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conscie nt iza r
PARA INCLUIR
SEXUALIDADE, VIOLÊNCIA E FAMÍLIA
DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR
Sexualidade, Violência e Família da Pessoa
com Deficiência
Berenice Reis Lessa
Presidente da Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência da
OAB/Paraná
(Coordenadora)
COLABORADORES
Integrantes da Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência da
OAB/Paraná
João Paulo Zuchi Fagundes
Luiz Cesar Alencar Ribeiro
Marcos Vinícius Moraes Kleinowski
Melize Oliveira Pontes
Pedro Batista Marques
Solange Teixeira Carrilho Filon
Valéria Mendes Siqueira
E d it o r a
Brasília - DF, 2021
© Ordem dos Advogados do Brasil
Conselho Federal, 2021
Setor de Autarquias Sul - Quadra 5, Lote 1, Bloco M
Brasília - DF CEP: 70070-939
Capa: Felipe Guillermo Costa Navea (Natural de São Paulo - Pessoa com
Síndrome de Down)
Revisão: Maria Christina dos Santos
C755
xx, 215 p.
ISBN: 978-65-5819-014-1.
CDD: 362.4
CDU: 36-056.26
Gestão 2019/2022
Diretoria
Felipe Santa Cruz Presidente
Luiz Viana Queiroz Vice-Presidente
José Alberto Simonetti Secretário-Geral
Ary Raghiant Neto Secretário-Geral Adjunto
José Augusto Araújo deNoronha Diretor-Tesoureiro
Conselheiros Federais
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Andrade Borges e Luiz Viana Queiroz; CE: André Luiz de Souza Costa; Hélio das Chagas Leitão Neto e
Marcelo Mota Gurgel do Amaral; DF: Daniela Rodrigues Teixeira, Francisco Queiroz CaputoNeto e Ticiano
Figueiredo de Oliveira; ES: Jedson Marchesi Maioli, Luciana Mattar Vilela Nemer e Luiz Cláudio Silva
Allemand; GO: Marcello Terto e Silva, Marisvaldo Cortez Amado e Valentina Jungmann Cintra; MA: Ana
Karolina Sousa de Carvalho Nunes, Charles HenriqueMiguez Dias eDaniel Blume Pereirade Almeida; MT:
Felipe Matheus de França Guerra, JoaquimFelipe Spadoni e Ulisses Rabaneda dos Santos; MS: AryRaghiant
Neto, Luís Cláudio Alves Pereira e Wander Medeiros Arena da Costa; MG: Antônio Fabrício de Matos
Gonçalves, BrunoReis de Figueiredo e LucianaDiniz Nepomuceno; PA: AfonsoMarcius Vaz Lobato, Bruno
Menezes Coelhode SouzaeJader Kahwage David; PB: HarrisonAlexandreTargino, OdonBezerraCavalcanti
SobrinhoeRogérioMagnus VarelaGonçalves; PR: AirtonMartins Molina, José AugustoAraújodeNoronhae
Juliano José Breda; PE: Leonardo Accioly da Silva, Ronnie Preuss Duarte e Silvia Márcia Nogueira; PI:
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Robertode SiqueiraCastro, Luiz Gustavo Antônio SilvaBicharaeMarceloFontes Cesar de Oliveira; RN: Ana
Beatriz Ferreira Rebello Presgrave, Artêmio Jorge de Araújo Azevedo e Francisco Canindé Maia; RS: Cléa
Anna Maria Carpi da Rocha, Rafael Braude Canterji e Renato da Costa Figueira; RO: Alex Souza de Moraes
Sarkis, AndreyCavalcante de Carvalho e FrancianyD’Alessandra Dias de Paula; RR: Emerson Luis Delgado
Gomes e Rodolpho César Maia de Morais; SC: Fábio Jeremias de Souza, Paulo Marcondes Brincas e Sandra
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Badaró; SE: Adélia Moreira Pessoa, Maurício Gentil Monteiro e Paulo Raimundo Lima Ralin; TO: Antônio
Pimentel Neto, Denise Rosa SantanaFonsecaeKellenCrystianSoares Pedreirado Vale.
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JunioreJosé Carlos deOliveiraGuimarães Junior; MS: AfeifeMohamadHajj, LuízRenêGonçalves doAmaral
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Gadelha, RodrigoAzevedoToscanodeBritoeWilsonSales Belchior; PR: ArturHumbertoPiancastelli, Flavio
Pansieri e Graciela IurkMarins; PE: Ademar RigueiraNeto, Carlos AntônioHartenFilho e Graciele Pinheiro
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MariaMachado e Stélio Dener de SouzaCruz; SC: José Sérgio da SilvaCristóvam, Sabine Mara Müller Souto
e Tullo Cavallazzi Filho; SP: Alice Bianchini, Daniela Campos Liborioe Fernando Calzade Salles Freire; SE:
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Ex-Presidentes
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Augusto Pinto Lima (1948) 5. Odilon de Andrade (1948/1950) 6. Haroldo Valladão (1950/1952) 7. Attílio
Viváqua (1952/1954) 8. Miguel Seabra Fagundes (1954/1956) 9. Nehemias Gueiros (1956/1958) 10. Alcino
de Paula Salazar (1958/1960) 11. José Eduardo do P. Kelly (1960/1962) 12. Carlos Povina Cavalcanti
(1962/1965) 13. Themístocles M. Ferreira(1965) 14. AlbertoBarretodeMelo (1965/1967) 15. Samuel Vital
Duarte (1967/1969) 16. Laudo de Almeida Camargo (1969/1971) 17. Membro Honorário Vitalício José
Cavalcanti Neves (1971/1973) 18. José Ribeirode Castro Filho (1973/1975) 19. Caio Mário da Silva Pereira
(1975/1977) 20. Raymundo Faoro (1977/1979) 21. Eduardo Seabra Fagundes (1979/1981) 22. Membro
Honorário Vitalício J. Bernardo Cabral (1981/1983) 23. Membro Honorário Vitalício Mário Sérgio Duarte
Garcia(1983/1985) 24. HermannAssis Baeta (1985/1987) 25. MárcioThomazBastos (1987/1989) 26. Ophir
Filgueiras Cavalcante (1989/1991) 27. Membro Honorário Vitalício Marcello Lavenère Machado
(1991/1993) 28. Membro Honorário Vitalício José Roberto Batochio (1993/1995) 29. Membro Honorário
Vitalício Ernando Uchoa Lima (1995/1998) 30. Membro Honorário Vitalício Reginaldo Oscar de Castro
(1998/2001) 31. Rubens ApprobatoMachado(2001/2004) 32. MembroHonorárioVitalícioRobertoAntonio
Busato (2004/2007) 33. Membro Honorário Vitalício Raimundo Cezar Britto Aragão (2007/2010) 34.
MembroHonorário Vitalício Ophir Cavalcante Junior (2010/2013) 35. Membro HonorárioVitalícioMarcus
Vinicius Furtado Coêlho (2013/2016) 36. Membro Honorário Vitalício Claudio Pacheco Prates Lamachia
(2016/2019).
Presidentes Seccionais
AC: Erick Venancio Lima do Nascimento; AL: Nivaldo Barbosa da Silva Junior; AP: Auriney Uchôa de
Brito; AM: Marco Aurélio de Lima Choy (licenciado); Grace Anny Fonseca Benayon Zamperlini (em
exercício: 1°.01.2021 a 31.12.2021); BA: Fabrício de Castro Oliveira; CE: José Erinaldo Dantas Filho; Df :
Delio Fortes Lins e Silva Junior; ES: Jose Carlos Rizk Filho; GO: Lúcio Flávio Siqueira de Paiva; MA:
Thiago Roberto Morais Diaz; MT: Leonardo Pio da Silva Campos; MS: Mansour Elias Karmouche; MG:
RaimundoCandido Junior; PA: AlbertoAntoniode Albuquerque Campos; PB: Paulo Antonio Maiae Silva;
PR: Cassio Lisandro Telles; PE: Bruno de Albuquerque Baptista; PI: Celso Barros Coelho Neto; RJ:
Luciano Bandeira Arantes; RN: Aldode Medeiros Lima Filho; RS: Ricardo Ferreira Breier; RO: EltonJose
Assis; RR: EdnaldoGomes Vidal; SC: Rafael de Assis Horn; SP: Caio Augusto Silva dos Santos; SE: Inácio
José Krauss de Menezes; TO: GedeonBatista Pitaluga Júnior.
Coordenação Nacional das Caixas de Assistências dos Advogados - CONCAD
PedroZanete Alfonsin Coordenador Nacional
Aldenize Magalhães Aufiero Coordenadora CONCADNorte
Andreia de Araújo Silva Coordenadora CONCADNordeste
Itallo Gustavo de Almeida Leite Coordenadora CONCADCentro-Oeste
Luis Ricardo Vasques Davanzo Coordenador CONCADSudeste
Presidentes Caixas de Assistência dos Advogados
AC: Thiago Vinícius Gwozdz Poerch; AL: Ednaldo Maiorano de Lima; AP: Jorge José Anaice da Silva;
AM: Aldenize Magalhães Aufiero; BA: Luiz Augusto R. de Azevedo Coutinho; CE: Luiz Sávio Aguiar
Lima; DF: Eduardo Uchôa Athayde; ES: Aloisio Lira; GO: Rodolfo Otávio da Mota Oliveira; MA: Diego
Carlos Sá dos Santos; MT: Itallo Gustavo de Almeida Leite; MS: José Armando Cerqueira Amado; MG:
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PR: Fabiano Augusto Piazza Baracat; PE: Fernando JardimRibeiro Lins; PI: Andreia de Araújo Silva; RJ:
Ricardo OliveiradeMenezes; RN: Monalissa Dantas Alves da Silva; RS: PedroZanete Alfonsin; RO: Elton
Sadi Fulber; RR: Ronald Rossi Ferreira; SC: Claudia Prudencio; SP: Luis Ricardo Vasques Davanzo; SE:
Hermosa Maria Soares França; TO: Sergio Rodrigo do Vale.
Fundo de Integração e Desenvolvimento Assistencial dos Advogados - FIDA
Felipe Sarmento Cordeiro Presidente
GedeonBatista Pitaluga Júnior Vice-Presidente
Andreia Araújo Silva Secretária Geral
José AugustoAraújodeNoronha RepresentantedaDiretoria
Membros
Alberto Antonio Albuquerque Campos
Aldenize Magalhães Aufiero
Itallo Gustavo de Almeida Leite
Luciana Mattar VilelaNemer
Luis Ricardo Vasques Davanzo
PauloMarcondes Brincas
PedroZanette Alfonsin
Silvia MarciaNogueira
Thiago Roberto Morais Diaz
Afeife Mohamad Hajj
Lucio Flávio Siqueira de Paiva
Monalissa Dantas Alves da Silva
Nivaldo Barbosa da Silva Junior
Raquel Bezerra Cândido
ESA Nacional
Ronnie Preuss Duarte Diretor-Geral
Luis Cláudio Alves Pereira Vice-Diretor
Conselho Consultivo:
Alcimor Aguiar RochaNeto
AurineyUchôa de Brito
Carlos Enrique Arrais Caputo Bastos
Cristina Silvia Alves Lourenço
Delmiro Dantas Campos Neto
GracielaIurkMarins
Henrique de Almeida Ávila
Luciana Christina Guimarães Lóssio
Igor ClemSouza Soares
PauloRaimundo Lima Ralin
Thais Bandeira Oliveira Passos
Diretores (as) das Escolas Superiores de Advocacia da OAB
AC: Renato Augusto Fernandes Cabral Ferreira; AL: Henrique Correia Vasconcellos; AM: Ida Marcia
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PE: Mario Bandeira Guimarães Neto; PI: Aurelio Lobao Lopes; RJ: Sergio Coelho e Silva Pereira; RN:
Daniel Ramos Dantas; RS: Rosângela Maria Herzer dos Santos; RO: Jose Vitor Costa Junior; RR: Caroline
Coelho Cattaneo; SC: Marcus Vinícius Motter Borges; SP: Jorge Cavalcanti Boucinhas Filho; SE: Kleidson
Nascimentodos Santos; TO: Guilherme Augusto Martins Santos.
Presidente Executivo da OAB Editora
José Robertode CastroNeves
AUTORES
PA R TE 1: Artigos Jurídicos
P A R TE 2: Depoimentos
i
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
ii
Dedicamos este livro às pessoas com deficiência,
mães, pais e demais familiares que se mantêm em
constante busca de seus direitos, alcançando vitórias
e sucessos, apesar das adversidades.
iii
AGRADECIMENTOS
v
APRESENTAÇÃO
vii
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
viii
PREFÁCIO
* Presidente da OAB/Paraná.
ix
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
pela colega Valéria Mendes Siqueira, que tem deficiência visual e que se
mostra incansável, persistente e invencível nessa luta.
De fato, há uma distância muito grande ainda entre o que diz a
lei 13.146/2015, a lei básica dos direitos das pessoas com deficiência, e
aquilo que ocorre no cotidiano da nossa sociedade. Pouco do que a lei
preconiza foi concretizado, e no âmbito jurídico, para se ter uma ideia,
ainda lutamos contra as deficiências elementares das plataformas de
processo eletrônico, que são pouco amigáveis para grande parte das
pessoas com deficiência visual.
A acessibilidade, que deve ser entendida num conjunto muito
maior do que a simplista visão de acessibilidade física a determinados
locais, é um desafio que deve ser enfrentado cotidianamente pela
sociedade brasileira, com vistas a incrementar aquilo que é preconizado
pela lei 13.146/2015, isto é, a possibilidade e condição de alcance para
utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários,
equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e
comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros
serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de
uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com
deficiência ou com mobilidade reduzida. Acessibilidade também é o
direito universal ao trabalho digno, à educação, aos desfrutes das
mesmas oportunidades que todas as pessoas têm. Algo que está bem
sintetizado no artigo 53, da Lei, ou seja: o direito que garante à pessoa
com deficiência ou com mobilidade reduzida viver de forma
independente e exercer seus direitos de cidadania e de participação
social.
A presente obra é mais uma das iniciativas pioneiras da nossa
valorosa Comissão dos Direitos das Dessoas com Deficiência, que
procurou organizar, com a contribuição de juristas de várias partes do
País, um livro diferente e atual. Um livro que, novamente, vem com a
missão de conscientizar, uma obra que precisa ser lida especialmente por
aqueles que não têm deficiência alguma, porque observamos nos textos
x
jurídicos e, notadamente, nos relatos das situações pessoais de pessoas
com deficiência, de mães, pais e familiares que com elas convivem,
como, por vezes, simples questões, se revelam grandes percalços na
concretização da dignidade humana.
A obra procura debater temas não comumente analisados na
questão da inclusão das pessoas com deficiência, como sexualidade,
violência e a vida familiar, o que traz também um ineditismo capaz de
instigar reflexões e apontar caminhos, nesses temas.
É de se cumprimentar essa forma de esquematização da obra,
reunindo textos com abordagem técnico jurídico, com relatos de
experiências reais. Ao ler o conjunto dos artigos, somos capazes de
entender porque há necessidade de uma lei de inclusão das pessoas com
deficiência e mais do que isso, porque precisamos, cada um de nós, fazer
também a nossa parte, na busca da igualdade, da quebra das barreiras e
obstáculos, sem esperar apenas dos órgãos governamentais as soluções,
porque, como sempre temos dito, a medida da felicidade de uma nação é
relacionada ao grau de igualdade que ela pratica no seu convívio social
e essa é uma tarefa da sociedade.
Parabéns à Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência
da OAB-PR pela organização dessa fantástica obra. O agradecimento
também a todos o(a)s juristas que forneceram seus artigos, fruto de
laboriosos e qualificados estudos e àqueles que deram seus depoimentos
pessoais. B oa leitura.
xi
INTRODUÇÃO
xiii
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
xiv
lhes são garantidos. Neste sentido, este livro foi idealizado, especialmente,
para ajudar ao leitor. Os exemplos de vida trazidos nos depoimentos, levam
a acreditar que, apesar das adversidades, existem meios e soluções para se
buscar a qualidade de vida, a igualdade de oportunidades e, à medida do
possível, enfrentar os desafios que lhe são propostos, podendo até alcançar
o sucesso. Por que não?
