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Biogeografia

UNOPAR BIOGEOGRAFIA
Biogeografia

Guilherme Alves de Oliveira


Luciana A. Pires
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Oliveira, Guilherme Alves


O48b Biogeografia / Guilherme Alves Oliveira, Luciana Andréa
Pires. – Londrina : Editora e Distribuidora Educacional
S.A., 2016.
224 p.

ISBN 978-85-8482-273-7

 1. Biogeografia. 2. Biodiversidade - Conservação. I.


Pires, Luciana Andréa. II. Título.

CDD 578

2016
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CEP: 86041-100 — Londrina — PR
e-mail: editora.educacional@kroton.com.br
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Sumário

Unidade 1 | Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e


distribuição dos seres vivos no planeta 7

Seção 1 - Biogeografia histórica 11


1.1 | A biogeografia enquanto ciência 11

Seção 2 - A origem da vida 17


2.1 | Uma breve história das teorias e formação do planeta 17
2.2 | Teorias sobre a origem da vida 19
2.2.1 | Gênesis e Criacionismo 19
2.2.2 | Geração espontânea e Abiogênese 19
2.2.3 | Panspermia Cósmica 22
2.2.4 | Hipótese Autotrófica 23
2.2.5 | Hipótese Heterotrófica 25
2.3 | Da origem da vida aos modelos científicos 27

Seção 3 - Evolução e biodiversidade 31


3.1 | Hereditariedade e genética 31
3.2 | Mendelismo e as características genéticas 34
3.3 | Lamarckismo, darwinismo e evolução 38
3.3.1 | Os estudos de Jean Lamarck 38
3.3.2 | Os estudos de Charles Darwin 41
3.3.3 | Evidências da evolução 45

Seção 4 - Dispersão e distribuição dos seres vivos 51


4.1 | A deriva continental 51
4.1.1 | Deriva continental e Biogeografia Histórica 55

Unidade 2 | Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição


dos seres vivos 67

Seção 1 - Fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 71


1.1 | Fatores geográficos 71
1.2 | Fatores climáticos 73
1.2.1 | Dinâmica climática global, temperatura e barreiras geográficas 73
1.2.2 | O clima e a biogeografia 79
1.3 | Fatores edáficos 83
1.4 | Fatores bióticos 88
1.5 | Fatores antrópicos 91
Seção 2 - Relações e interações ecológicas 97
2.1 | Relações harmônicas 98
2.1.1 | Colônia (+) (+) 98
2.1.2 | Sociedade (+) (+) 98
2.1.3 | Mutualismo (+) (+) 99
2.1.4 | Comensalismo (+) (0) 99
2.1.5 | Protocooperação (+) (+) 100
2.2 | Relações Desarmônicas 100
2.2.1 | Predatismo (+) (-) 100
2.2.2 | Parasitismo (+) (-) 100
2.2.3 | Competição (-) (-) 101
2.2.4 | Amensalismo (-) (0) 101
2.3 | Relações Neutras 102
2.4 | Conclusões sobre as relações 102

Unidade 3 | Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 115

Seção 1 - Ecossistemas, biomas e domínios 119

Seção 2 - Os biomas terrestres do planeta 125


2.1 | Classificações dos principais biomas do planeta 125
2.2 | Tundras – Árticas e Alpinas 126
2.3 | Taiga 128
2.4 | Florestas Decíduas Temperadas 131
2.5 | Pradarias (Campos Temperados) 132
2.6 | Campos Tropicais e Savanas 133
2.7 | Chaparral e Bosque Esclerófilo 135
2.8 | Desertos 136
2.9 | Florestas Tropicais 138
2.9.1 | Estrutura das florestas tropicais 138
2.9.2 | Dinâmica das florestas tropicais 139
2.9.3 | Florestas Tropicais Sazonais Subperenifólias 139
2.9.4 | Florestas Tropicais Úmidas 140

Seção 3 - Biomas brasileiros 145


3.1 | Biomas brasileiros 145
3.2 | Domínio Equatorial Amazônico 147
3.2.1 | Domínio das Caatingas (Domínio das Depressões Interplanálticas
Semiáridas do Nordeste) 150
3.2.2 | Domínio dos Cerrados 151
3.2.3 | Domínio dos Mares de Morros 155
3.2.4 | Domínio das Araucárias (Domínios dos Planaltos de Araucárias) 158
3.2.5 | Domínio das Pradarias 159

Unidade 4 | Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 171

Seção 1 - Biodiversidade: da norma à forma 175


1.1 | O conceito de biodiversidade 175
1.2 | Especificações dos conceitos: biodiversidade, bioma,
ecossistema e biocenose 178
1.2.1 | A Biodiversidade 179
1.2.2 | O Bioma 180
1.2.3 | O Ecossistema 181
1.2.4 | A Biocenose 182
1.3 | O meio ambiente na perspectiva pública e organizacional 183
1.3.1 | O Ambientalismo no Brasil 187

Seção 2 - Conservação e o manejo de ecossistemas 195


2.1 | Conservação e preservação 195
2.1.1 | Conservação 196
2.1.2 | Preservação 196
2.2 | A biogeografia: preservação, conservação e manejo ambiental 198
2.2.1 | A Biogeografia de Ilhas 199
2.3 | As unidades de conservação 205
Apresentação

A biogeografia é um ramo muito importante da Geografia Física que aborda,


como tema central, a distribuição dos seres vivos na superfície terrestre. Se você,
por algum motivo, já tentou saber o porquê de um determinado organismo
estar em um lugar e não estar em outro, de certa forma, você pensou acerca da
biogeografia. Assim, vamos buscar entender, por exemplo, quais são os fatores que
intervêm no fato de não haver pinguins no Polo Norte, ou camelos na Amazônia e
até mesmo Araucárias no topo do Everest.

Essa compreensão só é possível a partir de uma análise interdisciplinar, pois


não há como simplesmente dizer que um único fator seja o responsável pela
adaptação da vida em determinado lugar. Assim é necessário que utilizemos os
conhecimentos da Geologia, Geomorfologia, Biologia, Climatologia, Ecologia,
Botânica, Edafologia e tantas outras áreas do conhecimento que se fizerem
necessárias. Isso sem deixar de levar em conta a importância de realizar essa
análise tendo consciência da interação da Biosfera com a Litosfera, Atmosfera e
Hidrosfera (e também da Antroposfera!).

Além de todas essas interações entre diferentes esferas e ramos do saber, a


biogeografia também se ocupa de compreender como se deu a distribuição dos
seres vivos no planeta através dos tempos. Ora, o clima mudou com o tempo, os
continentes se deslocaram, algumas áreas que anteriormente estiveram submersas
agora estão emersas (e vice-versa) e, como não poderia ser diferente, a distribuição
e a adaptação dos seres vivos foram influenciadas por esses eventos.

Para que possamos compreender a biogeografia, nosso livro está separado em


quatro unidades. Na primeira unidade, iniciaremos nossas discussões buscando
compreender o que é a biogeografia histórica. Posteriormente, nos debruçaremos
em analisar o início da vida e como se deu (e se dá!) a evolução e, por fim, como
ocorreu a dispersão dos seres vivos no planeta.

Na segunda unidade, continuaremos a buscar a compreensão da distribuição


dos organismos na superfície terrestre, tendo como foco de análise os fatores
limitantes da distribuição dos seres vivos. As relações e interações ecológicas são
fundamentais para o entendimento da biogeografia e as estudaremos na seção 2
da segunda unidade.

A terceira unidade tem como escopo definir três diferentes e importantes


conceitos: ecossistema, bioma e domínios. Apesar das similaridades entre os
termos, há sensíveis diferenças que um professor de Geografia deve saber para
atuar como docente. Trabalharemos, então, quais são os principais biomas
terrestres e os domínios morfoclimáticos e fitogeográficos de nosso país.

Em nossa quarta e última unidade, teremos como objetivo discutir a respeito do


que é a Biodiversidade e Ecossistema, para, enfim, estudarmos a conservação e o
manejo de ecossistemas.

Você perceberá que esta disciplina lhe proporcionará uma vasta gama de
conhecimento para a compreensão da distribuição dos seres vivos na superfície
terrestre, bem como será possível perceber o modo como os conteúdos de
diversas disciplinas se interagem para responder às questões da biogeografia. Não
podemos deixar de citar, também, que esse conteúdo está contemplado tanto
nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) quanto nos Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN). Portanto, boa leitura e bons estudos!
Unidade 1

BIOGEOGRAFIA HISTÓRICA:
ORIGEM DA VIDA, EVOLUÇÃO
E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES
VIVOS NO PLANETA
Guilherme Alves de Oliveira

Objetivos de aprendizagem:

Esta unidade tem por objetivo focar os estudos no entendimento e


desenvolvimento dos segmentos da Biogeografia Histórica, o que é fundamental
para compreendermos elementos como a origem da vida em nosso planeta,
assim como teorias e conceitos evolutivos e, por fim, abranger as causas e
os fatores que levaram à distribuição dos seres vivos extintos e aqueles ainda
presentes pelo planeta Terra.

Seção 1 | Biogeografia histórica


Nesta Seção 1 dedicaremos uma análise e discussão acerca das
especificidades e elementos abordados no estudo da Biogeografia Histórica
para que possamos nos situar acerca dos ramos e enfoques presentes neste
ramo de estudo da Biogeografia, apresentando alguns estudos e teóricos que
fundamentaram os alicerces do que estudamos e discutimos até os dias atuais.

Seção 2 | A origem da vida


Na Seção 2 vamos nos dedicar aos elementos teóricos realizados sobre a
origem do nosso planeta, assim como a formação de vida nele. Junto a esta
apresentação partiremos para uma análise sobre o atual modelo científico
teórico no qual fundamentaremos as demais abordagens pelas unidades
deste livro.
U1

Seção 3 | Evolução e biodiversidade


Na Seção 3 desta unidade dedicaremos um espaço para a construção
e compreensão dos pensamentos de evolução e biodiversidade, com o
objetivo de analisarmos os princípios evolutivos com base nas concepções
genéticas e pelas correntes teóricas que abordem a adaptação dos seres
vivos aos diferentes meios e ambientes.

Seção 4 | Dispersão e distribuição dos seres vivos


Com a Seção 4 buscamos realizar uma abordagem pelo viés da
Biogeografia Histórica das causas e circunstâncias que induziram a dispersão
e distribuição dos seres vivos pelo nosso planeta, partindo de uma análise
sobre os critérios geológicos, como a deriva continental, em conjunto com
os elementos biológicos de adaptação que acarretaram a dispersão dos
seres vivos que iremos conhecer.

10 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

Introdução à unidade

A Biogeografia é uma ciência complexa, que se expressa através de uma série de


fenômenos e elementos do que hoje conhecemos por “Ciências da Terra”. Entretanto,
ao analisarmos cada um destes elementos e fenômenos e os compreender por um
viés lógico e educacional, esta complexidade passa a se tornar muito mais alcançável.

Para tal, iremos então nos aprofundar em um dos ramos desta ciência, a
Biogeografia Histórica. Esta abordagem nos fornecerá fundamentações para a
construção e o discernimento de determinados fenômenos da Biogeografia.

Em primeira instância, devemos justificar que, ao tratar o estudo da Biogeografia


pelos ramos da Biogeografia Histórica e Ecológica, não estaremos reforçando
a dicotomia ou a dualidade da ciência, uma vez que é praticamente impossível
dissociar a Biogeografia nestes dois ramos. Pois a Biogeografia deve ser tratada como
uma ciência multidisciplinar, encarando uma gama de associação e fenômenos de
distintos campos de pesquisa para a compreensão da origem, gêneros e distribuição
geográfica dos seres vivos.

Mas então surge um primeiro questionamento: Qual é a efetividade de


estudarmos a Biogeografia Histórica como uma vertente desta ciência? A resposta
advém por um viés didático-pedagógico, no qual a dificuldade de compreensão de
cada abordagem passa a ser suprimida pela construção de ideias e diálogos sobre
cada elemento, alcançando assim, ao final de cada unidade, um novo patamar de
conhecimento acerca da Biogeografia como um todo.

Nesta unidade vamos conhecer por um viés científico e funcional a estrutura


de diversos fenômenos, como, a concepção da origem da vida em nosso planeta
em suas diversas teorias, os conceitos acerca de evolução e seus fenômenos,
destacando elementos da genética e das relações de seleção e adaptação natural e,
por fim, buscamos uma análise das circunstâncias que proporcionaram a dispersão
e distribuição dos seres vivos pelo planeta.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 11
U1

12 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

Seção 1

Biogeografia histórica
Antes de iniciarmos nossas aplicações, devemos, primeiramente, responder a
um questionamento: “O que é e o que se estuda em Biogeografia?” A Biogeografia
faz parte de um componente das Ciências da Terra que busca compreender os
fenômenos e elementos da distribuição dos seres vivos em nosso planeta. Para tal,
realizam-se diversos estudos que contemplam áreas como a Geografia, Geologia,
Genética, Zoologia, Botânica e demais ciências afins.

Então, a Biogeografia se apresenta como uma ciência capaz de unificar os objetos


de estudo de diferentes áreas com o propósito de investigar circunstâncias e fatores
que possam nos auxiliar na compreensão de diversos fenômenos, sejam eles em
escala geológica ou observados em nosso dia a dia.

1.1 A biogeografia enquanto ciência


Como fundamentação para a pergunta realizada anteriormente sobre o objeto
de estudo da Biogeografia, a zoóloga Gillung (2011) apresenta como definição a
seguinte observação: “Biogeografia é a ciência que estuda a distribuição geográfica
dos seres vivos no espaço através do tempo, com o objetivo de entender os padrões
de organização espacial dos organismos e os processos que resultaram em tais
padrões” (GILLUNG, 2011, p. 3).

Mas, e a Biogeografia Histórica? Conforme Miranda (2012, p. 215), a centralidade


do ramo aponta que “A Biogeografia Histórica se propõe a estudar agentes do
passado utilizando padrões de distribuição de espécies e táxons supraespecíficos
gerados por processos que atuam em larga escala e dizem respeito a milhares de
anos”. Sendo assim, a Biogeografia Histórica é um ramo da Biogeografia que nos
auxilia a compreender as distribuições dos seres vivos através de uma reconstituição
dos fenômenos que motivaram essas distribuições. Um exemplo disto é a análise
da deriva continental, que proporcionou a separação de ecossistemas comuns em
novos ecossistemas independentes daquele anterior.

Além dos critérios de dispersão, a Biogeografia Histórica nos fornece meios

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 13
U1

que auxiliam na abordagem de discussões acerca da genética, evolução e


adaptação dos seres vivos nestes novos ambientes. Demonstrando assim que, para
compreendermos as relações ecológicas e os fatores determinantes biogeográficos
que abordaremos na Unidade 2, é fundamental o contato com algumas teorias,
elementos e fenômenos que fazem parte do estudo da Biogeografia Histórica.

Na Antiguidade (século XV), um dos fatores motivadores para a fundamentação


da Biogeografia como a ciência que nós conhecemos hoje foram as indagações de
muitos biólogos e naturalistas acerca da distribuição dos seres vivos em diferentes
regiões do planeta. Tais indagações acarretaram em diversas explorações científicas,
onde cada um deles apresentava, através de seus registros, novas teorias sobre a
dispersão dos seres, a origem da vida e a diferenciação destes ao redor do globo.

Um dos agentes que fundamentaram o desenvolvimento da Biogeografia


Histórica foi George Louis Leclerc (1707-1788), também conhecido como Conde
de Buffon. Através de suas viagens, notou uma diferenciação clara entre os seres
vivos e, consequentemente, instituiu o primeiro princípio biogeográfico, nomeado
como “Lei de Buffon”, que afirmava que a diferenciação entre as espécies de fauna
e flora era ocasionada pela diferenciação do clima em diferentes regiões do planeta
e que em ambientes com características minimamente similares há a presença
de animais diferentes. No Brasil, podemos aproximar os ensaios e as propostas de
Buffon pela classificação dos domínios morfoclimáticos e fitogeográficos propostos
pelo geógrafo Aziz Nacib Ab’Saber, presentes na obra “Os Domínios de Natureza no
Brasil: Potencialidades Paisagísticas”.

Ou seja, a primeira teoria biogeográfica nos remete a uma relação direta dos
seres vivos com um fator externo, como o clima, uma vez que a Lei de Buffon se
aplica pela afirmação “Áreas distintas possuem espécies distintas”.

Com a difusão e o firmamento deste estudo, demais pesquisadores naturalistas


passaram a utilizar a Lei de Buffon como um parâmetro em suas observações. Até
que, em meados do século XIX, o naturalista Augustin Pyramus de Candolle, baseado
no princípio biogeográfico já instituído, elencou dois conceitos considerados até
hoje como o núcleo da Biogeografia que estudamos até nossos dias.

De Candolle trazia como elementos de análise ao estudo da Biogeografia os


conceitos de Estação e Habitação, definindo-os da seguinte maneira:

Por estação eu me refiro à natureza especial da localidade na


qual cada espécie costumeiramente cresce; e por habitação,
uma indicação geral do país de onde a planta é nativa. O termo
estação está essencialmente relacionado ao clima, ao terreno

14 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

de um determinado local; o termo habitação está relacionado


às circunstâncias geográficas e até mesmo geológicas (DE
CANDOLLE, 1820, p. 383, tradução nossa).

Tal fundamentação firmou dois campos de análises dentro da Biogeografia que


conhecemos hoje: a Biogeografia Histórica, que se baseia na análise de agentes com
uma larga escala e espaço-tempo na história do planeta; já a Biogeografia Ecológica
se baseia no estudo dos agentes com uma curta escala e tempo no presente do
planeta.

Um exemplo de respectividade de cada campo de estudo que podemos observar é


de quando estudamos ou analisamos fenômenos ou eventos de alta escala temporal,
como a deriva continental e os processos evolutivos, podemos diretamente nos
remeter à Biogeografia Histórica como ramo de estudo. Em contrapartida, ao analisar
fenômenos de condicionantes espaciais ecológicos ou limitantes de distribuição,
estes estudos farão parte do ramo da Biogeografia Ecológica.

Todavia, a problemática criada desde as fundamentações de De Candolle


gerou inquietações na Biogeografia que perduram até hoje. A fragmentação destes
dois segmentos proporcionou diversas críticas, sobretudo pela generalização das
espécies em escala regional, dando origem assim à construção de diversas correntes
na agora fundamentada Biogeografia.

Uma destas principais correntes para a análise tanto do ramo histórico quanto do
ramo ecológico é a Panbiogeografia. A Panbiogeografia surgiu como uma análise
mais aprofundada através dos estudos de dispersão e adaptação dos seres vivos dos
renomados naturalistas Charles Darwin (1809-1882) e Alfred Wallace (1823-1913).

Esta corrente biogeográfica foi batizada por Leon Croizat (1894-1982), que se
baseou em uma plotagem cartográfica de mapas com a sobreposição de elementos
de análise de dispersão. Croizat observou, através de suas análises, uma espécie
de trilha criada pela dispersão dos seres vivos, afirmando que ele poderia recriar o
caminho reverso destes seres.

Ainda que Croizat refutasse a teoria da deriva continental, seu trabalho foi alvo de
críticas, por não ter como parâmetro de análise as relações genéticas entre os seres
vivos analisados e referenciados por mapeamento.

Entretanto, como um resultado de todos os estudos realizados posteriormente,


os biólogos Gareth Nelson e Norman Pletnick trouxeram, aos nossos dias atuais,
contribuições acerca de todo o estudo da Biogeografia Histórica, expressas através
do conceito de Vicariância.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 15
U1

A Vicariância como metodologia se institui por meio de três segmentos que


contemplam a teoria da tectônica de placas e as explicações dispersialistas, a relação
filogenética e os conceitos evolutivos e, por fim, os princípios da Panbiogeografia e
a aplicação cartográfica nas pesquisas.

Podemos afirmar que este método, atualmente, é o mais difundido no estudo de


Biogeografia, sobretudo no ramo da Biogeografia Histórica, principalmente por se
basear em um amálgama que nos traz as potencialidades de cada teoria e análises
realizadas pelos naturalistas e biólogos que já trilharam suas ideias e histórias na
Biogeografia como ciência.

Ao apresentarmos esta breve trajetória da Biogeografia em seu ramo histórico,


podemos concluir que, ao abordar tal segmento nesta ciência, buscamos desenvolver
um amplo espaço para análises de elementos, como a origem da vida, a evolução e
a biodiversidade, em paralelo com as discussões acerca das causas que originaram
a dispersão e distribuição dos seres vivos, criando assim a nossa própria trilha no
conhecimento desta ciência.

Observamos nesta seção o desenvolvimento e os critérios


para a definição da Biogeografia Histórica, porém, devemos
compreender quais são os pontos positivos e negativos
desta subdivisão da Biogeografia. Para compreender mais
sobre os elementos que distinguem cada ramo desta ciência,
leia: Biogeografia Ecológica VS. Histórica: Uma divisão
Necessária? Pelo Laboratório de Sistemática e Biogeografia.
<http://www.ib.usp.br/~silvionihei/biogeografia.htm>.
Acesso em: 22 jul. 2015.

De fato, podemos afirmar que a Biogeografia pode ser considerada


uma ciência multidisciplinar, que une diversos conhecimentos para
a compreensão de toda a dinâmica biótica dos seres vivos, desde sua
origem até os segmentos de dispersão e distribuição geográfica dos
seres vivos. Para conhecer um pouco mais sobre o histórico desta
ciência, leia o artigo “Introdução à Biogeografia”, disponibilizado em:
<http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/BolGeogr/article/
viewFile/12274/7401>. Acesso em: 14 ago. 2015.

16 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

1. De acordo com o desenvolvimento teórico e prático da


Biogeografia enquanto ciência, assinale a alternativa correta
que elenca a abordagem de estudo da Biogeografia:
a) A Biogeografia é uma ciência que busca compreender a
distribuição dos seres vivos e os fenômenos que motivaram
essa distribuição.
b) A relação climática é um dos únicos elementos estudados
pela Biogeografia.
c) A Biogeografia é uma ciência que estuda exclusivamente
critérios evolutivos.
d) O homem, enquanto ser vivo, não tem qualquer
representatividade nos estudos biogeográficos.
e) Os estudos no campo de pesquisa sobre evolução e genética
não estão atrelados aos ramos da ciência biogeográfica.

2. Tratando-se da segmentação da Biogeografia, observamos


a ramificação da ciência entre Biogeografia Histórica e
Biogeografia Ecológica. No que se diz respeito aos estudos
dirigidos ao campo da Biogeografia Histórica, destaque as
afirmações a seguir entre verdadeiro (V) e falso (F) e a seguir
assinale a alternativa correta.

São elementos de estudo da Biogeografia Histórica:


( ) Deriva continental e processos evolutivos.
( ) Condicionantes espaciais ecológicos.
( ) Dispersão e distribuição dos seres vivos.
( ) Correntes teóricas, como a Panbiogeografia.
( ) Análises de fenômenos biogeográficos de ampla escala.

a) V – F – V – F – V.
b) F – V – F – F – F.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 17
U1

c) V – F – V – F – V.
d) F – V – V – V – F.
e) V – F – V – V – V.

18 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

Seção 2

A origem da vida
Desde o princípio da humanidade, nós, como seres humanos, mantemos dúvidas
e indagações sobre: qual é a origem da vida? Como e quando surgiu vida nesse
planeta? Estas perguntas persistem ainda com o advento da sociedade moderna
que observamos hoje, porém, diversas teorias podem nos ajudar a compreender um
pouco mais sobre a história do nosso planeta.

Buscamos então compreender as hipóteses e teorias formuladas que indicam os


elementos da formação do planeta, assim como a origem da vida dos seres que nele
habitam, sob uma ótica analista. Para tal, iremos destacar nesta seção cada formulação
em busca de evidenciarmos o atual modelo científico que nos auxilia a compreensão
dos elementos e circunstâncias que proporcionaram a vida no planeta.

2.1 Uma breve história das teorias e formação do planeta


Ainda que muitas das teorias sobre a formação de vida no planeta que vamos listar
não tenham evidências científicas, como, a panspermia dirigida e o criacionismo,
devemos manter nossos olhares para os critérios científicos e os experimentos que
nos auxiliam na delimitação dos segmentos de vida na Terra.

Porém, antes de pensarmos na origem da vida em nosso planeta, devemos pensar


em como nosso planeta surgiu. Quais foram as circunstâncias que deram origem
ao processo de formação do planeta Terra? Essa pergunta deve ser respondida
antes mesmo de pensarmos na origem da vida, e para respondê-la devemos analisar
algumas teorias e hipóteses quanto à origem do universo.

Ao analisarmos a ideia de formulação do universo antes mesmo do planeta Terra,


já nos deparamos com três fundamentos teóricos para trazermos em discussão: a
teoria do Big Bang, a teoria do Oscilamento e a teoria Criacionista.

A teoria do Big Bang, tal qual Novello (2010) relata, se baseia em uma súbita
explosão de escala cósmica que induziu a uma expansão e fluxo de matéria e
energia. Em paralelo, a teoria do Oscilamento possui o início similar ao Big Bang, se

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 19
U1

diferenciando na ideia da expansão contínua, alegando que, ao atingir determinado


ponto pelo processo de expansão, haverá uma retração, levando assim a um modelo
cíclico. Por fim, a teoria Criacionista se atém na formulação do universo por meio
de uma entidade divina ou cósmica designada como responsável pela origem do
universo em toda a sua amplitude.

Ao pesquisarmos sobre a temática, iremos nos deparar com diversas teorias e


vertentes das três citadas anteriormente, mas há um consenso formulado por hipóteses
e experimentos que destacam as bases da teoria do Big Bang como um modelo para a
concepção da formulação do universo e as demais teorias oriundas desta.

Entretanto, entre a origem do universo e a formulação dos planetas e sistemas


que conhecemos hoje, houve um vasto espaço de tempo, denominado como
período Planckiano. Cordani (2008) nos ajuda a compreender o que foi esse período
para a ciência, com a seguinte formulação:

A ciência não tem elementos para caracterizar o período que


os físicos denominam como Planckiano, decorrido logo após
o instante inicial. Trata-se do tempo necessário para a luz
atravessar o comprimento de Planck, a unidade fundamental
de comprimento, pois não é possível saber se as constantes
fundamentais que governam nosso mundo já atuavam
naquelas condições (CORDANI, 2008, p. 4).

Cerca de 4,6 bilhões de anos atrás, após o período Planckiano que reconhecemos,
havia uma densa nuvem de gás e poeira cósmica como material decorrente da
explosão de estrelas em supernova. Este material se fundiu, dando origem a novas
estrelas de diferentes grandezas, incluindo o Sol do nosso sistema planetário.

Outras partículas sólidas também presentes nesta nuvem, como gelo e rochas,
se uniram criando um campo gravitacional decorrente da massa aglomerada e,
consequentemente, atraindo partículas menores em suspensão. Eis que assim
podemos idealizar a formação dos planetas em nosso sistema, integrando também
o planeta Terra.

Assim como os demais planetas presentes no nosso sistema solar, a Terra se


formou pela aglutinação destes materiais, e mesmo depois de formada continuou a
ser alvejada por matérias externas, tais como os meteoritos de que temos registros,
em uma escala extremamente maior do que a observada nos últimos anos.

Esses impactos dos materiais externos tiveram tanta relevância quanto a dinâmica
interna do planeta. A importância destes fenômenos se representa pela regulação do

20 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

que se tornaria a atmosfera e mesmo a formação do satélite lunar, formado pela


colisão de um grande meteoro que retirou uma porção de massa do planeta com a
violência do impacto, deixando-o em órbita, formando assim a Lua que conhecemos.

Com o passar de milhões de anos, a Terra passa a se solidificar em sua parte


externa, segmentando-a no modelo proposto em Geologia, onde há crosta, manto
e núcleo. Este momento da história geológica da Terra se remete ao período pré-
cambriano, e é nesse ponto que se passa a ter os primeiros registros das formas
primitivas de vida na Terra.

2.2 Teorias sobre a origem da vida


Quais foram as hipóteses que nós, enquanto seres humanos, formulamos para
racionalizar ou evidenciar a origem da vida no planeta? Eis que então surgem diversas
teorias e experimentos com a finalidade de justificar a origem da vida em diversas
vertentes, mas destacaremos aqui as mais relevantes para a construção da ciência e,
sobretudo, da Biogeografia.

2.2.1 Gênesis e Criacionismo

Paralelo à teoria de criação do universo, fora formulada através do criacionismo


a hipótese do Gênesis, que sustentava que toda forma de vida no planeta fora criada
por uma entidade divina que a regulava. Esta hipótese perdurou por muitos anos na
história da humanidade em paralelo com os fundamentos da origem do universo do
criacionismo, por meio de obras de cunho religioso, como a Bíblia, o Alcorão, Vedas
e demais obras designadas como livros sagrados.

Podemos observar os registros da hipótese do Gênesis ao observarmos os


segmentos históricos e religiosos de diferentes civilizações e culturas. Em diversos
momentos da humanidade essa teoria se apresenta como um princípio racional
para a concepção da formação do planeta e da vida presente neste.

2.2.2 Geração espontânea e Abiogênese

Conforme as observações históricas do pesquisador John S. Wilkins (2004), em


seu levantamento cronológico da teoria intitulado “Spontaneus generation and the
origin of life” (Geração Espontânea e a Origem da Vida), podemos apresentar aqui
o desenvolvimento histórico e as discussões acerca desta teoria em um panorama
comparativo e sequencial.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 21
U1

De modo a não apoiar a hipótese do criacionismo na íntegra, os gregos


acreditavam que não haveria a necessidade de uma intervenção divina para
a regulação da vida. Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.) elaborou uma teoria que se
pautava nesta ideia, considerando que a vida era o resultado da ação de um agente
externo sobre uma matéria inanimada, na qual se formaria a vida. Esta teoria passou
a ser reconhecida como Geração espontânea, na qual não haveria necessariamente
a relação de uma entidade divina na formação da vida, mas sim seria resultado de
um fenômeno natural.

Após muito tempo, a Igreja Católica foi conivente com a teoria da geração
espontânea de Aristóteles, inclusive difundindo-a ao passar dos anos, até ser
contestada na Idade Moderna.

Existem ainda relatos históricos sobre a teoria da geração espontânea, tal qual
espécies de receitas para a criação natural de vida. Um dos exemplos clássicos
que apoiava a teoria através do experimento se baseava em deixar a carne (matéria
inanimada) exposta ao tempo (princípio ativo), criando assim moscas.

Somente no século XVII um naturalista italiano, chamado Francesco Redi (1626-


1697), contestou a teoria da geração espontânea realizando um experimento com
amostras de carne em um frasco selado e em outro exposto. Consequentemente,
Redi relatou que nas amostras seladas não havia nenhum vestígio de vida, refutando
assim a teoria da geração espontânea.

Como conclusão de seus experimentos, Redi sugeriu o modelo de Biogênese,


uma vez que, com o apoio de lupas, observou a presença de ovos de moscas nos
frascos não vedados, evidenciando assim o seu modelo para a explicação da origem
da vida.

Anos depois, com a difusão do microscópio como instrumento aplicado às


ciências, a teoria da geração espontânea foi rebatizada como Abiogênese e retornou
ao posto de modelo para a explicação da origem da vida.

Essa retomada da teoria teve como principal circunstância a justificativa para os


seres vivos observáveis apenas através do microscópio. Experimentos como o de
John Needham (1713-1781) sugeriam que, ao ferver determinados tipos de infusões
e deixando-os expostos, haveria uma proliferação de organismos, implicando o
reconhecimento da abiogênese, uma vez que estes microrganismos surgiam de
maneira espontânea com o resfriamento de suas infusões.

Com o intuito de refutar o experimento de Needham e a teoria da abiogênese,


o naturalista Lazzaro Spallanzani (1729-1799) recriou os experimentos na tentativa
de comprovar o conceito de biogênese aplicado por Francesco Redi. Para
tal, Spallanzani realizou diversas infusões e deixou-as em grupos de amostras
extremamente vedadas, pouco vedadas e totalmente expostas. Como resultado de

22 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

seus experimentos, observou que, quanto mais expostas ao ar, mais as amostras
demonstravam a proliferação de organismos. Concluindo então que o ar conteria
os ovos destes organismos, levando a comunidade científica a um embate entre a
biogênese e a abiogênese.

Tal embate entre as teorias se manteve até 1862, quando o francês Louis Pasteur
(1822-1895) redefiniu definitivamente as ideias acerca da geração espontânea e
abiogênese através de seus experimentos. Estes experimentos se baseavam em criar
a infusão de soluções, submetendo-as a uma temperatura contínua em recipientes
esterilizados que permitiam a entrada de ar e minimizavam a entrada de organismos
pelo distanciamento do pescoço do recipiente com o fundo. Como resultado de
seus experimentos, Pasteur observou que os líquidos da infusão permaneciam
inalterados e não se apresentava vestígio de qualquer microrganismo.

Dentre as conclusões de seus experimentos, Pasteur destacou que a vida tem


origem em uma espécie de vida já existente. Wilkins (2004) nos traz o seguinte relato
de Pasteur acerca da conclusão de seus experimentos:

A vida não reside nos fluidos como sugerido, mas sim em seus
componentes celulares. É necessário excluir estes fluidos sem
células do reino das matérias vivas. A vida sempre será algo
à parte, mesmo se descobrirmos o que mecanicamente a
despertou. [...] Podemos evidenciar como origem os germes
ou partículas sólidas através de elementos que flutuam na
atmosfera ou de esporos de fungos ou ovos infusórios, mas
eu prefiro pensar que a vida vem da vida ao invés somente da
poeira. (PASTEUR apud WILKINS, 2004, p. 12, tradução nossa)

Sendo assim, através de suas pesquisas e experimentos, Pasteur demonstrou


meios para que a teoria da geração espontânea fosse definitivamente refutada,
comprovando a existência de partículas em suspensão na atmosfera e não nos
fluidos utilizados nos experimentos.

A revolução oriunda dos experimentos de Pasteur apresentou-se extremamente


competente no que circunda o pensamento científico sobre Biogeografia, uma
vez que, a partir da ruptura das teorias de abiogênese, deu-se início a uma busca
à origem e localidade dos seres vivos, apontando os elementos e as dinâmicas do
ambiente como fundamentais para a prospecção de certos organismos e seres vivos
no planeta.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 23
U1

Você sabia que o método deste experimento de Louis Pasteur é utilizado


até hoje? Além de revolucionar os ramos sobre as teorias da origem
da vida, este método ganhou destaque mundial para a esterilização de
alimentos, sendo reconhecida hoje como “pasteurização”, em referência
ao cientista.
Para saber mais sobre esta e outras revoluções no ramo da ciência por
Pasteur, acesse:
<http://www.cdcc.sc.usp.br/ciencia/artigos/art_31/EraUmaVez.html>.
Acesso em: 16 jul. 2015.

2.2.3 Panspermia Cósmica

Esta teoria teve sua origem na antiguidade com as hipóteses do grego Anaxágoras
(499 a.C. – 428 a.C.), que afirmava que a vida presente na Terra teria sido trazida pelo
bombardeamento de meteoros e meteoritos que atingiram nosso planeta.

Por mais controversa que esta teoria possa se apresentar aos nossos olhos,
alguns cientistas a têm como fundamento inicial para a explicação da origem da
vida. Tais ideias foram resgatadas no século XIX por Hermman von Helmholtz (1821-
1894), alegando a possibilidade circunstancial de que determinados elementos e
organismos essenciais para origem da vida tenham sido trazidos ao planeta através
da queda de meteoros e meteoritos.

Em relação ao conceito de Panspermia cósmica, os biólogos Amabis e Martho


(2006) podem nos ajudar a esclarecer e definir o conceito, com a seguinte afirmação:

A Panspermia considera que a vida na Terra se originou de


seres vivos ou substâncias precursoras de vida provenientes
de outros locais do cosmo. Esta ideia voltou a ganhar
força nos últimos anos, com a descoberta de que o espaço
interestelar não é um ambiente tão hostil à vida como se
pensava anteriormente (AMABIS; MARTHO, 2006, p. 13).

Esta teoria, também conhecida como “sementes da vida”, ganhou determinado


destaque através da difusão da comunidade científica clássica pelos trabalhos de
filósofos e cientistas como Richter (1865) e Lord Kelvin (1871), fazendo com que a
teoria se estruturasse como um modelo para a explicação da problemática.

24 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

Com o passar dos anos, duas principais correntes teóricas se formaram


baseando-se na Panspermia como base para novas discussões. Conhecemos
estas variações como Panspermia Dirigida e Nova Panspermia, ambas apresentam
o mesmo conceito base apresentado anteriormente, porém, devemos observar
cuidadosamente cada uma destas variações.

A Panspermia Dirigida faz parte de uma variação da Panspermia Cósmica com um


paralelo bem delimitado com as ideias do Criacionismo que vimos anteriormente.
Tal vertente teórica se apoia na ideia de que seres inteligentes de outras galáxias
disseminaram a vida pelo universo. No meio científico e dentro das hipóteses sobre
a origem da vida na Terra, esta teoria é a mais desacreditada, por conter critérios
designados como “fantasiosos” pelos pesquisadores e cientistas da área.

Quanto à Nova Panspermia, esta se designa como uma atualização da teoria


da Panspermia original, incluindo a ideia de que os vírus e outros componentes,
com partículas tanto de DNA quanto de RNA, tenham chegado à Terra através dos
meteoros. O apoio desta teoria baseia-se, sobretudo, em análises químicas e bióticas
dos componentes dos meteoros, fazendo com que esta teoria não seja totalmente
refutada dentro da comunidade científica.

De modo geral, a Panspermia Cósmica trouxe contribuições significantes para o


alicerce e desenvolvimento de novas ideias e teorias, porém, ainda apresenta uma
série de lacunas e dúvidas quanto ao transporte desses componentes químicos ou
bióticos para o nosso planeta, fazendo com que a teoria da Panspermia não seja
adotada como um modelo sobre a origem da vida na Terra.

2.2.4 Hipótese Autotrófica

Esta hipótese se baseia na ideia de que os primeiros organismos que se formaram


no planeta fossem seres autótrofos, ou seja, produziriam o próprio alimento para a
manutenção de suas vidas. Em paralelo com a hipótese heterotrófica, a hipótese
autotrófica se apresenta como uma das principais correntes de pensamento quando
pensamos na origem e manutenção da vida em nosso planeta.

Os defensores desta teoria utilizam como elemento principal de apoio a análise


de seres primitivos conhecidos como quimiolitoautotróficos. Desmembrando a
tipologia textual da palavra, são os seres que produzem seu alimento através de
reações químicas inorgânicas das rochas.

Estes organismos primitivos teriam como princípio de energia a matéria química


disposta na Terra no período pré-cambriano. Para elucidar esta ideia, recorremos à
análise de Amabis e Martho (2006, p. 16) sobre os seres quimioautotróficos, com a
seguinte explanação:

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 25
U1

Uma possibilidade é que estes seres utilizassem compostos de


ferro e enxofre (como, por exemplo, FeS e H2S) provavelmente
abundantes na Terra primitiva. Esta ideia tem se consolidado
graças à descoberta de microrganismos que vivem em
ambientes inóspitos, como fontes de água quente e vulcões
submarinos, obtendo energia a partir de reações químicas
como a mostrada a seguir:

FeS + H2S → FeS2 + H2 + ENERGIA (AMABIS; MARTHO, 2006,


p. 16)

Sendo assim, a primeira suposição da Teoria Autotrófica relata que estes


microrganismos produziriam seu próprio alimento e teriam surgido através de
reações químicas e bióticas ainda não conhecidas.

Outro ponto que podemos destacar acerca desta hipótese é a relação evolutiva
destes seres, uma vez que hoje temos ideia de que existem diversos tipos de bactérias,
considerados organismos simples unicelulares, que realizam o processo autotrófico
para a obtenção de energia.

E nesta série de pensamento, podemos evidenciar que houve um processo


evolutivo originado pela dificuldade e escassez da matéria química, forçando estes
organismos a desenvolverem diferentes meios para a obtenção de energia.

Reforçando esta linha de pensamento surge a dúvida; quais foram os outros meios
de obtenção de energia aos quais esses organismos tiveram que recorrer? Para sanar
nossas dúvidas acerca dessa problemática, devemos observar os meios de obtenção
de energia de organismos mais complexos do que os quimiolitoautotróficos, mas
ainda assim considerados como organismos simples na escala evolutiva. A resposta
definitiva nos vem através da seguinte análise evolutiva:

Nossos hipotéticos ancestrais poderiam viver, como certos


organismos quimiolitoautotróficos atuais, ao redor de fendas
vulcânicas submersas, onde há liberação contínua de gás
sulfídrico (H2S). Segundo a hipótese autotrófica, a partir dos
primeiros seres quimiolitoautotróficos teriam se originado
outros tipos de seres vivos, inicialmente os que realizavam
fermentação, depois os fotossintetizantes e, finalmente, os
que respiram gás oxigênio (AMABIS; MARTHO, 2006, p. 16).

26 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

Consolidando, deste modo, a hipótese de que as primeiras formas de vida


em nosso planeta foram seres autótrofos, esta teoria nos permite crer que, de
fato, determinados organismos primitivos obtinham energia através de processos
metabólicos de elementos inorgânicos como as rochas, realizando assim a
quimiossíntese desses elementos para a manutenção da vida e, consequentemente,
passaram a adotar mecanismos de evolução para a obtenção de energia através de
outros processos, como a fermentação e a fotossíntese.

2.2.5 Hipótese Heterotrófica

Esta hipótese tem como princípio a ideia de que as primeiras formas de vida
se dividiam entre seres autótrofos, que produziam seu próprio alimento, e seres
heterotróficos, que não conseguem produzir seu próprio alimento, buscando assim
meios para a obtenção de energia através de outras matérias orgânicas presentes
no ambiente.

O que fundamenta a origem destes seres é a hipótese de que estes organismos


eram menos complexos, tendo assim a necessidade de acesso à energia através de
elementos orgânicos por um processo semelhante à fermentação.

Na tentativa de reproduzir a formulação das primeiras formas de vida no planeta,


Stanley Lloyd Miller (1930-2007), em 1953, realizou um experimento para simular
a atmosfera primitiva de nosso planeta com a finalidade de provar os fenômenos
presentes no período pré-cambriano.

Para tal, Miller construiu uma espécie de simulador atmosférico referente a este
período geológico do planeta, implementando uma série de mecânicas capazes de
emular as condições da Terra primitiva entre os balões de vidro interligados, assim
como incluiu gases em suas respectivas proporções para observar o resultado dos
experimentos. O processo metodológico e fundamentos para o funcionamento do
experimento podem ser analisados tal qual como se sugere na seguinte citação:

Nesse simulador, constituído por tubos e balões de vidro


interligados, foi colocada uma mistura dos gases: metano
(CH4), amônia (NH3), hidrogênio (H2) e vapor d’água (H2O).
A mistura gasosa foi submetida a fortes descargas elétricas
durante alguns dias. Os gases simulavam a suposta atmosfera
primitiva da Terra e as descargas elétricas simulavam as
grandes tempestades que devem ter ocorrido nos primórdios
da existência de nosso planeta. No simulador também havia
um condensador, no qual a mistura de gases era resfriada. O

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 27
U1

vapor d’água presente nessa mistura se condensava e escorria


para a parte inferior do experimento, onde se acumulava. Com
isso, Miller simulava a chuva, os mares e os lagos da Terra primitiva.
Um aquecedor fazia ferver a água acumulada, que novamente
se transformava em vapor, simulando a evaporação da água na
superfície quentíssima do jovem planeta Terra (AMABIS; MARTHO,
2006, p. 14).

Como modelo estrutural do experimento de Miller, a citação acima referida nos auxilia
na compreensão e no funcionamento da pesquisa através da análise da figura abaixo.
Figura 1.1 | Modelo ilustrado do simulador de Miller

Fonte: Amabis e Martho (2006, p. 14)

Seguindo este modelo técnico, após uma semana de funcionamento, o líquido


na parte inferior do experimento foi devidamente examinado. Foi observada, então,
através de testes químicos, a presença de componentes que não foram inseridos
ao experimento, como tipos de aminoácidos e outras substâncias orgânicas menos
complexas.

Os experimentos de Miller nos ajudam a enfatizar a relação com os seres


heterotróficos, uma vez que podemos relacionar as bases da hipótese autotrófica
com a presença de aminoácidos e outras substâncias orgânicas oriundas do
experimento.

Esta pesquisa auxiliou as explicações de Aleksander Oparin (1894-1980) sobre


a origem da vida, uma vez que Oparin defendia a ideia de que a Terra primitiva
continha partículas de aminoácidos, proteínas e moléculas de gordura como

28 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

principais agentes para a formação da vida no planeta.

A ideia de que esses componentes se organizavam de maneira estrutural


fundamentou os primeiros indícios para a hipótese de um organismo denominado
Coacervado. Estes organismos se compunham de uma membrana, referente às
moléculas de gordura, atuando como um invólucro dos aminoácidos e proteínas.

Os experimentos de Miller auxiliaram a constatação das formulações de Oparin


e a origem dos coacervados. Entretanto, com as pesquisas atuais, tem-se indício de
que os coacervados não podem ser designados como seres vivos, mas podem, sim,
serem considerados como as moléculas precursoras da origem da vida em nosso
planeta.

Em concomitância com a hipótese autotrófica, a teoria de organismos


heterotróficos alega um princípio evolutivo baseado na indisponibilidade de alimentos
para a manutenção da vida. Alegando que os seres heterotróficos possivelmente
sofreram uma adaptação, a partir da qual evoluíram de organismos menos complexos
para organismos autótrofos (que realizam fermentação ou fotossíntese) ou, mesmo,
que buscaram outros meios de alimentação heterótrofa.

Sendo assim, a hipótese heterotrófica nos fornece determinados alicerces para


pensarmos não só na origem da vida em nosso planeta, mas também possibilita
cogitarmos que o processo de adaptação e seleção natural dos serves vivos é
um elemento-chave para a evolução dos organismos em diferentes tipos de
complexidade.

2.3 Da origem da vida aos modelos científicos


Vimos até então que, para explicar a origem da vida em nosso planeta, diversos
modelos, hipóteses e teorias são debatidos, aplicados e testados com o intuito claro
de constatar a origem e a presença do primeiro ser vivo no planeta. A racionalização
sobre a origem da vida sempre fez e sempre fará parte das indagações humanas,
sendo assim impossível destacarmos, hoje, um modelo irrefutável e permanente
para tal explicação.

Os avanços científicos e as produções de pesquisas e experimentos precedentes


nos permitem, atualmente, traçar um modelado para a aproximação da origem da
vida no planeta. Experimentos e hipóteses como os de Needham, Pasteur, Oparin e
Miller agregaram valores históricos para os ramos das ciências biológicas e da Terra,
sobretudo no que diz respeito aos questionamentos, como a origem da vida.

Entretanto, ainda não temos uma conclusão definitiva de como estes organismos,
sejam eles autótrofos, heterótrofos, até mesmo os coacervados, rumaram para o
modelado atual de vida em nosso planeta. Tal definição ainda motiva pesquisadores

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 29
U1

a descobrirem como esses organismos isolados moleculares adquiriram aptidão


para produzirem seu próprio alimento ou, mesmo, sistemas de reprodução.

Teorias recentes, como a do mundo do RNA, contribuem para uma racionalização


ante esta relação evolutiva, porém ainda há lacunas na transposição do conceito
de RNA (ácido ribonucleico) para o de DNA (ácido desoxirribonucleico), levantando
assim mais um degrau rumo à descoberta da origem da vida e dos primeiros seres.

Tal qual como o modelado tomado para a teoria do “mundo do RNA”, adotaremos
como base para o nosso aprofundamento em Biogeografia uma junção da
Hipótese Heterotrófica com a Hipótese Autotrófica. Ambas as hipóteses apresentam
segmentos necessários para a compreensão da vida, por adotarem um modelo de
evolução adaptativa.

Em circunstâncias diferentes, estas hipóteses confluem em um elemento comum,


a evolução. Tal conceito de evolução está intimamente atrelado com a necessidade
dos seres autótrofos e heterótrofos em buscar meios e mecanismos adaptativos
para superar a competição e a ausência de alimentos em seu meio.

Mantermos o elemento evolutivo e as questões sobre o que motivou a evolução


nos ajudará a desenvolvermos critérios fundamentais para a compreensão da
origem da vida. Tal qual como o paradigma adaptativo que designou as indagações
dos cientistas e as nossas, a ciência evolui este mesmo elemento de adaptação,
fazendo com que nenhuma hipótese possa ser definitivamente rejeitada, mas sim
incorporada a experimentos e pesquisas que nos auxiliem a comprovar as hipóteses.
Foi assim que a vida evoluiu e é assim que nós ajudamos a ciência a evoluir.

