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Design e Moda

SENAI – Centro de Tecnologia da Indústria Química e Têxtil – CETIQT

Administração Nacional do SENAI


Armando de Queiroz Monteiro Neto
Presidente do Conselho Nacional do SENAI
José Manuel de Aguiar Martins
Diretor Geral do Departamento Nacional do SENAI

Conselho Técnico-Administrativo do SENAI/CETIQT


Antonio Cesar Berenguer Bittencourt Gomes
Presidente

Conselheiros
Clóvis Gonçalves de Souza Júnior
Luiz Augusto Caldas Pereira
Maria Lúcia Alencar de Rezende
Maria Lúcia Paulino Telles
Oscar Augusto Rache Ferreira
Pierangelo Rossetti
Regina Maria Fátima Torres
Rolf Dieter Bückmann

Administração do SENAI/CETIQT
Alexandre Figueira Rodrigues
Diretor Geral

Renato Teixeira da Cunha


Diretor de Educação e Tecnologia

Dácio Lara de Lima


Diretor de Operações
Irina Aragão
Simone Formiga

Design e Moda

SENAI/CETIQT
Rio de Janeiro, 2010

3
Copyright 2010. SENAI/CETIQT
Nenhuma parte desta obra poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico,
mecânico, por fotocópia e outros sem prévia autorização, por escrito, do SENAI/CETIQT e do(s) autor(es).

DET – Diretoria de Educação e Tecnologia


CA – Coordenação Acadêmica
CPPE – Coordenação de Pós Graduação, Pesquisa e Extensão
NEAD – Núcleo de Educação a Distância

Equipe Gestora
Simone Aguiar C. L. Maranhão
Coordenadora Acadêmica

Ana Cristina Martins Bruno


Coordenadora de Pós Graduação, Pesquisa e Extensão

Ana Paula Abreu-Fialho


Gerente do Núcleo de Educação a Distância

Equipe técnica
Coordenação Geral: Ana Paula Abreu-Fialho
Consultora técnica: Irina Aragão
Design Educacional: Cristina Mendes e Flávia Busnardo
Revisão: Mariana Souza
Projeto Gráfico: Nobrasso Branding, design & web
Diagramação: Rejane Megale Figueiredo
Ilustrações e edição de imagens: José Carlos Garcia
Normalização: Biblioteca Alexandre Figueira Rodrigues – SENAI/CETIQT
Impressão e acabamento: Maio Gráfica

Apoio
Departamento Nacional do SENAI

Ficha catalográfica
Aragão, Irina.
Design e moda / Irina Aragão; Simone Formiga. – Rio de Janeiro: SENAI/CETIQT, 2010.
154 p.
ISBN: 978-85-60447-23-7
1. Design de moda. 2. Design. 3. Moda. 4. Desenvolvimento de produto. I. Formiga, Simone.
CDU 391:658.512.2

SENAI/CETIQT
Rua Dr. Manuel Cotrim, 195 – Riachuelo
20960-040 – Rio de Janeiro – RJ
www.cetiqt.senai.br
Sumário |

Apresentação 7

Design – entendendo o processo de configuração de produtos 9

Aula 1 11
Design – entendendo o processo de configuração de produtos
Aula 2 31
Breve história do design
Aula 3 59
O design e o campo da moda
Aula 4 73
Desenvolvendo produtos de moda
Aula 5 83
Percebendo oportunidades de projeto
Aula 6 121
Introdução à metodologia de projeto em design
Aula 7 135
Briefing – orientando o desenvolvimento do projeto

Glossário 153
Apresentação |

Estamos iniciando o Curso de Especialização em Design de Moda, na mo-


dalidade a distância, que objetiva oferecer, aos interessados das mais variadas
regiões do Brasil, a oportunidade de participar desta formação. Essa modali-
dade é uma nova iniciativa do SENAI/Cetiqt, que já tem grande experiência em
conduzir e ministrar o Curso presencial.
A disciplina Design e Moda é a primeira do Curso e do Módulo de For-
mação Básica. Gostaria de dar as boas vindas a todos em nome da equipe en-
volvida nesta jornada, e desejar que o seu aprendizado seja rico e prazeroso.
Entendemos o design como uma atividade criativa, que deve ser esti- mulada
para pensar e desenvolver o novo. Buscamos elaborar aulas interes- santes,
dinâmicas, interativas, com atividades lúdicas e conteúdos necessá- rios para
a melhor compreensão do que é o produto de moda e as atividades de projeto
em design. Ressalto que, ao elaborarmos o Curso, nos preocupa- mos com o
bom e eficiente ensino, focado na reflexão, nas questões meto-
dológicas e demandas de mercado.
Em Design e Moda vamos abordar questões referentes ao design − con-
ceitos, competências, metodologia de trabalho − e iniciar o debate sobre esta
área de conhecimento e a sua relação com a moda. Abriremos um espaço para
localizar as razões para adotarmos as ferramentas do design no desenvolvimento
de novos produtos de moda, bem como motivar a capacidade de análise e crítica
ao campo de atuação do designer de moda.
A disciplina foi dividida em três partes:
− Nossas três primeiras aulas podem ser consideradas como de embasa-
mento e alinhamento de conhecimentos sobre design. Nelas falaremos sobre
os conceitos do design e, para que estes sejam compreendidos e contextualiza-
dos, realizaremos uma breve visita à história. Ainda nesta unidade, falaremos
sobre os valores do campo do design e o seu uso como ferramenta estratégica
no desenvolvimento, diferenciação e inovação de objetos/produtos.
− Nas Aulas 4 e 5, buscaremos relacionar o design com a moda, para
identificar as atribuições do designer de moda nos processos de criação, de-
senvolvimento e produção de um produto de moda.

7
Apresentação

− Nas Aulas 6 e 7, conduziremos o conteúdo em debate para a compreensão


e aplicação das ferramentas de projeto de design no desenvolvimento de um pro-
duto de moda.
Ao longo da disciplina, apresentaremos referências para consultas e es-
tudos mais específicos.

8
Design – entendendo o
processo de configuração
de produtos

Antes de apresentar conceitos de design, conduzirei uma reflexão so-


bre o design como produto histórico. Isto é, através de um breve panorama
histórico, buscarei expor considerações e realizar um debate sobre o contex-
to em que a prática do design foi entendida como uma solução eficiente e
adequada às demandas industriais.
A partir desta exposição, poderemos dispor de elementos para pensar
o design como uma atividade importante no cenário produtivo industrial e,
consequentemente, entender os conceitos atribuídos a esta prática. Mas por
que estudar estes conceitos?
Porque construímos o conhecimento a partir de ideias e experiências
que aprendemos de estudiosos, pensadores e profissionais que atuaram e
atuam em uma área de conhecimento. Ao conhecermos diferentes opiniões,
passamos a gerenciar estes conteúdos e ter autonomia em pensar as compe-
tências de nossa profissão.
Não devemos esquecer que na construção do conhecimento é desejá-
vel termos noção das vivências e dos diferentes olhares sobre o conteúdo em
debate. Isso nos dá um repertório rico para ver, de forma criativa, o design
aplicado à moda.
Dessa maneira, objetivando ampliar o debate sobre o campo do design,
vamos abordar diferentes conceitos que definem esta prática. Este debate
e referências, somados à experiência de projeto, auxiliarão a compreender
o design como um recurso estratégico no processo de desenvolvimento de
novos produtos para o mercado.
Falaremos, então, sobre oportunidade de projeto, que entendemos
como um espaço no mercado, receptivo a inovações, propício para pensar-
mos e elaborarmos soluções criativas, resultantes do desenvolvimento de
projeto de design.
Feita a apresentação de nosso curso e apontadas as próximas etapas,
convido você a iniciar esta jornada. E que seja uma leitura agradável!

9
Design – entendendo o processo de configuração de
produtos
Aula 1
Seus Objetivos:
Ao final dessa aula, esperamos que você seja capaz de:
1. Relacionar o design às demandas de diferentes contex-
tos ao longo da história;
2. Reconhecer o design como produto histórico;
3. Reconhecer o campo do design e as suas atribuições;
4. Reconhecer e avaliar os diferentes conceitos de design abordados
nesta aula.

3 horas de aula
Design e Moda

1. História e Design

Ao ler este título, você deve estar se perguntando o que a história tem
a ver com design e com a moda, não é mesmo? E para que voltar ao passado
para começarmos a falar em design de moda no tempo presente...
Bom, então vamos do princípio. O que você entende por história?

Fonte: Stock Xchange | Foto: Sanja Gienero


Você vê a história como uma disciplina
que cursou em algum momento do ensino
médio ou da faculdade, preocupada com
fatos, datas e personalidades do passado?
E por que devemos conhecer a história do
design, mesmo que de forma breve? Que
importância este conhecimento tem para a pre-
sente formação?
Vamos então começar a responder a essas perguntas por partes.

2. O que é história?

História… é “a ciência dos homens no tempo”…


(Marc Bloch)

Bem, você concorda que, para entendermos o presente, precisamos co-


nhecer o passado? É através das experiências do passado que surgem as vivên-
cias que fundamentaram o que realizamos e modificamos hoje.
Ao longo do tempo, as sociedades humanas marcaram a trajetória de
sua existência com fatos, feitos, personagens, ideias, descobertas, atividades e
criações. Conhecer o que nossos antepassados realizaram nos localiza dentro
da grande malha de relações que a humanidade criou e segue tecendo, e au-

13
Aula 1

xilia no dinâmico movimento de recriar a história, inovando, transformando e


movimentando o mundo.
A história se forma como disciplina no século XIX e, desde então, seus es-
tudiosos vêm pensando e buscando entender a experiência humana ao longo
do tempo. Muito preocupada com a veracidade dos relatos e dados históricos,
Escola dos Annales: O
buscou-se o uso e estudo de fontes fidedignas e abordagens que contribuam movimento historiográ-
fico Escola dos Annales
para a compreensão das questões do presente. Inicialmente a disciplina His-
recebeu essa designação
tória pensou e estudou questões focadas na política, economia e organização por ter surgido em torno
do periódico acadêmico
social das sociedades. francês Revue des An-
A partir dos pensadores da Escola dos Annales, novos focos de estudo fo- nales, fundado em 1929,
por Marc Bloch e Lucien
ram agregados à disciplina. Esses pensadores estavam cientes da multiplicidade Febvre, então professo-
de olhares e abordagens para um mesmo fato histórico, entendido desde então res da Universidade de
Estrasburgo / Alsácia /
não mais como único, mas passível de diferentes interpretações e propostas. França. Destacou-se por
March Bloch (1886-1944) e Lucien Febvre (1878-1956) – historiadores fran- incorporar métodos das
Ciências Sociais à História.
ceses − lideraram esta nova forma de pensar e fazer história. Gerações seguintes
deram continuidade às suas ideias – Fernand Braudel (2a geração da escola),
Michel Foucault e Jacques Le Goff (3a geração), com contribuições que discu-
tiram, organizaram e formaram a história praticada no presente. A partir das
ideias e produção da terceira geração dos Annales, foi organizado o conceito
que influenciou a formação da Nova História e da História das Mentalidades,
que passou a entender toda a atividade e produção humana como histórica.

Quem foi Marc Bloch?


Marc Bloch foi historiador francês e soldado nas duas guerras mundiais. Lí- Imagem em domínio público

der da Resistência francesa, foi preso, torturado e morto pela Gestapo em


Foto: Chrouboulouboulou

junho de 1944. Como historiador, Bloch é conhecido, em especial, pela sua


obra póstuma Apologie pour l’histoire ou Métier d’historien (1949) e como co-fundador
da célebre revista Annales. Profundamente influenciado pelos dramáticos acontecimen-
tos que marcaram a sua época − guerras mundiais, anti-semitismo e totalitarismo −,
Bloch tornou-se símbolo do herói intelectual e do espírito crítico e independente.

“A diversidade dos testemunhos históricos é quase infinita. Tudo o que o


homem diz ou escreve, tudo o que fabrica, tudo o que toca pode e deve
informar-nos sobre ele.” (BLOCH, 1987, p. 63)

A partir deste ponto de vista, os objetos, que são criações das sociedades
humanas como soluções para as suas necessidades cotidianas, passaram a ser
considerados como documentos da história. São testemunhos materiais de cada

14
Design e Moda

época, que nos dão pistas sobre o modo de vida de nossos antepassados e, inclu-
sive, sobre como pensaram, solucionaram e produziram objetos para tornar o dia
a dia mais confortável, prazeroso e prático.
Com o auxílio da história, podemos pensar no momento e cenário em
que cada peça foi criada, desenvolvida, fabricada e usada. Lembre-se de que
cada objeto é fruto das ideias de pessoas, dentro de um grupo social, de uma
sociedade e cultura.

XVI

VII
XV

XVIII

1810

1820

1830

1840

1850

1860

1870
Joseph Box
1880
Edward Hayes

15
Aula 1

1890
C. Maykopf

1900

1910
Bally

1920
Delman

1930

1940
Charles Jourdan
1950

1960

1970
Roger Viver
1980
Yves Saint Laurent

1990
Delman

O somatório de fatores econômicos, sociais, políticos, ideológicos e tec-


nológicos influenciam a maneira de pensar e ver o mundo tanto da pessoa que
pensa e faz o objeto, como o da pessoa que vai fazer uso dele. Ou seja, tudo
aquilo que pensamos, consideramos como adequado e interpretamos como
belo pode ser transformado em objetos. E estes objetos, quando aceitos so-
cialmente, ou seja, quando os seus atributos são reconhecidos e adotados,
circulam reproduzindo valores, significados e papéis.
E a partir destas questões, gostaria de trazer mais um conceito importan-
te para a nossa aula – o da cultura material. Mas, antes de disso, vamos praticar
um pouco.

16
Design e Moda

Atividade 1 – Objetivo 1

Escolha um objeto em sua cozinha. Procure dados a respeito da sua criação:


• quem criou?
• quando foi criado?
• qual era o objetivo inicial?
• sua utilidade mudou ao longo do tempo? Quem trouxe essa inovação?
Após recolher esses dados, monte uma linha do tempo a respeito da
história do seu objeto. Você deverá entregar esse trabalho em duas laudas,
incluindo ilustrações, linha do tempo esquemática e fontes consultadas.

Resposta e comentário

A linha esquemática do tempo nos apresentou exemplos de calçados ao


longo da história da humanidade. Você deve ter reparado como estes variaram
na forma, na decoração, nos materiais, no acabamento e na possível maneira de
confeccioná-los... Cada peça foi idealizada e elaborada conforme a tecnologia,
materiais disponíveis e considerados adequados à fabricação destes objetos, bem
como os valores de funcionalidade, conforto, estética e mercado de cada época.

2.1. Cultura material

Segundo o professor Ulpiano Bezerra de Meneses (1984), do Departamen-


to de História da Universidade de São Paulo, entendemos por cultura material:

Segmento do meio físico que é socialmente apropriado pelo homem


(apropriação social); suporte físico da produção e reprodução da vida so-
cial. Abrange artefatos (produtos e vetores das relações sociais), estrutu-
ras, modificações de paisagens, coisas animadas, corpo, arranjos espa-
ciais, rituais, cultos, festas... (MENEZES, 1984)

Pela cultura material, as sociedades:


• classificam e demarcam espaços;
• expressam e comunicam ideias, padrões e valores;
• identificam e delimitam relações e papéis sociais;
• reproduzem e recriam as referências de seus antepassados;
• negociam privilégios;
• se reconhecem como grupo e constroem a identidade própria.

17
Aula 1

Por este ponto de vista, reiteramos a hipótese de que todas as produções


humanas − a cultura material − nos informam sobre as sociedades que as pro-
duziram, portanto, são ricos documentos históricos que respondem questões
do presente a partir das experiências do passado configuradas em objetos.
E por falar em objetos, sinto-me tentada a trazer para o nosso estudo
trecho do texto da antropóloga norte-americana Annette Weiner (1933-1997)
que, de forma simples e clara, mas muito simpática, descreve os objetos e as
suas implicações sociais:

[...] nós usamos objetos para fazer declarações sobre nossa identidade,
nossos objetivos, e mesmo nossas fantasias. Através dessa tendência hu-
mana a atribuir significados aos objetos, aprendemos desde tenra idade
que as coisas que usamos veiculam mensagens sobre quem somos e so-
bre quem buscamos ser. [...] Estamos intimamente envolvidos com obje-
tos que amamos, desejamos ou com os quais presenteamos os outros.
Marcamos nossos relacionamentos com objetos [...]. Através dos objetos
fabricamos nossa auto-imagem, cultivamos e intensificamos relaciona-
mentos. Os objetos guardam ainda o que no passado é vital para nós. [...]
não apenas nos fazem retroceder no tempo como também tornam-se os
tijolos que ligam o passado ao futuro. (WEINER, 1987, p. 159)

E dentre as várias atividades e práticas de produção da cultura material


desenvolvidas nas sociedades humanas, trataremos do design. O que você en-
tende por design?

3. O que é design?

A palavra design é de origem inglesa e significa desenho. É usada para


designar o processo intencional de pensar, organizar, sistematizar, planejar,
experimentar, projetar e desenvolver produtos, a partir de oportunidades iden-
tificadas no mercado.
Produção mista: Produ-
Atualmente, entendemos que esta atividade projeta objetos/produtos ção que faz uso de pro-
para a produção industrial, mista, artesanal, além de comunicar, sinalizar e cessos industriais e arte-
sanais de produção.
identificar em impressos e, não podemos esquecer, em reprodução virtual.

18
Design e Moda

Em sua primeira fase de desenvolvimento como área de conhecimento e


atuação (século XIX), o design industrial focava principalmente na produção in-
dustrial em série, por meio de máquinas e equipamentos. Nessa fase, a preocu-
pação de uma empresa estava voltada para a economia, que contava com uma
produção aquecida para obter lucros e, portanto, reinvesti-los na produção.
Para que o sistema fosse eficiente, foi necessária a unificação dos pro-
dutos e dos processos produtivos, o que reduziria o desperdício, a simplifica-
Necessidades subjeti- ção da montagem das partes estandardizadas e do controle das máquinas. No
vas e objetivas: As sub-
jetivas são as necessida- entanto, falaremos mais desta fase na aula seguinte, para a qual desenhei um
des ligadas ao desejo,
breve panorama da história do design.
individuais, passíveis de
mudanças, do gosto etc. Dentro do universo do design, questões referentes ao usuário são prio-
Já as objetivas são as de
ritárias: satisfação das necessidades subjetivas e objetivas, buscando tornar
ordem prática, solução
para uma melhor forma o cotidiano mais prático, otimizado, confortável, prazeroso e inteligente. O re-
de sentar, por exemplo.
As necessidades subje-
sultado deste processo é uma combinação de elementos percebidos e absorvi-
tivas e objetivas são ter- dos, pelo designer, no contexto histórico, social, cultural, econômico e político
mos que se complemen-
tam e se confundem. em que está inserido, somados a tecnologia e recursos disponíveis.
O design é uma atividade criativa. Nela, o designer faz uso das suas expe-
riências profissionais e de vida, formação e visão do mundo para materializar
ideias e soluções em objetos/produtos e serviços. Dessa forma, ele visa aten-
der demandas e preencher desejos dos usuários, a partir de considerações do
cliente que o contrata.
A definição de design, que vocês acabaram de ler, é uma síntese e per-
cepção que tenho após anos de trabalho no setor. Sem dúvida, desde a finali-
zação da graduação e ingresso no mercado de trabalho, o meu olhar vem se
transformando. A cada experiência, leitura, debate e reflexão sobre o campo,
novas opiniões se formam e outras são reformuladas. Entretanto, como men-
cionei na introdução de nosso curso, é importante conhecermos diferentes
abordagens sobre qualquer assunto antes de formar alguma ideia. Vamos en-
tão conhecer e pensar alguns conceitos de design propostos por profissionais
atuantes na área.

3.1. Design pelos olhos de outros profissionais

O historiador Rafael Cardoso Denis, no livro Introdução à História do


Design (2000), recorre à origem da palavra design para explicar as implicações
deste verbete e os seus significados:

19
Aula 1

A origem imediata da palavra está na língua inglesa, na qual o substan-


tivo design se refere tanto à idéia de plano, desígnio, intenção, quanto à
de configuração, arranjo, estrutura [...]. A origem mais remota da palavra
está no latim designare, verbo que abrange ambos sentidos, o de desig-
nar e o de desenhar. (DENIS, 2000, p. 16)

Denis (2000, p. 16) chama atenção para o fato de que a maioria das defi-
nições da atividade concorda que o design concilia um aspecto abstrato – de-
signar, conceber / projetar / atribuir − e outro concreto – desenhar, registrar /
configurar / formar. E define o design como “uma atividade que gera projetos,
no sentido objetivo de planos, esboços ou modelos”.

Aspecto abstrato Aspecto concreto

designar desenhar
conceber registrar
projetar configurar
atribuir formar

Design

Atividade que gera projetos, no sentido objetivo de planos, esboços ou modelos

Já o designer alemão Bernd Löbach, no livro Design Industrial (2001),


aponta cinco olhares que devemos levar em consideração ao se pensar o design:
• o do usuário dos produtos de design;
• o do fabricante – preocupado com o desenvolvimento de produtos
para o mercado;
• o do sistema econômico (Löbach cita como exemplo um crítico mar-
xista) – instrumento de gerar vendas e lucros;
• o do designer – pensa sua atividade entre as demandas do usuário e
as do empresário, que deveria levar em consideração as necessidades
físicas e psíquicas do homem.
Ele também recorre à tradução do verbete inglês para direcionar sua
definição:

20
Design e Moda

[...] design é uma idéia, um projeto ou um plano para a solução de um


problema determinado. O design consistiria então na corporificação des-
ta idéia para, com a ajuda dos meios correspondentes, permitir a sua
transmissão aos outros. (LÖBACH, 2001, p. 6)

Löbach (2001) entende que a atividade compreende a concretização de


uma ideia através de projetos e/ou modelos que resultem na construção de um
produto industrial, ou sistema de produtos, que possa ser produzido em série. As
fases do processo de elaboração deste produto ou sistema denomina-se design.

Design

Atividade que compreende fases do processo de elaboração do produto ou


sistema de produtos, que possa ser produzido em série

No livro Design: do material ao digital (1997), outro designer alemão,


Guy Bonsiepe, faz uma reflexão sobre as mudanças que o conceito de design
veio vivenciando, o que também desencadeou mudanças nas preocupações do
discurso de projeto. Bonsiepe traça uma interessante análise sobre a prática do
design dos anos 1950 aos anos 1990, que retomaremos na aula seguinte. Ele
propõe ainda a reinterpretação do conceito de design a partir de sete teses,
que são:

1. Design é um domínio que pode se manifestar em qualquer área do


conhecimento e práxis humana.

Bonsiepe frisa bem que, embora o design seja um domínio da


ação humana, “nem tudo é design nem todos são designers”,
embora o termo design se refira a um potencial inventivo dos
humanos diante das práticas da vida cotidiana. Segundo o
autor, “cada um pode chegar a ser designer no seu campo
de ação”. Um dos exemplos que cita é o do geneticista que
desenvolve um novo tipo de maçã, resistente a influências
externas. E completa: “Design é uma atividade fundamental,
com ramificações capilares em todas as atividades humanas”.

2. O design é orientado para o futuro.

21
Aula 1

3. O design está relacionado à inovação. O ato projetual introduz algo


novo no mundo.

A inovação motiva e orienta a prática do design. “Design se


refere a um tipo especial de ação inovadora, que cuida das
preocupações de uma comunidade de usuários”.

4. O design está ligado ao corpo e ao espaço, particurlamente ao


espaço retinal, porém não se limitando a ele.

Neste item, o autor faz menção à primeira experiência hu-


mana, que, geralmente, é visual. Mas reitera a ideia de que o
design desenvolve soluções que vão estar direta ou indireta-
mente em contato com o corpo/espaço.

5. Design visa à ação efetiva.

Para facilitar ações efetivas, as ações reais, artefatos transfor-


mados em produtos são inventados, projetados, produzidos,
distribuídos, comprados e usados.

6. Design está linguisticamente ancorado no campo dos juízos.

Design e linguagem são formas de expressão e, portanto,


oriundos de ideias, valores e contextos.

7. Design se orienta à interação entre usuário e artefato. O domínio do


design é o domínio da interface. (BONSIEPE, 1997, p. 15-17)

“O design visa fenômenos de uso e da funcionalidade de uso”.


Isto é, o design tem a preocupação de integrar os artefatos à
cultura, para torná-la eficiente.

É interessante a reflexão de Bonsiepe (1997) sobre o design como ativi-


dade em potencial vinculada à invenção de novas práticas da vida cotidiana.
Além disso, ele argumenta que “cada um pode chegar a designer no seu cam-
po de ação”, mas faz questão de frisar que “nem tudo é design e nem todos
são designers”.

22
Design e Moda

Design

Atividade em potencial vinculada à invenção de novas práticas da vida cotidiana.

Em El diseño industrial reconsiderado: definicion, historia, bibliografia, o


designer argentino Tomás Maldonado considera:

Design é uma atividade projetual que consiste em determinar as proprieda-


des formais dos objetos a serem produzidos industrialmente. Por proprie-
dades formais entende-se não só as características exteriores, mas, sobretu-
do, as relações estruturais e funcionais que dão coerência a um objeto tanto
do ponto de vista do produtor quanto do usuário. (MALDONADO, 1977)

Design

Atividade projetual que consiste em determinar as propriedades formais dos objetos a


serem produzidos industrialmente. Leva em conta relações estruturais e funcionais de um
objeto tanto do ponto de vista do produtor quanto do usuário.

E, para exemplificar as adequações pelas quais o campo do design pas-


ICSID: International sou e seguirá passando, afinal este processo atua como resposta às questões
Council of Societies of
Industrial Design (Con- do contexto em que é praticado, finalizaremos citando dois conceitos propos-
selho Internacional das tos em dois momentos diferentes pela ICSID.
Sociedades de Design
Industrial), sediado em Em setembro de 1959, ocorreu o primeiro Congresso do ICSID, em Esto-
Montreal, no Canadá,
colmo, na Suécia.
desde 2005.
A partir dele, a Convenção da ICSID foi oficialmente adotada e a seguinte
definição das competências do designer (que definem o campo do design):

“An industrial designer is one who is qualified by training, technical


knowledge, experience and visual sensibility to determine the materials,
mechanisms, shape, colour, surface finishes and decoration of objects
which are reproduced in quantity by industrial processes. The industrial
designer may, at different times, be concerned with all or only some of
these aspects of an industrially produced object.”

23
Aula 1

“O designer industrial é o sujeito qualificado pelo treino, conhecimento


técnico, experiência e sensibilidade visual para determinar os materiais,
mecanismos, forma, cor, acabamentos e decoração de objetos que são
reproduzidos em quantidade por processos industriais. O designer indus-
trial deve, em diferentes momentos, estar preocupado com todos ou al-
guns destes aspectos do objeto produzido industrialmente.”
(Tradução livre por Irina Aragão.)

“The industrial designer may also be concerned with the problems of


packaging, advertising, exhibiting and marketing when the resolution of
such problems requires visual appreciation in addition to technical knowl-
edge and experience.”

“O designer industrial deve também estar preocupado com as questões


referentes a embalagem, divulgação, exposição e marketing, quando a
solução de tais questões demanda compreensão visual além do conheci-
mento e experiência técnicos.”
(Tradução livre por Irina Aragão.)

“The designer for craft based industries or trades, where hand processes
are used for production, is deemed to be an industrial designer when the
works which are produced to his drawings or models are of a commercial
nature, are made in batches or otherwise in quantity, and are not per-
sonal works of the artist craftsman.”

“O designer que atua junto às indústrias ou comércio com base na produ-


ção artesanal, onde as mãos são usadas na produção, é entendido como
um designer industrial quando os produtos de seus desenhos e modelos
são de natureza comercial, são feitos em quantidade, e não são um traba-
lho autoral do artesão.”
(Tradução livre por Irina Aragão.)

Conheça o ICSID
O ICSID é uma organização que promove o design em todo o mundo e conta atualmen-
te com 150 membros em mais de 50 países, representando em torno de 150 mil designers.
No website podem ser acompanhados eventos, debates, informações e ações que estão
acontecendo no mundo.
Dê uma olhada: http://www.icsid.org

E no atual website do ICSID, encontramos a definição de design dividida


em objetivo e meta.
O objetivo:

“Design is a creative activity whose aim is to establish the multi-faceted


qualities of objects, processes, services and their systems in whole life

24
Design e Moda

cycles. Therefore, design is the central factor of innovative humanisation


of technologies and the crucial factor of cultural and economic exchange.”

“Design é uma atividade criativa cujo propósito é estabelecer as quali-


dades multifacetadas de objetos, processos, serviços e seus sistemas de
ciclos de vida. Assim, design é o fator central da humanização inovado-
ra das tecnologias e o fator crucial das trocas econômicas e culturais.”
(Tradução livre por Irina Aragão.)

A meta:

“Design seeks to discover and assess structural, organisational, functional,


expressive and economic relationships, with the task of:
• Enhancing global sustainability and environmental protection
(global ethics)
• Giving benefits and freedom to the entire human community, indi-
vidual and collective
• Final users, producers and market protagonists (social ethics)
• Supporting cultural diversity despite the globalisation of the world
(cultural ethics)
• Giving products, services and systems, those forms that are expressive
of (semiology) and coherent with (aesthetics) their proper complexity.
Design concerns products, services and systems conceived with tools, or-
ganisations and logic introduced by industrialisation - not just when pro-
duced by serial processes. The adjective “industrial” put to design must
be related to the term industry or in its meaning of sector of production
or in its ancient meaning of “industrious activity”. Thus, design is an acti-
vity involving a wide spectrum of professions in which products, services,
graphics, interiors and architecture all take part. Together, these activities
should further enhance - in a choral way with other related professions -
the value of life.
Therefore, the term designer refers to an individual who practices an in-
tellectual profession, and not simply a trade or a service for enterprises.”

“O design busca compreender e avaliar as relações estrutural, organiza-


cional, funcional, expressiva e econômica, com a meta focada em:
• melhorar a sustentabilidade global e proteção ao meio ambiente;
• oferecer benefícios e liberdade para todas as comunidades huma-
nas, usuários,
• produtores e agentes/protagonistas comerciais;
• apoiar a diversidade cultural apesar da globalização mundial;
• oferecer produtos, serviços e sistemas, que são expressivos e coe-
rentes com a sua complexidade.
O design trata de produtos, serviços e sistemas concebidos através de
ferramentas, organizações e da lógica introduzidas pela industrialização
– não somente quando são produzidos por processos de seriação. (...)
Design é uma atividade que envolve um amplo universo de profissões,

25
Aula 1

do qual produtos, serviços, gráfica, interiores e arquitetura fazem parte.


Estas atividades juntas deveriam ressaltar, em sintonia com as demais
profissões afins, o valor da vida.
O termo designer faz menção ao indivíduo que desempenha uma tra-
balho intelectual, e não simplesmente um comércio ou um serviço para
empresas.
(Tradução livre por Irina Aragão.)

Atividade 2 – Objetivo 2

Com base nos conceitos que vimos anteriormente e na compreensão do


design como fruto de diferentes realidades e contextos, indique pontos nucle-
ares do conceito proposto por Bernd Löbach e pelo conceito de 1959 do ICSID.

Resposta e comentário

Bernd Löbach entende o design como uma atividade focada no usuário.


O que jamais devemos esquecer, afinal, sempre projetamos algo para alguém,
para atender alguma demanda. O designer – profissional atento às questões
do momento, inclusive às do mercado − pensará soluções, ao longo do desen-
volvimento do projeto, que deverão levar em consideração as necessidades
humanas − que não são apenas físicas, mas também psíquicas − e os compro-
missos com aquele que o contratou (produção eficiente e retorno financeiro).
A definição do ICSID de 1959 descreve as qualidades do profissional de
design. O designer deve ser um profissional qualificado, ter conhecimentos
técnicos e percepção visual acurada no exercício de sua profissão. Deve estar
preocupado com todos os aspectos referentes ao desenvolvimento e produ-
ção do produto. Inclusive, espera-se que o designer também pense as formas
de melhor apresentação e divulgação do produto. Diferencia o designer que
desenvolve projetos para a produção em quantidades do que foca no produto
autoral. Este último aspecto ainda é muito discutido no meio acadêmico.

Atividade 3 – Objetivo 3

Após ter conhecido alguns conceitos de design, que aspectos você con-
sidera relevantes no processo de design?

26
Design e Moda

Comentário

Esta atividade não tem uma resposta única, por isso não podemos co-
mentá-la com mais detalhes. Mas, certamente, é importante que a partir dela
você tenha se debruçado sobre os conceitos de design apresentados, de forma
a ir construindo uma conceituação própria acerca do tema. O meu conceito de
design, por exemplo, está expresso lá no começo da seção 3, quando defino o
termo antes de apresentar as definições de outros autores.

Atividade 4 – Objetivo 4

Qual é a sua opinião sobre o conceito a seguir? O que Löbach entende


por problema?

(...) design é uma idéia, um projeto ou um plano para a solução de um


problema determinado. O design consistiria então na corporificação des-
ta idéia para, com a ajuda dos meios correspondentes, permitir a sua
transmissão aos outros. (LÖBACH, 2001, p. 16)

Resposta e comentário

Löbach entende por problema a oportunidade de projeto, isto é, ao


buscarmos soluções para alguma questão que nos foi apresentada por um
cliente, focada no usuário, buscamos conhecer o universo do projeto, pensa-
mos, experimentamos, geramos ideias e soluções. E pelo projeto detalhado e
as etapas que envolvem a produção, vamos dar corpo à ideia que elaboramos
na forma de produto que será levado para o usuário.

Conclusão

Acabamos de estudar alguns conceitos de design, pensados e organiza-


dos a partir de diferentes olhares e experiências. Mas pudemos perceber que
todos compreendem o campo do design como aquele focado na elaboração de
soluções para o usuário, por meio de projetos. Design é citado como recurso
estratégico na produção de novos produtos, pode orientar o desenvolvimento
otimizado e adequado às características do objeto. E o que considero interes-

27
Aula 1

sante observar é que estas atribuições vêm se adequando às demandas de


cada contexto ao longo da história desta área de atuação.

Para uma segunda olhada...

• História é a disciplina que estuda a experiência das sociedades hu-


manas ao longo do tempo.
• A cultura material, rico documento histórico, nos informa sobre as
sociedades humanas que as produziram.
• Os fatores econômicos, sociais, políticos, ideológicos e tecnológicos
influenciam a maneira de pensar e ver o mundo tanto da pessoa que
pensa e faz o objeto, como o da pessoa que vai fazer uso do objeto.
• O objeto é fruto das ideias de pessoas, dentro de um grupo social, de
uma sociedade e cultura.
• O design é um produto histórico.
• Design é o processo intencional de pensar, organizar, sistematizar,
planejar, experimentar, projetar e desenvolver produtos, a partir de
oportunidades identificadas no mercado, focadas em um usuário.
• O design é uma atividade criativa e interdisciplinar. Nela, o designer
faz uso das suas experiências profissionais e de vida, formação e vi-
são do mundo para materializar ideias e soluções em objetos/produ-
tos e serviços.
• O design é uma atividade importante no cenário produtivo indus-
trial, é um recurso estratégico no processo de desenvolvimento de
novos produtos para o mercado.
• O design desenvolve produtos, a partir de projeto sistematizado,
para um usuário, considerando os seguintes aspectos: diversidade
cultural, inovação, criatividade, funcionalidade, uso, estética, moda,
aspectos simbólicos, tecnologia, produção, custos, eficiência, pratici-
dade, meio ambiente...

