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SOCIAL
O PROTAGONISMO DAS PROFISSÕES
DO SISTEMA CONFEA-CREA EM
TEMPOS DE PANDEMIA
Giancarlo Lastoria
Juliana Casadei
coordenadores
REINVENÇÃO SOCIAL
O PROTAGONISMO DAS PROFISSÕES
DO SISTEMA CONFEA-CREA EM
TEMPOS DE PANDEMIA
Editora Majupá
2022
A impressão deste livro foi viabilizada com o apoio do Conselho Federal de
Engenharia e Agronomia - Confea, oriundo de projeto da Associação Campo-
Grandense de Engenheiros Agrônomos - ACEA
ISBN 978-85-67572-12-3
CDD - 607
Conselho Editorial e Científico
Prof. Dr. Giancarlo Lastoria (Coord.)
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, UFMS
Comissão Organizadora
Profa. Me. Juliana de Mendonça Casadei (Coord.)
Profa. Esp. Amanda Fernandes Santos
Profa. Me. Elaíne Britto de Castro
Prof. Me. Felipe Buller Bertuzzi
Prof. Me. Jason Brais Benites de Oliveira
Prof. Me. Luiz André de Carvalho Macena
Prof. Esp. Orildes Amaral Martins Júnior
PREFÁCIO
UM VERDADEIRO REGISTRO CIENTÍFICO
Boa leitura!
APRESENTAÇÃO
(1) Pós-Graduada em Gestão em Segurança Pública - Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
(UFMS), e-mail: fernandes.amandaadv@gmail.com (2) Mestre em Epidemiologia, Doutoranda em
Desenvolvimento Local, Universidade Católica Dom Bosco (UCDB), e-mail: konyl@terra.com.br (3)
Mestre em Arquitetura e Urbanismo, Doutorando em Desenvolvimento Local na Universidade Católica
Dom Bosco (UCDB), e-mail: arq.felipebertuzzi@gmail.com (4) Mestrando em Desenvolvimento Local,
Universidade Católica Dom Bosco (UCDB), e-mail: israelvbr@hotmail.com (5) Mestre em Saneamento
Ambiental e Recursos Hídricos, Doutoranda em Desenvolvimento Local, Universidade Católica Dom
Bosco (UCDB), e-mail: ju.casadei@gmail.com (6) Doutora em Ciências Sociais, PPGDL da Universidade
Católica Dom Bosco (UCDB), e-mail: 3002@ucdb.br.
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1 INTRODUÇÃO
A pandemia da COVID-19 contribuiu para a alteração de inúmeros processos que
vinham sendo realizados nas mais diferentes áreas como as engenharias, a mobilidade e
infraestrutura, a habitação, a construção civil, as tecnologias digitais, a energia, as áreas
verdes, a educação, a preocupação com os resíduos sólidos, a agricultura e a pecuária,
entre outros. Esses são alguns dos importantes ramos e áreas que estão diariamente
relacionados ao desenvolvimento das mais diferentes localidades.
Durante o período pandêmico, muitos trabalhos científicos tentaram elucidar os
problemas advindos deste cenário e também apresentar soluções de mediação que serão
devidamente pontuados neste trabalho. Sendo assim, o presente capítulo tem o objetivo
de apresentar um panorama geral dos principais assuntos abordados, estudos realizados,
tecnologias, produtos e métodos desenvolvidos durante o período pandêmico no âmbito
das engenharias, agronomia e geociências.
Além da introdução, metodologia e das considerações finais, o capítulo apresenta,
no desenvolvimento do trabalho, a revisão bibliográfica dos principais pontos
observados das áreas estudadas, de forma a apresentar os resultados analisados em cada
uma delas.
2 METODOLOGIA
A pesquisa consiste em uma revisão bibliográfica com foco em dados qualitativos a
partir de uma base de dados realizada em portais de busca de artigos acadêmicos online.
Com palavras-chave relacionando “pandemia” com as respectivas áreas de atuação
(engenharias, agronomia e geociências) e com o filtro de busca pré-definido para os
anos 2020, 2021 e 2022 (anos correspondentes ao período da pandemia da COVID-19),
encontraram-se resultados qualificados para a inclusão e a estruturação desde capítulo.
3 A CONTRIBUIÇÃO DAS ÁREAS DE ATUAÇÃO AO LONGO DA PANDEMIA DA
COVID-19
De acordo com Devezas (2020), a obrigatoriedade imposta pela crise sanitária em
âmbito global fez com que a economia fosse impactada principalmente pela
desaceleração de uma “conectividade excessiva” (DEVEZAS, 2020, p. 1) de um mundo
em constante evolução e rapidez. Nessa seara, o impedimento do trânsito de aviões
devido à possibilidade de contaminação ao longo das viagens impactou negativamente
na manutenção de empregos de inúmeras companhias de aviação. Além disso, a
proliferação de casos infectados foi impulsionada por meio do transporte de pessoas de
diferentes locais do mundo (DEVEZAS, 2020).
Essa integração que o transporte aéreo permite entre áreas distintas também pôde ser
vista nas questões voltadas à mobilidade urbana. Isso porque estudos constatam que as
regiões que possuíam maiores índices de contaminação pelo vírus da COVID-19
estavam próximas a rodovias de maior integração (MONTENEGRO et al., 2021). Os
autores observaram que o isolamento social foi importante, porém precisava estar aliado
ao controle de fluxos externos, a fim de evitar a proliferação dos que se aproximavam de
outros locais (MONTENEGRO et al., 2021).
Devido a essas mudanças bruscas necessárias para combater o vírus, Borchers,
Ferreira e Ribeiro (2021) apontam que houve uma grande diminuição de passageiros na
utilização dos serviços de transporte público. Por outro lado, sucedeu um aumento na
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utilização de transportes que fomentam a mobilidade ativa, como é o caso da bicicleta.
De acordo com as pesquisas desenvolvidas durante a pandemia, as pessoas se sentiram
mais confiantes e deram preferência à bicicleta do que ao uso do transporte público, o
qual ainda possui muitos problemas de superlotação e baixa qualidade nas cidades
brasileiras (ARAÚJO; RIBEIRO, 2021).
Como pôde ser visto, a relação entre o indivíduo e a cidade pode ocorrer de várias
formas e por meio de diferentes intensidades. O transporte é um dos elos que contribui
para isso. Outros que também foram bastante fomentados durante a pandemia tratam-se
do ato de pensar o ambiente urbano sob uma ótica imediatista, de forma a promover
ações urgentes. O chamado “urbanismo tático” é um deles e procura envolver a
sociedade na construção da cidade a partir de estratégias que correspondam às
necessidades locais (FRANÇA; FARIA, 2021).
Além das áreas públicas, as mudanças de comportamento impostas pela pandemia
também impactaram diretamente a ocupação dos espaços construídos. De acordo com
Siqueira e Montenegro (2021), devido as regras de isolamento inseridas durante os
momento de ápice da contaminação, muitas áreas comerciais ficaram vazias para dar
espaço ao trabalho home office. Devido a essa circunstância, os colaboradores foram
obrigados a destinar o espaço de suas residências para o trabalho.
Apesar de parecer mais confortável o fato de as pessoas trabalharem em casa durante
este período, essa forma de trabalho pode ser prejudicial. Isso porque é possível que
problemas de ordem física e mental surjam, o que exige a necessidade de uma
prevenção estratégica para a garantia da qualidade de vida dessas pessoas (SILVA;
GALLARDO, 2020). Esses problemas também pode ser consequência das condições
físicas da residência, a qual pode estar deteriorada ou desprovida de uma iluminação
natural e ventilação cruzada adequadas, o que contribui para os problemas citados
anteriormente.
No âmbito da construção civil, a crise sanitária fez trazer à tona outras discussões
paralelas que também implicam diretamente na saúde dos indivíduos. Medidas foram
tomadas para evitar a proliferação do vírus, mas percebeu-se que outras medidas são
ignoradas, como é o caso do manuseio do cimento da marca Portland de forma
incorreta, o que pode incidir em riscos como dermatites, inalação de poeiras,
consequências renais, neurológicas, entre outras (SILVA, 2021).
Essa foi uma das preocupações que passaram a ser consideradas no dia a dia da
construção civil. Aliado à garantia da saúde, também está a sustentabilidade econômica,
a qual se volta para a garantia do emprego e da renda. Nesse quesito, a pandemia
também contribuiu de forma enfática para a reestruturação de metodologias e do rodízio
de trabalhadores para a garantia da segurança de todos (SILVA, 2020). Por isso, é
importante estabelecer um compromisso com soluções inovadoras para a obtenção de
ganhos na área da construção civil de forma que se garanta a sustentabilidade e a
redução dos impactos gerados (MASUERO, 2021; MENDONÇA et al., 2021).
Dentre os novos desafios que surgiram no âmbito da construção civil também houve
a criação dos hospitais de campanha que, segundo Silva e Soares (2020), tinham o
intuito de suprir os atendimentos específicos aos contaminados pela COVID-19.
Já na área da engenharia mecânica, o estudo realizado por Braga (2021) comparou
os tipos de ventilação mais adequados e dos quantitativos das massas de ar de renovação
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quanto ao custo benefício em relação ao aumento da renovação de ar, enquanto Mariani
et al. (2021) realizaram uma avaliação experimental de processos de varrição
pneumática em relação à concentração de poluentes presentes no ar interno e externo
através de equipamentos do sistema de climatização e ventilação para renovação do ar.
Hernandez Neto e Camargo (2021) analisaram o impacto da carga térmica latente
em serpentinas de resfriamento de expansão direta e indireta, localizadas em climas
quentes e úmidos, propondo alternativas para mitigação desta carga e seus impactos no
desempenho energético do sistema de climatização. Já Mendes (2021) avaliou o
conforto térmico adequado no ambiente de trabalho segundo a legislação e as normas
técnicas vigentes e aponta evidências que sugerem que o Plano de Manutenção
Operação e Controle (PMOC) é uma ferramenta eficaz na descaracterização de
percepção de adicional de insalubridade.
Pimenta e Bortolaia (2021) analisaram a distribuição de ar em ambientes
hospitalares através do método de Dinâmica dos Fluidos Computacional (CFD) com
objetivo de reduzir a contaminação cruzada. Chaves et al. (2021) buscaram
compreender a importância da engenharia mecânica quanto ao uso dos ventiladores
mecânicos pulmonares na pandemia de COVID-19, pois o uso de equipamentos de
suporte ventilatório esteve em alta demanda durante a pandemia causada pelo
coronavírus.
Scarabelli, Machado e Sartori (2021) conduziram um estudo de casos múltiplos por
meio de entrevistas com objetivo de averiguar estratégias de inovação frugal e de baixo
custo no desenvolvimento de ventiladores mecânicos durante a pandemia de COVID-
19, enquanto que Suzumura et al. (2020) averiguaram os desafios para a pesquisa e o
desenvolvimento de ventiladores mecânicos de baixo custo durante a pandemia de
COVID-19 no Brasil, analisando os estudos clínicos e os processos regulatórios da
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
Em um relato de experiência produzido por Toscas, Holsbach e Santos (2021), foi
analisada a participação de mulheres em atividades primordiais para lidar com as
demandas geradas pelas emergências sanitárias causadas pela pandemia de COVID-19.
Campos et al. (2021) avaliaram os impactos ambientais gerados pelo filamento de
plástico ABS usado na fabricação de máscaras de proteção facial utilizadas para o
combate do COVID-19 feitas em impressora 3D através de uma análise comparativa
dos impactos gerados pelo uso do plástico virgem e reciclado.
No campo da engenharia biomédica, Viana et al. (2020) projetaram leitos com
pressão negativa em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de um hospital como
estratégia de minimização do fluxo de partículas de ar contaminadas para áreas fora do
leito de UTI, gerando benefícios para os pacientes e uma percepção maior de segurança
para a equipe de profissionais atuante no setor. Já Basile, Araújo e Smaniotto (2020)
desenvolveram um protocolo de limpeza de modo a realizar a desinfecção das alas
COVID de um hospital utilizando práticas de higienização usando um robô e de outros
equipamentos tecnológicos para verificar a eficácia da higiene e descontaminação do
ambiente hospitalar.
Celuppi et al. (2021) analisaram experiências de uso das tecnologias digitais em
saúde com objetivo de minimizar os impactos da COVID-19, identificando o
desenvolvimento de soluções tecnológicas de manejo clínico, diagnóstico por imagem,
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aplicativos de geolocalização, ferramentas de análise de dados e relatórios, uso de
inteligência artificial, entre outros recursos.
Pode-se notar que muitas foram as contribuições dos ramos das engenharias durante
o período pandêmico, de modo que alguns projetos e pesquisas encontram-se aqui
elencados. Quanto ao desenvolvimento de estudos no setor energético relacionados à
engenharia de produção, com o apoio do Ministério de Minas e Energia (2021),
constatou-se a iniciativa da pesquisa intitulada Profissões do Futuro na Área de Energia
e Implicações para a Formação Profissional, relacionada a transição energética, possui
foco em analisar o desenvolvimento de energias renováveis, mobilidade elétrica,
eficiência energética, redes inteligentes de transmissão e distribuição e resposta da
demanda. Cujo objetivo consiste em realizar uma investigação entre a demanda por
formação profissional do setor produtivo e a oferta de qualificação por instituições de
ensino, visando a área de energia.
De modo que o cenário pandêmico ocorrido corrobora a relevância de políticas
públicas vigorosas no sentido de consolidar a transição energética de modo a alcançar os
objetivos econômicos, ambientais e sociais (MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA,
2021).
Sob a ótica ambiental, uma pesquisa realizada com foco na relação do meio
ambiente em face do cenário pandêmico de COVID-19 no Município de São Paulo por
(LOMBARDO; FRUEHAUF; PELLEGRINO, 2021) trouxe análises quanto as
distinções socioespaciais da ante a pandemia, estudando a correlação quanto ao papel
dos espaços abertos em combate a pandemia, em face da desigualdade na distribuição
de renda e qualidade de vida dos habitantes. Com efeito, buscando ponderar a forma de
utilização dos referidos espaços no sentido de evitar aglomerações e riscos sanitários.
No mais, Melo, Melo e Melo (2021) aborda a vegetação como instrumento de modo
a melhorar relações sociais e sua influência positiva para temas psicológicos, físicos, tal
como o bem-estar em centros urbanos e em especial ante o agravamento em decorrência
do período pandêmico de 2020. No sentido de tratar do necessário debate quanto a
utilização de elementos de vegetação interna e sua relação com diversos benefícios
experimentados relativos à saúde e bem estar das pessoas presentes.
Em pesquisa realizada por Amaral, Silva e Nascimento (2020), buscou-se
argumentar quanto à conexão entre a propagação do COVID-19 e os impactos
socioambientais, ao passo que proliferação do vírus guarda relação não apenas com a
degradação do meio ambiente, como está interligado com a circulação de pessoas no
mundo globalizado. De outro norte, Albuquerque, Campos e Simioni (2020) trataram de
estudar quanto ao impacto sofrido ao meio ambiente durante o cenário pandêmico,
diante da diminuição da dinâmica das indústrias, destacando quanto ao efeito positivo
ao meio ambiente em face da pandemia, tendo em vista a diminuição de poluição gerada
pelo ser humano.
Com efeito, Oliveira (2021), em análise aos efeitos do período pandêmico
relacionados ao centro do Rio de Janeiro, evidenciou o claro abando das estruturas do
centro da cidade tendo em vista a crescente utilização da modalidade do trabalho
remoto, o que ocasionou por vez o declínio da região.
Em revisão promovida por Duarte e Rocha e Dias (2021), foram observadas e
destacadas diversas mudanças ocorridas diante das medidas restritivas advindas da
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pandemia de COVID-19, provocando impactos positivos no meio ambiente sobretudo
no ar e recursos hídricos, tal como o aumento de resíduos contaminantes da fauna
aquática. De igual forma, Bainy et al. (2021), ao realizar estudo na área buscou analisar
os efeitos das medidas restritivas como o confinamento quanto a qualidade do ar em
cidades no Estado de São Paulo, verificaram o aumento de contaminantes no ar, tendo
em vista a ocorrência de incêndios na região.
Segundo Mendonça, Chaché e Barbosa (2021), ao analisar a relação entre o início da
pandemia do COVID-19 associada às medidas de confinamento e isolamento social
detectou-se claro efeito positivo na diminuição da poluição atmosférica,
compreendendo o quanto condutas sustentáveis geram impactos positivos ao meio
ambiente.
Conforme dispõe Protasio, Morais e Ventura (2021) em estudos direcionados à
relação e efeito associados a resíduos sólidos em âmbito domiciliar, compreendeu-se a
ocorrência de adaptações emergenciais resultando na diminuição de resíduos sólidos
durante o período pandêmico.
Por outro lado, no campo da educação, Arruda, Silva e Bezerra (2020), em pesquisa
de revisão bibliográfica qualitativa, buscaram relatar as dificuldades enfrentadas por
professores e alunos diante de tempos de isolamento social e concluíram que a realidade
de práticas de Ensino À Distância (EAD) ficou ainda mais acentuada e no período pós-
pandemia um processo evolutivo se faz necessário com a presença de agentes públicos,
tanto na esfera federal, estadual e municipal. Para as autoras é preciso entender esta fase
pandêmica como uma revolução que acelerou diversos processos, no qual a sociedade
acabou sendo forçada a entrar de uma vez por toda na era digital. E aqueles que não
estiverem inseridos dentro deste processo de percepção, aprendizagem, ensino digital
ficará marginalizado do ponto de vista da aprendizagem.
Dotta, Pimentel, Silveira e Braga (2021), em ensaio com objetivo de discutir
aspectos a serem considerados no contexto da Educação mediada por tecnologias, em
um cenário emergencial, convidam a uma reflexão sobre as práticas pedagógicas e as
possibilidades de mediação da aprendizagem com o uso das Tecnologias da Informação
e Comunicação (TIC), na forma de um conjunto de ferramentas, via internet. Concluem
então, que mesmo com o final da pandemia, que é ainda imprevisível a grande formação
de professores em ação precisa continuar. Agora, não mais partindo do zero com todos
eles. Repositórios de boas práticas precisam ser construídos, organizados e divulgados.
Bem como novas soluções computacionais para a Educação como fruto de resultados de
investigações em campo, poderão surgir.
Silva e Gomes Filho (2020) apresentaram um panorama das publicações a partir da
sociologia da educação com os novos processos e modelos de educação surgidos no
decorrer da pandemia. O estudo buscou apresentar e debater os desafios e possibilidades
que a pandemia trouxe para a educação, com base na literatura publicada no ano de
2020. Com base nos estudos selecionados para análise, pode-se evidenciar que as TICs
adentraram de modo mais enfático nos espaços educacionais, em especial, os espaços
educacionais de nível superior. Pôde-se também perceber que muitas disciplinas que
antes da pandemia ocorriam de modo presencial, e no momento de pandemia
necessitaram se reconfigurar. Destaca-se que, o uso das ferramentas tecnológicas
contribuiu para a efetivação das atividades educacionais de modo remoto e a distância
em todos os níveis educacionais. Os estudos apontam que a pandemia por COVID-19
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(SARS-CoV-2) também desvelou as desigualdades sociais no Brasil que envolvem o
acesso à educação e as TICs. Com o avanço da pandemia as escolas e o corpo docente e
técnico em sua maioria não estavam preparados para o ensino remoto, e também para
novas metodologias e didáticas diretamente atravessados pelas tecnologias.
Apresentando assim novas demandas de formação de professores/as, reorganização do
espaço escolar, e ampliação das estruturas físicas das escolas, universidades e outros
espaços educacionais para o ensino remoto e a distância.
Em estudo de revisão sistemática da literatura conduzido por Vieira e Silva (2020),
conclui-se que a pandemia por COVID-19 obrigou as instituições educacionais e os
professores, em nível mundial, alterarem drasticamente as suas práticas educativas. As
circunstâncias nem um pouco ideais que cercaram a transição para o ensino remoto tem
permitido a professores e estudantes experimentar contextos comunicativos
emergentes. A adaptação a esta nova realidade não foi um processo fácil nem o mais
adequado, pelo menos em alguns níveis de ensino, mas foi o possível face aos
acontecimentos. Com base nos resultados desta RSL, pode-se afirmar que a tendência
que deriva do ensino remoto é ainda mais desigual, mais frágil na profissão docente,
mais desestruturação da educação pública, haja vista as limitações docentes quanto à
sua competência digital e habilidade para a transposição É preciso repensar a concepção
de aprendizagem, da ação pedagógica, do currículo e dos próprios sujeitos do processo
educacional; é preciso fomentar a tendência do ensino online aliado ao ensino presencial
na educação básica e secundária, em prol de uma educação transformadora,
emancipatória, inclusiva e de qualidade. E competência traduz-se, para além da
competência técnica em relação ao uso de plataformas e dos recursos digitais, na
capacidade de organizar e orientar didaticamente o processo de ensino-aprendizagem à
distância, na presença virtual constante e na habilidade para ler e escrever com fluência
em ambientes digitais.
Para Oliveira, Dreissig e Wedekin (2021) as transformações da pandemia da
COVID-19 afetaram as rotinas e os estilos de vida das pessoas em escala global,
principalmente em relação à intensificação do uso da tecnologia. Isso fica evidente
quando se dá luz à educação, é importante ter uma visão crítica do momento vivido, uma
vez que o Capitalismo de Vigilância prospera na falta de conhecimento da sociedade
sobre este tema e pela falta de regulamentação de medidas que limitem e punam ações
inadequadas por parte das detentoras de nossos dados. As empresas que compõem a
GAFAM¹ representam o que, talvez, seja a forma mais pujante com que o
neoliberalismo contemporâneo se expressa pela vigilância de modo aprofundado e que
põem em risco não só a educação, mas também os meios políticos e governamentais.
Esse cenário representa solo fértil para a expansão de uma economia baseada no
mercado de dados pessoais e de uma disputa pelas empresas que retém esses dados.
Seria possível uma maneira de descolonização desses meios tecnológicos? Quais
seriam os caminhos futuros? E como se daria a educação, sabendo que hoje a
dependência desses meios tecnológicos está em ascensão, ocasionando desafios e
potencialidades? Não há dúvidas de que as aulas presenciais no período pós-pandemia
deverão ser reformuladas. A vivência dos alunos, familiares, professores e gestores de
instituições com educação remota deverá provocar, no mínimo, uma discussão
construtiva e instigante sobre esse tema, onde a visão transformadora da educação deve
sair fortalecida. As potencialidades aparecem nas quebras de distâncias físicas e
geográficas, pelas quais os estudantes passaram a participar de diversos cursos, lives,
disciplinas, palestras e outros eventos digitais que corroboram com a disseminação do
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conhecimento, a redução de despesas e o estabelecimento de vínculos com outros
estudantes, professores e pesquisadores. Este debate levou ao entendimento de que os
desafios são mais numerosos e têm um maior impacto do que as potencialidades
encontradas até então. Ainda assim, há outros desafios a serem pensados quanto ao
impacto das aulas on-line ou híbridas na interação social e no tocante à saúde mental
através do desgaste do ambiente remoto criado, bem como a necessidade de adequação
quando na inserção do sistema para crianças, visto que seu processo educacional e de
aprendizagem requer uma interação física que vá além do núcleo familiar. Para os
jovens adultos que estão na graduação, as dificuldades derivam da necessidade de
contato com o outro, formação de pensamento crítico e debates que só o espaço físico da
universidade proporciona para o desenvolvimento profissional. Essas questões abrem
caminhos para novos trabalhos e requerem a visão de profissionais de outras áreas
também.
Santos et al. (2022) consideram de grande relevância a prática de Educação
Ambiental incorporada em unidades curriculares, proporcionando a formação de
estudantes reflexivos quanto às ações que possam promover uma contribuição para a
preservação ambiental por meio de práticas cotidianas de correta separação do lixo.
Com do uso da metodologia ativa Aprendizagem Baseada em Projetos observou-se o
protagonismo juvenil por meio do envolvimento dos estudantes na realização das
atividades propostas. Indiferente das instabilidades causadas pelo cenário de pandemia
da COVID-19 é necessário refletir sobre questões que envolvem a atuação do ser
humano no mundo e suas consequências. Foi possível pensar uma mudança de
comportamento sobre práticas corretas de reciclagem de resíduos.
Guedes (2021) em pesquisa exploratória discute que na pandemia de COVID-19, o
ensino regular em ambiente escolar presencial deixou de existir ou quando
realizado, não abarcava toda a comunidade de estudantes profissionais, dessa
forma afetando as dinâmicas dos escolares. As aulas de campo, muito utilizadas pela
Geografia, deixaram de ser realizadas devido ao isolamento social necessário nesse
período. Para minimizar esse problema, as imagens disponibilizadas pelo Google Earth
ajudam na identificação de feições naturais e artificiais encontradas no espaço
geográfico. Sua gratuidade e, às vezes, atualidade da imagem são fatores positivos para
o uso no ambiente escolar permitindo, portanto, conhecer feições do ambiente na forma
de um voo virtual.
Albuquerque e Costa (2021) apresentam uma discussão acerca da urgência da
formação humanista em tempos de pandemia na engenharia e dos aspectos que
reforçam esta premência. Para isso, foi realizada uma entrevista semiestruturada com o
professor Walter Bazzo (UFSC) referência no estudo da formação humanista em
engenharia. A análise do material discursivo foi realizada por intermédio da Análise de
Conteúdo (AC) proposta por Bardin (2016). Dentre os principais aspectos que
perpassam a urgência da referida formação no contexto pós-pandemia, contempla-se a
desigualdade social como a questão contemporânea mais importante. Nesse sentido,
reforça-se a necessidade de se implementar uma educação em engenharia fomentadora
da democratização do processo tecnológico em sinergia com o enfoque humano. Assim,
será possível pensar em uma educação em engenharia que trabalhe em benefício de uma
sociedade mais justa, fraterna e igualitária. Assim, a técnica adquirida na Universidade
pode e deve contribuir para a solução, ou ao menos, o abrandamento dos problemas
sociais. Nesse contexto, e de maneira imbricada com o conhecimento técnico, cabe a
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cada área do conhecimento da Humanidade uma parcela importante para a
transformação deste mundo segmentado em uma “Humanidade Nova” pautada pelos
valores humanos (RAIA JR., 2004). Em suma, pode-se dizer que é incerto o mundo pós-
pandemia, mas é muito provável que uma formação humanista integral exija além de
altas competências digitais, um elevado senso de responsabilidade e consciência social
acentuadas em um mundo de desigualdades crescentes.
No caso da engenharia de segurança do trabalho, campo de atuação das engenharias
mediante especialização, volta-se o olhar para a proteção do trabalhador em todas as
unidades laborais, e se incumbe de observar questões atinentes à segurança e higiene do
trabalho, conforme Resolução n. 359/1991 do Confea. A pandemia trouxe consigo
mudanças significativas nos modos de exercer as atividades laborais e até mesmo no
local deste exercício, que em muitos momentos passaram a ocorrer nas próprias casas,
que nem sempre dispõe dos meios mais adequados e ergonômicos para as tarefas, além
de tantos outros obstáculos.
Elementos protetivos individuais, como as máscaras, e coletivos, como dispositivos
de desinfecção, assim como a adoção de novas práticas de biossegurança, até então não
praticadas ou desconhecidas, passaram a ser incorporados no cotidiano dos
trabalhadores, com o mesmo rigor sobre seu uso tal como os equipamentos de proteção
individual e coletivos (EPI e EPC).
As repercussões da pandemia nas relações de trabalho e saúde foram abordadas por
Bernardes Santos et al. (2020), sob a ótica do risco e vulnerabilidade de trabalhadores, e
levantaram apontamentos sobre a dificuldade da manutenção de estratégias de
distanciamento social para atividades informais ou menos estáveis, alertando para os
entraves na adoção de estratégias de proteção devido à precarização do trabalho. Os
autores identificaram que os profissionais de saúde foram os mais acometidos pela
doença, contudo, tiveram mais acesso ao diagnóstico, de modo que pouco se sabe com
certeza sobre as demais categorias profissionais e os respectivos determinantes sociais
que implicam em maior vulnerabilidade.
As condições para o trabalho em casa também não são iguais para todos. O conceito
de home office há pouco era praticamente desconhecido pela maioria da população, e
acabou sendo internalizado com o início da pandemia (FARIA, 2021). Schneider,
Sugahara e Silva (2021) alertam que o teletrabalho, apesar de se apresentar como um
medida temporária, tomou contornos de perenidade no pós-pandemia, indicando que
uma preocupação com a melhor compreensão dessa nova realidade e a necessidade de
regulamentação em diversos aspectos, sob a preocupação de incorrer na precarização
das relações de trabalho.
Na perspectiva dos profissionais da Engenharia de Segurança do Trabalho, o
teletrabalho foi investigado por Faria (2021), que identificou desafios e vantagens, pois
afeta desde a produtividade, a redução de despesas, a melhoria da qualidade de vida e a
adaptabilidade; questões estas que são relacionadas diretamente com a saúde dos
colaboradores, a fim de evitar doenças ocupacionais. Em seu ensaio reflexivo, a autora
identificou estudos que relatam o papel do projeto ergonômico do ambiente laboral, com
o propósito de promover melhorias na eficiência do serviço desempenhado,
¹ GAFAM é o acrônimo de gigantes da Web, Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft que são cinco
grandes empresas dos EUA.
21
assegurando a saúde, segurança e satisfação do trabalhador. Porém, via de regra,
“percebe-se no trabalho remoto que as residências ou os cômodos não eram apropriados
para o trabalho em casa e em tempo integral” (FARIA, 2021, p. 9).
Mesquita e Soares (2020) reforçam essa discussão, argumentando que essas
dificuldades vão desde a falta de espaço, mobiliário inapropriado ou mesmo pela
multiplicidade de funções em um mesmo ambiente. E complementam, abordando a
necessidade de aplicação dos conceitos de ergonomia, sendo necessário que os agentes
de saúde e segurança do trabalho se adaptem às novas condições e utilizem a
criatividade para propor ações eficazes e viáveis para garantir que o ambiente de casa
também ofereça condições seguras e saudáveis de trabalho.
De outro norte, identificamos alguns trabalhos a respeito do uso de EPIs no período
pandêmico, especialmente na construção civil, considerada atividade essencial, que
teve sua continuidade mantida mesmo em períodos que outras foram suspensas, dada a
importância na manutenção de itens básicos. Hahn e Longen (2020) mencionam que o
surto de COVID-19 trouxe dúvidas quanto ao uso de máscaras e o apoio logístico para
cumprir as indicações de higiene, e que o canteiro de obras deve ser revisado, pois, por
característica, trata-se de uma instalação improvisada e temporária. Cardoso e Soares
(2020) destacam que há necessidade de aprimoramento destes aspectos, especialmente
nas obras realizadas em cidades de pequeno porte, enfatizando métodos eficazes
capazes de atingir uma alta produtividade e também resguardar a integridade física do
colaborador.
Especificamente sobre as máscaras, Hahn e Longen (2020) observam que as
máscaras caseiras, de tecidos, não podem ser considerados equipamentos de proteção
respiratória, tais como algumas tarefas da construção civil, por norma, exigem.
Adicionalmente, quando o distanciamento entre pessoas não pode ser atingido, os
autores concluíram que a máscara a ser utilizada deve ser a cirúrgica ou máscara médica.
No âmbito da Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), em pesquisa
realizada por Detoni et al. (2020), aborda quanto a função das TICs diante das políticas
públicas de planejamento urbano visando entender a conexão entre acesso à informação
digital e propostas de planejamento urbano, atestando que as políticas públicas ante o
cenário pandêmico de crise sanitária possuem relação com uma decadência social.
Ao passo que Ferreira (2021) busca analisar a utilização efetiva da modalidade do
home office em decorrência do surgimento da pandemia da COVID-19, no sentido de
destacar os efeitos promissores em diversos setores demonstrando-se eficiente e
positivo. Logo, constatou que a proposta de mudança do trabalho remoto reportou um
conjunto de recomendações com o intuito de auxiliar as empresas de maneira saudável e
eficiente.
Quanto ao uso das geotecnologias a serviço da saúde pública, a literatura nos trouxe
relatos e experiências principalmente sobre análises espaciais da dispersão de casos
positivados e óbitos em razão da COVID-19. A leitura da disseminação dos casos a
partir do mapeamento dos casos, utilizando-se de ferramentas de geoprocessamento,
possibilita uma análise de como a doença se difunde pelo território, tornando-se
estratégico para o gerenciamento da doença.
Assim, identificam-se importantes trabalhos para os estados do Maranhão,
Amazonas, Rio de Janeiro (LIRA et al., 2020; NETO; ALEIXO, 2020; FERREIRA;
22
SOUZA; MARINO, 2021), bem como no Município de Marechal Deodoro - AL
(CAVALCANTE et al., 2020) ou em toda a Região Nordeste (SILVA; COSTA, 2021).
São trabalhos que envolvem a elaboração de mapeamentos da difusão espacial da
doença utilizando o software QGIS ou o software livre para produção de mapas
anamórficos ScapeToad, ou ainda que analisaram a forma de disponibilização das
informações institucionais acerca do novo coronavírus concluindo não haver uma
padronização em função do uso de distintas metodologias e ferramentas
geotecnológicas.
Em outro aspecto, sob um olhar da Engenharia Agronômica, destaca-se que a
pandemia trouxe impactos sobre a produção, a distribuição e a oferta de alimentos. Uma
análise de Schneider et al. (2020) concluiu que a pandemia pode aumentar a oferta da
produção e inserção internacional do agronegócio brasileiro, considerando o aumento
da demanda por alimentos e a conjuntura econômica global, ao mesmo tempo que são
indicados problemas potenciais no abastecimento do mercado interno, associado a
aumentos de preço e inflação.
Neste sentido, Morais (2021) destaca o aumento dos custos de produção e insumos
agrícolas e pecuários, como a consequência mais relevante do período pandêmico e
Zúñiga et al. (2021) menciona a interrupção da cadeia de suprimentos em escala
imprevisível e de longo prazo. Há estudos do Instituto de Economia Agrícola (IEA) do
Estado de São Paulo correlacionando os impactos da pandemia no mercado do pescado
e na cadeia produtiva da cana-de-açúcar, o qual se soma as oscilações da cotação do
barril de petróleo (CHALITA, 2020; TORQUATO; SACHS; NACHILUK, 2020).
De um modo geral, o agronegócio é um dos grandes players mundiais, e por ser de
alta essencialidade, teve certa estabilidade e continuidade em suas atividades no período
pandêmico. Na Brasil, o agronegócio apresentou resultados quantitativos oficiais que
demonstram um crescimento, mesmo em um cenário de crise nos demais setores da
economia, demonstrando sua potencialidade para a reconstrução da economia brasileira
e contribuindo com o abastecimento internacional (LOPES et al., 2022; VIEIRA
FILHO, 2020).
Contudo, à luz da produção científica, percebe-se grande preocupação por parte dos
pesquisadores em compreender os impactos gerados na agricultura familiar, onde
poderia guardar maior vulnerabilidade, além de alguns nichos específicos, tais como a
agricultura orgânica, investigada por Almeida (2020) e Agnoletto (2021).
Assim, Basso (2021) investigou os reflexos na comercialização de
hortifrutigranjeiros em Taquaruçu do Sul-RS, e identificaram impactos para um dos
agricultores investigados por conta da falta de abastecimento dos mercados locais.
Claudino (2020), em uma análise nas cidades do interior do Pará, percebeu implicações
às redes de comercialização que envolve aglomerações, tais como feiras de produtores,
cujo cenário de restrições e controles de circulações ocasionou efeitos negativos,
movimento mais acentuado no início da pandemia, conforme apresentou Schneider et
al. (2020). Da mesma forma, as restrições de funcionamento das feiras diminuíram as
vendas em até 70% dos agricultores familiares em Cascavel-PR (ZANINI; FARIÑA,
2021) e, afetou drasticamente os produtores de Iturama-MG e região (SANCHES;
MARTINS; CONCEIÇÃO, 2022). Além do fechamento de feiras livres e a diminuição
na demanda por parte da população, o setor foi significativamente afetado pela
interrupção no fornecimento dos mercados institucionais, especialmente o Programa
23
Nacional de Alimentação Escolar – PNAE (SOUSA; JESUS, 2021) e o Programa de
Aquisição de Alimentos (PAA) (ARAÚJO; CANTERI; BITTENCOURT, 2021).
Esses impactos, segundo Futemma et al. (2021), são multidimensionais, no campo
da produção, comercialização, renda, saúde humana, além das formas de comunicação,
mas que puderam ser em parte superados a partir de um conjunto de fatores. Breitenbach
(2021) identificou e descreveu estratégias e ações direcionadas à minimizar esse
impactos, percebendo o envolvimento de diversos setores nesse processo, contribuindo
de maneira estratégica e mesmo humanitária, categorizando-os em: ações
governamentais e políticas públicas emergenciais; e ações da sociedade civil, incluindo
os agricultores e suas organizações representativas e demais atores da sociedade. Um
exemplo de solução no campo da gestão contingencial efetiva, considerado de sucesso
por Diverno, Passador e Marco (2020), foi o adotado pela Cooperativa de Agricultores
Familiares de Itararé, que optou pelo investimento em um novo nicho de mercado, com
a venda de cestas verdes, para garantir continuidade em suas operações.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base em uma revisão bibliográfica voltada às áreas das engenharias, agronomia
e geociências, observou-se uma crescente utilização de tecnologias digitais em prol de
soluções inovadoras que viabilizassem a manutenção das relações humanas e de
trabalho.
No quesito sustentabilidade, foram discutidos os impactos gerados pela utilização
do plástico nas máscaras de proteção facial e também das formas de mobilidade urbana,
evidenciando a preocupação da população frente a utilização do uso da bicicleta para o
transporte. Questão essa que também está relacionada à redução de deslocamentos pela
cidade devido à utilização do modo de trabalho home office de modo a evitar as
contaminações pelo vírus da COVID-19. Nova forma de trabalho que ainda traz
questionamentos sob a ótica das condições de trabalho, da produtividade e da saúde dos
colaboradores.
A utilização de ferramentas tecnológicas voltadas ao ensino e à educação em um
cenário emergencial também foi abordada, a ponto de promover reflexões acerca de
práticas pedagógicas que vinham sendo tomadas até então.
Todas essas temáticas, e desenvolvimento de soluções para os novos problemas que
surgiram ao longo desta crise sanitária faz vir à tona a necessidade cada vez maior de
apostar na tecnologia como mediadora, mas sem esquecer de compreendê-la e
incorporá-la sob uma visão holística, humana e sustentável.
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29
VIRTUALIZAÇÃO E DIGITALIZAÇÃO DAS
POLÍTICAS PÚBLICAS DE ACESSIBILIDADE
E INCLUSÃO NO RIO DE JANEIRO:
ACESSO, DIFUSÃO E DESAFIOS NO CONTEXTO DA
PANDEMIA DE COVID-19
¹ “Em sua administração anterior, o prefeito César Maia introduziu o conceito de macrofunção, buscando
uma visão integrada da gestão pública.” Cf. Projeto voltado a portadores de deficiência comemora um ano
no Rio. Folha de São Paulo. São Paulo, 10 de novembro de 2004.
² Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009, que promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007.
31
especificação, para que as pessoas com deficiência pudessem deles gozar
em igualdade de condições com as demais. Já em seu preâmbulo, a
CDPD reconhece expressamente que, apesar dos instrumentos e
compromissos existentes até então, as pessoas com deficiência ainda se
deparavam com problemas relativos à participação na sociedade e à
violação de seus direitos. Assim, a Convenção reforça a visão de
proteção e garantia da eficácia desses direitos, com superação da
segregação ou exclusão, reconhecendo, pois, a qualidade de sujeito de
direito das pessoas com deficiência. Em suma: protege e promove os
direitos que fazem parte do sistema geral dos direitos humanos, mas que
têm sido desrespeitados sistematicamente quando se trata de pessoas
com deficiência. (BARBOSA-FOHRMANN, 2016, p. 739-740).
Dessa forma, um processo de reorientação da política carioca foi iniciado. Era
necessário dissociar a atuação dos Centros de Referência das práticas reabilitadoras e
medicalizantes, alçar os usuários desses equipamentos a um patamar razoável de
autonomia e independência em suas decisões sobre o acompanhamento psicossocial,
revertendo o quadro de verticalidade das atividades e serviços prestados, deflagrando
um estado de imanência inédito nas “políticas intra-muros”, de modo a compreender a
acessibilidade enquanto elemento essencial à vida social e que deve ultrapassar os
limites espaciais das unidades de referência.
Em tal sentido, por meio da criação da Secretaria Municipal da Pessoa com
Deficiência, buscou-se emancipar tal política já estabelecida, dos domínios da saúde e
do trabalho, ressignificando a experiência dos assistidos. Nessa fase foi idealizada e
implantada a Central Carioca de Intérprete de Libras, reorganizada a Educação de
Jovens e Adultos (EJA) com a inserção de alunos com deficiência em salas de aula não
segregadas, criação do serviço de atendimento presencial à Central de Relacionamento
com a Municipalidade (Central 1741), a prestação de assistência jurídica gratuita por
meio de parcerias com a Defensoria Pública do Estado e da União, atividades de
capacitação e desenvolvimento pessoal abertos à população em geral, além de novas
estruturas para facilitação no cadastramento de benefícios sociais, incluindo o passe-
livre nos transportes.
A valorização das identidades – individuais e coletiva, da diversidade corporal,
cognitiva e existencial, a concepção de equipamento urbano aberto a todos, a
intensificação de práticas de interação com os núcleos familiares e com as comunidades
para além do espaço dos Centros, e a disseminação da cultura de direitos constituem os
pilares da nova concepção dos Centros de Referência, que hoje somam sete unidades,
localizadas em bairros de alto adensamento urbano, grande número de favelas e
comunidades carentes, cujos indicadores sociais sinalizam para a necessidade de
especial atenção do Estado nas questões do bem-estar social.
Muito embora imprescindível o conjunto de mudanças operadas na política carioca,
de forma a superar paradigmas ultrapassados, falsamente inclusivos, necessário
registrar uma crítica no que se refere à insuficiência ou limitação do modelo de
centralidades ou macrofunções na construção de um espaço urbano universalmente
acessível, tendo em vista que a função social da cidade e o direito à fruição integral do
espaço desta, compreendidos na Constituição da República de 1988, no Estatuto da
Cidade de 2001 e em diversas leis esparsas, exige um complexo de ajustes razoáveis no
espectro ambiental e humano. A mobilidade, o acesso aos direitos, bens e serviços, a
possibilidade de inserção política, de sociabilidade, de fruição da natureza e dos
32
ambientes construídos, da apropriação do trabalho, da cultura, da linguagem, e
sobretudo, a construção da condição subjetiva de pertencimento à humanidade e ao
espaço compõem o significado da acessibilidade e suas múltiplas dimensões –
atitudinal, instrumental, arquitetônica, comunicacional, metodológica, programática
(SASSAKI, 2006) e que por sua vez devem ser propiciadas pelo Estado e pela sociedade
numa perspectiva mais ampla, territorializada, especializada, e que compreenda a
cidade como uma totalidade de bens, serviços e direitos, como argumenta Harvey
(2014).
2. COVID-19: O DESAFIO DA VIRTUALIZAÇÃO E DIGITALIZAÇÃO DOS
SERVIÇOS PÚBLICOS NOS CENTROS DE REFERÊNCIA PARA A PESSOA COM
DEFICIÊNCIA
Tendo em vista que os Centros realizam uma extensa programação de atividades,
serviços e projetos, envolvendo equipes multidisciplinares, instituições parceiras,
dentro e fora dos limites da atuação da Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência,
a rotina de atendimentos comumente é intensa. Dados obtidos por meio da Lei de
Acesso à Informação (LAI)³ revelam uma média de 2.012 registros de atendimento/dia
no primeiro semestre de 2019, efetuados no âmbito das sete unidades municipais.
Levando em consideração que os atendimentos são eletivos, e contam com diversos
fluxos, formatos e durações, o número de registros diários de atendimento deve ser
analisado com base na rotatividade de assistidos e nos movimentos de entrada e
conclusão nas atividades. Assim, podemos concluir que o número de pessoas
efetivamente atendidas pelos Centros é expressivamente maior que o registro oficial,
por este desconsiderar as especificidades do sistema de atendimento efetuado pela
política. Em outras palavras, a atuação concreta dos CR's no Município do Rio de
Janeiro extrapola os limites apresentados pelo dado numérico informado pela própria
municipalidade.
A diversidade de deficiências - física, auditiva, visual, intelectual, múltipla,
sensorial, psicossocial, além dos Transtornos do Espectro Autista (TEA), Transtornos
Globais do Desenvolvimento (TGD) e síndromes como a de Down, Asperger, Williams
e de Rett – trazem uma gama de singularidades e necessidades que definem o esquema
de atuação da equipe multidisciplinar . Como exemplo, as atividades de
psicomotricidade desenvolvem habilidades permitem maior autonomia corporal às
pessoas com deficiências físicas e síndromes com reflexos físico-motores. As oficinas
nos Laboratórios de Tecnologia Assistiva, por sua vez, promovem a interação entre
pessoas com deficiências e síndromes com reflexos intelectuais e sensoriais com a
realidade virtual e as oficinas artísticas, que envolvem a utilização de materiais
audiovisuais atuam no despertar da curiosidade, do desenvolvimento da concentração,
da cognição e da interação familiar nos processos de inclusão da criança com
deficiência.
Como é possível perceber, a tarefa de condensar uma totalidade de projetos e
atividades habitualmente realizados na forma presencial, com intenso contato humano e
uso de equipamentos, estruturas físicas específicas, materiais de apoio e instrumentos
técnicos, e transformá-los, funcionalmente, em um serviço inteiramente virtual,
realizado de forma remota, tornou-se uma tarefa que não logrou êxito de forma
Conforme Orientação Técnica sobre o serviço de proteção social para pessoas com deficiência e suas
famílias, emitida pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, em 2015.
Informações obtidas através do Consórcio de Imprensa formado pelo Jornal O Estado de S. Paulo, portal
G1, Jornais O Globo, Extra, Folha de São Paulo e portal UOL em 19/10/2021. Disponível em:
https://g1.globo.com/saude/coronavirus/. Acesso em 19/10/2021.
34
moradores, igrejas e movimentos locais formou-se uma rede sociotécnica, centralizada
na comunicação por meio das redes sociais e que, enfim, foi capaz de viabilizar e
capilarizar a ideia original de virtualização, mesmo que de forma ainda precária, das
atividades dos CR's.
Conforme o pioneirismo de Egler:
O desafio do nosso estudo é exatamente essa possibilidade, compreender
que a técnica aumenta a capacidade humana de organização e interação,
possibilitadas por formas alternativas de conectividade que definem
novas identidades e institucionalidade políticas. Resta ainda questionar
suas possibilidades de contemplar o bem-estar social.
[...]
É inerente às novas tecnologias a possibilidade de articular redes sociais
que possam a se unir, visando um objeto de trabalho em comum. A
mesma natureza dos espaços de tecnologia informática, lógica numérica
e arquitetura em rede respondem por possibilidades de união e
organização social que não encontramos nos espaços hierarquizados da
sociedade industrial. Está claro que a constituição de redes sociais auto-
organizadas pode se constituir em um espaço de integração social que
abre caminhos para a realização de experimentos que, por sua vez, aliam
inovação tecnológica ao desenvolvimento social. (EGLER, 2012, p.
179).
Dessa forma, a ação social imanente, independente da atuação governamental,
desenvolvida numa perspectiva horizontal e dialógica, estabelecida entre diversos
atores e por meio das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC's) deu forma à
uma insurgência política originada no compromisso ético com a defesa dos direitos da
população com deficiência no território da cidade. Nessa toada, imprescindível
mencionar o pensamento de Ana Clara Torres Ribeiro, que ilumina a compreensão sobre
a origem e a potência da ação social na transformação do cotidiano, frente a conjunturas
de crises:
É neste contexto, e frente à crise societária, que as forças políticas que se
opõem à fragmentação e à exclusão sociais são confrontadas com o
desafio representado pela unidade básica da vida social que, como
propôs Norbert Elias (1994), é constituída pelo “eu-nós”. Com esta
unidade, que valoriza os vínculos sociais, rompe-se a clássica
perspectiva dicotômica indivíduo-sociedade, também tão acionada nos
estudos da modernização. O “eu-nós” dialoga com os mistérios da ação
espontânea e da gratuidade dos gestos (Godelier,1996), permitindo o
confronto tanto do individualismo - esta ideologia que impede a
individualidade - quanto do coletivismo que impossibilita a afirmação de
sujeitos sociais plenos, autônomos, com projetos e papéis protagônicos
na transformação da vida urbana. (RIBEIRO, 2006, p. 26).
Os desafios da digitalização e da virtualização das políticas públicas no Brasil, a
exemplo da política social especialmente abordada neste artigo, perpassa
precipuamente por duas barreiras encontradas na organização das políticas públicas
nacionais lato sensu, a saber, a persistência da exclusão digital de considerado segmento
populacional, ausência de assessoramento sociotécnico e a dificuldade de
implementação, manutenção e efetividade de sistemas informatizados de acesso e
controle de dados e processos, de modo a integrar a atuação estatal às tecnologias da
35
informação e comunicação (TIC's) e solidificar um panorama de inovação,
descentralização e desburocratização de gestão capaz de imprimir soluções mais céleres
e eficazes em momentos de crise ou crescimento vertiginoso da demanda por
determinado serviço, programa ou política.
A questão da exclusão digital, apontada pela literatura nacional desde o início da
década de 2000, refere-se ao processo de impossibilidade de obtenção de instrumentos
(smartphones, tablets, notebooks, computadores) e/ou a inexistência de conexão com
internet de razoável qualidade, além da falta de acessibilidade instrumental (SASSAKI,
2006), no caso da pessoa com deficiência. Mesmo antes da conjuntura pandêmica, a
intensa desigualdade no acesso à internet no Brasil já era objeto de métrica por pesquisas
especializadas, a exemplo da “TIC Domicílios”, realizada pelo Centro Regional de
Estudos para Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic), cujos resultados
divulgados ainda em 2019 apontavam para um cenário em que apesar de 70% dos lares
brasileiros, localizados em áreas urbanas, terem acesso à internet, a análise dessa média
perante a categoria classe social, apontava para enorme desigualdade de acesso: Se
entre as classes A e B, 96,5% das residências possui acesso à sinal de internet, nas
classes populares (D e E) esse índice cai para 59%. Na população de baixa-renda (cuja
renda familiar é inferior à 1 salário mínimo), 78% das pessoas só possuem acesso à
internet por meio de celulares, ou seja, em condições insatisfatórias para atividades que
demandam amplitude superior de dados, como acesso à plataformas de vídeo, de
educação, telemedicina, trabalho remoto e uso de ferramentas governamentais, entre
outros, tão importantes no contexto da Pandemia de COVID-19.