Fomos apresentados nesta seção a diversas correntes e


hipóteses sobre a origem da vida em nosso planeta. Ainda
que não possamos apresentar de forma irrefutável um
modelo que elenque os critérios da formação da vida na
Terra, podemos nos basear nos modelos científicos adotados
por diversos pesquisadores modernos.
Para pensarmos e avaliarmos de maneira crítica os
fundamentos que abordamos, vale a pena assistir e refletir
sobre os modelos e ensaios tratados no documentário “O
surgimento da vida”. Disponível em: <https://www.youtube.
com/watch?v=26SV_X506VY>. Acesso em: 15 ago. 2015.

30 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

1. Conforme o critério apresentado em relação à formação do


planeta Terra, assinale os apontamentos assertivos a seguir,
posteriormente, assinale a alternativa correspondente:
I – A teoria do Big Bang se apoia na ideia de que houve uma
súbita explosão em escala cósmica levando a um fluxo de
matéria e energia pelo universo.
II – Os corpos celestes que conhecemos tiveram origem após
o período Planckiano.
III – A origem do planeta Terra teve como ocorrência a fusão
do material presente nas nuvens de gás e poeira cósmica.
IV – O Criacionismo é uma das principais teorias quanto à
origem do planeta Terra, sendo esta teoria considerada um
modelo para as explicações científicas atuais.
V - A Lua é um satélite do planeta Terra, originado pela colisão
de um imenso corpo celeste durante a formação da Terra.

Dentre as afirmações sobre a origem do planeta Terra e do


universo, estão corretas:
a) I, II, IV e V.
b) I, II, III e V.
c) I, IV e V.
d) I, III e V.
e) Somente V.

2. Tendo como fundamento teórico a apresentação das


hipóteses e teorias sobre a origem da vida em nosso planeta,
assinale a alternativa que apresenta corretamente os atributos
dentre as opções afirmadas:
I - O Criacionismo está fundamentado na ideia de que uma
divindade é responsável pela origem do planeta e de todas as
formas de vida. Tal teoria se manteve, sobretudo, pela difusão
das religiões em diferentes culturas e civilizações do planeta.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 31
U1

II - A teoria da Geração espontânea foi uma das primeiras


hipóteses científicas acerca da origem da vida em nosso
planeta. Debatida durante muitos séculos, só houve uma
definição concreta sobre a teoria após os experimentos de
Louis Pasteur.
III - Como segmento teórico, a hipótese da Panspermia cósmica
ainda fornece ideias e elementos de que possivelmente alguns
componentes químicos essenciais para a origem da vida foram
dispostos ao nosso planeta através de meteoros.
IV - Dentre as teorias apresentadas, o segmento da
Panspermia Dirigida é o atual modelo científico adotado sobre
as discussões da origem da vida no planeta, uma vez que é
irrefutável a hipótese de que uma divindade cósmica tenha
semeado a vida pela galáxia, inclusive na Terra.
V - A hipótese Autotrófica, em conjunto com a hipótese
Heterotrófica, nos fornece elementos necessários para um
delineamento da origem da vida na Terra, substancialmente
por apresentar critérios químicos e bióticos acerca da
formação da vida em um ambiente primitivo como a Terra em
seu período pré-cambriano.

a) I, II, III e IV.


b) I, III, IV e V.
c) II, III, IV e V.
d) I, II, III e V.
e) Todas as afirmações estão corretas.

32 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

Seção 3

Evolução e biodiversidade
A diversidade de seres vivos que conhecemos hoje é fruto das transformações a
que estes seres foram submetidos. Mas como podemos explicar tais transformações? A
resposta para esta pergunta está intimamente ligada com o conceito de evolução. Tal
conceito nos auxilia a pensar que determinadas circunstâncias ocasionaram a modificação
destes seres, levando à mudança de diversos organismos ao longo do tempo.

Para compreendermos a Biodiversidade dos seres e como ocorrem estas


modificações, devemos dirigir os estudos aos ramos da Biologia que possam
nos fornecer elementos e processos de análise para tal. Sendo assim, nesta seção
abordaremos princípios do conceito de Hereditariedade e Genética para entendermos
os agentes fundamentais que proporcionam estas diversificações dos seres vivos,
e também abordaremos os elementos da evolução adaptativa, compreendendo
correntes teóricas e pensamentos de pesquisadores que possam nos auxiliar a
compreender a evolução de sua norma à forma.

3.1 Hereditariedade e genética


Os conceitos de Hereditariedade e Genética são considerados fundamentais para
compreendermos determinados aspectos quando buscamos desenvolver estudos
dirigidos sobre evolução. Para darmos início a esta abordagem, devemos partir
sobre a definição de um elemento-chave para a compreensão geral dos princípios
de hereditariedade, o DNA.

O DNA se baseia em uma combinação molecular orgânica que coordena as


informações necessárias a serem transmitidas para as células, que se desenvolvem de
acordo com a função genética aplicada, tal qual um código. Para exemplificar determinado
conceito, buscamos os apontamentos de Ridley (2006) na seguinte citação:

A molécula chamada de DNA (ácido desoxirribonucleico)


proporciona o mecanismo físico de herança em quase todas

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 33
U1

as criaturas vivas. O DNA é o portador das informações utilizadas


para a construção de um novo corpo e para diferenciá-lo em várias
partes. As moléculas de DNA existem em quase todas as células
do corpo e em todas as células reprodutivas. [...] A molécula de
DNA completa consiste em duas fitas, completamente pareadas,
cada uma delas formada por uma sequência de nucleotídeos que
são unidos quimicamente uns aos outros (RIDLEY, 2006, p. 47).

Sendo assim, o DNA deve ser visto como uma chave que contém as informações
que podem abrir determinadas características e funções nos organismos dos seres
vivos. Mas como o organismo se forma a partir das informações do DNA? Para
responder a esta pergunta devemos esclarecer e definir o gene.

O gene nada mais é do que um trecho do cromossomo que contém uma


associação de nucleotídeos. E o que delimita a formação de organismos é a sequência
de nucleotídeos, que ativam diversas novas sequências de proteínas, fazendo assim
com que os organismos se formem pela função ativada através do ordenamento
dos quatro tipos de nucleotídeos: Adenina, Citosina, Guanina e Timina.

Estes quatro tipos de nucleotídeos se combinam de uma forma variada,


especificada pela combinação das duas fitas de cromossomos, fazendo assim com
que haja uma informação predeterminada que se dirija a uma função estipulada
nos organismos. Estas informações são combinadas através dos cromossomos
presentes nos gametas reprodutivos.

Como exemplos, podemos citar as características de DNA transmitidas por


uma reprodução sexuada, como nos humanos, na qual os gametas masculino e
feminino contêm 23 cromossomos cada, e, quando unidos através da fecundação,
dão origem a um zigoto, formando um embrião com 46 cromossomos. Quanto a
um exemplo que difere deste, em uma reprodução assexuada, como em vegetais,
tendo como parâmetro as samambaias, neste tipo de vegetal não há uma troca
de gametas com um ser externo, levando assim a uma autofecundação, trocando
gametas entre o mesmo organismo com 600 cromossomos cada, dando origem
a um novo organismo com 1.200 cromossomos, fazendo com que este novo
organismo seja uma cópia idêntica do organismo primário.

Uma das principais causas da complexidade e perpetuação dos seres vivos mais
complexos foi o abandono da reprodução assexuada. A carga genética deste tipo
de reprodução é basicamente nula, com exceções de fenômenos que veremos a
seguir. A baixa variabilidade implica que o organismo sempre será idêntico, fazendo
com que este esteja sujeito ao mesmo tipo de adversidade do meio.

Sobre um tipo das adversidades encaradas pela baixa variação genética, podemos

34 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

destacar, por exemplo, as bananas, que são oriundas de um mesmo organismo


primário devido à sua reprodução assexuada, isto implica que todos estes organismos
não apresentem imunidade ou resistência a certos tipos de vírus e fungos, fazendo
com que, caso um organismo seja afetado por um vírus, toda a cultura de bananas
possa ser comprometida se o vírus não for erradicado.

Neste contexto, podemos afirmar que as cargas genéticas oriundas da reprodução


sexuada trazem ganhos no que se refere à resiliência e diversidade dos seres vivos,
atuando também como um fator determinante para a tolerância dos organismos a
determinados ambientes, concomitando em sua dispersão geográfica.

Como potencialidade das variações genéticas, podemos constatar então que a


reprodução sexuada é um dos elementos fundamentais para garantir a variabilidade
genética dos seres vivos. Entretanto, existem outras formas de variabilidade nos seres
vivos, como, a mutação. Neste caso, a ocorrência de mutação é oriunda de uma
falha na cópia dos nucleotídeos, ou mesmos cromossomos dispostos no gameta.

A mutação atua como uma alteração de determinadas características dos


organismos, fazendo assim com que o ambiente adaptativo diga se ela é uma
mutação benéfica ou maléfica. Uma vez que analisarmos casos como a imunidade
à malária causada pela mutação das hemácias em comunidades africanas,
incapacitando a reprodução do protozoário que dá origem à doença, podemos
evidenciar elementos benéficos da mutação. Todavia, caso membros desta mesma
comunidade fossem transpostos a um ambiente de altitude com o ar rarefeito, os
mesmos indivíduos apresentariam diversos problemas atrelados à falta de oxigênio,
uma vez que a hemácia é a principal responsável pelo transporte deste.

Ao assimilarmos as variações genéticas, sejam elas oriundas da troca de gametas,


ou de outras circunstâncias como a mutação, podemos concluir que tais variações
e combinações genéticas auxiliam na biodiversidade de seres vivos em uma vasta
gama de espécies, e ainda são responsáveis pelas características individuais de cada
ser vivo.

O ramo de estudo responsável pela análise destes tipos de fenômenos de


variação genética e hereditariedade é a Genética Ecológica. Tal ramo entra em
confluência com os estudos biogeográficos, sobretudo no que diz respeito à
Biogeografia Ecológica. Por pautar as pesquisas nas análises populacionais e nos
padrões adaptativos que evidenciam a contínua evolução dos seres vivos, a genética
ecológica nos traz elementos fundamentais para os estudos de evolução, dispersão
e diversidade presentes na Biogeografia.

No que se refere à Biogeografia Histórica, o direcionamento das pesquisas de


genética ecológica nos fornece alicerces fundamentais para a compreensão de
fenômenos e elementos em uma ampla escala. Podendo auxiliar na discussão
acerca dos conceitos de dispersão e distribuição, pautados sob uma ótica da

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 35
U1

variabilidade genética e de como podemos compreender a distribuição dos seres


vivos no decorrer do tempo.

Com estes segmentos apresentados, podemos concluir que é inegável a


representatividade dos princípios genéticos e da hereditariedade para a diversidade
e variação dos seres vivos. Contanto, como podemos afirmar que os genes e as
características dos pais são transpostos aos filhos? Ou mesmo, por que certas
características são mais comuns ao pai do que à mãe? Para responder a estas perguntas,
devemos discutir e apresentar fundamentações teóricas e práticas acerca da relevância
e critérios genéticos de dominância e recessividade, como veremos a seguir.

A Genética nos auxilia a compreender uma série de fenômenos e processos


fundamentais para a manutenção dos seres vivos. A variabilidade genética
possui um grande potencial para compreendermos e explicarmos muitas
das circunstâncias que podemos observar enquanto pesquisamos sobre
Biogeografia.
Para compreender mais e explorar os potenciais da variabilidade genética,
acesse:
<http://www.ib.usp.br/sti/evosite/evo101/IIICGeneticvariation.shtml>.
Acesso em: 20 jul. 2015.

3.2 Mendelismo e as características genéticas


Outro parâmetro científico oriundo da genética que nos auxilia na compreensão
dos elementos que caracterizam a biodiversidade dos seres vivos diz respeito ao
mendelismo e às características genéticas dos seres vivos. A interpretação pelo viés
biológico nos fornece alicerces para o entendimento dos fatores que ocasionam
a diversidade, podendo interpretá-los como elementos bióticos essenciais que
permitem a distribuição e variedade dos seres vivos sob uma ótica de dispersão
geográfica.

As características físicas da hereditariedade, intituladas como fenótipo, foram os


principais critérios motivadores para a investigação acerca da transmissão genética
para as novas gerações de seres vivos. O questionamento sobre as semelhanças
entre membros do mesmo grupo ou espécie biológica motivou e ainda motiva
os pesquisadores a compreenderem um pouco mais sobre o conceito de

36 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

hereditariedade.

É notório que as trocas de gametas entre os seres vivos, proporcionadas através


da reprodução sexuada, auxiliam no entendimento da transmissão de genes e a
própria biodiversidade. Porém, para compreendermos a origem desta formulação
e os conceitos da variabilidade genética, devemos retroceder no tempo histórico e
analisar os alicerces desta definição.

O bastião da genética moderna a que temos acesso hoje foi Gregor Johan
Mendel (1822-1884), um monge agostiniano considerado o pai da genética moderna
e o precursor da corrente de estudos sobre a genética derivada de seu nome, o
Mendelismo.

As pesquisas e os registros de Mendel abriram um novo leque de possibilidades


para a compreensão do conceito de genética e hereditariedade. Trabalhando
com organismos simples como ervilhas, Mendel observou que determinadas
características dadas pelo cruzamento de indivíduos com fenótipos distintos
resultavam em alternâncias de genes e em variabilidade nas gerações seguintes de
ervilhas.

Para evidenciar o conceito de hereditariedade, Mendel realizou o cruzamento


de ervilhas de grão amarelo e liso com ervilhas de grão verde e rugoso, atribuindo
como características de genótipo a cor e a textura dos referentes grãos utilizados no
experimento.

Nos dias atuais, sabemos que as características que determinam o genótipo


vão além dos elementos da designação fenotípica, atribuindo os conceitos das
associações entre os nucleotídeos antes citados, constituindo o gene presente
no DNA. Todavia, Mendel expôs esse conceito de uma forma simplificada, mas
extremamente funcional, através dos registros de suas pesquisas presentes na obra
mundialmente conhecida como “Ensaio com plantas híbridas”.

Como observação dos cruzamentos destes tipos distintos de ervilhas, foi


observado que na primeira geração todos os indivíduos possuíam características
fenotípicas referentes apenas ao grão amarelo e liso. Tal circunstância intrigou
o pesquisador, que retornou a realizar os cruzamentos entre membros desta
primeira geração. O resultado deste segundo cruzamento foi expresso em uma
vasta variabilidade de grãos, levando a crer que o que garantia a variabilidade não
eram apenas as características físicas, mas sim algo que hoje compreendemos por
variação genética e hereditariedade.

Com o intuito de ilustrar a pesquisa de Mendel, observe o registro da experiência


ilustrado na figura a seguir e note os segmentos das variações observadas através das
características fenotípicas de cada geração.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 37
U1

Figura 1.2 | Esquema ilustrado de cruzamento e características genéticas

Fonte: O autor (2015)

Observamos, então, que a variabilidade dos fenótipos se expressou mais


intensivamente na segunda geração, mas por qual motivo? A causa desta variação
está vinculada aos precedentes da lei de segregação de Mendel. Quando analisamos
os resultantes da primeira geração, observa-se uma predominância das características
das ervilhas amarelas e lisas, porém, os genes do outro indivíduo que não foram
evidenciados nesta geração ainda estão presentes. O motivo da não representação
das características verde e rugosa está atrelado com o critério de dominância e
recessividade.

Este critério foi um fundamento-chave para o progresso da genética,


biodiversidade e evolução. A relação entre os alelos recessivos e dominantes vem
como um alicerce para a lei da segregação e hereditariedade. Como observamos
na primeira geração exposta na figura anterior, não há a presença de nenhuma
característica verde (v) e rugosa (r), isto implica que tais alelos são recessivos, tendo
como resultado a dominância das características amarela (A) e lisa (L).

Quando analisamos a segunda geração do experimento, podemos observar uma


variabilidade de características atreladas à relação de dominância e recessividade do
genótipo entre os indivíduos da primeira geração “AvLr x AvLr”, derivando em uma

38 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

alta variação e transferindo características, como rugosidade(r), às ervilhas amarelas


(A), além do retorno da característica cor verde (v), presentes, anteriormente na
geração parental.

A relação destes cruzamentos se baseia na metodologia conhecida por proporção


mendeliana. Assim como na matemática, a proporção nos auxilia a compor em
percentuais as variedades de opções, e o mesmo ocorre quando pensamos na
variedade de opções que cada alelo oferece, sejam dominantes ou recessivos, para
a representação do fenótipo do indivíduo.

Para exemplificar a proporção mendeliana, partimos para as explicações de


Ridley (2006) acerca da variação apresentada entre dois indivíduos heterozigotos
(com duas características genéticas):

Considere o cruzamento entre dois heterozigotos Aa e Aa.


Tanto o macho quanto a fêmea produzem metade dos gametas
a e metade de gametas A. Se considerarmos que metade dos
óvulos da fêmea é a e, destes, metade será fecundada por
espermatozoides a e metade por espermatozoides A; a outra
metade dos óvulos A será fecundada por a e A. A proporção
resultante na prole é de 25% AA, 50% Aa e 25% aa (RIDLEY,
2006, p. 58).

As proporções mendelianas são facilmente compreendidas e reproduzidas


quando fazemos uso de uma tabela, como este exemplo que se baseia em uma
referência visual da citação acima:

Quadro 1.1 | Exemplificação das proporções mendelianas

Genes A A
A AA Aa
a Aa AA
Proporção: 25% AA 50% Aa 25%aa

Fonte: O autor (2015)

É visto então que a proporção mendeliana contribui para a compreensão


da variação genética e os princípios da hereditariedade. Para a Biogeografia, o
mendelismo e as atribuições dos conceitos da genética às variações dos seres
vivos são dados como fundamentais para compreendermos a relação de dispersão
e evolução dos seres, sendo assim um elemento crucial para o entendimento de

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 39
U1

circunstâncias que elenquem o estudo biogeográfico dos seres vivos como um


critério fundamental na pesquisa e ensino sobre Biogeografia.

3.3 Lamarckismo, darwinismo e evolução


Levantamos, até o presente momento, fundamentos teóricos e práticos que
culminem nas hipóteses e teorias sobre a evolução dos seres vivos e como ela está
definitivamente atrelada com os estudos de Biogeografia.

Para compreendermos de fato os elementos, as teorias e evidências da evolução,


devemos cunhar um caminho de hipóteses, desmistificações e reformulação de
ideias para que seja alcançada, de maneira eficaz, a real amplitude da evolução dos
seres vivos e os conhecimentos oriundos destes.

Realizaremos aqui um aprofundamento de correntes teóricas, como o


Lamarckismo e o Darwinismo, culminando em um segmento que nos apresente
evidências do processo evolutivo e como estes se expressaram através do tempo por
meio dos processos de adaptação e seleção natural dos seres vivos. As abordagens
realizadas com a compreensão destas informações nos darão alicerces teóricos
fundamentais para o entendimento geral da Biogeografia Histórica, fornecendo uma
série de componentes essenciais quando buscamos assimilar os conhecimentos da
Biogeografia ecológica e abrangermos, por fim, a real amplitude da Biogeografia
enquanto ciência.

3.3.1 Os estudos de Jean Lamarck

É notório que os elementos da hereditariedade em sua escala tenham dirigido


as primeiras formulações sobre a evolução dos seres vivos. Sempre que tentamos
compreender o presente e possíveis mudanças, realizamos uma análise do passado
para que seja possível compreendermos quais foram as causas e circunstâncias que
nos colocaram no cenário atual.

No contexto da biologia evolutiva não é diferente. Para compreender os princípios


evolutivos que originaram a diversidade dos seres vivos e até mesmo a origem da vida
como vimos anteriormente, realizaram-se diversas formulações e hipóteses acerca
de como os organismos evoluíram e alcançaram a biodiversidade que conhecemos
no planeta.

Dentre várias hipóteses acerca da evolução, concentraremos os esforços para a


compreensão da corrente do lamarckismo e como esta corrente científica teve sua
importância na época e qual é a real implicância desta no estudo da Biogeografia
moderna que almejamos pesquisar, compreender e ensinar.

40 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

Como o próprio nome sugere, o lamarckismo está diretamente relacionado


com as concepções fundadas pelo biólogo francês Jean-Baptiste Pierre Antoine de
Monet (1744-1829), que ganhou o título de cavaleiro de Lamarck, foi o precursor
das formulações acerca das circunstâncias evolutivas que dirigiam as variações das
espécies biológicas.

Sabemos hoje que as hipóteses formuladas por Lamarck possuem diversas


lacunas que motivaram cientistas vindouros a realizarem novas formulações
baseando-se nestas concepções. Adepto de correntes biogeográficas como a que
levou o Conde de Buffon às suas formulações, Lamarck também se apoiava nas
teorias da geração espontânea e no conceito de hereditariedade, formulando assim
suas hipóteses acerca do processo evolutivo e instituindo então a corrente evolutiva
do lamarckismo.

Pautando-se na ideia de que os primeiros organismos vivos surgiram através de


algo inanimado, foi cunhada uma primeira formulação acerca da evolução destes
seres alegando que a origem e evolução das primeiras formas de vida no planeta
foram motivadas pelo ambiente em que elas habitavam.

Como relatam Almeida e Falcão (2005, p. 19), a centralidade das pesquisas de


Lamarck não se pautava na evolução orgânica e muito menos nas explicações
acerca da origem das primeiras formas de vida, mas sim na evolução sistemática dos
seres vivos.

Na busca de compreender como os organismos evoluíam, o princípio da teoria e da


corrente do lamarckismo afirmava que “os mecanismos da formação dos seres vivos
se baseavam na organização complexa destes e a capacidade de reações a mudanças
ambientais” ALMEIDA; FALCÃO, 2005, p. 19). Sendo estes os principais atributos para a
formulação de suas teorias. Mas como o lamarckismo encara os processos evolutivos?
Para compreendermos, devemos nos inteirar das leis propostas por Lamarck: a lei do
uso e desuso e a lei da transmissão dos caracteres adquiridos.

A lei do uso e desuso instituía que os organismos dos seres vivos estavam sujeitos
de modo individual a alterações conforme a necessidade que o meio propunha.
Como meio de evidenciar esta lei, Lamarck utilizava a relação do alongamento
do pescoço de girafas, afirmando que a necessidade de alimentação de folhas
nas copas das árvores forçava os animais a alongarem os seus pescoços, e assim
justificava a variedade de comprimento entre estes animais como características que
os distinguiam de outros quadrúpedes.

Pensando por um viés biogeográfico, esta lei possui um arcabouço fundamental


para o desenvolvimento da ciência, uma vez que relatava indícios de uma relação
direta com a diversidade dos animais com o meio. Outro elemento que destaca
que esta lei não é totalmente refutável é a relação da atrofia de certos órgãos, tendo
como exemplo a atrofia muscular nas pernas de pessoas que ficaram paraplégicas.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 41
U1

Todavia, a lei do uso e desuso apresenta determinadas falhas conceituais no


processo evolutivo. Vimos como exemplo que o desuso pode influenciar em
alterações nos organismos, mas não há indício na ciência moderna comprovando
que o uso contínuo de determinada função possa levar ao desenvolvimento, como
sugerido no caso do pescoço alongado das girafas.

A segunda lei, referente à transmissão dos caracteres adquiridos, institui que as


características da relação de uso e desuso seriam transpostas às futuras gerações
pela hereditariedade. Ainda que esta hipótese não seja formulada exclusivamente
por Lamarck, sendo vista como um pensamento comum entre alguns cientistas da
época, Lamarck utilizou a relação de sua primeira lei como uma justificativa para o
conceito de transmissão dos caracteres.

Na tentativa de exemplificar a lei dos caracteres adquiridos, iremos nos referenciar


ao exemplo do uso e desuso utilizado nas girafas. Então, conforme esta lei implica,
as características desenvolvidas por uma geração são transmitidas às gerações
seguintes, como no caso das girafas que alongaram seus pescoços, desenvolvendo
filhotes com pescoços alongados, conforme implicado por Amabis e Martho (1997).

A única relevância deste segmento do lamarckismo se institui pela atenção


das características hereditárias. No entanto, esta lei é totalmente refutável
quando observamos que as características fenotípicas de um indivíduo não
são necessariamente transmitidas à geração seguinte, como compreendemos
anteriormente pelos experimentos de genética e hereditariedade realizados por
Mendel. É claro que o desenvolvimento dos ramos da genética na época não era
difundido entre os cientistas, mas hoje sabemos que esta teoria não possui nenhuma
evidência clara de que tais características possam ser transpostas às gerações
posteriores.

O progresso da ciência é marcado tanto pelos erros quanto pelos acertos dos
indivíduos que propõem hipóteses e teorias para justificar critérios que levam a
indagações. Neste ponto, ao pensarmos nos critérios da Biogeografia, as hipóteses
e teorias oriundas da corrente do lamarckismo possibilitaram um avanço significativo
com as contestações e novas formulações a respeito do processo evolutivo e
formulações das relações da biodiversidade em nosso planeta.

Sendo assim, podemos considerar que o lamarckismo, por mais que apresente
diversas lacunas e equívocos teóricos, possui um valor significativo quanto ao
desenvolvimento das ciências biológicas e das concepções da Biogeografia
aplicadas para contestar as teorias e hipóteses apresentadas por esta corrente do
evolucionismo.

42 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

O pioneirismo de Lamarck, sem dúvida, foi um marco crucial para o


desenvolvimento do modelo teórico atual sobre o evolucionismo. Apesar
de refutadas, suas hipóteses nos trouxeram elementos catalisadores para
o estudo das ciências biológicas.
Para conhecer um pouco mais da trajetória de Lamarck na ciência, leia a
edição especial da revista “Ciência Hoje”, volume 45, disposta em:
<http://www.biologia.bio.br/curso/Introdu%C3%A7%C3%A3o%20
%C3%A0%20Biologia%20Evolutiva/A%20bicenten%C3%A1ria%20
filosofia%20zool%C3%B3gica%20de%20Lamarck.pdf>. Acesso em: 24
jul. 2015.

3.3.2 Os estudos de Charles Darwin

Com o desenvolvimento das especulações sobre a busca de um modelo científico


capaz de abranger os segmentos evolutivos de uma forma concisa e eficaz, diversos
cientistas desenvolveram hipóteses explicativas catalisadas pela teoria de Lamarck
sobre a evolução.

O empirismo foi uma prática extremamente realizada nos estudos de vários


naturalistas. A importância de se deslocar ao local de estudo e coletar amostras,
observar e registrar fatos sempre foi uma característica necessária para as formulações
de hipóteses e teorias em diversos campos da ciência.

E fazendo uso desta prática científica, o naturalista Charles Robert Darwin (1809-
1882) desenvolveu uma corrente de pensamento que iria revolucionar o campo
das ciências biológicas e a própria Biogeografia, com uma série de apontamentos e
análises acerca do evolucionismo de todos os seres vivos, construindo uma corrente
científica hoje conhecida como darwinismo.

Por meio de suas viagens, Darwin observou as características, os hábitos e o


próprio ambiente de diferentes espécies animais, e constatou que a diversidade era
oriunda de uma seleção natural no desenvolvimento das espécies. Durante muito
tempo, o naturalista conservou suas hipóteses e mantinha o hábito contínuo de
investigação dos seres antes de publicar, com o apoio de Alfred Russel Walace
(1823-1913), a sua grande obra mundialmente conhecida, “A Origem das Espécies”.

Ainda que muitas formulações sobre as contribuições de Darwin sejam debatidas,


devemos sempre nos lembrar de que Darwin não descobriu a evolução, como
muito se acredita. Vimos, posteriormente, uma gama de cientistas especulando e
analisando os critérios de evolução, a contribuição deste cientista que mudou os

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 43
U1

ramos das teorias evolucionistas foi substancialmente o critério de seleção natural


das espécies.

Com base nos apontamentos presentes no estudo de Thomas Robert Malthus


(1766-1834) sobre o crescimento em progressões exponenciais e geométricas de
populações, Darwin constatou que o potencial de crescimento de populações
animais era muito maior do que a progressão do meio ambiente em gerar recursos,
demonstrando assim um princípio ecológico de competição entre os seres vivos no
mesmo ambiente.

Conforme Ridley (2006) relata, os indivíduos inseridos nesta competição por


alimentos acabavam desenvolvendo variações tanto nos critérios físicos quanto
comportamentais que os fizessem se destacar na busca dos alimentos, gerando,
consequentemente, uma prole com mais indivíduos apresentando características
idênticas ou similares destas variações, fazendo com que a competição e a busca
por alimentos se tornasse mais favoráveis a estes. Em contrapartida, os seres que não
apresentassem estas variações encontrariam dificuldades para buscar o alimento e
se reproduzir.

Analisando estas relações de mortalidade e os índices de reprodução em diversas


espécies animais, Darwin concluiu que estas variações nos indivíduos traziam
o sucesso em sua sobrevivência e reprodução, fazendo com que estes seres se
tornassem mais aptos ao meio em que estavam inseridos. Um elemento que enfatiza
estas observações de Darwin se encontra na seguinte citação:

As espécies que produzem variedades bem características


com mais frequência são exatamente as mais florescentes,
as espécies dominantes, conforme também se pode chamá-
las. Isto é, as que ocorrem em áreas mais extensas, as mais
difundidas dentro do seu próprio habitat, as de maior
número de indivíduos. Talvez isso já fosse de se esperar, pois
as variedades, para se tornarem permanentes, precisarão
competir com os demais habitantes do local. Assim, as espécies
que já são dominantes tenderão a produzir descendentes
que, mesmo ligeiramente modificados, ainda herdarão as
características positivas que permitiriam aos seus ancestrais
predominar sobre seus concorrentes (DARWIN, 2009, p. 82).

Sendo assim, temos o esboço do critério de seleção natural, no qual a adaptação


ao meio através das referentes características do indivíduo influencia diretamente
em sua predominância e perpetuação, sendo assim consideradas espécies mais
aptas ao meio. Erroneamente, os dizeres sobre os fundamentos da seleção natural

44 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

foram interpretados como “o mais forte sobrevive”, quando, na verdade, todos os


apontamentos e análises acerca da seleção natural apontam que a síntese correta
da teoria seria “o mais apto sobrevive”.

Como registro que demonstre a relevância irrefutável da seleção natural,


recorremos ao exemplo das mariposas sarapintadas (Biston betularia) mencionado
por Ridley (2006). Estas mariposas apresentavam como característica física uma
coloração esbranquiçada e acinzentada. Com a intensificação das indústrias em
decorrência da Revolução Industrial, os poluentes e as fuligens enegreciam cada vez
mais os troncos e as folhas dos vegetais. Dentre estas mariposas houve uma mutação,
fazendo com que estas apresentassem como característica física uma coloração
próxima do marrom. Este grupo de mariposas sarapintadas marrons conseguia se
camuflar melhor dentre as outras mariposas esbranquiçadas, tornando-as menos
perceptíveis aos predadores, levando assim a uma proliferação das mariposas
sarapintadas marrons.

A peculiaridade deste processo de seleção natural se dá essencialmente pela não


verticalização do processo. Comumente, pensamos que, para atingir a predominância
de uma espécie, os indivíduos se destacam dos demais e, ao atingirem a dominância
do ambiente, apenas irão se proliferar; entretanto, vimos que mesmo em um caso
onde já há uma dominância de uma espécie, as alterações do ambiente colocam o
segmento de dominância novamente na estaca zero, passando assim por um novo
processo de seleção natural.

Compreendemos então um princípio básico do darwinismo, a seleção natural,


mas ainda há coeficientes que devemos abordar para um entendimento geral do
darwinismo. Sobre estes coeficientes do darwinismo, podemos destacar, como um
apanhado geral da teoria de seleção natural de Darwin (2009), cinco elementos
fundamentais, como:

1) Variação: este elemento se baseia na diversificação do indivíduo no ambiente


em que ele está inserido, e as variações ocasionam a diversidade dos indivíduos,
onde cada um passará por um processo de adaptação distinto de acordo com suas
características.

2) Hereditariedade Genética: sabe-se que ao formular suas teorias, Darwin não


havia tido contato com a relação genética, mas os elementos de hereditariedade
observados serviram como parâmetro de observação e importância das
características que permitiam a adaptação do indivíduo ao meio de acordo com a
linhagem parental.

3) Seleção dos indivíduos: dada pela adaptação do indivíduo ao meio, a seleção


implica uma análise dos coeficientes tratados anteriormente com a diversidade do
meio, fazendo com que os indivíduos se destaquem tanto na busca por alimentos
quanto na reprodução.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 45
U1

4) Tempo: é um coeficiente fundamental para a ideia de seleção natural, uma vez


que “o processo de seleção se perdura no decorrer de várias gerações” (DARWIN,
2009, p. 134), sendo assim, o tempo hábil para a estabilidade e dominância de
determinadas espécies no ambiente.

5) Adaptação: é o elemento crucial que se faz dependente de todas as


circunstâncias apresentadas posteriormente, fazendo com que somente os
indivíduos aptos às condições do ambiente possam prosperar e se difundir.

Estes coeficientes são fundamentais para a vigência de seleção natural e a


diversidade dos seres vivos que conhecemos hoje. Apesar das fundamentações
do darwinismo apresentarem lacunas, sobretudo no que diz respeito às bases
do mendelismo e da genética, o darwinismo foi um dos principais alicerces que
envolvem as dúvidas e os esclarecimentos acerca da evolução.

Como meio de preencher as lacunas presentes na seleção natural, cientistas


modernos aplicaram os elementos de diversas ciências, cunhando uma nova
corrente de pensamento científica, conhecida como Neodarwinismo. Esta
corrente apresenta uma forte tendência às explicações sobre o evolucionismo, a
diversidade dos seres vivos e os segmentos de dispersão e distribuição de seres,
sendo atualmente reconhecida como um modelo científico adotado por muitos
pesquisadores e estudiosos atuais nas áreas das Ciências Biológicas e Ciências da
Terra, e, não obstante, da própria Biogeografia.

Podemos, agora, dar ênfase a um exemplo didático pautado no darwinismo, com


as contribuições sobre genética e população do neodarwinismo. Pensemos: todos
os ursos polares possuem pelagem branca, mas, e se criarmos um caminho reverso
para compreendermos como estes ursos se tornaram brancos?

Baseando-se nos princípios evolutivos de Darwin, podemos supor que o


ancestral comum dos ursos possuía pelagem escura e, por uma grande competição
em seu hábitat, foram migrando cada vez mais para regiões árticas em busca de
alimento. Porém, como o ambiente desta região era totalmente distinto do que
estes habitavam posteriormente, encararam dificuldades para obter o alimento, por
se destacarem com sua pelagem escura sob o tom esbranquiçado da neve. Dentre
os ursos de pelagem escura que se reproduziram, surge uma mutação na qual a
pelagem do urso passa a ser esbranquiçada (variação), a eficiência desta mutação
fez com que este tipo de urso pudesse se camuflar melhor no ambiente, tendo,
consequentemente, maior eficiência para obter o alimento. Logo, os ursos com
pelagem esbranquiçada se reproduziram, passando as suas características fenotípicas
através do cruzamento de genes como sugerido pelo mendelismo (hereditariedade
genética). Estes ursos com pelagem esbranquiçada passaram a competir com os
ursos da linhagem que não passaram pela mutação, os tornando mais aptos para
a obtenção de alimento no ambiente em que se inseriram (seleção dos indivíduos).

46 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

Com o passar das gerações, os ursos brancos se reproduziram (tempo), fazendo


com que a população de ursos com pelagem branca se sobressaísse como a mais
apta para aquele ambiente (adaptação).

Este segmento, então, nos apresenta, de uma maneira extremamente didática e


funcional, os parâmetros da seleção da espécie e do evolucionismo, sendo também
aplicável a todos os seres vivos de que se tem registro no planeta desde sua origem,
nos levando a crer que a evolução nada mais é do que um processo contínuo de
variabilidade genética de adaptação e seleção. Fundamentando assim as teorias
de Darwin como um dos principais expoentes para o evolucionismo, e podendo
demonstrar, de maneira prática, a evolução dos organismos através das evidências
da evolução.

E se aproximarmos as bases do darwinismo às relações sociais?


Um cenário interessante sobre esta aproximação está presente
no vídeo “Competição ou Solidariedade?”, que se baseia em
um diálogo fictício entre o naturalista Charles Darwin e o
geógrafo Piotr Kropotkin acerca das bases do darwinismo e as
relações sociais (Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=my833rPjbPA>. Acesso em: 10 ago. 2015).

3.3.3 Evidências da evolução

Dentre todas as hipóteses e teorias discutidas até o presente momento, temos um


alicerce para debatermos determinados elementos que possam ser considerados
como evidências técnicas do processo evolutivo. Meios de classificação sobre a
Taxonomia de Lineu e as organizações das espécies em chaves de análise nos
auxiliam a compreender mais as evidências de evolução e como estas se expressaram
nos seres vivos até os dias atuais.

Primeiramente, devemos tomar ciência sobre a organização dos seres vivos em


seus referentes eixos para que assim possamos comparar traços que demonstrem as
evidências evolutivas. Para tal, realizaremos um apanhado das inferências de Ridley
(2006), Brown e Lomolino (2006) e Amabis e Martho (1997) para compreendermos
a organização dos seres vivos.

As classificações dos seres vivos têm como principal aparato a organização de


todas as formas de vidas em eixos, os quais possuem como critério as características
físicas e genéticas comuns aos seres vivos. As relações dos eixos se apresentam na
seguinte ordem de especificidade:

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 47
U1

Reino: subdividido em animal (animais), vegetal (vegetais), fungi (fungos) e mineral


(minerais).

Filo: é uma divisão mais atenta dos segmentos do reino de acordo com suas
características. Por exemplo, o reino dos animais é subdividido em dez filos:
Poríferos (esponjas do mar), Celenterados (águas vivas), Platelmintos (planárias),
Asquelmintos (lombrigas), Anelídeos (minhocas), Moluscos (polvos), Artrópodes
(insetos), Aracnídeos (escorpião), Equinodermos (estrela-do-mar), Cordados (peixes,
mamíferos etc).

Classe: é uma divisão dos seres pertencentes ao filo, como, o filo dos cordados se
subdivide em cinco classes: peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos.

Ordem: é uma divisão que agrupa seres que apresentam características


extremamente similares, como, a ordem dos carnívoros (cães, lobos etc.), cetáceos
(mamíferos aquáticos), primatas (macacos) e muitas outras ordens que definem
características genéticas e físicas semelhantes.

Gênero: baseia-se em uma subdivisão que especifica as características da ordem,


como, na ordem dos primatas há os gêneros: Pan (chimpanzés), Homo (hominídeos),
Lemur (lêmures) e muitos outros.

Espécie: a espécie é o que define exatamente, especifica, como o próprio nome


sugere, determinado tipo de ser vivo, como, no gênero Homo: neanderthalensis
(Neandertal), sapiens (humanos arcaicos), entre outros. Há, também, a classificação
direcionada a subespécies, na qual é adicionado um sufixo dirigido à delimitação da
subespécie.

Apresentamos então um modelado genérico da taxionomia de Lineu, utilizada


como parâmetro de classificação dos seres vivos. Você deve ter percebido que, no
decorrer das explicações acerca da taxonomia, os exemplos foram dirigidos para
culminar nos humanos, sendo assim, partimos da exemplificação desde o Reino
até a espécie, mas ainda assim não delimitamos o ser humano tradicional. Para
realizar esta delimitação cabe uma classificação de subespécie, fazendo com que
biologicamente passamos a ser inseridos na taxonomia Homo sapiens sapiens.

É comum nos depararmos com as classificações taxonômicas em qualquer texto


que nos remeta a fundamentos biológicos. Sendo assim, podemos compreender
exatamente sobre qual gênero e espécie os autores se referem, por exemplo, as
mariposas sarapintadas mencionadas no segmento anterior sobre darwinismo:
Biston betularia é o seu nome científico, onde “Biston” se refere ao gênero e
“betularia” à espécie.

A compreensão destas classificações taxonômicas é fundamental para realizarmos


uma abordagem direcionada às evidências evolutivas, uma vez que iremos nos

48 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

basear em elementos como relação de funções por meio da biologia comparativa.

É nítido que, ao observarmos determinadas características físicas dos animais,


relacionamos as funções de determinados elementos entre diversas espécies
distintas desempenhando o mesmo papel, como membros e órgãos. As evidências
evolutivas relacionadas a estas particularidades e similaridades são apresentadas
através da análise das funções análogas e homólogas.

As referências evolutivas análogas nos referem a elementos no organismo que


desempenham a mesma função, mas, de acordo com a Biologia evolutiva, sabe-se
que origem embrionária é totalmente distinta, como, os órgãos de voo de um inseto
e de uma ave: a função desempenhada é a mesma, mas a origem embrionária é
totalmente distinta, fazendo com que as evidências evolutivas que possam apontar
um princípio ordenado de evolução de um inseto para uma ave sejam totalmente
descartadas (AMABIS; MARTHO, 1997).

Em contrapartida, as referências evolutivas homólogas apontam que


determinados organismos que desempenham funções diferentes possuem uma
origem embrionária similar, tendo como exemplo as asas das aves e as nadadeiras
dos mamíferos cetáceos. Tais comparações apresentam um fundamento biológico
que evidencia características evolutivas nestes seres, uma vez que podemos observar,
tal como a figura abaixo nos sugere, as mesmas características ósseas, derivando
assim evidências de que haveria um princípio de um ancestral comum a estes seres.

Figura 1.3 | Biologia comparada de órgãos homólogos

Fonte: Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Homologia_(biologia)#/media/File:Homology_vertebrates-pt.svg>.


Acesso em: 25 jul. 2015.

Entretanto, por mais que estes órgãos se apresentem extremamente similares,


como afirmar de fato que há uma evidência evolutiva entre eles? Para tal, devemos
recorrer às análises tratadas no tópico anterior sobre os fundamentos da seleção
natural. Em síntese, podemos afirmar que entre estes seres havia ancestrais comuns
que foram dispostos a ambientes diferentes e passaram por um processo de

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 49
U1

adaptação e seleção natural, ocasionando na diversidade e especificação de funções


destes seres, mas ainda assim mantendo critérios genéticos extremamente similares.

A Biologia comparativa nos traz então bases para que possamos evidenciar
princípios evolutivos similares entre seres vivos completamente distintos, mas
inseridos em um mesmo grupo taxonômico, possibilitando assim traçar elementos
que comprovem o evolucionismo pautado, sobretudo, nas correntes evolutivas
darwinista e neodarwinista, fornecendo bases suficientes para desenvolvermos um
amplo debate no segmento da Biogeografia Ecológica.

1. Pautando-se no cerne dos estudos presentes nos temas de


Hereditariedade e Genética, tendo como apoio teórico-prático a
corrente do mendelismo e as discussões acerca do conceito das
características genéticas, destaque as afirmações a seguir entre
verdadeiro (V) e falso (F) e a seguir assinale a alternativa correta.

( ) O mendelismo é uma corrente de estudo da genética


que foi fundamentada através dos experimentos de
Gregor J. Mendel, que servem como embasamento para
os conceitos de hereditariedade genética por meio da
expressão de característica fenotípica determinada pela
carga genotípica.
( ) O direcionamento das pesquisas genéticas ao estudo da
Biogeografia Histórica auxilia a formulação das hipóteses de
dispersão e diversidade biológica por meio da variabilidade
genética gerada pela reprodução ou, em casos específicos,
de mutação gênica.
( ) A reprodução sexuada tem como característica a variabilidade de
combinações genéticas através do cruzamento de informações
dispostas nos gametas masculinos e femininos, enquanto a
reprodução assexuada possui uma baixa variabilidade genética,
tendo como principal adversidade dos seres vivos assexuados a
alteração do ambiente (biótopo) que habitam.
( ) A mutação gênica é um processo que ocorre quando há
uma falha na cópia de nucleotídeos para os gametas. Tal
fenômeno tem ocorrência apenas através da reprodução
assexuada entre indivíduos de diferentes espécies.

50 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

( ) Para evidenciar os elementos de variabilidade genética,


utiliza-se um processo metodológico conhecido por
proporção mendeliana, que levanta informações acerca da
relação de dominância e recessividade dos genes cruzados.

a) V – F – V – F – V.
b) F – F – V – F – F.
c) V – V – F – F – V.
d) F – V – F – V – V.
e) V – V – V – F –V.

2. As evidências da evolução podem ser observadas quando


analisamos todos os seres vivos por um viés biológico e
taxonômico, apresentando características físicas e genéticas
similares, podendo assim traçar um padrão evolutivo.
Destaque as afirmações a seguir entre verdadeiro (V) e falso
(F) e a seguir assinale a alternativa correta.
( ) A taxonomia de Lineu auxilia a compreensão dos seres
em escala evolutiva através da análise dos grupos
pertencentes a cada táxon.
( ) As características homólogas são mais constatadas
entre seres pertencentes ao mesmo táxon, por
exemplo, o filo dos cordados (mamíferos, aves etc.).
( ) Referências evolutivas análogas são comumente
encontradas em seres de táxons distintos, por exemplo,
órgão de voo de insetos e aves.
( ) Os conceitos de seleção natural e adaptação não
podem ser designados como fatores que comprovam
o evolucionismo.

a) V – V – F – F.
b) F – F – V – V.
c) V – F – V – F.
d) V – V – V – F.
e) F – F – F – V.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 51
U1

52 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

Seção 4

Dispersão e distribuição dos seres vivos


É incontestável que todo o desenvolvimento das teorias e experimentos realizados até
então culminasse em um ponto explicativo, tornando possível e alcançável a compreensão
acerca dos elementos evolutivos como justificativa à distribuição e diversidade dos seres
vivos no planeta.

Até alcançar esta seção, discorremos sobre pontos cruciais e alguns elementos
presentes no estudo da Biogeografia Histórica, tornando possível a fundamentação teórica
e segmentos que proporcionem a compreensão de diversos motes tratados por este ramo
da Biogeografia. Foi fundamental então discutirmos sobre a origem da vida no planeta
e os conceitos que proporcionaram as concepções de evolução e biodiversidade para
alcançarmos este eixo que, quiçá, pode ser considerado uma das maiores potencialidades
de estudo oriundo do ramo da Biogeografia Histórica.

Firmando-nos à centralidade do ramo da Biogeografia Histórica, nesta seção iremos


compreender e analisar as circunstâncias que propiciaram a dispersão e distribuição dos
seres vivos no planeta através dos fenômenos de larga escala, e como estes fenômenos,
apoiados nos parâmetros de adaptação darwinista, levaram à dispersão dos seres ao redor
do globo.

Buscando compreender os fatores intrínsecos que motivaram a dispersão e a diversidade


dos seres vivos, devemos inicialmente discorrer sobre fenômenos fundamentais, como
a deriva continental, e em paralelo levantarmos as correlações e circunstâncias deste
fenômeno como um agente biogeográfico basal para o cenário dos seres vivos no planeta.

4.1 A deriva continental


Entre as maiores contribuições para a Biogeografia estão as concepções e
difusão das teorias sobre a deriva continental. As potencialidades destas teorias se
pautam na comprovação da similaridade entre os seres vivos em táxons. Esta teoria
apresenta uma representatividade para as Geociências tal qual a origem da espécie
e o darwinismo significaram para as Ciências Biológicas, sendo assim essencial

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 53
U1

destacá-la para um melhor aprofundamento em Biogeografia.

Mas o que é a teoria da deriva continental? O primeiro indício desta teoria se


encontra nos registros de Francis Bacon (1561-1626), que, através da análise dos
primeiros mapas, destacou com peculiaridade o delineamento nas margens entre o
continente sul-americano e africano, que se dispunham como encaixes separados
por algum fenômeno. Com o decorrer das atividades científicas, esta teoria era
retomada e sempre acrescida por algum aporte teórico na tentativa de explanar tais
peculiaridades do delineamento dos continentes.

Somente no século XX, com os estudos de Alfred Wegener (1880-1930),


apresenta-se um esboço teórico para a explicação do delineamento e disposição
dos continentes. Embora não apresentasse evidências experimentais sobre a deriva
continental, Wegener se baseava na ideia de que os continentes, no passado da
história da Terra, estiveram dispostos em um megacontinente.

O modelado proposto por Wegener se pautava em uma grande massa continental


que fora separada com a evolução gradual do planeta. Tassinari (2008) nos apresenta uma
concepção do modelado dos continentes proposto por Wegener no seguinte trecho:

A este supercontinente Wegener denominou Pangea,


onde Pan significa todo, e Gea, Terra, e considerou que
a fragmentação do Pangea teria iniciado há cerca de 220
milhões de anos, durante o Triássico, quando a Terra ainda
era habitada por dinossauros, e teria prosseguido até os dias
atuais. O Pangea teria iniciado a sua fragmentação dividindo-
se em dois continentes, o setentrional chamado de Laurásia
e o austral denominado Gondwana (TASSINARI, 2008, p. 98).

