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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 1

UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA

ESCOLA DE DIREITO

TRABALHO DE INVESTIGAÇÃO ORIENTADA

A RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA TRIBUTRÁRIA

Orientador:
DOUTOR RUI DUARTE MORAIS
A quem é devido um muito sentido
agradecimento pela disponibilidade sempre
manifestada, pelo apoio nunca negado e
pelo entusiasmo que sempre soube
transmitir ao autor.

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José Pedro Paupério Martins Panzina
A Responsabilidade Subsidiária Tributária 2

ABREVIATURAS UTILIZADAS

Ac.(s) Acórdão(s)
art. Artigo
CC Código Civil
CPA Código do Procedimento Administrativo
CPPT Código de Procedimento e de Processo Tributário
CRP Constituição da República Portuguesa
CSC Código das Sociedades Comerciais
CTF Revista de Ciência e Técnica Fiscal
DL Decreto-Lei
IRS Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares
IVA Imposto sobre o Valor Acrescentado
L Lei
LGT Lei Geral Tributária
ROA Revista da Ordem dos Advogados
STA Supremo Tribunal Administrativo
TC Tribunal Constitucional
TCAN Tribunal Central Administrativo do Norte

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José Pedro Paupério Martins Panzina
A Responsabilidade Subsidiária Tributária 3

ÍNDICE:

A RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA TRIBUTRÁRIA............................. 1

ABREVIATURAS UTILIZADAS ...................................................................... 2

ÍNDICE: ............................................................................................................... 3

1. Introdução................................................................................................................. 5

2. O actual quadro legal................................................................................................ 7

2.1. Os sujeitos da relação jurídica tributária .......................................................... 7

2.1.1. Sujeitos activos da relação jurídica tributária........................................... 8

2.1.2. Sujeitos passivos da relação jurídica tributária......................................... 8

2.2. O objecto da relação jurídica tributária .......................................................... 11

2.3. A constituição e a alteração da relação jurídica tributária.............................. 12

2.4. A extinção da relação jurídica tributária......................................................... 13

2.5. A garantia da prestação tributária................................................................... 15

3. O conceito e a natureza jurídica da responsabilidade subsidiária tributária........... 16

3.1. O conceito de responsabilidade subsidiária tributária .................................... 16

3.1.1. A característica ex lege da responsabilidade subsidiária tributária ........ 17

3.1.2. A característica subjectiva do responsável subsidiário tributário........... 18

3.1.3. O âmbito objectivo da responsabilidade subsidiária tributária............... 23

3.1.4. Síntese..................................................................................................... 24

3.2. A natureza jurídica da responsabilidade subsidiária tributária....................... 25

4. A efectivação da responsabilidade subsidiária tributária ....................................... 31

4.1. Condições para a sua efectivação ................................................................... 31

4.1.1. A reversão do processo de execução fiscal ............................................ 32

4.1.2. Fundada insuficiência de bens do devedor principal.............................. 33


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4.1.3. O benefício da excussão prévia e o direito de ressarcimento ................. 35

4.1.4. Fixação do exigível................................................................................. 37

4.1.5. A presunção legal de culpa e o ónus da prova........................................ 38

4.1.6. A prévia audição do responsável subsidiário e a declaração

fundamentada dos pressupostos e extensão............................................................ 44

5. O enquadramento constitucional ............................................................................ 47

6. Conclusão ............................................................................................................... 56

BIBLIOGRAFIA:............................................................................................... 60

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1. Introdução

O presente Trabalho de Investigação Orientada é o resultado de uma reflexão


suscitada ao seu autor pelo conhecimento próximo de uma concreta iniciativa
procedimental de reversão tributária intentada pela administração fiscal.
Percebeu, naquele momento, que era geral o desconhecimento de que a lei
tributária onera com responsabilidades tributárias certas pessoas, apenas porque essas
pessoas exercem determinadas funções.
Percebeu que, por exemplo, ser administrador de empresas não é uma situação
que confere apenas certos privilégios mas, afinal, que comporta, sobretudo, uma série de
riscos e responsabilidades de que é necessário ter consciência e que há que assumir e
enfrentar.
Sentiu, então, necessidade de conhecer bem a matéria em causa, designadamente
estudando a natureza jurídica dessa forma de responsabilidade e, se possível, porque lhe
parecia útil, dar a conhecer a outros o produto do seu estudo, numa associação nem
sempre fácil de interesse, de oportunidade e de qualidade.
Entre nós, o tema da responsabilidade subsidiária no âmbito tributário, e da
reversão como modo de efectivação dessa responsabilidade, apesar da sua
inquestionável importância, não está abundantemente tratado pela doutrina1.
Porém, nos dias de hoje, em resultado de uma maior pressão exercida sobre o
Fisco para que seja, sobretudo, mais eficaz2 na sua função de arrecadar as sempre
indispensáveis – e, também sempre, insuficientes – receitas do Estado, o tema adquire
maior importância e o seu tratamento ganha uma acrescida oportunidade.
Pelo previsível maior uso da figura da reversão tributária pela administração
fiscal, como ainda em consequência da conjuntura económica, serão mais, e cada vez
em maior número, os chamados a responder subsidiariamente pelos tributos de outros,
que não os pagaram nem dispõem de meios para o efeito.
Ao estimado maior uso do chamamento do responsável subsidiário, pode
associar-se um tão indesejável quanto intolerável abuso da figura da reversão. Só um

1
A escassa existente não está actualizada com as mais recentes alterações da LGT.
2
À eficácia, neste caso, como em muitos outros, não equivale a eficiência. Mas esse é um outro tema.

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amplo conhecimento deste direito, das condições e dos pressupostos do seu exercício,
pode ajudar a prevenir e a obstar a essa eventual utilização incorrecta e ilegítima.
Também não é desejável que o recurso desmedido ao instituto da reversão
tributária venha a promover o afastamento, pelo menos nominalmente, do exercício de
certas funções daqueles que melhor as poderiam exercer, em virtude de tais funções
trazerem consigo riscos patrimoniais pessoais indesejados e desproporcionados.
O presente estudo, porque realizado na perspectiva de ler o presente para servir o
futuro, não apresentará uma resenha da evolução histórica do instituto da
responsabilidade subsidiária tributária3.
A reflexão feita está estruturada em cinco partes, através das quais se procurará:
1. A apresentação e análise do actual quadro legal;
2. A apresentação das principais questões relacionadas com o conceito e a
natureza jurídica da responsabilidade tributária, através da qual,
designadamente, se identificarão os responsáveis subsidiários;
3. A apresentação da extensão da responsabilidade subsidiária tributária, que
permitirá conhecer as condições e os pressupostos substantivos para a sua
efectivação;
4. A apresentação do enquadramento constitucional do regime da
responsabilidade subsidiária tributária, nomeadamente das suas possíveis
inconstitucionalidades; e,
5. A apresentação da conclusão.

3
Vd., para este efeito, o estudo de PAULO DE PITTA E CUNHA e JORGE COSTA SANTOS,
Responsabilidade Tributária dos Administradores ou Gerentes, Lisboa, Lex, 1999, pp. 11-19.

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2. O actual quadro legal

A seguinte apresentação do actual quadro legal relativo à responsabilidade


subsidiária tributária, que em alguns dos aspectos correlacionados será sumária, seguirá
de perto a sistemática que o legislador utilizou na Lei Geral Tributária, aprovada pelo
DL nº 398/98, de 17 de Dezembro4, no seu Título II – “Da relação jurídica tributária”,
para conhecermos quem são, nos termos da lei, os sujeitos dessa relação, qual o
respectivo objecto, como se constitui, como se altera e como se extingue a relação e, por
fim, quais são as garantias da prestação tributária.
Será sempre à LGT que nos estaremos a referir, sempre que uma norma não
tenha outra referência.

2.1. Os sujeitos da relação jurídica tributária

O Capítulo I – art. 15º a art. 29º – refere-se aos “Sujeitos da relação jurídica
tributária”.
Para além das questões mais gerais relacionadas com a personalidade e
capacidade tributária, com a gestão de negócios, com a representação, com o domicílio
fiscal e com a transmissibilidade dos créditos e obrigações tributárias tratadas neste
Capítulo da LGT, interessa a este trabalho a definição dos sujeitos, sem os quais não há
relação jurídica, e, dentro destes, o sujeito da relação jurídica tributária alvo que é o
responsável subsidiário tributário.

4
A Lei Geral Tributária foi posterior e sucessivamente alterada pelos seguintes diplomas:
- Lei nº 100/99, de 26 de Julho
- Lei nº 3-B/2000, de 4 de Abril
- Lei nº 30-G/2000, de 29 de Dezembro
- Lei nº 15/2001, de 5 de Junho
- Lei nº 16-A/2002, de 31 de Maio
- Decreto-Lei nº 229/2002, de 31 de Outubro
- Lei nº 32-B/2002, de 30 de Dezembro
- Decreto-Lei nº 160/2003, de 19 de Julho
- Lei nº 107-B/2003, de 31 de Dezembro
- Lei nº 55-B/2004, de 30 de Dezembro
- Lei nº 60-A/2005, de 30 de Dezembro

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É o art. 18º que nos dá a saber que as duas grandes categorias de sujeitos da
relação jurídica tributária são os sujeitos activos, a que se referem os nºs 1 e 2, e os
sujeitos passivos, a que se referem os nºs 3 e 4.

2.1.1. Sujeitos activos da relação jurídica tributária

São sujeitos activos da relação jurídica tributária, ou titulares da personalidade


jurídica tributária activa, o Estado e os demais entes públicos que tenham o direito e o
poder de exigir o cumprimento das obrigações tributárias5, geralmente em seu próprio
benefício, devendo ter-se presente que, conforme o art. 3º, nº 1, da LGT, os tributos
podem ser fiscais e parafiscais6, e qualquer destes tributos pode ter origem e natureza
estadual, regional ou local.
A necessidade de realizar receitas resulta não só da necessidade de custear a
própria estrutura mas, em grande medida, para manter o “Estado social, que aceita
assumir os custos de satisfação de necessidades básicas, embora não os das demais
necessidades a não ser na medida do indispensável para assegurar aos que não podem
pagar as prestações os mesmos direitos a que têm acesso aqueles que as podem
pagar”7.
Atento o objecto do presente trabalho, que não apreciará os impostos nem o
direito de os arrecadar, não se irá mais longe neste ponto.

2.1.2. Sujeitos passivos da relação jurídica tributária

O art. 18º, nº 3, referido supra, estabelece que os sujeitos passivos da relação


jurídica tributária são todos os legalmente vinculados ao cumprimento de prestação

5
A subjectividade jurídica tributária activa não se pode confundir com a soberania fiscal, embora o
Estado ocupe os dois lugares. No primeiro, que não é seu exclusivo, actua como administrador da res
pública. No segundo, a sua actuação é uma manifestação de soberania.
6
“(...) as contribuições para a Segurança Social constituem tradicionalmente o mais típico exemplo desta
espécie de tributos (…)”, apud PAULO DE PITTA E CUNHA e JORGE COSTA SANTOS,
Responsabilidade Tributária dos Administradores ou Gerentes, Lisboa, Lex, 1999, pp. 18.
7
Cf. JORGE MIRANDA, Manual de Direito Constitucional, Tomo IV, Direitos Fundamentais, 3ª
Edição Revista e Actualizada, Coimbra Editora, 2000, pág. 395 e ss.

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tributária, e apenas sobre estes recai a obrigação de a realizar, seja como contribuintes
directos, seja como substitutos, seja como responsáveis.
Estabelece, ainda, que os legalmente vinculados, ou obrigados à realização da
prestação tributária, os contribuintes directos, os substitutos ou os responsáveis, tanto
podem ser pessoas singulares, como pessoas colectivas, como, também, patrimónios ou,
ainda, organizações de facto ou de direito.
A terminologia utilizada pelo legislador para identificar os vários sujeitos
passivos da relação jurídica tributária, bem como para os distinguir entre si, quer quanto
à intensidade do seu vínculo obrigacional, quer quanto à vez pela qual se procede ao seu
chamamento ao cumprimento da obrigação tributária, pode revelar-se, principalmente
para os menos “afoitos”, desnecessariamente confusa.
As leis fiscais, pelo interesse que têm para a universalidade dos cidadãos,
deveriam ser elaboradas tendo em atenção a quantidade e, sobretudo, a qualidade dos
destinatários, sem que esse especial dever de atenção pusesse em causa a especificidade
das figuras típicas deste ramo do direito, cuja dificuldade bastaria por si só.
A formulação do nº 3 do art. 18º, referindo-se num só tempo a contribuintes
directos, substitutos e responsáveis, não se mostra feliz. É que, verdadeiramente, em
sentido amplo, responsáveis na relação tributária são todos os referidos, sejam os
contribuintes directos, sejam os substitutos ou sejam os responsáveis, propriamente
ditos, – como o são, aliás, também, outros não referidos8, – pese, embora, a
responsabilidade tributária de cada um ter natureza distinta e poder verificar-se em
momentos e com intensidades diferentes.
Que são todos responsáveis é o que resulta do art. 22º da LGT, com a epígrafe
“Responsabilidade tributária”, em cujo nº 2 se estabelece que, “para além dos sujeitos
passivos originários9, a responsabilidade tributária pode abranger solidária ou
subsidiariamente outras pessoas”.
Assim, deve ter-se presente que há responsáveis tributários em sentido amplo,
que estes se podem dividir em dois grupos, os responsáveis originários e os

8
É o caso, por exemplo, do representante do sujeito passivo não residente e sem estabelecimento estável
em território nacional, conforme art. 29º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado.
9
Os sujeitos passivos originários tanto podem ser os contribuintes directos como serão os substitutos, nos
casos em que a lei estabelece a substituição.

