Você está na página 1de 86

UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE MEDICINA VETERINÁRIA

ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO E CLÍNICO SOBRE Thelazia callipaeda EM ANIMAIS DE


COMPANHIA EM PORTUGAL

SOFIA DE OLIVEIRA PIMENTA DE CASTRO

ORIENTADORA:
Doutora Esmeralda Sofia da Costa
Delgado

COORIENTADOR:
Doutor Luís Manuel Madeira de
Carvalho

2021

i
i
UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE MEDICINA VETERINÁRIA

ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO E CLÍNICO SOBRE Thelazia callipaeda EM ANIMAIS DE


COMPANHIA EM PORTUGAL

SOFIA DE OLIVEIRA PIMENTA DE CASTRO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO INTEGRADO EM MEDICINA VETERINÁRIA

JÚRI
PRESIDENTE: ORIENTADORA:
Doutor José Augusto Farraia e Silva Doutora Esmeralda Sofia da Costa
Meireles Delgado

VOGAIS: COORIENTADOR:
Doutora Esmeralda Sofia da Costa Doutor Luís Manuel Madeira de
Delgado Carvalho
Doutora Ana Mafalda Gonçalves
Xavier Félix Lourenço

2021

ii
DECLARAÇÃO RELATIVA ÀS CONDIÇÕES DE REPRODUÇÃO DA TESE OU
DISSERTAÇÃO
Anexo 3 – DECLARAÇÃO RELATIVA ÀS CONDIÇÕES DE REPRODUÇÃO DA TESE OU DISSERTAÇÃO

Sofia de Oliveira Pimenta de Castro


Nome: _______________________________________________________________________________________________________

Título da Tese ou Dissertação:

Estudo Epidemiológico e Clínico Sobre Thelazia Callipaeda em Animais de Companhia em Portugal


____________________________________________________________________________________________

Designação do curso de Mestrado ou de Doutoramento:


Mestrado Integrado em Medicina Veterinária
____________________________________________________________________________________________
Área científica em que melhor se enquadra (assinale uma):

X Clínica Produção Animal e Segurança Alimentar


Morfologia e Função Sanidade Animal

Declaro sob compromisso de honra que a tese ou dissertação agora entregue corresponde à que foi aprovada pelo
júri constituído pela Faculdade de Medicina Veterinária da ULISBOA.

Declaro que concedo à Faculdade de Medicina Veterinária e aos seus agentes uma licença não-exclusiva para
arquivar e tornar acessível, nomeadamente através do seu repositório institucional, nas condições abaixo indicadas,
a minha tese ou dissertação, no todo ou em parte, em suporte digital.
Declaro que autorizo a Faculdade de Medicina Veterinária a arquivar mais de uma cópia da tese ou dissertação e a,
sem alterar o seu conteúdo, converter o documento entregue, para qualquer formato de ficheiro, meio ou suporte,
para efeitos de preservação e acesso.
Retenho todos os direitos de autor relativos à tese ou dissertação, e o direito de a usar em trabalhos futuros (como
artigos ou livros).
Concordo que a minha tese ou dissertação seja colocada no repositório da Faculdade de Medicina Veterinária com o
seguinte estatuto (assinale um):
1. Disponibilização imediata do conjunto do trabalho para acesso mundial;
2. X Disponibilização do conjunto do trabalho para acesso exclusivo na Faculdade de Medicina Veterinária
durante o período de 6 meses, X 12 meses, sendo que após o tempo assinalado autorizo o acesso
mundial*;
* Indique o motivo do embargo (OBRIGATÓRIO)

Resultados originais que serão eventualmente publicados em revista científica

Nos exemplares das dissertações de mestrado ou teses de doutoramento entregues para a prestação de provas na
Universidade e dos quais é obrigatoriamente enviado um exemplar para depósito na Biblioteca da Faculdade de
Medicina Veterinária da Universidade de Lisboa deve constar uma das seguintes declarações (incluir apenas uma das
três, retirando as que não interessam):
1. É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTA TESE/TRABALHO APENAS PARA EFEITOS DE
INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE COMPROMETE.
2. É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO PARCIAL DESTA TESE/TRABALHO (indicar, caso tal seja necessário, nº
máximo de páginas, ilustrações, gráficos, etc.) APENAS PARA EFEITOS DE INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE
DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE COMPROMETE.
3. NÃO É PERMITIDA A REPRODUÇÃO DE QUALQUER PARTE DESTA TESE/TRABALHO.

11 de _________________________
Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de Lisboa, ____ Janeiro 21
de 20_____
(indicar aqui a data da realização das provas públicas)

Assinatura: ___________________________________________________________________________________

ii
ii
AGRADECIMENTOS

À Professora Doutora Esmeralda Delgado, por ter aceite este projeto de braços abertos. Por
todo o apoio e tranquilidade que me deu ao longo deste processo.
Ao Professor Doutor Luís Madeira de Carvalho, por todo o apoio que me deu desde o 3º ano
do MIMV, especialmente nesta fase final. Por toda a paciência para ouvir as minhas ideias e
embarcar neste projeto. Por todas as piadas intelecto-científicas, “Aleluia irmão!”.
Ao Professor Doutor Telmo Nunes, por toda a ajuda e disponibilidade na avaliação dos
resultados.
Ao Professor Doutor Jorge Correia, por toda a ajuda e disponibilidade com a execução das
fotografias dos nematodes.
À Dra. Lídia, por toda a ajuda e disponibilidade na preparação dos nematodes para
identificação ao microscópio.
À Professora Doutora Lina Costa, por toda a colaboração e disponibilidade em ceder os casos
clínicos e enviar exemplares de nematodes de Thelazia callipaeda.
Aos meus pais, pelo apoio incondicional. Por terem os horizontes tão abertos como os meus,
dando-me sempre a mão em momentos decisivos e ao embarcar em novas aventuras. Por
serem sempre o meu porto seguro.
Aos meus irmãos, por todas as vezes que acreditavam mais em mim do que eu. Por toda a
energia, sentido de humor e cumplicidade.
Às minhas lindas, únicas, maravilhosas, mirabolantes, Júlias Jolas, pela sorte que é ter esta
amizade. Por todas as gargalhadas, histórias, aventuras, viagens, noites, choradeiras, mas
acima de tudo pelo amor e cumplicidade. Estes 6 anos não teriam sido os mesmos sem
vocês.
À minha gémea univitelina, Rita, por termos tentado passar numa porta ao mesmo tempo na
primeira semana de faculdade. Por seres a minha pessoa. Por seres família e amiga. Pela
nossa amizade tão bonita e honesta. Por toda a paciência de ouvir mil palavras por fração de
segundo, diariamente. Por todas as peripécias e viagens. Por todas as nossas ideias de
negócios, sonhos de raças de cães, de casas, etc. E por tudo o que ainda está para vir.
À Helena e à Raquel, por um dos melhores anos da minha vida até agora. Pela amizade que
floresceu e que ficou. Por todos os momentos maravilhosos que vivemos juntas e que voltaria
a viver.
Aos meus amigos de faculdade por todas as gargalhadas, aventuras e memórias.
Aos amigos que a vida me deu, por toda a amizade, amor e apoio ao longo destes anos.
Por último, ao meu amor maior, Yuki. O motivo de ter vindo aqui parar e com quem termino
este percurso. Por ser a minha “filha”. Por todo o amor e carinho. Por estar cá comigo, hoje
e sempre.

iii
ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO E CLÍNICO SOBRE Thelazia callipaeda EM
ANIMAIS DE COMPANHIA EM PORTUGAL
RESUMO
A infeção ocular parasitária provocada por nematodes de Thelazia callipaeda tem
sido alvo de estudo desde inícios do século XX. O nematode tem um ciclo biológico indireto,
cujos hospedeiros definitivos são os carnívoros domésticos e silvestres, lagomorfos, bem
como o Homem, e um hospedeiro intermediário artrópode, Phortica variegata, o vetor de T.
callipaeda na Europa. A infeção enquadra-se na classificação clínica das conjuntivites tendo
em conta a reação inflamatória local que o nematode provoca. O parasita é conhecido como
oriental eyeworm, devido à sua origem asiática. No entanto, tem vindo a dispersar-se
gradualmente até à Europa. Em Portugal, os primeiros registos de Thelaziose em cães e
gatos surgiram em 2012 e, desde então, têm sido registados casos dispersos pelo país,
inclusive em carnívoros silvestres como raposas vermelhas e lobos.
O presente estudo teve como principais objetivos compreender a situação
epidemiológica desta parasitose em Portugal em animais de companhia e contribuir para a
sua caracterização clínica, desde o diagnóstico até ao tratamento, passando pela prevenção.
Foi elaborado um questionário direcionado a profissionais Médico-Veterinários que já
tivessem diagnosticado algum caso desta infeção parasitária em Portugal, tendo sido obtidas
55 respostas. Do ponto de vista de distribuição geográfica, observou-se uma predominância
de infeção por T. callipaeda no Norte (78,9%), para além da sua dispersão pela região Centro
do país. Foi também registado um elevado número de casos no distrito de Lisboa, onde até
à data tinha sido reportado apenas um caso. Relativamente à existência de hospedeiros
reservatório e respetivas espécies, a maioria dos inquiridos (58,2%) não estava muito
esclarecida face a este aspecto. Do ponto de vista clínico, a maioria dos médicos veterinários
participantes (83,6%) pôs em prática a abordagem terapêutica adequada ao realizar a
extração física dos nematodes antes da administração de formulações antiparasitárias,
enquanto mais de 50% registaram o uso de antiparasitários à base de milbemicina oxima; no
entanto, a sua eficácia contra T. callipaeda é inferior face à associação de moxidectina 2,5%
e imidacloprid 10%, registada apenas por 17,4% dos inquiridos.
Estes resultados permitiram compreender que tanto o ambiente rural como o urbano
constituem áreas de risco de transmissão deste nematode, incluindo as grandes cidades.
Também realçam a dúvida sobre a existência dum ciclo silvático e sobre quais as espécies
envolvidas no mesmo. O estudo contribui para a sensibilização dos profissionais Médico-
Veterinários para a presença desta parasitose endémica em Portugal, permitindo melhorias
no diagnóstico, abordagem terapêutica e prognóstico da doença.

Palavras-chave: Thelazia callipaeda; thelaziose; Portugal; conjuntivite; questionário

iv
EPIDEMIOLOGICAL AND CLINICAL STUDY ABOUT Thelazia callipaeda IN
SMALL ANIMALS IN PORTUGAL
ABSTRACT
The eye infection caused by nematodes of Thelazia callipaeda has been a subject of
study since the beginning of the 20th century. The parasite has an indirect biological cycle,
whose definitive hosts are domestic and wild carnivores, lagomorphs, and also humans, and
an arthropod intermediate host, Phortica variegata, the vector of T. callipaeda in Europe. This
infection is included in the clinical classification of conjunctivitis, taking into account the local
inflammatory reaction that the nematode causes in the eye. This parasite is known as the
oriental eyeworm due to its Asian origin, however it has been gradually spreading to and
through Europe. In Portugal, the first records of Thelaziosis, in dogs and cats, started in 2012
and since then more cases have been recorded scattered around the country, including in wild
carnivores such as red foxes and wolves.
The main goals of this study were to understand the epidemiological situation of this
parasitosis in small animals in Portugal and to contribute to its clinical characterization, from
diagnosis to treatment and prevention.
A questionnaire was prepared for veterinarians who had already diagnosed cases of
this parasite infection in Portugal, to which 55 answers were obtained. From the point of view
of geographical distribution, the predominance of T. callipaeda infection in the North (78.9%)
was confirmed, as well as its dispersion in the Center region of the country. A higher number
of cases was also recorded in the Lisbon district, where only one case had been reported to
date. Regarding the existence of reservoir hosts and their species, most of the participants
(58.2%) in the survey showed misinformation on the subject. From a clinical point of view, the
results confirmed that the vast majority of veterinarians (83.6%) put into practice the correct
therapeutic approach by performing nematode extraction prior to the administration of
antiparasitic formulations. More than 50% registered the use of antiparasitic drugs based on
milbemycin oxime, however their efficacy against T. callipaeda is inferior to the combination
of moxidectin 2.5% and imidacloprid 10%, considered only by 17,4%.
These results made it possible to understand that not only the rural but also the urban
environments are areas of risk of transmission of this nematode, including large cities. They
also highlighted the uncertainty towards the existence of a sylvatic cycle and the species that
are in involved in it.
The study has contributed to the awareness of veterinarians about the presence of this
endemic parasitosis in Portugal, providing the necessary data to improve the diagnosis,
therapeutic approach and, consequently, the prognosis of this disease.

Keywords: Thelazia callipaeda; thelaziosis; Portugal; conjunctivitis; survey

v
ÍNDICE

DECLARAÇÃO RELATIVA ÀS CONDIÇÕES DE REPRODUÇÃO DA TESE OU


DISSERTAÇÃO.......................................................................................................................ii
AGRADECIMENTOS..............................................................................................................iii
RESUMO................................................................................................................................iv
ABSTRACT.............................................................................................................................v
ÍNDICE...................................................................................................................................vi
LISTA DE FIGURAS.............................................................................................................viii
LISTA DE TABELAS...............................................................................................................ix
LISTA DE GRÁFICOS.............................................................................................................x
LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS........................................................... xii
CAPÍTULO 1 - DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS NO PERÍODO DE
ESTÁGIO ..............................................................................................................................1

1.1 ESTÁGIO CURRICULAR EXTRAMUROS ..............................................................................1


1.2 ESTÁGIO EXTRACURRICULAR EXTRAMUROS ....................................................................2

CAPÍTULO 2 - ENQUADRAMENTO DO ESTUDO: INTRODUÇÃO .....................................4

CAPÍTULO 3 - REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .........................................................................6

3.1 ÓRGÃO DA VISÃO DOS ANIMAIS DE COMPANHIA – CÃO E GATO.........................................6


3.2 AGENTE ETIOLÓGICO: THELAZIA SPP. ..............................................................................8
3.3 ESPÉCIES DO GÉNERO THELAZIA.....................................................................................8
3.3.1 Thelazia callipaeda ..............................................................................................10
3.4 MORFOLOGIA GERAL....................................................................................................10
3.4.1 Morfologia de Thelazia callipaeda........................................................................11
3.5 CICLO BIOLÓGICO ........................................................................................................13
3.5.1 Ciclo Silvático ......................................................................................................15
3.6 VETOR ........................................................................................................................16
3.7 EPIDEMIOLOGIA ...........................................................................................................19
3.7.1 Distribuição Geográfica .......................................................................................19
3.7.2 Ponto de Situação em Portugal ...........................................................................20
3.7.3 Identificação Molecular ........................................................................................21
3.8 THELAZIOSE ................................................................................................................23
3.8.1 Patogenia ............................................................................................................23
3.8.2 Enquadramento Clínico sobre Conjuntivites em Animais de Companhia .............23
3.8.3 Sinais Clínicos e Lesões......................................................................................24
3.8.4 Diagnóstico ..........................................................................................................25

vi
3.8.5 Tratamento, Profilaxia e Controlo ........................................................................26
3.9 THELAZIOSE HUMANA...................................................................................................28

CAPÍTULO 4 - ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO E CLÍNICO SOBRE THELAZIA CALLIPAEDA


EM ANIMAIS DE COMPANHIA EM PORTUGAL ...............................................................30

4.1 INTRODUÇÃO ...............................................................................................................30


4.2 OBJETIVOS ..................................................................................................................30
4.3 MATERIAIS E MÉTODOS ................................................................................................31
4.3.1 Área Geográfica ..................................................................................................32
4.3.2 Conjuntivites ........................................................................................................32
4.4 RESULTADOS ...............................................................................................................34
4.4.1 Distribuição Geográfica .......................................................................................34
4.4.2 Conjuntivites ........................................................................................................35
4.4.3 Conjuntivites Parasitárias ....................................................................................38
4.4.4 Biologia do Parasita - Vetor e Hospedeiros Reservatório.....................................42
4.4.5 Sinais Clínicos .....................................................................................................43
4.4.6 Protocolos Terapêuticos ......................................................................................44
4.5 DISCUSSÃO .................................................................................................................46
4.5.1 Distribuição Geográfica .......................................................................................47
4.5.2 Conjuntivites ........................................................................................................47
4.5.3 Conjuntivites Parasitárias ....................................................................................48
4.5.4 Biologia do Parasita – Vetor e Hospedeiros Reservatório ....................................49
4.5.5 Sinais Clínicos .....................................................................................................50
4.5.6 Protocolos Terapêuticos ......................................................................................51
4.6 LIMITAÇÕES DO ESTUDO...............................................................................................52
4.7 CONCLUSÃO ................................................................................................................53

CAPÍTULO 5 - CASOS CLÍNICOS E IDENTIFICAÇÃO MORFOLÓGICA DE EXEMPLARES


DE THELAZIA CALLIPAEDA .............................................................................................55

5.1 CASO CLÍNICO 1 ..........................................................................................................55


5.2 CASO CLÍNICO 2 ..........................................................................................................55
5.3 CASO CLÍNICO 3 ..........................................................................................................56
5.4 IDENTIFICAÇÃO MORFOLÓGICA DOS NEMATODES ...........................................................56
5.5 ENQUADRAMENTO EPIDEMIOLÓGICO E CLÍNICO DOS CASOS CLÍNICOS ............................56

CAPÍTULO 6 ANEXOS .......................................................................................................66

6.1 ANEXO 1 - QUESTIONÁRIO ............................................................................................66

vii
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Taxonomia de Thelazia spp. ....................................................................................9
Figura 2 Distribuição geográfica de Thelazia callipaeda ......................................................10
Figura 3 Características morfológicas de T. callipaeda ........................................................12
Figura 4 Fases do desenvolvimento do envelope do ovo de T. callipaeda...........................13
Figura 5 Esquema representativo do ciclo biológico de Thelazia callipaeda nos hospedeiros
definitivos e intermediário .............................................................................................14
Figura 6 Exemplares de estádios adultos de Thelazia callipaeda nos olhos de hospedeiros
reservatório ..................................................................................................................15
Figura 7 Taxonomia de Phortica variegata. .........................................................................16
Figura 8 Características morfológicas da espécie Phortica variegata ..................................19
Figura 9 Conjuntivite acompanhada de úlcera da córnea fluoresceína positiva, provocada
pela presença de um exemplar de Thelazia callipaeda no olho de um cão...................23
Figura 10 Identificação de exemplares de estádios adultos de Thelazia callipaeda na face
interna da membrana nictitante do olho de um cão ......................................................25
Figura 11 Exemplar de Thelazia callipaeda sob a córnea e membrana nictitante de um olho
de cão ..........................................................................................................................41
Figura 12 Fotografias originais de exemplares de Thelazia callipaeda e as suas
características morfológicas ao microscópio óptico ......................................................58

viii
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Número de Inquiridos por Distrito..........................................................................34


Tabela 2 Qual a abordagem terapêutica mais utilizada atualmente no tratamento de
Thelaziose, em animais de companhia , em Portugal? .................................................46

ix
LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 Número aproximado de casos de conjuntivites observados num ano em cães e


gatos ............................................................................................................................35
Gráfico 2 Número de inquiridos que votaram na opção "mais de 5 casos" por distrito .........35
Gráfico 3 Região com mais de 50 casos por ano de conjuntivites em cães e gatos ............36
Gráfico 4 Importância da etiologia infeciosa nas conjuntivites em cães ...............................36
Gráfico 5 Importância da etiologia alérgica nas conjuntivites em cães.................................36
Gráfico 6 Importância da etiologia de alterações nas pálpebras ou cílios nas conjuntivites em
cães .............................................................................................................................36
Gráfico 7 Importância da etiologia de deficiência de produção lacrimal nas conjuntivites em
cães .............................................................................................................................36
Gráfico 8 Importância da etiologia imunomediada nas conjuntivites em cães ......................37
Gráfico 9 Importância da etiologia infeciosa nas conjuntivites em gatos ..............................37
Gráfico 10 Importância da etiologia alérgica nas conjuntivites em gatos..............................37
Gráfico 11 Importância da etiologia de alterações das pálpebras ou cílios nas conjuntivites
em gatos ......................................................................................................................37
Gráfico 12 Importância da etiologia de deficiência de produção lacrimal nas conjuntivites em
gatos ............................................................................................................................37
Gráfico 13 Importância da etiologia viral dentro das conjuntivites infeciosas em gatos........38
Gráfico 14 Importância da etiologia bacteriana dentro das conjuntivites infeciosas em gatos
.....................................................................................................................................38
Gráfico 15 Importância da etiologia parasitária dentro das conjuntivites infeciosas em gatos
.....................................................................................................................................38
Gráfico 16 Número aproximado de conjuntivites parasitárias observadas nos últimos 10 anos
.....................................................................................................................................39
Gráfico 17 Região de Portugal com mais de 5 casos de conjuntivite parasitária nos últimos 10
anos .............................................................................................................................39
Gráfico 18 Distritos com representação de mais de 5 casos de conjuntivite parasitária nos
últimos 10 anos ............................................................................................................40
Gráfico 19 Respostas obtidas sobre a existência ou não duma tendência crescente no
diagnóstico de conjuntivite parasitárias ........................................................................40
Gráfico 20 Localização do Nematode no Órgão da Visão....................................................41
Gráfico 21 Importância dum ambiente exterior rural para animais infetados por T. callipaeda
.....................................................................................................................................42
Gráfico 22 Importância dum ambiente exterior urbano para animais infetados por T. callipaeda
.....................................................................................................................................42

x
Gráfico 23 Importância dum ambiente interior com acesso ao exterior para animais infetados
por T. callipaeda ...........................................................................................................42
Gráfico 24 Importância dum ambiente interior sem acesso ao exterior para animais infetados
por T. callipaeda ...........................................................................................................42
Gráfico 25 Representação gráfica das respostas abertas sobre possíveis hospedeiros
reservatório na transmissão de T. callipaeda................................................................43
Gráfico 26 Sinais clínicos apresentados em infeção por T. callipaeda .................................43
Gráfico 27 Representação gráfica do sucesso do protocolo terapêutico em casos de infeção
por T. callipaeda ...........................................................................................................46

xi
LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS

ITS1 – Primeiro Espaçador Interno Transcrito (do inglês “First Internal Transcribed Spacer”)
h – Horas
h1 – Haplótipo 1
HCV – Hospital Clínic Veterinari
HD – Hospedeiro Definitivo
HI – Hospedeiro Intermediário
HR – Humidade Relativa
SMT – Programa de Mobilidade para Estagiários (do inglês “Students Mobility for
Traineeships”)

xii
CAPÍTULO 1 - DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS NO PERÍODO
DE ESTÁGIO

1.1 Estágio Curricular Extramuros


Ao longo do meu percurso no Mestrado Integrado de Medicina Veterinária sempre foi
uma ambição conhecer o mundo da Medicina Veterinária para além das fronteiras
portuguesas, tanto a nível profissional como pessoal. O meu estágio curricular decorreu entre
16 de Setembro e 22 de Novembro de 2019, ao abrigo do Programa Erasmus+ Students
Mobility for Traineeships (SMT), no Hospital Clínic Veterinari (HCV), centro de referência da
Universidade Autónoma de Barcelona. Teve uma duração total de 550 horas, sendo
composto por rotações entre os serviços de Medicina Interna, Internamento, Imagiologia e,
por fim, Oftalmologia.
No serviço de Medicina Interna (165h), tive a oportunidade de acompanhar os médicos
veterinários na abordagem de casos clínicos e na sua discussão e resolução. Diariamente,
eram feitas rondas para discutir individualmente os casos agendados, priorizando os de maior
complexidade, de forma a esclarecer possíveis dúvidas antes da realização das consultas.
Este serviço era responsável pela realização de várias atividades, dando-me a oportunidade
de assistir a consultas tanto de vacinação e desparasitação como de primeira e segunda
opinião, e ainda de reavaliação. Foi possível melhorar o meu processo de recolha de histórias
pregressas, realizar exames físicos e a contenção dos animais, tal como recolher amostras
(sangue, urina, conteúdo auricular, pele) e realizar o devido processamento laboratorial e a
sua avaliação. Para além disso, foi permitido administrar fármacos por via oral, subcutânea,
intramuscular e endovenosa, assim como limpar feridas, drenar abcessos e colocar pensos.
Adicionalmente, por interesse próprio, foi possível assistir e auxiliar na realização da
terapêutica quimioterápica, que ocorria semanalmente, após as consultas de reavaliação dos
pacientes oncológicos.
No serviço de Internamento (165h), foi possível realizar a monitorização dos
pacientes, a alimentação, passeio e higienização dos mesmos e dos seus espaços, a
preparação e administração de medicação, tal como a limpeza das feridas e colocação de
pensos. Também tive a oportunidade de colocar cateteres endovenosos, sistemas de
fluidoterapia e colher amostras (sangue e urina). Para além disso, prestei auxílio nos casos
de emergência.
No serviço de Imagiologia (165h), tive oportunidade de ganhar mais à vontade tanto
em Radiologia como Ecografia. Em ambos as técnicas de imagem, fui responsável pela
recepção, preparação e posicionamento do animal. Para além de assistir aos exames,

1
participei diariamente na discussão de casos clínicos e a devida interpretação das imagens
obtidas.
No serviço de Oftalmologia (55h), tive a oportunidade de acompanhar médicas
veterinárias diplomadas pelo Colégio Europeu e os residentes do serviço, tanto em ambiente
de consulta como cirúrgico. Foi possível assistir a consultas de primeira e segunda opinião
assim como de reavaliação, e realizar a recepção, preparação, medicação e monitorização
dos pacientes em ambiente pré- e pós-cirúrgico. Tive a oportunidade de assistir a cirurgias,
como a correção de entropión, correção de pseudoptose segundo a técnica modificada de
Brow suspension, correção de distiquíase com crioterapia, desbridamento corneano com
broca de diamante, fixação da membrana nictitante e ainda colocação de lentes de contato,
entre outros.

