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GUSTAVO PALMQUIST MONLLOR

A HIPOTECA

CURITIBA
2002
GUSTAVO PALMQUIST MONLLOR

A HIPOTECA

Monografia de conclusão do Curso de Direito,


Setor de Ciências Jurídicas, Universidade Federal
do Paraná, como requisito parcial à obtenção do
grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Prof Eroulths Cortiano
Co-orientador: Prof Sérgio Seleme

CURITIBA
2002
TERMO DE APROVÇÃO

GUSTAVO PALMQUIST MON LLOR

A I-I1I>OTEcA E os REQUISITOS PARA A EXECUÇÃO I-IEPOTECÁRIA Dos


CREDITOS VINCULADOS AO SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO PELA LEI
5.741/71

Texto aprovado como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel no curso de
Graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná, pela seguinte Banca
examinadora:

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Orientador: Prof Eroulths Cortiano Junior


Departamento de Direito Privado

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Prof Elimar Sza awski
Departamento de Direito Privado

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Direito Privado

Curitiba, 29 de novembro de 2002.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..... r ............................................................................................


1. NOTICLA HISTORICA ..................................................................................
1.1 DIREITOS REAIS SOBRE COISA ALHEIA NO DIREITO ROMANO ._._.
1.2 A HIPOTECA NO DIREITO ROMANO; ........._........_.....__..........................
1.3 EVOLUÇAO NO DIREITO PORTUGUES E NO DIREITO BRASILEIRO
2. DIREITO REAL DE GARANTIA ..................................................................
2.1 NECESSIDADE DE DETERMINAÇÃO DA COISA ..._........
2.2 GARANTIA ......_._.._.._.......___...........__...___.._...___..._......__. _.._._....._._.
2.3 DIREITO DE GARANTIA E PRIVILÉGIO .I_.......__._._......_.._......___..
2.4 CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS REAIS DE GARANTIA ...__..
2.4.1 Direito de Seqüela .........................._._............................_............
2.4.2 Direito de Preferência .................._..........................................
2.5 A HIPOTECA COMO DIREITO,REAL DE GARANTIA ...........
3. CONCEITO CARACTERES JURÍDICOS DA HIPOTECA ........
3.1 CONCEITO ._.__......._......_.._.._..._.....___...__....__..._........._.._._...__...___
3.2 CARACTERES JURÍDICOS DA HIPOTECA ............._..
3.2.1 Natureza Civil ....................................._...........
3.2.2 Direito real ..........................._.......... ..........
3.2.3 Coisa do devedor ou de terceiro .......
3.2.4 Posse da coisa ........................_.....
3.2.5 Indivisibilidade .........................
3.2.6 Acessoriedade ..........................
4. ESPÉCIES DE HIPOTECA .................
4.1 HIPOTECA CONVENCIONAL .......
4.2 HIPOTECA LEGAL ..._..._..........
4.3 HIPOTECA JUDICIAL ........
4.4 HIPOTECA CEDULAR ..........
5.REQUISITOS .................................
5.1 REQUISITOS SUBJETIVOS ..._.._..
5.2 REQUISITOS OBIETIVOS .......
5.3 REQUISITOS FORMAIS ........
5.3.1 Título ..._......................_...
5.3.2 Especialização ............
5.3.3 Inscrição ...................................................
ó. EFEITOS ...............................................................
6.1 EFEITOS EM RELAÇÃO AO DEVEDOR .............................._...
ó.2 EFEITOS EM RELAÇÃO AO CREDOR ........._.............._.._.._.._....._.._.
ó.3 EFEITOS QUANTO À RELAÇÃO JURÍDICA EM SI MESMA ._......
6.4 EFEITOS EM RELAÇÃO A TERCEIROS ........_._......._....._....._._....
ó.5 EFEITOS EM RELAÇÃO AOS BENS GRAVADOS ...............
ó.ó EFEITOS QUANTO AOS ACESSÓRIOS DO CREDITO .. .... ..
7. REMIÇÃO HIPOTECÁRIA ..............................................................
7.1 REMIÇÃO PELO CREDOR DA SUB-HIPOTECARIO ......_..__._......._.._
7.2 REMIÇÃO PELO ADQUIRENTE DO IMOVEL HIPOTECADO ._...._..
7.3 REMIÇÃO PELO DEVEDOR, CONJUGE, ASCENDENTES OU
DESCENDENTES. ..._......__._...__._......._......._....__.........._._....______.._... .

ii
8. EXTINÇÃO DA HIPOTECA ..................................................................
8.1 PELO DESAPAREÇIMENTO DA OBRIGAÇÃQPRINCIPAIS .............
8.2 PELA DESÍRUIÇAO DA COISA OU RESOLUÇAO DO DOMINIO ..__..O
8.3 PELA RENUNCIA DO CREDOR ..........._.._..@..«.._._.....O._..._._..L_L._..L..._._._.
8.4 PELA REMIÇÃO _._______._._.______.._.____.._8....______._..._.
só PELA PRESCRIÇÃO .__._.__._I..__.._.___.._..__..........._........_..._...____..__.._._...._.,..__.__..
8.7 PELA ARREMATAÇÃO OU ADJUDICAÇÃO ...I~...__.._.I__._.._I_I.___.___I...._._._..
9. Os REQUSITOS PARA A EXECUÇÃO IIIPOTECÁRIA DOS CRÉDITOS
VINCULADOS AO SISTEMA FINANCEIRO DE HABITACAO
PELA LEI 5.741/71 .........................................................................................
9.1 NOÇÃO .._....__..__......._........_._............_..__.
9.2 PROCEDIMENTO DA LEI 5.741/71 ._....
9.3 REQUISITOS ..........................................
9.4 REQUISITOS ESPECÍFICOS .__.._....__.____._.__.._._.__..____...._.__.__....__.__
9.4.1 O título da dívida devidamente inscrita. ....._................................ .
9.4.2 Apresentação de demonstrativos de cálculo referentes à divida ........
9.4.3 Constltulção em mora do devedor ......_.........................................
9.4.4 Valor da causa ..........................................................................
CONSIDERAÇÕES FINAIS .....................
BIBLIOGRAFLA ........................

iii
RESUMO

O presente trabalho busca trazer, sob uma estrutura didática, uma visão geral
do instituto da hipoteca como direito real de garantia. Outrossim, visa possibilitar a
compreensão de como o mesmo se desenvolve na aplicação prática e cotidiana,
através da análise dos requisitos específicos para a execução na Lei n.° 5.741/71,
que é a lei que regula a proteção dos financiamentos de bens imóveis vinculados ao
Sistema Financeiro da Habitação (SFH).
Elegeu-se esse tema para finalizar-se o estudo do instituto por uma simples
razão, o Sistema Financeiro de Habitação e, hoje, responsável pela ampla utilização
da hipoteca em termos gerais. Pela própria natureza do trabalho não se pôde
analisar de maneira mais profunda as distinções que separam a hipoteca
convencional da hipoteca do SFH, contudo é possível visualizar como, na prática, o
ônus real traz a efetiva garantia que se propõe.
Para tal, estuda-se, a princípio um breve histórico dos direitos reais de
garantia no direito romano; em seguida, uma rápida visão do direito real de garantia
como é concebido hoje. Passa-se, então ao estudo da hipoteca em si, com a análise
dos seus caracteres jurídicos, denominação elegida por Caio Mário. Após,
concentra-se o estudo na estrutura da hipoteca, como: quais os requisitos para sua
regular formação, os efeitos que ela gera, como se opera a remição da hipoteca, e
sua extinção. Por fim, passa-se à análise da execução dos créditos vinculados ao
SFH.
Além da hipoteca convencional, que foi objeto do estudo aqui desenvolvido,
existem outras espécies, tais como a legal, a judicial ou judiciária e as denominadas
hipotecas especiais (naval, aeronáutica e de vias férreas). Não é do interesse e nem
seria possível trazer neste estudo maiores detalhes sobre estas distintas espécies
de hipoteca, embora lhes tenha sido dedicado um espaço para dar simples notícia
do seu objeto.

iv
iNTRoouçÃo

O presente trabalho tem o intuito de trazer uma visão geral sobre o instituto
da hipoteca como direito real de garantia. Tem-se presente que o estudo do instituto
não pretende, de nenhuma maneira, trazer ponto de vista inovador sobre o tema, eis
que já é conhecido de longa data.
Por outro lado, busca trazer uma visão do caráter pratico do instituto, que na
atualidade é amplamente utilizado nas operações de financiamento do Sistema
Financeiro de Habitação. Desta maneira, igualmente procura-se destacar o caráter
social do instituto, que vem facilitar imensamente a aquisição da tão desejada casa
própria.
O trabalho inicia-se pelo estudo das origens dos direitos reais de garantia. A
fim de que se tenha um visão histórica da necessidade social e econômica da
utilização das garantias desde o direito romano. Assim, possibilita-se visualizar como
foram evoluindo os negócios envolvendo garantias e como esta evolução resultou no
instituto que hoje conhecemos.
Num segundo momento, busca-se dar uma visão geral dos direitos reais de
garantia, e identificando a hipoteca como sendo um direito real de garantia mais
aperfeiçoado e ressaltando o ônus real como característica própria deste instituto.
No terceiro capítulo, traz-se o conceito de hipoteca, propriamente dito. A fim
de complementar o conceito, estudam-se os caracteres jurídicos da hipoteca, como:
a sua natureza civil; a manutenção da posse do imóvel hipotecado com o devedor; a
constituição da hipoteca sobre bem do devedor ou de terceiro; seu caráter indivisível
e, finalmente, seu caráter acessório.
Quanto às espécies de hipoteca, optou-se por apenas dar noticia da
existência da hipoteca legal, da hipoteca judicial e da hipoteca cedular. Isto porque a
própria natureza do trabalho não comporta um estudo mais amplo sobre as espécies
citadas, uma vez que pretende-se concentrar o foco na hipoteca convencional, que é
a constituída através de contrato.
Prossegue-se discutindo o instituto no que se refere aos requisitos que devem
ser observados para a regular constituição e validade da hipoteca. Quais sejam: os
2

requisitos de ordem subjetiva, de ordem objetiva e, por fim, os requisitos exigidos


quanto à forma.
No sexto capítulo estudam-se os efeitos gerados pela hipoteca em relação a:
terceiros; ao credor; aos acessórios dos crédito; ao próprio devedor; ao bem gravado
e em relação à relação jurídica em si mesma.
No sétimo capítulo analisa-se a remição hipotecária e por quem este direito
pode ser exercido. Para concluir o estudo da hipoteca, não poderia ser diferente, vê­
se a maneira de sua extinção.
Concluído a análise da hipoteca como direito real, buscou-se trazer uma visão
de como o instituto se aplica mais frequentemente, que, sem dúvida, é através dos
financiamentos regulados pelo Sistema Financeiro da Habitação.
Neste sentido, elegeu-se o tema da execução. Contudo seria impossível, pelo
próprio espaço, analisar-se o complexo Sistema Financeiro da Habitação e a
execução em toda sua extensão. De modo que, analisar-se-ão os requisitos para a
execução baseado na Lei 5.741/71, que são: o título da divida devidamente inscrita;
a correta constituição em mora do devedor; a regular apresentação de
demonstrativos de cálculo referentes à dívida; valor da causa na execução.
Por fim, quanto à estrutura dada ao trabalho, optou-se por adotar a estrutura
“manualística”, que apesar de passível de críticas, visa facilitar a compreensão do
leitor; do mesmo modo, assim foi estruturado por ser a maneira mais didática de
expor a seqüência de idéias que se pretendia desenvolver.
3

1. NoTic|A H|sTÓR|cA

1.1 D|RE|Tos REAIS soBRE co|sA ALHEIA NO oiRE|To ROMANO

Os intérpretes do Direito Romano distinguiram dois tipos de garantia: as


garantias reais, as quais garantem uma obrigação mediante a constituição de um
direito real sobre a coisa do devedor em favor do credor; e as garantias pessoais, as
quais surgem com a constituição de outra relação jurídica obrigacional, a fim de
assegurar o cumprimento de uma obrigação.
O sistema de garantias reais dos romanos apresentavam certas falhas, como
a falta de publicidade e a sua constituição por simples convenção, Moreira Alves
retrata bem essa situação:

“ao contrário do que ocorre modernamente, as garantias pessoais, no direito


romano, eram muito mais utilizadas do que as reais. Daí, certas falhas no
sistema que hoje se nos afiguram graves - assim, por exemplo, a
constituição de hipoteca mediante simples convenção, a falta de segurança
na publicidade da hipoteca; a admissibilidade da hipoteca sobre todos os
bens, presentes ou futuros de uma pessoa -, não terem acarretado maiores
problemas em Roma”.1

Pontes de Miranda identifica a falta de publicidade como sendo o erro mais


grave do sistema de garantia reais dos romanos:

“O ponto fraco, mais grave, do direito romano, a propósito de direitos reais


(limitados) de garantia era a falta de publicidade (...) só a partir do ano 469,
com a L. 11, C., qui potiories in pígnore habeantur, 8, 17, se exigiu o
instrumento público, ou o instrumento particular com três testemunhas, ao
penhor (pignus pub/icum), para se lhe dar preferência.”2

Ha sensível diferença entre o sistema moderno de garantias reais e o romano.


A hipoteca, em geral, tem por objeto coisa imóvel e não acarreta desapossamento.
Em Roma, vamos encontrar como garantias reais a fiducia cum creditore, o penhor
(pignus dactum) e a hipoteca (pignus ob/igatum, posteriormente h ypotheca).

í ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. Rio de Janeiro: Forense. 1991. Pg. 438.
' MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado: Parte Especial, Tomo XX, Direito das coisas: Direitos reais
de garantia. Hipoteca. Penhor. Anticrese. Rio de Janeiro, Editor Borsoi. 1958. p. 13.
4

A primeira - fiducia cum creditore- era a mais antiga delas e a forma mais
primitiva da garantia real, ademais, como veremos adiante, não era direito real sobre
coisa alheia.3 As duas ultimas, penhor e hipoteca, apresentavam no direito romano,
quase como diferença única, a de que, no penhor (pignus dactum), havia o
desapossamento da coisa em favor do credor, enquanto na hipoteca (pignus
ob/ígatum) isto não ocorria.
Ambos, penhor e hipoteca, se aplicavam indistintamente, às coisas móveis e
imóveis. Aliás, a semelhança destes dois institutos está retratada na própria
designação que as fontes dão a eles: ao penhor (pignus dactum) e ã hipoteca
(pignus ob/igatum). Em ambas as expressões o substantivo e o mesmo - pignus - o
adjetivo é que muda: dactum ou ob/igatum. Só no direito Justinianeu é que se trona
corrente, para o pignus ob/igatum a denominação hypotheca.
A fiducia cum creditore, por ser mais antiga existente no direito romano,
consistia num negócio jurídico, pelo qual o devedor, através da mancipattio ou da
iure cessio, ao transferir a propriedade de uma coisa infungível ao credor, visando
garantir-lhe o cumprimento de uma obrigação, convencionava com este, por meio de
um pacto (o pactum fiduciae - de acordo com os romanos), que previa a restituição
da coisa quando extinta a relação obrigacional.
Percebe-se, assim, que a fiducia cum credifore não era um direito real sobre
coisa alheia. A propriedade da coisa alheia passava para o credor e extinta a relação
obrigacional, convencionava-se por um pacto a restituição da coisa.
Tal garantia gerava desvantagens, tanto ao devedor quanto ao credor: ao
devedor, pois, este deveria transferir a propriedade da coisa ao credor, enquanto
não fosse extinto o crédito; além disto, muitas vezes, o devedor era obrigado a
transferir a propriedade de coisa com valor bem superior ao do débito, o que era o
grande inconveniente do instituto, e não podendo utilizar-se disto para a obtenção de
créditos, ou seja, o devedor para reaver a coisa, ficava na dependência, única e
exclusiva da vontade do credor, uma vez que não dispunha contra o credor de uma
actio para compeli-lo à restituição da coisa, uma vez que a restituição era apenas
pactuada.

3 ALVES, José Carlos Moreira. Obra citada. p. 439.


5

Somente mais tarde surgiu a actio fiduciae, que era uma ação pessoal,
permitia ao devedor obter apenas uma indenização pelo não cumprimento do pacto
de não restituição da coisa, porém não tinha o efeito de anular uma eventual venda
feita a terceiro.
Gerava desvantagens ao credor, pois, embora tenha este a propriedade
garantida da coisa, caso a coisa voltasse ã posse do devedor, uma vez que poderia
este, ao final de um ano (mesmo se se tratasse de imóvel), recuperar a propriedade
da coisa, através de uma modalidade especial de usucapião4 (usereceptio). No
entanto, tais problemas poderiam ser evitados se houvesse uma convenção entre
devedor e credor com o intuito de manter o devedor na posse, mesmo que a título
precário. Entretanto, tal acordo nem sempre era possível.
Os direitos reais de garantia para os romanos quase não apresentavam
variação para os bens móveis e imÓveis.5 Utilizava-se como garantia a transmissão
da propriedade.
O “pignus” surgiu como o primeiro direito real limitado, surge no século ll a.C.,
quando o pretor dá proteção, mediante interditos ã posse do credor, como também
concede a actio pigneraticia, ao devedor, para obter a restituição da coisa quando o
credor não a devolvesse após a extinção da dívida.
O “pignus” era direito com posse, pois o credor ficava com o poder fático
sobre a coisa, de direito, até que se extinguisse a dívida.6 Caso o credor desejasse
ficar com a coisa, na hipótese de não pagamento da dívida, era necessária a
constituição do pacto comissório (lex commissoria), “era o comisso, efeito de pacto
assaz empregado no direito grego, e certamente antigo, anterior ã concepção dos
direitos reais de garantia.”

1.2 A HIPOTECA NO DIREITO ROMANO

Examinar-se-ão, a seguir, os pontos importantes referentes a hipoteca dos


romanos: a sua constituição, a sua função, como se originou, os bens objeto de

Í ALVES, José Carlos Moreira. Obra citada. p. 440.