Referências

BLOCH, Marc. Introdução à história. 5. ed. Mem Martins: Publicações Europa-América, 1987.
BONSIEPE, Guy. Design: do material ao digital. Santa Catarina: IEL/LBDI, 1997.
DENIS, Rafael Cardoso. Uma introdução à história do design. São Paulo: Editora
Edgard Blücher, 2000.

28
Design e Moda

FORTY, Adrian. Objeto de desejo: design e sociedade desde 1750. São Paulo: Cosac
Naify, 2007.
HESKETT, John. Desenho industrial. Brasília: UnB/José Olympio Editores, 1997.
LÖBACH, Bernd. Design industrial. São Paulo: Editora Edgard Blücher, 2001.
MALDONADO, Tomás. Design industrial. Lisboa: Edições 70/Arte e Comunicação, 1991.
MALDONADO, Tomás. El diseño industrial reconsiderado: definicion, historia, biblio-
grafia. Barcelona: G. Gili, 1977.
MENESES, U. B. de. A cultura material no estudo das civilizações antigas. In: SIMPÓSIO
NACIONAL DE HISTÓRIA ANTIGA, 1., 1984. Anais. Pesquisas, problemas e debates.
João Pessoa: Imprensa Universitária, 1984, p. 34-42.
WEINER, Annette. The trobianders of Papua New Guinea. Stanford University, 1987.
p.159.

Sites consultados
INTERNATIONAL COUNCIL OF SOCIETIES OF INDUSTRIAL Design. Disponível em: <http://
www.icsid.org/about/about/articles33.htm>. Acesso em: 5 out..2009.
INTERNATIONAL COUNCIL OF SOCIETIES OF INDUSTRIAL Design. Disponível em: <http://
www.icsid.org/about/about/articles31.htm>. Acesso em: 5 out. 2009.
STOCK Exchange. Disponível em: <http://www.sxc.hu/photo/970346>. Acesso em: 15
jan. 2010.
STOCK Exchange. Disponível em: <http://www.sxc.hu/photo/1072657>. Acesso em: 15
jan. 2010.
STOCK Exchange. Disponível em: <http://www.sxc.hu/photo/668159>. Acesso em: 15
jan. 2010.
STOCK Exchange. Disponível em: <http://www.sxc.hu/photo/589018>. Acesso em: 15
jan. 2010.
STOCK Exchange. Disponível em: <http://www.sxc.hu/photo/825330>. Acesso em: 15
jan. 2010.
STOCK Exchange. Disponível em: <http://www.sxc.hu/photo/849395>. Acesso em: 15
jan. 2010.
WIKIMEDIA Commons. Disponível em: <http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Marc_
Bloch_d_cor_CG.jpg>. Acesso em: 15 jan. 2010.
WIKIMEDIA Commons. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Debret_
casa_ciganos.jpg>. Acesso em 15 jan. 2010.

Sites Recomendáveis para consultas


INTERNATIONAL COUNCIL OF SOCIETIES OF INDUSTRIAL Design. Disponível em: <http://
www.icsid.org>. Acesso em: 5 out. 2009.

29
Aula

Breve história do design


2
Seus Objetivos:
Ao final desta aula, esperamos que você seja capaz de:
1. Aplicar informações históricas ao desenvolvimento
do design de uma peça;
2. Relacionar o surgimento do design às demandas da consoli-
dação da industrialização;
3. Reconhecer o design como atividade estratégica no crescimento
do setor industrial;
4. Reconhecer as mudanças e variações sofridas pelo campo do
design ao longo de sua história.

3 horas de aula
Design e Moda

1. Continuando a nossa reflexão sobre a história

Gostaria de iniciar nossa aula retomando uma breve reflexão sobre a


história. Na primeira aula, mencionei que podemos entender a história como
a ciência que estuda as experiências humanas ao longo de tempo. Devemos
considerar que neste processo há aspectos da vida social que demandam pe-
ríodos diferentes para que sejam formulados, bem como ajustes e mudanças
que devem ser realizados e aceitos.

Tempo social: É o tem- Fernand Braudel, em História e Ciências Sociais, de 1958, aborda a plu-
po em que a sociedade ralidade do tempo social. O autor introduz um debate sobre a curta e longa
sente as mudanças que
vivencia. duração do tempo social, comparando a abordagem da história tradicional e
a Nova História.
Braudel atribui à história tradicional a abordagem da curta duração da
vida social, que vincula à história dos grandes acontecimentos, do fato, dos
heróis e do momento de um cronista ou jornalista.
A história das estruturas sociais, de longa duração, é a Nova História,
que aborda “uma realidade que o tempo demora imenso a desgastar e trans-
portar” (BRAUDEL, 1972). É a história que considera a duração de
uma série de relações, percebe uma cadeia de acontecimentos,
Fonte: Stock Exchange | Foto: Sanja Gjenero

implicações e consequências. Braudel entende a história como


a soma de todas as histórias: “uma coleção de ofí-
cios e de pontos de vista, de ontem, de hoje e
de amanhã” (Braudel, 1972). E, ao fazer uma
investigação histórica, sugere que devemos
compreender e distinguir os movimentos
longos e médios dos breves impulsos das
mudanças sociais, pois ao prestarmos atenção a es-
tes movimentos, percebemos a experiência social, seus modelos e dinâmica.
Da terceira geração de historiadores da Escola dos Annales, o medie-
valista Jacques Le Goff dedicou-se às mentalidades. Le Goff percebe nas men-
talidades os aspectos ligados ao cotidiano e às suas representações. As men-
talidades e as suas manifestações fazem parte das estruturas difíceis e lentas
na mudança/transformação. O objeto desta abordagem é o coletivo e a sua
relação com o individual, do que é geral ao marginal, o inconsciente e o in-
tencional, o estrutural e o conjuntural, que considera os aspectos psicológicos,
comportamentais e a tradição...
A partir destas considerações sobre a história, gostaria de traçar um bre-
ve panorama da história do design, para pensarmos o campo de atuação do
designer no tempo presente.

33
Aula 2

2. Panorama da história do design

Ao compreendermos que as transformações em qualquer área de conhe-


cimento são lentas e consequências de diversos fatores históricos, podemos
percebê-lo como resposta às demandas de cada contexto. O que não é diferen-
te com o campo do design...
Dentro desta perspectiva, penso que devemos entender o período da
História, que chamamos de Moderna, no qual se dá a passagem da sociedade
feudal à capitalista, e no qual ocorreram transformações que levaram à es-
truturação das duas formas de sociedades contemporâneas: a capitalista e a
socialista.
Os historiadores Francisco Falcon e Gerson Moura, em A formação do
mundo contemporâneo (1981), iniciam o estudo sobre a História Contempo-
rânea nos apresentando o período que a antecede – a História Moderna. De
fato, para que as questões referentes à História Contemporânea sejam compre-
endidas, torna-se relevante o conhecimento das estruturas que as geraram. Os
autores entendem a História Contemporânea como o período histórico cujo
marco inicial é a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), ao qual está vinculado o
fim da velha ordem e às grandes crises do século XX, no qual novas estruturas e
equilíbrios se organizam. O cenário destes movimentos é a Europa capitalista,
imperialista e industrial.

2.1. Panorama da História Moderna

A História Moderna é dividida pelos autores em duas fases:


• 1a fase: transição do feudalismo para o capitalismo (séculos XIV/XV); e
• 2a fase: estabelecimento e expansão das sociedades capitalistas (sécu-
los XVIII/XIX).
A fase de transição também é chamada de era do “capitalismo comer-
cial”, ou mercantilismo, ou era pré-capitalista. É caracterizada:
• pela acumulação primitiva de capital, oriunda da concentração de tí-
tulos e bens existentes para especulação da agricultura, indústria e
comércio;
• pela formação do proletariado resultante da liberação da mão de obra
camponesa que, sem terras, emigra para as cidades ou colônias, e da
desintegração das corporações de ofícios tradicionais incapazes de
acompanhar a demanda em expansão do mercado consumidor e re-
sistir aos preços mais baixos dos novos setores de produção; e

34
Design e Moda

• pelos progressos de técnicas aplicadas à produção: novos recursos tec-


nológicos e inventos mecânicos capazes de multiplicar, com rapidez e
regularidade, o trabalho humano, utilizando a energia hidráulica e
mais tarde o vapor, reduzindo os custos de produção e aumentando
a produtividade.
Nesse cenário de transição e novas demandas econômicas, em que o
processo de acumulação de bens de capital financiou a transição das pequenas
oficinas artesanais para grandes fábricas, ampliação do mercado consumidor e
alargamento do comércio, a Revolução Industrial ocorre.

2.1.1. Revolução Industrial (século XVII ao XIX)

O termo Revolução Industrial foi popularizado pelo historiador e econo-


mista inglês Arnold Tounbee (1852-1883), para descrever a rápida industrializa-
ção vivida na Grã-Bretanha, entre 1760-1840, que provocou alterações tecnoló-
gicas, socioeconômicas e culturais.
Aquele que produzia não era mais o “dono” do
processo de produção, nem da matéria-prima e nem do
produto final. Os trabalhadores passaram a vender sua
Fonte: Wikimedia Commons | Foto: Amman and Hans Sachs (1568)

força de trabalho e controlar máquinas que pertenciam


ao empresário − dono dos mecanismos de produção e
do lucro. Nesta nova estrutura, almejou-se o aumento e
rapidez na produção a baixos custos, que passou a ser
dividida em etapas planejadas, na qual cada trabalhador
ou grupo de trabalhadores passava a dominar apenas
uma etapa na confecção de um único produto. A nova
organização distanciou o trabalhador do produto final...
A Grã-Bretanha é o grande cenário das transfor-
mações nos meios de produção e fabricação. É pioneira
na industrialização, por conta da adoção de uma política
econômica liberal em meados do século XVIII, motivada por uma burguesia
com boas reservas de capital para:
• expandir os investimentos;
• ampliar os lucros;
• financiar e incrementar o setor fabril.
Além disso, a Grã-Bretanha pôde contar com grandes reservas de carvão
mineral − a principal fonte de energia para movimentar as máquinas a vapor
− e de minério de ferro. Destas ações, ocorreu um enorme progresso tecnoló-

35
Aula 2

gico e um grande aumento da produtividade em um curto espaço de tempo,


passando a ser o maior exportador mundial de produtos manufaturados, a
começar pelos produtos têxteis, cerâmicas e estruturas de ferro fundido.
Ao final do século XVIII, a Grã-Bretanha conta com uma organização e
escala de produção industrial considerável, interessada não apenas em aten-
der demandas internas, mas também em ser a grande referência no mercado
internacional. Os principais centros industriais britânicos, no final do século
XVIII, são Birmingham, Manchester, Coalbrookdale (área de mineração do car-
vão) e Staffordshire (região de olarias).
A renda per capita e a população começaram a crescer de forma acelera-
da e, com isso, dá-se o aumento da demanda por produtos e serviços. Os gran-
des centros urbanos são beneficiados com mais alimentos, melhores transpor-
tes e maior oferta de bens manufaturados e novos produtos. A atmosfera é de
modernidade e muitos economistas políticos e empresários compreendiam o
progresso como um processo benéfico, que motivaria o sucesso nos negócios
e, consequentemente, seria revertido em lucros. Uma relevante camada da so-
ciedade é consumidora, tem forte poder de compra e passa a exigir produtos
mais sofisticados.
Segundo Denis (2004, p.
22-26), podemos observar no
mercado de artigos de luxo os
primórdios da organização in-
dustrial. Afinal, os produtos de
luxo – móveis, objetos de arte
e decoração, tapetes, louças,
tecidos finos, alfinetes, botões,
Fonte: Wikipedia Commons

brinquedos, rendas, fitas, five-


las, jogos, plantas ornamentais,
novos itens de alimentação e
bebida, produtos de beleza etc.
− associados à moda e consumi-
dos pela nobreza, motivaram a Um ambiente burguês vitoriano. O conforto expresso em objetos requintados: tapetes, espelhos
emoldurados, objetos decorativos e móveis. O lar como expressão da prosperidade familiar.
produção fabril focada na exce-
lência da solução plástica, ma-
téria-prima e mão de obra. Esses produtos passaram a ser referência para os
objetos de bom gosto, almejados pela burguesia e adequados para os novos
consumidores pelas manufaturas em crescimento.
Podemos dizer, assim, que as raízes do design estão na tradição artesa-
nal. Isto é, o aparecimento do profissional de design está vinculado ao cresci-

36
Design e Moda

mento da produção fabril, inicialmente artesanal, que precisou de um profis-


sional que solucionasse questões referentes ao produto a partir de demandas
observadas no mercado.
A fábrica de Cerâmicas Wedgwood é um ótimo exemplo de iniciativa
empresarial em meados do século XVIII. A empresa passou por rápido cresci-
mento, além de atender o mercado interno. Atenta ao crescente mercado de
classe média, levou seus produtos à exportação para toda a Europa e para as
Américas. Esta empresa:

• apresentou preocupação com os aspectos do mercado e adoção do


design no seu processo produtivo;
• contratou modeladores autônomos e artistas para realizar projetos:
John Flaxman, George Stubbs e Joseph Wright;
• perseguiu a produção de artigos de boa qualidade, a partir de novas
técnicas que simulavam materiais finos, associados ao luxo, tais como
o basalto e jaspe;
• desenvolveu os moldes repetidos e a decoração rápida a baixos custos;
• ofereceu aos revendedores louças por encomenda – que pelos cader-
nos de padrões e modelos poderiam personalizar o produto;
• já em 1773, elaborou catálogos impressos para anunciar seus produtos.

Produtos bons ou melhores que os da Antiguidade.


Para anunciar suas habilidades e sofisticação de técnicas de produção de ce-
râmicas, o empreendedor Josiah Wedgwood, atento ao que estava na moda e
ao gosto de seus consumidores, reproduziu o vaso Portland – famosa peça ro-
mana de camafeu, de propriedade do duque
de Portland. Segundo o historiador inglês
Adrian Forty (2007), o objetivo de Wedgwood
Fonte: Wikimedia Commons | Foto: © Marie-Lan Nguyen

e outros empreendedores do segmento não


era fazer com que as pessoas acreditassem
Fonte: Wikimedia Commons | Foto: Josiah

que seus artigos eram antigos, mas convencê-


los de que seus produtos, feitos por proces-
sos modernos de produção, eram tão bons
ou até melhores do que os da Antiguidade. A
seguir, você vê o vaso Portland original, feito
na Itália entre os 5 e 25 anos antes de Cristo,
à esquerda. À direita, o vaso Portland por Jo-
siah Wedgwood & Sons Ltd., dos anos 1790.

37
Aula 2

Ao final do século XVIII, a expressão do bom gosto tem como referência


o estilo neoclássico, que buscou nos motivos da antiguidade clássica greco-
romana qualidades decorativas para expressar os sentimentos modernos. O
estilo neoclássico estava na moda e as mais variadas mercadorias seguiram
este padrão até meados do século XIX.

Atividade 1 – Objetivo 1

Que aspectos e preocupações consideradas pertinentes ao design pode-


mos identificar nos depoimentos de Josiah Wedgwood a seguir?

Depoimento 1

A cerâmica de alta temperatura (vidrada a sal) era artigo de nossa manu-


fatura; mas isso era feito havia muito tempo e os preços estavam agora
tão baixos que os ceramistas não podiam gastar muito com ela, ou fazê-
la tão boa em todos os aspectos quanto os artigos que tinham feito até
então; e, em relação à elegância da forma, esse era um tema que rece-
bia pouca atenção. O próximo artigo em importância depois da cerâmica
de alta temperatura era uma imitação de casco de tartaruga, mas como
não houvera nenhum aperfeiçoamento nesse ramo durante vários anos,
o consumidor estava quase cansado dele; e, embora o preço tivesse bai-
xado de tempos em tempos para aumentar as vendas, o expediente não
adiantou e era preciso alguma coisa nova para dar um pouco de alento ao
negócio. (FORTY, 2007, p. 29)

Depoimento 2

Pretendo apenas ter tentado copiar as belas formas antigas, mas não com
servidão absoluta. Tratei de preservar o estilo e o espírito ou, se quiser, a
simplicidade elegante das formas antigas e, ao fazê-lo, introduzir toda a
variedade de que era capaz, e isso Sir William Hamilton me garante que
posso me aventurar a fazer, e que é esse o verdadeiro modo de copiar o
antigo. (FORTY, 2007, p. 34)

38
Design e Moda

Resposta e comentário

É interessante observar nos depoimentos de Wedgwood preocupações


tão comuns ao universo de análises que designers e empresários, atualmente,
consideram como básicas ao pensar um novo produto para o mercado. Na pri-
meira fase da industrialização, a competitividade e as demandas do mercado,
o gosto do consumidor, e o que a moda considerava como elegante, passaram
a ser observados e considerados na elaboração de um novo produto. Para tal,
novas composições de formas e ornamentos, materiais, técnicas e tecnologias
foram pensados e testados. O empresário busca desenvolver um produto inova-
dor, viável economicamente e coerente com os processos de produção.

A) Movimento Arts and Crafts (segunda metade do século XIX até


início do século XX)
Na segunda metade do século XIX, críticos, artistas, arquitetos e até fa-
bricantes vão debater, questionar e criticar a produção industrial, que, de for-
ma indiscriminada, fazia uso deste estilo na elaboração de objetos em massa.
Na Inglaterra, o movimento Arts and Crafts − termos que significam Artes e
Ofícios − vai se organizar a partir do debate dos membros da Art and Crafts
Exhibition Society, que buscou:
• pensar e experimentar um estilo autêntico e significativo para a épo-
ca;
• promover e ressaltar a qualidade e as virtudes da produção artesanal,
que possibilitava ao designer experimentar e explorar, de forma criati-
va, soluções plásticas e materiais versus a industrial.
O movimento foi liderado pelo escritor, crítico de arte e desenhista John
Ruskin (1819-1896); o arquiteto, pintor e escritor William Morris (1834-1896);

Vernacular: referente
e o designer Charles Robert Ashbee (1863-1942), que percebiam no objeto re-
à cultura, tradição e sultante do trabalho do artesão-artista a qualidade almejada no produto mo-
expressão popular, do
povo, de massa. derno.
O discurso do movimento não é antimoderno − embora fosse uma rea-
Historicistas vitorianos:
Estilos historicistas vito- ção à produção em massa, à industrialização e à divisão do trabalho, que con-
rianos estão vinculados siderava o resgate da tradição vernacular, da identidade e cultura nacionais
aos estilos do passado,
que, muitas vezes, usam e reconhecia no modelo das guildas medievais o ideal em condições sociais e
referências das culturas
atuação do artesão aos produtos de baixa qualidade. Na verdade, rejeitava a
greco-romanas como
elementos estéticos e estética e o ecletismo dos estilos historicistas vitorianos e os efeitos sociais da
formais, tais como o Ne-
Revolução Industrial. Valorizava e exaltava a virtude da simplicidade da forma
oclassismo, Renascimen-
to, Barroco e Rococó. e do uso honesto dos materiais.

39
Aula 2

O Arts and Crafts antecede o movimento Modernista, e um dos estilos


que vai expressar estes ideais é o Art Nouveau. Este movimento, em nosso pa-
norama da história do design, é importante, pois o consideramos uma grande
referência na forma de pensar e organizar o ensino. Um ensino:
• estruturado em oficinas de artesãos-artistas;
• sob a orientação de um ou mais mestres;
• e sob a percepção da produção do design, que será adotado na pri-
meira fase da Bauhaus − escola alemã, que experimentou um novo
modelo de ensino em design, que abordaremos mais à frente.
Os colaboradores do movimento Arts and Crafts foram chamados de
românticos, já que seus argumentos e metas, além de negar a produção me-
canizada, focavam na produção artesanal que não atendia às demandas do
contexto. Isso demandava a diminuição de custos e mercadorias mais baratas,
sendo assim, as soluções propostas foram consideradas economicamente invi-
áveis para a industrialização e pouco acessíveis para a maioria da população.
Faço uma pequena pausa para falar do estilo Art Nouveau – estilo ar-
tístico que teve suas raízes no movimento Arts and Crafts, e mostrou como
as ideias e os temas do passado poderiam ser reinterpretados com enfoque
moderno.

B) Art Nouveau (final do século XIX até o final da década de 1910)


Este estilo é uma “reação” à massificação e diversidade dos estilos que
Belle Époque: Período
careciam de qualquer relação com a função, imitações baratas e pretensiosas de riqueza e prosperi-
dade, mas marcado pelo
produzidas pela produção em massa medíocre.
antagonismo de classes,
O nome surgiu a partir de uma loja parisiense, chamada Maison de l’Art dos movimentos socia-
listas, comunistas e anar-
Nouveau, fundada em 1895, especializada em objetos e mobiliário seguindo as quistas. Acirrada política
internacional e competi-
características do estilo. O estilo foi apresentado e divulgado nas exposições
ção entre as nações no
internacionais como uma nova proposta de valorização do trabalho artesanal e mercado internacional.
O nacionalismo político
o compromisso com um estilo autêntico e engajado com a época e a qualidade – expresso no patriotis-
dos produtos artesanais; com destaque para móveis, objetos de decoração, lu- mo e orgulho nacional
− norteia os discursos.
minárias, louças, têxteis, joias, moda, cartazes, interiores... Foi difundido pela Auge do luxo entre a
burguesia; cultura de
Europa na Belle Époque – período compreendido entre as últimas décadas do elite, que valorizava as
século XIX e a eclosão da Primeira Guerra Mundial, em 1914. boas maneiras.

40
Design e Moda

Um pouco mais sobre as exposições internacionais.


A primeira exposição internacional − a Great Exhibition of the Work of Indus-
try of all Nations − ocorreu no Palácio de Cristal de Paxton, Hyde Park, em
Londres, de maio a outubro de 1851. As exposições internacionais foram idealizadas
pelo príncipe Albert, marido da Rainha Victoria, para comemorar o progresso e a paz
entre os povos.
Na primeira exposição havia 6.500 expositores, e foi visitada por mais de 6
milhões de pessoas. A exposição divulgava o que havia de bom e de melhor
na produção de cada país, reforçando a identidade nacional: esculturas ita-
Fonte: Wikimedia Commons

lianas; peles e canoas do Canadá; tapeçarias, porcelanas, perfumes france-


ses; máquinas inglesas (prensa hidráulica, teares mecânicos, locomotivas);
dentre outros. E, pela concorrência de mercado, estimulou os industriais a
aperfeiçoarem sua produção. Veja na imagem a grandeza e o estilo do Palá-
cio de Cristal de Paxton.

Reconhecemos o estilo Art Nouveau pela assimetria e movimento na


composição, curvas sinuosas, vitalidade e vigor da juventude, sensualidade,
paixão, leveza, transparência, mistério e fantasia...

Cartaz e pulseira desenhada por Alphonse Mucha e exe-


cutada pelo joalheiro Georges Fouquet (1898), para a atriz
Sarah Bernhardt, que interpretou a tragédia grega Medeia, de
Eurípedes. Podemos observar, tanto na pulseira como no car-
taz, as linhas e formas sinuosas, a sensualidade, o mistério, a
assimetria da composição, a leveza, a riqueza de detalhes, a
policromia e o efeito visual dramático, coerentes com a perso-
nagem e a tragédia.

41
Aula 2

A natureza é a grande referência do estilo:


• flores exóticas: orquídeas, íris, fúcsias;
• plantas marinhas;
• insetos: libélulas, besouros, borboletas, gafanhotos;
• aves que conjugam beleza e fantasia: pavões, cisnes, galos, corujas,
águias;
• répteis e anfíbios: serpentes, lagartos, rãs, camaleões;
• figuras mitológicas e fantásticas: dragões, sereias, ninfas;
• rostos e figuras femininas aladas com longos cabelos cacheados;
• ornamentos celtas e vikings;
• paisagens;
• estações do ano...

Imagem em domínio público

Litogravura colorida Dança (60x38cm), de Alphonse Mucha (1898), que faz parte de uma série que comemora as
artes. Valoriza a beleza da figura feminina, em composição dinâmica pelo movimento e torção do corpo, cabelos
longos e tecidos transparentes que se misturam e flutuam suavemente pelo sopro da brisa matinal. Ao fundo,
um elemento decorativo que nos lembra um mosaico ou uma joia, e outros remetem aos elementos florais.
Exotismo, sensualidade e movimento.

42
Design e Moda

Os efeitos visual, estético e formal são mais importantes que o valor do


material. Materiais foram pesquisados − vidros, chifres, madeiras, ferro, aço
etc. − para se verificar que efeitos visuais eram capazes de gerar, por exemplo,
em joias, objetos de decoração, itens de arquitetura, dentre outros.
Nesse período, o público leitor aumenta nos centros urbanos. A deman-
da por livros, jornais, revistas ilustradas, cartazes, embalagens, rótulos e catá-
logos para marcas comerciais cresce, motivando a modernização da tecnologia
na área gráfica – o uso de polpa de madeira na fabricação de papel, a técnica
da litografia colorida, a variedade e maiores dimensões de tipos, as máquinas
de composição, linotipo, prensa cilíndrica a vapor. Isso possibilitou a grande
oferta de impressos.

Máquinas que revolucionaram a indústria de impressos


Linotipo: Máquina de compor caracteres/tipos em linhas para impressão. A
máquina de composição de tipos de chumbo que teve o maior sucesso foi a
do emigrante alemão Ottmar Mergenthaler, inventada no ano de 1884, em
Baltimore, nos EUA.
Ver: http://tipografos.net/tecnologias/linotype.html.

Máquinas de composição: Máquinas semi-automáticas que possibilitavam alinhar, jun-


tar tipos móveis e outros elementos tipográficos para impressão.

O século XIX apresentou-se como o cenário de uma nova ordem social


urbana, do aumento do consumo dos gêneros de primeira necessidade e su-
pérfluos e do crescimento e solidificação da produção industrial. A Inglater-
ra desponta neste panorama, promovendo seus produtos e firmando acordos
que lhe garantem vantagens no mercado internacional. A partir da segunda
metade do século, outros países europeus e os Estados Unidos da América
promovem a industrialização em seus territórios e buscam obter maior repre-
sentatividade no mercado local e internacional.

Integração entre arte e indústria


A Grã-Bretanha passa a promover a integração da arte com a indústria desde
século XVIII. É fundada, em 1754, a Real Sociedade de Apoio às Artes, Ma-
nufatura e Comércio − Royal Society for the Encouragement of Arts, Manufacture and
Commerce (RSA). Escolas de design são abertas a partir de 1837. Em 1902 é fundada a
Associação Britânica de Padrões de Engenharia, e, em 1915, é formada a Associação de
Design e Indústria − Design and Industries Associations (DIA), organizada para promo-
ver o design junto à indústria.

43
Aula 2

Os grandes centros urbanos reorganizam


seu espaço, o fluxo de pessoas é grande, novos
meios de transporte são adotados. Novos hábitos
e interesses surgem; novas formas de lazer popu-
lar são promovidas − museus, circos, teatros, festas

Fonte: Flickr | Foto: Zemoko


populares, locais de exposição, parques e jardins.
Nesse cenário, novos processos e modalidades de
consumo se organizam, o consumo e lazer se unem
nas primeiras lojas de departamento (1860) − Bon
Marché e Printemps, em Paris; Liberty, em Londres;
Aristide Boucicaut, filho de um humilde chapeleiro, fundou a
Macy’s e Marble Dry Goods, em Nova York; e Notre loja Bon Marché, em Paris, que cria o crédito direto ao consu-
midor. Ao morrer, em 1877, tinha acumulado uma fortuna de
Dame de Paris, no Rio de Janeiro.
22 milhões de francos.

Estes espaços de consumo impactam os hábitos e imaginário do consu-


midor – são mundos de sonhos. Além disso, significam uma transformação nas
formas de consumo – o conforto e a economia de tempo −, já que diferentes ar-
tigos podem ser adquiridos em um mesmo local. É o auto-serviço. Apresentam
os preços fixos nas mercadorias e diferentes meios de financiamento, além dos
métodos de distribuição, estocagem e relação com os fornecedores. O consu-
mo passa a ser individual e influenciado pela moda.
Os objetos de família, sinônimo de tradição, passam a compartilhar o
espaço com os novos objetos de moda, que têm o ciclo de vida menor. A moda
passa ser um agente regulador do gosto. As pessoas passam a construir a pró-
pria imagem e identidade, bem como ostentar seus valores, por meio de op-
ções de leitura, vestuário, decoração, consumo…
Nesse cenário, o design passa a ser uma atividade conciliadora das de-
mandas do mercado e as expectativas do industrial, um estímulo para a forma-
ção de códigos simbólicos de significação, agente da reconfiguração da vida
social, contribuindo para projetar a cultura material e visual da época. Será o
veículo de expressão dos novos hábitos de consumo. O designer vai atuar em
diferentes contextos, e o resultado de suas atividades vai ser associado a:
• aparência, sinalização, organização, divulgação e apresentação das
informações;
• projetos para a produção de objetos utilitários em metal, vidro e
cerâmica;
• móveis, tapetes e papéis de parede;
• mercadorias de uso essencialmente doméstico ou pessoal;
• projetos para interiores e fachadas;
• tecidos para roupas...

44
Design e Moda

2.1.2. Panorama da História Contemporânea

Na virada do século XIX para o XX, a oferta, circulação, concorrência e


divulgação de produtos no mercado internacional estimulam os industriais a
aperfeiçoarem seus produtos e produção. É grande o interesse na exportação,
a indústria moderna segue se desenvolvendo e o design passa a ser entendido
como recurso para a produção otimizada. Os profissionais debatem harmonia
entre utilidade e beleza, o uso dos ornamentos deve ser racional, busca-se a es-
tética da eficiência. Governos adotam sistemas técnicos e medidas de padrões
básicas, preocupados com a facilidade de troca de peças e componentes.

A) Nos Estados Unidos


O Sistema Americano surge como o modelo na produção industrial em
massa: larga escala de produtos padronizados, partes intercambiáveis, utiliza-
ção de máquinas-ferramentas e operações mecânicas simplificadas. O grande
exemplo deste sistema é o Fordismo, que buscou melhorias na produção pela
organização de um novo modelo de produção.

Máquinas-ferramentas – substituição do trabalho manual pelo mecânico


Elas têm como objetivo substituir o trabalho manual por trabalho mecânico
na fabricação de peças ou objetos de metal, madeira, plásticos e outros mate-
riais. Executam operações pouco viáveis na produção artesanal devido ao ta-
manho das peças ou outras circunstâncias. A máquina ferramenta mais antiga é o torno
mecânico, do qual derivaram a fresadora, furadeira, aplainadora mecânica, retificadora,
dentre outras (PUGLIESI, 1975).

Em 1913, Henry Ford e sua equipe raciona-


lizaram a produção de carros, pensaram em uma
linha de produção em fluxo contínuo, velocidade
Fonte: Imagem de domínio público.

constante e ritmo fixo – a linha de montagem. O


trabalho era dividido em tarefas simples e pode-
ria ser desempenhado por operários não qualifi-
cados, em ritmo ditado pela esteira mecanizada.
Dessa forma reduziam-se os movimentos desne-
cessários e aumentava-se a produtividade, que
previa a disposição correta das máquinas, equi-

45
Aula 2

pamentos e operários para o fluxo contínuo de peças. Em 1914, a linha móvel


de montagem passou a produzir o Ford T, carro que simbolizava modernidade,
produtividade e prosperidade.
A Ford Motor Company
foi fundada em 1901, pelo en-

Fonte: Imagem de domínio público, retirada do Jornal Literary Digest


genheiro Henry Ford e por doze
investidores, em Detroit, Michi-
gan, EUA. A preocupação do em-
presário era produzir carros em
grande quantidade e baixo cus-
to. O Ford T, lançado em 1908,
foi um sucesso de vendas. Até
1927, foram vendidos 15 milhões
carros.
Fordismo é o termo usa-
do para descrever o sistema de
gerenciamento do trabalho e de
fabricação focado na produção
em série, adotado pelos países desenvolvidos no século XX, que derivou do
sistema de fabricação do Modelo T. Por quase 50 anos foi sinônimo de desen-
volvimento industrial.

A máquina que mudou o mundo


Fonte: Imagem de domínio público | Foto: IFCAR
Fonte: Imagem de domínio público |
Foto: Harry Shipler

Ford T (1908): qualidade, grande Ford V8: novo modelo de sucesso,


quantidade e baixo custo. novo estilo, sofisticação.

Para saber mais detalhes sobre a história do Ford T, sugiro a leitura do texto: WOMACK,
James P.; JONES, Daniel T.; ROSS, Daniel. A máquina que mudou o mundo. Rio de Ja-
neiro: Campus, 2004.

46
Design e Moda

Atividade 3 – Objetivo 3

Vamos realizar um breve estudo de caso. Entre no site da empresa de ar-


mas americana Colt (http://www.colt.com/mil/history.asp) e identifique aspectos
que foram relevantes para a configuração de uma produção seriada eficiente.

Resposta e comentário

A indústria de armamentos nos EUA contribuiu para a compreensão do


processo de fabricação dentro da nova demanda de produtos, configurando pa-
drões de eficiência que buscavam a larga escala de produtos padronizados, com
partes intercambiáveis, fazendo uso da utilização de máquinas-ferramentas em
operações mecânicas simplificadas.

B) Na Alemanha
No cenário em que foram pensadas e debatidas modificações na estru-
tura do processo de trabalho e métodos de conceber e desenhar produtos, é
formada a Deutscher Werkbund (Associação Alemã do Trabalho) − fórum de
empresários, políticos, artistas, artesãos, arquitetos e publicitários − na Alema-
nha, em 1907. Tem como meta motivar a cooperação entre arte, ofícios artesa-
nais e indústria, focada nos novos padrões de qualidade, padronização técnica
e de estilo, e assim promover os produtos e a cultura alemães.
O arquiteto Hermann Muthesius (1861-1927), um dos fundadores da
Associação, apoiava e reivindicava uma relação mais estreita entre produção
industrial e o estilo nacional, o que possibilitaria a supremacia dos produtos
alemães no mercado internacional, já que o design permitiria o aumento das
exportações e a competitividade.
A partir de 1912, a Deutscher Werkbund passa a publicar o anuário sobre
trabalhos de design e artigos de seus membros, além de promover exposições e
debates sobre a prática do design. É dissolvida em 1934, após a ascensão do partido
Nacional Socialista de Adolf Hitler, que volta a atuar em 1947, mas menos influente.
O governo prussiano enviou Muthesius como adido diplomático para a
Inglaterra, onde permaneceu por seis anos (1896-1903). Sua missão era obser-
var os aspectos que possibilitaram o sucesso do design britânico, visitando as
oficinas do movimento Arts and Crafts.

47
Aula 2

Commons | Foto: Max


Fonte: WIKIMEDIA
Um pioneiro do design − Peter Behrens
Peter Behrens (1858-1940) – um dos pioneiros do design, em 1907, passa

Liebermann
a prestar serviços como conselheiro artístico para a AEG − Allgemeine
Elektrizitats Gesellschaft −, fundada em 1883, em Berlim. Foi responsável
Peter Behrens era conhecido como
pelos projetos de prédios da companhia, pelo design dos produtos, pela identidade
Herr Werkbund, que significa
corporativa e pela programação visual de seus produtos gráficos. A AEG tornou-se uma Senhor Werkbund, aquele que
pôs em prática as questões deba-
referência por ter combinado e explorado, na organização do seu processo produtivo, tidas na Deutscher Werkbund. De
1907 a 1912, Behrens teve como
os elementos padronizados, dispositivos estilísticos baseados em formas e técnicas ar- alunos e assistentes em seu ate-
tesanais, o domínio da função técnica, diferentes acabamentos de superfícies e diversi- lier Walter Gropius, Ludwig Mies
van der Rohe, Le Corbusier, Adolf
dade de dimensões, o que possibilitou a grande linha de produtos. Meyer, Jean Kramer e outros.