Finalmente, tivemos a intenção de proporcionar ao leitor,
uma interessante leitura, além de atingi-lo sentimentalmente, com
lições de vida, de amor maternal, de determinação, de garra para
vencer os obstáculos, através de uma abordagem verdadeira, simples
e impactante que nos emociona e envolve nos relatos daqueles que
tiveram a coragem de se mostrar, através de suas histórias de vida,
aqui registradas. Boa leitura.
xv
SUMÁRIO
xvii
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
1 Sexualidade............................................................................................133
xviii
2 Violência.................................................................................................147
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
xx
PARTE 1
Artigos Jurídicos
1 IMPORTÂNCIA DE UM MINISTRO PESSOA COM
DEFICIÊNCIA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL*
3
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
4
Fora da Lei não há solução pacífica para nada nesta vida, ainda que
nobres sejam os consideranda com os quais se empenhe o intérprete para
fazer valer os seus valores, e não os valores constitucionalizados. Para
uma reflexão generalista dos postulados primevos da sociedade a que o
magistrado está a serviço, cumpre ter a sobranceira humildade científica
de compreender que cabe ao poder constituinte - originário e derivado -
e também ao Poder Legislativo proceder, consoante a dinâmica de seus
funcionamentos político-jurídicos (clássicos). De fato, o juiz não é um
legislador e a consciência técnica que o forja como operador do sistema
jurídico é que se lhe aperfeiçoa a dignidade da própria função e o
conserva, sobranceiro, na própria atividade jurisdicional como elemento
integrante da engrenagem do Estado de Direito. Esse perfil confere ao
Magistrado plena legitimidade de ação, motivo pelo qual, dentro dessas
balizas lógicas, priva de faculdades formidáveis para produzir decisões
livres, calcadas na racionalidade do próprio sistema jurídico
(independência funcional).
Adicionalmente, mas não menos importante, cumpre destacar
uma singularidade que compõe a agenda política da Nação brasileira desde
o advento da mencionada Convenção sobre os Direitos das Pessoas com
Deficiência, sob os auspícios da ONU, assinada pelo Brasil em Nova
Iorque e mais tarde internalizada com status de Emenda Constitucional,
de acordo com a fórmula do art. 5°, § 3°, da Constituição Federal.
Sobre isto, parece claro que a deficiência, embora presente em
H da população brasileira (IBGE 2010), não marca critério algum
aferidor de atributos, competências e habilidades, sobretudo para fins de
inserção ou reabilitação em algum posto mais ou menos importante,
social e politicamente falando, caso de uma até agora inédita investidura
em cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal. Por que não?
A propósito, com ou sem deficiência, a pessoa dispõe de
múltiplos talentos, virtudes, habilidades e competências não
necessariamente associados às limitações humanas, sejam elas físicas,
psicossociais, sensoriais, intelectuais, mesmo múltiplas ou de qualquer
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
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acima, ao patamar de V da população nacional, algo em torno de 47
milhões de brasileiros. Some-se a eles o enorme contingente de seus
parentes, cônjuges, simpatizantes e militantes do campo dos direitos
humanos que se terá uma noção dessa massa de interessados em soluções
juridicamente adequadas, e em última instância, para esse segmento nada
desprezível do povo. Na Suprema Corte, um magistrado com essa
envergadura faria um contraponto formidável à densificação de todo esse
universo normativo, sem prejuízo das demais rotinas que o estariam a
aguardar no desate de suas funções de competência jurisdicional próprias.
Parecem fartas as vantagens sociais, políticas, filosóficas e institucionais
pelas quais um ministro pessoa com deficiência viesse a ser alçado aos
quadros da Suprema Corte do Brasil.
Realmente, vencidas as barreiras de gênero e étnicas, cumpre à
Nação brasileira, agora, vencer, também e principalmente, a barreira de
atitude que envolve o pressuposto de que todo aquele que tiver algum tipo
de limitação física, psicossocial, intelectual, sensorial ou múltipla deve ser
tratado como "peso social" e não se admite que exercite qualquer
protagonismo digno de nota e de transformação da própria sociedade. Ao
par do descalabro que essa cultura silenciosa de exclusão suscita, convém
esclarecer que os talentos adormecidos de tão farta parcela da população
brasileira precisam despertar, também em face da especial simbologia que
será o advento de um ministro pessoa com deficiência ao Supremo
Tribunal Federal que, naturalmente, reúna todos os predicados
constitucionais para assumir tão elevado posto da República.
Seria como que um primeiro passo concreto à inserção proativa
desse contingente social nos negócios de Estado para estimular novas
conquistas até à completa igualdade social. Ora, em toda a história da
Suprema Corte brasileira, jam ais foi incorporado em seus quadros
alguém com algum tipo de limitação tecnicamente definida como tal.
Aliás, em nenhum momento da história do Poder Judiciário nacional,
Tribunal algum até muito pouco tempo atrás incluiu a reserva de vagas
para ingresso nas carreiras da Magistratura, a despeito do comando
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
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simbólico e dando mostras de que somos capazes, o bloqueio cultural que
deriva das diversas formas de atitudes preconcebidas tende a reciclar-se
na direção de sua eliminação. Um país grandioso não pode conviver com
o preconceito por muito tempo, pois esse quadro é autofágico.
A construção jurídica adequada sobre os novos paradigmas que
já estão constitucionalizados no Brasil contribuirá para a emancipação
social de muita gente que aspira, com ansiedade tardinheira, por ser
reconhecida como protagonista do seu tempo, e não como mero
contingente humano, subjugado e pesaroso.
Querendo viver sem tutelas externas e internas, quer sejam
corporativas, sociais, afetivas ou institucionais - e disso têm todo o direito -
as pessoas com deficiência no Brasil pedem passagem, enquanto cidadãs,
em direção ao futuro. Para isso, reclamam espaço, respeito e liberdade real
para que possam, juntamente com todas as demais pessoas, realizar-se
plenamente em seus direitos e em sua cidadania. Sobretudo, pretende-se
vencer, talvez, a mais perversa de todas as barreiras: o preconceito!
É chegada a hora de quebrá-lo de um modo particularmente
emblemático e eloquente.
Devemos todos estar prontos e preferencialmente unidos para
enfrentar mais esse desafio: a indicação, afinal, de um ministro com
deficiência para o Supremo Tribunal Federal, dado que a solução não
encontra conjuntura que seja desfavorável e que, pela postergação de
décadas, realmente, não tem mais e porque aguardar. Trata-se de uma
questão de Justiça e de vida intergrupal e plenamente participativa. Outra
inferência pressupõe a conservação de privilégios que já vêm compondo
a pauta da crítica social hodierna, sempre baseada em recorrente
desconhecimento de causa ou na obtusidade dos agentes públicos e
daqueles que atuam na iniciativa privada.
Outrossim, ganhamos todos os de boa vontade com a ascensão
de um representante das pessoas com deficiência conquanto jamais
presentes na Suprema Corte, um órgão essencial para os seus destinos e
aspirações legais para todos.
9
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
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direito delas, enquanto persistirem as condições de desigualdade que
marcam o perfil de países periféricos como o Brasil.
R E F E R Ê N C IA S
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
12
2 DESIGN ACESSÍVEL E O EMPREGO DA TECNOLOGIA
ASSISTIVA
1 INTRODUÇÃO
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
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concernentes às pessoas com deficiência. São eles: a Constituição da
República Federativa do Brasil; a Convenção sobre os Direitos da Pessoa
com Deficiência - Convenção da ONU e seu Protocolo Facultativo; a Lei
Brasileira de Inclusão - Estatuto da Pessoa com Deficiência.
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
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Governo, como as instituições públicas e privadas e a sociedade em
geral, como partes integrantes das estratégias para a efetivação do
desenvolvimento sustentável.
Isto faz refletir que, diferentemente do modelo de integração,
como assegurado na Constituição, a responsabilidade para viabilizar a
inclusão, passou a ser compartilhada. De acordo com afirmação de
Amélia HAMZE (2020):
3 D ESIG N A C E S S ÍV E L E A IN C LU SÃ O SO C IA L
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
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corpo, ou seja, braços, mãos, dedos, botas ortopédicas, etc., muitas vezes
fixadas por talas, garantindo-lhe um melhor posicionamento, estabilização
e/ou função. São normalmente confeccionadas sob medida e servem no
auxílio de mobilidade, de funções manuais (escrita, digitação, utilização de
talheres, manejo de objetos para higiene pessoal), correção postural, entre
outros (BERSCH, 2020).
19
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
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inclusão das pessoas com deficiência e com mobilidade reduzida, na
forma do que se entende no inciso II do artigo 2° da LBI:
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
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participação autônoma no desafio educacional, visando sempre chegar
ao objetivo educacional proposto?” (BERSCH, 2020).
Pergunte-se aí, PARA QUE? Ou, o recurso se presta a atender
a sua necessidade pessoal específica? “ Sem este recurso o aluno estaria
em desvantagem ou excluído de participação?” (BERSCH, 2020).
Pergunte-se, O QUE? Ou, no quê o recurso pode servir de
auxílio ao usuário?
23
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
6 CO N CLU SÃ O
24
R E F E R Ê N C IA S
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
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3 A IMPLEMENTAÇÃO DA IGUALDADE SOCIAL PARA A
PESSOA COM DEFICIÊNCIA
1 INTRODUÇÃO
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
28
O que tal circunstância revela que a percepção do indivíduo a
partir do grupo a que se sente pertencente corrobora para a formação de
identidade própria dele. Ao passo em que, tal percepção deve se
apresentar de forma verdadeira, sob pena de interferir negativamente ou
erroneamente na composição da identidade do indivíduo.
Na lição de Nobert Elias (1994), não é possível pensar sujeito e
sociedade como entidades ontologicamente diferentes. O ser humano
singular não deriva da condição de isolamento, bem como a sociedade não
se estabelece como mera acumulação desestruturada de pessoas. Existe uma
relação entre as pessoas que formam a sociedade, a qual possibilita
transformações específicas na coletividade e, ao mesmo tempo, influência
nos padrões de autorregulação que o sujeito estabelece dentro de si.
Esses aspectos são importantes na medida em que o indivíduo,
especificamente a pessoa com deficiência física ou intelectual, forma sua
identidade numa parte desde si mesmo e noutra, desde a sociedade a que
pertence. Portanto, o que importa verificar é se a sociedade identifica o
indivíduo como capaz e competente, agindo de modo a integrá-lo ao seu
âmbito, ou se o identifica como inferiorizado, afastando-o da vida social
plena e interferindo negativamente para a formação de sua identidade.
Isso é relevante pois as interferências externas derivadas do
grupo a que o indivíduo se projeta, buscando e revelando o desejo de
pertencimento, contribuem para a formação da autoidentidade desse
indivíduo, o qual passa a ser ver desde o olhar da sociedade, como
resultado reflexo da dupla formação identitária.
Ressalte-se que, a concreção de um conceito inferiorizado e
reduzido de si mesmo pelo indivíduo pode incapacitá-lo para desafios e
medidas de melhoria em sua vida particular e social. Pois, ao se
identificar como incapaz, a partir de opiniões externas limitantes de suas
habilidades, o conceito individual sobre si mesmo sofre máculas
reiteradas, gerando danos à autoestima, podendo se tornar indivíduo
apático e autodestrutivo. (TAYLOR, 1994, p. 45).
29
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
3 DO P R O C E SSO L E G A L DE FO RM A ÇÃ O DA IDENTIDADE
30
Assim, o Imperial Instituto dos Meninos1 Cegos2 foi a primeira
instituição voltada à educação dos meninos com deficiência visual, na
segunda metade do século XIX. (LEÃO. 2019)
Apesar da aparente evolução, esse processo repercutiu na
proibição de que os surdos utilizassem a língua de sinais para se
comunicarem entre si, o que denota a hegemonia excludente dos falantes
e a não aceitação por eles de uma minoria de pessoas com deficiência
31
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
3 “Até a metade do século XIX, a deficiência Intelectual era considerada uma forma de
loucura e era tratada em hospícios. Durante a República, iniciaram-se as investigações
sobre a etiologia da deficiência intelectual, sendo que os primeiros estudos realizados
no Brasil datam do começo do século XX .” (LANNA JÚNIOR, 2020, p. 23).
4 MAIOR, Izabel, p. 01.
5 “A monografia sobre educação e tratamento médico pedagógico dos idiotas, do
médico Carlos Eiras de 1900, é o primeiro trabalho científico sobre a deficiência
32
Só em meados finais do século XX, como reflexo dos movimentos
de minorias em outros países ocidentais, o Brasil apresentou políticas
assistencialistas, contudo, ainda sem cotejo da inclusão social, tema que só
recentemente veio à baila no contexto jurídico-político do país.
A situação de “ segregação” silenciosa bem como a evidente
ausência do Estado no trato das questões de educação e de inclusão social,
somada ao estopim em países ocidentais de lutas de minorias, fizeram com
que, no Brasil, culminasse o movimento político das pessoas com
deficiência, na década de 70 do século passado. (2020, p. 33-34).
Lanna Júnior (2020, p. 33-34) descreve esse momento nos
seguintes termos:
33
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
34
Defesa das Pessoas Portadoras de Deficiência (MDPD) e
a Associação Nacional dos Ostomizados, e contou com
32.899 assinaturas. A proposta continha 14 artigos
sugerindo alterações no projeto da Constituição, onde
coubessem temas como igualdade de direitos,
discriminação, acessibilidade, trabalho, prevenção de
deficiências, habilitação e reabilitação, direito à
informação, educação básica e profissionalizante.
35
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
4 C O N S ID E R A Ç Õ E S F IN A IS
36
reflexiva direta, segundo a qual, “ o homem se identifica reflexivamente
em seu semelhante, ao passo em que se submeteria à m esm a decisão de
forma direta e imediata” . (CARVALH O , 2020, p. 156).
A decisão, normativa ou em concreto, deve ser ju sta segunda a
lógica do decisor e do destinatário da norma, de modo a viabilizar a paz
social em maior âmbito e garantir maior eficácia à decisão.
Destarte, importa ressaltar que decisões que buscam igualdade
social para minorias devem ser fiscalizadas e implementadas pelo Estado
em maior grau enquanto tais medidas ainda não integram a cultura da
sociedade a que aquele grupo minoritário se destina. “ Isso porque as
matérias de proteção de direitos fundamentais de minorias, exigem, por
sua própria natureza, uma atuação contramajoritária em nome da
preservação da igualdade reflexiva direta” . (CARVALHO, 2020, p. 176).
Parte da doutrina, inclusive, compreende que no âmbito do
Direito Administrativo, a luta por uma repartição isonômica, e não
igualitária, dos interesses e recursos constituiria o que vem se
convencionando denominar “ direito administrativo inclusivo” . Trata-se
de ramo que atua em favor de uma discriminação positiva (M ACERA,
2016), a qual promove direitos àqueles que se apresentam como mais
vulneráveis como, por exemplo, as pessoas com deficiência e a sua
recente inclusão nas políticas de cotas no Brasil.
Por todo o exposto, resta demonstrado o movimento político
social por igualdade implementado pelas pessoas com deficiência, desde
o total esquecimento pelo Estado até o reconhecimento da om issão e a
tentativa de reinclusão social por meio de legislação específica.
O processo aqui rapidamente evidenciado é longo e ainda
perdurará visto que a eficácia da decisão político legislativa ainda não é
uma realidade inclusiva por toda a sociedade brasileira. Por fim, o texto
milita no sentido de que, o debate e a luta ainda são imperiosos para fins
da necessária alteração da realidade social.
37
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R E F E R Ê N C IA S
38
Lanna Júnior, M ário Cléber Martins (Comp.). H istória do M ovim ento
Político das P essoas com D eficiência no B rasil. - Brasília: Secretaria
de Direitos Humanos. Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da
Pessoa com Deficiência, 2010. 443p. Disponível em:
https://files.cercomp.ufg.br/weby/up/211/o/Hist%C3%B3ria_do_Movi
mento_Pol% C3% ADtico_das_Pessoas_com _Defici% C3% AAncia_no_
Brasil.pdf?1473201976. A cesso em: 22 set. 2020.