° MIRANDA, Pontes de. Obra citada. p. 5.
6 MIRANDA, Pontes de. Obra citada. p. 5.
7 MIRANDA, Pontes de. Obra citada. p. 5.
6

hipoteca, em que consistia seu conteúdo, a proteção do credor e do devedor e, por


fim, sua extinção.
A hipoteca constitui-se na garantia real mais recente que se conheceu no
direito romano, a pignus ob/igatum. Sua origem e controvertida, alguns autores
acreditam que ela tenha surgido no direito grego, depois tenha migrado ao direito
romano.
Outros, porém, vislumbram sua origem nos praedia subdita ue/ subsignata, ou
seja, imóveis que eram dados em garantia a créditos do Estado ou do município, e
que se a dívida não fosse paga, seriam vendidos em favor do aerarium. Era assim
denominado, pois os devedores, declaravam, por escrito, no pé do instrumento do
contrato que o imóvel era dado em garantia. Com o intuito de demostrarem uma boa
gestão, os magistrados das cidades prestavam garantia dessa natureza, o que
demostrava a preocupação dos romanos com a boa administração pública.
Parece que ambas as teorias não apresentam fundamentos, uma vez que na
primeira, o termo hypotheca só aparece nas fontes romanas muito tempo depois de
existir em Roma a hipoteca; e na Segunda, pois entre a hipoteca e os praedia
subdita ue/ subsignata há diferenças marcantes, sem que haja qualquer texto que se
refira à hipoteca como praedium subsignatumg Segue-se mais uma terceira teoria, a
qual encontra a origem da hipoteca no arrendamento de imóveis rurais.
No direito romano a hipoteca podia constituir-se mediante: a) simples
convenção, a hipoteca era um instituto de ius onorarium (direito honorário ou
pretoriano), celebrado entre o credor e o devedor, segue-se a tradição da coisa,
surge do pactum hypothecae, é necessário que o devedor seja proprietário da coisa,
ou a tenha in bonis; b) ato mortis (legado ou fideicomisso); c) disposição de lei; os
casos que já se encontravam no direito clássico mas que se tornaram mais
numerosos no direito pós-clássico e justinianeu; d) por ordem de uma autoridade; no
processo extraordinário, uma das modalidades da execução forçada.
Em regra, tinha por função garantir o cumprimento de uma obrigação,
portanto, em consequência, a hipoteca é acessória da obrigação e disso decorre
que: só há hipoteca se houver uma obrigação cujo cumprimento ela garanta. Extinta
a obrigação extinguia-se também a hipoteca, salvo, em raros casos, em que isso

8 ALVES, José Carlos Moreira. Obra citada. p. 441.


7

não ocorria; as exceções que podiam paralisar o direito de crédito paralisavam


também a hipoteca, ainda que o direito aumentasse ou diminuísse, a hipoteca o
seguia, só se extinguindo com a extinção total daquele, uma vez que ela é
indivisível.
Na hipoteca do direito romano, especificamente no direito justinianeu, podiam
ser objeto de hipoteca (como também de penhor) as coisas corpóreas (objeto de
posse) e as incorpóreas, desde que alienãveis, como se mantém até a atualidade.
Para Moreira Alves o conteúdo constitui-se nas faculdades que a hipoteca
confere a seus titulares, como a ius possidendi - direito à posse - direito concedido a
partir do momento em que o débito não é pago. Foi possível, apenas no direito pós­
clãssico, igualmente pactuar conteúdo distinto, que era o de entrar na posse da
coisa para perceber-lhe os frutos:

“entrando o credor na posse da coisa, o direito de perceber os frutos


produzidos por ela, compensando com seu valor, em primeiro lugar, os juros
do débito, e, depois, o próprio capital; e isso a menos que tenha sido
celebrado entre credor e devedor um pacto - denominado antichresem -, pelo
qual o credor percebe os frutos da coisa, a título apenas de pagamento de
juros; por outro lado, note-se que o penhor ou a hipoteca, sendo direitos que
visam garantir o pagamento de um crédito, não atribuem ao seu titular na
posse da coisa do devedor a faculdade de usar dela, e, se o credor o fizer,
incorrerá no delito de furto do uso”.“

Se a dívida não fosse paga, o credor hipotecário, a princípio, não tinha o


direito de ficar com a coisa dada em garantia, nem de vendé-la a fim de pagar-se.
Para isso era preciso que, quando da constituição da hipoteca, houvesse um pacto
entre credor e devedor que desse àquele essas duas faculdades: (pactum de
distrahendo pignore, para poder vender a coisa, sem qualquer formalidade; e a /ex
commissoria, para poder ficar, a título de pagamento, com coisa dada em garantia).
Por outro lado, no direito clássico, admitia-se a faculdade de vender a coisa ­
ius distrahendi. Pontes de Miranda corrobora que, a hipoteca assegurava ao credor
o direito de readquirir a posse no vencimento da obrigação, ao mesmo tempo tinha a

9 ALVES, José Carlos Moreira. Obra citada. p. 442.


1° Palavra de origem grega. Em grego, significa “uso de uma coisa por outra”.
“ ALVES, José Carlos Moreira. Obra citada p. 446
8

faculdade de alienar livremente o bem hipotecado.” Já a /ex comissoria jamais foi


considerada elemento natural da hipoteca.
A partir da Constituição de Gordiano, o credor, mesmo depois de pago o
débito em cuja garantia foi dada a coisa em hipoteca, tem a faculdade de reté-la em
seu poder (ius retentionis), até que o devedor pague todos os outros débitos em
favor do credor, mesmo que não garantidos.
Com o Código de Justiniano, Livro Ill, Tít. 34, Leis 1 e 3, o poder de alienar
livremente o bem hipotecado foi suprimido totalmente, já que o uso de tal faculdade
acabou por acarretar em abusos, estimulando contratos opressivos e asfixiantes.
O credor hipotecário para entrar na posse da coisa, somente se a divida não
tivesse sido paga, dispunha do interdito Salviano, que era efetivo apenas contra o
devedor. Posteriormente, lhe foi concedida a ação Serviana, para haver coisa do
devedor ou de terceiro, porém, ambas as ações só se aplicavam em caso de
arrendamento de imóvel rural. Daí, ter surgido, como extensão utilitatis causa da
ação Serviana, para abranger todas as espécies de crédito, uma nova ação
denominada actio Sen/iana uti/is, ou actio hypothecaria. Tais meios de proteção
eram utilizados quando se perdia a posse, com violéncia ou clandestinidade, para
devedor ou terceiro. O devedor, quando o credor lhe negava a restituição da coisa
após paga a dívida, podia recuperá-la através da rei vindicatio, ação que protegia a
propriedade.
Sendo a hipoteca, em regra, um direito acessório, dependente do direito de
crédito, podia extinguir-se por via principal ou por via acessória. Extingue-se por via
principal nos seguintes termos: quando a coisa dada em hipoteca destruia-se ou
tornava-se inalienãvel; quando houvesse a renúncia do direito de hipoteca por seu
titular; quando ocorresse a confusão; ou por usucapião em favor de terceiro.
Igualmente extinguia-se a hipoteca por via acessória, quando a obrigação garantida
se extinguisse. Com a Constituição de Gordiano, que criou o pignus gordianum, a
extinção só ocorria quando todos os débitos do devedor para com o credor, mesmo
os não garantidos, estivessem extintos.
Por fim, o Imperador Leão criou a hipoteca privilegiada, que estabelecia que a
hipoteca constituida mediante instrumento público, ou a realizada por instrumento

12 MIRANDA. Pontes de. p. só


9

particular perante três testemunhas. Esta hipoteca teria prioridade sobre as demais
hipotecas, mesmo que fossem constituídas anteriormente e não preenchessem tais
requisitos. Pode-se afirmar que é o que originou (no ano de 472) o que atualmente
reconhecemos como o princípio da publicidade.

1.3 EVOLUÇÃO NO DIREITO PORTUGUÊS E NO DIREITO BRASILEIRO

Por sua vez, o Direito Português, no tempo das Ordenações adotou, com
ligeiras modificações, o direito hipotecário dos romanos, em que pese suas falhas e
defeitos, já que os estes não lograram cercar, com sua lógica, as garantias reais,
perdendo toda a característica de sistema.
Já o Direito brasileiro, conseguiu, com o passar do tempo, dar certa ordem e
disciplinar a hipoteca, assentando o instituto sobre os pilares da publicidade e da
especialidade.
A Lei n.° 317, de 21 de outubro de 1843, seguida de seu regulamento baixado
com o Decreto n.° 842, de 14 de novembro de 1846, iniciou a reforma de nosso
sistema hipotecário.
Imperfeito, todavia, como o reputava LAFAYETE, substitui-se pela Lei n.°
1.237, de 24 de setembro de 1864, regulamentada pelo Decreto n.° 3.423, de 26 de
abril de 1865, depois substituído pelo Decreto n.° 3.471, de 3 de julho de 1865, que
vigorou até a República, em cujos primórdios procedeu-se a uma reestruturação dos
Registros Públicos com o Decreto n.° 169-A, de 19 de janeiro de 1890, seguido do
regulamento baixado com o Decreto n.° 370, de 2 de maio de 1890.
Procurando dar atenção à aplicação prática do instituto, o Código Civil de
1916, com poucas mudanças, finalmente sistematizou o instituto.”

13 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. V.4. 12.3 edição, 5.” tiragem. Direitos Reais. Rio
de Janeiro: Forense, 1997. p. 251
10

2. DIREITO REAL DE GARANTIA

Os direitos patrimoniais se dividem em duas grandes classes; direitos


pessoais e reais. Os direitos pessoais recaem imediatamente sobre uma ou mais
pessoas individualmente obrigadas, enquanto os direitos reais afetam
imediatamente a coisa, sem a interferência de pessoa que seja por ela
individualmente obrigada.
Dionysio Gama traz a distinção dos direitos reais dos direitos pessoais: “Os
primeiros teem por objecto a propriedade, bem como os direitos della decorrentes,
ou que della podem ser separados e destacados; ao passo que os segundos
comprehendem e abrangem exclusivamente os actos e os factos do devedor
obngado?14
Affonso Fraga, traz uma das mais antigas noções de direito real criada por
Grocio e adotada por Huberus e Heineccio: “o direito real é a faculdade que compete
ao homem sobre uma coisa, sem relaçäo a determinada pessoa, ou, na língua que
fora formulada - facu/tas homini in rem competens, sine respectu ad certam
personam”. Em seguida, ressalva que a definição vista tem o grave senão de não
lograr envolver a totalidade do objeto a definir, eis que define o direito real por
excelência, ou seja, o domínio na sua integridade ou na soma total dos seus
elementos constitutivos, mas não o direito real sobre a coisa alheia.15
Assevera, ainda, o autor, que Heineccio acrescentou, ao conceito de Grocio,
o poder de o direito ser exercido contra qualquer possuidor, ex quo agi potest quem­
cumque personarem”, ou seja o conceito atualmente conhecido como direito de
sequela.
Ressalta-se que os adeptos da teoria clássica ou realista caracterizam o
direito real como o poder imediato ,da pessoa sobre a coisa, que se exerce erga
omnes. Enquanto o direito pessoal opõe-se unicamente a uma pessoa, de quem se
exige um comportamento determinado. Para esta teoria, a seqüe/a e a preferencia

14 GAMA, Affonso Dionysio. Dos Direitos Rcaes de Garantia(penhor, antichrese e hypotheca). Z.” Edição. São
Paulo:
15
Saraiva & CIA. 1930. p. 7.
FRAGA, Affonso. Direitos Reas de Garantia: Penhor, Antichrese e Hypotheca. São Paulo: Saraiva & Comp,
1933. p. 7.
16 FRAGA, Affonso. Obra citada. p.7.
ll

são manifestações típicas da oponibilidade absoluta dos direitos reais, e seu caráter
absoluto advém de ser um poder direto e imediato sobre a coisa.”
Contrapõe-se a tal posição a chamada teoria persona/ista, que, em primeiro
lugar, afirma não poder haver relação jurídica entre pessoa e coisa e, sim, entre
pessoas; como segunda crítica, de não ser a oponibilidade contra terceiros uma
característica particular dos direitos reais, mas sim, de todos os direitos absolutos.
A grande distinção entre as duas teorias está no sujeito passivo da relação
estabelecida, uma vez que nos direitos reais o sujeito passivo é indeterminado, pois
estabelece-se uma obrigação passiva universal, a de respeitar o direito. Nos direitos
pessoais, por outro lado, o sujeito passivo é pessoa certa e determinada - o
devedor.
Os autores modernos voltam-se para a estrutura interna do direito real, que é
o ponto que o caracteriza, salientando, finalmente, o poder de utilização da coisa,
sem intermediário.
Dentre as diversas classificações dos direitos reais, sobressai uma divisão
primária, em função da finalidade, que os divide em direitos reais de gozo e direitos
reais de garantia. Diferença básica entre os direitos de uso e gozo e os direitos reais
de garantia é que os primeiros têm existência autônoma, ao passo que os últimos
são sempre acessórios do direito que visam assegurar. Enquanto direitos reais de
garantia, classificação atribuída pela doutrina em função da extensão dos poderes
que o direito real confere ao seu detentor, encontramos o penhor, a anticrese e a
hipoteca. Nosso estudo versará sobre o terceiro deles. A hipoteca, assegura a
preferência e o direito de o credor excutir a coisa para satisfação de seu crédito, o
que será mais profundamente examinado posteriormente.
Para Sílvio Rodrigues: "a garantia real se apresenta quando o devedor separa
de seu patrimônio um bem e o destina, primordialmente, ao resgate de uma
obrigação".18
Por outro lado Pontes de Miranda traz a idéia de como nasceram os direitos
reais de garantia: “A garantia real sem transmissão, pela gravação de bem ou de
bens, é que faz nascer o direito real de garantia, espécie de direito real limitado. O
credor fica assegurado, ou por ser-lhe atribuído, em caso de inadimplemento, o

17 GOMES. Orlando. Direitos Reais. 10.8 ed. Rio de Janeiro: Forense. 1990. p. 2.
12

poder de dispor da coisa, ou por si, ou através do Estado, ou por ser-lhe facultado
u1g
perceber os produtos, até a satisfação do crédito.

2.1 NECESSIDADE DE DETERMINAÇÃO DA COISA

O espírito humano não pode conceber um direito real versando sobre bens
incertos, vagos e imprecisos. A determinação da coisa afetada é inerente à
finalidade do direito real, de maneira que, ao ser o direito lesado, tenha efeito a actio
in rem. A condenação poderá ser frustrada, ocorrendo a improcedência da ação, no
caso de surgirem dúvidas em relação à coisa, caso esta não esteja exatamente
designada - é a denominada especialização, que examinaremos adiante.2°

2.2 GARANTIA

A garantia é o ajuste que visa dar ao credor uma segurança de pagamento,


que poderá efetivar-se mediante a entrega de um bem móvel ou imóvel, pertencente
ao próprio patrimônio do obrigado (penhor, hipoteca ou anticrese), para responder
preferencialmente pelo resgate da dívida, caso em que terá garantia real, ou, então,
mediante promessa de terceiro, estranho ã relação jurídica, de solver pro debitore,
hipótese em que se configurarã a garantia pessoal, ou fidejussória, ou melhor, a
fiança, que além de garantir a boa vontade do devedor, completará sua insuficiência
patrimonial com o patrimônio do fiador
Para Darcy Bessone, nos direitos reais de garantia opera-se a vinculação de
uma coisa a determinada obrigação, a fim de garantir seu pagamento. A coisa dada
em garantia e vinculada a uma obrigação e garante uma relação creditória.
Tem-se em matéria de solução de dívida que, em regra, todo o património do
devedor responde por suas dívidas, considerando que não haja nenhum bem
particularmente afetado à garantia de determinada dívida. Todos os bens do
devedor são objeto de penhora, com exceção, obviamente, dos legalmente
impenhoráveis.

18 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil. Direito das Coisas. Vol. 5. São Paulo: Saraiva. 1981. p. 318.
19 MIRANDA, Pontes de. Obra citada. p. 3.
2° Ver item 5.3.2
13

O direito real de garantia abre exceção ã regra do concurso de credores, já


que vincula determinada coisa a certa razão creditória. Na chamada lei do concurso,
todos os credores do devedor comum concorrem em situação de igualdade, nota-se
daí a nítida vantagem para o credor em estabelecer-se a garantia. Tal vantagem
decorre de lei, como se verifica no art. 1.560 do Código Civil.”

2.3 DIREITO DE GARANTIA E PRIVILÉGIO

Não é prudente confundir direito de garantia com privilégio.” O privilégio, em


geral, está ligado ã qua/idade do crédito, já o direito real de garantia não preocupa­
se com esta qua/idade. A garantia pode ser dada a qualquer crédito e a créditos de
qualquer natureza. Pode ser dada a garantia através de bem que afete o
especialmente o mútuo, como também, com o que garanta qualquer outra relação
creditória.
Enquanto a garantia real decorre de convenção entre as partes, ou seja, ato
voluntário, o privilégio é instituído por lei. Ha casos, como o penhor legal e a
hipoteca legal, em que a garantia é instituída pela lei, mas, em regra, decorre de ato
voluntário. Já o privilégio constitui direito de natureza especial, não se estabelece
poderjurídico sobre a coisa.23

2.4 CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS REAIS DE GARANTIA

Os direitos de garantia tem como característica a sequela e a preferência,


conforme classificação de Orlando Gomes. Embora Caio Mário as inclua como
“efeitos” dos direitos reais de garantia em geral, conjuntamente com a excussão e a
indivisibilidade. Esta será analisada dentro dos caracteres jurídicos da hipoteca,
como assim o considera o próprio autor e Maria Helena Diniz; já e excussão sera
analisada como efeito latente da hipoteca.24

21
Código Civil, art. 1.560 - O crédito real prefere ao pessoal de qualquer espécie, salvo a exceção estabelecida
no parágrafo único do art. 759; o crédito pessoal privilegiado, ao simples, e ao privilégio especial, ao geral.
22 código Civil ans. 1.554 a 1.571
23 BESSONE, Darcy. Direitos Reais. 2.3 Edição. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 311.
24 Ver item 5.2
14

2.4.1 Direito de Sequela

Sequela é característica inerente aos direitos reais de garantia. O direito de


sequela autoriza ao credor hipotecário a perseguição da coisa para garantir-se a
dívida a que ela se vincula realmente, com quem quer que esteja, onde quer que se
encontre a coisa.
Sobre a sequela, Tito Fulgêncio diz: “Chamar ã execução a coisa hipotecada,
esteja onde estiver, em mão do devedor ou de outrem. É o direito de sequela, o
próprio direito real em atividade”.25
Caio Mário assim define o direito de sequela, quando se refere à hipoteca,
porém ressalva que se aplica aos direitos reais em geral:

”A sequela, como o próprio vocábulo indica, é a particularidade de seguir a


coisa onde quer que se encontre, própria dos direitos reais em geral. Se o
imóvel é transferido inter vivos ou causa mortis, pode o credor persegui-lo em
poder do adquirente, e sem dependência de ressalva especial. lncumbe ao
credor promover a execução do imóvel onerado e sua venda, mesmo que não
seja mais propriedade do devedor hipotecário. Por isto mesmo se poderá
dizer que a venda do bem gravado, não extinguindo a hipoteca, é um ato
indiferente para o credor, no sentido de que sempre lhe será lícito exercer seu
direito contra o adquirente.”26

Por outro lado, Orlando Gomes afirma: “O direito de sequela é o que tem o
titular de direito real de seguir a coisa em poder de todo e qualquer detentor ou
possuidor. Para significá-lo, em toda sua intensidade, diz-se que o direito real adere
à coisa como a lepra ao corpo (uti /epra outi). Não importam as usurpações;
acompanhará sempre a coisa”.27
Mesmo que o bem seja alienado ou transmitido por causa mortis, o bem
afetado pela garantia permanece como garantia ao credor, neste sentido Caio Mário
afirma: “transmitido o bem gravado (inter vivos ou causa mortis) continua afetado ao
cumprimento da obrigação garantida. Vale dizer: incorporada a coisa ao patrimônio