Estas hipóteses foram divulgadas por Wegener à comunidade científica em 1915


com a obra “A Origem dos Continentes e Oceanos”. Tais ideias auxiliavam a formulação
de respostas ante as problemáticas da Geologia e Biogeografia, baseando-se na
similaridade entre rochas e animais de distintos pontos do planeta, mas que em um
passado estiveram extremamente próximos antes da deriva continental do Pangea.

Os parâmetros utilizados para fundamentar a teoria de que os continentes já


estiveram unificados eram as semelhanças geomorfológicas de determinadas
cadeias montanhosas no sul da Argentina e na África do Sul, além da comparação do
paleoclima com as evidências de glaciação, e dos fósseis encontrados em regiões
distantes datando o mesmo período. Tal qual ilustra a figura a seguir, podemos
compreender o modelado do Pangea e as localidades que evidenciam a dispersão e

54 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

os elementos de comparação do paleoclima.

Figura 1.4 | Ilustração da Deriva Continental e zonas concomitantes do paleoclima

Fonte: Tassinari (2008)

Porém, as definições de Wegener só foram definitivamente aceitas na década


de 1940, através de sondagens realizadas pelos alemães durante a Segunda Guerra
Mundial. Através destas sondagens foi observado que o relevo submarino se
apresentava muito mais complexo do que se imaginava.

Um elemento principal que ainda sustenta a teoria da deriva continental foi a


descoberta de uma cadeia montanhosa submarina nomeada como Dorsal Meso-
Atlântica. Esta cadeia montanhosa se estende pelo fundo do Oceano Atlântico de norte
a sul do oceano, no decorrer da cadeia apresentam-se diversos vales, nos levando a
crer que havia um regime de pressão que forçou a separação dos continentes.

O modelo que enfatiza a presença da Dorsal Meso-Atlântica como uma das


principais evidências da deriva continental, conforme apresenta Tassinari (2008),

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 55
U1

poderia se basear em uma cicatriz que comprovasse a separação dos continentes,


mas estudos sobre a idade das rochas provam o contrário, alegando que estas
rochas são consideradas razoavelmente jovens.

Então, como comprovar a teoria da deriva continental? Através dos alicerces que
fundamentam a relação das tectônicas de placas, podemos evidenciar de maneira
conclusiva a teoria da deriva continental, comprovando tanto suas particularidades
como fornecendo informações a respeito da dinâmica interna da Terra.

Cientistas como Stanley (1999), Brown e Lomolino (2006) reforçam os segmentos


que estruturam a teoria de que a Terra pode ser dividida por três frações:

a) A crosta segmentada em continental, com as rochas mais antigas, e a


oceânica, com rochas razoavelmente jovens.

b) O manto, subdividido em superior e inferior, na porção superior se encontra


uma zona chamada atenosfera, que realiza movimento contínuo de correntes de
convecção baseado na temperatura do magma.

c) O núcleo, que é a porção central extremamente densa, composta de


materiais pesados como o Ferro (Fe).

Um dos principais elementos da estrutura interna do planeta que nos auxiliam


na compreensão da tectônica de placas é a atenosfera. Por estar em contínua
movimentação, a atenosfera influi diretamente na movimentação e no arranjo
das partes superiores, como a crosta, induzindo a abalos sísmicos quando a
movimentação faz com que choquem duas ou mais porções das placas da crosta.

Com as fundamentações da estrutura interna da Terra, Stanley (1999) nos indica


elementos que auxiliam a concepção de que a estrutura interna da Terra pôde
proporcionar a deriva continental partindo de dois elementos: 1) a expansão que
ocasionou a deriva advém das forças geradas pelas rochas derretidas vindas do
manto por falhas ou fissuras na crosta oceânica; 2) a subducção, quando parte da
crosta é tragada pelo manto.

Tais dinâmicas influenciaram diretamente na movimentação contínua dos


continentes, sendo assim a corrente de pensamento acerca da deriva continental
proposta por Wegener foi adotada como um modelo básico para o entendimento
do fluxo e deslocamento dos continentes.

Sendo assim, compreendemos que os continentes do planeta tenham se


desfragmentado da grande massa continental intitulada como Pangea, todavia,
devemos sempre nos recordar de que os decorreres destas movimentações se
remetam à escala do tempo geológico, ou seja, esta movimentação dos continentes
não ocorreu de forma abrupta, mas sim em uma movimentação lenta e contínua
por milhares de anos, até atingir o modelado atual dos continentes no planeta Terra.

56 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

Podemos encarar como complexo o processo de abstração utilizado


para compreendermos como ocorreu a dinâmica da Deriva Continental.
A modo de minimizar esta complexidade, podemos recorrer a um
modelo desenvolvido pela agência estadunidense de Administração
Nacional de Oceanos e Atmosfera (NOAA), que simula a dinâmica da
deriva continental.
Acesse: <http://sos.noaa.gov/Datasets/dataset.php?id=569#>, (Acesso
em: 10 ago. 2015), a seguir clique no botão no canto superior direito
“Interactive Sphere”.

4.1.1 Deriva continental e Biogeografia Histórica

Uma vez que atingimos a concepção do deslocamento dos continentes, é


inegável que, ao submeter olhares biogeográficos sobre esta dinâmica, pensemos
sobre os seres vivos que estiveram presentes durante este marco da história do
planeta.

Como supracitado, os animais que estiveram presentes na superfície do planeta


nos indícios da deriva continental eram os dinossauros e parcos mamíferos. Logo, é
natural que os principais registros associados à dispersão e diversidade deste período
geológico façam alusão aos seres vivos da época.

Para compreendermos como a concepção da deriva continental e o wegenismo


impactaram a inclusão de novas concepções acerca da distribuição dos seres vivos
no planeta, devemos retomar os pensamentos e as teorias tratados na seção 1
desta unidade, nos atendo aos estudos da Panbiogeografia e das formulações sobre
Vicariância.

Como mencionado anteriormente, a Panbiogeografia adolescida por Croizat


buscava a compreensão da distribuição dos seres vivos através das hipóteses de uma
dispersão migratória. Devemos ainda ressaltar que Croizat refutava a teoria da deriva
continental, alegando que a dispersão dos seres vivos era um reflexo das barreiras
geográficas e a similaridade entre os organismos era fruto da difusão destes seres
ante as barreiras geográficas.

A ideia central que podemos extrair sobre as relações do dispersionismo é que


os seres vivos tenderam a uma especiação de acordo com a barreira geográfica
imposta com a deriva continental. Quando analisamos os parâmetros evolutivos,
é nítida a divergência em determinado limite do tempo geológico, que formulou a
diversidade da distribuição de seres que conhecemos hoje.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 57
U1

Ilustrando de uma maneira didática, seres de um mesmo grupo animal que


estiveram no mesmo hábitat pré-deriva continental possuíam características em
comum. Com a fragmentação desse hábitat e a imposição de barreiras geográficas
,como a formação de montanhas, aumento do nível do mar e o distanciamento
progressivo dos continentes, este grupo animal se fragmentou e pouco a pouco
passou por processos evolutivos e adaptativos distintos, levando assim a uma
diversidade e a uma especiação distintas.

Tal relação didática nos apresenta o fundamento principal da dispersão tratada


na Panbiogeografia, mas, sobre as análises de vicariância, devemos nos ater
principalmente pela fragmentação dos grupos similares de seres vivos no mesmo
hábitat sujeitos a uma especiação dentro do grupo, e que com as barreiras geográficas
estes grupos passaram por uma intensificação das especiações.

Sobre o conceito de vicariância e a sua relação direta com a diversidade e


dispersão dos seres vivos, podemos ressaltar os apontamentos de Santos (2011),
afirmando que:

Quando se fala em vicariância, no entanto, acredita-se que


população ances¬tral ocupava, em alguma extensão, a
somatória das áreas habitadas hoje por seus descendentes,
tendo sido dividida em populações menores pelo
surgimento de barreiras que provocaram o isolamento entre
subpopulações. Essas barrei¬ras são as causas da disjunção
(ou separação) observada e afetam toda ou uma grande parte
da biota da área (SANTOS, 2011, p. 7).

A vicariância em si possui uma grande potencialidade para o exame dos fatos,


uma vez que encara a dispersão dos seres através de análises apuradas com os
grupos que ocupavam determinada área do globo e pela comparação dos
precedentes geológicos de determinada região. Construindo assim uma base para
fundamentações de teorias acerca da distribuição dos seres.

De modo a pensarmos de maneira prática sobre como a deriva continental


influenciara um papel fundamental para a dispersão e diversidade dos seres vivos
ante as barreiras geográficas, Silva (2011) nos aponta as seguintes inferências:

A espécie em questão surgiu a partir da diversificação de uma


espécie ancestral que provavelmente tinha uma distribuição

58 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

diferente das suas espécies descendentes. Uma forma comum


de especiação é a especiação alopátrica, que ocorre pelo
isolamento geográfico de populações da espécie ancestral.
Nesse caso, duas populações de uma espécie ancestral vivendo
em uma área A foram isoladas pelo aparecimento de uma barreira
geográfica (evento vicariante) que durou tempo suficiente para
que ocorresse a diferenciação em duas espécies dis-tintas. Essa
barreira pode ser o aparecimento de um rio, o soerguimento de
uma montanha ou grandes mudanças ambientais entre as duas
áreas (SILVA, 2011, p. 13).

As relações das barreiras geográficas atuaram e ainda atuam como um fator


fundamental para pensarmos como as espécies se distribuem pelo planeta, levando
a crer que a deriva continental deve ser interpretada como um marco crucial para
os estudos acerca da dispersão e distribuição dos seres, uma vez que foi formulada
uma nova geografia em nível global com o deslocamento dos continentes.

A reconstrução destes “passos” tomados para a distribuição e diversidade dos


seres em larga escala é o escopo geral dos estudos da Biogeografia Histórica, uma
vez que “a preocupação da Biogeografia Histórica é 'reconstruir' a origem, dispersão
e extinção de táxons e biotas” (BROWN; LOMOLINO, 2006, p. 4). Isto faz com que os
estudos acerca dos tipos de diversidade e a distribuição dos animais tratadas de uma
maneira mais específica sejam extremamente mais explorados pela Biogeografia
Ecológica. Fazendo assim com que a Biogeografia Histórica se atenha aos elementos
de grande escala, como a deriva continental mencionada aqui, criando um alicerce
voltado mais à dinâmica que motivou a distribuição dos seres do que à distribuição
exata dos seres vivos pelo planeta.

De forma a concluirmos a ideia de dispersão e diversidade dos seres vivos no


campo da Biogeografia Histórica, compreendemos que a deriva continental foi um
dos fatores de grande importância que estão intrinsecamente relacionados com a
dispersão e distribuição dos seres vivos ao redor do planeta. Vimos, também, que as
barreiras geográficas possuem um papel fundamental para a distribuição, adaptação
e evolução dos seres vivos nas mais diversas espécies, e que, se pensarmos nesta
questão, as barreiras geográficas globais nos dias atuais continuam exercendo este
respectivo na difusão e diversificação dos seres vivos em diferentes escalas.

Mas a relação ecológica que fundamenta e explica os porquês de determinadas


espécies terem um arranjo espacial específico cabe à abordagem e a um
aprofundamento teórico no campo da Biogeografia Ecológica, analisando os fatores
limitantes para a distribuição dos seres, como clima, edafologia, ecologia, entre outros.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 59
U1

Sendo assim, podemos concluir que a Biogeografia Histórica nos traz uma análise
dos processos de grande escala, e quando há a necessidade de uma compreensão
dos parâmetros de dispersão e diversidade dos animais no decorrer da história
da Terra, é fundamental recorrermos a concepções geológicas, como a deriva
continental, e observá-las por um viés biogeográfico que nos permita fundamentar e
comprovar determinadas hipóteses acerca da distribuição dos seres vivos no planeta.

1. A deriva continental foi uma teoria que, sem dúvida, abriu


diversos horizontes para as ciências da Terra, em campos
como a Geologia e a Biogeografia. Tal teoria auxilia a
fundamentação de uma gama de elementos e hipóteses
sobre o desenvolvimento geológico do planeta e dos seres
vivos que nele habitavam. Acerca dos conhecimentos sobre
a deriva continental, assinale a alternativa correspondente às
afirmações corretas.
I - A deriva continental foi uma teoria proposta por Alfred
Wegener para explicar as semelhanças taxonômicas e a
morfologia dos continentes.
II - Cadeias montanhosas, como a Dorsal Meso-Atlântica,
são compostas por rochas extremamente antigas, encaradas
assim como cicatrizes que comprovam a teoria.
III - Princípios como as contínuas correntes de convecção
dos fluidos magmáticos na atenosfera sustentam a teoria da
deriva continental e da tectônica de placas.
IV - A teoria defende que haveria uma grande massa continental
nomeada por Pangea, podendo esta ser dividida entre Laurásia
(Hemisfério Norte) e Gondwana (Hemisfério Sul).
V - As comprovações da deriva continental ainda são refutadas
diante dos modelos científicos adotados em diversas ciências.
a) I – II – III – V.
b) II – III – IV – V.
c) I – III – IV.
d) I – II – V.
e) II – III – IV.

60 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

2. Os conceitos sobre a deriva continental nos fornecem bases


epistemológicas da Biogeografia Histórica para traçarmos
hipóteses fundamentais sobre a dispersão e diversidade de
seres vivos, critérios amplamente estudados por este ramo
da Biogeografia. Acerca da amplitude do estudo deste ramo,
assinale a alternativa que contém o agrupamento temático:
I – Barreiras geográficas.
II – Conceito de vicariância.
III – Especiação dos seres vivos.

Estão corretos apenas:


a) I e III.
b) I e II.
c) II e III.
d) I, II e III.

Nesta unidade você aprendeu:


• Um pouco sobre o desenvolvimento histórico da Biogeografia.
• As teorias e os processos de formação do universo.
• As hipóteses e teorias sobre origem da vida na Terra.
• Conceitos de variabilidade genética e hereditariedade.
• Princípios evolutivos apoiados nas correntes do lamarckismo e
darwinismo.
• Organizações taxonômicas como princípio evolutivo.
• Evidências palpáveis do processo evolutivo e os princípios da
seleção natural.
• Elementos biogeográficos da deriva continental.
• Concepções sobre dispersão e vicariância.
• O papel da Biogeografia Histórica para a compreensão da
dispersão dos seres.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 61
U1

Com o transcorrer desta unidade, nós podemos compreender


as abordagens e os elementos fundamentais para o estudo da
Biogeografia Histórica em diferentes eixos, apontando critérios
que partiram desde a origem do planeta e da vida até os princípios
de evolução e dispersão dos seres vivos.
Ampliar nossos conhecimentos pautados na concepção de
fenômenos e dinâmicas biogeográficas é sem dúvida uma tarefa
complexa, porém extremamente prazerosa e recompensadora,
nos permitindo desenvolver uma nova gama de olhares para a
compreensão do mundo e de todos os seres que o habitam,
inclusive nós.
Para lhe auxiliar em sua jornada de expansão nos conhecimentos
sobre a Biogeografia enquanto ciência, indicaremos duas
referências que foram amplamente utilizadas no decorrer desta
unidade: a obra “A Origem das Espécies”, do naturalista Charles R.
Darwin, que revolucionou todo o campo das ciências biológicas,
inclusive a Biogeografia, nos apresentando bases essenciais para
a compreensão da origem, diversidade, distribuição e evolução
dos seres vivos. Outra referência indicada é o volume especial
de Biogeografia do periódico “Revista da Biologia”, disponível
gratuitamente em meio virtual pelo Instituto de Biociências da
Universidade Estadual de São Paulo. (Disponível em: <http://
www.ib.usp.br/revista/volume7>. Acesso em: 24 jul. 2015).

1. O mendelismo é uma corrente científica que nos auxilia


na compreensão das cargas genéticas dos seres vivos
(genótipo), sendo expressas através de suas características
(fenótipo). A dinâmica oriunda da reprodução sexuada é basal
para o entendimento da biodiversidade e dos processos de
adaptação e seleção natural aos quais os seres vivos estão
sujeitos. Partindo deste pressuposto, suponhamos que
os alelos Aa estipulem a coloração acinzentada em ratos
e os alelos aa causam o albinismo, tendo como principal
característica a coloração branca. Seguindo os parâmetros da

62 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

proporção mendeliana, assinale a alternativa correta que apresente


os percentuais da troca de genes entre os alelos Aa x aa.
a) 50% acinzentados (Aa), 25% albinos (aa) e 25% marrons (AA).
b) 50% acinzentados (Aa), 50% albinos (aa) e 0% marrons (AA).
c) 25% acinzentados (Aa), 25% albinos (aa) e 50% marrons (AA).
d) 0% acinzentados (Aa), 75% albinos (aa) e 25% marrons (AA).
e) 100% acinzentados (Aa), 00% albinos (aa) e 0% marrons (AA).

2. A diversidade dos seres vivos é decorrente de uma série


de dinâmicas biológicas e biogeográficas presentes pelo
desenvolvimento de uma espécie e sua difusão. Assinale a
alternativa que contemple todos os elementos tratados que
proporcionam a diversidade dos seres vivos.
I – Reprodução sexuada
II – Mutações gênicas
III – Seleção natural
IV – Barreiras geográficas

a) I, II e IV.
b) II, III e IV.
c) I e IV.
d) I, III e IV.
e) Todas as opções.

3. Tratando-se das concepções sobre o evolucionismo,


apresentam-se duas principais correntes científicas, o
lamarckismo e o darwinismo, sendo esta segunda um
predecessor do modelo neodarwinista. Diante destas três
correntes científicas, associe cada abordagem evolucionista
à corrente científica apropriada e assinale a alternativa
correspondente:
1 – Lamarckismo

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 63
U1

2 – Darwinismo
3 – Neodarwinismo

Apresenta-se sob a lei do uso e desuso como


catalisadores para a evolução dos seres vivos.
Apoia-se sobre as análises genéticas para tratar o
conceito de hereditariedade e os fundamentos de seleção
natural.
Expõe pela primeira vez o conceito de seleção natural
como critério para fundamentação do evolucionismo.
Apoia-se no fundamento de hereditariedade das
características físicas desenvolvidas na geração anterior.
Utiliza-se de análises e metodologias modernas para
a compreensão do evolucionismo, como a genética e os
fundamentos da Biogeografia.
a) 1 – 2 – 3 – 2 – 1.
b) 3 – 1 – 3 – 2 – 1.
c) 1 – 3 – 2 – 1 – 3.
d) 2 – 3 – 2 – 1 – 3.
e) 3 – 2 – 3 – 2 – 1.

4. Sabe-se que a Biogeografia enquanto ciência acabou por


apresentar uma dicotomia entre os ramos da Biogeografia
Histórica e a Biogeografia Ecológica. Tratando-se das abordagens
tratadas pelo ramo histórico, assinale a alternativa que difere dos
estudos e das pesquisas desenvolvidas neste ramo.
a) Diversidade e distribuição pelas relações ecológicas dos
seres vivos.
b) Desenvolvimento do evolucionismo analisado em ampla
escala.
c) Fenômenos de ação em escala global, como a deriva
continental, glaciações e paleobiogeografia.
d) Hipóteses e teorias sobre a origem da vida no planeta.
e) Segmentos e evidências históricas do evolucionismo.

64 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

5. Estudos sobre a origem da vida ainda são amplamente


debatidos e pesquisados por vários cientistas modernos.
Esta problemática deu origem a diversas hipóteses e teorias
com a finalidade de descobrir como os primeiros seres vivos
surgiram em nosso planeta. Sobre esta questão, assinale a
alternativa que apresenta o modelo atual científico para os
estudos acerca da origem dos seres vivos.
a) O criacionismo advém como principal modelo teórico para
a formulação das hipóteses acerca da origem da vida e da
formação do planeta.
b) A origem da vida está substancialmente pautada nos
trabalhos de Darwin, fornecendo um alicerce pelos estudos
sobre genética abordados na obra “A origem das espécies”.
c) Teorias como a geração espontânea são o atual modelo
científico utilizado para os estudos, fomentado essencialmente
pelas pesquisas de Pasteur.
d) As hipóteses autotrófica e heterotrófica se apresentam
como principal modelo científico apoiado pelo conceito de
seleção natural dos seres vivos.
e) O modelo para a explicação da origem da vida se baseia nas
análises entre as referências evolutivas análogas e homólogas.

Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 65
U1

66 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
U1

Referências

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pesquisa de Darwin e Lamarck e sua transposição para o ambiente escolar. Ciência &
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Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta 67
U1

Apr. 2004. Disponível em: <http://www.talkorigins.org/faqs/abioprob/spontaneous-


generation.html>. Acesso em: 4 jun. 2015.

68 Biogeografia histórica: origem da vida, evolução e distribuição dos seres vivos no planeta
Unidade 2

BIOGEOGRAFIA ECOLÓGICA:
FATORES LIMITANTES DA
DISTRIBUIÇÃO DOS SERES
VIVOS
Guilherme Alves de Oliveira

Objetivos de aprendizagem:

Nesta unidade iremos nos ater aos elementos que condicionam a dinâmica
dos fatores limitantes da distribuição dos seres vivos pelo viés fundamentado
na Biogeografia Ecológica, tendo por objetivo central a compreensão destas
dinâmicas e como as relações e as interações ecológicas contribuem para
a disposição dos seres ao redor do planeta diante da múltipla interação dos
fatores limitantes como um condicionante para a abundância ou a restrição
dos seres vivos.

Seção 1 | Fatores limitantes da distribuição dos seres vivos

Vamos nos dedicar nesta seção à compreensão da gama central de


fatores limitantes que influenciam na distribuição dos seres vivos. Para
tal, realizaremos abordagens direcionadas à compreensão baseando-nos
nos princípios gerais da Biogeografia e pela dinâmica da Biosfera e suas
interações com as demais esferas, como a Litosfera, Atmosfera, Hidrosfera,
entre outras. Elencando a interação de elementos da Geologia, Climatologia,
Geografia, Ecologia e demais segmentos, para que seja possível conceber
as dinâmicas oriundas destes fatores como agentes condicionantes para a
amplitude e limitação dos seres vivos no planeta.

Seção 2 | Relações e interações ecológicas


Na Seção 2 desta unidade dedicaremos um espaço para a compreensão
U2

da dinâmica das interações ecológicas como um elemento fundamental


da Biogeografia, pautado nas relações entre os seres vivos em respectivas
circunstâncias dos fatores bióticos, estudando pelos critérios de
sociabilidade a relação comportamental e a distribuição dos seres vivos
ante as interações de cada população, nos atendo substancialmente às
concepções de relações harmônicas, desarmônicas e neutras entre os
seres vivos.

70 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

Introdução à unidade

Dentre a complexidade dos estudos direcionados à Biogeografia, destacaremos


nesta unidade desenvolver os conhecimentos acerca dos elementos presentes no
ramo da Biogeografia Ecológica. Tal segmento de direcionamento de estudo está
voltado para a definição de critérios e dinâmicas fundamentais para a construção
e o discernimento de determinados fenômenos biogeográficos no que circunda a
atuação dos fatores limitantes à distribuição dos seres vivos.

Como justificativa, devemos reforçar que a abordagem por este ramo da


Biogeografia refuta a lógica da dicotomia, uma vez que elementos de estudos
desenvolvidos pelo ramo da Biogeografia Histórica serão tratados aqui de maneira
indissociável, fazendo com que a Biogeografia enquanto ciência seja contemplada
em seu cerne e especificidade.

Um primeiro questionamento diante destas aclarações é: Qual é a relevância


de estudarmos e direcionar o enfoque para a Biogeografia Ecológica? Estudar
este ramo da Biogeografia é fundamental para que possamos compreender as
dinâmicas que proporcionam a variedade de formas de vida e como estas se
relacionam com o meio em que habitam desenvolvendo critérios essenciais para
a relação de comunidade e composição de uma biota ante estas dinâmicas.

Ao analisarmos cada um destes elementos e fenômenos e os compreender


por um viés lógico e educacional, esta complexidade passa a se tornar muito
mais alcançável, uma vez que, com os conhecimentos oriundos da Biogeografia
Histórica, as compreensões das dinâmicas biogeográficas ecológicas tornam-se
extremamente palpáveis, elencando também o conhecimento necessário para as
demais abordagens presentes neste e nos demais ensaios que estudaremos pelas
unidades.

No decorrer desta unidade, vamos conhecer, por um viés científico e aplicado, a


dinâmica das relações biogeográficas, como, os princípios fundamentais dos fatores
limitantes para o estudo no ramo da Biogeografia Ecológica, a concepção dos
fatores em suas dinâmicas que limitam e proporcionam a distribuição dos seres vivos
e, por fim, buscamos analisar as relações e interações ecológicas com a finalidade
de compreendermos a sociabilidade entre os seres vivos.

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 71


U2

72 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

Seção 1

Fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


Antes de iniciarmos a apresentação e os estudos acerca dos fatores limitantes,
devemos nos ambientar sobre a ótica dos princípios gerais da Biogeografia. O arranjo
da Biogeografia diante dos segmentos ecológicos nos traz a fundamentação da
dinâmica de interassociação entre as esferas (Litosfera, Atmosfera, Hidrosfera etc.).

Esta associação e compreensão das dinâmicas e produtos da interação de cada


esfera nos permite formular a concepção de fatores que influenciam as dinâmicas das
demais esferas, sobretudo a Biosfera, a qual buscamos analisar para compreender a
distribuição dos seres vivos diante dos fatores limitantes oriundos da interação entre
os elementos das esferas.

A Biogeografia Ecológica nos permite a abordagem de elementos que elencaram


a distribuição e proporção dos seres vivos por meio da análise e do estudo dos fatores
limitantes e suas peculiaridades. Begon, Harper e Twosend (2006, p. 1) reforçam que
a compreensão dos fatores limitantes advém do “estudo científico da distribuição
e abundância dos organismos e das interações que determinam esta distribuição
e abundância”. E sobre esta perspectiva buscaremos estudar e compreender os
fatores limitantes e como eles influem em tal distribuição.

Realizaremos então uma apresentação dos fatores limitantes seguindo um


modelo sequencial que nos permita observar a influência de cada fator sobre o fator
seguinte. Entretanto, vale ressaltar que a dinâmica pautada pelos pressupostos dos
princípios gerais da Biogeografia se formula em uma concomitância mútua entre
os fatores, ou seja, fatores antrópicos podem influenciar em certos aspectos dos
fatores geográficos, firmando assim a ideia de que não há uma hierarquia dentre os
fatores, por mais que estes se apresentem correlacionados entre os outros.

1.1 Fatores geográficos


Os fatores geográficos se elencam como um fundamento essencial para
compreendermos a relação de limites na distribuição dos seres vivos, sobretudo no
que se refere ao conceito de barreira geográfica.

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 73


U2

Pelo viés da Biogeografia Histórica, um marco essencial para desenvolvermos


as análises da distribuição dos seres foi a teoria da deriva continental. Por meio
desta teoria passamos a compreender de uma maneira mais clara a implicância das
barreiras geográficas no contexto da dispersão e distribuição das formas de vida.

Antes de iniciarmos as consequências e potencialidades ecológicas deste fator


limitante, devemos responder a um questionamento: o que é considerado uma
barreira geográfica? Tal qual como relata o geógrafo Ab’Sáber (2007), podemos
definir como barreira geográfica os elementos físicos e mecânicos que compõem
uma paisagem, por exemplo: cadeias de montanhas, vales, rios e até mesmo os
oceanos. Ante esta definição, podemos entender o conceito pela Biogeografia como
um fator que limita a dispersão dos seres, ou condiciona determinados indivíduos a
um nicho ecológico.

No contexto da Biogeografia Ecológica que abordaremos nesta unidade, as


barreiras geográficas atuam de uma forma ainda mais impactante sobre os grupos
de seres vivos, criando isolamentos e especiações, estruturando assim a ecologia e
os nichos ecológicos de dadas regiões.

A especiação alopátrica é um dos melhores exemplos que demonstram


como as barreiras geográficas atuam sobre os seres vivos. De modo geral, este
tipo de especiação ocorre pela inabilidade de determinadas espécies superarem
determinadas barreiras geográficas, fazendo com que estes indivíduos se relacionem
ou se reproduzam apenas com outros seres do mesmo nicho ecológico.

Um modelo que pode ser apresentado para entendermos como uma barreira
geográfica atua no processo de especiação é a Ilha da Queimada Grande, no Estado
de São Paulo. Esta ilha possui uma população de serpentes Jararacas (Bothrops
jararaca) estimada entre 2.000 a 4.000 indivíduos. O isolamento da população de
serpentes deriva de um aumento do nível do mar, criando uma barreira geográfica
intransponível e condicionando estes seres vivos a uma especiação alopátrica no
nicho ecológico da ilha.

Este exemplo reforça as definições propostas por Brown e Lomolino (2006),


salientando que as barreiras geográficas atuam como um filtro para a dispersão
dos seres vivos. Neste contexto, todos os seres vivos, sem exceção, estão sujeitos
às barreiras geográficas enquanto fator limitante, até mesmo os vegetais e
microrganismos estão suscetíveis à relação das barreiras geográficas para a dispersão
e o desenvolvimento dos ecossistemas.

A amplitude decorrente das barreiras geográficas é tamanha que exerce ação


direta sobre os demais fatores limitantes, como a alteração dos condicionantes
climáticos, desenvolvimento edáfico, composição de biodiversidade e até mesmo
nas relações antrópicas.

74 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

Sendo assim, podemos designar os fatores geográficos como o bastião dos


elementos para a compreensão da distribuição dos seres vivos no planeta, por
fornecer elementos e critérios que possibilitem ou dificultem a distribuição de toda a
vida, sendo um fator crucial para a formulação e o entendimento dos demais fatores
limitantes, que abordaremos no decorrer desta unidade.

Compreendemos os fatores limitantes derivados das barreiras geográficas


e como estes fatores atuam por um viés biogeográfico. Podemos realizar
uma análise direcionada aos fatores limitantes tendo como exemplo a Ilha
da Queimada Grande–SP. Para entender como as barreiras geográficas
atuaram e ainda atuam na ilha, acesse a matéria da revista “Ciência Hoje”,
da Universidade Estadual de São Paulo.
Disponível em: <http://eco.ib.usp.br/labvert/insularis%20ciencia%20
hoje.pdf>. Acesso em: 05 ago. 2015.

1.2 Fatores climáticos


Podemos considerar os fatores climáticos como um dos critérios fundamentais
tanto para a regulação quanto para a distribuição de vida no planeta. Em modos
gerais, o clima específico de cada região pode ser considerado como um dos
principais fatores para o estabelecimento de determinadas espécies, auxiliando
assim o desenvolvimento de um nicho ecológico e uma biota de acordo com os
regimes climáticos.

Para compreendermos a influência dos fatores climáticos, devemos sumariamente


abordar temáticas como a dinâmica climática global, as relações de temperatura e
umidade e as barreiras geográficas como um dos principais reguladores para os
segmentos climáticos que regulam os ambientes. Através do esclarecimento sobre
estas temáticas, poderemos compreender de maneira clara e objetiva a influência do
clima como um dos fatores limitantes da distribuição dos seres.

1.2.1 Dinâmica climática global, temperatura e barreiras geográficas


É notório que, ao analisarmos as diferenças climáticas do planeta, observamos
uma variação generalizada, na qual podemos constatar que as zonas equatoriais
possuem uma temperatura mais elevada e que, ao nos dirigirmos aos polos, esse
padrão climático apresenta uma redução contínua da temperatura.

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 75


U2

Mas qual é o motivo para que estas temperaturas diminuam em direção aos
polos? Para respondermos a esta pergunta, devemos nos inteirar sobre a relevância
dos fatores de regulação climática vinculada à latitude.

Ainda que fatores de regulação como a altitude, longitude e continentalidade


possuam grande relevância no que tange à variação de temperatura, a latitude
apresenta um papel fundamental para a especificação do clima na escala global e
regional.

A variação de temperatura ocasionada pela latitude está intimamente atrelada


com a incidência de radiação solar e o ângulo de inclinação terrestre, conforme
relatado por Ayoade (1986). A angulação terrestre influencia na incidência de
radiação solar em determinados pontos do globo, sendo que a zona equatorial é
a área mais afetada pela radiação solar devido à sua angulação, fazendo com que
a radiação proveniente do Sol percorra uma distância relativamente menor quando
comparada aos polos.

Sendo assim, a regulação climática vinculada à latitude tem como principal critério
a angulação do eixo terrestre (23,5°), todavia, a Terra está em contínuo movimento
de rotação e translação, fazendo com que a variação de radiação e temperatura
também esteja relacionada com a duração do dia, latitude e estação do ano, tal qual
Ayoade (1986) menciona em:

A quantidade de radiação recebida em determinado local é


também afetada pela duração do dia. A duração do período
de luz obviamente afeta a quantidade de radiação recebida.
A duração do dia varia com a latitude e a estação do ano. Nas
proximidades do equador, dias e noites possuem duração
quase igual durante o ano. A duração do dia aumenta e
diminui com o aumento da latitude, dependendo da estação
(AYOADE, 1986, p. 25-26).

As afirmações acima nos fazem compreender que a variação de temperatura é


indissociável da latitude, entretanto, elementos como a rotação da Terra fazem com
que a incidência de radiação não seja contínua, alternando assim entre períodos de
maior incidência (dia) e períodos sem incidência (noite).

Vimos que latitude está intrinsecamente ligada à variação de temperatura, uma vez
que, de acordo com a angulação da Terra, quanto maior a latitude, maior é o caminho
percorrido pela radiação solar e, consequentemente, menor é a temperatura. Outro
ponto que também está atrelado nos parâmetros de dinâmica climática global que
nos demonstra a relevância do fator latitude são as estações do ano.

76 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

Se os movimentos de rotação regulam diariamente a incidência de radiação


solar, os movimentos de translação são responsáveis pela alternância de radiação
durante o ano. Ao nos remetermos ao movimento de translação, automaticamente
pensamos nas circunstâncias climáticas que este proporciona às estações.

Sabemos que as estações se dividem em quatro etapas, durando três meses


cada, completando todo seu contorno ao redor do Sol em um ano e iniciando
um novo ciclo. O eixo de inclinação da Terra é constante durante o movimento
de translação, isto faz com que haja uma alternância de incidência solar em cada
hemisfério, conhecida por solstício, e definindo assim as respectivas estações de
verão e inverno. Entre os solstícios, a Terra passa por um período no qual os dias e
as noites possuem a mesma duração e a radiação solar é distribuída igualmente aos
dois hemisférios e atribuindo a variação de temperatura à angulação do planeta, este
período é nomeado por equinócio e define as estações de primavera e outono de
cada hemisfério.

Estas alternâncias das estações acarretam em uma brusca variação de temperatura


nos hemisférios de acordo com a época do ano. Tal qual como Varejão-Silva (2006)
nos fundamenta no seguinte trecho:

Os solstícios e os equinócios são os eventos que estabelecem


o início das estações do ano em cada hemisfério. Como
consequência da inclinação do eixo da Terra ser praticamente
constante, a área iluminada pelo Sol em cada hemisfério varia
ao longo do ano. Exatamente por isso, o Hemisfério Sul recebe
mais energia solar que o Hemisfério Norte entre 23 de setembro
e 21 de março (do ano seguinte), sendo que o máximo de
suprimento energético (maior área iluminada) coincide com
o solstício de dezembro. De 21 de março a 23 de setembro o
Hemisfério Sul recebe menos energia solar que o Hemisfério
Norte. O suprimento energético mínimo (menor área iluminada)
acontece por ocasião do solstício de junho. Com o Hemisfério
Norte dá-se exatamente o oposto, em relação às datas desses
eventos (VAREJÃO-SILVA, 2006, p. 17, grifo nosso).

Através destes fenômenos, podemos perceber que os movimentos de rotação e


translação são capazes de conduzir os ritmos climáticos do planeta, fazendo com que
esta alternância seja dada como uma característica da Terra e, consequentemente,
atuando como um cenário para o desenvolvimento e dispersão dos seres vivos no
planeta.

Com o intuito de ilustrar as análises e explicações realizadas sobre este quesito da

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 77


U2

dinâmica climática global, observe a figura a seguir e se atente às datas e estações


dos equinócios e solstícios.

Figura 2.1 | Dinâmica Climática das estações do ano

Fonte: O autor (2015)

Dentre as diversas condições que podemos observar, vale a pena ressaltar a


relação direta da latitude no decorrer do movimento de translação, uma vez que
os hemisférios Norte e Sul apresentam uma diferenciação de seis meses entre uma
estação e outra.

Uma das principais características biogeográficas extremamente vinculadas com


as condições climáticas oriundas do movimento de translação e a relação da latitude
são os fluxos migratórios. O exemplo mais difundido desta condição se baseia
na migração de aves do Hemisfério Norte para o Hemisfério Sul em meados de
dezembro. As circunstâncias que motivam a migração de aves estão diretamente
relacionadas com as condições climáticas do inverno, fazendo com que haja uma
escassez de alimento e induzindo estes seres vivos a buscarem latitudes mais ao Sul
em busca de temperaturas mais amenas, facilitando assim a obtenção de alimento
e a reprodução das espécies.

As condições oriundas de cada estação nos auxiliam na compreensão dos fluxos


migratórios de diversos seres vivos. Entretanto, devemos tomar certos cuidados para
não confundir o processo de migração com a dispersão dos seres vivos.

Apoiando-se nas características climáticas, a migração, tal qual o exemplo das

78 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

aves citado anteriormente, nos remete que um grupo de seres vivos, devido à
condição climática da estação em seu hábitat, ruma para outras porções latitudinais
que proporcionam uma melhor busca por alimentos e reprodução, e posteriormente
retornam ao hábitat de origem quando a condição climática se torna mais amena. Já
a dispersão motivada pelas características climáticas faz que um grupo de seres vivos
abandone por completo seu hábitat devido a uma alteração climática no ambiente,
forçando-o a buscar um novo meio para se adaptar e sobreviver. Por exemplo, os
períodos das grandes glaciações.

A Climatologia nos fornece alicerces para o entendimento de diversas condições


sobre as quais todos os seres vivos estão sujeitos. Vimos até o presente momento
como as condições climáticas em nível planetário influenciam na dinâmica da
temperatura e, consequentemente, criam categorias distintas para a adaptação e
interação dos seres vivos com o meio na escala ecológica. Todavia, um dos critérios
que condicionam uma forte relevância dos fatores climáticos limitantes para a
distribuição dos seres vivos que devemos abordar é a continentalidade e morfologia
dos relevos.

A continentalidade pode ser diretamente relacionada com um dos fatores


limitantes que tratamos no segmento dos fatores geográficos. Conforme nos indica
Ayoade (1986), devemos conceber a relação climática em sua dinâmica vertical com
a relação de circulação geral da atmosfera, massas de ar e as variações sazonais.
Elementos da dinâmica horizontal podem nos auxiliar a compreender os fatores
climáticos que induzem e modificam a dinâmica climática atmosférica, criando
condições específicas para cada região do planeta. Podemos destacar, então, dentre
os fatores que fazem parte da dinâmica horizontal, a altitude, continentalidade,
disposição do relevo, entre outros.

É nítido como a influência de condições geográficas, como a continentalidade


e as disposições do relevo, agem sobre a variação e caracterização do clima e
temperatura de cada região. A continentalidade traz como principal característica
uma forte variação de temperatura, definida por amplitude térmica. A ocorrência
deste fator climático se dá devido ao distanciamento de mares e oceanos em
determinadas regiões, tal como nos indica o seguinte trecho:

A continentalidade traduz a influência causada pelo oceano e é


normalmente expressa pela distância do mar, tomada na direção
do vento dominante (aquele que sopra com maior frequência
durante o ano) ou, mais grosseiramente, em linha reta. Em
certas circunstâncias pode ser substituída pela longitude ou pela
latitude, dependendo da posição relativa do mar e da direção do
vento dominante (VAREJÃO-SILVA, 2006, p. 78).

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 79


U2

Todavia, a continentalidade não é um dos únicos fatores que auxiliam a


caracterização climática de cada região do planeta agindo sobre os seres vivos. A
disposição do relevo pode ser traduzida como um elemento morfoclimático que
nos auxilia a compreender como uma barreira geográfica influencia na dinâmica
climática de determinada região.

A concepção sobre elementos morfoclimáticos, tal qual fundamentada por


Ab’Sáber (2007 p. 12), se baseia em um “conjunto espacial de certa grandeza territorial
onde haja um esquema coerente de feições de relevo, tipos de solo, formas vegetais
e condições climático-hidrológicas”. Sobre esta concepção, analisaremos a relação
entre o clima e o relevo culminando nas características climáticas que os seres vivos
estão sujeitos.

Uma das principais características do relevo que afetam as condições climáticas


é a altitude. A proporção e dimensão do relevo e sua altitude atuam como uma
barreira que dificulta a entrada de calor e umidade proveniente das massas de ar
da dinâmica vertical em determinadas regiões, fazendo com que o clima possa ser
diferenciado em consequência do relevo.

Um dos exemplos claros sobre como a ação morfoclimática pode atuar em


decorrência do relevo é o processo de formação do deserto do Atacama, no Chile.
A Cordilheira dos Andes disposta no sentido dos meridianos atua como uma barreira
geográfica, retendo toda a umidade proveniente do Pacífico, sendo dissipada e
condensada ao ascender a Cordilheira, esta circunstância é denominada como
Barlavento. Após superar a Cordilheira, as massas de ar já não contêm umidade,
sendo assim, esta descende e se aquece por um processo adiabático, criando áreas
áridas ou, como no caso do deserto do Atacama, esta circunstância é denominada
como Sotavento.

Buscando meios de compreender e analisar como o relevo atua na dinâmica


climática, devemos nos atentar às explicações de Mendonça e Danni-Oliveira (2007)
sobre as relações mofoclimáticas entre o relevo e o clima, na seguinte citação:

O relevo apresenta três atributos importantes na definição dos


climas: posição, orientação de suas vertentes e declividade. A
posição do relevo favorece ou dificulta os fluxos de calor e
umidade entre áreas contíguas. Um sistema orográfico que se
disponha latitudinalmente em uma região, como o Himalaia,
por exemplo, irá dificultar as trocas de calor e umidade entre
as áreas frias do interior da China e aquelas mais quentes da
Índia. Já a Cordilheira dos Andes, por se dispor no sentido dos
meridianos, não impede que as massas polares atinjam o norte

80 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

da América do Sul e nem que as equatoriais cheguem ao sul do


Brasil. Entretanto, inibem a penetração de umidade proveniente
do Pacífico para o interior do continente (MENDONÇA; DANNI-
OLIVEIRA, 2007, p. 47).

Podemos afirmar então que o relevo possui uma influência direta no clima e,
consequentemente, na formulação de ambientes distintos sobre os quais diversas
espécies se relacionam em sua escala ecológica. Sendo assim, em parâmetros
biogeográficos, a compleição dos fatores climáticos deve ser voltada para uma
análise das características da dinâmica climática global, das relações de temperatura
e da influência de barreiras geográficas, atuando sobre a dinâmica climática e
proporcionando diferentes ambientes com uma biota respectiva ao meio.

Porém, para compreendermos de fato como os fatores climáticos atuam na


dispersão dos seres, devemos realizar uma abordagem pelo viés da Biogeografia
Ecológica, possibilitando assim uma melhor concepção das inferências do clima
sobre a composição de um ambiente e dos seres que neste habitam.

Compreendemos então que as condições climáticas possuem


características de variação de temperatura de acordo com a dinâmica
climática global e dos fatores climáticos, como as barreiras geográficas.
Um exercício para entendermos um pouco mais sobre estas condições
no Brasil pode ser realizado pela navegação do infoclima e da análise dos
mapas disposto pelo INPE neste link: <http://infoclima1.cptec.inpe.br/>.
Acesso em: 07 ago. 2015.

1.2.2 O clima e a biogeografia


Vimos então que o clima, em seus condicionantes, está sujeito a uma diversa
gama de fatores que motivam a variação de temperatura e as condições climáticas
de determinadas regiões do planeta. Mas como podemos assimilar o clima como
fator limitante na distribuição dos seres vivos por um viés biogeográfico? Para
respondermos a esta questão, devemos compreender os princípios da lei da
tolerância e as características de temperatura corporal dos animais.

A lei da tolerância, também conhecida como Lei de Shelford, baseia-se em uma


amplitude ecológica das espécies que tem como principais agentes a população

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 81


U2

de seres vivos e as condições de variação ambiental às quais estes seres estão


submetidos.

Ainda que a temperatura não seja o único elemento de avaliação de amplitude,


dividindo espaço com a salinidade, água, alimentação e hábitat, a relevância da
temperatura é dada como fundamental para as análises na lei da tolerância, uma vez
que influencia os demais elementos de amplitude.

Para compreendermos o que é esta lei e como podemos relacioná-la com


a interação do clima e a Biogeografia, devemos nos ater a certos segmentos
metodológicos, sobretudo nas explicações e discernimentos de Odum (1985). Esta
lei sugere que os seres vivos, de modo geral, possuem um ponto de tolerância aos
fenômenos do meio, e que quando este é alcançado, os seres vivos entram em
clímax ecológico, porém, quando se encontram em zonas de intolerância, há uma
tendência ao aumento dos níveis de mortalidade.

As circunstâncias que atuam sobre os seres vivos advêm como uma perspectiva
para compreendermos tanto os processos de migração quanto os de dispersão,
uma vez que os indivíduos de diversas espécies buscam o clímax ecológico para sua
sobrevivência. Para evidenciar estas circunstâncias, cientistas que se baseavam na
lei da tolerância formulavam “[...] provas de tensão realizadas no laboratório ou em
campo, em que os organismos são sujeitos a uma série de condições experimentais”
(ODUM, 1985, p. 170).

Estas provas de tensão constataram a implicação da lei de tolerância para a


análise de fatores limitantes da dispersão dos seres vivos. Dentre os principais fatores
destacam-se, em ordem de importância: térmico, hídrico, salinidade e alimentação.

De acordo com as apresentações de Odum (1985) sobre os termos da lei de


tolerância, utilizaremos os seguintes pressupostos para objetivar as discussões
acerca do clima e a Biogeografia:

Os organismos podem ter uma amplitude larga de tolerância


para um fator e uma amplitude estreita para outro. Os
organismos com amplitudes largas de tolerância para todos
os fatores são aqueles que têm mais possibilidades de se
encontrarem mais amplamente distribuídos [...] Verifica-se
com frequência que os organismos não vivem na natureza
efetivamente nos níveis ótimos. Em tais casos verifica-se que
outro fator, ou outros fatores, têm maior importância (ODUM,
1985, p. 170-171).

82 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

Esta relação de amplitude nos auxilia a conceber as inferências e atuações de


temperatura oriundas do clima de certas regiões sobre os seres vivos, além de
aplicar os conceitos de seleção natural e os condicionantes de adaptação para
determinados seres.

É claro que a temperatura do meio influencia diretamente na distribuição dos


seres vivos, criando situações em que se aplicam as leis de tolerância e os fatores
de amplitude. Entretanto, devemos compreender que os seres vivos, em sua
vasta diversidade, possuem características fisiológicas que possibilitam uma maior
adaptação e tolerância às adversidades do meio.

Para desenvolvermos uma análise neste segmento de tolerância climática, é


necessário recorrer a elementos da fisiologia animal que nos auxiliam a compreender
mecanismos que proporcionam a distribuição dos seres vivos.

Neste contexto, abordaremos os estudos de Randall, Burggren e French (2000)


sobre as características fisiológicas de temperatura dos animais. Podemos generalizar
por um viés taxonômico que os seres presentes no reino animal apresentam
características homeotérmica e heterotérmica.

Por definição, animais homeotérmicos apresentam como característica a


manutenção fisiológica que lhes permite manter uma temperatura contínua,
baseando-se na energia adquirida através da alimentação. Exemplo de seres
homeotérmicos são as aves e mamíferos que não sofrem influências diretas do meio
em sua amplitude térmica corporal.

Seres heterotérmicos são todos aqueles que apresentam como característica


fisiológica a variação de temperatura corporal de acordo com a condição climática
e de temperatura do meio. Popularmente conhecidos como “animais de sangue
frio”, podemos listar exemplos destes seres como répteis, anfíbios e peixes.

Podemos então analisar, conforme os apontamentos de Randall, Burggren e


French (2000) sobre as definições de animais homeotérmicos e heterotérmicos,
que o meio atua de certa forma como um agente regulador da temperatura, mas
que alguns animais possuem mecanismos fisiológicos para a adaptação deste
condicionante de temperatura.

Sobre os conceitos de fisiologia, dinâmica climática e a lei de tolerância que já


abordamos, podemos realizar um ensaio analítico para compreender de fato como
o clima e a Biogeografia estão intimamente atrelados para a explicação dos fatores
limitantes.