1.2 Estágio Extracurricular Extramuros


Entre o dia 17 de Fevereiro e 13 de Março de 2020 realizei um estágio extracurricular
no Hospital Veterinário (John and Anne Tickle Small Animal Hospital) da Universidade do
Tennessee. Este tinha uma duração planeada de 3 meses, no entanto, devido à pandemia
Covid-19, foi interrompido ao fim de 1 mês. De qualquer forma, a aprendizagem foi imensa,
tendo passado por 3 serviços – Medicina Geral, Imagiologia e Oftalmologia.
Em Medicina Geral (45h), tive a oportunidade de realizar consultas de vacinação e
desparasitação e executar cuidados primários. Era da minha responsabilidade preparar os
casos, receber os pacientes, fazer a devida recolha da história pregressa, realizar um exame
físico adequado e elaborar um plano diagnóstico e terapêutico. No fim de realizar a consulta
com os tutores, fazia uma breve apresentação do caso clínico ao Médico Veterinário
supervisor e após uma discussão sobre o mesmo, informava os tutores sobre o plano a
seguir. Neste serviço, tive ainda a oportunidade de participar numa sessão cirúrgica
supervisionada por médicos veterinários especializados em cirurgia, na qual pude realizar,
em primeira mão, todo o processo cirúrgico incluindo a indução, manutenção, monitorização
e recuperação anestésica e a realização duma ovariohisterectomia propriamente dita, a uma
cadela pertencente a um programa de adopção dum abrigo de cães. Para além disso,
participei numa formação sobre a prática clínica veterinária ambulante e de atuação solidária
em abrigos de animais.
No serviço de Imagiologia (90h), participei em sessões diárias de interpretação e
resolução de casos clínicos, realizando uma avaliação final sobre o conteúdo abordado nas
mesmas. Em Radiologia, era da minha responsabilidade receber, preparar e posicionar o
animal, tal como definir as constantes radiográficas adequadas à projeção pretendida para
cada caso, tanto em pequenos como em grandes animais. Em Ecografia, para além da

2
recepção, preparação e posicionamento dos pacientes, tive a oportunidade de participar
numa sessão prática de ecografia abdominal, na qual pude realizar um exame completo, sob
a supervisão da médica veterinária responsável do serviço.
No serviço de Oftalmologia (55h), havia uma grande componente de interpretação,
discussão e resolução de casos clínicos acompanhado da execução prática das consultas
propriamente ditas. Nestas tive a oportunidade de assumir a responsabilidade de início ao
fim, começando pela recolha das histórias pregressas e pela realização dum exame
oftalmológico completo até a elaboração do plano diagnóstico e terapêutico. O exame
propriamente dito incluía a avaliação dos reflexos palpebrais, corneano e pupilares, da
resposta de ameaça, da produção lacrimal, da medição da pressão intraocular e também a
realização de biomicroscopia e oftalmoscopia para avaliar o fundo do olho. No fim de cada
consulta, era responsável por realizar uma breve apresentação e discussão sobre os achados
clínicos e o meu raciocínio clínico, com os médicos veterinários supervisores, e posterior
comunicação com os tutores. Tive a oportunidade também de assistir a cirurgias oculares
como, por exemplo a facoemulsificação da lente com colocação de lente intraocular, a
correção de entropión e a correção de distiquíase com recurso a crioterapia. Adicionalmente,
tive a oportunidade de realizar uma sessão prática cirúrgica num olho de suíno morto, cujo
objetivo era aprender algumas das técnicas de microcirurgia utilizadas nas pálpebras, como
correção de entropión e remoção de massas palpebrais, e na córnea, como enxertos de
conjuntiva. Para além disso, tive a oportunidade de realizar a preparação, medicação e
monitorização dos pacientes hospitalizados, pré e pós-cirúrgicos. Em termos de exames,
pude assistir a ecografias oculares, eletrorretinografias e gonioscopias. Todas as atividades
descritas neste serviço foram realizadas não só no cão e no gato mas também em aves e
equinos.

De modo geral, ambos os estágios foram experiências muito enriquecedoras,


profissional e pessoalmente. Permitiram-me desenvolver e adquirir novas competências,
tanto a nível de raciocínio clínico, como também a nível de relacionamento interpessoal e de
trabalho em equipa.

3
CAPÍTULO 2 - ENQUADRAMENTO DO ESTUDO: INTRODUÇÃO

No fim da década de 1980 surgiu uma nova parasitose em animais de companhia, na


Europa, conhecida como Thelaziose, provocada por nematodes da espécie Thelazia
callipaeda (Otranto and Dantas-Torres 2015). Até então estava descrita como uma infeção
ocular parasitária em carnívoros domésticos e lagomorfos, no Oriente e no território da antiga
URSS, tendo como vetor um artrópode, da ordem Diptera (Anderson 2000). Atualmente esta
doença está disseminada por muitos países Europeus, tanto do Centro, Sul, Este e Oeste do
continente (Zhang et al. 2018), incluindo Portugal, tendo como hospedeiros definitivos
carnívoros domésticos e silvestres, lagomorfos e Humanos. Ao longo dos anos, os
nematodes de T. callipaeda foram alvo de estudo tendo em conta a sua dispersão global e
demonstrou-se a existência de duas sub-populações dos mesmos, uma na Ásia e outra na
Europa, na qual cada uma apresenta um grau de especificidade com o seu vetor (do Vale et
al. 2019). No entanto, foram anos de incertezas até se confirmar o verdadeiro vetor de T.
callipaeda na Europa, a mosca-da-fruta, Phortica variegata (Otranto, Lia, et al. 2005; Otranto,
Cantacessi, et al. 2006).
Até à data, em Portugal já foram documentados casos de infeção ocular por T.
callipaeda em carnívoros domésticos (Rodrigues et al. 2012; Vieira et al. 2012; Pimenta et al.
2013; Soares et al. 2013; Delgado et al. 2013; Madeira de Carvalho et al. 2014; Maia et al.
2016), em carnívoros silvestres (Sargo et al. 2014; Seixas et al. 2018) e em lagomorfos (Gama
et al. 2016). Relativamente a casos de Thelaziose em humanos, até ao momento não existem
relatos da sua ocorrência em Portugal, ao contrário de outros países europeus como Itália,
França, Espanha e estados dos Balcãs (Otranto and Dutto 2008; Fuentes et al. 2012; McGarry
et al. 2017).
A dispersão desta doença por Portugal tem sido cada vez mais vasta, afetando
predominantemente a região Norte, mas também o Centro do país (Rodrigues et al. 2012;
Vieira et al. 2012; Pimenta et al. 2013; Soares et al. 2013; Delgado et al. 2013; Madeira de
Carvalho et al. 2014; Maia et al. 2016). Por esse motivo, era importante compreender quais
as regiões em que esta parasitose tem vindo a ser diagnosticada mais recentemente, de
forma a estabelecer as potenciais áreas endémicas no país.
Para a elaboração do estudo epidemiológico e clínico de Thelaziose considerou-se
relevante rever conceitos gerais relativos à anatomia do órgão da visão, em particular as
estruturas afetadas pelos nematodes em questão; à biologia do parasita e do seu vetor; ao
ciclo silvático e aos respetivos hospedeiros reservatórios; à distribuição geográfica da
parasitose; e ao seu ponto de vista clínico, visto que se enquadra no grupo das conjuntivites,
nomeadamente parasitárias. Era importante compreender qual a consciência por parte dos

4
profissionais Médico-Veterinários face a uma doença emergente e endémica no país com
conhecido potencial zoonótico, assim como as medidas de controlo que são instituídas.
A contribuição original da nossa dissertação incluirá os resultados de um inquérito
online em que procurámos estudar a componente epidemiológica e clínica associada a
Thelazia callipaeda em animais de companhia em Portugal e uma caracterização de casos
clínicos e respetiva identificação parasitológica num foco emergente de Thelaziose em
Portugal continental, mais especificamente no distrito de Portalegre.

5
CAPÍTULO 3 - REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.1 Órgão da Visão dos Animais de Companhia – Cão e Gato


No âmbito desta dissertação, é importante fazer uma revisão das estruturas
anatómicas oculares mais afetadas numa conjuntivite parasitária provocada pela espécie
Thelazia callipaeda, em pequenos animais.
Quanto à sua anatomia, o órgão da visão dos animais vertebrados é composto pela
órbita, pelo globo ocular, pelo nervo ótico e por estruturas acessórias tais como os músculos
oculares, as pálpebras, a conjuntiva e o aparelho lacrimal (Diesem 2005).
A órbita é uma fossa óssea composta por vários ossos e pelo ligamento supraorbital.
Na cavidade orbitária existem pequenos forâmenes que dão acesso a vasos sanguíneos e
nervos (Diesem 2005; Turner 2010). O globo ocular apresenta uma forma esférica nos
animais de companhia, estando protegido anteriormente pelas pálpebras (Turner 2010).
Segundo Prince et al (1960), citado por Samuelson (2013), os eixos óticos dos carnívoros
domésticos, cão e gato, assumem uma posição rostro-lateral, a cerca de 20º e 10º do eixo
central, respetivamente. Devido a esse facto estas duas espécies, tal como outras espécies
predadoras, têm um campo de visão binocular mais amplo do que os herbívoros (Barnett et
al. 2002; Samuelson 2013). Tanto o cão como o gato possuem uma órbita incompleta que é
completada pelo ligamento supraorbital que parte do processo frontal do osso zigomático e
do processo zigomático do osso frontal (Cook et al. 2009). No entanto, no caso do gato, estes
processos encontram-se mais aproximados, levando a que o ligamento seja mais curto e que
a órbita seja mais fechada comparativamente com a do cão (Samuelson 2013).
As doenças da superfície ocular são comuns nos pequenos animais, sendo de grande
importância realizar um exame minucioso da conjuntiva, visto que esta é uma das estruturas
mais afetadas. Uma boa avaliação da mesma permite distinguir uma simples lesão superficial
duma alteração intraocular. A conjuntiva é uma membrana mucosa que reveste o interior de
ambas as pálpebras, envolvendo também a totalidade da terceira pálpebra e cobrindo a
porção exposta da esclera, dando origem a dois fórnices conjuntivais; um superior e um
inferior. Divide-se, por essa razão, em três porções – palpebral, bulbar e a que reveste a
membrana nictitante , dando origem ao saco conjuntival (Turner 2010). É um tecido composto
por células caliciformes, responsáveis por produzir a camada mucosa da lágrima, mas
também por tecido linfoide, tecido conjuntivo, vasos sanguíneos e nervos (Barnett et al. 2002;
Turner 2010). Por esse motivo, a conjuntiva confere proteção não só pelo revestimento que
oferece, mas também pela presença de tecido glandular lacrimal que ajuda a manter as
condições ideais de humidade da córnea (Diesem 2005) e por ser um reservatório de
linfócitos que permite gerar uma resposta inflamatória face a lesões corneais (Cook et al.

6
2009). Para além desta função de proteção, a mucosa conjuntival confere uma maior
mobilidade às pálpebras e ao globo ocular (Samuelson 2013).
A terceira pálpebra encontra-se no canto medial do olho e a sua estrutura deriva duma
cartilagem hialina (Murphy et al. 2012; Samuelson 2013) em forma de T na sua substância
própria, coberta por uma prega conjuntival (Cook et al. 2009; Turner 2010). O bordo livre do
T da cartilagem pode ser pigmentado. Na intimidade da terceira pálpebra existe tecido
glandular lacrimal acessório, denominado glândula nictitante ou glândula superficial da
terceira pálpebra, cuja secreção é seromucosa tanto no cão como no gato (Diesem 2005;
Maggs 2008; Murphy et al. 2012; Samuelson 2013). Na maior parte dos animais domésticos,
está descrito que esta pálpebra tem um movimento passivo que resulta da contração do
músculo retrator do bulbo (Martin 2010; Samuelson 2013). No entanto, Prince et al (1960)
descreveram que os gatos possuem fibras musculares nesta estrutura, importantes para a
protusão e retração voluntária da mesma, como citou Diesem em 2005.
A glândula lacrimal localiza-se dorso-lateralmente à órbita (Diesem 2005; Cook et al.
2009; Murphy et al. 2012; Samuelson 2013) e está dividida em duas porções, sendo que uma
está associada às pálpebras e a outra encontra-se ventralmente ao processo zigomático do
ligamento supraorbital. Uma vez libertada a secreção glandular sobre o globo ocular, esta é
eliminada através de dois orifícios nas margens palpebrais superior e inferior, junto à
comissura medial, denominados de punta lacrimalia (Diesem 2005; Murphy et al. 2012). Estes
são continuados por canalículos lacrimais que se unem no saco lacrimal, que origina a
dilatação superior do ducto nasolacrimal, que se abre na cavidade nasal (Cook and Peiffer Jr
2001; Turner 2010). Este ducto é circundado por osso a nível proximal e por cartilagem ou
mucosa a nível distal (Diesem 2005). Segundo Martín and Schauder (1938) citado por Diesem
(2005), este ducto pode ser incompleto, como acontece no cão, havendo uma
descontinuidade da parede do mesmo. A soma de todas as secreções provenientes da
glândulas lacrimal e superficial da terceira pálpebra, das glândulas sebáceas de Meibomius
juntamente com o produto das células caliciformes conjuntivais, compõem a película lacrimal.
Esta está dividida em três camadas cuja a mais superficial deriva do produto das glândulas
sebáceas ou de Meibomius, sendo considerada a camada lipídica da película. O seu papel é
oferecer lubrificação, prevenir o excesso de lágrima na margem palpebral, evitando que a
mesma caia sobre a face, e retardar a evaporação da camada aquosa da película. Esta última
é de natureza serosa e é o maior componente da película lacrimal, sendo produzida pelas
glândulas lacrimal e superficial da terceira pálpebra e composta por vários fatores que
influenciam a saúde da córnea, que incluem compostos antimicrobianos, como a transferrina
e as imunoglobulinas (Ig) IgA, IgG e IgM. A nível mais profundo, em contacto com a córnea,
está a camada mucosa, produto das células caliciformes como foi referido anteriormente, cujo

7
o seu papel é melhorar a aderência da película lacrimal à superfície corneal (Murphy et al.
2012).

3.2 Agente Etiológico: Thelazia spp.


Em 1676, Johannes Rhodes descreveu pela primeira vez o parasita do género
Thelazia com base em casos de infeção ocular parasitária em bovinos (Faust 1927). No
entanto, os primeiros estudos sobre o desenvolvimento e transmissão de nematodes deu-se
em maior escala nos meados do século XIX (Anderson 2000), sendo que Bosc, em 1819, fez
uma nova avaliação do mesmo parasita e por respeito ao primeiro autor que o reportou,
intitulou-o de ”Thelazia de Rhodes” (Faust 1927). Ao longo dos anos, foram efetuadas várias
alterações de nome adequando-se às várias espécies animais que foram sendo infetadas.
Os primeiros casos de infeção ocular por Thelazia spp. abriram um leque de novas
descobertas face ao novo nematode que flutuava na câmara anterior do olho, entre a íris e a
córnea, como pensavam na época. Fez sentido na altura incluí-lo na família Filaria pela sua
conformação filiforme e de movimentos verminosos. No entanto, os poucos estudos que havia
na época geraram várias dúvidas, tais como o porquê de não invadir a câmara posterior, a
associação à cegueira por alterações do humor aquoso e a turvação ocular corresponder à
excreção das fezes do parasita, levando os cientistas da época a pensar se este agente não
se incluiria na geração espontânea. Reconheciam que era algo confuso, um “verme” ocular
que não tinha entrada para o organismo, ficando apenas na córnea, onde destacavam a sua
evolução de crescimento em fases distintas de observação (Lee 1840). Foi nos meados do
século XIX, que o conhecimento adquirido acerca da transmissão dos parasitas permitiu
entender o seu ciclo biológico e de que forma é que afeta grupos hospedeiros ao longo da
sua evolução, tendo um papel importante no que toca a medicina humana e animal (Anderson
2000).
As espécies do género Thelazia são assinaladas em diversas estruturas da órbita de
mamíferos tais como a conjuntiva, a face interna das pálpebras, a membrana nictitante e as
glândulas lacrimais e os seus ductos (Anderson 2000; Otranto et al. 2004; Otranto and
Traversa 2005; Rodger 2007; Roberts et al. 2009; Bowman 2014; Otranto and Dantas-Torres
2017).

3.3 Espécies do género Thelazia


O género Thelazia Bosc 1819 e as suas 16 espécies pertencem à família Thelaziidae
da ordem Spirurida (Anderson 2000), como se pode ver na Figura 1. São parasitas
heteroxenos que têm como hospedeiro intermediário (HI) um artrópode pertencente à família

8
Drosophilidae da ordem Diptera (Otranto, Cantacessi, et al. 2006; Otranto et al. 2012; Otranto
and Dantas-Torres 2017; Marino et al. 2018; Otranto et al. 2018; Palfreyman et al. 2018).
Dentro das 16 espécies de Thelazia spp., destacam-se Thelazia callipaeda, T. californiensis,
T. gulosa, T. lacrymalis, T. rhodesii e T. skrjabini face à sua grande importância a nível
veterinário e médico (Otranto and Traversa 2005; Otranto and Dantas-Torres 2017). Cada
uma tem vindo a demonstrar diferentes hospedeiros definitivos (HD) e distribuições
geográficas, sendo que T. callipaeda surgiu inicialmente na China, tendo vindo a disseminar-
se até à Europa ao longo do tempo (Faust 1927; Rodger 2007; Pimenta et al. 2013; Bowman
2014; López Medrano et al. 2015; Mihalca et al. 2015; Farkas et al. 2018; do Vale et al. 2019;
Marino et al. 2020). O mesmo sucedeu com as outras espécies relevantes supramencionadas
que também demonstraram ter uma distribuição global. Entre estas, apenas a última está
descrita como tendo hospedeiros definitivos em comum com T. callipaeda, provocando
infeção ocular a canídeos, felinos, ovinos, mamíferos silvestres e Humanos (Anderson 2000;
Rodger 2007). Por esse motivo, até à data, apenas estas duas espécies (T. californiensis e
T.callipaeda) são conhecidas por terem um potencial zoonótico (Faust 1927; Schultz 1970;
Anderson 2000; Otranto and Traversa 2005; Fuentes et al. 2012; Otranto and Deplazes 2019),
enquanto que as restantes mencionadas são parasitas de ruminantes e equinos (Anderson
2000; Rodger 2007; Bowman 2014).

Reino Animalia

Filo Nematoda

Classe Secernentea

Ordem Spirurida

Família Thelaziidae

Género Thelazia Bosc 1819

Espécie Thelazia gulosa Espécie Thelazia callipaeda


Railliet and Henry 1910 Railliet and Henry 1910

Figura 1 Taxonomia de Thelazia spp.


(Adaptado de Global Biodiversity Information Facility, 2019)

9
3.3.1 Thelazia callipaeda
Esta espécie foi descrita pela primeira vez na Ásia por Railliet and Henry em 1910,
como refere Faust em 1928, tendo vindo a dispersar-se gradualmente até à Europa (Figura
2), registada pela primeira vez em território Europeu, em Itália, em 1989, por Rossi and
Peruccio, citado por Otranto and Dantas-Torres, em 2015. É um parasita que infeta
carnívoros domésticos e silvestres, lagomorfos e também Humanos (Anderson 2000; Otranto
et al. 2004; Otranto and Dantas-Torres 2017). Os nematodes adultos costumam ser
encontrados frequentemente no saco conjuntival (Rodger 2007; Naem 2007), na face interna
das pálpebras e da membrana nictitante do hospedeiro definitivo (Otranto et al. 2004) e ainda
no ducto lacrimal (Naem 2007). Segundo Faust (1928), é comum estarem envolvidos em
secreções mucosas e lacrimais, produzidas em maior volume em animais infetados, que
compõem a alimentação propriamente dita destes nematodes, visto que esta é à base de
células epiteliais e muco.