É adequado ressaltar, nesse ínterim, que grupos populacionais como idosos, pessoas
com deficiência, moradores de favelas, cortiços e comunidades carentes, ribeirinhos,
indígenas e residentes nas zonas rurais enfrentam desafios ainda maiores na obtenção de
recursos tecnológicos e no acesso à conexão de internet estável e de qualidade.
No que diz respeito ao assessoramento técnico compreende-se a dotação, pelas
instâncias gestoras da política social de quadros especializados em desenvolver e aplicar
novas tecnologias de armazenamento, gestão e integração de bases de dados de
indivíduos e de novas plataformas para prestação de serviços públicos, além de criação
de processos de aperfeiçoamento do trabalho, introdução do corpo funcional ao manejo
das tecnologias e criação de uma cultura de inovação, progresso e capilarização, em
outras palavras, “levar a política pública” ao seu público alvo de forma ágil, acessível e
por meio das TIC's.
A questão da implementação, manutenção e efetividade de sistemas informatizados
(VEALE e BRASS, 2019) vem em sequência: É necessário adotar estratégias de
planejamento digital no sentido de incorporar efetivamente o papel das tecnologias na
melhoria contínua da oferta do serviço público, valorizando a adoção de sistemas que
promovam novas experiências aos usuários, com possibilidade de controle e avaliação,
prima-facie, pelos beneficiários diretos da política pública e também pelas organizações
da sociedade civil, movimentos populares, órgãos de fiscalização e demais poderes
estatais como o legislativo e o judiciário. Frise-se que a obtenção de maior lisura nos
processos de trabalho e possibilidade de acompanhamento externo das ações
governamentais são vantagens do processo de digitalização e auxiliam na composição
de legitimidade e aderência popular, elementos tão importantes para a consecução de
efetividade e longevidade à uma política social.
36
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É possível afirmar que a conjugação de estratégias de digitalização de políticas
públicas e de difusão de serviços públicos virtualizados, juntamente à preocupação com
a inclusão, no processo de gestão dessas políticas, dos vários atores que compõem o seu
cotidiano – usuários, servidores, trabalhadores terceirizados, cuidadores, familiares,
membros das comunidades, lideranças locais, representantes de movimentos populares
– implica no fortalecimento e na capilarização da ação estatal que se dirige ao
atingimento do bem-estar social. A necessidade de incorporação das TIC's,
acompanhada de elementos de planejamento digital como a dotação de assessorias
sociotécnicas, investimento em formação de uma cultura de serviços públicos digitais,
inovação em sistemas de gestão de dados e processos e formalização dos instrumentos
de observação e fiscalização das políticas sociais produz um cenário de inovação com
responsabilidade, equidade e legitimidade social, que se apoia na sinergia entre ação
estatal, ação social e sociabilidades (TORRES, 2005). Conforme Milton Santos (1994),
“a questão, para nós, seria descobrir e pôr em prática novas racionalidades, em outros
níveis e regulações mais consentâneas com a ordem desejada, desejada pelos homens, lá
onde eles vivem”. (SANTOS, 1994, p. 154). Para Torres Ribeiro (2012) “trata-se da
necessidade de desencantar acordos tácitos; de conceber novos objetos de estudo e de
criar áreas mais sólidas para a reflexão intersubjetiva e ética das condições de vida da
maioria”. (RIBEIRO, 2012, p. 60).
O presente artigo, cujo nascimento se deve à utilização de parte dos meta resultados
de uma pesquisa empírica realizada a partir do ano de 2018 nos Centros de Referência
para Pessoa com Deficiência no município do Rio de Janeiro, utilizou-se da prática da
observação participante no interior dos espaços de realização da política pública de
inclusão e acessibilidade, o que possibilitou contato extensivo com usuários – que
revelaram suas demandas, percepções, críticas, necessidades, ou seja, seu “olhar em
primeira pessoa”. O contato com tal rede de atores também se estendeu ao longo de toda
a conjuntura pandêmica. Dessa forma, nuances reveladas pelos próprios usuários
estruturaram os eixos de argumentação, no sentido da necessidade de estabelecimento
de novas estruturas virtualizadas que superem os desafios impostos pela conjuntura
societária, desvelando outras possibilidades de capilaridade da ação estatal no sentido
de promoção do bem-estar social e do direito à cidade para a pessoa com deficiência.
Conforme Octavio Ianni (2001), trata-se de adequar a atuação pública no sentido
mais aguçado da globalização, imposta pelo avanço dos meios técnicos e científicos na
qual se incluem as TIC's, cuja aceleração se viu vertiginosa na conjuntura pandêmica; e
para além dessa tarefa, como ressalta Ana Clara Torres Ribeiro (2014), destacar os
sentidos e a essencialidade da ação social, como aglutinação entre o pensado e o
concreto, entre o desejado e o disposto, de forma a ofertar esquemas de produção social
que ultrapassem os limites da crise, da malograda experiência governamental atual e dos
muros – visíveis e invisíveis – que cercam as políticas públicas, sobretudo as de natureza
social, obstaculizando a permeabilidade, capilaridade e universalidade, desígnios
democráticos que deveriam ser refletidos na práxis pública.
Como inspiração final do escrito, resgatemos as indispensáveis palavras de Ianni:
As noções de espaço e tempo, fundamentais para todas as ciências
sociais, estão sendo revolucionadas pelos desenvolvimentos científicos e
tecnológicos incorporados e dinamizados pelos movimentos da
37
sociedade global. As realidades e os imaginários lançam-se em outros
horizontes, mais amplos que a província e a nação, a ilha e o arquipélago,
a região e o continente, o mar e o oceano. As redes de articulações e as
alianças estratégicas de empresas, corporações, conglomerados,
fundações, centros e institutos de pesquisas, universidades, igrejas,
partidos, sindicatos, governos, meios de comunicação impressa e
eletrônica, tudo isso constitui e desenvolve tecidos que agilizam relações,
processos e estruturas, espaços e tempos, geografias e histórias. O local e
o global estão distantes e próximos, diversos e iguais. As identidades
embaralham-se e multiplicam-se. As articulações e as velocidades
desterritorializam-se e reterritorializam-se em outros espaços, com
outros significados. O mundo se torna mais complexo e mais simples,
micro e macro, épico e dramático. (IANNI, 2001, p. 249-250).
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Oxford: Oxford University Press, 2019.
39
ENGENHARIA MECÂNICA E SUA
PARTICIPAÇÃO EFETIVA CONTRA O
VÍRUS COVID-19 NA APLICAÇÃO DOS
VENTILADORES MECÂNICOS
PULMONARES
40
1. INTRODUÇÃO
Ao longo de todo o contexto ao qual todos estão inseridos, frente às demandas
apresentadas pelo corona vírus (SARs-COV-2), a utilização de equipamentos que dão
suporte respiratório, a pessoas com estado grave e que dependem do mesmo se fez
necessário e a utilização de tais equipamentos se faz uma alternativa, altamente viável
para os doentes. Desde os primeiros sinais de agravamento da doença, que se iniciou
em dezembro de 2019, na cidade de Wuhan, na China, os ventiladores ou respiradores
mecânicos são amplamente utilizados (CRESTO, 2021).
O primeiro caso confirmado de COVID-19 no Brasil ocorreu em 26 de fevereiro
de 2020. Desde então, o número de novos casos e óbitos causados por COVID-19
aumentou de uma forma rápida e significativa no país. Aproximadamente 20% dos
pacientes com COVID-19 requerem hospitalização, principalmente devido à
dificuldade respiratória. Destes, cerca de 15% requerem cuidados em unidade de
terapia intensiva (UTI). UTI é onde existem recursos para suportar disfunções
orgânicas, principalmente onde há insuficiência respiratória, ventilador mecânico,
também conhecido como ventilador pulmonar (SUZUMURA, E. A. et al. 2020).
Em virtude de tamanho poder de transmissão, a doença tomou contornos mundiais
muito rapidamente e fez com que as fronteiras dos países se fechassem, pois, o vírus
ataca vias aéreas superiores de forma inicial, impactando de maneira direta no seu alto
poder de replicação e contaminação. Agências de saúde, a nível mundial relatam que
aproximadamente de todos os pacientes que se contaminam com COVID-19, a grande
maioria apresenta sintomatologia leve e a minoria dos pacientes apresentam estes de
forma grave, fazendo com que eles necessitem de tratamento intra-hospitalar, e na
grande maioria dos casos, estes pacientes precisam de suporte respiratório invasivo,
que ocorrem com o auxílio dos respiradores mecânicos (CRESTO, 2021).
Para que a ventilação mecânica ocorra de maneira efetiva é necessário que
critérios fisiológicos sejam respeitados e que a hipoxemia seja corrigida por estes
aparelhos, que devem ser ciclados de acordo com a necessidade de cada pessoa
hospitalizada, pois, sabe-se que muitas pessoas sofrem barotraumas em virtude do
excesso de oxigenação pulmonar, outro fator de suma importância, é a febre, pois, se
este fator não for respeitado o efeito da ventilação mecânica ao paciente passa a ser
prejudicial (CRESTO, 2021).
Sabe-se que a pandemia trouxe diversos contornos a demanda hospitalar,
entretanto, sem sombra de dúvida a que mais sofreu modificação foi referente a
utilização dos ventiladores mecânicos, pois, o aparelho é responsável pelo suporte
avançado de vida, em conjunto com as demais técnicas realizadas em ambiente de
assistência avançada à saúde. Portanto, o estudo, justifica-se pela necessidade de
compreender não somente a doença, haja vista, que ela depende do mesmo, mas como
funciona a montagem do presente aparelho e como é realizada a sua utilização. O
objetivo geral do estudo é compreender como é a aplicação do ventilador mecânico,
frente a necessidade da sua utilização em decorrência da Covid-19. Como objetivos
específicos tem se conhecer a dinâmica da doença, compreender o que é o ventilador
mecânico, qual a sua montagem e como o aparelho deve ser utilizado.
1.2. O COVID
Em 31 de dezembro de 2019, a Organização Mundial da Saúde (OMS) tomou
41
conhecimento de vários casos de pneumonia em Wuhan, província de Hubei,
República Popular da China. É uma nova cepa (tipo) de coronavírus que nunca foi
encontrada em humanos antes (Histórico da pandemia de COVID-19 - OPAS / OMS,
2021).
Uma semana depois, em 7 de janeiro de 2020, as autoridades chinesas
confirmaram que haviam descoberto um novo tipo de coronavírus. Eles são a segunda
causa de resfriado comum (depois do rinovírus) e, até as últimas décadas, raramente
causam doenças humanas mais graves do que o resfriado comum. Um total de sete
coronavírus humanos (HCoV) foram identificados: HCoV-229E, HCoV-OC43,
HCoV- NL63, HCoV-HKU1, SARS-COV (causando síndrome respiratória aguda
grave), MERS-COV (causando síndrome respiratória Oriente Médio) e o novo
coronavírus mais recente, inicialmente denominado temporariamente 2019-nCoV e
renomeado SARS-CoV-2 em 11 de fevereiro de 2020. Este novo tipo de coronavírus é
o responsável pela doença COVID-19. Conforme ilustrado na Figura 1 pode-se
analisar os números de casos relatados de Covid-19 em países em todo o mundo a
partir da confirmação das autoridades chinesas. (Histórico da pandemia de COVID-
19 - OPAS/ OMS, 2021).
Fonte: Ventiladores Pulmonares Mecânicos. Alibaba, 2020. Acesso em: 21 de abr. de 2022.
Nos dois casos, o gás desloca para dentro dos pulmões fazendo que os mesmos e a
caixa torácica se expandam em virtude das suas elasticidades, assim denominado de
respiração ou ventilação (URIBE, 2011). Este movimento de respiração ocorre através
de uma variação de pressão entre as vias aéreas superiores e o pulmão, podendo ser
realizado por um equipamento que diminua a pressão no pulmão (ventilação por pressão
negativa) ou que aumente a pressão da via aérea proximal (ventilação por pressão
positiva) (CARVALHO; TOUFEN JUNIOR; FRANCA, 2007).
Assim, diferente da respiração espontânea, o ventilador mecânico usa de pressão
positiva para forçar o ar para dentro dos pulmões durante a inspiração. O objetivo
fisiológico tem a se manter ou modificar as trocas gasosas, intervindo na ventilação
alveolar (hiperventilação ou hipoventilação de maneira controlada), porém utiliza-se
esta ferramenta para normalizar a ventilação alveolar, manter valores aceitáveis de
oxigenação arterial, aumentar o volume pulmonar, aperfeiçoar a capacidade residual
funcional e diminuir trabalho respiratório. Já os objetivos clínicos são focados na
reversão da hipoxemia com aumento da ventilação alveolar e do volume pulmonar,
permitir sedação, anestesia ou uso de bloqueadores neuromusculares, dentre outros e
44
reversão da acidose respiratória aguda e a fadiga da musculatura respiratória (CRESTO,
2021).
1.4. VENTILAÇÃO MECÂNICA INVASIVA
Os suportes ventilatórios são classificados em dois grupos: a ventilação mecânica
invasiva e não invasiva, em ambas as situações a ajuda com a ventilação artificial
acontece aplicando uma força nas vias aéreas. Sendo assim as duas situações
apresentam uma diferença na aplicação da pressão: nas ventilações invasivas usa-se
próteses adentradas nas vias aéreas (chamado tubo oro ou nasotraqueal ou cânula de
traqueostomia), já na ventilação não invasiva usa-se mascara como ligação entre o
respirador e o paciente. Conforme ilustrado na Figura 4 na qual pode-se analisar o
esquema de ventilação mecânica não invasiva (a) e invasiva (b) realizado no paciente de
forma adequada (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2008;
CARVALHO; TOUFEN JUNIOR; FRANCA, 2007).
Os sistemas de controle variam de acordo com o equipamento, mas constituem o
cérebro do equipamento, sendo programados pelo profissional e dirige o funcionamento
do ventilador (CALDERON ROMERO, 2006). Os equipamentos modernos contam
ainda com conjunto de sensores e interface para computador, para monitoramento e
controle de diversos parâmetros, além do envio, armazenamento, análise de medidas,
alarmes e dados sobre os procedimentos e evolução do paciente (AGÊNCIA
NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2008; CRESTO, 2021).
45
A alimentação dos ventiladores mecânicos acontece por rede elétrica ou baterias
internas com uma duração pequena para locomoção dos pacientes, e uma bateria
externa para casos esporádicos de quedas de energia da rede elétrica, cada máquina tem
um sistema de controle variado, mas em geral são todos similares com funções iguais,
mudando a programação pelo profissional que opera a máquina, nas máquinas mais
sofisticadas possuem interfaces e displays para melhor entendimento e monitoramento
do paciente, além do enviar, armazenar e analisar uma série de medidas e parâmetros
com a ajuda de alarmes e dados sobre os procedimentos e evolução do paciente
(AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2008; CALIL; ET AL,
2002).
Nesse contexto, pode-se analisar que os ventiladores são classificados de várias
formas de acordo com o tipo de ventilação mecânica, ambiente de sua utilização e
a p l i c a ç ã o ( C A L D E R O N R O M E R O , 2 0 0 6 ; C A RVA L H O ; TO U F E N
JUNIOR;FRANCA, 2007).
E as classificações mais utilizadas são:
● Ventilação por pressão negativa: No processo de
inalação, o dispositivo aplica pressão subatmosférica à cavidade
torácica do paciente para expandi-la e criar um gradiente de
pressão negativa, movendo assim o ar para os alvéolos. Ao
mesmo tempo, no processo de expiração, a pressão ao redor do
tórax tende à pressão atmosférica, fazendo com que a cavidade
torácica se contraia e o ar seja expelido dos alvéolos
(Cresto,2021).
● Ventilação por pressão positiva: Uma pressão positiva
acima da pressão atmosférica é gerada e aplicada às vias aéreas
superiores do paciente. Portanto, o gradiente de pressão
necessário para o movimento do ar para os pulmões é
estabelecido (Cresto, 2021).
1.5. VENTILAÇÃO MECÂNICA NÃO INVASIVA
A ventilação mecânica não invasiva (VNI) com pressão positiva como tratamento é
considerada o grande avanço das últimas décadas. Por ser um tipo de suporte
ventilatório parcial, e estar sujeito a interrupções, deve ser direcionada a pacientes
selecionados. A cooperação do paciente é um fator importante para obter sucesso neste
tratamento, essa técnica não deve ser utilizada naqueles que se encontram totalmente
dependentes da ventilação mecânica (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA
SANITÁRIA, 2008).
Os ventiladores específicos para VNI têm como característica principal a presença
de um circuito único, por onde ocorrem tanto a inspiração como a expiração. Um
orifício localizado na porção distal deste circuito é obrigatório para minimizar a
reinalacão de dióxido de carbono CO durante a inspiração apneia, a insuficiência
respiratória decorrente da doença pulmonar intrínseca e a hipoxemia, falência mecânica
do aparelho respiratório, prevenção de complicações respiratórias e redução do trabalho
muscular respiratório (CALIL; et al, 2002).
Nesse procedimento se pode oferecer um suporte ventilatório ao paciente através de
46
uma interface sem que necessite de procedimentos invasivos como IOT, reduzindo
gastos e complicações associadas. Esse método oferece algumas vantagens como
decréscimo do trabalho respiratório, melhoria da ventilação alveolar e padrão
respiratório (CALIL; et al, 2002). Na teoria todo ventilador pode ser utilizado para
aplicação de VNI, entretanto se deve ter em vista que seu desempenho não seja lesado
pela presença de vazamentos. Contudo existem ventiladores específicos para VNI,
caracterizado por um circuito único que realiza os ciclos inspiratórios e expiratórios. É
imperativo que na área distal desse circuito haja um orifício, para minorar a reinalação
do CO (SCHETTINO, et. Al. 2003).
Através desse orifício há um escape de ar constante, auxiliando na eliminação do
CO expirado. Os ventiladores específicos para VNI são projetados para desempenhar
sua função na presença de vazamentos. A boa sincronia, a complacência a vazamentos e
os custos reduzidos são os principais prós para a aquisição desses ventiladores.
(VITACCA et. Al. 2015). Um dos pontos mais importantes na VNI é a escolha da
interface adequada para cada paciente. Há inúmeras interfaces disponíveis atualmente:
máscaras nasais, faciais (oronasais), facial total, capacetes, peças bucais e almofadas
nasais (CALDERON ROMERO, 2006).
Em situações agudas é preferível a utilização das máscaras faciais, mas assim como
as máscaras faciais totais e o capacete, estas são por muitas vezes mal toleradas, por criar
sensação claustrofóbica e suscitam maiores riscos de aspiração de vômitos. Na
ventilação domiciliar as máscaras nasais são preferíveis por todas suas comodidades
como comunicação e a alimentação oral, quando há escape de ar pela boca pode-se
utilizar apoio no mento (parte inferior do rosto), contornando assim a problemática
(CALDERON ROMERO, 2006).
Não existe evidência que recomendem a utilização da máscara oronasal, ao invés da
nasal para pacientes com insuficiência respiratória aguda. Assim, as máscaras que
possuem um orifício de exalação podem diminuir a reinalação de CO , tudo isso se
comparado ao uso de orifícios de exalação no circuito de ventiladores de VNI, capacetes
e as alternativas (CAMPOS; COSTA, 2020).
Os capacetes eliminam o contato da interface com a face do paciente evitando
possíveis complicações da VNI. Além do paciente poder falar, comer ou beber
utilizando o VNI, também ocorre a diminuição de intubações, normalmente utilizado
em pacientes intubados, e o mesmo fornece suporte respiratório sem intubação,
diminuindo a possibilidade de ocorrer infecções hospitalares como pneumonia e a
sinusite (CALIL; et al, 2002).
Para melhores resultados, o uso da VNI requer conhecimentos específicos a fim de
ser eficaz, observando antes o tamanho correto da pronga ou da máscara e o
posicionamento correto para evitar extensiva ou extensão. Nas contraindicações a
utilização da VNI está a instabilidade cardiopulmonar grave, episódios apneicos
intratáveis, anormalidades faciais ou das vias aéreas congênitas e a incapacidade de
proteger uma via aérea (SPADARI; GARDENGHI, 2020). A VNI também não pode ser
usada em pacientes com cirurgia recente do trato gastrointestinal superior e com
traumas ou queimaduras faciais (CALIL; et al, 2002).
47
Figura 4: Esquema ventilação mecânica não invasiva (a) e invasiva (b).
48
de criação dos ventiladores, bem como o funcionamento técnico do equipamento, que
teve o funcionamento apresentado aos alunos durante a transmissão; eles ressaltaram a
importância do papel do Engenheiro como agente de mudança e auxílio na sociedade
em momentos de grandes desafios (Poli USP, 2020).
Segundo os professores, por conta do diálogo firmado ao longo de 20 anos com
médicos, matemáticos e físicos, a aplicação dos conceitos em Engenharia se tornou uma
fonte fundamental para resolver impasses inseridos na área da Saúde. “A pandemia não
surgiu apenas como um problema a ser resolvido pela Saúde e, para isso, a Engenharia
deveria se mobilizar e auxiliar a sociedade”, comentou Zuffo. Com grupos de pesquisa
que acompanham a evolução dos computadores ao longo de 50 anos, os responsáveis
desenvolveram as tecnologias necessárias para a fabricação do ventilador pulmonar
(Figura 5) durante um cenário de contingência, ou seja, enquanto enfrentavam a falta de
equipamentos, alta demanda de recursos sanitários e a alta precificação do mercado
(Poli USP, 2020).
51
MULHERES NA GESTÃO DE
TECNOLOGIAS E ENGENHARIA CLÍNICA:
O CASO DOS VENTILADORES PULMONARES NA
COVID-19
(1) Especialista, Centro de Tecnologias para o SUS – São Paulo (SP), fotini.toscas@isaude.sp.gov.br
(2) Doutora, Associação Brasileira de Engenharia Clínica (ABEClin), leriaholabach@icloud.com
(3) Especialista, Informática em Saúde, Engenharia Biomédica, anapaula.ljsantos@gmail.com
52
1 INTRODUÇÃO: ESCASSEZ DE VENTILADORES PULMONARES
A crise sanitária imposta pela pandemia da Covid-19 tem exigido esforços hercúleos
dos sistemas de saúde. Nesse enfrentamento, veio à tona das discussões a oferta e a
disponibilidade de ventiladores pulmonares, equipamento médico-assistencial crucial
para o atendimento dos casos graves da doença. A assimetria entre a disponibilidade
desses equipamentos ante a demanda histórica mundial gerou disputas entres os países,
com restrições e vedações de exportação, como a Lei nº 13.993/2020, que proibiu a
exportações de ventiladores pulmonares e outros produtos essenciais ao combate à
epidemia de coronavírus no Brasil.
O ventilador pulmonar é um equipamento utilizado para proporcionar a ventilação
pulmonar e artificial. O objetivo é prover suporte ventilatório completo ou parcial em
pacientes que não conseguem respirar por vias normais.
O risco iminente de desabastecimento de ventiladores pulmonares nos serviços de
saúde acarretou diversas frentes de trabalho e forças-tarefas para manter e disponibilizar
o maior número possível desses equipamentos à disposição para o tratamento dos
pacientes acometidos pela doença.
Os esforços foram empregados na escalada da produção nacional, em iniciativas
para realizar manutenção e recuperar o maior número possível de ventiladores
pulmonares, e iniciativas de projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação de novos
equipamentos. Tendo em vista a complexidade tecnológica e operacional desses
equipamentos, surgiu a necessidade de destacar a importância da atuação dos
profissionais de gestão de tecnologias em saúde e da engenharia clínica.
O agravamento da crise sanitária, em janeiro de 2021, colapsou serviços de saúde
com busca isocrônica por Unidades de Terapias Intensivas (UTI). Em meio ao colapso,
a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) detectou nova variante da linhagem Sars-CoV-2 e
confirmou o primeiro caso de reinfecção pelo novo coronavírus no estado do Amazonas.
Entre os pontos críticos, foram destaque: a escassez caótica de oxigênio e as taxas de
ocupação de leitos de UTI acima de 90%, Lobato (2021).
A extrema urgência no abastecimento das unidades de saúde provocou ações
conjuntas entre a sociedade civil e o poder público. Entre elas, destacou-se, inclusive em
âmbito nacional, a “SOS AM” - SOS Amazonas. A ação proveu retorno ágil à população
(individual, com fornecimento e abastecimento de cilindros) e prioritariamente à rede
de saúde, Mansueto (2021). Um diferencial na ação foi a agilidade dos processos e a
mobilização já no início de profissionais de engenharia clínica. Esses profissionais
participaram de todo o processo, desde a aquisição até a instalação de equipamentos
médicos, principalmente ventilador pulmonar, além da atuação na análise contingencial
para suprir o oxigênio, prestando suporte técnico na aquisição e gestão tecnológica de
concentradores e usinas de oxigênio.
2 GESTÃO DE TECNOLOGIAS E ENGENHARIA CLÍNICA
A gestão de tecnologias em saúde é definida na Política Nacional de Gestão de
Tecnologias em Saúde (PNGTS), publicada em 2011 pelo Ministério da Saúde, como
um conjunto de atividades gestoras relacionadas com os processos de avaliação,
incorporação, difusão, gerenciamento da utilização e retirada de tecnologias do sistema
de saúde. Esse processo deve ter como referenciais as necessidades de saúde, o
53
orçamento público, as responsabilidades dos três níveis de governo e do controle social,
além dos princípios de equidade, universalidade e integralidade, que fundamentam a
atenção à saúde no Brasil.
Já a engenharia clínica pode ser definida como o ramo da engenharia dedicado a
auxiliar e mesmo interferir na área da saúde, com o intuito de alcançar bem-estar,
segurança, redução de custos e qualidade nos serviços disponíveis aos pacientes e à
equipe multidisciplinar do hospital, por meio da aplicação dos conhecimentos
gerenciais e de engenharia à tecnologia da área de saúde. Esses profissionais agem em
todo o ciclo de vida das tecnologias da saúde, desde a Pesquisa, Desenvolvimento e
Inovação (PD&I), gerenciamento da tecnologia médico-hospitalar, avaliação de
tecnologias em saúde, incorporação e aquisição de tecnologias, gestão regulatória e
acesso de mercado.
3 O PAPEL DAS MULHERES NA ENGENHARIA CLÍNICA
A atuação das mulheres na área de gestão de tecnologias e engenharia cresce
paulatinamente. No que tange à engenharia, principalmente nas atuações em campo e
cargos de alta gestão, ainda é correlacionada com atuações masculinas; o que torna a
abordagem do tema de maior relevância ao destaque das mulheres na área de engenharia
clínica, Lombardi (2017).
Para discutir o tema, realizou-se uma pesquisa, por meio de formulário eletrônico
detalhado na seção de Métodos, para conhecer e compreender a participação das
mulheres nas áreas de ciência e saúde, com foco em engenharia clínica. Foram
respondidos 102 formulários, em que após refinamento, foram validados 88 destes.
Após novo refinamento, obtiveram-se 81 formulários de mulheres com curso superior
que estavam atuando com o uso de tecnologias para a saúde no apoio à pandemia de
Covid-19. Destas, apenas 56 realizaram o Curso de Especialização em Engenharia
Clínica.
Em 2020, a Associação Brasileira de Engenharia Clínica (ABEClin) realizou
pesquisa com o objetivo de conhecer o salário de seus associados (todos que trabalham
com engenharia clínica). Um dos questionamentos foi o sexo, e apenas 19% dos
associados que responderam o formulário eram mulheres, enquanto 81% eram do sexo
masculino, de um universo de 261 formulários respondidos. Isso permite dizer que o
número de mulheres na engenharia clínica, ou seja, que atuam com tecnologias da saúde
é inferior de forma significativa ao sexo masculino, ABEClin (2020).
Na atuação direta para o enfrentamento da pandemia, a ABEClin, em parceria com o
Ministério da Saúde, o Ministério da Economia e o Serviço Nacional de Aprendizagem
Industrial (Senai), realizou um levantamento de voluntários para atuar na força tarefa
para manutenção de ventiladores pulmonares, SENAI (2020) e ABEClin – Links e
documentos Covid-19 (2020), em que, do total de 118 voluntários profissionais,
somente 20% eram mulheres.
É de suma importância destacar a participação de mulheres em atividades que são
cruciais para responder, em tempo oportuno, às demandas oriundas de emergências
sanitárias. Registrar e evidenciar a atuação de mulheres na gestão tecnológica com
vistas ao alcance, estímulo e recrutamento de maior participação de mulheres nas
atividades de engenharia clínica e gestão de tecnologias em saúde.
54
PESQUISAS REALIZADAS
O método de pesquisa escolhido para o levantamento dos dados foi descritivo e
exploratório para atender a uma questão específica por meio de buscas na literatura.
Nesse caso, a questão à qual se pretende responder corresponde à Covid-19.
A busca na literatura foi feita na base de dados disponíveis no sítio eletrônico do
Ministério da Saúde, com os dados da resposta brasileira ao enfrentamento do novo
coronavírus, e da página eletrônica da ABEClin, com as atividades de suporte à Covid-
19. Foram verificadas as ações registradas, além de pesquisadas cinco perguntas
fechadas entre abril e julho de 2020 utilizando os descritores combinados pelo operador
lógico “Covid-19” e “ventilador pulmonar”. O símbolo de asterisco foi empregado para
incluir na pesquisa o termo no plural. Os termos foram buscados no campo que inclui na
pesquisa os trabalhos que possuem o termo no título, resumo ou palavras-chaves,
possibilitando a localização de um maior número de documentos. Foi encontrado um
total de cinco documentos. O quadro 1 mostra a distribuição dos artigos encontrados, e o
quadro 2, as referências das buscas realizadas.
A pesquisa foi limitada para apenas artigos científicos, em que foi obtido um total de
13 documentos. Após, foi realizada a leitura do título, do resumo e das palavras-chave
de todos os trabalhos, em que foram selecionados cinco artigos, classificando-os
conforme o objeto de estudo. A pesquisa pode ser classificada como de natureza
aplicada, pois tem por objetivo gerar conhecimentos para aplicação prática. Quanto à
abordagem, a pesquisa é tanto qualitativa quanto quantitativa, pois envolve um
aprofundamento da compreensão de uma organização ao mesmo tempo que recorre à
linguagem matemática para descrever as causas de um fenômeno. A utilização conjunta
das pesquisas qualitativa e quantitativa permite obter mais informações do que se
fossem feitas de forma isolada, corroborando as experiências práticas das autoras nos
processos de gestão de tecnologias. O objetivo é proporcionar maior familiaridade com
o problema com vistas a torná-lo explícito ou a construir hipóteses, e de procedimento
bibliográfico, elaborada com base em material já publicado, Fonseca (2002) e Gil
(2010).
56
Destaca-se a importância desse processo, já que o projeto de desenvolvimento requer
especificações técnicas e dados de entradas específicos, além da gestão de riscos com as
análises dos componentes, em atenção à gravidade pulmonar dos pacientes em
tratamento da Covid-19. Os projetos devem obrigatoriamente observar os aspectos de
regularidade sanitários, porém, dada a complexidade do equipamento, outros aspectos
devem ser analisados para disponibilização nos serviços de saúde, como características
do gerenciamento da tecnologia durante todo o ciclo de vida, como treinamento,
manutenção, assistência técnica, peças de reposição, fornecimento dos consumíveis,
desativação e descarte. Ressalta-se que o ventilador pulmonar é tecnologia operador-
dependente, cujas características de usabilidade, treinamento, interface são
consideradas para minimizar a curva de aprendizado. A fim de otimizar os recursos
públicos, são observadas as versatilidades das configurações para que os ventiladores
pulmonares possam ser aproveitados nos serviços de saúde em outras condições clínicas
no período pós-pandemia. Assim, foram realizadas análises dos projetos com prontidão
tecnológica e passíveis de escalonamento tendo como desafio transformar os protótipos
viáveis e funcionais, com as orientações de aspectos regulatórios, e técnico-
operacionais, com os critérios mínimos que assegurem a qualidade e segurança dos
ventiladores pulmonares.
57
Segundo Ruktanonchai et al (2020), a atuação da gestão de tecnologias também
colaborou nos processos para avaliação comparativa das especificações técnicas dos
ventiladores pulmonares, cujo corroborado por meio de referências técnicas como o
documento Technica lspecifications for invasiveand non invasive ventilators for Covid-
19 Interim guidance, publicado em 15 de abril de 2020, pela Organização Mundial da
Saúde (OMS). A avaliação se estendeu aos projetos de desenvolvimento de ventiladores
pulmonares com prontidão tecnológica com o objetivo de apoiar avaliações precoces de
novas tecnologias, além de contribuir tecnicamente nas análises referentes às medidas
tributárias para alterações tarifárias, restrições às exportações dos equipamentos críticos
para enfrentamento da pandemia.
Outro considerável fato foi a análise técnica de ventiladores desenvolvidos em
parceria entre indústria e poder público. A indústria buscou relação custo x benefício
para produção em escala, o que demonstrou o notório diferencial na avaliação por um
especialista na área de engenharia clínica. Nesse exemplo, a análise confirmou que o
equipamento desenvolvido não teria mercado para consumo em médio e longo prazo.
Outra participação em destaque é na força-tarefa para manutenção dos ventiladores
pulmonares, que reuniu mais de 500 engenheiros e técnicos capacitados voluntários,
mais de 21 parceiros, e foi distribuída por toda a federação pronta para prestar o suporte
necessário para recolocar em operação o maior número de ventiladores pulmonares.
Estima-se que estavam fora de operação 3,6 mil ventiladores pulmonares que impactam
nos serviços de saúde, sendo mais de 2 mil equipamentos recuperados por essa
iniciativa, SENAI (2020) e ABEClin – Links e documentos Covid-19 (2020).
Na ação da força-tarefa, a ABEClin participou com duas relevantes linhas de frente:
na captação de voluntários profissionais (pessoa física e jurídica) e na orientação às
entidades responsáveis na preparação do local para a realização da manutenção dos
ventiladores pulmonares. A orientação ocorreu em toda a cadeia de processo, desde o
recolhimento dos equipamentos nos Estabelecimentos Assistenciais de Saúde (EAS),
recebimento no local da manutenção, higienização, manutenção, calibração até o
retorno. Já foram devolvidos mais de 1.500 ventiladores pulmonares.
A captação de voluntários ocorreu totalmente on-line por meio das mídias digitais da
ABEClin (Instagram/Facebook/LinkedIn/ Grupo oficial WhatsApp e do Telegram). A
relação dos voluntários foi encaminhada ao Ministério da Saúde e ao Ministério da
Economia para operacionalização da força-tarefa, ABEClin – Links e documentos
Covid-19 (2020).
Os comunicados de orientação para as empresas terceirizadas para serviços de
engenharia clínica e profissionais no manejo do ventilador pulmonar, a busca de troca de
experiência internacional com os demais colegas da área e a atuação constante no
combate à desinformação também foram destaque.
Entre tantas trocas de experiências internacionais, ressalta-se a entrevista realizada
com a Associação Italiana de Engenharia Clínica (Associazione Italiana Ingegneri
Clinici – AIIC) em março de 2020. A realização das manutenções preventivas e
corretivas dos equipamentos médicos, principalmente utilizados na UTI, foi uma das
principais orientações de nossos colegas italianos. Outro ponto de relevância na
entrevista foi a orientação para a engenharia clínica brasileira aproveitar a oportunidade
de informação antecipada em um momento com dados escassos para a tomada de
decisão, sendo um diferencial para a preparação dos profissionais no enfrentamento da
58
Covid-19.
O estado emocional foi uma das preocupações; parcerias com entidades por meio de
projetos como a escuta ativa colaboraram para proporcionar alívio aos profissionais nos
serviços de saúde.
Na análise e no tratamento dos dados da pesquisa realizada com os 88 formulários
válidos, foi possível verificar que 81 mulheres possuíam curso superior e estavam
atuando na gestão de tecnologias para a saúde no apoio à pandemia de Covid-19.
Quanto à formação acadêmica, observou-se que 56 responderam que tinham o Curso de
Especialização em Engenharia Clínica, 2 com formação em cursos técnicos de nível
médio e 5 não informaram. Em relação ao tempo de formação, menos de 1 ano foi
17,11%; já entre 1 ano e 5 anos de formada, foi obtido 14,47%; e acima de 5 anos,
28,95%. Em relação ao tempo de atuação até 1 ano, 15,91%; entre 1 ano e 5 anos,
28,41%; e acima de 5 anos, 46,59%. Os locais de atuação mais significativos foram em
serviços de saúde, 56,03%; empresas privadas, 21,28%; área pública, 9,22%; e área
acadêmica, 5,67%.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A crise causada pela pandemia do novo coronavírus humano despontou as
discussões para a necessidade de profissionais que atuem na gestão de equipamentos
médico-hospitalares em todas as esferas de gestão – e, especialmente, nos serviços de
saúde. Esses profissionais, operantes em gestão de tecnologias e engenharia clínica,
ainda são, em sua maioria esmagadora, homens. A participação das mulheres nesses
cenários é altamente relevante, muito embora ainda tímida pelo pouco espaço ocupado.
Divulgar e dar amplo conhecimento as ações de mulheres nessa área, criar ambientes
favoráveis e estimular para que os espaços das engenharias de saúde e cargos de gestão
possam ser ocupados por mulheres em posição de igualdade colaboram para o
cumprimento do Objetivo 5 da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável:
alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas.
REFERÊNCIAS
Associação Brasileira de Engenharia Clínica. Links e documentos covid-19. Disponível em:
http://www.abeclin.org.br/post.php?p=213. Acesso em: 15/06/2020.
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http://www.abeclin.org.br/post.php?p=160. Acesso em: 19/05/2021.
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60
GEOTECNOLOGIAS APLICADAS NO
MAPEAMENTO DA COVID-19 NA REGIÃO
NORDESTE DO BRASIL
RESUMO. O uso das Geotecnologias vem tornando-se mais presente para obtenção
de informações visando a elaboração de pesquisas voltadas para a representação
espacial dos variados temas, para diversas áreas do conhecimento. O objetivo central
desse trabalho é apresentar a utilização das geotecnologias, especificamente a
representação cartográfica, no mapeamento e divulgação dos casos de Covid-19 na
Região Nordeste do Brasil. Nesse sentido, realizamos um levantamento de base
bibliográfica referente aos temas propostos, além de construirmos um Banco de
Dados Geográficos – BDG com informações disponibilizadas pelas Secretarias de
Saúde de cada estado da região Nordeste, bem como do Ministério da Saúde, referente
aos casos suspeitos, descartados, confirmados e óbitos, e, ao final, apresentamos as
formas de divulgação dessas informações pelos governos estaduais da região em
estudo. A pesquisa evidenciou que não há uma padronização da disponibilização das
informações acerca do novo Coronavírus, pois cada Estado, na Região Nordeste, faz
uso de metodologias e ferramentas geotecnológicas distintas. Diante disso, observou-
se que a transparência e a compreensão dos dados, em alguns casos, não se dão por
completo. Por fim, entende-se que o uso das geotecnologias, quando utilizadas de
forma padronizadas, auxiliam gestores públicos e privados na tomada de decisões
coletivas. Nesse sentido, propôs-se um modelo de divulgação de dados e informações
sobre os casos de COVID-19.
61
1 INTRODUÇÃO
No decorrer dos últimos meses, o mundo vivencia um surto de um vírus que tem
provocado enormes prejuízos socioeconômicos, em especial aos sistemas econômicos e
da saúde, decorrente do alto índice de mortalidade, principalmente em países
desenvolvidos, como é o caso da Itália, da China e, recentemente, da Espanha, se
estendendo para os países localizados em outros continentes, a exemplo do Brasil.
Segundo o Ministério da Saúde no Brasil (2020), o Coronavírus se apresenta como
um grupo familiar de vírus que provocam infecções respiratórias. Sendo que um novo
agente desse grupo foi descoberto em 31 de dezembro de 2019, depois de casos
registrados na China, especificamente na cidade de Wuhan, província de Hubei. Para
essa doença denominou-se novo coronavírus (COVID-19).
O Centro de Ciências e Engenharia de Sistemas (CSSE) da Universidade Johns
Hopkins, nos Estados Unidos (2020), até a data do dia 13 de abril de 2020, apresentou
dados que mostraram o número de 1.850.220 casos confirmados e o número de óbitos
chegavam a 114.185 em todo o globo terrestre. No Brasil, em relação a mesma data,
segundo o Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública do Ministério da
Saúde (2020), o número de casos confirmados chegava a 22.169, onde houveram 1.223
óbitos.
Nesse contexto, procuramos delimitar o espaço de análise para a Região Nordeste
brasileira, já que o objetivo principal do trabalho é apresentar o uso das geotecnologias
no mapeamento da COVID-19 para essa região, expondo as formas de aquisição e
disponibilização dos dados a partir de cada estado que a compõe. A partir de então,
caracterizamos a região, de forma sucinta, para compreendermos o objeto da pesquisa,
ou seja, as 09 (nove) Unidades Federativas, considerada a segunda maior região do
Brasil, representando 18% do território nacional (IBGE, 2010).
Em relação a distribuição territorial de casos confirmados da COVID-19 e óbitos
causados nessa região até o dia 27 de abril de 2020, encontra-se com o número de 19.427
casos confirmados e 1.200 óbitos, onde o primeiro número representa 29,3% e o
segundo representa 28,5% do total de casos e óbitos confirmados a nível nacional,
segundo o último Boletim Epidemiológico divulgado no dia 27 de abril de 2020, pelo
Ministério da Saúde.
Sabendo que os dados e informações citados acima são atualizados diariamente,
torna-se necessário a utilização de ferramentas que permitam a rápida manipulação e
plotagem dessas informações. Assim, o uso das geotecnologias é imprescindível para
tal, já que, de acordo com Ferraz (et al 2015), “são um conjunto de tecnologias para
coleta, processamento, análise e disponibilização de informações”, ou seja, são
ferramentas que possibilitam a análise da realidade que “está sujeita a contínuas
mudanças que modificam, rapidamente, a projeção territorial dos fenômenos
econômicos e sociais” (MOURA, 2014, p.12). Através disso, a realidade espacial pode
ser representada cartograficamente, facilitando o entendimento e compreensão das
informações, de acordo com objetivos traçados pela pesquisa.
O artigo apresenta a estrutura como segue. Após essa introdução, a próxima Seção
aborda a metodologia traçada e as técnicas utilizadas para a construção do artigo. A
Seção 3, expõe os resultados obtidos da pesquisa e, logo, a discussão articulada a um
referencial teórico. A Seção 4 traz as considerações finais e, por fim, a Seção 5 traz as
62
referências bibliográficas utilizadas durante o percurso da construção desse trabalho.
2 METODOLOGIA
A pesquisa foi entendida e elaborada a partir de uma metodologia capaz de
promover e desenvolver uma discussão quanti-qualitativa. Para tanto, realizamos um
levantamento de base bibliográfica referente aos temas propostos, além de construirmos
um Banco de Dados Geográficos – BDG com informações disponibilizadas pelas
Secretarias de Saúde de cada estado da região Nordeste, bem como do Ministério da
Saúde, referente aos casos suspeitos, descartados, confirmados e óbitos, e, ao final,
representamos cartograficamente as informações coletadas.
Para a elaboração dos mapas foi utilizado o software QGIS 3.4 Madeira. O Sistema
de Informações Geográficas - SIG possui um Banco de Dados Geográficos – BDG que
foi alimentado com os dados supracitados e a base cartográfica vetorial foi obtida no site
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2017). O BDG e o arquivo
vetorial foram estruturados no SIG, com o Sistema de Projeção Geográfica, Datum
horizontal SIRGAS 2000, com Meridiano Central 39ºW.
Após estruturação do projeto, fez-se uma classificação intervalar (graduada) em
ambiente SIG, utilizando o método quantil, que permite agrupar os dados pelo número
de classes pré-determinados que contém um número igual de observações. Nesse
método de classificação, os dados à serem classificados foram, inicialmente, ordenados
e foi encontrado o valor da mediana. Logo após, os subconjuntos acima e abaixo da
mediana foram subdivididos.
Os dados foram agrupados para a elaboração final do mapa. Para tanto, seguimos
para o compositor de impressão para inserir os elementos básicos do mapa (escala,
coordenadas geográficas, legendas, fonte, título e norte geográfico).
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
O novo Coronavírus (covid-19) e a sua rápida disseminação
Nos últimos meses, o mundo foi pego de surpresa com a descoberta de casos de uma
contaminação viral, cujo o vírus está ligado a família Coronavírus (Cov). A
denominação do novo Coronavírus foi algo que possibilitou determinadas discussões
entre cientistas e autoridades em todo o mundo.
Os primeiros casos dessa contaminação se deram na cidade de Wuhan, província de
Hubei, na China. A partir disso, segundo o Panorama Farmacêutico (2020), o vírus ficou
denominado como “2019-nCov”. No entanto, devemos levar em consideração que o
termo já não é mais utilizado por cientistas. De acordo com a Organização Mundial da
Saúde (2020), para evitar confusão dentre a compreensão dos vírus que compõe a
família Coronavírus, o descoberto é taxado como Sars-Cov-2, uma sigla inglesa que
significa “Severe acute respiratory syndrome coronavirus 2”, sendo traduzida para o
português com a seguinte definição: Síndrome Respiratória Aguda Grave do
Coronavírus 2. O numeral 2 (dois) é atribuído pelo fato de que já existe um vírus
semelhante, o Sars-Cov-1 (ou apenas Sars). Esse que foi responsável pela epidemia na
China no ano de 2002, além do Mers (também integrante da dessa família viral), que
atingiu o Oriente Médio no ano de 2012.
O termo COVID-19 é o nome oficial do novo Coronavírus, utilizado por toda
63
população ao designar-se ao vírus que se remete ao Sars-Cov-2. Nesse contexto, de
acordo com Ferreira (et al 2020), a rápida e momentânea disseminação do vírus pelo
mundo, em conjunto à sua gravidade, levou o Diretor-Geral da Organização Mundial da
Saúde (OMS), o Dr. Tedros Adhanom Ghebreyesus, em um dos seus discursos, no dia
11 de março de 2020, a caracterizar a situação como uma Pandemia.
De acordo com o Ministério da Saúde do Brasil (2020), a forma de contaminação é
através do contato físico direto ou indireto com pessoas ou objetos infectados. Os
sintomas desenvolvidos pela COVID-19 podem variar por um simples resfriado até o
desenvolvimento de uma pneumonia severa. Os sintomas mais comuns são: tosse,
febre, coriza, dor de garganta e, em estados mais críticos, uma persistente dificuldade
respiratória. Além disso, Strabelli e Uip (2020) nos diz que 5% dos casos acometidos
pelo novo Coronavírus, dentre os sintomas observados, podem persistir-se a dispneia, o
sangramento pulmonar, a linfopneia grave e a insuficiência renal.
A partir do dia 31 de dezembro de 2019, após pronunciamentos do governo chinês,
ao relatar os primeiros registros da COVID-19, novos casos começaram a ser
notificados e o processo de disseminação ocorreu de forma intensa para países europeus,
tais como a França, a Itália, a Espanha, entre outros. Países considerados
economicamente desenvolvidos, mas, que sofreram grandes impactos dentro dos seus
sistemas econômicos e de saúde, além do alto número de óbitos registrados, no caso da
Itália, onde no dia 27 de março de 2020, atingiu o número de 919 óbitos chegando a
recorde em um único dia, seguida pela Espanha que, em 24 horas, contabilizou o total de
769 óbitos (Portal G1, 2020).
Devido aos avanços da globalização, o fluxo de entradas e saídas de pessoas e
mercadorias em países, além do contínuo progresso do capital econômico ligado ao
turismo e até mesmo as pontes de interligação continental unindo espaços, outrora
segregados (SANTOS, 2012), permitiram que a propagação do vírus atingisse todos os
continentes do planeta, preocupando autoridades e toda população mundial.
Nesse contexto, ao tratarmos sobre o Brasil, país que, de acordo com Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatísticas (2020), apresenta uma população de
aproximadamente 211,4 milhões de habitantes, o fluxo de entrada e saída de pessoas no
país é considerável e, logo, o primeiro caso da COVID-19 no país foi confirmado.
Segundo o Ministério da Saúde (2020), foi no estado de São Paulo, no dia 26 de
fevereiro de 2020, onde um senhor de 61 anos de idade, com histórico de viagem para
Itália, apresentou alguns dos sintomas e, procurando ajuda hospitalar, fizeram os
devidos exames. Esse exame se dá através de biologia molecular, capaz de mostrar se
indivíduo está contaminado pela COVID-19 ou outras doenças, como a Influenza ou a
presença de Vírus Sincicial Respiratório (VSR), e o exame Imunológico (conhecido
como teste rápido), que pode detectar, ou não, a presença de anticorpos em amostras
coletadas. Porém, pode ser feito apenas após o sétimo dia de início dos sintomas.
Com a rápida movimentação de pessoas entre as diversas regiões do país, além da
chegada de várias outras advindas de países com casos confirmados, o número de casos
suspeitos e confirmados da COVID-19 no Brasil vai aumentando dia a dia. De acordo
com o Painel “CORONAVÍRUS//BRASIL” (2020), criado pelo Ministério da Saúde
para disponibilização de informações acerca do novo Coronavírus e outras doenças
virais, entre o dia 26 de fevereiro e 15 de abril de 2020, o número atingido foi de 28.320
casos confirmados. Apenas no 14 de abril, o Brasil registrou o total de 3.058 novos
64
casos. Sendo, que, o primeiro óbito causado pelo vírus no Brasil, foi registrado no dia 17
de março de 2020. Para essa variável, até o dia 15 de abril do mesmo ano, o número de
óbitos chegou a 1.736, sendo esses números distribuídos em todo o território nacional.
A região Nordeste do Brasil, segundo o IBGE (2010), representa cerca de 18% do
território do país, com uma população de aproximadamente 53,1 milhões de habitantes,
distribuídos em 9 (nove) estados, que são: Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do
Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia. Nela, o primeiro caso
confirmado da COVID-19 foi notificado e registrado pela Secretária de Saúde do estado
da Bahia (Sesab, 2020), no dia 06 de março. A partir de então, o número de casos
confirmados vem aumentando diariamente. Até o dia 15 de abril de 2020, a Região
Nordeste totalizava, segundo o Ministério da Saúde (2020), 5.831 casos confirmados
(20,6% do total nacional) e, dentre esses, o total de 377 óbitos causados pelo vírus, onde
o primeiro registrado ocorreu no dia 25 de março de 2020, no estado do Pernambuco
(SES-PE, 2020).
Com o alto índice de propagação de casos suspeitos, confirmados e óbitos
desencadeados pelo novo Coronavírus, o Ministério da Saúde e as Secretarias Estaduais
de Saúde buscaram desenvolver meios e técnicas para facilitar a divulgação de dados e
informações referentes a COVID-19, seja através de sites governamentais oficiais ou
redes sociais, buscando conscientizar a população, atualizar os números de casos e
óbitos e, apresentar a distribuição territorial do vírus através de representação
cartográfica ou apenas pelo Boletim epidemiológico.
No entanto, veremos como os estados que integram a Região Nordeste do Brasil
utilizam-se das geotecnologias para disponibilizar as informações coletadas acerca da
COVID-19.
