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Caderno de Recursos

em Educação Ambiental
Resíduos Sólidos e Animais em Meio Urbano

I - AMBIENTE E RESÍDUOS SÓLIDOS


II - ANIMAIS EM MEIO URBANO
III - DA CIDADANIA À EDUCAÇÃO AMBIENTAL
IV - A HISTÓRIA DA HIGIENE E LIMPEZA URBANA EM LISBOA

Financiamento: 1
Fundo Social Europeu /Estado Português/POEFDS
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

2
Prefácio

O Caderno de Recursos em Educação Ambiental, na área


dos resíduos sólidos e animais em meio urbano, destina-se
aos profissionais que têm como missão e objectivo desenvol-
ver projectos de intervenção, nesta área, junto da comunidade
escolar, local ou de públicos profissionais.
Esta publicação enquadra-se nos propósitos da Direcção
Municipal de Ambiente Urbano, de que sou responsável, em
transmitir competências, experiências e saberes, acumulados
ao longo dos anos pelos seus técnicos, a novos agentes
da formação de comportamentos favoráveis ao ambiente,
em particular naquilo que nos está mais próximo e onde,
no dia-a-dia, a nossa acção pode fazer a diferença.
Porque a Educação Ambiental também se faz pela partilha
e pelo estabelecimento de parcerias activas o Caderno
do Formador estará disponível, com actualização periódica,
no site da Câmara Municipal de Lisboa.
Faço votos para que a sua consulta seja profícua em prol
da construção de um ambiente de qualidade para as gera-
ções vindouras.
Lisboa, Abril de 2008
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

O Director Municipal,

Ângelo Mesquita

3
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

4
Sumário

INTRODUÇÃO 13
I AMBIENTE E RESÍDUOS SÓLIDOS
P
15
1. Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica 17
1.1. Os Recursos Naturais 18
1.2. A Atmosfera 20
1.2.1. Camada do Ozono 20
1.2.2. Efeito de Estufa e Alterações Climáticas 22
1.2.3. Chuvas Ácidas 24
1.3. O Solo 25
1.3.1. Poluição por Resíduos 25
1.3.2. Desflorestação/Desertificação 27
1.4. A Água 28
1.4.1. Poluição das Águas 28
1.5. A Consciência Ecológica 31
1.5.1. No Mundo 31
1.5.2. A Política do Ambiente na Europa 40
1.6. Linhas Orientadoras da União Europeia face aos Resíduos 42
1.7. A Política dos três R's 46
1.7.1. Reduzir 47
1.7.2. Reutilizar 50
1.7.3. Reciclar 52
1.8. A prevenção na produção de RSU`S 55
1.8.1. Aspectos gerais 55
1.8.2. Estratégias para a prevenção 56
1.8.2.1. Estratégias Nacionais e Regionais/Locais 56
1.8.2.2. A prevenção na produção dos Resíduos
no Sector Industrial 59
1.8.2.3. As embalagens 59
2. Resíduos Sólidos: Tipos, Composição e Propriedades 67
2.1 Classificação por Tipos 67
Sumário

2.2 Dados Evolutivos: Quantitativos e Características 70


5
3. Sistema de Recolha e Transporte dos RSU 72
3.1. Sistemas gerais 72
3.2. O Caso de Lisboa 73
3.2.1. Recolha Indiferenciada 74
3.2.2. Recolha Selectiva 75
3.2.3. Condicionantes da Actividade Municipal 79
3.2.4. Recolha de Informação 80
3.3. Novas Linhas de Orientação 80
4. Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem,
Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário 81
4.1. Tratamento de Resíduos 83
4.1.1. Reciclagem 85
4.1.1.1. Estações de Triagem 86
4.1.2. Reciclagem Material 87
4.1.2.1. Vidro 88
4.1.2.2. Papel/cartão 88
4.1.2.3. Plástico 92
4.1.2.4. Metal 95
4.1.2.5. Tetra brik 96
4.1.2.6. Pilhas 97
4.1.3. Reciclagem Orgânica 98
4.1.3.1. Compostagem 98
4.1.3.2. Biometanização 102
4.2. Incineração e Valorização Energética 104
4.3. Aterro Sanitário 108
5. Instrumentos Económicos na Gestão dos Resíduos
Sólidos Urbanos 115
5.1. Taxas por Serviços Prestados 118
5.2. Taxas sobre Produtos 121
5.3. Sistemas de consignação 122
5.4. Créditos à Reciclagem 124
Sumário

5.4. Taxas sobre Deposição em Aterro 124


6
6. Avaliação de Impacte Ambiental 125
6.1. Ambiente e Avaliação de Impacte Ambiental 125
6.2. Metodologia 127
6.3. Elementos de evolução 130

II ANIMAIS EM MEIO URBANO


P 135
1. Do Homem. Dos Direitos do Animal e dos Animais
na Cidade 137
2. Animais de Companhia 140
2.1. Conceitos gerais 141
2.2. Obrigação dos Detentores 142
2.3. Captura de Animais e Controle da Reprodução 146
2.3.1. Captura de Animais 146
2.3.2. Controle da Reprodução 148
2.4. Identificação Animal 150
2.5. Profilaxia da Raiva 152
2.5.1. Sintomas 153
2.5.2. Tratamento 155
2.5.2.1. Profilaxia Médica [vacinação anti-rábica] 156
2.5.2.2. Profilaxia Sanitária [quarentenas] 157
2.5.2.2.1. Animais agressores 157
2.5.2.2.2. Pessoas agredidas 158
2.5.2.2.3. Animais agredidos 158
2.6. Controlo de outras Zoonoses 159
2.6.1. Leishmaniose 159
2.6.2. Leptospirose 163
2.6.3. Toxoplasmose 165
2.6.4. Equinococose 168
2.6.5. Sarna Sarcóptica 169
2.6.6. Dermatomicoses 171
2.7. Registo e Licenciamento 171
Sumário

2.8. Animais Perigosos e potencialmente Perigosos 174


7
2.9. Actividades desenvolvidas pelo Canil/Gatil Municipal 177
2.10. Abandono versus Adopção de Animais 179
3. Pragas Urbanas 182
3.1. Conceitos gerais 182
3.2. Metodologia de Controlo de Pragas 183
3.3. Principais Pragas 187
3.3.1. Aspectos gerais 187
3.3.2. As Pragas de Roedores 189
3.3.2.1. Informação geral 189
3.3.2.2. Controlo de Pragas de Roedores 192
3.3.3. Pragas de Artrópodes e seu Controlo 196
3.3.3.1. Informação geral 196
3.3.3.2. Controlo de Pragas de Insectos 199
3.3.3.2.1. Formigas 199
3.3.3.2.2. Insectos alados 200
3.4. Pombos 203
3.4.1. Contexto da Problemática 203
3.4.2. Prevenção e Controlo 205
3.4.3. Risco para a Saúde 206
3.4.4. Transmissão de Doenças 207
3.4.4.1. Salmonelose 208
3.4.4.2. Histoplasmose 209
3.4.4.3. Criptococose 210
3.4.4.4. Ornitose [psitacose ou clamidiose aviária] 210
3.4.4.5. Alergias 211
3.5. Controlo da População de Pombos na Cidade de Lisboa 212

III DA CIDADANIA À EDUCAÇÃO AMBIENTAL


P 215
1. Da Cidadania 217
1.1. A Concepção Grega 217
Sumário

1.2. A Concepção Romana 220


8
1.3. Cidadania na Idade Média 222
1.4. A Concepção Moderna de Cidadania 223
2. Do Desenvolvimento 232
2.1. A Relação Homem-Natureza 232
2.2. A Globalização 233
2.3. Desenvolvimento Sustentável versus Desenvolvimento Humano 238
3. Da Educação Ambiental 245
3.1. A Emergência de uma Perspectiva Educativa 245
3.2. Educação Ambiental em Portugal 252
3.2.1. Um pouco de História 252
3.2.2. O Papel das Autarquias 258
3.3. Educação Ambiental e Participação 261
3.3.1. Educação Ambiental: O que é? 261
3.3.2 Participação para Todos e de Toda a Gente 270
3.3.3 Informação e Sensibilização 276
3.3.4 Transferência de Competências 277
3.3.5 Motivação 278
3.3.6 Crianças e Jovens - Agentes de Mudança 279
3.4. O Papel das Entidades Educativas 280
3.4.1 A Escola 280
3.4.1.1. Enquadramento 280
3.4.1.2. Os Currículos Escolares - O caso Português 283
3.4.1.3. Escolas Técnicas, Profissionais e Universidades 285
3.4.1.4. A Educação Ambiental e o Mundo do Trabalho 286
3.4.1.5. A Família 287
3.5. Olhando para a Floresta 288

IV A HISTÓRIA DA HIGIENE E LIMPEZA URBANA


P

EM LISBOA 291
Sumário

1. Até ao Terramoto de 1755 293


9
2. De 1755 ao final do Século XIX 300
3. As Fases de uma Nova Modernidade 305
3.1. O Desenvolvimento da Cidade: Breves Notas 305
3.2. Salubridade, Limpeza e Resíduos na Lisboa do Século XX 307
3.2.1. Até ao PPLL 308
3.2.2. O Plano a Curto Prazo para o Lixo de Lisboa 312
3.2.3. O Destino dos Lixos da Cidade de Lisboa 314
3.2.4. A Recolha Selectiva 316
3.2.5. O Normativo de Enquadramento 317
3.3. Sensibilização Sanitária e Ambiental 318
BIBLIOGRAFIA 323
FICHA TÉCNICA 333
AGRADECIMENTOS 335
Sumário

10
Sumário d e A nexos
[também em suporte digital]

A. Informação Complementar*
anexo A1 § Informação Estatística
anexo A2 § Resenha Legislativa
anexo A3 § Curiosidades Ambientais
anexo A4 § Documentos de Referência na Área do Ambiente
[apontadores]

anexo A5 § Sensibilização e Educação Ambiental em Lisboa


1979-2007 [síntese de materiais, programas e projectos]
anexo A6 § Referência Bibliográfica Complementar

B. Materiais de Apoio**
anexo B1 § Plano de Apoio para Exploração do Caderno
do Formador
anexo B2 § Apresentações Temáticas
ACTIVIDADES LÚDICO-DIDÁCTICAS:
anexo B3 § Animação com Grupos
anexo B4 § Visitas de Estudo
anexo B5 § Ateliers de Reutilização de Materiais
RECURSOS COMPLEMENTARES [B6]:
anexo B6.1 § Base de Imagens
anexo B6.2 § Vídeos
Sumário de Anexos

*Informação técnica complementar.


**Materiais para apoio a projectos/actividades.
11
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

12
Introdução

Este trabalho resulta de uma candidatura ao Fundo Social


Europeu, beneficiando do apoio do Programa Operacional
do Emprego, Formação e Desenvolvimento Social, o que não
só viabilizou a sua realização, como constituiu um incentivo
para a equipa que estruturou e concretizou o “Caderno do
Formador em Educação Ambiental: Resíduos Sólidos e Animais
em Meio Urbano”.
O presente recurso pedagógico surgiu da necessidade de orga-
nizar um material de apoio dirigido às equipas envol-
vidas na actividade de informação, sensibilização e educação
ambiental, na área de competências do Departamento
de Higiene Urbana e Resíduos Sólidos, pretendendo constituir
um recurso permanente de apoio e facilitar a integração
de objectivos associados à sustentabilidade na educação
ambiental.
O Caderno de Recursos disponibiliza diferentes materiais que
se interligam e complementam, estando organizados num
Dossier do Formador [em suporte de papel] e num DVD.
O Dossier do Formador integra a informação de carácter
mais persistente, nomeadamente a conceituação teórica
de enquadramento a esta área de intervenção e elementos
para a história da cidade de Lisboa, no que respeita à higie-
ne e limpeza urbana.
O DVD agrega a informação susceptível de actualização
e dirigida à prática diária dos profissionais. A informação
disponibilizada resulta da sistematização da intervenção
nesta área, desde 1992, pelo Departamento de Higiene
Urbana e Resíduos Sólidos [DHURS] da Câmara Municipal
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

de Lisboa, onde o contributo de parcerias e actores locais,


constituiu uma mais-valia.
O DVD integra a sistematização de materiais e recursos
dirigidos à prática diária da actividade de sensibilização
e educação ambiental:
P Propostas de planos de sessão e de apresentações-tipo
para apoio a acções informativas [formativas];
P Fichas para apoio à organização e realização de actividades
de sensibilização e educação ambiental na área deste
recurso didáctico [dinamização e animação com grupos];
13
P Organização de informação para apoio ao planeamento
de visitas de estudo [listagem de entidades e cadernos
de campo-tipo];
P Base de imagens e vídeos para apoio à estruturação e rea-
lização de actividades;
P Informação estatística, legislativa, informação e sites de refe-
rência associados ao ambiente e resenha da bibliografia
disponível no Centro de Documentação do DHURS;
P Cronologia das campanhas, projectos e acções dinamizadas
pelo Departamento de Higiene Urbana e Resíduos Sólidos
desde 1979, na área da sensibilização e educação ambiental.
Para a realização do Caderno de Recursos em Educação
Ambiental contribuíram quer os profissionais que hoje
desenvolvem a sua actividade na Divisão de Sensibili-
zação e Educação Sanitária, quer os que por aqui passaram,
pela sistematização da sua prática, assim como a Divisão
de Limpeza Urbana e a Divisão de Higiene e Controlo
Sanitário, a Direcção Municipal de Serviços Gerais, através
do Departamento de Modernização Administrativa e Gestão
de Informação, da Divisão de Imprensa Municipal e ainda
a Divisão de Comunicação e Imagem e o Eng.º Fernando
Louro, que realizou a supervisão científica do Manual
do Formador.
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

14
I Ambiente e Resíduos Sólidos
P
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

16
1. Os Problemas Ambientais
e a Consciência Ecológica

Para se poderem enunciar os principais problemas


ambientais é importante clarificar a noção de ambiente.
O ambiente é, de uma forma geral, o meio que sobre um
organismo pode ter influência, como pode por ele ser
influenciado. Consideram-se, neste contexto, todos os siste-
mas físicos [água, ar e solo] e os organismos vivos.
Desta forma, o ambiente é tudo o que nos rodeia, ou seja
a nossa envolvente social, cultural, familiar, natural e cons-
truída. Acresce que o Homem de uma qualquer cultura
ou latitude deste planeta acaba, invariavelmente, por pro-
duzir efeitos em locais distantes do seu meio próximo
e sofre globalmente as consequências ambientais relativas
à exploração dos recursos de que necessita para viver,
do consumo e das emissões e descargas poluentes sobre
o ambiente, de uma maneira geral.
Ao longo da história, o Homem tem modificado as suas
relações com o ambiente. Mas desde a revolução industrial
e em particular nas últimas décadas, a influência do Homem
no ambiente provocou alterações, até então jamais veri-
ficadas. Os avanços industriais e tecnológicos registados
permitiram ao ser humano usar grandes quantidades
de bens de consumo, essencialmente no mundo ocidental.
Porém, se por um lado se criaram necessidades que de se-
guida foram satisfeitas, por outro, essa satisfação tem-se
feito à conta da sobre-exploração dos recursos e muitas
vezes da degradação do ambiente.
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

A grande carga sobre a biosfera1 verifica-se quer ao nível


da delapidação dos recursos naturais, quer ao nível dos
poluentes descarregados nos meios receptores - águas
[interiores e mar], solo e atmosfera; ou seja, o Homem tem
vindo a explorar os recursos, quer estes sejam ou não
renováveis, transforma-os produzindo grandes quantidades
de bens [cuja transformação gera poluição] e, de seguida,
rejeita-os sob a forma de resíduos que, mais uma vez,
poluirão os meios receptores.

1
A terra, incluindo todos os seres vivos, a água, a atmosfera e o solo.

17
Contudo, nos nossos dias já é possível poluir menos:
controlar as emissões poluentes das fábricas, tratar a água
utilizada e antes de ser lançada nos rios e mares, tratar
de forma correcta os resíduos produzidos podendo fazer
destes verdadeiras fontes de riqueza, em detrimento da explo-
ração de recursos naturais para a produção de novos bens
de consumo.
Sem querer tratar exaustivamente todos os problemas am-
bientais globais, como por exemplo a explosão demográ-
fica, as assimetrias Norte-Sul, os conflitos raciais e a xeno-
fobia, que encerram em si factores de carácter político
e social que transcendem os objectivos destas páginas,
referem-se, de seguida, alguns dos problemas ambientais
directamente relacionados com o consumo humano e modos
de vida de modelo ocidental, ordenando-os, para uma
maior facilidade de consulta e orientação, consoante o seu
maior impacte ou influência sobre os Recursos, o Solo,
a Água e a Atmosfera.
Porém, quer as causas, quer as consequências dos factores
que mais contribuem para a degradação do ambiente,
não se esgotam num dos componentes da biosfera sendo
transversais e podendo ter incidência nos seres vivos, nos
solos, na atmosfera e na água.

1.1. Os Recursos Naturais


A exploração dos recursos naturais é transversal e incide
indiscriminadamente sobre as componentes viva e não viva
à face da terra.
PFactores bióticos - Todos os seres e sistemas vivos
do ambiente que habitam a biosfera: plantas, animais
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

e microrganismos.

18
P Factores abióticos - Todos os factores sem vida que inter-
vêm na biosfera: clima, luz, radiação, água, minerais, rochas;
em suma, os aspectos físicos do ambiente.
Os recursos que a natureza providência e que se exploram
para suprir as necessidades humanas dividem-se, de forma
genérica, em recursos não renováveis e recursos renováveis.
P Os recursos não renováveis - são os que têm uma
capacidade de renovação menor de que a exploração
de que são alvo e permitem a obtenção de energia ou
de outras matérias-primas de forma fácil; são por isso
os mais intensamente explorados. Sabe-se, contudo, que
se esgotam e que, por isso, são insubstituíveis à escala
da vida humana. Neste domínio situam-se os combustíveis
fósseis e os materiais inertes, tais como os mármores, gra-
nitos, areias, minerais nobres ou não, tais como a bauxite
[alumínio], ferro, ouro, prata, etc.
P Os recursos renováveis - são os que mais facilmente É, pois, urgente que
se renovam ou, à escala da vida humana, são inesgotáveis. se equacione a
exploração dos
Requerem para além de uma exploração controlada, recursos numa
grandes investimentos que dificilmente são ressarcidos perspectiva
no curto prazo, pelo que têm sempre subjacente uma deci- sustentável:
"...minimizar
são política. Neste domínio citam-se, a título de exemplo, o esgotamento dos
as fontes de energia proporcionadas pela radiação solar, recursos não3
renováveis” , gerir
pelo vento, pelas marés e pela energia geotérmica e, racionalmente todos
ainda, enquanto recursos para a produção de bens, várias os recursos, em
espécies vegetais e animais que, exploradas de forma especial os que mais
dificilmente se
controlada e eficaz, podem permitir o seu usufruto sistemá- renovam ou
tico: as explorações florestais em ecossistemas2 naturais, regeneram e
estabelecer como
os recursos piscícolas e cinegéticos. prioridade a obtenção
Na última metade do século XX, verificou-se uma sobre- de energia de forma
alternativa aos
-exploração dos recursos esgotáveis [fruto da procura cada combustíveis fósseis.
vez mais exigente e da afirmação social do Homem, e do
consumo] para a produção de produtos sinteticamente trans-
formados que, por sua vez, deram origem a grandes quanti-
dades de materiais rejeitados - a sociedade de consumo
caracterizada pela prática de “usar e deitar fora”.

2
Ecossistema - o todo formado pelos organismos [componente biótica]
e pelo meio [componente abiótica]. Uma espécie endémica significa que
pertence naturalmente ao meio, não foi introduzida. Por exemplo
o eucalipto é endémico na Austrália mas é uma espécie introduzida
em Portugal [embora se adapte bem ao meio, não é endémica].
In: Caring for the earth - IUCN/UNEP/WWF.
3

19
Tem-se assistido a uma constante delapidação dos recursos
naturais esgotáveis e a uma má gestão dos recursos reno-
váveis, o que põe em causa a sobrevivência de várias
espécies, contribuindo para a diminuição da biodiversidade.

1.2. A Atmosfera
1.2.1. Camada do Ozono
O ozono é um gás que existe na atmosfera, constituído
por três átomos de oxigénio [O3]. O ozono estratosférico
forma-se por acção da radiação solar ultravioleta nas molé-
culas de oxigénio [O2], segundo um processo denominado
fotólise: as moléculas de oxigénio são quebradas dando
origem a átomos de oxigénio, que por sua vez se combinam
com outras moléculas de oxigénio formando-se deste modo,
a molécula triatómica do ozono.
A quantidade de ozono presente na estratosfera é mantida
num equilíbrio dinâmico, por processos naturais, através
dos quais é continuamente formado e destruído. Mas este
equilíbrio natural de produção e destruição do ozono
estratosférico tem vindo a ser perturbado devido, essencial-
mente, às emissões de compostos halogenados, tais como
os clorofluorcarbonetos [CFC's] e os halons4.
Na troposfera [estrato da atmosfera, desde a superfície até
aos 10km de altitude], o ozono em elevadas concentrações
pode exercer um efeito tóxico nos animais, originando
problemas respiratórios e irritação ocular e um efeito
corrosivo em diversos materiais. Misturado com outros
gases e partículas, ele é responsável pela formação do smog
fotoquímico [nevoeiro fotoquímico que cobre os grandes
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

centros urbanos e industriais, resultante da poluição


atmosférica]5.
Contudo, este gás acumula-se principalmente numa camada
com cerca de 15 km de espessura, na estratosfera [estrato
compreendido entre os 10 e os 50 km de altitude], designa-
da por “camada de ozono”. É aqui que ele desempenha
o papel de escudo protector, de filtro que assegura a vida
na Terra. Ele absorve mais de 95 % das radiações ultravioleta

4
MAOT. Estado do Ambiente 2000. Lisboa: MAOT, 2003.
5
REIS, Maria do Carmo. Fonte: www.naturlink.pt [Março’06].
20 PIT
[parte do espectro electromagnético das radiações emitidas
pelo sol, que têm efeitos negativos], preservando da sua acção
nefasta todas as formas vivas6.
Se a camada de ozono não existisse, as radiações ultravioleta
A Agência
não teriam nenhuma barreira entre a sua fonte de emissão Norte-Americana
e a superfície da Terra e nenhuma forma de vida, das que de Protecção Ambiental
conhecemos, poderia sobreviver. No entanto, mesmo a peque- estima que a redução
de apenas 1%
na fracção que atinge a superfície da Terra é potencial- na espessura
mente perigosa para quem a ela se expõe por períodos da camada de ozono
é suficiente
prolongados, podendo afectar as defesas imunológicas para cegar
do homem e de outros animais, permitindo o desenvolvi- 100 mil pessoas
mento de doenças infecciosas e de carcinomas. por cataratas
e desencadear
Níveis elevados de radiação podem diminuir a produção um aumento
de 5% no número 7
agrícola, com a consequente redução na produção alimentar. de cancros de pele .
As radiações ultravioleta também afectam microrganismos,
embora não se tenha a noção da extensão de tais altera-
ções, já que estes organismos intervêm na decomposição dos
resíduos, no ciclo dos nutrientes e interagem com as plantas
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

e animais na forma de agentes patogénicos ou simbióticos.


Nos ecossistemas aquáticos a intensificação das radiações
ultravioleta interfere no crescimento, na fotossíntese e na repro-
dução do plancton. São estas plantas e animais micros-
cópicos que se encontram na base das cadeias alimentares
e que são responsáveis pela produção de grande parte
do oxigénio do planeta e absorção do dióxido de carbono,
actuando como um tampão contra o aquecimento global
do planeta.

6
Idem.
7
Ibidem.
21
A radiação ultravioleta afecta igualmente os ciclos biogeo-
químicos, como o ciclo de carbono, do azoto e o ciclo dos
nutrientes minerais, entre outros, lesando globalmente toda
a biosfera do planeta.
Apesar de a camada de ozono se ter mantido inalterada
por milhões de anos, nas últimas décadas tem-se assistido
à sua rápida degradação, com o aparecimento dos “buracos
de ozono”, zonas da estratosfera onde a camada se apre-
senta extremamente fina, com redução óbvia dos seus efeitos
protectores.
O maior responsável por esta situação é o Cloro, presente
nos clorofluorcarbonetos [CFC's], utilizados em sprays, em-
balagens de plástico, chips de computador, solventes para
Entre 1980 e 1989, a indústria electrónica e, especialmente, nos aparelhos
o número de novos de refrigeração e climatização, como os frigoríficos e os ares
casos praticamente
duplicou nos EUA. condicionados.
Em 1995 observou-se
um aumento A proibição da utilização de CFC's, a pesquisa de alterna-
do número de novos tivas inócuas para o ambiente e o decretar do “Dia Interna-
casos de cancro cional do Ozono”, com o objectivo de reduzir a utilização
em regiões
do Hemisfério Sul, de substâncias destruidoras do ozono, são algumas das
como a Austrália, medidas a adoptar. No entanto, mesmo pondo em prática
a Nova Zelândia,
África do Sul estas e outras medidas que visem a redução das emissões
e Patagónia. de Cloro e Bromo, irão ainda ser necessárias várias décadas
No Chile, os casos para que os níveis de ozono voltem a aumentar na estra-
de carcinoma da pele
aumentaram 133 % tosfera. Efectivamente, embora a utilização de compostos
desde o aparecimento halogenados tenha sofrido um decréscimo desde os anos 80,
do buraco do ozono
8 como resultado da implementação dos compromissos
sobre o Pólo Sul .
preconizados pelo Protocolo de Montreal sobre as Substân-
cias que Deterioram a Camada de Ozono [PNUA, 1987]
e suas Emendas, esperava-se que a concentração de Cloro
e Bromo na estratosfera atingisse um máximo por volta
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

do ano 2000 e que se tivesse de esperar até ao ano


2060 para que a camada de ozono fosse totalmente
recuperada9.

1.2.2. Efeito de Estufa e Alterações Climáticas


A temperatura terrestre é mantida, essencialmente, graças
ao vapor de água e pelo dióxido de carbono [CO2] existentes
na atmosfera. Para que tal seja possível, estes gases

8
REIS, Maria do Carmo. Fonte: www.naturlink.pt [Março’06].
9
MAOT. Estado do Ambiente 2000.
22
permitem a passagem da radiação solar em direcção
à Terra e absorvem o calor libertado por esta, reflectindo-
-o, criando deste modo um tecto, que impede que o calor
se liberte para o espaço - é a este fenómeno natural
que se dá o nome de efeito de estufa da atmosfera
terrestre e que permite a vida na Terra na forma que
actualmente a conhecemos.
Porém, desde a Revolução Industrial e principalmente nos
últimos anos a acumulação de gases responsáveis pelo efeito
de estufa tem aumentado. Tal deriva da queima de combus-
tíveis fósseis nos processos de fabrico, com a consequente
libertação de CO2. O trânsito automóvel é uma das causas
de libertação de dióxido de carbono e também de outros
gases, como por exemplo o dióxido de azoto [NO2]. A par
destes gases, o metano [CH4], proveniente da decomposição
da matéria orgânica e de processos agrícolas, os CFC's
e o ozono da troposfera têm aumentado a camada de gases
que causam o efeito de estufa. Refere-se, a título de exemplo,
que o dióxido de carbono e o metano são responsáveis
pelo aumento de cerca de 80 % da temperatura terrestre.
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

Assim o processo natural de efeito de estufa é largamente


ampliado. Ou seja, há maior retenção e reflexão do calor
libertado pela terra e menor libertação da energia calorífica
para o espaço.
As opiniões mais cépticas referem que não é linear a
correlação entre a acumulação destes gases na atmosfera
e o aumento da temperatura terrestre.
Porém as comparações dos registos climáticos confirmam
que a temperatura tem aumentado. Desde 1900, por
exemplo, a temperatura média anual aumentou entre 0,3º
e 0,6ºC. Estima-se, ainda, que no ano 2050 como conse-
quência do aumento da temperatura [que se prevê seja
23
de 1º a 4ºC] o nível das águas do mar, devido ao descon-
gelamento das calotes polares, possa subir cerca de 20 cm.
Prevê-se, também, que se não houver a nível global uma
redução de cerca de 70 % nas emissões de CO2, em 2100,
o nível das águas do mar possa subir cerca de 50 cm.
Tal conduzirá à inundação de áreas densamente povoadas
nos litorais oceânicos.
A redução na disponibilidade de água doce é outra
consequência do efeito de estufa, devido ao desconge-
lamento das calotes polares e glaciares que contêm cerca
de 79 % das reservas de água doce existente no planeta.
Para além das causas já enunciadas, ou seja a queima
de combustíveis fósseis quer nos processos industriais, quer
nos transportes, também a desflorestação desempenha
um papel importante neste fenómeno, dado que se gera
menor “consumo” de CO2 no processo de fotossíntese.
É, assim, necessário adoptar medidas que passam pela utili-
zação de energias alternativas, pela reflorestação e por
uma maior eficácia e eficiência energética.

1.2.3. Chuvas Ácidas


A precipitação, mesmo quando não está poluída, é ligeira-
mente ácida devido à presença natural de dióxido de car-
bono na atmosfera. A chuva age, assim, como agente
facilitador na dissolução dos sais minerais no solo,
tornando-os mais facilmente absorvíveis pelas plantas.
O aumento dos gases na atmosfera, nomeadamente o dos
óxidos de azoto e de enxofre, conduz à formação de ácido
nítrico e sulfúrico, por reacção química com o vapor
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

de água e com o oxigénio atmosférico.

24
Assim, quando chove caem verdadeiras cargas de água
ácida que destroem culturas e património construído e que
são nocivas para a saúde humana.
Em locais onde a concentração de gases é muito alta
chegam a ocorrer chuvas com pH muito baixo. Foram de-
tectados alguns charcos de água com origem na pluviosi-
dade com pH que ronda os 3,0. A existência de vida
nessas condições torna-se impossível.

1.3. O Solo
1.3.1. Poluição por Resíduos
Desde as últimas décadas do século XX, os resíduos10 sólidos
têm assumido proporções preocupantes a nível global, quer
derivadas do aumento crescente dos quantitativos produzidos
quer pela perigosidade que representam para o ambiente.
Até meados do século passado os resíduos sólidos eram
essencialmente orgânicos facilmente decompostos pela
natureza.
Lembremos que os materiais de difícil decomposição, como
por exemplo o vidro e os metais, eram reutilizados inúmeras
vezes, tendo praticamente todas as embalagens depósito
ou tara; ou seja só eram chamadas lixo quando, por
acidente, alguma delas se deteriorava.
Porém, devido à introdução de plásticos e demais materiais
processados sinteticamente em bens de consumo genera-
lizado, fabrico de vestuário, mobiliário e muitos outros
de uso corrente [nomeadamente nas embalagens que são
produzidas em larga escala com padrões atractivos e que
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

apenas visam vender melhor os produtos], a par da intro-


dução das tecnologias de fabrico mais leve de embalagens
de vidro e metal [com a consequente rejeição e não
reutilização destes produtos] alterou-se a forma de encarar
o problema em que os resíduos se tinham tornado.
Passou-se, numa primeira fase, por tentar resolver o destino
final do lixo para que não se pusesse directamente em
causa a saúde pública, através do confinamento controlado

10
Resíduos - são quaisquer substâncias ou objectos que o seu detentor
não usa e que por isso se quer desfazer ou tem obrigação legal de se
desfazer.
25
dos resíduos, até uma nova fase em que se integram os resí-
duos na política de ambiente. As preocupações são actual-
mente de carácter mais preventivo, embora não se descure
a saúde pública. Assim, primeiramente deve reduzir-se
a quantidade de resíduos produzidos, depois reutilizar o mais
possível os materiais e finalmente adoptar políticas de trata-
mento adequadas, que possibilitem a reciclagem dos mate-
riais rejeitados.
Os resíduos tornaram-se num dos factores que mais contribui
para a poluição, caso não sejam alvo de um tratamento
adequado, não só dos solos mas também dos lençóis
freáticos [águas subterrâneas], por percolação através dos
solos e ainda da atmosfera pela libertação de compostos
voláteis. Por tal e na sequência da Conferência do Rio
de Janeiro - ECO’92, a gestão integrada dos resíduos
assumiu particular importância e prioridade para os go-
vernos que se comprometeram com a intenção de reduzir,
por um lado os quantitativos dos resíduos e, por outro,
a toxicidade dos mesmos.
Em Portugal, a classificação dos resíduos é feita tendo por
base a origem da sua produção e consideram-se: resíduos
sólidos urbanos, resíduos industriais, resíduos hospitalares
e outros resíduos. Há também a classificação de resíduos
perigosos e estes podem estar presentes em qualquer uma
das categorias anteriormente referidas.
Se é quase imediata a ligação de resíduo perigoso aos
resíduos hospitalares e aos industriais, tal não parece tão
evidente quando se trata de resíduos sólidos urbanos.
Porém, estes englobam igualmente pequenas quantidades
de resíduos perigosos que vão de tintas a solventes,
passando por medicamentos fora de uso e pilhas e mesmo
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

por velhos electrodomésticos contendo clorofluorcarbo-


netos [CFC's].
Para além da necessidade de se implementarem sistemas
de gestão de resíduos cada vez mais eficazes e eficientes,
para que os resíduos que produzimos não ponham defi-
nitivamente em causa o futuro do planeta, é também
necessária a participação informada dos cidadãos, assente
num consumo mais controlado e ambientalmente mais
equilibrado, através da rejeição de produtos tóxicos e peri-
gosos e pela escolha de bens duráveis. A participação
activa na deposição selectiva para reciclagem é outra
26
vertente importante que, para além de reduzir os quanti-
tativos de resíduos a eliminar, contribui para fazer destes
verdadeiras fontes de riqueza para a produção de novos
bens de consumo.

1.3.2. Desflorestação/Desertificação
Muitos dos problemas ambientais globais passam pelo
fenómeno da desflorestação, saelização e desertificação Saelização
dos solos. processo regressivo
em que
Nos primórdios da humanidade a influência do Homem os ecossistemas
tendem
sobre os ecossistemas permitiu-lhe a descoberta da agri- para o pré-deserto.
cultura e do pastoreio e, por consequência, a sedentari-
Desertificação
zação. Contudo, este grande salto da humanidade fez-se processo regressivo
e continua ainda a fazer-se à conta da devastação de em que
grandes áreas de coberto vegetal, para a disponibilização, os ecossistemas
tendem para
cada vez mais exigente, de terrenos agrícolas. o deserto,
quase sempre
Esta prática, associada à agricultura extensiva e de monocul- deserto quente.
tura, tem vindo a esgotar os solos, fazendo com que cada
vez mais o homem continue a desbravar as florestas
visando obter novas terras férteis. Este é o processo artifi-
cial e galopante de desflorestação.
A desflorestação pode acontecer de forma natural, através
de incêndios e outras catástrofes, ou de forma artificial
como vimos atrás, através da redução da área coberta com
um qualquer sistema natural, para proveito humano imediato.
O processo de saelização daí decorrente é regressivo e con-
duz os ecossistemas a situações de pré-deserto. O processo
de desertificação é igualmente um processo regressivo em
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

que os ecossistemas tendem para o deserto quente -

27
temperaturas médias mais elevadas, geralmente sem estações
do ano tão diferenciadas, com humidade atmosférica prati-
camente inexistente e com baixos índices de pluviosidade.
Os solos são rochosos ou de areias soltas, praticamente
sem matéria orgânica, o que impossibilita qualquer prática
agrícola.
Uma floresta com biodiversidade, sendo alvo de desflores-
tação e de um processo de desertificação torna-se numa
área árida e pobre. O empobrecimento dos solos acaba
por conduzir ao empobrecimento económico e ao afasta-
mento ou abandono por parte dos residentes.
As principais causas da saelização e da desertificação
prendem-se com a desflorestação, a sobre-exploração da
fertilidade dos terrenos, com as alterações efectuadas aos
regimes hídricos e com a poluição dos solos. Constituindo
simultaneamente causa e consequência destes processos
refira-se o aquecimento global [provoca desertificação e ao
mesmo tempo é uma consequência desta, pela falta de
coberto vegetal].
A perda de nichos ecológicos e de biodiversidade tem forte
repercussão no desenvolvimento das populações podendo
desencadear o aumento da pobreza extrema, situações
de fome, de doença e fenómenos de migração conducentes
à desertificação humana.

1.4. A Água
1.4.1. Poluição das Águas
A água, conjuntamente com o ar, é fundamental para a exis-
tência de vida na terra.
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

A água cobre cerca de dois terços do planeta e, mesmo


assim, é considerada um bem escasso e que é necessário
poupar. Tal deriva da distribuição deste recurso não ser
igual em todo o planeta - existem zonas com grande
disponibilidade de água doce e outras onde a desertifi-
cação a fez desaparecer quase completamente.
Da totalidade de água existente na Terra, apenas cerca
de 3 % é doce e como tal passível de ser utilizada
no consumo humano. Contudo desta pequena percentagem
apenas uma parte está disponível: cerca de 79 % está
congelada nas calotes polares e nos glaciares e perto
28
de 20 % encontra-se no subsolo; ou seja, resta-nos 1 %
de água acessível para o consumo. Da água dita disponível
para consumo e que, feitas as contas é apenas 0,03 %
do total existente, 58 % encontra-se em lagos interiores,
38 % está retida no solo, 8 % é vapor de água que
se encontra na atmosfera e apenas 1 % corre nos rios.
Apesar desta pequeníssima porção de água disponível,
o Homem nas suas actividades, consome-a de forma
indiscriminada e faz dos cursos de água verdadeiros
receptores das descargas dos seus resíduos e efluentes.
Os contaminantes que se podem encontrar na água e que
provocam a sua poluição provêm quer de causas naturais
como erupções vulcânicas e arrastamentos de solos, quer
de causas com origem antropogénica: descargas de águas
residuais e de resíduos sem tratamento adequado e poluição
difusa maioritariamente proveniente de escorrências de pes-
ticidas e adubos agrícolas.
Durante muitos anos, as descargas de esgotos urbanos
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

e industriais foram feitas directamente para os cursos


de água. Porém, a pouca distância, a água apresentava nova-
mente boa qualidade para utilização humana. A utilização
de produtos cada vez mais tóxicos e o aumento da quan-
tidade de efluentes descarregados nos cursos de água veio
alterar este cenário inicial. Assim, a qualidade da água dei-
xou de ser retomada e degradou-se; ou seja, o meio deixou
de ter capacidade para se auto-regenerar.
Os rios deixaram por tal de ser vistos como fonte
inesgotável de água doce e o local para onde se poderiam
deitar todos os efluentes humanos.
29
Para o Homem as alterações mais evidentes de uma água
poluída são as suas características organoléticas: o cheiro,
a cor e o sabor. Porém, para os organismos que habitam
um curso de água, uma pequena subida da temperatura
é suficiente para pôr em causa a sua subsistência. Sendo
os peixes animais de sangue frio, não possuem resistência
às alterações de temperatura e tal pode conduzir à impos-
sibilidade da sua reprodução. Podem, igualmente, em presença
de água poluída, desenvolver dermatoses com origem em
fungos e diminuir a sua resistência a doenças, acabando
por morrer.
As descargas de efluentes de origem antropogénica têm
diferentes impactos consoante o meio receptor. Assim pas-
samos a analisar alguns meios hídricos:
Águas interiores - são as mais importantes enquanto fonte
P

de água potável, satisfazendo necessidades domésticas,


industriais e agrícolas. São o local mais acessível e menos
dispendioso para a descarga de efluentes.
Nas águas interiores consideram-se as águas subterrâneas
que resultam da infiltração da chuva a várias profundi-
dades, criando reservas no subsolo de água potável, e as
águas superficiais que se acumulam à superfície do solo
em lagos e rios criando igualmente reservatórios naturais
ou correndo para depressões ou para o mar.
P Águas do mar - são águas salgadas que podem dividir-se
em zonas costeiras e zonas de mar aberto. As descargas
de efluentes neste meio têm também impactes negativos.
Descargas urbanas sem tratamento em zonas costeiras
impossibilitam a utilização das praias e comprometem
actividades económicas que delas dependem. As descargas
em mar aberto, sobretudo quando existe um tratamento
prévio dos efluentes são menos negativas, devido ao maior
Não podemos esquecer volume de água e à maior diluição, que levam a um efeito
que, segundo dados de minimização do impacte.
recentes, cerca de
2 biliões de pessoas Para que a água possa continuar a constituir um bem
ainda não têm acesso disponível para a satisfação das necessidades humanas
a água potável e que
mais de um bilião é necessário que se proceda a uma gestão integrada dos
não está servida com efluentes que são descarregados nos cursos de água,
sistemas adequados
de tratamento que se diminua o consumo de água de boa qualidade,
de água. aproveitando-se integralmente este recurso, sem desperdí-
cios e promovendo a sua reutilização.
30
1.5. A Consciência Ecológica
1.5.1. No Mundo
Não foi imediatamente que o Homem se deu conta dos
impactes negativos que o padrão consumista aportava
ao ambiente e, em última análise, a si próprio.
“Até ao final do século XIX, a maior parte das calamidades “Os Estados-Membros
que afligiam os homens tinham uma origem natural. da União Europeia
devem promover
A Revolução Industrial veio alterar a situação, na medida campanhas
em que as ameaças passaram sobretudo a surgir no interior de informação
das próprias sociedades. Desta forma, a partir de meados e de sensibilização
dos consumidores
do século XIX, o homem civilizado transformou-se numa e incentivar
“força geológica planetária”, capaz de desencadear reacções os instrumentos
de prevenção”.
em cadeia susceptíveis de o destruir. Tratou-se de um corte
definitivo na história da humanidade pois, desde então,
é a própria sobrevivência da humanidade que tem estado
em jogo”11.
Data dessa época a emergência de uma inquietação
ambiental, que ganhou visibilidade e consistência durante
o século XX, impulsionada por acontecimentos que alertaram
o homem para a precaridade do equilíbrio do ecossistema
Terra e que culminou, no virar do Milénio, com o surgimen-
to de um novo conceito: o desenvolvimento sustentável,
onde a dimensão ecológica assume paridade com a eco-
nomia e as dimensões sociais e políticas [cfr. ponto 2
Para a estruturação
do capítulo III]. deste capítulo
contribuiu
Este foi um longo caminho para teóricos e pensadores, polí- de forma significativa
ticos e opinião pública. o documento
“Contributo para
Desde o século XVI que alguns pensadores, de uma forma a Cronologia
cada vez mais insistente, começaram a integrar as preocupa- dos mais importantes
marcos
ções ambientais na sua actividade filosófica e/ou científica12. em Ambiente
A partir da segunda metade do século XIX, elas começam e Educação Ambiental
e no Mundo” de
a ganhar visibilidade e consistência, primeiro na comuni- Fernando Louro Alves
dade científica e mais tarde na opinião pública. [2002].

11
DELÉAGE, Jean-Paul. Uma Nova Era de Perigos. In: BEAUD, Michel;
BEAUD, Calliope e BOUGUERRA, Mohamed Larbi. O Estado do Ambiente
no Mundo. Lisboa: Instituto Piaget, Perspectivas Ecológicas, 1995, p. 23.
12
Referenciam-se alguns elementos: Garcia da Horta [1501-1568], na sua
visita ao oriente, estudou as espécies vegetais. Georges Louis Leclerc
[1749-1789] publica a primeira versão naturalista da história da Terra.
Thomas Robert Malthus [1766-1834] no “Ensaio sobre os Princípios das
Populações” alerta para a importância do controlo da natalidade.
31
O Desenvolvimento Sustentável
Segundo Lawrence [1993]13 os objectivos centrais do desen-
volvimento sustentável podem sintetizar-se da seguinte forma:
1 Satisfazer as necessidades humanas básicas - sobre-
P

tudo ao nível da alimentação, para evitar a fome e a des-


nutrição;
2 Promover um crescimento económico constante - o que
P

se considera uma condição necessária mas não suficiente.


Pretende-se que as economias produzam bens e serviços
para servir as populações;
3 Melhorar a qualidade do crescimento económico - em
P

particular as possibilidades de acesso equitativo aos recur-


sos naturais e aos benefícios do desenvolvimento;
4 Atender aos aspectos demográficos - e, em especial,
P

à redução dos elevados índices de crescimento populacional;


5 Seleccionar opções tecnológicas adequadas - preten-
P

de-se estimular a investigação e capacitação [e competên-


cia] técnica para reduzir as transferências tecnológicas,
sobretudo nos países em desenvolvimento;
6 Aproveitar, conservar e restaurar os recursos naturais -
P

evitando a degradação dos recursos, protegendo a capa-


cidade da natureza favorecendo a sua restauração,
e evitando todos os efeitos adversos que danam a socie-
dade e os ecossistemas.
Darwin [1859], com a publicação do livro “A origem das
espécies” contribuiu significativamente para este processo.
Haeckel [1834-1919], por seu lado, concorreu para o sur-
gimento de um novo ramo do saber, para uma nova forma
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

de compreender e interpretar o mundo: a ecologia. Esta


apresenta-se como o “estudo das relações entre as espécies
e o seu meio ambiente” que durante o século XX se
multiplica em diversas perspectivas de análise - a ecologia
animal, a vegetal, a humana, a urbana, … acompanhando
a crescente afirmação das inquietações ambientais.
Destes primórdios fez também parte o conceito de Conser-
vação da Natureza, cuja afirmação conduziu à criação dos
primeiros Parques Naturais: o Parque Nacional de Yellowstone

13
LAWRENCE, Luis Chesney. Lecciones sobre desarollo sustentable.
Venezuela: Fundación de Educatión Ambiental, 1993, p. 40-44.
32
nos Estados Unidos [1872], o Parque Nacional de Banff no
Canadá [em 1887]. Com o século XX, estas preocupações
atravessaram o oceano Atlântico e na Europa foram criados
os primeiros parques nacionais europeus - na Alemanha
em 1910 [parque de Luneburger Heide], na França em
1913 e, com os Parques Naturais de Covadonga e Ordesa,
na Espanha em 1918. Em Portugal, apenas em 1971 foi
fundado o primeiro Parque Natural - o da Peneda Gerês.
O associativismo ambientalista apareceu, também, no final
do século XIX com a fundação de organizações que ainda
hoje constituem entidades de referência: o Sierra Club
[1892], cujo objectivo era a protecção da Serra Nevada e
a Royal Society for Protection of Birds [1889], no Reino
Unido. Fazendo eco de alguma agitação da consciência
internacional provocada pelo lançamento da primeira
bomba atómica em 1945, em 1948 foi fundada a Inter-
nacional Union for the Protection of Nature [a IUPN14].
Em Portugal [e também nesse ano] foi criada a Liga de
Protecção para a Natureza, a primeira associação ambien-
talista portuguesa.
É que: “o azul do céu transformou-se subitamente num
clarão ofuscante. Os seres vivos adquirem então a auto-
consciência da possibilidade de destruição completa do
planeta. É assim que Einstein,
em 1955, afirma:
Após o dia 6 de Agosto, a bomba acabava de plantar “a poderosa
desintegração
as primeiras sementes do ambientalismo contemporâneo. do átomo veio
Estava-se entrando na idade ecológica”15. modificar tudo,
salvo o nosso modo
Com a criação das Nações Unidas e de organizações a ela de pensar,
associadas17 e através da realização de eventos por ela fazendo-nos assim
deslizar para uma
patrocinados, a questão ambiental foi-se firmando [princi- catástrofe nunca vista.
palmente a partir dos anos 60] na agenda pública. A sobrevivência
da humanidade exige
uma nova 1maneira
de pensar” .
14 6
Em 1956 esta associação transforma-se na IUCN - Internacional Union
for the Conservation Nature and Natural Resources e que hoje constitui
a World Conservation Union.
15
Worster, 1992, citado por Louro, 2002.
16
Einstein, prefácio do livro “L'Heure H, a-t-elle sonné pour le Monde?”,
editado em 1955, da autoria do físico francês Charles-Nöel Martin. Citado
por GRINEVALD; Jacques. Os pioneiros da Ecologia. In: BEAUD, Michel;
BEAUD, Calliope e BOUGUERRA, Mohamed Larbi. O Estado do Ambiente
no Mundo. Lisboa: Instituto Piaget, Perspectivas Ecológicas, 1995, p. 29.
17
A Unesco [Organização das Nações Unidas para Educação Ciência e Cultura]
é criada em 1946. O Programa das Nações Unidas para o Ambiente
e Desenvolvimento será criado na década de 70.
33
A evidência dos problemas ambientais18 com determinantes
da acção humana contribuiu para a discussão da temática
em documentos científicos e fóruns internacionais, onde,
lentamente, a questão ambiental passou a ser vista não
apenas como um problema com relevância política, eco-
nómica e/ou tecnológica associado à conservação dos
recursos naturais, mas também como um problema de ética
e de consciências, a que se vem juntar a educação
ambiental [cfr. Capítulo III].
A apresentação cronológica de alguns acontecimentos
expressa a evolução do sentir durante a segunda metade
do século XX:
P Em 1949, a UNESCO impulsiona a realização de um estudo
em 24 países focalizado no uso do ambiente como
recurso pedagógico.
P As Nações Unidas proclamam a década de 60 como
a Década do Desenvolvimento.
P Em 1961, com o apoio das Nações Unidas é fundada
a World Wildlife Fund [WWF], cuja actividade está dirigida
para a conservação das espécies.
P O ano de 1962 é um momento de charneira para a emer-
gência de uma consciência ambiental contemporânea, com
a publicação do livro The Silent Spring da bióloga
americana Rachel Carson [1907-1964], centrado na temá-
tica do uso dos pesticidas [DDT] na agricultura, que quali-
fica como “biocidas”. Esta obra produziu um grande
impacte na opinião pública e comunidade científica. Roger
Heim [1900-1979], presidente do Museu de História Natural
[França] e da Academia das Ciências, escreveu na altura:
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

“O tema essencial do volume de R. Carson possui uma


significação prática e filosófica tão grande que dominará,
com certeza, as preocupações da humanidade na passagem
para o próximo século. Trata-se do «deve e haver» entre
a criação e a destruição, de que o homem é o principal

18
Alguns exemplos: a combustão dos produtos derivados do petróleo gera
vários gases tóxicos que influenciam o clima da Terra; a descarga de des-
perdícios nos rios, lagos e mares, alteram os bio-sistemas de sobrevivên-
cia de inúmeras espécies aquáticas e terrestres; os acidentes não-naturais
com a energia atómica e a devastação por eles provocada [Hiroshima -
1944, Three Miles Island - 1979, Tchernobyl - 1986, …], a poluição
de solos e aquíferos causadas por descargas industriais, pesticidas, etc.
34
agente, das consequências desta nova guerra desencadeada
pelo Homem contra a Natureza, deste conflito que surge
na sequência das batalhas gigantescas que os grandes tra-
varam entre si, por duas vezes, sobre quase toda a super-
fície das terras, das águas e dos céus planetários”19.
P Em 1968, Paris é mais uma vez palco de um evento inter-
nacional dirigido à problemática ambiental20. Nesse ano,
a UNESCO promove a Conferência da Biosfera, de que
resulta a institucionalização da educação ambiental. Por
consequência, o Reino Unido, a Suécia e a Noruega forma-
lizam a sua prática através da criação de estruturas
governamentais [Reino Unido] ou da sua integração nos
currículos escolares.
P Promovida pelas Nações Unidas, em 1972 tem lugar
a Conferência de Estocolmo, a qual culmina com a criação
do Programa das Nações Unidas para o Ambiente [PNUA]
e com a afirmação da centralidade da prática da educação
ambiental. Nesta linha, é desenhado o Programa Interna-
cional de Educação Ambiental [PIEA] cujos trabalhos virão
a servir de base à Conferência de Belgrado, a realizar
na Jugoslávia no ano de 1975.
Neste mesmo ano é também publicado o Relatório
Meadows, encomendado pelo Clube de Roma21. Neste
documento, onde era defendido o “crescimento zero”,
atendendo à conservação das espécies e à preservação
da biodiversidade.
Os Limites do Crescimento
Este relatório foi produzido a pedido do Clube de Roma.
Nesta obra era defendido que para atingir a estabilidade
económica e ecológica seria necessário “congelar” o cresci-
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

mento da população global e do capital industrial. Estas


teses foram actualizadas na obra publicada pelo casal
Meadows, em 1992, onde afirmavam que o homem ultra-
passou os limites de uso dos recursos naturais e níveis

19
GRINEVALD; Jacques. Os pioneiros da Ecologia. In: BEAUD, Michel; BEAUD,
Calliope e BOUGUERRA, Mohamed Larbi. O Estado do Ambiente no
Mundo. Lisboa: Instituto Piaget, Perspectivas Ecológicas, 1995, p. 31
20
A 1.ª Conferência Internacional sobre a Protecção da Natureza tivera lugar
nesta cidade no ano de 1913, sendo organizada pela Liga Suíça para
a Protecção da Natureza.
21
O Clube de Roma foi constituído em 1968 e integrava especialistas
do MIT [Massachussets Institute of Technology] e alguns industriais.
35
de poluição aceitáveis com incidência na redução dos
níveis de produção alimentar, de energia e produção
industrial [ttese 1]; o declínio do desenvolvimento é um
facto inevitável [ttese 2]; se se investir nesse sentido, ainda
será possível a inversão da tendência e rumar para
uma sociedade técnica e economicamente sustentável
[ttese 3]. MEADOWS, H. et al. Além dos Limites. Lisboa:
Difusão Cultural, 1993.
P Conferência de Belgrado [Jugoslávia] 1975 - conferência
internacional que produziu e aprovou a Carta de Belgrado
e o Programa Internacional de Educação Ambiental
[PIEA] “Este programa mantém uma base de dados
com informações sobre instituições e projectos envolvidos
com a Educação Ambiental, bem como promove eventos
e publicações específicas sobre esta temática”.
P Promovida pela UNESCO e pelo PNUA, em 1987 tem lugar
a Conferência de Tblisi22 [Geórgia, ex-URSS]. Neste encontro
são abordadas as alterações climáticas e, pela primeira
vez, o problema ambiental do buraco na camada de ozono.
Esta conferência constituiu um marco para a educação
ambiental.
P Em 1987 é publicado O Relatório de Brundtland23, o qual
define o conceito de Desenvolvimento Sustentável24 como
“o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes
sem comprometer a capacidade das gerações futuras
satisfazerem as suas próprias necessidades”.
P Protocolo de Montreal, em 1988 - Neste encontro inter-
nacional é assinado um compromisso por 40 Países, onde
as Nações se comprometem a alcançar a redução das
emissões de CFC's em 50 % até 1999, em ordem à preser-
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

vação da camada de ozono. Ulteriores correcções ao Proto-


colo apontam para a eliminação total dos CFC's e dos
Halons até 2010. Se o Protocolo de Montreal for inte-
gralmente cumprido, prevê-se que a recuperação da camada
de ozono possa ocorrer entre o ano 2033 e o ano 2052.

22
Este fórum internacional foi um marco para a educação ambiental [ver
capítulo III].
23
BRUNDTLAND. O Nosso Futuro Comum. Lisboa: Meribérica/Liber Editores,
1991.
24
O conceito de desenvolvimento humano e desenvolvimento sustentável serão
desenvolvidos no ponto 2 do capítulo III.
36
P A Comissão das Nações Unidas sobre o Ambiente e Desen-
volvimento promove em 1992, a Conferência das Nações
Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento25 [Rio de Janeiro,
Junho de 1992] - A ECO’92 “… envolveu muita polémica
durante a sua realização e aprovou cinco acordos oficiais
internacionais sobre temas como Meio Ambiente e Desen-
volvimento, Florestas, Mudanças Climáticas, Diversidade
Biológica, além da famosa Agenda XXI, que contém pressu-
postos para a implementação da Educação Ambiental,
visando a sobrevivência dos povos para o século XXI. Neste
documento foram apresentados compromissos e intenções
para uma melhoria da qualidade de vida e para a sua
sustentabilidade”26.
Agenda 21
Documento saído em 1992 da Conferência do Rio [Rio
de Janeiro, Brasil, de 3 a 14 de Junho de 1992].
Apresentou-se como um documento de referência para
a acção política, reflectindo o consenso entre os países
que assinaram o documento e o seu compromisso político
com o desenvolvimento e cooperação ambiental.
A denominação decorre do estabelecimento de metas
ambientais para o Século XXI, para que propõe linhas
de acção e antevê situações problemáticas e mudanças
futuras subsequentes.
Reconhece que o desenvolvimento sustentável é prima-
riamente da responsabilidade dos governos. Tal requer
a implementação de estratégias nacionais e planos
específicos adequados às várias nações, a concretizar sob
a forma de Estratégias Nacionais de Desenvolvimento
Sustentável [ENDS].
A Agenda 21 possui 40 capítulos, divididos em quatro sec-
ções distintas:
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

Dimensões socioeconómicas;
P

Conservação e Gestão de Recursos para o Desenvolvimento;


P

Reforço/Empowerment de Grupos de Influência [Major


P

Groups];
P Formas/Estratégias [Means] de Implementação.

25
Mais de 178 Países adoptaram, na Cimeira da Terra, a Agenda 21, a
Declaração do Rio e a Declaração de Princípios de Gestão Sustentável das
Florestas. [Earth Summit - Agenda 21 - The United Nations Programme
of Action from Rio -1992, New York: United Nations Reproduction Section].
26
Fonte: http://www.scielo.br [Setembro´05].
37
No Capítulo 36 trata de, uma forma exaustiva, as linhas
de acção “Promoção da educação, consciencialização
pública e formação”. Como linha de programática define
a orientação da educação para o desenvolvimento susten-
tável, enunciando o seguinte princípio de acção:
“… tanto a educação formal como a não formal são indis-
pensáveis para mudar as atitudes das pessoas de modo
a elas terem a capacidade de acesso e de resposta
às suas preocupações sobre o ambiente sustentável.
É igualmente decisiva para se chegar à consciencialização
ecológica e ética e para se alcançarem valores e atitudes,
aptidões e comportamentos compatíveis com o desenvolvi-
mento sustentável e para a eficaz participação pública
em processos de tomada de decisão [...]. [...] deverá
empregar métodos formais e não formais e meios
eficazes de comunicação” [Ponto 36.3. da Agenda 21].

Protocolo de Quioto, em 1997 - Regulamenta as emissões


Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

P

dos gases que contribuem para o efeito de estufa, visando


reduzir a emissão de dióxido de carbono, metano, óxido
nitroso, entre outros, em 5,2 % relativamente aos valores
de 1997. Espera-se atingir essa meta entre os anos 2008
e 2012. Os “mecanismos de Quioto” permitem o comércio
de emissões entre países industrializados e países em
desenvolvimento, visando a implementação em ambos
de mecanismos de tecnologias limpas.
P Conferência de Nova Iorque - “Rio+5”, 1997 - faz um
balanço dos avanços conseguidos desde a realização
da ECO’92 do Rio de Janeiro.
38
PConferência de Aarthus, em 1998 - em matéria de am-
biente, preconiza o acesso à informação e participação
do público no processo de tomada de decisão; refere
ainda o acesso à justiça, nesse domínio.
PEm Setembro de 2000, as Nações Unidas aprovam
a Declaração do Milénio onde a par do estabelecimento
de metas para a inversão da degradação ambiental, são
definidos objectivos dirigidos ao estabelecimento de um
desenvolvimento global mais equitativo e igualitário, sus-
tentado pelos valores da dignidade humana e parti-
cipação na realização do desenvolvimento.
PConferência de Joanesburgo, em 2002, 2.ª Conferência
da Terra - Conferência promovida pela Comissão das Nações
Unidas sobre o Ambiente e Desenvolvimento sob o lema
“Rio+10”, tinha por objectivo dar continuidade e avaliar
a execução dos acordos estabelecidos na Conferência
do Rio em 1992. Contou com a participação de 60 000
delegados de governos e representantes da sociedade
civil. Debruçou-se sobre o plano de acção para o desen-
volvimento sustentável, numa perspectiva de redução
de assimetrias sociais, visando a erradicação da pobreza
no Mundo, dando continuidade a preocupações de ante-
riores eventos internacionais [a execução do Protocolo
de Quioto, a liberalização do comércio, o financiamento
aos países mais pobres, etc.].
Portugal acompanhou esta evolução.
Em 1987 foi publicada a primeira Lei de Bases do Ambi-
ente - Lei n.º 11/87, de 7 de Abril, onde foram definidas
as políticas nacionais de protecção ambiental. É pela
primeira vez abordado o ambiente na sua globalidade,
perspectivando uma acção preventiva integrada.
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

Já antes, em 1971, fora criada a Comissão Nacional do


Ambiente27 a que se seguiu, no início da década de 80,
o Instituto Nacional do Ambiente [que veio mais tarde a dar
lugar ao Instituto de Promoção Ambiental]. Este Instituto pos-
suía competências na área da educação e participação am-
biental28. O Instituto de Conservação da Natureza possui com-
petências idênticas para a área da conservação da natureza.

27
De referir que elementos desta Comissão estiveram presentes na Conferên-
cia de Estocolmo, em 1972.
28
As competências deste Instituto vêm a ser integradas no Instituto
do Ambiente no início do milénio. Todavia, esta questão será desenvolvida
no enquadramento relativo à educação ambiental no capítulo III.
39
1.5.2. A Política do Ambiente na Europa
Os tratados que deram origem à Comunidade Económica
Europeia em 1957, não incluíam qualquer política ambiental.
Na sequência da Conferência das Nações Unidas sobre
Ambiente Humano de Estocolmo [1972] os Chefes de Estado
e de Governo da Comunidade Económica Europeia lançaram,
quase do zero, uma política de ambiente comunitária.
Em 1973, foi aprovado o primeiro Programa Comunitário
de Acção para a área do ambiente e lançada legislação
comunitária - sobretudo na área da prevenção e combate
à poluição e gestão de resíduos perigosos.
Com o Acto Único Europeu, em 1987, o Tratado de Roma
foi alterado pela introdução de um novo objectivo associado
à política do ambiente.
Já após a Conferência do Rio [1992] e da Agenda 21, em
1997 com o Tratado de Amesterdão, o desenvolvimento sus-
tentável passou a integrar os objectivos da União Europeia.
No dia 1 de Janeiro de 1986, Portugal deu entrada na
Comunidade Económica Europeia, o que também significou
a adesão do país aos objectivos e estratégias preconizados
pela Europa na área do Ambiente.
Nos últimos 30 anos, a União Europeia procurou assumir
um papel de liderança na política de ambiente. Desde muito
cedo, Portugal teve uma participação activa em diversos
grupos de trabalho, comissões, e plenários europeus, trans-
pondo para o direito nacional os desafios preconizados
para a Europa.
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

40
Entre as acções desenvolvidas na área do ambiente pela
União Europeia destaca-se:
“ Os seis programas comunitários de acção que se torna-
P

ram importantes documentos de referência e de estabele-


cimento de padrões na política de ambiente quer a
nível comunitário quer a nível internacional;
P O combate a várias formas de poluição e a regulamen-
tação rigorosa da utilização, transporte e destino final
dos resíduos perigosos;
P A preocupação com a defesa da biodiversidade europeia
que se traduziu na aprovação da Directiva Habitas e na
criação da Rede Natura 2000 que pretende preservar para
as gerações futuras as espécies e habitats mais represen-
tativos a nível europeu;
P A sensibilização e promoção da participação dos cidadãos
europeus na elaboração e na execução da política de am-
biente, que se traduziram na realização da campanha
do Ano Europeu do Ambiente em 1987 e na aprovação
de várias directivas relativas ao acesso à informação
e à participação dos cidadãos;
P A criação, em 1994, da Agência Europeia do Ambiente,
com sede em Copenhaga, que funciona como um centro
de recolha e tratamento de informação, na área do
ambiente, de modo a sustentar as decisões a tomar pela
União Europeia e Estados-Membros;
P A introdução da exigência de avaliação de impacte
ambiental prévia, para os projectos de determinada dimen-
são, recentemente alargada a planos e programas;
A aposta na produção de energias renováveis, resultante
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

P

do envolvimento empenhado da União Europeia nas nego-


ciações da Convenção das Nações Unidas sobre alterações
climáticas e do Protocolo de Quioto, através da aprovação
de legislação que estabeleceu metas comunitárias e nacio-
nais para as energias renováveis, e a criação de sistema
de incentivos para a respectiva produção;
P A utilização de parte dos fundos estruturais no inves-
timento em infra-estruturas na área do ambiente;
P O papel que a União Europeia tem tido na ajuda aos
países em desenvolvimento e na promoção do respectivo
desenvolvimento sustentável;
41
P A liderança exercida nas várias reuniões internacionais
[Conferência do Rio em 1992 e Conferência de Joanesburgo
em 2002] e na negociação dos vários instrumentos
jurídicos internacionais na área do ambiente permitindo
que, na generalidade, estes instrumentos assumissem
um carácter mais exigente”29.
Apesar destas e de outras acções desenvolvidas pela União
Europeia e onde estiveram implicados os seus Estados-
-Membros, foi diverso o alcance e a exigência de cada
Estado-Membro em relação aos instrumentos jurídicos apro-
vados. Por outro lado, a falta de integração das preocupações
ambientais em outras áreas políticas - como por exemplo
a indústria, a agricultura, o turismo, ou, ainda, os transportes
e a construção de infra-estruturas - levou a progressos
pouco significativos em alguns âmbitos de acção e países.
Acresce, ainda, a emergência de novas temáticas, que
é importante ponderar, como as relações entre o ambiente
e a saúde ou organismos geneticamente modificados, entre
outros.
Mesmo assim, a União Europeia assumiu novas iniciativas
que pretendiam minimizar as “disfunções ambientais que
colocam em perigo o funcionamento global do ecossistema
Terra ... a principal ameaça sendo as alterações dramáticas
em curso no Clima”30.

1.6. Linhas Orientadoras da União Europeia face aos


Resíduos
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

A integração de Portugal na União Europeia veio contribuir


para o estreitamento das metas protectoras do ambiente
e, no caso particular dos Resíduos Sólidos Urbanos, para
um compromisso efectivo na redução de resíduos a elimi-
nar, favorecendo-se deste modo a protecção primária [que
inclui a reutilização] e a protecção secundária [a recicla-
gem, entre outros factores].

29
SOROMENHO MARQUES, V. et al. Cidadania e Construção Europeia. Lisboa,
Ideias e Rumos, 2005, p. 190.
30
PIMENTA, Carlos. A Política de Ambiente da União Europeia - Evolução
e Desafios, 2005.
42
Evolução da Produção e Destino Final RSU Portugal
[1995-2004]

[Fonte: PERSU II. 2006]

Foram vários os Decretos-Leis e Portarias que vieram transpor


para o direito nacional as directivas comunitárias inerentes
a esta problemática. Assim:
P Decreto-Lei n.º 366-A/97, de 20 de Dezembro - Transpõe
para a ordem jurídica interna a Directiva 94/62/CE,
do Parlamento e do Conselho Europeu, de 20 de Dezembro
de 1994. Estabelece os princípios e as normas aplicáveis
à gestão de embalagens e resíduos de embalagens, com
vista à prevenção da sua produção, à reutilização
de embalagens usadas, à reciclagem e a outras formas
de valorização com consequente redução da sua elimi-
nação final, assegurando um elevado nível de protecção
do ambiente. Visa, igualmente, garantir o funcionamento
do mercado interno e evitar entraves ao comércio, dis-
torções e restrições da concorrência na Comunidade
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

Europeia. Este diploma sofre alterações através do De-


creto-Lei n.º 162/2000, de 27 de Julho e Decreto-Lei
n.º 92/2006, de 25 de Maio;
P Decreto-Lei n.º 162/2000 - Altera os artigos 4.º e 6.º
do Decreto-Lei n.º 366-A/97, de 20 de Dezembro, que
estabelece os princípios e as normas aplicáveis ao Sistema
Integrado de Gestão de Embalagens e de Resíduos de Em-
balagens - SIGRE;
P Decreto-Lei n.º 92/2006, de 25 de Maio - Este diploma
transpõe para a ordem jurídica portuguesa a Directiva
2004/12/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho,
43
de 11 de Fevereiro, a qual revê o quantitativo dos objecti-
vos a atingir pela valorização e reciclagem de resíduos.
Altera o Decreto-Lei n.º 366-A/97, de 20 de Dezembro;
P Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro - Aprova
o regime geral da gestão de resíduos e transpõe para
a ordem jurídica portuguesa a Directiva 2006/12/CE,
do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril,
relativa aos resíduos e a Directiva 91/689/CEE, do Conselho
da Europa, de 12 de Dezembro, relativa aos resíduos
perigosos. Neste diploma são definidos os princípios gerais
da gestão de resíduos: o princípio da auto-suficiência,
o da responsabilidade pela gestão, o da prevenção e da
redução, o da hierarquia das operações de gestão de resí-
duos, o da responsabilidade do cidadão, o da regulação
da gestão de resíduos e o princípio da equivalência.
O art.º 3.º deste diploma apresenta, de forma desen-
volvida, as definições de referência associadas ao regime
geral de gestão de resíduos. Este Decreto-Lei revoga
o anterior diploma regulador do sector - Decreto-Lei
n.º 239/97, de 20 de Dezembro;
P Directiva 2004/12-CE, 18 de Fevereiro - Actualiza a Directi-
va 94/62/CE e estabelece as metas a cumprir pelos
Estados-Membros da União Europeia, no âmbito da re-
ciclagem de resíduos de embalagem até 2008 [prazo este
prorrogado para Portugal até 2011], bem como reforça
a ideia da prevenção primária, pela promoção de políticas
internas em cada Estado-Membro incidindo na redução
e reutilização desses resíduos;
P Até 31 de Dezembro de 2011 serão valorizados ou incine-
rados em instalações de incineração de resíduos com recupe-
ração de energia no mínimo, 60 % em peso dos resíduos
de embalagens. Até 31 de Dezembro de 2011 serão
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

reciclados no mínimo 55 %, e no máximo 80 % em peso,


para cada material de embalagem. Neste último âmbito,
e de acordo com a Directiva 2004/12/CE, de 18 de Feve-
reiro todos os Estados-Membros da União Europeia têm de
atingir metas de valorização e reciclagem, transpostas para
Portugal pelo Decreto-Lei n.º 92/2006, de 25 de Maio.
Assim, até 31 de Dezembro de 2011, o nosso País deve
atingir os seguintes objectivos mínimos de reciclagem para
os materiais contidos nos resíduos de embalagens:
P60 % em peso para o vidro;
P 60 % em peso para o papel e cartão;
44
P 50 % em peso para os metais;
P22,5 % em peso para os plásticos, contando exclu-
sivamente o material que for reciclado sob a forma
de plástico;
15 % para a madeira.
P

No entanto, para Portugal, estes objectivos afiguram-se como


muito ambiciosos [sobretudo no que diz respeito à fracção
das embalagens de metal e plástico] considerando o prazo
estipulado.
No Município de Lisboa, as taxas de reciclagem alcançadas
no ano de 2005 foram as seguintes:
P 34 % para o vidro;
P 25 % para as embalagens de papel/cartão [29 % para
o papel - fracção não embalagem];
P 6 % para os metais;
P e, 5 % para o plástico.
Mesmo no caso dos subsistemas de recolha selectiva porta-
-a-porta implementados na cidade de Lisboa, nos quais
o rácio é mais favorável, as melhores taxas de reciclagem
obtidas foram as seguintes: 44 % para as embalagens
de papel/cartão, 17 % para as embalagens de plástico
e 31 % para as embalagens de metal.
Para se alcançarem as taxas de reciclagem estipuladas,
é fundamental entre outras medidas:
P Aumentar a adesão da população;
P Incrementar a qualidade dos materiais depositados
selectivamente.
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

Resíduos Sólidos recolhidos por Habitante

Fonte: www.ine.pt [Julho 2007]

45
Para atingir esses objectivos é importante a realização
de campanhas de sensibilização, que se pretendem concertadas,
continuadas e esclarecedoras dos materiais a depositar
e a evitar, e ainda, intensificar a recolha porta-a-porta de
RSU junto das entidades consideradas “Grandes Produtores”.
O aumento das taxas de reciclagem de embalagens e resí-
duos de embalagem está, igualmente, dependente da altera-
ção das limitações actualmente existentes ao nível da triagem
de determinadas embalagens de plástico e do seu escoa-
mento para reciclagem.

1.7. A Política dos três R´s


“Agir localmente, pensando globalmente” é o princípio
orientador de muitos projectos concretizados e a concretizar
no âmbito da formação de uma cidadania interveniente
para uma gestão ecológica e racional dos resíduos sólidos
através da prática dos 3 R's: Reduzir, Reutilizar e Reciclar.
A chamada Política dos três R's [3 R's], saída da Conferência
do Rio de Janeiro, foi adoptada como prioridade comunitá-
ria para a prevenção, tratamento e valorização dos resíduos.
A abordagem destas temáticas no âmbito da educação
das populações prende-se, essencialmente, com a percepção
de que é na Redução, Reutilização e Reciclagem que
os cidadãos mais poderão agir, em termos da conservação
da qualidade do ambiente.
Entendem-se, pois, como medidas preventivas na gestão
de resíduos a redução da sua produção [quer por parte
dos consumidores, quer nos processos industriais e comerciais
de colocação dos produtos no mercado], a redução da noci-
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

vidade dos resíduos, nomeadamente através da reutili-


zação e da alteração dos processos produtivos, por via
da adopção de tecnologias mais limpas. É, também, enten-
dida como medida preventiva a sensibilização dos agentes
económicos e dos consumidores.
Estas medidas, pedra base das prioridades de acção da União
Europeia, foram transpostas para a realidade portuguesa pelo
Plano Estratégico de Resíduos Sólidos Urbanos [PERSU].
Temos assim, a nível nacional:
P Medidas de prevenção primária - redução, reutilização
e educação das populações;
46
P Medidas de prevenção secundária - protecção dos operado-
res, dos sistemas de resíduos e protecção da saúde pública;
P Medidas de prevenção terciária - não confinar resíduos
que sejam passíveis de valorizar quer através de processos
de reciclagem, quer através da valorização energética;
Para melhor se entender, do ponto de vista da actuação
dos cidadãos, no que consiste a política dos 3 R's
desenvolvemos, em seguida, perspectivas práticas do que
pode ser a redução, reutilização e participação na recicla-
gem dos resíduos por parte da população.

1.7.1. Reduzir
A melhor forma de minimizar os efeitos negativos dos resí-
duos no ambiente é a diminuição da sua produção, bem
como a redução ou eliminação de produtos geradores
de poluição [por ex.: resíduos perigosos]. Pode falar-se
de redução a vários níveis - industrial, agrícola, etc.
Reduzir é a primeira forma de minimizar os impactes cau-
sados quer pelos quantitativos de resíduos, quer pela sua
toxicidade. As indústrias podem fazer muito para minimizar
o impacte ambiental dos seus produtos através da utilização
de novas tecnologias, do eco-design do produto e pela
opção de materiais com menor toxicidade.
O consumidor tem um papel fundamental. Pode evitar consu-
mos supérfluos e exprimir junto das entidades responsáveis
a sua opinião quanto ao tipo de produtos que são postos
à venda no mercado.
O consumidor é um dos agentes mais importantes na
redução da quantidade de RSU, ao tomar atitudes que
contribuam para a não produção de resíduos, de que são
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

exemplo:
POptar por produtos reciclados, biodegradáveis, recarregáveis
e de tamanho familiar e evitar os produtos descartáveis.