25 FULGÊNCIO, Tito. Direito Real de Hipoteca. Volumes I e II. 2.a Edição. Rio de Janeiro: Forense, 1960. p.56.
26 PEREIRA. Caio Mário da Silva. Obra citada, p. 270.
27 GOMES, Orlando. Obra citada. p. 9.
15

do adquirente, permanece objeto de garantia do débito do alienante, até a sua


so/utio”.28

2.4.2 Direito de Preferência

Onde mais nitidamente se desenha o perfil da garantia real é na insolvência


ou no inadimplemento do devedor que, neste caso, tera seus bens alienados em
hasta pública. A preferência ê o direito que tem o credor de pagar-se, no caso de
inadimplemento do devedor, mediante a venda do bem. Se houver excesso, restitui­
se ao devedor ou pagam-se os demais credores, por outro lado, se for insuficiente o
produto da venda judicial, tem direito o credor de buscar no patrimônio do devedor
recursos para se pagar, mas sem privilégio quanto ao remanescente do crédito.
Afinal, como dispõe o art. 767 do Código Civil, o credor continua obrigado
pessoalmente até a extinção do credito.29
Prudentemente observa Tito Fulgêncioz “A preferência não é da essência da
hipoteca, como o ê a seqüela, senão um predicado que a lei artificialmente lhe
confere, tanto que há hipotecas sem preferência (art. 824)”.3°
Sobre o direito de preferência, Orlando Gomes, diz: “Consiste no privilégio de
obter o pagamento de uma dívida com o valor do bem aplicado exclusivamente ã
sua satisfação (...) para o caso de inadimplemento tem o credor o direito de se
satisfazer sobre o valor deste bem, afastando os outros credores que tenham
apenas direito pessoal contra o devedor, ou mesmo direito real de inscrição
posterior”.31
No mesmo toar, assim Caio Mário define o direito de preferência: "ê o direito
reconhecido ao credor de se pagar prioritariamente, sem se sujeitar a concursos ou
rateio.”32

28 PEREIRA, Caio Mário de Silva. Obra citada. p. 226.


29 Código Civil, art. 767 - Quando, excutido o penhor, ou executada a hipoteca. o produto não bastar para o
pagamento da dívida e despesas judiciais. continuará o devedor obrigado pessoalmente pelo restante.
3° FULGÊNCIO, Tito. Obra citada. p. 57.
31 GOMES, Orlando. Obra citada. p. 9.
33 PEREIRA, Caio Mário de Silva. Obra citada, p. 269.
I6

2.5 A HIPOTECA COMO DIREITO REAL DE GARANTIA

Maria Helena Diniz utiliza-se do termo caracteres jurídicos da hipoteca, dentre


os quais destaca o de ser a hipoteca direito real de garantia: “É direito real de
garantia, pois vincula imediatamente o bem gravado, que fica sujeito à solução do
débito, sendo, ainda, oponível erga omnes, gerando para o credor hipotecário o
direito de sequela e a excussão da coisa onerada, para se pagar, preferencialmente,
com sua venda judiciaI.”33
O credor fica assegurado, ou por ser-lhe atribuído o poder de dispor da coisa,
no caso de inadimplemento, por si, ou através do Estado, ou por ser-lhe facultado
perceber os produtos até a satisfação do crédito.34

33 DINIZ, Maria Helena. Tratado Teórico e Prático dos Contratos. 3.a Edição, ampliada e atualizada. São Paulo:
Saraiva, 1999. p. 189.
34 MIRANDA, Pontes de. Obra citada, p. 3.
17

3. CONCEITO CARACTERES JURÍDICOS DA HIPOTECA

3.1 CONCEITO

A hipoteca é uma garantia real, em regra, imobiliária, que se realiza sem o


desapossamento do vendedor. Da afetação do imóvel resultam, em favor do credor,
o direito de preferência, oponível a todos os credores do devedor comum, e o direito
de sequela, que se opõe a qualquer outro direito, como veremos a seguir.
Pontes de Miranda define a hipoteca como sendo: “o direito real de garantia,
que grava imóvel ou bem a que a lei aponta (CC, art. 810) como hipotecável, sem
passar ao titular do direito a posse do bem ou dos bens”.35
A hipoteca recai sobre o bem por tornar seu valor sujeito ao gravame, ao
invés do uso, do fruto, ou da renda. O dono do bem gravado de hipoteca pode dispor
do domínio, cujo valor, em decorrência da hipoteca, diminui do total por ser esta um
direito real limitado.
Maria Helena Diniz, apesar de tratar mais especificamente da hipoteca
convencional, assim conceitua a hipoteca em geral: “A hipoteca é um direito real de
garantia de natureza civil, que grava coisa imóvel ou bem que a lei entende por
hipotecável, pertencente ao devedor ou terceiro, sem transmissão da posse ao
credor, conferindo a este o direito de promover a sua venda judicial, pagando-se,
preferentemente, se inadimplente o devedor. É, portanto, um direito sobre o valor da
coisa onerada e não sobre sua substancia.”36
Affonso Fraga define a hipoteca como sendo “o direito real que o credor tem
na coisa alheia deixada na posse e disposição do seu dono para na falta do
pagamento no vencimento do crédito, promover a sua venda em juízo e sobre o
preço se pagar com prelaçâo do que lhe fôr devido“37, tal conceito, segundo o autor
vem salientar os elementos substanciais da relaçäo, próprios ao objeto que procura
definir, ou seja, a ênfase no direito de prelação.


* MIRANDA, Pontes de. Obra citada. p. óz.
36 DINIZ, Maria Helena. Obra citada. p.3.
37
FRAGA, Affonso. Obra citada. p. 400.
18

Sucintamente, Orlando Gomes define: “A hipoteca é o direito real de garantia


em virtude do qual um bem imóvel, que continua em poder do devedor, assegura ao
credor, precipuamente, o pagamento de uma dívida”.38
Já para Caio Mário a hipoteca é “o direito real de garantia de natureza civil,
incidente em coisa imóvel do devedor ou de terceiro, sem transmissão da posse ao
credor“'39 a acrescenta, com propriedade que, da análise do conceito, conclui-se que
o mesmo é imperfeito, e passa ã análise do que denomina de caracteres jurídicos da
hipoteca, denominação esta também adotada por Maria Helena Diniz.

3.2 CARACTERES JURÍDICOS DA HIPOTECA

3.2.1 Natureza Civil

O Código Civil aclara que não importa quem são as pessoas envolvidas no
contrato hipotecário e acaba, definitivamente, com qualquer diferença que se
pretendesse estabelecer entre os negócios hipotecários dos comerciantes e os
negócios hipotecários de todas as outras pessoas. 4° Caio Mário afirma: “Não
importa, pois, a qualificação das pessoas do devedor ou do credor, nem a natureza
(civil ou mercantil) do débito garantido”.41

3.2.2 Direito real

Tratando-se de um direito real de garantia, logo se percebe que é


pressuposto da hipoteca um crédito, vale dizer, um direito de natureza pessoal a
garantir_42

3.2.3 Coisa do devedor ou de terceiro

38 GoMEs, Orlando. Obra citada. p. 353.


39 PEREIRA, caio Mário da Silva. Obra citada. p. 252
4° Código Civil, alt. 809 - A lei da hipoteca é a civil, e civil a sua jurisdição, ainda que a dívida seja comercial, e
comerciantes as partes.
41 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Obra citada. p. 253
tr ver item 2.5 - A hipoteca como direito real de garantia. p. 15
19

O objeto gravado deve ser da propriedade do devedor ou de terceiro, que dá


imóvel para garantir a obrigação contraída pelo devedor.

3.2.4 Posse da coisa

A hipoteca exige que o devedor hipotecante continue na posse do imóvel


onerado, que exerce sobre ele todos os seus direitos, podendo, inclusive, perceber­
lhe os frutos.” O devedor só perderá a posse no caso de execução hipotecária.
Sobre esta característica da hipoteca Orlando Gomes acertadamente comenta:
“Distingue-se a hipoteca dos outros direitos reais de garantia porque não desapossa
o devedor do bem dado em garantia. Daí sua superioridade econômica e técnica”.44
Como dispõe o Código Civil em seu art. 76545 será nula a cláusula que confira
ao credor a posse da coisa dada em garantia, é a chamada cláusula comissória que
consiste, claramente, em uma tecnica que oprime o tecnicamente mais fraco, o
devedor. Não importando se pactuada no momento do contrato ou posteriormente.46
Vale ressaltar que a repulsa a tal prática já se verificou no Direito Romano, na época
do Imperador Constantino, no século IV, já que, em pelo menos em quarto
passagens se notou tal repulsa: Código, Livro Vlll, Tít. 28, Leis 4, 7 e 14; Livro Vlll,
Tít. 35, Lei 3.47

3.2.5 lndivisibilidade

A hipoteca é considerada indivisível, no sentido que a hipoteca subsiste por


inteiro sobre a totalidade dos bens gravados, ainda que ocorra o pagamento parcial:
hypoteca est tota in toto et tota in qua/ibet parte (Código de Justiniano, Livro 8, Tít.

43 DINIZ, Maria Helena. Obra citada. p. 190


44 GOMES, Orlando. Obra citada. p. 354
45 Código Civil, art. 765 - É nula a cláusula que autoriza a o credor pignoratício, anticrético, ou hipotecário a
ficar com o abjeto da garantia. se a divida não for paga no vencimento.
46 FULGÊNCIO, Tito. Obra citada. p. 111
47 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Obra citada. p. 228.
20

27, § 6°). A indivisibilidade da hipoteca significa que os pagamentos parciais da


divida não autorizam a sua redução, ainda que ela compreenda vários bens.48
Orlando Gomes assim define a indivisibilidade: “Significa a indivisibilidade que o
ônus real grava a coisa na sua totalidade e em todas as suas partes, pouco
importando que seja dividida ou que a dívida seja amortizada. Assim, o devedor que
tenha pago parte da divida não obtém redução proporcional da garantia hipotecária;
o bem hipotecado continua a garantir o pagamento do saldo sem qualquer
diminuição, tal como gravado ao se constituir a relação”.49
Maria Helena Diniz esclarece: “Tal indivisibilidade não é do bem gravado ou
da dívida garantida, que podem ser divisíveis, mas sim do vinculo real que, apesar
do resgate parcial da obrigação, continua a recair sobre o bem, na sua
integralidade”.5°
Tito Fulgêncio diz: “A hipoteca é indivisivel, a dizer, cada porção do crédito é
garantida pela hipoteca inteira e cada porção da coisa hipotecada garante o crédito
inteiro”.51
A regra da indivisibilidade não é da essência da hipoteca52, mas criação de
lei, ou liberalidade dispositiva, já que as partes podem tornar o gravame divisível,
conforme disposição final do art. 758 do Código Civil. Da análise dos conceitos
trazidos, facilmente conclui-se que, a principal função da indivisibilidade é assegurar
eficazmente o pagamento da dívida na sua totalidade.
O axioma da indivisibilidade da hipoteca tem sido posto em rude prova em
face das novas necessidades. Como por exemplo em financiamentos concedidos
por agentes financeiros a construtoras para a construção de prédios de
apartamentos, verifica-se a necessidade de poder a construtura liberar a hipoteca
relativa às unidades já vendidas, desonerando, por sua vez, o adquirente da mesma.
Nenhum prejuízo adviria ao credor se, realizado o loteamento ou a edificação, fosse
possível aos adquirentes, na proporção do valor de sua unidade ou de seu terreno,
restringir a hipoteca à fração por eles adquirida, inclusive para poder remi-la.

48 Código Civil, art. 758 - O pagamento de uma ou mais prestações da dívida não importa exoneração
correspondente da garantia- ainda que esta compreenda vários bens, salvo disposição expressa no título, ou na
quitação.
49
50
GOMES, Orlando. Obra citada p. 35-l
DINIZ, Maria Helena. Obra citada. p. 190.
51 Fu1cÊNc1o,T1w.obm útzúz. p. 54.
52 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Obra citada. p. 254.
21

Clóvis do Couto e Silva traz pertinente critica à indivisibilidade, senão


vejamos: “O princípio da indivisibilidade das garantias reais, no pertinente à
hipoteca, tem de ceder no sentido de permitir a redução do gravame hipotecário,
quando efetuados pagamentos substanciais, e também quando se cuidar de
edifícios para venda de apartamentos ou de loteamentos, pois é de todo o interesse
do adquirente que grave o prédio apenas a fração que corresponda à totalidade dos
prédios hipotecados”.53
O mesmo autor comenta que a solução existe e á adotada em outros paises,
a divisão dar-se-á pelo aparecimento de várias hipotecas, cada uma delas vinculada
a um imóvel determinado: “No § 1.172 do BGB conferiu-se a cada um dos
proprietários o direito formativo modificativo, de fracionar a hipoteca que grava a
totalidade, de modo a que seu prédio fique gravado apenas com uma parcela ao
todo”.54 Em nosso direito, essa possibilidade fica na dependência do aceite do
credor.

3.2.6 Acessoriedade

A acessoriedade da hipoteca significa que a relação crediticia comanda e


determina o regime juridico de garantia de direito real, mais do que isso, tem o
sentido de que a garantia se refere sempre a um crédito.
Sobre a acessoriedade Caio Mário diz: “A hipoteca, como relação de garantia, não
pode nascer nem subsistir sem um crédito; se falta este ou se se invalida, inexiste
aquela; se se extingue, anula ou resolve o crédito, desaparece a garantia
hipotecária”.55 É acessório, já que é um direito real criado para assegurar a eficácia
de um direito pessoalsõ
Por sua vez, Orlando Gomes, corrobora: “Destinado a garantir o pagamento
de uma divida, o direito real de hipoteca, em nosso sistema jurídico, tem sua
existência condicionada e sua sorte ligada a um direito de crédito”.57

53 SILVA, Clóvis do Couto e. _-\ Hipoteca no Direito Comparado. Porto Alegre: CORAG, 1974. Pg. 39.
54
55
SILVA, Clóvis do Couto e. Obra citada. p. 39.
56
PEREIRA, Caio Mário de Silva- Obra citada. p. 254.
57
DINIZ, Maria Helena. Obra citada p. 191.
GOMES. Orlando. Obra citada p 353.
22

Completando o tema da acessoriedade da hipoteca, Afonso Fraga, afirma que


deste principio resulta:

“a) que sendo da essencia da hypotheca assegurar o cumprimento de uma


obrigação, se este se extinguir por qualquer causa juridica, ella também se
extingue; b) que a obrigação principal independe da acessoria; e assim ella
póde permanecer com vida juridica, não obstante a extinção da hypotheca; c)
que todas as excepções oponiveis á obrigação principal, são também
oponiveis á hypotheca, mas a reciproca não é verdadeira.”5

Como exemplo a essa última observação, se a hipoteca for constituída pelo


marido sem a outorga da mulher, nula ela será, porém o crédito subsistirá podendo
ser efetivado pelos meios competentes, isso é conseqüência da autonomia do direito
principal, por óbvio, da acessoriedade da hipoteca.

58
FRAGA. Affonso. Obra citada. p. 415.
23

4. ESPÉCIES DE HIPOTECA

Como já dantes fora esclarecido, não pretende esse trabalho trazer minúcias
sobre as distintas espécies de hipoteca, senão busca focalizar seu objeto na
hipoteca convencional, dando sobre as outras, tão somente, notícia do conceito.
Para as hipotecas denominadas especiais: a naval, a aeronautica e a de vias
férreas, igualmente se dara tratamento superficial, porém serão analisadas no
capítulo destinado aos requisitos (objetivos)59 da hipoteca.

4.1 HIPOTECA CONVENCIONAL

A hipoteca convencional é aquela constituída pelo acordo de vontades do


credor e do devedor. É a que deve atender os requisitos e deve gerar os efeitos6°
que serão objeto de análise deste trabalho.

4.2 HIPOTECA LEGAL

A hipoteca legal esta regida pela seção Il do capítulo destinado à hipoteca no


Código Civil, sejam os artigos 82761 a 830.
Igualmente à hipoteca convencional, fica um imóvel sujeito à solução da
obrigação, porém com a distinção que o proprietário não o destacou de seu
patrimônio por ato de vontade, mas sim por imposição de lei.
Dionysio Gama assim define a hipoteca legal:
“Chama-se - hypotheca legal - a que é insituida pela lei, independentemente
de qualquer convenção das partes, como um favor outorgado a certos
creditos, ou porque a natureza especial d'elIes o mereça, ou porque, com o
valor dos mesmos, se attente também ã condição das pessoas, em cujo
tá Ver item 5.2.
6° Ver capítulos 5 e 6. \
61 Código Civil, art. 827 - A lei confere hipoteca: I - A mulher casada, sobre os imóveis do marido para garantia
do dote e dos outros bens particulares dela, sujeitos à administração marital. II - Aos descendentes, sobre os
imóveis do ascendente, que lhes administra os bens. III - Aos filhos, sobre os imóveis do pai, ou da mãe, que
passar a outras núpcias, antes de fazer o inventário do casal anterior (artigo 183, n° XIII). IV - As pessoas que
não tenham a administração de seus bens, sobre os imóveis de seus tutores ou curadores. (Redação dada ao
inciso pelo Decreto Legislativo n° 3.725, de 15.01. 1919) V - À Fazenda Pública Federal, Estadual ou Municipal,
sobre os imóveis dos tesoureiros, coletores, administradores, exatores, prepostos. rendeiros e contratadores de
rendas e fiadores. VI e VII, ver nota ao item 4.3; VIII - Ao co-herdeiro para garantia do seu quinhão ou toma da
partilha, sobre o imóvel adjudicado ao herdeiro reponente.
24

benefício é estabelecido. Do direito romano, passou a hypotheca legal para o


velho direito portuguez, onde foi tambem conhecida pela denominação de
hypotheca tacita.”62

A hipoteca legal é constituída em favor das pessoas taxativamente


enumeradas nos incisos do art. 827 do Código Civil.
A especialização da hipoteca convencional decorre do próprio título,
mencionando a dívida e qual o imóvel destacado do patrimônio. Na hipoteca legal a
especialização se dá em juízo, observando-se a preceituação específica63 e a
discriminação dos bens gravados.
Pode-se observar a aplicação prática do instituto através do pequeno trecho
da jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em
julgamento de mandado de segurança:

“O certo é que, a priori, o administrador público responde com seus próprios


bens pelos erros que eventualmente cometer, culposa ou dolosamente, pois
deveria, rigorosamente, proceder hipoteca legal de seus bens no momento
em que iniciasse uma administração” - la Câmara Cível do Tribunal de Justiça
do Estado do Rio Grande do Sul, Mandado de Segurança n° 594014094,
julgado em O4 de outubro de 1994, observação feita pelo Desembargador
Tupinambá Miguel Castro Do Nascimento, em que se manteve afastamento
liminar do Prefeito Municipal de Imbé - RS de seu cargo, por incidente a Lei n°
8.429/92. (grifo nosso)

