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MARCO
REGULATÓRIO DO

SANEAMENTO
BÁSICO
Lei 1 4 .0 2 6 / 2 0 2 0
Marco Regulatório do Saneamento
Básico

Lei n° 14.026/2020
Leandro Frota
Vânia Aieta
(Coordenadores)

Marco Regulatório do Saneamento


Básico

Lei n° 14.026/2020

Brasília - DF, 2021


© Ordem dos Advogados do Brasil
Conselho Federal, 2021
Setor de Autarquias Sul - Quadra 5, Lote 1, Bloco M
Brasília - DF CEP: 70070-939

Distribuição: Conselho Federal da OAB - GRE


E-mail: oabeditora@oab.org.br

O Conselho Federal da OAB - por meio da OAB Editora - ressalta que as opiniões emitidas
nesta publicação, em seu inteiro teor, são de responsabilidade dos seus autores.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil - Biblioteca Arx Tourinho)

M321mr

Marco Regulatório do Saneamento Básico : Lei n° 14.026/2020 /


coordenadores: Leandro Frota, Vânia Aieta - Brasília: OAB Editora, 2021.

viii, 466 p.

ISBN: 978-65-5819-025-7.

1. Concessão de serviços públicos, regulação, Brasil, coletânea. 2.


Saneamento básico, regulação, aspectos jurídicos, Brasil, coletânea. 3.
Agência reguladora, saneamento, Brasil. 4. Políticas públicas,
saneamento, Brasil. 5. Serviço de água e esgotos, regulação, aspectos
jurídicos, Brasil. I. Frota, Leandro, coord. II. Aieta, Vânia, coord. III.
Brasil. Lei n° 14.026/2020. IV. Título.

CDDir: 341.353
CDU: 628:35.078.2(81)
Gestão 2019/2022
Diretoria
Felipe Santa Cruz Presidente
Luiz Viana Queiroz Vice-Presidente
José Alberto Simonetti Secretário-Geral
Ary Raghiant Neto Secretário-Geral Adjunto
José Augusto Araújo de Noronha Diretor-Tesoureiro
Conselheiros Federais
AC: Cláudia Maria da Fontoura Messias Sabino; AL: Fernanda Marinela de Sousa Santos, Fernando Carlos
Araújo de Paiva e Roberto Tavares Mendes Filho; AP: Alessandro de Jesus Uchôa de Brito, Felipe Sarmento
Cordeiro e Helder José Freitas de Lima Ferreira; AM: Aniello Miranda Aufiero, Cláudia Alves Lopes
Bernardino e José Alberto Ribeiro Simonetti Cabral; BA: Carlos Alberto Medauar Reis, Daniela Lima de
Andrade Borges e Luiz Viana Queiroz; CE: André Luiz de Souza Costa; Hélio das Chagas Leitão Neto e
Marcelo Mota Gurgel do Amaral; DF: Daniela Rodrigues Teixeira, Francisco Queiroz Caputo Neto e Ticiano
Figueiredo de Oliveira; ES: Jedson Marchesi Maioli, Luciana Mattar Vilela Nemer e Luiz Cláudio Silva
Allemand; GO: Marcello Terto e Silva, Marisvaldo Cortez Amado e Valentina Jungmann Cintra; MA: Ana
Karolina Sousa de Carvalho Nunes, Charles Henrique Miguez Dias e Daniel Blume Pereira de Almeida; M T:
Felipe Matheus de França Guerra, Joaquim Felipe Spadoni e Ulisses Rabaneda dos Santos; MS: Ary
Raghiant Neto, Luís Cláudio Alves Pereira e Wander Medeiros Arena da Costa; MG: Antônio Fabrício de
Matos Gonçalves, Bruno Reis de Figueiredo e Luciana Diniz Nepomuceno; PA: Afonso Marcius Vaz
Lobato, Bruno Menezes Coelho de Souza e Jader Kahwage David; PB: Harrison Alexandre Targino, Odon
Bezerra Cavalcanti Sobrinho e Rogério Magnus Varela Gonçalves; PR: Airton Martins Molina, José Augusto
Araújo de Noronha e Juliano José Breda; PE: Leonardo Accioly da Silva, Ronnie Preuss Duarte e Silvia
Márcia Nogueira; PI: Andreya Lorena Santos Macêdo, Chico Couto de Noronha Pessoa e Geórgia Ferreira
Martins Nunes; RJ: Carlos Roberto de Siqueira Castro, Luiz Gustavo Antônio Silva Bichara e Marcelo
Fontes Cesar de Oliveira; RN: Ana Beatriz Ferreira Rebello Presgrave, Artêmio Jorge de Araújo Azevedo e
Francisco Canindé Maia; RS: Cléa Anna Maria Carpi da Rocha, Rafael Braude Canteiji e Renato da Costa
Figueira; RO: Alex Souza de Moraes Sarkis, Andrey Cavalcante de Carvalho e Franciany D’Alessandra Dias
de Paula; RR: Emerson Luis Delgado Gomes, Dalva Maria Machado e Rodolpho César Maia de Morais;
SC: Fábio Jeremias de Souza, Paulo Marcondes Brincas e Sandra Krieger Gonçalves; SP: Alexandre
Ogusuku, Guilherme Octávio Batochio e Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró; SE: Adélia Moreira Pessoa,
Maurício Gentil Monteiro e Paulo Raimundo Lima Ralin; TO: Antônio Pimentel Neto, Denise Rosa Santana
Fonseca e Kellen Crystian Soares Pedreira do Vale.

Conselheiros Federais Suplentes


AC: Luiz Saraiva Correia, João Tota Soares de Figueiredo Filho e Odilardo José Brito Marques; AL: Ana Kilza
Santos Patriota, João Luís Lôbo Silva e Sergio Ludmer; AP: Emmanuel Dante Soares Pereira, Maurício Silva
Pereira e Paola Julien Oliveira dos Santos; AM: Daniel Fabio Jacob Nogueira; Márcia Maria Cota do Álamo e
Sergio Rodrigo Russo Vieira; BA: Antonio Adonias Aguiar Bastos, Ilana Kátia Vieira Campos e Ubirajara
Gondim de Brito Ávila; CE: Alcimor Aguiar Rocha Neto, André Rodrigues Parente e Leonardo Roberto
Oliveira de Vasconcelos; DF: Raquel Bezerra Cândido, Rodrigo Badaró Almeida de Castro e Vilson Marcelo
Malchow Vedana; ES: Carlos Magno Gonzaga Cardoso, Luiz Henrique Antunes Alochio e Ricardo Álvares
da Silva Campos Júnior; GO: Dalmo Jacob do Amaral Júnior, Fernando de Paula Gomes Ferreira e Rafael
Lara Martins; MA: Deborah Porto Cartágenes, João Batista Ericeira e Yuri Brito Corrêa; MT: Ana Carolina
Naves Dias Barchet, Duilio Piato Junior e José Carlos de Oliveira Guimarães Junior; MS: Afeife Mohamad
Hajj, Luíz Renê Gonçalves do Amaral e Vinícius Carneiro Monteiro Paiva; MG: Felipe Martins Pinto, Joel
Gomes Moreira Filho e Róbison Divino Alves; PA: Luiz Sérgio Pinheiro Filho e Olavo Câmara de Oliveira
Junior; PB: Marina Motta Benevides Gadelha, Rodrigo Azevedo Toscano de Brito e Wilson Sales Belchior;
PR: Artur Humberto Piancastelli, Flavio Pansieri e Graciela Iurk Marins; PE: Ademar Rigueira Neto, Carlos
Antônio Harten Filho e Graciele Pinheiro Lins Lima; PI: Raimundo de Araújo Silva Júnior, Shaymmon
Emanoel Rodrigues de Moura Sousa e Thiago Anastácio Carcará; RJ: Eurico de Jesus Teles Neto; Flavio
Diz Zveiter e Gabriel Francisco Leonardos; RN: Fernando Pinto de Araújo Neto e Olavo Hamilton Ayres
Freire de Andrade; RS: Beatriz Maria Luchese Peruffo, Greice Fonseca Stocker e Maria Cristina Carrion
Vidal de Oliveira; RO: Jeverson Leandro Costa, Juacy dos Santos Loura Júnior e Veralice Gonçalves de
Souza Veris; RR: Bernardino Dias de Souza Cruz Neto e Stélio Dener de Souza Cruz; SC: José Sérgio da
Silva Cristóvam, Sabine Mara Müller Souto e Tullo Cavallazzi Filho; SP: Alice Bianchini e Daniela Campos
Liborio; SE: Glícia Thaís Salmeron de Miranda, Tatiane Gonçalves Miranda Goldhar e Vitor Lisboa
Oliveira; TO: Alessandro de Paula Canedo, Cabral Santos Gonçalves e Luiz Tadeu Guardiero Azevedo.
Ex-Presidentes
1. Levi Carneiro (1933/1938) 2. Fernando de Melo Viana (1938/1944) 3. Raul Fernandes (1944/1948) 4.
Augusto Pinto Lima (1948) 5. Odilon de Andrade (1948/1950) 6. Haroldo Valladão (1950/1952) 7. Attílio
Viváqua (1952/1954) 8. Miguel Seabra Fagundes (1954/1956) 9. Nehemias Gueiros (1956/1958) 10.
Alcino de Paula Salazar (1958/1960) 11. José Eduardo do P. Kelly (1960/1962) 12. Carlos Povina
Cavalcanti (1962/1965) 13. Themístocles M. Ferreira (1965) 14. Alberto Barreto de Melo (1965/1967)
15. Samuel Vital Duarte (1967/1969) 16. Laudo de Almeida Camargo (1969/1971) 17. Membro Honorário
Vitalício José Cavalcanti Neves (1971/1973) 18. José Ribeiro de Castro Filho (1973/1975) 19. Caio Mário
da Silva Pereira (1975/1977) 20. Raymundo Faoro (1977/1979) 21. Eduardo Seabra Fagundes
(1979/1981) 22. Membro Honorário Vitalício J. Bernardo Cabral (1981/1983) 23. Mário Sérgio Duarte
Garcia (1983/1985) 24. Hermann Assis Baeta (1985/1987) 25. Márcio Thomaz Bastos (1987/1989) 26.
Ophir Filgueiras Cavalcante (1989/1991) 27. Membro Honorário Vitalício Marcello Lavenère Machado
(1991/1993) 28. Membro Honorário Vitalício José Roberto Batochio (1993/1995) 29. Membro Honorário
Vitalício Ernando Uchoa Lima (1995/1998) 30. Membro Honorário Vitalício Reginaldo Oscar de Castro
(1998/2001) 31. Rubens Approbato Machado (2001/2004) 32. Membro Honorário Vitalício Roberto
Antonio Busato (2004/2007) 33. Membro Honorário Vitalício Raimundo Cezar Britto Aragão
(2007/2010) 34. Membro Honorário Vitalício Ophir Cavalcante Junior (2010/2013) 35. Membro
Honorário Vitalício Marcus Vinicius Furtado Coêlho (2013/2016) 36. Membro Honorário Vitalício
Claudio Pacheco Prates Lamachia (2016/2019).
Presidentes Seccionais
AC : Erick Venancio Lima do Nascimento; AL : Nivaldo Barbosa da Silva Junior; AP : Auriney Uchôa de Brito;
AM : Marco Aurélio de Lima Choy (licenciado); Grace Anny Fonseca Benayon Zamperlini (em exercício:
1°.01.2021 a 31.12.2021); BA : Fabrício de Castro Oliveira; CE : José Erinaldo Dantas Filho; DF: Delio Fortes Lins
e Silva Junior; ES: Jose Carlos Rizk Filho; GO : Lúcio Flávio Siqueira de Paiva; MA: Thiago Roberto Morais Diaz;
MT : Leonardo Pio da Silva Campos; MS : Mansour Elias Karmouche; MG : Raimundo Candido Junior; PA :
Alberto Antonio de Albuquerque Campos; PB : Paulo Antonio Maia e Silva; PR :Cassio Lisandro Telles; PE : Bruno
de Albuquerque Baptista; PI: Celso Barros Coelho Neto; RJ : Luciano Bandeira Arantes; RN : Aldo de Medeiros
Lima Filho; RS : Ricardo Ferreira Breier; RO : Elton Jose Assis; RR : Ednaldo Gomes Vidal; SC: Rafael de Assis
Horn; SP: Caio Augusto Silvados Santos; SE: Inácio José Krauss de Menezes; TO: Gedeon Batista Pitaluga Júnior.
Coordenação Nacional das Caixas de Assistência dos Advogados - CONCAD
Pedro Zanete Alfonsin Coordenador Nacional
Aldenize Magalhães Aufiero Coordenadora CONCADNorte
Andreia de Araújo Silva Coordenadora CONCADNordeste
Itallo Gustavo de Almeida Leite Coordenador CONCAD Centro-Oeste
Luis Ricardo Vasques Davanzo Coordenador CONCAD Sudeste
Presidentes das Caixas de Assistência dos Advogados
AC : Thiago Vinícius Gwozdz Poerch; AL : Ednaldo Maiorano de Lima; AP : Jorge José Anaice da Silva; AM :
Aldenize Magalhães Aufiero; BA : Luiz Augusto R. de Azevedo Coutinho; CE : Luiz Sávio Aguiar Lima; DF:
Eduardo Uchôa Athayde; ES: Aloisio Lira; GO : Rodolfo Otávio da Mota Oliveira; MA : Diego Carlos Sá dos
Santos; MT : Itallo Gustavo de Almeida Leite; MS: José Armando Cerqueira Amado; MG : Luís Cláudio da Silva
Chaves; PA: Francisco Rodrigues de Freitas; PB : Francisco de Assis Almeida e Silva; PR: Fabiano Augusto Piazza
Baracat; PE : Fernando Jardim Ribeiro Lins; PI: Andreia de Araújo Silva; RJ : Ricardo Oliveira de Menezes; RN :
Monalissa Dantas Alves da Silva; RS : Pedro Zanete Alfonsin; RO : Elton Sadi Fulber; RR : Ronald Rossi Ferreira;
SC : Claudia Prudencio; SP: Luis Ricardo Vasques Davanzo; SE : Hermosa Maria Soares França; TO : Sergio
Rodrigo do Vale.
Fundo de Integração e Desenvolvimento Assistencial dos Advogados - FIDA
Felipe Sarmento Cordeiro Presidente
Gedeon Batista Pitaluga Júnior Vice-Presidente
Andreia Araújo Silva Secretária-Geral
José Augusto Araújo de Noronha Representante da Diretoria
Membros
Alberto Antonio Albuquerque Campos
Aldenize Magalhães Aufiero
Itallo Gustavo de Almeida Leite
Luciana Mattar Vilela Nemer
Luis Ricardo Vasques Davanzo
Paulo Marcondes Brincas
Pedro Zanette Alfonsin
Silvia Marcia Nogueira
Thiago Roberto Morais Diaz
Afeife Mohamad Hajj
Lucio Flávio Siqueira de Paiva
Monalissa Dantas Alves da Silva
Nivaldo Barbosa da Silva Junior
Raquel Bezerra Cândido
ESA Nacional
Ronnie Preuss Duarte Diretor-Geral
Luis Cláudio Alves Pereira Vice-Diretor
Conselho Consultivo:
Alcimor Aguiar Rocha Neto
Auriney Uchôa de Brito
Carlos Enrique Arrais Caputo Bastos
Cristina Silvia Alves Lourenço
Delmiro Dantas Campos Neto
Graciela Iurk Marins
Henrique de Almeida Ávila
Luciana Christina Guimarães Lóssio
Igor Clem Souza Soares
Paulo Raimundo Lima Ralin
Thais Bandeira Oliveira Passos
Diretores (as) das Escolas Superiores de Advocacia da OAB
AC : Renato Augusto Fernandes Cabral Ferreira; AL : Henrique Correia Vasconcellos; AM : Ida Marcia Benayon de
Carvalho; AP : Verena Lúcia Corecha da Costa; BA : Thais Bandeira Oliveira Passos; CE : Andrei Barbosa Aguiar;
DF : Fabiano Jantalia Barbosa; ES : Alexandre Zamprogno; GO : Rafael Lara Martins; MA : Antonio de Moraes
Rêgo Gaspar; MT : Bruno Devesa Cintra; MS: Ricardo Souza Pereira; MG : Silvana Lourenco Lobo; PA : Luciana
Neves Gluck Paul; PB : Diego Cabral Miranda; PR: Adriana D'Avila Oliveira; PE : Mario Bandeira Guimarães
Neto; PI: Aurelio Lobao Lopes; RJ: Sergio Coelho e Silva Pereira; RN : Daniel Ramos Dantas; RS : Rosângela
Maria Herzer dos Santos; RO : Jose Vitor Costa Junior; RR :Caroline Coelho Cattaneo; SC:Marcus Vinícius Motter
Borges; SP: Jorge Cavalcanti Boucinhas Filho; SE: Kleidson Nascimento dos Santos; TO : Guilherme Augusto
Martins Santos.
Presidente Executivo da OAB Editora
José Roberto de Castro Neves
SOBRE OS COORDENADORES

LEAN DRO M ELLO FRO TA


S ó cio d a M e llo F ro ta C o n su lto ria . A d v o g a d o e s p e c ia liz a d o em D ire ito
P ú b lic o , co m só lid a e x p e riê n c ia em re la ç õ e s in stitu c io n a is e
g o v e rn a m e n ta is, c o n te n c io so e stra té g ic o , c o n te n c io so re g u la tó rio ,
p ro c e s s o s a d m in istra tiv o s, p ro c e sso le g isla tiv o , m e io a m b ie n te , g e stã o
d e crises, s a n e a m e n to e a g ro n e g ó c io . C ie n tista P o lític o e P ro fe ss o r de
d iv e rsa s in stitu iç õ e s. P ro c u ra d o r E sp e c ia l A m b ie n ta l d a O A B N a c io n a l.
P re s id e n te d a C o m issã o E sp e c ia l d e S an ea m e n to , R e c u rso s H íd ric o s e
S u s te n ta b ilid a d e e V ic e -p re sid e n te da C o m issã o de A ssu n to s
R e g u la tó rio s d a O A B N a c io n a l. R e p re se n ta n te d a O A B N a c io n a l n a
O D S 6 d o P a c to G lo b al d a O N U . M e m b ro d o In stitu to d o s A d v o g a d o s
B ra s ile iro s -IA B N a c io n a l. C o o rd e n a d o r d o O b se rv a tó rio d o M a rc o do
S a n e a m e n to B á s ic o d o In stitu to B ra s ile iro d e E n sin o , D e se n v o lv im e n to
e P e s q u is a -ID P . M e m b ro d a b a n c a d o c o n c u rso p a ra Ju iz F e d e ra l do
TRF2 R eg ião . E s p e c ia lis ta do In stitu to M ille n iu m . Foi D ire to r
A d m in is tra tiv o e F in a n c e iro d a F u n d a ç ã o N a c io n a l d a S a ú d e -F U N A S A
e d o In s titu to C h ic o M e n d e s d e C o n se rv a ç ã o d a B io d iv e rs id a d e -
IC M B io . F o i D ire to r d e R e la ç ã o In stitu c io n a l d a O A B /R J. É M e stre em
C iê n c ia P o lític a e R e la ç õ e s In te rn a c io n a is p e lo In stitu to U n iv e rsitá rio de
P e s q u is a d o R io d e Ja n e iro -IU P E R J. É D o u to ra n d o em C iên cia,
T e c n o lo g ia e In o v a ç ã o em A g ro p e c u á ria p e la U n iv e rsid a d e F e d e ra l
R u ra l d o R io d e Ja n e iro -U F R R J.