Distribuição e divulgação das informações acerca da Covid-19 no Nordeste do Brasil
A rápida disseminação da COVID-19 fez com que instituições internacionais, como
a Organização Mundial da Saúde (OMS), grupos de pesquisas científicas e Órgãos do
Poder Executivo Federal e Estadual, como é o caso do Ministério da Saúde e as
Secretarias Estaduais de Saúde, buscassem desenvolver métodos para aquisição e
apresentação de informações sistematizadas, proporcionando a facilidade de
compreensão do exposto para a sociedade geral, além de manter a transparência dentro
dos portais de informações.
Segundo Ministério da Saúde do Brasil (2017), a estrutura do sistema de saúde do
país está subdividida. O órgão maior, o Ministério da Saúde, que formula, normatiza e
fiscaliza a nível nacional; em seguida vem as Secretarias Estaduais de Saúde (SES), que
participa do planejamento, controle e execução de ações nos serviços de saúde de cada
estado e, por seguinte, vem as Secretarias e Conselhos Municipais de Saúde.
Cada repartição ligada a estrutura do sistema de saúde do Brasil tem sua autonomia e
incumbências. No caso do tema exposto, cabe a cada estado da região Nordeste, assim
como as demais regiões, através da sua Secretaria de Saúde, informar e apresentar a
distribuição do novo Coronavírus dentro do seu território, além de outras informações,
para a sociedade.
Para compreendermos melhor a distribuição territorial dos casos e óbitos
desencadeados pela COVID-19 na região Nordeste, construímos representações
cartográficas a partir de informações disponibilizadas pelo Ministério de Saúde e
65
Secretarias Estaduais de cada estado que compõe a região. Isso foi possível a partir da
utilização de ferramentas geotecnológicas de mui valia para o estado, sociedade
técnico-científico e sociedade em geral.
A partir do uso e manipulação de qualquer informação espacial, levando em
consideração os objetivos propostos, juntamente com o uso das geotecnologias, torna-
se possível revelar elementos de conhecimento e novas sugestões de interpretação
relacionadas a particularidades de qualquer fenômeno em determinado espaço-tempo.
Um dos benefícios e adequação do uso das ferramentas geotecnológicas é a
possibilidade de aperfeiçoar o uso de dados espaciais, levando em consideração a sua
forma rápida de manipulação, permitindo uma análise intrínseca das subjetivas e
contínuas mudanças que ocorrem dentro da sociedade, investigando determinismos
antrópicos e da própria natureza.
Nesse caso, entende-se que as geotecnologias são tidas como ferramentas essenciais
para o gerenciamento de informações espaciais, proporcionando a organização em
produtos gráficos e/ou cartográficos, além de permitir a tomada de decisões feita por
qualquer ser ou entidade com um maior conhecimento da causa em análise,
proporcionando a facilidade da transparência na divulgação de dados nos sistemas
governamentais.
No início do mês de março de 2020, começamos a observar os primeiros casos de
COVID-19 no Nordeste e, ao passar do tempo, a região se torna uma das que
apresentam o segundo maior índice de casos confirmados do novo Coronavírus no país,
atrás, apenas, da Região Sudeste. Podemos ratificar essa afirmativa, ao analisarmos,
através do cartograma apresentado na Figura 1, a disseminação do vírus em um período
de apenas 18 dias, deixando o número de 06 casos confirmados no dia 13 de março e
chegando ao total de 1.399 casos confirmados em 03 de abril de 2020, segundo dados do
Ministério da Saúde (2020).
O rápido contágio na região Nordeste esteve atrelado, primeiramente, a
movimentação inter-regional. Mas, a partir de medidas tomadas por governos estaduais,
estabelecendo o Distanciamento Social Ampliado (DSA), impôs-se a diminuição do
fluxo de entrada e saída na região. Assim, a disseminação passou a acontecer,
principalmente, pela movimentação intrarregional de fluxos (MIRANDA, 2013) e
(Portal G1, 2020).
Observa-se que, no dia 13 de março, apenas 03 (três) dos 09 (nove) estados da região
Nordeste apresentaram casos confirmados da nova doença. Porém, já no dia 03 de abril,
apenas 20 dias depois, todos os estados da região apresentaram casos notificados e
confirmados do novo coronavírus, tornando possível observar o rápido avanço de casos
confirmados na região.
Ao analisarmos o Gráfico 1, vemos de forma mais detalhada o aumento expressivo
dos casos confirmados de COVID-19. Em alguns estados da região Nordeste, a exemplo
do estado do Ceará, que na data do dia 13 de março ainda não se tinha nenhum caso
confirmado, no dia 25 do mesmo mês, apresentava-se como o estado com o maior
número de casos confirmados da Região.
O aumento do número de casos confirmados dentre os estados da Região Nordeste,
apresenta-se expressivamente crescente até o dia 24 de março de 2020. Os estados,
através da Secretaria de Saúde, buscando dinamizar, facilitar e conscientiza a sociedade,
66
criou sites ou links de acesso rápido dentro dos seus sites governamentais, que
possibilita o acesso direto às informações dos boletins epidemiológicos diários, além da
atualização da distribuição territorial dos casos confirmados, suspeitos e óbitos
causados pelo novo vírus. A exemplo da Secretaria de Estado de Saúde do Ceará
(SESA-CE), onde criou um Portal de atualização diária acerca dos casos do novo
coronavírus, o Portal é denominado como “Painel Epidemiológico”, alimentado e
mantido pelo Governo do Estado do Ceará e o IntegraSUS, sistema de transparência de
saúde no estado.
Figura 1: Casos confirmados da COVID-19 na Região Nordeste do Brasil, entre os
dias 13 a 03 de abril de 2020.
67
A cada dia, na Região Nordeste, surgem novos casos e, diante disso, são necessárias
ferramentas que possibilitem a rápida manipulação e plotagem dos dados que são
inseridos nos portais e plataformas digitais. Os dados são apresentados diariamente e
podem ser vistos a partir dos links disponibilizados no Quadro 1.
Quadro 1: Estados e sites informativos
Estados Sites
Alagoas http://www.saude.al.gov.br/coronavirus/
Bahia http://www.saude.ba.gov.br/temasdesaude/coronavirus/
Ceará https://indicadores.integrasus.saude.ce.gov.br/indicadores/indicadore
s-coronavirus/coronavirus-ceara
Maranhão http://www.saude.ma.gov.br/boletins-covid-19/
Paraíba https://paraiba.pb.gov.br/diretas/saude/coronavirus
Pernambuco https://dados.seplag.pe.gov.br/apps/corona.html
Piauí http://portal.saude.pi.gov.br/2020/inf_saude/epidemiologia/covid-
19/boletim/result_covid-19.asp
Rio Grande do Norte http://www.saude.rn.gov.br/Conteudo.asp?TRAN=ITEM&TARG=2
23456&ACT=&PAGE=&PARM=&LBL=MAT%C9RIA
Sergipe https://todoscontraocorona.net.br/
Organização: Autores, 2020.
Pôde-se observar nos sites de cada Estado, que as apresentações se dão de forma
diferenciada. Os Estados do Ceará e de Pernambuco são considerados os mais
transparentes na divulgação das suas informações, de acordo com o Open Knowledge
Brasil (OKBR, 2020), que vem avaliando a qualidade dos dados e informações sobre o
coronavírus publicados pela União e pelos estados brasileiros, em seus portais oficiais.
Como exemplo, o site do Estado do Ceará apresenta todas as informações necessárias
logo no início, sendo possível buscar informações em diversos links disponíveis na
página (Figura 2).
Figura 2: Site do Estado do Ceará para a divulgação dos dados sobre a COVID - 19
Fonte: https://indicadores.integrasus.saude.ce.gov.br/indicadores/indicadores-
coronavirus/coronavirus-ceara
Por outro lado, os Estados de Alagoas e Sergipe apresentam meios de comunicação
que foram considerados uns dos mais fracos pela Organização (OKBR). No site da
Secretaria de Saúde de Sergipe, eles apenas citam quais os municípios apresentam casos
68
e óbitos confirmados. Há um site paralelo ao da Secretaria da Saúde, que apresentam os
dados um pouco mais organizados (Figura 3).
Figura 3: Site do Estado do Sergipe para a divulgação dos dados sobre a COVID - 19
Fonte: https://todoscontraocorona.net.br/
Fonte: http://www.saude.al.gov.br/wp-content/uploads/2020/04/Informe-COVID-19-
n%C2%BA-49-24-DE-ABRIL-16h45.pdf
Observou-se que o mapa apresenta casos notificados com representação graduada,
representado em áreas, utilizando a metodologia dos mapas coropléticos para dados
quantitativos, escolhendo a variação das tonalidades em azul. As informações referentes
a óbitos e casos confirmados foram apresentadas em representações pontuais, indicando
os municípios com os casos citados. É nítido que os pontos foram colocados
69
posteriormente, após a produção do mapa em ambiente SIG, ou em algum editor de
imagem, uma vez que o mapa só apresenta a legenda elaborada em ambiente SIG.
No Estado da Bahia, o mapa é apresentado no boletim epidemiológico, divulgado
diariamente, como pode ser visto na figura 5.
O documento é publicado em arquivo *.pdf e o mapa apresentado está representado
utilizando-se da técnica coroplética, indo do bege claro ao vermelho. Percebe-se os
locais onde ocorrem os maiores casos confirmados no Estado, bem como o cinza,
mostrando os municípios que não apresentaram casos confirmados.
Figura 5: Mapa da distribuição dos casos notificados, confirmados e de óbito pela
COVID - 19 no Estado da Bahia para o dia 25 de abril 2020.
Fonte: http://www.saude.ba.gov.br/wp-
content/uploads/2020/04/BOLETIM_ELETRONICO_25-04-2020.pdf
Apesar disso, como vemos apenas o território baiano, quando lemos os municípios
limítrofes com apenas 01 caso confirmado, perdemos a noção do real território do
Estado, além das cores dos limites dos municípios não ficarem nítidos, devido o cinza
muito escuro apresentado na representação. Além disso, não podemos identificar os
municípios pois não temos uma referência textual, como, por exemplo, a identificação
da capital, Salvador.
O Boletim epidemiológico do Estado do Ceará apresenta um mapa interativo, em
que pode ser observado a quantidade de casos confirmados, em investigação e óbitos
(Figura 6).
Há uma régua gradativa de cores, que vai do branco ao vermelho, sendo a zona
intermediária em amarelo. Nesse caso, o branco parece estar mal utilizado, pois dá a
entender que não a casos. No entanto, assim como no Estado da Bahia, os municípios
que não possuem os casos supracitados estão na cor cinza. Poderia ser utilizado um tom
de amarelo mais claro, ou seguir a tons de vermelho, já que o branco dá ideia de ausência
de informações.
Já no Estado de Pernambuco, o boletim epidemiológico apresenta um mapa inserido
70
em um arquivo PDF, representando os casos confirmados de COVID-19 por municípios
(Figura 7).
Figura 6: Mapa da distribuição dos casos notificados, confirmados e de óbito pela
COVID - 19 no Estado do Ceará para o dia 24 de abril 2020.
Fonte: https://indicadores.integrasus.saude.ce.gov.br/indicadores/indicadores-
coronavirus/coronavirus-ceara
Figura 7: Mapa da distribuição dos casos confirmados de COVID - 19 no Estado do
Pernambuco.
Fonte: https://www.cievspe.com/novo-coronavirus-2019-ncov
É possível observar que as cores utilizadas para apresentação dos casos estão na
tonalidade azul, com os tons mais claros para menores casos e os mais escuros para
maior quantidade de casos. Nesse caso, deixaram a cor branca para municípios sem
registros de casos confirmados. A tonalidade do intervalo entre 01 e 50 está muito fraco,
o que dificulta na análise espacial da informação a ser repassada.
No Estado do Piauí, a divulgação das informações é chamada de painel
epidemiológico, apresentando um mapa com dados referentes a municípios sem
registros confirmados, com casos confirmados e casos confirmados e óbitos (Figura 8).
71
O mapa apresenta uma representação qualitativa, com o uso de cores
complementares, que permitem uma diferenciação nítida da informação. No entanto,
não é possível ter a noção dos municípios que possuem as maiores quantidades de casos
confirmados e de óbitos, uma vez que a representação é generalizada.
Figura 8: Mapa da distribuição dos casos confirmados e óbitos causados pela
COVID - 19 no Estado do Piauí.
Fonte: https://cidadeverde.com/coronavirus/105862/piaui-tem-58-pacientes-com-
covid-19-e-registra-primeiro-caso-no-sul-do-estado
O Estado da Paraíba, nos últimos meses, atualizou o seu site governamental, na
oportunidade introduziu um link de direcionamento rápido dentro da área que pertence a
Secretaria Estadual de Saúde, que possibilita a verificação do boletim epidemiológico
diário e a distribuição territorial dos casos de Covid-19 no estado, essas informações são
apresentadas a partir de uma plataforma vinculada com o google, mais exatamente o
openstreetmap (Figura 9).
Nessa plataforma é possível observar o uso da técnica de representação pontual,
com a quantidade de casos representados no interior do círculo produzido no centróide
de cada área do município. A vantagem é a dinamicidade em observar as informações
individualmente. Mas só é possível ver a dimensão quantitativa dos casos na capital do
Estado (João Pessoa) e em Campina Grande. Para os demais municípios é necessária
uma ampliação do mapa, o que não permite uma visão geral do Estado, pois os pontos
possuem o mesmo tamanho, ou seja, não é usado a técnica dos círculos proporcionais.
O boletim epidemiológico do Estado do Rio Grande do Norte apresenta dois mapas,
diariamente, sendo o primeiro tratando sobre a taxa de notificação de casos
(casos/100.000 habitantes) e o segundo sobre o coeficiente de incidência de casos
confirmados (casos/100.000 habitantes) e óbitos no Estado (Figura 10).
72
Figura 9: Mapa da distribuição dos casos confirmados da COVID - 19 no Estado do
Paraíba.
Fonte: https://superset.plataformatarget.com.br/superset/dashboard/55/
Figura 10: Mapas de taxa de notificação de casos de COVID-19 e coeficiente de
incidência de casos confirmados e óbitos por município no Estado do Rio Grande do
Norte.
Fonte: http://www.adcon.rn.gov.br/ACERVO/sesap/DOC/DOC000000000229792.PDF
Observa-se, nos mapas, o uso do método quantitativo, com duas tonalidades
diferentes de cores, o primeiro com cores azuis e o segundo com cores vermelhas. Para o
segundo mapa, que trata, também, dos casos de óbitos, o mapa apresenta um segundo
método, denominado círculos proporcionais, com cor amarela. Uma das vantagens dos
mapas apresentados é a possibilidade da análise geral do Estado, sendo colocado 02
(dois) recortes espaciais (municípios e unidades regionais de saúde), o que permite
entender a distribuição espacial das 03 variáveis a serem representadas, não apenas com
número de casos, mais utilizando-se de taxas e coeficientes (casos /100.000).
No entanto, não há como identificar os municípios e associá-los aos casos. A última
variável dos casos confirmados, no segundo mapa, ficou preto, o que dificulta sua
interpretação e divisão entre municípios; os óbitos foram apresentados em círculos
proporcionais, e percebe-se que há uma diferenciação de tamanhos, provavelmente,
pela quantidade em cada município. Nesse caso, deveria vir apresentado na legenda.
O estado do Maranhão, igualmente ao estado da Paraíba, apresenta o número de
casos confirmados através da plataforma OpenStreetMap, ferramenta ligada
diretamente ao google e no boletim epidemiológico (Figura 11a e 11b).
73
Figura 11 a e b: Mapa da distribuição de casos confirmados da COVID-19 no Estado
do Maranhão.
Fonte: http://www.saude.ma.gov.br/painel-atualizado-covid-19/
Fonte: http://www.saude.ma.gov.br/wp-content/uploads/2020/04/nota46.pdf
A principal diferença entre os mapas apresentados na plataforma google do
Maranhão e da Paraíba, é que no Estado do Maranhão, a plataforma faz um
agrupamento dos dados, apresentando símbolos diferentes, à medida que aumenta a
escala do mapa, pois os dados vão se desagregando por município. Na Figura 11a
observa-se pontos azuis, que representam 01 (um) caso, os verdes são até 10 (casos), os
amarelos acima de 10 casos e o vermelho, com 1914 casos, representa a capital São
Luís.
Já a figura 11b apresenta um mapa quantitativo com cores que vão do azul ao
vermelho. Nesse formato de representação, as cores com tons azuis estão relacionadas a
menos casos e os mais próximos do vermelho são os maiores casos. Entende-se que a
escolha de cores está inadequada, pois dá ideia de áreas com pouco risco, risco médio e
alto risco, quando, na verdade, deveria indicar uma ordem, entre os que possuem menos
e mais casos confirmados. Além disso, não tem como identificar os municípios, nem
mesmo a capital.
No Estado de Sergipe, a Secretaria Estadual de Saúde construiu um site paralelo ao
74
site governamental, onde possibilita que a sociedade possa visualizar, de forma geral, o
boletim epidemiológico diário, com as atualizações dos números de casos confirmados,
curados e óbitos causados pelo vírus. O boletim epidemiológico diário é apresentado a
partir de uma tabela com os dados alfanuméricos e, ao lado, representado a partir de um
mapa temático (Figura 12).
Figura 12: Mapa da distribuição de casos confirmados e óbitos pelo novo
Coronavírus no Estado de Sergipe.
Fonte: https://todoscontraocorona.net.br/
O mapa visto na figura 12, trata-se de um mapa temático simples, de estilo graduado
que permite a identificação dos números de casos obedecendo a uma de escala de cor. O
método quantitativo foi o utilizado para a construção do mapa, onde, que, fazendo uma
interligação com a coloração, os municípios com os menores números de casos são
destacados em cores mais claras/suaves, ao contrário dos que contêm os maiores
números de casos, que são representados por uma cor mais escura/forte. Nesse sentido,
tendem a seguir um padrão gradativo.
Observa-se que todos os estados da Região Nordeste buscaram apresentar os dados
relacionados a COVID-19 e a distribuição desses, utilizando ferramentas
geotecnológicas, especificamente, ligadas a conceitos e representações cartográficas.
Alguns dos estados fazem uso de softwares específicos, a exemplo do QGIS, ArcGIS,
entre outros, possibilitando a plotagem final de uma representação mais detalhada e
uniformizada. Outros, porém, destacam e espacializam as informações inerentes do
novo coronavírus, a partir de bases cartográficas já disponíveis em páginas da web,
como é o caso do OpenStreetMap, não disponibilizando informações e elementos,
como a legenda, que proporcionem a fácil compreensão, por parte do leitor, do que é
exposto. Nota-se que cada estado se utilizou de metodologias distintas para aquisição,
manipulação e disponibilização das informações e dados em estudo.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do exposto, vemos que o uso das Geotecnologias, progressivamente, vem
ganhando espaço como recurso técnico-metodológico utilizado pelas/para diversas
áreas do conhecimento. Todavia, é perceptível, ultimamente, o seu uso em grande escala
pelas Ciências da Saúde.
A pesquisa evidenciou que as dificuldades para a catalogação e aquisição de dados e
75
informações, por não haver uma eventual padronização de divulgação desses, impõe a
sociedade a uma compreensão incompleta do exposto, ou seja, em alguns dos mapas
avaliados é perceptível sabermos, através da representação cartográfica, apenas os
municípios com casos confirmados da nova doença. Todavia, não descreve a quantidade
existente, sendo necessário que o leitor busque informações em documentos
complementares para completar a compreensão objetivada.
Nesse contexto, sugerimos a uniformização/padronização para organização e
divulgação das informações, sabendo que, quando se há a organização dos dados em
ambiente SIG, possibilita o manuseio dinâmico nos softwares, possibilitando a
construção de produtos cartográficos (Figura 13), que permitam uma divulgação das
informações de forma que se entenda os resultados obtidos com as metodologias e
técnicas empregadas para a divulgação das informações, de maneira espacializada.
Figura 13: Mapa da distribuição de casos confirmados de Covid-19 no Estado do Rio
Grande do Norte até o dia 23/04/2020
77
FERRAZ, C. A. M. et al. O uso de Geotecnologias como uma ferramenta para o controle externo.
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78
USO DE VANT PARA GESTÃO
TERRITORIAL NA PANDEMIA DE
COVID-19 E SEU POTENCIAL
PÓS-PANDEMIA
81
2 MÉTODO DE ANÁLISE
A fim de verificar a viabilidade do uso de VANTs para fins de gestão territorial
pública no contexto epidemiológico do novo coronavírus utilizou-se o método de
análise de Estudo de Caso, pois o mesmo possibilita relacionar aspectos teóricos a
questões experimentais (YIN, 2015).
Para tal, realizou-se um levantamento das principais feições a serem mapeadas para
fins de atualização de cadastro técnico urbano e regularização fundiária urbana, com
base em nas principais legislações vigentes, principalmente a Lei de Regularização
Fundiária Urbana (BRASIL, 2017). Foram então analisadas as seguintes feições: (i)
resolução espacial e acurácia posicional; (ii) delimitação de propriedades e construções;
(iii) identificação da quantidade de pavimentos; (vi) identificação do uso do solo; (v)
identificação de infraestruturas urbanas; e (vi) mapeamentos de feições ambientais.
Considerando estas feições selecionadas, foram estudadas as possibilidades de
identificação das mesmas por meio de ortofotos resultantes de levantamento por VANT
em comparação a outras metodologias como topografia tradicional, pesquisa de campo
ou imagens de satélites de baixa resolução (gratuitas). Além disso, foi levantado um
debate acerca das características do uso desta ferramenta considerando restrições
epidemiológicas impostas pela pandemia de COVID-19.
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
A ortofoto utilizada neste estudo possui pixel de tamanho de 6 cm². Quando
realizado georreferenciamento com pontos de apoio no solo, a acurácia posicional das
ortofotos resultantes de VANTs se enquadram nas Normas Técnicas da Cartografia
Nacional (BRASIL, 1984).
Na Figura 1 é possível observar dois aspectos relacionados à qualidade das ortofotos
resultantes de VANTs: resolução espacial e acurácia posicional. À esquerda é
apresentado um fragmento de ortofoto e à direita uma captura de tela do Google Earth
(imagem de satélite), sendo possível notar o deslocamento do polígono vetorizado na
ortofoto, além de se constatar o quão impreciso seria vetorizar alguma feição na imagem
de satélite de baixa resolução.
Figura 1 – Percepção de acurácia posicional pelo deslocamento de feição vetorizada
em escala 1:250. À esquerda ortofoto e à direita Google Earth (imagem de satélite)
82
quanto à Regularização Fundiária Urbana e trata da vetorização das feições relacionadas
à propriedade: divisa, construções e locais com cobertura. A partir da vetorização destas
feições é possível extrair e calcular informações relevantes como áreas construída, área
de cobertura, percentual de área construída. Em municípios onde se aplicam o IPTU
verde, por exemplo, também pode-se extrair as informações necessárias para o cálculo
do mesmo.
Figura 2 – Vetorização de feições do imóvel em escala 1:500
84
Figura 5 – Mapeamento de Infraestrutura Urbana
86
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88
GEOTECNOLOGIAS COMO SUBSÍDIO
NA GESTÃO PÚBLICA DA PANDEMIA
DE COVID-19:
O CASO DE ARARAQUARA-SP
90
plataformas (SANTOS E MOTA, 2020).
Tratando-se de propagação de epidemias e transmissão de doenças, Carvalho e
Souza-Santos (2005) destacam a importância de uma abordagem que considere espaço
e tempo. Logo, mapeamentos que contemplem séries temporais de dados mostram-se
promissores nesta tarefa e, de acordo com os mesmos autores, subsidiam métodos de
análise espacial na saúde coletiva, monitoramento ambiental e planejamento de serviços
de saúde. Este monitoramento temporal se torna ainda mais importante em casos como
o novo Coronavírus, em que ainda não há vacina ou medicamento específico para
tratamento da doença, exigindo monitoramento contínuo.
Rizzatti et al. (2020) atentam ainda para a importância do mapeamento intraurbano
para a compreensão da espacialização dos casos confirmados de COVID-19 numa
escala local. Este tipo de mapeamento possibilita a identificação de áreas de maior
ocorrência de casos e, no caso de séries temporais, áreas de maior crescimento de casos,
fornecendo subsídios para a identificação de contextos vulneráveis. Boulos e Geraghty
(2020) reforçam ainda que este tipo de mapeamento pode direcionar medidas de
isolamento ou flexibilização e atual na conscientização quando publicados em forma de
mapas interativos.
O objetivo deste estudo foi apresentar uma iniciativa de subsídio à gestão
transparente da pandemia por meio do uso de geotecnologias, especificamente o
mapeamento interativo, realizada pelo Urbie (Grupo de Inovação e Extensão em
Engenharia Urbana) através do projeto Urbie Maps, no município de Araraquara-SP,
Brasil.
2 MATERIAIS E MÉTODOS
O mapeamento interativo proposto foi desenvolvido pelo Urbie, grupo de extensão
vinculado à Universidade Federal de São Carlos, que busca a aproximação junto à
comunidade externa à universidade através de ações de intervenção pautadas nas
pesquisas desenvolvidas no PPGEU (Programa de Pós-Graduação em Engenharia
Urbana). Uma destas ações resultou no projeto denominado Urbie Maps¹, visando
oferecer estatísticas e mapeamentos para subsidiar a elaboração e planejamento de
políticas públicas na área da Engenharia Urbana.
O trabalho aqui descrito refere-se à parceria específica para mapeamento de casos de
coronavírus firmada junto à ao município de Araraquara, localizado na região central do
Estado de São Paulo, Brasil, estando à aproximadamente 273 km da capital São Paulo. A
população estimada é de 238.339 habitantes, com uma densidade demográfica de
237.62 hab./km2 (IBGE, 2020).
Visando garantir uma maior efetividade no monitoramento, foram incluídos no
mapeamento os casos registrados de moradores que residem em municípios contíguos e
que, de alguma forma, mantém um relacionamento de integração frequente com
Araraquara (por exemplo, trabalham ou estudam em Araraquara). A Figura 1 apresenta
a localização do município de Araraquara, bem como dos outros municípios
incorporados ao mapeamento.
91
Figura 1 – Identificação da Área de Abrangência do Mapeamento
94
desenvolvimento do projeto, não se tinha conhecimento de todos os bairros existentes
no município, bem como o tempo necessário para levantar esta informação poderia
atrasar a disponibilização dos primeiros resultados. Logo, tratando-se da natureza
emergencial do mapeamento de casos de COVID-19, optou-se pela localização dos
bairros de acordo com a demanda semanal de novos bairros, o que exige atualização
contínua por conta da equipe de trabalho. Por outro lado, esta decisão antecipou a
divulgação dos primeiros resultados.
A Figura 4 apresenta o mapa de Número de Casos por Bairro em fase de
desenvolvimento no Web Map. À esquerda, pode-se verificar a lista de mapas
adicionados à plataforma ao longo das semanas. À direita consta a simbologia escolhida
para representação dos dados, com círculos de tamanhos e cores diferentes de acordo
com a faixa de número de casos. No centro da Figura 4, os dados são exibidos conforme
o usuário final terá acesso.
Figura 4 – Layout de Edição do Mapa de Números de Casos por Bairro no Web Map
95
endereço eletrônico <https://arcg.is/neO5H>. A página disponibiliza estatísticas sobre a
situação epidemiológica no município de Araraquara e, em seguida, exibe os mapas de
Número de Casos por Bairro e Concentração de Casos. Ambos os mapas são
contemplados com ferramentas de interatividade (Figura 6).
Figura 5 – Layout de Edição do Mapa de Concentração de Casos no Web Map
98
PROJETOS URBANOS DE
DESENVOLVIMENTO EM TEMPOS DE
PANDEMIA:
UM RELATO A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DO
URBANISMO TÁTICO
99
1 INTRODUÇÃO
A pandemia de Covid-19 trouxe consigo a necessidade de reconstruir as bases de
planejamento e gestão de projetos urbanos, com o propósito de promover o
desenvolvimento integrado do território. Adaptar as metodologias de trabalho
tradicionalmente utilizadas na gestão pública tornou-se, em primeiro plano, uma
necessidade premente para garantia da continuidade das tarefas no período de crise
pandêmica. Mas, ao mesmo tempo, permitiu também uma oportunidade de novas
leituras metodológicas, abrindo-se a um leque de possibilidades no campo da
experimentação, da cocriação e da inovação social.
A experiência vivenciada no Município de Campo Grande, Mato Grosso do Sul,
demonstra os desafios enfrentados e as soluções adotadas pelas equipes
multidisciplinares de engenharia de projetos, à luz de um laboratório urbano vivo que
consolidou o desenvolvimento dos projetos executivos de requalificação de uma via
pública, atualmente em finalização das obras civis e de paisagismo.
O presente capítulo pretende compartilhar essa experiência, bem como apresentar os
procedimentos metodológicos desenvolvidos para o desenvolvimento do projeto de
requalificação de um corredor gastronômico, turístico e cultural, a partir do urbanismo
tático.
2 CONTEXTUALIZAÇÃO E ANTECEDENTES
O Município de Campo Grande têm uma larga experiência na concepção e
implantação de programas de desenvolvimento integrado do território urbano.
Conforme Castro et al (2021), nas últimas duas décadas foram experimentados projetos
com fomento internacional, a partir do apoio de organismos multilaterais creditícios,
totalizando oito iniciativas de financiamento, além diversas outras cooperações técnicas,
cujo enfoque voltou-se inicialmente à urbanização de áreas de fundos de vales, associado
a programas habitacionais, recuperação de áreas degradadas e saneamento básico,
culminando com recentes investimentos voltados à revitalização de área central e
melhorias da mobilidade urbana na cidade.
Paralelamente a execução sistemática dos programas de investimento, o Município
assistiu um crescimento dos indicadores socioeconômicos, especialmente o Índice de
Desenvolvimento Humano municipal – IDH, além de outros avanços significativos, tais
como os esforços para erradicação das favelas, os chamados aglomerados subnormais,
nas áreas de fundos de vale onde houve intervenções, e um aumento expressivo nos
indicadores de oferta de serviços públicos voltados ao saneamento básico, o que inclui a
cobertura da rede de água e esgoto, coleta de resíduos sólidos e sua destinação final em
aterro sanitário, além da expansão das redes de macro e microdrenagem, evidenciando
melhorias na qualidade de vida local (CASTRO et al, 2021).
2.1 REQUALIFICAÇÃO DO CENTRO DE CAMPO GRANDE
Atualmente, está em andamento um programa de desenvolvimento integrado, com
início em 2017, cujo objetivo principal é contribuir com a revitalização da região central
de Campo Grande. Neste sentido, buscou-se fomentar a ocupação de áreas com vazios
urbanos e a revitalização do comércio na Zona Especial de Interesse Cultural, por meio
da melhoria da infraestrutura e dos espaços públicos, bem como aumentar a eficiência do
sistema de transporte coletivo e a acessibilidade ao centro (CAMPO GRANDE, 2018).
100
Preliminarmente, entre os anos de 2008 a 2013, o Município de Campo Grande
executou o Programa Viva Campo Grande I, produto do Contrato de Empréstimo n.
2960/OC-BR estabelecido entre a Prefeitura e o Banco Interamericano de
Desenvolvimento – BID, tendo como objetivos a revitalização da área central da cidade,
a melhoria dos sistemas de mobilidade da população, bem como da gestão administrativa
do Município (CAMPO GRANDE, 2018).
Dando prosseguimento aos trabalhos iniciados nesta primeira etapa, foi elaborado o
Programa de Desenvolvimento Integrado do Município de Campo Grande – Viva
Campo Grande II, objeto de um novo Contrato de Empréstimo (n. 3630/OC-BR) entre o
Município e o BID, com início em 2017 a 2023. Neste caso, os objetivos foram: melhorar
as condições de urbanização e ampliar a rede de equipamentos sociais; reestruturar e
revitalizar o sistema viário, de transporte público e de mobilidade da região; integrar as
intersecções com vias transversais à Rua 14 de Julho e melhorar suas condições de
urbanização; padronizar a sinalização vertical e horizontal da via; promover a integração
do projeto urbanístico, paisagístico e de infraestrutura; ampliar as áreas de uso exclusivo
para pedestres, com alargamento dos passeios públicos e aumento de áreas úteis,
padronização de paginação, considerando as Leis de Acessibilidade vigente; e
implantação de mobiliários urbanos; implantar projetos paisagísticos; implantar rede
subterrânea de energia e telecomunicações de acordo com a Lei Complementar n.
161/2010 e de acordo com as normas dos órgãos competentes; implantar projeto de
arborização de calçadas; estimular a padronização de publicidade nas fachadas do
comércio local, reduzindo a poluição visual e promovendo um ambiente mais harmônico
e aconchegante; contribuir e estimular a valorização e a preservação de imóveis listados
pela Fundação Municipal de Cultura, como de interesse de preservação histórico-
cultural, localizados ao longo da Rua 14 de Julho, de acordo com a Guia de Diretrizes
Urbanísticas – GDU n. 21/2014, emitida em 27 de março de 2014; e fortalecer a
capacidade de planejamento e gestão urbana da Prefeitura (CAMPO GRANDE, 2018).
2.2 IMPACTOS DA COVID-19 NO PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO E PRINCIPAIS
SOLUÇÕES ADOTADAS
Importante salientar que Campo Grande vivenciou os impactos da pandemia por
Covid-19, passando o Município a tomar medidas de caráter geral com a finalidade de
prevenir a disseminação do coronavírus na cidade. A segunda quinzena do mês de março
de 2020, uma série de decretos foi editada pelo chefe do executivo, tendo em vista
minimizar a circulação e a aglomeração de pessoas.
Todas essas medidas afetaram a dinâmica dos trabalhos, de um modo geral, e alterou
substancialmente a metodologia normalmente adotada para o desenvolvimento das
atividades referentes ao gerenciamento do programa e a implantação das tarefas
finalísticas. Também algumas das ações já programadas para serem realizadas e outras
do cotidiano da execução do Programa foram interrompidas ou alteradas, tendo em vista
a pandemia.
De um modo geral, dentre as medidas adotadas, pode-se considerar a adoção do
home office nos períodos mais críticos da pandemia; a substituição de reuniões
presenciais por reuniões virtuais; o uso de medidas protetivas, tanto individuais quanto
coletivas, para as atividades presenciais nas instalações da sede da Unidade Gestora do
Programa e nas obras em andamento.
Nos períodos de impossibilidade das atividades presenciais, foram potencializadas as
101
atividades de planejamento, em conjunto com as equipes de supervisão ambiental, tais
como os preparativos para as obras de requalificação do segundo trecho da Rua 14 de
Julho (na extensão da Av. Mato Grosso à Rua Eça de Queiroz), a análise de projetos das
obras do quadrilátero central, o planejamento da adaptação dos programas ambientais do
Plano de Gestão Ambiental e Social - PGAS para as obras futuras, dentre outras ações.
Com a liberação das atividades essenciais, incluindo as obras de construção civil,
acerca do escopo do monitoramento das medidas socioambientais já realizadas houve a
inserção do acompanhamento específico da adoção e, consequente cumprimento, de
protocolos de biossegurança nas obras de partida e contrapartida que compõem o
Programa.
Para as demais atividades em curso, foram suspensos os eventos culturais,
denominados “Reviva Cultura”, realizados no trecho requalificado da Rua 14 de Julho;
além da suspensão de algumas ações objeto de uma parceria com o Sebrae, tais como
treinamentos presenciais de comerciantes, além da adaptação da metodologia
inicialmente proposta para a realização de um estudo de impactos cumulativos pela
Fecomércio.
Contudo, para os preparativos projetuais das obras futuras, destaca-se todo o
processo de concepção da Rua José Antônio, detalhado adiante.
3 O CASE DA RUA JOSÉ ANTÔNIO
A Rua José Antônio Pereira é um importante corredor viário que interliga distintas
regiões da cidade, no sentido norte-sul (Figura 1). O nome é uma homenagem ao
mineiro, desbravador brasileiro, que fundou Campo Grande em 1875. O encontro desta
rua com a principal avenida da cidade, a Av. Afonso Pena, é marcado pelo obelisco, um
monumento construído em memória aos fundadores da cidade, idealizado pelo general
Newton Cavalcante, então Comandante da Circunscrição Militar, e inaugurado em 1933,
atualmente tombado pelo patrimônio cultural (IPATRIMÔNIO, 2022).
Figura 1 – Rua José Antônio.
102
Gastronômico, Turístico e Cultural da Rua José Antônio Pereira (CAMPO GRANDE,
2020), que se estende da Rua Abrão Julio Rahe até a Rua Rodolfo José Pinho (Figura 1).
Segundo o Perfil Socioeconômico de Campo Grande, esses corredores têm por
finalidade incentivar a promoção e o ordenamento do local, promover apresentações
musicais, poéticas e artísticas, realizar festivais e encontros gastronômicos e culturais
para divulgação do próprio corredor (PLANURB, 2021).
Na sequência, uma cooperação técnica do Município com o Banco Interamericano
de Desenvolvimento - BID permitiu a realização de um piloto de intervenção na via,
tendo em vista a qualificação de usos da via durante e pós-pandemia de coronavírus, bem
como o traçado de diretrizes definitivas para a concepção do projeto executivo de
requalificação futura da via. Em síntese, as etapas do projeto englobaram a implantação
de táticas urbanas in loco, e efetivamente a sua entrega para uso e teste da população,
contemplando a fase de ativação cultural. Ao final, foi realizada uma avaliação com os
atores envolvidos no processo, antes da sua desmontagem (CASADEI, 2020).
O projeto promoveu quatro intervenções na via em especial, contemplando: as
esquinas do cruzamento com a Rua Marechal Rondon; as esquinas do cruzamento com a
Rua Barão do Rio Branco; um “bolsão de permanência” entre as Ruas Marechal Rondon
e Dom Aquino, no protótipo de um parklet; e outro entre as Ruas Barão do Rio Branco e
Av. Afonso Pena (Figura 2).
As intervenções de urbanismo tático realizados na Rua José Antônio foram
implantadas em um processo que considerou a organização de diferentes atores, tais
como equipes de consultores de laboratório urbano e inovação social, do Banco
Interamericano de Desenvolvimento, de diferentes órgãos e setores da Prefeitura de
Campo Grande, da Associação de Empresários da via, fornecedores externos e
população em geral (MÁRQUES; CUNHA, 2021). A articulação iniciou desde junho de
2020 (Figura 3), com mobilizações de diversos segmentos para compreender as
demandas locais e o início da cocriação das propostas (CASADEI, 2020).
Um especial destaque neste processo foi o engajamento da população local, uma vez
que a vizinhança recebeu visitas durante a pré-produção e nas etapas de execução, sendo
comunicada sobre o projeto e convidada a participar (Figura 3).
Figura 2 – Rua José Antônio após a execução das etapas de intervenção
103
Figura 3 – Envolvimento das partes interessadas: reunião com empresários da via (1),
capacitação sobre biossegurança para a abordagem de campo (2), cadastramento de
comunicação (3) e levantamentos de campo (4)
Fonte: Márquez & Cunha (2020) e UGP (2021), adaptado pelos autores (2022).
106
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A experiência de urbanismo tático na Rua José Antônio, em Campo Grande,
apresentou instrumentos e metodologias inovadoras de concepção de projetos de
requalificação do espaço público.
Somando-se todas as adaptações à dinâmica de trabalho realizada pelas equipes
envolvidas no gerenciamento e execução do Programa de Desenvolvimento Integrado
em andamento no Município, pode-se afirmar que o período pandêmico trouxe
inúmeros desafios, dentre estes, a possibilidade de reinventar as maneiras de conceber,
planejar e gerenciar projetos urbanos na cidade.
REFERÊNCIAS
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Grande: PMCG/BID, 2018.
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Programa Reviva Campo Grande, 2020.
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Financeiros Multilaterais: Experiências do Município de Campo Grande, MS. In: Congresso
Internacional de Direitos Humanos, 18 ed., 2021. Anais [...] Campo Grande: UFMS, 2021. p.571-
582.
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uso do espaço público em tempos de pandemia. Fórum Ambiental da Alta Paulista, v. 17, n. 5,
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IPATRIMÔNIO. Campo Grande: Obelisco. Disponível em: http://www.ipatrimonio.org. Acesso
em: 24 mai 2022.
MÁRQUES, L.; CUNHA, M. Corredor José Antônio: Urbanismo Tático CG II, Relatório Final.
Campo Grande: TransLabUrb/Reviva Campo Grande/BID, 2021.
PLANURB, Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano. Perfil
Socioeconômico de Campo Grande. 28. ed. Campo Grande: PLANURB, 2021.
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urbano em cenários epidêmicos: da modernidade ao pós-pandemia. Rev. Oculum Ensaios, v.18,
p.1-21, 2021.
107
IMPACTO DA PANDEMIA NAS
ATIVIDADES DOS AGRICULTORES
FAMILIARES DA FEIRA MUNICIPAL
DE CASCAVEL – PARANÁ, BRASIL
112
COVID-19, pois, a obesidade está associada ao risco de sofrer efeitos piores caso seja
contaminado (OPS, 2020).
A coordenadora do PMAE compra os produtos dos agricultores familiares para a
merenda das escolas municipais por meio de recursos livres provenientes da prefeitura
do municipal. Segundo ela, em 2019 foram utilizados em torno de R$ 11 mil reais para
essas compras e em torno de 3 mil reais foram utilizados do PNAE Federal para compras
para a merenda das escolas estaduais. Ela complementa que, o uso do PNAE Federal em
2019 foi de 67% e no ano de 2020 foi de em média 40%. No fim de 2020 todos os
produtos para a produção da merenda vinculados ao bolsa família estavam previstos
para serem comprados com recursos livres, já para os alunos da rede estadual a previsão
era o uso de recursos federais do PAA. O cadastro no bolsa família (CADÚnico) para
acesso aos kits escolares teve início em maio de 2020, mas as entregas aconteceram em a
partir de agosto de 2020 (TONIN, 2020), o que evidencia o fomento à agricultura
familiar no município de Cascavel.
De acordo com a FAO (2015), quando a agricultura familiar é trabalhada em
conjunto com outras políticas, ela pode contribuir com o desenvolvimento local,
avivando as economias locais e ajuda diminuir os índices de insegurança alimentar, uma
vez que, para Alfatin (2003), ela está ligada à segurança alimentar. Percebe-se por meio
das entrevistas, que esse trabalho conjunto está sendo feito no município.
Para Ploeg (2011), os mercados institucionais são essenciais para a redução da
pobreza e para a inclusão dos agricultores familiares no mercado e apenas 1 agricultor
citou como dificuldade para se inserir neste mercado, a quantidade de papéis e o pouco
tempo para envio para participação dos editais e 5 deles disseram que o fechamento das
escolas teve impacto na redução das vendas.
Diante do importante papel que a agricultura familiar exerce para o País, também foi
entrevistada a extensionista municipal, Teresina Barron, ligada diretamente aos
agricultores familiares da feira municipal, assim como os agricultores familiares da feira
municipal foram questionados sobre as dificuldades enfrentadas neste momento da
pandemia COVID-19. Em relação a elas, para a extensionista, os agricultores que
vendem para os mercados institucionais não sentiram tanto as dificuldades da pandemia,
o que foi confirmado pela também coordenadora estadual de agroindústria “O mercado
institucional é forte em Cascavel, então foram poucas as dificuldades”.
Barron acredita que tal fato é devido eles venderem para outros locais como o
exército, quartel e hospital universitário, por exemplo, mas, no entanto, os resultados da
pesquisa mostram que apenas dois agricultores questionados entregam para o exército e
nenhum deles citaram o quartel ou o hospital. “Os produtores de mercados institucionais
sofreram pouco com os cortes institucionais por conta dos programas municipais,
parcerias para vendas inclusive para o quartel e para o HU, no entanto, com a pandemia
as escolas fecharam e esses agricultores estão entregando os kits” (BARRON, 2021).
A coordenadora estadual de agroindústria, relatou que no cenário estadual uma das
dificuldades foi a adaptação cardápio feita pelos nutricionistas para atender o plano de
segurança alimentar e nutricional, por conta da necessidade de uma dieta balanceada.
Ela completa que, quando perceberam os cortes nas compras de alguns produtos e maior
incerteza perante maior concorrência (cooperativas) - pois muitos agricultores se unem
em cooperativas para participarem de editais - para que os agricultores sentissem menos
o impacto desses fatores, eles incentivaram os agricultores a não dependerem somente
113
deste mercado, alguns deles já tinham agroindústria e aqueles que já tinham um perfil
empreendedor, principalmente, os que tinham o negócio como fonte de renda principal,
passaram a produzir produtos minimamente processados, como a mandioca, que era
lavada, descascada e rotulada para entregarem para os mercados institucionais e o
incentivo foi para venderem para os mercados locais (mercadinhos, padarias...).
Segundo ela, os agricultores que tinham uma idade avançada, que produziam em menor
escala e não dependiam da agroindústria - o negócio era para um complemento de renda
- foram os que mais sentiram devido aos fatores citados anteriormente (SILVA, 2021).
No município de Cascavel, a Figura 4 apresenta algumas dificuldades enfrentadas
pelos agricultores familiares da feira municipal durante a pandemia.
Figura 4 - Dificuldades enfrentadas para as vendas dos produtos
119
IMPACTOS DA PANDEMIA DA
COVID-19 SOBRE A PRODUÇÃO E
COMERCIALIZAÇÃO DE ALIMENTOS
ORGÂNICOS EM CHAPECÓ - SC
124
impactados. Segundo Schneider et al. (2020), o cancelamento das aulas afetou
significativamente o PNAE, causando impacto negativo no sistema de abastecimento
alimentar local e de agricultura familiar.
A renda dos feirantes também foi afetada pela pandemia (Figura 2). Alguns feirantes
adotaram medidas sanitárias para continuar a comercialização em suas propriedades,
mas a grande maioria adotou novos canais de comercialização, como a distribuição nas
redes varejistas (supermercados), delivery com cestas de produtos e criação de redes
sociais para divulgação dos produtos. Com tais estratégias de adaptação, dois feirantes
não observaram diminuição na renda. Complementarmente, os consumidores
aumentaram o consumo de produtos orgânicos e isso contribuiu para a mitigar os efeitos
sobre a redução das vendas. De acordo com Schneider et al. (2020), a pandemia da
Covid-19 modificou a comercialização de alimentos, aumentando o número de compras
virtuais. As novas formas de comercialização transformaram o modo como os
agricultores ofertam os produtos, diminuindo os impactos da pandemia na economia
local. Segundo Organis (2021), em 2019 apenas 1% das vendas eram feitas online e,
com a pandemia da Covid-19, esse percentual chegou a 20%.
Figura 2 - Redução da renda dos feirantes durante a pandemia da Covid-19.
125
4 CONSIDERAÇÃOES FINAIS
A partir dos resultados obtidos, pode-se concluir que os produtores de alimentos
orgânicos que comercializam nas feiras livres do município de Chapecó são agricultores
familiares motivados pela produção de alimentos saudáveis, a agregação de valor
(renda) e o fortalecimento da relação com os consumidores através da venda realizada
nas feiras.
Os resultados apontam para o fortalecimento da demanda por alimentos orgânicos,
estimulada pela busca por saúde, a partir da pandemia da Covid-19, e a preocupação
com o uso de agrotóxicos. A expansão do mercado, no entanto, também depende de
estratégias e políticas públicas para promover a produção orgânica, com foco na
assistência técnica e eficiência produtiva (escassez de mão de obra).
A pandemia da Covid-19 afetou diretamente os agricultores familiares,
principalmente aqueles que comercializavam seus produtos nas feiras livres, mercados
locais e institucionais, pois com o fechamento do comércio e o cancelamento das aulas,
os feirantes perderam parte de sua produção, resultando em diminuição de renda. Em
alguns casos, os feirantes se reinventaram através da adoção de novas formas de
comercialização (p.ex. venda online, cestas de produtos), capazes de amenizar perdas
econômicas observados durante o período de isolamento social, as quais tendem a
serem mantidas após o período pandêmico.
A pandemia da Covid-19 também apresentou muitos desafios aos profissionais da
agronomia. O isolamento social destacou a importância da assistência técnica remota
(online) e da busca por formas alternativas de comercialização, particularmente àquelas
capazes de conectar os produtores rurais aos consumidores finais. Sobretudo, a
premência pelo desenvolvimento de plasticidade profissional, a partir da formação de
capacidades para identificar tendências e implementar as adaptações necessárias em seu
ambiente de trabalho.
REFERÊNCIAS
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e da certificação de produtos coloniais na Região do Oeste Catarinense. Chapecó, 2021.
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jul. 2021.
128
O IMPACTO DA PANDEMIA DA COVID-19
NA ATIVIDADE LEITEIRA NA REGIÃO DE
LAGOA DA PRATA – MG
130
Aplicada (Cepea) da Universidade de São Paulo (USP).
Figura 1 – Localização dos municípios e das propriedades estudadas.
134
por litro de leite aumentou 130%. No entanto, entre 2020 e 2021 a situação é bastante
diferente principalmente pela elevação dos custos de produção. Neste período o lucro
por litro reduziu 11% e preocupou muitos pecuaristas, principalmente pela relativa
estagnação dos preços recebidos pelo leite, apesar da contínua elevação dos custos de
produção. Entre outros fatores, a estagnação da economia nacional em 2021 reduziu o
poder de compra da população, o que dificulta a transferência dos custos de produção
para o preço final dos produtos lácteos, consumidos majoritariamente pelo mercado
interno.
Figura 5 – Preço médio mensal do leite recebido pelos pecuaristas na região de
Lagoa da Prata entre 2019 e 2021.
4 CONSIDERAÇÃOES FINAIS
A pandemia da Covid-19 gerou impactos importantes sobre a economia mundial e
com a atividade leiteira não foi diferente. O custo de produção, assim como o preço do
leite recebido pelos pecuaristas aumentou de forma significativa.
135
A atividade leiteira na região de Lagoa da Prata possui grande diversidade, o que
pode representar desafios de diferentes magnitudes às famílias rurais, na medida em que
são confrontadas com as incertezas e oscilações do mercado de leite. As propriedades
menores tendem ser as mais vulneráveis, pelas dificuldades para investir e manter-se
competitiva.
Apesar do desempenho econômico positivo entre 2019 e 2021, particularmente em
2020, o cenário econômico para a atividade leiteira tem se mostrado desafiador.
Principalmente a partir de 2021, quando o preço recebido pelo leite estabilizou apesar da
contínua elevação dos custos de produção.
A pandemia da Covid-19 também apresentou muitos desafios aos profissionais da
agronomia. O isolamento social destacou a importância da assistência técnica remota
(online) e da busca por formas alternativas para construção de sistemas de produção
mais resilientes às oscilações econômicas, principalmente de preço. Promover
autossuficiência e reduzir dependência por insumos externos são alguns exemplos. E a
importância do desenvolvimento de plasticidade profissional, a partir da formação de
capacidades para identificar tendências e implementar as adaptações necessárias em seu
ambiente de trabalho.