Primeiros registos fora do continente Asiático


Europa 2001 – 2011
Europa 2012 – 2020
Apenas casos importados
Ásia

Figura 2 Distribuição geográfica de Thelazia callipaeda


(Adaptado de Otranto et al. 2020)

3.4 Morfologia Geral


O género Thelazia Bosc 1819 apresenta uma coloração pálida e de conformação
longilínea, atingindo um comprimento médio que oscila entre os 0,5 cm e os 2 cm, variando

10
entre sexos, sendo que as fêmeas são geralmente de maiores dimensões (Faust 1928;
Rodger 2007; Otranto and Dantas-Torres 2017). Na extremidade anterior têm uma cápsula
bucal bem desenvolvida, apesar de curta (Railliet 1916; Anderson 2000), na qual se distingue
uma boca hexagonal desprovida de lábios (Railliet 1916; Roberts et al. 2009), assim como
também têm um esófago muscular (Anderson 2000). Ao nível da cutícula apresentam estrias
transversas e profundas na porção anterior, que ajudam à mobilidade do nematode sobre a
superfície ocular (Anderson 2000; Rodger 2007; Roberts et al. 2009). A nível reprodutivo, os
machos possuem duas espículas, papilas pré- e pós-anais e um par de testículos tubulares,
enquanto que as fêmeas têm uma vulva anterior localizada posteriormente ao esófago e um
útero bifurcado (Railliet 1916; Faust 1928). Na extremidade posterior, os nematodes têm o
reto e o poro anal, que nos machos recebe o ducto ejaculatório, denominando-se cloaca
(Railliet 1916; Roberts et al. 2009). É de importância para a sua identificação ter em conta as
diferenças morfológicas que existem entre as várias espécies de Thelazia sp. principalmente
no que diz respeito às estrias transversas cuticulares, à abertura vaginal e ao número de
papilas anais (Naem 2007).

3.4.1 Morfologia de Thelazia callipaeda


Em 1928, Faust citou a detalhada descrição morfológica da fase larvar e adulta de
Thelazia callipaeda, realizada por Railliet and Henry em 1910 (Figura 3). Na estrutura do
adulto destaca-se uma cápsula bucal apenas a nível dorsal, como uma continuação da
cabeça do parasita, sendo que a nível ventral e lateral as estruturas são mais vestigiais e
fundem-se dorsalmente com a mesma, dando origem a um capuz capsular. Em relação ao
esófago, este é muscular como foi referido anteriormente, e é seguido por um anel nervoso
circumesofágico, assim como por um esfíncter que antecede o intestino do parasita. Este
último assume uma coloração negra e termina numa ampola piriforme antes de transitar para
o reto. É característico de ambos os sexos que o intestino assuma uma posição mais dorsal
devido à presença dos órgãos reprodutores dos mesmos. No caso do macho, este possui
uma curvatura ventral na sua extremidade caudal, testículos tubulares e órgãos sexuais
acessórios tais como as papilas pré- e pós-anais e duas espículas curtas, que destoam em
tamanho uma da outra, segundo Otranto et al. (2003), como citou Otranto and Dantas-Torres
(2017), e Faust (1928). No caso das fêmeas, estas são providas duma vulva bastante
evidente seguida da vagina que se abre anteriormente perto da junção entre o esófago e o
intestino (Otranto and Dantas-Torres 2017), expandindo-se até ao ovojetor. A partir desta
última estrutura, surge o útero que é bifurcado e está envolto sobre si mesmo devido à sua
dimensão. Este é seguido pelos ovidutos que se continuam como túbulos ováricos, que estão
fixos à parede somática do parasita (Faust 1928).

11
a: vista ventral da extremidade
anterior – cápsula bucal;
cutícula estriada; e a porção
anterior do esófago.
b: extremidade anterior, fêmea
de T. callipaeda – cápsula
bucal; esófago; anel nervoso
circumesofágico; porção
anterior do intestino; vulva e
extremidade anterior da
vagina.
c: extremidade posterior,
fêmea de T. callipaeda –
intestino; reto; e porções do
útero, ovidutos e ovários.
d: extremidade posterior,
macho de T. callipaeda – 8
pares de papilas pré-anais e 2
pós-anais; 2 espículas.
e: detalhe da região
pericloacal de macho de T.
callipaeda – 2 espículas de
tamanhos distintos
(assinaladas com setas) com
as suas bolsas espiculares;
papila adjacente à abertura
anal.
f: espícula curta.

Figura 3 Características morfológicas de T. callipaeda


(Adaptado de Faust, 1928)

Relativamente ao estádio larvar da espécie Thelazia callipaeda (Figura 4), este


encontra-se inicialmente envolto sobre si mesmo dentro do ovo, que se encontra no útero,
juntamente com outros, e totalmente embrionado no momento da ovopostura. Esta ocorre
por consequência dos próprios movimentos da larva dentro do ovo e das contrações vaginais.
Por conseguinte, a evolução até ao primeiro estádio larvar é caracterizado pelo ovo e pelos
movimentos regulares verminosos da larva dentro do mesmo. À medida que evolui sofre uma
evaginação, assumindo uma conformação finger-like. O primeiro estádio larvar maduro atinge
um comprimento médio que ronda os 400µm e um diâmetro transverso médio de 13,3µm. A
nível anterior, é visível uma cabeça redonda com seis papilas circumorais e um vestíbulo
bucal que não é acompanhado por qualquer cápsula. A partir do poro anal há uma redução

12
evidente de diâmetro, no entanto o corpo larvar termina com um processo caudal aumentado.
Nesta fase do desenvolvimento larvar já é possível identificar as estrias transversas
características desta espécie (Faust 1928).

Figura 4 Fases do desenvolvimento do envelope do ovo de T. callipaeda


a-b: ovos in utero; c-d: ovos com contorno oval; e-f: ovos com contorno esférico; g: extremidade anterior
com evaginação finger-like; h-n: continuação do desenvolvimento do envelope do ovo até ao primeiro
estádio larvar
(Adaptado de Faust, 1928)

3.5 Ciclo Biológico


As espécies de Thelazia sp. são conhecidas por terem um ciclo indireto, sendo que a
sua transmissão ocorre a partir dum hospedeiro intermediário (HI) infetado para um
hospedeiro definitivo (HD) saudável, como se pode observar na Figura 5 (Hermosilla et al.
2004; Otranto and Traversa 2005; Otranto and Dantas-Torres 2017). As fêmeas são
larvíparas (Otranto and Dantas-Torres 2015), contendo in utero um número importante de
ovos de membrana fina que estão embrionados, dando origem ao primeiro estádio larvar (L1)
(Anderson 2000). Este é depositado nas secreções lacrimais do HD pelo parasita adulto,
sendo ingerido pelo HI artrópode, da família Drosophilidae, ordem Diptera, que se alimenta

13
das mesmas secreções oculares do HD (Anderson 2000; Otranto and Dantas-Torres 2017).
No caso específico de T. callipaeda, as L1 eclodem das finas membranas que as envolvem
e penetram o intestino e o hemocélio do HI, três dias após a infeção, segundo Kozlov (1962)
citado por Otranto et al. (2004). Ainda dentro do HI, ocorre uma nova migração, no caso das
fêmeas estas invadem os ovos, enquanto que os machos migram até aos testículos, sendo
nestes locais que as L1 sofrem uma encapsulação, crescimento e duas mudas culminando
no estádio infetante L3 (Anderson 2000; Otranto et al. 2004; Otranto and Dantas-Torres
2017). Em maior detalhe, a primeira muda da T. callipaeda ocorre ao fim de 8 a 9 dias e a
segunda ao fim de 21 dias após a infeção, segundo Kozlov (1962) citado por Otranto et al.
(2004). O estádio infetante é, portanto, atingido, em média, ao fim de duas a três semanas,
mas apenas se estiverem presentes as condições térmicas necessárias, que rondam os 25ºC.
As larvas L3 atingem em média 2-3 mm de comprimento, sofrem um desenvolvimento
precoce dos órgãos genitais e apresentam algumas das principais características
morfológicas do parasita adulto, como as estrias transversas, a cápsula bucal curta, o esófago
muscular e a cauda romba e curta (Anderson 2000). Por fim, sofrem uma descapsulação e
migram até à probóscide da mosca, sendo libertadas no momento em que o muscídeo se
alimenta das secreções lacrimais do HD, onde a larva é depositada, seguindo o seu
desenvolvimento até atingir o estádio adulto, que ocorre ao fim de 1 mês, aproximadamente.
Nesta fase, completa-se o ciclo e repete-se tudo de novo, como pode ser observado na Figura
5 (Anderson 2000; Otranto et al. 2004; Otranto and Traversa 2005; Otranto and Dantas-Torres
2017).

3 dias após
L1 infeção
Ovos
larvares na
vagina Hemocélio

55 dias após 8-9 dias após


infeção infeção
Hospedeiro
Ovos Intermediário
larvares in
utero
L2

29 dias após
infeção

Fêmea Hospedeiros
sexualmente
matura
Definitivos L3 21 dias após
infeção

22-25 dias 8-9 dias após


após infeção L5 L4 infeção

Figura 5 Esquema representativo do ciclo biológico de Thelazia callipaeda nos


hospedeiros definitivos e intermediário
(Adaptado de Otranto et al. 2004).

14
3.5.1 Ciclo Silvático
A espécie T. callipaeda é conhecida por infetar carnívoros domésticos e silvestres e
também lagomorfos, tendo sido descritos, até aos dias de hoje, casos de parasitismo em
raposas vermelhas (Vulpes vulpes), lobos (Canis lupus), lobos ibéricos (Canis lupus
signatus), chacais-dourados (Canis aureus), martas (Martes foina), texugos (Nyctereutes
procyonoides), felinos silvestres (Felis silvestres), linces (Lynx lynx), coelhos europeus
selvagens (Oryctolagus cuniculus) e lebres-comuns (Lepus europaeus) (Otranto et al. 2009;
Hodžić et al. 2014; Mihalca et al. 2016; Farkas et al. 2018; Marino et al. 2018; Seixas et al.
2018; Bojan et al. 2019; Ionicǎ et al. 2019; do Vale et al. 2019; Nájera et al. 2020). É conhecida
como a espécie de Thelazia sp. com o maior número de hospedeiros definitivos entre as 16
espécies (Figura 6). Até à data, as raposas são o hospedeiro silvestre mais conhecido de T.
callipaeda, sendo a grande prova de que existe um ciclo silvático e que esse pode ser um
fator de dispersão dos nematodes desta espécie para regiões não endémicas (Otranto et al.
2009). Este carnívoro é considerado o hospedeiro ideal devido aos seus hábitos de vida que
favorecem a interação com o vetor, Phortica variegata, e, por conseguinte, a infeção por T.
callipaeda. As raposas são animais de atividade matinal e crepuscular coincidindo com a
atividade de P. variegata, que é também crepuscular e sazonal (Fedriani et al. 1999; Otranto
et al. 2009). Segundo Niewold (1980) e Doncaster and Macdonald (1991), citado por Otranto
et al. (2009), as raposas costumam formar grupos de baixa densidade populacional, devido
ao distanciamento que praticam entre adultos do mesmo sexo, facilitando a introdução de T.
callipaeda noutras áreas. Por outro lado, os lobos, como foi descrito por Mech (1970), citado
por Otranto et al. (2009), percorrem largas distâncias no pico da idade reprodutiva,
separando-se da matilha e migrando para outros territórios. Desta forma, é reconhecido que
tanto o lobo como a raposa, têm um papel importante na disseminação do parasita entre
regiões não endémicas, proporcionando a manutenção do ciclo silvático e assumindo o papel
de hospedeiro reservatório de T. callipaeda (Otranto et al. 2003; Otranto et al. 2007; Otranto
et al. 2009; Hodžić et al. 2014; Bojan et al. 2019; Nájera et al. 2020).

Figura 6 Exemplares de estádios adultos de Thelazia callipaeda nos olhos de hospedeiros reservatório
A) Raposa Vermelha B) Lebre-comum C) Gato selvagem D) Lobo E) Marta
Fonte: Otranto D, Dantas-Torres F, Mallia E, DiGeronimo PM, Brianti E, Testini G, Traversa D, Lia RP. 2009. Thelazia
callipaeda (Spirurida, Thelaziidae) in wild animals: Report of new host species and ecological implications. Veterinary
Parasitology.166(3–4):262–267. Inclusão de fotografia gentilmente autorizada pelo Professor Doutor Domenico Otranto.
15
3.6 Vetor
Como foi referido anteriormente, a espécie T. callipaeda tem um ciclo de vida indireto,
tendo como hospedeiro intermediário (HI) um vetor artrópode da ordem Diptera, da família
Drosophilidae, conhecido, hoje, como Phortica variegata (Figura 7). Pertence à sub-família
Steganinae assumindo um comportamento zoofílico ao alimentar-se de produtos animais, tais
como as secreções lacrimais de carnívoros, lagomorfos e Humanos, mas também de
produtos frutícolas, daí a origem do nome vulgar “mosca-da-fruta” (Otranto, Lia, et al. 2005;
Otranto, Brianti, et al. 2006; Otranto and Dantas-Torres 2017).

Reino Animalia

Filo Arthropoda

Classe Insecta

Ordem Diptera

Família Drosophilidae

Sub-Família Sub-Família
Drosophilinae Steganinae

Género Drosophila Género Phortica


Fallen 1823 Schiner 1862

Figura 7 Taxonomia de Phortica variegata.


(Adaptado de Global Biodiversity Information Facility, 2019; Fauna Europea, 2020; Otranto et al.
2012).

Anteriormente, esta espécie era denominada como Amiota variegata (Fallen), tendo
sido descrita inicialmente como o vetor de T. callipaeda, juntamente com a espécie Amiota
magna (Okada), no Japão por Nagata, em 1960, como citaram Otranto et al. em 2006. No
entanto, até ao ano de 2005 houve vários estudos face ao verdadeiro papel da P. variegata
na transmissão de Thelazia sp. Por exemplo, Kozlov (1961, 1963) , citado por Otranto et al.
(2006), determinou que esta espécie era responsável pela transmissão de T. callipaeda na
Sibéria, sendo este um estudo que foi rapidamente descartado visto que ainda não existia

16
uma revisão taxonómica europeia que permitisse identificar com certeza esse vetor nessa
região, segundo Máca (1977) citado por Otranto et al. 2006. Foi em 2002 que Wang et al.,
citado por Otranto et al. em 2006, afirmou que o HI de T. callipaeda era então Phortica okadai,
tendo como provas casos dispersos pela China, Japão, Coreia e a região Este da Sibéria. No
entanto, sempre existiram incertezas face a essa afirmação devido à falta de conhecimento
sobre a biologia da espécie P. variegata, sabendo que era possível confundir a mesma com
outras espécies de Phortica sp., nomeadamente P. okadai, como foi referido por Okada
(1956), Máca (1977) e Bächli et al. (2004), citado por Otranto et al. 2006. Foi apenas na
década passada que se conseguiu concluir assertivamente que o verdadeiro vetor de T.
callipaeda na Europa é P. variegata, tanto em ambiente experimental como natural (Otranto,
Lia, et al. 2005; Otranto, Cantacessi, et al. 2006). No entanto, com os novos estudos do vetor,
concluiu-se que apenas o macho é responsável pela transmissão da larva L3 de T. callipaeda,
após ter sido estudado o seu comportamento zoofílico em detalhe, que compreende a sua
alimentação com base em secreções lacrimais dos animais e Humanos, para além de
alimentos vegetais. No caso das fêmeas, estas demonstram uma forte preferência por
produtos frutícolas. Pensa-se que este comportamento pode estar associado tanto a fatores
biológicos como ambientais e nutricionais (Otranto, Cantacessi, et al. 2006; Dorchies et al.
2007; Palfreyman et al. 2018). Esta descoberta foi recebida com alguma surpresa pelo mundo
da entomologia, visto que geralmente as fêmeas dos insetos artrópodes são os verdadeiros
vetores, tendo em conta que procuram alimentar-se de animais de forma a obter um
suplemento proteico apropriado para o desenvolvimento dos seus órgãos reprodutores, o que
proporciona uma fácil transmissão de agentes patogénicos entre hospedeiros (Otranto,
Cantacessi, et al. 2006). Por isso mesmo, a nutrição dos vetores tem um papel muito
importante sobre o seu ciclo biológico, especialmente no que diz respeito ao ciclo reprodutor
das fêmeas adultas de insetos artrópodes, para o qual a ingestão de proteína é relevante
para a caracterização das mesmas. Esta depende da origem da proteína que cada vetor
requer nutricionalmente, caso seja de origem sanguínea são denominados anautógenos e,
caso tenha outra origem para além de sangue de outros animais, são denominados vetores
autógenos (Attardo et al. 2005), como é o caso da fêmea adulta de P. variegata.
De modo geral, a atividade biológica de Phortica variegata tem sido alvo de estudo e
há evidências de que tem uma atividade sazonal, atingindo o seu pico quando as
temperaturas rondam os 20-25ºC e a humidade relativa (HR) é de 50-75% (Otranto, Brianti,
et al. 2006). Desta forma, prevê-se que esteja presente em regiões mais altas com carvalhos
(Quercus spp.) ou campos de produtos frutícolas (Palfreyman et al. 2018) e rios no meio
envolvente, que influenciam a HR do ambiente (Otranto et al. 2009), e que atinja temperaturas
continentais e alguma precipitação (Otranto, Brianti, et al. 2006). Com estes estudos
biológicos, tem sido possível identificar nichos ecológicos e a partir daí prever em que

17
momentos e locais estará presente o vetor e a espécie T. callipaeda, em simultâneo. Desta
forma é possível elaborar mapas que demonstrem a distribuição geográfica e ecológica de
Thelaziose à medida que se vai dispersando pela Europa (Otranto, Brianti, et al. 2006).
Há uma notável relação entre o vetor e o nematode, visto que a mosca hiberna durante
a temporada de Inverno-Primavera, forçando a que o parasita hiberne também no seu interior.
Em maio, quando se inicia a atividade do vetor, este que inicialmente se alimenta de produtos
frutícolas, quando as condições térmicas e de HR são ideais, dá início à alimentação no
hospedeiro definitivo, depositando a L3 que continuará o seu ciclo fora do vetor. A hibernação
é algo curioso que justifica o motivo de se capturar moscas infetadas por T. callipaeda fora
da sua época de atividade, levantando suspeitas duma coevolução dos mesmos (Otranto,
Cantacessi, et al. 2006).
Foi a partir de chaves dicotómicas das famílias pertencentes à ordem Diptera e da
família Drosophilidae que foi possível realizar a correta identificação de P. variegata., tendo
estas sido elaboradas por Oldroyd em 1977 e por Bächli et al. em 2004, respetivamente,
citado por Otranto et al. 2006 (Figura 8).
A nível morfológico, a fêmea e o macho mostram ter características idênticas, em
grande parte, começando pelo comprimento que para a primeira ronda os 3,5-5 mm e para o
segundo os 3,5-4 mm. A região cefálica é caracterizada por olhos de coloração vermelha com
um aro pálido em redor e também por antenas amarelas douradas com aristas compostas
por 3-6 ramos dorsais. O tórax é curto e volumoso de coloração escura, no entanto é
caracterizado por manchas confluentes cinzentas e oito filas de cerdas torácicas dispostas
de forma irregular. O abdómen tem um padrão amarelo e castanho escuro que é atravessado
por três bandas transversais e uma longitudinal mais escuras, a nível dorsal. Para além disso
o último tergito é rombo, nos machos, e cónico, nas fêmeas, cobrindo os órgãos genitais. As
patas são de coloração escura exceto a extremidade do fémur que é amarela; e a tíbia é
envolvida por três bandas mais escuras. O tarso é também amarelo até à porção apical do
último segmento, que é mais escura. Relativamente às asas das moscas pertencentes à
família Drosophilidae, estas são hialinas, têm duas veias pigmentadas, uma interrupção na
veia costal, tal como também uma veia adicional que separa a célula discal da basal,
característica dos membros da subfamília Steganinae (Otranto, Brianti, et al. 2006). Por
último, a característica chave de identificação de um macho da espécie P. variegata, o
verdadeiro vetor de T. callipaeda na Europa, foi definida pela presença de três “dentes” ou
sensilla no ramo medial da porção anterior e outro no ramo dorsal do órgão genital masculino
(Otranto, Cantacessi, et al. 2006; Otranto, Brianti, et al. 2006; Otranto et al. 2018; Palfreyman
et al. 2018).

18
Figura 8 Características morfológicas da espécie Phortica variegata
a) cabeça de P. variegata com olhos de coloração vermelha rodeados por um aro pálido (seta) b) antena
de P. variegata cuja arista tem três a quatro ramos dorsais c) abdómen de P. variegata com bandas escuras
com uma disposição característica d) região genital de macho P. variegata cujo último tergito cobre os
órgãos genitais; presença de três “dentes” (sensilla) no ramo medial do órgão genital masculino e) órgãos
genitais parcialmente soltos do último tergito; três sensilla no ramo medial do órgão genital masculino
(seta) f) delineamento do órgão genital masculino de P. variegata g) região genital de fêmea de P.
variegata; último tergito cónico (setas)
Fonte: Otranto D, Brianti E, Cantacessi C, Lia RP, Máca J. 2006. The zoophilic fruitfly Phortica variegata:
Morphology, ecology and biological niche. Medical and Veterinary Entomology. 20(4):358–364. Inclusão de
fotografia gentilmente autorizada pelo Professor Doutor Domenico Otranto.

3.7 Epidemiologia
3.7.1 Distribuição Geográfica
A infeção ocular provocada por T. callipaeda foi descrita inicialmente no Oriente,
sendo conhecida como oriental eye-worm, tendo vindo a dispersar-se ao longo dos anos até
à Europa (Anderson 2000; Zhang et al. 2018). Começou por atingir primeiro a antiga região
da República Soviética, tendo chegado mais recentemente à Europa, tendo como porta de
entrada Itália (Hodžić et al. 2014; Otranto et al. 2015; do Vale et al. 2019). Atualmente esta
doença está disseminada por muitos países Europeus como, por exemplo, Alemanha,
Áustria, Bélgica, Bósnia e Herzegovina, Croácia, Espanha, França, Grécia, Hungria, Portugal,
Roménia, Sérvia, Suíça, Turquia, assim como também Reino Unido (Hermosilla et al. 2004;
Dorchies et al. 2007; Malacrida et al. 2008; Rodrigues et al. 2012; Vieira et al. 2012; Caron et
al. 2013; Pimenta et al. 2013; Hodžić et al. 2014; López Medrano et al. 2015; Mihalca et al.

19
2015; Otranto and Dantas-Torres 2015; Colella et al. 2016; Graham-Brown et al. 2016;
Paradžik et al. 2016; Graham-Brown et al. 2017; Farkas et al. 2018; Marino et al. 2018;
Palfreyman et al. 2018; Papadopoulos et al. 2018; Bojan et al. 2019; Eser et al. 2019; Hodžić
et al. 2019; do Vale et al. 2019; Marino et al. 2020; Silva et al. 2020).
Até à data, apenas está identificado um haplótipo (h1) do ADN de T. callipaeda, na
Europa, suspeitando-se que tenha uma especificidade genética que facilita a sua adaptação,
sobrevivência e transmissão entre os vários hospedeiros nestes países. No entanto, na Ásia
estão descritos cerca de vinte haplótipos, o que levanta a suspeita que este haplótipo h1
possa indicar que à medida que o vetor alcança uma área geográfica mais vasta, mais tarde
ou mais cedo, irá ocorrer a dispersão de novos haplótipos vindos do oriente para a Europa,
da mesma forma como ocorreu com o primeiro (Hodžić et al. 2014; Palfreyman et al. 2018;
do Vale et al. 2019). Hoje em dia, a infeção de animais silvestres, que agem como
hospedeiros reservatório, tem sido um fator importante na dispersão do nematode para
regiões europeias que antes não eram endémicas, sendo que são hospedeiros ideais para o
mesmo e transitam facilmente entre e dentro dos países, infetando os animais domésticos
dos mesmos. A deslocação dos animais de companhia, por questões de turismo ou
emigração, também facilita a dispersão do parasita na Europa (Hodžić et al. 2014; do Vale et
al. 2019).

