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Composição do Júri:
(2) quaisquer materiais utilizados para produção deste trabalho não colocam
em causa direitos de Propriedade Intelectual de terceiras entidades ou sujeitos;
(3) este trabalho não foi previamente submetido como elemento de avaliação
nesta ou em outra instituição de ensino/formação.
iii
iv
AGRADECIMENTOS
A realização desta tese representa, para mim, não só a conclusão de um curso com o qual
desde sempre sonhei, mas também, em tom de nota pessoal, a minha singela homenagem à área
da Patologia e aos Patologistas Veterinários. Ter-me-ia sido impossível concretizar esta ideia
sozinha e, por isso, seguem aqui os meus mais sinceros agradecimentos a todos os que me
apoiaram de forma direta ou indireta ao longo não só da escrita deste documento, como também
no percurso que realizei até aqui chegar.
Ao Prof. Dr. José Manuel Almeida, que, para além de ter sido um excelente docente
durante o curso, e ter cedido a planta do LHAP-UTAD, também dispôs do seu tempo para me
dar conselhos em relação à escrita deste documento e me indicou o programa de bibliografia
que usei para as referências.
À técnica de laboratório, Lígia Bento, pela amabilidade que teve em deixar-me também
acompanhar o seu trabalho e por me ter explicado mais a fundo, o procedimento da preparação
das lâminas para histopatologia.
Aos Doutores que me acompanharam no INIAV, Dr. Carlos Pinto, Dra. Carla Lima e Dra.
Cristina Ochoa por terem tornado o meu último estágio num dos meus preferidos, tendo sindo
v
um mês de aprendizagem, durante o qual me permitiram colocar à prova as minhas capacidades
práticas de uma forma que me fez sentir autónoma e realizada.
Em segundo lugar, não poderia deixar também de agradecer aos meus Pais, que sempre
me deram condições para estudar, bem como para seguir em frente e não desistir dos meus
sonhos, permitindo-me a honra de poder ser uma estudante universitária. Aos meus Avós, que
sempre expressaram orgulho em mim, tanto para os pequenos como os grandes feitos. Ao meu
Irmão, que sempre ouviu as minhas lamúrias quando as coisas corriam menos bem, e ao meu
Tio, que me ajudou a preparar, há 7 anos, para o exame de físico-química e que para além disso,
sempre se preocupa com o bem-estar de ambos os sobrinhos, sendo também para mim um
exemplo de como o trabalho árduo é compensatório.
À minha melhor amiga, Andreia Carolina, pelos 18 anos de amizade verdadeira, por tudo
o que partilhamos, por continuarmos amigas mesmo em universidades diferentes e,
especialmente, pelas longas tardes de estudo e apoio mútuo, que contribuíram para que duas
concluíssemos o ensino superior.
Ao meu namorado e companheiro de longa data, Aaron, que sempre acreditou em mim
e me incentivou a seguir os meus objetivos, estando ao meu lado tanto nos bons momentos,
como nas adversidades, e que me deu forças, todos os dias, para este desafio final.
Às minhas amigas e colegas de curso, Daniela Maia e Ana Rita Ferreira, por terem sido,
de entre os amigos todos que fiz durante o curso, as pessoas que mais contribuíram para o meu
sucesso, não só pelo apoio e ajuda no estudo, como também para as merecidas pausas e
diminuição do stress.
vi
RESUMO
A Patologia é uma ciência base de valor irrefutável tanto para Medicina Humana como
Veterinária. Apesar disto, nas últimas duas décadas tem-se verificado nos jovens estudantes,
de forma universal, uma gradual perda de interesse pela mesma. Tal facto reflete-se numa
acentuada necessidade de formar profissionais qualificados, dado que a sua inexistência vem
alterar a dinâmica do trabalho realizado em clínica, impossibilitando a emissão de diagnósticos
definitivos, tardando a escolha de terapias, dificultando o estudo da evolução de casos, bem
como limitando o potencial de previsão prognóstica de variadas afeções. O patologista é muitas
vezes um herói silencioso, não reconhecido.
O presente documento resulta do trabalho que realizei no decorrer dos meus estágios, ao
longo de 6 meses, entre Portugal e a Irlanda do Norte, de entre os quais selecionei 15 casos
para uma abordagem mais extensiva e direcionada ao estudo de cada doença em questão,
visando reforçar importância dos patologistas e da sua contribuição para a medicina veterinária.
vii
ABSTRACT
Pathology is a basic science of irrefutable value for both Human and Veterinary Medicine.
Despite this, in the last two decades there has been an universal loss of interest, observed in
young students. This fact reflects an accentuated need to train qualified professionals, as their
absence changes the dynamics of clinical work, resulting in an impossibility to achieve
definitive diagnoses, delaying the choice of therapies, making it more difficult to study the
evolution of cases, and limiting the potential of prognostic prediction of many different
conditions. The pathologist is often a silent, unrecognized hero.
The present document is the result of the work I did during my internships, over the course
of 6 months, between Portugal and Northern Ireland, from which I selected 15 cases for a more
extensive, in depth approach, directed to the study of each disease, and which aim to reinforce
the importance of the pathologists and their contribution to veterinary medicine.
viii
ÍNDICE GERAL
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 1
2.2 Que tipo de análises são conduzidas no LHAP e a partir de que material? .............. 27
2.2.2 Como são preparadas as lâminas a partir de material para histopatologia? ....... 29
ix
3 ESTÁGIO Vets4Pets, Belfast, R.U (Irlanda do Norte) .................................................. 105
7 ANEXOS........................................................................................................................ 248
x
ÍNDICE DE FIGURAS
xi
Figura 38 – Pulmão; Congestão dos capilares alveolares. Agregado de macrófagos em posição peribronquiolar
que apresentam citoplasma com elevada quantidade de pigmento granular, negro, refringente,
correspondente a carvão – Antracose. Amp. 20x ................................................................................................. 72
Figura 39 – (A), (B), (C), (D) – Coloração amarelo-esverdeado das mucosas ocular, oral e almofadas plantares.79
Figura 40 – Fígado pálido, apresenta áreas deprimidas à superfície, multifocais, aleatórias e de tamanho
variável ................................................................................................................................................................. 81
Figura 41 – Serosas abdominais ictéricas. Pâncreas rosado com depressões punctiformes à superfície ............ 81
Figura 42 – Pulmões rosados. Congestão por hipóstase direita. .......................................................................... 82
Figura 43 – Presença de espuma ao pressionar os lobos pulmonares direitos, evidência de edema pulmonar.
Áreas hemorrágicas (sufusões) ............................................................................................................................. 82
Figura 44 – Rins: córtex e bacinete renal apresentam coloração amarelo-esverdeado com congestão da região
intercorticomedular .............................................................................................................................................. 83
Figura 45 – Fígado HE; observa-se aumento do estroma fibro-conjuntivo portal, evidenciando a estrutura
lobular hepática. Infiltrado linfocitário portal, que também se estende ao restante parênquima. Amp. 4x ...... 83
Figura 46 – Infiltrado linfoplasmocitário pericolangítico. Dilatação dos sinusóides hepáticos. Amp 20x ............ 84
Figura 47 – Proliferação dos ductos biliares. Infiltrado linfoplasmocitário pericolangítico e perivascular. Amp.
10x ........................................................................................................................................................................ 84
Figura 48 – Proliferação dos ductos biliares e fibrose pericolangítica. Infiltrado linfoplasmocitário periductal.
Amp. 20x ............................................................................................................................................................... 85
Figura 49 – Denso infiltrado linfoplasmocitário periportal. Amp 20x .................................................................. 85
Figura 50 – Cadáver Yorkshire .............................................................................................................................. 91
Figura 51 – Palidez da mucosa oral. Tártaro na arcada dentária superior ........................................................... 91
Figura 52 – Ascite e palidez das serosas abdominais. .......................................................................................... 93
Figura 53 – Detalhe de Hemotórax ....................................................................................................................... 93
Figura 54 – Espuma na traqueia (edema pulmonar), pulmões húmidos e brilhantes.......................................... 94
Figura 55 – Detalhe das câmaras cardíacas (HEVE). ............................................................................................. 94
Figura 56 – (A) congestão dos vasos do mesentério; (B) serosa do intestino delgado; (C) e (D) dilatação dos
vasos linfáticos da mucosa intestinal - linfangiectasia ......................................................................................... 95
Figura 57 – Congestão Renal ................................................................................................................................ 95
Figura 58 – Encurtamento e dilatação das vilosidades por ectasia dos quilíferos, alguns dos quais roturados.
Dilatação também das criptas. Amp 4x ................................................................................................................ 96
Figura 59 – Dilatação dos quilíferos, por material eosinofílico, proteináceo. Amp. 10x ...................................... 96
Figura 60 – Corte transversal de vilosidades intestinais. (A) Dilatação dos quilíferos com consequente expansão
de diâmetro das vilosidades; (B) Vilosidades normais. Adaptado de Rossi et al; 2015 ...................................... 101
Figura 61 – (A) Dolichotis patagonum – Mara; (B) Trachemys scripta – Tartaruga (C) Lutra lutra – Lontra ...... 103
Figura 62 – Planta da Clínica Vets4Pets (gentilmente produzido por Tiago Santos, com base no meu relato) . 105
Figura 63 – (A) Material para coloração Diff-Quick; (B) Microscópio da Clínica Vets4Pets ................................ 109
Figura 64 – (A) Aparelho de hemograma; (B) Aparelho de bioquímica sérica (seca); (C) material para realizar
patologia clínica .................................................................................................................................................. 110
Figura 65 – (A) Lista de Preços Laboratório Nation Wide e ficha de requisição; (B) Caixa fornecida pelo
laboratório; (C) Apresentação do laboratório de especialidade, clínica de grandes e pequenos. ..................... 111
Figura 66 – Consultório Principal (Vets4Pets Belfast) ........................................................................................ 112
Figura 67 – Sala de Cirurgia (Vets4Pets Belfast) ................................................................................................. 112
Figura 68 – Aspeto Macroscópico: pré (A, B) e pós cirúrgico (C); contentor com tecido excisado (D). ............. 113
Figura 69 – Aspeto Macroscópico da nova lesão verrucosa da fêmea Bulldog Americano ................................ 115
Figura 70 – Aspeto dorsal, anatomia dos ligamentos da porção distal do MAE de um canídeo, com referência à
numeração dos dígitos (Miller et al., 1979) ........................................................................................................ 115
Figura 71 – Papilomatose Canina Oral (Fantini, Videmont, & Pin, 2015) ........................................................... 116
Figura 72 – Fig. A - Proliferação exofítica, papilar, do epitélio escamoso, com hiperplasia do estrato espinhoso
(S), proeminência do estrato granular (G) e hiperqueratose paraqueratótica do estrato córneo (C); Fig. B -
Células do estrato espinhoso apresentam inclusões intranucleares, basofilicas. Presença de halo perinuclear
(adaptado de Bianchi et al., 2012) ...................................................................................................................... 118
Figura 73 – (A) vista dorsal da lesão cupuliforme, ulcerada, no MAD; (B) vista lateral da mesma lesão ........... 121
Figura 74 – (A), (B) aspeto macroscópico da lesão, pré-cirúrgico. (C) Lesão após extirpação. .......................... 122
xii
Figura 75 – Fibromixosarcoma de baixo grau, onde figuraram células (Angiero et al., 2007) Amp. 20x40 ....... 127
Figura 76 – Aspeto macroscópico da lesão, pré cirúrgico. A lesão mantém a integridade da barreira cutânea,
estando coberta por pele. .................................................................................................................................. 129
Figura 77 – (A) aspeto macroscópico da lesão pós extirpação; (B) presença de pequenos nódulos, calcificados,
de vários tamanhos. (C) lóbulos compostos por áreas bem definidas preenchidas por líquido branco, viscoso.
............................................................................................................................................................................ 130
Figura 78 - Mudança de penso 3 dias pós cirurgia ............................................................................................. 130
Figura 79 –Nódulos calcificados compatíveis com calcinose circunscrita (H&E); (A) Nódulos de várias
dimensões, basofílicos, distribuídos pela derme; (B) e (C) nódulos rodeados por células epitelióides, células
gigantes multinucleadas e fibroblastos reativos (adaptado de Lee et al., 2016) ............................................... 134
Figura 80 – Coloração vermelho S de alzarina evidenciado calcificação (Amp 20x) (Alçigir et al., 2014). ......... 135
Figura 81 – Aspeto macroscópico da lesão, cupuliforme, eritematosa, na linha média dorsal, pré e pós cirúrgico
............................................................................................................................................................................ 136
Figura 82 – CAAF de histiocitoma canino onde observamos várias células redondas, que exibem anisocitose
com grau variável de citoplasma pálido, ligeiramente basofílico. Os núcleos são excêntricos, alguns dos quais
indentados (Setas vermelhas), com cromatina finamente granular. Observamos também uma mitose (seta
preta) (adaptado de Garrett, 2016). ................................................................................................................... 139
Figura 83 – Secção de pele mostrando a junção dermo-epidérmica, onde é possível observar células do tipo
histiocítico dispostas em cordões que invadem a derme (Hendrick, 2017). ...................................................... 140
Figura 84 – ‘Close up’ das lesões eritematosas, alopécicas na Bulldog de 6 meses. (A) periocular; (B)
Subamandibular e face ventral do pescoço; (C) Lesões punctiformes na porção distal do MAD ...................... 142
Figura 85 – ‘Close up’ dos locais onde se realizou a raspagem de pele para citologia (A) região supraocular
direita; (B) Face ventral da porção distal do MAE .............................................................................................. 143
Figura 86 – Ácaros Demodex canis (citologia por raspagem de pele) - (A) MAE Amp. 10x; (B) zona supraorbital
esquerda, Amp. 20x ............................................................................................................................................ 144
Figura 87 – Aludex (Amitraz) .............................................................................................................................. 144
Figura 88 – Após 1 semana de tratamento......................................................................................................... 145
Figura 89 – (A) Procedimento CAAF do linfonodo poplíteo de furão; (B) Corado por Diff-Quick amp. 20x; (C)
Corado por Diff quick amp. 40x .......................................................................................................................... 152
Figura 90 – Planta geral (cedida pelo INIAV) ...................................................................................................... 153
Figura 91 – Câmara de corte ............................................................................................................................... 157
Figura 92 – (A) Corte de fragmento de pulmão, suspeita de tuberculose; (B) Processador; (C) Placa de Inclusão
............................................................................................................................................................................ 158
Figura 93 – Moldes metálicos, sob a placa de inclusão ...................................................................................... 159
Figura 94 – Micrótomo (desbaste) ..................................................................................................................... 159
Figura 95 – Banho-Maria .................................................................................................................................... 160
Figura 96 – Estufa LAHP-I .................................................................................................................................... 160
Figura 97 – Sistema de coloração manual. ......................................................................................................... 161
Figura 98 – Montagem manual de lâmina .......................................................................................................... 161
Figura 99 – Vista geral da sala de Necropsias LHAP-I ......................................................................................... 162
Figura 100 – Mesa principal de trabalho ............................................................................................................ 162
Figura 101 – Exploração da cavidade abdominal de um canídeo ....................................................................... 163
Figura 102 – Execução de necropsia de canídeo ................................................................................................ 163
Figura 103 – Corte do ápex cardíaco para posterior observação e comparação do diâmetro das câmaras
cardíacas ............................................................................................................................................................. 164
Figura 104 – (A) mesa para abertura de crânios; (B) Mesa de trabalho para recolha de amostras para
bacteriologia ....................................................................................................................................................... 164
Figura 105 – Sala de Microscopia LAHP-INIAV ................................................................................................... 165
Figura 106 – Exame hábito externo (A) cadáver; (B) Cav. Oral, (C) Cav. Ocular ................................................. 166
Figura 107 – Exame interno (A) comparação órgãos exangues na C.T e congestivo-hemorrágicos na C.A; (B)
Congestão ansas intestinais; C) Congestão e dilatação, torção ansas intestinais .............................................. 168
Figura 108 – (A) Palidez da mucosa traqueal; (B) Hipertrofia concêntrica do ventrículo esquerdo .................. 169
Figura 109 – Vólvulo e torção intestinal com encarceramento do jejuno resultando em congestão, necrose e
hemorragia. ........................................................................................................................................................ 170
xiii
Figura 110 – Pinça dente-de-rato indica detalhe de rotura do mesentério, por onde o jejuno herniou ........... 171
Figura 111 – Detalhe do interface entre as porções necrosadas do jejuno e as porções que não foram alvo de
isquemia. ............................................................................................................................................................ 171
Figura 112 – Avaliação do (A) Estômago; (B) Baço; (C) Rins; (D) Mucosa intestinal, zona de interface área não
isquémica/área isquémica .................................................................................................................................. 172
Figura 113 – Cadáver Maine coon ...................................................................................................................... 176
Figura 114 – (A) Palidez da conjuntiva ocular com afundamento do globo ocular; (B) Palidez da língua .......... 177
Figura 115 – (A) Efusão peritoneal fibrino-purulenta (serosite e peritonite fibrino-purulenta); (B) Detalhe
filamentos de fibrina .......................................................................................................................................... 179
Figura 116 – Detalhe abcesso peri-pancreático com conteúdo purulento concretizado ................................... 180
Figura 117 – Úlcera gástrica (antro-pilórico) com trajeto fistuloso até ao abcesso já mencionado .................. 181
Figura 118 – Fígado e vesícula biliar. Quistos no ducto biliar. ............................................................................ 181
Figura 119 – (A) traqueia e pulmões: focos de hemorragia petequial na periferia de todos os lobos; (B) Coração:
palidez do miocárdio, coágulos. ......................................................................................................................... 182
Figura 120 – Congestão das meninges ............................................................................................................... 183
Figura 121 – Breve resumo fotográfico da necropsia (Muntjac spp.) ................................................................ 190
Figura 122 – Breve Resumo fotográfico da necropsia (Macropus spp.) ............................................................. 191
Figura 123 – Tuberculose perlácea (pulmão e pleura) em fragmento de pulmão de bovino ............................ 192
Figura 124 – Linfonodo (bovino) apresenta lesões granulomatosas miliares .................................................... 193
Figura 125 – Pulmão (H&E): áreas de atelectasia e congestão dos alvéolos pulmonares bem como um
granuloma de centro necrótico, caseoso e calcificado. Amp. 4x........................................................................ 193
Figura 126 – Granuloma: necrose de caseificação, com calcificação central, envolvida por infiltrado
inflamatório mononuclear, onde também se observam GGM, seguido de cápsula fibrosa. Amp. 4x ............... 194
Figura 127 – Múltiplas áreas de necrose de caseificação, com áreas de calcificação. Amp 4x .......................... 194
Figura 128 – Detalhe CGM de Langhans (setas pretas) Amp. 20x ...................................................................... 195
Figura 129 – Granuloma típico de tuberculose bovina com área central de necrose de caseificação, com
calcificação, seguida de uma camada de células epitelioides e CGM (Langhans), seguida de uma camada de
células mononucleadas (macrófagos, linfócitos e plasmócitos), rodeado por uma cápsula de fibrose. Amp. 10x
............................................................................................................................................................................ 195
Figura 130 – (A) Campo lâmina tuberculose H&E (granuloma); (B) Mesmo campo, Ziehl Neelson. Amp. 4x .... 196
Figura 131 – Micobacterias coram de fúcsia com o Ziehl Neelson. Amp. 60x .................................................... 197
Figura 132 – Ampliação imagem anterior, bacilos de tuberculose (corados por Ziehl Neelson) ....................... 197
Figura 133 – Aspeto macroscópico dos 3 órgãos mencionados, após fixação em formol ................................. 204
Figura 134 – Fígado: hepatócitos neoplásicos dispostos quer em padrão cordonal quer sólido. H&E, Amp. 4x
............................................................................................................................................................................ 205
Figura 135 – Fígado: observam-se êmbolos de hepatócitos neoplásicos. H&E, Amp. 10x ................................ 206
Figura 136 – Fígado: áreas de hemorragia. H&E, Amp. 10x ............................................................................... 206
Figura 137 – Hepatócitos neoplásicos dispostos em padrão solido e trabecular. Anisocitose e anisocariose,
nucléolos evidentes. Áreas de hemorragia. H&E, Amp. 20x .............................................................................. 207
Figura 138 – Círculo: Anisocariose. Seta preta: Mitose (Ampliação da imagem anterior – 20x) ....................... 207
Figura 139 – Fígado: detalhe hemorragia e êmbolos neoplásicos. H&E, Amp.10x ............................................ 208
Figura 140 – Pulmão (H&E): Nódulo delimitado, parcialmente encapsulado, separado por trabéculas fibrosas.
Amp. 4x ............................................................................................................................................................... 209
Figura 141 – Pulmão (H&E): Observa-se o nódulo já referido, que comprime o parênquima pulmonar
originando áreas de atelectasia e enfisema pulmonar. Amp. 4x ....................................................................... 209
Figura 142 – Pulmão (H&E) trabéculas de tecido fibroso, hepatócitos neoplásicos formando ‘ninhos’. Amp. 10x
............................................................................................................................................................................ 210
Figura 143 – Pulmão (H&E): Espessamento e congestão dos capilares alveolares. Amp. 10x ........................... 210
Figura 144 – Linfonodo (H&E) área identificável como linfonodo, embora praticamente não se observem
linfócitos. Amp. 4x .............................................................................................................................................. 211
Figura 145 – Linfonodo (H&E) observam-se massas constituídas por hepatócitos neoplásicos, que alteram por
completo a estrutura do órgão. Amp. 4x ........................................................................................................... 211
Figura 146 – Linfonodo (H&E) trabécula de tecido fibroso separa população linfóide normal do órgão, da massa
neoplásica de hepatócitos dispostos em padrão cordonal e sólido que invade o parênquima. Amp. 10x ........ 212
xiv
ÍNDICE DE TABELAS
xv
ÍNDICE DE GRÁFICOS
xvii
LISTA DE ABREVIATURAS (ordem alfabética)
xviii
1 INTRODUÇÃO
Considerada a teoria da medicina (Potel & Gallego, 1984), esta é fundamental como
ferramenta de diagnóstico, prognóstico e no seguimento da sequência cronológica dos
processos que levam um animal a ficar doente, e aquilo que esse estado não fisiológico implica
para o mesmo (Peña et al., 2013; Yu et al., 2016).
1
et al., 2005) – para os quais se tenta estabelecer guidelines de forma a uniformizar e dar maior
consistência aos relatórios de diagnóstico emitidos (Kiupel et al., 2011).
O desinteresse pela Patologia leva a que a possibilidade de fazer carreira neste ramo seja
posta de parte pela maioria dos estudantes, que ao se formarem raramente escolhem esta
especialidade (Ghanchi et al., 2005). Tal facto reflete-se numa notória falta de Patologistas,
como foi aliás demonstrado pelo “Histopathology workforce census” realizado pelo Royal
College of Pathologists entre 2017-2018 no Reino Unido («Histopathology workforce survey»,
2018) o qual referiu o seguinte na sua introdução:
“Demand for pathology services has grown significantly in recent years – and
continues to grow. The pathology workforce has not increased in line with this demand
and is predicted to reduce to levels that may put clinical services in jeopardy. Making
sure diagnostic services can cope with current and future demand is essential if we
are to improve outcomes for patients. In our survey, only 3 per cent of histopathology
departments said they had enough staff to meet clinical demand. To compound these
pressures, there is an approaching retirement crisis – a quarter of all histopathologists
are aged 55 or over, and training places remain unfilled.”
2
Esta notória e crescente falta de Patologistas é também uma realidade na Medicina
Veterinária, atrasando relatórios de necropsia e diagnósticos de histopatologia (Cockerell &
Patterson, 2005; Gyles, 2009; Scudamore, 2010; Warren et al., 2009). Embora a Patologia seja
parte integral da sua formação académica, a maioria dos estudantes de veterinária tende a
escolher praticar medicina interna, sendo poucos os que escolhem fazer carreira em Patologia
(Market Research Statistics: Veterinary Specialists, 2018).
A falta de interesse por esta especialidade médica, poderá em parte ser atribuída à forma
como os cursos estão estruturados, sendo que a maior parte tem uma fortíssima componente
clínica que se baseia mais na avaliação de sinais clínicos e tratamentos standard do que no
correlacionar de informações, tendo em conta a fisiopatologia dos casos estudados de modo a
individualizar o acompanhamento médico respetivo de cada paciente. Em alguns destes
estudos, tentou-se também compreender em que extensão o ‘background’ de cada aluno poderá
também afetar a sua escolha (Kim et al., 2013). Nos Estados Unidos, espera-se que exista um
acentuado ‘pathologist gap’ por volta de 2030, com tendência a aumentar (Petriceks & Salmi,
2018; Robboy et al., 2013).
Tendo esta especialidade médica um papel tão vital (Scudamore, 2010), considero crucial
fomentar e estimular os alunos (tanto de medicina humana como de veterinária) a interessarem-
se cada vez mais pela Patologia e suas subáreas.
A Patologia Clínica (PC) é uma subespecialidade da Patologia na qual se faz uso de métodos
laboratoriais (bioquímica clínica, métodos de análise hematológica, análise de urina, entre
outros) de forma a obter informações e dados objetivos que auxiliem a delinear o perfil hígido
3
de cada paciente (hemograma e perfil bioquímico geral por exemplo), permitindo assim a
emissão de diagnósticos clínicos, bem como o estudo da evolução de cada paciente, por
comparação dos perfis hematológicos e bioquímicos no decurso de cada tratamento (MacNeill,
2017; Omidifar et al., 2017; Scudamore, 2010).
No sentido lato, a PC é então o estudo da doença em ambiente clínico, com recurso a ensaios
laboratoriais, usando geralmente para o efeito, amostras de sangue, urina e outros fluidos
corporais, colhidos de cada paciente (McConnell, 2007). Desta forma, os testes
complementares são realizados em laboratórios capazes de realizar serviços como ensaios
hematológicos, ensaios bioquímicos e análises citológicas simples, que podem localizar-se no
interior de hospitais e clínicas veterinárias. Outro tipo de ensaios e procedimentos mais
específicos (como análises microbiológicas, toxicológicas, ensaios hormonais e citologias mais
complicadas, etc.) terão de seguir para laboratórios externos que por vezes também exigem
maior grau de biossegurança, instalações especializadas e presença de técnicos qualificados,
pelo que podem existir limitações (Stockham & Scott, 2008).
4
(Potel & Gallego, 1984). Desta forma é possível correlacionar as alterações morfológicas,
macroscópicas, microscópicas, imuno-fenotípicas e genéticas com as manifestações clínicas
(Kumar et al., 2015). A AP pode ainda ser subdividida em Anatomia Patológica Especial na
qual se apresentam os diferentes quadros da doença, por ordem sistémica, ou seja, descrevendo
sistema a sistema (particularmente mais relevante ao elaborar relatórios post mortem, como os
realizados em necropsia e inspeção higio-sanitária (Potel & Gallego, 1984).
Com efeito, a Anatomia Patológica tem então, também, uma vertente forense, na qual o
médico veterinário patologista forense/médico legista pode ser solicitado a colaborar em casos
judiciais (Arkow, 2015; Babińska et al., 2019; Gerdin & McDonough, 2013).
Destaca-se por ser um método simples e fiável que desempenha essencialmente a função de
distinguir entre processos inflamatórios, provenientes de abcessos ou seromas, e neoplásicos,
sendo possível também distinguir a população celular observada (células epiteliais,
mesenquimatosas ou redondas) (Cowell, 2008). Em relação às neoplasias, este método permite-
5
nos também avaliar critérios de malignidade (distinguindo afeções benignas de malignas) que
poderão orientar o clínico, embora o diagnóstico definitivo seja histopatológico (Peleteiro et
al., 2011).
