Você está na página 1de 6

Iscte-IUL, DAU, MIA | Arquitetura III, 1º Semestre, 2023-24 | docentes: Mónica Pacheco (coord.

), Teresa Madeira da Silva | Exercício 2

Exercício 2.
A CASA PRIVADA E PÚBLICA

Fig. 1 Hector Esrawe e Ignacio Cadena, “Mi Casa, Your Casa 2.0”, Boston, 2021.Fot.: Celina Colby

“The term privacy has evolved over centuries and continues to do so. Nonetheless, the
privacy in the private house, since its inception, has been predicated on a discernible
separation of its inhabitants and activities from both the public realm and other houses.
The private house has also been from its establishment a building type that enshrines
family life to the exclusion of all other activities. Furthermore, as a space so dedicated,
it has been for almost four hundred years largely responsible for the creation and
development of those rituals and comforts that we now associate with the domestic. (…)
In western culture the private house has been subject of tremendous interest and
controversy. (…) The current ubiquity of the private house in its most traditional form is
rife with contradiction. The social conditions and structures that drove the development
of the private house – privacy, the separation of living and work, the family, domesticity
– have all changed drastically, perhaps more so in the last fifty years than in the
preceding four centuries. In contrast to the self-evident majority, a new and notable
generation of house designs – commissioned by forward-thinking clients – is addressing
not only critical architectural issues but also the cultural parameters of the private
house.”

Terrence Ryley, The Un-Private House (1999)

1
Iscte-IUL, DAU, MIA | Arquitetura III, 1º Semestre, 2023-24 | docentes: Mónica Pacheco (coord.), Teresa Madeira da Silva | Exercício 2

Terrence Riley, no seu livro “The Un-Private House” sugere que a casa hoje,
simultaneamente um reflexo e um estímulo da vida doméstica, deixou de dividir o público do
privado, trabalho da casa, comunidade de família, interior de exterior, cultura de natureza. A
passagem do milénio não foi, contudo, mais do que uma data arbitrária numa longa linha de
constantes transformações, e os aspetos fundamentais do nosso dia-a-dia – acordar, tomar uma
chávena de café, ir trabalhar, procurar os amigos no final do dia, apreciar boa comida e uma cama
confortável – não mudaram. O que muda são as nossas condições culturais e a consequente
resposta (cultural), formal e espacial da arquitetura.
A casa tem sido encarada como a origem e o arquétipo da arquitetura, a manifestação
dos seus atributos mais importantes. Certas casas são simultaneamente espaço de trabalho
oficial e casa, a representação de uma vida privada e outra pública. Passados quase vinte anos
sobre as considerações de Ryley, a recente crise pandémica veio sublinhar, muitas vezes até
urgir, algumas daquelas dualidades. Por outro lado, a recente crise da habitação, de que Lisboa
é palco, tem evidenciado a vulnerabilidade e pressão do sector, nomeadamente no que concerne
questões relacionadas com a ausência ou ineficácia de planeamento e de políticas publicas, a
escassez de oferta e o envelhecimento ou obsolescência do parque habitacional, o uso do solo,
as infraestruturas, a segurança e acessibilidade (pedonal, viária), densidade urbana, e os desafios
colocados pelas alterações climáticas.
É por isso premente dar resposta a este fenómeno global em contexto urbano, em
particular em Lisboa. Ou seja, são necessárias estratégias criativas que reflitam novos modos de
habitar e de trabalhar, novas estruturas sociais e familiares, e novos paradigmas sobre a
renovação do tecido urbano existente, o zonamento e os códigos de construção, a
sustentabilidade e eficiência energética, e a saúde pública.