Deste grupo de entusiastas, destaco o arquiteto Walter Gropius (1883-


1969). Membro ativo do Deutscher Werkbund, que, apoiado pelo governo de
Weimar, será responsável pela fusão entre a Academia de Belas-Artes e a Esco-
la de Artes e Ofícios, formando a Staatliches Bauhaus − escola interdisciplinar
de artesanato e design, que formaria profissionais criativos para o mercado.
Buscou estabelecer parcerias com as indústrias e promover atividades de ex-
tensão, e compartilhou das ideias da vanguarda artística do Construtivismo
e do Neoplasticismo (De Stijl – O Estilo). Com ideário socialista, percebia em
todos os saberes um meio para construir uma sociedade melhor, mais livre,
mais justa e plenamente internacional, sem conflitos de nacionalidade e raça.
O Construtivismo foi um movimento estético-político iniciado na Rússia a
partir de 1914, e a vanguarda recebeu a revolução bolchevique de 07 de novem-
bro de 1917 com entusiasmo. Ideais focados em uma nova sociedade, novo ho-
mem, novas possibilidades política e artística. Negava uma “arte pura”, procurou
abolir a ideia de que a arte é um elemento especial da criação humana, separada
do mundo cotidiano. Alexander Rodchenko e Varvara Stepanova publicam em
1920 o Manifesto de Produção − rejeição da tradição, entusiasmo pela tecnolo-
gia à ideologia comunista. A arte torna-se instrumento de transformação social,
participa da reconstrução do modo de vida e da “revolucionarização” da consci-
ência do povo. Em busca de um novo vocabulário visual pela utilização constan-
te de geometria, cores primárias, fotomontagem e a tipografia sem serifa.
O Neoplasticismo foi um movimento fundado por grupo de arquitetos,
designers, pintores, pensadores e poetas, na Holanda, em 1917: Theo van
Doesburg, Piet Mondrian, Jacob Johannes Poud, Jan Wils, Rob Van’t Hoff,
Thomas Gerrit Rietveld. Buscava uma nova cultura baseada na equivalência
entre universalidade e individualidade, abandono das formas naturais na arte
e arquitetura, e estabelecimento da nova e internacional unidade da cultura,
com premissas revolucionárias. Arte que incorporasse a nova visão da vida mo-
derna: total abstração geométrica; composição formal entre linhas horizontais
e verticais, objetiva o equilíbrio e a proporção; cores: vermelho, azul, amarelo,
preto, branco e cinza.

48
Design e Moda

“A arte não é um espelho para refletir o mundo, mas


um martelo para forjá-lo”.
Vladimir Maiakovski

A Fase de fundação (1919-1923) da Bauhaus, sob direção de Walter


Gropius, agrega pessoas e propostas diferentes que pensam ideias inovado-
ras. A estrutura de ensino está embasada nas oficinas − cerâmica, metal, tece-
lagem, mobiliário, vitrais, pintura mural, pintura de cavalete, escultura e ta-
lha, encadernação, impressão gráfica, teatro, arquitetura, design de interiores,
publicidade e fotografia, nas quais se desenvolviam capacidades específicas,
técnico-artesanais e artístico-criativas pelo trabalho prático. O corpo docente
heterogêneo é formado por: Johannes Itten (até 1923), Georg Muche, Gerhard
Marcks, László Moholy-Nagy, Lothar Schreyer, Lyonel Feininger, Oskar Schlemmer,
Paul Klee e Vassily Kandinsky.
A Fase de consolidação (1923-1928), ainda sob direção de Walter Gropius,
tem o discurso focado no tecnicismo, racionalismo e funcionalismo rígido: a
forma ideal de qualquer objeto deve ser determinada pela sua função. A pro-
dução em série e em massa que busca a síntese artística e o social. Em 1923, a
escola realizou a primeira grande mostra pública de suas atividades − Exposi-
ção da Bauhaus; e, em 1925, formou pequena empresa, Bauhaus GmbH, para
distribuir produtos projetados na instituição (centro de produção de protótipos
para a indústria). Nesse ano, a escola foi transferência para a cidade industrial
Dessau. Ex-alunos são incorporados ao corpo docente: Herbert Bayer, Marcel
Breuer, Hinnerk Scheper, Joost Schmidt e Gunta Stolzl.
A Fase de desintegração (1928-1933), inicialmente sob direção do arqui-
teto suíço Hannes Meyer (até 1930) e, posteriormente, de Ludwig Mies van
de Rohe. Sob direção de Meyer, deixa de ser uma escola de arte. A orientação
foi pensar um local de produção voltada à satisfação de necessidades sociais.
O ensino sistemático tem como intenção pensar o design como ação cons-
trutiva. Nos últimos anos, a escola passou a ser chamada de Hochschule für
Gestaltung. Em 1932, foi transferida para Berlim como instituto privado. Em
20/07/1933, sob repressão dos nacional-socialistas (National-sozialistische
Deutsche Arbeiterpartei), que associavam o espaço à subversão e ideário so-
cialista, a escola foi dissolvida.
A Bauhaus é considerada como o principal modelo do ensino de design
no século XX.
Ao chegarmos à formação e dissolução da Bauhaus, falaremos de forma
esquemática da inserção, atuação e características do design aos dias atuais
a partir da década de 1920. Assim, você poderá ter um panorama resumido e
observar as mudanças vivenciadas pelo design conforme as demandas de cada
década.

49
Aula 2

Anos 1920 Pela coletividade + o ideário é socialista + engajamento político; o design


Vanguardas europeias compreendido como ação construtiva, unificada e global; as transformações
Movimento modernista: na indústria intensificaram o trabalho do designer; designers passam a atuar
ruptura estética com os na indústria da moda e alta-costura, a identidade é marcada através do design;
padrões acadêmicos tecnologia + indústria + design identificados com o progresso industrial, mo-
dernidade e novos ideais estéticos e referências para a produção e reprodu-
ção artística.

Anos 1930 Transformações na indústria: novas tecnologias e materiais (alumínio, baque-


A Era do Rádio lite, cromados e melamina); designers americanos fazem uso de superfícies
cromadas, seu brilho acentua as formas aerodinâmicas dos produtos; nova
geração de designers, com formação ligada à publicidade, artes, cenografia
teatral, acostumados a trabalhar em equipes e em contexto comercial; projeto
de design é a fórmula para o êxito comercial; representação da velocidade
como elemento estético: alongamento assimétrico das formas, arredondadas
e aerodinâmicas, acabamento suave, nervuras estruturadas aplicados a trens,
automóveis, ônibus e aviões – streamlining (linha de fluxo de uma corrente
de ar, sinônimo de velocidade, dinamismo, eficiência e modernidade. Foco na
aparência e tratamento de superfícies; em tornar os produtos mais atraentes e
estimular o consumo, estratégia para a obsolescência planejada e aceleração
do ciclo de vida de um produto.

Anos 1940 Pesquisados e fabricados fios sintéticos para fins bélicos - nylon, que passa a
Anos de guerra ser usado na fabricação de tecidos; designers e arquitetos engajados em obras
Guerra + propaganda públicas, propaganda política com feições nacionalistas; ênfase militar no fun-
política + design cionalismo; elementos geométricos simples, modulados e modulares; eficiên-
cia, qualidade e durabilidade; estudos em aero e hidrodinâmica; novas formas
de propulsão. Nos EUA, crescimento econômico, desenvolvimento industrial
e agrícola; país autoconfiante em sua prosperidade; o consumo é intensifi-
cado. No pós-guerra: reorganização política, econômica e industrial; países
adotaram legislações ao estabelecer padrões de ensino do design orientados
para as necessidades da indústria; interesse em motivar o produto industrial
nacional, torná-lo competitivo no mercado externo. Na moda, após os rigores
da guerra, reação à militarização e à masculinização das formas femininas:
o New Look - uma nova silhueta feminina. O cinema segue lançando moda,
influenciando hábitos, conceitos estéticos e tendências de comportamento.

50
Design e Moda

Anos 1950 Expansão das grandes empresas multinacionais; organizações internacionais


por uma estabilidade monetária adequada ao comércio internacional; maior
Anos Dourados
crédito ao consumidor: cartões de crédito são lançados no mercado; início
O mundo dividido em
do regime de obsolescência programada dos produtos; estímulo ao consumo
dois polos + clima de
de reposição, superabundância de materiais e capacidade produtiva; consu-
democracia + incentivo
mismo = prosperidade. Nos EUA: da organização socioeconômica baseada no
ao consumo + expansão
consumo simples para o estágio de sociedade consumista. O rock’n’roll conta-
industrial + desenvolvi-
gia a juventude. O Pop Art. Tecnologias: TV, CAD, plásticos e espumas sintéti-
mento do design
cas, fibra de vidro, lycra. No design, o Estilo Internacional, módulos padroniza-
dos e formas universais; o objeto simplificado até atingir a forma ideal, reflexo
da sua função; a criação de formas universais reduziria as desigualdades e
promoveria uma sociedade mais justa... Escola de Ulm é fundada a partir de
modelos da Bauhaus: modernismo e funcionalismo. O design funcionalista é
atraente, conota austeridade, precisão, neutralidade, disciplina, ordem, esta-
bilidade, eficiência e modernidade.

Anos 1960 Explosão demográfica; crescimento dos meios de comunicação - difusão de


normas, valores, gostos e padrões de comportamento; eclode o movimento
Criatividade + individu-
estudantil internacional: mobilização e circulação de críticas às contradições
alidade + estilos de vida
da sociedade industrial capitalista, tecnocrática, dos valores e modo de vida
alternativos
ocidentais e os estilos tradicionais de autoridade e disciplina. O movimen-
to Hippie, a Contracultura: movimentos de mobilização e contestação social,
jovens em busca de novos valores. O psicodelismo: cores intensas, imagens
caleidoscópicas, efeito de luzes estroboscópicas, formas tridimensionais flu-
tuam no vazio, repetição de contrastes cromáticos; efeitos de vibração óptica
através das cores, superposição de imagens e textos altamente coloridos e
contrastantes, tons saturados. No design: móveis em fibras, espumas + mate-
riais sintéticos + infláveis... Italian design: objetos decorativos, policromados,
divertidos, provocativos e efêmeros.

Anos 1970 Sociedades pós-industriais (serviços, livre negociação financeira e informa-


ção); tecnociência computadorizada - novo cotidiano, o da informação; “a
Pós-modernidade +
estética impregna os objetos, para que eles se tornem mais atraentes”; des-
meio ambiente + tec-
centralização fabril e migração capital para países periféricos; terceirização
nologia + design
de serviços; capitalismo multinacional. Pluralismos incompatíveis; as van-
guardas perderam sua capacidade de escandalizar; popularização da moda,
o prêt-à-porter elegante e adequado à vida cotidiana urbana. A mercadoria
molda uma imagem para o consumidor. Formas esculturais fantásticas, cores
saturadas, formas amorfas, divertidas. Projetar considerando a funcionalida-
de, conforto, tecnologia, beleza, a distribuição, a manutenção, o pós-venda,
pluralismo de estilos; questionam-se a responsabilidade social do design e os
problemas ambientais.
O anti-design faz apologia ao valor artístico do design, rejeita o conservador, é
pela espontaneidade, criatividade e técnicas simples não industriais.

51
Aula 2

Anos 1980 Idade da informação; culto ao materialismo; prosperidade econômica; gera-

Pluralismo + novas ção yuppie - individualismo e mobilidade social; acidentes ambientais. Desper-

posturas e propostas tar da consciência ecológica. Tecnologias: laminados melamínicos, polímeros


variados, poliéster na moda, CD; popularização dos computadores pessoais;
registrada primeira patente de animal geneticamente modificado; reflexão e
movimento de “consciência do corpo” - culto ao corpo e à saúde. A moda
como expressão autêntica da personalidade, agente delimitador de identida-
de. Design é status, lhe atribuem valor de obra de arte; é comunicação, de-
sempenha papel de classificar - permite a afirmação social do seu consumidor
e delimita estilos de vida; representa e está preocupado com as necessidades
emotivas e psicológicas; tendências para atender gostos diversificados; desen-
volvimento de estratégias de marketing + lançamento do produto.

Anos 1990 Globalização.


Tecnologias: acesso à internet, Auto-CAD e 3D, processador Pentium, lança-
Mercado + consumo +
design + meio am- mento do DVD, compósitos de materiais, tecnologia informatizada e roboti-
biente zada. Na moda: estilo capaz de modelar o corpo; busca pela silhueta ideal; te-
cidos elásticos e inteligentes; materiais não convencionais + convencionais...
O design é conceito, comunicando imagens, associações psicológicas, valores
ou sentimentos; valor poético que transcende a objetividade; combinações
de materiais e linguagens anteriormente tidos como inconciliáveis: artesa-
nato, cibernética; luxo e minimalismo; high-tech; misticismo; papel social do
design; objetos multiusos e funções; consumidor intervém na definição das
utilizações das peças; objetos ressignificados com novas funções; designers
refletem sobre os recursos naturais e sustentabilidade; reciclando e reabili-
tando os materiais.

Anos 2000 Mundo globalizado. Debates, políticas e ações focadas nas questões ambientais.

A era da informação O design é conceito, experiência, afetividade e emoção; organiza, comunica,


sinaliza, veste, diferencia, inclui; tecnologia.

52
Design e Moda

O design ao longo do tempo representado em cadeiras

1850
Designer: Michael Thonet
Áustria
Modelo Thonet nº 14
Madeira e assento de palha

1910
Designer: Gerrit Rietveld
Holanda
Cadeira Vermelho e Azul
Madeira

1920
Vanguardas européias
Designer: Marcel Breur
Alemanha
Modelo nº B6
Aço cromado e madeira

1930
A Era do Rádio
Designer: Ludwing Mies Van der
Rohe
Alemanha
Modelo nº MR 90
Aço cromado e couro

1940
Anos de guerra
Designer: Charles e Ray Eames
EUA
Lounge Chair Wood
Madeira compensada moldada

53
Aula 2

1950
Anos dourados
Designer: Charles e Ray
Eames
EUA
Modelo Nº 670
Aluminio, couro, compensado
de madeira

1960
Designer: Eero Aarnio
Finlândia
Cadeira Globo
Poliéster, fibra de vidro, aluminio e espuma

1970
Designer: Mario Belline
Itállia
Modelo Le Bambole
Espuma de poliuretano, tecido e metal tubular

1980
Designer: Philippe Starck
França
Modelo Ed Archer
Aço, Aluminio e couro

1990
Designer: Donald Chadwick e William Stumpf (Herman Miller Furniture Co.)
EUA
Modelo Aeron
Alumínio reciclado e poliéster

54
Design e Moda

Atividade 4 – Objetivo 4

Diversos produtos sofreram variações em seu design ao longo do tempo.


Visite os sites a seguir, da Philips e da Shiseido, e faça uma avaliação do design
dos produtos dessas marcas em relação ao contexto histórico em que foram
comercializados.
http://www.us.shiseido.com/about/story/index.htm
http://www.philips.com.br/about/company/history/keyinventions/index.
page

Resposta e comentário

Neste exemplo de linha cronológica, podemos observar que os objetos/


produtos são reflexo de seu tempo. Os tipos, funções, formas de usos, valores
agregados, soluções formais, estética, divulgação etc. são históricos.

Conclusão

Na presente aula, realizamos uma breve viagem ao passado para enten-


dermos as motivações e fatos históricos que fomentaram o surgimento do
design como atividade estratégica na configuração de produtos e serviços. Nes-
se panorama, é possível observar que o design germinou de demandas circuns-
critas em um cenário econômico, político, tecnológico e social − estreitamente
vinculado à consolidação da industrialização −, o que nos faz compreender
como a cultura material e o universo de sua produção são históricos. Passamos
a observar as variações e formas de pensar e aplicar o design ao longo de sua
história e a partir de exemplos diversos.

Para uma segunda olhada...

Chamo a atenção para as seguintes questões:


• a história é a ciência que estuda as experiências humanas ao longo
de tempo;
• Fernand Braudel abordou a pluralidade do tempo social e introduz
um debate sobre a sua curta e longa duração na história. Comparou a

55
Aula 2

abordagem da história tradicional – de curta duração − e a Nova Histó-


ria, a história das estruturas sociais − de longa duração;
• a Revolução Industrial é fruto de um cenário de transição e novas de-
mandas econômicas, em que o processo de acumulação de bens de
capital financiou a transição das pequenas oficinas artesanais para
grandes fábricas, ampliação do mercado consumidor e alargamento
do comércio;
• a Grã-Bretanha é o grande cenário das transformações nos meios de
produção e fabricação e é pioneira na industrialização, passando a ser
o maior exportador mundial de produtos manufaturados;
• mercado de artigos de luxo esteve vinculado aos primórdios da orga-
nização industrial, à moda, consumo de elite, que motivou a produ-
ção fabril focada na excelência da solução plástica, matéria-prima e
mão de obra;
• as raízes do design estão na tradição artesanal. O aparecimento do
profissional de design está vinculado ao crescimento da produção fa-
bril, inicialmente artesanal, que precisou de um profissional que solu-
cionasse questões referentes ao produto a partir de demandas obser-
vadas no mercado;
• na Inglaterra, formou-se o movimento Arts and Crafts – reação à pro-
dução em massa, à industrialização e aos seus efeitos;
• a partir de 1851, são organizadas exposições internacionais para co-
memorar o progresso e divulgar o que havia de bom e de melhor na
produção de cada país;
• o século XIX apresentou-se como o cenário de uma nova ordem social
urbana, do aumento do consumo dos gêneros de primeira necessida-
de e supérfluos, e crescimento e solidificação da produção industrial;
• os grandes centros urbanos reorganizam seu espaço, novos hábitos e
interesses; novas formas de lazer popular são promovidas, novos pro-
cessos e modalidades de consumo se organizam, o consumo e lazer
se unem nas primeiras lojas de departamento;
• o design passa ser uma atividade conciliadora das demandas do mer-
cado e as expectativas do industrial, um estímulo para a formação de
novos códigos simbólicos, agente da reconfiguração da vida social,
contribuindo para projetar a cultura material e visual da época. Será o
veículo de expressão dos novos hábitos de consumo;
• na virada do século XIX para o XX, a oferta, circulação, concorrência e
divulgação de produtos no mercado internacional estimula os indus-
triais a aperfeiçoarem seus produtos e produção. É grande o interesse

56
Design e Moda

na exportação, a indústria moderna segue se desenvolvendo e o design


passa a ser entendido como recurso para a produção otimizada. Os
profissionais debatem harmonia entre utilidade e beleza, o uso dos
ornamentos deve ser racional, busca-se a estética da eficiência;
• o Sistema Americano surge como o modelo na produção industrial
em massa: larga escala de produtos padronizados, partes intercam-
biáveis, utilização de máquinas-ferramentas e operações mecânicas
simplificadas. O grande exemplo deste sistema é o Fordismo;
• é formada a Deutscher Werkbund − fórum de empresários, políticos,
artistas, artesãos, arquitetos e publicitários, preocupado com a coo-
peração entre arte, ofícios artesanais e indústria, novos padrões de
qualidade, padronização técnica e de estilo, e promoção dos produtos
e cultura alemães;
• forma-se a Staatliches Bauhaus − escola interdisciplinar de artesana-
to e design, que formaria profissionais criativos para o mercado, que
buscou estabelecer parcerias com as indústrias. A Bauhaus é conside-
rada como o principal modelo do ensino de design no século XX.

Referências:

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57
Aula 2

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THE HORTA MUSEUM. Disponível em: <www.hortamuseum.be>. Acesso em 22 jan. 2010.
INTERNATIONAL Council of Graphic Design Associations. Disponível em: <www.icograda.
org>. Acesso em 22 jan. 2010.
MUSEUM für Gestaltung. Disponível em: <www.museum-gestaltung.ch>. Acesso em:
22 jan. 2010.
ROYAL Society for the Encouragement of Arts, Manufacture and Commerce. Disponível
em: <http://www.thersa.org>. Acesso em: 22 jan. 2010.
STAATLICHE Museen zu Berlin. Disponível em: www.smb.spk-berlin.de/kgm. Acesso em
22 jan. 2010.
VITRA. Disponível em: <www.vitra.com>. Acesso em: 22 jan. 2010.

58
Aula

O design e o campo da moda


3
Seus Objetivos:
Ao final desta aula, esperamos que você seja capaz de:
1. Identificar o design como parte do universo da moda e
o design que incorporou a moda ao seu campo;
2. Relacionar o designer de moda e o estilista;
3. Relacionar os campos da arte, moda e design;
4. Reconhecer as mudanças e variações sofridas pelo campo do
design ao longo de sua história.

3 horas de aula
Design e Moda

1. Introdução

[...] processo excepcional, inseparável do nascimento e do desenvolvimen-


to do mundo moderno ocidental. [...] é formação essencialmente sócio-
histórica, circunscrita a um tipo de sociedade.

[...] a moda não permaneceu acantonada [...] no campo do vestuário [...]


em velocidades e em graus diversos, outros setores − o mobiliário e os
objetos decorativos, a linguagem e as maneiras, os gostos e as idéias, os
artistas e as obras culturais − foram atingidos pelo processo da moda, com
paixonites e suas oscilações rápidas. (LIPOVETSKY, 2004.)

Dando continuidade à nossa reflexão sobre o design, a presente aula é


o nosso primeiro momento de pensar e relacionar o design à moda. Para com-
preendermos o diálogo entre estes dois campos, torna-se importante ainda
falarmos um pouco mais sobre o design, fazendo menção às atividades que
o antecederam e ocuparam o papel de idealizar a cultura material nas socie-
dades. Neste caminho, passaremos a traçar considerações que nos auxiliarão
a pensar o design como ferramenta estratégica no desenvolvimento de novos
produtos de moda, ou seja, passaremos a observar as mudanças que as socie-
dades contemporâneas vivenciaram e, consequentemente, o design e a moda.
No entanto, antes de continuarmos, com a intenção de alinharmos a nos-
sa reflexão, faço uma breve pausa para pensar moda... Moda é um fenômeno
que se organizou a partir do final da Idade Média e, até os dias atuais, veio se
adequando aos mais variados cenários históricos e demandas sociais, contri-
buindo para formular a cultura material e visual de cada época. Passou a signifi-
car o novo, negócio, consumo, variações sazonais, estilo de vida, prazer, desejo,
fantasia... Não ficou restrita ao vestuário e acessórios; se fez presente na arqui-
tetura, em interiores, nos objetos de design, na popularização de alimentos,
no desenvolvimento tecnológico, espaços de entretenimento, linguagem etc.
A moda é expressão da dinâmica social, um produto histórico.
O estudo e o conteúdo de nossa aula serão orientados e conduzidos pelo
texto da designer e Professora Deborah Christo, que nos apresentará questões
que relacionam o design com a arte e a moda. Nas aulas seguintes, passaremos
a apresentar as ferramentas do design no desenvolvimento de novos produtos
e iremos relacioná-los à moda.

2. Designer de Moda ou Estilista?

Pequena reflexão sobre a relação entre noções e valores do campo da


Arte, do Design e da Moda (Deborah Chagas Christo):

61
Aula 3

“Podemos observar que, cada vez mais,


a Moda e o Design estão se aproximando e esta
1. É o caso, por exemplo,
do curso de Design de aproximação não está marcada apenas pela inser-
Moda do Senai-Cetiqt, no ção da palavra design para nomear o profissional
Rio de Janeiro, e da Facul-
dade Novo Milênio, no Es-
que atua no campo da moda. De alguma forma o
pírito Santo. design, não apenas como palavra, mas também
como conceito, passou a fazer parte do universo
da moda. É o caso de cursos que antes eram deno-
minados apenas como Moda ou Estilismo e que, além de passarem a ser no-
meados como cursos de Design de Moda, fizeram alterações em sua estrutura
curricular preocupados em inserir conteúdos específicos
do campo do design1. E não só a moda assimilou o design
2. É o caso, por exemplo, das dissertações defendi-
em seu universo, também o design incorporou a moda das no mestrado em Design da Puc-Rio: de Ana Pau-
ao seu campo. Podemos concluir isso ao identificar a pre- la Lima de Carvalho, intitulada “O cenário da moda
prêt-à-porter no Brasil, do pós-guerra aos anos 50:
sença de pesquisadores desenvolvendo trabalhos acadê-
Produção de vestimentas femininas”, defendida em
micos dentro de mestrados em design 2 e a apresentação 2001; ou de Cristina Seixas sobre “A questão da có-
de artigos em espaços especialmente dedicados à dis- pia e da interpretação no contexto da produção de
moda da casa Canadá no Rio de Janeiro na década
cussão sobre moda em congressos científicos específicos de 50”, defendida em 2001; ou de Fernanda Ribeiro
de design3. Além disso, é curioso perceber que algumas Coutinho, intitulada “O entrecruzamento de códigos
culturais: jovens brasileiros face a códigos conflitan-
noções características do sistema da moda aparecem no
tes permeados pela lógica da moda”, defendida em
desenvolvimento de produtos característicos do design de 2004; ou ainda de Gilda Chataignier, intitulada “De-
senho de moda recorta e costura cultural da década
produto, como é o caso dos produtos da Coza 4, que tem
de 60: o papel do Jornal do Brasil na formação da
no seu site a apresentação dos “lançamentos verão 2007”, moda brasileira”, defendida em 2005.
nos remetendo à noção de lançamentos de coleção, fato
bastante característico do universo da moda. Para alguns,
talvez a relação entre o design e a moda seja bas-
tante óbvia e antiga, porém, precisamos entender
3. É o caso do 3° Congresso
Internacional de Pesquisa que até há pouco tempo os cursos de design incluí-
em Design que, em 2005, am em seu currículo apenas conteúdos específicos
teve uma seção destinada
apenas a trabalhos relacio-
do design de produto e do design gráfico. Alunos
nados com moda e design dos cursos de design que tinham interesse em fa-
têxtil
zer trabalhos de curso com a configuração de obje-
tos de moda tinham
Disponível em
dificuldades em conseguir espaço para isso den-
<http://www.coza.com.br>.
tro das disciplinas dos cursos. Além disso, noções Acesso em: 28 ago 2006
características do campo da moda, como as al-
terações de coleções a cada estação, os desfiles
de peças conceituais, a observação de tendências etc., muitas vezes eram mal
vistas pelos designers de produto. É preciso lembrar que o design no Brasil tem
uma forte influência da tradição modernista (DENIS, 2000, p. 168-175), relacio-
nando design ao racionalismo e a um funcionalismo de característica ideológi-
ca e afastando-o da arte e de conceitos relacionados à moda.”

62
Design e Moda

Faço aqui uma pausa para mencionar que a tradição modernista mencio-
nada pela autora tem a ver com as raízes e os primeiros movimentos de orga-
nizar a formação em design no Brasil. Vale lembrar que a ESDI (Escola Superior
de Desenho Industrial), fundada em 10 de julho de 1963, seguindo o modelo
adotado pela Escola de Ulm (1953-1968), na Alemanha, organizada a partir dos
valores modernistas e funcionalistas herdados da Bauhaus (mencionada na
aula 2), é considerada como o marco do início do ensino do design no Brasil. O
auge da expressão modernista pode ser observado no Estilo Internacional que
buscava nas soluções funcionais a forma ideal. É atraente pela sua simplicida-
de, conota austeridade, precisão, neutralidade, disciplina, ordem, estabilidade,
eficiência e modernidade. O objeto é simplificado até atingir a forma ideal e
definitiva, como reflexo estrutural e construtivo perfeito da sua função.

“Basta observar que o trabalho de designers americanos como Raymond


Loewy e Henry Dreyfuss foi durante muito tempo criticado no Brasil como se a
sua construção tivesse apenas a preocupação com a forma e o senso estético,
deixando de lado a “função”, que era entendida
O grifo aos termos “fun- como a preocupação com as “reais necessidades
ção” e “reais necessidades do usuário” e com o incremento da produção in-
do usuário” se justificam
para enfatizar o caráter dustrial do objeto. Seus trabalhos foram classifi-
ideológico que eles pos- cados e nomeados como Styling, contendo nesta
suem neste contexto.
denominação um certo juízo de valor identifican-
do-os com uma preocupação em estilizar um pro-
duto. Existe uma parcela de verdade nesta afirmação, porém é preciso entender
que existia uma necessidade de incentivar o consumo no mercado americano
a fim de manter o crescimento da economia após a crise de 1929. Era preciso
configurar novos objetos para incentivar o consumo e uma das maneiras de
fazer isto era deixando claro que o objeto era novo através da forma, do esti-
lo (DENIS, 2000, p. 132-136). Podemos observar uma semelhança com noções
características do mundo da moda. É interessante observar que alguns desses
designers trabalharam como ilustradores de moda antes de se dedicarem ao
design de produto (FIELD, 2001, p. 674).”

A nova geração de designers americanos com formação ligada à publi-


cidade, artes, cenografia teatral e outras áreas afins, acostumados a trabalhar
em um contexto comercial e para um mercado muito competitivo, em equi-
pes, foram contratados para re-estilizar os produtos existentes. O Styling surge
como uma estratégia, um recurso diferencial, que atuou na aparência e no
tratamento de superfícies, portanto, na qualidade expressiva e estética do pro-
duto. Buscaram tornar os objetos mais atraentes para estimular o consumidor
a comprar novos produtos, o que promoveu a aceleração do ciclo de vida dos
produtos, tornando-os obsoletos rapidamente… Para torná-los desejados, pen-
saram em diversos recursos para agregar valor e dar características diferencia-
das ao produto:

63
Aula 3

• representação da velocidade, eficiência e modernidade como elemen-


tos estéticos em formas arredondadas, aerodinâmicas e delgadas com
aspecto moderno, em acabamento suave e alongamento assimétrico;
• formas mais elegantes, embora exageradas e chamativas;
• aplicação de nervuras estruturadas;
• grande uso de superfícies cromadas − seu brilho acentuava as formas
aerodinâmicas dos produtos.

Geladeira L300 para Eletrolux, 1939. Design para Eletrolux, Raymond Loewy, 1939

Rádio cromado, Raymond Loewy, 1933

“Entre dois produtos de preço, função e qualidade iguais, o que tem melhor aspecto
vende-se melhor do que o outro.” (Raymond Loewy)

Raymond Loewy
Raymond Loewy foi um dos mais conhecidos designers industriais do século
XX. Nascido na França, passou a maior parte de sua carreira nos Estados Uni-
dos (para onde migrou em 1919), onde foi influenciado pelos aspectos da vida ameri-
cana. Quando Loewy chegou aos Estados Unidos, morou em Nova York e encontrou
trabalho como designer de vitrines para lojas de departamento, como Macy’s, além de
trabalhar como ilustrador de moda para Vogue e Harper’s Bazaar. Loewy fez diversos
trabalhos importantes. Dentre os seus clientes podemos destacar:
• Coca-Cola (redesenhou a garrafa original em 1955, adicionando a tipografia
branca e vívida Coke & Coca-Cola, desenhando e apresentando as primeiras
garrafas king-size no mesmo ano. Desenhou também a primeira lata de alu-
mínio em 1960);
• Frigidaire (geladeiras, fogões e freezers);
• Lucky Strike (embalagem, em 1940);
• NASA (estação espacial Skylab, primeiro design de interior para viagens espaciais);
• Sears (geladeira Coldspot de 1935 – sucesso de vendas);
• Shell (logomarca).
Fonte: Adaptado de http://www.raymondloewy.com/about/bio.html

64
Design e Moda

“É verdade que, fora do Brasil, o uso da palavra Design relacionada à


moda já é comum. Um estilista poderia ser facilmente reconhecido como um
fashion designer. Mas, em uma tradução literal, fashion designer também po-
deria ser designer de moda. Mas esta variação parece compreensível se levar-
mos em consideração que a própria tradução do termo design traz questões
ainda hoje discutidas dentro do campo (DENIS, 2000, p. 16-18). Basta lembrar
que os cursos de design de produto no Brasil foram intitulados inicialmente
como cursos de desenho industrial, ou seja, a tradução dada para a palavra
design na época foi desenho industrial. Mas não é objetivo deste artigo se
prender a uma discussão linguística, porém o interessante nesta observação é
ver que, através da análise dos discursos construídos nas discussões provoca-
das pela tradução do termo design, podemos identificar diferentes noções e
valores que estão presentes no campo do design. O mesmo poderia acontecer
com relação aos termos design de moda e estilismo.
Se considerarmos que, tanto estilista como designer de moda, poderiam
ser a tradução para fashion designer, então não deveria existir uma diferencia-
ção entre os dois. Porém parece existir uma noção de que o designer de moda
está relacionado ao campo do design e que o estilista estaria relacionado ao
campo da arte. Nesse sentido, o entendimento sobre a palavra design parece
estar vinculado à questão da indústria e, consequentemente, de todos os fato-
res que envolvem a produção de um objeto que está inserido no contexto do
mercado. Isto nos levaria a entender design como algo relacionado à produção
em série. Assim o designer seria um profissional preocupado com as questões
objetivas do produto, ou seja, com questões específicas do objeto, ignorando
os conteúdos subjetivos, ou seja, as questões relacionadas ao sujeito, como o
gosto e os conteúdos simbólicos. Por outro lado, esta relação nos faria enten-
der o estilista como um profissional criativo, livre para a conceituação de um
objeto e desvinculado das questões que envolvem o mercado, ou seja, livre
para criar peças únicas. Nesse sentido o estilista se assemelharia ao conceito
de artista como um gênio, pertencente ao campo da arte. Então, para melhor
entender a relação entre designer de moda e estilista, podemos fazer uma re-
flexão sobre as noções que envolvem o conceito de artista e de designer.
Até o final do século XV, o artista não era visto como gênio, ou seja, a
obra de arte não era a expressão individual de um artista, e sim uma produ-
ção coletiva que acontecia nas oficinas das Guildas. O que legitimava o artista
como tal era a conclusão de um curso de instrução que seguisse as suas nor-
mas e não um talento especial. Não havia demérito algum em produzir peças
utilitárias, como objetos decorativos, arcas de casamento, jarros e pratos, bra-
sões de armas, bandeiras ou tabuletas (HAUSER, 2000, p. 325-326). Mas, com

65
Aula 3

a ascensão das classes mercantis na Itália, que viam na arte uma forma de se
autopromover, a demanda e a competitividade no mercado de arte aumenta-
ram e o artista se emancipou e ascendeu socialmente. Ele passou a ser visto
como um gênio inato, dotado de uma personalidade característica e um talen-
to especial, que transcendia a sua época, a sociedade em que estava inserido e
a sua própria existência. A realização, ou melhor, o realizador da obra de arte
passou a ter mais valor do que a própria obra em si, e a atividade do artista se
tornou mais intelectual do que artesanal. Com isso, em sua formação, a prática
das oficinas foi sendo progressivamente substituída pela instrução teórica das
academias e escolas de arte (HAUSER, 2000, p. 322-354). Essas ideias foram
reforçadas pelas noções românticas do século XIX, em que a cultura era vista
como uma realidade superior e irredutível às demandas econômicas, a obra de
arte era fruto de uma criação livre e desinteressada e o artista era um indiví-
duo dotado de uma inspiração inata, que vivia fora das regras e demandas da
sociedade, consequentemente, um ser livre e marginal. Segundo Janet Wolff,
essa é uma “figura histórica” que foi transformada em “definição universal” e
que surge com o desenvolvimento do capitalismo industrial paralelamente à
ascensão do individualismo e com a substituição do antigo sistema de patrocí-
nio pelo sistema do crítico-comerciante, afastando o artista de qualquer grupo
social definido, capaz de lhe proporcionar uma forma segura de patrocínio
(WOLFF, 1982, p. 25). Além disso, a indústria cultural, que começou a se desen-
volver com a Revolução Industrial, e a ampliação e diversificação do público
consumidor, acabaram provocando uma diversificação de produtos e de cate-
gorias de produtores de bens simbólicos, gerando um processo de diferencia-
ção entre produtos com valor mercantil e produtos com valor propriamente
cultural. Segundo Bourdieu, a transformação da obra de arte em mercadoria e
o surgimento de uma categoria de produtores de bens simbólicos destinados
especificamente ao mercado propiciaram o desenvolvimento de uma “teoria
pura da arte”, responsável por determinar a diferença entre “arte como sim-
ples mercadoria” e “arte como pura significação”, abrindo espaço para que os
artistas e intelectuais buscassem uma distinção cultural, demonstrando, por
meio de suas práticas e representações, a singularidade da sua condição e a
raridade, originalidade e irredutibilidade da sua obra em mercadoria. Segun-
do ele, essa busca por uma distinção seria característica da própria estrutura
do campo da arte e seria reforçada pela noção do artista como um gênio
(BOURDIEU, 1999, p. 117-118). Então, realmente a noção de artista, criador e
gênio estaria vinculada ao campo da arte.”
Agora, se observarmos algumas definições de design vamos realmente
perceber um discurso relacionando o design à indústria e ao mercado. Segun-
do Maldonado, por exemplo...
66
Design e Moda

O desenho industrial (ou design) é uma atividade projetual que consiste


em determinar as propriedades formais dos objetos produzidos indus-
trialmente. Por propriedades formais não se entende apenas as caracte-
rísticas exteriores, senão, sobretudo, as relações funcionais e estruturais
que fazem com que um produto tenha uma unidade coerente do ponto
de vista, tanto do produtor, como do consumidor. (MALDONADO apud
BONFIM, 1998, p. 10– grifo da autora.)