4.3 HIPOTECA JUDICIAL

A hipoteca judicial encontra assento nos incisos Vl e VII do art. 82764; e


constitui-se no direito de sequela conferido, na execução de uma sentença, ao
vencedor sobre os bens da parte vencida. É considerada uma espécie de hipoteca
62
GAMA, Affonso Dionysio. Obra citada, p.317.
63 Código de Processo Civil, art. 1.205 - O pedido para especialização de hipoteca legal declarará a estimativa da
responsabilidade e será instruído com a prova do domínio dos bens, livres de ônus, dados em garantia.
64 Código Civil, art. 827 - VI - Ao ofendido, ou aos seus herdeiros, sobre os imóveis do delinqüente. para
satisfação do dano causado pelo delito e pagamento das custas (artigo 842, n° I); VII - À Fazenda Pública
Federal, Estadual ou Municipal, sobre os imóveis do delinqüente, para o cumprimento das penas pecuniárias e o
pagamento das custas (artigo 842, n° II).
23

legal, vez que é oriunda de disposição legal e não de acordo de vontades. Porém
Pontes de Miranda distingue a hipoteca judicial da legal:

“O que distingue a hipoteca judicial das hipotecas legais é a interposição da


decisão constitutiva do juiz. O juiz não constitui hipotecas legais: pode
declarã-las, pode ter função no tocante à inscrição e cancelamento. Se as tem
como objeto de julgamento é para declará-las existentes ou não, eficazes ou
não eficazes. Quanto às hipotecas judiciais, o juiz, executando, as
constitui.”65

O pagamento dos ofendidos preferirá ao pagamento das custas e penas


pecuniárias, caso os bens do criminoso não forem suficientes para a satisfação do
<:iéi:›ii‹> iøiai, conforme dispõe 0 ari. 82966 do código civii.
Como nas ouras espécies de hipoteca, a inscrição é requisito fundamental
para que gere efeitos erga omnes, porém a hipoteca judicial permite que haja a
inscrição antes mesmo da sentença passar em julgado. Para bem ilustrar, examina­
se a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Paranã:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO - PEDIDO DE INSCRIÇÃO DE HIPOTECA


JUDICIAL - DEFERIMENTO - REQUISITOS ATENDIDOS - PENDENCIA DE
RECURSO - IRRELEVÀNCIA - DECISÃO MANTIDA - RECURSO
DESPROVIDO - Sendo conseqüência imediata da sentença condenatória a
hipoteca judicial, irrelevante que não haja, ainda, trânsito em julgado ou que o
devedor seja solvente, ou, ainda, que o valor do bem hipotecado seja superior
ã suposta dívida. Decisória a quo que atende os ditames do artigo 466 do
Código de Processo Civil.” (TJPR - Al 0102693-5 - (6953) - 6a C.Cív. - Rel.
Des. Jair Ramos Braga - DJPR 11.06.2001)

Orlando Gomes desaconselha o uso desta espécie de hipoteca: “Diversas


razões aconselham sua supressão. A principal é que se não justifica a concessão de
preferência ao credor que obteve a condenação, pois se encontra em situação

65 MIRANDA, Pontes de. Obra citada, p. 147.


66 Código Civil, art. 829 - Quando os bens do criminoso não bastarem para a solução integral das obrigações
enumeradas no artigo 827, n°s. VI e VII, a satisfação do ofendido e seus herdeiros preferirá às penas pecuniárias
e custas judiciais.
26

semelhante ã de outros credores, contrariando-se a regra de que o patrimônio do


devedor é a garantia comum dos credores.'67

4.4 HIPOTECA CEDULAR

A hipoteca cedular, como do próprio nome se deduz, é constituída por uma


cédula, que consiste num título representativo do crédito com a gravação do ônus
real. A emissão da cédula hipotecária só é permitida nas operações do Sistema
Financeiro de Habitação; ou se emitida por instituição financeira ou seguradora.
Caracteriza-se por ser título de crédito que pode ser endossada, sendo que o
beneficiado fica sub-rogado nos direitos do endossante. Para sua circulação, torna­
se imprescindível a sua averbação no registro de imóveis, sob pena de nulidade. Se
houver outro ônus real já inscrito não é possível a inscrição da cédula hipotecária.
Na hipoteca cedular são aplicados os mesmos princípios da hipoteca
convencional, desde que não colidam, como determina o art. 2668 do Decreto Lei n.°
413/69. Uma das principais distinções da hipoteca cedular em relação ã
convencional é a impossibilidade de se penhorar imóvel gravado com aquela. Pois, a
jurisprudência firmada no Tribunal de Alçada de Minas Gerais assim decidiu:

“AGRAVO DE INSTRUMETO - PENHORA - BEM HIPOTECADO - CÉDULA


DE CRÉDITO RURAL - É vedada a penhora de imóvel gravado com hipoteca
cedular rural, de acordo com o art. 6969 do Decreto-Lei n° 167/67. (TAMG - Al
0339461 -4 - (42023) - 43 C.Cív. - Rel. Juiz Alvimar de Ávila - J. 05.09.2001)

“AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE EXECUÇÃO - PENHORA DE


IMÓVEL HIPOTECADO - HIPOTECA CEDULAR EM FAVOR DE OUTRO
CREDOR - IMPENHORABILIDADE - RECURSO NÃO PROVIDO - 1. A
hipoteca, em regra, não induz inalienabilidade e impenhorabilidade pois o
direito de sequela permite ao credor hipotecário excutir o bem
independentemente de quem seja titular de domínio sobre o bem. 2. A

67 GOMES, Orlando. Obra citada, p. 360.


68 Decreto Lei n.° 413/69, art. 26 - Aplicam-se à hipoteca cedular os princípios da legislação ordinária sobre
hipoteca, no que não colidirem com o presente Decreto-Lei. Vide artigos 809 e segs. do Código Civil, sobre
hipoteca.
69 Decreto-lei n.° 167/67 . art. 69 - Os bens objeto de penhor ou de hipoteca constituídos pela cédula de crédito
rural não serão penhorados arrestados ou seqüestrados por outras dividas do emitente ou do terceiro empenhador
ou hipotecante, cumprindo ao emitente ou ao terceiro empenhador ou hipotecante denunciar a existência da
cédula às autoridades incumbidas da diligência ou a quem a determinou. sob pena de responderem pelos
prejuízos resultantes de sua omissão.
27

legislação especial, entretanto, excepciona a regra, dispondo que, na hipoteca


cedular, o bem torna-se impenhorável até mesmo em execução promovida
por credor de hipoteca simples ( art. 69 do Decreto-Iei n.° 167 de 1967 e art.
5770 do Decreto-|ei n.° 413, de 1969). 3. Havendo penhora cedular em grau
anterior, não pode o credor de hipoteca simples em grau posterior excutir o
bem dado em garantia. Tendo a decisão agravada adotado este
entendimento, revela-se correta. 4. Agravo de instrumento conhecido e não
provido.” (TAMG - AI 0296877-6 - 2a C.Civ. - Rel. Juiz Caetano Levi Lopes ­
J. 15.02.2000)

Decreto-lei n° 413/69, an. 57 - Os bens vinculados à cédula de crédito industrial não serão penhorados ou
sequestrados por outras dívidas do emitente ou do terceiro prestante da garantia real, cumprindo a qualquer deles
denunciar a existência da cédula às autoridades incumbidas da diligência, ou a quem a determinou, sob pena de
responderem pelos prejuizos resultantes de sua omissão.
28

5.REQUISITOS

Para que se verifique a validade da hipoteca é necessária a presença de


requisitos de natureza objetiva, subjetiva e formal.

5.1 REQUISITOS SUBJETIVOS

Sobre os requisitos de ordem subjetiva o Código Civil é bastante claro nos


dispositivos (arts. 755 a 757)71 que regulam o tema, náo necessitando de
exageradas considerações a respeito, embora alguns detalhes mereçam ser
observados.
Em primeiro lugar, o devedor que contrata a hipoteca deverá ter a capacidade
de alienar, já que o imóvel será vendido judicialmente no caso de inadimplemento da
dívida. Sobre os requisitos subjetivos, Orlando Gomes menciona que: “O direito real
de hipoteca constituído mediante contrato requer, no devedor, a capacidade de
alienar, visto que, se náo paga a dívida, o imóvel será judicialmente vendido”.72
Da leitura do artigo 75673, parágrafo único, visualiza-se que dominio
superveniente convalida a hipoteca desde a transcriçáo. Neste sentido, Maria
Helena Diniz comenta: “Se, porventura, a hipoteca for constituida por quem náo é
proprietário, nula ela será, salvo se o devedor estiver de boa-fé, revalidando-se o
ónus real se ele adquirir posteriormente a propriedade (CC, art. 756 parágrafo
único), desde a inscriçáo”.74
Dos dispositivos acima analisados pode-se deduzir que: a) a outorga uxória
ou marital se faz necessária para os casados que pretendem hipotecar, em caso de
recusa injustificada o juiz pode suprir a falta desta anuência; b) os condóminos
podem hipotecar a sua unidade e respectiva fração ideal, independentemente da
anuência dos demais; c) mediante autorizaçáo judicial e provada a necessidade, os

71
Código Civil, an. 7 55 - Nas dívidas garantidas por penhor, anticrese ou hipoteca, a coisa dada em garantia fica
sujeita. por vínculo real, ao cumprimento da obrigação.
Í2 GOMES, Orlando. Obra citada, p. 355.
/3 Código Civil, art. 756 - Só aquele que pode alienar poderá hipotecar, dar em anticrese, ou empenhar. Só as
coisas que se podem alienar poderão ser dadas em penhor, anticrese ou hipoteca. Parágrafo único - O domínio
superveniente revalida, desde a inscrição, as garantias reais estabelecidas por quem possuía a coisa a título de
proprietário.
74 DINIZ, Maria Helena. Obra citada. p. 192.
29

menores sob pãtrio poder poderão hipotecar, desde que representados pelos seus
pais; d) igualmente os curatelados poderão hipotecar, se o ato lhes trouxer
vantagem e devidamente representados e autorizados por magistrado; e) os falidos
não podem hipotecar por falta de administração e disposição dos bens; f) os
concordatãrios só poderão hipotecar mediante autorização judicial, até o
cumprimento da concordata; g) por criação jurisprudencial é permitido ao
ascendente hipotecar bem a descendente, independentemente do consentimento
dos outros75; h) igualmente por criação jurisprudencial, é possível hipotecar através
de procurador, desde que com poderes especiais; e finalmente o disposto no art.
757 do Código Civil.76

5.2 REQUISITOS OBJETIVOS

Conforme expressa determinação legal a hipoteca pode ter como objeto o rol
de bens apresentado no art. 81077 do Código Civil. Em regra, a hipoteca incide sobre
bens imóveis, embora recaia sobre coisas móveis, que, por lei, são passíveis de
serem hipotecadas sem perder sua mobilidade.”
Entre os bens que podem ser hipotecados incluem-se os acessórios dos
imóveis, juntamente com eles; o domínio direto; o domínio útil, no caso da enfiteuse;
as estradas de ferro; as minas e pedreiras; os navios e as aeronaves.
Vale relembrar que, em sua origem histórica, a hipoteca teve por objeto tanto
bens imóveis quanto bens móveis.
Os imóveis abrangendo por sua vez o solo e as construções de qualquer
espécie. Vale ressaltar que afim de facilitar o financiamento para aquisição de casa
própria admite-se a hipoteca de construções começadas caso em que o ônus real
recaira na fração ideal do solo.

Í” DINIZ, Maria Helena. Obra citada, p. 261.


'16 Código Civil, art. 757 - A coisa comum a dois ou mais proprietários não pode ser dada em garantia real, na
sua totalidade, sem o consentimento de todos; mas cada um pode individualmente dar em garantia real a parte
que tiver, se for divisível a coisa. e só a respeito dessa parte vigorará a indivisibilidade da garantia.
Código Civil, art. 810 - Podem ser objeto de hipoteca: I- os imóveis; Il- os acessórios dos imóveis
conjuntamente com eles; III- o domínio direto; IV- domínio útil; V- as estradas de ferro; VI- as minas e
pederiras, independentemente do solo onde se acham; VII- os navios.
78 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Obra citada, p. 255
30

Os acessórios dos imóveis conjuntamente com eles também serão objeto de


hipoteca. São eles descriminados no art. 43,l, ll e Ill, e 811 do CC. Ainda serão
abrangidas pela hipoteca todas as acessões, melhoramentos e construções do
imóvel.
Permite-se que o direito do senhorio direito, na enfiteuse, seja objeto de
hipoteca, independente do consentimento do enfiteuta, já que o domínio do senhorio
consiste na substância da coisa sem suas utilidades.
Igualmente o domínio útil pode ser hipotecado, vez que o mesmo pode ser
alienado pelo foreiro ou enfiteuta. O domínio útil é o poder que este tem de usufruir
do bem ou de transmiti-lo por ato inter vivos ou causa mon*is.
As estradas de ferro também são objeto de hipoteca, abrangendo-se todos os
acessórios, tais como: os trilhos acertados, as oficinas, as estações e as linhas
telegráficas, inclusive o material rodante; locomotivas e carros. A hipoteca de vias
férreas está regulada nos arts. 852 a 855 do Código Civil.
A lei requer que se respeite a sua administração e suas deliberações porque
são de funcionamento contínuo. A abrangência da hipoteca poderá recair sobre toda
a estrada ou somente sobre uma determinada linha. Desta maneira, o credor
hipotecário poderá impedir operações que rompam com a unidade da exploração
comercial, tais como: a venda da estrada ou de suas linhas, bem como a fusão com
qualquer outra empresa, sempre que a garantia ameace ser enfraquecida.
Ressalta-se, entretanto, que tanto a hipoteca ferroviária79 como a de minas e
pedreiras, são regidas por legislação especial.
As jazidas minerais são propriedade distinta do solo e pertence a União, que
tem direito preferencial para sua exploração. Como bem observa caio Mário: “ As
pedreiras, que pela sua natureza não dependem de concessão, podem ser
hipotecadas. As minas, convertido seu direito de exploração a uma concessão do
Governo, podem ser dadas em garantia, hipotecando-se as instalações fixas. Mas a
autorização governamental não poder ser objeto de gravame sem a averbação no
Livro de registro de Concessão da Lavra.”8°

if” ver Decreto Lei n.° 3.190/45; Decreto Lei n.° 4.857/39; an. iso da Lei n.° 6.015/73.
8° PEREIRA, Caio Mário da Silva. Obra citada. p.25s.
31

São hipotecados os navios porque vinculados a um porto; em virtude de


registro, tem dominação própria, nacionalidade e caracteres próprios que lhe dão
individualidade. A hipoteca efetua-se através de escritura pública com a
apresentação de propriedade naval, que deve ser inscrita no Tribunal Marítimo
conforme determina a Lei n° 9.432/97, regulamentada pelo Decreto n° 2.256/97.
Apesar de serem bens móveis, a legislação expressamente admite a hipoteca
dos mesmo, vista a necessidade e conveniência econômica.
Conquanto não sejam bens imóveis, as aeronaves constituem, também,
objeto de hipoteca, devido ao fato de são individualizáveis pela marca, prefixo,
matrícula e são subordinados a critérios preestabelecidos. A Lei n. 7565/86 dispõe ã
respeito. Já o Código Brasileiro de Aeronáutica permite que sejam hipotecadas
partes distintas da aeronave ou sua totalidade.

5.3 REQUISITOS FORMAIS

São requisitos formais da hipoteca o título, a especialização e a inscrição,


embora Orlando Gomes afirmar serem princípios da hipoteca, a especialização e a
inscrição, enquanto Pontes de Miranda ao invés de chamá-los de requisitos, os trata
como características dos direitos reais de garantia.

5.3.1 Título

O título consiste no documento que materializa a garantia sobre determinado


bem. Tanto na hipoteca convencional, que se constitui por contrato, quanto na
hipoteca legal, que decorre de disposição legal, ou na hipoteca judicial, oriunda de
sentença, é necessário, em todas as hipóteses, o título.
Na hipoteca legal o título constitutivo é a sentença de especialização, e na
judicial, a carta de sentença ou mandado judicial, que deve conter a indicação das
coisas gravadas e qual a dívida garantida.
32

Segundo Caio Mãrio: “é bem dever que o direito real surge com o registro e a
este o Oficial competente somente pode proceder ã vista de um instrumento inscrito.
Conforme se trate de hipoteca convencional ou legal o título variará. Mas há de
existir forçosamente.”81

5.3.2 Especialização

A especialização é requisito de validade da hipoteca contra terceiros expresso


em lei. Pois, assim o dispõe o Código Civil em seu inciso IV, do art. 761.82 A
especialidade estabelecida no contrato visa o interesse do devedor e atende a seu
crédito. A especialidade na inscrição (art. 846) é estabelecida no interesse de
terceiro, é o elemento de publicidade.83
A especialização consiste em indicar qual o bem separado do patrimônio, o
débito que se destina a garantir, e em favor de quem.
Ressalta-se ademais, que na falta desses requisitos, a hipoteca poderá ser
considerada ineficaz, não garantido, dessa maneira, terceiros interessados.
Distintos, porém são os critérios da especialização na inscrição, na qual e
necessária a descrição de todos os elementos necessários para que se possa fazer
uma individualização do bem; a data e a natureza do titulo; o valor do crédito e o da
coisa; além da completa qualificação das partes envolvidas.84 Em benefício do
credor especializa-se a hipoteca no contrato. Entretanto, na inscrição especializa-se
no interesse de terceiros, como fator de publicização.
Destaca-se que, conforme Caio Mário85, em relação ã impossibilidade de
hipotecar bens futuros, o mesmo não está a referir-se quanto a prédios em
construção, haja vista que a referência ao memorial descritivo, plantas e projetos,
constituem os dados especializadores, pois permitem que durante as diversas fases

81 PEREIRA. Caio Mário da Silva. Obra citada, p.261.


82 Código Civil, art. 761 - Os contratos de penhor. anticrese e hipoteca declararão, sob pena de não valerem
contra terceiros: I- o total da dívida ou sua estimação; II- o prazo fixado para o pagamento; III- a taxa dos juros,
se houver; IV- a coisa dada em garantia, com as suas especificações.
83 FULGÊNCIO. Tito. comema 0 zm. 761 ao cc.
84
Código Civil, art. 846 - A inscrição da hipoteca, legal, ou convencional, declarará: I- o nome, o domicílio e a
profissão do credor e do devedor; II- a data, a natureza do título. o valor do crédito e o da coisa ou sua estimação,
fixada por acordo entre as partes, o prazo e os juros estipulados; III- a situação, a denominação e os
característicos da coisa hipotecada.
85 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Obra citada. p. 263.
J.)

de construção objetive-se o gravame gradativamente, sem a necessidade de


qualquer outra providência no registro.
Igualmente importante a especialização para individualizar e separar qual a
parcela do patrimônio do devedor que se vê afetada. Orlando Gomes, assim
esclarece, sobre o que chama de princípio da especialização: “O direito do credor
hipotecário há de recair, necessariamente, em determinados imóveis, ou num só,
não podendo incidir indiscriminadamente em todos os bens do devedor.”

5.3.3 Inscrição

A inscrição da hipoteca deve seguir o disposto nos arts.831 a 848 do CC.