3.7.2 Ponto de Situação em Portugal


Os primeiros estudos sobre casos autóctones em Portugal de Thelaziose em cães
tiveram como base casos clínicos na região Norte do país, especificamente nas cidades de
Chaves, Vinhais e Bragança, em 2011 (Vieira et al. 2012), e Vila Real, em 2012 (Pimenta et
al. 2013). O primeiro caso autóctone de Thelaziose em gatos foi também descrito em 2011,
tendo sido diagnosticado no Norte, mais especificamente na região Nordeste, em Macedo de
Cavaleiros (Rodrigues et al. 2012). Os animais infetados apresentavam sinais clínicos e
viviam no exterior, como é o caso dos cães pastores ou de cães e gatos que habitam em
ambientes rurais. Estas características, associadas ao clima, altitude e vegetação das
regiões em causa, apoiavam o facto de poderem ser zonas potencialmente endémicas,
estando presentes as condições ambientais para o vetor coexistir. Os animais em questão
não tinham historial de viagens o que suportou a hipótese de que se tratavam de infeções
autóctones. No entanto, é de realçar a importância da existência do ciclo silvático de T.
callipaeda, que poderá ter sido responsável pela introdução do nematode, em Portugal, a
partir de animais silvestres provenientes de regiões endémicas em Espanha, tendo em conta
a proximidade destes casos da fronteira. Também é importante ter em conta que o
parasitismo destes animais costuma ocorrer no verão, em que há uma maior mobilidade de

20
animais domésticos provenientes de países endémicos tais como França, Itália e Suíça, por
motivos de turismo ou de movimento de emigrantes de visita a Portugal (Vieira et al. 2012;
Pimenta et al. 2013; Soares et al. 2013; Sargo et al. 2014; Madeira de Carvalho et al. 2014).
Hoje em dia, o parasita já se dispersou até ao Centro de Portugal, tendo vindo a demonstrar
uma tendência para se apresentar mais a sul, havendo dúvidas se é pela maior dispersão
geográfica do vetor ou pela introdução de hospedeiros infetados em regiões não endémicas,
onde o vetor já estava presente (Maia et al. 2016).
Relativamente ao ciclo silvático, os primeiros casos de infeção de raposas vermelhas
(Vulpes vulpes) em Portugal foram descritos em 2014, tendo sido capturadas em Montalegre,
também no Norte do país, e no Sabugal, na região Centro-Este. Ambos os locais são rurais
cuja atividade principal é a agricultura e gado, tendo cães pastores, de caça e de guarda que
facilmente entram em contato com espécies carnívoras silvestres (Madeira de Carvalho et al.
2014). No entanto, ainda não há uma relação clara entre a interação do ciclo biológico
doméstico e silvático (Sargo et al. 2014). Por outro lado, nos dias de hoje, estes animais
silvestres já praticam maiores aproximações aos Humanos, em busca de comida,
aumentando o potencial zoonótico de T. callipaeda. Para além dos casos em raposas-
vermelhas, já foram descritos casos de Thelaziose em coelhos Europeus (Oryctolagus
cuniculus) em Portugal, definindo-o como um novo hospedeiro reservatório do Sul da Europa
(Gama et al. 2016). Também foi descrito pela primeira vez no país um caso de Thelaziose
numa marta (Marta foina), como tinha ocorrido em Itália (Otranto et al. 2009), no entanto
ainda não tinham sido registados casos noutros países incluindo Portugal, até à data. Desta
forma, é possível concluir que no país já há registo dum vasto grupo de hospedeiros
definitivos e reservatório de T. callipaeda, aumentando, por consequência, o potencial de
infeção dos animais domésticos e zoonótico deste nematode (Seixas et al. 2018).

3.7.3 Identificação Molecular


De forma a poder estruturar planos de prevenção e controlo face à Thelaziose, foi
necessário encontrar métodos de estudo que permitissem saber a especificidade do parasita
face ao hospedeiro, o padrão de transmissão do mesmo, bem como as suas características
genéticas (Otranto, Testini, et al. 2005).
Os marcadores genéticos representam ferramentas moleculares que permitem
identificar e caracterizar especificamente a espécie parasitária que se encontra no interior
dos hospedeiros definitivo e intermediário, a partir de técnicas de epidemiologia molecular.
Em 2004, foram realizados estudos moleculares que pretendiam identificar padrões de
transmissão e estimar a prevalência de infeções por Thelazia spp. nos seus hospedeiros.
Para tal, foram realizadas avaliações do marcador genético ITS1, o primeiro espaçador

21
interno transcrito do ADN ribossomal nuclear, de 5 espécies de Thelazia sp., incluindo T.
callipaeda (Otranto and Traversa 2004). Este era usado há vários anos na área de
diferenciação molecular e identificação taxonómica dos nematodes, visto que tem uma
variação sequencial baixa intra-espécie e alta inter-espécie (Gasser and Newton 2000). No
caso específico de T. callipaeda, a sequência do marcador ITS1 atinge os 905 pares de
bases de comprimento e apresenta 16 locais de polimorfismo, sendo esta a maior sequência
genética conhecida em nematodes até à data. Após a realização de tais estudos moleculares
confirmou-se que este marcador genético, ITS1, era uma ferramenta útil para a identificação
e diferenciação de espécies de Thelazia sp., em qualquer estádio do ciclo biológico, visto que
apresentava uma variação sequencial baixa intra-espécie e alta inter-espécie, bem como as
sequências se mantinham iguais entre os diferentes estádios de desenvolvimento dos
nematodes, incluindo os estádios larvares no interior do hospedeiro intermediário (Otranto
and Traversa 2004).
No entanto, em 2005 foi realizada uma investigação para determinar a variabilidade
genética de T. callipaeda na Europa e na Ásia, a partir de estudos de caracterização
molecular das sequências genéticas da subunidade 1 do gene mitocondrial do citocromo c
oxidase (cox1) de T. callipaeda (Otranto, Testini, et al. 2005; Zhang et al. 2018). Esta técnica
provou ser mais eficaz do que a avaliação das sequências ribossomais (ITS), sobretudo
quando se trata de estudos de pequenas amostras de ADN para identificar e diferenciar novas
espécies, tal como estudar as suas relações filogenéticas (Blouin 2002; Hu et al. 2004).
Foram detetados 21 haplótipos sendo que apenas um, o h1, está presente na Europa,
enquanto que os restantes se encontram dispersos pela Ásia, nomeadamente na China,
Coreia e Japão (Hodžić et al. 2014; Zhang et al. 2018; do Vale et al. 2019). Os resultados
desta análise filogenética, demonstraram que existem duas subpopulações de T. callipaeda,
uma que compreende a população europeia com o haplótipo h1 e outra que compreende a
população asiática com os restantes haplótipos. Também ficou claro que há uma alta
especificidade entre T. callipaeda e P. variegata, o vetor europeu, resultando numa
disseminação geográfica comum entre eles (Otranto, Testini, et al. 2005; Hodžić et al. 2014;
Zhang et al. 2018; do Vale et al. 2019). No entanto, T. callipaeda apresenta uma baixa
variabilidade genética dentro da subpopulação da Europa (Otranto, Testini, et al. 2005), visto
que surgiu em regiões não endémicas após a migração de carnívoros domésticos e silvestres
provenientes de regiões endémicas (Hodžić et al. 2014; Palfreyman et al. 2018).
Para além do que já foi mencionado em relação às vantagens da identificação
molecular de espécies parasitárias, esta também permite realizar um prognóstico do animal
infetado após o tratamento, visto que cada espécie tem uma sensibilidade única aos vários
anti-helmínticos do mercado. Portanto, com a correta identificação da espécie infetante, é
possível escolher o fármaco mais eficaz (Otranto and Traversa 2004). No entanto, os estudos

22
moleculares são realizados não tanto para obter um diagnóstico, devido à fácil deteção e
identificação morfológica das espécies de Thelazia spp., mas sim para poder desenvolver
estudos filogenéticos e eco-epidemiológicos (Otranto and Dantas-Torres 2017).

3.8 Thelaziose
3.8.1 Patogenia
A Thelaziose é uma infeção ocular parasitária provocada pelos estádios larvares e
adultos de nematodes do género Thelazia, classificada como uma conjuntivite parasitária
(Gelatt 2003; Maggs 2008; Martin 2010; Turner 2010; Hendrix 2013). É caracterizada por
sinais clínicos inflamatórios que podem ser ligeiros, moderados ou graves, tais como
blefarospasmo, aumento de lacrimejo, corrimento ocular, epífora, blefarite, conjuntivite,
queratite, opacidade ou até mesmo úlceras da córnea, como se pode observar na Figura 9
(Bianciardi and Otranto 2005; Otranto and Traversa 2005; Motta et al. 2012; Otranto et al.
2016).

Figura 9 Conjuntivite acompanhada de úlcera da córnea fluoresceína


positiva, provocada pela presença de um exemplar de Thelazia callipaeda
no olho de um cão
(Fotografia original - Ana Marta Amorim)

3.8.2 Enquadramento Clínico sobre Conjuntivites em Animais de Companhia


Sendo a Thelaziose uma conjuntivite parasitária, justifica-se fazer um breve
enquadramento sobre o tema das conjuntivites. Ao longo dos anos, a classificação das
doenças inflamatórias da conjuntiva tem sido realizada de acordo com a sua duração,
natureza do corrimento ocular, aparência e etiologia. De todas estas, foi reconhecido que a
etiologia era o parâmetro mais importante para poder diagnosticar corretamente uma

23
conjuntivite, considerando a espécie que está em causa, pois as etiologias variam consoante
as mesmas (Maggs 2008).
No caso dos cães, a etiologia mais comum de conjuntivite é a queratoconjuntivite
seca, caracterizada pela redução da produção lacrimal, pelo seu caráter crónico e não
infecioso. Esta doença pode ser secundária a conjuntivites crónicas por alterações estruturais
das pálpebras ou dos cílios (ex: entropión ou triquíase) ou a processos infeciosos. Estes
podem ser causados tanto por agentes virais (ex: vírus da Esgana; FHV-1) como bacterianos
ou parasitários (ex: Leishmania sp.) e podem provocar uma disfunção das glândulas lacrimais
ou de Meibomius. Em casos mais severos ou mesmo agudos, a falta de lubrificação gera uma
desidratação epitelial tão acentuada que facilita a ocorrência de ulceração da córnea que
pode ser complicada por infeções bacterianas secundárias. Também está descrita no gato,
no entanto não assume tanta importância clínica em comparação com outras etiologias
(Barnett et al. 2002; Maggs 2008; Cook et al. 2009). Para além da deficiência de produção
lacrimal, existem outras causas não-infeciosas de conjuntivite como as etiologias
imunomediadas, alérgicas e alterações estruturais das pálpebras e dos cílios.
Respetivamente às conjuntivites imunomediadas, estas ocorrem em situações de exposição
conjuntival com uma resposta imunológica exacerbada, nas quais se enquadram as infeções
conjuntivais alérgicas. Estas últimas ocorrem frequentemente no cão sob a forma de reações
de hipersensibilidade, como em casos de dermatite atópica (Lourenço-Martins et al. 2011),
quando em contato direto com alergénios tais como os pólens, ácaros do pó ou esporos de
fungos, incluindo toxinas que podem ser produzidas por algumas das bactérias comensais
do saco conjuntival, como é o caso de Staphylococcus aureus. A inflamação consequente à
reação alérgica também facilita a ocorrência de infeções bacterianas secundárias (Maggs
2008; Cook et al. 2009; Hendrix 2013).
No caso dos gatos, a etiologia mais comum de conjuntivite é de origem infeciosa,
sendo provocada pelo Herpesvírus felino tipo 1 (FHV-1), tendo como diagnóstico diferencial
mais comum a infeção bacteriana provocada por Chlamydophila felis. Dentro dos agentes
bacterianos, Mycoplasma felis, que faz parte da flora comensal da conjuntiva dos gatos,
também pode estar presente em casos de conjuntivite felina (Fernandez et al. 2017).
Relativamente às infeções fúngicas, estas são pouco comuns em todas as espécies
mas quando surgem costumam assumir um carácter crónico, podendo estar presentes
microrganismos como Candida spp., Aspergillus spp. ou leveduras (Maggs 2008; Cook et al.
2009; Hendrix 2013).

3.8.3 Sinais Clínicos e Lesões


Tanto as características morfológicas do nematode como o género influenciam o grau
de inflamação do olho. A primeira é responsável por causar lesões físicas, tanto na conjuntiva

24
como no epitélio corneal, devido à presença da estriação transversa cuticular das espécies
de Thelazia sp. O género do nematode também é relevante, visto que até à data apenas
foram descritos sinais clínicos em casos de infeção provocados por fêmeas grávidas. Quando
se trata do nematode macho, esta parasitose apenas regista casos subclínicos (Otranto and
Traversa 2005), o que indica que podem estar ausentes sinais clínicos evidentes em animais
infetados por T. callipaeda (Maia et al. 2016). No entanto, tendo em conta que esta parasitose
se enquadra na classificação das conjuntivites é comum apresentar os seguintes sinais
clínicos: blefarospasmo, hiperémia, corrimento ocular seroso, epífora, lesões na córnea e/ou
quemose, tanto no cão como no gato, como se pode observar na Figura 10 (Otranto and
Traversa 2005; Otranto and Dantas-Torres 2017).

Figura 910Conjuntivite
Figura Conjuntivite marcada
exuberante acompanhada
com de quemosepor
edema da conjuntiva severa devidode
presença à
exemplares de Thelazia callipaeda sob a córnea de um olho de gato
presença de exemplares de Thelazia callipaeda sobre a córnea no olho
esquerdo de um gato
Fonte:
Fonte: Rodrigues
Rodrigues FT,
FT, Cardoso
Cardoso L,
L, Coutinho
Coutinho T,T, Otranto D, Diz-Lopes
Otranto D, Diz-Lopes D.D. 2012.
2012. Ocular
Ocular
thelaziosis due to Thelazia callipaeda in a cat from northeastern Portugal. J Feline
thelaziosis due to Thelazia callipaeda in a cat from northeastern Portugal. Journal Med
of
Surg.
Feline14(12):952–954. Inclusão 14(12):952–954.
Medicine and Surgery. de fotografia gentilmente
Inclusão deautorizada
fotografia pelo Professor
da autoria da
Doutor Luís Cardoso.
Professora Doutora Filipa Teixeira Rodrigues (Cínica VetSantiago, Bragança)
gentilmente autorizada pelo Professor Doutor Luís Cardoso.

Há uma tendência crescente para a infeção de cães de raças grandes que vivem no
exterior, enquanto que em gatos continua a haver um padrão menos acentuado de infeção
que pode ser devido aos seus hábitos de limpeza regulares ou a maior dificuldade em realizar
o diagnóstico nos mesmos (Otranto et al. 2003; Otranto and Traversa 2005).

3.8.4 Diagnóstico
Para um diagnóstico correto é necessário realizar um exame oftalmológico detalhado,
com especial atenção à observação do saco conjuntival e da face interna da membrana
nictitante (Figura 11). Após a detecção de indivíduos de espécies de Thelazia spp., tanto na

25
fase adulta como larvar, deve ser feita a remoção dos mesmos e proceder-se à sua
identificação morfológica e molecular (Otranto and Dantas-Torres 2017).
A remoção dos nematodes do olho é mecânica, através da lavagem do saco
conjuntival com solução salina estéril (NaCl 0,9%) e com recurso a zaragatoas ou fórceps
intraoculares estéreis, sendo necessário que o paciente esteja sob o efeito de anestesia
tópica ocular conseguida com recurso a 0,4% oxibuprocaína (Motta et al. 2012; Pimenta et
al. 2013) ou por aplicação tópica de cloridrato de proparacaína (segundo Bhaibulaya et al.
(1970), citado por Bianciardi and Otranto (2005)), e que a recolha seja feita de forma asséptica
(Shen et al. 2006; Pimenta et al. 2013; Otranto and Dantas-Torres 2017; Zhang et al. 2018).
Os exemplares são colocados em placas de Petri com solução salina 0,9% (NaCl)
para serem identificados no momento (Zhang et al. 2018) ou então conservados em etanol a
70% para uma avaliação posterior (Pimenta et al. 2013).

Figura 11 Numerosos exemplares de Thelazia callipaeda visíveis sobre a córnea,


após depressão da membrana nictitante, no olho direito de um cão
Fonte: Otranto D, Ferroglio E, Lia RP, Traversa D, Rossi L. 2003. Current status and
epidemiological observation of Thelazia callipaeda (Spirurida, Thelaziidae) in dogs, cats and
foxes in Italy: A “coincidence” or a parasitic disease of the Old Continent? Vet Parasitology.
Inclusão da fotografia gentilmente autorizada pelo Professor Doutor Domenico Otranto.

3.8.5 Tratamento, Profilaxia e Controlo


Relativamente ao tratamento e controlo da infeção por T. callipaeda, existem duas
abordagens terapêuticas a considerar, em primeiro lugar, a remoção mecânica dos
nematodes, e em seguida a administração de lactonas macrocíclicas, tais como a
ivermectina, a milbemicina oxima ou a moxidectina (Lia et al. 2004; Bianciardi and Otranto
2005).
Em relação à remoção mecânica, este é um procedimento invasivo que requer
atenção por parte de quem o realiza e que não garante a extração de todos os nematodes
presentes. No caso dos estádios larvares, estes são particularmente difíceis de remover,

26
sendo nesses casos mais eficaz a instituição de um tratamento anti-helmíntico (Bianciardi
and Otranto 2005). Segundo Rossi and Peruccio (1989), citado por Bianciardi and Otranto
(2005), este tem como base a instilação tópica ocular de organofosforados ou a injeção
subcutânea de ivermectina (200 µg/kg). Também poderá ser instilada localmente
moxidectina a 1%. Qualquer uma destas três opções terapêuticas tem tido resultados
positivos, mostrando ser eficazes no controlo da Thelaziose em cães (Lia et al. 2004).
Recentemente, foi realizado um estudo que veio comprovar que a combinação de
moxidectina 2,5% e imidacloprid 10% na aplicação tópica spot-on (Advocateâ; Elanco) é
eficaz no tratamento e profilaxia de Thelaziose por T. callipaeda em cães (Bianciardi and
Otranto 2005; Otranto et al. 2016). De certa forma, esta nova opção terapêutica veio facilitar
o tratamento e prognóstico, visto que é de fácil administração em comparação com injeções
e instilações de fármacos anti-helmínticos, segundo Rossi and Peruccio (1989) e Lia et al.
(2004), citado por Bianciardi and Otranto (2005). É relevante mencionar o largo espetro de
ação desta formulação face a outros tipos de nematodes que infetam os cães, tais como
Dirofilaria immitis, Toxocara canis, Toxascaria leonina, Ancylostoma caninum, Uncinaria
stenocephala e Trichuris vulpis, e também face a ectoparasitas (Bianciardi and Otranto 2005).
O tema de quimiprofilaxia foi algo que começou a ser equacionado no tratamento e
prevenção de infeções por T. callipaeda. Em 2008, foi realizado um estudo sobre o eficácia
duma formulação oral de milbemicina oxima (Interceptorâ, Elanco) que é usada no plano
profilático de infeções por Dirofilaria immitis em cães, cuja dose recomendada para essa
doença é 0,68 mg/kg. Ao longo do estudo comprovou-se que a eficácia do tratamento era
dose-dependente e que a mesma substância ativa era eficaz tanto a nível terapêutico como
profilático em cães infetados por T. callipaeda, sendo a dose terapêutica de máxima eficácia
de 0,86 mg/kg e a profilática de 0,68 mg/kg, administrada mensalmente, tal como na profilaxia
de infeções por D. immitis (Ferroglio et al. 2008). À medida que foram surgindo mais casos
de infeções por T. callipaeda, maior foi a procura de novas opções terapêuticas. Desta forma,
realizou-se um estudo para a avaliar a eficácia terapêutica da administração oral duma
formulação que incluía milbemicina oxima e praziquantel (Milbemax®, Elanco), em cães e
gatos (Motta et al. 2012). Os resultados deste estudo demonstraram uma alta eficácia
terapêutica ao usar esta combinação cujas doses de milbemicina oxima variavam entre os
0,5 mg/kg e 2 mg/kg juntamente com 5 mg/kg de praziquantel. Desta forma, esta opção
terapêutica acaba por ter um maior espetro de ação face a nematodes e cestodes em cães e
gatos. Este resultado veio confirmar que milbemicina oxima é uma substância ativa muito
eficaz isoladamente ou em combinação, no tratamento e profilaxia de infeção por T.
callipaeda, quando administrada mensalmente. A formulação de milbemicina oxima e
praziquantel é comercializada sob a forma de comprimidos palatáveis e mastigáveis o que

27
facilita a administração, principalmente em cães e gatos difíceis de manipular e, por
consequência, é mais segura do que as opções tópicas cuja absorção é afetada pelas
condições de humidade do pelo de animais que habitam no exterior e que se encontram em
regiões com maior precipitação e acaba por necessitar dum maior empenho no tratamento
por parte dos tutores (Motta et al. 2012).
Em 2016, apenas a formulação de milbemicina oxima/praziquantel (Milbemax®,
Elanco) estava registada como opção terapêutica de Thelaziose em cães, na Europa, tendo
surgido um estudo que comparou a sua eficácia com a formulação spot-on, acima
mencionada, de moxidectina 2,5% e imidacloprid 10% (Advocateâ; Elanco). Comprovou-se
que a última era mais eficaz, sendo que após uma única aplicação tópica, ao fim de 5 a 9
dias foi atingida a cura dos cães infetados, ao contrário dos comprimidos de milbemicina
oxima que tardaram 21 dias, após uma segunda administração, a obter os mesmos
resultados. A nível profilático também se provou que o spot-on de moxidectina 2,5% e
imidacloprid 10% era melhor que os comprimidos de milbemicina oxima, havendo uma
redução de nematodes de 100% e 90%, respetivamente, quando aplicados mensalmente de
forma profilática. Conclui-se que a existência dum tratamento contínuo é fulcral para o
controlo da infeção, reduzindo o risco zoonótico destes parasitas (Otranto et al. 2016).
Relativamente aos animais silvestres responsáveis pelo ciclo silvático de T.
callipaeda, deve ser considerada a administração de formulações de moxidectina e
milbemicina oxima, como as que foram mencionadas acima, visto que as coleiras repelentes,
com a formulação imidacloprid 10% e 4,5% flumetrina (Seresto®, Elanco), já provaram não
ser eficazes face à Thelaziose (Lechat et al. 2015).

