DO ESGOTAMENTO
SANITÁRIO NO COMBATE À COVID-19

Maria Teresa Casadei (1)


Juliana de Mendonça Casadei (2)
José Carlos de Oliveira (3)

RESUMO. Trata o presente trabalho de investigar o processo e a engenharia do


monitoramento do esgoto sanitário como forma de combater a Covid-19. Sabe-se que
uma das formas de contaminação pela SARS-CoV-1 é também a partir do esgoto
sanitário e fezes humanas, motivo pelo qual diversas pesquisas foram realizadas com
o intuito de averiguar o grau de risco de contaminação da SARS-CoV-2 da mesma
forma. A partir dessa preocupação, o monitoramento do esgoto sanitário passou a ser
uma ferramenta útil na prevenção e no combate a Covid-19 e este trabalho trouxe
dados quantitativos a partir de uma pesquisa bibliométrica com a finalidade de
identificar esses estudos e mapear as localidades que se utilizam dessa ferramenta no
combate a Pandemia, realçando-se o papel da ANA - Agência Nacional de Águas e
Saneamento Básico. A descrição desse processo de coleta de dados para
monitoramento, bem como a apresentação dos seus resultados também foram objeto
desta pesquisa.

Palavras-chave: Covid-19. Monitoramento. Esgoto sanitário.

(1) Doutora em Ciências/USP; Mestranda em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos/UNESP; e-mail:


casadei.mtc@gmail.com.
(2) Doutoranda em Desenvolvimento Local/UCDB; Mestre em Saneamento Ambiental e Recursos
Hídricos/UFMS; e-mail: ju.casadei@gmail.com.
(3) Docente na Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita filho" UNESP na graduação e nos
programas de pós-graduação da FCHS/Unesp e no Programa de Mestrado ProfÁgua/Unesp; e-mail:
jose.c.oliveira@unesp.br.

225
1 INTRODUÇÃO: A COVID-19
Desde que a Organização Mundial da Saúde declarou Emergência de Saúde
Pública de Importância Internacional por conta do surto de Covid-19 (Coronavírus
Disease 2019), a comunidade científica se posicionou em alerta. Além da
preocupação com o tratamento e prevenção da doença, circulou a necessidade de se
descobrir as fontes e formas de contágio. Nesse sentido, pesquisas iniciadas desde o
surgimento do SARS-CoV-1 contribuíram para demonstrar que o contágio era
possível pela disseminação do vírus e seu respectivo material genético pelas redes de
esgoto a partir dos dejetos humanos e demais resíduos. Essa evidência ampliou a
preocupação sobre a letalidade da Covid-19 (SARS-CoV-2), especialmente, sobre a
possibilidade de sua transmissão e retransmissão ocorrer da mesma forma.
Pensando em termos de controle do saneamento, especialmente o esgotamento
sanitário, a Covid-19 e essa possibilidade de transmissão é de fato ensejadora de
preocupação, pois como destacou a Fiocruz, na realidade não se trata de uma
pandemia, mas de uma sindemia¹, pois a interação com o ambiente e aspectos sociais
fazem com que essa doença não seja apenas uma comorbidade, mas o resultado
agravado de uma série de outros fatores, como por exemplo, as péssimas condições de
saneamento básico no Brasil.
Por esse motivo, o monitoramento do esgoto sanitário passou a integrar o radar das
autoridades com maior atenção. Mesmo sem dados concretos sobre a transmissão de
Covid-19 pelo esgoto, é certo que o monitoramento permite traçar estratégias para a
prevenção e controle da doença. E, nesse sentido, o presente trabalho buscou
identificar fontes e mapear os trabalhos acerca da engenharia do monitoramento do
esgoto sanitário como forma de combate à Covid-19.
2 BIBLIOMETRIA DA COVID-19 E ESGOTAMENTO SANITÁRIO
Em uma análise bibliométrica realizada a partir de consulta à base de dados da Web
of Science, para os termos “Covid-19” associado ao termo “wastewater”, foram
identificados um total de 742 publicações desde 2020 até o mês de abril de 2022
(Figura 1). O ano de 2021 se destacou, com um total de 493 documentos, dentre os
quais 379 são artigos e 94 artigos de revisão (WOS, 2022).
Do conteúdo publicado no período pandêmico, 220 se originam dos Estados
Unidos da América, 89 da China, 82 da Índia e 64 da Austrália. O Brasil contribuiu
com um total de 32 publicações no período, sendo a maioria no ano de 2021,
perfazendo 20 publicações (WOS, 2002).
Observa-se também que 65,50% das publicações foram publicadas na categoria
“Ciências Ambientais”, seguido de: Engenharia Ambiental (20,35%); Recursos
Hídricos (17,52%); Saúde Ocupacional e Ambiental Pública (13,75%);

¹ Sindemia é um termo utilizado em referência a combinação de elementos inclusive de ordem social que
ampliam os resultados de uma respectiva doença. De acordo com o artigo publicado pela Fiocruz, a origem
dessa palavra advém de um neologismo pela junção das palavras “sinergia” e “pandemia”, utilizado por
Merrill Singer, médico e antropólogo americano, na década de 1990, ao explicar que duas ou mais doenças
podem interagir e causar danos muito maiores do que a soma de ambas. Singer também esclareceu em
entrevista à BBC News Mundo que: “O impacto dessa interação também é facilitado pelas condições
sociais e ambientais que, de alguma forma, aproximam essas duas doenças ou tornam a população mais
vulnerável ao seu impacto”. (FIOCRUZ, 2020).

226
Microbiologia (8,22%); Engenharia Química (5,79%); entre outras. Com relação às
áreas de pesquisa, as publicações são categorizadas principalmente como: Ecologia e
Ciências Ambientais (65,63%); Engenharia 23,85%); e Recursos Hídricos (17,52%);
dentre outras áreas (WOS, 2022).
Figura 1 – Número de publicações contendo os termos “covid-19” e “wastewater”.

Fonte: Pesquisa dos autores à Coleção principal da Web of Science, em abril/ 2022
Os autores que mais publicaram a respeito foram Bibby K (24 artigos), Bivins A
(22), Ahmed W (19), Kumar M (17), Kitajima M (15), Simpson SL (11), Boehm AB
(10), La Rosa G (10), Haramoto E (9) e Jones DL (9). A maioria dos escritos,
totalizando 730 publicações, adotaram o idioma inglês, seguido do português (4),
francês (3), espanhol (2), além de outras línguas (WOS, 2022).
A análise demonstra um crescimento no interesse a respeito dessa temática pela
comunidade científica no mundo.
3 PRODUÇÃO CIENTÍFICA BRASILEIRA: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA
Inicialmente, cumpre afirmar que há algumas lacunas no conhecimento
atualmente disponível sobre a Covid-19 e o esgotamento sanitário, direcionando para
a necessidade de se produzir pesquisa e desenvolvimento. Uma revisão crítica
realizada por Bandala et al (2021) na literatura atual sobre os impactos potenciais do
vírus no caminho das águas residuais para as águas superficiais, deram conta, em
primeiro plano, que os efeitos da pandemia sobre o meio ambiente permanecem sem
esclarecimento. Em segundo plano, ao avaliar as pesquisas foi relatada a presença
potencial do vírus SARS-CoV-2 e fármacos usados no combate aos efeitos da Covid-
19 nas águas residuárias, embora se desconheça os fatores de influência na
transmissão e sobrevivência do vírus nos ecossistemas aquáticos.
De fato, vários estudos relataram a eliminação fecal do vírus por indivíduos
sintomáticos e assintomáticos infectados, sendo que sua quantificação nas águas
residuais pode colaborar no rastreamento da propagação da doença em uma
população (Claro et al, 2021). Isto porque o SARS-CoV-2 é excretado nas fezes
humanos e posteriormente eliminado na rede de esgoto, quando existente, ou no meio
ambiente, nos locais de saneamento básico precários (Aguiar-Oliveira et al, 2020).

227
Sodréa et al (2020) observam que a capacidade de monitorar a propagação de uma
doença é essencial para as práticas relacionadas à sua prevenção, intervenção e
controle, o que coloca em evidência a epidemiologia baseada nas águas residuais,
além de destacá-la como uma ferramenta inovadora de monitoramento da
disseminação viral entre as comunidades, mapear as curvas de contágio, além de
identificar os hotspots, dentre outras possibilidades.
Além disso, quando associado à coleta de dados sociodemográficos, o
monitoramento do vírus no sistema de esgotamento sanitário torna possível a
construção de um modelo de gestão do conhecimento, que permite tecer previsões
sobre o aparecimento da doença ou mesmo a diminuição dos casos, contribuindo na
tomada de decisão dos gestores (Mariosa et al, 2022).
No mundo, há diversos relatos que demonstram a presença do vírus nas águas
residuais. Em sua revisão, Aguiar-Oliveira et al (2020) identificaram relevantes
investigações nas Américas, na Europa, na Ásia, na Oceania e no Oriente Médio.
No Brasil, alguns experimentos foram realizados para identificar a presença do
vírus no sistema de esgotamento sanitário. Uma delas, na região do ABC paulista,
realizada por Claro et al (2021), constatou uma correlação positiva entre a carga viral
nas águas residuárias e os dados epidemiológicos/clínicos, em um intervalo de duas
semanas.
Importante destacar que, em que pese as vantagens, há alguns desafios associados
ao monitoramento para fins de vigilância, tais como a taxa de falso-positivo e
negativo, a relação efetiva entre a carga viral e a incidência da doença, além da
persistência viral (Aguiar-Oliveira et al, 2020). Os autores também mencionam um
suposto impacto de eventos climáticos extremos, tais como inundações e
tempestades, nas variações do fluxo de águas residuais e nas taxas de detecção de
vírus.
No ambiente aquático, pôde-se observar alguns estudos que apontaram o uso
excessivo do cloro em estações de tratamento de efluentes para melhorar os processos
de desinfecção e evitar a liberação de vírus ativo em corpos hídricos receptores
(Bandala et al, 2021).
Desta feita, o esforço da comunidade científica brasileira em investigar o tema
resultou em dezenas de artigos publicados em periódicos entre o período de 2020 a
2022, que se constituem em importante base de estudo, sistematizados no Quadro 1.
Quadro 1 – Artigos em periódicos produzidos sobre o tema.

Título Referência
Ano: 2020
Wastewater-Based Epidemiology (WBE) and Viral Detection in
Polluted Surface Water: A Valuable Tool for COVID-19 Aguiar-Oliveira
Surveillance - A Brief Review et al. (2020)
Wastewater-Based Epidemiology: Global Collaborative to Bivins et al.
Maximize Contributions in the Fight Against COVID-19 (2020)
continua

228
Costa et al.
Water, Sanitation and Covid-19 in the Amazon (2020)
Mariosa et al.
Sociodemographic indicators applied to the Covid-19 syndemic (2020)
Epidemiologia do esgoto como estratégia para monitoramento
Sodré et al.
comunitário, mapeamento de focos emergentes e elaboração de
(2020)
sistemas de alerta rápido para Covid-19
Ano: 2021
A satellite-based investigation into the algae bloom variability in Alcantara et al.
large water supply urban reservoirs during COVID-19 lockdown (2021)
SARS-CoV-2 sewage surveillance in low-income countries: Araujo et al.
potential and challenges (2021)
Impacts of COVID-19 pandemic on the wastewater pathway into Bandala et al.
surfasse water: A review (2021)
Padronização de método de concentração e extração de ácidos
nucleicos em amostras de esgoto sanitário: uma ferramenta de baixo Cabral et al.
custo para ser utilizada na vigilância epidemiológica de SARS-CoV-2 (2021)
Global occurrence of SARS-CoV-2 in environmental aquatic
matrices and its implications for sanitation and vulnerabilities in Castro et al.
Brazil and developing countries (2021)
Monitoramento do esgoto como ferramenta de vigilância
epidemiológica para controle da COVID-19: estudo de caso na Chernicharo et
cidade de Belo Horizonte al. (2021)
Long-term monitoring of SARS-COV-2 RNA in wastewater in Claro et al.
Brazil: A more responsive and economical approach (2021)
SARS-CoV-2 in Human Sewage and River Water from a Remote Fongaro et al.
and Vulnerable Area as a Surveillance Tool in Brazil (2021)
A critical review on SARS-CoV-2 infectivity in water and Giacobbo et al.
wastewater. What do we know? (2021)
Challenges and emerging perspectives of na international SARS- Mainardi &
CoV-2 epidemiological surveillance in wastewater Bidoia (2021)
Shedding light on toxicity of SARS-CoV-2 peptides in aquatic Mendonça-
biota: A study involving neotropical mosquito larvae (Diptera: Gomes et al.
Culicidae) (2021)
Assessing spatial distribution of COVID-19 prevalence in Brazil Mota et al.
using decentralised sewage monitoring (2021)
Viability of SARS-CoV-2 in river water and wastewater at different Oliveira et al.
temperatures and solids content (2021)
Wastewater-based epidemiology as a useful tool to track SARS- Prado et al.
CoV-2 and support public health policies at municipal level in Brazil (2021)
Make it clean, make it safe: A review on virus elimination via Sellaoui et al.
adsorption (2021)
SARS-CoV-2 coronavirus in water and wastewater: A critical Tran et al.
review about presence and concern (2021)
continua
229
Quantitative microbial risk assessment of SARS-CoV-2 for workers Zaneti et al.
in wastewater treatment plants (2021)
Ano: 2022*
Sampling strategies for wastewater surveillance: Evaluating the
Augusto et al.
variability of SARS-COV-2 RNA concentration in composite and
(2022)
grab samples
One-year surveillance of SARS-CoV-2 in wastewater from Barbosa et al.
vulnerable urban communities in metropolitan São Paulo, Brazil (2022)
Toxicity of spike fragments SARS-CoV-2 S protein for zebrafish: A Fernandes et al.
tool to study its hazardous for human health? (2022)
Can spike fragments of SARS-CoV-2 induce genomic instability and
DNA damage in the guppy, Poecilia reticulate? An unexpected effect Gonçalves et al.
of the COVID-19 pandemic (2022)
Application of activated carbon functionalized with graphene oxide
for efficient removal of COVID-19 treatment-related Januário et al.
pharmaceuticals from water (2022)
Revisão dos Procedimentos e Desafios Associados à Vigilância Mainardi &
Epidemiológica do SARS-CoV-2 em Águas Residuais Bidoia (2022)
First case of SARS-CoV-2 RNA detection in municipal solid waste Mondelli et al.
leachate from Brazil (2022)
“pySewage”: a hybrid approach to predict the number of Sousa et al.
SARS-CoV-2-infected people from wastewater in Brazil. (2022)
Um modelo de mistura para determinar a composição da variante Valieris et al.
SARS-Cov-2 em amostras agrupadas (2022)
(*) até abril de 2022
Fonte: elaborado pelos autores
4 A ENGENHARIA DO MONITORAMENTO
Atualmente, 6 capitais brasileiras (Curitiba, Belo Horizonte, Fortaleza, Brasília,
Recife e Rio de Janeiro) têm suas estruturas de esgotamento sanitário monitoradas
para fins de controle sobre a expansão da Covid-19. A denominada “Rede
Monitoramento Covid Esgotos” foi criada com a finalidade de ampliar dados e
informações sobre a Covid-19 e conta com a coordenação da Agência Nacional de
Águas e Saneamento Básico (ANA) e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia
em Estações de Tratamento de Esgotos Sustentáveis (INCT ETEs Sustentáveis),
apoiados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq).
A ANA divulga em seu sítio periodicamente boletins sobre a condição das análises
de cargas virais e ainda disponibiliza uma série de dados comparativos em seu painel
de monitoramento.
Dentre os dados confrontados estão os das doses de vacinação e os de cargas virais.
Tomando como exemplo o município de Belo Horizonte, a evolução temporal das
cargas virais no esgoto demonstra que após a 3ª dose da vacina houve uma diminuição