Dessa forma, para que a hipoteca tenha validade, deve ser inscrita no registro do
local do imóvel. Referidas inscrições e averbações deverão seguir a ordem em que
forem requeridas, com o protocolo correspondente, no caso de serem inscritas mais
de uma hipoteca sobre o mesmo imóvel.
Ressalta-se que não poderão ser registrada duas hipotecas, sobre o mesmo
bem, no mesmo dia, e nem a hipoteca juntamente com outro direito real a favor de
pessoas diversas, a menos que seja devidamente determinada, de forma precisa, a
hora em que foram lavradas cada uma delas.
Quando for levada ao registro o título de hipoteca que mencione a
constituição de uma anterior, ainda não registrada, o oficial do registro devera
aguardar trinta dias para que o interessado na primeira o realize, caso não o faça, a
segunda será registrada e preferirã ã primeira. O oficial do registro deverá fazer a
prenotação do pedido de registro de titulo de hipoteca, mesmo que paire dúvida
sobre a legalidade do mesmo.
A inscrição e o momento em que se cria o direito real de hipoteca, sem ela
trata-se de, apenas, um acordo entre as partes contratantes. Os doutrinadores são
bastante enfãticos em relação ã importãncia da inscrição, denominada como
“registro” pelo Novo Código Civil.
Orlando Gomes bem explicita a finalidade da inscrição da hipoteca: “A
inscrição da hipoteca destina-se a completar a constituição do direito real. Nada
acrescente à sua substãncia. Assim, não empresta validade ao contrato constitutivo
34

nulo, ou anulável.”86 No mesmo sentido, afirma Tito Fulgêncio: "É que a inscrição é
formalidade conservadora de direito existente, não constitutiva ou criadora de
direito.”87
Brilhantemente ensina Caio Mário:

“O registro é o momento culminante da hipoteca. O título e a especialização,


os elementos preparatórios ou causais. A inscrição é a operação geradora do
direito real. O elemento constitutivo do direito de hipoteca, propriamente dito.
Enquanto não inscrita, a hipoteca não passa de crédito pessoal, porque
subsišâe
real.” apenas inter partes. Depois de inscrita, vale erga omnes: direito

Para que não pairem dúvidas, confirma Lacerda de Almeida, enfaticamente:


“hipoteca não registrada é hipoteca não e×istente”.89

86 GOMES, Orlando. Obra citada. p. 355.


87 FULGÊNCIO, Tito. Obra citada, p. 381.
:É PEREIRA, Caio Mário da Silva. Obra citada, p. 264.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Apud - Obra citada, p. 264.
35

6. EFEITOS

O principal efeito da hipoteca é imediato e se confunde com sua própria


finalidade, que consiste em vincular um bem imóvel ao cumprimento de uma
obrigação originária.
Por Óbvio, não se pretende esgotar o tema dos efeitos gerados pela hipoteca.
Será objeto de análise os efeitos gerados para o devedor; para o credor; para
terceiros; para a relação jurídica em si mesma; quanto aos bens gravados e quanto
aos acessórios dos créditos.

6.1 EFEITOS EM RELAÇÃO AO DEVEDOR

Como já visto, o devedor não perde a posse do bem, por ser isto da própria
natureza da hipoteca. Em razão disto, poderá defendê-la contra credores e terceiros
que a molestem.
Da mesma maneira, pode o devedor fazer uso do ius disponendi, que é a
faculdade de alienar o imóvel. Porém, o ônus é transferido ao adquirente - transit
cum onere suo - que não poderá alegar ignorência. Caio Mário assevera: “nem lhe
socorrendo para libertá-lo qualquer cláusula de escritura, ou compromisso assumido
pelo devedor hipotecário.“9°
Fica proibido, contudo, o devedor, de constituir outro direito real sobre o
imóvel em despeito ao vínculo hipotecário, como por exemplo, constituir anticrese
por prazo mais longo que o da hipoteca.
Poderá hipotecar o imóvel mais de uma vez, a terceiros ou ao mesmo credor
hipotecário, desde que o valor de todas as hipotecas gravadas não excedam o valor
do imóvel.
Com a obrigação devidamente cumprida, assiste ao devedor o direito à
libertação do bem gravado. Caso o credor se recuse, injustamente, a receber o
débito, assiste ao devedor o direito de compeli-lo a receber pela ação de
consignação, claro que se presentes os requisitos para tal.

9° PEREIRA, Caio Mário da Silva. Obra citada. p. 267


36

Se desejar, poderá o devedor antecipar o pagamento de sua dívida, mesmo


que parceladamente, contudo a amortização não poderá ser inferior a 25% (vinte e
cinco por cento) do débito, conforme determina o Decreto n.° 22.626/33, em seu art.
7.° e parágrafos.

6.2 EFEITOS EM RELAÇÃO AO CREDOR

A hipoteca supõe que o valor do bem gravado continue o mesmo, ou


aproximadamente o mesmo.
Em primeiro lugar, o credor tem direito ã conservação do bem dado em
garantia, eis que se diminuído seu valor por qualquer razão, a garantia igualmente é
diminuída, caso em que poderá pedir reforço, sob pena do vencimento antecipado
da dívida. Nesse diapasão Pontes de Miranda confirma: “Todo ato que possa
diminuir o valor do bem ou o valor produtivo (anticrese) é vedado. Existe, portanto,
direito à integridade do bem. A esse direito correspondem pretensões e ações que
evitem as ofensas ã integridade do bem e tendam à reparação ou reforço de
garantia.” e o autor segue considerando sobre as pretensões do titular do direto
hipotecário: “O que lhe interessa e que, no momento da eventual execução forçada,
o valor do bem gravado não seja menor do que aquele que tinha ao ser constituída a
hipoteca.”91
Outro direito que assiste ao credor é o potencial direito ã execução. Potencial
porque, enquanto a obrigação é cumprida regularmente, o direito fica no plano ideal.
Deixando o devedor de cumprir a obrigação ou vencendo a dívida, sem pagamento,
o direito potencial do credor transforma-se em direito de ação, mediante
procedimento executório.
Pontes de Miranda confirma: “O titular do direito de hipoteca pode executá-la
logo que nasça a ação executiva real.”92 Tito Fulgèncio compartilha do raciocínio a
respeito da execução: “...cujo fundamento jurídico está na própria vontade do
devedor hipotecário; com a outorga da hipoteca, prometeu ao seu credor sujeitar-se
ã execução pronta. Reconhecendo ã vontade particular a faculdade de se impor esta

91 MIRANDA, Pontes de. obra citada. p. 231.


Qt MIRANDA, Pontes de. Obra citada. p. 238.
37

disciplina de ferro, o legislador prestigia o título a bem do crédito real, fomentando e


segurando o emprego de capitais na indústria, no comércio e na lavoura.”93
No caso de o bem hipotecado ser penhorado por outro credor a hipoteca
considerar-se-á vencida antecipadamente e imediatamente se torna executável a
hipoteca.94 Ademais, a citação do credor hipotecário ê obrigatória para que tenha
validade a praça, conforme determina o art. 82695 do Código Civil.
Neste sentido decidiu o Tribunal Regional Federal da 5.a Região:

“EMDARGOS DE TERCEIRO - IMÓVEL HIPOTECADO - ALIENAÇÃO SEM


ANUENCIA DO CREDOR HIPOTECARIO - EXECUÇAO JUDICIAL ­
PENHORA DO IMÓVEL - 1. A hipoteca ê direito real oponível erga omnes.
Garante ao credor hipotecário o direito de sequela, ou seja, de reaver o bem,
onde quer que se encontre. 2. A alienação do bem gravado por hipoteca é
ineficaz em relação ao credor hipotecário que não houver sido intimado,
consoante dicção dos arts. 619 do CPC e 826 do CC. 3. Apelação improvida_”
(TRF se R. - AC 111.612 - AL - 2a T. - Rel. Juiz Araken Mariz - DJU
06.11.1998 - p. 793) (grifo nosso)

Outro direito que assiste ao credor ê o de adjudicar o imóvel objeto da


hipoteca no caso de insolvência ou falência do devedor, desde que dê quitação pelo
total da dívida. O art. 82296 do Código Civil o prevê expressamente. Porêm não ê
necessária que a avaliação seja por valor inferior à dívida, pode ser superior como o
assevera Tito Fulgêncio sobre a relação de avaliação e dívida: “...ou superior, se o
credor repuser ã massa ou aos credores em concurso a diferença entre o montante
da dívida e o valor dos bens dado em avaliação ou no contrato.”97
Por fim, tem o credor hipotecário, que seja instituição financeira, o privilégio
de execução especial sumária do bem gravado, como disposto pelo Decreto Lei n.°
70, de 21 de novembro de 1966.

93 1=LUoÊNc1o.Tirb, Obra citada, p. 227.


“Í MIRANDA, Pontes db. Obra citada, p. 239.
9° Código Civil, art. 826 - A execução do imóvel hipoteoado far-se-á por ação executiva. Não será válida a venda
judicial de imóveis gravados por hipotecas, devidamente inscritas, sem que tenham sido notificados
judicialmente os respectivos credores hipotecários que não forem de qualquer modo partes na execução.
96 Código Civil. an. 822 - Pode o credor hipotecário, no caso de insolvência ou falência do devedor, para
pagamento de sua divida, requerer a adjudicação do imóvel avaliado em quantia inferior a esta, desde que dê
quitação pela sua totalidade. (Redação dada ao artigo pelo Decreto Legislativo n° 3.7 25, de 15.01. 1919)
97 FLUGENc1o.Tirb, Obra citada. p. 201.
38

6.3 EFEITOS QUANTO À RELAÇÃO JURÍDICA EM SI MESMA

O prazo de duração da hipoteca pode ser livremente estabelecido entre as


partes, porém convém observar o que ensina Caio Mário: ”Mas, não convi-ndo à
estabilidade dos negócios e ao interesse social se estabeleça garantia real perpétua,
ou demasiado prolongada, o legislador limita a sua duração a trinta anos.”98
Os principais efeitos da hipoteca quanto ã relação jurídica em si mesma são:
a preferência e a sequela, que são intrínsecas aos direitos reais, e foram objeto de
análise anteriormente.99

6.4 EFEITOS EM RELAÇÃO A TERCEIROS

A hipoteca, uma vez inscrita é oponível erga omrres, portanto desde então
produz efeitos em relação a terceiros. O terceiro que adquirir imóvel hipotecado, o
recebe juntamente com o ônus gravado.
Do exposto, decorre que, o terceiro, outro credor que desejar promover venda
judicial de bem já hipotecado deverá citar o credor hipotecário - conforme dispõe o
art. 826100 do Código Civil -, por ser este portador de direito real, sob pena de não o
fazendo, ser decretada a invalidade da venda. Pois, como credor quirografário,
concorrerá apenas depois de pago o titular do direito real, respeitando-se assim o
direito de preferência.
O crédito hipotecário pode ser cedido sem consentimento do devedor, e,
mesmo assim , o cessionário fica investido das mesmas garantias e preferências,
independente dos credores anteriores ã cessão, o que demonstra o caráter
permissivo à circulação do crédito. Igualmente é possível substitui-se o credor por
sub-rogação. Oportunamente Caio Mário distingue a sub-rogação da cessão de
crédito:

98 PEREIRA, caio Mário da silva. obra citada, p. 269.


99 Ver item 2.4
100
Código Civil, art. 826 - A execução de imóvel hipotecado far-se-á por ação executiva. Não será válida a
venda judicial de imóveis gravados por hipotecas, devidamente inscritas, sem que tenham sido notificados
judicialmente os respectivos credores hipotecários que não forem de qualquer modo partes na execução.
39

“A cessão do crédito hipotecário distingue-se da sub-rogação, que ocorre pela


substituição do credor satisfeito por aquele que paga a dívida ou fornece o
numerário para a solutio. Em um ou outro caso, pode o interessado, sem a
isso ser obrigado, como ensina DIONÍSIO GAMA, fazer inscrever a cessão ou
sub-rogação ã margem da inscrição hipotecária. Mas os dois fenômenos
distinguem-se: a sub-rogação é modalidade de pagamento, e tem efeito
extintivo da obrigação; ao passo que a mutação subjetiva com integridade do
vínculo é essencial à cessão.”1°1

6.5 EFEITOS EM RELAÇÃO AOS BENS GRAVADOS

Por ser de natureza real, a hipoteca adere ao imóvel, acompanhando-o em


todas as mutações subjetivas até a extinção. Com o perecimento do bem o ônus real
desaparece, porém o credor hipotecário exerce preferencia sobre o valor sub­
rogado, sem concorrência com os quirografários, no caso de haver indenização pelo
causador do dano ou seguradora. Outro efeito da hipoteca em relação ao bem
gravado é o de estender-se às suas benfeitorias, acréscimos ou acessões trazidas
ao bem, como dispõe o art. 810, ll do Código Civil.

6.6 EFE|Tos QUANTO AOS ACESSÓRIOS DO cRÉD|To

Destinando-se a garantir o pagamento da dívida, até sua liquidação, a


hipoteca assegura o cumprimento das obrigações acessórias, tais como: juros,
multa, custas judiciais, despesas de fiscalização.1°2 De modo diverso não teria
sentido, vez que nos dias de hoje, tais acessórios são parte integrante dos negócios
hipotecários e igualmente forma de garantia e remuneração do credor, ainda que de
valores bastante inferiores ao principal.
A jurisprudência se manifestou favoravelmente à inclusão dos acessórios na
execução da hipoteca, assim entendeu o Tribunal de Alçada de Minas Gerais:

“EMBARGOS DO DEVEDOR - PENHORA - HIPOTECA - MULTA - JUROS


- COMISSÃO DE PERMANÊNCIA - CUMULAÇÃO - ART. 192,
PARÁGRAFO 1, DA CF - A luz do art. 591 do CPC, todos os bens do
devedor respondem por suas obrigações, e, assim, a penhora não se
restringe apenas aos bens dados em garantia,_podendo alcançar outros até o

if" PEREIRA, caio Mário da Silva. obra citada. p. 271.


102 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Obra citada, p. 273.
40

limite da obrigação, exigindo-se, porém, o atendimento das disposições do


art. 655, parágrafo 2, do aludido código. E possível a cumulação de multa,
comissão de permanência e juros, em face da natureza e finalidade distintas
desses encargos contratuais, além de serem exigíveis, também, devido ao
princípio da força obrigatória dos contratos. O limite a pactuação de juros
instituído no art. 192, parágrafo 3, da CF não pode ser invocado pela parte,
por não ser auto-aplicável e necessitar de regulamentação, como já
pronunciou o pretório excelso. Viável e a cobrança de acessórios da dívida se
a existência dos mesmos encontra expressa previsão legal.” (TAMG - Ap
0244303-8 - 2a C.Cív. - Rel. Juiz Lucas Sávio - J. 11.11.1997) (grifo nosso)
41

7. REMIÇÃO HIPOTECÁRIA

Antes de mais nada vale trazer as sábias palavras de Pontes de Miranda que
esclarece a imprecisão terminológica e lingüística vastamente observada em
diversos autores: “remir é recomprar, readquirir, afastar, pagando, livrar-se,
solvendo. De remir vem remição, que os inexpertos confundem com remissão. Se
alguém r(ed)ime a hipoteca, prestando o que corresponder à garantia, dela fica livre
o prédio. Remitir é que vem remittire e a remissío é que corresponde remissão“'°3
A remição hipotecária é a faculdade de liberar o bem gravado mediante o
pagamento da soma da dívida com seus acessórios. Tem por finalidade conciliar a
segurança o credor e a livre circulação dos bens.
Esse direito é concedido, precipuamente, ao devedor, contudo podem remir a
hipoteca o adquirente do imóvel e o credor sub-hipotecário, que é o que constitui a
hipoteca depois de já haver uma hipoteca constituida.
Oralndo Gomes assim conceitua a remição: “Remir a hipoteca é liberar o bem
por pagamento da dívida que garante.”'°4
Por sua vez, Cáio Mário assim assevera sobre a remição: "Na dogmática
jurídica da hipoteca, a remissão (que em outros sistemas se denomina “purga da
hipoteca”) é uma faculdade reconhecida a certas pessoas, de liberar o bem gravado,
medinte pagamento da dívida e acessórios.”'°5 E em seguida o autor esclarece:
“Havendo composição ou entendimento, recebe o credor o que lhe cabe e dá
quitação. É pagamento. Não é remissão.”

7.1 REMIÇÃO PELO CREDOR DA SUB-HIPOTECÁRIO

O credor da Segunda hipoteca, ou das gravadas posteriormente, tem a


faculdade de remir a primeira, para tal é necessário que a primeira esteja vencida e
que o devedor não se ofereça à remição, pois deve promover sua citação para tal,
conforme disposto no art. 814106 do Código Civil. Deverá aquele, então, depositar o

103 MIRANDA, Pontes de. Obra citada, p. 249.


104 GOMES, Orlando. Obra citada, p. 366.
105
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Obra citada, p. 273
106 Código Civil, art. 814 - A hipoteca anterior pode ser remida, em se vencendo. pelo credor da segunda. se o
devedor não se oferecer a remi-la. § 1°. Para a remissão, neste caso, consignará o segundo credor a importância
42

total do débito e despesas judiciais, se estiver promovendo a execução judicial. A Lei


N° 6.015 de 31 de dezembro de 1973, conhecida como Lei de Registros Públicos
(LRP) também dispõe sobre a matéria da remição pelo credor sub-hipotecário, em
seus artigos 270 e 271 .107 Tem o devedor, se regularmente citado, o prazo de cinco
dias para exercer o direito de remição, se não o fizer, os autos irão conclusos para o
juiz julgar remição proposta pelo segundo credor.
O valor a ser depositado deve ser integral, incluindo o principal e acessórios,
não poderá ser parcelado, como assim decidiu o Tribunal de Alçada do Rio de
Janeiro:

“REMIÇÃO - VALOR - Deve ser feita pelo valor equivalente ao preço da


alienação ou adjudicação. lnadmissível o depósito de apenas metade do
í, sob argumento de estar a remitente amparada pela Lei n° 4.121/1963,
pois a pratica implicaria em prejuizo do adquirente ou do credor.” (TACRJ - Al
980/93 - (Reg. 374-2 - CÓd. 93.002.00980 - 58 C. - Rel. Juiz Bernardino
Machado Leituga - J. 22.09.1993) (Ementário TACRJ 34/94 - Ementa 36657)

REMIÇÃO - EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA - LEI N° 5.741/1971 - REMIÇÃO ­


PAGAMENTO PARCELADO - FALTA DE PREVISÃO LEGAL - Para se
utilizar da faculdade de remição. Prevista no art. 8° da Lei n° 5.741/1971, gvg
o solvens depositar em juizo a importãncia, que baste ao pagamento da
dívida reclamada, além das custas e da honorária, não prevendo a lei, nem
para esse caso, nem para as remições em geral, o pagamento parcelado.
(TACRJ - Al 1386/93 - (Reg. 635-3 - Cód. 93.002.01386 - 6a C. - Rel. Juiz
Luiz Odilon Gomes Bandeira - J. 23.11.1993) (Ementa 37219) (grifo nosso)