Um dos melhores exemplos que podemos facilmente abordar é uma pergunta


que nos intriga enquanto estudamos a diversidade de animais que conhecemos
hoje: Por que não há répteis nas regiões extremas dos polos? Com o alicerce

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 83


U2

conceitual construído até o presente momento da unidade, a resposta para esta


pergunta torna-se extremamente simples, como veremos a seguir.

Sabemos que os polos possuem uma menor incidência de radiação solar, por
conta da angulação do planeta e da latitude, isto faz com que a temperatura de
modo geral seja mais baixa nesta região. Também, temos ciência das condições
fisiológicas dos répteis, sendo estes heterotérmicos e suscetíveis à temperatura do
ambiente. Pensando no contexto da lei da tolerância de Shelford, podemos concluir
que a temperatura nas regiões extremas dos polos cria uma amplitude extremamente
estreita para os répteis, impossibilitando assim a distribuição deste tipo de ser vivo
em dado ambiente.

Este exemplo nos auxilia na compreensão do clima como um dos principais


fatores limitantes da distribuição dos seres vivos. Entretanto, aplicamos uma condição
de análise na qual os répteis estejam submetidos a uma condição extremamente
desfavorável para a distribuição no ambiente.

Todavia, uma das maiores particularidades dos seres vivos são as condições
evolutivas de adaptação e seleção natural decorrentes do processo evolutivo, às
quais todos os seres vivos estão submetidos. Odum (1985) realiza apontamentos
pertinentes para que possamos compreender os fatores limitantes em uma
perspectiva clara, na seguinte citação:

Os organismos não são apenas escravos do ambiente físico;


adaptam-se-lhes e modificam-no por forma a que ficam
reduzidos aos efeitos limitantes da temperatura, luz, água e
outras condições físicas de existência. Uma tal compensação
de fatores é particularmente eficaz ao nível de organização
da comunidade, embora também ocorra no seio da espécies.
As espécies com maiores amplitudes de expansão geográfica
desenvolveram quase sempre populações adaptadas
localmente, designadas por ecotipos, que têm valores ótimos
e limites de tolerância adaptados às condições locais (ODUM,
1985, p. 172).

É possível então afirmar que o meio possui uma grande influência na distribuição
dos seres vivos, porém, o contínuo processo evolutivo de adaptação e seleção
natural proporciona diversos mecanismos para que a distribuição seja facilitada.

Ainda que haja algumas exceções, a maioria dos seres vivos não possui
tolerância suficiente para se desenvolver em determinados hábitats, limitando assim
a distribuição geográfica. Os únicos seres vivos de que se tem registro de uma

84 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

forte dispersão em diversas regiões do planeta com climas distintos são o falcão
peregrino e o ser humano; todavia, o homem conta com um aparato que vai além
da adaptação, são as tecnologias.

Pensando agora no contexto do reino vegetal, podemos perceber que


determinadas espécies vegetais se adaptam em condições climáticas diferentes.
Tendo a mesma localidade dos exemplos supracitado dos polos, é possível observar
que algumas espécies vegetais conseguem se adaptar a tal região, por exemplo, os
musgos.

Quando analisamos a composição dos seres vivos de cada bioma terrestre,


podemos observar certa similaridade entre as espécies mesmo em condições
climáticas distintas, reforçando então o que Odum (1985) define por compensação
de amplitudes.

O clima então é um forte fator limitante para a distribuição dos seres, analisando-o em
sua escala biogeográfica, pois a temperatura e umidade fornecem condições climáticas
para determinados seres vivos, elencando assim o clima como um fator fundamental
quando estudamos os fatores de dispersão dos seres vivos em nosso planeta.

1.3 Fatores edáficos


Os fatores edáficos dizem respeito à influência dos solos nos vegetais e outros
seres vivos como fatores limitantes, enquanto as características que proporcionam a
sua sustentação estão pautadas na fundamentação dos fatores pedológicos.

Sendo assim, realizaremos neste eixo uma abordagem que contemple a


associação destes dois fatores limitantes de maneira indissociável para que possamos
identificar as propriedades que definem estes elementos como fatores limitantes
para a distribuição dos seres vivos.

É inegável que, ao pensarmos nos meios que proporcionam o desenvolvimento


dos vegetais, nos remetemos a uma gama de fatores que podem atuar como
critérios limitantes para estes, por exemplo, o clima, regulando as proporções e
variações de temperatura e umidade, as propriedades bióticas fornecendo matéria
orgânica e agentes decompositores e, por fim, o solo como suporte do meio físico
e de nutrientes para o desenvolvimento dos vegetais.

Enquanto a Edafologia nos fornece alicerces para compreendermos o


desenvolvimento dos vegetais e suas relações enquanto seres vivos, a Pedologia é a
ciência responsável pelo estudo, variedade, composição e distribuição dos tipos de
solo no planeta.

Abordar o conceito de solo é amplamente necessário para realizarmos certos

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 85


U2

ordenamentos acerca dos fatores edáficos e como estes estão relacionados com
a distribuição dos seres vivos. Porém, antes de iniciarmos nossas análises, devemos
compreender o conceito de solo tal qual como proposto em:

Solo é a superfície inconsolidada que recobre as rochas


e mantém a vida animal e vegetal da Terra. É constituído
de camadas que diferem pela natureza física, química,
mineralógica e biológica, que se desenvolvem com o
tempo sob a influência do clima e da própria atividade
biológica(VIEIRA, 1975, p. 28).

Ante esta definição, podemos afirmar que o solo é oriundo de uma interação
entre os componentes inorgânicos provenientes das rochas intemperizadas por ação
química e física, com os componentes orgânicos oriundos do material decomposto
pelo desempenho biótico de microrganismos.

Mas qual é a inferência do solo como fator limitante? Partindo do pressuposto


dos princípios gerais da Biogeografia, o solo está presente em uma interseção
dos elementos da Atmosfera, Biosfera, Hidrosfera e Litosfera. Sendo assim, as
características do solo refletem a atuação de outros fatores limitantes e agem como
um suporte para os seres vegetais e as demais relações.

Apesar de ser pouco referenciado enquanto analisam-se os elementos de um


bioma, o solo deve ser elencado ao mesmo patamar de grandes fatores limitantes,
como o clima e as barreiras geográficas, uma vez que exerce condições fundamentais
para o desenvolvimento de vegetais e microrganismos que constituem a ecologia
de determinado bioma.

Sabemos que o Brasil apresenta uma gama de fatores limitantes, a variação


climática de Norte ao Sul do país e as barreiras geográficas neste ínterim proporcionam
uma gama de fatores limitantes para a distribuição dos seres vivos. A variedade de
solos no país também é correspondente à atuação destes fatores limitantes, fazendo
com que a riqueza e multiplicidade de solos favoreçam o desenvolvimento dos seis
biomas do país e suas áreas de transição, atuando diretamente na distribuição e
formulação de hábitat de determinadas espécies.

Não somente para os seres do reino vegetal, o solo pode ser considerado como
um ambiente da microfauna à macrofauna, de acordo com suas características,
atuando como um fator restringente. Por exemplo, seres oligoquetos (minhocas e
outros) possuem um extremo vínculo com solos de características úmidas e com
grande densidade de matéria orgânica, enquanto algumas espécies, como a lagartixa

86 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

de areia (Lioalemus lutzae), amplamente encontrada no estado do Rio de Janeiro,


estão atreladas com solos arenosos e de baixa umidade.

A ação da microfauna nos solos diz respeito à presença de bactérias e outros


organismos decompositores, como os fungos, atuando como seres responsáveis
pela produção e manutenção de nutrientes fundamentais para o desenvolvimento
biótico e agrícola dos solos. Por exemplo, o papel das bactérias fixadoras de
nitrogênio que dispõem aos vegetais um meio para a obtenção deste elemento
essencial para seu desenvolvimento.

Podemos então observar que o solo e suas características advêm tanto como um
fator limitante para o suporte de determinados seres vivos quanto está suscetível a
estes fatores, uma vez que, para ser considerado como um elemento dos princípios
biogeográficos, é incontestável a sua interação com os meios edáficos, faunísticos
e das atuações das demais esferas. Fazendo assim que consideremos o solo um
componente indissociável dos critérios edáficos e bióticos como fatores limitantes.

A relação entre o solo e os fatores edáficos pode ser considerada intrínseca para
compreendermos a atuação destes fatores limitantes. Se, por um lado, o solo limita
o suporte para determinados vegetais de acordo com suas características, certos
vegetais irão limitar o fornecimento de matéria orgânica para o solo, fazendo assim
com que haja um ciclo concomitante de atuação entre estes dois fatores.

Tal qual menciona Ridley (2006), quando as características pedológicas e as


características edáficas atingem um determinado equilíbrio ecológico, nomeado
como Sinergia Ambiental, estes elementos passam a compor uma atuação de
fatores limitantes para determinados seres vivos de acordo com as características do
solo e da vegetação.

Neste sentindo, podemos constatar que há uma correlação direta entre as


características pedológicas e as características edáficas atuando em confluência,
proporcionando fatores limitantes. Odum (1985) enfatiza estas correlações entre os
fatores limitantes com o seguinte apontamento:

Uma vez que o solo é o produto do clima e da vegetação,


o mapa dos principais tipos de solos do mundo converte-
se num mapa complexo de climas e vegetações. Face a um
material originário favorável, a ação dos organismos e do
clima tenderá a formar um solo característico da região. De
um ponto de vista ecológico amplo, os solos de uma dada
região podem ser divididos em dois grupos, aqueles que são
fundamentalmente controlados pelo clima e a vegetação da
região e aqueles que são principalmente controlados pelas

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 87


U2

condições edáficas e topográficas locais, pelo nível da água, ou


pelo tipo de material originário (ODUM, 1985, p. 208).

O segmento apresentado na citação, como os dois tipos de solo, nos declara a


influência de atuação de fatores limitantes, como o clima, as barreiras geográficas
e quesitos edafológicos no que tange ao vínculo com os vegetais, fornecendo
elementos que dirigem a variedade dos tipos de solo sobre diversas condições.

A atuação dos fatores edáficos como limitantes à distribuição dos seres vivos se
atém aos quesitos que permeiam a relação ecológica entre os seres para com o
solo. No exemplo anteriormente citado, designamos as relações das características
do solo úmido e arenoso como suporte para o hábitat de diferentes seres do reino
Animalia e Funghi. Todavia, os integrantes do reino Plantae são os mais integrados
com as limitações edáficas.

Ao relacionarmos todos os seres vegetais com as características edáficas,


podemos observar uma nítida relação da distribuição das espécies conforme as
características do solo e a atuação climática (BLEASDALE, 1977). Um exemplo claro
no qual podemos analisar a relação edáfica dos vegetais são as características e o
ambiente de três tipos de vegetações amplamente difundidas no Brasil: as xerófilas,
hidrófilas e tropófilas.

Realizaremos um breve ensaio analítico sobre estes tipos de vegetação, com a


finalidade de compreender as relações edáficas atuando como fatores limitantes,
através dos apontamentos fisiológicos de Bleasdale (1977) acerca dos tipos de
vegetação e, como complemento teórico, utilizaremos a caracterização paisagística
realizada por Ab’Saber (2007) em diferentes domínios brasileiros formados com
estes tipos de vegetação.

O primeiro tipo de vegetação que podemos abordar com o intuito de avaliar a


atuação das relações edáficas são as vegetações xerófilas. Este tipo de vegetação
está atrelada a locais áridos, tendo como características climáticas altas temperaturas
e baixos níveis de umidade. Como características fisiológicas, apresentam profundas
raízes, com o intuito de captar a umidade em níveis mais profundos no solo, além
de mecanismos que evitam a transpiração, como espinhos e películas em folhas.

A principal zona que é caracterizada por este tipo de vegetação é a caatinga


brasileira e suas zonas de transição e refúgio. Um espécime bem difundido é um
gênero de cacto conhecido como Xique-xique (Pilocereus gounellei). O solo
da região é descrito por Ab’Saber (2007, p. 90) como “solos considerados solos
litolíticos [...] Não havendo condições para formar um verdadeiro solo”. Os fatores
climáticos e edáficos como nesta circunstância tornam favorável o desenvolvimento

88 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

de vegetações xerófilas em ambientes áridos e semiáridos, do mesmo modo que


atuam como fatores limitantes para demais tipos de vegetação.

As vegetações hidrófilas, por outro lado, apresentam características


substancialmente opostas das xerófilas. São vegetais altamente adaptados e
vinculados a sistemas com alta umidade. Em consequência disto, a fisiologia de suas
raízes não é profunda, pelo fácil acesso à água nos solos úmidos, além das folhas
esparsas, classificadas como folhas latifoliadas. Esta relação das folhas dos vegetais
atua como um mecanismo fisiológico que facilita a transpiração.

Zonas fitogeográficas com a presença deste tipo de vegetação podem ser


vinculadas a biomas como as florestas Amazônica e Atlântica, nos pampas, inclusive,
no Pantanal. Exemplo de espécimes que se apresentam como hidrófilas são
amplamente conhecidas no Brasil, como a Vitória-régia (Victoria amazonica), o Ingá
(Inga vera), entre outras espécies.

Por fim, as vegetações tropófilas podem ser entendidas como um amálgama


das características das xerófilas e hidrófilas. Estes tipos de vegetação possuem
uma amplitude de adaptação a ambientes que sofrem uma contínua variação de
temperatura e umidade. Uma característica dos mecanismos fisiológicos destes
vegetais é designada por suas folhas caducifólias, ou seja, em circunstâncias onde
ocorre uma queda na temperatura ou umidade, as folhas se desprendem como um
recurso para preservar a umidade durante determinado período.

A adaptação da vegetação tropófila vai além dos condicionantes climáticos,


fazendo com que suas raízes permitam tanto a captação de água e nutrientes em
solos ácidos. Como zona fitogeográfica atuante como fator limitante edáfico, este
tipo de vegetal é amplamente encontrado no bioma do Cerrado, porém, podem
ser encontradas de Norte a Sul do Brasil, de acordo com as condições climáticas
e edáficas que possibilitem a sua distribuição. Exemplos de espécies tropófilas: Ipê-
roxo (Tecoma heptaphylla), Jatobá (Hymenaea stigonocarpa).

Além destes elementos que caracterizam a fisiologia dos grupos vegetais, há de


pensarmos em um critério fundamental para a atuação dos fatores limitantes no
que se refere à ecologia. Conforme os relatos de Brown e Lomolino (2006) em
paralelo com os apontamentos ecológicos de Odum (1985), é possível desenvolver
apontamento afirmando que a representação dos fatores edáficos traz como
elemento de limitação características biotípicas relacionadas à cadeia alimentar.

Ao pensarmos que as características edáficas atuam como fatores limitantes para o


desenvolvimento de certos vegetais, podemos diretamente relacioná-los com a base
alimentar de seres herbívoros ou nectarívoros e traçar um padrão voltado à cadeia
alimentar onde os vegetais são dados como o alicerce da cadeia alimentar, atuando
sobre a distribuição dos seres de acordo com os fatores edáficos que proporcionam o
crescimento vegetal, elencando assim uma vasta gama de sistemas ecológicos.

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 89


U2

Compreendemos então que os fatores edáficos estão diretamente relacionados


com critérios oriundos do processo de formação do solo e da influência do clima e
da própria vegetação. Sendo assim, podemos designar os fatores edáficos como um
alicerce para o desenvolvimento de comunidades ecológicas, atuando assim como
um fator que pode proporcionar ou limitar a distribuição dos seres vivos de acordo
com as propriedades edáficas de determinada região.

O solo é um elemento indispensável quando direcionamos


os estudos para todas as circunstâncias que evidenciam
relações bióticas ou abióticas. Dentre as riquezas naturais,
o Brasil possui uma vasta gama de tipos de solos de Norte
a Sul. Podemos então traçar perfis sobre a composição de
ambientes através das concepções edáficas? Para conhecer
mais sobre Pedologia, as variedades de solos brasileiros e a
caracterização edáfica das regiões, acesse o Manual Técnico
de Pedologia, disposto pelo IBGE em:
<ftp://geoftp.ibge.gov.br/documentos/recursos_naturais/
manuais_tecnicos/manual_tecnico_pedologia.pdf>. Acesso
em: 10 ago. 2015.

1.4 Fatores bióticos


Como um apanhado geral dos fatores limitantes tratados anteriormente,
podemos compreender os fatores bióticos como um forte elemento de integração
das demais circunstâncias ligadas à distribuição dos seres vivos.

Com o escopo de elaborarmos uma concepção das inferências dos fatores


bióticos enquanto fatores limitantes, precisamos realizar determinadas análises sobre
as relações do Fluxo de Energia, permeando a concepção de Cadeia Alimentar para
elencar os princípios da dinâmica biótica.

A construção e o entendimento dos fatores limitantes abordados anteriormente


nos permite traçar um panorama geral da influência e dinâmica de cada fator como
um condicionante que permite ou limita a distribuição de diferentes seres vivos.
Neste contexto, os fatores bióticos atuam como um sistema sequencial de limitância
baseando-se nos níveis tróficos da cadeia alimentar e do fluxo de energia entre os
seres vivos.

O fluxo de energia pode ser entendido como o direcionamento de energia


de um nível trófico para outro. Por exemplo: os vegetais apresentam-se como a

90 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

base dos níveis tróficos, por se designarem como organismos fotossintetizantes e


autótrofos, sendo assim considerados como produtores de energia. Seres herbívoros
que se alimentam da base dos níveis tróficos são considerados seres heterótrofos e
consumidores primários. Já os seres carnívoros que se alimentam dos consumidores
primários são considerados consumidores secundários, e assim por adiante, até ser
concluída a dinâmica da cadeia alimentar em determinado ecossistema.

A energia utilizada e fornecida pelos organismos produtores segue um padrão


de difusão pelos consumidores no decorrer do fluxo de energia. Uma vez que nos
atermos a um princípio da Física, especificamente a primeira lei da termodinâmica,
podemos concluir que “A energia não pode ser criada nem destruída e sim
transformada”. Aproximando este apontamento acerca da energia, é possível
compreender determinadas circunstâncias do fluxo de energia biótica.

De modo geral, a manutenção e os ciclos bióticos dos seres vivos se baseiam


nestas interações de seres em distintos níveis tróficos. Begon, Harper e Twosend
(2006, p. 28) reforçam esta condição afirmando que “As transformações de energia
e matéria estão subordinadas a interações". Sendo assim, em cada nível trófico a
energia é consumida e dissipada pelos organismos.

O fluxo de energia acata a dinâmica de dissipação e transformação em cada nível


trófico da cadeia alimentar, desde os seres produtores até os demais níveis tróficos,
tal qual salienta Odum (1985), afirmando que:

A transferência de energia alimentar, desde a fonte nas


plantas, através de uma série de organismos com a repetição
dos fenômenos de comer e ser comido, é designada por
cadeia alimentar. A cada transferência uma larga proporção,
de 80 a 90 por cento da energia, é perdida em forma de calor.
Portanto, o número de passos ou elos numa sequência é
limitado, usualmente a quatro ou cinco. Quanto mais curta
for a cadeia (ou quanto mais perto o organismo estiver do seu
início), maior será a energia disponível. As cadeias alimentares
são de dois tipos básicos: a cadeia alimentar de pastoreio, que,
partindo de uma planta verde base, passa pelos herbívoros
de pastoreio (isto é, organismos que comem plantas vivas) e
continua pelos carnívoros (isto é, comedores de animais); e a
cadeia alimentar de detritos, que vai da matéria orgânica morta,
passa pelos microrganismos e depois para os organismos que
se alimentam de detritos (detritívoros) e seus predadores
(ODUM, 1985, p. 96).

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 91


U2

Sob esta lógica, podemos então afirmar que os organismos produtores (base da
cadeia alimentar) detêm um acúmulo de energia muito maior que os organismos
de níveis tróficos superiores de uma cadeia alimentar. Ante esta dinâmica do
fluxo de energia das cadeias alimentares, podemos observar critérios bióticos que
possibilitem traçarmos uma relação direta com os fatores limitantes da distribuição
dos seres vivos.

As condições que possibilitam a distribuição e o arranjo biótico dos seres vivos


estão primariamente relacionadas com os fatores geográficos, climáticos e edáficos.
Entretanto, a atuação dos fatores bióticos influencia diretamente nos componentes
da cadeia alimentar, proporcionando condições que limitem ou proporcionem
determinados tipos de seres vivos a aderirem aos níveis tróficos.

Um cenário em que possamos explorar uma Condição Trófica Harmônica diz


respeito a uma condição dos demais fatores limitantes, substancialmente os edáficos,
que permitam o desenvolvimento de organismos vegetais como a base produtora, a
presença de seres vivos nos níveis tróficos primário, secundário, e assim em diante.
A representação da condição trófica harmônica pode ser ilustrada através de uma
pirâmide onde a base seja composta pelos organismos produtores e o afunilamento
esteja condicionado aos demais consumidores até o topo da cadeia alimentar.

Estas condições delimitam um nível trófico que proporciona a condição e


manutenção de certos organismos como um fator biótico. Por outro lado, qualquer
divergência na representação piramidal pode ocasionar uma Condição Trófica
Desarmônica, por exemplo, se houver mais organismos consumidores primários do
que organismos produtores na base da cadeia alimentar, haverá uma limitação biótica
para todos os demais organismos presentes na cadeia alimentar, fazendo com que
os seres presentes nestas condições passem a se adaptar a outros ambientes ou a
novos níveis tróficos, designando assim um equilíbrio ecológico.

Estas duas condições tróficas nos permitem compreender como os fatores


bióticos atuam na limitação da distribuição e manutenção da vida dos seres vivos,
porém, outros elementos fazem parte desta inferência biótica, por exemplo, as
relações e interações ecológicas que exploraremos na seção três desta unidade,
indicando elementos como os fatores de dispersão, a competição por alimento em
um mesmo ecossistema e a predação.

Podemos concluir que os fatores bióticos possuem uma vasta complexidade


no que se refere aos conceitos de limitação e amplitude dos seres vivos em
determinados ecossistemas. O entendimento de condicionantes como os fluxos
de energia e o conceito de cadeia alimentar nos permite desenvolver elementos
fundamentais para a compreensão da relação entre distintos seres vivos e como
estes atuam na distribuição dos seres vivos pelo critério de limitância.

92 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

1.5 Fatores antrópicos


Apesar da possibilidade de inserirmos o ser humano como um ser vivo e agente
dos fatores bióticos, iremos tratar a sociedade como um elemento segmentado dos
demais fatores, sobretudo pela sua capacidade de intervir e modificar a relação de
todos os outros fatores abordados em diferentes escalas.

De fato, podemos destacar que a espécie humana, dentre todos os seres


vivos, merece ser sobressaída dos demais fatores limitantes pela sua capacidade
cerebral, criatividade e raciocínio, sendo estes expressos através da tecnologia e
meios artificiais de apropriação do ambiente. A própria tecnologia nos remete às
circunstâncias que proporcionaram a ocupação do ser humano em toda a superfície
terrestre, desde as áreas mais inóspitas até as mais propícias, deliberando assim ao
ser humano enquanto um ser biológico a característica de ecúmeno.

Se observarmos critérios abordados amplamente pela Geografia Urbana no


segmento de formação de cidades, podemos relatar características comuns em todo
o processo de apropriação do ambiente, desde o abandono da cultura nômade até o
período de globalização. Tal qual Munford (1962, p. 708) relata, a humanidade “deve
a sua existência, e mais ainda o seu engrandecimento, a tentativas concentradas de
controlar outros homens e dominar, com força coletiva, a totalidade do ambiente”.

Este âmago em dominar o ambiente em sua totalidade nos salienta as inferências


do homem, enquanto animal, atuando de maneira ativa sobre os condicionantes
e fatores naturais. Outro segmento em que podemos evidenciar esta relação de
alterações antrópicas no meio pode ser expresso no princípio da urbanização,
quando destacamos elementos das cidades alterando o meio natural, como "A
transformação de todo um vale de um rio numa organização unificada de canais e
obras de irrigação para a produção de alimentos e transporte” (MUNFORD, 1962, p.
43).

Sem dúvidas, a história da humanidade está marcada pela relação de apropriação


do ambiente e de respectivas alterações e modificações da natureza. E sob esta
ótica, podemos encarar as inferências antrópicas como um fator limitante para a
distribuição biótica dos seres vivos.

Analisando cada um dos fatores tratados, podemos elencar como a influência da


população humana atua diante dos fatores limitantes que abordamos no decorrer
desta seção. Para tal, iremos concentrar as abordagens em características gerais de
impacto antrópico, destacando suas relações diretas com fatores. Entretanto, estas
abordagens devem ser explícitas como exemplos conceituais que atuam de maneira
multilateral em um ecossistema.

A primeira abordagem que podemos realizar advém do seguinte questionamento:


como o homem influencia nos fatores geográficos? Pautado no conceito das

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 93


U2

barreiras geográficas construído anteriormente, podemos afirmar que o ser humano,


com o apoio da tecnologia desenvolvida, é substancialmente um agente de alteração
de barreiras.

Cursos de rios podem facilmente ser alterados com canais, áreas áridas podem
ser totalmente remodeladas com o arranjo de sistema de irrigações, até mesmo
barreiras geográficas de relevo são modificadas conforme a intenção e a tecnologia
aplicada.

Neste contexto, podemos compreender que determinadas barreiras geográficas


são facilmente modificadas pela atuação antrópica em determinadas escalas, todavia
algumas barreiras são praticamente inerentes à alteração, por exemplo, os oceanos
e as grandes cadeias de montanhas. Entretanto, elas podem não ser alteradas, mas
transpassadas com o advento das tecnologias móveis, como a náutica, aérea e
automobilística.

A superação de barreiras geográficas nesta circunstância é refletida muitas


vezes na alteração de ambientes nos quais outros seres vivos, inclusive o próprio
ser humano, passam a ter contato com novas populações e ecossistemas, fazendo
com que haja um desarranjo da harmonia e conservação de dado ecossistema
(GONÇALVES, 2013).

Ainda que haja uma ampla discussão acerca da inferência antrópica diante da
variação climática global, podemos afirmar, sem dúvidas, que o homem influencia
na dinâmica climática na escala local e, por vezes, na escala regional. As alterações
climáticas antrópicas podem ser vistas pela modificação do meio ambiente,
como a urbanização, o desmatamento e as grandes áreas de agricultura, que
influenciam significativamente no aumento de temperatura e nas quedas dos índices
pluviométricos em várias regiões.

Paralelo a este critério, a significativa influência das alterações climáticas induz


a novos ordenamentos, criando um novo arranjo dos fatores limitantes bióticos e
edáficos como respostas a estas alterações. Sobre a alteração do clima, podemos
direcionar uma guisa de conclusão de acordo com os seguintes apontamentos,
afirmando que:

O homem está influenciando o clima do globo, alterando


inadvertidamente o albedo da Terra e a composição
atmosférica (por exemplo, através da urbanização e
industrialização) e pela produção artificial de calor [...] Essas
alterações apresentam implicação para os balanços hídricos
e energéticos da Terra e para a circulação geral da atmosfera,
que são as controladoras do clima (AYOADE, 1986, p. 314).

94 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

Diante desta conclusão, podemos evidenciar a inferência antrópica nos fatores


climáticos sobre uma vasta gama de condições que impactam a distribuição dos
seres vivos e os demais fatores limitantes filiados a este.

Todas as inferências antrópicas, diante dos demais fatores, derivam em um maior


impacto no que diz respeito aos fatores bióticos. Por mais singela que pareça a
intervenção antrópica, as consequências dela passam a ser cumulativas para o impacto
diante da distribuição dos seres vivos e da automanutenção de um ecossistema.

Tais modificações estão diretamente relacionadas com o sistema social,


econômico e cultural de determinadas populações, mas é inegável que o principal
elemento de impacto se dá na relação homem–natureza, sob uma ótica extrativista
e expansionista que observamos na atualidade.

Uma breve condição que demonstra determinados elementos de inferência


antrópica pode ser expressa através dos apontamentos de Begon e Harper e
Twosend (2006) sobre a influência do ser humano enquanto fator limitante do meio
biótico:

A população humana global não poderá continuar aumentando


de tamanho; não poderemos continuar a retirar peixe do mar
mais rápido que a capacidade de repor os cardumes perdidos
(se quisermos ter peixe para comer no futuro); não podemos
continuar explorando culturas agrícolas em florestas se a
qualidade e quantidade do solo se deterioram e os recursos
hídricos se tornam inadequados; não poderemos continuar
a usar os mesmos pesticidas se os números crescentes de
pragas se tornarem resistentes a eles; não poderemos manter a
diversidade de natureza se continuarmos a provocar a extinção
das espécies (BEGON; HARPER; TWOSEND, 2006, p. 442).

Dado apontamento explicita as relações do ser humano com o meio biótico,


demonstrando significativamente seus impactos enquanto fator limitante da
distribuição dos seres vivos. Logo, podemos afirmar que estas e muitas outras
relações afetam diretamente todos os seres vivos em determinados ambientes,
criando enormes desarranjos no ecossistema, desde alterações no fluxo de energia
e cadeia alimentar, até mesmo processos de extinção de espécies e populações
ecológicas.

Por fim, com dados segmentos apresentados, podemos compreender o motivo


de os seres humanos se destacarem dos fatores bióticos e condicionarem um
novo eixo referente aos fatores antrópicos para a limitação da distribuição dos

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 95


U2

seres. Entendemos então que o ser humano pode realizar diversas modificações
no ambiente que influem na dinâmica ecológica, que, de modo geral, atua como
um impacto negativo ao ambiente, salvo raras exceções, onde o rompimento de
uma barreira geográfica ou a alteração do clima favorece determinado grupo de
seres vivos, mas ainda assim atuam como um elemento artificial que altera todo o
encadeamento ecológico e a harmonia ambiental.

Compreendemos a atuação do ser humano perante diversos fatores


limitantes da distribuição dos seres vivos sob a ótica do impacto gerado
pelas modificações do ambiente. Para se inteirar dos segmentos de
atuação antrópica em diversas escalas, indica-se a leitura da obra “Os
(Des)caminhos do meio ambiente”, de Carlos Walter Porto Gonçalves.

1. Um dos fenômenos de migração mundialmente conhecidos,


devido à sua dimensão, diz respeito às migrações das borboletas
monarcas (Danaus plexippus). Tal fluxo migratório tem início
em meados de novembro, quando esta espécie deixa as áreas
da América do Norte e ruma em direção à América Central,
realizando novamente a migração em meados de março.
Diante deste condicionante de limitação, assinale a alternativa
que apresenta as justificativas palpáveis para o entendimento
do fenômeno.

I - O fluxo migratório tem como principal escopo a busca por


áreas climaticamente favoráveis para a espécie.
II - A migração das borboletas monarcas é considerada um
mecanismo de sobrevivência que impede a predação por seres
humanos e outras espécies.
III - O período climatológico de migração corresponde ao
início do inverno no Hemisfério Norte, justificando assim a
migração para o Sul nas áreas com temperaturas mais amenas.

96 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

IV - Fatores climáticos, como as estações do ano e as


diferenças de temperatura entre as latitudes, são elementos
que justificam a migração para as áreas mais amenas do
globo.

a) I, II e III.
b) II, III e IV.
c) I, III e IV.
d) I, II e IV.
e) Todos.

2. A relação de fluxo de energia é um dos principais


condicionantes de limitação dos fatores bióticos. Uma vez
que há um limite de organismos de consumidores tróficos
em uma cadeia alimentar baseado pelo fluxo de energia,
considere as seguintes alternativas e assinale a alternativa
correta acerca do fluxo de energia e da cadeia alimentar.
a) Organismos considerados consumidores possuem mais
energia, uma vez que se alimentam de outros seres de níveis
tróficos abaixo na cadeia alimentar.
b) Organismos produtores possuem um maior índice de
energia, sendo estes considerados a base de uma cadeia
alimentar.
c) Condições tróficas desarmônicas em uma cadeia alimentar
são ocasionadas por um maior índice de organismos
produtores.
d) O fluxo de energia só pode ser constatado em uma cadeia
alimentar de pastoreio, uma vez que na cadeia de detritos
não há energia por conta de matérias orgânicas mortas.
e) Vegetais podem ser considerados organismos
consumidores primários, uma vez que realizam fotossíntese
e se alimentam de luminosidade.

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 97


U2

98 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

Seção 2

Relações e interações ecológicas


O estudo das relações ecológicas fornece um alicerce para pensarmos nas
interações entre distintos seres vivos e como estas se apresentam como critérios
bióticos para a distribuição e limitância dos seres vivos ao redor do planeta.
Considerado assim um elemento fundamental de abordagem e compreensão da
Biogeografia Ecológica.

Para iniciarmos nossas abordagens, iremos listar e descrever os tipos de relações


ecológicas, citando exemplos e situações nas quais podemos conotar a interação
dos seres vivos sempre tendo como escopo as circunstâncias que limitam ou
possibilitam a distribuição de várias formas de vida.

As relações e interações ecológicas se desenvolvem em três gêneros: harmônicas,


desarmônicas e neutras. Para compreendermos estes três gêneros, iremos recorrer
às explicações de Odum (1985) sobre a simbologia de cada uma destas relações:

Teoricamente, as populações de duas espécies podem interagir


segundo vias básicas que correspondem a combinações de
0, + e-, como se segue: 00, --,++, +0, -0 e+-. Três destas
combinações (++,-- e +-) são normalmente subdivididas,
assim resultando em nove importantes interações que têm
sido demonstradas (ODUM, 1985, p. 338).

A priori pode parecer um tanto quanto complexo compreendermos as relações


ecológicas por este viés simbológico apresentado, porém, com a definição de cada
segmento de relações, iremos observar uma grande facilidade na designação destes
símbolos para a distinção dos três gêneros de interações ecológicas.

Para iniciarmos as abordagens, devemos ressaltar que será apresentado um


amálgama teórico das definições de relações ecológicas propostas por Odum
(1985), Brown e Lomolino (2006), Begon, Harper e Twosend (2006) em paralelo com

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 99


U2

as terminologias didático-pedagógicas de Amabis e Martho (2005). Sendo assim,


iniciaremos as análises acerca dos apontamentos dirigidos para cada um dos tipos
de relações ecológicas, identificando-as com a simbologia proposta posteriormente
e, em paralelo, apresentando exemplos das relações e suas respectivas relevâncias
como fator biótico.

2.1 Relações harmônicas


Neste segmento exploraremos as relações harmônicas, dadas como elementos
positivos oriundos das interações dos seres vivos. Neste gênero de relações podemos
elencar como fator biótico o favorecimento na distribuição dos organismos
relacionados, uma vez que as prospecções biológicas permitem uma melhor
condição ambiental e ecológica da interação dos seres vivos para com o ambiente.

2.1.1 Colônia (+) (+)


Baseia-se em uma relação entre seres vivos de uma mesma espécie ou de
espécies distintas (colônia interespecífica) que se agrupam com a finalidade de
prosperar em um mesmo ambiente sem afetar negativamente os demais indivíduos
(BEGON; HARPER; TWOSEND, 2006).

Um exemplo biótico desta relação pode ser evidenciado como um dos exemplos
utilizados por Amabis e Martho (2005) sobre as algas (Volvox sp.) que se agrupam em
um modelo de esfera, possibilitando assim a reprodução no interior e a proteção de
organismos externos, ocasionando também um desenvolvimento para expansões e
distribuição geográfica das espécies envolvidas.

2.1.2 Sociedade (+) (+)


Diferentemente da colônia, a sociedade é uma relação ecológica na qual seres
de uma mesma espécie desenvolvem uma protocooperação com o intuito da
progressão do grupo. Na maioria dos casos, salvo raras exceções, podemos observar
a construção de uma hierarquia, em que cada indivíduo biológico é designado para
uma função na sociedade.

Demonstrações deste tipo de relação ecológica podem ser observadas através


de comportamentos sociais de grupos como abelhas, formigas, alcateias etc.
Biogeograficamente, este tipo de relação ecológica é extremamente positivo para os
seres integrantes, por fornecer meios de expansão e cooperação em determinado
ambiente.

100 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

2.1.3 Mutualismo (+) (+)


Este tipo de interação é um dos mais expressivos pela perspectiva de fatores
ecológicos limitantes dentre as relações harmônicas. A ocorrência deste tipo de
interação se baseia em uma colaboração de dois organismos de espécies distintas
que não conseguem sobreviver de maneira indissociável (ODUM, 1985). A implicância
desta relação pode ser observada em dois segmentos que demonstram como se
estrutura a obrigatoriedade deste tipo de interação.

Por exemplo, a relação entre abelhas e flores pode ser relacionada como uma
interação de mutualismo, uma vez que a abelha se alimenta do néctar das flores,
e, ao fazê-lo, carrega uma carga de pólens que fertilizarão outras flores, criando
assim uma relação benéfica obrigatória de interação, voltada para a alimentação e
reprodução de cada indivíduo respectivo.

Outro elemento de mutualismo que podemos analisar pela ótica biogeográfica


dos fatores de limitação são os líquens. Os líquens são organismos formados por
dois seres vivos, as algas e os fungos. As algas fornecem nutrientes oriundos da
fotossíntese aos fungos, que, por sua vez, retiram do ambiente a umidade, gás
carbônico e sais minerais, fornecendo-os às algas. Qualquer condicionante de
limitação que possa interferir na relação de um dos seres faz com o líquen não
seja desenvolvido sob estas circunstâncias, fazendo com que eles possam ser
compreendidos como bioindicadores que evidenciam as condições ambientais que
possam limitar a associação dos seres vivos envolvidos.

2.1.4 Comensalismo (+) (0)


A interação do comensalismo diz respeito a uma situação na qual um ser vivo se
favoreça de um outro, sem que beneficie ou prejudique este segundo. Esta relação
pode ser observada em casos como em tubarões e os peixes rêmora (Remorina).
Nesta relação observa-se que o peixe rêmora se fixa próximo à cavidade bucal do
tubarão, alimentando-se dos resíduos predados pelo tubarão. Esta interação se
apresenta benéfica para o peixe rêmora e neutra para o tubarão.

A dependência de um ser vivo para o outro não é necessariamente obrigatória


para a sobrevivência, porém, análises biogeográficas relatam que, quando fatores
limitam a distribuição dos seres neutros, é praticamente extinguida a presença dos
seres que se beneficiam desta relação (comensais). Ou seja, baseando-se no exemplo
citado anteriormente, se algum fator limitante, como a temperatura oceânica, limitar
a distribuição em dadas regiões para os tubarões, dificilmente serão encontrados
peixes rêmoras na mesma região, ainda que estes apresentem tolerância sobre a
variação da temperatura.

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 101


U2

2.1.5 Protocooperação (+) (+)


Baseia-se em uma relação “[...] na qual ambas as populações são beneficiadas pela
associação, embora as relações não sejam obrigatórias” (ODUM, 1985, p. 339). Esta
interação é amplamente constatada em diversos nichos ecológicos e independe de
muitos fatores limitantes.

Um exemplo de protocooperação pode ser dado pela relação entre os gados e


aves como o Anu (Crotophaga ani). Neste exemplo, a ave se alimenta de parasitas
presentes no gado, logo, o gado se beneficia pela retirada dos parasitas e a ave pelo
fácil acesso ao alimento.

Este tipo de interação beneficia os dois seres vivos relacionados, mas a ausência
de obrigatoriedade não configura qualquer fator limitante para ambos os seres,
fazendo com que esta relação seja completamente circunstancial.

2.2 Relações Desarmônicas


Este gênero de relação se configura pela atribuição benéfica a um ser vivo e
negativa a outro. Elementos como a condição trófica desarmônica e alguns fatores
antrópicos se inserem neste gênero de relações ecológicas, uma vez que atuam
como fatores limitantes para a distribuição de determinados seres vivos.

2.2.1 Predatismo (+) (-)


O predatismo é uma condição extremamente observada pela análise dos
organismos consumidores secundários diante de uma cadeia alimentar. A concepção
deste tipo de interação é simples, se baseia em uma condição trófica em que um
animal consome um segundo animal em uma escala trófica. Por exemplo, os seres
humanos se encontram em um alto patamar na escala trófica, fazendo com que
predem seres vivos em níveis tróficos inferiores.

A repercussão ecológica e biogeográfica desta relação diz respeito aos critérios


bióticos e antrópicos para os seres envolvidos, uma vez que, em uma condição trófica
desarmônica onde haja um maior número de predadores, logo haverá uma escassez
dos organismos predados. A repercussão deste tipo de relação para os organismos
predados (-) se apresenta como negativa, pois estes não terão a possibilidade de
reproduzir e se distribuir, por conta da predação enquanto fator biótico limitante.

2.2.2 Parasitismo (+) (-)


Esta condição ocorre quando um organismo se beneficia de outro causando

102 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

danos de curto e longo prazo no hospedeiro. O parasitismo tem ocorrência em


diversas espécies, sendo que os parasitas se apresentam em diversos filos, conforme
a taxonomia de Lineu. A atuação se delimita enquanto o parasita (+) se beneficia dos
nutrientes e condições de seu hospedeiro (-).

Um exemplo que pode ser relatado para esclarecer esta relação ecológica é
a relação entre a lombriga (Ascaris lumbricoide) e o ser humano. Neste caso, a
lombriga é um nematelminto que, no desenvolvimento de seu ciclo, se aloja no
intestino de seu hospedeiro, no caso o ser humano, e se alimenta dos nutrientes que
seriam dirigidos ao hospedeiro.

Sendo assim, o parasita se beneficia desta relação causando danos ao hospedeiro.


Tal interação desarmônica também pode ser observada em plantas e fungos que
atuam da mesma maneira. Ainda que o depauperamento do hospedeiro não seja o
objetivo do parasita, a ocorrência em longo prazo pode levar à morte do hospedeiro
e, consequentemente, do parasita.

2.2.3 Competição (-) (-)


A competição por recursos em um mesmo ambiente por seres da mesma
espécie (específica) e de espécies distintas (interespecífica) é considerada uma
relação desarmônica para ambas as espécies envolvidas, quando a exploração de
um nível trófico ou de alimento é a mesma (BEGON; HARPER; TWOSEND, 2006).

A aplicabilidade desta condição é atrelada pela disponibilidade de recursos no


ambiente, sendo assim, todos os condicionantes de fatores limitantes são relevantes
a esta relação ecológica. Dentre as consequências deste tipo de relação desarmônica
podemos citar a extinção de espécies, fluxos migratórios artificiais e a dispersão de
seres vivos para outras localidades.

2.2.4 Amensalismo (-) (0)


O amensalismo ocorre quando determinada espécie desenvolve alguma
condição que possa inibir diretamente outra espécie em um mesmo ambiente. As
circunstâncias desta interação se apresentam quando uma espécie inibidora (0) cria
uma condição que acaba prejudicando o amensal (-) sem o intuito.

Como exemplo de uma relação de amensalismo, podemos citar o eucalipto


(Eucalyptus microtheca) e demais espécies do gênero, que, ao derrubar suas folhas,
liberam uma substância que inibe o crescimento de outras espécies vegetais ao entorno.

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 103


U2

2.3 Relações Neutras


Tal qual o nome sugere, este gênero de relações entre os seres vivos é o menos
expressivo no que diz respeito aos fatores limitantes e impactos oriundos das
interações bióticas. A concordância simbológica deste tipo de relação se refere a (0)
(0), ou seja, “Nenhuma das populações é afetada pela associação a outra” (ODUM,
1985, p. 338).

Sendo assim, ainda que inexpressivo no que diz respeito à limitância entre os
seres vivos, este gênero de relação se baseia em uma condição presente em muitos
ambientes onde as espécies podem ou não interagir em seus nichos ecológicos
sem trazer qualquer representatividade entre as relações.

As relações e interações ecológicas nos apresentam atributos fundamentais


para compreendermos as principais dinâmicas presentes nas relações
bióticas e como estas atuam enquanto fator limitante para os seres vivos
e até mesmo para sua distribuição geográfica. Para explorar um pouco
mais sobre esta temática, acesse a página “Ciência a Mão”, disponível
em: <http://www.cienciamao.usp.br/tudo/exibir.php?midia=von&cod=_
biologiaecologiarelacoes>. Acesso em 10 ago. 2015.

2.4 Conclusões sobre as relações


Com o aporte teórico construído até o momento, diante das relações e interações
ecológicas, podemos alçar arguições que busquem uma guisa de conclusão ante as
análises apresentadas.

Compreendemos os três gêneros de relações ecológicas e os tipos de relação


que neles se inserem. Foi demonstrada, também, a aplicabilidade dos tipos de
interações ecológicas sob uma perspectiva biogeográfica da atuação dos fatores
limitantes, com um amplo destaque para os fatores bióticos e antrópicos.

As relações mencionadas podem ser sinteticamente analisadas pela simbologia


referida (+, - e 0), onde cada símbolo indica os atributos positivos, negativos e neutros
para cada espécie ou população ecológica referida. Vale a pena ressaltar que estas
interações são multidirecionais, ou seja, o mesmo ser vivo que apresenta uma relação
de protocooperação com outro ser pode apresentar uma relação de predatismo com
um terceiro ser vivo, conotando assim uma dinâmica extremamente mais complexa e
entrelaçada com os organismos presentes em um mesmo nicho ecológico.

104 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

De maneira a apresentarmos um apanhado geral sintetizado, recorremos a uma


tabela elaborada por Odum (1985) que apresenta algumas das principais relações
ecológicas , assim como as que tratamos anteriormente:

Quadro 2.1 | Análise das interações entre populações de duas espécies


0 Indica ausência de relações significativas
+ Indica crescimento, sobrevivência ou outro atributo benéfico
- Indica atributos de inibição ou negativos

Espécies
Tipos de Interação Natureza da Interação
1 2
Neutralismo 0 0 Nenhuma das populações afeta a outra
Competição: Influência
- - Inibição direta entre as espécies
direta
Competição: Recurso - - Inibição direta de acordo com o recurso
Amensalismo - 0 População 1 é inibida e a 2 não é afetada
Parasitismo + - Parasita 1 se beneficia do hospedeiro 2
Predação + - Predador 1 se beneficia da presa 2
Comensalismo + 0 Comensal 1 se beneficia e hospedeiro 2 é neutro
Protocooperação + + Interação favorável a ambas mas não obrigatória
Mutualismo + + Interação favorável a ambas mas obrigatória
Fonte: Adaptado de Odum (1985, p. 339)

Para a Biogeografia, compreender estas relações é uma etapa fundamental para


o entendimento das dinâmicas de dispersão dos seres vivos, uma vez que, além de
estar diretamente envolvida com os demais fatores limitantes, a atuação da dinâmica
biótica nos salienta a abrangência das circunstâncias que ocorrem entre os seres
vivos em um ambiente e como tais dinâmicas influem na proporção e dispersão das
populações diante das relações harmônicas e desarmônicas.

Ao pensarmos na atuação dos fatores limitantes e analisarmos


as relações ecológicas entre os seres vivos, é possível também
elencarmos o homem enquanto ser vivo responsável por
grandes intervenções no meio natural e no próprio ambiente,
sendo assim um elemento fundamental nos ensaios sobre
Biogeografia. Mas como podemos proporcionar uma relação
harmônica entre sociedade e ambiente? Como sugestão, leia
os parâmetros propostos pela Carta da Terra e reflita sobre o
direcionamento atual de nossa sociedade.

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 105


U2

Disponível em: <http://www.mma.gov.br/responsabilidade-


socioambiental/agenda-21/carta-da-terra> Acesso em: 11 ago.
2015.

1. Um fenômeno amplamente conhecido acerca das relações


ecológicas diz respeito às “Marés Vermelhas”. Este fenômeno
ocorre quando microplânctons (Pyrrophytas), similares às
algas, se aglomeram mudando a coloração da água. Paralelo
a esta alteração na cor, estes organismos liberam toxinas que
acidentalmente ameaçam a vida dos organismos aquáticos,
sejam eles marinhos ou de água doce.
Sobre este fenômeno, assinale a alternativa correta que
apresenta o gênero e o tipo de relação ecológica dada pela
interação das Pyrrophytas com os demais seres aquáticos.

a) Relação Desarmônica – Predatismo, uma vez que as


Pyrrophytas se alimentam dos demais seres vivos aquáticos.
b) Relação Harmônica – Protocooperação, todos os
organismos envolvidos no fenômeno da maré vermelha se
beneficiam desta dinâmica.
c) Relação Neutra – Neutralismo, nenhuma das populações
afeta a outra, uma vez que não há intenção.
d) Relação Desarmônica – Amensalismo, dado que as
Pyrrophytas liberam as toxinas sem a intenção de inibir a
população aquática.
e) Relação Harmônica – Comensalismo, as Pyrrophytas se
beneficiam da população aquática, sendo que esta não é
prejudicada pelo fenômeno da maré vermelha.

