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CENTRO UNIVERSITÁRIO ADVENTISTA DE SÃO PAULO

CAMPUS ENGENHEIRO COELHO


CURSO DE DIREITO

HENRIQUE AUGUSTO BALKO DE FARIA

TRAVA BANCÁRIA NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL: UMA ANÁLISE


JURÍDICO-ECONÔMICA À LUZ DO ART. 47 DA LEI 11.101/2005

ENGENHEIRO COELHO
2020
CENTRO UNIVERSITÁRIO ADVENTISTA DE SÃO PAULO
CAMPUS ENGENHEIRO COELHO
CURSO DE DIREITO

TRAVA BANCÁRIA NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL: UMA ANÁLISE


JURÍDICO-ECONÔMICA À LUZ DO ART. 47 DA LEI 11.101/2005

Trabalho de Conclusão de Curso do


Centro Universitário Adventista de São
Paulo do curso de Direito, sob a
orientação do prof. Dr. Antônio Jose
Iatarola

ENGENHEIRO COELHO
2020
Trabalho de Conclusão de Curso do Centro Universitário Adventista de São
Paulo, do curso de direito apresentado e aprovado em 6/11/2020

______________________________________________________

Antônio José Iatarola

________________________________________________________
Dedico este trabalho aos meus pais pelo
imensurável apoio que me ofertaram
durante todo o período de graduação e na
elaboração deste trabalho.
AGRADECIMENTOS

 A Deus por ter me mantido saudável durante a insanidade que foi fazer
esse trabalho em diversas noites viradas;
 Ao meu pai, minha mãe e irmão, por toda a paciência e o apoio,
financeiro e emocional, sem os quais, chegar a este ponto não seria
possível;
 Aos meus avós pelas noites de quarta-feira que eu deixei de ir para
assistir ao jogo do Corinthians e pelos hambúrgueres que deixei de fazer
para eles em função deste trabalho;
 À minha namorada pela paciência e compreensão das inúmeras tardes
e noites em que me mantive distante para a elaboração deste trabalho;
 À família Unasp Roosters por ser a única razão pela qual não desisti e
fui morar em outra cidade;
 Aos meus chefes Ari Torres, Elza Torres, Juliane Lima e Cláudia Torres
pela compreensão após minhas noites viradas e por terem me
despertado o interesse pelo tema eleito.
 Ao meu orientador pela orientação.
“O fim do Direito é a paz; o meio de
atingi-lo, a luta. O Direito não é uma
simples idéia, é força viva. Por isso a
justiça sustenta, em uma das mãos,
a balança, com que pesa o Direito,
enquanto na outra segura a espada,
por meio da qual se defende.”
Rudolph Von Ihering
RESUMO

O presente trabalho visa analisar o atual tratamento da doutrina e da


jurisprudência sobre o instituto da alienação fiduciária de direitos creditórios no
âmbito da recuperação judicial, destacadamente em função de sua natureza
extraconcursal conferida pelo §3º da Lei 11.101/2005, popularmente conhecida
como “trava bancária”, para tanto, foi necessário um estudo aprofundado sobre
o instituto da alienação fiduciária e suas modalidades para, após, definir qual o
posicionamento predominante sobre o assunto hoje, criticá-lo à luz do princípio
de regência da lei de recuperação judicial e falência, qual seja, o princípio da
preservação da atividade empresarial em função dos benefícios sociais que ela
promove (artigo 47 da LREF) e à luz das teorias da superação do dualismo
pendular e da distribuição equilibrada de ônus no processo de recuperação
judicial. Após, será realizada uma análise jurídico-econômica sobre os
fundamentos que ensejaram a proteção legal dos credores cessionários-
fiduciários e como as estatísticas e os modelos econômicos demonstram a
efetividade da Lei 11.101/2005 na consecução de seu objetivo principal. Ao
final, com base na teoria de Ovídio Baptista da autonomia material da
pretensão cautelar, propor uma solução a ser implementada pelos advogados
das recuperandas e juízes com vistas a equilibrar os ônus da recuperação
judicial e promover o princípio-maior da recuperação da atividade econômica.

Palavras-chave: Recuperação Judicial; Alienação Fiduciária; Trava Bancária;


Pretensão Cautelar Autônoma; Dualismo Pendular; Divisão Equilibrada de
Ônus.
ABSTRACT

The present work aims to analyze the current treatment of doctrine and the
courts on the chattel mortgage of credit rights in the context of judicial
reorganization, mainly due to its extra-bankruptcy nature conferred by §3 of Law
11.101 / 2005, popularly known as bank-locks, for that, it was necessary to
promote a deeper research on the chattel mortgage instutute and its variables,
so that, after defining which position is predominant on the subject today,
criticize it through the governing principle the law of judicial reorganization and
bankruptcy, which is the principle of preserving business activity in terms of the
social benefits it promotes (article 47 of the LREF) and in light of the theories of
overcoming pendular dualism and the balanced distribution of burdens in the
judicial reorganization process. Afterwards, a legal-economic analysis will be
carried out on the fundamentals that gave rise to the legal protection of
assignee-fiduciary creditors and how the statistics and economic models
demonstrate the effectiveness of Law 11.101 / 2005 in achieving its main
objective. In the end, based on Ovídio Baptista's theory of the material
autonomy of the precautionary claim, to propose a solution to be implemented
by the lawyers of the reorganizers and judges in order to balance the burden of
judicial recovery and promote the main principle of recovery of economic
activity.

Key words: Judicial Reorganization; Chattle Mortgage; Bank Lock;


Auotonomous Precautionary Claim; Pendular Dualism; Equal Share of Burdens.
LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1 – ÓTIMOS DE PARETO...............................................................44


GRÁFICO 2 – TAXA DE CONCESSÃO...........................................................
48
GRÁFICO 3 – RESULTADO DAS CONCESSÕES..........................................49
GRÁFICO 4 - ESCALA DE
SUCESSO............................................................50
GRÁFICO 5 - COMPOSIÇÃO DOS
PLANOS...................................................50
LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS OU TERMOS OPERACIONAIS

LREF – Lei de Recuperação de Empresas e Falência (11.101/2005)


BGB – Código Civil Alemão
SFI – Sistema Financeiro Imobiliário
CAE – Comissão de Assuntos Econômicos
STJ – Superior Tribunal de Justiça
TJSP – Tribunal de Justiça de São Paulo
TJRJ – Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
TJRS – Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul
Stay ou Stay-Period – Período de suspensões das ações e execuções contra
a empresa em recuperação judicial.
Holdout – Credor que não se dispõe a negociar.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................11
1. A CESSÃO FIDUCIÁRIA DE RECEBÍVEIS E SUA EXCLUSÃO DOS
EFEITOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL.......................................................16
1.1 O INSTITUTO DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA............................................16
1.2 HISTÓRICO DA CESSÃO FIDUCIÁRA NO DIREITO PRIVADO..............18
1.3 A CESSÃO FIDUCIÁRIA DE RECEBÍVEIS (CRÉDITOS A PERFORMAR)
E SUA RELEVÂNCIA NO ÂMBITO EMPRESARIAL.......................................20
2 O TRATAMENTO LEGAL, DOUTRINÁRIO E JURISPRIDENCIAL
CONFERIDO PARA A CESSÃO FIDUCIÁRIA DE DIREITOS CREDITÓRIOS
PERANTE A RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS............................24
2.1 TRATAMENTO DA DOUTRINA...........................................................24
2.2 DO TRATAMENTO JURISPRUDENCIAL...........................................32
3. DA ANÁLISE JURÍDICO-ECONÔMICA DA NÃO PARTICIPAÇÃO DO
CREDOR-CESSIONÁRIO-FIDUCIÁRIO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL EM
FACE DO PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA............................42
3.1 O PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA COMO REGENTE
DA LEI 11.101/2005...........................................................................................42
3.2 Das Razões Econômicas Para a Exclusão.......................................49
3.3 Da Efetividade da Recuperação Judicial..........................................54
4. DA MEDIDA CAUTELAR AUTÔNOMA DE LIBERAÇÃO DA TRAVA
BANCÁRIA.........................................................................................................57
4.1 DA AUTONOMIA DO DIREITO MATERIAL CAUTELAR EM
RELAÇÃO AO DIREITO “PRINCIPAL” PLEITEADO......................................58
4.2 DA APLICAÇÃO DA TUTELA CAUTELAR À TRAVA BANCÁRIA......59
CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................61
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................65
11

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por escopo a discussão sobre o tratamento legal,


doutrinário e pretoriano dado aos créditos garantidos por cessão fiduciária de
recebíveis no processo de recuperação judicial, tendo, sobretudo, em vista, o
princípio da preservação da empresa, insculpido no art. 47 da Lei 11.101/2005.

Para tanto, far-se-á necessária uma breve conceituação dogmática do


instituto da alienação fiduciária, bem como uma análise da ratio essendi do art.
47 da LREF e sua implicação na condução da hermenêutica da legislação
aplicável às empresas em recuperação judicial.

Para Gomes (apud Fachin e Tepedino, 2011, p.475) a alienação fiduciária


é uma distorção finalística do contrato de transmissão de propriedade, servindo
como meio à garantia, tendo como escopo final o retorno do objeto cedido
fiduciariamente ao patrimônio do Cedente.

Costa (2016, p.63), por sua vez, leciona que o princípio da preservação da
empresa e de suas funções sociais (circulação de riquezas, geração de
empregos e recolhimento de tributos), deve conduzir toda a atuação do
Magistrado no processo de soerguimento.

Em se tratando de uma lei “adolescente”, pois está, hoje, em seu 14º ano
de vigência, Bezerra (2015, p. 155/156), acrescenta que a ponderação de fins e
princípios e a análise caso a caso é, na Lei de Insolvência, ainda mais
acentuada que em outros dispositivos, complementando, in verbis:

Deverá o juiz sempre ter em vista, como orientação


principiológica, a prioridade que a lei estabeleceu para a
“manutenção da fonte produtora”, ou seja, a recuperação da
empresa.
Diante desse cenário, nasce a popular “trava bancária”, consistente na
exceção colocada pelo §3º do art. 49 da Lei 11.101/2005, explicada por Calças
e Silva (2014, p. 45) como não sujeição dos credores titulares de propriedade
fiduciária aos efeitos do deferimento do processamento da recuperação judicial,
quais sejam, o stay period, a necessidade de participação na Assembleia Geral
de Credores e submissão ao plano aprovado.
12

À parte da eventual discussão sobre a diferença entre o proprietário


fiduciário de bens corpóreos e infungíveis e o cessionário fiduciário de
recebíveis fungíveis e corpóreos, Sacramone e Piva (2016) aduzem que a
compreensão aprofundada do instituto da propriedade fiduciária esclarece que
todo proprietário fiduciário está englobado na exceção criada pelo §3º do art.
49 da LREF.

É sabido, como consignaram Viegas e Chagas (2016, p. 68), que a


atividade empresarial no Brasil é majoritariamente financiada por instituições
bancárias que, recorrentemente, lançam mão do mecanismo da cessão
fiduciária de direitos creditórios para escapar dos efeitos de uma eventual
recuperação judicial que venha a ser deferida em favor da empresa
mutuária/cedente.

Dessa forma, é natural que, via de regra, todos os contratos de


financiamento empresarial celebrados entre a sociedade e a instituição
financeira contenham alguma espécie de cessão fiduciária de recebíveis como
forma de garantia, sem prejuízo das garantias pessoais prestadas pelos
avalistas (normalmente sócios investidores), que fogem ao escopo da presente
discussão.

Trocando em miúdos, poder-se-ia dizer que, uma vez que os bancos


praticamente só emprestam mediante transmissão de propriedade fiduciária, e
essa espécie contratual está excepcionada pelo art. 49, §3º da Lei de
Insolvência, os bancos não se sujeitam à recuperação judicial, podendo
performar suas garantias independentemente do plano.

Sobre essa constatação, Bezerra (2015, p. 163) chega ao ponto de


ironizar, in verbis:

Essa disposição foi o ponto que mais diretamente contribuiu


para que a Lei deixasse de ser conhecida como “lei de
recuperação de empresas” e passasse a ser conhecida como
“lei de recuperação do crédito bancário” ou “crédito financeiro”,
ao estabelecer que tais bens não são atingidos pelos efeitos da
recuperação judicial.
13

Na análise de Viegas e Chagas (2016, p. 69), a operação da “Trava


Bancária”, com o bloqueio dos créditos a receber da recuperanda é feita ao
arrepio do princípio da par conditio creditorum.

Além do princípio civil supracitado, no entender de Mayer (2015, p. 24),


há o princípio específico da lei de recuperação judicial e falência é o princípio
da preservação da empresa e sua função social, princípio este que está
insculpido no art. 47 da referida lei.

Seja do ponto de vista civil, seja do ponto de vista do direito falimentar,


levando em conta que os bancos são credores nevrálgicos da atividade
empresarial, há um evidente conflito de princípios ao afastá-los dos efeitos da
recuperação judicial e, como consequência, da mesa de negociação que a
Assembleia Geral de Credores proporciona, podendo, potencialmente,
inviabilizar a recuperação da empresa e o interesse geral da sociedade e
comunidade de credores ao performar suas garantias ao alvedrio do restante.

CARVALHO FILHO (2018) afirma, com vigor, que a existência do §3º do


art. 49 da LREF só existe por conta de um forte lobby legislativo do sistema
financeiro.

Em matéria veiculada no Valor Econômico, WAISBERG e FRANCO


(2016) afirmam que, enquanto credores, devedores e tribunais tentam
colaborar para a possibilidade de recuperação das empresas, nos termos da
lei, o sistema financeiro, incluindo bancos e autoridades tem andado na direção
oposta.

Vale lembrar que o Conselho Monetário Nacional, através da resolução


2.682/1999, classificou, para WAISBERG e FRANCO (2016), erroneamente, o
crédito fornecido para empresas em recuperação judicial na categoria “H”, ou
seja, no maior risco de crédito possível, razão pela qual, nos termos do art. 6º,
VIII da referida resolução, é obrigatório o provisionamento contábil de 100%
(cem por cento) sobre o valor das operações.

Disso decorre um desinteresse generalizado do sistema financeiro em


emprestar dinheiro para as recuperandas, já que o principal produto
comercializado por um banco é o dinheiro, e provisionar 100% do valor
14

emprestado implica num altíssimo custo de oportunidade, que redunda, por sua
vez, em taxas de juros exorbitantes para uma empresa que está em processo
de soerguimento.

Por outro lado, Sacramone e Piva (2016) admoestam que a exceção


criada pelo §3º do art. 49 da LREF mitiga o risco de inadimplemento do crédito
empresarial, logo, facilita o acesso ao crédito pelo próprio empresário, e
permite às instituições financeiras praticarem taxas de juros mais baixas.

Assim, há que se sopesar os riscos macroeconômicos dos quais


supostamente a “trava bancária” protege o sistema, mas, sobretudo, sobre a
compatibilidade da exclusão dos bancos do processo de recuperação com a
própria essência principiológica da lei, que é a da manutenção da atividade
produtiva, da geração de riquezas, geração de empregos e recolhimento de
tributos.