230
da carga viral, sendo que a coleta demonstrou uma considerável queda nos meses de
março e abril e uma sensível majoração no mês de maio (Figura 2).
Figura 2 – Evolução temporal das cargas virais no esgoto e da vacinação

Fonte: ANA, 2022


Em outros municípios a análise foi feita sobre a evolução temporal das cargas
virais no esgoto e a relação de utilização dos leitos hospitalares para internações por
Covid, também identificando-se proporcional diminuição da linha de grandeza
comparativa.
Outro apontamento que merece registro é quanto à forma de coleta e análise das
amostras dos esgotos. A metodologia utilizada é a recomendada pela OMS, ou seja, a
da ultracentrifugação, tradicionalmente usada na análise da concentração de vírus
associada à técnica da transcrição reversa, seguida de reação em cadeia da polimerase
(RT-PCR) em tempo real.
Dessa forma é possível identificar o material genético do vírus (ácido ribonucleico
- RNA viral) no esgoto, permitindo o melhor controle da doença.
Essa perspectiva de análise supre a lacuna deixada pela impossibilidade de
testagem em massa da população devido ao alto custo que isso poderia proporcionar
ao Estado, além de ser impossível ou ineficaz a imposição da obrigação da testagem.
Pode-se afirmar, portanto, que a partir do esgoto é possível monitorar o vírus de forma
indireta, localizando regiões em perigo e mais afetadas, tecendo assim a melhor
estratégia para o combate da Covid-19.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do que foi exposto neste trabalho, é possível concluir que houve esforços
da comunidade científica em construir um arcabouço teórico a respeito do
monitoramento do vírus da Covid-19 nas águas residuais, especialmente no ano de
2021, tendência que continua em 2022.
Uma revisão sistemática foi realizada à luz de diversos trabalhos científicos
brasileiros, podendo-se inferir que a epidemiologia baseada nas águas residuais
apresenta-se como uma ferramenta com potencial de produzir informações
estratégicas para a gestão da doença.

231
Por fim, destaca-se no cenário brasileiro a iniciativa da Agência Nacional de
Águas, qual seja, o controle e monitoramento da covid-19 a partir do esgoto sanitário,
que, uma vez contaminado por conter presente material genético viral, pode indicar
regiões com incidência de covid-19 e permitir ações de combate a essa doença. A
prevenção e a erradicação dependem de instrumentos como tais para a proteção da
sociedade, considerando que o diagnóstico coletivo supre a testagem em massa. E,
embora não se possa ainda provar o nexo causal entre a doença e a contaminação a
partir do esgoto como no caso da SARS-CoV-1, é possível identificar a localidade que
carece de maior atenção por parte do Estado no que se refere a políticas de
atendimento à saúde.
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234
PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM
TEMPOS DE PANDEMIA DE COVID-19

Patrícia Aguiar de Oliveira dos Santos (1)


Ana Paula Oliveira Becker Alvarenga (2)
Lauriê Fernanda Silva (3)
Máriam Trierveiler Pereira (4)

RESUMO. Considerando a situação emergente que se declara o meio ambiente, sendo


pauta de referência para os ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) para o
cumprimento da Agenda 2030, foram desenvolvidas práticas de educação ambiental
no formato remoto para jovens de escolas públicas, criando espaços de diálogo por
meio de metodologias ativas que possibilitaram o pensar para uma mudança de
comportamento sobre práticas corretas de reciclagem de resíduos. Não há limites para
que a educação ambiental aconteça, pois mesmo no formato remoto verificou-se o
envolvimento e a receptividade por parte dos jovens que participaram das ações por
meio do uso da metodologia ativa Aprendizagem Baseada em Projetos.

Palavras-chave: Meio Ambiente, Educação Remota, Reciclagem, Metodologias


Ativas, Reflexão.