Para a coloração, os corantes Romanovsky (Giemsa, Wright, Diff-Quick) são os usados por
rotina, uma vez que são considerados baratos, fáceis de preparar, manter e usar, oferecendo
excelente detalhe citoplasmático e moderado detalhe nuclear e nucleolar (Cowell, 2008;
Jörundsson et al., 1999).
A citopatologia não é mais do que a observação e estudo das preparações obtidas pelas
técnicas de citologia já referidas, para o estudo de doença no qual vamos observar alterações a
nível da morfologia celular – alterações essas que só podem ser identificadas pelo médico
veterinário que conhece as componentes citológicas saudáveis/normais e as distingue das
anormais (Christopher et al., 2008; Cowell, 2008).
6
1.4 A Histologia e a Histopatologia
A palavra ‘Resposta’ é base central desta ciência, pois aquando de determinado estímulo o
organismo reage, reação essa que gera padrões lesionais tanto a nível macro como
microscópico, que são alvo de estudo. Quando essa resposta é deletéria para a saúde ou bem-
estar de um indivíduo, dá-se o nome de ‘doença’ ao fenómeno resultante e a histopatologia
permite o seu estudo, a nível tecidular e celular (Jones et al., 1997).
Os cortes histológicos obtidos têm potente valor de diagnóstico (Sikandar, 2018) servindo
de método complementar de estudo usado em várias vertentes da medicina humana, veterinária,
forense, dentária (Aughey et al., 2001; Dettmeyer, 2014; Frayling & Arends, 2015; Infusino et
al., 2013; Kaplan et al., 2015; Roy et al., 2017; Trindade Filho et al., 2018) e até na
paleontológica (Grove et al., 2015). Com estes, podemos ir além da colorações de rotina,
fazendo também uso de colorações especiais de histoquímica, imunohistoquímica e mesmo até
testes moleculares (Müllauer, 2017; Schwamborn, 2017) o que se apresenta valioso para a
patologia em geral, mas mais concretamente no apoio ao diagnóstico e classificação de
tumores e no campo das doenças infeciosas, parasitárias, degenerativas e várias outras áreas de
7
investigação médica, sendo então a histopatologia uma ferramenta médica de investigação, que
vai muito além da descrição de lâminas (Grillo et al., 2017; Gupta et al., 2009; Müllauer, 2017;
Raparia & Raj, 2018; Schwamborn, 2017).
A avaliação histopatológica tem como intuito o estudo de tecidos alterados quer por doença
quer experimentalmente, comparando estes com amostras controlo de tecidos saudáveis, sendo
então importante que os procedimentos estejam standerizados pois o conhecimento nesta área
baseia-se muito naquilo que o Patologista observa e enquadra dentro dos padrões lesionais
descritos e bem conhecidos, praticando desta forma medicina baseada na evidência
(Marchevsky & Wick, 2015; Slaoui & Fiette, 2011).
Sendo a Anatomia Patológica uma ciência médica que tem por base o sentido da visão, tato
e olfato para análise e compreensão de alterações celulares, orgânicas e tissulares, não será uma
surpresa que o exame post mortem seja um procedimento intrínseco a esta especialidade e, uma
vez que, no decorrer deste documento, apresentarei casos de necropsia, considero pertinente
incluir esta introdução. A necropsia (nekro + opsis = corpo morto + vista) é reconhecida como
uma ‘first day skill’ (First day skills - Veterinary Medicine - UTAD) e pressupõe que o médico
veterinário recém-formado tenha a capacidade de realizar necropsias nas várias espécies
domésticas.
8
De forma geral, o objetivo desta passa por determinar a causa, circunstâncias e mecanismos
em que a morte ocorreu, bem como o tempo decorrido entre a mesma e o exame e avaliar se as
lesões encontradas ocorreram ante ou post portem (Seixas & Pires, 2016). Esta, é dificultada
por fenómenos físico-químicos e biológicos que se iniciam após a morte ou durante a agonia
(fenómenos cadavéricos, abaixo descritos) e um patologista deve saber reconhecer a quais
lesões dar importância no enquadramento de cada caso (Peleteiro, 2016; Seixas & Pires, 2016).
Quando vamos realizar uma necropsia, devemos já ter conhecimento do que são e quais são
as alterações cadavéricas. Considerando ‘morte’ o término da atividade cardiorrespiratória e
cerebral, sabemos que após estas, dá-se início a uma série de alterações que são inevitáveis,
irreversíveis e progressivas e que ocorrem com uma certa consistência sequencial em respeito
à sua ordem de progressão (Brooks, 2016).
As alterações cadavéricas são então fenómenos que ocorrem post mortem e é de suma
importância que o patologista as saiba identificar e diferenciar de fenómenos ante mortem. O
período que decorre entre a morte até se realizar o exame de necropsia é chamado de intervalo
pós-morte (IPM) (Brooks, 2016).
9
As alterações ou fenómenos cadavéricos podem ser distribuídos em 2 grupos:
Após a morte, vai ocorrer falha na homeostasia da temperatura corporal (influenciada por
vários fatores, tanto intrínsecos como extrínsecos) que levam ao arrefecimento ‘cooling’
cadavérico por trocas entre o cadáver e o ambiente, originando uma descida gradual da
temperatura do cadáver até este atingir a temperatura ambiente (entre 3 a 4h podendo demorar
10
até 24h) (Brooks, 2016; Seixas & Pires, 2016). O modelo ideal da queda de temperatura não
está bem definido pelo que este parâmetro deve ser usado com reservas e nunca sozinho no que
toca à determinação do IPM (Brooks, 2016).
A força contrátil muscular é gerada pela interação de duas proteínas – a miosina e a actina.
Estas, estão organizadas em filamentos e sofrem interações transientes de deslizamento uma
pela outra com o intuito de promover a contração muscular (Lehninger et al., 2005).
O ciclo de contração muscular é composto por quatro fases: uma primeira na qual o ATP se
liga à cabeça da miosina, causando dissociação entre esta e a actina, uma segunda onde o ATP
é hidrolisado em ADP + fosfato e continua ligado à miosina, uma terceira fase na qual a cabeça
da miosina se liga a um filamento de actina causando a libertação do fosfato livre e por fim a
quarta fase na qual a libertação da molécula livre de fosfato leva a uma alteração da
conformação da cabeça da miosina que move os filamentos de ambas as proteínas em relação
uma à outra, libertando ADP no processo. Para voltar a haver dissociação entre a miosina e a
actina, promovendo o relaxamento muscular, é necessário então uma nova molécula de ATP
(Lehninger et al., 2005).
A rigidez cadavérica começa então entre 1 a 6h post mortem após uma fase de flacidez, e
fica totalmente instalada após 24h, demorando cerca de 48h até dissipar. Instala-se na direção
‘cranial para caudal’ (ou seja, da região da cabeça e membros torácicos para o membros
pélvicos e cauda). Se o cadáver apresenta apenas rigidez na sua porção anterior, o animal terá
morrido há poucas horas e quando apenas apresenta posterior, a morte terá ocorrido há mais
de 24h e menos de 48h (Brooks, 2016; Silva, 2016).
11
Poderemos então utilizar este fenómeno aquando da determinação do IPM tendo, porém, de
ser utilizado de forma crítica pois são vários os fatores que podem fazer variar a rigidez
cadavérica. No caso por exemplo da morte súbita, a rigidez cadavérica é mais tardia e
prolongada (Silva, 2016).
➢ Evaporação/Dessecação cadavérica
A epiderme é uma barreira fulcral e eficaz contra a perda de água por parte dos tecidos
subcutâneos. Após a morte, a integridade desta barreira é afetada pelo que a água contida nos
tecidos começa a evaporar (Silva, 2016). Este fenómeno pode levar a alterações no peso dos
cadáveres (pesos inferiores aos reais). Inicia-se entre 6 a 7h post mortem (Seixas & Pires,
2016). O globo ocular vai perdendo água por evaporação pelo que a sua tensão vai diminuindo
e a cerca de seis a sete horas post mortem cede à pressão dos dedos. Com o tempo afunda-se
pronunciadamente na respetiva órbita (Seixas & Pires, 2016; Silva, 2016). Estas alterações,
observadas geralmente em cadáveres são então resultantes dos fenómenos cadavéricos.
12
A progressão inevitável para fenómenos de hemólise, com libertação de hemoglobina, vai
originar a difusão desta no plasma sanguíneo, indo tingir tecidos vizinhos. Assim aparecem
manchas de difusão, de tonalidade mais clara que as de hipóstase. Estas manchas de lividez
cadavérica não devem ser confundidas com hemorragias ou infiltração sero-hemorrágica do
tecido conjuntivo subcutâneo pois estas últimas deformam e elevam as regiões onde ocorrem
(Silva, 2016).
13
Tabela 2 – Coágulo post mortem vs. Trombo (adaptado de Seixas & Pires 2016)
Tabela 3 – Fenómenos cadavéricos Transformativos (adaptado de Cocariu et al, e Seixas & Pires 2016 )
14
ii. Fenómenos Cadavéricos Transformativos
Este processo microscópio, leva a alterações macroscópicas que podem ser apreciadas,
deixando os órgãos moles, friáveis e de cor mais clara. A mucosa intestinal descama com
facilidade para o lúmen, sendo então uma das primeiras regiões a entrar em decomposição. O
fenómeno de autólise leva a que o pH do cadáver desça, tornando-se ácido, o que leva ao
desenvolvimento de bactérias com fraco poder proteolítico, mas com grande produção de gás
(Seixas & Pires, 2016; Silva, 2016).
Ocorre primeiramente por ação exclusiva das bactérias endógenas (provenientes to TGI –
bacilos anaeróbios formadores de esporos e coliformes) e depois também por bactérias
exógenas, à medida que a barreia física da pele se vai degradando. Os tecidos moles entram em
decomposição muito mais rápido e facilmente do que os tecidos conjuntivos fibrosos,
cartilagíneos ou ósseos (Brooks, 2016; Seixas & Pires, 2016; Silva, 2016).
15
A. Período cromático ou ‘Fresh stage’ – desde a morte até à fase gasosa. Caracterizado
pelo aparecimento de manchas verdes enegrecidas que surgem, geralmente no abdómen
e região inguinal pela formação de sulfametahemoglobina combinante do H2S
bacteriano e a hemoglobina resultante da autólise (Seixas & Pires, 2016).
B. Período de desenvolvimento gasoso, enfisematoso ou deformante – pode aparecer
só após uma semana – a proliferação bacteriana leva a meteorismo abdominal e mais
tarde a um timpanismo generalizado (Seixas & Pires, 2016).
C. Período de coliquação ou fusão pútrida ou ‘Decay Stage’ – tecidos perdem toda a
sua normal arquitetura orgânica, ficam massas amorfas, disformes (entre a segunda e
quarta semana post mortem) fase que pode durar mais de 100 meses (Seixas & Pires,
2016; Silva, 2016).
D. Período de redução esquelética ou ‘Dry Stage’ – 2 a 5 anos: todo o cadáver fica
reduzido a osso, faneras, dentes e pelos. Pode também ser rápido, dependendo de outros
agentes que têm acesso ao cadáver, principalmente fauna entomológica (Seixas & Pires,
2016; Silva, 2016).
A razão pela qual incluo este subtítulo e não outro (por exemplo, alterações cadavéricas pelo
contacto com a água) é pelo facto de, durante o meu estágio, ter realizado várias necropsias a
cadáveres previamente refrigerados/congelados e, sendo esta a forma mais frequente e
adequada de conservação cadavérica, considero então importante o conhecimento e estudo das
alterações decorrentes da mesma. Quer por necessidade, conveniência ou consequência do
local de repouso, os cadáveres são comumente refrigerados (2ºC a 4º C) ou congelados (-10ºC
a -50ºC) em medicina veterinária e depreende-se que esta forma de conservação pelo frio
contribua para uma redução na quantidade de bactérias disponíveis para participar nos
processos de putrefação (Roberts & Dabbs, 2015), fazendo que este processo altere tanto o
padrão como a velocidade de decomposição (Brooks, 2016).
16
O impacto térmico vai gerar artefactos tanto a nível macroscópico como microscópico
(autólise celular que deve ser diferenciada da necrose isquémica) sendo por isso necessário que
o patologista saiba previamente que os cadáveres foram sujeitos a esse processo, de forma a
evitar diagnósticos erróneos (Cocariu et al., 2016).
O artigo de referência onde encontrei a maior parte da informação à cerca das alterações
post mortem macroscópicas devido ao congelamento, é um que remota a 1986, realizado em
ratos fêmea da raça Wistar (Micozzi, 1986). Tendo-me então baseado nele e outros abaixo
citados para a construção da seguinte tabela:
Cadáveres mais propensos a putrefação por organismos aeróbicos externos (Micozzi, 1986);
Já para Histopatologia (alterações micro) apenas encontrei artigos de medicina humana para
cadáveres refrigerados. O que usei de referência para as tabelas a seguir apresentadas, foi um
estudo de 2016 no qual foram realizados exames de histopatologia ao coração, pulmão, fígado
e pâncreas, após um período de refrigeração que variou ligeiramente dependendo do órgão, e
onde se procurou estudar e descrever as alterações encontradas, de forma cronológica,
decorrentes então deste processo de conservação (Cocariu et al., 2016).
17
Tabela 5 – Alterações Cadavéricas Micro, em órgãos refrigerados (Coração)
2º ± 1ºC 60h: Autólise completa das membranas celulares dos cardiomiócitos com
consequente perda de delimitação celular. Distribuição irregular da cromatina.
+ 7 dias
formol 10% 72h: Perda ou externalização do núcleo de toda a massa miocárdica.
8-9d: Extensa fragmentação filamentar dos cardiomiócitos que já não são possíveis
de identificar. Endotélio vascular impossível também de identificar.
+ 7 dias 72h: Perda focal da arquitetura tecidular. Fragmentação total dos septos
formol 10% interalveolares. Tecido conjuntivo interlobular mantém integridade.
> 5d: Perda massiva da arquitetura tecidular. Apenas os septos espessados com
maior quantidade de colagénio são identificáveis.
18
Tabela 7 – Alterações Cadavéricas Micro, em órgãos refrigerados (Fígado)
24h: Lise ligeira das membranas celulares. Hepatócitos ligeiramente tumefactos. Sinais de
cariólise.
FÍGADO 48h: Núcleos dos hepatócitos apresentam-se balonizados enquanto que o citoplasma se
apresenta granular. Lise dos eritrócitos dos sinusóides hepáticos.
2º ± 1ºC
60h: Autólise do epitélio biliar. Observável destacamento deste da membrana basal
+ 7 dias
formol 10% 4-5d: Impossível distinguir limites dos hepatócitos. Autólise dos hepatócitos periportais.
36h: Contração das células secretoras dos lóbulos periféricos (espaços de clivagem entre
PÂNCREAS estas e a membrana basal). Citoplasmas fissurados e mais granulares. Autólise completa
dos ilhéus de Langerhans. Integridade da membrana celular das células endoteliais.
2º ± 1ºC
Turgescência dos eritrócitos sem sinais de lise (a não ser os capilares dos ilhéus de
+ 7 dias
Langerhans).
formol 10%
48h: Impossível identificar cerca de 60% dos núcleos das células pancreáticas. Citoplasma
dos adipócitos começa a fragmentar.
19
A conclusão que retirei após leitura da bibliografia encontrada, foi que embora os processos
de refrigeração/congelação preservem melhor a estrutura macroscópica dos tecidos, não quer
dizer que a estrutura histológica permaneça intacta. No entanto, em comparação com a
temperatura ambiente, é certo que a refrigeração atrasa bastante os processos de autólise e
decomposição, sendo uma opção viável de conservação (Brooks, 2016; Cocariu et al., 2016;
Micozzi, 1986). Dependendo do tempo que o cadáver está refrigerado/congelado e do órgão
em questão, vamos ter diferentes estadios de autólise, observada em microcopia. No caso do
pâncreas, este rapidamente entra em autólise algumas horas post mortem – facto devido ao seu
alto conteúdo em enzimas líticas – pelo que, na suspeita de doença pancreática ou mesmo para
fins de investigação, a colheita deste órgão deverá ser o mais célere possível. Os pulmões e o
coração, no entanto, poderão ter ainda poder de diagnóstico quando colhidos a partir de
cadáveres refrigerados até 48h (2ºC).
A palavra ‘Forense’, definida pelo Concise Oxford Dictionary, significa ‘em relação / usado
ou conectado com um tribunal de direito’ e no mesmo dicionário podemos encontrar como
definição de medicina forense ‘o uso aplicado do conhecimento médico, especialmente da área
da patologia com finalidade judicial’ (Cooper & Cooper, 2007).
A Patologia Veterinária Forense pode ser então definida como a aplicação do conhecimento
da patologia veterinária para a elucidação de provas em tribunal, onde seja então necessário
fazer uso dos conhecimentos do Patologista para fornecer a sua opinião médica (Cooper &
Cooper, 2007; Gerdin & McDonough, 2013).
O propósito da realização de um exame post mortem forense neste sentido é: (A) Descobrir
e registrar qualquer lesão, doença ou anomalia, e (B) interpretar essas descobertas de maneira
a permitir que em tribunal essas informações possam ser utilizadas e úteis no contexto do caso
em questão (Munro & Munro, 2008) sempre de forma objetiva e sem nunca fazer juízos de
valor. Todas as lesões que sejam alvo de processo judicial, são então da responsabilidade da
Patologia Forense.
20
Figura 3 – Ciência forense como bloco multidisciplinar (Cooper & Cooper, 2007)
➢ Morte Natural
➢ Morte Violenta: Acidental, Não Acidental, Indeterminada.
‘Causa, Mecanismo e Causa Jurídica de Morte Conceitos de Traumatologia Médico-Legal Tipos de Necrópsia’
J.F Silva, FMV-ULisboa 2017 – Curso Teórico-Prático de Medicina Veterinária Forense (SPPA)
21
1.6.2 Combate ao Abuso e Negligência Animal
Ainda dentro das necropsias forenses, estas podem servir de útil ferramenta no que diz
respeito ao combate ao abuso e negligência animal.
O exame físico destes pacientes revela-se de elevada importância e hoje em dia as guidelines
para caracterizar o abuso animal são inclusivamente baseadas nas guidelines de abusos de
menores (Munro & Thrusfield, 2001; Munro & Munro, 2008).
O Royal College of Veterinarian Surgeons, no Reino Unido, oferece também guidelines para
que o clínico que suspeite de abuso animal possa incluir um animal lesionado nas ‘non acidental
injuries’ sempre que suspeite estar perante um caso de maus-tratos ou negligência («Code of
Professional Conduct for Veterinary Surgeons», 2018).
Serão alvo da Patologia Veterinária Forense as causas de morte violentas não acidentais:
22
1.6.3 Em Portugal
Para que tais ações jurídicas sejam postas em prática, casos estas ocasionem a morte de um
animal, é necessária então a emissão de um relatório post mortem produzido por um
profissional adequado, que permita uma decisão justa em tribunal. A contextualização legal é
a seguinte:
23
E segundo o Artigo 1305.º-A:
1 - Quem destruir, no todo ou em parte, danificar, desfigurar ou tornar não utilizável coisa
ou animal alheios, é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa.
***
Caso se confirme que um animal é ou foi vítima de abuso e/ou negligência, o diagnóstico por
parte do Patologista é crucial para que seja feita justiça pois a opinião médica deste cariz não
pode ser dada por mais nenhum profissional. Neste sentido, a necropsia forense é fundamental
para apurar as circunstâncias e causa da morte. O relatório elaborado pelo patologista será então
uma prova usada em tribunal que poderá, em conjunto com outras, auxiliar na conclusão do
caso em questão. Caso fique provado que houve efetivamente violação da lei Portuguesa no
que toca a maus tratos e/ou negligência animal, o perpetrador terá então de pagar uma multa (a
24
definir pelo tribunal mediante as circunstâncias de cada caso) ou arriscar-se até um máximo 3
anos de prisão (que são cumulativos com outras infrações).
De realçar que tais sanções podem ser aplicadas ao próprio detentor do animal caso este lhe
provoque dor/sofrimento, se negue a procurar cuidados médico veterinários ou deixe o animal
passar fome e sede.
Uma vez que a necropsia forense segue uma metodologia de trabalho um pouco diferente
das necropsias anatomoclínicas, nem todos os patologistas veterinários terão capacidade para
as realizar, pelo que poderá ser vantajoso adicionar formação nesta área em específico ao
currículo. No HV-UTAD, podem e são conduzidos exames post mortem de carácter forense,
assim como no LAHP-INIAV.
1.7 Objetivos
Devido ao grande leque de atividades cobertos pela Patologia, e ao gosto pessoal que
desenvolvi por ela ao longo do curso, foi meu objetivo principal aproveitar os estágios finais
de curso para explorar e expandir as minhas capacidades nesta área, no âmbito da
identificação, descrição e classificação das várias lesões, enquadrando as mesmas no
contexto de cada caso, numa tentativa de dar continuidade ao que fui aprendendo ao longo do
curso nas unidades curriculares de histologia, patologia, anatomia patológica e inspeção higio-
sanitária.
25
2 ESTÁGIO LHAP – UTAD – Portugal
Figura 4 – Planta do LHAP-UTAD (gentilmente cedida pelo Dr. José Manuel Almeida ).
26
2.2 Que tipo de análises são conduzidas no LHAP e a partir de que material?
Todos os dias, chega a este laboratório uma variedade de requisições acompanhadas por
material biológico para análise, que, por conveniência de leitura vamos a partir de agora definir
como:
Para além dos objetivos de diagnóstico, as amostras recebidas são ainda divididas em duas
outras categorias:
27
Cada uma das amostras seguirá depois então para o tipo de análise anatomopatológica mais
adequada, dentro das seguintes valências:
Durante o meu estágio, ao LHAP-UTAD chegaram 306 requisições, sendo: 108 Exeréses
cirúrgicas, 82 necropsias, 61 citologias, 33 peças ‘material de necropsia’ e 22 biópsias,
resultando numa percentagem relativa de:
Citologias
20%
Necropsias
27%
28
De entre as 35% de Exeréses:
Conclui-se que, pelo menos nesta pequena amostra, a maioria das análises recebidas no LHAP
são exéreses (35%) provenientes de canídeos (60%) e que em geral, são requeridas mais análises
provenientes de canídeos do que felídeos, sendo que das restantes espécies, apenas foram
requisitadas necropsias.
Desde a chegada do material biológico até se obter uma lâmina para diagnóstico
histopatológico (ou outros exames histológicos), é necessário um conjunto de procedimentos
(que resumirei de seguida).
Cada um dos passos apresentados é realizado num local próprio e específico, dentro do
laboratório, que é apenas usado para esse fim. Apresentarei de forma resumida, todo o processo
que decorre no LHAP desde a chegada do material biológico até à obtenção de lâminas para
diagnóstico.
29
1. Câmara de Corte (sala anexa)
A
Figura 5 – (A) Mesa de corte; (B) – Mesa de Corte, em vista aproximada
30
2. Processador – Impregnação (sala anexa)
O processador do LHAP é automático e trabalha durante a noite para este fim. O que se
pretende com este procedimento é desidratar os fragmentos de tecido, para que a parafina possa
preencher os espaços antes ocupados por água.
A
B
31
3. Placa de Inclusão – Inclusão (sala anexa)
Os fragmentos são retirados das cassetes e colocados num molde de metal onde existe
parafina fundida a cerca de 60ºC. Após orientação, passam então para uma placa fria onde
rapidamente a parafina arrefece, fixando os fragmentos no bloco como podemos observar na
imagem.
Após poucos minutos, o bloco de parafina está pronto para passar para o micrótomo.
B C
C
Figura 7 – (A) e (B) Placa de Inclusão, parafina a 62º; (C) molde metálico, fragmentos de nódulo cutâneo em parafina
32
4. Micrótomo (Sala de laboratório Principal)
33
Entre o desbaste e o corte fino, os blocos repousam numa placa gelada.
A B
B
Figura 9 – (A) e (B) Blocos em placa fria
Após realizar o corte fino, colocamos a secção escolhida numa solução de álcool a 30%, em
temperatura ambiente e depois em água destilada, aquecida em banho maria (50ºC). Pretende-
se desta forma remover quaisquer pregas que o corte apresente, assim como promover um certo
grau de distensão, uma vez que ao gelarem, os tecidos retraem na parafina.
A B
B
Figura 10 – (A) Cortes distendidos em tina de água; (B) Corte em lâmina
34
5. Estufa – Secagem (Sala anexa)
Após distensão dos cortes, é agora necessário promover a sua secagem, para aderirem e
ficarem perfeitamente colados à lâmina de vidro. Para o efeito existe uma estufa no LHAP que
está entre 38 a 42ºC e onde as lâminas secam para que no dia seguinte possam ser coradas.
Os corantes de rotina utilizados no LHAP são a hematoxilina e eosina (H&E). Uma vez que
estes são corantes aquosos, é absolutamente necessário retirar a parafina (desparafinação) e que
ocorra a re-hidratação das lâminas antes de corar. Para o efeito de desparafinação, é usado o
xilol que vai remover toda a parafina. Para a re-hidratação são usados álcoois em concentração
decrescente, até chegar à água.
35
7. Montagem de Lamela (Sala de laboratório Principal)
Uma vez coradas as lâminas, é necessário fornecer-lhes transparência ótica e algum meio de
proteção (meio de montagem) para que se possam preservar. São então novamente
desidratadas, para que o meio de montagem (MM) possa penetrar no tecido. No LHAP, o MM
utilizado é o Entellan®, as lamelas são colocadas sobre o corte, de forma automática ou
manual) nas laminas de vidro.
A B
C D
36
2.3 Casos encontrados durante o estágio
Posto isto, as imagens de microscópio ótico que acompanham cada caso que em seguida
descrevo, foram obtidas e escolhidas por mim (salvo pontuais exceções nas quais está citada a
fonte), tendo observado cada lâmina e selecionado os campos que considerei mais
representativos dos padrões lesionais que achei relevantes. Pude contar com a valiosa opinião
crítica da minha orientadora, a Dra. Anabela Alves, que também me ensinou como utilizar o
programa de software de imagem NIS-Elements ® (Nikon) o qual me permitiu enriquecer os
casos com as imagens desejadas. Para as necropsias, tive de igual forma o apoio da minha
coorientadora, Dra. Isabel Pires que sempre me permitiu colocar questões bem como esclarecê-
las. Selecionei, para um estudo mais aprofundado, 2 casos de análise citológica, 1 de exérese
cirúrgica e 3 necropsias com histopatologia, cuja razão de escolha e relevância para a prática
clínica, podem ser encontradas no final da discussão de cada um.
37
2.3.1 Casos de Citologia e Histopatologia
CITOLOGIAS
Amostra recebida: 5 preparações de esfregaço, obtido por CAAF, de linfonodo (LN) poplíteo.
Coradas por Diff-Quick.
Figura 14 – CAAF LN poplíteo onde se observam múltiplos eritrócitos, vários macrófagos contendo
formas parasitárias intracitoplasmáticas compatíveis com formas amastigotas de Leishmania spp.