39
4 MULHERES SUBMETIDAS À MASTECTOMIA E A LEI
N° 1 3 .1 4 6 /2 0 1 5
1 IN T R O D U Ç Ã O
41
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2 A PESSO A COM D E F IC IÊ N C IA E A A V A L IA Ç Ã O
B IO P S IC O S S O C IA L
42
participação. Em outros termos, essa avaliação há de levar em conta o
contexto social, além das condições físicas, psicológicas e os fatores
ambientais em que a pessoa está inserida.
Apesar disso, esse modelo referencial específico ainda não existe,
uma vez que o art. 2°, da LBI, que prevê a sua criação, não foi
regulamentado. Diante dessa lacuna, órgãos ou equipamentos públicos
responsáveis pelas políticas afirmativas vinham utilizando processos,
parâmetros e instrumentos diferenciados, muitas vezes resultando na
impossibilidade de acesso de pessoa com deficiência a políticas afirmativas.
Ao tomar como exemplo o Benefício de Prestação Continuada
(BPC )3, inserido no contexto constitucional da Seguridade Social como
parte da Assistência Social, observa-se que “ (...) sua administração e
operacionalização foram delegadas ao Instituto Nacional do Seguro
Social (IN SS), entidade que tem como principal finalidade administrar
os direitos previdenciários e não os assistenciais” (SIL V A e DINIZ,
2012, p. 262). A Portaria Conjunta M D S/IN SS n° 2, de 30 de março de
2015, baseando-se - inclusive - na CDPD, dispõe sobre critérios,
procedimentos e instrumentos para a avaliação social4 e médica5 da
pessoa com deficiência, realizada por integrantes do quadro do Instituto
Nacional da Seguridade Social (IN SS). Contudo, ainda não há a previsão
de psicólogo e de outros profissionais na composição dessa equipe.
43
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
6 Esse Comitê foi composto por integrantes do Poder Público Federal e do Conselho
Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência - CONADE.
7 O IFBr-M avalia o domínio da aprendizagem e aplicação de conhecimento;
comunicação; mobilidade; cuidados pessoais; vida doméstica; educação, trabalho e
vida econômica; e relações e interações interpessoais, vida comunitária, social, cultural
e política. (BRASIL, 2019).
44
3 A M U L H E R S U B M E T ID A À M A S T E C T O M IA P O D E S E R
C O N SID E R A D A P E S S O A C O M D E F IC IÊ N C IA ?
45
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
46
especificidades nas áreas de educação, assistência social,
comunicação, cultura e lazer, trabalho e previdência social,
habitação, além de estabelecer isenções e incentivos
fiscais, direitos civis e ações de combate ao preconceito, e
mecanismos de políticas públicas e defesa de direitos (...).
(SANTOS e REZENDE, 2017, p. 30).
4 JU R IS P R U D Ê N C IA P E R T IN E N T E
47
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
48
REQUISITOS. PREENCHIMENTO. 1. Demonstrado, por
laudo pericial judicial, que a parte autora apresenta
comprometimento da função física (redução acentuada da força
motora do membro superior direito, em razão de mastectomia
radial D), que a impede de dirigir veículo comum, faz jus ao
benefício pretendido, uma vez que se encontram preenchidos
os requisitos previstos na Lei n° 8.989/95. 2. Sentença mantida.
(TRF4, APELREEX 5002923-66.2014.4.04.7115,
SEGUNDA TURMA, Relatora CLÁUDIA MARIA
DADICO, juntado aos autos em 10/07/2015).
49
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
5 C O N S ID E R A Ç Õ E S F IN A IS
R E F E R Ê N C IA S
50
B R A SIL . Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada
em 5 de outubro de 1988. In: V ade M ecum . 17. ed. rev. ampl. atual. São
Paulo: RT, 2020.
51
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
52
M ANOROV, M araisa et al. Após a mastectomia, o que esperar da vida
pessoal, familiar e profissional? E nferm agem B rasil, v. 18, n. 3, p. 321
329, 2019. Disponível em: http://dx.doi.org/10.33233/eb.v18i3.1381.
A cesso em: 23 ago. 2020.
53
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
54
5 TRATADO DE MARRAQUECHE: p ro m o ção da
ac e ssib ilid a d e à s o b ra s lite rá ria s p e la s P e sso a s com
D eficiência no B rasil
1 IN T R O D U Ç Ã O
55
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2 O R IG E N S E IN S T R U M E N T A L IZ A Ç Ã O DO T R A T A D O D E
M A R R A Q U E C H E NO B R A S IL
56
São bens culturais as obras literárias, artísticas e científicas, mas
o acesso a eles pelas pessoas com deficiência sempre foi precário, basta
realizar uma breve análise comparativa para identificar que a quantidade
de obras literárias acessíveis é muito menor em comparação a todo o
conjunto disponibilizado sem acessibilidade.
Apesar de nas últimas décadas ter se dispensado, tanto no
âmbito nacional quanto internacional, atendimento mais humanizado em
prol das pessoas com deficiência, é importante ressaltar que somente
entre as décadas de 1960 e de 1970 é que foi sendo contraposto “ [....] o
estado de segregação que lhes era imposto e reclamado o direito à
convivência social” (FRA N ÇA ; PAG LIUCA , 2009).
N o concernente a legislação internacional, em 28 de junho de
2013 ocorreu a celebração do Tratado de Marraqueche no contexto da
Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), decorrente da
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e do seu
Protocolo Facultativo1, os quais objetivaram “tornar efetivos os direitos
das pessoas com deficiência” (FERR EIRA ; O LIVEIRA, 2007), vez que
estes enfrentam “ [...] obstáculos físicos e sociais que os impede de:
receber educação total; exercer empregos com dignidade, mesmo
ostentando qualificações; ter acesso à informação e à saúde; de usufruir
a liberdade de ir e vir; interagir com o meio social e por ele ser aceitos”
(FERREIRA ; O LIVEIRA, 2007).
Em 30 de agosto de 2020, a Convenção sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência alcançava 177 membros (ONU, 2020) e o
Tratado de Marraqueche havia 71 Partes Contratantes (WIPO, 2020).
Todos os países que ratificaram os documentos mencionados
anteriormente, inclusive o Brasil, assumiram o “ [...] compromisso de
respeitar as pessoas com deficiência não mais em razão da legislação
57
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3 T R A T A D O D E M A R R A Q U E C H E E SU A S R E L A Ç Õ E S C O M
O S IS T E M A DE PROTEÇÃO DA P R O P R IE D A D E
IN T E L E C T U A L B R A S IL E IR O
58
uma “barreira excessiva ou discriminatória ao acesso de pessoas com
deficiência a bens culturais” (WACHOWICZ; M ED EIRO S, 2014).
Portanto, existe a perspectiva da solidariedade, justamente
porque tutela direitos humanos.
A solidariedade também é destacada na esfera internacional
pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência com
reconhecimento da “ [...] dificuldade que há na efetivação dos direitos
humanos e das liberdades fundamentais às pessoas com deficiência, e,
assim, estabelece meios de promover, proteger e assegurar o exercício
pleno e equitativo destes direitos” (WACHOW ICZ; M ED EIRO S, 2014).
Dados da Organização Mundial de Saúde (OM S) apontam que
em 2019 “ globalmente, pelo menos 2,2 bilhões de pessoas têm
deficiência visual” sendo que destes, “ 1 bilhão de pessoas inclui aqueles
com deficiência da visão à distância moderada ou severa ou cegueira[...]”
(WHO, 2019), mas constata-se a existência de muitos outros tipos de
deficiências que podem dificultar ou impossibilitar o acesso à leitura.
Sobre direito autoral e tutela das obras literárias, Ascenção
(1997) realça que não é um direito ilimitado ou absoluto, pois
circundado por normas positivas ou negativas limitadoras, que são
fundamentadas em outros direitos, tais como, direito ao acesso à
cultura, à educação, à informação.
Observam M arcos Wachowicz e Heloísa M edeiros (2014) que
é por não existir um direito absoluto que é comum encontrarmos “ [...]
nas legislações internacional e nacionais dispositivos legais que visam
não apenas garantir direitos aos titulares de direitos de propriedade
intelectual, m as também a previsão de direitos à sociedade, que deve
suportar o ônus de tornar um bem público em bem privado”
(WACHOWICZ; M ED EIRO S, 2014).
O Tratado de M arraqueche é um a destas legislações que
enaltecem a sociedade e promove lim itação e isenções ao direito do
autor, como também, propicia trocas fronteiriças de cópias em
formato acessível.
59
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
60
Desta forma, nota-se que o Estatuto da Pessoa com Deficiência
é uma legislação que avança, pois estabelece limitações aos direitos do
autor para a produção de livros acessíveis não somente para cegos, mas
para todas as pessoas com deficiência, ou seja, para toda pessoa que
tenha “ [...] impedimento de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras,
pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade
de condições com as demais pessoas.” 4
No entanto, a Lei n° 13.146/2015 alcança somente a
territorialidade brasileira, diferentemente do TM que passa a solucionar
questões entre os países com partes contratantes do tratado.
A respeito dos beneficiários, a norma internacional sob análise
indica no artigo 3° que compreenderá a toda pessoa:
a) cega;
b) que tenha deficiência visual ou outra deficiência de
percepção ou de leitura que não possa ser corrigida para se
obter uma acuidade visual substancialmente equivalente à de
uma pessoa que não tenha esse tipo de deficiência ou
dificuldade, e para quem é impossível ler material impresso
de uma forma substancialmente equivalente à de uma pessoa
sem deficiência ou dificuldade; e ainda,
c) que esteja impossibilitada, de qualquer outra maneira,
devido a uma deficiência física, de sustentar ou manipular
um livro, focar ou mover os olhos da forma que normalmente
seria apropriado para a leitura, independente de quaisquer
outras deficiências.
61
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
62
4 C O N S ID E R A Ç Õ E S F IN A IS
63
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
R E F E R Ê N C IA S
64
A SSO C IA Ç Ã O B R A SIL E IR A D E PRO PRIED A D E IN TE LEC T U A L -
APBI, 2020. T ratad o de M arraquech e: webinar discute acessibilidade
às obras intelectuais. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?
v=FCRqEaKflW s. A cesso em: 20 ago. 2020.
FRA NÇA, Inacia Sátiro Xavier de; PAGLIUCA, Lorita Marlena Freitag.
Inclusão social da pessoa com deficiência: conquistas, desafios e
implicações para a enfermagem. R evista da E scola de Enferm agem da
U SP, v. 43, n. 1, p. 178-
65
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
O RG ANIZAÇÕ ES D A S N A Ç Õ ES U N ID A S (ONU). A O NU e as
pessoas com deficiência. Disponível em: https://nacoesunidas.org/acao
/pessoas-com-deficiencia/. A cesso em 03 set. 2020.
66
https://www.bad.pt/publicacoes/index.php/cadernos/article/view/1587>.
A cesso em 21 ago.2020.
67
6 PLANOS DE SAÚDE E INTERNAÇÃO DOMICILIAR
PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
1 IN T R O D U Ç Ã O
2 P L A N O S D E SA Ú D E E IN T E R N A Ç Ã O D O M IC IL IA R
69
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
70
Importante ressaltar que o serviço de internação domiciliar vem
inclusive regulamentado pelo Conselho Federal de Medicina, por meio
da Resolução n° 1.668/2003, a qual, “ dispõe sobre normas técnicas
necessárias à assistência domiciliar de paciente, definindo as
responsabilidades do médico, hospital, empresas públicas e privadas; e
a interface multiprofissionalneste tipo de assistência” . Assim, a negativa
com fundamento de que o atendimento poderia ser feito pelos próprios
familiares não é motivo para o indeferimento do pedido.
Embora sejam vários os motivos apontados pelos Planos de
Saúde para negar a internação domiciliar, nenhuma delas prospera diante
da possibilidade de ser este o tratamento mais adequado ao(à) paciente.
3 IN T E R N A Ç Ã O D O M IC IL IA R DA P ESSO A COM
D E F IC IÊ N C IA
71
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
72
deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de
cobertura definidas no plano-referência de que trata o art.
10, segundo as seguintes exigências mínimas: (...) II -
quando incluir internação hospitalar: (...) c) cobertura de
despesas referentes a honorários médicos, serviços gerais
de enfermagem e alimentação; (...) d) cobertura de exames
complementares indispensáveis para o controle da
evolução da doença e elucidação diagnostica,
fornecimento de medicamentos, anestésicos, gases
medicinais, transfusões e sessões de quimioterapia e
radioterapia, conforme prescrição do médico assistente,
realizados ou ministrados durante o período de internação
hospitalar; e) cobertura de toda e qualquer taxa, incluindo
materiais utilizados, assim como da remoção do paciente,
comprovadamente necessária, para outro estabelecimento
hospitalar, dentro dos limites de abrangência geográfica
previstos no contrato, em território brasileiro; e (...) g)
cobertura para tratamentos antineoplásicos ambulatoriais e
domiciliares de uso oral, procedimentos radioterápicos
para tratamento de câncer e hemoterapia, na qualidade de
procedimentos cuja necessidade esteja relacionada à
continuidade da assistência prestada em âmbito de
internação hospitalar.2
2BRASIL. Lei n° 9.656, de 3 de junho de 1998. Dispõe sobre os planos e seguros privados de
assistência à saúde. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9656compila
do.htm. Acesso em: 28 ago. 2020.
3 BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Saúde Suplementar. Resolução
Normativa n° 349, de 9 de maio de 2014. Disponível em:
http://www.lex.com.br/legis_25508487_RESOLUCAO_NORMATIVA_N_349_DE_
9_DE_MAIO_DE_2014.aspx#:~:text=Altera%20a%20Resolu%C3%A7%C3%A3o%
20Normativa%20%2D%20RN,a%20Lei%20n%C2%BA%2012.880%2C%20de.
Acesso em: 28 ago. 2020.
73
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
74
pelo(a) consumidor(a) e que lhe garante determinado tratamento, porque
na contratação já tinha conhecimento da deficiência4.
Assim, ao ser surpreendido com uma doença ou deficiência, o
consumidor que tiver interesse em contratar um plano de saúde não estará
descoberto, bem como não poderá ser impedido de realizar este contrato.
75
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
76
Amparado o direito pela Lei n° 9.656/1998, não prospera a
negativa do plano de saúde no atendimento da criança com deficiência que
necessite de internação domiciliar, mesmo em caso de recém-nascido.
77
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
78
Ipe-saúde. Atendimento de enfermagem domiciliar 24 horas.
Home care. Antecipação de tutela. A tutela antecipada pode
ser revogada ou modificada a qualquer tempo. Art. 273, § 4°,
do cpc. Não provada a alteração das circunstâncias de fato que
levaram ao deferimento, em parte, da tutela antecipada, é de
ser mantida a decisão que deixou de reapreciar o pedido.
Negado seguimento ao recurso8.
4 C O N C L U SÃ O
ia/843218407/agravo-de-instrumento-ai-10007151820188110000-mt?ref=serp>.
Acesso em: 28 ago. 2020.
8TJ-RS - AI: 70064255441 RS, Relator: Maria Isabel de Azevedo Souza, Data de Julgamento:
08/04/2015, Vigésima Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: Diário
da Justiça do dia 13/04/2015. Disponível em: <https://tjrs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/18
0692359/agravo-de-instrumento-ai-70064255441-rs?ref=serp>. Acesso em 28 ago. 2020.
79
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
80
somente a letra de lei, mas, principalmente, assegurar a concretização
dos direitos das pessoas com deficiência que necessitam de saúde e vida
digna, a serem garantidas pelo Plano de Saúde contratado.