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responsáveis que chamaríamos secundários, acessórios ou não originários10, e que estes


segundos, que não existem sem os primeiros, cuja responsabilidade resulta da existência
de uma particular relação com o titular da responsabilidade originária, serão os que a
LGT designa de responsáveis, entendo-se em sentido estrito, e a sua responsabilidade
será ou solidária ou subsidiária.
Na primeira, o responsável solidário está por força da lei, perante o sujeito
activo, em igualdade de circunstâncias com o responsável originário e ambos
simultaneamente, ou qualquer deles, indistintamente, pode ser chamado ao
cumprimento da prestação tributária. O responsável solidário é um condevedor
solidário11.
Na segunda, que nos termos do art. 22º, nº 3 da LGT é a regra da
responsabilidade pelo pagamento de dívidas tributárias de outrem, só o incumprimento
do responsável originário poderá originar o subsequente chamamento ao cumprimento
da prestação tributária pelo responsável subsidiário, como veremos mais adiante.
A não ser pela confusão terminológica, não se percebe, pois, que o legislador
tenha consagrado – no art. 29º, nº 2 – a transmissibilidade mortis causa das “obrigações
tributárias originárias e subsidiárias” e não se tenha referido às obrigações solidárias.
Se tivermos em conta que, quanto à transmissibilidade das “obrigações
tributárias” inter vivos, o legislador estabeleceu a sua insusceptibilidade, – conforme
art. 29º, nº 3, – podemos concluir que,
i) ou as obrigações tributárias solidárias não são susceptíveis de transmissão,
nem inter vivos nem mortis causa, o que constituiria uma inaceitável discriminação
face, designadamente, às obrigações tributárias subsidiárias,
ii) ou o legislador considerou, para este efeito, que as obrigações tributárias
solidárias - não podendo, por definição, ser subsidiárias - são, também, obrigações
tributárias originárias, hipótese que se configura, no mínimo, como estranha. Basta ver,
por exemplo, que a responsabilidade solidária dos liquidatários das sociedades, prevista
no art. 26º da LGT nada tem de originária, pois que tanto as relações jurídicas

10
Como os designa SOARES MARTINEZ – Direito Fiscal – 10ª Edição (reimpressão) – Almedina,
2003, pág. 228.
11
Cf. MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, 9ª Edição, Revista e Aumentada,
Almedina, 2003, pág. 834.

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tributárias como, principalmente, as obrigações tributárias das sociedades pelas quais os


liquidatários poderão ser solidariamente responsabilizados, são prévias à sua entrada em
cena, isto é, não surgem com sua investidura no cargo. Esta responsabilidade solidária é,
inequivocamente, uma responsabilidade subsequente, secundária ou acessória, portanto
não originária.
Como adiante se verá, estes estatutos subjectivos não são imutáveis e
permanentes na mesma pessoa, e essa situação contribui ainda mais para a “desordem”.
Situações há, por exemplo, em que o sujeito passivo originário tanto pode ser,
também, responsável solidário como responsável subsidiário, como pode, ainda, ser
desonerado de responsabilidade.
Qualquer destas hipóteses tem a sua previsão no art. 28º da LGT e ocorrerá
quando intervém, por força da lei, o substituto tributário12, o qual não sendo o sujeito
passivo originário é, contudo, na maior parte dos casos, o responsável originário.
Mesmo sem o recurso a uma exemplificação extensa, não ficam dúvidas de que
uma mais apropriada nomenclatura e uma melhor definição estatutária dos diferentes
sujeitos passivos da relação jurídica tributária, facilitaria a compreensão do papel que a
cada um é dado desempenhar na relação jurídica tributária.

2.2. O objecto da relação jurídica tributária

O “Objecto da relação jurídica tributária”, a que respeita o Capítulo II – art. 30º


a art. 35º, – refere-se ao conjunto dos deveres e direitos que integram a relação jurídica
tributária, de que são titulares os sujeitos da relação jurídica tributária13.
Da titularidade dos sujeitos activos, ou credores, os deveres e direitos que
integram a relação jurídica tributária são, em síntese, os seguintes:
1) O crédito tributário
2) O direito a prestações acessórias de qualquer natureza

12
Sobre a substituição tributária, cfr., por todos, DIOGO FEIO, A substituição fiscal e a retenção na
fonte: O caso específico dos impostos sobre o rendimento – Coimbra Editora, 2001.
13
Este será o objecto imediato da relação tributária, que se distingue do objecto mediato da relação
tributária, “este correspondendo à prestação”, cf. SOARES MARTINEZ – Direito Fiscal – cit., pág. 264.

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3) O direito à dedução, e o dever de reembolso ou restituição do imposto


4) O direito a juros compensatórios
Da titularidade dos sujeitos passivos, ou devedores, os deveres e direitos que
integram a relação jurídica tributária são, também em síntese, os seguintes:
o A dívida tributária
o O dever ou sujeição a prestações acessórias de qualquer natureza
o O dever de dedução, e o direito ao reembolso ou restituição do imposto
o O direito a juros indemnizatórios
Deste rol destaque-se o crédito e a dívida tributária como a prestação tributária
propriamente dita, ou objecto mediato da relação jurídica tributária, e as demais
prestações (direitos e deveres) que, integrando a prestação tributária, são acessórias
desta.
Os sujeitos passivos, ou os seus representantes, têm como obrigação principal o
pagamento da dívida tributária, constituindo obrigações acessórias todas as que tenham
por objectivo possibilitar o apuramento da obrigação tributária principal, o pagamento
do imposto.

2.3. A constituição e a alteração da relação jurídica tributária

O Capítulo III – art. 36º a art. 39º – é dedicado à “Constituição e alteração da


relação jurídica tributária”, sendo relevante para este trabalho salientar que a alteração
dos elementos essenciais da relação jurídica tributária não está na disposição das partes,
e que a relação se constitui com o facto tributário.
O facto tributário, ou constitutivo da relação tributária, da obrigação tributária,
ou, ainda, gerador da “relação de imposto, será aquele facto que conjuga os
pressupostos previstos na lei tributária”14.
Como diz o mesmo autor, “Um pressuposto, em si mesmo, como tal, não é a
causa, não é facto constitutivo. É qualquer coisa sem a qual a causa, o facto
constitutivo, se não verifica; não actua”.

14
Cf. SOARES MARTINEZ – Direito Fiscal – cit., pág. 184.

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Sirva de exemplo o rendimento do trabalho independente e a sua tributação em


sede de IRS. O pressuposto material da relação jurídica tributária é o rendimento do
trabalho independente e não o trabalho independente, que será um pressuposto pessoal.
O trabalho independente que não tenha sido remunerado, que não tenha originado
rendimento, não se traduz em facto tributário.

2.4. A extinção da relação jurídica tributária

O Capítulo IV – art. 40º a art. 49º – é dedicado à “Extinção da relação jurídica


tributária” e está dividido em três secções, referentes a cada um dos três modos pelos
quais se extingue a relação jurídica tributária;
o O pagamento da prestação tributária, a que corresponde o cumprimento do
obrigação tributária;
o A caducidade do direito de liquidação, isto é, do direito de fixação do
quantitativo da prestação tributária15, tornando-a certa e exigível, ou, por
outras palavras, do fim do poder de aplicação da lei tributária a certo facto
tributável16, e
o A prescrição da prestação tributária, que se traduz na extinção da obrigação
da relação jurídica tributária, quando o cumprimento respectivo não é
realizado num certo período de tempo17, por inércia do titular do direito,
cessando o direito de ser exigido o cumprimento.
Na LGT, pagamento, caducidade e prescrição mantêm o sentido e alcance que se
lhes conhece do CC e, portanto, não sendo figuras típicas do Direito Fiscal, não se
justifica qualquer explicação adicional neste trabalho, que não seja uma referência à
razão de existência dos limites temporais em que se traduzem a caducidade e a
prescrição, razão sediada na exigência de certeza e de segurança jurídicas.

15
Cf. SOARES MARTINEZ – Direito Fiscal – cit., pág. 308.
16
Cf. J.L.SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, 2ª Edição, Coimbra Editora, 2002, pág.
146.
17
Cf. SOARES MARTINEZ – Direito Fiscal – cit., pág. 274.

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Porém, as questões relacionadas com a suspensão e a interrupção dos prazos,


quer de caducidade, quer de prescrição, pela relevância que podem adquirir no
chamamento do responsável subsidiário, merecem umas linhas de atenção.
Assim, quanto ao prazo de caducidade, o art. 45º, nº 1, fixa, para os casos em
que a lei não fixar outro, um prazo geral de 4 anos, prazo que o nº 2 do mesmo artigo
reduz para 3 anos, nos casos ali expressamente previstos.
O prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte do início
de inspecção externa que não ultrapasse o prazo de seis meses.
Nos casos de liquidação, o prazo de caducidade suspende-se:
a) Desde o início até ao trânsito em julgado da decisão judicial de que dependa a
liquidação do tributo.
b) Desde a apresentação até à decisão da reclamação ou da impugnação de que
resulte o direito à liquidação.
Em caso de benefícios fiscais, o prazo de caducidade suspende-se:
a) Desde o início até ao termo do contrato, ou durante o decurso do prazo dos
benefícios, quando estes têm natureza contratual.
b) Se os benefícios tiverem natureza condicionada, desde a apresentação da
declaração até ao termo do prazo legal do cumprimento da condição.
Verifica-se, ainda, a caducidade do direito de liquidar tributos, mesmo antes de
decorrido o prazo geral, no caso de fiscalização tributária solicitada pelo sujeito passivo,
para os factos ocorridos no período compreendido na acção inspectiva.
Embora nada seja expressamente referido a propósito, os responsáveis solidários
ou subsidiários aproveitam dos prazos de caducidade que se referem ao devedor
principal.
Já quanto à prescrição, cujo prazo geral é de oito anos, salvo o disposto em lei
especial, o art. 48º, nº 2 consagra que as causas da sua interrupção ou suspensão
produzem igual efeito quanto ao devedor principal e aos responsáveis solidários ou
subsidiários.
Porém, o art. 48º, nº 3, excepciona a produção do efeito suspensivo na pessoa do
responsável subsidiário se, em processo executivo, este vier a ser citado após o 5º ano
posterior ao da liquidação.

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A prescrição é interrompida pela prática de qualquer um dos seguintes actos


processuais, e apenas estes: citação, reclamação, recurso hierárquico, impugnação e
pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo.
A interrupção da prescrição cessa se, por motivo alheio ao sujeito passivo, o
processo estiver parado mais de um ano.
A suspensão do prazo de prescrição verifica-se quando há paragem do processo
de execução fiscal por motivo de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou
por motivo de reclamação, de impugnação ou de recurso.
Voltaremos a este tema da caducidade e da prescrição mais adiante.

2.5. A garantia da prestação tributária

Por último, o Capítulo V – art. 50º a art. 53º – trata da “Garantia da


prestação tributária”. As garantias caracterizam-se pelo princípio da legalidade, o que a
LGT faz de modo subordinado às seguintes noções:
Os créditos tributários têm como garantia geral o património do devedor
tributário.
Outros meios complementares de garantia de que a administração tributária pode
fazer uso são, nos termos da lei, os privilégios creditórios, o direito de penhor ou
hipoteca legal e o direito de retenção das mercadorias sujeitas à acção fiscal.
O recurso a providências cautelares está previsto a favor da administração
tributária para as hipóteses de fundado receio de frustração da cobrança dos créditos
tributários ou de destruição ou extravio dos meios necessários ao apuramento da
situação tributária do sujeito passivo e demais obrigados tributários, respeitando o
princípio da proporcionalidade.
Em caso de pagamento em prestações, reclamação, recurso, impugnação de
liquidação e oposição à execução, a oferta de garantia idónea pelo devedor tributário
suspende a cobrança da prestação tributária em sede de execução fiscal.
Só em situações muito excepcionais se manterá a suspensão da execução com
dispensa da garantia.
A garantia indevidamente prestada dará ao devedor tributário a direito a ser
indemnizado.

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3. O conceito e a natureza jurídica da responsabilidade subsidiária tributária

3.1. O conceito de responsabilidade subsidiária tributária

Como ficou demonstrado no ponto anterior, a pouca clareza conceptual do actual


quadro legal impõe, para que as normas atinentes com a responsabilidade subsidiária
tributária possam ser adequadamente aplicadas, um apurado exercício de interpretação.
Numa reafirmação e densificação do princípio constitucional relativo ao Sistema
Fiscal consagrado no art. 103º, nº 2 e 3 da CRP, o art. 8º da LGT, no seu nº 2, b), estatui
que “a regulamentação das figuras da substituição e responsabilidade tributária” está
sujeita ao “princípio da legalidade tributária”18.
O princípio da legalidade tributária, no quadro mais amplo do princípio da
legalidade da administração19, implica, desde logo, que não há tributos que não sejam
previamente criados por lei20, que não terão efeitos retroactivos e que, quanto ao que
aqui nos interessa, não há responsáveis pelo pagamento desses tributos se, como tal, não
estiverem previstos na lei.
Apesar da norma da LGT citada se referir a “regulamentação”, tendo em conta
que estarão em causa direitos e garantias de pessoas, cuja sujeição à incidência do
tributo ou à responsabilidade tributária não deriva de em si se verificar o facto
tributário, em nossa opinião esta matéria cabe na reserva de lei formal e não, apenas,
numa mera reserva de lei material21, pelo que não acompanhamos os que afirmam

18
O art. 8º da LGT consagra, também, a legalidade penal, à qual não se fará qualquer referência porque
excede os limites objectivos do presente trabalho.
19
Como ensina J.J.GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 5ª Edição,
Almedina, 2002, pág. 256, “O princípio da legalidade postula dois princípios fundamentais: o princípio
da supremacia ou prevalência da lei (Vorrang des Gesetzes) e o princípio da reserva de lei (Vorbehalt
des Gesetzes). Estes princípios permanecem válidos, pois no Estado democrático-constitucional a lei
parlamentar é, ainda, a expressão privilegiada do princípio democrático (daí a sua supremacia) e o
instrumento mais apropriado e seguro para definir os regimes de certas matérias, sobretudo dos direitos
fundamentais e da vertebração democrática do Estado (daí a reserva de lei). ”
20
De acordo com o art. 165º, nº 1, i), da CRP, esta é matéria da reserva relativa da competência
legislativa da Assembleia da República, o que significa, portanto, que o Governo pode, mediante lei de
autorização legislativa, criar tributos.
21
Cf. MANUEL AFONSO VAZ, Lei e Reserva da Lei – A Causa da Lei na Constituição Portuguesa de
1976, 1ª Reimpressão, 1996, UCP, pág. 17 e ss. que ensina: “Segundo a doutrina tradicional do duplo
conceito de lei, lei em sentido formal é todo o acto parlamentar revestido da forma de lei,
independentemente do seu conteúdo. Lei em sentido material é regra de direito (Rechtssatz) ou a norma
jurídica (Rechtsnorm). (...) Significa isto que para a lei em sentido material a forma de lei não é

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 17

estarem aqui em causa “apenas os mecanismos e garantias adequadas a uma eficaz


arrecadação da dívida do imposto”22.
O princípio da legalidade tributária implica, ainda, que toda a acção da
administração, em matéria tributária, se submeta absolutamente à lei.
Importa, pois, encontrar na lei, e só nela, a definição do que é a responsabilidade
subsidiária tributária, o que de seguida se procurará fazer numa tríplice perspectiva que,
em suma, nos dirá quando, quem (e porquê se) é responsável subsidiário tributário e o
pelo quê (tributário) se é subsidiariamente responsável.