Visiveis também plasmócitos e alguns neutrófilos. Amp. 40x
38
Figura 15 – Formas parasitárias intracitoplasmáticas, compatíveis com formas
amastigotas de Leishmania spp, dentro de macrófagos. Amp 40x
39
Discussão do Caso – Leishmaniose Canina
Apesar de também infetar felídeos (nomeadamente, o gato doméstico) sabe-se que a doença
clínica acomete, regra geral, apenas gatos imunodeprimidos (infetados por FIV ou FeLV,
doentes oncológicos, a fazer terapia imunossupressora, entre outros) sendo que em gatos
imunocompetentes a resposta imune parece ser suficiente para controlar a infeção e promover
algum grau de resistência, do ponto de vista da imunidade celular (de notar, no entanto, gatos
infetados podem ser reservatórios) (Solano-Gallego et al., 2007).
Nos cães, existe elevada incidência de doença subclínica (que ocorre quando a resposta de
imunidade celular é competente, sendo a humoral menos expressiva – o que se traduz em menor
produção de anticorpos e sinais clínicos menos severos) que dificulta o diagnóstico e o controlo
da disseminação de infeção (Solano-Gallego et al., 2009), pelo que as guidelines da LeishVet
(grupo de cientistas médico-veterinários de instituições académicas da bacia do Mediterrâneo
e da América do Norte com interesse clínico e científico na leishmaniose canina, dos quais
quais faz parte o docente Dr. Prof. Luís Cardoso, da UTAD) dividem os cães infetados entre
40
os que apresentam doença clínica e subclínica (os portadores) (Solano-Gallego et al., 2011),
acentuando a importância do diagnóstico de Leishmaniose nas seguintes situações:
Este diagnóstico vai consistir na realização de análises quer serológicas, moleculares e/ou
parasitárias (por exemplo, encontrando as formas amastigotas de Leishmania em amostras de
citologia e/ou histopatologia) (Solano-Gallego et al., 2011).
O caso apresentado ocorreu num Boxer, que é uma das raças caninas consideradas de risco
para leishmaniose (Solano-Gallego et al., 2011; Vasconcelos et al., 2017). Este animal
apresentava também o fator de risco idade, sendo que a Leishmaniose apresenta distribuição
bimodal com alta prevalência em cães com idade inferior a 4 ou superior a 8 anos (Solano-
Gallego et al., 2011). No caso em questão, temos um animal de raça e idade predisposta, que
habita um país considerado endémico para a Leishmaniose.
41
Transmissão e Ciclo de Vida
A infeção por leishmaniose, dá-se aquando da refeição das fêmeas flebótomo (que são
hematógenas) e transmitem a forma flagelada e infetante aos mamíferos (forma promastigota).
Uma vez dentro destes hospedeiros, a forma promastigota é fagocitada pelos macrófagos e
torna-se numa forma intracelular, amastigota, capaz de reprodução assexuada, e que se replica
continuamente até rutura da célula hospedeira, indo então os parasitas infetar mais células do
sistema fagocítico mononuclear em vários órgãos, com mais relevância para o baço, fígado,
medula óssea e linfonodos. Quando um novo flebótomo fêmea picar o animal infetado, esta
vai ingerir macrófagos com as formas amastigotas, não móveis, que passam de novo à forma
flagelada e se multiplicam, por fissão binária no intestino do inseto, migrando posteriormente
para a faringe, cibário e probóscide do flebótomo infetado para que possam ser transmitidos a
novo hospedeiro aquando da nova refeição, cumprindo assim o ciclo (Ribeiro et al., 2018;
Solano-Gallego et al., 2011).
Outras formas de infeção que estão provadas, e não incluem o flebótomo são: transfusões
sanguíneas de animais portadores (sendo que, para um cão ser candidato para doação de
sangue, deve ser negativo em serologia e PCR), vertical (transplacentária) e venérea. Apesar
de não estar provado, suspeita-se também que possa ser possível a infeção direta de cão para
cão através de mordedura (Ribeiro et al., 2018; Solano-Gallego et al., 2011).
Esta é então uma doença multi-sistémica que pode potencialmente envolver qualquer órgão,
tecido ou fluido corporal, sendo que os cães podem desenvolver uma forma cutânea ou visceral
(L. infantum) da doença, sendo comum o aparecimento de lesões cutâneas, bem como o
desenvolvimento de doença renal crónica por deposição de imunocomplexos, a qual é a causa
de morte principal em cães com leishmaniose (Ribeiro et al., 2018) estes afetam também as
articulações (Acero et al., 2015).
42
✓ Sinais Clínicos (Ribeiro et al., 2018; Solano-Gallego et al., 2011):
o Gerais – Linfadenomegalia generalizada (mais evidente nos linfonodos poplíteos,
pré-escapulares ou submaxilares), perda de peso, alterações de apetite (hiporexia
ou polifagia), letargia, poliúria e polidipsia (doença renal), febre, vómito e diarreia.
o Cutâneos (mais frequentes) – Vários tipos de dermatite (exfoliativa não prurítica,
com ou sem alopécia, localizada ou disseminada, dermatite erosiva ulcerativa,
dermatite nodular, papular e ou, pustular), hiperqueratose nasal com
despigmentação e onicogripose.
o Oculares – Blefarite, conjuntivite, queratoconjuntivite, uveíte.
o Outros – Epistaxis, claudicação (artrite protozoária – associado a leishmaniose
visceral), miosite mastigatória atrófica, doenças vasculares e desordens
neurológicas, doença renal crónica (glomerulonefrite por deposição de
imunocomplexos e lesões resultantes de hipoperfusão (Costa et al., 2003)).
43
✓ Análise Molecular: Estes testes são bastante caros mas altamente sensíveis e específicos
(Andrade & Norma, 2014). PCR convencional e em tempo real – Realizado em amostras
de DNA extraídos de tecidos, sangue, fluidos corporais (RT-PCR: medula óssea,
linfonodos, baço, pele, conjuntivas [por zaragatoa ou biopsias de conjuntiva ocular]; PCR:
sangue, buffy coat, urina) – Pode originar, no entanto, falsos positivos por contaminação
de DNA. Este, confirma infeção, mas não confirma doença clínica – Geralmente usado
como exame complementar para cães dadores de sangue (Gomes et al., 2007; Otranto et
al., 2004).
44
✓ Histopatologia – Alguns padrões descritos na leishmaniose visceral canina
45
✓ Imunohistoquímica: Técnica da estreptavidina-biotina, para deteção de formas
amastigotas de Leishmania spp.
46
Estadiamento Clínico (adaptado de Solano-Gallego et al., 2011)
Estadio I – Doença ligeira: Serologia revela níveis de anticorpos negativos ou fracamente positivos.
Animais apresentam sinais clínicos ligeiros (linfadenopatia periférica ou dermatite papular). Sem
alterações clínico-patológicas. Terapia sugerida: Fazer apenas monitorização ou usar um dos fármacos
disponíveis (alopurinol, domperidona, antimoniato de meglumina ou então miltefosina). Prognóstico:
Bom.
Estadio II – Doença moderada: Serologia revela níveis de anticorpos baixos a fracamente positivos.
Animais apresentam os mesmos sinais de doença ligeira, mas também podem apresentar lesões cutâneas
(dermatite esfoliativa, úlceras, nódulos), linfadenomegalia generaliza, onicogripose, anorexia, perda de
peso, febre, diarreia e epistaxe. Alterações clínico-patológicas consistem em anemia não regenerativa,
hipergamaglobulinemia e hipoalbuminemia.
o Subestádio IIa: Função renal normal, creatinina sérica inferior a 1,4 mg/dL e não há proteinúria
(rácio PCU >0,5).
o Subestádio IIb: creatinina sérica inferior a 1,4 mg/dL, mas o rácio PCU situa-se entre 0,5 e 1.
Níveis de anticorpos anti‑Leishmania oscilam entre limites inferiores e superiores de positividade.
O tratamento recomendado é a combinação de antimoniato de meglumina (ou miltefosina como
alternativa) e alopurinol.
O prognóstico do estádio II é tanto pior quanto mais alterada estiver a função renal.
Estadio III – Doença grave: Serologia revela níveis de anticorpos médios a altos. Animais apresentam
os sinais dos estádios anteriores, bem como lesões resultantes da deposição de imunocomplexos como
vasculite, glomerulonefrite, artrite e uveíte. Alterações clínico-patológicas: iguais ao estádio II, mas a
creatinina sérica situa-se entre 1,4–2 mg/dL e o rácio PCU é >1. Recomenda-se o mesmo tratamento para
a leishmaniose e o tratamento da doença renal, de acordo com as recomendações do grupo IRIS. O
prognóstico oscila entre desfavorável a reservado.
Estadio IV – Doença muito grave: Serologia varia de igual forma ao estadio anterior. Animais
apresentam sinais clínicos e lesões já mencionadas, para além de tromboembolismo, síndrome nefrótica
ou ‘end stage kidney’. Os valores de creatinina correspondem ao nível 3 da classificação IRIS (2–5
mg/dL) ou ao estádio 4 do grupo IRIS (creatinina >5 mg/dL). Tratamento com alopurinol (monoterapia)
e seguimento das recomendações do grupo IRIS para o controlo da doença renal. Prognóstico muito
reservado.
47
O tratamento, bem como o prognóstico desta doença varia então em função da situação
clínico-patológica de cada animal, não sendo por isso igual para todos os cães. O recurso a
fármacos leishmanicidas (como o antimoniato de meglumina ou miltefosina) e/ou
leishmaniostáticos (alopurinol) embora permitam a cura clínica com certo grau de sucesso, não
eliminam de forma definitiva o parasita, ficando então os cães com sintomatologia controlada,
mas continuando a ser reservatórios (Solano-Gallego et al., 2009; Solano-Gallego et al., 2011)
***
Quanto mais célere for o diagnóstico, mais rapidamente se pode proceder às avaliações
necessárias e adotar planos de tratamento, pelo que se volta a destacar a citologia como um
importante, fácil e rápido meio de diagnóstico, sendo então de elevada importância que haja
veterinários com capacidade de avaliar estar preparações. Escolhi este caso pelo facto de
Portugal ser um país endémico para a Leishmaniose, e devido ao facto desta frequente afeção
será de rápido e fácil diagnóstico citológico.
48
CASO II – Hiperplasia Prostática
Amostra recebida: Duas preparações citológicas prostáticas, obtidas por CAAF (ecoguiada)
coradas for Diff-Quick.
Figura 18 – CAAF de próstata onde se observa: Elevada celularidade (células cuboidais) e heterocromasia,
com alteração do rácio núcleo:citoplasma. Amp. 20x
49
Figura 20 – CAAF de próstata onde se observam células agregadas em formação de tipo ‘papila’. Amp. 40x
50
Discussão do Caso – Hiperplasia Prostática Canina
A próstata é a única glândula sexual acessória dos cães e localiza-se na cavidade pélvica de
cães adultos, rodeando a uretra pélvica (e comunicando com esta por aberturas por onde a sua
secreção é excretada, fazendo parte e enriquecendo o ejaculado), que faz contacto dorsal com
o reto, ventral com a sínfise púbica, lateral com a parede abdominal e cranial com a bexiga –
localização esta que vem justificar alguns dos sinas clínicos que podem então aparecer aquando
do seu aumento de volume (Leis-Filho & Fonseca-Alves, 2018).
Apresenta-se como uma estrutura semi-ovóide, bilobada (dividida por um septo mediano
em dois lobos que são ainda divididos em lóbulos, separados por trabéculas). É também uma
estrutura capsulada (cápsula fibromuscular) que permite a sua contração para facilitar a
excreção de fluido (Smith, 2008; Threlfall, 2010).
Para além desta, há outras doenças prostáticas comuns em cães, como os quistos e abcessos
prostáticos, infeções agudas a crónicas, metaplasia escamosa e neoplasias (entres estas, a mais
comum, o adenocarcinoma (Cornell et al., 2000). Os sinais clínicos destas, são muitas vezes
51
semelhantes, pelo que é vital fazer diagnóstico diferencial mesmo que por vezes possam existir
em simultâneo (Das et al., 2012).
Este caso apresentando por citologia é então compatível com HPC, que se define por um
aumento do tamanho das células epiteliais prostáticas (hipertrofia) bem como do seu número
(hiperplasia) e representa mais de 50% das doenças prostáticas reportadas em cães (Foster,
2012; Krawiec & Heflin, 1992). Aos 8 anos de idade, um cão não castrado tem probabilidade
>80% de desenvolver HPC, existindo também predisposição para animais de raças grandes,
como os pastores alemães, como o presente caso (Polisca et al., 2016; Sridevi & Kumarasamy,
2012).
52
e obstipação. As fezes sólidas podem ser diminutas de tamanho e apresentar aspeto cónico
por compressão de uma extremidade em detrimento de outra.
✓ Patologia clínica:
o Hemograma: linfopenia e eosinofilia; Bioquímica sérica: Diminuição da proteína
total (albumina, globulinas) – rácio A:G – bem como do potássio; Urianálise:
Diminuição da densidade específica, glicosúria, proteína e sangue oculto (Das et
al., 2017).
o Serologia – biomarcadores – Quantificação sérica da arginino-esterase prostato-
específica (CPSE) que é uma protéase semelhante ao PSA humano e um bom
marcador de estimulação androgénica em cães (Chapdelaine et al., 1984).
✓ Citologia: A aspiração eco-guiada por agulha fina, da próstata, apresenta-se como um meio
fiável, barato, rápido e regra geral, sem necessidade de recurso a anestesia, para avaliar a
próstata (com maior taxa de sucesso que as amostras obtidas por ejaculado ou massagem
prostática (Powe et al., 2004; Vali et al., 2019). Sabe-se também que existe alta
concordância entre os resultados obtidos em citologia e histopatologia e o facto das
preparações citológicas quando bem preparadas, apresentarem uma fina monocamada,
53
facilita a avaliação celular (Powe et al., 2004). A principal indicação para se proceder à
CAAF de próstata é precisamente o seu aumento. A citologia vai, para além de excluir
processos inflamatórios, revelar características típicas de células prostáticas hipertrofiadas.
Estas lâminas podem ser coradas por Diff quick, Giemsa ou Wright e quando na presença
de HPC, vamos observar: escassa a moderada celularidade, células dispostas em cordões
e/ou agregados (sheets e clusters) de tamanho variável, com as características que podemos
observar nas imagens deste caso: Células de citoplasma basófilo, finamente granular, sem
nucléolos muito proeminentes ou outros critérios de malignidade, núcleos redondos a ovais,
centrais ou excêntricos e rácio nuclo:citoplasma vai estar aumentado (Cowell, 2008; Powe
et al., 2004).
54
o Forma complexa (hiperplasia quística): Na hiperplasia complexa observamos áreas
de hiperplasia glandular, bem como presença de lesões quísticas, de fino epitélio. O
estroma fibromuscular da glândula está aumentado de tamanho. Mais comuns em
cães com mais de 5 anos (Arista-Nasr et al., 2015; Bigliardi et al., 2018).
Prevenção e Tratamento
No caso da HPC, a orquiectomia bilateral serve tanto como medida preventiva, como
curativa, devido ao seu carácter andrógeno-dependente. Após a cirurgia, há involução completa
da glândula entre 6 a 12 semanas (Niżański et al., 2014). No caso de quistos prostáticos, estes
podem ser drenados, removidos cirurgicamente ou então omentalizados (Bigliardi et al., 2018).
Em animais com interesse reprodutivo ou limitações anestésicas, pode optar-se por terapia
medicamentosa (inibidores da 5α-redutase como a finasterida e o acetato de osaterona;
Prostagénios como o acetato de megestrol e o acetato de medroxiprogesterona), embora esta
tenha de se fazer de forma vitalícia, sendo também obrigatório excluir situações de neoplasia
testicular antes de realizar a mesma (Niżański et al., 2014).
Devido à elevadíssima prevalência de HPC, e uma vez que esta afeção constitui um fator de
risco para outras doenças prostáticas tais como a prostatite, o diagnóstico precoce revela-se
importante, pois permite a adaptação de protocolos de tratamento, monitorização e controlo da
evolução desta afeção. Esta abordagem, para além de melhorar a qualidade de vida dos animais,
aumenta também a longevidade dos mesmos (Das et al., 2017).
***
55
HISTOPATOLOGIA
Amostra recebida: Nódulo cutâneo (lesão única) surgido há cerca de mês e meio, aderido à
musculatura abdominal. CAAF prévia sugestiva de neoplasia mesenquimatosa.
Exame macroscópico: Retalho cutâneo com 10,5 x 5,5 cm, que reveste formação multi-
nodular (8x 5x4,5cm), sem margens definidas. Ao corte observa-se área quística central com 3
cm de diâmetro, preenchida por líquido incolor. Parede constituída por tecidos brancos firmes.
Figura 22 – Proliferação dérmica de células fusiformes que se dispõe quer em feixes fasciculados como
'penas' quer em ninhos enovelados. Amp. 10x
56
Figura 23 – Feixes de células fusiformes, em diferentes direções. Amp. 10x
Figura 24 – Detalhe da disposição em feixes paralelos de células fusiformes (alongadas) que apresentam
anisocariose, citoplasma bipolar, acidofilico e nucléolos proeminentes. CGM de tipo corpo estranho. Amp. 20x
57
Figura 25 – Detalhe da invasão ao músculo esquelético pelas células fusiformes neoplásicas que se
dispõe em feixes paralelos entre si, em corte longitudinal. Amp. 20x
58
Figura 27 – Células fusiformes neoplásicas, com nucléolos proeminentes. Anisocariose e mitoses atípicas
(setas vermelhas) Amp. 40x
***
59
Discussão do Caso – Fibrossarcoma Felino
***
Apesar de estar descrito em todas as espécies domésticas, esta neoplasia com origem no
tecido conjuntivo fibroso, é mais comumente observado em gatos e cães de idade avançada,
sendo também o tipo de tumor que mais é diagnosticado no gato (Dean et al., 2013; Hendrick,
2017). Os fibroblastos dos gatos parecem ser especialmente responsivos a situações de lesão e
inflamação (Ackermann, 2017) tendo sido reconhecidas nesta espécies 3 formas – Induzida por
vírus, Solitária e Associada a inoculações (Mauldin & Peters-Kennedy, 2016):
o Induzido por vírus: Esta rara variante (2% dos fibrossarcomas felinos (Hendrick,
2017)) é causada por um vírus mutante do vírus da leucemia felina (FeLV) o qual se denomina
de sarcoma-vírus felino (FeSV) e cuja incidência recai sobre gatos com apenas alguns meses
de idade, (média 3 anos) o que diferencia esta forma de todas as outras (Hardy et al., 1977;
Hendrick, 2017). De crescimento rápido, estes sarcomas são geralmente multicêntricos e
metastizam usualmente nos pulmões (Hendrick, 2017; Mauldin & Peters-Kennedy, 2016).
Esta associação de origem viral com o desenvolvimento de fibrosarcoma, não é recente
(Harasen, 1984).
o Solitário: Gatos adultos a geriátricos – muito mais comum que o induzido por vírus.
Localizam-se geralmente na derme ou tecido subcutâneo do tronco, porção distal dos
60
membros ou na cabeça. São neoplasias nodulares, irregulares, firmes a carnosos e de margens
mal definidas. Podem variar entre 1 a 15cm. Os que infiltram a derme são mais comuns nos
dígitos e ouvido (Mauldin & Peters-Kennedy, 2016).
61
✓ Sinais Clínicos: Vão depender da extensão do processo. Aquando do exame físico,
geralmente em gatos com idade superior a 10 anos, é detetada a lesão cutânea, que
consiste num único nódulo, indolor, de crescimento lento, firme a carnoso, com
dimensões variáveis (entre 1 a 15cm), normotérmico, bem diferenciado dos tecidos
adjacentes (móvel), focalmente alopécico, que pode ou não apresentar-se ulcerado,
podendo infetar secundariamente caso ulcere (Fox, 1995). Este pode localizar-se na
cabeça, tronco ou porção distal dos membros do animal. Caso já existam metástases nos
pulmões, os animais podem apresentar também sinais clínicos como tosse, dispneia e
intolerância ao exercício. Em estádios muito avançados da doença o animal pode
inclusive apresentar caquexia (Hendrick, 2017).
✓ Histopatologia: Estes tumores podem apresentar quer fibroblastos imaturos, quer células
fusiformes, anaplásicas, em proliferação, sendo então diferenciados ou anaplásicos, de
62
crescimento infiltrativo e invasivo, sendo também tumores produtores de colagénio
(Hendrick, 2017).
Nos fibrossarcomas, são também comumente encontradas figuras mitóticas (mais nos
indiferenciados), que quando em números elevados, sugerem uma neoplasia mais agressiva
(Fig. 27). Outras características que podemos encontrar são áreas de necrose isquémica, de
hemorragia, inflamação e edema. Quando estes apresentam áreas focais de degenerescência
mixóide e deposição de mucina, podem ser classificados de fibromixosarcomas. Índices
mitóticos de 6 ou mais mitoses por campo de 40x está associado com mau prognóstico (Miller
et al., 2013a).
63
citoqueratina, desmina, S100 e mesmo a partículas viras do FeLV, entre outras (Carneiro
et al., 2019) Apresenta-se em baixo alguns exemplos que podem ser úteis para diferenciar
sarcomas anaplásicos de células fusiformes (Ann & Ann, 2017; Ramos-Vara & Borst,
2017):
Tabela 9 – Testes de IHQ com potencial diferenciador para tumores histologicamente semelhantes (adaptado de Ann & Ann, 2017)
Tratamento
Tal como acontece na generalidade dos Sarcomas de Tecidos Moles (STM) em humanos, a
excisão cirúrgica radical (margens livres com mínimo de 1,5cm, sendo no entanto, no caso de
fibrossarcoma associado a injetáveis, recomendados 3cm livres mínimos (Zabielska-Koczywąs
et al., 2017)), associada a radioterapia pré e/ou pós cirúrgica, é indicada como a melhor medida
terapêutica para tratamento de fibrossarcoma (Augsburger et al., 2017; Dangoor et al., 2016;
Zabielska-Koczywąs et al., 2017). A quimioterapia está descrita como terapia adjuvante e
64
nunca isolada (Pereira et al., 2017). Apesar do seu crescimento lento, é de realçar que estas
neoplasias são localmente invasivas e dado o seu local de incidência, por vezes pode não ser
possível fazer excisão completa. Aqui, também a histopatologia tem um papel relevante pois
permite explorar se a massa foi removida na totalidade, com margens de segurança, livres de
células neoplásicas, (que quanto acontece, em conjunto com ausência de lesões necróticas e
baixo índice mitótico, traduz um bom prognóstico (Giudice et al., 2010). Quando presente nos
membros, a amputação pode ser recomendada (Phelps et al., 2011).
***
Como primeiro caso oncológico que apresento neste documento, não podia deixar de
reforçar, ainda que de forma breve, o papel do patologista no que diz respeito ao diagnóstico
de neoplasias. Por mais exames que possam ser realizados, a verdade é que o cancro apresenta
evidentes alterações tanto a nível micro como macroscópico, sendo uma doença
fundamentalmente relacionada com desregulações no metabolismo celular (Almendro et al.,
2013; DeBerardinis, 2008) que não é possível diagnosticar, muito menos obter informação
prognóstica, ou orientar o próprio tratamento se não houver profissionais qualificados para
analisar as células, os tecidos e por vezes associar então técnicas inclusive moleculares com o
intuito de produzir uma conclusão de diagnóstico bem como tentar entender melhor como se
comporta biologicamente esta afeção mundial (Pierotti, 2017). Quando se faz uma suposição
clínica, e não se suporta a mesma com a opinião de um patologista, é como dar ‘um tiro no
escuro’ uma vez que há inclusive vários tipos de afeções que podem ser classificadas como
‘tumor-like lesions’, que também ocorrem em tecidos moles (Wu & Hochman, 2009).
Devido ao facto do HV-UTAD ser um hospital associado a uma universidade onde existe o
curso de Medicina Veterinária, são realizadas com regularidade necropsias de todas as já
referidas valências (didáticas, anatomo-clínicas, forenses e de investigação). Assim, durante o
curso, no decorrer das aulas das unidades curriculares de Anatomia Patológica e também de
65
Doenças Parasitárias, pudemos observar e realizar exames post mortem a diversos cadáveres
de várias espécies.
Durante esta primeira parte do meu estágio, pude então também usufruir das instalações da
nossa sala de necropsias, tendo acompanhado desde setembro a dezembro o maior número de
aulas que consegui. Abaixo segue a proporção relativa, em percentagem (24 canídeos, 23 aves,
9 leporídeos, 6 felídeos, 6 cervídeos, 4 pequenos ruminantes e 10 ‘outros’, especificados no
gráfico de barras, ao lado).
Leporídeo
11%
Felídeo
Ave 8%
28%
As imagens de histopatologia, foram tiradas e escolhidas por mim, com autorização da Profa.
Anabela Alves e usando o programa de aquisição de imagem da sala de microscopia do LHAP-
UTAD.
66
2.4.1 Necrópsias durante o estágio
CASO I - Aterosclerose
➢ Necropsia
67
▪ Exame ao Hábito Interno: À abertura da cavidade celómica verificou-se um
espessamento dos sacos aéreos caudais e ventrais que se encontravam opacos e
exsudativos.
68
Figura 31 – Ventrículo, proventrículo. Aorta abdominal.
69
Figura 33 – Aorta, placa de ateroma.
➢ Histopatologia
• Aorta
Figura 34 – Artéria fibroelástica. Placa de ateroma: Fendas de colesterol, focos de calcificação. Amp 10x
70
Figura 35 – Artéria fibroelástica. Observa-se uma placa resultante do depósito de colesterol e esteres de colesterol Amp. 10x.
71
Figura 37 – Artéria fibroelástica: Metaplasia condróide. Amp. 20x
• Pulmão
Figura 38 – Pulmão; Congestão dos capilares alveolares. Agregado de macrófagos em posição peribronquiolar que apresentam
citoplasma com elevada quantidade de pigmento granular, negro, refringente, correspondente a carvão – Antracose. Amp. 20x
72
Discussão do caso – Aterosclerose de origem nutricional
Esta afeção vascular está bem descrita em aves psitaciformes – papagaios e periquitos –
especialmente nas mais velhas que se sabe serem espécies aterosensíveis, desenvolvendo
formas mais severas da doença, quando comparadas com mamíferos (Bavelaar & Beynen,
2004). Aves anseriformes (cisnes, gansos, patos), columbiformes (pombas, pombos), bem
como galináceos, são também consideradas como tendo predisposição para desenvolver
aterosclerose (Bandyopadhyay, 2017; Bavelaar & Beynen, 2004; Beaufrèr et al., 2011; Hugues
et al., 2011; Beaufrère et al., 2014).
***
São várias as influências patogénicas que podem contribuir para o desenvolvimento das
placas de ateroma. A hipótese de ‘response to injury’ que deriva da lesão endotelial resultante
da hiperlipemia (colesterol de baixa densidade e lipoproteínas de baixa densidade) pensa-se ser
a causa principal. As placas formadas são então constituídas por lípidos, colesterol,
proteoglicanos, colagénio, detritos celulares, cálcio, macrófagos espumosos e linfócitos T
(Bandyopadhyay, 2017; Robinson & Robinson, 2016).