V A N IA S IC IL IA N O A IE T A
P o litó lo g a e a d v o g a d a e sp e c ia liz a d a em D ire ito E le ito ra l, é p ro fe sso ra
a d ju n ta d o P ro g ra m a d e P ó s -G ra d u a ç ã o em D ire ito d a F a c u ld a d e de
D ire ito d a U E R J, a p ro v a d a em p rim e iro lu g a r em c o n c u rso d e p ro v a s e
títu lo s. P ó s -D o u to ra em D ire ito C o n stitu c io n a l p e la U n iv e rsid a d e de
S a n tia g o d e C o m p o ste la , E s p a n h a (2 0 1 8 ), e p e la P U C -R io (2017).

i
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

D o u to ra em D ire ito C o n stitu c io n a l p e la P U C -S P (2 0 0 3 ), M e s tre em


T e o ria G e ral d o E sta d o e D ire ito C o n stitu c io n a l p e la P U C -R io (1997).
G ra d u a ç ã o em D ire ito p e la U E R J (1 9 9 1 ). V isitin g R e s e a rc h e r n a
U n iv e rs id a d e d e S a n tia g o d e C o m p o ste la , E s p a n h a (2 0 1 8 ) e V isitin g
S c h o la r n a U n iv e rsitá L a S ap ien za, R o m a , Itá lia (2 0 1 8 -2 0 1 9 ). L íd e r dos
g ru p o s d e p e sq u isa n o CNPQ O b se rv a tó rio d o D ire ito E le ito ra l,
H e rm e n ê u tic a C o n stitu c io n a l e A n á lise T ra n sa c io n a l e P o lític a s P ú b lic a s
e D ire ito d a In fra e stru tu ra . P re s id e n te d a E s c o la S u p e rio r d e D ire ito
E le ito ra l (E S D E L ). E d ito ra d a R e v is ta B A L L O T , e sp e c ia liz a d a em
D ire ito E le ito ra l In te rn a c io n a l. L e c io n a ta m b é m na E s c o la da
M a g istra tu ra , n a E s c o la Ju d ic iá ria E le ito ra l, n a U n iv e rsid a d e V e ig a de
A lm e id a e n o In stitu to d e D ire ito d a P U C -R io . P u b lic o u d iv e rso s artig o s
n o B ra sil e n o ex terio r. F o i c o n fe re n c ista em c o n g re sso p ro m o v id o p e la
O N U a p re s e n ta n d o o tra b a lh o W o m e n ’s P a rtic ip a tio n in th e S tru g g le fo r
E q u a lity in B ra z il, em P e q u im , na C h in a (1 9 9 5 ); n a N o ru e g a ,
a p re s e n ta n d o o tra b a lh o T h e p ro b le m o f fin a n c in g ele c tio n c a m p a ig n s
under c o n stitu tio n a l e lec to ral law : ra isin g fu n d s and p u b lic
ac c o u n ta b ility , em c o n g re sso p ro m o v id o p e la T h e In te rn a tio n a l
A s s o c ia tio n o f C o n stitu tio n a l L a w (2 0 1 4 ); e n a Itália, a p re se n ta n d o o
tra b a lh o L a G a ra n tia d e lla so v ra n itá nel p ia n o in te rn o risp e tta n d o le
re g o le del g io co : l ’ a c c e ta z io n e del risu lta to e le tto ra le d a v a n ti l ’
in s o d d isfa z io n e co m il g o v e rn o eletto . É e d ito ra -g e ra l d a R e v ista
B A L L O T e m e m b ro d o C o n se lh o E d ito ria l d as E d ito ra s F re ita s B asto s,
ID D E , P a ra n á E le ito ra l, o n d e ta m b é m é p a re c e rista , E d ita r e d a R e v is ta
e sp a n h o la C a d e rn o s d e D e re ito A c tu a l. P a re c e ris ta d a R e v is ta d e
In fo rm a ç ã o L e g is la tiv a do S en ad o F ed eral. In te g ra o C o n se lh o
E x e c u tiv o d as R e v ista s d e D ire ito d a C id a d e e Q u a e stio Iu ris (a m b a s
co m Q u a lis A ). C o m u n ic a -se em in g lês, fra n c ê s, e sp a n h o l e italia n o .

ii
APRESENTAÇÃO

Felipe de Santa Cruz Oliveira Scaletsky*

A Constituição Federal de 1988, nossa Constituição Cidadã,


inova em diversos aspectos, especialmente no que se refere ao direito à
saúde enquanto um direito de todos e um dever do Estado, devendo seu
acesso ser universal e igualitário. Além do estabelecido no art. 186, no
inciso IV do artigo 199, o constituinte atribuiu ao sistema único de saúde
a função de participar da formulação da execução de políticas de
saneamento básico.
Por mais corriqueira que possa hoje soar, essa determinação
constitucional inaugurou um inédito paradigma no que diz respeito à
questão do saneamento básico no Brasil. A Constituição da República,
portanto, contrapõe à concepção do saneamento básico enquanto medida
de infraestrutura a concepção de saneamento básico enquanto medida de
saúde pública. Na primeira, o saneamento apresenta-se como
investimento necessário à reprodução do capital, cuja prestação deveria
ser realizada de acordo com uma lógica empresarial voltada à
autossustentabilidade. A segunda, reflexo dos debates sanitaristas da
década de 80, encara o saneamento básico como medida de saúde pública
integrante da agenda de política social.
Contudo, mais de 30 anos após a promulgação da Carta Magna,
o Brasil ainda enfrenta sérios problemas relacionados à temática do
saneamento básico. Segundo o Ranking do Saneamento 2021, formulado
pelo Instituto Trata Brasil, o cenário nacional é o seguinte: a) cerca de
35 milhões de brasileiros não tem acesso aos serviços de água; b)
aproximadamente 100 milhões de pessoas não tem acesso à coleta de
esgotos; c) o país ainda não trata metade dos esgotos que gera (49%), o

*
Advogado e Presidente Nacional da Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

ui
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

que sig n ific a la n ç a r n a n a tu re z a c o tid ia n a m e n te 5,3 m il p isc in a s


o lím p ic a s d e esg o to sem tra ta m e n to 1.
D ia n te d e sse s d ad o s, fic a e v id e n te q u e o ac e sso ao sa n e a m e n to
b á s ic o su rg e n o o rd e n a m e n to b ra sile iro c o m o u m d ire ito co n stitu c io n a l
v o lta d o à p ro m o ç ã o d e m e lh o ria s d a q u a lid a d e d e v id a d a p o p u la ç ã o e
n a p re s e rv a ç ã o d o m e io a m b ien te. M o tiv o p e lo qual, n o d ia 15 d e ju lh o
d e 2 0 2 0 , fo i s a n c io n a d a a L ei 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , re fe re n te ao n o v o M a rc o
R e g u la tó rio d o S a n e a m e n to B á sic o , q u e p re v ê a u n iv e rsa liz a ç ã o dos
se rv iç o s d e á g u a e esg o to até 2033 e o p o rtu n iz a in v e stim e n to s p riv ad o s.
E s s a s são a lg u m a s d as q u e stõ e s a b o rd a d a s n a p re se n te obra,
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei 14.026/2020,
b rilh a n te m e n te o rg a n iz a d a p e lo s a d v o g a d o s L e a n d ro F ro ta, M a u ríc io
B e z e rra e V â n ia A ieta. P o r m e io d e sta p u b lic a ç ã o , a O rd e m dos
A d v o g a d o s d o B ra sil re a firm a seu c o m p ro m isso co m a d e fe sa dos
d ire ito s h u m a n o s e co m o a p e rfe iç o a m e n to d a c u ltu ra ju ríd ic a n o P aís,
o b se rv a n d o rig o ro sa m e n te o d isp o sto n o art. 4 4 d a L ei n. 8 .9 0 6 /1 9 9 4
(E s ta tu to d a A d v o c a c ia e d a O A B ).

B o a le itu ra ! 1

1 Disponível em: https://www.tratabrasil.org.br/blog/2021/03/23/55-milhoes-de-


brasileiros-sem-agua-tratada-e-quase-22-milhoes-sem-esgotos-nas-100-maiores-
cidades-segundo-novo-ranking-do-saneamento/. Acesso em: 30 jul. 2021.

iv
SUMÁRIO

O DIREITO HUMANO À ÁGUA ANALISADO À LUZ DA LEI FEDERAL


N° 1 4 . 0 2 6 / 2 0 2 0 ............................................................................................................. 1
Alexandre Oheb Sion

A TRAJETÓRIA DA REGIONALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS


DE ÁGUA E ESGOTO: d o PLANASA a o N ovo M arco R e g u la tó r io ..........37
Anderson Paulino

O MUNICÍPIO E OS IMPACTOS DA LEI FEDERAL n ° 1 4 . 0 2 6 / 2 0 2 0 .. 57


Aparecido Hojaij
Francisco dos Santos Lopes

O NOVO MARCO LEGAL REGULATÓRIO DO SANEAMENTO


BÁSICO: a s in o v a ç õ e s tr a z id a s p e la Lei 1 4 . 0 2 6 / 2 0 2 0 ............................. 77
Benedito Gonçalves
Renato Cesar Guedes Grilo

REGIÕES METROPOLITANAS E O NOVO MARCO DO SANEAMENTO..... 85


Bernardo Santoro
Douglas Estevam

UNIVERSALIZAÇÃO DA REGULAÇÃO E OS DESAFIOS DO NOVO


MARCO DO SANEAMENTO................................................................................... 103
Carlos Roberto de Oliveira

v
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A IMPLEMENTAÇÃO DO NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO


BÁSICO SOB A PESRSPECTIVA DA REGULAÇÃO CONTRATUAL........123
Christianne Dias Ferreira
Cintia Leal Marinho

A REGIONALIZAÇÃO DO SANEAMENTO BÁSICO: in str u m e n to


p a ra p r o m o v e r a u n iv e r sa liz a ç ã o e fo r ta le c e r o fe d e r a lism o
c o o p e r a t iv o ................................................................................................................ 139
Cristiane Braz

A SINTONIA COM A NATUREZA NA PRESERVAÇÃO DOS CORPOS


HÍDRICOS E NO MANEJO DAS ÁGUAS PLUVIAIS........................................ 155
Demetrios Christofidis

SANEAMENTO BÁSICO E O PLANEJAMENTO BRASILEIRO: u m a


b r e v e a n á lis e da le g is la ç ã o p á tr ia ................................................................... 177
Gustavo Manso de Oliveira
Rogerio Borba da Silva

ANOTAÇÕES SOBRE O NOVO MARCO REGULATÓRIO DO


SANEAMENTO BÁSICO........................................................................................... 201
Humberto Martins

REFLEXÕES SOBRE A MANUTENÇÃO AO VETO DO ART. 2 1 NO


NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO BÁSICO......................................215
Joelma Gonçalves Ribeiro

vi
NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO BÁSICO: c o n sid e ra çõ e s
in icia is so b re a p o ssib ilid a d e d e p resta çã o reg io n a liza d a d os
ser v iç o s p ú b lico s e s e u s im p a cto s e m rela çã o a o s M unicípios de
p e q u e n o e m é d io p o r t e ......................................................................................... 229

José Paes Neto


Vânia Siciliano Aieta

TRANSFERÊNCIA DA RESPONSABILIDADE CIVIL POR PASSIVOS


AMBIENTAIS DECORRENTES DE CONCESSÕES DE SANEAMENTO.......245

Luciana Gil
Patrícia Mendanha Dias
Tatiana da Silva Souza Teixeira

EXTINÇÃO DO REGIME PÚBLICO DE PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS


DE SANEAMENTO BÁSICO & O DESAFIO DA INDENIZAÇÃO DOS
BENS REVERSÍVEIS................................................................................................. 293
Marcos Paulo Marques Araújo

QUAL A FINALIDADE DO NOVO MARCO REGULATÓRIO DO


SANEAMENTO?......................................................................................................... 319
Maria Isabelle Souto Leite
Leandro Mello Frota

O CAMPO DE VIGÊNCIA DOS FUNDAMENTOS DECISÓRIOS DO


RECURSO ESPECIAL REPETITIVO N° 1 .339.313/R J FRENTE À LEI N°
1 4 .0 2 6 /2 0 , QUE ATUALIZA O MARCO LEGAL DO SANEAMENTO
BÁSICO BRASILEIRO................................................................................................ 333

Mauro Campbell Marques

vil
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

PRESTAÇÃO REGIONALIZADA DO SANEAMENTO BÁSICO NA LEI


1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 : co m o a sse g u r a r a D ig n id a d e H um ana
C o n stitu c io n a l........................................................................................................... 347
Rafael Lara Martins
Ariana Garcia do Nascimento Teles

A ESTRUTURA TARIFÁRIA NOS SERVIÇOS DE ÁGUA E ESGOTO.......365


Rodrigo Santos Hosken
Giovani Morelli

MARCO DO SANEAMENTO: a n o v a era d o fin a n cia m en to p r iv a d o 389


Rodrigo Terra Cyrineu
Artur Mitsuo Miura

O NOVO MARCO LEGAL E AS EXPECTATIVAS PARA A MELHORA


DO SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL.......................................................... 415
Rogério de Paula Tavares

A PRESTAÇÃO REGIONALIZADA NO NOVO MARCO LEGAL DO


SANEAMENTO BÁSICO.......................................................................................... 433
Rubens Naves
Guilherme Amorim Campos da Silva
Roberto Nucci

CONTROLE SOCIAL DAS PPPs CONTRATADAS E O NOVO MARCO


LEGAL DO SANEAMENTO BÁSICO.................................................................... 455

Sérgio Silveira Banhos


Daniel Castro Gomes da Costa

viii
O DIREITO HUM ANO A AG U A ANALISADO A LUZ DA LEI
FEDERAL N ° 14.026/2020

A le x a n d re O h eb Sion*

RESUMO: A á g u a co n stitu i m in era l e sse n cial à v id a n o p la n e ta e


in d isp e n sá v e l à sa ú d e e à d ig n id a d e d a p e s s o a h u m an a. O p re se n te
tra b a lh o v is a ao estu d o d o ac e sso à á g u a p o tá v e l c o m o d ire ito h u m a n o
fu n d a m e n ta l à lu z d a L e i F e d e ra l n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , q u e e sta b e le c e u o
N o v o M a rc o L eg a l d o S a n e a m e n to B á sic o n o B ra sil. P a ra ta n to , fe z u so
d o m é to d o te ó ric o d e d u tiv o co m b a se n a n o ssa e x p e riê n c ia e em u m a
a n á lise leg al e d o u trin ária .

Palavras-chave: Á g u a. R e c u rso s H íd ric o s. S a n e a m e n to B á sico . L ei


F e d e ra l n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 .

ABSTRACT: W a te r is a m in era l e sse n tia l to life o n th e p la n e t an d


in d is p e n s a b le to th e h e a lth a n d d ig n ity o f th e h u m a n p erso n . T h e p re se n t
stu d y aim s at th e stu d y o f ac c e ss to d rin k in g w a te r as a fu n d a m e n ta l

* Advogado. Pós-doutorando em Direito pela Universidad de Salamanca na Espanha


(certificado pendente da defesa do doutorado). Doutorando em Ciências Jurídicas pela
Universidade Autónoma de Lisboa em Portugal (créditos concluídos). Mestre em
Direito Internacional Comercial - L.L.M. pela Universidade da Califórnia nos Estados
Unidos. Especialista em Direito Constitucional. Pós-Graduação em Direito Civil e
Processual Civil (FGV). Advogado com formação em Direito e Administração de
Empresas. Presidente da Associação Brasileira de Direito da Energia e Meio Ambiente
(ABDEM). Cofundador, tendo sido o primeiro Vice-Presidente da União Brasileira da
Advocacia Ambiental (UBAA). Presidente da Comissão de Direito de Infraestrutura da
OAB/MG e membro da Comissão Nacional da OAB - Conselho Federal. Membro do
Conselho Diretor do ICLEI - Governos Locais pela Sustentabilidade. Membro da
Comissão de Direito Ambiental do IAB - Instituto dos Advogados Brasileiros.
Professor da PUC/MG e professor convidado da PUC/RS, IDP/SP, UFG, UNISANTA,
CESUPA, CEDIN, ESA/RJ, ESMAM, EJAP, CERS, entre outras. Palestrante atuante
na Europa e em diversas capitais brasileiras, autor e coautor de inúmeros livros e quase
uma centena de artigos jurídicos.

1
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

h u m a n rig h t u n d e r F e d e ra l L a w 1 4 ,0 2 6 /2 0 2 0 , w h ic h e sta b lish e d th e N e w


L e g a l F ra m e w o rk fo r B a sic S a n ita tio n in B raz il. T o th is end, w e m a d e
u s e o f th e d e d u c tiv e th e o re tic a l m e th o d b a se d o n o u r e x p e rie n c e a n d on
a leg al a n d d o c trin a l an aly sis.

Keywords: W a te r. W a te r R e so u rc e s. B a sic S an itatio n . F e d e ra l L a w n°


1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 .

SUMARIO: 1 In tro d u ç ã o . 2 A á g u a c o m o d ire ito h u m a n o n a p e rsp e c tiv a


in te rn a c io n a l. 3 U m b re v e c e n á rio d o a c e sso à água. 4 D ire ito à á g u a n o
o rd e n a m e n to ju ríd ic o b ra sile iro . 5 S a n e a m e n to b á sic o e ac e sso à á g u a
p o táv el. 6 N o v o m a rc o le g a l d o san e am en to . 7 C o n clu são . R e fe rê n c ia s.