(1) Mestranda IFPR - Instituto Federal do Paraná campus Umuarama - Pr. E-mail:
senac.profpatricia@gmail.com. Link para o Lattes: http://lattes.cnpq.br/9963728185981176
(2) Mestre - UNESPAR - Universidade Estadual do Paraná campus de Campo Mourão - Pr. E-mail:
profanabecker@gmail.com. Link para o Lattes: http://lattes.cnpq.br/7635106870971910
(3) Mestranda UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná, campus Cascavel - Pr. E-mail:
lauriesilva1588@gmail.com. Link para o Lattes: http://lattes.cnpq.br/0195598301943531
(4) Doutora - Docente IFPR - Instituto Federal do Paraná campus Umuarama - Pr. E-mail:
mariam.pereira@ifpr.edu.br Link para o Lattes: http://lattes.cnpq.br/6867974583171879
235
1 INTRODUÇÃO
O ano de 2020 foi marcado pelo surgimento da pandemia do novo Coronavírus, o
que provocou inúmeras mudanças no formato de vida das pessoas. Tais mudanças
refletiram significativamente na socialização dos indivíduos, que foram obrigados a
adotar o distanciamento social em busca de segurança. Em contrapartida, promoveu-
se a tecnologia como mediadora para novas possibilidades em diversas áreas, no
trabalho, na religião e principalmente na educação.
De acordo com Guedes e Macedo (2020), a pandemia acelerou os processos
tecnológicos influenciando algumas tarefas diárias que eram realizadas de forma
presencial, e nesse movimento com habilidades individuais, os indivíduos tiveram
que se adaptar e lidar com o digital, o virtual e com a inteligência artificial.
A partir desta nova realidade para a educação, escolas, professores e estudantes
tiveram que ir em busca de adequação para o ensinar e o aprender, inclusive
introduzindo efetivamente a tecnologia nesse processo. Diante do agravamento do
cenário pandêmico e tendo a certeza de que a educação não voltaria aos moldes do
ensino presencial, restou a toda comunidade escolar se reinventar.
No novo contexto de aceleração do uso da tecnologia, é urgente que as
metodologias ativas façam parte do cenário em sala de aula, mesmo sendo no formato
de aulas online, como por exemplo: sala de aula invertida, vídeos, projetos,
construção de mapas conceituais, atividades focadas em problemáticas locais
impulsionando a ação, reflexão e ação, promoção do protagonismo juvenil, dentre
outras atividades. A apropriação destas possibilidades para o ensino educacional por
parte do professor, impulsiona a motivação, principalmente nos estudantes, o que
consequentemente gera conhecimento e envolvimento de tais partes.
É preciso destacar que essa nova realidade no formato de ensino trouxe
consequências de defasagem na educação, principalmente para os países da América
Latina, conforme relatório do Banco Mundial (2021). Segundo essa fonte, que
introduz apontamentos referentes ao ano de 2020, apesar dos inúmeros esforços, a
educação está defasada para as crianças mais pobres.
Neste cenário de pandemia do Covid-19, pode haver um salto de 51% para 62,5%
de crianças que finalizam o ensino fundamental sem ter a capacidade de ler e
compreender um texto simples, podendo gerar 7,6 milhões de crianças pobres sem
aprendizagem. A América Latina pode ainda entrar no rol de países com estudantes do
ensino médio que vão ficar abaixo dos níveis mínimos de proficiência medidos pelo
resultado do PISA - Programa Internacional de Avaliação de Alunos. Em dez meses de
escolas fechadas, o relatório afirma que o nível de proficiência medido poderá
apresentar déficits na educação em nível médio. (BANCO MUNDIAL, 2021).
Portanto, verifica-se que a pandemia intensificou problemas de cunho social na
educação. Esses assuntos já foram tratados pela ONU (Organização das Nações
Unidas) em 2000 com o estabelecimento dos ODM (Objetivos de Desenvolvimento
do Milênio), que vigoraram até 2015 (ODM BRASIL, 2021). Para continuidade do
pacto global com a sustentabilidade, em 2015 foram implantados os ODS (Objetivos
de Desenvolvimento Sustentável), que definiram objetivos de melhorias em nível
mundial nas esferas econômicas, sociais e ambientais contemplando a Agenda 2030
(ODS BRASIL, 2021). Deste modo, justifica-se a implantação de diálogos e práticas
236
educacionais entre jovens em idade escolar para que possam conhecer e discutir os
principais problemas de agressão ao meio ambiente.
Quando se observam os noticiários, são vistas catástrofes ambientais e escassez de
recursos, e ficam nítidas as consequências refletidas acerca de atitudes escolhidas pela
humanidade num momento pretérito. Por isso, é de extrema importância a discussão
para uma conscientização ambiental, almejando mudanças de atitudes, a fim de uma
construção mais consciente no futuro. Assim, o tema sustentabilidade tem se tornado
tendência mundial, pois a preservação do meio ambiente é uma das possibilidades de
construção de uma educação humanizada e que satisfaça as necessidades das gerações
futuras.
Diante do exposto, é preciso que as atividades realizadas que promovam a
educação ambiental sejam compartilhadas com profissionais do meio acadêmico,
principalmente em tempos de pandemia, sinalizando que mesmo em momentos de
crise, não há limites para que ações conscientizadoras aconteçam.
Nas instituições de ensino, o tema sustentabilidade ou educação ambiental sempre
ficaram restritos às disciplinas de ciências, biologia ou até mesmo educação
ambiental. Entretanto, observa-se mais eficiência quando o tema é tratado em meio à
interdisciplinaridade, ou por meio de projetos construídos com base em um calendário
ambiental (PEREIRA, 2020).
Dessa forma, o que se observa é uma tentativa mais efetiva de se pensar a
consciência na prática, até mesmo por documentos norteadores da educação, como é o
caso da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que abrange várias disciplinas em
sua abordagem conceitual intitulada Ciência da Natureza e suas Tecnologias.
Inclusive essas aproximações possibilitam uma abordagem multidisciplinar, o que dá
a possibilidade de refletir acerca de um currículo integrado.
Neste sentido, o objetivo deste trabalho foi proporcionar momentos de reflexão,
diálogo e construção para os discentes, por meio de dois encontros virtuais com
pessoas convidadas, trazendo informações sobre a correta forma de separação para
coleta seletiva, os desafios para a cooperativa local, o tratamento do chorume, bem
como ações que possibilitam às famílias colaborar com a prática correta de separação
do lixo em suas residências.
2 REFLEXÕES SOBRE EDUCAÇÃO AMBIENTAL
A emergente situação global citada nas entrelinhas da Carta da Terra, escrita há
mais de vinte anos, continua a reforçar a preocupante situação que o globo terrestre
emerge frente ao desenvolvimento econômico causado pelas linhas de produção em
larga escala, em especial, a utilização dos recursos naturais de forma desenfreada.
Para iniciar uma reflexão acerca da educação ambiental é necessária a reflexão de um
texto construído há tempos, mas que ao analisá-lo nunca esteve tão atual.
O sistema capitalista de produção dominante e o incentivo ao consumo estão
causando devastação ambiental, esgotamento dos recursos e uma massiva extinção de
espécies. Partes da sociedade estão sendo arruinadas, observa-se que os benefícios do
desenvolvimento não estão sendo divididos equitativamente e a diferença entre ricos e
pobres está, de tempos em tempos, aumentando (CARTA DA TERRA, 2000).
A responsabilidade pela preservação ambiental deve ser universal, porém
237
reconhecida individualmente frente à comunidade local. É preciso visar um modo de
vida sustentável, que somente será construído frente a mudanças de condutas, sendo
esta ação eficiente a partir da união entre indivíduos, empresas, organizações e
governos (CARTA DA TERRA, 2000).
Frente a tais responsabilidades expressas por este documento, é evidente que a
educação deve estar pautada na busca por este ideal e pela formação de sujeitos
críticos e cientes do seu papel de cidadão atuantes na comunidade local. Dessa forma,
as ações de educação ambiental devem ser realizadas dentro do currículo escolar, pois
além de estar inserida em lei, é nos espaços escolares que as ações de educação
ambiental alcançam um público maior.
A educação ambiental no Brasil passou a ser introduzida a partir da Constituição
Federal de 1988, porém apenas com o surgimento da Lei n° 9.795/99 instituiu-se a
Política Nacional de Educação Ambiental. Tal legislação define que a Educação
Ambiental (EA) é um processo onde indivíduos e a sociedade como um todo
constroem valores sociais, conhecimentos, atitudes e competências voltadas para a
preservação do meio ambiente (BRASIL, 1999).
Segundo Layrargues e Lima (2011), a EA pode ser sintetizada em três
macrotendências: conservadora, pragmática e crítica. A educação conservadora traz
uma mensagem de que o homem é o autor da destruição da natureza, sendo necessário
promover a sensibilidade humana em relação à natureza. Atividades de visitas práticas
como ecoturismo, trilhas interpretativas e dinâmicas agroecológicas são promovidas
para indivíduos em idade escolar. Nesta macrotendência, o objetivo é apresentar a
problemática ambiental para uma busca de mudança de comportamento.
Em uma EA pragmática, proposta por Layrargues e Lima (2011), discute-se a ideia
do individual, onde cada um deve fazer a sua parte para a preservação ambiental. Esta
linha de discussão está atrelada às causas e consequências originadas pela
modernidade, onde a destruição dos recursos naturais ocorre sem limites. Os pilares
de estudos se desencadeiam em torno do consumo sustentável, mudanças climáticas e,
por fim, economia verde. A educação pragmática é atuante nas mídias, divulgadas em
empresas e com foco no consumidor, evidenciando a responsabilidade individual de
cuidar do meio ambiente.
A educação ambiental crítica, terceira e última tendências discutidas por
Layrargues e Lima (2011), prevê a formação de indivíduos responsáveis
ambientalmente, de modo que se comprometam socialmente para construir um
mundo sustentável. Isso envolve ter a responsabilidade frente a comportamentos que
promovam a sustentabilidade. Como exemplos pode-se citar: ações corretas no ato da
separação dos resíduos, compreensão de que o consumismo afeta diretamente o
consumo dos bens naturais, adoção de práticas de economia no consumo diário de
energia e água, entre outras ações.
Dessa forma, a construção da EA crítica deve ser promovida com base na
interdisciplinaridade na escola, ou seja, diante da junção de diversas possibilidades de
se discutir a educação ambiental, não estando restrita apenas aos conteúdos de
ciências ou biologia. Conforme cita Reigota (2017), atualmente a educação ambiental
está definida como educação política, a partir de análises de relações econômicas,
políticas, sociais e culturais entre a humanidade e o meio ambiente, relacionando o
“por que” fazer com o “como” fazer. A partir desta afirmação, verifica-se a
238
importância de ações com a missão de formar cidadãos conscientes de suas ações
preservacionistas ambientalmente.
De acordo com Carvalho (2004), a EA pode ser discutida a partir do viés de
contribuição para a formação do sujeito ecológico, por meio da mudança de valores,
atitudes e reorientação de modos de vida coletivos e individuais. É fundamental trazer
o sentido de pertencimento e responsabilidade frente às ações individuais.
Nesse contexto, as escolas devem assumir o papel de promover ações de educação
ambiental voltados para uma reflexão individual com o objetivo de conquistar uma
transformação social. Freire (2013) faz menção à importância do significado dos
conteúdos, dos sentimentos e das emoções do educando, tornando relevante a
construção crítica do ser no mundo com os outros.
Na mesma direção, para Morin (2003), há profundas inadequações em construir o
que se chama de saberes desunidos, divididos, compartimentados e distantes das
realidades. O autor defende que a educação seja contextualizada, globalizada,
multidimensional e, consequentemente, complexa.
Isso leva à reflexão de que educar a respeito do meio ambiente, pressupõe ações
coerentes e vivências do que se vê na teoria, pois é preciso uma mudança de postura ao
propor o tema aos estudantes, e a instituição tem de repensar suas práticas cotidianas,
como por exemplo, o uso de copos descartáveis.
Morin (2003) ensina que também faz diferença nesse processo o corpo docente
envolvido e os agentes de educação de uma instituição, visto que estes serão guias no
processo de mudança de postura de toda uma comunidade.
Neste sentido, Steiner (2000, 2011, 2019) propõe a qualidade da consciência como
evolução do processo do ser humano. Por esses conceitos, o autor defende a
autoeducação, tanto para o desenvolvimento individual como coletivo. Em outra
obra, Steiner (2018) reflete acerca de como toda organização econômica da
humanidade remonta à natureza, não sendo possível, excluí-la de nenhum processo.
Por isso, não há como se manter imparcial diante das discussões, principalmente
quando os assuntos estão em torno da preservação, sustentabilidade e recursos da
natureza.
É importante ressaltar que as ações de educação ambiental devem estar pautadas
no texto dos ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para o cumprimento
da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas, no qual descreve uma série de
ações a serem praticadas pelos países em busca da resolução de problemas sociais,
bem como práticas de sustentabilidade essenciais para a promoção da qualidade de
vida para todos.
Dentre tais práticas, pode-se citar algumas que promovem a sustentabilidade, e
que devem ser refletidas entre docentes e discentes, como é o caso de: acabar com a
fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura
sustentável, defendida pelo ODS 2; buscar pela melhoria da qualidade da água,
reduzindo a poluição referente ao ODS 6; garantir acesso à energia barata, confiável,
sustentável e renovável para todos conforme exige-se o ODS 7; tornar as cidades e os
assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis conforme
sugere o ODS 11; assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis, referente
ao ODS 12; e tomar medidas urgentes para combater a mudança do clima e seus
239
impactos, de acordo com o ODS 13 (ODS BRASIL, 2021).
Em meio a todos esses desafios, no início de 2020 surgiu uma situação inusitada,
uma pandemia causada por um novo vírus, que obrigou o mundo a adotar medidas até
então não usuais em todos os setores, inclusive na educação.
3 A PANDEMIA E O ENSINO REMOTO
A pandemia começou a mudar a rotina da educação quando foi publicado no
Diário Oficial da União, pelo Ministério da Educação, a Portaria nº 343, de 17 de
março de 2020, ainda em vigor, que dispõe sobre a substituição das aulas presenciais
por aulas em meios digitais enquanto durar a situação de pandemia do Novo
Coronavírus (Covid-19). Essa portaria entrou em vigor a partir de 20 de março de
2020 com o fechamento das escolas e o cancelamento das aulas presenciais (BRASIL,
2020).
O Conselho Nacional de Educação (CNE), a fim de auxiliar na implementação
eficaz do ensino remoto emergencial, autorizou uma série de atividades educacionais
remotas para serem usadas pelos sistemas de ensino durante a pandemia. Dentre os
recursos digitais utilizados destacam-se as videoaulas, Ambientes Virtuais de
Aprendizagem (AVA), Google Classroom, redes sociais (Facebook e WhatsApp),
programas de televisão ou rádio, videoconferências com compartilhamento de tela
usando aplicativos de grandes empresas, tais como Google Meet© e Zoom Meeting©.
Esses recursos foram oferecidos à comunidade dentre os diversos níveis escolares:
ensino infantil, ensino fundamental inicial e final, ensino médio, ensino técnico,
ensino superior, educação de jovens e adultos (EJA), educação especial, e, por fim, a
educação indígena, do campo e quilombola (BRASIL, 2020).
A partir disso, com o fechamento das escolas, no intuito de evitar aglomerações,
professores e estudantes foram estimulados a dar continuidade ao ensino de forma
remota, para evitar prejuízos na formação escolar. Nesse ínterim, foram fortalecidos
os cursos online, palestras ao vivo pela internet, conhecidas por lives, e formações
docentes para que as escolas implementassem de forma rápida as aulas virtuais,
ocorrendo uma imposição do uso de tecnologias digitais para essa situação. Surgiram
diversos termos na mídia, tais como educação virtual, educação domiciliar ou
homeschooling, ensino remoto, educação remota em caráter emergencial, educação
mediada com Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), os quais deixaram
pais, professores e estudantes bastante confusos (JOYE; MOREIRA; ROCHA,
2020).
De acordo com Moreira, Henriques e Barros (2020), a modalidade remota é
dividida em dois momentos: as aulas síncronas são aquelas que ocorrem de forma
sincronizada, fazendo com os participantes se encontrem no mesmo espaço físico ou
online e em tempo real para realização da comunicação; e os momentos assíncronos,
que ocorrem de forma não sincronizada, não exigindo a presença simultânea dos
participantes, nem no espaço e nem no mesmo tempo.
Corroborando com este pensamento, Arruda (2020) discorre que esse modelo de
educação se assemelha à educação presencial com horários específicos para as
transmissões das aulas com a participação de todos de maneira simultânea, além disso
pode proporcionar a possibilidade de gravação das atividades para posterior acesso.
Levando em consideração toda esta situação pandêmica, somado ao isolamento
240
social e às aulas na modalidade remota, além das incertezas e preocupações tanto dos
docentes quanto dos discentes, percebe-se que esta nova configuração de ensino
aprendizagem é muito complexa e requer uma mudança de paradigma na educação,
bem como uma mudança na postura do docente, a fim de estimular os estudantes a
assistirem e participarem das aulas, despertando o interesse nas atividades.
Portanto, para atender a este novo paradigma da educação no século XXI, faz-se
necessário adotar outro perfil docente. Uma alternativa seria a utilização de
metodologias ativas de ensino e aprendizagem, a fim de acompanhar as demandas
atuais da sociedade (MORAN; BACICH, 2018).
4 METODOLOGIAS ATIVAS NA EDUCAÇÃO
Já faz certo tempo que algumas escolas sentiram a necessidade de mudar para
modelos mais centrados em aprender ativamente com problemas reais e desafios
relevantes, combinando atividades individuais com atividades coletivas de ensino e
aprendizagem. Para tanto, é importante que seja realizada uma mudança de
configuração do currículo, da participação dos professores, da organização das
atividades didáticas, da organização dos espaços e tempos, bem como da participação
e envolvimento dos discentes no processo ensino-aprendizagem (MORAN;
BACICH, 2018).
Tais metodologias dão ênfase à educação inovadora, instigando o
desenvolvimento da autonomia, protagonismo, curiosidade e tomada de decisão
individual e coletiva dos alunos. Estas metodologias buscam conduzir a formação
crítica de futuros profissionais nas mais diversas áreas (BORGES; ALENCAR, 2014).
Freire (2011) já defendia as metodologias ativas, afirmando que, para que haja
educação é necessário a superação de desafios, a resolução de problemas e a
construção de novos conhecimentos a partir de experiências prévias, e que isso
impulsiona as aprendizagens. Segundo o autor, um dos grandes problemas da
educação paira no fato de os estudantes praticamente não serem estimulados a
pensarem autonomamente.
Para Freire (2011), a curiosidade dos alunos é um ponto fundamental para a
aprendizagem no sentido de inquietação, de crítica, que pode ser uma pergunta
verbalizada ou não, na procura de esclarecimento. Não haveria criatividade sem a
curiosidade que move a humanidade diante do mundo.
Essa aprendizagem é mais significativa quando o estudante é motivado a aprender
por meio de atividades que tenham mais sentido para ele, com engajamento em
projetos e diálogos sobre as práticas, além da forma de realizá-las (MORAN;
BACICH, 2018).
Na concepção de Barbosa e Moura (2013), a aprendizagem ativa ocorre quando o
educando interage com o assunto estudado, ouvindo, falando, perguntando,
discutindo, fazendo, enfim, sendo estimulado a construir o conhecimento em vez de
recebê-lo de forma passiva na interação com o professor. Neste ambiente, o professor
atua como guia, orientador, supervisor, facilitador do processo de aprendizagem, e
não como detentor do conhecimento.
Freire (2011) ainda enfatiza que o educador em sala de aula deve ter respeito aos
saberes que os discentes carregam sobre determinado tema, desta forma o
241
aprendizado é mais significativo.
4.1 APRENDIZAGEM BASEADA EM PROJETOS
A aprendizagem baseada em projetos (ABP) ou Project-Based Learning (PBL) é
uma metodologia ativa que tem seu foco direcionado na realização de tarefas. Esta
metodologia utiliza uma abordagem sistêmica, envolvendo os participantes na
construção do saber e competências por meio de um processo de investigação de
questões complexas, tarefas autênticas e construção de produtos, cuidadosamente
planejados com vista a uma aprendizagem eficiente e eficaz (MASSON et al., 2012).
Rocha e Lemos (2014) destacam as três categorias desta metodologia: (1) projeto
construtivo, no qual o objetivo é construir algo, propondo uma solução nova, um novo
olhar, estimulando a criatividade e inventividade do estudante; (2) projeto
investigativo, no qual se busca o desenvolvimento da pesquisa científica sobre uma
questão ou situação; (3) projeto didático ou explicativo, que tem como objetivo
explicar, ilustrar, revelar os princípios científicos de funcionamento de objetos.
Apesar de estar em pauta atualmente, o desenvolvimento da metodologia da
aprendizagem baseada em projetos não é novo. Registros apontam suas origens em
1900, quando o filósofo americano John Dewey (1859 – 1952) comprovou o
“aprender mediante o fazer”, em que ele valorizava e contextualizava a capacidade de
pensar dos discentes na aquisição do conhecimento de forma gradativa, resolvendo
situações reais em projetos referentes aos conteúdos na área de estudos (MASSON et
al. 2012).
Nesta mesma linha de raciocínio, para Bender (2014), esse modelo de ensino
permite aos participantes confrontar as questões com o mundo real, agindo de forma
colaborativa na busca de soluções dos problemas.
Campos (2011) ressalta que a PBL tem sido um dos principais focos da discussão
não apenas como abordagem de metodologias ativas, mas também como alternativa
para se elaborar currículos e se adotar práticas inovadoras na educação, surgindo
como uma estratégia de ensino e aprendizagem do século XXI, em que a forma de
ensinar e aprender vem sofrendo transformações, passando a exigir muito mais
empenho dos estudantes e dos professores. A metodologia faz o professor refletir
sobre a atividade docente e mudar suas práticas, deixando de lado a postura tradicional
de especialista em conteúdo para treinador de aprendizagem, além de estimular os
estudantes a assumirem maior responsabilidade por sua própria aprendizagem,
compreendendo que o conhecimento deve ser construído por meio de seu esforço
pessoal e envolvimento com a atividade, sendo assim, mais duradouro do aquele
obtido apenas por informações de terceiros.
METODOLOGIA
Este trabalho foi realizado com o apoio da instituição de ensino SENAC - Serviço
Nacional de Aprendizagem Comercial, com jovens entre 14 e 23 anos inseridos no
Programa Jovem Aprendiz e que são estudantes das escolas públicas da cidade de
Umuarama-PR e região. Ao todo participaram das atividades setenta e seis alunos.
A ação de informação e conscientização foi realizada por três professoras que
convidaram profissionais atuantes na área de separação do lixo e resíduos para
momentos síncronos com os estudantes. A finalidade da ação foi de ensinar a correta
242
separação do lixo nas casas, bem como a diferença entre resíduos e lixo, com destaque
aos itens que podem ou não ser reciclados. Além disso, foi mostrado o funcionamento
da coleta de recicláveis da cidade, a atuação da cooperativa local e sua
representatividade para a economia de muitas famílias pobres.
Com o objetivo de promover a educação ambiental crítica direcionada para a
prática correta de separação dos resíduos nas residências, foram promovidos quatro
encontros via sala virtual entre 01 a 31 de maio de 2021, organizados em atividades
diversificadas. A primeira atividade foi uma palestra com a presidente da Cooperuma
(Cooperativa dos Trabalhadores na Reciclagem de Resíduos de Umuarama-Paraná),
Gisele do Nascimento Domingues, e o representante da Prefeitura Municipal de
Umuarama, o técnico em Meio Ambiente Valério Silva. Ambos apresentaram
informações sobre a quantidade do lixo recolhido, destinação, geração de renda,
Projeto Lixo que Vale e o aterro sanitário da cidade.
A segunda atividade foi uma palestra com o gari coletor e tecnólogo de alimentos,
Flávio de Oliveira, o qual, por meio de informações técnicas diferenciando lixo e
resíduos, promoveu uma tarde de muitas reflexões com imagens ilustrativas.
Para a prática de educação ambiental desenvolvida neste trabalho, utilizou-se as
seguintes práticas de metodologias ativas: diálogo promovido por meio de
palestrantes convidados, protagonismo juvenil incentivado por meio da apresentação
de pequenos temas sobre a preservação dos recursos naturais, criação de cartazes com
mensagens informativas ou de caráter conscientizador e a criação de mapas
conceituais identificando principais temáticas discutidas.
Após o ciclo de palestras, os alunos foram orientados a escolher temas citados
sobre a correta separação dos resíduos e a realizar tais atividades, que foram
compartilhadas por meio de apresentações e compartilhamentos via Whatsapp©.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Diante de novas possibilidades para o ensino, e com o intuito de continuar
adotando práticas de educação ambiental, foi realizado um projeto contemplando
quatro encontros com diferentes propostas de aprendizagem para uma reflexão acerca
da correta separação do lixo.
Na primeira ação desenvolvida estavam presentes 76 participantes, sendo
estudantes com idade entre 14 e 23 anos de escolas públicas da cidade de Umuarama-
Paraná, professores e pessoas convidadas para palestrar, como ilustra a Figura 1. A
ação se desencadeou de forma online, no dia 05 de maio de 2021, onde a presidente da
Cooperuma (Cooperativa dos Trabalhadores na Reciclagem de Resíduos de
Umuarama-Paraná) Gisele Domingues Silva, relatou como é o seu trabalho na
cooperativa, destacando como importantes as informações de que a cooperativa
recebe o lixo reciclável pela população da cidade e que esta prática acontece porque
existe participação ativa da prefeitura da cidade com os caminhões e os servidores
realizando o trabalho de coleta. Segundo a palestrante, “infelizmente é nesse
momento que observamos a grande falta de conhecimento da população na correta
separação do lixo”, pois muitos produtos são misturados ao lixo orgânico e a
população não realiza uma higienização dos materiais separados, o que dificulta a
venda de tais itens junto a indústrias que os compra. A presidente da Cooperativa ainda
ressaltou a importância das ações da instituição na oferta de trabalho a muitas pessoas
243
para o sustento de suas famílias.
Uma informação observada por Gisele, e que foi palco de muitas discussões, foi a
sinalização de que ao iniciar a pandemia houve um aumento significativo de pessoas
que passaram a recolher os materiais recicláveis nas residências para vendê-los, e
consequentemente complementar a renda, cenário que demonstra ainda mais a crise
acentuada pelo surgimento do Coronavírus. Em meio às informações compartilhadas,
os alunos se sentiram à vontade e realizaram perguntas e questionamentos, o que
promoveu um diálogo bastante participativo.
O representante da Prefeitura Municipal da cidade, Valério Silva, completou a fala
da presidente da cooperativa com informações técnicas a respeito da diferença entre
lixão e aterro sanitário, observando que o órgão realiza ações de preservação para
diminuir o impacto ambiental causado pelos resíduos. Valério também expôs a forma
de tratamento do chorume, líquido poluente proveniente da degradação da matéria
orgânica presente no aterro. Outro ponto destacado por ele foi o projeto Lixo que Vale,
ação organizada pela Prefeitura em bairros periféricos, que visa incentivar a troca de
itens recicláveis pelas famílias carentes, uma espécie de moeda de troca, que
posteriormente são trocados por produtos da horta municipal, uma ação considerada
bastante incentivadora.
No segundo encontro, dia 12 de maio de 2021, foi realizada outra palestra com o
coletor de reciclados Flávio de Oliveira (Figura 2) com o objetivo de trazer o ponto de
vista do coletor, as dificuldades encontradas na execução do seu trabalho, bem como
realizar uma diferenciação entre lixo e resíduo, trazendo várias alternativas para
reduzir a produção de lixo doméstico. Uma alternativa apresentada foram os
brinquedos construídos com objetos reciclados. Outra opção foi o incentivo à doação
de roupas e objetos que não são mais usados, além da compostagem feita com
alimentos a fim de reduzir o lixo orgânico. Os estudantes foram incentivados a
participar contando as ações que são realizadas por eles e seus familiares, bem como
as ações que são realizadas nos bairros onde moram, trazendo suas experiências sobre
o tema para a discussão.
Figura 1 - Palestra da Presidente da
Cooperuma, Gisele do Nascimento Figura 2 - Palestra com o coletor gari e
Domingues, e o Técnico em Meio Tecnólogo em Alimentos Flávio de
Ambiente Valério Silva Oliveira

Fonte: Elaborado pelas autoras. Fonte: Elaborado pelas autoras.