R E F E R Ê N C IA S
81
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
82
7 A EXCEPCIONALIDADE DE AULAS ON-LINE PARA
CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM DEFICIÊNCIA
DURANTE O ISOLAMENTO SOCIAL
1 IN T R O D U Ç Ã O
83
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
2 A C R IA N Ç A E O A D O L E S C E N T E C O M D E F IC IÊ N C IA E O
D IR E IT O À E D U C A Ç Ã O
84
ao instituir normas sobre o direito à educação. A Lei de Diretrizes e
B ases da Educação (L D B ) - Lei n° 9.394/1996 - prevê que o direito à
educação seja efetivado aos alunos com deficiência, bem como aos que
apresentam transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades/superdotação, inseridos na educação especial, incluídos em
classes comuns. Todavia, o aluno que, em função de suas condições
específicas, não possa ser integrado em classes comuns, deve receber
atendimento educacional em classes, escolas ou serviços especializados.
N o que tange à regulamentação do uso da rede mundial de
computadores, o Marco Civil da Internet - Lei n° 12.965/2014 - prevê o
reconhecimento do acesso ao ciberespaço como essencial ao exercício
da cidadania. Ainda, entre os direitos assegurados ressalta-se, aqui, a
acessibilidade, devendo-se considerar as características físico-motoras,
perceptivas, sensoriais, intelectuais e mentais do usuário.
Até recentemente, seria inimaginável ministrar aulas remotas
para alunos do 1° ao 9° ano. Todavia as circunstâncias obrigaram a sua
utilização para esse fim, como se verá na sequência.
85
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
86
mobilidade quanto para acessar a informação” . Anteriormente o Comitê
de Ajudas técnicas (CAT) - instituído pela Portaria n. 142/2006,
estabelecido pelo Decreto n° 5.296/2004, no âmbito da Secretaria
Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República -
conceituou TA como segue:
4 A L U N O S M A T R IC U L A D O S NA E D U C A Ç Ã O E S P E C IA L NO
B R A S IL E NO PA R A N Á
87
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
ETAPA DE ENSINO
Total Educ. inf. Ens. fund. Ens. mcd. Prof. ( on /sut). EJA
88
Observa-se que especificamente no tocante aos alunos com
idades compreendidas entre quatro e dezessete anos, incluídos em
classes comuns, ocorreu o aumento de 88,4% em 2015 para 90,9% em
2017 e 92,8% em 2019.
89
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
5 C O N S ID E R A Ç Õ E S FIN A IS
90
a garantir o direito a educação para essa população mais vulnerável.
N esse contexto, o ensino para estudantes com deficiência demandou uma
estrutura com adaptações, possibilidades de acesso e adequações
metodológicas, além da anteriormente oferecida no ambiente escolar.
A s aulas remotas, em que a tela está como interface do ensino e
aprendizagem, sem a interação presencial do professor, exigiram
empenho alteroso das equipes pedagógicas e a interação humana
mediada exclusivamente pelas fam ílias ou responsáveis. Estes, por sua
vez, desempenham papel de alta relevância tanto para que processo de
aprendizagem fosse eficaz - na medida do possível - quanto para
minimizar os riscos decorrentes da complexidade desta modalidade de
ensino, especialmente para alunos com deficiência física, motora,
sensorial e intelectual.
N ão obstante o fato de o ensino a distância ter sido a alternativa
possível para minimizar os efeitos do isolamento social na trajetória
escolar, não resta dúvida de que geraram prejuízos, que - sugere-se -
sejam objeto de estudos futuros.
R E F E R Ê N C IA S
91
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Fam ília d a P essoa com Deficiência
92
_________. M IN ISTÉRIO D A ED UCAÇÃ O . E du cação e C oronavírus.
C N E aprova diretrizes para escolas durante a pandemia. 28 de abril de
2020. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/component/content/arti
cle?id=89051>. A cesso em: 12 ago. 2020.
93
8 O ACESSO À JUSTIÇA PELAS PESSOAS COM
DEFICIÊNCIA
1 IN T R O D U Ç Ã O
95
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
3 O D IR E IT O E A JUSTIÇA
96
4 AS DIFICULDADES E A ACESSIBILID ADE NO ACESSO À
JUSTIÇA
97
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
98
os Direitos das Pessoas com Deficiência e os artigos 84 e 85 da LBI.
Mesmo na hipótese de necessitar de curatela, é oportuno destacar que
esta afeta unicamente os atos relacionados aos direitos de natureza
patrimonial e negocial, mas não o direito ao próprio corpo, à sexualidade,
ao matrimônio, à privacidade, à educação, à saúde, ao trabalho e ao voto.
Devem receber todo o apoio necessário a fim de terem respeitados os
seus direitos, vontades e preferências.
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiências,
no seu artigo 13, determina que:
99
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
100
5 CO N SID ER AÇ Õ E S FINAIS
101
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
REFERÊN CIAS
102
Justiça, Rio Grande do Sul, v. 04, n 02, p. 39-60, jul./dez. 2018.
Disponível em: <https://indexlaw.org/index.php/acessoajustica/article/v
iew/4791>. Acesso em: 02 out. 2020.
103
9 COMO FICOU O BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO
CONTINUADA: BPC ap ós a Reform a P revidenciária e a
Lei n° 1 3 .9 8 2 /2 0 2 0
1 IN T R O D U Ç Ã O
105
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
Social - e a lei que o regula, para então abordar seu objetivo, requisitos
e as recentes alterações para a sua concessão.
2 BPC: o que é?
106
composta por seu cônjuge ou companheiro(a), pais e, na ausência de um
deles, madrasta ou padrasto, irmãos(as) solteiros(as), filhos(as) e
enteados(as) solteiros e os(as) menores tutelados(as), desde que vivam
sob o mesmo teto.
O primeiro fato relevante a se esclarecer é que, por se tratar de
um benefício social, ou seja, o(a) beneficiário(a) não é segurado(a) do
Regime Geral da Previdência Social (RGPS). Por esse motivo, não faz
jus a décimo terceiro salário, contagem por tempo de contribuição e não
dá azo a que seu(s) dependente(s) requeira(m) pensão por morte.
Conforme a redação originária da LOAS, em 1993, para a
concessão do BPC, o(a) beneficiário deveria ser: a) pessoa “ portadora de
deficiência” , ou seja, incapacitada para a prática dos atos da vida diária - de
forma independente - e para o trabalho; b) integrante de família cuja renda
mensal per capita fosse inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
Essa exigência de incapacidade para a vida independente e para
o trabalho gerou a exclusão da PcD do mercado de trabalho, pois a
insegurança quanto à sua permanência no emprego formal, associado ao
receio de não mais preencher os requisitos para obter o BPC - na maioria
das vezes sua única fonte de renda - constitui-se em uma grande barreira
para a busca de sua capacitação profissional. Em decorrência, acentuou-
se em demasia, a visão preconceituosa de que a PcD é incapaz,
ineficiente e improdutiva.
Destaca-se que a definição de PcD, trazida pela LBI, em 2015,
foi inserida no texto da LOAS, em seu artigo 20, § 2°.
Apesar da alteração na LOAS, decorrente da inclusão trazida
pela Lei n° 12.470/2011, no artigo 21-A e seus parágrafos, que permite
à PcD transitar entre receber o BPC, se necessário, e estar inserido no
mercado de trabalho, ainda hoje o maior problema consiste na
insegurança e falta/insuficiência de informação sobre os critérios de
concessão, suspensão e retomada desse benefício.
Sobre esta alteração, Gurgel (2011) afirma que com a nova
previsão da Lei n° 12.470/2011 é permitido o trânsito da PcD da assistência
107
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
3 Q U EM TE M D IR E IT O A O BPC?
108
efeito de obtenção do BPC. Assim, os rendimentos dessas pessoas não
integram o orçamento familiar para efeito de apuração da renda per
capita. (HERMES, 2019).
A concessão do BPC está sujeita, inclusive, à avaliação social.
Após estudo social e visita domiciliar, em regra, realizados por
profissionais dos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS).
O resultado da avaliação e os demais documentos exigidos são
encaminhados ao INSS, para que, então, o pedido seja ou não deferido.
Caso não haja CRAS no município de residência do(a)
requerente, este(a) deverá ser encaminhado ao município mais próximo
que conte com tal estrutura. E conforme determina a LOAS, o(a)
beneficiário(a) passará por uma revisão a cada 2 (dois anos), a fim de
verificar se existem fatores que podem cessar o benefício, com o o fato
do PcD iniciar em um emprego, e o aumento na renda per capita familiar.
Além disso, estar cadastrado no Cadastro Ú nico para
Programas Sociais do Governo Federal (C A D Ú nico) - instrumento
que identifica e caracteriza as famílias de baixa renda - , é condição
para ter o benefício deferido.
Todavia, em caso de indeferimento do pedido, o(a) cidadão(ã)
pode, por meio de um processo judicial, comprovar sua miserabilidade,
já que essa condição é relativa, e juntar provas necessárias, ainda que a
renda per capita seja maior do que a estabelecida legalmente.
É possível que o pleito judicial seja realizado pelo(a)
interessado(a) desde que o pedido administrativo tenha sido negado pelo
INSS, ou seja, a negativa na esfera administrativa é condição para
ingressar com a demanda judicial.
O Poder Judiciário tem entendido que a renda não pode ser o
único critério para decidir o direito ao benefício, pois o estado de pobreza
é questão controversa, e existe ampla jurisprudência neste sentido.
Importante mencionar que, para requerer o BPC, a pessoa
interessada deve se dirigir à agência do INSS ou realizar seu pedido, de
109
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
110
no cálculo da renda per capita (LOAS artigo 20, § 14). Esta
alteração acrescenta, além do BPC, todos os outros
benefícios previdenciários na renda do grupo familiar, que
não serão computadas para verificar a renda per capita do
requerente do BPC.
■ O BPC será devido a mais de um membro da mesma família
enquanto atendidos os requisitos exigidos na LOAS (artigo
20, § 15). Esta alteração é significativa, pois, anteriormente
não era possível haver duas PcD amparadas pelo BPC
residindo no mesmo domicílio.
■ Possibilita o aumento da renda per capita de H para V
salário-mínimo, durante o período da pandemia do COVID-
19, que ocorrerá através de escalas graduais. Essas escalas
observarão, cumulativamente ou isoladamente, fatores
como: a) grau da deficiência; b) dependência de terceira
pessoa na prática de atos da vida diária; c) circunstâncias
pessoais e ambientais; d) fatores socioeconômicos e
familiares e; e) comprometimento do grupo familiar com
gastos no tratamento de saúde, remédios não
disponibilizados pelo SUS, médicos, fraldas e alimentos
especiais etc., desde que comprovadamente necessários à
preservação da saúde e da vida (LOAS artigo 20-A).
■ Autoriza a antecipação do BPC aos requerentes previstos no
artigo 20 da LOAS, no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais),
por 3 (três) meses, ou até a aplicação, pelo INSS, do
instrumento de avaliação da PcD, ou o que ocorrer primeiro,
em decorrência do estado de calamidade pública originado
pela pandemia do COVID-19 (artigo 3°).
■ Reconhecido o direito da PcD ao BPC, seu valor será devido
a partir da data do requerimento, deduzindo-se os
pagamentos antecipados em decorrência da pandemia do
COVID-19 (artigo 3°, Parágrafo único).
111
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
112
5 CO N SID ER AÇ Õ E S FINAIS
113
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
REFERÊN CIAS
114
CARNEIRO, Bruno. Lei n. 13.982/2020: os 7 destaques que merecem a
sua atenção especial. Disponível em: https://www.desmistificando.com.
br/lei-13982-2020-destaques/. Acesso em: 1 out. 2020.
115
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
116
1 0 "PROCURO UMA MULHER": r e fle x õ e s so b re
v io lê n c ia con tra m u lh eres com d eficiên cia a partir
do film e "Maudie"
1 IN T R O D U Ç Ã O
117
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
118
internações (SIEBERS, 2011, p.25). A partir das contribuições do modelo
social da deficiência, proposto inicialmente por homens com deficiência,
nos anos 1970, a desigualdade à qual as pessoas com deficiência estão
submetidas deixa de ser compreendida com o consequência do
impedimento corporal (lesão), mas sim um produto da relação entre este
corpo com uma sociedade incapaz de atender à diversidade física,
sensorial e intelectual das pessoas. A desigualdade deixa de ser fruto de
imposições genéticas (fenômeno biomédico) e passa a ser uma questão de
injustiça social (fenômeno sociológico) (DINIZ, 2003; 2007).
Por sua vez, nos anos 1990, teóricas feministas - mulheres com
deficiência e mulheres cuidadoras de pessoas com deficiência -
revigoram a tese social da deficiência, ao acrescentar à discussão, os
conceitos de interdependência e cuidado. Defendiam o conceito de
“ corpos temporariamente não-deficientes” , ao invés da dicotomia
deficiente X não-deficiente, ampliando o conceito de deficiência para o
envelhecimento e/ou doenças crônicas e argumentando que a
dependência e a interdependência são inerentes à condição humana.
Assim sendo, afirma-se que a política pública do cuidado promoverá
justiça no campo da deficiência e amenizará a vulnerabilidade de muitas
pessoas com deficiência, uma vez que se observam relações de extrema
desigualdade de poder, com o é o caso das pessoas com deficiência com
alto nível de impedimento corporal (DINIZ, 2003; 2007).
Maudie morava com a tia, após a morte de sua mãe, uma vez
que o irmão vendeu a casa onde vivia. Nesta sequência do filme, observa-
se que a relação familiar é construída com sucessivas agressões
psicológicas realizadas pela tia, o que inclui a negação do direito à
maternidade com o uma expressão da violência a que estava submetida.
Constantemente desacreditada naquele ambiente, ela se mantém
persistente na tentativa de obter um trabalho, mesmo diante do desprezo
do homem, já que considerava aquela oportunidade uma saída possível
à sua condição de vida. Junto a nós, espectadoras da história, instala-se
a percepção de que a escolha que se apresenta à personagem não
119
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
2 D E SEN V O LVIM E N TO
120
depois, o homem reconsidera a possibilidade, e vai até a casa onde
morava Maudie para buscá-la, percurso que ela faz na carroceria do
carro, juntamente com as bagagens. O homem havia, enfim, buscado as
coisas de que precisava para ter sua casa bem cuidada. A existência de
Maudie é objetificada sem constrangimentos e de modo cada vez mais
intenso, seja na explicitação da hierarquia do cuidado - primeiro o
homem, depois os cachorros, depois as galinhas, depois a mulher com
deficiência - , seja nas violências verbal e física a que é submetida.
Pessoas com deficiência têm três vezes mais probabilidade de
experienciar violência física, emocional ou sexual do que seus pares sem
deficiência, enquanto mulheres com deficiência têm 10 vezes mais chances
de experienciar violência sexual, além de aborto forçado ou, antes dessa
violação, esterilização compulsória (MSH; UNFPA, 2016). No Brasil, o
Atlas da Violência, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (IPEA, 2018), aponta que, das pessoas com deficiência que
sofreram violência sexual, 73,7% foram violentadas mais de uma vez,
podendo indicar que a violência é praticada por pessoas próximas.
Além da maior vulnerabilidade das mulheres com deficiência à
violação dos direitos sexuais e reprodutivos, elas também tendem a
permanecer em relacionamentos afetivo-sexuais marcados por violência
por mais tempo do que homens com deficiência e do que mulheres sem
deficiência (SMITH, 2008).
A presença de Maudie invoca o abandono, o descrédito, a
abjeção e o desprezo com o bases razoáveis das relações a serem
estabelecidas com uma mulher com deficiência naquela época. De
acordo com o relatório sobre violência contra mulheres com deficiência
da Rede Internacional de Mulheres com Deficiência (RIMCD, 2011), o
aumento da vulnerabilidade desse grupo deriva da complexa rede de
discriminações que perpassam o gênero (sexismo) e a deficiência
(capacitismo). O sexismo refere-se à inflexível divisão de papéis sociais
de gênero, estabelecendo que comportamentos relacionados à esfera
pública são apropriados para os homens, enquanto comportamentos
121
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
122
existência no mundo, o que justificaria sua persistente experiência de
desalento nas relações humanas.