1 INTRODUÇÃO

A á g u a c o n stitu i m in era l fu n d a m e n ta l p a ra a v id a n a T e rra e seu


ac e sso é v is to com o um d ire ito hum ano g lo b al, in c lu siv e com
n o rm a tiz a ç ã o in te rn a c io n a l p a ra su a g a ra n tia a to d a s as p esso a s. O
in te re ss e d a c o m u n id a d e ju ríd ic a n o te m a d o ac e sso à á g u a c o m o d ire ito
h u m a n o te m sid o cre sc e n te , e sp e c ia lm e n te p e lo s e sfo rç o s e m p re e n d id o s
e lid e ra d o s p e la O rg a n iz a ç ã o d as N a ç õ e s U n id a s (O N U ) p a ra o
re c o n h e c im e n to d o d ire ito fu n d a m e n ta l d e a c e sso u n iv e rsa l à á g u a
p o táv el. A C o n stitu iç ã o d a R e p ú b lic a F e d e ra tiv a d o B ra sil d e 1988
(C R /8 8 ) n ã o p re v iu o a c e sso à á g u a e ao e sg o ta m e n to sa n itá rio co m o
d ire ito fu n d a m e n ta l, m a s su a re le v â n c ia p o d e se r e x tra íd a d o s d ireito s
fu n d a m e n ta is à v id a , à sa ú d e e à d ig n id a d e d a p e sso a h u m a n a , j á q u e a
á g u a p o tá v e l c o n stitu i e le m e n to in stru m e n ta l ao a lc a n c e d e sse s d ireito s.
A á g u a v e m se to rn a n d o u m re c u rso c a d a v e z m a is ra ro d e v id o
ao a u m e n to p ro g re ssiv o d a p o p u la ç ã o g lo b a l a sso c ia d o à u tiliz a ç ã o
m a s s iv a d a ág u a, ta n to n o â m b ito d o m é stic o q u a n to a g ríc o la e in d u stria l,
n e c e ssita n d o , assim , d e u m o lh a r a te n to v is a n d o à su ste n ta b ilid a d e d esse
re c u rs o tã o ca ro a n o ssa ex istên c ia .

2
Q u a n to ao sa n e a m e n to b á sic o , a m p la m e n te co n sid e ra d o , a p e sa r
d o s e sfo rç o s q u e v ê m se n d o im p le m e n ta d o s n o B ra sil, 35 m ilh õ e s de
p e sso a s n ã o tê m a c e sso à á g u a tra ta d a e 100 m ilh õ e s n ã o d isp õ e m do
se rv iç o d e c o le ta d e e sg o to , o q u e a p o n ta p a ra u m d o s g ra n d e s p ro b le m a s
d a in d is p o n ib ilid a d e d e á g u a q u e é, ju sta m e n te , a a u sê n c ia d e p la n o s
e fe tiv o s d e tra ta m e n to d o s re c u rso s h íd rico s. A a p ro v a ç ã o e p ro m u lg a ç ã o
d o N o v o M a rc o L e g a l d o S a n e a m e n to B á sic o a ssu m e o c o m p ro m isso de
u n iv e rs a liz a ç ã o d o a c e sso até 2 0 3 3 , d e m a n d a q u e se m o s tra p re m e n te
p a ra a so c ie d a d e b ra sile ira , e v id e n c ia d a p e la p a n d e m ia d a C o v id -1 9 , q u e
la n ç o u lu z so b re u m p ro b le m a q u e p e rsiste h á anos.
O p resen te artigo tem co m o principal objetivo an alisar o D ireito
H u m a n o à Á g u a à lu z do N o v o M arco L egal d o S an ea m e n to B ásico, de
fo rm a a en ten d e r a elev ação do acesso à ág u a a direito fundam ental, ainda
que im p licitam en te n a C R /88, d ad a sua re le v ân cia p a ra a v id a n o planeta.
O tra b a lh o ju s tif ic a -s e em ra z ã o d o c e n á rio p re o c u p a n te d e
ac e sso ao s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , em e sp e cial a c o b e rtu ra p o r
re d e de a b a s te c im e n to de água, que a in d a não a te n d e p a rc e la
s ig n ific a tiv a d a p o p u la ç ã o , e ac e sso ao se rv iç o d e c o le ta e tra ta m e n to de
e sg o to , d e m o n stra n d o u m p o te n c ia l le siv o ao m e io a m b ie n te , m o rm e n te
p e la c o n ta m in a ç ã o d o s c o rp o s h íd ric o s, in d ic a n d o o q u a n to o p a ís ain d a
p re c is a a v a n ç a r p a ra u n iv e rsa liz a ç ã o d o a te n d im e n to .
O m é to d o u tiliz a d o n o tra b a lh o foi o te ó ric o d o c u m e n ta l d o tip o
d ed u tiv o , co m b a s e em n o ssa e x p e riê n c ia e n a a n á lise d o u trin ária ,
ju ris p ru d e n c ia l e legal.

2 A ÁGUA COMO DIREITO HUMANO NA PERSPECTIVA


INTERNACIONAL

A água é um m in era l e sse n cial p a ra o m e io a m b ien te,


in te g ra n d o 7 1 % d o p lan eta , d o s q u ais 3 % é d e á g u a d o c e p a ra o co n su m o ,
sen d o ca p a z d e fo rn e c e r as c o n d iç õ e s n e c e ssá ria s p a ra to d a s as fo rm a s

3
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

d e v id a n a T erra. T ra ta -se d e e le m e n to q u e co n stitu i a p ró p ria d ig n id a d e


d a p e s s o a h u m a n a , in d isp e n sá v e l a u m a e x istê n c ia d ig n a .1
D e s s a fo rm a , os re c u rso s h íd ric o s, além d e fu n d a m e n ta is p a ra a
s o b re v iv ê n c ia te rre stre , c o n stitu e m b e m e c o n ô m ic o a lta m e n te v isa d o ,
fu n c io n a n d o co m o u m d o s p ro p u lso re s d a e c o n o m ia . É o q u e se
d e p re e n d e d a D e c la ra ç ã o d a O N U Á g u a (2 0 1 0 ), p a ra o D ia M u n d ia l d a
Á g u a: “ A á g u a p o tá v e l lim p a , se g u ra e a d e q u a d a é v ita l p a ra a
s o b re v iv ê n c ia d e to d o s os o rg a n ism o s v iv o s e p a ra o fu n c io n a m e n to dos
ec o ssiste m a s, c o m u n id a d e s e e c o n o m ia s” .12 A im p o rtâ n c ia d o b e m
m in e ra l se d á n ã o so m e n te p a ra o e q u ilíb rio e c o ló g ic o , m a s p a ra a p ró p ria
s o b re v iv ê n c ia d o se r h u m a n o c o m o se r in te g ra n te d o m eio , v e z q u e o
c o rp o h u m a n o é c o m p o sto d e 6 0 % d e água.
A á g u a 3 é a b a rc a d a p e lo s 17 O b je tiv o s d e D e se n v o lv im e n to
S u ste n tá v e l (O D S ) d a O N U , q u e se d e sd o b ra m em 169 m e ta s g lo b a is
co m h o riz o n te d e im p le m e n ta ç ã o p a ra 2 0 3 0 , v is a n d o e rra d ic a r a p o b re z a
e x tre m a, c o m b a te r a d e sig u a ld a d e e a in ju stiç a , c o n te r as m u d a n ç a s
c lim á tic a s e o e sg o ta m e n to d o s re c u rso s n a tu ra is, e n g lo b a n d o as
d im e n s õ e s a m b ie n ta l, so cial e e c o n ô m ic a d a su ste n ta b ilid a d e d e fo rm a
in te g ra d a e c o rre la c io n a d a .
C o m b a s e n a s m e ta s g lo b a is e sta b e le c id a s p e lo s p a íse s a p o ia d o s
p e la O N U , as n a ç õ e s e sta b e le c e ra m m e ta s n a c io n a is, d e fo rm a a
a b ra n g e r as suas e sp e c ific id a d e s, a p a rtir d e in d ic a d o re s o fic ia is
c o n fiá v e is, b e m co m o d e m é to d o s d e m o n ito ra m e n to d a im p le m e n ta ç ã o
d o s O D S , sob a su p e rv isã o g lo b a l d o F ó ru m P o lític o d e A lto N ív e l so b re
o d e s e n v o lv im e n to su sten táv el.
O a c e sso à á g u a e ao sa n e a m e n to b á s ic o co n stitu i d ire ito
fu n d a m e n ta l, re c o n h e c id o p e la O N U c o m o “ c o n d iç ã o esse n c ia l p a ra o

1 FACHIN, Zulmar; SILVA, Deise Marcelino da. 2010. p. 74.


2 MAIA, Ivan Luis Barbalho. 2017. p. 320.
3 O ODS 6 pretende “Até 2030, alcançar o acesso universal e equitativo a água potável
e segura para todos” (ONU, 2021).

4
g o z o p le n o d a v id a e d o s d e m a is d ire ito s h u m a n o s ” .4 N ã o p o r o u tro
m o tiv o , a m e ta 6.4 e sta b e le c e com o o b je tiv o “ a u m e n ta r
s u b s ta n c ia lm e n te a e fic iê n c ia d o u s o d a á g u a em to d o s os seto re s e
a ss e g u ra r re tira d a s su ste n tá v e is e o a b a s te c im e n to d e á g u a d o ce p a ra
e n fre n ta r a e s c a sse z d e água, e re d u z ir s u b sta n c ia lm e n te o n ú m e ro de
p e sso a s q u e so fre m co m a esc a sse z d e á g u a ” .5
N o e n tan to , o ac e sso à á g u a p o tá v e l n e m se m p re fo i o b je to de
p re o c u p a ç ã o p o r p a rte d o s p a íse s o u m e sm o p e la o rd e m g lo b al. O q u a d ro
n o rm a tiv o in te rn a c io n a l foi a p e rfe iç o a n d o -se c o m o te m p o , co m a
c o m p re e n s ã o d a á g u a c o m o u m re c u rso n a tu ra l fin ito e fu n d a m e n ta l p a ra
m a n u te n ç ã o d o s d e m a is d ire ito s h u m a n o s e, c o n se q u e n te m e n te , d a
d ig n id a d e d a p e sso a h u m an a.
O m a rc o n o rm a tiv o da água no c e n á rio in te rn a c io n a l é
re p re s e n ta d o p e lo T ra ta d o d e P a ris d e 1814 e p e lo A to F in a l do
C o n g re s s o d e V ie n a d e 1 8 1 5 , q u e a trib u íra m ao m in e ra l u m a p o siç ã o
m a is im p o rta n te , n a m e d id a em q u e “ re p re se n ta m o p rin c íp io d e u m a
n o v a siste m a tiz a ç ã o d a m atéria , d e n tro d as m u d a n ç a s d e p a ra d ig m a
g e ra d a s n o d ire ito in te rn a c io n a l d e sse p e río d o ” .6
O direito d e acesso à ág u a p otável co m o co n d ição d a d ignidade da
p esso a h u m a n a e fundam ental p a ra seu b em -e sta r está prev isto tam b ém no
art. 11 do P acto Internacional R elativ o aos D ireito s E co n ô m ico s, S ociais e
C u ltu rais (P ID E S C ), firm ad o em 1966, co n sag ran d o “ o direito de to d a
p esso a a u m nível de v id a adeq u ad o p a ra si p ró p rio e sua fam ília, inclusive
à alim en tação , v e stim en ta e m o rad ia adequadas, assim co m o a u m a
m elh o ria co n tín u a de suas condições de v id a ” .7
F o i a p a rtir d a d é c a d a d e 6 0 q u e irro m p e u m n o v o p a ra d ig m a
d o u s o d a á g u a re la c io n a d o à g e ra ç ã o d e e n e rg ia elétrica. A ssim , “ta n to
n a le g is la ç ã o in te rn a c io n a l, q u a n to nas m a is d iv e rsa s le g isla ç õ e s

4 ONU. Resolução A/RES/64/292. Assembleia Geral das Nações Unidas, New York, 2010.
5 BRASIL. IPEA. 2019. s. p.
6 AMORIM, João Alberto Alves. 2015. p. 96.
7 Idem, p. 96.

5
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

in te rn a s, a p re o c u p a ç ã o co m a c o o p e ra ç ã o e o u so c o m p a rtilh a d o e
e q u ita tiv o d o s p o te n c ia is h id re lé tric o s d o s rio s in te rn a c io n a is p a ssa a
in te g ra r o e sc o p o d e d isc ip lin a d o d ire ito ” .8 P a iro u , en tão , u m a d ic o to m ia
q u e le v a v a em c o n sid e ra ç ã o a c o n se rv a ç ã o d a á g u a e d o m e io a m b ien te,
a p a rtir d a re g u la m e n ta ç ã o ju ríd ic a , e seu a p ro v e ita m e n to e c o n ô m ic o .
D ian te d essas n o v as constatações, h o u v e u m g ran d e esforço d a
co m u n id ad e internacional p ara tra z e r a ág u a e o m eio am b ien te com o
q u estõ es q u e n ecessitav am de u m a análise d etid a e aten cio sa das nações. A
C arta E u ro p e ia d a Á gua, ap ro v ad a p ela co m u n id ad e eu ro p eia em 1968,
refletiu essa p reo cu p ação , sendo p io n eira n as d iscussões g lo b ais do
ab astecim en to d a ág u a potável nos países. P a ra além d a água, as q uestões
am b ien tais p assaram a o cu p ar a ordem do dia, g an h a n d o fô leg o n a esfera
g o v ern am en tal, esp ecialm en te relacio n ad as à p ro b lem á tica do
d esen v o lv im en to eco n ô m ico que v in h a crescen d o a u m ritm o acelerado,
sem co n sid erar a p ro teção am biental. A m u d an ça de p arad ig m a v e io com a
C o n ferên cia de E sto co lm o , em 1972, que in tro d u ziu a qu estão am biental
co m o co n d icio n an te ao p ro cesso d e d esen v o lv im en to ec o n ô m ico n a ag enda
p o lítica in tern acional. “N a q u e le docum ento, g ên ese do direito internacional
do m eio am biente, sua C arta M a g n a d e princípios, a p re o cu p aç ão de se
ad o tar u m reg im e ju ríd ic o p ara a ág u a doce, que v isasse ao acesso e à g estão
h u m an ista d esse recu rso vital, j á estava p resen te” .9
E m 1977, foi realizada, n a A rgentina, em M a r del P lata, a p rim eira
co n ferên cia d a O N U g u iad a ao d eb ate de tem as relacionados à p ro b lem ática
d a água, o b jetivando, esp ecialm ente, can alizar a aten ção dos E stad o s a fim
de realizarem planos e políticas p ú b licas d e re fo rm a e m o d ern ização da
g estão dos recu rso s hídricos p a ra aten d e r às necessid ad es d e ág u a potável e
san eam en to b ásico p ara todos. N ã o p o r o utro m otivo, a d éc ad a q u e sucedeu

8 Ibidem, p. 98.
9 Ibidem, p. 18.

6
a co n ferên cia fico u co n h ecid a co m o a D écada Internacional do
F o rn ec im e n to d a Á g u a P o táv el e do S an ea m e n to .101
O q u e h a v ia sid o p la n ta d o n a C o n fe rê n c ia d e E sto c o lm o
c o m e ç o u a g e rm in a r e, em 1987 foi p u b lic a d o o R e la tó rio B ru n d tla n d ,
in titu la d o “N o s s o F u tu ro C om um ” , com o re su lta d o d a C o m issã o
M u n d ia l so b re o M e io A m b ie n te e D e se n v o lv im e n to (C M M A D ) e d e u m
e sfo rç o q u e v in h a se n d o c o n c e b id o d e sd e 1972, c o n c e itu a n d o o
d e s e n v o lv im e n to su ste n tá v e l co m o aq u e le q u e “ e n c o n tra as n e c e ssid a d e s
a tu a is sem c o m p ro m e te r a h a b ilid a d e d as fu tu ra s g e ra ç õ e s d e a te n d e r
su as p ró p ria s n e c e ssid a d e s” .11
C o m e sp e cial d e sta q u e p a ra a su ste n ta b ilid a d e h íd ric a , em 1990
fo i a d o ta d a a C a rta d e M o n tre a l so b re Á g u a P o tá v e l e S a n e a m e n to , q u e
tra ta v a d a e d u c a ç ã o a m b ie n ta l e h íd ric a e e sta b e le c e u o a c e sso à á g u a
p o tá v e l co m o c o n d iç ã o d e so b re v iv ê n c ia in d isso c iá v e l d e o u tro s d ire ito s
d a p e s s o a h u m a n a .12
A s e g u n d a g ra n d e c o n fe rê n c ia in te rn a c io n a l so b re a á g u a foi
re a liz a d a em D u b lin , em 1992, e te v e c o m o o b je tiv o o re c o n h e c im e n to
d o d ire ito fu n d a m e n ta l à á g u a p o tá v e l c o m o u m re c u rso fin ito e
v u ln e rá v e l, e sse n cial à g a ra n tia d a v id a n a T e r ra .13 E m m a té ria
a m b ie n ta l, 1992 fo i um ano re p re se n ta tiv o , e s p e c ia lm e n te p e la
re a liz a ç ã o d a C o n fe rê n c ia d as N a ç õ e s U n id a s so b re M e io A m b ie n te e
D e se n v o lv im e n to (C N U M A D ) n o R io d e Ja n e iro , a R io 92, q u e te v e
c o m o fin a lid a d e a m u d a n ç a d e m o d e lo d e d e se n v o lv im e n to p a ra o séc u lo
X X I. A lg u n s c o n c e ito s d e in te re sse fo ra m ra tific a d o s p a ra os p a íse s em
d e se n v o lv im e n to , co m fo c o n o a lc a n c e d e m e ta s d e d e se n v o lv im e n to
su ste n tá v e l, c o n su b sta n c ia d o s n a A g e n d a 21 G lo b al.