47
Rótulos
A preocupação com o ambiente começa a ser um factor
relevante na decisão de compra, cada vez mais, um acto
esclarecido por parte dos consumidores. Estes são cada vez
mais exigentes e procuram o máximo de informação sobre
os produtos antes de os adquirir.
Os símbolos e menções nos produtos não garantem, só por si,
que sejam mais “verdes” ou ecológicos.

É o único símbolo ecológico oficial. Indica que


Comunitário

o produto tem um impacto reduzido no seu ciclo de vida,


Ecológico
Rótulo

atendendo a critérios como a poluição do ar, da água,


a utilização de matérias-primas, o consumo de energia,
os resíduos de pesticidas, de metais pesados, etc.

Indica que o fabricante, embalador ou distribuidor


Ponto Verde

contribui financeiramente para o sistema de recolha


selectiva e de valorização dos resíduos de embalagens
instituído pela Sociedade Ponto Verde.
Biodegradável Não contém CFC's

Indica que o produto não tem CFC's


[Clorofluorcarbonetos], um gás propulsor acusado
de destruir a camada de ozono. Desde Janeiro de 1995
que este tipo de gás é proibido nos aerossóis.
Biodegradável

Indica que o produto é biodegradável.


Cumpre a lei que impõe que 90 % dos agentes
tensioactivos sejam biodegradáveis em 28 dias.

Este símbolo tem dois significados:


indica que a embalagem é reciclável [mas não garante
Reciclável

que seja reciclada por ainda não existir entidade


que desenvolva o processo], ou que o produto
ou embalagem contém materiais reciclados.
Reciclado

Este símbolo indica que o produto foi obtido através


Os problemas ambientais e a consciência ecológica

Reciclado

de material recuperado. Diminui-se a quantidade


de resíduos, poupam-se recursos naturais e energéticos.

A Redução é a melhor forma de diminuir os efeitos


negativos dos resíduos no ambiente.
Reduzir

Evitar consumos desnecessários e rejeitar o excesso


de embalagens são exemplos de redução.
Este símbolo indica que o produto poderá ser utilizado
Reutilizável

de novo, com o mesmo ou com outros fins diferentes


daquele que o originou. Permite a diminuição da
quantidade dos resíduos domésticos a eliminar.

[Fonte: DECO/PróTeste, Revista Fórum Ambiente e IPAMB]

48
Este símbolo indica que o produto favorece

Comburente* Corrosivo*
a inflamação de matérias combustíveis.
Pode provocar incêndios. Pode explodir quando
misturado com matérias combustíveis.
Este símbolo indica
que o produto pode provocar queimaduras.

Este símbolo indica que o produto

Inflamável* Inflamável*
é facilmente inflamável. Em contacto com o ar
é espontaneamente inflamável. Em contacto com a água
liberta gases extremamente inflamáveis.

Extramente
Extremamente inflamável

Este símbolo indica que o produto é nocivo por


Xn inalação, em contacto com a pele e por ingestão.
Pode causar danos nos pulmões se ingerido. Possibilidade

Nocivo*
de efeitos irreversíveis muito graves. Riscos de efeitos
graves para a saúde em caso de exposição prolongada.
Possíveis riscos de comprometer a fertilidade e, durante
a gravidez, de efeitos indesejáveis na descendência.
Xi
Este símbolo indica que o produto é irritante
Irritante*

para os olhos, para as vias respiratórias e para a pele.


Risco de lesões oculares graves.

Este símbolo indica que o produto é muito tóxico para


o Ambiente* de Explosão*
Perigo para

os seres aquáticos, para as plantas e animais, organis-


mos presentes no solo e insectos. Pode causar efeitos
nocivos no ambiente. Pode destruir a camada de ozono.

Este símbolo indica que o produto pode explodir


Perigo

em estado seco, em caso de choque, fricção,


fogo ou perante outras fontes de ignição.
Este símbolo indica que o produto é tóxico por
inalação, em contacto com a pele e ingestão.
T
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

Pode causar efeitos irreversíveis muito graves.


Riscos graves para a saúde em caso de exposição
Tóxico*

prolongada. Pode causar doenças cancerígenas, por


contacto ou inalação. Pode ocasionar alterações genéticas
hereditárias e comprometer a fertilidade. Riscos durante
a gravidez com efeitos adversos na descendência.
T+ Este símbolo indica que o produto
Muito Tóxico*

é muito tóxico por inalação, em contacto com a pele


e ingestão. Pode causar efeitos irreversíveis muito
graves, mesmo por inalação.

[*] De acordo com a Portaria n.º 732-A/96, de 11 de Dezembro e a Portaria n.º 1159/97,
de 12 de Novembro. [Fonte: Miguel, Alberto Sérgio S. R., Manual de Higiene e Segurança
do Trabalho, 5.ª Ed., Porto Editora]
49
PNo quotidiano praticar gestos simples que estão ao alcance
de todos os cidadãos, de que são exemplo:
A utilização do papel de ambos os lados da folha;
P

A utilização na cozinha de panos em vez de toalhas


P

de papel;
Optar por produtos feitos de papel reciclado;
P

Utilizar sacos de pano ou rede para as compras em vez


P

de sacos de plástico ou de papel;


Escolher produtos embalados em vidro, dado que estas
P

embalagens são facilmente recicladas;


Preferir vasilhame com depósito em vez de tara perdida;
P

Utilizar sempre que possível a electricidade em vez


P

de pilhas;
Usar pilhas recarregáveis e com baixo teor de mercúrio;
P

Colocar lâmpadas compactas fluorescentes, porque duram


P

mais e gastam 25 % da energia despendida por uma


lâmpada incandescente;
Lavar a frio na máquina da roupa e da louça, porque
P

permite economizar 75 % de energia na máquina da


roupa e até 90 % na máquina da loiça;
Comprar pneus mais duradouros e mantê-los com a pres-
P

são correcta, dado que permite poupar gasolina e impede


o seu desgaste prematuro.
Estes esforços conjugados permitem reduzir a utilização
de recursos naturais na produção de bens de consumo.

1.7.2. Reutilizar
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

Reutilizar é uma noção que sempre esteve associada


à prática da humanidade até à afirmação da sociedade
de consumo, uma vez que a predominância diária dos povos
e populações era a da gestão da escassez de recursos, fossem

50
eles económicos ou naturais. “Naturalmente” as pessoas
reutilizavam o vestuário, o calçado, passando-os de pais para
filhos e entre irmãos; usavam “até quase ao impossível”
o papel, o qual acabava muitas vezes a ensopar fritos;
vendiam ao ferro-velho, o que já não tinha utilidade, etc.
Hoje vivemos na sociedade do comprar e deitar fora, sendo
este um valor de consumo apregoado pela publicidade e,
muitas vezes, visto como sinónimo de aquisição de status
social. O reutilizar adquiriu uma conotação negativa,
incentivando o “usar e deitar fora”, o que teve efeitos
directos na quantidade de resíduos rejeitados/produzidos pelo
consumidor. É assim que se impôs um novo reconheci-
mento desta prática ancestral através da sua integração
na política dos 3 R's. Nesta óptica Reutilizar:
P “É aquilo que pode ser usado várias vezes [as garrafas
de vidro, por exemplo, ou as caixas de ovos] antes dos
materiais serem reciclados, queimados para reaver
energia, ou simplesmente deitados fora”31;
P “Utilizar um produto mais de uma vez para o mesmo fim
para que foi concebido. Fala-se normalmente de reutili-
zação no caso das embalagens, que são projectadas para
perfazer um número mínimo de viagens ou rotações
no seu ciclo de vida. É o caso das garrafas de vidro com
tara”32.
A reutilização assume particular importância nos proces-
sos de fabrico e, fazendo um balanço ambiental desta
opção versus reciclagem, pode afirmar-se que, por exemplo
para o vidro, a poupança de energia33 lhe é favorável
em cerca de 30 %.
Optar por produtos reutilizáveis diminui, a curto prazo,
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

a quantidade de lixo doméstico a eliminar. Deste modo,


um consumidor atento e responsável avalia as vantagens
da utilização de embalagens reutilizáveis e opta pela sua
aquisição.

31
ELKINGTON, John; HAILES, Júlia. Guia do Jovem Consumidor Ecológico.
Lisboa: Gradiva Jovem.
32
In: Guia do BCE, 1995 e 1996 - CML-DHURS.
33
Os indicadores utilizados são: para a garrafa retornável - transporte e
lavagem; para a garrafa reciclada - transporte do casco, tratamento
[limpeza e fragmentação], fusão, produção e transporte [cfr. MARTINHO,
M.ª da Graça.; GONÇALVES, M.ª da Graça P. Gestão de Resíduos. Lisboa:
Universidade Aberta, 2000, p. 136].
51
Deixamos algumas sugestões e dicas sobre práticas de reu-
tilização associadas aos resíduos:
P Os frascos de vidro ou de plástico, podem ser reutilizados
para armazenar bebidas, ingredientes, parafusos, pregos,
como porta-lápis ou como jarra para flores;
P As caixas de cartão podem ser reutilizadas para arma-
zenar roupa, calçado, louça, revistas e livros;
P Os envelopes em bom estado podem ser reaproveitados,
colando etiquetas por cima do que estiver escrito;
P A roupa pode ser oferecida a quem precisa ou transfor-
mada em panos e esfregões;
“Utilização do lixo
[isto é, P As latas podem ser utilizadas como vasos para plantas
vidro, metais, ou recipientes para guardar objectos domésticos;
plástico, papel,
restos de comida] P Alguns componentes de computadores obsoletos podem
para que possa ser ser reutilizados para fazer melhorias noutros computa-
transformado em dores, tais como: placas gráficas, placas de memória, discos
qualquer outra coisa rígidos, fontes de alimentação, placas de som, proces-
com utilidade
[por exemplo, garrafas, sadores, cabos, dissipadores, torre do computador, etc.
latas, plástico, papel,
composto para34
a agricultura]” . 1.7.3. Reciclar
A reciclagem é um processo de transformação física, química
ou biológica que permite valorizar um determinado resíduo,
convertendo-o num novo bem de consumo.

Evolução da Composição dos Resíduos Sólidos Urbanos


produzidos em Portugal35
2000 2003
[%] [%]
Matéria Orgânica 35.9 29.7
Papel/Cartão 27.3 26.4
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

Plástico 11.1 11.1


Vidro 5.6 7.4
Têxteis 3.4 2.6
Metal 2.4 2.8
Madeira 0.3 0.5
Finos 11.9 14.3
Outros 5.7 5.4

34
ELKINGTON, John; HAILES, Júlia. Guia do Jovem Consumidor Ecológico. Lisboa:
Gradiva Jovem.
35
MAOT. Relatório do Estado do Ambiente em Portugal 2000. Lisboa: MAOT,
2003. e MAOT. Relatório do Estado do Ambiente em Portugal 2003. Lisboa:
MAOT 2005.
52
Vantagens da Reciclagem de Materiais

Matérias-Primas Energia Ar Água


“O consumo de energia “A poluição “O consumo de
no processo de fabrico atmosférica reduz água no processo
reduz em ...” em ...” diminui em ...”
Poupa o abate
Papel* 2 a 3 vezes 50 a 200 vezes
de 15 a 20 árvores
Evita a extracção
Vidro* 32 % 50 %
de 400 kg de areia
Reduz
Metal 95 % 95 % 95 %
a extracção de Bauxite
[*] Por tonelada de material reciclado

Estando na ordem do dia e contrariamente ao que se possa


pensar, a reciclagem enraíza na história onde foram actores
centrais [por exemplo] ferros-velhos, ferreiros, produtores
de papel. Estes artesãos andaram de mãos dadas, desem-
penhando um papel parecido ao das nossas modernas
estações de triagem de resíduos e indústrias de reciclagem.
O ferro-velho ia pelas ruas, pelas cidades, de porta-em-
-porta, comprava o que já não era útil e depois, levava
o produto do seu trabalho até junto daqueles que
o transformavam e produziam novos produtos, fossem eles
o papel [a partir dos tecidos, ...] ou novos objectos em ferro.
A actual tecnologia e dinâmicas da sociedade moderna
requerem processos mais sofisticados. Já se não recicla
apenas o papel e o ferro. Hoje em dia é comum afirmar-
-se que tudo é reciclável, sendo as fronteiras do não-
-reciclável voláteis e susceptíveis de alteração decorrente
da descoberta de novas tecnologias amigas do ambiente
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

e que permitam tornar atractiva a reciclagem a deter-


minado sector para o capital. Desta forma, o que neste
momento ainda é colocado no contentor de deposição
indiferenciada de resíduos, amanhã poderá vir a ser
objecto de uma recolha específica de material.
Para o desenvolvimento do sector da reciclagem também
não é indiferente, o balanço negativo entre os processos
de reciclagem de resíduos e o seu envio para valorização.
Para que a reciclagem seja possível é necessário que se
separem os resíduos por tipos, os quais são posteriormente
encaminhados para indústrias transformadoras que os vão
53
incorporar nos seus processos produtivos. Deste modo,
salvaguardam-se recursos naturais [uma vez que os resí-
duos os substituem ou complementam], há uma maior
poupança de água e de energia ao mesmo tempo que é
menor a carga poluente dos efluentes dos processos
produtivos, quando comparados com os resultantes
da produção dos mesmos bens a partir, exclusivamente,
das matérias-primas virgens.
Reciclar é:
“Recolher é transformar um resíduo de modo a que este
possa ser novamente utilizado, quer para o mesmo fim,
quer para um fim distinto do original”36.
Na actual sociedade, as embalagens constituem uma parcela
importante associada ao consumo [em 2003 representavam
71,4 % dos resíduos produzidos em Portugal], constituindo
uma das principais fontes de reciclagem.
À semelhança da redução e da reutilização de resíduos,
o consumidor tem um papel primordial na reciclagem dos
resíduos. Da sua participação na recolha selectiva de resí-
duos depende a quantidade de materiais enviados para
reciclagem, a que estão associadas vantagens ambientais
significativas. Estas vantagens são avaliadas através de variá-
veis diversas as quais são determinadas pelo tipo de resí-
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

duo e materiais a produzir, características e finalidade


do produto e matérias-primas envolvidas no seu fabrico37.
No processo avaliativo são, normalmente, ponderados
os seguintes aspectos na produção de bens obtidos através
da integração de matérias-primas provenientes da reciclagem:
P A poupança na quantidade das matérias-primas consumidas;
P A economia na energia despendida;

36
In: Guia do BCE 1995 e 1996 - CML-DHURS.
37
Para informação mais desenvolvida, ver o ponto 4.1.2. do presente capítulo,
onde é abordada a reciclagem de uma forma mais alargada.
54
P A diminuição da poluição atmosférica;
P A redução no consumo de água associado à produção
do bem.
Tornar perceptível a relação entre a prática individualizada
do cidadão na deposição selectiva de resíduos e a redução
dos impactes ambientais traduz-se, normalmente, no uso
de unidades de medida que tornam esta associação mais
tangível e perceptível.
Para obter estas vantagens ambientais, a colaboração
na recolha selectiva é central. Desta forma:
P Os resíduos devem ser separados e depositados por tipo
de material: papel, vidro, embalagens de metal, plástico
e cartão para líquidos alimentares e pilhas e depositados
no equipamento adequado;
P Todos os resíduos encaminhados para reciclagem devem
apresentar-se limpos, vazios, espalmados e sem tampa.

1.8. A prevenção na produção dos RSU`S


1.8.1. Aspectos gerais
Os elevados níveis de consumo da sociedade moderna têm
contribuído para uma crescente produção de RSU'S, o que
implica a adopção de medidas urgentes conducentes
à redução da produção de resíduos, pelo que é necessário
intervir ao nível da prevenção da produção de resíduos,
quer em termos quantitativos, quer em termos qualitativos.

Produtos/Materiais Resíduos

Eliminação
Valorização Confinamento
e Redução Reutilização Reciclagem
Energética Técnico
na Fonte

Prevenção de Resíduos

Minimização de Resíduos Eliminação

Estratégia de Prevenção dos Resíduos [Adaptado de Almeida, C., 2006]

55
Segundo Barros, N. [2006], a hierarquização da gestão dos
resíduos deveria ser a seguinte: Prevenção [Redução], seguida
da Reutilização, Reciclagem Multimaterial e Orgânica, Valo-
rização Energética e finalmente Confinamento Técnico.
A redução quantitativa dos resíduos pode ser conseguida
através da eliminação e redução dos resíduos na fonte e da
reutilização de produtos.
A redução qualitativa pode ser alcançada através do incentivo
à redução da perigosidade dos resíduos.

1.8.2. Estratégias para a prevenção


1.8.2.1. Estratégias Nacionais e Regionais/Locais
Segundo Pinheiro, L. [2006], a Estratégia Nacional para
a Prevenção na Produção de Resíduos tem como objectivo
final a diminuição dos quantitativos produzidos e a sua
perigosidade. Esta Estratégia irá consistir no seguinte:
P Aplicação do princípio da responsabilidade do produtor;
P Adopção de medidas regulamentares e normativas;
P Acordos voluntários com sectores económicos;
P Reforço da aplicação do princípio do poluidor-pagador:“Pay
as you Throw” e taxas;
P Sensibilização dos produtores e da população em geral.
A aplicação do princípio da responsabilidade do produtor
depende da:
P Existência de entidades gestoras, licenciadas para os diversos
fluxos de resíduos [Embalagens e Resíduos de Embalagens,
Resíduos de Equipamentos Eléctricos e Electrónicos e Pilhas
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

e Acumuladores];
P Definição de objectivos de reutilização; normalizar as embala-
gens e os resíduos de Equipamentos Eléctricos e Electrónicos;
P Substituição de substâncias perigosas por outras menos
poluentes na fase de concepção dos produtos;
P Recorrer ao eco-design e à utilização de tecnologias mais
limpas nos processos produtivos.
A adopção de medidas regulamentares e normativas consiste
em estipular objectivos de prevenção, tais como: Estabilizar
a capitação da produção de RSU's e separar na origem
56
os resíduos perigosos presentes nos RSU's; Reforçar metas
de reutilização no canal Horeca; Incentivar a compostagem
caseira; Desmaterializar [ex: SIMPLEX], Implementar legis-
lação e procedimentos de consumo sustentáveis; e Implemen-
tar medidas de gestão de RSU'S ao nível da Administração
Pública Central e Local [Pinheiro, L., 2006].
Relativamente à Aplicação do princípio do poluidor-pagador
“Pay as you Throw”, o Instituto dos Resíduos propõe um
sistema diferenciado de tarifação fixo e variável, consoante
os destinos.
Para a sensibilização dos produtores e da população em
geral, o Instituto dos Resíduos propõe a realização de uma
Campanha Nacional de Comunicação, elaboração de dossiers
temáticos no âmbito escolar e incentivos à realização
de projectos inovadores.
A Associação das Cidades para a Reciclagem [ACR+] lançou
recentemente um projecto ambicioso intitulado “Produzir
menos 100 kg/habitante/ano”. A LIPOR, como membro
desta Associação, está a implementar este projecto na área
metropolitana do grande Porto, que irá ter uma duração
de dois anos [2006-2008].
Segundo Barros, N. [2006], a estratégia para implementar
a Prevenção e a Redução da Produção e da Perigosidade
dos RSU's tem de assentar:
P No estabelecimento de parcerias entre todos os agentes
envolvidos na gestão de RSU's;
P Na promoção de tecnologias mais limpas;
P Na reutilização de produtos;
No estabelecimento de limites para a utilização de produ-
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

tos que contenham substâncias perigosas com o objectivo


de reduzir a perigosidade dos resíduos;
P No eco-design;
P Na utilização de instrumentos económicos;
P Na análise do ciclo de vida do produto.
Com estas medidas, poderá verificar-se a redução dos custos
associados à gestão e tratamento de Resíduos. No entanto,
dever-se-á investir no incentivo à participação dos cidadãos
e da comunidade em geral, apelando à adopção de boas
práticas tendo como objectivo o consumo sustentável.
57
Neste tipo de projecto as áreas de impacto vão ser as
seguintes: prevenção na produção de resíduos orgânicos,
indiferenciados e recicláveis; redução da perigosidade dos
resíduos, desenvolvimento económico sustentável, redução
de impactes na saúde pública, realização de campanhas
concertadas e bem definidas para comunicação com
a comunidade-alvo do projecto [população em geral,
escolas, associações locais; comércio e serviços, indústria,
etc.] e sensibilização e envolvimento de todos os parceiros.
A redução da produção de RSU's em casa, pode ser alcan-
çada de diversas formas:
P Privilegiando a compra de produtos com menos emba-
lagens, produtos concentrados e embalagens familiares;
P Adquirindo bebidas em embalagens de vidro com retorno;
P Evitando a utilização de sacos de plástico fornecidos pelos
estabelecimentos comerciais, reutilizando-os para acondicio-
namento dos RSU's;
P Consumindo água da torneira;
P Fazendo compostagem caseira dos resíduos biodegra-
dáveis da cozinha e do jardim;
P Reparando e reutilizando objectos e roupa e finalmente
promovendo a desmaterialização.
Na implementação de um programa de Prevenção da Pro-
dução de RSU's, a Catalunha definiu como prioritárias
as seguintes áreas de intervenção: taxas de tratamento
e deposição de RSU'S, aplicação de taxas relacionadas com
a produção de resíduos, parcerias entre todos os agentes
envolvidos na gestão dos resíduos, realização de várias
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

campanhas de incentivo à aquisição de produtos reciclados


e a revisão dos programas sobre resíduos [Chiva, P., 2006].
Para encorajar a prevenção e a reciclagem, a Catalunha
impôs as seguintes taxas: €10/ton. pela deposição em aterro,
€5/ton. pela incineração, €3/ton. pela deposição de resí-
duos de construção e demolição em aterros específicos.
Definiu ainda como áreas prioritárias: a compostagem caseira;
a prevenção na produção de resíduos em festivais e eventos
públicos; a redução de anúncios gratuitos; a promoção
da reutilização dos equipamentos e dos produtos; a redução
do consumo e do tamanho das embalagens; o incentivo
58
à realização dos mercados de artigos em segunda mão;
e a realização de campanhas de sensibilização concertadas
que alertem para a prevenção na produção dos resíduos
e para as boas práticas visando o consumo sustentável
[Chiva, P., 2006].

1.8.2.2. A prevenção na produção dos Resíduos


no Sector Industrial
Nos diversos sectores industriais a prevenção na produção
de resíduos também deve ser assumida como uma priori-
dade, dado que a minimização da produção de resíduos
e da sua perigosidade, permite em simultâneo poupanças
financeiras e salvaguarda dos recursos naturais. A estra-
tégia para a prevenção pode ser adoptada na altura
da concepção da embalagem e do produto, na definição
das matérias-primas a utilizar [recicladas ou menos
poluentes], no equipamento mecânico ou eléctrico utilizado
no processo produtivo, etc.
Se os industriais optarem por intervir ao nível da concepção
da embalagem existem várias análises que devem ser feitas,
nomeadamente qual o melhor material para embalar
o produto em questão [plástico, vidro, metal, cartão,
madeira, etc.].
Seguidamente apresentam-se algumas vantagens inerentes
à utilização dos diferentes materiais e exemplos de diversas
indústrias que definiram estratégias para a prevenção, que
entretanto foram implementadas e que se vieram a traduzir
em evidentes benefícios para essas empresas do ponto
de vista da imagem do produto, económico e ambiental,
uma vez que se verificou redução dos custos da embalagem
e dos custos logísticos associados e ainda permitiu gerar
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

ganhos de eficiência
Recentemente muitas foram as empresas que introduziram
optimizações na concepção das embalagens primárias,
sobretudo ao nível da sua dimensão e peso. A concepção
das embalagens passou a ser vista pelos industriais como
um ponto estratégico de investimento.

1.8.2.3. As embalagens
Por definição, uma boa embalagem é aquela que consegue
proteger e conservar o produto, ao mesmo tempo que
informa o consumidor, diferencia a marca e permite,
59
em fase pós-consumo, a sua reutilização, valorização
[ex: energética] ou fácil reciclagem [Media Monitor - Especial
Embalagem, Julho de 2005].
A embalagem pode ser dividida em 3 géneros:
P Embalagem primária: foi feita de modo a constituir uma
unidade de venda para o utilizador final ou consumidor
em qualquer estabelecimento comercial;
P Embalagem secundária: constitui uma grupagem de deter-
minado grupo de embalagens, quer sejam vendidas ao
consumidor final ou ao estabelecimento comercial;
P Embalagem terciária: facilita a movimentação e o transporte
de uma série de unidades ou embalagens agrupadas,
evitando danos físicos durante a movimentação e trans-
porte.
Segundo a Media Monitor - Especial Embalagem [Julho de
2005], o princípio de que uma embalagem reutilizável,
e portanto normalizada, é sempre preferível está errado,
uma vez que a normalização limita a criatividade das
marcas. Em termos económicos e ambientais, a reutilização
pode, eventualmente, também não ser a melhor solução.
A embalagem de tara perdida que colocamos habitual-
mente nos vidrões pode ser valorizada através da recicla-
gem, compostagem ou valorização energética, o que não
acontece com a embalagem reutilizável. Por outro lado, as
embalagens reutilizáveis precisam de aumentar os seus
níveis de resistência, o que implica a utilização de mais
matéria-prima, podendo tornar-se mais dispendiosa do que
a de tara perdida, uma vez que acarreta custos adicionais
no processo produtivo. Por outro lado, uma embalagem
reutilizável utiliza pouco transporte ao nível local ou
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

regional. No entanto, se se efectuar o transporte de uma


região para outra ou até mesmo para outro país, os custos
de transporte aumentam, bem como a poluição associada,
a que se deverá ainda adicionar os custos de lavagem, nos
que compreende consumo de água, energia e detergentes,
o que pode não compensar os benefícios da reutilização.

Embalagens de Plástico
O plástico é um material que se apresenta com diversas
vantagens na concepção de uma embalagem:
P É um material asséptico;
60
P É um isolante térmico durável e fiável;
P É um material leve, com elevada maleabilidade e imper-
meabilidade;
P Pode ser reciclado ou valorizado com recuperação de energia;
P Permite a várias combinação com diferentes plásticos
e materiais.
Na fase de concepção das embalagens de plástico, deve
pensar-se em utilizar polímeros compatíveis em termos de
reciclagem [PET com o PP e não com o PVC] e sempre
que possível um só tipo de material na embalagem. Por
outro lado, devem-se utilizar rótulos compatíveis, em termos
de reciclagem, com o corpo da embalagem e utilizar colas
solúveis em água. As cores das embalagens devem igual-
mente estar normalizadas. A marcação internacional SPI
deve, também, ser utilizada por todos os embaladores, uma
vez que facilita o encaminhamento para reciclagem ou
valorização energética.
A título de curiosidade refere-se que as garrafas de água,
sumos, detergentes e produtos de higiene são habitualmente
feitas em PET. As garrafas de amaciador, champô,
detergente, álcool e iogurte líquido são de PEAD. Os sacos
e filme de paletes são de PEBD e os copos de iogurte
sólido, esferovite e tabuleiros são feitos de PS.
Uma empresa do sector dos detergentes, passou a comercia-
lizar o produto concentrado, garantindo o mesmo número
de lavagens. Com esta alteração, deixou de necessitar de
uma garrafa de 2 litros de capacidade, passando a utilizar
uma embalagem de apenas 500 ml, o que conduziu a uma
poupança no custo da embalagem de cerca de 75 %. Esta
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

alteração no volume da embalagem, permitiu aumentar


de 320 para 1152 o número de embalagens acondicio-
nadas em cada palete, o que se traduziu na diminuição
de custos logísticos e na melhoria da imagem do produto.
Noutro caso, a substituição de 4 insufladoras antigas por
uma insufladora moderna, originou uma poupança ener-
gética de 15 % e uma redução de cerca de 3 gramas no
peso da embalagem, gerando assim um acréscimo de 20 %
na produção.
Noutra situação ainda, a melhoria das técnicas de enchi-
mento e a eliminação de espaços vazios existentes numa
61
saqueta compósita do café, permitiram uma redução no peso
da embalagem primária, que se veio a traduzir na poupança
do material da embalagem primária e secundária.
No sector das bebidas, a simples eliminação do tabuleiro
de cartão, reduziu em cerca de 70 % o peso da embala-
gem secundária, o que representou uma poupança anual
de 306 toneladas.
Noutros casos, a alteração do “design” e a redução do
diâmetro do garrafão, obrigou à adopção de uma cápsula
e pega mais pequenas e à utilização de um rótulo de
menores dimensões, o que permitiu reduzir o peso da emba-
lagem primária em 10,33 gramas, que representou uma
poupança nos recursos naturais e nos custos de transporte.
Noutra situação ainda, a redução da embalagem primária
e a substituição da cápsula metálica por outra de polietileno,
originou a redução do peso da embalagem e consequen-
temente o consumo de combustível no transporte, aumen-
tando as possibilidades de reciclagem uma vez que houve
diminuição da variedade de materiais utilizados.

Embalagens de Vidro
O vidro apenas pode ser utilizado nas embalagens primárias
e apresenta as seguintes vantagens:
P É inerte e permite preservar as características do produto
embalado, nomeadamente o sabor;
P É higiénica e transparente, permitindo visualizar o produto
embalado;
É hermética;
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

P É resistente;
P O vidro de cor tem capacidade de protecção solar, garan-
tindo a qualidade do produto;
P É infinitamente reciclável, dado que a qualidade do vidro
produzido a partir do vidro usado não se altera;
P O preço da embalagem é competitivo, quando comparado
com outros materiais;
P Contribui positivamente para a economia Portuguesa,
porque o vidro de embalagem é fabricado em Portugal;
62
P É mais apelativo nas prateleiras dos Super e Hiper-
mercados porque permite visualizar o produto [as sal-
sichas, os produtos hortícolas e as conservas de peixe],
podendo a embalagem ser posteriormente reciclada.
A título de curiosidade refere-se que no total de vendas
de 2004, o sector do vinho consumiu 50 % das embalagens
de vidro produzidas em Portugal, o sector das cervejas
consumiu 26 %, o dos refrigerantes, as águas e os sumos
14 %, o dos vinagres, óleos e azeite 3 %, as conservas 2 %
e os molhos 1 %.
No conjunto dos países da UE, a França é o país que
apresenta o maior consumo do vidro de embalagem [57 %],
seguido da Suíça [43 %] e da Alemanha [41 %], Reino
Unido e Espanha [37 %], Portugal [36 %], Itália [34 %],
Holanda [32 %], Bélgica [31 %], Áustria [29 %], Polónia
[22 %] e República Checa [15 %].
Numa situação particular, a simples melhoria no processo
de fabrico da garrafa e a alteração do formato da emba-
lagem, permitiram reduzir o seu peso em 30 gramas.
Com esta alteração conseguiu-se diminuir o consumo
das matérias-primas, optimizar a utilização das paletes
e consequentemente reduzir os custos de transporte
e distribuição e ainda introduzir melhorias ao nível
da imagem do produto. As alterações introduzidas
na concepção da embalagem traduziram-se portanto
em evidentes benefícios ambientais e económicos.

Embalagens de Metal
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

As embalagens metálicas são comummente utilizadas nos


seguintes sectores:
P Bebidas [sumos, refrigerantes e cervejas];
P Conservas [atum];
P Produtos alimentares [leite em pó, polpa de tomate,
confeitaria e azeite];
P Aerossóis [desodorizantes e purificadores de ar];
P Indústria [colas, tintas e vernizes];
P Bidões;
63
P Barris e bilhas de gás;
P Tabuleiros de alumínio para comida preparada.
A embalagem metálica é constituída por aço ou alumínio.
As de alumínio são mais caras, pelo que a embalagem
de aço está a ser objecto de estudo no sentido de se obter
uma embalagem com menor peso e espessura.
O alumínio [liga rica em magnésio e manganês] é geral-
mente utilizado para a produção de latas de refrigerantes
e cervejas, mas também pode ser utilizado nos tabuleiros
de comida preparada, nos pacotes das margarinas ou nos
pacotes de cartão complexo para líquidos alimentares
[tetra brik].

As latas de alumínio pesam no máximo 14 gramas, ou seja


cerca de metade do peso das latas de aço, o que em mer-
cados de exportação, tem importantes repercussões do ponto
de vista económico. Para além disso, são também menos
espessas e ainda resistentes e 100 % recicláveis.
O aço é utilizado fundamentalmente nas latas das conservas
de tomate, azeite e fruta enlatada, caricas, tampas de frascos
de doce, embalagens de aerossóis, tintas, vernizes, etc.
A lata é 100 % reciclável, sem perder qualidade e é eco-
nómica devido à rapidez do seu fabrico, já que as moder-
nas linhas de produção alcançam velocidades de produção
superiores a 1000 embalagens por minuto, com um
reduzido consumo energético. A eficiência destas linhas
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

de produção é da ordem dos 95 %, com desperdícios


inferiores a 2,5 %.
Refere-se ainda que o canal Horeca do programa Verdoreca,
permite a utilização de embalagens metálicas não reuti-
lizáveis.
A adopção de novas tecnologias tem contribuído para a dimi-
nuição da espessura das latas de 33 cl, e consequentemente
no peso da embalagem. Com esta alteração, conseguiu-se
reduzir o consumo de combustível no transporte deste tipo
de embalagens.
64
Embalagens de Papel
A utilização das embalagens de papel tem vantagens eco-
nómicas e ambientais relativamente a outras embalagens:
P O papel e o cartão são recicláveis, recuperáveis e biode-
gradáveis;
P São leves, resistentes, higiénicas e económicas;
P O fabrico do papel novo com a introdução de novas
tecnologias e a utilização de fibras recicladas prove-
nientes do papel reciclado tem um impacte ambiental
menor, uma vez que os consumos de água e energia são
menores. Por outro lado, salvaguarda os recursos naturais,
que são as árvores, e diminui o volume de resíduos inci-
nerados ou depositados em aterro;
P O papel e o cartão que não podem ser reciclados, são
valorizados gerando produção de energia através da inci-
neração.
Considera-se embalagem de papel/cartão, aquela que é consti-
tuída - em pelo menos 75 % do seu peso - de papel/cartão
e cuja função é proteger os produtos que acondiciona e/ou
agrupa com o fim de serem transportados, bem como todos
os produtos cuja função é a apresentação para venda.
Existem 4 tipos de embalagens: as de cartão canelado,
cartão compacto, cartão para líquidos alimentares e emba-
lagens de papel.
Actualmente grande parte do papel é produzido a partir
de florestas geridas no âmbito de uma política de Gestão
Florestal, que visa o desenvolvimento sustentado e a preser-
vação do ambiente.
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

A reciclagem do papel, para além de ser uma medida


vantajosa do ponto de vista económico, contribui para a re-
dução da quantidade dos RSU'S incinerada ou depositada
em aterro e permite diminuir a velocidade de abate de
árvores. No entanto, as fibras recuperadas do papel usado
não podem ser recicladas mais do que 4 a 6 vezes, o que
implica a obrigatoriedade de utilização de matérias-primas
virgens para a produção de papel novo.
O papel é classificado em 57 categorias diferentes, agru-
padas em 5 grupos: Qualidade Corrente, Qualidades Médias,
Qualidades Elevadas; Qualidade Kraft, Qualidades Especiais.
65
Algumas empresas do sector alimentar promoveram altera-
ções conceptuais nas embalagens primárias, conducentes
à redução das suas dimensões e consequentemente do seu
peso, permitindo armazenar mais unidades por palete. Esta
pequena alteração teve repercussões na redução dos custos
de transporte e distribuição. Por outro lado, promoveu
a redução das embalagens secundária e terciária.

Embalagens de Madeira
As embalagens de madeira são constituídas por um material
limpo e higiénico, são resistentes e recicláveis. São leves
e fáceis de manipular e melhora a imagem do produto
colocado directamente [frutas e legumes]. Possibilita ainda
impressão directa.
As embalagens de madeira podem ser classificadas em vários
tipos: caixas, paletes, contentores-palete, bobines e barris
de madeira.
86 % das embalagens de madeira têm destino desco-
nhecido. Dos resíduos que tem destino conhecido, 80 % são
reciclados, 8 % são incinerados ou depositados em aterro.
Em 2002, 11 % dos resíduos de paletes foram reciclados,
1 % valorizados com recuperação de energia, 2 % foram
depositados e 85 % destes resíduos tiveram outros destinos.
10 % dos resíduos das outras embalagens de madeira
foram recicladas, 1 % foi depositado em aterro e 89 %
tiveram outros destinos.
Os Problemas Ambientais e a Consciência Ecológica

66
2.Resíduos S ólidos: T ipos,
Composição e P ropriedades

2.1. Classificação por Tipos


A legislação portuguesa face à caracterização dos
resíduos sólidos, Dec.-Lei n.º 239/97, de 9 de Setembro,
separa claramente os resíduos sólidos considerados espe-
ciais e alvo de legislação específica. Destes resíduos pouco
há a acrescentar, no âmbito deste manual, dado tratar-se
de resíduos muito específicos e que por tal transcendem
os objectivos destas páginas. Nesse domínio encontram-se:
a] Os resíduos radioactivos;
b] Os resíduos resultantes da prospecção, extracção e arma-
zenagem de recursos minerais, bem como da exploração
de pedreiras;
c Os cadáveres de animais e os resíduos agrícolas que
]
sejam matérias fecais ou outras substâncias naturais
não perigosas aproveitadas nas explorações agrícolas;
d] As águas residuais, com excepção dos resíduos em esta-
do líquido;
e] Os explosivos abatidos à carga ou em fim de vida;
f] Os efluentes gasosos emitidos para a atmosfera.
O diploma atrás referido estabelece as regras a que fica
sujeita a gestão dos resíduos, abaixo discriminados, nomea-
damente quanto à sua recolha, transporte, armazenagem,
tratamento, valorização e eliminação, de forma a não cons-
tituírem perigo ou causar prejuízo para a saúde humana
ou para o ambiente:
a] Resíduos - quaisquer substâncias ou objectos de que
Resíduos Sólidos: Tipos, Composição e Propriedades

o detentor se desfaz ou tem intenção ou obrigação de


se desfazer, nomeadamente os previstos em Portaria
dos Ministros da Economia, da Saúde, da Agricultura,
do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Ambiente,
em conformidade com o Catálogo Europeu de Resí-
duos38, aprovado por decisão da Comissão Europeia;

38
Catálogo Europeu dos Resíduos - recentemente substituído pela Lista
Europeia de Resíduos [LER]. Os diferentes tipos de resíduos incluídos na
lista são totalmente definidos pelo Código LER [um código de seis dígitos
e que visa uma linguagem e tratamento comum dos resíduos no espaço
europeu]. Inclui, também, a lista dos resíduos perigosos e quais as
características de perigo que lhes são atribuíveis.
67
b] Resíduos perigosos - os resíduos que apresentem
características de perigosidade para a saúde ou para
o ambiente, nomeadamente os definidos em Portaria
dos Ministros da Economia, da Saúde, da Agricultura,
do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Ambiente,
em conformidade com a Lista de Resíduos Perigosos,
aprovada por decisão do Conselho da União Europeia;
c] Resíduos industriais - os resíduos gerados em actividades
industriais, bem como os que resultem das actividades
de produção e distribuição de electricidade, gás e água;
d] Resíduos urbanos - os resíduos domésticos ou outros
resíduos semelhantes, em razão da sua natureza ou
composição, nomeadamente os provenientes do sector
de serviços ou de estabelecimentos comerciais ou indus-
triais e de unidades prestadoras de cuidados de saúde,
desde que, em qualquer dos casos, a produção diária
não exceda 1100 litros por produtor;
e] Resíduos hospitalares - os resíduos produzidos em uni-
dades de prestação de cuidados de saúde, incluindo
as actividades médicas de diagnóstico, prevenção e tra-
tamento da doença, em seres humanos ou animais,
e ainda as actividades de investigação relacionadas;
f] Outros tipos de resíduos - os resíduos não considerados
como industriais, urbanos ou hospitalares.
Situemo-nos, pois, nos resíduos classificados por este norma-
tivo e, mais em particular, nos resíduos sólidos urbanos.
Partindo da definição geral de Resíduos e de Resíduos
Urbanos, resultam os Resíduos Sólidos Urbanos [RSU].
Resíduos Sólidos: Tipos, Composição e Propriedades

É sobre estes resíduos que se exercem as competências


das Autarquias quanto às operações de remoção, transporte,
valorização, tratamento e eliminação.
Em Lisboa entraram em vigor, em Novembro de 2004,
as alterações ao Regulamento de Resíduos Sólidos da Cidade.
Este documento operacionaliza ao nível das competências da
Autarquia as operações que constituem o sistema integrado
de gestão dos resíduos, bem como define claramente o que
se entende por Resíduos Sólidos Urbanos [RSU]:
P Resíduos sólidos domésticos - provenientes das normais
actividades das habitações;
68
P Monstros - objectos volumosos fora de uso, tais como
colchões, mobiliário, tapetes e outros produzidos nas habi-
tações, que, pelo seu volume, forma ou dimensão, não
possam ser recolhidos pelos meios habituais;
P Resíduos verdes urbanos - troncos, aparas e ervas, desde
que a produção não exceda os 1100 litros por semana;
P Resíduos provenientes da limpeza pública e os produzidos
na via pública;
P Resíduos comerciais, industriais e hospitalares equiparáveis
a domésticos, que não sejam considerados contaminados,
e cuja produção não exceda os 1100 litros por dia.
Este tipo de classificação dos resíduos, por tipos, atende
essencialmente à sua proveniência ou fonte [resíduos
hospitalares, resíduos urbanos, industriais], embora estes
possam ser classificados de acordo com os materiais
constituintes.
Se atendermos à composição física dos resíduos teremos
uma classificação do tipo papel/cartão, plástico, vidro,
têxteis, metais, etc. Este tipo de classificação revela-se
particularmente útil quando se pensa no destino final dos
resíduos que, assim classificados, integrarão uma mesma
fileira39 de reciclagem, tratamento ou eliminação.
Os resíduos podem, também, ser classificados de acordo
com a sua composição química [orgânicos, inorgânicos]
ou face às suas propriedades relativamente aos sistemas
de tratamento [compostáveis, combustíveis, recicláveis].
A sua perigosidade pode ser expressa em classificações
do tipo: corrosivos, tóxicos, inflamáveis etc.
Resíduos Sólidos: Tipos, Composição e Propriedades

Por outro lado a noção de fluxo introduz um outro tipo


de classificação que se prende com as utilizações dadas aos
produtos que agora são resíduos. Temos, assim, de acordo
com o Plano Estratégico para a Gestão dos Resíduos
Sólidos Urbanos [PERSU], os seguintes fluxos: embalagens,
resíduos de jardim, pilhas e acumuladores, óleos usados,
resíduos de construções ou demolições [entulhos], resíduos
de equipamentos eléctricos e electrónicos [REEE], lamas
de estações de tratamento de águas residuais e pequenas
quantidades de resíduos perigosos.

39
Fileira - corresponde aos materiais componentes dos resíduos.31
69
Em Lisboa separam-se os resíduos com vista à sua poste-
rior valorização ou tratamento adequado para eliminação,
do seguinte modo:
PResíduos indiferenciados;
PPapel/cartão [de embalagem ou outros formatos, tipo jor-
nais e revistas];
PEmbalagens [plástico, metal e tetra brik];
PPilhas [alcalinas, níquel-cádmio, lítio e outras];
PVidro de embalagem;
PResíduos orgânicos;
PEntulhos [resíduos provenientes de construções ou demo-
lições];
PMonstros [sofás, colchões, móveis velhos etc.];
PResíduos de equipamentos eléctricos e electrónicos [REEE];
PLinha Branca frigorífica e outra linha branca [fornos,
fogões, esquentadores, etc.];
PResíduos de jardim;
PPneus;
PBaterias;
PÓleos usados;
PLâmpadas;
PEmbalagens de madeira [paletes e caixas de fruta].
Esta classificação mistura algumas das anteriormente
referidas, seja a de fluxo e fileira, seja ainda a de material
constituinte ou de proveniência. Porém, dados os destinos
finais dos resíduos de Lisboa, é a que melhor se adequa
para que, claramente, se possa entender que tipo de mate-
rial temos em presença.
Resíduos Sólidos: Tipos, Composição e Propriedades

2.2. Dados Evolutivos: Quantitativos e Características


Como foi referido na introdução a este tema “Ambiente
e Resíduos Sólidos”, as quantidades e características dos
resíduos modificaram-se substancialmente durante o século
passado, fruto do desenvolvimento tecnológico e das cres-
centes “necessidades” de consumo do Homem.
Assim, passámos rapidamente de uma capitação40 diária
de cerca de 300 gramas, na década de 50, para cerca

40
Capitação - no caso dos resíduos refere-se à quantidade produzida por
habitante e por dia ou por habitante e por ano.
70
de 750 gramas na de 80, atingindo-se na dealbar
do século XX uma capitação diária de 1,5 Kg, em Lisboa.
Paralelamente, os resíduos orgânicos, fracção desde sempre
maioritária no lixo [uma vez que representa o excedente
do consumo primário dos indivíduos] deu lugar a outro
tipo de resíduos que assumiram lugar de destaque, em
peso relativo, mas especialmente em volume: os plásticos
e o papel.

Evolução da Composição dos Resíduos Sólidos Urbanos


produzidos em Lisboa [1940-2000]

Fonte: Câmara Municipal de Lisboa e Valorsul

O gráfico tenta mostrar, do ponto de vista evolutivo,


as diferenças verificadas na composição física dos resíduos
em Lisboa, num intervalo de 60 anos.
Resíduos Sólidos: Tipos, Composição e Propriedades

Assistiu-se, pois, a alterações muito significativas das suas


características físicas o que implicou, do ponto de vista
da recolha e destino final dos resíduos, ajustamentos
efectivos para a salvaguarda da saúde e do ambiente, bem
como para a eficiência de todo o tecnossistema de gestão.
Mas, para além das características físicas, outros parâ-
metros são considerados quando se trata de conhecer que
resíduos temos em presença. Assim vulgarmente determina-se:
P O peso específico, que se expressa em kg/m3, e que traduz
o peso de uma massa de resíduos relativamente à unidade
de volume;
71
P A humidade, ou seja a percentagem de água contida
na massa de resíduos. Este parâmetro tem especial influên-
cia nos processos de tratamento;
P O poder calorífico ou seja a quantidade de calor libertada
por combustão;
P A análise elementar que envolve o conhecimento das per-
centagens relativas de carbono, azoto, oxigénio, hidrogénio,
enxofre e cinzas. O conhecimento destes parâmetros assu-
me importância particular nos processos de incineração
e compostagem.
Conhecer claramente as quantidades e características dos
resíduos que se produzem é fundamental para que o processo
de gestão possa revelar-se eficaz, em termos da protecção
ambiental e da saúde pública, e o mais eficiente possível.

3.Sistema de Recolha e Transporte


dos Resíduos Sólidos Urbanos

3.1. Sistemas gerais


São vários os tipos de recolha de resíduos que podem
fazer uso de diferentes equipamentos de deposição.
Contudo prioriza-se actualmente a recolha hermética41,
de forma a reduzir os riscos para a saúde e para o ambiente.
Este tipo de recolha utiliza contentores de diferentes capa-
cidades e materiais. Podem ser contentores plásticos [geral-
Sistema de Recolha e Transporte dos Resíduos Sólidos Urbanos

mente em polietileno de alta densidade] com capacidades


que variam entre os 50 e os 1100 litros, ou de metal que
são contentores de deposição colectiva de 1000 e 1100 litros
de capacidade.
A deposição por sacos é um procedimento que pode ser
adoptado, quer para os resíduos indiferenciados, quer para
as fracções recicláveis.
Existem outros equipamentos de deposição que determi-
narão o tipo de recolha a efectuar e que são sobretudo

41
A recolha hermética faz uso de contentores herméticos que têm tampa
para evitar espalhamentos de resíduos e proliferação de vectores.
As viaturas de recolha têm adufas que evitam igualmente o espalhamento
de resíduos e proliferação de maus cheiros ou vectores, dado que encos-
tam, no momento do despejo, completamente à “boca do contentor”.
72
equipamentos de deposição colectiva [ecopontos, vidrões
e contentores de grandes capacidades].
No caso dos contentores de grandes capacidades a recolha
é efectuada, quer por substituição do equipamento de depo-
sição [ou seja, a viatura que efectua a recolha deixa no local
um contentor vazio e transporta o que está cheio], quer
por esvaziamento, o que requer a utilização de viaturas com
sistema de elevação, à semelhança das utilizadas para
ecopontos e vidrões.
É vulgar classificar-se a recolha conforme a sua periodici-
dade, o tipo de resíduos a que se destina e o tipo de conten-
torização adoptado.
Podemos, pois, ter uma recolha individual, diária para resí-
duos indiferenciados, associada à recolha individual selectiva
não diária ou à recolha selectiva colectiva. Ou seja são
várias as conjugações que um sistema de gestão de resí-
duos permite e que normalmente são efectuadas para
responder à produção de resíduos de um aglomerado
urbano, às suas características sociais, urbanísticas e topo-
gráficas, bem como para optimizar os recursos humanos
e materiais desse mesmo sistema.

3.2. O Caso de Lisboa


O sistema de recolha e transporte de resíduos na cidade
de Lisboa processa-se de forma diferenciada que visa a
adaptação dos meios humanos e materiais às condições
Sistema de Recolha e Transporte dos Resíduos Sólidos Urbanos

topográficas e à tipologia da ocupação urbana da cidade.


Embora as actividades inerentes à gestão do Sistema
de Resíduos Sólidos seja uma competência municipal,
a remoção é uma operação partilhada entre a Autarquia
e os respectivos produtores de resíduos, uma vez que inclui
a sua deposição [indiferenciada e selectiva], a recolha e o
transporte para tratamento/destino final adequado.
Tradicionalmente, e na maior parte da cidade de Lisboa,
o sistema de recolha de resíduos assenta na recolha indi-
ferenciada e selectiva. Contudo, desde 2003, que novas
formas de recolha se têm vindo a desenvolver, visando
uma adequação cada vez mais concreta do sistema
às exigências da população, por um lado, e às realidades
urbanísticas por outro.
73
Evolução da capitação anual de resíduos recolhidos
e dos recolhidos selectivamente
Kg/hab/ano

resíduos urbanos recolhidos resíduos urbanos recolhidos selectivamente


*
Fonte: www.ine.pt [Julho 2007]

* Concelhos de Amadora, 3.2.1. Recolha Indiferenciada


Cascais, Lisboa, Loures,
Mafra, Odivelas, A recolha indiferenciada divide-se em dois grandes grupos:
Oeiras, Sintra a realizada em áreas com deposição individual e com depo-
e Vila Franca de Xira.
sição colectiva.
PDeposição individual - os contentores são
atribuídos aos munícipes, sendo estes os
responsáveis pelo bom acondicionamento
dos RSU, pela colocação e retirada dos
equipamentos de deposição da via pública
e pela limpeza, conservação e manutenção
dos sistemas de deposição. Os contentores habitualmente
utilizados são em polietileno verde e têm uma capacidade
entre os 90 e os 340 litros.
Em algumas áreas, nomeadamente em alguns bairros
Sistema de Recolha e Transporte dos Resíduos Sólidos Urbanos

e núcleos históricos da Cidade, devido às características


das habitações e dos arruamentos, são entregues sacos
de plástico para a deposição indiferenciada dos resíduos.
Em entidades com grande produção de resíduos são utili-
zados contentores de 1000 ou 1100 litros de capacidade,
em polietileno verde ou metálicos.
P Deposição colectiva - os conten-
tores estão colocados na via pública
e servem ao mesmo tempo um
número indeterminado de indivíduos.
A atribuição destes equipamentos
não é feita a nenhum dos utentes. Os contentores
habitualmente utilizados são de 1000 ou 1100 litros
de capacidade, em polietileno verde ou metálicos.
74
3.2.2. Recolha Selectiva
A recolha selectiva de resíduos tem como objectivo a recicla-
gem das fracções valorizáveis dos resíduos.
Em Lisboa recolhem-se selecti-
vamente o papel e o cartão,
o vidro, as embalagens [plástico,
metal e cartão complexo], os resí-
duos orgânicos provenientes de
grandes produtores e as pilhas.
Actualmente estão implementados dois subsistemas de re-
colha selectiva: O subsistema de deposição colectiva ou
de transporte voluntário e o subsistema de recolha selectiva
porta-a-porta.
No subsistema de deposição colectiva incluem-se:
P Os Ecopontos - são constituí-
dos por uma bateria de con-
tentores do tipo “Cyclea”,
de cor “azul safira”, identi-
ficados com chapas metálicas
de cores diferenciadas, de
acordo com o tipo de resíduos
a que se destinam. Existem dois tipos de ecopontos, os
de superfície que têm 2,5 m3 de capacidade e os subter-
râneos que têm 3 m3 de capacidade. O vidro é depositado
no contentor que tem chapa verde, o papel/cartão no
contentor que tem chapa azul, as embalagens de plástico,
metal e cartão complexo [vulgarmente conhecidas como
Sistema de Recolha e Transporte dos Resíduos Sólidos Urbanos

embalagens para líquidos alimentares] no contentor que


tem chapa amarela e as pilhas no recipiente vermelho,
com 50 litros de capacidade.
P Os Vidrões - são equipamentos que
podem estar incluídos na bateria de
ecopontos ou existir isoladamente na
via pública, podendo ser do tipo
“Cyclea” de cor “azul safira” e chapa
verde, com 2,5 m3 de capacidade ou
do tipo “igloo” de cor verde, com
1,5 m3 de capacidade. Existem ainda
vidrões do tipo “igloo” com pilhões acoplados e vidrões
do tipo “Cyclea” junto aos quais foi instalada uma
estrutura metálica com um pilhão.
75
Os circuitos de recolha dos ecopontos e vidrões são
efectuados por viaturas de caixa aberta equipadas com
grua, com uma capacidade de 10/11 m3 ou por viaturas
“Ampliroll” equipadas com caixas de 18 m3 e obedecem
a periodicidades de recolha que variam com a taxa de
ocupação dos respectivos equipamentos [taxa de enchi-
mento] e os circuitos de recolha a que estão adstritos.
As “Eco-ilhas ou Ilhas Ecoló-
P

gicas” - são baterias de con-


tentores de 1000/1100 litros
que se destinam à deposição
selectiva de papel e embala-
gens de plástico, metal e car-
tão para líquidos alimentares. Estas baterias são utili-
zadas em zonas onde a deposição dos resíduos indife-
renciados é colectiva.
P Os Centros de Recepção de Papel - são áreas vigiadas,
destinadas à recepção de papel ou cartão, onde os
munícipes podem utilizar os equipamentos disponíveis para
a sua deposição. Os centros de recepção de papel estão
inseridos nos circuitos de recolha de papel porta-a-porta.
A Central de Triagem e Ecocentro da Valorsul, situado na
Estrada Militar [ao Lumiar]. Nessa instalação, para além
dos resíduos que são recolhidos selectivamente pelo Muni-
cípio, podem ser entregues, por munícipes ou entidades:
óleos usados, REEE [resíduos de equipamentos eléctricos
e electrónicos], linha branca [frigorífica e outra], baterias,
madeiras e paletes, entulhos e resíduos verdes de jardins,
Sistema de Recolha e Transporte dos Resíduos Sólidos Urbanos

de acordo com o seu regulamento interno.


O subsistema de recolha selectiva porta-a-porta está orga-
nizado da seguinte forma:
Recolha de Papel Porta-a-Porta em En-
P

tidades - Esta recolha porta-a-porta é rea-


lizada em entidades com grandes produções
de papel. A deposição de papel é efectuada
em contentores de polietileno azul ou verde
de tampa azul, com capacidades que va-
riam entre os 240 e os 1100 litros. Os circuitos de re-
colha de papel porta-a-porta são efectuados por viaturas
com compressão [iguais às da recolha indiferenciada], com
uma capacidade de 13/15 m3.
76
P Recolha de Papel Porta-a-Porta em Zonas
Residenciais - As habitações e as activi-
dades económicas localizadas em áreas
abrangidas pelo sistema de recolha
porta-a-porta de papel/cartão podem
utilizar diversos equipamentos de depo-
sição. Nos bairros históricos, a deposição
de papel/cartão é efectuada em sacos
azuis translúcidos, com 30 litros de capa-
cidade, mas no caso das actividades
económicas sem espaço para armazenar
contentores, podem ser utilizados sacos
de 50 litros de capacidade, que são distribuídos gratui-
tamente pelo Município. Em zonas específicas utilizam-se
fitas azuis distribuídas gratuitamente para fechar os sacos
colocados à remoção. Noutras, ainda, utilizam-se contento-
res de corpo verde escuro com tampas azuis, cujas capaci-
dades variam entre os 90 e os 340 litros de capacidade.
As actividades económicas localizadas em zonas residen-
ciais dispõem ainda da possibilidade de entregar o cartão
produzido devidamente acondicionado em fardos.
P Recolha de Papel/Cartão em Zonas Comerciais - Recolha
realizada junto de entidades grandes produtoras, locali-
zadas em zonas com elevada densidade de comércio.
A remoção é efectuada em fardos que se recolhem no inte-
rior dos estabelecimentos comerciais [no caso da Baixa-
-Chiado] ou colocam na via pública em horários e dias
bem definidos [no caso das Av. Novas e Bairro Alto].
Sistema de Recolha e Transporte dos Resíduos Sólidos Urbanos

Os circuitos de recolha de papel/cartão em zonas


comerciais são efectuados por viaturas com compressão
de 13/15 m3 e por viaturas “Calabrese” de 9 m3 de capa-
cidade no caso dos arruamentos mais estreitos, como
os da Baixa-Chiado.
P Recolha de Embalagens Porta-a-Porta em Zonas Resi-
denciais - As habitações e as actividades económicas
localizadas em áreas abrangidas pelo sistema de recolha
porta-a-porta de embalagens, podem utilizar diversos
tipos de equipamentos de deposição. Nalguns bairros his-
tóricos, a deposição das embalagens de plástico, metal
e cartão para líquidos alimentares é efectuada em sacos
de plástico amarelos e translúcidos, com 30 litros
de capacidade, mas no caso das actividades económicas,
77
sem espaço para armazenar contentores, podem ser utiliza-
dos sacos com 50 litros de capacidade, que são distribuí-
dos gratuitamente pela Autarquia. Em zonas específicas
utilizam-se fitas amarelas para fechar os sacos colocados
à remoção. Noutras zonas da cidade, este tipo de deposi-
ção é efectuado em contentores de cor verde com tampa
amarela, cuja capacidade pode variar entre os 90 e os
340 litros.
P Recolha de Embalagens Porta-a-Porta em Entidades -
A deposição de embalagens de plástico, metal e cartão
para líquidos alimentares é efectuada em contentores de
cor verde com tampa amarela, cuja capacidade pode variar
entre os 90 e os 1100 litros de capacidade. No entanto,
no caso dos estabelecimentos de restauração e hotelaria
localizados na Baixa Pombalina, Chiado e Zona Ribeirinha
a deposição das embalagens é efectuada em sacos de
plástico que são adquiridos pelos próprios estabelecimentos
de restauração e similares e são recolhidos no interior
dos mesmos.
P Recolha de Vidro Porta-a-Porta - Este tipo
de recolha tem vindo a ser realizada em
locais com elevada densidade de esta-
belecimentos de restauração e similares,
tais como a Baixa Pombalina, Chiado,
Zona Ribeirinha e Bairro Alto. A depo-
sição do vidro é efectuada em conten-
tores de cor verde escuro e tampa verde claro, de 90,
140 e 240 litros de capacidade. No caso do Bairro Alto,
Sistema de Recolha e Transporte dos Resíduos Sólidos Urbanos

utilizam-se contentores de 50 e 90 litros de capacidade.


Os circuitos de recolha de vidro são efectuados por
viaturas de recolha hermética de 7 m3 de capacidade.
P Recolha de Resíduos Orgânicos Porta-a-Porta - Este tipo
de recolha iniciou-se em
2005, por forma a promover
a reciclagem anaeróbia da
fracção orgânica dos resíduos
produzidos pelos estabeleci-
mentos de restauração, hote-
laria e comércio alimentar. A deposição da matéria
orgânica é efectuada em contentores de cor verde com
tampa castanha, com capacidades compreendidas entre

78
os 90 e os 1000 litros. A recolha destes resíduos é
efectuada conjuntamente pela Câmara Municipal de Lisboa
e pela Valorsul.

3.2.3. Condicionantes da Actividade Municipal


Em Lisboa são várias as restrições que se colocam ao bom
funcionamento do sistema de resíduos sólidos. Para além
de incumprimentos muitas vezes verificados por parte
dos munícipes no correcto acondicionamento dos resíduos
que produzem e na participação na deposição selectiva
para reciclagem, também outras restrições de carácter
técnico e de funcionamento se colocam à actividade
municipal, como por exemplo:
P Características dos arruamentos da cidade - velocidade
média das vias, sentidos de trânsito, proibição [ou impos-
sibilidade] de circulação de determinado tipo de viaturas,
proibição de “virar” à esquerda ou à direita, proibição
de inversão de marcha;
P Características sócio-urbanísticas - área comercial ou re-
sidencial a que correspondem resíduos com diferentes
composições, que se reflecte no peso e volume;
P Características do edificado - moradias, prédios de baixa
densidade de ocupação, prédios com elevada densidade
de ocupação; edifícios em banda com várias entradas, etc.;
P Estrutura topográfica e morfológica da cidade;
Frota de viaturas - capacidades diferenciadas de cada
Sistema de Recolha e Transporte dos Resíduos Sólidos Urbanos

P

viatura;
P Localização dos contentores - nos contentores de 90
a 340 litros e nos sacos a localização é efectuada por
quarteirão, nos restantes a localização é exacta;
P Localização das garagens e dos postos de limpeza;
P Localização do destino dos resíduos;
P Horário de remoção nos pontos de recolha e horário
de trabalho dos Condutores de Veículos Pesados e dos Can-
toneiros de Limpeza;
P Em cada ponto de recolha: quantidade e tipo de resíduos,
quantidade e tipo de contentores;
P Periodicidade de recolha em cada ponto de recolha;
79
3.2.4. Recolha de Informação
Após a realização dos circuitos de recolha são inseridos
em suporte informático os seguintes dados:
P Data, quantidades recolhidas, com local de descarga e res-
pectivo horário;
P N.º da viatura, quilómetros percorridos;
P Horário de partida e chegada da garagem e do posto
de limpeza e o tempo gasto no trabalho;
P Na recolha selectiva é indicada a taxa de enchimento de
cada equipamento [vidrão ou ecoponto] e as anomalias
à remoção que foram verificadas [equipamento dani-
ficado, inacessibilidade ao equipamento, entidade encer-
rada, existência de contaminantes, se existe lixo no chão,
etc.];
Aquando da análise desta informação ou quando se registam
restrições à optimização dos circuitos, se se verificar a neces-
sidade de intervenção no sistema, há uma actualização, com
a respectiva correcção nos circuitos de remoção recorrendo-
-se, para tal, a um software de optimização.

3.3. Novas Linhas de Orientação


Com datas definidas para que Portugal atinja as metas
exigidas pela União Europeia para a separação de resíduos,
conforme visto anteriormente [25 % em peso do total
de resíduos de embalagem em 2005 e 60 % em 2011],
Sistema de Recolha e Transporte dos Resíduos Sólidos Urbanos

a Câmara Municipal de Lisboa tem vindo a desenvolver


estratégias no sentido de aumentar os quantitativos
recolhidos seletivamente.
Assim, tem-se vindo a alterar o tradicional sistema para
a recolha selectiva porta-a-porta, a fim de tornar mais
cómoda e próxima a deposição e, por essa via, incentivar
a participação dos munícipes42.
Acresce que a deposição e recolha dos resíduos recicláveis
nos ecopontos aportam algumas dificuldades práticas, quer

42
Em 2005 o sistema porta-a-porta está a funcionar na Baixa Pombalina
[em entidades comerciais], urbanização da Alta de Lisboa, Freguesia de
Santa Maria dos Olivais, Bairros de Caselas, Alvalade [vivendas], St.ª Cruz
de Benfica, Restelo, Bairro Alto e parte das Freguesias de S. Domingos
de Benfica e Carnide.
80
para os Serviços Municipais quer para os utentes, fazendo
diminuir as quantidades passíveis de serem recolhidas:
PEstacionamento anárquico - que compromete a recolha;
PColocação de resíduos fora do contentor - o que compro-
mete o acesso de mais participantes na deposição e consti-
tui verdadeiros focos de insalubridade;
PDificuldade na colocação deste tipo de equipamento em
vários locais da cidade [topografia acidentada, ruas
estreitas, cabos eléctricos, etc.].
Para além das recolhas selectivas efectuadas em Lisboa,
os munícipes ou entidades podem utilizar o Ecocentro
da Valorsul, de acordo com o regulamento daquela instituição.
Mas, por mais ajustados que estejam os tecnossistemas
de resíduos, só a participação activa dos munícipes na depo-
sição selectiva fará Portugal atingir as metas de reciclagem
a que está vinculado.

4.Tratamento e Valorização de Resíduos:

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


Reciclagem, Incineração e Valorização
Energética, Aterro Sanitário

Até 1996, altura em que foi aprovado o Plano


Estratégico para a Gestão Integrada dos Resíduos
Sólidos Urbanos [PERSU], Portugal sofria de um grande
atraso face aos restantes países da União Europeia, no que
respeita aos Sistemas de Resíduos Sólidos Urbanos.
As lixeiras eram, até então, o método de deposição e destino
final mais comum no país e contavam-se mais de 300 que
provocavam graves problemas ambientais e que punham
em causa a saúde pública.
O PERSU veio estabelecer para o nosso País a mesma hie-
rarquia da União Europeia para a gestão dos resíduos, mas
enfatiza a prevenção e a necessidade urgente de “limpar
o País”. Assim, para além destas duas prioridades, estabelece
todas as outras emanadas das políticas orientadoras
da União Europeia, por ordem decrescente:
PRedução;
PReutilização;
PReciclagem [material e orgânica];
81
PIncineração com valorização energética;
PAterro sanitário;
PIncineração sem valorização energética.
O PERSU refere ainda que é fundamental a educação
das populações quer para a sua participação na redução,
reutilização de resíduos e na deposição selectiva para
reciclagem, quer na correcta informação sobre os sistemas
de gestão e exploração dos resíduos e respectiva monito-
rização. Outro aspecto importante foi o reconhecimento
da necessidade da criação e aplicação de taxas municipais
de gestão dos resíduos, de forma a cobrir custos de explo-
ração dos sistemas e também como instrumento estraté-
gico para a redução na produção de resíduos por parte
dos cidadãos.
O PERSU propõe, igualmente, metas e objectivos para o ano
2000 e para o ano 2005. Se até 2000 foi prioritário o en-
cerramento total das lixeiras do País, para 2005 refere que
a incineração com recuperação de energia se estenda
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

a 22 % do total de resíduos, que seja pelo menos construída


e entre em funcionamento uma estação de tratamento ana-
eróbico para a valorização das fracções orgânicas, que
diminua a deposição directa em aterro sanitário [devendo
esta ser aplicada a apenas 13 % da produção global dos
resíduos] e que metade dos resíduos produzidos seja condu-
zida a reciclagem [25 % de reciclagem orgânica; 25 %
de reciclagem de materiais].
Em Lisboa, nessa data [1996], embora se fizesse a recupe-
ração de vidro e de algum papel e cartão para reciclagem,
a maior parte dos resíduos era depositada no aterro
sanitário do Vale do Forno. Porém, o destino final dos
resíduos da capital tem sofrido alterações decorrentes quer
das suas características físicas, quer de condicionalismos
diversos. Assim, desde a década de oitenta e até ao encer-
ramento da Estação de Tratamento de Resíduos Sólidos
de Beirolas [ETRS], por motivo da realização da EXPO’98,
cuja localização coincidiu com a da ETRS, Lisboa dispunha
de um tratamento por compostagem para as fracções
orgânicas dos resíduos. Nessa mesma estação de trata-
mento eram então recuperados os metais ferrosos presentes
nos resíduos, através de um sistema de separação elec-
tromagnético, sendo os metais posteriormente conduzidos
a reciclagem.
82
Mas o verdadeiro impulso
para a recuperação selecti-
va de materiais e para
um tratamento e destino Central
de Tratamento
final adequado dos lixos de de Resíduos Sólidos
Lisboa, começou, também, § Urbanos [Valorsul].
em 1996, ano de encerra-
mento da ETRS, mas de início da colocação de ecopontos
na via pública e da integração de Lisboa na Valorsul
- Valorização e Tratamento de Resíduos Sólidos da Área
Metropolitana de Lisboa Norte, S. A., empresa responsável
pelo tratamento e destino final dos resíduos recolhidos nos
Municípios de Lisboa, Loures, Amadora, Odivelas e Vila
Franca de Xira.

4.1. Tratamento de Resíduos


Um sistema de gestão de Resíduos Sólidos Urbanos [RSU]
compreende várias operações que vão desde a recolha,

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


transporte e armazenamento, até ao tratamento e des-
tino final.
São vários os métodos de tratamento e de destino final
dos Resíduos Sólidos Urbanos, que se complementam. Contu-
do, qualquer que seja o tratamento ou conjunto de métodos
adoptado há sempre um destino último para as fracções
de refugo - o aterro sanitário.
O tratamento dos resíduos é composto por processos ma-
nuais, mecânicos, físicos, químicos ou biológicos que alterem
as suas características, de forma a reduzir o seu volume
ou perigosidade, bem como facilitar a sua movimentação,
valorização ou eliminação.
Temos, assim, como formas de tratamento, eliminação e ope-
rações associadas:
P Armazenagem - a deposição temporária e controlada, por
prazo não indeterminado, de resíduos antes do seu trata-
mento, valorização ou eliminação;
P Reutilização - a reintrodução, em utilização análoga e sem
alterações de substâncias, objectos ou produtos nos circuitos
de produção ou de consumo, de forma a evitar a produção
de resíduos;
83
P Valorização - as operações que visam o reaproveitamento
dos resíduos e que engloba:
P Reciclagem - reprocessamento dos resíduos num processo
de produção, para o fim original ou para outros fins,
considerando-se incluídos neste tipo de operação, nomea-
damente os seguintes processos:
Compostagem - processo de reciclagem onde se dá a de-
[

gradação biológica, aeróbia ou anaeróbia, de resíduos orgâ-


nicos, de modo a proceder à sua estabilização, produzindo
uma substância húmica, utilizável em algumas circuns-
tâncias como um condicionador do solo;
Regeneração - processo de reciclagem por tratamento que
[

visa obter, de um produto usado, um produto no mesmo


estado e com propriedades iguais às originais, tornando-
-o apropriado à sua utilização inicial.
P Valorização energética - a utilização dos resíduos combus-
tíveis para a produção de energia através da incineração
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

directa com recuperação de calor;


P Estações de triagem - instalações onde os resíduos são
separados, mediante processos manuais ou mecânicos,
em materiais constituintes destinados a valorização ou
a outras operações de gestão;
P Instalações de incineração - qualquer equipamento técnico
afecto ao tratamento de resíduos por via térmica, com
ou sem recuperação do calor produzido por combustão,
incluindo o local de implantação e o conjunto da instala-
ção, nomeadamente o incinerador, seus sistemas de alimen-
tação por resíduos, por combustíveis ou pelo ar, os apa-
relhos e dispositivos de controlo das operações de inci-
neração, de registo e de vigilância contínua das condições
de incineração;
P Aterros - instalações de eliminação utilizadas para a depo-
sição controlada de resíduos, acima ou abaixo da superfície
do solo.
Passemos agora à descrição dos métodos e estruturas
integrantes dos tecnossistemas de tratamento e destino final
dos resíduos, que asseguram o seu correcto tratamento
e destino final e de acordo com a hierarquia estabelecida
84
Destino final de RSU em Portugal Continental - 1999 a 2004

Ano Aterro [t] Outros [t][a] Incineração Compostagem Rec. Selectiva [b] Total [t]
]t] [t] + Ecocentros [t]

1999 61.813 3.650 0 32.291 10.739 108.493


2000 72.828 2.213 0 31.450 22.339 128.830
2001 88.853 2.425 35 27.798 25.279 144.390
2002 55.730 0 29.205 29.611 30.466 145.012
2003 24.458 0 110.106 0 14.215 148.779
2004 18.185 0 117.414 3.173 15.389 154.160
[a]
Inclui lixeiras e vazadouros controlados.
[b]
Inclui recolha nos ecopontos e porta-a-porta.
FONTE: INR, SGIR

pelo PERSU43. Lembremos, ainda que as metas para a re-


ciclagem e incineração com valorização energética emanadas
da UE estreitam-se para 201144.

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


4.1.1. Reciclagem
A reciclagem é uma das prioridades da política de gestão
dos resíduos a nível europeu e, como vimos, também
a nível nacional. A reciclagem é um método de valorização
que aproveita os materiais contidos nos resíduos, intro-
duzindo-os de novo no ciclo produtivo. De uma forma
geral a reciclagem de materiais, bem como a reciclagem
orgânica, origina uma grande poupança de matérias-primas
virgens, poupança de energia, redução das emissões atmos-
féricas e de efluentes líquidos e diminui os quantitativos
de resíduos a depositar em aterro sanitário.
Para que a reciclagem, quer a material, quer a orgânica,
seja possível é necessário que os materiais estejam sepa-
rados por tipos. Assim, relativamente à reciclagem material,
no momento da deposição os munícipes separam os mate-
riais por tipos mas, mesmo após essa operação, é neces-

43
No ponto 6 deste capítulo encontram-se definidos os conceitos de redução
e reutilização de materiais.
44
O Anexo A2 onde se encontra sistematizada a legislação de enquadramento.
85
sário proceder a uma separação mais fina e à retirada
de materiais contaminantes45. Para tal existem as estações
de triagem.

4.1.1.1. Estações de Triagem


Estas instalações podem pos-
suir equipamentos simples
[com recurso a processos
Centro de Triagem exclusivos de separação ma-
e Ecocentro [Valorsul]. §
nual] ou equipamentos mais
complexos com sistemas
de alta tecnologia, que complementam os primeiros
ou os substituem.
Em ambos os casos uma estação de triagem tem uma zona
de descarga dos resíduos, normalmente provenientes de sis-
temas de recolha selectiva [quer esta tenha sido efectuada
através de ecopontos, contentores colectivos, sacos ou con-
tentores individuais]. Como a recolha já é feita de forma
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

selectiva, o vidro, o papel/cartão e as embalagens, chegam


à estação de triagem e são descarregados em diferentes
locais, sendo de seguida escolhidos separadamente. Esta
separação visa a retirada de contaminantes e o isolamento
por materiais constituintes, sobretudo nas embalagens.
Separam-se assim os metais ferrosos dos não ferrosos,
os cartões complexos e os diferentes plásticos por tipos.
Os resíduos são conduzidos através de tapetes rolantes e são
separados, quer recorrendo-se a sistemas automáticos, que
combinam diversos equipamentos mecânicos e que separam
os resíduos pelas suas propriedades físicas, ou por ope-
radores que se encontram dispostos ao longo dos tapetes
e que manualmente vão separando os materiais.
É vulgar que os plásticos sejam separados manualmente
dado que as características físicas dos diferentes plásticos
são muito idênticas46, e que sejam separados os metais
ferrosos dos alumínios através do recurso a separadores
electromagnéticos ou de contracorrente.