REFERÊNCIAS
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Pecuária Sudeste, 2009. Disponível em: http://www.cooperideal.com.br/arquivos/mip.pdf Acesso
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confinamento de vacas leiteiras. Revista Leite Integral. 2012. Disponível em:
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136
IMPACTOS E INOVAÇÕES NO SETOR DE
FRUTAS, LEGUMES E VERDURAS NO
CONTEXTO DA PANDEMIA DE COVID-19
E PROPOSIÇÕES TEÓRICAS PARA UMA
MELHOR GESTÃO DA CADEIA
137
1 INTRODUÇÃO
A pandemia de COVID-19 iniciou a partir de 2020 uma crise multidimensional em
todo o mundo – especialmente nos países em desenvolvimento –, freando o ritmo já lento
de progresso em direção aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Organização
das Nações Unidas (FAO, 2021). Enormes dificuldades foram criadas para muitos
setores que já sofriam de fragilidades estruturais. Pode-se dizer que um dos casos mais
flagrantes é o setor de alimentos perecíveis, mais notadamente Frutas, Legumes e
Verduras (FLV), pela sua essencialidade, multiplicidade de agentes envolvidos, impactos
socioambientais gerados e peculiaridades logísticas (BÉNÉ et al., 2021). Partindo dessas
premissas, a Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas) designou
2021 como o Ano Internacional das Frutas e Vegetais (ONU, 2020).
No Brasil, o setor de FLV envolve desde pequenos produtores rurais até grandes
redes varejistas, incluindo também distribuidores autônomos (ou, no jargão popular,
“atravessadores”), operadores logísticos diversos, feiras livres, “sacolões”, pequenos
estabelecimentos comerciais (hortifrútis ou quitandas) e organizações de apoio à
agricultura familiar e de subsistência, dentre muitos outros. Apesar da importância
estratégica para a saúde humana e a economia nacional, o setor padece de grandes
fragilidades que foram evidenciadas e intensificadas pela pandemia. Isso gerou
oportunidades e lacunas de mercado que estão sendo prontamente exploradas por novos
negócios.
Registra-se que grande parte dos empreendimentos envolvidos na oferta de Frutas,
Legumes e Verduras (FLV) são de pequeno porte e cunho familiar, trabalhando com
margens estreitas e uso intensivo de mão de obra. Isso se verifica tanto a nível global,
com 70% do setor alimentício compondo-se de pequenas e médias empresas (ALI et al.,
2021; NORDHAGEN et al., 2021), quanto a nível nacional, com 70% dos alimentos
consumidos no Brasil provindo da agricultura familiar (IBGE, 2020). Embora haja
alguns questionamentos quanto à metodologia para se chegar a tal número no Brasil
(HOFFMANN, 2014), é inegável a importância da agricultura familiar no segmento de
Frutas, Legumes e Verduras para a alimentação dos brasileiros e geração de impactos
socioambientais (FIGUEIREDO et al., 2017).
Os produtos do setor caracterizam-se por serem altamente perecíveis, com demanda
inelástica e dependentes das condições climáticas e sazonalidade (WALQUIL, MIELE e
SCHULTZ, 2010). Frente a esses desafios intrínsecos, os produtores geralmente carecem
de ferramentas e princípios administrativos básicos, o que acarreta baixa eficiência das
atividades e baixa lucratividade do negócio (BUAINAIN et al., 2021; DEPONTI, 2014).
Esse cenário é especialmente relevante quando se considera que a maior parte dos
produtores pertencem a classes sociais mais baixas e têm na atividade agrícola sua
principal fonte de renda. Além disso, observam-se baixíssima escolaridade, reduzido
acesso ao crédito e baixa conectividade entre os produtores (BUAINAIN et al., 2021;
IBGE, 2020).
A logística de distribuição de FLV reflete a desorganização do setor produtivo e o
poder das grandes redes atacadistas e varejistas. Com o progressivo desmantelamento
das Ceasas (Centrais de Abastecimento) – outrora com maior atuação do poder público –,
não há muitos agentes focais que auxiliem na comunicação e coordenação da cadeia de
forma socialmente responsável, ocasionando falta de previsibilidade para os produtores,
desperdícios ou distorções nos preços, entre outros efeitos deletérios (BELIK e CUNHA,
138
2018). Um fator agravante para o quadro é a própria característica de perecibilidade dos
itens, restringindo medidas anticíclicas como aumento de estoque. A cadeia de
suprimentos deve ser ágil e extremamente eficiente para suprir a demanda e ainda
proporcionar boas margens de lucro para os seus agentes.
Finalmente, tratando-se do consumo, tais produtos, mesmo que considerados
essenciais, ainda não são amplamente consumidos pela população brasileira, situação
que foi agravada pela pandemia. A insegurança alimentar no Brasil vem crescendo desde
2017/2018, de acordo com a Pesquisa de Orçamentos Familiares (IBGE, 2020) e, em
2020, conforme Galindo et al. (2021), 59,4% dos domicílios brasileiros relataram estar
vivendo algum nível de insegurança alimentar, com consumo reduzido de alimentos
saudáveis e/ou frequência irregular de refeições.
Dessa forma, o estudo dos efeitos da presente pandemia sobre um sistema complexo
e com tais fragilidades pode permitir uma compreensão aprofundada de seus pontos mais
sensíveis e sua resiliência para resistir a enormes choques externos, bem como a
verificação de eventuais inovações estruturais, com potencial de melhorar a saúde e a
renda dos brasileiros, bem como a preservação ou regeneração do meio-ambiente.
2. PROBLEMA DE PESQUISA E OBJETIVO
O artigo enfoca a seguinte questão: quais foram as mudanças no fornecimento e
demanda de FLV a nível nacional e regional (a partir da cidade de Poços de Caldas -
MG), incluindo eventuais inovações, ocasionadas ou catalisadas pela pandemia de
COVID-19? O objetivo principal é, a partir dos dados secundários e evidências
empíricas, encontrar experiências e abordagens promissoras para a estruturação e gestão
das cadeias de suprimentos alimentares, de maneira a promover governança eficiente e
impactos socioambientais positivos. Especificamente, discutem-se a consistência teórica
e viabilidade prática de abordagens e conceitos como resiliência e cadeias curtas de
alimentos para uma gestão de riscos mais eficaz no âmbito dos sistemas alimentares,
incluindo sua vinculação com o surgimento e agravamento da pandemia.
3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
3.1. Gestão de Riscos das Cadeias de Suprimentos
A gestão de riscos associada às cadeias de suprimentos é tema de particular interesse
desde o atentado ao World Trade Center em 2001 (TANG, 2006), chegando a sua
relevância máxima com a presente crise pandêmica. Manuais para modelagem de
cadeias de suprimentos com ênfase na gestão de riscos e continuidade dos negócios têm
sido publicados durante esse período. Christopher e Peck (2003) consideram 4 níveis
principais de risco à operação das cadeias de suprimentos, inextricavelmente
interligados: Processo/Fluxo de Valor (Nível 1), Ativos e Dependências da Infraestrutura
(Nível 2), Organizações e Redes Interorganizacionais (Nível 3) e Ambiente (Nível 4).
Para os autores, o setor alimentício é um dos setores críticos para análise em relação à
cadeia de suprimentos.
Nesse sentido, diversas estratégias de gestão de riscos são apresentadas na literatura,
englobando características como agilidade, robustez, flexibilidade e resiliência, de forma
pouco consensual e, por vezes, conflitante. Wieland (2013) procura diferenciar essas
quatro características para as cadeias de suprimentos na gestão de riscos. Segundo o
autor, a cadeia pode ser resiliente ou rígida, ao usar ou não recursos para responder à
mudança, respectivamente; por outro lado, no uso dos recursos, pode alterar ou não sua
139
situação inicial – configurando-se como ágil ou robusta, respectivamente.
Em particular, a característica de resiliência tem sido objeto de numerosos estudos,
podendo ser vista sob o prisma de abordagens mais determinísticas e reducionistas ou
mais sistêmicas (STONE e RAHIMIFARD, 2018; WIELAND, 2021). Wieland (2021)
advoga pela necessidade de se ver as cadeias de suprimentos como sistemas dinâmicos e
abertos, sugerindo a metáfora da “dança da cadeia de suprimentos”, tendo-se em vista a
crise ocasionada pela COVID-19.
3.2. Sistemas Alimentares e COVID-19
Para o setor agroalimentar, as cadeias de suprimentos podem ser tratadas no âmbito
dos sistemas alimentares, definidos na intersecção das dimensões segurança alimentar,
ambiente alimentar, saúde e bem-estar, pegada alimentar e contexto macroeconômico.
Segundo a ONU, “o termo sistema alimentar se refere à constelação de atividades
envolvidas na produção, processamento, transporte e consumo de alimentos” (ONU,
2021). A Figura 1 apresenta este modelo teórico conforme Béné et al. (2021), que
realizaram uma análise criteriosa de 337 documentos – englobando 62 países da África,
Ásia, Europa, Oceania e Américas – para avaliar os impactos da pandemia na segurança
alimentar pelo mundo e quais os melhores atributos para o fortalecimento da resiliência
dos sistemas alimentares.
Figura 1 – Caracterização de “Sistema Alimentar”
144
(24,4%). Considerando-se o cenário pandêmico, houve redução de consumo de frutas
para 40,8% dos entrevistados, de hortaliças e legumes para 36,8% e de tubérculos para
32,9%. Aumento no consumo foi registrado apenas para 9,4%, 8% e 5,7% dos
entrevistados, respectivamente.
Tabela 2 – Agentes abordados durante pesquisa primária
Agente Descrição Breve Localização Abrangência
5 indivíduos Feirante produtor Poços de Caldas - MG Municipal
6 indivíduos Feirante revendedor Poços de Caldas - MG Municipal
Citropoços Hortifruti com e-commerce Poços de Caldas - MG Municipal
EMATER-MG Setor público - Empresa de Assistência Técnica e Poços de Caldas - MG Municipal
Extensão Rural de Minas Gerais
Fonte de Vida Hortifruti Poços de Caldas - MG Municipal
Hashtag Hortifruti Hortifruti Poços de Caldas - MG Municipal
Hortah Hortaliças Pequeno produtor de FLV Poços de Caldas - MG Municipal
Especiais
Hortah Quitanda e Varejista especializado em FLV responsavelmente Poços de Caldas - MG Municipal
Empório produzidos e produtos artesanais/naturais
Hortifruti Moraes Hortifruti com e-commerce, aberto a parcerias com Poços de Caldas - MG Municipal
feirantes
NHU Orgânicos Varejista de orgânicos - pedidos semanais por Poços de Caldas - MG Municipal
WhatsApp
SEDET Setor público - Secretaria Municipal de Poços de Caldas - MG Municipal
Desenvolvimento Econômico e Trabalho
Brunório Atacadista sediado no Ceasa Poços de Caldas Poços de Caldas - MG Regional
Lellis Atacadista sediado no Ceasa Poços de Caldas Poços de Caldas - MG Regional
Papayas Negócio de impacto - vale-alimentação e refeição Porto Alegre - RS Regional
sustentável
San Michel Rede varejista/supermercadista Poços de Caldas - MG Regional
Santa Food Negócio de impacto - desenvolvimento de CSAC São Paulo - SP Regional
sustentáveis
Sumá Negócio de impacto - desenvolvimento de pequenos Balneário Camboriú - SC Regional
produtores
Amachains Foodtech - compliance via blockchain Belém - PA Nacional
Produtor Grande produtor de frutas cítricas Campanha - MG Nacional
Vila Nova / Vila Sul Centro de distribuição, Atacadista e Varejista Poços de Caldas - MG Nacional
NetWordAgro Agtech - Agricultura de precisão e digital Palotina - PR Internacional
145
Em um olhar regional, tomou-se como referência o cenário da cidade de Poços de
Caldas (MG), que possui aproximadamente 170.000 habitantes, sendo a maior cidade da
Mesorregião do Sul/Sudoeste de Minas e 15ª maior de Minas Gerais (IBGE, 2021).
Registrou-se uma sensível mudança no comportamento dos preços de Frutas, Legumes e
Verduras comercializadas na Ceasa de Poços de Caldas entre os anos de 2019 e 2020-21,
conforme a Figura 3 – ressalta-se que a Ceasa continuou em funcionamento durante toda
a pandemia.
Figura 3 – Preços médios mensais por categoria na Ceasa Poços de Caldas
146
não se pode classificar tal comportamento, a nível macro, como uma destruição criativa –
não chegaram a ocorrer rupturas drásticas de políticas, processos e arranjos formais.
Por outro lado, confirmando o observado a nível global por Béné et al. (2021), alguns
players menores, como feirantes (produtores ou revendedores) e pequenas lojas de
hortifrúti, já não apresentavam grande nível de organização e articulação com a cadeia.
Entre 23 de março e 4 de abril foram aplicadas as restrições mais severas ao comércio e
movimentação, suspendendo-se todas as 11 feiras livres realizadas no município
(POÇOS DE CALDAS, 2020). As feiras foram gradualmente retomadas em seguida,
com a adoção das medidas de distanciamento e higiene recomendadas pelas autoridades
sanitárias e já em vigor junto aos outros players do setor agroalimentar (POÇOS DE
CALDAS, 2020). Os relatos dos feirantes atestam grande dificuldade para se adaptarem
a esse momento e continuarem a comercialização, devido à queda do fluxo de clientes,
havendo entre os feirantes produtores relatos de consideráveis perdas de itens mais
perecíveis como folhosas.
Cabe ressaltar que a maioria dos frequentadores das feiras livres, segundo todos os
relatos, são idosos – justamente a faixa de maior risco para infecção por COVID-19. Isso
levanta questionamentos sobre o futuro do fenômeno social e da longa tradição das feiras
livres no Brasil. Feirantes que fornecem para restaurantes também foram severamente
impactados, pela redução drástica ou total nos volumes adquiridos. Quanto aos pequenos
lojistas de hortifrúti, o cenário é ligeiramente mais favorável, com melhor uso da entrega
a domicílio (delivery) e maior resiliência do movimento presencial em meio às
restrições.
Conforme já levantado por outros autores, como Galindo et al. (2021), sugere-se que
grande parte dos beneficiados pelo Auxílio Emergencial utilizaram-no para compras de
itens essenciais, como gêneros alimentícios frescos, tendo-se em vista os relatos dos
feirantes de aumento das vendas, ao menos durante a primeira rodada do auxílio. Esse
fenômeno, combinado a outros relatos de diversos players da cadeia, fundamenta a
percepção de que as feiras atingem classes menos favorecidas com maior força que
outros canais de vendas.
Apesar da ausência de características claras da fase de Destruição Criativa, observa-
se nitidamente a ocorrência das fases de Reorganização e Crescimento Rápido do ciclo
adaptativo, a nível macro. O fenômeno da aquisição de gêneros alimentícios por
delivery, mesmo que suavizado posteriormente, pode sinalizar uma mudança duradoura,
com consolidação deste canal de entrega nas empresas que já o utilizavam, rápida adoção
por empresas ainda reticentes em utilizá-lo e a emergência de novos agentes e modelos
de negócio nele baseados. Porém, conforme expresso anteriormente, o sucesso desse
modelo varia consideravelmente entre os atores, estando os menores e mais informais
em condições desvantajosas. Em termos dos itens demandados, observou-se entre as
classes A e B um expressivo aumento na procura por alimentos saudáveis e com maior
valor agregado – sem agrotóxicos e orgânicos, especialmente –, o que contribui para a
viabilidade das entregas a domicílio.
Alguns atores, principalmente feirantes e lojistas em regiões socialmente periféricas,
também enfocam clientes com menor poder aquisitivo, priorizando o oferecimento de
bons preços. Uma prática adotada por alguns feirantes, já há algum tempo, é oferecer
pacotes fechados de itens com menor valor comercial e/ou próximos do ponto de
descarte. Alguns atores maiores também realizam doações esporádicas para entidades
147
sociais como ONGs e o Banco de Alimentos de Poços de Caldas. É fundamental destacar
a atuação do Banco de Alimentos e do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) para
o suporte alimentar às populações mais vulneráveis. Em Poços de Caldas, o Banco de
Alimentos registrou doações recordes durante os 4 primeiros meses de 2021, tendo o seu
vínculo com o PAA fortalecido (POÇOS DE CALDAS, 2021).
Dentre as novas empresas que surgiram, observa-se grande proatividade e um ímpeto
empreendedor que transcende o mero oportunismo, com ações de planejamento
(segmentação dos clientes, projetos de novos investimentos, projeções financeiras, etc.)
e experimentos diversos, tanto em termos de processos (métodos e ferramentas de
gestão, com uso de aplicativos freemium, softwares sob demanda, etc.) quanto de
proposta de valor (produtos diferenciados, ações de promoção em canais digitais, etc.).
Alguns deles também já identificaram outras oportunidades e têm expandido seu escopo
de ofertas, mas sem perder de vista seu core business. A maior parte dos agentes
entrevistados tem perseguido, mesmo que de forma inconsciente, princípios de gestão
enxuta e ágil da cadeia de suprimentos, como estoque mínimo e estreita cooperação com
parceiros da cadeia. Também apresentam senso de responsabilidade socioambiental,
preocupando-se com a destinação de sobras ou doação de excedentes, por exemplo.
5.3. Caracterização Geral das Cadeias de FLV
As cadeias de suprimentos adotadas para atender aos clientes em Poços de Caldas são
bastante variadas e podem ser extrapoladas para grande parte das regiões do interior do
Brasil. Um dos casos extremos presente no município é o de um grupo empresarial
atacadista, distribuidor e varejista, que se beneficia de uma grande rede de fornecedores
por todo o país, englobando principalmente grandes produtores e revendedores nas
Ceasas (notadamente em Campinas e São Paulo – CEAGESP). Com o giro do estoque
em 3 vezes por semana, esse grupo sequer registrou carências pontuais de itens devido a
compras por pânico. Um outro caso é o de uma grande rede varejista local, com
fornecimento próprio baseado na Ceasa local e, simultaneamente, parcerias com outros
fornecedores que administram pontos de venda nas diversas lojas espalhadas pelas
regiões da cidade. Esta rede teve de limitar temporariamente as compras de itens
perecíveis pelos clientes, mas logo conseguiu normalizar a oferta.
O restante dos atores, em sua maioria, baseiam-se em produção própria, algumas
compras diretas com produtores locais ou regionais e, principalmente, transações na
Ceasa local. Os novos modelos de negócio remetem em grande parte a cadeias curtas,
nos 3 tipos sugeridos por Marsden (2004), especialmente as cadeias próximas e
estendidas, com as empresas atuando como intermediários entre os consumidores e os
produtores, muitos dos quais situados a maiores distâncias, mas munidos de selos de
certificação orgânica (por empresa certificadora ou cooperativas de certificação
coletiva). Parte desses arranjos são inevitáveis, principalmente para orgânicos, devido à
forte regionalização da produção – produz-se apenas o que é naturalmente adaptado para
cada região. As transações face a face ainda não perfazem uma parcela considerável dos
circuitos curtos, consistindo principalmente em alguns produtores de hortaliças e
leguminosas.
Em Poços de Caldas, não há ainda uma preocupação explícita generalizada com os
atributos de qualidade mencionados por Marsden (2004). A maior preocupação se dá em
relação à presença de agrotóxicos; aspectos como manejo dos recursos naturais (uso
inadequado de fertilizantes e consequente eutrofização de corpos de água, por exemplo),
148
vínculo com agricultura familiar ou mesmo a origem local ou regional dos produtos
ainda constituem atributos de valor ou qualidade apenas para alguns nichos. De fato, é
consenso entre os novos negócios que há muito o que se avançar na educação do
consumidor, como por exemplo em relação à inevitabilidade da sazonalidade no
mercado de orgânicos, mesmo quando o fornecimento se dá a longas distâncias.
5.4. Inovações em outras regiões
O contexto local-regional supracitado ainda não registra a efervescência registrada
em maiores centros, onde agtechs e foodtechs têm impulsionado com força modelos
alternativos, mais saudáveis e mais responsáveis de consumo, fortemente baseados no
uso da Internet. De acordo com um levantamento da plataforma de inovação Liga
Ventures (2021), já existem mais de 400 empresas categorizadas nesses setores. Muitas
dessas iniciativas se destacam como negócios de impacto social, que respondem ao
desafio de garantir o acesso a alimentos balanceados e com preço justo para
consumidores e produtores, perseguindo não apenas lucros e uma missão institucional
restrita, mas também o impacto social de uma maneira mais sistêmica.
De forma mais focada na própria produção de hortifrutigranjeira, merece destaque a
Hortify, uma startup especializada no setor cujo objetivo é “possibilitar ao produtor rural
e parceiros a gestão de seu negócio, prezando sempre pela qualidade da produção e pelo
impacto na qualidade de vida do planeta e das pessoas que os consomem” (HORTIFY,
2022). A empresa oferece demonstração gratuita de seu aplicativo e diversos planos de
assinatura, com diferentes preços e funcionalidades, abrangendo rastreabilidade, gestão
de pessoal, gestão de produção e gestão financeira. Os recursos oferecidos para tais
funcionalidades incluem desde registros dos plantios, caderno de campo, controle de
colheita e rastreabilidade alimentar com QRCode, na versão mais básica, até
previsão/planejamento de faturamento e lucro por plantio, na versão mais completa.
Outras startups se dedicam a conectar os diversos agentes das cadeias de FLV,
aprimorando sua governança e eficiência. Para isso, constroem parcerias estreitas para
escalar e alcançar um mercado mais amplo. Um desses casos é o Muda Meu Mundo, que
provê assistência para pequenos agricultores orgânicos e os conecta a grandes redes
varejistas, fechando negócios e executando a logística, para garantir uma renda maior e
mais regular. Um caso semelhante é o Sumá, que tem como foco o desenvolvimento de
agricultores familiares para garantir-lhes contratos de compras públicas ou privadas,
operando em cooperação com o SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e
Pequenas Empresas).
Na porção final das cadeias de suprimentos, encontram-se algumas das abordagens
de negócio mais difundidas, como o farm to table (“da fazenda à mesa”) e D2C (direct to
consumer, “direto ao consumidor”), que propõem o contato direto entre os
produtores/fornecedores e consumidores. Nesses dois setores, podemos citar negócios
como: Raizs, Nutriens, Orgânicos In Box, Fazendinha em Casa, que possuem ativos
logísticos e de processamento próprios para realizar a logística do campo ao consumidor,
com um modelo de negócio baseado em compras individuais ou assinatura de cestas.
A comodidade e conveniência das ofertas aos consumidores , e l e m e n t o s d o s
ambientes alimentares dentro dos sistemas alimentares, é ainda mais explorada por
empresas como Beleaf e LivUp, que possuem centros de processamento de FLV e outros
gêneros para a produção de diferentes modalidades de refeições congeladas e prontas
para o consumo após rápido aquecimento. Beleaf, em particular, foca no atributo de
149
qualidade plant-based, não utilizando proteína animal nas preparações, e LivUp também
comercializa cestas dos alimentos in natura. Os produtos são oferecidos de forma avulsa,
combinada (combos) ou planos de assinatura.
Tabela 3 – Negócios Inovadores nas Cadeias de Frutas, Legumes e Verduras
ATUAÇÃO SEDE ORGANIZAÇÃO DESCRIÇÃO BREVE
Plataforma de gestão para
SP Holambra/SP Hortify
hortifrutigranjeiros
Desenvolvimento de pequenos
CE e SP Fortaleza Muda Meu Mundo
agricultores e conexão com
compradores regulares (públicos
SC Balneário Camboriú/SC Sumá
e/ou privados)
150
Figura 4 – Cadeias de FLV no Brasil - arranjos e inovações
151
Essa abordagem ou filosofia de gestão das cadeias de suprimentos alimentares,
especialmente FLV, revela-se afim com as práticas e métodos já adotados empiricamente
por muitos atores que estão conseguindo transformar a crise pandêmica em
oportunidade. Expandindo-se o entendimento das abordagens sistêmicas e desdobrando-
as em metodologias práticas, será possível avançar de forma qualificada caminhos já
abertos pelos empreendedores e empresários pioneiros, além de permitir o advento de
outras possibilidades que contribuam para o avanço em direção aos ODS.
O mundo pós-COVID-19 terá de se organizar de forma a evitar novas pandemias,
responder às mudanças climáticas, proteger e regenerar recursos naturais em situação
dramática e avançar em direção a modelos socioeconômicos viáveis. As abordagens
sistêmicas aqui apresentadas revelam grande potencial para iniciar esse movimento, pela
sua aplicabilidade ao mais essencial dos setores – o da alimentação saudável. Sugere-se
para pesquisas futuras a aplicação de frameworks sistêmicos práticos e testes de atributos
específicos de resiliência para as cadeias de FLV.
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154
STARTUPS E NEGÓCIOS DE IMPACTO
NO SETOR AGROALIMENTAR:
UM NOVO CAMINHO PARA OS SISTEMAS
ALIMENTARES?
155
1. INTRODUÇÃO
A pandemia de COVID-19 iniciou a partir de 2020 uma crise multidimensional em
todo o mundo – especialmente nos países em desenvolvimento –, freando o ritmo já lento
de progresso em direção aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Organização
das Nações Unidas (FAO, 2021). Uma das situações mais alarmantes ocorre no setor
agroalimentar, pela sua essencialidade, multiplicidade de agentes envolvidos, impactos
socioambientais gerados e peculiaridades logísticas (BÉNÉ et al., 2021).
Simultaneamente, os desafios oriundos da crise pandêmica aceleraram uma grande
emergência de inovações no meio agroalimentar brasileiro, muitas delas vinculadas a
startups conhecidas como agrifoodtechs, agtechs ou foodtechs (BAMBINI e
BONACELLI, 2019). Muitas das organizações deste ecossistema procuram
desenvolver abordagens de negócio que endereçam de forma explícita muitas
problemáticas socioambientais que foram dramaticamente evidenciados pela
pandemia, alinhando-se aos ODS (CAMPOS e COMINI, 2019) e a pautas ESG
(Environmental, Social and Governance – “Ambientais, Sociais e de Governança”)
(PIPE SOCIAL, 2021a).
Dessa forma, objetiva-se com esse trabalho mapear o ecossistema de organizações e
inovações que procuram maximizar não apenas o retorno ao investidor, mas aos
stakeholders e à sociedade em geral, de forma a aprimorar os sistemas alimentares em
um cenário de crescimento da insegurança alimentar no Brasil e no mundo.
2. DISCUSSÃO TEÓRICA
O agronegócio tem se firmado como um dos principais motores da economia
brasileira, registrando trajetória constante de crescimento mesmo em meio às recentes
crises econômicas por que o Brasil passa desde meados da década de 2010. Prova disso
é que o Produto Interno Bruto (PIB) do agronegócio teve expansão recorde de 24,31%
em 2020, representando hoje 26,6% do PIB brasileiro (CEPEA, 2021). A estimativa
considera não apenas a produção agrícola em si, mas também insumos, indústria e
serviços que são englobadas pelo conceito de agronegócio.
A inovação dentro do agronegócio e indústria agroalimentar surge a partir da
interface entre vários atores, como EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária), universidades e empresas, tendo desempenhado papel crucial para que
esses setores conquistassem o atual protagonismo econômico (SANTOS et al., 2021).
Contudo, a profundidade dos impactos da inovação no setor agroalimentar depende
muito do nível de instrução e familiaridade dos atores em aspectos gerenciais e
tecnológicos (VIEIRA FILHO e SILVEIRA, 2011), além de envolver também “traços
da personalidade, como aversão ao risco, disciplina e ambição do agricultor, o acesso ao
conhecimento, ao crédito e aos serviços de extensão rural” (ALVES et al., 2013 apud
BUAINAIN et al., 2021).
Em específico, quando se consideram os pequenos agricultores (podendo ser
considerados os imóveis com menos de 50 ha, que representam 81,4% dos
estabelecimentos rurais), nota-se um grande abismo tecnológico em relação ao
agronegócio, mais voltado à exportação de commodities (BUAINAIN et al., 2021). No
aspecto crucial das tecnologias de informação e comunicação, tem-se que em 2017
apenas 12,1% dos estabelecimentos rurais contavam com internet, 31,2% contavam
apenas com rádio e 52,5 dispunham de TV (IBGE, 2020).
156
2.1. Agricultura 4.0 e Negócios de Impacto
A presente onda de inovação tecnológica e organizacional no meio rural, baseada em
tecnologia da informação e ferramentas da Indústria 4.0 (como Big Data, computação
em nuvem, Internet das Coisas, sistemas automatizados de produção) é frequentemente
denominada Agricultura 4.0 (FRANÇA, 2021). Conforme Buainain et al. (2021), são
cinco os pilares para o ecossistema da Agricultura 4.0 no Brasil: grandes empresas
produtoras de insumos e bens de capital; pequenas empresas emergentes de base
tecnológica (startups ou agtechs); universidades e centros/institutos de pesquisa;
agências do estado, da sociedade civil e organizações corporativas; investidores, em
geral privados.
O potencial da Agricultura 4.0, porém, apenas será justamente revertido para a
sociedade nacional se os pequenos agricultores também puderem se beneficiar e os
recursos naturais forem preservados ou regenerados. Nesse sentido, muitos dos
negócios inovadores atuantes neste ecossistema estão adotando e desenvolvendo
abordagens de negócio que têm por missão ajudar a solucionar problemáticas
socioambientais que foram dramaticamente evidenciados pela pandemia, alinhando-se
aos ODS (CAMPOS e COMINI, 2019) e a pautas ESG (Environmental, Social and
Governance – “Ambientais, Sociais e de Governança”) (PIPE SOCIAL, 2021a). Tais
negócios são conhecidos no Brasil como “negócios de impacto” e, conforme a Aliança
pelos Investimentos e Negócios de Impacto, são 4 as suas características centrais
(SENSE LAB, 2019):
“Propósito (Explicitam na sua missão o propósito de gerar impacto
socioambiental positivo); Avaliação de impacto (Conhecem, mensuram
e avaliam seu impacto periodicamente); Receita própria (operam com
geração de receita oriunda da venda de seus produtos e serviços;
Governança (estabelecem um modelo de governança que considera as
várias partes interessadas, não apenas investidores e clientes, mas
também a comunidade).”. (SENSE LAB, p. 10, 2019).
Conforme o relatório nacional sobre negócios de impacto da Pipe Social, em 2021 as
preocupações despertadas pela crise pandêmica impulsionaram as pautas ESG nos
negócios e investimentos em todo o mundo, inclusive no Brasil. Além de ações
emergenciais para mitigar os impactos dramáticos da pandemia no Brasil, grandes
empresas, instituições, fundações, governos e outros agentes começam a situar as pautas
ESG no centro de seus discursos e ações institucionais e também a sondarem
possibilidades de atuação no ecossistema de apoio aos negócios de impacto. Dessa
forma, pode-se dizer que a atuação empresarial com foco em impacto está deixando de
ser um nicho de mercado (PIPE SOCIAL, 2021a).
2.2. Sistemas Alimentares e Impactos da Pandemia de COVID-19
No contexto pandêmico e pós-pandêmico, é interessante tratar as cadeias de
suprimentos no âmbito dos “sistemas alimentares”, definidas pela ONU (2021) como “a
constelação de atividades envolvidas na produção, processamento, transporte e
consumo de alimentos” (ONU, 2021). Essa abordagem é reiterada pela análise de
Friedrich et al. (2021), que veem a própria COVID-19 como uma sindemia,
considerando que “a doença se une de modo interdependente e interage com
comorbidades como as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), em contextos
permeados por desigualdades sociais estruturais” (HORTON, 2020 apud FRIEDRICH
157
et al., 2021, p. 80).
A Figura 1 apresenta este modelo teórico conforme Béné et al. (2021), que
realizaram uma análise criteriosa de 337 documentos – englobando 62 países da África,
Ásia, Europa, Oceania e Américas – para avaliar os impactos da pandemia na segurança
alimentar pelo mundo e quais os melhores atributos para o fortalecimento da resiliência
dos sistemas alimentares. Segundo os autores, as dimensões de segurança alimentar
mais afetadas pela pandemia foram a “acessibilidade (econômica)” e “acesso (físico)”,
em particular em áreas urbanas e em países de renda baixa e média.
Figura 1 – Caracterização de “Sistema Alimentar”
161
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163
A FEIRA DA AGRICULTURA FAMILIAR
DE ITURAMA-MG FRENTE À
PANDEMIA DA COVID-19
165
consumidores possuem um local para troca não apenas de produtos, mas também de
informações, conhecimento e experiências rico. Quando se fala em feiras, é possível
atrelar tal forma de comercialização ao conceito de cadeias curtas de comercialização.
Schneider e Gazolla (2016, p.12), ressaltam que “a definição de cadeias curtas resgata
uma dimensão central das economias de proximidade e de escopo que refere ao papel
da geografia e da interação entre espaço e atividade econômica”.
Portanto, é notório que as feiras da agricultura familiar têm crescido
significativamente com o passar dos anos, fortalecendo a importância dos circuitos
curtos de comercialização para o desenvolvimento rural e driblar algumas facetas
atribuídas ao homem do campo. Entretanto, no ano de 2020, com o acometimento de
uma pandemia causada pelo COVID-19, agricultores familiares se viram diretamente
atingidos por conta da proliferação do vírus.
Segundo informações do Ministério da Saúde (2020), COVID-19 é uma doença
causada pelo coronavírus, denominado SARS-CoV-2, que apresenta um espectro
clínico variando de infecções assintomáticas ou sintomáticas a quadros graves. De
acordo com a Organização Mundial da Saúde (2020), tal vírus se espalha
principalmente através de gotículas de saliva ou descarga do nariz quando uma pessoa
infectada tosse ou espirra, por isso é importante tanto o distanciamento social quanto a
utilização de máscaras e álcool em gel. Sendo assim, observa-se que a transmissão
pode acontecer de uma pessoa doente para outra ou simplesmente através do contato
direto ou por meio do toque em alguma superfície contaminada.
É sabido que a partir de março de 2020, a situação de pandemia causada pelo
Covid-19 chegou ao Brasil, e pegou todos de surpresa trazendo diversos
inconvenientes, principalmente no quesito saúde e economia. Quanto aos agricultores
familiares, tem-se que estes tem dificuldade na comercialização de sua produção bem
como de acesso a novos mercados. No início de todo esse cenário pandêmico, a
instrução de grande parte dos governos foi o isolamento social, e em Iturama-MG não
foi diferente. A principal iniciativa da prefeitura foi o isolamento da cidade e o
fechamento dos pontos de comercio, restaurantes e feiras, cujo qual afetou
diretamente os agricultores e agricultoras da região que expunham seus produtos na
feira da agricultura familiar que ocorria as quartas feiras. Houve também a redução
dos editais e compra de alimentas da agricultura familiar via programa PNAE
(Programa Nacional de Alimentação Escolar), e muitos agricultores familiares que
participavam do projeto tiveram uma drástica redução na sua renda.
Diante deste cenário, os agricultores e agricultoras familiares viram seus
principais canais de comercialização paralisados, além dos próprios, em sua grande
maioria serem considerados do grupo de risco, fazendo com que eles ficassem, assim,
à mercê de sua própria sorte, uma vez que tanto as feiras foram proibidas de
funcionarem quanto as compras institucionais, principalmente as voltadas para a
alimentação escolar, também pararam de serem realizadas.
Com a impossibilidade da realização das feiras e vendas para programas
governamentais, os agricultores e agricultoras familiares precisaram se reinventar,
buscando novas formas de comercialização que não os expusessem de forma perigosa
ao vírus, mas que garantisse sua sobrevivência financeira. Sendo assim, observa-se
que na conjuntura da pandemia causada pela COVID-19, as dinâmicas de produção e
comercialização dos agricultores familiares têm sido forte mente afetadas. E a
166
comunicação torna-se uma saída potencial para minimizar os efeitos observados.
E em busca de novas oportunidades, as tecnologias de informação e comunicação
(TIC), principalmente à internet, passam a ser adotados por agricultores no meio rural,
influenciando as atividades dos moradores e colaborando, inclusive, para acesso
mercados antes inacessíveis. Ocorre, então, o surgimento não apenas de uma mudança
cultural, mas sim uma modificação nas atividades rotineiras através de busca por
novas práticas, novos mercados e experiências que podem ser vivenciadas com o
advento da comunicação.
Há uma necessidade de novas tecnologias que transformem e auxilie o rendimento
de produção e traga um maior contentamento aos compradores, sendo assim, esta
nova perspectiva demanda dos produtores modos eficientes de gerenciamento e
produção, isto leva as TIC uma importante atribuição para este novo viés produtivo
(ASSAD & PANCETTI, 2009).
Frente a esse contexto, a pesquisa buscou compreender de que forma os
agricultores e agricultoras familiares de Iturama-MG e região estão comercializando
seus produtos, a partir das dificuldades encontradas perante a pandemia gerada pelo
novo coronavírus, com a adoção de tecnologias para proporcionar maior visibilidade
dos produtos vendidos na feira através do mercado digital.
2 ASPECTOS METODOLÓGICOS
Para a realização do presente estudo, optou-se por uma metodologia de pesquisa
de natureza descritiva e exploratória. Ademais, foram utilizadas algumas técnicas de
coleta de dados.
Inicialmente fora realizado um levantamento bibliográfico, que ocorreu através de
um aprofundamento na revisão de literatura acerca da temática da agricultura familiar
e a pandemia causada pelo SARS-COV-19, afim de ampliar os conhecimentos acerca
da realidade de Iturama-MG, município o qual a feira em questão é realizada.
Como também, foram selecionadas informações secundárias, adquiridas junto a
dados da Prefeitura Municipal, ao Centro de Tecnologia de Informação e
Comunicação (Cetic), Comitê Gestor da Internet (CGi) e dados referentes à pandemia
junto ao Ministério da Saúde.
Posteriormente, com o objetivo de resguardar a segurança dos entrevistados e dos
autores deste artigo, optou-se por realização de uma pesquisa semiestruturada junto
aos agricultores familiares e suas lideranças locais, com o objetivo de diagnosticar e
conhecer a realidade dos agricultores familiares participantes da feira da agricultura
familiar frente a pandemia. Foram realizadas entrevistas por meio de questionários
semiestruturados gerados com o auxílio do formulário Google, que constou de
questões quantitativas como qualitativas, além de questões referentes a fatores
socioeconômicos dos agricultores, sendo este realizado por contato por meio do
aplicativo WhatsApp o qual foi encaminhado o formulário para preenchimento.
A título de exemplificação, foram coletadas informações sobre o perfil social e
econômico dos feirantes familiares: gênero, idade, escolaridade, se possui aparelho
celular/smartphone e redes social entre outros. No âmbito da pandemia em curso do
COVID-19, pergunta-se o conhecimento sobre e se algum familiar já contraiu a
doença, se já foi contaminado entre outros.
167
Além das entrevistas com os produtores, o presente estudo utilizou de métricas
fornecidas pelas redes sociais do perfil no Facebook e Instagram do projeto de
extensão denominado Cafiturama, hoje contando com 606 seguidores no Instagram e
706 no Facebook, foi analisado os dados do período de março de 2020 à julho de 2021,
estes perfis que foram criados afim de divulgar os produtores da região através de
postagens informativas contendo as mercadorias e contatos de cada produtor com o
propósito de atingir um maior número de consumidores na cidade. Métrica essa
definida através de algoritmos das próprias plataformas, como número de pessoas
alcançadas, público com interesse, dias com maior acesso a página.
Assim, foi realizada a tabulação dos dados quantitativos que serão organizados e
gerado pela própria plataforma de formulário Google, que utiliza a estatística
descritiva por meio de gráficos e figuras. Nesse programa, os dados e as fórmulas
serão reunidos, facilitando a sistematização das informações. Os dados qualitativos
foram transcritos e apresentados de acordo com o discurso dos entrevistados, numa
perspectiva fidedigna de compreensão e descrição dos fenômenos observados durante
as entrevistas. Ademias, as identidades dos entrevistados serão totalmente
preservadas.
2 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Sendo um dos municípios de Minas Gerais, Iturama situa-se no Triângulo
Mineiro, mais precisamente na região do pontal do triângulo mineiro, localizado na
Microrregião de Frutal. Trata-se de um município de pequeno porte, contando com
uma população de 39.263 habitantes e área de 1.404,7 km² de cerrados, campos e
matas, lavouras e pastagens (IBGE, 2019).
Iturama conta com grandes plantações de cana-de-açúcar e soja, e ao mesmo
tempo conta com um grande número de assentamentos e acampamentos
circunvizinhos. Sendo assim, a agricultura familiar da região torna-se forte e
proeminentes, com uma diversidade de produtos que são oferecidos nas feiras tanto da
agricultura familiar, que ocorre às quartas-feiras no período da noite, quanto na feira
de diversos agricultores que ocorre aos domingos pela manhã.
A FAFIR (Feira da agricultura familiar de Iturama e região) teve sua criação e
inauguração no dia onze setembro de dois mil e dezenove, com o intuito de contribuir
na organização e união dos agricultores familiares do município e região Sendo assim,
em 2019, a feira foi inaugurada com dez barracas que comercializavam diversos
produtos oriundos da agricultura familiar, proporcionando aos feirantes e
consumidores uma dinâmica social e econômica de interação e integração, mediante a
um nicho mercadológico regional gerador de capital e fluxo da economia local,
favorecendo assim, as cadeias curtas de produção, tornando possível o contato entre
produtor e consumidor. Outrossim, as feiras acontecem nas quartas-feiras, das 17 até
22 horas (horário de Brasília). Atualmente, a FAFIR conta com mais de 40
agricultores e agricultoras familiares que tem a feira como sua principal fonte
geradora de renda da propriedade.
Assim como no país e no mundo, em Iturama o cenário pandêmico não fora
diferenciado. Foi necessário que a Prefeitura Municipal tomasse uma série de medidas
de segurança com o objetivo de minimizar tanto o número de casos quanto o número
de óbitos no município. Sendo assim, embora o primeiro caso no país fora constatado
168
no dia 26 de fevereiro de 2020, o município confirmou o seu primeiro caso apenas no
dia 04 de junho de 2020.
Um dos motivos desse retardo na confirmação do primeiro caso no município pode
ter como motivo o fato de o prefeito da época, Anderson Golfão, por meio do decreto
nº 7564 de 23 de março de 2020 que suspendia a realização de qualquer evento, seja
público ou privado, inclusive as feiras livres do município, sendo este prorrogado por
inúmeras vezes. Além do decreto, foi criado o Hospital do Covid para receber casos de
suspeitos da doença. Durante o período de 2020, houve diversos decretos
endurecendo e afrouxando as medidas, o que fez com que a situação fosse controlada.
Com a eleição municipal, houve a troca de prefeito, levando o Cláudio Burrinho
para a prefeitura. Mudando a administração, houve também a alteração de decretos,
assim como houve aumento de casos principalmente devido a abertura de comércio no
município e os festejos natalinos e de ano novo.
Consoante ao decreto nº 7.859, de 18 de fevereiro de 2021, da Prefeitura
Municipal de Iturama – MG, este dispunha que Art. 1º Como medida excepcional,
para conter a propagação do Novo coronavírus (COVID-19), fica determinado, para
os próximos 07 dias as seguintes medidas: VI- Ficam proibidas as feiras livres dos dias
21 e 24 de fevereiro.
Em esfera nacional, uma pesquisa inédita realizada pela Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz) mostra que o número de mortes por COVID-19 no Brasil em 2020 foi 18,2%
maior do que o registrado. A análise indicou que foram 230.452 óbitos pela doença no
ano passado e não 194.949 (FIOCRUZ, 2021). Como também, perante a atualização
epidemiológica semanal no COVID-19 (13 de abril de 2021), por meio de dados
recebidos pela OMS das autoridades nacionais, a partir das 10h (horário de Brasília)
de 11 de abril de 2021, que:
Globalmente, os novos casos de COVID-19 subiram pela sétima semana
consecutiva, com mais de 4,5 milhões de novos casos notificados na
última semana. O número de novas mortes aumentou pela quarta semana
consecutiva, aumentando 7% em relação à semana passada, com mais de
76 mil novas mortes notificadas. Nesta edição, uma atualização especial
de foco é fornecida nas variantes SARS-CoV-2.
Vale ressaltar que, uma pesquisa do Instituto Interamericano de Cooperação
Agrícola (IICA) alega que a maioria dos agricultores familiares da América Latina e
do Caribe tem trabalhado com a ausência de equipamentos de proteção e protocolos
sanitários durante a pandemia, além de enfrentar limitações e uma crescente
preocupação no setor da agricultura familiar em relação às possibilidades de
comercialização de alimentos em mercados locais, devido à redução no fluxo de
consumidores por medo de serem infectados (GLOBO RURAL, 2020).
Nesse sentido, um pensamento complementar que contribui para a noção do
impacto dos primeiros meses da pandemia para a agricultura familiar, é o de Claudino
(2020) que em seu dossiê, constata que o setor da produção e comercialização
agropecuária foi duramente afetado nesse período, havendo perdas econômicas
expressivas, muito mais intensas entre aquelas famílias ou grupos mais vulneráveis, e
aqueles que diversificaram seus meios e canais de comercialização, ou que tinham
produtos que não dependiam de colheita imediata puderam superar ou driblar aquele
determinado momento.
169
Para efeitos de resultado da presente pesquisa, coletadas informações sobre o
perfil social e econômico dos feirantes tais como gênero, localização da propriedade,
idade, escolaridade de acordo com o citado na metodologia deste trabalho, foram
analisados os perfis socioeconômicos e escolaridade dos agricultores e agricultoras
que expõem seus produtos na feira.
Quanto ao gênero dos agricultores familiares, 60% dos respondentes declararam
ser do sexo feminino enquanto 40% são do sexo masculino. Tal informação pode ser
corroborada com a pesquisa realizada por Conceição (2016), a qual pode-se perceber
que as mulheres vêm tomando posições de contato com o público para
comercialização dos produtos, enquanto os homens cada vez mais estão na
propriedade cuidando da lida no campo.
Quanto a faixa etária dos entrevistados, parâmetro muito importante visando o
cenário de pandemia, pois pessoas acima de 60 anos são consideradas grupo de risco
do vírus. Logo, pode-se observar que maioria dos feirantes correspondem a um grupo
de idade superior a 40 anos, sendo 35% com idade entre 41 a 50 anos, 50% de 51 a 60
anos e 5% acima de 60 anos.
Ambos os dados citados acima, como faixa etária e gênero, se reforça a
importância desses dados, através de um estudo publicado pela revista Veja Saúde
(2020), o qual mostra um artigo que aborda a influência de idade e sexo na gravidade
do coronavírus, pois de acordo com análises descritas no artigo, a infecção pelo Sars-
CoV-2 em indivíduos de 13 a 60 anos se mostrou associada a alteração em diversos
parâmetros laboratoriais de maneira muito mais frequente em homens do que em
mulheres.
Quanto a escolaridade, é possível observar que entre os entrevistados, 15%
apresentam ensino superior completo, 20% Ensino médico completo, 30% ensino
médio incompleto, 10% ensino fundamental completo e 10% ensino fundamental
incompleto. Não houve relatos de analfabetos ou em alfabetização.
Apesar da logística ser um dos principais entraves para a realização de feiras e
entregas de produtos da agricultura familiar do município, é possível observar que as
propriedades não distam muito do local de realização, além de boa parte das
propriedades terem acesso a estrada principal asfaltada.
Corroborando com o objetivo do presente artigo sobre os efeitos da pandemia na
feira, foi levado em consideração na pesquisa se o agricultor familiar participante da
feira sabe o que é o COVID-19, chegando ao resultado da ciência dos mesmos em
porcento (100%) dos entrevistados que sabiam e tinham conhecimento acerca da
doença. Ademais, foi abordado junto aos entrevistados se ele ou algum familiar já
havia sido infectado com a doença respiratória citada. Observa-se que metade dos
entrevistados contraíram ou tiveram algum familiar acometido pelo vírus, o que pode
ser um indicador que o fechamento da feira guiou os produtores a se informar sobre a
situação em que se encontram, a fim de se manterem saudáveis e produtivos dentro das
possibilidades.
E perante a temática das TICs, fora perguntado aos agricultores acerca da
utilização de celular ou smartphone, e de acordo com os entrevistados, 95% utilizam
celulares ou smartphones. E quanto ao acesso à internet, 95% dos respondentes
afirmaram possuir acesso à internet na propriedade. E segundo dados do Cetic (2019),
170
51% da população rural brasileira apresenta acesso à internet em suas propriedades.
Outrossim, quando questionados sobre a utilização das redes sociais, 80% apontarem
terem perfis em redes sociais. Por redes sociais, entende-se como utilização de
Facebook, Instagram, WhatsApp, Twitter, TikTok).
Em virtude ao pensamento de Del Grossi (2020), citado por Schneider (2020) que
metade dos agricultores familiares brasileiros (51%) sentiram uma queda na receita
no mês de julho no ano de 2020, notando um retrocesso de 35% da renda bruta orçadas
pelas famílias mensalmente, é possível observar que essa queda também acometeu os
agricultores familiares em nível municipal em Iturama-MG. Também houve quedas
expressivas e perda da produção durante a pandemia, como o notório relato no
formulário de queda de menos da metade das vendas.
Fora perguntado aos entrevistados acerca das dificuldades enfrentadas atualmente
na pandemia, a opinião sobre o fechamento da feira por conta da pandemia, Como
você está vendendo seus produtos durante a pandemia e quanto estão conseguindo
comercializar em média nesse cenário.
A grande maioria dos agricultores entrevistados afirmaram ter uma perda grande
de valor comercializado, principalmente com a não autorização do funcionamento da
feira. Segundo um dos entrevistados, “Antes da pandemia entre R$1.500,00 à
R$1.600,00. Mas agora em média de R$500,00”. Essa é a realidade de muitos
feirantes não somente em Iturama-MG. Acaba que as feiras constituem um dos
principais, se não o principal local de comercialização dos pequenos agricultores que
relatam que “Caiu muito por não ter a feira no momento”; “A metade do que vendia.”;
“Menos da metade”; “200 reais por semana”.
É notório salientar que, ainda que fora proporcionados momentos de autorização
da realização da feira FAFIR, devido a pandemia e o temor da população em contrair o
vírus, o público da feira reduziu drasticamente, fazendo que mesmo com seu
funcionamento, os agricultores não conseguissem comercializar suas mercadorias
como no período anterior ao COVID-19. Além disso, essas falas corroboram para a
certeza de que o fechamento da feira da agricultura atingiu desastrosamente os
agricultores familiares de maneira econômica e social.
Ao serem questionados sobre a forma sobre como estão realizando as vendas
durante a pandemia, apesar de um dos entrevistados afirmar que “Quando a feira está
fechada, não vendemos”; alguns entrevistados afirmaram estarem usando suas redes
sociais, seja “Divulgando nas redes sociais”; “Através do contato com os clientes” e
“Entregando de porta em porta pedidos feitos pelo zap”.
O acesso à internet, por meio da utilização de redes sociais tem colaborado no
processo de comercialização dos agricultores da FAFIR. E diante dessa situação,
alguns agricultores procuraram novas formas de divulgar seus produtos, e um desses
meios, destaca-se a comercialização dos produtos na internet, por meio das redes
sociais, e entregas via delivery.