2. Associe cada relação ecológica correspondente à descrição


e exemplos de interação entre as populações bióticas a

106 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

seguir e assinale a alternativa compatível com a sequência


formulada:
Alcateias de lobos disputando o mesmo
1- Protocooperação
território e recursos alimentícios.
Relação trófica que condiciona o fluxo de
2- Predatismo
energia entre insetos e anfíbios.
Doença nomeada como teníase em seres
3- Parasitismo
humanos e outros animais.
Hierarquia presente em populações de inse-
4- Competição
tos como formigas ou abelhas.
Colaboração entre aves e répteis, como
5- Sociedade crocodilos, garantindo a alimentação e a
higiene bucal de respectivos seres.

Alternativas:
a) 1 – 2 – 5 – 3 – 4.
b) 2 – 4 – 3 – 1 – 5.
c) 4 – 2 – 1 – 3 – 5.
d) 2 – 4 – 5 – 3 – 1.
e) 4 – 2 – 3 – 5 – 1.

Nesta unidade você aprendeu:


• A interação das esferas através dos fatores limitantes.
• O conceito de barreiras geográficas atuando na distribuição
dos seres vivos.
• As dinâmicas climáticas oriundas do movimento de rotação,
translação e a influência da latitude.
• A temperatura do ambiente e dos seres vivos como quesitos de
tolerância para a dispersão.
• Noções de edafologia e pedologia e como estas atuam para
com os seres vivos de diferentes reinos.
• Os fatores bióticos como resultado e coeficiente na análise dos
fatores limitantes.
• A atuação do homem enquanto ser vivo capaz de inferir nos
demais fatores.

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 107


U2

• As relações e interações ecológicas.


• Como ocorrem estas interações e como identificá-las entre
harmônicas, desarmônicas e neutras.
• A relevância do estudo das relações ecológicas para a distribuição
dos seres vivos.

No decorrer das análises realizadas nesta unidade foi possível


compreender a dinâmica dos fatores limitantes e suas inferências
no que diz respeito à distribuição dos seres vivos. Em paralelo,
realizamos abordagens fundamentais para o entendimento das
interações e relações ecológicas entre os seres vivos por uma
perspectiva biogeográfica, encarando-os como elementos
circunstanciais dos fatores bióticos que possibilitam a distribuição
de distintas populações de organismos vivos.
A Biogeografia Ecológica nos permite pensar, analisar e compreender
toda a interação de fenômenos que ocorrem no planeta para
justificar a dispersão dos seres vivos, uma vez que entendermos que
a Biosfera é uma das esferas mais complexas de abordagem, devido
à amplitude de efeitos de um simples condicionante dos fatores
limitantes. Estudar os fatores limitantes e as relações ecológicas é,
de certa maneira, buscar meios fundamentais para o rompimento e
entendimento da complexidade no processo de associações entre as
esferas do planeta Terra.
Como artifício para que você se aprofunde ainda mais no
entendimento das dinâmicas entre as esferas e os condicionantes
dos fatores limitantes, iremos indicar dois referenciais bibliográficos.
O primeiro, amplamente abordado em nossas análises nesta
unidade, diz respeito à obra “Fundamentos de Ecologia”, de
Eugene P. Odum. Esta obra explora elementos fundamentais
da ecologia vastamente analisados pela Biogeografia, partindo
desde as relações ecológicas de organismos unicelulares até
seres vivos mais complexos, inclusive indicando a relação entre
o homem e o meio natural. A segunda indicação se refere ao
seguinte artigo publicado no periódico “Boletim de Geografia”
pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), de autoria de Maria
Juraci Z. dos Santos (Disponível em: <http://www.periodicos.
uem.br/ojs/index.php/BolGeogr/article/view/12274> Acesso
em: 16 ago. 2015), que nos apresenta um panorama dos estudos
biogeográficos pelo viés da Geografia.

108 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

1. As barreiras geográficas correspondem a uma circunstância


que proporciona alterações significativas em diferentes escalas
da dinâmica climática, como nos meios edáficos, pedológicos
e bióticos. Acerca da atuação dos fatores geográficos
enquanto elemento fundamental para a designação dos
fatores limitantes para a distribuição dos seres vivos, assinale
a alternativa que apresenta os apontamentos corretos diante
deste fator limitante.

I - O fator geográfico pode ser evidenciado sobre a análise do


processo de especiação alopátrica, firmando-se as evidências
de que determinadas espécies não possuem mecanismos
essenciais para superar certas barreiras geográficas, fazendo
com que estas fiquem reclusas à reprodução e relacionamento
apenas com seres vivos do mesmo nicho ecológico.
II - A dinâmica climática está diretamente atrelada com os
fatores geográficos. Um dos exemplos que demonstra esta
relação se baseia na distinção espacial de temperatura e
umidade, em dois ambientes relativamente próximos, imposta
por uma barreira geográfica, como a Cordilheira dos Andes.
III - O fator geográfico pode ser designado como um fator
físico e mecânico que não possui quaisquer interferências na
dispersão dos seres vivos, atuando somente na condição de
outros fatores, como o climático.
IV - A amplitude decorrente das barreiras geográficas é
tamanha que exerce ação direta sobre os demais fatores
limitantes, como a alteração dos condicionantes climáticos,
desenvolvimento edáfico, composição de biodiversidade e,
até mesmo, nas relações antrópicas.
V - As barreiras geográficas possuem influência somente sobre
os fatores climáticos, uma vez que este pode ser considerado
um fator primordial para a distribuição dos seres vivos.

a) I, II, IV e V.
b) II, IV e V.
c) I, III, IV e V.

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 109


U2

d) I, II e IV.
e) II, III, IV e V.

2. “[...] o sertão é um vale fértil. É um pomar vastíssimo, sem


dono. Depois tudo isto se acaba. Voltam os dias torturantes;
a atmosfera asfixiadora; o empedramento do solo; a nudez
da flora; e nas ocasiões em que os estios se ligam sem a
intermitência das chuvas, o espasmo assombrador da seca”
(CUNHA, p. 43).
As descrições acerca das paisagens nos apresentam
fundamentos para analisar determinados contextos
biogeográficos sobre os fatores limitantes. O trecho da
obra “Os Sertões” nos fornece segmentos de análise sobre
a caatinga, um bioma brasileiro que apresenta a atuação
de fortes fatores limitantes para a distribuição das espécies.
Selecione as opções corretas a seguir que apresentam
correlação aos fatores limitantes que atuam na caatinga:
I – Atuação do fator de continentalidade, ocasionando baixos
índices de umidade devido ao distanciamento do mar, sendo
este um dos condicionantes climáticos que designam a região
como árida.
II - A dinâmica dos fatores edáficos proporciona vegetações
xerófilas com profundas raízes para a captação de umidade
em níveis mais profundos do solo e mecanismos fisiológicos
como espinhos e películas em folhas para evitar a transpiração.
III – Fatores limitantes climáticos e bióticos limitam a
presença de seres vivos heterotérmicos na região, uma vez
que a temperatura corporal destes seres varia conforme a
temperatura do ambiente, tendo como grandes representantes
deste grupo os répteis.
IV – Os fatores antrópicos são as principais causas do
fenômeno descrito como seca na citação, pois a densidade
populacional e os altos índices de urbanização geram o calor
artificial que compõe este bioma.

Dadas as apresentações das opções, selecione a alternativa

110 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

correspondente às caracterizações biogeográficas e atuações


dos fatores limitantes na região. Estão corretas apenas:

a) I, II e III.
b) I, II e IV.
c) II, III e IV.
d) I e II.
e) Todos.

3. O ser humano pode ser considerado como um fator


limitante na distribuição dos seres vivos, pois este proporciona
condições que podem afetar diretamente outros fatores
limitantes, de acordo com a escala e o nível de modificação
do ambiente. Acerca dos elementos dos fatores antrópicos
elencados como limitantes, diferencie as opções entre
verdadeiro e falso, e assinale a alternativa correspondente.

( ) O fator antrópico pode proporcionar a alteração de


barreiras geográficas, como rios, vales e a interconexão entre
continentes decorrente das tecnologias de mobilidade.
( ) As modificações antrópicas no ambiente ocasionam uma
ação direta nos sistemas ecológicos de determinada região,
forçando as espécies do nicho ecológico a um novo processo
de adaptação, abandono ou, até mesmo, a extinção destas
em seu nicho.
( ) O ser humano possui total controle sobre as variações
climáticas, podendo delimitar e dirigir os efeitos benéficos ou
adversos ao ambiente através das tecnologias.
( ) Determinadas espécies possuem uma relação de
comensalismo com os seres humanos, por exemplo, as
atividades antrópicas em centro urbano produzem os
resíduos sólidos que alimentam comensais como os urubus
ou abutres.

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 111


U2

a) V – V – F – V.
b) F – F – V – V.
c) V – V – F – F.
d) F – F – V – V.
e) V – V – V – F.

4. Os atributos do fluxo de energia em ecologia nos auxiliam


na compreensão das dinâmicas de relações tróficas e,
consequentemente, fundamentos da distribuição e localidade
de espécies em ecossistemas, pautados nas interações entre
os seres vivos. Diante deste contexto, assinale a alternativa
correta dentre as afirmações acerca das relações bióticas
enquanto fator limitante.

a) O fator antrópico detém como elemento a alteração do


ambiente e, como consequência, isto se reflete de maneira
benéfica ou adversa nas relações ecológicas, atuando na
limitação de certos seres vivos ao ambiente alterado, mas não
no desenvolvimento de determinados seres vivos em novos
ambientes modificados.
b) O fluxo de energia salienta que há uma perda significativa
de energia conforme a escalada dos níveis tróficos. Neste
contexto, pode-se afirmar que organismos produtores, como
os vegetais, possuem menos energia acumulada do que os
consumidores primários, como animais de pastoreio e os
demais organismos em níveis tróficos superiores.
c) As condições tróficas desarmônicas são dadas como um
excelente parâmetro para a análise dos fatores limitantes
bióticos, uma vez que atuam como agentes benéficos à
prosperação de seres vivos em um mesmo nicho ecológico.
d) As condições que possibilitam a distribuição e o arranjo
biótico dos seres vivos estão primariamente relacionadas
com os fatores geográficos, climáticos e edáficos. Entretanto,
as atuações dos fatores bióticos influenciam diretamente
nos componentes da cadeia alimentar, proporcionando
condições que limitem ou propiciem determinados tipos de

112 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

seres vivos a aderirem aos níveis tróficos.


e) Condições tróficas harmônicas são as menos impactadas
com a atuação de outros fatores, uma vez que, quando já
estão estabelecidos, os demais fatores limitantes não exercem
efeitos sobre as relações do nicho ecológico.

5. A Lei de Shelford se apoia no contexto de amplitude


à tolerância, no qual os seres vivos estão submetidos
em um ambiente. Sobre estas dinâmicas que atuam no
desenvolvimento ou limitância dos seres vivos em diversos
ambientes, assinale a alternativa que contempla corretamente
as opções listadas a seguir:
I – A latitude e as dinâmicas de estações proporcionam
um fator de tolerância vinculado à temperatura e umidade
no planeta, atuando como critérios de limitância para a
distribuição dos seres vivos.
II – A presença de seres terrestres heterotérmicos nos polos
é vetada pelo critério da tolerância destes seres às condições
do ambiente.
III – A tolerância a determinados ambientes pode ser
contornada pelo processo de adaptação e seleção natural
dos seres vivos.
IV – As características edáficas e pedológicas não atuam
como fatores de tolerância, uma vez que não há relação
destes fatores com a Lei de Shelford.
V – Seres humanos não estão suscetíveis ao contexto das leis
de tolerância, por se destacarem em um alto patamar dos
níveis tróficos.

Estão corretas as opções:


a) II, III e V.
b) I, II e IV.
c) I, II e III.
d) II, V e IV.
e) Somente IV e V.

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 113


U2

114 Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos


U2

Referências

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Paulo: Ateliê Editorial, 2007.
AMABIS, J. M.; MARTHO, G. R. Biologia. v. 3, 2. ed. São Paulo: Editora Moderna, 2005.
AYOADE, J. O. Introdução à climatologia para os trópicos. São Paulo: Difel, 1986.
BEGON, M.; HARPER, J. L; TWOSEND, C. R. Fundamentos em cologia. 2. ed. Porto
Alegre: Artmed, 2006.
BLEASDALE, J. K. A. Fisiologia egetal. São Paulo: EDUSP, 1977. p. 91-112.
BROWN, J. H.; LOMOLINO, M. V. Biogeografia. 2. ed. Ribeirão Preto: Funpec, 2006.
CUNHA, E. Os sertões. São Paulo: Brasiliense, 1985.
GONÇALVES, C. W. P. Os (des)caminhos do meio ambiente. 15. ed. São Paulo:
Contexto, 2013.
MENDONÇA, F.; DANNI-OLIVEIRA, I. M. Climatologia: noções básicas e climas do
Brasil. São Paulo: Oficina de Textos, 2007.
MUNFORD, L. A cidade na história. Belo Horizonte: Itatiaia, 1962.
ODUM, E. P. Fundamentos de ecologia. Rio de Janeiro: Guanabara, 1985.
RANDALL, D.; BURGGREN, W.; FRENCH, K. Eckert. Fisiologia animal: mecanismos e
adaptações. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 2000.
RIDLEY, M. Evolução. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2006.
VAREJÃO-SILVA, M. A. Meteorologia e climatologia. 2006. Disponível em: <http://
www.leb.esalq.usp.br/aulas/lce5702/Meteorologia_e_Climatologia_VD2_Mar_2006.
pdf>. Acesso em: 20 jul. 2015.
VIEIRA, L. S. Manual da ciência do solo. São Paulo: Editora Agronômica Ceres, 1975.

Biogeografia ecológica: fatores limitantes da distribuição dos seres vivos 115


Unidade 3

BIOMAS TERRESTRES E
DOMÍNIOS BIOGEOGRÁFICOS
DO BRASIL
Luciana A. Pires

Objetivos de aprendizagem:
Esta unidade visa apresentar como as diferentes paisagens naturais,
distinguíveis especialmente pelo clima, e relevo, vegetação, podem ser delimitadas
em biomas e/ou domínios morfoclimáticos, que são formas de classificações
fitogeográficas. Pretende-se que, ao final, você possa caracterizar e localizar os
principais biomas do mundo, bem como dos diversos domínios fitogeográficos
brasileiros, conhecimento importante para fins de pesquisa, planejamento e
implantação de políticas públicas. Também, será discutido ligeiramente sobre as
principais ameaças impostas pelas atividades antrópicas neles.

Seção 1 | Ecossistemas, biomas e domínios


Esta seção tem o intuito de definir alguns conceitos importantes para
o reconhecimento dos níveis de organização estudados na Biogeografia,
a saber, ecossistema, bioma e domínio, que são unidades que podem
ser utilizadas para a regionalização do espaço. Tanto os biomas como
os domínios são agrupamentos de áreas que levam em consideração
os elementos naturais, principalmente clima, relevo e vegetação
predominante, e são compostos por diversos ecossistemas.

Seção 2 | Os principais biomas terrestres do planeta


A biosfera possui diversos biomas, que a despeito de ocorrerem em
distintas localizações geográficas, guardam especificidades quanto aos
processos ecológicos e à estrutura da vegetação. Esta seção caracteriza
e apresenta a distribuição dos principais biomas do mundo.
Seção 3 | Os domínios morfoclimáticos e fitogeográficos do
Brasil

Nesta seção iremos apresentar a classificação fitogeográfica brasileira


proposta por Aziz Ab´Saber (1970), que divide o país em seis domínios
morfoclimáticos - Amazônico, Cerrado, Mares de Morros, Araucárias,
Caatingas e Pradarias, mais as faixas de transição entre eles. Esta classificação
segue aproximadamente a classificação dos biomas brasileiros.
U3

Introdução à unidade

Você já refletiu por que as paisagens se modificam ao longo do espaço e


tempo?

Você já deve ter reparado que, quando viajamos, em especial a longas distâncias,
podemos observar que a paisagem, mesmo em áreas não antropizadas (ou seja, as
áreas naturais sem ou pouca interferência humana), vai se modificando conforme
o clima e outras condições abióticas (como o solo e o relevo) prevalecentes.

Conhecer como as espécies se encontram distribuídas no espaço, e como os


processos ecológicos, geológicos e históricos, em curto e longo prazo, influenciam
nestes padrões de distribuição, é um dos principais objetivos da Biogeografia. Estes
estudos foram alavancados, no século XIX, pelo aumento das oportunidades de
grandes viagens, nas quais os cientistas ou naturalistas podiam observar que cada
local exibia conjuntos de animais e plantas distintos entre si.

O clima é um dos principais determinantes das comunidades biológicas, e pode


variar de acordo com a latitude, altitude (relevo), distância do oceano, correntes
marítimas, massas de ar, sendo que, entre os estudiosos pioneiros da fitogeografia
(ramo da biogeografia que estuda as plantas), o geógrafo alemão Alexander
von Humboldt foi o primeiro a reconhecer a relação entre altitude e latitude na
distribuição das plantas (SANTOS, 2012).

Considerando a relação clima x vegetação, este elemento da paisagem foi o


objeto delineador de várias classificações dos territórios nacional e mundial.

E por que um geógrafo, professor – profissional das Ciências Humanas -, precisa


saber sobre as características e a distribuição da vegetação e seus condicionantes?

Além dos pesquisadores do ramo da Biogeografia propriamente dita, este


conhecimento é importante para os geógrafos em geral, visto que estes
profissionais se dedicam em grande parte a compreender e contribuir para que
o homem conviva com outras espécies e com o ambiente natural. Por exemplo,
muitos desastres e degradação ambiental poderiam ser evitados se o uso e a
ocupação territorial levassem em consideração as características ambientais, suas
potencialidades e fragilidades.

Assim sendo, esta unidade visa apresentar alguns conceitos relevantes da


fitogeografia (Seção 1), e as classificações propostas para delimitar as distintas
regiões do planeta (Seção 2), e do Brasil (Seção 3).

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 119


U3

120 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

Seção 1

Ecossistemas, biomas e domínios


Você sabe que para qualquer estudo (e a aplicação de seus resultados) é necessário
delimitar a área, o objeto a ser pesquisado. A delimitação do espaço em unidades
relativamente homogêneas ou que guardam relações ecológicas e históricas entre
si torna-se, portanto, de fundamental importância para o trabalho dos geógrafos.

Você sabe qual é a diferença entre Ecossistema e Bioma?

Estes termos nem sempre são facilmente definidos, mas podem ser distinguidos
segundo alguns conceitos que veremos a seguir.

Ecossistema pode ser definido como qualquer local ou área que inclua a
comunidade de organismos (denominada de biota) e o ambiente físico, de maneira
que haja relação entre os componentes bióticos (seres vivos) e abióticos (água, luz,
temperatura etc.) (ODUM, 1988). Desta forma, podemos considerar ecossistemas
de tamanhos variados, desde uma poça, lago, mares ou uma floresta, e até mesmo
ecossistemas artificiais (ou seja, produzidos pelo homem), podemos citar os
agroecossistemas (sistemas agrícolas), um aquário e até mesmo uma cidade.

Já os biomas (bio = vida + oma = grupo) correspondem a um nível de organização


biológica superior ao de ecossistemas, correspondendo, a grosso modo, a um
conjunto de ecossistemas terrestres submetidos a um regime climático similar,
sendo, geralmente, nominado pela vegetação predominante. Os ecossistemas
que pertencem ao mesmo tipo de bioma em diferentes partes do mundo, embora
possuam composições taxonômicas distintas, desenvolvem uma estrutura de
vegetação e funcionamento, como produtividade e taxas de ciclagem de nutrientes,
semelhantes uns aos outros (RICKLEFS, 2010).

Ao conjunto de todos os biomas do planeta nós damos o


nome de Biosfera!
Você sabe quais locais não fazem parte da biosfera, ou seja,
onde ainda não foram encontrados seres vivos?

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 121


U3

No Brasil, Coutinho (2006) conceitua bioma como:

Uma área do espaço geográfico, com dimensões de até


mais de um milhão de quilômetros quadrados, que tem por
características a uniformidade de um macroclima definido,
de uma determinada fitofisionomia ou formação vegetal, de
uma fauna e outros organismos vivos associados, e de outras
condições ambientais, como a altitude, o solo, alagamentos,
o fogo, a salinidade, entre outros. Estas características todas
lhe conferem uma estrutura e uma funcionalidade peculiares,
uma ecologia própria.

Fitofisionomia é a primeira impressão proporcionada pela vegetação, uma


característica morfológica da comunidade vegetal.

O renomado ecólogo estadunidense Eugene Odum define os biomas como


grandes unidades comunitárias facilmente reconhecíveis, formadas a partir da
interação do clima com a biota regional e o substrato. Em cada bioma a forma de
vida da vegetação clímax climática é uniforme (ODUM, 1971).

Chamamos de clímax climático a comunidade biológica encontrada no


estágio final da sucessão ecológica, sendo, ao menos teoricamente, capaz de se
autoperpetuar na área, pois encontra-se em equilíbrio dinâmico em si mesma e com
o hábitat físico (em especial, o clima regional). Já a comunidade vegetal que inicia o
processo de sucessão é denominada de “pioneira”, e as comunidades intermediárias,
sere. Sobre sucessão e as características de uma comunidade clímax, acesse: <http://
www.sobiologia.com.br/conteudos/bio_ecologia/ecologia23.php>.

Em determinados locais, devido a condições de solo e/ou topografia, o


clímax climático não é alcançado, desenvolvendo-se o clímax edáfico.
As alterações antrópicas podem levar também a esta situação, como é
discutido no link: <https://goo.gl/5dSmWP>.

Portanto, é fundamental, para a delimitação e a identificação dos biomas


terrestres, reconhecer as formas de vida predominantes da vegetação clímax

122 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

climático. Por exemplo, as árvores são as formas dominantes nos biomas florestais,
e as herbáceas, nos campos naturais. No entanto, podemos encontrar outras formas
de vida predominando quando a vegetação se encontra em regeneração.

Figura 3.1 | Órgão reprodutivo (em forma de cone) do pinheiro

Fonte: Disponível em: <https://pixabay.com/pt/ramo-de-pinheiro-agulhas-de-pinheiro-8169/. Acesso em: 15 ago. 2015.

As coníferas são plantas perenifólias pertencentes ao grupo das Gimnospermas


(plantas com sementes nuas, como o pinhão); possuem acículas, folhas em forma
de agulhas, que são adaptadas às condições de ambientes frios e temperados.

Podemos citar como formas de vida as plantas herbáceas, arbustivas, árvore


decídua (perde suas folhas durante a estação desfavorável, seca ou muita
fria), árvore perenifólia (mantém suas folhas ao longo do ano, substituindo-as
gradativamente) e coníferas.

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 123


U3

O agrupamento de porções dos territórios com condições similares é uma


ferramenta importante para os geógrafos, e embora Bioma seja o conceito mais
adotado para este agrupamento, e o que será utilizado para descrever a próxima seção
(seção 2), outros podem ser utilizados, conforme os objetivos e critérios dos autores.

No Brasil, cabe ressaltar a classificação do território nacional em domínios


morfoclimáticos e fitogeográficos, proposta na década de 70 por Aziz Ab’Saber, um
dos maiores nomes da geografia física do país. Por ser consagrada no âmbito desta
disciplina, utilizaremos para descrever a seção 3 da unidade, quando discutiremos
sobre as grandes zonas fitogeográficas brasileiras. A divisão da paisagem em domínios
da natureza é uma forma de regionalização, e compreende áreas contíguas com
dimensões subcontinentais, de milhões até centenas de milhares de quilômetros
quadrados, que tem como principais elementos distinguíveis o clima, o relevo e a
vegetação predominante.

1. “Alguns autores usam como sinônimos certos termos que


conceitualmente são bem distintos. Uma certa uniformidade
na conceituação desses termos se faz necessária, a fim de que
as principais áreas e fatores de risco possam ser estabelecidos
para que providências sejam tomadas no sentido de sua
conservação” COUTINHO, Leopoldo Magno. O conceito de
bioma. Acta Bot. Bras., v. 20, p. 13-23, 2006). Sobre o uso dos
diferentes termos técnicos, analise as afirmativas a seguir e
assinale a alternativa correta.
I. O sistema de classificação internacional mais utilizado para
delimitar as paisagens naturais do planeta são os domínios
morfoclimáticos, que agrupam unidades da paisagem com o
mesmo conjunto de espécies da fauna e da flora.
II. Ecossistema é uma área de dimensões variadas, onde
um conjunto de organismos vivos interage com os fatores
abióticos (água, solo, nutrientes, ar), como, um campo tropical,
uma mata ciliar, ou até mesmo um sistema antrópico, como
um campo agrícola.
III. Bioma é uma unidade territorial, em escala regional,
que abriga um conjunto de fauna e flora sujeito às mesmas
condições de clima e de relevo. Como exemplo de bioma,

124 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

podemos citar um aquário, um lago ou uma floresta.


Está(ão) correta(s) apenas a(s) afirmativa(s):
A) I.
B) I e II.
C) II.
D) II e III.
E) III.

2. Bioma, domínio e ecossistema são termos ligados e


utilizados ao mesmo tempo nas áreas da biologia, geografia
e ecologia, mas não significando, em absoluto, que sejam
palavras referentes a um mesmo conceito. São todos
empregados quando se pretende dividir um território
de acordo com suas paisagens naturais (Fonte: <http://
www.infoescola.com/geografia/biomas-dominios-e-
ecossistemas/>). Sobre estes termos, analise as afirmativas
abaixo e depois assinale a alternativa correta.
I. Os biomas podem ser reconhecidos como um nível de
organização inferior a ecossistemas, ou seja, um ecossistema
pode conter diversos biomas.
II. Os conceitos de domínios e biomas são aproximados e de
certa forma correspondentes, sendo o primeiro empregado
na classificação fitogeográfica brasileira, enquanto o segundo
é utilizado também para classificar a vegetação mundial.
III. Os biomas possuem a mesma composição de espécies da flora
e da fauna, mesmo se encontrados em locais distintos do planeta.
IV. O clima, o relevo e a vegetação dominante são os
principais elementos naturais que delimitam os domínios
fitogeográficos brasileiros.
Estão corretas apenas as alternativas:
A. I e II.
B. I e III.
C. II e III.
D. II e IV
E. III e IV.

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 125


U3

126 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

Seção 2

Os biomas terrestres do planeta


Nesta seção iremos abordar os principais biomas terrestres do planeta. Você
deve considerar que a descrição é superficial e abrangente, pois é difícil falar de
particularidades existentes em cada canto da Terra, mas mostra as principais
características apresentadas por cada bioma.

2.1 Classificações dos principais biomas do planeta


Assim como não existe um conceito único sobre bioma, também não existe
um consenso sobre o melhor tipo de classificação, e quantos biomas ocorrem
no planeta. Nesta seção iremos apresentar os biomas terrestres do mundo, tendo
como base, principalmente, a descrição proposta em Odum (1988).

Figura 3.2 | Distribuição mundial dos principais biomas terrestres (segundo AUDERSIK;
AUDERSIK, 1996 apud BEGON et al., 2006).

Fonte: Begon et al. (2006, p. 22)

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 127


U3

Notas: As montanhas, em decorrência da alta diversidade das condições físicas,


exibem uma mistura de biomas, geralmente sendo classificados por zonação.
Devido à sua complexidade, não as descreveremos nesta unidade.

Como já comentamos acima, por tratar-se de uma abordagem global, há


imprecisões também aqui no mapa: repare que os “campos temperados” adentram
o Brasil Central, quando, de fato, ocorrem apenas no Rio Grande do Sul.

Você sabe em qual tipo de bioma são cultivados o milho e o


trigo que alimentam grande parte das populações?
Qual é a maior floresta em extensão, e qual é a que possui a
maior biodiversidade do mundo?

A tundra é caracterizada por uma vegetação com predomínio de musgos, líquens


(organismos formados pela união de algas e fungos) e herbáceas, formas de vida que
suportam os fortes ventos e a pequena camada de solo, embora também possam
ser encontradas plantas lenhosas anãs. A precipitação, embora possa ser baixa
(cerca de 300mm/ano), visto a reduzida taxa de evaporação, não é considerada,
em geral, como principal fator limitante para o desenvolvimento das plantas.

2.2 Tundras – Árticas e Alpinas


Pense num lugar frio...

...talvez na região onde se encontram as tundras, as temperaturas sejam ainda


mais baixas e com invernos duradouros, os principais fatores limitantes para o
desenvolvimento de uma vegetação arbórea. Por isso o termo Tundra, originado da
palavra finlandesa “Tunturia”, que significa “planície sem árvores”.

É o bioma mais frio do planeta, localizado numa faixa circumpolar entre a calota
de gelo polar ao norte e as florestas ao sul. Embora concentrado no Hemisfério
Norte, também é encontrado em outras regiões ecologicamente semelhantes, até
nos trópicos, em altas montanhas, onde as árvores não se desenvolvem, sendo
denominado de “tundra alpina”.

Na paisagem são visíveis as cadeias de montanhas, áreas abertas e aparentemente


desertas, mas na curta estação de verão, quando as temperaturas podem chegar
a 10°C e a camada superficial do solo (chamado de permafrost) descongela, a
vegetação exibe o colorido das flores.

128 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

Figura 3.3 | Parque Nacional de Sarek, Suécia

Fonte: Disponível em: < https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Bierikj%C3%A5hk%C3%A5_Sarek.JPG>. Acesso em: 15 ago.


2015.

O solo da tundra e da taiga é conhecido como permafrost


(“permanentemente congelado”), é formado por rochas, gelo e
sedimentos, onde se encontra um grande depósito de carbono. Estes
depósitos, assim como são cobiçados pelo seu potencial energético,
preocupam os cientistas que estudam o efeito estufa, visto que o aumento
da temperatura pode provocar o degelo do permafrost e liberar grandes
quantidades de carbono na atmosfera, oriundas da decomposição dos
materiais orgânicos, provocando ainda mais calor (MYLLER JR, 2007).

Por estarem próximas aos polos, neva muito, e as temperaturas podem chegar
a dezenas de graus negativos no inverno, com suas noites duradouras; no verão,
o frio torna-se mais ameno, os dias são muito longos e ocorrem chuvas ligeiras
(ROSS, 1996). Tais condições climáticas retardam o processo de decomposição de
matéria orgânica, o que torna o solo pouco fértil e muito sensível aos distúrbios,
apresentando uma lenta recuperação quando isso acontece.

Podem ser observadas comunidades dominadas por gramíneas e ciperáceas que

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 129


U3

dão lugar aos musgos e líquens nas áreas mais frias, onde os ventos fortes aumentam
a aridez do ambiente, até, por fim, darem lugar ao deserto polar.

Em locais favoráveis, a tundra pode exibir uma alta produtividade primária em


decorrência dos grandes fotoperíodos do verão (dias longos).

Juntando a produtividade terrestre com a aquática (que inclui a dos oceanos


árticos férteis), consegue sustentar tanto a abundante fauna migratória como aquela
residente.

Faz parte do conjunto de grandes animais que vivem na Tundra a rena, o urso polar,
o lobo, a raposa, o boi almiscarado, o caribu e aves predadoras, além de pequenos
animais, como os lemingues (roedores), que fazem túneis no manto da vegetação.
No litoral, vivem as focas e os lobos marinhos. Os animais possuem adaptações ao
clima, como uma espessa camada de gordura sob sua pele, e coloração branca para
evitar os predadores.

2.3 Taiga
Também conhecido como Floresta Boreal ou Floresta setentrional de coníferas,
este bioma exclusivo do Hemisfério Norte fica localizado na região biogeográfica
subártica setentrional e úmida, sendo, junto à tundra, os únicos biomas que possuem
uma certa continuidade ao longo do planeta (veja a Figura 3.2).

As florestas boreais compreendem cerca de 38% do total de florestas do mundo,


sendo a Taiga Siberiana a maior em extensão.

A taiga pode ser encontrada em largas faixas nas regiões frias e úmidas no norte
do Alasca, Canadá, sul da Groenlândia, parte da Noruega, Suécia, Finlândia, Sibéria e
Japão. Faz limite ao sul com a tundra, e, ao norte, com a floresta temperada, savanas
ou campos, conforme a precipitação.

As coníferas, principalmente dos gêneros Pinus, Abies e Picea, são a forma de


vida que caracterizam a taiga, podendo ser observadas em diversas alturas.

Os troncos retos, copa em forma de cones, e as folhas modificadas em acículas


contribuem para que resistam ao peso da neve acumulada em seus galhos.

130 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

Figura 3.4 | Taiga no inverno

O agrupamento destas árvores


perenifólias promove um denso
sombreamento sob o dossel da floresta
o ano todo, inibindo a entrada de luz e,
consequentemente, o desenvolvimento
dos estratos inferiores (herbáceo e
arbustivo).

É notável a camada de serapilheira


que se acumula no chão das florestas
em função das baixas temperaturas
e do longo período de inverno, que
reduz sensivelmente a atividade de
decomposição. Além disso, o material das
acículas é bem resistente à degradação.
Disponível em: <http://www.torange-it.com/
Landscape/winter/neve-10529.html>. Acesso em: 25
ago. 2015.

Serapilheira: matéria orgânica proveniente das plantas e animais que ficam na


camada superficial do solo, tais como folhas, galhos, flores, frutos, carapaças etc.

Assim como a tundra, a taiga se desenvolve em regiões onde a estação de


crescimento é curta, cerca de três meses, com solos ácidos e pobres, e, por
permanecerem congelados (permafrost) durante o rigoroso inverno, condiciona
uma situação de “seca”. Diferente da tundra, aqui o solo descongela completamente
durante o verão, quando as raízes das árvores conseguem absorver água da camada
superficial.

As condições adversas restringem a biodiversidade deste bioma, sendo que imensas


áreas da América do Norte e Eurásia são ocupadas por florestas com domínio de
uma só espécie, como o espruce (Picea) (TOWNSEND et al., 2008).

Tais florestas homogêneas, ou com baixa diversidade, são, assim como a


monocultura agrícola, mais susceptíveis às doenças e pragas, como a larva-de-
espruce, que vive em baixas densidades na floresta boreal imatura, e vai aumentando
conforme avança o estágio sucessional. Quando a comunidade vegetal alcança o
estágio maduro, a população de larvas alcança seu pico e, por vezes, avassala toda
a floresta, que recomeça seu desenvolvimento por meio da regeneração de novos
indivíduos. Este ciclo todo dura cerca de 40 anos.

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 131


U3

Você já ouviu falar do Parque das Sequoias gigantes nos EUA?

Existe um tipo distinto de taiga localizada ao longo da costa ocidental da América


do Norte, desde o centro da Califórnia até o Alasca, em locais onde a temperatura e
a umidade são mais altas, e a amplitude sazonal é menor. Tais florestas, muitas vezes
chamadas de Florestas Pluviais Temperadas, podem ser consideradas como um outro
bioma, pois, embora as coníferas também sejam predominantes, a composição de
espécies é bem diferente, desenvolvendo, às vezes, uma floresta mista, ou seja, com
presença de coníferas como os pinheiros (Pinus) e árvores decíduas (que perdem
suas folhas marcadamente na estação desfavorável), como lariços, bétulas e álamos,
propiciando maior desenvolvimento do sub-bosque e estrato herbáceo.

Figura 3.5 | Parque nacional de Yosemite (Flórida)

Fonte: Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/villamon/4033077356>. Acesso em: 24 ago. 2015.

Talvez o exemplo de floresta pluvial temperada mais conhecido seja a floresta de


sequoias da Califórnia, que são consideradas árvores gigantes por sua altura, chegando
a medir mais de 100 m, e por sua robustez, podendo viver mais de 3.000 anos.

Podem ser consideradas ainda como outras subdivisões do bioma algumas


formações abertas no sudoeste dos EUA, tais como os bosques de coníferas anãs,
e, ao contrário, as altas florestas de Pinus ponderosa. Nos locais em que o fogo é
um elemento natural, a vegetação herbácea é bem desenvolvida.

132 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

As florestas boreais são alvos de grande interesse comercial, haja visto seu potencial
como produtor de madeiras para celulose, sendo estimado que só o Canadá contribui
com cerca da metade de todo o papel-jornal comercializado no mundo (FRANCISCO,
2015). Considerando que a maior parte da biomassa do bioma encontra-se retida nas
árvores, a extração excessiva pode causar sérios danos a ele.

2.4 Florestas Decíduas Temperadas


Tem como característica marcante o fato de as árvores e os arbustos perderem
suas folhas durante o outono, quando as copas tomam a coloração amarelo-
esverdeado, produzindo um grande contraste entre as estações.

Figura 3.6 | Floresta decídua temperada

Fonte: Disponível em: <https://pixabay.com/pt/floresta-de-outono-floresta-outono-276048/>. Acesso em: 15 ago. 2015.

Cobriam originalmente a parte oriental da América do Norte, toda a Europa e


parte do Japão, da Austrália e a extremidade meridional da América do Sul.

Estas florestas localizam-se em regiões de temperaturas com um padrão


fortemente sazonal, sendo observado em alguns locais, como o norte da Europa, até
seis meses de temperaturas congelantes (TOWNSEND et al., 2008), o que contribui
para o lento processo de sucessão neste bioma. A precipitação pode variar de 750 a
1500 mm e na maioria das regiões ocorre um déficit hídrico durante alguns meses.

A entrada de luz no interior da floresta, proporcionada pela queda de folhas das


espécies do dossel, promove um bom desenvolvimento dos estratos herbáceo e
arbustivo, assim como da biota do solo.

A floresta clímax pode ser encontrada em diversas fitofisionomias, sendo


caracterizada pelas florestas mistas de coníferas e latifoliadas (folhas largas) decíduas,
tais como o carvalho e a castanheira.

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 133


U3

Mesmo situadas em solos férteis, as florestas temperadas decíduas têm baixa


diversidade de espécies arbóreas, especialmente as europeias, fato atribuído
supostamente a uma glaciação que ali ocorreu.

Faz parte da floresta original na América do Norte os veados, o urso as raposas,


linces, esquilos e diversas espécies de pássaros. Muitos animais têm ocorrência
marcadamente sazonal, especialmente, aves migratórias que chegam durante a
primavera, período de maior abundância de recursos alimentares. Foi neste bioma
que a civilização ocidental atingiu seu maior desenvolvimento, e isso reflete no seu
alto grau de degradação, sendo que grande parte das florestas decíduas temperadas
foi substituída por cultivos e outras atividades antrópicas. Na Europa central, onde há
intensa industrialização, também sofrem degradação devido à chuva ácida e deposição
atmosférica de poluentes.

Os campos temperados recebem diversos nomes regionais: estepes, na Ásia;


pradarias, na América do Norte; pampas, na América do Sul; e Veldt, na África do Sul.

Agora, vamos descrever os biomas mais quentes...

2.5 Pradarias (Campos Temperados)


São encontradas no interior dos continentes norte-americano e eurasiano, na Austrália
e na América do Sul Meridional, em regiões onde a precipitação é relativamente baixa,
cerca de 250 a 750 mm por ano ou mais, intermediária entre a dos desertos e das florestas.

Figura 3.7 | Região de campos temperados (pampa) no Parque das Cascatas, RS

Fonte: Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/douglucas/16877837867/>. Acesso em: 20 ago. 2015.

134 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

Tem como característica marcante um relevo relativamente plano coberto por


uma vegetação com predomínio de espécies herbáceas (especialmente as gramíneas)
e arbustivas. Podem ser encontradas com fisionomias distintas, dependendo da
precipitação, temperatura e condições do solo, especialmente a umidade do solo, haja
vista que, em sua maioria, os campos estão sujeitos a uma seca periódica. Quando a
umidade é muito baixa, limita a decomposição da serapilheira e, consequentemente,
a ciclagem de nutrientes.

Muitas vezes, o solo dos campos temperados pode exibir uma camada de húmus
bem maior que a encontrada em biomas florestais; isto porque as gramíneas e outras
plantas herbáceas possuem um ciclo de vida curto, havendo uma constante deposição
de uma grande quantidade de matéria orgânica no solo. Esta se decompõe rápido no
início, mas lentamente depois.

Não é à toa que os solos escuros e ricos dos campos temperados estão entre os
melhores para produção de milho, trigo e outras espécies de gramíneas cultivadas.
Nas áreas mais secas, nos limites do bioma, os campos são manejados para produção
de carne e leite.

A manutenção da dominância da vegetação dos campos em detrimento da


vegetação arbustiva/arbórea em regiões de temperatura elevada e/ou úmidas é, em
grande parte, atribuída ao fogo.

A fauna das pradarias tem como elemento característico os grandes herbívoros,


como os bisões, antílopes e cangurus – cada um em região biogeográfica distinta, os
quais, em muitos locais, foram substituídos por rebanhos de gado.

Em decorrência das suas características de relevo plano e solo rico em húmus,


propícios às atividades agropastoris, os campos, dentre todos os biomas, são os mais
cobiçados, utilizados e transformados pelo homem (TOWNSEND et al., 2008).

No pampa argentino, por exemplo, o superpastoreio reduziu substancialmente a


matéria orgânica, combustível necessário para os incêndios periódicos que ocorriam.
Desta forma, começam a predominar alguns arbustos espinhosos, sendo que a
recuperação da produtividade só pode ocorrer mediante gastos com intervenções,
como a remoção mecânica e queima da vegetação arbustiva. “Eis um exemplo de
uma mudança vegetacional antropogênica que é reversível apenas a um grande custo”
(ODUM, 2008, p. 359). Em alguns locais, os campos viraram verdadeiros desertos e
dificilmente retornarão às suas condições originais.

2.6 Campos Tropicais e Savanas

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 135


U3

Assim como nos campos temperados, nos campos tropicais e nas savanas
predomina uma vegetação aberta, sendo encontradas desde fisionomias herbácea,
arbustiva até arbórea; todavia, a mais característica refere-se àquela onde as gramíneas
dominam e os arbustos e as árvores são elementos isolados na paisagem, como o
típico baobá (ou barriguda), cujo tronco é enorme, por acumular água em seu interior,
entre outras. Não é raro o predomínio de uma ou poucas espécies.

Figura 3.8 | Savana africana

Fonte: Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%81frica>. Acesso em: 19 set. 2015.

Note a presença de várias árvores da mesma espécie de leguminosa, plantas que


possuem associação com bactérias (rizóbio) que fixam o nitrogênio atmosférico. Estes
mecanismos são importantes, haja vista que o solo, geralmente, é pobre em nutrientes.

Estes biomas ocorrem em regiões quentes e chuvosas (cerca de 1000 a 1500


mm por ano), e com uma ou duas épocas de seca rigorosas, sendo encontrados em
grandes extensões no centro e no leste da África, além de algumas áreas na Austrália
e na América do Sul (inclusive no Brasil, onde é conhecido como Cerrado). Como nos
campos temperados, as savanas e os campos tropicais têm suas estações regidas mais
pela precipitação do que pela temperatura.

A grande quantidade de matéria orgânica que se acumula durante a estação seca


estimula os incêndios, também considerados como um fator importante no controle
e manutenção das savanas.

136 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

O fogo, assim como em outros biomas que o têm como fator natural (chaparral e
pradarias), contribui para a dominância da vegetação arbustiva em competição com
a arbórea, sendo encontradas várias plantas adaptadas a este elemento, tais como
aquelas que produzem sementes que só germinam após o incêndio, e outras, que
podem rebrotar a partir de reservas em suas raízes resistentes. O fogo também é
importante para a mineralização da matéria orgânica neste bioma, visto que o
processo de decomposição pode ser lento devido às condições climáticas (com uma
estação seca) e do substrato que apresenta um grau de resistência relativamente alto
(folhas grossas e duras).

Em relação à fauna, é notável, especialmente na savana africana, a abundância e


diversidade de animais de grande porte, como as zebras, antílopes, girafas, veados e
leopardos, os quais, em grande parte, já foram dizimados pela caça predatória.

Foi nas savanas da África Oriental que os primeiros hominídeos viveram!

2.7 Chaparral e Bosque Esclerófilo


Existem grandes extensões de chaparral na Califórnia e no México, na costa do Mar
Mediterrâneo e em pequenas áreas no Chile, no litoral meridional da Austrália e África
do Sul, em regiões temperadas amenas, com verões secos e invernos chuvosos (e
pouco rigorosos, não ocorrendo congelamento). A pluviosidade anual varia entre 500
a 1000 mm (ROSS, 1996).
Figura 3.9 | A Floresta de manzanita
Caracteriza-se por uma vegetação
(Arctostaphylos sp) no Monumento Nacional
arbórea (de porte pequeno e médio de Chiricahua, no sul do Arizona, é um exemplo
porte) e arbustiva, composta por de chaparral.
espécies perenifólias, com folhas
duras e grossas (esclerófilas), podendo
ser distinguidas diferentes fisionomias,
desde aquelas com predomínio de
arbustos com árvores esparsadas,
como no charrapal litorâneo (por
ex, no Mediterrâneo), até aquelas
com predomínio de árvores, como
o bosque latifoliado esclerófilo. Em
geral, não possuem muita diversidade
de plantas, sendo comum o fato de Fonte: Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/
poucas espécies predominarem. kretyen/2959346189>. Acesso em: 21 ago. 2015.

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 137


U3

A exemplo dos campos temperados e tropicais, o fogo é considerado um elemento


natural, exercendo as mesmas funções descritas anteriormente. Após um incêndio, o
chaparral pode completar seu ciclo em torno de 15 a 20 anos.

A fauna residente é composta por pequenos vertebrados, pouco coloridos, como


os coelhos, ratos, lagartos e pássaros. Muitas aves e outros animais (por exemplo,
veados) visitam os chaparrais durante o período chuvoso.

Este bioma já vem sendo alterado há séculos para atividades agrícolas e pastoris,
além da urbanização, sendo praticamente erradicada nas montanhas baixas de Los
Angeles (EUA) e no Oriente antigo, região do Mediterrâneo.

2.8 Desertos
Os desertos estão localizados em regiões onde a precipitação é muito baixa, às
vezes menor que 250mm por ano, e distribuída de forma muito desigual. No centro
do deserto do Saara na África, e no norte do Chile, já foram registradas situações
extremas, de menos ou nenhuma chuva.

A escassez de água pode ser atribuída a três fatores, segundo Odum (1988): alta
pressão subtropical, como o caso dos desertos do Saara e da Austrália; posição
geográfica em sombras de chuva, como os desertos na parte ocidental da América do
Norte; à grande altitude, como ocorre com os desertos tibetano, boliviano e de Gobi.
Em geral, fatores físicos, como cordilheiras e locais muito interiorizados, impedem a
chegada dos ventos carregados de umidade do oceano.

Embora a precipitação seja o principal fator limitante deste bioma, as temperaturas


também são bem extremas, alcançando tanto as muito elevadas como as muito
baixas, afetando também o conjunto de mecanismos desenvolvidos pelos organismos
que conseguem sobreviver nos desertos.

Existem três formas de adaptações de plantas facilmente reconhecidas no deserto


(ODUM, 1988):

1. As plantas anuais, incluindo as gramíneas, que aproveitam os curtos períodos


de maior umidade para se desenvolverem.

2. As suculentas, como os cactos, iucas e agaves, além de armazenarem água,


possuem a fotossíntese tipo CAM, que contribui para evitar as perdas de água.

3. Os arbustos de deserto (ex. do gênero Larrea no deserto do Arizona),


caracterizados por folhas grossas e numerosas ramificações a partir de um curto
tronco basal.

138 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

Os desertos quentes ficam localizados em latitudes subtropicais, por exemplo, o


deserto de Victoria, na Austrália; e Sonoran, nos Estados Unidos; na África, o Kalahari
e o Saara, onde a temperatura pode chegar a 58°C. O ar seco é originado dos ventos
que sopram dos trópicos em direção ao Equador.

Já os desertos frios são aqueles em que as temperaturas durante o inverno chegam


abaixo de zero, podendo inclusive nevar; isto porque estão situados em latitudes
temperadas, no interior do continente, ou cercados por cordilheiras. Por exemplo, o
deserto de Gobi, na Mongólia e parte da China. Nas Américas, podem ser citados o da
Grande Bacia, nos Estados Unidos, e o da Patagônia, no sul da Argentina.

Em ambos, a baixa umidade do ar intensifica o aquecimento do solo durante o


dia e, ao contrário, permite o resfriamento muito rápido, induzindo a uma elevada
amplitude térmica durante o dia e a noite, característico destes ambientes.

Os desertos podem apresentar desde solo muito arenoso até rochoso, reflexo do
lento processo de intemperização em decorrência da reduzida presença de plantas e
precipitação, agentes importantes para o processo de formação de solo. Em planícies
de terras baixas, o solo pode ser coberto com sal.

Quando pensamos em um deserto, logo nos vem à cabeça ser um local de muito
calor, mas acontece que também existem desertos frios!