3.1.1. A característica ex lege da responsabilidade subsidiária


tributária

O respeito pelo princípio da legalidade tributária impõe que não seja admissível
a responsabilidade subsidiária tributária sem a sua previsão legal.
Por outras palavras, a responsabilidade subsidiária tributária é uma figura que
não se presume, não é uma atitude voluntarista, é, antes, uma imposição da lei, sobre a
qual as partes não têm capacidade de dispor.
De igual modo, o sentido e o alcance do instituto da responsabilidade subsidiária
em matéria tributária, tal como o regime da sua efectivação e as garantias dos
responsáveis tributários, estão sujeitos ao princípio da legalidade tributária, na sua dupla
vertente: anterior previsão legal e submissão à sua estatuição.
Assim, ninguém pode ser colocado em posição de poder ser subsidiariamente
chamado ao pagamento dos tributos de outrem se essa possibilidade não estiver
estabelecida na lei, ou se não se verificarem os pressupostos do chamamento que a lei

necessária nem é suficiente: as leis formais podem representar leis em sentido material, mas os
regulamentos governamentais ou autárquicos, por exemplo, também o poderão ser”. Caso em que, em
matéria de regulamentação das figuras do substituto e dos responsáveis tributários, estaríamos perante
competência concorrente da Assembleia da República e do Governo. Neste caso, nos termos do art. 112º,
nº 7 e 8, da CRP, ou estaríamos perante regulamentos subordinados e o requisito prévio é o da existência
de norma que o determine - a lei que regulamentam, - a qual é expressamente referida, ou estamos perante
regulamentos independentes e estes devem referir a lei habilitante, quer quanto à competência subjectiva,
quer quanto à competência objectiva, para a sua emissão.
22
ANTÓNIO LIMA GUERREIRO, Lei Geral Tributária Anotada, Editora Rei dos Livros, 2000, pág.
72.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 18

preveja, ou, ainda, se não forem reconhecidas ao chamado as garantias que a lei
consagre.
Deve, pois, ter-se presente que, como a seguir se verá, sendo esta
responsabilidade tributária atribuída pela lei a certas pessoas, estas determinadas
pessoas apenas são responsáveis, em regime subsidiário, na estrita medida que a lei
fixar.
Portanto, não podendo tais pessoas ser responsabilizadas sem a preexistência de
lei, também o não podem ser se nelas não se verificar a preexistência dos atributos
pessoais que a lei determina.

3.1.2. A característica subjectiva do responsável subsidiário tributário

É na LGT que podemos encontrar as pessoas que, dotadas das características


funcionais e comportamentais referidas, são responsáveis subsidiárias tributárias.
Assim:
Nos termos do art. 24º, nº 1, “os administradores, directores e gerentes e outras
pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou
gestão” são, relativamente às “pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados”
onde exerçam essas funções, responsáveis subsidiários tributários, sendo solidária a
responsabilidade entre si, se “tiver sido por culpa sua que o património da pessoa
colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente” para a satisfação das
dívidas tributárias, ou se a falta de pagamento tempestivo “lhes foi imputável”.
A clareza da norma afasta a necessidade de grande esforço interpretativo.
É, pois, evidente que o legislador pretendeu abarcar na previsão todos os que
tenham efectiva acção e capacidade de influir na relação jurídica tributária das pessoas
colectivas ou entes fiscalmente equiparados.
Daí que expressamente tenha referido também aqueles que, não o sendo de jure,
são gestores ou administradores de facto das pessoas colectivas ou entes fiscalmente
equiparados.
Neste grupo de gestores ou administradores de facto, devem incluir-se os que,
sendo de direito, outorguem procuração a terceiro para o exercício da gerência de facto.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 19

Deve considerar-se, neste caso, que o mandante exerce a gestão ou


administração através do mandatário, pois que, tal como disse o TCAN em 15-07-2004,
“a verdade é que outro entendimento conduziria a que qualquer gerente de direito se
poderia eximir, por acto voluntário e unilateral, da referida responsabilidade
(subsidiária) mediante a outorga de procuração a terceiro para o exercício das funções
de administração ou gerência”23.
A única dúvida que se pode colocar respeita a saber se estão incluídos, ou não,
na previsão desta norma os administradores ou gestores das pessoas colectivas ou entes
equiparados que, sendo-o de jure, não o são de facto.
Porém, a referência às características comportamentais “tiver sido por sua
culpa” e “lhes foi imputável” apontam inequivocamente para a acção culposa ou para a
acção omissiva e, portanto, para o afastamento destes “inactivos” sujeitos, já que quem
não gere ou não administra de facto, não pode “agir com culpa” nem “lhe pode ser
imputável” a falta de pagamento. Como dizia o TC em 09-11-199424, “(...) porque o
gerente meramente nominal não exerce de facto as funções de gerência ou
administração, não se podendo dizer que a concreta condução dos negócios da
sociedade, designadamente quando dela resulte a inobservância de deveres ou
obrigações legais impostas à sociedade, se deva a qualquer actuação da sua parte
(...)”.
Nos termos do art. 24º, nº 2, “os membros dos órgãos de fiscalização e revisores
oficiais de contas nas pessoas colectivas onde os houver” são, relativamente a estas,
responsáveis subsidiários tributários e, entre si, a responsabilidade é solidária, se a
violação dos deveres tributários das pessoas colectivas resultar “do incumprimento das
suas funções de fiscalização”.
A única nota que fazemos a esta disposição prende-se com a expressão “pessoas
colectivas”, que substitui a anterior expressão “sociedades”, para não deixar passar em
claro o sentido em que segue o pensamento do legislador, o qual, inequivocamente,

23
Acórdão nº 00087/04, de 15-07/2004, Sumário, ponto 2, http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/, (23-01-2006).
24
Acórdão nº 94-328-2, de 13/04/94, Sumário, ponto III, 1), tirado em sede de fiscalização concreta,
referente ao art. 13º do DL nº 103/80, de 9 de Maio, diploma que consagrava o Regime Jurídico das
Contribuições para a Previdência, http://www.dgsi.pt/atco1.nsf/, (02-02-2006).

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 20

alargando, quis integrar nesta responsabilidade os “fiscais” de todas as outras pessoas


colectivas que não, apenas, sociedades.
Nos termos do art. 24º, nº 3, “os técnicos oficiais de contas” são responsáveis
subsidiários tributários, relativamente aos contribuintes por cujas contas sejam
oficialmente responsáveis, se violarem os “deveres de assunção de responsabilidade
pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de
declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos ”.
Dos Técnicos Oficiais, aliás como dos Revisores Oficiais de Contas, espera-se e
exige-se um exercício de funções deontologicamente irrepreensível. A aposição da sua
assinatura nos legais documentos de prestação de contas e de cumprimento das
obrigações fiscais tem de ser um atestado de credibilidade do respectivo conteúdo e da
sua conformidade com as exigências da lei.
Nos termos do art. 25º, nº 2, o titular de estabelecimento individual de
responsabilidade limitada é, face a este, responsável subsidiário tributário, sem prejuízo
do disposto no art. 24º, “em caso de falência25 do estabelecimento (...) por causa
relacionada com a actividade do seu titular, salvo se (...) o princípio da separação
patrimonial foi devidamente observado na sua gestão”.
Esta norma, que prevê o chamamento de todos os bens do titular do
estabelecimento, constitui uma excepção à regra prevista no nº 1, segundo a qual “pelas
dívidas fiscais do estabelecimento individual de responsabilidade limitada respondem
apenas os bens a este afectos”.
A excepção está, todavia, sujeita à verificação cumulativa da acção culposa do
titular que tenha exercido funções de administração ou de gerência e a violação do
princípio da separação dos patrimónios - o património do titular e o património do
estabelecimento.
Nos termos do art. 28º, nº 2, o substituto tributário, quando a retenção a que
esteja obrigado for efectuada meramente a título de pagamento por conta do imposto
devido a final, é responsável subsidiário tributário relativamente ao substituído
tributário.

25
Deve ler-se “insolvência”, à luz da evolução legislativa.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 21

Para melhor se compreender o sentido e alcance desta disposição, tenha-se por


exemplo a entidade empregadora que, relativamente aos rendimentos do trabalho postos
à disposição dos seus empregados, está obrigada por lei, como substituto tributário, a
reter o respectivo IRS.
Isto é, a entidade empregadora (substituto) substitui-se a cada empregado
(substituído) na entrega do imposto, o que ela faz retendo a importância de imposto
tabelada quando coloca o rendimento do trabalho à disposição destes.
A retenção na fonte do imposto, a que o empregador está obrigado, é efectuada a
título de pagamento por conta do imposto a liquidar a final, visto que a liquidação
daquele imposto compete à Direcção-Geral dos Impostos e é processada no ano seguinte
àquele a que respeitam os rendimentos26.
Neste exemplo, pelo imposto que não tenha sido retido, mas que devesse ter
sido, o responsável originário pelo pagamento do imposto em falta é o substituído
tributário – o trabalhador, o contribuinte, o titular do rendimento, – atribuindo a lei ao
substituto tributário – o empregador – a responsabilidade de, subsidiariamente, pagar o
imposto em falta.
Do que se trata aqui é do imposto que deveria ter sido retido e não foi, e não do
imposto em falta que, devido a final, resulta de outros factores implícitos na natureza do
próprio imposto, tais como, por exemplo, o englobamento de outros rendimentos do
titular ou de outros membros do agregado familiar.
A repartição de responsabilidades encontrada pelo legislador para garantir a boa
cobrança do imposto, na situação particular do IRS devido sobre os rendimentos de
trabalho dependente, não nos parece a mais adequada e a mais eficaz.
Com efeito, os empregadores estarão geralmente mais habilitados do que os seus
empregados a uma boa aplicação da lei, pelo que a falta de retenção do imposto na fonte
se ficará a dever mais ao substituto que ao substituído, a menos que a falta de entrega do
imposto resulte de conluio entre ambos, empregador e empregado.
Por outro lado, o rendimento colocado à disposição do empregado é geralmente
tido por este como líquido de todas as obrigações contributivas e tributárias, pelo que a

26
Conforme, respectivamente, art. 75º e art. 76º do Código do IRS.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 22

sua capacidade para, posteriormente, entregar a título de imposto uma importância que
percebeu supostamente livre de impostos, pode ser muito reduzida.
No nosso entendimento, uma inversão das responsabilidades tributárias, neste
caso particular da retenção do IRS relativo a trabalho dependente, a exemplo do que se
estabelece no art. 28º, nº 3, mostrar-se-ia mais adequado, seria provavelmente um
auxílio considerável para reduzir a evasão fiscal e, seguramente, contribuiria fortemente
para a redução do contencioso tributário.
Por fim, nos termos do art. 28º, nº 3, nos restantes casos de substituição
tributária, é o substituído tributário que responde subsidiariamente face à
responsabilidade originária que cabe ao substituto tributário.
Esta é, em nossa opinião, a solução de responsabilidade mais adequada para a
figura do substituto tributário. Este é quem detém não só o poder financeiro no
momento em que ocorre o facto tributário gerador do dívida tributária, mas o poder de,
cumprindo a obrigação que a lei lhe comete – a obrigação de reter o tributo devido e
entregá-lo ao credor, o sujeito activo tributário, – não originar a dívida tributária. Só
assim não se premeia a má conduta do substituto tributário.
Temos, assim, três grupos de responsáveis subsidiários tributários, que o
legislador identificou pelas suas características funcionais e de comportamento, a saber:
i) Os membros dos órgãos sociais das pessoas colectivas ou entes fiscalmente
equiparados – administradores, gestores de facto, directores, gerentes, fiscais – e
os respectivos responsáveis técnicos pela observância da legalidade fiscal e
contabilística – revisores oficiais de contas e técnicos oficiais de contas (art. 24º
da LGT), quando por culpa sua o devedor principal não possua suficientes bens
para pagar a dívida tributária ou quando lhes seja imputável o não pagamento ou
entrega do imposto em dívida;
ii) Os titulares dos estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada (art.
25º da LGT), quando a sua actividade tenha gerado a insolvência do
estabelecimento, contanto que não tenham respeitado o princípio da separação
de patrimónios; e,
iii) Os substitutos ou os substituídos tributários (art. 28º da LGT).