Disso resulta a principal pergunta a ser respondida nesse ensaio: A


exclusão dos créditos garantidos por cessão fiduciária de recebíveis é
compatível com o princípio da preservação da atividade econômica no
processo de recuperação judicial?

De plano, salta aos olhos que a exceção do art. 49, §3º da Lei
11.101/2005 é fruto do lobby bancário junto ao legislador para garantir a
proteção do crédito. Proteção essa que é sistemicamente incompatível com o
restante da lei, especialmente com o princípio da preservação da atividade
empresarial.

Para muitas empresas, especialmente as do ramo de serviços, que não


possuem vultuosos ativos não-circulantes e UPI’s que possam servir de opção
para a elaboração do plano de recuperação judicial, o fluxo de caixa
proveniente de suas contas a receber são o instrumento mais viável e
economicamente saudável de apresentar um plano que faça sentido
econômico à comunidade de credores, se não for possível performá-los por
conta da “trava bancária”, é provável que a própria recuperação judicial
fracasse e seja convolada em falência, acarretando prejuízos sociais e
econômicos para todos os envolvidos e interessados.
15

Por evidente, empresas que sejam economicamente inviáveis, seja por


uma atividade ultrapassada (ex.: Blockbuster – Locação de filmes físicos), seja
por ausência de atividade (ex.: empresas “de fachada” ), ou, que por qualquer
outra razão, não seja mais capaz de manter os benefícios sociais de sua
atividade, têm tratamento específico previsto pela legislação: A Falência. Por
conseguinte, não consideraremos nenhuma hipótese relacionada a esse tipo
de empresa para a análise dos pontos de vista apresentados neste trabalho.

Gize-se que a própria LREF, no entendimento de COSTA (2016, p.73)


define a viabilidade econômica da empresa como condição da ação de
recuperação judicial, não sendo lógico, portanto, estudar e discutir o tratamento
de um tipo de crédito num processo onde haja carência de uma das condições
da ação.

Assim como o próprio instituto da recuperação judicial, o presente


trabalho analisará apenas o terceiro tipo de empresa, aquela definida por
COSTA (2016, p.63) como “a empresa viável que não consegue encontrar
solução de mercado para superação da crise”.”.

A revisão bibliográfica consistente na análise de posicionamentos


doutrinários e jurisprudenciais é a melhor forma de realizar esta crítica à luz
dos principais princípios que a própria doutrina instituiu para o estudo da
recuperação judicial.

No entanto, para melhor visão das consequências da trava bancária e


para a crítica dos fundamentos que a tentam justificar, será realizada uma
análise jurimétrica, quantificando as teses aventadas no decorrer do texto para,
ao final, também com base em revisão bibliográfica dogmática do direito
processual civil, mormente da tese de Ovídio Baptista, propor-se-á uma
solução viável para a mitigação dos deletérios efeitos da trava bancária sobre a
recuperação judicial.
16

1. A CESSÃO FIDUCIÁRIA DE RECEBÍVEIS E SUA EXCLUSÃO DOS


EFEITOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL.

1.1 O INSTITUTO DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA

É imperiosa a compreensão dogmática do instituto da Alienação


Fiduciária para que se almeje discutir sobre os seus efeitos perante o processo
de recuperação judicial.

Assim, destaca-se que, em estudo sobre o perfil dogmático da alienação

fiduciária, o acadêmico Orlando Gomes (2006 , p. 475) preleciona que a

estrutura do contrato de alienação fiduciária , embora dela derive, em nada se

mistura à fidúcia do direito romano , pois, enquanto essa, em essência,

dependia da relação de confiança entre as partes , aquela apenas se preza à

finalidade de garantia sobre outro negócio jurídico realizado .

Para o autor (GOMES, 2006, p.475), a alienação fiduciária é uma distorção

finalística do contrato de transmissão de propriedade , servindo como meio à

garantia, tendo como escopo final o retorno do objeto cedido fiduciariamente ao

patrimônio do Cedente.

Assinala, nesse sentido, o professor Melhim Namem Chalhub (2017 ,

p.9) que “o negócio de natureza fiduciária é negócio bilateral composto por dois

acordos que criam uma situação sui generis”, onde, embora haja a transmissão

da propriedade em relação a terceiros, permanece um vínculo de obrigação

entre o fiduciante e o fiduciário, nos termos ajustados no negócio principal .

Complementa GOMES (2006, p. 476) que, no ordenamento brasileiro,

essa transmissão não encerra, por si só, a vontade das partes, mas serve a

um fim menor do que a transmissão da propriedade , qual seja, a prestação de

garantia para um negócio adjeto e indissociável do primeiro .


17

Dessa maneira, MAYER (2015, p.31) caracteriza a alienação fiduciária

como “transmissão da propriedade de um bem ou direito ao credor , em caráter

resolúvel, até que seja adimplida a obrigação contraída” . Assim, fica a


alienação fiduciária caracterizada como um negócio acessório de garantia a
outro negócio principal.

Por fim, apenas por preservação à exatidão terminológica , e, com o fito


de evitar imprecisões na compreensão dos conceitos utilizados no presente
texto, há de se esclarecer que, embora diversos autores mencionem

“propriedade fiduciária” e “alienação fiduciária em garantia” como sinônimos ,

vale-se da distinção conceitual de PONTES DE MIRANDA (1976 , p.285) in

verbis:

“No sistema positivo brasileiro, os direitos reais de garantia são


o penhor, a caução de crédito, a hipoteca e a anticrese . Na
cessão fiduciária de segurança, o cessionário pode cobrar o
crédito quando já exigível no seu interesse (pois foi garantido
com a cessão) e no do credor cedente, que se libera e tem

direito de receber o excesso sobre o seu débito. Por onde se


vê que ao tornar exigível o crédito cedido, tem o cessionário

autorização para cobrar.”

Embora o código REALE não tenha acolhido a distinção ponteana entre


a “cessão fiduciária de segurança “e os outros direitos reais de garantia , é

importante que não se confundam os conceitos na interpretação desse texto .

Por fim, adota-se como mais precisa e concisa , a definição de alienação

fiduciária proposta por Caio Mario da Silva PEREIRA (2010 , p. 363 apud

MAYER, 2015, p. 31), em que essa espécie de garantia consiste na

transferência resolúvel da propriedade e da posse indireta do bem ao fiduciário ,


essa transferência resolver-se-á com o adimplemento da obrigação principal à
qual o contrato de alienação fiduciária é satélite .
18

1.2 HISTÓRICO DA CESSÃO FIDUCIÁRA NO DIREITO PRIVADO

CALÇAS e SILVA (2014, p.45) aduzem que a origem do que hoje é a

alienação fiduciária em garantia , se dá nos idos tempos do direito romano e da

lei das XII tábuas, no instituto da fidúcia.

A fidúcia era gênero do qual fiducia cum amico e a fiducia pignoris causa
cum creditore eram espécies, a primeira tratava da transferência de bens a

uma pessoa de confiança, durante períodos de guerra , ausência, entre outros,

com a condição da devolução ao fim da causa do negócio , enquanto a

segunda tratava-se da mera alienação de bens a um credor , que os restituiria

mediante o pagamento da dívida. (CALÇAS e SILVA, p. 46)

De acordo com CHALHUB (2017, p.13) a fidúcia entrou em decadência,

no período pós-clássico (Compilações Justinianas) , e as legislações modernas

do Império Romano sequer se interessaram em regular o instituto , pois

lastreava-se demasiadamente na boa-fé, cabendo, à época, apenas


indenizações por perdas e danos caso o proprietário fiduciário se dispusesse
do bem ofertado.

Em sua obra “Instituições de Direito Civil” , o célebre autor Caio Mário da

Silva PEREIRA (1961, p. 362), como citado por CALÇAS e SILVA (2014 , p.

46), preconiza que a decadência da fidúcia nas Compilações Justinianas

acarretou sua não-recepção pelos ordenamentos romano-cristãos , e.g. Código

de Napoleão e o BGB alemão, dessa forma, ficou de fora, também, do Código

Civil Brasileiro de 1916.

O ordenamento jurídico brasileiro conheceu o negócio fiduciário pela


primeira vez com o advento da Lei nº 4 .278/65 (Lei do Mercado de Capitais) ,

ocasião que, conforme CALÇAS e SILVA (2014 , p.47), o regulou “sob o


19

modelo romano da fiducia pignoris causa cum creditore, conferindo-lhe a


natureza jurídica de direito real com escopo de coisa móvel infungível”

Impende, neste ponto, realizar a distinção entre “direito real de garantia”

e “direito real em garantia”, como fez COELHO (2009, p.39 apud MAYER,

2015, p.32), onde esse representa a garantia que recai sobre o bem do

devedor, que passa a incorporar a esfera jurídica do credor (onde se engloba o

negócio fiduciário) e aquele, regido pelo rol taxativo do art. 1.225 do Código

Civil, mantém o bem ofertado em garantia na propriedade do devedor .

No entanto, salienta CHALHUB (2017, p. 375) que, à época, o instituto

da alienação fiduciária se restringia a créditos do setor habitacional , e,

basicamente, foi introduzido no nosso ordenamento com o fito de fomentar a

produção do setor de construção civil de casas populares , e, portanto, tinha


sua aplicação limitada à relação entre os bancos integrantes do Sistema
Financeiro de Habitação e os produtores de imóveis .

Três anos depois, a redação do art. 66 da Lei nº 4.278/65 viria a ser

alterada para vigorar com a seguinte redação :

A alienação fiduciária em garantia transfere ao credor o


domínio resolúvel e a posse indireta da coisa móvel alienada,
independentemente da tradição efetiva do bem, tornando-se o
alienante ou devedor em possuidor direto e depositário com
tôdas as responsabilidades e encargos que lhe incumbem de

acordo com a lei civil e penal.

Assim, o escopo de utilização da alienação fiduciária se tornou mais

amplo para englobar outras espécies de financiamento que não ,

necessariamente a de crédito do setor habitacional .

No entanto, foi com o advento da Lei nº 9.514/97 a alienação fiduciária

ganhou o status de direito real , quando aplicada sobre um imóvel objeto do


20

financiamento principal que daria origem à transmissão da propriedade


fiduciária como garantia acessória (CALÇAS E SILVA , 2014, p.47)

Foi no texto dessa lei que se introduziu o conceito de alienação fiduciária


adotado hodiernamente, in verbis:

A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico


pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia,
contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade

resolúvel de coisa imóvel.

Foi, também, com a promulgação da Lei nº 9 .514/97 que se deu a

expansão definitiva do escopo subjetivo de utilização do instituto , como consta

do parágrafo primeiro da mesma lei, ora transcrito por sua contundência:

A alienação fiduciária poderá ser contratada por pessoa física


ou jurídica, não sendo privativa das entidades que operam
no SFI, podendo ter como objeto, além da propriedade plena:

(...) (grifo nosso)

Finalmente, a regulação definitiva e hoje vigente sobre a alienação


fiduciária se aperfeiçoou com a sua introdução no Código Civil Brasileiro de
2002, mais especificamente dos artigos 1.361 e seguintes.

1.3 A CESSÃO FIDUCIÁRIA DE RECEBÍVEIS (CRÉDITOS A PERFORMAR)


E SUA RELEVÂNCIA NO ÂMBITO EMPRESARIAL

Conquanto a alienação fiduciária tenha , até a promulgação do Código

Reale, mormente se aplicado sobre bens móveis infungíveis , com o advento da

Lei 10.931/04, houve importante inovação no nosso ordenamento , com a

introdução da titularidade fiduciária sobre bens móveis , coisas fungíveis, tais

como títulos de crédito e direitos creditórios em geral (CHALHUB , 2017, p.

376).
21

A referida lei introduziu, na Lei do Mercado de Capitais, o art. 66-B, com

a seguinte redação:

O contrato de alienação fiduciária celebrado no âmbito do


mercado financeiro e de capitais, bem como em garantia de
créditos fiscais e previdenciários, deverá conter, além dos

requisitos definidos na Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002


- Código Civil, a taxa de juros, a cláusula penal, o índice de
atualização monetária, se houver, e as demais comissões e

encargos.

§ 3o  É admitida a alienação fiduciária de coisa fungível e a


cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, bem como de
títulos de crédito, hipóteses em que, salvo disposição em
contrário, a posse direta e indireta do bem objeto da
propriedade fiduciária ou do título representativo do direito ou
do crédito é atribuída ao credor, que, em caso de
inadimplemento ou mora da obrigação garantida, poderá
vender a terceiros o bem objeto da propriedade fiduciária
independente de leilão, hasta pública ou qualquer outra medida
judicial ou extrajudicial, devendo aplicar o preço da venda no
pagamento do seu crédito e das despesas decorrentes da
realização da garantia, entregando ao devedor o saldo, se
houver, acompanhado do demonstrativo da operação

realizada. (grifo nosso)

Dessa forma, foi instituída a cessão fiduciária de títulos de crédito no

âmbito do mercado de capitais, distinta, por sua vez, da alienação fiduciária do

Código Civil (comum), e da alienação fiduciária imobiliária (regida pela lei

9.514/97), sendo caracterizada como um espécie sui generis de alienação

fiduciária (TOMAZETTE, 2014, p.74 apud MAYER, 2015, p.34).

O efeito da alienação fiduciária de recebíveis (títulos de crédito) , no

âmbito empresarial é descrito por CHALHUB (2017 , p. 377) como a


22

transmissão da propriedade fiduciária ao credor-fiduciário , com as restrições

inerentes à titularidade fiduciária , estando facultado ao credor-fiduciário ,

configurado o inadimplemento da obrigação originária da garantia fiduciária , a,

independentemente de qualquer medida judicial , cobrar os créditos diretamente

dos devedores do devedor-fiduciante , apropriando-se do valor obtido até o

limite do débito, seus encargos e o custo da cobrança , restituindo ao devedor-

fiduciário eventual saldo.

Insta consignar, ainda, que, não sendo o produto da cobrança dos

créditos cedidos fiduciariamente suficiente para o pagamento do crédito ,

encargos e despesas, a teor do §5º do art . 66-B da Lei do Mercado de

Capitais, o devedor-fiduciante continuará pessoalmente obrigado quanto ao

saldo restante.

É nesse contexto legal que as instituições financeiras , valendo-se das

vantagens que a lei confere à garantia fiduciária , aliadas às peculiaridades do


Direito Cambiário a que estão sujeitos os títulos de crédito emitidos pelas
empresas (eg. Duplicatas Mercantis), quais sejam, especialmente aquelas que

aceleram o exercício do direito creditório e às cobranças em juízo (execuções) ,


passam a usar com contumácia os contratos de financiamento garantidos por
cessão fiduciária de recebíveis e títulos de crédito . (VIEGAS e CHAGAS, 2016,

p.68).

É sabido, como consignaram VIEGAS E CHAGAS (2016 , p. 68), que a


atividade empresarial no Brasil é majoritariamente financiada por instituições
bancárias que, recorrentemente, lançam mão do mecanismo da cessão
fiduciária de direitos creditórios para escapar dos efeitos de uma eventual
recuperação judicial que venha a ser deferida em favor da empresa
mutuária/cedente.