1. OBJECTIVOS
Enquadrado no programa “Mais do que Casas”, apresentado pela Faculdade de
Arquitetura da Universidade do Porto (FAUP), com o objetivo de celebrar o 50.º aniversário do
25 de abril de 1974, Arquitetura III irá participar na iniciativa lançada às outras universidades, de
refletir e apresentar propostas sobre os atuais desafios da habitação e do espaço público na
construção de uma de uma sociedade livre e plural.
Neste sentido, propõe-se a realização de um projeto de arquitetura que ensaie uma
reflexão alargada sobre estas questões. A proposta deverá estudar as vantagens e estratégias de
densificação da cidade consolidada e seus potenciais de ocupação e expansão (ocupação de
lotes obsoletos, degradados ou devolutos, ampliação ou extensão do existente, preenchimento
de interstícios) e, simultaneamente refletir sobre a ideia de “cidade compacta”, em particular no
que concerne as relações entre habitar/trabalhar.
Espera-se dos alunos o desenvolvimento de uma abordagem critica à condição do habitar
contemporâneo, a definição de um programa de habitação, em função de um determinado
cenário de encomenda, e a materialização deste num objeto arquitetónico, propositivo
relativamente a um futuro próximo, procurando a consolidação e qualificação do tecido urbano.

2. LOCALIZAÇÃO
A área de intervenção integra-se numa encosta do bairro dos Prazeres, no gaveto
devoluto delimitado a norte pelo Largo das Necessidades, a poente pela Calçada do Livramento
e a Sul e nascente pela Rampa das Necessidades.

2
Iscte-IUL, DAU, MIA | Arquitetura III, 1º Semestre, 2023-24 | docentes: Mónica Pacheco (coord.), Teresa Madeira da Silva | Exercício 2

Fig. 2 Identificação da área de intervenção na sua relação com o quarteirão (Área de implantação 336m2).

3. PROGRAMA
O programa organiza-se a duas escalas diferentes, desenvolvidas em duas fases
distintas.
Na primeira fase pretende-se uma proposta de redesenho do conjunto através de uma
reinterpretação contemporânea da cidade compacta, articulando espaços de habitação
unifamiliares e de trabalho de pequena escala, destinados a agregados jovens, trabalhadores
independentes e/ou a trabalhar em pequenas indústrias ou indústrias criativas, com as suas
próprias oficinas/escritórios.

Exemplos:
Galerista(s) / Artista – Galeria; - Família nuclear
Restaurador/Marceneiro – Oficina; biparental/monoparental;
Professor(a)/(s) de Música – Sala de Aula e Audições; - Família nuclear ampliada
Jardineiro/Paisagista – Loja-estufa; (cuidadora por exemplo dos
Fotógrafo – Estúdio de fotografia; avós);
Merceeiro(a/(s) – Loja-mercearia; - Família extensa;
Arquiteto(a)/(s) / Designer – Atelier; - Família reconstituída (com filhos
Costureiro(a)/(s) – Loja-Gabinete de costura; dos primeiro e/ou segundo
Instrutor(a)/(s) de yoga/pilatos/condição física – Ginásio; casamentos);
Farmacêutico(a)/(s) – Farmácia; - Família anfitriã (que acolhe
Etc. temporariamente uma ou mais
crianças diferentes das suas);
- Agregado de jovens adultos sem
relações de consanguinidade;
Etc.

3
Iscte-IUL, DAU, MIA | Arquitetura III, 1º Semestre, 2023-24 | docentes: Mónica Pacheco (coord.), Teresa Madeira da Silva | Exercício 2

As propostas devem atender à especificidade do contexto onde se inserem, dando


especial atenção à questão da acessibilidade, articulação de acessos, às relações entre espaço
publico e privado, entre espaço individual e coletivo

Na segunda fase deverá ser desenvolvido em detalhe uma das habitações e respetivo
espaço de trabalho de acordo com o perfil familiar e profissional selecionado por cada aluno. Esta
deve obrigatoriamente contemplar:
- Espaço(s) de estar e de refeições (autónomos ou integrados);
- Espaço(s) de dormir;
- Espaço(s) de higiene;
- Espaço(s) de trabalho (incluindo acesso independente e/ou possibilidade de receber
clientes, consoante o programa escolhido pelo aluno);
- Espaço para estacionamento integrado no lote de um automóvel elétrico próprio, de
pequenas dimensões, e bicicletas, de forma a libertar a rua;
- Espaço exterior privado integrado no lote;
- Uma organização espacial acolhedora e confortável, atenta aos aspetos ecológicos e
energéticos da construção.