Após a realização do ciclo de palestras, os discentes foram divididos em grupos e


foram orientados via WhatsApp© oficial das turmas a desenvolver as seguintes
atividades propostas e de livre escolha: definir um tema discutido em meio as palestras
244
e utilizar uma ferramenta tecnológica para produção de mídias contendo informações
ou mensagens reflexivas para a divulgação entre os demais, podendo ser um cartaz
eletrônico, um vídeo, ou imagens ou apresentação via ferramenta Power Point©. Em
um momento bastante interativo, os estudantes apresentaram para os demais colegas a
atividade escolhida e a mensagem definida pela equipe para a reflexão.
Nas Figuras 3 e 4 podem-se observar exemplos dos cartazes montados pelos
alunos. Percebeu-se que os estudantes exercitaram a autonomia e tiveram iniciativas
proativas, sabendo utilizar os recursos tecnológicos para expressar suas ideias.
Figura 3 - Cartaz eletrônico produzido pelos estudantes: Leandro Proença, Larissa
da Silva Bibiano de Souza, Maria Eduarda Fernandez de Almeida e Nicoly
Evangelista da Silva

Figura 4 - Cartaz eletrônico produzido pelos estudantes: Leandro Proença, Larissa


da Silva Bibiano de Souza, Maria Eduarda Fernandez de Almeida e Nicoly
Evangelista da Silva

As apresentações se deram nas aulas seguintes, onde as professoras agiram como


mentoras realizando os feedbacks. Após o término das apresentações foi realizada
uma última atividade, a Construção do Mapa Conceitual, a fim de fixar os conteúdos
discutidos na ação. As orientações para esta prática foram disponibilizadas via
WhatsApp© das turmas e compreendia na elaboração de um vídeo explicativo sobre
conceitos e exemplos de como construir um mapa conceitual.
A mensagem disparada para propor a atividade foi: “A partir dos materiais
disponibilizados vocês deverão construir o mapa mental de vocês, cada um constrói o
seu. O tema é "Reciclagem". Você poderá usar: Papel sulfite ou cartolina, canetas,
canetões coloridos, giz de cera, enfim, tudo que estiver ao seu alcance, e pode ser
realizado também com recursos tecnológicos. Use e abuse de sua criatividade!!!
Pesquise mais informações na internet se achar necessário. Depois de terminado o
trabalho vocês devem postar uma foto do mapa conceitual de vocês até às 17:30h do
dia de hoje (26/05/2021)”. As Figuras 5 a 9 mostram alguns mapas conceituais
construídos pelos discentes.

245
Figura 5 - Mapa Conceitual da aluna Thalita Akemi Ynamura Soares

Figura 6 - Mapa Conceitual do aluno Figura 7 - Mapa Conceitual da aluna


Pedro Henrique Gonçalvez de Souza Kezia Cristina da Silva

Figura 8 - Mapa Conceitual do aluno Figura 9 - Mapa Conceitual do aluno


Leonardo Duarte Carlos Eduardo de Lima Lunardi

Pôde-se perceber que os estudantes se motivaram com a ação e se apropriaram do


conhecimento transmitido pelos palestrantes. Observou-se também que o estímulo à
participação aflorou a criatividade dos discentes para o desenvolvimento do mapa
conceitual.
A partir dessa avaliação, chegou-se à conclusão da importância de ressignificar
algo que já está posto ao educando. Nesse sentido, vale ressaltar a importância das
palestras, das confecções dos trabalhos durante as aulas e apresentações para o
conhecimento de ideias, teorias e práticas que o estudante, até aquele momento, não
tivera a oportunidade de reconhecer.
A partir das experiências vivenciadas por eles, tem-se a oportunidade de acessar o
que Morin (2000) chama de processo circular, pois à medida que eles têm contato com
as teorias, discussões e ações de pessoas envolvidas, dá-se a oportunidade de análise
para que os jovens cheguem a uma síntese nesse processo de repensar o pensamento.
246
Corroborando com Lopes e Abílio (2021), percebeu-se que as ações contribuíram para
a transformação dos indivíduos diante de si e do mundo.
Portanto, por esse estudo concluiu-se que, como defende Morin (2003), há uma
troca singular entre indivíduo e sociedade, sendo que uma contribui para que a outra se
perpetue, afinal são essas interações que permitem a construção e auto-organização da
sociedade. Assim, pode-se observar quão importante é o trabalho de conscientização
dos educandos, pensando que estes serão perpetuadores de conhecimentos adquiridos
em prol da sociedade e esta seria, nas palavras do autor, ensinar a condição humana.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A prática de educação ambiental incorporada em unidades curriculares é de grande
relevância para a formação de estudantes reflexivos quanto às ações que possam
promover uma contribuição para a preservação ambiental por meio de práticas
cotidianas de correta separação do lixo.
Com esta ação observou-se o protagonismo juvenil por meio do envolvimento dos
estudantes na realização das atividades propostas. Indiferente das instabilidades
causadas pelo cenário de pandemia da Covid-19, é necessário refletir sobre questões
que envolvem a atuação do ser humano no mundo e suas consequências.
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STEINER, R. Os pontos centrais da questão social: aspectos econômicos, políticos-jurídicos e
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248
ORGANIZAÇÃO DE LIVRO DURANTE A
PANDEMIA: RELATO DE EXPERIÊNCIA DE
PROJETO DE ENSINO-PESQUISA-
EXTENSÃO TRANSDISCIPLINAR SOBRE
URBANISMO

Máriam Trierveiler Pereira (1)


Juliana Cavalaro Camilo (2)

RESUMO. A pandemia de covid-19, iniciada no final de 2019 e com duração de mais


de três anos, fez milhões de vítimas fatais por todo o planeta e prejudicou todos os
setores da sociedade. Na educação, os impactos e consequências da exclusão social e
da evasão pela adoção do ensino remoto ainda são incalculáveis. Entretanto, por todo
o contexto, foi possível desenvolver e acelerar alguns processos e tecnologias que
auxiliarão os discentes futuramente, já que o novo paradigma instaurado é o da
complexidade. Uma das formas de se alcançar um novo patamar na educação é por
meio de metodologias que valorizem os estudantes e que desenvolvam competências
transdisciplinares. Essas premissas já fazem parte da missão, visão e valores do
Instituto Federal do Paraná (IFPR), que também incentiva seus docentes a
desenvolverem projetos integrados de ensino, pesquisa e extensão. Por toda a
conjuntura, e pela impossibilidade de encontros presenciais durante o ano de 2021, o
objetivo geral deste trabalho foi expor uma atividade de metodologia ativa
transdisciplinar de ensino-pesquisa-extensão na Educação Profissional e Tecnológica
(EPT) do IFPR, tendo como tema o desenvolvimento urbano de Umuarama (PR), uma
cidade de porte médio do oeste-paranaense, e apresentando como resultado final a
organização de um e-book. Com esse projeto, foi possível descobrir características
espaciais e ambientais dos espaços urbanos, discutir a respeito das qualidades
humanas destes locais, por meio da percepção, da memória, da história e da
apropriação, contribuindo para o desenvolvimento social e conservação ambiental.

Palavras-chave: Metodologias ativas. Educação Profissional e Tecnológica.


Espaços Públicos. Paradigma da complexidade. Projeto integrado de ensino.

(1) Doutora, Instituto Federal do Paraná, Campus Curitiba, mariam.pereira@ifpr.edu.br.


(2) Doutora, Instituto Federal do Paraná, Campus Umuarama, juliana.cavalaro@ifpr.edu.br.

249
1 INTRODUÇÃO
O ano de 2020 iniciou de forma atípica. O mundo precisou aprender novos
vocábulos e adotar novos hábitos, além de se obrigar a ressignificar a vida cotidiana
imposta pela pandemia da Sars-COV-2, ou covid-19. A insegurança, a tristeza, a
ansiedade, e tantos outros sentimentos inundaram cada ser humano do planeta e, da
pior forma possível, os fizeram entender outros contextos pandêmicos do passado que
só se via em livros de história.
Entretanto, em um ponto, a pandemia de covid-19 foi diferente das demais: o
isolamento social foi mediado por tecnologias e a presencialidade começou a ser
discutida em alguns setores da economia, em especial na produção imaterial. Neste
contexto, o sistema de ensino e aprendizagem, acostumado fisicamente à sala de aula e
à escola, se viu em meio a um caótico cenário de exclusão social e evasão escolar pela
necessidade do ensino remoto, possível apenas para os que tinham acesso à internet, o
que provavelmente pode significar “a extensão de uma crise cujos impactos e
consequências econômicas e sociais são incalculáveis” (MAGALHÃES; RAMOS,
2021, p. 255).
Paradoxalmente, se por um lado, cerca de 1,4 bilhão de estudantes foram
prejudicados pontualmente pela pandemia (THE WORLD BANK, 2020), por outro
lado, foram desenvolvidas alternativas e metodologias que podem auxiliar todos os
discentes no futuro. Diante do paradigma da complexidade, introduzido por
Nicolescu (1999), é urgente que a sociedade entenda que todas as relações, sejam
biológicas, sociais, econômicas ou culturais, reais ou virtuais, estão intimamente
conectadas. Isso só será possível por meio da educação, que atualmente, precisa
alcançar um novo patamar, como preconizou Morin (2014) com seus sete saberes
necessários à educação do futuro. Esse autor ressalta que a complexidade é um
problema a ser superado, principalmente porque, até o final do século XVIII, as
ciências foram fragmentadas e reduzidas (MORIN, 2015).
Desde então, vários conceitos e metodologias educacionais têm sido
desenvolvidos, principalmente pela ótica da transdisciplinaridade, que pode ser
definida como o “que está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes
disciplinas e além de qualquer disciplina” (NICOLESCU, 1999, p. 51). Nessa
perspectiva, as que mais se despontam são as metodologias ativas, que são abordagens
centradas nos estudantes, pois lhes conferem autonomia, criticidade,
comprometimento, organização, altruísmo e flexibilidade a mudanças, entre outras
competências (BACICH; MORAN, 2017). Dessa maneira, esse deve ser o novo
panorama teórico e prático da educação por aliar conteúdos científicos, emocionais e
sociais (BEHRENS; ENS, 2015).
Dentro dessa conjuntura, o Instituto Federal do Paraná incentiva, como valores
educacionais, a inovação, a visão sistêmica, a sustentabilidade, a diversidade humana
e cultural e o respeito às características regionais, entre outros. Sua missão é:
“promover a educação profissional, científica e tecnológica, pública,
gratuita e de excelência, por meio do ensino, pesquisa e extensão,
visando à formação integral de cidadãos críticos, empreendedores,
comprometidos com a sustentabilidade e com o desenvolvimento local
e regional” (IFPR, 2022, p. 1).
Por todo o contexto apresentado, esse trabalho se justificou pela impossibilidade
250
de encontros presenciais durante o ano de 2021 devido à pandemia de covid-19, e pelo
encorajamento por parte do IFPR de projetos integrados de ensino, pesquisa e
extensão como inovação no ensino e aprendizagem.
Dessa forma, o objetivo geral deste trabalho foi expor uma atividade de
metodologia ativa transdisciplinar de ensino-pesquisa-extensão na Educação
Profissional e Tecnológica (EPT), tendo como tema o desenvolvimento urbano de
Umuarama (PR), uma cidade de porte médio do oeste-paranaense, e apresentando
como resultado final a organização de um e-book.
2 O ESPAÇO PÚBLICO
Refletir sobre o conceito de espaço público obriga a pensar o espaço como um
recurso, um produto e como uma prática. Importa igualmente refletir sobre a
apropriação e utilização do espaço, a transformação de espaços existentes e a
produção de espacialidades inéditas, em correspondência com distintos projetos
culturais emergentes e em seu apogeu.
O espaço público – que desde a ágora ateniense até à modernidade constituiu-se
como fonte de discussão e debate permanente das ideologias coletivas – vê-se hoje
como um espaço fragmentado e diluído pela reconfiguração espaço-temporal operada
na sociedade do conhecimento. O espaço físico do encontro – outrora sede de
enriquecimento e partilha social – não é mais do que a negação dos topos, o não-lugar
cuja erosão configura uma nova geografia das relações interpessoais. Na confluência
dos novos paradigmas pós-industriais, questiona-se a capacidade deste novo espaço
público operar mudanças significativas rumo a valores sólidos e socialmente
partilhados.
O termo espaço público surge cada vez mais como o lócus de uma base de
discussão transversal às diversas ciências, suscitando permanentemente novas
abordagens. Segundo Ascher (1995 apud NARCISO, 2009), o termo de espaço
público aparece pela primeira vez num documento administrativo em 1977, no quadro
de um processo de intervenção pública, agrupando na mesma definição os espaços
verdes, as ruas, as praças e a valorização da paisagem urbana. É considerado ainda
como aquele espaço que, dentro das cidades é de uso comum e posse coletiva,
pertencente ao poder público.
Sendo este espaço existente e relativo à cidade, pode-se dizer, que no decorrer da
história, o espaço público foi em simultâneo, lugar de encontro, de comércio, de
circulação (GEHL; GEMZOE, 2000) e de representação, mas ao longo do tempo estes
usos foram se desequilibrando. Assim, após a segunda Guerra Mundial assistiu-se,
sobretudo na Europa, a uma drástica redução qualitativa e quantitativa da convivência
humana no espaço público devido a novos critérios urbanísticos, mais benevolentes
com a especulação imobiliária – estimulação do investimento e crescimento
econômico – e com o uso do automóvel como principal meio de transporte.
Paulatinamente foram se perdendo os benefícios do espaço da sociabilidade, do
espaço simbólico da coletividade e as possibilidades que um espaço comum oferece
como mediador de diferenças socioeconômicas e de oportunidades numa sociedade
que é cada vez mais competitiva e menos solidária, como a contemporânea. Segundo
Garcia (1999),
En definitia, los nuevos espacios urbanos de la segunda mitad del siglo