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 23

3.1.3. O âmbito objectivo da responsabilidade subsidiária tributária

Procuraremos neste ponto saber o quê tributário pelo qual os sujeitos referidos
no ponto anterior são responsáveis, em regime subsidiário, seguindo a mesma ordem de
enumeração acima utilizada.
Assim:
Quanto aos “administradores, directores e gerentes e outras pessoas que
exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão” das
“pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados”, quanto aos “membros dos
órgãos de fiscalização e revisores oficiais de contas nas pessoas colectivas onde os
houver” e quanto aos “técnicos oficiais de contas”, todos eles respondem
subsidiariamente pelas
a) Dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de
exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha terminado
depois deste, ou
b) Dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha
terminado no período do exercício do seu cargo.
É o que resulta da leitura conjugada do art. 24º, nº 1, alíneas a) e b), nº 2 e nº 3,
da LGT, pois que tanto o nº 2 como o nº 3 se referem à “responsabilidade prevista
neste artigo”.
Nos termos do art. 25º da LGT, o titular de estabelecimento individual de
responsabilidade limitada responde subsidiariamente por todas as dívidas fiscais do
estabelecimento falido, se acumulava a titularidade com a gerência ou administração do
estabelecimento quando ocorreu o facto constitutivo da dívida tributária ou, se nesse
período, ou depois deste, se venceu ou deveria ser entregue o tributo em dívida.
Já quanto ao substituto tributário, quando a retenção a que esteja obrigado for
efectuada meramente a título de pagamento por conta do imposto devido a final,
responde subsidiariamente pelo imposto não retido e, ainda, conforme o art. 28º, nº 2, da
LGT, pelos “juros compensatórios devidos desde o termo do prazo de entrega até ao
termo do prazo para apresentação da declaração pelo responsável originário (o
substituído) ou até à data da entrega do imposto retido, se anterior”.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 24

Por último, nos termos do art. 28º, nº 3, nos restantes casos de substituição
tributária, é o substituído tributário que responde subsidiariamente pelo pagamento da
diferença entre as importâncias que o substituto tributário devia ter deduzido e as que
efectivamente o foram.

3.1.4. Síntese

Em resultado do que ficou escrito nos pontos acima sobre a origem legal da
figura do responsável subsidiário tributário, sobre quem responde subsidiariamente e
face a quem existe essa subsidiariedade, sobre o porquê e o quê tributário que conduzem
ao estatuto, a responsabilidade subsidiária tributária poderá apresentar-se
sintetizadamente esquematizada deste modo:

LGT art. 24º art. 25º, nº 2 art. 28º, nº 2 e nº 3


Administradores, Membros Técnicos Titulares de Substituto Substituído
Quem responde subsidiariamente?

directores e dos órgãos oficiais estabelecimentos tributário tributário


gerentes e outras de de individuais de
pessoas que fiscalização contas responsabilidade
exerçam, ainda e revisores limitada
que somente de oficiais de
facto, funções de contas
administração ou
gestão

Pessoas colectivas e entes fiscalmente Estabelecimentos Substituído Substituto


Face a?

equiparados individuais de tributário tributário


responsabilidade
limitada
a) tiver sido por culpa sua que o em caso de em caso de em caso de
património se tornou insuficiente para a falência por causa não não retenção
satisfação das dívidas tributárias, ou relacionada com a retenção a nos restantes
b) se a falta de pagamento ou entrega actividade do seu título de casos de
Porquê?

dentro do prazo legal lhes foi imputável titular, salvo se pagamento substituição
este respeitou o por conta tributária
princípio da do imposto
separação devido a
patrimonial final

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a) dívidas tributárias cujo facto todas as dívidas imposto imposto não


constitutivo se tenha verificado no tributárias não retido retido
período do exercício do seu cargo ou relativas ao e juros
O quê?

cujo prazo legal de pagamento ou período de


entrega tenha terminado depois deste, ou gerência do titular
b) dívidas tributárias cujo prazo legal de
pagamento ou entrega tenha terminado
no período do exercício do seu cargo

3.2. A natureza jurídica da responsabilidade subsidiária tributária

A qualificação da natureza jurídica da responsabilidade subsidiária tributária


sempre suscitou dificuldades e originou opiniões diferentes.
Não é, no plano das “repercussões lógicas e metódicas” 27, indiferente a escolha
de uma ou outra qualificação.
São três as mais importantes linhas de pensamento sobre a figura da
responsabilidade subsidiária tributária e que, sucintamente, a identificam com28:
1. Uma fiança legal;
2. Uma outra forma de responsabilidade civil extracontratual;
3. Um tertium genus ou uma figura típica, exclusiva do Direito Fiscal.

FIANÇA LEGAL? – Alguns autores, e certa jurisprudência, consideram que a


posição do responsável subsidiário tributário na relação jurídica tributária é equivalente
à posição do fiador nas obrigações civis, e que exerce, enfim, uma função análoga à da
garantia.
Foi nesse sentido, por exemplo, que o STA definiu a figura do responsável
tributário que, embora específica do Direito Fiscal, “tem por fins tornar mais fácil e
mais segura a cobrança do imposto exequendo”29.
Na mesma linha vai um reputado autor30, o qual, sob o título “As garantias do
crédito tributário – Generalidades”, ensina que “Num sentido muito geral pode

27
Cf. PAULO DE PITTA E CUNHA e JORGE COSTA SANTOS, Responsabilidade Tributária ..., cit.,
pp. 26.
28
Idem, idem.
29
Acórdão de 24-04-90, Processo nº 012124, Sumário, ponto VI, http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/, (23-01-
2006)

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 26

entender-se por garantia qualquer forma ou modo de assegurar a efectividade do


crédito”, para numas linha mais à frente, no elenco das garantias afirmar “Existe
também (...) a responsabilidade solidária ou subsidiária dos responsáveis tributários
em termos largamente comuns com o Direito civil”.
Ainda no mesmo trajecto ideológico, outro autor31, referindo-se às garantias
especiais de cumprimento da obrigação tributária e, dentro destas, às garantias pessoais,
escreve: “No domínio fiscal, encontramos em primeiro lugar a chamada fiança legal,
resultante directamente da lei, de que é exemplo a responsabilidade fiscal dos membros
dos órgãos de gestão e fiscalização das pessoas colectivas, dos revisores oficiais de
contas e dos técnicos oficiais de contas, casos em que a responsabilidade é apenas
subsidiária”.
Temos, assim, que o que estaria essencialmente em causa com a figura do
responsável subsidiário tributário seria, sob este ponto de vista, um reforço da
cobrabilidade da dívida tributária.
Estaríamos, afinal, perante um expediente legal que faria acrescer ao sujeito
passivo, responsável principal pela dívida tributária, um certo número de fontes
devedoras do tributo e, portanto, de garantias potenciais do bom pagamento da dívida
tributária.
Ora, o instituto da fiança supõe, mesmo sendo imposta por lei, que estejam
preenchidas certas características comuns às fianças convencionais ou voluntárias e aos
fiadores, seja a determinabilidade, seja a disponibilidade da obrigação.
Não nos parece que tal se verifique.
Desde logo, a indeterminabilidade do objecto da fiança, pelo facto de garantir
obrigações futuras, e a indisponibilidade da relação jurídica tributária, que não permite,
por exemplo, que o credor exija um reforço da garantia, constituem sérias dificuldades
para admitir a sua validade32.

30
Cf. DIOGO LEITE DE CAMPOS e MÓNICA HORTA NEVES LEITE DE CAMPOS, Direito
Tributário, 2º Edição, reimpressão – Almedina, 2005, pág. 425.
31
Cf. MANUEL HENRIQUE DE FREITAS PEREIRA – Fiscalidade – Almedina, 2005, pág. 267.
32
Como ensina MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, cit., pág. 829 e ss.

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Acresce que o responsável subsidiário tributário é não só aquele que tem uma
determinada relação com o sujeito passivo e devedor principal mas, sobretudo, aquele
que tendo essa relação tem um comportamento censurável, do qual terá resultado,
directa ou indirectamente, a dívida tributária.
Por outras palavras, exemplificando, não é responsável subsidiário tributário
quem exerce um cargo de administrador do ente devedor tributário, mas quem,
exercendo esse cargo de administrador, não fez tudo o que lhe competia fazer para que a
administrada cumprisse com as suas obrigações tributárias.
Esta é uma flagrante diferença entre esta figura inscrita no Direito Fiscal e o
instituto da fiança, já que o fiador responderá sempre pela dívida, independentemente do
contributo, maior, menor, ou nenhum, que tenha dado para a não cumprimento da
obrigação.
Assim, reconhecendo-lhe algumas identidades, não subscrevemos a teoria de que
a responsabilidade subsidiária tributária é uma “espécie” de fiança legal.

RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL? – Há quem


defenda que a responsabilidade subsidiária tributária “convoca os pressupostos da
responsabilidade civil por factos ilícitos”33, porque nela se vê
i) uma conduta de alguém,
ii) a ilicitude nessa conduta,
iii) a existência de dolo ou de mera culpa na conduta, ou imputabilidade,
iv) o dano e, finalmente,
v) o nexo de causalidade entre o dano e a conduta.
Estariam, assim, reunidos os cinco pressupostos da responsabilidade civil por
factos ilícitos, geradores da obrigação, por parte do responsável, de reparar o dano.
Também aqui, embora não ignorando as similitudes, não acompanhamos a teoria
de que a responsabilidade subsidiária tributária seja uma outra forma de
responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana, não só porque, na responsabilidade
subsidiária tributária estamos perante dívidas e não perante danos, dívidas que

33
Cf. ABÌLIO MORGADO, Responsabilidade Tributária: Ensaio sobre o Regime do art. 24º da Lei
Geral Tributária, CTF, nº 415, Janeiro – Junho de 2005, pág. 79.

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continuam a ser do responsável principal, mas ainda porque estamos perante uma
obrigação de pagar uma dívida, e não uma obrigação de indemnizar.

FIGURA EXCLUSIVA DO DIREITO FISCAL? – Num sentido diverso, autores


há que defendem a existência de uma conexão entre a responsabilidade tributária e o
incumprimento do devedor originário, que vêem na responsabilidade tributária uma
certa função de garantia e uma subordinação, uma função preventiva ou de dissuasão de
certos comportamentos e, assim, a responsabilidade subsidiária tributária deveria a sua
existência “também, algumas vezes, a um fim repressivo, de punição de
irregularidades”34, o que se justificará “tendo em conta a importância do interesse
juridicamente protegido através do crédito tributário (a sustentação da despesa
pública, que se alimenta em grande medida com a receita tributária)”35.
Sem embargo dos pontos de contacto que o instituto da responsabilidade
subsidiária tributária tem com as figuras antes referidas da fiança e da responsabilidade
civil extracontratual ou por factos ilícitos, esta “figura própria do Direito Tributário”
apresenta características que são próprias do ramo do Direito onde se insere, “tais como
as revela a legislação fiscal”36.
Nessa caracterização da responsabilidade tributária surge, na primeira linha, a
sua inclusão no art. 18º da LGT e a sua qualificação como “sujeito passivo” da relação
tributária, como parte na relação jurídica tributária, embora não aquele sobre quem
incide um imposto, mas alguém que “se encontra obrigado, por estar nessa relação
jurídico-tributária, a um determinado comportamento”37, pelo que aquela
responsabilidade tem “um carácter marcadamente sancionatório”38.
O responsável subsidiário tributário é alguém que, porque a lei assim o
determina, está virtualmente obrigado a responder pelas dívidas tributárias de outrem, o
contribuinte principal.

34
Cf. SOARES MARTINEZ, Direito Fiscal, 10ª Edição (Reimpressão), Almedina, 2003, pág. 251.
35
Cf. JAVIER GALÁN RUIZ, La Responsabilidad Tributaria, Editorial Aranzadi, Navarra, 2005, pág.
45
36
Cf. SOARES MARTINEZ, Direito Fiscal, cit., pág. 253.
37
Cf. J.L.SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, cit., pág. 136.
38
Idem, idem, pág. 152.

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Recorda-se aqui a doutrina que “decompõe a obrigação em dois elementos


distintos: o débito (Schuld; debitum) e a responsabilidade (Haftung; obligatio). O
primeiro consiste no dever de prestar, na necessidade de observar determinado
comportamento; o segundo, na sujeição dos bens do devedor ou do terceiro aos fins
próprios da execução, ou melhor, na relação de sujeição que pode ter por objecto,
tanto a pessoa do devedor (antigo direito romano), como uma coisa ou complexo de
coisas do devedor ou do terceiro”39.
O responsável subsidiário tributário, para o ser, ocupa uma das posições relativas
ao contribuinte fixadas na lei, – titular e actor de facto dos órgãos de gestão e de
fiscalização das pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados, incluindo os não
titulares mas gestores apenas de facto, responsáveis técnicos (Revisores Oficiais de
Contas e Técnicos Oficiais de Contas), titulares gerentes de estabelecimentos
individuais de responsabilidade limitada e os substitutos tributários – e há-de ter um
comportamento lesivo dos interesses da administração fiscal, leia-se do interesse
público, porque desse comportamento terá resultado terem ficado por cumprir, pelo
sujeito passivo principal, dívidas tributárias.
O responsável subsidiário tributário, sendo-o, está investido numa posição
jurídica tributária de que não pode dispor e à qual não pode renunciar, posição que, no
nosso entendimento, nasce com o facto tributário que origina, para si e para o
responsável principal, a constituição da relação jurídica tributária. Diferente é o
momento em que nasce a obrigação de pagar – “El nacimiento de la responsabilidad no
supone que el responsable se convierta en obligado de pago”40.
Por esta mesma razão, na pessoa do responsável subsidiário tributário se devem
repercutir os efeitos da caducidade e da prescrição, enquanto limites temporais do
exercício dos direitos e deveres tributários, contanto que ao seu conhecimento sejam
levados todos os actos processuais.
Do mesmo modo, o responsável subsidiário tributário deve ser parte, desde o
primeiro momento e do primeiro acto, em todos os procedimentos tributários de

39
Cf. JOÃO DE MATOS ANTUNES VARELA, Das Obrigações em geral, Volume I, 10ª Edição,
Revista e Actualizada, Reimpressão, Almedina, 2003, pág. 143 ss.
40
Cf. JAVIER GALÁN RUIZ, La Responsabilidad Tributaria, cit., pág. 234.