10 TUNDISI, José Galizia; TUNDISI, Takako Matsumura. A água. São Paulo:


Publifolha, 2009. p. 37.
11 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. A ONU e o meio ambiente. ONU,
Brasília, 2019. s. p.
12 AMORIM, João Alberto Alves. 2015. p. 109.
13 MAIA, Ivan Luis Barbalho. 2017.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A A g e n d a 21 d e d ic o u u m c a p ítu lo e sp e c ífic o à p ro te ç ã o d a
q u a lid a d e e d o a b a ste c im e n to d e água, a p lic a ç ã o d e c rité rio s in te g ra d o s
n o d e se n v o lv im e n to , m a n e jo e u s o d o s re c u rso s h íd rico s. A s p rio rid a d e s
n o u s o d a á g u a in stitu íd a s n a c a rta fo ra m n o sen tid o d e sa tisfa z e r as
n e c e s s id a d e s h u m a n a s b á sic a s e p ro te g e r o s ec o ssiste m a s, in d ic a n d o
p a ra a n e c e s s id a d e d e ap lic a ç ã o d e u m a a b o rd a g e m in te g ra d a p a ra o
d e se n v o lv im e n to , g e stã o e u tiliz a ç ã o d o s re c u rso s h íd rico s.
A O N U c o n stitu iu , em 1996, o C o n se lh o M u n d ia l d a Á g u a “ q u e
tra b a lh a p a ra a u m e n ta r a c o n sc ie n tiz a ç ã o d o s to m a d o re s d e d e c isã o de
alto n ív e l so b re q u e stõ e s d e água. B u s c a p o s ic io n a r a á g u a n o to p o d a
a g e n d a p o lític a g lo b al e p ro d u z ir p o lític a s m u n d ia is p a ra a ju d a r as
a u to rid a d e s a d e s e n v o lv e r e g e re n c ia r o s re c u rso s h íd ric o s e in c e n tiv a r o
u s o e fic ie n te d a á g u a ” .14
O C o n se lh o crio u o F ó ru m M u n d ia l d a Á g u a q u e o c o rre a c a d a
trê s an o s e b u s c a d isc u tir o s p rin c ip a is te m a s re fe re n te s à g e stã o dos
re c u rs o s h íd ric o s, b e m co m o c a ta lisa r a ç õ e s c o le tiv a s ao e n fre n ta m e n to
d o s d e sa fio s h íd ric o s g lo b ais. O p rim e iro F ó ru m M u n d ia l d a Á g u a
o c o rre u em M a rro c o s, u m an o ap ó s a c ria ç ã o do C o n se lh o M u n d ia l, com
o in tu ito d e d isc u tir a fu n ç ã o d a á g u a p o tá v e l p a ra o d e se n v o lv im e n to
su ste n tá v e l, tra z e n d o p a ra o ce n tro d as d isc u ssõ e s o sa n e a m e n to b ásico ,
o m e io a m b ie n te e as fo n te s re n o v á v e is d e e n e rg ia .15 O 2° fó ru m foi
re a liz a d o em H a ia , em 2 0 0 0 , e te v e c o m o te m a fu lcral a “v is ã o d a á g u a
p a ra o fu tu ro ” , o b je tiv a n d o o d e b a te d a g e stã o d e re c u rso s h íd ric o s, a
re d u ç ã o da p o b re z a , os im p a c to s a m b ie n ta is e os p o ssív e is
fin a n c ia m e n to s p a ra o s e to r.16 E m 2 0 0 3 , foi re a liz a d o o 3° F ó ru m
M u n d ia l em Q u io to , c o n ta n d o co m 130 m in istro s d e estad o . O F ó ru m
“ p rio riz o u a d isc u ssã o d e c o m p ro m isso s a ssu m id o s p e la c o m u n id a d e

14 BRASIL. Construção sustentável: a mudança em curso. CNI, Brasília, 2017. p. 42.


15 ONU. I Fórum Mundial da Água. World Water Council, Marrakesh, 1997.
16 ONU. II Fórum Mundial da Água. World Water Council, Haia, 2000.

8
in te rn a c io n a l e v iso u u m a m a io r a rtic u la ç ã o in stitu c io n a l p a ra o
e n fre n ta m e n to d o s d e sa fio s fu tu ro s ” .17
O 4° F ó ru m M u n d ial foi o p rim eiro a ser sed iad o n a A m éric a
L atin a, n o M éx ico , em 2006, e reu n iu rep resen tan tes de 140 países p ara
d eb a te r a u n iv ersalização do san eam en to b á sic o , a á g u a co m o b em natural
resp o n sáv el p elo crescim en to e d esen v o lv im en to hu m an o , a g estão de
risco s híd rico s e sua disp o n ib ilização p ara to d o s.18 O 5° F ó ru m (2009)
ap resen to u u m av anço significativo n a d iscu ssão do acesso à ág u a potável,
m o rm en te em razão das pro g ressõ es o b serv ad as com os O bjetivos de
D e se n v o lv im e n to do M ilên io (O D M ), estabelecidos em 2000, com foco
especial p ara a educação sustentável e a g o v ern an ça h íd ric a .19
O 6° F ó ru m foi re a liz a d o n a F ra n ç a , em 2 0 1 2 , e foi m a rc a d o
p e la p re s e n ç a d e d iv e rsa s a u to rid a d e s e p e la p a rtic ip a ç ã o in te n s a de
O N G s e d a so c ie d a d e civil. “F o ra m d isc u tid a s m a is d e 2 5 0 se ssõ e s so b re
tó p ic o s q u e v ã o d e sd e a g e stã o tra n sfro n te iriç a d a á g u a até o c re sc im e n to
v e rd e o u se g u ra n ç a a lim en tar. E stiv e ra m p re se n te s alg u n s d o s to m a d o re s
d e d e c isã o m a is in flu e n te s d o m u n d o p a ra a á g u a ” .20 O 7° F ó ru m (2015),
p ro m o v id o n a C o re ia d o Sul, re u n iu re p re se n ta n te s d e e m p re sa s
p riv a d a s, O N G s, g o v e rn o s, e n tid a d e s in te rn a c io n a is, a c a d e m ia e
so c ie d a d e lo c a l e te v e c o m o re su lta d o a im p le m e n ta ç ã o d e d iv e rso s
a sp e c to s d o s O D S re la c io n a d o s à água, além d a c ria ç ã o d e u m S iste m a
d e M o n ito ra m e n to d e A ç õ e s p a ra lig a ç ã o c o n c re ta e n tre su c e ssiv o s
F ó ru n s em te rm o s d e a ç ã o c a ta lisa d o ra , d e m o d o q u e o im p u lso p a ra u m a
m u d a n ç a p o s itiv a p a ra a c a u sa d a á g u a se ja c o n tin u a m e n te a u m e n ta d o .21
O ú ltim o F ó ru m ocorreu em 2018, n o B rasil, e foi co n sid erad o o
m a io r ev en to d a história, in serin d o a ág u a n o to p o d a ag en d a po lítica
m u n d ial e ten d o “u m a im p o rtan te inovação: a particip ação d o P o d e r

17 ONU. III Fórum Mundial da Água. World Water Council, Kyoto, 2003.
18 ONU. IV Fórum Mundial da Água. World Water Council, Cidade do México, 2006.
19 ONU. V Fórum Mundial da Água. World Water Council, Istambul, 2009.
20 ONU. VI Fórum Mundial da Água. World Water Council, Marselha, 2012.
21 ONU. VII Fórum Mundial da Água. World Water Council, Seul, 2015.

9
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

Ju d iciário ”22 com ju íz e s e p ro m o to res especialistas n a tem ática dos recursos


h íd rico s p ara d eb a te r o tem a, ten d o co m o resu ltad o a C arta d e B rasília23 e a
D e clara ção do M in isté rio P ú b lic o sobre o D ire ito à Á g u a .24_25
O u tro p o n to d ig n o d e n o ta é q u e a A g e n d a 2 1 v e m sen d o
c o n s ta n te m e n te a tu a liz a d a . E m 2 0 1 2 , d u ra n te a R io + 2 0 , os p rin c íp io s
n e la e s ta b e le c id o s fo ra m re a v a lia d o s, e s p e c ia lm e n te os re fe re n te s à
g e s tã o d o s re c u rso s d e á g u a d o c e e ao c o m b a te à e sc a sse z h íd rica,
re c o n h e c e n d o a c o n se rv a ç ã o da água com o in d isp e n sá v e l ao
d e s e n v o lv im e n to su ste n tá v e l.
Im p o rta tra z e r à b a ila q u e a e sc a sse z h íd ric a é a trib u íd a a
d iv e rso s fa to re s com o fa lh a s na g e stã o d as ág u as, p ro b le m a s
re la c io n a d o s à d is p o n ib ilid a d e e a u m e n to d a d e m a n d a p e lo re c u rso
n a tu ra l, q u e s tõ e s re fe re n te s à d e g ra d a ç ã o a m b ie n ta l e a u m p ro c e sso n ã o
sistê m ic o e p re d itiv o d e g e re n c ia m e n to , v o lta d o tã o so m e n te p a ra aç õ es
seto ria is e d e re sp o sta s a situ a ç õ e s c irc u n s ta n c ia is .26
P a ra m u ito s au to re s, a q u e s tã o d a g o v e rn a n ç a d e v e ser o fo c o
d a d isc u ssã o , d e fo rm a a re a liz a r u m a b o a g e stã o d a á g u a d ire c io n a d a a
u m a m a io r a te n ç ã o ao p la n e ja m e n to sistê m ic o e in te g ra d o d a u tiliz a ç ã o
dos re c u rso s h íd ric o s, a sso c ia d o a in ic ia tiv a s que g a ra n ta m a
p a rtic ip a ç ã o c o n c re ta d a so c ie d a d e e d e a u to rid a d e s p ú b lic a s n o p ro c e sso
d e p la n e ja m e n to e to m a d a d e d e c isõ e s.27
A p a rtic ip a ç ã o p ú b lic a n o s p ro c e sso s d e p la n e ja m e n to e to m a d a
d e d e c isõ e s fo i, in c lu siv e , c o rro b o ra d a n a C o n fe rê n c ia In te rn a c io n a l

22 ONU. VIII Fórum Mundial da Água. World Water Council, Brasília, 2018.
23 BRASIL. Declaração de Juízes de Brasília sobre Justiça da Água. World Water
Council, Brasília, 2018.
24 BRASIL. Declaração do Ministério Público sobre o Direito à Água. World Water
Council, Brasília, 2018.
25 O próximo Fórum Mundial terá como tema a segurança hídrica e ocorreria em março
de 2021, no Senegal, tendo sido adiado para março de 2022 devido à pandemia do novo
coronavírus (CONSÓRCIO PCJ, 2018).
26 BRZEZINSKI, Maria Lúcia Navarro. 2009.
27 CASTRO, José Esteban; HELLER, Léo; MORAIS, Maria da Piedade. 2015.

10
so b re a Á g u a e M e io A m b ie n te , em D u b lin , 1992, o c a siã o em q u e foi
e rig id a a u m d o s p rin c íp io s b á sic o s p a ra a g e stã o d a água. N a c o n ju n tu ra
d a e s s e n c ia lid a d e d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to , o a c e sso à á g u a tra ta d a e
ao e s g o ta m e n to sa n itá rio c o n stitu e m d ire ito s h u m a n o s fu n d a m e n ta is.

3 UM BREVE CENÁRIO DO ACESSO À ÁGUA

A ág ua, p a ra além de c o m p o n e n te fu n d a m e n ta l ao
d e s e n v o lv im e n to social, c o n stitu i p a trim ô n io e sse n cial à m a n u te n ç ã o
d o s c ic lo s v ita is d o m e io a m b ie n te , ra z ã o p e la qual v e m sen d o o b je to de
d isp u ta s ao re d o r d o m u n d o . Isto p o rq u e , à m e d id a q u e a so c ie d a d e se
d e se n v o lv e , a p o p u la ç ã o au m en ta , os m o d o s d e v id a to rn a m -s e m ais
c o m p le x o s e a d e m a n d a p o r á g u a p o tá v e l p a ra as d iv e rsa s u tilid a d e s, seja
p a ra a a g ric u ltu ra , p a ra a in d ú stria o u p a ra c o n su m o d o m é stic o , cre sc e
p ro g re ssiv a m e n te . N a d a o b stan te, a água, c o m o to d o re c u rso n atu ra l, é
d o ta d o d e fin itu d e, p e lo q u e d iv e rsa s c irc u n stâ n c ia s, c o m o as m u d a n ç a s
clim á tic a s, a g ra v a m a d is p o n ib ilid a d e d o s re c u rso s h íd ric o s em d iv e rsa s
re g iõ e s e to rn a m a c irra d a s as d isp u ta s p e lo c h a m a d o o u ro a z u l.28
U m case em b lem ático dos conflitos relacio n ad o s aos recursos
h íd rico s é o C aso R io A tuel, n a A rgentina, o casião em que a C o rte S uprem a
A rg e n tin a ju lg o u o caso com a ap licação d a te o ria d a d ecisão n o rm ativ a.29
O R io A tu el n a sc e n a C o rd ilh e ira d o s A n d e s, n a P ro v ín c ia de
M e n d o n ç a e d e sc e a tra v é s d a P ro v ín c ia d e L a P a m p a até o O c e a n o
A tlâ n tic o . N o in íc io d o S écu lo X X , o flu x o d o rio c o m e ç o u a d im in u ir,

28 BARLOW, Maude; CLARKE, Tony, 2003.


29 A teoria da decisão normativa, de acordo com Lorenzetti, busca analisar os resultados
das decisões anteriores sobre o assunto ou determinar decisões ótimas, a partir das
restrições e suposições apresentadas. Uma das vertentes da teoria da decisão é a teoria
dos signos - que se divide em semântica, que se ocupa da análise dos métodos de
interpretação e valoração da prova; sintática, preocupada em estabelecer a relação da
decisão com outras normas de direito material e processual; e pragmática, que respeita
à relação entre a decisão e o contexto fático, sendo produto do diálogo entre as partes
(LORENZETTI, Teoria da decisão judicial. 2010).

11
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

n ã o so m e n te p e la c o n stru ç ã o d e re p re sa s p ú b lic a s e p riv a d a s e o u so


in te n s iv o d a ág ua, m a s ta m b é m d e c o rre n te d as m u d a n ç a s c lim á tic a s, q u e
p ro v o c a ra m u m a re d u ç ã o d a o fe rta d e água.
O s a rg u m e n to s d as p a rte s fo ra m típ ic o s d e u m c o n flito b ilatera l.
A P ro v ín c ia d e L a P a m p a a le g o u q u e o R io A tu e l h a v ia sid o “ ro u b a d o ” ,
o q u e c a u so u u m a c a tá stro fe am b ie n ta l e u m a d e se rtific a ç ã o d o esta d o
d a P am p a. A P ro v ín c ia de M e n d o n ç a , p o r o u tro lad o , a rg u m e n to u p e la
d e s a rra z o a b ilid a d e d e se b u s c a r á g u a n o d e se rto e q u e 9 7 % d o P a m p a j á
e ra d esé rtic o . A d e m a is, a P ro v ín c ia d e L a P a m p a n ã o u tiliz a v a a á g u a de
fo rm a a d e q u a d a e e fic ie n te .30
A C o rte S u p re m a A rg e n tin a a d o to u u m a p e rsp e c tiv a in te g ra l e
p o lic ê n tric a d o co n flito . N e ss e sen tid o , a C o rte fu n d a m e n to u q u e a b a c ia
h id ro g rá fic a em q u e stã o c o n stitu i u m siste m a in teg ra l p e la e stre ita
in te rd e p e n d ê n c ia e n tre as v á ria s p a rte s d o c u rso d ’água, e n fa tiz a n d o a
im p o rtâ n c ia d e a b o rd a r o c o n flito a p a rtir d e ssa p e rsp e c tiv a a b ran g en te.
E x p lic o u , ain d a, q u e a so lu ç ã o e x ig ia a a d o ç ã o d e m e d id a s re la c io n a d a s
à b a c ia em g eral, e n ã o lim ita d a s a ju ris d iç õ e s te rrito ria is, u m a v e z q u e
os c o n flito s a m b ie n ta is n ã o c o in c id e m co m as d iv isõ e s p o lític a s ou
ju ris d ic io n a is . R e ssa lto u a C o rte q u e o p ró p rio c o n c e ito d e b a c ia
h id ro g rá fic a é d e u n id a d e , n a qual o c ic lo h id ro ló g ic o é e n te n d id o co m o
u m to d o v in c u la d o a u m te rritó rio .
A d e c isã o d a C o rte im p lic o u u m a m u d a n ç a n a g e stã o d o R io . O
T rib u n a l e x ig iu d e M e n d o n ç a , L a P a m p a e d o g o v e rn o n a c io n a l q u e
c h e g a sse m a u m a c o rd o p a ra im p le m e n ta r u m p ro g ra m a d e a lte rn a tiv a s
té c n ic a s co m re la ç ã o às c a ra c te rístic a s e c o ló g ic a s e sp e c ífic a s, os c u sto s
d e c o n stru ç ã o d a s o b ra s e seu m o d o d e d istrib u iç ã o e n tre os trê s
g o v ern o s. O p ro g ra m a d e v e ria p re v e r os b e n e fíc io s do u so , as
n e c e s s id a d e s d a p o p u la ç ã o v iz in h a , as n e c e ssid a d e s d e d e fe n d e r o ac esso

30 ARGENTINA. Corte Suprema de Justiça de la Nación. 2017.

12
d a p o p u la ç ã o à á g u a p o tá v e l, a p a rtic ip a ç ã o d as c o m u n id a d e s o rig in á ria s
lo c a liz a d a s n a re g iã o e a a tiv id a d e e c o n ô m ic a p ro d u tiv a .31
A C o rte re c o n h e c e u q u e h á u m d ire ito h u m a n o d e a c e sso à á g u a
p o tá v e l, q u e é u m a c o n sid e ra ç ã o c e n tral n a d ec isã o . O a c e sso à á g u a
p o tá v e l a fe ta d ire ta m e n te a v id a e a saú d e d as p e sso a s, p o r isso d ev e ser
p ro te g id a . É esse n c ia l su a tu te la p a ra q u e a N a tu re z a 32 m a n te n h a seu
fu n c io n a m e n to co m o siste m a e q u e a á g u a m a n te n h a su a c a p a c id a d e de
re g e n e ra ç ã o re silie n te .
N ã o se trata , p o r ó b v io , d e u m re c o n h e c im e n to a b so lu to de
ac e sso à ág u a, c o n fo rm e p o n tu a d o p e la p ró p ria C o rte. N e ste caso, o
d ire ito à á g u a p o tá v e l c o m p re e n d e u u m d ire ito a u m flu x o d ’á g u a q u e
g a ra n tiss e a re s ta u ra ç ã o am b ie n ta l e u m u so e c o n su m o su sten táv eis.
A d em ais, a C orte d ecid iu que o estad o de seca e a desertificação
que caracteriza a região das P am p as n ão p o d e continuar. A A rg en tin a
assin o u a C o n v en ção das N a çõ es U n id as p a ra C o m b ater a D esertificação
em P aíses q u e S o fram S eca s G ra v es e, n essa perspectiva, os recu rso s devem
ser alo cad o s p a ra seu com bate, o q u e inclui to d a a b a c ia h id ro g ráfica.33
A n alisad o o caso p aradigm a, h á de se d estac ar alguns dados da
O N U sobre a água, q u e apontam que, aproxim adam ente, 4 0 % d a p o p u lação
m u n d ial v iv e rá sob g ra v e estresse h íd rico até 2050, p rin cip alm en te os
h ab itan tes n o O rien te M éd io , n o sul d a Á sia, n a Á frica e n a A m éric a
L atin a.34 E m 2018, a O N U pro sp ecto u a subm issão de m ais de 30 países ao
estresse h íd rico e m ais de 20 n açõ es subm etidas a g ra v e estresse h ídrico.35

31 Idem.
32 A natureza é, por vezes, denominada Pachamama, conforme designação dada pelos
povos ancestrais e previsto no ordenamento jurídico de alguns países como a Bolívia.
É um conceito da língua quechua. Pacha pode ser traduzida como “mundo” ou “Terra”,
enquanto mama equivale a “mãe”. Por isso, Pachamama é, para certas etnias andinas,
a Mãe Terra (PORTO, Julián Pérez; GARDEY, Ana. Definición de Pachamama.
Definición.de, 2014).
33 Ibidem.
34 UNESCO. United Nations World Water Development Report 2020. Water and
Climate Change, Paris, 2020.
35 UNESCO. World Water Assessment Programme. Perúgia: UNESCO, 2019.