Quanto à terminologia empregada pela legislação Pontes de Miranda discorda


do termo “remição” empregado in casu, e afirma que não se trata de remição e sim
de sub-rogação. O autor discorre sobre o tema, analisando o parágrafo segundo do
art. 814 do Código Civil:

do débito e das despesas judiciais, caso se esteja promovendo a execução, intimando o credor anterior para
levanta-la e o devedor para remi-la, se quiser. § 2°. O segundo credor, que remir a hipoteca anterior, ficará ipso
facto sub-rogado nos direitos desta, sem prejuízo dos que lhe competirem contra o devedor comum.
107 Lei 6.015/73, art. 270. Se o credor de segunda hipoteca, embora não vencida a dívida, requerer remição,
juntará o título e certidão da inscrição da anterior e depositará a importância devida ao primeiro credor. pedindo
a citação deste para levantar o depósito e a do devedor para dentro do prazo de cinco dias remir a hipoteca, sob
pena de ficar o requerente sub-rogado nos direitos creditórios, sem prejuízo dos que lhe couberem em virtude da
segunda hipoteca. Art. 271. Se o devedor não comparecer ou não remir a hipoteca, os autos serão conclusos ao
juiz para julgar por sentença a remição pedida pelo segundo credor.
43

“Se não houvesse a regra jurídica do art. 814, o titular da posterior hipoteca
não poderia executar a sua hipoteca e teria de assistir à execução da
hipoteca anterior ou das anteriores hipotecas. Ainda que se vencesse a sua,
estaria privado de ir contra o bem na ação executiva, enquanto não se
vencesse a anterior, ou não se vencessem as anteriores. Vencida a anterior
ou vencidas as anteriores, teria de estar sujeito ã execução pelo titular ou
pelos titulares das hipotecas anteriores. A lei permite-lhe que chame a si, com
remição (ai, sub-rogação pessoal), a hipoteca vencida ou as hipotecas
vencidas, e aguarde o vencimento da sua para a execução, ou como titular
por sub-rogação pessoalexecute o bem, pois que vencida - ex hipothesi ­
está a hipoteca. Posto que, se já vencida a execução pelo titular das
hipotecas anteriores, passa o titular da hipoteca posterior remir a hipoteca, o
fito da regra juridica do art. 814 é evitar a execução por outrem.”'°8

7.2 REMIÇÃO PELO ADQUIRENTE DO IMOVEL HIPOTECADO

Da inteligência do art. 815109 do Código Civil tem-se que para obter a remição,
o adquirente do imóvel hipotecado deverá notificar judicialmente a aquisição ao
credor hipotecário. Tem o prazo de trinta dias para que notifique e proponha preço
não inferior ao da aquisição, assim também o dispõe o art.266“° da Lei Caso o
credor não concorde, pode dentro do prazo assinado requerer a licitação.
A licitação consiste na convocação dos interessados, procedendo-se como se
fora arrematação em hasta pública. Sobre a imóvel posto em licitação Tito Fulgêncio
diz: “Posto à venda entre os interessados, procedendo-se como se fora arrematação
em hasta pública, para prevenir perigos a que fica exposto. Antes deste
requerimento, estando ainda em curso o prazo, é lícito ao adquirente retratar total ou
parcialmente a proposta.”“1

108 MIRANDA, Pontes de. Obra citada, p. 250.


109 Código Civil, art. 815. Ao adquirente do imóvel hipotecado cabe igualmente o direito de remi-lo. § 1°. Se o
adquirente quiser forrar-se aos efeitos da execução da hipoteca, notificará judicialmente, dentro ein trinta dias, o
seu contrato, aos credores hipotecários, propondo, para a remissão, no mínimo, o preço por que adquiriu o
imóvel. A notificação executar-se-á no domicílio inscrito (artigo 846, parágrafo único), ou por editais, se ali não
estiver o credor. § 2°. O credor notificado pode. no prazo assinado para a oposição, requerer que o imóvel seja
licitado.
“U Lei 6.015/73, art. 266. Para remir o imóvel hipotecado, o adquirente requererá, no prazo legal. a citação dos
credores hipotecários propondo, para a remição, no mínimo, o preço por que adquiriu o imóvel.
“I FULGÊNCIO, Tito. Obra citada. p. 176.
44

112
Se o credor hipotecário não requerer a licitação dentro do prazo assinado ø
I

operar-se-á a remição mediante o depósito do preço, extinguindo-se, assim, o ônus


hipotecário.
Ressalta-se que a remição não produz o efeito extintivo do débito, porque o
devedor não é quitado e continua sujeito a pagar, não mais ao antigo credor
hipotecário, mas ao adquirente do imóvel que se sub-roga nos direitos dele. Porém a
garantia real não mais subsiste”, uma vez que a remição é causa de extinção da
hipoteca“4, como veremos adiante.“5
Outrossim, conforme o determina o art. 816116 do Código Civil, o adquirente
responderá por eventuais perdas e danos; pelas custas judiciais e pela diferença
entre a avaliação e a adjudicação, caso não notifique os credores hipotecários no
prazo assinalado no parágrafo 1.° do art. 815 do Código Civil. Tito Fulgêncio
esclarece sobre o que incidirão as perdas e danos, no caso de não notificação do
credor hipotecário:

'“Oriundas de deterioração ou desvalorização que sofra o imóvel por culpa do


adquirente, não os provenientes de caso fortuito ou força maior. Devem ser
pedidos por ação, em que se prove a culpa do adquirente, que, em relação
aos credores hipotecários, dada a publicidade da hipoteca, se considera um
detentor, a que foi considerada a guarda do imóvel do devedor. Possuidor de
boa-fé, tem direito puramente pessoal a indenização de benfeitorias
necessárias e úteis, que verteram em utilidade dos credores.”“7

112 FULGÊNCIO. Tito. Obra citada, p. 176. “Assinado em audiência, cinco dias, que em geral. marcam as leis
nos processos sumános.”
“3 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Obra citada. p. 274.
“4
ll
Código Civil, an. 849. A hipoteca extingue-se: IV - Pela remissão.
5 Ver item 8.4
“Õ Código Civil, an. 816. São admitidos a licitar: I - Os credores hipotecários. II - Os fiadores. III = O mesmo
adquirente. § 1°. Não sendo requerida a licitação, o preço da aquisição. ou aquele que o adquirente propuser.
haver-se-á por definitivamente ñxado para a remissão do imóvel, que, pago ou depositado o dito preço, ficara
livre de hipotecas. § 2°. Não notificando o adquirente, nos trinta dias do artigo 815, § l°, aos credores
hipotecários, tica obrigado: 1 - As perdas e danos para com os credores hipotecários. II - As custas e despesas
judiciais. III - A diferença entre a avaliação e a adjudicação, caso esta se efetue. (Redação dada pelo Dec. Leg. n°
3.725, de 15.01. 1919) § 3°. O imóvel será penhorado e vendido por coma do adquirente, ainda que ele queira
pagar, ou depositar o preço da venda, ou da avaliação, exceto se o credor consentir. se o preço da venda ou da
avaliação bastar para solução da hipoteca, ou se o adquirente a resgatar. A avaliação não será nunca em preço
inferior ao da venda. § 4°. Disporá de ação regressiva contra o vendedor o adquirente, que sofrer expropriação do
imóvel mediante licitação, ou penhora. o que pagar a hipoteca, o que por causa da adjudicação, ou licitação.
desembolsar com o pagamento da hipoteca importância excedente à da compra e o que suportar custas e
despesas judiciais. § 5°. A hipoteca legal é remível na forma por que o são as hipotecas especiais, figurando
pelas pessoas, a que pertencer. as competentes segundo a legislação em vigor.
117 1='uLGÊNc1o, Tito. Obra citada. p. 181.
45

Por outro lado, se o adquirente não proceder à remição conforme prevê a lei
ficará sujeito à excussão do bem, caso em que o credor exercerá o seu direito de
sequela. Assim decidiu o Tribunal de Alçada de São Paulo:

“EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA - Penhora de imóvel pertencente a terceiro


adquirente. Remição ou pagamento da dívida hipotecária por ele não
efetuada. Sujeição à excussão do bem. Direito de sequela exercitável
adversus quemcumque possessorem. improcedência dos embargos de
terceiro decretada. Inteligência dos arts. 815, § § 1° e 2°, 930, 972 e 985, ll,
do CC e 266 a 269 da L. 6.015/73”. (1° TACSP - Ap. 446.097-7 - 4a C. - Rel.
Juiz José Roberto Bedran - J. 13.11.199O) (RT 674/138) (grifo nosso)

7.3 REMIÇÃO PELO DEVEDOR, CÔNJUGE, ASCENDENTES OU


DESCENDENTES.

A remição pelo devedor ou familiares“8 é mais instituto processual do que


propriamente de direito civil, vez que cabe em qualquer processo de arrematação, e
não apenas na execução hipotecária.
Será permitido, no processo de execução, ao devedor e aos seu familiares
remir o imóvel após a realização da primeira praça e antes da assinatura do auto de
arrematação, conforme determinam os arts.651“9 e 787120 a 790 do Código de
Processo Civil.
O imóvel se libertará do ônus pela remição, desde que o preço oferecido pelo
devedor ou familiares seja igual ao da arrematação ou ao da avaliação, se não
houverem interessados na licitação.
A remição pelo devedor ou familiares não pode ser considerada prejudicial ao
credor, eis que o valor alcança o que efetivamente rendeu a venda judicial. Ressalta­
se que, não assiste ao credor, após essa modalidade de remição, o direito de
prosseguir executando o devedor pela diferença do valor da remição no próprio bem,

118 Leia-se: cônjuge, ascendentes ou descendentes.


“9 Código de Processo Civil, art. 651 - Antes de arrematados ou adjudicados os bens, pode o devedor, a todo
tempo, remir a execução, pagando ou consignando a importância da divida, mais juros, custas e honorários
advocatícios.
120 Código de Processo Civil, art. 787 - É lícito ao cônjuge, ao descendente, ou ao ascendente do devedor remir
todos ou quaisquer bens penhorados. ou arrecadados no processo de insolvência, depositando o preço por que
foram alienados ou adjudicados.
46

mas, como afirma Caio Mário: “continua titular de direito contra o executado, pelo
saldo, mas não lhe assiste o de penhorar o bem remido.”121
Também os sucessores têm o direito de remir o bem gravado de hipoteca,
desde que o façam pelo valor total, não podendo remir pela porção equivalente aos
seus quinhões, conforme determinação expressa do art. 766122 do Código Civil.
Os sucessores, para exercerem seu direito a remição devem ser citados no
processo de execução, sob pena de decretação de nulidade. Assim decidiu o
Tribunal de Alçada de São Paulo.

“EXECUÇÃO - Arrematação. Praceamento realizado sem a intimação dos


herdeiros da mulher do executado. lnadmissibilidade. Possibilidade de
remição do bem pelos sucessores. Nulidade decretada. Inteligência dos arts.
43 e 265, I, c.c. o art. 791, ll, do CPC e 1.572 do CC.” (1° TACSP - Al
529.128-5 - 3a C - Rel. Juiz Ferraz Nogueira - J. O9.02.1993) (RT 693/160)
(grifo nosso)

Outrossim, essencial o depósito do preço no prazo estipulado pelo art. 788123


do Código de Processo Civil, caso contrário não há como exercer o direito da
remição, assim decidiu o Tribunal de Alçada de Minas Gerais:

“EXE^CUÇÃO - REMIÇÃO - DEPÓSITO DO PREÇO INEXISTENTE ­


AUSENCIA DE REQUISITO ESSENCIAL - O direito de remição, nos termos
do CPC 788, deve ser exercido no prazo de 24 horas que mediar entre a
arrematação dos bens em praça ou leilão e a assinatura do auto. É lícito ao
cônjuge, ao descendente, ou ao ascendente do devedor remir todos ou
guaisquer bens penhorados ou arrecadados no processo de insolvência, mas
sempre depositando o preço por que foram alienados ou adjudicados” (CPC
121
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Obra citada, p. 278.
122 Código Civil, an. 766. Os sucessores do devedor não podem remir parcialmente o penhor ou a hipoteca na
proporção dos seus quinhões; qualquer deles, porém, pode fazê-lo no todo. Parágrafo único. O herdeiro ou
sucessor que fizer a remissão fica sub-rogado nos direitos do credor pelas quotas que houver satisfeito.
'23 Código de Processo Civil, art. 788 - O direito a remir será exercido no prazo de 24 (vinte e quatro) horas. que
mediar: I - entre a arrematação dos bens em praça ou leilão e a assinatura do auto (artigo 693); II - entre o pedido
de adjudicação e a assinatura do auto, havendo um só pretendente (artigo 715, § l°); ou entre o pedido de
adjudicação e a publicação da sentença, havendo vários pretendentes (artigo 715, § 2°).
47

787). (TAMG - AI 0342709-4 - (40988) - sa C.Cív. - Rel. Juiz Wander


Marotta - J. 29.08.2001)
48

8. EXTINÇÃO DA HIPOTECA

A extinção da hipoteca está regulada pelo Código Civil nos arts. 849 a 851124
Pelo que, passa-se a analisar individualmente as causas extintivas como
enumeradas no art. 849.

8.1 PELO DESAPARECIMENTO DA OBRIGAÇÃO PRINCIPAL

A hipoteca é um direito acessório, criado para garantir uma obrigação. Se


esta se extingue perde a hipoteca a sua razão de ser. Não há que indagar da causa
extintiva da obrigação; qualquer que ela seja, operando seu efeito em relação ã
obrigação principal, acarreta extinção do vínculo hipotecário, contanto que seja total.
Se a extinção da obrigação for parcial, mantém-se a hipoteca em relação à
parte restante, como se deduz da inteligência dos artigos 758 e 762125 do Código
Civil.

O ônus se levanta quando há o pagamento da importância devida, caso em


que a hipoteca se extingue pelo desaparecimento da obrigação principal, como se
observa na jurisprudência assentada no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:

“HIPOTECA: BAIXA E CANCELAMENTO - CITAÇÃO DO CREDOR


HIPOTECÁRIO - CITAÇÃO POR EDITAL - REVELIA - DESCABIMENTO ­
ART. 302 - § ÚNICO - CPC - Ação ordinária objetivando cancelamento de
hipoteca, cumulada com perdas e danos. Dívida hipotecária estabelecida por
escritura de confissão. Extinção do ônus pelo pagamento. Credor que não é
encontrado. Citação por edital. Defesa realizada pela Curadoria. Sentença
124 Código Civil, art. 849. A hipoteca extingue-se: I - Pelo desaparecimento da obrigação principal. II - Pela
destruição da coisa ou resolução do domínio. III - Pela renúncia do credor. IV - Pela remissão. V - Pela sentença
passada em julgado. VI - Pela prescrição. VII - Pela arrematação ou adjudicação.
12° Código Civil, art. 762 - A divida considera-se vencida: I - Se, deteriorando-se. ou depreciando-se a coisa
dada em segurança. desfalcar a garantia, e o devedor, intimado. a não reforçar. (Redação dada ao inciso pelo
Dec. Leg. n° 3.725, de 15.0l.l919); II - Se o devedor cair em insolvência, ou falir. Ill - Se as prestações não
forem pontualmente pagas, toda vez que deste modo se achar estipulado o pagamento. Neste caso. o recebimento
posterior da prestação atrasada importa renúncia do credor ao seu direito de execução imediata. IV - Se perecer o
objeto dado em garantia. V - Se se desapropriar a coisa dada em garantia, depositando-se a parte do preço, que
for necessária para o pagamento integral do credor. § 1°. Nos casos de perecimento ou deterioração do objeto
dado em garantia, a indenização. estando ele seguro ou havendo alguém responsável pelo dano, se sub-rogará na
coisa destruída ou deteriorada. em beneflcio do credor, a quem assistirá sobre ela preferência até ao seu completo
reembolso. (Parágrafo acrescentado pelo Dec. Leg. n° 3.725, de I5.01.19l9) § 2°. Nos casos dos n°s IV e V, só
se vencerá a hipoteca antes do prazo estipulado. se o sinistro, ou a desapropriação recair sobre o objeto dado em
garantia. e esta não abranger outros. subsistindo. no caso contrário, a dívida reduzida, com a respectiva garantia
sobre os demais bens, não desapropriados. danificados, ou destruídos. (Antigo parágrafo único renumerado pelo
Dec. Leg. n° 3.725, de l5.0l.19l9)
49

que acolhe o pedido aplicando os efeitos da revelia. Descabimento. A


presunção de veracidade só se aplica quando a citação do réu é real.
Inteligência do § único do art. 302, do Código de Processo Civil. Prova dos
autos demonstrando, no entanto, o pagamento da dívida. Não comprovação
de perdas e danos. Provimento parcial do recurso.” (TJRJ - AC 8000/96 ­
(Reg. 060397) - Cód. 96.001.08000 - RJ - 5 C.Cív. - Rel. Des. Marcus
Faver - J. 17.12.1996)(grifo nosso)

8.2 PELA DESTRUIÇÃO DA COISA OU RESOLUÇÃO DO DOMÍNIO

A destruição da coisa tira da hipoteca o seu objeto. Se, porém, há quem


indenize a destruição, seja o segurador, ou o responsável pelo dano, sobre o preço
se transporta o direito preferencial do credor, conforme prevê o art. 762, IV e V do
Código Civil.
A desapropriação, extinguindo o domínio, produz situação semelhante ã
resultante da destruição. Resolvido o domínio, resolvem-se os direitos que do
mesmo se derivam, feita a distinção que se segue.
Com a resolução do domínio por implemento da condição, ou advento do
termo, resolvem-se os direito reais instituidos na sua pendência. Da mesma forma,
quando o domínio de resolve por causa superveniente, como no caso de doação
revogada por ingratidão, a hipoteca subsiste, como se pode concluir dos art. 647126 e
648127 do Código Civil.

8.3 PELA RENÚNCIA DO CREDOR

A renúncia tácita dificilmente se harmoniza com o direito hipotecário. Deve ser


ordinariamente expressa. Contudo, se o credor juntamente com o devedor requerer
o cancelamento da hipoteca, sem estar pago, é claro que renunciou à hipoteca,
dando causa ã extinção da mesma.