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iniciativa da administração fiscal, pois só assim lhe será facultado o conhecimento da


situação e o exercício dos meios legais de defesa.
É, principalmente, do modo como exerce a sua função, que o responsável
subsidiário se afasta ou aproxima da efectivação dessa responsabilidade e do seu
chamamento subsidiário.
Como muito bem dizia a então Direcção Geral das Contribuições e Impostos,
através da Direcção dos Serviços de Justiça Tributária, referindo-se à responsabilidade
subsidiária dos gerentes ou administradores das pessoas colectivas, esta
responsabilidade “afere-se em função de uma interpretação pessoal dos actos sociais e
fundamenta-se numa culpa orgânica e funcional, porquanto são eles os elementos
representativos das sociedades, os quais exteriorizam a vontade das mesmas nos mais
diversos negócios jurídicos realizados”41.
As medidas legalmente impostas aos responsáveis subsidiários tributários, de
uma responsabilização patrimonial potencialmente ilimitada, pretendem ter um efeito
dissuasor dos comportamentos lesivos referidos.
Nesta medida, o instituto da responsabilidade subsidiária tributária reforça as
garantias de cobrabilidade dos créditos tributários.
A figura do responsável subsidiário louva-se nas normas do Direito Fiscal, tem a
tipicidade deste ramo do Direito e não encontra paralelo noutras figuras de outros ramos
do Direito.

41
Ofício-Circulado nº 1675, de 17/04/1995, Direcção de Serviços de Justiça Tributária,
http://www.dgci.min-financas.pt/dgciappl/informacaoDGCI.nsf/ , (23-01-2006).

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4. A efectivação da responsabilidade subsidiária tributária

4.1. Condições para a sua efectivação

As condições para a efectivação da responsabilidade subsidiária são as que estão


fixadas no art. 23º da LGT, o qual, pela sua importância se transcreve (com sublinhados
nossos):
“1 – A responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução
fiscal.
2 – A reversão contra responsável subsidiário depende da fundada insuficiência de
bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do
benefício da excussão.
3 – Caso, no momento da reversão, não seja possível determinar a suficiência dos
bens penhorados por não estar definido com precisão o montante a pagar pelo
responsável subsidiário, o processo de execução fiscal fica suspenso desde o termo do
prazo da oposição até à completa excussão do património do executado, sem prejuízo
da possibilidade de adopção das medidas cautelares adequadas nos termos da lei.
4 – A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição
do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada
dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação.
5 – O responsável subsidiário fica isento de juros de mora e de custas se, citado para
cumprir a dívida tributária principal, efectuar o respectivo pagamento no prazo de
oposição.
6 – O disposto no artigo anterior não prejudica a manutenção da obrigação do
devedor principal ou do responsável solidário de pagarem os juros de mora e as
custas, no caso de lhe virem a ser encontrados bens. ”
Tendo em conta que o nº 1 do artigo acabado de transcrever se refere ao
processo de execução, é igualmente importante ter presente o que, nesta sede, respeita
ao responsável subsidiário tributário. Diz o art. 153º, nº 2 do CPPT (com sublinhados
nossos):
“O chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação de
qualquer das seguintes circunstâncias:

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a) Inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores;


b) Fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora
e outros de que o órgão de execução fiscal disponha, do património do devedor para a
satisfação da dívida exequenda e acrescido.”
A análise ao art. 23º da LGT, bem como da norma do CPPT referida, far-se-á de
seguida tendo como referência os sublinhados do artigo da LGT acima transcrito.
Antes, porém, reafirma-se o nosso conceito de que a responsabilidade
subsidiária não nasce no momento da reversão. Este é, apenas, o momento em que
aquela se efectiva, que surge a obrigação de pagar.
A responsabilidade subsidiária tributária existe na medida em que se verifiquem,
na pessoa do responsável subsidiário, as características funcionais referidas em 3.1.2,
cessando quando cessar para o devedor principal a correspondente responsabilidade
tributária originária.

4.1.1. A reversão do processo de execução fiscal

A reversão do processo de execução fiscal42 contra a pessoa de algum ou de


alguns dos responsáveis subsidiários é o seu chamamento, leia-se o chamamento do seu
património, a esse processo de execução.
A reversão é o início do procedimento de efectivação da responsabilidade
subsidiária tributária.
Nem a LGT nem o CPPT impõem o chamamento de todos os responsáveis
subsidiários43,44, por certo porque há solidariedade na responsabilidade entre si, mas
fixam as condições para que tal medida possa ser accionada.

42
Para RUI DUARTE MORAIS – A Execução fiscal – Almedina, 2005, pág. 38, o processo de execução
fiscal é “um processo especial de execução para pagamento de quantia certa (uma das modalidades que
a execução pode revestir de acordo com o critério da pretensão) em que se busca, através do produto da
venda dos bens que pertencem ao devedor ou através da sua entrega a este, obter a realização da
prestação devida, uma execução por equivalente portanto”.
43
Ao contrário do que defende SOARES MARTINEZ. Direito Fiscal, cit., pág. 448.
44
Ainda que o art. 160º, nº 1, do CPPT determine que o “órgão de execução fiscal mandá-los-á citar
todos”, o nº 2 do mesmos art. 160º não estabeleça nenhuma cominação se assim não for, já que “a falta
de citação de qualquer dos responsáveis não prejudica o andamento da execução contra os restantes”.

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Tais condições, sempre estabelecidas por lei, ligam-se à natureza subsidiária da


responsabilidade, – o que quer dizer que só depois de se dirigir sem sucesso ao devedor
principal é que o credor tributário pode chamar o responsável subsidiário, – à prova da
culpabilidade da actuação do titular da responsabilidade tributária – nos casos em que
esse ónus lhe cabe – e, ainda, ao integral respeito pelos princípios procedimentais de
defesa e de garantias pessoais dos administrados.

4.1.2. Fundada insuficiência de bens do devedor principal

Para que a reversão do processo de execução se possa efectivar contra a pessoa


do responsável subsidiário, é necessário que, de modo fundado, se prove que os bens do
devedor principal são insuficientes.
O primeiro problema que este dispositivo suscita é o do preenchimento do
conceito indeterminado “fundada insuficiência”, e o segundo problema, mais simples de
resolver, é o de saber a quem cabe o ónus de demonstrar, fundadamente, a insuficiência.
Esta última questão fica desde já respondida com a nossa opinião de que é à
administração fiscal que cabe o ónus de provar a insuficiência de bens do devedor
principal, devendo fazê-lo fundadamente.
Quanto à primeira questão, pode basicamente dizer-se que “insuficiência” é a
qualidade do que não é bastante, do que não tem quantidade suficiente.
Ora, no nosso caso, assim sendo, o apuramento da suficiência quantitativa só
pode resultar da elementar operação aritmética de subtrair, ao valor total dos bens do
devedor principal, o valor total da dívida tributária. Se o resultado for igual ou superior
a zero, concluir-se-á pela suficiência; se o resultado da operação for negativo estamos
perante uma insuficiência.
Por outras palavras, a insuficiência existe quando o valor total da dívida
tributária for superior ao valor total dos bens do devedor principal.
Este raciocínio tem uma expressão mais reduzida que é existência de óbvia e
“fundada insuficiência” quando existe dívida tributária e inexistem bens penhoráveis do
devedor principal e seus sucessores – solução prevista pelo legislador no art. 153º, nº 2,
a) do CPPT.

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Do exposto resulta que, para se apurar e fundar a “insuficiência”, são necessárias


duas prévias operações de apuramento de valores totais:
i) O quantum da dívida tributária exequenda, que inclui os acrescidos, questão a
tratar no ponto 4.1.4 – Fixação do exigível, e
ii) o quantum dos bens do devedor principal, que tendo em conta o disposto no
art. 153º, nº 2, do CPPT, se trata aqui de bens penhoráveis.
Não havendo a possibilidade de apurar com rigor um ou outro dos valores
referidos, não é possível conhecer a “fundada insuficiência” e, portanto, não seria
admissível a reversão do processo de execução contra o responsável subsidiário
tributário.
Porém, estranhamente, o legislador admite que, mesmo não estando apurados
com rigor os valores que permitirão fundar a insuficiência de bens penhoráveis, ainda
assim, a reversão se possa efectivar.
Para tanto, tendo presente o disposto no nº 3 do art. 23º da LGT, havendo
dúvidas quanto ao montante a pagar pelo responsável subsidiário, o legislador abre
portas à sustação da reversão.
Uma nova questão que esta norma coloca é a de saber qual o seu sentido e
alcance.
Podendo suspender-se todas as reversões, porque no momento do seu
accionamento dificilmente se saberá com precisão o grau da insuficiência, estaríamos
perante um processo que seria em tudo semelhante a um procedimento cautelar e não,
como consideramos que deva ser, um processo de chamamento ao cumprimento
subsidiário de um responsável, em resultado do incumprimento do responsável
principal.
Para que a reversão do processo seja não um procedimento cautelar mas um
expediente de coercibilidade, para garantir o pagamento de uma dívida pelo responsável
subsidiário, porque o devedor originário não tem meios de garantir o pagamento,
sentido que é o próprio da subsidiariedade da responsabilidade, então “a dúvida quanto

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 35

ao montante a pagar pelo responsável subsidiário é uma dúvida residual”45, mas na


certeza de há algo a pagar.
Assim, a certeza ou uma forte e fundada probabilidade de insuficiência de bens
penhoráveis do devedor principal, permitirá a efectivação da reversão da execução
contra o responsável subsidiário tributário, ainda que à reversão da execução se possa
seguir a sustação da execução.
Não pode passar sem uma nota de crítica esta manifestação de desrespeito pelos
direitos do responsável subsidiário, o qual, a menos que preste uma garantia idónea,
verá os seus bens penhorados, sem que verdadeiramente saiba por quanto tempo e por
que valor é responsável, situação que é de questionável constitucionalidade.

4.1.3. O benefício da excussão prévia e o direito de ressarcimento

O benefício da excussão prévia é o modo pelo qual se concretiza a


subsidiariedade da obrigação subsidiária e consiste no direito que pertence ao obrigado
subsidiário de “recusar o cumprimento enquanto não estiverem excutidos todos os bens
do devedor principal; e, inclusive, depois dessa excussão, se provar que o crédito não
foi satisfeito por culpa do credor (art. 638º, no 1 e 2)” do CC46.
Só depois de excutido todo o património do devedor principal47, o responsável
subsidiário conhecerá a diferença pela qual se tornará devedor.
Só este caminho evitará a penhora, por tempo indeterminado e, muito
provavelmente, por valor superior ao necessário, dos bens do responsável subsidiário.
O mesmo é dizer que a faculdade de reverter a execução contra o responsável
subsidiário, antes da prévia excussão dos bens do responsável principal, corresponderia
a uma derrogação daquele benefício que o art. 23º, nº 2, da LGT expressamente
concede.
Um benefício que a lei concede não pode, no terreno da prática tributária, ser
revogado. Tal prática violaria os deveres fundamentais a que a administração tributária

45
Cf. TÂNIA MEIRELES DA CUNHA – O Momento da Reversão da Execução Fiscal Contra os
Responsáveis Subsidiários – CTF, nº 416, Julho – Dezembro de 2005, PÁG. 147.
46
Cf. MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, cit., pág. 833.
47
Deve entender-se que nos estamos a referir sempre, também, à excussão prévia dos bens dos eventuais
responsáveis solidários.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 36

está obrigada pela CRP (art. 188º, nº 2 e art. 266º, nº 2) e que o art. 55º da LGT, sob a
epígrafe “Princípios do procedimento tributário”, consagra nos seguintes termos: “A
administração tributária exerce as suas atribuições na prossecução do interesse
público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da
proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas
garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários” (sublinhado nosso).
Entre os princípios enunciados encontra-se “o princípio da proporcionalidade
lato sensu ou princípio da proibição do excesso, nos diversos aspectos ou subprincípios
em que o mesmo se desdobra, a saber, o princípio da necessidade, exigibilidade ou
indispensabilidade, o princípio da adequação ou aptidão e o princípio da
proporcionalidade stricto sensu ou da justa medida”48.
De acordo com o princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso, ao
responsável subsidiário deve impor-se, de entre os vários caminhos disponíveis para
prosseguir o interesse público, o menos penoso, o que lhe provoque menor sacrifício.
De todos os pagamentos que o responsável subsidiário haja feito, este há-de
poder ressarcir-se.
Também neste domínio, não seria indiferente a qualificação da natureza jurídica
da responsabilidade subsidiária tributária.
Com efeito, se a responsabilidade subsidiária tributária fosse um tipo de fiança
legal, o fiador que cumprisse a obrigação que cabia ao devedor principal ficaria sub-
rogado nos direitos do credor, na medida em que estes fossem por ele satisfeitos, tal
como estabelecido no art. 644º do CC.
Aliás, a sub-rogação está prevista no CPPT (art. 91º e ss.), apenas para o
pagamento voluntário por terceiro, antes de instaurada a execução, e será admitida se o
devedor autorizar ou se o Chefe do Serviço de Finanças competente reconhecer o
interesse legítimo do terceiro.
É, pois, de excluir que os responsáveis subsidiários possam aproveitar daquela
previsão e ficar sub-rogados nos direitos da Fazenda Pública. “Com efeito, tal sub-

48
Cf. JOSÉ CASALTA NABAIS – O Dever Fundamental de Pagar Impostos, Almedina, 2004, pág.
145.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 37

rogação será um estímulo ao pagamento voluntário por terceiro dos impostos.


Pagamento voluntário dos impostos que aqui não se verifica”49.
Porém, se a responsabilidade subsidiária tributária fosse uma outra forma de
responsabilidade civil extracontratual, o responsável subsidiário tributário teria, sobre o
responsável principal, o direito de regresso na medida das respectivas culpas e das
consequências que delas adviessem, como previsto no art. 497º, nº 2, do CC.
Ora, a LGT é omissa quanto ao direito de ressarcimento do responsável
subsidiário, seja porque se deva considerar que este, quando chamado ao pagamento,
suporta a carga tributária a título definitivo, seja porque essa é uma questão a apreciar
nas relações entre credor e devedor50, ou seja porque, a haver um direito de
ressarcimento face a um devedor principal sem bens penhoráveis ou bens fundadamente
insuficientes, “ese derecho puede considerarse vacío de contenido”51.