“Isso definiria o design como uma atividade preocupada com a identifi-


cação de necessidades do consumidor para, através de um planejamento cor-
reto, suprir também as necessidades do produtor, tentando evitar problemas
e minimizar perdas e prejuízos tanto para um como para outro, ou seja, iden-
tificar necessidades do consumidor e conseguir identificar as melhores formas
de produzir industrialmente algo que supra essas necessidades. Isso envolveria
conhecimentos sobre custos, materiais, formas de produção, comportamentos
do consumidor, gestão de projetos, entre outros. Este conceito está marcado
por um olhar bastante pragmático e técnico sobre o design. No caso do Brasil,
este discurso foi reforçado por uma tradição modernista que marcou a insti-
tucionalização do design na década de 1950 e 1960 que tentava aproximar o
design da ciência e da técnica e afastá-lo do campo da arte. Porém, ao tentar-
mos identificar na história o surgimento desse profissional responsável pela
configuração de objetos que interagem com o cotidiano do homem, podemos
perceber que esta atividade no início estava ligada ao campo da arte. Na Idade
Média, por exemplo, o mesmo artista que era responsável por uma pintura
também construía um objeto utilitário como um baú, ou uma cama, sem isso
significar nenhum demérito. Essa divisão entre o que conhecemos como arte
pura e arte aplicada só vai se concretizar a partir do surgimento das manufa-
turas e do desenvolvimento das ciências no século XV. Com as manufaturas,
começa a existir uma divisão entre a produção e o projeto, divisão esta que se
intensificará com o advento da mecanização das manufaturas. Com isso o artis-
ta-artesão da Idade Média passa a ser ou o operário responsável pela produção
do objeto ou o mestre-desenhista responsável pelo seu projeto. Nesse momen-
to surge a noção do projeto como mercadoria, pois se alguém era responsável
pela criação e desenho de um objeto que poderia, a partir disso, ser produzido
por qualquer um, este desenho passa a ter valor, poderia ser vendido, ou seja,
passa a ser a peça fundamental da produção do objeto. Logo, este profissional
responsável por desenvolver o projeto passa a ser uma das peças principais da
empresa, muitas vezes recebendo altos salários (DENIS, 2000 p. 25, 29). Tendo
em vista que este profissional teve a sua origem no campo da arte, podemos
considerar que as noções que marcam este campo também poderiam influen-
ciar a estrutura de crenças e valores do designer e de como ele é visto pela
sociedade onde está inserido. Conforme já vimos, algumas das noções que
a arte traz consigo são a da capacidade criativa do artista, da posição social

67
Aula 3

diferenciada com relação ao resto da sociedade, da busca pela superação de


velhas formas através de novas manifestações artísticas, do comprometimento
com a inovação, entre outras (BOURDIEU, 1999). Talvez isto explique por que
alguns designers são vistos como artistas de talento especial e suas criações
ganham valor de verdadeiras “obras de arte”, ou por que objetos de design são
considerados como sinônimos de objetos modernos, inovadores e arrojados.
Isto não quer dizer que o design não tenha uma relação com a indústria e o
mercado. Não podemos esquecer que a atividade do designer ganhou força
com a Revolução Industrial e que as noções que envolvem a industrialização
ainda estão presentes no campo do design.
Segundo Cardoso, existe uma dialética que norteia as discussões sobre
as definições de design. De um lado as que são baseadas no objeto e de outro
as que são baseadas no processo. Porém, segundo ele, a solução para uma de-
finição de design não seria apenas a união entre estas duas formas de analisar
a atividade do designer, seria necessário considerar também que os produtos
desenvolvidos a partir de um determinado processo podem ser investidos de
significados que não são restritos aos percebidos claramente através da sua
natureza (DENIS, 1998, p. 15-17). Os seus objetos não são apenas soluções para
necessidades objetivas dos usuários, pois os usuários também possuem ne-
cessidades subjetivas, ou seja, desejos, anseios, expectativas. Logo, um objeto
adquire significados que vão além das suas questões estruturais e funcionais,
ou seja, podemos dizer que um objeto cumpre variadas funções. Além disso,
não podemos ignorar que os objetos estão inseridos no tempo e no espaço,
logo vão perdendo sentidos e adquirindo novos, ou seja, estes significados não
são estanques, eles podem ser alterados à medida que o contexto se modifica.
Segundo Cardoso, os objetos terão alguns significados universais e inerentes
e outros extremamente pessoais e volúveis. Estes significados são imputados,
através de atribuições ou apropriações, pelos fabricantes, distribuidores, ven-
dedores, consumidores ou pela união de todos estes agentes (DENIS, 2000, p.
33). Então, se o designer deve levar em consideração as necessidades subjeti-
vas do usuário e os significados adquiridos pelos objetos, sua atuação não está
vinculada apenas às questões produtivas e técnicas, mas também às questões
expressivas e simbólicas.”
Com isso, poderíamos dizer que, tanto valores relacionados à indústria
e ao mercado, como relacionados ao campo da arte, permeiam as discussões
sobre design. Logo, o termo design traria em si a confluência das noções e va-
lores característicos dessas duas áreas. Assim, dizer que o design de moda está
vinculado ao design, significaria dizer que ele também possui a influência des-
tes dois campos na construção dos seus significados e de seus discursos. Logo,
se o estilista está relacionado ao campo da arte e o designer possui a influência
tanto do campo da arte, como do mercado, então, não poderíamos separar

68
Design e Moda

estes dois termos como definições diferentes, teríamos que entendê-las como
termos diferentes para uma mesma definição. Talvez a necessidade de diferen-
ciação acabe caindo sobre a necessidade de legitimação a partir de instituições
de ensino, porém esta é uma discussão que caberá a um outro artigo.

Deborah Chagas Christo


Doutoranda em Design pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
(PUC-Rio), Mestre em Design pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro (PUC-Rio) e Bacharel em Desenho Industrial pela Escola Superior de Desenho
Industrial (ESDI) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Com dezessete
anos de experiência profissional como designer gráfica, trabalhou em escritórios de
Design, em empresas privadas e como autônoma, atuando na criação, desenvolvimento
e produção de projetos gráficos na área de identidade visual de empresas, embalagens,
editoria de livros, revistas e jornais, material promocional de eventos, sinalização etc.
Tem publicações em congressos e simpósios, tem como interesse a pesquisa sobre a
relação entre o campo da Arte, do Design e da Moda.

Atividade 1 – Objetivos 1, 2, 3 e 4

A partir do texto apresentado, em no máximo uma página, relacione


aspectos que vinculam a moda ao design e vice-versa.

69
Aula 3

Resposta e comentário

Mais uma vez nos deparamos com um panorama do design ao longo da


história. No texto que acabamos de ler, nos são apresentados uma reflexão e
um convite para um debate sobre a inserção do design no universo da moda e
vice-versa e a relação de ambos com a arte. Estas relações dinâmicas são traba-
lhadas como frutos de um processo histórico.

Atividade 2 – Objetivos 1 e 2

Visite o website da empresa Coza (http://www.coza.com.br) e faça uma


avaliação do seu website e produtos. Perceba e avalie os seguintes aspectos:
• Adequação ao contexto histórico;
• Adequação à moda;
• Inovações – propostas diferenciadas.
Em no máximo uma página, indique que aspectos da moda e do design
podemos perceber nos produtos e no website da empresa Coza?

70
Design e Moda

Resposta e comentário

Atualmente, as empresas se fazem conhecer, apresentam e oferecem


seus produtos ao mercado nas mais variadas formas, das grandes campanhas
publicitárias que circulam na mídia, aos websites facilmente acessáveis de qual-
quer lugar em que haja um computador ligado à internet. Além da divulgação
do catálogo de produtos e seus lançamentos, disponibilizam informações que
nos possibilitam conhecer a história de sua formação, a filosofia, preocupações
e metas da empresa. Um canal de comunicação com a empresa e compra pelo
site são acessíveis. São informações organizadas de forma tal que a comunica-
ção com o consumidor seja prática e eficiente. O design se faz presente na mar-
ca, expresso na identidade visual desenvolvida para o material gráfico – im-
presso e virtual −, no conceito que direciona a criação dos produtos. Aspectos
da moda são expressos em famílias/coleções de objetos, em usos, em formas,
paleta de cores, texturas, efeitos visuais, dimensões e composições adequados
ao estilo de vida urbana, contemporânea e que demanda praticidade.

Conclusão

O design e a moda são campos que passaram a interagir para atender


movimentos e novos anseios da sociedade e, portanto, demandas do mercado.
Ambos os campos dialogam com a arte, se relacionam e apresentam o discurso
que transita tanto entre as questões objetivas no desenvolvimento de um pro-
jeto quanto com as subjetivas.

Para uma segunda olhada...

• O design passou a fazer parte do universo da moda e vice-versa: no-


vos cursos foram oferecidos, pesquisadores desenvolvendo trabalhos
acadêmicos, profissionais de design e de moda atuando no mercado,
interação entre os conhecimentos específicos de cada área.
• O design e a moda movimentam e aquecem a competitividade no
mercado.
• O design é uma atividade preocupada com as necessidades do usuário/
consumidor, produtor e mercado; considera os aspectos objetivos no
desenvolvimento de um produto (questões formais, funcionais, técni-
cas, produtivas etc.) e os subjetivos (questões expressivas e simbólicas).

71
Aula 3

Referências:

BOMFIM, Gustavo Amarante. Idéias e formas na história do design: uma investigação


estética. João Pessoa: Editora Universitária/UFPB, 1998.
BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 1999.
COZA. Disponível em: <http://www.coza.com.br>. Acesso em: 28 ago. 2006
DENIS, Rafael Cardoso. Uma introdução à história do design. São Paulo: Edgard
Blücher, 2000.
DENIS, Rafael Cardoso. Design, cultura material e o fetichismo dos objetos. Arcos: de-
sign, cultura material e visualidade. Rio de Janeiro, v. 1, n. único, p. 14-39, out. 1998.
FIELD, Charlotte; FIELD, Peter. Design do século XX. Köln: Taschen, 2001.
HAUSER, Arnold. História social da arte e da literatura. São Paulo: Martins Fontes,
2000.
LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades mo-
dernas. 7. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
TEIXEIRA, José Carlos Bonzi. Gênese do Campo do Design no Brasil. 1997. Dissertação
(Mestrado em design) – Departamento de Artes e Design, Pontifica Universidade Cató-
lica, Rio de Janeiro, 1997.
WOLFF, Janet. A produção social da arte. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.

Sites consultados:
RAYMOND Loewy; thefather of industrial design. Dsiponível em: <http://www.raymon-
dloewy.com/about/bio.html>. Acesso em: 18 fev. 2010.

72
Aula

Desenvolvendo produtos de moda


4
Seus Objetivos:
Ao final desta aula, esperamos que você seja capaz de:
1. Identificar a importância do design no desenvolvi-
mento de produtos de moda;
2. Utilizar as ferramentas empregadas pelo design no desen-
volvimento de produtos de moda;
3. Reconhecer o potencial inovador do design e sua capacidade de
diminuir custos e otimizar a produção.

3 horas de aula
Design e Moda

1. Analisando design e moda

“O design é em sua essência um processo criativo e inovador, provedor


de soluções para problemas de importância fundamental para as esferas
produtivas, tecnológicas, econômicas, sociais, ambientais e culturais.”
Mônica Moura
(MOURA, 2008, p. 71)

Nossa quarta aula apresentará o seu conteúdo a partir de uma ativida-


de prática. O objetivo desta aula é, exatamente, verificar e se apropriar das
relações existentes entre as ferramentas utilizadas pelo design na solução de
problemas e nas possibilidades de inovar e de como essas ferramentas podem,
e devem, contribuir no desenvolvimento de produtos de moda.
Estas questões são relevantes para realizarmos um exercício que tem por
objetivo a vivência e a compreensão das ferramentas do design importantes no
desenvolvimento de um novo produto, ou no redesign de um produto já exis-
tente. Aproveito para sugerir uma pequena lista de referências bibliográficas
que nos oferece ricos debates e opiniões sobre design e moda. A leitura desses
textos, incluídos na bibliografia de apoio, pode auxiliá-lo muito no melhor en-
tendimento das questões referentes à relação entre design e moda. A leitura
de textos é sempre uma forma de ampliarmos nosso conhecimento, são novas
ideias, outros olhares. Fica aqui, então, essa sugestão.

Bibliografia de apoio

DEMETRESCO, Sylvia; MARTINS, Marcelo M. Estetização espetacularizada


do design que já pode virar moda. In: OLIVEIRA, Ana Claudia de; CASTILHO,
Kátia. (Org.). Corpo e moda: por uma compreensão do contemporâneo.
Barueri: Estação das Letras e Cores Editora, 2008.
FIORINI, Verônica. Design de moda: abordagens conceituais e metodo-
lógicas. PIRES, Dorotéia Baduy (Org). Design de moda: olhares diversos.
Barueri: Estação das Letras e Cores Editora, 2008.
MORAES, Dijon de. Moda, design e complexidade. In: Design de moda:
olhares diversos. PIRES, Dorotéia Baduy (Org). Design de moda: olhares
diversos. Barueri: Estação das Letras e Cores Editora, 2008.
MOURA, Mônica. A moda entre a arte e o design. In: PIRES, Dorotéia Baduy
(Org). Design de moda: olhares diversos. Barueri: Estação das Letras e
Cores Editora, 2008.

75
Aula 4

PIRES, Dorotéia Baduy. Design de moda: uma nova cultura. Dobras Revis-
ta, Barueri, n. 1, v. 1, p. 66-73, 2007.
PIRES, Dorotéia Baduy. O desenvolvimento de produtos de moda: uma
atividade multidisciplinar. CONGRESSO BRASILEIRO DE PESQUISA E DE-
SENVOLVIMENTO EM Design, 6., 2004, São Paulo. Anais... São Paulo: Fun-
dação Armando Penteado, 2004.
SANT’ANA, Denise Bernuzzi de. Consumir é ser feliz. In: OLIVEIRA, Ana
Claudia de; CASTILHO, Kátia. (Org.). Corpo e moda: por uma compreen-
são do contemporâneo. Barueri: Estação das Letras e Cores Editora, 2008.

Atividade 1 – Objetivos 1, 2 e 3

Agora vamos utilizar o potencial inovador do design e elaborar um estudo


de caso em que as ferramentas de diagnóstico utilizadas pelo design deverão ser
utilizadas. Nossa atividade será um pouco longa e exigirá muita pesquisa e aná-
lise. Para dar início, você deverá escolher um segmento, entre os existentes, da
área de moda: feminino, masculino, infantil, calçados, acessórios ou moda casa.
Uma vez escolhido seu segmento, faça uma pesquisa acerca das marcas encontra-
das no mercado e opte por uma delas. Ao fazer sua escolha, leve em consideração
a sua empatia com a marca, a facilidade de acesso às informações, a proximidade
dos pontos de venda etc. Lembre-se de que você precisará ir aos pontos de ven-
da, conversar com vendedores e, possivelmente, com gerentes, observar vitrines,
displays, fluxo de clientes, público-alvo etc. Você deverá se tornar um grande
conhecedor da marca selecionada e dos produtos por ela comercializados.
Ao final de toda a pesquisa e análise que vamos propor − análise esta
que deverá utilizar as ferramentas das quais o design faz uso −, você deve-
rá realizar um diagnóstico acerca de um dos produtos comercializados pela
marca e propor possíveis modificações visando a uma melhora em um dos
seguintes aspectos: conforto, usabilidade, praticidade, ergonomia ou impacto
ambiental. Se você quiser, poderá, lógico, sugerir modificações em mais de um
aspecto. Não se esqueça de que, quanto mais você praticar, mais facilmente se
apropriará dos conceitos e, consequentemente, das ferramentas apresentadas
pelo exercício em questão.
Mais à frente nesta aula, lhe será fornecida uma tabela com as tarefas so-
licitadas, o objetivo de cada uma delas e o resultado esperado. Todo o material
derivado de sua coleta deverá ser enviado à tutora da disciplina por etapas, ou
seja, por tarefa finalizada, e, a cada tarefa finalizada, será dado um feedback e
a indicação da continuidade dos trabalhos.
No entanto, antes de apresentarmos esta tabela e de você começar a
realizar a atividade, precisamos definir alguns conceitos.

76
Design e Moda

Linhas de produtos:

Grupos de produtos relacionados por exercerem função similar podem


atender ao mesmo público, ser comercializados pelos mesmos canais ou ser
agrupados em determinadas faixas de preços ou categorias. Uma marca que
se insere dentro do segmento de moda feminina, por exemplo, pode possuir
várias linhas de produtos: de jeans, básica, fashion, moda praia etc.

Conceito de marca:

O conceito é emoção. É o espírito que mobiliza o consumidor e o faz atri-


buir valor ao produto, atendendo às suas necessidades subjetivas. Alguns
produtos de moda freqüentemente se tornam instrumento para comunicar
o pertencimento, o ‘modo de ser e de viver’; outros satisfazem necessidades
físicas, emocionais ou funcionais. O conceito é a força motriz que dá direção
ao trabalho criativo. Sintetiza significados e informações, é o banco de me-
mória de uma marca, uma coleção ou um produto. No design, os conceitos
são mais eficientes quando expressos por imagens, tanto no inconsciente
como no campo físico. Exemplo disso é o caso da Benetton que trabalha
com o conceito de solidariedade humana. Suas coleções, por sua vez, mu-
dam no mínimo duas vezes ao ano, entretanto, seguem levando em con-
sideração a imagem e o conceito de solidariedade humana (PIRES, 2004).

Tendência:

Evolução de algo em um determinado sentido, direção, orientação


(HOUAISS, 2002).

Matriz FOFA:

É um instrumento metodológico para análise de projetos, organizações


ou de ator social que se propõe a planejar, diagnosticando sua situação e pre-
parando propostas de ações estratégicas. O objetivo é identificar os pontos
FORTES, as OPORTUNIDADES, os pontos FRACOS e as AMEAÇAS. Os pontos
FORTES e FRACOS dizem respeito ao produto em si, enquanto as OPORTUNI-
DADES e as AMEAÇAS são relativas ao mercado.

Mapa de percepção:

É uma representação gráfica e simplificada (síntese visual) da percepção


que o consumidor tem sobre o produto e outras diferentes marcas. Auxilia na
compreensão da estrutura do mercado, na identificação de oportunidades e na

77
Aula 4

decisão quanto a um melhor posicionamento do produto no mercado. Permite


a visualização direta do conceito que o consumidor tem de um determinado
produto e permite a concentração de esforços de planejamento e desenvolvi-
mento para a melhoria de determinados aspectos de um produto.
Para se construir um mapa de percepção, deve-se, em primeiro lugar, de-
finir o segmento alvo de mercado com os produtos que serão avaliados. Depois,
identificam-se os atributos mais importantes com base numa pesquisa qualitati-
va (o número de atributos deve ser menor que 20); define-se o tamanho e tipo
da amostra, coleta de dados de avaliação dos competidores e é feita uma análise
estatística; por fim, elabora-se uma análise de atributos que mostre o grau de
correlação de pares de variáveis, definindo as variáveis sem informação e os dois
eixos que gerem mais informações (FREITAS, 2003). A seguir, um exemplo de um
mapa de percepção dos competidores no negócio do vestuário, retirado de http://
www.dep.ufmg.br/disciplinas/epd034/teste_de_conceito-apresentacao.pdf

PREÇO ALTO

BONAPARTE
FORUM
RICHARD’S
SIBERIAN
BROOKSFIELD
SKETCH CHRISTIAN DIOR

PÚBLICO PÚBLICO
JOVEM ADULTO

SPUTINK CASA JOSÉ SILVA

PREÇO BAIXO

Mapa de concepção de competidores para marcas de vestimenta, relacionando marcas de consumo, preço e
público. Fonte: Freitas (2003).

Tipos de produto:

Produto vaca leiteira: baixo custo, baixo lucro e grande volume de venda.
Produto pérola: baixo custo e alto valor agregado.
Produto ostra: alto custo, alto lucro e probabilidade de se tornar pérola.
Produto problema: alto custo, baixo lucro e baixo volume de venda.

78
Design e Moda

TAREFA EXERCÍCIO PROPOSTO OBJETIVO RESULTADO ESPERADO

1) Linhas de produtos - Descrição dos produtos com figuras e


- Verificar a abrangência dos nomes
produtos: poucas linhas de
produtos ou muitas linhas de Conhecer os produtos e - Análise final sintética da descrição dos
produtos as linhas de produtos da produtos da marca selecionada
- Verificar a profundidade das marca escolhida (ex. a marca possui muitos produtos, com
linhas de produtos: poucos itens linhas variadas e sem uma identidade
ou muitos itens em cada linha comum)

2) Conceito da marca
- Verificar que significados e - Descrição, em um parágrafo, de qual é
informações a marca escolhida o conceito da marca estudada, ou seja,
- Identificar o conceito da
pretende transmitir através o que a marca pretende despertar no
marca
de suas linhas de produtos e consumidor em termos de emoções e
estratégia de posicionamento que necessidades ela busca suprir
no mercado

- Descrição dos suportes de produtos


3) Suporte para o produto Verificar se existe uma com imagens e nomes
- Verificar e analisar os tipos de preocupação em estender - Análise sintética final da descrição dos
embalagens: manual, etiquetas a identidade da marca aos suportes de produtos da marca
etc. que suportam os produtos suportes de produtos (ex. existe um cuidado visual explícito
nos suportes de produtos)

- Descrição dos produtos suportes de


4) Suporte para a promoção
Verificar se existe uma promoção com imagens e nomes
- Verificar e analisar os produtos
coerência de identidade - Análise sintética da descrição dos
suportes de promoção: folders,
e estratégia da marca suportes de promoção da empresa
catálogos, cartões de visita,
nos produtos suportes de (ex. não foi verificado uma coerência
desfiles, propagandas impressas,
promoção entre a estratégia da empresa e as
propagandas de TV, website.
- Levantamento promoções...)
das linhas de
produtos da 5) Suporte para distribuição e
marca vendas
- Descrição do sistema de distribuição
- Concorrentes - Verificar e analisar como é feito
e vendas dos produtos da marca com
o sistema de distribuição e de
Verificar se existe uma imagens
vendas dos produtos da marca:
coerência de identidade e - Análise sintética do sistema de
embalagem de transporte,
estratégia da marca e seu distribuição e vendas dos produtos da
design de interiores dos
sistema de distribuição e marca
pontos de venda, sinalização,
vendas dos seus produtos (ex. existe um cuidado em ser coerente
mobiliários, fachadas, vitrines,
com a estratégia evidenciada pelo uso
displays, merchandising visual,
de...)
uniformes, veículos, política de
preços e promoções da empresa

- Descrição das linhas de produtos


dos principais concorrentes, sem a
profundidade exigida para o estudo da
própria empresa
- Só utilizar imagens quando for para
6) Analisar os itens 1, 2, 3, 4 e 5 Conhecer as linhas de
melhor exemplificar um fato
dos principais concorrentes de produtos dos principais
- Análise sintética confrontando as
forma mais superficial concorrentes
linhas de produtos dos concorrentes
com a marca em estudo (ex. o principal
concorrente apresenta um maior cuidado
em relação a demonstrar a estratégia por
ele assumida...)

- Fazer uma tabela onde se colocam


na horizontal a marca estudada e os
7) Enumerar pontos fortes e Evidenciar quais são os principais concorrentes. Na vertical,
fracos de cada concorrente em pontos fortes e fracos de colocar títulos dos itens 1, 2, 3, 4, 5
relação à marca estudada cada concorrente do exercício anterior. Para cada um
destes, comparar pontos fortes e fracos
encontrados

79
Aula 4

Conhecer as tendências
8) Estudo das tendências do - Elaborar um texto contendo a tendência
que dominam a evolução
setor em que a marca está para o setor da marca escolhida (duas
dos produtos de um
inserida páginas formato A4)
determinado setor
9) Estratégias da marca (além
do design, existem outras - Apresentar em texto a estratégia que
Definir qual a estratégia
- Estudo das estratégias evidentes da marca, a empresa adota e justificar como é
a marca está adotando
tendências do como: qualidade, inovação, possível verificar isto (no mínimo uma
atualmente
setor exclusividade, valor, apelo página no formato A4)
- Estratégia da ecológico etc.)
marca - A partir do resultado da Matriz FOFA,
- Matriz FOFA 10) Matriz FOFA a partir das Analisar se a marca está selecione de forma hierárquica as forças,
oportunidades e ameaças coerente com as tendências fraquezas, ameaças e oportunidades
levantadas com o estudo das do setor e evidenciar mais impactantes
tendências do setor e das forças pontos fracos e fortes para - Ao final, apresentar um pequeno texto
e fraquezas levantadas pela sugerir futuros produtos ou conclusivo evidenciando quais seriam as
marca mudanças nos já existentes oportunidades e ameaças para a empresa
(uma página no formato A4)

- Texto descrevendo o público-alvo, mas


não fazer a descrição de forma genérica.
(ex. Qual o nível de escolaridade?, Nível
Compreender qual o de renda?, Gênero?, São casados?,
público-alvo da marca em Onde moram?, Trabalham?, Praticam
11) Descrição do público-alvo
estudo, suas características esporte?, Como se divertem?, Se forem
e padrões de consumo adolescentes: são meninos e meninas?,
Estudam?, Ganham mesada?, Que
lugares frequentam?, O que lêem?, A que
assistem?, Que música ouvem? etc.

- Analisar o mercado de venda dos


Compreender o alcance
produtos: nacional, estadual etc. e
dos produtos da marca e
12) Se for um produto genérico, verificar se existe uma necessidade
estabelecer a necessidade
prestar atenção nas diferenças de mudança de padrões para regiões
de criar produtos com
étnicas e culturais diferentes (O produto deve se adaptar
diferenças culturais e
a diferentes lugares de venda? Onde é
étnicas
vendido? Qual a origem de quem usa?)
- Público-alvo - Apresentar um painel semântico,
Apresentar visualmente
seja ele com imagens de descrição do
o público-alvo da
público- alvo, dos produtos similares que
empresa em estudo, suas
o público alvo consome ou do seu estilo
13) Painel semântico características e padrões
de vida. Recomendamos ter, ao menos,
de consumo a fim de
o painel semântico com os produtos
compreender o público-
similares que repassam o padrão de
alvo
gosto deste público-alvo

- Representar graficamente
e de forma simplificada - Apresentar um texto com uma análise
(síntese visual) a percepção dos resultados do mapa de percepção
que o consumidor tem - Apresentar um texto analisando se
14) Mapa de percepção dos sobre a marca em estudo e o conceito que o cliente percebe do
consumidores sobre a marca outras marcas concorrentes produto é, provavelmente, aquele
- Verificar se o conceito que que a empresa deseja passar, ou
o cliente percebe da marca seja, é coerente com a sua estratégia
é o mesmo estabelecido estabelecida
estrategicamente por ela

Verificar, dentro dos


produtos da marca, quais - Apresentar a análise de portfólio de
seriam os “vaca leiteiras, forma visual, usando, se possível, a
- Análise de
15) Análise de portfólio da os pérolas, os ostras e imagem dos produtos e apresentar um
portfólio da
marca os problemas”, a fim de texto justificando o porquê da escolha
empresa
observar oportunidades destes produtos como vaca leiteira,
para o redesign de um pérola, ostra e problema
produto já existente

80
Design e Moda

- Texto justificativo da escolha do


produto com os aspectos solicitados,
Escolher um produto que apresentando uma análise dos fatores
possa ser melhorado em motivantes para a escolha. Você deve
16) Escolha uma linha de
relação ao conforto, à se basear nos resultados das etapas
produtos e, dentro dessa linha,
usabilidade, à praticidade, anteriores para a escolha (ex. como a
um produto para ser analisado
à ergonomia e ao impacto empresa possui o produto X como vaca
criticamente
ambiental através das leiteira e, portanto, está “garantida” em
ferramentas pertencentes à relação ao faturamento, percebe-se que
Escolha de um área do design haveria grandes chances de associar
produto essas características ao redesign de um
outro produto agregando, assim,...)

Verificar quais as - Tabela contendo análise de similares


17) Análise dos similares diretos características dos produtos diretos e indiretos do produto eleito. Não
e indiretos do produto escolhido similares (preço, aspectos se esquecer de colocar, em cada similar,
para análise de segurança, aspectos uma análise de aspectos positivos e
visuais, medidas etc.) negativos observados

Verificar quais são os


aspectos relativos ao
18) Análise das características - Elaborar um texto propondo mudanças
conforto, à usabilidade, à
Propostas para conforto, usabilidade, baseadas nas ferramentas utilizadas pelo
praticidade, à ergonomia
um redesign praticidade, ergonomia ou design (uma página, no mínimo, em
ou ao impacto ambiental
impacto ambiental formato A4)
que devem ser modificados
no produto selecionado

Conclusão

Podemos dizer que, com a expansão do mercado, com a globalização,


com uma maior consciência dos consumidores e, consequentemente, uma
maior exigência em termos de qualidade, custo, praticidade, entre outros
atributos, por parte desses consumidores, o desenvolvimento de produtos de
moda deve, e precisa, fazer uso das ferramentas do design, com o objetivo de
inovar e resolver questões relativas às esferas produtivas, tecnológicas, econô-
micas, sociais, ambientais e culturais.

Para uma segunda olhada...

Pudemos refletir sobre as ferramentas utilizadas pelo design que são


aplicáveis ao desenvolvimento de produtos de moda. Tais ferramentas devem
estar sempre presentes no desenvolvimento desses produtos com o intuito de
inovar, otimizar e tornar esses produtos mais atraentes ao consumidor, aten-
dendo, assim, às necessidades de um mercado cada vez mais exigente e em
constante mutação.

81
Aula 4

Referências

BAXTER, Mike R. Projeto de produto: guia prático para o design de novos produtos. São
Paulo: Blucher, 2000.
FREITAS, Lauro. Teste de conceito e mapa de percepção. Dez. 2003. Disponível em:
<http://www.dep.ufmg.br/disciplinas/epd034/teste_de_conceito-apresentacao.pdf>.
Acesso em: 10 fev. 2010.
HOUAISS, Antonio. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva,
2002.
MOURA, Mônica. A moda entre a arte e o design. In: PIRES, Dorotéia Baduy (Org.). De-
sign de moda: olhares diversos. Barueri, SP: Estação das Letras e Cores Editora, 2008.
PHILIPS, Peter L. Briefing: a gestão do projeto de design. Tradução Itiro Iida; revisão
técnica Whang Pontes Teixeira. São Paulo: Blucher, 2008.
PIRES, Dorotéia Baduy. O desenvolvimento de produtos de moda: uma atividade multi-
disciplinar. CONGRESSO BRASILEIRO DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO EM Design, 6.,
2004, São Paulo. Anais... São Paulo: Fundação Armando Penteado, 2004.

82
Aula

Percebendo oportunidades de projeto


5
Seus Objetivos:
Ao final desta aula, esperamos que você seja capaz de:
1. Reconhecer o design como um processo estratégico na
inovação de produtos;
2. Identificar oportunidades em design;
3. Identificar as etapas do desenvolvimento de produtos de moda a
partir do processo de design;
4. Reconhecer no design uma atividade reflexiva, disciplinada e siste-
matizada;
5. Reconhecer as referências e os aspectos que auxiliam a identifi-
cação de oportunidades de projeto.