Maudie tem a cabeça, invariavelmente, voltada para o chão, o
que talvez se explique não só pela artrite reumatoide de que a
acompanha, mas também pela ideia de que sua presença só seria tolerada
a partir de uma condição de subalternidade. A o se dirigir a seus
interlocutores, nota-se o movimento dos olhos de Maudie de baixo para
cima, com o gesto que confere ao outro o suposto conforto de se saber
em uma posição superior àquela mulher defeituosa. Erguer os olhos e a
cabeça para alcançar o outro é gesto que marca a inexorável exigência
da submissão de seu corpo às estruturas de poder vigentes.
O contexto social, ao combinar sexismo e capacitismo, produz
desvalorização das mulheres com deficiência, as quais passam a se sentir
inadequadas com o parceiras íntimas, baixam os critérios que esperam
encontrar em um companheiro (a) e estabelecem e/ou mantêm-se em
relacionamentos afetivo-sexuais abusivos, conforme foi encontrado em
entrevistas realizadas por Hassouneh-Phillips (2005), com 37 mulheres
com deficiência física residentes nos Estados Unidos, sendo a maioria
heterossexual. Esse estudo revelou que, além do contexto social de
desvalorização, as mulheres entrevistadas que tiveram relacionamentos
ruins com os pais e/ou foram vítimas de violência na infância estavam
mais propensas a permanecer em relacionamentos íntimos de alto risco.
De que modo se constrói a subjetividade de uma pessoa que tem
sua experiência de vida permanentemente influenciada pelo desprezo e pela
violência? Como a perspectiva do tempo se insere no projeto de vida de
quem conhece o desamparo e o desamor desde a infância? Estas são
perguntas que o filme nos provoca, enlaçado com a realidade das mulheres
com deficiência, sem intenção de oferecer respostas ou conclusões.
Na obra “ O corpo rejeitado” , Susan Wendell (1996), sustenta que
ter algum tipo de imperfeição provoca diversos tipos de opressões
alimentados por enunciados que valorizam determinados tipos de aparência
em nossa sociedade. O corpo diferente da personagem é submetido ao
123
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
124
Muitas mulheres com deficiência, inclusive aquelas
sexualmente ativas ou que contribuíam com a renda familiar, atribuíram
à deficiência a causa da violência, considerando o comportamento dos
agressores uma resposta natural ao estresse de viver com uma mulher
com deficiência. Para elas, nesse sentido, a violência era uma
consequência inevitável da deficiência ao invés de um reflexo do caráter
dos agressores (RICH, 2014).
Outra crença refere-se à compreensão de que o parceiro teria
comportamentos violentos porque estaria debilitado, portanto, caberia à
mulher com deficiência exercer o papel de oferecer o apoio, o cuidado
necessário para fazê-lo melhorar. Há também a crença de que o abuso
foi resultado de um acidente provocado pela ausência de um corpo com
tamanho e força “ normais” , ou seja, se as mulheres com deficiência
tivessem outra estrutura física, os atos de seus agressores não as teriam
prejudicado. Deste modo, sobrepondo a culpa ao próprio impedimento
corporal, e não a intenção do agressor, essas mulheres consideram-se
responsáveis pelo dano a elas causado (RICH, 2014).
Outras mulheres avaliaram os abusos praticados pelos parceiros
com o relativamente inofensivos em comparação com experiências
dolorosas de procedimentos de reabilitação a que já haviam sido
expostas. A o identificarem-se tolerantes às dores físicas, essas mulheres
avaliavam que o abuso experimentado nos relacionamentos não era tão
ruim (RICH, 2014).
N o filme, a autonomia da personagem se constrói em tons muito
próprios, com sua arte se esparramando pelos postais, telas, muros e
janelas da casa onde morava, conquistando a oportunidade de ser notada
por seu talento e sensibilidade, de ser reconhecida por sua capacidade de
trabalho e de ser remunerada de modo a obter sua independência
financeira. A arte torna-se sua resposta mais contundente às estruturas
sexistas, misóginas e capacitistas vigentes.
O cerceamento da autonomia das mulheres com deficiência por
seus parceiros ainda é muito comum. O agressor assume um papel de
125
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
3 C O N CLU SÃO
126
por familiares, parceiros (as) que se aproveitam das condições de
imobilidade da vítima para mantê-la em cárcere.
Além disso, é importante a desconstrução do conceito de
mulher universal, o qual sugere que todas as mulheres vivenciam o
mesmo tipo de violência provocado por um único tipo de opressão, no
caso, o patriarcado. É necessário considerar os diversos fatores que
atravessam os corpos, tais com o deficiência, raça/etnia, classe e
sexualidade, por exemplo, evidenciando e sustentando as desigualdades
e vulnerabilidades a que estão submetidos. A compreensão
interseccional possibilita observar com o essas categorias estão
imbricadas e, principalmente, de que forma devem ser compostas as
ações de combate a todo tipo de opressão.
REFERÊNCIAS
127
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
128
Social W ork , vol. 29, n. 4, p. 418-433, 2014. Disponível em:
https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/0886109914522626.
129
PARTE 2
Depoimentos
1 Sexualidade
1.1 EXPERIÊNCIAS DE UMA PESSOA CEGA
135
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
própria, uma sociologia própria, criando condições para que hoje ainda
estas questões sejam tratadas com o coisas tão distintas.
Sobre essa questão, tenho um dado interessante: já vivenciei a
sexualidade com o uma pessoa vidente, e constatei que entre as pessoas
que enxergam, há todo um jo g o de sedução, não é?
Costumo brincar dizendo que as pessoas transam pelo olhar,
literalmente se desejam pelo olhar. A o olhar nos olhos de uma pessoa,
você vê a sua alma. É com o se você estivesse penetrando naquela pessoa
pelo olhar, e junto com isso, vem toda uma produção social.
N o meu caso por exemplo, pude ter essa experiência de
enxergar e ver todo esse jo g o de sedução através de um olhar, de uma
nuance, de um piscar de olhos, coisas desse tipo. Entretanto, aos 35 anos,
eu fiquei cego, privado de tudo isso. Evidentemente, passei a enfrentar
algumas situações nas quais precisei reaprender a lidar, a vivenciar e a
fazer determinados encaminhamentos de maneira diferente.
Mas as fantasias que estão na cabeça das pessoas que enxergam,
não são diferentes das que estão nas cabeças das pessoas cegas.
As pessoas cegas que querem demonstrar interesse afetivo por
alguém, chegam de maneira diferente. Utilizam um jo g o de sedução pela
palavra mais mansa, por determinados tipos de sons produzidos e ainda
pelo toque, pelo tato, na medida em que as pessoas se permitem ser
tocadas, acariciadas, enfim, tudo isso faz parte do imaginário, também,
das pessoas cegas.
Tive essas experiências com mulheres cegas, umas muito
positivas, outras nem tanto. O mesmo ocorreu com minhas experiências
enquanto pessoa que enxergava.
Uma das maiores experiências que eu vivenciei e agradeço
muito por isso, foi o fato de ter tido relação, trocas, sexo, com uma pessoa
tetraplégica, que utilizava cadeira de rodas para a sua mobilidade. Nessa
situação, ocorreram todas as dificuldades que você possa imaginar,
inclusive, e talvez o mais interessante, em relação a questões
136
operacionais, uma vez que a pessoa estava numa cadeira de rodas e não
podia sair dela sozinha.
Na medida em que você se isola, num local privado, aquela
relação se dá entre você - cego - e a pessoa que não tem todos os
movimentos e precisa ser ajudada. Cabe a você fazer toda a
movimentação: tirá-la da cadeira, colocá-la na cama, tirar a sua roupa e
depois do ato em si, recomeçar todo aquele processo de volta.
Essas experiências foram extremamente ricas do ponto de vista
da compreensão das relações afetivas e amorosas. Elas precedem tantas
outras coisas que vão acontecendo, que o ato sexual tão somente, se torna
secundário. Todavia, há pessoas com “ instintos mais carnais” , que não
agem ou pensam dessa forma.
Um psicólogo me disse que se pode fazer sexo o dia inteiro, na
medida que se vai jogando sedução, fazendo carícias, dizendo palavras
agradáveis e à noite, acontece o ato de consumação de um processo que
já vinha se insinuando.
O meu namoro com a pessoa tetraplégica, por dois anos, foi
muito significativo, por ter oportunizado um momento divino na minha
vida. Claro, sem querer transformar o relacionamento numa coisa isenta
de problemas. Houve dificuldades que qualquer relacionamento tem:
brigas, enfrentamentos, divergências, disputa de poder na relação. Mas
tudo isso faz parte das relações humanas, independentemente de ser
pessoa com deficiência ou não.
Aos olhos da sociedade, ao mesmo tempo que juntos
despertávamos uma certa curiosidade e admiração (talvez pena mesmo),
também parecia uma coisa meio bizarra, totalmente fora do esquadro,
um cego e uma cadeirante desfilando e convivendo nos espaços sociais,
estudando e militando nos movimentos de defesa dos direitos das
pessoas com deficiência.
Outra questão é a influência da opinião de terceiros nas relações
afetivas. A opinião dos nossos amigos, familiares, enfim, o social
também está nesse processo. Queremos uma parceira que possa ser
137
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
138
mudanças, na verdade, alteram a compreensão do mundo, das pessoas e, por
conseguinte, das relações da afetividade e questões de sexualidade.
Portanto, se relacionar com pessoas com deficiência, depois
de cego, com o nas experiências que tive, trazem novos elementos,
outros recursos, e outras perspectivas que são colocadas nessa relação.
Consequentemente, todo aquele jo g o de sedução, que o olhar tinha
antes, desapareceu.
As pessoas cegas tendem a ser “ um pouco conservadoras” , no
sentido de manter o relacionamento. Evidentemente que as minhas
relações hoje, estão num outro patamar, eu diria assim, mas isso não é
apenas porque sou cego, evidentemente. É que, junto com a cegueira,
vieram outras necessidades que eu tive que trabalhar, o meu pensamento,
por exemplo, alargar digamos assim, o campo mais intelectual.
Para descontrair, às vezes digo que, se do ponto de vista físico,
a perda de visão “ escureceu meu mundo” , por um lado do olho, a
cegueira iluminou minha consciência e me abriu novas perspectivas que
antes, apenas com a percepção do olhar, eu não tinha conseguido
alcançar. Evidentemente, tudo isso traz mudanças na vida da gente e
também, nas nossas relações.
139
1.2 VIVÊNCIAS DE UMA PESSOA COM TETRAPLEGIA
Thiago Córdova*
141
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
142
Prestei vestibular e consegui ingressar na faculdade através de
uma bolsa parcial de estudos. Este incentivo foi importante e possibilitou
a seguir com meu propósito. Durante o período acadêmico, as barreiras
arquitetônicas foram superadas, dia após dia. As dificuldades se
apresentavam e sempre de formas diferentes, porém, pude contar com o
companheirismo e a solidariedade dos colegas de classe que me
ajudavam a superá-las.
Recentemente, um amigo de faculdade revelou que no primeiro
dia de aula, enquanto me apresentava à classe e falava sobre o meu
objetivo de ser um advogado, ele disse que pensou: ‘ ’ o quê este cara está
fazendo aqui?” e que logo eu desistiria do curso. Ele me contou que, a
cada semestre que eu concluía, sempre com boas notas, ele foi
percebendo o quanto estava enganado.
Durante a faculdade, essa pessoa acabou sendo uma das que
mais me ajudaram, e no fim, o convívio com a deficiência se tornou uma
grande inspiração e lição de vida. Infelizmente, ele acabou não se
formando por circunstância da vida.
Fui o primeiro aluno da classe a passar no Exame de Ordem. N o
final do quarto ano da Faculdade me dediquei, pois sentia que tinha que
sair à frente e compensar as dificuldades que viriam após o término da
graduação. Uma das maiores preocupações era a de conseguir um
emprego e ter clientes. Não parei de estudar, completei duas pós
graduações e enfrentei e superei as mesmas adversidades da Faculdade,
o que mostra que tudo é possível com dedicação e esforço.
Atualmente tenho uma carreira sólida e me encontrei,
profissionalmente na carreira jurídica e sou realizado e não me limito a
ficar apenas no escritório, viajo e faço audiências, busco alcançar todas
as prerrogativas da profissão.
Porém, com o nem tudo na vida são flores, existem aspectos da
deficiência que são quase insuportáveis, que podem causar grande
desconforto e constrangimento, por exemplo, a perda involuntária das
fezes ou da urina.
143
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
144
Também conheci pessoas que criaram a ilusão de que um dia eu
voltaria a andar, mas que, com o passar do tempo, se frustraram e sofriam
por mim. Sempre fui muito sincero sobre a irreversibilidade da
deficiência e sobre minhas limitações, e mesmo assim, algumas parceiras
não acreditavam naquela realidade.
Para mim é comum conhecer alguém por aplicativo de
relacionamento. Costumo colocar a deficiência e fotos, logo no meu perfil
do site. Não considero uma invasão direta à minha privacidade, mas uma
informação importante. E mesmo que algumas pessoas se choquem -
porque isso acontece com certa frequência - , conheço pessoas que
compreendem e se dão uma chance de viver uma experiência nova. Afinal
também faço minhas escolhas e filtro aspectos que não me agradam.
Tento apresentar o homem gentil, sincero e honesto antes do
homem com deficiência, e depois tento passar uma visão ampla sobre o
que esperar de um relacionamento com uma pessoa com deficiência.
Para muitos é um mundo novo, é preciso se ajustar e aprender
sobre a deficiência em si. Uma das perguntas mais frequentes logo no
início, é justamente, sobre a função sexual e a capacidade reprodutora,
pois o sexo é importante para qualquer relacionamento, incluindo a
pessoa com deficiência.
Não trato a questão da sexualidade com o um tabu, no meu caso,
antes mesmo de transar, gosto de falar sobre meus gostos, com o consigo
chegar ao prazer e driblar minhas limitações, mas para isso é necessário
o mínimo de intimidade.
Também sei que algumas parceiras se socorreram a buscar
informações na internet, pois queriam compreender a deficiência, e como
é possível ter uma vida de qualidade. Essas informações são importantes,
reduzem o preconceito e diminuem a insegurança em assumir uma
relação com uma pessoa com deficiência.
Com a ajuda da indústria farmacêutica que desenvolveu o
famoso “ azulzinho” , hoje posso ter ereção, lembrando que a minha
deficiência importou na perda da sensibilidade dos membros inferiores.
145
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146
2 Violência
2.1 O BULLYING E O TRAUMA PSICOLÓGICO
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150
turma e costumavam atacar sempre os mais vulneráveis para se
afirmarem perante o grupo, tanto no quesito força, quanto na
popularidade ao sempre adotarem um tom jocoso nas agressões.
Diferente do que muitos imaginam, o bullying não surge
aleatoriamente. Seus perpetradores sempre buscam algo com isso
(instigar medo e ganhar popularidade são os mais comuns) e eles sabem
exatamente que é errado, mesmo na minha época (anos 90) eram comuns
palestras sobre o tema e tentativas de conscientização. Esses esforços
para criar bom senso sobre esse tipo de abuso sempre eram tratados com
deboche pelos agressores.
Minha experiência com o tema ocorreu desde o jardim 2 da pré-
escola até a 8a série do ensino fundamental. Quando cheguei no ensino
médio, estava no auge da condição física e treinado em artes marciais.
Como a covardia é a característica n°1 dos bullies, ninguém se arriscava
realmente. Tentativas não faltaram, mas diante de uma ameaça sincera
de retaliação violenta, todos desistiam, eventualmente.
Como foi algo prolongado por muitos anos, tratar pontualmente
de cada situação individual, acabaria sendo muito extenso. Sendo assim,
prefiro comentar sobre o modus operandi dos bullies, que foi
basicamente o mesmo em todas as ocasiões.
O ponto de partida em quase todos os meus casos de bullying
era uma conversa demonstrando curiosidade sobre a condição de pessoa
com deficiência - PcD. É algo quase com o um início de tentativa de
amizade, por isso é algo realmente maligno. Sobre esse aspecto, é um
dos principais motivos de eu sempre tentar mascarar a deficiência, para
não dar armas ao inimigo. Depois de várias vezes sofrendo por dar
confiança a esse tipo de pessoa, acaba sendo o único passo lógico.