Neste sentido, uma iniciativa realizada foi a criação da página CAFITUR (Apoio à
comercialização da agricultura familiar de Iturama e região), que tem o intuito de
divulgar os produtos e agricultores da agricultura familiar de Iturama e região, estando
disponível publicações no Facebook e Instagram. Sendo assim, buscou-se com a
CAFITUR alcançar como objetivo a diminuição da perda, tanto de produtos quanto
171
financeiras dos agricultores familiares de Iturama e região a fim de criar um grupo de
pessoas com o intuito de apoiar e divulgar a comercialização dos produtos advindos da
agricultura familiar, possibilitando ampliar as possibilidades de comercialização dos
produtos dos agricultores e agricultoras familiares criando um mecanismo de compra
direta entre agricultor e consumidor.
Concomitante a esse objetivo, buscou-se ampliar a rede de comercialização local,
e como consequência, buscar uma melhor distribuição de alimentos, visto que
adquirir alimentos direto do produtor tende a colaborar com o desenvolvimento da
economia local. Em pouco tempo, a quantidade de acessos as páginas do Facebook
contavam com 551 curtidas e 558 pessoas seguindo, o perfil no Instagram com 485
seguidores; números interessantes para uma cidade de 39 mil habitantes. Não foi
possível dimensionar o alcance dos grupos do WhatsApp devido ao
compartilhamento das imagens e mensagens. Quanto aos links de acesso direto de
mensagem, esses encaminham mensagens diretamente para o aplicativo do agricultor
ou agricultora e em apenas três dias de divulgação, a página contava com mais de 350
acessos em 2 semanas de disponibilidade.
E por meio das métricas da plataforma social do Instagram foi possível
dimensionar que 73% do público consiste ser do sexo feminino e 27% do sexo
masculino, no Facebook a média mostra que as mulheres são o público alvo
predominante da página com 63,7% contra 36,3% do público masculino. Sobre a faixa
etária dos seguidores, nota-se uma grande variação, sendo entre 18 a 24 anos (10,6%
do público no Facebook e 12,4% no Instagram), entre 25 e 34 (27,5% no Facebook e
31,7% no Instagram), idades de 35 a 44 anos (32,7% no Facebook e 31,4% no
Instagram), de 45 a 54 (8,1% no Facebook e 16% no Instagram) e findando as idades,
entre 55 a 64 anos (8,1% no Facebook e 6,1% no Instagram).
Figura 1 – Média de visualizações mensais (2020 – 2021).
172
processo de comercialização afirmando que: “Nossas vendas Graças à Deus estão nos
ajudando muito com a ajuda da CAFITUR uma rede social muito bem-feita que nos
ajuda a vender nossas mercadorias”.
Assim, concretiza-se a suma importância dessa página como um veículo de
comércio online em prol dos agricultores familiares, auxiliando nas vendas através do
marketing digital, buscando retornar à possibilidade de venda direta dos produtores, e
principalmente gerando renda. No entanto, Niederle, Schneider e Cassol (2021, p. 42)
afirmam que “permanece a dúvida, todavia, sobre os riscos dos pequenos
empreendimentos se aventurarem nessa odisseia digital, e sobre os riscos talvez ainda
mais expressivos de serem completamente excluídos dela”.
No âmbito referente ao decreto municipal, que proíbe e inviabiliza o
funcionamento da feira da agricultura familiar, observa-se que ao mesmo tempo em
que há agricultores com posicionamento a favor ao fechamento da feira da agricultura,
afirmando que “Se for para acabar com a aglomeração acho correto. Infelizmente
estamos passando por momentos difíceis”; há uma grande insatisfação dos feirantes,
de acordo com as respostas a seguir: “Eu acho que é injusto, porque se não abre, não
temos aonde vender já que os mercados não compram nossas verduras, e nossa feira
tem menos aglomerações do que os supermercados, lanchonetes, atacadão. Se os
bancos continuam abertos, nossas contas, continuam chegando, e os juros continuam
correndo, porque quer nós tirar nosso meio de ganhar nosso dinheiro para
continuarmos cumprindo com nossos deveres e obrigações”. “Eu acho que na feira
livre é um ambiente aberto que tem o menor risco de contrair o vírus”.
“Desnecessário, pois a feira da agricultura familiar sempre atendeu as normas de
higiene e não causa aglomeração”.
Entretanto, mesmo com toda ciência acerca dos prejuízos causados pelo decreto
suspendendo o funcionamento da feira, é necessário prudência e cuidado devido a
situação pandêmica a qual estamos vivendo desde março de 2020.
Em nota, a Prefeitura Municipal de Iturama (2020) visando apoiar o pequeno
produtor do município, perante ao decreto nº 7.606, de 30 de abril de 2020, impôs a
flexibilização de determinadas medidas na comercialização de produtos, no entanto,
os feirantes e o público deveriam seguir normas sanitárias de prevenção, como o uso
de máscaras de proteção, disponibilidade de álcool em gel, distanciamento social e
esterilização dos produtos. Frente à discussão, a realidade então é que a reabertura dos
mercados locais não prosseguiu a demanda da volta dos números de consumidores.
Sendo assim devido aos diversos fatores, a população tem preferido não se deslocar
para estes mercados, fazendo com que os agricultores avaliassem os volumes de
produção, adotando novos métodos de vendas através de mídias digitais e redes
sociais, garantindo um alavanque na comercialização digital (SCHNEIDER, S. et al.,
2020).
Então para driblar as adversidades impostas pela doença, uma maneira seria a
venda das mercadorias, que antes eram vendidas presencial nas feiras-livres,
atualmente poderiam ser comercializadas online, por meio de divulgações em redes
sociais. Além de ser um recurso para escoar o produto e obter lucro, também o
agricultor familiar evita de uma maneira menos exposta de contrair a doença. Assim, é
necessário que os agricultores adotem as tecnologias que podem figurar como um
fator a mais para a produtividade na propriedade.
173
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Consoante a discussão do trabalho apresentado, entende-se a importância da feira
para os agricultores familiares da região, como um gerador de renda e subsídio para
essas famílias. Entretanto, esta está sendo drasticamente afetada devido ao fato da
pandemia em curso do novo coronavírus.
Sendo assim, podemos observar que apesar de os fechamentos da feira da
agricultura familiar ter causado grande impacto econômico, foi de extrema
importância a fechada da mesma, devido aos perigos do contágio por aglomeração, o
município de Iturama tem uma densidade populacional pequena, porém ainda
mantém uma rotina interiorana na qual ainda se observa a exposição de pessoas em
locais públicos sem utilização de máscaras, o que acarretaria um maior nível de
contaminação, que agravaria a situação do hospital de campanha do município que
tem números baixo de leito para internação se comparado ao número populacional
contando com poucos leitos disponíveis para os habitantes da cidade e dos municípios
vizinhos.
O CAFITUR tem importância substancial, trabalhando no campo dos e-comerce
em prol dos agricultores familiares, auxiliando nas vendas por meio do marketing
digital, ampliando as possibilidades de venda direta dos produtores. Cabe ainda
destacar a contribuição dessa página como uma garantia de segurança alimentar e
nutricional através de processos melhorados para o acesso e troca de informação
baseada no uso das TIC em meio ao caos gerado pela pandemia do COVID-19, que
está atingindo a oferta e distribuição de alimentos em diversas formas e intensidades.
Percebemos a necessidade do funcionamento das feiras, mas também
presenciamos a inevitabilidade do fechamento das mesmas, a divergência de
pensamentos também se encontra na dificuldade da adaptação de novos meios de
produção, apesar do número de comércio on-line ter tido um progresso suntuoso,
notamos ainda uma dificuldade de alguns agricultores de se adaptarem a estas novas
fórmulas.
Mas em vias de fatos, é importante reafirmar a necessidade de isolamentos sociais
para a restrição da propagação do novo coronavírus, e também denotamos a
dificuldades encontradas pelos produtores, onde podemos dizer que é uma classe que
tem batalhado diariamente a fim de se manterem firmes em suas lutas diárias de
produção e escoamento de suas mercadorias.
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175
A INSERÇÃO DA AGROECOLOGIA
EM UM NOVO SISTEMA ALIMENTAR
PÓS-COVID-19
RESUMO. A lógica do atual sistema alimentar tem sido incapaz de gerar saúde
respeitando os limites do planeta. Assim sendo, o presente trabalho propõe uma
reflexão acerca da inserção da agroecologia em um novo sistema alimentar pautado na
construção de sociedades sustentáveis em tempos de crise ambiental e de saúde
global. A pandemia provocada pelo vírus SARS-CoV-2 está profundamente associada
com a ruptura ecológica produzida pelo sistema convencional de produção de
alimentos. A atual crise mundial ressalta a necessidade de um sistema agroalimentar
mais sustentável, e a agroecologia, que além de atender as demandas das famílias
rurais, garantindo benefícios sociais, econômicos e ambientais, também se apresenta
como solução viável para atender as demandas urbanas.
(1) MSc. em Ciências Agrárias (Agroecologia), Universidade Federal da Paraíba, Bananeiras – PB, Brasil;
joaohenriqueconst@gmail.com.
(2) Doutor em Agronomia, Universidade Federal da Paraíba, Bananeiras – PB, Brasil;
aldasibarbosa@cchsa.ufpb.br.
176
1 INTRODUÇÃO
A maior parte dos nossos problemas globais, a exemplo da escassez de água e
energia, poluição ambiental, mudanças climáticas, desigualdades socioeconômicas,
insegurança alimentar, dentre outros, não podem ser vistos de forma dissociada, uma
vez que um desiquilíbrio no sistema causa uma reação em cadeia, afetando as demais
esferas desse sistema. Nesse sentido, a atual crise mundial provocada pelo vírus SARS-
CoV-2, causador da enfermidade Coronavirus disease 2019 (COVID-19), faz-nos
compreender o quão frágil e vulnerável é o nosso planeta, numa perspectiva
sócioecológica; e que a agroecologia pode ajudar a explorar o elo existente entre
agricultura e saúde (ALTIERI; NICHOLLS, 2020).
A declaração de pandemia da COVID-19 fez com que muitas pessoas ao redor do
mundo mudassem suas rotinas de forma drástica. Mas, poucos são os que questionam as
causas reais que levaram ao surgimento do vírus e ao fato de que, enquanto governos
trabalham para contê-lo, outros vírus e pandemias continuam surgindo (Ribeiro 2020a).
Ribeiro (2020b) menciona três possíveis causas, concomitantes e complementares, que
produziram todos os vírus infecciosos que se propagaram mundialmente nas últimas
décadas, sendo elas: 1) a criação de animais em confinamento; 2) o desmatamento da
vegetação nativa, principalmente com finalidade de criação de pastos e monocultivos; e
3) o crescimento descontrolado da urbanização e das indústrias.
A pandemia do coronavírus mostrou que o homem e sua maneira inconsciente de
consumir são um dos maiores culpados pelo que estamos vivenciando hoje (GLETTE,
2020). As restrições causadas pela pandemia da COVID-19 – devido ao necessário
cumprimento do isolamento social, na expectativa de postergar a velocidade de
contaminação do vírus – passaram a impor dificuldades para promover o abastecimento
alimentar no Brasil. Multidimensional, a alimentação sempre refletiu as prioridades
políticas e de desenvolvimento presentes na sociedade, e não seria diferente nesse
contexto com o coronavírus (PORTO; GRISA, 2020).
O isolamento preventivo nos levou a repensar a nós mesmos, consumir estritamente
o necessário, valorizar o trabalho dos camponeses e esperar que o mercado de frutas e
verduras esteja disponível nas quitandas mais próxima ou venha à nossa porta. O
trabalho digno do feirante camponês, que há muito foi subordinado e marginalizado
pelo agronegócio, está sendo reavaliado gradativamente neste período de
distanciamento social, uma vez que as pessoas estão dando preferência a procurar
suprimentos nas quitandas, pequenos mercados ou armazéns mais próximos, em vez de
ir a centros comerciais lotados (LEAL, 2020).
Se uma ida ao mercado precisa de uma série de precauções e medidas de segurança,
as compras online nunca se mostraram tão essenciais. No entanto, é preciso mais do que
nunca saber de quem estamos comprando e valorizar pequenos produtores locais
comprometidos com o meio ambiente (GLETTE, 2020). Nesse sentido, a agroecologia,
mais do que uma alternativa, é uma necessidade para enfrentar a atual crise
civilizacional, uma vez que ela é capaz de entrelaçar conhecimentos das ciências
naturais e ciências sociais, rompendo assim a dicotomia cultura-natureza, visto que a
agroecologia concebe o mundo a partir de uma perspectiva sócioecológica, onde tanto
as desigualdades sociais como as ambientais fazem parte do todo (VALDERRAMA,
2020).
177
Ante ao exposto, a presente pesquisa bibliográfica propõe uma reflexão acerca da
inserção da agroecologia em um novo sistema alimentar pautado na construção de
sociedades sustentáveis em tempos de crise ambiental e de saúde global.
2. O SISTEMA CONVENCIONAL DE PRODUÇÃO DE ALIMENTOS E A COVID-19
Inúmeros estudos têm apontado para a insustentabilidade do atual sistema
agroalimentar com produção em larga escala (ALENTEJANO, 2020). De acordo com
alguns especialistas, enormes quantidades de animais de criação confinados, vacinados
e imunodeprimidos fazem com que os vírus tenham mutações de forma mais rápida.
Esses animais consomem antibióticos e antivirais continuamente, propiciando
rusticidade e adaptação aos novos vírus. Além disso, os vírus podem passar de uma
espécie à outra e embora possam originar-se em espécies silvestres, como aves e
morcegos, é a destruição dos habitats naturais que fazem esses animais migrarem de
suas áreas de ocorrência natural, onde as cepas dos vírus estavam controladas dentro de
sua própria população (RIBEIRO, 2020a; RIBEIRO, 2020b). Ou seja, o avanço do
desmatamento, por sua vez, leva animais silvestres que antes se encontravam nas
florestas a se deslocar para outras áreas, inclusive urbanas, transformando-se também
em vetores da disseminação de doenças.
Causas estruturais, assim como outros vírus (gripe aviária H5N1, gripe suína H1N1
e a doença da vaca louca), estão relacionadas a um sistema agroalimentar que se sustenta
na ideia antropocêntrica de que certos animais (porcos, vacas, galinhas) são meros
objetos para a exploração (VALDERRAMA, 2020). De acordo com este autor, o
problema vai muito além do que suscita uma visão sanitarista, centrada na saúde
pública, mas, sim, está em questionar um sistema de vida atual, que declarou guerra à
mãe natureza, ao acreditar estar acima de seus limites. O modelo de produção de
alimentos proposto pelo agronegócio, espalha vírus selvagens mortais para organismos
adoecidos por alimentos cheios de açúcares, gorduras e agrotóxicos.
Esse sistema convencional de produção tem uma grande contribuição nas
morbidades crônicas, a exemplo da diabetes e hipertensão arterial, que colocam muitas
pessoas no grupo de risco, aumentando as chances de complicação pela COVID-19
(OLIVEIRA, 2020a). Além disso, o agronegócio tem como um dos principais pilares o
uso de agrotóxicos e, atualmente, vários estudos relatam os malefícios destes à saúde
humana e ambiental, como os trabalhos descritos por Carneiro et al. (2019), Mello et al.
(2019), Pereira et al. (2019) e Haddad et al. (2019). Contudo, a pandemia de COVID-19
não foi motivo suficiente para que o atual governo brasileiro contivesse a liberação de
novos agrotóxicos no país, visto que em março do decorrente ano foi dado aval para
mais 53 agrotóxicos (leia atos 17 e 22 no Diário Oficial da União). Somando-se os 101
liberados apenas no primeiro trimestre de 2020 aos 503 liberados em 2019, tem-se o
total de 604 novas liberações em 15 meses (OLIVEIRA, 2020a).
De acordo com Loureiro e Zarref (2020):
Por um lado, o envenenamento massivo da natureza estimula a seleção
natural no sentido de surgirem variedades de vegetais, vírus, bactérias
cada vez mais resistente. Por outro lado, vegetais, animais e seres
humanos que estão subordinados à lógica alimentar das grandes
transnacionais vão se tornando cada vez mais vulneráveis, com menos
imunidade e resistência a essas doenças. O francês Francis Chaboussou,
ao desenvolver a teoria da trofobiose para as plantas, afirmou que “solo
178
doente, planta doente”. Podemos reproduzir isso para todo o
metabolismo socioecológico: alimento doente (ultraprocessado, pouco
diverso, envenenado), ambiente doente (escassez hídrica, ausência de
biodiversidade, poluições diversas), seres humanos doentes.
Pinheiro (2020) aponta o momento atual como oportuno para reconhecermos o
impacto das escolhas alimentares sobre a saúde humana, ambiental e planetária, como: a
iminente escassez dos recursos naturais, o desmatamento das florestas, a poluição do ar
e dos solos, o aumento de doenças crônicas provocadas pelo uso e consumo excessivo
de agrotóxicos, alimentos transgênicos e ultraprocessados, o extermínio das
comunidades tradicionais e suas práticas ancestrais de respeito e preservação da
natureza, o acúmulo de lixo reciclável e não reciclável sem tratamento e
reaproveitamento correto, dentre outras questões ético-políticas que violam os direitos
humanos, destroem a biodiversidade e ameaçam a sobrevivência do planeta.
As grandes metrópoles brasileiras são marcadas por profundas desigualdades, com
trânsito caótico, falta de saneamento, ilhas de calor e poluição, ambientes mais do que
favoráveis à disseminação de epidemias e pandemias ligadas aos mais diferentes
agentes infectocontagiosos. A desconcentração espacial da população brasileira através
de uma ampla reforma agrária agroecológica permitiria ao mesmo tempo combater
essas mazelas. Uma vez que há no Brasil 247,7 milhões de ha sob o controle do
latifúndio, dos quais 175,9 milhões de ha são de terras improdutivas. Por outro lado, a
área plantada com alimentos básicos (arroz, feijão e mandioca) diminuiu 5 milhões de
ha nos últimos 30 anos. Portanto, reverter esse cenário é urgente e só uma reforma
agrária agroecológica pode fazê-lo. Antes que se ampliem ainda mais a fome, a miséria e
as doenças geradas por esse modelo agroalimentar dominado pelas grandes corporações
do agronegócio (ALENTEJANO, 2020).
3. A AGROECOLOGIA PERANTE AS ATUAIS CRISES SOCIOAMBIENTAIS
Em meio ao contexto de pandemia que se instaurou no mundo e no Brasil, muitas
aldeias indígenas, quilombos, ribeirinhos e outras comunidades tradicionais que têm o
turismo e o artesanato como uma fonte de renda, tiveram que limitar o acesso de pessoas
vindas de fora de seus territórios. Assim sendo, muitas redes de solidariedade têm
reforçado ações nas áreas de soberania e segurança alimentar, direito à terra e economia
solidária para evitar que a fome e a falta de recursos essenciais cheguem às pessoas que
estão em maior situação de vulnerabilidade (OTSS, 2020).
A crise causada pela pandemia do novo coronavírus veio alertar os países
dependentes de importações de alimentos sobre o risco que essa dependência pode
trazer à segurança alimentar nacional, fazendo-se necessário rever o abastecimento
interno das importantes olerícolas (NASCIMENTO, 2020). De acordo com este autor,
essa crise está sendo uma grande oportunidade para o governo, empresas, produtores e
para a sociedade geral repensarem a sua atuação e a sua forma de organização em busca
de caminhos alternativos.
Leal (2020, p.1) afirma que:
É hora de acreditar no campesinato, apoiá-lo, em vez de aplausos
invisíveis por meio das redes sociais, com políticas públicas que lhes
proporcionem benefícios para melhorar sua qualidade de vida, para que
mantenham a disponibilidade de alimentos e para que nosso país possa
oferecer sua própria comida.
179
Stedile (2020) ressalta que a agricultura familiar cumpre um papel importante na
alimentação saudável da população e pode ser a saída para essa crise que se aprofunda.
Ainda segundo Stedile (2020), defender a soberania alimentar e utilizar a agroecologia
para produzir alimentos sadios, se mostrou não apenas como uma política pontuada pelo
MST ou de algum governo, mas, sim, uma necessidade real de sobrevivência das
sociedades atuais. Além disso, no contexto de isolamento social das cidades, com o
fechamento de fronteiras e as restrições ao comércio, é a Agroecologia e a produção
camponesa que estão mantendo o abastecimento alimentar das cidades, fornecendo
alimentos saudáveis e fortalecendo o comércio justo e solidário (LOUREIRO;
ZARREF, 2020).
No momento da pandemia do coronavírus, inúmeros problemas têm dificultado o
acesso aos alimentos. No entanto, a sociedade vem gerando outras estratégias de acesso
à alimentação saudável, como os grupos de consumo. Estes grupos reúnem famílias,
amigos ou indivíduos que, em parceria com assentados da reforma agrária, povos
originários e comunidades tradicionais, planejam e financiam sistemas de produção de
alimentos agroecológicos locais, de forma colaborativa, coletiva e solidária. Fortalecer
estas aproximações em tempos de quarentena pode ser uma alternativa saudável para a
sociedade e o meio ambiente (PINHEIRO, 2020).
No Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, vários produtores agroecológicos se
organizaram e expandiram sua clientela durante o avanço da pandemia. Diante da
determinação de medidas de isolamento social, os pedidos por cestas de frutas, legumes,
verduras e outros itens derivados da tradicional feira ecológica, quadruplicaram através
de aplicativos e redes sociais, exigindo rapidez dos agricultores na revisão de suas
estratégias de atuação para atender às demandas sem sobrecarregar os processos de
produção (OLIVEIRA, 2020b). Acredita-se ainda, que esta tendência de consumo se
firme, após a superação do isolamento preventivo, em reconhecimento à contribuição
dessas práticas produtivas para a proteção ambiental e a saúde de produtores e
consumidores.
Nessa perspectiva, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor criou a
plataforma “Comida de Verdade”, com o apoio de diversas organizações, para divulgar
iniciativas que comercializam alimentos saudáveis durante a pandemia do COVID-19.
A ferramenta tem o objetivo de apoiar a economia local e aproximar quem produz de
quem consome. Nela, o usuário pode encontrar iniciativas da agricultura familiar, de
pequenos produtores e dos sistemas de produção orgânica e agroecológica em todas as
regiões do Brasil. Essa plataforma é um importante meio de informar às pessoas que,
além dos mercados, existem canais alternativos para o abastecimento, seja em pontos de
venda físicos ou na modalidade de entrega a domicílio (IDEC, 2020). Outra
característica da plataforma é que os produtores, ou quem quiser contribuir, podem fazer
novos cadastros.
Para escoar a produção de assentamentos da zona rural de Teresina – PI, produtores
rurais e entidades ligadas à agricultura familiar realizaram um projeto piloto de venda de
produtos como hortaliças, legumes e frutas via Drive Thru. Sem descer do carro,
consumidores recolhem as cestas de produtos encomendados previamente pelo
WhatsApp. Estas cestas variam de R$ 10 a R$ 130 reais, dependendo da quantidade de
produtos que vão desde legumes a produtos manuseados como farinha e goma e a
entrega é feita pelos próprios produtores, evitando o máximo de contato com os
180
consumidores (MACÊDO, 2020). No Estado do Espirito Santo, alguns agricultores
também comercializaram seus produtos nesta modalidade, como reportado por
Nascimento e Esteves (2020). Essas iniciativas tiveram uma repercussão positiva, uma
vez que são alternativas diante da suspensão das feiras livres e das aulas nas escolas,
onde muitos agricultores comercializam produtos via Programa de Aquisição de
Alimentos (PAA).
Outra iniciativa que ganhou notoriedade foi a criação do Portal dos Produtos da
Agricultura Familiar pela Secretaria do Desenvolvimento Agrário do Governo do
Ceará. O portal consiste numa ferramenta capaz de fortalecer a agricultura familiar,
diminuir a vulnerabilidade e criar a perspectiva da renda, através da segurança
alimentar. Pelo espaço de pesquisa da nova plataforma, compradores podem procurar
pelo produto, região ou cidade de preferência e até mesmo a cooperativa responsável
pelo gênero. Assim, ofertar alimentos como frutas, hortaliças e verduras de maneira
dinâmica pode ajudar ainda na movimentação da economia (CELEDÔNIO; GURJÃO,
2020).
De acordo com Porto e Grisa (2020) o desafio nesse momento será o de assegurar
diferentes mecanismos que contribuam para garantir o Direito Humano à Alimentação
Adequada e Saudável (DHAAS), de um lado acelerando os repasses de transferência de
renda e, de outro, potencializando diferentes estratégias de abastecimento alimentar.
Ainda de acordo com esses autores, essas estratégias devem ser estabelecidas tanto por
meio da ação do Estado quanto por iniciativas que promovam a construção social dos
mercados, fortalecendo as relações diretas entre produtores e consumidores. Importante
que essas estratégias considerem o papel multidimensional da alimentação e suas
repercussões no desenvolvimento. Além de lidar com o contexto emergencial, essas
medidas podem deixar um legado para novas ações estruturantes, contribuindo para
colocar a alimentação no centro dos processos de desenvolvimento e das prioridades
políticas, onde deve estar.
4. AGROECOLOGIA, SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL: UM DIÁLOGO
NECESSÁRIO
De acordo com Moreira (2020), o momento histórico e conjuntural que vivemos é
privilegiado para analisar mecanismos e tendências sociais em funcionamento há
muitos anos, a exemplo das práticas agroecológicas e sustentáveis. Segundo este autor,
manter um estilo de vida saudável e sustentável remete-nos a uma alimentação
equilibrada e heterogênea, uma vez que os alimentos recomendados pelos
imunologistas são, em maior ou menor medida, encontrados em abundância na
natureza, e, sobretudo nos quintais, hortas familiares ou comunitárias, assentamentos da
reforma agrária e feiras de produtores familiares e agroecológicos, o que ressalta os
aspectos eminentemente sociais e ambientais da saúde e da medicina.
Nessa mesma linha de raciocínio, Melo et al. (2017) evidenciam o elo existente entre
a agroecologia e nutrição e como esses dois pilares coexistem e caminham juntos na
promoção da saúde ambiental e humana, nos seus mais complexos contextos. Para esses
autores, não há como dissociar essas duas temáticas, visto que elas estão intimamente
relacionadas à soberania e segurança alimentar e nutricional, à medicina popular e
dietoterapia; e à promoção da saúde através de uma dieta heterogênea.
Loureiro e Zarref (2020) afirmam que:
181
Se compararmos a China com os EUA nessa pandemia atual, já podemos
tirar algumas lições. Uma é que dentre os tratamentos utilizados na
vitoriosa ação chinesa contra a doença, estão um conjunto de mais de
uma dezena de plantas da medicina tradicional do país. Outra é o perfil
epidemiológico da doença: enquanto na China o grupo de risco era quase
exclusivamente idosos, nos EUA pessoas de 20 a 50 anos já representam
40% dos internados. Isso se deve à diferença de alimentação e práticas de
saúde entre os dois países.
Segundo Altieri e Nicholls (2020), a agroecologia tem o potencial de produzir
localmente grande parte dos alimentos necessários para as comunidades rurais e
urbanas, particularmente em um mundo ameaçado pelas mudanças climáticas e outros
distúrbios, como as pandemias de doenças. Ainda de acordo com esses autores, a
ingestão de alimentos nutritivos à base de vegetais produzidos em propriedades
agroecológicas locais pode ajudar a fortalecer nosso sistema imunológico,
possivelmente melhorando nossa capacidade de resistir a várias ameaças, incluindo os
vírus contagiosos como o SARS-CoV-2.
Nesse sentido, romper com o sistema alimentar hegemônico que potencializa a
produção e comercialização dos produtos ultraprocessados, baseados em açúcares,
gorduras, sódio, aditivos químicos e cada vez mais restritos a poucas culturas (como
soja e milho), significa dar passos para reverter o quadro de agravo da saúde da
população, refém das doenças crônicas como diabetes, hipertensão, obesidade, cânceres
(LOUREIRO; ZARREF, 2020). Segundo esses autores, é na soberania alimentar
proposta pela agroecologia que estão as chances de garantir às comunidades o acesso
aos recursos naturais dos seus territórios, como água, terra, sementes, insumos e a
biodiversidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pandemia provocada pelo vírus SARS-CoV-2 está profundamente associada com
a ruptura ecológica produzida pelo sistema convencional de produção de alimentos.
Embora se acredite numa origem zoonótica para a COVID-19, o problema de fundo
passa pela destruição dos habitats naturais dos animais silvestres pela agricultura
industrial aliada ao uso abusivo de antibióticos em animais confinados, o que gera as
condições adequadas para as aceleradas mutações virais.
A atual crise mundial ressalta a necessidade de um sistema agroalimentar mais
sustentável e diante da segurança e da soberania alimentar que a Agroecologia propõe,
acredita-se que esta tendência de consumo se firme, após a superação do isolamento
preventivo, em reconhecimento à contribuição dessas práticas produtivas para a
proteção ambiental e a saúde de produtores e consumidores.
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184
A DINÂMICA DA COVID-19 NO MUNICÍPIO
DE SÃO PAULO E A BUSCA DE SOLUÇÕES
BASEADAS NA NATUREZA:
A IMPORTÂNCIA DOS ESPAÇOS LIVRES E PARQUES
PÚBLICOS NA SAÚDE NO CONTEXTO PÓS-PANDEMIA
186
Porém, apenas uma pequena porção da população brasileira tem acesso aos serviços
da saúde, a grande maioria encara a dificuldade no suprimento de leitos hospitalares.
Isto vinculado a expansão pandêmica da COVID-19, associado a falta de um
gerenciamento no nível federal e a dificuldade de reação dos serviços de vigilância
epidemiológica e pouca aderência ao distanciamento social tornou o Brasil o centro das
atenções mundiais com intenso aumento de contaminações e aumento significativo de
mortes no primeiro trimestre de 2021. Assim, é cada vez mais evidente a necessidade de
medidas abrangentes para diminuir a transmissão interpessoal da COVID-19.
1.2 URBANIZAÇÃO E ANÁLISE SOCIOAMBIENTAL
Nas capitais dos Estados, bem como no Distrito Federal, as desigualdades
socioeconômicas e ambientais são agudas e evidenciam o descompasso entre o
tratamento da saúde pública e a distribuição dos habitantes com rendas diferenciadas no
tecido urbano.
Destaca-se o aumento da temperatura nas áreas urbanas, devido à intensa expansão
da área construída e supressão da vegetação, propiciando a formação da Ilha de Calor,
afetando assim, a saúde dos habitantes e evidenciando a desigualdade social.
Segundo Lombardo (1985), a urbanização interfere significativamente na atmosfera
urbana, onde aos materiais da construção civil absorvem calor e removem as áreas
verdes. Além disso está intensa urbanização propicia surgimento de novas doenças,
como o novo coronavírus e ressalta as diferenças socioeconômicas.
A expansão urbana da Região Metropolitana de São Paulo, assim como do
Município de São Paulo, SP, ocorreu de forma periférica e com processo de
periurbanização, envolvendo a dispersão espacial de dois grupos, os de baixa renda,
incluindo autoconstrução e por loteamentos irregulares e comunidades e os de renda
média a alta, onde existem os condomínios fechados.
A Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) possui 8000 km2 de área, é composta
de 39 municípios (Figura 1). A área urbanizada é de aproximadamente 2500 km2. A
população atual é de aproximadamente 19 milhões de habitantes, com densidade
demográfica de 2.361 hab/km2 e PIB que representa aproximadamente 45 % do PIB do
Estado e cerca de 15% do PIB país (IBGE, 2017).
O clima na RMSP pode ser definido como seco no inverno e úmido no verão.
Durante os meses de setembro a abril, a região, é caracterizada pela ocorrência sucessiva
de sistemas frontais, com ventos úmidos do Sul, resultando em precipitações. No
inverno pode ocorrer inversão térmica de subsidência e céu claro, com pouca ocorrência
de precipitação (TARIFA; ARMANI, 2001).
A área de estudo deste projeto será o Município de São Paulo, SP. O município de
São Paulo, com 31 subprefeituras (Figura 2), possui 11.253.503 habitantes e uma área
de 1521 km2, com densidade demográfica de 7898, 2 hab/km2 (IBGE, 2010).
1.3 SAÚDE E MEIO AMBIENTE
No âmbito da saúde, há vários estudos na literatura médica que relacionam
doenças respiratórias e clima, destacando a ocorrência em cidades grandes,
sendo a poluição do ar uma das causas destas patogêneses. Assim, os efeitos da
degradação ambiental, incluindo as ondas de calor, ilha de calor e frio afeta a
187
saúde humana, fazendo que algumas doenças se manifestam ou evoluem
(NATALINO, 2011).
Figura 1 – Região Metropolitana de São Paulo.
189
A verificação da qualidade ambiental das cidades é cada vez mais evidente e
importante, pois é no espaço urbano que os problemas ambientais geralmente atingem
maior amplitude, notando-se concentração de poluentes no ar e na água, a degradação
do solo e subsolo, em consequência do uso intensivo do território pelas atividades
urbanas (LOMBARDO, 1985).
1.4 DISTRIBUIÇÃO DO SISTEMA DE SAÚDE
No nível das metrópoles, as desigualdades socioambientais são extremas e refletem
a má distribuição do sistema de saúde.
Na pandemia, o Ministério da Saúde e os gestores locais recomendam que as
pessoas com suspeita de COVID-19 fiquem em casa. Aquelas com sintomas leves,
podem se dirigir a Unidade de Saúde mais próxima que fara a primeira entrevista com o
paciente e a notificação a equipe de vigilância. Os casos graves devem ser
encaminhados para internação com demanda de leitos gerais e leitos de UTI (Brasil,
2020).
Segundo Pereira et.al. (2020), no caso do Município de São Paulo, foram mapeadas
onde moram as pessoas mais vulneráveis (menor renda e com mais de 50 anos de idade)
que não conseguem acessar a pé em menos de 30 minutos, um estabelecimento que
atende pelo Sistema Unificado de Saúde (SUS), que poderiam fazer triagem e que
moram a uma distância maior que 5 km do hospital com capacidade de internar
pacientes em estado grave de insuficiência respiratória (Figura 3).
Figura 3 – Acesso da população a estabelecimentos de saúde em São Paulo (2020).
192
No estágio da pandemia, os gestores devem planejar o uso dos parques pela
população, de modo a preservar a saúde dos habitantes. Neste sentido, as regras de
ocupação devem ser únicas, evitando aglomeração e estabelecendo uma dinâmica de
organização diária.
No período pós-pandemia é urgente repensar o uso e ocupação desses espaços
urbanos, implementando uma maior cobertura vegetal e intensificando assim a
integração com a população, na busca da saúde e qualidade de vida.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho apresenta uma discussão com referencial teórico sobre os serviços de
lazer e recreação dos parques do Município de São Paulo, destacando-se sua função e
seu relacionamento com seu entorno, na busca da Solução Baseada na Natureza,
contribuindo para a saúde e qualidade de vida da população.
Figura 7 - Parques públicos e áreas de proteção localizada no Município de São
Paulo, SP
194
2020.
ORGANIZAÇAO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Carta de Otawwa para la promocion de
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195
PANDEMIA E REINVENÇÃO
METODOLÓGICA:
PROCEDIMENTOS DE BIOSSEGURANÇA NA CONTAGEM
DE BITUCAS DE CIGARROS
(1) Doutora em Ciências Sociais, PPGDL da Universidade Católica Dom Bosco, e-mail: 3002@ucdb.br
(2) Mestre em Arquitetura e Urbanismo, Universidade Católica Dom Bosco, e-mail:
arq.felipebertuzzi@gmail.com
(3) Mestre em Saneamento Ambiental e Recursos Hídricos, Universidade Católica Dom Bosco, e-mail:
ju.casadei@gmail.com
(4) Mestre em Desenvolvimento Local, Universidade Católica Dom Bosco, e-mail: mairafas@gmail.com
196
1 INTRODUÇÃO
Após o primeiro caso confirmado de coronavírus (Covid-19) no território brasileiro
em 26 de fevereiro de 2020, com a entrada de um homem de 61 anos no Hospital Albert
Einsten, na cidade de São Paulo, segundo dados do Ministério de Saúde (BRASIL,
2020), o país entrou em alerta e as noções de biossegurança, tornaram-se cruciais não
apenas para resguardar a saúde da população, mas também, no desenvolvimento da
atividade investigativa, como ferramenta para assegurar uma rede de atenção à saúde
dos pesquisadores.
Ultrapassando procedimentos determinados por especialista ou um conjunto de
trabalhadores, podendo-se ampliar e envolver uma rede de atores preocupados em
aplicar boas práticas, a biossegurança tem a finalidade de reduzir a gravidade e
majoração de riscos acessíveis ao meio ambiente, sendo portanto, caracterizada como
inovação quando pensada e executada em rede multidisciplinar, e centrada, cada vez
mais, em sujeitos atentos aos problemas das práticas sociais, abarcando governos,
empresas e a sociedade como um todo.
De acordo com Teixeira e Valle (2010, p. 19, grifo nosso):
a Biossegurança é o conjunto de ações voltadas para a prevenção,
minimização ou eliminação de riscos inerentes às atividades de pesquisa,
produção, ensino, desenvolvimento tecnológico e prestação de serviços,
riscos que podem comprometer a saúde do homem, dos animais, do
meio ambiente ou a qualidade dos trabalhos desenvolvidos.
Na busca de soluções compatíveis e necessárias para preservar a saúde de todos, a
implementação dos princípios da biossegurança reverenciam uma pesquisa com
protocolos mais seguros e de qualidade. Diante das informações de gerenciamento dos
riscos de contágio do novo coronavírus (Covid-19), medidas de proteção, bem como a
necessidade da prática segura das amostras da pesquisa, o esforço do grupo do trabalho
atuou para os riscos biológicos, expondo-se por menor aos agentes patógenos
respiratórios e as substâncias tóxicas oriundas das bitucas de cigarro.
Almejando eliminar os riscos que envolviam a coleta de dados (pesquisa de campo)
em um projeto piloto com resíduos sólidos de elevada toxicidade, é que os
pesquisadores, atuando em rede, elaboraram metodologia capaz de proporcionar a
execução da coleta de dados envolvendo bitucas de cigarro descartadas em uma via
pública durante a realização de um evento de ativação no território.
Nesse sentido, o presente capítulo tem por objetivo apresentar a metodologia
utilizada para a aplicação dos procedimentos de biossegurança utilizados na contagem
de bitucas de cigarros, bem como os resultados advindos da coleta de dados. Por se
caracterizar como inovação, a presente metodologia poderá ser aplicada em outros
contextos, evitando-se contato direto entre o pesquisador e o resíduo tóxico,
contribuindo para a biossegurança e alcance de resultados relevantes.
Além da introdução, discussão dos resultados e conclusão, o texto se divide em duas
partes: uma breve revisão de literatura para a contextualização da temática que envolve
o resíduo sólido, bem como o desenvolvimento do trabalho de coleta por meio dos
procedimentos metodológicos elaborados pela equipe de investigadores.
197
2 REVISÃO DE LITERATURA
A Agenda 2030 é a expressão das metas globais pactuadas de modo participativo no
ano de 2015 dentre 193 países (ONU, 2015), em âmbito da Organização das Nações
Unidas. Considerado um plano de ação universal, ela manifesta preocupações com
diversas questões, as quais estão materializadas nos 17 Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável (ODS), convergentes com a necessidade de se repensar as formas
sustentáveis de se viver. Dentro desse conjunto de metas, destaca-se a garantia da
disponibilidade e manejo sustentável da água e a oferta de saneamento básico para todos
(ODS 6); a busca por transformação das cidades em lugares inclusivos, seguros,
resilientes e seguros (ODS 11); os padrões de produção e consumo sustentáveis (ODS
12); e a adoção de medidas urgentes para combater a mudança do clima e seus impactos
(ODS 13).
Em que pese os inúmeros benefícios, o domínio humano acerca do desenvolvimento
industrial e tecnológico contribuiu também para a formação de um ideário coletivo de
infinidade dos recursos naturais, ou ainda que a descoberta de novas tecnologias
pudesse ser suficiente para suprir necessidades ou remediar consequências dos avanços
desmedidos (MACHADO; GARRAFA, 2020).
Contudo, a partir dos anos 1970, em tímidos passos, ampliou-se o conceito de
desenvolvimento sustentável, tendo sido cunhado e disseminado em diversos setores da
economia, de modo que a atenção da sociedade se voltou para a questão ambiental com
mais intensidade, pela percepção das consequências dos impactos das intervenções
antrópicas sobre o meio ambiente (LACERDA; CÂNDIDO, 2013).
Os autores anteriores, citando Rattner (1991), propõem uma abordagem pragmática
para que os conceitos de sustentabilidade sejam incorporados, associados ao uso de
tecnologias apropriadas, educação e conscientização ambiental permanente e promoção
de um modo de produção mais harmônico.
As dinâmicas de transformação individuais e coletivas, em perspectiva relacional,
são moldadas a partir de intervenções educacionais, que conferem novos sentidos às
práticas cotidianas, as quais, por sua vez, passam a ser transformadas (GUIMARÃES,
2005). Além disso, o fomento à conscientização ambiental pode contribuir para a
redução do descarte incorreto ou indevido de resíduos como forma de combater as
toneladas de lixo produzidas diariamente (PESTANA, 2021).
A preocupação com o descarte responsável está muito alinhada a um processo de
reeducação no estilo de vida de cada indivíduo. De acordo com Simão, Nebra e Santana
(2020), é preciso que haja sensibilidade por parte do consumidor de forma que isso
responda às necessidades de toda a sociedade de modo conscientizador. A Figura 01
retrata como a sustentabilidade deve ser entendida a partir de vários fatores que se
interseccionam.
As relações apresentadas na figura anterior demonstram que a sustentabilidade não
se trata de abordagem unilateral, sendo resultante de um único fator isolado. Trata-se,
portanto, de um conglomerado de ações que resultam na garantia da resiliência do meio
ambiente (segurança ambiental), equidade econômica e justiça social geridos por um
pensamento mais próximo das perspectivas das ODS o que resulta, segundo Simão,
Nebra e Santana (2020), em uma Gestão da Mente Sustentável (GMS).
198
Figura 1 – Gestão da Mente Sustentável.
204
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As metas globais voltadas à conscientização ambiental contribuem para discussões
permanentes acerca da manutenção do meio ambiente e do bem estar humano. O
cuidado e a correta destinação de resíduos nocivos à saúde podem contribuir para
alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das
Nações Unidas (ONU).
Os procedimentos de biossegurança aqui descritos foram desenvolvidos e
executados em virtude das condições da pandemia da COVID-19. No entanto, essa
metodologia demonstrou-se como forma inovadora e segura de se realizar levantamento
de dados para a investigação do PIBITUCA e de outras pesquisas que poderão ser
inspiradas nesta pesquisa. Sugere-se que essa metodologia possa ser replicada em outras
cidades de diferentes escalas, garantindo-se a biossegurança do(s) pesquisador(es) a fim
de evitar a contaminação do resíduo descartado irregularmente.
Algumas das formas de contribuir a todo esse processo, na consecução de
reeducação individual e coletiva, poderá ser a inclusão de bituqueiras nas calçadas e
informativos/lembretes na via, como o fito de promover a conscientização ambiental,
até que um ecossistema de inovação, alicerçado em resultados desta e outras pesquisas,
possa se instalar.
AGRADECIMENTOS
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.
O processo de contagem das bitucas de cigarro por meio dos procedimentos de
biossegurança foi realizado pelo Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Territorial
Sustentável vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Local da
Universidade Católica Dom Bosco – UCDB. O trabalho teve as parcerias do Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID) e da Prefeitura Municipal de Campo
Grande.
O trabalho foi coordenado pela Profa. Dra. Dolores P. R. Coutinho, Me. Juliana
Casadei, Me. Maira Fernanda dos Anjos Santos e Me. Felipe Buller Bertuzzi. Os
estudantes pesquisadores de Iniciação Científica envolvidos foram Adenésio Mariano
da Silva Junior, Bruno Almeida Albertini, Gabrielly Dias Petersen, Juliana Oleques
Pradebon, Luciano Albuquerque Silva, Mariane Jimenez Franco, Silvana Romanini
Monti, Sara Jordana Cabral Peixoto e Nubia de Oliveira Brito.
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207
IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS EM BIOMAS
FLORESTAIS E AS LIÇÕES DO
INVESTIMENTO SOCIAL PRIVADO
RESUMO. O objetivo deste estudo foi efetuar uma análise e diagnóstico territorial
voltado para a gestão do Investimento Social Privado (ISP), considerando os
interesses entre empresas e atores sociais locais, legitimando o atendimento às
necessidades do território, nos impactos sobre a devastação florestal. Tendo como
abordagem o estudo de casos múltiplos, duas corporações foram estudadas: a
BRACELL, empresa de reflorestamento para produção de celulose com impacto em
31 municípios e 300 comunidades, situada no Litoral e Agreste baianos; e a VALE,
uma mineradora com atuação no Pará, onde está a maior planície mineral do mundo.
Os casos foram selecionados por estarem em territórios completamente distintos e
possuírem impacto significante na transformação do território onde estão localizados.
A coleta de dados se deu por meio da observação direta, análise documental e
entrevistas semiestruturadas. As empresas estudadas vêm realizando aportes de
recursos, planejando programas e projetos para atender a demandas do território. Foi
possível analisar com base nos dados do Indice deDesenvolvimento Humano
municipal que as ações socioambientais da VALE e da BRACELL em seus territórios
possuem impacto positivo no aumento da qualidade de vida das comunidades no
entorno de áreas afetadas, colaborando com a pressão ambiental contra o
desmatamento e a caça predatória. O Marketing Social estruturado é necessário para
demonstrar os perigos do desmatamento e o contato indesejado com espécimes da
fauna local,provocando mudanças de hábitos e atitudes e prevenindo eventuais novas
pandemias.
211
aspectos ambientais e financeiros relacionados à estratégia ou plano. De acordo com os
autores, a RSE é utilizada pelo Marketing Social como estratégia para alavancar a
marca, visto que o conceito traz a premissa de parceria na qual a empresa pode ter
resultados hibridamente emocionais e racionais, sendo também sustentáveis . Em
seguida, benefícios como a fidelidade dos clientes, também atraindo novos
consumidores e proporcionando um maior volume de vendas, bem como, tendo foco
principal, a mudança de comportamentos e atitudes. Também, é uma ferramenta
importante para criar vantagem competitiva; desenvolvendo a lealdade dos
colaboradores e atraindo novos talentos; novos parceiros de negócios, e investimentos
financeiros na marca , melhorando o relacionamento entre a empresa e as comunidades
locais, e a imagem da marca , consequentemente aprimorando o posicionamento
mercadológico da mesma.
Porter e Kramer (2006) mostram que, em muitos casos, a filantropia é usada como
forma de relações públicas para promover a imagem ou a marca da empresa.
Pressionadas por demandas crescentes da sociedade, os executivos sentem que suas
empresas devem realizar ações filantrópicas, mas sentem dificuldades para justificá-las
do ponto de vista dos resultados financeiros que elas possam proporcionar. A filantropia
apresentará uma conotação estratégica quando representar uma melhor relação custo-
benefício num contexto competitivo, assim aproxima-se do conceito de ISP. Os autores
entendem que é possível sair da armadilha dos extremos: a filantropia pura que se realiza
por meio de doações diretas em dinheiro ou prestação de serviços sem fins lucrativos e o
interesse comercial puro. Desse modo, questões revestidas de caráter filantrópico, de um
lado, e econômico, de outro, podem se combinar, fazendo com que as empresas se
insiram de maneira mais harmônica e solidária em questões de interesse da sociedade
com benefícios tangíveis e intangíveis para o negócio.
A combinação de interesses comerciais com benefícios sociais não amesquinha a
filantropia, desde que esses interesses sejam orientados por uma prática de gestão
responsável coerente com os princípios diretivos aqui apresentados. Uma filantropia
praticada nessas condições difere radicalmente da filantropia feita apenas para melhorar
a imagem pública da empresa. Com efeito, a gestão do ISP para a transformação das
localidades onde os empreendimentos se instalam ainda carece de produção acadêmica,
havendo uma série de desafios na sua implementação, os quais vão desde o investimento
à gestão, perpassando por várias situações, tais como: muitos investimentos realizados
por diversas empresas, num mesmo território, na maioria das vezes, estão concentrados
nas mãos das organizações sociais mais conhecidas, o que dificulta a possibilidade
desses recursos serem distribuídos para outras regiões e diversificar seu alcance,
ademais os seguintes aspectos são observados: (a) baixo grau de participação dos atores
sociais locais envolvidos no processo de tomada de decisão; (b) não se discute com a
comunidade as necessidades locais; (c) não consideração da necessidade mudança de
comportamentos e atitudes, através de campanhas de Marketing Social. Sendo assim, as
chances de o investimento ter o impacto na transformação positiva da localidade ficam
cada vez mais distantes.
2.3 TERRITÓRIOS
Saquet (2003) referencia território como relação social e de conflitos. Ele coloca que
para existir território é preciso haver algum tipo de poder, de relações sociais e de escuta
e conversação entre as partes . Neste estudo, trazemos como territórios o Litoral Norte
212
baiano, onde atua uma empresa de reflorestamento para produção de celulose, a
BRACELL, e a região sudeste do Pará, onde está localizado o maior complexo de
minério de ferro do mundo operada pela VALE. Ambas as organizações atuam em um
território marcado pela disputas sociais e exploração dos ecossistemas.
No Norte da Bahia, até a década de 70, com um processo lento de ocupação e uma
base econômica consolidada em torno da agricultura de subsistência e de atividades
extrativistas de produtos vegetais e animais, o Litoral Norte da Bahia não tinha sofrido
grandes mudanças socioeconômicas. No entanto, a partir das três últimas décadas, vem
se observando modificações fundamentais na estrutura produtiva da região com a
introdução de novas atividades econômicas, vinculadas, principalmente, ao segmento
do turismo e a plantação de eucaliptos para a fabricação de celulose. As atividades
agropecuaŕias tradicionais e de produção extrativa vegetal e animal são bastante
importantes na região, sendo responsav́el pela absorção de aproximadamente 15% da
população nativa dos municípios de Mata de São João e Entre Rios. São pessoas que
asseguram sua sobrevivência e reprodução mediante o trabalho autônomo informal
relacionado ao uso, beneficiamento ou comercialização direta dos recursos naturais:
pequena produção de coco, coleta de frutas, pesca, mariscagem, artesanato da palha de
piaçava etc.
No entanto, a percepção atual e futura desses artesãos sobre o seu negócio não é
promissora. A construção da Linha Verde (BA-099), a especulação imobiliária ocorrida
ao longo desta rodovia que corta a região e de complexos turísticos, como o da Costa de
Sauípe, abriu oportunidades de trabalho e renda para a população mas, simultaneamente,
desestruturou sistemas locais de produção social, como o artesanato de palha de piaçava,
e avanço do desmatamento na região. Esta desestruturação está relacionada à
privatização da base de recursos naturais, até então, 'livre' ao acesso de todas as
populações nativas da região e, particularmente, às mulheres artesãs da região de Sauípe.