45
Objectos ou substâncias comprometedores no posterior processo de
transformação ou reciclagem.
46
Embora o PVC [policloreto de vinilo] possa ser separado do PET [poli-
terftalato de etileno] pelo uso de sensores de raio X e o PP [polipro-
pileno] possa de igual forma ser separado do PEAD [polietileno de alta
densidade].
86
Para além da zona de descarga e da zona de proces-
samento em que se separam os resíduos, uma estação
de triagem dispõe também de uma zona de enfardamento
e armazenagem de materiais recuperados para reciclagem
e de um local de armazenamento dos materiais rejeitados
para posterior condução a destino final adequado.
Em Lisboa os resíduos provenientes das recolhas selectivas
são conduzidos à estação de Triagem da Valorsul onde são
separados por tipos e aos quais são retirados os conta-
minantes. Refere-se que a contaminação é muito frequente
- ou seja na deposição quando os munícipes não respeitam
ou desconhecem as regras de separação e por tal misturam

Processo de Fabrico Consumo de Energia Consumo de Matérias-Primas


[TEP/t][a]
Garrafas fabricadas com matérias-primas
virgens. 1,24 t: 70 % de sílica,
Extracção e laboração de matérias-primas 0.083 18 % de carbonato de sódio,
Fusão, fabrico e transporte das embalagens 0.218 10 % de carbonato de cálcio
0.301 e 2 % de óxidos e sais
Total
Garrafas recicladas
Transporte do vidro recolhido selectivamente 0.002 Uma tonelada
Tratamento [triagem, limpeza e fragmentação 0.004 de casco velho
Fusão, fabrico e transporte das embalagens 0.215 por cada tonelada
de vidro novo
Total 0.221
[a]
TEP/t toneladas equivalentes de petróleo gastas por cada tonelada de vidro produzido
[Adaptado de Martinho, 2000]

indevidamente materiais nos contentores que se destinam


apenas a um tipo de resíduo.

4.1.2. Reciclagem Material


Cada material reciclável tem um ciclo específico, associado
ao consumo, o qual o momento em que se transforma
num resíduo, após a sua utilização, até à sua deposição
selectiva e transporte para a estação de triagem, e ao seu
encaminhamento às indústrias recicladoras, que farão dele
um novo produto. Desta vez um produto reciclado.
87
De seguida abordam-se os ciclos dos principais materiais
conduzidos a reciclagem.

4.1.2.1. Vidro
O vidro é um material muito homogéneo que é composto
por sílica [material vitrificante], carbonato de cálcio [esta-
bilizante e que confere resistência], carbonato de sódio
[favorece a fusão], óxidos e sais metálicos [que são corantes
e estabilizantes]. Para o fabrico de vidro estes produtos
são misturados e fundidos a temperaturas que podem
atingir os 1500ºC.
O processo de reciclagem de vidro consiste na fusão do casco
velho do vidro de embalagem, limpo de contaminantes.
Desta forma estão a introduzir-se no forno os mesmos
constituintes que formaram o vidro inicial. As gotas fundidas
são insufladas de ar, dando forma a novas embalagens.
A percentagem de casco velho introduzido no processo
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

de reciclagem depende do tipo de embalagem que se


pretende produzir, mas pode atingir os 100 %. Ou seja,
o vidro reciclado pode não necessitar de incorporar
matérias-primas provenientes de recursos naturais.
O processo de fabricação de vidro a partir de casco velho
oferece vantagens ambientais e para as indústrias transfor-
madoras, porque funde a temperaturas mais baixas que
os materiais originais. Desta forma poupa-se energia
e aumenta-se a vida útil dos fornos de fusão.
Na tabela seguinte podemos observar as vantagens do pro-
cesso de reciclagem de vidro, comparativamente à produção
de vidro a partir de matérias-primas virgens.
Para além da poupança energética de cerca de 3,8 Gj/t
e da totalidade das matérias-primas, no processo de re-
ciclagem de vidro, quer as emissões atmosféricas, quer
os efluentes líquidos, são mais reduzidos e, portanto, menos
prejudiciais para o ambiente.

4.1.2.2. Papel/cartão
O papel e o cartão têm como componente fundamental
a celulose, cujas fibras provêm do algodão [que possui
cerca de 90 % de celulose], da madeira [com 60 %
88
de celulose] ou das palhas de cereais [que chegam a possuir
cerca de 50 % de celulose].
Para o fabrico de papel usam-se diferentes selecções
de matérias-primas, que dependem do tipo de papel que
se visa obter. Para além da celulose, na produção do papel
e do cartão, são usados outros produtos, como por exemplo,
resinas e colas, para conferir maior resistência, sais, materiais
inertes e corantes.
O processo de produção de papel a partir das fibras
celulósicas é bastante poluente, dado que é necessária a uti-
lização de branqueadores, maioritariamente à base de cloro.
O branqueamento pode, igualmente, ser conseguido através
de um processo que tem por base o ozono ou o oxigénio
e do qual resultam efluentes menos poluentes.
No caso do papel, a reciclagem não pode ser integral porque,
quer durante o uso do papel, quer durante o processo
de reciclagem, acontece a ruptura das fibras de celulose,

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


o que implica a incorporação de matérias-primas virgens.
A quantidade destas matérias depende do tipo e qualidade
de papel que se pretende produzir: se para se obter
cartão canelado basta incorporar apenas 1 % de fibras
virgens, já para produzir papel de escrita [tipo folhas A4
e papéis de revistas], são necessárias mais de 80 %; ou
seja só são utilizados até 20 % de papéis velhos para o
seu fabrico.
Porém, fabricar papel reciclado é muito mais simples e eco-
nómico. É apenas necessário desmembrar o papel em água
e retirar-lhe as impurezas [agrafos, plásticos, colas, etc.],
recuperando-se de seguida as fibras que contém. Estas são
posteriormente destintadas, incorporadas, ou não, com
as fibras virgens necessárias ao tipo de papel que se
pretende produzir. A pasta é depois estendida em mesas de
formação da folha, seca e posteriormente cortada à medida.
Os papéis velhos são classificados por lotes consoante o tipo
de papel a que podem dar origem. Assim, o papel branco
[impresso e não impresso] é utilizado para a produção
de papéis de escrita e impressão; o papel colorido e o im-
presso são usados para o fabrico de jornais e papéis para
folhetos; os papéis misturados e os cartões são utilizados
para fabricar outros cartões de embalagem.
89
Utilização de garrafas
Extracção de areias
e frascos de vidro

Deposição no Deposição no vidrão. Garrafas com retorno,


Lixo de indiferenciados. Demonstração do que não se deve deposi- para reutilização
tar, nomeadamente vidros de janela,
Ciclo do Vidro

espelhos, lâmpadas, porcelanas


e produtos de cristal

Remoção e transporte do vidro


Engarrafamento
das garrafas
e utilizadas de novo.
Indústria de reciclagem do vidro

Árvores Apresentação Apresentação do aproveitamento Deposição


a serem cortadas de alguns problemas do verso das folhas de escrita do papel
para produção oriundos da produção para rascunho com prévia selecção no Ecoponto para
de pasta de papel da pasta de papel em casa ou no escritório reciclagem

Demonstração de processos Demonstração do tipo de papel Recolha e transporte


para produção que não deve ser depositado. do papel para
da pasta de papel. Por ex.: Papel de embrulho; Papel unidade de triagem
com gorduras; Papel betuminoso.
Ciclo do Papel
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

Enfardamento do papel para reciclagem

Processo de Reciclagem.
A partir do papel usado
é possível fazer papel com elevada qualidade, Apresentação das vantagens da reciclagem.
papel de jornal, cadernos, cartão, Permite o abate de menos árvores.
cartão canelado e isolante na construção civil, Necessidade de menos água.
entre outros Consome 2 a 3 vezes menos energia.
Diminuição da poluição atmosférica
e da de aquíferos.

90
Várias acções e/ou objectos Deposição no ecoponto Transporte para a unidade
com a utilização do plástico com visualização de triagem e envio para
da prévia selecção em casa as indústrias de reciclagem

Ciclo Embalagens de Plástico


Deposição Realização de alguns objectos O plástico é separado pelas
no lixo indiferenciado. através das embalagens que já diferentes características e subme-
não se pretende usar. tido aos vários processos de
reciclagem

Os novos produtos já reciclados voltam


para as lojas para serem utilizados.

Apresentação da aquisição Apresentação de caixotes para o restos dos alimentos


de vários alimentos e de resíduos recicláveis.
Preparação dos alimentos e envio dos restos
para o caixote dos resíduos de matéria orgânica

Imagem da compostagem Deposição nos contentores de indiferenciados


no próprio jardim. com a imagem
também de diferenciados ou recicláveis
Ciclo Orgânico
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

Transporte dos resíduos para uma estação Transporte até à incineradora


de triagem para posterior compostagem para obter energia

Estação de compostagem Transporte até à incineradora


para obter energia

Lançamento Objecto que demonstre


do composto nos solos. o uso de energia.

91
Vantagens Ambientais da Reciclagem do Papel47
Papel de Papel de
Papel Reciclado
1.ª Qualidade 2.ª Qualidade
Área de floresta [ha] 5,3 3,8 0
Árvores 15 10 0
Madeira [kg] 2 400 1 700 0
Água [litros] 200 000 100 000 1 000
Energia [KW/h] 7 500 5 000 2 500
Poluição da água Elevada Média Baixa ou nula
Poluição do ar Elevada Média Nula
1,5 a 2 m3 1,5 a 2 m3
Produção de RSU Baixa ou nula
em aterro em aterro

As vantagens da reciclagem de papel são bastante evidentes,


quer do ponto de vista económico, quer ambiental. Se por
um lado o processo de fabrico de papel reciclado gasta
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

menos água, isto traduz-se imediatamente num benefício


económico para os fabricantes e também num benefício
ambiental. Por outro lado, os efluentes resultantes do pro-
cesso de reciclagem são menos poluentes, o que implica
menos custos associados ao seu tratamento por parte das
indústrias e menos impactes negativos no ambiente.
Também a poupança de matérias-primas [normalmente
a madeira proveniente de árvores de crescimento rápido
e que substituem a floresta tradicional com a consequente
diminuição da biodiversidade e esgotamento dos solos] não
pode ser desprezada.

4.1.2.3. Plástico
O plástico é fabricado a partir do petróleo. Estima-se que
para fabricar um quilo de plástico sejam necessários dois
quilos de petróleo.
A maior parte dos plásticos não é biodegradável e por tal
a sua eliminação é dispendiosa e danosa para o ambiente.

47
Centro de Informação de Resíduos da Quercus. Formação de Professores
na Área dos Resíduos Sólidos Urbanos. Quercus.
Fonte: http://www.quercus.pt [Setembro’05].

92
Mas a reciclagem dos plásticos também não é um processo
simples, como os que vimos atrás, relativamente ao vidro
e ao papel.
Diariamente somos confrontados com imensos objectos
de plástico e nem nos apercebemos que são plásticos
de diferentes tipos, provenientes de diferentes polímeros48,
com características distintas, e que para serem reciclados
têm de ser devidamente separados.
Na tabela seguinte referem-se os plásticos mais correntes,
os termoplásticos, e que podem ser fundidos e remoldados.

Símbolo Classificação Principais Usos


Embalagens para
PET líquidos gaseificados,
Politerftalato garrafas de água,
de Etileno detergentes, sumos
e produtos de higiene

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


HDPE [PEAD] Garrafas
Polietileno e frascos,
de Alta Densidade brinquedos

Embalagens
PVC de detergente,
Cloreto água e óleo, tubos
de Polivinilo e perfis de estores

LDPE [PEBD] Sacos de plásticos


Polietileno de e filme plástico
Baixa Densidade
Embalagens
PP de bolachas, batatas
Polipropileno fritas, cadeiras,
tabuleiros,
caixas de CD

PS Copos de iogurte,
Poliestireno embalagens de ovos,
esferovite, e tabuleiros

48
Polímeros - corpos formados pela reunião de muitas moléculas numa só.

93
Estes plásticos são também os que têm menor grau
de polimerização. Para além destes existem também os plás-
ticos termoendurescíveis, que pelas suas características [alto
grau de polimerização] são resistentes ao calor e à pressão,
não podendo, por isso, ser reciclados.
A reciclagem dos plásticos assenta em tecnologias físico-
-mecânicas ou químicas. Da mistura de diferentes plásticos
podem obter-se produtos com alta resistência e que
podem competir com a madeira em bancos de jardim
e outro mobiliário urbano, com os metais, em tubagens
e outras aplicações, ou mesmo com o cimento para
a construção de pavimentos. Quando se requer a obtenção
de produtos com características análogas aos produtos
de origem, a selecção dos plásticos tem que ser muito
cuidadosa para se garantirem os mesmos polímeros.
A reciclagem química promove, então, a quebra das estru-
turas poliméricas até se chegar às moléculas de origem que
podem, assim, ser recicladas. Este processo pode ter por
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

base a hidrogenação49, gaseificação50 ou pirólise51.


Comparativamente, e pese embora os benefícios ambientais
da reciclagem dos plásticos, nomeadamente no que respeita
à poupança de recursos naturais, o custo da reciclagem
destes materiais é maior que o do processo de fabrico
com matérias virgens [petróleo bruto].
A reciclagem dos plásticos traduz-se numa diminuição dos
impactes ambientais a nível de52:
PPoupança de matérias-primas não renováveis, como o petróleo;
PRedução do consumo de energia na fabricação de mate-
riais plásticos;
PTransformação de produtos de vida curta [embalagens],
em produtos de vida longa;
PRedução dos encargos com a remoção e tratamento de RSU.
Em Portugal já é possível a reciclagem de diversos plásticos
e existem várias empresas que incorporam nos seus pro-
cessos de fabrico os plásticos provenientes dos resíduos
sólidos urbanos após a sua triagem.

49
Hidrogenação - quebra das correntes polímeras com hidrogénio e calor.
50
Gaseificação - aquecimento dos plásticos com ar ou oxigénio.
51
Pirólise - quebra das moléculas a quente mas em vácuo.
52
Idem.
94
4.1.2.4. Metal
Os metais que fazem parte do nosso dia-a-dia de con-
sumidores dividem-se em dois tipos distintos: uns são
metais ferrosos, maioritariamente o aço [ou seja provêm
do ferro], os outros, os não ferrosos, são essencialmente
os de alumínio [que têm por base a bauxite].
A reciclagem do metal tem alguma tradição no nosso país
e é um processo simples de fusão para a produção de novos
bens metálicos.
A recuperação dos metais enviados para reciclagem é quase
total, devido ao seu elevado valor económico. É efectuada
a recuperação do cobre, do latão e do alumínio. O cobre
é utilizado na metalurgia, o latão para a produção de, por
exemplo, contadores de água e o alumínio é fundido sendo
novamente utilizado com excelente qualidade.
Para além de outras, tal como temperaturas de fusão infe-
riores para a reciclagem, a grande vantagem de reciclar
o metal está na poupança dos recursos naturais que estão

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


na base da produção de latas de bebidas, comidas, sprays e
outras latas, e que são recursos esgotáveis.

Tabela de Redução dos Impactes Ambientais no Fabrico


de Produtos através da Reciclagem do Metal53
Metais ferrosos Metais
[%] não ferrosos [%]
Consumo de energia - 75 - 95
Poluição do ar - 85 - 95
Consumo de água - 40 - 95
Poluição da água - 75
Redução de resíduos - 97

A reciclagem de uma tonelada de alumínio permite a eco-


nomia de cerca de 5670 litros de combustível, considerada
suficiente para o abastecimento de um automóvel durante
três anos [The Resource Conservation Challenge, 2003].
Acresce que a construção de minas para extracção de ferro
e de bauxite, provoca a devastação de grandes áreas
de floresta, especialmente de floresta tropical, no caso
da extracção da bauxite.

53
Ibidem, p. 34-35.
95
Para produzir uma tonelada de alumínio são necessários
17 600 KW/h de energia. Por seu lado a reciclagem de uma
tonelada de alumínio necessita, apenas, de 700 KW/h. Este
diferencial garante energia a 160 pessoas durante um mês
[ABA - Associação Brasileira do Alumínio - www.abal.org.br].

4.1.2.5. Tetra brik


O Tetra brik, também designado por cartão compósito,
cartão complexo ou cartão para líquidos alimentares
é constituído por uma camada de papéis, sobre a qual
assenta um filme plástico e cujo interior é constituído por
uma folha de alumínio. Este material é usado em emba-
lagens de leite, vinho, natas, concentrados de tomate
e outros produtos alimentares. Tem excelentes características
de impermeabilidade e de opacidade que garantem as ca-
racterísticas organoléticas54 dos produtos, sem necessitarem
de refrigeração.
A reciclagem destas embalagens pode ser efectuada de duas
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

formas:
P Uma que tritura e mistura todos os componentes das
embalagens, que depois de prensados podem ser usados
na produção de diferentes aglomerados;
P E uma outra que separa os constituintes [essencialmente
a fibra de celulose] para serem reciclados separadamente.
No caso do aproveitamento conjunto, e por um processo
de extrusão, obtêm-se tacos para paletes e briquetes
[utilizadas como um combustível pelas indústrias]. Desde
há vários anos que na Alemanha e na Suécia, se fabricam
a partir das embalagens usadas aglomerados com a marca
registada Tectan. Este aglomerado não necessita de colas,
é impermeável e termoformável, sendo utilizado para
a produção de vários produtos comerciais, nomeadamente
bases para copos, pastas, dossiers, suportes de relógios,
quadros, caixas, tabuleiros de jogos, mobiliário e acaba-
mentos para soalhos.
No caso da reciclagem separativa de cada componente, que
é o processo utilizado na fábrica da Tetra pak em Espanha,
o principal objectivo é a recuperação da fibra celulósica.

54
Características organoléticas - o cheiro, o sabor, a cor, a textura e o aspecto,
as que são detectadas pelos sentidos.
96
A separação da componente celulósica realiza-se num
hidropulper com um sistema de filtragem, obtendo-se uma
fibra sem branqueamento do tipo kraft de alta qualidade.
A fracção de alumínio e plástico é transportada até uma
caldeira onde se realiza o aproveitamento do polietileno
através da utilização do seu calor na secagem do papel.
O alumínio, em forma oxidada, pode ser aproveitado para
a produção de sulfato de alumínio que tem diversas
aplicações industriais. Este processo possibilita uma
poupança energética de 156 kg de fuel por tonelada de
papel. Em Portugal e Espanha este papel kraft, produzido
pela reciclagem das embalagens Tetra brik, é utilizado
para fazer bolsas de papel para fins comerciais e sacos
para fins industriais.
As embalagens Tetra brik provenientes das recolhas
selectivas de resíduos são enviadas, depois de seleccionadas
e enfardadas nas estações de triagem, para a fábrica
de Espanha onde são recicladas utilizando o processo

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


de reciclagem acima mencionado55.

4.1.2.6. Pilhas
As pilhas têm alguns constituintes que são nocivos à saúde
e ao ambiente, como o cádmio e o mercúrio.
Perspectiva-se que cada vez mais sejam consumidas pilhas
recarregáveis que são mais económicas, e que estas deixem
de incorporar o cádmio, passando preferencialmente a ser
constituídas por hidróxido de níquel.
As pilhas de mercúrio têm vindo a ser retiradas do mercado
devido à perigosidade deste componente e são substituídas
por pilhas de zinco-ar ou de óxidos de prata.
As tecnologias de recuperação dos constituintes das pilhas
baseiam-se na separação dos diversos metais para a sua
posterior utilização no fabrico de novas pilhas.
Em Portugal as pilhas são todas importadas, não havendo
nenhuma indústria que as retome e incorpore nos seus
processos de fabrico/reciclagem. Deste modo é comum exis-

55
Fonte de informação: http://www.consultorioct.mct.pt [Março de 2006].

97
tirem acordos de exportação destes materiais para países
que os possam processar correctamente.
No caso de Portugal, as pilhas e acumuladores [segundo
a Ecopilhas] são encaminhados para a Áustria para serem
recicladas.
Dada a perigosidade destes resíduos, o seu transporte e ex-
portação para reciclagem obedecem a um normativo legal
específico para este tipo de resíduos [resíduos perigosos].

4.1.3. Reciclagem Orgânica


A reciclagem das fracções orgânicas dos resíduos pode ser
conseguida por via aeróbia [em presença de oxigénio]
como é o caso da compostagem ou por via anaeróbia [na
ausência de oxigénio], que se designa por biometanização
ou digestão anaeróbia.

4.1.3.1. Compostagem
“A compostagem é a degradação aeróbia dos resíduos
orgânicos até à sua estabilização, produzindo uma substância
húmida [composto] utilizada como corrector de solos”56.
Numa instalação de tratamento por compostagem estão
presentes três operações básicas até se chegar à última eta-
pa e que é a da afinação do composto para a aplicação
na agricultura e que são: a preparação, a decomposição
Numa e a maturação.
Central de Triagem
ou Estação A preparação visa a reti-
de Compostagem
a separação rada de resíduos indesejá-
de embalagens veis das fracções orgânicas
de metal faz-se compostáveis e pode ser
por correntes
de Foucault efectuada com recurso a
[não ferrosas] trabalho manual conjunta-
ou por eletro-íman
[ferrosas]. § mente com equipamentos
diversos, como por exemplo:
separadores electromagnéticos [que retiram os metais
ferrosos], separadores de contracorrente [para a retirada
de metais não ferrosos], crivos de malhas diversas [que

56
Segundo Lobato Faria, et al, 1997.
98
Processo de decomposições e maturação de resíduos orgânicos

Fonte: CARAPETO, Cristina [coord. Científica]; ALVES, Fernando Louro; CAEIRO, Sandra.
Educação Ambiental. Lisboa: Universidade Aberta, 1999. [Adaptado]

retiram todos os materiais com dimensões superiores

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


ou inferiores às desejáveis, ou ainda para separar materiais
mais leves ou mais pesados].
São assim separados os vidros, plásticos, metais, papel,
têxteis, cascalhos, materiais leves, etc., que podem pôr em
causa o processo de compostagem, dado que contêm
substâncias com propriedades que podem neutralizar
os ácidos que se formam durante a fase seguinte - a de-
composição. Com a preparação pretende-se obter uma
massa de materiais fermentáveis, triturada e de caracte-
rísticas homogéneas.
Na fase de decomposição é muito importante o controlo
contínuo de diferentes factores como por exemplo:
P A temperatura - para indicar o equilíbrio biológico e a efi-
ciência do processo;
P A oxigenação - para garantir as condições aeróbias; evitar
temperaturas excessivas; diminuir os maus cheiros;
P O teor em humidade - para assegurar a actividade
dos microrganismos [altos teores de humidade - > 65 %
- levam à formação de água impedindo a circulação
do oxigénio e causando anaerobiose; baixos teores de hu-
midade - < 40 % - inibem a actividade microbiológica];
P O pH - para garantir a actividade dos microrganismos;
99
P A relação carbono/ozono [C/N] - para indicar a disponi-
bilidade de nutrientes e de condições metabólicas para
a actividade dos microrganismos;
P O tamanho das partículas a compostar - para assegurar
que toda a área está em contacto com os microrganis-
mos [partículas muito pequenas: dificuldade de circulação
do oxigénio; partículas muito grandes: muito tempo para
a decomposição].
O processo de decomposição e de maturação apresenta
uma grande variação de temperatura e uma evolução das
características bioquímicas da mistura.
Na fase inicial da decomposição, com a formação de pilhas
ou medas que são revolvidas para arejamento ou são
injectadas de ar forçado, a temperatura começa a au-
mentar muito rapidamente até atingir perto dos 70ºC
e mantém-se assim alta durante duas a três semanas. Este
aumento de temperatura deve-se à actividade da população
de microrganismos. Na fase mesófila acontece a decompo-
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

sição dos compostos mais facilmente degradáveis, por acção


de fungos mesofilos e de bactérias. Esta grande actividade
gera calor que fica retido na massa de resíduos. O aumento
da temperatura dá origem ao aparecimento de bactérias
termófilas e de actinomicetes que degradam a quase totali-
dade da fracção orgânica. A estas temperaturas [entre
os 50 e os 65º] é destruída uma grande parte dos
organismos patogénicos presentes nos resíduos, bem como
ovos de parasitas, larvas de insectos e sementes de ervas
daninhas, sobretudo quando esta fase termófila é mantida
durante alguns dias.
Quando se esgota o carbono mais acessível para a acti-
vidade destes organismos termófilos, a temperatura da mas-
sa desce o que favorece nova colonização por outros
organismos que vivem a temperaturas mais baixas e que
vão decompor os compostos mais difíceis de degradar, como
a celulose e a lenhina. Quando se atinge uma temperatura
próxima da temperatura ambiente o composto passa à fase
de maturação, que pode demorar entre algumas semanas
a vários meses. Nesta fase a humidade é de cerca de 20 %
e a relação C/N atinge valores de 10:1. Continua lenta-
mente a processar-se a degradação de substâncias mais
resistentes com a formação de ácidos húmicos.
100
O pH na fase de maturação encontra-se próximo de 8
- o composto é ligeiramente alcalino.
O processo atrás descrito é também referido como sendo
o processo de compostagem lenta. Porém a compostagem
pode ser acelerada através do recurso a um reactor que
funciona como catalisador ou acelerador dos processos
naturais, podendo em alguns casos o processo estar
concluído ao fim de 6 dias. Neste caso, para higienizar
o composto é necessário eliminar os organismos patogénicos
que só desaparecem quando a fase termófila dura pelo
menos alguns dias.
Em qualquer dos casos o processo de compostagem passa,
ainda, pela afinação do composto e que consiste na retira-
da de materiais inertes que “escaparam” na fase de prepa-
ração e na redução da granulometria. Este tipo de afinação
depende da utilização final que o composto irá ter.
No final do processo de compostagem o composto deve
apresentar um odor a terra húmida, ter uma cor castanha

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


escura e homogénea e uma textura porosa.
A compostagem tem várias vantagens económicas e ambi-
entais, dado que incorpora nos solos matéria orgânica prove-
niente dos resíduos e que serve de correctivo e fertilizante.
Em Lisboa, como foi aliás referido no início deste capítulo,
durante a década de oitenta e primeira metade dos
anos 90 e até ao seu encerramento para a realização
da EXPO’98, esteve em funcionamento uma estação
de tratamento por compostagem [ETRS] que recebia e proces-
sava, na altura, cerca de 1020 toneladas de resíduos
diariamente. Pese embora a entrada em funcionamento
desta estação ter sido anterior, durante esse período ela
era uma responsabilidade da Câmara de Lisboa. Contudo,
os resíduos recebidos na ETRS não eram alvo de recolha
selectiva, pelo que o processo de preparação da composta-
gem era complicado e apenas uma pequena fracção
do total de resíduos recebido na instalação era passível
de sofrer reciclagem orgânica. A separação dos contaminantes
contava também com um separador electromagnético que
conduziu a reciclagem várias toneladas de metais ferrosos.
O composto na altura produzido, o Ferthumus, era vendido
a diversas explorações agrícolas situadas maioritariamente
na Estremadura e Ribatejo.
101
Refere-se que a legislação nacional não menciona quais as
características que o composto orgânico deve possuir para
aplicação agrícola. Porém, vários normativos internacionais
estabelecem as características físico-químicas e microbioló-
gicas que devem ser requeridas ao composto para o seu uso
agrícola. Mas mesmo que o uso deste produto não se faça
na agricultura ele pode igualmente ser utilizado como cor-
rector e fertilizante de solos para usos recreativos e florestais.

4.1.3.2. Biometanização
A biometanização é tam-
bém um processo de re-
ciclagem das fracções orgâ-
nicas dos resíduos, mas é
ETVO - efectuado sem a presença
Estação de Tratamento
e Valorização Orgânica de oxigénio. Este processo
da Valorsul requer uma tecnologia
[fase de construção]. §
mais sofisticada que o de
compostagem e o produto
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

final obtido é pastoso e necessita, para aplicação agrícola,


de uma fase de secagem e de maturação aeróbica.
Para que a biometanização possa acontecer, a recolha da
matéria orgânica a reciclar deve ser selectiva, embora mesmo
assim seja alvo de preparação [retirada de contaminantes]
e homogenização.
A degradação da matéria orgânica, como foi atrás referido,
é efectuada por digestão anaeróbia, ou seja, pela actividade
de bactérias anaeróbias e os produtos finais desse meta-
bolismo são o dióxido de carbono e o metano. Estes
constituintes fazem parte do biogás que se produz durante
a degradação orgânica, o qual pode ser aproveitado para
a produção de energia eléctrica, aquecimento ou abasteci-
mento das redes de gás canalizado. A produção deste
subproduto pode ascender a 200 m3 de biogás, por tonelada
de resíduos processada.
Todo o processo ocorre num sistema fechado, que se designa
por digestor, mas a estabilização do produto final é lenta,
uma vez que não se atingem temperaturas muito elevadas.
Por tal, a destruição de organismos patogénicos não
é totalmente eficaz, sendo necessária a sua posterior destrui-
ção ou uma selecção muito apurada dos resíduos iniciais
a incorporar.
102
A biometanização pode classificar-se de acordo com os ma-
teriais que entram no processo e pode ser por via seca
[quando a concentração total de sólidos é superior a 25 %]
ou por via húmida [quando a concentração de sólidos
é inferior a esse valor]. Também o tipo de degradação
pode variar, embora seja feita por bactérias metanogénicas,
dependendo da temperatura alcançada: diz-se que o processo
é mesofílico quando a temperatura oscila entre os 30
e os 40ºC, ou termofílico quando atinge temperaturas mais
elevadas, na casa dos 50 a 65ºC.
Comparativamente com a compostagem este processo
apresenta algumas vantagens e desvantagens que podem
ser verificadas no próximo quadro.

Características Compostagem Combustão anaeróbia

Calor, C02, vapor Biogás [C02 e CH4],


Outputs de água água e os resíduos

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


e composto da digestão [lamas]

Emissões Amónia Ácido sulfúrico


atmosféricas [odor]
Investimento Relativamente baixo Elevado
Tempo do processo Demorado Relativamente baixo
[Adaptado de Martinho, 2000]

Uma das principais vantagens da biometanização é a rapidez


com que se processa o tratamento dos resíduos orgânicos
e a recuperação do biogás para a produção de energia.
Em Portugal, há uma estação de digestão anaeróbia na
Valorsul que se situa no Concelho da Amadora e que entrou
em funcionamento, com os primeiros testes, no Verão de 2005.
Esta central destina-se a tratar os resíduos orgânicos do
Mercado Abastecedor de Lisboa e os recolhidos selectiva-
mente em restaurantes, cantinas, hotéis e outros mercados
municipais. No Município de Lisboa, durante 2005, foram
integradas no sistema de recolha selectiva de matéria
orgânica, cujo destino é a central de valorização orgânica
da Valorsul, cerca de 500 entidades.
103
4.2. Incineração e Valorização Energética
Embora a valorização ener-
gética, como vimos no
Incineração ponto anterior, possa ser
[Estação de
Tratamento efectuada através do pro-
de RSU cesso de biometanização
de São João da Talha com a recuperação do bio-
- Valorsul]. §
gás, ela assume particular
importância associada ao processo de incineração dos resí-
duos, com a recuperação do calor produzido.
A incineração é um processo de combustão controlada
dos resíduos ou seja um processo químico por via térmica
e realiza-se em duas fases:
P Na combustão primária acontece a transformação quase
imediata e total dos resíduos em cinzas ou escórias de
fundo e em efluentes gasosos, com libertação de energia;
P Na combustão secundária, queimam-se os gases resultan-
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

tes da fase anterior [gases voláteis e produtos da combustão


incompleta]. Nesta fase há a libertação de cinzas volantes.
O processo de incineração visa:
P A redução dos resíduos, que permite atingir os 90 %
no volume e os 70 % no peso;
P A recuperação de energia que pode ser realizada sob
a forma de energia térmica, eléctrica, ou ambas as formas
conjugadas;
P A estabilização dos resíduos [as cinzas ou escórias
de fundo são consideradas mais inertes que os resíduos
que entram na incineração].
Por razões económicas a incineração deve efectuar-se sem
recurso a combustíveis auxiliares. Ou seja, deverão ser
os próprios resíduos a única fonte combustível do processo.
Porém isto nem sempre é possível, porque geralmente os
resíduos são admitidos em bruto e a sua composição não
respeita os pressupostos essenciais, para que tal aconteça.
Quer isto dizer que podem ter poder calorífico inferior
[PCI] abaixo das 1100 Kcal/Kg; ou que não têm matéria
combustível superior a 25 % em peso; ou ainda que o seu
teor em humidade é mais elevado que o admissível [50 %
em peso]. O teor em cinzas é outro elemento limitante
104
da auto-combustão dos resíduos. Existem queimadores de re-
forço que funcionam a fuel ou gás e que entram automati-
camente em funcionamento quando a temperatura dos ga-
ses de combustão é inferior a 850ºC. Estes queimadores
auxiliares são também utilizados no arranque e paragens
da instalação.
A admissão dos resíduos em bruto na incineração aporta
algumas dificuldades que comprometem o processo ou que
diminuem a sua eficiência. Assim, a presença de materiais
inertes como o vidro, pedras e metais, degradam a câmara
de combustão [forno] e implicam uma menor eficiência.
Também a presença de resíduos com metais pesados condu-
zem a emissões muito poluentes.
A eficiência do processo depende das temperaturas em que
este ocorre [variam entre 800 e 1000ºC, sendo mais comum
verificarem-se 850ºC], do tempo de permanência dos resí-
duos no forno [cerca de 2 segundos] e da turbulência ou
grau de mistura dos resíduos com o ar - o teor em oxigénio

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


deve ser superior a 6 %.
Uma central de incineração dispõe de uma zona de recepção
e preparação dos resíduos [que pode incluir a sua separação
ou pré-processamento], de uma câmara de combustão,
de uma ou mais caldeiras para a recuperação de vapor.
Tem igualmente vários métodos e equipamentos para
o tratamento das emissões gasosas e líquidas e de locais
de armazenamento dos resíduos da combustão [cinzas
ou escórias de fundo e cinzas volantes].
A fossa de recepção dos resíduos e a área de descarga
e processamento são estruturas normalmente cobertas para
evitar a emanação de maus cheiros.
O forno de combustão deve ser suficientemente alto para
que os compostos voláteis libertados se possam misturar
com o ar e inflamar-se. A pressão dentro do forno é inferior
à pressão atmosférica para evitar que os gases de combus-
tão se libertem para o exterior.
As câmaras de combustão são normalmente dotadas
de grelhas e todo o processo de incineração é controlado,
podendo requerer insuflação de ar. Da combustão dos resí-
duos resultam gases a elevadas temperaturas. Estes gases
podem ser conduzidos a uma caldeira de recuperação
de calor, ou a tubos verticais alinhados e interligados
105
colocados no interior da câmara de combustão. Pelo seu
interior passa água que absorve o calor. Em ambos os casos
o que se obtém para a recuperação de energia é o vapor.
Para a produção de energia eléctrica o vapor passa por
uma turbina de condensação, sendo a refrigeração efectuada
por água. Se se pretender usar o vapor para aquecimento,
e como este é produzido a alta pressão, tem que ser
conduzido a uma turbina de contrapressão para se reduzir
a pressão até ao nível de utilização de consumo.
Numa estação de incineração é inevitável a produção de po-
luentes, embora seja possível a sua minimização através
da triagem de substâncias indesejáveis e pela utilização
de dispositivos eficientes de controlo.
Os gases provenientes da queima podem conter poeiras,
metais pesados [mercúrio, cádmio, chumbo], gases ácidos
e compostos orgânicos [como por exemplo dioxinas e fura-
nos, clorofenóis, clorobenzenos]. As partículas ou poeiras
formam-se se a combustão for incompleta e, geralmente, são
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

produzidas entre 10 a 75 Kg de partículas por cada tonelada


de resíduos incinerada. Os metais pesados podem estar
contidos nos gases de combustão ou ficar com as cinzas
e escórias de fundo. A natureza química destes metais
é alterada pelo calor mas não é destruída o que implica
que concentrações significativas possam ser emitidas, espe-
cialmente, no estado gasoso.
Os gases ácidos que se formam são essencialmente ácido
clorídrico e ácido fluorídrico. Formam-se igualmente óxidos
de azoto e de enxofre que na atmosfera podem originar
ácido sulfúrico e ácido nítrico, gases que originam vários
problemas ambientais e de saúde pública.
Os compostos orgânicos, nomeadamente os furanos e dioxi-
nas são considerados substâncias tóxicas. Contudo, segundo,
White et al, 1995, os níveis de dioxinas emitidos por um
incinerador são consideravelmente menores que a quanti-
dade que dá entrada no processo.
Estes diferentes poluentes são alvo de diferentes dispositivos
de controlo.
As partículas são controladas por precipitadores electros-
táticos [atracção electrostática], filtros de mangas [filtração
mecânica das partículas] ou filtro electrostático de leito
de areia grossa [combina os dois dispositivos anteriores].
106
Estes três sistemas de controlo de partículas são igualmente
eficazes na recolha de metais pesados que estão dissolvidos
nas poeiras. Tal acontece quando à saída da caldeira
a temperatura baixa para valores da ordem dos 230ºC ou
inferiores, o que beneficia a condensação e recolha de ácidos,
metais voláteis e compostos orgânicos [Clarke et al, 1991].
Tipicamente são produzidos cerca de 6000 m3 de gases
de combustão por tonelada de resíduos incinerada. Estes
efluentes são, como vimos atrás,“despoluídos” e dependendo
da altura da chaminé, da temperatura a que são emitidos
e da velocidade e orientação dos ventos dominantes, diluem-
-se e dispersam-se na atmosfera.
Também os resíduos resultantes do processo de incineração
são alvo de tratamento, aproveitamento ou destino final.
Tal depende dos resíduos em presença.
Assim, temos por um lado as cinzas ou escórias de fundo
consideradas um resíduo não perigoso, que podem ser alvo
de aproveitamento e utilizadas como um agregado de subs-

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


tituição na construção civil ou para a pavimentação
de estradas. A utilização desses materiais para estes fins
tem sido alvo de controvérsia, que se prende com a toxici-
dade dos materiais em causa. Por tal é conveniente a exis-
tência de um pré-tratamento [separação] e monitorização
das características para estas aplicações. A valorização destes
materiais pode também incluir a separação dos metais
ferrosos e não ferrosos presentes nas escórias, visando a sua
condução a reciclagem.
Caso não sejam alvo de valorização estes resíduos são
depositados em aterro sanitário, em células separadas ou
conjuntamente com outros resíduos.
Por outro lado, as cinzas volantes, as cinzas da caldeira e
os resíduos provenientes do tratamento dos efluentes gasosos
são considerados resíduos perigosos [de acordo com o catá-
logo europeu de resíduos]. Assim a sua eliminação deve ser
encarada como tal e por isso devem ser alvo de cuidados
especiais e que passam por um tratamento de solidifi-
cação/estabilização [por exemplo a encapsulação destes
resíduos com cimento] ou pela sua vitrificação ou fusão
[processos térmicos muito dispendiosos]. Seja qual for
o método de tratamento a deposição final tem que ser
efectuada em aterro sanitário para resíduos perigosos.
107
Do processo de incineração resultam também alguns eflu-
entes líquidos, embora em pequena quantidade: águas
de lavagem e arrefecimento, efluentes do tratamento húmido
dos gases ácidos, água usada para a recuperação do calor
e águas residuais de diversas actividades de limpeza. Estes
efluentes, antes de serem lançados nas redes de esgotos
municipais, para tratamento conjunto com os efluentes
domésticos, são também alvo de pré-tratamento na instala-
ção de incineração.
Todos os efluentes produzidos numa instalação de incine-
ração são alvo de uma monitorização e controlo contínuos
que verificam se os poluentes emitidos estão dentro de pa-
râmetros que não comprometam o ambiente e a saúde
pública. Os dados recolhidos são facultados às populações
locais e a vigilância e monitorização é também efectuada
por entidades externas, podendo ser realizada no âmbito
de um sistema de vigilância ambiental, por Câmaras
Municipais ou Entidades Governamentais.
Os resíduos indiferenciados produzidos em Lisboa, ou seja
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

os que não são alvo de recolha selectiva para reciclagem,


são conduzidos à Central de Tratamento de Resíduos
Sólidos Urbanos da Valorsul, situada em S. João da Talha.
Esta instalação tem capacidade para processar perto de
2000 t/dia. A recuperação do vapor é feita para a produção
de energia eléctrica que é lançada na rede de abaste-
cimento público;“produz-se energia suficiente para alimentar
uma cidade com 150 mil habitantes”57.

4.3. Aterro Sanitário


O aterro sanitário é o destino último dos resíduos sólidos,
ou pelo menos de uma parte deles, dado que nos processos
anteriores de tratamento e valorização [reciclagem material
e orgânica e incineração] há sempre uma quantidade
de materiais rejeitados, cujo destino final é o confinamento
em aterro.
No nosso país é também frequente que este equipamento
seja o único disponível para a eliminação dos RSU; ou seja
a recolha selectiva ainda não é extensível a todo o país,
existem poucas instalações de compostagem, apenas funcio-

57
Valorsul. Regulamento de Utilização da Central de Tratamento de Resíduos
Sólidos Urbanos. 2003.
108
nam duas incineradoras, a
da Valorsul [empresa para
o tratamento dos resíduos
da Área Metropolitana Vista aérea
[Aterro Sanitário
de Lisboa Norte] e a da
de Mato da Cruz
LIPOR [Empresa para o § - Valorsul].
tratamento dos resíduos
do Grande Porto]. Porém, como vimos atrás, o PERSU
estabelecia que em 2005 apenas 13 % do total de resíduos
do país seriam conduzidos directamente a aterro sanitário.
Na eliminação dos resíduos em aterro sanitário têm que ser
executadas com segurança as várias operações, de forma
a não se pôr em causa a saúde humana ou o ambiente.
É frequente a confusão dos termos “lixeira” e “aterro sani-
tário”. Porém são grandes as diferenças entre um vazadouro
e um aterro sanitário. Na lixeira ou vazadouro os resíduos
são depositados a céu aberto ao passo que um aterro
sanitário obedece a normas estreitas, que visam a protecção
da saúde e a redução ao mínimo de contaminações ou

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


riscos ambientais58.
PLixeira ou vazadouro não controlado - é uma modalidade
de confinamento no solo, em que os resíduos são lançados
de forma indiscriminada e não existe qualquer controlo
posterior.
PVazadouro controlado - é uma modalidade indesejável
de confinamento no solo, em que os resíduos são lançados
de forma ordenada e cobertos com terra; o local possui
vedação completa e pelo menos uma das duas condições
de drenagem [águas ou gases] e impermeabilização é satis-
feita, mas em contrapartida não é feita qualquer moni-
torização de impacte ambiental.
PAterro sanitário - é a modalidade de confinamento no solo
em que:
POs resíduos são lançados ordenadamente e cobertos com
terra ou material similar;
PExiste controlo sistemático das águas lixiviantes59 e dos ga-
ses produzidos;

58
LOBATO FARIA et al. [1997], citado por M.ª da Graça Martinho [1999].
59
Efluentes resíduais líquidos, ou seja as águas que percolam através dos
resíduos. Estas águas são portadoras de elevadas concentrações de matéria
orgânica e outros poluentes.
109
P É feita a monitorização do impacte ambiental durante
a operação do aterro e após o seu encerramento.
Um aterro sanitário deve, assim, obedecer às seguintes con-
dições técnicas:
P Vedação total;
P Cobertura diária dos resíduos;
P Impermeabilização do fundo do aterro e respectivos taludes;
P Drenagem, recolha, tratamento e posterior rejeição no siste-
ma de esgotos municipais das águas lixiviantes;
P Drenagem do biogás [com ou sem aproveitamento ener-
gético];
P Plano de monitorização durante a operação do aterro
e após o seu encerramento;
P Plano de recuperação paisagística após o encerramento
da instalação.
Estas condições visam assegurar a redução dos incómodos
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

e riscos de saúde pública, quer para trabalhadores, quer


para a população residente nas proximidades da instalação,
a minimização dos problemas de poluição quer do ar, quer
da água, e ainda dos solos e da paisagem.
Os aterros sanitários têm vários tipos de configurações
e de designações:
P Aterros em depressão [construídos em depressões naturais
- vales, ravinas - ou em depressões artificiais - por ex.
antigas pedreiras];
P Aterros em trincheira [que implicam a escavação e retira-
da de terras, depois usadas para a cobertura dos resíduos];
P Aterros de superfície [que implica a construção de um talu-
de, de encontro ao qual se vão depositando os resíduos].
De qualquer forma o aterro é composto por uma área
de solo impermeabilizada, normalmente com tela plástica
ou um material argiloso, onde os resíduos são depositados
em camadas diárias cobertas com terra. A estas áreas
de deposição dá-se o nome de células e têm normalmente
uma altura de cerca de 1,5 metros. Os resíduos são com-
pactados por equipamentos mecânicos de modo a evitar-
-se a formação de espaços intersticiais, como bolhas de ar.
Num aterro sanitário existem igualmente diversas insta-
110
lações de apoio. É comum a existência de uma báscula
para a pesagem dos resíduos que entram na instalação,
um pavilhão para a recolha e lavagem de viaturas e rodados
e, dependendo da sua dimensão e número de operadores
que aí trabalham, poderá também ter refeitório, vestiário,
oficinas, etc.
Durante a vida útil do aterro, e mesmo após o seu encer-
ramento, os resíduos aí depositados passam por várias fases
de transformação que dão lugar à formação de lixiviado
e de biogás.
Na primeira fase a decomposição dos resíduos é essencial-
mente aeróbia. O oxigénio dissolvido nos resíduos é rapida-
mente consumido por bactérias aeróbias e os materiais
orgânicos decompõem-se dando origem à produção de dió-
xido de carbono, água e outros compostos.
Na fase seguinte a decomposição dos resíduos passa a ser
anaeróbia [dado que o oxigénio dissolvido foi já consumido]
e a actividade de degradação é assegurada por bactérias

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


fermentadoras e acetogénicas. Daqui resulta a formação
de águas lixiviantes de natureza ácida que podem conter
elevadas concentrações de CQO [carência química de oxi-
génio] e CBO5 [carência bioquímica de oxigénio], de ácidos
gordos, cálcio, ferro, metais pesados e azoto amoniacal.
Os gases que se formam são o dióxido de carbono
e hidrogénio.
A terceira fase de decomposição designa-se por decom-
posição metanogénica intermédia e caracteriza-se pelo desen-
volvimento lento de bactérias metanogénicas, que aumentam
a concentração do metano nos gases produzidos e reduzem
o dióxido de carbono.
A fase metanogénica estável que se segue tem uma concen-
tração estável de metano [cerca de 50 a 65 % do total
de gases produzidos]. Nesta fase o lixiviado apresenta uma
redução de CQO e CBO5. A decomposição metanogénica
estável pode durar entre 15 a 20 anos.
A última fase de decomposição dos resíduos designa-se por
fase de maturação na qual apenas a matéria orgânica
de difícil decomposição permanece na massa de resíduos.
Todavia têm sido observadas emissões gasosas, 75 anos após
a selagem de alguns aterros.
111
A construção e exploração de um aterro sanitário passa por
várias fases. O estudo para o melhor local de implemen-
tação é normalmente assegurado pela realização comple-
mentar de estudos de impacte ambiental. Nesta fase esti-
ma-se igualmente a duração de vida do aterro para
a quantidade diária de resíduos que aí irão ser depositados.
O projecto do aterro elaborado para a obtenção de autori-
zação de construção, deverá conter uma memória descritiva
e justificativa da qual constam as características geológicas
e hidrológicas do local de construção, o sistema de imper-
meabilização a utilizar, a tipologia dos resíduos a receber,
o sistema de drenagem de águas lixiviantes e de águas
pluviais a implementar e o respectivo tratamento, o sistema
de drenagem e tratamento do biogás e, para além do plano
de exploração, com o respectivo estudo económico deve
igualmente conter o pro-
jecto de cobertura final
e recuperação paisagís-
Vista aérea tica do local, após o seu
das células
do Aterro Sanitário encerramento. O detalhe
[Aterro Sanitário dos elementos a constar
de Mato da Cruz do projecto de execução
- Valorsul]. §
para a construção de um
aterro sanitário podem ser consultados no Anexo I da Por-
taria n.º 961/98, de 10 de Novembro.
Na fase de construção e para se garantirem as normas
de segurança ambiental têm que ser contemplados um con-
junto de sistemas de protecção, dos quais se salientam60:
P Sistema periférico de valetas para o desvio das águas plu-
viais do perímetro de deposição dos resíduos e, sobretudo,
para fora das zonas em intervenção e frente de trabalhos;
P Impermeabilização do solo e dos taludes [feita com tela
de polietileno de alta densidade, protegida por geotêxtil];
P Aplicação de uma camada drenante sobre o sistema de im-
permeabilização, com 0,5 metros de espessura;
P Sistema de drenagem de fundo com valas e colectores
para que, de forma estratégica, possam captar e drenar
todas as escorrências líquidas para um poço de captação
e derivação;

60
Cabeças, 1996; Martinho 2000 [adaptado].
112
P Sistema de recepção para concentrar e acumular todas
as águas lixiviantes drenadas;
P Sistema de tratamento para esses efluentes que permita
o seu lançamento no meio receptor natural em condições
admissíveis;
P Sistema de drenagem de biogás em tubagem de polieti-
leno de alta densidade colocada horizontal e verticalmente
e ligada por “estrelas” que permita a saída para o exterior
dos efluentes gasosos;
P Sistema de condução do
biogás captado para uma Queimador de biogás
unidade de queima ou para [Aterro Sanitário
um sistema de aproveita- de Mato da Cruz
§ - Valorsul].
mento de energia.
Igualmente na fase de exploração do aterro devem ser
observadas normas básicas que permitam o bom funcio-
namento da estrutura e das quais se destacam:

Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário


P O controlo e registo do peso dos resíduos entrados
diariamente. Esta operação é feita através da pesagem
das viaturas na báscula à entrada e à saída do aterro
[a diferença obtida corresponde à tonelagem de resíduos
depositada]. Para se garantir que não há disparidades
nos dados, as viaturas devem passar por uma unidade
de lavagem dos rodados após efectuarem a descarga.
Esta operação evita também que lamas ou outros
resíduos conspurquem as vias e outros espaços públicos
exteriores ao aterro;
P A descarga dos resíduos deve ser sempre efectuada nas cé-
lulas diárias que constituem a frente de trabalhos. Após
a descarga os resíduos devem ser “arrumados” por uma
máquina compactadora ou pá de rastos, que de seguida
circula sobre estes, procedendo à sua compactação;
P As células de descarga têm que ser diariamente compacta-
das e cobertas por “um palmo” de terra. A superfície deve
ser regularizada e ter uma ligeira inclinação para permitir
o escoamento e drenagem superficial das águas pluviais.
Estes cuidados são da maior importância para a redução
dos impactes negativos:
P Evitam o espalhamento de resíduos mais leves por acção
do vento;
113
P Reduzem a propagação de maus cheiros e a proliferação
de roedores, aves e insectos;
P Causam menos incomodidade e insalubridade.
Na fase de encerramento ou selagem de um aterro, ou seja
quando este atinge a sua capacidade limite, há também
várias regras a observar para que o terreno possa ter
utilidade, sem pôr em causa, uma vez mais, a saúde
humana e o ambiente. Assim, a cobertura é da maior im-
portância porque a estabilidade dos terrenos só é conse-
guida em muitos casos após 30 ou mais anos da selagem
do aterro. Deve-se pois reduzir ao máximo a infiltração
de águas pluviais e permitir o desenvolvimento de vegeta-
ção, continuando-se a monitorização ambiental relativa
à drenagem do biogás e do lixiviado.
A cobertura final de um aterro sanitário é feita através
da colocação de diversas camadas:
P Camada em terra, regularizada sobre os resíduos, com
uma espessura de 80 cm;
Tratamento e Valorização de Resíduos: Reciclagem, Incineração e Valorização Energética, Aterro Sanitário

P Camada mineral [material arenoso com elevada poro-


sidade] com 20 cm para a captação e drenagem horizon-
tal do biogás acumulado à superfície;
P Camada de impermeabilização;
P Camada mineral drenante [material britado] com 30 cm
protegida por geotêxtil não-tecido;
Camada de cobertura de terra e terra vegetal. Se o reves-
P

timento posterior for do tipo herbáceo a camada deverá


ter pelo menos 60 cm, se a opção for por um revesti-
mento arbóreo, o solo de suporte deve ter no mínimo
2 metros. Esta camada não deve ser compactada para
permitir a circulação de ar e a penetração das raízes
das plantas;
P Sistema de drenagem das águas pluviais.
Após o encerramento de um aterro o terreno pode ser
utilizado essencialmente para fins recreativos: relvados,
jardins ou zona florestal. O uso agrícola e a construção
de infra-estruturas são pouco comuns porque requerem
técnicas muito dispendiosas de recuperação.

114
5.Instrumentos Económicos na Gestão
dos Resíduos Sólidos Urbanos

A integração da economia, ambiente e emprego, são


fundamentais para o desenvolvimento sustentável,
de acordo com a definição da Comissão das Nações Unidas
para o Ambiente e Desenvolvimento, constante no relatório
“O Nosso Futuro Comum”. Para além dos instrumentos legais
e sociais, os instrumentos económicos são cada vez mais
utilizados, como ferramenta fundamental para o desenvol-
vimento sustentado.
Um outro aspecto da gestão de RSU é a necessidade de
criação e implementação de taxas municipais de gestão
dos RSU, que são indispensáveis para cobrir os custos de
operação e manutenção dos sistemas implementados e que
podem funcionar simultaneamente como instrumento econó-
mico para prevenir e reduzir a produção de RSU e alterar
os comportamentos dos cidadãos, que tradicionalmente
consideram que os serviços de recolha, tratamento e depo-
sição dos seus resíduos devem ser gratuitos e da respon-
sabilidade da Autarquia.
A aplicação de impostos e de taxas à recolha de resíduos
domésticos é a forma mais directa, imediata e visível de in-
fluenciar o comportamento dos cidadãos. Os instrumentos
económicos incluem taxas, impostos, subsídios, sistemas
de depósito e licenças de comercialização.
Instrumentos Económicos na Gestão de Resíduos Sóliods Urbanos

De acordo com a Association of Cities and Regions for


Recycling61, existem duas grandes categorias de instrumen-
tos económicos aplicados à recolha de resíduos: os impostos
e as taxas. Dentro destas categorias há várias subcategorias:
P O sistema geral de impostos é baseado em impostos
directos: os impostos sobre a habitação, os impostos
comerciais, os impostos sobre as propriedades, não sendo
suposto cobrirem o custo dos serviços nem estarem
directamente relacionados com a produção de resíduos.
Este sistema é utilizado em Inglaterra;

61
ACRR. Conferência Internacional: Financing Models for Municipal Waste
Management based on Taxes, Charges, Volume-bbased Rates. Viena, Áustria,
1997.
115
P A taxa específica foi concebida para a recolha de resíduos,
mesmo que as facturas-recibo não estejam necessariamente
relacionadas com a gestão dos resíduos. Os parâmetros
de análise podem ser a dimensão da habitação ou do
agregado familiar, o consumo de água ou o imposto de pro-
priedade. Esta taxa é aplicada fundamentalmente nos
seguintes países: França, Grécia, Itália, Espanha e Portugal;
P A taxa fixa destina-se a cobrir os custos dos serviços
efectuados. Não é feita nenhuma distinção em relação
à produção de resíduos. Esta taxa é utilizada na Bélgica,
Dinamarca e Irlanda;
P A taxa variável não relacionada com a produção de resí-
duos é determinada em função dos serviços prestados
e cobre os seus custos, mas os parâmetros de análise
não estão relacionados com a produção de resíduos
[dimensão da habitação ou do agregado familiar, consumo
de água, valor da renda]. Esta taxa é utilizada na Bélgica,
França, Holanda e Suíça;
P A taxa variável relacionada com a produção de resíduos
cobre os custos dos serviços prestados. Reflecte o princípio
do poluidor-pagador, estando os parâmetros de análise re-
lacionados com a gestão de resíduos, tais como o volume,
frequência de recolha ou peso. Esta última subcategoria é
a que tem maior impacto na alteração do comportamento
dos cidadãos. Esta taxa é largamente utilizada na Áustria,
Bélgica, Finlândia, Alemanha, Luxemburgo, Suécia e Suíça.
A aplicação de taxas variáveis relacionadas com a produção
Instrumentos Económicos na Gestão de Resíduos Sóliods Urbanos

de resíduos em países como a Bélgica, a Alemanha, o Luxem-


burgo e a Holanda, teve os seguintes efeitos:
P Redução de 15 % a 50 % das quantidades de resíduos
domésticos, residuais ou não;
P Aumento de cerca de 5 % a 10 % dos resíduos que são
triados e reorientados para os recipientes adequados;
P O aumento da compostagem individual.
Os efeitos adversos também estão presentes, mas raramente
foram quantificados, sendo da ordem dos 3 % a 10 %, embora
possam ser minimizados através da adopção de medidas
adequadas.
Relativamente à aplicação de sistemas “Pay-as-you throw”
por parte das Autoridades Locais e com base num outro es-
116
tudo realizado em 15 Países da União Europeia e na Suiça,
a ACRR [1999] voltou a concluir e recomendar o seguinte:
POs sistemas que aplicam o princípio “Pay-as-you throw” são
largamente utilizados na Europa e sê-lo-ão cada vez mais.
Representam um importante instrumento da política nacio-
nal, regional e local;
PNos locais em que os sistemas “Pay-as-you throw” já foram
desenvolvidos, o esforço é feito no sentido de se optimizar
a sua aplicação, de forma a incrementar a prevenção dos
resíduos, a compostagem individual e a triagem, minimi-
zando os efeitos adversos;
POs dados disponíveis resultantes da aplicação dos sistemas
“Pay-as-you-throw”, revelaram os seguintes resultados:
Redução dos resíduos residuais domésticos;
P

Aumento da triagem na origem;


P

Encorajamento da prevenção na origem e da compos-


P

tagem individual;
Presença de efeitos adversos, que podem ser minimizados
P

pela adopção de medidas adequadas;


Os sistemas “Pay-as-you throw” devem ter em conside-
P

ração alguns aspectos de forma a alcançar um bom de-


sempenho económico e ambiental:
Informação e comunicação à população;
[

Transparência do sistema;
[

Aplicação de um sistema eficiente de recolha selectiva;


Instrumentos Económicos na Gestão de Resíduos Sóliods Urbanos

[

Factores socioeconómicos [rendimento, educação, dimen-


[

são do agregado familiar];


Tipo de habitação [edifícios ou moradias];
[

Selecção do tipo e capacidade dos contentores de acordo


[

com o comportamento da população;


Aplicação de um sistema de coimas.
[

A aplicação dos Sistemas “Pay-as-you throw” nestes países,


revelou as seguintes tendências:
O volume é o principal parâmetro de análise nos países
P

examinados; o custo dos primeiros metros cúbicos é su-


perior aos seguintes, mas por vezes o custo também
é constante ou progressivo, o que constitui um importante
incentivo para reduzir os resíduos;
117
P A frequência é um parâmetro largamente difundido,
o custo da frequência de recolha normalmente diminui,
mas, nalguns casos, aumenta podendo ser um incentivo
para reduzir os resíduos;
P A pesagem é rara porque recorre à utilização de tecnolo-
gia sofisticada o que pode ser economicamente inviável
nalguns casos;
P Outros parâmetros também são considerados tais como:
a dimensão do agregado familiar, a dimensão da habi-
tação, o valor da renda, medidas sociais e incentivos
no caso da compostagem;
P Em sistemas baseados na recolha de sacos, por vezes
os sacos são vendidos a um preço que inclui a taxa;
PNos sistemas que se baseiam na descarga dos contentores
individuais, a taxa está relacionada com a capacidade do
contentor [normalmente de 60 ou 240 litros]. Quando
o sistema de reconhecimento electrónico dos contentores
é utilizado as frequências de recolha ou a pesagem dos
resíduos são as variáveis utilizadas para a determinação
da taxa a pagar;
P As tarifas tendem a ser divididas em duas partes, uma
fixa e outra variável, que nalguns casos estão relacio-
nadas com os custos fixos e variáveis.
Segundo Martinho [1998]62, os instrumentos económicos
mais utilizados pelos diversos países comunitários têm
Instrumentos Económicos na Gestão de Resíduos Sóliods Urbanos

sido: as taxas por serviços prestados, taxas sobre produtos,


sistemas de depósito e consignação, créditos à reciclagem,
taxas de deposição em aterro ou incineração, apoios
financeiros ou subsídios à criação de novos mercados para
recicláveis e reciclados.

5.1. Taxas por Serviços Prestados


O objectivo da utilização de taxas por serviços prestados
é o de cobrir total ou parcialmente os custos de recolha
e tratamento/deposição, incentivar a redução das quantida-

62
MARTINHO, M. G. Factores Determinantes Para os Comportamentos de
Reciclagem. Tese de Doutoramento. Caso de Estudo: Sistema de Vidrões.
Departamento de Ciências e Engenharia do Ambiente. Faculdade de Ciências
e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, 1998.
118
des produzidas, desviar os resíduos valorizáveis para a re-
colha selectiva e a matéria orgânica para a compostagem
e incentivar o consumo de produtos com menos embalagens.
Contudo, a aplicação de taxas por serviços prestados pode
ser injusta, uma vez que é difícil estimar as quantidades
de RSU produzidas por família. Em muitos Municípios,
o cálculo do tarifário de RSU, não é proporcional à produção
de RSU, mas sim ao consumo da água e à dimensão do
agregado familiar. Porém, na prática, este sistema tem-se
revelado injusto, uma vez que as famílias que poupam água,
não produzem necessariamente menos resíduos; as famílias
que têm jardins consomem mais água, mas podem colocar
menos resíduos à remoção, porque podem utilizar os resí-
duos orgânicos como fertilizantes ou como alimento para
animais. Por outro lado, as famílias que triam os resíduos
valorizáveis não são beneficiadas com este tipo de tarifário.
Todavia nos EUA, no Canadá e em algumas cidades
europeias, foram adoptadas formas mais justas, embora
mais dispendiosas, que consistem na aplicação do “princípio
do poluidor-pagador” ou seja na cobrança de tarifários
proporcionais à quantidade de resíduos depositada em
cada contentor. O mecanismo utilizado consiste na instalação
de um sistema de identificação de frequências de rádio
[sistema RFID] no veículo de recolha. Os contentores são
identificados e pesados no momento em que são elevados
para descarga. Este sistema identifica ainda os contentores
vazios, o tempo de descarga de cada recipiente e o tempo
gasto entre pontos de recolha, o que aumenta a eficácia
Instrumentos Económicos na Gestão de Resíduos Sóliods Urbanos

dos sistemas de recolha. McAdams63 refere que em 1994,


cerca de 1000 comunidades nos EUA utilizaram um sistema
destes e que a redução registada na quantidade de RSU
chegava a ser superior a 40 %.
Existe ainda um outro sistema de deposição que permite
cobrar tarifários proporcionais à quantidade de RSU de-
positada, que consiste na utilização de um equipamento
de deposição, que dispõe de uma torre telemática com
uma plataforma rotativa com 8 contentores, na qual se
insere um cartão magnético identificativo do utilizador
do sistema. Pressionado o botão relativo ao resíduo que se
pretende depositar, o contentor correspondente é activado

63
McADAMS, C.; RFID. The Missing Link To Comprehensive Automated Refuse
Collection Recycling. In: Waste Age, 25[4], 1994, p. 143-147.
119
e o resíduo colocado pesado, sendo o seu peso registado
numa base de dados com o código do respectivo utilizador.
Deste modo, é possível saber os quantitativos depositados,
por tipo de material, e por habitação, num determinado ano.
O cálculo do tarifário proporcional à quantidade de resíduos
produzidos pode, igualmente, basear-se no pagamento
prévio de recipientes para deposição, cujo preço poderá ser
fixo ou variável em função da capacidade dos recipientes
ou da frequência de recolha. Num relatório da EPA64,
é referido que em Perkasie e Llion [EUA], a utilização de
taxas baseadas no número e no tamanho de contentores
ou sacos induziu uma redução igual ou superior a 10 %
da quantidade de resíduos produzidos e a um aumento
superior ao dobro da reciclagem previamente verificada
e reduziu, ainda, em cerca de 30 % a quantidade de resíduos
misturados. A aplicação deste tarifário apresenta, no entanto,
alguns inconvenientes nos casos em que a deposição é co-
lectiva, uma vez que é difícil taxar cada família em função
das quantidades realmente produzidas. Por outro lado,
podem favorecer deposições ilegais, para além dos custos
financeiros associados, de recolha e deposição, sem contudo
incluir os custos externos65.
Para finalizar, destaca-se o impacte que poderá ter para
os sistemas de gestão de resíduos a reforma fiscal que
a União Europeia pretende realizar. Esta reforma, ainda em
estudo e debate na UE, pretende reduzir ou deslocar os
tradicionais impostos e taxas sobre o capital e o trabalho,
Instrumentos Económicos na Gestão de Resíduos Sóliods Urbanos

para a poluição e depleção dos recursos não renováveis,


ou seja pretende-se a substituição de algumas taxas por
eco taxas que visem a promoção do desenvolvimento sus-
tentável e sejam melhor aceites pelos contribuintes66.

64
USEPA. Charging Households for Waste Collection and Disposal: The
Effects of Weight or Volume-Based Pricing on Solid Waste Management.
In: Environmental Protection Publication 530-SW-90-047, U.S. Printing
Office, Washington, D.C., 1990.
65
BRISSON. Externalities in Solid Waste Management: Values, Instruments and
Control. PhD Thesis: University College London Department of Economics,
1994.
66
GEE, D. Economic Tax Reform in Europe: Opportunities and Obstacles.
In: O'RIORDAN, T., CSERGE, University of Esat Anglia e University College
London [eds], Ecotaxation. Earthscan Publications, 1997.
120
5.2. Taxas sobre Produtos
As taxas sobre produtos baseiam-se num princípio directa-
mente relacionado com o princípio do poluidor-pagador, uma
vez que procura incluir no produto final os custos de re-
colha, tratamento ou de deposição final. Refere-se, portanto,
à obrigatoriedade de pagamento de uma taxa adicional,
por parte dos produtores ou importadores de um produto,
com o objectivo de se assegurar um destino final adequado.
Contudo, como os produtores transferem a taxa para
o consumidor, existe o risco de não se realizarem esforços
no sentido de reduzir as quantidades de embalagens dos
produtos. Por outro lado, a taxa representa uma ínfima
parcela do preço final pelo que dificilmente terá efeito nos
comportamentos.
A Alemanha adoptou uma taxa deste tipo para as embala-
gens, as quais constituem cerca de 35-40 % do peso total
de RSU. A conhecida “Packaging Ordinance”, introduzida
pela Lei Topfer, em 1991, estipula dois grandes princípios:
primeiro, atribui aos produtores a responsabilidade de recupe-
rar as embalagens dos produtos que colocam no mercado;
segundo, os resíduos que são recolhidos devem ser reciclados
ou reutilizados e não podem ser incinerados ou enviados
para aterro.
A recolha e reciclagem dos resíduos de embalagem são
organizadas pelo “Duales Systems Deutchland” [DSD],
uma rede nacional independente67.
As empresas que contribuem para
Instrumentos Económicos na Gestão de Resíduos Sóliods Urbanos

o DSD estão autorizadas a rotular as


suas embalagens com a marca “Ponto
Verde”. O esquema foi introduzido
segundo as seguintes fases:
P Em Janeiro de 1992 envolveu as embalagens terciárias;
P Em Abril de 1992 englobou todos os tipos de embalagens.
A meta global era a de atingir, em 1995, uma taxa
de reciclagem de 64 % para todo o papel e cartão
de embalagem. Isto significa que 80 % de todo o papel
e cartão produzidos têm que ser recolhidos, separados
e reciclados ou reutilizados. Este esquema foi tão bem

67
FAZERKERLEY, E. Profile: the German packaging ordinance. European
Environment, 2 [5], 1992, p. 12-13.
121
sucedido que a indústria alemã se viu incapacitada para
absorver todo o papel e o plástico recolhidos, tendo come-
çado a enviar estes produtos para outros países, nomea-
damente para Portugal68.
A França também utiliza o símbolo “Ponto Verde” mas,
ao contrário da Alemanha, não estipulou metas quantificadas
para a reciclagem e a estrutura de funcionamento da orga-
nização “Eco-Embalagens” é diferente.
Em Novembro de 1996, surge em Portugal a Sociedade
Ponto Verde para implementação do Sistema Integrado
de Gestão de Resíduos de Embalagens, previsto no Decreto-
-Lei n.º 322/95, de 28 de Novembro e na Portaria n.º 313/96,
de 29 de Julho.

5.3. Sistemas de consignação


Os sistemas de depósito e consignação apresentam uma
relação com o conceito de taxa sobre o produto. Trata-se
de uma sobretaxa ao preço do produto sobre o qual se
quer actuar. O depósito não se baseia no peso ou no volume
do produto em questão e é devolvido quando o produto
é entregue aos agentes de recolha. Nos últimos anos tem-
-se verificado a sua aplicação nas embalagens de bebidas,
mas também em produtos como electrodomésticos, pilhas
e baterias, carcaças de automóveis ou pneus. Este instru-
mento económico permite reduzir a quantidade de resíduos
e preservar os recursos e a energia, induzindo a reutilização
e a reciclagem.
Instrumentos Económicos na Gestão de Resíduos Sóliods Urbanos

O valor do depósito deve ser suficientemente alto para


encorajar o retorno por parte do consumidor e com isto
incentivar a reutilização e a reciclagem. Um depósito
de 0,08 € numa embalagem de bebida asseguraria uma
taxa de retorno de 95 %. Isto representaria mais de um
milhão de toneladas de plástico, metal e vidro, que sairiam
do fluxo dos RSU, o que representa 6 % do seu peso total
e o cumprimento de cerca de ¼ das metas para a re-
ciclagem estabelecidas em Inglaterra69.

68
COLLINS, L. Recycling and the Environmental Debate: A Question of Social
Conscience or Scientific Reason? In: Journal of Environmental Planning
and Management, 39 [3], 1996, p. 333-355.
69
KPMG Peat Marwick. Market Mechanisms. In: Environment Briefing Note,
Autum, 1992, p. 9.
122
Pearce e Brisson70 afirmam, no entanto, que as experiências
de aplicação desta medida indicam que as taxas de retorno
não são muito sensíveis ao valor do depósito. Muito mais
importante é o número, conhecimento e conveniência
dos pontos de recolha para os consumidores.
Em Portugal o Sistema Ponto Verde, ou melhor, o Sistema
Integrado de Gestão de Resíduos de Embalagens [SIGRE],
tem como principal objectivo fazer a gestão dos resíduos
de embalagens que, no pós-consumo, não são reutilizadas.
Isto é, na sequência da publicação do Decreto-Lei n.º 366-A/97
[que estabelece os princípios e as normas aplicáveis ao
sistema de gestão de embalagens e resíduos de embalagens],
foi constituído, a nível nacional, um dispositivo que garante
a valorização, essencialmente, através da reciclagem [prece-
dida de recolha selectiva] do fluxo de resíduos de embala-
gens que não são reutilizáveis. O funcionamento deste sistema
integrado pauta-se pelas regras definidas na Portaria
n.º 29-B/98. Este mesmo diploma estabelece, igualmente, as
regras a observar no sistema alternativo, designado sistema
de consignação, destinado a gerir os resíduos de emba-
lagens reutilizáveis.
No âmbito do sistema integrado, os operadores económicos
[os embaladores e importadores de embalagens] que colo-
cam as embalagens no mercado, sendo por isso co-res-
ponsáveis pela gestão destes resíduos, transferem a sua
responsabilidade na correcta eliminação dos resíduos prove-
nientes do consumo dos seus produtos para a entidade
Instrumentos Económicos na Gestão de Resíduos Sóliods Urbanos

gestora do sistema, a Sociedade Ponto Verde, através de uma


contrapartida financeira.
O sistema consubstancia-se num ciclo fechado de diversas
operações/responsabilidades/intervenientes:
P Embaladores e importadores asseguram o financiamento
do sistema através de contrapartidas financeiras, pagando
uma taxa por cada embalagem colocada no mercado;
P Consumidores separam as embalagens usadas por tipo
de material e depositam-nas em contentores de recolha
selectiva;

70
PEARCE, D. W.; BRISSON, I. The Economics of Waste Management. In:
Hester, R.E e Harrison, R.M. [eds.], Waste Treatment and Disposal, The
Royal Society of Chemistry, 1995.
123
Câmaras Municipais efectuam a recolha selectiva e trans-
P

portam os resíduos para estações de triagem onde é feita


uma separação mais fina dos materiais, recebendo parte
das contrapartidas financeiras da Sociedade Ponto Verde,
face aos custos acrescidos da recolha selectiva;
Fabricantes de embalagens e de matérias-primas de emba-
P

lagens encarregam-se de reciclar os resíduos recuperados


da fase anterior.
As embalagens abrangidas pelo SIGRE são identificadas
através do símbolo “Ponto Verde”. Este indica que a embala-
gem financia, a nível nacional, um sistema de recolha
selectiva e valorização de embalagens usadas.

5.4. Créditos à Reciclagem


Consiste em passar os custos evitados na deposição em
aterro, para as empresas que fazem recolha selectiva.
A intenção desta medida é a de deslocar o destino dos
resíduos para as primeiras posições da hierarquia dos
resíduos. Aumentando os preços da deposição em aterro,
relativamente à reciclagem, esta tornar-se-á financeiramente
mais viável71.

5.5. Taxas sobre Deposição em Aterro


Estas taxas têm-se revelado um bom mecanismo para
incentivar a redução e promover a valorização.
Em França esta taxa aplica-se a cerca de 6500 aterros
de RSU e de resíduos industriais e perigosos. As indústrias
Instrumentos Económicos na Gestão de Resíduos Sóliods Urbanos

que depositam os resíduos nos seus próprios aterros estão


isentas. Os 3,05 € por tonelada podem sofrer um aumento
de 50 % se os resíduos a depositar forem oriundos de outras
zonas. As receitas da taxa vão para o Fundo para a Moder-
nização da Gestão dos Resíduos, administrado pela ADEME
[Agence Governamentale de l’Environnement et de la
Maitrise de l’Energie], cujo objectivo é o de financiar
o desenvolvimento e a instalação de tecnologias inovadoras
de tratamento de resíduos, apoiar projectos locais, eliminar
os depósitos ilegais e descontaminar solos poluídos72.

71
MacLEAN, J.C. Tax Exempt Debt Financing for privately Owned Facilities.
In: Biocycle. 1988; Turner e Brisson, August, 61-64.
72
FERNANDEZ, V.; TUDDENHAM, M. The Landfill Tax in France. In: GALE, R.;
BARG, S.; GILLIES, A. [Editores], Green Budget Reform: An International
Casebook of Leading Pratices. London: Earthscan, 1995.
124
No caso do objectivo ser o de reduzir as quantidades de RSU
produzidos na fonte e aumentar as quantidades recicladas
[reduzindo ao mínimo os custos económicos e ambientais]
então vários grupos de instrumentos económicos devem ser
aplicados de uma forma complementar e integrada. As inter-
-relações técnico-económicas entre os vários elementos
da cadeia dos RSU e os diferentes materiais presentes exi-
gem uma abordagem integrada e multisectorial73.

