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LISBOA NO SÉCULO XX
(Licenciada)
Orientação Científica:
Júri:
DOCUMENTO DEFINITIVO
I
II
Abstract
In the present dissertation it was aimed to find connecting elements between
parallel evolution of society and social accommodation in the 20th century, in Portugal.
We have done proper research on the changes and evolution processes of society, of the
accommodation object itself –the house; of the housing space appropriation and the
accommodation policies in Lisbon.
Hereby we are able to determine the RGEU consequences and its influence on
the dichotomy “society – household”: the first phase is related to the significant change
through the inversion between bedrooms/living room and the concrete distinction
between living room/bedrooms; and the second phase held on the normalization process
becoming an obstacle to creativity, resulting ultimately in crystalized ideals.Therefore, we
may conclude with the present study that, until the RGEU there has been a transposition
of values, socially and familiarly speaking, to accommodation; and after the RGEU there
has been an evolution regarding social and family-related aspects that have found no
direct link to the accommodation typologies’ evolution of their own.
III
IV
Agradecimentos
Em primeiro lugar, aos professores Carlos Lameiro e José Luís Crespo, por todo o
acompanhamento incansável.
Aos colegas, que influenciaram de alguma forma o meu caminho, e principalmente aos
que partilharam estes últimos meses de curso.
Aos que estiveram presentes desde o primeiro ano, Inês, Maria e Miguel, e aos que
chegaram depois, Henrique e Armando.
À Rita.
Por fim e principalmente, à Mãe e Mana, que só querem o melhor para mim.
V
VI
As fachadas das casas nada nos podem dizer, nada revelando senão uma
conformidade arquitectónica aos gostos de algum grupo ou classe que talvez
nem já habite sequer naquela rua. Por trás das fachadas escondem-se os
mistérios sociais (Nunes, 1984:27).
VII
VIII
Índice Geral
Resumo I
Abstract III
Agradecimentos V
Índice Geral IX
Índice de Figuras XI
Listagem de abreviaturas XIV
1 Introdução 1
1.1 Tema e motivação 1
1.2 Objetivos e questões de trabalho 2
1.3 Metodologia 2
1.4 Estrutura da dissertação 3
2 Da Primeira República à Adesão à União Europeia 5
2.1 Introdução 5
2.2 Enquadramento Histórico: breve síntese 5
2.3 Desenvolvimento da habitação em Lisboa 8
2.3.1 Expansão dos limites da cidade 8
2.3.2 O Estado Novo, a Câmara Municipal de Lisboa e os programas
habitacionais. 12
2.4 Casa, sociedade e a apropriação do espaço doméstico 15
2.4.1 Habitar a casa 15
2.4.2 Sociedade e família 18
2.5 Síntese 23
3 Casos de Estudo 27
3.1 Processo de escolha dos casos de estudo 27
3.2 Prédios de Rendimento 27
3.2.1 Caso de Estudo 1 – Avenida Visconde Valmor, 35 (1913) 29
3.2.2 Caso de Estudo 2 – Avenida Duque de Ávila, 28-30ª (1920) 32
3.2.3 Caso de Estudo 3 – Avenida 5 de Outubro, 134 (1920) 35
3.2.4 Caso de Estudo 4 – Rua Castilho, 65 (1937) 38
3.3 Rabo de Bacalhau 41
3.3.1 Caso de Estudo 5 – Rua Joaquim António de Aguiar, 35 (1937) 42
3.3.2 Caso de Estudo 6 – Rua Almeida e Sousa, 63 (1939) 45
3.3.3 Caso de Estudo 7 – Avenida António Augusto Aguiar, 9 (1942-47) 48
3.3.4 Caso de Estudo 8 – Rua Cervantes, 4 (1947-48). 52
3.4 Mudança de Paradigma 55
3.4.1 Caso de Estudo 9 – Bairro das Estacas – Célula 8 (1949-55) 56
3.4.2 Caso de Estudo 10 – Av. Estados Unidos da América (1953) 59
3.4.3 Caso de Estudo 11 – Bloco das Águas Livres (1953-55) 63
3.4.4 Caso de Estudo 12 – Avenida Infante Santo, 57 (1956) 66
3.5 Novos Bairros 69
3.5.1 Caso de Estudo 13 – Olivais Norte, categoria II (1955-58) 70
IX
3.5.2 Caso de Estudo 14 – Olivais Sul, categoria II (1960-61) 73
3.5.3 Caso de Estudo 15 – Olivais Sul, categoria III (1960-61) 77
3.5.4 Caso de Estudo 16 – Olivais Sul, categoria IV (1960-61) 80
3.6 1970/1990- Pós-Modernismo 83
3.6.1 Caso de Estudo 17 – Torres de Alfragide (1968/1973). 84
3.6.2 Caso de Estudo 18 – Complexo Habitacional Olaias (1982) 87
3.7 Síntese 90
4 Conclusão 91
4.1 Concretização dos objetivos 91
4.2 Perspetivas futuras 92
Bibliografia 93
Anexos 97
X
Índice de Figuras
Fig. 3. Plano Urbanização Alvalade, João Faria da Costa, 1945, in Salgado e Lourenço,
2006: 25. 10
Fig. 11. Anúncio de tabaco dirigido às mulheres, in Donas de Casa, nº 53, 1966: 41. 25
Fig. 12. Av. Visconde Valmor, 35. Fachada, e pormenor de fachada, fotografias da
autora. 29
Fig. 13. (à esquerda) Av. Visconde Valmor, 35 planta tipo. Fonte: CML, tratada pela
autora. (à direita) Análises realizadas pela autora utilizando a mesma planta. 30
Fig. 14. Av. Duque de Ávila, 28-30. Fachada e pormenor de fachada, fotografias da
autora. 32
Fig. 15. Av. Duque de Ávila, 28-30 planta tipo, fonte: CML, tratada pela autora. 33
Fig. 17. Av. 5 de Outubro, 134. Fachada e pormenor de fachada, fotografias da autora. 35
Fig. 18. Av. 5 de Outubro, 134 planta tipo, in Reis, 2009: 174. 36
fig 20. Rua Castilho, 65. Fachada e pormenor de fachada, fotografias da autora 38
Fig. 21. R. Castilho, 65 planta tipo, Fonte: CML, tratada pela autora. 39
XI
fig 23. R. Joaquim António de Aguiar, 35. Fachada e pormenor de fachada, fotografias da
autora 42
Fig. 24. (à esquerda). R. Joaquim António de Aguiar, 35 planta tipo, in AAP 1987:158
tratada pela autora. (à direita) Análises realizadas pela autora utilizando a mesma planta.
43
Fig. 25. R. Almeida e Sousa, 63. Fachada principal e traseiras, fotografias da autora. 45
Fig. 26. (à esquerda). R. Almeida e Sousa, 63, planta tipo, fonte: CML, tratada pela
autora. (à direita) Análises realizadas pela autora utilizando a mesma planta. 46
Fig. 27. Av. António Augusto Aguiar. Fachada e pormenor de fachada, fotografias da
autora. 48
Fig. 28. Av. António Augusto Aguiar, 9 planta tipo, in AAP 1987: 160. 49
Fig. 31. (à esquerda). R. Cervantes, 4, planta tipo, fonte: CML, tratada pela autora. (à
direita) Análises realizadas pela autora utilizando a mesma planta. 53
Fig. 33. Bairro das Estacas. Da esq. para a dir. : Duplex 1º e 2º andar, respetivamente,
T3 planta tipo, in Sanches e Atouguia, 1954: 4. 57
Fig. 35. Cruzamento entre Av. Estados Unidos da América e a Av. de Roma. Fachadas e
pormenor, fotografias da autora. 59
Fig. 36. (à esquerda). Av. Estados Unidos da América, Lote 21, planta tipo, fonte: CML,
tratada pela autora. (à direita) Análises realizadas pela autora utilizando a mesma planta.
60
Fig. 37 .Cruzamento entre Av. Estados Unidos da América e Av. Roma planta tipo plano
urbano, fonte: CML, tratada pela autora. 61
Fig. 38. Bloco das Águas Livre. Fachada principal, fotografias da autora. 63
Fig. 39. Bloco das Águas Livres planta tipo, in Pereira e Cabral, 1959 : 9. 64
Fig. 41. Av. Infante Santo, 57. Fachada principal, fotografias da autora. 66
Fig. 42. Av. Infante Santo, 57 planta tipo, fonte: CML, tratada pela autora. 67
Fig. 44. Olivais Norte, cat. II. Duas das fachadas, fotografias da autora. 70
XII
Fig. 45. (em cima) Olivais Norte, cat. II planta tipo, in AAP 1987: 254. (em baixo) Análises
realizadas pela autora utilizando a mesma planta. 71
Fig. 46. Olivais Sul, cat II. Fachada e pormenor de fachada, fotografias da autora. 73
Fig. 47. Olivais Sul, cat II planta tipo, in GTH, 1980 : 29. 74
Fig. 49. Olivais Sul, cat. III. Fachada e pormenor da caixa de escadas exteriores,
fotografias da autora. 77
Fig. 50. (em cima) Olivais sul, cat III planta tipo, in GTH, 1980 : 30. (em baixo) Análises
realizadas pela autora utilizando a mesma planta. 78
Fig. 51. Olivais Sul cat. IV. Duas das fachadas, fotografias da autora. 80
Fig. 52. Olivais Sul, cat. IV planta tipo, in GTH, 1980 : 31. 81
Fig. 58. Complexo Habitacional Olaias, planta tipo, in Fernandes e Lacerda, 1985 : 7. 88
XIII
Listagem de abreviaturas
AU – Área útil
UE – União Europeia
XIV
1 Introdução
1
1.2 Objetivos e questões de trabalho
No desenvolvimento desta Dissertação, procuramos responder a algumas
questões:
- De que forma a planta de um fogo, nos permite uma leitura mais vasta sobre os
valores da sociedade, à época da sua construção?
1.3 Metodologia
No trabalho adotou-se uma metodologia de estudo de caso, com uma abordagem
de carácter qualitativo em que se mobilizaram técnicas de recolha e análise de
informação para perceber o fenómeno estudado na sua totalidade e múltiplas
dimensões.
2
diversificada que versou alguns indicadores sociais e programas habitacionais para o
período em estudo.
A terceira fase resultou numa análise e descrição dos resultados obtidos nas fases
anteriores, procurando validar as questões de trabalho e os objetivos definidos para uma
melhor compreensão do tema e do problema em análise.
Por fim, focámo-nos nos vários casos estudados subdivididos nas distintas
categorias: Prédio de Rendimento, Rabo de Bacalhau, Mudança de Paradigma, Novos
Bairros, 1970/1990 Pós Modernismo, com base nas fases anteriormente descritas, onde
se procurou uma reflexão crítica sobre a evolução da casa como reflexo da sociedade,
para o caso lisboeta, no século XX.
3
focando-se essencialmente as relações entre áreas úteis atribuídas a cada uso (privado,
social, serviços) e entre divisões, relativas portanto à sua disposição e os elementos da
casa; por último, iii) os aspetos arquitetónicos relevantes, no qual foi realizada uma
análise de caráter mais subjetivo, fazendo-se algumas referências sociais abordadas no
segundo capítulo.
4
2 Da Primeira República à Adesão à União Europeia
2.1 Introdução
O intervalo de tempo escolhido para esta dissertação centra-se no século XX,
mais concretamente desde a Primeira República, ao final dos anos 80, quando Portugal
assina o tratado de adesão à Comunidade Europeia. É portanto importante, para este
trabalho, percebermos por um lado os acontecimentos históricos durante esse período,
em Portugal, como também em geral na Europa, assim como os planos que foram
realizados na lógica de expansão dos limites da cidade, sempre com a questão da
habitação como motor dessa expansão; e por outro lado, quais as alterações do tecido
social e familiar durante este século, que são intrínsecas à habitação, assim como a
relação casa/família que se desenvolve no tema da apropriação do espaço doméstico.
Assim sendo, este capítulo divide-se em três partes, uma primeira que consiste numa
compilação dos dados históricos mais relevantes, uma segunda parte já focada numa
relação desses dados com a evolução da habitação e, uma terceira parte destinada à
análise de indicadores sociais, mais objetivamente, à análise da família e a sua relação
com a casa.
Este capítulo tem também a função de servir como base para o capítulo seguinte
referente aos casos de estudo, permitindo uma análise mais clara e completa,
contribuindo para um “olhar” mais consciente e conhecedor da esfera envolvente a cada
um dos casos.
5
grande instabilidade política, onde em menos de 16 anos Portugal teve 45 governos, 30
primeiros-ministros diferentes, 7 parlamentos e 8 presidentes da república. A Primeira
República chega ao fim em 1926, com uma marcha militar cujo líder foi o general Manuel
Gomes da Costa, abrindo caminho para uma Ditadura Militar (Sardica, 2012: 58) que
antecedeu o Estado Novo.
O Estado Novo teve o seu apogeu no início dos anos 50, quando Portugal
recebeu ajuda financeira de 70 milhões de dólares resultando numa expansão e
progresso económico nos anos seguintes. Portugal era um dos países fundadores da
NATO e desde 1955 era membro de pleno direito das Nações Unidas, tudo isto
contribuiu para um desenvolvimento económico e alguma estabilidade política. No
período dos anos 50 surgiram novos ramos de negócio como a siderurgia, os cimentos,
os químicos, a celulose, a refinação do petróleo, a eletrificação e a construção naval
(Sardica, 2012: 92). Surgiu também um investimento do Estado em várias construções
como edifícios estatais, escolas, correios, estradas, pontes e ainda estações ferroviárias
(Sardica, 2012: 92). 1961 é o ano do princípio do fim do salazarismo e do próprio Estado
6
Novo (Sardica, 2012: 94), iniciaram-se os conflitos em Angola e no fim desse ano as
tropas portuguesas perdem para a União Indiana, Goa, Damão e Diu.