4.1.4. Fixação do exigível

Como referimos no supra ponto 4.1.2, o quantum da insuficiência dos bens do


devedor principal para satisfação das suas dívidas tributárias, que justifica e de que
depende a reversão do processo de execução fiscal contra o responsável subsidiário, só
pode ser determinado quando o exigível estiver fixado.
Porque o pagamento que o responsável subsidiário é chamado a fazer é, ele
próprio, por definição, subsidiário, “torna-se necessário fixar as quantias exigíveis;
porque não respondem «in solidum», ao contrário do que acontece com os responsáveis
solidários, relativamente aos quais não interessa fixar tais quantias, porque a sua
responsabilidade respeita a toda a dívida tributária, na sua totalidade”52.
O responsável subsidiário é, pois, obrigado a responder apenas pelo que falta
pagar, sendo que o que falta pagar é tanto quanto o devedor principal deixou por

49
Cf. DIOGO LEITE DE CAMPOS e MÓNICA HORTA NEVES LEITE DE CAMPOS – Direito
Tributário, cit., pág. 393.
50
Cf. PAULO DE PITTA E CUNHA e JORGE COSTA SANTOS – Responsabilidade Tributária dos
Administradores ou Gerentes – cit., pág.100.
51
Cf. JAVIER GALÁN RUIZ, La Responsabilidad Tributaria, cit., pág. 34
52
Cf. SOARES MARTINEZ, Direito Fiscal, cit., pág. 253

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 38

cumprir, porque manifestamente eram insuficientes os meios de que dispunha para


cumprir totalmente.

4.1.5. A presunção legal de culpa e o ónus da prova

Uma primeira nota introdutória é devida para referir que a presunção legal é,
como nos diz o art. 349º do CC, a ilação que a lei tira de um facto conhecido para firmar
um desconhecido.
De acordo com o art. 350º do mesmo diploma, quem tem a seu favor a
presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz, podendo, porém, as
presunções ser ilididas mediante prova em contrário (presunções juris tantum), a menos
que a lei o proíba (presunções juris et de jure).
O art. 73º da LGT vem esclarecer que “as presunções consagradas nas normas
de incidência tributária admitem sempre prova em contrário”, o que significa,
portanto que nenhuma das presunções legais a que nos iremos referir são inilidíveis.
Uma segunda nota introdutória servirá para transcrever o art. 74º, nº 1, da LGT,
no qual se pode ler: “O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da
administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque, excepto
nas situações de não sujeição, em que recai sempre sobre os contribuintes”53.
Como vimos antes, a responsabilidade subsidiária tributária é fixada pela lei em
certas pessoas, que exercem certas funções e que se identificam com certos
comportamentos.
Vimos, também, que poderíamos agrupar essas pessoas, mediante as suas
características funcionais e comportamentais, em três:
1. Os membros dos órgãos sociais das pessoas colectivas ou entes fiscalmente
equiparados – administradores, gestores de facto, directores, gerentes, fiscais – e
os respectivos responsáveis técnicos pela observância da legalidade fiscal e
contabilística – revisores oficiais de contas e técnicos oficiais de contas (art. 24º
da LGT);

53
O texto sublinhado foi introduzido pela Lei nº 55-B/2004, de 30 de Dezembro.

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2. Os titulares dos estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada (art.


25º da LGT), e
3. Os substitutos e os substituídos tributários (art. 28º da LGT).

I
Para os primeiros sujeitos referidos, recorde-se, o art. 24º da LGT estabelece a
responsabilidade subsidiária em duas situações de “comportamento funcional”:
i) Quando, em qualquer dos casos54, tiver sido por culpa sua que o
património da pessoa colectiva ou do ente fiscalmente equiparado
se tornou insuficiente para a satisfação das dívidas tributárias; ou
ii) Quando não provem que não lhes foi imputável a falta de
pagamento das dívidas tributárias55.
O que importa aqui saber é a quem cabe fazer a prova dos comportamentos
tipificados e saber quais os casos em que há a presunção legal de culpabilidade.
A letra da lei não oferece grandes dificuldades de interpretação sobre a quem
está cometido o encargo da prova de culpa ou da prova de não culpa (ou prova em
contrário), esta a fazer nos casos de presunção legal de culpa, presunções que aqui são
ilidíveis.
Assim, na situação i), cabe à administração fiscal a prova de que foi por culpa
dos responsáveis subsidiários que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente
equiparado se tornou insuficiente para satisfação das dívidas tributárias cujo facto
constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal
de pagamento ou de entrega tenha terminado depois deste.
É de admitir uma grande dificuldade na tarefa que está atribuída à administração
fiscal, de provar a culpa na situação referida, seja porque os meios da administração
fiscal são normalmente escassos, seja porque, principalmente, as dificuldades
económicas dos devedores principais (pessoas colectivas ou entes fiscalmente

54
Os casos são dois:
1. Dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu
cargo.
2. Dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois do
período de exercício do seu cargo.
55
Neste caso trata-se das dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado
no período do exercício do seu cargo.

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equiparados) e a escassez de bens para a satisfação das obrigações não têm que ser
sempre, necessariamente, um resultado duma gestão ou duma fiscalização pouco
criteriosa.
Pode adivinhar-se que a reversão do processo de execução fiscal, nos casos em
que cabe à administração fiscal o ónus de provar a culpa funcional, se verifique, apenas,
nos casos de “flagrante” e grosseira intenção de escapar ao pagamento da dívida
tributária.
É também adivinhável que, nesta hipótese, os responsáveis tributários se tenham
prevenido através da adequada e preventiva protecção do seu património pessoal.
Quanto à situação ii) cabe aos responsáveis subsidiários o ónus de ilidirem a
presunção de culpa, juris tantum, que está estatuída a favor da administração fiscal.
Tal como referiu o STA, “ – a Administração, beneficiária da presunção, está
dispensada de alegar e provar os factos integradores dessa culpa, de acordo com o art.
350º nº 1 do Código Civil; - o responsável subsidiário, onerado pela mesma presunção,
para se exonerar da responsabilidade deve provar a ausência de culpa sua na oposição
à execução”56.
Portanto, os responsáveis subsidiários tributários referidos, que não quiserem ver
o seu património atacado, em resultado da reversão contra si do processo de execução
fiscal, terão de provar que não lhes foi imputável a falta de pagamento das dívidas
tributárias das pessoas colectivas ou dos entes fiscalmente equiparáveis, cujo prazo legal
de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo.
Esta é uma norma que suscita sérias dúvidas quanto à sua constitucionalidade,
matéria que abordaremos infra, no ponto 5, como se pode revelar de enorme dificuldade
a prova negativa, a prova da não culpa, que a norma impõe ao responsável subsidiário
tributário.
Acresce que esta disposição do art. 24º, nº 1 b), da LGT traduz, quanto ao ónus
da prova, um inexplicado desvio do regime estabelecido para a responsabilidade dos
titulares do órgãos de administração das sociedades comercias para com os credores
sociais que, nos termos do art. 78º, nº 1, do CSC, aqui se recorda:

56
Acórdão de 11-01-2006, Processo nº 0717/05, http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/, (23-01-2006).

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“Os gerentes ou administradores respondem para com os credores da


sociedade quando, pela inobservância culposa das disposições legais ou contratuais
destinadas à protecção destes, o património social se torne insuficiente para a
satisfação dos respectivos créditos”57.
Pode argumentar-se a favor do regime previsto na LGT referindo a
subsidiariedade da responsabilidade a qual, pelo benefício da excussão prévia, coloca o
responsável numa segunda linha de chamamento à responsabilidade, enquanto que esta
responsabilidade do CSC é solidária e, portanto, o responsável solidário está na primeira
linha do chamamento, ao lado da sociedade que é a responsável principal.
Porém, a diferença substancial entre os dois regimes, que é mais gravoso para o
responsável no primeiro do que no segundo, verifica-se exactamente na inversão do
ónus da prova.
Neste último, o regime da responsabilidade para com os credores sociais
estabelecido no CSC, o credor social que pretende invocar o direito de chamar à
responsabilidade qualquer dos titulares dos órgãos de administração da sociedade
devedora, terá o encargo de provar que o ou os chamados não só inobservaram as
disposições legais ou contratuais que destinadas a protegê-lo, como o fizeram com
culpa58.
No que respeita aos casos do chamamento à responsabilidade dos titulares dos
órgãos de fiscalização e dos revisores oficiais de contas e, ainda, dos técnicos oficiais de
contas, transcreve-se, pela sua clareza, perdoando-se-lhe a “aproximação” ao instituto
de responsabilidade civil extracontratual, a opinião escrita da Direcção de Serviços de
Justiça Tributária59 (os realçados são do próprio documento):
“1 – Quanto à responsabilidade tributária dos órgãos de fiscalização e dos
revisores oficiais de contas, prevista no nº 2 do art. 24º da LGT, ela decorre do
incumprimento das suas funções de fiscalização. No entanto, tal incumprimento tem
que ser culposo, quer por dolo ou por negligência, como decorre do nº 2 do mesmo
artigo, e afere-se também em função da culpa funcional dos mesmos.

57
De acordo com a nova redacção, introduzida pelo DL nº 76-A/2006, de 29 de Março.
58
Nos termos do art. 487º, nº 2, do CC, “A culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela
diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso”.
59
Ofício-Circulado nº 60043/2005, de 25 de Janeiro, http://www.dgci.min-
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2 – Assim, não basta qualquer incumprimento dos seu deveres de fiscalização


para que tenha lugar a responsabilidade subsidiária desses órgãos. É indispensável
que exista um nexo causal entre a sua actuação, que tem que ser ilícita, e o dano
resultante desse incumprimento. Inexistindo o referido nexo causal, não tem lugar a
responsabilidade subsidiária.
3 – Os requisitos dessa responsabilidade podem ser fundamentados por uma
gama muito ampla de elementos, como o relatório anual e a certificação legal de
contas elaborados pelos Revisores Oficiais de Contas, nos termos ao art. 452º do
Código das Sociedades Comerciais, informações, recomendações e advertências
prestadas à administração no exercício das suas funções de fiscalização, etc.
4 – Deste modo deverão os Chefes dos Serviços de Finanças fundamentar
sempre os seus despachos de reversão com os elementos concretos que tenham apurado
em face das averiguações, uma vez que o ónus da prova nestes casos compete à
Fazenda Pública.
5 – Em caso de inexistência de quaisquer indícios de incumprimento culposo
desses deveres de fiscalização, por falta dos elementos acima indicados, ou do nexo
causal entre estes e o incumprimento dos deveres tributários por parte das pessoas
colectivas ou entidades equiparadas, devem os serviços absterem-se de efectuar
reversões em execução fiscal contra esses órgãos de fiscalização.
6 – De igual modo podem ser responsáveis subsidiários os técnicos oficiais de
contas. Neste caso, deve a administração fiscal apurar e demonstrar uma conduta
dolosa da sua parte em violação dos seus deveres no âmbito da sua responsabilidade
pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de
declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos. Neste último caso
estamos perante um dever de atestação da verdade e regularidade dos documentos do
cliente e é uma resultante da própria função pública à semelhança do que se passa com
os revisores oficiais de contas.”
Resultaria, assim, que os membros dos órgãos de administração das pessoas
colectivas ou entes equiparados são os únicos dos responsáveis subsidiários referidos no
art. 24º da LGT que têm, contra si, a presunção legal de culpa e que, consequentemente,
têm a árdua tarefa de demonstrar o contrário.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 43

II
Para os segundos responsáveis subsidiários referidos, o art. 25º da LGT atribui-
lhes a responsabilidade subsidiária caso a insolvência do estabelecimento individual de
responsabilidade limitada se dever a causa relacionada com a actividade do seu titular,
salvo se este provar que, na sua gestão, observou devidamente o princípio da separação
patrimonial.
Também neste caso a letra da lei não suscita dúvidas de interpretação.
O legislador quer que a administração fiscal possa reverter a execução fiscal
contra o titular do estabelecimento individual de responsabilidade limitada nos casos em
que esta demonstre que a insolvência do estabelecimento se ficou a dever ao
comportamento do seu titular, tendo a administração fiscal a seu favor a presunção de
que esse titular não terá respeitado devidamente, como era sua obrigação, o princípio de
separação dos patrimónios.
Por seu turno, se o titular do estabelecimento individual de responsabilidade
tiver respeitado devidamente o princípio da separação dos patrimónios, o seu e o do
estabelecimento, demonstra-o e, assim, afasta do seu património o ataque que a
administração fiscal lhe dirigiu.
Esta repartição dos ónus de prova parece equilibrada.
No que toca ao responsável subsidiário, não nos parece que lhe caiba uma tarefa
ingrata e de difícil alcance, a menos que não tenha respeitado o princípio da separação
patrimonial, caso em que se justifica plenamente o seu chamamento ao pagamento das
dívidas tributárias, pois é certo que ele sabia (ou não podia ignorar) que a
responsabilidade do seu estabelecimento só seria “limitada” se não se misturassem os
patrimónios.

III
Quanto aos substitutos e substituídos, a responsabilização subsidiária de uns
relativamente aos outros depende apenas, como vimos acima, do tipo de retenção a que
estava obrigado o substituto e a presunção está estabelecida a favor da administração
fiscal.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 44

A uns e a outros caberá, pois, demonstrar que ou não tinham obrigação de reter o
imposto (substitutos) ou não têm a obrigação de pagar aquele imposto em dívida
(substituídos).
Dificilmente se compreenderia uma solução normativa diferente que não fosse a
da culpa presumida em ambos, excepto, como referimos supra no ponto 3.1.2, quanto ao
caso da substituição em sede do IRS incidente sobre os rendimentos do trabalho
dependente em que preferiríamos uma alteração do ordem de responsabilidades entre
substitutos e substituídos.