6. Avaliação de Impacte Ambiental


6.1. Ambiente e Avaliação de Impacte Ambiental

A Avaliação de Impacte Ambiental [AIA] constitui um


instrumento de apoio à decisão sobre as acções
prioritárias num desenvolvimento que se pretende
equili-brado e sustentável.
Surgiu no final da Década de 60 nos EUA. Ganhou relevân-
cia e visibilidade com a tomada de consciência da determi-
nante humana no equilíbrio dos ecossistemas da Terra,
a par do reconhecimento da importância da participação
dos cidadãos, organizações e comunidades nas decisões
sobre planos, programas e projectos de desenvolvimento,
a sua incidência no ambiente, na qualidade de vida das po-
pulações, bem como a afirmação da equidade no direito
ao desenvolvimento entre as actuais e as gerações futuras.
Nos documentos internacionais de referência74, de forma
crescente e explícita manifestou-se a associação entre a ne-
cessidade de um desenvolvimento sustentável, a respon-
sabilização dos Estados e a afirmação da importância da
participação, por organizações e cidadãos, nos processos
de tomada de decisão que, na Conferência do Rio, assume
a seguinte expressão:
“A melhor forma de tratar as questões ambientais é asse-
gurar a participação de todos os cidadãos interessados
ao nível conveniente. Ao nível nacional cada pessoa terá
Avaliação de Impacte Ambiental

73
ZABOLI. The integrated use of economic instruments in the policy of muni-
cipal solid waste. In: Curzio, A.; Prospetti, L; Zoboli, R., Developments in
Environmental Economics. Volume 5: The Management of Municipal Solid
Waste in Europe: Economic, Technological and Environmental Perspectives.
ELSEVIER, 1994.
74
Cfr. Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano [Estocolmo,
1972] - princípios 1 a 8. Declaração do Rio sobre Ambiente e Desenvolvi-
mento [Rio de Janeiro, 1992] - princípios 2,3,4, 7,8,10 e 17 [ver anexo A3].
125
acesso adequado às informações relativas ao ambiente
detidas pelas autoridades, incluindo informações sobre
produtos e actividades perigosas nas suas comunidades,
e a oportunidade de participar em processo de tomada
de decisão. Os estados deverão facilitar e incentivar a sensi-
bilização e a participação do público, disponibilizando
amplamente as informações. O acesso efectivo aos processos
judiciais e administrativos, incluindo os de recuperação
e de reparação, deve ser garantido”75.
A AIA é um instrumento de política de ambiente gene-
ralizada nos países desenvolvidos e recomendada por
organismos internacionais suportada pelo princípio da pre-
venção ambiental na implementação de planos, programas
e projectos de desenvolvimento, mediante:
“Uma avaliação sistemática dos efeitos previsíveis [efeitos
directos e indirectos] causados por um dado projecto no
ambiente - fauna, flora, solo, água, atmosfera, paisagem,
factores climáticos, bens materiais, património arquitectó-
nico e população76, sendo para o efeito suportado por um
Estudo de Impacte Ambiental [EIA]”.
Sustentado pelo princípio da participação, a AIA é tão mais
eficaz quanto a sociedade integre cidadãos conscientes dos
seus direitos e deveres e, mais e melhor informados este-
jam sobre a problemática ambiental, capacitando-os para
uma participação substantiva na discussão pública.
“Desejando promover a educação ambiental para um melhor
conhecimento do ambiente e do desenvolvimento sustentável
e no sentido de encorajar uma maior sensibilização do
público e a sua participação nas decisões que afectam
o ambiente e o desenvolvimento sustentável”77, bem como
consumidores com práticas ambientalmente informadas,
a Convenção de Aarhus78 encerra um conjunto de princípios
que devem informar a participação em matérias ambientais.
Avaliação de Impacte Ambiental

75
Declaração do Rio sobre Ambiente e Desenvolvimento, princípio 10
[cfr. anexo A3].
76
ANTUNES, Paula. Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova
de Lisboa. Fonte: http://www.iapmei.pt [Setembro 2005].
77
Preâmbulo da “Convenção sobre o acesso à informação, participação do
público no processo de tomada de decisão e acesso à justiça em matéria
de Ambiente”, promovida pela Comissão Económica para a Europa
das Nações Unidas, a 26 de Junho de 1998, em Aarhus [Dinamarca]
- cfr. anexo A3.
126
6.2. Metodologia

A AIA é uma metodologia de avaliação de planos e projectos,


normalmente dinamizada por uma estrutura institucional,
que tem por objectivo avaliar os efeitos potenciais de uma
actividade a nível ambiental. A AIA assenta numa concepção
de Ambiente multidireccional, assumindo-se como um ins-
trumento preventivo dos impactes ambientais associados
à execução de projectos. Para além da vertente associada
ao Ambiente-Natureza, à AIA importa também a cultura,
o ambiente social e psicossocial das comunidades a que se
dirigem os projectos.
Esta metodologia permite, pois, orientar a decisão no respei-
to pelos princípios do desenvolvimento sustentável onde se
articulam os interesses do homem com os do equilíbrio dos
ecossistemas e preservação dos recursos naturais. A par da
avaliação técnica das soluções, esta metodologia permite
integrar inputs resultantes da participação das comunidades
locais e entidades externas aos projectos.
De forma genérica, e independentemente das concreti-
zações locais, o processo de AIA é orientado pelos seguintes
princípios/linhas de acção:
A par das propostas de acção, os projectos devem incluir
P

a previsão de efeitos [positivos e negativos] associados


à sua execução, bem como a identificação de soluções
técnicas alternativas, ou opções possíveis;
P Os projectos devem prever e assegurar a adopção de
medidas de minimização e monitorização dos impactes
associadas à execução dos projectos;
P Os projectos devem garantir decisões ambientalmente
sustentáveis, orientando-se pelo princípio da flexibilidade
de modo a integrar os aspectos resultantes da ponderação
das soluções técnicas e da participação pública.
À aplicação da metodologia de AIA é possível associar um
Avaliação de Impacte Ambiental

78
Portugal aprova para ratificação esta Convenção em 2003 [Resolução da
Assembleia da República n.º 11/2003, publicada no DR I Série - A, n.º 47,
de 2003/02/25]. A Directiva 2005/370/CE, de 17 de Fevereiro, valida-a, em
nome da Comunidade Europeia, sendo confirmada por Portugal através
do Decreto do Presidente da República, de 25 de Fevereiro, publicado
no DR I Série - A, n.º 47, de 2005/02/25 - Ratifica a Convenção de Aarhus.
[a Convenção vigora em Portugal desde 2003/09/07] - cfr. anexo A3.

127
conjunto de vantagens79:
P Ainda na fase de concepção do projecto assegura-se
o estudo aprofundado e a ponderação das soluções
a adoptar e dos efeitos que são passíveis de produzir;
PIdentificam-se problemas e prevêem-se soluções numa fase
inicial do projecto, contribuindo para reduzir os custos
da protecção ambiental pela adopção de medidas
de prevenção em vez de medidas correctivas;
P Contribui para uma tomada de decisões suportada pela
articulação entre razões técnicas e sociais e pela partici-
pação dos interessados.
Favorece a equidade social e económica a par de uma
melhor gestão dos recursos naturais em articulação.
Desta forma, a Avaliação de Impacte Ambiental é mais
eficiente quando o Estudo de Avaliação de Impacte Ambi-
ental é exaustivo80, as instituições e as comunidades locais
são ambientalmente informadas, de forma a participar
substantiva e efectivamente, quer na fase de decisão sobre
a implementação do projecto, quer nas fases ulteriores
associadas à monitorização dos efeitos, onde a manutenção
de níveis adequados de informação é central para a
verificação dos níveis de eficácia ambiental com impactes
mínimos no ambiente natural, social, cultural e psicossocial
dos indivíduos, a par de um desenvolvimento económico
que contribua para um bem-estar e conforto material81.
A AIA é uma metodologia de apoio à decisão com um con-

79
MELO, João Joanaz. Metodologia de Avaliação de Impactes Ambientais.
In: Centro de Estudos Judiciários. Ambiente e Consumo. II volume, 1996.
80
Onde a par da avaliação das soluções técnicas propostas sejam ponde-
rados os efeitos nos seres humanos, fauna, flora, solo, ar, água, clima,
paisagem, bens materiais, património cultural e social, de curto e longo
prazo, directos e indirectos, desenvolvendo para o efeito análise de risco
e de custo benefício.
Avaliação de Impacte Ambiental

81
Nesta acepção, o processo de AIA pode contribuir efectivamente para o
que hoje é entendido como qualidade de vida: “este conceito compreende
a abundância material e o conforto económico como componentes a não
desprezar, mas onde não [se] pode esquecer, ao mesmo tempo, os
aspectos não materiais das condições de vida, como sejam as próprias
apreciações que delas se faz, as condições sanitárias, os serviços e as
condições de saúde, a família e as relações sociais, ou ainda, a qualidade
do ambiente natural envolvente” [FERRÃO, João; GUERRA, João; HONÓRIO,
Fernando. Municípios, sustentabilidade e qualidade de vida. Lisboa:
Observa, 2004, p. 4].
128
junto de procedimentos chave. Assim, em qualquer processo
de AIA são sempre intervenientes82:
P O dono da obra ou proponente, que propõe o projecto
[de que faz parte o Estudo de Impacte Ambiental - EIA];
P Os consultores ou peritos, presentes em diferentes fases
do processo, estando presentes quer no Estudo de Impacte
Ambiental, quer nas comissões que realizam a apreciação
técnica dos processos na Administração Pública;
P A sociedade civil, neste caso todas as organizações que
possam estar interessadas no processo decisório [Autarqui-
as Locais, Associações de Defesa do Ambiente, Associa-
ções de Moradores, profissionais ou económicas locais,
o cidadão].
Referencialmente, o processo de AIA de um projecto de de-
senvolvimento inclui as fases de definição do âmbito do EIA,
a sua preparação83, a consulta pública84 e a decisão.
O desenvolvimento de um sistema de monitorização asso-
ciado ao funcionamento da instalação ou do projecto, acom-
panhado de auditorias ambientais [externas e/ou internas]
constituem instrumentos promotores de boas práticas
e promotores da prossecução de objectivos ambientais
e de um desenvolvimento sustentável.

82
MELO, João Joanaz, ob.cit.
83
Processo complexo onde se identifica e prevê a amplitude dos impactes,
avalia as alternativas para a acção, [atendendo ao espaço e ao tempo],
se identificam as medidas mitigadoras, bem como a metodologia do
processo de monitorização. A utilização de índices ambientais de medição
permite a articulação entre estes diversos níveis de análise. São exemplo
de índices utilizados nestes estudos: índices de emissão, de qualidade
ambiental, socioeconómicos de qualidade de vida, de sensibilidade
[ecológica, paisagem, …], tecnológicos, etc. Idem.
84
Ibidem. A consulta pública assenta no uso de dois conjuntos de técnicas:
Avaliação de Impacte Ambiental

as informativas e as de participação. São exemplos de técnicas infor-


mativas: conferências de imprensa, comunicados, reportagens, artigos e
anúncios nos meios de comunicação social; dossiers informativos,
apresentação a grupos civis e técnicos, envio de relatórios técnicos ou
estudo para as entidades interessadas, “briefings” com representantes de
organismos públicos ou grupos para informar sobre uma decisão. Entre as
técnicas de participação referenciam-se: comissões de acompanhamento,
grupos de discussão representativos do público, entrevistas, palestras,
workshop, inquérito, plebiscito, etc.
129
6.3. Elementos de evolução
A metodologia de Avaliação de Impacte Ambiental foi criada
nos Estados Unidos da América com a publicação da Na-
tional Environmental Policy Act [NEPA] a 1 de Janeiro de 1970.
Sucessivamente, este instrumento de política ambiental foi
sendo integrado nos sistemas jurídicos de um crescente
número de países85, acabando por ser reconhecido como
instrumento indutor de decisões orientadas para um desen-
volvimento sustentável na Conferência do Rio:
P A avaliação de impacte ambiental, como instrumento
nacional, deve ser efectuada em relação a determinadas
actividades que possam vir a ter um impacte adverso signi-
ficativo sobre o ambiente e estejam dependentes de uma
decisão de uma autoridade nacional competente86 .
Ao longo dos anos, a metodologia de AIA evoluiu, assim
como se amplificou o seu âmbito de aplicação. Do estudo
monográfico dos primeiros tempos transformou-se numa
metodologia de apoio à decisão validada, em processos de
desenvolvimento. Exemplo deste reconhecimento é a exi-
gência de Estudos de Impacte Ambiental em projectos
liderados ou apoiados por organismos internacionais, de que
são exemplo o Banco Mundial, a FAO, a OCDE, a Organização
Mundial de Saúde, a Comissão Económica para a Europa
da ONU, etc.
Na União Europeia, a AIA foi introduzida em 1985, com
a entrada em vigor da Directiva Comunitária 85/337/CEE,

85
Na Holanda e Países Escandinavos [1970], a AIA passou a existir em
todos os projectos de grandes dimensões; na Alemanha, em 1971, passou
a ser obrigatória a sustentação das decisões federais pela “análise de
Compatibilidade Ambiental”; no Canadá, em 1973 - o Environmental
Assessment and review process; na Austrália, em 1974 - o Environmental
Protection Act; na Irlanda, em 1976, com a publicação do Local
Government Planing and Development Act, a AIA foi introduzida em todos
os projectos públicos e privados com um orçamento superior a 5 milhões
Avaliação de Impacte Ambiental

de libras; em França, em 1976, com a aprovação da Lei de Protecção da


Natureza todos os grandes empreendimentos públicos e privados sujeitos
a autorização pública passaram a carecer de Estudos de Impacto
Ambiental [LIMA. Luísa. Avaliação Psicossocial de Impactes Ambientais.
Lisboa: Universidade Católica Portuguesa, Pós-Graduação em Educação
Ambiental, 1996-97].
86
Princípio 17 da “Declaração do Rio sobre Ambiente e Desenvolvimento”,
aprovada na Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desen-
volvimento, Junho 1992 - cfr. anexo A3.
130
de 27 de Junho [alterada pela Directiva 97/11/CE do Con-
selho, de 3 de Março] e complementada pela Directiva
2001/42/CE, de 27 de Junho, que encerram os princípios
orientadores da avaliação de impactes ambientais: os prin-
cípios da prevenção e da participação.
A Directiva 2003/04/CE, 28 de Janeiro87, complementada
pela Directiva 2005/370/CE, de 17 de Fevereiro88, desenvolve,
em particular, os procedimentos associados à participação
pública em planos e programas relativos ao ambiente.
Em Portugal realizam-se Estudos de Impacte Ambiental
[EIA] desde o início da década de 80, sendo determinados
pela realização de projectos onde se percepcionava o ambi-
ente como factor crítico89. São exemplo de estudos realizados
nesta fase o empreendimento hidro-agrícola de Alqueva,
a Central Termoeléctrica do Pego e o empreendimento
das Minas de Neves Corvo.
Até à aprovação da Lei de Bases do Ambiente [Lei n.º 11/87,
de 7 de Abril], estes estudos não têm enquadramento jurí-
dico, apesar da menção explícita neste diploma à realização
de Estudos de Impacte Ambiental [EIA] - artigos 30.º e 31.º
- para “… planos, projectos, trabalhos e acções que possam
afectar o ambiente, o território e a qualidade de vida
dos cidadãos …”.
Todavia, a partir de então, assiste-se à afluência de um
conjunto de EIA ao Ministério Tutelar - Ministério do Pla-
neamento e Administração do Território - respondendo
assim às exigências da legislação europeia, os quais eram
enquadrados por Comissões de Acompanhamento definidas
ad hoc pelos serviços competentes.
A Avaliação de Impacte Ambiental é regulamentada em 1990,
através do Decreto-Lei n.º 186/90, de 6 de Junho, onde
se definem os princípios gerais por que se deve reger
Avaliação de Impacte Ambiental

o processo de Avaliação de Impacte Ambiental90. Este diploma

87
Revoga a Directiva 90/313/CE.
88
Ratifica a Conferência de Aarhus e determina a sua complementaridade
em relação a aspectos específicos enquadrados pela Directiva 2003/04/CE,
de 28 de Janeiro.
89
Melo, João Joanaz, ob.cit.
131
legal e toda a legislação complementar foi revogado pela
entrada em vigor de novo diploma legal enquadrador do
processo de Avaliação de Impacte Ambiental: o Decreto-Lei
n.º 69/2000, de 3 de Maio. Este diploma transpõe para a
legislação nacional as Directivas comunitárias e estabelece
o novo regime jurídico da avaliação de impacte ambiental
em projectos públicos e privados susceptíveis de
produzirem efeitos significativos no ambiente91.
Tendo por referência o Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de Maio,
e legislação acessória, o processo de Avaliação de Impacte
Ambiental [AIA] segue um faseamento específico, inte-
grando os critérios técnicos da avaliação dos projectos
[a nível da concepção do projecto na participação de peritos
em determinadas fases do processo], com a audição dos
interessados internos e externos. Assim, de forma sistemática,
o AIA deve respeitar o seguinte faseamento:
1 Selecção dos projectos - atendendo à enunciação cons-
P

tante dos anexos I e II, sobre os projectos obrigatoriamente


sujeitos a AIA, o proponente deve apresentar à Autoridade
de AIA o processo devidamente instruído com o objectivo
de possibilitar a determinação da aplicação dos procedi-
mentos de AIA.
2 Definição do âmbito - para permitir a identificação
P

das questões a ser objecto de Estudo de Impacte Ambiental


[EIA] e facilitar a identificação dos impactes a serem
objecto de atenção particular no EIA, o proponente do
projecto pode [de forma facultativa] solicitar um parecer
à Autoridade de AIA. Esta fase contribuir para aumentar
a eficácia do processo de AIA.
3 Preparação do Estudo de Impacte Ambiental [EIA] -
P

a realizar pelo proponente, contendo:


P Descrição do projecto;
P Apreciação das alternativas;
P Descrição do estado actual do ambiente;
Avaliação de Impacte Ambiental

90
Este enquadramento foi complementado e alterado por legislação publicada
posteriormente: Portaria n.º 590/97, de 5 de Agosto, pelo Decreto Regula-
mentar n.º 38/90, de 27 de Novembro, pelo Decreto-Lei n.º 278/97,
de 8 de Outubro e Decreto Regulamentar n.º 42/97, de 10 de Outubro.
91
ANTUNES, Paula. Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova
de Lisboa. In: http://www.iapmei.pt [Setembro’05].
132
P Análise de impactes;
P Interpretação e apreciação dos impactes;
P Minimização e gestão de impactes;
P Descrição dos programas de monitorização.
4 Apreciação técnica do EIA - que avalia o cumprimento
P

dos termos de referência pelo EIA, dos requisitos legais,


assim como a presença da informação base necessária
à tomada de decisão. A apreciação técnica é da responsabi-
lidade da Autoridade de AIA [constituída pela Agência
Portuguesa do Ambiente ou Direcções Regionais do Am-
biente, de acordo com a natureza do projecto em análise].
5 Participação pública - nesta fase procede-se à recolha
P

de opiniões, sugestões e outros contributos dos interes-


sados no projecto sujeito a AIA, através de consulta pública.
6 Preparação da Declaração de Impacte Ambiental [DIA]
P

- A Declaração de Impacte Ambiental contém a decisão


formal do procedimento de AIA, assim como a fundamen-
tação a ela associada, sustentada pelos resultados da parti-
cipação pública. A DIA é proferida pelo Ministro do Ambiente
e do Ordenamento do Território e tem carácter vinculativo.
7 P Pós-avaliação - que visa assegurar que os termos

Números de Processos de Avaliação de Impacte Ambiental


entrados em Entidade Competente

[Fonte: AAVV. Impacte Ambiental, Contingência e Regulação. Lisboa: 2000]


e condições de aprovação de um projecto são efectivamente
cumpridos, através da verificação de conformidade, de moni-
torização e da realização de auditorias.
É ainda de referir que, tendo por base a análise do gráfico
anterior, tem sido crescente o número de processos sujeitos
a avaliação de impacte ambiental, os quais se têm centrado
em áreas que acompanham as próprias determinantes do
desenvolvimento de Portugal92. Sob o ponto de vista quali-
tativo na década de 90 predominaram os projectos associa-
dos à construção/alteração de vias de comunicação, constru-
ção de barragens e infra-estruturas93. Com a entrada em
vigor do novo regime legal, o Relatório do Estado do Am-
biente de 2003 reconhece:
“Nos três primeiros anos de vigência do novo regime legal
verificou-se um aumento significativo do número global
de processos sujeitos a avaliação, nomeadamente os projectos
das grandes infra-estruturas de iniciativa do Estado”94.
As vias rodoviárias e os projectos eólicos constituem a maio-
ria dos projectos submetidos a AIA.

92
A tipologia dos projectos abrangidos por AIA está definida nos anexos I
e II do Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de Maio, de que são exemplo:
refinarias de petróleo bruto, centrais térmicas, centrais nucleares,
instalações químicas ou ligadas à actividade mineira, vias de comuni-
cação, instalações de tratamento de vários tipos de resíduos, de trata-
mento de águas e efluentes, instalações industriais; bem como [anexo 2]
projectos de emparcelamento rural, de desenvolvimento agrícola com
Avaliação de Impacte Ambiental

infra-estruturas de rega, de florestação e reflorestação com espécies de


crescimento rápido, instalações de pecuária e de piscicultura intensiva;
produção e transformação de metais; indústrias extractiva, da energia
e mineral química, alimentar, têxtil, curtumes, madeira e papel, da borracha;
projectos de infra-estruturas, turismo.
93
Cfr. GARCIA, J.L.; SUBTIL, F., POTT, M. Impacte Ambiental, contingência
e regulação. Lisboa: Observa, 2000, p. 38.
94
MAOT. Relatório do Estado do Ambiente em Portugal 2003. Lisboa: MAOT,
2005, p. 174.
134
II Animais em Meio Urbano
P
31
CAPIT
1.Do Homem. Dos Direitos
do Animal e dos Animais na Cidade

A relação do Homem com a Natureza e a sua evo-


lução foi, ao longo dos tempos, objecto de refle-
xão filosófica, mas também da curiosidade científica.
Da visão animada da Natureza na Antiguidade chegou-se,
nos nossos dias, a uma nova consciência sobre a relação
Homem-Natureza95, a par do aprofundamento da aborda-
gem científica aos segredos da Terra, das espécies, da vida,
do comportamento e vivência em sociedade.
Nos nossos dias a pertinência e visibilidade da temática
animal toca aspectos tão diversificados como a defesa de
animais em extinção, a discussão em torno da manutenção
de animais em cativeiro e da sua exibição em espectáculos
[jardins zoológicos, circos], do uso de animais para investi-
gação e ensino, bem como questões bem mais próximas
de nós: os maus-tratos e o abandono, sem esquecer aqueles
que connosco convivem diariamente e partilham o espaço
em que vivemos - as pragas.
A abordagem ecológica analisa o ser vivo inserido e em
inter-relação com o meio. Michel Lamy96 considera que o
Homem possui diversos invólucros ecológicos: “o aquático,
a pele, o vestuário, o espaço individual, os invólucros ecoló-
gicos e sociais [da casa à aldeia, do espaço rural à cidade
e às grandes metrópoles]”:
“O Homem não se contentou com os seus invólucros eco-
lógicos e individuais. Com o auxílio de utensílios, construiu
Do Homem. Dos Direitos do Animal e dos Animais na Cidade

a sua casa para proteger a família. Organizando-se em


sociedade, agrupou as casas em aldeias, cidades e megapólis,
no seio das quais desenvolve as suas actividades.
Estas construções não foram edificadas ao acaso.
[…]
O espaço rural, devido à sedentarização do homem e à
urbanização, foi então completamente reestruturado, e as
nossas paisagens ficaram profundamente modificadas”97.

95
Ver capítulo III sobre Educação Ambiental.
96
LAMY, Michel. As camadas ecológicas do homem. Lisboa: Instituto Piaget,
Perspectivas ecológicas, 1996.
97
Idem, p. 101.
137
Todavia, onde quer que esteja o Homem é acompanhado
por outros ser vivos, encontre-se ele no campo ou na cidade.
Aves, insectos, mamíferos e outros animais acompanham-
-no de uma forma mais ou menos visível, beneficiando dos
locais de refúgio por ele proporcionados, adaptando-se
às novas condições.
Em casa, desejando-o ou não, o homem conviveu com nume-
rosos ser vivos. A par dos animais domésticos [galináceos,
ovinos, etc.] e de companhia [cães, gatos…], numerosos
invertebrados convivem dia-a-dia com o homem - tais como
insectos, aranhas, ácaros e mamíferos [ratos]. Também
fungos e bactérias potenciais causadores de fenómenos
alérgicos são uma presença forte no quotidiano humano.
O convívio equilibrado entre espécies colocou desafios.
Nas cidades o controlo de pragas e a intimidade com
animais de companhia em nome da saúde pública sus-
tentou o desenvolvimento de métodos e técnicas que supor-
tam a partilha do espaço, onde o equilíbrio entre espécies
é conseguido pela adopção de métodos mais ou menos
ofensivos dos ecossistemas.
A segunda metade do século XX assiste ao reconhecimento
público dos direitos dos animais através da proclamação
da “Declaração Universal do Direitos dos Animais”98 pela
UNESCO, em 1978. Em França, pela primeira vez, surgira
em 1924 a publicação da Declaração dos Direitos dos Ani-
mais [André Géraud]99.
A reflexão filosófica sobre as relações Homem-Natureza
teve ao longo dos tempos abordagens diversificadas.
Do Homem. Dos Direitos do Animal e dos Animais na Cidade

A discussão em torno dos “direitos dos animais” foi um


dos “parêntesis” dessa discussão filosófica100, muitas das vezes
com tradução em acontecimentos que dão nota das preo-
cupações e entendimento de cada época. Ferry, numa lingua-
gem muito pitoresca, dá nota da realização de processos

98
Cfr.: http://www.lpda.pt [Novembro 2005]. Esta declaração coloca-se por
oposição à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, proclama-
dos pela 1.ª vez na Revolução Francesa [1789]. Em 1948, a Assembleia
Geral das Nações Unidas, a 10 de Dezembro de 1948, proclamou, no
pós-II Guerra Mundial, a Declaração Universal dos Direitos do Homem
Cfr.: http://www.unhchr.ch [Novembro 2005].
99
Cfr. prefácio da obra de FERRY, L. A Nova Ordem Ecológica. Lisboa:
Edições Asa, 1993, p. 61.
100
Idem.
138
judiciais no século XV para julgar a devastação causada
por animais em povoações101, sendo estes constituídos réus
e julgados à luz dos valores da época, podendo “…a sen-
tença variar consoante os animais fossem considerados
como criaturas de Deus limitando-se a seguir a lei natural,
como flagelo enviado aos homens em castigo dos seus
pecados, ou como instrumento do demónio opondo-se
frontalmente à própria autoridade eclesiástica”102.
Descartes103, sustentado pela sua visão racional do mundo,
reconhece ao homem todos os direitos e nenhum à nature-
za; defendia “é que o animal como todas as máquinas
bem feitas, «funciona» melhor do que o homem: «bem sei
- escreve Descartes - fazem coisas muito melhor do que nós,
mas tal não me admira, pois isso mesmo serve para provar
que eles agem natural e mecanicamente, assim como um
relógio que mostra as horas com mais exactidão do que
o nosso julgamento. E não há dúvida de que, quando as ando-
rinhas voltam na Primavera, estão a agir como relógios»”104.
Durante o século XVIII surgem alguns pensadores105 que,
numa postura anti-cartesiana, ensaiam a defesa do “Direito
dos Bichos”, depois continuada no século XIX, centrando as
suas teses na concepção de que o animal pensa e sofre e,
nessa medida possui direitos e cria deveres à humanidade106.

101
São exemplos: o processo levantado pela aldeia de Saint-Jean-de
Maurienne contra uma colónia de gorgulhos; a cidade de Coire contra
as larvas.
102
Ibidem, p. 13.
103
Do Homem. Dos Direitos do Animal e dos Animais na Cidade

1596-1650.
104
Citado por FERRY, p. 57-58.
105
Maupertuis nas Mémoires pour servir l' histoire des Insectes [1734]
e Condillac no Traité des Animaux são alguns dos autores centrais desta
linha de pensamento.
Pierre-Louis Moreau de Maupertuis [1698-1759] - “No Sistema da
natureza [1752], o autor apresenta uma ampla teoria que pretende
explicar, a partir de um princípio gerativo universal, como os organismos
actuais são gerados, como as espécies podem conservar-se ao longo do
tempo e como ocorre a formação de novas espécies a partir de uma
dada linhagem de organismos.” [RAMOS, Maurício de Carvalho. Origem da
vida e origem das espécies no século XVIII: as concepções de Maupertuis.
São Paulo: Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo.
In: http://www.fflch.usp.br [Novembro 2005].
Tienne Bonnot de Condillac [1714-1780]. Publicou 2 trabalhos: Ensaio
das origens do conhecimento humano [1746], Tratado das Sensações
[Treatise on Sensations, de 1754].
106
FERRY, ob. cit., p. 60. Identifica como autores relevantes: Rousseau e Kant,
entre outros.
139
No seu tempo, J. Bentham107 equacionava o problema nos
seguintes termos: “a questão é: não podem raciocinar? Nem
podem falar? Mas podem sofrer?”.
Ferry sintetiza do seguinte modo a evolução do pen-
samento filosófico em relação à problemática do direito
dos animais:
“ A posição cartesiana, segundo a qual a natureza, incluin-
P

do o reino animal, está inteiramente privada de direitos


em benefício desse pólo único de sentido que é o sujeito
humano;
P A tradição republicana e humanista […] Quatro temas
filosóficos revelam-se inseparáveis: o homem é o único
ser titular de direitos; o fim último da sua actividade
moral e política não é, antes de mais, a felicidade, mas
a liberdade; é nesta última que se funda o princípio
da ordem jurídica, e não primordialmente a existência
de interesses a proteger; apesar de tudo, o ser humano
está ligado por certos deveres aos animais, em particular
pelo de não lhes infligir sofrimentos inúteis;
P O pensamento utilitarista … no qual o homem não é
o único detentor de direitos, mas em que o são, com
ele, todos os entes susceptíveis de prazeres e dores”108.
Peter Singer109 é na actualidade, um dos pensadores que
se inscreve nesta última linha e postula como princípio
ético básico o da “Igual Consideração de Interesses”, que
designa como princípio, a igualdade quer entre as pessoas,
quer nas relações com seres de outras espécies: os animais
não-humanos.

2. Animais de Companhia

A problemática dos animais de companhia, a nível


nacional, é enquadrada por um conjunto de diplomas
Animais de Companhia

107
1748-1842. Principal obra: Introduction to the Principles of morals and
legislation [1789].
108
Idem, p. 65.
109
São obras de referência deste autor: Animal Liberation [1975] e Practical
ethics [Ética Prática]. Gradiva, 2002.
140
legais110 que regulam de uma forma muito precisa a acti-
vidade institucional nesta área de acção.
A Convenção Europeia para a Protecção dos Animais de
Companhia, assinada por todos os Estados-Membros do Con-
selho da Europa, constitui o documento internacional de
referência, tendo sido transposto para a legislação portu-
guesa em 1993.

2.1. Conceitos gerais


P Dono ou Detentor - Qualquer pessoa singular ou colectiva
responsável pelos animais de companhia para efeitos
de reprodução, criação, manutenção, acomodação ou uti-
lização, com ou sem fins comerciais.
P Animal de Companhia - Qualquer animal detido ou desti-
nado a ser detido pelo homem, designadamente em sua
casa, para seu entretenimento e companhia.
P Animal Vadio ou Errante - Qualquer animal que seja
encontrado na via pública ou outros lugares públicos, fora
do controlo e guarda dos respectivos detentores, ou relati-
vamente ao qual existem fortes indícios de que foi aban-
donado ou não tem detentor e não esteja abandonado.
P Animal Potencialmente Perigoso - Qualquer animal que,
devido à sua especificidade fisiológica, tipologia racial,
comportamento agressivo, tamanho ou potência de mandí-
bula, possa causar lesão ou morte a pessoas ou outros
animais, nomeadamente os cães pertencentes às raças
Cão de Fila Brasileiro, Dogue Argentino, Pit Bull Terrier,
Rottweiller, Staffordshire Terrier Americano, Staffordshire
Bull Terrier e Tosa Inu, bem como os cruzamentos destas
raças entre si ou o seu cruzamento com outras.
P Animal Perigoso111 - Qualquer animal que se encontre
numa das seguintes situações:
P Tenha mordido, atacado ou ofendido o corpo ou saúde
de uma pessoa;

110
Animais de Companhia

Cfr. o anexo A2, que inclui um capítulo com uma síntese da legislação
de enquadramento [Portaria n.º 81/2002, de 24 de Janeiro; Portaria
n.º 899/2003, de 28 de Agosto; Decretos-Leis n.ºs 312/2003, 313/2003,
314/2003 e 315/2003, de 17 de Dezembro; Portarias n.ºs 421/2004
e 422/2004, de 24 de Abril; Portaria n.º 585/2004, de 29 de Maio].
111
Foi publicada legislação específica para este tipo de animais [Decreto-
-Lei n.º 312/2003, de 17 de Dezembro] - cfr. anexo A2.
141
P Tenha ferido gravemente ou morto um outro animal fora
da propriedade do detentor;
P Tenha sido declarado voluntariamente pelo seu detentor,
à Junta de Freguesia da área da sua residência, que tem
um carácter ou comportamento agressivos;
P Tenha sido declarado pela autoridade competente como um
risco para a segurança de pessoas ou animais, devido
ao seu carácter agressivo ou especificidade fisiológica.
Campanha P Cães e Gatos Adultos - Todos os
de sensibilização animais destas espécies, com idade
sobre os animais igual ou superior a 1 ano de idade.
de companhia dirigida
à cidade de Lisboa. § P Cão Guia - Todo o cão devida-
mente treinado, através de ensino especializado mi-
nistrado por entidade reconhecida para o efeito, para
acompanhar como guia pessoas invisuais e que tem o
direito de acompanhar o invisual, com entrada, sem quais-
quer restrições, em todos os locais públicos e privados.
P Cão de Caça - Cão que pertence a um indivíduo habilitado
com carta de caçador actualizada e que é declarado como
tal pelo seu dono ou detentor.
P Animal com Fins Económicos - Animal que se destina
a objectivos e finalidades utilitários, guardando rebanhos,
edifícios, terrenos, embarcações ou outros bens ou ainda
utilizado como reprodutor nos locais de selecção e multi-
plicação.
P Animal para Fins Militares ou Policiais - Animal que é pro-
priedade das Forças Armadas ou de entidades policiais ou de
segurança e se destina aos fins específicos destas entidades.
P Açaime Funcional - Utensílio que, aplicado ao animal sem
lhe dificultar a função respiratória, não lhe permita comer
nem morder.
P Animal suspeito de Raiva - Qualquer animal susceptível
que, por sinais ou alterações de comportamento exibidos,
seja considerado como tal por um Médico-Veterinário. São
sempre considerados como suspeitos de raiva todos os
animais que agridem pessoas ou outros animais.
Animais de Companhia

2.2. Obrigação dos Detentores


Aos donos ou detentores de animais cabe o que podemos
designar por cuidados gerais e por cuidados especiais,
142
sendo estes últimos, com alguma frequência negligenciados
ou desconhecidos dos proprietários.
Dentro dos cuidados gerais temos:
P Alimentação adequada - de Uma alimentação
acordo com a espécie, raça, idade completa e equilibra-
e estado fisiológico, o proprietá- da é essencial para
o bem-estar do seu
rio pode optar por confeccionar § animal de companhia.
a alimentação destinada aos seus
animais, a qual deve ser apenas
cozida com água e um pouco de sal, sem quaisquer outros
temperos [os restos da nossa comida não são adequados
para os cães e gatos], ou optar por rações comerciais,
podendo esta ser húmida [enlatados] ou seca [normal-
mente sob a forma de grânulos]. Qualquer dos tipos
de alimentação é adequada se for completa e equilibra-
da, o que normalmente sucede com as rações comerciais,
mas nem sempre com a alimentação caseira. Esta última
deve conter proteína de origem animal [carne ou peixe],
uma fonte energética [arroz ou massa; se for utilizada
batata esta deve ser em pouca quantidade] e uma fonte
de vitaminas e minerais [vegetais e fruta].
Em animais jovens pode fornecer-se algum leite, podendo
ser leite gordo de vaca, caso não provoque diarreia, ou
preferencialmente leite de substituição destinado a cachor-
ros ou gatinhos, uma vez que o leite de cadela e gata
é muito mais rico que o de vaca. Para além de leite,
podemos proporcionar aos animais, mesmo adultos, outros
produtos lácteos, de que destacamos o iogurte natural não
açucarado, queijo fresco ou requeijão.
Não devem ser fornecidos aos animais produtos açucarados
[bolachas, bolos, etc.], gorduras [gordura animal, pão com
manteiga, etc.] ou ossos, sobretudo ossos de galinha ou
codorniz, costeleta ou qualquer osso de pequenas dimen-
sões. Os únicos ossos adequados são os de dimensão
elevada [especialmente os ossos do joelho ou perna de
vaca] e só depois da mudança de dentição - a qual se
inicia aos 4 meses de idade - podem também ser dados
Animais de Companhia

ossos artificiais. Para os animais até aos 4 meses de idade


devem ser fornecidos alimentos 4 vezes por dia; entre
os 4-6 meses, 3 vezes por dia; após os 6 meses, 2 vezes
por dia. Nas rações comerciais, a quantidade total diária
vem normalmente mencionada na embalagem;
143
P Fornecimento de água em quantidade e qualidade - os
gatos são especialmente exigentes na qualidade da água,
gostando de água fresca [nunca proveniente de frigorífico]
e limpa, obrigando à sua mudança diária. Os animais que
são alimentados com rações secas consomem muito mais
água, pelo que isso tem de ser tido em conta;
P Higiene do animal - Os cães necessitam de um banho
quinzenal ou mensal para minorar os odores caracterís-
ticos, podendo ser usados nesse banho champôs para uso
veterinário ou simplesmente sabão azul e branco ou sabão
de seda, desde que não haja patologia do foro derma-
tológico. Os gatos não necessitam de banhos frequentes
e não produzem odores desagradáveis, cuidando eles mes-
mo da sua higiene, salvo em caso de doença, em que
deixam de o fazer. Pode-lhes ser dado um banho espo-
rádico [normalmente um banho em cada 6 meses];
P Higiene do local onde vive o animal;
P Desparasitações periódicas - Existem 2 tipos de despara-
sitações: as desparasitações internas e as desparasita-
ções externas, dizendo as primeiras respeito ao combate
aos parasitas existentes no interior do corpo, predominan-
temente no tubo digestivo e as segundas ao combate
aos parasitas existentes na pele.
Dentro dos parasitas internos temos 2 grupos predominantes,
que são os nemátodos ou vermes redondos [as vulgares
lombrigas] e os céstodos ou vermes chatos [conhecidos
genericamente por ténias]. Em geral, os animais devem
ser desparasitados internamente pelo menos 2 vezes por
ano, mas preferencialmente 4 vezes por ano. No caso
dos cachorros ou gatinhos, as desparasitações devem ter
início logo nas primeiras semanas de vida e serem repetidas
em intervalos de 2-3 semanas, seguindo depois o esquema
antes mencionado para desparasitações de manutenção.
Existem desparasitantes internos sob várias formas farma-
cêuticas [comprimidos, xaropes ou suspensões e pastas].
As pastas e xaropes são, como regra geral, mais adequa-
Animais de Companhia

das para animais jovens, enquanto que os compri-


midos se destinam predominantemente a animais adultos.
Os desparasitantes internos devem ser de amplo espectro,
ou seja, abranger nemátodos e céstodos, sobretudo nos
animais adultos.
144
Quanto aos parasitas externos ou ectoparasitas predominam
2 grupos: as carraças e as pulgas. Para o seu combate
há produtos que actuam sobre ambos e outros que só
actuam sobre um dos grupos. Os produtos mais recentes
têm efeito residual; isto é, actuam durante períodos
prolongados, podendo chegar até aos 6 meses. Existem
sob várias formas desde champôs, coleiras, comprimidos,
sprays, injectável e spot-on. Este último consiste numa
pipeta, contendo um líquido, o qual é aplicado sobre
a pele na região dorsal do pescoço - na zona mais
próximo da cabeça - de modo que o animal não possa
lamber o local, tendo uma acção que vai de 1 a 3 meses.
Um dos principais problemas dos anti-parasitários -
sobretudo nos externos - é a capacidade dos parasitas
adquirirem resistência, pelo que é fundamental não admi-
nistrar doses inferiores às recomendadas;
P Cuidados Médico-Veterinários, quer em termos de profilaxia
[vacinas], quer em termos de terapêutica [tratamentos
propriamente ditos] - Existem vacinas que são obrigatórias
[destinam-se fundamentalmente à prevenção do contágio
humano] e outras que são facultativas.
No primeiro caso temos a vacinação anti-rábica, a qual
é obrigatória para todos os cães com 3 ou mais meses
de idade e tem de ser repetida anualmente.
No segundo caso há, para os cães, as vacinas contra
a Esgana, Hepatite, Leptospirose, Parvovirose, Tosse do Canil,
Piroplasmose [babesiose] e Borreliose [Doença de Lyme].
Estas devem ser dadas a partir das 6-7 semanas de
idade, repetidas ao fim de 3-4 semanas e depois anual-
mente112. Entre as vacinas facultativas para os gatos há,
também, a vacina contra a coriza, a panleucopénia felina
e a leucose, sendo o esquema de vacinação idêntico ao
mencionado para os cães. A vacina anti-rábica é facultativa
para os gatos.
Os cuidados especiais para os donos dos animais são os des-
critos na Lei. Ou seja:
P Identificação do animal - Todo o animal que circula
na via pública ou em quaisquer outros lugares públicos
Animais de Companhia

- seja cão, ou gato - tem obrigatoriamente de possuir

112
No caso da esgana e parvovirose, já existem vacinas que podem ser
dadas logo às 4-5 semanas, conferindo assim um início de imunidade mais
cedo contra duas doenças que têm elevada mobilidade e mortalidade.
145
coleira ou peitoral, onde deve estar colocado, por qualquer
forma, o nome e morada ou telefone do dono do detentor;
P Uso de trela ou açaimo - É proibida a presença na via
pública [ou em quaisquer outros lugares públicos] de cães
sem açaimo funcional, excepto quando conduzidos à trela;
ou, tratando-se de animais utilizados na caça, durante
os actos venatórios ou em provas e treinos. Nos termos
da lei, nos animais perigosos ou potencialmente perigosos
é sempre obrigatório o uso de açaimo e trela curta
[inferior a 1 metro] em material resistente113;
Dever especial de cuidado - Incumbe ao detentor do animal
P

o dever especial de o vigiar, de forma a evitar que este


ponha em risco a vida ou a integridade física de outras
pessoas ou animais114.

2.3. Captura de Animais e Controle da Reprodução


2.3.1. Captura de Animais
A captura de animais pode ser determinada por várias
situações: por circulação indevida, por risco para a saúde
pública e por abandono de animais de companhia.
A circulação de cães e gatos na via ou lugares públicos
tem, como vimos, regras bem claras. As Câmaras Municipais
podem criar zonas ou locais próprios para a permanência
e circulação de cães e gatos, sem os meios de contenção
previstos na Lei, estabelecendo, para o efeito, as condições
em que aquelas se podem fazer.
Considera-se abandono de animais de companhia a não
prestação de cuidados no alojamento, bem como a remoção
efectuada pelos seus detentores para fora do domicílio ou
dos locais onde costumam estar mantidos, com vista a pôr
termo à sua detenção, sem que procedam à sua transmissão
para a guarda e responsabilidade de outras pessoas,
das Autarquias Locais ou das Sociedades Zoófilas115.

113
No ponto 2.8. deste capítulo encontra-se desenvolvida a temática dos
animais perigosos ou potencialmente perigosos.
Animais de Companhia

114
Art.º 6.º do D.L. n.º 276/2001, de 17 de Outubro, com a redacção dada
pelo D.L. n.º 315/2003, de 17 de Dezembro. A violação do dever
de cuidado é punível com coima que varia entre 500,00€ e 3740,00€
- cfr. anexo A2.
115
Contra-ordenação por abandono, punível com coima de 500,00€
a 3740,00€ - cfr. anexo A2.
146
Nos domínios da Defesa da Saúde Pública e do Ambiente
é atribuição das Autarquias proceder à captura dos cães
e gatos vadios ou errantes, encontrados na via ou em quais-
quer lugares públicos. Para o efeito deverá ser utilizado
o método de captura mais adequado a cada caso, recolhen-
do os animais no Canil ou Gatil Municipal.
Os animais capturados são submetidos a exame clínico pelo
Médico-Veterinário Municipal, que do facto elabora relatório
síntese e decide do seu ulterior destino. Os animais devem
permanecer no Canil ou Gatil
Municipal durante o período
mínimo de 8 dias.
Animais
Durante o período de recolha capturados e entregues
no canil/gatil, todas as despe- no Canil/Gatil
sas de alimentação e alojamento
§ Municipal.
são da responsabilidade do dono ou detentor do animal,
bem como o pagamento das multas e coimas corres-
pondentes aos ilícitos contra-ordenacionais verificados.
Caso estes pagamentos não sejam efectuados, as Câmaras
Municipais podem dispor livremente destes animais.
Os animais recolhidos só podem ser entregues aos presumí-
veis donos ou detentores depois de identificados, submetidos
às acções de profilaxia consideradas obrigatórias para o ano
em curso e sob termo de responsabilidade escrito do dono
ou detentor com a sua identificação completa.
Quando não reclamados, as A CML possui
Câmaras Municipais deverão uma linha de adopção
disponível na sua
publicitar, pelos meios própria página
usuais, a existência destes da internet:
animais com o objectivo de www.cm-lisboa.pt
§ [link da Lisboa Limpa].
cedência a particulares ou
a entidades [públicas ou privadas] que demonstrem possuir
os meios necessários à sua manutenção. Se mesmo assim
não forem reclamados/cedidos, as Autarquias podem
dispor deles livremente. Atendendo à salvaguarda de
quaisquer riscos sanitários para as pessoas ou outros
animais, por parecer do Médico-Veterinário Municipal,
podem até decidir a sua occisão através de métodos que
não impliquem dor ou sofrimento ao animal.
Se conhecida a identidade dos detentores dos cães e gatos
capturados, aqueles são notificados para o seu levantamento
e punidos pelo abandono de animais, nos termos da legis-
lação em vigor.
147
2.3.2. Controle da Reprodução
Entre os animais de companhia, o Homem permite a re-
produção excessiva dos animais, nomeadamente do cão
e do gato, o que tem implicações no elevado número
de abandonos e de animais errantes, causa de sofrimento
para os animais, mas também um risco para a saúde pública.
É competência das Câmaras Municipais promover a captura
de animais vadios ou errantes na via pública, fazendo-os
recolher ao Canil e/ou Gatil Municipais. A captura de animais
na via pública e a sua occisão não pode ser considerada
como a maneira mais eficaz de lidar com o excesso de ani-
mais vadios, pois não tem qualquer efeito na origem
do problema: “excesso de produção de animais”. A captura
de animais errantes reduz apenas temporariamente a sua
população num determinado local, o que aumenta a probabi-
lidade de sobrevivência dos restantes e encoraja a migração
de outros para essas “zonas limpas”.
É necessário que sejam tomadas medidas a longo prazo,
as quais incluem:
P Uma correcta identificação animal;
P O controle da reprodução através da esterilização;
P Sensibilização e educação da população.
A razão porque muitos Governos evitam a introdução de um
programa mais humanitário de controlo da população vadia
ou errante, prende-se com o custo destas operações. Trata-
-se de uma falsa economia se tivermos em conta os custos
que advêm dos programas pouco efectivos, como sejam:
P Os acidentes de tráfego;
P As despesas médicas provocadas pelas mordidelas;
P O custo da eutanásia em si;
P Outras implicações a nível da Saúde Pública, como sejam
a propagação de certas zoonoses, nomeadamente a raiva.
O Canil/Gatil de Lisboa deu início a um programa de este-
rilização de animais vadios para adopção. O programa
Animais de Companhia

consiste em:
P Relativamente aos Gatos - Um casal de gatos pode ter
2 ou mais ninhadas por ano o que, exponencialmente,
pode representar 420.000 animais no final de um período
148
de 7 anos. Perante este facto, torna-se evidente a im-
portância da adopção de medidas eficazes de controlo,
as quais podem passar por:
P Captura dos animais;
P Despiste das principais doenças e, no caso dos gatos
saudáveis, a esterilização e libertação de novo no local.
Este método apresenta as seguintes vantagens:
P Estabiliza o número de animais nas colónias;
P Elimina os comportamentos ruidosos associados ao aca-
salamento;
P É mais eficaz, dado que os animais não são retirados
do local, reduzindo a possibilidade de migrações e de
futura procriação;
P Ajuda a combater os roedores;
P Menor custo;
P Pode proporcionar uma vida melhor a esses animais.
Estas colónias deverão ser supervisionadas por grupos de
moradores ou por pessoal das Associações de Protecção
dos Animais.
Para evitar a propagação de doença a outros membros
da colónia ou a gatos da vizinhança, só devem ser libertados
animais saudáveis nas zonas supervisionadas e eutanasiados
os animais com doenças fatais ou contagiosas.
Relativamente aos Cães:
P Captura dos animais;
P Despiste das suas principais doenças;
P Esterilização das fêmeas saudáveis e com possibilidades
de adopção;
P Os machos, em princípio, só serão castrados aqueles cujos
donos o solicitarem. Encara-se a possibilidade de esteri-
lização dos outros, o que impede a sua reprodução sem
Animais de Companhia

os inconvenientes associados à castração, nomeadamente


a nível estético, de obesidade, etc.
O objectivo a atingir é reservar a occisão para animais
doentes e agressivos.
149
O estabelecimento de programas de esterilização apoiados
[por Institutos Veterinários e Associações Protectoras de
Animais] é uma estratégia também a observar pelas
autoridades locais, a par da concordância da população
em geral. A colaboração de todos é importante, para que
o controle das populações seja efectivo e se obtenham
resultados a mais curto prazo.

2.4. Identificação Animal


Existem 2 tipos de identificação: a tatuagem e a identifi-
cação electrónica [microship].
Esta é o tipo de identificação
adoptado pela actual legisla-
ção, sendo a única em pleno
Identificação electrónica. § funcionamento.
Qualquer dos tipos de identificação, para ser eficaz,
necessita de:
P Possuir um conjunto de letras e/ou números;
P Regras de descodificação para as letras e/ou números,
a qual não existe, ainda neste momento, para a tatuagem;
P Base de dados - actualmente, há duas bases de dados.
Uma delas existe já há vários anos sendo designada por
Sistema de Identificação e Registo Animal [SIRA] e está
instalada no Sindicato Nacional dos Médicos-Veterinários.
A actual legislação obrigou à criação do Sistema de Iden-
tificação de Caninos e Felinos [SICAFE] coordenada pela
Direcção-Geral de Veterinária [DGV]. A legislação é omissa
quanto à articulação entre o SIRA e o SICAFE.
A identificação electrónica é obrigatória, desde 1 de Julho
de 2004, para os seguintes grupos de animais, devendo
ser efectuada entre os 3 e os 6 meses de idade:
P Cães perigosos ou potencialmente perigosos;
P Cães utilizados em acto venatório [Cães de caça];
P Cão em exposição, para fins comerciais ou lucrativos,
em estabelecimentos de venda, locais de criação, feiras
Animais de Companhia

e concursos, provas funcionais, publicidade ou fins similares.


A partir de 1 de Julho de 2008, a identificação electrónica
passa a ser obrigatória para todos os cães nascidos após
esta data.
150
A obrigatoriedade de identificação electrónica para os gatos
será fixada por despacho do Ministro da Agricultura, Desen-
volvimento Rural e Pescas.
A identificação electrónica animal é de primordial impor-
tância nas seguintes situações:
P Abandono - só é possível identificar e punir o proprietário
se o animal estiver identificado, pois a coleira com identi-
ficação perde-se ou retira-se com facilidade e apanhar
o dono em flagrante é muito difícil;
P Perda - se não tiver coleira com identificação [nome
e morada ou telefone do proprietário], não é possível
estabelecer contacto com o proprietário;
P Roubo - Só é possível confirmar, de forma inequívoca,
se determinado animal foi roubado se estiver identificado.
A tatuagem, para além do facto de não ter regras para
a sua descodificação e não possuir base de dados, ainda
apresenta as seguintes desvantagens face à identificação
electrónica:
P É colocada normalmente na face interna da orelha, o que,
em caso de lesão ou amputação, torna inviável a sua
leitura [a tatuagem pode também ser feita na face interna
da coxa];
P É removida com relativa facilidade, quer por amputação
da orelha, quer por remoção da pele no local de implan-
tação;
P É fácil a confusão entre diversos algarismos, sobretudo
0, 3, 6, 8 e 9;
P A dificuldade de leitura aumenta ao longo do tempo
e com o crescimento do animal;
P Quando feita pelo método tradicional, causa mais dor
do que a aplicação do microship [a tatuagem pode tam-
bém ser feita a laser, sendo neste caso indolor].
A identificação electrónica, por sua vez, apresenta algumas
desvantagens em relação à tatuagem:
Como qualquer dispositivo electrónico, pode avariar ou
Animais de Companhia

ser adulterado;
P Pode migrar, embora sejam obrigados a conter dispositivos
anti-migração;
P Necessita de um leitor.
151
O microship [transponder] é aplicado por injecção subcutâ-
nea na face lateral esquerda do pescoço, sendo a agulha
de grosso calibre. Apresenta um conjunto de 15 dígitos,
em que os primeiros 3, correspondem ao código do País.
Aquando da identificação electrónica efectua-se o preenchi-
mento de uma ficha, em que o original e o duplicado são
para o proprietário [fazendo este posteriormente a entrega
de um dos exemplares na Junta de Freguesia, para esta pro-
ceder à inserção dos dados na Base de Dados - SICAFE]
e o triplicado na posse do médico-veterinário que procedeu
à identificação. No caso do SIRA, a ficha é em quadrupli-
cado, em que o triplicado é para o veterinário enviar à base
de dados [SIRA] e o quadruplicado fica na posse do médico.
Na ficha constam dados relativos a:
P Animal - espécie, sexo, cor, raça, nome, data de nascimento,
sinais particulares e n.º de registo/pedigree;
P Proprietário - nome, telefone, morada, localidade, freguesia,
concelho, código postal, bilhete de identidade e país;
P Médico-Veterinário - nome, telefone, cédula profissional,
morada, localidade, código postal, país, data, carimbo
e assinatura.
A Câmara Municipal de Lisboa tem realizado campanhas
gratuitas de identificação electrónica de canídeos desde 1997,
destinadas aos animais vacinados contra a raiva no Posto
Móvel de Vacinação [PMV], bem como para os animais que,
não tendo aí sido vacinados, os seus proprietários residam
no concelho de Lisboa. A Autarquia tem, também, procedido
à identificação electrónica gratuita dos canídeos adoptados
no Canil/Gatil Municipal, desde essa data.
Desde o ano 2004 [altura em que a identificação electrónica
se tornou obrigatória para algumas categorias de animais]
existe igualmente uma campanha oficial de identificação
electrónica, promovida pelo Ministério da Agricultura,
a qual é feita em simultâneo com a vacinação anti-rábica.
Animais de Companhia

2.5. Profilaxia da Raiva


A raiva é uma zoonose de risco e pode ser transmitida
ao ser humano pelos carnívoros domésticos [em especial
pelo cão], mas também por roedores, mamíferos selvagens
152
como a raposa e o lobo e certos morcegos hematófagos,
estando Portugal indemne desta doença, há vários anos.
Na Europa, sobretudo nos países da zona central, esta
zoonose deixou de ter carácter exclusivamente doméstico
- isto é, deixou de atacar só os cães e os gatos que privam
connosco - para se mostrar também como epizootia
silvestre, atacando principalmente as raposas, os lobos,
os texugos, etc.
A Raiva é uma doença contagiosa aguda, conhecida desde
os tempos mais recuados e das mais estudadas em todos
os seus aspectos, por ser transmitida ao Homem e por, em
regra, ser mortal. É essencialmente uma encéfalo-mielite viral.
A infecção natural é consequência da mordedura de um
animal raivoso, ou da aposição da sua saliva na pele não
intacta [mãos lambidas por cães, por exemplo]. A gravidade
da infecção está ligada a vários factores, como sejam
a virulência da saliva, a extensão e profundidade da ferida,
a riqueza em nervos e vasos linfáticos da região atingida,
a protecção dispensada pelo revestimento piloso ou pelo
vestuário, a proximidade dos centros nervosos, etc. A seguir
à replicação no local, o vírus progride centripetamente pelos
nervos periféricos e vai até ao cérebro. Vindo do sistema
nervoso central, atinge as glândulas salivares por intermédio
da rede nervosa.
A transmissão também pode ser feita por via aerógena,
porque a atmosfera de certas cavernas habitadas por
morcegos tem-se mostrado infectante para o Homem e para
os animais que lá tenham permanecido. Também pode haver
transmissão por via transplacentária.

2.5.1. Sintomas
O período de incubação é variável, podendo ir de 15 a
90 dias no cão e de 14 a 60 dias nos gatos. Pensa-se que
a distância a percorrer pelo vírus entre o local da inoculação
e o cérebro tenha influência no período de incubação, mas
o que seguramente tem importância, é a quantidade de vírus
Animais de Companhia

inoculado e a sua virulência, a severidade da mordedura,


a idade do animal e a sua espécie.
No cão, a raiva pode apresentar-se de três formas: furiosa,
muda e atípica.
153
A raiva furiosa é a mais importante e evolui em três perío-
dos distintos: o melancólico, o de excitação e o de depressão.
O período melancólico dura 1 a 3 dias, e caracteriza-se por
modificações profundas do carácter. O animal mostra-se
triste, de reflexos exaltados, procurando evitar os ruídos
e a luz intensa, isolando-se por isso em lugares tranquilos
e semiobscuros. Se o dono lhe fala mostra-se pouco solícito,
ainda que significando tê-lo ouvido e acaba por se apro-
ximar lentamente procurando lamber as mãos das pessoas
com quem convive podendo, em certos casos, readquirir
a habitual vivacidade.
As manifestações nervosas agravam-se rapidamente e surge
inquietação e agitação: o animal deita-se, levanta-se, vagueia,
pára repentinamente e parece ter alucinações, abocando
objectos imaginários no ar e no chão; se é excitado, rosna
e se alguém tenta acariciá-lo tenta morder; o apetite torna-
-se caprichoso e surge picacismo, que o leva a ingerir corpos
estranhos; procura a água, mas só consegue, à custa de gran-
des esforços, deglutir quantidades mínimas.
O período de excitação corresponde à exacerbação das mani-
festações iniciais e dura em regra 3 a 4 dias: a inquietação
intensifica-se, traduzindo-se em acessos de fúria que alter-
nam com curtos períodos de acalmia. Em certas regiões
do corpo surge prurido, às vezes tão intenso que o animal
coça-se até se mutilar, sem manifestar dor. Se está preso,
tenta soltar-se e se está enjaulado morde as grades desespera-
damente, a ponto de partir os dentes e rasgar as gengivas.
Destrói todos os objectos que apanha, chegando a deglutir
parte deles. Normalmente apresenta-se com a língua pen-
dente, a baba escorrendo em fio, o pelo eriçado. Habitual-
mente não mostra agressividade para o Homem, a não ser
que seja provocado, mas ataca todos os animais, em especial
os da sua própria espécie. A voz torna-se rouca e, por
vezes, solta um uivo lúgubre e prolongado, muito caracte-
rístico, e que traduz o começo da paralisia da faringe. Desta
paralisia resulta grande dificuldade na deglutição e acessos
de fúria em presença da água.
Animais de Companhia

Os acessos de fúria vão sendo cada vez mais espaçados e,


no extremo deste período, o aspecto do animal é impres-
sionante e inesquecível; a boca entreaberta e cheia de saliva,
o olhar vago e a pupila dilatada, a voz rouca, a tendência
dominante para morder, em resumo, um aspecto feroz.
154
Surge então o período de depressão com o alargamento
de fase de abatimento entre cada acesso de fúria, e com
a marcha cambaleante a denunciar o progresso degene-
rativo medular. Deste resulta parésia seguida de paraplégia
ou paralisia e micções e defecações involuntárias, em con-
sequência do relaxamento dos esfíncteres. A cauda está pen-
dente e metida entre as pernas. A paralisia vai ascendendo
e acentuando-se, tornando-se cada vez mais difícil a deglu-
tição. Os globos oculares entram em estrabismo convergente,
aprofundando-se nas órbitas e a córnea turva-se.
Para o fim da doença, os animais caem em decúbito lateral,
surgindo hipotermia e coma, morrendo ao fim de poucas
horas em estado de miséria extrema.
A duração total da doença medeia de 4 a 7 dias, com
o máximo de 12 dias.
A raiva muda difere da furiosa principalmente pela ausên-
cia ou fugacidade dos dois períodos anteriores ao da depres-
são; as paralisias surgem prematuramente, e logo são
localizadas no maxilar inferior e na cabeça. O aspecto
do animal é de intensa depressão. A evolução é bastante
rápida e raramente vai além dos 5 dias.
A raiva atípica, traduz-se em modificações largas dos pe-
ríodos referidos, em paralisias limitadas a certos grupos
musculares, ou em simples manifestações de gastroenterite
hemorrágica, de que o animal se cura muitas vezes, vindo
contudo a morrer de raiva, sem sintomas característicos,
passados poucos dias. Outras vezes, ocorre a morte logo
a seguir à fase de excitação, sem que se verifiquem paralisias.
No gato, a evolução é muito semelhante à do cão, mas
na fase furiosa o animal é muito mais agressivo, atacando
com unhas e dentes. A evolução realiza-se entre 2 a 6 dias.
A raiva muda manifesta-se por sialorreia intensa [baba-se
muito] e apatia profunda, com ligeira paralisia do terço
posterior.

2.5.2. Tratamento
Animais de Companhia

A raiva não tem tratamento curativo e a Lei obriga à occi-


são dos animais nos casos declarados, embora seja acon-
selhável a conservação da vida dos animais suspeitos, tanto
quanto possível, para se poder fazer um diagnóstico seguro.
155
No acto do provável contágio
deve-se fazer um rápido trata-
mento, desinfectando-se cuida-
Posto dosamente a ferida e mesmo
de Vacinação Móvel. § cauterizando-a.
Para o Homem, há um tratamento preventivo, que consiste
na tentativa de imunizar rapidamente o indivíduo que se
expôs ao contágio, para que no termo da incubação da
doença, já esteja assegurado o estado de imunidade orgânica.
Existe um Programa Nacional de Luta e Vigilância Epide-
miológica da Raiva Animal e outras zoonoses, que integra
o conjunto de acções de profilaxia médica e sanitária
destinadas a manter o estatuto de indemnidade de Portugal
relativamente à raiva ou - no caso de eclosão da doença
- executar, rapidamente, as medidas de profilaxia e de polícia
sanitária com vista à sua rápida erradicação.

2.5.2.1. Profilaxia Médica [vacinação anti-rábica]


A vacinação anti-rábica116 é obrigatória para todos os caní-
deos com três ou mais meses de idade, podendo os animais
ser vacinados nos serviços veterinários oficiais ou em clínicas
privadas, ficando isso à consideração do dono. É obrigatória
a revacinação anual.
No caso dos felinos, a vacinação anti-rábica não é obriga-
tória.
Todos os canídeos provenientes do estrangeiro devem ser
vacinados contra a raiva no prazo de 10 dias, excepto
se for feita prova de validade da vacina, ou seja, se tiver
sido administrada há menos de um ano.
A campanha de vacinação anti-rábica desenvolve-se
ao longo de todo o ano e compreende dois períodos.
P Período Normal - 1 de Março a 31 de Maio, no qual
é cobrada uma taxa N que é definida anualmente por
despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Agri-
cultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas;
P Período Extraordinário - 1 de Junho a 28 ou 29 de Feve-
reiro, no qual é cobrada uma taxa E, que corresponde
Animais de Companhia

ao dobro da taxa N definida para esse ano.

116
Nos termos do Decreto-Lei n.º 314/2003, de 17 de Dezembro, que
aprova o Plano Nacional de Luta e Vigilância Epidemiológica da Raiva
Animal e Outras Zoonoses [PNLVERAZ] - cfr. anexo A2.1
156
Os felinos pagam sempre a taxa N, independentemente
da época do ano em que são vacinados.
Estão isentos do pagamento das taxas de vacinação e do
boletim sanitário de cães e gatos:
P Cães-guias;
P Cães-guardas de estabelecimentos do Estado, de corpos
administrativos, de instituições de beneficência e de utili-
dade pública;
P Cães dos serviços de caça da Direcção-Geral das Florestas;
P Cães de autoridades militares, militarizadas e policiais.
A vacinação anti-rábica é anunciada através de editais,
afixados até ao dia 15 de Fevereiro de cada ano, indicando
os locais, dias e horas das concentrações, bem como o valor
das taxas a pagar.
No acto de vacinação, os cães devem estar açaimados ou
imobilizados pelo peito, pescoço e cabeça, devendo o proprie-
tário apresentar o boletim sanitário de cães e gatos, excepto
se for a primeira vez que o animal é vacinado. É então
colocado no respectivo boletim, o selo comprovativo da acção
de profilaxia efectuada117.

2.5.2.2. Profilaxia Sanitária [quarentenas]


Em caso de declaração de área suspeita ou infectada de
raiva ou outras zoonoses, podem ser impostos condici-
onalismos especiais ao trânsito de cães, gatos e outros ani-
mais susceptíveis àquelas doenças, ou pode mesmo ser deter-
minado o seu confinamento por período de tempo a definir.

2.5.2.2.1. Animais agressores


Os cães, gatos e outros animais susceptíveis à raiva que
tenham agredido pessoas ou outros animais, por morde-
dura ou arranhão, são considerados suspeitos de raiva
Animais de Companhia

117
A Câmara Municipal de Lisboa dispõe de um posto Móvel de Vacinação,
que entre Março a Outubro, diariamente e segundo um calendário pre-
estabelecido, disponibiliza os seus serviços. No período de Novembro a
Fevereiro, a vacinação só é efectuada no Canil/Gatil Municipal. O calendário
anual encontra-se disponível no site da CML: http://www.cm-llisboa.pt
[Março 07].
157
e deverão ser objecto de observação médico-veterinária obri-
gatória e imediata, e permanecer em sequestro durante, pelo
menos, 15 dias.
Se o animal se encontrar vacinado contra a raiva e dentro
do prazo de validade imunológica da vacina, a vigilância
clínica pode ser domiciliária, sempre que haja garantias
para o efeito, devendo neste caso o dono ou detentor do
animal entregar no Canil/Gatil Municipal, um termo de res-
ponsabilidade, passado por Médico-Veterinário, onde o clínico
se responsabiliza pela vigilância sanitária do animal durante
15 dias, comunicando no fim do período, o estado do animal
vigiado.
O dono do animal é responsável por todos os danos causados
e por todas as despesas relacionadas com o transporte
e manutenção do animal, durante o período de sequestro.

2.5.2.2.2. Pessoas agredidas


Se a pessoa agredida por cão suspeito de raiva for presente
para tratamento médico, este facto deverá ser comunicado
urgentemente à entidade policial mais próxima, indicando
a entidade e a residência da pessoa agredida e do dono
do animal para, em colaboração com o Médico-Veterinário
Municipal, se proceder à recolha do animal agressor.
Qualquer pessoa, qualquer elemento da autoridade e todos
os donos ou detentores de animais, em particular, têm
obrigação de comunicar às autoridades veterinárias locais,
regionais ou centrais e às autoridades policiais ou municipais,
qualquer caso que os leve a suspeitar de raiva e promover
a captura e o rápido isolamento do animal suspeito, acau-
telando todo e qualquer contacto directo com aquele.

2.5.2.2.3. Animais agredidos


Os cães e gatos agredidos por outros com raiva confir-
mada serão abatidos, com excepção dos que tenham sido
Animais de Companhia

vacinados contra a raiva há mais de 21 dias e há menos


de 12 meses, tendo estes, no entanto, que ser submetidos
a sequestro em Canil/Gatil Oficial, por um período mínimo
de 6 meses, e sujeitos a duas vacinações anti-rábicas
consecutivas com intervalo de 180 dias.
158
Se o animal agressor estiver confinado e em observação,
o sequestro terá a duração de 15 dias, procedendo-se de
seguida em conformidade com o resultado da observação
do animal agressor.
Se o animal agressor tiver desaparecido, o sequestro do
animal agredido, terá a duração de 180 dias, reduzido
para 90 dias no caso de ter sido vacinado contra a raiva
há mais de 21 dias e há menos de 6 meses.
Todos os animais mortos ou abatidos por suspeita da raiva,
serão submetidos a exame laboratorial, para diagnóstico
diferencial.
O dono ou detentor de animais de companhia que causem
ferimentos, lesões ou danos materiais a terceiros ou à sua
propriedade, será responsável pelas despesas daí decorrentes,
nomeadamente as resultantes de tratamentos médicos,
sem prejuízo de outras eventuais responsabilidades cíveis
ou criminais.

2.6. Controlo de outras Zoonoses


Entende-se por zoonose toda a doença transmitida pelos
animais ao homem.
No caso das zoonoses em que intervêm os animais de com-
panhia [cães e gatos] têm especial relevância as seguintes:

2.6.1. Leishmaniose
A leishmaniose canina é uma doença parasitária, provocada
por um protozoário do género Leishmania, transmitida
Animais de CompanhiaAs fases da Nova Modernidade

por intermédio de um mosquito pertencente ao género


Phlebotomus.
É uma doença sistemática
crónica, característica dos paí-
ses mediterrânicos e chamada,
por analogia com a leishma-
niose cutânea indiana, “Kala- § Flébotomos.
-azar”.
No homem pode provocar a forma cutânea ou a forma
visceral, enquanto que no cão é sempre mista [cutânea
e visceral].
159
Nos mamíferos, o protozoário multiplica-se nas células
do sistema mononuclear fagocitário [células de defesa
do organismo] e distribui-se por praticamente todos os
tecidos do corpo, com excepção do sistema nervoso central.
Tem uma distribuição idêntica à dos vectores, os flebótomos,
estando descrita na Ásia Central, China e todos os países
mediterrânicos.
Os dados existentes indicam que é endémica em Portugal,
podendo afirmar-se que predomina nas zonas próximas
dos rios - o Tejo, Sado, Guadiana e Douro - e, de um modo
geral, em áreas arenosas e com vegetação, condições essas
que favorecem a presença do vector.
Os flébotomos adultos vivem durante o dia nos muros
de pedra, troncos e sebes, sendo activos no crepúsculo,
deslocando-se em voos regulares, interrompidos sempre que
se levante vento.
Os flebótomos machos alimentam-se exclusivamente de sucos
vegetais, sendo apenas as fêmeas hematófagas, é necessária
a alternância de uma refeição de sangue com uma açuca-
rada para a maturação dos ovos.
O ciclo evolutivo da leishmania inicia-se quando um flebó-
tomo fêmea pica um hospedeiro infectado e ingere sangue.
No mosquito, o protozoário sobre evolução vai localizar-se
na sua faringe e será inoculado num novo vertebrado
mediante picadela.
A transmissão da leishmaniose nos vertebrados realiza-se
sempre pela picadela do flebótomo; somente em casos
excepcionais há uma transmissão directa [transmissão inter-
-humana, através de feridas
infectadas].
Exame clínico de animal A sintomatologia observada
no Canil/Gatil é muito variada e o período
Municipal. § de incubação pode ir de vários
meses a vários anos.Verifica-se que cerca de 50 % dos cães
infectados não apresentam sintomas evidentes, sendo mais
frequentes os problemas dermatológicos.
Principais manifestações gerais:
P Febre - transitória, moderada e inconstante;
P Modificações do comportamento - perda da vivacidade, ape-
tite irregular, fadiga e abatimento;
160
P Emagrecimento - é frequente e resulta de atrofia muscular,
especialmente dos músculos da cabeça [crotáfitas], dando ao
animal o aspecto de “cabeça velha”. Vai progredindo para
todos os músculos, terminando num estado de caquexia;
P Anemia - é devida à invasão da medula óssea pelo parasita;
P Hemorragias - as mais frequentes são a epistaxis [sangue
pelo nariz] e as hemorragias digestivas.
Principais manifestações cutâneas:
P Alopécias [zonas sem pêlo] - em volta dos olhos, chanfro,
orelhas, pescoço, parte ventral do tórax, saliências ósseas,
extremidades dos membros e cauda; A leishmaniose
é uma zoonose
P Hiperqueratose - espessamento da camada de queratina com importância real
do chanfro, almofadas plantares e focinho, acompanhada em Saúde Pública,
nos países mediter-
de pele seca, dura e rugosa [aspecto paquidérmico]; rânicos. A sua
prevalência é de
P Paraqueratose - descamação cor de amianto, sob a forma 14 milhões
de escamas, predominantemente na região dorso-lombar de pessoas infectadas
e extremidade do pavilhão auricular; e a incidência anual
é de 1,5 milhões
P Onicogrifose - crescimento anormal das unhas, sendo de novos casos,
em que um milhão
conhecido por “unhas de faquir”; são formas cutâneas
P Úlceras - cutâneas, da boca, estômago, intestino ou da mu- e meio milhão de
forma visceral.
cosa nasal, estando na origem da epistaxis. São crónicas
e não cicatrizam;
P Nódulos - nas regiões toráxica e lombar;
P Formas oculares - conjuntivites, lesões da córnea e glaucoma.
Principais manifestações viscerais:
P Hipertrofia dos linfonodos;
P Esplenomegália;
P Hepatomegália;
P Diarreia e colite, se for atingido o aparelho digestivo;
PClaudicação e artrites, se for atingido o aparelho locomotor.
Para se confirmar uma suspeita de leishmaniose é sempre
necessário recorrer ao laboratório, que pode passar pela
observação microscópica directa do parasita ou através
Animais de Companhia

de reacção antigénio-anticorpo [serolologia] e ainda exames


não específicos [hematológicos ou bioquímicos].
No Norte de África, a leishmaniose visceral afecta sobretudo
crianças, enquanto no sul da Europa afecta igualmente
adultos e crianças.
161
Em França, os últimos dados estatísticos revelam um aumento
significativo do número de casos de leishmaniose visceral.
Em Portugal, os estudos realizados indicam que predomina
em crianças até 3 anos de idade, não evidenciando um
aumento do número de casos em adultos, ao contrário de
outros países, como a França, onde são já cerca de 50 %
dos casos. No que se refere à leishmaniose visceral humana,
a sua frequência parece inversa à leishmaniose canina, predo-
minando nas zonas urbanas e suburbanas - principalmente
nos bairros degradados de Lisboa e Setúbal. A maior preva-
lência da leishmaniose canina nas zonas rurais juntamente
com a raridade da infecção humana explica-se pelo facto
de haver maior abundância de animais disponíveis para a re-
feição de sangue do flebótomo e pelo tipo disperso do povoa-
mento humano. Quer isto dizer que o flebótomo parece
preferir o cão para se alimentar, ou outro mamífero susceptível.
Assim sendo, porque se verifica um aumento do número
de casos de leishmaniose humana? O número de cães não
tem diminuído!?
Curiosamente, em França, país onde tem havido um número
crescente de casos humanos é também um dos países com
maior número de cães, chegando a atingir 1 cão para
2 habitantes.
O aumento do número de casos humanos poderá estar
relacionado como incremento do número de cães tratados
e das doses usadas, já que a terapêutica mais usada na
medicina veterinária [antimoniato de N-acetil glucamina,
GLUCANTIME] é a mesma que a usada em medicina humana,
causando assim um aumento da resistência das leishmanias,
pois o tratamento da leishmaniose canina não permite obter,
na quase totalidade dos casos, a esterilização completa
e definitiva do animal parasitado.
Há um factor que aumenta a sensibilidade humana
ao parasita. Trata-se de indivíduos imunodeprimidos, quer
de origem viral [principalmente os portadores de SIDA],
quer os indivíduos que fizeram terapêuticas com corticos-
teroides, antineoplásicos ou imunodepressores.
Animais de Companhia

Alguns autores aconselham que, perante um cão infectado


com leishmaniose, se deve proceder do seguinte modo:
P Eutanásia de todos os cães errantes infectados com
leishmaniose;
162
P Indicar ao proprietário o perigo que é um cão infectado
e que o tratamento tem uma eficácia de cerca de 20 %;
P Despiste anual de novos casos e tratamento precoce,
sabendo que 1/3 dos cães infectados e tratados são
capazes de recuperar o poder infestante;
P As recaídas são frequentes, devido a populações de
leishmania resistentes.
A evolução clínica não evolui paralelamente à parasito-
lógica, pelo que se recomenda tratamentos anuais, a realizar
durante toda a vida do cão, com todos os problemas econó-
micos que isso acarreta.
A Direcção-Geral de Veterinária recomenda que, aquando
da Campanha de Vacinação Anti-Rábica, os proprietários
cujos animais apresentem sintomas que levem a suspeitar
de leishmaniose, sejam notificados para que procedam ao
despiste da doença, devendo os resultados ser apresentados
no prazo de trinta dias. Caso o resultado seja positivo,
deverão os proprietários ser notificados, no sentido de pro-
cederem ao tratamento médico do animal no prazo de
30 dias, e apresentar atestado médico comprovativo da exe-
cução do tratamento, no prazo de 60 dias. Todos os animais
com diagnóstico positivo à leishmaniose, que não forem
sujeitos a tratamento médico da doença, deverão ser
eutanasiados. Sempre que os detentores não cumpram as
determinações do Médico-Veterinário Municipal, ser-lhes-á
instaurado processo de contra-ordenação ao abrigo do n.º 9
do art.º 6.º do Decreto-Lei n.º 91/2001, de 23 de Março.