251
XIX funcionaban como un macrosistema técnico que concentraba
todas las innovaciones de la modernidad; cumpliendo también con los
requisitos de una nueva sociabilidad. Las dos funciones resultaban
compatibles (GARCIA, 1999, p. 16).
O espaço público pode ser considerado como aquele espaço que é muito mais do
que um receptáculo e a arquitetura muito mais do que um objeto na espacialidade das
nossas cidades. A nova urbanidade, como forma de vida dependente do fluir
contemporâneo, carece de um espaço aberto e acessível para a sociabilidade, que se
faz e desfaz na deriva dos encontros, das situações e das apropriações transitórias dos
seus sujeitos; ou seja, de um espaço que é mais da urbs do que da polis, tal como
defende Delgado (2011, p. 8), apesar de este ser também o espaço onde “los individuos
y los grupos definen y estructuran sus relaciones con el poder, para someterse a él,
pero también para insubordinarse o para ignorarlo mediante todo tipo de
configuraciones autoorganizadas.”
Delgado (2011) utiliza-se dos trabalhos de Lyn H. e John Lofland (1984, 1985),
onde estes mostram que quando se fala em espaço público, se refere a áreas de uma
cidade, onde geralmente todas as pessoas têm acesso legal, abrangendo-se às ruas da
cidade, seus parques, seus lugares de acomodação do público, além dos edifícios
públicos e das zonas públicas de edifícios privados. O espaço público deve ser
distinguido do espaço privado, em que este acesso pode ser objeto de restrições legais.
No fundo, muitos dos espaços eleitos por esta noção de espaço público remetem
para o conceito proposto por Marc Augé de “não-lugares”, ou seja, espaços marcados
por relações transitórias e anônimas, espaços promovidos à individualidade solitária
(AUGÉ, 1994). Apesar de neste tipo de espaços se estar, essencialmente, perante
“interações não-focalizadas”, não se deve descurar o fato destas apresentarem formas
específicas de troca e coexistência.
A passagem da noção de espaço público a “espaço do público” coloca a questão do
estatuto do espaço comum. O espaço público é uma determinação político-jurídica,
mas também um produto do uso social, ou seja, existem espaços públicos inacessíveis
ou proibidos e outros, que não são juridicamente públicos, mas têm um uso coletivo
intenso.
A noção de público não é, pois, uma qualidade intrínseca a um espaço, mas sim
uma construção social e política que resulta da combinação de vários fatores,
nomeadamente dos usos aí confinados; do sentido que é atribuído por um determinado
grupo social; da acessibilidade; da tensão entre o estrangeiro/anônimo e o
reconhecimento/reencontro; da dialética entre proximidade e distância física e social
(CASTRO, 2002).
Não parece demais insistir que perante os desafios que hoje se colocam na
abordagem dos espaços é importante relembrar que “o espaço público é um desafio
global à política urbana: um desafio urbanístico, político e cultural, referido a toda a
cidade” (BORJA, 2000, p. 84). Ainda o autor alerta, assim, para o fato, de o espaço
público, independentemente da escala do projeto urbano, deve organizar um território
capaz de suportar diferentes usos e funções e não se ignorar que ele é também espaço
de expressão coletiva, da vida comunitária, do encontro, ou seja, uma questão de
vontade política e de respeito pelos direitos do cidadão. É, ainda, um desafio cultural,
na medida em que é um dos melhores indicadores dos valores urbanos predominantes
252
(BORJA, 2000).
O espaço público é o espaço da sociedade, o espaço político como refere Hannah
Arendt (1972), e nestes contornos é necessariamente um espaço simbólico, pois opõe-
se e responde a discursos dos agentes políticos, sociais, religiosos, culturais,
intelectuais que constituem uma sociedade. É, portanto, antes de mais um espaço
simbólico, que requer tempo para se formar, um vocabulário e valores comuns, um
reconhecimento mútuo das legitimidades; uma visão suficientemente próxima das
coisas para discutir, contrapor, deliberar. Não se decreta a existência de um espaço
público da mesma maneira que se organizam eleições. Constata-se a sua existência. O
espaço público não é da ordem da vontade. Simboliza, simplesmente, a realidade de
uma democracia em ação, ou a expressão contraditória das informações, das opiniões,
dos interesses e das ideologias.
Ainda pode-se dizer que o espaço é constituído por meio das relações sociais, do
trabalho, e assim, o espaço é social. Ele é o receptáculo das ações humanas, de
realização do homem, construído através do tempo. À medida que o homem produz,
ele produz espaço. O espaço é, assim, um verdadeiro campo de forças cuja aceleração
é desigual. Desigual, pois os elementos que impõem essa aceleração e que animam as
categorias do espaço, como as infra estruturas, as instituições, o meio ecológico, e o
homem em si, o fazem conforme suas necessidades e possibilidades. Esses elementos
fazem parte de um objeto de estudo da geografia que deve ser “considerado como um
conjunto indissociável de que participa, de um lado, certo arranjo de objetos
geográficos, objetos naturais e objetos sociais, e de outro, a vida que os preenche e os
anima” (SANTOS, 1996, p. 26).
Entende-se que a cidade ideal é aquela constituída por espaços de diálogo e de
encontro das diversidades, sem os quais não se consegue conquistar a identidade
individual e coletiva, não se desenvolvem as potencialidades e nem o sentido da
existência.
Este trabalho insere-se no contexto da sociedade urbana contemporânea, pautada
pela velocidade da informação e do consumo, pela ausência de pausas, pelo tempo
regido pelo trabalho. Porém, neste universo complexo é necessário assegurar alguns
direitos: o direito aos espaços da cidade ‒ que está muito longe da liberdade individual
de acesso a recursos urbanos ‒, o direito à qualidade de vida, de morar, de lazer e de
assegurar um futuro para as sociedades que virão. Pretende-se assim, além de
descobrir características espaciais e ambientais dos espaços, discutir a respeito das
qualidades humanas destes locais, por meio da percepção, da memória, da história e
da apropriação, contribuindo para o desenvolvimento social e conservação a fim de
cumprir o desafio de atender às expectativas da sociedade sem comprometer o
ambiente e as políticas de espaços públicos abertos.
3 RELATO DE EXPERIÊNCIA
A inspiração para a elaboração do livro “Vozes dos Silêncios de Umuarama” foi a
poesia de João Cabral de Mello Neto, O Rio. É surpreendente a genialidade da ideia do
escritor: um poema documental sobre a trajetória do rio Capibaribe, de sua nascente
no sertão, à foz na cidade do Recife, escrito em primeira pessoa. É o rio que conta suas
dificuldades em se formar, as mazelas sociais por onde passa e seu encontro com as
águas do mar. Além de todo rigor poético, a beleza do conteúdo é inatingível. O rio se

253
compara aos retirantes do sertão que, ao chegar no mar, encontram seu fim, mas
começo de outra viagem. O rio também narra questões sociais, econômicas e
ambientais muito presentes nas regiões urbanas, tanto na época em que o poema foi
escrito (1953) como nos dias de hoje.
Com essa ideia em mente, e como docentes de Estudos Ambientais Urbanos e
Paisagismo, em um ano totalmente insólito pela pandemia de Covid-19, as autoras
propuseram aos estudantes uma atividade integrada de ensino-pesquisa-extensão que
contemplasse suas disciplinas. Sabe-se que as mudanças globais das cidades, que hoje
se vivencia, geraram uma nova atitude na sua compreensão. A transformação da sua
estrutura econômica e social, a sua organização espacial e a sua configuração formal
marcam a produção de novas territorialidades. Neste contexto, os espaços ganham um
novo significado, político, social e estrutural (LEITE; AWAD, 2012; GEHL, 2015).
Nesse sentido, tomou-se como estudo de caso os espaços públicos abertos da
cidade de Umuarama-PR, tendo como metodologia o walkthrough e o registro
fotográfico. Para o alcance dos objetivos deste trabalho, adotou-se como ferramenta
metodológica o registro por meio de imagens associadas à percepção dos autores dos
capítulos.
Partindo destas premissas e de elementos e teorias vistos em sala de aula, cada
estudante deveria pesquisar e escrever até duas páginas da história de um local de
Umuarama (PR), ressaltando a importância desse lugar no contexto cultural da
cidade. Alguns locais foram sugeridos pelos professores, mas os estudantes ficaram
livres para investigar outros ambientes que quisessem retratar. A orientação era lançar
luzes ao processo de urbanização e seus efeitos ambientais, ao urbanismo social, à
guetização da cidade, à acessibilidade e mobilidade e às leituras do espaço urbano,
ampliando o debate sobre a urbe. Nem todos os espaços públicos, sejam de lazer,
sejam de cultura, necessariamente estão condicionados a locais com programas e usos
predefinidos. Os sentidos podem ser explorados de muitas formas no ambiente
urbano, e as operações sensoriais dos usuários imprimem uma identidade deles com o
lugar, tornando-o um pouco “seu lugar”.
Em Umuarama, assim como em muitas cidades do Brasil, ainda não há um museu
ou centro histórico, e muitas informações são obtidas apenas por registro oral de seus
pioneiros e moradores, relacionadas com uma inscrição emotiva e de grande
intensidade, ou em leis municipais, ou em documentação jornalística. Portanto,
organizar essas informações não foi tarefa fácil.
Ainda por meio destes registros orais e das imagens dos lugares, revela-se a
necessidade e importância dos usos habituais dos espaços públicos e refletem um
processo de atribuição de sentidos ao ambiente urbano. Nesta relação entre cognitiva
de espaços e cidade, as imagens e os textos podem resgatar imaginários com
temporalidade, memórias de infância e brincadeiras, reestruturadas e redefinidas de
modo que os sentidos presentes e latentes sejam compreendidos, observados por meio
da retórica, a fim de estimular a compreensão e os usos dos ambientes urbanos.
A vida cotidiana acontece na cidade e é ela quem deve proporcionar condições
favoráveis e acessíveis para que, em determinado momento, as pessoas possam
conviver e ter experiências urbanas diretamente relacionadas aos usos de seus
espaços. O espaço público agrega e oferece a formação de uma cultura, seja ela social
ou política, mas que se articule com a formação estrutural e representativa que este
254
espaço público tende a oferecer, contribuindo de modo significativo na qualidade de
vida do indivíduo.
Não parece demais insistir que perante os desafios que hoje se colocam na
abordagem dos espaços é importante relembrar que “o espaço público é um desafio
global à política urbana (...), referido a toda a cidade” (BORJA, 2000, p. 84).
Após a laboriosa pesquisa e coleta dos fatos, os estudantes deveriam “traduzir” os
textos para apresentá-los à comunidade de uma forma mais poética, mais lúdica, mais
criativa e com maior proximidade do leitor. E esse foi o grande desafio: como usar a
pedra filosofal da inteligência para transmutar o ouro da redação científica em metais
triviais da extensão para que a informação pudesse ser acessível e afetiva?
Essa provocação foi aceita pelos estudantes do 3º e 4º ano de Arquitetura e
Urbanismo do IFPR Campus Umuarama, porém a mesma atividade poderia ser
aplicada em outros cursos, como Engenharia Civil e Engenharia Ambiental.
Neste caso específico, as produções geraram um registro histórico original da
cidade que os acolhe, dando vozes a ambientes por vezes esquecidos, marginalizados
ou desvalorizados pela vida corrida dos seus habitantes, salvo ainda o “tempo”
flagrado nas imagens que revelam uma apropriação do espaço para além de sua
destinação primária. Além da expressão escrita, por vezes em prosa, por vezes em
versos, os discentes fizeram expressivas reproduções fotográficas de seu olhar sobre o
território de estudo.
Todo o material foi organizado, submetido e aceito para publicação como e-book
pela Editora do IFPR, estando atualmente no prelo. Ao todo, o livro possui 21
capítulos que contam a história da própria cidade, de dois distritos, de cinco bairros
afastados do centro, de dois bosques, de um parque, de dois lagos, de seis praças e de
dois prédios de relevância histórico-cultural. O Quadro 1 expõe a estrutura do ebook,
os autores dos capítulos e os estilos de escrita.
Como resultados, os capítulos do e-book mostram histórias de fragmentos, de
espaços, de lugares que por hora estavam esquecidos e marginalizados, mas que pelo
resgate dessas memórias, voltam a assegurar alguns direitos, principalmente do
reconhecimento desses ambientes, de ressaltar sua importância no contexto cultural e
histórico da cidade. Assim, essas vozes que ecoam neste momento contam suas
histórias, trazem uma reflexão para compreensão de sua evolução em meio a esta
sociedade contemporânea.
Por meio dos resgates das memórias e registros das imagens, pôde-se pensar sobre
esses espaços como um recurso, um produto e como uma prática social. Importa
igualmente refletir sobre a apropriação, a utilização, suas transformações e as
produções de espacialidades inéditas, em correspondência com distintos projetos
culturais emergentes e em seu apogeu. A nova urbanidade, como forma de vida
dependente do fluir contemporâneo, carece de espaços abertos, ambientalmente
respeitados e acessíveis para a sociabilidade, que se faz e desfaz na deriva dos
encontros.
Ainda pode-se dizer que todas essas histórias revelaram a significação de espaços
que são constituídos por meio das relações sociais. São receptáculos das ações
humanas, de realização do homem, construídas através do tempo. À medida que o
homem produz, ele produz estes espaços, que se tornam um verdadeiro campo de
255
forças cuja aceleração é desigual. Desigual, pois os elementos que impõem essa
aceleração e que animam as categorias destes locais, como as infra estruturas, as
instituições, o meio ecológico, e o homem em si, o fazem conforme suas necessidades
e possibilidades. E essas vozes, até então em silêncio, revelaram aquilo que
constituem ou deveriam constituir uma fonte de forte representação pessoal, cultural,
ambiental e social, pois trata-se de espaços simbólicos onde se opõem e se respondem
aos discursos que constituem esta sociedade.
Quadro 1 – Capítulos do Ebook “Vozes dos Silêncios de Umuarama”, seus autores
e estilos.
Capítulo Autor/a Estilo de escrita
Prefácio Juliana Cavalaro Camilo Prosa
Umuarama Máriam Trierveiler Pereira Prosa
Distrito de Roberto Silveira Fabiana Zinerman Lopes Prosa
Distrito de Lovat Leonardo Gouveia Biazini Poesia
Bairro Sonho Meu 1 Gustavo Félix de Lima Prosa
Bairro Sonho Meu 2 Luana de Oliveira Pinheiro Poesia
Bairro Jardim São Cristóvão Larissa Pazzin Sanches Prosa
Bairro Parque Laranjeiras Tatiana Pereira de Souza Prosa
Bairro Parque Jabuticabeiras Isis Gabrielle Bonifácio Neves Prosa
Bosque do Índio Giovanna Gabriely Mendes Barbosa Prosa
Bosque Uirapuru Jyan Gustavo Oliveira Prosa
Parque dos Ipês Felipe Toledo Barros Silva Prosa
Lago Aratimbó Milena Luiza Schaurich Alves Prosa
Lago Tucuruvi Lucia Adriane de Mello Prosa
Praça do Ceprev Kelvin Faneco Ornelas Prosa
Praça Tamoio Maria Eduarda Pereira Nunes Prosa
Praça Sete de Setembro Caroline de Andrade Schroder Prosa
Praça da Bíblia Beatriz Pinheiro Beserra Prosa
Praça Xetás Gabriela Paião Schiapati Poesia
Praça Arthur Thomas Bruna Carvalho de Souza Prosa
Prédio do IBC Guilherme Nishiyama Uliana Prosa
Centro Cultural Vera Schubert Bruna Janaína Cavalcante Prosa
Posfácio Juliana Cavalaro Camilo Prosa
Fonte: Autoras, 2022.
Cada espaço pôde contar sua história, sua trajetória, seus personagens e suas
particularidades, que paulatinamente foram sendo resgatadas. Portanto, conseguir
ouvir e ver um espaço modifica não somente o lugar, mas transforma o sujeito. As
apropriações e improvisações dos espaços definem a legitimação do que foi projetado.
As experiências dos espaços pelos habitantes, passantes ou errantes reinventam os
espaços do cotidiano.
256
Os espaços públicos podem ser projetados, podem ser funcionais, mas deve-se
considerar que seu uso efetivo se dá pelo valor a ele atribuído pela sociedade que o
utiliza. Os espaços públicos abertos são muito importantes num bairro e numa cidade
de modo geral, pois além de melhorar a qualidade de vida do bairro (FARR, 2013,
p.168), promovem melhorias na qualidade do ar, criam espaços sombreados,
contribuem para a redução do calor (evapotranspiração) e proporcionam à sociedade
um espaço de convivência social.
Além desse precioso resultado, percebeu-se ainda que, mesmo em um ano
incomum, pandêmico, os estudantes se motivaram para o aprendizado, sendo
protagonistas como pesquisadores e autores de capítulos de um livro, além de ser uma
proposta significativa e emblemática a partir de uma reestruturação dos espaços,
marcados pela memória de seus pioneiros e moradores, uma verdadeira ação de
transformação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Devido às constantes transformações tecnológicas e sociais do novo paradigma, é
urgente a inovação na educação formal em instituições de ensino para que haja
condições de ocorrer a transdisciplinaridade. Assim, a atividade educacional
apresentada mostrou-se viável para ambas situações, pandêmica e não-pandêmica, e
pode ser replicada em outras localidades, sejam urbanas ou rurais, habitáveis ou
inóspitas, e em outros cursos e outras modalidades de ensino superior.
Este livro também adotou as imagens como registro de uma percepção individual,
convidando o leitor a olhar atentamente para o cotidiano retratado e a se posicionar
diante delas. Buscou-se flagrar momentos e características dos lugares, não visíveis à
primeira vista, mas que qualificam e interferem de algum modo no comportamento do
usuário.
Embora exista uma cumplicidade entre o espaço público e a sociedade, ela nem
sempre é percebida, camuflando muitas vezes qualidades ambientais e
fenomenológicas que afetam a qualidade de vida do indivíduo.
Como atualmente a vida acontece majoritariamente na cidade, é ela quem
proporciona condições favoráveis e acessíveis para as experiências urbanas,
diretamente relacionadas aos seus usos, à sua formação cultural, social, política e
ambiental, mas que também se articula com a formação estrutural e representativa que
estes espaços tendem a oferecer, contribuindo de modo significativo na qualidade de
vida da comunidade. São garantias do direito à cidade.
Perceber, lembrar e se apropriar pertencem a um mesmo conjunto de ações. Um
espaço ou um percurso, ao ser percebido, carrega consigo lembranças, que se
misturam com milhares de experiências passadas e que trazem à tona, imagens e
memórias.
E a memória “é a vida, sempre carregada por grupos vivos e, nesse sentido, ela está
em permanente evolução, aberta à dialética da lembrança e do esquecimento,
inconsciente de suas deformações sucessivas, vulnerável a todos os usos e
manipulações, susceptível de longas latências e de repentinas revitalizações” (NORA,
1993, p. 9). A memória é um elo vivo do presente, são discursos escondidos e
entrelinhas que viram história.