1
http://www.dn.pt/arquivo/2008/interior/breve-historia-legal-do-casamento-e-do-seu-fim-em-
portugal-997861.html.
7
O país estava dividido pelas várias opiniões sobre qual o melhor futuro para
Portugal e, o Verão de 1975 ficou marcado como verão quente devido aos conflitos
sociais, violência e protestos. Se por um lado o crescimento económico estagnara devido
ao fim dos fundos recebidos nos anos 50, por outro, a aprovação da Constituição em
1976 consegue uma consolidação e estabilidade democrática. Ainda em 1976, em
Setembro, Portugal ingressou no Conselho da Europa, e um ano depois apresentou a
candidatura para entrar na Comunidade Económica Europeia. O Tratado de Adesão foi
assinado em Junho de 1985, embora Portugal tivesse recebido a confirmação do pedido
um ano após a candidatura. A demora do processo deveu-se às dificuldades económicas
e sociais em que o país se encontrava, assim como a discordâncias entre alguns
Estado-membros. Até aos anos 90 o panorama foi relativamente estável no geral, a Expo
98 que foi um dos marcos dessa década.
fig 1. Planta do Fava. Cartografia de Lisboa séculos XVIII a XX in Salgado e Lourenço, 2006: 35
8
Em 1874 Frederico Ressano Garcia foi nomeado engenheiro da Câmara
Municipal de Lisboa, onde levou a cabo um dos mais importantes planeamentos urbanos
que se destinava à expansão urbana de Lisboa, influenciado por Georges-Eugène
Haussmann. Dessa intervenção fazem parte: a Avenida da Liberdade, o antigo Passeio
Público, a Avenida 24 de Julho, a Praça Marquês de Pombal, o Mercado da Ribeira
Nova, as designadas Avenidas Novas que se encontram entre a Praça Duque de
Saldanha e a Praça de Entrecampos e ainda os bairros de Campo de Ourique e
Estefânia. O primeiro bairro social de Lisboa, o Bairro Arco do Cego, aparece nos finais
dos anos 10 como resposta à necessidade de alojamento operário. Nos primeiros anos
do Estado Novo, a ideia de Lisboa como capital do Império (Tostões, 2006: 23) foi o
mote para a expansão da cidade ao longo da zona ribeirinha, passando por Belém onde
seria inaugurada a Exposição do Mundo Português em 1940. Este plano de expansão da
cidade no sentido ao ocidente adotou o nome Costa do Sol, iniciado por Donat-Alfred
Agache (1875-1959), durante o período em que Duarte Pacheco (1899-1943) ocupou o
lugar de ministro das Obras Públicas, e levado a cabo por Étienne de Gröer (1882-?), já
em 1938 quando Pacheco assumiu o cargo de presidente da Câmara de Lisboa. O Plano
Director de 1938-48 constituiu o último plano pensado como projecto para a cidade. No
quadro político da ditadura definiu todo o seu desenvolvimento: encarando a globalidade
do seu território, estabeleceu os novos limites de Lisboa transformando em solo urbano
as antigas extensões rurais que foram expropriadas (…) (Tostões, 2006: 23). Desse
Plano Director fizeram parte também alguns bairros de habitação social, o Parque
Eduardo XVII desenhado pelas mãos de Keil do Amaral (1910-1975), assim como a
Estufa Fria, e o aeroporto de Lisboa também fazia parte dos equipamentos projetados.
Ainda no mesmo ano de 1938 foi desenhada por Cristino da Silva a Praça do Areeiro,
que (…) define o paradigma da arquitectura do “fascismo duro e puro” no seu desenho
classizante baseado num padrão tradicionalista de estilização da arquitectura erudita
(Tostões, 2006: 25). Nos finais dos anos 40, em 1947 foi criada a FCP-HE (…) com o
objectivo de canalizar as verbas da Previdência para a promoção de habitações
económicas (…) (Matos, 2002: 34).
9
Fig. 3. Plano Urbanização Alvalade, João Faria da Costa, 1945, in Salgado e Lourenço, 2006: 25.
Foi nos anos 50 que acontece (…) o corte com a tradição urbana (…) quando o
sistema mais ou menos regrado ou regular de malha/quarteirão é substituído pela
composição livre de blocos, e torres, e a malha dos acessos, que de hipodinâmica se
torna arborescente, deixa de ser a bitola ordenadora da disposição dos edifícios. (Portas,
2006: 14).
10
O Bairro de Alvalade é o primeiro exemplo em Lisboa representativo das mudanças
que, de alguma forma, a Carta de Atenas provocou, O “Bairro das Estacas” (1949-1955)
é a imagem paradigmática desta nova situação, com uma série de blocos que por
obrigação legal não ultrapassavam os quatro pisos, dispostos perpendicularmente ao
eixo viário, em substituição dos tradicionais quarteirões previstos no plano, criando uma
extensa plataforma de jardim prolongada em transparência sob os edifícios (Tostões,
1998: 45). Ainda no início dos anos 50, em 1953, foi projetado um dos edifícios que
também reflete a influência dos princípios da Carta de Atenas, o Bloco Águas Livres.
Este é um edifício destinado a habitação, que (…) representa um primeiro momento no
questionamento do método internacional aplicado a um prédio de rendimento de grande
dimensão. Ao sentido funcionalista do cumprimento do programa, miscigenando funções
e propondo novos espaços de uso colectivo, contrapõe-se um sentido vernacular e
escultórico formalizado nas varandas salientes, que modelam a fachada na luz e na
sombra, trabalhada com diferentes texturas acentuadas pelo jogo da cor (Tostões, 1998:
46). Uns anos depois (1959/1960) os arquitetos Nuno Teotónio Pereira e António Pinto
de Freitas, projetaram um edifício de habitação que ganhou um prémio Valmor, em 1967,
nos Olivais Norte.
O Bairro dos Olivais está dividido em duas partes, Olivais Norte e Olivais Sul, sendo
que o primeiro funcionou como “teste” para o segundo. Ao contrário do que aconteceu
com Alvalade, os Olivais foram concebidos sem concessões ao urbanismo tradicional e
sem qualquer intenção de continuidade com o tecido urbano existente. (Tostões, 2006:
27). A grande diferença entre os Olivais Norte e os Olivais Sul é que enquanto no
primeiro o desenho era fiel à Carta de Atenas, o segundo (…) anunciam já uma postura
crítica às propostas dogmáticas e mais ortodoxas do Movimento Moderno. De facto, a
sua concepção deve menos à Carta de Atenas e muito mais ao espírito das new towns
inglesas (Tostões, 2006: 27). Enquanto Portugal perdia as colónias uma a uma, por outro
lado ia testando novos modelos habitacionais, prolongando os limites da cidade de
Lisboa, ao cargo do GTH que veio no seguimento da FCP-HE. Pelo GTH foram também
realizados estudos para Chelas, cujo plano de expansão da cidade nessa direção já
tinha sido prevista no plano de Gröer (CML, 1981). Entre os anos 60 e os anos 80, com o
25 de Abril, foram criados dois programas com o objetivo de responder às populações
mal alojadas, um foi o Programa SAAL e outro foi o Programa das Cooperativas de
Habitação (Lôbo, 1998)
11
estruturas de transportes como o metro e a criação da Estação do Oriente, assim como
novas áreas para habitação (Tostões, 2006).
Entre 1926 e 1932, a Câmara Municipal de Lisboa “agiu” sobre sete pontos:
Vistorias à estabilidade dos prédios que ameaçavam ruína e eventual demolição dos
mesmos ou consolidação; criação de um regulamento geral da construção urbana para a
cidade de lisboa em 1930; repressão das obras executadas clandestinamente, isto é,
sem licença camarária; conservação e beneficiação exterior dos prédios; construção de
novas habitações para as classes menos abastadas; interessar a iniciativa privada por
este tipo de habitação; inserção das novas realizações dentro de um plano geral da
cidade. Em 1930 a Câmara Municipal de Lisboa publicou, em Agosto, um regulamento
geral da construção urbana (RGCU), devido à construção civil estar entregue aos “patos
bravos” (construtores civis), cujas construções apresentavam anomalias (Silva, 1994).
12
Os padrões de conforto do edificado desenvolveram-se até aos dias de hoje. As
introduções destes padrões, através de normas técnicas, são realizadas com o objetivo
de melhorar a construção e alcançar condições de conforto superiores. Em Portugal, na
década de 50, foi introduzido o Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) é
um diploma de 1951 que tem sofrido sucessivas alterações e se encontra em fase de
revisão. Até 1951, a construção era estabelecida pelo bom senso dos proprietários e
construtores, surgindo então o RGEU, que foi criado com o propósito de estabelecer
normas na área da construção. No preâmbulo são referidos os princípios higienistas e
funcionais, e nas cidades portuguesas através do desenvolvimento dos primeiros planos
urbanos de inspiração modernista.
13
cumprissem algumas condições pré-definidas. Este programa foi aplicado no Alto da
Ajuda, Alto da Serafina, Terras do Forno, Madre de Deus, Encarnação e Campolide.
No mesmo ano, 1945, foi também criado o programa das “casas de renda
económica”, que se destinava à classe média que não estavam abrangidas pelos outros
programas. Tinha como objetivo a criação de fogos com rendas compatíveis com os
rendimentos mensais das famílias a que se destinavam. Foi ainda criado um programa
na Federação de Caixas de Previdência – Habitações Económicas, tendo sido este o
responsável pela maior parte das construções realizadas em Lisboa, dentro do programa
das “casas de renda económica” (Silva, 1994: 89).
Em 1959 foi criado o Gabinete Técnico de Habitação (GTH), que tinha como
plano de trabalho urbanizar algumas áreas vastas dentro do perímetro da cidade, com
habitação social como previsto no Plano Director de Urbanização de Lisboa de 1959. Os
programas do GTH incidiram nos Olivais Norte, Olivais Sul e Chelas. As atribuições do
GTH, explicitamente assumidas, eram: proporcionar habitação aos agregados familiares
de menores recursos; substituir gradualmente os bairros de lata por habitações
adequadas e de renda módica; realojar os agregados familiares atingidos por obras de
urbanização ou vivendo em «partes de casa» e quartos arrendados ou «outras formas
de habitação, social e normalmente inconvenientes (Silva, 1994: 161).
14
Cavaleiros (fig.4), acontece também um empreendedorismo urbanístico, no mesmo
modelo de torres conjugadas com bandas dos Olivais. Já nos finais dos anos 80, dá-se
um “boom” de condomínios residenciais fechados ou semifechados, como os
empreendimentos urbanísticos Quinta da Marinha (Cascais) e Quinta da Beloura
(Sintra). (Barroso, Gaspar e Simões, 2006).
15
necessidades básicas, desde a procura de alimento, à construção das próprias cabanas.
Desta forma, a casa era concebida por quem a ia habitar, estando assim agregadas as
funções de conceber, construir e habitar. A evolução da sociedade levou a uma divisão
destas funções, numa primeira fase as casas deixaram de ser concebidas e construídas
por quem as habita, surgindo assim a arquitetura como profissão, e numa segunda fase
acontece uma divisão de funções entre quem as projeta e quem gere as construções
(Duarte, 1995).
A adaptação das pessoas ao espaço doméstico vai além das paredes desenhadas
pelos arquitetos, como Monteys e Fuertes defendem na Casa Collage, a perceção do
espaço e da arquitetura muda consoante as pessoas que lá estão, tal como com a
decoração. Os pertences de uma família revelam os seus hábitos e culturas, e por outro
lado também revelam os objetos mais comuns transversalmente às culturas e crenças
diferentes. Una de las razones para utilizar insistentemente la palabra “casa” – con
preferencia a “vivenda” – es la indentificatión que el término establece com sus
ocupantes (Monteys e Fuertes, 2001: 14).
16
No filme do grupo Habitar - “Mudanzas”, a palavra mudança adquire um duplo
sentido, mudança porque o filme retrata uma família que está à espera da carrinha para
fazer as mudanças para uma outra casa, e mudança de ponto de vista relativamente à
casa e às suas possíveis qualidades. A ideia principal do filme é a da mudança de
perspetiva como um elemento chave para a adaptação e apropriação do espaço
doméstico, duma forma mais adequada e ajustada aos moldes de quem o habita. Após a
“desconstrução” da casa como sempre a viram, a família fica apenas com as caixas
onde guardavam os seus pertences, e as divisões totalmente “despidas”, estando
criadas as condições para um novo “olhar” sobre a casa. No final do filme, a família
percebe que já não precisa de mudar de casa, uma vez que o problema estava na forma
como usufruíam os espaços. Ainda sobre a questão do ponto de vista do “mau uso” das
coisas e dos espaços, Monteys e Fuertes (2001) chamam à atenção para a capacidade
que as crianças demonstram em dar usos diferentes às coisas, por exemplo aos
armários. Além da escala, para as crianças, constituir uma predisposição para outra
perspetiva sobre os espaços, o pensamento do uso do espaço também não está
formatado, nem “infetado”, com ideias pré-concebidas acerca da utilização e função dos
objetos. As portas também são referidas pelos mesmos autores, como um elemento
determinante na perceção e uso do espaço doméstico, permitindo simultaneamente a
comunicação ou a separação de espaços ou divisões.