73
Fisiopatologia
a) Fatty Streak Stage (Placas gordurosas superficiais): Ocorre quando há deposição de lípidos
(maioritariamente colesterol, ésteres de colesterol e triglicéridos) na lâmina íntima, que fazem
apenas uma ligeira saliência no lúmen, não causando obstrução nem sinais clínicos. É
caracterizada pela observação de células espumosas contendo ésteres de colesterol. Algumas
destas células derivam de monócitos em circulação que encontram o endotélio lesado e fazem
então fagocitose de colesterol LDL, enquanto que outras são células musculares lisas da
parede de artérias (grande e médio calibre). Esta acumulação focal de lípidos pode ser
observada em histopatologia após coloração com sudão IV (Bavelaar & Beynen, 2004;
Stevens et al., 2003). Este tipo de lesão é ainda reversível (Bhanvadia et al., 2013).
b) Fibro-lipid plaque stage: Fase que surge na sequência da anterior, considerada como uma
forma de lesão mais avançada (Berliner et al., 1995). A presença de material lipídico na
íntima, estimula a formação de tecido fibroso. A secreção de citocinas pelos macrófagos, vai
estimular a proliferação de células musculares da túnica íntima, que passam a sintetizar
colagénio, o que leva ao aparecimento de lesões que se elevam da parede das artérias e que
consistem numa acumulação de células de músculo liso, tecido conjuntivo e lípidos. À
medida que o ateroma cresce, a camada média muscular começa a atrofiar e há perda de
células de músculo liso (Bavelaar & Beynen, 2004; Stevens et al., 2003). Quando a túnica
intima é substituída por tecido fibroso, a situação é irreversível (Stanford, 2005).
c) Complicated ateroma: A marcada atrofia da túnica média, com perda de tecido muscular
contrátil (que é substituído por colagénio), vai dar origem às lesões ‘complicadas’ da
aterosclerose, que são as responsáveis pela oclusão do lúmen arterial e aparecimento de sinais
clínicos. Nesta fase, observam-se placas fibrosas concretizadas, que podem ulcerar, calcificar
e originar situações de trombose e hemorragia (Bavelaar & Beynen, 2004; Singh et al., 2002).
74
Caso Específico nos papagaios:
Estão descritos casos em psitacídeos sedentários, obesos, onde se estima que estes
desenvolvam aterosclerose secundária a uma nutrição rica em dietas com elevada quantidade
de gordura (Beaufrère et al., 2013), como dietas ricas em sementes de girassol – estas pobres
em cálcio e vitaminas A, D, E e K que, devido ao facto de serem altamente palatáveis, levam
a um consumo voluntário excessivo das mesmas, contribuindo para quadros de obesidade,
aterosclerose, lipidose hepática e diabetes melitus nestes animais (Bandyopadhyay, 2017;
Bavelaar & Beynen, 2004; Santo et al., 2019).
75
Diagnóstico de aterosclerose em Papagaios:
✓ Sinais Clínicos: O mais comum é a morte súbita, sendo que o quadro de aterosclerose
geralmente é apenas encontrado como achado de necropsia. No entanto estes animais
podem também apresentar dispneia, intolerância ao exercício, tosse, episódios de perda
de consciência, atrofia muscular, letargia, claudicação, paresia progressiva dos
membros posteriores e por vezes convulsões ou outros sinais neurológicos (Bavelaar &
Beynen, 2004; Beaufrère, 2013; Beaufrère et al., 2013; Beaufrère et al., 2011;
Whitehead et al., 2015).
✓ Imagiologia: Imagens radiográficas podem ser úteis para visualizar a opacificação das
artérias (aumento de densidade pela formação de placas), no entanto não permite um
diagnóstico precoce. Em ultrassonografia podem encontrar-se áreas hiperécoicas na
base das artérias, bem como se pode avaliar por doppler a velocidade de fluxo
sanguíneo (Beaufrère et al., 2010).
76
o Macroscopia: Lesões características de aterosclerose (espessamento e endurecimento
das grandes artérias, com descoloração amarelada das mesmas e deposição de placas
de ateroma que fazem saliência e obstruem o lúmen vascular, geralmente nos vasos já
mencionados (Fig. 31, 32, 33) (Bavelaar & Beynen, 2004; Reavill & Dorrestein, 2010).
o Microscopia: De forma geral, as lesões de aterosclerose em histopatologia vão
apresentar: Nos fragmentos de artéria, presença de lípidos, fendas de colesterol,
metaplasia condróide e lesões de fibrose e mineralização (Fig. 34 a 37) (Beaufrère,
2013b). No entanto, devido ao facto da aterosclerose ser uma doença degenerativa, de
desenvolvimento lento e poder apresentar variações no padrão lesional histopatológico
(dependendo da fase em que se encontra), foi estabelecido pela associação americana
de cardiologia (American Heart Association) em 1995 um esquema de classificação
(Stary Herbert C. et al., 1995). Este esquema foi testado precisamente em psitacídeos,
num estudo de 2011 (Beaufrère et al., 2011) no qual foi encontrada evidência que
permite a extrapolação desta classificação para aves desta ordem. Com base nestes dois
artigos, adaptei a seguinte tabela
Tabela 10 – Classificação de lesões ateroscleróticas em histopatologia. Adaptado de Beaufrère et al., 2011; Herbert
et al., 1995
77
Com base nesta classificação, diria que o papagaio do nosso caso em questão apresenta lesões
compatíveis com tipo IV – V.
Tratamento
A medicina preventiva é a melhor opção, sendo então que devem ser evitadas dietas
hipercalóricas e deve haver promoção de atividades e algum exercício para estes animais, fazer
análises clínicas de rotina pelo menos uma vez por ano, bem como adaptar medidas para reduzir
o stress, o que deve ser discutido pelo detentor com o clínico de exóticos.
***
Neste caso em particular, o trabalho do Patologista na realização do exame post mortem, contribuiu
não só para obter um diagnóstico definitivo e concluir a causa de morte, como também confirmar ao
colega de clínica de exóticos que a sua suspeita de diagnóstico estava correta. Graças a este exame,
o detentor do animal pode também identificar uma prática errada que estaria a aplicar, devido ao
desconhecimento da dieta mais adequada para o seu animal. Assim, a conclusão desta necropsia
serviu também para educar esta pessoa que certamente caso adquira um novo papagaio não cometerá
o mesmo erro.
78
CASO II – Colangite Linfocítica Felina
➢ Necropsia
A B
C D
Figura 39 – (A), (B), (C), (D) – Coloração amarelo-esverdeado das mucosas ocular, oral e almofadas plantares.
C D
79
• Exame ao Hábito Interno:
✓ Cavidade Abdominal:
✓ Cavidade Torácica:
Colheita: Adrenal, baço, fígado, pâncreas, rim, coração, pulmão, estômago e intestino.
80
Figura 40 – Fígado pálido, apresenta áreas deprimidas à superfície, multifocais, aleatórias e de tamanho variável
Figura 41 – Serosas abdominais ictéricas. Pâncreas rosado com depressões punctiformes à superfície
81
Figura 42 – Pulmões rosados. Congestão por hipóstase direita.
82
Figura 44 – Rins: córtex e bacinete renal apresentam coloração amarelo-esverdeado com congestão da região intercorticomedular
• Fígado:
Figura 45 – Fígado HE; observa-se aumento do estroma fibro-conjuntivo portal, evidenciando a estrutura
lobular hepática. Infiltrado linfocitário portal, que também se estende ao restante parênquima. Amp. 4x
83
Figura 46 – Infiltrado linfoplasmocitário pericolangítico. Dilatação dos sinusóides hepáticos. Amp 20x
Figura 47 – Proliferação dos ductos biliares. Infiltrado linfoplasmocitário pericolangítico e perivascular. Amp. 10x
84
Figura 48 – Proliferação dos ductos biliares e fibrose pericolangítica. Infiltrado linfoplasmocitário periductal. Amp. 20x
85
Discussão do Caso – Colangite linfocítica felina
Com base no quadro lesional observado quer macro quer microscopicamente, em conjunto
com as informações da história clínica, foi feito o diagnóstico de colangiohepatite linfocítica.
Nos gatos, estão descritas três subcategorias principais de diferenciação (cuja mais comum,
é a neutrofílica), sendo a classificação dependente do diagnóstico histopatológico, uma vez que
não é possível distingui-las com base apenas no quadro clínico (Boland & Beatty, 2017; Otte,
2017; Warren et al., 2011).
Apesar de não estar descrita, de forma oficial, predisposição de espécie ou idade para a
colangite linfocítica felina (CLF) verificou-se uma sobre representação do gato de raça persa,
acometido por esta afeção, num estudo de 1984 (Lucke & Davies, 1984).
A CLF poderá ter uma origem imunomediada (Day, 1998) ou bacteriana (Greiter-Wilke et
al., 2006; Otte et al., 2012). Pensa-se que agentes infeciosos possam dar origem a processos
inflamatórios que se continuam no tempo mesmo após eliminado o agente patológico, por
hiper-reactividade imunitária (Otte, 2017).
86
Características
87
destas células não pode ser apreciada através deste exame) (Otte, 2017). Há uma
discrepância no que toca ao diagnóstico de colangites, em 55% dos casos com a
histopatologia.
88
está provada. Atentando à característica acima descrita, de proliferação de ductos
biliares, convém dizer que em alguns gatos, os linfócitos apresentam maior
afinidade para os ductos biliares, infiltrando-se no epitélio biliar, levando a
colestase intra-hepática (Day, 1998; Warren et al., 2011). Estes são
predominantemente CD3-T positivos em IHQ.
Deve ser realizado o diagnóstico diferencial com colangite supurativa e linfoma
(também se observa distribuição portal) (Brown et al., 2017; Cullen & Stalker,
2016).
Tabela 11 – Comparação entre as alterações Histopatológicas dos 3 tipos de colangite felina, adaptado de Boland & Beatty, 2017
89
• Infiltrado inflamatório predominante: Linfocítico.
• Localização do infiltrado inflamatório: Perivascular, pericolangítico e também um
pouco pelo parênquima adjacente.
• Há proliferação de ductos biliares? Sim.
• Há fibrose? Sim.
Tratamento
Neste caso específico, de colangite linfocítica, complicada com pancreatite, num gato de 4
anos e já com alterações ictéricas, o prognóstico não é favorável. Uma vez que o diagnóstico
também não é propriamente fácil, muitos dos animais afetados acabam por falecer, como foi o
caso. A medicação tipicamente usada para a colangite linfocítica passa geralmente pela
associação de antibioterapia a imunomodeladoras. Esta é então realizada com recurso a
antibióticos de largo espetro (uma vez que apesar de não provado, como já mencionei, existe
possibilidade desta ser consequência de uma colangite neutrofílica) e anti-inflamatórios em
dose imunossupressora como a prednisolona e o clorambucilo (Vandevelde, 2015). O acido
ursodexicólico (UDCA), considerado um fármaco hepatoprotetor com propriedades também
anti-inflamatórios, imunomodeladores e antifibróticas geralmente usado em medicina humana
(Cullen et al., 2008), pode também ser aplicado embora se tenha verificado, maior tempo de
sobrevivência com o uso da prednisolona (Otte et al., 2013). Aplicação de vitamina E, vitamina
K, suplementação com taurina, alimentação entérica e antioxidantes podem ser também usados
(Vandevelde, 2015).
90
CASO III – Linfangiectasia Intestinal
➢ Necropsia
91
• Exame ao Hábito Interno: Hidrotórax (7ml) e ascite (50ml). Palidez generalizada das
serosas abdominais. Congestão dos vasos do mesentério.
✓ Cavidade Abdominal:
✓ Cavidade Torácica:
o Traqueia: Presença de espuma rosada no terço distal que se continua pelos grandes
brônquios (edema pulmonar);
o Pleura: Observam-se focos brancos miliares como ‘pó de giz’ atribuídos ao método de
eutanásia com pentobarbital.
o Pulmões: Não colapsam à abertura da cavidade torácica. Pesados, húmidos e brilhantes.
Pulmão esquerdo apresenta áreas pálidas, insufladas compatíveis com enfisema.
o Coração: Observa-se dilatação do ventrículo esquerdo. Colapso da câmara cardíaca do
ventrículo direito, onde se observa sangue coagulado (post mortem).
92
Figura 52 – Ascite e palidez das serosas abdominais.
93
Figura 54 – Espuma na traqueia (edema pulmonar), pulmões húmidos e brilhantes.
94
A B
A B
C D
Figura 56 – (A) congestão dos vasos do mesentério; (B) serosa do intestino delgado; (C) e
(D) dilatação dos vasos linfáticos da mucosa intestinal - linfangiectasia
95
➢ Exame Microscópico
Figura 58 – Encurtamento e dilatação das vilosidades por ectasia dos quilíferos, alguns dos quais
roturados. Dilatação também das criptas. Amp 4x
Figura 59 – Dilatação dos quilíferos, por material eosinofílico, proteináceo. Amp. 10x
96
Discussão do Caso – Enteropatia com perda de proteína secundária a Linfangiectasia
Intestinal
Esta afeção pode desenvolver-se devido a várias doenças (que não são mutualmente
exclusivas) algumas das quais induzem fenómenos erosivos na mucosa intestinal (levando à
perda de integridade da mesma e aumento da permeabilidade) e outras que geram aumento da
pressão linfática devido a obstruções mecânicas (ou aos dois) (Dossin & Lavoué, 2011; Umar
& DiBaise, 2010).
No cão, as causas mais comuns são: Linfangiectasia intestinal (LI) primária ou adquirida,
doença intestinal inflamatória (que pode levar a linfangiectasia secundária) e linfoma intestinal
(que pode também levar a linfangiectasia).
97
A perda de proteína nesta condição, não é seletiva, e o peso molecular das proteínas em
questão não tem influência na mesma, podendo gerar-se quadros de panhipoproteinemia
(Dossin & Lavoué, 2011).
Com a perda de linfa, para além de proteína, há também perda de linfócitos, lípidos (bem
como má absorção destes e outros nutrientes) sendo assim possível observar em patologia
clínica, alterações como hipoalbuminemia, hipocolesterolemia e linfopenia (Dossin & Lavoué,
2011; Kull et al., 2001; Simmerson et al., 2014).
O grau de hipoalbuminemia apresenta elevado grau de correlação com a gravidade das lesões
histológicas observadas (Kull et al., 2001).
***
Devido aos sinais clínicos abaixo apresentados, devem ser descartados como diagnósticos
diferenciais condições como: nefropatias com perda de proteína e situações de insuficiência
hepática. No caso das afeções renais, deve ser realizada análise à urina (esta cursa também com
hipercolesterolemia, ao contrário da linfangiectasia que cursa com hipocolesterolemia) e no
caso de suspeita de problemas hepáticos, devem ser realizados testes aos ácidos biliares pré e
pós-prandiais (Craven & Washabau, 2019; Dossin & Lavoué, 2011).
98
Características gerais - Enteropatia por perda de Proteína, secundária a linfangiectasia
✓ Sinais Clínicos: Perda de peso e massa muscular, diarreia crônica, esteatorreia, emêse
intermitente, desidratação, flatulência e lesões associadas a perda de proteína como
edema periférico, ascite (distensão abdominal), efusões pleurais (com sinais respiratórios
de dispneia ou taquipneia). Nem todos os animais com linfangiectasia vão apresentar
diarreia, mas este sinal é dos mais prevalentes nesta afeção (Bota et al., 2016). Estão
também descritos tremores e até mesmo convulsões devido a hipocalcemia e
hipomagnesiemia (Bota et al., 2016; Dossin & Lavoué, 2011; Kull et al., 2001;
Simmerson et al., 2014; Umar & DiBaise, 2010). Alguns animais vão apresentar também
dor à palpação abdominal e o clínico poderá notar o espessamento das ansas intestinais
aquando da mesma (Ilha et al., 2004).
✓ Patologia clinica: A alteração mais consistente com todas as enteropatias com perda de
proteína, é precisamente a hipoproteinemia (Kull et al., 2001) (maioritariamente devida
a hipoalbuminemia < 25 g/l que por sua vez pode levar a hipocalcemia pois 40% do
cálcio circula unido à albumina), linfopenia (por perda de linfa, e consequentemente,
linfócitos), hipoglobulinemia, hipocolesterolemia, e aumentos moderados na atividade da
Alanina Aminotransferase (ALT), da Fosfatase Alcalina (ALP) e do Aspartato
Transaminase (AST) também podem ser observados (Dossin & Lavoué, 2011; Ilha et al.,
2004; Kull et al., 2001; Simmerson et al., 2014). Alguns animais poderão também
apresentar trombocitose (descrito em Yorkshire Terriers (Simmerson et al., 2014)).
99
estriações híper-ecóicas na mucosa intestinal (geralmente jejuno e duodeno), sinais de
hipomotilidade e ascite (Dossin & Lavoué, 2011; Kull et al., 2001). Endoscopia: Mucosa
friável, edemaciada, onde se podem observar elevações múltiplas, de coloração branca
(Kull et al., 2001).
100
linfoplasmocitária (também observada na IBD) (Rossi et al., 2015) Outra alteração
relativamente comum, é a hipertrofia das criptas intestinais (preenchidas de detritos
celulares). O epitélio de superfície pode apresentar-se normal ou atenuado.
Ocasionalmente, de forma inconsistente, podem ser observados também lipogranulomas
(caracterizados por cristais extracelulares, lipídicos, rodeados por macrófagos
epitelioides) provavelmente em resposta inflamatória ao extravasamento de linfa
(Beheregaray et al., 2018; Ilha et al., 2004) estes são geralmente encontrados no íleo e
junção ileocólica (Lecoindre et al., 2016).
A B
Caso a origem da linfangiectasia seja devida a uma massa de cariz tumoral, podem também
ser observadas então células neoplásicas. Edema da lamina própria e da submucosa podem
também estar presentes (Melzer & Sellon, 2005).
101
Tratamento
A dieta é o ponto mais importante no que diz respeito ao tratamento da linfangiectasia, tanto
em humanos como em animais (Craven & Washabau, 2019). Esta deve ser pobre em gordura
(suplementada com triglicerídeos de cadeia média e especialmente reduzir nos de cadeia longa)
e rica em proteína de alta digestibilidade, suplementada com vitaminas hidrossolúveis (A, D,
E, K). Caso os animais sejam demasiado seletivos e não se adaptem, está aconselhada a
colocação de tubo de esofagostomia, seguida de transfusão plasmática pós cirúrgica (esta
transfusão é apenas útil como forma temporária de manter a pressão oncótica) (Craven &
Washabau, 2019). A terapia medicamentosa imunossupressora e corticosteróide, embora
usada, é algo controversa, apesar da possível etiologia imunomediada da linfangiectasia, isto
devido aos seus efeitos secundários como o aumento do catabolismo proteico e hiperlipidemia
(McKay & Cidlowski, 2003; Meng et al., 2017; Steiner et al., 2011) que se devem evitar num
caso de linfangiectasia. Ainda assim, fármacos como a prednisolona ou a ciclosporina são
usados (Brooks, 2005; Dossin & Lavoué, 2011; Okanishi et al., 2014) geralmente após
tentativa, sem sucesso, de alteração da dieta. Outros fármacos usados são os antieméticos,
probióticos bem como anti trombóticos como o sulfato de heparina e o clopidogrel (Akira
Takeuchi, 2014; Brooks, 2005; Craven & Washabau, 2019; Dossin & Lavoué, 2011).
O animal deste caso em específico, foi sacrificado. Sendo assim, o exame post mortem não
teve como finalidade determinar a causa da morte, mas sim para confirmação do diagnóstico.
O clínico em questão soube analisar o caso de forma pertinente e suspeitar de um diagnóstico
que viu ser confirmado tanto em necropsia como na histopatologia, sendo então que a sua
suspeita estava correta.
Devido ao facto desta necropsia ter ocorrido durante uma aula, o exame teve também carácter
educativo, tendo servido de excelente exemplo de como se apresentam as lesões macroscópicas
de linfangiectasia (como se pode apreciar nas fotografias).
102
Diversidade de espécies necropsiadas no HV-UTAD
B 61 – (A) Dolichotis patagonum – Mara; (B) Trachemys scripta – Tartaruga (C) Lutra lutra – Lontra
Figura
103
2.5 Overview do Estágio
Esta foi também a primeira vez que tomei conhecimento da realidade do que é a rotina de
um laboratório de anatomia patológica, uma vez que no ano em que ingressei o curso (em 2013)
não fez parte do nosso plano de estudos a visita guiada ao mesmo (falha esta que se encontra
neste momento corrigida, sendo que os alunos de veterinária têm agora possibildiade de visitar
o laboratório e inteirar-se dos variados procedimentos que lá tomam lugar).
Em 3 meses de estágio, entre citologias, histopatologia e exames post mortem, mais de 300
análises foram solicitadas a este laboratório, o que vem corroborar e dar ainda mais enfâse à
importância da sua existência bem como a necessidade de haver patologistas qualificados para
o efeito. No anexo II (pág. 249-251) pode ser encontrado um resumo dos resultados das
necropsias às quais eu assisti/colaborei.
104
3 ESTÁGIO Vets4Pets, Belfast, R.U (Irlanda do Norte)
O estágio que realizei em Belfast decorreu numa clínica da cidade e teve a duração de 9 semanas
(desde o dia 11 de fevereiro de 2019 até ao dia 12 de abril). Consistiu em 8 horas de trabalho diárias,
de segunda a sexta-feira, entre as 8:30 e as 16:30, resultando num total de 360 horas de contacto
prático.
A clínica em questão (Vets4Pets, Belfast) pertence a um grupo - Vets4Pets - que se distribui por
toda a Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, tendo todas as clínicas abrangidas por este, a mesma
metodologia de trabalho, os mesmos equipamentos, programa informático, planos de vacinação, e
protocolos de ação.
Figura 62 – Planta da Clínica Vets4Pets (gentilmente produzido por Tiago Santos, com base no meu relato)
105
A maioria das clínicas Vets4Pets têm também parceria com uma loja de produtos animais (Pets
At Home) sendo as clínicas dentro das próprias lojas, o que revelou ser bastante conveniente para os
detentores uma vez que facilmente poderiam adquirir produtos tais como alimentação apropriada,
enriquecedores de ambiente, produtos de higiene animal, brinquedos, entre outros, à saída da
consulta.
A principal razão para a escolha desta clínica foi o desafio de pôr à prova o meu desempenho
prático e ganhar experiência fora da minha zona de conforto, ou seja, fora do meu país. A segunda
razão foi o facto de saber que, caso escolha seguir uma vertente clínica, uma vez que as metodologias
entre as clínicas Vets4Pets são as mesmas por todo o Reino Unido, facilmente poderei depois
adaptar-me, se assim o escolher.
Os gráficos que apresento em seguida, representam a distribuição geral dos casos relevantes para
patologia veterinária. O primeiro (gráfico 4), demonstra a quantidade de casos nos quais foram
realizados exames complementares quer citologia, quer de histopatologia, em cada semana. O
segundo (gráfico 5), demonstra a percentagem relativa que estes casos tiveram em comparação com
os casos totais (onde constatamos que em 9 semanas, 3.2% dos casos necessitaram de análise quer
citológica quer histopatológica) e, por fim, o terceiro gráfico (gráfico 6) especifica de forma geral
que casos foram estes.
100
98 100
95
80
82 80 82
73
60 67
64
40
20
3 2 5 0 3 2 3 3 3
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9
Gráfico 4 – Nº Consultas na clínica Vets4Pets (por semana); AZUL – Consultas rotina; LARANJA
– Consultas nas quais foi realizada quer citologias, quer análises de histopatologia
106
Casos de
HistP/Citologia
3.2%
Consultas
Gerais
96.8%
Gráfico 5 – Percentagem relativa consultas/casos que requereram citologia ou histopatologia duramte o estágio Vets4Pets
5
4 4
4
3
3
2 2
2
1 1 1 1 1 1 1 1 1
1
Gráfico 6 – Casos onde foi necessário realizar exames de citologia / histopatologia durante o estágio na clínica Vets4Pets
107
3.2 A Patologia em âmbito clínico
Em todas as consultas que acompanhei, à anamnese nunca faltou a pergunta: ‘Any lumps or bumps
that you’ve noticed and may be concerned about?’ (Algum nódulo ou massa que o esteja a
preocupar?) bem como um completo exame físico que sempre incluía a palpação cuidada de cada
animal, em busca de possíveis nódulos ou assimetrias que pudessem ter escapado ao detentor. Na
minha opinião, este exercício é bastante importante, pois para além do que a patologia clínica nos
possa informar, os sentidos de um clínico veterinário (visão, tato, olfato) devem ser apurados de
forma a poder detetar também ao exame físico, possíveis alterações macroscópicas que possam
justificar a requisição de um exame de citologia ou histopatologia.
Para além desta abordagem em consulta, que embora valiosa, por si só é limitante, qualquer clínica
ou hospital veterinário beneficia, caso possa realizá-los, de exames complementares de Patologia
Clínica. Nesse sentido, a clínica Vets4Pets Belfast dispunha de aparelhos para realização de
hemograma e bioquímica sérica (os quais eram usados diariamente, em conjunto com uma
centrífuga) bem como microscópio, lâminas para o mesmo (com possibilidade de realizar coloração
de Diff Quick), tiras reativas para analise rápida de urina bem como refratómetro. Existem grandes
vantagens no facto de haver tais equipamentos na prática clínica, bem como profissionais com
capacidade de realizar e interpretar os resultados provenientes do seu uso. Em primeiro lugar, temos
a rápida possibilidade de despistar bem como diagnosticar certas doenças como é o caso da
demodicose (3 casos em 2 meses) ou iniciar antibioterapia no caso de confirmação de infeção
bacteriana (por exemplo antibioterapia tópica no caso de otites bacterianas). A existência do
microscópio permite também o despiste rápido, por citologia, entre situações inflamatórias ou
neoplásicas (como já discutido) sendo também uma ferramenta confiável no caso de mastocitomas
ou linfomas ou mesmo na pesquisa de hemoparasitas. Permite também a pesquisa da presença de
cristais na urina bem como a sua identificação.
108
Tal como apresentei no gráfico acima, vários pacientes apresentavam massas que ao EF tinham
aparência e consistência suspeita de lipomas, geralmente também em animais adultos ou geriátricos,
com excesso de peso, tal como é suportado pela bibliografia (O’Neill et al., 2018). Apesar disto,
nenhuma massa suspeita desta neoplasia benigna foi excisada e enviada para histopatologia.
Geralmente o que se fazia era CAAF para uma lâmina de vidro, que era posteriormente observada
contra uma fonte de luz para observar as gotículas de gordura.
A B
A A
Figura 63 – (A) Material para coloração Diff-Quick; (B) Microscópio da Clínica Vets4Pets
A B
A A
109
A
110
A
A
Figura 65 – (A) Lista de Preços Laboratório Nation Wide e ficha de requisição; (B) Caixa fornecida pelo laboratório;
(C) Apresentação do laboratório de especialidade, clínica de grandes e pequenos.
A 111
Figura 66 – Consultório Principal (Vets4Pets Belfast)
112
3.3 Casos clínicos
História Clínica e exame físico: Animal vacinado (DHPPi + Leptospirose) e chipado, veio a
consulta por apresentar uma lesão única no Membro Posterior Direito (MPD), interdigital (entre o
terceiro e quarto dígito), elevada, de aparência verrucosa, alopécica, não prurítica, não pigmentada
e não dolorosa ao toque. Para além das lesões observadas, o animal não apresentou qualquer outra
alteração ao exame físico.
A B
A A
A A
A A
C D
A A
113
A A
Perante a localização e o carácter morfológico da massa observada, bem como tendo em conta a
idade do animal, foi colocado como diagnóstico diferencial primário a papilomatose.
Com base neste, foi proposta a realização de uma biopsia de excisão para efetuar exame
complementar de histopatologia, o qual o detentor do animal aceitou realizar no dia seguinte.
Foram feitos exames básicos de patologia clínica (hemograma e bioquímica sérica – painel pré
cirúrgico) que se apresentaram dentro da normalidade e habilitaram o animal a ser submetido a
cirurgia. Tendo esta decorrido sem problemas, foi então excisada a totalidade da massa interdigital
com cerca de 1,2x1,8cm, que foi enviada para histopatologia (solução de formol a 10%).