257
REFERÊNCIAS
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Editora, 1994.
BACICH, Lilian; MORAN, José. Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma
abordagem teórico-prática. Porto Alegre: Penso, 2017.
BEHRENS, Marilda. A.; ENS, Romilda. T. Complexidade e transdisciplinaridade: novas
perspectivas teóricas e práticas para formação de professores. Curitiba: Appris, 2015.
BORJA, J. Fazer cidade na cidade actual. centros e espaços públicos como oportunidades. In
BRANDÃO, P.; REMESAR, A. (coord.). Espaço público e interdisciplinaridade, 2000.
CASTRO, A. Espaços públicos, coexistência social e civilidade: contributos para uma reflexão
sobre os espaços públicos urbanos. Cidades, comunidades e territórios, p. 53-67, 2002.
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FARR, D. Urbanismo sustentável: desenho urbano com a natureza. Tradução: Alexandre
Salvaterra - Porto Alegre: Bookman, 2013.
GARCIA, E. La reconquista de Europa. ¿Por qué el espacio público? Public Space, 16, 1999
GEHL, J. Cidades para pessoas. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 2015.
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MAGALHÃES, Jonas E. P.; RAMOS, Marise N. Saberes e conhecimentos na educação pós-
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MORIN, Edgar. Os setes saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez, 2014.
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NARCISO, C. A. Espaço Público: acção política e práticas de apropriação. Conceito e
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NICOLESCU, Basarab. O manifesto da transdisciplinaridade. São Paulo: Triom, 1999.
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História, São Paulo: Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em História e do
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EDUCACIONAIS-NA-PANDEMIA-DA-COVID-19-O-QUE-O-BRASIL-PODE-
APRENDER-COM-O-RESTO-DO-MUNDO.pdf. Acesso em: 22 abr. 2022.

258
DESENVOLVIMENTO DE ATIVIDADES DE
ESTÁGIO SUPERVISIONADO NO AMBIENTE
DA CONSTRUÇÃO CIVIL DURANTE A
PANDEMIA

Ana Cláudia Marques (1)


Rocheli Carnaval Cavalcanti (2)

RESUMO. Este artigo tem como objeto de estudo o estágio dentro da área da
construção civil e suas implicações após a chegada da pandemia do Covid-19.
Durante o biênio de 2020 e 2021, grande parte das profissões tiveram que se
reinventar. Novas formas de trabalhar foram adotadas, por conta das medidas
restritivas para evitar a propagação do vírus. O sistema de trabalho a distância e o uso
da internet foram vitais, principalmente para o mercado da construção civil. O
superaquecimento no setor da construção, exigiu maior mão de obra para execução de
projetos e em um formato totalmente digital. Muitos escritórios foram em busca de
estagiários em modo remoto, no intuito de atender a grande demanda. A procura por
um perfil jovem, que dominasse softwares de projeto, ágil para a apresentação e
propagação do trabalho por mídias sociais, foi intensa. Baseado em dados
extremamente atuais e na aplicação de formulário com um grupo de acadêmicos dos
cursos de engenharia civil e arquitetura e urbanismo, este trabalho procura dar início a
uma análise dos prós e contras que esse período gerou na prática profissional
proporcionada pelo estágio no modo remoto. É sabido que a pandemia mudou o
comportamento social, a dinâmica profissional, dentro de empresas, escritórios e que
antigas práticas estão sendo revistas.

Palavras-chave: Construção civil. Estágio supervisionado. Pandemia. Covid-19.


Formação profissional.

(1) Doutora, Universidade Católica Dom Bosco, rf4450@ucdb.br


(2) Doutora, Universidade Católica Dom Bosco, rocheli@ucdb.br

259
1 CONSTRUÇÃO CIVIL NO CENÁRIO DA PANDEMIA
Esta é uma pesquisa que tem como objeto de estudo o estágio supervisionado
durante o período pandêmico. Estabeleceu-se como objetivo geral deste artigo
analisar o desenvolvimento de atividades de estágio supervisionado no ambiente da
construção civil durante a pandemia. Esta análise foi aplicada entre estudantes dos
cursos de Arquitetura e Urbanismo e Engenharia Civil de uma instituição privada de
ensino superior, na cidade de Campo Grande, MS.
A pandemia do Covid-19 evidenciou muitas mudanças na forma de desenvolver as
atividades de trabalho, principalmente aquelas que podiam ser executadas via
plataformas digitais com os serviços de internet. O intuito foi evitar a aglomeração de
pessoas em um mesmo ambiente, mantendo as regras de distanciamento social.
Neste cenário a construção civil possui um contingente de trabalhadores
considerável e um complexo sistema de atividades com muitas variáveis de risco que
geram certa dificuldade na gestão de pessoas e processos. Segundo a CBIC (2020)
este campo de trabalho se viu obrigado a se adaptar a esse novo panorama, propondo
novas estratégias e remodelando as rotinas de trabalho do setor, na tentativa de evitar a
proliferação do vírus nos canteiros bras e nos seus respectivos escritórios.
Pereira e Azevedo (2020) citam que com a necessidade do isolamento social,
houveram muitos impactos, sendo o principal, a necessidade de paralisação de
atividades, o que acarretou a dificuldade de circulação e transporte da população e, da
possibilidade do contágio do Coronavírus, especialmente nas capitais. Com tudo isso
os canteiros ficaram paralisados por pelo menos duas semanas, como forma de
dificultar o contágio, os escritórios de projeto passaram a trabalhar remotamente e,
com isso o novo normal, passou a minimizar tudo que já era obsoleto e rotineiro na
indústria da construção civil.
Dentre as atividades rotineiras no canteiro de obras, tem-se o estágio
supervisionado obrigatório, que segundo o Art. 11. da Resolução CNE/CES nº 2, de 24
de abril de 2019, faz parte das práticas reais que compõem a boa formação do
engenheiro. Este ocorre em organizações que desenvolvam ou apliquem atividades de
Engenharia, de modo que os profissionais dessas organizações, se envolvam
efetivamente em situações reais que contemplem o universo da Engenharia.
Cazaque e Volpato (2013) também descrevem sobre o estágio supervisionado
como uma atividade de complementação acadêmica estabelecida pela Lei 11.788 de
25 de setembro de 2008. Sendo desenvolvido de forma individual, havendo
concomitância entre aula e atividade profissional.
Como as demais atividades desenvolvidas no canteiro de obras, a prática do
estágio supervisionado também sentiu o impacto inicial da paralisação dos trabalhos
in loco, mas rapidamente se reestruturou, sendo segundo Gomes e Longo (2020) a
adoção de medidas alternativas para as pessoas que não trabalham nas atividades de
produção, como o home office.
Muitos escritórios e empresas se desfizeram da locação de espaços para suas
sedes, acabaram adotando o formato de trabalho remoto por completo. A sistemática
geral consistiu em encontros online, via conferência com o grupo, onde eram feitas as
designações de tarefas e prazos. Os trabalhos foram compartilhados através do

260
sistema de nuvens e o exaustivo uso da ferramenta WhatsApp, agilizando a
comunicação, dúvidas e até possíveis tutoriais explicativos.
Os avanços tecnológicos moldam cada vez mais os modelos, as formas
e os padrões de trabalho e, como consequência, influenciam os gostos,
as atitudes e as decisões. Estamos a falar um conceito de negócios
inovador, 7 criador, diferenciador, como temos verificado. Os centros
de negócios, como todas as franjas produtivas, alavancam-se cada vez
mais apoiados nas novas ferramentas. Para que um centro de negócios
evolua e os seus serviços se tornem ainda mais personalizados e
eficazes é fundamental acompanhar o desenvolvimento tecnológico. A
gestão vê-se confrontada com o aumento da qualidade, exigida cada
vez mais pelos clientes deste tipo de serviço. (QUARESMA;
GONÇALVES, 2013, p. 33).
Neste formato compreende-se que a tecnologia foi importantíssima para que as
coisas pudessem funcionar, exigindo uma adaptação da empresa e dos prestadores de
serviço. Sendo assim toda a parte de produção, orçamento, projeto, pôde ser realizada
a partir do computador pessoal do funcionário ou estagiário. Para os encontros com
clientes ou fornecedores, situações mais formais, muitos fizeram uso dos espaços
Coworking, que nada mais são que espaços criados para locação temporária de
estações de trabalho.
Segundo Rocha (2020) várias construtoras estão reestruturando seus planos de
expansão e políticas de home office, e isso com certeza poderá gerar uma redução na
demanda por espaços corporativos simultaneamente uma outra alteração irá ocorrer
que poderá impactar na caracterização de unidades residenciais para o mercado
imobiliário, já que morar e trabalhar em um mesmo espaço poderá ocorrer com cada
vez mais frequência.
Para isso se faz necessário um espaço adequado para o trabalho dentro de casa e
muitas adaptações foram feitas durante o período pandêmico. Assim como
Professores fizeram de seus quartos suas salas de aula, muitos funcionários e
estagiários tiveram que adaptar espaços como mesa de jantar em estação de serviço.
Devemos considerar que este não é um modelo adequado, pois sabemos que
ergonomicamente a estação de trabalho é fator importante para a saúde do trabalhador,
evitando fadiga ou sequelas posturais. Portanto, adaptações no modelo Home Office
ou a busca de locais compartilhados de estações de trabalho, pode ser a solução para
essa nova modalidade de serviço.
Diversos estudos têm revelado que locais de trabalho com condições ambientais
favoráveis, ou seja, que atendam às necessidades de seus usuários aos níveis
fisiológico e simbólico, exercem impactos positivos sobre os mesmos, resultando em
melhor desempenho e maior produtividade. (FONSECA, 2004).
Importante salientar que a empresa que adota o modelo remoto de trabalho,
deveria fornecer as ferramentas necessárias para o serviço, como computadores e
programas da área, com as liberações devidas de software.
1.1 A prática do estágio supervisionado durante a pandemia
Segundo Kuazaqui e Volpato (2013) considerando a importância dos ativos
humanos para as organizações, e o papel das instituições de ensino superior brasileiras
261
para a construção do perfil de seus alunos, sobretudo, por meio do Programa de
Estágio. Supervisionado, favorecer a empregabilidade do formando no mercado de
trabalho, na medida em que promove o melhor desenvolvimento de atitudes,
habilidades, capacidades e competências em seu primeiro emprego no decorrer de
toda a sua vida profissional.
A compreensão do estágio curricular como um tempo destinado a um processo de
ensino e de aprendizagem, uma oportunidade para refletir, sistematizar e testar
conhecimentos durante o curso de graduação (não sendo, simplesmente, uma
experiência prática) é reconhecer que, apesar da formação oferecida em sala de aula
ser fundamental, ela sozinha não é suficiente para preparar os alunos para o pleno
exercício de sua profissão (ROSA et al., 2012).
Dentro da construção civil é sabido que as atitudes dos trabalhadores, dentro deste
contexto também os estagiários, o porte da empresa, as políticas de saúde e segurança,
treinamentos em geral afetam diretamente no desempenho da saúde e na
disseminação de vírus, assim, algumas orientações de autoridades de saúde foram
consideradas para melhor adequação dos trabalhadores nas obras no cenário de
pandemia (CBIC, 2020).
Dentre as principais medidas, houve a restrição da circulação de pessoas, sendo
tanto trabalhadores como estagiários, avaliando a possibilidade de home office
quando possível. A longo prazo, compreende-se que certas orientações podem ser
absorvidas e previamente planejadas.
A adoção de softwares como BIM, que já estavam sendo incorporados pelo
mercado da construção civil, e a adoção de modelos de construção que permitam
maior organização do canteiro de obras e racionalização do processo de edificação
também devem ser incentivados.
Na média dos últimos 10 anos, 49,46% da Formação Bruta de Capital
Fixo da economia foram realizados pela Construção. Ou seja, o setor
foi responsável por quase 50% dos investimentos no País nos últimos
10 anos (CBIC, 2021).
Portanto, não há como negar que o setor da construção civil está extremamente
aquecido e possui participação relevante e ativa na economia nacional. Mesmo com
poucos estudos voltados para a análise dos estagiários como mão de obra ativa, sabe-
se na prática dentro das universidades que a demanda por estagiários aumentou
substancialmente. É muito difícil encontrarmos alunos disponíveis para estágios após
o terceiro semestre de curso, desde a metade de 2021 até a data atual.
2. MATERIAIS E MÉTODOS
Conforme a fundamentação teórica sendo fator inerente ao objeto de estudo com
tipologia exploratória e descritiva, para atender aos objetivos específicos propostos.
Para o objetivo específico (1) levantar informações sobre o mercado da construção
civil no período de pandemia, foram consultadas fontes primárias e secundárias,
através de sites, revistas, artigos relacionados às áreas da construção civil, engenharia,
arquitetura e economia. Foram consultados dados do IBGE - Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística, relacionados ao PAIC - Pesquisa Anual da Indústria da
Construção Civil. Fontes como o CBIC - Câmara Brasileira da Indústria da