O programa base deverá ser abordado numa perspetiva crítica e criativa, sendo o ponto
de partida para o desenvolvimento do trabalho.

4. METODOLOGIA
O trabalho proposto será desenvolvido em grupos de dois, a par de algumas reflexões
de enquadramento temático, ao longo de duas fases distintas. Os alunos deverão realizar as
visitas necessárias ao local durante o tempo destinado a trabalho autónomo.

4.1. Na primeira fase, cada grupo definirá o agregado familiar e profissional para quem
será concebido o seu espaço, desenvolvendo uma proposta estratégica de
intervenção urbana no gaveto (1/500);
4.2. Com base na fase anterior, deverá desenvolver-se detalhadamente uma estrutura
espacio-formal que albergue simultaneamente um espaço de habitar e um espaço
de trabalho.

Ambas as fases implicam a produção de desenhos de análise do sítio, a produção de


diagramas conceptuais de aproximação ao programa proposto, desenhos e perspetivas
elucidativos das várias propostas e esquemas de análise sintetizadores de uma matriz
conceptual de suporte do projeto, todos os elementos necessários a uma boa
compreensão da consolidação estratégica, espacial, formal e material proposta.

5. ELEMENTOS A ENTREGAR
5.1. Portfolio A3 organizado com capa e contracapa, devidamente identificado e
encadernado, contendo:
 Planta de localização (1/500);
 Planta de implantação (1/200);
 Plantas, cortes (mínimo 2) e alçados (com integração de edifícios adjacentes), da
espacialidade proposta com indicação das dimensões e respetivas características
formais e construtivas (1/100);
 Esboços conceptuais e de desenvolvimento da proposta;
 Imagens ilustrativas do ambiente proposto (desenhos, perspetivas, fotomontagens,
colagens, etc.);
 Texto justificativo da proposta (máximo 500 palavras).

5.2. Maqueta(s) de estudo (1/100, 1/50);

4
Iscte-IUL, DAU, MIA | Arquitetura III, 1º Semestre, 2023-24 | docentes: Mónica Pacheco (coord.), Teresa Madeira da Silva | Exercício 2

5.3. Objeto síntese do trabalho final, incluindo os elementos gráficos bidimensionais e


tridimensionais mais relevantes, concebido para transportar e expor o trabalho na
Exposição “Mais do que Casas”. Como referência aponta-se a obra de Marcel
Duchamp, “La Boîte-en-valise”, cuja mala-contentor e a reprodução das obras eram
a exposição da obra de Marcel Duchamp, pela facilidade de transporte e os reduzidos
recursos envolvidos na produção da mesma:

https://www.nationalgalleries.org/art-and-artists/483/la-bo%C3%AEte-en-valise-
boxsuitcase

Fig. 3 Marcel Duchamp, La Boîte-en-Valise [Box in a Suitcase], 1935

Os alunos deverão colocar na drive da turma uma cópia em pdf dos painéis, do texto e
das fotografias das maquetas devidamente tratadas.

6. CALENDARIZAÇÃO E PROCESSO DE AVALIAÇÃO


Fase 1
16.10 (s.5) - 03.11 (s.7): Apresentação das propostas urbanas de grupo (desenhos,
maquetas e todos os elementos considerados necessários a uma boa compreensão dos mesmos)
– formato pin up (não deverá exceder 5’).

Fase 2
06.11 (s.8) – 11.12 (s.13): Apresentações preliminares dos trabalhos finais (desenhos,
maquetas e todos os elementos considerados necessários a uma boa compreensão dos mesmos)
– formato pin up (não deverá exceder ‘5).

Entrega final
15.01.2024: Inclui o conjunto de trabalhos realizados ao longo do semestre.
16 e 17.01.2024 – Apresentação oral (júri). A apresentação oral deverá ser ensaiada
antecipadamente, cuidada e sintética, incidindo e enfatizando os principais aspetos de ordem
conceptual, sua tradução espacial e concretização.