3.9 Thelaziose Humana


A Thelaziose Humana é uma zoonose, visto que surge como consequência da
interação entre humanos e animais, neste caso, carnívoros domésticos ou silvestres ou ainda
lagomorfos infetados por T. callipaeda, que vivem na proximidade dos humanos. Por esse
motivo, o ser humano foi considerado como um hospedeiro acidental de Thelaziose, visto que
uma vez infetado, rapidamente procura a extração dos nematodes, interrompendo o seu ciclo
de transmissão (Fuentes et al. 2012).
O primeiro relato de infeção Humana por T. callipaeda ocorreu em Pequim, na China
(Stuckey 1917). A Thelaziose Humana foi-se dispersando gradualmente pela China, afetando
principalmente idosos e jovens de áreas menos desenvolvidas e com condições
socioeconómicas mais pobres, segundo K. C. Wang, Wang e Shen, em 1999, citado por Shen
et al., em 2006. Foi uma questão de tempo até se tornar uma doença endémica nesse país

28
e também, mais tarde, na antiga União Soviética, segundo Miroshnichenko et al. (1988) citado
por Shen et al. (2006).
Foi em 2008, que surgiram os primeiros casos humanos na Europa, nomeadamente
no Norte de Itália e no Sul de França, onde já tinham sido diagnosticados casos de Thelaziose
em carnívoros domésticos (Otranto and Dutto 2008). Até à data, para além de Itália e França,
já existem registos de infeções em humanos em Espanha (Fuentes et al. 2012; McGarry et
al. 2017) e nos estados dos Balcãs (McGarry et al. 2017), como a Croácia (Paradžik et al.
2016) e a Sérvia (Tasić-Otašević et al. 2016). Atualmente, ainda não existem registos de
ocorrência desta parasitose em humanos em Portugal, no entanto o risco de infeção é cada
vez superior tendo em conta o maior número de casos de carnívoros infetados no Norte e
Centro do país, bem como o potencial zoonótico de T. callipaeda.
Os sintomas de Thelaziose em humanos geralmente são representados por
conjuntivite ligeira, hipertrofia dos folículos linfoides, irritação por corpo estranho, aumento de
lacrimejo, e também prurido, congestão, inchaço, fotossensibilidade e queratite (Otranto and
Dantas-Torres 2017). É comum que esta infeção seja complicada por uma infeção bacteriana
secundária a microrganismos dos géneros Pasteurella, Chlamydia ou Staphylococcus, devido
ao ato de coçar para aliviar o prurido, segundo Smith (2004) citado por (Shen et al. 2006). No
entanto, nestes casos, os sintomas são mais exuberantes e dificultam o diagnóstico de
Thelaziose por serem caracterizados por blefarite, congestão conjuntival e secreções
purulentas bilaterais (Shen et al. 2006). A sazonalidade de T. callipaeda e P. variegata
sobrepõe-se com a época de conjuntivites alérgicas, que frequentemente mimetiza os sinais
inflamatórios de Thelaziose e esta acaba por ser negligenciada (Otranto and Dutto 2008).
Para controlo de casos humanos, até à data não há nenhuma formulação de repelente
inseticida eficaz contra P. variegata, sendo que as estratégias preventivas se baseiam na
utilização de redes protetoras e no tratamento a partir da remoção mecânica dos nematodes,
não só dos humanos infetados, mas também dos animais coabitantes que podem atuar como
hospedeiro reservatório para a infeção humana (Shen et al. 2006; Otranto and Dutto 2008).
O método mais eficaz que poderá estabelecer um melhor controlo desta zoonose é a
cooperação entre Medicina Humana e Veterinária, complementando técnicas e
conhecimentos e promovendo novas soluções, de forma a melhorar a saúde ocular, tanto
animal como Humana (Shen et al. 2006), de acordo com o princípio de One Health, One
Medicine (Tasić-Otašević et al. 2016)

29
CAPÍTULO 4 - ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO E CLÍNICO SOBRE Thelazia
callipaeda EM ANIMAIS DE COMPANHIA EM PORTUGAL

4.1 Introdução
A infeção ocular provocada por Thelazia callipaeda, conhecida como Thelaziose,
apenas foi descrita em Portugal em animais de companhia no decurso da última década (do
Vale et al. 2019). Ao longo dos anos foi subestimada pelos médicos veterinários, visto que se
desconhece a sua situação epidemiológica no país, sobretudo em cães e gatos. No entanto,
é uma parasitose com incidência crescente, tendo em conta o número de casos que têm
vindo a ser relatados até à data em carnívoros domésticos (Rodrigues et al. 2012; Vieira et
al. 2012; Pimenta et al. 2013; Soares et al. 2013; Delgado et al. 2013; Madeira de Carvalho
et al. 2014; Maia et al. 2016; Seixas et al. 2018), carnívoros silvestres (Sargo et al. 2014;
Seixas et al. 2018) e lagomorfos (Gama et al. 2016).
Este estudo pretende ajudar a colmatar essa ausência de informação, reunindo dados
nacionais sobre a ocorrência da doença, comprovando que esta deve ser incluída na lista de
diagnósticos diferenciais nos casos de conjuntivite em carnívoros domésticos e silvestres, e
também lagomorfos.

4.2 Objetivos
Este trabalho pretende contribuir para a caracterização da infeção parasitária por
Thelazia callipaeda atualmente em Portugal, trazendo um aporte de conhecimentos à
comunidade científica na área da Oftalmologia e Parasitologia Veterinária de animais de
companhia e na área de Saúde Pública.
Mais especificamente, os objetivos deste trabalho foram os seguintes:
§ Perceber a importância da infeção parasitária por Thelazia callipaeda atualmente em
animais de companhia em Portugal.
§ Identificar, através do inquérito realizado, quais as regiões geográficas do país que
têm registos clínicos de conjuntivites parasitárias devido a esta parasitose.
§ Perceber qual a espécie mais afetada e se há conhecimento da existência de
hospedeiros reservatório em Portugal por parte dos médicos veterinários participantes
no estudo.
§ Estudar de que forma é que o ambiente em que o hospedeiro habita, rural vs. urbano,
influencia a ocorrência desta doença.
§ Descrever a abordagem clínica perante esta parasitose, incluindo o reconhecimento
dos sinais clínicos, a identificação do parasita, o tratamento e a prevenção da doença.

30
§ Compreender a perceção dos Médicos Veterinários face ao impacto desta doença na
população animal.

4.3 Materiais e Métodos


Este trabalho tem como base um estudo descritivo, realizado a partir dos dados
obtidos pelo preenchimento de um questionário online direcionado a médicos veterinários
que exerçam clínica de animais de companhia, tanto em Portugal Continental, como também
nos Arquipélagos dos Açores e da Madeira.
O questionário foi desenvolvido com base em conhecimentos adquiridos ao longo do
ciclo de estudos do MIMV e através de pesquisa bibliográfica específica sobre a doença em
questão. Teve como público alvo profissionais Médico-Veterinários que já diagnosticaram
casos de Thelaziose, no decorrer da sua prática clínica. Foi realizado um pré-teste
previamente à divulgação oficial do questionário a médicos veterinários que
correspondessem ao critério de seleção do público alvo. Posteriormente, o questionário foi
disponibilizado a partir da plataforma GoogleâForms e enviado para o maior número de
clínicas veterinárias dispersas por todo o país, assim como para os membros do Grupo de
Interesse Especial de Oftalmologia da Associação Portuguesa de Médicos Veterinários
Especialistas em Animais de Companhia (APMVEAC), para membros do Fórum de Médicos
Veterinários em Portugal, para o corpo clínico do Hospital Escolar Veterinário da Faculdade
de Medicina Veterinária (HEV-FMV) e, adicionalmente, para membros do corpo docente da
Faculdade de Medicina Veterinária (FMV) da Universidade de Lisboa.
O questionário era composto por 25 perguntas de preenchimento obrigatório, das
quais 22 eram fechadas e as restantes 3 eram abertas, como pode ser constatado no Anexo
1. Relativamente às perguntas fechadas, estas tinham múltiplas opções de resposta, sendo
que apenas 1 das 22 questões incluía uma opção aberta. O questionário era composto por
um número relativamente restrito de questões, de modo a incentivar a colaboração por parte
dos médicos veterinários e, consequentemente, aumentar a taxa de resposta. Em janeiro de
2020, foram enviados e-mails com o questionário no qual se fez uma breve descrição do
estudo de forma a encorajar o preenchimento do mesmo. A divulgação foi efetuada via online,
a partir do envio de e-mails, da partilha no grupo de interesse supramencionado, através de
redes sociais, e entre membros institucionais tanto da FMV como do HEV-FMV. As respostas
foram obtidas entre os meses de janeiro e agosto de 2020, num espaço temporal de 8 meses.
A elaboração do questionário teve como base a informação obtida após a recolha
bibliográfica sobre a infeção parasitária em questão, a biologia do parasita, bem como os
seus hospedeiros definitivos, reservatórios e vetor. Do ponto de vista clínico, procurou-se
incluir questões relativas às alterações causadas pela presença do nematode, bem como a
abordagem terapêutica e preventiva realizada pelos médicos veterinários em Portugal.

31
As questões abordadas no questionário podem ser divididas nos seguintes pontos:

4.3.1 Área Geográfica


Um dos objetivos do presente estudo era compreender a área geográfica em que cada
médico veterinário, no questionário, exercia clínica, de forma a interpretar a dispersão da
infeção parasitária pelo território nacional. Foram listadas as 13 províncias tradicionais de
divisão do país para posterior seleção – Minho, Trás-os-Montes e Alto Douro, Douro Litoral,
Beira Alta, Beira Litoral, Beira Baixa, Ribatejo, Estremadura, Alto Alentejo, Baixo Alentejo,
Algarve e os Arquipélagos dos Açores e da Madeira.

4.3.2 Conjuntivites
O outro objetivo era caracterizar melhor as conjuntivites descritas pelos clínicos
quanto a número de casos, etiologia, espécies afetadas, sinais clínicos e a sua apresentação,
bem como o tratamento instituído.

4.3.2.1 Número de Casos


Era relevante compreender, aproximadamente, quantos casos de conjuntivite eram
observados pelos inquiridos num ano, sendo que as opções variavam desde menos de 10
casos até mais de 50 casos. No caso de conjuntivites parasitárias, especificamente, a
questão foi feita para uma observação nos últimos 10 anos, tendo em conta a frequência com
que era diagnosticada, variando entre menos de 1 caso até mais de 5 casos.

4.3.2.2 Etiologia
Tendo em conta que o estudo se focou na infeção de animais de companhia, em
primeiro lugar, foram elaboradas questões para poder compreender globalmente quais as
etiologias mais comuns de conjuntivites em cães e gatos. Após uma pesquisa específica
sobre o tema, foram selecionadas diferentes causas para que os inquiridos as ordenassem
por grau de importância. Para a espécie canina o diagnóstico diferencial incluiu deficiência
de produção lacrimal, agentes infeciosos, processo alérgico, processo imunomediado e
alterações nas pálpebras ou cílios. Para os gatos as opções apresentadas foram as mesmas,
à exceção do processo imunomediado, sendo que esse não está descrito como causa de
conjuntivite nesta espécie. Em maior profundidade, investigou-se qual a etiologia mais
comum dentro das conjuntivites infeciosas nos gatos: a bacteriana (ex: Chlamydophila felis;
Mycoplasma felis), a viral (ex: FHV-1; Calicivirus) ou a parasitária (ex: Thelazia callipaeda),
tendo em conta a respetiva importância clínica nesta espécie. A mesma questão não foi
direcionada para cães, pois não tem a mesma representatividade que tem nos gatos.

32
Em segundo lugar, abordou-se a conjuntivite parasitária em específico, elaborando
questões não só relativamente à sua frequência, mas também sobre a identificação do
parasita propriamente dito. Pretendeu-se compreender a opinião dos médicos veterinários
face à frequência de diagnóstico desta doença, se a sua incidência apresentava uma
tendência crescente ou não, e se tinham conhecimento do vetor da mesma, Phortica
variegata, conhecido por mosca-da-fruta.

4.3.2.3 Espécie Afetadas e Meio Ambiente


Era de extrema relevância inquirir sobre qual a espécie mais afetada dentro dos
pequenos animais, cão e gato, incluindo os novos animais de companhia, coelho e furão, de
forma a compreender a percepção dos médicos veterinários sobre este tópico. Para além
disso era também importante compreender em que ambiente viviam os mesmos, tendo em
conta as condições de transmissão da doença em que o ambiente exterior no meio rural é de
facto o mais propício à mesma (Madeira de Carvalho et al. 2014). Foram incluídas as opções
de ambiente interior com ou sem acesso ao exterior tal como o ambiente exterior, neste caso,
urbano ou rural. Para a transmissão da mesma, entendeu-se que era também importante
questionar se os médicos veterinários tinham conhecimento de qualquer contato entre o
animal infetado e o doutra espécie que pudesse atuar como hospedeiro reservatório.

4.3.2.4 Sinais Clínicos e Apresentação Clínica


Tendo em conta a perspetiva clínica e de diagnóstico do estudo, era importante
abordar o parecer de cada médico veterinário relativamente ao local onde os parasitas se
alojavam habitualmente, podendo ser no saco conjuntival, na face interna da membrana
nictitante ou mesmo sobre a córnea. Também era de extrema relevância compreender quais
os sinais clínicos que os animais infetados por Thelazia callipaeda apresentavam, tais como
blefarospasmo, quemose, hiperémia, corrimento ocular seroso, epífora e/ou lesões na
córnea, sendo esses, segundo a bibliografia, os mais importantes numa conjuntivite
parasitária em ambas as espécies, cão e gato (Otranto and Traversa 2005; Otranto and
Dantas-Torres 2017). Para além destes dois fatores, era também interessante compreender
se a apresentação clínica da doença era predominantemente uni ou bilateral.

4.3.2.5 Tratamento
Relativamente à abordagem terapêutica, foi questionado no inquérito se os médicos
veterinários realizavam a extração física do nematode e algum tratamento médico,
requerendo a descrição do último em resposta aberta. Também se procurou compreender se
os animais tratados clinicamente foram reavaliados após a instituição do plano terapêutico e

33
se evidenciaram melhorias, variando desde a resolução total até à total ineficácia terapêutica,
ou recorrência da infeção. Somando a esses fatores, considerou-se interessante saber se os
médicos veterinários recomendavam alguma medida preventiva, tal como uma
desparasitação específica contra a Thelaziose.

4.4 Resultados
4.4.1 Distribuição Geográfica
O inquérito começa por abordar a temática da distribuição geográfica ao listar as
províncias tradicionais do país, de forma a entender em quais é que os médicos veterinários
participantes exerciam clínica de animais de companhia. No entanto, após a elaboração e
envio do mesmo, compreendeu-se que seria de maior utilidade saber precisamente qual o
distrito em que cada inquirido exercia clínica, de forma a esclarecer quais os mais afetados
atualmente, em Portugal. Para tal efeito, entrou-se em contacto com os participantes e
obteve-se os resultados distritais, como se pode ver na tabela 1.
Tabela 1 Número de Inquiridos por Distrito
Distritos Nº Inquiridos/Distrito % Inquiridos/Distrito
NORTE 31 56,4% (31/55)
Porto 10 32,3% (10/31)
Vila Real 5 16,1% (5/31)
Viseu 5 16,1% (5/31)
Aveiro 4 12,9% (4/31)
Castelo Branco 2 6,5% (2/31)
Braga 2 6,5% (2/31)
Bragança 1 3,2% (1/31)
Coimbra 1 3,2% (1/31)
Guarda 1 3,2% (1/31)
CENTRO 20 36,4% (20/55)
Lisboa 14 70% (14/20)
Santarém 3 15% (3/20)
Portalegre 2 10% (2/20)
Setúbal 1 5% (1/20)
SUL 4 7,3% (4/55)
Beja 2 50% (2/4)
Faro 2 50% (2/4)

O presente estudo revelou que mais de 50% dos inquiridos exerciam clínica de
pequenos animais na região Norte do país, realçando que 32,3% (10/31) dos inquiridos
praticam clínica no distrito do Porto. Um total de 36,4% (20/55) dos médicos veterinários era
oriundo da região Centro do país, dos quais 70% (14/20) dos mesmos se referem ao distrito

34
de Lisboa como a sua área de prática clínica. Cerca de 7% dos inquiridos eram do Sul de
Portugal, sendo feita referência a apenas dois distritos, Beja e Faro.

4.4.2 Conjuntivites
4.4.2.1 Número de casos
Relativamente aos casos de conjuntivite em cães e gatos, 32,7% (18/55) dos médicos
veterinários inquiridos indicaram que num ano costumavam observar mais de 50 casos,
14,5% (8/55) entre 30 e 50 casos, 27,3% (15/55) observavam entre 20 e 30 casos, 14,5%
(8/55) responderam que observavam entre 10 e 20 casos e outros 10,9% (6/55)
diagnosticavam menos de 10 casos de conjuntivite por ano, como se poder ver no gráfico 1.
Gráfico 1 Número aproximado de casos de conjuntivite
observados num ano, em cães e gatos

10,9%
Menos de 10 casos
32,7% 14,5% Entre 10 e 20 casos

Entre 20 e 30 casos

Entre 30 e 50 casos
14,5% 27,3%
Mais de 50 casos

Dos 18 inquiridos que escolheram a opção “mais de 50 casos”, 22,2% (4/18) exercem clínica
tanto nos distritos do Porto como de Lisboa, como se pode observar no gráfico 2.

Gráfico 2 Número de inquiridos que votaram na opção "mais de 5 casos" por distrito

Aveiro 2
Beja 0
Braga 1
Bragança 1
Castelo Branco0
Coimbra 0
Faro 2
Distritos

Guarda 1
Lisboa 4
Portalegre 1
Porto 4
Santarém 0
Setúbal 0
Vila Real 1
Viseu 1
0 1 2 3 4 5
Nº Inquiridos

35
No entanto, duma perspetiva regional, 61% (11/18) dos inquiridos que votaram nesta
opção exercem no Norte, correspondendo por isso à região com maior número de casos de
conjuntivite em cães e gatos num ano, informação esta que está representada no gráfico 3.

Gráfico 3 Região com mais de 50 casos por ano de conjuntivite em


cães e gatos

11%
28%

61%

Centro Norte Sul

4.4.2.2 Etiologia
No presente estudo, a etiologia infeciosa foi considerada como a causa mais comum
de conjuntivites em cães por 43,6% (24/55) dos inquiridos, vindo em segundo lugar de
importância a etiologia alérgica, considerada em 38,2% (21/55) dos casos diagnosticados e
em terceiro as alterações nas pálpebras ou nos cílios, considerada por 36,4% (20/55) dos
participantes. A deficiência de produção lacrimal foi registada em quarto lugar de importância,
por 44,4% (24/55), e por fim, a etiologia imunomediada foi apontada por 56,4% (31/55) dos
médicos veterinários inquiridos como a causa menos provável de conjuntivites em cães.
Estes resultados podem ser observados nos gráficos 4 a 8, em seguida.

Gráfico 6 Importância
Gráfico da etiologia
4 Importância infeciosa
da etiologia nas
infeciosa Gráfico 54 Importância
Gráfico Importância da
da etiologia
etiologia alérgica
alérgica nas
nas
conjuntivites
nas emem
conjuntivites cães
cães conjuntivites em
conjuntivites em cães
cães
40 40

30 24 30
Nº Inquiridos

21
20
Nº Inquridos

20 15
13 12
10 7 7 10 6
4
1
0 0
Muito Pouco Pouco Importante Muito Extremamente Muito Pouco Pouco Importante Muito Extremamente
Importante Importante Importante Importante Importante Importante Importante Importante
Grau Importância
Grau Importância

Gráfico7 6Importância
Gráfico Importânciadadaetiologia
etiologiadedealterações
alterações Gráfico 75 Importância da etiologia de deficiência de
naspálpebras
nas pálpebrasououcílios
cíliosnas
nasconjuntivites
conjuntivitesem emcães
cães de produção lacrimal nas conjuntivites em cães

40 40

30 30 24
20
Nº Inquridos

20 20
14
Nº Inquiridos

9 10
7 8 6 10 6 6
10

0 0
Muito Pouco Pouco Importante Muito Extremamente Muito Pouco Pouco Importante Muito Extremamente
Importante Importante Importante Importante Importante Importante Importante Importante

Grau Importância Grau Importância


36
Gráfico 8 Importância da etiologia imunomediada nas
conjuntivites em cães
40
31
30

Nº Inquiridos
20

10 7 7 7
3
0
Muito Pouco Pouco Importante Muito Extremamente
Importante Importante Importante Importante
Grau Importância

Foi questionada qual a causa mais provável de conjuntivites em gatos, tendo em conta
a sua relevância clínica no dia-a-dia da prática médico-veterinária, e 80,0% (44/55) dos
inquiridos consideraram a origem infeciosa como a mais relevante para esta doença nesta
espécie, seguida da etiologia alérgica por 65,5% (36/55), das alterações nas pálpebras e nos
cílios por 58,2% (32/55) e a deficiência de produção lacrimal foi considerada como a causa
menos provável por 60,0% (33/55) dos médicos veterinários. Estes resultados podem ser
observados nos gráficos 9 a 12, em seguida.

Gráfico 9 Importância da etiologia infeciosa nas Gráfico 10 Importância da etiologia alérgica


conjuntivites em gatos nas conjuntivites em gatos
50 44 50

40 40 36
Nº Inquiridos

Nº Inquiridos

30 30

20 20
12
8
10 10 4
3 3
0
0 0
Muito Pouco Pouco Importante Muito Importante Muito Pouco Pouco Importante Muito
Importante Importante Importante Importante Importante
Grau Importância Grau Importância

Gráfico 11 Importância da etiologia de alterações Gráfico 12 Importância da etiologia de deficiência


das pálpebras ou cílios nas conjuntivites em gatos de produção lacrimal nas conjuntivites em gatos
50 50

40 40
32 33
Nº Inquiridos

Nº Inquiridos

30 30

20 20
10 12 11
10 10 7
1 4
0 0
Muito Pouco Pouco Importante Muito Muito Pouco Pouco Importante Muito
Importante Importante Importante Importante Importante Importante
Grau Importância Grau Importância

37
Conhecendo a incidência de conjuntivites de origem infeciosa na espécie felina, foi
abordado com maior detalhe a verdadeira origem da mesma, sendo que 54,5% (30/55) dos
médicos veterinários atribuíram a etiologia viral como a causa predominante da afeção em
questão, 63,6% (35/55) consideraram agentes bacterianos como a segunda causa mais
provável e 81,8% (45/55) definiram a conjuntivite parasitária como a menos comum das três
etiologias infeciosas. Estes resultados podem ser observados nos gráficos 13 a 15, em
seguida.

Gráfico 13 Importância da etiologia viral dentro Gráfico 14 Importância da etiologia bacteriana


das conjuntivites infeciosas em gatos dentro das conjuntivites infeciosas em gatos
50 50

40 40 35
30

Nº Inquiridos
Nº Inquiridos

30 30
20
20 20 15

10 5 10 5

0 0
Pouco Importante Importante Muito Importante Pouco Importante Importante Muito Importante
Grau Importância Grau Importância

Gráfico 15 Importância da etiologia parasitária


dentro das conjuntivites infeciosas em gatos

50 45

40
Nº Inquiridos

30

20
10
10
0
0
Pouco Importante Importante Muito Importante
Grau Importância

4.4.3 Conjuntivites Parasitárias


4.4.3.1 Frequência
Tendo em conta o foco do estudo, as conjuntivites parasitárias são o tema a abordar
e nesse sentido questionou-se em primeiro lugar a frequência com que os médicos
veterinários inquiridos tinham observado casos da mesma. Do total de médicos veterinários
que responderam ao inquérito, 34,5% (19/55) reportaram mais de 5 casos nos últimos 10
anos, 20,0% (11/55) entre 3 e 5 casos, 23,6% (13/55) entre 2 e 3 casos e 21,8% (12/55)
menos de 1 caso, como se pode ver no gráfico 16.