Ao ser informado do diagnóstico, o detentor ficou satisfeito por se tratar de uma condição benigna
e auto limitante. A cirurgia de excisão foi curativa para a lesão em questão.
10 dias após a excisão, houve reaparecimento de nova lesão, desta vez entre o segundo e o terceiro
dígito, uma lesão verrucosa, hiperpigmentada (Fig. 69).
Devido à natureza benigna do papiloma viral, e ao facto do animal não apresentar desconforto,
dor ou claudicação, o detentor optou por não realizar nova cirurgia.
114
Figura 69 – Aspeto Macroscópico da nova lesão Figura 70 – Aspeto dorsal, anatomia dos ligamentos
da porção distal do MAE de um canídeo, com
verrucosa da fêmea Bulldog Americano
referência à numeração dos dígitos (Miller et al.,
1979)
O caso clínico aqui descrito, necessitou de diagnóstico histopatológico. O resultado, como acima
mencionado, foi de papilomatose cutânea, interdigital.
Os papilomas víricos são, como o nome indica, doenças de origem viral (vírus DNA), que
acometem uma grande variedade de espécies, podendo afetar vários sistemas orgânicos, e gerar
diferentes lesões (dependendo do animal afetado e da subespécie viral que o infeta) (Goldschmidt &
Goldschmidt, 2017; Gross, 2005).
A transmissão ocorre por contacto direto ou indireto (via fómites) (Lange & Favrot, 2011; Miller
et al., 2013a; Zachary, 2017) sendo que o tempo de incubação varia entre 4 a 8 semanas (1 a 2 meses)
(Miller et al., 2013a; Nicholls et al., 2001).
115
No cão, os papiloma-vírus que originam lesões do tipo verrucoso, vão afetar as células do epitélio
escamoso, originando lesões macroscópicas que podem ter distribuição oral, cutânea e mucocutânea,
estando descritas algumas síndromes, que se diferenciam pela distribuição anatómica das lesões,
características histológicas, imunohistoquímica, análises de PCR e/ou hibridização in situ de DNA.
• Papilomatose oral (Papiloma vírus oral canino - COPV): Comum em animais jovens, de idade
inferior a um ano. Induz lesões tipo papiloma, de fenótipo geralmente exofítico, na mucosa da
cavidade oral. Estas são geralmente múltiplas, podendo afetar também a língua, palato, faringe,
epiglote, lábios, plano nasal, pele, pálpebras, conjuntiva ocular e córnea. Pode cursar com
halitose e ptialismo (Miller et al., 2013b; Yuan et al., 2007).
116
• Papilomatose cutânea (Papiloma vírus canino - CPV): Origina lesões que podem ser exofiticas
ou endofiticas (também denominadas de ‘papilomatose cutânea invertida’), podendo também
originar lesões planas, em placa, pigmentadas. No caso em questão, observamos uma lesão
única, tipo papiloma, de localização interdigital.
O termo ‘papiloma’ refere-se então a uma lesão epitelial firme, benigna, que se eleva de uma
superfície cutânea ou mucocutânea (Ann & Ann, 2017; Newkirk et al., 2017) e que neste caso foi
confirmado como tendo etiologia vírica.
Os papiloma-vírus infetam primariamente, os queratinócitos do estrato basal. Para que tal ocorra, é
necessário que haja uma lesão prévia que interrompa a barreira cutânea. Uma vez na camada basal,
podem ocorrer 3 situações, resumidas no quadro seguinte (Ann & Ann, 2017):
Infeção latente: Ocorre quando o vírus tem acesso ao núcleo das células germinativas,
organizando-se num episoma de DNA circular, incapaz de induzir alterações morfológicas nos
queratinócitos.
Infeção Ativa: Com a maturação das células da camada basal, ocorre amplificação do DNA viral
e o vírus passa de latente a infecioso, formando viriões que vão ter efeitos citopatológicos, que por
sua vez se traduzem em alterações tais como: hiperplasia epitelial, lesões de degenerescência
balonizante, formação de coilócitos (queratinócitos de citoplasma pálido, basofílico e núcleo
picnótico) e nas células do estrato granuloso e espinhoso, é possível observar nas células
degeneradas, corpos de inclusão intranucleares, basófilos claros.
Tendo em conta o relatório de histopatologia, concluo que o caso seguido se encontrava em fase de
desenvolvimento. As imagens de histopatologia, que apresento de seguida, são uma representação
do que seria esperado observar neste caso uma vez que não tive acesso às imagens reais de
histopatologia
A B
A
Figura 72 – Fig. A - Proliferação exofítica, papilar, do epitélio escamoso, com hiperplasia do estrato espinhoso (S),
proeminência do estrato granular (G) e hiperqueratose paraqueratótica do estrato córneo (C); Fig. B - Células do estrato
Aespinhoso apresentam inclusões intranucleares, basofilicas. Presença de halo perinuclear (adaptado de Bianchi et al., 2012)
118
Para que as lesões entrem em fase de regressão, é essencial que ocorra uma boa resposta de
imunidade celular (Lange & Favrot, 2011), sendo então a infiltração por linfócitos CD4+
(predominantemente) e CD8+ observada (quer em histopatologia, como um infiltrado linfocítico,
quer confirmada por imunohistoquímica) com frequência em papilomas que se encontrem em fase
regressiva, sendo então desaconselhado o uso fármacos imunossupressores (como os
glucocorticoides) nestes animais (Goldschmidt & Goldschmidt, 2017; Nicholls et al., 2001). Para
além de poder atrasar a resolução, algumas moléculas imunossupressoras como a ciclosporina estão
também associadas ao desenvolvimento de novas lesões verrucosas (Favrot et al., 2005).
***
Para além do ponto acima referido, o tempo de espera para a regressão das lesões pode não ser do
agrado do detentor, devido ao facto destas, para além de serem esteticamente desagradáveis,
poderem também causar desconforto ao animal. Sendo assim, existem várias formas de tratamento
à escolha, algumas das quais: administração oral de azitromicina (Yac et al., 2008), terapia com
recurso a interferões recombinantes (Fantini et al., 2015), aplicação tópica de Imiquimod (Aldara)
(Miller et al., 2013c) excisão cirúrgica (Bianchi et al., 2012; Goldschmidt & Goldschmidt, 2017;
Lange & Favrot, 2011) ou criocirurgia (Collier & Collins, 1994; Richman et al., 2017).
119
Contribuição da Patologia para este caso clínico
Sem haver veterinários patologistas, qualificados para o efeito, não se poderia sequer saber se a
neoplasia em questão seria benigna ou maligna, e mesmo realizando a excisão da massa, o
detentor ficaria sem informações sobre o prognóstico.
Este resultado permitiu também eliminar alguns dos possíveis diagnósticos diferenciais,
preocupantes, como por exemplo: carcinoma de células escamosas, tumores das glândulas
sebáceas, mastocitoma, acantoma infundibular queratinizante e melanoma (Miller et al., 2013b).
Poderia ter-se realizado também na clínica, uma citologia aspirativa da lesão, na qual
provavelmente, observaríamos células de epitélio pavimentoso, em diferentes fases de
queratinização e sem grande evidência de atipia (Peleteiro et al., 2011).
O detentor do animal apresentou-se apreensivo aquando da primeira consulta, por pensar que
iria receber um diagnóstico de neoplasia grave. Neste sentido o contributo da patologia permitiu
não só descansar o proprietário, bem como oferecer excelentes notícias de prognóstico. Para
além disto, a excisão total foi curativa para a lesão em questão.
***
120
CASO II – Spindle cell tumor (Tumor de Células Fusiformes)
História clínica e exame físico: Paciente regular na clínica, vacinação (DHPPi + Leptospirose +
BB) e desparasitação tanto interna como externa em dia. Sem problemas de saúde prévios de
relevância.
Foi trazido à consulta no dia 19 de fevereiro de 2019 por apresentar agravamento de uma lesão de
tipo cortante, na face medial do carpo (MAD), que teria ocorrido durante a permanência do animal
em canil.
A ferida em questão, não teria cicatrizado e ao exame físico, na zona onde teria ocorrido a laceração
podíamos agora observar uma lesão de tipo granulomatosa, elevada, bastante exsudativa e ulcerada.
O detentor do animal revelou pensar tratar-se apenas de uma ferida de aspeto irregular pelo que terá
tardado em obter uma opinião clínica sobre o mesmo.
Foi sugerida a remoção da massa e envio para histopatologia. O detentor aceitou e assim foi feito.
A B
A
Figura 73 – (A) vista dorsal da lesão cupuliforme, ulcerada, no MAD; (B) vista lateral da mesma lesão
A
B
B
121
A
A
B
A C
A C
Figura 74 – (A), (B) aspeto macroscópico da lesão, pré-cirúrgico. (C) Lesão após extirpação.
A C
DoAponto de vista cirúrgico, a massa não se encontravaCem localização de fácil excisão (uma vez
que a porção distal dos membros está sujeita a grande tensão, e apresenta pouca flexibilidade cutânea
para encerrar suturas). No entanto, o procedimento decorreu sem problemas, embora não tenha sido
possível excisar a massa com margens amplas. Em formol a 10%, foi enviada para os laboratórios
NationWide que após cerca de duas semanas enviaram um relatório (que pode ser encontrado na
íntegra no anexo I, pág. 248), a título de curiosidade, como exemplo de um relatório do Reino Unido)
com as seguintes informações:
122
Perante este resultado, e com base nas guidelines de medicina humana para tratamento de
sarcomas de tecidos moles (que são também aplicadas a STM caninos, as quais falarei mais adiante)
foi sugerido ao detentor a realização de radioterapia. No entanto, devido ao facto de não haver, na
Irlanda do Norte, nenhum hospital ou clínica com essa capacidade e de o tutor ter de realizar esse
tratamento em Inglaterra, decidiu-se não recorrer a essa via e caso a massa reaparecesse, fazer nova
excisão.
123
Discussão do Caso – Tumor de células fusiformes
O caso aqui descrito, necessitou de diagnóstico histopatológico e foi então confirmado como
sendo uma neoplasia mesenquimatosa, de células fusiformes neste caso de tecidos moles (STM) cujo
subtipo histológico, não foi especificado. Este é o segundo caso de neoplasia mesenquimatosa
apresentado neste documento, tendo o primeiro sido um fibrossarcoma felino.
***
O caso apresentado, foi diagnosticado então como sendo um tumor mesenquimatoso maligno da
pele (sarcoma de tecidos moles), tendo-se utilizado o sistema de Trojani para classificar o seu grau,
que é um sistema adaptado de medicina humana (Coindre et al., 1988; Trojani et al., 1984), que
pode ser aplicado a sarcomas caninos e cuja principal função é fornecer informações sobre o
prognóstico, o qual será discutido mais adiante.
Estas neoplasias constituem um grupo variado de tumores (geralmente localmente invasivos, mas
com baixo risco metastático) (Selting et al., 2005) que têm origem em células de tecido
mesenquimatoso (neste caso, no tecido de suporte da derme e tecido subcutâneo) as quais podem ser
células do tecido conjuntivo fibroso, vasos sanguíneos, linfáticos, tecido adiposo e músculo liso,
bem como células redondas mas com origem mesenquimatosa (Dennis et al., 2011; Hendrick, 2017),
indo então o subtipo depender do tecido em que teve origem: tumores mesenquimatosos de tecido
fibroso (como fibrossarcomas), de tecido adiposo (lipossarcomas), de tecido muscular (como
rabdomiossarcomas ou leiomiosarcomas), dos vasos sanguíneos (hemangiossarcomas), linfáticos
124
(linfangiossarcomas) ou nervosos (neurofibrosarcomas) entre outros (Dennis et al., 2011; Hendrick,
1998; Weiss, 1974).
Uma vez que nem sempre é possível proceder a esta identificação (Dennis et al., 2011; Meachem
et al., 2012) e que o subtipo de sarcoma (quando de baixo grau) não mostrou ter correlação com o
prognóstico, tanto em cães como em humanos (Séguin, 2017; Selting et al., 2005), alguns
patologistas emitem como diagnóstico final, a designação de ‘sarcoma indiferenciado’, ‘sarcoma de
células fusiformes’ ou ‘sarcoma de células fusiformes não classificado’, sendo que esta
denominação, exclui especificamente tumores de alto grau como fibrossarcomas anaplásicos ou
indiferenciados, ou sarcomas histiocíticos) o que já por si denota um prognóstico mais favorável
(Chase et al., 2009; Coindre et al., 2001; Séguin, 2017; Selting et al., 2005), e este diagnóstico de
tumor de células fusiformes, deve fazer-se acompanhar, no relatório, do grau que o patologista atribui
a cada caso (grau este que como acima mencionado, se baseia num esquema de classificação de
medicina humana, a escala de Trojani (Tabela 10), que de forma geral vai ter em conta o grau de
diferenciação, o índice mitótico e a percentagem de necrose), sendo que cada vez mais se dá
importância não ao subtipo de sarcoma mas sim ao seu grau (Chase et al., 2009; Dennis et al., 2011;
Meuten, 2017), do ponto de vista de prognóstico.
Após diagnóstico feito e grau atribuído, as opções de tratamento vão então variar (bem como as
informações relativas ao prognóstico), sendo porém, tanto em medicina humana como em
veterinária, a excisão cirúrgica a medida de tratamento preferencial, curativa para sarcomas de baixo
a médio grau (Banks et al., 2011; Dangoor et al., 2016; Ramu et al., 2017).
O que está sugerido na literatura é que a radioterapia pós-operatória é indicada sempre que o
tumor em questão, seja de grau 2 ou 3 pela classificação de Trojani, apresente um diâmetro maior
ou igual a 5cm, envolva a fáscia profunda, tenha sido extirpado com margens de segurança inferiores
a 1cm, ou então seja considerado um tumor grau de 1 mas de localização de difícil acesso para nova
cirurgia, caso recidive (como, por exemplo neste caso, localizado na porção distal de uma
extremidade (Dangoor et al., 2016; Forrest et al., 2000)).
Pode aferir-se informações relativas ao prognóstico sobre a recidiva deste tipo de neoplasias, com
base então no grau atribuído pelo patologista (grau 1, menos de 10% de possibilidade), a excisão
com boas margens de segurança e o uso de radioterapia, estando estes 3 parâmetros associados a um
excelente prognóstico (Dennis et al., 2011).
125
Neste caso específico, tendo em conta história do animal, existe um fator de risco (descrito)
que foi o facto deste animal se ter lesionado aquando da sua estadia num canil. Sabe-se que
este tipo de tumores em cães está associado a inflamação secundária a traumatismo (Bar &
Merimsky, 2017; Miller et al., 2013a; Van Mater et al., 2015) e que a própria condição de
inflamação é indutora de neoplasias, tendo sido já descrito tanto em humanos como animais
(Balkwill & Mantovani, 2001; Philip et al., 2004).
Tabela 13 – Sistema de classificação em graus, para sarcomas de tecidos moles no cão (Grau Trojani)
Adaptado de Dennis et al., 2011, modificado de Trojani et al., 1984
126
Figura 75 – Fibromixosarcoma de baixo grau, onde figuraram células (Angiero et al., 2007) Amp. 20x40
✓ Sinais Clínicos: Como em todos os pacientes oncológicos, e como já discutido também em outros
casos, os sinais clínicos vão variar, dependendo do tipo, agressividade, estadiamento do tumor em
questão e até mesmo do próprio animal. Neste caso, os sinais mais evidentes foram detetados ao
exame físico, apresentando-se então uma lesão cupuliforme, de superfície ulcerada, na face latero-
caudal da zona suprametacárpica (MAD) o que orientou de imediato o clínico para um possível
exame de histopatologia.
✓ Patologia Clínica: Outro parâmetro que pode variar bastante em pacientes oncológicos. No caso
em questão o animal fez hemograma e bioquímica sérica como exames básicos pré cirúrgicos,
que se apresentaram dentro da normalidade.
✓ Imagiologia: Em qualquer paciente onde se suspeite de uma neoplasia, devem ser realizados
exames de imagiologia e neste caso seria então útil para saber se havia envolvimento ósseo,
calcificação ou metástases (Dangoor et al., 2016). No caso em questão o detentor decidiu que
queria a excisão da massa o mais rápido possível e não foram realizados exames de imagiologia.
✓ Citologia: No caso de sarcomas de tecidos moles, estes tendem a ser fracamente exfoliativos,
embora a CAAF possa revelar uma população de células fusiformes com graus variáveis de
ansiocitose e anisocariose, sugestiva de neoplasia mesenquimatosa (Meachem et al., 2012)
podendo assim ajudar a descartar alguns diagnósticos diferenciais como linfoma ou melanoma.
127
Uma vez que os diagnósticos de sarcomas se baseiam na morfologia e padrões lesionais
característicos, observáveis em histopatologia e imunohistoquímica, a citologia prova ser
insuficiente para atingir um diagnóstico definitivo.
Quando li pela primeira vez o relatório de histopatologia referente a este caso, fiquei um pouco insatisfeita
devido ao facto de, na altura, tê-lo considerado pouco específico. No entanto, como pude aprender
posteriormente, ao fazer a revisão bibliográfica, percebi estar precisamente a focar num dos temas desta
tese: Qual o nosso objetivo enquanto patologistas veterinários? O principal será decerto, zelar pela saúde e
bem-estar dos nossos animais, sendo que aqui, em tudo ganhamos caso seja possível realizar um diagnóstico
o mais completo possível, que nos permita escolher a modalidade de tratamento mais adequada para cada
paciente, bem como obter alguma informação referente ao prognóstico e ao seu seguimento. Apesar disto,
para o caso em questão, o preciosismo de saber qual o subtipo exato de STM, não iria interferir nem na
escolha do tratamento nem do prognóstico do animal e por isso é que não foi solicitado, nem especificado.
Pessoalmente, creio que seria necessário estudar mais a fundo se o subtipo de STM realmente não interfere
com o prognóstico, porém, à luz do que se sabe hoje em dia, esta abordagem é correta em medicina
veterinária e, o Patologista escreveu um bom relatório que continha apenas as informações necessárias para
a prática clínica.
128
CASO III – Calcinosis circumscripta
História clínica e exame físico: Em julho de 2018, o animal foi levado a consulta por apresentar,
na face caudal do MPD, uma massa de consistência sólida, não dolorosa ao toque, com cerca de 1cm
de diâmetro. O clínico realizou CAAF da mesma, a qual não foi conclusiva. O detentor do animal
não voltou à consulta nesse ano.
No dia 12 de Março de 2019, a lesão tinha aumentando exponencialmente de tamanho, tendo agora
também uma conformação de estrutura lobular, mantendo a consistência sólida, normotérmica, não
doloroso ao toque e de epiderme integra.
129
A
C B
A A
Figura 77 – (A) aspeto macroscópico da lesão pós extirpação; (B) presença de pequenos nódulos, calcificados, de
Cvários tamanhos. (C) lóbulos compostos por áreas bemBdefinidas preenchidas por líquido branco, viscoso.
A A
130
Devido ao facto desta massa se encontrar numa extremidade de membro (com pouca pele para
suturar e sujeita a pressões), o local de excisão demorou algum tempo a cicatrizar. O penso foi
mudado um total de 4 vezes, tendo a ferida apresentado extenso tecido de granulação e odor
desagradável 5 dias após a cirurgia (ainda devido ao tamanho e peso do animal não consegui
fotografar devidamente pois foi necessário a minha ajuda para o conter).
A massa foi então enviada para os NationWide laboratories, que enviaram de volta o seguinte
relatório:
Perante este relatório, o detentor mostrou-se bastante aliviado por se tratar de uma lesão benigna,
embora em contexto clínico, tendo em conta o aspeto morfológico da lesão após excisão da mesma,
já se poder realizar um diagnóstico diferencial com certo nível de confiança, devido aos focos de
calcificação observados e também atendendo à raça, idade do animal e localização da lesão.
***
131
Discussão do Caso – Calcinose Circunscrita
Quando ocorre no tecido subcutâneo, sob forma de lesão única, e geralmente em local específico,
é então designada de calcinose circunscrita, a qual pode ter etiologia metastática, distrófica,
idiopática ou iatrogénica, sendo nos cães a etiologia idiopática a mais comum (Jeong et al., 2004;
Tafti et al., 2005; Zachary & Miller, 2017). De forma geral, esta é uma lesão benigna, bem definida,
de crescimento lento, composta por áreas de material calcificado, amorfo e separado em lóbulos de
tamanho variável por tecido conjuntivo, que pode apresentar áreas de inflamação granulomatosa
(Organização Mundial de Saúde, 2007).
Em alguns estudos, parece existir uma sobre-representação em machos (Lee et al., 2016; Linden
& Thompson, 2017; Tafti et al., 2005). Estima-se também que até 25% dos casos ocorram na mucosa
oral.
No caso específico que aqui relato, temos um animal de raça grande, com idade inferior
a 2 anos, macho, que apresenta uma lesão que tanto do ponto de vista de localização
anatómica como do seu aspeto morfológico, implica colocar calcinose circunscrita como
diagnóstico diferencial, o qual só a histopatologia pode confirmar.
***
No caso específico que aqui relato, temos um animal de raça grande, com idade inferior
O processo de calcificação inicia-se com a deposição de fosfato de cálcio (insolúvel) que leva à
a 2 anos, macho, que apresenta uma lesão que tanto do ponto de vista de localização
formação de cristais de hidroxiapatite, numa matriz colagenosa (Burns et al., 2013; Miller et al.,
anatómica como do seu aspeto morfológico, implica colocar calcinose circunscrita
2013a). Os estímulos desencadeadores para esta deposição podem decorrer de áreas de necrose e/ou
como diagnóstico diferencial, o qual só a histopatologia pode confirmar.
traumatismo continuado (designando-se nesse caso de calcificação distrófica, e sendo uma expressão
132
primária) ou então assumir caracter sistémico devido, por exemplo, a situações causadoras de
hipercalcemia, como o hiperadrenocorticismo (Ricardo Huppes et al., 2013).
✓ Citologia: Ao realizar CAAF poderá obter-se material espesso, esbranquiçado (tipo gesso)
que ao microscópio apresentará escassos macrófagos e CGM de tipo corpo estranho,
dispostas sobre pano de fundo basofílico e granular onde se poderão notar cristais de cálcio,
133
fagocitados ou também em plano de fundo, como estruturas refringentes que vão corar por
Von Kossa ou vermelho S de alizarina (Peleteiro et al., 2011).
✓ Histopatologia: Podem ser apreciados tanto na derme profunda como tecido subcutâneo,
focos irregulares, multifocais, por vezes confluentes, de material granular, acelular, amorfo,
mineralizado, fortemente basofílicos, rodeados por reação inflamatória de tipo
granulomatoso, que consiste na visualização de células epitelióides e células gigantes
multinucleadas (CGM), separados entre si por trabéculas de tecido fibroso, sendo também
possível observar fibroblastos (Miller et al., 2013a). Os sais de cálcio são depositados ao
longo das fibras de elastina e no colagénio da derme, na membrana basal e frequentemente
então rodeadas por reações de corpo estranho, sendo que os nódulos calcificados são
positivos, corando com Von Kossa e com vermelho S de alzarina (Gross, 2005; Lee et al.,
2016; Alçigir et al., 2014; Szczepaniak et al., 2008).
A C
A
Figura 79 –Nódulos calcificados compatíveis com calcinose circunscrita (H&E); (A) Nódulos de várias
dimensões, basofílicos, distribuídos pela derme; (B) e (C) nódulos rodeados por células epitelióides, células
gigantes multinucleadas e fibroblastos reativos (adaptado de Lee et al., 2016)
C
134
Figura 80 – Coloração vermelho S de alzarina evidenciado calcificação (Amp 20x) (Alçigir et al., 2014).
Tratamento
Dependendo da causa para o aparecimento das lesões, o primeiro passo será atender à origem da
afeção (animais com a síndrome de Cushing ou doença renal crónica). Para lesões de tamanho
reduzido, mesmo estas sendo múltiplas (pápulas, placas e pequenos nódulos), a terapia tópica com
dimetil-sulfóxido (DMSO) está descrita num caso de calcinose iatrogénica, e poderá ser usada de
forma não só curativa bem como preventiva da formação de mais cristais (Miller et al., 2013c; Tolon
et al., 2018).
Para lesões de maior dimensão, como o caso em questão, a remoção cirúrgica é o tratamento de
primeira linha, que para além de servir de diagnóstico é também curativo (Lee et al., 2016; Huppes
et al., 2013) tendo sido aqui realizada também.
O aspeto morfológico desta lesão, poderia fazer suspeitar de uma condição maligna. A
histopatologia foi o ‘tira-teimas’ definitivo capaz de produzir um diagnóstico bem como oferecer
informações sobre o excelente prognóstico deste tipo de lesão. A excisão para exame, foi também
curativa.
135
CASO IV – Histiocitoma cutâneo juvenil
História clínica e exame físico: Animal vacinado (DHPPi + L), chipado e desparasitado interna e
externamente. Foi trazido à consulta no dia 7 de fevereiro, na qual apresentava uma massa de
pequenas dimensões na linha média dorsal da coluna. Suspeita de quisto sebáceo. Duas semanas
após esta consulta, a massa tinha triplicado de tamanho, em relação ao anterior.
Ao detentor, foi proposta a realização de citologia ou então excisão cirúrgica e envio para
histopatologia. A segunda opção foi aceite e a massa foi enviada para os NationWide laboratories.
Figura 81 – Aspeto macroscópico da lesão, cupuliforme, eritematosa, na linha média dorsal, pré e pós cirúrgico
136
O resultado recebido foi o seguinte:
Os histiócitos são células que derivam de linhagens do sistema mononuclear fagocítico e cuja
diferenciação dá origem a macrófagos, células dendríticas intersticiais e células de Langerhans
(Araújo et al., 2012; Moore et al., 1996; Moore, 2017).
O histiocitoma cutâneo canino (HCC), é então uma neoplasia de células redondas, benigna, que
pode afetar cães de todas idades, sendo, no entanto, mais comum em cães jovens (< 3 anos) (Miller
137
et al., 2013a). Macroscopicamente, apresenta-se como uma lesão nodular única (1 a 3cm, bem
delimitada, cupuliforme, indolor, com localização preferencialmente na cabeça, pavilhão auricular,
tronco e membros), de crescimento rápido e ulceração precoce, (Hendrick, 2017) que se pode
apresentar de cor rosada (frequentemente alopécica) e regressão espontânea (Hendrick, 2017; Taylor
et al., 1969). Caso não fossem estas características bem descritas, poder-se-ia pensar numa neoplasia
de carácter maligno como diagnóstico diferencial, o que ocorre quando animais mais velhos
desenvolvem este tipo de lesões (geralmente múltiplas e associadas a linfadenomegalia) tendo de se
distinguir de linfoma epidermotrópico de células T através de imunohistoquímica (uma vez que em
animais mais velhos ocorre invasão da epiderme), especialmente na fase de regressão uma vez que
esta é caracterizada por infiltrado linfocitário (Moore et al., 1996).
Embora a idade de incidência possa fazer variar alguns aspetos tanto a nível macro como
microscópico, esta não altera o cariz benigno do HCC que, como já mencionado, regride
espontaneamente (auto-limitante em semanas ou meses), embora se proceda, em alguns casos, à
excisão cirúrgica, geralmente para fins de produzir um diagnóstico definitivo, por opção do detentor
ou sugerido pelo clínico quando as lesões são persistentes, ulceram ou se encontram em local de
desconforto para o animal (Kaim et al., 2006; Patial et al., 2013).