17
lavar a loiça e a roupa, o aspirador, ou até a máquina do café. Pelos anúncios é visível
que o público-alvo dos eletrodomésticos é o sexo feminino, refletindo ainda uma maior
atribuição das tarefas domésticas (ver fig. 6). Todos estes elementos interferem e
modificam a forma como se “vive” dentro da casa, seja a nível projetual quando desde a
raiz se destina o local desses elementos, seja na apropriação do espaço quando a
família se junta para ver um programa televisivo. Em Portugal, aconteceu em Março de
1957, o lançamento da televisão portuguesa com emissões regulares da RTP (Sardica,
2012: 1966).
18
futuros, uma vez que cada indivíduo poderia usar o seu livre-arbítrio, tornando-se assim
imprevisível. Na realidade, as coisas acontecem de outra forma, (…) quando, por
exemplo, entramos num restaurante, estamos certos – isto é, não temos dúvida em
prever - de que haverá ali alguém para preparar as refeições e alguém para as servir
(excepto no caso dos self-services) (Nunes, 1984: 15). Não sendo então compreendido
duma forma “naturalista”, interpretar o comportamento do homem de uma forma
científica também gera alguns problemas, como por exemplo colocar novamente em
causa a existência do livre-arbítrio.
Com isto, procuramos entender o que é uma sociedade numa perspetiva sociológica, no
seguimento do pensamento de Nunes. O autor defende que para o sociólogo, a
sociedade é representada por uma grande rede complexa de relações humanas, ou na
linguagem mais “técnica” um sistema de interacção (Nunes, 1984: 23). No entanto, os
critérios para o sociólogo aplicar o conceito de sociedade têm de ser qualitativos e não
quantitativos, o importante é a complexidade das relações, tem-se uma sociedade
quando um complexo de relações é suficientemente complexo para ser analisado em si
mesmo, entendido como uma entidade autónoma, comparada com outras da mesma
espécie (Nunes, 1984: 23). Para uma definição mais concreta, Nunes procura explicar a
sociedade como um conjunto de factos sociais, sendo aceite ou entendido como social,
aquilo que tem qualidades de interacção, inter-relação, e de reciprocidade. O mesmo
autor, utiliza a definição de social de Max Weber, segundo a qual uma situação «social»
é aquela em que as pessoas orientam as suas acções umas para as outras (Nunes,
1984: 23). Assim sendo, nem todos os acontecimentos históricos têm o mesmo peso no
desenvolvimento da sociedade, numa perspetiva sociológica, uma vez que esta
apresenta uma evolução maior quando “encontra” obstáculos. É de admitir desde logo,
por conseguinte, que o pensamento sociológico encontre melhores condições de
desenvolvimento em circunstâncias históricas marcadas por severos choques na
autoconcepção (cultura) de uma sociedade (…) (Nunes, 1984: 25). Posto isto, será o
19
impacte provocado pelos acontecimentos, que “obriga” o homem a repensar questões
por vezes basilares, em busca de “soluções”.
Para perceber como funcionam as famílias de “hoje”, Lauwe & Lauwe (1966),
começam por estudar a evolução dos seus papéis na sociedade, onde defendem que
quando a mulher deixa de cuidar apenas da família e arranja um emprego, altera-se o
núcleo familiar ficando mais reduzido; o tempo passado com os filhos também é menor
e, consequentemente, a rotina da refeição continua a ser um momento de comunhão e
reunião. O aparecimento da televisão e do rádio vêm também alterar as atividades
culturais e de lazer, passando estas a ter um papel principal no dia-a-dia em casa. O
aumento dos divórcios resulta em estruturas familiares desagregadas, que por sua vez,
em casos de segundos casamentos, resultam em agregados familiares, em partes, de
duas famílias. Os autores referem-se também à evolução das necessidades, referindo o
papel importante da economia, assim como o da temporalidade. Dividem as
necessidades em necessidades-obrigações e necessidades-aspirações. As primeiras
(necessidades-obrigações) são necessidades cuja importância é vital para o equilíbrio
familiar, fazem parte destas: as necessidades económicas que podem determinar a
saúde, educação, cultura e lazer; as necessidades de espaço e tempo que integram
também o primeiro grupo de necessidades, estas prendem-se com a organização do
espaço e as relações sociais, e como este permite o isolamento ou o agrupamento da
família. Está, porém, relacionado com o poder de compra e, assim com as necessidades
económicas. O último lugar deste primeiro grupo pertence às necessidades de
segurança e de estabilidade, isto numa sociedade ainda marcada pela última guerra. O
segundo grupo de necessidades (necessidades-aspirações), é composto por:
necessidade de harmonia e união do casal, se antes o casamento era “arranjado” pelos
familiares e tinha como objetivo principal a continuidade da linhagem, agora é a procura
do amor que leva à união matrimonial; a necessidade de instrução e de informação é
cada vez mais generalizada em todos os meios sociais. Os interesses políticos,
económicos e sociais estão mais incutidos na família. Reflete-se assim numa
necessidade de comunicação tanto exterior à família como entre a mesma. As
20
necessidades de relações sociais e de consideração social advêm também dos
problemas da comunicação, e refletem-se na necessidade do espaço doméstico permitir
uma harmonia na relação da família, mas também na receção de vizinhos, amigos ou
estranhos nesse espaço. A consideração social está ligada a um sistema de valores que
varia entre regiões, países e grupos sociais. A última necessidade-aspiração será a
necessidade relativa ao papel a preencher pela família na sociedade, enquanto na aldeia
a família está mais disponível para os vizinhos, na cidade a família ‘fecha-se’ dos outros.
Há assim, interesse em manter uma certa reserva do exterior, e paralelamente criar
unidades de vizinhança. Existindo uma atividade profissional por parte dos que
sustentam uma família, o investimento de horas nessa atividade tem como consequência
menos horas passadas em família, isto por sua vez reflete-se no distanciamento entre
pais e filhos. Este distanciamento afeta os laços familiares assim como a participação em
atividades familiares tanto de lazer como de responsabilidades da casa.
Este assunto também é abordado por José Pinto Duarte, que compara as
alterações sociais e culturais dos Estados Unidos da América com as mesmas
alterações em Portugal, sendo que o único elemento que difere entre os casos é o tempo
em que essas mudanças acontecem. Isto é, enquanto essa evolução acontece a um
ritmo crescente nos Estados Unidos, outras sociedades demoram mais tempo a sofrer
uma mesma mudança. O autor refere-se ainda à composição familiar dos Estados
Unidos, onde o agregado familiar antes composto por avós, pais e filhos, dá lugar a um
agregado mais reduzido composto por pais e filhos, e depois dos anos 70 o agregado
assume outras realidades distintas como pais solteiros, grupo de amigos vivendo em
comum, etc. (Duarte, 1995: 12).
21
Em Portugal, segundo Barreto e Preto (1996), verificam-se as mesmas tendências
que Lauwe e Lauwe haviam estudado a nível europeu. A partir dos anos 60, a dimensão
familiar diminuiu de uma média de quatro pessoas para três pessoas, enquanto o
agregado familiar antes composto por uma média de cinco pessoas, não só baixou como
houve um aumento de agregados de uma e duas pessoas. Entre 1960 e 1995, há um
conjunto de indicadores sociais que permitem uma leitura geral da sociedade
portuguesa, são eles: o aumento da taxa de divórcios e com isto, um consequente
aumento de filhos “fora do casamento”; uma maternidade tardia que é quase inexistente
depois dos quarenta anos de idade; um envelhecimento populacional e ainda uma
deslocação das pessoas do interior para o litoral – Lisboa e Porto, ou para sedes de
concelhos. Para João Ferrão (1996), este período correspondeu à última fase da
alteração demográfica “moderna”, relativamente “atrasada” em relação a outros países
europeus mais desenvolvidos. Esta mudança demográfica e social teve repercussões
nos desenvolvimentos urbanos e suburbanos, contribuindo então para uma
desagregação rural. A desagregação rural por sua vez, teve impacte na atividade
agrícola, que deixou de ocupar o papel principal de fonte de rendimento, e
desvaneceram-se os comportamentos e hábitos tipicamente rurais com o nascimento de
novas gerações. Quando partiram do meio rural para uma realidade urbana, as pessoas
levaram consigo as práticas inerentes às suas vivências anteriores, como por exemplo
as práticas religiosas, esses resquícios rurais perduraram enquanto as pessoas foram
vivas. As gerações seguintes, já deslocadas fisicamente desse meio rural, adotaram
comportamentos “urbanos”, substituindo os valores de outrora.
22
familiares ao longo dos anos, resultou na individualização de cada um dos elementos. O
uso de contracetivos contribuiu para essa alteração de comportamentos, e para uma
maior liberdade feminina. Embora o processo para a igualdade de género esteja em
desenvolvimento até aos dias de hoje, ainda são visíveis as desigualdades no que diz
respeito às tarefas domésticas que são maioritariamente atribuídas à mulher.
Pereira (2012) assume três modelos familiares que evoluíram durante o século XX,
são eles: a família instituição, a família fusão e por último a família associação. O
primeiro tem como base a divisão de papéis mulher/marido estando a mulher
dependente do marido, e uma relação entre pais/filhos assente numa hierarquia
autoritária; o segundo, família fusão, parte duma democracia familiar, onde a felicidade
de cada um advém da felicidade global; o último modelo, família associação, constituído
por um conjunto de pessoas cuja individualidade é assegurada e onde a felicidade do
todo é o produto da felicidade individual.
2.5 Síntese
A partir do século XVI assistiu-se a um processo de nuclearização da família
acompanhado de uma individualização dos seus membros, que reivindicaram uma
progressiva privacidade, o que veio alterar profundamente os espaços da habitação. Os
moradores começam a ter o próprio espaço individual para dormir, e os encontros
sociais familiares reduziram-se ao núcleo familiar principal, composto pelos pais e filhos.
No século XIX, aparece a família burguesa já definida, principalmente pelas figuras do
pai, mãe e filhos. Nos inícios do século XX, a ideia de que o modelo da família moderna
é o da família nuclear parece ser aceite por todos os extratos sociais europeus e tem-se
mantido até aos dias de hoje. No Mundo Ocidental, ao longo do século XX, a evolução
da habitação acompanhou as necessidades de alojamento de massas tendo em conta,
de uma forma geral, o crescimento da população urbana. Um acontecimento muito
importante foi o final das duas guerras, que levou à necessidade de reconstrução das
cidades europeias visando a sucessiva emergência da chamada sociedade do consumo.
Além disso, as mudanças no espaço da casa foram ditadas por uma crescente produção
legislativa normativa da produção arquitetónica.
Nos novos projetos arquitetónicos, que surgem na segunda metade do século XX, a
compartimentação organiza-se segundo um critério puramente racional, regido por
princípios concebidos de acordo com certos requisitos higienistas e estabelecidos
seguidamente por lei, nomeadamente no RGEU, e por noções e imposições de uma
nova economia doméstica que tende a uniformizar o ambiente doméstico. Os aspetos
económicos, passaram a ser considerados como principais fatores, que condicionam os
tipos de materiais utilizados e, consequentemente, os sistemas construtivos. Na
23
organização interior a cozinha perde o seu lugar de destaque e os quartos assumem um
papel mais individualista, ganhando uma superfície maior em comparação às das
tradicionais alcovas.
De uma forma geral, podemos fazer uma síntese dos eventos mais relevantes: a
possibilidade de divórcio resultou numa alteração dos agregados familiares que outrora
não acontecia; a emancipação da mulher teve repercussões a todos os níveis desde o
mercado de trabalho à indústria de eletrodomésticos e, também, na organização do fogo
na tentativa de supressão das desigualdades de género. A participação de Portugal na I
Guerra Mundial provocou mazelas no país tanto economicamente como
psicologicamente, assim como as guerras coloniais contribuíram para um aumento
populacional extraordinário e consequentemente, para o aumento da necessidade de
construção habitacional. A estabilidade política, ou a falta dela, também é um fator
determinante como percebemos pelos avanços arquitetónicos, embora sob uma
ditadura; e de uma forma geral, é bastante percetível as tendências provenientes dos
outros países como aconteceu de modo claro, tanto com a Revolução Francesa, como
com os partidos políticos de extrema-direita no poder como em Itália, na Alemanha e em
Portugal. Uma última referência nesta janela temporal que também adotámos da Europa
foi o Movimento Moderno que teve um enorme impacte na indústria da habitação.
Podemos ainda fazer uma reflexão sobre as mudanças dos agregados familiares ao
longo deste período de tempo em estudo, começando com agregados de um número
vasto de elementos até a agregados de uma pessoa singular. Ainda dentro dos vários
agregados familiares, também difere as maneiras de habitar a casa, sendo os valores e
princípios de cada família, os principais responsáveis por essa apropriação do espaço
doméstico, e por sua vez esses princípios sofrem influências da sociedade exterior. No
seguimento destas reflexões, conseguimos concluir que a forma como nos apropriamos
do espaço doméstico, está diretamente relacionado com as ideias preconcebidas que se
transmitem entre gerações.
24
Fig. 10. Anúncios dirigidos a homens e mulheres, respetivamente, in Donas de Casa, nº 53,
1966:53.