13
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

P esq u isas elab orados p o r M ek o n n e n e H o e k stra rev elaram q u e m ais d a


m etad e d a p o p u laçã o global, cerca d e q u atro b ilh õ es de pessoas, v iv em
g rav e escassez h íd rica n o m ín im o u m a v e z ao ano.36
A dem anda po r água p o tá v e l vem c re sc e n d o d e fo rm a
s ig n ific a tiv a a d e sp e ito d o e stre sse h íd ric o o b se rv a d o n o m u n d o . D e
a c o rd o co m d a d o s d isp o n ib iliz a d o s p e la O N U , a u tiliz a ç ã o d a á g u a
p o tá v e l em u m e sp e c tro d e 100 an o s a p re se n to u u m a u m e n to d e 1% ao
a n o .37 T al d e m a n d a a in d a te m p e rsp e c tiv a s d e c re sc im e n to c o n tín u o , j á
q ue, se g u n d o e stim a tiv a da O rg a n iz a ç ã o p a ra C o o p e ra ç ã o e
D e se n v o lv im e n to E c o n ô m ic o (O C D E ), a d e m a n d a p o r á g u a a p re se n ta ria
u m a u m e n to d e 5 5 % e n tre 2 0 0 0 e 2 0 5 0 .38
O u tro d a d o a la rm a n te re s p e ita à o rig e m d as fo n te s d e água.
E s tu d o s d a O N U in d ic a m q u e a p ro x im a d a m e n te 6 6 3 m ilh õ e s d e p e sso a s
u tiliz a ra m fo n te s d e á g u a n ã o seg u ras em 2 0 1 5 , a p re se n ta n d o u m
c re sc im e n to d e 9 % se c o m p a ra d o ao s an o s 2 0 0 0 . Se p o r u m la d o as
fo n te s in s e g u ra s d e re c u rso s h íd ric o s se rv ira m à sa tisfa ç ã o d e p a rc e la d a
d e m a n d a p o r á g u a p o tá v e l, é b e m v e rd a d e q u e as d e sig u a ld a d e s de
ac e sso e n tre os p a íse s e n o in te rio r d eles p e rs is tiu .39 E m 2 0 1 1 , m a is d e
4 0 n a ç õ e s a p re se n ta ra m e stre sse h íd ric o e m a is d e 9 4 0 m ilh õ e s de
p e sso a s n ã o tin h a m a c e sso a e sg o ta m e n to san itário , c o m p ro m e te n d o a
q u a lid a d e d a á g u a e, c o n se q u e n te m e n te , a saú d e d a p o p u la ç ã o . E m 2 0 1 2 ,
a p ro x im a d a m e n te 2 b ilh õ e s d e p e sso a s fo ra m su b m e tid a s ao c o n su m o de
á g u a c o n ta m in a d a p o r m a te ria l fe c a l.40
A A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to B á sic o (A N A )
d iv u lg o u u m estu d o q u e in d ic a q u e o B ra sil a b rig a c e rc a d e 12% d a á g u a
d o ce do m undo, m as a su a d istrib u iç ã o é d e sig u a l, m o rm e n te

36 MEKONNEN, M. M.; HOEKSTRA, A. Y. 2012. p. 410.


37 ONU. Centro Regional de Informação para a Europa Ocidental. Água. 2020.
38 OCDE. OECD Environmental 2000 to 2050. 2012.
39 ONU. The Sustainable Development Goals Report 2016. New York: United
Nations, 2016.
40 Idem.

14
c o n s id e ra n d o as p e c u lia rid a d e s re g io n a is. A re g iã o n o rte d o p a ís a b rig a
c e rc a d e 5% d a p o p u la ç ã o n a c io n a l e d etém a p ro x im a d a m e n te 8 0 % d a
á g u a d isp o n ív e l n o te rritó rio b ra sile iro , ao p a sso q u e as re g iõ e s p ró x im a s
ao O c e a n o A tlâ n tic o , n a fa ix a lito râ n e a , c o n ta m co m 3 % d o s m a n a n c ia is
e 4 5 % d a p o p u la ç ã o .41
A d e sp e ito d e v e rific a rm o s u m ín d ic e d e e stre sse h íd ric o
re la tiv a m e n te b a ix o d o B ra sil em c o m p a ra ç ã o co m o c e n á rio m u n d ia l, as
re g iõ e s c o m p re e n d id a s n a s B a c ia s H id ro g rá fic a s d o A tlâ n tic o N o rd e ste ,
o n d e in s e re -s e o se m iá rid o b ra sile iro , e n a s B a c ia s H id ro g rá fic a s do
A tlâ n tic o S u l, q u e c o n ta m co m u m a u tiliz a ç ã o m a is in te n sa d o s re c u rso s
h íd ric o s p a ra a tiv id a d e s in d u stria is, a p re se n ta m u m c e n á rio crític o
q u a n to à d is p o n ib ilid a d e d e á g u a .42 A A N A a p re se n to u , ain d a, as B a c ia s
H id ro g rá fic a s d o A tlâ n tic o L e ste e a B a c ia d o S ã o F ra n c isc o co m o
re g iõ e s em q u e a d isp o n ib ilid a d e h íd ric a n ã o é c a p a z d e a te n d e r às
d e m a n d a s p o r á g u a p o táv el.
A in d a d e a c o rd o co m dados da A N A , os p ro c e sso s de
u rb a n iz a ç ã o e c re sc im e n to e c o n ô m ic o a sso c ia d o s ao s p a d rõ e s d e
c o n s u m o a d o ta d o s a c a rre ta m u m a u m e n to d a d e m a n d a p o r á g u a n o p aís,
le v a n d o à a m p lia ç ã o d a re tira d a d e á g u a d e c e rc a d e 80% , co m p re v isã o
d e q ue, até 2 0 3 0 , o c o rra u m a c ré sc im o d e 2 6 % .43
E m co n tra p a rtid a , a p ro x im a d a m e n te 6 0 ,9 m ilh õ e s d e p e sso a s
n o c o n te x to u rb a n o tiv e ra m u m a g a ra n tia d e a b a ste c im e n to m e n o r em
2 0 1 7 . O In fo rm e A n u a l d a A N A so b re a C o n ju n tu ra d o s R e c u rso s
H íd ric o s n o B ra sil re v e lo u q u e p a ra o h o riz o n te d e 2 0 3 5 , 7 3 ,7 m ilh õ e s
d e h a b ita n te s e sta rã o su b m e tid o s à in se g u ra n ç a híd rica.
A q u e stã o d a se c a n o p a ís a p re se n ta d a d o s a la rm a n te s. E stu d o
d iv u lg a d o p e la A N A re v e la que, e n tre 2 0 1 6 e 2 0 1 7 , o n ú m e ro d e p e sso a s
a fe ta d a s p e la se c a d o b ro u , co m u m a m a io r in c id ê n c ia n o n o rd e ste do

41 BRASIL. Panorama das Águas. Quantidade de Água. Agência Nacional de Águas,


Brasília, 2020.
42 BRASIL. Panorama das Águas. Agência Nacional de Águas, Brasília, 2019.
43 Idem.

15
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

B ra sil. E m 2 0 1 8 , e sse s ev e n to s a tin g ira m c e rc a d e 43 m ilh õ e s d e p esso a s,


d o s q u a is 8 5 ,9 % são d a R e g iã o N o rd e ste .
E s s e c e n á rio te m le v a d o m u ito s m u n ic íp io s a re c o rre re m aos
c a rro s -p ip a p a ra o a b a ste c im e n to d e á g u a d a p o p u la ç ã o , situ a ç ã o ain d a
m a is e v id e n c ia d a p e la p a n d e m ia d e C o v id -1 9 . D e a c o rd o co m as
e sta tístic a s a p re se n ta d a s p e lo In s titu to B ra sile iro d e G e o g ra fia e
E s ta tís tic a (IB G E ), m a is d e 9 0 ,2 % d a p o p u la ç ã o tin h a a c e sso à fo n te de
a b a ste c im e n to d e á g u a p o tá v e l em 2 0 1 9 , se ja p e la re d e d e d istrib u iç ã o
p ú b lic a , seja a p a rtir d e p o ç o s p ro fu n d o s o u a rte sia n o s, co m m a io r
c o b e rtu ra na re g iã o su d e ste e m enor na re g iã o no rte. Logo,
a p ro x im a d a m e n te 16,4 m ilh õ e s p e sso a s n ã o tiv e ra m ac e sso a fo n te s
seg u ras d e s u p rim e n to h íd ric o , d estes, 4 0 ,6 % d a re g iã o N o rd e ste . P o r
o u tro lad o , d as p e sso a s co m a c e sso à á g u a p o tá v e l p e la re d e p ú b lic a de
d is trib u iç ã o (c e rc a d e 8 5 % d a p o p u la ç ã o ), q u a se 12% re c e b ia á g u a de
fo rm a in te rm ite n te .44
Q u a n to ao e sg o ta m e n to san itário , 8 5 ,9 % d a p o p u la ç ã o , em
2 0 1 9 , e ra a te n d id a p e lo serv iço , co m a m a io r c o b e rtu ra n o su d este, ce rc a
d e 94 % , se g u id a d o n o rd e ste (7 5 % ) e n o rte (6 8 % ). E m 2 0 2 0 , fo ram
d e te c ta d a s 100 m ilh õ e s de p e sso a s sem e sg o ta m e n to sa n itá rio e c e rc a de
35 m ilh õ e s d e p e sso a s sem a c e sso à á g u a p o tá v e l.45
O s d ados ap resentados in d icam que, a desp eito dos avanços
em p reen d id o s pelos p aíses p ara disp o n ib ilizar o acesso à ág u a potável e ao
esg o tam en to sanitário, os serviços n ão cheg aram p ara todos, tan to n a esfera
n acional q u an to global, p elo q u e esfo rço s reiterados d evem ser en g endrados
p ara q ue h aja a u n iv ersalização dos serviços d e saneam ento b ásico aptos a
p ro p o rcio n ar às p esso as ág u a trata d a e esg o tam en to sanitário.

44 BRASIL. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua Anual. IBGE,


Brasília, 2020.
45 SNIS. Brasília, 05 mar. 2020. p. 57.

16
4 DIREITO À ÁGUA NO ORDENAMENTO JURÍDICO
BRASILEIRO

U m E sta d o d e D ire ito C o n stitu c io n a l im p lic a a firm a r q u e v ig e


o p rin c íp io d e d e c isã o m a jo ritá ria co m lim ite n o s d ire ito s fu n d a m e n ta is.
A m a io r g a ra n tia q u e se p o d e o u to rg a r a esse s d ire ito s é q u e eles n ão
sejam d e rro g a d o s p e la s m a io ria s o u p e lo m e rc a d o . E s s e p rin c íp io
a p lic a d o à s d isc u ssõ e s a m b ie n ta is te m g ra n d e re le v â n c ia em to d o o
m u n d o . E m m u ita s C o n stitu iç õ e s h á d ire ito a u m m e io a m b ie n te
sau d á v el, à v id a e à á g u a p o táv el. Q u a lific a r ju rid ic a m e n te esse s d ireito s
a m b ie n ta is com o fu n d a m e n ta is p ro d u z d o is tip o s de e fe ito s: a
p o s s ib ilid a d e d e d e c la ra ç ã o d e in c o n s titu c io n a lid a d e d as le is q u e os
afe te m g ra v e m e n te 46 e ta m b é m p re te n sõ e s p o sitiv a s d e sa tisfa ç ã o ao
c o n te ú d o m ín im o d o d ireito , c o m o o c o rre n o ca so d a á g u a p o tá v e l.47 O
d ire ito à á g u a é e n te n d id o c o m o u m d ire ito in a lie n á v e l e irre n u n c iá v e l,
e le m e n to c o n s titu tiv o d a cid a d a n ia , n ã o p o d e n d o se r d isso c ia d a d a id e ia
d e d e m o c ra c ia e im p le m e n ta ç ã o d e d ire ito s fu n d a m e n ta is.48
A C R /8 8 n ã o a p resen ta, e x p lic ita m e n te , o d ire ito à á g u a p o tá v e l
e ao e s g o ta m e n to sa n itá rio c o m o d ire ito s fu n d a m e n ta is. T o d av ia , ta is
d ire ito s p o d e m ser d e p re e n d id o s d o s d ire ito s c o n stitu c io n a is e x p líc ito s
d e ac e sso à v id a, à sa ú d e e à d ig n id a d e d a p e s s o a h u m a n a . N e ss e sen tid o ,
“ o s d ire ito s e g a ra n tia s e x p re sso s n e s ta C o n stitu iç ã o n ã o e x c lu e m o u tro s
d e c o rre n te s d o re g im e e d o s p rin c íp io s a d o ta d o s p o r ela o u d o s tra ta d o s
in te rn a c io n a is q u e a R e p ú b lic a F e d e ra l d o B ra sil é p a rtic ip a n te ” .49

46 Nesse sentido, cabe ressaltar que, conforme entendimento do STF, o princípio da


vedação ao retrocesso ambiental veda a exclusão do núcleo essencial dos direitos
fundamentais. Não é, portanto, qualquer diminuição da proteção ambiental que será
inconstitucional. Para mais informações vide SION. Considerações. 2020.
47 RANGEL, Tauã Lima Verdan. 19 jan. 2014.
48 IRIGARAY, Carlos Teodoro Hugueney. 2003.
49 Art. 5°, § 2° (BRASIL. Constituição. 05 out. 1988).

17
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

O direito à água potável, portanto, visto como direito


fundamental, consiste em meio de preservar a vida e a
dignidade da pessoa humana. Este direito é de aplicação
imediata (artigo 5°, §1°, da Constituição Federal),
conferindo-lhe posição privilegiada no ordenamento
jurídico, haja vista que é a Carta Magna que orienta o
restante do ordenamento, servindo como guia para a
efetividade das demais normas.50

O m o v im e n to d e re c o n h e c im e n to d a g a ra n tia d e ac e sso à á g u a
p o tá v e l c o m o d ire ito h u m a n o fu n d a m e n ta l é re c e n te n o B rasil. T ra ta -se
d e u m a tra n s iç ã o n o tra ta m e n to ju ríd ic o d o s re c u rso s h íd ric o s q u e ,
o u tro ra , e ram c o n sid e ra d o s, p re d o m in a n te m e n te , em seu c a rá te r
m e rc a n til, m a s q u e a g o ra p a ssa a se r o b je to d e p ro te ç ã o c o m o d ire ito
fu n d a m e n ta l p a ra q u e as p re se n te s e fu tu ra s g e ra ç õ e s p o ssa m te r o seu
ac e sso a s s e g u ra d o .51
S en d o assim , a d e sp e ito d e n ã o e sta r p re v isto c o m o d ire ito
h u m a n o fu n d a m e n ta l, o a c e sso à á g u a p o tá v e l d e v e se r re c o n h e c id o a
p a rtir d a a p lic a ç ã o d o s p rin c íp io s d a n ã o tip ic id a d e d o s d ireito s
fu n d a m e n ta is e d a d ig n id a d e d a p e sso a h u m a n a , a ser a sse g u ra d o e
p ro v id o p e lo P o d e r P ú b lic o em q u a n tid a d e e q u a lid a d e su fic ie n te s e
a d e q u a d a s, d e fo rm a q u e a lc a n c e to d a p o p u la ç ã o , p o rta n to u n iv e rsa l,
sem q u e q u e stõ e s e c o n ô m ic a s sirv am c o m o e n tra v e à su a e fe tiv a ç ã o .52
A C R /8 8 p re v iu , n o art. 21, in c iso X X , a c o m p e tê n c ia
a d m in is tra tiv a e e x c lu siv a d a U n iã o p a ra e sta b e le c e r d ire triz e s p a ra o
sa n e a m e n to b á sic o . O art. 23, in c iso V I, e sta b e le c e a c o m p e tê n c ia
co m u m d o s e n te s fe d e ra tiv o s p a ra a p ro te ç ã o d o m e io a m b ie n te e o

50 ANDREASSA, Andrea Paula. O acesso à água potável como direito fundamental e


a necessidade de conscientização ambiental. In : MIRANDA, João et al. (coord.).
Estudos de Direito do Saneamento. Lisboa: Faculdade de Direito da Universidade de
Lisboa, 2020. Cap. 5, p. 181-202. p. 190.
51 O acesso à água potável poderá ser inserido brevemente no rol de direitos e garantias
fundamentais da CR/88, devido à provável aprovação da Proposta de Emenda à Constituição
(PEC) 04/2018, que antecedeu o 8° Fórum Mundial da Água realizado em 2018.
52 OLIVEIRA, Celso Maran. 2017.