3 horas de aula
Design e Moda

1. Design e o conceito de inovação

“A inovação é um ingrediente vital


para o sucesso dos negócios.”
Mike Baxter

Nas aulas anteriores fizemos um rápido panorama da história do design,


e nele pudemos perceber que a atividade se organizou como resposta às ne-
cessidades de produção e mercado do mundo moderno ocidental.
A economia, política e sociedade capitalistas industriais desencadea-
ram uma nova ordem de produção, hábitos e práticas cotidianas, consumo e
demandas. Neste cenário, o design surgiu como um processo otimizador das
questões que deveriam ser consideradas para que um produto atendesse as ex-
pectativas daquele contexto, e como instrumento que pudesse agregar algum
diferencial à mercadoria e torná-la competitiva no mercado regional / nacional
/ internacional. As sociedades foram se adequando, reproduzindo e reformu-
lando suas relações com a estrutura econômica e política em vigor, e o design,
como campo de atuação focado no pensar soluções eficientes, adequadas,
inovadoras para o usuário, veio se adaptando aos mais variados momentos,
situações e estímulos ao longo da história.
Atualmente, a compreensão do que é design é, sem dúvida nenhuma,
mais abrangente e menos rígida do que, por exemplo, em seu período funcio-
nalista. Nele, a atividade era considerada como um processo sistematizado, fo-
cado na produção de bons artigos, cuja forma resultasse dos seus aspectos fun-
cionais, para o mercado, em produção seriada, em grande escala, e industrial.
Hoje compreendemos o design como uma atividade e um processo in-
terdisciplinar, sistematizado, que considera diversos aspectos do mercado. Mas
que tem o principal foco no usuário, no promover a boa qualidade de vida, que
pode pensar e desenvolver produtos e serviços, a partir da produção industrial,
mista e/ou artesanal, de um único objeto à produção em grande escala.
Mais do que nunca, em um mundo globalizado, em que a tecnologia e o
acesso à informação o torna veloz, a competitividade no mercado está acirra-
da, a oferta de mercadorias é enorme. O usuário tornou-se mais exigente e os
fabricantes buscam soluções diversas para se manter na disputa pelo lucro e a
sobrevivência de seu negócio.
Neste cenário competitivo, a inovação, isto é, a criação e o lançamento
de novos produtos, ainda é entendida como recurso para a manutenção da
boa saúde econômica de uma empresa. O design é compreendido como um
diferencial no desenvolvimento, produção, comunicação e divulgação de mer-
cadorias. As soluções criativas e inovadoras são esperadas pelo consumidor,
que busca nestes artigos soluções ou respostas para aspectos cotidianos que

85
Aula 5

considera importantes. Estes aspectos podem ser de ordem prática − como a


aquisição de um bom aparelho de ar condicionado, por um preço justo, que
não seja apenas um eficiente refrigerador de ar, mas que o seu consumo de
eletricidade seja menor, faça pouquíssimo barulho, seja discreto o bastante
para não interferir na aparência do ambiente em que será instalado e que ofe-
reça recursos tecnológicos modernos (um controle remoto, um timer inteligen-
te, um dispositivo antibactérias etc.) − ou simbólica, como a aquisição de um
aparelho de ar condicionado com todas as qualidades mencionadas, mas da
marca X, associada não apenas às boas soluções tecnológicas e de design, mas
a um produto usado pela elite.
Porém, sem dúvida, há diversos níveis de demanda e consumo no mer-
cado, e para cada nível são desenvolvidas variações e adequações de produtos,
que resultam de produção, insumos, mão de obra e, consequentemente, cus-
tos distintos. Embora o design seja reconhecido como atividade que agrega di-
ferencial ao produto, nem todos os empresários brasileiros contratam designers
ao desenvolvê-lo. Muitos fabricantes fazem adaptações e até cópias de artigos
que estão no mercado na hora de pensar um novo produto. Pensam que o seu
produto é tão barato que o orçamento não poderia suportar a despesa de ter
um designer em sua equipe de profissionais... Embora eu tenha dito que, atu-
almente, o design seja reconhecido como um recurso de inovação de um pro-
duto, não quer dizer que todos os empresários entendam e realmente saibam
dos benefícios e vantagens na contratação de um profissional de design para o
seu processo produtivo...
E no caso da moda, as grandes grifes passaram a adotar o design no
desenvolvimento de suas mercadorias a partir da década de 1960 – [...] uma
produção burocrática orquestrada por criadores profissionais, uma lógica in-
dustrial serial, coleções sazonais, desfiles de manequins com fim publicitário
(LIPOVETSKY, 2004, p. 107). O segmento passou a observar o movimento do
mercado e, portanto, do consumo, e perceber o seu produto como passível de
projeto sistematizado, que deveria atender um grande número de usuários.
Passou a pensar o produto de moda como um sistema mais democratizado,
um vestuário pronto para o consumo – o prêt-à-porter, que deveria atender as
exigências de um mundo urbano, a cada dia mais veloz, ávido por novidades e
formas de expressar e representar valores individuais e coletivos.

Todas as casas de Costura, depois dos anos 1960, lançaram-se na corri-


da lucrativa dos acordos de licença referentes não apenas aos perfumes
e cosméticos, mas aos mais diversos artigos: óculos, artigos de couro,
louça, isqueiros, canetas, lingerie, windsurfe, prêt-à-porter masculino e
feminino. (LIPOVETSKY, 2004, p. 108)

86
Design e Moda

Desse modo, penso na moda que está no cotidiano, que acompanha a


dinâmica da sociedade contemporânea, observa, interpreta e influencia o mer-
cado. Ao adotar o design como estratégia, busca oportunidades e assimila suas
ferramentas para desenvolver novos produtos...

A fabricação de vestuário de massa vai seguir em parte o mesmo cami-


nho aberto, a partir dos anos 1930, pelo desenho industrial. Trata-se de
produzir tecidos, malharia, trajes que integram a novidade, a fantasia, a
criação estética, tendo por modelo o princípio das coleções sazonais de
moda. Com o estilismo, o vestuário industrial de massa muda de estatuto,
torna-se integralmente um produto da moda.

É a partir do começo dos anos 1960 que o prêt-à-porter vai chegar de


alguma maneira à verdade de si mesmo, concebendo roupas com espírito
mais voltado à audácia, à juventude, à novidade do que à perfeição “clas-
se”. (LIPOVETSKY, 2004, p. 110)

Atividade 1 – Objetivos 1, 2 e 3

Leia o texto O Desenvolvimento de Produtos de Moda: Uma Atividade


Multidisciplinar (anexo 1), de Dorotéia Baduy Pires. Desenvolva uma reflexão
e apresente em uma resenha, em no máximo duas páginas, a relação entre
design e moda. Identifique os elementos pertinentes ao campo do design e ao
de moda expostos pela autora.

Observações:
1. Você encontra o texto disponível no ambiente virtual, na parte de
Recursos Didáticos.
2. Ao finalizar sua resenha, você deverá postá-la no ambiente, na tarefa
Relação entre Design e Moda.

2. Design pelos olhos da moda

Em mais um momento da história da moda, podemos observar que as ques-


tões, ações e soluções de problemas são contextuais. No tempo presente, o design
se apresenta como solução estratégica na elaboração de novos produtos. A moda
passou a perceber no processo de design uma forma organizada, criativa e multi-
disciplinar de elaborar produtos inovadores e adequados às demandas do mercado.
E aqui voltamos a falar de design e as oportunidades de projeto... Você
tem ideia de como surgem as oportunidades de desenvolvermos novos produ-
tos para o mercado?

87
Aula 5

2.1. Como surgem as oportunidades de desenvolvermos no-


vos produtos para o mercado?

Para apresentar estas questões, farei uso de considerações do professor


de design Mike Baxter sobre o desenvolvimento de novos produtos.

Aproveito para deixar como sugestão de boa leitura sobre o assunto: BAXTER, Mike.
Projeto de produto. 2. ed. São Paulo: Edgar Blücher, 2000.

Quando trabalhamos dentro de uma empresa, ou como freelancers, re-


cebemos uma questão para solucionar, portanto, uma oportunidade de projeto
para desenvolver. As empresas muitas vezes contam com setores de marketing
que realizam pesquisas sobre o mercado e direcionam para as possíveis oportu-
nidades de novos projetos. Quando somos empreendedores, autônomos, a opor-
tunidade de projeto surge de uma acurada observação e imersão no segmento
em que você quer atuar. É um trabalho exaustivo de pesquisar, questionar, ler, se
informar e, como disse, observar o mercado. Entramos em contato com:
• as demandas do consumidor;
• as mercadorias que estão em oferta nas lojas;
• as novas propostas de empresas, empreendedores e designers;
• propostas de áreas afins, como a arquitetura, o design de interiores e
as artes;
• as opiniões de pesquisadores de tendências em moda e comporta-
mento;
• conceitos e sugestões apresentados em eventos divulgadores de marcas;
• o que está sendo divulgado na mídia;
• e, principalmente, prestando atenção ao que está acontecendo em
torno de nós, em nossa cidade, país e no mundo. Afinal, antes de
designers, estamos envolvidos em um contexto histórico, e também
somos consumidores, formamos uma opinião própria a partir dos vá-
rios estímulos que recebemos a cada instante. E ao pensarmos design,
com o olhar voltado para o futuro e o novo, devemos sistematizar e
educar nosso trabalho e percepção para o entorno.

A atividade de desenvolvimento de um novo produto não é sim-


ples e nem direta. Ela requer pesquisa, planejamento cuidadoso, controle

88
Design e Moda

meticuloso e, mais importante, o uso de métodos sistemáticos. Os mé-


todos sistemáticos de projeto exigem uma abordagem interdisciplinar,
abrangendo métodos de marketing, engenharia de métodos e a aplicação
de conhecimentos sobre estética e estilo. Esse casamento entre ciências
sociais, tecnologia e arte aplicada nunca é uma tarefa fácil, mas a neces-
sidade de inovação exige que ela seja tentada. O que [...] capacitará o
designer a ter uma visão global sobre o processo de desenvolvimento […]
de produtos. (BAXTER, 1998, p. 3.)

Dentro do design fazemos uso de várias referências e conhecimentos


básicos para pensarmos o desenvolvimento de um projeto, mas na adoção de
uma metodologia para o desenvolvimento de novos produtos, encontramos
uma forma organizada de coordenar as atividades de projeto. Nas próximas
aulas falaremos sobre metodologia de projeto em design e as suas ferramentas.
Devemos lembrar sempre que fazemos design para pessoas, que chama-
mos de usuários, e o mercado chama de consumidores ou clientes. Segundo
Baxter, o designer de produtos bem sucedido é aquele que consegue pensar
com a mente do consumidor: ele consegue interpretar as necessidades, sonhos,
desejos, valores e esperanças do consumidor (BAXTER, 1998, p. 21) e materia-
lizá-los em objetos, que, quando vão para o mercado, são transformados em
mercadorias.
O autor chama nossa atenção para a difícil tarefa de colocar no mercado
novos produtos, principalmente os que têm maior grau de inovação, e ressalta
a importância de realizarmos uma avaliação do nosso usuário, ou público-alvo,
já que os consumidores apresentam tendências conservadoras e só estão dis-
postos a mudar de hábitos se tiverem uma boa razão para isso (BAXTER, 1998,
p. 21). Nesta afirmação, reitera a necessidade de estabelecermos metas claras,
concisas, específicas e verificáveis para o desenvolvimento de novos produtos;
bem como deixarmos evidente para o consumidor o diferencial e o acréscimo
de valor do novo produto. Falamos de uma tarefa difícil, onde o modo como
o desenvolvimento de um produto é conduzido tem grande influência sobre o
seu sucesso ou fracasso. O designer deve ter disciplina e resolver as questões
do desenvolvimento de um novo produto por etapas, afinal, estamos condu-
zindo um processo controlado por um método, critérios e etapas refletidas.

Consumidor / usuário Designer

Valores Valores
Necessidades Ideias
Expectativas Soluções
Desejos Adequações
Sonhos Alternativas

89
Aula 5

2.2. Mas como identificar a oportunidade de projeto?

Geralmente, em um primeiro momento em que nos é colocado o desafio


de projeto, imediatamente associado à inovação, várias ideias e caminhos por
explorar nos ocorrem, mas qual destes devemos adotar? Qual caminho nos
conduzirá a uma solução de sucesso? Baxter nos sugere quatro etapas no pro-
cesso de planejamento do produto (1998, p. 124):
1. traçar a estratégia de desenvolvimento do novo produto – que na ver-
dade é uma orientação geral do planejamento e seus objetivos;
2. identificar um estímulo, um elemento norteador, um diferencial que
direcionará o desenvolvimento de um produto específico;
3. realizar pesquisa e análise das oportunidades e restrições do projeto;
4. definir as especificações e as justificativas do produto. Neste item, o
autor ressalta que as questões de projeto devem estar orientadas para dois
níveis de compromisso: o focado nos objetivos comerciais do produto (oportu-
nidade comercial identificada no mercado); e o focado nos aspectos técnicos
do produto (detalhes que orientarão o trabalho do designer).
Podemos resumir o procedimento no esquema a seguir:

Estratégia de inovação do produto

Início do desenvolvimento de um produto específico

Pesquisa e análise das oportunidades e restrições

Especificações e justificativas do produto

Especificações da oportunidade Especificações do projeto

Compromisso comercial Compromisso técnico

A especificação da oportunidade de projeto precisa descrever a oportu-


nidade e justificá-la levando em consideração os quesitos comerciais. Afinal, a
oportunidade de projeto de design está direcionada para o mercado, traduz-se
em oportunidade de negócio e no sucesso comercial do produto! E aqui faço
minhas as palavras de Dorotéia Baduy Pires: “Projetamos, planejamos, criamos
e investimos com o objetivo de vender; afinal, moda é negócio!” (PIRES, 2004,
p. 2). Design é uma estratégia em negócios! Portanto, neste quesito, devem
ser consideradas as possibilidades de bons lucros para a empresa ou para o
empreendedor. O produto, para ser competitivo, deve apresentar, de forma
clara, vantagens sobre os concorrentes que estão em oferta no mercado. O

90
Design e Moda

diferencial proposto deve ser um incentivo para o consumidor se sentir atraído


por ter o novo produto. Portanto, ao descrevermos uma oportunidade de pro-
duto, devemos pensar nos detalhes e considerar os fatores que podem torná-lo
sucesso de mercado.
Ainda segundo Baxter (1998, p. 129), devemos justificar a oportunidade
de desenvolvimento do novo produto, pois, ao pensarmos nesta argumenta-
ção, observamos outros elementos que nos fazem avaliar a oportunidade de
projeto e nos auxiliam a compreender e conhecer melhor o potencial do que
pretendemos desenvolver.
O autor cita dois aspectos que devemos considerar nesta fase:
• os não-financeiros, que avaliam a capacidade produtiva da empresa
(existência de equipamentos, mão de obra, infraestrutura, tecnolo-
gias, capacidade de distribuição, o mercado e os pontos de venda do
novo produto); e
• os financeiros, que avaliam os custos variáveis do produto (insumos
incorporados em cada unidade do produto em sua produção: matéria-
prima, mão de obra, energia, distribuição e vendas por unidade); os
custos fixos do produto (custos com o desenvolvimento do produto,
salários da equipe de gerência, aluguel); qual é a meta de preço para
o produto e, consequentemente, a margem de lucro; e o ciclo de vida
previsto para o produto no mercado.
Iniciamos a aula mencionando meios que nos dão suporte para iden-
tificarmos oportunidades de projeto. Reitero agora que este direcionamento
surge do levantamento de dados cuidadoso que, portanto, consome tempo e
demanda disciplina e critérios em identificar, avaliar e justificar a oportunida-
de. Geralmente, ao percebermos a viabilidade comercial de um produto, pas-
samos a pensar as etapas de desenvolvimento do projeto. Assim, quanto mais
informações sobre a oportunidade levantarmos, maior apoio vamos ter em
desenvolver o projeto e as estratégias de sua inserção no mercado. Devemos
compreender que sempre iniciamos nossa pesquisa:

• conhecendo os usuários / consumidores / público-alvo de nosso pro-


duto;
• identificando suas demandas e desejos;
• considerando o movimento do mercado;
• analisando os produtos concorrentes em oferta; e
• buscando conhecer as inovações tecnológicas que podem permitir so-
luções interessantes na fabricação de novos produtos.

91
Aula 5

Pode-se considerar que uma oportunidade de negócios só passa a


existir quando se pode identificar: 1) as demandas e desejos dos
consumidores; 2) diferenças em relação aos produtos oferecidos
pelos concorrentes. Uma oportunidade de negócios só pode ser
explorada quando as tecnologias disponíveis permitem a fabricação
de um produto que satisfaça a uma demanda até então não atendida
no mercado. (BAXTER, 1998, p. 131)

Quanto melhor for o planejamento do produto, maiores serão as


chances de sucesso comercial do produto. (BAXTER, 1998, p. 132)

O designer, assim como o de moda, deve ser um profissional dinâmico,


flexível, curioso, bem informado, aberto às inovações, atento ao entorno, às
variações de gosto, à dinâmica e às múltiplas facetas socioculturais. Identifica-
da e analisada a oportunidade de projeto, os aspectos comerciais e as restri-
ções ao seu desenvolvimento, faz-se conveniente a elaboração de um briefing
de projeto, a definição de uma metodologia de trabalho, a elaboração de lista
dos conteúdos que devem ser estudados e levantados, tais como inovações
em materiais e tecnologias, referências, afinal, ideias são frutos de ideias etc.
Destes dados, reflexões e considerações, vamos elaborar um conceito para o
produto ou sistema de produtos (o que pode ser uma linha ou coleção de
produtos, e que em design chamamos de família de produtos), que norteará
o processo de criação. Analisados e assimilados estes conteúdos, o processo
criativo terá combustível para gerar boas alternativas e soluções.

Sugestão de leitura:
PIRES, Dorotéia Baduy (Org.). Design de moda: olhares diversos. São Paulo: Estação das
Letras e Cores, 2008.

Antes de passarmos para a nossa atividade, vale mencionar que, em


design, denominamos de briefing (palavra inglesa que significa instruções) a
lista de metas, características, exigências e limites no desenvolvimento de um
projeto. É uma síntese de vários elementos básicos, vindos das mais diversas
áreas que participam do processo de desenvolvimento de produtos e serviços.
Porém, mais à frente, falaremos mais sobre o assunto.

92
Design e Moda

Atividade 2 – Objetivos 4 e 5

Na atividade que realizaremos a seguir, vamos abrir mais um espaço


para pensar o design como uma atividade reflexiva, que considera, ajusta e
busca soluções para as demandas do usuário.
A partir do texto À sombra do objeto (anexo 2), do Prof. Dr. Luiz Antonio
Coelho, aponte pelo menos 2 (dois) aspectos da relação entre o objeto e o usu-
ário em um breve texto (até uma página). Estabeleça relação com o conteúdo
apresentado em aula.

Resposta e comentário

É importante observarmos que a formação da cultura material está vin-


culada aos valores, padrões e questões históricos. O objeto se relaciona com
o indivíduo e com o social: como modelo do sujeito e modelo para o sujeito.
É elemento demarcador de identidade, bem como de pertencimento social. O
texto levanta a questão: como o design pode considerar os aspectos individu-
ais / da afetividade ao projetar para a indústria, para a produção em massa?
Como equacionar os aspectos objetivos, gerais, práticos, funcionais, aos da
subjetividade?

Conclusão

Gostaria de concluir esta aula organizando um resumo esquemático


que nos leva a pensar e adotar uma oportunidade de projeto. A estratégia de
desenvolvimento de produto, que tem por intenção a inovação, apresenta-se
como uma orientação na definição de metas e objetivos no planejamento de
um projeto. Ao organizarmos os conteúdos em um planejamento, devemos
considerar a oportunidade e as restrições em especificações claras e, conse-
quentemente, apontando os benefícios que deverão ser percebidos pelo con-
sumidor.

93
Aula 5

Para uma segunda olhada...

Estratégia de desenvolvimento do produto


(orientação geral do planejamento do produ- Intenções de inovação
to que estabelece seus objetivos)

Considerar oportunidades e restrições


(viabilidade comercial / investimento)

Planejamento do produto
(orientação geral do planejamento do produ- Objetiva fixar metas
to que estabelece seus objetivos)

Especificações de oportunidade Especificações do produto


(justificativa financeira para o in- (aspectos técnicos do produ-
vestimento) to)

Benefício básico
(vantagem que o consumidor perceberá ao
adquirir o novo produto, em relação ao con-
corrente)

Referências:

BAXTER, Mike. Projeto de produto. São Paulo: Edgar Blücher, 1998.


COELHO, Luiz Antonio L. Tal objeto, tal dono. In: MOITA LOPES, Luiz Paulo da; BASTOS,
Liliana Cabral (Org.). Identidades: recortes multi e interdisciplinares. Campinas: Merca-
do de Letras, 2002. p. 69-81.
LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades mo-
dernas. 7. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
PIRES, Dorotéia Baduy. O desenvolvimento de produtos de moda: uma atividade multi-
disciplinar. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO EM Design,
6. , 2004, São Paulo. Anais... São Paulo: Fundação Armando Penteado, 2004.

94
Design e Moda

Anexo 1

O Desenvolvimento de Produtos de Moda : Uma Atividade


Multidisciplinar
The fashion development and its products : a multidiscipline
activity

PIRES, Dorotéia Baduy


Mestre, Universidade Estadual de Londrina

Palavras chaves : moda, produto, design.


Resumo: Este artigo trata do design de moda como uma ativida-
de multidisciplinar, a fim de que se entenda a amplitude dessa
área e, sobretudo, que se promova maior discussão para superar
a equivocada dicotomia estabelecida entre a visão empresarial e
o design.

Keywords : fashion, product, design


Abstract: This article is about the fashion design as a multidiscipline
activity in order of to be understood in its full meaning and, above
all, that it instigates deeper discussions to overcome the mistaken
dicotomy found between business vision and the design.

O Desenvolvimento e Produtos de Moda : Uma Atividade Multidisciplinar


Para Stefania Saviolo e Salvo Testa, autores da obra Le imprese del sistema
moda: il management al servizio della creatività, o criador de moda deve ser
dinâmico, flexível, aberto às inovações, capaz de perceber os sinais do novo e
antecipar a evolução do gosto interpretando os cenários socioculturais. Trata-
se de uma atividade movida por estímulos técnicos e estéticos que desenvolve
produtos com características especiais que a distinguem das demais e, talvez
por isso, venha sendo estudada em cursos específicos, quando poderiam estar
nos programas dos cursos de design de produto.
1
Um designer de moda projeta conciliando aspectos de inovação dos
materiais e das tecnologias, com os aspectos das interpretações culturais dos
grupos sociais e das comunidades, integrando componentes estéticos, econô-
micos e competitivos.
É recente a adoção do termo design para a formação e a profissão de
quem exerce a função de conceber produtos de moda. “Convém, nesse mo-
mento, recordar a luta do hoje consagrado designer de moda Issey Miyake,

95
Aula 5

pelo reconhecimento da moda como legítimo estudo do design, nos idos 1960,
durante uma conferência internacional do setor, em Kyoto. Miyake, na con-
dição de estudante de design gráfico, (não por opção, mas pela inexistência
de estudos acadêmicos de moda) na Tama Art University em Tokyo, interpela
publicamente os organizadores daquela conferência pela omissão da moda no
rol dos acontecimentos”. (HOLBORN, 1995, p. 22). Porém, esta não pode ser
uma alteração somente de nomenclatura, mas de princípios, fundamentos e
conceitos.
No Brasil, o primeiro curso superior na área de moda teve início em 1988,
no mesmo ano em que se optou em um fórum nacional pela denominação
design para a área e designer para o profissional que o pratica. Antes do recen-
te surgimento dos cursos específicos nas universidades, o cargo de criador de
moda era sempre ocupado por um autodidata que, em geral, não adotava um
processo criativo organizado que interagisse com as ações empresariais. Al-
guns desses profissionais adotavam métodos próprios e colocavam em prática
etapas da metodologia aplicada pelos designers, mas a maioria ainda o faz de
modo intuitivo, sem haver teorizado ou refletido sobre sua prática.
Há uma grande diferença entre planejar ou desenvolver produtos para
uma confecção artesanal e uma outra industrial. Neste artigo, a criação será
vista no contexto do industrial design, em que um produto de design de moda
como objeto (roupa) com conteúdo de moda, é resultado da aplicação de um
pensamento e método projetual.
Uma das características que distingue esta área é a concepção de produ-
tos agrupados em coleções divididas pelas estações do ano, primavera/verão e
outono/inverno. Podemos definir coleção como o conjunto de uma variedade
de produtos de moda cíclicos e sazonais que, dependendo dos parâmetros e
estratégias da empresa, são dotados de maior ou menor valor simbólico, coefi-
cientes de unidade, estética, criatividade e novidade. Algumas empresas/marcas
vem substituindo o termo “coleção” por “produto” uma vez que os ciclos de lan-
çamentos tem sido abreviados para atender a necessidade de novidade.
As soluções propostas em uma coleção de moda podem ter origem na
arte ou fazer uso da percepção artística como referência e nem por isso pas-
sarem a ser arte. O assunto causa divergências entre os estudiosos da moda.
Assim como a arte, o design tem seus princípios e fundamentos, mesmo que
em determinados momentos seja difícil estabelecer limites precisos entre arte
e design, talvez porque compartilhem de alguns princípios criativos e estéticos.
A moda está em permanente troca de informações com a arte e o artesana-
to. Assim, a roupa pode servir de suporte para uma manifestação artística ou
ser uma referência para que um designer de moda expresse sua criatividade e

96
Design e Moda

conceito. Pode-se ainda fazer interferências artísticas no processo produtivo


sem que com isto o resultado caracterize uma obra de arte. Lorenzo Merlino
declarou em entrevista: “uma das coisas que mais odeio é o conceito de moda
arte. Moda é business”. Projetamos, planejamos, criamos e investimos com o
objetivo de vender; afinal, moda é negócio. Para o estilista de moda italiano
Alessandro Moroni do Istituto Europeo di Design de Milão, “uma coleção deve
conter muita poesia para fazer muito dinheiro”.
Em geral, um produto de moda é projetado para ser vendido; portanto,
considera-se a estratégia e a visão empresarial. As empresas do setor apre-
sentam produtos que sintetizam a visão do design, da arte, da gestualidade
do artesanato e o pensamento estratégico da gestão. São empresas cuja exis-
tência é fundamentada na mudança, na contínua inovação e na obsolescência
programada dos produtos, e isto não é arte, é um empreendimento, é design.
Seja qual for a área, o designer deve ser ético e contribuir para uma ho-
nesta, inteligente e saudável cultura de produtos. Por exemplo: que não polua
o ambiente e que não crie tanto lixo. Para Philippe Starck, “o designer hoje tra-
balha para o homem não idiota do século XXI, o novo consumidor: entusiasta,
mas desconfiado, vigilante, um rebelde que sabe dizer não, e sabe reconhecer
o que compra. A qualidade de um produto está presente em seu tempo de
duração, no serviço que presta, no respeito à ecologia, no preço justo e, não
podemos esquecer, na felicidade que traz, na pequena dose de irracional, de
2
poesia ou mistério que encerra”.
Desenvolver produtos de moda é portanto uma atividade multidisciplinar.
Uma empresa que produz artigos do vestuário com conteúdo de moda, deve ter
uma cultura tanto de gestão quanto de projeto de produto e coleção. No Brasil,
ainda é preciso que os empresários compreendam a importância da dimensão
criativa e inovadora nos negócios e os criadores de moda, por sua vez, que acei-
tem a relevância da capacidade do empresário em valorizar plenamente esse
potencial criativo, em dar-lhe suporte, racionalizá-lo.
No Brasil, a mentalidade, a cultura e o pensamento do empreendedor
que dirige os negócios e contrata os designers é imediatista. Ter boas idéias é
muito diferente de viabilizá-las e concretizá-las em produtos. É comum um cria-
dor sofrer decepções ou frustrações ao apresentar propostas que julgou desen-
volver por meio de planejamento, pesquisa e muito trabalho. Entretanto, não
basta a intuição. Por isso, é recomendável que esse tema seja objeto de estudo
dos criadores de moda e designers, para que a empresa corra menos riscos e
para que o hiato existente entre a criação e o empreendimento seja reduzido4.
Para Mauro Lipparini, designer italiano, “o design não deve ser uma
questão de estilo, mas de conceito. Deve somar a personalidade da empresa

97
Aula 5

5
com a personalidade do designer” . É preciso uma dupla cultura, empresarial
e criativa.
Se design é método e se método demanda disciplina, logo, estamos fa-
lando de planejamento, o que requer investimento de tempo. Como praticar o
planejamento se nossa cultura empresarial sofre da síndrome do imediatismo,
se o modus operandi é o de uma corrida contra o tempo que não dá margem
a ações preventivas? A rotina é “apagar incêndios”, “queimar etapas”, “dar
jeitinhos”. Não há tempo a perder, planejamento é perda de tempo, pesquisa
então, nem pensar!
Assim, sem planejamento definido, pouco se investe em tecnologia e no
desenvolvimento de produtos, gerando déficit em sua qualidade, dependência
tecnológica e sucateamento em alguns setores. Por ausência de planejamen-
to, somos campeões em desperdício e ineficiência. Em 1995, uma pesquisa do
Instituto Nacional de Metrologia revelou que o desperdício de tecido no Brasil,
6
mensalmente, era de 500 mil metros . Todos os anos, milhares de confecções
do vestuário abrem e fecham e o setor industrial registra perdas anuais de cer-
ca de 40% da produção, US$ 9 a 10 bilhões. No Japão, esta margem é de 1 a 3%
e nos EUA, de 5 a 8%. Precisamos superar ainda perdas materiais enquanto o
mundo já discute os desperdícios simbólicos de um produto.
A prática do design de moda no Brasil está longe de explorar toda a sua
potencialidade. A indústria vê o design como uma decoração supérflua, um
processo de embelezamento do produto, o que impede que o design mostre
seu valor como disciplina voltada à melhoria da qualidade global dos objetos
e da vida humana.
O imediatismo no retorno dos investimentos tem imposto aos designers
resultados supérfluos, motivando a cultura da cópia. Na feira de Hannover, na
Alemanha, algumas vezes o Brasil recebeu o Prêmio Plagiarius, concedido ao
país participante que copiou o maior número de produtos de origem alemã.
Não somos o único país a praticar esse crime que no mundo da moda às vezes
é considerado uma “homenagem” feita a algum estilista ou uma “releitura” da
obra do mesmo.
Além disto, mo planejamento de um produto ou coleção, questões im-
portantes são muitas vezes atropeladas ou ignoradas devido a essa visão de
curto prazo. É preciso pensar na qualidade formal do produto; na adequação
ao uso (conforto, praticidade, ergonomia); na inovação; na confiabilidade; na
evolução tecnológica; nas características culturais e socioeconômicas; no estu-
do dos materiais e processos de fabricação; na racionalização dos componen-
tes; na melhor utilização dos recursos em capacidade instalada; na ética e no
respeito ao meio ambiente.

98
Design e Moda

Vamos atribuir números que podem fortalecer uma argumentação.


Quanto custa o design? Estudos feitos pela Xerox, Motorola e Honda apontam
que, em média, o design custa 6% do custo total de desenvolvimento e repre-
senta 70% do resultado final. Em 1988, a Confederação Nacional da Indústria
– Programa Brasileiro de Design informou que cada dólar investido em design,
na comercialização, traz cinco dólares de retorno, e, na produção, 15% do cus-
to final de um produto é referente ao desenvolvimento do projeto de design.
Os demais 85% são gastos com a produção propriamente dita.
O desenvolvimento e a pesquisa para novos produtos requerem inves-
timentos, mas são poucas as empresas dispostas a fazê-los. O design aliado à
tecnologia, por exemplo, oferece certas garantias. Tomemos a marca Armani
ao criar o terno lavável, de secagem rápida, que pode ser lavado à noite e
reutilizado pela manhã, sem precisar passar. É uma proposta inovadora, sem
precedentes, que garante lugar de destaque entre seus produtos. Em 1995,
após investir em tecnologia, a marca Forum obteve lucros de 33%. A Zanotta,
importante marca de móveis italianos, investiu 100 mil dólares no desenvolvi-
mento de um novo produto que não foi sucesso de venda, porém, devido ao
design e ao elevado conteúdo de inovação, sua imagem esteve na capa de 80
revistas, ocupando um espaço na mídia equivalente a 800 mil dólares. Eis uma
visão mais ampla sobre investimento.
“A cópia não me preocupa em nada!” – declarou Alberto Balloco, diretor
de criação da marca italiana Robe di Kappa, que explica que o alto nível de
pesquisa nos seus produtos, de modo geral voltados aos esportes, garante a
segurança da marca, e complementa, “até que um concorrente consiga plagiar
7
a nossa tecnologia, já teremos avançado em novas direções” . Podemos então
afirmar que investimento em tecnologia e design proporcionam o diferencial
de uma marca.
Para Saviolo e Testa, é necessário que se estabeleça um processo contí-
nuo de pesquisa interna para que estas informações e estímulos sejam tradu-
zidos em produtos inovadores e propostos ao mercado de um modo estrutura-
do, transformando condições pouco favoráveis em algo positivo.
Fazer design é designar cores, formas, materiais, funções e emoções,
pensando de modo consciente e responsável. Atualmente, os cursos superio-
res na área da moda, que hoje chegam a quase 50 em todo o Brasil, e os pro-
fissionais da moda entendem que não basta criar produtos com soluções esté-
ticas, para fruição ou para gerar novas necessidades de compra. É preciso levar
em conta outras questões.
Se você já teve oportunidade de estudar a história da moda, deve ter
percebido as mudanças: ora mais ajustadas, ora mais largas, mais curtas, mais

99
Aula 5

longas, pesadas, leves, fluídas, rígidas. Quem atua como designer de moda,
deve estudar o corpo e a moda conforme os conceitos da ergonomia, relacio-
nada à segurança e ao conforto, cada vez mais definitivos como critério de
compra. Para a designer Suzana Barreto Martins, “a roupa sem ergonomia é
8
prisão para o corpo” .
O conforto pode ser definido como um estado de harmonia física e men-
tal com o meio ambiente, baseado na ausência de qualquer sensação de in-
cômodo. Em relação ao vestuário, o conforto é definido por três aspectos não
independentes, que interagem em função de cada situação: físico - relacionado
às sensações provocadas pelo contato do tecido com a pele e do ajuste da
confecção ao corpo e a seus movimentos; fisiológico ligado à interferência do
vestuário nos mecanismos do metabolismo do corpo, em especial o termo-
regulador, e o psicológico - função de fatores relacionados à estética, aparên-
cia, situação, meio social e cultural (Rubens Nicolini - Rhodia).
Devemos entender o corpo sob todos os aspectos possíveis: sociológi-
cos, culturais, fisiológicos, biológicos, psicológicos e espirituais. O produto que
projetamos, a roupa, veste um corpo que sente, que se emociona, que se mo-
vimenta, que sua, que sente frio, que namora, que come, que corre riscos, que
malha, que adoece, que brinca, que trabalha, que dorme.
Imagine um arquiteto que pretende elaborar um projeto e pouco se in-
forma sobre o espaço disponível. Do mesmo modo acontece com o criador
de moda que concebe um produto sem estudar, compreender e refletir sobre
o corpo humano, que é o espaço que centralizará grande parte nas nossas
atenções, preocupações e energias, considerando que somos “projetistas de
segunda-pele”. Para a designer Maria Celeste MONTEMEZZO, se

o homem, antes de interagir com qualquer objeto/máquina, tem, na


maioria do tempo a presença de uma vestimenta que pode interferir na
sua percepção ambiental, em seus movimentos e em seu comportamento
social, caberia dizer que o vestuário funciona como uma interface global
primária, no que se refere à relação homem-ambiente. Ou seja, ele faz
parte do meio físico/material do homem, está presente na maior parte do
tempo como uma extensão do seu corpo e interage com o organismo hu-
mano de maneira generalizada e direta, como uma segunda pele. E, sob
tais condições, pode intervir, positiva ou negativamente, na realização de
qualquer ação humana, influenciando o relacionamento do homem com
quaisquer sistemas. (2002, p. 3)

As relações do homem moderno com o corpo sofreram severas altera-


ções com reflexos de ordem econômica. Antigamente, a roupa desempenhava
a função de alterar a aparência do corpo; a exemplo do espartilho, o cérebro