Uma vez descobertas as fraquezas, seja por perguntar
abertamente ou por pura observação, o bully começava a “jogar verde”
para sua plateia, geralmente nos intervalos entre as aulas e
principalmente nas aulas de educação física.
151
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152
familiar ou escolar para pararem, e mesmo assim continuaram. Espero
nunca reencontrar nenhum desses sujeitos, pelo bem deles.
Apesar de tudo, toda essa violência acabou despertando algo
positivo em mim. Tenho uma aversão intensa à arrogância e covardia.
Jurei a mim mesmo sempre tratar as pessoas com o máximo de
consideração e gentileza possível, que nunca deixaria de agir ao
presenciar um ato de violência contra alguém mais fraco e que nunca
mais seria humilhado por mais ninguém. Afiei meu espírito e meu corpo
com uma convicção absoluta de sempre fazer ser correto, sincero e
amável com os outros.
153
2.2 O BULLYING E SUAS FACETAS
155
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156
2 .3 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E PATRIMONIAL
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158
em vista que a pessoa necessitava transformar-se para ser
verdadeiramente incluída na sociedade, quanto mais se aproximasse da
normalidade, mais incluída seria.
Na verdade, a minha própria família me segregava,
inconscientemente. Agia conforme o mandamento social da época, para
que se atingisse êxito era primordial se adequar às normas
preestabelecidas de forma padronizada, do contrário não poderia a ela
pertencer. Muitas foram as expectativas frustradas: aulas de balé, violão,
natação e outras, uma vez que para uma aluna com deficiência, as
adequações e adaptações estavam fora de cogitação. Evidenciava-se,
dessa forma, o preconceito, o descaso, o abandono, o descrédito, o
estigma e a segregação.
Lembro-me com saudades que de forma inconsciente, uma
professora da “Escola Estadual de Primeiro Grau Doutor Prudente de Morais” ,
incluiu-me, permitindo que eu fosse ao quadro-negro copiar o conteúdo no meu
caderno e que através de textos ampliados eu pudesse acompanhar todo o
conteúdo de forma igualitária aos demais alunos sem deficiência.
Na adolescência, isolava-me na leitura de livros da biblioteca de
meu tio e de enciclopédias e revistas solicitadas e ofertadas pelo meu pai.
Este, muitas vezes com a intenção de me proteger, propiciava a minha
exclusão a não permitir a minha participação em atividades escolares como
excursões e festas. Passada a fase da adolescência ao adentrar na fase adulta,
tornei-me uma pessoa insegura, tímida e antissocial.
A escolha da carreira jurídica foi pensada, pois nem todas as
profissões seriam compatíveis com minha deficiência, podendo
acarretar falsas expectativas e acentuar o com plexo de inferioridade.
Concomitante, nesse período, houve namoro, casamento e a conclusão
do curso de Direito. N o início da década de 1990, após namoro de
quatro anos, casei-me com o meu primeiro e único namorado, m oço
educado, inteligente, engenheiro mecânico com futuro promissor. A
realidade, porém, nos mostraria que um diploma não era sinônimo de
ascensão profissional.
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160
certidão de nascimento do nosso segundo filho. Embora advogada, tive
que aceitar em silêncio tal imposição.
Sempre com o objetivo de progredir e, para a alegria de todos, no
ano 2000, o pai de meus filhos foi aprovado em concurso e iniciou a carreira
de Auditor fiscal em Corumbá/MS, onde passamos a residir, nós e os nossos
três filhos. Como os meninos já estavam em idade escolar, retomei minha
vida profissional. Ficava meio período no escritório de meu pai, também
advogado, onde por dez anos tive a graça de Deus de com ele aprender e
compartilhar processos cíveis, criminais e previdenciários.
Já estabilizados, no ano de 2010, uma promoção de ofício fez
com que a contragosto dos meninos e meu, nos mudássemos para a
Campo Grande/MS. A vida, porém, nos traz surpresas e ao completar
dois anos de nossa mudança, em outubro de 2012, meu marido veio a
falecer, acometido de um tumor em estágio avançado.
Quando fiquei viúva, meus dois filhos mais novos - já
adolescentes - residiam com igo e o mais velho cursava faculdade em
outro Estado. Incentivada por eles, em 2014, retomei a minha profissão,
ingressei em um curso de Pós-Graduação e nos momentos de solidão,
buscava distração em chats da internet.
Nesse período, fiz amizade com um homem que mais tarde viria
a saber que se tratava de um psicopata. Muito carente e sozinha, não
demorou para ser conquistada com sua lábia. Três meses de conversa
virtual foi o bastante para ele vir de Porto Alegre/RS, de mudança para
Campo Grande/MS.
No início tudo transcorreu com tranquilidade, porém,
decorridos dois meses, iniciaram-se as implicâncias com as minhas redes
sociais e amigos homens que faziam parte dela. Estes, aos poucos, foram
sendo excluídos por ele que até minhas senhas já tinha conseguido.
Segundo ele, mulher que ficava em redes sociais era “ vagabunda” .
Mantínhamos um relacionamento discreto sem postagens na
mídia, porém, em dezembro de 2014, os desentendimentos fizeram com
que eu, de todas as formas, tentasse me libertar da opressão e domínio
161
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exercido por ele. Pensei que uma viagem ao exterior com meus filhos
seria a oportunidade de mandá-lo embora de casa. Alguns
acontecimentos, porém, me impossibilitaram e, no regresso, tomei
coragem e entrei com a medida protetiva, na Casa da Mulher Brasileira.
Foi muito difícil, senti um misto de vergonha e constrangimento
por exercer a advocacia e conhecer alguns delegados, juízes. Apesar
disso, os entraves burocráticos foram imensos. Os atendentes não
acreditavam, encaminhavam-me para psicólogas, desacreditavam que
meu celular estava interceptado.
Todas as ligações que eu fazia eram rastreadas por ele. Em
vários telefonemas que recebia dele eram infindáveis as ameaças, de que:
“ isso não ficará assim” , “ mulher nenhuma nunca me disse não” , “ não sei
lidar com o não de uma mulher, ainda mais de você” . Houve muitas
tentativas de empréstimos no meu nome, sem contar o meu pavor de sair
de casa e encontrá-lo na rua ou onde eu fosse.
Foram muitos meses para superar esse trauma! Mas, graças a
Deus, com a ajuda de familiares e de uma pessoa muito especial,
acreditei no amor novamente e consegui continuar a viver e a ter
esperanças em dias melhores.
162
2 .4 DISCRIMINAÇÃO E CONQUISTAS NO ESPORTE
163
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164
Tive uma longa trajetória com a Seleção Brasileira que não
com eçou recentemente, mas sim em 2011, na Suécia. Fomos para o
Mundial desta modalidade e gênero e ficamos em 11° lugar - na
verdade, último lugar. Seis jogos, seis derrotas por goleada, incluindo
uma por 23 a 0 para a Rússia, que seria campeã. Isso mesmo, 23 a 0!
Eu particularmente sofri muito por ser capitã da primeira equipe da
Seleção Brasileira de Futsal formada. Às vezes penso que não cumpri
o papel correto naquele campeonato. Eu não estava disposta a passar
por tudo aquilo de novo. Então, iniciei um trabalho diferente,
juntamente com outras meninas que tinham papel fundamental em suas
Associações de Surdos. Foi uma luta diária na CBDS, assim com o em
todo o Surdodesporto.
A partir dali, nos tornamos as principais líderes e deixei de lado
a faixa de capitã. A faixa de capitã é usada para a comunicação com os
árbitros dentro da quadra/campo. Esta não era minha principal função.
Fomos buscar encontrar novos talentos, atletas mais novas.
Com o passar do tempo, me tornei uma líder para conduzir a
equipe dentro e fora da quadra/campo, para que as atletas surdas
pudessem alcançar seus sonhos, quando achassem que era impossível,
devido à limitação financeira, à falta de apoio. Colocava na cabeça delas
que nada é impossível, que pode ser difícil sim, mas há um jeito para as
coisas se tornarem mais fáceis. Incentivava para não desistirem assim,
de repente. Quando tivessem um problema ou vontade de desistir, que
viessem falar com igo antes de tomar uma decisão, para que eu pudesse
explicar que para viver a vida é preciso ser paciente e persistente, se
quisermos alcançar algo.
Passo a passo, fomos conseguindo vencer. Veio o título do Pan-
Americano de 2012. Depois, o bicampeonato no Sul-Americano em
2013 e 2014. Neste último fui capitã. Nos dois anos anteriores não herdei
a faixa de capitã porque trabalhava com o voluntária na CBDS e não
queria gerar conflitos de interesse. Neste período fomos beneficiadas
pelo Programa Bolsa-Atleta federal.
165
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
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sonho fosse aquecido ali, e não apagado. Continuamos na luta
mensalmente, até irmos para o nosso terceiro Mundial. Sabíamos que
seria difícil para todos nós, porque iríamos enfrentar seleções com mais
apoio pelos seus Governos Federais e Patrocinadores e muito bem
preparadas. Não tememos!
Exatamente no dia 16 de novembro de 2019 veio a recompensa
para cobrir todos os sacrifícios: a perda dos momentos com familiares e
tudo o que tivemos que deixar de lado para seguir esse sonho. É isso:
bastava acreditar, ter a união da equipe. Mas o principal de todos foi a fé
que cada um de nós tinha. Enfim, vencemos por 4 a 0 a Polônia, campeã
europeia de 2018 e equipe com investimento governamental. E hoje
podemos dizer: "Somos brasileiras, com muito orgulho e com muito
amor!". Somos campeãs do Mundo!
Até hoje, ninguém acredita que fomos conquistar o ouro com
nossos próprios recursos financeiros, por conta própria, devido ao
pouquíssimo apoio financeiro que recebemos.
Neste Mundial, revezamos a faixa de capitão para testar o
emocional de cada uma que recebia esta tarefa. Todas tiveram suas
em oções controladas e cumpriram muito bem este papel. Com o eu
disse antes, o papel de capitão é só conversar com árbitros e tentar
liderar o jo g o dentro da quadra, mas nada de mandar fora da quadra.
Todas sabiam da importância de cumprir seu papel: demonstrar o
comportamento adequado, ter respeito, ter união e fazer se sentir uma
família quando juntas.
Então, acredito que toda a trajetória relatada até aqui foi uma
superação. Acredito que nunca foi sorte, e sim sempre foi Deus. Ele
sempre tem seus planos para cada um de nós. Com o dito, foi com
muita dificuldade. Sem patrocínio, sem bolsa, sem nada. Não somos
nem do programa paralímpico e não tivemos mais apoio do governo
federal desde o fim de 2017. H oje entendo que tudo foi Deus para que
seus planos fossem executados no momento certo e maravilhoso para
Seleção Feminina.
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
Posso dizer que liderar uma equipe não é nada fácil. V ocê pode
ser atleta, intérprete, coordenador, assistente técnico e tudo mais, ao
mesmo tempo. Multifunções que eu tive que lidar e executar com a
Seleção. V ocê é cobrado o tempo todo para que tudo saia do jeito que a
Torcida/Diretoria quer. Às vezes eles não entendem nem veem o que se
passa por trás da equipe. Enfim, é preciso ter muita paciência e
persistência para conseguir a confiança de todos de que é possível
realizar o sonho de cada um, no tempo certo.
O maior desafio de uma atleta surda no cenário brasileiro atual
é treinar com a equipe devido à falta de apoio financeiro. Diante da
quarentena, fica cada vez mais difícil manter o ritmo de treinos com a
equipe, física e mentalmente. Além disso, também há falta de
reconhecimento por parte das autoridades de governo e falta de apoio
financeiro regularmente dos órgãos públicos e privados. Porém, aos
poucos, estamos quebrando esta barreira já que recentemente os órgãos
públicos estão dando mais atenção aos desportistas surdos.
Há outros obstáculos que uma atleta surda de futebol/futsal
enfrenta, por exemplo, sempre tem que mostrar que sabe jogar sim. Às
vezes sofremos preconceito, mas depois do vice-campeonato de 2015, a
modalidade feminina de Futsal ganhou o respeito da comunidade surda,
que tanto nos criticava em 2011.
O esporte oferece oportunidades para as pessoas com
deficiência, pelo seu bem-estar sim, porém é preciso ter apoio
fundamental dos familiares e dos amigos, para que a vida com qualidade
siga em frente. Só no esporte, perdi a conta de quantas coisas aprendi:
sinais internacionais, cultura das colegas de outras Seleções etc.
Hoje, meu conselho para crianças, adolescentes, enfim, pessoas
com deficiência que querem seguir carreira no esporte, é nunca desistir de
seus sonhos, nada é impossível. Há um jeito para alcançá-lo, tudo em seu
tempo certo. É preciso ter persistência pelo que quer na vida. Se você quer
algo, você pode, você consegue! Para isso, é preciso acreditar em si para
alcançar seus objetivos de vida, seja ela esportiva, pessoal e/ou profissional.
168
3 Família
3.1 ADOÇÃO DE PESSOA COM DEFICIÊNCIA
INTELECTUAL
Anônimo
171
CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
172
Até que por volta do final de setembro W. volta a frequentar a
escola e finalmente D. o conhece, e só se fecha o ciclo de um sentimento
de amor por aquela criança que havia se iniciado. Na época não existia
os recursos de um smartphone para tirar uma foto e enviar para a família,
mas assim que conseguiu, ela pôde nos relatar com o ele era.
D. começou a sentir em seu coração o desejo de adotar W.,
porém, recém-formada, solteira, certamente a justiça não daria chance
para esta adoção. Mas o amor por W. foi crescendo. Eu só o conhecia
por fotos, mas o interesse em conhecê-lo e mesmo poder dar amor para
ele foram aumentando. Pedíamos para a direção da casa lar liberá-lo para
passar algum final de semana conosco, mas sempre era negado, por conta
do autismo e cerca de 400km de distância entre a cidade que D. e W.
estavam e a nossa casa, então só ficávamos na curiosidade.
Dezembro D. saiu de férias e retornou para nossa casa, na época
a tecnologia não era tão avançada e ficamos sem contato dele, porém,
decidi junto com minha outra filha Dn., de irmos conhecê-lo quando D.
voltasse de férias, e assim aconteceu no final de janeiro. W. passou dois
dias conosco no apartamento que D. morava, nenhum momento ele
estranhou, era uma criança apática e nem pegar num copo sabia. O
levamos a um clube da cidade e não sabia, sequer usar o brinquedo do
parquinho, pouco sorriso esboçava.
Na segunda e última noite então, minhas filhas e eu fomos orar
para buscar à direção de Deus na decisão da adoção. Meus filhos já
adultos, com estabilidade financeira e iniciando uma nova etapa o
aproveitar da vida, mas a chegada do W. em nossas vidas nos fez
entender que não tinha sido por acaso que D. havia ido trabalhar numa
cidade longe de casa e eu não hesitei, pois sempre fui muito cuidadosa
com meus filhos, sentia que Deus nos apresentou W. para que ele
pudesse ser amado, ter uma família, algo que nunca havia tido. N o outro
dia, pela manhã então, fui atrás de um advogado e pedi a guarda dele.
Foram apenas dois meses de espera e, no final de março de
2007, recebi a ligação de que a guarda havia sido liberada. Meu esposo
173
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ainda relutante, com medo de que não desse certo, porém, pintou o quarto
de azul, o preparamos com os móveis para a chegada dele. E meu esposo
e eu fomos buscá-lo. A o chegar na Escola Especial em que ele estudava
e D. trabalhava, a professora de W. relatou que parecia que ele sabia o
que iria acontecer, pois estava muito feliz, irradiante, diferente da
maneira com o costumava ser.
W. ao se deparar com meu esposo agarrou no pescoço dele e
começou a passar a mão em seu rosto, na verdade foi amor à primeira vista
dos dois, não paravam de se olhar! No dia seguinte retornamos para a nossa
cidade, D. pediu demissão da escola e foi junto conosco, não houve
estranheza ou desorganização da parte de W. em nenhum momento.