Dessa forma, é natural que, geralmente, todos os contratos de


financiamento empresarial celebrados entre a sociedade e a instituição
financeira contenham alguma espécie de cessão fiduciária de recebíveis como
23

forma de garantia, sem prejuízo das garantias pessoais prestadas pelos

avalistas (normalmente sócios investidores) , que fogem ao escopo do presente

ensaio.

Trocando em miúdos, poder-se-ia dizer que, uma vez que os bancos


praticamente só emprestam mediante transmissão de propriedade fiduciária de
bens ou recebíveis, e, como essa espécie contratual está excepcionada pelo

art. 49, §3º da Lei de Insolvência, os bancos não se sujeitam à recuperação

judicial, podendo performar suas garantias independentemente do plano .

(VIEGAS e CHAGAS, 2016)

Orlando GOMES (2006, p. 480) alerta que “para justificar a tipicidade

social dessa interessante figura jurídica ( ...), preciso não é, com efeito, usar
desse recurso para justificar a proteção jurídica a fins que não podem ser
alcançados mediante meios tradicionais”.

Fica nua, nesse aspecto, a distorção do mecanismo de garantia conferido

pela propriedade fiduciária para se tornar um mecanismo praticado ,

principalmente, por contratos genéricos, especialmente com empresas de

pequeno porte, para burlar os efeitos do deferimento da recuperação judicial .

Rafael Alves de OLIVEIRA (2013, p.12), ao realizar a comparação entre a


cessão fiduciária de direitos creditórios e a securitização de recebíveis acabou
por denunciar a distorção finalística que as instituições financeiras vêm
praticando, senão veja-se, verbis:

Portanto, a securitização de recebíveis e a cessão fiduciária


possuem características similares, porém a estruturação e
tamanho da operação são distintos, por uma se tratar de

emissão de títulos e a outra de cessão de direitos creditórios.

Dentre as principais diferenças, ressaltam-se duas, primeiro


que a securitização necessita de grande volume e títulos
pulverizados, caso contrário, é financeiramente inviável,
24

diferente da cessão fiduciária, que é realizada em qualquer

porte de operação.

A segunda grande diferença está na estruturação, visto que a


securitização perfeita necessita de pessoa jurídica específica,
que receba os títulos, e emita valores mobiliários lastreados

nestes, e repasse aos investidores. Já na cessão fiduciária, a


transferência pode ser realizada através de endosso, não é
necessária a criação de pessoa jurídica específica e não ocorre

a emissão de valores mobiliários. (grifamos)

Nota-se que a alienação fiduciária tem sido utilizada pelas instituições


financeiras como uma alternativa para criar “patrimônios de afetação” dentro
das empresas, que ficam empenhados em garantir o crédito das instituições

financeiras. (CHALHUB, 2017, p. 382).

2 O TRATAMENTO LEGAL, DOUTRINÁRIO E JURISPRIDENCIAL


CONFERIDO PARA A CESSÃO FIDUCIÁRIA DE DIREITOS CREDITÓRIOS
PERANTE A RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS.

2.1 TRATAMENTO DA DOUTRINA

Desde a noção gramatical atribuídas a esses verbetes até o


entendimento doutrinário e jurisprudencial a elas agregados para, só então,
termos a compreensão exata de qual é o tratamento conferido a estes institutos
no nosso ordenamento jurídico e, ao fim, possibilitar o cotejo crítico desse
tratamento com o princípio da preservação da empresa, que informa toda a Lei
de Falências.

Até mesmo autores como CHALHUB (2017 , 382), notadamente

conhecidos pelo posicionamento pró sistema financeiro , confessam que a

utilização de garantias fiduciárias são mecanismos para , como pondera, com

eufemismos:
25

“salvaguardar o objeto da garantia dos efeitos da insolvência


do devedor, mediante a formação de um patrimônio autônomo,
que responde exclusivamente pelas obrigações específicas
para as quais foi constituído”

Ora, a colocação acima pode perfeitamente ser parafraseada como

“burlar a Lei regente da insolvência (Lei 11 .101/2005), através da criação de


um patrimônio de afetação que os afaste da mesa de negociações da
Recuperação Judicial” e entendemos que os intérpretes da lei não podem
chancelar a utilização de um instrumento para driblar uma comunidade de
credores e a divisão de ônus que a recuperação judicial proporciona .

Contra a constatação posta acima, OLIVEIRA (2013, p. 16) argumenta


que a Lei de Recuperação de Empresas e Falências deliberadamente protege
o credor fiduciário:

Apesar da opção do legislador em segregar o patrimônio


parecer clara, na prática, algumas decisões judiciais vêm
determinando o levantamento dos valores depositados na
conta vinculada, para possibilitar ao empresário, que pague os

demais credores. Tal posição nos parece equivocada, visto que


os valores depositados na conta vinculada são de propriedade
do credor fiduciário, não sendo sua retenção indevida,
seguindo o mesmo entendimento que vem tomando corpo nos

tribunais (...)

OLIVEIRA (2013, p. 17) cita, ainda, ASSUNÇÃO (2005), verbis:

Nessa linha, Márcio Calil de Assunção ensina: “O credor


fiduciário tem o direito de requerer a restituição da garantia
fiduciária na hipótese de insolvência ou falência do fiduciante,

consoante dispõem os arts. 85 e 90 da Lei nº 11.101/2005, o

art. 7º do Decreto-Lei 911/1969 e o art . 32 da Lei nº

9.514/1997”.
26

Outrossim, entendemos, data venia, equivocada a posição desses


autores, e o primeiro contra-argumento se dá a partir da própria interpretação
literal do dispositivo legal, ora transcrito:

§3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário


fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil,
de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos
respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade
ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou
de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio,
seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação
judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa
e as condições contratuais, observada a legislação respectiva,
não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a
que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei, a venda ou a retirada
do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais
a sua atividade empresarial. (grifamos)

Partindo da premissa de que “a Lei não possui palavras inúteis e não


usa palavras diferentes para expressar a mesma coisa”, BEZERRA (2017), em
sua coluna no periódico Valor Econômico constata que, na Lei do Mercado de
Capitais, art. 66-B, §3º há a presença dos termos “alienação fiduciária” e
“cessão fiduciária” , enquanto o parágrafo 4º do mesmo dispositivo possui
apenas o termo “cessão fiduciária”, já os parágrafos 5º e 6º voltam a mencionar
ambos os verbetes.

A partir da premissa básica de hermenêutica jurídica verba cum effectu


sunt accipienda, já é possível distinguir a cessão fiduciária da alienação
fiduciária, mas não é só.

Diante dessa explícita menção da preocupação em não enfraquecer a


garantia da cessão fiduciária de créditos (que, até então, era tratada pelo termo
que a legislação vigente à época designava, qual seja, “alienação fiduciária de
direitos creditórios”), fica nítida a separação conceitual do proprietário fiduciário
do cessionário fiduciário de direitos creditórios. (TEIXEIRA, 2010, p. 146)

Conforme análise do processo legislativo realizado por (TEIXEIRA, 2010,


p. 137/139), é possível denotar que, por conta das emendas substitutivas
27

apresentadas ao texto do que hoje é a LREF, após a promulgação da Lei do


Sistema de Financiamento Imobiliário, (que é a lei responsável pela regulação
das operações de alienação fiduciária de direitos creditórios), não houve
vontade do legislador de incluir na exceção legal os titulares de cessão
fiduciária de recebíveis.

Tanto o é, que o referido texto possuía em sua redação o termo


“prevalecerão, para todos os efeitos, os direitos de propriedade sobre a coisa
alienada”, o que, aos olhos da dogmática jurídica brasileira, denota um bem
corpóreo.

Tampouco poderia o congresso, à época da redação inicial do PL


4.376/1993 ter visado à blindagem da figura do cessionário de crédito cedido
fiduciariamente, pois apenas onze anos depois da redação inicial do texto,
haveria de ser aprovada a Lei nº 10.931/2004, que criava essa figura no âmbito
da Lei do Mercado de Capitais (TEIXEIRA, 2010, p.144)

Ainda, o Código Civil, alterado pela Lei nº 10.931/2004, que o introduziu


o art. 1368-A, dispõe, in verbis:

As demais espécies de propriedade fiduciária OU de


titularidade fiduciária submetem-se à disciplina específica das
respectivas leis especiais, somente se aplicando as
disposições deste Código naquilo que não for incompatível com
a legislação especial. (grifamos)

Não há como se admitir, mesmo que se ignorasse a premissa de que a


lei “não possui palavras inúteis e não usa palavras diferentes para expressar a
mesma coisa”, que o legislador redija uma lei valendo-se de conjunção
alternativa para designar dois sinônimos. (BEZERRA, 2017)

Para PRATA (2008, p.947)1, a “titularidade se define pela relação de


pertença do sujeito com o direito, enquanto propriedade”, para PRATA (2008,
p.364), é “um direito, propriamente dito, que franquia o poder de usar, gozar,
dispor e reaver um bem.”

1
PRATA, Ana.Dicionário Jurídico 5ª ed. Coimbra: Almedina, 2008
28

De acordo com o Novo Dicionário da Língua Portuguesa - AURÉLIO 2


(1986, p. 1683), a titularidade é “a qualidade do titular que, por sua vez, pode-
se definir por senhor ou dono de um direito”, já a propriedade, no verbete de
AURÉLIO (1986, p. 1403), é “o direito de usar, gozar, e dispor dos bens e
reavê-los do poder de quem injustamente os possua”.

Conclui TEIXEIRA (2010, p.146) que a tramitação do projeto de lei que


veio a se tornar a Lei 11.101/2005 já fornece o primeiro forte argumento no
sentido de que a proteção contra os efeitos da recuperação judicial contida no
art. 49, §3º da LREF, engloba apenas o proprietário fiduciário e não cessionário
de direitos creditórios.

Outrossim, são mais extensas e contundentes as definições entabuladas


por DE PLÁCIDO E SILVA (1984, p.376/481), ora transcritas:

“Titular: Originado de título, do latim, titulus. Em sentido especial e


tecnicamente jurídico, o titular é o sujeito ativo de um direito, ou o
credor de uma obrigação.
Neste conceito, pois, o titular é toda pessoa que possui um direito,
reconhecido ou declarado por lei a seu favor. Assim, pois, o dono, o
proprietário, o possuidor, o usuário, o usufrutuário, o enfiteuta, o
credor, o senhorio, o locador, o locatário, enfim, qualquer sujeito ativo
de uma obrigação, são titulares dos direitos correspondentes, isto é,
dos direitos que lhes são assegurados e reconhecidos pela própria
lei.
Por esse motivo, a titularidade jurídica revela a revelação ou a
dependência atual de um direito, ou de uma obrigação a um sujeito
de direito, ou a um credor, a quem foram atribuídos por um título, o
que os autoriza a exercitá-los.

Proprietário: Do latim, proprietarius, designa a pessoa a quem se


atribui a qualidade de senhor ou dono da coisa. É, assim, a pessoa
que tem o direito de propriedade sobre determinada coisa, móvel ou
imóvel.”

Pode-se depreender, portanto, que a noção gramatical e de definição


jurídica para cada um dos verbetes é a de que a titularidade se aproxima do
conceito cartular de pertença enquanto a propriedade é qualidade jurídica
daquele que pode gozar, dispor, usufruir e reaver um determinado bem.
(TEIXEIRA, 2010, p.150)

2
BUARQUE DE HOLANDA, A. Novo Dicionário da Língua Portuguesa, Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1986.
29

TEIXEIRA (2010, p.151), por sua vez, conclui que propriedade é espécie
do gênero titularidade, isso porque todo proprietário é titular de um direito, mas
nem todo titular de um direito é, também, proprietário em sua significação
jurídica.

É, possível, portanto, extrapolar o conceito jurídico atribuído aos


verbetes integrais para seus derivados no escopo de estudo deste trabalho, ou
seja, se a titularidade é gênero, a titularidade da cessão fiduciária também o é,
do qual a propriedade fiduciária será espécie. Logo, todo proprietário fiduciário
é titular de uma cessão, mas nem todo cessionário será proprietário fiduciário.

Alertou, ainda, TEIXEIRA (2010, p.151), que não se pode perder de vista
o caráter dúplice do negócio fiduciário onde há uma obrigação principal e uma
relação satélite de cessão ou transmissão da propriedade resolúvel na
qualidade de garantidor do principal.

CHALHUB (2017, p.359), no entanto, leciona que o conceito empregado


na expressão legal de “credor titular da posição de proprietário fiduciário de
bens móveis ou imóveis” deve ser aplicada em sua forma mais ampla,
englobando, inclusive os títulos de crédito.

O sentido amplo que CHALHUB (2017, p.359) se referia é aquele


explicado por NOGUEIRA (apud. TEIXEIRA, 2010, p.152) como aplicável a
qualquer espécie de bem, corpóreo ou incorpóreo, o que não criaria uma
situação de relação pessoal entre credor e devedor, mas de relação real com a
coisa cedida em alienação fiduciária.

TEIXEIRA (2010, p.153) conclui que, por conta dessa estrutura é que a
interpretação do §3º do art. 49 da LREF, deve ser a mais ampla, incluindo,
assim, o titular dos créditos cedidos fiduciariamente.

Diante dessa interpretação abrangente do §3º, do art. 49 da LREF,


CHALHUB (2017, p. 359) conclui que os bens, móveis ou imóveis, e neles
incluídos os créditos cedidos fiduciariamente, acabam por constituir uma
segregação patrimonial própria da natureza da alienação fiduciária (afetação),
permanecendo afastados de quaisquer efeitos da recuperação judicial até que
cumpra integralmente com a adimplência da obrigação original.
30

Vale, aqui, destacar que, embora CHALHUB (2017, p. 359) tenha


utilizado o termo “quaisquer efeitos da recuperação judicial”, é evidente que a
impossibilidade de retirar bens essenciais do estabelecimento do devedor é um
efeito aplicável, por força de lei. Não entendemos que o autor tenha tentado
criar uma tese contrária à própria segunda parte do §3º do art. 49 da LREF.

BONAMIN (apud. TEIXEIRA, 2010, p.159) é ainda mais incisivo ao


afirmar que o pensamento contrário (isso é, o de que os recebíveis não são
bens móveis e sofrem os efeitos da recuperação judicial) é ignorar a literalidade
do artigo 83, III do Código Civil, a “melhor doutrina” e desestabilizar o já
represado mercado de crédito no Brasil.

Sobre essa constatação, Bezerra (2015, p. 163) chega ao ponto de


ironizar, in verbis:

Essa disposição foi o ponto que mais diretamente contribuiu


para que a Lei deixasse de ser conhecida como “lei de
recuperação de empresas” e passasse a ser conhecida como
“lei de recuperação do crédito bancário” ou “crédito financeiro”,
ao estabelecer que tais bens não são atingidos pelos efeitos da
recuperação judicial.

Na análise de Viegas e Chagas (2016, p. 69), a operação da “Trava


Bancária”, com o bloqueio dos créditos a receber da recuperanda é feita ao
arrepio do princípio da par conditio creditorum.