Fig. 11. Anúncio de tabaco dirigido às mulheres, in Donas de Casa, nº 53, 1966: 41.
25
26
3 Casos de Estudo
27
Estas particularidades de organização, permite perceber que modelo familiar que está na
base destes exemplos é a família instituição (Pereira, 2012). A organização do espaço
doméstico responde a uma matriz composta por um conjunto de opostos: frente/
traseiras; formal/ informal; limpo/ sujo; dia/ noite; público/ privado; simbólico/ secular;
sagrado/profano; masculino/ feminino (Pereira, 2012: 41). Um dos opostos mais óbvios
ao olhar de qualquer espectador é a frente/traseiras, cuja deteção é quase automática e
instantânea em todos os prédios de rendimento. A diferenciação funcional da fachada e
das traseiras era inequívoca: a fachada estava indelevelmente associada ao domínio
simbólico, referente à intenção implícita de demarcação estatuária, e as traseiras,
essencialmente destinadas a serem utilizadas pela dona de casa, crianças, criados e
fornecedores representa o profano (Pereira, 2012: 43). Desde sempre que o papel
atribuído à mulher na sociedade tinha um carácter secundário, deixando o principal para
o homem, sendo-lhe incumbida a responsabilidade de sustentar financeiramente a
família. Esta dinâmica também é vivida no fogo, e representada através da separação
sexual dos espaços. Percebe-se que, por um lado, o universo feminino se esgote em
grande medida no espaço doméstico, e, por outro, que este último reproduza as
condições espaciais correspondentes às linhas mestras da matriz normativa da família
instituição, materializando a divisão sexual dos papéis conjugais e o pressuposto vertical
da autoridade familiar (Pereira, 2012: 44).
28
3.2.1 Caso de Estudo 1 – Avenida Visconde Valmor, 35 (1913)
Fig. 12. Av. Visconde Valmor, 35. Fachada, e pormenor de fachada, fotografias da autora.
Este caso de estudo situa-se na Avenida Visconde Valmor, uma das avenidas do
projeto de expansão urbana de Ressano Garcia no final do século XIX, atuais Avenidas
Novas. É um prédio de rendimento de 1913, destinado a habitação familiar da classe
média. A nível social e político, enquadra-se no início da primeira república e um ano
antes da Primeira Guerra Mundial. O edifício é de esquerdo/ direito, com dois fogos por
piso e ambos têm: quatro quartos, uma sala, uma cozinha, uma I.S. completa. Há ainda
dois saguões de ventilação, um em cada empena do edifício, e na fachada tardoz há
uma escada de incêndio.
29
Aspetos Particulares Analisados
Fig. 13. (à esquerda) Av. Visconde Valmor, 35 planta tipo. Fonte: CML, tratada pela autora. (à
direita) Análises realizadas pela autora utilizando a mesma planta.
30
Partição da Casa
Neste exemplo é maioritariamente de uso privado sendo que ocupa 48% do total
da AU, restando 18% para uso social e 14% para os serviços. Há comunicação direta
entre divisões com o mesmo uso (privado) reforçando a ideia da falta de necessidade de
privacidade. Não há qualquer comunicação direta entre compartimentos de diferentes
usos, embora a localização das divisões assumam uma lógica funcional refletida pela
proximidade da cozinha com a sala, e da I.S. com os quartos. A zona privada da casa
estende-se ao longo da frente do fogo e junto ao saguão de ventilação, as zonas social e
de serviços encontram-se na parte de trás do fogo.
Elementos da Casa
Todas as divisões têm um vão exterior à exceção da sala que tem dois,
conferindo-lhe desta forma um valor espacial superior mesmo estando localizada na
fachada tardoz. Os vãos exteriores da sala são de sacada, os dos quartos que se situam
na fachada de rua são de sacada com varandim e os dos quartos cujos vãos dão para o
saguão de ventilação são de peito. Ao corredor distributivo é atribuído um carácter
apenas funcional, sem qualquer comunicação direta com o exterior condicionando a
ventilação e a iluminação natural. Para os quatro quartos existe uma única I.S. completa,
que abre para um pequeno poço de luz na empena. Junto à cozinha, há uma zona
exterior de copa que permite o tratamento da roupa.
Este primeiro caso de estudo ainda existe hoje em dia como edifício de
habitação, apresenta um revestimento na fachada de rua de azulejos, e alguns
elementos decorativos em ferro nas varandas e varandins. Estes elementos decorativos,
ainda que pouco neste caso, são representativos de um dos opostos que serviam como
matriz reguladora: fachada/ traseira. Outro aspeto relevante é o facto de existir apenas
uma sala que é de refeições e se encontrar na fachada de tardoz, aqui a ótica da
agregação de divisões com os mesmos usos prevalece na organização do espaço
doméstico. A largura do edifício obrigada à utilização da área relativa às escadas da
fachada ser utilizada por apenas um fogo por piso como área de costura, beneficiando
um fogo em relação ao outro. Podemos concluir que embora este exemplo partilhe dos
princípios referidos no ponto 3.2, é um exemplo relativamente simples e sóbrio.
31
3.2.2 Caso de Estudo 2 – Avenida Duque de Ávila, 28-30ª (1920)
Fig. 14. Av. Duque de Ávila, 28-30. Fachada e pormenor de fachada, fotografias da autora.
O fogo deste caso de estudo situa-se na Avenida Duque de Ávila, uma das
avenidas do projeto de expansão urbana de Ressano Garcia no final do século XIX, e
atuais Avenidas Novas. É um prédio de rendimento de 1920, destinado a habitação
familiar de classe alta. Enquadra-se numa fase final da Primeira República e nos
primeiros anos seguintes à primeira guerra-mundial. O edifício é de um fogo por piso,
com sete quartos, uma sala, quatro saletas, uma sala de refeições, uma cozinha, uma
I.S. completa e uma I.S. sem banheira. O edifício tem dois saguões de ventilação, um
em casa empena, e na fachada tardoz há uma escada de incêndio.
32
Aspetos particulares analisados
Fig. 15. Av. Duque de Ávila, 28-30 planta tipo, fonte: CML, tratada pela autora.
Partição da Casa
Aqui a AU distribui-se praticamente igual entre uso privado 33% e uso social
31%, contrastando com 9% destinado aos serviços. Há comunicação direta entre
33
divisões de uso privado e uso social embora sejam usados pequenos halls nas
transições entre compartimentos. As divisões de uso social estão distribuídas pelas duas
fachadas opostas, na fachada de rua e na fachada de logradouro. Ao longo do fogo
ficam então as divisões de uso privado e as instalações sanitárias.
Elementos da Casa
Todas as divisões têm um vão exterior à exceção da sala que tem um vão
exterior maior e dois mais pequenos, todos eles de sacada com varandim, fazendo-se
notar a diferenciação e a valorização deste espaço social em relação ao resto do fogo.
Os vãos exteriores nas fachadas de rua e tardoz são todos de sacada com varandim e
os que dão para os saguões de ventilação, são de peito. Para sete quartos há duas
instalações sanitárias, uma mais pequena com apenas sanita, bidé, e outra maior com
banheira. Os únicos espaços sem vãos exteriores são a dispensa e os espaços de
distribuição, ficando assim condicionada a ventilação e a iluminação naturais. Junto à
cozinha, há uma zona exterior de copa que permite o tratamento da roupa.
Tal como o primeiro caso de estudo, este edifício existe nos dias que correm,
destinado a habitação do primeiro piso para cima, e com o piso térreo destinado ao
comércio. Embora seja visível também uma preocupação estética e decorativa na
fachada, aqui é notório um valor económico superior em relação ao primeiro exemplo. A
fachada é toda trabalhada, apresenta varandas e varandins diferentes e elementos
decorativos em ferro e também esculpidos. Ao contrário do exemplo anterior, este caso
de estudo, com quase dez anos de distância, apresenta não só um maior número de
divisões como revela uma hierarquização das mesmas. Em paralelo com a construção
do primeiro bairro social (Arco do Cego, 1918-1935), este exemplar reflete uma realidade
bastante diferente, desde o requinte do desenho dos desenhos técnicos à qualidade dos
espaços que nos permite deduzir que se destina a uma classe social alta. O exemplo
está inserido num quarteirão, onde a profundidade do fogo atinge mais de trinta metros,
obrigando a uma concentração das divisões no seu interior. Esta característica, traduz-
se numa organização do espaço doméstico regida pela oposição dia/noite, (…) é a
oposição dia/noite que dita, em parte, as regras da estruturação do espaço doméstico,
relegando as divisões destinadas às práticas que decorrem essencialmente durante a
noite (quartos) para a zona mais interior da casa, aquela que menos beneficia de luz
natural e de boas condições de arejamento (Pereira, 2012: 45). Um outro ponto
importante no desenho deste prédio de rendimento é a repetição do mesmo desenho
34
nos edifícios vizinhos, duplicando assim a área de saguão cuja função é primordial numa
empena da dimensão deste caso.
Fig. 17. Av. 5 de Outubro, 134. Fachada e pormenor de fachada, fotografias da autora.
35
Aspetos particulares analisados
Fig. 18. Av. 5 de Outubro, 134 planta tipo, in Reis, 2009: 174.
Partição da Casa
Neste fogo 39% da AU destina-se ao uso privado, 28% ao uso social e 10% a
serviços. Há comunicação direta entre divisões dos mesmos usos e entre usos
36
diferentes, sendo que os usos são sociais e privados. As divisões de uso social
encontram-se quase todas na fachada de rua, as divisões de uso privado encontram-se
dispostas ao longo do corredor distributivo, assim como as I.S. Na fachada de logradouro
situa-se a sala de refeições e a cozinha, revelando uma lógica funcional na distribuição
das divisões.
Elementos da Casa
Todas as divisões são dotadas de um vão externo, à exceção da sala que tem
dois vãos e da sala de refeições que tem um vão externo com o dobro da dimensão. Os
vãos exteriores dos quartos são de peito e estão virados para o saguão de ventilação, o
vão exterior da saleta é de peito e virado para a fachada de rua, assim como os da sala
que são de sacada com varandim. Os vãos da sala de refeição e da cozinha são ambos
de sacada com varanda, e estão na fachada tardoz. Os únicos vãos que dão para o
saguão são o do corredor e o da I.S., ambos de peito. Para seis quartos há apenas uma
I.S. Junto à cozinha, há uma zona exterior de copa que permite o tratamento da roupa.
Assim como os dois exemplos anteriores, este edifício existe e mantém-se como
edifício destinado a habitação, e comércio no piso térreo. Mantém-se a preocupação da
decoração da fachada, mais simples do que o exemplo da avenida Duque de Ávila, com
elementos de ferro nos varandins e alguns elementos decorativos esculpidos. É do
mesmo ano que o exemplo anterior embora se destine a uma classe social inferior,
conclusão que retiramos depois de comparar áreas brutas, para apenas menos três
divisões, o primeiro exemplo beneficia de quase do dobro da área bruta deste caso de
estudo 3. Repete-se a lógica de organização do primeiro caso de estudo, embora
aplicada a um fogo mais comprido, obrigando o uso de um saguão interior além do
saguão de ventilação junto à empena. O oposto dia/noite também ocupa o seu papel
ordenador neste fogo, posicionando os quartos na zona mais interior da casa. Tal como
acontece no caso de estudo Visconde Valmor, aqui também é utilizada a área da
fachada equivalente às escadas para um divisão, divisão essa que pertence a um dos
dois fogos existentes no piso. Um aspeto a considerar neste caso de estudo, é a
ocupação central do edifício, portanto duma área de menor qualidade, para a colocação
de tudo o que é motor, isto é: cozinhas, instalações sanitárias, dispensa e acessos
verticais.
37
3.2.4 Caso de Estudo 4 – Rua Castilho, 65 (1937)
fig 20. Rua Castilho, 65. Fachada e pormenor de fachada, fotografias da autora
38
Aspetos particulares analisados
Fig. 21. R. Castilho, 65 planta tipo, Fonte: CML, tratada pela autora.
O fogo deste caso de estudo apresenta uma estrutura distributiva com alguma
hierarquia. A entrada pode ser feita para o corredor distributivo, ou para uma divisão que
tem a possibilidade de ser independente do fogo. A entrada situa-se junto às divisões de
39
uso social, próximo à fachada de rua. O corredor distributivo desenvolve-se em forma de
U e assume dois níveis de privacidade; na área junto à entrada e às divisões de uso
social tem um caracter público, com a mudança de direção serve as divisões de uso
privado adquirindo também um carácter privado. Tem 1.25m de largura e um total de
32m, sendo a soma de três partes do U (7m, 19m e 6m). Os vãos interiores que fazem a
comunicação entre o corredor e as divisões têm 0.80m, à exceção de um de 1m e outro
de 1.40m.
Partição da Casa
Elementos da Casa
Todas as divisões garantem luz natural com um vão exterior, sendo que nas
divisões de uso social a dimensão dos vãos é maior, refletindo a importância atribuída a
estas divisões. Os vãos exteriores das divisões saleta, sala e escritório, são de sacada
com varandim e estão na fachada de rua. Os vãos exteriores dos quartos são de peito
virados para o saguão, assim como os da I.S. A sala de refeições e a cozinha têm vãos
exteriores de sacada e estão na fachada tardoz. Os únicos espaços sem vãos exteriores
são a dispensa e os espaços de distribuição, ficando assim condicionada a ventilação e
a iluminação naturais. Para seis quartos há uma I.S. que está desenhada de maneira a
poder ser utilizada por mais que uma pessoa ao mesmo tempo, e comunica diretamente
com dois dos quartos. Junto à cozinha há uma zona de tratamento de roupa exterior.