18
c o m b a te à p o lu iç ã o em to d a s as su as fo rm a s, d e v e n d o “ p ro m o v e r
p ro g ra m a s d e c o n stru ç ã o d e m o ra d ia s e a m e lh o ria d as co n d iç õ e s
h a b ita c io n a is e d e s a n e a m e n to b á s ic o ” (art. 23, in c iso IX ). O art. 200,
in c is o IV , p re v iu c o m o c o m p e tê n c ia d o S iste m a Ú n ic o d e S aú d e (S U S )
“ p a rtic ip a r d a fo rm u la ç ã o d a p o lític a e d a e x e c u ç ã o d as aç õ es de
sa n e a m e n to b á s ic o ” , ao p a sso q u e a c o m p e tê n c ia le g is la tiv a em m a té ria
h íd ric a é re s e rv a d a à U n iã o (art. 22, in c iso IV ), n ã o e x c lu in d o os estad o s,
q u e p o d e m le g is la r a p a rtir d e lei a u to riz a tiv a p re v ista n o art. 22, § ú n ico .
O art. 30, in c iso s I e II, d a C R /8 8 p re v ê a c o m p e tê n c ia dos
m u n ic íp io s p a ra le g isla r so b re q u e stõ e s d e in te re sse lo cal, d e fo rm a a
s u p le m e n ta r a le g isla ç ã o e sta d u a l o u fe d e ra l, o rg a n iz a r e p re sta r
d ire ta m e n te o u sob re g im e d e c o n c e ssã o o u p e rm issã o os se rv iç o s
p ú b lic o s d e in te re sse lo cal, in c lu íd o s os se rv iç o s d e a b a ste c im e n to de
á g u a e d e e s g o ta m e n to san itário .
A d e m a is, a á g u a é re g u la d a em le g isla ç õ e s in fra c o n stitu c io n a is,
c u jo ac esso é a lç a d o a d ire ito fu n d a m e n ta l p a ra a v id a h u m a n a , co m o
d e p re e n d e -se d a L ei F e d e ra l n° 1 1 .3 4 6 /2 0 0 6 , q u e c o n sid e ra a á g u a co m o
a lim e n to e a a lim e n ta ç ã o c o m o d ire ito h u m a n o fu n d a m e n ta l.53
N o m e sm o sen tid o , a P o lític a N a c io n a l d e R e c u rso s H íd ric o s
fo i e s ta b e le c id a a p a rtir d a p ro m u lg a ç ã o d a L ei F e d e ra l n° 9 .4 3 3 /1 9 9 7 ,
p re v e n d o q u e a á g u a é u m p a trim ô n io p ú b lic o p a ra u s o c o le tiv o das
p esso a s. A ág u a, a p e sa r d e te r su a d o m in ia lid a d e a tre la d a à U n iã o e aos
E sta d o s, n ã o p e rte n c e ao s g o v e rn o s e n e m às p e sso a s e sp e c ífic a s, sen d o
c o n s id e ra d a “u m b e m p ú b lic o p a ra q u e a a p ro p ria ç ã o id e n tific á v e l n ão
se ja aceita, p o is é u m d ire ito h u m a n o fu n d a m e n ta l, c a ra c te riz a d o p e la
in a lie n a b ilid a d e e n ã o re n ú n c ia a d ire ito s” .54
A L e i F e d e ra l n° 10.25 7 /2 0 0 1 p re v ê d ire triz e s g e ra is das
p o lític a s u rb a n as, o b je tiv a n d o o p la n e ja m e n to d o d e se n v o lv im e n to das
fu n ç õ e s so ciais d a c id a d e e d a p ro p rie d a d e u rb a n a. O art. 2°, in c iso I,

53 BRASIL. Lei Federal n° 11.346, de 15 de setembro de 2006.


54 (IRIGARAY, 2003, p. 309).

19
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

c o n c e itu a “ g a ra n tia d o d ire ito às cid a d e s su sten táv eis, c o m o o d ire ito à
te rra u rb a n a , à h a b ita ç ã o , ao sa n e a m e n to a m b ie n ta l, à in fra e stru tu ra
u rb a n a , ao s tra n sp o rte s e se rv iç o s p ú b lic o s, ao tra b a lh o e ao laze r, p a ra
as g e ra ç õ e s p re se n te s e fu tu ra s” .55 L o g o , p a ra q u e a c id a d e seja
c o n s id e ra d a su ste n tá v e l d e v e c u m p rir su as fu n ç õ e s so ciais, in c lu in d o os
se rv iç o s d e c ria ç ã o e p ro m o ç ã o d o sa n e a m e n to b á s ic o .
D e n tre as n o rm a s in fra le g a is q u e tra ta m d a te m á tic a , a L ei
F e d e ra l n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 p re v ê as d ire triz e s n a c io n a is p a ra o sa n e a m e n to
b á s ic o e p a ra a p o lític a fe d e ra l d e sa n e a m e n to b á sic o , e sta b e le c e n d o
c o m o se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to o a b a ste c im e n to d e á g u a p o táv el,
o e s g o ta m e n to san itário , a d re n a g e m e m a n e jo d e ág u a s p lu v ia is e a
lim p e z a u rb a n a e m a n e jo d e re síd u o s só lid o s. T a is se rv iç o s d ev e m ser
a te n d id o s c o n s id e ra n d o os p rin c íp io s fu n d a m e n ta is d a u n iv e rsa liz a ç ã o
d o acesso ; a in te g ra lid a d e ; a u tiliz a ç ã o d e te c n o lo g ia s a p ro p ria d a s e o
c o n tro le so cial (art. 2°), sen d o o b rig a tó rio a te n d e r, ao m e n o s, os
re q u is ito s m ín im o s de re g u la rid a d e e c o n tin u id a d e dos serv iço s,
c o n fo rm e art. 43. A u n iv e rsa liz a ç ã o d o a c e sso à á g u a p o tá v e l p o d e ser
c o m p re e n d id a co m o o re c o n h e c im e n to p e lo B ra sil d o s n o rm a tiv o s
in te rn a c io n a is d a á g u a c o m o d ire ito h u m a n o .56
O art. 29, § 1°, d a re fe rid a lei e sta b e le c e as d ire triz e s p a ra a
in s titu iç ã o d e ta rifa s, p re ç o s p ú b lic o s e ta x a s, le v a n d o em c o n sid e ra ç ã o
a “ I - p rio rid a d e p a ra o a te n d im e n to d as fu n ç õ e s e sse n c ia is re la c io n a d a s
à sa ú d e p ú b lic a ” e a “ II - a m p lia ç ã o d o ac e sso d o s c id a d ã o s e lo c a lid a d e s
d e b a ix a re n d a ao s se rv iç o s” . H á, ain d a, a p re v isã o d e su b síd io s ta rifá rio s
e n ã o ta rifá rio s “ p a ra os u su á rio s q u e n ã o te n h a m c a p a c id a d e d e
p a g a m e n to s u fic ie n te p a ra c o b rir o c u sto in teg ra l d o s se rv iç o s” , se rv in d o
c o m o g a ra n tia d e ac e sso d o s se rv iç o s d e fo rn e c im e n to e d istrib u iç ã o de
á g u a p o tá v e l a p e sso a s d e b a ix a re n d a (art. 30, in c iso s III e V I) .57

55 BRASIL. Lei Federal n° 10.257, de 10 de julho de 2001.


56 BRASIL. Lei n°. 11.445, de 5 de janeiro de 2007.
57 Idem.

20
Já o art. 40, §3°, p o r seu tu rn o , d e te rm in o u a in te rru p ç ã o ou
c rité rio s e p ra z o s e sp e c ífic o s q u a n d o d a in te rru p ç ã o d o se rv iç o p a ra
d e te rm in a d a s situ açõ e s, com o d e p re e n d e -se do te x to legal: “A
in te rru p ç ã o o u a re striç ã o d o fo rn e c im e n to d e á g u a p o r in a d im p lê n c ia a
e sta b e le c im e n to s d e saú d e, a in stitu iç õ e s e d u c a c io n a is e d e in te rn a ç ã o
c o le tiv a d e p e s so a s e a u s u á rio re sid e n c ia l d e b a ix a re n d a b e n e fic iá rio de
ta rifa so cial d e v e rá o b e d e c e r a p ra z o s e c rité rio s q u e p re se rv e m
c o n d iç õ e s m ín im a s d e m a n u te n ç ã o d a sa ú d e d a s p e sso a s a tin g id a s” .58

5 SANEAMENTO BÁSICO E ACESSO À ÁGUA POTÁVEL

E m q u e p e se os a v a n ç o s e m p re e n d id o s n o B ra sil e n o m u n d o n o
q u e re s p e ita ao a c e sso à á g u a p o tá v e l e ao sa n e a m e n to b á sic o , e a p e sa r
d e e x istire m n o rm a s n o B ra sil q u e tu te le m o d ire ito ao sa n e a m e n to
b á sic o , os d a d o s in d ic a m q u e a in d a h á m u ito a se fa z e r p a ra g a ra n tir
ac e sso u n iv e rsa l à á g u a p o tá v e l e c o le ta e tra ta m e n to d e esg o to s. D e
a c o rd o co m S o are s e t al.

[...] o saneamento se destaca pela essencialidade atribuída


aos serviços necessários para a garantia de salubridade
ambiental e dignidade humana. Tais serviços trazem
benefícios significativos para a população em diversos
campos, como saúde, preservação ambiental e
desenvolvimento de atividades econômicas, como o
turismo, por exemplo. No entanto, a situação do
saneamento ainda é precária no Brasil, especialmente no
que diz respeito ao esgotamento sanitário.59

O S iste m a N a c io n a l d e In fo rm a ç õ e s S o b re S a n e a m e n to (S N IS )
“ é o m a io r e m a is im p o rta n te siste m a d e in fo rm a ç õ e s d o se to r d e
sa n e a m e n to b ra s ile iro ” . O S iste m a v in c u la d o ao M in isté rio do
D e se n v o lv im e n to R e g io n a l e su b o rd in a d o à S e c re ta ria N a c io n a l de

58 Ibidem.
59 SOARES, J. A. et al. 2015. p. 320.

21
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

S a n e a m e n to fo i cria d o em 1994 co m b a s e n o P ro g ra m a d e M o d e rn iz a ç ã o
d o S e to r d e S a n e a m e n to (P M S S ) e “ [...] p o ssu i u m a b a s e d e d ad o s q u e
c o n té m in fo rm a ç õ e s e in d ic a d o re s so b re a p re s ta ç ã o d e se rv iç o s d e Á g u a
e E sg o to s, d e M a n e jo d e R e síd u o s S ó lid o s U rb a n o s e D re n a g e m e
M a n e jo d as Á g u a s P lu v ia is U rb a n a s ” .60
O S N IS é re sp o n sá v e l p e la c a te g o riz a ç ã o d o s d a d o s re la tiv o s ao
siste m a d e a b a ste c im e n to d e á g u a d u ra n te o p e río d o q u e se in ic ia co m a
c a p ta ç ã o e fin a liz a co m a d istrib u iç ã o d o p ro d u to fin al ao c o n su m id o r.
O s ú ltim o s d a d o s p u b lic a d o s p e lo S N IS , em 2 0 1 8 , re v e la m q u e
8 3 ,6 % d a p o p u la ç ã o tê m a c e sso ao se rv iç o d e a b a ste c im e n to d e á g u a
p o tá v e l, ao p a s s o q u e os n ú m e ro s re fe re n te s ao e sg o ta m e n to sa n itá rio são
a la rm a n te m e n te m en o re s, a p e n a s 5 3 ,2 % é a te n d id a p e lo se rv iç o d e co le ta
d e esg o to e 4 6 ,3 % p o ssu e m tra ta m e n to d e e sg o to .61
L e v a n ta m e n to s d e 2 0 2 0 re v e la m q u e d o s 5 .5 7 0 m u n ic íp io s,
a p e n a s 4 5 % p o ssu e m a te n d im e n to d e á g u a a c im a d e 9 9 % , 7 3 % dos
se rv iç o s d e esg o to e 5 6 % d e tra ta m e n to d e esg o to . D e a c o rd o co m d ad o s
d o IB G E , em 2 0 2 0 , 31,3 m ilh õ e s d e p e sso a s n ã o p o ssu e m ac esso à á g u a
p o r m e io d a re d e d e a b a ste c im e n to , n ú m e ro m u ito p re o c u p a n te .62
C o m b a se n o s d ad o s o b serv ad o s e n o n ú m e ro sig n ificativ o de
p esso a s sem ac esso à á g u a p o táv el e ao esg o tam e n to sanitário, d e p re e n d e -
se q u e ex iste u m a d isc re p â n c ia re la c io n a d a às re g iõ e s do p aís e,
p rin cip a lm en te , às classe s so ciais p a ra ac esso a esses serv iço s essen ciais,
co m p ro m e te n d o , assim , a g a ra n tia d o d ireito d e a b a ste cim en to d e á g u a
p o táv el e san e am en to b á sic o a todos. “ O ac esso re g u la r à á g u a p o táv el e
segura, e m b o ra seja u m d ireito h u m a n o b ásico , n ã o tem sido esten d id o a
to d a p o p u laçã o , e sp e cialm en te àq u e la en c o n tra d a em áreas p eriu rb an as
esq u e cid as p elas p o lítica s p ú b licas d e san e am en to e saú d e” .63 A in d a, “ a
u n iv e rsa liz a ç ã o do ac esso e efetiv a p re sta ção d o serv iço é o d isp o sto n o

60 SNIS. 05 mar. 2020.


61 SNIS. Diagnóstico dos Serviços de Água e Esgoto. 2018. p. 57.
62 DESAFIOS... 2020.
63 RAZZOLINI, Maria Tereza Pepe; GUNTHER, Wanda Maria Risso. 2008. p. 25.

22
art. 2°, I, d a [Lei F ed eral n° 11445/2007], o n d e em su a p re sta ção o P o d e r
P ú b lic o d e v e rá d isp o n ib ilizá -lo à p o p u la ç ã o sem fa z e r q u a lq u e r d istin ção
en tre as p e sso a s” .64
E m fa c e às in fo rm a ç õ e s a p re se n ta d a s, v e rific a m o s u m a situ açã o
a la rm a n te , te n d o em v is ta q u e in c o n tá v e is fa m ília s b ra sile ira s n ão
d isp õ e m d e “ á g u a p o tá v e l se q u e r p a ra a la v a g e m c o rre ta d as m ão s. E sse
c e n á rio se p re sto u , in c lu siv e , p a ra o d e sp e rta r d o C o n g re sso N a c io n a l
q u e v iu n a C O V ID -1 9 a n e c e ssid a d e p re m e n te d e a p ro v a r u m n o v o
m a rc o d o sa n e a m e n to q u e b u sca , e sp e c ia lm e n te , a u n iv e rsa liz a ç ã o dos
se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á s ic o n o p a ís” .65
D e ssa fo rm a , o P o d e r P ú b lic o , d ire ta o u in d ire ta m e n te , d ev e
a d o ta r m e d id a s q u e v ise m sa n a r a d e sig u a ld a d e d o ac e sso e d istrib u iç ã o
d o se rv iç o d e a b a ste c im e n to d e á g u a p o tá v e l e d e sa n e a m e n to b á sic o n o
B ra sil, d e s ta c a n d o o sta tu s d e d ire ito h u m a n o fu n d a m e n ta l ele n c a d o
p e la s n o rm a s in fra le g a is e tra ta d o s in tern a c io n a is.

6 NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO

O sa n e a m e n to , co m o a p o n ta d o ao n o rte, é re g u la d o p e la L ei
F e d e ra l n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , q u e “ foi c o n c e b id a d e fo rm a a a b rig a r to d a s as
fo rm a s le g a lm e n te p o ssív e is d e o rg a n iz a ç ã o in stitu c io n a l d o s se rv iç o s de
sa n e a m e n to b á sic o , c o e re n te co m as m ú ltip la s re a lid a d e s so ciais,
a m b ie n ta is e e c o n ô m ic a s d o B ra s il” .66
A L ei F e d e ra l n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 p a sso u por a lteraçõ e s
im p le m e n ta d a s p e la L e i F e d e ra l n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , d e n o m in a d a N o v o
M a rc o L e g a l d o S a n e a m e n to B á sic o , sa n c io n a d a p e lo P re sid e n te Ja ir
B o lso n a ro em 15 d e ju lh o d e 2 0 2 0 . O N o v o M a rc o L e g a l é fru to de
in te n s a s d isc u ssõ e s q u e se p ro lo n g a ra m d u ra n te m u ito s an o s e cu jo

64 LAHOZ, Rodrigo Augusto; DUARTE, Francisco Carlos. 2015. p. 330.


65 SION, Alexandre Oheb. 2020. p. 130.
66 PEREIRA JR, José de Sena. 2008. p. 7.

23
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

d e b a te se a c irro u co m a e d iç ã o d as M e d id a s P ro v isó ria s (M P s) n°


8 4 4 /2 0 1 8 e 8 6 8 /2 0 1 8 . “ A s alte ra ç õ e s e m p re e n d id a s p e la s M P s n ã o fo ram
b e m re c e b id a s , em e sp e c ia l p o r v e rsa re m so b re te m a c o m p le x o e q u e ,
p o rta n to , n e c e s s ita v a se r a n a lisa d o e d e b a tid o d e fo rm a a m p la com o
se to r e co m a so c ie d a d e ” .67
O P ro je to d e L e i (P L ) n° 4 .1 6 2 /2 0 1 9 c o n v e rtid o n a L e i F e d e ra l
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 foi p ro p o sto p e lo P o d e r E x e c u tiv o em ag o sto d e 2 0 1 9 ,
tra m ito u em c a rá te r d e u rg ê n c ia ap ó s a p e rd a d e e fic á c ia d a M P 8 6 8 /2 0 1 8
e foi a p ro v a d o em 2 4 d e ju lh o d e 2 0 2 0 .68
U m a d as p rin c ip a is fin a lid a d e s d o N o v o M a rc o L eg a l é a
g a ra n tia d e a b a ste c im e n to d e á g u a p o tá v e l p a ra 9 9 % d a p o p u la ç ã o e de
c o le ta e tra ta m e n to d e e sg o ta m e n to sa n itá rio p a ra 9 0 % d a p o p u la ç ã o até
2 0 3 3 . T ra ta -se, c o m o j á a n a lisa d o n o p re se n te tra b a lh o , d e m e d id a
a tin e n te a a te n d e r ao s O D S d a O N U n a A g e n d a 2 0 3 0 , q u e a lm e ja a
u n iv e rs a liz a ç ã o d o s se rv iç o s em p a u ta a té 2030.
P o d e -se o b se rv a r q u a tro p ila re s d e a tu a ç ã o n a L e i F e d e ra l n°
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , q u e c o n stitu e m m u d a n ç a s e sse n c ia is a b o rd a d a s p e lo N o v o
M arco . P rim e ira m e n te , e cre m o s o m a is re le v a n te , é a g a ra n tia de
u n iv e rs a liz a ç ã o d o se rv iç o d e sa n e a m e n to b á s ic o até 2 0 3 3 , m e ta q u e
ab ran g e, in clu siv e, M u n ic íp io s com co n tra to s d e p ro g ra m a firm a d o s,
a in d a q u e sem e stip u la ç ã o d e o b je tiv o s claro s e b e m d efin id o s, te n d o a
o b rig a to rie d a d e d e a g o ra d efin i-lo s.
D e a c o rd o co m B e s s a A n tu n e s e D ’O liv eira , a p e sa r dos
e sfo rç o s p a ra u n iv e rsa liz a ç ã o d o s serv iç o s, “tu d o le v a a c re r q u e as m e ta s
d e u n iv e rs a liz a ç ã o n ã o serão c u m p rid a s até 2 0 3 3 , h a ja v is ta o v u lto dos
in v e stim e n to s, o te m p o e o a m b ie n te p o lític o n e c e ssá rio s p a ra ta n to ” ,69
p o d e n d o h av e r, n o e n ta n to , “ d ila ç ã o d o p ra zo , d e sd e q u e n ã o u ltra p a sse
1° d e ja n e ir o d e 2 0 4 0 e h a ja a n u ê n c ia p ré v ia d a a g ê n c ia re g u la d o ra , que,

67 SION, Alexandre Oheb. 2020. p. 131.


68 BRASIL. Projeto de Lei 4.162/2019. Câmara dos Deputados, Brasília, 02 ago. 2019.
69 BESSA ANTUNES, Paulo de; D ’OLIVEIRA, Rafael Daudt. 23 jul. 2020. s. p.