Foi uma alegria a chegada dele. Tratado com o o bebê da casa,
iniciou-se uma nova dinâmica na família: terapias, cuidados no
desenvolvimento, não tínhamos noção do que era o autismo, não
tínhamos ninguém da família com a deficiência, tudo novidade e
adaptações. Durante muitos anos, eu tive medo da mãe biológica dele
aparecer e o querer de volta. Dizia que sumiria com ele, mas que ela não
sentiria nem o cheiro de W.
Por conta dos cuidados com W., nossa família passou a ser mais
unida, meu esposo abandonou a prática do alcoolismo, esqueceu as
ideias de suicídio e nos aproximamos mais com o casal. M. se realizou na
paternidade e cuida de nosso filho de uma maneira ímpar.
A o longo desses anos, W, apresentou três sérias crises de
desorganização, que exigiu mais do cuidado da família para com ele,
graças a Deus todas elas superadas. Apresenta autoagressão, com
mordidas no braço quando contrariado ou bate a cabeça na parede
quando deseja expressar algo, essas são nossas preocupações. Tem uma
saúde fragilizada, alergias respiratórias e alimentares, exigindo cuidados
também nesta parte.
O ano é 2020, W. está com 18 anos de idade, com 1,80 de altura,
barba no rosto, e ele tem se desenvolvido aos poucos, ainda sua fala é
cheia de balbucios, e alguns deles identificamos com o algumas palavras.
174
Ainda não há controle de esfíncteres, precisa de ajuda para banho,
alimentação, porém, ele já progrediu em muita coisa. Terapias, não vai
mais, apenas na escola especializada para autistas e lá existem alguns
atendimentos extracurriculares. Ele ama a escola. Gosta também da
praia, e em todas as férias fazemos questão de levá-lo, o acalma.
Um dos filhos já se casou, já temos netos, e todos entendem que
W. precisa de cuidados, carinho e de amor. É um jovem feliz, se alimenta
de quase tudo, gosta de ouvir música e anda o dia todo pelo grande
quintal que tem em casa. É o motivo da união da família.
Ainda não sabemos em que ponto ele chegará no seu
desenvolvimento, com o será o amanhã... tem dias que são difíceis, não
dá para enfeitar ou romantizar o autismo, mas é o meu filho, um amor
que não dá para se mensurar e nem dizer que é maior ou menor se
comparado aos demais filhos.
Quando temos um filho biológico não sabemos se terá
deficiência ou não, quais serão suas características específicas e nem
sobre seu comportamento. O filho biológico ou o filho de adoção tem e
nos dá a mesma força do amor
Este é o relato de uma mãe que escolheu amar alguém que
desejava ser amado, uma mãe que tem o amor incondicional por seus
quatro filhos.
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3.2 CUIDANDO DO FILHO COM SÍNDROME DE DOWN
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
178
precisar de muita ajuda delas, que eu tinha que cuidar bastante, porque ele
tinha um probleminha. Então foi assim, tanto que, quando eu fazia os
exercícios nele, elas também passaram a fazer nas bonecas delas. Daí
chegou um dia e, ainda muito pequenas, elas perguntaram o quê ele tinha,
porque já haviam percebido uma diferença, então eu expliquei.
Durante a internação, logo foi necessário fazer um cateterismo.
Ele já estava com quase um ano... N o dia de seu aniversário, levei as
meninas para vê-lo. Não faltaram o bolo e as b e x ig a s . Ele estava todo
entubado, aí foi a coisa mais incrível quando ele viu as meninas: ele riu!
Ele que era sério, fechado, quando viu as meninas, acredite, ele as
reconheceu e riu para elas. Ah, meu coração parecia querer explodir de
emoção! Hoje temos essa lembrança muito forte de sua passagem pelo
hospital, que faz parte de sua história de vida. Depois do aniversário,
uma semana mais ou menos, eu recebi a notícia de que estava marcada a
cirurgia cardíaca dele, para o dia seguinte. Aí quase tive um troço.
Ficamos todos na expectativa de um resultado que não tardou a nos trazer
nova esperança: deu tudo certo! Eu fiquei mais de uma semana sem vê-
lo porque não tinha condições e só ia lá, pra receber o boletim médico.
Uma semana após a cirurgia, F recebeu alta. Nossa vinda para casa, todos
reunidos, era gratificante, mas outras questões começaram a minar nossa
convivência: tínhamos que administrar a curiosidade e o preconceito dos
vizinhos! Aliás, isso ainda é uma coisa inevitável não somente em
relação ao F, mas também às pessoas que são diferentes.
Passado esse período do pós-operatório, nossa vida familiar deu
uma guinada. Meu marido conseguiu novo emprego e nos mudamos para
Campinas. Lá, F foi colocado numa escola regular, onde ficou durante
dois anos convivendo com crianças ditas normais. Isto foi muito positivo
para o seu desenvolvimento. Em casa, lhe era dado o mesmo tratamento
recebido pelas irmãs. Assim a estimulação se fazia presente, na forma
com o os três eram criados, sem diferenciação. Mais tarde encontrei uma
Associação de Pais de filhos com Síndrome de Down, o quê foi muito
importante, tanto para F, com o para nós pais, pois é onde esses pais
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
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repente, ele sabe se comportar adequadamente, e também a respeitar as
pessoas. A gente tem que falar além do que está em livros, mas o que
entendemos ser o melhor para eles, nas diversas situações: dizer NÃO,
dói, mas é necessário, caramba, com o aos outros filhos, também. Eu
tinha que falar, me doía tanto ...mas se a gente não fizer isso, com o quê
se diz normal, senão, vira aí dono da vida, ainda mais sendo uma pessoa
com deficiência, você também tem que por limites, para não ficar um
coitado ou chamando atenção, não é mesmo? Daí ser muito importante
procurar educar com o é o certo, mas sem insistir: ensina, ele aprende,
entende, e aí, de repente, sim, ele vai saber, inclusive, se comportar
socialmente, respeitar as pessoas, cuidar do que é seu, ter certa
responsabilidade de acordo com as suas possibilidades intelectuais. Ele
adora festas, encontrar seus amigos...quando ele vai às festas, em casa
dos amigos, vai sozinho. A gente o deixa à porta e depois vai buscá-lo à
meia-noite, que é o horário combinado. O F. nunca foi rejeitado em lugar
algum. Ele já teve uma namoradinha, então a situação é muito legal
porque eles cresceram juntos, as crianças se tornaram jovens, aí chega
aquela idade em que o namorico entre eles é inevitável. Eles se
apaixonam com intensidade. Quando ele começou a namorar, a gente
percebeu crescer o sentimento, a paixão.... é com o qualquer
adolescente...não tem diferença dos “ normais” ... eles sentem amor, raiva
desprezo... eu sei porque eu convivo com meu filho, já sei quando ele
não gosta das coisas... eu sei quando ele não quer, mas olha, não teve
jeito... até que um dia, ele mesmo acabou o namoro porque ela se jogou
no pescoço de outro garoto do grupo. Ele ficou muito bravo, muito bravo
mesmo e, até hoje, são apenas amigos. Em alguns aniversários dele, aqui
em casa, cheguei a ver os dois dançando juntos, mas assim, como
amigos, ela solta, ele também, nada mais que isso. Com o é bonito de ver
esse sentimento entre eles!
Hoje, já adulto, eu penso muito no futuro. Minha maior
preocupação é porque eu já sou uma mãe idosa e tudo pode acontecer...
aí eu penso em depois que eu for, quem vai cuidar dele? Quem é que vai
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Felipe Guillermo Costa Navea (Natural de São Paulo - Pessoa com Síndrome
de Down)
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3.3 PERDA DE VISÃO POR NEGLIGÊNCIA
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dito anteriormente, meu pai preenchia um formulário para eu saber o que
era requerido em cada campo, e eu preenchia todos os demais, das 18
empresas que eu era responsável.
Isso, na minha concepção, foi fundamental para toda a minha
vida, porque aprendi a fazer tudo o que posso fazer dentro da adaptação
necessária e a não transferir essa tarefa a terceira pessoa. Facilitou muito,
inclusive, o estudo do Direito, na graduação, pois quando entrei na
faculdade já estava cega, mas totalmente adaptada às necessidades que
teria desde o primeiro dia de aula.
Apesar de ter baixa visão, sempre fui vaidosa e assim tive meu
primeiro contato com a massagem modeladora. Mal sabia eu que a minha
vaidade me levaria a conhecer uma técnica que, mais tarde, sustentaria a
mim e a minha filha, sendo o meio pelo qual iniciei uma trilha de
conhecimento acrescido de paixão pelas terapias holísticas.
Quanto a minha formação em Direito, antes de qualquer coisa,
aprendi a transformar livros e xerox em documentos acessíveis através de
scanner e de um programa específico que transformava a imagem em texto
de Word e, assim, tive acesso a todo material necessário ao meu estudo.
Também os professores da graduação não tiveram que fazer
qualquer adaptação as suas aulas, a não ser me fornecer a prova em
arquivo Word para que eu respondesse junto com meus colegas na sala
de aula, situação que fez com que muitos professores só descobrissem a
minha deficiência quando eu requeria a prova adaptada.
Durante a faculdade de Direito, também tive poucos amigos e
para dizer a verdade acho que tinha mais colegas que não gostavam de
mim na turma do que o contrário. Meu pai sempre me dizia que quando
chegávamos pela manhã na faculdade, além de algumas pessoas ficarem
totalmente mudas para não me cumprimentar ou falar comigo, havia
carteiras e cadeiras espalhadas pelo caminho que eu teria de fazer para
chegar até o local aonde eu sentava. Além de que, é claro, eram raros os
convites para sair para um barzinho ou baladinha com meus colegas de
turma. Mas, dentre os poucos colegas que fiz, tenho a alegria de trabalhar
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com um deles até hoje e de ter umas três colegas que ainda mantenho o
contato e tenho muito carinho.
Voltando para a minha graduação em Direito, o fato de eu
digitar rapidamente me facilitou anotar tudo o que meus professores
passavam em sala de aula. Então não fiz uso de gravadores ou de outros
métodos que exigissem esforço maior, fora daquele período,
possibilitando assim, que eu trabalhasse com o massoterapeuta no contra
turno, à tarde, sendo esta a principal forma com a qual sustento a mim e
a minha filha, até os dias atuais.
Faço questão de dizer que sou eu quem sustenta a mim e a
minha filha porque este é outro período importante da minha história.
Como já disse, logo que engravidei o meu problema de visão voltou a
progredir e trouxe uma catarata de presente com o nascimento da minha
filha. Quando ela tinha 1,2 anos fiz cirurgia de catarata nos dois olhos.
Costumo dizer que entrei enxergando no hospital e sai de lá guiada pela
ausência da visão que antes da cirurgia era consideravelmente razoável.
Usava 5,5 graus e 6 graus nos óculos, o que me permitia andar sem
qualquer auxílio de pessoa ou de bengala, ler letras em tamanho normal
e até letrinhas da Bíblia, e levar uma vida pessoal e profissional dentro
dos padrões considerados normais para a sociedade.
Hoje sei que jamais deveria ter feito aquela cirurgia que me fez
entrar enxergando no hospital e sair dele guiada, pois, com a doença
degenerativa que eu tinha, a cirurgia de catarata representava um risco
enorme de ficar cega. Entretanto, além de não ter tido essa informação
antes de fazer a cirurgia, o grupo dos médicos que me operaram garantiu
que não havia risco algum.
Com a nova realidade de pessoa praticamente cega, meu ex-
marido e pai da minha filha foi embora e em seguida constituiu nova
família, ignorando absolutamente qualquer necessidade da própria filha
que temos em comum.
Então, neste período fiquei cega, fui abandonada e descobri que
já era traída há certo tempo. Não estava trabalhando, as parcelas do
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seguro-desemprego haviam terminado e eu não tinha dinheiro para
absolutamente nada e ainda tinha a minha filhinha de apenas 1,2 anos
para criar.
Confesso que de fato, só me dei conta desta realidade, no dia
em que tive de limpar e desligar a geladeira da minha casa. Não havia
nada para colocar nela, bem com o também não havia nada nos armários,
e sequer, um shampoo eu tinha em casa. Com o eu morava de favor em
uma casa no terreno dos meus pais, naquele período em que eu iniciava
um processo de reabilitação, eu comia na casa deles, tomava meu banho
lá e dependia deles para me auxiliarem com toda a logística minha e da
minha filha (escola, médico, etc.).
Neste início lembro de três passagens singulares que marcaram
a minha vida de “ cega fresca” :
1. Quando eu, no cantinho da sala dos meus pais, bem na ponta
da mesa de imbuia que eles tinham, segurando minha filha no colo e
chorando, perguntei se eles já tinham contado para o meu irmão, que
morava na época em New York, se ele já estava sabendo que a irmã dele
tinha ficado uma inválida, que não servia para mais nada na vida;
2. Quando estava caminhando, lentamente, passo a passo, para
o local aonde eu estava iniciando a minha reabilitação, sozinha, por
imposição minha, sem bengala, porque eu tinha vergonha de haver me
tornado “ uma mulher cega” , então caí de joelhos sobre um monte de
areia no meio da calçada, bem no centro da cidade, e na frente de um
rapaz que gargalhou e pior, caminhou longas duas ruas, rindo de mim.
Digo longas porque pareciam nunca acabar, rindo desesperadamente da
minha condição de pessoa cega, sem mobilidade, andando suja,
lentamente e chorando. Naquele dia e por conta deste episódio, peguei a
bengala pela primeira vez e decidi que aprenderia a andar com ela para
jamais passar por aquilo novamente; e
3. Quando tive que limpar e desligar a minha geladeira por não
ter nada para por dentro dela. Lembro de que depois que limpei tudo, fui
me abaixando até ficar prostrada no chão chorando, muito,
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3 .4 VIVER COMO ESPOSA, MULHER E CUIDADORA
*Mãe. Avó. Dona de casa. Ativista social. Natural de São Paulo/SP. Esposa de Wilson
Roberto Gomiero.
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
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ainda dava alguns passos e conseguia ir ao banheiro. Dormíamos juntos
na nossa cama de casal.
Com a evolução do quadro, tivemos que comprar uma cama
hospitalar para tornar mais fácil sua movimentação. Ele também passou
a utilizar uma cadeira de rodas e tivermos que providenciar uma cadeira
de banho. Começou também a ficar difícil retirá-lo da cama para colocá-
lo na cadeira de rodas e de banho, então, lançamos mão de um guincho,
Desde 2000, estávamos nos envolvendo no Terceiro Setor, trabalhando
nas associações de pacientes para poder aprender a utilizar os serviços
públicos que temos direito e também começar a atuar para ter mais
direitos. Como eu já havia parado de trabalhar, definitivamente, por ter
que tomar conta das suas necessidades no dia a dia, passei então a
acompanhá-lo em toda essa rotina de associações, conselhos de direitos,
reuniões com políticos, viagens para intercâmbio com outros pacientes e
também para palestras sobre esclerose múltipla.
A partir de 2010, começamos a nos envolver com doenças raras
o que, no final, nos levou a participar, digo ele, a participar do Conselho
Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, o CONADE, em
Brasília, o que fazia com que tivéssemos que viajar a cada dois meses.
Daí passamos a conviver com todos os problemas da
acessibilidade no Brasil, desde a questão do transporte terrestre,
transporte aéreo, hospedagem e até mesmo a falta de acessibilidade para
utilização de banheiros, o que ocorre até na própria Secretaria Nacional
da Pessoa com Deficiente, em Brasília.
Parece-me que o meu marido está tão concentrado na sua
participação nos conselhos, nas discussões, às vezes dá impressão de que
ele não está atento às necessidades que não são atendidas para as pessoas
com deficiência. E isso me causa revolta, pois acredito que o nosso
trabalho não está sendo visto e levado a sério com o deveria.