126
Código Civil, art. 647 - Resolvido o domínio pelo implemento da condição ou pelo advento do termo,
entendem-se também resolvidos os direitos reais concedidos na sua pendência, e o proprietário, em cujo favor se
opera a resolução, pode reivindicar a coisa do poder de quem a detenha.
127 Código Civil, art. 648 - Se, porém, o domínio se resolver por outra causa superveniente, o possuidor, que o
tiver adquirido por titulo anterior à resolução. será considerado proprietário perfeito. restando à pessoa ein cujo
beneflcio houve a resolução, a ação contra aquele cujo domínio se resolveu haver para a própria coisa, ou seu
valor.
50

Para que seja válida, requer capacidade de dispor do renunciante, eis que o
seu efeito é converter o credor hipotecário em quirografário. Entenda-se que a
renúncia se dá em relação ao ônus real, subsistindo, portanto, a obrigação.
A hipoteca estará extinta se o credor, apesar de notificado em processo de
execução, não comparece para manifestar seu interesse naquela, implicando em
renuncia. Neste sentido, pode-se observar jurisprudência do Tribunal de Justiça de
Minas Gerais e do Superior Tribunal de Justiça:

“EXECUÇÃO MOVIDA POR TERCEIRO - INÉRCIA DO CREDOR


HIPOTECÁRIO - EXTINÇÃO DA HIPOTECA - Se o credor hipotecário foi
notificado dos termos da execução e deixou o processo correr, sem
manifestar o seu interesse, opera-se a extinção da hipoteca.” (TJMG - AG
162.297/6.00 - 3a C.Cív. - Rel. Des. José Antonino Baía Borges - J.
09.03.2000)

“PROCESSO CIVIL - AÇÃO DECLARATÓRIA - EXTINÇÃO DA HIPOTECA


- ARREMATAÇÃO DO BEM EM OUTRO PROCESSO - 1. Simples
manifestação do credor hipotecário da existência de saldo devedor não
caracteriza seu interesse para impedir a extinção da hipoteca pela
arrematação do bem em outro processo executório. 2. Violação da lei não
configurada e dissenso pretoriano não demonstrado. 3. Recurso especial não
conhecido.” (STJ - RESP 148356 - RS - 2a T. - Rel. Min. Francisco Peçanha
Martins - DJU 18.12.2000 - p. 00174) (grifo nosso)

Por outro lado, não é possível a extinção, em fase de arrematação, se o


credor não teve ciência desta, não implicando, assim, renuncia por parte deste.
Como decidiu o Tribunal de Alçada do Paraná:

“PROCESSUAL CIVIL - ARREMATAÇÃO - FALTA DE INTIMAÇÃO DO


CREDOR HIPOTECARIO - EXTINÇAO DE HIPOTECA REPELIDA ­
AGRAVO DESPROVIDO - Restando demonstrado nos autos que o
verdadeiro credor hipotecário não foi intimado para a praça, não há que se
falar em extinção de hipoteca.” (TAPR - Al 116275600 - (12276) - Curitiba ­
1a C.Cív. - Rel. Juiz Marcos Galliano Daros - DJPR 31 .03.2000) (grifo nosso)

8.4 PELA RE|vi|çÃo


51

Como já visto, a remição é recompra, ou afastamento com pagamento. Disso


decorre a extinção do vinculo real. Como já analisado, a remição é a faculdade de
liberar o bem gravado mediante o pagamento da soma da dívida com seus
acessórios, portanto causa a extinção do gravame.

8.5 SENTENÇA PASSADA EM JULGADO

A extinção da hipoteca pode ser decretada por juiz que declara nulidade ou
anulabilidade do õnus real. Pode para tal levar em conta qualquer um de seus
requisitos: formal, objetivo ou subjetivo; como também a existência de algum vicio de
consentimento; igualmente se verificada simulação ou fraude. Ressalta-se que a
sentença extingue o ônus real, não a obrigação principal, a não ser que assim o
declare.
De outra sorte, não é possível extinguir-se a hipoteca através de decisão
liminar. Neste sentido decidiu o Tribunal de Justiça do Espírito Santo:

“AGRAVO - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - EXTINÇÃO DE HIPOTECA ­


EXCESSO DE GARANTIA - IMPOSSIBILIDADE - RECURSO IMPRO\./IDO ­
O Código Civil exige sentença passada em julgado para extinção da hipoteca.
Somente em situações excepcionais é possível a extinção do gravame
através de provimento liminar de antecipação de tutela. Alegação de excesso
de garantia não constitui fundamento para extinção da hipoteca através de
provimento liminar recurso que se nega provimento.” (TJES - Al
11009000255 - Rel. Des. Frederico Guilherme Pimentel - J. 13.02.2001)

8.6 PELA PRESCRIÇÃO

A prescrição põe termo às relações jurídicas, extinguindo-se a exigibilidade da


pretensão. Quando o legislador se refere à prescrição como razão de extinção da
hipoteca, reporta-se a uma causa que extingue qualquer relação jurídica, portanto
com a hipoteca não poderia ser diferente, eis que mantém a coerência do sistema
jurídico.

8.7 PELA ARREMATAÇÃO OU ADJUDICAÇÃO


52

A hipoteca é dotada de natureza executiva. A execução da hipoteca tem seu


fim: na arrematação pelo maior preço oferecido; na adjudicação pelo credor
hipotecário ou na remição pelos que o podem fazer. Sobre a arrematação e a
adjudicação Caio Mário assevera: “São alinhadas como causa extintiva da hipoteca,
que lhes não sobrevive, ainda que o preço seja inferior ao crédito garantido. Neste
caso, o credor ainda o será pelo saldo, mas sem privilégio: simples credor
quirografário.”128 O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul confirma as palavras
do ilustre doutrinador:

“APELAÇÃO - HABILITAÇÃO DE CRÉDITO - HIPOTECA ­


ARREMATAÇÃO DO IMOVEL - RESPONSABILIDADE DO ADQUIRENTE
PELO RESTANTE DA DÍVIDA - Com a arrematação dá-se a extinção da
hipoteca. Decisão do STJ. Erro material. O adquirente do imóvel hipotecado,
após a arrematação deste, na sua falência, continua garantidor da dívida
enquanto não extinta a obrigação principal. Apelo parcialmente provido.” (8
fls.) (TJRS - APC 599400231 - 6a C.Cív. - Rel. Des. João Pedro Freire - J.
10.05.2000) (grifo nosso)

Confirma-se na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que a


arrematação da causa à extinção da hipoteca:

HIPOTECA - EXTINÇÃO - ARREMATAÇÃO - PRECEDENTES DA CORTE


- 1. Na linha de precedentes da corte, pela arrematação extingue-se a
hipoteca, nos termos do art. 849, VII, do Código Civil, não havendo nenhuma
impugnação quanto à realização da mesma, com o que admite-se tenha sido
o credor hipotecário, intimado da realização da praça. 2. Recurso especial
conhecido e provido. (STJ - REsp 139101 - RS - 3a T. - Rel. Min. Carlos
Alberto Menezes Direito - DJU 22.02.1999 - p. 104)

128
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Obra citada, p. 290.
3

9. OS REQUSITOS PARA A EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA DOS CRÉDITOS


VINCULADOS AO SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO PELA LEI 5.741/71

9.1 NoçÃo

A execução dos créditos vinculados ao Sistema Financeiro de Habitação é


regida pelo procedimento ditado pela Lei 5.741/71. Esta foi criada, especialmente,
para viabilizar um procedimento mais célere, capaz de propiciar ao agente financeiro
um retorno mais rápido do capital por ele investido no financiamento, face ao
inadimplemento do mutuário. A justificativa para o procedimento mais célere está no
caráter social dos financiamentos realizados sob o ãmbito do Sistema Financeiro de
Habitação.
Isto porque a princípio, o fim maior do Sistema Financeiro de Habitação,
criado com a Lei 4.380/64, era o de propiciar a aquisição da casa própria pelas
populações de menor renda, a fim de combater o déficit habitacional. Entretanto,
mesmo desvirtuado o sistema, a legislação em comento continua em vigor. Nesta,
ressalte-se, face ao procedimento mais célere, supre-se algumas fases do
procedimento executório regulamentar. Estas questões processuais representam,
ainda hoje, o ponto polêmico desta legislação especial, questionando-se a sua
constitucionalidade.
No processo de execução, em geral, não se pode, em principio, põr em
dúvida a satisfação concreta do credor, a não ser pela via de embargos. Isto porque
a execução sempre é instruída com um título, judicial ou extrajudicial, o qual
somente é desconstituído pela via de embargos, que trata-se de processo de
conhecimento. Mesmo na Lei 5.741/71 esta oportunização de embargos é muito
limitada, com restrições impostas pela própria lei, no tocante ao efeito em que estes
serão recebidos pelo juiz.

9.2 PROCEDIMENTO DA LEI 5.741/71

A execução especial prevista nesta lei tem um procedimento mais rígido e


mais ágil que a execução comum, justamente visando garantir ao credor o retorno
mais rápido de seu crédito, viabilizando novos financiamentos no ãmbito do SFH e
5-l

mantendo o caráter social da legislação em comento. Este procedimento mais rigido


da lei específica não só beneficia o credor, mas, pelos requisitos exigidos para a
propositura da ação e pela intenção de desonerar integralmente o devedor da
obrigação, também visa a beneficiar o mutuário, sobretudo em comparação com a
execução extrajudicial do Decreto n.° 70/66, que lhe é totalmente desfavorável.
Nestas execuções de título extrajudicial de contrato de financiamento para
aquisição de imóvel com fundos do SFH, o imóvel financiado é garantia da
operação, pois se encontra hipotecado ao agente financeiro. Esse imóvel hipotecado
corresponde ã residência do mutuário, posto que a lei proíbe a aquisição, através de
financiamento pelo SFH, por parte de pessoas que já possuam imóveis na mesma
jurisdição, conforme o disposto no §1° do artigo 9° da Lei 4.380/64. Este parágrafo
foi revogado pela Medida Provisória n.° 1.951-21, de 06.01.2000, DOU 07.01.2000,
entretanto, anteriormente a esta data, o parágrafo encontrava-se plenamente em
vigor, devendo o mesmo ser convertido em lei para ter sua validade plena.
O Superior Tribunal de Justiça já firmou seu entendimento de que as
execuções de financiamentos no ãmbito do SFH devem seguir o rito previsto na Lei
5.741/71, de acordo oom e decisão proferida no REsp 78365/R$129 Neste ponto,
cabe ressaltar a lição de José Vidal quanto ã aplicação da legislação específica em
detrimento ao Código de Processo Civil:

“A execução prevista na Lei 5.741 constitui procedimento especial destinado a


atender aos fins sociais, protegendo o financiamento de bens imóveis
vinculados ao Sistema Financeiro de Habitação, bem como a própria
economia do devedor. A sua aplicação é obrigatória, a fim de alcançar os fins
previstos. Está o juiz obrigado a imprimir o procedimento determinado pela lei,
ainda que as partes pretendam seguir outro diverso. No caso, há
indisponibilidade procedimental. Se a lei fixou certo rito processual, foi porque
o considerou como mais adequado à realização finalística do processo
executório. Essa matéria é de ordem pública, não podendo ser derrogada
pela vontade das partes, muito menos pelo juiz, que deve indeferir a petição
inicial, quando o tipo de procedimento não corresponder ã natureza da causa
(ri. v, do art. 295l3°, do CPC).”131

129 REsp 78365/RS “A cobrança judicial do crédito hipotecário vinculado ao Sistema Financeiro da Habitação
deve observar,obrigatoriamente, o rito previsto pela Lei n.° 5.741/71. Recurso Especial conhecido e provido. DJ
de 08.09.1997 - p. 42.437 - Rel: Min. Ari Pargendler.”
13° Código de Processo Civil, art. 295. A petição inicial será indeferida: V - quando o tipo de procedimento,
escolhido pelo autor. não corresponder a natureza da causa. ou ao valor da ação: caso em que só não será
indefefida. se puder adaptar-se ao tipo de procedimento legal;
131 VIDAL. José. A Praça Pública da Lei 5.741. Repro23/147. são Paulo: jul/set. 1981.
55

Esta aplicação se dá porque referido diploma legal se trata de procedimento


especial, enquanto o processo de execução, no Código de Processo Civil, trata-se
de procedimento geral, comum às medidas executivas. E havendo lei especial, esta
se sobrepõe á lei geral. Havendo incompatibilidade entre a norma especial e a
norma geral, o regramento especial se sobrepõe ao procedimento comum. A Lei
5.741/71, procedimento especial, encontra-se plenamente em vigor.
O processo de execução do Código de Processo Civil se trata de norma
comum a todos os processos de execução. Assim, no que a Lei 5.741/71 for omissa
ou no que não houver colisão de disposição, aplicar-se-á, subsidiariamente ã Lei
5.741/71, os dispositivos legais do Código de Processo Civil. Assim, não se cogita
da aplicação ou não da lei especial, posto ser a mesma obrigatória às execuções em
comento.
Argumenta-se acerca, também, da constitucionalidade dos dispositivos
constantes da Lei 5.741/71. Acredita-se que não há razão de ser para a dúvida, com
exceção do artigo 5° no que tange às condições para atribuição de efeito suspensivo
aos embargos, uma vez que tido como inconstitucional por alguns autores. No
restante, constitucional a lei que rege o procedimento especial. Para tanto, tomemos
a lição de Evaristo Aragão Ferreira dos Santos sobre o assunto:

“É evidente que criar um rito de execução mais célere implica modificação, e


até mesmo supressão de aluns momentos do procedimento comum da
execução. Isto não significa, porém, que aos interesses do mutuário
inadimplente do SFH teriam sido sobrepostos os das instituições financeiras
de um modo geral. Ao contrário, sempre se protegeu ao máximo o mutuário
do SFH. Esta proteção, todavia, sempre esteve limitada à sobrevivência do
próprio Sistema Financeiro da Habitação, cuja manutenção está
umbilicalmente ligada à necessidade de retorno rápido do capital investido,
para que novos financiamentos possam ser real¡zados.”132

Segundo ensinamentos de Pedro Vasconcellosm, desde que o fundamento


da execução seja a falta de pagamento, conforme estatui o art. 10 da Lei, não se
aplica o Código de Processo Civil nem de maneira subsidiária, fazendo uso,

132 SANTOS. Evaristo Aragão Ferreira dos. Uma Abordagem Crítica da Execução dos Créditos Vinculados ao
Sistema Financeiro da Habitação, In Processo de Execução e Assuntos Afins. Tereza Arruda Alvim
Warnbier (org). 1.a Edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p. 207.
56

somente do rito sumário da lei extravagante. Não parece correto o entendimento,


visto que, em princípio, deve-se aplicar a lei especial e, de maneira subsidiária,
utiliza-se o CPC no que não forem conflitantes.
Há quem entenda que a Lei 5.741/71 ab-rogou a execução extrajudicial do DL
70/66, face servirem para a tutela da mesma espécie de litígio. Entretanto, ambas as
legislações convivem simultaneamente no nosso ordenamento, pois seus
procedimentos não são incompatíveis. Ocorre que a utilização de um exclui a
incidência do outro, como não poderia deixar de ser.
Ainda, questiona-se se a execução hipotecária judicial não teria sido ab­
rogada pelo Código de Processo Civil de 1973, se alguns pontos do procedimento
colidem ou não com a normatividade do CPC/73, face este haver incluído a
cobrança hipotecária em seu artigo 585, inciso lll, na Seção que trata dos Títulos
Executivos. Ocorre que este artigo refere-se tão somente a crédito hipotecário não
vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação, pelo que a legislação extravagante
continua em vigor.
Quanto ao juízo competente para as execuções, a menos que a entidade
financiadora seja a Caixa Económica Federal, não haverá participação desta. Assim,
sendo o contrato firmado com qualquer outro agente permitido que não a CEF, a
competência será da Justiça Estadual, sem a intervenção desta. A não participação
da Caixa Econômica nestas execuções decorre do fato de que não se trata de
readequação do contrato ou revisão de sua cláusulas, mas tão somente de cobrança
de prestações em atraso.

9.3 REQUISITOS

O Código de Processo Civil no artigo 267, inciso VI134, estabelece quais são
as condições genéricas da ação, quais sejam: possibilidade jurídica do pedido,
interesse de agir e legitimidade de parte, condições estas indispensáveis para o
exercicio de qualquer tipo de ação.

133 VASCONCELLOS, Pedro. Execução Extrajudicial e Judicial do Crédito Hipotecário no Sistema Financeiro
134
da Habitação. If* Edição. São Paulo: Edições Francisco Alves, 1976. p. 127.
Código de Processo Civil, art. 267 - Extingue-se o processo, sem julgamento do mérito: V - quando o tipo de
procedimento, escolhido pelo autor, não corresponder à natureza da causa, ou ao valor da ação; caso em que só
não será indeferida. se puder adaptar-se ao tipo de procedimento legal;
57

Entretanto, face ao caráter da Lei 5.741/71, que possui rito mais célere e visa
desonerar integralmente o devedor, o legislador entendeu por bem instituir-lhe
condições especiais para o exercício deste tipo de ação. A imposição de condições
específicas para este tipo de execução visa proteger o mutuário e sua família, além
dos interesses do credor. Estes requisitos encontram-se elencados no artigo 2°133 da
lei.

O primeiro requisito e mais fundamental é a mora do devedor. Se a razão da


cobrança for outra que não a falta de cumprimento das obrigações a que se
comprometeu o executado, a execução se processará pelo rito comum previsto no
CPC, conforme expresso nos artigos 1°133 e 10137 da Lei.
Portanto, fundada a execução em outro motivo que não seja a mora, seguirá
o rito do Código de Processo Civil. Ainda, a lei 8.004/90, que dispõe sobre
transferência de financiamento no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, no
seu artigo 211313, determinou que a execução fundada no Decreto-Lei 70/66 ou na Lei
5.741 só pode ser feita quando houver, no mínimo, três prestações em atraso.

9.4 REQUISITOS ESPECÍFICOS

Os requisitos específicos são os elencados no art. 2.° da lei em comento, que


serão analisados a seguir:

B..
1 3 Lei 5.741/71, art. 2.° - A execução terá início por petição escrita, com os requisitos do artigo 282 do Código
de Processo Civil, apresentada em três vias, servindo a segunda e terceira de mandado e contrafé, e sendo a
primeira instruída com: I - o título da dívida devidamente inscrita; II - a indicação do valor das prestações e
encargos cujo não pagamento deu lugar ao venciinento do contrato; III - o saldo devedor, discriminadas as
parcelas relativas a principal, juros, multas e outros encargos contratuais. fiscais e honorários advocatícios; IV ­
cópia dos avisos regulamentares reclamando o pagamento da dívida, expedidos segundo instruções do Banco
Nacional da Habitação.
133 Lei 5.741/71, art. 1.° - Para a cobrança de crédito hipotecário vinculado ao Sistema Financeiro da Habitação
criado pela Lei n.° 4.380, de 21 de agosto de 1964, é lícito ao credor promover a execução de que tratam os
artigos 31 e 32 do Decreto-Lei n.° 70, de 21 de novembro de 1966, ou ajuizar a ação executiva na forma da
presente lei.
13 ' Lei 5.741/71, art. 10 - A ação executiva, fundada em outra causa que não a falta de pagarnento pelo executado
das prestações vencidas, será processada na forma do Código de Processo Civil, à ação executiva de que trata
esta lei.”
133 Lei 8.004/90, art. 21 - Sornente serão objeto de execução na conforrnidade dos procedirnentos do Decreto-Lei
n° 70, de 21 de novembro de 1966, ou da Lei n° 5.741, de 1° de dezembro de 1971. os financiámentos em que se
verificar atraso de pagarnento de 3 (três) ou rnais prestações.
58

9.4.1 O título da dívida devidamente inscrita.

Qualquer execução deve ser instruída com um título executivo. Neste caso, o
título executivo é a contrato de financiamento firmado entre o mutuário e a
financiadora, onde conste a garantia hipotecária do imóvel. No caso específico das
execuções ora mencionadas, o título da dívida deve estar registrado no Cartório de
Registro de Imóveis competente, junto à matrícula do imóvel, e dele deve constar o
gravame da hipoteca.
Se esta não estiver registrada, o credor não será considerado carecedor de
ação, pois trata-se de negócio jurídico que gera efeitos entre as partes desde a sua
formação, mas a mesma não terá eficácia perante terceiros, como, por exemplo, no
caso de expedição de mandado de desocupação contra terceiro ocupante do imóvel,
que poderá opor embargos contra o desapossamento. Assim, a dívida hipotecária,
para a própria segurança do credor, deve ser averbada à matrícula do imóvel. A
averbação obedecerá o disposto no art. 11139 da art. 11.