Além do princípio civil supracitado, no entender de Mayer (2015, p. 24),


há o princípio específico da lei de recuperação judicial e falência, que é o
princípio da preservação da empresa e sua função social, consoante o texto
insculpido no art. 47 da referida lei.

Seja do ponto de vista civil, seja do ponto de vista do direito falimentar,


levando em conta que os bancos são credores nevrálgicos da atividade
empresarial, há um evidente conflito de princípios ao afastá-los dos efeitos da
recuperação judicial e, como consequência, da mesa de negociação que a
Assembleia Geral de Credores proporciona, podendo, potencialmente,
inviabilizar a recuperação da empresa e o interesse geral da sociedade e
comunidade de credores ao performar suas garantias ao alvedrio do restante.
31

Por outro lado, Sacramone e Piva (2016) admoestam que a exceção


criada pelo §3º do art. 49 da LREF mitiga o risco de inadimplemento do crédito
empresarial, logo, facilita o acesso ao crédito pelo próprio empresário, e
permite às instituições financeiras praticarem taxas de juros mais baixas.

Assim, há que se sopesar os riscos macroeconômicos dos quais


supostamente a “trava bancária” protege o sistema, mas, sobretudo, sobre a
compatibilidade da exclusão dos bancos do processo de recuperação com a
própria essência principiológica da lei, que é a da manutenção da atividade
produtiva, da geração de riquezas, geração de empregos e recolhimento de
tributos.

No parecer CAE nº 534/2004 do Senado Federal TABET (2004, p. 14) já


constatava a existência da emenda nº 107 ao PLC 71/2003 que visava a
restrição da proteção aos “bens de capital essenciais à atividade empresarial”,
excluindo as alienações fiduciárias de direitos creditórios. Inclusive, ao
comentar à referida Emenda, o fez da seguinte forma:

Em relação à Emenda nº 107, entendemos meritória a distinção que


faz entre bens em geral e bens de capital. O objetivo da modificação
do art. 48, §3º, do texto aprovado na Câmara foi evitar que a venda
das instalações ou a retirada de bens, máquinas ou equipamentos
inviabilizasse a recuperação das empresas. Em nenhum momento se
quis diminuir a garantia da alienação fiduciária de créditos, permitida
pela Medida Provisória nº 2.160-25, de 23 de agosto de 2001, e já
utilizada com frequência pelas instituições financeiras para
concessão de crédito a empresas brasileiras. Dessa forma, a redação
proposta pela referida emenda é mais adequada, pois mantém a
proteção às instalações, máquinas e equipamentos do devedor em
recuperação judicial, mas deixa claro que não há prejuízo à garantia
desses contratos, o que contribui para a expansão do crédito e a
redução de seu custo no Brasil.

Para TEIXEIRA (2010, p.142), o Senador Ramez Tabet jamais quis, com
seu parecer, reduzir a força da garantia fiduciária, no entanto, a Autora,
igualmente, entende que a retirada de bens de capital do estabelecimento da
recuperanda, por si só, já é capaz de inviabilizar a maior parte dos planos de
recuperação judicial, eis a razão de o parecer CAE nº 534, de 2004 ter
redundado na redação final do que viria a ser o art. 49 §3º da LREF, para
adicionar o final “não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a
32

que se refere o §4º do art. 6º, a venda ou a retirada do estabelecimento do


devedor dos bens de capital essenciais à sua atividade empresarial”

Na posição de TEIXEIRA (2010, p.144), não houve, a priori, intenção do


legislador em proteger os cessionário de créditos cedidos fiduciariamente, pois
à época, já havia a distinção entre o proprietário fiduciário e o titular de crédito
cedido no âmbito do financiamento imobiliário, pois a Lei do Sistema Financeiro
Imobiliário já distinguia os dois conceitos, e apenas um deles (o do proprietário
fiduciário), foi englobado na redação inicial do PL 4.376/1993 na Câmara dos
Deputados.

2.2 DO TRATAMENTO JURISPRUDENCIAL

No que concerne aos tribunais estaduais brasileiros, verifica-se


divergências de entendimentos, que vieram a ser resolvidos, posteriormente,
pelo STJ, em decisão que será comentada mais a frente neste ensaio. No
entanto, é valido analisar as diferentes posições adotadas pelos tribunais
estaduais, resumidas no ementário selecionado abaixo:

RECUPERAÇÃO JUDICIAL - CONTRATOS COM GARANTIA REAL


(ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA E PENHOR DE DUPLICATAS) -
REQUERIMENTO DE DESBLOQUEIO DE IMPORTÂNCIAS
RETIDAS PELO BANCO AGRAVADO - INDEFERIMENTO -
Incidência do disposto no artigo 49, §§ 3o e 5°, da Lei 11.101/05, ou
seja, de um lado, o credor titular da posição de proprietário fiduciário
de bem móvel não se submete aos efeitos da recuperação judicial,
devendo prevalecer os direitos de propriedade sobre a coisa e as
condições contratuais, observada a legislação respectiva, e, do outro,
tratando-se de crédito garantido por penhor sobre títulos de crédito,
poderão ser substituídas ou renovadas as garantias liquidadas ou
vencidas durante a recuperação judicial e, enquanto não renovadas
ou substituídas, o valor eventualmente recebido em pagamento das
garantias permanecerá em conta vinculada durante o período de
suspensão de que trata o § 4odo art. 6° da mesma lei — Agravo de
instrumento não provido (TJSP; Agravo de Instrumento 9069863-
12.2008.8.26.0000; Relator (a): Romeu Ricupero; Órgão Julgador:
N/A; Foro de Limeira - 2.VARA CIVEL; Data do Julgamento:
30/07/2008; Data de Registro: 08/08/2008)

RECUPERAÇÃO JUDICIAL - CONTRATO DE PARCERIA


COMERCIAL - TRADICIONAL OPERAÇÃO DE CARTÃO DE
CRÉDITO - DESPACHO JUDICIAL DE LIBERAÇÃO DE TRAVA
33

BANCÁRIA, AFASTANDO A MANUTENÇÃO DE GARANTIA SOBRE


RECEBÍVEIS FUTUROS - INADMISSIBILIDADE - INTELIGÊNCIA
DO DISPOSTO NO ART. 49, § 2", DA LEI 11.101/2005 - Fidelidade
ao princípio da obrigatoriedade das convenções livremente pactuadas
- Assim, até que o Plano de Recuperação seja aprovado e venha a
modificar o pactuado, os contratos celebrados anteriormente ao
requerimento da recuperação judicial devem ser estritamente
observados tal como livremente ajustados - Agravo de instrumento
provido em parte, sem reconhecimento de que, após o pedido de
recuperação judicial, os valores gerados seriam extraconcursais..  

(TJSP;  Agravo de Instrumento 9025081-80.2009.8.26.0000; Relator


(a): Romeu Ricupero; Órgão Julgador: N/A; Foro de Sertãozinho
- 3.VARA CIVEL; Data do Julgamento: 28/07/2009; Data de Registro:
10/08/2009)

Nestes acórdãos, a negativa de provimento ao Agravo de Instrumento


interposto contra a decisão que negou a determinação de devolução de valores
retidos em função de contrato de mútuo garantido por alienação fiduciária de
duplicatas, o relator Romeu Ricupero (2008), em seu voto, sugere que, mesmo
sem previsão legal para tanto, a melhor prática em casos como esse é a de
manter os valores retidos em conta vinculada durante o stay period para, nos
termos do §5º do art. 49 da LREF, se a recuperação judicial for concedida, o
crédito garantido será recebido pelo credor na forma do plano de recuperação
e os valores vinculados, liberados em favor da recuperanda, caso contrário,
serão imediatamente transferidos para o credor fiduciário.

AGRAVO DE INSTRUMENTO. Execução de título extrajudicial.


Alienação fiduciária em garantia. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. Crédito
que não se submete ao stay period. Avaliação da essencialidade do
que deverá ser feita pelo juízo da recuperação. Pedido de bloqueio
das contas bancárias da recuperanda. Bens móveis dados em
garantia que devem ser priorizados. Precedentes do C. STJ e deste
E. Tribunal de Justiça. Agravo desprovido. 

(TJSP;  Agravo de Instrumento 2272273-95.2019.8.26.0000; Relator


(a): Marcos Gozzo; Órgão Julgador: 23ª Câmara de Direito Privado;
Foro Regional XI - Pinheiros - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento:
30/09/2020; Data de Registro: 02/10/2020)

Dez anos depois, em sentido oposto, a 23ª Câmara de Direito Privado


do TJSP decidiu que nem mesmo ao stay period estaria sujeito o crédito cedido
34

fiduciariamente, no entanto, o relator Marcos Gozzo ressalvou em seu voto que


o privilégio da garantia fiduciária se limita ao bem gravado, não podendo,
portanto, caso a “trava bancária” seja insuficiente para a liquidação do crédito,
prosseguir com a expropriação de bens do patrimônio da recuperanda em
detrimento do plano de recuperação judicial.

No entanto, a posição majoritária de jurisprudência do Tribunal


Bandeirante pode ser representada pelo julgado da 35ª Câmara de Direito
Privado, cuja ementa segue transcrita, in verbis:

PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO


FIDUCIÁRIA. PEDIDO DE REVOGAÇÃO DA LIMINAR INDEFERIDO.
EXISTÊNCIA DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL COM
PROCESSAMENTO DEFERIDO. IRRELEVÂNCIA. DECURSO DO
PRAZO DE "STAY PERIOD". COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA
RECUPERAÇÃO JUDICIAL PARA ANALISAR A ESSENCIALIDADE
DO BEM. DECISÃO REFORMADA. 1. A Lei nº 11.101/2005 exclui
expressamente o direito objeto destes autos da influência do
processo de recuperação judicial, ao determinar, em seu art. 49, §3º,
que: "Tratando se de credor titular da posição de proprietário
fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de
proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos
contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade,
inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em
contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se
submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os
direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais,
observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo,
durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4o do art. 6o desta
Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens
de capital essenciais a sua atividade empresarial". 2. É certo que a
jurisprudência admite a mitigação do rigor do art. 6º, §4º, da Lei nº
11.101/2005, possibilitando a prorrogação do stay period de 180 dias.
Ocorre que descabe ao juízo da busca e apreensão analisar a
essencialidade do bem, cabendo ao juízo da recuperação eventual
ampliação do prazo, visto que este é o competente para tanto. 3.
Recurso provido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2071855-
15.2017.8.26.0000; Relator (a): Artur Marques; Órgão Julgador: 35ª
Câmara de Direito Privado; Foro de Pederneiras - 2ª Vara; Data do
Julgamento: 06/07/2017; Data de Registro: 06/07/2017)

Para a turma julgadora, tendo em vista os precedentes reiterados que


aumentam o período da suspensão das ações e execuções contra a
35

recuperanda, estando esgotados os 180 dias legalmente previstos, é de rigor


que se franquie ao juízo universal da recuperação judicial a decisão sobre a
possibilidade ou não da retirada de bens no estabelecimento da recuperanda,
mesmo após os 180 dias previstos no art. 6º, §4º da LREF.

Assim, ao que nos parece, no momento, o caminho eleito pela


jurisprudência paulista é o da não-submissão do crédito garantido por cessão
fiduciária de recebíveis aos efeitos da recuperação judicial, com exceção do
stay-period, prorrogado ou não, período no qual os bens essenciais, assim
considerados pelo juízo da recuperação judicial, não poderão ser retirados do
estabelecimento do devedor.

A sedimentação desses entendimentos ensejou a Corte Especial do


Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a editar as súmulas 59 e 62, nos
seguintes termos:

Súmula 59: Classificados como bens móveis, para os efeitos legais,


os direitos creditórios podem ser objeto de cessão fiduciária.

Súmula 62: Na recuperação judicial, é inadmissível a liberação de


travas bancárias com penhor de recebíveis e, em consequência, o
valor recebido em pagamento das garantias deve permanecer em
conta vinculada durante o período de suspensão previsto no §4º do
art. 6º da referida lei.

Importa repisar que o juízo de essencialidade do bem (nisso incluso o


capital mantido em conta vinculada) é de competência do juiz da recuperação
judicial.

O posicionamento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, como se


há de depreender dos julgados, ora colacionados, segue, em suma, o do TJSP,
no entanto, os acórdãos prolatados por aquele tribunal se atentam a um
importante detalhe na constituição da alienação fiduciária de recebíveis,
divergindo do TJSP ao exigir o registro da cessão fiduciária no cartório de
títulos como requisito indispensável para a eficácia e constituição da cessão,
nos termos do art. 1.361, §1º, do Código Civil e art. 42 da Lei 10.931/04:
36

Art. 1.361. Considera-se fiduciária a propriedade resolúvel de coisa


móvel infungível que o devedor, com escopo de garantia, transfere ao
credor.
§ 1o Constitui-se a propriedade fiduciária com o registro do contrato,
celebrado por instrumento público ou particular, que lhe serve de
título, no Registro de Títulos e Documentos do domicílio do devedor,
ou, em se tratando de veículos, na repartição competente para o
licenciamento, fazendo-se a anotação no certificado de registro.