Está descrita predisposição racial em cães de raça pura tais como Boxers, Dashounds, Bull terrier,
Cocker Spaniels, Great Danes e estima-se que estes tumores representem em 3 a 14% dos tumores
de pele em cães (Withrow & Vail, 2007).
✓ Sinais Clínicos: Como já mencionado, ao exame físico poderá ser detetada uma lesão
nodular, de crescimento rápido, geralmente de cor rosada e alopécica que se pode apresentar
ulcerada, sendo comum em animais jovens como já descrito.
✓ Citologia: Ao realizar uma CAAF, vamos obter preparados onde podemos observar células
redondas a ovaladas, monomórficas que apresentam ligeira a moderada anisocitose, núcleos
de grande dimensão (alguns dos quais indentados) geralmente de localização excêntrica,
cromatina finamente granular e nucléolos pouco proeminentes. Em fase de regressão
podemos observar mais linfócitos do que histiócitos (Duncan & Prasse, 1979).
138
Figura 82 – CAAF de histiocitoma canino onde observamos várias células redondas, que exibem anisocitose com grau variável
de citoplasma pálido, ligeiramente basofílico. Os núcleos são excêntricos, alguns dos quais indentados (Setas vermelhas), com
cromatina finamente granular. Observamos também uma mitose (seta preta) (adaptado de Garrett, 2016).
139
Numa fase de regressão vamos observar infiltrados progressivamente mais ricos em linfócitos
(CD8 positivos), principalmente na base do tumor, que estão associados a lesões de necrose e que
em fases mais avançadas obrigam ao diagnóstico diferencial com linfoma (Hendrick, 2017).
Figura 83 – Secção de pele mostrando a junção dermo-epidérmica, onde é possível observar células do tipo
histiocítico dispostas em cordões que invadem a derme (Hendrick, 2017).
140
Tratamento
Espera-se que esta neoplasia benigna regrida num prazo de 3 meses. Quando tal não acontece,
estão então disponíveis opções como a excisão cirúrgica, criocirurgia ou mesmo a eletrocirurgia, que
oferecem bons resultados e baixa taxa de recidiva (Queiroz et al., 2008; Fulmer & Mauldin, 2007;
Miller et al., 2013a).
***
141
CASO V – Demodicose canina
A B C
A
A
Figura 84 – ‘Close up’ das lesões eritematosas, alopécicas na Bulldog de 6C
meses. (A) periocular; (B)
Subamandibular e face ventral do pescoço; (C) Lesões punctiformes na porção distal do MAD
B A
142
A B
A B
A A
Procedeu-se então à realização das raspagens cutâneas, tendo o colega realizado a raspagem na
face latero-cranial da zona supraocular direita e eu, com o seu auxílio, realizado o mesmo na face
interna do MAE.
Para o efeito, ambos calçamos luvas de látex, colocamos uma lâmina de bisturi na mão direita, e
com o polegar e indicador da mão esquerda, fizemos uma prega de pele de modo a gerar alguma
pressão e aumentar a probabilidade de encontrar o ácaro, realizando a raspagem na direção de
crescimento do pêlo (com a lâmina embebida em óleo mineral) até provocarmos escoriação e
hemorragia (Fig. 85, (A) e (B)).
Realizaram-se então duas preparações citológicas (as quais trouxe comigo para poder tirar
fotografias com o microscópio do LHAP) que ao exame microscópico assim se apresentaram:
143
A B
Figura 86 – Ácaros Demodex canis (citologia por raspagem de pele) - (A) MAE Amp.
10x; (B) zona supraorbital esquerda, Amp. 20x
Perante o resultado da citologia, foi feito o diagnóstico definitivo de demodicose canina pelo agente
etiológico Demodex canis e agendado o plano de tratamento que consistiu num mês (4 semanas) de
um banho semanal com solução de amitraz (Aludex ®) associado à administração Per Os de 1
comprimindo de fluralener (Bravecto ®).
144
Figura 88 – Após 1 semana de tratamento
Os banhos consistiram na aplicação da solução tópica de amitraz (nome comercial Aludex ®), de
uso externo, usando para o efeito um recipiente próprio que a clínica mantém apenas para este tipo
de tratamentos, no qual a solução é manualmente diluída e aplicada no animal, sem enxaguar.
O animal em questão era depois transferido para uma jaula perto do ar condicionado (ar quente)
e coberto com uma toalha. O tratamento foi realizado durante quatro semanas tendo o animal
recuperado, tanto clinicamente como no exame citológico, não tendo sido encontrado mais nenhuma
forma viva de Demodex canis ou outro do género, uma vez concluídas as quatro semanas de
tratamento.
145
Discussão do Caso – Demodicose Canina
Apesar de ser uma doença bastante comum (e por vezes auto-limitante) e o seu tratamento não
ser peculiarmente desafiante na maioria dos casos, outros há, de extensão tão severa que levam
mesmo à eutanásia dos animais acometidos (Duclos et al., 1994), embora com os avanços da
medicina veterinária e novas técnicas de diagnóstico e tratamento, a mortalidade hoje em dia não
seja tão elevada (Mueller & Shipstone, 2017).
Pensa-se que o aumento exponencial destes parasitas possa ter uma componente genética, ou estar
associado a desordens imunomediadas que originem deficiente resposta imuno-celular, quando
ocorre em animais jovens – demodicose juvenil – sendo que a infeção nestes casos decorre após a
normal transmissão vertical ‘progenitor-cria’, quando o organismo do cão jovem não consegue,
ainda, controlar a proliferação da população deste ectoparasita (Ferrer et al., 2014; Fondati et al.,
2010; Greve & Gaafar, 1966; Miller et al., 2013d).
Quando ocorre em animais adultos – demodicose adulta – o que varia são principalmente os
fatores de risco, sendo que regra geral é identificada a causa potenciadora (animais que sofram de
síndrome de Cushing, hipotiroidismo, sejam pacientes oncológicos ou tenham sido submetidos a
tratamentos prolongados com terapias imunossupressoras), sendo que os ácaros Demodex são
considerados patógenos oportunistas (Bowden et al., 2018; Ferrer et al., 2014)
***
146
implicado neste caso (Fig. 86) (tropismo para a unidade pilossebácea), seguida de Demodex injai
(tropismo mais para as glândulas sebáceas) e por fim Demodex cornei (estrato córneo). Um conjunto
de fatores genéticos, estruturais, bioquímicos, imunológicos e hormonais bem como a existência de
morbilidades associadas, ditam a diferença entre infestação e infeção (Singh & Dimri, 2014; Sousa
et al., 2019).
Esta sobrepopulação de ácaros vai originar uma série de sinais clínicos dermatológicos, referidos
na secção de sinais clínicos, que derivam da rutura da barreira cutânea, reações inflamatórias
resultantes de hipersensibilidade tipo IV e podem então dar origem a infeções bacterianas
secundarias com foliculite e furunculose supurativa (Bowden et al., 2018).
✓ Sinais clínicos: Uma série de lesões cutâneas tanto primárias como secundárias podem
aparecer em consequência da demodicose. De forma geral, vamos observar aquando do
exame físico a animais com idade inferior a 1 ano, lesões de alopécia, descamação, lesões
eritematosas, hiperpigmentação, lesões crostosas, seborreia e prurido, em grau variável. A
localização mais comum é no focinho (região periocular, comissura labial) e membros
(dígitos inclusive), podendo também acometer o tronco e dependendo da extensão lesional,
poderemos classificar cada caso como sendo demodicose localizada ou generalizada. Alguns
animais vão apresentar também foliculite e furunculose e lesões de pioderma (pápulas,
pústulas e/ou colaretes epidérmicos) como já referido. Pode então apresentar várias fases de
progressão: demodicose localizada, generalizada, generalizada piogénica ou então crónica
associada a pododermatite (Miller et al., 2013d).
147
✓ Patologia Clínica: Algumas alterações descritas (Dadhich, 2008; Haleem et al., 2015) em
cães com demodicose (generalizada) são, no hemograma: anemia ligeira, bem como
leucocitose por neutrofilia e eosinofilia (mas com linfopenia, o que suporta a possível
imunodepressão induzida pelos ácaros Demodex, que se pensa estimularem a apoptose de
linfócitos (Singh & Dimri, 2014)). Em bioquímica sérica estes animais poderão apresentar
hipoalbuminemia, hipergamaglobulinemia e síndrome eutiróideo (Singh & Dimri, 2014).
✓ Citologia: Forma de diagnóstico simples e rápida que neste caso pode ser realizada por
impressão das lesões (quando exsudativas) ou então por raspagem de pele, que foi o realizado.
Através do exame citológico é possível identificar ácaros Demodex nas suas conhecidas
quatro fases de desenvolvimento: Ovos – estruturas fusiformes, que dão origem a larvas com
6 pernas que passam a ninfas de oito e depois adultos também com 8 (machos e fêmeas) cuja
morfologia varia consoante a espécie (Fig. 86, A e B) (Miller et al., 2013d).
✓ Histopatologia: O exame histológico está indicado para casos onde exista suspeita clínica
para demodicose, porém o resultado de citologia por raspagem é negativo (o que pode
acontecer nos cães de raça Shar pei, pelo facto do acesso aos folículos pilosos ser mais difícil
uma vez que estão mais profundos na derme (Miller et al., 2013d).
148
o Foliculite mural – Padrão mais prevalente, associado a doença clínica, onde observamos
dentro dos folículos (ao nível do infundíbulo e istmo) células inflamatórias como linfócitos,
plasmócitos, macrófagos, mastócitos e eosinófilos. A combinação da existência deste padrão
inflamatório em associação com degenerescência hidrópica de queratinócitos e apoptose de
células epiteliais foliculares, com incontinência pigmentar é característica da foliculite mural
de interface (Caswell et al., 1997; Miller et al., 2013d).
o Foliculite supurativa associada a furunculose (observa-se em cerca de 20% dos casos quando
ocorre destruição da unidade pilossebácea) (Miller et al., 2013d).
Tratamento
Quer por administração oral, aplicação tópica, ou associação dos dois, vários são os tratamentos
disponíveis para a demodicose canina, os quais de eficácia variável. A cura clínica é alcançada regra
geral de forma mais rápida do que a parasitária (entenda-se por cura, a não visualização de formas
parasitárias em citologia de raspagem de pele) (Miller et al., 2013d).
Um estudo italiano realizado este ano (Perego et al., 2019) concluiu serem 6 as combinações de
tratamento com maior sucesso para a demodicose canina: uso de doramectina paraenteral ou oral,
uso de isoxazolinas como o fluralaner (bravecto) ou saroloner oral, combinação de moxidectina com
imidoclopramica tópicas, milbemixina oxima oral, e por fim ivermectina oral (embora não como
primeira linha devido aos seus efeitos adversos).
Embora não figure no estudo mencionado, o amitraz tem sido e continua a ser usado para o
tratamento tópico de demodicose e produz resultados de sucesso. No entanto este fármaco traz efeitos
secundários não desejados como é o caso de sedação temporária, prurido, hipotermia, bradicardia,
hipotensão e hiperglicemia. Estes achados são consistentes com o que observei nesta paciente, uma
vez que auxiliei no tratamento e permaneci com ela durante a recuperação. A hipotermia, bradicardia
e sedação foram observadas.
149
No caso em questão, foi usada uma combinação de tratamento tópico que consistiu em banhos de
amitraz (que é o único fármaco licenciado para uso nos Estados Unidos e Canadá), associado à
administração oral (toma única) de uma isoxazolina (um ectoparasiticida) o fluralener (bravecto)
cuja eficácia está provada (Djuric et al., 2019).
Rara é a vez em que nos é possível enquanto veterinários, emitir um diagnóstico definitivo,
relativamente benigno, poucos minutos após um animal ser admitido a consulta, e para além disso
poder inclusive mostrar ao detentor do mesmo qual o agente causador das lesões cutâneas que
acometem o seu cão, bem como especificar qual a espécie.
***
150
3.4 Overview do Estágio
O estágio que realizei na Irlanda do Norte, foi interessante e enriquecedor, sob vários pontos de
vista. Em primeiro lugar, uma diferença que pude apreciar em relação à prática clínica, comparando
com a realidade em Portugal, é que a maioria dos animais no Reino Unido está coberto por um
seguro animal. Baseado não só nos casos que acompanhei durante os dois meses como também em
conversa com os clínicos, é comum os detentores requererem exames de histopatologia, o que a meu
ver vem provar que há de facto bastante aderência por parte dos tutores em obter diagnósticos deste
carácter e que o facto destes não serem requeridos com tanta frequência em Portugal, talvez se prenda
mais com questões económicas do que falta de interesse e/ou preocupação. Os cães no Reino Unido
também não são rotineiramente vacinados contra a raiva, procedendo à vacinação apenas caso
tenham de se ausentar do país.
Durante o estágio também não observei qualquer caso de tumor mamário felino, tendo concluído
que tal poderá dever-se ao facto das práticas de OVH em gatas serem extremamente comuns na
Irlanda do Norte e, uma vez que um dos fatores de risco para esta neoplasia (contraceção oral), não
é medida terapêutica que se adote com frequência, poderá então haver uma menor prevalência deste
tipo de neoplasia em felinos.
Outra diferença que gostaria de abordar aqui, é a dispensa pelo uso de lamelas nas preparações
citológicas. Colocarei a título de exemplo, um caso ‘rápido’ de linfoma num furão. Não fui eu a fazer
a CAAF, mas corei as lâminas por Diff-Quick e quando perguntei pela lamela disseram-me não ser
necessário. Como já referido na secção de preparação de lâminas, a lamela protege a lente da objetiva
do microscópio, ajuda a preservar e confere transparência ótica à lâmina. O resultado é a seguir
apresentado, e evidencia imagens de fraca qualidade, o que reforça a importância da colocação da
lamela. Perante tais imagens e devido ao facto de o animal ter sido sacrificado, não prosseguindo
para tratamento, optei por não desenvolver o caso.
151
A
A
152
A
4 ESTÁGIO INIAV
153
No polo de Vairão, realizam-se análises específicas no âmbito da segurança alimentar/higiene
pública e sanidade animal, existindo uma unidade de BSE (Laboratório para controlo e vigilância de
Encefalopatias Espongiformes Transmissíveis – EET’s) que está separada da restante unidade de
anatomo-histopatologia (que é responsável, de uma forma geral, por realizar diagnósticos
histopatológicos e exames de necropsia, tanto anatomo-clínicas como forenses).
154
Casuística – Anatomopatologia
Leporídeos Leporídeos
2%
Aves
Peq.
Felídeos
Ruminantes
15% Canídeos Cervídeos
65%
Marsupiais
155
Casuística – Histopatologia
7
6
5
4 4
3 3 3 3
2 2 2 2 2 2
1 1 1 1
Tabela 16 – Peças cirúrgicas e material de matadouro recebidos em cada semana, para exame macro e microscópico
O LAHP-I funciona de forma semelhante ao LHAP-UTAD, no que diz respeito tanto ao serviço
de necropsias (anatomo-clínicas e forenses) como à realização do exame macroscópico e
histopatológico a amostras/peças anatómicas.
156
Seguem as principais diferenças que observei entre ambos.
• O LAHP-I não recebe amostras de citologia para análise (apenas faz histopatologia);
• No LAHP-I não são realizadas técnicas de imunohistoquímica;
• O LAPH-I, por ser um laboratório do estado, recebe amostras provenientes de inspeção
sanitária, tanto no âmbito dos planos de vigilância nacional (suspeitos de tuberculose) bem
como de forma a diagnosticar outras afeções, tais como as suspeitas de outras doenças
infeciosas ou de carácter neoplásico maligno, servindo de apoio à saúde pública;
• No LAPH-I, microtomia, os cortes de tecido não passam por uma fase de expansão em tina
de água fria, passando diretamente do banho maria para as lâminas;
• A eosina utilizada, não é alcoólica (como no LHAP) mas sim aquosa;
• A coloração e montagem das lâminas, no LAHP-I, são realizadas sempre de forma manual;
• O LAHP-I recebe pontualmente cadáveres de animais de explorações pecuárias (mais
frequente no LHAP-UTAD).
157
A
A
Figura 92 – (A) Corte de fragmento de pulmão, suspeita de tuberculose; (B) Processador; (C) Placa de Inclusão
158
Figura 93 – Moldes metálicos, sob a placa de inclusão
159
Figura 95 – Banho-Maria
160
Figura 97 – Sistema de coloração manual.
161
3. Sala de Necropsias:
162
Figura 101 – Exploração da cavidade abdominal de um canídeo
163
Figura 103 – Corte do ápex cardíaco para posterior observação e comparação do diâmetro das câmaras cardíacas
4. Sala de Microscopia
A B
Figura 104 – (A) mesa para abertura de crânios; (B) Mesa de trabalho para recolha de amostras para bacteriologia
164
Figura 105 – Sala de Microscopia LAHP-INIAV
Como se pode observar pelas imagens que aqui apresento (cedidas pelo INIAV), este laboratório
de anatomia patológica e histopatologia, bem como a sala de necropsias, são semelhantes ao já
conhecidos no LHAP e no HV-UTAD. Como já tinha referido neste documento, em termos de
instalações e metodologia de trabalho, destacam-se aqui as diferenças para sistema de coloração (que
aqui é manual, justificado pelo menor número de amostras recebidas).
De entre todos os casos que acompanhei no LAHP-I, escolhi destacar duas necropsias e dois casos
de material proveniente de inspeção sanitária, cujas razões de escolha e contribuição do patologista,
podem ser encontradas no final da discussão de cada um, à semelhança dos restantes casos já
descritos. Um resumo das necropsias realizadas pode ser encontrado também no anexo III (pág. 252
a 255).
165
4.4.1 Necrópsias
História Clínica: Animal em bom estado hígido, vacinado e desparasitado interna e externamente
nos 3 meses prévios. Encontrado morto, ao final do dia, pelos tutores, com sinais de emêse espumosa
não alimentar. Suspeita clínica: Intoxicação.
➢ Necropsia
• Exame ao Hábito Externo: Bom estado de conformação, score corporal 3.5 em 5. Pelagem
de boa qualidade. Opacidade corneal bilateral. Palidez das conjuntivas oculares. Bom estado
de dentição, palidez da mucosa oral.
B C
A
Figura 106 – Exame hábito externo (A) cadáver; (B) Cav. Oral, (C) Cav. Ocular
166
A
• Exame ao Hábito Interno:
167
A
Figura 107 – Exame interno (A) comparação órgãos exangues na C.T e congestivo-hemorrágicos na
C.A; (B) Congestão ansas intestinais; C) Congestão e dilatação, torção ansas intestinais
168
A
169
Figura 109 – Vólvulo e torção intestinal com encarceramento do jejuno resultando em congestão, necrose e hemorragia.
170
Figura 110 – Pinça dente-de-rato indica detalhe de rotura do mesentério, por onde o jejuno herniou
Figura 111 – Detalhe do interface entre as porções necrosadas do jejuno e as porções que não foram alvo de isquemia.
171
A B
A A
A B
A A
Figura 112 – Avaliação do (A) Estômago; (B) Baço; (C) Rins; (D) Mucosa
intestinal, zona de interface área não isquémica/área isquémica
172
Discussão do caso – Vólvulo Intestinal
Esta afeção de curso geralmente agudo e progressão fatal, inclui-se no tipo de lesões circulatórias
que pode ter como consequência a oclusão da artéria e veia mesentéricas craniais. Ocorre
comprometimento vascular com obstrução venosa e linfática eferente devido à torsão e compressão
dos vasos (neste caso do mesentério) que levam primeiramente a um impedimento da drenagem
sanguínea (pois as vénulas, sendo menos rígidas que as arteríolas, ocluem mais facilmente), edema,
congestão, hemorragia e eventual necrose dos tecidos afetados. Tal situação pode levar a choque
hipovolémico e septicemia – devido ao aprisionamento de sangue nas ansas intestinais e à isquemia
e hipoxia mural que levam à destruição da barreira da mucosa, facilitando assim a difusão de
endotoxinas bacterianas pela circulação sistémica (Harvey & Rendano, 1984).
A torção, pode ir até 720ºC (no sentido dos ponteiros do relógio, ou contrário a este), levando a
uma oclusão parcial ou completa do lúmen intestinal. A redução de uma lesão deste calibre é
possível, no entanto há indicação para cirurgia de urgência (laparotomia exploratória) onde é
essencial avaliar a vitalidade intestinal, sendo necessário remover segmentos quando necrosados.
Por vezes, no entanto, a resolução poderá consistir apenas na redução do vólvulo, tudo vai depender
da gravidade de cada caso. Quando a porção afetada é extensa ou se a cirurgia não for realizada a
tempo, a progressão é fatal. Nos casos menos severos, onde há preservação da perfusão sanguínea,
pode inclusive ter curso crónico ao longo de alguns meses como está descrito, embora raro
(Spevakow et al., 2010). A obstrução venosa eferente é das causas mais comuns de isquemia
intestinal, e esta surge em consequência da encarceração de ansas de intestino herniadas (como no
caso em questão) (Uzal et al., 2016)
Os fatores de risco conhecidos (raças médias a grandes) consistem em: aumento da motilidade
gastrointestinal, cirurgia abdominal prévia (com risco de formação de aderências – geralmente de
curso mais lento e com maior probabilidade de resolução cirúrgica (Spevakow et al., 2010) ingestão
de dietas ricas em fibra, insuficiência pancreática exócrina, enteropatias crónicas (podem ocasionar
hiperperistaltismo), ingestão de corpos estranho, traumatismo abdominal, intussusceção, rutura do
ligamento duodeno-cólico, vólvulo-dilatação gástrica e presença de defeitos congénitos como
permanência de ducto onfalomesentérico (que deve involuir ainda in utero mas em alguns indivíduos
173
permanece como uma banda fibrosa – sendo em humanos a causa primária para ocorrência de
vólvulo intestinal (Gaisie et al., 1985; Hassinger, 1997; Junius et al., 2004; Sethi & Sarna, 1991;
Spevakow et al., 2010).
✓ Sinais Clínicos: Dor intensa, desconforto e distensão abdominal, palidez das mucosas, vómito
agudo hematoquezia, estase intestinal, desidratação, taquicardia, hipotensão, tenesmo
(Gelberg, 2017; Junius et al., 2004) – duração horas/dias.
✓ Patologia Clínica: Geralmente não é possível obter tais informações, mas quando há tempo
de realizar este exame, vamos observar: Leucocitose, hipoproteinemia, hipoalbuminemia,
hipocalemia, hiponatremia, hipocloremia (Shealy & Henderson, 1992).
174
✓ Histopatologia: Imagens de hemorragia e congestão, enfartes venosos com lesões massivas de
sufusões, vilosidades necrosadas, ingurgitamento vascular e vacuolização das células epiteliais
(Stevens et al., 2003).
No caso aqui apresentado, não existe hipótese de associar o cadáver a nenhum dos fatores
de risco descritos a não ser a raça (média) sendo que não havia história clínica significante
para suspeitar de afeções pancreáticas ou lesão intestinal crónica, o animal não tinha sido
submetido a cirurgia abdominal prévia e, durante a necropsia, também não havia evidência
de nenhuma situação de deformação congénita, tendo sido no entanto observada uma rutura
da parede do mesentério pela qual herniaram ansas intestinais que ficaram depois
encarceradas.
O exame post mortem neste caso foi fundamental para excluir outras causas de morte não
natural, nomeadamente associada a maus tratos.
Ficou também claro que perante o quadro lesional de extensa necrose do jejuno, a
intervenção cirúrgica não seria curativa.
175
CASO II – Peritonite Infecciosa Felina
➢ Necropsia:
• Exame ao Hábito Externo: Animal magro (score de 1.5 em 5, costelas palpáveis, mínima
cobertura de gordura), desidratado. Bom estado de pelagem (cinza e branca). Distensão
abdominal. Ausência de secreções nasais. Palidez das conjuntivas, afundamento dos
globos oculares. Sem sinais de conjuntivite. Bom estado de dentição, palidez da mucosa
oral sem evidência de úlceras ou erosões; palato ruborizado; vestígios de pasta branca
(possivelmente medicamentosa).
176
A
A
Figura 114 – (A) Palidez da conjuntiva ocular com afundamento do globo ocular; (B) Palidez da língua
177
o Diafragma: côncavo, frémito e silvo após perfuração (exclui pneumotórax);
o Estômago: preenchido por conteúdo líquido, floculado, branco; úlcera de bordos fibrino-
purulentos na mucosa (antro-pilórico) com trajeto fistuloso até ao abcesso peri-pancreático
previamente descrito;
o Intestinos: paredes distendidas, conteúdo catarral, sufusões lineares transversais na mucosa
do jejuno. Conteúdo progressivamente mais líquido e floculado com gás no seguimento do
trato intestinal. Fezes pastosas e amarelas no intestino grosso;
o Pâncreas: Coloração pálida, aspeto sucoso e exsudativo (compatível com pancreatite).
o Baço: brilhante, engorgitado;
o Fígado: hepatomegalia, parênquima pálido com manchas amarelas distróficas, consistência
branda ao corte (hepatose), quistos na parede do ducto biliar, bílis fluida, sem obstruções ao
seu trajeto;
o Rins: fáceis de descapsular, superfície cortical pálida, edematosos ao corte;
✓ Cavidade Torácica:
✓ Crânio:
o Meninges brilhantes e congestionadas.
178
A
Figura 115 – (A) Efusão peritoneal fibrino-purulenta (serosite e peritonite fibrino-purulenta); (B) Detalhe filamentos de fibrina
179
Figura 116 – Detalhe abcesso peri-pancreático com conteúdo purulento concretizado
180
Figura 117 – Úlcera gástrica (antro-pilórico) com trajeto fistuloso até ao abcesso já mencionado
181
A
182
Figura 120 – Congestão das meninges
183
Discussão do caso – Peritonite Infeciosa Felina
O quadro lesional macroscópio observado, bem como a confirmação por virologia e história do
centro de criação deste animal (que viemos a saber mais tarde que já tinham tido casos de PIF,
precisamente em crias da mesma progenitora do animal em questão) sugerem diagnóstico definitivo
de Coronovirose felina originando quadro de peritonite infeciosa efusiva, polisserosite e enterite.
A PIF (Peritonite Infeciosa Felina) ocorre quando o coronavírus entérico felino (biótipo menos
severo, com tropismo para os enterócitos) sofre uma alteração genética in vivo no indivíduo infetado,
que origina diversas, complicadas e ainda não perfeitamente entendidas, mutações em segmentos de
RNA, dando origem a um novo biótipo (FiPV) tendo este alto tropismo para os macrófagos (Murphy,
1999; Pedersen, 2014b; Vennema et al., 1998), que vai afetar de forma preferencial, órgãos
parenquimatosos. No sistema nervoso central, é causa frequente de meningoencefalite viral (Coates,
2010).
A PIF é, então, uma síndrome viral secundária, imuno-mediada, não transmissível que pode
apenas ocorrer em felídeos previamente infetados pelo coronavírus entérico e a sua ocorrência está
diretamente relacionada com a resposta imunitária do hospedeiro em questão, sendo que mesmo em
felinos onde ocorram estas mutações e que sejam positivos para FiCV, nem sempre há progressão
para a PIF e esta quando ocorre, em animais que desenvolvam a forma efusiva, o tempo de vida
estimado não chega aos dois meses (Hartmann, 2005; Murphy, 1999; Pedersen et al., 2014).
A doença sistémica está relacionada com uma menor expressão de imunidade celular, o que
poderá facilitar a multiplicação vírica dentro dos macrófagos. Uma elevada expressão de factor-α de
necrose tumoral e a baixa expressão de interferon-γ também está associada com maior probabilidade
de prosseguir para doença sistémica (Kyuwa et al., 1998; Pedersen, 2014b).