38
Gráfico 16 Número aproximado de conjuntivites parasitárias
observadas nos últimos 10 anos

21,8% Menos de 1 caso


34,5%
Entre 2 e 3 casos
Entre 3 e 5 casos
23,6%
Mais de 5 casos
20,0%

4.4.3.2 Distribuição Geográfica


Neste estudo era importante compreender qual a distribuição geográfica da infeção
parasitária por T. callipaeda em Portugal, tendo sido a região Norte considerada como a área
predominante para a ocorrência da mesma, por 78,9% (15/19) dos médicos veterinários que
diagnosticaram mais de 5 casos nos últimos 10 anos, como se pode ver no gráfico 17.

Gráfico 17 Região de Portugal com mais de 5 casos de conjuntivite


parasitária nos últimos 10 anos

5,3%
15,6%
Centro
Norte
Sul
78,9%

Concretamente, os distritos que mais representaram a opção “mais de 5 casos” foram


o Porto, por 26,3% (5/19), e Vila Real, por 21,1% (4/19) dos inquiridos, podendo ser
considerados focos desta parasitose face aos outros distritos, como se pode observar no
gráfico 18.

39
Gráfico 18 Distritos com representação de mais de 5 casos de conjuntivite
parasitária nos últimos 10 anos

Viseu 2
Vila Real 4
Setúbal 0
Santarém 0
Porto 5
Portalegre 1
Lisboa 2
Distritos

Guarda 1
Faro 1
Coimbra 0
Castelo Branco 2
Bragança 1
Braga 0
Beja 0
Aveiro 0
0 1 2 3 4 5 6
Nº Inquiridos

4.4.3.3 Identificação do Parasita


Do número total de respostas obtidas, 70,9% (39/55) dos inquiridos assinalaram que
realizaram a identificação do parasita responsável pela infeção, dentro dos quais, 97,4%
(38/39) identificaram exemplares de Thelazia sp. ou Thelazia callipaeda e apenas um dos
inquiridos, que corresponde aos restantes 2,6%, indicou miíases como o agente infetante.
Foram também questionados face à notoriedade duma tendência crescente no diagnóstico
de conjuntivites parasitárias, e mais de 50% dos clínicos de animais de companhia
participantes no estudo afirmaram que notaram um aumento do número de casos nos últimos
tempos, como se pode observar no gráfico 19.

Gráfico 19 Respostas obtidas sobre a existência ou não duma tendência


crescente no diagnóstico de conjuntivite parasitárias

25%

53%

22%

Não Não sabe Sim

40
4.4.3.4 Localização do Nematode no Órgão da Visão
Neste estudo, 43,6% (24/55) dos médicos veterinários verificaram que o nematode se
alojava na face interna da membrana nictitante dos animais afetados (Figura 12), 32,7%
(18/55) afirmaram que foram observados exemplares sobre a córnea e apenas 23,6% (13/55)
encontraram exemplares no saco conjuntival, como se pode observar no gráfico 20.

Gráfico 20 Localização do Nematode no Órgão da Visão

23,6%
32,7%

43,6%

Sobre a córnea Na face interna da membrana nictitante Saco conjuntival

Figura 15
Figura 12 Exemplar de Thelazia callipaeda sob a córnea ee
membrana
membrana nictitante
nictitante de
de um
um olho
olho de
de cão
cão
(Fotografia
(Fotografia original
original -- Esmeralda
Esmeralda Delgado)
Delgado)

4.4.3.5 Espécie Mais Afetada – Hospedeiros Definitivos


Relativamente às espécies mais afetadas por conjuntivites parasitárias, o cão foi
considerado o mais afetado, por 98,2% (54/55) dos inquiridos, sendo os restantes 1,8% (1/55)
dos casos atribuídos aos gatos.

41
4.4.3.6 Meio Ambiente
Face ao ambiente em que os animais infetados viviam, 74,5% (41/55) dos médicos
veterinários referiram o ambiente exterior rural como o local predominante de habitação dos
mesmos. O exterior urbano foi considerado por 58,2% (32/55) como o segundo mais
importante, no contexto dos casos de conjuntivite parasitária. Alojamentos no interior foram
considerados como menos importantes, sendo que entre os mesmos, o interior com acesso
ao exterior foi votado em terceiro lugar em ordem de relevância, por 52,7% (29/55) dos
inquiridos, e o interior sem acesso ao exterior foi marcadamente considerado como o menos
importante por 81,5% (44/55) dos clínicos que responderam ao inquérito. Estes resultados
podem ser observados em seguida nos gráficos 21 a 24.

Gráfico 21
Gráfico 24 Importância dum ambiente
Importância dum ambiente exterior
exterior Gráfico 23
Gráfico 22 Importância
Importânciadumdumambiente
ambienteexterior
exterior
rural para animais infetados por T. callipaeda
rural para animais infetados por T. callipaeda urbano
urbano para animais infetados por
para animais infetados por T.
T. callipaeda
callipaeda

50 50
41
40 40 32
Nº Inquiridos
Nº Inquiridos

30 30 21
20 20
7 5 10
10 2 2 0
0 0
Muito Pouco Pouco Importante Muito Muito Pouco Pouco Importante Muito
Importante Importante Importante Importante Importante Importante
Grau Importância
Grau Importância

Gráfico
Gráfico22
23Importância
Importânciadum dumambiente
ambienteinterior
interior Gráfico 2124
Importância dum ambiente interior
Gráfico Importância dum ambiente interior
com
comacesso
acessoao
aoexterior
exteriorpara
paraanimais
animaisinfetados
infetados sem acesso aoao
exterior para animais infetados
sem acesso exterior para animais infetados
por
porT.T.callipaeda
callipaeda por T. T.
callipaeda
por callipaeda

50 50 44
40 40
Nº Inquiridos
Nº Inquiridos

29
30 30
20 17
20
10 7 10 7
2 3 1
0 0
Muito Pouco Pouco Importante Muito Muito Pouco Pouco Importante Muito
Importante Importante Importante Importante Importante Importante

Grau Importância
Grau Importância

4.4.4 Biologia do Parasita - Vetor e Hospedeiros Reservatório


No que respeita ao vetor, Phortica variegata, 87,3% (48/55) dos inquiridos assinalou
que tinha conhecimento do mesmo.

42
Relativamente à existência dum hospedeiro reservatório (HR) que pudesse interagir
com o carnívoro doméstico, apenas 41,8% (23/55) dos médicos veterinários tinha
conhecimento dessa possibilidade como fonte de infeção e transmissão. Do número de
respostas que apoia este facto, 69,6% (16/23) dos inquiridos indicaram quais as espécies
que consideravam como potenciais HR, como se pode ver no gráfico 25. Os ruminantes foram
considerados, por 56,3% (9/16) dos inquiridos, como a espécie mais provável de ser HR,
podendo entrar em contacto com animais de companhia.
Gráfico 25 Representação gráfica das respostas abertas sobre possíveis hospedeiros
reservatório na transmissão de T. callipaeda

Ruminantes 9
Coabitantes 3
Raposas 2
Roedores 2
Artrópodes 1
Lobos 1
Mustelídeos 1
Equinos 1

0 2 4 6 8 10
Nº Respostas

4.4.5 Sinais Clínicos


Neste estudo era importante ter uma perspetiva clínica, tendo sido redigidas algumas
questões nesse âmbito, começando pelos sinais clínicos típicos de conjuntivite, de forma a
entender quais e em que proporção é que os mesmos se apresentavam em animais infetados
por Thelazia callipaeda. Como se pode verificar no gráfico 26, os três sinais clínicos
considerados mais comuns na presença desta conjuntivite parasitária foram epífora (80,0%;
44/55), hiperémia conjuntival (78,2%; 43/55), blefarospasmo (63,6%; 35/55) e corrimento
ocular seroso (58,2%; 32/55).

Gráfico 26 Sinais clínicos apresentados em infeção por T. callipaeda

Blefarospasmo 35/55 (63,6%)

Corrimento Ocular
Seroso 32/55 (58,2%)

Epífora 44/55 (80,0%)

Hiperémia 43/55 (78,2%)

Lesões na córnea 13/55 (23,6%)

Quemose 10/55 (18,2%)

0 10 20 30 40 50

Nº Respostas

43
Relativamente à apresentação clínica desta doença, neste estudo não foi encontrada
uma predominância para apresentações uni ou bilaterais, visto que os resultados para ambas
as opções foram bastante semelhantes: 52,7% (29/55) dos inquiridos diagnosticaram a
doença de forma unilateral e 47,3% (26/55) de forma bilateral.

4.4.6 Protocolos Terapêuticos


Relativamente à terapêutica instituída, 43,6% (24/55) dos médicos veterinários
participantes comentaram que foi possível realizar uma extração total dos nematodes
presentes, 40,0% (22/55) comentaram que removeram apenas alguns dos exemplares e os
restantes 16,4% (9/55) não realizaram a extração propriamente dita.
No presente estudo, 87,3% (48/55) dos inquiridos afirmaram ter posto em prática um
tratamento médico, descrito por 97,9% (47/48) dos inquiridos. Deste número, 97,8% (46/47)
afirmaram utilizar formulações antiparasitárias, como se pode ver na tabela 2, entre as quais
apenas 6,5% (3/46) não forma discriminadas.
A administração de formulações antiparasitárias com base no princípio ativo
milbemicina oxima (52,2%; 24/46) foi a abordagem terapêutica mais indicada pelos inquiridos,
podendo ser combinada com praziquantel (16,7%; 4/24) ou não (83,3%; 20/24), como é o
caso das formulações comerciais Milbemaxâ, Milproâ ou Milbactorâ e Nexgard Spectraâ),
respetivamente. A injeção subcutânea de ivermectina foi considerada por 26,1% (12/46) dos
inquiridos e, em terceiro lugar, a aplicação cutânea da combinação de moxidectina 2,5% e
imidacloprid 10%, comercialmente conhecida como Advocateâ, por 17,4% (8/46) dos
participantes no estudo.
Para além da administração de agentes antiparasitários, por via oral ou na forma
spot-on para o tratamento etiológico da doença, 23,4% (11/47) dos médicos veterinários
consideraram a utilização de fármacos anti-inflamatórios e antibióticos tópicos oculares no
tratamento médico sintomático das conjuntivites parasitárias, sendo que os primeiros
fármacos foram mencionados por 14,9% (7/47) e os segundos por 8,5% (4/47) dos inquiridos.
Relativamente a estes dois grupos de fármacos, foram obtidas respostas específicas e
inespecíficas. No grupo dos anti-inflamatórios, 57,1% (4/7) revelaram especificamente quais
os que administraram, como por exemplo anti-inflamatórios não-esteróides (AINEs) (ex:
Cetorolacâ), por 75% (3/4) dos inquiridos, e esteróides (ex: Dexametasona), por 25% (1/4)
dos restantes que discriminaram a sua abordagem anti-inflamatória. No que diz respeito aos
antibióticos, 50% dos médicos veterinários participantes não descriminaram a sua escolha
antibiótica, no entanto os outros 50% registaram o uso de formulações tópicas de
Cloranfenicol e de Ácido Fusídico.

44
Tabela 2 Qual a abordagem terapêutica mais utilizada atualmente no tratamento de Thelaziose, em
animais de companhia , em Portugal?
% Administração
Fármacos pelos Inquiridos
52,2% (24/46)
Milbemicina Oxima

combinada com praziquantel


16,7% (4/24)
(Milbemaxâ/Milproâ/Milbactorâ)

não combinada com praziquantel 83,3% (20/24)


Formulação Antiparasitária (NexgardSpectraâ)

26,1% (12/46)
Ivermectina
97,8%
(46/47) Moxidectina + Imidacloprid 17,4% (8/46)
(Advocateâ)

10,9% (5/46)
Moxidectina

Fluralaner 2,2% (1/46)


(Bravectoâ)

Indiscriminada 6,5% (3/46)

Anti-inflamatório 42,9% (3/7)


Indiscriminado

Anti-inflamatório 57,1% (4/7)


Anti-inflamatório Tópico Discriminado
Ocular Anti-Inflamatórios 75% (3/4)
Não Esteróides (AINES)
14,9% (ex: Cetorolacâ)
(7/47)
Anti-inflamatório Esteróide 25% (1/4)
(ex: Dexametasona)

Antibiótico 50% (2/4)


Indiscriminado
Antibiótico Tópico ocular
Antibiótico 50% (2/4)
8,5% Discriminado
(4/47) Cloranfenicol 50% (1/2)

Ácido Fusídico 50% (1/2)

45
Do ponto de vista de prognóstico e prevenção, 90,9% (50/55) dos médicos
veterinários realizaram uma avaliação do animal infetado após a instituição do plano
terapêutico, na qual 87,3% (48/55) dos médicos veterinários revelaram sucesso terapêutico
total do quadro clínico. No entanto, 10,9% (6/55) registaram apenas uma resolução parcial e
1,8% (1/55) consideraram o tratamento médico em questão ineficaz, como se pode observar
no gráfico 27.

Gráfico 27 Representação gráfica do sucesso do protocolo terapêutico


em casos de infeção por T. callipaeda

60
48
50

40
Nº Inquiridos

30

20

10 6
1
0
Resolução total da Resolução parcial da Tratamento ineficaz
conjuntivite conjuntivite

Face à sua melhoria a longo prazo, apenas 21,8% (12/55) dos inquiridos registaram
recorrência da parasitose. Na tentativa de reduzir a frequência de conjuntivite parasitária,
81,8% (45/55) dos médicos veterinários recomendaram medidas preventivas. No entanto, a
desparasitação preventiva específica para Thelaziose só foi considerada como uma opção
preventiva por 43,6% (24/55) dos inquiridos. Os outros 23,6% (13/55) mencionaram que
dependeria do aparecimento de novos casos clínicos na sua área de trabalho, enquanto que
os restantes 32,7% (18/55) dos clínicos não a recomendariam.

4.5 Discussão
O presente estudo, que pretende contribuir para a caracterização da infeção
parasitária por Thelazia callipaeda em animais de companhia em Portugal, baseou-se nos
resultados de inquéritos online. A taxa de resposta foi de 10,4%, correspondendo a 55
respostas para um número total de questionários enviados de 529, o que leva a considerar
esta taxa como baixa. Os inquéritos foram enviados para clínicas veterinárias e profissionais
Médico-Veterinários, dispersos por todo o terreno nacional, incluindo arquipélagos.

46
4.5.1 Distribuição Geográfica
De forma global, o presente estudo revelou uma tendência crescente no aparecimento
de Thelaziose em Portugal. Mais de metade dos inquiridos que afirmaram ter diagnosticado
casos de Thelaziose pertenciam ao Norte, exercendo clínica de pequenos animais em vários
distritos dessa região (Aveiro, Braga, Bragança, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Porto,
Vila Real, Viseu). Em especial, os distritos do Porto e de Vila Real mostraram ser áreas de
maior ocorrência desta parasitose. No entanto, como dado novo, também se encontrou um
número relativamente elevado de casos de infeção por Thelazia callipaeda no distrito de
Lisboa, na região Centro, em que 25,5% (14/55) do número total de médicos veterinários
afirmaram diagnosticar casos desta parasitose que, até ao momento, só tinha sido relatada
uma única vez nesse distrito (Delgado et al. 2013). Os resultados deste estudo estão de
acordo com a literatura visto que, até à data, em Portugal, a Thelaziose em animais de
companhia começou por ser reportada de forma focal pelo território nacional, sendo que os
primeiros relatos bem como a maior parte dos casos foram registados no Norte do país
(Rodrigues et al. 2012; Vieira et al. 2012; Pimenta et al. 2013). No entanto, ao longo dos anos,
ocorreu uma dispersão gradual rumo ao Centro do território nacional (Madeira de Carvalho
et al. 2014; Maia et al. 2016). O maior número de casos nessa região pode dever-se à
migração de animais de regiões endémicas, quer por motivos turísticos, de acolhimento de
animais dessas mesmas regiões ou mesmo pelo maior número de hospedeiros reservatório
infetados. De forma geral, a translocação de animais entre regiões endémicas para não
endémicas associado a alterações climáticas, que favorecem o ciclo biológico tanto do
parasita como do seu vetor, facilitam, em grande escala, a dispersão desta parasitose.

4.5.2 Conjuntivites
4.5.2.1 Número de Casos
Neste estudo apenas 10,9% (6/55) dos inquiridos afirmaram diagnosticar menos de
10 casos de conjuntivite por ano, enquanto todos os outros inquiridos diagnosticaram um
número superior. Segundo a literatura, a conjuntivite é uma das afeções oculares mais
frequentes no cão e no gato (Martin 2010; Turner 2010), havendo concordância com os
resultados obtidos.

4.5.2.2 Etiologia
No questionário deste estudo fez-se referência às conjuntivites e a algumas das suas
etiologias, tais como infeciosas, alérgicas, imunomediadas, deficiências de produção lacrimal
e alterações estruturais das pálpebras e dos cílios, tendo em conta a frequência com que

47
estas, especificamente, são incluídas em listas de diagnósticos diferenciais quando surgem
casos de conjuntivites no dia-a-dia da prática clínica.
Do número total de inquiridos, 80,0% dos médicos veterinários participantes (44/55),
consideraram a etiologia infeciosa como a mais provável de provocar uma conjuntivite felina.
Dentro dessa categoria, o estudo também revelou que os médicos veterinários inquiridos
consideraram os vírus como os agentes mais prováveis de perpetuar tal doença, seguidos de
agentes bacterianos e, por fim, parasitários. Os resultados obtidos estão de acordo com a
literatura, em que se descreve o Herpesvírus felino tipo 1(FHV-1) como o principal agente de
conjuntivites felinas, seguido pela bactéria Chlamydophila felis (Maggs 2008; Cook et al.
2009; Hendrix 2013).
No entanto, no caso da espécie canina, 43,6% dos inquiridos (24/55) acreditam que
a etiologia mais comum é também infeciosa, ao contrário do que a literatura indica. A
queratoconjuntivite seca, uma causa não-infeciosa, caracterizada pela deficiência de
produção lacrimal, está descrita como a principal causa de conjuntivite em cães. Esta pode
surgir como uma inflamação crónica secundária a diversos fatores como processos infeciosos
e ser acompanhada de corrimento ocular purulento abundante (Maggs 2008; Hendrix 2013).
Tal apresentação clínica pode justificar o facto de tantos médicos veterinários considerarem
a etiologia infeciosa como a causa mais provável de provocar conjuntivite nesta espécie, visto
que se concentraram apenas no processo infecioso em si e não no fator desencadeante do
mesmo que, neste caso, seria a diminuição da produção lacrimal.

4.5.3 Conjuntivites Parasitárias


Face à ocorrência de Thelaziose em animais de companhia em Portugal, os
resultados obtidos (52,7%; 29/55), aliados à literatura mais recente sobre a parasitose,
comprovam a presença duma tendência crescente no diagnóstico desta parasitose e das
respetivas conjuntivites parasitárias por Thelazia sp. no país. Os inquiridos consideraram um
número maior do que seria de esperar de casos diagnosticados nos últimos dez anos, visto
que a opção mais votada (34,5%; 19/55) foi a que referia “mais de 5 casos” e segundo a
literatura, até à data, as conjuntivites parasitárias estavam documentadas como sendo pouco
frequentes no nosso país em animais de companhia. Tal facto também pode ser influenciado
pelo interesse do médico veterinário inquirido na oftalmologia veterinária, visto que o inquérito
foi distribuído pelos membros do Grupo de Interesse Especial em Oftalmologia da APMVEAC.
Os resultados do estudo relativamente à distribuição geográfica da parasitose em
Portugal estão de acordo com a literatura, visto que os inquiridos identificaram uma dispersão
da doença por todo o país, mas com uma predominância na região Norte para 56,4% (31/55)
dos médicos veterinários participantes (Rodrigues et al. 2012; Vieira et al. 2012; Pimenta et

48
al. 2013; Soares et al. 2013; Sargo et al. 2014; Madeira de Carvalho et al. 2014; Gama et al.
2016; Maia et al. 2016; Seixas et al. 2018).
Relativamente ao grau de consciencialização e conhecimento sobre esta parasitose,
por parte dos médicos veterinários inquiridos, o resultado foi melhor do que o esperado visto
que 70,9% (39/55) afirmaram identificar o parasita, sendo que desse número apenas um
médico veterinário identificou algo que não Thelazia sp. ou T. callipaeda. Mais uma vez, tal
pode dever-se ao interesse do médico veterinário pela área de oftalmologia veterinária.
No presente estudo, assinalou-se uma maior presença deste nematode na face
interna da membrana nictitante, tendo o saco conjuntival sido considerado como o local
menos comum para a sua observação e identificação. Este resultado está parcialmente de
acordo com o descrito na literatura, que afirma que o estádio adulto do parasita costuma estar
alojado na face interna da pálpebra inferior e da membrana nictitante, embora também possa
ser encontrado no saco conjuntival (Anderson 2000; Otranto et al. 2004; Otranto and Traversa
2005; Rodger 2007; Roberts et al. 2009; Bowman 2014; Otranto and Dantas-Torres 2017).
O presente estudo está de acordo com a literatura quando a maioria dos inquiridos
considera o cão como o animal de companhia mais afetado por T. callipaeda, tendo em conta
que, para além deste hospedeiro, pode infetar outros carnívoros domésticos, carnívoros
silvestres, lagomorfos e ainda o Homem (Otranto and Dantas-Torres 2017).
A grande parte dos médicos veterinários inquiridos, especificamente 74,5% (41/55),
consideraram o ambiente rural com acesso ao exterior como o local mais provável de ocorrer
infeção por T. callipaeda, indo ao encontro do descrito em Portugal nos casos já conhecidos
de Thelaziose em ambientes rurais, ocorridos sobretudo em cães pastores e de caça
(Madeira de Carvalho et al. 2014). No entanto, o presente estudo demonstrou que têm vindo
a ser diagnosticados casos desta parasitose em distritos que incluem as grandes cidades do
país, Lisboa e Porto, considerando que a movimentação de animais entre regiões rurais e
urbanas possa ser um fator de risco de transmissão mais importante do que se entendia até
à data. O nosso estudo sugere que a presença de casos de Thelaziose em cidades será
maior do que era anteriormente, recomendando incluir esta etiologia nos diagnósticos
diferenciais de conjuntivite realizados em meio urbano.