4.1.6. A prévia audição do responsável subsidiário e a declaração


fundamentada dos pressupostos e extensão

O nº 4 do art. 23º da LGT reúne em si e impõe à administração fiscal dois


deveres, – um dever de audiência prévia e um dever de fundamentação, – a que
correspondem dois direitos, – o direito de audição e o direito à fundamentação.
A CRP, no seu art. 267º, nº 5, consagra a “participação dos cidadãos na
formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito”, direito que o CPA
substantivou nos art. 8º, art. 59º, art. 100º e art. 117º.
O direito de audição traduz-se no direito dos contribuintes participarem no
procedimento administrativo, sobretudo quando os actos administrativos em que
culminam esses procedimentos podem produzir alterações na situação jurídica dos
respectivos destinatários, impondo deveres, sujeições ou sanções, ou causem prejuízos
ou, ainda, se extinguirem ou diminuírem direitos ou interesses legalmente protegidos.
Esse direito de participação exprime-se, principalmente, no direito de audição
prévia ao termo do procedimento, ou seja, à tomada da decisão.
Veja-se, a este propósito, o disposto no art. 60º da LGT, que estabelece o direito
de audição do contribuinte “antes da liquidação”, “antes do indeferimento total ou
parcial dos pedidos, reclamações, recursos ou petições”, “antes da revogação de
qualquer benefício ou acto administrativo em matéria fiscal”, “antes da decisão de
aplicação de métodos indirectos” e “antes da conclusão do relatório da inspecção
tributária”, assim se percebendo o alcance deste princípio da participação.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 45

O direito à fundamentação, que está intimamente associado ao direito à


notificação, também tem a sua consagração na CRP, em cujo art. 268º, nº 3 se lê “Os
actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista
na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou
interesses legalmente protegidos”.
O CPA, que se aplica supletivamente às relações jurídico-tributárias, por força
do art. 2, b) da LGT, e supletivamente ao procedimento tributário, nos termos do art. 2º
d) do CPPT, reafirmou este direito, fixando no art. 124º, nº 1, o dever de fundamentar os
actos administrativos que, total ou parcialmente:
“a) Neguem, extingam, restrinjam ou afectem por qualquer modo direitos ou
interesses legalmente protegidos, ou imponham ou agravem deveres, encargos ou
sanções;
b) Decidam reclamação ou recurso;
c) Decidam em contrário de pretensão ou oposição formulada por interessado,
ou de parecer, informação ou proposta oficial;
d) Decidam de modo diferente da prática habitualmente seguida na resolução
de casos semelhantes, ou na interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou
preceitos legais;
e) Impliquem revogação, modificação ou suspensão de acto administrativo
anterior”.
A fundamentação é nos termos do art. 125º, nº 1, do CPA, e do art. 77º da LGT,
a exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir
em mera declaração de concordância com os fundamentos constantes do procedimento e
que integrarão o acto decisório.
Por seu turno, o art. 125º, nº 2, do CPA faz equivaler à falta de fundamentação a
adopção de fundamentos que não sejam claros, congruentes e suficientes.
Socorrendo-nos do já referido Ofício-Circulado da Direcção de Serviços de
Justiça Tributária60, temos que “O Chefe do Serviço de Finanças deve proceder, mesmo
nos casos de presunção legal de culpa, à audição do eventual responsável subsidiário”,
notificando-o da proposta de decisão da reversão contra si do processo de execução

60
Ofício-Circulado nº 60043/2005, de 25 de Janeiro, http://www.dgci.min-financas.pt/
dgciappl/informacaodgci.nsf/, (23-01-2006)

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 46

fiscal, devendo esta proposta de decisão, tal como a decisão final, “ser devidamente
fundamentadas, nomeadamente no que respeita aos pressupostos da responsabilidade e
nos casos em que a sua prova compete à administração fiscal. A culpa pode ser
fundamentada com recurso a qualquer meio de prova em direito admitida,
designadamente, através da invocação da prática de qualquer um dos actos lesivos
elencados no art. 126-A do Código dos Processos Especiais de Recuperação da
Empresa e de Falência, aprovado pelo Decreto-Lei nº 132/93, de 23 de Abril ou dos
actos descritos no art. 186º, nº 2 do Código da Insolvência e da Recuperação de
Empresa, aprovado pelo Decreto-Lei nº 53/04, de 18 de Março, após a sua entrada em
vigor”.
Para que a notificação seja válida, torna-se necessário que, para além da decisão
– ou do sentido provável da decisão, no caso da audição prévia – e da fundamentação,
contenha a indicação dos meios de defesa e prazo para reagir contra o acto notificado –
ou de resposta, no caso de audição prévia, - bem como a indicação da entidade que o
praticou e se o fez no uso de delegação ou subdelegação de competências, tal como
estatui o art. 36º do CPPT.
As notificações de audiência prévias deverão conter ainda, conforme art. 101º, nº
2, do CPA, a indicação da hora e local onde o processo poderá ser consultado.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 47

5. O enquadramento constitucional

Ao longo do trabalho fomos fazendo algumas referências ao texto constitucional,


a certos princípios constitucionais e, também, à duvidosa constitucionalidade de
algumas disposições da LGT atinentes com o instituto da responsabilidade subsidiária
tributária.
Não deverá causar nenhuma surpresa que, sempre que estejam em causa as
relações entre os cidadãos e o Estado, melhor dizendo, entre os cidadãos e o poder do
Estado, demos por nós a olhar para a Constituição, para a Lei das Leis, nela procurando
buscar a suficiente justificação das normas legais, o fundamento da actuação do Estado
e a salvaguarda dos cidadãos.
É na Constituição, qual “porto de abrigo”, que sempre encontramos a segurança
jurídica, não agora no sentido da certeza no Direito, “mas de uma segurança através do
Direito, com acento tónico na defesa do indivíduo perante os órgãos estatais”61.
Repescamos agora os princípios fundamentais fixados pela CRP (art. 206º) para
a Administração Pública, e portanto para a Administração Fiscal, a qual, nos termos do
nº 1, “visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses
legalmente protegidos dos cidadãos”.
O nº 2 do mesmo artigo fixa o princípio da legalidade a que se subordina a
Administração Pública, bem como os princípios sob que regerão a sua actuação,
fazendo-o nos seguintes termos (sublinhados nossos): “Os órgãos e agentes
administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício
das suas funções, com o respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade,
da justiça, da imparcialidade e da boa-fé”.
O princípio da legalidade, conforme já referimos, não se concretiza apenas no
princípio de reserva da lei mas também, como agora foi evidenciado, no princípio da
vinculação da administração à lei, ou seja, da sua subordinação à lei.
Assim, também os actos da administração estão sujeitos ao princípio da
legalidade, maxime da sua conformidade com a Constituição, sob pena de invalidade,
conforme nº 3 do art. 3º da CRP – “A validade das leis e dos demais actos do Estado,

61
Cf. ANTÓNIO MARCOS, O Direito dos Contribuintes à Segurança Jurídica – Edições Universidade
Fernando Pessoa, 1997, pág. 91.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 48

das regiões autónomas, do poder local e de quaisquer outras entidades públicas


depende da sua conformidade com a Constituição”.
Por isso, o CPA, no art. 133º, nº 2 d), comina com a nulidade – a mais drástica
das formas de invalidade – os actos da administração “que ofendam o conteúdo
essencial de um direito fundamental”.
É consabido que “o acto nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos,
independentemente da declaração de nulidade” (CPA, art. 134º, nº 1), nulidade que “é
invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada, também a
todo o tempo, por qualquer órgão administrativo ou por qualquer tribunal” (CPA, art.
134º, nº 2).
Aqui chegados, apreciemos à luz dos princípios constitucionais referidos alguns
aspectos normativos tipificadores da figura do responsável subsidiário tributário e
outros tantos hipotéticos actos da administração fiscal, não sem antes referir que, com a
publicação da LGT em 1998, e com as sucessivas alterações que esta foi sofrendo, tem
vindo a reduzir-se de intensidade o imenso e justíssimo coro de críticas às inúmeras
inconstitucionalidades que diferentes autores62 vislumbravam no instituto da
responsabilidade subsidiária tributária63.

I
Tenhamos de novo presente a norma da LGT que regula as condições de
reversão do processo de execução fiscal contra o responsável subsidiário tributário e a
que abre portas a reversão mesmo não estando verificadas todas as condições exigidas
(art. 23º, nº 2 e nº 3):

62
Cf., por exemplo, PAULO DE PITTA E CUNHA e JORGE COSTA SANTOS, Responsabilidade
Tributária dos Administradores ou Gerentes, cit., J.L.SALDANHA SANCHES, Manual de Direito
Fiscal, cit., DIOGO LEITE DE CAMPOS e MÓNICA HORTA NEVES LEITE DE CAMPOS, Direito
Tributário, cit. e TÂNIA MEIRELES DA CUNHA – O Momento da Reversão da Execução Fiscal
Contra os Responsáveis Subsidiários, cit.
63
Verdade a que fez referência o próprio preâmbulo do DL nº 398/98, de 17 de Dezembro, que aprovou e
introduziu no nosso ordenamento jurídico a LGT, identificando como um dos desígnios desta Lei a
“sujeição a uma regulamentação clara e equilibrada do instituto da responsabilidade subsidiária,
incluindo dos administradores ou gerentes, limitando os pressupostos da reversão e libertando, assim,
os tribunais tributários de múltiplos casos susceptíveis de resolução meramente administrativa”.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 49

“2 – A reversão contra responsável subsidiário depende da fundada


insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários,
sem prejuízo do benefício da excussão.
3 – Caso, no momento da reversão, não seja possível determinar a suficiência
dos bens penhorados por não estar definido com precisão o montante a pagar pelo
responsável subsidiário, o processo de execução fiscal fica suspenso desde o termo do
prazo da oposição até à completa excussão do património do executado, sem prejuízo
da possibilidade de adopção das medidas cautelares adequadas nos termos da lei.”
A regra estabelecida impõe que só depois de excutidos os bens do devedor
principal (e dos eventuais devedores solidários) e perante a fundada insuficiência dos
seus bens, insuficiência que só se enxergará quando estiver fixado o exigível, é que se
poderá reverter contra o responsável subsidiário tributário o processo de execução
fiscal.
Tem-se por bom, neste raciocínio, que o responsável subsidiário tributário
exercia de facto uma das funções previstas, por exemplo no art. 24º, que teve um dos
comportamentos funcionais tipificados e que o facto tributário de que originou a dívida
se verificou no período em que exerceu essa função.
O referido nº 2 do art. 23º abre a possibilidade de, não estando determinada com
segurança a suficiência ou a insuficiência dos bens penhorados, por não estar definido
com precisão o montante a pagar pelo responsável subsidiário, o processo de execução
fiscal contra o responsável subsidiário ficar suspenso até à completa excussão dos bens
penhorados.
Recordemos que a interpretação que defendemos neste trabalho quanto a esta
excepção ia no sentido da sua inadmissibilidade, mesmo nos casos em que a dúvida da
administração fiscal não pairasse entre a suficiência e a insuficiência dos bens
penhorados, mas na insuficiência desses bens e, ainda que fosse a circunstância, a
margem de imprecisão do montante da dívida tributária a pagar pelo responsável
subsidiário fosse mínima, fosse uma “dúvida residual”.
Este ensaio abre-nos, pelo menos, as seguintes hipóteses de actuação da
administração fiscal:

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 50

1) A administração fiscal faz esta mesma interpretação da norma e, à falta de


certeza do montante a pagar pelo responsável subsidiário, não reverte o
processo de execução contra o responsável subsidiário.
2) A administração fiscal faz outra interpretação da norma e, à falta de certeza
do montante a pagar pelo responsável subsidiário, porém estando certa da
insuficiência de bens do devedor principal, porque inexistem bens, reverte o
processo de execução contra o responsável subsidiário.
3) A administração fiscal faz ainda outra interpretação da norma e, à falta de
certeza do montante a pagar pelo responsável subsidiário, e face também,
portanto, à incerteza da insuficiência de bens do devedor principal, reverte o
processo de execução contra o responsável subsidiário.

A hipótese 1) é, quanto a nós, a actuação que melhor traduz o respeito pela


subsidiariedade da responsabilidade, visto que só depois do devedor principal incumprir
definitivamente, ou de estar inequivocamente demonstrada a impossibilidade de
cumprir, é que o obrigado subsidiário pode ser chamado ao cumprimento da obrigação.
A hipótese 2), embora introduzindo um importante desvio à natureza subsidiária
da responsabilidade é, porém, uma actuação admissível porque o art. 153º, nº 2, a), do
CPPT faz, justamente, equivaler a inexistência de bens (depois de devidamente
verificada) à fundada insuficiência de bens, de que o art. 23º, nº 1, da LGT faz depender
a reversão contra o responsável subsidiário.
A hipótese 3) é uma actuação, ainda que hipotética, inadmissível a vários títulos
porque:
a) Não respeita a subsidiariedade da responsabilidade. Com uma tal actuação,
estaria a solidarizar o que não é solidário, mas subsidiário. A administração
usurparia funções se pretendesse modificar as leis, ainda que o fizesse por
via da necessária interpretação para orientar a sua actuação.
b) Cria um esforço desnecessário, excessivo e injusto, ao responsável
subsidiário que, assim, veria os seus bens afectos por tempo indeterminado a
uma dívida cujo montante desconhece. A administração, para a prossecução
do interesse público, sempre poderia socorrer-se de outros expedientes
previstos na lei, tais como os referidos no próprio art. 23º, nº 3, que não

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 51

estranhamente refere: “sem prejuízo da possibilidade de adopção das


medidas cautelares adequadas nos termos da lei”. É que o princípio da
proporcionalidade, em sentido lato, ou da proibição do excesso, impõe que a
administração busque o caminho menos penoso, aquele que exija menos
sacrifícios ao administrado.
c) Evidencia a existência de uma margem de discricionariedade a favor da
administração, que, assim, arbitrariamente tanto pode reverter como não
reverter, o que se traduz uma flagrante violação do princípio da
imparcialidade, ou da proibição do arbítrio, e da segurança jurídica.
Em suma, uma interpretação das normas legais que albergasse uma actuação
como a configurada na hipótese 3), seria materialmente inconstitucional por violação
dos princípios da proporcionalidade da justiça e imparcialidade e, como vimos, os actos
deste modo praticados seriam nulos.