Art. 42. A validade e eficácia da Cédula de Crédito Bancário não


dependem de registro, mas as garantias reais, por ela constituídas,
ficam sujeitas, para valer contra terceiros, aos registros ou
averbações previstos na legislação aplicável, com as alterações
introduzidas por esta Lei. (grifamos)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRAVA BANCÁRIA. CÉDULAS DE


CRÉDITO BANCÁRIO AMPARADAS PELA GARANTIA DA CESSÃO
FIDUCIÁRIA NÃO PODEM SER CLASSIFICADAS COMO CRÉDITO
EXTRACONCURSAL, MAS, SIM, QUIROGRAFÁRIOS, UMA VEZ NÃO
REGISTRADAS, NA FORMA DO ART. 1.361, PAR.1º, DO CC/2002,
ANTES DO DEFERIMENTO DO PROCESSAMENTO DA RECUPERAÇÃO
JUDICIAL DA EMPRESA. O DISPOSTO NO PAR.3º, DO ART. 49, DA LEI
10.101/05, TAMBÉM NÃO SE APLICA AO CASO CONCRETO FACE AO
NÃO REGISTRO DA GARANTIA FIDUCIÁRIA DA CÉDULA DE CRÉDITO
BANCÁRIO NO CARTÓRIO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS ANTES DO
PROCESSAMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DA AGRAVADA. 1.No
caso em tela, contudo, as cédulas de crédito bancário garantidas por
alienação/cessão fiduciária foram registradas no Ofício de Registro de
Títulos e Documentos de Caxias do Sul, domicílio da agravada,
somente em 11.10.01 (fls. 211 a 412, 179 a 181), ou seja, após o
deferimento do processamento da recuperação judicial, ocorrido em
27.09.11. 2. Ocorre que, conforme determina o artigo 1.361,
parágrafo 1º, do Código Civil, o registro do contrato no Registro de
Títulos e Documentos do domicílio do devedor é requisito
indispensável para a constituição da propriedade fiduciária, não se
tratando tal ato de mera publicização a fim de conferir-lhe efeito
erga omnes. Portanto, os créditos decorrentes dos aludidos
contratos não podem ser considerados extraconcursais, mas, sim,
quirografários, uma vez que, não tendo sido devidamente registrados
no domicílio da agravada antes de iniciada a recuperação judicial, não
está o agravante na posição de proprietário fiduciário . 3. Aliás,
embora o artigo 42 da Lei nº 10.931/04 estabeleça que "a validade e
eficácia da Cédula de Crédito Bancário não dependem de registro",
também prevê que "as garantias reais, por ela constituídas, ficam
sujeitas, para valer contra terceiros, aos registros ou averbações
previstos na legislação aplicável". Ainda que a empresa recuperanda
não possa ser considerada terceira, todos os seus credores
encontram-se nesta condição em relação ao avençado com a
instituição bancária recorrente, não podendo as garantias fiduciárias
firmadas, portanto, ser opostas em detrimento destes, uma vez que
os contratos, tendo sido registrados após o deferimento do
37

processamento da recuperação judicial, não geram efeitos contra


terceiros. Logo, sendo as garantias ineficazes perante os demais
credores, não pode o agravante receber seu crédito fora da
recuperação judicial, a ela se sujeitando, razão pela qual deve ser
liberada a trava bancária que recai sobre os contratos registrados
após iniciada a recuperação judicial. 4. Daí também a inaplicabilidade
do par.3º do art. 49 da Lei 11.101/05, face ao não registro do crédito
bancário e sua garantia no Cartório de Títulos e documentos para
valer contra terceiros . 4. Pena pecuniária apropriada para a espécie,
face ao descumprimento inicial de ordem judicial. NEGARAM
PROVIMENTO AO AGRAVO. UNÂNIME. (Agravo de Instrumento Nº
70047101399, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Luís Augusto Coelho Braga, Julgado em 24/05/2012). (grifamos)

Ementa:AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
CRÉDITO REFERENTE ÀS CÉDULAS DE CRÉDITO BANCÁRIO.
GARANTIA POR CESSÃO FIDICUÁRIA. NÃO SUJEIÇÃO AO
PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. A Lei n. 11.101/05
estabelece os créditos sujeitos à recuperação judicial, excetuando
dessa relação os credores titulares da posição de proprietário
fiduciário, nos termos do art. 49, §3°. Hipótese dos autos em que
firmado contrato com a instituição financeira mediante a constituição
de garantia de cessão fiduciária de créditos representados por
duplicatas de venda mercantil, conjunto de recebíveis decorrente da
condição empresarial do agravante. 
CESSÃO FIDUCIÁRIA. RECEBÍVEIS A TÍTULO DE DUPLICATAS
DE VENDA MERCANTIL. DIREITO CREDITÓRIO FUTURO.
INVIABILIDADE DE INDICAÇÃO PRÉVIA E INDIVIDUALIZADA. Não
há falar em descumprimento do art. 33 da Lei n. 10.931/04 pela falta
de individualização da garantia, tendo em vista que os créditos
cedidos pelo agravante, representados por duplicatas de venda
mercantil, foram objeto de especificação no instrumento contratual,
sendo identificáveis os recebíveis – ainda que não no exato momento
da contratação. Trata-se, pois, de conjunto de recebíveis, em relação
ao qual não é possível a indicação prévia e individualizada, tendo em
vista se tratarem de direitos creditórios futuros, a teor do art. 31 do
mesmo diploma legal. Manutenção da decisão agravada. RECURSO
DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70082871740, Sexta
Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira
Cezar, Julgado em: 30-04-2020)

Outrossim, há julgados mais recentes do TJRS que já têm admitido a inclusão


de créditos garantidos fiduciariamente sem o registro no cartório de notas, a exemplo
das ementas ora transcritas:

Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL.


NÃO SUJEIÇÃO DE CRÉDITO GARANTIDO POR CESSÃO
FIDUCIÁRIA. TRAVAS BANCÁRIAS MANTIDAS. 1. Na esteira do
disposto no art. 49, §3º da Lei n. 11.101/2005, não se sujeitam ao
regime da recuperação judicial os créditos decorrentes de alienação
38

fiduciária e arrendamento mercantil. 2. Cédula de crédito bancário n.º


22398. Tratando-se de crédito bancário com garantia de cessão
fiduciária, independentemente de registro, não há submissão ao
Juízo da recuperação, devendo ser mantidas as condições
contratuais. Precedentes desta Corte e do e. STJ. AGRAVO DE
INSTRUMENTO PROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº
70083818963, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Isabel Dias Almeida, Julgado em: 29-04-2020) (Grifamos)

Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
IMPUGNAÇÃO AO CRÉDITO. NÃO SUJEIÇÃO DE CRÉDITO
GARANTIDO POR CESSÃO FIDUCIÁRIA. 1. Tratando-se de
crédito bancário com garantia de   cessão  fiduciária,
independentemente de registro, não há submissão ao juízo
da  recuperação  judicial. Precedentes desta Corte e do e. STJ. 2.
Na espécie, os contratos foram firmados mediante a constituição de
garantia de cessão fiduciária de direitos creditórios futuros (recebíveis
de cartão de crédito), como tais não se sujeitando ao rito
da recuperação judicial. 3. Não há falar, na situação em liça, em falta
de individualização das garantias, em suposto desatendimento do
disposto no art. 18, IV, da Lei 9.514/97. Avenças pactuadas sob
garantia de cessão dos “recebíveis de cartão de crédito”, em relação
aos quais nem sempre se revela viável a indicação prévia e
pormenorizada da garantia, tendo em vista a possibilidade de os
recebíveis sobre os quais versa a cessão referirem-se a créditos já
constituídos por ocasião da firmatura do contrato e/ou a créditos
ainda não formados (futuros), consoante previsão do art. 31 da Lei
10.931/2004. Validade das garantias contratadas. Precedentes.
RECURSO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70081899809,
Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Isabel Dias
Almeida, Julgado em: 27-11-2019)

O Tribunal de Justiça do estado do Rio de Janeiro, por sua vez, adota


uma postura mista, a depender da câmara ou órgão julgador, como se pode
depreender das seguintes decisões, representadas por suas ementas, porém
em sentido diametralmente oposto:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL.


INCIDENTE DE IMPUGNAÇÃO AO CRÉDITO. CONTRATO DE
CESSÃO FIDUCIÁRIA DE DIREITOS CREDITÓRIOS GARANTIDO
POR RECEBÍVEIS ("TRAVA BANCÁRIA"). Decisão recorrida, que
rejeitou os embargos de declaração opostos pela instituição financeira
ora agravante, restando mantida a sentença que acolheu
parcialmente o incidente de impugnação ao crédito incluído na
recuperação judicial da empresa agravada.Preliminar de
intempestividade do agravo de instrumento rejeitada. O entendimento
jurisprudencial do e. Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a
forma de contagem de prazo em dias corridos é a que melhor
preserva a unidade lógica da recuperação judicial se refere a prazos
previstos na Lei de Recuperação e Falências. Caso em apreço no
qual se discute a forma de contagem do prazo recursal previsto na Lei
39

Processual Civil. Necessidade de se observar a técnica chamada


distinguish (ou distinguishing). Os recursos não se referem ao
procedimento recuperacional em si, em sua tramitação em primeiro
grau, razão por que os prazos recursais devem ser contados em dias
úteis, conforme estabelece o CPC de 2015. Créditos decorrentes de
contratos garantidos com cessão fiduciária, que não estão sujeitos
aos efeitos da recuperação judicial, na forma do § 3°, do art. 49, da
Lei n° 11.101, de 2005. Títulos garantidos por instrumentos de cessão
fiduciária de direitos de crédito ou "trava bancária" em conta
vinculada, que resulta na transferência da titularidade dos
créditos/recebíveis para a instituição financeira, até a liquidação do
débito. O crédito garantido por cessão fiduciária possui a
mesma natureza de propriedade fiduciária, podendo o credor
valer-se da chamada trava bancária. Precedentes do e. STJ.
Descabimento da determinação de que somente parte do crédito
deve ser classificada como extraconcursal.Garantia que não se limita
ao valor retido na conta vinculada na data do pedido de recuperação
judicial, mas à totalidade do saldo devedor.Recurso a que se
conhece e se dá provimento. (TJRJ. Agravo de Instrumento 0063298-
97.2019.8.19.0000; Des. Relatora Cristina Tereza Gaulia; Órgão
Julgador 5ª Câmara Cível. Data do Julgamento 06/10/2020. Data de
Publicação 07/10/2020).(Grifamos)

A incerteza gerada por decisões conflitantes de diversas câmaras dos


mesmos tribunais ou, até mesmo, de tribunais diferentes necessitou, então, de
um posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, com o intento de unificar o
entendimento, donde surgiu o seguinte julgado:

DIREITO EMPRESARIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CRÉDITOS


RESULTANTES DE ARRENDAMENTO MERCANTIL E COM
GARANTIA FIDUCIÁRIA. NÃO SUBMISSÃO À RECUPERAÇÃO. 1.
Interpretando o art. 49, § 3º, da Lei n. 11.101/2005, a jurisprudência
entende que os créditos decorrentes de arrendamento mercantil ou
com garantia fiduciária - inclusive os resultantes de cessão fiduciária -
não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial. 2. Recurso
especial a que se nega seguimento. (STJ. REsp nº 1.181.533/MT.
Rel. LUIZ FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em
05/12/2013, publicado em 08/12/2013)

RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO


GARANTIDA POR CESSÃO FIDUCIÁRIA DE DIREITOS CREDITÓRIOS.
NATUREZA JURÍDICA. PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA. NÃO SUJEIÇÃO AO
PROCESSO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. "TRAVA BANCÁRIA". 1. A
alienação fiduciária de coisa fungível e a cessão fiduciária de direitos
sobre coisas móveis, bem como de títulos de crédito, possuem a
natureza jurídica de propriedade fiduciária, não se sujeitando aos
efeitos da recuperação judicial, nos termos do art. 49, § 3º, da Lei nº
11.101/2005. 2. Recurso especial não provido. (REsp 1202918/SP,
40

Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA,


julgado em 07/03/2013, DJe 10/04/2013)

Foi nesse diapasão que, em 2013, o STJ julgou o RESp 1.263.500/ES


da seguinte forma:

RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CONTRATO DE


CESSÃO
FIDUCIÁRIA DE DUPLICATAS. INCIDÊNCIA DA EXCEÇÃO DO
ART. 49, § 3º DA LEI 11.101/2005. ART. 66-B, § 3º DA LEI
4.728/1965.
1. Em face da regra do art. 49, § 3º da Lei nº 11.101/2005, não se
submetem aos efeitos da recuperação judicial os créditos garantidos
por cessão fiduciária.
2. Recurso especial provido. (STJ. Recurso Especial nº 1.263.500/ES;
Relatora Ministra Maria Isabel Gallotti; Órgão Julgador 4ª Turma. Data
do Julgamento 05/02/2014. Data de Publicação 12/04/2013)

No referido acórdão, o ministro Luis Felipe Salomão proferiu ressalva de


entendimento, nos seguintes termos:

“Não se sujeitam à recuperação judicial os créditos referentes à


cessão fiduciária de títulos, realizada pela empresa em favor de
entidade bancária, com base no artigo 66-B, § 3º, da Lei 4.728/1965,
devendo, entretanto, a liquidação desses créditos ser decidida pelo
Juízo da recuperação, visto que é o Juízo condutor do processo de
recuperação quem dirá se o bem gravado com a garantia fiduciária
é
ou não essencial à manutenção da atividade empresarial, de sorte
que
a satisfação do crédito fiduciário limita-se pelo imperativo maior
de preservação da empresa, previsto nos artigos 47 e 49, § 3º, parte
final, da Lei 11.101/2005.”
Com efeito, a solução que se me afigura correta é a que harmoniza a
situação da empresa em crise e as garantias do credor fiduciário, de
modo que os valores recebíveis mediante o instrumento de cessão
fiduciária não sejam simplesmente diluídos para o pagamento dos
outros credores submetidos ao Plano, tampouco liquidados
extrajudicialmente pelo credor fiduciário na satisfação do próprio
crédito, sem a interferência judicial. Assim, reconheço que o crédito
garantido por cessão fiduciária de título não faz parte do Plano de
Recuperação Judicial, mas sua liquidação deverá ser sindicada pelo
Juízo da recuperação, a partir da seguinte solução: i) os valores
deverão ser depositados em conta vinculada ao Juízo da
recuperação, os quais não serão rateados para o pagamento dos
demais credores submetidos ao Plano; ii) o credor fiduciário deverá
pleitear ao Juízo o levantamento dos valores, ocasião em que será
decidida, de forma fundamentada, sua essencialidade ou não - no
todo ou em parte - ao funcionamento da empresa; iii) no caso de os
valores depositados não se mostrarem essenciais ao funcionamento
da empresa, deverá ser deferido o levantamento em benefício do
credor fiduciário.
41

Do entendimento do ministro Luís Felipe Salomão se pode extrair que o


posicionamento do STJ não é o de proteção indiscriminada ao crédito bancário,
e assim como o proprietário fiduciário dos bens de capital essenciais à
atividade da recuperanda, não pode o credor-cessionário-fiduciário excutir sua
garantia durante o período do Stay, bem lembrando que a essencialidade ou
não dos bens é matéria de competência do juiz da recuperação judicial e não
do juiz da eventual execução.

O entendimento do STJ foi ampliado, em 2013, para declarar


competente o juízo da execução do título garantido pela alienação fiduciária
para, em não havendo declaração de essencialidade por parte do juízo da
recuperação, dar sequência aos atos expropriatórios, ainda que a alienação de
referido imóvel constasse no plano de recuperação judicial.

PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA.


RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CONTRATOS DE COMPRA E VENDA
DE AÇÚCAR PARA EXPORTAÇÃO. GARANTIA FIDUCIÁRIA
SOBRE IMÓVEIS RURAIS. EXECUÇÃO. CRÉDITO EXCLUÍDO DO
PLANO DE RECUPERAÇÃO. ART. 49, § 3º, DA LEI 11.101/2005. 1.
Em face da regra do art. 49, § 3º, da Lei 11.101/2005, não se
submetem aos efeitos da recuperação judicial os créditos garantidos
por alienação fiduciária. 2. Hipótese em que os imóveis rurais sobre
os quais recai a garantia não são utilizados como sede da unidade
produtiva, não se tratando de bens de capital imprescindíveis à
atividade empresarial das devedoras em recuperação judicial,
tanto que destinados à venda no plano de recuperação
aprovado. 3. Conflito conhecido, para declarar competente o
Juízo de Direito da 25ª Vara Cível de São Paulo para
prosseguimento da execução (STJ – CC nº 131.656/Pe, Rel.
Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
08/10/2014, Publicado em 20/10/2014)

Em se tratando de uma garantia que tem viés de propriedade, havendo


majoritária doutrina e jurisprudência no sentido da exclusão da cessão
fiduciária de recebíveis da recuperação judicial, o sistema financeiro passou a
usar desse instrumento quase que exclusivamente para fornecer crédito à
atividade empresarial (TEIXEIRA, 2010, p.174)

TEIXEIRA (2010, p.174, entende, ainda, que os créditos cedidos


fiduciariamente não podem ser englobados no conceito de “bens de capital
essenciais à atividade empresarial”, e, portanto, não podem estar sujeitos ao
depósito em conta vinculada de acordo com o exercício do poder do juiz da
42

recuperação de realizar o juízo de essencialidade, pois o conceito de “bens de


capital” da redação do §3º do Art.49 da LREF presume a posse indireta.