4.5.4 Biologia do Parasita – Vetor e Hospedeiros Reservatório


Era importante analisar em que meio ambiente é que os animais infetados habitavam,
de forma a tentar compreender se existia alguma predisposição ambiental para que estas
infeções ocorressem, como está descrito para os meios rurais em Portugal (Vieira et al. 2012;
Pimenta et al. 2013; Soares et al. 2013; Sargo et al. 2014; Madeira de Carvalho et al. 2014).
Locais com intervalos térmicos continentais aliados a uma humidade relativa significativa (50-

49
75%), em regiões mais altas na presença de árvores e rios, são considerados nichos
ecológicos com condições climáticas favoráveis à atividade biológica do vetor do nematode,
Phortica variegata, conhecido por 87,3% (48/55) dos inquiridos. No entanto, é necessário ter
também em conta a sazonalidade de transmissão, que é maior na temporada de Verão-
Outono, devido à hibernação do vetor juntamente com o parasita no seu interior nos meses
de Inverno e Primavera; a presença de hospedeiros reservatórios que possam disseminar a
doença por mais territórios; e as épocas ou regiões de maior atividade turística que facilitem
a introdução de animais provenientes de regiões endémicas para outras não endémicas ou
vice-versa (Otranto, Cantacessi, et al. 2006; Otranto, Brianti, et al. 2006; Otranto et al. 2009;
Hodžić et al. 2014; Palfreyman et al. 2018).
Relativamente à possível existência de hospedeiros reservatório (HR), foi notório
algum desconhecimento por parte dos inquiridos, sendo que apenas uma minoria tinha
conhecimento de possíveis interações entre o animal infetado e outras espécies, suportado
também pelo facto de que 56,3% (9/16) dos médicos veterinários participantes considerarem
os ruminantes como a espécie mais provável de ser HR. Tal facto pode ser justificado pela
existência de Thelaziose em bovinos em maior escala, que pode levar a uma suposição por
parte dos inquiridos de que estes animais poderão intervir no processo de transmissão de T.
callipaeda, sendo que é a infeção ocular provocada pelo género Thelazia mais estudado na
Europa e nos Estados Unidos da América (Otranto and Traversa 2005). Por esse motivo, é
de extrema relevância esclarecer que a infeção desses animais é perpetuada por outras
espécies do género Thelazia, tais como T. rhodesii, T. skrjabini ou T. gulosa (Brás 2012).
Segundo a literatura, os carnívoros silvestres e os lagomorfos são os verdadeiros
hospedeiros reservatório, como raposas vermelhas, lobos, lobos ibéricos, chacais-dourados,
martas, texugos, felinos silvestres, linces, coelhos europeus selvagens e lebres-comuns,
(Otranto et al. 2009; Hodžić et al. 2014; Farkas et al. 2018; Marino et al. 2018; Seixas et al.
2018; Bojan et al. 2019; Ionicǎ et al. 2019; do Vale et al. 2019; Nájera et al. 2020).

4.5.5 Sinais Clínicos


Do ponto de vista clínico, os resultados obtidos corroboram os descritos na literatura
sobre os sinais clínicos da conjuntivite parasitária, sendo que os médicos veterinários
inquiridos consideraram a epífora, a hiperémia conjuntival, o blefarospasmo e o corrimento
ocular seroso como os mais frequentemente apresentados pelos pacientes. O último é um
resultado direto da lesão mecânica provocada pelas estrias cuticulares transversas do
nematode e tem um forte impacto na transmissão do parasita, visto que predispõe para um
aumento do corrimento ocular, a partir do qual o vetor se vai alimentar e, consequentemente,
depositar larvas do estádio L1 (Otranto and Traversa 2005; Otranto and Dantas-Torres 2017).

50
Relativamente à apresentação clínica da doença em termos de lateralidade, como uni
ou bilateral, este estudo não demonstrou qualquer tipo de predominância de uma das duas
formas, correspondendo à evidência teórica, ou falta dela, sobre este aspeto.
Em casos de Thelaziose, tanto os estádios larvares como adultos são responsáveis
por provocar uma reação inflamatória da conjuntiva, que se pode apresentar de forma
subclínica ou assintomática, quando a infeção é provocada por um nematode macho, ou
apresentar sinais clínicos bastante evidentes quando se trata de uma fêmea grávida. A
conjuntivite surge como uma consequência do movimento ondulante do parasita na
conjuntiva e na córnea, provocada pela lesão mecânica com origem nas estrias cuticulares
transversas do nematode. Os sinais clínicos típicos de conjuntivite podem assumir vários
graus de gravidade, consoante a carga parasitária e o género do nematode presente. A
apresentação clínica de animais infetados por T. callipaeda é caracterizada pela presença de
epífora, hiperémia, blefarospasmo e corrimento ocular seroso. Para além destes, a
inflamação conjuntival também se pode manifestar doutras formas menos comuns como é o
caso de lesões na córnea ou mesmo quemose, sendo este último um sinal clínico mais
exuberante noutro tipo de conjuntivites inflamatórias, como por exemplo as provocadas por
vírus nos gatos (Otranto and Traversa 2005; Otranto and Dantas-Torres 2017).

4.5.6 Protocolos Terapêuticos


Um dos objetivos deste estudo era avaliar o grau de consciencialização por parte dos
médicos veterinários em relação a esta parasitose em Portugal e à sua abordagem
terapêutica. Constatou-se que existia um bom conhecimento relativamente ao protocolo
terapêutico recomendado pela literatura, visto que apenas uma minoria dos inquiridos, 16,4%
(9/55), referiu que não realizava a extração do nematode em primeiro lugar. Até à data, o
protocolo que provou ser mais eficaz no combate à infeção por T. callipaeda tem como
princípios a extração física dos nematodes, seguida da administração da formulação spot-on
de moxidectina 2,5% e imidacloprid 10% (Advocateâ; Elanco) (Bianciardi and Otranto 2005;
Otranto et al. 2016).
Foi também possível perceber que existia uma forte tendência para realizar o
tratamento associando formulações antiparasitárias com fármacos anti-inflamatórios e/ou
antibióticos tópicos. Tal combinação pode ser útil em certos casos clínicos, nos quais a
inflamação conjuntival é exuberante ou em que haja lesão corneal com infeção bacteriana
secundária. No entanto, a base do tratamento da infeção por T. callipaeda deve passar
sempre pela extração propriamente dita, juntamente com a administração duma formulação
antiparasitária (Otranto et al. 2016).

51
Neste trabalho foi bastante evidente que as formulações com milbemicina oxima eram
as mais usadas pelos inquiridos (52,2%; 24/46). Apenas 17,4% (8/46) referiram recorrer à
formulação spot-on de moxidectina 2,5% e imidacloprid 10% (Advocateâ; Elanco). A
ivermectina provou continuar a ser considerada como uma opção terapêutica (26,1%; 12/46),
independentemente das evidências bibliográficas revelarem uma maior eficácia e mais fácil
administração das formulações acima mencionadas, além daquelas estarem concebidas para
a administração a animais de companhia, ao invés da ivermectina subcutânea, que é uma
administração off label (Lia et al. 2004; Bianciardi and Otranto 2005; Ferroglio et al. 2008;
Otranto et al. 2016). No entanto, mesmo com a instituição dum plano terapêutico de eficácia
variada consoante a formulação escolhida pelos médicos veterinários participantes, o
sucesso terapêutico foi superior ao esperado, visto que 93,8% (45/48) dos inquiridos que
realizaram tratamento médico revelaram uma resolução total do quadro clínico e apenas 6,3%
(3/48) uma resolução parcial do mesmo. Relativamente à elaboração dum plano profilático,
43,6% (24/55) revelaram que recomendariam uma desparasitação específica para
Thelaziose, de forma a dificultar a infeção de novos animais e recorrência de animais
previamente infetados, que vivam ou transitem por regiões endémicas ou contactem com
espécies que possam agir como hospedeiros reservatórios. No entanto, este estudo revelou
uma falha na realização da desparasitação preventiva por parte dos médicos veterinários
participantes, visto que foi relatada uma recorrência de infeção por 37,5% (9/24) dos que
recomendavam métodos preventivos. Este resultado pode ser justificado pela utilização de
formulações antiparasitárias profiláticas ineficazes contra a Thelaziose, como a literatura já
provou relativamente à utilização de coleiras repelentes com formulação de imidacloprid 10%
e 4,5% flumetrina (Seresto®, Elanco), que é largamente recomendada e utilizada em animais
de companhia para a desparasitação externa (Lechat et al. 2015).

4.6 Limitações do Estudo


Um estudo baseado num questionário online à partida está limitado pela
disponibilidade e vontade do público alvo de responder ao mesmo. A divulgação do
questionário foi, de certa forma, desafiante devido à política de proteção de dados, que não
permitiu o acesso a listas de contactos, tendo sido necessário gerar uma base de dados
própria para este estudo. A taxa de resposta foi baixa, em parte por se ter definido que o
questionário seria preenchido apenas por médicos veterinários que já tivessem diagnosticado
casos desta parasitose até ao momento, de forma a compreender quais as áreas endémicas
em Portugal. A baixa taxa de respostas também pode ter sido afetada pelo facto da
divulgação do questionário ter sido realizada no mês de janeiro de 2020, coincidindo com o

52
inicio da pandemia de Covid-19. Ao longo dos últimos 8 meses, as prioridades mudaram e
isso poderá ter influenciado a quantidade de respostas.

4.7 Conclusão
Thelazia callipaeda é um nematode que infeta carnívoros domésticos e silvestres,
lagomorfos assim como o Homem, tendo uma importância significativa tanto a nível de saúde
animal como de saúde pública.
O objetivo deste estudo era contribuir para o conhecimento da situação
epidemiológica da infeção parasitária por T. callipaeda, em animais de companhia.
Os resultados deste estudo apontam no sentido dos médicos veterinários de Portugal
estarem conscientes de que esta parasitose está presente em território nacional, confirmando
uma tendência crescente no diagnóstico de conjuntivites parasitárias nos últimos dez anos.
O nematode foi identificado com sucesso por mais de 50% dos profissionais médico-
veterinários que colaboraram no inquérito, justificado pela literatura já existente sobre o
impacto do mesmo, especialmente na Europa, e pelos registos de maior ocorrência desta
parasitose em Portugal.
O estudo veio confirmar a distribuição geográfica no Norte e no Centro, sendo que a
região Norte continua a ser o maior foco desta parasitose. No entanto, em tom de novidade,
conclui-se que mesmo em ambientes urbanos podem ocorrer casos desta parasitose, tendo
em conta o número de repostas obtidas provenientes de distritos que incluem grandes
cidades, como Porto e Lisboa.
O vetor, Phortica variegata, que foi alvo de estudo durante largos anos, mostrou ser
conhecido pela grande parte dos médicos veterinários inquiridos. O mesmo não se
demonstrou em relação à existência de hospedeiros reservatório, visto que foi notória a
dúvida sobre a possibilidade dum ciclo silvático e a falta de informação relativa às espécies
serem silvestres. Independentemente do vetor ter maior atividade biológica em ambientes
rurais, a mobilidade dos animais entre os dois cenários, rural e urbano, e a presença de
hospedeiros reservatório, faz com que seja possível ter casos tanto em ambientes urbanos,
como rurais.
O estudo reforçou a importância da abordagem médica, começando pela identificação
dos sinais clínicos mais comuns (epífora, hiperémia, corrimento ocular seroso e
blefarospasmo), seguida pelo tratamento médico e medidas preventivas.
O protocolo médico mais eficaz no combate à infeção por T. callipaeda tem duas
componentes - a extração física dos nematodes presentes no globo ocular e seus anexos e
a administração duma formulação spot-on de moxidectina 2,5% e imidacloprid 10%
(Advocateâ, Elanco).

53
O estudo foi realizado no sentido de contribuir para a sensibilização dos profissionais
Médico-Veterinários quanto à presença desta parasitose endémica no nosso país, facultando
os dados necessários para melhorar o diagnóstico, a abordagem terapêutica e,
consequentemente, a resolução de futuros casos clínicos da mesma.
Até à data, não há registos de casos de Thelaziose humana em Portugal. No entanto,
é da responsabilidade do médico veterinário alertar os tutores dos animais infetados para o
seu potencial zoonótico.
Em estudos futuros, seria interessante compreender se os profissionais de Medicina
Humana estão a par desta infeção e da sua importância em saúde pública, sendo relevante
a partilha de conhecimentos entre profissionais de Medicina Veterinária e Humana sobre a
mesma, como sugere o princípio da One Health, One Medicine.

54
CAPÍTULO 5 - CASOS CLÍNICOS E IDENTIFICAÇÃO MORFOLÓGICA DE
EXEMPLARES DE Thelazia callipaeda

Os casos clínicos cedidos por colegas Médico-Veterinários que exercem clínica de


animais de companhia no distrito de Portalegre, constituem o cerne deste capítulo. Como o
presente estudo comprovou, este distrito é uma região endémica, talvez pela proximidade à
fronteira com Espanha, que facilita o contato fronteiriço entre animais provenientes de regiões
endémicas, incluindo hospedeiros reservatórios. A descrição destes casos permite uma boa
ilustração da situação através do reporte de três casos clínicos recentes.

5.1 Caso Clínico 1


Macho da espécie canina de raça indeterminada com 14 anos e 5 meses e com peso
de 12,75Kg, com registos recentes duma viagem a Espanha. Apresentou-se à consulta, em
fevereiro de 2020, pela presença de corrimento ocular bilateral. Ao realizar um exame
oftálmico, foi diagnosticada uma conjuntivite bilateral provocada pela presença de
nematodes. Estes foram extraídos e conservados em etanol a 70% para posterior
identificação morfológica. Ao animal foi administrado oralmente, no momento da consulta, um
comprimido de Milbemax® (Elanco) para cão, cuja formulação é 12,5mg/ml milbemicina
oxima e 125mg praziquantel. Também foi prescrita a administração duma segunda toma
igual, ao fim de 3 semanas. Para além do plano terapêutico foi também recomendado manter
a desparasitação externa do animal, como plano profilático de outros potenciais parasitas.

5.2 Caso Clínico 2


Fêmea inteira da espécie canina, de raça e idade indeterminada, com peso de 5,4 kg,
com historial de abandono numa serra do distrito de Portalegre e posterior adoção.
Apresentou-se à consulta, em maio de 2020, pela presença de corrimento ocular seroso
bilateral. Ao realizar o exame oftálmico foi diagnosticada uma conjuntivite bilateral e uma
queratite no olho esquerdo, ambas provocadas pela presença de nematodes. Estes foram
extraídos e conservados em etanol a 70% para posterior identificação morfológica. Ao animal
foi administrado oralmente, no momento da consulta, meio comprimido de Milbemax®
(Elanco) para cão, cuja formulação é 12,5 mg/ml milbemicina oxima e 125 mg praziquantel.
Também foi prescrita a administração duma segunda toma igual, ao fim de 3 semanas. Para
além do plano terapêutico foi também recomendado manter um plano profilático atualizado
através da desparasitação externa do animal com uma formulação de 100 mg/ml imidacloprid
e 500 mg/ml permetrina (Advantixâ, Elanco).

55
5.3 Caso Clínico 3
Fêmea inteira da espécie canina de raça Rafeiro Alentejano de 13 anos com habitação
exclusivamente exterior. Os tutores comentaram que não praticavam qualquer tipo de
desparasitação regular, quer externa quer interna. Ao realizar a consulta ao domicílio, em
junho de 2020, e o exame geral, notou-se a presença de corrimento ocular tendo sido
realizado o exame oftálmico, no qual se diagnosticou uma conjuntivite pela presença de
nematodes. Foi administrado oralmente, no momento da consulta, um comprimido de
Milbemax® (Elanco) para cão, cuja formulação é 12,5 mg/ml milbemicina oxima e 125 mg
praziquantel. Foi prescrita a administração duma segunda toma igual, ao fim de 3 semanas.
Para além do plano terapêutico, foi recomendado manter a desparasitação externa do animal,
como plano profilático de outros potenciais parasitas.

5.4 Identificação Morfológica dos Nematodes


Nos três casos clínicos acima mencionados, foi realizada a devida extração e
conservação dos nematodes encontrados nos órgãos da visão dos animais em causa. A
conservação foi feita em etanol a 70% e as amostras foram enviadas para a Faculdade de
Medicina Veterinária da Universidade de Lisboa, para realizar a identificação morfológica dos
exemplares. Para a observação ao microscópio óptico, fez-se a montagem e o
esclarecimento dos nematodes com lactofenol d’Amman. Foram realizadas várias fotografias
dos mesmos para avaliar as suas características morfológicas que permitiram uma
identificação morfológica de T. callipaeda (Figura 13). Esta avaliação permitiu confirmar o
diagnóstico previamente feito pelos médicos veterinários encarregues dos casos clínicos. No
futuro, poderá ser realizada a identificação molecular dos exemplares para a sua inclusão em
estudos filogenéticos e eco-epidemiológicos.

5.5 Enquadramento Epidemiológico e Clínico dos Casos Clínicos


Neste capítulo foi possível compreender os fatores de risco presentes nos casos
clínicos descritos, bem como a abordagem terapêutica e profilática para cada um.
Do ponto de vista epidemiológico, é importante realçar a localização geográfica em
que os mesmos foram diagnosticados, tendo sido comprovado neste estudo que Portalegre
pertence ao grupo de distritos endémicos de Thelaziose em animais de companhia em
Portugal. Para além das características da região que a distinguem como uma zona de risco
de transmissão de Thelazia callipaeda, é importante realçar o registo duma viagem recente
a Espanha, no caso do cão do primeiro caso clínico, tal como o ambiente rural exterior em
que os dois outros pacientes se encontravam e habitavam, respetivamente. Estes dados
constituem fatores de risco para a doença em questão, como o presente estudo comprovou.

56
Do ponto de vista clínico, os pacientes apresentavam corrimento ocular seroso tendo
sido diagnosticada uma conjuntivite pela presença de nematodes, nos três. Relativamente à
abordagem terapêutica, esta foi realizada de acordo com o protocolo recomendado
começando pela extração propriamente dita dos nematodes e a posterior administração duma
formulação antiparasitária. Neste caso, aos três pacientes foi administrada uma fórmula
comercial à base de milbemicina oxima e praziquantel (Milbemax®, Elanco), por via oral,
consoante o peso de cada animal, bem como foi prescrita uma segunda toma da mesma ao
fim de 3 semanas, de forma a garantir a eficácia do tratamento. Preventivamente, foi
recomendado realizar uma desparasitação externa dos animais apresentados em questão.
De modo geral, o relato destes casos clínicos permitiu confirmar a situação
epidemiológica do distrito em causa e também a execução dum protocolo médico correto. No
futuro, este último pode ser melhorado ao escolher uma formulação spot-on de moxidectina
2,5% e imidacloprid 10% (Advocateâ; Elanco), cuja eficácia é comprovadamente maior em
comparação às restantes fórmulas antiparasitárias, ao fim de uma única aplicação cutânea,
face a infeções por Thelazia callipaeda (Otranto et al. 2016).

57
A D

B E

C F

Figura
Figura 19
13 Fotografias
Fotografias originais
originais de exemplares de
de exemplares de Thelazia
Thelazia callipaeda
callipaeda ee as
as suas
suas características
características
morfológicas ao microscópio ótico
morfológicas ao microscópio ótico
A
A –– C:
C: Exemplar
Exemplar adulto
adulto macho
macho dede T.
T. callipaeda
callipaeda
A) Segmento anterior
A) Segmento anterior –
– cápsula
cápsula bucal;
bucal; cutícula
cutículaestriada;
estriada;esófago;
esófago;porção
porçãoanterior
anteriordodo
intestino
intestino
[ escala = 100
[escala = 100µm] µ m ]
B) Segmentoposterior
B) Segmento posterior––extremidade
extremidadecaudal
caudalcomcomcurvatura;
curvatura;espícula [ escala==200µm]
espícula[escala 200µm]
C) Detalheda
C) Detalhe da região
região pericloacal – espícula
espícula (assinalada
(assinalada com
comseta
setacompleta);
completa);papila
papilapré-cloacais
pré-cloacais
(assinaladas
(assinaladas comcomsetaseta interrompida)
interrompida) [escala
[escala = 100µm]
= 100µm]
D - F: Exemplar adulto fêmea de T. callipaeda
D - F: Exemplar adultoanterior
D) Segmento fêmea de T. callipaeda
– cápsula bucal; cutícula estriada; esófago; porção anterior do intestino;
D) Segmento
vulva anterior – cápsula
anterior (assinalada com seta)bucal; cutícula
[escala estriada; esófago; porção anterior do intestino;
= 100µm]
vulva anterior (assinalada com seta) [ escala
E) Segmento posterior - intestino; porções de útero = e µovidutos
100 m] com ovos embrionados [escala =
E) Segmento
200µm] posterior - intestino; porções de útero e ovidutos com ovos embrionados [escala =
200µm]dum ovo embrionado [escala = 20µm]
F) Detalhe
F) Detalhe dum ovo embrionado [ escala = 20µm]
G)

58
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Anderson RC. 2000. Nematode Parasites of Vertebrates. Their Development and


Transmission. 2nd Edition. New York (NY): CABI Publishing.

Attardo GM, Hansen IA, Raikhel AS. 2005. Nutritional regulation of vitellogenesis in
mosquitoes: Implications for anautogeny. Insect Biochemistry Molecular Biology. 35(7):661–
675. doi:10.1016/j.ibmb.2005.02.013.

Barnett KC, Sansom J, Heinrich C. 2002. Canine Ophthalmology, An Atlas & Text. Gregory J,
editor. W.B. Saunders.

Bianciardi P, Otranto D. 2005. Treatment of dog thelaziosis caused by Thelazia callipaeda


(Spirurida, Thelaziidae) using a topical formulation of imidacloprid 10% and moxidectin 2.5%.
Veterinary Parasitology. 129(1–2):89–93. doi:10.1016/j.vetpar.2004.12.020.

Blouin MS. 2002. Molecular prospecting for cryptic species of nematodes: Mitochondrial DNA
versus internal transcribed spacer. International Journal of Parasitology. 32(5):527–531.
doi:10.1016/S0020-7519(01)00357-5.

Bojan G, Vanja BS, Aleksandra P, Milica K, Neda B, Duško Ć. 2019. First report of eyeworm
infection by Thelazia callipaeda in gray wolf (Canis lupus) from Serbia. Parasitology Research.
118(12):3549–3553. doi:10.1007/s00436-019-06519-z.

Bowman DD. 2014. Georgis’ Parasitology for Veterinarians. In: Georgis’ Parasitology for
Veterinarians. 10th Edition. Elsevier.

Brás ALL. 2012. Estudo Epidemiológico e Geospacial de Thelazia spp. em Bovinos da Região
do Alentejo, Portugal. Faculdade de Medicina Veterinária - Universidade de Lisboa.

Caron Y, Premont J, Losson B, Grauwels M. 2013. Thelazia callipaeda ocular infection in two
dogs in Belgium. Journal of Small Animal Practice. 54(4):205–208. doi:10.1111/jsap.12003.

Colella V, Kirkova Z, Fok É, Mihalca AD, Tasić-Otašević S, Hodžić A, Dantas-Torres F,


Otranto D. 2016. Eyeworm infections in Eastern Europe. Veterinary Record. 22(15):382.

Cook CS, Peiffer Jr RL, Landis ML. 2009. Small Animal Ophthalmology A Problem-Oriented
Approach. In: Peiffer Jr RL, Petersen-Jones SM, editors. Small Animal Ophthalmology A
Problem-Oriented Approach. 4th Edition. Saunders. p. 1–13.