40
aumento significativo da dimensão do saguão, também por influência do RGCU,
aumentando consideravelmente a qualidade das divisões que estão viradas para o
mesmo. Há uma inversão de posicionamento do corredor distributivo no fogo, devido à
supressão do saguão de ventilação lateral, passando assim para a parede lateral
partilhada com o edifício vizinho. A fachada também apresenta uma linguagem diferente
dos casos anteriores, tendo desaparecido qualquer manifestação de elementos
decorativos, e onde os ferros das guardas dão lugar a guardas compactas sobressaindo
na fachada. A diferenciação entre piso térreo e pisos superiores é assumida não só pela
utilização de um pé direito superior no piso térreo, como também pela utilização de outro
material na fachada, e pelo uso de comércio.
41
uma mudança de comportamentos da mulher mas sempre a cumprir o papel secundário,
dependente do seu marido.
fig 23. R. Joaquim António de Aguiar, 35. Fachada e pormenor de fachada, fotografias da autora
42
Aspetos particulares analisados
Fig. 24. (à esquerda). R. Joaquim António de Aguiar, 35 planta tipo, in AAP 1987:158 tratada pela
autora. (à direita) Análises realizadas pela autora utilizando a mesma planta.
Partição da Casa
As divisões de uso privado ocupam 35% da AU, as de uso social ocupam 29% e
14% destina-se aos serviços. Há comunicação direta entre uma divisão de uso social e
43
outra de uso privado, e há ainda dois quartos que comunicam entre si. As divisões de
uso social e privado desenvolvem-se ao longo da fachada de rua, a meio do fogo a I.S.
faz a transição para a sala de refeições e a cozinha que ocupam a fachada tardoz. A
distribuição das divisões revela uma lógica funcional, a I.S. junto aos quartos e a cozinha
próxima da sala de refeições.
Elementos da Casa
Todas as divisões deste fogo assumem vãos exteriores, sendo que através das
dimensões dos vãos as divisões adquirem importâncias distintas e assim sendo as de
uso social são as mais privilegiadas. Os vãos exteriores são todos de peito, à exceção
do da cozinha que é de sacada e dá acesso à zona de tratamento de roupa exterior. A
sala e um dos quartos têm os vãos exteriores na fachada de rua, ou outros dois quartos
e a I.S. têm os vãos exteriores na fachada lateral, e o quarto principal juntamente com a
cozinha têm os vãos exteriores na fachada tardoz. Os espaços sem vãos para o exterior
são, a dispensa e o corredor.
Este é um prédio que ainda existe, usado como prédio de habitação com
comércio no piso térreo. Relativamente à fachada é bastante notória a diferença entre o
prédio de rendimento e este exemplo, sendo este desprovido de elementos decorativos e
onde há como uma extorsão da varanda mas que não é realmente varanda porque é
fechada, remetendo apenas visualmente para esse elemento. Todo o edifício apresenta
uma linguagem maciça e uniforme, dada através da materialidade contínua, com espaço
apenas para vãos de peito. Esta imagem representa de certa forma o período de
austeridade que se vivia durante o Estado Novo, com a utilização de linhas simples e
duras. Admitindo que a planta assume a forma de T invertido, há uma distinta separação
entre a área mais larga que ocupa a fachada e a área mais estreita que se estende para
as traseiras. A zona mais larga serve as divisões sociais e privadas, enquanto a zona
mais estreita é onde se encontram as áreas técnicas, cozinha e casa de banho, e ainda
a sala de refeições. É claro o facto de este ser ainda um exemplo de transição entre o
prédio de rendimento e o Rabo de Bacalhau, devido à permanência da sala de refeições
próxima da cozinha, como também pelo facto das escadas de servido ainda estarem no
exterior.
44
3.3.2 Caso de Estudo 6 – Rua Almeida e Sousa, 63 (1939)
Fig. 25. R. Almeida e Sousa, 63. Fachada principal e traseiras, fotografias da autora.
45
Aspetos particulares analisados
Fig. 26. (à esquerda). R. Almeida e Sousa, 63, planta tipo, fonte: CML, tratada pela autora. (à
direita) Análises realizadas pela autora utilizando a mesma planta.
46
Partição da Casa
Neste caso, a distribuição da AU é de 33% para o uso privado, 20% para o uso
social e 15% para os serviços. Não há comunicação direta entre divisões de uso privado
e uso social embora sejam usados pequenos halls nas transições entre compartimentos.
As divisões de uso social encontram-se na fachada de rua, a meio do fogo encontra-se a
I.S. e a zona de serviços, e na zona posterior da casa distribui-se a zona privada. A zona
de serviços faz a transição entre a zona pública da casa e a zona privada.
Elementos da Casa
Cada divisão deste fogo possuiu um vão exterior, com várias dimensões, sendo
assim atribuídos graus de importância aos espaços do fogo. Os vãos exteriores da
fachada de rua são de sacada com varandim e pertencem às salas, e um dos quartos
também tem vão de sacada com varandim mas na fachada tardoz. Os outros três
quartos têm vãos de peito, um na fachada tardoz e os outros dois para o saguão. Como
referido no ponto 3.8.1, os vãos exteriores do corredor e da I.S. são virados para um
pequeno poço de luz. Há ainda uma porta entre a zona de tratamento de roupa e as
escadas de incêndio.
Este Caso de estudo ainda existe e é usado para o uso destinado, habitação.
Este já é um exemplo totalmente representativo do Estado Novo, estando inserido num
quarteirão que ele próprio já corresponde às novas ideologias como a permeabilidade
pedonal e viária. O quarteirão reflete uma preocupação extrema de desenho,
apresentando traçados rígidos e exigentes mesmo nos logradouros que são desenhados
ao pormenor. Relativamente à oposição entre fachada/traseiras, este exemplo exprime
totalmente os princípios referidos no parágrafo inicial, tendo sido retirada a porta de
serviço da fachada para as traseiras cuja linguagem é bastante simples e desprovida de
qualquer elemento decorativo, enquanto a fachada apresenta alguns elementos que lhe
conferem ritmo embora com alguma simplicidade. Na planta já se verificam as alterações
como a deslocação do quarto principal para a zona mais periférica do fogo, assim como
também a supressão do contacto entre quartos que era bastante comum nos prédios de
rendimento, e ainda a utilização do hall como recetor.
47
3.3.3 Caso de Estudo 7 – Avenida António Augusto Aguiar, 9 (1942-47)
Fig. 27. Av. António Augusto Aguiar. Fachada e pormenor de fachada, fotografias da autora.
48
Aspetos particulares analisados
Fig. 28. Av. António Augusto Aguiar, 9 planta tipo, in AAP 1987: 160.
49
largura, o corredor principal tem 8.2m, e o de serviço 4.5m. Os vãos interiores que fazem
a comunicação entre os corredores e as divisões, têm valores bastante variados entre
0.70m e 2m, sendo que os maiores correspondem às divisões sala e sala de refeições e
os mais pequenos às divisões funcionais como a dispensa e I.S. Outra característica
destes vãos, é a orientação frente a frente, permitindo uma maior comunicação entre as
divisões inclusive visual.
Partição da Casa
A distribuição da AU neste fogo é: 27% para o uso privado, 37% para o uso
social e 14% para os serviços. Não há comunicação direta entre divisões de diferentes
usos, no entanto há comunicação direta entre o escritório, a saleta e a sala. Embora a
sala de refeições seja a única divisão de uso social que não comunica diretamente com
as restantes divisões com o mesmo uso, está frente-a-frente com a sala separadas
apenas pelo corredor. Não só permite uma comunicação visual, como também uma
proximidade física. Além de estarem frente-a-frente, são as duas divisões com os vãos
interiores de maiores dimensões (2m) facilitando essa comunicação física e apropriação
dos espaços em simultâneo. As divisões de uso social desenvolvem-se orientadas
perpendicularmente ao corredor principal, ocupando a maior parte da fachada de rua e
parcialmente a fachada tardoz. As divisões de uso privado seguem-se às sociais,
ocupando o restante da fachada de rua e também parte da fachada tardoz. Entre as
sociais e as privadas situam-se as I.S. que partilham a mesma fachada tardoz. Na zona
mais afastada da fachada de rua, encontram-se as divisões de serviços que incluem a
cozinha e o quarto da empregada com I.S.
Elementos da Casa
Todas as divisões têm um vão exterior, à exceção da sala que tem dois, os da
fachada de rua são de sacada com varandim, os restantes vãos exteriores são de peito.
A sala uma vez que é a única divisão social que não está na fachada de rua, tem um vão
exterior de maior dimensão colmatando a desvalorização comparativamente com as
outras divisões. Para três quartos há três instalações sanitárias, uma completa e duas
mais pequenas sem banheira. Os únicos espaços do fogo que não têm comunicação
com o exterior diretamente são a dispensa e os corredores, dependendo das outras
divisões para a ventilação e iluminação natural. Junto à cozinha, há uma zona fechada
mas exterior ao fogo, que se destina ao tratamento da roupa.
50
Aspetos Arquitetónicos Relevantes
O edifício existe e cumpre o mesmo programa funcional, piso térreo para comércio
e os pisos superiores para habitação. É um edifício com uma imagem imponente, cuja
ocupação se destinava à classe alta, inserido num quarteirão onde a proporção
fachada/empena será de um para um. Na fachada de rua, além da diferença assumida
pelo pé direito mais alto no piso térreo e pela materialidade utilizada na fachada, há
ainda um grande destaque visual, induzido pela aplicação de uma cor forte emoldurada
por um revestimento em pedra. A porta assume um papel primordial na fachada não só
devido à dimensão, mas também pelos elementos decorativos metálicos. Em planta,
constata-se a receção através do hall, uma intercomunicação entre salas e em
simultâneo a mesma supressão de intercomunicação entre quartos, que havia
acontecido nos exemplos anteriores da mesma categoria, e ainda um elemento novo: o
quarto da empregada. Este último veio no seguimento da (…) separação efetiva da
família relativamente aos seus empregados (Pereira, 2012: 60), sendo visto como área
de serviços e portanto colocada junto à cozinha de acordo com a lógica de agregação de
funções. Além do quarto destinado às empregadas, algumas têm também uma
instalação sanitária que é o caso deste exemplo. Há uma nítida preocupação com a
subdivisão das instalações sanitárias, de forma a responder às diversas necessidades
dos vários elementos da família, permitindo assim o uso em simultâneo. Este exemplo
tem a particularidade de ser desenvolvido ao longo da fachada, ao contrário do usual
desenvolvimento perpendicular à fachada visto até aqui, beneficiando assim dum maior
número de vãos na fachada de rua.
51
3.3.4 Caso de Estudo 8 – Rua Cervantes, 4 (1947-48).
Este caso de estudo situa-se na rua Cervantes, que é uma rua perpendicular a
uma das avenidas principais de Lisboa, a Avenida João XXI, que une a praça do Areeiro
à praça do Campo Pequeno. A rua de Cervantes rompe um quarteirão, fazendo a ligação
entre a Av. João XXI e a Av. de Madrid. É um prédio de rendimento de 1948, destinado a
habitação, estando enquadrado num período pós-guerra. O edifício é composto por dois
corpos unidos pelo bloco de escadas, sendo que o primeiro é composto por dois fogos
por piso, e o segundo por apenas um. Os fogos são todos T2, mudando apenas a
organização devido à separação do segundo corpo. Sendo assim, numa lógica de
análise dos dois fogos diferentes, atribuímos a designação de T2A ao fogo do copo
maior, e T2B ao fogo do corpo isolado. Os fogos são então compostos por dois quartos,
uma sala, uma cozinha e uma instalação sanitária. Não há escadas de serviço neste
exemplo, e o bloco de escadas assume um papel central no conjunto dos corpos e na
sua agregação.
52
Aspetos particulares analisados
Fig. 31. (à esquerda). R. Cervantes, 4, planta tipo, fonte: CML, tratada pela autora. (à direita)
Análises realizadas pela autora utilizando a mesma planta.
53
Partição da Casa
T2A e T2B: A distribuição da área útil segundo os vários usos, é quase igual nos
dois casos A e B, verificando-se apenas uma ligeira diferença na percentagem da AU
para o uso privado, sendo que no A é de 32% e no B de 24%. Esta diferença pode ser
consequência da área dispensada para a distribuição, que na tipologia B é superior à da
A. Não há comunicação direta entre divisões em nenhuma das tipologias, embora
aconteça um alinhamento visual entre vãos interiores na tipologia B devido à
configuração do hall.
Elementos da Casa
Todas as divisões são dotadas de vãos exteriores, sendo que no T2A, os da sala
e os da cozinha são de sacada com varanda, e os restantes de peito; e no T2B apenas
um dos quartos e a sala beneficiam de vãos exteriores de sacada com varanda, e os
restantes de peito. No T2B, verifica-se ainda uma valorização da divisão social, sendo
favorecida com três vãos exteriores, um de sacada como já referido, e os outros dois de
peito. No corpo maior, as divisões situadas na fachada principal são: a sala e o quarto
principal, deixando a cozinha, a I.S. e o outro quarto na fachada traseira; no volume
isolado, a organização do espaço é praticamente a mesma que o T2A, mas está em
espelho com o bloco de escadas como charneira.