No entanto, admite TEIXEIRA (2010, p.177/178) que a cessão de


recebíveis traz consequências devastadoras ao fluxo de caixa da recuperanda,
inviabilizando a elaboração de um plano economicamente factível, chegando a
questionar se a recuperação de empresas seria mesmo uma possibilidade,
diante do fato de estarem os bancos, principais credores da atividade
empresarial no Brasil, excluídos da negociação, e alertando sobre o efeito
cascata decorrente dessa inviabilidade (desemprego, encerramento de
contratos, inadimplemento de credores com alta dependência financeira da
recuperanda, etc...)

Em suma, pode-se verificar que a tendência pendular em favor do sistema


financeiro é dominante no STJ, isso porque, toda vez que alguma tese é
adotada pelos tribunais estaduais e mitigue a posição de holdout dos bancos
(necessidade de registro da alienação fiduciária, distinção entre cessão e
alienação, etc...), ela acaba por ser revertida em sede do Especial.

3. DA ANÁLISE JURÍDICO-ECONÔMICA DA NÃO PARTICIPAÇÃO DO


CREDOR-CESSIONÁRIO-FIDUCIÁRIO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL EM
FACE DO PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA.

3.1 O PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA COMO REGENTE


DA LEI 11.101/2005

Para o fim de delinear o princípio da preservação da empresa no direito


falimentar pátrio, é importante estabelecer uma análise da ratio essendi do
texto, bem como pontos relevantes do processo legislativo começado por
iniciativa do Poder Executivo em 1993, através pelo PL nº 4.376/1993, tendo
sido aprovado na Câmara dos Deputados em 15/10/2003, sendo encaminhado
ao Senado Federal oito dias depois e sendo numerado sob o PLC nº71/2003.

Na relatoria do referido PLC na Comissão de Assuntos Econômicos -


CAE, o Senador Ramez Tabet (2003, p.19), com precisão irretocável, afirmou,
em seu parecer, que a dinâmica social, empresarial e econômica daquela
43

época já destoava vertiginosamente daquela que ensejou o DL 7.661/45


(Antiga Lei de Falências).

Dessa forma, fazia-se mister a adequação do sistema falimentar à


realidade contemporânea, onde não mais poderia se presumir a
hipossuficiência pela mera condição de trabalhador assalariado ou a de riqueza
pela condição de empregador, não mais seria possível recuperar um negócio
tão somente com prorrogação de prazo e concessão de deságio como era no
tempo das concordatas, enfim, a necessidade da modernização do regime
falimentar era pujante. (TABET, 2003. p.19/20)

Foi adiante, ainda, o Relator (TABET,2003. P.20), naquele ensejo:

“Nesse sentido, nosso trabalho pautou-se não apenas pelo


objetivo de aumento da eficiência econômica – que a lei
sempre deve propiciar e inventivar – mas, principalmente, pela
missão de dar conteúdo social à legislação. O novo regime
falimentar não pode jamais se transformar em bunker das
instituições financeira. Pelo contrário, (...), o novo regime
falimentar deve ser capaz de permitir a eficiência econômica
em ambiente de respeito ao direito dos mais fracos.
É nessa perspectiva que o projeto traz como grande novidade
instrumentos, hoje inexistentes, que permitirão às empresas
recuperáveis a superação de conjunturas adversas. Pode
haver objetivo mais favorável aos trabalhadores do que esse?
O que se pretende é dar condições às empresas viáveis de
se manterem ativas.

BEZERRA FILHO, (2016, p.47) começa a sua obra alertando que o


correto método de estudo da LREF é aquele apregoado por Montesquieu, em
“O espírito das leis”, ou seja, submeter as particularidades de cada caso
analisado aos olhos da lei aos princípios regentes daquela lei, inclusive
subordinando a interpretação dos próprios artigos da lei aos princípios que a
ela ascendem.

Para SALLES DE TOLEDO (2004, apud BEZERRA FILHO, 2016, p.64),


a “preocupação principal que deveria nortear o legislador deve ser aquela no
sentido de preservação da empresa”. Adiciona, ainda, que sempre que uma
empresa for viável e produzir os benefícios sociais atinentes à atividade
empresarial, deverá ser preservada.
44

Na opinião de COSTA (2018), a função primordial da LREF,


especialmente no instituto da Recuperação Judicial, inspirado no direito
estadunidense, é ajudar a empresa em crise a superá-la, isso se depreende da
própria literalidade do art. 47 da LREF:

Art. 47 - A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação


da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de
permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos
trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a
preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade
econômica

BEZERRA FILHO, (2016, p.60) menciona ainda o entendimento de


Nelson Abrão no sentido de que a nova lei faz o direito falimentar deixar de ser
apenas um instrumento de liquidação dos bens de uma empresa para se tornar
um mecanismo de preservação de sua atividade.

Mesmo nas legislações falimentares mais antigas, sempre foi


demonstrado, em algum grau, a preocupação com alguma possibilidade de
recuperação do devedor, mesmo que fosse abrindo mão de todos os seus bens
para evitar a execução pessoal/física da dívida, comenta BEZERRA FILHO
(2016, p.65), mas, para o autor, nunca houve, no Brasil, uma legislação que
demonstrasse tamanha preocupação com a manutenção da atividade
empresarial, inserindo essa preocupação como princípio de regência da lei.

Essa intenção legislativa, conforme BEZERRA FILHO (2016, p.65) trata-


se de verdadeira declaração de princípios que nortearão a correta aplicação e
interpretação da lei, e que deverá influenciar tanto a aplicação da lei como um
todo, como na interpretação artigo por artigo.

COMPARATO, (1970, p.95/96), analisando historicamente as


legislações de insolvência ao redor do mundo, destacadamente, no Brasil,
identificou que as alterações nas leis falimentares seguem um padrão pendular,
ora aumentando a proteção ao devedor, ora aos credores, de acordo com o
momento político, econômico e social vivido no momento de sua edição.
45

BEZERRA FILHO, (2016, p.66) extrapola o raciocínio do dualismo


pendular para praticamente toda a geração de leis no Brasil, porém, comenta o
autor, enquanto o processo legislativo da LREF se encaminhava, desde 1993
até 2015 quando foi, finalmente, promulgada, houve um crescente lobby do
setor financeiro (o mais forte e organizado politicamente no Brasil) que
descarrilhou o PL de seu trilho original com o pêndulo pendendo para a
recuperação da empresa para pender em direção da mais rápida e segura
recuperação do crédito financeiro, mesmo que em detrimento de própria
possibilidade das empresas se recuperarem.

Resta, portanto, analisar através de quais institutos a lei busca preservar


esse princípio de regência, para essa análise, é de bom alvedrio realizar uma
breve contextualização histórica:

Na história recente, a lei procurava salvaguardar a possibilidade de


recuperação das empresas através da concordata, que consistia em 2 soluções
básicas: Parcelamento (prazo) e Desconto. (COSTA, 2018)

Por muitos anos, essa fórmula foi útil, pois resolvia problemas de fluxo de
caixa, no entanto, o mundo das empresas se tornou demasiadamente
complexo e, com isso o combo Prazo e Desconto se tornou obsoleto, pois os
problemas passaram a ser mais complexos do que apenas fluxo de caixa.
(COSTA, 2018)

Diante dessa complexidade, que tornaria uma tarefa demasiadamente


árdua criar e prever legalmente as soluções possíveis para empresas em crise,
o legislador estadunidense entendeu que, para que crises complexas
pudessem ser resolvidas, seria necessário criar um ambiente de negociação,
para que os próprios credores e a empresa criassem uma solução “built-to-suit”
o caso concreto. (COSTA, 2018)

COSTA (2016, p.63) arrola três tipos de empresas que enfrentam crises
econômico-financeiras: (i) a empresa com viabilidade econômica capaz de
encontrar soluções de mercado para a sua crise; (ii) a empresa inviável e
incapaz de manter os benefícios de sua atividade, e (iii) a empresa viável que,
no entanto, é incapaz de apresentar uma solução de mercado para sair do
estado de crise.
46

É importante ressaltar que o princípio da preservação da empresa parte


de uma premissa básica, qual seja, a viabilidade econômica da empresa, não
podendo ser o instituo aplicável para qualquer crise empresarial (COSTA,2018)

A empresa recuperanda precisa ser produtora de riquezas, precisa


empregar trabalhadores, recolher tributos, produzir e circular mercadorias e
serviços além de desenvolver uma atividade econômica relevante, caso
contrário, o instituto a ser aplicado é o da Falência. (COSTA, 2018)

Surge o questionamento: havendo uma empresa com viabilidade


econômica reconhecida pelos agentes de mercado, mas passando por uma
crise que a impede de honrar com os seus compromissos temporariamente, o
que a impediria de negociar diretamente com os seus credores sem a
necessidade da intervenção judicial?

A resposta é melhor explicada através de um exemplo hipotético onde a


empresa Coffee Break LTDA, que possui patrimônio de R$ 400.000,00, e, em
seu passivo total, deve R$ 600.000,00, sendo R$ 200.000,00 para a AMBEV
S/A, R$ 200.000,00 para a Realize Imobiliária LTDA, e R$ 200.000,00 para a
Iatarola Advogados Associados.

Após demonstrar a viabilidade econômica de seu negócio e a


efemeridade de sua crise devido, por exemplo, à paralisação temporária das
atividades em ambientes por conta de uma pandemia global, a Coffee Break
LTDA consegue renegociar seu passivo com as duas primeiras fornecedoras.

Assim, ao procurar a Iatarola Advogados Associados para negociar,


depara-se com uma negativa, pois, com o restante do passivo negociado, há
ativo suficiente para adimplir com a dívida que possui com o terceiro
fornecedor, que não só entra em holdout como executa a dívida e penhora R$
200.000,00 do patrimônio da empresa, gerando uma verdadeira corrida pela
penhora e aquisição da preferência sobre o restante do ativo.

Nesse contexto, faz-se necessária a intervenção judicial para que haja


uma negociação global envolvendo todos os credores e que possa, inclusive,
obrigar os holdouts nos termos da negociação realizada pela maioria dos
credores. (COSTA, 2016)
47

Remete-se, novamente, à teoria de COMPARATO (1970, p.95/96), na


qual a legislação sempre irá se curvar diante do interesse de um dos sujeitos
de direito afetados por aquela lei, isso de acordo com as estruturas filosófico-
sociais da época.

COSTA (2016, p.60) afirma que não é apenas a mudança legislativa que
tem o condão de resolver os problemas complexos trazidos pela sociedade em
constante modernização, mas há a necessidade de maior pragmatismo dos
operadores do direito, isso é, ao aplicar e interpretar o direito, é necessário que
jamais perca-se de vista o resultado e o objetivo do processo.

Nesse contexto, COSTA (2016, p.60) preleciona que todos os agentes


do processo de recuperação judicial possuem ônus processuais e materiais
para possibilitar o sucesso do processo de recuperação judicial atinja o seu
objetivo, e essa divisão de ônus não mais ocorre na sua forma arcaica, na qual
o pêndulo da balança apontará os ônus do processo para a devedora ou para
os credores.

Essa forma de distribuir o ônus através de um dualismo pendular deve


ser superada e o juiz deve distribuir e fiscalizar justamente a divisão desses
ônus no processo de recuperação, seja para credores, para devedores,
administrador judicial, ministério público, e o sistema social que abrange a
atividade da empresa em recuperação, eis a consagrada teoria da superação
do dualismo pendular, do juiz e professor Daniel Carnio Costa (2016, p.60)

Para COSTA (2016, p.61) uma das grandes diferenciações entre o


sistema estadunidense de insolvência (o chapter 11) e o sistema brasileiro, é
que, no Brasil, ao invés de objetivar a satisfação dos créditos e a simples
recuperação da empresa como interesses naturalmente antagonistas, preza-se
pela manutenção dos benefícios sociais da atividade empresarial. Dessa forma,
é absolutamente imprescindível que a empresa em recuperação aja
adequadamente ao seu ônus, seja no processo, seja na sua atividade
empresarial.

O levantamento realizado por ARAUJO e LUNDBERG (2004, p. 11),


analisa que, dentre os 36 países que foram estudados, apenas 4, incluindo o
Brasil, possui, no âmbito da Falência, prioridade do crédito fiscal sobre o
48

crédito garantido fiduciariamente. Essa constatação leva os analistas de


crédito das instituições financeiras a precificar um altíssimo risco de default,
mesmo nas operações garantidas fiduciariamente, pois, justamente no
momento em que a garantia mais se faria necessária (a falência), o banco está
sujeito à prioridade trabalhista e fiscal para recuperar o seu crédito.

Vale repisar que, conforme preleciona COSTA (2016, p. 64), só fará


sentido a intervenção do Estado-Juiz numa relação de livre-mercado, como a
empresarial, quando o resultado dessa intervenção seja o pagamento dos
créditos aos credores, ainda que em condições renegociadas, e a manutenção
das relações comerciais, trabalhistas e tributárias que permeiam a atividade
daquela empresa.

Nessa estrutura balanceada de divisão de ônus, podemos verificar que


não é o objetivo da lei tutelar exclusivamente os direitos dos credores ou dos
devedores, os credores, prima facie, já terão que suportar o ônus da
suspensão das execuções a ações durante o prazo do stay, e, ainda, é comum
que na novação ocorrida por conta da aprovação do plano, venham a suportar
deságio nos seus créditos, redução de juros, carência e aumento de prazo para
pagamento. (COSTA, 2016, p.64)

O contrapeso desses ônus suportados por credores se dá no dever da


recuperanda em agir com absoluta transparência, em evitar, na medida do
possível, reduzir ou suspender a produção dos benefícios sociais que gera, ou
seja, evitar demissões, arrefecimento das produções, cancelamento de
contratos, etc... (COSTA, 2016, p.65)

Diante da análise econômica, ARAUJO e LUNDBERG (2004, p. 5)


entendem que o grande desafio da legislação falimentar, em especial a de
recuperação de empresas, é atingir o ponto máximo de eficiência econômica
do mercado de crédito, na qual não haja uma situação tão desfavorável à
devedora que a leve à bancarrota, impossibilitando, assim, que continue
demandando do mercado de crédito, mas que não aproxime do colapso o
mercado de crédito ao tratar com demasiado favor legal.

COSTA (2016, p.67) afirma que o único motivo pelo qual os credores,
que, normalmente, ocupam posição de ascendência sobre a devedora, é a
49

submissão do seu crédito à recuperação judicial e, portanto, ao stay period


criado pelo art. 6º da LREF. Assim, a lei, a exemplo do que é feito nos Estados
Unidos através do chapter 11 do Bankruptcy Code, cria um ambiente de alta
motivação à negociação coletiva diante da impossibilidade de, por pelo menos
180 dias, executarem individualmente os seus créditos.