2.6.2. Leptospirose
A leptospirose é uma doença bacteriana, provocada por
microorganismos do género Leptospira. Frequentemente
as leptospiras localizam-se no rim e são eliminadas em
grande número pela urina, durante meses ou anos.
É uma doença que afecta várias espécies animais, sendo
os roedores, especialmente, os murídeos [ratos], os seus
hospedeiros naturais.
A penetração no organismo faz-se através de erosões da pele,
Animais de Companhia

através da mucosa ocular, vaginal e nasal e, possivel-


mente pelo tubo digestivo. Após uma infecção transitória
do sangue, onde se multiplicam, as leptospiras vão depois
acantonar-se nalguns órgãos, como o fígado, linfonodos
supra-renais e principalmente no rim.
163
Podem ser veículos da infecção as águas e os alimentos
[em particular o leite] quando conspurcados com produtos
infectantes, especialmente com urina. A infecção também
se pode dar por contacto directo, através da mordedura
de roedores e da picada de insectos. O coito e a placenta
também podem ser vias de infecção.
A infecção nos animais não provoca, com frequência, doença
declarada, havendo muito mais animais infectados do que
animais doentes.
No cão, a doença pode apresentar-se de uma forma aguda
ou hemorrágica, provocando depressão, vómitos hemorrá-
gicos, febre, epistáxis, hemorragias cutâneas, sede muito
intensa, conjuntivite, necrose da língua e sintomas de menin-
gite. Nesta forma a doença pode levar à morte num prazo
de poucas horas ou num período de 5-15 dias.
Na forma ictérica, não há grande elevação da temperatura,
a qual baixa logo que surge icterícia [3.º-4.º dia], vómito
sanguinolento, epistáxis, obstipação, fezes estriadas de san-
gue, urina de cor carregada [com muita albumina
e pigmentos biliares]. A morte pode dar-se em poucos
dias, mas se a doença se arrastar por mais de uma semana,
o animal pode recuperar a saúde.
Na forma subaguda, pode aparecer icterícia ligeira pas-
sados 4-6 dias, febre, anorexia, conjuntivite, vómito e obsti-
pação. O animal tem muita sede, mas não consegue
conservar os líquidos no estômago, resultando numa profun-
da desidratação, úlceras da boca e morte por urémia
[grande elevação dos níveis de ureia].
O diagnóstico clínico é muito difícil, porque a doença tem
aspectos muito variados, pelo que é fundamental recorrer
ao laboratório.
O tratamento tem por base o uso de antibióticos, espe-
cialmente a estreptomicina e a penicilina.
Em termos de profilaxia sanitária, é fundamental eliminar
os ratos, fazer drenagem das águas estagnadas e realizar
desinfecções periódicas.
Animais de Companhia

Os cães devem ser vacinados a partir das 7 semanas, nor-


malmente com vacinas associadas, contendo Esgana, Hepatite,
Leptospirose, podendo ainda ter a Parvovirose, Tosse do Canil
e Raiva.
164
2.6.3. Toxoplasmose
A toxoplasmose é uma doença parasitária, causada por um
protozoário, o Toxoplasma gondii. O gato é o hospedeiro
definitivo, enquanto que os mamíferos [roedores, ovinos,
bovinos, suínos, homem] e aves são os hospedeiros inter-
mediários.
A forma adulta localiza-se no epitélio intestinal [parede
do intestino] do gato, formando oócistos que são libertados
nas fezes. As formas larvares formam normalmente quis-
tos, que se localizam principalmente no cérebro, coração
e músculos.
O gato infecta-se ingerindo roedores ou pássaros contendo
quistos, que sob a acção dos sucos digestivos vão libertar
o parasita, o qual acaba por penetrar no epitélio intestinal,
culminando com a produção de oócitos 3-20 dias depois
da infecção. Durante o ciclo intestinal, o parasita pode A toxoplasmose
invadir outros órgãos, dando então origem a quistos, humana está
funcionando o gato simultaneamente como hospedeiro defi- largamente difundida,
existindo no Mundo
nitivo e intermediário. Os oócitos eliminados com as fezes cerca de meio bilião
do gato, sob condições adequadas de humidade, temperatura de pessoas com
anticorpos contra
e oxigenação, esporulam e tornam-se infectantes. o Toxoplasma gondii,
com predominância
O hospedeiro intermediário [mamíferos, aves e homem] nos países com climas
quentes e húmidos.
infecta-se ingerindo os oócitos [normalmente através de
alimentos contaminados com fezes de gatos infectados] ou
tecidos animais contendo os quistos. Os parasitas liber-
tados por acção dos sucos digestivos, atravessam a parede
intestinal, atingem a corrente sanguínea e distribuem-se
pelo organismo, penetrando em diferentes tipos de células
e sofrendo aí uma rápida multiplicação, dando origem
à forma aguda de toxoplasmose. Quando as células infecta-
das se rupturam, libertam os parasitas, indo estes infectar
novas células. À medida que o processo avança, o organis-
mo reage e produz anticorpos que limitam o processo.
Assim, ao estabelecer-se a imunidade, formam-se quistos,
o que constitui a forma crónica da toxoplasmose.
Animais de Companhia

Existem no homem dois processos de contaminação, que


correspondem às duas formas da doença. Na forma
adquirida a contaminação dá-se pela ingestão de oócitos
[através de vegetais ou água] ou carne mal passada
165
contendo quistos. Na forma congénita a contaminação só
é possível quando uma mulher grávida não imune adqui-
re infecção durante o primeiro trimestre da gravidez.
O gato desempenha Os dados existentes [publicados em 1984] indicam que,
o papel principal na região de Lisboa, 6 em cada 1000 mulheres adquirem
na epidemiologia a toxoplasmose durante a gravidez, sendo o risco de trans-
da toxoplasmose,
sendo a doença missão placentária cerca de 50 %. Nascendo em Portugal
praticamente 180 000-200 000 crianças por ano, haverá em cada ano
inexistente
em áreas onde 540-600 casos de toxoplasmose congénita. A toxoplasmose
não exista. congénita pode dar origem a aborto [quando contraída no
início da gravidez], hidrocefalia, microcefalia, encefalite,
convulsões, lesões oculares, hepato-esplenomegália e icterícia
neonatal.
A prevalência Os gatos só eliminam oócitos durante algumas semanas
da toxoplasmose da sua vida, contudo quando há perdas de imunidade
nas áreas urbanas
é maior do que podem voltar a eliminá-los. Os oócitos só são perigosos
nas áreas rurais, pois para o homem e depois de esporulados mantêm-se viáveis
nestas últimas durante muitos meses ou anos, em condições favoráveis
os gatos dispõem
de uma área maior de humidade e temperatura, pelo que a sua grande
para eliminarem resistência compensa o seu curto período de eliminação.
as suas fezes. Os oócistos podem ser encontrados nos locais de defecação
dos gatos, no solo dos jardins e nos espaços destinados
às brincadeiras das crianças.
A prevalência da toxoplasmose nas áreas urbanas é maior
do que nas áreas rurais, visto que nestas últimas os gatos
dispõem de uma maior área para eliminarem as suas
fezes, reduzindo a concentração de oócitos, ao contrário
das zonas urbanas, em que grande parte dos terrenos
estão ocupados por edifícios e arruamentos, havendo maior
concentração dos oócitos.
Um estudo epidemiológico realizado na região de Lisboa,
e publicado em 1984, revelou que 71 % dos gatos têm
anticorpos contra a toxoplasmose, o que sugere que nesta
região os gatos devem constituir um importante reserva-
tório do parasita. Este estudo mostrou ainda que os gatos
começam a apresentar anticorpos relativamente cedo,
ou seja, logo que iniciam a caça aos roedores e às aves.
Aos 5-6 meses, cerca de 50 % dos gatos foram infectados,
Animais de Companhia

devendo já ter eliminado os oócitos. A partir dos 15 meses,


o gato já não desempenha um papel importante na cadeia
da toxoplasmose, pois, nessa idade, a maioria da população
felina está imunizada, sendo então rara a re-eliminação
de oócitos.
166
A carne e vísceras de várias espécies de mamíferos e aves
podem conter quistos toxoplásmicos infectantes, não só
para o gato, mas também para os hospedeiros interme-
diários, incluindo o homem. Assim, o homem pode adquirir
a infecção ao ingerir carne crua ou mal cozinhada, princi-
palmente de origem bovina ou ovina. Os quistos são
destruídos, quando a carne é submetida a temperaturas
de 66ºC ou sujeita a congelação. Estudos realizados na
região de Lisboa indicam que aos 14 anos de idade 45 %
da população já está imunizada e, por conseguinte, a per-
centagem de população em risco é de 55 %.
O diagnóstico da doença é feito por serologia, devendo ser
feitas 2 colheitas de sangue com intervalos de 3 semanas,
para determinação dos títulos de duas classes de anticorpos,
as imunoglobulinas G e M [IgG e IgM]. Da análise desses
resultados, podemos ter três situações:
P Ausência de imunidade - IgG e IgM negativas [títulos
inferiores a 1:64];
P Toxoplasmose antiga - IgG positivas e com títulos estáveis
após 3 semanas de intervalo e IgG negativas ou franca-
mente positivas;
P Toxoplasmose recente - IgG e IgM inicialmente negativas
e que se tornam positivas na segunda análise, ou IgG
e IgM positivas na primeira análise, com subida da IgG
ao fim de 3 semanas.
As mulheres não imunes à toxoplasmose, devem seguir
as seguintes normas durante a gravidez:
P Efectuar controlo serológico regular;
P Ingerir carne bem cozinhada;
P Lavar as mãos, com sabão ou detergente, sempre que
manipule carne crua, ou usar luvas de protecção;
P Não dar carne crua ou mal cozinhada aos gatos domésti-
cos, sobretudo se forem jovens. Alimentá-los nesse período,
preferencialmente com rações comerciais;
Animais de Companhia

P Limpar diariamente os cestos e caixas onde dormem


os gatos e lavar, com água fervente, os recipientes usados
na sua alimentação;
P Lançar nos sanitários, ou queimar, as fezes dos gatos;
167
P Utilizar luvas de protecção quando fizer jardinagem
ou tiver necessidade de mexer em terra;
P Não comer saladas cruas nem frutas com casca;
P Combater os insectos e artrópodes caseiros;
P Evitar ovos crus.
A mais perigosa complicação da toxoplasmose encontra-se
em pacientes imunodeprimidos, pelo facto, de estarem
submetidos a uma terapêutica anti-tumoral ou serem porta-
dores de SIDA. Em pacientes com SIDA haverá reactivação
de infecções crónicas ou latentes de toxoplasmose, sendo
a principal manifestação clínica nestes pacientes uma ence-
falite. Muitos doentes apresentam uma dor de cabeça
persistente, bilateral e severa, que não permite dormir
à noite e responde fracamente aos analgésicos.
A percentagem de indivíduos com anticorpos anti-toxoplas-
mose em Portugal é cerca de 47 %, o que é nitidamente
baixo, quando comparado com o que se verifica em países
como a França, mas bastante mais elevado quando compa-
rado com o que se verifica nos países do Norte da Europa.

2.6.4. Equinococose
Também designada por Hidatidose, é uma doença parasi-
tária, provocada por um pequeno céstodo [ténia], com cerca
de 1,5 a 6 milímetros de comprimento.
O verme adulto vive no intestino delgado do cão [ou outros
carnívoros, como o lobo] e a forma larvar, o Echinococcus
granulosus, designado vulgarmente por quisto hidático,
pode localizar-se em vários órgãos, sendo mais frequente
a localização ao nível do fígado e pulmão do homem,
ruminantes [vaca, ovelha e cabra] e roedores, funcionando
estes como hospedeiros intermediários.
O Echinococus é especialmente importante como parasita
pela prevalência dos quistos hidáticos em pessoas que
vivem em estreita relação com os cães, que se alimentam
Animais de Companhia

de restos de cadáveres de animais, constituem hospedeiros


intermediários. O homem pode também infestar-se sem
contactar directamente com os cães, através da ingestão
de vegetais crus ou de água contaminados com fezes
de cães parasitados.
168
O verme adulto liberta ovos nas fezes dos cães, os quais
eclodem quando ingeridos pelos hospedeiros intermediá-
rios, entram na circulação sanguínea e vão até às várias
partes do corpo, ficando a maioria retida no fígado e pul-
mões, formando os quistos hidáticos, os quaios podem ter
alguma dimensão.
A infestação dos hospedeiros definitivos [cães] tem lugar
quando estes ingerem quistos hidáticos. Os sucos digestivos
digerem a parede dos quistos, libertando os parasitas,
que vão atingir o estado adulto no intestino delgado.
Num meio urbano como Lisboa, não é tão fácil a infes-
tação dos hospedeiros definitivos [os cães], uma vez que estes
não possuem acesso fácil às ovelhas para alimentação.
Na cidade a sua alimentação é feita cada vez mais à base O pêlo dos cães
de alimentos compostos [as rações], quer estas sejam enla- não é prejudicial
à saúde humana,
tadas ou sob a forma de granulado. ao contrário do que
correntemente
Não havendo cães parasitados, também é menos provável se pensa, excepto
a infestação do homem. No entanto há as vias indirectas nos casos alérgicos,
de infestação, principalmente através da ingestão de vegetais os quais
são muito raros.
mal lavados.
Para prevenir a doença há que desparasitar regularmente
os cães com um antiparasitário que seja eficaz contra
o equinococos, não permitir a ingestão de vísceras cruas
e cumprir as regras básicas de higiene, designadamente la-
var as mãos após mexer nos cães. Uma vez que os parasitas
existentes no intestino dos cães podem aderir aos pêlos
dos animais e penetrar no organismo humano por ingestão
ou inalação. Deve-se ainda lavar bem os vegetais antes
de os consumir, especialmente se forem consumidos crus
e ingerir apenas carne e vísceras provenientes de animais
que tenham sido submetidos a inspecção sanitária [evitar
o auto-consumo].

2.6.5. Sarna Sarcóptica


É uma doença parasitária, provocada por ácaros da espécie
Sarcoptes scabiei.
Para além do homem pode afectar
cães, raposas, coelhos, ovinos,
caprinos, bovinos, suínos, equinos
e outros mamíferos. § Ácaro.

169
Os ácaros vivem na pele dos hospedeiros, causando uma
dermite com grande prurido. Este é devido à acção mecânica,
pois cavam galerias na pele, onde a fêmea realiza a postura
de 40-50 ovos, dando origem a larvas ao fim de 3-5 dias,
mas também a substâncias pruriginosas por elas secretadas
[saliva] e a reacções de hiper-sensibilidade do hospedeiro.
As escamas e espinhas existentes na parte dorsal do corpo
impedem-nos de recuar.
O ácaro adulto mede 0,2-0,4 mm, tem uma forma circular
e possui 2 pares de membros na parte cranial e 2 pares
na parte caudal, sendo estes de menores dimensões, pelo
que faz lembrar a forma de uma tartaruga minúscula.
O parasita completa o seu ciclo de vida [ovo-larva-ninfa-
-adulto] em 17-21 dias e o adulto vive cerca de 4 semanas.
É uma doença altamente contagiosa e transmitida sobretudo
por contacto directo.
Como sintomas, para além do prurido [o qual é intenso,
pois os ácaros utilizam as patas e os dentes até surgir
sangue, esfregando-se contra tudo] há também as alopécias
resultantes da acção dos ácaros sobre os folículos pilosos
e pela acção da coceira, e as crostas resultantes do processo
inflamatório, devido à produção de exsudados e de sangue
provocados pela comichão intensa. O sangue aglutina os
produtos de descamação da pele e o suor, formando crostas
acastanhadas. Estas aumentam de tamanho, podendo cobrir
todo o corpo. Em alguns casos, há infecções bacterianas
secundárias que causam piodermites [infecção purulenta da
pele, forma crónica marcada com alopécia], escamas, crostas
e lenhificação.
As lesões aparecem primeiramente na parte ventral do corpo
e face. As áreas classicamente afectadas são as espáduas,
focinho, parte ventral do tórax e tronco do animal.
No homem, as áreas do corpo mais afectadas são as que
contactam com os animais, tais como as palmas das mãos
[sobretudo as zonas interdigitais], pulsos, braços e tronco.
O diagnóstico da doença baseia-se nos sinais clínicos, acom-
Animais de Companhia

panhado de raspagem dos locais afectados para observação


microscópica da presença dos ácaros.
O tratamento pode prolongar-se por algumas semanas
e basear-se na aplicação tópica de produtos, champôs
170
de tratamento e/ou injecções em intervalos de 15 dias
[3 administrações], mas dá lugar a uma cura efectiva.
Como medidas de prevenção, há que manter a boa higiene
dos animais e do local onde eles vivem, lavar as mãos
com água e sabão após o contacto com os animais e mantê-
-los bem alimentados e saudáveis, visto que a capacidade
do hospedeiro para limitar a multiplicação do parasita,
é um factor a ter em conta.

2.6.6. Dermatomicoses
São doenças cutâneas provocadas por fungos dos géneros
Trichophyton ou Microsporum, designando-se também por
tinhas.
As zonas do corpo mais afectadas são a cabeça e o pescoço,
formando placas de depilação mais ou menos circulares -
especialmente à roda dos olhos - podendo confluir e dar
depilação total dessas regiões. A extremidade das patas
também é frequentemente atingida. Estas situações são
normalmente acompanhadas de prurido. Em certos casos
aparecem pústulas, nas zonas depiladas ou normalmente
desprovidas de pêlo. Os animais jovens são os mais
susceptíveis de contrair esta doença.
Os tratamentos podem ser locais [à base de cremes,
pomadas, sprays ou banhos] ou sistémicos [de duração
longa], tendo frequentemente a duração de 30-45 dias.

2.7. Registo e Licenciamento Deve-se evitar


o contacto com
“A luta contra as zoonoses transmissíveis pelos cães e gatos animais atingidos
por esta doença,
envolve um conjunto de medidas tendentes a disciplinar usar luvas aquando
a posse daqueles, nomeadamente através da sua classificação da manipulação
de animais doentes
segundo a utilidade, da sua identificação, do seu registo e lavar as mãos
e do seu licenciamento nas Autarquias Locais. Tal conjunto sempre que se
de medidas, permite estabelecer barreiras à progressão des- contacte com estes.
tas doenças, visando o seu controlo e futura erradicação”118.
Os detentores de cães entre 3 a 6 meses de idade são obri-
Animais de Companhia

gados a proceder ao seu registo e licenciamento na Junta


de Freguesia da área do seu domicílio. O registo e licen-
ciamento de gatos ainda não é obrigatório.

118
Preâmbulo da Portaria n.º 421/2004, de 24 de Abril - cfr. anexo A2.
171
O registo será efectuado mediante a apresentação dos
seguintes documentos:
P Boletim sanitário de cães e gatos;
P Duplicado [ou original] da ficha de registo de identificação
electrónica, quando aplicável.
Os cães e gatos classificam-se nas seguintes categorias:
A Cão de companhia;
P

B Cão com fins económicos [guarda e pastor];


P

C Cão para fins militares, policiais e de segurança pública;


P

D Cão para investigação científica;


P

E Cão de caça;
P

F Cão-guia;
P

G Cão potencialmente perigoso;


P

H Cão perigoso;
P

I Gato.
P

A licença é feita aquando do registo e é sujeita à reno-


vação anual - a solicitar nas Juntas de Freguesia - para
o que é necessário apresentar:
P Boletim sanitário de cães e gatos;
P Prova de realização dos actos de profilaxia médica
declarados obrigatórios para esse ano [comprovadas pelas
respectivas vinhetas oficiais], que podem ser substituídas
por um atestado de isenção dos actos de profilaxia médica
emitido por um Médico-Veterinário;
P Exibição da carta de caçador actualizada, no caso dos cães
de caça;
P Declaração dos bens a guardar, assinada pelo dono do cão
ou pelos seus representantes, no caso dos cães de guarda;
P Prova de identificação electrónica, quando seja obrigató-
ria, comprovada com a etiqueta e número de identificação;
P Registo criminal e seguro de responsabilidade civil, quando
se trate de animais perigosos ou potencialmente perigosos.
Animais de Companhia

Na actual legislação deixou de constar qualquer referência


à renovação da licença nos meses de Junho e Julho. Esta
pode ser tirada em qualquer altura do ano e tem a validade
de 12 meses.
172
As taxas a cobrar pelo
registo e licenciamento
de canídeos, são apro-
vadas pelas Assembleias
de Freguesia e têm
por referência o valor
da taxa N de profila-
xia médica para esse
ano, não podendo em
regra exceder o triplo
daquele valor e vari-
ando de acordo com a
§ Boletim Sanitário.
categoria do canídeo.
Ao proceder ao registo e ao licenciamento de cães e gatos,
a Junta de Freguesia colocará um selo ou carimbo no Bo-
letim Sanitário.
Os canídeos cujos donos não apresentem carta de caçador,
declaração dos bens a guardar, ou prova de cão-guia, são
licenciados como cães de companhia.
Os cães-guia, de guarda de estabelecimentos do Estado,
corpo administrativos, organismos de beneficência e de utili-
dade pública, bem como os recolhidos em instalações
pertencentes a Sociedades Zoófilas ou nos Canis Municipais,
estão isentos das taxas de licenciamento.
Os cães para fins militares, policiais ou de segurança do
Estado, estão também isentos de licença, devendo possuir
sistemas de identificação e registos próprios sediados nas
entidades onde se encontram e cumprir todas as disposições
de profilaxia médica e sanitária.
A morte ou desaparecimento de um cão deverá ser comunica-
da pelo dono ou representante à Junta de Freguesia, no
prazo de 5 dias, sob pena de presunção de abandono119.
A transferência do titular do registo de um animal é efectua-
da na Junta de Freguesia, que procederá ao seu averba-
mento no Boletim Sanitário de cães e gatos, mediante
requerimento do novo detentor, no prazo de 30 dias.
O alojamento dos cães e gatos em prédios urbanos, rústicos
Animais de Companhia

ou mistos, fica sempre condicionado à existência de boas

119
Punível com coima de 50 a 1850 € [pessoa singular] ou 22 € [pessoa
colectiva] - Decreto-Lei n.º 314/2003, de 17 de Dezembro.

173
condições e ausência de riscos higio-sanitários relati-
vamente à conspurcação ambiental e doenças transmissíveis
ao Homem.
Nos prédios urbanos podem ser alojados até 3 cães ou
4 gatos adultos por cada fogo, não podendo no total
ser excedido o número de 4 animais, excepto se, a pedido
do detentor, e mediante parecer vinculativo do médico-
-veterinário municipal e do Delegado de Saúde, for autori-
zado alojamento até ao máximo de 6 animais adultos,
desde que se verifiquem todos os requisitos higio-sanitários
e de bem-estar animal legalmente exigidos.
No caso de fracções autónomas em regime de proprie-
dade horizontal, o Regulamento do Condomínio pode esta-
belecer um limite de animais inferior ao previsto por lei.
Nos prédios rústicos ou mistos podem ser alojados até 6 ani-
mais adultos, número que pode ser excedido se a dimensão
do terreno o permitir e desde que as condições de aloja-
mento obedeçam aos requisitos legalmente exigíveis.
Sempre que se verifiquem situações que colidam com as
condições acima referidas, as Câmaras Municipais notificam
os detentores dos animais para correcção das situações
detectadas. No caso de incumprimento, após vistoria conjunta
do Delegado de Saúde e do Médico-Veterinário Municipal.
As Autarquias podem retirar os animais para o Canil ou Gatil
Municipal, se o dono não optar por outro destino.
No caso da criação de obstáculos ou impedimentos à retirada
dos animais em situação que desrespeite as condições,
o Presidente da Câmara Municipal pode solicitar a emissão
de mandado judicial para permitir o acesso ao local e à sua
remoção.

2.8. Animais Perigosos e potencialmente Perigosos


A propriedade deste tipo de animais como animais de com-
panhia carece de licença emitida pela Junta de Freguesia da
área de residência do detentor, a qual tem a categoria G
para os cães potencialmente perigosos e a categoria H para
Animais de Companhia

os cães perigosos.
Para a obtenção da referida licença, o detentor tem de ser
maior de idade e apresentar a seguinte documentação:
P Boletim Sanitário;
174
P Vacina anti-rábica actualizada [efectuada há menos de
um ano];
P Ficha de identificação electrónica;
P Termo de responsabilidade no qual declara as condições
do alojamento, as medidas de segurança e o historial
de agressividade do animal;
P Registo criminal do qual resulte não ter sido o detentor
condenado por sentença transitada em julgado, poor crime
contra a vida ou a integridade física, quando praticados
a título de dolo;
P Documentação que certifique a formalização de um
seguro de responsabilidade civil relativamente ao animal120.
A licença tem de ser renovada todos os anos.
Os alojamentos destinados a animais perigosos ou poten-
cialmente perigosos devem possuir medidas de segurança
reforçadas, nomeadamente para não permitir a fuga dos
animais e acautelar de forma eficaz a segurança de pessoas,
outros animais e bens.
O detentor fica obrigado à afixação no alojamento, em local
visível, de uma placa de aviso relativa à presença e peri-
gosidade do animal.
Estes animais não podem circular sozinhos na via pública
ou lugares públicos, devendo ser conduzidos por pessoas
maiores de 16 anos, com açaimo e trela curta [até 1 metro
de comprimento] fixa à coleira ou peitoral, no caso
dos cães. Tratando-se de outras espécies, a sua circulação
deverá fazer-se com meios de contenção adequados à
espécie e à raça, nomeadamente caixas, jaulas ou gaiolas.
Refira-se que, de acordo com a Lei, incumbe ao dono do
animal o dever de o vigiar, de forma a evitar que este
ponha em risco a vida ou a integridade física de outras
pessoas ou animais121.
As Câmaras Municipais podem regular as condições de au-
torização de circulação e permanência destes animais nas
ruas, parques, jardins e outros locais públicos. Nestes
Animais de Companhia

120
Valor mínimo de 50 000 € - Decreto-Lei n.º 314/2003, de 17 de
Dezembro - cfr. anexo A2.
121
Punível com coimas que variam entre 500 e 3740 €, se estiverem em
causa pessoas. Entre os 25 e 3740 €, se estiverem em causa animais.
175
termos as Autarquias podem determinar zonas onde
é proibida a permanência e circulação destes animais,
assim como definir as àreas e horas onde é permitida,
estabelecendo para o efeito as condições em que se pode
fazê-lo sem o uso de trela ou açaimo funcional.
Os animais que tenham agredido pessoas ou outros animais
são obrigatoriamente recolhidos para um centro de recolha
oficial [canil], onde permanecerão por um período mínimo
de 15 dias, a expensas do detentor, ficando a situação
registada no cadastro do animal. Findo o prazo, se tiver
causado ofensas graves à integridade física de uma pessoa
[devidamente comprovadas através de relatório médico],
o animal é obrigatoriamente abatido.
Se as ofensas à integridade física de uma pessoa não forem
graves, o animal pode ser entregue ao detentor, sendo
requisito obrigatório a realização de provas de socialização
e/ou de treino de obediência.
Entende-se por ofensas graves à integridade física, as ofen-
sas ao corpo ou à saúde de uma pessoa, de forma a:
P Privá-lo de órgão ou membro, ou a desfigurá-lo grave
e permanente;
P Tirar-lhe ou afectar-lhe, de forma grave, a capacidade
de trabalho, as capacidades intelectuais ou de procriação,
ou a possibilidade de utilizar o corpo, os sentidos ou
a linguagem;
P Provocar-lhes doença particularmente dolorosa ou perma-
nente, ou anomalia psíquica grave ou incurável, ou pondo
em perigo a sua vida.
Todo o animal que não é controlado pelo seu dono
e constitua um risco grave à integridade física de uma
pessoa, pode ser imediatamente abatido pelas autoridades,
não tendo o detentor direito a qualquer indemnização.
Os detentores de animais perigosos ou potencialmente peri-
gosos devem promover o seu treino com vista à sua domes-
ticação e socialização, não podendo, em caso algum, ter por
objectivo a participação em lutas ou o reforço da sua agres-
sividade para com as pessoas, outros animais ou bens122.
Animais de Companhia

O treino deve ser efectuado por treinadores certificados


por entidade reconhecida pela Direcção-Geral de Veterinária.

122
Punível com coima de 500 a 3740 €, no caso de pessoas singulares;
ou 500 a 44 890 €, no caso de pessoas colectivas.
176
2.9. Actividades desenvolvidas pelo Canil/Gatil Municipal
Nos termos da legislação em vi-
gor, as Autarquias deverão pos-
suir um Canil ou Gatil Municipal,
o qual deverá possuir condições
técnicas adequadas ao exercício O Canil/Gatil
de um conjunto de competências:
§ de Lisboa.

“As Câmaras Municipais, de forma isolada ou em associação


com outros Municípios, são obrigadas a possuir e manter
instalações destinadas a canis e gatis, de acordo com as
necessidades da zona, e postos adequados para execução
das campanhas de profilaxia, quer médica, quer sanitária,
que a DGV entenda determinar”123.
O Canil/Gatil Municipal de Lisboa124 desenvolve as seguin-
tes actividades125:
P Recolha de animais vadios ou errantes - A captura é efectu-
ada na via pública ou em quaisquer lugares públicos, nor-
malmente no período nocturno e com a Polícia Municipal.
No que diz respeito aos gatos vadios, em quintais par-
ticulares, a captura é feita por solicitação do interessado,
mediante a colocação de gaiolas com armadilha, no período
diurno;
P Recolha de animais mortos ou acidentados - No caso
de animais mortos, a recolha é feita na via pública
ou em local privado, pagando o dono uma taxa de
recolha126;
P Recolha domiciliária de animais para eutanásia - A reco-
lha é efectuada por solicitação do dono, o qual terá
de dispor de um atestado passado pelo Médico-Veterinário
que acompanhou o animal, solicitando a sua occisão127;

123
N.º 1 do art. 21.º da Portaria n.º 1427/2001, de 15 de Dezembro.
124
Localização: Canil/Gatil Municipal, Estrada da Pimenteira [Monsanto],
1300 Lisboa. Telf. 213 617 700.
Animais de Companhia

125
As taxas associadas aos serviços prestados pelo Canil/Gatil Municipal
estão integradas na “Tabela de taxas e outras receitas municipais”,
sendo anualmente actualizadas por deliberação da Assembleia Municipal.
126
No valor de 5,35 € [ano de 2005].
127
São cobradas as taxas de recolha e de occisão, nos valores de: 5,35 €
e 8,55 € [ano de 2005].
177
Actividade clínica dos animais
P

do Canil/Gatil Municipal - Todos


os animais que dão entrada
Exame clínico de animal no Canil/Gatil, são submetidos
no Canil/Gatil
Municipal. § a exame clínico, iniciando-se
o tratamento para quem dele
necessite. É, também, efectuado o acompanhamento clínico
e tratamento dos animais pertencentes aos vários serviços
da Autarquia;
P Adopção de animais - a adopção de animais é gratuita
para todos os que tenham até 4 meses de idade. A partir
daí é cobrada uma taxa de adopção128.
Todos os canídeos com mais de 3 meses é realizada
a identificação electrónica gratuita, bem como as acções
de profilaxia médica em vigor [vacinação anti-rábica].
A todos os animais adoptados é oferecida a desparasitação
internae e esterilização;
P Realização de quarentenas - São efectuadas quarentenas
durante o período de 15 dias, de animais vadios e de ani-
mais com dono, no âmbito da profilaxia sanitária da raiva;
P Restituição de animais - Se o dono tiver os documentos
que comprovem que o animal lhe pertence [Boletim
Sanitário de cães e gatos e, no caso dos cães o registo
e licença actualizados], este é-lhe restituído. Caso contrário,
o animal terá de permanecer no Canil/Gatil durante
8 dias, findos os quais, o presumível dono o poderá levantar;
Tendo por base alguns
P Resolução de situações de insalubridade - desde que
indicadores e estudos provocadas por animais, são realizadas vistorias conjuntas
realizados, estima-se com a autoridade de saúde;
existir uma proporção
de 1 cão para P Occisão de animais e cremação de cadáveres - é feita
10 habitantes,
a que corresponde a cremação de cadáveres de animais propriedade de resi-
uma estimativa dentes no concelho de Lisboa ou fora dele129.
de 1 milhão de cães
em Portugal.
Em Lisboa,
com quase 600 000 128
Os valores são de 14,50 € para os cães e 5,75 € para os gatos
habitantes, [valores 2005].
existirão cerca 129
de 60 000 cães, Sendo que para os proprietários de animais residentes no concelho
não havendo dados é gratuita e para os não residentes é cobrada uma taxa de 6,75 €.
130
quanto ao número 13de0 Não existem estudos que nos permitam ter uma ideia precisa sobre
cães abandonados . esta realidade.
178
2.10. Abandono versus Adopção de Animais
Não existem dados sobre o número de cães ou gatos exis-
tentes em Lisboa ou em Portugal.
Relativamente a estes últimos, segundo estimativas da asso-
ciação CATTUS PORTUGAL, existirão na Área Metropolitana
de Lisboa 1-2 milhões de gatos errantes no país, desconhe-
cendo-se o número dos existentes na cidade de Lisboa.
As causas de abandono, ou entrega de animais no Canil
/Gatil, são múltiplas, destacando-se as seguintes:
P Mudança de habitação - esta é uma causa frequente
devido à transferência do dono do animal para uma casa
de menores dimensões que não permitem manter o[s]
animal[s] em condições condignas;
P Realojamentos - a mudança de um bairro degradado
para construções em altura, justificam a entrega de animais
no Canil/Gatil, dado que os animais perdem a sua anterior
utilidade [de cão de guarda]131;
P Dificuldades económicas - os obstáculos financeiros das
famílias portuguesas reflectem-se no aumento de aban-
dono de animais, como meio de economizar nas despesas
“assim que as dificuldades apertam”;
P Férias - durante o período de férias assiste-se a um
incremento no número de animais entrados no Canil/Gatil

§ Passaporte.
Animais de Companhia

131
Nestas situações a Câmara Municipal de Lisboa, mediante a apresentação
de declaração comprovativa, pode receber os animais, encaminhando
os saudáveis para adopção.
179
por abandono dos seus donos. Todavia, há que ter em
conta que é quando o tempo está melhor que os animais
se expõem mais, sendo então mais fácil capturá-los;
P Caça - O fim da caça é apontado como um dos períodos
de grande abandono de animais - sobretudo no Alentejo,
Ribatejo e na zona interior de Portugal. Este fenómeno
não é sentido em Lisboa, por ser apenas um fornecedor
de caçadores e não um local de caça;
P Crescimento excessivo do animal - ao decidir-se adquirir
um animal de companhia, frequentemente, o animal é
muito jovem, não se tendo a noção do seu futuro
crescimento. Quando cresce e se verifica que este não se
adequa ao espaço que lhe estava destinado, esta pode
ser uma razão que induz ao abandono;
P Alterações do comportamento do animal - o animal co-
meça a tornar-se agressivo, a roer objectos em casa, ladra
ou uiva com frequência, urina ou defeca dentro da habi-
tação em locais inapropriados [principalmente os felinos
machos, não castrados], causando incómodo aos donos
e/ou vizinhos;
P Doença do animal - esta é uma das grandes causas de
abandono, sobretudo se a esse facto se aliar a elevada
idade do animal;
P Doença do[s] proprietário[s] - A doença impede o seu
dono de cuidar do seu animal, não tendo normalmente
ninguém a quem o entregar. Numa população cada vez
mais envelhecida, esta é uma situação geralmente associa-
da aos mais idosos. É também frequente e determinante
a presença de elementos na família com problemas
de saúde ou doença alérgica, sendo os animais uma
das primeiras vítimas [seja por iniciativa própria ou por
conselho médico], muitas das vezes sem serem causa
directa de doença;
P Reprodução descontrolada - o animal não foi esterilizado
ou castrado, tendo ninhadas com frequência. Nesta
Animais de Companhia

situação, as grandes vítimas são, obviamente, as fêmeas;


P “Adopções a quente” - a adopção não planeada de um
animal, seja porque estava abandonado em algum local,
porque se adoptou um animal numa campanha de
180
Adoptados/Restituídos aos
Data Entrados Total Total
donos
Cães Gatos Cães Gatos
2002 1.083 944 2.027 240 141 381
2003 959 1.318 2.277 326 96 422
2004 1.552 1.906 3.458 498 463 961
2005 1.591 1.308 2.899 517 222 739
2006 1691 1181 2872 543 182 725
Animais capturados e adoptados no Canil/Gatil Municipal de Lisboa 2002|2006

sensibilização132, ou devido a oferta de animais de estima-


ção em aniversários ou festas similares - leva a que, com
frequência, existam situações de abandono ou de entrega
dos animais nos canis.
No Canil/Gatil Municipal de Lisboa a prática tem demons-
trado que existe uma situação de desfasamento entre
a oferta e a procura de animais para adopção: as pessoas
procuram um tipo de animais que não coincide com
o disponível para adopção.
Neste Canil, como em todos
os outros - sobretudo nos muni-
cipais - predominam os animais
sem raça definida [muitos deles
velhos ou doentes], adultos e um
grande número de fêmeas.
A procura de animais para adopção dirige-se, sobretudo,
para animais com as seguintes características:
P Raça - São preferidos os animais com raça definida - fre-
quentemente associados à aquisição de status social
- sendo os canis um local onde o preço a pagar é baixo
ou nulo;
P Idade - São mais procurados os animais jovens - em espe-
cial até aos 3-4 meses de idade - por serem mais atra-
entes e pela convicção [falsa] que um animal adulto não
Animais de Companhia

se adapta a novos donos;

132
Sobretudo nas acções de adopção de animais promovidas em locais
onde supostamente não deveriam existir animais - tais como Hiper-
mercados ou Centros Comerciais.
181
P Sexo - Os machos são muito procurados, o que se rela-
ciona com ausências de problemas com a reprodução.
O facto de ser fêmea é, com frequência, motivo de rejei-
ção de um animal, mesmo que tenha sido previamente
escolhido;
P Estado de saúde - Aqui podemos dizer que os extremos
tocam-se. Existe por um lado o “cidadão normal” que quer
adoptar um animal, preferindo ou exigindo apenas animais
saudáveis. Por outro os auto-designados “protectores dos
animais” [normalmente adultos do sexo feminino] com
problemas de solidão ou de relacionamento social, com
o objectivo de impedir a eutanásia.
Como forma de estimular a adopção de animais133,
a Câmara Municipal de Lisboa divulga alguns dos animais
existentes para adopção através da página da Internet134.

3. Pragas Urbanas
3.1. Conceitos gerais
O ser humano, na maior parte dos locais onde
vive, contacta com várias espécies animais. Algumas
delas são benéficas enquanto produtoras de alimentos,
companhia ou como predadores de espécies indesejáveis.
Outras podem ocasionar situações de risco para o Homem,
porque mordem, picam, transmitem doenças, destroem
ou danificam alimentos e outros bens, ou causam repulsa
ou pânico; isto é, por diversas formas, directa ou indi-
rectamente, provocam incómodo ao homem. A este grupo
chamamos pragas.
As pragas podem classificar-se em agrícolas e não agrícolas
ou urbanas.
Definem-se como pragas urbanas as que afectam as cidades,
perturbando as actividades que aí se desenvolvem afectando
a envolvente, transmitindo doenças infecciosas, estragando
ou perturbando o habitat e o bem-estar humano.

133
A adopção de animais até aos 4 meses de idade é gratuita. A partir
Pragas Urbanas

dos 4 meses, é paga a taxa de 5,75 € para os gatos e 14,50 € para


os cães, acrescida da vacinação anti-rábica. É oferecida a desparasitação,
a identificação electrónica e apanha dejectos.
134
http://www.cm-llisboa.pt [Março 06], na área designada por [Lisboa Limpa].
182
O controlo das pragas urbanas tem então como finalidade
a protecção da saúde, do bem-estar das populações e do
património. Para tanto, há que intervir sobre os factores
de que qualquer ser vivo necessita - e neste caso, os animais
sinantrópicos135 não são excepção: água, alimento e abrigo.
Para que uma população de organismos vivos [como as
pragas] se estabeleça com sucesso num determinado local
[nicho] é fundamental que lhe sejam favoráveis algumas
variáveis ambientais, como por exemplo: as condições cli-
máticas, a oferta de abrigos, a proximidade da fonte
de alimentos e de água, ausência de inimigos naturais, entre
outras. Por essas razões, as acções que visam o controle
de pragas devem passar, necessariamente, pela observação
atenta dessas variáveis.
Para se definir uma estratégia de controlo da espécie é
necessária uma avaliação criteriosa da situação, atendendo
às seguintes linhas de análise:
P Conhecer o “inimigo” que se quer combater, identificando-
-o, estudando o seu modo de vida e comportamento
[dados biológicos];
P Caracterizar o local de permanência da espécie;
P Identificar a quantidade de indivíduos da população
no local [dados da infestação], bem como a análise dos
factores ambientais que favoreceram a sua introdução,
instalação e reprodução [histórico da infestação].

3.2. Metodologia do Controlo de Pragas


São vários os métodos para controlo de pragas urbanas.
Os tradicionais assentam na aplicação de forma defensiva
de químicos. A curto prazo são obtidos alguns resultados
positivos expressos na diminuição da população infestante.
A médio e longo prazo observa-se uma reacção inversa pois,
para além dos prejuízos causados à saúde e ao ambiente,
ocorre um crescimento desordenado da população da praga-
-alvo [reinfestação]. Esta é mais acentuada do que antes da
primeira aplicação e com um número maior de indivíduos
resistentes aos produtos químicos aplicados. Quando se
adopta esta filosofia de controlo, perante estas condições,
Pragas Urbanas

135
Por oposição aos animais domésticos designam-se de sinantrópicos os
animais que se adaptam a viver junto do homem, a despeito da sua
vontade.
183
aumenta-se o número de aplicações e a dosagem dos produtos
biocidas, reaplicando-os nos ambientes de forma intensiva.
Desta forma cria-se um ciclo vicioso:

reinfestação
aumento do
aplicação maciça número de aplicações

infestação reinfestação
reaplicação com o aumento
da dose de biocidas aplicada

Toda a expectativa de sucesso do controle fundamenta-se


no número e no tipo de aplicações e nos produtos quí-
micos aplicados, não existindo o combate às causas primá-
rias da infestação o que, ao longo do tempo, resulta na
perpetuação e agravamento dos problemas.
O Controlo Integrado de Pragas Urbanas é a alternativa
mais moderna, tecnicamente mais adequada e ecologica-
mente mais correcta e segura. Destina-se às áreas urbanas
e instituições aí existentes [espaço público, habitações,
hospitais, escolas, mercados, hotéis, indústria, comércio, etc.].
Implica o envolvimento de todos os intervenientes na tarefa
de manter o ambiente livre de pragas e uma população
mais saudável.
O Controlo Integrado de Pragas Urbanas é definido como
“o uso de todas as tecnologias apropriadas, de práticas
e procedimentos que procuram conseguir a eliminação
e prevenção de pragas dentro de uma relação custo-
-benefício adequada e uma prática ambientalmente
segura” e que mantém a expectativa de controlo baseado
apenas no biocida a ser aplicado.
São objectivos do Controlo Integrado de Pragas Urbanas:
P Controlar e eliminar as populações de pragas que infestem
as áreas abrangidas pelo sistema;
P Prevenir a presença de pragas ocasionais;
Minimizar os riscos para a saúde humana e o ambiente;
Pragas Urbanas

P Minimizar a formação de populações de pragas resistentes;


P Reduzir a necessidade de biocidas [químicos];
184
P Minimizar a formação de resíduo químico;
P Abordar preventivamente a questão de pragas;
P Envolver toda a população na prevenção das pragas,
nos hábitos saudáveis de vivência na Cidade.
O Controlo Integrado de Pragas Urbanas difere da aborda-
gem tradicional em vários aspectos:
P Programa Pró-Activo - Os métodos tradicionais tendem
a ignorar as causas dos proble-
mas, atacam as consequências
e removem uma parte da infes-
tação com produtos químicos.
Apesar do método também in-
cluir uma resposta correctiva
imediata pelo uso de produtos
químicos; no essencial este novo processo procura eliminar
ou restringir condições propiciadoras do estabelecimento
da infestação - seja de insectos, aracnídeos, roedores
ou qualquer organismo indesejado;
P Processo de Intervenção - Os métodos tradicionais baseiam-
-se na aplicação intensiva de produtos químicos para
resolver os problemas com pragas, frequentemente sem
o apoio de alguém habilitado a determinar que serviços
são necessários e o tipo de controlo desejado. O Controlo
Integrado de Pragas Urbanas visa coordenar iniciativas
que ampliem o grau de higienização e a manutenção
da área abordada;
P Uso Mínimo de Químicos - Os métodos tradicionais consis-
tem na aplicação periódica de produtos químicos, estejam
as pragas presentes ou não. O Controlo Integrado de
Pragas Urbanas privilegia as inspecções e monitorizações
periódicas. Os tratamentos químicos só ocorrem quando as
pragas estão efectivamente a infestar o local em questão.
As aplicações repetidas de biocidas que não têm em con-
sideração a dinâmica populacional das pragas são caras,
ineficientes e apresentam um risco ambiental desneces-
sário. Este método reduz potencialmente o risco de aci-
dente ecológico ou dano para a saúde humana;
P Baixa Toxicidade - Alternativas [que não o controlo quí-
mico] devem ser sempre consideradas antes do uso de
Pragas Urbanas

biocidas. Os métodos tradicionais levam, por vezes, à apli-


cação de quantidades excessivas de químicos em áreas
expostas e distantes do local onde são realmente necessá-
185
rios. No Controlo Integrado de Pragas Urbanas, quando ne-
cessários os biocidas são usados com precisão e parcimónia.
As aplicações tradicionais reservam-se para quando não
existe nenhuma outra alternativa;
P Conhecimento Técnico-Científico - Os métodos tradicionais
ainda são utilizados devido às condicionantes: desco-
nhecimento, factores predisponentes não identificados.
O Controlo Integrado de Pragas Urbanas assenta num
sistema que envolve as seguintes práticas:
P Avaliação criteriosa da área a ser atingida pelo sistema;
P Análise quantitativa e qualitativa das pragas existentes;
P Elaboração de um plano de acção que visa interferir, o mí-
nimo possível, no quotidiano da Cidade;
P Intervenção inicial para eliminar os principais focos
de infestação;
P Monitorização da área;
P Utilização de iscas, armadilhas e produtos bio-racionais,
com o objectivo de aumentar o índice de controlo;
P Treino de pessoas que trabalham no local para a adopção
de práticas preventivas;
P Relatórios periódicos das actividades desenvolvidas e consi-
derações sobre a questão de pragas, para orientações
e intervenções futuras.
Sob o ponto de vista metodológico, o Controlo Integrado
de Pragas Urbanas pressupõe as seguintes medidas:
PMedidas Físicas - Acções correctivas no meio, modificando-
-o de forma parcial ou definitiva para eliminar as pragas
ou prevenir a sua reinstalação;
PMedidas Biológicas - Actividades executadas sobre o meio
através da utilização de produtos biológicos e/ou bio-
-racionais;
PMedidas Químicas - Incluem a aplicação de biocidas que
são escolhidos segundo a área a tratar e as pragas-alvo,
com uma utilização criteriosa e no respeito pelas normas
técnicas;
PMedidas Profiláticas - Envolvem a higienização dos ambientes;
Pragas Urbanas

P Envolvimento - A participação efectiva de todos os agentes


no programa, bem como da população residente são deter-
minantes para a prossecução dos objectivos;
186
P Medidas Educativas - Pretendem a motivação e a mudança
de comportamento das pessoas face aos processos que
compõem o controle de pragas;
P Documentação - Elaboração de relatórios das actividades,
para facilitar a avaliação contínua do programa e suportar
o planeamento futuro.
Quando não controladas, as pragas urbanas podem originar Sabia que:
doenças: P 30 % dos incêndios
em indústrias
P A Barata: diarreias, alergia, tifo, hepatite; e comércios,
que não têm causas
P Os Mosquitos: dengue, febre amarela, malária; definidas, são
atribuídos a roedores;
P As Formigas: choque anafilático; P As baratas

de esgoto vivem
P Os Ratos: Leptospirose, tifo, peste bulbónica; em média 2 anos
As Pulgas: peste e tifo; e seis meses
e chegam a produzir
P

P Os Pombos: toxoplasmose, piolhos, doenças respiratórias 810 ovos. Elas podem


ficar até 15 dias
e infecções por histoplasma. sem água e alimento
ou até 30 dias
apenas com água;
P As pragas precisam
3.3. Principais Pragas de quatro factores
3.3.1. Aspectos gerais básicos para
se desenvolverem:
As espécies que causam pragas urbanas são divididas ou acesso, abrigo,
alimento e água;
classificadas de diversas formas. É frequente o seu agrupa- P As formigas são

mento em função do tipo de problemas que causam ao os principais vectores


homem e ao seu habitat. Assim, falamos de pragas dos ali- de infecção hospitalar
no Mundo.
mentos armazenados, dos tecidos, do papel, da madeira;
das pragas provocadas por espécies que mordem, picam
e provocam irritação; pragas ocasionais, etc.
De forma a ajudar o planeamento e execução de um pro-
grama de controlo adequado [ainda que muitos destes
grupos se sobreponham], a classificação de uma praga num
grupo apropriado permite aos profissionais conhecer os aspec-
tos mais importantes do seu comportamento e os seus
hábitos específicos.
As pragas que afectam alimentos armazenados são inú-
meras. Infestam armazéns de cereais, combóios, barcos
e camiões utilizados para o seu transporte, restaurantes,
fábricas de processamento de alimentos, habitações, estabele-
cimentos comerciais, etc., ingerindo os alimentos destinados
Pragas Urbanas

ao homem e contaminando-os, o que leva a prejuízos


consideráveis. Estas pragas podem ser de dois tipos: as que
atacam os alimentos apenas para os ingerir [por exemplo,
187
roedores, baratas e formigas] e as das espécies que depen-
dem desses alimentos para completar o seu ciclo biológico
[por exemplo gorgulho e traças].
As espécies que pertencem ao primeiro grupo não são
normalmente muito selectivas quanto ao tipo de alimento,
passando-se o contrário com as do segundo grupo. Algu-
mas pragas dos alimentos armazenados podem ter origem
no campo antes das colheitas, enquanto outras apenas
infestam os produtos durante as fases de processamento
e armazenamento.
Os insectos que infestam os tecidos podem causar pre-
juízos importantes. Além de perdas no seu fabrico e nas
operações de armazenamento, há ainda que ter em conta
os prejuízos causados a nível doméstico. Os materiais infes-
tados incluem vestuário, componentes do mobiliário como
tapeçarias, almofadas e revestimentos de lã de qualquer
outra peça. As fibras e os materiais sintéticos apenas aci-
dentalmente são afectados, devendo-se geralmente a sua
destruição à presença de manchas provocadas por alimentos
gordos, por secreções corporais ou por outros resíduos que
são objecto do ataque dos insectos.
As pragas dos insectos dos tecidos são problemáticas devido
à capacidade que têm para digerir a queratina, principal
proteína constituinte por exemplo dos cabelos, das unhas
e da pele nos humanos e, noutras espécies, das penas,
pêlos, lã e cornos. Esta capacidade aliada ao uso frequente
pelo homem de tecidos de lã e outras peles de animais
constituem a base dos problemas de pragas que afectam
os tecidos. São também vulneráveis a estas pragas as
colecções de insectos ou outros animais, bem como qualquer
alimento armazenado como carne, peixe e produtos
lácteos. Existem ainda outras espécies que destroem tecidos
por mastigação, mas não digerem a queratina, como por
exemplo os peixinhos de prata, as baratas e os grilos.
A madeira encontra-se bastante difundida no ambiente urba-
no. Diversas espécies podem afectar este material, nomea-
damente térmitas e carunchos. As infestações em edifícios
com construção em madeira são um quebra-cabeças para
Pragas Urbanas

a reabilitação urbana. Mas, de uma forma geral podemos


ainda identificar as pragas de aranhas, formigas, maria-
-café, centopeias, peixinhos de prata, piolhos dos livros, etc.
188
Muitas das espécies causadoras destas pragas transmitem
ao homem agentes que podem provocar doenças infecciosas.
As principais espécies que se incluem neste grupo são artró-
podes, como as carraças, os ácaros, os piolhos, as pulgas,
os percevejos, os mosquitos, as moscas, as abelhas, etc.
A sua origem pode ser diversa: a partir do exterior pelas
portas e janelas, animais presentes nas habitações, por par-
tilha de bens e utensílios ou directamente de outras pessoas,
alimentos e instalações sanitárias públicas.
As reacções humanas às espécies que picam, mordem ou
provocam irritação são várias, desde as praticamente ine-
xistentes até a tumefacções ou outros problemas alérgicos
de extensão alarmante.
Muitas das espécies referidas incluem-se no grupo das
designadas “pragas ocasionais”. Vivem no exterior e, em
determinadas ocasiões, são atraídas por factores diversos
e entram nos edifícios [muitas vezes durante a noite atraídas
pela luz], embora não completem aí o seu ciclo de vida.
Embora algumas sejam comuns às várias regiões do Globo,
outras incidem sobre regiões específicas. Algumas causam
danos elevados no mobiliário e outro equipamento domés-
tico, ao passo que outras podem ser venenosas ou produzir
reacções alérgicas. No entanto, de um modo geral, não
provocam danos elevados e a sua presença é considerada
inofensiva.

3.3.2. As Pragas de Roedores


3.3.2.1. Informação geral
Entre as pragas urbanas, as dos roedores ocupam um lugar
de destaque.
Os roedores são os mais importantes competidores do
homem relativamente aos alimentos e outros bens e, quer
a nível industrial, quer a nível doméstico, podem encontrar
as condições ideais para uma rápida multiplicação: dispo-
nibilidade de alimentos e água, refúgio e ausência de preda-
dores e competidores.
Pragas Urbanas

Podem ocorrer pragas de roedores nas habitações, super-


mercados, restaurantes, indústrias alimentares, esgotos,
escolas, hospitais, etc. Aberturas das canalizações, ventiladores
189
Rato caseiro Mus Musculus
Comprimento do corpo =< 10cm

Cauda 5 a 7 cm
Características físicas

Peso 10 a 20 gramas
Focinho Pontiagudo
Grandes
Orelhas [ultrapassam os olhos quando rebatidas]
Cinzento a castanho
Cor da pelagem [diversificada de acordo com o habitat ]
Fezes Grão de arroz [6 mm]
Informação específica Odor típico devido ao cheiro da urina

Interior de edifícios com materiais maleáveis


Ninhos [papel, material de isolamentos, pedaços de madeira]
Reprodução

Gestação 21 dias
Ninhada 6 a 8 crias
Número de ninhadas/ano 8
Esperança de vida 2 anos
Espécie Omnívora
Cereais, alimentos secos, aves
Alimentos preferidos e animais de companhia
Alimentação

2 refeições principais [manhã e à noite],


Ingestão diária de alimentos com ingestão de pequenas porções de alimento
cada 1 a 2 horas, 3 a 4 gr/dia
Ingestão de água Subsiste durante períodos apreciáveis sem água
Informação específica Comem baratas alemãs nos edifícios com infestações
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

Todas as zonas habitadas da cidade


Locais de presença com alimentação e ambiente seco

Locais habitados: aparece à noite


Biologia

Rotinas Locais desabitados: aparece também de dia

Capacidade de nadar Pode nadar


Deslocação Deslocação individual reduzida com raio de acção de 10 m
Informação específica
190
Ratazana de esgotos Rattus Norvegicus Ratazana preta ou caseira Rattus Rattus
19 a 26 cm 16 a 23 cm
Mais comprida que a combinação de cabeça
16 a 20 cm
e corpo [17 a 28 cm]
200 a 475 gramas 100 a 200 gramas
Pontiagudo Pontiagudo
Médias Bem desenvolvidas
Castanho-acinzentada, avermelhada, Preto a acinzentado
até branco acinzentado
Cápsula [19 mm] Fuso [12 mm]
Pelo lustroso
Interior de edifícios: preferência por pisos inferiores Constrói os ninhos em árvores,
e uso de materiais moles
Exterior: subterrâneos e cava galerias telhados, sótãos, caixas de edifícios
22-24 dias 21 dias
8-12 crias 5-10 crias
3-5 3-5
1 ano 1-2 anos
Omnívora Omnívora e carnívora
Prefere alimentos com elevado teor de proteína Sementes, vegetais e frutos secos
e hidratos de carbono
Come grandes quantidades de uma vez:
25 a 30 grama/dia
Não subsistem sem água Subsiste durante períodos apreciáveis sem água
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

Lixeiras, esgotos, jardins, muros, ribeiras, Encontra-se em qualquer habitat,


locais de rega; instalações pecuárias, industriais
ou costeiras; bermas de estrada. mas prefere áreas florestadas
ou agricultura com preferência por locais secos
Entrada em edifícios através de canalizações
Actividade nocturna com picos ao amanhecer
e anoitecer. Se as populações forem grandes Predomina actividade nocturna
ou houver fome, têm actividade diurna
Excelentes nadadores, Pode nadar
podendo ficar submersos até 30 segundos
Raio de acção: 30 a 50 m
Vector de doenças causadas pelas fezes
[tifo, peste, etc.] Vector de doenças
191
e algerozes, mas também janelas e portas podem ser fonte
de infestação, tal como edifícios contíguos ou mercadorias
infestadas.
As espécies de roedores mais vulgarmente implicados nas
pragas urbanas são:
P Mus Musculus - rato caseiro ou ratinho;
P Rattus Norvegicus - ratazana dos esgotos ou ratazana
castanha;
P Rattus Rattus - ratazana preta ou caseira.
Estas espécies consideram-se oportunistas ou comensais,
isto é, dependem em muito da presença do homem, cujos
alimentos e desperdícios constituem a sua principal fonte
alimentar, ao mesmo tempo que a proximidade do homem
as protege contra muitos inimigos naturais. Provocam
estragos consideráveis nos locais que infestam, consumindo
alimentos e contaminando-os com fezes, urina e pêlos, estra-
gando mobiliário, roupas e documentos.
Atendendo aos hábitos e características dos roedores,
a adopção de medidas de prevenção em casa, no comércio,
indústria e serviços é o primeiro passo. Assim:
1 Manter a limpeza de todas as áreas;
P

2 P Não acumular entulho de obra no quintal e espaços


expectantes e eliminar outros possíveis esconderijos;
3 Não deixar restos de alimentos em vasilhames/lixeiras
P

abertas;
4 Colocar protecções nos esgotos;
P

5 Eliminar goteiras e outras fontes de água;


P

6 Ao perceber-se da presença de roedores contactar ser-


P

viços especializados ou a Autarquia.

3.3.2.2. Controlo de Pragas de Roedores


A suspeita da existência de uma praga de roedores carece
sempre de confirmação da sua presença através da identi-
Pragas Urbanas

ficação de diversos sinais.


Para combater as pragas de roedores é fundamental iden-
tificar a espécie em causa, já que os ratos e as ratazanas
192
exigem diferentes estratégias de controlo, dado diferirem
nos hábitos e comportamentos relativamente aos iscos.
Antes de colocar ratoeiras com a finalidade de identificar
a espécie e a dimensão do problema, obtêm-se normalmente
bons resultados pela observação cuidada das fezes, trilhos,
ninhos, marcas de mordedura, etc.
Assim, o planeamento e execução de um programa de con-
trolo de roedores pressupõe:
1 Inspecção dos locais infestados, com a finalidade de
P

identificar a espécie e verificar quais as condições que


favorecem o estabelecimento dos roedores;
2 Medidas de higiene que impeçam os roedores de obter
P

alimentos e zonas de refúgio;


3 Medidas para eliminar os locais de entrada dos roedores
P

e reduzir a população presente através de raticidas,


ratoeiras, etc.
São vários os processos e fontes de informação que per-
mitem identificar/caracterizar a presença de uma praga
de roedores:
P Sons - Depois de entrar nos locais onde existem roe-
dores à noite, aguardar em silêncio durante alguns minutos
e tentar ouvir sons da actividade dos roedores: sons
de roer, de trepar pelas paredes, guinchos, etc.;
P Zonas escavadas - No solo em direcção às paredes;
P Trilhos - Os trilhos são os caminhos percorridos dia-
riamente pelos roedores desde o ninho até à área de
alimentação e que são normalmente os mesmos. A pas-
sagem contínua pelo mesmo local deixa manchas de gor-
dura. Se o trilho estiver a ser usado estas apresentam-se
frescas, se estiver abandonado, as manchas de gordura
estarão secas e a descamar. O conhecimento dos trilhos
percorridos pelos roedores é imprescindível para colocar
ratoeiras, pós de pista e iscos;
P Pegadas - Detectam-se mais frequentemente em zonas
com pó, como por exemplo as ombreiras das portas e das
janelas. Se não existirem estas zonas, pode colocar-se pó
de pista - tal como a farinha ou o pó de talco - que
é utilizado para detectar a presença e localização de roe-
Pragas Urbanas

dores, através das marcas deixadas pelas patas ou cauda.


Este pó não é tóxico, não os destrói e serve apenas para
detectar a sua presença;
193
P Marcas de roeduras - Os dentes dos roedores são de cres-
cimento contínuo, o que contribui para a sua necessidade
permanente de roer todos os materiais ao seu alcance.
Quando roem, os ratos fazem orifícios com cerca de 1
a 2,5 centímetros de diâmetro, ao passo que os das rata-
zanas têm 5 ou mais centímetros de diâmetro.
Nas cozinhas encontram-se frequentemente marcas nos can-
tos de caixas de madeira e de cartão, tendo os animais
removido estes materiais para construir os ninhos. Roem
também barras de sabão;
P Presença de fezes - A forma mais simples de detectar
uma infestação por roedores e de diferenciar o tipo de
infestação [por rato ou ratazanas], baseia-se no tamanho
das fezes. A análise das fezes dá ainda outras infor-
mações. Por exemplo, se estiverem duras e secas têm geral-
mente mais de três dias; se estiver presente uma grande
variedade de tamanhos o ninho encontra-se próximo;
P Odor a roedores - Um odor almiscarado persistente é sinal
de infestação por roedores;
P Visualização de roedores - Durante o dia é possível visua-
lizar os ratos, que, no caso de ratazanas, só acontece
quando a população é muito grande;
P Marcas de sujidade - Em tubagens e em vigas onde a suji-
dade e a gordura da pelagem dos roedores deixam uma
película gordurosa;
PVisualização de ninhos - A localização dos ninhos pode
ajudar a identificar a espécie em causa. A inspecção dos
locais infestados permite também constatar as condições
que favorecem a instalação e a sobrevivência de uma
praga de roedores.
Uma vez que as populações de roedores se fixam quando
existe alimento, água e locais para a construção de ninhos,
o objectivo inicial deve ser prevenir ou diminuir o número
de roedores através de medidas de higiene e saneamento
para diminuir a disponibilidade daquelas condições.
São vários os métodos de controlo, embora o mais comum
seja o recurso a métodos químicos - através da colocação
de iscos - devendo atender-se aos seguintes aspectos na
Pragas Urbanas

sua colocação:
P Usar caixas de isco para proteger o produto e diminuir
o risco para crianças e animais domésticos;
194
P Colocar o raticida em locais que facilitem a sua ingestão
pelos roedores [ninhos, locais de passagem e locais de refú-
gio]. Assim, as distâncias a respeitar são:
P Para os ratos - 1 a 2 metros;
P Para as ratazanas - 7 a 10 metros.
P Sinalizar, em planta de localização, os iscos para facilitar
a monitorização.
Ao colocar com frequência um determinado isco no trilho
dos ratos, estes animais desenvolvem um reflexo condicio-
nado que os leva a continuar a procurá-lo. Alguns roedores
possuem uma resistência natural aos raticidas, ingerindo-
-os durante várias semanas, sem qualquer efeito.
O uso de aparelhos de ultra-sons é um outro processo de
controlo de pragas. Este equipamento emite sons imper-
ceptíveis para o ouvido humano [acima de 18-20 kHz],
mas desagradáveis para os roedores. Se acontecer habi-
tuação, o método perde eficácia, apresentando-se o ultra-
-sons como uma das soluções a integrar num programa
de controlo de roedores [por exemplo, alterando o padrão
de deslocações dos roedores de forma a atraí-los para
as ratoeiras].
As armadilhas para roedores [ratoeiras] são úteis em locais
de risco, como por exemplo na indústria alimentar, para
capturar sobreviventes isolados depois de uma desinfes-
tação ou para capturar exemplares com vista à sua identi-
ficação. Este processo tem a vantagem de impedir a morte
dos roedores em locais inacessíveis, com os consequentes
maus odores ou surtos de moscas.
Assim, deve utilizar-se uma gama variada de métodos, se
se pretende identificar a espécie envolvida. Embora sejam
criaturas de hábitos [utilizam sempre os mesmos percursos],
os ratos são também muito curiosos, abertos a novos ali-
mentos e a novidades. Assim a combinação destes dois
factores com a colocação de um número adequado de rato-
eiras, favorece o êxito elevado na captura destes animais136.
Pragas Urbanas

136
Por exemplo, se forem vistos um ou dois ratos na cozinha de uma
habitação devem colocar-se seis ratoeiras; no caso de um restaurante
deverão colocar-se 24 a 36 ratoeiras.
195
As superfícies que contenham materiais pegajosos constituem
um outro processo de controlo das pragas de roedores
e tem por objectivo eliminar sobreviventes ocasionais
de uma desinfestação. Devem observar-se cuidados idênticos
aos da colocação de ratoeiras, sendo desaconselhado o seu
uso em locais com muito pó ou com temperaturas muito
baixas ou muito elevadas. São mais eficazes com os ratos
do que com as ratazanas.

3.3.3. Pragas de Artrópodes e seu Controlo


3.3.3.1. Informação geral
Aranhas, escorpiões, carrapatos, caranguejos, moscas, borbo-
letas, baratas e centopeias são alguns dos animais mais
comuns do planeta. Formam o filo Arthropoda [do grego
arthros = articulação; podos = pés]. É o maior dos grupos
zoológicos, tanto em diversidade de formas como em número
de indivíduos, incluindo a maioria das espécies potencial-
mente causadoras de pragas.
Assim reveste-se de especial importância, a identificação
das diversas espécies de artrópodes consideradas como
potenciais pragas urbanas. Deve apoiar-se em critérios
específicos que permitam, de uma maneira simples e fiável,
conhecer uma determinada espécie, num dado espaço
e numa determinada etapa do seu ciclo biológico.
Os artrópodes apresentam as seguintes características
morfológicas gerais:
P Corpo segmentado [articulado] com os segmentos agru-
pados em duas ou três regiões distintas;
P Apêndices [patas, antenas] em número par, segmentados;
P Esqueleto externo que se renova periodicamente;
P Simetria bilateral.
O filo dos artrópodes inclui várias classes, a que pertencem
espécies causadoras de pragas urbanas, cujas características
gerais são:
Pragas Urbanas

196
Classes Insectos Aracnídeos Crustáceos Quilópodes Diplópodes

mosca aranha
mosquitos escorpião
Exemplo bicho de conta centopeia maria-Café
formiga ácaros
pulga carraças

1 par por 2 pares por


Patas 3 pares 4 pares número variável
segmento segmento

Antenas 1 par ausentes 2 pares 1 par 1 par

cefalotórax cefalotórax cabeça


cabeça cabeça
Divisão do abdómen abdómen tórax curto
tórax segmentos
corpo segmentos
abdómen
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

filotraquéias e
Respiração traqueias brânquias traqueias traqueias
traqueias

túbulos de
túbulos de glândulas verdes túbulos de túbulos de
Excreção Malpighi e
Malpighi ou antenais Malpighi Malpighi
glândulas coxais

197
Os conhecimentos de sistemática e de chaves para a iden-
tificação de espécies é de grande importância para os pro-
fissionais de controlo de pragas. Além da apreciação das
características morfológicas que permitem identificar uma
praga - utilizando chaves de identificação - o conhecimento
dos hábitos [alimentares e outros] das espécies e caracte-
rísticas biológicas é imprescindível para a sua identificação,
nomeadamente quando não são capturados elementos das
espécies.
A maioria dos insectos desenvolve-se a partir de ovos.
Estes são depositados pelas fêmeas nos hospedeiros numa
cápsula [ou ooteca, como é o caso das baratas], individual-
mente ou em massas, soltos ou fixos a objectos diversos,
normalmente em locais protegidos do meio.
O crescimento dos insectos faz-se em estádios separados
por mudas; ou seja, pela substituição do esqueleto rígido
externo que possuem. O número de mudas varia com
a espécie. Além das alterações do tamanho, muitas espécies
mudam a sua forma durante o crescimento - processo que
é conhecido por metamorfose. Relativamente a esta apa-
rência existem quatro tipos de insectos:
P Sem metamorfoses - Ao longo do crescimento verifica-se
apenas um aumento de tamanho, sem ocorrerem
alterações da forma. Exemplo: peixinhos de prata;
P Metamorfose gradual - Distinguem-se três etapas de desen-
volvimento: ovos, ninfas e adultos. As ninfas assemelham-se
aos adultos na forma e hábitos alimentares, entre outros.
As alterações na aparência são graduais, excepto nas asas
que só atingem desenvolvimento completo nos adultos.
Exemplos: baratas, percevejos das camas;
P Metamorfose incompleta - As alterações da forma são
superiores às que se verificam nos artrópodes de meta-
morfose gradual. Os jovens têm uma forma e hábitos
diferentes dos adultos. Exemplo: algumas moscas;
P Metamorfose completa - Distinguem-se quatro etapas de
desenvolvimento: ovos, larvas [com vários estádios], pupas
e adultos. Exemplo: escaravelhos, traças, algumas moscas,
pulgas, formigas, abelhas, vespas. A larva [forma que sai
Pragas Urbanas

do ovo] tem frequentemente hábitos diferentes dos adultos


e é causadora de estragos [exemplo: larva da traça da
roupa], o que justifica a importância do conhecimento
198
dos hábitos e características biológicas das várias etapas
de desenvolvimento.
Embora seja conhecida como fase de repouso, a pupa
é uma das etapas mais activas do desenvolvimento dos
insectos, pois é durante esta fase que atingem as estru-
turas corporais adultas. Os adultos emergem da cápsula
pupal, sem qualquer desenvolvimento posterior.

3.3.3.2. Controlo de Pragas de Insectos


3.3.3.2.1. Formigas
As formigas existem em quase Os ninhos
todas as regiões: desde desertos, das formigas
constituem um
florestas inundadas, montanhas, sistema de passagens
vales e dentro das nossas casas, ou cavidades
com excepção dos pólos. Perten- que se comunicam
entre si e com
cem à ordem hymenoptera, onde o exterior. Um ninho
se incluem também as vespas e as abelhas. Em função de típico de formiga
seus hábitos de vida as formigas são insectos que apre- gira em torno
da rainha, a mãe
sentam as três características que definem o comportamento da colónia, a qual é
dito verdadeiramente social em insectos: coabitação de duas uma fêmea
que foi fecundada.
gerações na colónia, diferenciação entre indivíduos estéreis O seu papel
e reprodutivos, cuidado cooperativo com as crias. é pôr os ovos,
donde nascem
As formigas são um perigo potencial para a saúde pública as larvas.
quando acontecem infestações em hospitais, pois têm De acordo com
a alimentação
a capacidade de transportar microorganismos patogénicos que recebem,
[vectores mecânicos]. Estas infecções provocadas pelas as larvas podem
formigas são decorrentes da sua circulação pelas insta- tornar-se operárias
ou fêmeas férteis.
lações dos hospitais, entrando em contacto com material
infectado [ferimentos, ataduras usadas, lixo, etc.] e poste-
riormente com os pacientes, alimentos, medicamentos,
aparelhos e utensílios, salas de UTI, etc., disseminando
os microorganismos patogénicos [vírus, bactérias e fungos].
Hábitos Alimentares A dieta alimentar de uma formiga
P

é muito variada. Algumas formigas são carnívoras e ali-


mentam-se de outros animais [mortos ou vivos]; ao passo
que outras se alimentam de secreções de plantas, seiva,
néctar, fungos e outras substâncias. Porém, a maioria
alimenta-se do que encontra, seja doce ou não, e isso não
Pragas Urbanas

varia, esteja ela nas residências ou não.


Há ainda as formigas que protegem pulgões e cochonilhas,
que atacam as plantas dentro das casas ou do jardim.
199
Esses insectos são protegidos como “vacas leiteiras”, pois
as formigas aproveitam as suas secreções açucaradas como
alimento.
Controlo A prevenção das pragas de formigas assenta em
P

regras básicas de higiene idênticas às das restantes espécies:


higienizar os ambientes, diminuir a oferta de alimentos
e mantê-los bem acondicionados, embalar e dispensar diaria-
mente o lixo e vedar frestas.
Os processos de controlo podem ser naturais ou químicos.
Entre os processos naturais, fruto da experiência de gera-
ções, é possível inventariar:
P Identificados os potenciais ninhos [buracos em azulejos,
por exemplo] aplica-se, com uma seringa, uma mistura
de água e detergente, fechando de seguida os furos com
parafina, cimento ou sabão. Se as formigas voltarem,
significa que o ninho da rainha não foi eliminado.
Repetem-se as aplicações até atingir o ninho principal;
P Colocação de produtos repelentes nos locais passíveis
de infestação [armários, cantos da casa], como cravo-da-
-índia, folhas de louro, cascas de limão ou de tangerina
- que possuem óleos essenciais repelentes.
Identificar a espécie de formiga, estudar a sua biologia
e comportamento são as bases de definição para uma estra-
tégia de controlo da praga, no uso de processos químicos,
pois cada espécie exige uma intervenção química específica.
O uso de ultra-sons é um outro processo de controlo.
O aparelho altera o campo magnético dos insectos, fazendo
com que as formigas percam as referências de localização.