Segundo os resultados da pesquisa sobre empreendimentos formais e informais nas
áreas da Mata de São João e Entre Rios, 54,4% dos empreendedores ligados à
exploração de recursos naturais mencionaram a crescente distância e as dificuldades de
acesso em relação às fontes de matéria-prima. Assim, a restrição ao acesso das
comunidades tradicionais da área de influência às reservas naturais de Mata Atlântica
para a extração de palha da piaçava, matéria-prima para o artesanato local, é o objeto de
um significativo conflito socioambiental como alertam Loiola et al. (2000).
Já no Estado do Pará, desde os anos 1970 a região de Paraubepas/Carajás tem sido o
local de conflitos socioambientais. Palco da guerrilha do Araguia, em 1960, paralela a
história agrária, surge o lançamento dos grandes projetos de mineração, iniciado em
Serra Pelada, no Complexo de Carajás, no fim dos anos 70 e que dura até os nossos dias.
Justamente nessa zona montanhosa, ao pé da qual se situa Parauapebas, se encontra a
maior reserva mineralógica brasileira, sob a batuta da VALE, muito provavelmente a que
contem a maior concentração mundial de minério de ferro de alto teor, além de
manganês, cobre, ouro e minérios raros. O aumento da atividade acirrou os ânimos sobre
a posse da terra entre os produtores e as comunidades o que levou ao conhecido
“massacre de Carajás” no qual um conflito entre militantes do Movimento do Sem Terra
e a Polícia Militar deixou 21 camponeses mortos, 19 no local do ataque, e outros dois que
faleceram no hospital (SCOTTO; LIMONCIC, 1997).
Assim, em ambos os territórios impera a informalidade dos negócios quer sejam dos
pequenos artesãos, na Bahia, quer seja dos pequenos produtores rurais, no Pará. Com
213
efeito a informalidade é aliada da ilegalidade. O debate sobre a extração ilegal de
madeira aparece como um efeito colateral da falência dos instrumentos tradicionais do
Estado para garantir o cumprimento das políticas públicas abrindo espaço para os ISP.
3 METODOLOGIA
Utilizamos nesta pesquisa o estudo de casos múltiplos como abordagem
metodológica (YIN, 2015), sendo estudado dois casos que permitiram um melhor
entendimento dos processos e práticas (“como” e “por que”), utilizados por duas grandes
corporações no que se refere ao Investimento Social Privado. São elas: a gestão do
Investimento Social Privado da BRACELL, uma empresa de reflorestamento para
produção de celulose, com impacto em 31 municípios e mais de 300 comunidades,
situada no Litoral e Agreste baianos; e da VALE, uma mineradora com atuação no Pará,
onde está a maior planície mineral do mundo, e em Minas Gerais, sendo este último local
não considerado neste estudo. Ambos os casos foram selecionados por terem muitos
insumos para a pesquisa e por estarem em territórios completamente distintos e
possuírem impacto significante na transformação do território onde estão localizados. A
coleta de dados se deu por meio das seguintes técnicas: dados secundários existentes
sobre o tema e os casos escolhidos para pesquisa; observação direta; análise documental
de dados colhidos nos sites; declarações e documentos publicados pelas duas
organizações e entrevistas com responsáveis pelos setores de Investimento Social e
Ambiental.
O primeiro passo foi mapear e selecionar experiências significativas de Investimento
Social Privado como ferramentas de gestão social de ambas as empresas. A partir da
pesquisa de dados secundários, buscou-se artigos de periódicos, sites das empresas
referidas e demais documentos referentes a gestão social, Investimento Social Privado e
Responsabilidade Social e Ambiental. Posteriormente, buscou-se dados publicados
acerca dos empreendimentos estudados. Nessa etapa, foram analisados documentos
institucionais e produtos técnicos, publicados pelas organizações mencionadas, bem
como informações sobre os projetos sociais desenvolvidos, relatos de reuniões, dentre
outros. A partir daí, foi realizada a interpretação e análise dos dados levantados na
pesquisa. A fim de complementar as informações, realizou se de forma remota,
entrevistas com sos responsáveis pelos referidos setores.
Para a análise da efetividade dos ISPs escolheu-se uma abordagem quantitativa.
Foram coletados dados ex-post facto de indicadores de qualidade de vida e de
desenvolvimento (IDH) de 407 cidades do Estado da Bahia e de 142 cidades do Estado
do Pará. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é uma unidade de medida
utilizada para aferir o grau de desenvolvimento de uma determinada sociedade nos
quesitos de educação, saúde e renda. Quanto mais próximo de zero, menor é o grau de
desenvolvimento de um território. Utilizou-se a base dados do ATLAS DO
DESENVOLVIMENTO HUMANO DO BRASIL de 2011.
Para a verificação do tipo de análise foi aplicado o teste de aderência à normalidade
de Kolmogorov-Smirnov revelando que todas as variáveis se mostraram aderentes a
distribuição de Gauss, indicado valores da significância (p-valor >0,100) e portanto
também maiores que o valor do nível de significância adotado de 0,050. Por fim, para a
comparação dos grupos empregou-se o intervalo de confiança com os limites de
equivalência. Se o intervalo de confiança estiver completamente dentro dos limites de
equivalência, pode-se afirmar que a média da população do teste é equivalente à média
214
da população de referência. Em todos os tratamentos de dados foi utilizado o software
Minitab 19.2020.2.0.
Quadro 1 - Entrevistados dos estudos de caso da pesquisa
Função/Cargo Empresa Organização
Gerente Sênior de Relações Corporativas, Comunicação,
Bracell
Digital e Sustentabilidade
Gerente de Relações Institucionais e Responsabilidade
Bracell
Social
Gerente de Meio Ambiente e Certificações Bracell
Vice-presidente
Associação Comunitária do Cangula
Diretora
Cooperativa de Trabalho das Costureiras de Inhambupe e
Presidente
região - COOPECIR
Gerente de Relacionamento com Comunidades Vale
Diretor de Geotecnia Vale
Associação de Moradores da Vila Planalto, município de
Presidente
Canãa dos Carajás
Associação dos Moradores da Vila Bom Jesus, município
Presidente
de Canãa dos Carajás
Consultor Consultor externo de sustentabilidade da Vale
Associação de Pequenos Produtores Rurais da Vila Ouro
Presidente
Verde, município de Canãa dos Carajás
Associação dos Agricultores do Projeto de Assentamento
Presidente
União Américo Santana, município de Canãa dos Carajás
Agência de Desenvolvimento Econômico de Canãa dos
Diretora Executiva
Carajás
215
Florestal (ABAF, 2020), a falta de pesquisas que subsidiassem um maior conhecimento
sobre a atividade, aliada ao planejamento inadequado do uso da terra, escolhas
equivocadas das espécies a serem plantadas, utilização inadequada de fertilizantes, uma
frágil legislação e ineficiente fiscalização culminaram no surgimento de correntes
contrárias à cultura do eucalipto. Dentre mitos e verdades estão afirmações de que o
eucalipto seca e empobrece o solo, gera um deserto verde e que resulta em poucos
benefícios sociais, econômicos e ambientais para os municípios e a região, além de não
ser um local apropriado a fauna, desalojada de seu habitat natural. Para a entidade, a qual
reúne as principais empresas florestais da Bahia, o Brasil possui 7,74 milhões de
hectares plantados de eucalipto, pinus e outras espécies, em uma área correspondente a
0,9% do território nacional. O setor brasileiro de árvores plantadas é responsável por
91% de toda a madeira produzida para fins industriais no País − os demais 9% vêm de
florestas nativas legalmente manejadas. A utilização de madeiras certificadas e
produzidas de forma sutentável levou a uma melhor aceitação das atividades desta
empresa, agregando valor à marca da mesma.
Em decorrência de uma forte pressão negativa e críticas de seus principais
stakeholders, e também para conhecer melhor seu território de atuação, em 2012, a
Bracell Bahia contratou uma consultoria externa especializada para elaborar um
diagnóstico socioeconômico. O documento, disponibilizado pela empresa para essa
pesquisa, trouxe subsídios que possibilitaram a elaboração e implementação de sua
Política de Responsabilidade Social e Ambiental, com quatro principais pilares:
educação, empreendedorismo, agronegócio e diálogo permanente. Este último foi
necessário, visto que o diagnóstico apontou, depois de ouvir as comunidades vizinhas,
que a empresa era ausente e não havia ações de parceria para o desenvolvimento da
região. Oito anos depois do diagnóstico, a empresa vive outro cenário: são 26 programas
e projetos socioambientais estruturados, alcançando 65 mil pessoas nas mais de 300
comunidades vizinhas aos plantios de eucalipto, nos 31 municípios onde atua. No
organograma da empresa, o setor de Responsabilidade Social faz parte de uma Gerência
Sênior que também reúne Relações Institucionais e Sustentabilidade, e está ligada
diretamente à alta gestão da empresa, o que possibilita que a tomada de decisão de seu
investimento social esteja alinhada às estratégias de negócio. Outro passo importante
dado foi a implementação de sua Política de Sustentabilidade, em 2016, a qual está
publicada no site da empresa e que traz como base a filosofia de que tudo que a empresa
realiza “deve ser bom para a comunidade, bom para o país, bom para o clima e bom para
os clientes. Só então será bom para a empresa” (BRACELL, 2020). A política está
dividida em sete temas, ou assuntos, dentre eles, o desenvolvimento de comunidades
locais. Nesse trecho, o documento dá as orientações para o trabalho que a empresa
realiza nas mais de 300 comunidades vizinhas. No passo a passo estão: conhecer o
contexto local e realizar o engajamento das partes interessadas; elaborar e implementar
os projetos com o envolvimento das comunidades na tomada de decisão; apoiar o
desenvolvimento da região por meio do fortalecimento dos arranjos produtivos locais;
investir na educação; proteção ambiental; estabelecer parcerias; dar preferência a
projetos estruturantes em detrimento aos filantrópicos; estar engajada com os Objetivos
do Desenvolvimento Sustentável, sendo signatária do Pacto Global das Nações Unidas;
monitorar indicadores sociais; e priorizar comunidades tradicionais além das que estão
na área de sua atuação (BRACELL, 2020). Sobre o processo de conhecer o contexto
local a percepção da organização está refletida na fala:
[...] No caso dos projetos de investimento social privado, esse diálogo é
216
permanente e realizado desde o início da definição de qualquer projeto.
As comunidades apresentam muitas demandas que são de
responsabilidade do governo, assistencialistas, que entendem que a
empresa tem condições de assumir. Nossa empresa procura sempre se
distanciar desta linha de atuação. Nosso objetivo é, nesse caso, ser um
articulador no território. A empresa acredita que, desenvolvendo as
pessoas, elas podem estar aptas para lutar por mais e não ficarem
dependentes de nenhuma organização pública ou privada (GERENTE
SÊNIOR DE RELAÇÕES CORPORATIVAS, COMUNICAÇÃO,
DIGITAL E SUSTENTABILIDADE NA BRACELL).
Tal argumentação é validada pelo representante da organização social atendida pela
empresa, conforme depoimento abaixo registrado em entrevista:
“[...] a empresa sempre ouve a gente. Perguntou qual nossa demanda, se
havia algum projeto que queremos fortalecer ou se existe algum
conhecimento que pode ser trabalhado para gerar renda, como foi o caso
do Farmácia Verde” (ASSOCIAÇÃO DO CANGULA).
Dentre os projetos sociais desenvolvidos pela Bracell Bahia, elencamos aqueles com
destaque maior e foco na proteção dos ecossistemas:
Projeto de Coleta de Resíduos de Madeira: o desmatamento da Mata Atlântica
tem várias vertentes. Dentre elas a cultural, onde pequenos produtores rurais retiram
madeira nativa para uso em fornos de carvão, atividade ilegal, ou para subsistência. Na
operação florestal, após a colheita da floresta de eucalipto, as ponteiras, partes mais finas
que ficam no topo das árvores, são descartadas. No solo elas viram adubo que reforça a
saúde da terra para o próximo ciclo de plantio no local. Durante muitos anos houve o
conflito entre empresa e os pequenos produtores por causa dessa madeira. Em retaliação
à empresa, havia altos índices de incêndios as pilhas de eucalipto, furto de madeira,
principalmente de áreas de florestas nativas da empresa, bloqueios do transporte de
madeira nas estradas, dentre outros. Após muitas situações de conflito a Bracell
entendeu que poderia transformar aquele cenário negativo em oportunidade. Dessa
forma a empresa conseguiu validar junto a Superintendência do Ministério do Trabalho
um projeto social para que aquelas pessoas, pequenos produtores rurais, pudessem
coletar os resíduos da madeira de eucalipto para uso próprio ou até mesmo para venda
para cerâmicas, por exemplo, a partir de um procedimento elaborado pela Bracell com o
aval da Superintendência do Trabalho. Nele, comunidades organizadas em associações
ou cooperativas são capacitadas e precisam seguir uma série de protocolos antes de
entrar nas áreas da empresa para realizar a coleta dos resíduos, por exemplo o uso de
EPI´s, áreas de vivência para os momentos de descanso, dentre outros. O projeto tem
reduzido significativamente os conflitos e a pressão por madeira nativa, e o melhor, tem
contribuído com a geração de renda dessas comunidades. Apenas em 2020, cerca de 2
mil pessoas que participaram do projeto geraram mais de R$ 6 milhões de reais de renda.
Além disso, os índices de incêndios cairam pela metade (BRACELL, 2020)
Artesanato de Cipó e Piaçava: também é cultural que os artesãos do Litoral Norte
baiano coletem o cipó e piaçava da Mata Atlântica. Nas florestas preservadas pela
Bracell foram mapeados 130 artesãos que precisam entrar em área privada para
realizarem a coleta. Com o intuito de preservar a floresta e manter a sustentabilidade
dessa atividade a Bracell juntamente com os mesmos elaborou o Plano de Manejo da
Piaçava. No documento estão registrados os saberes dessas populações, ou seja, quais as
217
maneiras de realizar a coleta sem esgotar a matéria-prima. Além disso, os artesãos foram
cadastrados e hoje podem circular livremente nas áreas de mata nativa da empresa desde
que munidos com a identificação do projeto. Todos receberam capacitações de
empreendedorismo para ampliar a geração de renda com o artesanato.
Apicultura: para utilização sustentável da Mata Atlântica nas dependências da
Bracell, foi implementado o Projeto Polinizadores. No passado era comum as operações
se depararem com caixas clandestinas com abelhas, deixadas sem nenhuma ordenação
dentro das áreas da empresa. O que pelo risco de acidentes, precisavam ser retiradas. Na
maioria das vezes as caixas não possuíam nenhum registro de propriedade o que
dificultava o contato com o apicultor. A partir de 2015, a empresa implementou o projeto
de apicultura onde dentre as ações estava o ordenamento das atividades nas áreas de
nativa da empresa, mediante a um cadastro e organização das atividades. Hoje, o projeto
evoluiu e junto a 160 apicultores a empresa está em fase final da implantação da primeira
unidade de criação de abelhas rainha do Litoral Norte, o que vai fazer com que a
produção seja ampliada.
O Projeto de Educação Continuada iniciou em 2014, com a parceria da rede
pública e execução do Instituto Chapada de Educação, com o objetivo de não apenas
levar formações para os professores do território, mas, também, buscar articular um
arranjo de desenvolvimento regional em prol da educação, estabelecendo a mobilização
e cooperação, além de consolidar as políticas públicas de formação continuada desses
educadores. Participam do projeto cerca de 2.300 professores da rede pública de oito
municípios, com impacto em 36 mil alunos. Os principais indicadores de evolução do
projeto são o IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e o índice de
alfabetizados. No início do projeto, tanto o IDEB quanto o índice de alfabetizados dos
municípios onde o projeto era executado configuravam entre os menores da Bahia. Após
seis anos de implementado, pode-se perceber o aumento do IDEB e também do índice de
alfabetizados, sendo que, em alguns municípios, já atingiu os 100%. Além dos projetos
de geração de renda com cunho ambiental realizados pela reflorestadora, foi também
necessário reforçar a comunicação para a preservação. Para isso a empresa tem em seu
portfólio projetos de Educação Ambiental onde são trabalhados temas que tem como
objetivo proteger as florestas e contribuir para criação de uma cultura prevencionista.
Um exemplo é o projeto Ecomunidade. Após um diagnóstico ambiental realizado pela
empresa, que atestou que as comunidades depositavam lixo em áreas de preservação.
Dessa forma foi preciso iniciar um trabalho de conscientização. Dentre as atividades
estão: formação de ecoagentes, gincanas ecológicas, oficinas de reciclagem,
implantação de projetos ambientais nas comunidades; produção de vídeos sobre temas
ambientais para apoiar a atuação dos agentes ecológicos; e premiação de ações
ambientais desenvolvidas pelos Ecoagentes. Também é realizada articulação com o
Poder Público para garantir que a coleta do lixo esteja regular. As comunidades que
conseguem manter o ambiente das áreas preservadas sem lixo recebem uma área de
lazer com um parque de eucalipto que também é mantido pela comunidade. As
alternativas criadas pela empresa possuem efeito positivo na geração de renda,
reduzindo a pressão sobre os ecossistemas e à caça predatória como ilustra o seguinte
depoimento do presidente de uma organização social:
[...] A empresa solicitou uma reunião com a comunidade, mobilizou todo
mundo, porque o viveiro tinha sido desativado e havia muitas mulheres
desempregadas. A proposta da empresa era desenvolver um projeto onde
218
as pessoas tivessem uma renda, mas não tinha carteira assinada. A
comunidade aceitou o projeto. Foi discutido sobre termos um curso de
costura. Aceitamos. Foi um curso de um ano e meio de costura industrial
(PRESIDENTE DA COOPECIR).
Verificou-se que o uso das ferramentas do Marketing Social se dão indiretamente. Os
programas de geração de renda, por exemplo, reduziram o impacto da caça predatória e
do roubo de madeira nativa.
[...] As certificações florestais, em especial o selo CERFLOR do
INMETRO/ABNT promoveram um redirecionamento da empresa com
foco no diálogo com as comunidades. Com os programas de
complementação de renda observou-se uma redução significativa nas
queimadas criminosas nas regiões de nativa. Houve uma expansão de
36% vegetação nativa em estágio avançado (GERENTE DE MEIO
AMBIENTE E CERTIFICAÇÕES.
Há iniciativas que correlacionam-se em direção ao Marketing Social como os
projetos de educação ambiental, o monitoramento de recursos hídricos e o programa de
“Amigos da Floresta”, de combate a incêndios florestais. Mas essas iniciativas não
compõem ainda um arcabouço lógico que possam conscientizar dos problemas que
podem ocorrer, com reflexos em escala planetária, com a alimentação de animais
silvestres.
4.2 A GESTÃO SOCIOAMBIENTAL DA VALE NO PARÁ
Em 1967, nascia o Projeto Carajás e a história da Companhia Vale do Rio Doce no
Pará, quando foi descoberta a primeira jazida de minério de ferro da região, onde está
localizada a maior planície mineral do planeta. Mais precisamente no município de
Canaã dos Carajás, sudeste do estado, está o Complexo S11D Eliezer Batista, maior
investimento privado realizado no Brasil na segunda década do século 20. O minério de
ferro é o carro chefe da empresa no Brasil, e o encontrado em Carajás é considerado o
melhor do mundo. A VALE atua em 105 municípios no país e mantem relacionamento
com 1.149 comunidades, destas, 443 são prioritárias, onde estão seus maiores esforços.
Em 2019, a empresa lançou o Portal “ESG Environmental, Social and Governace”, um
canal onde é possível encontrar dados ambientais, sociais e de governança. Segundo o
portal, a empresa investe em ações potencializadoras, preventivas, e compensatórias,
relacionadas a impactos socioeconômicos de operações, projetos ou pesquisa mineral.
Além de ações que contribuam para o desenvolvimento e a melhoria da qualidade de
vida nos territórios onde atua (VALE, 2020).
A história da VALE é acompanhada de grande desconfiança sobre sua ação
socioambiental, em especial, após a sua privatização durante o governo FHC (Fernando
Henrique Cardoso) em 6 de maio de 1997. Coelho et al. (2016) pesquisaram a relação
entre mineração e desenvolvimento em municípios onde a VALE opera. Eles avaliam
que uma das principais mudanças entre a gestão pública e privada da empresa é a
imposição de um modelo de mineração mais predatório e antidemocrático.
Em janeiro de 2012, por exemplo, a mineradora foi eleita como a pior empresa do
mundo,no que refere-se a direitos humanos e meio ambiente, pelo Prêmio Public Eye,
premiação realizada desde o ano 2000 pelas ONGs Greenpeace e Declaração de Berna.
O motivo: uma “[...] história de 70 anos manchada por repetidas violações dos direitos
humanos, condições desumanas de trabalho, pilhagem do patrimônio público e pela
219
exploração cruel da natureza” (ESTADO DE SÃO PAULO, 2012).
Entretanto, a postura da empresa tem outras vertentes mais socialmente
responsáveis. Por exemplo, segundo a Fundação Vale, braço social da empresa, em
2019, cerca de 770 mil pessoas foram beneficiadas por seus projetos sociais em 68
municípios, nos seis estados onde atua: Pará, Maranhão, Minas Gerais, Espírito Santo,
Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro. A empresa realiza sua gestão social por meio da
Diretoria de Investimento Social integrada com a Diretoria Executiva de
Sustentabilidade e Relações Institucionais, a qual reúne os projetos e programas
socioculturais e ambientais da empresa de cunho Obrigatório e Voluntário, incluindo a
Fundação Vale. A empresa também é mantenedora do Fundo Vale, uma Organização da
Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), criada em 2009.
Para realizar o Investimento Social, a empresa traz como diretrizes, entre outras:
alinhamento à Estratégia de Sustentabilidade do Sistema Vale; implementação em
territórios impactados pelos negócios ou de interesse para a empresa; prioridade para
comunidades em situações de vulnerabilidade; e ações estruturantes, com resultados
mensuráveis e prazo de conclusão definido (VALE, 2020). Com 50 anos de atuação, a
Fundação Vale coloca-se como uma referência do país em desenvolvimento territorial.
Inclusive, detém a autoria do conceito de Parceria Social Público-Privada (PSPP), o qual
trata da integração entre governo, iniciativa privada e comunidades para maximizar os
impactos positivos do Investimento Social Privado (VALE, 2020). A empresa afirma,
em suas publicações, que não realiza investimentos em ações que sejam de obrigação do
Poder Público, porém, pode complementá-las no caso de calamidades públicas, como no
atual cenário de pandemia. A Fundação Vale apoia a gestão de espaços culturais e
mantém estações de conhecimento (espaços socioeducativos que promovem atividades
com foco na formação integral de 4.500 crianças e adolescentes de 6 a 17 anos e suas
famílias). As atividades buscam ampliar as oportunidades educativas no contraturno
escolar, nos eixos de esporte, cultura, cidadania e multiletramento (VALE, 2020).
Segundo a empresa, apenas na região de Canaã dos Carajás, existem 4.288 famílias
beneficidas diretamente, com investimento de R$4,2 milhões. Também são realizadas
articulações com entidades financiadoras. Em 2020, foram mapeados 437 stakeholders,
em 131 comunidades, com a realização de 133 reuniões do comitê gestor. “O foco é na
agricultura familiar, mas são trabalhadas as cadeias produtivas, o empoderamento das
mulheres, capacitação de jovem, todos os temas fazendo a ligação com os ODS”,
conclui a gerente de sustentabilidade da VALE. A organização atua não apenas em
Canãa dos Carajás, mas também em outros municípios da região sudeste do Pará, como
Paruapebas e Marabá, com projetos de geração de emprego e renda e proteção
ambiental. São 19 associações cadastradas e 12 projetos em execução. Além da empresa
e Poder Público, há também os convênios para desenvolvimento de projetos. Um deles é
utilizado para a Sala de Apoio ao Desenvolvimento Econômico, um núcleo com
estrutura formada por um gerente de projetos, dois analistas e um gerente financeiro, que
tem como atribuição apoiar as comunidades na elaboração e gestão dos projetos sociais
desenvolvidos. Há sinais de que a VALE atua em constante diálogo com suas
comunidades e tais diálogos são desdobrados em ações de cunho socioambiental como
ilustram os depoimentos.
[...] Depois que viemos para o Assentamento, foi criada uma associação.
Começamos a ter reuniões do comitê para discutir as necessidades e os
projetos foram construídos assim. O principal é o de agricultura familiar.
220
Mas já iniciamos também os projetos de avicultura, suinocultura,
piscicultura e fruticultura. Além disso, têm alguns pras mulheres, de
costura, serigrafia, saboaria (PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DOS
PRODUTORES DO ASSENTAMENTO AMÉRICO SANTANA).
[...] A empresa sempre consulta a associação para elaborar os projetos. Nas reuniões
discutimos tudo, sobre saúde, educação [...] (PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO
COMUNITÁRIA OURO VERDE).No território estudado de Carajás existe o Parque
Zoobotânico Vale que tem características bem próximas de um programa de Marketing
Social.
[...] Nos últimos 10 anos, mais de 1 milhão de pessoas viveram a
experiência de conhecer um pedacinho da Floresta Amazônica visitando
o Parque Zoobotânico Vale (PZV), considerado referência em
conservação e preservação da biodiversidade amazônica. Localizado em
Parauapebas, sudeste do Pará, o espaço fica no coração da Floresta
Nacional de Carajás, Unidade de Conservação Federal fiscalizada pelo
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio),
com o apoio da Vale. O passeio pelo Parque possibilita ao visitante
conhecer mais sobre espécies da fauna amazônica a partir de um plantel
de aproximadamente 270 animais, com destaque para aves e mamíferos.
Entre elas, espécies ameaçadas de extinção, como o Harpia (gavião-real),
onça-pintada, suçuarana, macaco-aranha-da-testa-branca, macaco-
aranha-da-cara-vermelha e o macaco cuxiú (VALE, 2018).
Durante o passeio no parque o visitante recebe instruções e acessa informações sobre
a necessidade de preservação da fauna e flora amazônica. Nos últimos anos, a
mineradora vem atravessando uma fase conturbada de sua história, após acidentes em
sequência em suas instalações, resultando em centenas de vítimas fatais, explicam
Fernandes et al (2020). O Relatório de Sustentabilidade 2019 da empresa traz as ações
desenvolvidas para enfrentar e minimizar os efeitos dos últimos acontecimentos.
Independentemente do impacto à imagem e reputação da marca, a empresa mantém seus
investimentos sociais na região do Pará (VALE, 2018). Há, entretanto, sinais positivos
de uma nova postura para o enfrentamento de situações críticas como o acontecido no
rompimento da barragem de Brumadinho.
[...] É senso comum que a mineração tem um importante papel social e
cria um impacto de proporções significantes onde atua, tanto positivo
quanto negativo. A empresa entende que faz um bom trabalho e tem a
comprovação desse entendimento, uma vez que mede o seu índice de
reputação. Antes de Brumadinho era bom, depois caiu com o acidente e
depois subiu na pandemia. A Vale tem hoje 48% de reputação positiva.
Isso se deve ao fato do protagonismo que teve diante a pandemia
(DIRETOR DE GEOTECNIA DA VALE).
5 VERIFICAÇÃO DA EFETIVIDADE DOS ILP DOS TERRITÓRIOS AFETADOS PELA
BRACELL E PELA VALE
Estudou-se a base da dados do PNUD (2013) com 417 cidade da Bahia e 142 cidades
do Pará. Excluiu-se da base de dados as capitais do Estado (Salvador e Belém) por serem
outliers com impacto na análise e interpretação dos fenômenos. O teste de normalidade
Kolmogorov-Smirnov efetuado sobre o indicador de IDH das cidades do Estado do Pará
e do Estado da Bahia e apresentam distribuição normal (p-value > 0,100) ilustra a Figura
1.
221
Figura 1 – Teste Kolmogorov – Smirnov sobre dados IDH Estado do Pará
Fonte: elaborado pelos autores com base nos dados do PNUD (2013)
Efetuou-se testes de hipóteses (two samples equivalence tests) para as duas
populações comparando-se as áreas de influência da VALE e da BRACELL com as
demais cidades dos Estados do Pará e da Bahia, respectivamente. O quadro 2 ilustra os
dados retirados do Minitab. Pode-se inferir então que em ambos os casos a amostra de
cidades sob influência da VALE e da BRACELL nos projetos estudados têm uma
influência positiva no IDH municipal.
Quadro 2 – Testes Estatísticos
Fonte: elaborado pelos autores com base nos dados do PNUD (2013)
Ambas as empresas estudadas neste trabalho vêm não apenas realizando aportes de
recursos, mas planejando seus programas e projetos para atender a demandas do
território. Porém, entende-se que o protagonismo desempenhado pela iniciativa privada
no desenvolvimento local não é apenas para expor a “boa vontade em contribuir”, mas,
sim, por ser necessário à sustentabilidade de seus negócios, um melhor posicionamento
de suas marcas e melhoramento de suas imagens e reputações organizacionais,
sobretudo, a partir de pressão de investidores estrangeiros.
Foi possível analisar com base nos dados do IDH Municipal que as ações
socioambientais da VALE e da BRACELL em seus territórios possuem impacto positivo
no aumento da qualidade de vida da sociedade no entorno, o que colabora com a pressão
ambiental sobre o desmatamento e a caça predatória.
Além da melhora do IDH, faz se necessário a formulação e divulgação de Marketing
Social, no intuito da eventual modifiação dos comportamentos atuais, demonstrando os
perigos do desmatamento, em termos do Aquecimento Global e o contato indesejado
com espécimes da fauna local, no intuito de se prevenir eventuais novas pandemias.
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224
MONITORAMENTO DO ESGOTAMENTO
SANITÁRIO NO COMBATE À COVID-19
225
1 INTRODUÇÃO: A COVID-19
Desde que a Organização Mundial da Saúde declarou Emergência de Saúde
Pública de Importância Internacional por conta do surto de Covid-19 (Coronavírus
Disease 2019), a comunidade científica se posicionou em alerta. Além da
preocupação com o tratamento e prevenção da doença, circulou a necessidade de se
descobrir as fontes e formas de contágio. Nesse sentido, pesquisas iniciadas desde o
surgimento do SARS-CoV-1 contribuíram para demonstrar que o contágio era
possível pela disseminação do vírus e seu respectivo material genético pelas redes de
esgoto a partir dos dejetos humanos e demais resíduos. Essa evidência ampliou a
preocupação sobre a letalidade da Covid-19 (SARS-CoV-2), especialmente, sobre a
possibilidade de sua transmissão e retransmissão ocorrer da mesma forma.
Pensando em termos de controle do saneamento, especialmente o esgotamento
sanitário, a Covid-19 e essa possibilidade de transmissão é de fato ensejadora de
preocupação, pois como destacou a Fiocruz, na realidade não se trata de uma
pandemia, mas de uma sindemia¹, pois a interação com o ambiente e aspectos sociais
fazem com que essa doença não seja apenas uma comorbidade, mas o resultado
agravado de uma série de outros fatores, como por exemplo, as péssimas condições de
saneamento básico no Brasil.
Por esse motivo, o monitoramento do esgoto sanitário passou a integrar o radar das
autoridades com maior atenção. Mesmo sem dados concretos sobre a transmissão de
Covid-19 pelo esgoto, é certo que o monitoramento permite traçar estratégias para a
prevenção e controle da doença. E, nesse sentido, o presente trabalho buscou
identificar fontes e mapear os trabalhos acerca da engenharia do monitoramento do
esgoto sanitário como forma de combate à Covid-19.
2 BIBLIOMETRIA DA COVID-19 E ESGOTAMENTO SANITÁRIO
Em uma análise bibliométrica realizada a partir de consulta à base de dados da Web
of Science, para os termos “Covid-19” associado ao termo “wastewater”, foram
identificados um total de 742 publicações desde 2020 até o mês de abril de 2022
(Figura 1). O ano de 2021 se destacou, com um total de 493 documentos, dentre os
quais 379 são artigos e 94 artigos de revisão (WOS, 2022).
Do conteúdo publicado no período pandêmico, 220 se originam dos Estados
Unidos da América, 89 da China, 82 da Índia e 64 da Austrália. O Brasil contribuiu
com um total de 32 publicações no período, sendo a maioria no ano de 2021,
perfazendo 20 publicações (WOS, 2002).
Observa-se também que 65,50% das publicações foram publicadas na categoria
“Ciências Ambientais”, seguido de: Engenharia Ambiental (20,35%); Recursos
Hídricos (17,52%); Saúde Ocupacional e Ambiental Pública (13,75%);
¹ Sindemia é um termo utilizado em referência a combinação de elementos inclusive de ordem social que
ampliam os resultados de uma respectiva doença. De acordo com o artigo publicado pela Fiocruz, a origem
dessa palavra advém de um neologismo pela junção das palavras “sinergia” e “pandemia”, utilizado por
Merrill Singer, médico e antropólogo americano, na década de 1990, ao explicar que duas ou mais doenças
podem interagir e causar danos muito maiores do que a soma de ambas. Singer também esclareceu em
entrevista à BBC News Mundo que: “O impacto dessa interação também é facilitado pelas condições
sociais e ambientais que, de alguma forma, aproximam essas duas doenças ou tornam a população mais
vulnerável ao seu impacto”. (FIOCRUZ, 2020).
226
Microbiologia (8,22%); Engenharia Química (5,79%); entre outras. Com relação às
áreas de pesquisa, as publicações são categorizadas principalmente como: Ecologia e
Ciências Ambientais (65,63%); Engenharia 23,85%); e Recursos Hídricos (17,52%);
dentre outras áreas (WOS, 2022).
Figura 1 – Número de publicações contendo os termos “covid-19” e “wastewater”.
Fonte: Pesquisa dos autores à Coleção principal da Web of Science, em abril/ 2022
Os autores que mais publicaram a respeito foram Bibby K (24 artigos), Bivins A
(22), Ahmed W (19), Kumar M (17), Kitajima M (15), Simpson SL (11), Boehm AB
(10), La Rosa G (10), Haramoto E (9) e Jones DL (9). A maioria dos escritos,
totalizando 730 publicações, adotaram o idioma inglês, seguido do português (4),
francês (3), espanhol (2), além de outras línguas (WOS, 2022).
A análise demonstra um crescimento no interesse a respeito dessa temática pela
comunidade científica no mundo.
3 PRODUÇÃO CIENTÍFICA BRASILEIRA: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA
Inicialmente, cumpre afirmar que há algumas lacunas no conhecimento
atualmente disponível sobre a Covid-19 e o esgotamento sanitário, direcionando para
a necessidade de se produzir pesquisa e desenvolvimento. Uma revisão crítica
realizada por Bandala et al (2021) na literatura atual sobre os impactos potenciais do
vírus no caminho das águas residuais para as águas superficiais, deram conta, em
primeiro plano, que os efeitos da pandemia sobre o meio ambiente permanecem sem
esclarecimento. Em segundo plano, ao avaliar as pesquisas foi relatada a presença
potencial do vírus SARS-CoV-2 e fármacos usados no combate aos efeitos da Covid-
19 nas águas residuárias, embora se desconheça os fatores de influência na
transmissão e sobrevivência do vírus nos ecossistemas aquáticos.
De fato, vários estudos relataram a eliminação fecal do vírus por indivíduos
sintomáticos e assintomáticos infectados, sendo que sua quantificação nas águas
residuais pode colaborar no rastreamento da propagação da doença em uma
população (Claro et al, 2021). Isto porque o SARS-CoV-2 é excretado nas fezes
humanos e posteriormente eliminado na rede de esgoto, quando existente, ou no meio
ambiente, nos locais de saneamento básico precários (Aguiar-Oliveira et al, 2020).
227
Sodréa et al (2020) observam que a capacidade de monitorar a propagação de uma
doença é essencial para as práticas relacionadas à sua prevenção, intervenção e
controle, o que coloca em evidência a epidemiologia baseada nas águas residuais,
além de destacá-la como uma ferramenta inovadora de monitoramento da
disseminação viral entre as comunidades, mapear as curvas de contágio, além de
identificar os hotspots, dentre outras possibilidades.
Além disso, quando associado à coleta de dados sociodemográficos, o
monitoramento do vírus no sistema de esgotamento sanitário torna possível a
construção de um modelo de gestão do conhecimento, que permite tecer previsões
sobre o aparecimento da doença ou mesmo a diminuição dos casos, contribuindo na
tomada de decisão dos gestores (Mariosa et al, 2022).
No mundo, há diversos relatos que demonstram a presença do vírus nas águas
residuais. Em sua revisão, Aguiar-Oliveira et al (2020) identificaram relevantes
investigações nas Américas, na Europa, na Ásia, na Oceania e no Oriente Médio.
No Brasil, alguns experimentos foram realizados para identificar a presença do
vírus no sistema de esgotamento sanitário. Uma delas, na região do ABC paulista,
realizada por Claro et al (2021), constatou uma correlação positiva entre a carga viral
nas águas residuárias e os dados epidemiológicos/clínicos, em um intervalo de duas
semanas.
Importante destacar que, em que pese as vantagens, há alguns desafios associados
ao monitoramento para fins de vigilância, tais como a taxa de falso-positivo e
negativo, a relação efetiva entre a carga viral e a incidência da doença, além da
persistência viral (Aguiar-Oliveira et al, 2020). Os autores também mencionam um
suposto impacto de eventos climáticos extremos, tais como inundações e
tempestades, nas variações do fluxo de águas residuais e nas taxas de detecção de
vírus.
No ambiente aquático, pôde-se observar alguns estudos que apontaram o uso
excessivo do cloro em estações de tratamento de efluentes para melhorar os processos
de desinfecção e evitar a liberação de vírus ativo em corpos hídricos receptores
(Bandala et al, 2021).
Desta feita, o esforço da comunidade científica brasileira em investigar o tema
resultou em dezenas de artigos publicados em periódicos entre o período de 2020 a
2022, que se constituem em importante base de estudo, sistematizados no Quadro 1.
Quadro 1 – Artigos em periódicos produzidos sobre o tema.
Título Referência
Ano: 2020
Wastewater-Based Epidemiology (WBE) and Viral Detection in
Polluted Surface Water: A Valuable Tool for COVID-19 Aguiar-Oliveira
Surveillance - A Brief Review et al. (2020)
Wastewater-Based Epidemiology: Global Collaborative to Bivins et al.
Maximize Contributions in the Fight Against COVID-19 (2020)
continua
228
Costa et al.
Water, Sanitation and Covid-19 in the Amazon (2020)
Mariosa et al.
Sociodemographic indicators applied to the Covid-19 syndemic (2020)
Epidemiologia do esgoto como estratégia para monitoramento
Sodré et al.
comunitário, mapeamento de focos emergentes e elaboração de
(2020)
sistemas de alerta rápido para Covid-19
Ano: 2021
A satellite-based investigation into the algae bloom variability in Alcantara et al.
large water supply urban reservoirs during COVID-19 lockdown (2021)
SARS-CoV-2 sewage surveillance in low-income countries: Araujo et al.
potential and challenges (2021)
Impacts of COVID-19 pandemic on the wastewater pathway into Bandala et al.
surfasse water: A review (2021)
Padronização de método de concentração e extração de ácidos
nucleicos em amostras de esgoto sanitário: uma ferramenta de baixo Cabral et al.
custo para ser utilizada na vigilância epidemiológica de SARS-CoV-2 (2021)
Global occurrence of SARS-CoV-2 in environmental aquatic
matrices and its implications for sanitation and vulnerabilities in Castro et al.
Brazil and developing countries (2021)
Monitoramento do esgoto como ferramenta de vigilância
epidemiológica para controle da COVID-19: estudo de caso na Chernicharo et
cidade de Belo Horizonte al. (2021)
Long-term monitoring of SARS-COV-2 RNA in wastewater in Claro et al.
Brazil: A more responsive and economical approach (2021)
SARS-CoV-2 in Human Sewage and River Water from a Remote Fongaro et al.
and Vulnerable Area as a Surveillance Tool in Brazil (2021)
A critical review on SARS-CoV-2 infectivity in water and Giacobbo et al.
wastewater. What do we know? (2021)
Challenges and emerging perspectives of na international SARS- Mainardi &
CoV-2 epidemiological surveillance in wastewater Bidoia (2021)
Shedding light on toxicity of SARS-CoV-2 peptides in aquatic Mendonça-
biota: A study involving neotropical mosquito larvae (Diptera: Gomes et al.
Culicidae) (2021)
Assessing spatial distribution of COVID-19 prevalence in Brazil Mota et al.
using decentralised sewage monitoring (2021)
Viability of SARS-CoV-2 in river water and wastewater at different Oliveira et al.
temperatures and solids content (2021)
Wastewater-based epidemiology as a useful tool to track SARS- Prado et al.
CoV-2 and support public health policies at municipal level in Brazil (2021)
Make it clean, make it safe: A review on virus elimination via Sellaoui et al.
adsorption (2021)
SARS-CoV-2 coronavirus in water and wastewater: A critical Tran et al.
review about presence and concern (2021)
continua
229
Quantitative microbial risk assessment of SARS-CoV-2 for workers Zaneti et al.
in wastewater treatment plants (2021)
Ano: 2022*
Sampling strategies for wastewater surveillance: Evaluating the
Augusto et al.
variability of SARS-COV-2 RNA concentration in composite and
(2022)
grab samples
One-year surveillance of SARS-CoV-2 in wastewater from Barbosa et al.
vulnerable urban communities in metropolitan São Paulo, Brazil (2022)
Toxicity of spike fragments SARS-CoV-2 S protein for zebrafish: A Fernandes et al.
tool to study its hazardous for human health? (2022)
Can spike fragments of SARS-CoV-2 induce genomic instability and
DNA damage in the guppy, Poecilia reticulate? An unexpected effect Gonçalves et al.
of the COVID-19 pandemic (2022)
Application of activated carbon functionalized with graphene oxide
for efficient removal of COVID-19 treatment-related Januário et al.
pharmaceuticals from water (2022)
Revisão dos Procedimentos e Desafios Associados à Vigilância Mainardi &
Epidemiológica do SARS-CoV-2 em Águas Residuais Bidoia (2022)
First case of SARS-CoV-2 RNA detection in municipal solid waste Mondelli et al.
leachate from Brazil (2022)
“pySewage”: a hybrid approach to predict the number of Sousa et al.
SARS-CoV-2-infected people from wastewater in Brazil. (2022)
Um modelo de mistura para determinar a composição da variante Valieris et al.
SARS-Cov-2 em amostras agrupadas (2022)
(*) até abril de 2022
Fonte: elaborado pelos autores
4 A ENGENHARIA DO MONITORAMENTO
Atualmente, 6 capitais brasileiras (Curitiba, Belo Horizonte, Fortaleza, Brasília,
Recife e Rio de Janeiro) têm suas estruturas de esgotamento sanitário monitoradas
para fins de controle sobre a expansão da Covid-19. A denominada “Rede
Monitoramento Covid Esgotos” foi criada com a finalidade de ampliar dados e
informações sobre a Covid-19 e conta com a coordenação da Agência Nacional de
Águas e Saneamento Básico (ANA) e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia
em Estações de Tratamento de Esgotos Sustentáveis (INCT ETEs Sustentáveis),
apoiados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq).
A ANA divulga em seu sítio periodicamente boletins sobre a condição das análises
de cargas virais e ainda disponibiliza uma série de dados comparativos em seu painel
de monitoramento.
Dentre os dados confrontados estão os das doses de vacinação e os de cargas virais.
Tomando como exemplo o município de Belo Horizonte, a evolução temporal das
cargas virais no esgoto demonstra que após a 3ª dose da vacina houve uma diminuição
230
da carga viral, sendo que a coleta demonstrou uma considerável queda nos meses de
março e abril e uma sensível majoração no mês de maio (Figura 2).
Figura 2 – Evolução temporal das cargas virais no esgoto e da vacinação
231
Por fim, destaca-se no cenário brasileiro a iniciativa da Agência Nacional de
Águas, qual seja, o controle e monitoramento da covid-19 a partir do esgoto sanitário,
que, uma vez contaminado por conter presente material genético viral, pode indicar
regiões com incidência de covid-19 e permitir ações de combate a essa doença. A
prevenção e a erradicação dependem de instrumentos como tais para a proteção da
sociedade, considerando que o diagnóstico coletivo supre a testagem em massa. E,
embora não se possa ainda provar o nexo causal entre a doença e a contaminação a
partir do esgoto como no caso da SARS-CoV-1, é possível identificar a localidade que
carece de maior atenção por parte do Estado no que se refere a políticas de
atendimento à saúde.
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234
PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM
TEMPOS DE PANDEMIA DE COVID-19
(1) Mestranda IFPR - Instituto Federal do Paraná campus Umuarama - Pr. E-mail:
senac.profpatricia@gmail.com. Link para o Lattes: http://lattes.cnpq.br/9963728185981176
(2) Mestre - UNESPAR - Universidade Estadual do Paraná campus de Campo Mourão - Pr. E-mail:
profanabecker@gmail.com. Link para o Lattes: http://lattes.cnpq.br/7635106870971910
(3) Mestranda UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná, campus Cascavel - Pr. E-mail:
lauriesilva1588@gmail.com. Link para o Lattes: http://lattes.cnpq.br/0195598301943531
(4) Doutora - Docente IFPR - Instituto Federal do Paraná campus Umuarama - Pr. E-mail:
mariam.pereira@ifpr.edu.br Link para o Lattes: http://lattes.cnpq.br/6867974583171879
235
1 INTRODUÇÃO
O ano de 2020 foi marcado pelo surgimento da pandemia do novo Coronavírus, o
que provocou inúmeras mudanças no formato de vida das pessoas. Tais mudanças
refletiram significativamente na socialização dos indivíduos, que foram obrigados a
adotar o distanciamento social em busca de segurança. Em contrapartida, promoveu-
se a tecnologia como mediadora para novas possibilidades em diversas áreas, no
trabalho, na religião e principalmente na educação.
De acordo com Guedes e Macedo (2020), a pandemia acelerou os processos
tecnológicos influenciando algumas tarefas diárias que eram realizadas de forma
presencial, e nesse movimento com habilidades individuais, os indivíduos tiveram
que se adaptar e lidar com o digital, o virtual e com a inteligência artificial.
A partir desta nova realidade para a educação, escolas, professores e estudantes
tiveram que ir em busca de adequação para o ensinar e o aprender, inclusive
introduzindo efetivamente a tecnologia nesse processo. Diante do agravamento do
cenário pandêmico e tendo a certeza de que a educação não voltaria aos moldes do
ensino presencial, restou a toda comunidade escolar se reinventar.
No novo contexto de aceleração do uso da tecnologia, é urgente que as
metodologias ativas façam parte do cenário em sala de aula, mesmo sendo no formato
de aulas online, como por exemplo: sala de aula invertida, vídeos, projetos,
construção de mapas conceituais, atividades focadas em problemáticas locais
impulsionando a ação, reflexão e ação, promoção do protagonismo juvenil, dentre
outras atividades. A apropriação destas possibilidades para o ensino educacional por
parte do professor, impulsiona a motivação, principalmente nos estudantes, o que
consequentemente gera conhecimento e envolvimento de tais partes.
É preciso destacar que essa nova realidade no formato de ensino trouxe
consequências de defasagem na educação, principalmente para os países da América
Latina, conforme relatório do Banco Mundial (2021). Segundo essa fonte, que
introduz apontamentos referentes ao ano de 2020, apesar dos inúmeros esforços, a
educação está defasada para as crianças mais pobres.
Neste cenário de pandemia do Covid-19, pode haver um salto de 51% para 62,5%
de crianças que finalizam o ensino fundamental sem ter a capacidade de ler e
compreender um texto simples, podendo gerar 7,6 milhões de crianças pobres sem
aprendizagem. A América Latina pode ainda entrar no rol de países com estudantes do
ensino médio que vão ficar abaixo dos níveis mínimos de proficiência medidos pelo
resultado do PISA - Programa Internacional de Avaliação de Alunos. Em dez meses de
escolas fechadas, o relatório afirma que o nível de proficiência medido poderá
apresentar déficits na educação em nível médio. (BANCO MUNDIAL, 2021).
Portanto, verifica-se que a pandemia intensificou problemas de cunho social na
educação. Esses assuntos já foram tratados pela ONU (Organização das Nações
Unidas) em 2000 com o estabelecimento dos ODM (Objetivos de Desenvolvimento
do Milênio), que vigoraram até 2015 (ODM BRASIL, 2021). Para continuidade do
pacto global com a sustentabilidade, em 2015 foram implantados os ODS (Objetivos
de Desenvolvimento Sustentável), que definiram objetivos de melhorias em nível
mundial nas esferas econômicas, sociais e ambientais contemplando a Agenda 2030
(ODS BRASIL, 2021). Deste modo, justifica-se a implantação de diálogos e práticas
236
educacionais entre jovens em idade escolar para que possam conhecer e discutir os
principais problemas de agressão ao meio ambiente.
Quando se observam os noticiários, são vistas catástrofes ambientais e escassez de
recursos, e ficam nítidas as consequências refletidas acerca de atitudes escolhidas pela
humanidade num momento pretérito. Por isso, é de extrema importância a discussão
para uma conscientização ambiental, almejando mudanças de atitudes, a fim de uma
construção mais consciente no futuro. Assim, o tema sustentabilidade tem se tornado
tendência mundial, pois a preservação do meio ambiente é uma das possibilidades de
construção de uma educação humanizada e que satisfaça as necessidades das gerações
futuras.
Diante do exposto, é preciso que as atividades realizadas que promovam a
educação ambiental sejam compartilhadas com profissionais do meio acadêmico,
principalmente em tempos de pandemia, sinalizando que mesmo em momentos de
crise, não há limites para que ações conscientizadoras aconteçam.
Nas instituições de ensino, o tema sustentabilidade ou educação ambiental sempre
ficaram restritos às disciplinas de ciências, biologia ou até mesmo educação
ambiental. Entretanto, observa-se mais eficiência quando o tema é tratado em meio à
interdisciplinaridade, ou por meio de projetos construídos com base em um calendário
ambiental (PEREIRA, 2020).
Dessa forma, o que se observa é uma tentativa mais efetiva de se pensar a
consciência na prática, até mesmo por documentos norteadores da educação, como é o
caso da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que abrange várias disciplinas em
sua abordagem conceitual intitulada Ciência da Natureza e suas Tecnologias.
Inclusive essas aproximações possibilitam uma abordagem multidisciplinar, o que dá
a possibilidade de refletir acerca de um currículo integrado.
Neste sentido, o objetivo deste trabalho foi proporcionar momentos de reflexão,
diálogo e construção para os discentes, por meio de dois encontros virtuais com
pessoas convidadas, trazendo informações sobre a correta forma de separação para
coleta seletiva, os desafios para a cooperativa local, o tratamento do chorume, bem
como ações que possibilitam às famílias colaborar com a prática correta de separação
do lixo em suas residências.