Nas relações de crédito, propõe COSTA (2016, p.68) que, ao invés de a


legislação e a atuação do intérprete se manterem no ciclo de pender, ora para
o interesse do credor, ora para o do devedor, a lei deve se orientar pela
eficiência do sistema, evitando proteções ao devedor que, levados ao extremo,
tragam o colapso do sistema financeiro ou mesmo do de cobrança (criando
uma situação indesejada de auto-tutela dos credores), mas que, também, não
tragam proteções ao devedor a ponto de inibir as relações creditórias.

Em suma, o pensamento de COSTA (2016, p. 69) é que, no atual


sistema de recuperação judicial, a noção de eficiência no atingimento do
objetivo da lei é o norte que deve limitar o exercício hermenêutico da lei, assim,
a correta interpretação prática da LREF é aquela que visa a recuperação da
empresa, sempre em função da relevância da manutenção de seus benefícios
econômicos-sociais, caso contrário, o intérprete estará (sic) “ferindo de morte o
instituto da recuperação judicial de empresas.”

Entendemos, portanto, que, embora haja uma ampla possibilidade de


interpretações logicamente viáveis e hermeneuticamente corretas da legislação
falimentar, a partir do ponto de vista ou interesse do agente, só será correta a
interpretação da LREF a partir do princípio da preservação da empresa, que,
inclusive, está insculpido no seu próprio texto, no art. 47.

3.2 Das Razões Econômicas Para a Exclusão

Narra BEZERRA FILHO (2016, p.67/68) que, desde a criação do projeto


de lei, em 1993 até meados dos anos 2000, o projeto trazia forte conteúdo em
prol da preservação da empresa, mas, a partir da distribuição da cartilha
“Principles and guidelines for effective insolvency and creditor rights systems”
50

nos principais polos acadêmicos do Brasil, diversos fóruns, jornadas e


encontros foram se espalhando pelas principais universidades brasileiras.

O art. 49, §3º, que, até então, não existia, apareceu no texto do projeto
de lei a partir deste momento, que BEZERRA FILHO (2016, p.68) denomina
como o momento em que a lei deixou de ser a “lei de recuperação de
empresas” para se tornar uma “lei de recuperação do crédito”.

Segundo essa cartilha, (WORLD BANK, 2001, p.2) a recuperação das


empresas somente seria viável mediante financiamento a juros baixos pelo
sistema financeiro, o que dependia de maiores proteções e garantias ao crédito
financeiro em caso de insolvência da empresa.

Segue, para melhor compreensão, em tradução livre, o texto da referida


cartilha.

Estrutura legal para o direito dos credores. Um sistema de crédito


regularizado deve ser apoiado por mecanismos que promovam
métodos eficientes, transparentes e confiáveis para a recuperação do
crédito, incluindo a cisão e venda de bens móveis e imóveis, a
arrecadação de bens intangíveis como créditos do devedor contra
terceiros. Um sistema eficiente de recuperação do crédito é crucial
para um sistema de crédito funcional. A habilidade do credor de
tomar posse da propriedade do devedor e vende-la para satisfazer o
débito é a forma mais segura e efetiva de garantir o pronto
adimplemento. É muito mais efetivo que a ameaça de um processo
de insolvência, que sói requerer prova e trâmites processuais que
atrasam a satisfação. (WORLD BANK and UNCITRAL. Principles
and guidelines for effectvie insolvency and creditor rights
systems. 2001)

Para o BANCO MUNDIAL (2001, p.3), uma economia moderna só


poderia ser baseada na proteção do crédito, e um sistema de insolvência
precisa proteger o crédito para que seja internamente harmônico, sob pena de
o custo do crédito se tornar demasiado elevado ou, até mesmo, escasso, para
compensar o risco de default.

Curiosa e paradoxalmente, a referida cartilha (WORLD BANK, 2001, p.3)


estabelecia como um dos alvos dos sistemas de insolvência “prevenir a
dilapidação prematura do capital do devedor por credores individuais”.

Nesse diapasão, o argumento de a proteção do crédito ser, em


realidade, benéfica ao sistema de insolvência e ao ambiente de negociações
51

necessita ser confrontada com dados para se confirmar. Para Araújo (2004,
p.2) a imposição da penalidade correta em caso de inadimplência é importante
para o bom funcionamento dos mercados de crédito.

Para sustentar o argumento, nos valemos do tecnicismo de ARAUJO E


LUNDBERG (2004, p.2), que transformaram em gráfico o desafio a que se
submete a legislação falimentar:

λ = 0 Mercado financeiro colapsa

λ = ∞ Ninguém vai à bancarrota: demasiada restrição ao crédito.

No gráfico a fronteira externa representa o conjunto das alocações de


bens da economia que são ótimos de Pareto, ou seja, que podem ser
alcançadas quando os mercados são completos.

Segundo REIS (2018), o Ótimo de Pareto, também designado “Eficiência


de Pareto”, é o estado máximo de eficiência na alocação de recursos escassos
numa economia, pressupondo a competição perfeita, na qual qualquer
mudança na alocação, obrigatoriamente, prejudicaria a alguém em benefício de
outrem.

REIS (2018) alerta, ainda, que o estado máximo de eficiência de Pareto


não pressupõe, obrigatoriamente, a distribuição igualitária ou equitativa dos
recursos, mas apenas a maximização dos excedentes totais tanto na ponta da
oferta quanto na da demanda. Desta forma, numa economia que ainda não
52

tenha atingido o seu Ótimo, é possível que mudanças na alocação dos


recursos sejam benéficas ou maléficas em todas as pontas.

A análise da curva acima explicaria a ideia de (DUBEY,


GENAKOPOULOS E SCHUBACK (2001) apud ARAUJO e LUNDBERG, 2004)
no sentido de que quanto maior fosse a punição para o inadimplente, melhor e
mais eficiente seria o mercado de crédito. No entanto, para ARAUJO e
LUNDBERG (2004 p.2), essa premissa somente seria válida diante de uma
situação utópica na qual uma mudança na alocação de recursos causasse um
desequilíbrio econômico negativo.

Foi nesse sentido que ARAUJO e LUNDBERG (2004, p.3) entenderam a


curva interna do gráfico como mais apropriada para designar a análise
econômica do tratamento do inadimplente no âmbito da Recuperação Judicial
pois, parte-se do pressuposto de que o mercado de crédito não é completo e
absolutamente eficiente.

Assim, o verdadeiro bem-estar do universo econômico da Recuperação


Judicial implica alguma tolerância à inadimplência, em favor do próprio
mercado de crédito. (ARAUJO e LUNDBERG, 2004. P. 3).

Um exemplo caricato se faz pertinente, neste ponto, para ilustrar ao


acadêmico de direito o conceito econômico aqui implicado:

Numa sociedade de direito arcaico, onde os inadimplentes possam ser


escravizados ou presos, a consequência lógica e intuitiva para o mercado de
crédito é tender a zero (inexistência), pois o instinto natural de sobrevivência e
autopreservação humana só tornaria viável a obtenção de crédito quando a
própria sobrevivência e a autopreservação da família estivesse em risco. –
Talvez seja possível, em alguma escala, comparar o exemplo acima ao que
leva um cidadão a obter crédito com um agiota nos dias de hoje. – Essa é a
circunstância denotada pela fórmula λ = ∞ , onde o Lâmbda representa a
certeza do crédito, tendendo ao infinito por conta das graves consequências do
inadimplemento.

No outro lado, estaria presente uma sociedade absolutamente leniente


com a inadimplência, com proteções absolutas ao devedor, circunstância em
53

que, novamente, por simples intuição, podemos notar a tendência de


desaparecimento do mercado de crédito, dessa vez pelo colapso, pois ninguém
ofertará crédito sabendo que não terá como recuperá-lo em caso de
inadimplência. – Essa é a circunstância representada pela fórmula λ = 0, onde
o Lâmbda, representando a certeza do crédito, tende a zero.

No sistema brasileiro, conforme observa BEZERRA FILHO (2016, p.69),


A proteção conferida ao credor garantido por alienação fiduciária por esse
dispositivo é tamanha que, dado o privilégio conferido para os credores com
garantia real no processo de falência (Art. 83, II, LREF), quando o bem
alienado (ou o crédito cedido) for de grande valor, mais vale para a instituição
financeira a falência da recuperanda do que a própria recuperação.

Na reflexão de COSTA (2018), a exclusão dos dois maiores credores da


atividade empresarial do sistema de negociação da Recuperação Judicial
explica, por si só, os altos índices de insucesso do instituto nas primeiras duas
décadas de existência da LREF.

Conclui-se, pelo observado, que a tese aventada na cartilha do Banco


Mundial em 2001, que influenciou (Conforme BEZERRA FILHO, 2016, p.68) as
mudanças no projeto de lei que redundaram na redação atual do §3º do art. 49
da LREF, quando confrontada com a realidade brasileira, é um antônimo, pois
o contrário é possível se afirmar. Ou seja, não é a proteção ao crédito que é
capaz de garantir a harmonia do sistema de insolvência, mas é exatamente o
que acaba, por fim, trazendo um prejuízo geral ao processo.

Nem mesmo a exclusão do credor fiduciário da recuperação judicial é


fator determinante na precificação do crédito.

Com efeito, Para RODRIGUES, TAKEDA, ARAUJO (2004, p.2), pode


haver uma associação positiva entre juros e garantias, eis que, a depender do
perfil de risco do tomador, os empréstimos somente serão fornecidos mediante
a apresentação de garantias reais (como a alienação fiduciária), e, ainda, serão
praticados a juros elevados.

Berger e Udell (1990 apud RODRIGUES, TAKEDA e ARAUJO, 2004,

p.3) entendem que, portanto, a correlação negativa entre juros baixos e


54

fornecimento de garantias sequer é real e, mesmo se real fosse, aplicar-se-ia


aqui o brocardo de que correlação não denota causalidade.

A conclusão de RODRIGUES, TAKEDA e ARAUJO (2004, p.16) após


analisar complexas fórmulas estatísticas a partir do modelo de Berger e Udell e
com dados do SCR (Sistema de Informações do Crédito Bancário), é a de que
“as operações de crédito são diferentes em fatores não observáveis ao
econometrista” e que, apenas da análise da estrutura de garantias não é
possível concluir que as taxas de juros para operações iguais sofram relevante
variação no preço do crédito, isso porque os reais fatores que levariam a
estimativas consistentes sobre o impacto dos tipos de garantias sobre o juros
provém da assimetria de informações entre bancos e clientes.

Conclui-se, portanto, que, nem mesmo para os modelos matemáticos


utilizados na economia, a superproteção ao crédito bancário no caso de
empresas em recuperação traz o efeito ventilado na cartilha influenciadora da
nossa legislação.

3.3 Da Efetividade da Recuperação Judicial

Segundo dados do SERASA (2020), entre a vigência da lei em julho de


2016 e agosto de 2020, foram requeridas 13.054 recuperações judiciais no
Brasil, no entanto, apenas 4.288 foram concedidas, o que implica numa
proporção de, aproximadamente, um terço, como ilustra o gráfico abaixo.
55

Taxa de Concessão de Recuperação


Judicial por Aprovação do Plano

Plano Não-Aprovado
33% Plano Aprovado

67%

Deve-se lembrar que a concessão da recuperação judicial não implica


na impossibilidade de posterior convolação em falência, por descumprimento
do plano, nos termos do art. 73, IV da LREF.

Conforme o estudo promovido pela Associação Brasileira de Jurimetria –


ABJ (2016, p.15), denominado “Observatório da Insolvência”, 57,5% (cinquenta
e sete e meio por cento) das recuperandas que têm seus planos aprovados,
têm seu processo convolado em falência, denotando uma ineficácia patológica
da LREF na consecução de seus objetivos sociais e do princípio da
preservação da empresa, estampado no art.47 do diploma falimentar.

O gráfico abaixo demonstra a taxa de sucesso das empresas


recuperandas em cumprir com seus planos de recuperação judicial aprovados:
56

Resultado das Recuperações Judiciais


Concedidas por Aprovação do Plano

Convolação Em Falencia (Art.


73, IV)
Bem Sucedidas
43%
58%

A situação demonstra-se ainda mais grave quando comparamos o


número de recuperações judiciais requeridas no Brasil com a quantidade das
que obtiveram êxito, e chegamos à proporção de 14%.

A taxa média anual de juros praticada nos planos de recuperação judicial


analisados pelo estudo é de 3% (três por cento), com prazo médio de dez anos
para o pagamento e deságio de 37% (trinta e sete por cento) para credores
com garantias reais, conforme ilustrado no gráfico abaixo. (ABJ, 2016, p.15)
57

É curioso analisar que o mesmo estudo foi realizado tendo por base de
dados os créditos quirografários, tendo sido obtidos números muito próximos, o
que é contraintuitivo, a priori, mas é explicado pela ABJ (2016, p.16) como uma
disfunção negocial derivada da possibilidade de credores titulares de créditos
inclusos e excluídos da Recuperação Judicial (como as instituições financeiras
cessionárias fiduciárias de recebíveis), possam sopesar, dentro e fora do
processo, as suas posições negociais, de acordo com seus próprios interesses.

Outrossim, conforme estudo de jurimetria elaborado pela ABJ (2019,


p.36), em 21% (vinte e um por cento) dos processos de recuperação judicial
analisados, houve a decretação da falência de recuperanda antes da primeira
AGC ou durante o processo negocial. O mesmo estudo demonstra que essa
proporção de falências precoces aumenta conforme diminuem os patamares de
faturamento das recuperandas.

Tal fato, por si só, denuncia que há patologias graves no tratamento do


instituto e, para SACRAMONE e PIVA (2016, p.2), uma delas é a incapacidade
da empresa em crise se recuperar quando boa parte de seu endividamento
provém de créditos não-sujeitos à Recuperação Judicial

COSTA (2018), afirma que o sistema brasileiro de Recuperação Judicial


começou “manco”, pois manteve como holdouts os dois maiores credores da
atividade empresarial brasileira: O Fisco e as Instituições Financeiras, em
58

oposição, inclusive, ao sistema estadunidense, que inspirou o modelo brasileiro


de insolvência.

Os bancos, no geral, desde 2005, (promulgação da LREF), passaram a


oferecer crédito empresarial somente mediante a alienação fiduciária de ativos,
inclusive dos recebíveis a performar. (COSTA, 2018)

Note-se que, no capítulo inaugural do presente ensaio, já mencionava-se


que o uso da Alienação Fiduciária no financiamento empresarial não mais
possuía apenas a característica de garantia que viabilizasse o acesso ao
crédito mais barato, mas numa verdadeira manobra engendrada pelo “Lobby
da FEBRABAN” para burlar a negociação obrigatória da novel legislação.

A conclusão não poderia ser diferente da de TEIXEIRA (2010, p. 179),


para quem é nítido que a exclusão dos bancos (credores garantidos por cessão
fiduciária de recebíveis) não é compatível com o princípio da preservação da
empresa, insculpido no art. 47 da LRE, pois não traz benefícios sistêmicos
relevantes em face dos prejuízos que traz ao procedimento.