3.3.3.2.2. Insectos alados


A Mosca Entre os insectos aéreos
P

o que se destaca é a mosca


doméstica [Musca Domestica], que
é a espécie mais presente em
áreas urbanas.
A crescente aglomeração humana
Pragas Urbanas

em centros urbanos tem produzido efeitos indesejáveis à so-


ciedade, os quais se traduzem em inúmeras enfermidades,
muitas delas associadas a pragas urbanas: a Musca Domestica
200
[muscidae] e as moscas-varejeiras pertencentes aos géneros
Chrysomya e Phaenicia [Calliphoridae]. A Musca Domestica
possui uma distribuição geográfica mundial e um alto nível
de sinantropia, sendo provavelmente a espécie com maior
diversidade de hábitos alimentares: frequenta o lixo, carcaças
de animais, fezes e matéria orgânica em geral [Harwood
& James,1979; Smith, 1986].
Há pelo menos três factores que têm visivelmente contri-
buído para a manutenção das moscas em áreas urbanas:
P O aumento do volume de dejectos de natureza orgânica
[dependendo da dimensão do núcleo urbano] - A biologia
das moscas envolve um processo de desenvolvimento, em
que os adultos põem os ovos na matéria orgânica e de
que as larvas se alimentam para obter o peso mínimo
necessário à formação das pupas e dos adultos [Ullyett,
1950; Levot, et al., 1979]. A população urbana de moscas
é proporcional ao volume de matéria orgânica acumulada
pelo homem;
P A diminuição da distância entre as zonas urbana e rural
devido ao crescimento das cidades - A aproximação
destes ambientes facilita a invasão da zona urbana por
espécies que, até esse momento, estavam circunscritas
às áreas rurais;
P A presença de aterros sanitários mantidos em condições
precárias e próximos das zonas urbanas.
Os Mosquitos São insectos
P
Estes insectos são
pequenos da ordem díptera, importantes vectores
conhecidos popularmente como mecânicos,
pernilongos. Depositam os ovos podendo transportar
germes nas suas
em água parada, correntes e até patas, disseminando-os
águas limpas. Destes ovos eclodem ao pousarem nos
as larvas, que continuam a viver na água até se alimentos.
transformarem em adultos. As larvas transformam-se em
pupas que vivem na água, mas não se alimentam. As pupas
transformam-se em adultos que têm hábitos nocturnos,
porém a sua presença incomoda a qualquer hora do dia.
Os mosquitos são potenciais transmissores de várias doenças
- dependendo da espécie - como dengue, malária, febre
amarela, filaríase, etc.
Pragas Urbanas

Podem adoptar-se, comummente, algumas medidas de pre-


venção, tais como: evitar a presença de água parada e acumu-
lada em recipientes, proteger os recipientes com água.
201
Sabia que:
Há 5000 espécies As Baratas [Ordem Ohthoptera] P

de baratas, sendo que Os hábitos alimentares das bara-


apenas 1 % tem
o carácter de praga. tas colocam-nas em contacto di-
As baratas existem há recto com os alimentos, com as
mais de 300 milhões pessoas e utensílios de cozinha,
de anos.
www.mundodasbaratas.vilabol.uol.com.br

Passam 75 % deixando para trás um cheiro repugnante e fezes, para


do seu tempo além de uma grande variedade de organismos, tais como:
em fendas e buracos,
e preferem os locais bactérias, protozoários e outros, contaminando alimentos,
próximos de uma utensílios, equipamentos, etc. Entre as doenças transmitidas
fonte de alimento, pelas baratas há a cólera, a difteria, o carbúnculo, o tétano,
água, calor e alta
humidade. a tuberculose, as diarreias e a toxoplasmose, ...
São resistentes
à radioactividade, Controlo Integrado - As pragas envolvem estratégias inte-
P

aumentando gradas de tratamento químico e não-químico, onde as


de tamanho. técnicas de monitorização determinam as necessidades de
aplicação de insecticidas e outras medidas correctivas.
Os métodos de controlo não-químico têm um papel vital
na eliminação efectiva das baratas, pois de nada adiantará
fazermos uso de insecticidas se não cuidarmos das causas
que propiciam a infestação e as condições ideais para
a sua proliferação.
Medidas de Prevenção nas práticas quotidianas - É im-
P

portante promover a limpeza rigorosa das instalações,


pois um ambiente com comida, água e abrigo, propicia
infestações, bem como medidas para a eliminação ou
redução de restos de alimento e água. São recomendáveis:
[ Usar caixotes do lixo com tampa;
[ Recolher o lixo com frequência;
[ Evitar deixar o local com restos de comida durante
a noite ou durante um período muito longo;
[ Manter limpos os locais de colocação dos caixotes de
lixo e, nos terrenos baldios, assegurar a sua limpeza.
A realização de inspecções periódicas pode também prevenir
a infestação de baratas.
Nas habitações podem adoptar-se ainda as seguintes
medidas para impedir o acesso das baratas a ambientes
húmidos:
[ O uso de sifões nas pias;
Pragas Urbanas

[ Conserto da canalização;
[ Vedação de frestas e buracos [como azulejos
quebrados, rachas, tampa de esgoto, etc.];
202
[Ventilar o local, mantendo o local sempre seco e are-
jado.
As Pulgas Estes animais ocupam um lugar importante
P

como vectores de doenças. As espécies mais perigosas, são


as que transmitem os germes
da peste bubónica e do tifo Existem cerca
de 1900 espécies
murino dos ratos e as que de pulgas no Mundo.
propagam a peste entre os A que preocupa
a maior parte
roedores silvestres, podendo dos donos de animais

www.hospvetprincipal.pt
infectar o homem. é Felis Ctenocephalides.
Esta é a pulga
Referem-se as espécies domésticas importantes: que encontramos
nos animais
Pulex Irritan - É uma espécie cosmopolita. O hospedeiro
P de estimação [gatos,
primário desta espécie é o homem, podendo ser encontrada cães, coelhos
e a outras espécies].
em vários animais [cães, gatos e outros, onde raramente
se alimentam];
Ctenocephalides Felis e Ctenocephalides Canis - Espécie
P

cosmopolita que ataca cães e gatos. E também em roe-


dores. Ctenocephalide Felis parece ser a mais abundante
e de distribuição mais ampla que Ctenocephalides Canis.
São encontradas habitualmente em residências habitadas,
preferindo lugares onde se acumula o pó ou resíduos
orgânicos. Estas espécies constituem uma séria ameaça,
em especial durante o Verão.
A Felis leva de 2 a 4 dias no estágio de ovo, 8 a 24 dias
na fase larval, 5 a 7 dias, na fase pupal;
Xenopsylla Cheopis [Pulga do Rato] - é o principal vector
P

da peste bubónica e do tifo murino. Foi introduzida em


todos os países do Mundo pelo rato preto [Rattus Rattus]
e pela ratazana [Rattus Norvegicus] através dos navios mer-
cantes, particularmente na segunda metade do século XIX.

3.4. Pombos
3.4.1. Contexto da Problemática
O pombo convive com o homem
desde tempos imemoráveis, exis-
tindo a convicção de que, já no
tempo de Noé, foi um pombo
Pragas Urbanas

quem trouxe a notícia da proxi-


midade de terra, após o Grande
Dilúvio. Os romanos e os gregos
203
utilizaram-no para fins militares e, ao longo dos tempos,
foi um “carteiro” eficaz de boas e más notícias. De tal
modo que, mesmo já na era da “telegrafia sem fios”,
a agência noticiosa REUTERS não dispensou os seus
serviços durante as Grandes Guerras do século XX.
Sob o ponto de vista religioso e cultural, e em diferentes
civilizações, o Pombo apresenta-se associado a uma forte
simbologia: ícone de sorte para os chineses, do Espírito
Santo para os Cristãos, Mensageiro da Paz …
Actualmente os pombos são encontrados em praticamente
todas as cidades do Mundo.
O pombo das cidades [Columba Livia] é um descendente
do pombo de rochas europeu e foi aproveitado como
animal doméstico, mantido em cativeiro [em gaiolas] para
o consumo doméstico.
Características:
P Pequena corpulência [32 cm];
P Envergadura 60 a 65 cm;
P Cabeça cinzenta;
P Olhos cor de laranja;
P Pescoço com reflexos verdes;
P Asas cinzentas;
P Cauda com barra preta;
P Alimentação: grãos, sementes e pequenos moluscos.
Em estado selvagem, estes animais são uma espécie pouco
prolífica, produzindo no máximo três posturas por ano.
Trata-se de uma ave monogâmica, com uma esperança
média de vida entre os 12 e os 15 anos.
Características Fisiológicas do Pombo:
P Temperatura - 38º - 40º C;
P Peso médio - 450 - 500 grs;
P Ingestão de água - 30 - 60 cc por dia [45 cc em média],
que duplica no Verão [60 - 100 cc];
Pragas Urbanas

P Ingestão de alimentos - 30 gramas por dia [média].


Nos núcleos urbanos - onde possuem condições favoráveis
para a sua fixação - os pombos vivem cerca de três anos.
204
São aves granívoras e podem alimentar-se de uma grande
variedade de grãos e sementes. Porém, a sua adaptação
às cidades promoveu uma mudança na sua dieta que vai
desde o pão e o farelo a outras iguarias oferecidas pela
população. Na sua ausência, debicam os sacos de lixo ou,
simplesmente, comem o que encontrarem.
Nas cidades, o equilíbrio ecológico é atingido quando
o número de aves é inferior a um quinto da população
humana residente. A situação torna-se problemática quando
o seu número é superior, o que se deve à presença
e à conjugação de vários factores, tais como:
P Fotoperíodo longo [número de horas de luz];
P Ausência de predadores;
P Disponibilidade constante de alimento;
P Facilidade de nidificação [devido à arquitectura do patri-
mónio edificado].
A partir do momento em que a população de pombos
atinge valores superiores ao aceitável137, passa a ser consi-
derado como uma “praga”, com interferência na vida cita-
dina. A título de exemplo podemos referir acumulações
inestéticas nos edifícios causadoras de estragos. As conse-
quências para a saúde pública são várias - desde patologias
respiratórias, distúrbios intestinais a problemas alérgicos.

3.4.2. Prevenção e Controlo


As soluções para o controlo da população de pombos nas
cidades exigem a aplicação e utilização de técnicas variadas,
sendo a prevenção um dos aspectos a atender. Enquadra-
-se nesta perspectiva a proibição da criação de pombos
domésticos na cidade, assim como a sua alimentação cons-
titui contra-ordenação punível com coima138. São também
opções que se inscrevem na prevenção, o desenvolvimento

137
Nas cidades, os pombos põem ovos praticamente todo o ano pro-
duzindo cerca de 8 a 10 filhotes por ano. A fêmea coloca um a dois
ovos de cada vez, que ficam a encubar cerca de 18 dias. Depois da
eclosão dos ovos os filhotes são alimentados com uma dieta ofereci-
Pragas Urbanas

da pelos adultos chamada de “leite de pombo” e que consiste em


alimento pré-digerido.
138
De acordo com o n.º 1 do art.º 60.º do Regulamento de Resíduos Sólidos
da Cidade de Lisboa.
205
de acções de sensibilização dirigidas à população e o incen-
tivo à adopção de práticas preventivas que visem a redu-
ção da oferta de locais de postura nos imóveis [através
da colocação de gel repelente, espículas e telas de protecção].
Nesta última situação, o primeiro passo é verificar o local
onde as aves se abrigam ou nidificam, seguido da análise
das melhores opções de protecção na área, tendo em conta
o aspecto financeiro e numa óptica custo-benefício. Não
esquecendo que um serviço dessa natureza utiliza muita
mão-de-obra podendo exigir a utilização de equipamentos
para apoio ao trabalho em altura, o que encarece bastante
o serviço. É pois preciso ser bastante cuidadoso na escolha
do sistema a utilizar, de tal forma que ele seja o mais
permanente possível e não exija muita mão-de-obra para
a sua colocação ou reparação.
Na verdade deve prevenir-se ou retirar as aves do local
de pouso ou nidificação e impedir o acesso ao alimento
preferencial. Num segundo momento, o controlo deve criar
mecanismos de barreira para impedir o retorno dessas
aves aos locais de interesse.
Como métodos de controlo enuncia-se a captura [através
de canhão e gaiolas] e a distribuição de anticoncepcional
aos pombos139, o qual inibe a ovulação nas fêmeas e a
espermatogénese nos machos.

3.4.3. Risco para a Saúde


Sem inimigos naturais nas metrópoles, os pombos proliferam
rapidamente. Pela simpatia que despertam, são alimentados
diariamente com pão e outros alimentos. Este constitui um
comportamento de risco já que a ave pode ser fonte
de contaminação bacteriana. Por isso, é importante colaborar,
para que estas aves procurem ambientes mais apropriados
ao seu desenvolvimento e encontrem os alimentos próprios
da sua dieta natural [grãos, insectos, frutas].
Os pombos podem afectar a saúde nas seguintes situações:
P O contacto com as fezes pode causar problemas res-
piratórios, renais e outros como meningite, encefalite
e histoplasmose;
Pragas Urbanas

139
Esta metodologia será desenvolvida de forma mais aprofundada no
ponto 3.5 deste capítulo.
206
P Os parasitas naturais que carregam no corpo podem
causar alergias e outros incómodos;
P Os pombos podem provocar danos ao património ao abri-
garem-se em casas, prédios, telhados, torres de igreja
e parques. As suas fezes ocasionam a descoloração de
pinturas, corrosão de superfícies de alvenaria e metal,
além do apodrecimento de madeiras devido à composição
química das secreções.
Como proceder:
P Limpar os locais com acumulação de dejectos destes
animais usando máscara, luvas e produtos desinfectantes;
P Humedecer as fezes antes de as remover, o que evita
a dispersão de partículas que podem provocar doenças;
P Não dar comida às aves. Assim, elas procurarão alimentos
em ambientes naturais, longe das cidades;
P Não deixar restos de comida, grãos ou lixo ao alcance
dos pombos;
P Impedir a formação de ninhos, removendo-os sempre;
P Fechar com tela os espaços onde as aves se possam abrigar.

3.4.4. Transmissão de Doenças


Este é um assunto polémico, pois muitos acreditam ser difícil
comprovar a participação das aves na difusão de doenças
para o homem. Mas não é bem assim. Se aceitamos que
os pombos podem adquirir doenças com as pessoas, devemos
entender que o inverso também é possível.
Pragas Urbanas

207
Doenças dos pombos

Salmonelosis ou Paratifosis
Bacterianas Pasteurelosis ou Cólera
[bactéria] Coriza
Ornitosis
Micoplasmosis

New Castle ou Paramixovirus


Infecciosas
Viróticas Adenovirus
[vírus] Herpes Vírus
Varicela

Micóticas Aspergilosis
[fungos] Candidiasis ou Muguet

Coccidiosis
Ascariosos
Internos
Capilariosos
Teniasis

Plasmodiosis ou Malária
Parasitárias Protozoários Haemoproteosis
Trichomoniasis

Piolhos
Ácaros
Externos
Dípteros [moscas]
Carraças

3.4.4.1. Salmonelose
P Agente etiológico - Bactéria do género Salmonela.
P Fonte - Vivem no tubo digestivo dos animais.
Pragas Urbanas

P Animais que são portadores e sensíveis à doença - Todos,


inclusive o homem. Em cada 100 pombos, espera-se que
menos de 10 tenham a bactéria. Os portadores podem
208
apresentar sintomas da doença, quando são conhecidos
como portadores sadios. Estes são os mais perigosos.
P Modo de transmissão - Pela ingestão de carne e de ovos
contaminados ou de alimentos mal lavados [que tenham
estado em contacto com fezes, ou ainda, que foram
lavados com água contaminada por fezes de pombos].
P Patologia que pode provocar no homem - Gastroenterite.
P Como evitar a doença - Ter higiene na manipulação dos
alimentos; lavar as mãos ao chegar a casa, sempre que
se for à casa de banho e antes das refeições; manter os
alimentos cobertos; janelas e peitoris da cozinha bem
limpos.
P Grupo de risco - Qualquer pessoa exposta a condições
de falta de higiene.

3.4.4.2. Histoplasmose
P Agente etiológico - Um fungo dimórfico chamado Histo-
plasma Capsulatum.
P Fonte - Solos e pisos com dejectos de animais.
P Modo de transmissão - Pela inalação dos esporos suspensos
no ar. Quanto mais excrementos ressequidos e pulverizados
no ambiente, maior a probabilidade de o homem apre-
sentar a doença. Por exemplo, o forro do telhado de uma
casa, se frequentado por pombos, é um ambiente insalubre
repleto de microorganismos patogénicos inaláveis.
P Patologia que pode provocar no homem - A histoplasmose
é uma micose sistémica de gravidade variada. A infecção
é comum, mas a doença não. Isto é, estamos sempre expos-
tos aos esporos, em maior ou menor quantidade, podendo
desenvolver sensibilidade sem apresentar doença sintomá-
tica. Quando há sintomas, pode ser uma enfermidade
respiratória benigna ou, nos casos mais graves, os órgãos
internos podem ser afectados de forma aguda ou crónica.
P Como evitar a doença - Mantendo a higiene dos locais
que frequentamos e destinando adequadamente os dejectos
dos animais domésticos e peridomiciliares, como os pombos.
Importante: Na acção de limpeza dos excrementos,
Pragas Urbanas

humedecer o piso e as superfícies a serem limpas e usar


sempre um lenço húmido ou máscara na face para evitar
inalação da poeira levantada.
209
P Grupo de risco - Pessoas expostas a ambientes em-
poeirados e contaminados com fezes de animais. Se estas
pessoas estão imunodeprimidas, ou seja, com as suas
defesas orgânicas diminuídas [como transplantados, porta-
dores de cancro em tratamento com quimioterapia, tuber-
culosos, pessoas infectadas com o HIV e idosos debilitados]
os riscos de contrair a histoplasmose são maiores.

3.4.4.3. Criptococose
P Agente etiológico - O fungo Cryptococcus Neoformans.
P Fonte - Como na histoplasmose.
P Modo de transmissão - Como na histoplasmose.
P Patologia que pode provocar no homem - Uma micose
sistémica que geralmente se apresenta como meningite
subaguda ou crónica. A seguir ocorre o comprometimento
dos pulmões, baço, articulações, músculos, pele e gânglios
linfáticos.
P Como evitar a doença - Como na histoplasmose.
P Grupo de risco - Como na histoplasmose.

3.4.4.4. Ornitose [psitacose ou clamidiose aviária]


P Agente etiológico - Um microorganismo intracelular
nomeado Chlamydia Psittaci.
P Fonte - Aves infectadas.
P Animais que são portadores e sensíveis à doença - As aves
domésticas e as silvestres, pois a doença é comum entre
os pombos, patos, galinhas e psitacídeos [papagaios,
periquitos e araras].
Os grandes bandos de aves, sob stress, são mais sensíveis
à doença.
A sua ocorrência no homem é esporádica.
P Modo de transmissão - Por via aérea por inalação em
locais contaminados [uma vez que o agente patogénico
Pragas Urbanas

é eliminado nos excrementos e secreções corporais das


aves doentes] podendo ficar nas penas, aderir ao material
do ninho e poleiros das aves. Os dejectos secos formam
210
aerossóis contendo a clamídia. O grau de exposição ao
agente infeccioso pode determinar a gravidade da doença
no homem.
P Patologia que pode provocar no homem - Pode ser assin-
tomática ou ocorrer doença de gravidade variada. Pode
confundir-se com enfermidade respiratória comum e pas-
sar despercebida; ou ser traiçoeira e provocar pneu-
monia e broncopneumonia [nas formas mais graves],
hepato-espleno-megalia, vómitos, diarreias, depressão men-
tal e delírios.
P Como prevenir a doença - Para evitar a inalação de
aerossóis durante a limpeza das superfícies frequentadas
por aves, humedecer os excrementos, os ninhos e as
camas de aves usando uma máscara.
P Grupo de risco - idosos, pessoas com saúde debilitada
e profissionais com contacto estreito com as aves, em
especial os que se exponham em ambientes confi-
nados140.

3.4.4.5. Alergias
P Agentes - Poeira com resíduos orgânicos [pêlos, penas,
escamas de pele, plumas, secreções corporais e excre-
mentos] e/ou ectoparasitas de pombos [ácaros de pele
ou penas, carrapatos, piolhos, pulgas e moscas].
P Fonte - Aves e outros animais que frequentam os
mesmos ambientes que pessoas sensíveis.
P Sensibilização - Pela inalação e pelo contacto com
os agentes irritantes ou picadas dos ectoparasitas.
P Patologia que pode provocar no homem - Alergias com
diversos sintomas que vão desde a irritação e pruridos
da pele, à coriza ou à sufocação por edema de glote.
É comum a bronquite asmática alérgica, principalmente
em crianças e idosos.
P Como evitar a doença - Manter limpos e ventilados os
locais frequentados por pessoas sensíveis e impedir a proxi-
midade dos agentes irritantes.
Pragas Urbanas

140
Como forros e sótãos onde os pombos fazem os seus ninhos ou se
abriguem.
211
3.5. Controlo da População de Pombos na Cidade
de Lisboa
O aumento do número de pombos e de queixas dos resi-
dentes em Lisboa, é um facto. Os incómodos causados pelas
aves que se traduzem na destruição do património edifi-
cado, dos monumentos e dos pavimentos e a identificação
de agentes patogénicos nas aves [com eventual risco para
a Saúde Pública] levaram a CML a tentar controlar a popu-
lação columbófila na cidade.
Tendo por objectivo atingir o equilíbrio da espécie pelo
controlo da reprodução das aves, a solução adoptada
replicou [com as devidas alterações] uma metodologia tes-
tada com êxito, em algumas cidades europeias, nomea-
damente Veneza e Treviso.
Este método de controlo assenta na utilização de um contra-
ceptivo oral que agindo como factor de selecção natural,
não esteriliza as aves, mas apenas diminui a sua capacidade
reprodutiva141 permitindo, assim, controlar a população,
de uma forma humanitária. Substitui os predadores utilizados
em várias cidades.
A metodologia utilizada observou os seguintes aspectos:
I Fase - Caracterização do problema [situação de referência]:
P Censo da população de pombos na Cidade de Lisboa;
P Levantamento dos locais com maior número de reclama-
ções de munícipes, relacionadas com os pombos;
P Identificação dos locais com elevado número de aves;
P Contagem do número de animais que poisam em cada um
dos locais [contagem directa e por fotografia feita duran-
te a distribuição de milho simples].
II Fase:
P Avaliação da informação recolhida, mapeamento e defi-
nição de áreas prioritárias;
P Definição do programa de alimentação [estimativa da quan-
tidade de produto a utilizar142, locais, etc.];

141
Sendo faseado, este método inicia-se com uma distribuição de milho
Pragas Urbanas

impregnado com contraceptivo oral [progesterona a 0,01 %], durante


180 dias ano, dividido em 2 acções de 90 dias correspondentes às épocas
de postura das aves.
142
Tendo por base a regra: n.º de animais que poisam x 30 g de milho/dia.
212
P Formação aos operacionais a envolver no projecto.
III Fase:
P Distribuição diária de milho atendendo aos dois momentos:
fase de habituação, fase de distribuição de milho impre-
gnado com contraceptivo oral143;
P Envio de amostras de pombos para análise e identificação
dos agentes patogénicos144;
P Desenvolvimento de acções de sensibilização à população,
acompanhadas de uma intervenção dirigida pela Polícia
Municipal junto de munícipes infractores.
Para além desta metodologia, o Município de Lisboa tem
também incentivado a colocação de repelentes de poiso
das aves [picos, fio simples, fio electrostático, rede, etc.]
quer nos edifícios municipais, quer nos privados, prestando
aconselhamento técnico.

143
A distribuição teve duas fases: Abril, Maio e Junho [1.ª fase] e Setembro,
Pragas Urbanas

Outubro e Novembro [2.ª fase].


144
Foram enviados 20 pombos capturados para o Laboratório Nacional de
Investigação Veterinária, 10 pombos para a Faculdade de Medicina Vete-
rinária e 20 pombos para o Instituto de Medicina Tropical para identifi-
cação dos agentes patogénicos das aves.
213
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

100
III Da Cidadania à Educação Ambiental
P
1. Da Cidadania

A capacidade criativa e intelectual do homem trouxe


inúmeros benefícios e possibilitou a transformação
da Terra, mas também, a transformação do próprio homem,
da sua maneira de pensar, de estar e da própria noção
de cidadania.
Os desafios da actualidade implicam uma reflexão pro-
funda sobre estas alterações, com especial destaque para
a própria noção de cidadania, uma vez que esta, de algum
modo, acaba por traduzir a nossa relação, quer com a natu-
reza, quer com os nossos semelhantes.
Neste capítulo pretendemos sublinhar a importância de uma
cidadania efectiva, por forma a consciencializar para o papel
fundamental [tantas vezes ignorado ou descurado] que cada
um desempenha na construção da uma sociedade melhor,
em consonância com o meio natural e construído, de cuja
preservação somos responsáveis. A noção de participação
é determinante numa cidadania activa e empenhada, consti-
tuindo um dos componentes básicos da educação ambiental
para um desenvolvimento sustentável.
Mas, o conceito de cidadania não é unívoco. Ao longo dos
tempos assumiu vários significados que procurámos recupe-
rar pelo seu interesse para o debate e para uma melhor
compreensão da sua relação com os problemas e os valores
de cada época e ainda a forma como se impôs ou omitiu,
forjando as próprias histórias.
Procuramos também identificar alguns dos desafios que
actualmente se impõem à humanidade, os valores emer-
gentes e, por fim, algumas estratégias associadas à prática
da informação, sensibilização e educação ambiental na área
dos Resíduos Sólidos Urbanos e Animais.

1.1. A Concepção Grega


A primeira teoria sobre a noção de cidadania
deve-se a Aristóleles, mas podemos considerar que
a “prática da cidadania” grega remonta à época da formação
Da Cidadania

da Polis Grega, por volta do ano 800 a.C. Contudo, foi entre
os séc. V e IV a.C., em pleno apogeu da democracia grega,
217
que o exercício da cidadania atinge a sua maior expressão.
Apesar da associação generalizada da noção de cidadania
a este período da história da humanidade, a verdade é que
a própria formação da Polis é já fruto do espírito embrio-
nário da cidadania e da democracia: a discussão pública.
Os habitantes encontravam-se no Ágora145 onde discutiam
os vários problemas, principalmente os de natureza política.
Começa-se, assim, a ganhar consciência de que a adminis-
tração é uma coisa pública, que interessa a todos e que
todos devem dar a sua opinião. É desta forma que a cidade
se encaminha para uma abertura à participação dos
cidadãos146 e ensaia a tão paradigmática democracia grega.
Para Aristóteles, o elemento central da cidadania é efectiva-
mente a participação na comunidade política, cujo objectivo
último é o Bem comum. Mas para os gregos “comunidade
política” abrangia todos os aspectos da vida dos indivíduos
desde as questões familiares, religiosas e mesmo lazer, até
aos assuntos puramente públicos. O Homem é definido como
“um animal político” por natureza que vive em conjunto
com os seus semelhantes e que, portanto, “nasceu para
a cidadania”. Esta definição dá à noção de cidadania,
enquanto participação na comunidade política, um sentido pro-
fundo, ligado à própria noção do “ser” da pessoa humana.
Sendo a natureza de um ser o fim último da sua existência,
isto é, o estado em que cada ser se encontra desde o mo-
mento do seu nascimento até ao seu perfeito desenvolvi-
mento147, o exercício da cidadania é a possibilidade do
desenvolvimento das capacidades humanas e da plena reali-
zação do homem. Para se ser verdadeiramente humano era
necessário ser cidadão, mas, mais do que isso, era necessário
ser cidadão activo.
Estando a noção de cidadania tão intimamente ligada à na-
tureza humana, facilmente se depreende que dela fazem parte
todos os aspectos da polis: a vida política, económica, reli-
giosa, social e familiar, formando uma ideologia cívica cujos
valores são vistos como imutáveis e de origem divina.
Utilizando uma terminologia contemporânea podemos dizer
que a noção aristotélica de cidadania era essencialmente
baseada em obrigações e não em direitos. Contudo, em rigor,

145
Inicialmente praça pública e mais tarde mercado.
Da Cidadania

146
PENEDOS, Álvaro J. Introdução aos Pré-SSocráticos. Lisboa: Rés-Editora,
Lda, 1984.
147
CRESSON, André. Aristóteles. Lisboa: Edições 70, 1943.
218
no contexto grego, não deveríamos falar em “obrigações” ou
“direitos” mas sim em deveres morais e possibilidades de
desenvolver a nossa natureza humana ou oportunidades para
exercer a virtude cívica, como referimos anteriormente.
O carácter holístico da concepção grega de cidadania não
permite a noção de “direitos” e “obrigações” porque estes
pressupõem uma cisão ou oposição entre quem concede
direitos e quem está obrigado a algo. Ora, em Atenas, os in-
teresses individuais e os interesses da comunidade são total-
mente coincidentes e interdependentes. Nada escapa à auto-
ridade da polis porque, simplesmente, não há divisão entre
Estado e sociedade, público e privado ou lei e moralidade,
como nas sociedades contemporâneas. A própria liberdade só
existe na participação da vida da cidade e na procura
do bem comum. Por isso, não há na Grécia a noção de “obri-
gações” e muito menos a de que estas são um mal
necessário ou mesmo formas de limitar a liberdade. Além
disso, apesar do Estado ter características de protecção dos
seus cidadãos, não era essa a sua essência.
Na democracia grega todos os cidadãos participavam
directamente na gestão da cidade e alguns cargos eram
mesmo atribuídos por sorteio. Por conseguinte, todos tinham
a capacidade de regular [construir normas] mas, também,
eram regulados e fiscalizados. Assim, para Châtelet148
“a democracia não é a força do povo, é a extensão da cida-
dania a todo o homem livre, é a equiparação da condição
de cidadão a todos, sejam quais forem os rendimentos
e a origem”. Mas não nos iludamos com a noção de “ori-
gem”: na Atenas clássica, esta diz respeito apenas aos cida-
dãos [cerca de 10 % da população] pois, como é sabido,
os escravos, os estrangeiros, as mulheres e as crianças,
não têm este estatuto.
O grande senão da concepção grega de cidadania era, obvia-
mente, o facto de ser altamente exclusiva e o facto desta,
para além de aceite com grande naturalidade, se encontrar
perfeitamente justificada à luz dos valores da época.
As mulheres não eram seres suficientemente racionais para
a participação política e os escravos nem sequer eram verda-
deiramente humanos.
Da Cidadania

148
CHATELÊT, François. História da Filosofia de Platão a S. Tomás de Aquino.
Lisboa: Círculo de Leitores, 1986.
219
1.2. A Concepção Romana
Ao falar da concepção romana de cidadania devemos ter
presente que esta diz respeito a um longo período de tempo
e a um espaço geográfico muito alargado [inicialmente Roma
e depois todo o Império Romano]. Contudo, se deixarmos
de lado as várias nuances que o conceito foi adquirindo
ao longo do espaço e do tempo, podemos dizer que a noção
romana de cidadania é, genericamente, menos filosófica
e bastante mais pragmática.
No tempo de Roma, a cidadania estava também ligada à par-
ticipação política semelhante ao que vimos na Grécia.
Contudo, com a expansão do império foi-se desligando cada
vez mais deste ideal, tornando-se um conceito legalista
e utilitário que facilitava o controlo e a pacificação dos
povos conquistados, bem como a cobrança de impostos.
Comparativamente com a concepção Grega, a noção romana
de cidadania é assim inclusiva, mas desligada da ética
e da participação. Abrangendo povos longínquos e de múl-
tiplas culturas, transforma-se numa mera expressão das leis
do Império e reflecte-se quase exclusivamente na simples
guarda e segurança judicial. O aspecto legalista do Império
Romano foi de tal forma marcante que o legado do direito
romano no nosso sistema legal e judicial é ainda hoje
vastíssimo.
Apesar da “inclusividade” que caracteriza a concepção romana
de cidadania, esta só muito lentamente foi alargada a todo
o Império acabando, pelo menos teoricamente, com a desi-
gualdade entre cidadãos e não cidadãos.
Segundo Coulanges149 só depois de oito a dez gerações terem
ansiado por ela, surgiu um decreto imperial a concedê-la
a todos os homens livres sem distinção. Embora paradoxal,
esta situação não contraria o que atrás foi dito. Quando
este decreto surgiu já todos os homens com algum valor
tinham conseguido o pleno direito de cidadania. Coulanges
considera espantoso que, apesar de na história quase não
se encontrar decreto mais importante do que este [que
suprimia a desigualdade entre povo dominador e povos subju-
gados] tenha passado completamente despercebido. Não se
Da Cidadania

consegue determinar com exactidão nem a data, nem o nome

149
COULANGES, Fustel. A Cidade Antiga. Lisboa: Clássica Editora, 1988.
220
de quem o promulgou. Por isso, Coulanges conclui que se não
impressionou os seus contemporâneos e não é referido pelos
que então escreviam a história, é porque a modificação,
da qual é expressão legal, há muito estava estabelecida.
Sendo a igualdade um conceito fundamental na noção de
cidadania, convém sublinhar que se tratava apenas de uma
igualdade que eliminava a diferença formal entre povo
dominador e povo dominado. Continuavam a existir partes
da população que não estavam incluídas [os escravos, por
exemplo] e as desigualdades entre cidadãos e não cidadãos
eram tomadas como naturais e imutáveis.
Para melhor compreender a importância da “inclusividade”
que caracteriza a concepção romana de cidadania, acres-
centamos que das cerca de 1000 cidades da Grécia e de
Itália, Roma foi a única capaz de subjugar todas as outras.
Em vez de impôr os seus deuses, Roma adoptou os das
cidades vizinhas, passando a viver em harmoniosa comunhão
religiosa com todos os povos. Esta abertura foi fundamental,
quer durante a expansão do Império, quer durante o declínio
da velha religião. À medida que esta ia perdendo o seu peso
na forma como as cidades se organizavam, perdia-se também
o patriotismo. Já não se amava a pátria pela sua religião
e os seus deuses mas, somente, pelas suas leis, instituições
e segurança. A terra já não era sagrada e se as suas leis
e instituições não agradassem, era muito fácil aceitar
o império romano ou mudar de urbe.
Mais tarde o cristianismo com o seu Deus único assinalou
o fim da sociedade antiga e concluiu a transformação social
iniciada seis ou sete séculos antes. Um dos aspectos mais
importantes foi a separação entre o Estado e a religião,
tendo esta vivido três séculos completamente fora do Estado.
Esta independência foi particularmente importante na história
do direito romano que há muito tentava libertar-se da
velha religião.
Na perspectiva de Nogueira e Silva150, o contributo da con-
cepção romana de cidadania para a nossa questão [Como
definir cidadania?] está relacionado com o facto de ser
o primeiro exemplo da utilização da cidadania como instru-
mento de controlo social e, em segundo lugar, permitir
Da Cidadania

150
NOGUEIRA, Conceição; SILVA, Isabel. Cidadania - Construção de Novas
Práticas em Contexto Educativo. Lisboa: Edições Asa, 2001.
221
discutir se um sentido profundo de cidadania só será possível
em comunidades pequenas e homogéneas como a de Atenas.
Mas a abertura e o carácter de inclusividade romana
parece-nos, também, fundamental para o actual debate da noção
de cidadania.

1.3. Cidadania na Idade Média


Conforme constatámos ao longo da explanação da noção
romana de cidadania, este conceito foi perdendo impor-
tância. Depois da sua atribuição a todos os que habitavam
o império caiu em desuso ou, quando usada, servia apenas
para designar a condição de homem livre em oposição
à de escravo. Com a agonia e posterior queda do império,
o espírito cívico degrada-se ainda mais. A conjugação
de factores como a depressão económica [regresso à econo-
mia baseada na agricultura e na troca], a decadência das
cidades e a passividade, revolta ou fuga dos cidadãos às suas
obrigações [o exército, por exemplo, era totalmente composto
por mercenários estrangeiros] afectaram toda a organização
social, cultural e política, dando origem a um longo período
de obscurantismo e estagnação no desenvolvimento da his-
tória da humanidade.
A cidadania na Idade Média é muitíssimo marcada pelo
cristianismo que depressa tomou o lugar do Império.
Se antes a cidadania significava honras, riqueza e segurança,
agora o grande objectivo do Homem era a salvação.
Se nos velhos tempos a religião e o Estado formavam um
todo, agora são completamente distintos. Em vez de vários
deuses temos um Deus único que chama a si toda a hu-
manidade. O sacerdócio deixa
de ser hereditário porque a
Criação de Adão, religião já não é um patri-
Pintura mónio. O Estado só governa
de Miguel Ângelo parte do homem porque a al-
na capela sistina
- 1508/1512. § ma só a Deus pertence.
A alma já não tem pátria
e daqui resulta, pela primeira vez, a possibilidade da liber-
dade individual. O cristianismo coloca Deus, a família,
a pessoa humana acima da pátria, coloca-se fora do direito
e acima de tudo o que é terreno. Em suma, a nova reli-
Da Cidadania

gião separa tudo o que a antiga confundia. Esta distinção


- cidade terrena e cidade celeste - foi estabelecida por
222
St.º Agostinho [sécs. IV e V d.C.] em A Cidade de Deus, onde
demonstrava que para o cristão só contava a Cidade de Deus
e é com esta que o Homem se deve preocupar. Contudo,
fizera notar que apesar de independentes, a sociedade
temporal se integrava no plano divino e que, por esse
motivo, não podia contrariá-lo. Ora, desta “superioridade”
do plano divino à interpretação de que este deve submeter
o mundo material, vai um pequeno passo.
A Cidade de Deus preconizava um desprendimento material
que conduzia a uma visão mística. Por isso as noções
agostinianas de paz e de justiça não se impõem ao direito
natural, pelo contrário, situam-se num plano absolutamente
distinto. Segundo Touchard151 não podemos sequer dizer que
o que para St.º Agostinho era apenas uma inclinação de
espírito se tenha transformado em doutrina [o agostinia-
nismo político] nos seus comentadores. Estes amputaram-lhe
as perspectivas: da defesa de uma causa superior fizeram
uma regra de governo quotidiano, em que a ordem natural
é absorvida pela ordem sobrenatural, o direito natural pela
justiça sobrenatural e o Estado pela Igreja. Nos séculos XI,
XII e XIII a Igreja exprime a “totalidade” no mundo
e controla todos os aspectos da vida do Homem.
Foram ainda precisos mais dois séculos de profundas
convulsões políticas e ideológicas, crises económicas, pestes
e escândalos no seio da Igreja que à medida que enfra-
queciam o poder eclesiástico fomentavam a formação das
nações, a eclosão do sentimento nacional e todo um
humanismo regenerado que constituiu os alicerces da cida-
dania moderna.

1.4. A Concepção Moderna de Cidadania


A concepção moderna de cidadania está intimamente rela-
cionada com o desenvolvimento do Estado liberal, cujas
bases foram preparadas
no final do séc. XVI. A Re-
volução Francesa [1789]
e a noção de igualdade,
introduzida nos debates “A Liberdade
sobre a relação do indi- guiando o povo”
§ Delacroix, 1831.
víduo com o Estado pelos

151
TOUCHARD, Jean. História das Ideias Políticas. Lisboa: EA, vol. I, 1981.
223
filósofos Thomas Hobbes152 e John Locke153, desde o século
anterior, bem como o direito à vida e à liberdade foram
preconizados por diversos filósofos e outros humanistas
também depois da Revolução Francesa.
A insegurança provocada pela violência das guerras religiosas
e da guerra civil inglesa levaram à concepção de soberanias
absolutas como forma de garantir a paz. O cidadão é,
então, um sujeito a quem compete obedecer em troca
de protecção. Contudo, ao longo dos séculos XVII e XVIII
assume-se cada vez mais a ideia de que o poder tem por
base um contrato social através do qual os cidadãos
transferem para a comunidade os seus direitos e interesses
individuais para que esta possa garantir os direitos e inte-
resses de todos. Mas se no início esta filosofia esteve na
origem do absolutismo, as discussões em torno dela criaram
as bases da democracia.
Hobbes considera que só uma soberania
absoluta é capaz de pôr fim àquilo que
considera ser o estado natural do Ho-
mem: a guerra perpétua de uns contra
Rousseau, os outros. Mas, ao afirmar que todos
filósofo francês têm este potencial, permite a Locke
do século XVIII. §
introduzir a noção de igualdade. Estas
ideias têm continuidade e são reforçadas por Rousseau154 no
Contrato Social, obra escrita em 1762, onde defende que,
se todos transferem para a comunidade todos os seus
direitos, então são iguais e livres porque se sujeitam às leis
que eles próprios consentiram no contrato social. Por outro
lado, o facto de transferirem os seus direitos para o Estado
não significa que abdiquem deles. Muito pelo contrário,
significa que concordam com a protecção desses direitos.
Portanto, a soberania continua a ser do povo.
A partir do séc. XVII iniciou-se uma profunda mudança no
significado da cidadania que passa a estar muito mais
ligada à noção de “protecção” do que à noção de “partici-
pação”. Esta tendência foi ainda mais acentuada depois
do séc. XVIII, através de sucessivas reivindicações e lutas
sociais que, no séc. XX, deram origem aos direitos sociais
Da Cidadania

152
Filósofo inglês, fundador da filosofia moral, que viveu entre 1588 e 1679.
153
Filósofo inglês, iniciador do iluminismo, que viveu entre 1632 e 1704.
154
Filósofo francês que viveu entre 1712-1778.
224
nos Estados-Providência, em muitos países da Europa.
Assim, se nas primeiras versões da modernidade encon-
tramos a troca de benefícios por serviços, ou protecção por
fidelidade, nas democracias liberais contemporâneas encon-
tramos a troca de direitos por obrigações. Com a definição
das fronteiras, durante o séc. XVIII assiste-se, também,
à associação da noção de cidadania à de nacionalidade,
gerando fenómenos de inclusão e exclusão de pessoas.
Ao atingir os direitos sociais [por exemplo, direito à saúde,
educação, habitação, etc.] o processo de construção da
cidadania parecia concluído. Thomas Marshall155 formulou
mesmo uma teoria sobre a evolução da cidadania moderna
composta por três estádios:
PO primeiro concretizou-se no séc. VII d.C. e diz respeito
à conquista da cidadania civil face ao absolutismo [liber-
dade da pessoa, liberdade de expressão, pensamento e fé
e direito à propriedade e à justiça];
Mesas de voto,
PO segundo teve lugar entre os instaladas no átrio
sécs. XVII e XIX com o desenvolvi- principal da Câmara
mento da democracia parlamen- Municipal de Lisboa,
para as eleições
tar e diz respeito à cidadania § autárquicas. AFL.
política [direito à participação
na vida política como eleitor através do sufrágio universal
e como eleito];
PE, por último, a cidadania social.
Mesmo sem abordar aqui as discussões que esta teoria tem
gerado - no nosso caso, basta pensar que as primeiras elei-
ções livres só aconteceram depois do 25 de Abril de 1974
- podemos então perguntar: por que razão, nas últimas
décadas se fala tanto de cidadania? Porquê uma tão grande
ênfase sobre a importância da educação para a cidadania?
Para uma melhor abordagem desta questão, voltemos
à génese da cidadania moderna sintetizada no primeiro
parágrafo deste tema.
O séc. XVIII [ou Século das Luzes, como ficou conhecido]
foi o século da afirmação da racionalidade humana, da li-
bertação do dogmatismo da religião e da metafísica, da afir-
Da Cidadania

155
Professor de Sociologia da Universidade de Londres. A sua obra princi-
pal foi Classe, Cidadania e Status [1950]. Citado por: NOGUEIRA, Concei-
ção; SILVA, Isabel. Cidadania - Construção de Novas Práticas em Contexto
Educativo. Lisboa: Edições Asa, 2001.
225
mação do conhecimento científico. A Revolução Francesa,
marco fundamental deste século, foi considerada por Kant156
como o maior acontecimento jamais verificado no mundo,
a livre auto-determinação de um povo e símbolo do pro-
gresso moral da Humanidade. A nível científico a civilização
moderna concretizou, finalmente, o ideal de manipulação
e domínio da Natureza pelo Homem preconizado pelos
filósofos do séc. VII [Descartes157 exaltava esta relação técnica
do Homem com a Natureza e Bacon158 proclamou como
ideal científico que “saber é poder”]. A ciência passa a ser
vista como um instrumento ao serviço da melhoria das con-
dições de vida e eliminação de todas as preocupações e mi-
sérias da Humanidade. O progresso científico e tecnológico
alcançado, sobretudo no séc. XIX, alimentou este optimismo
e a crença exacerbada no poder da razão e no progresso
generalizado. Esta concepção instrumentalista do conheci-
mento levou a um pragmatismo e individualismo egoísta,
próprios da ordem económica reinante: o capitalismo.
A modernidade revela-se um
projecto ambicioso e carrega-
A descoberta do de contradições. Em vez
da máquina a vapor
marcou o início da harmonia e da qualidade
da Revolução de vida que prometia, trouxe
Industrial. §
o agravamento da injustiça
social, da concentração da riqueza e consequente desi-
gualdade e exclusão social, bem como a devastação eco-
lógica que afecta a qualidade de vida e até a sustentabilidade
do Planeta.
O Estado-Providência procurou atenuar algumas destas
contradições - por exemplo, assegurando uma melhor distri-
buição da riqueza e garantindo os direitos básicos. Todavia,
no final da década de 70 do século XX existia já a cons-
ciência de que muitas das expectativas da modernidade
seriam irrealizáveis. Paradoxalmente, a dominação da Natu-
reza com todos os seus efeitos perversos e consequente
crise ecológica excedeu em muito todas as expectativas.
Da Cidadania

156
Immanuel Kant, filósofo alemão que viveu entre 1724-1804.
157
Filósofo francês que viveu entre 1596-1650.
158
Francis Bacon [1561-1626], filósofo iniciador do empirismo em Inglaterra.
226
Depois dos anos 80 a globalização introduz uma nova
relação entre a economia e a sociedade, criando incertezas
e acentuando as desigualdades. A concentração de capi-
tais [multinacionais e cartéis] põe em causa o Estado-
-Providência e tende a tornar os Estados impotentes face
a problemas como a emigração, crime organizado, doenças
infecciosas, poder nuclear e problemas ambientais que têm
impacto planetário e escapam ao controlo de qualquer país.
As fragilidades e inconsistências do paradigma da moderni-
dade estão à vista. Será possível reformulá-lo e reiterar
as promessas da modernidade de melhoria das condições
de vida e do bem-estar para todos? Ou vivemos, como
alguns defendem, uma época de transição de paradigmas,
de dúvidas e incertezas que urge esclarecer? Seja qual for
a verdadeira resposta parece claro que são os problemas
acima expostos e a procura de alternativas para ultrapassar
o vazio da modernidade e enfrentar as questões decisivas
para o futuro da humanidade, o motivo das crescentes dis-
cussões em torno da cidadania.
No cenário actual Nogueira e Silva159 identificam várias
acepções de cidadania, padecendo todas de fragilidade
e limitações. Contudo, segundo as referidas autoras e a pró-
pria definição apresentada na generalidade dos dicio-
nários da língua portuguesa, a concepção dominante define
cidadania como vínculo jurídico-político de um indivíduo
a um Estado traduzido num conjunto de direitos e obri-
gações - que nas sociedades ocidentais se refere essencial-
mente à liberdade de expressão, voto, benefícios sociais,
pagar impostos e servir nas forças armadas. Está associada
a interpretações legais e formais que são válidas na caracte-
rização de um cidadão mas, do ponto de vista sociológico,
é bastante pobre e promove a cisão entre o indivíduo
e a comunidade.
Para alguns autores, no contexto da tradição liberal onde
se enquadra a modernidade, esta cisão constituiu a principal
dicotomia que origina o individualismo, a desresponsabili-
zação e o entendimento da cidadania como uma mera ma-
nutenção dos direitos adquiridos. Os direitos são entendidos
como a representação dos interesses dos indivíduos, por
exemplo, os que dizem respeito à sua autonomia, à proprie-
Da Cidadania

159
NOGUEIRA, Conceição; SILVA, Isabel. Cidadania - Construção de Novas
Práticas em Contexto Educativo. Lisboa: Edições Asa, 2001.
227
dade e ao livre desenvolvimento das actividades económicas.
Os deveres representam os interesses da comunidade e,
como tal, podem colidir com os interesses individuais.
Desta dicotomia decorrem as contradições sucintamente
referidas que são fonte e consequência de uma forte apatia
face ao exercício da cidadania por egoísmo, desinteresse,
desconhecimento dos direitos ou por incapacidade de apro-
priação desses direitos e, por conseguinte, de participação
social.
Ultrapassar as contradições da modernidade exige uma
nova cidadania baseada no conhecimento e exercício
efectivo de direitos e deveres, perspectivando-os de uma
forma conjunta e interdependente, onde um dos principais
deveres é a participação activa dos indivíduos - nomeada-
mente no que se refere à defesa contínua dos direitos de
todos - de forma a garantir uma igualdade efectiva e não
apenas a sua consagração nas leis dos estados ou princípios
internacionais. Direitos e deveres são duas faces de uma
mesma moeda. Por isso usufruir dos primeiros implica neces-
sariamente aceitar os segundos. Implica reaprender a ser
cidadão, construir uma cidadania partilhada e orientada pelo
princípio da solidariedade, responsável e efectivamente parti-
cipada a nível político, social, cultural e ambiental. Se dos
ideais da Revolução Francesa a “liberdade” foi fundamental
para assegurar os direitos individuais e a “igualdade” para
assegurar a democracia e garantir a liberdade, a “frater-
nidade” ou a solidariedade - na sua versão linguística mais
avançada - é hoje uma exigência.
A inquietação ecológica ultrapassa largamente as preocupa-
ções da década de 70, praticamente confinada às conta-
minações da actividade industrial e agrícola em deter-
minadas regiões do Globo, deterioração dos espaços naturais
considerados únicos ou a ameaça de determinadas espécies.
A crise ecológica é desde o final da década de 80 enten-
dida como um fenómeno planetário e não localizado, ana-
lisado a partir de uma visão complexa e interdependente
das realidades ambientais, dos seus significados sociais,
económicos e culturais. A pobreza que afecta um número
cada vez maior de pessoas, quer nos países ricos, quer nos
Da Cidadania

países pobres, a falta de equidade na divisão da riqueza


e de acesso a bens e serviços tão essenciais como a água
potável e o saneamento básico, bem como o crescimento
228
Desenho publicado
em 1854
numa revista londrina
quando as instalações
do Parlamento foram
abandonadas devido
ao mau cheiro
§ do rio Tamisa.

demográfico são questões ambientais que exigem tanta


atenção como o problema do buraco do ozono, a desflores-
tação ou o aquecimento global.
A crise rugiu com tal força que acordou a humanidade para
o facto de não haver lugares seguros. Viajamos no mesmo
barco, mas um rombo numa das extremidades deste navio,
por mais distante que seja, significa uma viagem mal
sucedida. O desenvolvimento económico assente num
completo desrespeito pela Natureza e ciclos de regeneração
para alimentar a opulência da cultura ocidental, tem
vindo a cavar um fosso cada vez maior entre os países
desenvolvidos e os subdesenvolvidos. É o “rombo” que tem
de ser urgentemente reparado por todos. De qualquer
forma, a verdade é que ninguém o pode ignorar e que
a sua reparação depende da construção de um novo
projecto social baseado nas pessoas e não na economia,
um projecto necessariamente mais exigente porque implica
uma participação activa.
Citando Turner [1993] também Nogueira e Silva160 propõem
que a cidadania seja definida como “um conjunto de prá-
ticas [jurídicas, políticas, económicas e culturais] que define
uma pessoa como membro competente de uma sociedade”.
Estamos, pois, perante uma perspectiva que vai muito para
além da mera relação Indivíduo-Estado, assumindo um
sentido mais amplo que compromete todos e exige repensar
as responsabilidades individuais e colectivas.
A ênfase nos direitos tem empobrecido as responsabilidaes
e, segundo alguns autores, cria sujeitos e não cidadãos. Por
Da Cidadania

isso o novo projecto social exige uma forte ligação entre

160
Idem.
229
direitos e responsabilidades. Se os direitos são fundamentais
para a apropriação e exercício da cidadania, assumir res-
ponsabilidades é a própria cidadania. Temos, pois, o dever
de participar activamente na defesa do bem comum [por
exemplo, na protecção do ambiente], numa repartição mais
justa dos recursos e fazendo-nos ouvir - por nós e pelos
outros. Só desta forma será possível recuperar o princípio
mais esquecido da Revolução Francesa: a “solidariedade”.
E não se pense que se trata de uma utopia ou de algo
impossível de concretizar a nível individual. Defender o bem
comum pode passar por medidas políticas ou grandes
movimentações de origem social a nível nacional ou inter-
nacional [às quais, de qualquer modo, também podemos
aderir], ou também por gestos tão simples como separar
os resíduos para reciclar, rejeitar produtos sobre-embalados
ou, na rua, apanhar os dejectos dos nossos animais
de estimação. Ser solidário e defender uma repartição
mais justa dos recursos não significa apenas “dar”. Evitar
o desperdício, rejeitar produtos provenientes da exploração
Da Cidadania

de mão-de-obra barata, optar por produtos do “comércio


justo”, poupar água e energia, para além de proteger
o ambiente, disponibilizam recursos que contribuem para
a promoção do desenvolvimento humano.
Contudo, qualquer acção
intencional [ou mesmo
a decisão de não agir] im-
plica escolhas e decisões
O direito ao ambiente num quadro de valores im-
de qualidade é um
direito de cidadania. § plícitos ou explícitos que
cada indivíduo possui. Por
isso a educação para a cidadania não pode deixar de in-
tegrar a questão dos valores, tendo em conta a sua pere-
nidade mas principalmente a sua historicidade. Os valores
são indissociáveis de toda e qualquer experiência humana,
mas são marcados pelos acontecimentos históricos, pela
cultura e especificidade dos grupos. Cada época valoriza
mais determinados valores161, hierarquiza-os de um modo

161
A Idade Média valorizou mais os valores religiosos; a partir do Renasci-
mento valorizaram-se mais os valores humanistas; hoje tendemos a valo-
rizar mais aos valores estéticos e os que se relacionam com o bem-estar.
230
próprio ou cria novos valores face aos problemas que vão
surgindo e cada homem vive, também a sua própria histori-
cidade, criando valores que dão sentido à sua existência.
Vivemos numa sociedade pluralista, onde o respeito pelo
outro, pela sua identidade cultural e religiosa, em suma,
pela diferença, assumem um papel preponderante na educa-
ção para a cidadania. Mas também vivemos numa sociedade
marcada pelo desenvolvimento científico e tecnológico que
provocou o desmoronamento de valores próprios de socie-
dades que já não existem e o reescalonamento, reorientação
e mesmo a criação de novos valores que permitam res-
ponder aos novos desafios que se nos deparam.
Lipovetsky162, considera que alguns dos valores da moder-
nidade que dominaram até à actualidade foram o trabalho,
o progresso, a norma universal, a disciplina e a obediência,
entre outros. Hoje temos um conjunto de valores relacio-
nados “Bioética, caridade mediática, acções humanitárias,
defesa do meio ambiente, moralização dos negócios, da polí-
tica e dos meios de comunicação, debates em torno
do aborto e do assédio sexual, cruzadas contra a droga
e o tabaco: por toda a parte a revitalização dos “valores”,
e o espírito de responsabilidade são brandidos como o impe-
rativo primeiro da época. Ainda há pouco as nossas socie-
dades electrizavam-se com a ideia de libertação individual
e colectiva. Actualmente, vão proclamando que não há mais
utopia possível a não ser a moral. Todavia, não se trata
de nenhum “retorno da moral”. A época do dever rigorista
e categórico eclipsou-se em benefício de uma cultura
inédita que difunde as normas do bem-estar de prefe-
rência às obrigações supremas do ideal, que metamor-
foseia a acção moral em show recreativo e em comunicação
de empreendimento, que promove os direitos subjectivos,
mas faz cair em desgraça o dever dilacerante. Eis-nos
comprometidos no ciclo pós-modernista das democracias
que repudiam a retórica do dever austero e integral
e celebram os direitos individuais à autonomia, ao desejo,
à felicidade”163.
É neste contexto que a educação para a cidadania
assume uma importância fundamental na preparação
dos indivíduos.
Da Cidadania

162
LIPOVETSKY, G. A Era do Vazio. Lisboa: Relógio de Água, 1988.
163
Idem.
231
2. Do Desenvolvimento

2.1.A Relação Homem-Natureza


Ao longo da história podemos, facilmente, iden-
tificar três fases distintas da relação do Homem
com a Natureza.
A primeira foi uma relação de dependência caracterizada
pelo medo, pela angústia e pela magia. A falta de explicações
para os fenómenos naturais suscitou no Homem Primitivo,
como meio de acalmar as suas forças, uma atitude de ado-
ração. Apesar disso, era uma relação de harmonia e respeito
com a Natureza, na qual o Homem se sentia integrado,
fazendo parte dela.
A segunda foi uma relação de pseudo domínio baseada
na ciência e na técnica que trouxe conforto e bem-estar,
mas também a destruição. A ciência permitiu desvendar
os segredos da Natureza, e criou no Homem a ilusão de um
controlo absoluto sobre ela. Numa atitude antropocêntrica,
a Natureza passou a ser vista como um reino sobre o qual
o Homem impera, fazendo dela o que entendesse. Esta
é a civilização Moderna teoricamente estruturada no séc. XVII
por Francis Bacon e Descartes que teve grande impacto
negativo sobre o ambiente desde a Revolução Industrial
até aos nossos dias.
A terceira fase - aquela em que nos encontramos presente-
mente - embora ainda subjugada pela anterior, é uma relação
de diálogo com a Natureza. É a fase da consciencialização
ecológica e da reconciliação. O Homem compreendeu que
não consegue dominar a Natureza, de cujo destino depende
e com quem vai aprendendo a dialogar. Num contexto mar-
cado por uma sociedade de contradições e assimetrias, cuja
superação é um dos maiores desafios da humanidade, a tese
do desenvolvimento ilimitado é cada vez mais um mito que
urge substituir pela noção de contenção e por um desenvol-
vimento verdadeiramente sustentável.
Tendo em conta o propósito deste manual respigamos
Do Desenvolvimento

alguns dos aspectos que poderão contribuir para o enqua-


dramento e o trabalho ao nível da educação ambiental,
ainda que apenas na área da higiene urbana, resíduos
sólidos e animais em meio urbano.
232
2.2. A Globalização
Entre os pensadores associados à problemática do desenvol-
vimento é frequente defender-
-se que a globalização se ini-
ciou com os Descobrimentos
Portugueses, sendo a chegada
de Vasco da Gama à Índia
o exemplo paradigmático164.
Nesta fase significava essencialmente: contacto com novos
povos, criação de novos mercados com base na troca de pro-
dutos e exploração de recursos naturais.
Hoje:
“A globalização pode […] ser definida como a inten-
sificação das relações sociais de escala mundial, relações
que ligam localidades distantes de tal maneira que as ocor-
rências locais são moldadas por acontecimentos que se dão
a muitos quilómetros de distância, e vice-versa”165.
Mas o conceito de globalização a que nos referimos surgiu
apenas em meados da década de 1980 para designar um
novo impulso do desenvolvimento do capitalismo marcado
pela livre movimentação do capital entre os países, as priva-
tizações e o desenvolvimento de novas tecnologias.
A partir dos anos 90 do século XX, a globalização intensi-
fica-se, acentuando o seu carácter macroeconómico, também
denominado como “mundialização do capital”. A globalização
dos investimentos e da produção traduz-se, por exemplo,
na forte concorrência internacional entre as grandes potên-
cias económicas, geradora de conflitos; na fusão de grandes
empresas e grupos bancários e financeiros; na generaliza-
ção de baixas taxas de crescimento do Produto Interno Bruto;
na deflação acentuada; no enfraquecimento das soberanias
nacionais; na marginalização de grandes regiões do Mundo
e crescimento do desemprego estrutural [altas taxas de de-
semprego e generalidade do emprego temporário].
Do Desenvolvimento

164
ANTUNES, Manuel de Azevedo. Do Crescimento Económico ao Desenvol-
vimento Humano. In: Campos Social - Revista Lusófona de Ciências
Sociais. Lisboa: Universidade Lusófona, N.º 1, 2004, p. 73.
165
GIDDENS, Anthony. As Consequências da Modernidade. Oeiras: Celta Editora,
1992, p. 45.
233
São quatro as linhas que caracterizam a globalização dos
séculos XX e XXI166:
Novos mercados de câmbio e de capitais traduzidos numa
P

internacionalização do capital financeiro, em permanente


actividade de negociação à distância. Acentua-se a impor-
tância dos investimentos externos directos em detrimento
da troca comercial;
Novos instrumentos tecnologias que permitem a comuni-
P

cação em tempo real [internet, redes telemáticas, telefone,


rádio, televisão, ...];
Novos actores “A Organização Mundial do Comércio [OMC]
P

com autoridade sobre os governos nacionais, empresas


multinacionais com mais poder económico que muitos esta-
dos, redes mundiais de organizações não governamentais
[ONG's] e outros que transcendem as fronteiras nacionais;
Novas regras acordos multilateriais sobre comércio, ser-
P

viços, propriedade intelectual, apoiados por fortes meca-


nismos de imposição e mais vinculativos que os governos
nacionais, reduzindo o campo de acção da política
nacional”167.
Neste contexto, o desenvolvimento económico, industrial
e tecnológico apresenta-se como um paradoxo que combina
a unificação com a fragmentação, o crescimento económico
com a pobreza, o progresso com a degradação do ambiente.
A globalização fez do planeta uma “aldeia global”. Au-
mentou o intercâmbio comercial e cultural, generalizou bens
de consumo e fomentou a partilha do conhecimento cientí-
fico. Mas esta interdependência tem sido mais benéfica
para os países desenvolvidos. À medida que aumentam
os seus níveis de riqueza, os países mais desfavorecidos
ficam cada vez mais pobres. Já em 1995, os Estados Unidos
e o Japão detinham 45 % do PIB mundial168 e o Programa
das Nações Unidas para o Ambiente e Desenvolvimento
acrescenta que “em 1960, os 20 % da população mundial

166
Do Desenvolvimento

PNUD. Relatório de Desenvolvimento 1999. Lisboa, Trinova Editora, 1999, p. 1.


167
Idem.
168
De acordo com a revista Fortune Internacional, citada por: ARIAS, Miguel
Ángel. La educación ambiental ante las tendencias de globalización
mundial. Algunas reflexiones para América Latina. In: Revista de la
Escuela y el Maestro. 1998. Fonte: http:// www.anea.org.mx [Março’06].
234
que viviam nos países mais ricos detinham 30 vezes
o rendimento dos 20 % mais pobres - por volta de 1995,
82 vezes mais rendimento”169.
Desigualdades no consumo entre países
Bens Os 20 % mais ricos Os 20 % mais pobres
Carne e Peixe 45 5
Energia 58 4
Metal 74 1.5
Linhas de Telefone 84 1.1
Papel 87 1
Fonte: PNUD; Relatório do Desenvolvimento Humano, 1998

A par das fortes assimetrias económicas que dividem o mun-


do em Norte/Sul é possível, também, identificar - quer nos
países em desenvolvimento, quer nos próprios países
desenvolvidos - uma dicotomização idêntica e cada vez mais
visível relativamente à distribuição da riqueza, cuidados
de saúde e acesso à educação e à informação.
O Relatório do Desenvolvimento Humano de 1998 introduz,
pela primeira vez, um novo índice para medir a pobreza
nos países desenvolvidos e mostra que há pouca relação
entre o rendimento médio de um país e a pobreza, a ex-
clusão social e a marginalidade de determinados grupos.
Entre os 17 países mais desenvolvidos, os EUA apresentam
o rendimento médio mais elevado e, simultaneamente,
o maior índice de pobreza humana. A Suécia encontra-se
em 13.º lugar na tabela do rendimento médio, mas tem
o nível de pobreza humana mais baixo de todos.
“No Brasil, os 50 % mais pobres da população recebiam 18 %
do rendimento nacional em 1960, caindo para os 11,6 %
em 1995. Os 10 % mais ricos recebiam 54 % do rendi-
mento nacional em 1960, crescendo para 63 % em 1995.
[...] na Rússia, a parcela de rendimento de 20 % dos mais
ricos é 11 vezes a dos 20 % mais pobres. Na Austrália
e no Reino Unido é perto de 10 vezes mais”170.
Do Desenvolvimento

169
PNUD. Relatório de Desenvolvimento 1998. Lisboa, Trinova Editora, 1998,
p. 29.
170
Idem, p. 29.
235
Num mundo global a riqueza dos países está dependente
das grandes empresas e das movimentações do capital que
frequentemente circula à margem dos Estados. Ultrapassam
a especificidade de um determinado território enquanto
unidade de produção e consumo e, ao alterar os mecanismos
associados a estes dois processos, a globalização afecta não
só a organização económica mas, também, a organização
social, política e cultural.
Os Estados deparam-se com situações pouco confortáveis.
Controlam cada vez menos os fluxos de capital, de mercado-
rias e de informação, embora continuem a ser responsa-
bilizados por áreas altamente dependentes de capital tais
como a educação, a segurança e a saúde. Isto significa que
as políticas económicas e sociais são cada vez mais
determinadas pelo mercado global e cada vez menos efi-
cazes para enfrentar, entre outras, a problemática ecológica
cujas causas e consequências vão muito para além do seu
território.
O industrialismo171, “… enquanto difusão universal das
tecnologias da máquina […] não está limitado à esfera
de produção … afecta muitos aspectos da vida quotidiana,
além de influenciar o carácter genérico da interacção
humana com o ambiente”172. “O Estado já não é totali-
tário, porém a economia, na era da mundialização, tende
cada vez mais a sê-lo”173.
Deste modo, a globalização emerge, também, como uma
entidade macrossocial que integra as especificidades das
populações: a sua riqueza cultural e social, a sua organi-
zação política e até os seus aspectos psicológicos.
As tecnologias de informação e comunicação de massas
assumem uma importância decisiva e convertem-se num
instrumento de homogeneização cultural que visa estimular
o consumo e criar novos mercados para produtos iguais:
tanto aqui como do outro lado do mundo, os jovens ouvem
as mesmas músicas, vêem os mesmos filmes, seguem os mes-
mos ídolos, vestem as mesmas marcas ... aderem a valores
que lhes são apresentados de forma descontextualizada.
Do Desenvolvimento

171
Entendido por Giddens como “a transformação da natureza: desenvolvi-
mento do “ambiente produzido” [ob. cit.].
172
Idem, p. 59.
173
RAMONET, citado por CARIDE e MEIRA, ob. cit.
236
A globalização contribui para a diluição da identidade
colectiva e também para a alteração dos papéis da escola
e da família a quem, por tradição, cabia aquela função.
Não obstante os aspectos positivos e negativos174 frequen-
temente apontados por autores com posições divergentes
sobre a globalização, ela não se pode evitar. Contudo,
é uma realidade para a qual não dispomos de referências
que nos permitam compreender ou prever os seus efeitos.
A globalização e a inerente “… problemática ambiental
colocam a necessidade de interiorizar um saber ambiental
emergente num conjunto de disciplinas, tanto das ciências
naturais como sociais, para construir um saber capaz de
captar a multi-causalidade e as relações de interdependência
dos processos de ordem natural e social que determinam
as mudanças socio-ambientais, assim como para construir
um saber e uma racionalidade social orientados para
os objectivos de um desenvolvimento sustentável, equitativo
e duradoiro”175.
A crise ambiental é demasiado complexa e não pode ser
“resolvida só com mudanças marginais na esfera económica
e tecnológica; qualquer alternativa viável de mudança
deverá repor em profundidade os pressupostos éticos
[avançar de uma moral antropocêntrica para moralidades
bio- ou eco-cêntricas], económicos [limitar e redistribuir
o crescimento], sociais [potenciar a participação real das
comunidades nas decisões que afectam o meio ambiente
e o desenvolvimento], culturais [mudar os estilos de vida

174
As teorias positivas enfatizam o progresso da humanidade alicerçado no
crescimento económico florescente e num planeta unificado sem bar-
reiras económicas, comunicativas ou ideológicas. O mercado global é
uma inquestionável fonte de riqueza - a expandir e a alargar a todos
os países para que possam fazer frente à pobreza, à desigualdade, aos
problemas ambientais e a todas as preocupações que ainda persistem.
A degradação do ambiente está intimamente relacionada com a pobreza,
a qual exerce fortes pressões sobre a Natureza para angariar sustento,
não dispondo de meios para aplicar na sua protecção. Só com a riqueza
gerada pela globalização será possível assegurar as necessidades básicas
das populações e desviar recursos para a recuperação e preservação do
ambiente.
Do Desenvolvimento

As teorias negativas denunciam, em geral, o mercado como valor cen-


tral em torno do qual se organiza o modo de vida de toda a
humanidade, sem deixar espaço para outras alternativas, que combinem
a vivência das populações, com um desenvolvimento desejado [e não
imposto]. In: CARIDE e MEIRA, 2004 e PNUD, 1998.
Idem.
175

237
baseados no consumo crescente de bens e serviços por
uma cultura de “escassez” na qual se replante a noção
de necessidade], tecnológicos [implementar tecnologias mais
eficientes e com menos custos] e políticos [situar as questões
do ambiente e do desenvolvimento adiante dos imperativos
do mercado e reforçar a tomada de decisões democráticas
a nível mundial]. No seu conjunto, são mudanças que
pressupõem questionar e abandonar a racionalidade econó-
mica e instrumental dominante para construir e preservar
a manutenção de uma racionalidade ecológica-ambiental
emergente”176.