262
Construção e SINDUSCON MS - Sindicato da Construção Civil de Mato Grosso do
Sul, para busca de indicativos atualizados em âmbito Nacional e Regional.
Para o objetivo específico (2) analisar o comportamento e as consequências do
estágio em modelo home office, este artigo propôs a aplicação de formulário durante o
mês de abril de 2022 com os estudantes dos cursos de engenharia civil e arquitetura e
urbanismo da Universidade Católica Dom Bosco.
O formulário foi estruturado no Google Forms, que é um aplicativo de
gerenciamento e pesquisa, disponível na plataforma de aplicação web, desenvolvido
pelo Google Corp, com 11 questões, sendo 10 questões objetivas com alternativas de
respostas, que tiveram como função levantar dados sobre a caracterização do período
de estágio, as mudanças ocorridas nessa prática durante a pandemia, assim como o seu
desenvolvimento do ponto de vista do estudante e, 01 questão discursiva, para que
pudesse ser observado as dificuldades enfrentadas pelo aluno de uma forma mais
aprofundada.
A divulgação da pesquisa foi feita via os grupos de WhatsApp todos líderes das
turmas dos dois cursos analisados, para que fosse possível abranger o maior número
possível de alunos em período obrigatório ou não de estágio.
A compilação dos dados foi feita na forma de gráficos de setores (gráfico de pizza)
gerados pelo próprio aplicativo, para que a análise fosse feita de forma precisa sobre as
questões objetivas, restando a análise específica sobre a questão aberta, para o
embasamento da discussão dos resultados obtidos.
3. RESULTADOS OBTIDOS E DISCUSSÕES
Dos respondentes 75% estão fazendo estágio supervisionado extracurricular e
25% em estágio supervisionado obrigatório. Do total, 55% são estudantes do curso de
arquitetura e 45% do curso de engenharia civil e o maior número começou a estagiar a
partir do 3° semestre do curso. A grande maioria domina softwares como Autocad e
Revit. No quadro 01 abaixo estão descritos os benefícios e as dificuldades enfrentados
na pandemia pelos estudantes que estavam estagiando em home office, sendo a maior
dificuldade ter o programa licenciado na sua máquina pessoal, e o melhor benefício a
redução de custos que envolve a prática presencial.
Quadro 01 - Benefícios e dificuldades no estágio remoto (continua).
Maiores dificuldades Melhores benefícios
Licença de softwares cara Ganho de tempo de deslocamento
Pequeno espaço físico em casa Redução de gastos com transportes
Ergonomia da estação de trabalho Redução de gastos alimentares
Entendimento da rotina da empresa Organização da relação estágio/faculdade
Disciplina de horários pessoais
Fonte: Autoras, 04/2022.
Durante a pandemia 77% dos alunos entrevistados estavam estagiando no modo
remoto. Eles fazem apontamentos dos prós e contras sobre o estágio a distância,
relatando que no início foi bastante difícil não ter o profissional próximo para explicar
sobre representações técnicas, atender aos padrões do escritório. Dúvidas também
263
relativas a ferramentas dos softwares, coisas bastante simples, mas que naquele
momento dificultou o rendimento na execução das tarefas.
Um ponto importante a se observar é que mesmo com as dificuldades naturais da
ausência de um supervisor presencial durante o trabalho remoto, as atividades de
estágio na construção civil não pararam e o acadêmico pode cumprir as suas
obrigações para com a empresa e suas atividades práticas da graduação e finalizar o
seu curso sem prejuízo de tempo.
Acreditam que se houver uma boa organização por parte do estagiário e um
computador capacitado, realizar o trabalho a partir de casa não é um problema.
Relatam que os pontos positivos é que conseguem se concentrar melhor, não precisam
ter gasto com locomoção. Porém existe problema do ambiente em home office não ser
ergonomicamente adequado para o trabalho e acabam tendo prejuízos posturais e
cansaço.
A figura 01 a seguir mostra as modalidades de estágios que se apresentam hoje
mesmo passado as restrições de afastamento social do período pandêmico, o que leva
a crer que a modalidade remota irá continuar dentro da construção civil, o que mostra a
rápida adaptação e a versatilidade das empresas.
Fator interessante a ser ressaltado é que o estágio em modo remoto permite que a
contratação aconteça entre municípios. Escritórios ou alunos de cidades vizinhas
conseguem trabalhar juntos. Outra dificuldade apresentada com a restrição do estágio
apenas presencial, era o horário de entrada e saída, muitos perdiam a vaga pois devido
ao transporte e o horário de saída da aula, não conseguiam chegar no horário.
Figura 1 – Modalidade de estágio supervisionado 2022 A

Fonte: Autoras, 04/2022


Outro ponto importante é que com a modalidade remota se tornando uma prática
nas empresas de construção civil, haverá um ganho significativo quanto a redução de
custos de manter presencialmente alguns colaboradores efetivos e/ou estagiários.
264
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se com esse estudo que as práticas de estágio supervisionado não pararam
durante o período da pandemia, além das duas semanas iniciais de isolamento social,
permitiram aos jovens concluir esta etapa importante de sua formação profissional.
Houveram dificuldades principalmente para o jovem em se adaptar em casa para o
desenvolvimento das atividades de estágio, porém, muitos ganhos houveram para
ambas as partes: contratantes e estagiários, como redução de custos de transportes e
alimentação, redução dos tempos de deslocamento e principalmente mostrou que a
construção civil adaptou rapidamente seus procedimentos para o pessoal que não
trabalha na área de produção.
Entende-se que não haverá um retorno ao modo de estágio restrito ao presencial.
Assim como vários setores foram afetados pelo modo híbrido de trabalho, a
construção civil passa por uma transformação importante no que toca principalmente
a prestação de serviço e produção de projetos.
Compreende-se também que a nova geração de estagiários, muito mais
tecnológica que as anteriores, vêm de encontro com esse processo de mudança e pode
potencializar a produção em tempo e qualidade dos serviços prestados.
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Brasília, 2020 Disponível em: <https://cbic.org.br/cresce-populaco-ocupada-na-
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Humanas. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de
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na Construção Civil. Boletim do Gerenciamento, v. 20, n. 20, p. 71-80, 2020.
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Ed. Vida Económica, 2013. 222p.
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Educação (Bauru), v. 18, n. 3, p. 675-688, 2012.

266
O CONHECIMENTO HIDROGEOLÓGICO NO
ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL:
LINHA DO TEMPO A PARTIR DA DÉCADA DE 1970

Giancarlo Lastoria (1)


Sandra Garcia Gabas (2)

RESUMO. As águas subterrâneas representam o manancial hídrico mais explotado


em Mato Grosso do Sul, tanto nas regiões urbanas, quanto nas áreas rurais, onde
concentra-se sua principal atividade econômica - a agropecuária. Sistemas de
abastecimento público de água, indústrias, agroindústrias, fazendas, projetos de
assentamentos de reforma agrária, territórios indígenas, remanescentes Quilombolas
e os mais diversos postos de serviços (públicos e privados), distribuídos por todo seu
território, fazem uso deste recurso hídrico. Dentre os oito sistemas aquíferos
identificados no Estado, destaca-se o Aquífero Guarani, correspondente à maior área
no domínio brasileiro desta unidade hidro-estratigráfica. Entretanto, apesar da
importância estratégica das águas subterrâneas, não se encontra uma sistematização
das informações hidrogeológicas. Com o advento da pandemia e a indiscutível
necessidade de isolamento, trabalhos de campo, bem como investigações
laboratoriais, tornaram-se inviáveis. Buscou-se, então, outra forma para o
desenvolvimento da atividade profissional, e a pesquisa bibliográfica, por meio
digital, conseguiu avançar. Assim, foi possível reunir neste trabalho os diferentes
registros de dados hidrogeológicos de interesse sul-mato-grossense, abrangendo todo
seus mais de quarenta anos de criação. Inclui dados históricos, marcos regulatórios e
legais, mapeamentos, relatórios, capítulos de livros, teses e dissertações, artigos
publicados em periódicos indexados, trabalhos completos e resumos publicados em
anais de eventos.

Palavras-chave: Informações hidrogeológicas; Mato Grosso do Sul; estado da arte.

(1) Geólogo, Doutor em Geociências e Meio Ambiente, Professor Titular aposentado da Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul, g.lastoria@ufms.br
(2) Geóloga, Doutora em Engenharia Civil, Professora Associada da Universidade Federal de Mato Grosso
do Sul e Universidade Federal de Goiás, sandra.gabas@ufms.br

267
1 HISTÓRICO
O Estado de Mato Grosso do Sul (MS) foi criado por meio da Lei Complementar
número 31, sancionada em 11/10/1977. De fato, o Estado foi instalado no início de
1979, ocupando uma área pouco superior a 357.100 km².
Anterior à divisão do antigo Mato Grosso (MT), existem contribuições para a
hidrogeologia, abrangendo o atual MS. Na década de 1960 a PETROBRAS perfurou
11 poços estratigráficos no Pantanal e outros 9 poços na porção sul-matogrossense da
Bacia do Paraná. Outros trabalhos em escala mais regional: Notas preliminares sobre
as águas do sub-solo da Bacia Paraná-Uruguai (Maack,1970); Bacia do Rio da Prata.
Inventário e Análise da Informação Básica sobre Recursos Naturais (OEA,1971);
Recursos Hídricos Subterrâneos da Bacia do Paraná – Análise de pré-viabilidade
(Tese Livre Docência, Rebouças, 1976).
Em 1973, a Companhia de Desenvolvimento do Estado de Mato Grosso-
CODEMAT, estruturou o Setor de Perfuração de Poços, contando com duas
perfuratrizes percussoras a cabo. Prioritariamente, os poços tubulares eram
perfurados em localidades onde não havia viabilidade econômica para operação da
empresa estatal de saneamento, a SANEMAT. Convênio firmado com o
Departamento Nacional de Obras de Saneamento-DNOS, pagava a perfuração,
revertendo em equipamento para extração de água e reservatório.
O final de 1973, completou um ciclo de 10 anos de seca no Pantanal, com grandes
perdas de bovinos. O DNOS contratou a T. JANER, para a perfuração de dezenas de
poços em fazendas no Pantanal, principalmente no município de Corumbá. As
primeiras informações sobre águas subterrâneas no Pantanal, com base nestes poços,
estão no relatório da UNESCO de 1973 “Hydrological studies of the Upper Paraguay
River Basin (Pantanal): Technical Report 1966-1972”.
A empresa HIDROSOMAT foi contratada pela CODEMAT, em meados de 1974,
para perfuração de 30 poços, a maioria no sul do MT, e os outros no oeste, em glebas
rurais sendo implantadas. Muitas localidades, com poços pioneiros construídos
naquele período, são hoje importantes sedes municipais nos dois estados.
Em 1976, a SANEMAT licitou a elaboração do Estudo Global de Viabilidade
Técnica, Econômica e Financeira-EVG, contemplando os “Estudos Hidrogeológicos
de Mato Grosso”. O produto apresentado sobre o tema não atendeu o objetivo,
composto, majoritariamente, por transcrição de mapas, coluna estratigráfica e mesmo
texto, do trabalho de Northfleet, Medeiros e Muhlmann (1969): “Reavaliação dos
dados geológicos da Bacia do Paraná”.
As normas do extinto BNH, relativas à definição do manancial, priorizavam as
águas subterrâneas. Em 1977 a SANEMAT fez um convênio com o Departamento de
Geologia da Universidade Federal de Mato Grosso-UFMT, visando a locação de
poços, utilizando sondagem elétrica vertical-SEV, e acompanhamento da
perfuração/testes dos poços, por equipe de geólogos e estagiários. Cerca de 40 locais
foram contemplados, a maioria no atual MS.
Dois mapeamentos geológicos, em escala de semidetalhe (1:50.000), devem ser
destacados, ambos realizados por meio de Convênio entre o Departamento Nacional