9.4.2 Apresentação de demonstrativos de cálculo referentes à dívida

Em tese, deve o Autor, para instrução da execução, juntar duas planilhas ­


uma com o valor das prestações em atraso e outra com o saldo devedor total, ainda
pendente de pagamento. Isto é necessário pelo fato da execução servir de base
para a cobrança das prestações que encontram-se em atraso. Nesta esteira, o
executado é citado para, em 24 horas, pagar o que está sendo exigido, que
corresponde ao valor das prestações em atraso.
Pagos os valores, é sanada a relação contratual, permanecendo intacto o
vínculo entre os contratantes. Entretanto, se não ocorrer o pagamento, o imóvel será
levado a leilão, sendo que neste, o lance mínimo será o valor do saldo devedor da
hipoteca. Por este motivo é que é necessária a demonstração dos dois valores, pois

139 Lei 5.741/71, art. 11 - Ficam dispensadas de averbação no Registro de Imóveis as alterações contratuais de
qualquer natureza, desde que não importem ein novação objetiva da dívida, realizadas em operações do Sistema
Financeiro da Habitação, criado pela Lei n° 4.380, de 21 de agosto de 1964, sejam as operações
consubstanciadas em instrumentos públicos ou particulares, ou ein cédulas hipotecárias. Parágrafo único. O
registro de cédulas hipotecárias lirnitar-se-á à averbação de suas características originais, a que se refere o artigo
13 do Decreto-Lei n° 70, de 21 de novembro de 1966, ficando dispensadas de averbação também as alterações
que decorram da circulação do título.
59

a citação é para pagamento das prestações em atraso e o valor para leilão é do


saldo devedor total do contrato. Neste sentido, não há como pretender o devedor
alegar a inépcia da inicial se os demonstrativos a acompanham. Assim decidiu o
Tribunal de Alçada do Paraná:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO - ALEGAÇÃO DE INÉPCIA DA INICIAL E


CARÊNCIA DE AÇÃO NA EXECUÇÃO - PEDIDO DE CONCESSAO DE
LIMINAR INAUDITA ALTERA PARS PARA IMEDIATA SUSPENSÃO DE
PROSSEGUIMENTO DO TRAMITE DE EMBARGOS A EXECUÇÃO ­
INSUBSISTÊNCIA ARGUMENTATIVA - RECURSO DESPROVIDO - Não há
se aludir a inépcia da inicial quando o título executivo, acompanhado dos
suficientes demonstrativos do débito expressam a evolução da dívida e, por
conseqüência, a liquidez, a certeza e exigibilidade do título exeqüendo. Não
se cogita de carência da ação quando o título executado é uma escritura
pública de confissão de dívida com garantia hipotecária avençada entre as
partes, devidamente assinadas, inclusive por testemunhas.” (TAPR - Al
149025700 - (10319) - Curitiba - 7a C.Cív. - Rel. Juiz Eduardo Fagundes ­
DJPR 03.03.2000) (grifo nosso)

Ressalta-se que a prestação paga mensalmente pelo mutuário não engloba


apenas a amortização do saldo devedor, mas os demais encargos inerentes ao
financiamento concedido pelo agente financeiro, tais como: juros e o seguro que é
obrigatório.

9.4.3 Constituição em mora do devedor

É indispensável para a propositura da execução especial que haja


inadimplemento contratual inequívoco do mutuário. Por se tratar de financiamento
para aquisição de casa própria, há muitos interesses ligados à continuação do
contrato. Deve-se comprovar a mora de forma incontroversa.
A cópia dos avisos regulamentares é requisito do inciso IV do artigo 2° da lei
5.741/71. Estes têm a expedição regulamentada pelo BNH, através da Resolução
11, editada em 15/03/1972. Os itens 4.1 e 43140, para fins de instrução da execução

14° Resolução ll- Item 4.1- Antes de promover a execução da dívida, o credor ou seu agente cobrador, deverá
comprovar haver expedido ao devedor, pelo menos, os seguintes avisos: após 15 (quinze) dias do vencimento da
primeira prestação não paga, convocando o devedor para esclarecimentos e alertando-o da conveniência de
regularizar o débito; a) se a dívida continuar sem pagamento após 30 (trinta) dias da expedição do aviso referido
na alínea “a”, outro aviso será emitido exigindo o pagamento e fixando o prazo de, no mínimo, 20 (vinte) dias
para a liquidação do débito, sob pena de execução da dívida. Item 4.3- Os avisos via postal ou telegráfica
60

hipotecária, determinam o prazo para envio dos avisos, bem como regulamentam a
expedição por via postal. Segundo esta resolução, o mutuário deve ser cientificado
no mínimo por duas vezes do seu inadimplemento, tendo em vista que a lei especial
fala em “avisos” no plural.
Sobre o assunto há divergência da doutrina e jurisprudência, pois o item 4.4
da Resolução diz que, em inadimplemento superior a seis meses, basta somente a
expedição de um único aviso. E alarga a possibilidade de somente um aviso para a
hipótese de ser dada ao imóvel financiado finalidade outra que não seja a moradia
do mutuário.
Entretanto, a matéria é sumulada pelo STJ, através da Súmula 199, que
estabelece: “Súmula 199: na execução hipotecária de crédito vinculado ao Sistema
Financeiro da Habitação, nos termos da Lei n.° 5.741/71, a petição inicial deve ser
instruída com, pelo menos, dois avisos de cobrança.”
No tangente ã emissão de somente um aviso, regulado pela Resolução 11/72
do BNH, a jurisprudência se manifesta igualmente contrária. Pois, assim confirma a
decisão do Tribunal de Alçada de Minas Gerais:

“EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA - SFH - MORA DO DEVEDOR - RC 11/72


BNH - DEMONSTRATIVO DO DÉBITO - LEI N° 5741/71 - CORREÇÃO
MONETÁRIA - JUROS - A exigência de que seja a inicial da ação de
execução hipotecária instruída com cópia dos avisos de constituição do
devedor em mora desautoriza a aplicação da RC 11/72, do BNH, na parte em
gue dispensa a publicação de mais de um comunicado. A informação, pelo
credor, constante de demonstrativo, do valor originário total das prestações
vencidas, sem que haja discriminação mês a mês do débito, não atende ao
requisito do inciso Il do art. 2 da Lei n° 5741/71, porque impede o devedor de
verificar não só como tal valor foi encontrado, como também o conhecimento
da correta aplicação da correção monetária e dos juros incidentes sobre o
débito.” (TAMG - Ap 0221490-8 - 3a C.Cív. - Rel. Juiz Kildare Carvalho - J.
25.09.1996)

A ciência deve ser pessoal, por carta entregue contra recibo, telegrama, etc.,
facultando ao credor a publicação dos avisos em jornal de circulação local, em casos
de avisos coletivos envolvendo mais de um devedor. Neste ponto também há

poderão ser dirigidos ao endereço do imóvel financiado e serão comprovados pela exibição do recibo assinado
por morador do imóvel, ou pela exibição do recibo de registro postal ou de expedição de telegrama. Os avisos
pela imprensa serão comprovados pela exibição de exemplar do jomal que os houver publicado.
61

controvérsia. Alguns autores entendem que a notificação para constituição da mora


deve ser pessoal.
Assim, somente admitir-se-ia a publicação coletiva em jornal de publicação
local nos casos de o mutuário não mais residir no foro da situação do imóvel.
Atualmente, o que mais freqüentemente se utiliza é, efetivamente, a publicação, em
jornal de grande publicação, de avisos coletivos, pois assim a expedição torna-se
menos onerosa ao agente financeiro e também mais rápida.
Porém a jurisprudência tem orientado no sentido que a citação no endereço
do imóvel financiado é suficiente para produzir os efeitos desejados. Neste sentido
decidiu o Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

“EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA - LEI N° 5.741/71 - ALEGAÇÃO DE NÃO


RECEBIMENTO PESSOAL DOS AVISOS E AUSÊNCIA DO VALOR DO
DÉBITO - CARÊNCIA DE AÇÃO AFASTADA - 1. Os avisos previstos no
artigo 2°, IV, da Lei n° 5.471, de 1971, produzem todos os seus efeitos, se
remetidos ao endereço do imóvel hipotecado, no qual,_por força de obrigação
contratual, o mutuário está obrigado a residir; dispensam a notificação
pessoal, porque não tem natureza da citação, constituindo-se apenas
condição de procedibilidade, sem a qual a execução não pode ser proposta
(RESP n° 56.111, Min. Ari Pargendler). 2. A redação do art. 2°, inc. IV da Lei
n° 5.741/71 não exige que o aviso regulamentar contenha o valor do débito
mas apenas exige a reclamação do pagamento da dívida.“ (AC n° 96.006733­
7, Des. Nelson schaefer Martins). (TJSC - AC 00.014965-9 - 2a C.Cív. - Rel.
Des. Mazoni Ferreira - J. 09_11.2000) (grifo nosso)

Ainda, o STJ, no julgamento do REsp 166340, entendeu que os avisos


expedidos reclamando o pagamento da dívida devem mencionar o valor da mesma,
sob pena de nulidade de tais avisos.

“PROCESSUAL CIVIL - EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA - INDICAÇÃO DO


VALOR DO DEBITO NOS AVISOS DIRIGIDOS AO EXECUTADO:
NECESSIDADE - PRECEDENTES DO STJ - RECURSO CONHECIDO E
PROVIDO - I - Os avisos dirigidos ao devedor antes do ajuizamento da
execução hipotecária devem mencionar o valor do debito. Il - Precedentes do
STJ: REsp n° 38.832/ES e REsp n° 103.806/RJ. III - Recurso especial
conhecido e provido.” (STJ - REsp 166340 - SC - 2a T. - Rel. Min. Adhemar
Maciel - DJU 01.02.1999 - p. 154) (grifo nosso)

Quanto ã questão dos avisos coletivos, pode-se admitir que esta seria
possível somente quando o credor não tivesse conhecimento do paradeiro do
62

mutuário inadimplente, pois se este não está no endereço do imóvel mas tem outros
endereços conhecidos, os avisos deveriam ser dirigidos a este outro endereço, na
opinião de Evaristo Aragão Ferreira Santos141. Entretanto, conforme a disposição da
Resolução 11/72 do BNH, entende-se como faculdade do credor a notificação
pessoal ou coletiva, através da imprensa.
De outro norte, a jurisprudência do Tribunal de do Paraná entende que a
convocação do devedor pela imprensa somente é válida se demonstrado que o
mutuário não foi encontrado:

“EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA - SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO ­


CONTRATO POR INSTRUMENTO PARTICULAR DE COMPRA E VENDA,
FINANCIAMENTO, QUITAÇÃO E HIPOTECA E CONSTITUIÇÃO DE
OUTRA, QUITAÇÃO DE CAUÇÃO DE CRÉDITO HIPOTECÁRIO E
CONSTITUIÇÃO DE OUTRA - INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 2 , INCISO IV
DA LEI N 5.741/71 - REQUISITOS EXPEDIÇÃO DE AVISOS RECLAMANDO
PAGAMENTO - SÚMULA 199 DO STJ - AUSÊNCIA - CONVOCAÇÃO PELA
IMPRESSA IMPOSSIBILIDADE - NECESSIDADE DE DEMONSTRAR-SE
QUE O MUTUÁRIO ENCONTRA-SIE EM LUGAR lNC'_ERTO E NÃO SA`BIDO,
O QUE NÃO OCORREU NA ESPECIE - RESOLUÇAO N 11/72 CARENCIA
DA AÇÃO DECRETADA EX OFFICIO - 1. A inicial da execução hipotecária
lastreada na Lei n° 5.741/71 deve ser instruída com cópia de, pelo menos,
dois avisos regulamentares reclamando ao mutuário o pagamento da divida
(artigo 2 , IV), por serem estes condição específica de sua admissibilidade. 2
O edital de convocação pela imprensa, de devedor hipotecário em débito
vinculado ao SFH, somente e admissível se demonstrado que o mutuário não
foi encontrado. 3. A resolução administrativa, ato de hierarquia inferior a lei,
não pode invadir a reserva legal, revogando, modificando ou desvirtuando
disposições expressas de texto legislativo. A invasão do ancilar princípio da
legalidade, no caso, restringe ou impede a defesa do mutuário, criando
obstáculo formal a garantia dos particulares contra execução. A lei estabelece
avisos (plural) não permitindo apenas a expedição de um aviso (art. 2 , IV, Lei
n° 5.741/71). (TAPR - AC 137486900 - (11855) - Maringá - 1a C.Cív. - Rel.
Juiz Lauro Augusto Fabricio de Melo - DJPR 10.12.1999) (grifo nosso)
9.4.4 Valor da causa

Segundo o artigo 259 do CPC, o valor da causa deve englobar a soma do


principal, da pena e dos juros vencidos até a data da propositura da ação.
Entretanto, nas execuções sob o ãmbito do sistema financeiro de habitação, o valor
da causa é o valor da dívida, englobando as prestações vencidas, acrescida de

141 SANTOS, Evaristo Aragão Ferreira dos. Obra citada, p.207.


63

encargos contratuais e honorários advocatícios (Súmula 12 do Tribunal de Alçada


Civil de São Paulo), e não o valor do contrato.
O executado, então, é citado para o pagamento da dívida, correspondente à
prestações em atraso. Na hipótese do executado remir a dívida, pagando apenas as
prestações em atraso, o contrato se convalesce, consoante artigo 8°142 da Lei 5.741,
podendo ser passível de nova execução se ocorrer novo inadimplemento.

“EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA - RITO DA LEI N° 5.741/71 - VALOR DA


CAUSA - ART. 259 DO CPC - 1. Na execução de título extrajudicial fundada
em contrato de mútuo vinculado à garantia hipotecária do Sistema Financeiro
da Habitação, regulada pela Lei n° 5.741/71, determina-se o valor da causa
de acordo com o inc. I do art. 259143 do CPC/73, posto tratar-se de ação para
cobrança de dívida. 2. Agravo provido.” (TRF 4a R. - Al 1999.04.01.073816-9
- RS - 3a T. - Rela Juíza Maria de Fátima Freitas Labarrère - DJU
19.04.2000)

Não pretende-se aqui esgotar as implicações do prosseguimento da execução


segundo a lei específica em tela, eis que surgem diversas situações controvertidas_
Contudo a execução se segue com o despacho saneador, devendo o devedor ser
citado para pagar o valor do crédito reclamado ou depositá-lo em vinte e quatro
horas, sob pena de não o fazendo, ser-lhe penhorado o imóvel hipotecado.
Se o executado não pagar a dívida, acrescida das custas e honorários de
advogado, ou não depositar o saldo devedor, efetuar-se-á a penhora do imóvel
hipotecado, sendo nomeado depositário o exeqüente ou quem este indicar.
Se o executado não estiver na posse direta do imóvel, será ordenada a
expedição de mandado de desocupação do imóvel contra a pessoa que o estiver
ocupando, para entregá-lo ao exeqüente no prazo de dez dias.
Caso o executado esteja na posse direta do imóvel, será ordenada a
desocupação e no prazo de trinta dias, entregando-o ao exeqüente.

“Ê Lei 5.741/71, an. 8° - É lícito ao executado remir o imóvel penhorado, desde que deposite em juízo, até a
assinatura do auto de arrematação, a importância que baste ao pagamento da dívida reclamada mais custas e
honorários advocatícios; caso em que convalescerá o contrato hipotecário.
M3 Código de Processo Civil, art. 259 - O valor da causa constará sempre da petição inicial e será: I - na ação de
cobrança de dívida, a soma do principal, da pena e dos juros vencidos até a propositura da ação;
64

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foi desenvolvido um arcabouço que proporcionou o entendimento genérico


do instituto da hipoteca como direito real de garantia.
Por certo que não é a mais efetiva garantia, contudo representa uma das mais
seguras alternativas ao detentor do capital para ver-se ressarcido no caso de
inadimplemento do devedor. Entretanto, se considerarem-se os privilégios
estabelecidos por lei a outros créditos preferenciais, como o fiscal e o trabalhista,
nenhuma garantia, em nenhum momento, trará completa satisfação ao credor.
Com o intuito de verificar a aplicação prática do instituto da hipoteca, buscou­
se verificar o momento culminante do exercício da garantia hipotecária, a sua
execução. Seria impossível dentro da proposta do trabalho de monografia tratar da
execução em toda sua amplitude, desta maneira foram analisados, na lei específica
do Sistema Financeiro da Habitação(Lei 5.741/71) , os requisitos para a execução.
Contudo, apesar dos mais de trinta anos de promulgação daquela lei, sua
aplicação é, até hoje, amplamente discutida, principalmente pela alegação que
alguns de seus dispositivos seriam contrários ao texto da Constituição Federal de
1988, mais especificamente aqueles que se referem ao prazo para a interposição de
embargos, ã aplicação da lei específica, ã desnecessidade de avaliação e ã
possibilidade de desocupação imediata. Contudo, tais questões mereceriam um
outro trabalho. A aplicação desta legislação sempre tratou de questão delicada, com
a defesa da inconstitucionalidade de muitos de seus dispositivos como também
critica-se o rigorismo de algumas disposições, não enfrentadas no estudo em tela,
Conforme demonstrado, a lei específica deve ser aplicada em detrimento do
Código de Processo Civil, com a aplicação subsidiária deste, para os créditos que
envolvem o Sistema Financeiro da Habitação.
Não obstante, a jurisprudência pátria tem aplicado-a com certa cautela,
preferindo-se, em alguns casos, o prosseguimento da execução pela sistemática do
Código de Processo Civil, que proporciona maiores oportunidades de defesa aos
executados, principalmente no que tange aos embargos.
Todavia, há de se levar em conta que nem todos os dispositivos são
prejudiciais ao executado. Assim, a não aplicação da lei especial, mas sim do CPC
65

trata-se, somente, de desvirtuação do procedimento especialmente criado com o


intuito de desonerar o mutuário inadimplente, vez que este tem diversas
oportunidades para livrar-se da execução.
Desta maneira, acredita-se que o procedimento especial criado com a lei
5.741/71 deve ser atendido, excetuando-se o caráter de não suspensividade com a
interposição dos embargos, já que tem sua constitucionalidade contestada por
muitos. Contudo, apesar do inconformismo de alguns com certos rigorismos
adotados pela lei, deve esta ser aplicada, sob pena de desvirtuar-se todo o sistema.
Compreendido o instituto da hipoteca, logrou o trabalho alcançar seu objetivo,
eis que finalizou-se com a observação do modo através do qual o direito de sequela,
característica fundamental dos direitos reais, se torna vivo. Visualizou-se, assim, em
sua aplicação prática no cotidiano do direito: a execução hipotecária,
especificamente de acordo com a Lei 5.741/71.
Outrossim, pelo ponto de vista do credor, visualizou-se que a garantia real de
hipoteca e uma garantia efetiva, ressalvando-se o já comentado, que permite,
através do procedimento especial estudado, o rápido retorno do capital investido no
caso de inadimplemento por parte do mutuário.
66

BIBLIOGRAFIA

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