II
Recordemos agora o que acima dissemos sobre a presunção legal de culpa e o
ónus da prova no ponto 4.1.5, a propósito do grupo de responsáveis subsidiários
tributários onde estão os administradores, gerentes ou gestores de facto, fiscais e
técnicos oficiais das pessoas colectivas ou entes fiscalmente equiparáveis, e quanto à
norma constante do no art. 24º, nº 1, b), da LGT.
Escrevemos, então, que os responsáveis subsidiários tributários referidos, que
não quiserem ver o seu património atacado, em resultado da reversão contra si do
processo de execução fiscal por dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou
entrega tenha terminado no período de exercício do seu cargo, porque a administração
fiscal beneficia da presunção legal da sua culpa, terão de provar que não lhes foi
imputável a falta de pagamento dessas dívidas tributárias das pessoas colectivas ou dos
entes fiscalmente equiparáveis, os devedores principais.
Expressámos a nossa convicção de que se pode revelar de enorme dificuldade a
prova negativa, a prova da não culpa, que a norma impõe ao responsável subsidiário
tributário.
Diferentemente da solução encontrada pelo legislador na LGT, o CSC, no seu
art. 78º, nº 1, que também protege todos os credores sociais, responsabiliza

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 52

solidariamente com a sociedade comercial os seus gerentes ou administradores, com a


substancial diferença de que, neste regime, são os credores que estão onerados com o
dever de provar a culpa dos gerentes ou administradores, se pretenderem deles a
solidariedade com a sociedade no cumprimento das obrigações de que sejam credores.
Entendeu o legislador, no regime da responsabilidade dos gestores pelas dívidas
das sociedades, que ao credor não basta, pois, “provar uma administração negligente, a
violação das regras de uma administração técnica e cientificamente correcta. É
necessário que se prove que o prejuízo derivou da inobservância culposa das
disposições legais ou contratuais destinadas à protecção dos credores.
Julgou o legislador que tal bastava para protecção dos credores sociais.
Atribuir-lhes mais protecção constituiria violência”64.
Mas a verdade é que o legislador quis estabelecer uma diferença, criando dois
regimes diferentes, um para o credor da administração fiscal e outro para os demais
credores sociais.
A diferenciação entre os credores pode e deve estabelecer-se, contanto que tal
diferença resulte dos diferentes interesses por si prosseguidos ou que os mesmos
representam ou, como diz o art. 733º do CC, “em atenção à causa do crédito”.
A justificação para o estabelecimento da diferença tem de encontrar acolhimento
nos princípios constitucionais, desde logo conformando-se com o princípio da igualdade
e com o princípio da imparcialidade.
Mas os privilégios creditórios mobiliários gerais, mobiliários especiais e
imobiliários, fixados na lei de modo a proteger primeiramente o Estado, não bastariam
já para garantir e assegurar a necessária diferenciação?
Se não, expliquem-se e justifiquem-se os demais necessários.
Podemos sintetizar o referido quadro normativo esquematicamente do seguinte
modo, esperando que o modelo apresentado auxilie a visualização das diferenças
existentes no domínio do ónus de provar, diferenças para as quais, em nenhum lado,
encontramos explicação e justificação:

64
Cf. DIOGO LEITE DE CAMPOS e MÓNICA HORTA NEVES LEITE DE CAMPOS, Direito
Tributário, cit., pág. 386.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 53

Credor
Administração Outros
Devedor
fiscal (*) credores
Regime da Subsidiária Solidária
responsabilidade
Sociedade Comercial
Quem tem o ónus da O responsável O credor
prova
Regime da Subsidiária Solidária
Outras pessoas colectivas ou responsabilidade (**)
entes fiscalmente equiparados Quem tem o ónus da O responsável O credor
prova (**)
Regime da Subsidiária Solidária
responsabilidade (**)
Titulares de EIRL (***)
Quem tem o ónus da A administração O credor
prova fiscal (**)
Regime da Subsidiária Não
responsabilidade aplicável
Substitutos ou substituídos
Quem tem o ónus da A administração Não
prova fiscal aplicável
(*) Créditos referidos no art. 24º, nº 1, b).
(**) Por analogia.
(***) Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada.

Qual o princípio constitucional a coberto do qual se fixaram estas diferenças?


Não há-de ser no princípio da igualdade, que manda tratar diversamente as
situações diferentes e de modo idêntico as situações semelhantes, que as diferenças
encontram justificação.
A nosso ver, não há diferença entre o gestor titular de estabelecimento individual
de responsabilidade limitada, estabelecimento que tenha dívidas tributárias por impostos
que não foram pagos no prazo legal, e o gerente de uma sociedade por quotas – cuja
responsabilidade é também limitada, – sociedade que tenha dívidas da mesma natureza,
ambas vencidas nos respectivos períodos de exercício de funções.
Como não enxergamos qualquer diferença entre o gerente da mesma sociedade
por quotas, sociedade que não reteve e não entregou dentro do prazo legal o IRS que
deveria ter retido quando pôs à disposição dos seus trabalhadores os respectivos
salários, aqui actuando como substituo tributário, e o gerente de outra sociedade por
quotas, sociedade que não pagou no prazo legal o IVA por si liquidado nas vendas
efectuadas.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 54

Em ambas as situações, sendo todos os referidos gerentes subsidiariamente


responsáveis, os primeiros de cada exemplo têm a seu favor que o ónus da prova cabe à
administração tributária, enquanto que aos segundos a lei inverte o ónus da prova e são
eles os onerados com a difícil prova negativa, a prova em contrário.
A inversão do ónus da prova, na circunstância referida na alínea b) do nº 1 do
art. 24º da LGT, “é um regime de grande severidade: a sanção vai ter uma relação
directa com o imposto em dívida mas nenhuma relação com a capacidade contributiva
do contribuinte”65.
A responsabilidade que se pensava subjectiva passa a responsabilidade
objectiva.
Vem a propósito referir que se a medida abrangesse também os administradores
ou gerentes apenas de direito, tendo presente que a sua nomeação e registo público não
supõe nenhuma declaração de aceitação ou acto de posse, o que permite, como o
provam inúmeros casos, que haja administradores ou gerentes que absolutamente
ignoram essa sua situação, então estaríamos perante uma enormidade66.
É o princípio da igualdade que está flagrantemente posto em causa nesta
inversão do ónus da prova, que atinge apenas alguns dos responsáveis subsidiários
tributários – os referidos no art. 24º – e, mesmo quanto a estes, só em certas situações –
as previstas na alínea b) do nº 1.
As alterações produzidas sucessivamente na LGT, criando esta única situação de
inversão do ónus da prova, retirou oportunidade ao argumento segundo o qual “na
verdade a cuidadosa distinção entre os gestores que cumprem com diligência as suas
obrigações fiscais e os que as não cumprem – falseando deste modo as regras da
concorrência – pode salvar a constitucionalidade (da norma)”67.

65
Cf. J.L.SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, cit., pág. 160.
66
Ao contrário do que defendem PAULO DE PITTA E CUNHA e JORGE COSTA SANTOS,
Responsabilidade Tributária dos Administradores ou Gerentes, cit., pág. 110, que consideram que a
interpretação e aplicação das normas que estabelecem a responsabilidade tributária dos gerentes ou
administradores das sociedades feitas no sentido de só responsabilizam aqueles que exercem
efectivamente o seu cargo, excluindo os que apenas o detêm formalmente, se compreende “como forma
de temperar a iniquidade dos regimes legais que estabeleciam a responsabilidade tributária dos gerentes
independentemente da culpa destes”. Acrescentam, porém, que “não deixa de ser verdade que ela
introduz uma discriminação arbitrária entre os gerentes de facto e os gerentes meramente de direito”.
67
Cf. J.L.SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, cit., pág. 161.

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O que agora temos é a distinção entre alguns que não cumprem e outros que não
cumprem.” E esta distinção só tem um nome: violação do princípio da imparcialidade,
ou do princípio da proibição do arbítrio.
Os princípios violados apontam claramente para a inconstitucionalidade material
da norma do art. 24º, nº 1, b), da LGT.

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6. Conclusão

O precedente estudo do instituto da responsabilidade subsidiária tributária,


ocasião que foi propícia à manifestação de algumas opiniões próprias, permite que se
tirem as seguintes conclusões:
I. Há na Lei Geral Tributária, quanto aos sujeitos passivos da relação jurídica
tributária, uma confusão terminológica e conceptual não desejável.
A sempre possível coexistência simultânea na mesma pessoa de mais de uma
figura (por exemplo, contribuinte directo, responsável subsidiário e substituído
tributário) não favorece uma boa relação entre administração e administrados.
II. Para além da responsabilidade tributária, em sentido amplo, que engloba os
responsáveis originários e os responsáveis não originários, deve considerar-se a
existência de uma responsabilidade tributária em sentido estrito, a dos
responsáveis não originários, responsabilidade que pode ser subsidiária (a regra)
ou solidária (a excepção).
III. O responsável subsidiário tributário é, tal como resulta da lei, um sujeito passivo
da relação jurídica tributário constituída pela verificação do facto tributário.
IV. A responsabilidade subsidiária tributária não se confunde com a obrigação que o
responsável subsidiário tributário eventualmente pode vir a ter de pagar as
dívidas tributárias de outrem (o devedor principal).
A responsabilidade subsidiária nasce para os respectivos titulares com o facto
tributário que origina a relação tributária entre o devedor principal e o sujeito
activo tributário.
A eventual obrigação de poder ter de pagar as dívidas tributárias do devedor
principal surge com a verificação cumulativa dos pressupostos fixados na lei:
um comportamento lesivo dos interesses públicos em causa e a fundada
insuficiência de bens do devedor principal, depois de excutidos.
V. No responsável subsidiário tributário devem repercutir-se todos os efeitos dos
limites temporais de exercício dos direitos pelo sujeito activo tributário e que
conduzem à extinção da relação jurídica tributária, casos da caducidade e da
prescrição.

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VI. Os factos que originam quer a suspensão e interrupção dos prazos de


caducidade, quer a interrupção e suspensão da prescrição, só se deverão
repercutir no responsável subsidiário tributário se deles tiver tido provado
conhecimento.
Deve o responsável subsidiário tributário, ab initio, ter a possibilidade de exercer
os mesmos direitos de intervenção processual que ao devedor principal estão
reconhecidos, designadamente o direito de reclamar, de recorrer
hierarquicamente, de impugnar e de pedir a revisão oficiosa da liquidação do
tributo.
VII.A responsabilidade subsidiária tributária é matéria de reserva da lei formal e da
exclusiva competência legislativa da Assembleia da República, salvo
autorização ao Governo (reserva relativa de competência legislativa).
Qualquer iniciativa de regular o instituto da responsabilidade subsidiária
tributária, ou de alterar as normas legais existentes, que não respeite a referida
reserva da lei, estará irremediavelmente ferida de inconstitucionalidade orgânica.
VIII. A característica ex lege da responsabilidade tributária impõe que só com a
verificação de todos os pressupostos legais possa haver o chamamento do
responsável subsidiário ao pagamento da dívida tributária.
IX. Um dos pressupostos é a verificação cumulativa na mesma pessoa do exercício
de facto de certas funções, como titular ou não, e um certo comportamento
lesivo dos interesses públicos, porque dele terá resultado a dívida tributária e a
fundada incapacidade do devedor originário a pagar.
X. É outro pressuposto do chamamento do responsável subsidiário ao pagamento
da dívida tributária (ou do restante da dívida tributária), a fundada insuficiência
de bens penhoráveis do devedor principal, conclusão a que apenas se pode
chegar se estiver fixado o exigível e estiverem excutidos todos os bens
penhorados.
XI. Só assim, conhecida a dívida sobrante, pode haver lugar à reversão do processo
de execução fiscal contra o responsável subsidiário.
A não ser assim, ao exigir a disponibilidade dos bens do responsável subsidiário
por montante que pode mostrar-se excessivo e por tempo indeterminado, a
reversão pode mostrar-se inconstitucional, por violação do princípio da

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 58

proporcionalidade, ainda que o processo de reversão possa ser sustido até ao


apuramento do valor em dívida.
XII. A reversão do processo de execução sem uma definição precisa do quantum da
insuficiência não deve ser admitido, mesmo que a dúvida sobre o montante a
pagar pelo responsável subsidiário seja residual.
XIII. A presunção de culpa estabelecida a favor da administração fiscal no art. 24º, nº
1 b), da LGT, onera excessivamente os responsáveis subsidiários abrangidos,
pela dificuldade da prova em contrário, e é uma excepção à regra do ónus da
prova criando uma inexplicada e infundada diferença entre situações
manifestamente equivalentes, assim configurando um caso de violação do
princípio da igualdade e do princípio da imparcialidade, tudo apontando para a
inconstitucionalidade material da norma referida.
XIV. São, ainda, pressupostos do chamamento do responsável subsidiário a sua
audição prévia à decisão de contra si reverter o processo de execução e a
notificação fundamentada dos pressupostos e da extensão da sua obrigação.
XV. A figura do responsável subsidiário tributário, ainda que se lhe reconheçam
pontos de contacto com a fiança e com a responsabilidade civil extracontratual, é
uma figura própria do Direito Fiscal, cujas características são reveladas pela
legislação fiscal.
XVI. É desejável, na substituição tributária, e no caso da não retenção de imposto por
conta em sede de IRS sobre o trabalho dependente, uma inversão das
responsabilidades entre substituído e substituto, passando este a ser o
responsável principal e aquele o responsável subsidiário.
Uma tal medida, para além de promover a redução do contencioso tributário,
poria termo ao “estímulo ao incumprimento” que o actual regime parece dar ao
substituto.
XVII. É desejável que um previsível recrudescimento do recurso à reversão dos
processos de execução fiscal, pela qual se efectiva a responsabilidade
subsidiária, seja acompanhado do escrupuloso respeito dos princípios
constitucionais pelos quais se deve reger a actuação da administração fiscal.

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A Responsabilidade Subsidiária Tributária 59

È muito importante que haja eficácia68 na cobrança das dívidas fiscais, como é
muito importante que não se deixem passar impunes os comportamentos lesivos
dos interesses públicos.
Igualmente muito importante é que não sejam incentivados a afastar-se no
exercício das funções que pressupõem a responsabilidade subsidiária tributária,
ou a fazer-se substituir por “homens de palha”, os mais capazes e os mais
competentes.
O acréscimo de risco da função, que resultará duma eventual utilização pouco
criteriosa da reversão dos processos de execução fiscal, poderá conduzir a tal
indesejável desfecho.

68
E se houver eficiência, melhor ainda.

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