Delgado E, Otranto D, Jesus S, Fonseca IP da. 2013. Infecção por Thelazia callipaeda num
cão na região de Lisboa. Congresso da Associação Portuguesa Médicos Veterinários
Especialistas em Animais de Companhia 2013.

Diesem C. 2005. Sisson y Grossman - Anatomia de los Animales Domésticos I. In:


Rosenbaum CE, Ghoshal NG, Hillman D, editors. Anatomia de los Animales Domésticos I. 5a
Edición. Masson. p. 257–277.

Dorchies P, Chaudieu G, Siméon LA, Cazalot G, Cantacessi C, Otranto D. 2007. First reports
of autochthonous eyeworm infection by Thelazia callipaeda (Spirurida, Thelaziidae) in dogs
and cat from France. Veterinary Parasitology. 149(3–4):294–297.
doi:10.1016/j.vetpar.2007.08.005.

Eser M, Miman Ö, Acar A. 2019. Thelazia callipaeda (Railliet and Henry, 1910) case in a dog:
First record in Turkey. Kafkas Universitesi Veteriner Fakultesi Dergisi. 25(1).

59
doi:10.9775/kvfd.2018.20487.

Farkas R, Takács N, Gyurkovszky M, Henszelmann N, Kisgergely J, Balka G, Solymosi N,


Vass A. 2018. The first feline and new canine cases of Thelazia callipaeda (Spirurida:
Thelaziidae) infection in Hungary. Parasites and Vectors. 11(1):1–6. doi:10.1186/s13071-018-
2925-2.

Faust EC. 1927. Thelazia Infection Of Man And Mammals In China. Peking Union Medical
College. (82).

Faust EC. 1928. Studies on Thelazia callipaeda Railliet and Henry, 1910. Journal of
Parasitology. 15(2):75–86.

Fedriani JM, Palomares F, Delibes M. 1999. Niche relations among three sympatric
Mediterranean carnivores. Oecologia. 121(1):138–148. doi:10.1007/s004420050915.

Fernandez M, Manzanilla EG, Lloret A, León M, Thibault JC. 2017. Prevalence of feline
herpesvirus-1, feline calicivirus, Chlamydophila felis and Mycoplasma felis DNA and
associated risk factors in cats in Spain with upper respiratory tract disease, conjunctivitis
and/or gingivostomatitis. Journal of Feline Medicine and Surgery. 19(4):461–469.
doi:10.1177/1098612X16634387.

Ferroglio E, Rossi L, Tomio E, Schenker R, Bianciardi P. 2008. Therapeutic and prophylactic


efficacy of milbemycin oxime (interceptor) against Thelazia callipaeda in naturally exposed
dogs. Veterinary Parasitology. 154(3–4):351–353. doi:10.1016/j.vetpar.2008.03.011.

Fuentes I, Montes I, Saugar JM, Latrofa S, Gárate T, Otranto D. 2012. Thelaziosis in humans,
a zoonotic infection, Spain, 2011. Emerging Infectious Diseases. 18(12):2073–2075.
doi:10.3201/eid1812.120472.

Gama A, Pires I, Canado M, Coutinho T, Lopes AP, Latrofa MS, Cardoso L, Dantas-Torres F,
Otranto D. 2016. First report of Thelazia callipaeda infection in wild European rabbits
(Oryctolagus cuniculus) in Portugal. Parasites and Vectors. 9(1):4–7. doi:10.1186/s13071-
016-1526-1. http://dx.doi.org/10.1186/s13071-016-1526-1.

Gasser RB, Newton SE. 2000. Genomic and genetic research on bursate nematodes:
Significance, implications and prospects. International Journal of Parasitology. 30(4):509–
534. doi:10.1016/S0020-7519(00)00021-7.

Gelatt KN. 2003. Fundamentos De Oftalmologia Veterinaria. Masson.

Graham-Brown J, Gilmore P, Colella V, Moss L, Dixon C, Andrews M, Arbeid P, Barber J,


Timofte D, McGarry J, et al. 2017. Three cases of imported eyeworm infection in dogs: A new
threat for the United Kingdom. Veterinary Record. 181(13):346. doi:10.1136/vr.104378.

Graham-Brown J, Gilmore P, Williams D, Barber J, Andrews M, Timofte D. 2016. Case of


canine ocular thelaziosis in the UK. Veterinary Record. 179(2):51. doi:10.1136/vr.i3743.

Hendrix DVH. 2013. Veterinary Ophthalmology, 5th edn. Two volume set. In: Gelatt KN, editor.
Veterinary Ophthalmology. Vol. 1, Section. Fifth Edition. John Wiley & Sons, Inc.

Hermosilla C, Herrmann B, Bauer C. 2004. First case of Thelazia callipaeda infection in a dog
in Germany. Veterinary Record. 154(18):568–569. doi:10.1136/vr.154.18.568.

Hodžić A, Latrofa MS, Annoscia G, Alić A, Beck R, Lia RP, Dantas-Torres F, Otranto D. 2014.

60
The spread of zoonotic Thelazia callipaeda in the Balkan area. Parasites and Vectors. 7(1):1–
6. doi:10.1186/1756-3305-7-352.

Hodžić A, Payer A, Duscher GG. 2019. The first autochthonous case of feline ocular
thelaziosis in Austria. Parasitology Research. 118(4). doi:10.1007/s00436-019-06275-0.

Hu M, Chilton NB, Gasser RB. 2004. The Mitochondrial Genomics of Parasitic Nematodes of
Socio-Economic Importance: Recent Progress, and Implications for Population Genetics and
Systematics. Advances in Parasitology. 56(03):133–212. doi:10.1016/S0065-308X(03)56003-
1.

Ionicǎ AM, Deak G, D’Amico G, Stan GF, Chieamera GB, Constantinescu IC, Adam C,
Lefkaditis M, Gherman CM, Mihalca AD. 2019. Thelazia callipaeda in mustelids from Romania
with the European badger, Meles meles, as a new host for this parasite. Parasites and
Vectors. 12(1):1–6. doi:10.1186/s13071-019-3631-4. https://doi.org/10.1186/s13071-019-
3631-4.

Lechat C, Siméon N, Pennant O, Desquilbet L, Chahory S, Le Sueur C, Guillot J. 2015.


Comparative evaluation of the prophylactic activity of a slow-release insecticide collar and a
moxidectin spot-on formulation against Thelazia callipaeda infection in naturally exposed dogs
in France. Parasites and Vectors. 8(1):4–8. doi:10.1186/s13071-015-0696-6.

Lee CA. 1840. An Account of a Filaria in a Horse’s Eye, with Remarks on Similiar Phenomena
and the Mode of their Origin. American Journal of Sciences and Arts. 39(2).

Lia RP, Traversa D, Agostini A, Otranto D. 2004. Field efficacy of moxidectin 1 per cent
againstagainst Thelazia callipaeda in naturally infected dogs. Veterinary Record - Short
Communications.

López Medrano R, Guerra Calleja G, Díez Morrondo C, Panadero Fontán R. 2015. Ocular
thelaziosis, an emergent zoonosis in Spain. Medicina Clinica (Barc). 145(7):317–318.
doi:10.1016/j.medcli.2015.02.014.

Lourenço-Martins AM, Delgado E, Neto I, Peleteiro MC, Morais-Almeida M, Correia JHD.


2011. Allergic conjunctivitis and conjunctival provocation tests in atopic dogs. Veterinary
Ophthalmology. 14(4):248–256. doi:10.1111/j.1463-5224.2011.00874.x.

Madeira de Carvalho LM, Alho AM, Matos M, Sousa S, Miranda LM, Anastacio S, Meireles J,
Otranto D, Belo S, Deplazes P. 2014. Helmintic CVBD and Antiparasitic Control Measures in
Portugal - recent updates. Expect the unexpected.

Maggs D. 2008. Slatter’s Fundamentals Of Veterinary Ophthalmology. Fourth Edition. Winkel


A, Slaten M, editors. Saunders.

Maia C, Catarino AL, Almeida B, Ramos C, Campino L, Cardoso L. 2016. Emergence of


Thelazia callipaeda Infection in Dogs and Cats from East-Central Portugal. Transboundary
and Emerging Diseases. 63(4):416–421. doi:10.1111/tbed.12284.

Malacrida F, Hegglin D, Bacciarini L, Otranto D, Nägeli F, Nägeli C, Bernasconi C, Scheu U,


Balli A, Marenco M, et al. 2008. Emergence of canine ocular thelaziosis caused by Thelazia
callipaeda in southern Switzerland. Veterinary Parasitology. 157(3–4):321–327.
doi:10.1016/j.vetpar.2008.07.029.

Marino V, Gálvez R, Colella V, Sarquis J, Checa R, Montoya A, Barrera JP, Domínguez S,


Lia RP, Otranto D, et al. 2018. Detection of Thelazia callipaeda in Phortica variegata and

61
spread of canine thelaziosis to new areas in Spain. Parasites and Vectors. 11(1):1–10.
doi:10.1186/s13071-018-2773-0.

Marino V, Gálvez R, Montoya A, Mascuñán C, Hernández M, Barrera JP, Domínguez I, Zenker


C, Checa R, Sarquis J, et al. 2020. Spain as a dispersion model for Thelazia callipaeda
eyeworm in dogs in Europe. Preventive Veterinary Medicine. 175.
doi:10.1016/j.prevetmed.2020.104883.

Martin CL. 2010. Ophthalmic Disease in Veterinary Medicine. Northcott J, Maxwell R, Beynon
P, editors. Manson Publishing/The Veterinary Press.

McGarry JW, Graham-Brown J, Pasztor M. 2017. Threats of vector-borne zoonotic disease in


Europe: dogs, drosophilids, and Oriental eye worm. Lancet Infectious Diseases. 17(11):1115–
1117. doi:10.1016/S1473-3099(17)30580-7.

Mihalca AD, D’Amico G, Scurtu I, Chirilə R, Matei IA, Ionicə AM. 2015. Further spreading of
canine oriental eyeworm in Europe: First report of Thelazia callipaeda in Romania. Parasites
and Vectors. 8(1):2–5. doi:10.1186/s13071-015-0663-2.

Mihalca AD, IonicǍ AM, D’Amico G, Daskalaki AA, Deak G, Matei IA, Şimonca V, Iordache D,
Modrý D, Gherman CM. 2016. Thelazia callipaeda in wild carnivores from Romania: New host
and geographical records. Parasites and Vectors. 9(1):1–5. doi:10.1186/s13071-016-1628-9.

Motta B, Schnyder M, Basano FS, Nägeli F, Nägeli C, Schiessl B, Mallia E, Lia RP, Dantas-
Torres F, Otranto D. 2012. Therapeutic efficacy of milbemycin oxime/praziquantel oral
formulation (MilbemaxW) against Thelazia callipaeda in naturally infested dogs and cats.
Parasites and Vectors. 5(1):1–6. doi:10.1186/1756-3305-5-85.

Murphy CJ, Pollock RVH, Samuelson D. 2012. Miller’s Anatomy of the Dog. Fourth Edition.
Elsevier.

Naem S. 2007. Morphological differentiation among three Thelazia species (Nematoda:


Thelaziidae) by scanning electron. Parasitology Research. doi:10.1007/s00436-006-0432-4.

Nájera F, de Lucas-Veguillas J, Vela Á, López-Fernández M, Martínez-Martínez P, Mata-


Huete M, Cáceres-Urones J, Annoscia G, Otranto D, Calero-Bernal R. 2020. First report of
Thelazia callipaeda in a free-ranging Iberian wolf (Canis lupus signatus) from Spain.
Parasitology Research. 119(7). doi:10.1007/s00436-020-06735-y.

Otranto D, Brianti E, Cantacessi C, Lia RP, Máca J. 2006. The zoophilic fruitfly Phortica
variegata: Morphology, ecology and biological niche. Medical and Veterinary Entomology.
20(4):358–364. doi:10.1111/j.1365-2915.2006.00643.x.

Otranto D, Cantacessi C, Dantas-Torres F, Brianti E, Pfeffer M, Genchi C, Guberti V, Capelli


G, Deplazes P. 2015. The role of wild canids and felids in spreading parasites to dogs and
cats in Europe. Part II: Helminths and arthropods. Vet Parasitol. 213(1–2):24–37.
doi:10.1016/j.vetpar.2015.04.020. http://dx.doi.org/10.1016/j.vetpar.2015.04.020.

Otranto D, Cantacessi C, Lia RP, Kadow ICG, Purayil SK, Dantas-Torres F, Máca J. 2012.
First laboratory culture of Phortica variegata (Diptera, Steganinae), a vector of Thelazia
callipaeda. Journal of Vector Ecology. 37(2):458–461. doi:10.1111/j.1948-
7134.2012.00251.x.

Otranto D, Cantacessi C, Mallia E, Lia RP. 2007. First report of Thelazia callipaeda (Spirurida,
Thelaziidae) in wolves in Italy. Journal of Wildlife Diseases. 43(3):508–511. doi:10.7589/0090-

62
3558-43.3.508.

Otranto D, Cantacessi C, Testini G, Lia RP. 2006. Phortica variegata as an intermediate host
of Thelazia callipaeda under natural conditions: Evidence for pathogen transmission by a male
arthropod vector. International Journal of Parasitology. 36(10–11):1167–1173.
doi:10.1016/j.ijpara.2006.06.006.

Otranto D, Colella V, Crescenzo G, Solari Basano F, Nazzari R, Capelli G, Petry G, Schaper


R, Pollmeier M, Mallia E, et al. 2016. Efficacy of moxidectin 2.5% and imidacloprid 10% in the
treatment of ocular thelaziosis by Thelazia callipaeda in naturally infected dogs. Veterinary
Parasitology. 227:118–121. doi:10.1016/j.vetpar.2016.07.035.
http://dx.doi.org/10.1016/j.vetpar.2016.07.035.

Otranto D, Dantas-Torres F. 2015. Transmission of the eyeworm Thelazia callipaeda:


Between fantasy and reality. Parasites and Vectors. 8(1):7–9. doi:10.1186/s13071-015-0881-
7.

Otranto D, Dantas-Torres F. 2017. Arthropod Borne Diseases. In: Marcondes CB, editor.
Arthropod Borne Diseases. Springer.

Otranto D, Dantas-Torres F, Mallia E, DiGeronimo PM, Brianti E, Testini G, Traversa D, Lia


RP. 2009. Thelazia callipaeda (Spirurida, Thelaziidae) in wild animals: Report of new host
species and ecological implications. Veterinary Parasitology. 166(3–4):262–267.
doi:10.1016/j.vetpar.2009.08.027.

Otranto D, Deplazes P. 2019. Zoonotic nematodes of wild carnivores. International Journal of


Parasitology: Parasites and Wildlife. 9(December 2018):370–383.
doi:10.1016/j.ijppaw.2018.12.011. https://doi.org/10.1016/j.ijppaw.2018.12.011.

Otranto D, Dutto M. 2008. Human thelaziasis, Europe. Emerging Infectious Diseases.


14(4):647–649. doi:10.3201/eid1404.071205.

Otranto D, Ferroglio E, Lia RP, Traversa D, Rossi L. 2003. Current status and epidemiological
observation of Thelazia callipaeda (Spirurida, Thelaziidae) in dogs, cats and foxes in Italy: A
“coincidence” or a parasitic disease of the Old Continent? Veterinary Parasitology.
116(4):315–325. doi:10.1016/j.vetpar.2003.07.022.

Otranto D, Iatta R, Lia RP, Cavalera MA, Máca J, Pombi M, Dantas-Torres F, Jaenike J. 2018.
Competence of Phortica variegata from the United States as an intermediate host of the
Thelazia callipaeda eyeworm. American Journal of Tropical Medicine and Hygiene.
98(4):1175–1178. doi:10.4269/ajtmh.17-0956.

Otranto D, Lia RP, Buono V, Traversa D, Giangaspero A. 2004. Biology of Thelazia callipaeda
(spirurida, thelaziidae) eyeworms in naturally infected definitive hosts. Parasitology.
129(5):627–633. doi:10.1017/S0031182004006018.

Otranto D, Lia RP, Cantacessi C, Testini G, Troccoli A, Shen JL, Wang ZX. 2005. Nematode
biology and larval development of Thelazia callipaeda (Spirurida, Thelaziidae) in the
drosophilid intermediate host in Europe and China. Parasitology. 131(6):847–855.
doi:10.1017/S0031182005008395.

Otranto D, Testini G, De Luca F, Hu M, Shamsi S, Gasser RB. 2005. Analysis of genetic


variability within Thelazia callipaeda (Nematoda: Thelazioidea) from Europe and Asia by
sequencing and mutation scanning of the mitochondrial cytochrome c oxidase subunit 1 gene.
Molecular and Cellular Probes. 19(5):306–313. doi:10.1016/j.mcp.2005.05.001.

63
Otranto D, Traversa D. 2004. Molecular Characterization of the First Internal Transcribed
Spacer of Ribosomal DNA of the Most Common Species of Eyeworms (Thelazioidea:
Thelazia). Journal of Parasitology. 90(1):185–188. doi:10.1645/ge-115r1.

Otranto D, Traversa D. 2005. Thelazia eyeworm: An original endo- and ecto-parasitic


nematode. Trends of Parasitology. 21(1):1–4. doi:10.1016/j.pt.2004.10.008.

Palfreyman J, Graham-Brown J, Caminade C, Gilmore P, Otranto D, Williams DJL. 2018.


Predicting the distribution of Phortica variegata and potential for Thelazia callipaeda
transmission in Europe and the United Kingdom. Parasites and Vectors. 11(1):1–8.
doi:10.1186/s13071-018-2842-4.

Papadopoulos E, Komnenou A, Thomas A, Ioannidou E, Colella V, Otranto D. 2018.


Spreading of Thelazia callipaeda in Greece. Transboundary and Emerging Diseases. 65(1).
doi:10.1111/tbed.12626.

Paradžik MT, Samardžić K, Živičnjak T, Martinković F, Janjetović Ž, Miletić-Medved M. 2016.


Thelazia callipaeda—first human case of thelaziosis in Croatia. Wiener Klinische
Wochenschrift. 128(5–6):221–223. doi:10.1007/s00508-015-0889-1.

Pimenta P, Cardoso L, Pereira MJ, Maltez L, Coutinho T, Alves MS, Otranto D. 2013. Canine
ocular thelaziosis caused by Thelazia callipaeda in Portugal. Veterinary Ophthalmology.
16(4):312–315. doi:10.1111/j.1463-5224.2012.01074.x.

Railliet A. 1916. La Famille des Thelaziidae. The Journal of Parasitology. 2(3).

Roberts LS, Schmidt GD, Jr. JJ. 2009. Foundations of Parasitology. In: Foundations of
Parasitology. Eighth Edition. McGraw-Hill.

Rodger HD. 2007. Veterinary Parasitology. 2nd Edition. Blackwell Publishing.

Rodrigues FT, Cardoso L, Coutinho T, Otranto D, Diz-Lopes D. 2012. Ocular thelaziosis due
to Thelazia callipaeda in a cat from northeastern Portugal. Journal of Feline Medicine and
Surgery. 14(12):952–954. doi:10.1177/1098612X12459645.

Samuelson DA. 2013. Veterinary Ophthalmology, 5th edn. Two volume set. In: Gelatt KN,
editor. Veterinary Ophthalmology. Vol. 1, Section. Fifth Edition. John Wiley & Sons, Inc. p. 39–
170.

Sargo R, Loureiro F, Catarino AL, Valente J, Silva F, Cardoso L, Otranto D, Maia C. 2014.
First Report of Thelazia callipaeda in Red Foxes ( Vulpes Vulpes ) From Portugal . Journal
Zoo and Wildlife Medicine. 45(2):458–460. doi:10.1638/2013-0294r.1.

Schultz GR. 1970. Intraocular nematode in man. American Journal of Ophthalmology.


70(5):826–829. doi:10.1016/0002-9394(70)90507-6. http://dx.doi.org/10.1016/0002-
9394(70)90507-6.

Seixas F, Travassos P, Coutinho T, Lopes AP, Latrofa MS, Pires M dos A, Cardoso L, Otranto
D. 2018. The eyeworm Thelazia callipaeda in Portugal: Current status of infection in pets and
wild mammals and case report in a beech marten (Martes foina). Veterinary Parasitology.
252(2010):163–166. doi:10.1016/j.vetpar.2018.02.007.
http://dx.doi.org/10.1016/j.vetpar.2018.02.007.

Shen J, Gasser RB, Chu D, Wang Z, Yuan X, Cantacessi C, Otranto D. 2006. Human
Thelaziosis—A Neglected Parasitic Disease of the Eye. Journal of Parasitology. 92(4):872–

64
876. doi:10.1645/ge-823r.1.

Silva LMR, Spoerel S, Wiesner L, Klein M, Pantchev N, Taubert A, Hermosilla C. 2020.


Ophthalmic Thelazia callipaeda infections: first feline and new canine imported cases in
Germany. Parasitology Research. doi:10.1007/s00436-020-06785-2.

Soares C, Sousa SR, Anastácio S, Matias MG, Marquês I, Mascarenhas S, Vieira MJ, de
Carvalho LM, Otranto D. 2013. Feline thelaziosis caused by Thelazia callipaeda in Portugal.
Veterinary Parasitology. 196(3–4):528–531. doi:10.1016/j.vetpar.2013.03.029.
http://dx.doi.org/10.1016/j.vetpar.2013.03.029.

Stuckey EJ. 1917. Circumocular Filariasis. British Journal of Ophthalmology.:542–546.

Tasić-Otašević S, Gabrielli S, Trenkić-Božinović M, Petrović A, Gajić B, Colella V, Momčilović


S, Cancrini G, Otranto D. 2016. Eyeworm infections in dogs and in a human patient in Serbia:
A One Health approach is needed. Comparative Immunology Microbiology and Infectious
Diseases. 45:20–22. doi:10.1016/j.cimid.2016.01.003.

Turner SM. 2010. Oftalmología de Pequeños Animales - Soluciones Saunders en la Práctica


Veterinaria. Primera Edición. Fred Nind, editor. Elsevier.

do Vale B, Lopes AP, da Conceição Fontes M, Silvestre M, Cardoso L, Coelho AC. 2019.
Thelaziosis due to Thelazia callipaeda in Europe in the 21st century—A review. Vet Parasitol.
275. doi:10.1016/j.vetpar.2019.108957.

Vieira L, Rodrigues FT, Costa Á, Diz-Lopes D, MacHado J, Coutinho T, Tuna J, Latrofa MS,
Cardoso L, Otranto D. 2012. First report of canine ocular thelaziosis by Thelazia callipaeda in
Portugal. Parasites and Vectors. 5(1):1–5. doi:10.1186/1756-3305-5-124.

Zhang X, Shi YL, Han LL, Xiong C, Yi SQ, Jiang P, Wang ZX, Shen JL, Cui J, Wang ZQ. 2018.
Population structure analysis of the neglected parasite Thelazia callipaeda revealed high
genetic diversity in Eastern Asia isolates. PLoS Neglected Tropical Diseases. 12(1):1–14.
doi:10.1371/journal.pntd.0006165.

65
CAPÍTULO 6 ANEXOS

6.1 Anexo 1 - Questionário

66
67
68
69
70
71
72

Você também pode gostar