Figura 3.10 | Deserto do Saara

Fonte: Disponível em: <https://it.wikipedia.org/wiki/A%C3%AFr>. Acesso em: 18 ago. 2015.

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 139


U3

Diferente dos ambientes úmidos e florestados, a erosão é causada pela ação dos
ventos (eólica), fator importante para a composição da paisagem do deserto.

Como seria esperado, com tamanhas condições adversas, a diversidade de


espécies é baixa, mas mesmo nos ambientes onde aparentemente não há vida
vegetal, tais como as dunas de areia, podem ser encontrados musgos, algas e
líquens, os quais são importantes como estabilizadores de substrato, bem como
podem contribuir com o aumento de matéria orgânica e nutrientes, especialmente
no caso das cianofíceas, algas – muitas vezes associadas ao fungos, formando
os líquens - que conseguem fixar o nitrogênio atmosférico no solo. Apenas em
situações muito extremas de aridez, como o deserto de Atacama no Chile e os
desertos frios da Antártida e os muito quentes e áridos, são realmente desprovidos
de vegetação.

Assim como as plantas, os animais do deserto, como os lagartos, ratos, camelos


e insetos, também são adaptados à escassez de água, envolvendo aspectos
comportamentais e fisiológicos.

A produtividade anual de matéria orgânica é baixa e diretamente relacionada à


precipitação, sendo que em alguns solos mais férteis a irrigação pode aumentar
sobremaneira este parâmetro. Todavia, este processo pode ser extremamente caro,
econômica e ambientalmente, visto que, em decorrência da rápida evaporação, são
exigidas grandes quantidades de água, podendo levar à salinização dos solos locais.

2.9 Florestas Tropicais


As florestas encontradas nos trópicos podem ser divididas, conforme a sazonalidade,
em Florestas Úmidas (aquelas situadas em regiões sem a ocorrência de uma estação
seca rigorosa) e Florestas Sazonais Subperenifólias (em regiões onde existe uma
estação seca bem definida), as quais serão descritas adiante separadamente.

As florestas tropicais são consideradas os biomas mais biodiversos do planeta, em


função do clima úmido ideal ao estabelecimento e crescimento das espécies,
bem como pela grande variedade de hábitats e de heterogeneidade espacial,
proporcionada respectivamente, pelas diferentes condições de relevo e solo, e da
estratificação da floresta.

2.9.1 Estrutura das florestas tropicais

Estas florestas possuem, geralmente, uma estratificação bem definida: o dossel


formado pela união das copas das árvores (a altura pode variar, girando em torno
de 30m); os indivíduos emergentes (ou seja, que ultrapassam o dossel) espalhados;

140 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

o sub-bosque composto por espécies arbustivas e arbóreas de menor tamanho, ou


de juvenis de espécies do dossel; e o estrato herbáceo, com a presença de ervas,
arbustos, além das plântulas das espécies lenhosas, que compreendem a regeneração
da floresta. Outras formas de vida também estão presentes em abundância, como as
lianas (também chamadas de trepadeiras ou cipós) e epífitas (plantas que vivem sobre
outras, como muitas espécies de samambaias, bromélias e orquídeas).

2.9.2 Dinâmica das florestas tropicais

Quando a floresta sofre algum distúrbio ou é totalmente retirada, a regeneração


se dá principalmente por árvores de rápido crescimento, denominadas de pioneiras,
que proporcionam condições de luz e umidade para que espécies não pioneiras
se estabeleçam e continuem o processo de sucessão até atingir o estágio “clímax”,
quando estas últimas espécies (não pioneiras) são predominantes. Este ciclo pode
durar cerca de 40 anos, dependendo das condições locais e proximidades com outras
florestas, de onde podem chegar sementes para que ocorra a colonização da área
desmatada.

As florestas secundárias, aquelas que se encontram nos estágios seriais da sucessão


ecológica, podem apresentar fisionomia viçosa, todavia, são muito diferentes em
termos funcionais e florísticos, em geral com uma diversidade muito menor de
espécies.

As florestas tropicais situam-se, muitas vezes, em países subdesenvolvidos e em


desenvolvimento, sofrendo diversas ameaças antrópicas, tais como a exploração
irracional de seus recursos naturais (biodiversidade, minérios) e expansão agropecuária
e urbana.

2.9.3 Florestas Tropicais Sazonais Subperenifólias

Ocorrem nas regiões de clima tropical úmido, geralmente associadas às florestas


tropicais úmidas, todavia, onde existe uma estação seca mais pronunciada, época em
que algumas ou a totalidade das árvores perdem sua folha, embora as variadas plantas
do sub-bosque permanecem sempre verdes; por isso, o termo “subperenifólia” na
nomenclatura do bioma.

Em locais onde a sazonalidade é pronunciada, com a estação seca e úmida durando


o mesmo tempo, as florestas podem ser fisionomicamente muito semelhantes às
florestas temperadas decíduas, sendo a baixa pluviosidade correspondente à baixa
temperatura nestas últimas. Estas florestas sazonais apresentam elevada riqueza de
espécies, inferior apenas às florestas tropicais úmidas, podendo ser citadas como
exemplos as florestas de monções na Ásia tropical, e em partes da Índia e da América
do Sul (inclusive, no Brasil).

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 141


U3

No Brasil, é conhecida como Floresta Estacional Semidecidual (ou


floresta subcaducifolia), quando o conjunto florestal pode perder de
20% a 50% das folhas, ou decidual (ou floresta caducifólia), quando perde
mais de 50%. O link <http://www.meioambiente.pr.gov.br/arquivos/File/
cobf/V5_Floresta_Estacional_Semidecidual.pdf> apresenta a descrição e
situação atual destas florestas no Paraná.

2.9.4 Florestas Tropicais Úmidas

A biodiversidade, tanto da fauna quanto da flora, atinge seu auge nestas florestas
latifoliadas e perenifólias, localizadas em regiões próximas ao equador, por isso também
chamada de Floresta latifoliada equatorial. Podemos encontrá-las em três áreas
principais: 1. Na América do Sul, nas bacias Amazônica e do Orenoco (que possuem
as maiores extensões contínuas); 2. No centro e oeste da África e no Madagascar, nas
Bacias do Congo, do Níger e do Zambeze; 3. Na Índia, Malaia, Borneo e Nova Guiné.
Embora estas áreas estejam em regiões biogeográficas distintas, e, portanto, diferem
entre si em relação à composição taxonômica das espécies, apresentam estrutura e
ecologia similares.

A maior floresta tropical pluvial do mundo, e considerada a mais biodiversa, é a Floresta


Amazônica, cuja maior parte encontra-se em território brasileiro.

A precipitação é elevada (cerca de 2000 a 4000 mm anuais), assim como a


temperatura, ocorrendo variações moderadas ao longo do ano, embora possa
ser reconhecido um período mais seco (com menos de 125 mm por mês). Estas
condições, além de contribuírem com a alta biodiversidade, também promovem a
maior produtividade encontrada entre os biomas do mundo (TOWNSEND et al., 2008).

A alta densidade do dossel promove um sombreamento intenso no sub-bosque,


o que os torna menos desenvolvidos do que o encontrado nas florestas tropicais
sazonais. Exceção são os locais de clareiras no dossel (formadas pela queda de galhos
e árvores), que permitem uma maior entrada de luz, sendo um importante elemento
na dinâmica de regeneração destas florestas.

Como a água é abundante, a luz passa a ser um dos principais fatores limitantes
para as plantas dos estratos inferiores, além, é claro, da alta competição entre os
organismos.

142 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

Mesmo nos solos inférteis, desenvolve-se exuberante vegetação graças à eficiente


ciclagem de nutrientes, mantida pelas características inerentes da vegetação nativa.

O solo destas florestas pode ser rico em nutrientes, mas em sua maioria são pobres
e ácidos, devido, em parte, à alta lixiviação que carrega os cátions junto à água da
chuva. A serapilheira depositada pela comunidade vegetal é rapidamente decomposta
pelos micro-organismos, que têm suas atividades em alta proporcionadas pelas
condições adequadas de temperatura e umidade, disponibilizando, desta forma, os
nutrientes para serem novamente utilizados pelas plantas.

Figura 3.11 | Floresta Atlântica sobre solo arenoso no litoral do Rio Grande do Norte

Fonte: Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/tarcisoleao/17087620536>. Acesso em: 09 set. 2015.

É muito comum a presença de simbiose das plantas com fungos (micorrizas) e


bactérias, tais como as espécies de leguminosas que possuem em suas raízes nódulos
de bactérias (rizóbio), que são capazes de fixar o nitrogênio atmosférico no solo.

De fato, as inter-relações entre fauna e flora na floresta tropical são muito intensas,
por exemplo, cerca de 95% da polinização e de 75% a 95% da dispersão de sementes
(processos ecológicos fundamentais para a reprodução das plantas) das espécies

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 143


U3

arbóreas nativas tropicais são realizadas pelos animais (FERRETTI, 2004). Por isso, a
defaunação pode levar ao desaparecimento de diversas espécies de plantas.

A fauna também possui alta diversidade, sendo grande parte dos animais pouco
visível, e muitos são noturnos; comparada às florestas temperadas, proporção muito
maior de animais é encontrada no dossel da floresta, por exemplo, na Guiana, mais da
metade dos mamíferos são arborícolas, além das aves, lagartos, cobras e pererecas.
Além do alimento, visto a abundante produção de frutos e brotos comestíveis, o dossel
pode oferecer abrigo para muitas das espécies, visto que o chão da floresta também
é habitado por diversos predadores, como formigas, aranhas e outros animais (como
onça, lobos etc.).

No Brasil, a floresta pluvial (termo de origem latina) também é chamada de


Floresta Ombrófila Densa (ellenberg; mueller-dombois, 1967 apud IBGE, 2012).
O termo grego Ombrófila refere-se à alta umidade (ombro= chuva; fila= amigo),
e o termo Densa refere-se à justaposição das copas das árvores, que formam
um dossel vigoroso.

A variedade de insetos é incrível, sendo já encontradas numa área de 15km2 na zona


do canal do Panamá cerca de 20.000 espécies, enquanto na França toda existem
apenas algumas centenas (ODUM, 1988).

As florestas pluviais podem receber denominações e guardar determinadas


características distintas de acordo com a altitude e outros elementos físicos (como os
rios) ou biológicos (por ex., estrutura da floresta). Por exemplo, nas áreas montanhosas,
a floresta torna-se cada vez mais baixa e com epífitas mais abundantes conforme
aumenta a altitude. Nas proximidades dos rios são encontradas as florestas de galerias
ou ribeirinhas (ou matas ciliares).

Você conhece as regiões onde existem florestas pluviais no Brasil?

São conhecidas como Floresta Amazônica, no norte do país, e Floresta Atlântica,


ao longo da costa. Na classificação da vegetação brasileira (IBGE, 2012), a Floresta
Ombrófila Densa pode ser subdividida conforme as variações das faixas altimétricas,
que condicionam distintas fisionomias, lembrando que a cada 100m de altitude as
temperaturas reduzem cerca de 1°C. Desta forma, temos cinco tipos de formação:
Aluvial (chamadas também de florestas de galerias ou ribeirinha); Terras Baixas (em
terrenos sedimentares); Submontana, Montana e Alto-Montana (ou Floresta de
Neblina).

144 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

Quais dos biomas descritos podem ser encontrados no


Brasil?

1. “Ao todo, 129 milhões de hectares de floresta, o equivalente,


aproximadamente, a uma superfície do tamanho da África do
Sul, sumiu do mundo nos últimos 25 anos. (...) uma tendência
que deve continuar no futuro, sobretudo nas zonas tropicais”
(Fonte: BBC Brasil, 3 set. 2015. Disponível em: <http://noticias.
terra.com.br/ciencia/mundo-tem-tres-trilhoes-de-arvores-
e-perde-10-bilhoes-por-ano-diz-estudo,9ae26cf477dda3a52
b9799d6b8535f63oj1fRCRD.html>. Acesso em: 21 set. 2015).
Sobre o bioma predominante nestas zonas, a floresta tropical,
é correto afirmar que:
A. As florestas tropicais úmidas e as florestas tropicais sazonais
podem ser chamadas de Floresta Ombrófila Densa e Floresta
Ombrófila Aberta, respectivamente.
B. As florestas tropicais são denominadas também de florestas
ombrófilas em referência ao sub-bosque muito sombreado, e
significa, literalmente, floresta “amiga do escuro”.
C. As florestas tropicais úmidas são os biomas de maior
biodiversidade do planeta, proporcionada, especialmente,
pelos solos férteis que as caracterizam.
E. As florestas tropicais decíduas são encontradas em locais de
clima úmido, mas com temperaturas muito baixas, comumente
abaixo de zero, sendo caracterizadas pela baixa diversidade e
ausência de árvores perenifólias.
F. As florestas tropicais sazonais subperenifolias situam-se em
regiões de clima relativamente úmido, mas com a presença de
uma época seca marcante, quando parte das árvores do dossel
perde suas folhas.

2. Veja a descrição de um relato de viagem na Sibéria do Leste,

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 145


U3

onde ocorre a tundra: “O sol aparece. Pouco a pouco, a neve


caindo fica mais espessa, o vento é cada vez mais forte e
de repente estamos no meio de uma tempestade de neve.
Tenho uma forte sensação de estarmos rodeados por 1.000
quilômetros só de tundra [...] A tenda quadrada é parecida
com as de exércitos, só que a estrutura de madeira é coberta
de peles de veado. [...] Peles de veado protegem do frio da
melhor maneira: o chão não está frio, apesar de o solo estar
congelado por baixo” (Fonte: <http://gazetarussa.com.br/
arte/viagem/2014/01/19/a_vida_nomade_de_uma_tribo_
em_extincao_na_tundra_23729>). Sobre a tundra pode-se
afirmar que:
A. Por estar próxima aos polos, a alta evaporação na região é
o principal fator limitante ao desenvolvimento de vegetação
arbórea.
B. Nos locais onde os solos são permanentemente congelados
não são encontrados seres vivos.
C. As plantas possuem adaptações à aridez local, tais como o
acúmulo de água observado nas suculentas, como os cactos
e agaves, os quais predominam no bioma.
D. Os dias na tundra são caracterizados, tanto no inverno
quanto no verão, por serem extremamente curtos.
E. O solo congelado é denominado de permafrost, formado
por rochas, gelo e sedimentos, e armazena grandes depósitos
de carbono.

146 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

Seção 3

Biomas brasileiros
Nesta seção você poderá conhecer a localização e as delimitações de cada
domínio fitogeográfico brasileiro e observar as especificidades e as semelhanças
existentes entre eles. Como a classificação em domínios segue a divisão dos biomas,
em algumas ocasiões serão apresentados dados relativos aos últimos. Embora não
seja o foco de estudo, também discutiremos brevemente alguns dos principais
impactos antrópicos causados nos distintos domínios morfoclimáticos.

3.1 Biomas brasileiros


Vivemos num país de dimensão continental, já que caberiam nos seus 8,5
milhões km2 a Índia ou a Austrália. Este imenso território, que possui uma ampla
variação em latitudes e longitudes, abrange diversas zonas climáticas, desde o clima
equatorial/tropical úmido no Norte, o semiárido no Nordeste e áreas temperadas no
Sul. Além disso, conta com uma costa marinha de 3,5 milhões de km², que abarca
ecossistemas como recifes de corais, lagoas, estuários, entre outros.

Esta variedade de climas, associada a diferentes tipos de solo, relevo, altitude,


dá forma a uma gama de condições ambientais e biológicas, originando zonas
biogeográficas distintas. Estas zonas, como comentado na seção 1 desta unidade,
podem receber distintas classificações de acordo com o autor e os objetivos
de estudo, sendo utilizada aqui a divisão do território nacional em domínios
morfoclimáticos e fitogeográficos brasileiros proposta por Aziz Ab´Saber (1970).

Segundo esta classificação, são reconhecidos seis domínios paisagísticos e


macroecológicos distintos, quatro intertropicais (Terras baixas florestadas, Cerrados,
Mares de Morros e Caatingas) e dois subtropicais (Araucárias e Pradarias), mais
as faixas de transições entre eles (Figura 3.12). Estas últimas são difíceis de serem
caracterizadas, visto as grandes variações que podem ocorrer pela interpenetração,
diferenciação ou mistura entre os domínios.

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 147


U3

Esta classificação fitogeográfica segue proximamente a proposta


no Mapa de Vegetação do Brasil, que divide o país em seis biomas:
Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pampa e Pantanal. Para
conhecer este mapa a descrição dos biomas, acesse: <http://www.ibge.
gov.br/home/presidencia/noticias/21052004biomashtml.shtm>. Analise
as duas classificações e observe suas principais diferenças. Aproveite
para ver a definição de bioma dada pelo IBGE.

Figura 3.12 | Domínios morfoclimáticos e fitogeográficos brasileiros

Fonte: Adaptado de Ab´Saber (2003)

Cada domínio está, em geral, associado a uma determinada região do Brasil,


possuindo uma unidade paisagística, uma fitofisionomia vegetal marcante; todavia,
as peculiaridades de diversos componentes do ambiente, especialmente, o clima, o
relevo e o solo, condicionam a ocorrência de um mosaico de ecossistemas distintos.
Desta forma, por exemplo, encontramos no Domínio de Terras baixas florestadas,
onde predomina a floresta tropical úmida amazônica, redutos de cerrados, campinas
e manguezais.

148 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

Cabe ressaltar que, exceto o domínio das Caatingas, os demais se estendem para
outros países.

Antes da descrição de cada tipo de Domínio encontrado no Brasil, baseado


principalmente em Ab´Saber (2003), vamos conhecer alguns conceitos.

Core (ou área nuclear): chamamos de área “core” a área mais típica e contínua de
determinado domínio, onde as condições fisiográficas e biogeográficas formam um
complexo relativamente homogêneo e extensivo.

Entre as áreas core vizinhas existem as faixas de transição, sendo que cada área
de contato apresenta uma combinação distinta de vegetação, solo e relevo.

Já o termo “Enclave” designa manchas de ecossistemas típicos de um determinado


domínio, encravadas no interior de outro de natureza diferente. Veja como descreve
Ab´Saber:

“[...] no interior das próprias áreas nucleares existem padrões de


paisagem sensivelmente diferenciados, que transformam cada
área core em uma verdadeira família regional de ecossistemas,
dominada espacialmente por um deles (cerrados, caatingas,
araucárias, matas) e que devem ser considerados como
subconjuntos participantes do mosaico global. Criando grandes
contrastes de paisagens e de ecologias, devem também ser
computados os pequenos quadros de exceção, representados
pelos enclaves, reconhecidos um pouco por toda a parte, no
interior das áreas core, cada qual com sua própria natureza, suas
vinculações genéticas e suas implicações socioeconômicas e
regionais“ (AB´SABER, 2003, p. 23).

3.2 Domínio Equatorial Amazônico


Localizado na região Norte do Brasil, em relação direta com a bacia hidrográfica
Amazônica, é o domínio de maior extensão do país, estimado em 4,2 milhões de
quilômetros quadrados (AB´SABER, 2003). Caracteriza-se, em sua maior parte, por
terras baixas, cobertas com floresta equatorial, além de morros baixos com formas
arredondadas. Predomina o clima equatorial, com pluviosidade alta (>1600mm a
4000 mm anuais), nebulosidade constante e temperaturas com pequena amplitude,
oscilando entre 25°C e 27°C ao longo do ano. Ondas de “friagem” são observadas
no oeste de Rondônia até o Acre. Os climas regionais podem ser classificados como
úmidos ou superúmidos, sendo que apenas em algumas áreas, como o leste de
Roraima até o médio Araguaia e o extremo norte de Tocantins, ocorre um período
de dois a três meses secos (entre agosto e outubro).

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 149


U3

Figura 3.13 | Vista da Floresta Amazônica

Fonte: Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/lubasi/6127720949>. Acesso em: 18 ago. 2015.

“O mundo das águas na Amazônia é o resultado direto da excepcional pluviosidade


que atinge a gigantesca depressão topográfica regional” (AB´SABER, 2003, p. 67).

Circulam, por toda a bacia Amazônica, 20% das águas doces do mundo.
Estima-se que somente na parte brasileira, a partir do Amazonas (rio
mestre), haja cerca de 20 mil quilômetros de cursos passíveis de serem
navegados, e com saída terminal livre para o Oceano Atlântico. Imagine
só a potência deste rio, que chega ao mar no Golfão Marajoara, numa
profundidade de até 120 metros, empurrando as águas do oceano,
fenômeno conhecido como pororoca (AB´SABER, 2003).

Quase toda a bacia hidrográfica depende deste regime de chuvas, exceto pelas
precipitações nevais e degelo de primavera, que chegam das cordilheiras dos Andes,
onde nasce o principal rio.

O domínio das terras baixas florestadas da Amazônia compreende uma extensa

150 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

planície inundável, tabuleiros com altitudes de até 200 m, terraços com cascalhos e
lateritas e morros baixos com formas arredondadas. Essa paisagem apresenta uma
relação direta com a bacia hidrográfica amazônica e uma rica variedade de águas
perenes, com rios brancos, negros e cristalinos.

A vegetação predominante é a Floresta Tropical Úmida (Floresta ombrófila),


caracterizada por árvores altas com troncos longos e copas fartas, e abriga diversas
espécies arbóreas de alto valor econômico, como o mogno e diversas palmeiras
(ex. buriti, açaí, carnaúba); a baixa quantidade de luz que chega ao chão da floresta
proporciona um sub-bosque menos denso.

A vegetação que não está sujeita diretamente à ação dos rios é chamada de Mata
de Terra Firme, enquanto que nas planícies que os acompanham, a vegetação muda
de estrutura e recebe o nome de acordo com os períodos de inundação, sendo
reconhecidas as: Matas de várzeas (periodicamente inundadas) e as Matas de igapó
(permanentemente inundadas).

Também são observados ecossistemas distintos, como os enclaves de campinas


e campinaranas (na região de Manaus, vale do Tocantins, nordeste do Pará e altos
dos Carajá), vegetação campestre (em Roraima), cerrados (Monte Alegre, Amapá) e
manguezais costeiros.

Devido à sua real importância como detentora de grande biodiversidade do planeta,


e, por outro lado, pelo reconhecimento da fragilidade dos seus ecossistemas, o bioma
da Amazônia é foco da atenção de ambientalistas do mundo todo. Embora apenas
cerca de 10% sejam caracterizados como áreas antrópicas (MMA, 2015), a região
sofre grande ameaça pela expansão da agropecuária, além da exploração ilegal de
madeiras e outros recursos biológicos e minerais, tráfico de animais silvestres, e mais
recentemente, com a implantação de infraestruturas (estradas, usinas hidroelétricas
etc.).

O desenvolvimento ocorrente no domínio da Amazônia é estratégico e


importante para a economia local e do país, podendo ser observados, atualmente,
vários instrumentos legais que visam ordenar a ocupação. Todavia, para que seja
sustentável, deve enfrentar situações muito complexas, que envolvem a conservação
da biodiversidade, o reconhecimento das terras e direitos indígenas e de populações
tradicionais, a proteção das fronteiras, das unidades de conservação, entre outros.

No vídeo “Paisagens brasileiras e conservação da biodiversidade” (Disponível em:


<http://www.youtube.com/watch?v=REwepKi2ijo>), você tem a oportunidade de ver
o geógrafo Aziz Ab´Saber destacando a importância do planejamento da ocupação
da Amazônia para evitar a perda de sua biodiversidade.

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 151


U3

Reflita: Qual é a sua opinião sobre a implantação da usina Belo Monte, no Rio
Xingu? Realize uma pesquisa procurando saber os prós e os contras deste
empreendimento antes de emitir sua opinião.

3.2.1 Domínio das Caatingas (Domínio das Depressões Interplanálticas Semiáridas


do Nordeste)

Domínio de maior contraste climático ao citado anteriormente, com a presença


de uma rede de cursos d´água intermitente devido a irregularidades e pouca
frequência das chuvas. Localizado no semiárido brasileiro, região subequatorial e
tropical, constituído pelos sertões do Nordeste brasileiro, uma grande região de seca
– considerada por Aziz Ab´Saber (2003) como a mais homogênea sob o aspecto
fisiográfico, ecológico e social dentre as áreas secas da América do Sul -, onde o
período sem chuvas pode durar de seis a sete meses ao ano (parte do outono até a
primavera). Interessante notar que este período, quando o calor é acentuado, coincide
com o inverno meteorológico, estação chamada pela população da região como
“verão”, em contrapartida com o verão chuvoso, designado por ela como “inverno”.
De fato, as temperaturas são, em geral, muito elevadas e relativamente constantes,
sendo em média entre 25 a 29°C, enquanto a precipitação anual varia de 270 e 800
mm, resultando numa fortíssima evaporação.

A baixa precipitação, longos períodos de estiagem e temperaturas que podem


alcançar 50°C ao nível do solo desfavorecem a intemperização físico, química e
biológica (por meio da inibição das atividades dos decompositores) das rochas, sendo
comuns os solos litólicos (pedregosos). Algumas áreas, chamadas de “altos pelados”, se
constituem de colinas desnudas, formadas por rochas metamórficas com fragmentos
dispersos de quartzo. Áreas de granitos criam um conjunto de “campos de matacões”
ou “mares de morros”, entremeados pela vegetação espinhenta. Em locais pontuais
são observados solos salinos, como nos aluviões dos baixos cursos d´água no Rio
Grande do Norte e Ceará.
Figura 3.14 | Xique-xique (espécie de cacto) no sertão baiano

Fonte: Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Beleza_da_Caatinga.jpg>. Acesso em: 25 ago. 2015.

152 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

A vegetação característica é xerófita e contrasta com a maior parte da encontrada


no nosso país, que conta com 92% de seu espaço dominado por climas úmidos e
subúmidos.

Xerófita: plantas que possuem adaptações às condições de estresse hídrico,


tais como a presença de espinhos e caules suculentos que podem armazenar
água, como os cactos. Por exemplo, o xique-xique e o mandacaru, são plantas
xeromórficas.

As fitofisionomias variam bastante na caatinga, de acordo com o solo e a


disponibilidade de água, existindo desde comunidades “arbóreas, arbustivo-arbóreas
e arbóreo-arbustivas pontilhadas por cactos, campos gerais de cimeiras arbustivas
espinhentas, caatingas espinhentas e 'altos pelados' com touceiras de cactos. Além de
lajedos e inselbergs* dominados por diferentes combinações de cactos” (AB´SABER,
2003, p. 140) (*morretes).

Acredita-se que grande parte deste domínio era formada por Caatinga arbórea,
entremeada a matas secas, florestas com espécies decíduas, que perdem suas folhas
durante o período mais seco.

A vegetação considerada mais típica de caatinga encontra-se nas depressões


sertanejas: uma ao norte e outra ao sul do bioma, todavia, na paisagem podem ser
observadas, além das mencionadas matas secas, as matas úmidas de galerias nas
margens dos rios e enclaves de brejos florestados, com solos de boa fertilidade natural.

As distintas tipologias reconhecidas por expressões populares no interior do


Nordeste seguem proximamente às propostas pelos cientistas. Deste modo, as áreas
mais secas e subdesérticas são denominadas de “sertão bravo”, as faixas semiáridas
nas depressões colinosas de “altos sertões”, nas áreas onde a umidade é maior e as
condições do solo são melhores, usa-se a expressão caatingas agrestadas.

A Caatinga já conta com cerca de 36% do bioma ocupado por áreas antrópicas,
sofrendo com processos como a desertificação. Para saber mais sobre a Caatinga,
acesse: <http://www.mma.gov.br/biomas/caatinga/>, e assista ao vídeo que alerta
sobre as ameaças, o qual está disponível em: <http://globotv.globo.com/rede-
globo/nordeste-viver-e-preservar/v/devastacao-de-area-da-caatinga-chega-a-50-no-
nordeste/2541811/>.

Quais são os principais impactos antrópicos no domínio de Caatinga?

3.2.2 Domínio dos Cerrados

Domínio dos chapadões recobertos por cerrados e penetrados por florestas


de galeria, possui cerca de 1,8 milhões de quilômetros quadrados de extensão. Em

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 153


U3

contraste com o domínio morfoclimático e fitogeográfico da caatinga, cuja área core


fica nas depressões interplanálticas, este fica localizado num elevado e relativamente
contínuo conjunto de terras altas do Brasil Central, em altitudes de 300 a 1700m,
desde o sul do Mato Grosso até o Maranhão e Piauí. Possui clima tropical sazonal, com
uma pluviosidade anual relativamente alta, em torno de 1500 mm (RIBEIRO; WALTER,
1998), apresentando estações muito chuvosas alternadas com estações secas (que
duram de três a cinco meses).

A temperatura média anual é cerca de 22°C, com intensa radiação solar o ano todo
(COUTINHO, 2002), por isso, mesmo na época chuvosa (verão), aliado às elevadas
temperaturas que podem chegar a 40°C, podm ser observada baixa umidade do ar ao
final do dia (FRANCO, 1998; MEINZER et al., 1999). Na estação seca, as temperaturas
podem cair bastante, inclusive com a ocorrência de geadas, bem como a umidade
do ar, que pode girar em torno de 15%, condições que ficam piores ainda com os
frequentes incêndios que ocorrem nesta época, condicionando comumente o estado
de alerta à saúde da população.

A vegetação característica deste domínio é o Cerrado, incluindo suas diversas


fisionomias: campos cerrados (onde predominam as formas de vida herbácea),
cerrados (arbustivo/arbórea) e cerradões (arbórea). Assim como a Mata Atlântica,
possui um alto grau de endemismo.

Figura 3.15 | Diferentes fisionomias do domínio do cerrado

Fonte: Coutinho (2002, p. 83). Disponível em: <http://www.qmdmt.cnpm.embrapa.br/13.htm>. Acesso em: 25 ago. 2015.

A vegetação campestre tem ocorrência limitada, sendo a mais parecida com


as savanas africanas. Dispostas linearmente na paisagem, encontramos as matas
de galeria (matas ciliares), além de capões de matas biodiversas (como as florestas
tropicais estacionais semideciduais) encontradas pontualmente em manchas de solo
rico ou em nascentes. As galerias florestais podem ser transformadas em alinhamento
de buritis (palmeira nativa) após o desmatamento parcial.

Costuma-se caracterizar o cerrado “sensu stricto” como uma vegetação

154 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

relativamente baixa, com arbustos e árvores espalhadas, de aparência seca, com troncos
retorcidos e folhas grossas, muitas vezes descrito como vegetação xeromórfica. Como
mencionado anteriormente, xeromorfia está relacionado à adaptação à seca. De fato,
existe um elevado déficit hídrico nas camadas superficiais do solo durante a estação
seca, perceptível pelo dessecamento das plantas herbáceas, sendo que muitas destas
espécies perdem sua parte aérea (epigeia) nesta época, mas permanecem com suas
partes subterrâneas (hipogeia) vivas, que rebrotam novamente na estação chuvosa.

Todavia, ao menos para as espécies arbóreas/arbustivas que contam com raízes


que podem chegar a 20m de profundidade, a água não parece ser o fator limitante,
pois a alta precipitação abastece os lençóis freáticos e as camadas mais profundas
do solo. Por isso, alguns autores acreditam que as caracteristas xeromórficas, como
folhas esclerófilas (duras), espessas, pilosas, alto grau de suberização (tecido tipo
cortiça) dos troncos, estejam mais relacionadas às condições de oligotrofia (pouco
fértil) do solo e da marcante sazonalidade climática.

Os solos, além de pobres em nutrientes, são altamente lixiviados e com altas


concentrações de alumínio e ferro, que cooperam para o desenvolvimento de
carapaças ferruginosas denominadas lateritas. Predominam os latossolos, tanto para
as áreas sedimentares como para terrenos cristalinos; em alguns locais, podem ser
observados solos extremamente arenosos, enquanto em outros, a existência de “terras
roxas” resultantes da decomposição de afloramentos basálticos.

Segundo Ab´Saber (2003, p. 125), “no universo geoecológico do Brasil intertropical


não existe comunidade biológica mais flexível e dotada de poder de sobrevivência em
solos pobres do que os cerrados”.

A dinâmica de
ciclagem de nutrientes Figura 3.16 | Incêndio no Parque Nacional de Brasília -
da vegetação de Cerrado queimada e destruição ambiental
se opõe ao encontrado
nas florestas tropicais
úmidas, apresentando
uma lenta decomposição
da matéria orgânica, em
decorrência da dureza
do substrato vegetal,
elevadas luminosidade
e temperatura, e baixa
umidade do solo e do
ar ao longo da estação
seca. Assim como
outras savanas (descritas
Fonte: Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Queimada_
na seção anterior), o ABr_02.jpg>. Acesso em: 25 ago. 2015.

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 155


U3

acúmulo de serapilheira durante este período promove a ocorrência de incêndios.


Aqui o fogo também se constitui como elemento natural, exercendo as mesmas
funções descritas para as savanas (Seção 2).

O Cerrado é, atualmente, palco de uma grande expansão agropecuária (abrigando o


maior rebanho bovino brasileiro, muitas vezes sem as devidas medidas de conservação
e manejo das terras).

A devastação ambiental deste bioma só é menor do que o observado na Mata


Atlântica, sendo estimado que áreas antrópicas já ocupem cerca de 40% do total,
além de muitos remanescentes com vários níveis de perturbação. Para saber mais,
acesse: <http://www.mma.gov.br/biomas/cerrado/mapa-de-cobertura-vegetal>).

Restam pouquíssimos exemplos de ecossistemas dos


cerradões [...]. Além de conviver com alguns dos piores solos
do Brasil intertropical, a vegetação dos cerrados conseguiu a
façanha ecológica de resistir às queimadas, renascendo das
próprias cinzas, como uma espécie de fênix dos ecossistemas
brasileiros. Não resiste, porém, aos violentos artifícios
tecnológicos inventados pelos homens ditos civilizados
(AB´SABER, 2003, p. 43).

Comparando as descrições dadas na seção 3.2 e nesta, podemos dizer que


todo Cerrado é uma Savana, e que toda Savana é um Cerrado? Confira sua
resposta no link: <http://ecologia.ib.usp.br/cerrado/questionario.htm>.

O domínio dos Cerrados possui uma ampla faixa transicional, que resulta em
diferentes sistemas biológicos. Cabe ressaltar, entre eles, os encontrados nas planícies
aluviais pantaneiras, no sul do estado do Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul,
onde podem ser reconhecidos vários tipos de ecossistemas. Dadas as peculiaridades
do local, e a sua complexidade de ecossistemas, é muito comum esta região ser
classificada como um bioma separado do Cerrado, chamado de Pantanal.

156 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

3.2.3 Domínio dos Mares de Morros

Domínio das regiões serranas, tropicais úmidas, ou dos mares de morros


extensivamente florestados, abrangendo uma área de cerca de 650 mil quilômetros
quadrados, onde encontra-se concentrada a maior parte da população brasileira, é
também conhecido como Domínio Tropical Atlântico (NÓBREGA JÚNIOR, 2011).
Está associado ao Bioma Mata Atlântica, caracterizado como o segundo complexo de
florestas tropicais biodiversas brasileiras.

Figura 3.17 | Serra da Bocaina - Vista do Pico do Gavião


Observe a fisionomia arredondada dos morros, típica deste domínio

Fonte: Schinke (2012)

É constituído, em grande parte, por relevos acidentados e variados entre si, com
altitudes de 2 a acima de 1100m de altitude ao nível do mar, com presença de morros
arredondados e serras íngremes, como as escarpas da Serra do Mar, além de alguns
chapadões florestados. Presença marcante da mamelonização, processo conhecido no
cinturão das terras intertropicais, definido como “um conjunto de processos fisiográficos
suficientemente capaz de "arredondar" as vertentes de rochas cristalinas até o nível de
uma feição geométrica policonvexa” (AB'SÁBER; MARIGO, 2009, p. 53).

A proximidade do oceano está relacionada à umidade e à temperatura, e como


o domínio abriga tanto baixas até médias latitudes, podem ser encontrados desde
climas tropicais, tropical de altitude e subtropical. Em comum, todos eles apresentam
ausência de uma estação seca muito severa ou longa, com precipitações anuais entre
1500 a 4000 mm, e temperaturas não muito baixas, com médias entre 20 a 24°C
(NÓBREGA JÚNIOR, 2011).

A área core localiza-se nas regiões serranas granítico-gnáissicas cobertas pela


floresta tropical úmida (floresta ombrófila densa; floresta atlântica), relacionadas a um
clima quente e carregado de umidade que chega do oceano. As condições climáticas
são propícias a uma decomposição acentuada das rochas, formando solos com
profundidade de 3 a 8m até 40 a 60m, exceto nos locais de afloramentos de rochas,
“pães de açúcar”, espinhaços e nos “mares de pedra”.

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 157


U3

A Floresta Atlântica pode ser considerada como a mais rica do mundo em


diversidade de árvores por unidade de área, sendo já registrado o número
de 454 espécies por hectare numa área no sul da Bahia, superando o
recorde da Floresta Amazônica (no Peru), que foi de 300 espécies por
hectare. Só para ter uma noção comparativa, nas florestas de clima
temperado são estimadas menos de 30 espécies arbóreas por hectare
(MOURA, 2006).
Para aprofundar seus estudos e conhecer a legislação específica da Mata
Atlântica, acesse: <http://www.mma.gov.br/estruturas/202/_arquivos/
folder_legislao_mata_atlantica.pdf>, e
<http://www.ufal.edu.br/usinaciencia/multimidia/livros-digitais-
cadernos-tematicos/A_Mata_Atlantica_em_Alagoas.pdf>.

Além dos ecossistemas inseridos no domínio de mares de morros, também são


reconhecidas diversas faixas de transição e contato existentes entre os outros distintos
domínios de natureza do Brasil, resultando em uma grande variedade de biotas
(comunidades biológicas).

Podemos citar como ecossistemas associados, por exemplo, nas planícies


sedimentares de deposição marinha, os manguezais, localizados nos estuários,
recortes de lagunas e na foz dos rios que chegam ao mar influenciados diretamente
pelas marés, as restingas.

Pela sua disposição norte-sul - do Amapá ao Rio Grande do Sul –, e por variações
setoriais de seus ecossistemas, a zona costeira atlântica do Brasil pode ser
considerada como um Domínio de natureza.

A vegetação de mangue desenvolve-se nos estuários, recortes de lagunas e na


foz dos rios que chegam ao mar, sob um substrato instável, com baixa quantidade
de oxigênio, recebendo diretamente a influência das marés. Dadas estas condições
adversas, a comunidade arbórea é de baixa diversidade (sendo reconhecidas três ou
quatro dominantes), e possui adaptações, como glândulas nas folhas para expelir sais,
raízes que permitem a sua fixação e/ou sua respiração.

As restingas ficam estabelecidas em solos muito arenosos, instáveis, pobre em


nutrientes, e às vezes com grande quantidade de sal. Podem ser reconhecidos diversos
tipos de restinga com comunidades florísticas e estruturalmente diferenciadas, que
dependem, em grande parte, da distância do oceano e da variação do nível do lençol
freático, que condiciona distintas umidades do solo.

158 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

No interior, onde o clima possui duas estações bem definidas (uma mais seca e
outra mais úmida), encontramos as florestas estacionais (Floresta Tropical Sazonal),
sob solos que podem ser bem férteis, e manchas de cerrado, especialmente em São
Paulo e norte de Paraná, subdomínio dos chapadões florestados.

Nos planaltos mais altos (em geral, maior que cerca de 600m de altitude), como
em Campos de Jordão e Bocaina, localizam-se as matas de araucária, as quais iremos
descrever adiante como um domínio próprio.

Nos topos das serras, sobre os solos rasos e afloramentos rochosos, ocorrem os
campos rupestres com vegetação predominantemente herbácea, como cactos e
outras plantas adaptadas às condições de alta luminosidade e temperatura, ventos
constantes e falta de solo orgânico.

Dado seu histórico de ocupação desde a colonização (para a extração de pau-


brasil, plantio de cana-de-açúcar e depois café) até recente (urbanização, além da
agropecuária), o bioma Mata Atlântica encontra-se altamente reduzido e fragmentado,
contando já com 71% de áreas antrópicas, sendo que apenas cerca de 7% estão bem
conservados em fragmentos acima de 100 hectares. Saiba mais em: <http://www.
mma.gov.br/biomas/mata-atlantica>.

Você sabe o que são Hotspots? São áreas prioritárias para conservação,
ou seja, que possuem uma alta biodiversidade, rica em espécies
endêmicas, e que estejam com sua vegetação original altamente
ameaçada. No Brasil, encontram-se dois hotspots: Mata Atlântica e
Cerrado. Aprofunde-se no assunto acessando: <http://www.seer.ufu.br/
index.php/caminhosdegeografia/article/viewFile/15700/8881>.

Neste domínio, devido às suas características de clima


úmido e relevo acidentado, são encontrados os maiores
índices de deslizamentos de terras, colocando em risco
a vida de moradores, em decorrência da associação de
chuvas abundantes e relevo acidentado, condições que são
agravadas pelo desmatamento de encostas e ocupações
irregulares. Você considera estas tragédias como um
fenômeno imprevisível? O que poderia ser feito para que
estes desastres fossem impedidos?

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 159


U3

Agora, vamos descrever os dois domínios extratropicais brasileiros. Você sabe quais
são?

Eles são caracterizados, principalmente, por uma discreta perda da tropicalidade,


que reflete, especialmente, em relação às temperaturas médias mais baixas e à maior
frequência de temperaturas negativas (NÓBREGA JÚNIOR, 2011).

3.2.4 Domínio das Araucárias (Domínios dos Planaltos de Araucárias)

Situado no sul do país, em regiões de clima subtropical úmido, desde o Paraná até
o norte do Rio Grande do Sul, com altitudes elevadas variando entre 800 a 1300m
(podendo ser citado como um dos aspectos mais relevantes para sua distinção do
domínio dos Mares de Morro), abrangendo cerca de 400 mil quilômetros quadrados.
Na classificação do IBGE (2004), a área deste domínio está incluída junto ao bioma
Mata Atlântica.

A precipitação anual é elevada (entre 1200 a 1800 mm) e relativamente bem


distribuída ao longo do ano, as temperaturas médias podem variar de 14 a 22°C,
sendo que no inverno podem ocorrer geadas ou mesmo, eventualmente, nevar nos
setores mais elevados. Este tipo climático se estende para os domínios das Pradarias
(NÓBREGA JUNIOR, 2011).

Este domínio da natureza é caracterizado por grandes pinheiros (Araucaria


angustifolia), que podem atingir mais de 35m de altura, emergentes acima de uma
mata subtropical de alta biodiversidade, sendo as espécies mais conhecidas o chá-
mate (Ilex paraguariensis), diversas canelas e o pinheiro-bravo. Sua área mais típica
coincide com o planalto basáltico sul-brasileiro, do Paraná ao Rio Grande do Sul.
Figura 3.18 | Remanescente da mata de araucária em Piraquara, PR

Fonte: Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:AraucariasPiraquara.jpg>. Acesso em 21 ago. 2015.

160 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

Os planaltos são cobertos com matas de araucária (também chamadas de


Floresta Ombrófila Mista), em mosaicos com pradarias mistas (vegetação campestre
pontilhadas pelos bosques de araucárias), especialmente em elevadas altitudes (como
nos campos de Lages e de Ponta Grossa), e matas de galerias nas encostas. Também
ocorrem enclaves de cerrados no norte do Paraná (em Campo Mourão) e na depressão
periférica paulista (entre Pirassununga e Sorocaba).

A Floresta de Araucária é considerada como uma floresta ombrófila, porque


encontra-se em clima de regime chuvoso, sem estação seca muito severa. O termo
mista é porque compõe-se tanto de espécies de angiospermas (plantas que produzem
flores e frutos) como de gimnospermas, grupo a que pertence a araucária e outras
espécies presentes nestas florestas, como o pinheiro bravo.

As florestas de araucárias estão praticamente extintas, devido, inicialmente, à


extração de madeiras de excelente qualidade, por exemplo, da araucária, canelas e
imbuia, e atualmente, pela expansão agrícola (soja e trigo).

3.2.5 Domínio das Pradarias

Situado no extremo sul do Brasil, no estado do Rio Grande do Sul, onde o relevo é
plano a levemente ondulado - também conhecido como domínio das coxilhas (relevo
com suaves ondulações), região das campinas meridionais, Campanha Gaúcha e
Pampas -, conta com aproximadamente 80 mil quilômetros quadrados.

Encontra-se em zona tipicamente temperada quente, subúmida, com frequência


de frentes polares e temperaturas negativas no período do inverno, apresentando as
maiores amplitudes térmicas no país.

O termo “pampa” é de origem indígena, que significa “região plana”.

A vegetação campestre é característica deste domínio, sendo composta de plantas


herbáceas (ervas, gramíneas) e pequenos arbustos. Podem ser observados outros
ecossistemas associados, como os banhados (áreas de elevada umidade do solo
durante o ano todo), os buritizais (com o predomínio destas palmeiras) e as formações
rupestres (nos afloramentos rochosos). Também existem ecossistemas florestais, tais
como do tipo de floresta ombrófila densa e mista, floresta estacional decidual (com
muitas árvores que perdem suas folhas no período de seca) e as matas ciliares ao
longo dos rios.

O domínio das pradarias apresenta distintos tipos de solo associados à


decomposição de rochas basálticas, sedimentares (areníticas) e aos depósitos aluviais
ao longo dos rios; são mais ou menos férteis, em geral, poucos profundos (NÓBREGA
JÚNIOR, 2011). As condições edáficas da região influenciam fortemente na formação

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 161


U3

dos campos, mais até do que as condições climáticas. As pastagens para criação de
animais (tradicionais na região desde a sua colonização) e os incêndios não permitem
o estabelecimento da vegetação arbustiva/arbórea, como se verifica em vários trechos
da área de distribuição dos Campos do Sul.

A principal ameaça está relacionada à progressiva introdução e expansão das


monoculturas (agrícolas e silviculturais, como o reflorestamento de Pinus) e das
pastagens com espécies exóticas, que têm levado a uma rápida degradação das
suas paisagens naturais. Estima-se que, atualmente, cerca de 50% do bioma sejam
ocupados por áreas antrópicas (MMA, 2015).

Algumas regiões passam pelo processo de arenização, semelhante ao de


desertificação encontrado na Caatinga, mas com origens diferentes, como você pode
conhecer acessando: <http://cienciahoje.uol.com.br/noticias/2010/10/proximo-alvo-
desertificacao>. Acesso em: 11 nov. 2015.

Saiba mais sobre as pradarias pampeanas nos links: <http://www.mma.


gov.br/biomas/pampa> e <http://www.mma.gov.br/estruturas/chm/_
arquivos/campossulinos_parte1_14.pdf>. Acesso em: 11 nov. 2015.

1. Um dos aspectos característicos dos domínios de Cerrado


e Caatinga é a presença de uma vegetação com aspectos
xeromórficos. No entanto, podemos afirmar que a vegetação
de Caatinga é xerófita, enquanto a do Cerrado não. Explique.

2. Em alguns domínios, o fogo pode ser considerado como


um elemento natural da paisagem. Quais são estes domínios e
quais são as funções ecológicas do fogo natural?

162 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

Nesta unidade foram abordados:


- As concepções de termos correlatos, como ecossistemas,
biomas e domínios, sendo os dois últimos muito utilizados para
classificar distintas regiões fitogeográficas. Tanto os biomas
quanto os domínios são caracterizados pelo clima, relevo
e vegetação predominante, e são compostos por diversos
ecossistemas.
- Caracterizamos os principais biomas terrestres mundiais,
a saber: tundra, taiga, floresta temperada (decídua e pluvial),
campos temperados e tropicais (pradarias e savanas), chaparral
(e bosques esclerófilos), florestas tropicais (úmidas e sazonais),
caatinga e deserto.
- Caracterizamos os seis domínios morfoclimáticos e
fitogeográficos brasileiros: Amazônico, Mares de Morro, Cerrado
e Caatinga (domínios tropicais), e das Araucárias e das Pradarias
(domínios extratropicais), e comentamos sobre as faixas de
transição.
- Identificamos que o Brasil possui a maior floresta tropical do
mundo e a mais biodiversa – a Floresta Amazônica -, e conta
com dois hotspots – locais de elevada diversidade e endemismo,
e por outro lado, altamente ameaçado, portanto, prioritários para
a conservação: a Mata Atlântica (floresta com maior diversidade
arbórea por hectare do mundo) e o Cerrado.

Caro aluno, vamos encerrar esta Unidade com os dizeres de


Aziz Ab’Sáber, em sua obra "Domínios da Natureza no Brasil:
Potencialidades Paisagísticas" (2005):

Todos os que se iniciam no conhecimento das


ciências da natureza – mais cedo ou mais tarde,
por um caminho ou por outro – atingem a ideia de
que a paisagem é sempre uma herança. Na verdade,
ela é uma herança em todo o sentido da palavra:

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 163


U3

herança de processos fisiográficos e biológicos, e


patrimônio coletivo dos povos que historicamente
as herdaram como território de atuação de suas
comunidades (AB´SABER, 2003, p. 9).