268
de Pesquisa Mineral-DNPM e a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais-
CPRM: Projeto Bodoquena (1976) e Projeto Bonito-Aquidauana (1978).
2 TÓPICOS APÓS A IMPLANTAÇÃO DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL
Com a instalação do primeiro governo do Estado, em janeiro de 1979, foi criada
sua empresa estatal de saneamento, a SANESUL, destacando que, na maioria das
cidades, eram sistemas autônomos municipais. Em meados deste ano foi criado o
Setor de Hidrogeologia, subordinado à Diretoria de Engenharia.
A SANESUL firmou convênio com o Departamento de Águas e Energia Elétrica
de São Paulo-DAEE, objetivando avaliações hidrogeológicas em cerca de 10 cidades,
incluindo a realização de SEVs. Campo Grande, Dourados e Três Lagoas, tinham
indicação, desde o EVG, para captação do Aquífero Botucatu, pois nas três
localidades existem poços da PETROBRAS, indicando a espessura da Formação
Serra Geral sobrejacente. Em Três Lagoas, o estudo mostrou a viabilidade de captação
apenas no Aquífero Bauru, aflorante.
A Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais-CPRM, iniciava em alguns
estados brasileiros, a abertura de poços no Aquífero Botucatu, sendo contratada para
perfuração de 2 poços em Campo Grande e 2 em Dourados. Pelas avaliações do
DAEE, eram previstas vazões de 400 m³/h. Os 4 poços foram executados com
emprego de empresas especializadas em poços de petróleo para injeção do pré-filtro.
Apesar do empenho construtivo, todos os poços produziram vazões de 100 m³/h,
inviabilizando o manancial Botucatu e as duas cidades migraram para a captação
superficial, mantendo o Aquífero Basáltico como complemento ao sistema.
Em 1980, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico publica o primeiro mapa
geológico de Mato Grosso do Sul, escala ao milionésimo. Neste mesmo ano,
Rebouças e Lastoria publicam no 1º Congresso Brasileiro de Águas
Subterrâneas/ABAS, o trabalho “Potencial hidrogeológico do Aquífero Basáltico em
Campo Grande-MS-Brasil”, mostrando a viabilidade do uso deste manancial para
sistemas de abastecimento de água em áreas urbanas. Também neste ano foi perfurado
pelo Consórcio CESP/IPT (PAULIPETRO), o poço estratigráfico Rio Aporé, no
município de Cassilândia, atingindo o embasamento cristalino da Bacia Sedimentar
do Paraná a 3437 metros.
Lastoria e Souza Leite publicaram o artigo “Reavaliação dos recursos hídricos
subterrâneos com utilização de perfilagem geofísica” (Engenharia Sanitária/ABES,
v.20, n.4, 1981). O uso da ferramenta, em poços de 4 localidades sobre o Aquífero
Bauru, proporcionou uma maior produção e menor custo dos poços tubulares,
comparando com outros não perfilados nos mesmos locais. Cidades que já possuíam,
ou estava previsto captação superficial, como Deodápolis, Aral Moreira e Nova
Andradina, passaram a explotar águas subterrâneas.
Nos anos de 1982 e 1983 o Ministério das Minas e Energia-MME, publica os
levantamentos de recursos naturais do Projeto RADAMBRASIL, mapas na escala
1:1.000.000, Folhas Campo Grande, Corumbá e Goiânia. É lançado o Mapa
Hidrogeológico do Brasil (DNPM, 1983).
Mapa Hidrogeologico America del Sur (DNPM, CPRM, UNESCO, 1986).
A SEPLAN/MS (1990), edita o “Atlas Multirreferencial”, contemplando a
269
geologia, com mapa geológico na escala ao milionésimo e texto explicativo.
Na 2ª Reunião Especial da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência-
SBPC (Cuiabá,1995), Fulfaro e Lastoria chamam a atenção para a importância dos
lineamentos estruturais da Bacia do Paraná em Mato Grosso do Sul, no controle do
fluxo subterrâneo. No mesmo evento, Lastoria apresenta uma primeira classificação
para os aquíferos, propondo 7 unidades: Cenozóica (Pantanal); Bauru; Basáltica;
Triássica (Fm. Botucatu/Pirambóia); Paleozóica Superior (Fm. Aquidauana/Ponta
Grossa); Devoniana (Fm. Furnas) e Pré-Cambriana (Embasamento cristalino e meta-
calcários).
Em 1997 o Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia
Legal, publica o Relatório do Plano de Conservação da Bacia do Alto Paraguai-
PCBAP. No contexto da hidrogeologia foram medidos valores da condutividade
hidráulica, elaborado o Mapa de potencialidade de águas subterrâneas da BAP, com
parâmetros hidroquímicos. Neste ano foi realizado em Campo Grande o X Encontro
Nacional dos Perfuradores de poços/ABAS.
O trabalho mais abrangente envolvendo as águas subterrâneas no Estado, foi
realizado pela SANESUL/TAHAL. O Relatório Final foi apresentado em 1998, com
maior detalhamento para Campo Grande e Dourados. O estudo não considera o
Pantanal e apresenta uma divisão em 7 Aquíferos: Bauru; Serra Geral;
Botucatu/Pirambóia; Aquidauana; Furnas; Pré-Cambriano Calcários e Pré-
Cambriano Cristalino. Mapa hidrogeológico na escala ao milionésimo.
Marco legal importante, a Lei nº 2406 editada em 29/01/2002, estabelece a
Política Estadual de Recursos Hídricos. É lançado o Mapa de Domínios
Hidrogeológicos do Brasil (CPRM, 2002).
O livro “Aquífero Guarani: A verdadeira integração dos países do Mercosul”
(Borghetti e Rosa Filho, 2004), traz informações relativas ao Estado.
No Programa UNESCO/OEA para os Aquíferos Transfronteiriços da América, a
Agência Nacional de Águas-ANA, realizou em Corumbá, 2005, o Seminário
Internacional sobre o Aquífero Pantanal (Bolívia – Brasil – Paraguai). Jongman e
EMBRAPA Pantanal publicam em 2005 o Relatório: “Pantanal–Taquari; Ferramentas
para tomada de decisão na Gestão Integrada dos Recursos Hídricos”.
Outro marco legal específico para a hidrogeologia, a Lei Estadual 3.183, de
21/02/2006, dispõe sobre a administração, a proteção e a conservação das águas
subterrâneas de domínio do Estado e dá outras providências.
Em 2006 a CPRM lança o mapa “Geologia e Recursos Minerais de Mato Grosso
do Sul”, escala ao milionésimo, com texto explicativo, incluindo as Águas Minerais e
Termais.
No ano seguinte, 2007, a URUCUM Mineração finaliza o Relatório “Estudos
Hidrogeológicos no Morro de Santa Cruz – Corumbá”.
Com relação ao Aquífero Guarani, MS possui a maior área de ocorrência em
território brasileiro, descrito na “Síntese Hidrogeológica do Sistema Aquífero
Guarani” e “Aquífero Guarani-Programa Estratégico de Ações” (ANA, 2009).
Contemplando a Política Estadual de Recursos Hídricos, foi concluído o Plano
270
Estadual de Recursos Hídricos-PERH/MS (SEMAC, 2010). Com base no mapa
geológico da CPRM de 2006, foi proposto o Mapa Hidrogeológico de MS, dividido
em 8 Sistemas Aquíferos: Cenozóico; Bauru; Serra Geral; Guarani;
Aquidauana/Ponta Grossa; Furnas; Pré-Cambriano Calcários e Pré-Cambriano. Com
base em dados da porosidade efetiva dos Aquíferos, associado às respectivas áreas de
afloramento e índices pluviométricos, foram estimadas suas recargas anuais. Ficaram
definidas 15 sub-bacias hidrográficas como Unidades de Planejamento e Gestão
(UPGs), conforme preconizado na “Lei das Águas” – 9433, de 08/0/1997.
XVII Congresso Brasileiro de Águas Subterrâneas/ABAS, Bonito (2012). Neste
ano de 2012, a CPRM inicia o programa Rede Integrada de Monitoramento das Águas
Subterrâneas-RIMAS e publica 3 Relatórios Diagnósticos: Vol. 12- Aquífero Furnas
nos estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Paraná, Bacia Sedimentar do Paraná;
Vol. 14- Sistema Aquífero Bauru-Caiuá nos estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul
e Paraná, Bacia Sedimentar do Paraná; Vol. 15- Sistema Aquífero Guarani nos estados
de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Paraná, Bacia Sedimentar do Paraná.
Decreto Estadual/MS nº 13.990, de 02/07/2014, regulamenta a Outorga de direito
de uso dos recursos hídricos em seu domínio. O “Manual de Outorga” foi lançado pelo
Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul-IMASUL, em dezembro/2015,
dispondo como volume outorgável por Aquífero, 20% da reserva renovável
estabelecida no PERH/MS. O Órgão adota, como recorte, a área de afloramento de
cada Aquífero por município. Aquíferos confinados não são quantificados, embora
estejam sendo explotados, notadamente o Aquífero Guarani. É relevante destacar que
a responsabilidade técnica nos processos de outorga de uso de água subterrânea, de
acordo com o Manual (IMASUL, 2015), deve ser assinada por geólogo ou engenheiro
de minas.
Sob a coordenação de Gabas e Lastoria, foi montado o Laboratório de Águas
Subterrâneas e Áreas Contaminadas-LASAC (2015), no âmbito do Programa de Pós-
Graduação em Tecnologias Ambientais/UFMS. Neste ano foi realizado em Campo
Grande o I Simpósio de Águas Subterrâneas de Mato Grosso do Sul/UFMS-
IMASUL, discutindo o conflito na captação de água subterrânea em Campo Grande.
Em 2015, a SANESUL concluiu 2 estudos: “Relatório Geo-estrutural e
Hidrogeológico” e “Relatório de Estudo Geofísico através de métodos elétricos
associados em Bonito-MS”, ambos executados pela LÓGICA-Consultoria SAMS.
Dando sequência ao detalhamento do Projeto Guarani, a ANA (2016), divulga o
Relatório Final “Resultados e Estratégias de Proteção do SAG a partir de estudos na
escala 1:50.000 na área piloto de São Gabriel do Oeste-MS”.
Relatório Final do Plano de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica do Rio
Paraguai descreve a hidrogeologia da Bacia do Rio Paraguai (ANA, 2018).
Na revisão e atualização da Carta Geotécnica de Campo Grande, aspectos
hidrogeológicos da área urbana da capital são abordados (PLANURB, 2019).
A Resolução nº 64 do Conselho Estadual de Recursos Hídricos/MS, de
08/12/2020, altera dispositivos da Resolução CERH/MS nº 040, de 03/10/2016,
quanto ao volume considerado como uso insignificante para as águas subterrâneas,
passando para 600 m³/mês. Ficam também dispensados de outorga e sujeitos apenas à
autorização para perfuração de poços, captações coletivas de água subterrânea para
271
atendimento de projetos de assentamentos e demais beneficiários de reforma agrária,
bem como dos territórios indígenas e remanescentes Quilombolas.
Em 2021, o IMASUL publica o primeiro documento relativo à Qualidade das
Águas Subterrâneas do Estado de Mato Grosso do Sul. Relatório de Implantação da
Rede de Monitoramento. O trabalho é baseado em avaliação dos dados das análises
laboratoriais (automonitoramento), referentes aos anos de 2018 e 2019 de 69 poços da
SANESUL e da Concessionária do sistema de abastecimento de Campo Grande -
Águas Guariroba S.A.
Também no ano de 2021, a CPRM publica o Mapa Hidrogeológico da região
urbana e entorno de Campo Grande, escala 1:50.000, com Nota Explicativa.
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E.F. A importância do monitoramento de águas subterrâneas no abastecimento
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E.F. O uso do Sistema Aquífero Bauru-Caiuá para abastecimento público através de
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(2018) - Lastoria, G.; Cavazzana, G.H.; Oliva, A.; Gabas, S.G.; Chang, H.K.
Contribuição da geofísica para a hidrogeologia da APA Guariroba, município de
Campo Grande-MS. In: XX Cong. Bras./ABAS, Campinas.
(2019) - Lastoria, G.; Cavazzana, G.H.; Gabas, S.G.; Casadei, J.M. Gestão da água
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7 ESTÁGIO ATUAL
Mato Grosso do Sul possui 79 municípios e vem experimentando um incremento
280
na agroindústria, mas, indiscutivelmente, sua principal vocação ainda é a
agropecuária. Neste cenário, as águas subterrâneas são de fundamental importância
para seu desenvolvimento socioeconômico, tanto nos centros urbanos, como nas áreas
rurais.
Da totalidade dos municípios, 68 são operados pela SANESUL, 10 são sistemas
autônimos municipais e Campo Grande tem uma concessionária – Águas Guariroba.
Em mais de 90% destes sistemas de abastecimento de água, predomina a captação do
manancial subterrâneo. Existem também mais de 80 distritos, dos quais, a quase
totalidade, explota água subterrânea.
É importante destacar que o Estado possui algumas centenas de projetos de
assentamentos de reforma agrária, bem como territórios indígenas e remanescentes
Quilombolas, todos captando água subterrânea.
Embora Mato Grosso do Sul ainda não utilize prioritariamente seus recursos
hídricos subterrâneos para efeito de projetos de irrigação, este manancial é, sem
dúvida, quem garante o abastecimento de água, também, para indústrias, propriedades
rurais e os mais diversos postos de serviços (públicos e privados), distribuídos por
todo seu território.
No Estado, a RIMAS/CPRM construiu e opera 16 poços de monitoramento
(piezômetros), assim distribuídos: 01 no Sistema Aquífero Furnas; 04 no Sistema
Aquífero Guarani aflorante e 11 no Sistema Aquífero Bauru. Todavia, o IMASUL
ainda não implantou o enquadramento das águas subterrâneas, para contemplar o
preconizado na Portaria CONAMA 396/2008.
O cadastro de poços tubulares no Sistema de Informações de Águas Subterrâneas-
SIAGAS (CPRM, 2022), mostra para o Estado um número de 2142 poços.
Com a aprovação da Lei nº 14.026/2020, que atualiza o marco legal do saneamento
básico, é possível utilizar-se de fontes e métodos alternativos de abastecimento de
água, incluindo águas subterrâneas (Art. 45). A instalação hidráulica predial prevista
no § 2º deste artigo, constitui a “rede ou tubulação que se inicia na ligação de água da
prestadora e finaliza no reservatório de água do usuário”. A redação da Portaria
GM/MS nº 888, de 24 de maio de 2021, versando sobre os procedimentos de controle e
de vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de
potabilidade, reforça a possibilidade de uso das águas subterrâneas, como fonte
alternativa de captação.
Atendendo ao disposto na Lei Estadual nº 3.183/2006, em seu Art. 8º (“A
implantação ou ampliação de empreendimentos consumidores de elevados volumes
de águas subterrâneas, classificados ambientalmente como empreendimentos de
grande porte e/ou de potencial poluidor, deverá obrigatoriamente apresentar, para
avaliação da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (SEMA),
estudos hidrogeológicos das disponibilidades hídricas e do não-comprometimento do
aquífero a ser explorado.”), a Concessionária Águas Guariroba contratou empresa
especializada para elaboração do Estudo Hidrogeológico de Campo Grande (no
prelo).
Visando incrementar a gestão das águas subterrâneas, faz-se necessário atualizar o
Plano Estadual de Recursos Hídricos (SEMAC, 2010), considerando o grande
número de informações hidrogeológicas obtidas nas últimas duas décadas. Existem
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riscos hidrogeológicos apontados no PERH/MS relativos ao Sistema Aquífero Pré-
Cambriano Calcários, que não estão sendo levados em consideração e, certamente
agravados, face ao aumento da explotação, devido à expansão das atividades turísticas
em um dos atrativos naturais reconhecido nacional e internacionalmente – complexo
Bonito/Bodoquena.
É importante, também, a elaboração de estudo visando a quantificação do raio de
influência/proteção de cada poço tubular, tendo em vista que o Manual de Outorga
(IMASUL, 2015), define apenas um único valor de 200 metros, independentemente
do aquífero captado e vazão explotada, bem como o enquadramento das águas
subterrâneas.
Em complementação ao incremento de uma política de gestão dos recursos
hídricos subterrâneos, em um primeiro momento, deve ser incentivada a criação de
mais comitês de bacias hidrográficas e, tanto para os novos, bem como nos já
existentes, incluir de forma mais detalhada a abordagem hidrogeológica.
Por mais que pesquisadores do LASAC/UFMS tenham chamado a atenção sobre a
importância das águas subterrâneas, lamentavelmente, também não se constata
observações sobre este manancial em programas de gestão e manejo de Áreas de
Proteção Ambiental-APA, como é o caso da APA Guariroba, no município de Campo
Grande. A captação de água superficial nesta bacia garante o abastecimento de cerca
de 40% da capital, onde a rede de drenagem tem o seu nível de base mantido pelo
Sistema Aquífero Bauru.
Embora exista uma Câmara Técnica Permanente de Águas Subterrâneas-CTPAS,
vinculada ao Conselho Estadual de Recursos Hídricos/MS, não se tem observado uma
atuação mais incisiva e propositiva deste grupo especializado de profissionais (do
serviço público e da sociedade civil) na abordagem de tópicos relevantes sobre a
hidrogeologia no Estado, uma vez que a CTPAS somente pode se manifestar quando
demandada pelo CERH/MS.

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Patrocínio: ISBN 978-85-67572-12-3

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