100
Design e Moda

alongado dos gregos; os pés de lótus das chinesas; as luvas vitorianas, que
reduziam as mãos, e outros instrumentos. Hoje, os consumidores dividem o
orçamento, antes destinado à compra de roupas, com investimentos para re-
configurar o corpo: academia, dieta, plástica, lipoaspiração, implantes, tatua-
gens, tratamento de pele... Hoje podemos quase redesenhar o nosso corpo.
O consumidor percebeu que investir no corpo faz melhorar a auto-estima e,
também, que a roupa veste melhor num corpo “sarado”.
Este assunto tem também relação com os padrões estéticos impostos
pela sociedade e que interessam muito a quem estuda moda. Os valores esta-
belecidos pelo mercado e pela moda têm grande influência sobre tais padrões,
alguns com conseqüências graves, como os distúrbios alimentares anorexia e
9
bulimia . “Uma das poucas obrigações que temos na vida é trazer felicidade”,
define Philippe Starck acerca da responsabilidade de um designer. Este é um
assunto que deveria ser mais discutido. A lógica de mercado poucas vezes se
detém diante das questões éticas.
Quando tratamos de planejamento e desenvolvimento de produtos, per-
cebemos quão multidisciplinar é o design. Para a semioticista Kathia CASTILHO
(2003), “a moda pode ser entendida como um conjunto de comportamentos
significativos que exprimem os valores próprios de uma época e tramitam
juntamente com esta determinada época. Um fenômeno assim, por sua com-
plexidade e vastidão, apresenta um horizonte complexo, que não pode ser
objeto de uma só ciência. Remete-se então, freqüentemente, a estudos e con-
ceitos da etologia, cinética, psicologia, sociologia, etnologia, neurofisiologia,
semiótica, entre outros, os quais nos permitem elaborar uma análise ade-
quada a atender sua natureza interdisciplinar e, portanto, rica em elementos
constituintes”.
A embalagem do corpo, a arquitetura têxtil a que chamamos roupa,
apresenta características especiais tais como: a constante mobilidade, a es-
treita relação com a identidade do usuário, a sazonalidade, o alto nível de
obsolescência programada e o fato de ser um produto consumido em grande
quantidade e variedade durante toda a existência do ser humano. A roupa, em
nossa cultura, vai além da dimensão material. Pode comunicar uma ideologia,
proteção, pudor, personalidade, status, sexualidade. Logo que passe a excita-
ção gerada pelo lançamento a embalagem do corpo entra em fase de declínio.
As embalagens dos produtos que consumimos em um supermercado são, em
média, redesenhadas a cada dois ou três anos; a roupa se renova aproximada-
mente a cada seis meses.
A moda é um fenômeno sociocultural. Criá-la é transformar a vontade
coletiva em produto, na hora certa. Desenvolvê-lo, no âmbito da moda, não

101
Aula 5

se trata de propor o que o consumidor quer, mas a evolução de um conceito,


a previsão de seu comportamento, do seu estilo de vida. Portanto, é preciso
manter os elementos motivadores de compra. Não estamos projetando um
vestuário destituído do conteúdo “moda”, a exemplo de um uniforme militar
ou a batina de um padre quando o período de mudanças é infinitamente me-
nor. A roupa diferencia, socializa, concilia traços contraditórios, é independen-
te e dotada de vigorosa vontade.
As informações que auxiliam a reduzir as incertezas são chamadas de
tendência, que estudam aspectos gerais ou aspectos específicos de uma área
de conhecimento ou geográfica. As informações para as tendências podem ter
validade de algumas décadas, anos ou meses, variando também a sua abran-
gência. Existem empresas e profissionais que se dedicam a esse estudo. Entre
as mais conceituadas, estão nos Estados Unidos a Alvin Toffler, Faith Popcorn e
Naisbitt; na França, o Instituto Risc e na Itália, a GPF & Associados e Trend’s Lab.
Esses escritórios e seus consultores publicam estudos e análises que se situam
entre a sociologia e o marketing, ajudando empresas e cidadãos a investir no
futuro e contribuir para sua transformação.
Diante de tantas variantes é fundamental um bom planejamento estra-
tégico para reduzir os riscos. É importante entender o cronograma de informa-
ção de moda quando o setor se organiza para reduzir tais riscos e compreen-
der suas variáveis, os tempos da cadeia têxtil, da matéria-prima química para a
produção de fios até chegar ao mercado de consumo, num processo que leva
aproximadamente três anos, o mais longo na fabricação de qualquer produto
de consumo. Desde 1966, o setor conta com os bureau du style, escritórios de
informação e promoção de moda que organizam informações da cadeia têxtil
10
e de moda . Formalizou-se a previsão e o desenvolvimento das tendências
num processo cada vez mais comum em diversos países devido à interação das
economias industrializadas.
Charlotte Perriand, designer/arquiteta colaboradora de Le Corbusier, di-
zia que “criar é antecipar” e que “isto tem muita relação com a moda, prever
necessidades ainda não expressas, traduzindo nossa vontade de novas formas
de viver ou trazendo uma visão intuitiva dos rumos que irão seguir os padrões
estéticos.” (ESTRADA, 2000)
Em design, dizemos que o desenvolvimento de um projeto tem nos dois
extremos o problema e a solução, sendo que a formulação do problema é
fundamental para os resultados de um projeto. Sobre a importância da formu-
lação do problema, afirmou o cientista Einstein: “A mera formulação de pro-
blemas é muito mais importante que a solução, que poderá ser simplesmen-
te uma questão de habilidade matemática ou experimental. Levantar novas

102
Design e Moda

questões, novas possibilidades ou considerar problemas antigos sob um novo


ângulo requer imaginação criativa e marca avanços reais na ciência”. É preciso
organizar-se para trabalhar de modo equilibrado com a criatividade e a tec-
nologia. Bruno Munari, designer italiano, é didático ao ilustrar a metodologia
projetual estabelecendo uma analogia com uma receita culinária, um risoto de
11
espinafre . Ao pensar o problema, não pense no sentido negativo da palavra,
mas como uma direção, a definição de um desafio, uma demanda.
A identificação de um problema de design pode surgir da observação do
habitante dos centros urbanos, como roupas lúdicas que proporcionem repou-
so e prazer aos que freqüentam metrô; roupas para quem trabalha em casa;
uma coleção que resgate as brincadeiras para crianças que têm tido a infância
abreviada e a sexualidade antecipada; ou, ainda, vestuário para a terceira ida-
de, obesos, entre outros.
Pode-se identificar um problema a partir de uma necessidade emergen-
tes de consumo, de um grupo, uma necessidade social, estética, funcional,
ergonômica, ecológica, econômica, psicológica. E somente então se gera al-
ternativas até encontrar soluções adequadas e inovadoras. Trata-se, em cer-
ta medida, de transformar filosofia e realidade em roupa. O designer deve se
voltar para o bem-estar do ser humano, sem esquecer segmentos geralmente
excluídos do sistema. Para isso, é importante que a universidade forme cida-
dãos capazes de pensar sobre questões humanas, sociais e ambientais, com
uma visão para além do fascínio que exerce a passarela e a mídia. Poucos atin-
gem a notoriedade. Precisamos de profissionais que atuem, de modo ético e
transformador, nas milhares de indústrias de nosso país, mesmo que o façam
anonimamente.
Além de multidisciplinar, o desenvolvimento de uma coleção exige ca-
pacidade de interação com as diferentes áreas, pois quanto mais pessoas par-
ticiparem do processo e se sensibilizarem pela proposta, mais chances haverá
de ser aceita. Quanto melhor estudada a viabilidade de um produto, menor o
risco e mais perspectivas – de duas a quatro vezes – em relação aos produtos
12
não estudados .
Durante o planejamento, é equívoco não fazer sistematicamente a ava-
liação das coleções anteriores junto ao cliente intermediário e ao consumidor
final, considerando inclusive as reclamações recebidas. Com isso, perde-se um
número importante de informações para criar a próxima coleção, correndo o
risco de perder de vista idéias potenciais e, pior, de repetir erros. Dimensionar
uma coleção em um país de proporções continentais, onde o verão predomina
e onde simultaneamente há uma grande variedade de climas, cada vez mais
em desequilíbrio, é um grande desafio. Uma das alternativas é planejar e pre-

103
Aula 5

parar uma coleção mista em formas, materiais coordenados e componíveis en-


tre si. No Brasil, temos a certeza da chegada do calor, mas nunca de um inverno
frio, mesmo na Região Sul.
Grandes coleções dificultam o entendimento do comprador e favorecem
o atrito entre modelos semelhantes de uma mesma coleção. Recomenda-se
optar por coleções com dimensões reduzidas, mini-coleções (flash) coordena-
das que são lançadas em prazos menores de tempo. O dimensionamento de
uma coleção depende também do tipo de comercialização e do tipo de canal
13
de distribuição escolhido . Uma coleção padrão deve estudar a composição
entre a quantidade, a variedade, a coordenação e o ciclo para que, satisfazen-
do amplamente o público, garanta a continuidade da marca e o sucesso co-
mercial. Uma sólida estratégia de planejamento é indispensável uma vez que
as variantes são cada vez mais complexas de serem gerenciadas.
Outro aspecto importante é entender o conceito de marca e conceito
de coleção ou produto. A marca é como a mãe e os produtos, seus “filhotes”.
O conceito é emoção. É o espírito que mobiliza o consumidor e o faz atribuir
valor ao produto, atendendo às suas necessidades subjetivas. Alguns produtos
de moda freqüentemente se tornam instrumento para comunicar o perten-
cimento, o “modo de ser e de viver”; outros satisfazem necessidades físicas,
emocionais ou funcionais. O conceito é a força motriz que dá direção ao tra-
balho criativo. Sintetiza significados e informações, é o banco de memória de
uma marca, uma coleção ou um produto. No design, os conceitos são mais efi-
cientes quando expressos por imagens, tanto no inconsciente como no campo
físico. Exemplo disso é o caso da Benetton que trabalha com o conceito de soli-
dariedade humana. Suas coleções, por sua vez, mudam no mínimo duas vezes
ao ano, entretanto, seguem levando em consideração a imagem e o conceito
de solidariedade humana.
Uma marca é palpável, tem personalidade. Veja o que escreve José Mar-
tins quando cita um exemplo: “a Hugo Boss passa a imagem de líder visionário.
A comunicação, a vitrine, além, é claro, do corte dos ternos, caracterizam um
conteúdo emocional de objetividade, determinação, limpeza e a impressão de
alguém que sabe o que quer. Não são mauricinhos à procura da fama ou al-
mofadinhas buscando prestígio, como é a imagem explorada pela maioria das
marcas de ternos. Esse posicionamento e suas ações de marketing levaram-na
à liderança de mercado”.
Um conceito cria parâmetros que orientam esse complexo conjunto de
informações facilitando a comunicação com o cliente. Quando criamos uma
coleção autoral e desconsideramos um público específico ou aspectos comer-
ciais, privilegiando o inusitado, temos um resultado centrado na percepção

104
Design e Moda

pessoal do criador, nas preferências e na personalidade de um indivíduo que


adota um percurso heterogêneo e descontínuo, como é o caso da Alta Costura.
Para Stefania Saviolo e Salvo Testa, o designer deve buscar o equilíbrio
entre os dois componentes fundamentais do sistema de oferta na moda, aque-
le de natureza permanente – posicionamento de mercado, conceito de marca
-e o sazonal, que garante ao consumidor uma contínua evolução das propos-
tas, sem colocar em risco os componentes permanentes, definindo a modali-
dade de renovação dos códigos estilísticos da empresa, sempre respeitando a
14
identidade estilística permanente .
Hoje, a lógica e as variantes do desenvolvimento de produtos de moda
se tornaram-se mais complexas, de difícil gestão. Ao mesmo tempo em que
aparecem novos perfis de consumidores, o cliente fica cada vez mais fiel a si
mesmo. Com a supersegmentação de mercado, é importante estar sensível às
preferências, exigências e necessidades do usuário concretizando o conceito
da marca em formas, cores e matérias.
Diante da experiência de criar uma coleção ou um produto, as etapas
acontecem em ordem inversa ou simultânea. Cada coleção estará em um mo-
mento diferente. Os intervalos entre elas podem ser muito diferentes: enquan-
to os europeus trabalham com duas coleções por ano, os norte-americanos tra-
balham com 24 mini-coleções no mesmo período, para renovar continuamente
a mercadoria. É habitual que um designer esteja envolvido com três coleções
contemporaneamente; a coleção da estação passada, o monitoramento da co-
leção em andamento e o início da próxima.
No processo criativo, é importante aprender a estabelecer conexões ori-
ginais entre as informações disponíveis de âmbito pessoal, regional, nacional
ou internacional; analisar a relação dos fenômenos socioculturais de hoje com
as tendências estéticas, estabelecendo a relação entre a música, o espetáculo,
o cinema, a arte, o design, a decoração de interiores, a arquitetura, a realidade
brasileira, adequando-os às condições técnicas da empresa onde atua e com
sintonia na evolução sociocultural da clientela.
É curioso observar que, nesse percurso, muitas vezes evidenciamos al-
gum temor de ser provinciano, o que nos coloca numa armadilha contra a pró-
pria identidade. No entanto, é da província que emerge a questão cultural. Na
cultura européia, é justamente esse dado de provincianismo que lhe dá vitali-
dade. Assim, é importante interligar o mundo exterior ao espírito do mundo
interior, do sujeito, em sua particularidade. Emilio Pucci traduziu os elementos
da cultura de seu país para a moda. Em 1957, num processo de transposição,
transformou as referências de um evento cultural da cidade de Siena, o Palio,
em produtos de moda que alcançaram sucesso internacional.

105
Aula 5

Portanto, a exigência da Academia é formar indivíduos capazes de con-


ciliar a cultura do produto com a orientação de mercado, pois o mercado de
trabalho demanda profissionais capazes de gerenciar a criatividade no desen-
volvimento de produtos e criar um sistema coerente nos diferentes níveis do
contexto, entre as variáveis estéticas e as variáveis competitivas, considerando
as questões eco-éticas e a responsabilidade social.
Assim, devemos estar sempre em busca da interação entre a criativida-
de, a tecnologia, o marketing e o comércio – entre a alma criativa-emocional e
a alma empresarial-racional – para que seja possível traduzir o tempo em que
vivemos em produtos comprometidos com a qualidade de vida.

Notas
1 Entendemos que apesar de envolvidos com a atividade de desenvolvimento
e planejamento de produto os termos designer e estilista dizem respeito a ati-
vidades com distintos níveis de responsabilidade e abrangência.
2 ESTRADA, Maria H. Design: o melhor amigo do homem. Revista Ícaro Brasil, 2000.
3 Idem.
4 Entre consagradas marcas de moda, encontramos histórias de sucesso pro-
tagonizadas por duplas compostas pela perfeita sintonia entre a alma do cria-
dor e a alma de empresário/gestor: Yves Saint Laurent e Pierre Bergè, Giorgio
Armani e Sergio Galeotti, Gianni e Santo Versace, Tom Ford e Domenico De
Sole, Calvin Klein e Barry Schwartz, Valentino Garavani e Giancarlo Giammetti
(Saviolo e Testa, 2000 : p. 32).
5 Palestra em Arapongas, Pr, 2001.
610 bilhões de toneladas de frutas produzidas anualmente acabam no lixo:
igual à soma da produção anual do Chile, Uruguai, Paraguai, Bolívia, Peru e
Equador (Folha de S. Paulo, 9.11.98).
7 Em palestra ao Projeto Milano, Turim, fev/2001.
8 Em entrevista em 24/02/2003.
9 Há 30 anos, as modelos pesavam 8% menos do que a média. Hoje, o peso é
23% inferior.
10 Françoise Vincent-Ricard, autora do livro As espirais da moda, foi a primeira
a propor uma organização da estética e promoção industrial, criando um escri-
tório em Paris chamado Promostyl. Depois vieram outros: Nelly Rodi, Domini-
que Peclers, Design Intelligence, Fred Carlin, S.I.S., Index, Fashion Info, Fashion
Trends.
11 MUNARI, Bruno. Das coisas nascem coisas. Lisboa: Edições 70, 1993.
12 BAXTER, M. Projeto de Produto : guia prático para desenvolvimento de no-
vos produtos. São Paulo: Edgard Blücher, 1998.

106
Design e Moda

13 Em geral, estipula-se no mínimo um total de 20 a 30 peças e no máximo de


70 a 80. Esse padrão pode variar muito, a exemplo da Ellus que apresentou 600
itens numa coleção e a YSL Alta Costura, 300 modelos em um único desfile.
14 Ao se observar a Maison Dior, percebe-se que durante o período em que
Gianfranco Ferrè foi responsável pela marca, sua histórica memória de elegân-
cia e feminilidade foi respeitada e bem-interpretada. John Galliano trabalhou
a mesma marca de modo pessoal e muito distante dos códigos estilísticos da
Maison Dior. (SAVIOLO, 2000, p. 175)

Bibliografia
CALDAS, D. Universo da moda: cursos on-line. São Paulo: Anhembi Morumbi, 1999.
CASTILHO, K. A gênese da moda. http://www.anhembi.br/processo/genese.html, em
17.02.2003 às 07h00.
DALISI, R. Creatività, design e management : percorso nella cultura del progetto. Na-
poli : Electa, 2000.
HOLBORN, M. Issey Miyake. Alemanha : Taschen, 1995.
MARTINS, J. A natureza emocional da marca: como escolher a imagem que fortalece a
sua marca. São Paulo: Negócio Editora, 1999.
MONTEMEZZO, M.C.S.; SANDOS, J.E.G. O papel do vestuário na interação homem-
ambiente. In: CONGRESSO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM Design, 1º CONGRESSO
BRASILEIRO DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO EM Design, P&D Design, 5., Brasília.
Anais... Brasília, 2002.
NOSELLA, P. A escola de Gramsci. Porto Alegre : Artes Médicas, 1992.
PIRES, D.B; MONTEMEZZO, M. C.F.S. Dossiê e books de moda: elaboração de um book
de coleção. In ABC Design, edição 3, junho 2002, p. 36.
SAVIOLO, S. Le imprese del sistema moda: il management al servizio della creatività.
Milano: Etas, 2000.

Dorotéia Baduy Pires doroteia@sercomtel.com.br

107
Aula 5

Anexo 2

À sombra do objeto
Luiz. Antonio L. Coelho, PhD

Palavras-chave: Atributos do objeto, afetividade, projetação

1. A ubiqüidade do objeto

O objeto/coisa está dentro e fora de nós. Para conscientizar-se de si pró-


prio, o ser humano fez objeto de si mesmo.1 E para ampliar sua capacidade
física e mental usa o objeto como prótese de seus órgãos.2 É o objeto quem
constitui a base do valor do trabalho e a marca do status de seu possuidor. A
própria história da humanidade é marcada por nossa relação com objeto. As
grandes fases que atribuímos à cultura estão associadas ao tipo de material e
objeto utilizados nos diversos períodos. Do Paleolítico à Idade Atômica, as eras
são definidas pelos processos de exploração das coisas físicas com propósito
de produção. (Csikszentmihalyi e Rochberg-Halton, 1998:1).
Essa ubiqüidade dá ao objeto uma segunda natureza, a ponto de termos
por certas coisas sentimentos como a um semelhante. Mais desprezado ou
mais querido – e desejado – cada objeto ocupa um lugar em nossa hierarquia
de valores. Entender essa natureza corresponde a saber como criá-lo/projetá-
lo e enxergá-lo. Com este trabalho pretendemos contribuir um pouco com tal
reflexão. Escapam, contudo, à nossa capacidade as muitas possibilidades de
se analisar o impacto do objeto no indivíduo ou no meio social. O fetichismo,
o colecionismo e a alegorização, por exemplo, trabalhados por autores como
Adorno, Baudrillard e Benjamin, representam um potencial de estudo que não
vamos aqui abordar. Tão somente pretendemos chamar a atenção para certos
aspectos simbólicos – os afetivos em particular – no trato com a coisa, que nor-
malmente não são considerados pelo designer como requisitos importantes
para definições dos atributos de um produto na fase de configuração projetu-
al. E pretendemos fazê-lo desenvolvendo alguns dos aspectos já levantados,

1 Referimono-nos à constatação fundamental da existência sujeito contida na máxima “cogito,


ergo sum” de Descartes, em O discurso do método (1973).
2 No contexto da comunicação, Marshall McLuhan tratou da questão da extensão do potencial
humano contida no uso da mídia, entendida pelo autor como virtualmente qualquer objeto.
McLuhan também atribuiu sentido simbólico nessa relação. Atenta, porém, para um paradoxo
da situação: ao mesmo tempo que amplia determinada capacidade física, o objeto provoca
uma narcose dessa capacidade (McLuhan, 1965).

108
Design e Moda

formulando também hipóteses sobre o futuro do processo de fabricação do


produto no atendimento dos anseios afetivos do usuário.

2. Questões norteadoras

Em finais de período, costumamos fazer um balanço das realizações e


colocar perguntas sobre nossas perspectivas para os tempos que se aproxi-
mam. Para quem pensa o projeto e o produto, neste início de milênio, muitas
dessas perguntas giram em torno do processo de fabricação: estaremos atin-
gindo – ou poderemos algum dia atingir – os recursos tecnológicos de um
processo adequado de fabricação para o produto ideal?
As respostas a tais perguntas, naturalmente complexas, envolvem tantas
variáveis que muitas vezes os resultados parecem ganhar um cunho especu-
lativo. Por outro lado, não nos devemos furtar em tentar refletir sobre tais
indagações e, em casos como esse, um recurso comumente adotado é o de
decomposição da pergunta, sua formulação por partes. Por exemplo, o que se
entende por ideal, tanto no processo de fabricação quanto no que se refere ao
objeto? Sob certos parâmetros, o processo ideal de fabricação está condiciona-
do a razão de custo e benefício, tal como o ritmo de produção com menos re-
cursos. Por outro lado, parece razoável também afirmar que nenhum processo
seria adequado se não gerasse um produto satisfatório ao usuário, e que tanto
mais adequado seria quanto mais o produto correspondesse aos anseios desse
usuário. Entendemos, assim, que o objeto ideal vem a ser um objeto particu-
larizado, que satisfaça aos anseios, das mais variadas naturezas, do usuário. E
nesses anseios são equacionados aspectos simbólicos.
Para pensarmos a questão, combinamos basicamente autores da Teoria
da Comunicação e Design. Dentro dessa perspectiva, um trabalho representou
o fio condutor de nossa moldura teórica e, por tal razão, lhe damos maior des-
taque. Trata-se do livro The Meaning of Things. Domestic Symbols and the Self,
de Mihaly Csikszentmihalyi e Eugene Rochberg-Halton.

3. Entre o real e o simbólico

Esses autores desenvolveram um estudo em que trabalham a relação


indivíduo/objeto em sua dimensão simbólica a partir de uma perspectiva pró-
pria, sem desconhecer o vulto da psicologia, antropologia e semiótica. Para
Csikszentmihalyi e Rochberg-Halton, os escritos de pensadores como Freud,
Jung, George Hebert Mead, Victor Turner ou Peirce são marcos na compreen-
são do papel do símbolo na subjetivação e na representação das diferenças

109
Aula 5

sociais e, com elas, fia na manutenção do status e sistema em si.3 (Ibid.: 22


e seguintes) O trabalho, contudo, coloca a relação humana com o objeto
como tal, isto é, dentro de uma perspectiva fenomenológica alinhada com
a psicologia, que difere da posição freudiana e jungueana, preocupada com
uma visão conceitual abstrata do “papel das coisas na transformação sim-
bólica da psique.” (Id.: 25) Para Csikszentmihalyi e Rochberg-Halton, nem
Freud nem Jung “... estava interessado na experiência real que as pessoas
possam ter tido em suas vidas com objetos concretos” mas em sua dimensão
puramente simbólica. (Id.) Apesar de trabalharem aspectos também simbó-
licos, Csikszentmihalyi e Rochberg-Halton o fazem na relação concreta com
o indivíduo. Na parte aplicada da pesquisa, os autores tratam de objetos
no espaço do lar, os objetos domésticos, porque acreditam serem esses os
objetos que, dentre vários que nos cercam e que utilizamos diariamente,
escolhemos para nos relacionarmos mais intimamente. Se há dissonância
nessa relação, se deixam de nos agradar – e representar – eliminamo-los do
entorno íntimo. Não obstante o recorte feito pelos autores na parte aplicada
da pesquisa, suas reflexões valem para outros objetos, como fazemos aqui.
Em nosso caso, pensamos nos objetos que idealizamos e que buscamos no
ato da compra. Trata-se de uma particularização que também pode compre-
ender os objetos do lar.
Na construção de uma individualidade concreta a partir do contato fí-
sico, os objetos particulares tornam-se o “eu” íntimo conforme definido por
George Herbert Mead.4 Mead também ressaltou a propriedade de objetos em
representar o “outro generalizado”, isto é, valores e qualidades de natureza
social, que funcionam como signo-modelo de comportamento. Para o autor,
objetos constroem, portanto, a subjetividade e o social ao mesmo tempo.
Para Geertz (1973), citado por Csikszentmihalyi e Rochberg-Halton, os
objetos têm como que o poder de induzir e refletir ao mesmo tempo as qua-
lidades que representam simbolicamente. São modelos do sujeito ao mesmo
tempo que modelos para o sujeito. Assim, criamos nosso ambiente físico, com
um próprio onde nos sentimos bem porque nos representa duplamente em

3 Os autores mostram que os aspectos que dão status ao objeto são: sua raridade, sua idade e
seu preço (que pode ser causa ou efeito do status). Além disso, a proximidade, uso ou associa-
ção a uma pessoa de status agrega ao objeto status também, ainda que por oposição, isto é,
algo que é associado negativamente ao indivíduo de prestígio. (Csikszentmihalyi e Rochberg-
Halton, 1998: 30) Acrescentamos aqui o afeto, que também condiciona a hierarquização que
fazemos dos objetos que nos cercam, e que normalmente projetamos sobre aquelas coisas
associadas a uma pessoa querida.
4 O me, do inglês, no esquema de Mead, associado ao “eu íntimo”, em contraste ao I, o “eu
social”.

110
Design e Moda

dois níveis, como reflexo e como indutor, para nós mesmos e para o social.5 Nes-
se particular, o objeto não seria um signo apenas. Não estaria representando
algo que não a si próprio. Ele precisaria estar presente para atualizar suas refe-
rências. A presença constante do objeto dá, dessa forma, ao possuidor o “poder
mágico” dos atributos que representa. W. Lloyd Warner (1953) e Evans-Pritchard
falam na extensão de poderes físicos e qualidades que nos dão objetos que
usamos. (Csikszentmihalyi e Rochberg-Halton: 17 e 26) Para eles, precisamos do
contato físico com a coisa, da textura do objeto, sua temperatura, sua aparência
para constantemente confirmamos suas/nossas qualidades. Além disso, o obje-
to que nos representa na definição do “eu” íntimo e provém de negociação com
o entorno porque é fruto de escolha, vem a constituir-se em extensão real de
nós mesmos. Para ilustrar esse ponto falamos do objeto livro. Ele vem a repre-
sentar uma extensão cognitiva do usuário. Guardamos em nossa biblioteca esta
ou aquela obra para termos o conforto do saber preservado; um saber que que-
remos manter, mas que nossa memória não consegue fixar em sua totalidade.6
Ao mesmo tempo em que individualiza seu usuário ou possuidor na re-
presentação simbólica, o objeto também serve de amálgama social, isto é, ao
mesmo tempo que difere e personaliza, liga o indivíduo ao social justamente
a partir do reconhecimento do apreço ao objeto pelo grupo. É o social que
legitima o valor simbólico do objeto. Quando um indivíduo ostenta objetos/
símbolos de um grupo social – com seu inerente status – “declara” ser membro
daquele grupo (individualização grupal) em contraste a outros grupos. Portan-
to, ao mesmo tempo em que o objeto representa um elemento de um grupo
(socialização em um micro-nível), também representa a convivência entre gru-
pos nos sistema social (socialização no macro-sentido). (Id.: 36-39)
Transferimos sonhos e expectativas para o objeto. Tanto em sua fabrica-
ção quanto em seu uso refletimos nossas tendências e apreço pessoal e social.
Para Csikszentmihalyi e Rochberg-Halton, “as memórias passadas, experiências

5 Aqui os autores advogam que o objeto integra o ser humano a si mesmo, a seu semelhante
e também ao cosmos. (Ibid: 38) A transação com o objeto pode, assim, ser representativa de
modelo de algum aspecto do cosmos, ou estimuladora e criadora de um modelo para o
mesmo cosmos (Ibid: 43).
6 Como vimos, McLuhan fala em extensões de capacidades físicas ou mentais (1965). Já
Csikszentmihalyi e Rochberg-Halton nos ilustram essa questão no veículo que usamos: “do
primeiro triciclo de uma criança à sua bicicleta de dez velocidades, e posteriormente à moto ou
carro, a energia física do possuidor é ampliada pelo crescente aumento do poder da máquina.
Ele, como próprio carro, pode ser auto-móvel, movendo-se literalmente.” (Csikszentmihalyi e
Rochberg-Halton, 1998: 27) McLuhan acrescentaria que ao mesmo tempo em que ampliaram a
capacidade humana de percorrer espaços com rapidez, os veículos modernos também vieram
provocar o sedentarismo do ser humano contemporâneo. Para ele, o ser humano abre mão
de sua capacidade física natural por algum tipo de ganho (maior velocidade, maior volume ou
maior espaço por exemplo). Adota uma prótese para o órgão “ampliado”.

111
Aula 5

presentes e futuros sonhos de cada pessoa estão ligados inextrincavelmente


aos objetos que compreendem seu entrono.” [t.m.] (Ibid.: ix)
Dentro dessa perspectiva, recolocaríamos as questões já formuladas e
perguntaríamos de que maneira seriam fabricados nossos objetos e como nos
relacionaríamos com eles? Quais seriam os objetos que teríamos ou gostaría-
mos de ter?
Para examinarmos as questões, trazemos aqui um silogismo hipotético:
se o objeto representa status social, se estrutura a subjetividade e é por ela
reconfigurado, e se em sua produção e fruição investimos energia psíquica,
então é natural que no ato da compra busquemos um objeto individualizado.
A busca pela satisfação do cliente constitui um ponto de venda do produ-
to; produzir o objeto ideal torna-se, portanto, um fim para o fabricante. Houve
tempos em que o objeto “sob medida” era acessível à classe média, sobretudo
em locais onde a mão de obra ainda era barata. Mais recentemente, porém, com
o encarecimento generalizado dessa força de trabalho, o objeto talhado tornou-
se privilégio de poucos abastados. O caminho possível para o consumo em larga
escala passou a ser a estandardização propiciada pela industrialização. Primeiro
a indústria concentrou esforços na definição do perfil do usuário padrão para
racionalizar custos e atingir maior clientela. Em seguida, passou a ouvir a voz
do próprio consumidor, a partir de um grupo de usuários, e a basear-se nessas
estatísticas para definir a melhor configuração do produto na busca do objeto
ideal. Através do Design buscou equacionar a questão do “objeto sonhado” ora
em relação à sua função, ora pensando na “bela forma”, ou no estilo pelo estilo.
Sem perder de vista as conquistas obtidas após sua institucionalização, sobre-
tudo no século XX, a indústria parece aproximar-se do processo que tanto vem
buscando. Hoje a indústria se refere, com mais segurança, ao objeto único na
satisfação do usuário final. E o elemento que propicia essa postura vem sendo
a tecnologia; a mesma que fez prevalecer a estandardização, que trouxe a au-
tomação ao processo, e que agora aponta para o reverso da estandardização.

4. O sentido afetivo

Deixamos rastros na passagem pela vida. Rastros do que fazemos, no


que fazemos e de como fazemos. Da observação dessas marcas saem idéias
sobre novas tendências e sobre o futuro.7 Os vestígios que deixamos impregnados

7 Irvin Panofsky caracteriza o homem como um fazedor de “trilhas” no momento em que traba-
lha o entorno. A familiaridade com essa característica, associada ao conhecimento das práticas
humanas nos dá a habilidade de falar delas e formular hipótese a respeito de sua natureza.
(Panofsky, 1955: 23)

112
Design e Moda

nos objetos podem ser, portanto, marcas semânticas, verdadeiros signos de


época. Enquanto signos, essas marcas representam valeres simbólicos atribu-
ídos ao objeto por seu autor ou fabricante, incluídos aí os afetivos e ideológi-
cos. O que determinado objeto representa para uma cultura revela o apreço
social que lhe é atribuído, algo que também é passado para o indivíduo pela
ideologia. Entretanto, existe todo um investimento afetivo no objeto, que é
de ordem individual. Algo que normalmente nem prestamos muita atenção.
No momento em que utilizamos um objeto, não costumamos verificar se lhe
atribuímos algum apreço, isto é, não costumamos nos perguntar se gostamos
do objeto que estamos utilizando ou mesmo quais os objetos, à nossa volta,
que nos são mais caros. E quando o fazemos, em geral justificamos a preferên-
cia por sua utilidade. Também temos carinho pelo objeto que nos lembra um
momento ou uma pessoa especial. Mas realmente nos foge à percepção os
traços que imprimimos na coisa – referidos acima como reconfiguração – de-
talhes que caracterizam talvez posse e propriedade, tal como iniciais de nosso
nome, desenhos, decalques, adereços ou marcas pessoais que caracterizam
essa posse.8
Quando o artesão estava próximo do usuário no período pré-industrial,
os aspectos simbólicos – além do uso – fundiam-se no próprio uso. Com a
industrialização houve uma ruptura nessa relação de proximidade e, com ela,
uma separação na semiose. Passou a haver uma impregnação simbólica na
fabricação diferente daquela do usuário. Determinado produto ou classe de
produtos, enquanto signo, passou a ser a bandeira de uma era, de um segmen-
to industrial, de um país. Passou a signo-gênero, superestrutural.
O esvaziamento afetivo do objeto, do lado do fabricante, prevaleceu du-
rante o período industrial, ressurgindo, quando muito, no styling e nos estilos
de designers de renome, em momentos de individualização da forma. Mas
ainda estavam condicionados aos limites da própria tecnologia que prevalecia
nessa fase da era industrial. O estilo autoral ainda estava associado ao fabri-
cante, embora aparecesse aí a figura de um intermediário – o designer – que,
de certa forma, assumia o papel do artesão do período pré-industrial na ques-
tão afetiva de marca particularizada. Dependendo do setor industrial, eram,
de fato, apenas modelos diferenciados de um produto de massa ou, no caso
do Design em menor escala, de produto autoral com as marcas de estilo do
auteur-produtor.

8 Mais uma vez nos valemos aqui do objeto livro como ilustração. O livro é um objeto que co -
mumente apresenta as marcas pessoais de seus leitores nas glossias deixadas nas margens,
marcas de posse e comentários que se agregam às futuras leituras do texto.

113
Aula 5

Pensar a relação do humano com o mundo físico e o significado do ob-


jeto são preocupações remotas na história do pensamento. A postura que con-
sidera aspectos afetivos nessa interpretação, contudo e teoricamente falando,
vem do pós-guerra. Surgiu como reação ao racionalismo exacerbado predomi-
nante no século XIX e primeiras décadas do século XX e à posição estruturalista
vigente até meados do século recém findo. Tais posturas, de lastro positivista,
colocavam o sentido como algo imutável e inerente à natureza/essência do
ser humano – ou do objeto – este interpretado a partir da revelação das es-
truturas fixas da mente ou do mundo físico. Aqui a interpretação estaria vin-
culada essencial e tão somente à razão. Para o novo paradigma, a experiência
do fenômeno (Merleau-Ponty) bem como o envolvimento emocional com o
objeto (Ricoeur) seriam essenciais para sua interpretação.9 À incorporação do
afeto na interpretação viriam somar-se, posteriormente, a idéia da influência
cultural (cultura aqui usada no sentido benjaminiano de experiência e antro-
pológico de aquisição dos padrões e modos autóctones do grupo social) e do
estado emocional no momento da fruição na própria percepção do objeto,
incluindo-se aí valores individuais, isto é, tendências, visões, pressuposições,
preferências, projeções, expectativas, e preconceitos pessoais, sem mencionar
a memória e objetivos específicos, que alteram a percepção e, com ela, nossa
interpretação de fatos e do sentido do objeto, particularmente.10
A questão afetiva não representava, conforme já mencionado, uma pre-
ocupação no chamado período clássico da industrialização, aqui colocado en-
tre a segunda fase da Revolução Industrial inglesa do século XIX e o período de
robotização industrial do pós-guerra eu meados do século XX. Buscava-se apri-
morar o nível de qualidade de um produto destinado a um usuário imputado,
um usuário-tipo. Na projetação, portanto, não seria comum ainda considerar
aspectos afetivos da relação objeto/usuário enquanto atributos na definição
das especificações desse produto.
Em uma fase posterior ao processo industrial, que acontece a partir dos
anos oitenta do século passado, com a preocupação do design participati-
vo e o eqüacionamento do usuário na configuração do produto, passou-se a
contemplar a afetividade daquele usuário na definição das especificações do

9 Embora aqui se estivesse tratando ao contexto linguístico e do significado de textos religiosos


– no caso, Ricoeur – a idéia passou a ser considerada em outros contextos teóricos e objetos.
10 Para Csikszentmihalyi e Rochberg-Halton (1998:4), a atenção ou o foco com que abordamos o
objeto constitui variável importante. Trata-se do recorte seletivo constituído a partir de nossas
intenções e objetivos, por sua vez ligados a nossos interesses em determinado momento. Ela
nos influencia no momento em que nos relacionamos com objetos para percebê-los, interpre-
tá-los e mesmo deles nos servirmos cognitivamente.