24
em su a an álise, d e v e rá o b se rv a r o p rin c íp io d a m o d ic id a d e ta rifá ria ” 70
n a s h ip ó te s e s em q u e fo r o b se rv a d a in v ia b ilid a d e d e c u m p rim e n to do
p ra z o .71 As m e ta s de u n iv e rsa liz a ç ã o c o n sid e ra m , além da
d is p o n ib ilid a d e d o s se rv iç o s, a g a ra n tia d e p re sta ç ã o d e q u a lid a d e de
fo rm a in in te rru p ta .72
O segundo p ila r re fe re -se ao fo rta le c im e n to do poder
re g u la tó rio , a p a rtir d e m e ta s p a ra m a io r efic iê n c ia , d e fo rm a a g a ra n tir a
s e g u ra n ç a ju ríd ic a e a tra ir in v e stim e n to s p riv a d o s p a ra o setor. P a ra o
M in is tro d o D e se n v o lv im e n to R e g io n a l, R o g é rio M a rin h o , “ e ssa é u m a
c o n q u is ta h is tó ric a q u e to rn a p o ssív e l q u e to d o b ra sile iro te n h a ac e sso à
á g u a p o tá v e l e ao e sg o to trata d o . A lei v ai p a d ro n iz a r re g ra s e d ar
s e g u ra n ç a ju ríd ic a , a lg o q u e in v e stid o re s d o m u n d o to d o a g u a rd a v a m ” .73
A re g u la ç ã o seto rial d e sp o n ta c o m o e le m e n to m e d u la r p a ra a
g a ra n tia d e u n iv e rsa liz a ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o n o B ra sil,
vez que o fe re c e fe rra m e n ta s de in c e n tiv o às p re sta d o ra s p a ra
c u m p rim e n to d as p o lític a s re g u la tó ria s e stip u la d a s p e la ANA e,
c o n se q u e n te m e n te , c o n trib u e m p a ra um c e n á rio estáv e l p a ra
in v e s tim e n to s p ú b lic o s e p riv a d o s .74 D e ss a fo rm a , a re g u la ç ã o d o setor,
a n tes c a p ila riz a d a e co m d isc re p â n c ia s e n tre u m a re g iã o e o u tra, p a ssa a
se r n a c io n a liz a d a co m a c o m p e tê n c ia a trib u íd a à A N A p a ra in stitu ir
n o rm a s d e re fe rê n c ia c la ra s e u n ifo rm e s, te n d e n te s a o rie n ta r a a tu a ç ã o
d o s d e m a is e n tes fe d e ra tiv o s. “ A n o v a L e i n ã o tra z a d e fin iç ã o d o q u e
sejam n o rm a s d e re fe rê n c ia ” , se n d o c o n v e n ie n te a p lic a r a “ a n a lo g ia e n tre
as n o rm a s d e re fe rê n c ia n o â m b ito d a re g u la ç ã o co m as n o rm a s g e ra is d a
U n iã o n o e x e rc íc io d a c o m p e tê n c ia le g is la tiv a c o n c o rre n te p re v ista n o

70 BRASIL. Lei Federal n° 14.026, de 15 de julho de 2020.


71 O legislador previu, no art. 11-B, § 7° da Lei Federal n° 11.445/2007, que a agência
reguladora, no caso a ANA, tem a obrigação de abrir de procedimento administrativo,
a fim de aplicar as sanções que entender cabíveis, inclusive a vedação de distribuição
de lucros e dividendos pelo prestador do serviço (BRASIL, 2007).
72 SION, Alexandre Oheb. 2020. p. 132.
73 BRASIL. Novo Marco do Saneamento... 2020.
74 GALVÃO JUNIOR, Alceu de Castro. 2009. p. 554.

25
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

art. 2 4 d a C R F B ” .75 D e ss a fo rm a , “ as n o rm a s d e re fe rê n c ia d ev e m se ate r


ao e s ta b e le c im e n to de d ire triz e s n a c io n a is que p o ssa m ser
u n ifo rm e m e n te a p lic a d a s em to d o o B ra s il” .76
O terceiro p ilar re sp eita à p restação re g io n alizad a dos serviços de
san eam en to básico, com o intuito de criar b lo co s de m u n icíp io s que
fo rn ece rão aten d im en to aos p equenos m u n icíp io s d esprovidos de ren d a
p ara im p le m e n taçã o dos serviços d e fo rm a adequada, qualitativa e
in interrupta, p ara v iab ilizar a p restação dos serviços de m an eira universal,
co b rin d o o d é fic it atu alm en te o b servado n o p aís.77 A proposta, aqui, é
in teg ra r diferen tes instituições que prestam o serviço de san eam en to e criar
u m a co rren te d e auxílio entre os m u n icíp io s a partir de co nsórcios públicos
e co n v ên io s de co o p eração entre m u n icíp io s vizinhos.
O q u a rto p ila r tra ta d a p ro ib iç ã o d e n o v o s c o n tra to s de
p ro g ra m a e d a fo rm a liz a ç ã o d o s co n tra to s d e c o n c e ssã o p a ra “ en tid a d e
q u e n ã o in te g re a a d m in istra ç ã o d o titu la r” (art. 10, c a p u t).78 A q u i, h á “ a
p riv a tiz a ç ã o d e e sta ta is d o se to r e e x tin ç ã o d o m o d e lo atu al d e c o n tra to
e n tre m u n ic íp io s e e m p re sa s e sta d u a is d e á g u a e e sg o to ” 79 e a lic ita ç ã o
to rn a -s e o b rig a tó ria ta n to p a ra e m p re sa s p riv a d a s q u a n to p ú b licas, as
q u ais d ev e m a p re se n ta r c lá u su la s co m m e ta s c la ra s e c o n c re ta s de
u n iv e rs a liz a ç ã o d o serviço.
O u tro po n to d e salutar im p o rtân cia en fren tad o pelo N o v o M arco
L eg al diz resp eito à p erd a de ág u a n o pro cesso de d istribuição e os im p acto s
relacio n ad o s à p erd a hídrica. Q u an to a essa tem ática, a L ei F ederal n°
9 .4 3 3/1997, d esd e sua criação, n ec essita v a d e u m arranjo institucional
cap az de re g er o S istem a de G eren ciam en to de R ecu rso s H ídricos,

75 BESSA ANTUNES, Paulo de; D ’OLIVEIRA, Rafael Daudt. 2020. s. p.


76 Idem.
77 DIAS, Christianne; MARANHÃO, Pedro (palestrantes) MOTTA, Carlos. 02 jul.
2020. 35m.
78 BRASIL. Lei n°. 11.445, de 5 de janeiro de 2007.
79 BRASIL. Senado aprova novo marco legal do saneamento básico. Senado Notícias,
Brasília, 2020.

26
g aran tin d o u m a g estão h íd rica m ais eficien te.80 O sistem a era baseado,
praticam en te, n a atu ação dos C o m itês de B acia, in ap to s a ap resen tar
ativ id ad es essen cialm en te técn icas o u a im p le m e n tar sistem as com plexos,
co m o a co b ran ça p elo u so d a água. C o m o fo rm a d e so lu cio n ar esse dilem a,
a A N A foi criad a em 2000, com a co m p etên cia p a ra av aliar as q uestões
relacio n ad as à disponibilidade dos recursos hídricos e relacioná-las às
d em an d as de u so d a água, a fim de im p le m e n tar ações de com b ate ao
desperdício, de p ro teção aos eco ssistem as aquáticos e p ro m o çã o do u so
sustentável d a água, m as os C om itês de B acia, entes do S iste m a N acio n al
de G e stã o dos R ecu rso s H ídricos, ain d a são responsáveis p elas deliberações
de recu rso s h ídricos n o país.
E m e s tu d o d iv u lg a d o p e la C o n fe d e ra ç ã o N a c io n a l de In d ú s tria
(C N I) ,81 c o n s ta to u -s e q u e em c a d a d ez litro s d e á g u a q u a tro são
p e rd id o s a n te s d e c h e g a r à p o p u la ç ã o . A p e rd a m é d ia n o B ra sil,
a tu a lm e n te , chega a 3 8 ,5 % , p ro v o c a d a , p rin c ip a lm e n te , por
in s u fic iê n c ia s té c n ic a s .82 T ra ta -s e d e te m á tic a “ d e a lta re le v â n c ia fre n te
a c e n á rio s d e e s c a s s e z h íd ric a e de a lto s c u sto s d e e n e rg ia e lé tric a , além
d a s u a re la ç ã o d ire ta co m a sa ú d e fin a n c e ira d o s p re s ta d o re s de
s e rv iç o s , u m a v e z q u e p o d e m re p re s e n ta r d e s p e rd íc io d e re c u rso s
n a tu ra is, o p e ra c io n a is e d e re c e ita ” .83 S e rra n o e C a rv a lh o su ste n ta m q u e
u m a d as in ic ia tiv a s p a ra o e n fre n ta m e n to d e s s a p ro b le m á tic a p a s s a p e la
re g u la ç ã o d o s m e rc a d o s de d is trib u iç ã o d o s re c u rso s h íd ric o s.
D e s s a fo rm a , a p a rtir d a n o v a le g isla ç ã o , h á a o b rig a to rie d a d e
de q u e os co n tra to s de p re sta ç ã o dos se rv iç o s a p re se n te m m e ta s de
p ro g re s s ã o d a p e rd a h íd ric a , co m p la n e ja m e n to c o n c re to e e sp e c ífic o
c a p a z d e p e rm itir a im p le m e n ta ç ã o d e ssa re d u ção . N o s te rm o s d a lei, “ a
entidade reguladora estabelecerá limites máximos d e p e rd a n a
d is trib u iç ã o d e á g u a tra ta d a , q u e poderão ser reduzidos gradualmente,

80 BRASIL. Novo Marco do Saneamento... 2020.


81 CNI. 2020. p. 13.
82 SNIS 2018, p. 82
83 Idem, p. 80

27
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

c o n fo rm e se v e rifiq u e m a v a n ç o s te c n o ló g ic o s e m a io re s in v e stim e n to s
em m e d id a s p a ra d im in u iç ã o d e sse d e sp e rd íc io ” (art. 43, § 2°).84
E m q u e p e se as o p in iõ e s p o lític a s c o n trá ria s ,85 a L e i F e d e ra l n°
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 v is a à u n iv e rsa liz a ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o ,
d e fo rm a a g a ra n tir o a c e sso a to d o s os c id a d ã o s ao a b a ste c im e n to de
á g u a p o tá v e l e e sg o ta m e n to san itário . T ra ta -se d e n o rm a que, a in d a q u e
m e re ç a alg u n s aju stes, a p re se n ta u m a v a n ç o n a g a ra n tia d e d ire ito s
h u m a n o s fu n d a m e n ta is.

7 CONCLUSÃO

O d ireito à ág u a potável co m o direito h u m an o fundam ental po d e


ser ex traído do direito à v id a re co n h ecid o e g aran tid o constitucionalm ente,
d a saúde e d a d ig n id ad e d a p esso a hum ana, v e z que n ão existe v id a sem
água. A ssim , o acesso à água, em q ualidade e q u antidade suficientes e
ad eq u ad as ao aten d im en to das necessid ad es hum anas, in sere-se entre os
req u isito s in d isp en sáv eis à ex istên cia de u m a v id a digna.
C o m efeito , o d ire ito fu n d a m e n ta l à á g u a p o tá v e l, en q u a n to
e le m e n to e sse n cial à e x istê n c ia h u m a n a e a o u tra s fo rm a s d e v id a , c a rec e
d e tra ta m e n to p rio ritá rio d as in stitu iç õ e s so c ia is e estata is, re c la m a n d o
m udanças e stru tu ra is no p ap e l d e se m p e n h a d o p e lo E sta d o e de
c o m p o rta m e n to re fe re n te à a tu a ç ã o d a so cied ad e.
O p re se n te tra b a lh o te v e c o m o o b je tiv o a n a lisa r o a c e sso à á g u a
p o tá v e l c o m o d ire ito h u m a n o fu n d a m e n ta l à lu z d o N o v o M a rc o L eg a l
d o S a n e a m e n to B á sic o n o B rasil.

84 BRASIL. Lei n°. 11.445, de 5 de janeiro de 2007. Grifo nosso.


85 O Novo Marco Legal foi alvo de ADIs com objetivo de invalidar diversos
dispositivos da lei. Dentre elas destaca-se a ADI 6492, julgada improcedente sob o
fundamento de que “A manutenção do status quo perpetua a violação à dignidade de
milhares de brasileiros e a fruição de diversos direitos fundamentais” (BRASIL.
Supremo Tribunal Federal. 05 ago. 2020).

28
N os p rim e iro s tó p ic o s fo ra m a p re se n ta d a s as d isc u ssõ e s
in te rn a c io n a is d a te m á tic a d e g a ra n tia à á g u a p o tá v e l a to d o s os cid ad ã o s,
co m o le v a n ta m e n to d a s C o n fe rê n c ia s M u n d ia is so b re a Á g u a q u e
o c o rre ra m d e sd e 1977, b e m c o m o a a p re se n ta ç ã o d e ca so p a ra d ig m a
so b re c o n flito e n v o lv e n d o a d isp u ta p o r re c u rso s h íd ric o s n a A rg e n tin a .
P o steriorm ente, an alisam os o direito à ág u a potável e ao
esg o tam en to sanitário n o ord en am en to ju ríd ico b rasileiro, conclu in d o que o
acesso à água, em b o ra n ão prev isto ex p licitam en te n a C R /88, constitui
direito h u m an o fundam ental im plícito, essencial ao p len o desen v o lv im en to
h u m an o e à m an u ten ç ão d a v id a n a T e rra . T ais direitos estão previstos
ex p licitam en te em leg islaçõ es infralegais, em especial n a L ei F ed eral n°
9 .4 3 3/1997, q u e p revê as diretrizes dos recu rso s hídricos, e n a L ei F ederal
n° 11.445/2007, q u e estabelece as d iretrizes do saneam ento n o país.
P o r fim , an alisam o s o N o v o M arco L eg al do S aneam ento B ásico,
d estacan d o os pilares d a n o v a lei e as q uestões relacio n ad as ao
ab astecim en to d e ág u a e co leta e trata m e n to de esgoto à lu z d a L ei F ederal
n° 14.026/2007. C o n clu iu -se que, em que p ese as críticas sobre o N o v o
M arco , as d isp o siçõ es n ele p rev istas m o stram -se co m o u m a p ersp ectiv a de
alcan ce d a u n iv ersalização dos serviços de san eam en to b ásico até 2033,
com fo co n a reg u lação setorial ap ta a g aran tir m a io r seg u ran ça ju ríd ic a p ara
in v estim en to s n o seto r e red u ção dos índices d e p erd a hídrica.

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36
A TRAJETÓRIA DA REGIONALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS
PÚBLICOS DE ÁGUA E ESGOTO: do PLANASA ao Novo
M arco R egulatório

A n d e rso n P aulino*

1 UMA BREVE HISTÓRIA DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS DE


ÁGUA E ESGOTO ANTES DO PLANASA: o caso do Rio de Janeiro.

A h istó ria d o san eam en to n a cidade do R io de Jan eiro é


em b lem ática p ara ex p licar o perío d o secular que an teced eu ao P L A N A S A .
A p rim eira so lu ção d e saneam ento a p artir d a fu n d ação d a cidade do R io de
Jan eiro d ata de 1561 q u e é a ab ertu ra de u m po ço p ara abastecim en to de
água. A p artir daí, foram realizadas outras in terv en çõ es pú b licas com v istas
a so lu ção d e ab astecim en to p o r m eio de p o ço s e co n stru ção d e chafarizes.
A co n stru ção do A q u ed u to C arioca, que cap tav a ág u a n o b airro de S anta
T ereza e tran sp o rta v a até a L apa, é u m m arc o n a ad u ção de ág u a em 1723.1
A s so lu ç õ e s d e a b a ste c im e n to eram in d iv id u a liz a d a s. H a v ia
m a n a n c ia is q u e a b a ste c ia m p o u c a s re sid ê n c ia s n o séc u lo d e X IX , cu jo s
p ro p rie tá rio s re c e b ia m u m a e sp é c ie d e “ c o n c e ssã o ” p a ra c a p ta r a ág u a s
d o s p o ç o s a b e rto s n a C id a d e m e d ia n te o p a g a m e n to d e u m a “ta x a ” . E m
1876, in ic io u -s e a c o n stru ç ã o d a re d e d e a b a ste c im e n to d e á g u a em
d o m ic ílio d a C id ad e. *1

* O autor é advogado especialista em saneamento, pós-graduado em Direito do Estado


e Regulação pela FGV-Rio, ex-diretor jurídico da Companhia de Saneamento de
Maricá, atualmente é membro da Comissão de Saneamento, Recursos Hídricos e Gás
Encanado da Ordem dos Advogados do Brasil Seção Rio de Janeiro.
1 CEDAE. História do Abastecimento. Disponível em: https://cedae.com.br/abasteci
mento/tipo/historia-da-agua. Acesso em: 28 abr. 2020.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

E m re la ç ã o ao e sg o ta m e n to san itário , a in d a n o Im p é rio , foi


c e le b ra d o o c o n tra to co m J o ã o F re d e ric o R u sse l e Jo a q u im F ra n c isc o de
L im a Ju n io r, a p ro v a d o p e lo D e c re to n° 1929 d e 1857 d e e sg o ta m e n to
sa n itá rio d a C id a d e d o R io d e Jan e iro , co m v a lid a d e d e 90 anos, p a ra
c o n stru ç ã o e a d m in istra ç ã o d a re d e p ú b lic a d e e sg o to s san itário s, b e m
c o m o e x e c u ç ã o d e in sta la ç õ e s d e e sg o to s d o s p ré d io s, d en tro d o s lim ite s
d a á re a ce n tral, d e c e rc a d e 4 ,2 4 k m 2. 2
E sse c o n tra to foi p o ste rio rm e n te tra n s fe rid o p a ra um a
C o m p a n h ia d e ca p ita l in g lês, a T he R io d e J a n e ir o C ity Im p r o v e m e n ts
C o m p a n y L im ite d , sim p le sm e n te d e n o m in a d a C ity, q u e e x p lo ro u o
se rv iç o d e e s g o ta m e n to sa n itá rio até 1947, d a ta q u e foi e x tin to o c o n tra to
d e c o n c e ssã o p a ssa n d o à a d m in istra ç ã o d ire ta a c o n tra ta ç ã o d e o b ra s de
e x p a n sã o d a re d e e a o p e ra ç ã o d o se rv iç o d e e sg o ta m e n to sa n itá rio p o r
m e io d o S e rv iç o s d e E sg o ta m e n to d o D e p a rta m e n to d e Á g u a s e E sg o to s
d a P re fe itu ra d o D istrito F e d e ra l.3
A situ a ç ã o d o s se rv iç o s d e á g u a e esg o to n o R io d e Ja n e iro até
a d é c a d a d e 1960 e ra a p re sta ç ã o d o se rv iç o fe ita p e la a d m in istra ç ã o
p ú b lic a co m a rre c a d a ç ã o d e trib u to s o u p re ç o s p ú b lico s. S alv o a
c o n c e ssã o fe ita a C ity, a e x p a n sã o d a re d e d e á g u a e esg o to e a o p e ra ç ã o
d o s se rv iç o s fo ra m re a liz a d a s sob o re g im e d e d ire ito p ú b lic o p e la
a d m in is tra ç ã o d ire ta o u p o r suas au tarq u ias.