2.3. Desenvolvimento Sustentável versus


Desenvolvimento Humano
O desenvolvimento económico, industrial e tecnológico, veri-
ficado nas últimas décadas, trouxe novas oportunidades para
milhões de pessoas em todo o mundo mas, também, novos
riscos e novos desafios. A esperança de vida aumentou, mais
pessoas passaram a ter acesso a água potável, saneamento
básico, electricidade, transportes, tempo para o lazer e mui-
tos outros benefícios até então inimagináveis. Mas ao analisar
o progresso por regiões do globo, países e dentro dos
próprios países, encontram-se fenómenos de desigualdade,
exclusão e marginalização verdadeiramente escandalosos.
Apesar de níveis de desenvolvimento nunca antes registados,
na última década, mais de 50 países tornaram-se mais
pobres [PNUD - 2003].
Do Desenvolvimento

176
Ibidem [realces nossos].
238
Por outro lado, a visibilidade dos problemas ambientais
a partir da década de 70 - a desertificação de grandes áreas
do planeta, o buraco da camada do ozono, os acidentes
nucleares, as marés negras, as chuvas ácidas, etc. - contri-
buíram para aprofundar a reflexão sobre o desenvolvimento.
Neste contexto, o desafio que se coloca à humanidade não
é o de travar o desenvolvimento, mas sim o de encontrar
formas de partilhar os seus benefícios entre todos os povos
e grupos sociais e de o fazer protegendo o ambiente.
Trata-se de promover um desenvolvimento ao serviço das
pessoas e não do lucro que vem exigindo um compromisso
cada vez mais forte entre a noção de desenvolvimento
económico e desenvolvimento humano, sem o qual não
poderá existir um verdadeiro desenvolvimento sustentável.
A associação entre desenvolvimento e ambiente começou
a ganhar centralidade ideológica e política com o contributo
da publicação da obra “Os Limites do Crescimento” do casal
Meadows, bem como a realização de fóruns internacionais
onde estiveram presentes as temáticas do desenvolvimento
e do ambiente. A Conferência de Estocolmo sobre o Ambiente
Humano, em 1972, contribuiu de forma efectiva para a divul-
gação da integração do desenvolvimento com a sustenta-
bilidade social, económica e ecológica.
Nesta linha de preocupações, o Relatório de Brundtland177,
publicado em 1987, define o conceito de Desenvolvimento
Sustentável como “o desenvolvimento que satisfaz as neces-
sidades presentes sem comprometer a capacidade das gera-
ções futuras satisfazerem as suas próprias necessidades”.
A partir de então, o desenvolvimento sustentável insinua-se
como uma nova estratégia de desenvolvimento, influenciando
posições e a produção de documentos de referência na área
política.
A partir de 1990, através do Programa das Nações Unidas
para o Desenvolvimento e da publicação anual do Rela-
tório de Desenvolvimento Humano, as Nações Unidas assu-
mem, também, uma concepção de desenvolvimento pluri-
-dimensional, onde estão presentes as dimensões humana
e ecológica:
“Para enfrentar o crescente desafio da segurança humana
é necessário um novo modelo de desenvolvimento que colo-
Do Desenvolvimento

que o povo no centro, que olhe o crescimento económico

177
BRUNDTLAND. O Nosso Futuro Comum. Lisboa: Meribérica/Liber Editores,
1991.
239
Relatórios
do Desenvolvimento
Humano [PNUD]. §

como um meio e não como um fim, que proteja as oportu-


nidades de vida das futuras gerações, assim como das actuais
e respeite os sistemas naturais dos quais a vida depende”178.
Com a Conferência das Nações Unidas de Ambiente e Desen-
volvimento, em 1992 - Conferência do Rio179 -, este
conceito fica, definitivamente, na agenda política mundial.
A Agenda 21180 e a Declaração do Rio181 constituem,
a partir de então, documentos estruturantes para a efecti-
vação de políticas de sustentabilidade:
“A implementação do desenvolvimento sustentável assentava
inicialmente em duas dimensões fundamentais: o desen-
volvimento económico e a protecção do ambiente. Após
a Cimeira de Copenhaga, realizada em 1995, foi integrada

178
PNUD. Relatório de Desenvolvimento Humano, 1994. Lisboa: Tricontinental
Editora, 1994, p. 4. As dimensões que compõem o índice de desenvolvi-
mento humano são: longevidade [esperança de vida à nascença], conhe-
cimento [taxa de alfabetização de adultos e taxa de escolaridade
combinada], padrão decente de vida [rendimento per capita ajustado
em dólares PPC - Paridade do Poder de Compra]. - In: PNUD. Relatório
de Desenvolvimento Humano 1998. Lisboa: Trinova Editora, 1998, p. 15.
179
Produziu cinco documentos importantes: 2 acordos internacionais -
“Convenção de Mudanças Climáticas” e a “Convenção sobre Diversidade
Biológica”; duas declarações de princípios - “O Guia da Gestão da
Conservação e do Desenvolvimento Sustentável de Todo o Tipo de
Florestas” e a “Declaração do Rio”; e ainda uma agenda global para
o desenvolvimento sustentável - “Agenda 21”. Esta Conferência reuniu
um elevado número de representantes de todo o mundo, tendo assinado
as convenções mais de 150 países.
Do Desenvolvimento

180
Que se assume como um instrumento que visa “identificar actores, par-
ceiros, e metodologias para a obtenção de consensos e os mecanismos
institucionais necessários para sua implementação e monitorização”
In: Agenda 21.
181
O anexo A3 incluiu a menção a endereços electrónicos para consulta
dos textos originais.
240
a vertente social como terceiro pilar do conceito de desen-
volvimento sustentável. Assim, […] a sua implementação
é realizada com base em três dimensões essenciais: o desen-
volvimento económico, a coesão social e a protecção do
ambiente”182. A estas acresce uma dimensão institucional,
onde se integram as vertentes governativa, legislativa [flexi-
bilidade, transparência e democracia] e participativa [sindi-
catos e associações empresariais, bem como organizações
não-governamentais]183.
“O desenvolvimento humano não é um conceito separado
do desenvolvimento sustentável - mas pode ajudar a salvar
“o desenvolvimento sustentável” da falsa ideia de que este
envolve apenas a dimensão ambiental”184. É um processo
de alargamento das escolhas dos indivíduos que pressupõe
a possibilidade de acesso a uma vida longa e saudável,
ao conhecimento e a recursos que lhe permitam uma melhor
qualidade de vida.
Para além destas dimensões básicas - sem as quais não
há verdadeira escolha - o desenvolvimento humano pres-
supõe também oportunidades sociais e políticas que conferem
a cada cidadão um sentimento de pertença a uma socie-
dade. Deste modo, o desenvolvimento humano abarca todas
as questões já antes abordadas, tais como: as que se rela-
cionam com a cidadania, os valores, os direitos humanos,
as responsabilidades individuais e colectivas, a equidade -
na repartição de riqueza e na igualdade de oportunidades
- e o desenvolvimento sustentável.
O esgotamento de recursos e o crescimento demográfico
exponencial que afecta principalmente os países mais
pobres, são factores fundamentais de desequilíbrio e fazem
com que este seja o maior desafio jamais colocado à huma-
nidade. A população mundial é hoje de 6 mil milhões de
habitantes, estimando-se que em 2050 atinja os 9,5 mil
milhões - dos quais mais de 8 mil milhões viverá nos
países em vias de desenvolvimento. Por seu lado, os países
Do Desenvolvimento

182
AAVV. Estratégia Nacional para o Desenvolvimento Sustentável 2005-
2015. Lisboa: Pandora, 2005, p. 14.
183
Idem, p. 14.
184
PNUD, 1998, p.14.
241
desenvolvidos, representando apenas 20 % da população
mundial, consomem 80 % dos recursos do planeta e
produzem a maior parte dos gases poluentes e de resíduos
tóxicos185.
Paradoxalmente a degradação do ambiente deve-se tanto
à pobreza quanto à riqueza. Nos países em vias de
desenvolvimento, para sobreviverem, as populações exercem
uma pressão sem precedentes sobre os recursos naturais,
ao passo que nos países mais desenvolvidos a pressão
social se faz no sentido da manutenção de elevados níveis
de consumo que, por sua vez, influenciam o aumento
da pobreza e da exclusão.
Num planeta fisicamente limitado, os níveis de consumo
verificados nos países desenvolvidos não se podem alargar
aos países em vias de desenvolvimento. Todavia, estes
precisam de expandir drasticamente as suas economias
para suprir as necessidades das suas populações, promover
o desenvolvimento humano e canalizar recursos para a
protecção e recuperação do ambiente.
O equilíbrio só será possível se os países mais pobres
puderem prosperar economicamente, ao mesmo tempo que
os mais ricos abrandem ou diminuam o consumo e a
quantidade de resíduos produzidos. Porém, num planeta
global altamente competitivo e marcado por fortes cliva-
gens, o desenvolvimento dos países mais pobres - onde os
países doadores disponibilizam para a cooperação para
o desenvolvimento apenas 0,25 % do total do seu PNB, de
22 milhões de dólares EUA186- exige um forte compromisso
dos mais desenvolvidos ao nível da solidariedade e da
defesa do bem-estar comum, como objectivo último do
progresso “e de o fazer através do esforço colectivo, do uso
racional dos recursos e dos direitos em que assentam as
liberdades, a justiça, a solidariedade e a equidade social”187.
Surgindo o desenvolvimento sustentável, a nível internacional,
como um imperativo para enfrentar a crise social e ambi-
ental, em Setembro de 2000 as Nações Unidas aprovaram
os Objectivos de Desenvolvimento para o Milénio, voltan-
do “… a afirmar a responsabilidade colectiva de apoiar
Do Desenvolvimento

185
Idem, p. 5.
186
Ibidem, p. 37.
187
CARIDE e MEIRA, 2004.
242
As prioridades do mundo
[despesa anual em dólares]

Despesas militares 780 mil milhões


Narcóticos no mundo 400 mil milhões
Bebidas alcoólicas na Europa 105 mil milhões
Cigarros na Europa 50 mil milhões
Negócios de entretenimento no Japão 35 mil milhões
Alimentos para animais domésticos
17 mil milhões
na Europa e nos EUA
Saúde básica e nutrição 13 mil milhões
Perfumes na Europa e nos EUA 12 mil milhões
Saúde reprodutiva para todas as mulheres 12 mil milhões
Gelados na Europa 11 mil milhões
Água e saneamento para todos 9 mil milhões
Cosméticos nos EUA 8 mil milhões
Educação básica para todos 6 mil milhões

*Custo anual adicional estimado para atingir o acesso universal aos serviços sociais básicos
em todos os países em desenvolvimento. PNUD 1998, tendo como fonte Euromonitor 1997;
UN 1997g; UNDP, UNFRA e UNICEF 1994; Worldwide Research, Advisory
and Business Intelligence Services 1997.
Fonte: PNUD; Relatório do Desenvolvimento Humano 1998, p. 37 [adaptado]

os princípios da dignidade humana, igualdade e equidade


a nível global, estabelecendo para isso metas concretas
[millenium development goals] que pretendem contribuir
para inverter a tendência de degradação do Ambiente
e de agravamento da sustentabilidade das condições de vida
em grande parte do planeta”188:
1 Erradicar a pobreza e fome extremas;
P

2 Atingir a educação primária a nível mundial;


P

3 Promover a igualdade entre os sexos e delegar poderes


P

nas mulheres;
Do Desenvolvimento

4 Reduzir a mortalidade infantil;


P

188
AAVV. Estratégia Nacional para o Desenvolvimento Sustentável 2005-
2015. Lisboa: Pandora, 2005.
243
5 Melhorar a saúde materna;
P

6 Combater o HIV/SIDA, malária e outras doenças;


P

7 Garantir a sustentabilidade ambiental;


P

8 Desenvolver uma parceria global para o desenvolvimento.


P

Existem 59 países considerados de prioridade máxima e


alta, onde os fracassos do progresso impedem a concre-
tização destes objectivos189. “Para atingir o crescimento
sustentável [estes países] têm de atingir limiares básicos
em várias áreas funcionais: governação, saúde, educação,
infra-estruturas e acesso aos mercados. Se um país ficar
abaixo do limiar em qualquer dessas áreas, pode cair na
“armadilha da pobreza”190. Este é um desafio demasiado
grande para poderem enfrentar sozinhos.
A política internacional deve centrar a sua atenção nestes
países e contribuir para que possam ultrapassar os obstá-
culos criados pelas elevadas dívidas externas, barreiras aos
mercados internacionais, infertilidade dos solos, desastres
naturais, pandemias e dificuldades estruturais diversas.
A ajuda externa é decisiva e deve incluir também a trans-
ferência de tecnologias limpas que permitam desenvolver as
suas economias, saltando algumas das etapas seguidas pelos
países desenvolvidos e evitar a degradação do ambiente. Mas
o esforço e a convergência das políticas dos próprios países
na resolução dos seus problemas são igualmente determinan-
tes. É necessário que “mobilizem recursos internos, combatam
a corrupção e melhorem a governação, passos essenciais
no caminho do desenvolvimento sustentável”191.
Esta aliança envolve a participação activa de todos os cida-
dãos e dos vários grupos que compõem uma comunidade.
Famílias, organizações comunitárias, ONG e forças produtivas
desempenham, também, um papel fundamental na medida
em que, estando próximo dos problemas, podem controlar
e exigir do poder político medidas adequadas. É neste
cenário que se desenha a importância da Educação para
a Cidadania e da Educação para o Desenvolvimento Susten-
tável, designação nascida na Conferência Internacional
de Tessalónica, na Grécia, em 1998.
Do Desenvolvimento

189
PNUD. Relatório do Desenvolvimento Humano 2003. Queluz [Lisboa]:
Mensagem - Serviço de Recursos Editoriais, Lda., p. 3.
190
Idem, p. 3.
191
Ibidem, p. 5.
244
3. Da Educação Ambiental

3.1. A Emergência de uma Perspectiva Educativa


Em rigor não se sabe bem quando nem como
a “reacção” planetária ganhou visibilidade, ultra-
passando os “nichos” de consciência ambiental que lentamente
se foram afirmando ao longo do século XX até à década
de 60, saltando para a ribalta no final do século192.
Lentamente as redes de pesca colhiam menos peixe, os filões
de minério diminuíam, o ar saturou-se de gases nocivos,
o solo perdeu propriedades, a água potável tornou-se um
bem precioso e escasso, e os desastres naturais sucedem-se
a um maior ritmo193. Ou seja, os efeitos da destruição dos
equilíbrios ecológicos que desde há muito se faziam sentir,
embora mais nuns pontos do Globo do que noutros194.
Desde os primeiros fóruns internacionais a problemática
ambiental fizera-se acompanhar de preocupações formativas,
relacionadas com a generalização da consciência ambiental,
bem como de preocupações associadas à promoção de prá-
ticas ecologicamente orientadas - de governos e cidadãos195.
Três eventos importantes marcaram a década de 70 e foram
impulsionadores do desenvolvimento da educação ambiental
em todo o mundo: Estocolmo [1972], Belgrado [1975]
e Tbilisi [1977].
Na Conferência do Ambiente Humano em Estocolmo [Suécia],
em 1972, é feita uma recomendação sobre a Educação
Ambiental:
“É indispensável um esforço para a educação em questões
ambientais, dirigida tanto às gerações jovens como aos
adultos e que preste a devida atenção ao sector da popu-
lação menos privilegiada, para fundamentar as bases de
uma opinião pública bem informada e de uma conduta

192
Cfr. Capítulo I.
193
Da Educação Ambiental

É questionável afirmar-se que os desastres naturais aumentaram, pois


temos que contar sempre com a evolução dos meios de comunicação
e a recente possibilidade de hoje sabermos com maior acuidade e em
simultâneo, o que se passa em várias zonas do globo.
194
Sugerimos e leitura do capítulo “Grandes desastres de contaminação
da biosfera”, de Moralles [1999], p. 27 a 29.
195
Cfr. Capítulo I.
245
A qualidade de vida
na cidade depende
de jovens e adultos. §
dos indivíduos, das empresas e das colectividades inspirada
no sentido da sua responsabilidade sobre a protecção
e melhoria do meio ambiente em toda a sua dimensão
humana. É igualmente essencial que os meios de comu-
nicação de massas evitem contribuir para a deterioração
do meio ambiente humano e, ao contrário, difundam infor-
mação de carácter educativo sobre a necessidade de protegê-
-lo e melhorá-lo, a fim de que o homem possa desenvolver-
-se em todos os aspectos”.
Três anos depois, em 1975, seguindo as recomendações
da Conferência de Estocolmo, a UNESCO realiza o Encontro
de Belgrado [ex-Jugoslávia], onde é elaborada a Carta
de Belgrado - Uma Estrutura Global para a Educação
Ambiental, e lançado o Programa Internacional de
Educação Ambiental [PIEA], derivado do Programa das
Nações Unidas para o Ambiente, criado em Estocolmo.
O PIEA produz a primeira declaração intergovernamental
sobre educação ambiental, enunciando metas, objectivos,
conceitos chave e princípios de orientação, assegurando,
a partir de então, uma base de dados com informações sobre
instituições e projectos realizados na área da Educação
ambiental, assim como a promoção de eventos e publicações
sobre esta temática.
Carta de Belgrado196
Uma Estrutura Global para a Educação Ambiental
Os breves, mas abrangentes compromissos para a educação
ambiental preparados em Belgrado, podem ser sumariados
da seguinte forma:
1 Promover o conhecimento claro e a compreensão das
Da Educação Ambiental

interdependências económica, social, política e ecológica,


entre as zonas urbanas e as rurais;

196
PALMER, J. Environmental Education in the 21st Century - Theory,
Practice, Progress and Promise. 1998.
246
A fertilização
dos solos a partir
da decomposição
de matéria orgânica
foi um processo
de fertilização usado
§ durante gerações.

2 Providenciar a todas as pessoas oportunidades para


P

adquirirem conhecimentos, valores, atitudes, competências


e os compromissos necessários à protecção e recuperação
do ambiente;
3 Criar novos padrões de comportamento nos indivíduos,
P

grupos e sociedade em geral, enquanto conjunto e a favor


do ambiente.
Porque no Encontro de Belgrado participaram, sobretudo,
educadores e/ou indivíduos relacionados com a educação,
foi muito importante o plano de acção seguinte que impli- L Também
cava envolver e comprometer a esfera política. foi em Belgrado
que foi criada
Decorrente desta questão chave, dois anos mais tarde, em a revista “Connect”
sobre
1977, desta vez na ex-URSS, em Tbilisi [Geórgia], a UNESCO educação ambiental.
organiza a Primeira Conferência Internacional e Intergover-
namental sobre Educação Ambiental, onde participaram
66 delegações oficiais de Estados-membros da UNESCO,
para além de um número significativo de representantes
de Organizações Não-Governamentais [ONGs].
Na Conferência de Tbilisi foi preparada uma série de reco-
mendações dirigida a uma aplicação mais alargada da edu-
cação ambiental, tanto na educação formal como na educa-
ção não formal, envolvendo pessoas de todas as idades.
O relatório final da Conferência inclui uma Declaração, em
muito baseada nos princípios antes defendidos em Belgrado,
Da Educação Ambiental

consagrando a estrutura de um consenso internacional


a nível de objectivos, estratégias, características, princípios
e recomendações para a Educação Ambiental que foram
aperfeiçoados em publicações posteriores da UNESCO em
1985, 1986, 1988 e 1989. Tbilisi constituiu o embrião
247
do desenvolvimento de políticas de educação ambiental em
todo o mundo e que ainda hoje se evoca em muitos países
do mundo197.

Tbilisi198 - Recomendações sobre Educação Ambiental


L A Conferência de Tbilisi [Adaptado do Relatório 2/1978 das Recomendações da Conferência]
definiu
a Educação Ambiental Educação Ambiental:
nos seguintes termos:
“um processo permanente P É um processo que dura toda a vida;
no qual os indivíduos
e a comunidade P É interdisciplinar e de natureza holística na sua aplicação;
tomam consciência
de seu meio P Deve abordar a educação como um todo e não como
e adquirem
o conhecimento, assunto particular;
os valores,
as habilidades, P Tem a ver com a inter-relação e inter-conectividade entre
as experiências o Homem e os sistemas naturais;
e a determinação
que os tornam aptos P Vê o ambiente na sua plenitude, incluindo os aspectos
a agir - individual
e colectivamente sociais, políticos, económicos, tecnológicos, morais, estéticos
- para resolver e espirituais;
os problemas ambientais”.
P Reconhece que os recursos energéticos e materiais se apre-
sentam com possibilidades limitadas;
P Encoraja a participação nas experiências de aprendizagem;
P Dá ênfase e importância à acção responsável;
P Utiliza uma variedade de técnicas de ensino-aprendi-
zagem, com particular incidência nas actividades práticas
e experiências inovadoras;
PPreocupa-se com as dimensões local
e global, assim como com o presente,
Os concursos estimu-
passado e futuro;
lam a criatividade. PDeve ser salientada e suportada pela
A reutilização de
materiais de desperdício organização e estrutura as situações
permite explorar de aprendizagem e as instituições, como
a política dos 3 R's,
mas também outros um todo;
problemas ambientais
[concurso “Recria em P Estimula o desenvolvimento da sensibili-
lata”- 1.º ciclo; dade, compreensão, pensamento crítico
concurso de painéis
- 2.º/3.º ciclos]. § e competências de resolução de problemas;

197
Fonte: http://www.scielo.br [Setembro’05].
198
Idem. De referir que Tbilisi se localiza na Geórgia [ex-URSS].
248
P Motiva a clarificação de va-
lores e o desenvolvimento
de valores sensíveis ao am-
biente;
P Preocupa-se em desenvolver
uma ética ambiental.
A animação de rua
A focalização da educação am- cria cumplicidade
biental progrediu desde então e afectividade
no espaço público,
e até aos nossos dias, nas para os temas am-
suas metodologias e temáticas § bientais.
centrais. Esta evolução enraíza
na problematização da relação Homem-Natureza, na consti-
tuição de uma ética ambiental, na formação para a cida-
dania - onde se inscreve uma polarização mais ou menos
acentuada das questões ambientais de acordo com os
entendimentos de cada época e da participação na própria
concepção do desenvolvimento, temas já abordados.
Nos anos 80, consolidando desenvolvimentos anteriores, foi
lançada a Estratégia de Conservação Mundial [pela IUCN -
International Union for the Conservation of Nature and
Natural Resources/The World Conservation Union, pelo PNUA
e pela WWF], documento esse que reafirmava a importância
da conservação dos recursos, através do desenvolvimento
sustentável e enfatizava a ideia de que a conservação e o
desenvolvimento são mutuamente interdependentes. Incluía,
igualmente, um capítulo dedicado à educação ambiental,
com a seguinte mensagem: “No fundo, o comportamento
de sociedades inteiras em relação à biosfera precisa de
ser transformada se quisermos assegurar que os objectivos
de conservação sejam atingidos ... a tarefa a longo prazo
da educação ambiental é a de estimular e reforçar as atitudes
e os comportamentos compatíveis com uma nova ética”199.
Foi na Cimeira da Terra [Rio 92] que a educação ambiental
tomou corpo documental, fruto do reconhecimento da sua
urgência e importância, constituindo-se num compro-
misso para os países que assinaram os acordos subjacentes
Da Educação Ambiental

à Agenda 21200.

199
PALMER, J. Environmental Education in the 21st Century - Theory,
Practice, Progress and Promise. 1998, p. 15.
200
Cfr. capítulo 1.
249
“O Tratado de Educação Ambiental para as Sociedades
Sustentáveis e Responsabilidade Global [TEASSRG]201 em
coordenação com a Agenda 21 definem os públicos-alvo
prioritários da educação ambiental202, integram os princípios
do desenvolvimento sustentável com os da participação,
da formação de competências e apresentam um plano
de acção para a educação ambiental. Nesses documentos
enfatiza-se o processo participativo na promoção do ambi-
ente, orientado para a sua recuperação, conservação
e melhoria, bem como para uma melhor qualidade
de vida”203.
O Tratado de Educação Ambiental [TEASSRG] apresenta
os seguintes princípios básicos para a educação ambiental:
a A educação ambiental deve ter como base o pensa-
P

mento crítico e inovador, em qualquer lugar ou tempo,


no seu modo formal, não-formal e informal, a transfor-
mação e a construção da sociedade;
b A educação ambiental é individual e colectiva, sendo
P

o seu propósito formar cidadãos com consciência local


e planetária, que respeitem a autodeterminação dos
povos e a soberania das nações;

201
Documento produzido pelo fórum internacional das ONG's que decor-
reu em simultâneo à Conferência do Rio, onde se reconhece a educação
como direito dos cidadãos, capaz de transformar a relação do Homem
com a Natureza - porque indutora de uma responsabilização individual
e colectiva. A educação ambiental tem como objectivos contribuir para
a construção de sociedades sustentáveis, igualitárias ou socialmente jus-
tas, assim como ecologicamente equilibradas e geradoras de mudanças
na qualidade de vida [Fórum Internacional das ONGs, 1995].
202
As crianças, os jovens, as mulheres e as comunidades locais.
203
JACOBI, Pedro. Educação Ambiental, cidadania e sustentabilidade. In:
Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n.º 118, Março 2003, p. 194. De referir
a existência de algum paralelismo na evolução conceptual entre os con-
ceitos de desenvolvimento e qualidade de vida. Hoje, a conceptualização
sobre a qualidade de vida assume-se como relevante, na medida em
Da Educação Ambiental

que a dimensão ambiental se junta às dimensões subjectivas e de auto-


realização do indivíduo, à saúde física e mental; às dimensões económi-
cas, sociais, culturais e institucionais. Assim, para que exista qualidade
de vida, é também necessário haver qualidade ambiental, daí a sua
relevância para a educação ambiental [cfr. FERRÃO, J; GUERRA, J. Agenda
21 Local: Municípios e Sustentabilidade: Relatório final de Julho de 2004.
Lisboa: Observa, p. 4].
250
c A educação ambiental deve desenvolver uma pers-
P

pectiva holística, focalizando a relação entre o ser humano,


a natureza e o universo, de forma interdisciplinar”204.
Em 1997, e novamente sob o patrocínio da UNESCO, tem
lugar a Conferência Internacional sobre Meio Ambiente
e Sociedade, Educação e Consciência Pública para a Sustenta-
bilidade, realizado em Tessalónica [Grécia]. No documento
final é chamada a atenção para a necessidade de inte-
gração/articulação da educação ambiental com os conceitos
de ética e sustentabilidade, identidade cultural e diversidade,
mobilização, participação e práticas interdisciplinares205.

As parcerias locais
e activas favorecem
a formação
de uma consciência
§ ambiental.

Enquanto dimensão educativa para a cidadania, a educação


ambiental, deverá ser perspectivada como Educação para
o Desenvolvimento Sustentável, aproveitando a dinâmica
das iniciativas locais, mobilizando as pessoas para as ener-
gias renováveis, desenvolvendo e consolidando parcerias,
ajudando as escolas a resolver as suas disfunções e a trans-
formarem-se num exemplo de pedagogia cívica e ambiental,
solicitando a participação e responsabilidade cívica de todos.
A Resolução 57/254 das Nações Unidas, de 20 de Dezembro
de 2002, proclama a Década das Nações Unidas da Edu-
cação para o Desenvolvimento Sustentável [DEDS], para
o período de 2005 a 2015.

204
GADOTI, M. ECO-92 e educação ambiental. In: Revista de Educação
Pública, Cuiabá, Editora Universitária da UFMT, vol. 2, n.º 2, Out 1993
Da Educação Ambiental

[citado por: SPAZZIANI, Maria de Lurdes. A Formação de Educadores


Ambientais para Sociedades Sustentáveis: Memórias do Processo de
Elaboração do Projecto Piloto de um Curso de Especialização].
205
Cfr. SORRENTINO, M. De Tiblissi a Tessalónica: a educação ambiental
no Brasil. 1998. Citado por: JACOBI, Pedro. Educação Ambiental, cidadania
e sustentabilidade. In: Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n.º 118, Março
2003, p. 190.
251
A vizinhança activa
é um poderoso instru-
mento de sensibilização
nas pequenas
comunidades. §
“O objectivo é consagrar a integração do desenvolvimento
sustentável nos vários sistemas e a todos os níveis de ensino,
quer tenham cariz formal ou informal. Pretende-se equipar
os indivíduos e sociedades com competências, perspectivas,
conhecimentos e valores para que possam viver e trabalhar
de uma forma sustentável.
A Educação para o Desenvolvimento Sustentável [EDS]
introduz uma visão da educação que procura um balanço
entre o bem-estar humano e o bem-estar económico, com
respeito pelas tradições culturais e pelos recursos naturais
do planeta. A EDS aplica métodos e aproximações de edu-
cação transdisciplinares com vista a:
PDesenvolver uma ética de aprendizagem ao longo da vida;
PPromover o respeito pelas necessidades humanas compa-
tíveis com o uso sustentável dos recursos naturais e com
as necessidades do planeta;
PNutrir um sentido de solidariedade global;
PPreparar os cidadãos para o exercício da cidadania.
A cooperação internacional em matéria de Educação para
o Desenvolvimento Sustentável pode favorecer a compreensão
mútua, reforçar a confiança entre Nações e o respeito dos
valores culturais; desenvolver as relações de amizade e a
tolerância entre Nações; contribuir para a paz, para a segu-
rança e para o bem-estar das populações em geral”206.

3.2. Educação Ambiental em Portugal


3.2.1. Um pouco de História
Segundo Alves207, a primeira Associação de Defesa do Am-
biente [ADA], criada em Portugal, surgiu em 1948; mas só
Da Educação Ambiental

206
SCHMIT, Luísa. Educação Ambiental e Educação para o Desenvolvimento
Sustentável - Um Futuro Comum. In: ASPEA; XII Jornadas Pedagógicas
de Educação Ambiental da ASPEA, 2005, p.20.
207
ALVES, Fernando Louro. A Educação Ambiental em Portugal. In: Carapeto,
C., Cadernos de Educação Ambiental, Lisboa: Universidade Aberta, 1998.
252
vinte e um anos mais tarde, em 1969, o Governo Português L Louro Alves (1998)
cria um estrutura ligada à protecção do ambiente e à refere “situações
que surgiram muitas
conservação da natureza, que deu pelo nome de Comissão vezes de uma forma
Nacional de Ambiente [CNA]. Foi a resposta encontrada espontânea,
algumas vezes
ao pedido das Nações Unidas, para a definição de um com uma certa
interlocutor, na área ambiental. confusão de conceitos,
mas curiosamente
A partir desta data a prática da educação ambiental no envoltas de um certo
secretismo ...”.
país surge muito timidamente e sempre muito localizada,
seja em áreas protegidas, seja numa escola ou grupo de
escolas, sensíveis às questões ambientais.
O mesmo autor208 situa em 1975 o surgimento das primei-
ras preocupações com a educação ambiental através da
publicação do Decreto-Lei n.º 550/75, de 30 de Setembro, e da
criação do Serviço Nacional de Participação das Populações
[SNPP], cuja missão era “… a realização de campanhas
de divulgação, participação e formação da população em
geral e da juventude em particular em ordem à consecução
e concretização de uma política nacional, regional e local
do ambiente”209.
Relativamente à educação ambiental no nosso país, em 1983,
José de Almeida Fernandes210 referia: “… à partida podemos
afirmar que não existe uma Educação Ambiental minima-
mente estruturada em Portugal, quer consideremos o ensino
formal quer o não-formal”211.
Desde a criação da Comissão Nacional de Ambiente [CNA],
a situação evoluiu com a criação do INAMB - Instituto
Nacional do Ambiente [mais tarde, 1994, denominado de
IPAMB - Instituto de Promoção Ambiental, que integrou, em
conteúdo e propósito a Direcção-Geral de Ambiente, até Abril
de 2007 e agora a Associação Portuguesa de Ambiente],
sobretudo entre os anos de 1993 a 1999, observando-se
um forte impulso na área da educação ambiental.
O INAMB, de âmbito nacional, teve por objectivos a promo-
ção da qualidade de projectos de educação ambiental, assim
Da Educação Ambiental

208
Idem.
209
Ibidem.
210
José de Almeida Fernandes foi o primeiro director do Instituto Nacional
de Ambiente [INAMB].
211
FERNANDES, José de Almeida. Manual de Educação Ambiental. Lisboa: Secre-
taria de Estado do Ambiente\Comissão Nacional de Ambiente, 1983, p. 42.
253
Formação
de Animadores
de Educação Ambiental:
Visita de Estudo
ao Parque Ecológico
de Monsanto. §
como a gestão e investimento em projectos e acções que
exibissem indicadores de eficácia.
Decorrente de um acordo estabelecido entre o Ministério
do Ambiente e o Ministério da Educação212, o IPAMB
concretizou um modelo de apoio a acções e projectos
de educação ambiental - para incentivar a crescente
adesão à educação ambiental dinamizada por entidades
públicas e privadas213 - para além de manter uma visão
estratégica a favor da sustentabilidade e da continuidade
de acções orientadas para o desenvolvimento sustentável,
em geral.
A par destas surgiram, também, em Portugal outras estru-
turas de âmbito nacional, regional ou local na área do
ambiente, vocacionadas para a educação ambiental em áreas
de intervenção privilegiada: os resíduos, a indústria, a água,
as energias renováveis, os centros de observação e recupe-
ração de animais, entre outros214.
Por outro lado, programas e projectos de educação ambien-
tal começaram a ser uma realidade, dentro e fora da escola,
visando a informação dos cidadãos e a sua focalização na
preservação e gestão equilibrada dos recursos naturais.
Apesar desta perspectiva, não podemos deixar de referir
a existência de várias iniciativas condutoras à actual situação

212
Este acordo deu início a um novo processo de elaboração de uma
“Estratégia Nacional de Educação Ambiental [ENEA]”, a ser inserida
na Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Portugal.
Da Educação Ambiental

213
Durante estes anos foram criadas diversas Organizações Não Governa-
mentais de Defesa do Ambiente [ONGA], tendo muitas delas uma acção
privilegiada em projectos/acções de educação.
214
Refere-se, a nível central, o Instituto de Conservação da Natureza,
Parques Naturais [Gerês, Serra da Estrela, etc.]; a nível empresarial,
empresas intermunicipais de gestão de resíduos, associações empresari-
ais na área da reciclagem de materiais, etc.
254
Informar,
criar proximidade
e empatia com
as causas ambientais
junto de alunos,
professores
e auxiliares
§ de educação.

da educação ambiental em Portugal e que, tanto individual-


mente como no seu conjunto, muito contribuíram para que
hoje, em 2006, a situação inclua:
a A existência de Áreas protegidas e reconhecidas a nível
P

nacional e internacional, como é o caso do Parque Peneda-


-Gerês, da Serra da Estrela, das Dunas de S. Jacinto
[Aveiro], de Montesinho, da Mata da Margaraça, da Serra
da Malcata, entre outros, como do Parque da Serra do Cal-
deirão e Candeeiros, de Monchique, da Lousã e, para
referenciarmos um Parque de Lisboa, o Parque Florestal
de Monsanto, onde existe uma infra-estrutura criada
[a partir de 1990] especificamente para o apoio à prática
da Educação Ambiental: o Parque Ecológico de Monsanto;
b Interesse [e “carolice”] de professores, docentes, inves-
P

tigadores e profissionais de áreas diversas relacionadas com


a temática de ambiente, no desenvolvimento de iniciativas
a favor do ambiente, seja através de projectos de acção
com alunos, seja através da criação de associações ou, ain-
da, pela dinamização de projectos sustentados pela meto-
dologia da investigação-acção a partir das universidades.
“Entre 1989 e 1990 um grupo de professores do Depar-
tamento de Educação da Faculdade de Ciências da Uni-
versidade Clássica de Lisboa, liderado por Ana Benavente
[Secretária de Estado da Educação em 1995], levou a cabo
uma investigação a respeito dos projectos de educação
ambiental. Merece também destaque o estudo de caso
Da Educação Ambiental

desenvolvido pela Universidade do Minho, em 1993-94,


relativo ao papel das crianças enquanto catalisadoras
de mudanças de comportamentos e atitudes face às alte-
rações no estado do ambiente” [Louro, 1998, p. 88 - Ob. cit.].
Este último, em conjunto com estudos similares
255
Jogos didácticos
e dinâmicas de grupo:
fortes aliados
na sensibilização
para o Ambiente. §

de outros países, deu origem a uma publicação coordenada


por Patrícia Joyce Fontes, em Novembro de 1998:
As Crianças como Agentes de Mudança Ambiental;
c Uma Lei de Bases do Sistema Educativo, em 1986,
P

que incluiu no ensino básico a formação pessoal e social,


possibilitando o desenvolvimento da educação para a
cidadania, educação para a saúde, educação ecológica,
educação para o consumo, entre outras valências;
d Sobretudo a partir do Encontro de Tbilisi [onde
P

Portugal esteve representado e apresentou um relatório


sobre as iniciativas que estavam a ser desenvolvidas, na
área da educação ambiental] referencia-se o envolvimento
de estruturas governativas. Entre outros documentos ofi-
ciais destacam-se a Lei de Bases do Ambiente, publicada
em 1987 [Decreto-Lei n.º 11/97] e a Lei das Associações
de Defesa do Ambiente [Decreto-Lei n.º 10/87]. Mais do que
o envolvimento das estruturas governativas, importa
salientar a colaboração entre os Ministérios do Ambiente
e da Educação, em várias ocasiões215;
e A realização de Encontros Nacionais de Educação
P

Ambiental, que inicialmente tiveram como principais


participantes indivíduos e representantes de Associações
de Defesa de Ambiente216 e que, hoje em dia, são parti-

215
Para um conhecimento mais aprofundado sobre este tema sugere-se a
leitura do “Bloco 5” do livro Educação Ambiental. [CARAPETO, Cristina
Da Educação Ambiental

«coord. Científica»; ALVES, Fernando Louro; CAEIRO, Sandra. Lisboa:


Universidade Aberta, 1999].
216
Entre muitas outras, são conhecidas as ADA's: GEOTA - Grupo de Estudos
do Ordenamento do Território e Ambiente, criada em 1981, a QUERCUS
- Associação Nacional de Conservação da Natureza, fundada em 1985,
e a APE-AMIGOS DA TERRA - Associação Portuguesa de Ecologistas,
de 1985.
256
I Encontro
de Professores:
a Educação ambiental
no âmbito do progra-
ma “Lisboa Limpa,
tem outra Pinta”
§ - 1998/1999.

cipados também por representantes de ONG's217, Redes


Nacionais e Internacionais de Ambiente, e por represen-
tantes de estruturas governativas;
f A formação na área ambiental: Formações dirigidas
P

a Professores e a Jovens - conhecidos por Monitores


de Educação Ambiental;
g O papel dos media na divulgação [embora não muito
P

ambiciosa] de iniciativas de índole ambiental, desde


a publicidade de iniciativas escolares, à denúncia de situa-
ções controversas e ambientalmente desadequadas e à
divulgação de iniciativas do Governo na área, entre outras.
Em Portugal muitos foram os projectos, acções e eventos
de educação ambiental que deixaram rasto - para o que
contribuíram os media - pelo que o conhecimento das
gerações mais novas e a sua sensibilidade face às questões
ambientais, é superior à de anteriores gerações. Os dois
Inquéritos Nacionais às Representações e Práticas dos Portu-
gueses sobre o Ambiente218 revelaram que, de uma forma
geral, o cidadão Português é sensível às questões am-
bientais só que essa sensibilidade não se traduz, ainda, em
participação activa, salvo poucas excepções honrosas.
Independentemente da idade, o nível de participação cívica

217
A primeira ONG - Organização Não Governamental, criada em Portugal,
foi a ASPEA: Associação Portuguesa de Educação Ambiental.
218
ALMEIDA, J.F. [org.]. Os Portugueses e o Ambiente: I Inquérito Nacional
Da Educação Ambiental

às Representações e Práticas dos Portugueses sobre o Ambiente. Oeiras:


Celta, 2000 e ALMEIDA, J.F. [Coord]. Os Portugueses e o Ambiente:
II Inquérito Nacional às Representações e Práticas dos Portugueses sobre
o Ambiente. Oeiras: Celta Editora, 2004. Estes inquéritos tiveram por
objectivo saber o que os portugueses pensam das questões ambientais,
avaliar opiniões e atitudes, valores e representações, para inferir sobre
práticas e comportamentos.
257
Adquirir
novas competências
é um instrumento
importante
para estimular
o interesse e para
motivar para a acção
nas comunidades. §
é reduzido, em particular, no que respeita às práticas am-
bientais [à excepção do que se relaciona com a separação
de RSU e algumas - poucas - políticas de qualidade imple-
mentadas por indústrias, sobretudo indústrias recicladoras
de materiais].

3.2.2. O Papel das Autarquias


L Em Lisboa, Algumas Autarquias portuguesas, desde muito cedo, estiveram
na década de 80, atentas aos acontecimentos e à evolução das discussões de
surgiu uma rede
de Escolas na zona pequenos e grandes grupos, nacionais e internacionais, sobre
de Benfica, questões relacionadas com o ambiente - a nível técnico,
com destaque para
a Escola Secundária económico ou educativo.
José Gomes Ferreira,
que catalizou um Por comparação com o Governo Nacional, as Autarquias
projecto de âmbito [a estrutura político-social mais próxima dos cidadãos]
comemorativo,
a propósito do Dia podem desenvolver estratégias, programas, projectos e acções
Mundial do Ambiente
[5 de Junho], em que que visem a educação ambiental junto dos cidadãos, em
houve a colaboração todas as suas possíveis vertentes. Falamos não só da moti-
do Município
de Lisboa. Esta nova vação para uma participação cívica responsável dos indiví-
relação com duos, como de todos os aspectos bio-físicos que nos rodeiam
a Autarquia, embora
apenas embrionária e que nos permitem ter uma melhor ou pior qualidade
na altura, de vida, em função dos equilíbrios que conseguirmos gerir.
foi posteriormente
estendida a outras Enquadrados pelo âmbito de competências dos Municípios,
escolas do concelho é possível encontrar programas, projectos e acções associa-
e, também, a outras
Autarquias. dos as diversas áreas de acção das Autarquias219.

219
Tendo por referência a actividade da Câmara Municipal de Lisboa,
refere-se a título meramente exemplificativo, a acção do Espaço
Monsanto na área da Conservação da Natureza e das Espécies, a Quinta
Pedagógica numa perspectiva agro-cultural e a actividade do Departa-
mento de Higiene Urbana e Resíduos Sólidos [neste último caso cfr.
anexo A5].
258
As Autarquias têm, também, disponível como princípio para
a acção a implementação da Agenda 21 Local, a qual
traduz, para o nível autárquico, as orientações e recomen-
dações da Agenda 21 [Rio, 1992]. Aquela apresenta-se
como um instrumento que contribui para o uso racional
dos recursos naturais, sem hipotecar as necessidades das
gerações futuras220. A Agenda 21 Local reúne as seguintes
características:
P Potencia políticas de proximidade;
P Promove a abertura dos governantes ao envolvimento
dos cidadãos;
P É flexível, cooperante, participativa, pedagógica e dinâmica;
P Envolve num mesmo processo, empresas, serviços públicos,
instituições educativas, religiões, comunidades científicas,
associações, sindicatos, vários grupos de interesse e cidadãos;
P Monitoriza e avalia - com base em relatórios de progresso
regulares, de consenso estatístico e de leitura acessível
a todos os cidadãos. Desta avaliação decorre o aumento
do conhecimento das realidades locais, um superior envolvi-
mento de todos os intervenientes na procura de soluções
e, ainda, uma maior adequação das políticas implemen-
tadas face às necessidades locais.
A Agenda 21 Local é promovida a nível Europeu pela Cam-
panha Europeia das Cidades e Vilas Sustentáveis [ICLEI]
e a nível internacional pela Organização das Nações Unidas,
pela Organização Mundial de Saúde e pelo Banco Mundial,
entre outras organizações.
A Agenda 21 Local é um programa de acção promotor
da participação e envolvimento entre o poder e os agentes
locais, nas dinâmicas de desenvolvimento económico, social
e ambiental, à escala autárquica. Traduz-se num programa
de acção integrado e pluridimensional e requer a partici-
pação dos cidadãos nas decisões.
Da Educação Ambiental

Tendo presente as orientações da Agenda 21 Local e aten-


dendo à necessidade de participação social de todos, com
espírito crítico e empreendedor na promoção da sustenta-

220
Princípio da Sustentabilidade.
259
bilidade ambiental221, o papel das Autarquias revela-se
fundamental, não só pela maior proximidade ao cidadão e
mais profundo conhecimento das realidades locais mas,
também, porque podem ser o apoio, a regulação e a
garantia de continuidade de políticas sociais e educativas
que incluam a educação ambiental e a educação para a
cidadania, como elementos integradores dos seus projectos
para a população.
O Município de Lisboa tem vindo a desenvolver, nas
últimas duas décadas, esforços adicionais na área da
educação ambiental, onde se integra a acção desenvolvida
na área da higiene urbana e animais em meio urbano222.
São disso exemplo:
PCampanhas de informação e divulgação;
PAcções de sensibilização para munícipes, escolas, públicos
profissionais específicos [educadores e professores,
técnicos de equipamentos sociais, pessoal de apoio
diverso, porteiros, auxiliares de acção educativa, ajudantes
domiciliários, entre outros];
PAcções de formação para professores [no âmbito das
escolas] e para munícipes [animadores e monitores de edu-
cação ambiental];
PVisitas de estudo de vária índole;
PConcursos diversos;
PIntervenção comunitária com jovens enquanto agentes
de mudança de comportamentos, junto dos munícipes
[na área dos Resíduos Sólidos Urbanos];

221
Como também “das capacidades sociais, económicas, políticas e cultu-
rais potenciadoras do desenvolvimento endógeno, como da compreensão
e manejo das possibilidades e dos limites que estabelece o ambiente
para garantir a satisfação adequada das necessidades básicas a médio
e a longo prazo” RAMOS PINTO, Joaquim & MEIRA CARTEA, Pablo.
Processos Participativos e Educação Ambiental: Estratégias para a sus-
tentabilidade Local. In: Revista ASPEA, Lisboa: ASPEA, 2005, p. 6-7.
222
O anexo A5 integra uma síntese descritiva das principais acções, pro-
jectos, programas e campanhas de informação e sensibilização desen-
volvidos desde 1979 nesta última área de competências. A experiência
acumulada constitui também a base da informação operativa constante
Da Educação Ambiental

dos anexos B1 [fichas e planos de sessão], B2 [apresentações tipo, para


apoio à dinamização de acções informativas], B3 [fichas lúdico-didácti-
cas dirigidas a actividades de animação com grupos], B4 [informação
relativa à organização de visitas de estudo], B5 [fichas lúdico-didácticas
dirigidas à actividades com grupos na área da reutilização de resíduos]
e B6 [base de imagens e vídeos para apoio à organização de activi-
dades na área dos resíduos sólidos e animais em meio urbano].
260
P Programas regulares de educação ambiental nas escolas
dos 1.º, 2.º e 3.º Ciclos e Jardins de Infância;
P Formação de técnicos e operacionais do Departamento
de Higiene Urbana, na área dos Resíduos Sólidos Urbanos
e Animais na Cidade;
Participação em Fóruns/Seminários/Congressos, organizados
P

por entidades governamentais e não governamentais, onde


a temática da educação ambiental se constitui como tópico
de trabalho;
P Divulgação das iniciativas realizadas, através da imprensa
diária ou em publicação própria com regularidade anual223.

3.3. Educação Ambiental e Participação


3.3.1. Educação Ambiental: O que é?
“Durante muito tempo, muitos pensaram que as acções em
prol do ambiente eram coisas distantes e impraticáveis,
como se estivesse em causa um voltar as costas à civiliza-
ção e um regresso à natureza: quando os problemas parecem
muito complicados e as soluções muito difíceis, sentimos
vontade de desistir […] Hoje em dia, acção em prol do
ambiente significa o conjunto de pequenas coisas que
fazemos diariamente: onde vazamos as garrafas e as latas,
como conduzimos os nossos automóveis, o que fazemos
para reduzir o consumo de energia nos nossos chuveiros,
aparelhos de ar condicionado e fogões ...”224.
Tal como o lema “Pensar Global, Agir Local”225, o que importa
é participar, mas não de qualquer forma e a qualquer
preço: é necessária informação correcta, sentido crítico,
partilha e persistência.
A Educação Ambiental é parte integrante da educação
cívica e social do indivíduo. Ela pretende chamar a atenção
para a vivência equilibrada com o ambiente que nos rodeia,
Da Educação Ambiental

223
A este respeito, importa referir que as iniciativas executadas no âmbito
da educação ambiental são descritas, também, no relatório anual de
Experiências Educativas da Cidade de Lisboa, editado pelo Departamento
de Educação e Juventude da Câmara Municipal de Lisboa.
224
EarthWorks Group. 30 coisas simples que você pode fazer com energia
para salvar a terra, 1993.
225
Lema estratégico que surgiu com a Agenda 21, em 1992.
261
“Chuva de Ideias”. §
informando e desenvolvendo o sentido crítico, valorizando
o sentido de equilíbrio e de percepção dos limites [do meio].
Sendo um vector educativo particular, insere-se na educação
para a cidadania dos indivíduos uma vez que também ela,
e a propósito do meio e da Natureza que nos rodeia, nos
“exige” valores, participação e cooperação, de forma restrita
e/ou alargada.
Ao promover uma chuva de ideias226, alguns dos registos
possíveis sobre a definição de Educação Ambiental seriam:
“Um processo dinâmico/interactivo que pretende moderar
a relação homem/natureza, promovendo comportamentos
pró-ambientais, através da mudança e/ou “conservação”
de atitudes face ao ambiente.”
L “A Educação
Ambiental, “A Educação Ambiental visa sensibilizar e alertar a socie-
como parte integrante
da educação cívica, dade para os problemas ambientais, promovendo competên-
deverá contribuir cias e comportamentos pró-ambientais, com o intuito de
para uma melhor
compreensão propiciar uma melhoria da qualidade de vida. É educar para
das formas mais a prevenção, preservação e reabilitação do meio ambiente
adequadas de actuar
perante o ambiente, mobilizando, assim, a sociedade para as questões ambientais.”
alertando,
sensibilizando e “Educação Ambiental passa pela sensibilização de grupos,
educando as pessoas,
envolvendo-as no sentido de os alertar para problemas ambientais, que
e informando-as.” podem ser melhorados ou superados com um maior envol-
vimento e acção participada, por parte de todos, promovendo
estratégias facilitadoras da modificação de comportamentos.”

226
As definições que se apresentam sem autor referenciado, resultaram
de uma chuva de ideias promovida entre alunos finalistas da licencia-
tura de Psicologia [área Educacional] do Instituto Superior de Psicologia
Aplicada, no ano lectivo 2003/2004.
262
“Educação Ambiental ... sensibilização sobre as formas de
preservar, melhorar e modificar o ambiente, mediante uma
componente de educação cívica, alertando para algumas
estratégias concretas como a reutilização dos materiais
ou a reciclagem, consciencializando as pessoas para o facto
de que as suas motivações e comportamentos influenciam
o meio ambiente e os seus ciclos naturais.”
“Educação Ambiental ... deve ser uma passagem social que
assenta na sensibilização das pessoas para a mudança
de atitudes ambientais e na chamada de atenção para
o facto dos seus comportamentos influenciarem o ambiente.
Ensinar estratégias [ex: reciclagem, ...], para prevenir, melhorar
e proteger o ambiente, tendo em conta as expectativas e re-
presentações das pessoas, de modo a que estas elaborem
objectivos e estratégias de intervenção ambiental.” L “Educação Ambiental
é um processo
“Educação Ambiental ... interactivo e dinâmico
no âmbito da
1] Promover atitudes/comportamentos que facilitem
P
educação cívica,
que, com base
um melhor viver; na motivação, visa
informar, sensibilizar
2] Preservação, Reabilitação ... Criar um melhor ambiente
P e educar através
natural e social!” do desenvolvimento
de competências
“Educação Ambiental é uma forma de sensibilizar e alertar pró-ambientais, no
sentido de produzir
para as questões ambientais e para os seus problemas, mudanças de
envolvendo e informando as pessoas, de modo a que estas comportamentos
e atitudes”.
compreendam as formas mais adequadas de actuar no quo-
tidiano, prevenindo e remediando algumas situações, em
ordem a um ambiente cada vez melhor e a uma melhor
qualidade de vida.”
“Educação Ambiental? Uma definição possível: é uma com-
ponente da educação cívica que tem como objectivo educar,
sensibilizar e alterar atitudes/comportamentos da população,
face às práticas ambientais, contribuindo desta forma para
uma melhor qualidade de vida.”
“A Educação Ambiental é um processo interactivo e dinâ-
mico, parte integrante da educação cívica, que através
Da Educação Ambiental

da informação, sensibilização e motivação, tem como


objectivo educar [os indivíduos] para a mudança de
atitudes e comportamentos desenvolvendo as competências
pró-ambientais de prevenção, preservação e reabilitação
[do ambiente] para uma melhoria da qualidade de vida”.
263
Estas definições contêm e articulam alguns vectores que
integram o conceito de educação ambiental, tais como:
PComponente educativa;
PDesenvolvimento;
PAquisição de competências;
PPromoção de práticas;
PParticipação e acção;
PMelhoria de qualidade de vida dos indivíduos.

Inter-relações da Educação Ambiental

A educação ambiental apresenta-se, assim, como uma ferra-


menta de que dispomos para mudar valores e atitudes
e usarmos os conhecimentos que temos a favor de uma
coexistência equilibrada com a nossa “casa” Terra.
A educação ambiental não é só “aprender a Natureza”,
é também “aprender o Homem e o seu lugar na Natureza”,
é ainda “aprender a respeitar as leis que regem os equilí-
brios naturais e a usar os conhecimentos para restabelecer
pontes destruídas”. Constitui-se como um elemento227 pro-

227
Não devemos esquecer que o poder da educação na transformação dos
Da Educação Ambiental

problemas socioambientais é relativo e a sua eficácia tende a ser reduzi-


da se não for integrada num modelo sistémico, coerente, pragmático e cul-
turalmente reconhecido. Apesar de esta ser uma ferramenta poderosa para
uma mudança de atitudes e comportamentos a favor de um desenvolvi-
mento sustentável, não só na área do ambiente, mas em todas as valên-
cias que respeitam a vida humana, a educação ambiental, ou outra, não
é uma panaceia para todos os problemas da sociedade contemporânea.
264
motor de mudanças de atitudes e comportamentos com
o objectivo de formar uma nova cidadania ambiental. Essas
mudanças ocorrem quando a motivação para a participação
é alicerçada em conhecimentos, sentimentos e valores que
os indivíduos e os grupos partilham sobre o Mundo que
os rodeia.
“Educação Ambiental é Educar sobre o Ambiente, no Am-
biente e pelo Ambiente”228.
Segundo Elisa Vila Nova identificam-se os seguintes
objectivos gerais da educação para o ambiente:
P “A tomada de consciência e a sensibilização para o Ambi-
ente global e as questões ambientais [locais e regionais];
P A aquisição dos conhecimentos necessários à compre-
ensão do Ambiente global e das várias questões ambientais;
P A aquisição e desenvolvimento de atitudes que eviden-
ciem interesse, responsabilidade, sentido crítico e desejo
de defender e melhorar a qualidade do Ambiente;
P A aquisição/desenvolvimento de competências necessárias
para a solução de questões ambientais;
P A aquisição da capacidade de avaliação em matéria
de Ambiente [em função de factores ecológicos, políticos,
económicos, sociais, estéticos e educativos];
P O desenvolvimento de uma participação activa na resolu-
ção de questões ambientais”229.
Uma vez que não há respostas prontas, nem soluções
ou processos únicos [porque as naturezas do Mundo e do
Homem são dinâmicas e evolutivas], procura-se através
da educação ambiental, provocar um novo diálogo que induza
a uma nova forma de pensar, que, por sua vez, resulte
num novo agir.
E porque o Homem faz parte dessa relação, os objectivos
e metas estabelecidas para qualquer programa de educação
ambiental nunca devem perder de vista a pessoa, o indi-
Da Educação Ambiental

víduo inserido no seu contexto social, económico e cultural.

228
LOURO ALVES, Fernando. O Conceito de Educação Ambiental. In: Edu-
cação Ambiental. Lisboa: Universidade Aberta, 1998.
229
NOVA, Elisa Vila. Educar para o Ambiente: projectos para a área-eescola.
Lisboa: Texto Editora, 1994, p. 17.
265
As crenças, os valores, as representações que todos temos
a propósito do ambiente, são o nosso ponto de partida
para o desenvolvimento de um processo educativo que se
pretende que seja válido e eficaz. É muito importante, por
isso, atender às percepções que os indivíduos tem de si
próprios, dos outros, do ambiente que os rodeia, às repre-
sentações que elege como suas, às suas crenças, aos valores
que persegue, como percebem e resolvem as situações do
quotidiano, que valor dão à sua participação social e como
a avaliam. Todas estas e outras dimensões são válidas tanto
para os mais novos como para os mais velhos, pois todos
nós aprendemos [dimensão cognitiva], sentimos [dimensão
sensorial] e estabelecemos relações [dimensão afectiva] com
o ambiente.
A educação ambiental deve, então, privilegiar estratégias
activas que atinjam e mobilizem senão todas, pelo menos
uma de três dimensões: cognitiva, sensorial e afectiva,
sendo que, segundo a prática de quem já se envolveu
amplamente em projectos de educação ambiental de vária
índole, tanto no planeamento, como no acompanhamento
e realização de projectos, como ainda na área da inves-
tigação, é a dimensão afectiva aquela que evidencia mais
resultados.
Segundo Alves “se atestarmos a eficácia de cada uma das
vertentes [ou dimensões], verificamos que aquela que perdura
após uma acção, na maior parte das situações, é a que
tocou no ponto emocional/afectivo do participante. Na maior
parte dos casos, aquela que menos perdura é a que se
prende com os conhecimentos. Valeria a pena, em função
disso, repensar algumas técnicas mais habitualmente empre-
gues pelos pedagogos”230.

Conhecer e compreender
como se organiza
e realiza a limpeza
urbana, ajuda à for-
mação de valores
e atitudes orientadas
para a qualidade
de vida urbana. §
230
LOURO ALVES, Fernando. Técnicas de Acção/Actuação em Educação
Ambiental. In: CARAPETO, C. [coord. Cient.]. Educação Ambiental. Lisboa:
Universidade Aberta,1998.
266
A este propósito, e tendo presente o que foi referido sobre L Essa valoração pode
a educação para a cidadania, gostaríamos de atender à estar ancorada numa
proposição emocional,
questão das crenças e dos valores subjacentes à actividade a que chamamos
humana e à sua importância em todos os processos de crença, que por sua
vez emerge de uma
ensino-aprendizagem. Importa, por isso, dar atenção à ques- matriz de valores
tão dos valores quando falamos de educação ambiental. sobre objectos e
pessoas, e o papel
O homem é um ser criador e cria e re-cria valores, através que os mesmos têm
dos quais dá sentido à sua existência. Viver é resolver no comportamento
dos indivíduos.
problemas teóricos e práticos. As crenças individuais
podem ou não estar
A relação primeira e primordial do homem com o mundo associadas a questões
que o rodeia é utilitária, prática e afectiva. O homem religiosas, culturais ou
valoriza o que o rodeia, aprecia as coisas que o cercam étnicas. Por exemplo:
uma pessoa pode
e a sua vida está sempre relacionada com os valores. acreditar numa
A sua relação com o mundo não é só teórica e o Homem entidade divina e não
perfilhar nenhuma
anseia sempre por ir mais além do simples conhecer. Sabe religião, ou realizar
o valor utilitário das coisas e atribui valor àquilo com que determinado ritual
se relaciona. porque é tradição e
culturalmente aceite.
E porque cada um se relaciona com o mundo à sua ma-
neira, a valorização é diferente de pessoa para pessoa,
de cultura para cultura, embora possamos identificar alguns
traços comuns de valores entre vários indivíduos de um
mesmo grupo, sociedade ou nação. Estaremos então
perante valores sociais internalizados231 por todos os indiví-
duos desse grupo, mais ou menos alargado, para além da
criação ou recriação dos seus próprios valores individuais.
Através da educação para a cidadania, na família, na escola,
e ao longo da vida, perpetuam-se esses valores comuns
que orientam os grupos, as sociedades, o mundo.
Fazendo a educação ambiental parte integrante da edu-
cação para a cidadania, é necessário atendermos aos valores
dominantes do indivíduo, da sociedade e contexto em que
está inserido, para que o processo educativo que se lhe
propõe, para além de motivar uma mudança de compor-
tamentos individual, se estenda a uma acção mais abran-
gente e social, na relação com os outros e com o meio
ambiente.
Da Educação Ambiental

231
Mais do que incluir, ou integrar a internalização de algo implica
aceitação - que pode não ser adopção - de crenças, valores, atitudes
e práticas, como sendo do próprio. O conceito é oriundo das ciências
sociais, e muito utilizado na psicossociologia, querendo significar o nível
ou grau que um indivíduo [ou grupos de indivíduos] atribui aos seus
motivos comportamentais.
267
Se a relação do Homem com o mundo é uma relação
valorativa, se o Homem valora espontaneamente coisas
e acontecimentos, se uns consideram que os valores estão
nas coisas [valorização utilitária] e outros atribuem valor
às coisas, então podemos facilmente imaginar, só através
das premissas referidas, que exista uma pluralidade imensa
de valores individuais cruzados com outra imensidão de
valores societais que se “concentram” em questões como
a dignidade humana, o respeito por outrém, a liberdade,
a saúde, a educação, a justiça, a solidariedade, a cidadania,
o ambiente, ...
António Gedeão lembra-nos bem essa nossa diversidade
de interpretação e relação com o Mundo:
Os meus olhos são uns olhos.
E é com esses olhos uns
que eu vejo no mundo escolhos
onde outros, com outros olhos,
Não vêem escolhos nenhuns.
Nas ruas ou nas estradas
Onde passa tanta gente, uns vêem pedras pisadas, mas outros
gnomos e fadas
Num halo resplandecente.
Inútil seguir vizinhos,
Quem diz escolhos diz flores,
de tudo o mesmo se diz,
onde uns vêem luto e dores
uns outros descobrem cores
do mais formoso matiz.
Querer ser depois ou ser antes.
Cada um é seus caminhos.
Onde Sancho vê moinhos
Da Educação Ambiental

D. Quixote vê gigantes.
Vê moinhos? São moinhos.
Vê gigantes? São gigantes.
[A. Gedeão [s/data], Poesias Completas, Lisboa, Portugália, p. 7-8]

268
O ambiente liga,
facilmente, com todas
§ as áreas disciplinares.

Tudo o que tem valor para o homem é considerado dese-


jável e, por isso, prefere-se a sua existência à sua não-
-existência. Se os nossos valores convergirem, também, para
um ambiente equilibrado, diversificado, sustentado por uma
gestão de recursos naturais [ou mesmo já transformados]
de forma a garantir a propagação das espécies [incluindo
o Homem], então teremos condições propícias para a apro-
priação de atitudes e comportamentos em conformidade
com esses novos valores.
Melhor dizendo, se o desenvolvimento sustentável do ambi-
ente [assim como de outras valências da vida humana] se
apresenta como uma necessidade vital e o Homem assume
esse valor [que tal como outros irá regular as suas
estratégias mediante as quais orientam a sua conduta]
então, nas nossas estratégias de educação para a cidadania
e de educação ambiental, necessitamos, também, de educar
/trabalhar/recriar/reajustar valores e escalas de valores,
junto dos nossos interlocutores.
Da acção humana fazem parte várias dimensões, entre as
quais temos os valores e a “dimensão ética do agir”, que
nos “diz” o que devemos ou não fazer, ou, quando fizemos
algo, nos “passa uma reprimenda” interior” e nos ordena
o que “deve” ser. A consciência moral, tal como nos aconte-
cerá com a consciência ecológica e ambiental [já referida
no Capítulo 1.5], funciona como uma espécie de “juiz
interno” e desempenha uma função crítica do agir, traduzido
nas nossas acções e comportamentos.
Interessa-nos, então e também, provocar a emergência de
uma consciência ambiental racional e cognitiva, mas também,
emocional, dialéctica232 e evolutiva, uma vez que estamos
Da Educação Ambiental

232
Dialéctica porque o Homem é um ser relacional, e os elementos da sua
consciência são complexos, amadurecem em função dos resultados das suas
experiências, e interagem uns com os outros, intensificando-se ou inibindo-se,
e os sentimentos e raciocínios pessoais constituem-se em função
das pressões e normas sociais.
269
a falar de uma dimensão humana não estática e que
se desenvolve com o próprio Homem.
Nas sociedades democráticas, de que fazem parte valores
como a liberdade e a responsabilidade, podemos fazer
escolhas e tomar decisões, o que significa que temos consciên-
cia dos nossos actos e por isso podemos ser responsabili-
zados por eles.
A educação ambiental, enquanto dimensão integrante
da cidadania, não pode descurar este aspecto sob pena
de estar a criar um falso contexto de acção/reacção, tipo
bolha de ar, que não compromete os indivíduos a agir
responsavelmente sobre o ambiente, independentemente
da valência a que nos referirmos. Ou seja, é imperativo
mantermos uma perspectiva holística233, em todas as
situações e contextos, aliada a uma motivação para a
acção, para participação de um e de todos na resolução
dos problemas ambientais.

3.3.2. Participação para Todos e de Toda a Gente


A Agenda 21 estabeleceu a ligação entre o desenvolvimento
sustentável e o envolvimento activo dos cidadãos na ques-
tão ambiental. Tal implica a sua informação e educação
para a cidadania e para o ambiente.
“O reconhecimento da necessidade da participação volun-
tária e consciente de cada cidadão, para implementar uma
política de ambiente, afigura-se como óbvia já que um
desenvolvimento sustentável requer a opção individual por
modelos de consumo menos lesivos para o ambiente”234.
Para que a participação ocorra, é necessário o encontro
de factores como: a motivação, as atitudes, o desenvolvimento
de competências, e a percepção da eficácia de cada um.
As pessoas só se voluntarizam para a participação se se
sentirem informadas, capazes e competentes para agir a favor
Da Educação Ambiental

de uma mudança ambientalmente mais adequada.

233
Em ambiente não existem “mundos isolados”. Aqui e ali as intersecções
sucedem-se em número incalculável, sem limite.
234
IPAMB. Guia de Recursos em Educação Ambiental. Lisboa: IPAMB.
270
Dia da Árvore:
plantação de árvores
com a participação
de associações locais
e estabelecimentos
§ de ensino.

São necessários pelo menos 5 elementos básicos para uma


participação eficaz:
Sensibilidade dimensão sobretudo afectiva, mas que
P

motiva os indivíduos e chama a atenção para determinadas


preocupações;
Informação dimensão do foro cognitivo e que se su-
P

porta sobretudo do conhecimento das ciências naturais,


mas também de outros campos científicos associados;
Competência traduzida nas ferramentas ou instrumentos
P

necessários à acção, que serão tão mais eficazes quanto


mais experimentados e avaliados;
Motivação não havendo motivação o indivíduo não con-
P

segue encontrar razões para a mudança ou para a acção.


Se essa necessidade não existir, as restantes dimensões
referidas, mesmo se presentes, não se revelam. A moti-
vação será tanto mais propulsionadora da participação
e da acção quanto menos externa, o mesmo é dizer que
só a motivação intrínseca do indivíduo induzirá a uma
participação activa e duradoura;
Acção O comportamento e a atitude resultante de uma
P

decisão informada e consciente.


A participação, contudo, não se esgota na acção. A for-
mação de uma consciência ecológica atenta e crítica235,
a discussão e o diálogo, a reflexão individual e colectiva,
Da Educação Ambiental

verbal ou escrita, a partilha de conhecimentos com os


outros, são outros exemplos de participação - também
eles da maior importância.

235
Consciência ecológica e ética ambiental - Capítulo I.
271
Na educação ambiental, o que se pretende é que a participa-
ção não seja pontual, antes se revele contínua, responsável,
crítica e adaptável às mudanças e evoluções constantes.
Nesta perspectiva a educação ambiental é um processo edu-
cativo em permanente evolução, exigente e sem limite à vista.

Entraves à Educação Ambiental


No desenvolvimento de iniciativas [programas, projectos,
acções] de educação ambiental, devemos prevenir algumas
“resistências” relacionadas com as representações individuais
e sociais existentes, que se prendem com:
P As pessoas percepcionarem os problemas ambientais de
acordo com o seu contexto socioeconómico e a forma como
estes afectam o seu quotidiano. Essa percepção raramente
é empírica, ou seja, fenómenos como a destruição da
camada do ozono, o aquecimento global, a desflorestação
ou a contaminação do ar, não são vivenciados pelas pessoas
e por isso parecem irreais. Quanto menos acessíveis são
os riscos reais para a experiência humana, menor será
a possibilidade de gerarem motivação para a acção;
P Os aspectos económicos, sociais e políticos, não são reco-
nhecidos como partes constituintes do meio ambiente;
PAs notícias transmitidas pelos meios de comunicação
social são enviesadas. Geralmente limitam-se a referências
mediáticas sobre catástrofes e incidentes ambientais ines-
perados e não abordam as causas profundas que os en-
volvem. São quase sempre entendidos como situações
pontuais [falhas na segurança, erros humanos ou avarias]
e raramente põem em causa a organização social, política
e económica que sustenta tais riscos;
PExiste uma espécie de contra-informação em que os
valores ecológicos são sucessivamente desmentidos pelos
valores de mercado, seja através da publicidade seja
através do confronto entre os impactos ambientais adver-
sos de determinadas indústrias e práticas económicas
e os benefícios [bens de consumo, postos de trabalho,
desenvolvimento económico, competitividade, etc.];
Da Educação Ambiental

PConflito “entre optar pela qualidade de vida ou pela


qualidade ambiental”;
PDesconhecimento dos impactos sociais e ambientais dos
bens de consumo, devido ao longo e complexo processo
que envolve a extracção de matérias-primas, produção,
272
distribuição, comercialização e destino dos resíduos produ-
zidos. É muito fácil deitar fora uma lata de sumo sem
qualquer problema de consciência se não soubermos que
para produzir uma tonelada de alumínio são necessários
50 000 KWh, o suficiente para abastecer uma casa
durante cerca 17 anos. Podemos estar verdadeiramente
preocupados com a fome e a falta de água potável nos
países pobres, mas nunca nos lembramos que para
produzir a lata que deitámos fora foi necessário esventrar
a terra para extrair a bauxite [minério de que é extraído],
destruir florestas, ecossistemas e eventualmente áreas
agrícolas vitais para a subsistência das populações
ou a contaminação dos cursos de água;
P Efeitos do marketing e da publicidade na alteração dos
hábitos de consumo e principalmente na alteração da
noção de “necessidade”. Num sistema económico baseado
no consumo, o sistema de produção já não tem como
objecto satisfazer as necessidades das pessoas, mas sim
criar necessidades. A distinção entre necessidade e luxo
é cada vez mais ténue;
P Sentimento de impotência face a uma questão cujas
causas e consequências estão muito para além da actuação
individual. Este sentimento traduz-se numa acomodação
ao risco do tipo: “sei que o perigo existe mas não vale
a pena pensar nisso”;
P Vitimização. As pessoas tentem a sentir-se vítimas e não
co-responsáveis pela degradação do ambiente, atribuindo
o ónus ao estado e às empresas;
P Optimismo face à capacidade do desenvolvimento tecno-
lógico e científico para resolver os problemas ambientais.
Pinto & Meira, apresentando-nos um muito interessante L Jornais e revistas
quadro de leitura das estratégias, inter-relações e inter- diárias, publicações
periódicas da
dependências da participação social no processo socio- especialidade, cadernos
educativo da educação ambiental e para a sustentabi- ambientais, relatos de
lidade, que a seguir transcrevemos: outras experiência de
educação ambiental,
Uma rápida observação permite-nos logo identificar alguns entrevistas, visitas
centro de recursos,
aspectos neste desenho sistematizador das estratégias a pri- entre outros ...
vilegiar, como sendo:
P Relações entre diferentes componentes ou aspectos da
participação, desde o nível individual ao nível estrutural;
273
Quadro Pinto & Meira da revista da ASPEA|Estratégias de Participação Social

P Factores condicionantes da participação como: o nível


de participação, os instrumentos disponíveis, os interesses
dos participantes e interesses dos “promotores” da mu-
dança [seja um indivíduo, grupo de indivíduos ou estru-
turas mais organizadas];
P Áreas que se inter-relacionam na participação como sejam:
um sistema democrático, um sistema comunicacional, a escola
no global, e a educação ambiental no particular.
Sendo fundamental a participação dos cidadãos, conforme
referimos, no processo de ensino-aprendizagem236 de qualquer
programa de educação ambiental e tendo também presente
Da Educação Ambiental

236
Optamos por considerar a educação ambiental um processo de ensino-
-aprendizagem porque acontecem ganhos em ambos os lados, quem trans-
mite a nova informação e conhecimentos também recebe novas pers-
pectivas e modos de agir e sentir o ambiente. É na evolução espiralada
desta relação de dar e receber que a construção sustentada da educação
deverá assentar para catalizar a consolidação de conhecimentos e com-
petências adquiridas e internalizadas pelos indivíduos.
274
em palco as dimensões da educação para a cidadania,
deveremos assegurar que o processo seja:
Motivador que estimule a participação em todas
P

as suas fases, desde o planeamento, à execução


e até mesmo à regulação e avaliação dos resultados obti-
dos em função dos objectivos preconizados [e partici-
pação na decisão dos passos seguintes que se revelarem
necessários];
Democrático o processo deve desenvolver-se por interesse
P

da maioria dos cidadãos, contemplando igualmente


aqueles que revelaram menor interesse, mas que serão
igualmente afectados pelas mudanças;
Crítico deve exercitar a capacidade de questionar e ava-
P

liar não só a realidade ambiental, como também social,


cultural e individual, para permitir o desenvolvimento
de uma autonomia de reflexão e decisão;
Transformador este processo deve, pelo menos induzir
P

a mudanças de atitudes e comportamentos, burilando


com os valores individuais e de grupo;
Dialogante o processo deve sempre fundar-se no diálo-
P

go entre todos os participantes e também entre estes


e a sociedade envolvente. O facto de participantes directos,
num processo desta natureza, dialogarem e questionarem
questões ambientais com terceiros pode, em si mesmo,
ser considerado um indício de mudança;
Multidimensional os factos abordados devem ser com-
P

preendidos e discutidos integrando diversos aspectos


da realidade próxima e distante;
Ético neste e noutros processos educativos, a ética,
P

enquanto fundação de novos valores e novas éticas, que


dá prioridade à defesa da vida, da solidariedade e de
sustentabilidade sócio-ambiental, tem de ser uma dimen-
são de constante presença;
Afectivo e porquê? Porque estudos empíricos vários,
P

em todo o mundo, apontam para o facto de que o que


motiva os indivíduos, de forma mais duradoura, é tudo
aquilo que os afecta emocionalmente, e que é endógeno.
Da Educação Ambiental

Se for estabelecida uma relação afectiva com outros


participantes do processo ou mesmo uma relação emo-
cional com valores como justiça e/ou solidariedade ine-
rentes ao processo em curso, as probabilidades de partici-
pação activa dos indivíduos aumentam.
275
A partilha de resulta-
dos nas Festas
do Ambiente no final
de cada ano,
é uma marca indelével
na experiência
de um ano inteiro. §

3.3.3. Informação e Sensibilização


Não é possível sensibilizar sem informar, assim como a
informação ausente de sensibilização também não é eficaz.
Para ganharmos adeptos na educação ambiental, mesmo
contando com todos os recursos e suportes informativos
já existentes nos nossos dias, na área do ambiente, deve-
mos atender ao seguinte:
Focalizar e clarificar o nosso objectivo;
Contextualizar a nossa intervenção apesar de particular,
P

todas as acções, projectos e programas de educação


ambiental devem integrar uma estratégia maior de
intervenção, consoante o nível de acção: local, regional
ou mesmo nacional;
Seleccionar a informação mais relevante e validá-la o que
P

significa ajudar os nossos interlocutores a processar a infor-


mação e confiar na sua veracidade. Na área dos RSU,
por exemplo, existem “verdades relativas” em relação
à forma de deposição dos resíduos recicláveis;

Acções de sensibilização
para moradores. §
276
Transmitir a informação da forma mais adequada ao nosso
público alvo ter em atenção, idades, escolaridade, hábitos
P

de vida, contextos socioeconómicos, culturais e religiosos


e ainda [não menos importante] o tempo de que dispomos
para apresentação, exploração e sistematização da infor-
mação principal;
Contemplar os conhecimentos, representações e valores do
nosso público alvo, assim como atender às suas características
particulares [idade, contexto sociocultural, escolaridade, …].
Devemos ter em conta que informação e sensibilização não
são exactamente a mesma face da moeda. A informação
só será sensibilização se, de algum modo, nos afectar emo-
cionalmente de forma positiva ou negativa. Se a infor-
mação nos for indiferente, ela não aporta uma chamada
de atenção para olharmos numa determinada direcção
ou área, para um campo ou contexto que não “víamos”
ou que não nos interessava anteriormente.
Nesta perspectiva, a sensibilização ambiental é uma cha-
mada de atenção, se quisermos um “teaser”, para direccio-
narmos a motivação e o interesse dos nossos interlocutores.
Já a compreensão ambiental se relaciona com o processo que
se estabelece entre a divulgação de informações específicas
sobre o ambiente, ecossistemas e elementos constituintes,
características e funcionamento de relações biofísicas, e inter-
-relação com as dimensões vivenciais do indivíduo.
A responsabilidade ambiental [conducente a uma mudança
de atitudes e comportamentos] resulta, não só da compre-
ensão ambiental, mas também do facto do indivíduo se
protagonizar como elemento constituinte de ecossistemas
e, por isso, responsável pelas suas transformações.
E é esta responsabilidade ambiental que irá permitir uma
cidadania ambiental de efectiva participação na busca de
soluções para problemas ambientais [assim como de outros]
ou ainda na prevenção de possíveis riscos ambientais
previsíveis a partir do conhecimentos de comportamentos
ecologicamente desiquilibrados.
Da Educação Ambiental

3.3.4. Transferência de Competências


Saber fazer em ambiente, como noutras áreas, é mais
do que “seguir uma receita”: é aplicar conhecimentos numa
acção prática, que se acredita irá mudar alguma coisa
a favor do ambiente.
277
Apesar de serem as crianças mais novas, quem nos exige,
num primeiro plano, a concretização de ideias em acções [pe-
la sua necessidade de sentirem o mundo através dos senti-
dos e por ainda não conseguirem desenvolver complexas
elaborações cognitivas e representações da realidade], também
os jovens e os adultos necessitam de exercitar as suas capaci-
dades para se apropriarem da sua competência para a acção.
Nuns e noutros a absorção da competência adquirida será
necessariamente diferente, mais ou menos elaborada, mais
ou menos abrangente e contextualizada.
Por ser uma área transversal a diversas faces da vida
humana, é importante que todos os implicados sintam que
a sua acção particular faz a diferença. O que nos leva
a falar de uma outra dimensão que é a motivação.