Procure conhecer os principais impactos que o homem vem


provocando nos domínios morfoclimáticos brasileiros em
decorrência do mau uso das potencialidades de cada um, e quais
alternativas podem ser concebidas para evitar ou minimizar tais
impactos socioambientais.

Considerando a atual exploração territorial nos distintos


domínios brasileiros, qual será a herança que iremos deixar
para as futuras gerações?

1. “A Mata Atlântica é formada por um conjunto de florestas,


restingas, manguezais e campos de altitude, que se estendiam
originalmente por 17 estados do território brasileiro. Hoje
os remanescentes de vegetação nativa estão reduzidos a
cerca de 22% de sua cobertura original e encontram-se em
diferentes estágios de regeneração” (Adaptado de: <http://
www.mma.gov.br/biomas/mata-atlantica>). Acesso em: 11
nov. 2015. De acordo o texto e o conteúdo da seção, assinale
a alternativa correta:
A. A “Mata Atlântica” refere-se a um bioma composto por
vários ecossistemas.
B. As restingas, os manguezais e os campos de altitudes
referem-se a diferentes biomas encontrados no Brasil.

164 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

C. As comunidades vegetais encontradas em estágio inicial de


regeneração são chamadas de climácicas, ou seja, encontram-
se no clímax climático.
D. Devido à sua baixa cobertura de vegetação nativa original,
a Mata Atlântica não pode mais ser considerada como um
bioma, elevada atualmente ao status de domínio, apenas.
E. As espécies arbóreas são as formas de vida predominantes
nas comunidades pioneiras da Mata Atlântica, onde a vegetação
atinge seu máximo de desenvolvimento.

2. Cerca de 1/3 das terras emersas do globo, isto é, 50 milhões


de quilômetros quadrados, ou aproximadamente seis vezes a
dimensão do Brasil, apresentam condições de aridez e aí vivem
1 bilhão de habitantes ou 20% da humanidade. As regiões
hiperáridas, ou de aridez absoluta, correspondem a 4% desse
total (Fonte: CONTI, José Bueno. O conceito de desertificação.
CLIMEP: Climatologia e estudos da paisagem, Rio Claro, SP,
v. 3, n. 2, p. 42, 2008). Sobre o(s) bioma(s) que ocupa(m) as
regiões hiperáridas do planeta, é correto afirmar que:
A. É classificado como deserto, onde a pluviosidade anual é,
em geral, menor que 250 mm, distribuída de forma irregular.
Também possui uma elevada amplitude térmica, com altas
temperaturas durante o dia e negativas à noite. Possui uma
vegetação bem ínfima, com presença de cactos, agaves,
alguns arbustos e herbáceas.
B. É classificado como bosque esclerófilo, caracterizado por
arbustos e árvores espinhosas, como os cactos, e presença de
plantas leguminosas, as quais possuem associação simbiótica
com bactérias (chamadas de rizóbio) que fixam o nitrogênio
atmosférico no solo.
C. É chamado de deserto, os quais estão distribuídos em diferentes
continentes, em regiões que são sempre muito quentes, mesmo
durante o período noturno, com ocorrência irregular de uma
baixa precipitação. A árvore predominante é o baobá.
D. Podem ser encontrados dois tipos de biomas, o deserto e o
chaparral, ambos com médias anuais de precipitação menor
que 500 mm, e caracterizados por uma vegetação herbácea.
Enquanto o primeiro fica situado nos trópicos quentes, o
segundo localiza-se em regiões temperadas, com presença
de um inverno bem rigoroso.

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 165


U3

E. Podem ser encontrados dois tipos de biomas, o deserto e a


caatinga, ambos com médias anuais de precipitação variando
entre 300 e 700 mm. Enquanto os primeiros são encontrados
apenas em regiões temperadas, muito frias, os segundos
ficam nos trópicos quentes, e, por isso, podem desenvolver
uma vegetação florestal.

3. Muitas áreas onde se concentram os biomas mais


biodiversos do planeta, as florestas tropicais, possuem solo
com baixa fertilidade. Que aspecto funcional relacionado aos
processos ecológicos permite que estes solos comportem
exuberantes e produtivas formações?

Analise o mapa a seguir que apresenta os domínios


morfoclimáticos e fitogeográficos brasileiros, bem com suas
faixas de transição (segundo AB´SABER, 2003), e responda às
questões 4 e 5:

Araucárias
Campos

Fonte: Disponível em: <http://www.geografiaparatodos.com.br/index.php?pag=capitulo_14_dominios_


morfoclimaticos_e_questao_ambiental_no_brasil>. Acesso em: 11 nov. 2015.

4. Sobre os domínios fitogeográficos expostos, analise as


afirmativas a seguir e e assinale a alternativa correta.
I. A área “1” representa o Cerrado, situado em regiões de clima
relativamente úmido, mas com uma estação seca rigorosa.
Os solos são, em geral, muito pobres, e com muito alumínio,
o fogo é um elemento natural. A vegetação é xeromórfica.

166 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

II. Os campos, também chamados de pradarias ou pampas, e o


domínio das Araucárias, são os únicos em zonas subtropicais
do país, sendo caracterizados pela presença de uma estação
muito fria, que impede o desenvolvimento de vegetação
florestal.
III. O domínio de mares de Morro abriga a floresta tropical
úmida, conhecida como Mata Atlântica, considerada como a
de maior diversidade por unidade de área do mundo.
Está(ão) correta(s) apenas a(s) afirmativa(s):
A. I.
B. I e II.
C. II.
D. I e III.
E. III.

5. Assinale a alternativa que apresenta corretamente os


domínios e seus respectivos aspectos marcantes:
A. Na faixa de transição do domínio Mares de Morros (1) com
os países vizinhos, encontramos o Pantanal Matogrossense,
que é a maior planície inundável do planeta e está localizado
no centro da América do Sul.
B. Os biomas correspondentes aos domínios Amazônico e de
Mares de Morros são considerados como hotsposts, ou seja,
áreas prioritárias à conservação por abranger as florestas mais
biodiversas e extensas do planeta.
C. O domínio da Caatinga (2) localiza-se no semiárido
nordestino, onde os rios são intermitentes, os solos são
pedregosos com baixa quantidade de matéria orgânica e a
vegetação é xerófita.
D. O domínio das pradarias localizadas no centro-oeste do país,
em clima com duas estações bem definidas, é comumente
denominado de Pampas ou Campanhas gaúchas.
E. A área core do domínio das Araucárias fica localizada
apenas no Estado do Rio Grande do Sul, sendo caracterizada
por bosques homogêneos de Araucária (chamado de pinheiro
do Paraná) e de outras coníferas, como o Pinus.

Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil 167


U3

168 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


U3

Referências

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170 Biomas terrestres e domínios biogeográficos do Brasil


Unidade 4

BIODIVERSIDADE,
CONSERVAÇÃO E MANEJO
DE ECOSSISTEMAS

Guilherme Alves de Oliveira

Objetivos de aprendizagem
O escopo central desta unidade visa contemplar nossos estudos no
entendimento sobre a Biodiversidade como um elemento basal para
fundamentação dos ecossistemas, e, assim, apresentar os meios e as
formas de conservação destes ambientes sob o ponto de vista da relação
sociedade e ambiente. Para tal, buscamos realizar abordagens direcionadas
que contemplem tanto a fundamentação dos conceitos atribuídos à unidade
como as políticas públicas envolvidas nas concepções de conservação e
manejo dos ecossistemas.

Seção 1 | Biodiversidade: da norma à forma


Nesta seção buscamos contemplar e definir o conceito de
Biodiversidade e Ecossistema, de modo que tais definições nos permitam
interagir e compreender os estudos e as análises das demais unidades.
As concepções sobre a Biodiversidade serão apresentadas por meio das
formulações estipuladas por biogeógrafos, assim como os elementos
que permeiam as políticas públicas e conferências internacionais que
proporcionaram os alicerces para que possamos compreender os demais
segmentos, como o ambientalismo e os princípios da sensibilização e
consciência ambiental.

Seção 2 | Conservação e manejo de ecossistemas


No decorrer desta seção iremos conhecer os potenciais ambientais
U4

que permeiam os critérios de preservação e conservação de


ecossistemas no Brasil de sua norma à forma. A expressão máxima dos
critérios que trabalharemos em primeira instância incumbe as Unidades
de Conservação como um dos principais elementos que estimulam
o manejo de ecossistemas e a Biodiversidade. No que circunda os
estudos biogeográficos, realizaremos uma análise por um viés crítico
que evidencie as principais potencialidades e fragilidades desta forma
de manejo de ecossistemas, aplicando concepções teóricas, como
a Biogeografia de Ilhas, para conceber como a biodiversidade e os
sistemas naturais se desenrolam em suas dinâmicas ecológicas naturais
nestes ambientes de conservação.

172 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

Introdução à unidade

Compreender as dinâmicas naturais e a Biodiversidade sempre foi, e ainda é,


uma das tarefas mais complexas inerentes a qualquer ramo das Ciências Naturais
e da Terra. Não obstante, a Biogeografia se incumbe em buscar meios capazes de
contribuir para um panorama do entendimento das dinâmicas naturais sob uma
perspectiva multilateral e integradora, avaliando as potencialidades e as fragilidades
dos ambientes e auxiliando na tomada de decisões e no próprio manejo do
ambiente com a finalidade de desenvolver uma acuidade ambiental e sustentável
tanto pelo viés natural quanto para com a sociedade.

E sob esta perspectiva buscamos direcionar nossos estudos no que circunda


a manutenção da Biodiversidade e a conservação e manejo de Ecossistemas.
Entretanto, para compreendermos as complexidades que permeiam o
direcionamento dos nossos estudos, devemos primeiramente realizar um
desenvolvimento teórico-funcional para ampliarmos os campos de análise sob a
amplitude das dinâmicas ambientais.

Para tal, procuramos realizar uma abordagem inicial que contemple o conceito
da Biodiversidade de sua norma à forma, entendendo pelo viés teórico as suas
definições e delineamentos, fundamentais para uma análise sobre o que é a
Biodiversidade na prática e como esta se expressa diante das dinâmicas naturais.

Em decorrência da amplitude dos campos de definições e práticas acerca


da Biodiversidade, compreenderemos sob a ótica do Ambientalismo e
Conservacionismo, a representatividade destes e o desenvolvimento ideológico
diante das fragilidades ambientais e os primeiros indícios expressos através das
conferências mundiais sobre o meio ambiente, atuando no campo de formulações
e propostas de manejo ambiental que adotamos hoje no cenário ambiental do país.

No decorrer da unidade iremos também compreender segmentos fundamentais


para o manejo de ecossistemas sob a perspectiva da corrente biogeográfica da
Biogeografia de Ilhas, compreendendo suas potencialidades para a formulação e
manutenção dos parâmetros de conservação ambiental adotados pelas Unidades
de Conservação.

Por fim, temos como principal escopo compreender como as dinâmicas político-
administrativas atreladas aos segmentos da Ciência biogeográfica podem contribuir
para uma melhor acuidade ambiental sob a perspectiva da proposta de um ambiental
sustentável e harmônico, tanto para a sociedade quanto para a natureza.

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 173


U4

174 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

Seção 1

Biodiversidade: da norma à forma


O escopo desta seção está direcionado para um desenvolvimento das concepções
sobre a Biodiversidade por uma ótica regida pelos conceitos da Biogeografia e
das fundamentações das definições elencadas por ciências afins, tomadas pela
caracterização da Biodiversidade e registradas em documentos, laudas e obras de
caráter científico no Brasil.

A designação e o desenvolvimento de nossa abordagem se fazem necessários,


uma vez que, ao buscarmos compreender os elementos de conservação e manejo
de ecossistemas, é fundamental conhecer em primeira instância os atributos
e discernimentos sobre Biodiversidade. Uma vez que já fomos apresentados à
compreensão dos elementos fundamentais que propiciam a Biodiversidade nas
unidades anteriores, buscaremos nesta seção delimitar o conceito adotado por órgãos
públicos como o Ministério do Meio Ambiente (MMA).

Sendo assim, nesta seção, iremos ampliar os conhecimentos acerca da


Biodiversidade por um viés biogeográfico, buscando compreender a Biodiversidade
em sua norma conceitual até os componentes de sua forma evidenciada pela
perspectiva de biogeógrafos, da gestão pública brasileira e do Ambientalismo.

1.1 O conceito de biodiversidade


Com o alicerce teórico construído até a presente unidade, podemos constatar
que, para compreender a Biodiversidade, devemos nos inteirar sobre uma gama de
fatores e dinâmicas que proporcionam o entendimento deste segmento como um
todo. Ao pensarmos sobre a ótica biológica, a Biodiversidade é evidenciada como
uma dinâmica dos processos de seleção natural, das cargas genéticas transpostas
por hereditariedade a indivíduos de uma mesma espécie. Já sobre uma perspectiva
geográfica, podemos escalar a Biodiversidade como um reflexo biótico da atuação
de fatores limitantes da distribuição das espécies ante os condicionantes como as
barreiras geográficas, o clima, o solo e outros atributos deste segmento interpretativo.

Mas como devemos interpretar e conceber a Biodiversidade no âmbito da

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 175


U4

Biogeografia? Se analisarmos os conceitos apresentados pela Convenção da


Diversidade Ecológica (CDB) disposta pelo Ministério do Meio Ambiente no Brasil,
podemos nos dirigir ao entendimento da Biodiversidade. Este documento nos traz
como fundamentação os seguintes apontamentos:

Diversidade biológica significa a variabilidade de organismos


vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros,
os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas
aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte;
compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre
espécies e de ecossistemas (BRASIL, 2000, p. 9).

Sobre os pressupostos da Convenção da Diversidade Ecológica, podemos


compreender o conceito de Biodiversidade como toda a variedade dos seres vivos
presentes em determinado espaço geográfico, incluindo as relações e fundamentações
dos ecossistemas, bem como as espécies animais que fazem parte deste.

No sentido da Biogeografia, a Biodiversidade pode ser interpretada como uma


dinâmica fundamental para a formulação da Biocenose. A Biocenose, por definição,
se institui pelo “[...] Conjunto de numerosos organismos de espécies diferentes
em contínua interação entre si” (VIADANA, 1985, p. 43). Sendo assim, podemos
compreender pela perspectiva da Biocenose a relação e interação entre seres vivos
distintos capazes de criar um determinado ecossistema.

Na perspectiva da Biogeografia, podemos nos embasar sobre os apontamentos


de Troppmair (2004) ante a interação da Biocenose para com o desenvolvimento
de ecossistemas em:

[...] O estudo das interações, da organização, dos processos


espaciais do presente e do passado, dando ênfase aos seres
vivos que habitam determinado local: o biótopo. Como na
ecologia, o objeto de estudo da Biogeografia também são os
seres vivos, incluindo aí os seres humanos, quando vistos como
participantes de uma Biocenose, portanto, integrante das
cadeias tróficas e dependente das condições geoambientais
(TROPPMAIR, 2004, p. 112).

Neste contexto, devemos conceber o ser humano como um dos componentes


intrínsecos nos campos da Biocenose, Biodiversidade e do próprio Ecossistema. Tal

176 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

concepção nos auxilia a compreender que a influência do ser humano no meio


ambiente pode ser expressa por relações harmônicas ou desarmônicas para com
os demais seres vivos que constituem a diversidade biológica de um ecossistema,
influindo também nas cargas dos impactos, benéficos ou adversos, oriundos da
inferência antrópica nos meios naturais.

A compreensão da Biodiversidade no campo da Ciência deve então salientar estes


termos que abordamos, respeitando os critérios genéticos, de distribuição geográfica e
organização dos seres vivos, incluindo sempre o ser humano sob a ótica da Biocenose
e da formação de ecossistemas.

Ante esta concomitância de elementos que circundam a definição de


Biodiversidade, podemos destacar os apontamentos de Matos et al. (1999), afirmando
que:

O termo diversidade engloba a organização biológica como


um todo, abrangendo do nível molecular ao global. Então,
teoricamente, a diversidade pode ser considerada como a
quantidade e a distribuição da informação genética dentro da
comunidade natural, podendo ser medida em diferentes níveis
de complexidade, ou seja: diversidade genética, de espécies e
de ecossistemas (MATOS et al., 1999, p. 3).

Tais apontamentos direcionam o entendimento da Biodiversidade enquanto


norma. Em paralelo, Solbrig (1991) define a Biodiversidade por uma relação de três
elementos intrínsecos para qualquer análise ou pesquisa neste campo, destacando
a interação entre a diversidade genética, taxionômica e funcional dos seres vivos. Ou
seja, as associações entre estes três elementos fundamentam a Biodiversidade no
que tange às cargas genéticas dos seres vivos, a taxionomia oriunda dos processos
evolutivos e de adaptação natural ou artificial e a diversidade funcional expressa pelas
relações ecológicas e fatores limitantes estudados em Biogeografia.

Delimitamos então os componentes que são considerados fundamentais para a


conceituação de Biodiversidade em sua norma; mas, e quanto à expressão prática
destas circunstâncias que corroboram a forma? Para ampliarmos o conhecimento
ante a expressão da Biodiversidade, devemos pensar nas conjunturas resultantes desta,
e em primeira instância podemos destacar a Ecologia como um dos principais meios
de expressão e forma da Biodiversidade.

Seguindo os apontamentos de Odum (1985) que conceituam a Ecologia, podemos


evidenciar segmentos de análise que fundamentam as bases da Biodiversidade pela
práxis em:

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 177


U4

A palavra ecologia deriva da palavra grega oikos, que significa


'casa' ou 'lugar onde se vive'. Em sentido literal, a ecologia é
o estudo dos organismos 'em sua casa'. A ecologia define-se
usualmente como o estudo das relações dos organismos ou
grupos de organismos com o seu ambiente, ou a ciência das
inter-relações que ligam os organismos vivos ao seu ambiente.
Uma vez que a ecologia se ocupa especialmente da biologia
de grupos de organismos e de processos funcionais na terra,
no mar e na água doce, está mais de harmonia com a moderna
acepção definir a ecologia como o estudo da estrutura e do
funcionamento da natureza, considerando que a humanidade
é uma parte dela (ODUM, 1985, p. 4).

Tais definições nos auxiliam na concepção de que a ecologia somente é capaz de


ser expressa através da diversidade e das relações entre espécies e organismos vivos ou
elementos abióticos presentes nas esferas da Litosfera, Atmosfera e Hidrosfera. Por meio
da diversidade e interação destes elementos, podemos constatar a evidência de processos
funcionais no ambiente, criando-se assim o vínculo entre a Biodiversidade e a Ecologia.

A expressão final deste vínculo advém da formulação de ecossistemas, que


contempla as relações ecológicas dos seres vivos em paralelo com a diversidade de
organismos oriundos da Biodiversidade. Desta forma, podemos definir a Biodiversidade
enquanto forma pela expressão das relações ecológicas em determinado ambiente,
constituindo por fim a Biocenose.

A Biogeografia se elenca então como uma ciência capaz de abarcar a Biodiversidade


tanto em sua norma, pelos parâmetros científicos e o estudo aplicado em cada um
de seus elementos, quanto pela forma, abarcando todo o conceito da Biocenose e
os transpondo a uma caracterização geográfica do ambiente, formulando assim a
Geobiocenose, conforme nos sugere Troppmair (2004).

Por fim, a amplitude do diálogo acerca da Biodiversidade de sua norma à


forma é dada como um parâmetro fundamental para iniciarmos os estudos acerca
das especificações de outros conceitos amplamente abordados no estudo de
Biogeografia, além de ser tratada como principal preceito para as formulações e
práticas organizacionais de conservação do meio ambiente e dos ecossistemas.

1.2 Especificações dos conceitos: biodiversidade, bioma,


ecossistema e biocenose

178 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

À primeira vista é comum nos confundirmos sobre a abordagem e significância dos


conceitos de Bioma, Biodiversidade, Ecossistema e Biocenose. Neste sentido, por quanto
mais similares estes conceitos possam parecer, eles apresentam uma grande discrepância
tanto em sua composição analítica quanto em suas proporções geográficas.

No intuito de compreendermos no decorrer desta unidade as relações de conservação


e manejo de ambientes sobre as diretrizes públicas, devemos sumariamente listar e
compreender cada um destes elementos e sua relação para com a Ciência biogeográfica
no que circunda este campo do conhecimento.

Para tal, listaremos cada um destes conceitos a modo de expor sumariamente cada
condicionante capaz de expor a amplitude dos conceitos em um cunho biogeográfico,
além de expor os critérios fundamentais que culminam na perspectiva pública e
organizacional de conservação e manejo do ambiente pelo fator antrópico.

1.2.1 A Biodiversidade

No segmento de análise anterior, realizamos um aprofundamento sobre


a Biodiversidade de sua norma à forma. Pautado nos segmentos de definição
supracitados e expostos através dos apontamentos de Troppmair (2004), Matos et
al. (1999), Odum (1985) e a Convenção de Diversidade Ecológica (CDB), buscaremos
aqui somente sintetizar as ideias acerca da definição do conceito.

A Biodiversidade pode ser definida como a interação dos elementos de cargas


genéticas e hereditariedade em paralelo com os processos evolutivos de seleção
natural das espécies e das relações ecológicas nas quais estas espécies estão envolvidas.

Por estes apontamentos, podemos também nos dirigir sobre a abordagem desta
temática com olhares atentos à dinâmica de alteração da Biodiversidade. Se por um lado
consideramos que as relações ecológicas são um dos elementos fundamentais para
o desenvolvimento da Biodiversidade, as alterações do ambiente atuam diretamente
nas relações ecológicas fundamentais para a manutenção da Biodiversidade,
desenvolvendo então uma necessidade de redução de impactos e conservação do
meio ambiente para um melhor incremento e estabilidade da diversidade dos seres
vivos em determinado ambiente.

Você já imaginou por um instante as ações que nós,


enquanto seres humanos, desenvolvemos para com o meio?

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 179


U4

É notório que a história e o desenvolvimento da humanidade


estão marcados pela contínua alteração do ambiente e,
consequentemente, afetando a Biodiversidade. Ante este
questionamento, reflita sobre as maneiras individuais na qual
você, enquanto indivíduo, desempenha para com o meio. Para
auxiliar a reflexão é indicada a leitura do artigo “Ser Humano e
os Problemas Ambientais”, disponível em <http://www.revistaea.
org/artigo.php?idartigo=1296> - acesso em 22. ago. 2015.

1.2.2 O Bioma

Podemos definir este conceito através dos critérios apresentados pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em seu respectivo domínio, destacando o
seguinte segmento:

Conjunto de vida (vegetal e animal) definido pelo agrupamento


de tipos de vegetação contíguos e identificáveis em escala
regional, com condições geoclimáticas similares e histórias
compartilhadas de mudança, resultando em uma diversidade
biológica pronta (IBGE, 2004).

Sendo assim, o Bioma em sua definição é dado como uma associação dos seres
vivos e características naturais referenciadas em uma escala geográfica de similaridade
que abrange uma determinada diversidade biológica de acordo com a atuação
dinâmica dos fatores limitantes para a distribuição de espécies em determinada região.

Neste sentido, podemos então observar a presença de biomas similares em nosso


planeta, todavia, as características dos fatores limitantes atuam como um elemento
crucial para a presença e distribuição geográfica de determinados seres vivos, como
os biomas polares e de tundra possuem características similares no que diz respeito
à atuação do clima e vegetação, mas as distribuições das espécies estão ligadas a
outros fatores limitantes, fazendo com que seres vivos, como os ursos polares (Ursus
maritimus), sejam animais respectivos do Polo Norte, enquanto os pinguins (Família
Spheniscidae) sejam respectivos do Polo Sul, apesar de compartilharem características
similares em seus respectivos biomas.

Logo, a caracterização dos biomas advém dos elementos similares que os


compõem, frisando assim que em sua definição deve-se primeiramente pensar no

180 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

contexto espacial e geográfico que proporciona o seu desenvolvimento, ressaltando


que a diversidade biológica dos seres vivos nos biomas está relacionada a elementos
externos de desenvolvimento e distribuição biogeográfica das espécies.

1.2.3 O Ecossistema

Como frisado anteriormente, definimos o conceito de ecologia pautado nos


apontamentos de Odum (1985), tais formulações acerca do conceito de ecologia são
fundamentais para associarmos os elementos que definem os Ecossistemas.

Se buscarmos uma definição concisa sobre o conceito de ecossistema,


comumente iremos nos deparar com apontamentos similares aos do IBGE (2004),
definindo o ecossistema como um “Sistema Integrado e autofuncionante que consiste
em interações dos elementos bióticos e abióticos e cujas dimensões podem variar
consideravelmente” (IBGE, 2004).

Todavia, com o escopo de definirmos o conceito a partir de uma ótica que elenque
os elementos que o formulam, é válido ressaltarmos os apontamento de Pierre George
(1974) salientados por AB’Saber (2009) em:

O ecossistema é uma unidade estrutural da biosfera. Ele é


constituído por uma parte do espaço emerso ou aquático,
o qual apresenta um caráter homogêneo, do ponto de vista
topográfico, microclimático, botânico, zoológico, hidrológico
e geológico. O sentido de um ecossistema decorre de uma
série de ciclos, o energético como o da luz solar, da água, ciclo
dos componentes múltiplos, ciclo do ozônio e do carbono.
A hierarquização dos seres viventes se dá em função de seu
tipo de alimentação, formando a chamada cadeia trófica ou
alimentar (GEORGE, 1974 apud AB’SABER, 2009, p.22).

Ambos os apontamentos nos demonstram uma concepção geral e específica dos


elementos que designam um ecossistema como um critério intimamente vinculado
com a interação dos seres vivos para com o ambiente. Ou seja, pode-se definir
ecossistema como um conjunto das expressões destas interações entre os elementos
bióticos e abióticos em uma porção do espaço no ambiente.

A correlação dos elementos e a ideia da distribuição espacial do ecossistema


enquanto conceito faz com que este seja usualmente confundido com os elementos
conceituais de definição do Bioma. Para que possamos ir na contramão deste erro
comum, devemos conceber a distinção da escala e as proporções geográficas que

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 181


U4

definem um Bioma e um Ecossistema.

Tal qual nos fomenta Viadana (1985), os biomas possuem uma grande escala
espacial e até mesmo uma distribuição geográfica dada pela generalização de
características bióticas e abióticas em determinadas regiões, salientando assim a
escala regional como atributo geográfico para a delimitação de um Bioma. Já os
ecossistemas não se atêm a este atributo de escalas, podendo assim se expressar sob
diferentes proporções espaciais.

Por definição, os ecossistemas têm como resolução a interação entre organismos


em uma respectiva dimensão espacial. Ante este contexto pode-se entender o Bioma
como um conjunto de ecossistemas em diferentes proporções, sendo assim a
distinção entre Bioma e ecossistema em um estado de clímax ecológico, onde há
uma estabilidade nas relações e interações dos organismos bióticos e abióticos no
sistema (AB’SABER, 2009).

1.2.4 A Biocenose

O emprego do termo Biocenose é comumente utilizado para enfatizar a dinâmica


de um ecossistema, ou, muitas vezes, é ressaltado como um segmento mais complexo
aplicado como sinônimo de ecossistema. Entretanto, a Biocenose se diferencia dos
conceitos que definem o ecossistema por se pautar como a interação de organismos
de diferentes espécies em determinado espaço, tal qual nos sugerem Viadana (1985)
e Troppmair (2004).

Além das definições propostas acerca das dinâmicas que instituem a Biocenose,
para distinguirmos este conceito do ecossistema e o destacarmos enquanto um
importante elemento nos estudos biogeográficos, devemos conhecer primeiramente
a amplitude da Biocenose em sua terminologia.

Se, por um lado, as definições apresentadas sobre Biocenose e Ecossistema


apresentem certa similaridade quando analisamos o destaque dado pela “interação
entre os organismos”, entretanto, um critério importante e fundamental da Biocenose
é a sua estruturação pelo Biótopo.

Por definição, o Biótopo se refere a “[...] uma área geográfica de superfície e volume
variáveis, submetida a condições cujas dominantes são homogêneas" (PERES, 1968,
p. 42). Nesta perspectiva, encaramos o Biótopo como o ambiente físico, detentor das
características abióticas fundamentais para a interação dos seres vivos vinculados ao
conceito e definição de Biocenose.

A relevância do conceito de Biótopo para a Biocenose é o critério fundamental


que a distingue do conceito de ecossistema (VIADANA, 1985). Por esta afirmação,
podemos salientar que o estudo do espaço geográfico em suas características

182 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

determina a Biocenose, que, quando associada ao Biótopo e sua dinâmica geográfica


e espacial, pode ser interpretada como Geobiocenose (TROPPMAIR, 2004).

Ante esta dinâmica espacial, a Geobiocenose pode ser correlacionada da


seguinte maneira: “Geobiocenose é o ecossistema do ecólogo e biólogo, mas numa
perspectiva horizontal, onde seu foco é a distribuição e a dinâmica da organização
espacial abrangendo os elementos bióticos e abióticos” (TROPPMAIR, 2004, p. 5).

Se partirmos de uma análise integrada diante a todos os conceitos que discorremos


até o presente momento, podemos realizar uma classificação dos conceitos para
entendermos como estes interagem entre si. A Biocenose, por definição, atribui as
características e a diversidade dos organismos vivos tal qual indicam os parâmetros
da Biodiversidade. Neste segmento, a Biocenose se destaca por abranger o
espaço geográfico no qual os seres vivos realizarão suas interações, designando-o
como Biótopo. O Ecossistema é desenvolvido, então, por meio das relações da
Geobiocenose entre os organismos vivos (bióticos) e os físicos (abióticos). Os Biomas,
como já compreendemos anteriormente, podem ser compreendidos enquanto uma
associação de Ecossistemas em um clímax (estabilidade) ecológico.

Logo, podemos compreender que estes conceitos apresentados são distintos em


suas essência e funcionalidade, porém são complementares no que diz respeito a uma
hierarquização dos conceitos. Sendo assim, podemos compreender de maneira direta
que a Biodiversidade é o elemento fundamental para qualquer nível de classificação de
estudo (táxon) na Biogeografia, elencando assim a necessidade de compreendermos
e distinguirmos cada um de seus elementos, para que no fim possamos contemplar e
buscar novos meios de assimilar a complexidade ambiental.

1.3 O meio ambiente na perspectiva pública e organizacional

Se realizarmos um breve levantamento histórico da tomada da perspectiva da


Biodiversidade nos últimos séculos, teremos acesso a informações primordiais que
indicam uma preocupação do ser humano para com os impactos que ocasionam a
redução progressiva da Biodiversidade no planeta. Neste segmento, então, buscamos
avaliar a perspectiva pública sobre o Meio Ambiente e a Biodiversidade por meio da
análise do histórico, os principais marcos globais que fomentaram a organização e o
manejo das políticas que conhecemos hoje.

Podemos assegurar que a preocupação com a Biodiversidade no que circunda


os elementos ambientais surgiu paralelamente com as concepções e sistemas
políticos e organizacionais do Ambientalismo. Como marco histórico para as
tomadas e discussões acerca desta problemática, tiveram início na década de 1960
importantes eventos com a participação de diversas nações que se uniram no intuito

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 183


U4

de problematizar acerca da perspectiva ambiental, estabelecendo critérios e bases


metodológicas para mitigar os impactos e tornar mais harmônica a relação entre
sociedade e natureza.

Tais eventos podem ser retratados através da Conferência Intergovernamental


de Especialistas sobre as Bases Científicas para Uso e Conservação Racionais dos
Recursos da Biosfera, também conhecida por Conferência de Paris (1968) e da
Conferência de Estocolmo (1972), onde firmou-se a necessidade de repensar a
relação entre a sociedade e o ambiente em escala mundial, instituindo um novo
patamar das relações ambientais e reforçando a amplitude do conceito e terminologia
de Biodiversidade para com o ambiente (RIBEIRO, 2001).

Ambas as conferências podem ser destacadas como eventos fundamentais para


a amplitude dos estudos e a própria gestão da Biodiversidade e do ambiente que nós
conhecemos atualmente. Podemos, também, elencar a relevância da Conferência
de Estocolmo, estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) como
um primeiro momento em que se confrontou a perspectiva de desenvolvimento
econômico e degradação do meio ambiente, tendo como parâmetro de observação
os países do Hemisfério Norte e do Hemisfério Sul.

Apesar de tanto a Conferência de Paris quanto a de Estocolmo serem destacadas


como as bases do Ambientalismo, sabe-se que a preocupação da degradação do
meio por causas antrópicas advém desde a Antiguidade, quando o ser humano
deixou de ser nômade e passou a ter de gerir os recursos ambientais ao seu entorno.
Todavia, por meio destas conferências difundiram-se as concepções acerca desta
acuidade e necessidade de proteção e conservação do ambiente, garantindo assim
futuras convenções e encontros com o intuito de avaliar ou realizar propostas de
cunho preservacionista.

Devemos, também, nos atentar às decorrências destas conferências, como a


criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) em 1972,
cujo objetivo era o de coordenar e orientar as ações internacionais acerca do meio
ambiente, visando ao desenvolvimento sustentável dos países. Outro evento de
grande importância histórica foi a Rio-92 ou ECO-92, em 1992. A escolha do Brasil
como país-sede da conferência foi oriunda de uma crescente preocupação com a
perda da Biodiversidade do país, sobretudo do Bioma amazônico. O objetivo central
desta conferência foi o de reunir os representantes de diversos países e discorrer
sobre propostas e modelos que buscassem uma diminuição no ritmo antrópico de
degradação ambiental.

A Conferência Rio-92 teve como principais resultados a formulação de modelos


e convenções práticas e conceituais acerca de parâmetros ambientais de análise
fundamentais, como os princípios sobre florestas, declaração de ambiente e
desenvolvimento, as mudanças climáticas e os três principais documentos: a Agenda

184 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

21, a Convenção da Biodiversidade (CDB) e, posteriormente, a Carta da Terra. Com


o intuito de explicitar a importância destes três documentos no direcionamento de
nossos estudos, cabe aqui uma breve apresentação do conteúdo de cada um destes
documentos.

A Agenda 21, por definição, pode ser designada pelos seguintes termos: “[...] um
instrumento de planejamento para a construção de sociedades sustentáveis, em
diferentes bases geográficas, que concilia métodos de proteção ambiental, justiça
social e eficiência econômica” (BRASIL, 1993).

Este documento contou com a assinatura dos representantes de 179 países, onde
fora estipulado o compromisso político para com o desenvolvimento, conservação e
manejo ambiental. Logo a partir deste documento surgiu ou tornou-se mais rigorosa
a legislação no que circunda a perspectiva pública e organizacional sobre o meio
ambiente.

A Carta da Terra corresponde a uma declaração que exalta os princípios do


desenvolvimento sustentável, se atendo a uma conjectura que contemple uma
relação harmônica entre os segmentos social, ambiental e econômico. Este
documento expressa de forma textual todo o diálogo intercultural acerca da
problemática ambiental proporcionado pela Organização das Nações Unidas (ONU)
e debatida desde a Conferência de Estocolmo (1972).

O documento trata substancialmente de princípios éticos e a Conferência Rio-92


(1992), inerentes da realidade ambiental, como o respeito e preservação de todas
as formas de vida no planeta, a integridade ecológica, a vigência da democracia e
a justiça no que circunda os parâmetros sociais e econômicos. A amplitude deste
documento se estende devido à sua representatividade para o Ambientalismo e a
formulação de uma consciência ambiental das nações envolvidas.

No que diz respeito à Conservação da Biodiversidade (CDB), a representatividade


deste documento se expressa pelo agrupamento de normas e princípios gerais
que buscam a preservação e a manutenção de toda a diversidade biológica das
respectivas nações que assinaram o tratado. Tais normas têm como principais
atributos a conservação da Biodiversidade e, consequentemente, de ecossistemas,
induzindo arbitrariamente as nações signatárias a desenvolverem políticas públicas
e organizacionais para alcançar a real amplitude das normas propostas pela CDB.

Dentre estas normas, podemos desde já salientar que os fundamentos de


conservação e manejo de ecossistemas oriundos da atuação das unidades de
conservação somente foram estruturados através das normas propostas pela CDB,
fazendo com que possamos atribuir uma grande importância ao documento em sua
norma e em sua forma no que circunda a prática, bem como a real amplitude da
conservação da Biodiversidade.

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 185


U4

Sendo assim, a Conferência Rio-92 possui um grande destaque dentre os


parâmetros ambientais atuais em nosso planeta, por propor melhorias e normas
a serem cumpridas a diversas nações com o intuito de exaltar toda a dinâmica do
desenvolvimento sustentável e buscar meios de instituir critérios para a conservação
do meio ambiente.

Desde então aconteceram outros encontros dirigidos pela ONU com o intuito
de debater e verificar os parâmetros sugeridos pelas conferências anteriores, bem
como a discussão e formulação de propostas, como o Protocolo de Kyoto proposto
em 1997, entrando em vigor em 2005, o qual tinha como proposta a redução da
emissão de gases poluentes na atmosfera mediante o cumprimento de determinados
países em delegar meios e técnicas para esta redução.

Em 2012, fora realizada uma nova conferência, intitulada Rio+20, cujo escopo era
discorrer acerca das tomadas de decisões, normas e medidas tomadas nos últimos
anos ante o ritmo ambiental proposto na Conferência de 1992, assim como renovar
as propostas e os cumprimentos ambientais entre as nações participantes.

Nesta conferência contou-se com a presença de representantes de 193 países,


incluindo mais 14 nações que se comprometeram a adotar os modelos propostos
pela Conferência Rio-92 e renovados durante a Rio+20. A relevância desta
conferência para no âmbito ambiental, apresentou-se pela inserção de novos países
em prol da preservação do meio ambiente, bem como a renovação e continuidade
das práticas conservacionistas adotadas desde os anos 90.

A apresentação do histórico e da trajetória político-organizacional ambiental se faz


necessária para compreendermos o desenvolvimento da acuidade proposta e tomada
para a preservação do ambiente em diferentes esferas. Neste contexto, podemos
conceber que a preocupação com o meio ambiente advém de uma acuidade
dos conceitos tratados anteriormente, mas, substancialmente, a conservação e
preservação da Biodiversidade e dos Ecossistemas se fazem necessárias e permeiam
toda a concepção de qualquer política pública organizacional que tenha o ambiente
enquanto cerne das medidas de ações.

Para a Biogeografia, o resultado destas conferências e as normas e os modelos


propostos se expressam de uma maneira extremamente positiva, uma vez que estas
normatizações ambientais propuseram a conservação dos ambientes em diferentes
escalas, proporcionando paralelamente uma acuidade com a Biodiversidade e os
Ecossistemas em diferentes regiões do globo, ampliando assim campos de estudos
para que biogeógrafos possam analisar e compreender certos parâmetros da
dinâmica e complexidade ambiental.

186 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

Nós realizamos um breve levante histórico das principais conferências e


convenções que designaram muitas das normas e modelos de gestão e
conservação ambiental no Brasil e no mundo todo. Porém, a leitura destes
documentos auxilia em uma concepção total da real amplitude almejada
pelo desenvolvimento sustentável. Para compreender um pouco mais
sobre a Agenda 21, Carta da Terra e a Conservação da Biodiversidade,
acesse estes documentos na íntegra dispostos pelo Ministério do
Meio Ambiente em: <http://www.mma.gov.br/responsabilidade-
socioambiental> Acesso em 10. set. 2015.

1.3.1 O Ambientalismo no Brasil

Podemos datar o firmamento do ambientalismo em uma escala global através das


conferências de Paris e Estocolmo realizadas na década de 1970. Um dos principais
expoentes oriundos destes eventos foi a propagação e sensibilização acerca da
acuidade ambiental e a tomada de decisões buscando a conservação e manutenção
de ambientes naturais.

Estas ideias se propagaram para diversos países, inclusive os países emergentes,


categoria na qual o Brasil se encontrava na década de 1970. Para compreendermos
como o Ambientalismo e as correntes de sensibilização e conscientização ambiental
se propagaram em terras tupiniquins, realizaremos um histórico com o escopo de
salientar a amplitude do diálogo ambiental e sua repercussão no país.

Para iniciarmos nossas análises acerca da empreitada ambiental no Brasil, partimos


do primeiro esboço institucional na perspectiva pública, desenvolvido em 1958 através
da criação da Fundação Brasileira para Conservação da Natureza (FBCN), atuando
por muitas décadas como a principal organização não governamental (ONG) do país
responsável por disseminar o discurso acerca da conservação da natureza no Brasil.

O surgimento da FBCN pode ser destacada como um marco para o desenvolvimento


das ideias ambientalistas e conservacionistas no país, uma vez que fomentou um corpo
conceitual e metodológico definido sobre a questão ambiental ainda não difundida no
Brasil.

Todavia, autores como Viola e Leis (1996) ressaltam que a amplitude do diálogo
ambiental só se firmou através das propostas e concepções público-organizacionais
oriundas do Estado e da sociedade civil na década de 1970, como fomentado no
seguinte trecho:

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 187


U4

[...] A rigor, a emergência do ambientalismo no país não


aparece como um fenômeno isolado, ainda que faça parte
de um amplo processo de mudanças políticas, econômicas
e sociais. A profundidade (e até a violência) das mudanças
modernizadoras no Brasil, nos anos 70, ajuda a explicar o
maior espaço de atenção que aqui tiveram as novas questões
ambientais em relação a outros países da América Latina
que permaneciam mais afastados da dinâmica do sistema
internacional e praticamente adormeciam repetindo os
mesmos debates das últimas décadas. Essas circunstâncias
marcam simultaneamente a força e origem do ambientalismo
no Brasil que, promovido por cima e por baixo, se estruturaram
no período formativo como um movimento bissetorial
constituído por associações ambientalistas e agências
estatais de meio ambiente. Esses dois atores terão uma
relação simultânea complementar e contraditória, confluindo
ambos na definição da problemática ambiental recortada
pelo controle da poluição urbano-industrial e agrária e pela
preservação dos ecossistemas naturais (VIOLA; LEIS, 1996, p.
96-97, grifo nosso).

Neste sentido, estruturou-se um movimento ambientalista pautado em um


movimento bissetorial no qual se busca um controle da poluição e a preservação
de ecossistemas. A expressão desta corrente ideológica nos remete às associações
ambientais, como a AGAPAN (Associação Gaúcha de Proteção ao Meio Ambiente
Natural), a APPN (Associação Paulista de Proteção à Natureza), dentre outras
associações do gênero.

A importância desta difusão ideológica ambiental da década de 1970 foi de


extrema valia, uma vez que o Brasil, no mesmo período histórico, se encontrava em
um processo intenso e expansivo de desenvolvimento econômico e urbano. Tais
processos ocasionaram a degradação em grande escala do ambiente, que poderiam
ser ainda mais impactantes caso as concepções ideológicas do ambientalismo não
estivessem em expansão no país.

Podemos destacar um dos exemplos deste processo de expansão, visando


ao desenvolvimento econômico na década de 1970, como a instauração da
agroindústria, em continuidade da Revolução Verde brasileira. Com a extensão da
agroindústria, houve um êxodo rural no qual grande parte da população brasileira foi
induzida a habitar centros urbanos em decorrência da mecanização da produção
rural. Em paralelo, esta década marca o aumento do uso dos inseticidas, biocidas,
a devastação de áreas verdes voltadas para o cultivo de commodities agrícolas em

188 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

sistema de latifúndios.

Mesmo com as ideias ambientalistas em franca expansão, a década de 1970 foi


marcada como um período de forte degradação ambiental no Brasil em prol do
desenvolvimento econômico, tal qual salientado em:

Essa imensa degradação ambiental e pauperização social


estavam, no entanto, recobertas pela ideologia do chamado
“milagre econômico”, expressa inclusive na Conferência de
Estocolmo (1972), onde a posição do governo brasileiro era
de atrair as indústrias dos países mais industrializados, mesmo
à custa da degradação ambiental (DIEGUES, 1994, p.114).

Este cenário de degradação ambiental do país foi um dos principais agentes


catalisadores que encaminharam a elaboração do Manifesto Ecológico Brasileiro: o
Fim do Futuro, no ano de 1976. O escopo deste manifesto buscou um levantamento
analítico das experiências norte-americanas e europeias ante a relação do
desenvolvimento econômico e a decorrente degradação ambiental, como um
ensaio comparativo com o expoente cenário brasileiro. Em paralelo, este manifesto
teve como principal proposta a fundamentação de uma ética que contemple o meio
natural de modo que a sociedade não crie meios de sobreposição e degradação do
ambiente.

Este documento foi de extrema valia para o ambientalismo brasileiro e os indícios


de modelos conservacionistas que compõem nossos sistemas de conservação
atuais. Outro critério fundamental oriundo dos apontamentos presentes no Manifesto
Ecológico Brasileiro era o contexto social atrelado ao desenvolvimento econômico,
impactando diretamente na sociedade, e a contínua degradação da biodiversidade e
dos ambientes naturais no decorrer das décadas futuras.

Na década de 1980, houve uma expansão da ideologia do ambientalismo,


atingindo as camadas da sociedade e os órgãos públicos governamentais. Na
primeira metade desta década (1980–1985), a problemática ambiental era vista pelo
Estado brasileiro no segmento do movimento bissetorial e, consequentemente, nos
sistemas de ações buscou-se o controle dos agentes poluidores e o zoneamento de
ambientes de preservação da Biodiversidade e de ecossistemas.

No período que compreende a segunda metade da década (1985–1989), as


relações políticos-organizacionais tornaram-se mais complexas, uma vez que houve
uma unificação no campo de ações entre as agências estatais de meio ambiente para
com o órgão federal, fazendo com que as medidas ambientais tomem um sentido
organizacional para a efetividade de meios, modelos e propostas para preservação e

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 189


U4

conservação do ambiente (DIEGUES, 1994).

Ante esta complexidade, Viola e Leis (1996) fazem apontamento que nos
ajuda a esclarecer estas relações político-organizacionais nas tomadas do Estado,
formulando assim um movimento multissetorial:

[...] As políticas públicas estão a meio caminho entre


um discurso-legislação bastante ambientalizado e um
comportamento individual-social bastante predatório.
Se, por um lado, as políticas públicas contribuem para o
estabelecimento de um sistema de proteção ambiental no país,
por outro lado, o poder público é incapaz de fazer cumprir,
tanto aos indivíduos quanto às empresas, uma proporção
importante da legislação ambiental (VIOLA; LEIS, 1996, p. 110).

Diante dessa problemática, devemos destacar que o Estado desenvolveu em


1989 um artifício responsável pelo cumprimento da legislação ambiental no país,
fundando assim o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (IBAMA).

Dentre as deliberações do IBAMA, visa-se ao cumprimento da Política Nacional


do Meio Ambiente, instituído pela Lei nº 6.938/1981. Um dos principais segmentos
do IBAMA enquanto órgão federal se baseia no segundo artigo (art. 2º) do mesmo
decreto legislativo, firmando que:

[...] A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a


preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental
propícia à vida, visando assegurar, no país, condições
ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da
segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana
(BRASIL, 1981).

Neste sentido, o IBAMA atua nos critérios de manutenção, funcionamento


e fiscalização das leis ambientais em território nacional com a finalidade de fazer
cumprir os sistemas de proteção e conservação da Biodiversidade e do meio
ambiente nas esferas político-organizacionais.

Logo, podemos afirmar que, na década de 1980, os parâmetros normativos e


legislativos acerca do ambientalismo e da acuidade ambiental tomaram um grande

190 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

passo para a amplitude dos meios de conservação e preservação da Biodiversidade


e dos ecossistemas através de meios políticos e organizacionais.

A década de 1990 foi marcada por elementos fundamentais para toda a esfera
ambiental no Brasil. O perfil das políticas organizacionais do meio ambiente nesta
década mantinha os movimentos multissetoriais no que circunda unir diversas
esferas em torno de uma mesma causa, a acuidade ambiental.

O histórico brasileiro ante as políticas e meios de gestão ambiental sofreu um


pareamento ideológico e legislativo com diversos outros países, com a inserção do
Brasil enquanto nação com voz ativa nas conferências ambientais globais realizadas
pela Organização das Nações Unidas (ONU), tendo como exemplo a supracitada
Conferência Rio-92.

Devemos destacar a inferência dos elementos multissetoriais de gestão como


critérios fundamentais para a concepção de Desenvolvimento Sustentável que se
firmou após a Conferência de 1992. O reflexo do desenvolvimento sustentável
fomentou a política de diversos países, incluindo o Brasil, em proporcionar meios
de conciliar o crescimento econômico, a justiça social e a qualidade e preservação
dos ambientes naturais, fazendo com que todas as esferas sejam contempladas
mutuamente, sem a sobreposição sobre os outros segmentos (Figura 4.1).