114
Design e Moda

produto.11 No período do design participativo, o usuário enquanto grupo –


menor que uma massa-tipo – passa a imprimir seu “vestígio” antes da posse
e do uso, ou mesmo da compra, funcionando, porém, como um indicativo de
garantia de aquisição. A tomada de opinião e a definição do perfil consumidor
permitiu essa adequação da indústria. Ouvir o cliente e o usuário antes mesmo
do consumo, descobrir suas preferências enquanto classe ou segmento social,
caracterizado pelo gosto grupal, caracteriza essa fase do design na indústria.
A solução do eqüacionamento afetivo nas especificações do produto,
não seria algo simples para o design participativo, já que não estamos falando
aqui de um produto sob-medida, isto é, um objeto específico para um usuário
especial e sim de um objeto padrão para um usuário também padrão. Mapear
o afeto investido no produto enquanto classe seria tarefa complexa. Não obs-
tante, surgiram métodos eficientes que vieram equacionar a questão.12
No tocante à afetividade da maneira que temos aqui tratado, todavia,
um problema ainda permaneceria na questão do levantamento das necessida-
des simbólicas. Ainda estaríamos tratando de um usuário-tipo.
Qualquer que fosse o perfil contemplado por esse novo paradigma – que
incorpora uma filosofia de produto e um método de projetar – seria ainda o
de um usuário abstrato. Para certa categoria de objetos – os de uso coletivo
– talvez estivesse aí o limite da customização. Mas seria a indústria capaz de
atender ao usuário de maneira individualizada? Como faria ela para os objetos
domésticos e aqueles com os quais nos relacionamos mais intimamente e que
temos como consolidadores do “eu” negociado? Poderia ela sobreviver sem
perder em economia e rapidez, sem onerar seus custos? A resposta chegou
por via tecnológica. Os novos métodos projetuais passaram a permitir altera-
ções nas especificações de produto sem onerar o processo produtivo. O uso de
recursos computacionais – hardware, periféricos e programas –, na linha pro-
dutiva em geral, parece ter sido o divisor de águas no ritmo da customização.
Começando por setores que viram modificada sua natureza industrial, como o
da produção gráfica, onde softwares mais sofisticados permitiram ao próprio
usuário produzir suas peças gráficas em casa, a partir de seu computador pes-
soal, com qualidade comparável à da gráfica profissional. O caso de papela-

11 Gostaríamos de estabelecer aqui uma distinção entre o chamado design participativo e o


design social, conforme temos observado no contexto brasileiro. Trabalhamos com a noção
de participativo associada ao produto ainda fabricado pela indústria, e de social para denotar
o projeto que individualiza o usuário, o objeto único.
12 Cito aqui, com exemplo, o trabalho do Professor Marco Antonio Magalhães Lima, que conside-
rou os atributos semânticos dos usuários na definição das especificações do produto (ônibus
urbanos do Rio de Janeiro). O projeto nesse caso considerou necessidades que não aquelas
que o fabricante e o cliente (empresário de companhia de ônibus) atribuiam ao usuário. A voz
deste incorporou a afetividade na consecução do produto. (Lima, 1999)

115
Aula 5

rias vale também ser mencionado, onde o usuário passou a obter reproduções
fotográficas coloridas de alta resolução com recursos de ampliação, redução
e efeitos visuais a preços razoáveis, além de cartões sociais de máquinas de
impressão por ele próprio operadas. Os bureaux, com a utilização de gráficas
digitais, passaram também a oferecer respostas mais rápidas aos atributos grá-
ficos definidos pelo cliente.
Outros setores de maquinaria pesada, como o da indústria automobilís-
tica, também foram impactados pela automatização introduzida pela revolu-
ção da informática. Aqui, sem alterar a rotina produtiva, o usuário pôde espe-
cificar aspectos da carroceria e do interior do veículo, atributos estéticos e de
materiais: cor, ausência ou presença de frisos, tipos de acessórios, materiais de
estofamento, localização de fechos, entre outros.
Com a possibilidade de maior individualização na produção industrial,
possibilitada pela tecnologia, estamos entrando na fase em que se combinam
as vantagens do design participativo – da tomada de opinião com a intervenção
direta do usuário no processo de fabricação. Acontece também na fase de fabri-
cação, portanto antes da posse. Mas com uma diferença da fase anterior: aqui
já existe um compromisso de consumo ou a efetivação da compra. O usuário
define suas preferências e recebe o produto com as características desejadas.
O produto sob medida sempre existiu, mesmo no período industrial, po-
rém a um custo elevado, para uma clientela abastada, e em certos segmentos
industriais. Hoje a escala é maior em alguns segmentos, como no exemplo das
artes gráficas, onde o produto sob medida banaliza-se mais e mais e o próprio
cliente torna-se um co-autor. O mesmo vem acontecendo com a produção de
som, imagens virtuais, edições de livros e em setores mais sofisticados, como o
bancário (produção de cheques personalizados).13 Abre-se, assim, a possibilida-
de dos valores simbólicos de uso, de estilo e autoria retomarem à fase artesanal.

5. O usuário no centro

A indústria logra mais hoje o que sempre se preocupou fazer na pro-


dução do objeto, a satisfação de usuário. O que vemos hoje em termos de
configuração de um produto em seus aspectos visuais, como mudar a tela do
computador segundo padrões pré-definidos, a correia do relógio ou o tom da
campainha do telefone celular, embora tenha ganho exponencialmente em
variedade a partir das possibilidades introduzidas pelo computador, já existe

13 Muitos bancos oferecem ao cliente a possibilidade de escolher cor de cheque, imagem de


fundo e tipo de letra, sobretudo nos Estados Unidos.

116
Design e Moda

desde há muito. O importante é frisar que a busca pelo atendimento aos an-
seios mais particularizados do cliente representa a importância que se dá o
objeto em nossas vidas, que, de fato, como vimos, é algo que vai além dos
aspectos pragmáticos de uso. Falamos de questões afetivas do objeto no perío-
do de fruição, isto é, enquanto somos consumidores. Falamos da importância
que ele representa na subjetivação, de como o selecionamos no ato da com-
pra, e de como a indústria procura atender a esse anseio. Falamos também de
como deixamos nossa marca no objeto a partir do contato que temos durante
a fruição. Gostaríamos agora de falar de outro aspecto, o lado criativo durante
o uso. No ato de fruição, somos também autores, e nesse sentido entende-se
que a criação está tanto na configuração e fabricação efetiva do objeto quanto
em sua fruição.14
A afetividade como um atributo na relação com o objeto implica, ainda,
aspectos bastante variados. A começar pelo cruzamento disciplinar aventado
por teóricos como Victor Margolin (1989). Para ele, as teorias da recepção e a
da resposta-do-leitor, oriundas da crítica literária, são inspiradoras para o De-
sign na compreensão da relação usuário/objeto para além do que os estudos
de mercado revelam. (Ibid.: 9) Aqui a idéia central reside no deslocamento
da atenção do autor para o receptor, e do texto para a recepção. No caso da
literatura, a idéia tem origem na postura pós-estruturalista – encarnada por fi-
guras como Roland Barthes e Jacques Derrida – e é formulada por Hans Robert
Jauss e Wolfgang iser (1983, 1978, respectivamente) e Jonathan Culier (1981),
Jane Tompkins (1994) e Stanley Fish. Esses autores defendem que o receptor na
relação texto/leitor – que aqui estendemos para o fruidor na relação produto/
usuário – deve ser o foco principal na interpretação do texto/objeto e que o
sentido da obra/objeto se dá no contato texto/leitor, como, no caso, objeto/
usuário no ato da leitura/uso. O foco migra do ato criativo da autoria para o
da interpretação sem que haja preponderância ou excelência do texto sobre a
interpretação. O que equivale a dizer que no caso do produto o deslocamento
se daria do fabricante para o usuário e do produto para o uso.
E que a criação deveria contemplar os atributos da fruição no mesmo
nível que os do produtor. Como vimos acima, atualmente haveria a tendência a
uma preocupação maior com o usuário e a conseqüente incorporação de seus

14 Giulio Carlo Argan, em Arte moderna, fala que passamos da tecnologia dos objetos, o arte-
sanato, para a tecnologia dos produtos, a indústria, e com a segunda revolução industrial,
passou-se da tecnologia dos produtos para a tecnologia dos circuitos. Hoje atuamos no mundo
não mais pelas forças políticas ou pelas dicotomias econômicas, mas pelo poder de consumo.
Consumimos imagens. O cidadão busca seu valor e prazer, e enxerga o poder de objeto/ima-
gem, objeto enquanto imagem e seus significados e valores agregados afetivos.

117
Aula 5

valores na especificação do produto, incluindo a afetividade. Tanto no caso do


produto sob medida quanto no do projeto para um objeto industrial.
Outros autores, como Gillo Dorfles, consideram aspectos da relação de
uso na questão da afetividade. Para ele, o objeto de uso supra-individual me-
rece menos afeto que o objeto de uso próprio. (Dorfles, 1973) B. Löbach, em
contrapartida, advoga que a afetividade observada para com o objeto de uso
individual ocorre também, porém com menos intensidade, com o objeto de uso
coletivo. O autor atribui três funções ao produto (prática, estética e simbólica) e
considera que a gradação de afetividade depende do grau de representativida-
de simbólica no meio social. Isto é, quanto maior o apreço de determinado obje-
to no grupo social maior o afeto que ele exerce no usuário. De fato, a relação de
uso privado versus coletivo e determinante no afeto que dispensamos aos obje-
tos, como pudemos ver no trabalho de Csikszentmihalyi e Rochberg-Halton. Mas
não a única ou nem talvez a mais importante, apesar da opinião desses autores.
A nosso ver, parece precipitado afirmar que um aspecto predomina sobre outro.
Outros aspectos contribuem, ainda, na aferição do afeto ao objeto e devem ser
considerados. É o caso do espaço de fruição (como parte do contexto) em que
se insere o objeto. Parece óbvio que objetos ligados a cemitérios tendem a ser
menos apreciados que aqueles ligados a restaurantes e locais festivos. É bem
verdade que aqui o afetivo torna-se mais complexo por tratar-se de caso onde
dicotomias tão essenciais quanto pulsões de vida e morte entram em jogo. Mas
o exemplo serve-nos de ilustração para notar como o emocional do indivíduo e
o contexto do objeto agem além da consciência na valoração afetiva.
No tocante à relação de uso – seja para o objeto de uso individual ou
coletivo – há que se considerar, ainda, aspectos como o grau de intimidade
dessa relação, bem como os sentidos que atinge, as capacidades que esti-
mula ou as necessidades que atende e de que maneira. Por exemplo, apesar
do ônibus urbano ser de utilização coletiva, a fruição compreende o contato
de grande parte do corpo com o assento, cerca de 50% de sua capacidade tá-
til. (Lima, 1999) O prazer passa, então, a atributo especial na aferição afetiva.
O prazer da leitura, por exemplo, grande estimulante da capacidade estética,
cognitiva e contemplativa, investe o objeto-livro, enquanto classe de objetos,
como dos mais valorados afetivamente por leitores ainda que utilizem outras
mídias como fonte de leitura (jornais, revistas ou computadores).
A apropriação temporária (ônibus) versus o domínio permanente (mo-
radia), a relação de um-para-um (livro ou computador) em oposição à fruição
coletiva (televisão ou cinema) são ainda outros aspectos que determinam o afeto
de que investimos o objeto. Assim como necessidades de sobrevivência (como
as que envolvem a percepção dos objetos relacionados a um hospital), ou neces-

118
Design e Moda

sidades menos fundamentais (como conforto; locomoção, visualização, lazer,


comunicação, etc.) são consideráveis no investimento afetivo sobre o objeto.
As pessoas “unem-se” a objetos de uso de maneira peculiar. Assim como
investem afeto nas relações de amizade interpessoal, destinam a objetos afetos
e valores que vão além daqueles traduzidos em valores pecuniários. Não se fala
aqui do afeto que dirigimos apenas a objetos que nos são queridos por laços de
memória – signos de momentos ou pessoas queridas – mas aqueles que atribu-
ímos a objetos do dia-a-dia. O colecionador, por exemplo, traz um olhar único
para o objeto para além do uso. Esse valor se agrega a outros objetos da mesma
categoria e tem por base um conhecimento da origem e da história do objeto
que o colecionador costuma obter. O alegorista, por outro lado, teria outra rela-
ção com a coisa. Desloca propriedades e relações do contexto original da mes-
ma no sentido de justamente acrescentá-la em termos de significado e valor.
O que parece acontecer é que hierarquizamos nosso entorno a partir de
uma escala de valores afetiva. Temos mais apreço a certos objetos que a outros.
Há objetos que nos são individualmente caros e há objetos que se tornam úni-
cos pela classe a que pertencem, como no caso de colecionismo. Investimos afe-
tividade, ou energia psíquica na opinião de Csikszentmihalyi e Rochberg-Halton
(1998), de acordo com essa valoração simbólica. Às vezes mais pelo significado
social e valor financeiro que têm, roupas de grife, aparelhos eletrônicos, auto-
móveis, equipamentos sofisticados. Outras vezes, é a percepção de aspectos
intrínsecos desses objetos – material de fabricação, acabamento, tecnologia in-
corporada, etc. – em virtude de formação técnica ou conhecimentos específicos,
que nos dá a medida do apreço. O valor é dado, ainda, pela relação metafórica
com necessidades básicas, conforme nos coloca Freud, ou é sentido como uma
representação arquetípica, na palavra de Jung. Pode ter valor por constituir o
índice, na acepção peirciana, de um ente querido. O que mais justificaria a di-
ferença do que as pessoas estão dispostas a investir, em termos de energia e
dinheiro, na aquisição e manutenção de um objeto único, personalizado?
Mas até onde iria a busca pelo objeto ideal, diferenciado? Essa diferen-
ciação teria um limite? O limite da desintegração social, segundo autores como
Durkheim, Weber e Freud (Ibid.: 42). Seria como que a busca de uma nego-
ciação homeostática entre dois extremos desintegradores: o da massificação
robotizante e o do atomismo exacerbado.
Nesse sentido o equilíbrio estaria nas mãos da tecnologia adotada pela
indústria dentro do atual nível de satisfação pessoal do usuário no processo de
produção. E tal integração através da diferenciação do objeto, seria ela como
um aglutinador social representando um retorno ao período pré-alienante de-
finido por Marx? Estaríamos vivendo um dialogismo produtivo, onde se permi-
te a coexistência de diferenças?
119
Aula 5

6. Referências

[1] Csikszentmihalyi, Mihaly & Rochberg-Halton, Eugene. The Meaning of Things.


Domestic Symbols and the Self, Cambridge UK, Cambridge University Pres, 1998.
[2] Culler, Jonathan. The pursuit of signs: Semiotics, literature, deconstruction, Ithaca,
NY, Cornell University Press, 1981.
[3] Dorfles, Gillo. El diseño industrial y su estética, Barcelona, Editorial Labor, 1973.
[4] Geertz, C. The interpretation of Cultures, New Yo.k, Basic Books, 1973. (1966)
[5] Jauss, Hans Robert. Toward an Aesthetic of Reception, Minneapolis, University of
Minnesota Press, 1983.
[6] Iser, Wolfgang. The Implied Reader. Patterns of Communication in Prose Fiction
from Bunyan to Beckett, Baltimore and London, The John Hopkins University Press,
1978.
[7] Lima, Marco Antonio Magalhães. Os atributos dos usuários no projeto: o caso do
ônibus, Rio de Janeiro, UFRJ/COPPE, 1999 (dissertação de mestrado).
[8] Margolin, Victor. Design Discourse, Chicago. The University of Chicago Press, 1989.
[9] Tompkins, Jane P. (ed.). Reader-response Criticism. From Formalism to Post-structuralism,
Baltimore, MD, The Johns Hopkins University Press, 1994.
[10] Warner, W Lloyd. Yankee City, New Haven, Con., Yale University Press, 1963.

Luiz Anotnio Luzio Coelho, PhD


Departamento de Artes & Design, PUC-Rio, R. Marquês de São Vicente, 225, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Telefone: + 55 21 5299211, Fax: + 55 21 5299418
E-mail: artcoel@rdc.puc-rio.br

Os direitos de uso deste artigo foram gentilmente cedidos pelo seu autor e pela Revista
ComunicArte, onde foi sua publicação original (ano 2002, vol. 1 (3): p.267-272). O artigo
está reproduzido aqui na íntegra, sem qualquer alteração em relação à obra original.

120
Aula

Introdução à metodologia de projeto em design


6
Seus Objetivos:
Ao final desta aula, esperamos que você seja capaz de:
1. Elaborar um plano de ação para o desenvolvimento de
um projeto em design;
2. Estabelecer objetivos (para que fazer), justificativa (por que fa-
zer), metodologia (como fazer) e cronograma (quando fazer);
3. Identificar uma oportunidade de projeto em design.

2 horas de aula
Design e Moda

1. Introdução

“Nada existe no intelecto que, primeiramente,


não tenha estado nos sentidos.”
René Descartes

Para darmos início à terceira parte do nosso curso, gostaríamos de reto-


mar o conceito de design que trouxemos aqui em nossa primeira aula:

A palavra design é de origem inglesa, que significa desenho, e é usada


para designar o processo intencional de pensar, organizar, sistematizar,
planejar, experimentar, projetar e desenvolver produtos, a partir de opor-
tunidades identificadas no mercado.

Ao prestarmos maior atenção a este conceito, podemos afirmar que, por


ser um “processo intencional”, pressupõe uma metodologia, aliás, uma METO-
DOLOGIA PROJETUAL. Vamos, então, antes de discutirmos este assunto, nos
apropriar dos conceitos básicos e necessários a um melhor entendimento dos
conceitos de projeto, processo, método e metodologia.

2. Conceitos básicos e necessários

Podemos partir das definições encontradas no livro Conceitos-chave em


design organizado por Luiz Antonio L. Coelho:

Projeto - 3. O projeto em design – em nosso entendimento mais restrito do


termo – difere do projeto em outras disciplinas projetuais, por nele haver um
procedimento e uma postura transdisciplinar que implica apropriação com-
preensiva do problema a ser enfrentado. O projeto em design se configura
como processo de elaboração do conjunto de documentos necessários à exe-
cução de qualquer objeto, seja este de qualquer dimensão ou característica,
tendo sido desenvolvido a partir da construção do problema em multiplicadas
derivações, por exemplo: quanto a seu significado, quanto a aspectos de pro-
dução, quanto a múltiplos aspectos de uso e funcionamento, quanto ao im-
pacto no meio ambiente, quanto às ferramentas projetivas, entre outras tan-
tas, inclusive os aspectos subjetivos de quem projeta. (COELHO, 2008, p. 272.)

Significado
Aspectos subjetivos Aspectos de uso
de quem projeta e funcionamento
PROBLEMA ou
OPORTUNIDADE
Impacto no de Design Aspectos
meio ambiente de produção

Ferramentas projetivas

123
Aula 6

5. Diferentes áreas do campo do design exigem processualísticas diferen-


tes quanto ao seu projeto. Isso diz respeito, tanto aos processos, quanto
aos documentos que caracterizam o projeto. Isto significa que a aborda-
gem ao projeto de design em cada uma de suas áreas específicas implica
relações de LINGUAGEM características. Assim, embora sejam projetos de
design, um projeto na área de design de interiores difere de um projeto
em design gráfico pela natureza de suas questões específicas, que condi-
cionarão diferentes abordagens metodológicas. (Ibid., p. 273.)

Processo – Pode-se dizer que a noção de processo está intimamente li-


gada à de ação e à de DESENVOLVIMENTO. O termo pressupõe, dessa maneira,
um curso, um movimento. Processo depende de tempo, e refere-se ao SISTEMA,
cuja principal característica é a mudança. Existem sistemas estacionários, inde-
pendentes de tempo, mas, sem dúvida, não constituem processos. (Ibid., p. 264.)

Processo sem método são apenas fases predefinidas. O método está den-
tro do processo e compreende a organização na realização das etapas
processuais. O método pode ser tanto normas de organização e controle
através das quais o processo se desdobra, quanto um lado criativo do
desenvolvimento do processo. [...]

Em resumo, embora haja alguns e diferentes sentidos para método, como


por exemplo, o que chamamos aqui de ‘etapas de um processo’, preferimos
entender que o processo vem a ser um caminho, um movimento que tem
etapas predefinidas e conhecidas, mas não é o mesmo que método. Este se-
ria constituído dos princípios de organização das etapas, mais relacionados
com a postura organizacional do trabalho. Quanto às técnicas, seriam as
receitas já experimentadas e realizadas inúmeras vezes com sucesso.

Para o design, o processo representa a seqüência de operações, ou encade-


amento ordenado de fatos e fenômenos, obedecendo a um certo esquema,
com a finalidade de produzir um resultado específico de CONCEPÇÃO e PRO-
DUÇÃO de objetos – estes entendidos como produtos bi ou tridimensionais.
O processo é entendido também como o conhecimento em curso na CRIA-
ÇÃO e realização do OBJETO, sendo o registro do processo talvez a melhor
maneira de transmissão desse conhecimento. (Ibid., p. 265-266.)

Método - O substantivo método chega-nos do latim methodus, que pro-


vém da locução grega meta (meta) + hodos (caminho). Seria, então, o
caminho para se atingir uma finalidade. Normalmente, o termo método
vem associado a outros termos, como PROCESSO e TÉCNICA. Entendemos
processo, este sim, como o caminho em si, composto de fases, por onde o
método percorre. Em realidade, é muito difícil perceber método separado
do processo, sendo este caracterizado pelas grandes etapas que aquele
deve percorrer. De fato, o processo seria um método em movimento. Já
a técnica seria como que o método cristalizado e, em geral, compreende
ação menos complexa em termos de procedimentos envolvidos. É mais
fácil entender o método como um composto de várias TÉCNICAS.

124
Design e Moda

Assim como a técnica, o método envolve instrumentos de coleta e ANÁ-


LISE, caracterização do MATERIAL e pessoal com quem se trabalha, crono-
grama etc., além de outras fontes, tais como as teorias e autores adota-
dos, e, é claro, as técnicas envolvidas – como questionários, entrevista ou
OBSERVAÇÃO, por exemplo.

[...] em termos metodológicos, determinado PROJETO envolve uma elabo-


ração complexa de ações previamente conhecidas e rotuladas, combina-
das a outras nem sempre conscientes, que vão ganhando forma durante o
processo do trabalho. E que, sobretudo, se deve recuperar o processo atra-
vés do registro da maneira particularizada de se trabalhar cada etapa per-
corrida. A busca da consciência dos métodos compreendidos no processo
é a grande riqueza que se passa para a posteridade. (Ibid., p. 252- 253.)

Metodologia - Entende-se por metodologia o conjunto de métodos utiliza-


dos em determinado trabalho. Sob outro ângulo, o termo refere-se à teoria
que estuda a maneira de se desenvolver tal trabalho, isto é, seu modus fa-
ciendi. É comum também o USO da palavra metodologia como sinônimo de
método, embora, em nossa opinião, esta utilização do termo leve a uma per-
cepção equivocada de duas figuras distintas como uma única. (Ibid., p. 254.)

Ao darmos início, então, a um projeto em design, devemos ter em mente o


“problema a ser enfrentado”, que nada mais é do que a oportunidade de projeto.

3. Planejando o desenvolvimento de um produto

Uma oportunidade de projeto pode apresentar-se de algumas formas dife-


rentes. Geralmente nós somos chamados para “resolver” um problema apresenta-
do pelo cliente; não somos nós que “identificamos” o problema/oportunidade. A
oportunidade de projeto pode dizer respeito a qualquer uma das áreas de atuação
do designer, ou seja, pode ter como produto final um objeto bi ou tridimensional.
Lógico que para cada oportunidade haverá um conjunto de métodos mais
adequados para a obtenção de uma solução apropriada ao problema/oportunida-
de. Independentemente de que métodos sejam escolhidos, eles se fazem necessá-
rios, ou seja, considerando que metodologia é um “conjunto de métodos utilizados
em determinado trabalho”, um projeto não acontece sem metodologia. E, aqui,
vamos estabelecer que a metodologia empregada no desenvolvimento de projetos
em design denominamos de metodologia projetual, procurando, assim, não con-
fundir com metodologia científica. Faz parte da disciplina Metodologia do Trabalho
Científico deste curso uma aula sobre metodologia científica e, ao se apropriarem
dos conceitos, acreditamos que as diferenças ficarão claras para todos.

Lembre-se: metodologia projetual é diferente de metodologia científica.

125
Aula 6

Concordamos plenamente com Coelho quando ele afirma que “Meto-


dologia é, antes de tudo, o trabalho de organização do pensamento” (ibid., p.
53). Sem organização do pensamento, sem sua estruturação, um projeto não
acontece. Assim, precisamos ter muito claro em nossas mentes:
• O QUE fazer,
• PARA QUE fazer,
• POR QUE fazer,
• COMO fazer e
• QUANDO fazer.
Vejamos, então, como estruturar estas etapa
s.

3.1. Oportunidade de projeto = O QUE fazer

Denominaremos a oportunidade de projeto como O QUE fazer.

Identificamos uma necessidade ou simplesmente decidimos com o que


trabalhar [ou nos é apresentado algo – inserção nossa]; confrontamos
possibilidades e alternativas de temas e manifestamos intenções; levan-
tamos questões, maneiras preliminares de realização e tentamos buscar
razões para nossa opção. É nesse momento que pensamos em objetivos
e justificativas primeiras e em possíveis planos investigatórios. Ao che-
garmos à idéia, é bastante comum que a mesma venha acompanhada
também de seus possíveis modos de realização. (COELHO, 2006, p. 42.)

3.2. PARA QUE fazer está relacionado aos objetivos do projeto

PARA QUE fazer diz respeito aos objetivos do projeto. Com que intuito?
PARA QUEM pretendemos desenvolver o produto? Aonde queremos chegar?
Ao levarmos em conta essas variáveis, estaremos estabelecendo uma direção
para nosso pensamento, para a escolha dos possíveis métodos de execução do
projeto. Logo, não existe projeto:
• sem objetivos,
• sem púbico- alvo,
• sem motivos para se concretizar.

3.3. POR QUE fazer está relacionado à justificativa do projeto

POR QUE fazer está relacionado à justificativa. Temos a consciência de


que é muito comum uma certa confusão entre objetivos e justificativa, ou seja,
entre o PARA QUE fazer e o POR QUE fazer.
126
Design e Moda

No caso de objetivo e justificativa, a confusão advém do fato de ambos


serem intercambiáveis em determinado nível, sendo apenas uma questão
de estratégia enquadrar este como objetivo e aquele como justificativa.
(...) Em geral, o objetivo é mais específico do que a justificativa, enquanto
que as melhores justificativas tendem a ser aquelas que representam valo-
res econômicos e sociais (aquelas que representam lucro e economia para
o cliente, ou aplicação e benefício social). (Ibid., p. 51.)

Com a intenção de tornar as explicações acerca das diversas etapas de


desenvolvimento de um projeto em design mais claras e fáceis de serem com-
preendidas, tomemos como exemplo um projeto fictício de uma cadeira. No
Estação de trabalho entanto, nossa cadeira não será uma cadeira qualquer, ou “mais uma cadeira”
− termo utilizado pela
ergonomia que diz res- para um planeta já lotado de cadeiras. Pensemos numa cadeira específica, em
peito ao mobiliário uti- uma estação de trabalho: uma cadeira para manicures.
lizado na função de um
trabalhador. A estação Podemos imaginar que estas profissionais devem sofrer de sérios proble-
de trabalho de uma ma-
mas na coluna e mesmo em outras partes do corpo em função das muitas ho-
nicure é a sua cadeira.
ras que passam em uma posição não muito recomendável e nada confortável.
Além de “imaginar”, fomos conversar com algumas manicures e esta
conversa confirmou nossas suposições.

Foto: Cristina Mendes

Estas são algumas das cadeiras destinadas às manicures disponíveis no mercado. Podemos imaginar o quanto
desconfortáveis são, pois são baixas e deixam as profissionais em uma posição muito desagradável.

Temos, então, uma oportunidade de projeto.


O QUE fazer: uma cadeira para manicures exercerem sua profissão, uma
estação de trabalho pra uma determinada categoria profissional.
Nosso objetivo, ou seja, PARA QUE fazer, será desenvolver uma cadeira/
estação de trabalho:

127
Aula 6

• para as manicures trabalharem com uma postura corporal que não


lhes cause danos à saúde;
• que lhes proporcione melhor satisfação no trabalho;
• onde elas possam armazenar seu material e ter fácil acesso a ele; e
• contribua para uma maior eficiência nas atividades dessas profissionais.
Teremos como justificativa, ou seja, o POR QUE fazer, um excelente mo-
tivo para o desenvolvimento deste projeto:
• a saúde das profissionais; e
• consequentemente, uma maior rentabilidade dos estabelecimentos
em que trabalham manicures.
Não temos como negar que faltas ao trabalho são prejudiciais não só aos
funcionários, mas, principalmente, às empresas. Não é sem motivos que, hoje
em dia, a maioria das empresas conhecedoras das modernas técnicas de admi-
nistração empresarial vem se preocupando com a saúde e a melhor qualidade
de vida de seus funcionários. Logo, o projeto de uma estação de trabalho que
melhore a postura das funcionárias, lhes proporcione bem-estar e diminua as
faltas decorrentes de problemas de saúde causados pela postura errada du-
rante o expediente estará trazendo vantagens econômicas para os donos do
estabelecimento. Estará, também, trazendo vantagens econômicas para as pró-
prias manicures, visto que, normalmente, seus salários são comissionados e,
se não trabalharem, não recebem. Além, é claro, de ser um projeto que busca
uma melhor qualidade de vida para um determinado grupo e por isso também
possui um valor social.
Definidos, então, O QUE fazer, PARA QUE / PARA QUEM fazer e POR QUE
fazer, é chegada a hora de pensarmos em COMO fazer.

3.4. COMO fazer

3.4.1. Levantamento e análise de dados

COMO fazer está diretamente ligado ao processo, ao desenvolvimento. E


como já foi visto anteriormente, “processo sem método são apenas fases pre-
definidas. O método está dentro do processo e compreende a organização na
realização das etapas processuais”. Claro que, para cada projeto, teremos um
processo diferente, as ações, as etapas do processo devem ser pensadas e for-
muladas a partir do objetivo e da justificativa de cada projeto. Por exemplo, um
projeto que tenha como objetivo desenvolver um novo sistema de identidade
visual para uma determinada empresa terá um processo, e consequentemente

128
Design e Moda

métodos utilizados, completamente diferentes do escolhido para o desenvolvi-


Briefing − Palavra ingle- mento de nossa estação de trabalho.
sa que significa “instru-
ções”. Em design, deno- Como poderíamos, então, pensar o COMO fazer do nosso projeto? Deve-
minamos de briefing a mos estabelecer uma série de ações, ações essas necessárias para o desenvol-
lista de metas, caracterís-
ticas, exigências e limites vimento e finalização de nosso produto.
no desenvolvimento de
Em primeiro lugar teremos que elaborar um briefing. Muitas vezes já
um projeto. É uma sín-
tese de vários elemen- recebemos o briefing pronto do cliente, mas, dentro do possível, é bom que
tos básicos, vindos das
mais diversas áreas que
este briefing seja elaborado juntamente com o cliente. Falaremos mais apro-
participam do processo fundadamente sobre esse assunto na próxima aula. Mas neste momento é im-
de desenvolvimento de
produtos e serviços. portante termos em mente que o briefing deve conter “TODAS as informações
relevantes aos interessados no projeto”. (PHILLIPS, 2008, p. 2.)
Em nosso caso, o desenvolvimento de uma estação de trabalho para
manicures requer um levantamento de dados específicos. Uma primeira ação
deverá ser a elaboração de um questionário para as manicures em que tentare-
mos obter um grande número de informações. Precisaremos saber:

• quantas horas, em média, elas ficam sentadas por dia;


• que tipo de desconforto sentem;
• que materiais utilizam na execução de seu trabalho;
• quais são as características desses materiais;
• se existe alguma necessidade especial para o armazenamento dos ma-
teriais em questão;
• se existem itens que devem ficar em locais com maior facilidade de
acesso;
• que ações e movimentos mais executam;
• em que posição os clientes devem ficar, ou seja, tudo que conseguir-
mos extrair do maior número de profissionais possível.

Nesse momento, é também muito importante observar o trabalho delas


e registrar nossas observações através de anotações e imagens.
Depois dos dados levantados, faremos uma análise minuciosa desses
dados com o objetivo de extrairmos as informações mais relevantes e poder-
mos definir que características nossa estação de trabalho terá que possuir para
atender aos objetivos, ou seja, o PARA QUE fazer do projeto.
Neste momento é extremamente importante não “definirmos” formas,
categorias ou coisas do gênero. Nossas mentes devem “imaginar” sem cen-
sura. Devemos, somente, estabelecer as funções de nosso objeto, nada mais.
Paralelamente ao levantamento de dados junto às profissionais da área
e à análise desses dados, deveremos também realizar uma pesquisa ergonômi-
ca, postural. Não podemos esquecer que o design é uma atividade multi/trans/

129
Aula 6

interdisciplinar e que nos permite e incentiva a busca e a troca de conhecimen-


tos com outras áreas do saber.
Uma pesquisa de similares também será importante. O que existe no
mercado em termos de estações de trabalho? Como são as diversas cadeiras de
manicure disponíveis? E outras cadeiras destinadas a outras funções?
Deveremos realizar, também, uma boa análise nos produtos similares
encontrados e verificar que soluções utilizadas atendem aos nossos objetivos
e que características exercem, exatamente, o efeito contrário, ou seja, causam
problemas e dificultam o trabalho do usuário.

3.4.2. Desenvolvimento

De posse, então, do maior número de informações possível, iniciaremos


uma nova etapa, a qual denominaremos desenvolvimento. Aqui nossa cabeça
deve estar o mais livre possível de “soluções” já utilizadas. Devemos ter em
mente exatamente o objetivo do nosso projeto e começar a elaborar possibi-
lidades que busquem atender a estes objetivos, sem, ainda, pensar na confec-
ção ou elaboração do produto. Devemos deixar fluir possibilidades, caminhos
que busquem, única e exclusivamente, atender aos objetivos preestabelecidos.
Então, a partir da geração dessas possibilidades, ou caminhos, como alguns
preferem denominar, faremos uma análise e, levando em consideração os ob-
jetivos do projeto, verificaremos a viabilidade destas possíveis soluções.
É comum, neste momento, a escolha de dois ou três caminhos diferentes
e um maior desenvolvimento deles. Isto faz com que as possibilidades de erro
na escolha do caminho a ser totalmente desenvolvido diminuam muito.
Só depois do caminho determinado é que vamos definir melhor nosso
objeto, aí sim estabelecendo:

• materiais;
• processos de fabricação;
• dimensões e formas;
• desenho técnico; e
• tudo mais que facilite a fabricação de nosso produto.