2 REFLEXÕES SOBRE EDUCAÇÃO AMBIENTAL
A emergente situação global citada nas entrelinhas da Carta da Terra, escrita há
mais de vinte anos, continua a reforçar a preocupante situação que o globo terrestre
emerge frente ao desenvolvimento econômico causado pelas linhas de produção em
larga escala, em especial, a utilização dos recursos naturais de forma desenfreada.
Para iniciar uma reflexão acerca da educação ambiental é necessária a reflexão de um
texto construído há tempos, mas que ao analisá-lo nunca esteve tão atual.
O sistema capitalista de produção dominante e o incentivo ao consumo estão
causando devastação ambiental, esgotamento dos recursos e uma massiva extinção de
espécies. Partes da sociedade estão sendo arruinadas, observa-se que os benefícios do
desenvolvimento não estão sendo divididos equitativamente e a diferença entre ricos e
pobres está, de tempos em tempos, aumentando (CARTA DA TERRA, 2000).
A responsabilidade pela preservação ambiental deve ser universal, porém
237
reconhecida individualmente frente à comunidade local. É preciso visar um modo de
vida sustentável, que somente será construído frente a mudanças de condutas, sendo
esta ação eficiente a partir da união entre indivíduos, empresas, organizações e
governos (CARTA DA TERRA, 2000).
Frente a tais responsabilidades expressas por este documento, é evidente que a
educação deve estar pautada na busca por este ideal e pela formação de sujeitos
críticos e cientes do seu papel de cidadão atuantes na comunidade local. Dessa forma,
as ações de educação ambiental devem ser realizadas dentro do currículo escolar, pois
além de estar inserida em lei, é nos espaços escolares que as ações de educação
ambiental alcançam um público maior.
A educação ambiental no Brasil passou a ser introduzida a partir da Constituição
Federal de 1988, porém apenas com o surgimento da Lei n° 9.795/99 instituiu-se a
Política Nacional de Educação Ambiental. Tal legislação define que a Educação
Ambiental (EA) é um processo onde indivíduos e a sociedade como um todo
constroem valores sociais, conhecimentos, atitudes e competências voltadas para a
preservação do meio ambiente (BRASIL, 1999).
Segundo Layrargues e Lima (2011), a EA pode ser sintetizada em três
macrotendências: conservadora, pragmática e crítica. A educação conservadora traz
uma mensagem de que o homem é o autor da destruição da natureza, sendo necessário
promover a sensibilidade humana em relação à natureza. Atividades de visitas práticas
como ecoturismo, trilhas interpretativas e dinâmicas agroecológicas são promovidas
para indivíduos em idade escolar. Nesta macrotendência, o objetivo é apresentar a
problemática ambiental para uma busca de mudança de comportamento.
Em uma EA pragmática, proposta por Layrargues e Lima (2011), discute-se a ideia
do individual, onde cada um deve fazer a sua parte para a preservação ambiental. Esta
linha de discussão está atrelada às causas e consequências originadas pela
modernidade, onde a destruição dos recursos naturais ocorre sem limites. Os pilares
de estudos se desencadeiam em torno do consumo sustentável, mudanças climáticas e,
por fim, economia verde. A educação pragmática é atuante nas mídias, divulgadas em
empresas e com foco no consumidor, evidenciando a responsabilidade individual de
cuidar do meio ambiente.
A educação ambiental crítica, terceira e última tendências discutidas por
Layrargues e Lima (2011), prevê a formação de indivíduos responsáveis
ambientalmente, de modo que se comprometam socialmente para construir um
mundo sustentável. Isso envolve ter a responsabilidade frente a comportamentos que
promovam a sustentabilidade. Como exemplos pode-se citar: ações corretas no ato da
separação dos resíduos, compreensão de que o consumismo afeta diretamente o
consumo dos bens naturais, adoção de práticas de economia no consumo diário de
energia e água, entre outras ações.
Dessa forma, a construção da EA crítica deve ser promovida com base na
interdisciplinaridade na escola, ou seja, diante da junção de diversas possibilidades de
se discutir a educação ambiental, não estando restrita apenas aos conteúdos de
ciências ou biologia. Conforme cita Reigota (2017), atualmente a educação ambiental
está definida como educação política, a partir de análises de relações econômicas,
políticas, sociais e culturais entre a humanidade e o meio ambiente, relacionando o
“por que” fazer com o “como” fazer. A partir desta afirmação, verifica-se a
238
importância de ações com a missão de formar cidadãos conscientes de suas ações
preservacionistas ambientalmente.
De acordo com Carvalho (2004), a EA pode ser discutida a partir do viés de
contribuição para a formação do sujeito ecológico, por meio da mudança de valores,
atitudes e reorientação de modos de vida coletivos e individuais. É fundamental trazer
o sentido de pertencimento e responsabilidade frente às ações individuais.
Nesse contexto, as escolas devem assumir o papel de promover ações de educação
ambiental voltados para uma reflexão individual com o objetivo de conquistar uma
transformação social. Freire (2013) faz menção à importância do significado dos
conteúdos, dos sentimentos e das emoções do educando, tornando relevante a
construção crítica do ser no mundo com os outros.
Na mesma direção, para Morin (2003), há profundas inadequações em construir o
que se chama de saberes desunidos, divididos, compartimentados e distantes das
realidades. O autor defende que a educação seja contextualizada, globalizada,
multidimensional e, consequentemente, complexa.
Isso leva à reflexão de que educar a respeito do meio ambiente, pressupõe ações
coerentes e vivências do que se vê na teoria, pois é preciso uma mudança de postura ao
propor o tema aos estudantes, e a instituição tem de repensar suas práticas cotidianas,
como por exemplo, o uso de copos descartáveis.
Morin (2003) ensina que também faz diferença nesse processo o corpo docente
envolvido e os agentes de educação de uma instituição, visto que estes serão guias no
processo de mudança de postura de toda uma comunidade.
Neste sentido, Steiner (2000, 2011, 2019) propõe a qualidade da consciência como
evolução do processo do ser humano. Por esses conceitos, o autor defende a
autoeducação, tanto para o desenvolvimento individual como coletivo. Em outra
obra, Steiner (2018) reflete acerca de como toda organização econômica da
humanidade remonta à natureza, não sendo possível, excluí-la de nenhum processo.
Por isso, não há como se manter imparcial diante das discussões, principalmente
quando os assuntos estão em torno da preservação, sustentabilidade e recursos da
natureza.
É importante ressaltar que as ações de educação ambiental devem estar pautadas
no texto dos ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para o cumprimento
da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas, no qual descreve uma série de
ações a serem praticadas pelos países em busca da resolução de problemas sociais,
bem como práticas de sustentabilidade essenciais para a promoção da qualidade de
vida para todos.
Dentre tais práticas, pode-se citar algumas que promovem a sustentabilidade, e
que devem ser refletidas entre docentes e discentes, como é o caso de: acabar com a
fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura
sustentável, defendida pelo ODS 2; buscar pela melhoria da qualidade da água,
reduzindo a poluição referente ao ODS 6; garantir acesso à energia barata, confiável,
sustentável e renovável para todos conforme exige-se o ODS 7; tornar as cidades e os
assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis conforme
sugere o ODS 11; assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis, referente
ao ODS 12; e tomar medidas urgentes para combater a mudança do clima e seus
239
impactos, de acordo com o ODS 13 (ODS BRASIL, 2021).
Em meio a todos esses desafios, no início de 2020 surgiu uma situação inusitada,
uma pandemia causada por um novo vírus, que obrigou o mundo a adotar medidas até
então não usuais em todos os setores, inclusive na educação.
3 A PANDEMIA E O ENSINO REMOTO
A pandemia começou a mudar a rotina da educação quando foi publicado no
Diário Oficial da União, pelo Ministério da Educação, a Portaria nº 343, de 17 de
março de 2020, ainda em vigor, que dispõe sobre a substituição das aulas presenciais
por aulas em meios digitais enquanto durar a situação de pandemia do Novo
Coronavírus (Covid-19). Essa portaria entrou em vigor a partir de 20 de março de
2020 com o fechamento das escolas e o cancelamento das aulas presenciais (BRASIL,
2020).
O Conselho Nacional de Educação (CNE), a fim de auxiliar na implementação
eficaz do ensino remoto emergencial, autorizou uma série de atividades educacionais
remotas para serem usadas pelos sistemas de ensino durante a pandemia. Dentre os
recursos digitais utilizados destacam-se as videoaulas, Ambientes Virtuais de
Aprendizagem (AVA), Google Classroom, redes sociais (Facebook e WhatsApp),
programas de televisão ou rádio, videoconferências com compartilhamento de tela
usando aplicativos de grandes empresas, tais como Google Meet© e Zoom Meeting©.
Esses recursos foram oferecidos à comunidade dentre os diversos níveis escolares:
ensino infantil, ensino fundamental inicial e final, ensino médio, ensino técnico,
ensino superior, educação de jovens e adultos (EJA), educação especial, e, por fim, a
educação indígena, do campo e quilombola (BRASIL, 2020).
A partir disso, com o fechamento das escolas, no intuito de evitar aglomerações,
professores e estudantes foram estimulados a dar continuidade ao ensino de forma
remota, para evitar prejuízos na formação escolar. Nesse ínterim, foram fortalecidos
os cursos online, palestras ao vivo pela internet, conhecidas por lives, e formações
docentes para que as escolas implementassem de forma rápida as aulas virtuais,
ocorrendo uma imposição do uso de tecnologias digitais para essa situação. Surgiram
diversos termos na mídia, tais como educação virtual, educação domiciliar ou
homeschooling, ensino remoto, educação remota em caráter emergencial, educação
mediada com Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), os quais deixaram
pais, professores e estudantes bastante confusos (JOYE; MOREIRA; ROCHA,
2020).
De acordo com Moreira, Henriques e Barros (2020), a modalidade remota é
dividida em dois momentos: as aulas síncronas são aquelas que ocorrem de forma
sincronizada, fazendo com os participantes se encontrem no mesmo espaço físico ou
online e em tempo real para realização da comunicação; e os momentos assíncronos,
que ocorrem de forma não sincronizada, não exigindo a presença simultânea dos
participantes, nem no espaço e nem no mesmo tempo.
Corroborando com este pensamento, Arruda (2020) discorre que esse modelo de
educação se assemelha à educação presencial com horários específicos para as
transmissões das aulas com a participação de todos de maneira simultânea, além disso
pode proporcionar a possibilidade de gravação das atividades para posterior acesso.
Levando em consideração toda esta situação pandêmica, somado ao isolamento
240
social e às aulas na modalidade remota, além das incertezas e preocupações tanto dos
docentes quanto dos discentes, percebe-se que esta nova configuração de ensino
aprendizagem é muito complexa e requer uma mudança de paradigma na educação,
bem como uma mudança na postura do docente, a fim de estimular os estudantes a
assistirem e participarem das aulas, despertando o interesse nas atividades.
Portanto, para atender a este novo paradigma da educação no século XXI, faz-se
necessário adotar outro perfil docente. Uma alternativa seria a utilização de
metodologias ativas de ensino e aprendizagem, a fim de acompanhar as demandas
atuais da sociedade (MORAN; BACICH, 2018).
4 METODOLOGIAS ATIVAS NA EDUCAÇÃO
Já faz certo tempo que algumas escolas sentiram a necessidade de mudar para
modelos mais centrados em aprender ativamente com problemas reais e desafios
relevantes, combinando atividades individuais com atividades coletivas de ensino e
aprendizagem. Para tanto, é importante que seja realizada uma mudança de
configuração do currículo, da participação dos professores, da organização das
atividades didáticas, da organização dos espaços e tempos, bem como da participação
e envolvimento dos discentes no processo ensino-aprendizagem (MORAN;
BACICH, 2018).
Tais metodologias dão ênfase à educação inovadora, instigando o
desenvolvimento da autonomia, protagonismo, curiosidade e tomada de decisão
individual e coletiva dos alunos. Estas metodologias buscam conduzir a formação
crítica de futuros profissionais nas mais diversas áreas (BORGES; ALENCAR, 2014).
Freire (2011) já defendia as metodologias ativas, afirmando que, para que haja
educação é necessário a superação de desafios, a resolução de problemas e a
construção de novos conhecimentos a partir de experiências prévias, e que isso
impulsiona as aprendizagens. Segundo o autor, um dos grandes problemas da
educação paira no fato de os estudantes praticamente não serem estimulados a
pensarem autonomamente.
Para Freire (2011), a curiosidade dos alunos é um ponto fundamental para a
aprendizagem no sentido de inquietação, de crítica, que pode ser uma pergunta
verbalizada ou não, na procura de esclarecimento. Não haveria criatividade sem a
curiosidade que move a humanidade diante do mundo.
Essa aprendizagem é mais significativa quando o estudante é motivado a aprender
por meio de atividades que tenham mais sentido para ele, com engajamento em
projetos e diálogos sobre as práticas, além da forma de realizá-las (MORAN;
BACICH, 2018).
Na concepção de Barbosa e Moura (2013), a aprendizagem ativa ocorre quando o
educando interage com o assunto estudado, ouvindo, falando, perguntando,
discutindo, fazendo, enfim, sendo estimulado a construir o conhecimento em vez de
recebê-lo de forma passiva na interação com o professor. Neste ambiente, o professor
atua como guia, orientador, supervisor, facilitador do processo de aprendizagem, e
não como detentor do conhecimento.
Freire (2011) ainda enfatiza que o educador em sala de aula deve ter respeito aos
saberes que os discentes carregam sobre determinado tema, desta forma o
241
aprendizado é mais significativo.
4.1 APRENDIZAGEM BASEADA EM PROJETOS
A aprendizagem baseada em projetos (ABP) ou Project-Based Learning (PBL) é
uma metodologia ativa que tem seu foco direcionado na realização de tarefas. Esta
metodologia utiliza uma abordagem sistêmica, envolvendo os participantes na
construção do saber e competências por meio de um processo de investigação de
questões complexas, tarefas autênticas e construção de produtos, cuidadosamente
planejados com vista a uma aprendizagem eficiente e eficaz (MASSON et al., 2012).
Rocha e Lemos (2014) destacam as três categorias desta metodologia: (1) projeto
construtivo, no qual o objetivo é construir algo, propondo uma solução nova, um novo
olhar, estimulando a criatividade e inventividade do estudante; (2) projeto
investigativo, no qual se busca o desenvolvimento da pesquisa científica sobre uma
questão ou situação; (3) projeto didático ou explicativo, que tem como objetivo
explicar, ilustrar, revelar os princípios científicos de funcionamento de objetos.
Apesar de estar em pauta atualmente, o desenvolvimento da metodologia da
aprendizagem baseada em projetos não é novo. Registros apontam suas origens em
1900, quando o filósofo americano John Dewey (1859 – 1952) comprovou o
“aprender mediante o fazer”, em que ele valorizava e contextualizava a capacidade de
pensar dos discentes na aquisição do conhecimento de forma gradativa, resolvendo
situações reais em projetos referentes aos conteúdos na área de estudos (MASSON et
al. 2012).
Nesta mesma linha de raciocínio, para Bender (2014), esse modelo de ensino
permite aos participantes confrontar as questões com o mundo real, agindo de forma
colaborativa na busca de soluções dos problemas.
Campos (2011) ressalta que a PBL tem sido um dos principais focos da discussão
não apenas como abordagem de metodologias ativas, mas também como alternativa
para se elaborar currículos e se adotar práticas inovadoras na educação, surgindo
como uma estratégia de ensino e aprendizagem do século XXI, em que a forma de
ensinar e aprender vem sofrendo transformações, passando a exigir muito mais
empenho dos estudantes e dos professores. A metodologia faz o professor refletir
sobre a atividade docente e mudar suas práticas, deixando de lado a postura tradicional
de especialista em conteúdo para treinador de aprendizagem, além de estimular os
estudantes a assumirem maior responsabilidade por sua própria aprendizagem,
compreendendo que o conhecimento deve ser construído por meio de seu esforço
pessoal e envolvimento com a atividade, sendo assim, mais duradouro do aquele
obtido apenas por informações de terceiros.
METODOLOGIA
Este trabalho foi realizado com o apoio da instituição de ensino SENAC - Serviço
Nacional de Aprendizagem Comercial, com jovens entre 14 e 23 anos inseridos no
Programa Jovem Aprendiz e que são estudantes das escolas públicas da cidade de
Umuarama-PR e região. Ao todo participaram das atividades setenta e seis alunos.
A ação de informação e conscientização foi realizada por três professoras que
convidaram profissionais atuantes na área de separação do lixo e resíduos para
momentos síncronos com os estudantes. A finalidade da ação foi de ensinar a correta
242
separação do lixo nas casas, bem como a diferença entre resíduos e lixo, com destaque
aos itens que podem ou não ser reciclados. Além disso, foi mostrado o funcionamento
da coleta de recicláveis da cidade, a atuação da cooperativa local e sua
representatividade para a economia de muitas famílias pobres.
Com o objetivo de promover a educação ambiental crítica direcionada para a
prática correta de separação dos resíduos nas residências, foram promovidos quatro
encontros via sala virtual entre 01 a 31 de maio de 2021, organizados em atividades
diversificadas. A primeira atividade foi uma palestra com a presidente da Cooperuma
(Cooperativa dos Trabalhadores na Reciclagem de Resíduos de Umuarama-Paraná),
Gisele do Nascimento Domingues, e o representante da Prefeitura Municipal de
Umuarama, o técnico em Meio Ambiente Valério Silva. Ambos apresentaram
informações sobre a quantidade do lixo recolhido, destinação, geração de renda,
Projeto Lixo que Vale e o aterro sanitário da cidade.
A segunda atividade foi uma palestra com o gari coletor e tecnólogo de alimentos,
Flávio de Oliveira, o qual, por meio de informações técnicas diferenciando lixo e
resíduos, promoveu uma tarde de muitas reflexões com imagens ilustrativas.
Para a prática de educação ambiental desenvolvida neste trabalho, utilizou-se as
seguintes práticas de metodologias ativas: diálogo promovido por meio de
palestrantes convidados, protagonismo juvenil incentivado por meio da apresentação
de pequenos temas sobre a preservação dos recursos naturais, criação de cartazes com
mensagens informativas ou de caráter conscientizador e a criação de mapas
conceituais identificando principais temáticas discutidas.
Após o ciclo de palestras, os alunos foram orientados a escolher temas citados
sobre a correta separação dos resíduos e a realizar tais atividades, que foram
compartilhadas por meio de apresentações e compartilhamentos via Whatsapp©.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Diante de novas possibilidades para o ensino, e com o intuito de continuar
adotando práticas de educação ambiental, foi realizado um projeto contemplando
quatro encontros com diferentes propostas de aprendizagem para uma reflexão acerca
da correta separação do lixo.
Na primeira ação desenvolvida estavam presentes 76 participantes, sendo
estudantes com idade entre 14 e 23 anos de escolas públicas da cidade de Umuarama-
Paraná, professores e pessoas convidadas para palestrar, como ilustra a Figura 1. A
ação se desencadeou de forma online, no dia 05 de maio de 2021, onde a presidente da
Cooperuma (Cooperativa dos Trabalhadores na Reciclagem de Resíduos de
Umuarama-Paraná) Gisele Domingues Silva, relatou como é o seu trabalho na
cooperativa, destacando como importantes as informações de que a cooperativa
recebe o lixo reciclável pela população da cidade e que esta prática acontece porque
existe participação ativa da prefeitura da cidade com os caminhões e os servidores
realizando o trabalho de coleta. Segundo a palestrante, “infelizmente é nesse
momento que observamos a grande falta de conhecimento da população na correta
separação do lixo”, pois muitos produtos são misturados ao lixo orgânico e a
população não realiza uma higienização dos materiais separados, o que dificulta a
venda de tais itens junto a indústrias que os compra. A presidente da Cooperativa ainda
ressaltou a importância das ações da instituição na oferta de trabalho a muitas pessoas
243
para o sustento de suas famílias.
Uma informação observada por Gisele, e que foi palco de muitas discussões, foi a
sinalização de que ao iniciar a pandemia houve um aumento significativo de pessoas
que passaram a recolher os materiais recicláveis nas residências para vendê-los, e
consequentemente complementar a renda, cenário que demonstra ainda mais a crise
acentuada pelo surgimento do Coronavírus. Em meio às informações compartilhadas,
os alunos se sentiram à vontade e realizaram perguntas e questionamentos, o que
promoveu um diálogo bastante participativo.
O representante da Prefeitura Municipal da cidade, Valério Silva, completou a fala
da presidente da cooperativa com informações técnicas a respeito da diferença entre
lixão e aterro sanitário, observando que o órgão realiza ações de preservação para
diminuir o impacto ambiental causado pelos resíduos. Valério também expôs a forma
de tratamento do chorume, líquido poluente proveniente da degradação da matéria
orgânica presente no aterro. Outro ponto destacado por ele foi o projeto Lixo que Vale,
ação organizada pela Prefeitura em bairros periféricos, que visa incentivar a troca de
itens recicláveis pelas famílias carentes, uma espécie de moeda de troca, que
posteriormente são trocados por produtos da horta municipal, uma ação considerada
bastante incentivadora.
No segundo encontro, dia 12 de maio de 2021, foi realizada outra palestra com o
coletor de reciclados Flávio de Oliveira (Figura 2) com o objetivo de trazer o ponto de
vista do coletor, as dificuldades encontradas na execução do seu trabalho, bem como
realizar uma diferenciação entre lixo e resíduo, trazendo várias alternativas para
reduzir a produção de lixo doméstico. Uma alternativa apresentada foram os
brinquedos construídos com objetos reciclados. Outra opção foi o incentivo à doação
de roupas e objetos que não são mais usados, além da compostagem feita com
alimentos a fim de reduzir o lixo orgânico. Os estudantes foram incentivados a
participar contando as ações que são realizadas por eles e seus familiares, bem como
as ações que são realizadas nos bairros onde moram, trazendo suas experiências sobre
o tema para a discussão.
Figura 1 - Palestra da Presidente da
Cooperuma, Gisele do Nascimento Figura 2 - Palestra com o coletor gari e
Domingues, e o Técnico em Meio Tecnólogo em Alimentos Flávio de
Ambiente Valério Silva Oliveira
245
Figura 5 - Mapa Conceitual da aluna Thalita Akemi Ynamura Soares
248
ORGANIZAÇÃO DE LIVRO DURANTE A
PANDEMIA: RELATO DE EXPERIÊNCIA DE
PROJETO DE ENSINO-PESQUISA-
EXTENSÃO TRANSDISCIPLINAR SOBRE
URBANISMO
249
1 INTRODUÇÃO
O ano de 2020 iniciou de forma atípica. O mundo precisou aprender novos
vocábulos e adotar novos hábitos, além de se obrigar a ressignificar a vida cotidiana
imposta pela pandemia da Sars-COV-2, ou covid-19. A insegurança, a tristeza, a
ansiedade, e tantos outros sentimentos inundaram cada ser humano do planeta e, da
pior forma possível, os fizeram entender outros contextos pandêmicos do passado que
só se via em livros de história.
Entretanto, em um ponto, a pandemia de covid-19 foi diferente das demais: o
isolamento social foi mediado por tecnologias e a presencialidade começou a ser
discutida em alguns setores da economia, em especial na produção imaterial. Neste
contexto, o sistema de ensino e aprendizagem, acostumado fisicamente à sala de aula e
à escola, se viu em meio a um caótico cenário de exclusão social e evasão escolar pela
necessidade do ensino remoto, possível apenas para os que tinham acesso à internet, o
que provavelmente pode significar “a extensão de uma crise cujos impactos e
consequências econômicas e sociais são incalculáveis” (MAGALHÃES; RAMOS,
2021, p. 255).
Paradoxalmente, se por um lado, cerca de 1,4 bilhão de estudantes foram
prejudicados pontualmente pela pandemia (THE WORLD BANK, 2020), por outro
lado, foram desenvolvidas alternativas e metodologias que podem auxiliar todos os
discentes no futuro. Diante do paradigma da complexidade, introduzido por
Nicolescu (1999), é urgente que a sociedade entenda que todas as relações, sejam
biológicas, sociais, econômicas ou culturais, reais ou virtuais, estão intimamente
conectadas. Isso só será possível por meio da educação, que atualmente, precisa
alcançar um novo patamar, como preconizou Morin (2014) com seus sete saberes
necessários à educação do futuro. Esse autor ressalta que a complexidade é um
problema a ser superado, principalmente porque, até o final do século XVIII, as
ciências foram fragmentadas e reduzidas (MORIN, 2015).
Desde então, vários conceitos e metodologias educacionais têm sido
desenvolvidos, principalmente pela ótica da transdisciplinaridade, que pode ser
definida como o “que está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes
disciplinas e além de qualquer disciplina” (NICOLESCU, 1999, p. 51). Nessa
perspectiva, as que mais se despontam são as metodologias ativas, que são abordagens
centradas nos estudantes, pois lhes conferem autonomia, criticidade,
comprometimento, organização, altruísmo e flexibilidade a mudanças, entre outras
competências (BACICH; MORAN, 2017). Dessa maneira, esse deve ser o novo
panorama teórico e prático da educação por aliar conteúdos científicos, emocionais e
sociais (BEHRENS; ENS, 2015).
Dentro dessa conjuntura, o Instituto Federal do Paraná incentiva, como valores
educacionais, a inovação, a visão sistêmica, a sustentabilidade, a diversidade humana
e cultural e o respeito às características regionais, entre outros. Sua missão é:
“promover a educação profissional, científica e tecnológica, pública,
gratuita e de excelência, por meio do ensino, pesquisa e extensão,
visando à formação integral de cidadãos críticos, empreendedores,
comprometidos com a sustentabilidade e com o desenvolvimento local
e regional” (IFPR, 2022, p. 1).
Por todo o contexto apresentado, esse trabalho se justificou pela impossibilidade
250
de encontros presenciais durante o ano de 2021 devido à pandemia de covid-19, e pelo
encorajamento por parte do IFPR de projetos integrados de ensino, pesquisa e
extensão como inovação no ensino e aprendizagem.
Dessa forma, o objetivo geral deste trabalho foi expor uma atividade de
metodologia ativa transdisciplinar de ensino-pesquisa-extensão na Educação
Profissional e Tecnológica (EPT), tendo como tema o desenvolvimento urbano de
Umuarama (PR), uma cidade de porte médio do oeste-paranaense, e apresentando
como resultado final a organização de um e-book.
2 O ESPAÇO PÚBLICO
Refletir sobre o conceito de espaço público obriga a pensar o espaço como um
recurso, um produto e como uma prática. Importa igualmente refletir sobre a
apropriação e utilização do espaço, a transformação de espaços existentes e a
produção de espacialidades inéditas, em correspondência com distintos projetos
culturais emergentes e em seu apogeu.
O espaço público – que desde a ágora ateniense até à modernidade constituiu-se
como fonte de discussão e debate permanente das ideologias coletivas – vê-se hoje
como um espaço fragmentado e diluído pela reconfiguração espaço-temporal operada
na sociedade do conhecimento. O espaço físico do encontro – outrora sede de
enriquecimento e partilha social – não é mais do que a negação dos topos, o não-lugar
cuja erosão configura uma nova geografia das relações interpessoais. Na confluência
dos novos paradigmas pós-industriais, questiona-se a capacidade deste novo espaço
público operar mudanças significativas rumo a valores sólidos e socialmente
partilhados.
O termo espaço público surge cada vez mais como o lócus de uma base de
discussão transversal às diversas ciências, suscitando permanentemente novas
abordagens. Segundo Ascher (1995 apud NARCISO, 2009), o termo de espaço
público aparece pela primeira vez num documento administrativo em 1977, no quadro
de um processo de intervenção pública, agrupando na mesma definição os espaços
verdes, as ruas, as praças e a valorização da paisagem urbana. É considerado ainda
como aquele espaço que, dentro das cidades é de uso comum e posse coletiva,
pertencente ao poder público.
Sendo este espaço existente e relativo à cidade, pode-se dizer, que no decorrer da
história, o espaço público foi em simultâneo, lugar de encontro, de comércio, de
circulação (GEHL; GEMZOE, 2000) e de representação, mas ao longo do tempo estes
usos foram se desequilibrando. Assim, após a segunda Guerra Mundial assistiu-se,
sobretudo na Europa, a uma drástica redução qualitativa e quantitativa da convivência
humana no espaço público devido a novos critérios urbanísticos, mais benevolentes
com a especulação imobiliária – estimulação do investimento e crescimento
econômico – e com o uso do automóvel como principal meio de transporte.
Paulatinamente foram se perdendo os benefícios do espaço da sociabilidade, do
espaço simbólico da coletividade e as possibilidades que um espaço comum oferece
como mediador de diferenças socioeconômicas e de oportunidades numa sociedade
que é cada vez mais competitiva e menos solidária, como a contemporânea. Segundo
Garcia (1999),
En definitia, los nuevos espacios urbanos de la segunda mitad del siglo
251
XIX funcionaban como un macrosistema técnico que concentraba
todas las innovaciones de la modernidad; cumpliendo también con los
requisitos de una nueva sociabilidad. Las dos funciones resultaban
compatibles (GARCIA, 1999, p. 16).
O espaço público pode ser considerado como aquele espaço que é muito mais do
que um receptáculo e a arquitetura muito mais do que um objeto na espacialidade das
nossas cidades. A nova urbanidade, como forma de vida dependente do fluir
contemporâneo, carece de um espaço aberto e acessível para a sociabilidade, que se
faz e desfaz na deriva dos encontros, das situações e das apropriações transitórias dos
seus sujeitos; ou seja, de um espaço que é mais da urbs do que da polis, tal como
defende Delgado (2011, p. 8), apesar de este ser também o espaço onde “los individuos
y los grupos definen y estructuran sus relaciones con el poder, para someterse a él,
pero también para insubordinarse o para ignorarlo mediante todo tipo de
configuraciones autoorganizadas.”
Delgado (2011) utiliza-se dos trabalhos de Lyn H. e John Lofland (1984, 1985),
onde estes mostram que quando se fala em espaço público, se refere a áreas de uma
cidade, onde geralmente todas as pessoas têm acesso legal, abrangendo-se às ruas da
cidade, seus parques, seus lugares de acomodação do público, além dos edifícios
públicos e das zonas públicas de edifícios privados. O espaço público deve ser
distinguido do espaço privado, em que este acesso pode ser objeto de restrições legais.
No fundo, muitos dos espaços eleitos por esta noção de espaço público remetem
para o conceito proposto por Marc Augé de “não-lugares”, ou seja, espaços marcados
por relações transitórias e anônimas, espaços promovidos à individualidade solitária
(AUGÉ, 1994). Apesar de neste tipo de espaços se estar, essencialmente, perante
“interações não-focalizadas”, não se deve descurar o fato destas apresentarem formas
específicas de troca e coexistência.
A passagem da noção de espaço público a “espaço do público” coloca a questão do
estatuto do espaço comum. O espaço público é uma determinação político-jurídica,
mas também um produto do uso social, ou seja, existem espaços públicos inacessíveis
ou proibidos e outros, que não são juridicamente públicos, mas têm um uso coletivo
intenso.
A noção de público não é, pois, uma qualidade intrínseca a um espaço, mas sim
uma construção social e política que resulta da combinação de vários fatores,
nomeadamente dos usos aí confinados; do sentido que é atribuído por um determinado
grupo social; da acessibilidade; da tensão entre o estrangeiro/anônimo e o
reconhecimento/reencontro; da dialética entre proximidade e distância física e social
(CASTRO, 2002).
Não parece demais insistir que perante os desafios que hoje se colocam na
abordagem dos espaços é importante relembrar que “o espaço público é um desafio
global à política urbana: um desafio urbanístico, político e cultural, referido a toda a
cidade” (BORJA, 2000, p. 84). Ainda o autor alerta, assim, para o fato, de o espaço
público, independentemente da escala do projeto urbano, deve organizar um território
capaz de suportar diferentes usos e funções e não se ignorar que ele é também espaço
de expressão coletiva, da vida comunitária, do encontro, ou seja, uma questão de
vontade política e de respeito pelos direitos do cidadão. É, ainda, um desafio cultural,
na medida em que é um dos melhores indicadores dos valores urbanos predominantes
252
(BORJA, 2000).
O espaço público é o espaço da sociedade, o espaço político como refere Hannah
Arendt (1972), e nestes contornos é necessariamente um espaço simbólico, pois opõe-
se e responde a discursos dos agentes políticos, sociais, religiosos, culturais,
intelectuais que constituem uma sociedade. É, portanto, antes de mais um espaço
simbólico, que requer tempo para se formar, um vocabulário e valores comuns, um
reconhecimento mútuo das legitimidades; uma visão suficientemente próxima das
coisas para discutir, contrapor, deliberar. Não se decreta a existência de um espaço
público da mesma maneira que se organizam eleições. Constata-se a sua existência. O
espaço público não é da ordem da vontade. Simboliza, simplesmente, a realidade de
uma democracia em ação, ou a expressão contraditória das informações, das opiniões,
dos interesses e das ideologias.
Ainda pode-se dizer que o espaço é constituído por meio das relações sociais, do
trabalho, e assim, o espaço é social. Ele é o receptáculo das ações humanas, de
realização do homem, construído através do tempo. À medida que o homem produz,
ele produz espaço. O espaço é, assim, um verdadeiro campo de forças cuja aceleração
é desigual. Desigual, pois os elementos que impõem essa aceleração e que animam as
categorias do espaço, como as infra estruturas, as instituições, o meio ecológico, e o
homem em si, o fazem conforme suas necessidades e possibilidades. Esses elementos
fazem parte de um objeto de estudo da geografia que deve ser “considerado como um
conjunto indissociável de que participa, de um lado, certo arranjo de objetos
geográficos, objetos naturais e objetos sociais, e de outro, a vida que os preenche e os
anima” (SANTOS, 1996, p. 26).
Entende-se que a cidade ideal é aquela constituída por espaços de diálogo e de
encontro das diversidades, sem os quais não se consegue conquistar a identidade
individual e coletiva, não se desenvolvem as potencialidades e nem o sentido da
existência.
Este trabalho insere-se no contexto da sociedade urbana contemporânea, pautada
pela velocidade da informação e do consumo, pela ausência de pausas, pelo tempo
regido pelo trabalho. Porém, neste universo complexo é necessário assegurar alguns
direitos: o direito aos espaços da cidade ‒ que está muito longe da liberdade individual
de acesso a recursos urbanos ‒, o direito à qualidade de vida, de morar, de lazer e de
assegurar um futuro para as sociedades que virão. Pretende-se assim, além de
descobrir características espaciais e ambientais dos espaços, discutir a respeito das
qualidades humanas destes locais, por meio da percepção, da memória, da história e
da apropriação, contribuindo para o desenvolvimento social e conservação a fim de
cumprir o desafio de atender às expectativas da sociedade sem comprometer o
ambiente e as políticas de espaços públicos abertos.
3 RELATO DE EXPERIÊNCIA
A inspiração para a elaboração do livro “Vozes dos Silêncios de Umuarama” foi a
poesia de João Cabral de Mello Neto, O Rio. É surpreendente a genialidade da ideia do
escritor: um poema documental sobre a trajetória do rio Capibaribe, de sua nascente
no sertão, à foz na cidade do Recife, escrito em primeira pessoa. É o rio que conta suas
dificuldades em se formar, as mazelas sociais por onde passa e seu encontro com as
águas do mar. Além de todo rigor poético, a beleza do conteúdo é inatingível. O rio se
253
compara aos retirantes do sertão que, ao chegar no mar, encontram seu fim, mas
começo de outra viagem. O rio também narra questões sociais, econômicas e
ambientais muito presentes nas regiões urbanas, tanto na época em que o poema foi
escrito (1953) como nos dias de hoje.
Com essa ideia em mente, e como docentes de Estudos Ambientais Urbanos e
Paisagismo, em um ano totalmente insólito pela pandemia de Covid-19, as autoras
propuseram aos estudantes uma atividade integrada de ensino-pesquisa-extensão que
contemplasse suas disciplinas. Sabe-se que as mudanças globais das cidades, que hoje
se vivencia, geraram uma nova atitude na sua compreensão. A transformação da sua
estrutura econômica e social, a sua organização espacial e a sua configuração formal
marcam a produção de novas territorialidades. Neste contexto, os espaços ganham um
novo significado, político, social e estrutural (LEITE; AWAD, 2012; GEHL, 2015).
Nesse sentido, tomou-se como estudo de caso os espaços públicos abertos da
cidade de Umuarama-PR, tendo como metodologia o walkthrough e o registro
fotográfico. Para o alcance dos objetivos deste trabalho, adotou-se como ferramenta
metodológica o registro por meio de imagens associadas à percepção dos autores dos
capítulos.
Partindo destas premissas e de elementos e teorias vistos em sala de aula, cada
estudante deveria pesquisar e escrever até duas páginas da história de um local de
Umuarama (PR), ressaltando a importância desse lugar no contexto cultural da
cidade. Alguns locais foram sugeridos pelos professores, mas os estudantes ficaram
livres para investigar outros ambientes que quisessem retratar. A orientação era lançar
luzes ao processo de urbanização e seus efeitos ambientais, ao urbanismo social, à
guetização da cidade, à acessibilidade e mobilidade e às leituras do espaço urbano,
ampliando o debate sobre a urbe. Nem todos os espaços públicos, sejam de lazer,
sejam de cultura, necessariamente estão condicionados a locais com programas e usos
predefinidos. Os sentidos podem ser explorados de muitas formas no ambiente
urbano, e as operações sensoriais dos usuários imprimem uma identidade deles com o
lugar, tornando-o um pouco “seu lugar”.
Em Umuarama, assim como em muitas cidades do Brasil, ainda não há um museu
ou centro histórico, e muitas informações são obtidas apenas por registro oral de seus
pioneiros e moradores, relacionadas com uma inscrição emotiva e de grande
intensidade, ou em leis municipais, ou em documentação jornalística. Portanto,
organizar essas informações não foi tarefa fácil.
Ainda por meio destes registros orais e das imagens dos lugares, revela-se a
necessidade e importância dos usos habituais dos espaços públicos e refletem um
processo de atribuição de sentidos ao ambiente urbano. Nesta relação entre cognitiva
de espaços e cidade, as imagens e os textos podem resgatar imaginários com
temporalidade, memórias de infância e brincadeiras, reestruturadas e redefinidas de
modo que os sentidos presentes e latentes sejam compreendidos, observados por meio
da retórica, a fim de estimular a compreensão e os usos dos ambientes urbanos.
A vida cotidiana acontece na cidade e é ela quem deve proporcionar condições
favoráveis e acessíveis para que, em determinado momento, as pessoas possam
conviver e ter experiências urbanas diretamente relacionadas aos usos de seus
espaços. O espaço público agrega e oferece a formação de uma cultura, seja ela social
ou política, mas que se articule com a formação estrutural e representativa que este
254
espaço público tende a oferecer, contribuindo de modo significativo na qualidade de
vida do indivíduo.
Não parece demais insistir que perante os desafios que hoje se colocam na
abordagem dos espaços é importante relembrar que “o espaço público é um desafio
global à política urbana (...), referido a toda a cidade” (BORJA, 2000, p. 84).
Após a laboriosa pesquisa e coleta dos fatos, os estudantes deveriam “traduzir” os
textos para apresentá-los à comunidade de uma forma mais poética, mais lúdica, mais
criativa e com maior proximidade do leitor. E esse foi o grande desafio: como usar a
pedra filosofal da inteligência para transmutar o ouro da redação científica em metais
triviais da extensão para que a informação pudesse ser acessível e afetiva?
Essa provocação foi aceita pelos estudantes do 3º e 4º ano de Arquitetura e
Urbanismo do IFPR Campus Umuarama, porém a mesma atividade poderia ser
aplicada em outros cursos, como Engenharia Civil e Engenharia Ambiental.
Neste caso específico, as produções geraram um registro histórico original da
cidade que os acolhe, dando vozes a ambientes por vezes esquecidos, marginalizados
ou desvalorizados pela vida corrida dos seus habitantes, salvo ainda o “tempo”
flagrado nas imagens que revelam uma apropriação do espaço para além de sua
destinação primária. Além da expressão escrita, por vezes em prosa, por vezes em
versos, os discentes fizeram expressivas reproduções fotográficas de seu olhar sobre o
território de estudo.
Todo o material foi organizado, submetido e aceito para publicação como e-book
pela Editora do IFPR, estando atualmente no prelo. Ao todo, o livro possui 21
capítulos que contam a história da própria cidade, de dois distritos, de cinco bairros
afastados do centro, de dois bosques, de um parque, de dois lagos, de seis praças e de
dois prédios de relevância histórico-cultural. O Quadro 1 expõe a estrutura do ebook,
os autores dos capítulos e os estilos de escrita.
Como resultados, os capítulos do e-book mostram histórias de fragmentos, de
espaços, de lugares que por hora estavam esquecidos e marginalizados, mas que pelo
resgate dessas memórias, voltam a assegurar alguns direitos, principalmente do
reconhecimento desses ambientes, de ressaltar sua importância no contexto cultural e
histórico da cidade. Assim, essas vozes que ecoam neste momento contam suas
histórias, trazem uma reflexão para compreensão de sua evolução em meio a esta
sociedade contemporânea.
Por meio dos resgates das memórias e registros das imagens, pôde-se pensar sobre
esses espaços como um recurso, um produto e como uma prática social. Importa
igualmente refletir sobre a apropriação, a utilização, suas transformações e as
produções de espacialidades inéditas, em correspondência com distintos projetos
culturais emergentes e em seu apogeu. A nova urbanidade, como forma de vida
dependente do fluir contemporâneo, carece de espaços abertos, ambientalmente
respeitados e acessíveis para a sociabilidade, que se faz e desfaz na deriva dos
encontros.
Ainda pode-se dizer que todas essas histórias revelaram a significação de espaços
que são constituídos por meio das relações sociais. São receptáculos das ações
humanas, de realização do homem, construídas através do tempo. À medida que o
homem produz, ele produz estes espaços, que se tornam um verdadeiro campo de
255
forças cuja aceleração é desigual. Desigual, pois os elementos que impõem essa
aceleração e que animam as categorias destes locais, como as infra estruturas, as
instituições, o meio ecológico, e o homem em si, o fazem conforme suas necessidades
e possibilidades. E essas vozes, até então em silêncio, revelaram aquilo que
constituem ou deveriam constituir uma fonte de forte representação pessoal, cultural,
ambiental e social, pois trata-se de espaços simbólicos onde se opõem e se respondem
aos discursos que constituem esta sociedade.
Quadro 1 – Capítulos do Ebook “Vozes dos Silêncios de Umuarama”, seus autores
e estilos.
Capítulo Autor/a Estilo de escrita
Prefácio Juliana Cavalaro Camilo Prosa
Umuarama Máriam Trierveiler Pereira Prosa
Distrito de Roberto Silveira Fabiana Zinerman Lopes Prosa
Distrito de Lovat Leonardo Gouveia Biazini Poesia
Bairro Sonho Meu 1 Gustavo Félix de Lima Prosa
Bairro Sonho Meu 2 Luana de Oliveira Pinheiro Poesia
Bairro Jardim São Cristóvão Larissa Pazzin Sanches Prosa
Bairro Parque Laranjeiras Tatiana Pereira de Souza Prosa
Bairro Parque Jabuticabeiras Isis Gabrielle Bonifácio Neves Prosa
Bosque do Índio Giovanna Gabriely Mendes Barbosa Prosa
Bosque Uirapuru Jyan Gustavo Oliveira Prosa
Parque dos Ipês Felipe Toledo Barros Silva Prosa
Lago Aratimbó Milena Luiza Schaurich Alves Prosa
Lago Tucuruvi Lucia Adriane de Mello Prosa
Praça do Ceprev Kelvin Faneco Ornelas Prosa
Praça Tamoio Maria Eduarda Pereira Nunes Prosa
Praça Sete de Setembro Caroline de Andrade Schroder Prosa
Praça da Bíblia Beatriz Pinheiro Beserra Prosa
Praça Xetás Gabriela Paião Schiapati Poesia
Praça Arthur Thomas Bruna Carvalho de Souza Prosa
Prédio do IBC Guilherme Nishiyama Uliana Prosa
Centro Cultural Vera Schubert Bruna Janaína Cavalcante Prosa
Posfácio Juliana Cavalaro Camilo Prosa
Fonte: Autoras, 2022.
Cada espaço pôde contar sua história, sua trajetória, seus personagens e suas
particularidades, que paulatinamente foram sendo resgatadas. Portanto, conseguir
ouvir e ver um espaço modifica não somente o lugar, mas transforma o sujeito. As
apropriações e improvisações dos espaços definem a legitimação do que foi projetado.
As experiências dos espaços pelos habitantes, passantes ou errantes reinventam os
espaços do cotidiano.
256
Os espaços públicos podem ser projetados, podem ser funcionais, mas deve-se
considerar que seu uso efetivo se dá pelo valor a ele atribuído pela sociedade que o
utiliza. Os espaços públicos abertos são muito importantes num bairro e numa cidade
de modo geral, pois além de melhorar a qualidade de vida do bairro (FARR, 2013,
p.168), promovem melhorias na qualidade do ar, criam espaços sombreados,
contribuem para a redução do calor (evapotranspiração) e proporcionam à sociedade
um espaço de convivência social.
Além desse precioso resultado, percebeu-se ainda que, mesmo em um ano
incomum, pandêmico, os estudantes se motivaram para o aprendizado, sendo
protagonistas como pesquisadores e autores de capítulos de um livro, além de ser uma
proposta significativa e emblemática a partir de uma reestruturação dos espaços,
marcados pela memória de seus pioneiros e moradores, uma verdadeira ação de
transformação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Devido às constantes transformações tecnológicas e sociais do novo paradigma, é
urgente a inovação na educação formal em instituições de ensino para que haja
condições de ocorrer a transdisciplinaridade. Assim, a atividade educacional
apresentada mostrou-se viável para ambas situações, pandêmica e não-pandêmica, e
pode ser replicada em outras localidades, sejam urbanas ou rurais, habitáveis ou
inóspitas, e em outros cursos e outras modalidades de ensino superior.
Este livro também adotou as imagens como registro de uma percepção individual,
convidando o leitor a olhar atentamente para o cotidiano retratado e a se posicionar
diante delas. Buscou-se flagrar momentos e características dos lugares, não visíveis à
primeira vista, mas que qualificam e interferem de algum modo no comportamento do
usuário.
Embora exista uma cumplicidade entre o espaço público e a sociedade, ela nem
sempre é percebida, camuflando muitas vezes qualidades ambientais e
fenomenológicas que afetam a qualidade de vida do indivíduo.
Como atualmente a vida acontece majoritariamente na cidade, é ela quem
proporciona condições favoráveis e acessíveis para as experiências urbanas,
diretamente relacionadas aos seus usos, à sua formação cultural, social, política e
ambiental, mas que também se articula com a formação estrutural e representativa que
estes espaços tendem a oferecer, contribuindo de modo significativo na qualidade de
vida da comunidade. São garantias do direito à cidade.
Perceber, lembrar e se apropriar pertencem a um mesmo conjunto de ações. Um
espaço ou um percurso, ao ser percebido, carrega consigo lembranças, que se
misturam com milhares de experiências passadas e que trazem à tona, imagens e
memórias.
E a memória “é a vida, sempre carregada por grupos vivos e, nesse sentido, ela está
em permanente evolução, aberta à dialética da lembrança e do esquecimento,
inconsciente de suas deformações sucessivas, vulnerável a todos os usos e
manipulações, susceptível de longas latências e de repentinas revitalizações” (NORA,
1993, p. 9). A memória é um elo vivo do presente, são discursos escondidos e
entrelinhas que viram história.
257
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258
DESENVOLVIMENTO DE ATIVIDADES DE
ESTÁGIO SUPERVISIONADO NO AMBIENTE
DA CONSTRUÇÃO CIVIL DURANTE A
PANDEMIA
RESUMO. Este artigo tem como objeto de estudo o estágio dentro da área da
construção civil e suas implicações após a chegada da pandemia do Covid-19.
Durante o biênio de 2020 e 2021, grande parte das profissões tiveram que se
reinventar. Novas formas de trabalhar foram adotadas, por conta das medidas
restritivas para evitar a propagação do vírus. O sistema de trabalho a distância e o uso
da internet foram vitais, principalmente para o mercado da construção civil. O
superaquecimento no setor da construção, exigiu maior mão de obra para execução de
projetos e em um formato totalmente digital. Muitos escritórios foram em busca de
estagiários em modo remoto, no intuito de atender a grande demanda. A procura por
um perfil jovem, que dominasse softwares de projeto, ágil para a apresentação e
propagação do trabalho por mídias sociais, foi intensa. Baseado em dados
extremamente atuais e na aplicação de formulário com um grupo de acadêmicos dos
cursos de engenharia civil e arquitetura e urbanismo, este trabalho procura dar início a
uma análise dos prós e contras que esse período gerou na prática profissional
proporcionada pelo estágio no modo remoto. É sabido que a pandemia mudou o
comportamento social, a dinâmica profissional, dentro de empresas, escritórios e que
antigas práticas estão sendo revistas.
259
1 CONSTRUÇÃO CIVIL NO CENÁRIO DA PANDEMIA
Esta é uma pesquisa que tem como objeto de estudo o estágio supervisionado
durante o período pandêmico. Estabeleceu-se como objetivo geral deste artigo
analisar o desenvolvimento de atividades de estágio supervisionado no ambiente da
construção civil durante a pandemia. Esta análise foi aplicada entre estudantes dos
cursos de Arquitetura e Urbanismo e Engenharia Civil de uma instituição privada de
ensino superior, na cidade de Campo Grande, MS.
A pandemia do Covid-19 evidenciou muitas mudanças na forma de desenvolver as
atividades de trabalho, principalmente aquelas que podiam ser executadas via
plataformas digitais com os serviços de internet. O intuito foi evitar a aglomeração de
pessoas em um mesmo ambiente, mantendo as regras de distanciamento social.
Neste cenário a construção civil possui um contingente de trabalhadores
considerável e um complexo sistema de atividades com muitas variáveis de risco que
geram certa dificuldade na gestão de pessoas e processos. Segundo a CBIC (2020)
este campo de trabalho se viu obrigado a se adaptar a esse novo panorama, propondo
novas estratégias e remodelando as rotinas de trabalho do setor, na tentativa de evitar a
proliferação do vírus nos canteiros bras e nos seus respectivos escritórios.
Pereira e Azevedo (2020) citam que com a necessidade do isolamento social,
houveram muitos impactos, sendo o principal, a necessidade de paralisação de
atividades, o que acarretou a dificuldade de circulação e transporte da população e, da
possibilidade do contágio do Coronavírus, especialmente nas capitais. Com tudo isso
os canteiros ficaram paralisados por pelo menos duas semanas, como forma de
dificultar o contágio, os escritórios de projeto passaram a trabalhar remotamente e,
com isso o novo normal, passou a minimizar tudo que já era obsoleto e rotineiro na
indústria da construção civil.