De fato, depreende-se dos números que a lei criou um instituto que tem
por fundamento de regência a preservação da empresa, no entanto, permitiu
entraves práticos que a tornaram, de todo, ineficiente ao fim para que foi
criada, o que nos leva ao derradeiro tópico desse trabalho, que seria a busca
de uma solução não-legislativa para buscar a aproximação do ótimo de pareto
na distribuição dos recursos de capital no sistema recuperacional brasileiro.

4. DA MEDIDA CAUTELAR AUTÔNOMA DE LIBERAÇÃO DA TRAVA


BANCÁRIA.

4.1 DA AUTONOMIA DO DIREITO MATERIAL CAUTELAR EM RELAÇÃO


AO DIREITO “PRINCIPAL” PLEITEADO

Para o professor Antônio Carvalho Filho (2018), há um aspecto


processual alheio à LREF e, por isso, virtualmente ignorado no âmbito do
direito falimentar e recuperacional, que desemboca numa importante solução
59

para o problema criado pelo parágrafo 3º do artigo 49 da LREF, qual seja, a


autonomia substancial do procedimento cautelar.

Trata-se da celebrada tese de Ovídio Baptista, mencionada por


CARVALHO FILHO (2018) de que a pretensão cautelar é um direito material à
segurança/garantia e, dessa forma, a coisa julgada e o contexto fático-
probatório do processo cautelar não nutrem nexo com o mérito da ação
principal, pois, na ação cautelar o que será submetido ao crivo do Judiciário é o
direito material à segurança enquanto na ação principal será o próprio mérito
do direito pleiteado.

FONSECA COSTA (2011, p.5) aponta que, no processo cautelar, é


emitido um juízo de certeza sobre a probabilidade e o risco de dano, um juízo
vertical exauriente da verossimilhança do direito invocado. Dessa forma, se há
uma sentença irrecorrível no processo cautelar, opera-se sobre a causa a coisa
julgada material. Gize-se que a res iudicata aqui analisada é o direito à
segurança e não a pretensão de direito material que será aventada em
eventual ação “principal”.

Na mesma toada, MOURÃO (2008, apud FONSECA COSTA, 2011) já


afirmava que “a função da coisa julgada cautelar será, única e exclusivamente,
impedir a repropositura da mesma demanda cautelar, não produzindo qualquer
efeito sobre a demanda principal”.

Outro argumento de FONSECA COSTA (2011, p.5) para a materialidade


do direito à segurança pleiteado no processo cautelar é o de que, embora haja
disciplina específica para ele nos artigos 300 e seguintes do Código de
Processo Civil, essa sequer seria necessária diante do consagrado princípio da
inafastabilidade da jurisdição, insculpido no artigo 5º, XXXV da Constituição
Federal, ou seja, não é porque está tratada em diploma processual que a tutela
cautelar não possua natureza material.

Insta reprisar que, para FONSECA COSTA (2011, p.6) a pretensão


cautelar (direito material ao acautelamento) é coisa distinta da pretensão
material que virá a ser arguida e defendida na ação principal, a relação entre
elas será, portanto, de referibilidade.
60

4.2 DA APLICAÇÃO DA TUTELA CAUTELAR À TRAVA BANCÁRIA

A tese de CARVALHO FILHO (2018), a qual adotamos, é a de que, em


razão do direito substancial de cautela, a recuperanda pode exercer pretensão
cautelar mesmo contra os credores holdout (aqueles protegidos pela LREF).
Isso porque a Constituição Federal, em seu artigo 5º, XXXV, proíbe a Lei (in
casu, o artigo 49 §3º da LREF) de afastar do Judiciário a lesão ou ameaça a
direito.

Assim, CARVALHO FILHO (2018) considera que o direito material à


segurança da possibilidade da empresa de se recuperar pode, sim, ser julgado
em análise exauriente de probabilidade (característica da ação cautelar),
podendo, em sentença, garantir o direito à superação da crise mesmo contra a
previsão do artigo 49, §3º da LREF.

O Art. 300 do Código de Processo Civil é aquele que define os


requisitos necessários para a concessão de um provimento cautelar, são eles a
“probabilidade do direito” ou fumus boni iuris, e o risco de dano, ou periculum in
mora. Com base nesse raciocínio, CARVALHO FILHO (2018) adota o
posicionamento de que, no caso de uma soerguente que almeje obter
provimento cautelar para garantir o direito à segurança da possibilidade de se
recuperar, pode invocar tal direito comprovando o periculum in mora através da
comprovação de que, sem os valores dos recebíveis não performados, será
certa a sua quebra, diante a escassez do mercado de crédito para
recuperandas. O fumus boni Iuri, todavia, decorre da essencialidade do bem
para a operação da empresa.

Como o bem da vida pleiteado no processo de recuperação judicial é o


soerguimento, a manutenção da atividade econômica, da geração de riquezas,
recolhimento de tributos e manutenção do emprego (COSTA, 2018), entende
CARVALHO FILHO (2018) que a legitimidade ativa para o ajuizamento de tal
ação cautelar seja da própria recuperanda (interessada em garantir a
segurança da probabilidade de se recuperar), ou até mesmo do Ministério
Público, na defesa dos interesses sociais múltiplos que circundam o
soerguimento de uma empresa economicamente viável.
61

Há, inclusive, uma decisão recente do Tribunal de Justiça do Rio de


Janeiro confirmando uma tutela cautelar concedida com base no direito
substancial à recuperação:

Agravo de Instrumento. Recuperação Judicial. Liberação de travas


bancárias obstadas pelo Juízo a quo em favor das empresas
recuperandas. Insurge-se a instituição financeira agravante contra a
decisão que, em sede de medida de urgência, durante o prazo a que
alude o §4º do art. 6º da Lei nº11.101/2005, determinou o bloqueio
em favor das recuperandas de 70% dos ativos representados por
recebíveis futuros gravados com cláusula de cessão fiduciária
creditado em nome do agravante, mantendo-se os valores
equivalente aos 30% restantes, até ulterior ordem, depositados na
conta de domicílio bancário, sem qualquer apropriação para
pagamentos das prestações dos empréstimos. Presença da
verossimilhança do direito e do risco de dano ou ao resultado
útil do processo. Inteligência do art. 300 CPC. Decisão agravada
que se volta para o início do iter recuperacional quando a lei
indica devam ser tomadas medidas assecuratórias da
manutenção da atividade produtiva, livrando temporariamente as
devedoras das investidas dos credores no stay period. Inteligência do
§4º do art. 6º da Lei 11.101/05. Debate acerca da natureza e dos
privilégios que teriam os créditos invocados pela agravante que deve
aguardar a fase a que alude o art. 8º da 11.105/05. Laudos técnicos
apresentados que indicam claramente que a implementação
integral da trava bancária inviabilizaria a continuidade das
unidades produtoras. Decisão agravada que razoavelmente
pondera o direito de crédito do agravante com os objetivos a
serem alcançados de superação da crise econômico-financeira
das devedoras e da função social das empresas. Inteligência do
art. 47 LRJ. Convocação dos interessados através de avisos e
editais. Possibilidade. Necessária medida de organização, economia
e efetivação em meio a processo que congrega o interesse de
inúmeros credores. Precedentes do TJRJ. Percentuais fixados pela
decisão vergastada que bem ponderada pelo Juízo a quo previne
todos os interesses em jogo. Contagem dos prazos em dias corridos
que é a que melhor preserva a unidade lógica da recuperação judicial
de forma a atingir os fins de superação da crise empresarial.
Precedente no STJ. Manutenção da liberação parcial das travas
bancárias. Inteligência dos arts. 47 e do 49 §3º da Lei 11.101/05.
Precedentes do TJRJ. Recurso a que se nega provimento. (TJRJ.
Agravo de Instrumento 0020664-86.2019.8.19.0000; Des. Relatora
Denise Levy Tredler; Órgão Julgador 21ª Câmara Cível. Data do
Julgamento 03/03/2020. Data de Publicação 17/03/2020). (Grifamos)

Nesse caso, o credor cessionário fiduciário, de forma oblíqua, sofre os


efeitos de uma tutela cautelar deferida em razão do direito à recuperação, mas
fica excluído do âmbito de negociação da própria recuperação, e, assim, para
ele, só restará a execução de seu crédito, com todas as restrições às
execuções que são inerentes à recuperação judicial. (CARVALHO FILHO,
2018).
62

Na visão de CARVALHO FILHO, (2018), o direito não admite lobby,


traquejos ou fraudes, e a exclusão dos credores holdouts da mesa de
negociação da recuperação judicial, com os efeitos deletérios que esse
privilégio causa ao próprio objeto da lei, extrapola a opção política do legislador
para adentrar o campo do lobby e da fraude de forma que a cautelar
eventualmente concedida em favor da recuperanda que “expulse” o Banco da
recuperação judicial, nada mais é do que o próprio (sic) “feitiço se virando
contra o mago”.

No entanto, CARVALHO FILHO (2018) alerta que, no âmbito da ação


cautelar apartada da recuperação judicial, o Credor Cessionário Fiduciário terá
a oportunidade do contraditório pleno e efetivo, pois, a umas, apenas a prova
inequívoca da essencialidade dos recebíveis para a viabilidade da recuperação
judicial (fumus boni iuris) terá o condão de atrair o direito material à cautela e, a
outras, sendo o direito à cautela material, a cognição da ação cautelar será
exauriente sobre a presença do fumus boni iuris e o periculum in mora.

Cremos que a referida solução se apresenta como viável forma de


dirimir o conflito principiológico criado pelo forte lobby bancário, pois, em
análise perfunctória do direito à segurança, o juiz poderá analisar exatamente
qual é a proporção dos recebíveis que se mostra como essencial à
manutenção da atividade produtiva e, por conseguinte, da possibilidade de
recuperação da empresa, fazendo valer o princípio de regência da lei,
insculpido no artigo 47 da Lei 11.101/2005.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O escopo do presente trabalho era analisar, à luz do princípio da


preservação da atividade empresarial e das teorias da superação do dualismo
pendular e da distribuição equilibrada de ônus no processo de recuperação
judicial.

Após a compreensão do instituto da alienação fiduciária como uma


distorção finalística do contrato de compra e venda e, mais especificamente, da
cessão fiduciária de recebíveis como principal modalidade de garantia para o
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financiamento da atividade empresarial, procedemos com a problemática


trazida pelo §3º do art. 49 da Lei 11.101/2005, qual seja, a da exclusão dos
créditos cedidos nessa modalidade de garantia do processo de recuperação
judicial.

Analisamos algumas teses propostas por estudiosos da área para


mitigar os efeitos desse viciado processo legislativo que criou uma proteção
abusiva aos bancos dentro do sistema de insolvência brasileiro, essas teses
variavam desde a semântica da palavra “cessão fiduciária” em detrimento do
verbete legal, que é “alienação fiduciária”, passando, até, por tentativas de
relativizar a proteção através de questões registrais.

No entanto, ficou nítida a posição do STJ contra cada uma dessas teses,
ou seja, basicamente qualquer tese arguida que reduzisse a proteção ao
crédito financeiro na recuperação judicial foi prontamente afastada pela Corte
da Cidadania, o que mostra a força da pressão do sistema financeiro, que
ameaça com o aumento das taxas de juros e a redução da oferta de crédito.

Partimos, então, para um estudo aprofundado das teorias que serviriam


como parâmetro para analisarmos esse tratamento “pró-sistema financeiro”
dado tanto pela lei como pela jurisprudência do STJ.

A primeira lente para a observação do problema foi o princípio de


regência da lei 11.101/2005, que é o da preservação da atividade empresarial
em função dos benefícios econômicos que ela traz (geração de empregos,
recolhimento de tributos, circulação de mercadorias e serviços e aumento da
riqueza). Partimos, portanto, da premissa que este trabalho apenas analisaria o
tratamento da problemática em relação a empresas realmente viáveis.

A segunda e terceira lentes foram os das teorias do maior autor do


direito da insolvência no Brasil, o juiz da primeira vara de falências e
recuperações judiciais da comarca da capital paulista, Dr. Daniel Carnio Costa,
quais sejam, a da superação do dualismo pendular e a divisão equilibrada de
ônus no processo da recuperação judicial.

A superação do dualismo pendular se refere à tendência histórica das


leis brasileiras e do mundo, em especial no tratamento da insolvência, de, em
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acordo com circunstâncias sociais e econômicas dos períodos de elaboração,


de penderam mais para a proteção de devedores ou credores. A teoria de
COSTA é a de que é necessário superar esse entendimento e buscar a
proteção dos interesses da sociedade que permeia aquela atividade
empresarial e aquele sistema creditório.

Por sua vez, a divisão equilibrada de ônus no processo de recuperação


judicial se trata da necessidade de cada agente do processo de soerguimento
arcar responsavelmente com seus ônus, evitando que o processo seja cômodo
para devedores ou um meio expropriatório eficiente para credores em
detrimento dos demais agentes.

Concluímos que a interpretação da lei mais correta só poderia ser


aquela que andasse em acordo com essas três premissas, o que nos levou a
analisar o documento do Banco Mundial que influenciou as alterações no texto
do projeto de lei que redundo na Lei 11.101/2005, que afirmava, em suma, que
a proteção ao crédito financeiro era a única forma de manter o sistema
economicamente saudável, pois, com relativização de garantias ou aumento da
dificuldade de expropriação, o sistema não sustentaria essa precificação nas
taxas de juros e oferta de crédito.

Passamos, então, a analisar os modelos estatísticos e econômicos do


Banco Central Brasileiro e do Serasa para concluirmos que a mitigação de
garantias não tem nexo de causalidade direta com a taxa de juros, e essa,
historicamente, subiu e diminuiu sob efeitos outros que não a proteção
conferida por tribunais e lei falimentar

Com dados das mesmas fontes, pudemos enxergar que a Lei de


Falências e Recuperação Judicial é extremamente ineficaz na consecução do
seu objetivo, que é a preservação da empresa, pois menos de 20% dos
pedidos de recuperação acabam com o integral cumprimento do plano e o
efetivo soerguimento da empresa.

Houve unanimidade entre os autores pesquisados que, dentre outros


fatores, a Trava Bancária é determinante para esse insucesso da legislação, o
que, muitas vezes, prejudica não só a trabalhadores e fornecedores, mas ao
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próprio sistema financeiro que financia toda a rede de contratos que se quebra
com a falência da recuperanda.

Com isso, temos a inexcusável conclusão de que, interpretando a lei


através dos espectros por ela mesma propostos, em especial o seu princípio de
regência, insculpido no art. 47, a exclusão dos credores-cessionários-
fiduciários do âmbito da recuperação é absolutamente incompatível com a ratio
essendi da lei.

Ao fim, entendemos que, com base na autonomia das medidas


cautelares em relação aos pedidos principais, encontramos na clássica
dogmática processual civil uma saída para, sem mudar a lei, promover, no
mínimo uma justa equalização entre a proteção do crédito bancário e a
manutenção da atividade empresarial.
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