7. PLANEAMENTO
13.10 – Lançamento do exercício;
16.10 – Ciclo de conversas, sala B203 do Iscte:
 9.30 – 10:10 a.m.: Lisbon's housing problem (Sandra Marques Pereira,
DINÂMIA’CET Iscte)
 10:10 – 10:40 a.m.: Break
 10:40 – 11:20 a.m.: Public Housing Policies in Portugal – from 1974 to the present
day (Gonçalo Antunes)

5
Iscte-IUL, DAU, MIA | Arquitetura III, 1º Semestre, 2023-24 | docentes: Mónica Pacheco (coord.), Teresa Madeira da Silva | Exercício 2

 11:20 – 12:00 a.m.: Architecture is not enough (Tim Benton)


19.10 (facultativo e independente): 18.00 Conferência DeFlat Kleiburg
Kamiel Klaasse (NL Architects), CCB;
20.10 – 14.00h Apresentações dos resultados do workshop Blended Intensive
Programme Living in Lisbon, sala a indicar do Iscte
25.10 – Visita guiada à exposição “Habitar Lisboa”, Garagem Sul, CCB
12-18.10 (facultativo e independente): Ciclo de Cinema “Onde Vamos Morar?”, Cinema
Ideal – consultar programação em https://www.optecfilmes.com/

8. BIBLIOGRAFIA DE APOIO
ÁBALOS, Inaki (2001), The good life – a guided visit to the houses of modernity, GG,
Barcelona.
BRAYER, Marie-Ange et al. (2002), Archilab’s Future House. Radical Experiments in
Living Space, Thames & Hudson, London
BROTO, Carlos (2002), New Housing Concepts, Leading International Publishing Group,
Barcelona.
COSTA, Xavier (ed.) (2000) New Working and Living Conditions in Cities. Actar,
Barcelona.
EAMES, Charles (2007), Qué es una casa? Que es el diseño?, GG mínima, Barcelona.
EVANS, Robin (1997), Figures, Doors and Passages in “Translations from Drawing to
Building and Other Essays”, AA documents 2, Architectural Association, London.
GALFETTI, Gustau Gili, Pisos Piloto. Células domésticas experimentales / Model
Apartments. Experimental domestic cells, GG, Barcelona.
GAUSA, Manuel (1998), Housing: New alternatives – New Systems, Actar, Barcelona
GUERRERO, Julián Santos et all (2011). Pensar a Casa. Conferências da Casa 1, Casa
da Arquitectura, Matosinhos.
HEIDEGGER, Martin, Building, dwelling, thinking In Leach, Neil. “Rethinking Architecture.
A reader in cultural theory”. Routledge, 1997.
KLOOS, Maarten et all. (1992), Formats for living. Contemporary floor plans in
Amsterdam. Arcam/Architectura & Natura Press.
MC COY, Esther (1962). Case study houses 1945-1962, Hennessey + Ingalls, Santa
Monica.
MENDES, Luís Castro, Como habitar poeticamente o mundo?
https://www.dn.pt/opiniao/como-habitar-poeticamente-o-mundo-16706762.html
MONTEYS, Xavier e Pere Fuerts (2001), Casa Collage – un ensayo sobre la arquitectura
de la casa, GG, Barcelona.
MOZAS, Javier et all (2004), Density. New Collective Housing. A+T Ediciones, Vitoria-
Gasteiz.
MUNARI, Bruno. (1976) Square Circle Triangle., Princeton Architectural Press
RILEY, Terence (1999), The Un-Private House, The Museum of Modern Art, New York.
RODRIGUES, João Ferro “Casas e Bairros: pilares da democracia do bem comum”
(https://www.youtube.com/watch?v=7TpfxSruSOE&t=2708s).
SCHNEIDER, Friederike (ed.) (2003) Floor Plan Atlas, Housing. Birkhäuser / Editorial
Gustavo Gili.
https://maisdoquecasas.arq.up.pt/ (Seminário #1 de 28 de Abril de 2023).
Série “The Architect” Kerren Lumer-Klabbers, 2023 (Filmin).
Filme “Seca”, Paolo Virzì, 2022
13 de outubro de 2023

Você também pode gostar