Dentre as atividades rotineiras no canteiro de obras, tem-se o estágio
supervisionado obrigatório, que segundo o Art. 11. da Resolução CNE/CES nº 2, de 24
de abril de 2019, faz parte das práticas reais que compõem a boa formação do
engenheiro. Este ocorre em organizações que desenvolvam ou apliquem atividades de
Engenharia, de modo que os profissionais dessas organizações, se envolvam
efetivamente em situações reais que contemplem o universo da Engenharia.
Cazaque e Volpato (2013) também descrevem sobre o estágio supervisionado
como uma atividade de complementação acadêmica estabelecida pela Lei 11.788 de
25 de setembro de 2008. Sendo desenvolvido de forma individual, havendo
concomitância entre aula e atividade profissional.
Como as demais atividades desenvolvidas no canteiro de obras, a prática do
estágio supervisionado também sentiu o impacto inicial da paralisação dos trabalhos
in loco, mas rapidamente se reestruturou, sendo segundo Gomes e Longo (2020) a
adoção de medidas alternativas para as pessoas que não trabalham nas atividades de
produção, como o home office.
Muitos escritórios e empresas se desfizeram da locação de espaços para suas
sedes, acabaram adotando o formato de trabalho remoto por completo. A sistemática
geral consistiu em encontros online, via conferência com o grupo, onde eram feitas as
designações de tarefas e prazos. Os trabalhos foram compartilhados através do
260
sistema de nuvens e o exaustivo uso da ferramenta WhatsApp, agilizando a
comunicação, dúvidas e até possíveis tutoriais explicativos.
Os avanços tecnológicos moldam cada vez mais os modelos, as formas
e os padrões de trabalho e, como consequência, influenciam os gostos,
as atitudes e as decisões. Estamos a falar um conceito de negócios
inovador, 7 criador, diferenciador, como temos verificado. Os centros
de negócios, como todas as franjas produtivas, alavancam-se cada vez
mais apoiados nas novas ferramentas. Para que um centro de negócios
evolua e os seus serviços se tornem ainda mais personalizados e
eficazes é fundamental acompanhar o desenvolvimento tecnológico. A
gestão vê-se confrontada com o aumento da qualidade, exigida cada
vez mais pelos clientes deste tipo de serviço. (QUARESMA;
GONÇALVES, 2013, p. 33).
Neste formato compreende-se que a tecnologia foi importantíssima para que as
coisas pudessem funcionar, exigindo uma adaptação da empresa e dos prestadores de
serviço. Sendo assim toda a parte de produção, orçamento, projeto, pôde ser realizada
a partir do computador pessoal do funcionário ou estagiário. Para os encontros com
clientes ou fornecedores, situações mais formais, muitos fizeram uso dos espaços
Coworking, que nada mais são que espaços criados para locação temporária de
estações de trabalho.
Segundo Rocha (2020) várias construtoras estão reestruturando seus planos de
expansão e políticas de home office, e isso com certeza poderá gerar uma redução na
demanda por espaços corporativos simultaneamente uma outra alteração irá ocorrer
que poderá impactar na caracterização de unidades residenciais para o mercado
imobiliário, já que morar e trabalhar em um mesmo espaço poderá ocorrer com cada
vez mais frequência.
Para isso se faz necessário um espaço adequado para o trabalho dentro de casa e
muitas adaptações foram feitas durante o período pandêmico. Assim como
Professores fizeram de seus quartos suas salas de aula, muitos funcionários e
estagiários tiveram que adaptar espaços como mesa de jantar em estação de serviço.
Devemos considerar que este não é um modelo adequado, pois sabemos que
ergonomicamente a estação de trabalho é fator importante para a saúde do trabalhador,
evitando fadiga ou sequelas posturais. Portanto, adaptações no modelo Home Office
ou a busca de locais compartilhados de estações de trabalho, pode ser a solução para
essa nova modalidade de serviço.
Diversos estudos têm revelado que locais de trabalho com condições ambientais
favoráveis, ou seja, que atendam às necessidades de seus usuários aos níveis
fisiológico e simbólico, exercem impactos positivos sobre os mesmos, resultando em
melhor desempenho e maior produtividade. (FONSECA, 2004).
Importante salientar que a empresa que adota o modelo remoto de trabalho,
deveria fornecer as ferramentas necessárias para o serviço, como computadores e
programas da área, com as liberações devidas de software.
1.1 A prática do estágio supervisionado durante a pandemia
Segundo Kuazaqui e Volpato (2013) considerando a importância dos ativos
humanos para as organizações, e o papel das instituições de ensino superior brasileiras
261
para a construção do perfil de seus alunos, sobretudo, por meio do Programa de
Estágio. Supervisionado, favorecer a empregabilidade do formando no mercado de
trabalho, na medida em que promove o melhor desenvolvimento de atitudes,
habilidades, capacidades e competências em seu primeiro emprego no decorrer de
toda a sua vida profissional.
A compreensão do estágio curricular como um tempo destinado a um processo de
ensino e de aprendizagem, uma oportunidade para refletir, sistematizar e testar
conhecimentos durante o curso de graduação (não sendo, simplesmente, uma
experiência prática) é reconhecer que, apesar da formação oferecida em sala de aula
ser fundamental, ela sozinha não é suficiente para preparar os alunos para o pleno
exercício de sua profissão (ROSA et al., 2012).
Dentro da construção civil é sabido que as atitudes dos trabalhadores, dentro deste
contexto também os estagiários, o porte da empresa, as políticas de saúde e segurança,
treinamentos em geral afetam diretamente no desempenho da saúde e na
disseminação de vírus, assim, algumas orientações de autoridades de saúde foram
consideradas para melhor adequação dos trabalhadores nas obras no cenário de
pandemia (CBIC, 2020).
Dentre as principais medidas, houve a restrição da circulação de pessoas, sendo
tanto trabalhadores como estagiários, avaliando a possibilidade de home office
quando possível. A longo prazo, compreende-se que certas orientações podem ser
absorvidas e previamente planejadas.
A adoção de softwares como BIM, que já estavam sendo incorporados pelo
mercado da construção civil, e a adoção de modelos de construção que permitam
maior organização do canteiro de obras e racionalização do processo de edificação
também devem ser incentivados.
Na média dos últimos 10 anos, 49,46% da Formação Bruta de Capital
Fixo da economia foram realizados pela Construção. Ou seja, o setor
foi responsável por quase 50% dos investimentos no País nos últimos
10 anos (CBIC, 2021).
Portanto, não há como negar que o setor da construção civil está extremamente
aquecido e possui participação relevante e ativa na economia nacional. Mesmo com
poucos estudos voltados para a análise dos estagiários como mão de obra ativa, sabe-
se na prática dentro das universidades que a demanda por estagiários aumentou
substancialmente. É muito difícil encontrarmos alunos disponíveis para estágios após
o terceiro semestre de curso, desde a metade de 2021 até a data atual.
2. MATERIAIS E MÉTODOS
Conforme a fundamentação teórica sendo fator inerente ao objeto de estudo com
tipologia exploratória e descritiva, para atender aos objetivos específicos propostos.
Para o objetivo específico (1) levantar informações sobre o mercado da construção
civil no período de pandemia, foram consultadas fontes primárias e secundárias,
através de sites, revistas, artigos relacionados às áreas da construção civil, engenharia,
arquitetura e economia. Foram consultados dados do IBGE - Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística, relacionados ao PAIC - Pesquisa Anual da Indústria da
Construção Civil. Fontes como o CBIC - Câmara Brasileira da Indústria da
262
Construção e SINDUSCON MS - Sindicato da Construção Civil de Mato Grosso do
Sul, para busca de indicativos atualizados em âmbito Nacional e Regional.
Para o objetivo específico (2) analisar o comportamento e as consequências do
estágio em modelo home office, este artigo propôs a aplicação de formulário durante o
mês de abril de 2022 com os estudantes dos cursos de engenharia civil e arquitetura e
urbanismo da Universidade Católica Dom Bosco.
O formulário foi estruturado no Google Forms, que é um aplicativo de
gerenciamento e pesquisa, disponível na plataforma de aplicação web, desenvolvido
pelo Google Corp, com 11 questões, sendo 10 questões objetivas com alternativas de
respostas, que tiveram como função levantar dados sobre a caracterização do período
de estágio, as mudanças ocorridas nessa prática durante a pandemia, assim como o seu
desenvolvimento do ponto de vista do estudante e, 01 questão discursiva, para que
pudesse ser observado as dificuldades enfrentadas pelo aluno de uma forma mais
aprofundada.
A divulgação da pesquisa foi feita via os grupos de WhatsApp todos líderes das
turmas dos dois cursos analisados, para que fosse possível abranger o maior número
possível de alunos em período obrigatório ou não de estágio.
A compilação dos dados foi feita na forma de gráficos de setores (gráfico de pizza)
gerados pelo próprio aplicativo, para que a análise fosse feita de forma precisa sobre as
questões objetivas, restando a análise específica sobre a questão aberta, para o
embasamento da discussão dos resultados obtidos.
3. RESULTADOS OBTIDOS E DISCUSSÕES
Dos respondentes 75% estão fazendo estágio supervisionado extracurricular e
25% em estágio supervisionado obrigatório. Do total, 55% são estudantes do curso de
arquitetura e 45% do curso de engenharia civil e o maior número começou a estagiar a
partir do 3° semestre do curso. A grande maioria domina softwares como Autocad e
Revit. No quadro 01 abaixo estão descritos os benefícios e as dificuldades enfrentados
na pandemia pelos estudantes que estavam estagiando em home office, sendo a maior
dificuldade ter o programa licenciado na sua máquina pessoal, e o melhor benefício a
redução de custos que envolve a prática presencial.
Quadro 01 - Benefícios e dificuldades no estágio remoto (continua).
Maiores dificuldades Melhores benefícios
Licença de softwares cara Ganho de tempo de deslocamento
Pequeno espaço físico em casa Redução de gastos com transportes
Ergonomia da estação de trabalho Redução de gastos alimentares
Entendimento da rotina da empresa Organização da relação estágio/faculdade
Disciplina de horários pessoais
Fonte: Autoras, 04/2022.
Durante a pandemia 77% dos alunos entrevistados estavam estagiando no modo
remoto. Eles fazem apontamentos dos prós e contras sobre o estágio a distância,
relatando que no início foi bastante difícil não ter o profissional próximo para explicar
sobre representações técnicas, atender aos padrões do escritório. Dúvidas também
263
relativas a ferramentas dos softwares, coisas bastante simples, mas que naquele
momento dificultou o rendimento na execução das tarefas.
Um ponto importante a se observar é que mesmo com as dificuldades naturais da
ausência de um supervisor presencial durante o trabalho remoto, as atividades de
estágio na construção civil não pararam e o acadêmico pode cumprir as suas
obrigações para com a empresa e suas atividades práticas da graduação e finalizar o
seu curso sem prejuízo de tempo.
Acreditam que se houver uma boa organização por parte do estagiário e um
computador capacitado, realizar o trabalho a partir de casa não é um problema.
Relatam que os pontos positivos é que conseguem se concentrar melhor, não precisam
ter gasto com locomoção. Porém existe problema do ambiente em home office não ser
ergonomicamente adequado para o trabalho e acabam tendo prejuízos posturais e
cansaço.
A figura 01 a seguir mostra as modalidades de estágios que se apresentam hoje
mesmo passado as restrições de afastamento social do período pandêmico, o que leva
a crer que a modalidade remota irá continuar dentro da construção civil, o que mostra a
rápida adaptação e a versatilidade das empresas.
Fator interessante a ser ressaltado é que o estágio em modo remoto permite que a
contratação aconteça entre municípios. Escritórios ou alunos de cidades vizinhas
conseguem trabalhar juntos. Outra dificuldade apresentada com a restrição do estágio
apenas presencial, era o horário de entrada e saída, muitos perdiam a vaga pois devido
ao transporte e o horário de saída da aula, não conseguiam chegar no horário.
Figura 1 – Modalidade de estágio supervisionado 2022 A
265
PEREIRA, Lohana Lopes; DE AZEVEDO, Bruno Freitas. O Impacto da Pandemia
na Construção Civil. Boletim do Gerenciamento, v. 20, n. 20, p. 71-80, 2020.
QUARESMA, José G; GONÇALVES, Carlos. Out of the Office. E-Book. Porto:
Ed. Vida Económica, 2013. 222p.
ROCHA, C. COVID-19: CENÁRIO DA CONSTRUÇÃO DURANTE E APÓS A
PANDEMIA. São Paulo. 2020. Disponível em:
<https://www.mapadaobra.com.br/negocios/pandemia-construcao/ >. Acesso em:
26/04/2022.
ROSA, Jeâni Kelle Landre; WEIGERT, Célia; SOUZA, Ana Cristina Gonçalves de
Abreu. Formação docente: reflexões sobre o estágio curricular. Ciência &
Educação (Bauru), v. 18, n. 3, p. 675-688, 2012.
266
O CONHECIMENTO HIDROGEOLÓGICO NO
ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL:
LINHA DO TEMPO A PARTIR DA DÉCADA DE 1970
(1) Geólogo, Doutor em Geociências e Meio Ambiente, Professor Titular aposentado da Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul, g.lastoria@ufms.br
(2) Geóloga, Doutora em Engenharia Civil, Professora Associada da Universidade Federal de Mato Grosso
do Sul e Universidade Federal de Goiás, sandra.gabas@ufms.br
267
1 HISTÓRICO
O Estado de Mato Grosso do Sul (MS) foi criado por meio da Lei Complementar
número 31, sancionada em 11/10/1977. De fato, o Estado foi instalado no início de
1979, ocupando uma área pouco superior a 357.100 km².
Anterior à divisão do antigo Mato Grosso (MT), existem contribuições para a
hidrogeologia, abrangendo o atual MS. Na década de 1960 a PETROBRAS perfurou
11 poços estratigráficos no Pantanal e outros 9 poços na porção sul-matogrossense da
Bacia do Paraná. Outros trabalhos em escala mais regional: Notas preliminares sobre
as águas do sub-solo da Bacia Paraná-Uruguai (Maack,1970); Bacia do Rio da Prata.
Inventário e Análise da Informação Básica sobre Recursos Naturais (OEA,1971);
Recursos Hídricos Subterrâneos da Bacia do Paraná – Análise de pré-viabilidade
(Tese Livre Docência, Rebouças, 1976).
Em 1973, a Companhia de Desenvolvimento do Estado de Mato Grosso-
CODEMAT, estruturou o Setor de Perfuração de Poços, contando com duas
perfuratrizes percussoras a cabo. Prioritariamente, os poços tubulares eram
perfurados em localidades onde não havia viabilidade econômica para operação da
empresa estatal de saneamento, a SANEMAT. Convênio firmado com o
Departamento Nacional de Obras de Saneamento-DNOS, pagava a perfuração,
revertendo em equipamento para extração de água e reservatório.
O final de 1973, completou um ciclo de 10 anos de seca no Pantanal, com grandes
perdas de bovinos. O DNOS contratou a T. JANER, para a perfuração de dezenas de
poços em fazendas no Pantanal, principalmente no município de Corumbá. As
primeiras informações sobre águas subterrâneas no Pantanal, com base nestes poços,
estão no relatório da UNESCO de 1973 “Hydrological studies of the Upper Paraguay
River Basin (Pantanal): Technical Report 1966-1972”.
A empresa HIDROSOMAT foi contratada pela CODEMAT, em meados de 1974,
para perfuração de 30 poços, a maioria no sul do MT, e os outros no oeste, em glebas
rurais sendo implantadas. Muitas localidades, com poços pioneiros construídos
naquele período, são hoje importantes sedes municipais nos dois estados.
Em 1976, a SANEMAT licitou a elaboração do Estudo Global de Viabilidade
Técnica, Econômica e Financeira-EVG, contemplando os “Estudos Hidrogeológicos
de Mato Grosso”. O produto apresentado sobre o tema não atendeu o objetivo,
composto, majoritariamente, por transcrição de mapas, coluna estratigráfica e mesmo
texto, do trabalho de Northfleet, Medeiros e Muhlmann (1969): “Reavaliação dos
dados geológicos da Bacia do Paraná”.
As normas do extinto BNH, relativas à definição do manancial, priorizavam as
águas subterrâneas. Em 1977 a SANEMAT fez um convênio com o Departamento de
Geologia da Universidade Federal de Mato Grosso-UFMT, visando a locação de
poços, utilizando sondagem elétrica vertical-SEV, e acompanhamento da
perfuração/testes dos poços, por equipe de geólogos e estagiários. Cerca de 40 locais
foram contemplados, a maioria no atual MS.
Dois mapeamentos geológicos, em escala de semidetalhe (1:50.000), devem ser
destacados, ambos realizados por meio de Convênio entre o Departamento Nacional
268
de Pesquisa Mineral-DNPM e a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais-
CPRM: Projeto Bodoquena (1976) e Projeto Bonito-Aquidauana (1978).
2 TÓPICOS APÓS A IMPLANTAÇÃO DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL
Com a instalação do primeiro governo do Estado, em janeiro de 1979, foi criada
sua empresa estatal de saneamento, a SANESUL, destacando que, na maioria das
cidades, eram sistemas autônomos municipais. Em meados deste ano foi criado o
Setor de Hidrogeologia, subordinado à Diretoria de Engenharia.
A SANESUL firmou convênio com o Departamento de Águas e Energia Elétrica
de São Paulo-DAEE, objetivando avaliações hidrogeológicas em cerca de 10 cidades,
incluindo a realização de SEVs. Campo Grande, Dourados e Três Lagoas, tinham
indicação, desde o EVG, para captação do Aquífero Botucatu, pois nas três
localidades existem poços da PETROBRAS, indicando a espessura da Formação
Serra Geral sobrejacente. Em Três Lagoas, o estudo mostrou a viabilidade de captação
apenas no Aquífero Bauru, aflorante.
A Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais-CPRM, iniciava em alguns
estados brasileiros, a abertura de poços no Aquífero Botucatu, sendo contratada para
perfuração de 2 poços em Campo Grande e 2 em Dourados. Pelas avaliações do
DAEE, eram previstas vazões de 400 m³/h. Os 4 poços foram executados com
emprego de empresas especializadas em poços de petróleo para injeção do pré-filtro.
Apesar do empenho construtivo, todos os poços produziram vazões de 100 m³/h,
inviabilizando o manancial Botucatu e as duas cidades migraram para a captação
superficial, mantendo o Aquífero Basáltico como complemento ao sistema.
Em 1980, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico publica o primeiro mapa
geológico de Mato Grosso do Sul, escala ao milionésimo. Neste mesmo ano,
Rebouças e Lastoria publicam no 1º Congresso Brasileiro de Águas
Subterrâneas/ABAS, o trabalho “Potencial hidrogeológico do Aquífero Basáltico em
Campo Grande-MS-Brasil”, mostrando a viabilidade do uso deste manancial para
sistemas de abastecimento de água em áreas urbanas. Também neste ano foi perfurado
pelo Consórcio CESP/IPT (PAULIPETRO), o poço estratigráfico Rio Aporé, no
município de Cassilândia, atingindo o embasamento cristalino da Bacia Sedimentar
do Paraná a 3437 metros.
Lastoria e Souza Leite publicaram o artigo “Reavaliação dos recursos hídricos
subterrâneos com utilização de perfilagem geofísica” (Engenharia Sanitária/ABES,
v.20, n.4, 1981). O uso da ferramenta, em poços de 4 localidades sobre o Aquífero
Bauru, proporcionou uma maior produção e menor custo dos poços tubulares,
comparando com outros não perfilados nos mesmos locais. Cidades que já possuíam,
ou estava previsto captação superficial, como Deodápolis, Aral Moreira e Nova
Andradina, passaram a explotar águas subterrâneas.
Nos anos de 1982 e 1983 o Ministério das Minas e Energia-MME, publica os
levantamentos de recursos naturais do Projeto RADAMBRASIL, mapas na escala
1:1.000.000, Folhas Campo Grande, Corumbá e Goiânia. É lançado o Mapa
Hidrogeológico do Brasil (DNPM, 1983).
Mapa Hidrogeologico America del Sur (DNPM, CPRM, UNESCO, 1986).
A SEPLAN/MS (1990), edita o “Atlas Multirreferencial”, contemplando a
269
geologia, com mapa geológico na escala ao milionésimo e texto explicativo.
Na 2ª Reunião Especial da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência-
SBPC (Cuiabá,1995), Fulfaro e Lastoria chamam a atenção para a importância dos
lineamentos estruturais da Bacia do Paraná em Mato Grosso do Sul, no controle do
fluxo subterrâneo. No mesmo evento, Lastoria apresenta uma primeira classificação
para os aquíferos, propondo 7 unidades: Cenozóica (Pantanal); Bauru; Basáltica;
Triássica (Fm. Botucatu/Pirambóia); Paleozóica Superior (Fm. Aquidauana/Ponta
Grossa); Devoniana (Fm. Furnas) e Pré-Cambriana (Embasamento cristalino e meta-
calcários).
Em 1997 o Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia
Legal, publica o Relatório do Plano de Conservação da Bacia do Alto Paraguai-
PCBAP. No contexto da hidrogeologia foram medidos valores da condutividade
hidráulica, elaborado o Mapa de potencialidade de águas subterrâneas da BAP, com
parâmetros hidroquímicos. Neste ano foi realizado em Campo Grande o X Encontro
Nacional dos Perfuradores de poços/ABAS.
O trabalho mais abrangente envolvendo as águas subterrâneas no Estado, foi
realizado pela SANESUL/TAHAL. O Relatório Final foi apresentado em 1998, com
maior detalhamento para Campo Grande e Dourados. O estudo não considera o
Pantanal e apresenta uma divisão em 7 Aquíferos: Bauru; Serra Geral;
Botucatu/Pirambóia; Aquidauana; Furnas; Pré-Cambriano Calcários e Pré-
Cambriano Cristalino. Mapa hidrogeológico na escala ao milionésimo.
Marco legal importante, a Lei nº 2406 editada em 29/01/2002, estabelece a
Política Estadual de Recursos Hídricos. É lançado o Mapa de Domínios
Hidrogeológicos do Brasil (CPRM, 2002).
O livro “Aquífero Guarani: A verdadeira integração dos países do Mercosul”
(Borghetti e Rosa Filho, 2004), traz informações relativas ao Estado.
No Programa UNESCO/OEA para os Aquíferos Transfronteiriços da América, a
Agência Nacional de Águas-ANA, realizou em Corumbá, 2005, o Seminário
Internacional sobre o Aquífero Pantanal (Bolívia – Brasil – Paraguai). Jongman e
EMBRAPA Pantanal publicam em 2005 o Relatório: “Pantanal–Taquari; Ferramentas
para tomada de decisão na Gestão Integrada dos Recursos Hídricos”.
Outro marco legal específico para a hidrogeologia, a Lei Estadual 3.183, de
21/02/2006, dispõe sobre a administração, a proteção e a conservação das águas
subterrâneas de domínio do Estado e dá outras providências.
Em 2006 a CPRM lança o mapa “Geologia e Recursos Minerais de Mato Grosso
do Sul”, escala ao milionésimo, com texto explicativo, incluindo as Águas Minerais e
Termais.
No ano seguinte, 2007, a URUCUM Mineração finaliza o Relatório “Estudos
Hidrogeológicos no Morro de Santa Cruz – Corumbá”.
Com relação ao Aquífero Guarani, MS possui a maior área de ocorrência em
território brasileiro, descrito na “Síntese Hidrogeológica do Sistema Aquífero
Guarani” e “Aquífero Guarani-Programa Estratégico de Ações” (ANA, 2009).
Contemplando a Política Estadual de Recursos Hídricos, foi concluído o Plano
270
Estadual de Recursos Hídricos-PERH/MS (SEMAC, 2010). Com base no mapa
geológico da CPRM de 2006, foi proposto o Mapa Hidrogeológico de MS, dividido
em 8 Sistemas Aquíferos: Cenozóico; Bauru; Serra Geral; Guarani;
Aquidauana/Ponta Grossa; Furnas; Pré-Cambriano Calcários e Pré-Cambriano. Com
base em dados da porosidade efetiva dos Aquíferos, associado às respectivas áreas de
afloramento e índices pluviométricos, foram estimadas suas recargas anuais. Ficaram
definidas 15 sub-bacias hidrográficas como Unidades de Planejamento e Gestão
(UPGs), conforme preconizado na “Lei das Águas” – 9433, de 08/0/1997.
XVII Congresso Brasileiro de Águas Subterrâneas/ABAS, Bonito (2012). Neste
ano de 2012, a CPRM inicia o programa Rede Integrada de Monitoramento das Águas
Subterrâneas-RIMAS e publica 3 Relatórios Diagnósticos: Vol. 12- Aquífero Furnas
nos estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Paraná, Bacia Sedimentar do Paraná;
Vol. 14- Sistema Aquífero Bauru-Caiuá nos estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul
e Paraná, Bacia Sedimentar do Paraná; Vol. 15- Sistema Aquífero Guarani nos estados
de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Paraná, Bacia Sedimentar do Paraná.
Decreto Estadual/MS nº 13.990, de 02/07/2014, regulamenta a Outorga de direito
de uso dos recursos hídricos em seu domínio. O “Manual de Outorga” foi lançado pelo
Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul-IMASUL, em dezembro/2015,
dispondo como volume outorgável por Aquífero, 20% da reserva renovável
estabelecida no PERH/MS. O Órgão adota, como recorte, a área de afloramento de
cada Aquífero por município. Aquíferos confinados não são quantificados, embora
estejam sendo explotados, notadamente o Aquífero Guarani. É relevante destacar que
a responsabilidade técnica nos processos de outorga de uso de água subterrânea, de
acordo com o Manual (IMASUL, 2015), deve ser assinada por geólogo ou engenheiro
de minas.
Sob a coordenação de Gabas e Lastoria, foi montado o Laboratório de Águas
Subterrâneas e Áreas Contaminadas-LASAC (2015), no âmbito do Programa de Pós-
Graduação em Tecnologias Ambientais/UFMS. Neste ano foi realizado em Campo
Grande o I Simpósio de Águas Subterrâneas de Mato Grosso do Sul/UFMS-
IMASUL, discutindo o conflito na captação de água subterrânea em Campo Grande.
Em 2015, a SANESUL concluiu 2 estudos: “Relatório Geo-estrutural e
Hidrogeológico” e “Relatório de Estudo Geofísico através de métodos elétricos
associados em Bonito-MS”, ambos executados pela LÓGICA-Consultoria SAMS.
Dando sequência ao detalhamento do Projeto Guarani, a ANA (2016), divulga o
Relatório Final “Resultados e Estratégias de Proteção do SAG a partir de estudos na
escala 1:50.000 na área piloto de São Gabriel do Oeste-MS”.
Relatório Final do Plano de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica do Rio
Paraguai descreve a hidrogeologia da Bacia do Rio Paraguai (ANA, 2018).
Na revisão e atualização da Carta Geotécnica de Campo Grande, aspectos
hidrogeológicos da área urbana da capital são abordados (PLANURB, 2019).
A Resolução nº 64 do Conselho Estadual de Recursos Hídricos/MS, de
08/12/2020, altera dispositivos da Resolução CERH/MS nº 040, de 03/10/2016,
quanto ao volume considerado como uso insignificante para as águas subterrâneas,
passando para 600 m³/mês. Ficam também dispensados de outorga e sujeitos apenas à
autorização para perfuração de poços, captações coletivas de água subterrânea para
271
atendimento de projetos de assentamentos e demais beneficiários de reforma agrária,
bem como dos territórios indígenas e remanescentes Quilombolas.
Em 2021, o IMASUL publica o primeiro documento relativo à Qualidade das
Águas Subterrâneas do Estado de Mato Grosso do Sul. Relatório de Implantação da
Rede de Monitoramento. O trabalho é baseado em avaliação dos dados das análises
laboratoriais (automonitoramento), referentes aos anos de 2018 e 2019 de 69 poços da
SANESUL e da Concessionária do sistema de abastecimento de Campo Grande -
Águas Guariroba S.A.
Também no ano de 2021, a CPRM publica o Mapa Hidrogeológico da região
urbana e entorno de Campo Grande, escala 1:50.000, com Nota Explicativa.
3 TESES DE DOUTORADO E DISSERTAÇÕES
(1998) - Pinto, A.L. Saneamento básico e suas implicações na qualidade das águas
subterrâneas da cidade de Anastácio (MS). Tese de Doutorado, UNESP/Rio Claro.
(2002) – Lastoria, G. Hidrogeologia da Formação Serra Geral no Estado de Mato
Grosso do Sul. Tese de Doutorado, UNESP/Rio Claro.
(2005) – Castello Branco Filho, H. Distribuição espacial e temporal das
características hidroquímicas das águas subterrâneas do Pantanal do Rio Negro.
Dissertação, UFRJ, Instituto de Geociências, Rio de Janeiro.
(2006) - Raposo Júnior, J.L. Otimização e validação de método para determinação de
pesticidas organoclorados em água de poços empregando MEFS-CG-DCE.
Dissertação, UFMS/CCET/ Pós-Graduação em Química, Campo Grande.
(2007) – Gastmans, D. Hidrogeologia e Hidroquímica do Sistema Aquífero Guarani
na porção ocidental da Bacia sedimentar Paraná. Tese de Doutorado, UNESP/Rio
Claro.
(2007) – Shinzato, M.O. Recursos hídricos subterrâneos no Município de Campo
Grande-MS: aspectos técnicos/jurídicos. Dissert., UFMS/CCET/PGTA, C. Grande.
2007 – Abrão, M.E.A.S. Avaliação da contaminação de águas subterrâneas a partir de
cemitérios: o caso do Cemitério Santo Amaro em Campo Grande-MS: Dissertação,
UFMS/CCET/PGTA, Campo Grande.
(2007) – Souza, A.V.B. Análise da qualidade das águas subterrâneas para fins de
irrigação na Bacia Hidrográfica do Ribeirão Salobra em Terenos, MS. Dissertação,
UFMS/CCET/PGTA, Campo Grande.
(2009) – Enetério, N.G.P. Avaliação da vulnerabilidade do aquífero freático à
contaminação por necrochorume em Bonito-MS. Dissertação, UFMS/CCET/PGTA,
Campo Grande.
(2009) – Pontes. C.H.C. Determinação da Vulnerabilidade do Aquífero Basáltico na
Área do Campus da UFMS, em Campo Grande - MS. Dissertação,
UFMS/CCET/PGTA, Campo Grande.
(2011) – Cavazzana, G.H. Análise da Corrosividade e Incrustação das Águas
Subterrâneas na Região Urbana de Campo Grande-MS. Dissertação,
UFMS/CCET/PGTA, Campo Grande.
272
(2013) - Oliveira, A.C.C. Análise de atributos físicos, químicos e microbiológicos de
poços de monitoramento em área aplicada com vinhaça. Dissertação, UEMS/ Pós-
Graduação em Recursos Naturais, Dourados-MS.
(2013) – Souza, A.A. (2013) - O Aquífero Cenozóico em São Gabriel do Oeste-MS.
Dissertação, UFMS/FAENG/PGTA, Campo Grande.
(2013) – Miranda, C.S. Avaliação da Vulnerabilidade de Aquíferos Livres: Subsídios
para a Gestão dos Recursos Hídricos Subterrâneos. Dissertação,
UFMS/FAENG/PGTA, Campo Grande.
(2014) – Uechi, D.A. Análise da concentração de ferro, manganês, cromo, cobre e
zinco no Sistema Aquífero Bauru em Mato Grosso do Sul. Dissertação,
UFMS/FAENG/PGTA, Campo Grande.
(2014) – Ferraro, A.A. Origem de metais pesados em Aquífero Livre em São Gabriel
do Oeste, MS. Dissertação, UFMS/FAENG/PGTA, Campo Grande.
(2016) – Casadei, J.M. Vulnerabilidade do Aquífero Livre na Bacia Hidrográfica do
Córrego Guariroba, Campo Grande-MS. Dissert., UFMS/FAENG/PGTA, C. Grande.
(2016) - Pahl, C.B.C. Avaliação de indicadores microbiológicos da qualidade de água
de aquífero livre em áreas fertirrigadas com efluente de suinocultura. Dissertação,
UFMS/FAENG/PGTA, Campo Grande.
(2016) – Takahashi, K.M. Análise multitemporal da temperatura da água no Aquífero
Basáltico em Mato Grosso do Sul. Dissertação, UFMS/FAENG/PGTA, C. Grande.
(2017) – Souza, T.A. Hidroquímica aplicada ao estudo de interação entre água
subterrânea e superficial em bacia hidrográfica do centro-oeste brasileiro.
Dissertação, UFMS/FAENG/PGTA, Campo Grande.
(2018) – Cavazzana, G.H. Relação entre a água superficial e a água subterrânea da
Área de Proteção Ambiental do Guariroba, Estado de Mato Grosso do Sul, Brasil. Tese
de Doutorado, UFMS/FAENG/PGTA, Campo Grande.
(2019) - Centurião, T.D. Fauna aquática subterrânea em aquífero livre em área
fertirrigada com efluente suinocultura. Dissertação, UFMS/FAENG/PGTA, C.
Grande.
(2019) – Cardoso, J.M. Avaliação da qualidade da água subterrânea de poços
tubulares outorgados no município de Campo Grande–MS. Dissertação, Faculdade
Engenharia, UNESP/Ilha Solteira.
(2019) – Uechi, D.A. Comportamento de metais pesados em aquífero livre em área
f e r t i r r i g a d a c o m e fl u e n t e s d a s u i n o c u l t u r a . Te s e d e D o u t o r a d o ,
UFMS/FAENG/PGTA, Campo Grande.
4 CAPÍTULOS DE LIVROS
(2005) - Barbiéro, L.; Furquim, S.; Valles, V.; Furian, S.; Sakamoto, A.Y.; Rezende
Filho, A.T.; Graham, R.C.; Fort, M. Natural Arsenic in Groundwater and alkaline
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Groundwater Environment: Biogeochimical interactions. Elsevier Book Series
"Trace metals and other contaminants in the environment", USA.
273
(2011) – Lastoria, G.; Gabas, S.G.; Bergier, I.; Miranda, C.S.; Santos, T.H.L.;
Machado, C.D. A gestão do SAG na borda oeste da Bacia Sedimentar do Paraná no
Estado de Mato Grosso do Sul. In: A gestão do Sistema Aquífero Guarani: um
exemplo de cooperação. Ed. IGc/USP, São Paulo.
(2012) - Ide, C.N.; Gonçalves, F.V.; Lastoria, G.; Val, H.C.; Silva, J.B.; Steffen, J.L.;
Val, L.A.A.; Ribeiro, M.L.; Gabas, S.G.; Broch, S.A.O. Soil and water conservation in
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experience. Ed. University of Aberdeen, Grã-Bretanha.
(2014) – Gabas, S.G.; Lastoria, G.; Cavazzana, G.H. Hydrochemistry Applied to
Water Supply System: A Case Study from a Brasilian Urban Area. In: Engineering
Geology for Society and Territory Urban Geology, Sustainable Planning and
Landscape Exploitation. Ed. Springer, London.
(2017) - Lastoria, G.; Gabas, S.G.; Cavazzana, G.H.; Casadei, J.M.; Souza, T. A.
Potencialidades dos recursos hídricos na Bacia do Córrego Guariroba, município de
Campo Grande-MS In: Geologia Ambiental: tecnologias para o desenvolvimento
sustentável. Ed. Atena, Ponta Grossa.
(2018) - Tcacenco-Manzano, L.M.; Atahyde, C.V.M.; Lau, A.M.P.; Zuqui, A.R.; Rosa
Filho, E.F. Comparativo de parâmetros hidroquímicos de sistemas aquíferos
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Agua Subterránea: Recurso sin fronteras: Química, calidad y contaminación del agua.
Ed. Universidad Nacional de Salta, Argentina.
(2019) - Russi, D.; Gabas, S.G.; Lastoria, G. Monitoramento da água subterrânea para
ensaio de prova de carga em solo basáltico. In: As Engenharias frente a Sociedade, a
Economia e o Meio Ambiente 2. Ed. Atena, Ponta Grossa.
(2019) - Lastoria, G.; Cavazzana, G.H.; Oliva, A.; Gabas, S.G.; Chang, H.K.
Contribuição da geofísica para a hidrogeologia da APA Guariroba, município de
Campo Grande-MS. In: Gestão de recursos hídricos e sustentabilidade. Ed. Atena,
Ponta Grossa.
(2021) - Gabas, S.G.; Lastoria, G.; Uechi, D.A. Inclusion of Indigenous Communities
in Water Resources Management in the Middle West of Brazil: A Proposal. In:
Advances in Geoethics and Groundwater Management: Theory and Practice for a
Sustainable Development. Ed. Springer, Porto.
(2021) - Gabas, S.G.; Lastoria, G.; Uechi, D. A.; Cavazzana, G.H. Importância das
águas subterrâneas para o Estado de Mato Grosso do Sul, Brasil. In:
Responsabilidade social, produção e meio ambiente nas ciências agrárias. Ed. Atena,
Ponta Grossa.
(2021) - Uechi, D.A.; Gabas, S.G.; Lastoria, G. Análise comparativa da concentração
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(2022) - Gabas, S.G.; Dourado, G.F.; Uechi, D.A.; Cavazzana, G.H.; Lastoria, G.
The role of groundwater in economic and social development of Mato Grosso do Sul
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274
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Subterrâneas/ABAS, São Paulo, v. 19, n.01, p. 35-48.
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(2014) - Souza, A.A.; Lastoria, G.; Gabas, S.G.; Machado, C.D. Avaliação da água
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(2015) - Ferraro, A.A.; Gabas, S.G.; Lastoria, G. Origem de metais pesados em
aquífero livre de São Gabriel do Oeste-MS. Geociências, São Paulo, v. 34, p. 801-815.
(2017) - Uechi, D.A.; Gabas, S.G.; Lastoria, G. Análise de metais pesados no Sistema
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(2018) - Goehr, A.P.L.; Barros, S.A.N.O.; Cavalheri, P.S.; Cavazzana, G.H.; Paiva,
L.A. Avaliação da influência da suinocultura na qualidade da água subterrânea em São
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(2019) - Cavazzana, G.H.; Lastoria, G.; Gabas, S.G. Surface-groundwater
interaction in unconfined sedimentary aquifer system in the Brazil tropical west
region. RBRH, v. 24, p. 1-15.
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(2020) - Centurião, T.D.; Silva, W.M.; Gabas, S.G. Is groundwater fauna impacted by
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(2020) - Rodrigues Neto, G.C.; Queiroz, E.V.; Barbosa, J.M.C.; Castro, M.A.H.;
Cavazzana, G.H. Meshless method using fundamental solution applied to
computational simulation of groundwater flow of real aquifers: study case
(Guariroba's APA and Juazeiro do Norte). RBRH, v. 25, p. 1-15.
(2021) - Russi, D.; Lastoria, G.; Cavazzana, G.H.; Gabas, S.G.; Oliva, A. Water table
fluctuation method to estimate the recharge of the free aquifer in the Guariroba river
basin, Campo Grande-MS. Ciência e Natura, v. 42, p. 57-73.
(2022) - Rodrigues, A.C.; Santos, L.R.; Cury, L.F.; Rumbelsperger, A.B. Continental
freshwater carbonate coated grains: oncoids in Quaternary deposits of the Serra da
Bodoquena region, Central-West Brazil. Braz. J. Geol., 52(2): e2021042, p. 1-18.
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(1982) - Lastoria, G.; Sinelli, O.; Hausman, A. Hidrogeologia dos Derrames
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(1984) - Lastoria, G. Avaliação Hidrogeológica da Bacia do Rio Anhanduí - MS. In:
3º Congr. Bras./ABAS, Fortaleza.
(1997) – Jordão, A.M. Estudos hidrogeológicos do MS. SANESUL/TAHAL. 1-
Evolução estrutural e história geológica. In: X Enc. Nac. Perfuradores Poços/ABAS,
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276
(1997) – Jordão, A.M. Estudos hidrogeológicos do MS. SANESUL/TAHAL. 2-
Qualidade de água. In: X Enc. Nac. Perfuradores Poços/ABAS, Campo Grande.
(1999) – Barbosa, M.C.; Do Val, L.A.A.; Lastoria, G. Aplicação do método QC
STORY enfocando como problema os custos de manutenção em poços tubulares
profundos. In: XX Congr. Bras./ABES, Rio de Janeiro.
(2000) – Marques, C.E.; Ide, C.N.; Lastoria, G.; Steffen, J.L. Migração das nascentes
dos cursos d'água em decorrência de alterações no uso do solo, em São Gabriel do
Oeste-MS. In: IX SILUBESA/ABES, Porto Seguro.
(2000) - Lastoria, G.; Sinelli, O.; Chang, H.K. Hydrochemistry of the basaltic aquifer
in Mato Grosso do Sul State, Brazil. In: XXXI International Geological Congress,
Rio de Janeiro.
(2000) - Barbiéro, L.; Queiróz Neto, J.P.; Ciornei, G.; Capellari, B. Geoquímica das
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desafios do novo milênio, Embrapa-Pantanal/UFMS, Corumbá.
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and Field Guide, Victoria Undercover, Benalla, Austrália.
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(2003) - Lastoria, G.; Souza, A.; Paranhos Filho, A.C.; Cunha, G.N.; Klais, T.B.A.;
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(2006) – Peixoto Filho, G.E.C.; Paranhos Filho, A.C.; Lastoria, G.; Teruya Junior,
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(2006) – Lastoria, G.; Sinelli, O.; Chang, H.K.; Gabas, S.G. Importância do Aquífero
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(2007) – Lastoria, G.; Chang, H.K.; Sinelli, O.; Hutcheon, I. Evidências da
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de Mato Grosso do Sul e aspectos ambientais correlacionados. In: XV Enc. Nac.
Perfuradores Poços/ABAS, Gramado.
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(2008) - Lastoria, G.; Souza, A.V.B.; Gabas, S.G.; Souza, A. Qualidade da água do
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(2010) - Tcacenco, L.M.; Rodrigues, J.A.; Assis, F.L.G. O uso do Software Visual
Poços no cadastro de poços tubulares profundos no Município de Campo Grande-MS.
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Cong. Bras. Geologia/SBGeo, Belém.
(2010) - Gabas, S.G.; Souza, A.; Alves, M.M.; Cavazzana, G.H.; Lastoria, G.
Condutividade hidráulica na zona não saturada em área do Assentamento
Campanário, município de São Gabriel do Oeste-MS. In: 45º Cong. Bras.
Geologia/SBGeo, Belém.
(2011) - Gabas, S.G.; Lastoria, G.; Callegaro, M.J.W.; Souza, A.; Miranda, C.S.
Potenciais fontes pontuais de contaminação de água subterrânea na área urbana de
São Gabriel do Oeste-MS. In: II Intern. Cong. of Subsurface Environment, São Paulo.
(2011) - Tcacenco, L.M.; Rodrigues, J.A. Características físico químicas das águas
subterrâneas dos aquíferos sedimentares no município de Campo Grande-MS. In:
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(2012) - Gabas, S.G.; Lastoria, G.; Enetério, N.G.P.; Souza, A.; Hydrogeology and
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(2012) - Lastoria, G.; Enetério, N.G.P.; Gabas, S.G.; Souza, A.A. Contaminação de
aquífero freático por necrochorume em Bonito-MS. In: XVII Cong, Bras./ABAS,
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(2012) - Santos, T.H L.; Miranda, C.S.; Lastoria, G.; Gabas, S.G.; Souza, A.A.
Análise da vulnerabilidade em Aquífero Livre na região de São Gabriel do Oeste-MS.
In: XVII Cong, Bras./ABAS, Bonito.
(2013) - Lastoria, G.; Gabas, S.G.; Souza, A.; Cavazzana, G.H. Uso do Índice de
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subterrânea. In: 13º Simp. Geologia da Amazônia, Belém.
(2013) – Ferraro, A.A.; Gabas, S.G.; Lastoria, G. Impactos ambientais de atividade
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do Sul. In: 14º Cong. Bras./ABGE, Rio de Janeiro.
(2014) - Gabas, S.G.; Lastoria, G.; Cavazzana, G.H. Hydrochemstry applied to water
supply system: A Case Study from a Brazilian area. In: XII IAEG Congress-
Engineering Geology for Society and Territory, Turim-Itália.
(2014) – Casadei, J.M.; Lastoria, G.; Gabas, S.G.; Takahashi, K.M.; Cavazzana,
G.H. Estágio atual na utilização da vinhaça para fertirrigação no Estado de Mato
Grosso do Sul. In: XVIII Cong. Bras./ABAS, Belo Horizonte.
(2014) – Lastoria, G.; Gabas, S.G.; Sant'Anna, R.S.L.; Cavazzana, G.H.; Souza, A.;
Casadei, J.M. Análise quantitativa do potencial hídrico subterrâneo na parte centro-
ocidental do Estado de Mato Grosso do Sul. In: XVIII Cong. Bras./ABAS, Belo
Horizonte.
(2015) - Lastoria, G.; Gabas, S.G.; Cavazzana, G.H.; Casadei, J.M.; Azoia, T.S.
Potencial hídrico da bacia do córrego Guariroba, município de Campo Grande-MS.
In: 15º Cong. Bras./ABGE, Bento Gonçalves.
279
(2015) – Couto, C.B.; Gabas, S.G.; Lastoria, G.; Ferraro, A.A.; Takahashi, K.M.
Influência da irrigação com efluente de suinocultura na qualidade da água subterrânea
em área de afloramento do Sistema Aquífero Guarani, Brasil. In: IV International
Congress of Subsurface Environment, São Paulo.
(2016) – Leite, P.C.; Gesualdo, G.C.; Batista, C.S.P.; Azoia, T.S.; Cavazzana, G.H.;
Casadei, J.M.; Lastoria, G.; Gabas, S.G. Hidroquímica das águas subterrâneas e
superficiais na Área de Proteção Ambiental do córrego Guariroba, Campo Grande-
MS. In: XIX Cong. Bras./ABAS, Campinas.
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7 ESTÁGIO ATUAL
Mato Grosso do Sul possui 79 municípios e vem experimentando um incremento
280
na agroindústria, mas, indiscutivelmente, sua principal vocação ainda é a
agropecuária. Neste cenário, as águas subterrâneas são de fundamental importância
para seu desenvolvimento socioeconômico, tanto nos centros urbanos, como nas áreas
rurais.
Da totalidade dos municípios, 68 são operados pela SANESUL, 10 são sistemas
autônimos municipais e Campo Grande tem uma concessionária – Águas Guariroba.
Em mais de 90% destes sistemas de abastecimento de água, predomina a captação do
manancial subterrâneo. Existem também mais de 80 distritos, dos quais, a quase
totalidade, explota água subterrânea.
É importante destacar que o Estado possui algumas centenas de projetos de
assentamentos de reforma agrária, bem como territórios indígenas e remanescentes
Quilombolas, todos captando água subterrânea.
Embora Mato Grosso do Sul ainda não utilize prioritariamente seus recursos
hídricos subterrâneos para efeito de projetos de irrigação, este manancial é, sem
dúvida, quem garante o abastecimento de água, também, para indústrias, propriedades
rurais e os mais diversos postos de serviços (públicos e privados), distribuídos por
todo seu território.
No Estado, a RIMAS/CPRM construiu e opera 16 poços de monitoramento
(piezômetros), assim distribuídos: 01 no Sistema Aquífero Furnas; 04 no Sistema
Aquífero Guarani aflorante e 11 no Sistema Aquífero Bauru. Todavia, o IMASUL
ainda não implantou o enquadramento das águas subterrâneas, para contemplar o
preconizado na Portaria CONAMA 396/2008.
O cadastro de poços tubulares no Sistema de Informações de Águas Subterrâneas-
SIAGAS (CPRM, 2022), mostra para o Estado um número de 2142 poços.
Com a aprovação da Lei nº 14.026/2020, que atualiza o marco legal do saneamento
básico, é possível utilizar-se de fontes e métodos alternativos de abastecimento de
água, incluindo águas subterrâneas (Art. 45). A instalação hidráulica predial prevista
no § 2º deste artigo, constitui a “rede ou tubulação que se inicia na ligação de água da
prestadora e finaliza no reservatório de água do usuário”. A redação da Portaria
GM/MS nº 888, de 24 de maio de 2021, versando sobre os procedimentos de controle e
de vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de
potabilidade, reforça a possibilidade de uso das águas subterrâneas, como fonte
alternativa de captação.
Atendendo ao disposto na Lei Estadual nº 3.183/2006, em seu Art. 8º (“A
implantação ou ampliação de empreendimentos consumidores de elevados volumes
de águas subterrâneas, classificados ambientalmente como empreendimentos de
grande porte e/ou de potencial poluidor, deverá obrigatoriamente apresentar, para
avaliação da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (SEMA),
estudos hidrogeológicos das disponibilidades hídricas e do não-comprometimento do
aquífero a ser explorado.”), a Concessionária Águas Guariroba contratou empresa
especializada para elaboração do Estudo Hidrogeológico de Campo Grande (no
prelo).
Visando incrementar a gestão das águas subterrâneas, faz-se necessário atualizar o
Plano Estadual de Recursos Hídricos (SEMAC, 2010), considerando o grande
número de informações hidrogeológicas obtidas nas últimas duas décadas. Existem
281
riscos hidrogeológicos apontados no PERH/MS relativos ao Sistema Aquífero Pré-
Cambriano Calcários, que não estão sendo levados em consideração e, certamente
agravados, face ao aumento da explotação, devido à expansão das atividades turísticas
em um dos atrativos naturais reconhecido nacional e internacionalmente – complexo
Bonito/Bodoquena.
É importante, também, a elaboração de estudo visando a quantificação do raio de
influência/proteção de cada poço tubular, tendo em vista que o Manual de Outorga
(IMASUL, 2015), define apenas um único valor de 200 metros, independentemente
do aquífero captado e vazão explotada, bem como o enquadramento das águas
subterrâneas.
Em complementação ao incremento de uma política de gestão dos recursos
hídricos subterrâneos, em um primeiro momento, deve ser incentivada a criação de
mais comitês de bacias hidrográficas e, tanto para os novos, bem como nos já
existentes, incluir de forma mais detalhada a abordagem hidrogeológica.
Por mais que pesquisadores do LASAC/UFMS tenham chamado a atenção sobre a
importância das águas subterrâneas, lamentavelmente, também não se constata
observações sobre este manancial em programas de gestão e manejo de Áreas de
Proteção Ambiental-APA, como é o caso da APA Guariroba, no município de Campo
Grande. A captação de água superficial nesta bacia garante o abastecimento de cerca
de 40% da capital, onde a rede de drenagem tem o seu nível de base mantido pelo
Sistema Aquífero Bauru.
Embora exista uma Câmara Técnica Permanente de Águas Subterrâneas-CTPAS,
vinculada ao Conselho Estadual de Recursos Hídricos/MS, não se tem observado uma
atuação mais incisiva e propositiva deste grupo especializado de profissionais (do
serviço público e da sociedade civil) na abordagem de tópicos relevantes sobre a
hidrogeologia no Estado, uma vez que a CTPAS somente pode se manifestar quando
demandada pelo CERH/MS.
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Patrocínio: ISBN 978-85-67572-12-3