Sempre digo a ele que, muito do que ele conseguiu e muito do
que nós temos, deveu-se a inúmeras vezes que tive que me humilhar para
pedir favores, para fazer valer os direitos que não deveriam necessitar
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
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3.5 ENCARANDO A MATERNIDADE E O AUTISMO
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proteger, você cai. E ficar caída para uma mãe de autista não é uma
possibilidade. Se cair, temos que nos levantar rápido. E não foram poucas
as vezes que caí e me levantei. Eu também passei por choros (e muitos!) e
terapias. Procurei me procurar, meditei, fui encontrar eu mesma.
M esmo com as dificuldades, a minha filha só me faz evoluir
com o ser humano. Eu sei o quanto é ser feliz com o pouco. Ser feliz por
ela conseguir imitar um gesto, uma palavra nova, uma habilidade.
Enxergo que cada pessoa é única e que não existe perfeição e que temos
que aceitar todas as pessoas com o são.
E mesmo após os 6 (seis) anos do aniversário do diagnóstico,
esses longos anos que demoraram tanto a passar, eu me sinto bem e feliz,
mesmo ela não tendo evoluído como o idealizado por mim lá no com eço
do diagnóstico.
É que hoje eu vivo o hoje! Não penso no que passou nem muito
no que vai ser. A ansiedade lá do início me paralisava. Quando chegava
perto do aniversário dela, sempre me perguntava se um dia ela
conseguiria me perguntar algo ou manter um diálogo e me dava uma
grande tristeza.... E tudo que eu esperava um dia, está acontecendo, mas
muito, muito lentamente e somente com a motivação da existência da
vida dela é que eu sigo na persistência.
Hoje, fruto da quarentena e pela realização de um sonho, estou
esperando uma bebê. Não a idealizo, apenas a amo e a aceito. A vida me
ensinou a não idealizar e sim ACEITAR e AM AR, pois somente com o
A M O R é que tudo faz sentido. Não penso se será autista ou não. Apenas
vivo o hoje, vendo minha barriga crescer e passar apenas tranquilidade
para esse ser que está no meu ventre. Estou verdadeiramente curtindo
essa fase, sem me “ PREocupar” com o que será. Aliás, ela está se
mexendo nesse exato momento, já deixo registrado.
A lgo que me ajuda muito é que eu tenho uma rede de apoio de
14 (quatorze) mães de crianças e adolescentes com autismo. Eles são de
diferentes jeitos, cada um do seu, porque afinal, somos únicos. Elas me
dão força para continuar na luta, são mais família do que família, são
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mais irmãs do que irmã pelo simples fato de que passamos pelo mesmo
caminho, as mesmas dores e superações. E uma ajuda a outra, numa linda
rede de apoio e laços de afeto.
Se eu fosse dar uma dica para uma mãe que recebeu o
diagnóstico hoje é: viva o hoje, procure pessoas com o você e cultive uma
rede de apoio. Isso está sendo muito importante nessa pandemia que
vivemos, pois obviamente tudo bagunçou. As terapias e escola
suspenderam e a mãe atípica acrescentou mais duas funções: ser
professora e terapeuta.
E é muito mais fácil superar juntos do que isoladamente. Essa
rede de apoio vem para isso. Quando uma cai, várias mãos se estendem.
É como disse, o AM O R vence tudo. Parece clichê, mas não é, é
a mais pura verdade. Hoje eu ainda continuo sem saber se minha filha
vai atingir a plena independência, mas até lá, estarei com ela, feliz e a
incentivando, vivendo o hoje e dando-lhe muito amor.
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3 .6 DE REPENTE... AUTISTA
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
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encontrava na internet, porque naquela época, não tínhamos informações
de qualidade. Foi então que resolvi criar uma associação de pais, com a
ajuda de uma psicóloga do grupo de pais.
Em 2009 fundamos a Associação Kasa dos Autistas (AK A),
hoje referência em Transtorno do Espectro Autista (TEA).
Participamos da criação de leis municipais, damos assessoramento às
famílias que solicitam ajuda.
Depois de passar 2 anos em busca do que não tínhamos nem na
saúde e nem na educação, resolvi eu mesma ser o apoio que meu filho
precisava. Especializei-me, aprendi sobre protocolos internacional de
intervenção e eu mesma fui todos os terapeutas que pude para ele. Não
tinha plano de saúde e no SUS não existia, e ainda não existe,
atendimento específico e de qualidade para as pessoas com autismo.
Meu filho teve um desenvolvimento fantástico, passou em
primeiro lugar na Universidade Positivo, mas infelizmente ainda não está
na faculdade porque não podemos pagar.
Hoje eu vivo em função do TEA, estou fazendo Faculdade de
Psicopedagogia com bolsa gratuita, que conquistei com a minha nota do
Enem. Faço formação em A B A 1 e TEA, quero ser analista do
comportamento para poder ajudar as famílias com o diagnóstico do TEA.
Tenho o sonho de construir um Centro de Referência em TEA, aqui na
minha cidade e estou trabalhando para isso.
Hoj e temos mais um diagnóstico na família: meu único neto é autista.
Não foi fácil, não romantizo o autismo, não é benção, não é
carma, praga, não sou super-mãe, “ mãe azul” , nada disso. Passamos por
momentos desesperadores, alienação parental. A família nos desprezou,
meu filho sofreu bullying, rejeição, exclusão, passei dias ajoelhada ao pé
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da sua cama pedindo a Deus forças. Mas com toda certeza, esse foi o
maior ensinamento da minha vida, colocar-me no lugar do outro me fez
ser um ser humano infinitamente melhor. Sei que não é fácil e muitas
mães não conseguem, devido a falta de apoio. O índice de suicídio entre
as mães de filhos com autismo é altíssimo, esse é o motivo da minha luta:
ser em prol de “ quem cuida” . A falta de atendimento às famílias
especificamente às mães, também é uma violência, somos invisíveis.
Não foi fácil, nem tudo são rosas, mas as que eu pude colher
fizeram a diferença na minha vida.
Am o meu filho incondicionalmente, muito além do TEA.
Essa é a minha história.
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3.7 CONHECENDO A DEFICIÊNCIA VISUAL - BAIXA VISÃO
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
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contato de fato, com essa realidade de ter uma filha que mais tarde ficaria
quase totalmente cega.
Tudo era novidade, desconhecido e amedrontador. N o início,
me sentia estranha no meio de outras mães com suas crianças, era um
misto de sentimentos tristes, com pena. Não só dos outros, mas também
de mim mesma, por fazer parte daquela rotina.
Uma das professoras também tinha Glaucoma e foi muito
importante para me mostrar que era possível ser uma pessoa totalmente
capaz, independente e autônoma. Sua mãe era uma pessoa muito a frente:
estimulava, incentivava e foi quem abriu a instituição para que a filha
pudesse trabalhar com crianças e adultos com a mesma deficiência. Foi um
dos maiores exemplos, com quem consegui vislumbrar que seria possível
L. ser quem ela gostaria de ser e fazer o quê gostaria de fazer no futuro.
Essa instituição foi muito importante no aprendizado e estímulo
neurológico, psicomotor e geral. Ela aprendeu diversas coisas básicas,
com o noção espacial, sensorial, percepção de outros sentidos e toda a
alfabetização inicial, aos poucos, com dedicação e cuidado.
Confesso que não foi fácil: morria de medo de que algo
acontecesse, que ela se machucasse. Mas é preciso deixar a criança
experimentar. Só assim ela terá condições de ver até aonde pode ir.
Sempre digo que o limite é a própria pessoa quem faz. Não devem existir
limites pré-estipulados. Mas os pais precisam ser corajosos e ensinar seus
filhos a serem da mesma forma. Caiu, levanta! Se machucou, melhora,
se restabelece. Foram inúmeras as vezes em que chorei calada, porque a
vi tropeçar, cair, bater a cabeça em algum lugar, mas deixei-a construir
sua própria noção de espaço.
Não temos noção do que são capazes, até realmente os
soltarmos com cuidado e então vermos que podem sim, aprender e
superar o que quiserem, mesmo com a limitação visual. É possível!
Os primeiros desafios maiores foram na escola, pois as
professoras do ensino regular não sabiam com o atendê-la e trabalhar com
o que fosse melhor para ela. Às vezes, foi necessário fazer mudança de
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está adulta, trabalha numa empresa de tecnologia e cursa Letras na
UFPR. Hoje conta com mentores e assessores dentro da Faculdade. Tudo
é passado conforme as normas.
Quando ela nasceu, perguntei a mim mesma: “ por que isso
aconteceu com igo? Por que sou mãe de uma pessoa com deficiência? ”
Hoje minha pergunta modificou e digo: “ e por que não com igo? ”
Se quisermos ver mudança no mundo e uma melhor
conscientização sobre acessibilidade e diferenças é necessário que
comecemos por nós, em assumirmos nossa identidade e
representatividade ativa.
Sempre tentei possibilitar experiências a ela. Pois mostro como
fazer, mas tento não fazer em seu lugar, para que ela aprenda. Hoje trago
principalmente da minha formação e profissão com o psicóloga, que a
mãe suficientemente boa é aquela que solta o seu filho para que ele
desbrave suas reais e possíveis capacidades. Esse é um ponto crucial para
mim, ficamos sim preocupadas, por acharmos que nossos filhos são
vulneráveis ou indefesos, mas a superproteção seria uma forma de
incapacitar e até mesmo “ aleijar” um sujeito que pode ter alguma
condição física limitante, mas que não faz dele um limitado.
Agradeço muito todos os dias a Deus, a força criadora e fonte
de tudo, ter me permitido ser mãe de um ser tão especial, real, feliz,
encantador, batalhador e forte que é a minha filha nesta vida. Eu ensino,
mas digo que aprendo muito mais, por ser mãe dela.
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3 .8 OS DESAFIOS DA DEFICIÊNCIA NA VIDA DO CASAL
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CONSCIENTIZAR PARA INCLUIR: Sexualidade, Violência e Família da Pessoa com Deficiência
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A o final de 1999, comecei a sentir que o meu lado esquerdo
havia começado a ter problemas de sensibilidade, tanto na perna quanto
no braço. Fui ao meu médico neurologista e após a consulta, ele disse
não ser normal aquilo que eu estava sentindo. Ele me acompanhava, bem
ou mal, desde 1989 e tinha absoluta certeza de que a esclerose múltipla
havia desenvolvido seu foco de atividade do lado direito e minha última
ressonância magnética não apresentava nenhum ponto que pudesse
configurar um novo surto que pudesse atingir meu lado esquerdo.
Diversos exames expuseram o que havia de errado comigo:
havia crescido na minha cervical, correndo em paralelo com a medula
espinal, um tumor de 12 centímetros de comprimento. Estava
comprimindo toda a medula, fazendo com que eu tivesse todos aqueles
sintomas incômodos, quais sejam: já estava paralisado do pescoço para
baixo, sem movimento nos braços e pernas, estava com a respiração
muito comprometida e tinha dores que não me deixaram dormir.
Entrei em cirurgia no Hospital de Clínicas (HC) de São Paulo
às 8 da manhã do dia 5 de junho de 2000 e a cirurgia terminou por volta
das 21 do mesmo dia. Fui encaminhado para a UTI do centro cirúrgico.
Fui para o quarto na terça e no domingo, seis dias após a cirurgia, minha
esposa me disse acreditar que logo eu teria alta, ao que respondi: “ vou te
dar de presente do Dias dos Namorados a minha ida para casa” .
Realmente foi o que aconteceu, tive alta no dia 12 pela manhã e à tarde
já me encontrava em casa. Para quem tinha uma previsão de quem sabe,
até um mês de internação após cirurgia, em uma semana fiquei liberado.
Começava então a minha recuperação dentro da minha casa.
Minha esposa havia conseguido uma cama hospitalar que foi colocada
na sala da minha casa, onde eu fiquei durante três meses.
Após três meses fui a uma consulta com o cirurgião e entrei na
sala andando devagar, apoiado pela minha esposa. Escutei a pergunta por
parte dele: “ com o você anda?” Eu respondi a ele: “ C oloco um pé na
frente do outro e ando” . Então ele me disse: “ pelo tipo de cirurgia que te
fiz você não deve ter quase que nenhuma sensibilidade do pescoço para
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pois passei a entender os grandes problemas que atrapalham a todos que,
no Brasil, procuram trabalhar no terceiro setor.
Um grande dilema de quem entra numa situação com o a que eu
estava entrando agora, é descobrir que a coisa mais importante do mundo
- o tempo - nos é retirado. Tentando explicar de uma forma mais
transparente, quando você se torna dependente de outras pessoas a
satisfação de suas necessidades depende do tempo e disposição delas.
Neste meu início da caminhada para a deficiência, não tinha mais
condições de fazer pequenos reparos ou pequenas manutenções na casa
onde morava. A sala era enorme e havia na mesma, seis pontos com
lâmpada, sendo que uma delas ficava bem sobre a cadeira que eu utilizava
para leitura. Percebi que essa lâmpada já se encontrava em ponto de
queimar, comentei com a minha filha e ela me disse: “ realmente, logo,
logo ela queima” . Depois passou meu genro e comentei que lâmpada iria
queimar. Ele disse: “ não deve durar mais do que duas semanas” . Esperei
um pouco, meu filho passou, comentei com ele: “ cara, esta lâmpada vai
queimar” . Ele mais do que depressa, disse-me: olha, pensei que ela já
tivesse queimado.” Por último passou meu cunhado, chamei-o e disse:
“ por favor, me pega aquela cadeira” . Ele rapidamente pegou. “ Coloque
aqui na minha frente” . Falei em seguida: “ agora pega a lâmpada, sobe na
cadeira e troque para mim, por favor” . Ele então me disse: “ pô compadre,
por que não me pediu direto para trocar a lâmpada?” . Respondi a ele: “ falei
com três e nenhum tomou providência” . Ele me respondeu: “ mas você
pediu o que queria?” Daí aprendi também que não adianta querer que as
pessoas adivinhem o que você deseja, você tem que deixar bem claro o
que quer. Fica, porém, a ressalva de que você somente será atendido no
tempo que essa pessoa se dispuser.
A pessoa a quem eu devo estar vivo e ser quem eu sou hoje é,
sem dúvida nenhuma, a minha parceira de todas as horas, a minha
esposa. Quando a conheci, há 46 anos, não tinha ideia de quanto era
possível amar uma pessoa e ter por parte dela toda correspondência, ou
melhor, muito mais do que eu dei, tenho recebido.
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pele. Não que eu não possa fazer isso, porém eu não tenho a sensibilidade
do contato. Isto me faz muita falta.
Nos dias de hoje, acordo pela manhã e vivo o resto do dia em
função de tê-la ao meu lado, ajudando-me em tudo, desde minha
alimentação, higiene pessoal, água, até o olhar para meus momentos de
tristezas e desânimo.
Com o evoluir da doença e principalmente em decorrência das
dores neuropáticas, comecei a consumir uma quantidade muito grande
de medicações. Um dos efeitos colaterais dessas medicações é a
impotência sexual, que no meu caso ainda foi agravada pela lesão
medular. Deixamos de ter uma vida ativa sobre esse ponto de vista,
porém, com o sempre dizemos, o importante não é o ato em si, mas todo
o carinho, amor e envolvimento que ainda podemos levar um para o
outro, bem com o respeito entre nós. A falta do contato física é suplantada
por uma carícia, um abraço, uma palavra de amor e no nosso caso, aquele
momento bem nosso, quando ela faz da hora do meu banho, um momento
especial de cuidado e carinho.
Nunca enfrentei episódio de violência, porém, sempre fico um
pouco perturbado quando nos encontramos em algum lugar público e a
pessoa ao me atender não se dirige a mim e sim à minha esposa. Tenho
certeza de que não é só no meu caso, mas na maioria das vezes isso
acontece com as pessoas com deficiência, aparentando que elas não têm
com o expressar a sua vontade, dependendo totalmente da manifestação
de quem as acompanha.
Vem daí aquilo que eu sempre digo: a pessoa com deficiência
física tem que assumir o protagonismo de sua vida, pois só assim
passará a ser respeitado com o cidadão. Não queremos ser incluídos,
queremos ser reconhecidos. Reconhecidos com o pessoas, com o
cidadãos, com o seres humanos.
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NACIONAL
Editora