184
A incidência de PIF é mais alta em animais machos, inteiros de raça pura (Murphy, 1999;
Pedersen, 2014a), quando comparado com animais de raça indefinida, e que ocorre com maior
frequência em animais entre os 6 meses e os 5 anos de idade (sendo, dentro deste intervalo, mais
comum em animais com menos de 1 ano – o que se adequa ao caso aqui descrito).
Existem duas apresentações clínicas de PIF (que não são mutualmente exclusivas, pode haver
evidência lesional das duas, mas a classificação de cada caso clínico é dada consoante a forma mais
prevalente observada).
A forma clássica (observada neste caso) é de progressão rápida e deve ser diagnosticada com base
na associação entre:
✓ Sinais clínicos: Anorexia, perda de peso, diarreia, febre crónica (gatinhos com idade inferior
a 6 meses que se apresentem com febre não responsiva a antibióticos são imediatamente
suspeitos de PIF), dispneia com efusão pleural (25% dos gatos), icterícia, distensão abdominal
progressiva com ascite e por vezes também sinais neurológicos e oculares como ataxia e uveítes
(mais associados com a forma seca). Animais afetados podem também apresentar claudicação
devido a sinovite ocasionada pela migração de macrófagos para a sinóvia articular (Pedersen,
2009, 2014a). Linfadenomegalia pode ou não estar presente (Tasker, 2018).
185
✓ Patologia clínica: Hemograma – anemia crónica não regenerativa (característica de doença
crónica), leucocitose com um aumento absoluto dos neutrófilos e decréscimo absoluto dos
linfócitos. Bioquímica sérica – hiperglobulinemia, hipoalbuminemia, hipercalcemia,
hiperbilirubinemia (mais na forma efusiva) e hiperbilirubinúria (não por lesão hepática ou
colestase, mas sim pela eritrólise, pelo que não há elevação dos parâmetros de lesão hepática)
(Pedersen, 2014a; Tasker, 2018). Citologia da efusão peritoneal revela inflamação
piogranulomatosa rica em macrófagos e neutrófilos (Addie et al., 2009).
✓ Anatomia Patológica: Uma das características mas evidentes de PIF efusiva, é a acumulação
de fluído abdominal, altamente viscoso de coloração amarelo-pálida (pela acumulação de
bilirrubina e por vezes esverdeada por acumulação de biliverdina), rico em proteína (Horhogea,
et al., 2011; Pedersen, 2014a) contendo macrófagos, neutrófilos e alguns linfócitos –
transudado modificado (Pedersen, 2014a) – que é acompanhado pela presença de placas
extensas e filamentos de fibrina , podendo também apresentar nódulos acinzentados no omento
e superfícies serosas do fígado, baço, intestinos, rins, pericárdio e meninges (Murphy, 1999;
Uzal et al., 2016). Devido à vasculopatia resultante, abaixo descrita (deposição de
imunocomplexos), por vezes vamos também observar sinais de enfartes e trombos (Murphy,
1999; Pedersen, 2014a). Uma vez que a PIF pode acometer diversos órgãos, poderemos até
observar formas menos típicas, como lesões cutâneas (Ann & Ann, 2017).
186
deposição de imunocomplexos devido à produção de anticorpos (resposta humoral) que
promovem maior fagocitose do FiCV pelos macrófagos (Hartmann, 2005; Pedersen, 2014b).
No omento, mesentério e serosas pode ser observado com frequência proliferação de células
mesoteliais e acumulação de fibrina bem como proliferação de fibroblastos e áreas de necrose.
As restantes alterações observadas nos diversos órgãos são geralmente consequência da
vasculite.
A forma “seca” ou não efusiva, apresenta pouco ou nenhum exsudado peritoneal e é de progressão
mais lenta. As lesões são semelhantes às da forma clássica, no entanto sem a polisserosite fibrinosa
que caracteriza a forma efusiva (de forma que neste caso em específico o diagnóstico realizado foi
‘forma efusiva de PIF’ (Murphy, 1999).
A imunidade humoral vai facilitar a progressão da doença porque vai promover a fagocitose dos
vírus por macrófagos (sendo esta capacidade essencial como fator de virulência) (Rottier et al.,
2005). Por esta razão, a produção de vacinas é dificultada e gatos que sejam seropositivos para o
coronavirus entérico podem então desenvolver uma forma fulminante da doença, uma vez que já
dispondo de anticorpos, vão ter uma resposta humoral bastante competente e facilitar a infeção
sistémica por disseminação viral (Haijema et al., 2004; Myrrha et al., 2011; Pedersen, 2014b).
187
Outras medidas de medicina preventiva (que não a vacinação) devem então ser aplicadas, como
a eliminação do biótipo FeCV, mesmo que este cause por si só apenas uma leve forma clínica, pode
despoletar uma infeção muito mais severa. Outros fatores de risco conhecidos para além da
seropositividade a FeCV são: gatos jovens entre 6 meses a 5 anos de idade, de raça pura, machos
inteiros, positivos a FIV e/ou FELV (ou imunodeprimidos por outras causas), que vivam em locais
com elevada densidade populacional como gatis (Foley et al., 1997).
Se um gato foi sacrificado ou morreu naturalmente por PIF, e o detentor em questão não tiver
mais felinos em casa, devemos aconselhar o mesmo a esperar cerca de 3 meses antes de obter um
novo gato (Hartmann, 2005). Caso haja mais gatos (casas com vários gatos, gatis, centros de criação)
então é muito provável que os outros animais coabitantes estejam infetados e a excretar coronavirus
entérico felino (Hartmann, 2005; Pedersen, 2009). De notar que o vírus que circula é este mesmo, o
FeCV que por si só não é perigoso. O que desejamos é evitar que ocorra a mutação deste para FIPV
e para isso é necessário promover a eliminação deste biótipo menos patogénico. Para que ocorra uma
eficaz excreção e eliminação deste sem perigo de reinfeções, gatos que estejam habituados a defecar
indoor devem defecar outdoor pois de outra forma o FECV será infetante até 7 semanas nas fezes
secas cujos vestígios permaneçam nas habitações (Hartmann, 2005). Também não está aconselhado
situações de consanguinidade pois deixa animais de raça pura mais suscetíveis (Pedersen, 2009).
As gatas, fêmeas gestantes, devem ser isoladas por 3 semanas pré-parto e devem permanecer em
quarentena com as crias até às 6 semanas de idade após as quais os gatinhos devem ser separados
das mães. Fêmeas que sucessivamente tenham 2 a 3 ninhadas com PIF devem ser eliminadas como
reprodutoras (Addie et al., 2004). O contacto com fezes, caixas de areia, fómites (contaminados com
saliva, aerossóis) e especialmente o grooming entre os gatos são importantes vias de infeção
(Zachary, 2017).
Como já foi então mencionado, uma vez então que nem todos os gatos positivos a FeCV sofrem
mutação para FiCV (e mesmo os que sofrem da mutação nem sempre desenvolvem a doença de PIF)
o facto de estes serem positivos, não é, por si só, situação de alarme. Se a eliminação do FeCV for
eficaz, os animais que sobrevivam podem tornar-se seronegativos após meses ou anos, ficando livres
de perigo (Hartmann, 2005). A progressão para a doença vai depender então do animal em questão
188
e de como o sistema imunitário deste responde, pelo que o diagnóstico de PIF não é ‘sentença certa
de morte’ e o detentor deve apostar em táticas de enriquecimento ambiental, diminuição do stress e
promoção da excreção e eliminação vírica do ambiente infetado.
***
189
Diversidade de espécies para necropsia no LAHP-I
190
b. Canguru (Macropus spp.): Pormenor – Cauda fortemente musculada; glote de morfologia
bastante diferente quando comparado com cães e gatos. Baço em formato de T.
191
4.4.2 Exame Macro e Microscópico
192
Figura 124 – Linfonodo (bovino) apresenta lesões granulomatosas
miliares
Exame Microscópico
Figura 125 – Pulmão (H&E): áreas de atelectasia e congestão dos alvéolos pulmonares bem como um
granuloma de centro necrótico, caseoso e calcificado. Amp. 4x
193
Figura 126 – Granuloma: necrose de caseificação, com calcificação central, envolvida por infiltrado inflamatório
mononuclear, onde também se observam GGM, seguido de cápsula fibrosa. Amp. 4x
Figura 127 – Múltiplas áreas de necrose de caseificação, com áreas de calcificação. Amp 4x
194
Figura 128 – Detalhe CGM de Langhans (setas pretas) Amp. 20x
Figura 129 – Granuloma típico de tuberculose bovina com área central de necrose de caseificação, com calcificação,
seguida de uma camada de células epitelioides e CGM (Langhans), seguida de uma camada de células mononucleadas
(macrófagos, linfócitos e plasmócitos), rodeado por uma cápsula de fibrose. Amp. 10x
195
A
FiguraA130 – (A) Campo lâmina tuberculose H&E (granuloma); (B) Mesmo campo, Ziehl Neelson. Amp. 4x
196
Figura 131 – Micobacterias coram de fúcsia com o Ziehl Neelson. Amp. 60x
Figura 132 – Ampliação imagem anterior, bacilos de tuberculose (corados por Ziehl Neelson)
197
Diagnóstico Histopatológico: Compatível com tuberculose bovina.
As implicações desta doença vão então muito além da saúde animal, uma vez que para além do
carácter zoonótico, acarretar também prejuízos económicos (planos de erradicação e controlo) bem
como limitações comerciais (Caminiti et al., 2017; Tanimura et al., 2014; Torgerson & Torgerson,
2010).
Embora possa existir uma noção geral de que a tuberculose (em humanos) é uma doença do
passado, a verdade é que a ausência de vacinas capazes de conferir 100% de proteção contra a TB,
bem como a progressiva instalação de resistência a antibióticos, em associação com o lento
desenvolvimento de novos fármacos para antibioterapia, e a prevalência de reservatórios de infeção
em vida selvagem têm vindo a contribuir para uma reemergência desta doença em humanos
(Borgdorff & van Soolingen, 2013; Bhuachalla et al., 2015; Sakamoto, 2012) sendo um dos maiores
fatores de risco conhecidos (quando a etiologia é Mycobacterium bovis), a ingestão de produtos
lácteos não pasteurizados (Davidson et al., 2017).
198
pasteurização do leite (períodos antecedentes a 1960) no Reino Unido (Torgerson & Torgerson,
2010).
Hoje em dia, esta realidade ocorre mais comumente nos países em desenvolvimento (sendo alguns
fatores de risco o facto de existir elevada prevalência de coinfecção com HIV como é o caso dos
países africanos (Borgdorff & van Soolingen, 2013; Cosivi et al., 1998; Gallivan et al., 2015;
Sakamoto, 2012) sendo que nos países desenvolvidos, a tuberculose em humanos é hoje em dia
melhor caracterizada como doença ocupacional (Ehrlich et al., 2018; Mendoza-Ticona, 2012;
Nienhaus et al., 2016), inclusive em Portugal (Costa et al., 2011). Os patologistas veterinários,
representam um grupo de risco, suscetíveis de contraírem infeção por M.bovis, devido ao facto de
contactarem com cadáveres e peças orgânicas com capacidade infetante (Burton, 2003; Posthaus et
al., 2011).
***
As micobactérias são bacilos fracamente gram positivos, sendo a sua álcool-ácido resistência a
propriedade de eleição usada para deteção em coloração específica de histoquímica (Ziehl-Neelson
- ZN) (Caswell & Williams, 2016; Sakamoto, 2012), uma vez que é impossível distinguir qual a
subespécie implicada, conhecendo apenas a forma clínica ou usando a coloração de rotina H&E
(Ramos et al., 2018; Torres-Gonzalez et al., 2016).
A tuberculose bovina é primariamente causada por M.bovis (embora de forma esporádica possa
ocorrer infeção por M.tuberculosis ou M.caprae). Esta doença pode ser adquirida por várias vias,
havendo, porém, nos bovinos adultos destaque para a forma pulmonar por inalação e nos bovinos
jovens, devida a ingestão de leite não pasteurizado.
Quando inalados, os bacilos chegam aos alvéolos onde rapidamente são fagocitados pelos
macrófagos alveolares que posteriormente produzem citocinas e quimiocinas pró-inflamatórias,
quimiotáticas para outros leucócitos no local de infeção, tais como neutrófilos e monócitos
(Sakamoto, 2012). Se estas células conseguem conter a situação, a infeção é revertida, no entanto
células dendríticas também vão fagocitar os bacilos Mycobacterium, migrando posteriormente para
os linfonodos regionais onde apresentam os antigénios das micobactérias aos linfócitos (Caswell &
Williams, 2016; Sakamoto, 2012).
199
(macrófagos) que vão fagocitar os bacilos, que por sua vez vão-se multiplicar no citoplasma destes
(López & Martinson, 2017). Nos linfonodos regionais, os antigénios das micobactérias são então
apresentados pelos macrófagos aos linfócitos T que ficam ativados e dão inicio a uma resposta de
hipersensibilidade tipo IV (celular) sendo que começam a sintetizar fatores solúveis como as
citocinas que vão fazer quimiotaxia para mais macrófagos, aumentando também a sua capacidade
de secreção, ficando o citoplasma destes mais granular, eosinofílico, conferindo-lhes uma aparência
semelhante a células epiteliais pelo que adquirem o nome de células epitelióides que vão participar
na formação do granuloma (que é uma estrutura dinâmica capaz de prevenir a disseminação de
infeção, por contenção dos bacilos, que se irão encontrar no centro do granuloma, fazendo-se
acompanhar de necrose de caseificação rodeada por camadas de infiltrados inflamatórios (Fig. 129)
(Caswell & Williams, 2016). Caso haja falhas na contenção dos bacilos em granulomas (indivíduos
imunodeprimidos por exemplo) vai haver evolução para uma broncopneumonia granulomatosa, e
caso haja sucesso na produção dos granulomas, nas áreas necrosadas podem ser depositados sais de
cálcio (Fig. 127, 128, 129).
Quando, para além dos focos granulomatosos no pulmão temos também granulomas com
características semelhantes nos linfonodos regionais, temos o designado ‘complexo primário da
tuberculose’ ou foco de Gohn. Este tipo de lesão raramente dissemina, formando-se uma cápsula de
tecido conjuntivo já mencionada. A disseminação hematógena também pode ocorrer, quando há
erosão da parede de vasos (geralmente veias) causando vasculite e entrada em circulação dos bacilos
que vão, de forma rápida e massiva, acometer outros órgãos tais como o fígado, rim, e as glândulas
mamárias (Caswell & Williams, 2016) – gerando pequenos focos de infeção em vários órgãos –
tuberculose miliar (Stevens et al., 2003).
200
✓ Sinais Clínicos: Esta doença pode apresentar um variado espetro de lesões, indo desde
pequenos granulomas localizados (sem sintomatologia clínica) a doença generalizada, debilitante e
grave. De forma geral, é uma doença de progressão lenta, crónica (apesar de em alguns casos poder
apresentar-se de forma aguda e ter progressão rápida), cujos sinais clínicos são de certa forma
inespecíficos, e dependem de qual o sistema afetado. No caso de bovinos adultos, uma vez que a
forma mais comum é a pulmonar, alguns dos sinais são: fraqueza, anorexia com perda de peso, febre
baixa e intermitente, tosse intermitente, e produtiva, linfadenomegalia, e dispneia que pode ou não
ser taquipneica (Cousins, 2001; Ramos et al., 2015).
Apesar de nem todos os animais positivos à prova da tuberculina (teste intradérmico, indireto que
permite detetar infeção incipiente e realizar um diagnóstico in vivo) (Schiller et al., 2010))
apresentarem lesões macroscópicas visíveis (os granulomas da tuberculose podem levar semanas a
meses até serem visíveis macroscopicamente), de forma geral, nas infeções respiratórias (forma mais
comum em bovinos adultos) a maioria das lesões vão ser encontradas não nos pulmões mas sim nos
linfonodos retro faríngeos, traqueobrônquicos e mediastínicos, sendo que com menor frequência nas
tonsilas palatinas, e linfonodos submandibulares, parotídeos e mesentéricos e são então estes órgãos
colhidos para exame histopatológico e bacteriológico. As lesões pulmonares detetam-se em cerca de
10 a 30% dos animais afetados (Caswell & Williams, 2016). No caso apresentado, foram detetadas
em matadouro lesões suspeitas de tuberculose em linfonodos bem como no pulmão.
Nos bovinos (caso em questão) estes granulomas vão ser geralmente do tipo caseo-calcário,
firmes, branco-amarelados, tipicamente de pequenas dimensões, de localização torácica (80% dos
casos). Nos pulmões (geralmente regiões dorso-caudal e subpleural) aparecem como pequenos
nódulos que com a progressão da doença coalescem formando áreas de necrose caseosa e podendo
evoluir para broncopneumonia supurativa (López & Martinson, 2017).
201
A observação de nódulos múltiplos na pleura e peritoneu permitem classificar os casos como
tuberculose perlácea (Radostits & Done, 2007). Como lesões crónicas podemos então observar
lesões nodulares discretas com espessas cápsulas fibrosas a conter o material caseoso por vezes
calcificado. A disseminação hematógena é responsável pela generalização da infeção.
***
202
Tratamento
Devido a elevado custo e implicação para a saúde pública, o gado bovino acometido por
tuberculose não é tratado, mas sim abatido, havendo total rejeição da caraça, como já mencionado.
A tuberculose em cães e gatos é considerada uma zoonose reversa e bacilos de Mycobacterium spp.
vão causar infeção multisistémica, granulomatosa, que devido aos riscos que possa implicar para a
saúde pública, não é, por norma, recomendado o tratamento, sendo os animais acometidos
eutanasiados.
O controlo da tuberculose bovina passa por um diagnóstico precoce, remoção dos animais infetados
e contenção das reses expostas.
Como já referido, a tuberculose bovina é muitas vezes uma doença subclínica, difícil de
diagnosticar sem o auxílio a anatomia patológica, histopatologia e também a bacteriologia.
Destaca-se assim o papel do patologista em regime de inspeção sanitária bem como o seu trabalho
realizado nos laboratórios do estado como é o caso do LAHP-I. Assim, fazendo uso dos
conhecimentos tanto de lesões macroscópicas como microscópicas, existe todo um trabalho de
cooperação tanto do patologista responsável pela inspeção post mortem no matadouro como do
patologista que recebe as amostras para histopatologia.
Para a saúde publica, é também importante diferenciar entre M.bovis e M.tuberculosis, não só
para monitorizar a disseminação de M. bovis entre bovinos e destes para os seres humanos bem como
para orientar tratamentos uma vez que o M.bovis é resistentes a Pyrazinamida, agente de primeira
linha no tratamento da tuberculose humana por M.tuberculosis, que não apresenta esta resistência
(Allix-Béguec et al., 2010). Uma vez que esta se trata de uma zoonose que não está 100% erradicada
e pode acometer várias espécies, considero este caso também importante reforçar a ideia que ainda
existem sim casos, até bastantes em bovinos e ainda mais na vida selvagem, pelo que esta é uma
doença que não deve ser ‘esquecida’.
203
CASO II – Proveniente de Inspeção Sanitária
História: Material proveniente de inspeção sanitária. O material veio refrigerado (quando iniciei o
meu estágio, no entanto, já se encontrava fixado). Órgãos enviados: Fígado, Pulmão, Linfonodo.
Exame macroscópico
o Fígado: Dois fragmentos, contendo uma massa multi-nodular de coloração castanho-claro com
áreas verdes, aspeto sólido e consistência branda ao corte. Observam-se também focos
hemorrágicos. Focalmente delimitada do restante parênquima por tecido fibroso.
o Linfonodo: Alteração da arquitetura por massa de aspeto heterogéneo, contendo áreas sólidas
castanhas, focos de necrose esverdeados e hemorragia;
Figura 133 – Aspeto macroscópico dos 3 órgãos mencionados, após fixação em formol
204
Exame microscópico
Figura 134 – Fígado: hepatócitos neoplásicos dispostos quer em padrão cordonal quer sólido. H&E, Amp. 4x
205
Figura 135 – Fígado: observam-se êmbolos de hepatócitos neoplásicos. H&E, Amp. 10x
206
Figura 137 – Hepatócitos neoplásicos dispostos em padrão solido e trabecular. Anisocitose e
anisocariose, nucléolos evidentes. Áreas de hemorragia. H&E, Amp. 20x
Figura 138 – Círculo: Anisocariose. Seta preta: Mitose (Ampliação da imagem anterior – 20x)
207
Figura 139 – Fígado: detalhe hemorragia e êmbolos neoplásicos. H&E, Amp.10x
208
Figura 140 – Pulmão (H&E): Nódulo delimitado, parcialmente encapsulado, separado por trabéculas fibrosas. Amp. 4x
209
Figura 142 – Pulmão (H&E) trabéculas de tecido fibroso, hepatócitos neoplásicos formando ‘ninhos’. Amp. 10x
Figura 143 – Pulmão (H&E): Espessamento e congestão dos capilares alveolares. Amp. 10x
210
o Linfonodo: Observa-se completa alteração da estrutura orgânica. Córtex e medula substituídos
por nódulos de hepatócitos neoplásicos, áreas de edema e estase linfática com necrose; imagens
de êmbolos linfáticos (metástases). Áreas de hemorragia.
Figura 144 – Linfonodo (H&E) área identificável como linfonodo, embora praticamente não se observem linfócitos. Amp. 4x
Figura 145 – Linfonodo (H&E) observam-se massas constituídas por hepatócitos neoplásicos, que alteram
por completo a estrutura do órgão. Amp. 4x
211
Figura 146 – Linfonodo (H&E) trabécula de tecido fibroso separa população linfóide normal do órgão, da
massa neoplásica de hepatócitos dispostos em padrão cordonal e sólido que invade o parênquima. Amp. 10x
Decisão de Matadouro: Rejeição total da carcaça por evidencia de doença neoplásica sistémica.
***
212
Discussão do caso – Carcinoma Hepatocelular
O CHC é uma neoplasia hepatocitária primária, de cariz maligno, que acomete todas as espécies
animais (incluindo humanos) estando destacados os grandes ruminantes como os bovinos (Bettini &
Marcato, 1992), seguido de pequenos ruminantes (ovelhas) e carnívoros domésticos como o cão
(sendo mais comum em animais geriátricos) (Brown et al., 2017; Cullen, 2017). Algumas das
etiologias apontadas são infeções parasitárias de tropismo hepático, químicos com potencial ação
carcinogénica, vírus, micotoxinas e toxicidade associada a algumas plantas como o senécio
(Hablolvarid et al., 2006; Harris & Chen, 1970; Leong & Leong, 2005; Sarin et al., 2001). Em
humanos é considerado a mais frequente neoplasia associada a afeções hepáticas crónicas (Paradis,
2013).
Uma vez que a maioria dos casos em bovinos é um achado decorrente da inspeção post mortem,
considera-se não existirem dados suficientes para se estabelecer incidência ou distribuição de idade
nestes animais (Jeong et al., 2005).
***
Em termos de sinais clínicos não é possível distinguir esta de qualquer outra afeção hepática
(letargia, perda de peso, icterícia), sendo então que o diagnóstico de carcinoma hepatocelular vai
basear-se numa combinação de características morfológicas tanto a nível macro como microscópico,
sendo os diagnósticos diferenciais principais o adenoma hepatocelular e o colangiocarcinoma
(Bettini & Marcato, 1992; Jeong et al., 2005). Poderá haver alguma evidência em patologia clínica
de que a hipoglicemia persistente possa ser uma alteração comum neste tipo de afeção, tanto em
medicina humana como veterinária (Tsai et al., 2014; Zini et al., 2007).
Apesar da metastização ser considerada infrequente no CHC de bovinos (Bettini & Marcato,
1992) quando ocorre, os órgãos predispostos são linfonodos regionais, pulmões, baço, rins, pâncreas
e ossos (Cullen, 2017; Jeong et al., 2005). Neste caso em específico, ocorreu metastização
(observável quer nos êmbolos neoplásicos quer nas massas presentes no pulmão e linfonodos)
podendo-se assim excluir com confiança o diagnóstico diferencial de adenoma hepatocelular.
213
Características de anatomia patológica e histopatologia observáveis no CHC
Exame Macroscópico: Regra geral, em bovinos, vamos observar lesões únicas, de superfície
irregular, multi-nodular, podendo envolver um ou mais lobos contíguos, que apresentam
consistência friável (diferindo da firme dos colangiocarcinomas (Cullen, 2017)), e que apesar de
malignas podem ter bordos bem definidos. A coloração varia entre branco-acinzentado a amarelo-
acastanhado. É comum observar áreas focais vermelho-escuras hemorrágicas, bem como áreas de
tecido necrosado (Cullen, 2017).
Exame Microscópico: A aparência varia muito com o grau de diferenciação (geralmente suficiente
para identificar a origem hepática) e a organização dos hepatócitos que pode ser distribuído em 4
padrões: trabecular (mais frequente), adenóide (ou pseudoglandular), sólido e cirrótico (Bettini &
Marcato, 1992; Brown et al., 2017; Cullen, 2017; Jeong et al., 2005). A mesma neoplasia pode
apresentar mais do que um destes padrões, havendo também áreas de invasão mais evidente do que
outras (geralmente nas margens) (Cullen, 2017).
As metástases ocorrem geralmente por via das veias hepáticas para o pulmão, o que pode originar
êmbolos neoplásicos e posterior trombose (Fig. 135). São também frequentes as metástases nos
linfonodos abdominais craniais (Fig. 144, 145, 146).
o Padrão trabecular ou cordonal: Considerado o padrão mais comum nos animais domésticos
(Anderson & Sandison, 1968; Bettini & Marcato, 1992; Patnaik et al., 1981). Geralmente
acompanha carcinomas bem diferenciados, que lembram o fígado normal. Nestes casos
observam-se células neoplásicas que se dispõe em placas ou trabéculas de espessura variável,
irregulares que podem apresentar áreas com três ou mais hepatócitos em escasso estroma
conjuntivo (característica esta que pode auxiliar no diagnóstico diferencial com adenoma
hepático nos quais as trabéculas são geralmente finas e de espessura uniforme) (Bettini &
Marcato, 1992; Cullen, 2017). Pode também apresentar áreas de necrose e dilatação de
sinusoides bem como telangiectasia vascular (Bettini & Marcato, 1992; Cullen, 2017).
214
quais contendo material proteináceo mas nunca mucoso (o que permite diferenciar de
colangiocarcinoma) (Bettini & Marcato, 1992; Cullen, 2017).
o Padrão sólido: Caracterizado por carecer de evidente organização. O padrão lesional observado
consiste em nódulos sólidos de hepatócitos neoplásicos que geralmente são pouco
diferenciados e bastante pleomórficos, podendo apresentar citoplasmas vacuolizados –
variante clear cell (células claras) – ausência de sinusoides. Também é possível observar áreas
de telangiectasia (Bettini & Marcato, 1992; Cullen, 2017).
o Padrão cirrótico: Descrito em cães e humanos – caracterizado por um denso infiltrado de tecido
conjuntivo, no meio do qual se observam focos de formações ductulares, cujas marcações de
IHQ permitem um melhor prognóstico: Se mais de 5% dos hepatócitos neoplásicos corarem
por Citoqueratina 19, poderá ser uma neoplasia com alta capacidade metastática (Cullen,
2017).