54
edifício como já referimos, mas também a desconstrução do próprio quarteirão que é
“invertido”. A rua atravessa o quarteirão no seu interior, atribuindo um carácter principal
às fachadas de dentro do quarteirão, e um carácter secundário às fachadas
supostamente exteriores. Há assim uma inversão entre exterior e interior, invertendo a
normal perceção que nos é “dada” pelos quarteirões normalmente.
55
anteriormente, remetendo para o segundo modelo familiar referido anteriormente- família
fusão.
Este exemplo insere-se no Bairro de Alvalade, cujo plano urbano inicial (1945-
47) foi realizado na sequência do Plano de Gröer (1938-48). O Bairro das Estacas ocupa
a Célula VIII do Plano Urbano de Alvalade, foi desenhado pelos arquitetos Ruy Jervis
Athouguia (1917-2006) e Sebastião Formosinho Sanches (1922-2004), que fizeram
alterações ao plano inicial de João Guilherme Faria da Costa (1906-71). É do mesmo
período do exemplo anterior, uma altura de desenvolvimento económico durante o
clímax do Estado Novo. O edifício está inserido num quarteirão com os topos abertos,
elevado sobre pilotis e com mais que uma tipologia. Para esta análise, foram escolhidas
duas tipologias: T3 e T3 Duplex. Ambos os fogos são compostos por três quartos, uma
sala, uma cozinha com zona de tratamento de roupa e uma I.S. completa. Os acessos
verticais são compostos apenas por um bloco de escadas, que acedem a dois fogos por
piso, e quatro no caso do duplex.
56
Aspetos particulares analisados
Fig. 33. Bairro das Estacas. Da esq. para a dir. : Duplex 1º e 2º andar, respetivamente, T3 planta
tipo, in Sanches e Atouguia, 1954: 4.
57
As dimensões do hall, do corredor e dos vãos é igual à tipologia T3. O piso de entrada
tem um carácter público, e do superior tem um carácter privado.
Partição da Casa
Elementos da Casa
58
projeto. A área de lazer que era comum estar subdividida é agora um espaço que
cumpre a função de estar e de refeição. A divisão de casa de banho é removida para o
interior, para a área privada e junto dos quartos seguindo também a lógica funcional. O
desenho do fogo permite a existência de duas fachadas relativamente idênticas,
desaparecendo por completo a oposição entre fachada/traseiras. Todas as divisões têm
acesso a varandas, resultando em fachadas simples onde essas varandas funcionam
como elementos unificadores, sobressaindo apenas as zonas técnicas com elementos
cerâmicos perfurados. Hoje em dia, devido à atitude comum de fechar as varandas para
usufruir dessa área coberta, há uma leitura bastante diferente, saltando entre vazios e
vazios preenchidos. As tipologias duplex assumem um papel dinamizador na fachada,
uma vez que o facto de não existir zona técnica no último pios se reflete diretamente na
fachada.
Fig. 35. Cruzamento entre Av. Estados Unidos da América e a Av. de Roma. Fachadas e
pormenor, fotografias da autora.
59
desenhado pelos arquitetos Filipe Figueiredo e José Segurado, composto por um
conjunto de edifícios que “cosem” com a envolvente, e outros quatro, mais altos, que
assumem uma verticalidade imponente. É um projeto de grande plasticidade exterior
com fachadas ritmadas pelos elementos estruturais, e onde dois dos quatro grandes
volumes, se elevam sobre pilares. Tal como na Unidade de Marselha, aqui a proposta,
era o piso do meio dos grandes volumes assumir a função de comércio, que depois não
se concretizou, destinando-se a habitação. Ao tempo, esta obra foi um paradigma de
inserção de um modelo moderno, uma espécie de unidade de habitação, numa área da
cidade desenvolvida segundo padrões relativamente tradicionais de ruas e quarteirões
(Almeida, 1998: 198).
O fogo escolhido para análise foi o fogo tipo do edifício referenciado na proposta
geral como 22M. É então uma tipologia T3, composta por três quartos, uma sala, uma
cozinha com uma zona semiexterior e uma I.S. completa. Os acessos verticais do
edifício são compostos por um bloco de escadas, elevadores e monta carga, servindo
dois fogos por piso.
Fig. 36. (à esquerda). Av. Estados Unidos da América, Lote 21, planta tipo, fonte: CML, tratada
pela autora. (à direita) Análises realizadas pela autora utilizando a mesma planta.
60
Fig. 37 .Cruzamento entre Av. Estados Unidos da América e Av. Roma planta tipo plano urbano,
fonte: CML, tratada pela autora.
A estrutura distributiva apresenta uma hierarquia dada pela separação das áreas
distributivas, criando filtros para uma maior seleção e consequentemente maior
privacidade nalgumas divisões. A entrada é feita para um hall (3.5mx1.8m) dotado de um
armário, que distribui para a divisão da cozinha ou para a divisão social. Daqui a sala
assume também um papel distributivo, acedendo a uma segunda área distributiva – um
corredor com 1.45m de largura e 6.9m de comprimento, que permite o acesso às
divisões mais privadas – quartos, e à instalação sanitária no final. O hall neste exemplo
funciona como um primeiro filtro entre público / privado, a sala representa um filtro mais
“apertado” dividindo entre social / privado. Os vãos interiores das divisões têm todos
0.75m, à exceção do vão entre o hall e a sala que assume uma maior expressão com
1.15m.
Partição da Casa
61
Elementos da Casa
Todas as divisões do fogo são dotadas de vãos exteriores, todos eles de sacada
com varanda, assumindo uma expressão na fachada constante. A cozinha está ainda
agregada a uma área semiexterior, utilizando as mesmas técnicas referidas em
exemplos anteriores de parede perfurada permitindo essa dualidade. Todas as divisões
garantem então luz e ventilação naturais, e há apenas uma casa de banho para os três
quartos.
62
3.4.3 Caso de Estudo 11 – Bloco das Águas Livres (1953-55)
Fig. 38. Bloco das Águas Livre. Fachada principal, fotografias da autora.
O Bloco das Águas Livres é um edifício dos arquitetos Nuno Teotónio Pereira
(1922-2016) e Bartolomeu Costa Cabral (1929). Localiza-se na praça das Águas Livres,
na freguesia de Campo de Ourique. É um bloco habitacional construído, no mesmo
período de desenvolvimento económico durante o Estado Novo, que os exemplos 9 e 10.
Toussaint (2010) refere-se a ele como uma célula de cidade por ser um edifício
relativamente solto no espaço e por outro lado denso, tornando-se um protótipo de uma
cidade moderna. Este bloco habitacional tem quatro tipologias distintas, e além de
habitação destina-se também a escritórios/ateliers e alguns serviços complementares à
habitação. Para análise foram escolhidas duas tipologias, a maior T4 e a mais pequena
T1. Os acessos verticais são maioritariamente elevadores, embora haja duas caixas de
escada devido à regulamentação. Cada elevador dá acesso a dois fogos por piso, à
exceção dum que serve apenas uma tipologia (T4) por piso. Há ainda uma galeria ao
longo da fachada tardoz que faz a comunicação entre todos os acessos verticais. A
tipologia T1 é composta por um quarto, uma sala, uma cozinha com zona de tratamento
de roupa e uma I.S. completa. O T4 é mais complexo, e ocupa o topo do bloco
habitacional. Este é composto por quatro quartos, uma sala, uma cozinha com zona de
tratamento da roupa, três I.S. completas e ainda uma zona de estendal.
63
Aspetos particulares analisados
Fig. 39. Bloco das Águas Livres planta tipo, in Pereira e Cabral, 1959 : 9.
Partição da Casa
Tipologia T1: Neste fogo verifica-se uma utilização de 18% para o uso privado da
AU, 40% para o uso social e 16% para os serviços. Sobre a comunicação entre divisões,
64
a única comunicação entre divisões que existe é entre a sala e o quarto através de uma
porta de correr. Uma vez que a galeria é longitudinal e se encontra na fachada tardoz, os
fogos estão orientados para a fachada de rua. As zonas técnicas encontram-se junto à
galeria, enquanto a sala e o quarto ocupam a zona privilegiada do fogo.
Elementos da Casa
Tipologia T4: Este fogo é privilegiado sendo que partilha apenas um troço da
parede exterior com a zona da galeria, permitindo vãos exteriores com maior
privacidade. Na fachada tardoz encontram-se os vãos exteriores das zonas técnicas, um
dos quartos cujo vão exterior é de sacada e comunica com a área de estendal, na
fachada de topo rompem-se os vãos dos quartos que são três de sacada e um de peito
com uma varanda comum. À semelhança do que acontece no T1, a sala tem dois
grandes vãos de sacada com uma varanda ampla, e ainda um vão de peito
correspondente a um dos quartos.
65
estritos princípios funcionalistas do movimento moderno (Tostões, 1998: 218). Neste
bloco habitacional há apenas lugar para o quarto de empregada, na tipologia maior, T4.
Há uma projeção da lógica de isolamento de grupos sociais, no detalhe projetual da
colocação de um pequeno vão entre a cozinha e a galeria, permitindo a receção de
produtos e mercearias, assim como os vários percursos com diferentes destinos de
utilização. A lógica dos fogos é igual em qualquer que seja a tipologia, sendo de referir a
preocupação demonstrada na tipologia maior, T4. Esta tipologia beneficia do topo do
edifício, simultaneamente de mais vãos exteriores possibilitando assim o aumento dos
quartos. Aqui a arrumação também tem um papel importante, fazendo parte da
organização do espaço doméstico, fator importante para uma sociedade moderna regida
pelo consumo. A oposição fachada / traseiras está presente, sendo que a fachada
principal apresenta-se dinâmica onde as varandas lhe conferem ritmo, assim como a
utilização de diferentes materiais e cores no revestimento. A fachada traseira segue
portanto, uma função técnica.
Fig. 41. Av. Infante Santo, 57. Fachada principal, fotografias da autora.
O fogo deste caso de estudo situa-se na Avenida Infante Santo, avenida que foi
traçada no início do século XX, e que posteriormente sofreu um plano para a sua
continuação em 1954. O caso de estudo deste exemplo pertence ao plano municipal,
66
desenhado por Alberto José Pessoa, Hernâni Granda e João Abel Manta. Foi construído
num período de apogeu do Estado Novo. O edifício está inserido num conjunto de
edifícios iguais, em banda contínua e destina-se a habitação. É um edifício
esquerdo/direito, cada fogo é composto por três quartos, uma sala, uma de refeições,
uma cozinha, uma zona de estendal, uma I.S. completa com uma divisão extra com
chuveiro e lavatório, e ainda um quarto de criada com I.S. completa. Este é o primeiro
exemplo dos analisados que já tem elevador, e apenas umas escadas.
Fig. 42. Av. Infante Santo, 57 planta tipo, fonte: CML, tratada pela autora.
67
Estrutura Distributiva do Fogo
Partição da Casa
Elementos da Casa
Não há uma única divisão que não tenha vãos exteriores, sendo que todos os
vãos da fachada principal são de sacada com varanda. O vão exterior da sala de
refeições é o único de sacada com varanda na fachada tardoz, e os vãos exteriores do
quarto da empregada, da cozinha e da I.S. são de peito. Para os três quartos há uma
casa de banho completa e uma divisão extra com um duche e um lavatório, permitindo a
sua utilização simultânea.
68
Aspetos Arquitetónicos Relevantes
69
tipologias de edifício, que por sua vez também tem influência direta na distribuição e
acessos, as plantas espelham as preocupações modernistas e racionalistas da utilização
das áreas. Desde a procura de novas formas que possibilitassem uma maior
rentabilidade dos espaços, à aglomeração das zonas técnicas resultando em paredes
técnicas, são preocupações onde estas novas habitações pretendem incidir. Em
comparação com as classes de exemplos identificadas anteriormente, é visível o
desaparecimento de algumas oposições como: frente/traseiras, as novas tipologias
principalmente em torre excluem por completo as traseiras e o masculino/feminino, já
não existindo divisões destinadas consoante o género.
Fig. 44. Olivais Norte, cat. II. Duas das fachadas, fotografias da autora.
Este exemplo enquadra-se no Plano dos Olivais Norte, desenvolvido entre 1955
e 1958 no GTH, por Sommer Ribeiro, Pedro Falcão e Cunha e Guimarães Lobato. É o
último exemplo da década de 50, fazendo ainda parte do período de desenvolvimento
económico durante o Estado Novo. No plano há vários edifícios de categorias diferentes
(I, II, III e IV), para o exemplo escolhido optámos pelo edifício de categoria II. É da
autoria dos arquitetos Nuno Teotónio Pereira, Nuno Portas e António Pinto de Freitas,
ganhou o Prémio Valmor atribuído em 1967. Este edifício em torre tem ainda três
tipologias (T1, T2 e T3) mas para efeitos de análise foram selecionadas apenas duas, o
70
T1 e o T3. Este é um edifício em Torre com 8 pisos, destinado exclusivamente a
habitação, os acessos verticais principais são elevadores, existindo sempre uma caixa
de escadas. Os acessos verticais ocupam o centro do edifício, e os fogos desenvolvem-
se em redor beneficiando de todas as fachadas exteriores. A tipologia T1 tem uma planta
bastante simples, é composta por um quarto, uma sala, uma cozinha e uma I.S.
completa. O T3 é mais complexo com três quartos, uma sala, uma cozinha com zona de
tratamento da roupa e uma I.S. completa.
Fig. 45. (em cima) Olivais Norte, cat. II planta tipo, in AAP 1987: 254. (em baixo) Análises
realizadas pela autora utilizando a mesma planta.