3.3.5. Motivação
Podemos encontrar indivíduos auto-motivados para partici-
parem em eventos a favor do ambiente, desde a redacção
de um artigo num jornal, à elaboração de uma exposição,
à construção de uma casa gerida através de energias
renováveis, à representação de uma peça de teatro ... Para
estas pessoas, a gratificação emerge da satisfação de alcan-
çarem com êxito os objectivos a que se propõem, derivados
da sua motivação pessoal.
No entanto, muitos de nós, embora com sensibilidade para
L A educação para a as questões ambientais, necessitamos de um investimento
cidadania propõe-se
desenvolver nos extra para nos envolvermos em questões desta natureza.
alunos regras de É neste campo “fértil” que pode ser largada a semente
convivência, respeito
mútuo para além de da educação ambiental, por agentes persistentes, informados
promover a sua auto- e entusiastas.
estima e autonomia,
de forma a que se Para além do que já foi referido, a propósito da partici-
tornem cidadãos
responsáveis, pação, interessa-nos aqui salientar que a motivação dos
participativos e indivíduos poderá ser induzida do exterior mas o seu locus
informados na vida
da escola e da de controle deverá ser sobretudo interno. É a motivação
comunidade em que endógena [ou mesmo internalizada] que leva o indivíduo
estão inseridos,
reflectindo também a agir, mais do que uma simples instrução de realização
sobre os princípios de um conjunto de tarefas que, até podem ser lúdicas,
democráticos que lhes mas não acarretam consigo ganhos cognitivos e emocionais
estão associados.
para o indivíduo.
278
3.3.6. Crianças e Jovens - Agentes de Mudança
O sucesso de alcançarmos uma sociedade em harmonia
com o ambiente, dependerá da vontade e engenho das nossas
crianças e jovens.
Não esquecendo outros grupos da população, as crianças
devem ser o alvo principal do investimento educativo em
cidadania e educação ambiental, maximizando-se essa poten-
cialidade no espaço e vida da escola.
Apesar da sua pouca idade, as crianças podem agir como
catalizadores significativos de mudança de atitudes e com-
portamentos ambientais, tanto na comunidade, como no
meio familiar - se apoiadas por processos continuados
e eles próprios promotores da mudança.
As crianças revelam desde muito cedo a sua capacidade
de imitação dos adultos e também o seu desejo e ansiedade
para terem o seu próprio papel e reconhecimento. A inter-
venção das crianças nas atitudes e comportamentos ambien-
tais tem elevadas probabilidades de eficácia, se sentirem que
têm poder e que são apoiadas por adultos significativos.
Devemos mostrar-lhes a possibilidade de serem “Amigos da
Terra”, através de pequenas acções “amigas do ambiente”.
Deixá-las experimentar e sentir a satisfação que também
nós sentimos quando realizamos algo que sabemos ser
correcto ou bem feito, evitando a todo o custo que se
instale um sentimento de impotência do tipo “não vai servir
de nada!”.
O nível de consciencialização e conhecimento pode elevar-
-se através da ajuda dos pais aos filhos, tal como acontece
com os deveres escolares e actividades extracurriculares,
o nível de consciencialização e conhecimento pode elevar-

“Utilize o ecoponto”,
dizem as crianças
§ no Desfile de Carnaval.
279
Construção
de maquetes
a partir de materiais
de desperdício. §
-se por esta via. A discussão sobre temáticas ambientais
mais próximas [exemplo: porque é que nem toda a água
é potável?] pode, também, tornar-se parte do quotidiano
familiar e revelar simetrias de conhecimento benéficas
para pais e filhos. No entanto, nos estudos realizados por
Fontes et al.237, as crianças não iniciam espontaneamente
este tipo de discussões, a menos que o tema surja a propó-
sito do relato de uma actividade realizada na escola,
a pedido dos pais.
Já em relação aos jovens a perspectiva é ligeiramente dife-
rente. Quase adultos, já conseguem relativizar os problemas
apresentados e agir em conformidade com aquilo em que
acreditam ou representam poder ser a realidade. Sendo
detentores de informação correcta e apoiados nos seus pro-
jectos ou integrados em projectos já estruturados e dirigidos
a jovens238, podem cativar os adultos para as causas que
defendem com o seu entusiasmo.

3.4. O Papel das Entidades Educativas


3.4.1. A Escola
3.4.1.1. Enquadramento
O presente Currículo Nacional compreende um conjunto
de aprendizagens e competências que integram conhecimen-
tos, capacidades, atitudes e valores a desenvolver junto dos
Da Educação Ambiental

237
UZZEL, David: FONTES, Patricia Joyce; JENSEN, Bjarne Bruun; VOGNSEN,
Christian; UHRENHOLDT, Jean; KOFOED, Jens. As Crianças como Agentes
de Mudança Ambiental. Porto: Campo das Letras Editores, S.A., 1998.
238
Nestes projectos, a [in]formação, aquisição de competências próprias, acom-
panhamento e monitorização estão previstos.
280
alunos, ao longo de toda a escolaridade239. A Lei de Bases
do Sistema Educativo240 [no respeito absoluto da Consti-
tuição da República Portuguesa241] estabelece objectivos
de aprendizagem para a escolaridade obrigatória. As orien-
tações curriculares incluem a definição de competências trans-
versais e essenciais para cada disciplina e área curricular,
em cada um dos níveis de ensino.
Sendo a Escola um lugar privilegiado de aprendizagem,
é inegável a importância da educação para a cidadania
no meio escolar, em todas as suas etapas. Se nos lembrarmos
de que passamos parte significativa dos nossos dias na
escola [10 anos em média242], então a educação para a cida-
dania, a par da instrução lectiva, revela-se não só importante
como fundamental. Espaço relacional, de convivência social
e de formação pessoal243, a Escola é determinante para a for-
mação de cidadãos interventores e participativos.
Apesar de assuntos como os Direitos Humanos, o Ambiente,
a Saúde, o Emprego, entre outros, poderem [e deverem]
ser abordados em qualquer área curricular, pode também
acontecer que - num ou noutro momento - a escola sinta
necessidade de tratar academicamente e de forma isolada
um ou mais temas relacionados com o bem-estar dos indiví-
duos em sociedade, com tudo o que isso implica [o bem-
-estar físico, psíquico, social, económico, cultural, étnico
e religioso].
Através do Projecto Curricular de Escola244, ou mesmo do

239
Em 2005/2006, a escolaridade obrigatória em Portugal é o 9.º ano de
escolaridade [com os anos de ensino pré-escolar recomendados mas ainda
opcionais], mas aqui referimo-nos ao período de escolaridade desde o pré-
-escolar até ao ingresso numa escola técnico-profissional, ensino superior
ou outras formações específicas.
240
Lei de Bases do Sistema Educativo: Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro.
241
A nova Constituição da República Portuguesa entrou em vigor em 1976
[ após o período revolucionário iniciado a 25 de Abril de 1974] .
A Constituição a que nos referimos é a revista em 2004.
242
Valor médio [do pré-escolar ao final da escolaridade - 12.º ano].
Da Educação Ambiental

243
A Escola pretende a promoção de aprendizagens que levem ao conheci-
mento e à compreensão da realidade, para que os indivíduos desenvolvam
sentido crítico em relação ao mundo que os rodeia.
244
Projecto Curricular de Escola: É a adequação do currículo nacional ao con-
texto de cada estabelecimento de ensino. A responsabilidade é da Direcção
da Escola, do Conselho Directivo ou Executivo, ou de estrutura local respon-
sável pela gestão da escola.
281
Projecto Curricular de Turma245, as escolas podem optar por
desenvolver áreas vocacionadas para a valorização da Edu-
cação para a Cidadania. No primeiro e segundo ciclos de es-
colaridade, o projecto da escola pode passar por temas tão
abrangentes como: Higiene, Alimentação, Reciclagem de Resí-
duos, Água, Energias, Estações do Ano, Hortas Pedagógicas,
entre outros. Qualquer um destes temas permite um traba-
lho de exploração junto dos alunos, e de acordo com as suas
capacidades e potencialidades, de forma isolada ou inte-
grado nas próprias aprendizagens do “ler, escrever e contar”246.
Já no 3.º ciclo e no ensino secundário, a organização e fun-
cionamento das escolas é diferente. Os tempos lectivos podem
divergir e ser priorizados de diferente forma, entre discipli-
nas como a Formação Cívica e a Área Projecto; os Clubes
de Ambiente, a Aprendizagem Intercultural [Jornalistas,
Rádio, Investigadores]; para além das conhecidas visitas
de estudo e o estudo acompanhado. Em todas estas áreas,
a educação para a cidadania pode [e deve] acontecer, tendo
aqui a educação ambiental um lugar privilegiado. Sabendo-
-se que, frequentemente, os problemas ambientais resultam
da incúria da acção humana, é necessário preparar os indi-
víduos [e sobretudo, as crianças e os jovens] para agir
a favor de um desenvolvimento sustentável, quando iniciarem
o período de vida activa.
A concretização de acções e actividades educativas de edu-
cação ambiental ou educação para a cidadania depende
da iniciativa do docente - em regime de mono-docência,
como acontece no 1.º ciclo de escolaridade, ou em colabo-
ração com o Conselho de Turma, como é o caso dos 2.º
e 3.º ciclos e ensino secundário. Exceptuam-se as situações
em que são planificadas disciplinas específicas, onde o pro-
fessor responsável pela cadeira será o principal agente
- como no caso da Formação Cívica.

245
Projecto Curricular de Turma: Trata-se do Projecto Curricular da Escola,
especificado ao nível de uma turma particular. A responsabilidade deste
projecto é do/a professor/a titular da turma, em colaboração com a
direcção da escola ou conselho de docentes ou de turma, ou, no caso do
Da Educação Ambiental

ensino secundário é da responsabilidade do conselho de turma em cola-


boração com o director de curso respectivo.
246
Pode ser seleccionado um texto de leitura que conte uma história sobre
qualquer aspecto ambiental, da vida dos animais e das plantas, da acção
do Homem nos rios, da mudança das estações, ou ainda sobre perso-
nagens mediáticos que representem preocupações ambientais e que sejam
heróis actuais das crianças e jovens.
282
3.4.1.2. Os Currículos Escolares - O caso Português
A Lei de Bases do Sistema Educativo de 1986 determinou
que “os planos curriculares do ensino básico incluirão em
todos os ciclos e de forma adequada uma área de forma-
ção pessoal e social, que pode ter como componentes
a educação ecológica, a educação do consumidor, a educação
familiar, a educação sexual, prevenção de acidentes, a edu-
cação para a saúde e a educação para a participação nas
instituições, serviços cívicos e outras do mesmo âmbito”247.
O Decreto da Reforma Curricular de 1989 previu 4 estra-
tégias de formação pessoal e social - não só para o ensino
básico, mas também para o ensino secundário - em confor-
midade com anterior recomendação do Conselho Nacional
de Educação, denominadas:
Estratégia transdisciplinar todas as componentes de ensi-
P

no devem contribuir de forma sistemática para a formação


pessoal e social dos indivíduos;
Estratégia multidisciplinar a Área-Escola não sendo uma
P

disciplina, é curricular e beneficia da contribuição e cola-


boração das várias disciplinas e respectivos docentes;
Estratégia disciplinar a criação de uma disciplina
P

específica de formação e desenvolvimento pessoal e social;


Estratégia de complemento curricular às actividades P 

de complemento curricular são atribuídos também objecti-


vos de formação pessoal e social.
Ainda assim, seja sob a designação da Formação Pessoal
e Social, ou de Educação para a Cidadania, já existem
múltiplas oportunidades curriculares que permitem aos
jovens aceder - no quadro da educação formal - a alguma

Jogo “Missão
Ambiente”:
§ actividade de grupo.

247
N.º 2, art..º 47.º, Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro.
283
informação ambiental integrada nas disciplinas [por exem-
plo: nas ciências naturais e na Área-Escola]. Todavia, continua
a ser necessário um maior investimento na formação dos
processos de participação cívica, regras de jogo democrático,
dos direitos e deveres, desde a comunidade escolar, à Autar-
quia, à escala nacional e outras.
Dependendo da maior ou menor sensibilidade relativa-
mente às questões ambientais, haverá uma diferenciação
de investimento nas acções educativas transversais que
versem sobre matérias ambientais, já que não há a nível
nacional, o estabelecimento de objectivos específicos a cum-
prir, por determinados períodos de tempo - tal como acon-
tece, por exemplo, com os manuais escolares. Face a esta
realidade, professores e formadores de educação para a cida-
dania, de formação pessoal e social e mesmo de educação
ambiental, muitas vezes optam por contextualizar apenas
localmente a sua intervenção, perdendo-se aqui e ali a noção
do impacto que o conjunto destas acções isoladas pode ter.
Deste modo uma Estratégia Nacional de Educação Ambiental
carece da definição por anos lectivos, segundo níveis de
ensino, o que constituirá uma mais-valia a considerar num
futuro próximo.
Recorrendo aos recursos existentes, os professores e as escolas
podem, todavia248:
a] Desenvolver sessões de sensibilização para grupos de
P

alunos suportadas por documentação escrita e/ou audio-


visual;
b] Preparar e realizar com os alunos exposições temá-
P

ticas sobre ambiente ou complementar outras exposições


nas escolas com “curiosidades ambientais”;

Festa de final de ano


em estabelecimento
de ensino do 1.º ciclo. §

248
Ver exemplos de actividades já desenvolvidas no anexo 5.
284
c] Dinamizar projectos específicos com a colaboração
P

de várias áreas disciplinares: por exemplo sobre a água,


o ar, as energias ...;
d] Implementar sistemas de recolha selectiva de resí-
P

duos dentro da escola;


e] Realizar visitas de estudo de interesse ambiental com
P

preparação, acompanhamento e avaliação, a par da inte-


gração nos currículos escolares adequados;
f] Participar em acções de escolas vizinhas e promover
P

intercâmbios escolares;
g] Elaborar e distribuir materiais de informação com
P

a participação dos alunos;


h] Criar Clubes do Ambiente na Escola e apoiar os alu-
P

nos na dinamização desses Clubes;


i] Discutir e fazer aprovar conteúdos curriculares para
P

a Área-Escola que propiciem a educação ambiental


para a cidadania e para o desenvolvimento sustentável.

3.4.1.3. Escolas Técnicas, Profissionais e Universidades


A educação ambiental nas escolas técnicas e profissionais
deve sobretudo chamar à atenção para o facto de existi-
rem profissões - tais como: Técnicos de Ambiente, Guardas
Florestais, Engenheiros do Ambiente, Arquitectos Paisagistas,
etc. - cuja acção contribui para minorar os impactes
negativos da acção humana no ambiente.
Nas Escolas Superiores e Universidades, em que a diversi-
dade de cursos é elevada e os interesses dos académicos
docentes e discentes se multiplicam, a Educação Ambiental
acontece através da realização de eventos dinamizados por
grupos de alunos e para alunos - de colóquios, seminários,
workshops e exposições sobre temas ambientais variados
que podem ir desde: “Do filão de petróleo” às “Energias
Renováveis”, ou “Da vida no campo” à “Fábrica de Sonhos
Virtual”, ou ainda, da “Vida da Formiga” à “Biografia de
Bill Gates”. Pode também estar presente através da gestão
energética dos edifícios e/ou da informação sobre a utili-
Da Educação Ambiental

zação das energias.


Devem ser incitadas, promovidas e apoiadas pelas Escolas
Superiores, Universidades e outras Entidades Educativas dis-
cussões e apresentações abrangentes, acções que incomo-
285
dem consciências e alertem para a necessidade de agir de
forma informada a nível ambiental e em particular acções
que motivem a participação activa dos indivíduos.
No contexto do ensino profissional, a Educação Ambiental
e a Educação para a Cidadania têm uma dimensão trans-
versal no processo de ensino-aprendizagem, que deve estar
sempre presente e ser valorizada em todos os contextos
educativos.
A investigação sobre as temáticas do ambiente249, embora
não seja propriamente educação ambiental e a divulgação
dos seus resultados, é um contributo valioso para o
entendimento de como a acção do Homem pode beneficiar
ou prejudicar o ambiente.
Uma outra área de investigação que importa realçar é a
área das ciências sociais e humanas sobretudo ao nível da
psicologia comportamental, cognitiva e social, assim como na
área educativa, para que, com base e sustentação técnico-
-científica, possamos ensaiar e desenvolver novas estratégias
de intervenção e mobilização dos indivíduos, indo ao encon-
tro dos seus interesses a favor de uma sustentabilidade
ambiental.

3.4.1.4. A Educação Ambiental e o Mundo do Trabalho


A Educação Ambiental também não deve ser esquecida nos
contextos empresariais ou de serviço público [como as esco-
las, hospitais, autarquias, serviços sociais e outros]. A sua
presença revela-se através de: implementação de sistemas
de controlo e redução de energia; instalação de sistemas de
reaproveitamento de produtos não comercializáveis; coloca-
ção de fontes de energia não tradicionais; triagem dos
resíduos produzidos no local de trabalho; consumo de consu-
míveis menos poluentes; utilização de tecnologias mais
limpas; etc.
Da Educação Ambiental

249
De que são exemplos o estudo das alterações climáticas, movimento
dos glaciares, forças eólicas, movimentos tectónicos, sismologia, estudos
sobre o desenvolvimento das diversas espécies de animais e plantas, força
das marés, poluição atmosférica, poluição dos recursos hídricos, ruído, etc.
286
Formação
para técnicos
de Gabinete
de instituições
com actividade junto
§ das comunidades locais.

A certificação ambiental [ISO 14000 e 14001] é um instru-


mento de incentivo às boas práticas em matéria de ambiente
ao nível empresarial. Traduz-se na valorização da imagem
ambiental da empresa, com benefícios significativos na re-
dução dos impactes ambientais da sua actividade.
No mundo do trabalho, a educação ambiental pode e deve
acontecer, constituindo um instrumento indutor de eficiência.
Compreender o porquê das “regras amigas do ambiente”
justifica o desenvolvimento de acções [in]formativas e de
sensibilização extensíveis a todos os níveis profissionais,
de forma a obter colaboradores críticos, informados e partici-
pativos no sistema.

3.4.1.5 A Família
A família é o primeiro agente educativo de qualquer
indivíduo, por isso, faz sentido não esquecer este “micro-
sistema” que tanta influência tem na educação e desen-
volvimento das crianças e dos jovens. Independentemente
do seu tipo de organização ou estrutura, mais restrita
ou mais alargada, mais ou menos convencional, influência
e é influenciável pelos seus elementos mais novos.
Se podemos “levar” a educação ambiental até cada família,
através das crianças e dos jovens com quem trabalhamos,
também devemos promover a sua participação enquanto
Da Educação Ambiental

grupo em acções educativas, de teor ambiental e de


cidadania. Estar informado, reflectir, agir com sentido
crítico em questões relativas ao ambiente, é tarefa que
não tem limite à vista e que é válida para o indivíduo,
famílias, comunidade, organizações e população em geral.
287
Em Portugal já existem projectos dirigidos às famílias250,
sobretudo nos grandes centros urbanos. Todavia, é neces-
sário um maior investimento na oferta e na diversidade
destes projectos educativos, a custos reduzidos, de forma
a facilitar a motivação e participação de todos251.

3.5. Olhando para a Floresta

Atendendo aos objectivos da Educação Ambiental, enquanto


parte integrante da Educação para a Cidadania, sabendo
das inter-relações envolvidas, das influências mútuas de
várias dimensões humanas [pensar, sentir, agir] e do meio
[escola, família, trabalho, sociedade, Natureza], sabendo que
o Homem persegue os seus valores e é tanto mais “activo”
quando mais motivado ou envolvido emocionalmente
estiver com alguma coisa [ou alguém], apresentamos esta
metáfora da floresta, tão infinitamente rica de níveis de
intervenção, de diversidade individual, nacional, internacio-
nal … onde todas as “árvores” se alimentam de uma
mesma Terra, se interligam nos seus ramos estendidos e
criam novas formas de existir e co-existir, se revelam únicas
mas integradas num ambiente aparentemente homogéneo
mas que sabemos é muito diverso à volta do Mundo252.
É nesta perspectiva aqui metamorfoseada e imensa que
acreditamos na Educação e Cidadania Ambiental.

250
Importa aqui ressaltar o aumento de projectos para pais em todo o país
através das “Escolas de Pais”.
251
Alguns exemplos são: os Museus; o Oceanário - em Lisboa; O Jardim
Zoológico - Lisboa; as Quintas Pedagógicas - um pouco espalhadas por
Da Educação Ambiental

todo o Portugal; o Visionarium, na Feira; o Centro de Recuperação do Lince


Ibérico, na Serra da Malcata; ou o Museu-Laboratório e Jardim Botânico,
em Lisboa, entre outros.
252
É muito importante a existência de redes locais, nacionais e internacionais
para que o conhecimento flua facilmente à volta do Globo e se desen-
volvam estratégias das catástrofes ambientais, sobretudo preventivas,
de forma concertada e não dispersa.
288
Processo Ensino-Aprendizagem

289
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

180
IV A História da Higiene e Limpeza Urbana em Lisboa
P
CAPIT
31
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

292
1. Até ao Terramoto de 1755

A história da formação da cidade de Lisboa perde-


-se na memória dos tempos, datando de 138 a.C.
a primeira referência à romana Felicitas Iulia Olisipo253.
Na verdade, desde 2000 anos a.C. que Monsanto recebera
os primeiros núcleos de povoação humana e, depois dos
romanos, os árabes254 aqui permaneceram até à conquista
da cidade por D. Afonso Henriques255.
A formação e consolidação da nacionalidade [séc. XII] faz
com que Lisboa vá adquirindo centralidade e importância
em que, a par de uma crescente população, se afirma
como capital do reino [D. Afonso III - 1256].
Mantendo a influência da traça mourisca, a formação,
constituição e afirmação da nacionalidade até ao século XVIII
transformam a cidade num burgo rico, de elevada
densidade populacional e forte movimento mercantil.
Nas Memórias de Lisboa256, Rómulo de Carvalho de uma
forma breve e rica conduz-nos pelo ambiente desta cidade
até ao Terramoto de 1775:
“Nos primeiros séculos da nacionalidade toda a zona que
vai actualmente desde o Largo do Pelourinho, passando pelo
Terreiro do Paço, até alturas da Conceição Velha, era uma
extensa e larga praia, ao norte da qual a pequena cidade
se acumulava nas encostas das colinas sobranceiras ao Tejo.
O local prestava-se, optimamente, para incursões de piratas
pelo que D. Dinis, em 1294, mandou construir uma muralha
a todo o comprimento da referida praia, com fortes torres,
robustas paredes e portas espessas, bem aferrolhadas […].
Anos mais tarde, em 1372, quando Henrique de Castela
sitiou Lisboa, reconheceu-se que a muralha de D. Dinis era
insuficiente para a defesa da cidade. Serenada a guerra,

253
Até ao Terramoto de 1755

SERRÃO, Joel. Dicionário de História de Portugal. Porto, Livraria Figueirinhas,


1979, vol. VI, p. 659.
254
Os árabes permaneceram na cidade entre 714 e 1147 [DIAS, Marina Tavares;
Lisboa Desaparecida. Lisboa, Imprensa Municipal, tomo 1, 1990].
255
Idem.
256
RÓMULO de CARVALHO. Memórias de Lisboa. Lisboa, Relógio d´Água, 2000,
p. 12 a 19.

293
o rei de então, D. Fernando, mandou construir uma segunda
muralha, à frente da primeira, do lado do rio, e que
devidamente prolongada envolvia toda a cidade […].
Com o decorrer dos anos foi-se procedendo ao aterro
da praia até que D. Manuel [séc. XVI] mandou aplanar
a parte central e fazer daí um terreiro onde se instalou
um mercado, em melhores condições, não só do peixe
como de tudo o mais.
Nesse tempo o palácio real, que já vinha dos antigos reis,
ficava situado no cume da colina onde hoje se encontra
o Castelo de São Jorge [reconstruído] e daí D. Manuel
descia, frequentemente, até ao terreiro para ver trabalhar
os carpinteiros das naus […] no sítio denominado RIBEIRA
DAS NAUS.
[…] o rei mandou construir um palácio, ali mesmo,
na zona ribeirinha.
[…] Não se passou muito tempo sem que o rei sentisse
a exiguidade das instalações, não só pela consciência
da grandeza pessoal que ia adquirindo com a expansão
dos descobrimentos, como pela intensificação do comércio
com a Índia […].
Foi a partir da construção do paço que o terreiro da ribeira
passou a ser conhecido por TERREIRO DO PAÇO […].
Pela sua vastidão era aí que se efectuavam as corridas
de touros e que desfilavam as intermináveis procissões
do Santo Ofício […].
Em 1609, durante a ocupação castelhana, Filipe II [em Por-
tugal] mandou fazer obras no paço da Ribeira […].
O aspecto do conjunto melhorou muito, mas o açougue
que distribuía a carne para toda a Lisboa, continuava
a funcionar no Terreiro do Paço, e era também aí que
se iam lançar as imundícies da cidade.
D. João IV, após a Restauração, proibiu tais desacatos,
mandou limpar o terreiro e pôs-lhe ao centro um chafariz
de quatro bicas, encimado por um Apolo […].
Foi nessa época, e nesse local, que se iniciou a revolução
Até ao Terramoto de 1755

de 1640, em que Miguel de Vasconcelos foi lançado de uma


das janelas do paço para o Terreiro […].
O Paço da Ribeira chegou ao século XVIII recheado com
as riquezas acumuladas durante os Descobrimentos e, com
D. João V, atingiu o auge do esplendor […] Perto do Paço,
294
D. João V mandou construir [1716] a catedral Metropolitana
e Patriarcal de Lisboa [mais ou menos onde se encontra
hoje a Igreja de São Julião], sumptuosa; e D. José, a Casa
da Ópera [1753], de 120 m de frente [correspondente
ao edifício do arsenal da Marinha na parte voltada para
o Largo do Pelourinho].
Assim era a extensa zona ocupada pelo Paço da Ribeira
e edificações anexas, às 9 horas e 40 minutos da manhã
de sábado, dia 1 de Novembro de 1755.”
Como vimos, embora tenham existido algumas preocupa-
ções pontuais com a limpeza dos burgos “[...] na Europa
cristã medieval […] não existiam hábitos de higiene
pessoal nem de salubridade pública. As condições sanitárias
ambientais eram péssimas. As cidades medievais não tinham
sistemas de saneamento básico. Os despejos domésticos
eram feitos para a via pública.
Quanto à tradição romana dos banhos públicos, de algum
modo valorizada pela medicina judaica e árabe na Península
Ibérica, sabemos como ela foi duramente combatida pelo
cristianismo: por exemplo, homens da Igreja como São Jeró-
nimo [343-420] não viam razões válidas para um cristão
tomar banho depois do baptismo, se bem que na planta
arquitectónica do célebre mosteiro de Sant Gallen [séc. IX]
estivessem previstas latrinas e balneários [Graça, 1996].
Refira-se que este preconceito teológico em relação aos
cuidados de higiene corporal vai ter consequências nefastas
na saúde da população europeia …”257.
Na Lisboa, cuja população se adensou ao longo dos
séculos258, a salubridade colocou, aos monarcas, desafios
difíceis de ultrapassar. A frequência e persistência de doenças
epidémicas era favorecida pela escassez de águas, pelo
lançamento de detritos para as ruas ou para o rio, bem

257
GRAÇA, Luís. Representações Sociais da Saúde, da Doença e dos Prati-
cantes da Arte Médica nos Provérbios em Língua Portuguesa. 2000.
Fonte: http://www.ensp.unl.pt - [Setembro 2005].
258
À data da conquista da cidade, Lisboa tinha 15 000 habitantes
Até ao Terramoto de 1755

e 15 hectares e meio de extensão. Com a construção da cerca fernan-


dina, a área do burgo alarga-se até aos 105 hectares comportando uma
população que entre os séculos XV e XVII passou dos 50 000 habitantes
aos 100 000 habitantes, onde abundavam marinheiros, soldados, cambis-
tas, mercadores, artífices, frades e mendigos, a par de uma forte pre-
sença estrangeira. Durante o domínio filipino, em 1626, eram recen-
seados 126 000 residentes. [In: DIAS, Marina Tavares. Lisboa Desaparecida.
Lisboa, Quimera, Tomo 1, 1990].
295
como por uma relação permanente com povos de nações
diversas, proporcionadas pelo Porto do Lisboa e por toda
a actividade ligada às Descobertas.
O povo vivia na rua. Amontoava-se entre as galinhas,
os monturos e as centenas de cães e gatos que faziam
o “aproveitamento” dos restos que encontravam. Desconhecia
a importância da higiene na saúde e estava impossibilitado
de ter hábitos de higiene devido à falta de água e de esgo-
tos. Frequentemente era assolado por febres originadas
pela falta de limpeza e pelos maus cheiros daí resultantes
que se faziam sentir em toda a cidade e que provocaram
entre a população, nos séculos XV e XVI, graves crises de mor-
talidade. Refere-se, a título de exemplo, a peste que
grassou durante o cerco a Lisboa259, em 1384, matando
entre as tropas castelhanas 150 a 200 homens por dia;
e a que aconteceu em 1414 e conduziu à morte de D.ª Filipa
de Lencastre.
“Em cortes de 1434 afirma-se o mau estado de salu-
bridade do país. Nos fins de Agosto de 1437 deram-se em
Lisboa e arredores casos mortais de pestes. Sobre a sua
profilaxia e tratamento realizaram-se conferências públicas
semanais, tendo o rei aprovado um sistema de medidas
sanitárias apresentado pela Câmara de Lisboa”260. No Leal
Conselheiro, D. Duarte ao abordar o problema da peste
é de opinião que se abandonassem os lugares infestos261.
As pestes ocasionadas pela insalubridade das ruas atormen-
tavam os poderes públicos. Renovam-se as medidas surgindo,
então, para auxiliar o trabalho dos “carretões”262, as “negras
calhandreiras”263 que transportavam as imundícies apanha-
das nas ruas para as praias.
O crescimento desordenado da cidade [edificado e arrua-
mentos], a ausência de saneamento e a escassez na distri-
buição de água, a par da falta de dinheiro do Senado264,
contribuíram para que a Limpeza da Cidade fosse tratada

259
Crise de 1383-1385 que veio culminar na proclamação de D. João I dando
início à dinastia de Aviz.
260
Até ao Terramoto de 1755

Epidemias. In: SERRÃO, Joel [coord]; Dicionário de História de Portugal.


Porto, Livraria Figueirinhas, 1979, p. 407.
261
Idem.
262
Homens com carroças que transportavam as imundícies para as praias.
263
Designação dada às escravas negras que trabalhavam para as vendedoras
dos mercados.
264
Estrutura que funcionava ao nível da gestão da cidade.
296
durante o século XV265, com medidas pontuais que tentavam
minorar o estado imundo em que as ruas se encontravam.
Só as regulares procissões, cortejos, casamentos e baptizados
reais permitiam alguma limpeza nas ruas.
D. João II266, entre 1485-1495, emanou diversas cartas régias
e alvarás, ordenando a limpeza da cidade e dos canos das
habitações, proibindo o abandono de sujidades nos quin-
tais descobertos e fixando o seu local de lançamento.
Chamou a si a resolução de questões sobre limpeza, às quais
o Senado não conseguia responder por transcenderem
as suas competências267.
“As ruas afogavam-se em estrumeiras; quem podia, só as
transitava a cavalo. Canos, apenas mencionados no regimento
municipal de 1502, só ao findar do século XVI é que tinham
traçado figurável - tudo parcelar e desconexo, contando-se
tão-somente dois canos reais”268.
Talvez o marco mais importante de todo o tipo de medidas
tomadas por D. João II seja a Carta Régia de 1486, na
qual o monarca ordenava que nas freguesias existissem
homens pagos pelos próprios moradores para “averem
dallimpar a cidade”.
Nos anos de 1500 Lisboa era uma cidade populosa com
18 000 casas distribuídas por 270 ruas e 89 becos e
cerca de 50 000 ou 60 000 habitantes [podendo atingir
os 100 000 habitantes, segundo alguns autores], oriundos
não só das diversas províncias do Reino como das terras
recentemente descobertas. O Tejo, local de partida e chegada
das naus da Índia, era também o local de despejo das
imundícies da cidade269. Não é, pois, de estranhar que a sa-
lubridade da cidade continuasse a ser uma preocupação
de D. Manuel270, o qual legislou sobre esta matéria ora

265
Que coincide com o período que vai de D. João I a D. João II, durante
o qual se inicia o expansionismo português, primeiro para África
e depois através da Descoberta de novas Terras.
266
1481-1495.
Até ao Terramoto de 1755

267
Ibidem.
268
Nas palavras de Ricardo Jorge citado por GRAÇA, Luís. Representações
Sociais da Saúde, da Doença e dos Praticantes da Arte Médica
nos Provérbios em Língua Portuguesa. 2000.
Fonte: http://www.ensp.unl.pt [Setembro 2005].
269
Demografia. In: SERRÃO, Joel. Dicionário de História de Portugal. Porto,
Livraria Figueirinhas, 1979, Tomo II, p. 281-286.
297
fixando o “logar onde se deveriam lançar os estercos” ora
obrigando todos, sem excepção, a contribuir para a limpeza
e higiene da cidade.
Contrariamente à prática generalizada de enterramento
da época, este monarca também determinou, para sanear
a cidade, a abertura de dois poços para colocar os cadáveres
da colónia negra existente em Lisboa271, que até então
[1515] eram lançados no monturo de Santa Catarina, na
praia de Santos ou atirados para herdades dos arredores272.
Apesar das preocupações dos reis, segundo dados de 1552,
o número de “homês que andã cõ suas carretas pela cidade,
allimpando da lama e as mais sugidades” não passara ainda
de quatro.
No reinado de D. Sebastião273 - que considerava a limpeza
como “cousa principal” e importante - foi emitido um
Alvará determinando que “homes com carretões, e bestas
na parte em que os carretões não poderem servir, limpem
as imundices e as levem aos lugares para isso deputados,
à custa dos moradores das ditas ruas, travessas e becos”.
Esta determinação isentava do pagamento da contribuição
os “visitados pelas Misericórdias e outras semelhantes”.
Como forma de melhorar quer a execução e fiscalização
da limpeza quer a gestão deste serviço, aumentou em
dois o número de almoçatéis da limpeza, que ficaram
a perfazer o número de seis, e repartiu a Cidade em seis
bairros274.
Pestes sucessivas assolaram o final dos anos de Mil e Qui-
nhentos [1580, 1598 e 1599]275. Em 1607, o Senado deter-
minou que as intervenções da limpeza se fizessem por conta
do “real da água”276 e que, em todos os bairros, se utili-

270
1494-1521.
271
O Poço dos Mouros e o Poço dos Negros. O topónimo de “Poço dos
Negros” existente ao fundo da Calçada do Combros [MARQUES, António.
Os negros na Lisboa quinhentista. In: Jornal de Artes e Letras. Fonte:
http://www.eomais.cjb.net [Setembro 2005] e GRAÇA, Luís. Representações
Sociais da Saúde, da Doença e dos Praticantes da Arte Médica nos Provér-
Até ao Terramoto de 1755

bios em Língua Portuguesa, 2000. Fonte: www.ensp.unl.pt [Setembro 2005].


272
Idem.
273
1556-1578.
274
OLIVEIRA, Eduardo Freire de. Elementos para a História do Município
de Lisboa. Lisboa, Tipografia Universal, 1898.
275
Demografia In: SERRÃO, Joel. Dicionário de História de Portugal. Porto,
Livraria Figueirinhas, 1979, Tomo II, p. 281-286.
298
zassem os “carretões e ribeirinhos”277, já que a verba prove-
niente das contribuições dos moradores era insuficiente
para custear esta tarefa.
Apesar do seu papel mais modesto, durante o domínio
filipino, Lisboa continuou a crescer: “Em 1620, segundo
Fr. Nicolau de Oliveira, Lisboa contava 27 000 fogos
e 165 000 pessoas, das quais 10 000 seriam escravos,
6000 estrangeiros e 3000 frades e freiras”278 e ciganos,
sendo que em 1642 a população da cidade se aproxi-
mava dos 200 000279 habitantes”.
Em 1661, Nuno de Mendonça, Conde de Vale de Reis [então
Presidente do Senado de Lisboa] ordenou que a cidade fosse
dividida em bairros e que aos respectivos ministros se aco-
metesse a obrigação de olharem pela limpeza, para o que
lhes deu dinheiro e o “rol dos monturos”.
Mais tarde, ainda no século XVII, com Garcia de Melo na
Presidência do Senado, os Serviços melhoraram um pouco.
Na sequência de um empréstimo, faz-se a aquisição de
“seis carros de duas rodas”, sendo que em cada um deles
“andarão dois homens para limparem as ruas e as gover-
narem”. Uma das condições impostas era que todo o serviço
deveria estar concluído até às 9 h da manhã e, para além
disso, os moradores que até então pagavam “um vintém
por cada sobrado e dois o que estiver com tenda debaixo
dele ou em outra parte” não seriam sobrecarregados com
novas contribuições280.
Posteriormente, no princípio do século XVIII281, cria-se um

276
O real da água surgiu no tempo de D. João em substituição da anú-
duva que no tempo se dirigia à edificação. “O real de água atravessou
diversas fases, tanto no valor das taxas cobradas, como na sua apli-
cação. Às câmaras competiam sempre os encargos da cobrança e da
administração, mas o produto do imposto revertia, no todo ou em
parte, em benefício da coroa” [SERRÃO, Joel. “Dicionário da História
de Portugal.” Porto, Livraria Figueirinhas, Tomo 1, 1979, p. 238].
277
OLIVEIRA, Eduardo Freire de. Elementos para a História do Município
Até ao Terramoto de 1755

de Lisboa. Lisboa, Tipografia Universal, 1898.


278
SERRÃO, Joel. Dicionário da História de Portugal. Porto, Livraria Figueirinhas,
Tomo 1, 1979, p. 238.
279
Idem, citado no Decreto de 10 de Julho de 1642 in: CHABY, Cláudio.
Synopse dos Decretos do extinto Conselho de Guerra.
280
OLIVEIRA, Eduardo Freire de. Elementos para a História do Município
de Lisboa. Lisboa, Tipografia Universal, 1898.
299
outro imposto [resultante da imposição de um novo
adicional sobre a venda da carne e do vinho] denominado
“realete da limpeza”, deixando os habitantes da cidade
de ter que contribuir directamente para a limpeza das ruas.
Os Decretos de 1738 e 1746 determinaram que “nenhum
morador lance ou mande lançar águas ou lixos nas ruas,
nem de dia, nem de noite, senão depois do sino corrido”,
tendo estas medidas contribuído para melhorar o aspecto
da Cidade, apesar de não serem cumpridas por todos282.

2. De 1755 ao final do Século XIX

A visão estratégica do Marquês de Pombal, após


o Terramoto de 1755, foi a oportunidade de renasci-
mento da cidade de Lisboa. José Augusto França
sintetiza283:
“No século XVIII português, o único acontecimento verda-
deiramente original foi o terramoto de 1755 - e o nasci-
mento de uma cidade que disso foi consequência. Esta é
a última das antigas cidades da Europa e a primeira
das cidades modernas”.
“A Lisboa do século XIX desenvolveu-se à medida do país,
sem programa urbano nem modelo social, fosse ele refor-
mista ou utópico: faltou-lhe uma filosofia, como lhe faltou
a necessidade pragmática que lhe determinaria uma política

281
“Em 1702 adicionou-se mais um real no vinho e outro na carne, mas
com a condição, imposta por D. Pedro II [1683-1706], em 10 de Julho
daquele ano, de que o novo tributo se aplicaria exclusivamente à
limpeza da cidade e à reparação dos caminhos públicos e calçadas
extramuros. Recebeu este novo imposto o nome de realete ou realete
da limpeza”. In: SERRÃO, Joel. Dicionário da História de Portugal. Porto,
Livraria Figueirinhas, Tomo 1, 1979, p. 238.
De 1755 ao final do Século XIX

282
OLIVEIRA, Eduardo Freire de. Elementos para a História do Município
de Lisboa. Lisboa, Tipografia Universal, 1898.
283
FRANÇA, José Augusto. Lisboa Pombalina e o Iluminismo. Lisboa, 2.ª ed.,
Bertrand, 1977, p. 296; FRANÇA, José Augusto; Lisboa Oitocentista. Lisboa,
Academia Nacional de Belas-Artes/Fundação Calouste Gulbenkian
[exposição documental] - [Citado por FERREIRA, Vítor Matias. A cidade
de Lisboa: de capital do império a centro da metrópole. Lisboa, Dom
Quixote, 1987, p. 75].
300
[…]. Só no ocaso Rosa Araújo esboçou idealisticamente
um novo destino urbano de que Ressano Garcia tirou
consequências, na charneira materialista dos dois séculos”.
Sob o traço de Eugénio dos Santos e Carlos Mardel, a nova
Lisboa foi reconstruída com a orientação da racionalidade
iluminista da época, conferindo à cidade uma estrutura
orientada pela funcionalidade, onde a par de áreas de habi-
tação e mercantis se evidencia as da gestão político-admi-
nistrativa - o Terreiro de Paço - e a convivial - o Passeio
Público.
“… o Passeio Público foi, no dizer de Júlio Castilho, um
dos filhos dilectos do Marquês de Pombal; um dos instru-
mentos mais eficazes que teve o grande pensador para
amalgamar as classes”284.
E ao mesmo tempo que reconstruía a cidade, o Marquês
de Pombal decidiu concentrar a limpeza, a iluminação e a
guarda a cavalo da cidade, numa única instituição, a In-
tendência de Polícia, atribuindo as despesas aos habitantes
de Lisboa - “segundo o aluguel que pagarão” as lojas
e casas de pasto, as estalagens e os estrangeiros que de
novo entram na cidade285.
Por Decreto de 20 de Maio de 1780 foram transferidas,
também, para a Intendência Geral da Polícia, a adminis-
tração e arrecadação dos reais e realete da carne. Este
produto era aplicado às despesas de reedificação e con-
serto de pontes, bem como às calçadas, fontes e limpeza
da cidade. Ficou assim a administração do concelho sem
estes serviços e rendimentos286.
Em 1823, por Carta de Lei de 7 de Abril, o serviço da
limpeza da cidade passou a ser, conjuntamente com a ilu-
minação, uma competência do Município de Lisboa. Para
tal, pagava o Governo, a dotação anual de oitenta e quatro
contos de réis: sessenta contos para a iluminação e vinte
e quatro para a limpeza287.
De 1755 ao final do Século XIX

284
DIAS, Marina Tavares. Lisboa Desaparecida. Lisboa, Quimera Editores,
7.ª ed., Vol. I, 1991, p. 51.
285
Idem.
286
SERRÃO, Joel. Dicionário de História de Portugal. Porto, Livraria Figueirinhas,
omo 1, 1979.
287
Idem.
301
Sabemos que em 1835, de acordo com Lisboa Antiga
de Júlio de Castilho, a remoção do lixo era efectuada
“... por meio de carroças numeradas e puxadas a muares,
que através do toque da campainha anunciavam aos mora-
dores a passagem dos carretões”.

Carroça
“Carro de recolha
de lixo puxado por
boi” [In: Costume of
Portugal - Henri L'
Êveque, 1806(?)
mencionado por
Nuno Madureira.
In: Luxo e Distinção,
ed. Fragmentos]. §

O Pelouro da Limpeza.
1855.
Autor: D. Fernando II. §

Tardiamente, e por essa altura, o país desperta para a indus-


trialização, com a chegada da máquina a vapor, em 1835.
Apesar do predomínio da força motriz ser ainda humana
e animal, a máquina a vapor ganha espaço nas pequenas
concentrações industriais de Lisboa e Porto. Em 1852
existiam já 70 unidades com uma potência instalada
De 1755 ao final do Século XIX

de 983 cv288.
A política de transportes da Regeneração289 [caminhos
de ferro e estradas] liga o país e abre-o ao exterior.

288
Ibidem, Regeneração.
289
Inicia-se em 1850.
302
Lisboa cresce e acompanha este movimento. Entre 1852
e 1857290 é construída a Estrada da Circunvalação, o que
constitui um facto política e administrativamente signi-
ficativo “abstraindo as cercas medievais construídas para
fins defensivos da Cidade” e que “pela primeira vez, foi
o Município de Lisboa demarcado por uma linha de limites,
contínua e nitidamente definida”, atingindo uma área
de 1278 hectares291. À iluminação pública a azeite do tempo
de Pina Manique292 sucede a de óleo de purgueira [1842],
rapidamente substituída pela do gás [1848]. No final
do século [1880] surgiu a luz eléctrica, sendo que os últimos
candeeiros a gás do centro de Lisboa se apagaram perto
do Campo de Santana, já nos anos de 50 do século XX293.
O transporte público vulgarizou-se294 e a tracção animal é
sucessivamente substituída pela tracção a vapor [1867],
pelo carro eléctrico [1873] e no século XX pela motorização.
A abertura da Avenida da Liberdade - por que tanto se
bateu o Vereador e depois Presidente da Câmara Rosa Araújo
- e da Av.ª 24 de Julho, ajudam a expandir os horizontes
da cidade.

De 1755 ao final do Século XIX

§ Torre Belém [1855].

290
Incluía as áreas de Alcântara, Prazeres, Campolide, São Sebastião da
Pedreira, Arco Cego, Arroios, Penha de França, Cruz da Pedra e Santa
Apolónia e, numa outra área, a estrada militar da Ameixoeira, Lumiar,
Sete Rios e Chelas.
291
Vieira da Silva. Os Limites de Lisboa: Dispersos. vol. I, p. 61. Citado
por: FERREIRA, Vítor Matias. A Cidade de Lisboa. Lisboa, Publicações
Dom Quixote, 1987, p. 80.
292
1780.
293
DIAS, Marina Tavares. Lisboa Desaparecida. Lisboa, Quimera, vol. 4,
1994, p. 151.
294
Em 1837 é fundada a Companhia dos Transportes Públicos de Lisboa.
303
“Nesse tempo295, a praia de Lisboa estendia-se desde
Xabregas até Belém. O aspecto da área que englobava
Alcântara e a Ribeira Nova não era famoso: estava coberta
de toldos e barracões, servia de vazadouro e, em vez
de areia, ensopava-se em lama”296.
À organização da limpeza de Pina Manique sucede a do
Município de Lisboa, em meados do século XIX, sendo
assegurada por um grupo de serventuários [varredores
e carroceiros]. Percorrendo a cidade de lés-a-lés competia-
-lhes varrer as ruas durante a noite e retirar tanto os lixos
das habitações como o estrume das cavalariças, condu-
zindo o lixo recolhido na cidade até ao Vazadouro. Assen-
tando na força humana e animal, a limpeza da cidade
estava organizada em sete distritos, cabendo a cada um
quatro giros.

Regulamento da
Administração da
Limpeza do Município
de Lisboa, aprovado
em Dezembro 1855,
sendo a Edilidade
presidida por
Damasceno Monteiro. §

Em 3 de Dezembro de 1855, é aprovado o Regulamento


da Administração da Limpeza de Lisboa que vigorou até
que esta actividade passou a ser arrematada por uma
pessoa contratada para o efeito297.
Em 1857 “… o Governo propôs-se fazer desaparecer todas
as áreas insalubres da capital. Ajardinaram-se as praças que
estavam quase transformadas em lixeiras […]. O Parla-
mento destinou 800 contos à “maior obra de salubridade
pública” jamais feita em benefício do povo de Lisboa:
o aterro das lamas da Boavista”298 - a Avenida 24 de Julho.
De 1755 ao final do Século XIX

295
Meados do século XIX.
296
DIAS, Marina Tavares. Lisboa Desaparecida. Lisboa, Quimera, vol. 3, 1992,
p. 121.
297
Por sua vez, o arrematante contratava, particularmente, diversos indi-
víduos que, sob as suas ordens, executavam a limpeza da cidade.
298
DIAS, Marina Tavares. Lisboa Desaparecida. Lisboa, Quimera, vol. 3, 1992,
p. 127.APIT
304
Todavia, e segundo os registos da Exposição “O Povo de
Lisboa”299, no final do século XIX “Lisboa era ainda uma
cidade suja, desordenada e malcheirosa. Encantava pela sua
beleza e pitoresco, mas decepcionava pelo aspecto caótico
das suas ruas e o atraso em que vivia a população.
As ruas estreitas e tortuosas dos bairros populares para onde
se lançavam detritos de toda a espécie, formando autên-
ticas lixeiras, apresentavam-se esburacadas, com poças de
água suja ...”.

3. As Fases de uma Nova Modernidade

3.1. O Desenvolvimento da Cidade: Breves Notas


O final do século XIX é marcado pela inauguração da
Avenida da Liberdade:
“A partir de então, o “centro histórico” da cidade - a Baixa
Pombalina - deixa de ser a exclusiva componente urbana
centralizadora […] de todo o processo de urbanização.
[…] A cidade deixa de estar, assim, exclusivamente
virada para o seu “umbigo pombalino”, ao mesmo tempo
que as urbanizações dispersas, situadas no exterior
daquele “centro histórico”, tenderão a uma progressiva
integração no conjunto urbano da cidade”300.
Até meados do século XX Lisboa caracteriza-se por um
continuum cidade-campo, acentuando-se algumas das linhas
de crescimento do centro para a periferia da urbe. São
Sebastião-Benfica, Campo Pequeno-Lumiar, Almirante Reis-
-Areeiro, a que se vem juntar a frente ribeirinha301 [cuja
gestão passa a ser da responsabilidade da então criada
Administração do Porto de Lisboa] são, nessa altura, os prin-
As Fases de uma Nova Modernidade

cipais eixos de expansão da cidade.

299
Exposição promovida pelo Município de Lisboa, em 1978.
300
FERREIRA, Vítor Matias. A Cidade de Lisboa: de Capital do Império
a Centro da Metrópole. Lisboa, Dom Quixote, 1987, p. 85.
301
BARROS, M.ª Armanda. O desenvolvimento de Lisboa 1890 a 1940.
In: Revista Municipal, n.º 71, p. 26-31. Citado por: FERREIRA, Vítor
Matias. A Cidade de Lisboa: de Capital do Império a Centro da
Metrópole. Lisboa, Dom Quixote, 1987, p. 86.
305
Fotografia aérea
da Avenida dos Estados
Unidos da América
e arredores [Alvalade],
1950-1959. Autor: Mário
de Oliveira. AFL §

Duarte Pacheco302 implementa uma política de expropriação


no concelho de Lisboa, aprova e/ou realiza projectos emble-
máticos para o Estado Novo [que pretendiam transformar
a cidade no centro do Império e do Mundo Português].
Enfim, marca o rosto da Lisboa da década de 40. Planta-se
o Parque Florestal de Monsanto - “o pulmão da cidade”,
são abertas novas vias de acesso303, são aprovadas novas
urbanizações304 e inicia-se a construção de bairros sociais
na periferia da cidade [Boavista, Encarnação, etc.], a par
da edificação de novos equipamentos para a cidade305
e da inauguração do Aeroporto de Lisboa.
A década de 50 coincide com a génese da Área
Metropolitana de Lisboa306, cuja expansão para a Margem
Sul do Tejo é facilitada pela inauguração da Ponte sobre
o Tejo [1966].
A instalação de um regime democrático em Portugal em
1974, o retorno de compatriotas das ex-colónias e a adesão
à União Europeia, influenciaram a dinâmica de Lisboa
no último quartel do século XX. Definitivamente, a cidade

302
Presidente da Câmara Municipal de Lisboa entre 1938 e 1943, a par
da orientação do Ministério das Obras Públicas.
303
A Avenida de Ceuta em Alcântara e a Marginal e a auto-estrada para
o Estoril, vias de acesso à zona do Estoril.
As Fases de uma Nova Modernidade

304
Do Sítio de Alvalade, da Encosta da Ajuda, da Encosta de Palhavã
e da Estrada de Benfica e Circunvalação.
305
De que a Cidade Universitária e o Instituto Superior Técnico são
exemplo.
306
De acordo com a Lei n.º 10/2003, de 13 de Maio, actualmente a Área
Metro-politana de Lisboa abrange os seguintes concelhos: Alcochete,
Almada, Amadora, Azambuja, Barreiro, Cascais, Lisboa, Loures, Mafra, Moita,
Montijo, Odivelas, Oeiras, Palmela, Seixal, Sesimbra, Setúbal, Sintra e Vila
Franca de Xira. Para mais informação consultar: http://www.aml.pt
[Setembro 2005].1 CCAPIT
306
Construção
da Ponte sobre o Tejo,
§ na década de 60,
do séc. XX.
assume-se como pólo de concentração de serviços, o que,
a par da diminuição da população residente e do aumento
da dos concelhos limítrofes, justifica um elevado número
de deslocações diárias.
Sob o ponto de vista urbanístico assinalam-se alguns ele-
mentos que podem ajudar a compreender a organização
da higiene e limpeza urbana de Lisboa neste final de século:
P A densificação da malha urbana, pela criação de novas
áreas residenciais [Lumiar, Charneca, Ameixoeira, Olivais, etc.];
P A renovação urbanística da zona oriental da cidade
motivada pela Exposição Mundial dos Oceanos em 1998;
P A premência da renovação urbana dos núcleos históricos
da Cidade [Alfama, Chiado, Bairro Alto, Madragoa, etc.];
P A construção de novas áreas de habitação social, que per-
mitiu a demolição das construções degradadas instaladas
nos terrenos expectantes pertença da Edilidade.

3.2. Salubridade, Limpeza e Resíduos na Lisboa


do Século XX
O aumento da área construída da cidade de Lisboa e das
vias a percorrer, a transformação da estrutura económica
e modos de vida da população residente e flutuante deter-
minou que os processos associados à manutenção de níveis
aceitáveis de salubridade na cidade sofressem uma grande
modificação durante o século XX. Por outro lado evoluíram
As Fases de uma Nova Modernidade

mentalidades e por consequência as exigências de moradores


e governantes da urbe lisboeta.
Do binómio salubridade - saúde pública passou-se a uma
gestão tecnicamente orientada para a qualidade de vida
na cidade e para a sustentabilidade ambiental incentivada
pelas directrizes da União Europeia307.

307
Ver capítulo I e anexo A2.
307
3.2.1. Até ao PPLL308
No início do século XX [1907], a Câmara Municipal de
Lisboa chamou a si, de novo, a organização da limpeza
da cidade, integrando o pessoal que, até então, executava
essa tarefa.

Varredor
varrendo a rua
em finais do séc. XIX,
início do séc. XX. AFL §

Trabalhador da limpeza
a remover o lixo
depositado em caixas,
Rua dos Sapateiros
[início séc. XX]. AFL §
As fases de uma
Nova

Carrinhola do lixo, 1930


[Colecção Ferreira
da Cunha]. AFL §
Modernidade

308
Plano a Curto Prazo para o Lixo de Lisboa. 3
308
Nos arruamentos que permitiam a sua passagem, as car-
rinholas e carroças-pipa aliviavam o trabalho exclusivamente
manual. Os locais mais estreitos, eram limpos sem qualquer
meio auxiliar.
Por volta dos anos 20, e no sentido de verificar as soluções
encontradas para o problema dos lixos nas cidades, os res-
ponsáveis pela limpeza deslocaram-se a vários Países da
Europa Ocidental, donde resultou posteriormente a mecani-
zação da limpeza urbana. E foi assim que entraram em fun-
cionamento os primeiros veículos de remoção motorizados.
Em meados dos anos 30, os Serviços de Limpeza dispõem
de 30 veículos automóveis e 439 hipomóveis309 e em 1939
é adquirido o primeiro veículo automóvel adaptado à apa-
nha de canídeos. Os hipomóveis continuaram a ser utili-
zados até finais dos anos 50, tendo coexistido com os
primeiros veículos motorizados na remoção e lavagem
de ruas, durante quase duas décadas.
Nos anos da II Grande Guerra devido às restrições no
fornecimento de combustíveis e de todo o tipo de peças,
parte das viaturas motorizadas ficou imobilizada. Foi
necessário recorrer ao gasogénio para conseguir que funcio-
nassem alguns dos veículos, bem como reactivar os
hipomóveis que já não se encontravam em utilização plena.
Nesses tempos difíceis, alguns dos atrelados a tracção
mecânica foram transformados em hipomóveis. Por exemplo
um atrelado para recolha de lixo da marca Scammel -
de tapete rolante - foi adaptado à tracção animal, puxado
por três cavalos.
A varredura das ruas da cidade era efectuada por
varredores, com o apoio de carros em ferro, empurrados
pelas acidentadas colinas da cidade. No Pós-Guerra foi
adoptado um novo modelo de carro de cantoneiro que,
por ser dotado de rodados pneumáticos tornava este
equipamento muito mais leve e, consequentemente mais
ligeiro que os anteriores.
As Fases de uma Nova Modernidade

Nos anos 50, a frota automóvel aumentou gradualmente


e os transportes hipomóveis [que em 1951 totalizavam
65 unidades] passaram a ser usados, no decurso desta
década, apenas no fornecimento de água à população
e na limpeza de fossas e sarjetas.

309
Veículo de tracção animal, com condutor. Em Lisboa estes veículos eram
utilizados para a recolha do lixo.
309
Cantoneiro na varredura
junto à Igreja
de São João da Praça,
fachada principal.
Autor: José Artur
Leitão Bárcia. AFL
Cantoneiro de limpeza,
1944 [Colecção
de Fardamentos].
Autor: António
Passaporte. AFL §

Balde. AFL §

Carros de Remoção
de Lixo, 1939. Autor:
António Passaporte. AFL §

Ainda em 1951310 com o objectivo de normalizar os proce-


dimentos de deposição do lixo, foi finalmente adoptado
o uso obrigatório de recipientes metálicos, todos numerados
e registados [com 20 e 30 l] de capacidade.

310
Dando provimento à Postura de 15 de Agosto de 1939, aprovada durante
a presidência de Duarte Pacheco.
310
§
Veículo para Transporte
de Lixo. Belém. 1959. AFL
Com esta medida pretendia-se evitar que os lixos se
espalhassem pela rua, uma vez que contribuíam para a
propagação de doenças como a cólera, difteria e tétano.
No mesmo sentido, as autoridades impuseram outras normas
de higiene sancionando, por exemplo, cuspir no chão, sacudir
o tapete à janela e deixar o lixo ao abandono.
Paralelamente, as actividades comerciais que aconteciam
em plena rua, como a venda de peixe, legumes, pão, figos,
etc., passaram, também, a utilizar estes recipientes, o que
contribuiu para uma melhoria significativa do aspecto
e higiene das ruas de Lisboa.
Em 1959, os Serviços de Limpeza possuíam quatro estações
centrais de apoio à actividade dos Serviços de Salubridade
e a cidade estava dividida em 12 Postos de Limpeza.
Por esta altura, o número de funcionários a recolher o lixo,
varrer e lavar as ruas de Lisboa era já de, aproximada-
mente, 1430.
Em finais dos anos 60 foram adquiridos os primeiros veí-
culos de recolha de lixo do tipo rotativo e caixa de carga,
bem como a primeira viatura equipada com elevador de
As Fases de uma Nova Modernidade

contentores.
Em 1967 foram admitidas pela primeira vez auxiliares
da limpeza e guardas de sentinas do sexo feminino, que
vieram reforçar a mão-de-obra masculina. Em Dezembro de
1967 eram já 200 as mulheres afectas a estas actividades.
Em 8 de Agosto de 1966, deixou de actuar a última viatura
hipomóvel utilizada na recolha de lixo.
311
No início dos anos 70 fez-se um grande esforço de moder-
nização da frota de apoio à limpeza urbana, tendo sido
adquiridas viaturas de remoção com capacidades que
variavam entre os 6 e os 14 m3, as primeiras máquinas
de varrer de pequena dimensão e também viaturas para
desobstrução de colectores.

3.2.2. O Plano a Curto Prazo para o Lixo de Lisboa


Em 1976, a estrutura responsável pela limpeza na cidade
- Direcção dos Serviços de Salubridade e Transportes [DSST],
deu início a vários estudos orientados para a criação
de um sistema integrado para os lixos de Lisboa.
Tais estudos conduziram à aprovação do Projecto de Plano
a Curto Prazo para o Lixo de Lisboa [PPLL], entre 1978
e 1980, com o objectivo de responder ao problema a curto
e médio prazo através da recolha hermética dos lixos.
A implementação do PPLL levou à reestruturação dos ser-
viços, à renovação das instalações [foram vários os Postos
de Limpeza reconstruídos], dos equipamentos, à reformu-
lação dos circuitos de varredura e de lavagem e à formação
especializada do pessoal, para além da sensibilização
à população da cidade de Lisboa.
Como resultado da adopção do novo sistema hermético
de remoção de lixos, a cidade passa a dispor de novos
contentores para as habitações e papeleiras nas ruas para
a deposição de papéis e pequenos lixos.
A prossecução dos objectivos do PPLL dependia da cola-
boração dos funcionários envolvidos na implementação
do projecto, da colaboração da população, tendo sido por
isso imprescindível o desenvolvimento de programas de edu-
cação sanitária a acompanhar esta grande reestruturação
da Cidade. Sob o mote “Lisboa Cidade Limpa” desenvol-
As Fases de uma Nova Modernidade

veram-se vários programas articulando os aspectos técnicos


e funcionais com a sensibilização aos funcionários, à popu-
lação em geral e à população escolar.
Ao nível dos funcionários, estas acções tinham por objectivo
a sua consciencialização para a saúde pública no trabalho.
Pretendia-se, por outro lado, informar e sensibilizar a popu-
lação para o cumprimento das normas correctas de deposi-
ção e acondicionamento do lixo doméstico nos contentores
312
§
Novos Equipamentos
de Recolha de Lixo.
Acompanhamento
do Presidente da CML,
Nuno Krus Abecasis.
§ Autor: Artur Gonçalves.
PPLL

e papeleiras, de forma
a tornar Lisboa uma ci-
dade mais limpa. Ensinar
hábitos de higiene e sa-
lubridade era o objectivo Materiais de Sensibilização
prosseguido junto da po- §
para a população em geral
e público escolar.
pulação escolar311.

311
Ver anexo A4.31
313
3.2.3. O Destino dos Lixos da Cidade de Lisboa
Durante grande parte do séc. XX, mais precisamente até
meados da década de 60, os lixos produzidos na cidade
de Lisboa eram transportados para a Margem Sul do rio
Tejo, para serem aproveitados no melhoramento dos terre-
nos agrícolas, como fertilizantes. Os lixos eram levados
pelos veículos motorizados e hipomóveis até aos batelões
[ao serviço do arrematante] e faziam a travessia até um
ancoradouro na margem esquerda do rio.

Descarga de lixo. AFL §

Nos dias de temporal nem os veículos motorizados nem


os hipomóveis conseguiam descarregar o lixo, sendo neces-
sário recorrer a vazadouros de emergência terrestres, criados
para o efeito. Ao longo dos anos tiveram várias locali-
zações: Quinta da Musgueira, em 1939; Quinta das Areias,
à Rotunda do Aeroporto, em 1960; Quinta da Lobeira,
ao Lumiar, em 1962.
A partir de 1 de Janeiro de 1963, a totalidade dos lixos
produzidos na cidade começou a ser depositada nesta
Quinta. Entre 1 de Janeiro de 1963 e 31 de Dez. de 1965,
a Federação dos Grémios da Lavoura da Província da Estre-
madura passa a ser a entidade adquirente dos lixos,
tendo também como objectivo a organização de um novo
vazadouro na Quinta da Barroca, em Odivelas. Por falta
de anuência do Município de Loures, aquela estrutura nunca
se concretizou, pelo que os lixos continuaram a ser colo-
As Fases de uma Nova Modernidade

cados na Quinta da Lobeira até que, em princípios de Agosto


de 1963, passaram a ser encaminhados para o Casal
da Boba, na Amadora.
Contudo, desde os anos 50 que se equacionava a construção
de uma central para o tratamento biológico dos resíduos,
cuja edificação teve início em 1969 - Estação de Tra-
tamento de Lixos de Lisboa [ETLL]. A unidade entrou em
funcionamento em 1973 e possuía uma capacidade de tra-
314
tamento de 600 t/d312, transformando a fracção orgânica
dos resíduos em correctivo de solos para aplicação na
agricultura. Em 1986 a capacidade de tratamento desta
instalação - ora designada Estação de Tratamento de Resí-
duos Sólidos, ETRS - foi alargada para 1050 t/d.
Os resíduos não aproveitados nesta unidade eram deposi-
tados no Aterro de Beirolas, situado em terreno contíguo.
Esgotada a sua capacidade, a Câmara Municipal de Lisboa
[CML] investiu na construção de um novo aterro sanitário,
situado no Vale do Forno, o qual entrou em funcionamento
em 1989, dotado de modernas infra-estruturas, com imper-
meabilização dos terrenos, recolha e tratamento de efluentes
líquidos e gasosos.

Estação de Tratamento
§
de Resíduos Sólidos,
em Beirolas.

A ETRS foi encerrada na segunda metade dos anos 90


devido à EXPO 98, a qual se realizou na zona oriental da
cidade, exactamente nos terrenos ocupados por esta estação.
A partir de 1994, com a criação da Valorsul, S.A.313, dá-se
um passo de grande alcance no tratamento e destino final
dos resíduos produzidos na Área Metropolitana de Lisboa
Norte [Amadora, Lisboa, Loures, Odivelas e Vila Franca de
Xira]. Aquela empresa fica responsável pela construção
e gestão de todas as instalações necessárias à exploração
deste sistema, técnica e ambientalmente avançado, o qual
inclui as seguintes unidades:
As Fases de uma Nova Modernidade

P CTRSU - Central de Tratamento de Resíduos Sólidos


Urbanos [em São João da Talha]314;

312
Toneladas por dia.1
313
Sociedade concessionária responsável pela gestão integrada dos resíduos
sólidos urbanos da Área Metropolitana de Lisboa Norte [ver: Capítulo I].
314
Destinada à incineração dos resíduos sólidos urbanos, iniciou a sua
actividade em 2000.
315
P CTE - Centro de Triagem e Ecocentro - Vale do Forno
[Lisboa]315;
P AS - Aterro Sanitário de Mato da Cruz [Vila Franca
de Xira]316;
P ITVE - Instalação de Tratamento e Valorização de Escórias
[Vila Franca de Xira]317;
P ETVO - Estação de Tratamento e Valorização Orgânica
[Amadora]318.

3.2.4. A Recolha Selectiva


Acompanhando as tendências do desenvolvimento social
e económico do País, o final dos anos oitenta e, sobre-
tudo toda a década de 90, são marcados por novas formas
de consumo que provocaram alterações na composição
e quantidade de resíduos produzidos na cidade de Lisboa319.
A par do que já acontecia noutros países320 e acompa-
nhando as soluções técnicas e as directrizes emanadas da
União Europeia enceta-se a implementação de soluções
dirigidas à deposição selectiva de resíduos, com a adopção
das técnicas determinadas pela evolução do conhecimento
científico e prática dos lisboetas.

Recolha de Ecopontos. §
As Fases de uma Nova Modernidade

315
Unidades que permitem, respectivamente, a separação selectiva dos resí-
duos sólidos urbanos recolhidos nos 5 concelhos que integram a Valorsul
e a recepção de resíduos. A sua actividade iniciou-se em 2002.
316
Iniciou actividade em 1998.
317
Esta unidade recepciona e trata as escórias da CTRSU, tendo sido inau-
gurada em 2000.
318
Entrou em funcionamento em Fevereiro de 2005.
319
Ver anexos A1 e B2.
320
Ver capítulo I.
316
Entre 1988 e 1989, inicia-se em Lisboa a recolha selectiva
de vidro para reciclagem, através da colocação de vidrões
[do tipo “igloo”] na via pública. Em 1993, foi lançada
a primeira campanha para a reciclagem do papel, em
simultâneo com a abertura de 40 Centros de Recepção
de Papel. Deu-se início à recolha porta-a-porta de papel
na área de Telheiras e no eixo da Baixa Pombalina - com
enfoque na participação das empresas, serviços da CML
e Escolas, para além da população em geral.
Em 1997 são instalados ecopontos na cidade, atingindo-se
em 1999 um universo de 990 unidades. Entre 1997 e 2000
foram recolhidas para reciclagem 2516 toneladas de resí-
duos de embalagens de plástico, metal e cartão para
líquidos alimentares; 20 796 toneladas de vidro e 30 629
de papel/cartão.
Em 2003 iniciaram-se as recolhas selectivas porta-a-porta
em locais da cidade onde a morfologia urbana e o tipo
de edificado o permitiam, facto que contribuiu para o
aumento dos quantitativos de resíduos entregues para
reciclagem, a que esteve associada uma forte componente
de sensibilização.

3.2.5. O Normativo de Enquadramento


Sob o ponto de vista legal, a intervenção da Câmara
Municipal na área da higiene e salubridade pública é
enquadrada pela legislação geral. Assim, na Lei n.º 100/84,
de 23 de Março, de forma clara ficou estabelecido que
compete às Autarquias, no âmbito do seu funcionamento
e serviço [alínea h], n.º 4, artigo 51.º] “Deliberar sobre
a deambulação de animais nocivos, especialmente cães va-
dios, e sobre a construção do canil municipal”.
Com a publicação do Decreto-Lei n.º 488/85, de 25 de No-
vembro, foi definido pela 1.ª vez em Portugal o quadro
As Fases de uma Nova Modernidade

jurídico da gestão dos resíduos, sendo cometido de forma


clara às Autarquias um papel na gestão dos resíduos
produzidos.
Em Lisboa a actividade do Município nesta área é en-
quadrada desde 1979 pelo Regulamento de Resíduos Sóli-
dos da Cidade. Este normativo camarário compila, à luz
da legislação em vigor, as normas orientativas da acção
dos serviços.
317
Várias edições
do Regulamento
de Resíduos Sólidos
da Cidade. §

Ao longo dos anos foram publicadas diversas edições,


a última das quais em 2004321, introduzindo acertos à luz
da nova legislação publicada e aperfeiçoamentos que a expe-
riência e a aplicação prática dos anteriores demonstrou como
necessários.
Este documento suporta a actividade fiscalizadora do Muni-
cípio nesta área, tendo justificado a constituição de um
As fases de uma Nova Modernidade

grupo especializado em 1998322.

3.3. Sensibilização Sanitária e Ambiental


À implementação do PPLL, em
Lisboa, esteve estreitamente asso-
ciado o desenvolvimento de estra-
tégias informativas e de sensibi-
lização que procuravam motivar
os moradores e utentes da cidade
para o uso dos novos equipa-
mentos, divulgando argumentos de
higiene e saúde pública associa-
dos à introdução da remoção
Folheto de campanha, hermética dos lixos domésticos
1997-1998. § produzidos e controlo das con-

321
Deliberação n.º 64/AM/98. In: Boletim Municipal, n.º 241, de 1 de Outubro
de 1998. Disponível para consulta no site da CML: http://www.cm-llisboa.pt
[Setembro 2005].
322
A acção do Gabinete de Fiscalização foi reconhecida como exemplar,
tendo-lhe sido atribuído o Prémio Nacional de Excelência Autárquica 1999.
318
Materiais de campanhas
de divulgação [cartazes,
§
agenda e folhetos],
1998-2005.

dições higio-sanitárias. Marketing social nos variados órgãos


de imprensa, contacto com moradores e utentes da cidade,
assim como a realização de acções de sensibilização junto
ao público escolar323, foram os meios privilegiados para
atingir aquele desiderato, a par da criação de uma valên-
cia vocacionada para o atendimento dos munícipes -
Gabinete de Relações Públicas324.
A reestruturação dos serviços camará-
rios de 1992 contempla no Departa-
mento de Higiene Urbana e Resíduos
Sólidos uma estrutura cuja principal
missão é a informação, sensibilização
e educação ambiental na área dos
resíduos, respondendo, desta forma,
As Fases de uma Nova Modernidade

às preocupações emanadas da Con-


ferência do Rio em 1992 e, em particular, às orientações
expressas no documento da Agenda 21325.

323
Ver anexo A5.
324
Este Gabinete foi reconhecido como entidade com Boas Práticas de Mo-
dernização Administrativa Autárquica, em 2003, 2004 e 2005.
325
Ver capítulo 3.
319
Materiais Didácticos:
programa Lisboa Limpa
Tem Outra Pinta,
1997-1998.
programa Escola a Escola,
Pró-Ambiente,
2002-2003. §

A aposta na formação de novas gerações é, a partir de 1993,


um dos principais enfoques concretizado em programas
que se desenvolvem de forma continuada nos estabele-
cimentos do ensino básico oficial da cidade de Lisboa:
os programas “Lisboa Limpa Tem Outra Pinta”326 e “Escola
a Escola, Pró-Ambiente”327.
As fases de uma Nova Modernidade

Ao longo dos anos, estes programas incluem a produção


e distribuição de materiais pedagógicos, actividades lúdico-
-didácticas328 [jogos de animação, peças de teatro, …],
visitas de estudo, distinguindo-se pela continuidade e envol-
vimento da comunidade escolar.

Equipas de Intervenção Local:


jovens das comunidades
locais na sensibilização
porta-a-porta. §

326
Iniciado no ano lectivo de 1993-1994, dirigida ao 1.º ciclo e alargado
aos Jardins de Infância em 1998-1999. [Ver anexo A5].
327
Iniciou-se no ano lectivo de 1997-98, tendo como público alvo priori-
tário as escolas dos 2.º e 3.º ciclos do ensino oficial, apoiando igual-
mente iniciativas de estabelecimentos oficiais e particulares de ensino
secundário e técnico-profissional. [Ver anexo A5].
328
Ver anexo B3 - Actividades Lúdico-Didácticas: animação com grupos;
anexo B4 - Actividades Lúdico-Didácticas: visitas de estudo; anexo B5 -
Actividades Lúdico-Didácticas: ateliers de reutilização de materiais.
320
Programa Escola a Escola,
Pró-Ambiente:
Visita de estudo
§
à Estação de Triagem
da Valorsul.

Programa Lisboa Limpa


Tem Outra Pinta:
§
Jogo lúdico-didáctico
com crianças.

Trabalho nas
comunidades locais:
actividade
de animação,
§ Ambiente sem Fronteiras.

Os princípios de acção “pensar global, agir local” sustentam


a participação de líderes e comunidades, desde 1996, no
desenvolvimento de projectos em zonas históricas do concelho
e áreas residenciais de construção apoiada, motivadas pela
alteração do sistema de remoção de resíduos da cidade329,
numa estratégia que se pretende de continuidade.
As Fases de uma Nova Modernidade

A estratégia de intervenção assenta nas metodologias do


Marketing Social no sentido de convocar os cidadãos para
a adopção de comportamentos mais consentâneos e coo-
perantes com a construção de um melhor ambiente
na cidade330.

329
Ver Anexo A5.
330
Idem.
321
Sensibilização Sanitária e Ambiental

322
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Bibliografia

330
331
Os problemas ambientais e a consciência ecológica

332
Ficha T écnica

EDIÇÃO P Câmara Municipal de Lisboa | Direcção Municipal de Ambiente


Urbano | Departamento de Higiene Urbana e Resíduos Sólidos
| Divisão de Sensibilização e Educação Sanitária

COORDENAÇÃO DA EDIÇÃO P António Trindade


COORDENAÇÃO P Alcinda Barata | Veríssimo Pires
SUPERVISÃO CIENTÍFICA P Fernando Louro Alves
SUPERVISÃO TÉCNICA P Augusto Baptista [Animais em Meio Urbano ]
| Carla Tamagnini | Rita Lucas [Ambiente e Resí-
duos Sólidos]
REDACÇÃO P Alcinda Barata | Augusto Baptista | Carla Tamagnini | Carla
Teixeira | Domingos Ferreira | Elisabete Andrade |
Helena Grosso | Sandra Balau | Sandra Teixeira
Sousa | Virgília Encarnação
COLABORADORES P Ana Dias | Augusta Figueiredo | Cândida Ferreira
| Carolina Ferreira | Carlos Carola | Carlos Ferreira
| Cristina Pinto | Eduardo Cruz | Fátima Mendes
| Fátima Rodrigues | Filipe Sousa | Franscisco Raposo
| Gentil Rocha | Glória Silva | Inês Cristóvão | João Cruz
| José Carlos Lopes | Luísa Costa Gomes | Marta Mouro
| Patrícia Rodrigues | Paulo Cuiça | Sandra Nobre
| Sílvia Regageles | Sofia Vieira | Sofia Vitória | Tiago Paiva
e Pona
PRODUÇÃO VÍDEO E FOTOGRAFIA P Américo Simas | Armindo Ribeiro
| Jorge Ramalho | Humberto Mouco
| Luís Ponte | Nuno Morais
APLICAÇÃO INFORMÁTICA P Luís Vaz | Paulo Bastos | Philip Almeida
PAGINAÇÃO E CONCEPÇÃO DE IMAGEM P Isilda Marcelino
SECRETARIADO P Fátima Silva | João Diogo
TIRAGEM P 1000 exemplares
ANO P 2007
DEPÓSITO LEGAL P 241287/06
FOTÓLITO, IMPRESSÃO E ACABAMENTO P Câmara Municipal de Lisboa
Ficha Técnica

Imprensa Municipal

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Agradecimentos

Os nossos agradecimentos à Dr.ª Paula Levy e ao Dr. António Trindade pela


disponibilidade e interesse, assim como o apoio do Arquivo Fotográfico.
A colaboração e o empenhamento da Divisão de Imprensa Municipal
e Divisão de Novas Tecnologias.

Agradecimentos

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