Quanto aos hepatócitos neoplásicos, estes apresentam características celulares variáveis, sendo
que nos carcinomas bem diferenciados vão então assemelhar-se a hepatócitos normais, com núcleo
central, redondo, e citoplasma eosinófilo, moderadamente abundante, possuindo nucléolos evidentes
e apresentando anisocariose, sendo também comum observar células binucleadas. Nos CHC
indiferenciados, os hepatócitos podem também apresentar aumento do rácio núcleo:citoplasma.
Neste caso em específico, foi relativamente fácil chegar ao diagnóstico definitivo, uma vez
que em primeiro lugar o carácter maligno foi desde logo atribuído, e sendo que se verificou
em histopatologia um padrão trabecular-sólido de células com origem hepática,
apresentando anisocariose, nucléolos evidentes e invasão vascular, realizou-se o diagnóstico
de carcinoma hepatocelular de padrão trabecular e sólido.
Neste caso em específico, foi relativamente fácil chegar ao diagnóstico diferencial, uma
vez que em primeiro lugar o carácter maligno foi desde logo atribuído, e sendo que se
verificou em histopatologia um padrão trabecular-sólido de células hepatóides,
apresentando anisocariose, nucléolos evidentes e invasão vascular, realizou-se o
diagnóstico de carcinoma hepatocelular de padrão trabecular e sólido.
215
Para além das colorações standard, também se poderiam ter realizado técnicas de
imunohistoquímica (estas mais usadas em medicina humana e veterinária para deteção de carcinoma
hepatocelular em cães e gatos, onde se investe mais no tratamento). Alguns exemplos, são o
antigénio hepatócito-específico (HepParl) ou então a Citoqueratina 7 ou 19 (Cullen, 2017; Ramos-
Vara et al., 2001).
Neste caso, uma vez que é um caso proveniente de inspeção sanitária, bastou a classificação de
neoplasia maligna, que é o suficiente para rejeitar a carcaça. No caso apresentado, os padrões
lesionais observados pela coloração de H&E foram suficientes para obter um diagnóstico.
Algo que achei interessante aquando do estudo deste caso: Em humanos, está descrita a regressão
progressiva deste tipo de neoplasias (Huz et al., 2012; Kojima et al., 2006), tema que abre portas
para discussões várias. Em bovinos, um artigo de 2016 retrata um caso de regressão parcial de CHC
no qual ocorreu infiltração intratumoral de linfócitos T (Ohfuji, 2016).
Considerei este caso interessante devido ao facto de ter ocorrido num animal alvo para este tipo
de afeção, as lâminas de pulmão bem como do linfonodo evidenciaram sem sombra de dúvida
neoplasia metastizada, com origem hepática (bem como os êmbolos) o que permitiu com facilidade
justificar a rejeição total da carcaça (devido a processo de doença sistémica).
216
4.5 Overview do Estágio
O estágio que realizei no INIAV revelou-se por um lado bastante semelhante ao estágio do LHAP,
mas por outro também muito diferente. Algumas das diferenças e semelhanças foram já abordadas.
No anexo III pode ser encontrado um resumo das necropsias realizadas (46 no total), das quais 30
foram cães (65.2%) sendo que apenas 5 foram gatos (10.8%, um dos 6 felídeos tratou-se de uma
pantera). Segundo a revista ‘Veterinária Atual’, em 2015 um estudo concluiu que 38% dos animais
de estimação em Portugal são cães, 20% são gatos, 9% pássaros e 4% outros («Portugal tem 6,7
milhões de animais de estimação», 2016) sendo então esperada uma sobre prevalência dos cães nas
requisições de necropsia. Considero, no entanto, que o número obtido de necropsias em gatos foi
reduzido, embora tenha plena consciência que devido à curta duração do estágio não possa daqui
retirar grandes conclusões. Para além disto, as necropsias não se distribuem de igual forma ao longo
do ano pelo que estes resultados não têm adequada validade estatística.
11 das necropsias realizadas a pets não apresentaram informação clínica suficiente sobre o
background hígido de cada cadáver, representando 24% dos casos. Na caso do gato suspeito de PIF,
teria sido útil que tivesse constado do relatório o facto de ter havido já casos de PIF no centro de
criação, dado que este diagnóstico diferencial (que se revelou definitivo) foi colocado apenas e só
com base no que observamos no exame post mortem, o que não só retardou o procedimento como
obrigou a telefonar 2 vezes para a clínica em questão para saber se desejariam proceder com o exame
de virologia e alertar para um possível surto.
De seguida apresento, de forma geral, a proporção relativa das alterações patológicas observadas
nas necropsias que realizei LHAP-INIAV:
217
Alterações do TGI: Das 46 necropsias realizadas, em 21 cadáveres foram encontradas alterações
quer gástricas quer intestinais (1 cervídeo, 1 leporídeo, 3 felinos, 2 aves e 14 em canídeos)
perfazendo 46% das alterações encontradas.
Alterações do tipo nodular/tumoral: Das 46 necropsias, 7 casos em cães sendo que apenas 3
estavam clinicamente identificados como suspeita de neoplasia)
No mesmo anexo poder-se-á verificar que houve 4 casos de morte súbita, todos em cães, 2 dos quais
por torção esplénica, 1 vólvulo gástrico e ainda 1 devido a complicações respiratórias. Houve ainda
5 casos de morte por suspeita de complicações pós-cirúrgicas, 3 das quais com aparente relação
com a cirurgia e 2 que excluíam esta hipótese.
Para além então da carência informativa, observei a existência de uma certa discrepância entre o
diagnóstico/suspeita clínica e os resultados observados em exame post mortem. Apesar da minha
pequena amostra, esta tendência é uma realidade em medicina veterinária, ocorrendo também em
medicina humana, embora em menor grau (Perkins et al., 2003), pois um dos fatores principais é o
facto dos nossos pacientes não realizarem frequentemente exames de rotina ou exames mais
específicos como ecocardiografia, sendo então que muitas das alterações são apenas encontradas na
necropsia (Blanca et al., 2017; Dank et al., 2012).
218
Do restante estágio, considero que foi bastante enriquecedor no sentido que pude contactar de
forma direta com a realidade de um laboratório de anatomo-histopatologia veterinária de serviço
público, bem como pude observar e participar do trabalho de colegas, patologistas, que estudaram
na mesma academia (Dra Carla Lima. Dra Cristina Ochoa e Dr. Carlos Pinto) e que me
proporcionaram um excelente ambiente de convívio e aprendizagem.
***
219
5 CONCLUSÕES FINAIS
No âmbito da minha dissertação de Mestrado, como parte integral da aquisição de grau Mestre, a
título de conclusão do curso de Medicina Veterinária pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto
Douro, decidi dar enfoque à especialidade médica da Patologia Veterinária e à contribuição desta
para a prática clínica.
Ao longo de seis meses de estágio, distribui as minhas horas de contacto prático pelas
componentes quer laboratorial (LHAP-UTAD, LAHP-INIAV) quer clínica (Vets4Pets) de forma a
ter contacto com ambas as realidades e entender qual a posição do patologista e em que extensão o
seu trabalho vai impactar de forma positiva o ponto base de maior relevância na nossa profissão: a
saúde animal.
Para além deste, devido ao interesse pessoal que tenho pela área, foi também meu objetivo o
aperfeiçoamento de capacidades de identificação, classificação e diagnóstico tendo por base a
associação não só das alterações clínicas (as quais pude ir desenvolvendo de forma mais robusta no
decorrer do curso, mas que também estiveram presentes, quer direta quer indiretamente nos meus
estágios) como então as relativas à anatomohistopatologia, as quais penso ter deixado claro com a
apresentação dos meus casos, serem de elevado valor não só para diagnóstico, prognóstico, bem
como por vezes curativo (Papilomas cutâneos, HCC, STM…) de um variado número de afeções.
O terceiro ponto foi precisamente mostrar o abrangente leque de atividades que o patologista pode
desenvolver, bem como o diferente número de espécies (e dentro destas, diferentes órgãos) com que
se pode ter contacto. O patologista veterinário não é só patologista de exóticos, nem só de pequenos
ou grandes animais (embora possa existir preferência neste sentido), e este facto, na minha opinião,
sem dúvida dinamiza muito a área, tornando-a verdadeiramente interessante e enriquecedora de um
ponto de vista comparativo. Por essa mesma razão, decidi apresentar um maior volume de casos, de
forma a dar enfâse a este facto e tentar incluir casos em diferentes espécies. Devido à diversidade de
casos apresentados, fiz questão de apresentar uma pequena conclusão no final de cada caso, uma vez
que não poderia generalizar de forma adequada o suficiente nesta secção.
220
É com satisfação que também deixo aqui por escrito que ao longo da escrita deste documento, fui
partilhando com amigos e colegas fotos de alguns casos bem como parte do conhecimento que pude
adquirir, e penso ter contribuído, especialmente junto de colegas de curso mais novos, para o
despertar de um maior interesse pela anatomia patológica, uma vez que sinto ter recebido feedback
positivo por esta atividade. Considero de extrema importância mostrar aos colegas que há mais para
além da clínica e cirurgia e que é perfeitamente concretizável realizar uma tese de mestrado em
Patologia.
De entre os três pontos referidos, penso ter concluído com sucesso os objetivos que delineei antes
de iniciar o meu primeiro estágio. Tenho plena consciência que seis meses (embora valiosos!) são
insuficientes no sentido de preparar um estudante de veterinária para ser patologista. No entanto,
considero que, se temos gosto pela área, independentemente de estarmos apenas a iniciar atividade,
ou mesmo se sentirmos certo grau de dúvida em relação às nossas capacidades, devemos na mesma
dar o nosso melhor e não desistir. É verdade que há falta de patologistas e segundo a minha
experiência pessoal, uma das principais razões é o medo que se adquire, por vezes durante o curso,
o que leva muitos alunos a desistirem, por vezes, de fazer uma carreira em patologia.
***
221
Do estágio realizado na clínica Vets4Pets, de entre os 24 casos com relevância para a patologia
veterinária, selecionei cinco os quais achei interessantes quer por serem casos comuns, para os quais
eu já tinha uma boa noção clínica, mas poucas bases de histopatologia (como o caso do papiloma
cutâneo) quer por um ponto de vista de separar o que é a investigação daquilo que é o serviço que o
patologista presta à clinica (por exemplo, no caso do STM canino, não interessa ao clínico saber qual
o subtipo de sarcoma mas sim o grau de Trojani, de forma a que ele possa fazer uma correta
orientação do tratamento e prognóstico baseado na evidência cientifica conhecida para o caso).
Do estágio realizado no LAHP-INIAV, escolhi falar de quatro casos (2 necropsias, das 46
realizadas e 2 casos de anatomohistopatologia) os quais achei relevantes. As necropsias, por terem
sido altamente elucidativas e também por aquilo que representaram para os detentores de ambos os
animais, por diferentes motivos (o caso do vólvulo, permitiu excluir morte por envenenamento
enquanto que o caso de PIF vai permitir que o criador do centro em questão possa instalar medidas
sanitárias e profiláticas de forma a erradicar o coronavírus felino, prevenindo assim mais mortes no
futuro). Já os casos de anatomohistopatologia foram interessantes pelo facto de, no caso na
tuberculose, ter tido contacto, tendo a possibilidade de selecionar as áreas a examinar ao corte, bem
como observado posteriormente o padrão lesional clássico, típico da tuberculose bovina, em
histopatologia, bem como o diagnóstico final através de coloração de ZN, evidenciando as
micobactérias. O caso do CHC foi para mim o caso de histopatologia mais interessante dado o facto
de eu nunca ter observado uma metástase hepática de tão grandes dimensões no pulmão nem num
linfonodo, tendo então obtido imagens em Histopatologia que me deram imenso gosto de estudar.
Assim, com 15 casos descritos, concluo a minha tese de mestrado com uma sensação de plenitude
por ter escolhido uma área apaixonante e poder deixar o meu testemunho para futuras gerações que
sem Patologistas, não se faz uma boa Medicina Veterinária.
***
222
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247
7 ANEXOS
248
ANEXO II – Necropsias LHAP UTAD
Casos
Achados/Conclusão de
LHAP Espécie Género História Clínica Suspeita Clínica E. Compl.
Necropsia/Histopatologia
UTAD
Cx para resolução de Fx Complicações pós- Proventriculite, aerosaculite e
1 Ave Macho Não
úmero cirúrgicas gota visceral
Obstrução esofágica Aerosaculite, Hepatomegalia de
Anorexia, regurgitação, (corpo estranho). origem parasitaria por
2 Ave Macho Não
hipotermia Pneumonia por leucocytozoon, úlcera e abcesso
aspiração esofágico
Hiperextensão dos
Traumatismo craniano Hemorragia Pulmonar.
3 Ave Macho membros posteriores, Não
/ medular Insuficiência respiratória
s/ propriocepção
Hipotermia, Ateroesclerose, proventriculite,
Gosta visceral,
4 Ave Macho hipotensão, perda de aspergilose e hepatite. Histopatologia
aterosclerose
CC; + Candida albicans Insuficiência cardiovascular
Fx MPD c/ completa rotura dos
tecidos moles e exposição do
fémur e tíbia. Necrose dos tecidos
5 Ave Macho Sem dados Eletrocussão adjacentes. Parasitismo intestinal Não
por nemátodo. Edema cerebral.
Compatível c/ morte por
eletrocussão
Alopecia e necrose bilateral das
asas. Congestão pulmonar.
6 Ave Fêmea Sem dados Eletrocussão Não
Hepatomegalia. Compatível com
morte por eletrocussão.
Desidratação. Fígado de
7 Ave Macho Sem dados Sem dados consistência branda, Não
congestionado. Inconclusivo
Avançado estado de putrefação.
8 Ave Macho Sem dados Sem dados Não
Inconclusivo
Fratura cervical (Pescoço em S).
9 Ave Fêmea Sem dados Sem dados Hemorragia pulmonar. Provável Não
traumatismo
Avançado estado de putrefação.
10 Ave Macho Sem dados Sem dados Não
Inconclusivo
Animal politraumatizado.
11 Ave Macho Sem dados Sem dados Provável acidente de tráfego. Não
Morte Violenta
Congestão e Hemorragia
12 Canídeo Macho Dispneia Sem dados pulmonar. Insuficiência Não
respiratória
Hidrotórax e ascite. Lesões de cor
Eutanásia. esbranquiçada, elevadas na
13 Canídeo Fêmea Hipoalbuminemia Histopatologia
Linfangiectasia mucosa jejunal, compatível c/
linfangiectasia intestinal.
Lesões macroscópicas
compatíveis c/ Insuficiência
Complicações
Alterações cardíaca bilateral c/ persistência
14 Canídeo Fêmea cardíacas de origem Não
gastrointestinais do DA. HEVD, estenose da mitral,
congénita
edema pulmonar, hemotórax e
ascite
Tetraparesia, dispneia Insuficiência cardíaca congestiva
15 Canídeo Fêmea Sem dados Não
e constipação secundária a DDVM (lesões de
249
nodularidade). Hemoperitoneu,
hepatomegalia, HEVE
Dilatação-torção gástrica e torção
16 F Canídeo Macho Sem dados Abuso/maus tratos Não
esplénica. Morte súbita
Lesões perfurantes, compatíveis
com mordedura, perfurando
região toracoabdominal. Fx da
17 F Canídeo Macho Sem dados Morte violenta mandíbula e várias costelas, Não
hérnia paracostal. Rutura do
pulmão no lobo diafragmático.
Morte violenta
Timpanismo intestinal, intensa
carga parasitária (céstodos e
nemátodos), gastrite
18 Canídeo Fêmea Ectoparasitismo Sem dados Parasitologia
hemorrágica.
Hepatoesplenomegalia. Edema e
hemorragia pulmonar.
Hidronefrose, urolitíase. Enterite
19 Canídeo Macho Sem dados Sem dados necro-hemorrágica, necrose Histopatologia
placas de Peyer
Enterite necro-hemorrágica
20 Canídeo (J) Macho Diarreia hemorrágica Virose Não
linfandemegalia
Enterite necro-hemorrágica
21 Canídeo (J) Macho Sem dados Virose Não
linfandemegalia
Animal politraumatizado.
22 Canídeo Macho Acidente rodoviário Morte violenta Provável acidente de tráfego. Não
Morte Violenta
Tumefação cervical bilateral, por
Aborto devido a aumento das tiroides. Presença
23 Cordeiro Macho Aborto hipertiroidismo bócio de mixedema. Hidrotórax e Não
congénito. ascite. Compatível com bócio
congénito.
Quadro de icterícia generalizada.
24 Felídeo Macho Anorexia, pancreatite Lipidose hepática Histopatologia
Insuficiência hepática
Perda de condição
Processo tumoral (Linfoma
25 Felídeo Macho corporal, Linfoma Histopatologia
multicêntrico)
Lindadenomegalia
Hepatomegalia, rins coloração
Eutanásia devido a heterogénea, uma superfície
26 Felídeo Fêmea Doença renal crónica Não
insuficiência renal. irregular; hidrotórax e efusão
peritoneal
Abcesso ventrocervical, caudal à
mandibula, causa de osteomielite.
Anorexia, perda de CC,
Trajeto fistuloso desde mandibula
27 Leporídeo Macho letargia. Abcesso Convulsão Não
ate entrada do peito (fleimão).
ventro-cervical
Piotórax. Insuficiência
respiratória por rotura de fleimão
28 Leporídeo Macho Dispneia Sem dados Pleuropneumonia fibrinosa Não
Avançado estado de putrefação.
29 Leporídeo Fêmea Sem dados Sem dados Histopatologia
Inconclusivo
Cx resolução de fx Complicações pós- Úlceras na cavidade oral,
30 Réptil Fêmea Não
plastrão. Úlceras na CO cirúrgicas peritonite necrótico-hemorrágica
Abcesso cervico-latero-caudal.
31 Réptil Macho Sem dados Sem dados Histopatologia
Possível septicemia
Vítima de Abrasões e hematomas subcut.
32 F Javali Macho Sem dados atropelamento, múltiplos, hemorragias ms., Não
acidente rodoviário rutura cecal esplénica ante
250
mortem. Fxs múltiplas. Roturas
cardíacas multifocais. Morte
violenta, por Rotura cardíaca e
hemorragia interna
Ouriço- Congestão e atelectasia, atrofia
33 Macho Sem dados Sem dados Histopatologia
Cacheiro hepatocelular
Traumatismo com Animal politraumatizado. Morte
34 Texugo Macho Sem dados Não
veículo automóvel Violenta.
Lesão perfurante cervico-lateral
esquerda, c/ exposição da
traqueia. Hemotórax, fx costelas
Encontrado numa múltiplas, enfisema pulmonar.
35 F Lontra Macho Morte violenta Não
barragem Deformação do crânio, c/ fx
múltiplas. Traumatismo e
hemorragia interna, morte
violenta.
Hematomas no tecido
subcutâneo da região cervical e
torácica sugestivas de lesões
36 Mara Fêmea Sem dados Sem dados Não
contundentes. Hemorragia
uterina. Não exclui causa jurídica
da morte não-violenta.
251
ANEXO III – Necropsias LAHP INIAV
Casos
Achados/Conclusão de
LAHP Espécie Género História Clínica Suspeita Clínica E. Compl.
Necropsia/Histopatologia
INIAV
Hepatose, Enterite,
1 Ave Macho Picacismo Sem dados Não
Inconclusivo
Toxicologia,
2 Ave macho Sem dados Plano controlo microcistina Hepatomegalia. Inconclusivo
Histopatologia
3 Ave Fêmea Sem dados Plano controlo microcistina Hepatomegalia. Inconclusivo Toxicologia
Hepatomegalia, parasitismo Toxicologia,
4 Ave Fêmea Sem dados Plano controlo microcistina
por nematodo (íleo) Parasitologia
Quadro generalizado de
congestão. Hemorragia
5 Canguru Macho Sem dados Sem dados Histopatologia
pulmonar. Compatível com
choque séptico.
Inconclusivo, mas não
6F Canídeo Macho Envenenamento Intoxicação/Envenenamento Toxicologia
descarta suspeita clínica
Inconclusivo, mas não
7F Canídeo Fêmea Envenenamento Intoxicação/Envenenamento Toxicologia
descarta suspeita clinica
Neoplasia mamária,
Cardíaca; Dispneia;
metastizada nos LN regionais e
8 Canídeo Fêmea Tumores Sem dados Não
ilíacos, EM, DRC, HEVD.
mamários;
Insuficiência Multiorgânica.
Cardíaca; Tumores Neoplasia mamária, HEVE.
9 Canídeo Fêmea Neoplasia Não
mamários Insuficiência Cardíaca.
Paralisia 1/3
Gastroenterite hemorrágica,
posterior (2 anos),
10 Canídeo Macho Sem dados cistite, HEVE. Insuficiência Não
ITU com litíase,
Cardíaca e choque.
hematúria
Feridas cutâneas fistuladas,
Cardíaca, Paralisia gastrite ulcerativa, melena,
11 Canídeo Fêmea bilateral 1/3 Sem dados enfartes renais, cistite Não
posterior, otite mucopurulenta, EM.
Insuficiência Multiorgânica
Nódulos no baço, fígado e
adrenal; Gastrite ulcerativa,
12 Canídeo Fêmea Elevação da FA Afeção hepática Não
Enterite hemorrágica, cistite
crónica, HEVD.
Torção esplénica, nódulos
13 Canídeo Macho Dispneia Severa Sem dados esplénicos e hepáticos, Não
prostatite crónica.
Dilatação-torção gástrica e
14 Canídeo Macho Morte súbita sem dados Não
esplénica, HEVE
Politraumatismos lacero-
Paralisia 1/3 contundentes compatíveis
15 Canídeo Macho posterior, ITU, Mordedura com mordedura, intensa Não
mordido destruição muscular.
Rabdmiólise associada a IRA
Enterectomia após
sinais clínicos Enterite necro-hemorrágica,
16 Canídeo Fêmea Eutanásia Não
decorrentes de Cistite hemorrágica, HEVE
laparotomia exp.
252
Morte súbita,
17 Canídeo Fêmea dilatação dilatação-torção gástrica Dilatação-torção gástrica Não
abdominal
Possível golpe de calor
Animal encontrado
(hemorragias epicárdicas e
dentro de carro
18 F Canídeo Macho Golpe de Calor renais. Congestão pulmonar, Não
fechado, num dia
hepática e meníngea). Exclui
de calor
morte natural.
Cianose generalizada,
congestão e edema pulmonar.
Morte horas após
19 Canídeo Fêmea Complicações pós cirúrgicas Não exclui tromboembolismo Não
OVH
pulmonar. HEVE. Sem
aparente relação com cx.
Síndrome obstrutiva
Cantoplastia
braquicefálica, Dilatação
medial bilateral
20 Canídeo Macho Complicações pós cirúrgicas gástrica com ingurgitamento Histopatologia
com resolução de
esplénico. Sem aparente
distiquíase
relação com cx.
Torção do mesentério e volvo
21 Canídeo Macho Morte Súbita Intoxicação/Envenenamento Toxicologia
intestinal
Elevação das
Enterite necro-hemorrágica,
Canídeo transaminases Histopatologia,
22 Macho Afeção hepática serosite e peritonite fibrinosa.
(J) hepática bem Virologia
Possível etiologia viral
como da FA
Politraumatismo perfuro-
contundente e lacerante
23 F Canídeo Fêmea Sem dados Maus Tratos associado a pneumotórax, Não
compatível com mordedura.
Morte violenta.
Enterite necrohemorrágica,
peritonite e pericardite
24 Canídeo Macho Sem dados Complicações pós cirúrgicas Não
fibrinosa com aparente
relação com cx.
Nefrite intersticial crónica
25 Canídeo Macho Prostração Eutanásia bilateral, nódulos testiculares Não
e prostáticos com prostatite.
Pneumonia lobar
fibrinopurulenta, piotórax;
Laparotomia
26 Canídeo Fêmea Complicações pós cirúrgicas Nódulos nas adrenais e rins, Histopatologia
exploratória
infeção da sutura abdominal,
aparente relação com cx
Quadro congestivo-
Ingestão Histopatologia,
hemorrágico inespecífico com
27 F Canídeo Macho medicamentosa Intoxicação/Envenenamento Toxicologia,
sinais de cianose; não exclui
inadequada Virologia
envenenamento.
Neuropatologia:
enfartes
Ataxia, Circling, cerebrais
Fígado congestivo, litíase renal
28 Canídeo Fêmea Coma não Meningite, neoplasia lacunares
e biliar. Obstipação
reversível (trombose
vascular
cerebral)
Anorexia,
Gastroenterite hemorrágica Histopatologia,
29 Canídeo Macho hipoproteinemia, Quadro infecioso/tóxico
severa. Choque hipovolémico Toxicologia
prostração,
253
diarreia
hemorrágica
Anorexia,
hipoproteinemia,
Gastroenterite hemorrágica Histopatologia,
30 Canídeo Fêmea prostração, Quadro infecioso/tóxico
severa. Choque hipovolémico Toxicologia
diarreia
hemorrágica
Quadro congestivo-
Intoxicação, hemorrágico, enterite necro- Histopatologia,
31 Canídeo Macho Sem dados
Envenenamento hemorrágica. Choque Toxicologia
hipovolémico
Linfadenomegalia, Processo tumoral compatível
32 Canídeo Fêmea anorexia e atrofia Neoplasia com linfoma. Insuficiência Não
muscular multiorgânica
Hemorragia pulmonar e Histopatologia,
Ansioso aquando
33 Canídeo Macho Morte Iatrogénica gastrorragia; Insuficiência Toxicologia,
do corte de unhas
respiratória Virologia
Sugestivo de edema pulmonar
Toxicologia,
34 Canídeo Fêmea Morte súbita Sem dados cardiogénico. Insuficiência
Virologia
respiratória
Congestão generalizada,
edema pulmonar,
Taquipneia e
35 Canídeo macho Sem dados hepatosplenomegalia, Não
cianose
compatível com golpe de
calor. HEVE
Neoplasia óssea do MAE,
Lesão nodular gastroenterite hemorrágica,
36 F Canídeo Fêmea Maus tratos Bacteriologia
MAE osteomielite. Possível choque
séptico.
Ataxia,
Histopatologia,
hipermetria, Poliencefalomalácia, Inconclusivo, alterações
37 Cordeiro Macho Neuropatologia,
opistótonos, Listeriose posturais, edema subcutâneo
Bacteriologia
défices visuais
Anemia,
trombocitopenia, Hepatose, EP, HCVE, DRC.
38 Felídeo Macho Sem dados Histopatologia
emêse, diarreia, Insuficiência Multiorgânica.
anorexia há 1 dia
Alterações
Traumatismo Medular,
Neurológicas,
39 Felídeo Macho Sem dados retenção urinária. Hepatite Não
paralisia bilateral
Multifocal, HCVE.
do 1/3 posterior
Litíase vesical e Enterite fibrinopurulenta.
40 Felídeo (J) Macho Sem dados Virologia
ascite Ascite.
Ileíte Traumática por corpo
41 Felídeo Macho Sem dados Sem dados Virologia
estranho
Enterite fibrinopurulenta. Histopatologia,
42 Felídeo (J) Macho Sem dados Suspeita de CRP/M.felis
Ascite. Virologia
Enterite fibrinopurulenta. Histopatologia,
43 Felídeo Macho Sem dados Sem dados
Ascite. Virologia
Serosite fibrinopurulenta, com
44 Leporídeo Fêmea Sem dados Complicações pós cirurgicas Virologia
aparente relação com a cx
Quadro generalizado de
45 Muntjack Fêmea Sem dados Sem dados congestão. Hemorragia Histopatologia
pulmonar.
254
Abomasite erosiva, duodenite,
46 Muntjack Macho Sem dados Sem dados Histopatologia
hipoproteinemia
255