71
Estrutura Distributiva do Fogo
Partição da Casa
Elementos da Casa
Tipologia T1: Esta tipologia beneficia de duas fachadas exteriores, numa delas
são rasgados dois vãos exteriores ambos de peito, um que corresponde à cozinha e
outro à sala. Na outra fachada, rompem-se os vãos de maior importância, um deles de
sacada com varanda que corresponde à sala, e o outro mais pequeno e de peito que
corresponde ao quarto. A I.S. é interior, sendo que está privada de iluminação e
ventilação naturais.
72
sala, na outra fachada há ainda 4 vãos de peito, três correspondentes a cada quarto e
um que pertence também à sala.
Fig. 46. Olivais Sul, cat II. Fachada e pormenor de fachada, fotografias da autora.
73
Questões determinantes iniciais
Este caso de estudo pertence ao Plano dos Olivais Sul, realizado também no
GTH pelos arquitetos Rafael Botelho, Carlos Duarte, Mário Bruxelas, Celestino de Castro
e António Pinto de Freitas. Foi um projeto realizado em 1960/1961, menos de um ano
antes da Guerra Colonial que levou a uma crise económica e política em Portugal. À
semelhança do que aconteceu no Plano dos Olivais Norte, também aqui foram pensados
e projetados edifícios de várias categorias. O caso de estudo 14 debruça-se sobre um
edifício em torre de categoria II, destinado exclusivamente para habitação com sete
pisos e 4 tipologias T2 por piso. Os acessos verticais são compostos por dois elevadores
e uma caixa de escadas, colocados de maneira a ocuparem pouca área de fachada e o
mais central possível. Os fogos organizam-se em plantas quase quadradas, em redor
dos acessos verticais. Cada fogo é composto por dois quartos, uma sala, uma cozinha e
uma I.S. completa.
Fig. 47. Olivais Sul, cat II planta tipo, in GTH, 1980 : 29.
74
Fig. 48. Análises realizadas pela autora utilizando a fig. 47.
Este fogo apresenta uma estrutura distributiva com alguma hierarquia, com duas
zonas de distribuição, uma de carácter privado e outra mais pública. A entrada é feita
para uma pequeno hall (1.8mx1.3m), que dá acesso à cozinha, à sala e a outro espaço
distributivo (2mx1m) que acede a um dos quartos. Há ainda uma área de distribuição de
carácter privado que faz a transição entre três divisões, a sala e a casa de banho e o
outro quarto. Os vãos interiores entre divisões e áreas de distribuição têm todos
aproximadamente 0.75m.
75
Partição da Casa
Neste fogo a distribuição da AU é de 34% para o uso privado, 24% para o uso
social e 22% para os serviços. A comunicação entre espaços de usos diferentes
acontece entre a sala e a cozinha, através de um vão interior. A sala acaba por assumir
um papel central no fogo e também distributivo. A área da cozinha é colocada
estrategicamente junto a uma das duas paredes exteriores do fogo, mas interiores no
edifício, libertando assim as fachadas mais privilegiadas para as outras divisões. A casa
de banho é colocada entre os dois quartos, sendo acedida através da área de
distribuição privada.
Elementos da Casa
Cada fogo tem duas paredes exteriores com vãos, uma parede exterior com o
vão da porta de entrada e uma parede exterior sem vãos, partilhada com outro fogo. A
fachada correspondente aos dois quartos e à I.S. tem apenas dois vãos exteriores,
ambos de peito, um (0.9m) do quarto e outro mais pequeno (0.4m) da casa de banho. A
outra fachada dotada de vãos exteriores corresponde a três divisões, à cozinha, à sala e
a um dos quartos. Os vãos da cozinha e do quarto são de peito, o da sala é de sacada
com varanda. Há ainda um recuo da fachada entre a sala e o quarto, permitindo ao
quarto aceder através de um vão de sacada à varanda. O vão de peito da cozinha, tem
uma zona de estendal protegida por uma estrutura metálica.
Esta torre onde incide o caso de estudo 14, também permite a entrada de luz e
ventilação no patamar de acessos, criando um elemento dinâmico na fachada
contrapondo com as linhas direitas e simples das plantas. O fogo apresenta um
elemento bastante extravagante e chamativo, uma sala que se desenrola para o interior
do fogo. O facto de a planta ser praticamente quadrangular, e ter apenas duas arestas
exteriores, cria automaticamente uma área mais escura, onde a solução encontrada foi o
“puxar” a sala para o interior de forma a trazer alguma luz natural. Com esta
organização, a sala assume uma forma dinâmica com ângulos em planta, que se
desenvolve na diagonal, servindo de elemento aglutinador de todas as divisões. Este é
mais uma vez o reflexo da sala a assumir um papel principal no fogo, quer seja de
caracter distributivo e permeável ou local de comunhão familiar. Neste fogo o motor é
dividido em duas partes, a cozinha estende-se ao longo duma das paredes e a I.S. é
colocada na parede oposta, intercalada com os quartos. A oposição público/privado está
bastante demarcada neste fogo, através da separação das áreas distributivas e da fácil
comunicação entre sala/cozinha.
76
3.5.3 Caso de Estudo 15 – Olivais Sul, categoria III (1960-61)
Fig. 49. Olivais Sul, cat. III. Fachada e pormenor da caixa de escadas exteriores, fotografias da
autora.
77
Aspetos particulares analisados
Fig. 50. (em cima) Olivais sul, cat III planta tipo, in GTH, 1980 : 30. (em baixo) Análises realizadas
pela autora utilizando a mesma planta.
78
Partição da Casa
Elementos da Casa
Todas as divisões são dotadas de um vão exterior, sendo que o vão da casa de banho é
de dimensões mais reduzidas. Os vãos exteriores dos quartos são de peito, o vão
exterior da sala é de sacada com varanda e o vão exterior da cozinha é de peito. A zona
de estendal é composta por elementos físicos na fachada, junto ao vão exterior da
cozinha.
79
3.5.4 Caso de Estudo 16 – Olivais Sul, categoria IV (1960-61)
Fig. 51. Olivais Sul cat. IV. Duas das fachadas, fotografias da autora.
Este é o último exemplo do Plano dos Olivais Sul, pertence à categoria mais
elevada (IV) e foi projetada pelos arquitetos Jorge Ribeiro Ferreira Chaves e Goulartt de
Medeiros. O edifício desenvolve-se em torre com os acessos verticais ao centro,
compostos por elevadores e duas caixas de escadas, umas interiores e outras
exteriores. Cada piso tem quatro fogos, dois de tipologia T3 e dois T4, para efeitos de
análise optámos pela tipologia maior. A lógica dos fogos é a mesma, daí termos optado
pela tipologia T4 que é composta por quatro quartos, uma sala, uma cozinha e duas I.S.
completas.
80
Aspetos particulares analisados
Fig. 52. Olivais Sul, cat. IV planta tipo, in GTH, 1980 : 31.
81
interiores entre as zonas de distribuição e as divisões são todos de aproximadamente
0.8m.
Partição da Casa
Elementos da Casa
82
do espaço. É portanto assumida a estrutura visualmente, sendo ocultada no resto da
casa. Mantém-se a relação de proximidade entre a sala a cozinha, e em simultâneo,
entre as instalações sanitárias e os quartos. Mais um exemplo da prevalência da
oposição público/privado, marcada pelo uso do hall como elemento de acesso e
distribuição das áreas assumidas como públicas, e o uso do corredor para acesso aos
quartos.
83
3.6.1 Caso de Estudo 17 – Torres de Alfragide (1968/1973).
Este é o único caso de estudo que não pertence à cidade de Lisboa, no entanto
optámos por mantê-lo devido às suas qualidades arquitetónicas. Este exemplo insere-se
na freguesia de Alfragide, município da Amadora, e foi construído em 1973. A nível
político e social enquadra-se no ano anterior ao 25 de Abril, antecedendo portanto a um
período de grande instabilidade a todos os níveis. Projetado pelo atelier Conceição Silva,
as torres são destinadas a habitação com 4 ou 5 fogos por piso, dependendo da
existência de duplex. A maioria das habitações são tipologias T3, variando a
organização, há ainda algumas tipologias com quarto de criada com I.S. Para a tabela de
análise, optámos pela tipologia B, constituída por três quartos, uma sala, uma cozinha
com zona de estendal e duas instalações sanitárias. Os acessos verticais do edifício são
um núcleo central composto por elevadores, uma caixa de escadas e ainda uma queda
de lixos.
84
Aspetos particulares analisados
85
Estrutura Distributiva do Fogo
Partição da Casa
Elementos da Casa
86
deve ao facto de as classes sociais mais elevadas terem a possibilidade financeira de
contratar uma criada a tempo inteiro, nesse caso terá de haver separação no fogo.
Contrastante com esse hábito “antigo”, neste caso de estudo, além da existência de
duplex, em qualquer que seja a tipologia, cada divisão é assumida como um volume
independente em planta e em alçado, reproduzindo linhas perpendiculares e formas
maciças. Na planta que analisámos, é notável a distinção entre o quarto principal e os
secundários, reflexo da hierarquia familiar. Todas as divisões que se destinam a função
dormir, usufruem de um armário que está integrado na matriz organizadora do fogo, tal
como se começou a verificar nos exemplos da Mudança de Paradigma. A sala mantém a
posição principal no fogo, centralizada e próxima da entrada e da cozinha.
Fig. 57. Complexo Habitacional Olaias. Fachada principal e traseiras, fotografias da autora.
87
habitacional é desenvolvido em banda e tem tipologias T2, T3 e T4 em duplex. Os
acessos verticais são compostos por dois elevadores e uma caixa de escada, cada
núcleo destes dá acesso a dois fogos por piso. Para a análise que se segue, optámos
pela tipologia T3 composta por três quartos, uma sala, uma cozinha e duas I.S.
Fig. 58. Complexo Habitacional Olaias, planta tipo, in Fernandes e Lacerda, 1985 : 7.
Embora tenha esta análise sido feita com base na tipologia T3, o T2 segue
exatamente a mesma organização e lógica. A entrada no fogo é feita para um hall
(3.4mx2m), sendo que a divisão mais próxima é a cozinha. Todas as outras divisões são
acedidas pelo hall, embora se possa verificar três níveis de proximidade à entrada do
fogo. No primeiro nível, de carácter menos privado, há o acesso à cozinha, num segundo
nível de privacidade há a entrada para um dois quartos e uma I.S., e para a sala, por fim
num último nível de privacidade há a entrada para o outro quarto e a outra I.S.
88
Partição da Casa
Neste exemplo a percentagem maior de área útil é definida para o uso privado,
ocupando assim 40%, o uso social ocupa 29%, e para os serviços são atribuídos 19% do
total da AU. Há comunicação direta entre a cozinha e a sala, tanto através da partilha do
espaço, como através da utilização de um passa-pratos. O fogo desenvolve-se
perpendicularmente à banda, beneficiando assim das duas fachadas do edifício. À
fachada de rua corresponde a zona pública da casa, enquanto à fachada tardoz
corresponde a zona privada.
Elementos da Casa
Este complexo é dotado duma expressão visual bastante forte, desde as cores,
aos vãos em forma circular até à colocação de colunas técnicas no exterior. A
composição visual de elementos geométricos, e a aplicação de três cores: verde,
amarelo e rosa/magenta, consoante o tipo de elementos, confere ao edifício uma
linguagem arquitetónica própria. Em planta as soluções apresentadas partilham a
mesma lógica funcional, independentemente da tipologia. Analisando o fogo T3, a
organização dos espaços remete automaticamente para a oposição público/privado,
sendo a zona pública composta pela cozinha e a sala intercomunicantes entre si, e a
zona privada pelos quartos e casa de banho. Volta a ser visível de alguma forma a
oposição entre dia/noite em paralelo com frente/traseiras, a frente é usufruída pelas
divisões “diurnas” – sala, cozinha, enquanto as traseiras são usufruídas pelas divisões
“noturnas” – quartos. Este edifício acaba por unir conceitos e matrizes antigas com
alguns ideais modernistas, dos conceitos antigos estão representados: distribuição dos
fogos esquerdo/direito, oposição frente/fachada; de princípio modernista são notáveis: as
tipologias em duplex, as áreas mínimas seguindo os ideais funcionalistas e a
aproximação entre a cozinha e a sala.
89
3.7 Síntese
Após a análise linear caso a caso, podemos constatar alguns factos, agora de uma
forma comparativa entre os dezoito exemplos, comparando áreas úteis, número e
variedade de divisões, estruturas distributivas, e programa do edifício.
90
4 Conclusão
Portugal passou por uma Primeira República entre 1910 e 1926, que conduziu
quase 50.000 portugueses a imigrarem principalmente, para o Brasil, e que travou desde
início uma “luta” contra a Igreja. A entrada na guerra ao lado de Inglaterra deixou o país
com uma dívida que foi paga nos anos que se seguiram, ao custo do empobrecimento
das classes média e baixa, durante um período de grande instabilidade política. Num
panorama europeu de ditadura, o Estado Novo distinguiu-se pelo seu autoritarismo
principalmente com a PIDE; marcou o seu lugar nas construções públicas e privadas,
onde as linhas construtivas assumiam uma analogia ao poder, e ainda foi realizada da
Exposição do Mundo Português em 1940, na tentativa de enaltecer o país no cenário da
II Guerra Mundial. A ajuda financeira vinda do Plano Marshall permitiu a Portugal, um
desenvolvimento global que se estendeu em vários novos ramos (Cimentos, Refinação
do petróleo, construção naval, entre outros), tendo contribuído também para a
construção de edifícios estatais. O país assistiu a um despovoamento do interior,
aumentando a população nas grandes cidades e consequentemente um aumento do
sector terciário como reflexo de uma sociedade pós industrial, assim como também se
propiciou um aumento no sector do turismo. Houve uma mudança de pensamentos e de
hábitos, produto de influência europeia, colaborando para um aumento da população
literata inclusive do género feminino. Depois do 25 de Abril, Portugal recebeu um grande
número de retornados, aumentando a procura à habitação. Os anos seguintes foram
bastante instáveis economicamente, socialmente e politicamente, marcando a mudança
a entrada do país na CE em 1986.