Figura 4.1 | Interação esquemática das esferas do desenvolvimento sustentável

Sociedade

2 3
4

Economia 1 Ambiente

Legenda
1- Relação Justa na ótica Ambiental
2- Relação Viável no ambito Socioeconômico
3- Relação Suportável sob a ótica Sócioambiental
4- Interação Estável e Equalitária entre todos os elementos

Fonte: Oliveira (2015)

Se traçarmos um paralelo entre o histórico do ambientalismo e das concepções


de preservação da Biodiversidade e dos Ecossistemas, podemos compreender que
desde o final do século XX até as primeiras décadas que se remetem ao presente
no século XXI, alçamos um grande passo nas políticas de preservação ambiental,
mas, além disto, construímos meios de sensibilização e conscientização ambiental
fundamentais para uma melhor harmonia entre sociedade e ambiente, cuja tendência

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 191


U4

é desenvolver-se de uma maneira progressiva e exponencial tanto no Brasil quanto


em nível global.

Realizamos um histórico do ambientalismo diante da perspectiva política


e organizacional do Brasil no que tange à preservação e conservação
do meio ambiente. É claro que as definições e o contexto evolutivo
das matrizes legislativas se encontram em contínua modificação
diante das necessidades econômicas, sociais e ambientais do país. Para
compreender um pouco mais sobre o histórico e os passos legislativos
do cenário ambiental brasileiro, acesse o portal do Ministério do Meio
Ambiente, disponível em: <http://www.mma.gov.br/programas-mma>
acessado em 20 de set. de 2015.

1. A Biodiversidade se apresenta de forma complexa desde sua


norma à forma. A atuação e especificação dos fundamentos que
envolvem esta dinâmica são estudadas por diversas ciências,
inclusive pela Biogeografia, que detém elementos e critérios
teóricos que nos auxiliam a compreender as especificidades de
cada campo de estudo na perspectiva organizacional. Diante
destas condições, associe os conceitos de cada segmento ao
campo de estudo específico e a seguir assinale a alternativa
correspondente a estes.
I - Biodiversidade
II - Biocenose
III - Ecossistema
IV – Bioma

( ) Compete à variabilidade de organismos vivos em todas as


formas expressas pela diversidade biológica entre os seres que
compõem o ambiente.
( ) Conjunto de seres vivos (vegetal e animal) agrupados em um

192 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

ambiente contíguo e identificado em escala regional quando


associado a condições compartilhadas.
( ) Unidade estrutural da Biosfera que detém como
característica a interação entre os seres vivos, onde é possível
desenvolver uma hierarquização entre os seres no ambiente.
( ) Relação entre as condições físicas e geográficas do
ambiente designada como Biótopo, com os organismos
vivos em suas interações ecológicas.

a) I – IV – III – II.
b) I – III – IV – II.
c) II – IV – III – I.
d) II – III – I – IV.
e) III – IV – I – II.

2. Acerca dos saberes construídos ante o meio ambiente e a


perspectiva público-organizacional, apresenta-se uma série
de marcos e concepções formuladas pelo Estado e órgãos
civis que estimularam o amadurecimento das ideologias e
características de manutenção do meio natural nos moldes
gerais. Neste sentido, analise as concepções apresentadas
e identifique-as entre verdadeiro (V) e falso (F) e a seguir
assinale a alternativa correspondente ao arranjo estipulado.

( ) A Conservação da Biodiversidade (CDB) foi um documento


elaborado em decorrência da Conferência Rio-92, que
expressa o agrupamento de normas e princípios gerais que
buscam a preservação e manutenção de toda diversidade
biológica.

( ) O Manifesto Ecológico Brasileiro foi um documento


desenvolvido em concordância das nações presentes na
Conferência Rio+20 e seu conteúdo tem como escopo a
fundamentação de uma ideologia ética que contemple o
meio natural de modo que a sociedade não crie meios de

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 193


U4

sobreposição e degradação do meio ambiente.

( ) O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos


Naturais (IBAMA) é um órgão federal criado em 1989 que
busca o cumprimento da legislação ambiental no país com
o escopo de estimular e fiscalizar a preservação, melhoria e
recuperação da qualidade ambiental propícia à vida.

( ) Pode-se dizer que a concepção de Desenvolvimento


Sustentável busca proporcionar meios de conciliar o
crescimento econômico, a justiça social e a qualidade e
preservação ambiental, sendo estes conceitos estipulados
pela Conferência de Estocolmo em 1972.

( ) É possível afirmar que a preocupação com a Biodiversidade


no que circunda os elementos ambientais surgiu
paralelamente com as concepções e sistemas políticos e
organizacionais do Ambientalismo.

a) V – V – F – F – V.
b) F – F – V – V – F.
c) V – F – F – V – F.
d) F – V – V – F – F.
e) V – F – V – F – V.

194 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

Seção 2

A conservação e o manejo de ecossistemas


Como fomentado na seção anterior, o diálogo e a ideologia do Ambientalismo
dirigiram o desenvolvimento de conceitos essenciais para ações legislativas e práticas
que detenham como centralidade os elementos de preservação e conservação do
meio ambiente em diversas escalas de atuação. Não obstante, as concepções de
preservação e conservação ambiental permeiam toda a dinâmica na relação entre
a sociedade e o meio natural, sendo assim consideradas como um dos principais
objetos de estudo que analisaremos no decorrer desta seção.

Por um viés teórico-conceitual, buscaremos desenvolver um direcionamento


biogeográfico acerca destes conceitos no que tange à esfera teórica dos nossos
estudos. No campo de ações práticas e normativas, realizaremos um desenvolvimento
analítico que nos permitirá compreender as concepções que cercam os termos
de manejo de ecossistemas sob a ótica da Biogeografia aplicada para evidenciar a
amplitude entre as potencialidades e fragilidades sobrepostas ao modelo de unidades
de conservação no Brasil.

2.1 Conservação e preservação


Em grande parte dos estudos direcionados às Ciências Ambientais, comumente
nos deparamos com os conceitos de preservação e conservação ambiental como
critérios essenciais para uma relação harmônica entre a sociedade e a natureza. Mas,
o que deve ser preservado e o que deve ser conservado? Para podermos responder
a esta pergunta, devemos sumariamente compreender a aplicação conceitual e
prática destes termos.

No aspecto prático e funcional, estes termos apresentam arrolamentos distintos


no que circunda as relações conceituais diante da dinâmica sociedade e natureza. Os
termos Conservação e Preservação são comumente empregados como sinônimo,
uma vez que o objeto de estudo, o meio ambiente, é o mesmo em ambos os casos.
Neste sentido, devemos primariamente compreender a distinção destes conceitos e
a amplitude no campo de ação sob a perspectiva da Biogeografia.

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 195


U4

2.1.1 Conservação

Se nos atermos ao conceito de Conservação Ambiental em sua essência, podemos


conceber este conceito pelos apontamentos de Art (2001, p. 122), afirmando que
a conservação designa “[...] a administração dos recursos naturais para fornecer
o benefício máximo por um período de tempo estável”. Ou seja, a conservação
se designa pela administração e o manejo dos recursos e dos ambientes naturais
de modo que os parâmetros que envolvem as concepções de desenvolvimento
sustentável sejam ressaltados.

Ante a mesma perspectiva acerca do conceito de Conservação Ambiental, Guerra


et al. (2009, p.100) destacam que a Conservação Ambiental se dá pelo uso dos
recursos naturais de forma que vise manter a qualidade e acuidade ambiental sob o
aspecto de um Equilíbrio Dinâmico, no qual as alterações ocasionadas no ambiente
não modifiquem a estrutura funcional da Biodiversidade e dos Ecossistemas,
incluindo os fluxos de matéria e energia presentes em um sistema ambiental.

Tais apontamentos possibilitam a compreensão da perspectiva geral da


Conservação ambiental, uma vez que a ideia central se determina pelo manejo
ambiental, proporcionando meios que estimulem a renovação e a autorregulação
dos ambientes naturais. É importante ressaltar que a ideologia que permeia este
conceito se atém aos critérios fundamentados do Desenvolvimento Sustentável,
onde é possível atender as necessidades da população (antrópica) atual e das
gerações futuras.

Logo, a Conservação Ambiental, em seu conceito, nos expõe a uma postura


ambientalista com base antropocentrista, uma vez que se empenha em desenvolver
meios práticos e jurídicos que possibilitem a conservação de Ecossistemas
degenerados ou ameaçados pelas práticas humanas de exploração ou expansão
inadequadas.

No Brasil, a principal expressão prática e funcional dos parâmetros


conservacionistas se dá pela instituição das Unidades de Conservação, onde se
busca desenvolver elementos de atuação que possibilitem tanto o manejo natural
da Biodiversidade e do Ecossistema como propiciem uma melhor qualidade de
vida para a sociedade que é inerente a esta relação, fomentando assim o que se
definiu anteriormente por Equilíbrio Dinâmico.

2.1.2 Preservação

A Preservação Ambiental, no entanto, difere em níveis conceituais e práticos da


Conservação Ambiental no que tange à relação entre sociedade e ambiente. As ideias
que permeiam o conceito de Preservação salientam que se baseia na manutenção

196 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

dos fluxos ambientais sem que haja qualquer intervenção voltada para o benefício
ou exploração pela sociedade. “Essa preservação radical, algumas vezes chamada de
preservação ética, é um conceito quase exclusivamente americano, seus defensores
são chamados de preservacionistas” (ART, 200, p.122).

Sobre este “radicalismo” detemos um principal elemento que difere a Preservação


da Conservação, a ideologia do intocável. Mas no contexto prático-funcional a
Preservação se baseia em um conjunto de normas e metodologias que detém como
escopo a proteção de ambientes naturais, sua Biodiversidade e seu ecossistema,
assegurando à área uma proteção integral diante dos elementos externos que
possam fragilizar a dinâmica ambiental.

Esta prática ambiental visa à proteção integral de ambientes naturais de modo


que este possa impactar em efeitos benéficos tanto para o ambiente quanto para
a sociedade, como a disponibilização de oxigênio na atmosfera e a regulação do
clima oriundo da evapotranspiração destes ambientes.

As medidas preservacionistas são adotadas quando o ambiente apresenta um


alto grau de fragilidade. Isto pode ocorrer pela ação antrópica, se expressando em
diferentes formas, como os desmatamentos, atividades com fins exploratórios ou
mesmo a inserção de culturas e espécies invasoras não pertencentes à dinâmica
natural de determinado ambiente que ocasionam relações desarmônicas para
com as espécies pertencentes. Nestes casos aplicam-se medidas preservacionistas
buscando a recuperação e a autorregulação do ambiente, de modo que este possa
se restaurar através dos critérios de resiliência ambiental.

No Brasil, pode-se afirmar que a expressão máxima das medidas preservacionistas


se dá pela delimitação das Áreas de Preservação Permanente (APP). Por definição,
estas áreas são designadas como:

As Áreas de Preservação Permanente foram instituídas pelo


Código Florestal (Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012) e
consistem em espaços territoriais legalmente protegidos,
ambientalmente frágeis e vulneráveis, podendo ser públicas
ou privadas, urbanas ou rurais, cobertas ou não por vegetação
nativa (BRASIL, 2013).

Esta medida político-administrativa para o manejo do ecossistema é amplamente


adotada no Brasil, tendo como principal objetivo a preservação integral do ambiente.
O Código Florestal é o artifício jurídico que delimita a instituição destas áreas e a
fiscalização compete a diferentes órgãos deliberativos municipais, estaduais e
federais, tendo como representante principal o IBAMA.

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 197


U4

Podemos concluir, então, que a diferenciação entre os conceitos de Conservação


e Preservação ambiental é bem delimitada, ainda que muitas vezes possam
ser considerados sinônimos, uma vez que o objeto de estudo e o escopo são o
mesmo, a acuidade ambiental. Entretanto, a diferenciação destes conceitos se dá
essencialmente pela condição ambiental em que a área designada se encontra, sendo
assim responsabilidade dos órgãos públicos político-administrativos a delimitação
das áreas, a fiscalização e o monitoramento com o intuito de fazer vigentes tais
conceitos acerca do manejo de Ecossistemas e da Biodiversidade, almejando assim
uma melhor acuidade ambiental.

Compreendemos a dinâmica conceitual que permeia os


critérios de Preservação e Conservação ambiental de sua
norma à forma. Mas, como nós, enquanto sociedade,
podemos encarar e compreender este conceito em seu
aspecto ambiental e econômico, uma vez que o ser humano
é considerado um dos principais agentes que estimulam a
prosperidade e a fragilidade do ambiente e seus recursos
naturais? Diante da relação dos recursos naturais que são
essenciais para a vida humana e a atuação prática dos critérios
de preservação e conservação, leia a matéria disponível em:
<http://www.mma.gov.br/index.php/comunicacao/agencia-
informma?view=blog&id=768> (Acesso em 24 set. 2015) e
reflita sobre a amplitude no campo de ação destes conceitos.

2.2 A biogeografia: preservação, conservação e manejo ambiental

Diante da apresentação dos conceitos e definições de Preservação e Conservação


ambiental, devemos pensar como a Biogeografia interpreta essas medidas de
manejo do Ecossistema e da Biodiversidade sob a perspectiva desta ciência. Apesar
da distinção dos conceitos de Preservação e Conservação, há uma convergência no
objeto de estudo e no campo de ação, onde ambas as práticas buscam uma melhor
acuidade ambiental para o desenvolvimento dos parâmetros que os permeiam.

Todavia, ainda que a delimitação de uma área ou um ambiente geográfico sob


as aplicações destes conceitos possua uma forte propensão ao desenvolvimento
potencial e progressivo dos sistemas e dinâmicas ambientais, a mesma restrição
espacial ocasiona fragilidades aos sistemas naturais, e neste segmento a Biogeografia
auxilia a compreensão do espaço biogeográfico analisando os critérios e elementos

198 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

que permeiam os potenciais e fragilidades destas formas de manejo ambiental.

Para desenvolvermos o entendimento destas dinâmicas e seus resultados,


buscamos realizar uma análise no que tange a uma corrente da Biogeografia
denominada por Biogeografia de Ilhas. Esta corrente nos ambientará diante das
relações funcionais de sistemas ambientais isolados, como é o caso dos fragmentos
de Preservação e Conservação em suas respectivas escalas geográficas.

2.2.1 A Biogeografia de Ilhas

O nome desta corrente da Biogeografia nos incide à impressão de que


compreenderemos a dinâmica biogeográfica de sistemas ambientais isolados,
tendo como a água um dos principais fatores limitantes expressos por uma barreira
geográfica, entretanto não é somente e literalmente a este fator que devemos
interpretar as ilhas. De certa forma, esta impressão que nos é transmitida pela
denominação da corrente de estudo não está errada.

Este segmento da Biogeografia foi cunhado na década de 1960, através dos


estudos dos ecólogos MacArthur e Wilson (1967), com a publicação da obra intitulada
“Teoria da Biogeografia de Ilhas”. A obra apresentou uma concepção teórica e prática
de análises biogeográficas de um ambiente natural insular, neste caso cercado
por água, através de duas diretrizes que auxiliaram o levantamento quantitativo e
qualitativo das dinâmicas naturais analisadas na ilha. As diretrizes fundamentais que
fomentam a aplicação e evidenciam a dinâmica natural da Biogeografia de Ilhas
se baseiam na Dispersão dos Seres Vivos e da Dinâmica Ecológica em Função do
Segmento Espacial.

No que diz respeito à diretriz de Dispersão dos Seres Vivos, para compreendermos
a proposta da teoria, deve-se correlacionar os elementos oriundos da Biogeografia
Histórica e Ecológica para compreender os possíveis fatores que contribuíram para a
disposição das espécies em determinada região, assim como os fatores limitantes que
os restringem a determinado ambiente (MACARTHUR; WILSON, 1976). Um exemplo
prático desta diretriz pode ser apresentado quando se analisam as características
biogeográficas da Ilha da Queimada Grande–SP, anteriormente relatadas na Unidade
2 deste livro.

Já nos parâmetros que permeiam a diretriz da Dinâmica Ecológica em Função


do Segmento Espacial apresentam-se segmentos que detêm como expressão
elementos qualitativos e quantitativos que demonstram as relações da dinâmica
ambiental do recorte geográfico analisado (MACARTHUR; WILSON, 1967). As
definições qualitativas e quantitativas propostas pela Teoria da Biogeografia de
Ilhas baseiam-se nas Taxas de Imigração das Espécies e nas Taxas de Extinção das
Espécies.

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 199


U4

Para compreender as Taxas de Imigração das Espécies, os ecólogos propuseram


uma expressão matemática que apresenta como coeficiente a distância do local de
origem (d), a população analisada no ambiente (P), o total de espécies no segmento
espacial analisado (R) e a variação populacional entre comunidades (k). Tal expressão
auxilia uma interpretação quantitativa das taxas de imigração de determinada espécie
em comparativo com outras em um mesmo ambiente, sendo estas representadas
pela seguinte fórmula:

Figura 4.2 | Formulário de taxas de imigração das espécies

Fonte: Adaptado de MacArthur e Wilson (1967)

Tal formulação quantitativa permitiu aos autores da teoria correlacionar diversos


fatores analisados no ambiente e exprimi-los nos moldes de dados para realizar
devidas comparações entre espécies em um mesmo recorte geográfico, a ilha, no
caso, e também comparar os dados com outros recortes espaciais, realizando assim
um aparato quantitativo para avaliar as taxas de imigração de espécies.

Em paralelo, as Taxas de Extinção das Espécies detêm a mesma perspectiva


quantitativa, com a qual se busca avaliar proporcionalmente o número de espécies
que estão em estado de extinção no recorte geográfico analisado, tendo como
principais critérios expostos através de coeficientes: o tamanho do recorte espacial
(S), o número de espécies (n) e o número da possível espécie em extinção (m). Estes
elementos são evidenciados através da seguinte formulação:

Figura 4.3 | Formulário das taxas de extinção

Fonte: Adaptado de MacArthur e Wilson (1967)

Diante deste critério, os autores da teoria propuseram uma análise quantitativa que
buscava interpretar uma relação proporcional das possíveis espécies em extinção no

200 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

determinado recorte geográfico em relação às demais espécies, conotando assim


os possíveis elementos que possam justificar a causa das taxas de extinção.

A conclusão dos autores referencia que as taxas de extinção devem ser


consideradas como um dos principais fatores que diferenciam a proporção e os
tipos de espécies entre uma ilha e um continente, salientando que a extinção de
determinado grupo está relacionada com o acréscimo da população de outra espécie
por um processo dinâmico intitulado “Compensação de Densidade” (MACARTHUR;
WILSON, 1967).

Tais estudos foram fundamentais para embasar e explicitar a teoria da Biogeografia


de Ilhas enquanto um forte critério para a análise de ambientes isolados. Todavia,
atualmente, este modelo quantitativo caiu em desuso parcial, uma vez que os
autores da teoria não consideraram explicitamente as relações ecológicas inter e
intraespecífica como um dos fatores de análise. A teoria da Biogeografia de Ilhas foi,
e ainda é, extremamente aplicável no que circunda os segmentos interpretativos das
espécies em ambientes isolados, sobretudo a ilhas, como propriamente sugere o
nome da teoria.

Mas por que esta teoria e corrente científica não restringe seus estudos somente
a ilhas, como mencionado anteriormente? Se analisarmos o cerne deste campo
de pesquisa, busca-se compreender a Biodiversidade e as dinâmicas ecológicas
de fragmentos naturais isolados. No que tange a este objeto de estudo, podemos
associar as áreas de Preservação ou Conservação ambiental enquanto fragmentos
ambientais nestes mesmos parâmetros, interpretando-as enquanto fragmentos ou
remanescentes florestais isolados e sujeitos a uma dinâmica própria, sendo assim
vistos como “ilhas” devido à segregação biogeográfica designada a determinados
recortes geográficos e espaciais. Sob este viés, aplicam-se então os mesmos
parâmetros epistemológicos a ambientes fragmentados, ainda que estes não sejam
estritamente relacionados com o critério de um ambiente cercado de água.

No decorrer das últimas décadas, com a forte difusão da ideologia do


Ambientalismo e dos critérios de Preservação e Conservação ambiental, diante da
progressiva interferência antrópica nos ambientes naturais, os conceitos oriundos da
corrente da Biogeografia de Ilhas auxiliam na análise destes ambientes fragmentados
e das áreas de preservação e conservação, no intuito de avaliar as potencialidades e
fragilidades da fragmentação destes ambientes naturais.

Para compreendermos como a fragmentação e o isolamento dos ambientes


naturais estão intrinsecamente relacionados com os segmentos analíticos da
Biogeografia de Ilhas, devemos nos atentar a determinados segmentos que
atuam como fatores que propiciam ou limitam a dinâmica ecológica e a própria
Biodiversidade nestes ambientes, tal qual ressaltam Viana e Pinheiro (1988) em:

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 201


U4

A fragmentação introduz uma série de novos fatores na


história evolutiva de populações naturais de plantas e animais.
Essas mudanças afetam de forma diferenciada os parâmetros
demográficos de mortalidade e natalidade de diferentes
espécies e, portanto, a estrutura e dinâmica de ecossistemas.
No caso de espécies arbóreas, a alteração na abundância de
polinizadores, dispersores, predadores e patógenos altera as
taxas de recrutamento de plântulas; e os incêndios e mudanças
microclimáticas, que atingem de forma mais intensa as
bordas dos fragmentos, alteram as taxas de mortalidade de
árvores. As evidências científicas sobre esses processos têm se
avolumado nos últimos anos (VIANA; PINHEIRO, p. 26, 1998).

Ante a estes destaque sobre as decorrências das fragmentações, atribuem-se os


parâmetros analíticos da Biogeografia de Ilhas no que tange ao campo de ações
sobre as relações ecológicas nos fragmentos, destacado na citação anterior pelos
parâmetros demográficos, e as taxas de extinção representadas pela relação entre a
natalidade e mortalidade de espécies presentes no fragmento ambiental.

Sobre estes fatores que influenciam na dinâmica dos fragmentos ambientais,


devemos analisar a dinâmica e inferência dos elementos que permeiam os critérios
que servirão como diagnósticos para afirmar a potencialidade ou a fragilidade do
fragmento ambiental, seja ele uma área de Conservação ou Preservação. Neste
sentido, pode-se afirmar que “Os principais fatores que afetam a dinâmica de
fragmentos florestais são: tamanho, forma, grau de isolamento, tipo de vizinhança
e histórico de perturbações” (VIANA; PINHEIRO, 1998, p. 27). Logo, listaremos
brevemente como cada fator pode influenciar na dinâmica ecológica ambiental
sob a perspectiva da Biogeografia de Ilhas enquanto fundamento analítico para o
diagnóstico do manejo ambiental destes fragmentos.

O Tamanho dos Fragmentos diz respeito à extensão territorial do fragmento


ambiental, seja ele relacionado com uma área de Preservação ou Conservação
ambiental. Assim como nos princípios da formulação da teoria da Biogeografia de
Ilhas, este parâmetro tem como fundamento a dimensão geográfica da área de
estudo, onde quanto menor é o fragmento ambiental, mais suscetível este estará a
fragilidades no ecossistema e na perda de Biodiversidade.

Se nos ativermos às bases que trabalham os parâmetros da Biogeografia Histórica


e Ecológica, facilmente podemos compreender a baixa interação da dinâmica
ambiental em um fragmento com uma porção territorial restrita. Uma vez que, para
desenvolver uma complexidade das relações ecológicas inter e intraespecíficas, se

202 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

faz necessária uma vasta diversidade de seres vivos no ambiente, um fragmento


com pouca porção territorial é incapaz de suportar muitas espécies por conta das
relações desarmônicas impostas a estas condições, levando assim à extinção ou ao
fluxo migratório das espécies limitadas a este ambiente.

Um exemplo claro da influência do Tamanho dos Fragmentos pode ser indicado


se pensarmos em um cenário onde há uma área que foi reduzida e, posteriormente,
delimitada como um ambiente de Preservação ou Conservação. As espécies
inseridas neste ambiente limitado são induzidas a uma competição por recursos,
alimentos e até mesmo reprodutivas, levando assim a um cenário que cause uma
seleção das espécies totalmente artificial, induzida pelo novo modelado imposto às
espécies nestes fragmentos ambientais (QUAMMEN, 2008).

Um modo de contornar esta situação para proporcionar o Manejo do


Ecossistema e da Biodiversidade se baseia no planejamento para a delimitação das
áreas de Preservação e Conservação ambiental de modo que seja proposta uma
porção Territorial que detenha como bases a autorregulação e sustentabilidade dos
fragmentos ambientais, sendo assim um plano estritamente vinculado à manutenção
e manejo destes ecossistemas através do planejamento ambiental.

A Forma é um fator que considera o modelado da área do fragmento ambiental


em relação com o seu perímetro. O escopo da análise deste fator é realizar
uma abordagem que busque o entendimento do Efeito de Borda, derivado pela
intervenção antrópica às margens do limite da área do fragmento ambiental. Uma vez
que este efeito condiciona uma maior fragilidade dos seres vivos que se encontram
às margens do fragmento ambiental devido à sua exposição a elementos e fatores
externos (VIANA, 1998). Paralelamente, a forma enquanto fator de análise ambiental
está diretamente relacionada aos mesmos atributos do Tamanho do Fragmento
enquanto fator, que por sua vez influenciam a fragilidade e potencialidades no
fragmento ambiental.

O Grau de Isolamento se baseia em uma análise que condiciona o distanciamento


de um fragmento ambiental dos demais. As medidas de manejo ambientais que visam
à redução do grau de isolamento podem ser aplicadas a áreas de Conservação, mas
substancialmente estão vinculadas com ambientes de Preservação. O Isolamento
dos fragmentos muitas vezes tem como principal fragilidade a indução de relações
desarmônicas no ambiente, criando as adversidades anteriormente relatadas.

Um dos modelos de manejo do ecossistema que visa à redução do Grau de


Isolamento são os Corredores Ecológicos, que buscam, por sua vez, conectar os
fragmentos para evitar uma queda na Biodiversidade e o acréscimo de relações
desarmônicas nos fragmentos. Como efeito, esta metodologia de manejo dos
fragmentos ambientais proporciona a autorregulação dos ambientes e um acréscimo
da Biodiversidade por meio da interação dos fragmentos anteriormente isolados.

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 203


U4

Os Tipos de Vizinhança influem diretamente na dinâmica ambiental dos


fragmentos, por ocasionar Efeitos de Bordas neste. Sendo assim, as atividades
antrópicas ou mesmo as condições ambientais desenvolvidas ao entorno do
fragmento ambiental (ilha) ocasionam a fragilidade do fragmento. Em áreas de
Preservação, a prática aplicada para mitigar os efeitos ocasionados pela vizinha se
baseia em atividades de reflorestamento com a finalidade de proporcionar uma
melhor sustentabilidade no core da área de Preservação. Já no que diz respeito às
áreas de Conservação, além das práticas de reflorestamento, outras metodologias
adotadas têm como escopo o melhor desenvolvimento da área, como no caso do
plantio de Bordadura, o cultivo agroflorestal em vizinhas de produção agropecuária
e o isolamento da área de conservação em meios urbanos com a finalidade de reter
o avanço antrópico sobre o fragmento ambiental.

O fator Histórico de Perturbações diz respeito às dinâmicas externas ao fragmento


ambiental que condicionaram alterações que afetaram diretamente ou indiretamente
nas condições ambientais dos fragmentos. Neste contexto, a intervenção antrópica nos
ambientes naturais se destaca como uma das principais causas que desenvolvem o histórico
de perturbações. Para o manejo deste fator, cabe um levantamento por meio de um
registro histórico que evidencie tais perturbações com a finalidade de criar normas político-
administrativas que busquem a mitigação dos agentes que induzem estas perturbações.

As análises dos fatores mencionados anteriormente são aplicadas para o


desenvolvimento da Biodiversidade e manejo dos ecossistemas em diversas
Unidades de Conservação ambiental no Brasil e em outras nações.

Sendo assim, a corrente teórica e metodológica da Biogeografia de Ilhas busca


compreender as causas que proporcionam a fragilidade dos fragmentos naturais nas
áreas de Preservação e Conservação ambiental, com a finalidade de desenvolver
meios que auxiliem a autorregulação destes fragmentos naturais, pautados na análise
integrada das dinâmicas oriundas dos fatores anteriormente listados, com o intuito
de proporcionar o desenvolvimento e sustentabilidade dos ecossistemas. Podemos
então considerar que a Biogeografia de Ilhas é um elemento fundamental para a
prosperidade dos fragmentos naturais, uma vez que busca proporcionar meios que
integram a prosperidade da Biodiversidade e do Ecossistema destes ambientes.

A Biogeografia de Ilhas é uma corrente da Biogeografia que nos auxilia


na compreensão das dinâmicas biogeográficas de diversos tipos de
fragmentos ambientais, sejam estes continentais ou insulares. Com o
intuito de ampliar seus conhecimentos acerca desta fantástica corrente,
indica-se a leitura da obra “O Canto do Dodô: Biogeografia de Ilhas numa
Era de Extinções”, por David Quammen.

204 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

2.3 As unidades de conservação


Sem sombra de dúvidas, podemos afirmar que a expressão máxima da dinâmica
conservacionista se dá pela fundamentação teórica, prática e funcional das Unidades
de Conservação. Como compreendemos anteriormente, a Conservação ambiental
busca um equilíbrio dinâmico entre a sociedade e o ambiente por um viés sustentável.
Sob esta ótica podemos fomentar o escopo das Unidades de Conservação em sua
totalidade em:

[...] consideram, portanto, que a natureza é intocada, e é


impensável que uma unidade de conservação (parques nacionais
e reservas ecológicas) possa proteger, além da diversidade
biológica, a diversidade cultural (DIEGUES, 1994, p. 113).

Diante desta concepção, podemos então assegurar que as Unidades de


Conservação se atêm à própria etimologia da palavra Conservação, garantindo não
só o desenvolvimento dos ambientes naturais, mas também a sustentabilidade dos
agentes humanos que constituem diretamente a interação sociedade e ambiente.
Para compreendermos o escopo das Unidades de Conservação enquanto uma
ferramenta de manejo dos Ecossistemas e da Biodiversidade, devemos pensar no
cerne de seu desenvolvimento.

A progressiva expansão da sociedade sobre o meio ambiente para a execução de


práticas exploratórias, ou mesmo para o uso e a ocupação das áreas, induziu a um
depauperamento dos ambientais naturais, ocasionando a perda da Biodiversidade e
a fragilidade dos ecossistemas, tal qual compreendemos sobre as análises realizadas
pela Biogeografia de Ilhas.

Com a difusão das ideologias oriundas do Ambientalismo, desenvolveu-se uma


consciência e medidas político-administrativas no intuito de proteger os ambientes
naturais remanescentes desta expansão sob o meio natural. Neste sentido, dentre
as práticas de manejo dos ambientes naturais foram as delimitações das Unidades e
áreas de Conservação ambiental. O escopo basal das Unidades de Conservação é a
manutenção da Biodiversidade e dos recursos naturais e culturais no que circunda a
interação com os elementos sustentáveis da sociedade (IUCN, 1994).

Se observarmos o crescimento das áreas de Conservação no mundo com o passar


das décadas, podemos compreender o quão fundamental foram as conferências
sobre o meio ambiente realizadas no século XX, sobretudo na década de 1970, ao
analisarmos o gráfico a seguir:

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 205


U4

Gráfico 4.1 | Evolução e extensão das áreas protegidas no mundo durante o século XX

Fonte: UNEP (2004) apud IPEA (2010, p. 361)

No entanto, há uma clara necessidade em avaliar, mensurar e monitorar de forma


quantitativa e qualitativa a Biodiversidade existente nesses ambientes de conservação,
bem como desenvolver meios que permitam a identificação de ambientes fragilizados
que se demonstram como áreas prioritárias a serem conservadas.

Conforme referenciado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA,


2010), o manejo das Unidades de Conservação baseia-se em critérios fundamentais
para os ambientes naturais, como o clima, os recursos pedológicos, a composição
dos organismos no ambiente e os regimes de equilíbrio e desequilíbrio nos
ecossistemas.

Dentre as competências das Unidades de Conservação enquanto ferramenta de


manejo dos ecossistemas, cabe a aplicação de medidas que busquem o equilíbrio
dentre os critérios anteriormente mencionadas, no intuito de proporcionar ao
ambiente meios de autorregulação, sendo assim aplicáveis medidas de intervenções
ecológicas sustentáveis aos fragmentos ambientais delimitados como Unidades de
Conservação.

Consideram-se também os fatores compreendidos pela Biogeografia de Ilhas


anteriormente mencionados em sua respectiva seção, uma vez que estes auxiliam
na designação da vulnerabilidade das áreas de conservação, tornando possível as
distinguir entre áreas a seres preservadas integralmente, e as áreas de Conservação
de uso sustentável. A expressão que delimita a categoria ambiental e os objetivos das
áreas pode ser analisada por meio da observação do seguinte quadro:

206 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

Quadro 4.1 | Objetivo das unidades de conservação da natureza por categoria de manejo

Fonte: Lei n. 9.985/2000 apud IPEA (2010, p.367).

As especificações dos objetivos de cada categoria das Unidades de Conservação


traduzem a acuidade ambiental em que cada um destes ambientes se encontra.
Por exemplo: enquanto uma reserva biológica se atém aos critérios de Preservação
ambiental visando uma proteção, autorregulação e o desenvolvimento do
ecossistema e da Biodiversidade, uma reserva de fauna se incumbe em conservar
os organismos vivos de modo que seja desenvolvido o manejo sustentável da fauna.
Este exemplo pode nos demonstrar características sobre a fragilidade de cada
ambiente, uma vez que, quanto mais comprometido ou vulnerável o ambiente se
encontra, as políticas preservacionistas tornam-se vigentes.

No Brasil, a expressão das Unidades de Conservação está substancialmente


voltada para a conservação dos fragmentos naturais dentre os seis Biomas do
país, sendo a floresta Amazônica o bioma que mais possui áreas de Preservação
e Conservação ambiental diante dos demais biomas brasileiros. Entretanto, com a
progressiva difusão e criação de novas Unidades de Conservação no decorrer das
últimas décadas, há uma problemática no que tange à amplitude e à integração
destas áreas de conservação, uma vez que estas se apresentam por vezes sob a lógica
de fragmentos naturais isolados e, paralelamente, não contemplam a amplitude total
dos biomas brasileiros, sendo assim considerado um problema de planejamento
ambiental.

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 207


U4

Para dirigirmos as análises acerca do modelado e da dispersão dos fragmentos


ambientais de proteção no Brasil e suas problemáticas, devemos analisar o mapa
a seguir (Figura 4.5) por um viés proporcional entre a quantidade das Unidades de
Conservação pelos Biomas do país. Lembrando que no mapa apresentado em sua
versão original não constam elementos cartográficos de extrema importância, como
a escala e a indicação do Norte geográfico entretanto sua análise é de extrema valia
pelo viés interpretativo.

Figura 4.5 | Distribuição das unidades de conservação ativas no SNUC por classe e bioma

Fonte: Brasil (2006) apud IPEA (2010, p. 368)

Com a análise do mapa acima sobre a distribuição das Unidades de Conservação,


podemos reforçar a problemática anteriormente citada, uma vez que se observam
grandes “vazios”, ou mesmo a ausência de unidades dentre alguns dos biomas
brasileiros. Dentre os principais fatores que ocasionam esta problemática enquadram-
se a ausência de planejamento e manejo dessas áreas, paralelo a distúrbios gerados
pelo avanço antrópico, alterando completamente a dinâmica de algumas áreas,
mesmo aquelas já delimitadas como Unidades de Conservação ou Preservação.

A ocorrência da fragmentação e perda das áreas de conservação está diretamente


atrelada com os avanços exploratórios, sejam eles da iniciativa privada, como no caso
de sistemas agropastoris ou outras explorações produtivistas, ou da iniciativa pública,
como no caso da inserção de usinas hidroelétricas ou outros meios de exploração
dos recursos naturais que ocasionam a perda da Biodiversidade e o regime dos
ecossistemas com o intuito de proporcionar um crescimento econômico (DIEGUES,
1994).

208 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

Podemos concluir que as Unidades de Conservação são uma das melhores formas
de manejo do ecossistema quando estas se pautam em um planejamento ambiental
adequado, frisando os critérios para o desenvolvimento do equilíbrio dinâmico e
os fatores discorridos como elementos fundamentais para a autorregulação de
fragmentos ambientais pela Biogeografia de Ilhas.

Dentre os objetivos propostos pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação


(SNUC), o que melhor proporciona a acuidade ambiental e o manejo de ecossistemas
e da Biodiversidade é aquele que visa “promover a utilização dos princípios e práticas
de conservação da natureza no processo de desenvolvimento” (BRASIL, 2000). Esta
proposição lança a relevância das práticas conservacionistas no cotidiano, e possui
como pressuposto um manejo sustentável dos ambientes e fragmentos naturais,
concebendo assim uma melhor relação entre a sociedade e o ambiente, resultando
em uma relação mais harmônica entre os agentes envolvidos.

1. A Biogeografia, sem dúvidas, é um dos campos que auxilia


na descrição dos parâmetros ambientais tanto de áreas
estritamente naturais quanto de áreas que estão sujeitas ao
contato direto das atividades antrópicas. Sob esta perspectiva,
a Biogeografia de Ilhas advém como uma corrente
biogeográfica que detém como potencial a compreensão
das dinâmicas ambientais e antrópicas no que se refere a
fragmentos ambientais isolados por diversas causas. Acerca
da Biogeografia de Ilhas e seu respectivo campo de atuação e
objeto de estudo, assinale a alternativa correta que apresenta
critérios fundamentais para a descrição das potencialidades e
fragilidades dos fragmentos naturais.

a) A Biogeografia de Ilhas detém como único escopo a


compreensão dos ambientes naturais isolados e protegidos
por medidas preservacionistas com a finalidade exclusiva de
propiciar condições para que a sociedade possa utilizar-se dos
recursos naturais de maneira sustentável.
b) O Efeito de Borda é um fenômeno estritamente natural
que ocorre em fragmentos ambientais isolados, sendo este
considerado o principal objeto de estudo da Biogeografia de Ilhas.

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 209


U4

c) A Biogeografia de Ilhas é responsável pelo estudo e


compreensão dos elementos biogeográficos de uma ilha,
não sendo aplicável às relações biogeográficas e às dinâmicas
naturais de áreas de Preservação ou Conservação Ambiental.
d) Os principais fatores que influem na compreensão das
dinâmicas ambientais dos fragmentos naturais e auxiliam no
campo de ação do manejo do ecossistema e Biodiversidades
são: o tamanho, a forma, o grau de isolamento, o tipo de
vizinhança e o histórico de perturbações.
e) Os Corredores ecológicos são uma das medidas adotadas
nos sistemas, que apresentam como principal adversidade
a fragilidade de ambientes naturais isolados, uma vez que
fomentam as relações ecológicas desarmônicas.

2. Diante das finalidades propostas para um acréscimo


da potencialidade ambiental oriunda das Unidades de
Conservação, identifique como Verdadeiro (V) e Falso (F)
as afirmações realizadas a seguir e assinale a alternativa
correspondente.

( ) As Unidades de Conservação de uso sustentável são áreas


naturais, cujo principal aspecto é a proteção integral do
ambiente sem que haja qualquer intervenção voltada para o
benefício ou a exploração da sociedade.
( ) Áreas de Proteção Ambiental têm como finalidade
a proteção da diversidade biológica e asseguram o uso
sustentável dos recursos naturais.
( ) Parques nacionais têm como escopo a preservação dos
ecossistemas naturais e promovem paralelamente atividades
de educação ambiental, recreação e turismo de maneira
estritamente ecológica.
( ) As reservas extrativistas são áreas onde a exploração dos
recursos ambientais é assegurada por lei a grandes empresas
de extrativistas.
( ) Os Monumentos Naturais são considerados patrimônios
da sociedade pela sua representação, singularidade e beleza.

210 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

a) V – V – V – F – V.
b) F – V – V – F – V.
c) F – F – V – V – V.
d) F – V – F – F – F.
e) V – F – V – V – F.

Nesta unidade você aprendeu:


• O conceito de Biodiversidade da teoria à prática.
• Definições e conceituação de Biodiversidade, Bioma,
Ecossistema e Biocenose.
• Um levante histórico sobre Meio Ambiente na perspectiva
pública e organizacional.
• As bases e caminhos do Ambientalismo no Brasil.
• Elementos que definem a Preservação e a Conservação
Ambiental.
• A influência da Biogeografia de Ilhas como viés interpretativo
dos sistemas naturais.
• Fundamentos e Conceitos das Unidades de Conservação
enquanto elementos do manejo de ecossistemas.

No decorrer desta unidade, pudemos compreender segmentos


fundamentais para o entendimento da dinâmica natural como
elementos indispensáveis a serem considerados nas propostas
e formulações acerca do manejo do Ecossistema e da
Biodiversidade.
Compreender a dinâmica natural em seu campo de atuação é uma
tarefa árdua, que demanda tanto as análises sobre a perspectiva
ambiental quanto da influência da sociedade nesta, uma vez que
são elementos indissociáveis na concepção do desenvolvimento

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 211


U4

ambiental e sustentável. Ainda que realizemos abordagens básicas


para o entendimento da dinâmica natural sobre a perspectiva da
Biogeografia, pode-se afirmar que ainda há muito a se percorrer
para compreendermos esta dinâmica em sua totalidade para
criarmos uma relação justa, sustentável e consciente para com a
natureza.
No intuito de lhes auxiliar nesta busca para o entendimento das
dinâmicas naturais e no manejo ambiental, indicaremos duas
leituras de extrema importância que exprimem todo o trabalho e
estudo sobre os manejos ambientais em território brasileiro. A obra
“Sustentabilidade Ambiental no Brasil: biodiversidade, economia e
bem-estar humano”, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(IPEA) (Disponível em <http://www.ipea.gov.br/agencia/images/
stories/PDFs/livros/livros/livro07_sustentabilidadeambienta.
pdf> acesso: 27 de set. de 2015), que avalia todos os critérios de
potencialidades, fragilidades e propostas aplicáveis de um manejo
ambiental sustentável.
A segunda indicação pertinente no que se refere à relação entre a
sociedade para com os fragmentos naturais protegidos obra utilizada
para a elaboração desta unidade, intitulada “O Mito Moderno da
Natureza Intocada”, por Antônio Carlos Diegues, disponibilizado
pelo Núcleo de Apoio à Pesquisa sobre Populações Humanas em
Áreas Úmidas Brasileiras (Disponível em <http://nupaub.fflch.usp.
br/sites/nupaub.fflch.usp.br/files/color/publiport.pdf > acesso: 20
de out. de 2015).

1. A Biodiversidade pode ser encarada enquanto um forte


fator para a determinação da qualidade ambiental de um
designado domínio natural. Acerca dos conhecimentos
sobre a definição de Biodiversidade, analise as afirmações
apresentadas e assinale a alternativa que contemple o grupo
de afirmações corretas.

I - A Biodiversidade pode ser interpretada como uma


dinâmica fundamental para a formulação da Biocenose.

212 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

II - Pode-se compreender o conceito de Biodiversidade como


toda a variedade de seres vivos presentes em determinado
espaço geográfico, incluindo as relações e fundamentações
dos ecossistemas, bem como as espécies animais que fazem
parte deste.
III - Para Solbrig (1991), a Biodiversidade pode ser compreendida
pela associação de três elementos; a diversidade genética, a
taxionomia evolutiva e a diversidade funcional ecológica.
IV - As relações antrópicas são inerentes ao conceito de
Biodiversidade, uma vez que o ser humano se destaca dos
demais elementos que permeiam o conceito.
V - Biodiversidade é considerada como uma associação dos
seres vivos e características naturais referenciadas em uma
escala geográfica.

A sequência correta é:
a) I, II e III.
b) I, III e IV.
c) II, III e V.
d) II, III e V.
e) Todas as opções.

2. Acerca das definições dos conceitos de Preservação e


Conservação ambiental, associe os referentes conceitos
com as referidas formulações temáticas e a seguir assinale a
alternativa que representa a sequência correta dos segmentos
apresentados.
1 Preservação Ambiental
2 Conservação Ambiental

( ) Atem-se à administração dos recursos naturais, fornecendo


benefícios em um determinado período no tempo histórico.
( ) Propõe o Equilíbrio Dinâmico entre Sociedade e Ambiente.
( ) Visa à proteção da Biodiversidade, Ecossistemas e outros

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 213


U4

elementos ambientais em sua totalidade.


( ) Considerada uma estratégia de suporte às formas de
vida em determinada área sem que haja qualquer ação ou
interferência na dinâmica deste ambiente.
( ) Tem como expressão político-funcional as Unidades de
Conservação.

a) 1 – 2 – 1 – 2 – 1.
b) 2 – 2 – 1 – 2 – 2.
c) 2 – 2 – 1 – 2 – 2.
d) 2 – 2 – 1 – 1 – 2.
e) 1 – 1 – 2 – 1 – 2.

3. Um dos principais elementos analisados pela corrente


biogeográfica da Biogeografia de Ilhas para avaliar as
inferências do isolamento na dinâmica ambiental dos
fragmentos naturais são os Efeitos de Borda. Acerca da
compreensão destes efeitos, assinale a alternativa que
apresenta corretamente as causas que os permeiam.

a) Práticas Preservacionistas induzem aos Efeitos de Bordas,


uma vez que isolam o fragmento natural e impossibilitam
seu devido manejo.
b) As grandes extensões territoriais que delimitam a área do
fragmento natural contribuem para uma maior atuação dos
Efeitos de Borda.
c) Criação dos Corredores Ecológicos como forma de
manejo ambiental, uma vez que comprometem a margem
dos fragmentos naturais.
d) Delimitação de áreas de Conservação Ambiental que
induzem ao isolamento dos fragmentos naturais.
e) Intervenção antrópica que compromete a dinâmica
ambiental às margens de um fragmento natural isolado.

214 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

4. Um dos principais critérios que demonstra a


representatividade no âmbito ambiental da Conferência
sobre o meio ambiente, intitulada Rio-92, foi a promulgação
de três documentos que detiveram como objetivo uma
melhor acuidade ambiental em distintos campos de ações,
sendo eles a Agenda 21, a Carta da Terra e a ata sobre
Conservação da Diversidade Ecológica (CDB). Acerca dos
campos de atuação e propostas realizadas presentes em cada
um destes documentos, associe estes às suas respectivas
sínteses e assinale a alternativa correta.
I - Agenda 21
II - Carta da Terra
III - Conservação da Diversidade Biológica (CDB)

( ) Agrupamento de normas e princípios gerais que buscam


a preservação e a manutenção de toda a diversidade
biológica. Detém como principais atributos a conservação
da Biodiversidade e, consequentemente, de ecossistemas.
( ) Instrumento de planejamento para a construção de
sociedades sustentáveis, em diferentes bases geográficas,
que concilia métodos de proteção ambiental, justiça social e
eficiência econômica.
( ) Exalta os princípios do desenvolvimento sustentável,
se atendo a uma conjectura que contemple uma relação
harmônica entre os segmentos social, ambiental e
econômico.
( ) Expressa de forma textual todo o diálogo intercultural
acerca da problemática ambiental.

a) I – II – III.
b) III – I – II.
c) II – III – I.
d) I – III – II.
e) III – II – I.

Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas 215


U4

5. As Unidades de Conservação são elementos práticos


de manejo do ecossistema e da Biodiversidade, com uma
das maiores amplitudes no Brasil. Acerca da definição e
da amplitude dos critérios e segmentos que permeiam as
potencialidades e fragilidades das Unidades de Conservação
enquanto ferramenta para o manejo ambiental, caracterize
as formulações a seguir entre verdadeiras (V) e falsas (F) e
assinale a alternativa correspondente.

( ) As Unidades de Conservação fomentam a conservação


dos fragmentos naturais dentre os seis Biomas do país.
( ) A ocorrência da fragmentação e perda das áreas de
conservação está diretamente atrelada com os avanços
exploratórios, sejam eles da iniciativa privada ou pública.
( ) Os critérios fundamentais nas Unidades de Conservação
visam de maneira totalitária à proteção integral dos ambientes
naturais.
( ) Fatores como tamanho, forma, grau de isolamento, tipo
de vizinhança e histórico de perturbações são dispensáveis
no manejo dos ecossistemas nas Unidades de Conservação.

a) V – V – F - V.
b) F – F – V – F.
c) F – F – V – V.
d) V – V – F – F.
e) V – F – F – F.

216 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


U4

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218 Biodiversidade, Conservação e Manejo de Ecossistemas


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UNOPAR BIOGEOGRAFIA

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