Elaboraremos modelos, os testaremos, faremos os ajustes necessários


até chegarmos ao produto final.

130
Design e Moda

3.4.3. Finalização

Um protótipo deverá ser confeccionado e tudo deverá ficar registrado o


mais detalhadamente possível. Deverá ser realizado um relatório em que o pro-
cesso de concepção, desenvolvimento e finalização do produto esteja registrado.
É recomendável que este documento vá sendo elaborado durante o processo.
Este registro ajudará a resolver futuros problemas, caso venham a ocorrer
e, principalmente, servirão de instrumento para outros projetos similares. As
conclusões a que chegaremos, as escolhas que faremos, os testes e as explica-
ções para tudo isso podem vir a ser de grande ajuda em outros projetos afins.
Aqui, vimos como poderíamos desenvolver nosso projeto. Identificamos
nossa oportunidade, estabelecemos os objetivos, a justificativa, ou seja, a re-
levância do projeto, pensamos nas etapas a serem cumpridas e como devere-
mos desenvolver e finalizar o produto. Digamos, então, que nosso projeto vai
ser apresentado a uma empresa que muito se interessou pelo tema e pretende
financiá-lo. O diretor desta empresa solicitou-nos um planejamento da execução
do projeto, ou seja, como pretendemos desenvolvê-lo. Precisaríamos elaborar
um documento explicando, exatamente, como pretendemos fazer.

1. Este documento, ou seja, o plano de trabalho, deverá conter os se-


guintes itens:
2. oportunidade/problema – O QUE fazer;
3. objetivos – PARA QUE / PARA QUEM fazer;
4. justificativa – POR QUE fazer;
5. etapas da execução – COMO fazer;
6. cronograma – QUANDO fazer.

Claro que um orçamento também se fará necessário. No entanto, ele de-


verá conter os custos para a concepção, o desenvolvimento e a finalização do
produto; o custo de fabricação do objeto, só após todo o processo percorrido.

3.5. Cronograma

Um cronograma nada mais é do que um planejamento de tempo para


cada etapa necessária do processo. Existem várias formas de se elaborar um
cronograma e, é claro, que o importante é buscar uma maneira que se encaixe
bem nas necessidades do seu plano de trabalho.
Uma boa opção é elaborar uma tabela em que a coluna vertical conte-
nha as etapas a serem cumpridas, ou seja, as ações necessárias ao desenvol-

131
Aula 6

vimento do processo. Na linha horizontal períodos de tempo que podem ser


divididos em semanas ou quinzenas. Não se deve esquecer que muitas tarefas
podem ser realizadas simultaneamente e que este cronograma é um ponto de
partida, um planejamento e pode, muito bem, sofrer algumas alterações ao
longo do processo. Veja a seguir o exemplo de um cronograma:

ATIVIDADE 1º MÊS 2º MÊS 3º MÊS 4º MÊS

Elaboração do briefing X
Levantamento e análise de dados

Pesquisa com usuárias X X

Registro dos dados levantados X X X X

Pesquisa ergonômica e postural X X

Pesquisa de similares X X X

Análise dos dados levantados X X X

Análise dos produtos similares X X

Definição das características necessárias X

Geração de alternativas X X

Confecção de alguns modelos X X


Desenvolvimento

Análise das alternativas geradas X

Escolha de um partido X

Construção de modelos já mais


X X
aperfeiçoados

Teste dos modelos X X

Refinamentos e acertos X X X

Construção do protótipo X

Especificações técnicas X X
Finalização

Elaboração do custo de produção X X

Desenho técnico X

Relatório X X X X X X X X X X X X X X X

Atividade 1 – Objetivos 1, 2 e 3

Chegou a hora de colocar em prática os conceitos apropriados até agora.


Para tal, você deverá elaborar um pré-projeto, ou seja, um planejamento de
como pretende desenvolver o seu projeto. Assim, você precisará:

132
Design e Moda

• identificar uma oportunidade de projeto – O QUE fazer;


• traçar os objetivos – PARA QUE fazer; justificar sua escolha – POR QUE
fazer;
• pensar nas etapas pelas quais deverá passar para atingir os seus ob-
jetivos;
• chegar a uma boa solução para o seu produto – COMO fazer; e, final-
mente
• definir períodos de tempo para as etapas da sua metodologia, ou seja,
elaborar um cronograma – QUANDO fazer.

Para identificar sua oportunidade de projeto, que deverá ser na área de


moda, tenha em mente as quatro etapas no processo de planejamento do pro-
duto que Baxter sugere (2000, p. 124), como foi visto na Aula 5:
1. traçar a estratégia de desenvolvimento do novo produto – que na ver-
dade é uma orientação geral do planejamento e seus objetivos;
2. identificar um estímulo, um elemento norteador, um diferencial que
direcionará o desenvolvimento de um produto específico;
3. realizar pesquisa e análise das oportunidades e restrições do projeto;
4. definir as especificações e as justificativas do produto. Neste item, o
autor ressalta que as questões de projeto devem estar orientadas para
dois níveis de compromisso: o focado nos objetivos comerciais do pro-
duto (oportunidade comercial identificada no mercado); e o focado
nos aspectos técnicos do produto (detalhes que orientarão o trabalho
do designer).

Escolha, então, um segmento inserido na área de moda e identifique


uma oportunidade de projeto, O QUE fazer, e elabore um planejamento para
a execução desse projeto. Você deverá estabelecer os objetivos, a justificativa,
as etapas a serem executadas e um cronograma e enviar seu pré-projeto pela
plataforma para o tutor da disciplina.

Conclusão

Podemos concluir então que, para desenvolvermos um bom produto na


área do design, seja ele de que natureza for – projeto de produto, design grá-
fico, moda ou mídia digital −, precisamos planejar antes de “colocar a mão na
massa”, e a este planejamento damos o nome de pré-projeto.

133
Aula 6

Para uma segunda olhada...

Vimos a importância de termos sempre em mente que design significa


“o processo intencional de pensar, organizar, sistematizar, planejar, experimen-
tar, projetar e desenvolver produtos, a partir de oportunidades identificadas no
mercado”. Logo, para que seja um processo sistematizado, precisamos fazer
uso de uma metodologia, e esta metodologia nós denominamos metodologia
projetual.
Quando elaboramos um planejamento para o desenvolvimento de um
determinado produto, o que podemos denominar como pré-projeto, devemos
descrever O QUE fazer – a oportunidade de projeto; PARA QUE fazer – os ob-
jetivos do projeto; POR QUE fazer – a justificativa para a realização do proje-
to; COMO fazer – as etapas necessárias para o desenvolvimento do projeto; e
QUANDO fazer − o tempo previsto para cada etapa a ser desenvolvida.
Se estruturarmos nosso pensamento a partir destes itens, nossas chan-
ces de chegarmos a um bom produto, que atenda às necessidades de seu usu-
ário, aumentam enormemente. Design é processo e como tal pressupõe um
método.

Referências:

BAXTER, Mike R. Projeto de produto: guia prático para o design de novos produtos. São
Paulo: Blucher, 2000.
COELHO, Luiz Antonio L. (Org.). Conceitos-chave em design. Rio de Janeiro: Ed. Puc-
Rio; Teresópolis: Novas Ideias, 2008.
COELHO, Luiz Antonio L. (org.). Design método. Rio de Janeiro: Ed. PUC-Rio; Teresópo-
lis: Novas Ideias, 2006.
PHILLIPS, Peter L. Briefing: a gestão do projeto de design. São Paulo: Edgar Blucher,
2008.

134
Aula

Briefing – orientando o desenvolvimento do projeto


7
Seus Objetivos:
Ao final desta aula, esperamos que você seja capaz de:
1. Reconhecer a importância do briefing de design;
2. Identificar os elementos de um briefing de design a partir da
observação das etapas do desenvolvimento de um projeto;
3. Elaborar um briefing de design.

2 horas de aula
Design e Moda

1. Briefing: o que é isso?

Agora que já vimos como elaborar o planejamento de um projeto, ou


seja, o que podemos nomear de pré-projeto, e nos apropriamos da importân-
cia da metodologia projetual para chegarmos a um bom desenvolvimento e
finalização de um produto, seja ele bi ou tridimensional, vamos falar da im-
portância do briefing de design. Vamos utilizar os conceitos apresentados por
Peter L. Philips em Briefing: a gestão do projeto de design, livro lançado em
2008. Este livro é uma excelente leitura, por isso fica aqui a sugestão.

2. Conhecendo o briefing

No capítulo 1, Philips traz conceitos bastante importantes. Começa des-


crevendo o que é briefing de design. Segundo ele, durante os seminários que
vem apresentando sobre a elaboração dos briefings de design, verificou que
as pessoas utilizam diversas denominações equivalentes: “briefing criativo”,
“briefing da inovação”, “briefing de marketing”, “briefing de projeto”, “especi-
ficação do projeto”, “descrição da tarefa”, entre outras. No entanto, Philips diz
que “todas elas referem-se a uma descrição de um projeto envolvendo aplica-
ção do design” (PHILIPS, 2008, p. 1).
A seguir, vamos ver os conceitos mais significativos, sob nosso ponto de
vista, acerca do briefing de design apresentados por Philips em seu livro. De-
mos um maior destaque às palavras que consideramos fundamentais.

A. Formato do briefing

O briefing deve conter TODAS as informações relevantes aos interessados


no projeto. Além disso, deve ser disponível em papel e em meio eletrônico.
(PHILIPS, 2008, p. 2.)

Todas as informações e meios em que essas informações possam estar


contidas devem ser levados em consideração. Textos explicativos, imagens, es-
quetes, diagramas, vídeos, entrevistas gravadas, transcritas, recortes de jornais
e revistas. Qualquer informação relativa ao assunto deve ser guardada. Reco-
menda-se guardá-las em uma caixa ou um arquivo, assim como a digitalização
das diversas mídias. Quanto mais fácil for o acesso a essas informações por
todos envolvidos no projeto, melhor.

137
Aula 7

B. Tamanho do briefing

De acordo com Philips (2008, p. 2-3):

Pergunta: Que tamanho deve ter o briefing?


Resposta: O tamanho necessário.
A forma correta é preparar o briefing da maneira mais COMPLETA
e ÚTIL possível.

Aqui, nos parece bastante claro: cada caso é um caso; o importante é


que o conteúdo do briefing seja mais que suficiente para o bom desenvolvi-
mento do projeto.

C. Ingredientes de um conceito criativo

O briefing é o ponto de partida para descoberta de conceitos criativos.


A elaboração de um briefing deve ser considerada como uma ativida-
de prévia ao projeto.
O tempo gasto na elaboração de um bom briefing é altamente
compensador.
A melhor forma para se alcançar todos os objetivos é partir de um
conceito central que sirva de guia para direcionar a criação.

Os ingredientes
Para preparar um prato especial, você deve encontrar a receita cer-
ta que liste todos os ingredientes, contenha as instruções de preparo e
as demais informações necessárias. Isso vale também para organizar as
especificações de um projeto.

Os parâmetros do projeto
Para se construir um conceito criativo é necessário revisar os parâme-
tros do projeto, representados pelas restrições que condicionam o trabalho.
O primeiro deles é o PRAZO final ou tempo disponível para se apresentar a
solução. Isso determinará a “margem de manobra” para a busca de soluções.
Outro parâmetro é constituído pelos REQUISITOS TÉCNICOS de
produção e distribuição. Aqui podem surgir vários conflitos entre projeto
de design e a produção industrial.
Após determinar o prazo e as restrições técnicas, chega a hora de
verificar o orçamento disponível para o projeto. É necessário conhecer o
ORÇAMENTO disponível, antes de começar o projeto.
Todo e qualquer projeto tem suas limitações e é exatamente na
hora da elaboração do briefing que tais limitações, como: prazo, orça-
mento, requisitos técnicos etc., devem ser apresentadas à equipe respon-
sável por seu desenvolvimento e apropriadas por ela. As limitações são
fatores que impedem logo de início, ou não, certas possibilidades de solu-
ção para o problema/oportunidade de design em questão.

138
Design e Moda

Revisão das oportunidades


POR QUE se desenvolve o projeto?
QUAIS os resultados que se pretende alcançar?
O conceito criativo a ser desenvolvido deve refletir esses dois
objetivos.
Você deve ter também um conhecimento muito bom sobre o pú-
blico-alvo do produto.
Cada classe de consumidores valoriza um determinado conjunto de
características. Isso quer dizer que eles têm necessidades e desejos próprios.

Análise dos concorrentes


Antes de começar a projetar, é aconselhável analisar os produtos
concorrentes, para obter respostas a questões como:
Quais são as oportunidades para se projetar um produto mais
competitivo?
O que está funcionando bem?
O que não funciona?
Que mensagens se pretende passar?
Que mensagens devem ser evitadas?
Como o produto será percebido?
Qual é a “tonalidade” que se quer dar ao produto?
O principal objetivo é produzir algo diferente aos olhos do consu-
midor. (PHILIPS, 2008, p. 3-8.)

Uma análise minuciosa do que existe no mercado, ou seja, da concorrên-


cia, é extremamente útil e pode ajudar imensamente no desenvolvimento de
soluções inovadoras. Comparar produtos concorrentes, identificando em que
eles poderiam ser melhores, que lacunas existem e como podem ser preenchi-
das, tornando, assim, o produto mais atraente aos olhos do consumidor, é uma
ação muito recomendada.

D – Quando é necessário o briefing?

O briefing é útil em quase todos os projetos de design.


O briefing deve ser ESCRITO, não oral.
O briefing contribui para abreviar o tempo para se concluir o projeto.
Faz parte das atribuições do designer ter ideias e convencer as
pessoas. E, sobretudo, mostrar as vantagens do design para os demais
dirigentes da empresa. Antes de pensar em criar briefings perfeitos, preci-
samos aprender a falar sobre aspectos estratégicos do design, desfazendo
conceitos errôneos como o de serviços decorativos.
Se não me engano, foi o grande designer Paul Rand que disse:
“design é uma disciplina que soluciona problemas”. Se definirmos design
dessa forma, o ponto de partida para qualquer trabalho de design deveria
ser justamente o perfeito conhecimento do PROBLEMA a ser solucionado.
(PHILIPS, 2008, p. 9-10.)

139
Aula 7

Devemos ter sempre em mente que a função do design é solucionar pro-


blemas, logo precisamos estar aptos para identificar e conhecer profundamen-
te o problema. Só a partir deste conhecimento seremos capazes de encontrar
soluções inovadoras.

E – Designers não são decoradores

Nossa pesquisa de mercado descobriu que muitos jovens norte-


americanos de vinte e trinta anos estão tomando chá. Isso acontece princi-
palmente nos campus universitários. A mudança de hábito dessas pessoas,
substituindo o café pelo chá, representa uma oportunidade para a nossa em-
presa lançar uma chaleira especialmente desenhada para esse público-alvo.
Decidiu-se que essa chaleira deverá ter características atraentes
aos jovens. Deverá ter aparência masculina. Para diferenciar-se de outras
chaleiras, as formas arredondadas serão substituídas por linhas angulo-
sas. O acabamento deverá ter aparência metálica, lembrando aço inox ou
cromado. A alça deve permitir uso confortável por uma mão masculina. O
bico também deve ter uma aparência tipicamente masculina.
As especificações apresentadas para o projeto de design dizem
exatamente O QUE se deseja, mas não explicam POR QUE certas caracte-
rísticas são desejadas. Quem redigiu esse briefing certamente considera
os designers como pessoas que simplesmente executam os desenhos de
acordo com as especificações do marketing. (PHILIPS, 2008, p. 11.)

Neste exemplo, fica claro que o departamento que elaborou o briefing


não conhece qual é a verdadeira função do design, ou seja, não tem consciên-
cia que o design busca soluções inovadoras para problemas identificados. Exis-
te um problema/oportunidade: jovens americanos do sexo masculino estão
trocando o café pelo chá. Assim, existe a oportunidade de se lançar no merca-
do uma chaleira para este público. As características da chaleira não deveriam
ser descritas. Conceituar o que são formas representativas da masculinidade e
como o público em questão irá se identificar com essas formas, e mesmo qual
seria o material mais adequado etc. são funções do design.

F – Briefing é diferente de proposta de projeto

Um briefing de design de boa qualidade deve conter informações mais


ESPECÍFICAS e ESTRATÉGICAS. Além disso, o mesmo deve ser preparado
de forma colaborativa entre o solicitante e o grupo de projeto, após diver-
sos entendimentos sobre a natureza desse projeto, forma de executá-lo,
prazos e recursos disponíveis. (PHILIPS, 2008, p. 13.)

O briefing deve ser desenvolvido após a proposta de projeto ter sido


aprovada. Uma proposta de projeto apresentada pressupõe um planejamento
140
Design e Moda

de desenvolvimento de um determinado produto e o orçamento para o de-


senvolvimento deste produto. Então, só após a aprovação da proposta e do
orçamento, é que se dá início ao desenvolvimento do projeto. Aí sim a primeira
etapa deste desenvolvimento deve ser, exatamente, a elaboração do briefing.

G – Diversos usos do briefing

O briefing tem diversos usos. Serve como acordo ou contrato formal


entre as partes envolvidas no projeto. Serve também como roteiro a ser se-
guido durante o desenvolvimento do projeto, definindo as várias etapas
intermediárias desse projeto. Assim, serve para elaborar um CRONOGRA-
MA, estabelecendo os prazos para cada uma dessas etapas. Os briefings de
design devem incluir também informações sobre a estratégia da empresa
e estratégia do design. De fato, é útil considerar o briefing de design como
parte do planejamento estratégico da empresa. (PHILIPS, 2008, p. 14.)

H – Responsabilidades pela elaboração do briefing

A elaboração do briefing de design exige a definição prévia do


tema a ser desenvolvido e a identificação do grupo que fará o projeto.
Antes disso, é necessário definir o “dono” do projeto. Quem pagará as
despesas? Quem tomará as principais decisões? De quem será o mérito,
se o projeto for bem-sucedido? Se falhar, de quem será o ônus?
Um projeto de design deve ter CO-RESPONSABILIDADES.
Os dois lados envolvidos, demandantes e projetistas, não devem
comportar-se apenas como compradores e fornecedores de serviços, mas
como parceiros de um empreendimento com responsabilidades compar-
tilhadas. Se ocorrer desvios, ambos os lados devem sentar-se à mesa para
verificar as suas causas e propor soluções, em vez de ficarem se acusando
entre si. (PHILIPS, 2008, p. 17.)

I – Início do processo

O mais importante é que o OBJETIVO do projeto seja claramente


entendido por todos. As questões mais importantes são:
Quais são os objetivos básicos do projeto?
Por que esse projeto tornou-se necessário? Por que agora?
Que resultados mercadológicos são esperados?
Quem assume a responsabilidade pelo projeto?

Quais são os objetivos básicos do projeto


Qual é o PRINCIPAL objetivo desse projeto? Por que as pessoas
sentiram, de repente, a necessidade desse projeto?
Considerando que o design se propõe a solucionar problemas, pre-
ciso saber exatamente quais são esses problemas.
As perguntas devem ser feitas naturalmente, sem constrangimentos
e sem confidencialidades durante o processo de elaboração do briefing.

141
Aula 7

Por que esse projeto tornou-se necessário? Por que agora?


Essas questões podem parecer simples e desnecessárias, mas não
podem ser omitidas, porque servem para determinar o prazo do projeto. O
prazo é importante, porque vai influir nos RECURSOS que preciso para execu-
tar o projeto. Além do mais, pode influir também no aspecto metodológico.

Que resultados mercadológicos são esperados?


Como o projeto vai contribuir para alongar a vida do produto?
Como se pode aumentar a participação no mercado?
Como se pode ser mais competitivo?
Certamente o design pode dar uma boa contribuição para alavan-
car os negócios de uma empresa, mas dentro de certos limites. É impor-
tante que esses limites sejam estabelecidos de forma bem realista.
O importante sempre é ter em mente: QUAL É EXATAMENTE O
PROBLEMA QUE SE QUER RESOLVER?

Quem assume as responsabilidades pelo projeto?


Os advogados são um bom suporte. Eles tratam de assuntos, como
direitos autorais, propriedade industrial, marcas, patentes, licenciamen-
tos e outros. Eles podem ajudar a responder perguntas como:
Você vai usar imagens? Neste caso tem direito a elas? Vai terceirizar
a produção? Tem contrato pra isso? Há restrições legais ao uso do produto?
Outras pessoas que podem opinar representam as funções de ven-
das, produção, compras, distribuição, assistência técnica e outras.

Design é apenas uma parte do sucesso


Como posso projetar material de apoio às vendas sem ter conver-
sado com os vendedores da minha empresa?
Se eu desejar que o design seja considerado como assunto estraté-
gico dentro da empresa, preciso atuar estrategicamente, em coordenação
com outras funções da organização. (PHILIPS, 2008, p. 20-24.)

Aqui fica claro que, quanto maior for o envolvimento dos diversos depar-
tamentos da empresa na elaboração do briefing, mais completo e útil ele será.

J – Elementos essenciais do briefing

É importante repetir: não há uma fórmula única, padronizada,


para o briefing. O formato de cada briefing vai depender de muitos fato-
res, como a natureza do projeto (embalagem, gráfico, produto, web e ou-
tras). Algumas empresas preferem briefing descritivos. Outras preferem
aqueles itemizados. Muitas incluem ilustrações, como fotos, gráficos e
diagramas. Contudo, todos eles devem conter determinados conteúdos,
não importando a forma como são apresentados.

Os tópicos básicos são:

• natureza do projeto e contexto;

142
Design e Moda

• análise setorial;
• público-alvo;
• portfólio da empresa;
• objetivos do negócio e estratégia de design;
• objetivo, prazo e orçamento do projeto;
• informações de pesquisa; e
• apêndice. (PHILIPS, 2008, p. 27-28.)

Principais conteúdos dos tópicos básicos do briefing de design

Tópicos básicos Conteúdos

Sumário executivo, incluindo:


• justificativas
Natureza do projeto e contexto • objetivo do projeto
• resultados desejáveis
• responsabilidade pelo projeto

• lista de produtos
• concorrentes
• preços e promoções
Análise setorial
• marca
• estudo das tendências
• estratégia da empresa

• Características do público-alvo: sexo, faixa etária, escolaridade,


Público-alvo nível de renda, ocupação, hobbies
• Diferenças: regionais, culturais, hábitos de consumo

• marca
Portfólio da empresa • imagem corporativa
• segmento do mercado
• principais resultados visados pelo projeto, descrito na linguagem
Objetivos do negócio e estratégias de
de negócios
design
• atividade de design, correspondentes aos resultados visados

Descrição das diversas fases do projeto, especificando:


• tempo previsto
Objetivo, prazo e orçamento do projeto • orçamento
• recursos humanos necessários
• responsabilidade por aprovação

Aprovação do projeto:
• preparação dos materiais de apresentação
• responsáveis pelas aprovações
Aprovação, implementação e avaliação Implementação:
• providências necessárias
Avaliação:
• critérios para medir o sucesso do projeto

• tendências do negócio
Informações de pesquisas • avanços tecnológicos
• lançamentos de novos produtos

Materiais suplementares:
Apêndice • catálogo de produtos, fotos, mostruários, artigos de jornais,
artigos científicos, manuais, legislações

Retirado de: Philips (2008, p. 29).

143
Aula 7

Análise setorial

Qual é o setor em que atua a empresa McDonald’s? Muita gente vai


dizer fast-food. Certo, McDonald’s serve fast-foods e pode-se argumentar que
esse é o principal negócio da empresa. Contudo, a empresa argumenta que
atua principalmente no setor de ENTRETENIMENTO. McDonald’s deve gran-
de parte do seu sucesso por ser um lugar agradável para as famílias. Ela tem
parques de diversão, pequenos brinquedos, jogos, Ronald McDonald fazendo
brincadeiras, tudo isso com o slogan “Você merece um descanso hoje!”. O
CONCEITO está baseado na diversão das crianças – bem, além disso, você pode
tomar um lanche. Enquanto os concorrentes focalizavam a atuação da comida.
Agora suponha que você tenha sido convidado para realizar um projeto
de design para a McDonald’s no início da vida da empresa. Você teria
pensado no entretenimento como principal negócio da empresa?
Passaria pela sua cabeça incluir elementos que a assemelhassem com um
parque de diversões? Se você a tivesse pensado apenas como uma vende-
dora de hambúrgueres, seu CONCEITO de design teria sido muito limita-
do. (PHILIPS, 2008, p. 32-33.)

Acreditamos que Philips foi extremamente feliz ao citar este exemplo,


pois ele é bastante ilustrativo. Demonstra como uma pequena mudança no
CONCEITO pode tornar a proposta extremamente inovadora. Tenha sempre
isto em mente; pense, antes de conceituar o produto que você pretende desen-
volver, o que MAIS ele pode oferecer.

Atividade 1 – Objetivos 1, 2 e 3

As informações a seguir foram retiradas de um livro e tratam de um es-


tudo de caso do desenvolvimento de um produto: um descascador de batatas.
A partir destas informações, você deve elaborar o briefing do produto abai-
xo descrito. Tente identificar as informações a que os designers responsáveis
pelo projeto tiveram acesso. Considerando que o briefing deve conter “todas
as informações relevantes aos interessados no projeto”, como já foi citado
anteriormente, identifique as informações relevantes a que os interessados
neste projeto tiveram acesso para que pudessem chegar ao resultado alcan-
çado. Procure se guiar pela tabela apresentada anteriormente que fala dos
tópicos básicos de um briefing de design e seus respectivos conteúdos. Não
se esqueça de que um bom briefing de design deve ser o mais completo e útil
possível e que o tamanho deve ser o necessário. O seu briefing de design deve
ser enviado ao tutor para ser avaliado.

144
Design e Moda

Plasteck Ltda.: É uma Plásticos Plasteck Ltda.


empresa fictícia, mas
os produtos, mercado e A Plasteck é uma empresa de plásticos com 170 empregados, que fabri-
objetivos do desenvol-
vimento de produtos ca peças injetadas em plástico para uso doméstico, principalmente pequenos
foram baseados num objetos para uso em cozinha. Ela tem uma rede de distribuição própria para
caso real, em que o De-
sign Research Centre da pequenas lojas, supermercados e lojas de departamentos. O faturamento do
Universidade de Brunel último ano foi de $ 13,6 milhões, gerando um lucro de $ 1,5 milhões.
trabalhou durante 4
anos. Os nomes foram
trocados para se manter
o sigilo comercial.

Estratégia da Plasteck:

Missão da Plasteck
Atingir a liderança na fabricação de pequenos objetos domésticos de plástico, baseados em excelente design,
excelente qualidade e excelente valor em relação ao preço cobrado.

Objetivos da empresa
Desenvolver produtos que sejam apreciados pelos consumidores, devido ao design inovador e alto valor pelo
preço. Criar uma identidade, uniformizando a linha de produtos em 2 anos. Aumentar o faturamento em 60%
em 2 anos e aumentar os lucros em 70% em 2 anos.

Estratégia da empresa
Aumentar o investimento no desenvolvimento de novos produtos, em 75%, em 1 ano.
Melhor o projeto de embalagens, em 1 ano. Conquistar novos mercados, mais apropriados para os novos pro-
dutos, com aumento de 15% em 2 anos.

Objetivos do desenvollvimento de produtos


• Criar uma imagem corporativa associada com inovação e alto valor.
• Melhorar os procedimentos do desenvolvimento de produtos (mais inovador e mas sistematico, com confia-
bilidade nos prazos e custos).
• Introduzir pelo menos 5 produtos novos por ano.
• Reduzir a taxa de falha a indices menores que 20% dos produtos lançados (considerando-se falha a venda inferior
ao projetado no primeiro ano).
• Reduzir os casos de atrasos ou custos maiores que os previstos, para nivel zero.

Estratégia do desenvolvimento de produtos


Recrutar dois designer para melhorar o desenvolvimento de novos produtos.
Começar um planejamento pró-ativo de planejamento do produto, capaz de gerar mais propostas de novos
produtos.
Criar um grupo de gerenciamento do produto, composto do diretor de marketing, diretor de desenvolvimento,
diretor de produção e diretor financeiro.
Realizar avaliações semestrais de todas as atividades de desenvolvimento de produtos.

Adaptado de: Baxter (2000).

145
Aula 7

Especificação da oportunidade do descascador de batata

1. Necessidades do consumidor
Os consumidor demonstram forte fidelidade tanto ao tipo de lâmina fixa como ao de lâmina móvel
Os consumidores estão consientes dos problemas que ocorrem nos dois tipos

2. Proposição do beneficio básico


Desenvolver um novo descascador de batatas, reunindo as vantagens da lâmina fixa e da lâmina móvel, elimi-
nando-se as desvantagens de ambos, com um projeto consolidado

3. Oportunidade de marketing
É possivel abranger os dois mercados hoje segmentados (lâmina fixa e lâmina móvel)
Os descascadores estão presentes em todos os lares (isso foi confirmado por 40 pessoas pesquisadas na pró-
pria empresa)

4. Oportunidade de vendas
Os descascadores de batata são vendidos em 95% dos pontos de venda de produtos da Plasteck (estimativa do
diretor comercial)

5. Oportunidade de fabricação
O molde para injeção do cabo pode ser fabricado na própria empresa. As lâminas podem ser fornecidas por
um fabricante externo, já existente.

6. Principal risco comercial


O novo descascador pode não satisfazer os dois grupos de consumidores (lâmina fixa e lâmina móvel)

7. Pesquisa de mercado
Realizou-se uma pesquisa de mercado interna (na própria empresa) baseada em um desenho de apresentação
do novo produto, que foi confirmada com uma pesquisa dos consumidares, baseada em um protótipo do novo
produto.

Adaptado de: Baxter (2000).

Configuração e projeto detalhado

A configuração do projeto começa com o conceito escolhido e termina


com o protótipo completamente desenvolvido e testado. Ela compreende qua-
tro fases:
• Geração de ideias, explorando-se todas as formas possíveis de fabri-
car o produto.
• Seleção das ideias, escolhendo-se a melhor ideia, em comparação
com as especificações de projeto.
• Análise das possibilidades de falha e seus efeitos, para levantar os
possíveis pontos de falha do produto.
• Construção e teste do protótipo, para aprovar ou rejeitar o projeto.

146
Design e Moda

Veja, a seguir, dois quadros. O primeiro representa as entradas e princi-


pais resultados da fase de configuração do projeto e o segundo representa as
entradas e resultados do projeto detalhado.

Adaptado de: Baxter (2000).

147
Aula 7

Características funcionais

Processo de configuração do projeto:

Princípios funcionais Princípios do estilo

Característicass funcionais Características do estilo

Permutação das características do produto

Formas alternativas da função Formas alternativas do estilo

Integração entre formas da função e do estilo

Seleção da configuração

Adaptado de: Baxter (2000).

Características funcionais do descascador de batatas:

Mecanismo giratório Lâmina Goiva

Cabo

Limitador de
profundidade

Adaptado de: Baxter (2000).

148
Design e Moda

Permutações possíveis entre as três características funcionais do descas-


cador de batatas:
H = cabo B = lâmina G = goiva

Linear Perpendicular

G B B H G B G G B
B G H B H H Configuração
do descascador
H H G
Viável
Não viável
Parcialmente embutido
B H G H B G
H B H G G B

G G B B H H
Completamente embutido
G G H H B B
H B G B H G
B H B G G H

Adaptado de: Baxter (2000).

Diferentes permutações entre os componentes do descascador de


batatas. Os asteriscos indicam conceitos mais viáveis.

Adaptado de: Baxter (2000).

149
Aula 7

Integração do projeto – O uso da lista MESCRAI (modificar, eliminar,


substituir, combinar, rearranjar, adaptar e inverter) para desenvolver ideias
de novas configurações do produto.

B H B G * B G
*
G
H
H

B G B G
H
H

H
B *
G

H
G

Adaptado de: Baxter (2000).

Conclusão

O briefing de design é uma ferramenta imprescindível para o bom de-


senvolvimento de um produto, seja ele de que natureza for. O briefing de
design deve ser completo e útil e conter o maior número de informações
possíveis com o objetivo de fornecer os dados necessários para o desenvol-
vimento de soluções inovadoras. Deve, também, envolver pessoas dos mais
diferentes departamentos com o objetivo de abranger as várias faces do pro-
blema/oportunidade.

150
Design e Moda

Para uma segunda olhada...

• O briefing de design é uma ferramenta bastante útil e recomendável


para o bom desenvolvimento de projetos de design, sejam eles da na-
tureza que forem: produto, gráfico, mídia digital ou moda.
• O briefing de design deve ser COMPLETO e ÚTIL, contendo o maior
número de informações possíveis.
• O briefing de design deve ser elaborado conjuntamente, ou seja, com
todas as pessoas envolvidas no projeto, com quem solicitou o projeto
e com quem irá desenvolvê-lo.
• O briefing de design deve conter claramente os objetivos do projeto,
assim como a quem se destina – público-alvo, quem são os concorren-
tes e as limitações do projeto – prazos, orçamento, requisitos técnicos
etc.

Referências

BAXTER, Mike R. Projeto de produto: guia prático para o design de novos produtos. São
Paulo: Blücher, 2000.
PHILIPS, Peter L. Briefing: a gestão do projeto de design. São Paulo: Edgar Blücher, 2008.

151
Design e Moda

Glossário:

Belle Époque: período de riqueza e prosperidade, mas marcado pelo antago-


nismo de classes, dos movimentos socialistas, comunistas e anarquistas. Acir-
rada política internacional e competição entre as nações no mercado interna-
cional; o nacionalismo político – expresso no patriotismo e orgulho nacional
− norteia os discursos. Auge do luxo entre a burguesia; cultura de elite, que
valorizava as boas maneiras.

Briefing: palavra inglesa que significa “instruções”. Em design, denominamos


de briefing a lista de metas, características, exigências e limites no desenvol-
vimento de um projeto. É uma síntese de vários elementos básicos, vindos
das mais diversas áreas que participam do processo de desenvolvimento de
produtos e serviços.

Escola dos Annales: O movimento historiográfico Escola dos Annales rece-


beu essa designação por ter surgido em torno do periódico acadêmico francês
Revue des Annales, fundado em 1929, por Marc Bloch e Lucien Febvre, então
professores da Universidade de Estrasburgo / Alsácia / França. Destacou-se por
incorporar métodos das Ciências Sociais à História.

Estação de trabalho: termo utilizado pela ergonomia e diz respeito ao mo-


biliário utilizado na função de um trabalhador. A estação de trabalho de uma
manicure, por exemplo, é a sua cadeira.

Historicismo: Estilos historicistas vitorianos estão vinculados aos estilos do


passado, que, muitas vezes, usam referências das culturas greco-romanas
como elementos estéticos e formais, tais como o Neoclassismo, Renascimento,
Barroco e Rococó.

ICSID: International Council of Societies of Industrial Design (Conselho Interna-


cional das Sociedades de Design Industrial), sediado em Montreal, no Canadá,
desde 2005.

Necessidades subjetivas e objetivas: As subjetivas são as necessidades liga-


das ao desejo, individuais, passíveis de mudanças, do gosto etc. Já as objetivas
são as de ordem prática, solução para uma melhor forma de sentar, por exem-
plo. As necessidades subjetivas e objetivas são termos que se complementam
e se confundem.

Produção mista: Produção que faz uso de processos industriais e artesanais de


produção.

Tempo social: É o tempo em que a sociedade sente as mudanças que vivencia.

Vernacular: referente à cultura, tradição e expressão popular, do povo, de massa.

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