Ficou claro para nós, que as várias transições entre as tipologias de edifícios
habitacionais estudadas são originadas por diferentes motivos. A transição entre os
Prédios de Rendimento e os edifícios Rabo de Bacalhau parte de uma lógica higienista,
contudo já é visível uma mudança de modelo familiar, principalmente pelo número de
divisões e com a agregação da sala de estar com a sala de refeições. A transição entre o
Rabo de Bacalhau e a Mudança de Paradigma terá sido a mais contrastante,
91
influenciada pelo Movimento Moderno, onde não só o fogo sofre alterações como
também a lógica do edifício é totalmente posta em perspetiva. Entre a Mudança de
Paradigma e os Novos Bairros, a maior particularidade está assente na oportunidade de
aplicação dos princípios urbanos do Movimento Moderno em novas parcelas da cidade,
e não limitadas ao edifício. Por fim, a transição entre os Novos Bairros e os anos
seguintes a que demos o nome de 1970/1990 – Pós Modernismo, já é mais suave,
devido a uma estagnação do funcionalismo adotado com o RGEU.
Concluímos portanto, que esta dissertação pode representar apenas uma secção
de uma malha complexa, que agrega vários campos, como a própria natureza da
disciplina de Arquitetura.
92
Bibliografia
Referenciada
ALMEIDA, Rogério Vieira da, “Edifícios no Cruzamento da Avenida dos Estados Unidos
da América com a Avenida de Roma”, in BECKER, Annette, TOSTÕES, Ana, WANG,
Wilfried, Arquitectura do Século XX: Portugal, Alemanha, Prestel, 1998, p. 198
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novos bairros aos novos aglomerados”, in MEDEIROS, Carlos Alberto (Dir.), Geografia
de Portugal. Planeamento e ordenamento do território, Parte IV, IV Volume, Lisboa,
Círculo de Leitores, 2006, pp. 362-368
93
FERNANDEZ, Sérgio, “Arquitectura Portuguesa, 1961-1974”, in BECKER, Annette,
TOSTÕES, Ana, WANG, Wilfried, Arquitectura do Século XX: Portugal, Alemanha,
Prestel, 1998, pp. 54-63
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impacto ambiental de construções solares passivas em climas temperados. Dissertação
de doutoramento em Engenharia Civil, Universidade do Minho de Guimarães, 2005
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in Quadern’s d’Arquitectura i Urbanisme nº 250, ed. Co.legi d’Arquitectes de Catalunya,
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sociedade portuguesa a partir da casa, Casal de Cambra, Caleidoscópio, 2012
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(Coord.) Atlas Urbanístico de Lisboa, Lisboa, Argumentum, 2006, pp. 12-18
94
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Consultada
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Continental, Porto, Universidade Fernando Pessoa, 2014.
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Faculdade de Arquitetura, Universidade Técnica de Lisboa, 2013
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95
TEIXEIRA, Liliana – Start-up Architecture! Repensar o espaço doméstico sob uma nova
lógica de flexibilidade e adaptabilidade. Coimbra: Dissertação de Mestrado,
Departamento de Arquitectura, Universidade de Coimbra, 2013
Webgrafia
96
Anexos
97
fregues tipologia tipologia AB fogo AU divisões época categorias de análises
nº exemplo data época categoria planta publicação prémio obs
ia edifício fogo m2 quarto sala coz. I.S. outras histórica programa organização estrutura distributiva
prédio rendimento
Avenidas Novas
circulação O saguão na
Av. Visconde 10 + 11 + 14,5
1 1913 1910-20 T5 +1 124 19 8 7 habitação comunicação entre divisões privadas habitação -
Valmor 35 + 16
urbana'
prédio rendimento
Avenidas Novas
hall comum
22 + 14 + 14 + 30 + 19 + circulação O saguão na
Av. Duque de 11 +
2 1920 1910-20 T13 400 14 + 14 + 17 + 16 + 9,5 + 16 habitação com comunicação directa entre divisões habitação arquitecto Norte Júnior
Ávila 28-30 3,5
15 30,5 hall urbana'
PRÉDIO DE RENDIMENTO
semi-privado
primeira república
serviços privativo social 33% privado 31% social 9% serviços
circulação
Av. 5 de O saguão na
16 + 10 + 10 + 14 + 12 +
3 Outubro 126- 1920 1920-30 T9+1 230 9 10 habitação comunicação entre privado / social habitação -
10 + 10 + 15 25
138 urbana'
serviços privativos ocial
39% privado 28% social 10% serviços
escritório 14
circulação
16,5 + 12,5 + O saguão na
Rua Castilho 11,5 + 16 3,5 + 4
4 1937 1930-40 T10 245 10 + 15,5 + 10 8,5 habitação comunicação entre privado/serviços habitação -
65 + 27,5 + 3,5
+10 urbana'
hall
R. Joaquim
5 António 1937 1930-40 T5 145 20 + 13 + 12 22 + 16 11 7 habitação comunicação entre privado/social GUAL introdução do hall
Aguiar 35
serviços privativo social
prédio rendimento
hall
R. Almeida e 7 + 11 + 11 + circulação
6 1939 1930-40 T6+1 150 12 + 13 13 6 habitação sem comunicação directa entre divisões GUAL aproximação da cozinha à entrada
Sousa 63 12
RABO DE BACALHAU
serviços privativo social
33% privado 20% social 15% serviços
serviço
Avenidas Novas
hall
escritório 16
Av. António
1942/ 17 + 22 +18 17 + 28 + 8+3+ circulação
7 Augusto 1940-50 T8 278 16 habitação comunicação entre divisões sociais GUAL arquitecto Miguel Simões Jacobetty Rosa
7 +10 31 2,5 + 5
Aguiar 9 hall
semi-privado
guerra / pós-guerra
hall
32% privado 27 % social 14% serviços
Areeiro
T3 110 16 +10 + 8,7 23 11 3,6 circulação sem comunicação directa entre divisões RGEU
habitação +
Bairro das piso térreo Revista
Alvalade
hall
hierarquizada através de diferentes áreas de distribuição / entrada única
social
lade
quarteirão aberto n
Bairro das piso térreo Revista
Alvalade
1949/ 38% privado 20% social 16% serviços
9 Estacas - 1950-60 com habitação serviços privativo social Arquitectura
55
Célula 8 porteira e hall circulação hierarquizada por pisos diferentes / entrada única nº 53
comércio arquitectos Ruy Athouguia e Sebastião
Duplex T3 110 9 + 9 + 12,8 30 11 3,6 sem comunicação directa entre divisões
fregues tipologia tipologia AB fogo AU divisões época categorias de análises Formosinho Sanches
nº exemplo data época serviços social serviços privativo
30% privado 22% distributiva
social 16% serviços categoria planta publicação prémio obs
ia edifício fogo m2 quarto sala coz. I.S. outras histórica programa organização estrutura
pouco
hierarquizada através de hierarquizada / entrada
diferentes áreas única / entrada única
de distribuição
hall
rendimento
Novas
social
circulação O saguão na
Av. Visconde
Avenida EUA Alvalade 10 + 11 + 14,5 Arquitectura
prédiobanda
1
10 1913
1953 1910-20
1950-60 T5T3+1 124
130 10 + 11 + 19 19
34 8
7,5 7
5 habitação comunicação
sem entre
comunicação divisões
directa privadas
entre divisões habitação -
arquitectos: Filipe Figueiredo, José Segurado
Avenidas
Valmor
92 35 + 16 hall do Século XX
urbana'
MUDANÇA DE PARADIGMA
serviços privativo
hall
pouco hierarquizada / entrada única
com galeria
muito hierarquizada / entrada única
T1 130 20 44 10 7
prédio rendimento
circulação comunicação entre privado / social
de Ourique
habitação +
Novas
hall comum
22 + 14 + 14 + 30 + 19 + serviços circulação O saguão na
Av. Duque de 11 + 18% privado 40% social 16% serviços
2 Bloco Águas 1953/ Ohabitação
Bloco das
bloco habitacional
Ávila 28-30
Livres 55 3,5 hall Águas Livres'
15 30,5 es à habitação alguma hierarquia / entrada única urbana'
Campo
hall
PRÉDIO DE RENDIMENTO
24 + 13 + 22 + 8+5+ semi-privado
+ escritórios
república
T4 230 50 10 circulação sem comunicação directa entre divisões
14 3,5 serviços privativo social 33% privado 31% social 9% serviços
primeiraEstado
serviços privativo social 36% privado 24% social 13% serviços
apogeu
pouco hierarquizada
bastante hierarquizada / entrada
/ dupla entrada únicadistribuição
/ dupla
rendimento
entrada de entrada
Grande
serviço circulação
quarto criada
Av. 5 de O saguão
Atlas na
Av. Infante 16 + 10
10,5 + 10
+ 11 + 1413,5
+ 10 + 12+ + 5 +103,5 circulação arquitectos: Alberto Pessoa, Hernani Granda,
Estrela
prédiobanda
3 Outubro
12 126- 1920 1920-30
1956 1950-60 T9+1
T3 230
128 9
10 habitação
habitação comunicação entre
comunicação entre social
privado / social
/ serviços habitação
Urbanístico -
10 ++10
7,5+ 15 25
Campo
Santo
13857 16,5 + 2,5 urbana' João Abel Manta
de Lisboa
serviçosserviçosprivativos
social privativo
ocial
39%
27% privado
privado 28%
27% social
social 10%
25% serviços
serviços
escritório 14
circulação
circulação
16,5 + 12,5 + O saguão na
Rua Castilho 11,5 + 16 3,5 + 4 27% privado 38% social 26% serviços
4 Olivais Norte 1955/ arquitectos: Nuno Teotónio Pereira, Nuno
Olivais
1937 1930-40 T10 245 10 + 15,5 + 10 8,5 habitação comunicação entre privado/serviços habitação -
prédiotorre
hallhall
R. Joaquim circulação
5 António
Olivais Sul 1937 1930-40
1960/ T5 145 20 + 13 + 12 22 + 16 11 7 habitação comunicação entre privado/social GUAL introdução do hall
torre
14 1960-70 T2 77 12 + 11,5 16,5 12 3,5 habitação GUAL arquitectos Bruno Costa Cabral e Nuno Portas
Coração
serviços
serviços privativo
privativo social
social
NOVOS BAIRROS
35% privado 29% social 14% serviços arquitecto Cassiano Branco
Salazarnovo
rendimento
hall
hall
R. Almeida e 7 + 11 + 11 + circulação social
6 Olivais Sul 1939 1930-40
1960/ T6+1 150 12 + 13 13 6 habitação sem comunicação directa entre divisões GUAL arquitectos Fernando
aproximação G da silva
da cozinha e Octávio
à entrada
Olivais
torre
15 Sousa 63 1960-70 T2 109 9,512+ 8 29,5 7,5 3 habitação comunicação entre social / serviços GUAL
cat III 61 hall Rego Costa
Campo
prédio
RABO DE BACALHAU
serviços privativo social
serviços privativo
33% privado 20% social 15% serviços
18,5% privado 31% social 11% serviços
serviço
Olivais Novas
hall
escritório 16
torre
hall
semi-privado
guerra / pós-guerra
circulação
hall
32% privado 27 % social 14% serviços Jornal
Areeiro
17 Cervantes 4 1973
47 1970-80 T3 145 11 + 14 + 19 26 15 7+4 habitação sem comunicação directa entre divisões arquitecto Francisco Conceição Silva
1970/1980 - PÓS-MODERNISMO
Alfragide circulação pouco hierarquizada / entrada única Março/Abril
serviços privativo social
hall 1985
T2 B 78 10,4 + 8,6 21 8,8 4,6 sem comunicação directa entre divisões
37% privado 22% social 22% serviços
serviços privativo social 24% privado 27% social 17% serviços
Bairro das
Complexo piso térreo Revista
Alvalade
9 Habitacional
Estacas - 1950-60 com habitação serviços privativo social Arquitectura
18 1982
55 1980-90 T3 95 10 + 10 + 11 22 10 3 + 1,5 comunicação entre social / serviços arquitecto Tomás Taveira
Célula es porteira
à habitação hierarquizada por pisos diferentes / entrada única Março/Abril
Olaias8 e hall
serviços privativo circulação
social nº 53
+comércio
comércio 1985 arquitectos Ruy Athouguia e Sebastião
Duplex T3 110 9 + 9 + 12,8 30 11 3,6 piso térreo sem comunicação directa entre divisões
Formosinho Sanches
serviços social serviços privativo
40% privado 29% social 19% serviços
30% privado 22% social 16% serviços
hall
hierarquizada através de diferentes áreas de distribuição / entrada única
social
de