2 Decreto n. 1.929, de 29 de abril de 1857. Aprova o contrato para o serviço da limpeza


das casas da Cidade do Rio de Janeiro, e do esgoto das águas pluviais, em virtude do
que dispõe o § 3.° do Art. 11 do decreto n. 719 de 28 de setembro de 1853.
3 CAMARGO, Angelica Ricci. Engenheiro/repartição fiscal do governo junto a “The
Rio de Janeiro City Improvements Company”, In : Dicionário da Primeira República,
Memória da Administração Pública Brasileira, Arquivo Nacional. Jun. 2018
acessado em 28/04/2021. Disponível em: http://mapa.an.gov.br/index.php/dicionario-
primeira-republica/614-engenheiro-reparticao-fiscal-do-governo-junto-a-the-rio-de-
janeiro-city-improvements-company. Acesso em: 28 abr. 2020.

38
N o s d em ais m unicípios, u m a fig u ra ju ríd ico -a d m in istrativ a m u ito
co m u m eram os D e p artam en to s d e Á g u as e E sg o to s (D A E s), ó rgãos da
p ró p ria ad m in istração d ireta local que p restavam serviços de ág u a e esgoto.
O c a so d o R io d e Jan e iro , p o r se r u m a d as p rim e ira s cid a d e s a
in v e s tire m em sa n e a m e n to é b e m ilu stra tiv o d o c e n á rio até a d é c a d a de
60. O p ro c e s s o d e u rb a n iz a ç ã o d as cid a d e s v in h a se in te n sific a n d o com
o c o rre s p o n d e n te a u m e n to d a d e m a n d a p o r m e lh o re s c o n d iç õ e s de
p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e san e am en to .
D e u m a fo rm a g eral, co m re d u z id a c a p a c id a d e d e in v e stim e n to s
em san e am en to , os m u n ic íp io s n ã o fo ra m c a p a z e s d e a c o m p a n h a r às
m e s m a s ta x a s o c re sc im e n to d a p o p u la ç ã o u rb a n a , c ria n d o u m d é fic it
c re sc e n te n a d isp o n ib ilid a d e d o s se rv iç o s p a ra a p o p u la ç ã o .4 D a í a
n e c e s s id a d e d e u m n o v o m o d e lo d e p re sta ç ã o d e serv iço s.

2 O PLANASA

S e g u n d o R o s ito , a té m e a d o s d a d é c a d a d e 1970, o c e n á rio


p a r a o d e s e n v o lv im e n to d o s a n e a m e n to n o p a ís era: “ a e x is tê n c ia d e
p ro je to s is o la d o s , e s fo rç o s em n ív e l c o m u n itá rio , a u s ê n c ia d e u m
s is te m a ra c io n a l d e ta rifa s , d e te r io ra ç ã o d o s o rç a m e n to s e ta rifa s p e la
in fla ç ã o , p o lític a de e m p re g u is m o nas o p e ra d o ra s, re c u rs o s

4 O esvaziamento tributário dos municípios em favor da união federal é apontado como


uma das causas da dificuldade para manter os investimentos na expansão do sistema.
Segundo Jorge, “foi necessário haver um certo período entre a reforma tributária
implantada e o consequente e progressivo esvaziamento financeiro dos municípios, o
que facilitou sua submissão a política de saneamento federal.” In: JORGE, Wilson
Edson. Planasa - A Avaliação da Política Nacional de Saneamento pós 64. Revista do
Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo. FAUUSP, São Paulo
v. 1, n. 2, p. 21- 34, dez. 1992, p. 23- 24. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/
posfau/article/view/136178/131992. Acesso em: 22 abr. 2021.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

fin a n c e iro s , h u m a n o s e té c n ic o s a q u é m d a d e m a n d a , g ra n d e n ú m e ro
d e o rg a n is m o s a tu a n d o , f a lta d e c o o r d e n a ç ã o ” . 5
E x c e to p o r a lg u m a s p o u c a s cid ad e s, o ín d ic e n a c io n a l de
c o b e rtu ra d o s se rv iç o s d e á g u a e esg o to e ram a in d a m u ito b a ix o s, p o u c o
m a is d e 3 0 % (trin ta p o r c e n to ) d o s d o m ic ílio s e ram a te n d id o s a á g u a e
c e rc a d e 10% (d ez p o r c e n to ) d e e sg o to .6 O S a n e a m e n to j á n ã o p o d ia ser
m a is e n c a ra d o c o m o p ro b le m a d e v á ria s lo c a lid a d e s is o la d a m e n te e sim
c o m o u m p ro b le m a d e to d o s.
A fa lta d e sa n e a m e n to d e ix o u d e se r v is ta co m o u m p ro b le m a
lo cal e p a s s o u a ser u m p ro b le m a n ac io n a l. E m 1967, a re fo rm a
a d m in is tra tiv a v ia b iliz a d a p e lo D e c re to - le i n° 2 0 0 /6 7 atrib u i ao
M in isté rio d o In te rio r a c o m p e tê n c ia p a ra o p la n e ja m e n to d a p o lític a
p ú b lic a d e s a n e a m e n to .7- 8
N o m esm o ano, foi instituída a P olítica N acional de S aneam ento e
o C onselho N acional de S aneam ento p o r m eio da L ei n° 5.318/67.9

5 Carlos Alberto Rosito fez um diagnóstico do cenário pré-Planasa informando que havia ilhas
municipais de boa gestão, destacando Rio de Janeiro, São Paulo, Campinas e Porto Alegre,
mas com índices de cobertura insatisfatórios. Apresentação: Política Nacional de Saneamento:
Do Planasa ao Plansab: I Primeiro Seminário FIESP de Saneamento Básico. São Paulo, 07
de novembro de 2011. Disponível em: https://pt.slideshare.net/goassociados/poltica-
nacional-de-saneamento-fiesp7novembro2011-c-rosito. Acesso em: 29 abr. 2021.
6 SAIANI, Carlos César Santejo e TONETO JÚNIOR, Rudinei. Evolução do acesso a
serviços de saneamento básico no Brasil (1970 a 2004). Economia e Sociedade,
Campinas, v. 19, n. 1 (38), p. 79-106, abr. 2010.
7 Assim dispõe o Decreto-lei 200/1967 no seu Art. 39: Os assuntos que constituem a
área de competência de cada Ministério são, a seguir, especificados: (...) Ministério do
Interior (...) IV - Saneamento básico.
8 O Ministério do Interior também desempenhava função de órgão regulador eis que a
aprovação da estrutura tarifária das CESBs passava pela aprovação do próprio Ministério após
parecer técnico do BNH, conforme se verifica nos artigos 6° e 7° do Decreto 82.587/1978.
9 Art. 1° A Política Nacional de Saneamento, formulada em harmonia com a Política
Nacional de Saúde, compreenderá o conjunto de diretrizes administrativas e técnicas
destinadas a fixar a ação governamental no campo do saneamento.

40
P a r a v ia b iliz a r a p o lític a de s a n e a m e n to fo i e d ita d o o
D e c re to - L e i n° 8 2 .5 8 7 /7 8 P la n o N a c io n a l de S a n e a m e n to -
P L A N A S A - e o B a n c o N a c io n a l d e H a b ita ç ã o (B N H ) fo i d e s ig n a d o
c o m o ó rg ã o c e n tra l e n o r m a tiv o .101A c ria ç ã o d o F G T S im p u ls io n o u os
in v e s tim e n to s n o P L A N A S A .11
O P la n o N a c io n a l de S a n e a m e n to tin h a com o o b je tiv o s
p e rm a n e n te s, d e sc rito s n o art. 3° d o D e c re to -L e i n° 8 2 .5 8 7 /7 8 :

a) - a eliminação do déficit e a manutenção do equilíbrio


entre a demanda e a oferta de serviços públicos de água e

10 Art. 7° - Constituem atribuições do Banco Nacional da Habitação (BNH), na condição


de órgão central e normativo do Sistema Financeiro de Saneamento (SFS):
a) - propor ao Ministério do Interior, a edição das normas a que se referem as alíneas a
e d do artigo 6° deste Decreto;
b) - estabelecer normas complementares às expedidas pelo Ministro de Estado do Interior;
c) - analisar e aprovar os planos estaduais de saneamento básico, integrante do
PLANASA;
d) - exercer a fiscalização técnica, contábil, financeira e do custo dos serviços das
companhias estaduais de saneamento básico;
e) - analisar os planos, estudos e propostas tarifárias elaborados pelas companhias
estaduais de saneamento básico, com vistas às autorizações de reajustes;
f) - coordenar, orientar e fiscalizar a execução dos serviços de saneamento básico;
g) - propiciar de acordo com seu orçamento, assistência financeira necessária à
execução das programações estaduais de saneamento básico, visando a atingir os
objetivos e metas do PLANASA;
h) - estabelecer normas relativas as Sistema Financeiro de Saneamento (SFS);
i) - aplicar as penalidades e sanções estabelecidas pelo Ministro de Estado do Interior.
11 Segundo Jorge: “A montagem institucional para implantar a política do Governo Federal
de Saneamento Urbano foi desencadeada sucessivamente: a criação do FGTS, sua
passagem para controle do BNH, a formalização dos princípios a serem geridos pela política
federal de saneamento, a criação do Fundo de Financiamento para o Saneamento - FISANE
(agosto de 1967) e a passagem de seu controle para o BNH, a criação do Conselho Nacional
de Saneamento (setembro de 1967). A origem dos Fundos de Financiamento para Água e
Esgotos - FAE passou pela política do BNH, em estímulo à criação de fundos regionais para
saneamento (agosto de 1968). Finalmente em 1969, o BNH foi autorizado a aplicar os
recursos do FGTS em sistemas de água e esgoto. Portanto, já tendo como objetivo a entrada
no setor de saneamento, o Governo Federal, através do BNH, montou a estrutura
institucional necessária para implantar sua política, em dois anos, de 1967 a 1969.”

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

de esgotos, em núcleos urbanos, tendo por base


planejamento, programação e controle sistematizados:
b) - a auto-sustentação financeira do setor de saneamento
básico, através da evolução dos recursos a nível estadual, dos
Fundos de Financiamento para Água e Esgotos (FAE);
c) - a adequação dos níveis tarifários às possibilidades dos
usuários, sem prejuízo do equilíbrio entre receita e custo
dos serviços, levando em conta a produtividade do capital
e do trabalho;
d) - o desenvolvimento institucional das companhias
estaduais de saneamento básico, através de programas de
treinamento e assistência técnica;
e) - a realização de programas de pesquisas tecnológicas
no campo do saneamento básico.

V iu -s e n a s C o m p a n h ia s E sta d u a is d e S a n e a m e n to (C E S B s) a
re a liz a ç ã o d e u m a id e ia q u e e ra a c o n c e n tra ç ã o d e e sfo rç o s e re c u rso s
p a ra a e x p lo ra ç ã o d o s se rv iç o s lo cais. O s estu d o s d e se n v o lv id o s n u m a
e ta p a p re lim in a r “ d e m o n stra ra m q u e u m a d as c o n d iç õ e s b á sic a s de
v ia b iliz a ç ã o d o s o b je tiv o s d o P L A N A S A re p o u s a v a n a n e c e ssid a d e d a
e x is tê n c ia , em c a d a e sta d o d a fe d e ra ç ã o , d e e m p re sa d e sa n e a m e n to ,
in c u m b id a d a im p la n ta ç ã o , o p e ra ç ã o e m a n u te n ç ã o d o s siste m a s lo c a is
d e esg o to s san itá rio s e d e a b a ste c im e n to d e á g u a ” .12
A e sc o lh a p e lo m o d e lo d as C E S B s p a sso u p e la p e rc e p ç ã o de
q u e a e m p re s a e sta d u a l p e rm itiria : a) a e c o n o m ia d e e sc a la co m re d u ç ã o
d o c u sto o p e ra c io n a l; b ) a m e lh o ria d e a d m in istra ç ã o e o p e ra ç ã o dos
siste m a s p e la p o ssib ilid a d e d e m a io r a ssistê n c ia té c n ic a p re s ta d a e; c) a
v ia b ilid a d e d e to d o s os p ro je to s , m e sm o d as cid a d e s e v ila s m a is p o b re s,
p e la c o m p e n s a ç ã o in te rn a p ro p icia d a. 13
O P L A N A S A m a rc o u a tra n siç ã o d e u m m o d e lo lo c a lista p a ra
u m m o d e lo re g io n a lista . O s m u n ic íp io s , titu la re s d o sa n e a m e n to b á sic o ,
p a ssa ra m a re a liz a r c o n c e ssõ e s d e lo n g o p ra z o p a ra as c o m p a n h ia s

12 Plano Nacional de Saneamento - PLANASA - aspectos básicos. Estudo Especial.


Revista Conjuntura Econômica. Rio de Janeiro. Março de 1974. p. 90-94.
13 Idem.

42
e sta d u a is d e sa n e a m e n to b á sic o (C E S B s). O m o d e lo p re v ia in c e n tiv o s
ao s m u n ic íp io s, p o r m e io d e fin a n c ia m e n to estatal v ia B N H e fu n d o s
e stad u a is, co m v ista s a o u to rg a d o s se rv iç o s d e á g u a e esg o to p a ra as
C o m p a n h ia s E s ta d u a is .14
A s C E S B s p o ssib ilita ria m o g a n h o d e e sc a la em te rm o s de
p re s ta ç ã o d o se rv iç o e u m a m a io r e sp e c ia liz a ç ã o d o c o rp o té c n ic o , o q u e
a m a io ria dos m u n ic íp io s não c o n se g u ia re a liz a r iso la d a m e n te .
D e sta q u e -s e q u e n ã o se c o n stru iu u m m o d e lo d e h o ld in g n a c io n a l co m o
em o u tro s ra m o s d e in fra e stru tu ra . A so lu ç ã o d e p re sta ç ã o d e se rv iç o s
p o r m e io d e C o m p a n h ia s E sta d u a is e sta b e le c e u u m a c e n tra lid a d e do
p ap e l d o s E sta d o s, q u e se in te rp ô s e n tre a U n iã o , q u e d isp u n h a dos
re c u rso s, e o s M u n ic íp io s, q u e v ira m seu p o d e r d e c isã o d im in u íd o s 15.

14 Embora com incentivos de recursos, muitos municípios não aderiram ao programa


mantendo seus próprios sistemas sob administração direta e indireta. Vale destacar que:
“O PLANASA estimulou a criação de companhias estaduais de saneamento básico
(CESBs) (art. 7°, g da Lei n. 5.318/67), as executoras do programa. Paralelamente,
incentivou que Municípios aderissem ao modelo mediante a concessão da prestação
dos serviços { CESB (art. 7°, d da Lei n. 5.318/67) que, por sua vez, habilitava-se aos
empréstimos do Banco Nacional da Habitação, único financiador do sistema (art. 7° do
Decreto n. 82.587, de 6 de novembro de 1978). Os Municípios que não aderiram ao
programa (autônomos) mantiveram seus próprios sistemas sob administração direta e
indireta”. In: BRZEZINSKI, Maria Lúcia Navarro Lins. O serviço público de
abastecimento de água e o acordo geral sobre comércio de serviços. Dissertação
submetida a Universidade Federal de Santa Catarina para obtenção do título de Mestre
em Direito. Florianópolis/2006. p. 64.
15 Até 1965 o Sistema Financeiro do Saneamento no BNH financiava tanto órgãos
estaduais, quanto os serviços municipais. O PLANASA restringiu o acesso aos recursos
do SFS tornando-os exclusivos às Companhias Estaduais de Saneamento Básico
(CESB). Exigiu ainda a unificação dos vários órgãos estaduais em uma única CESB.
Com estas medidas os municípios que estavam esvaziados após a Reforma Tributária
de 1965, foram forçados a aderir a este plano, passando aos poucos a conceder os
serviços 'as companhias estaduais. Estes municípios perderam a partir daí, qualquer
autonomia e poder decisório sobre prioridades para alocação de recursos, definição de
tarifas etc. In: GLEIZER, Simone. Ordenamento institucional da gestão dos serviços
de saneamento: o caso do município de Angra dos Reis. Dissertação (Mestrado em
Administração) - Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas, Fundação
Getúlio Vargas - FGV, Rio de Janeiro, 2000. Disponível em: http://hdl.handle.net/104
38/3429. Acesso em: 26 abr. 2021.

43
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A p o lític a de in v e stim e n to p ú b lic o nas c o m p a n h ia s de


e c o n o m ia m is ta e n c o n tro u o seu p o n to in tra n sp o n ív e l n o a m b ie n te
h ip e rin fla c io n á rio d a d é c a d a d e 1980. O E sta d o b ra sile iro p e rd e u su a
c a p a c id a d e d e in v e stim e n to o q u e a fe to u a v ia b ilid a d e e c o n ô m ic o -
fin a n c e ira d as co m p an h ia s.
A u tiliz a ç ã o d as ta rifa s p a ra c o n tro le in fla c io n á rio se re v e lo u
um in s tru m e n to e c o n ô m ic o d e e n fra q u e c im e n to d a c a p a c id a d e d e
in v e s tim e n to s d as C E S B s e a tin g iu o p o n to estru tu ra l d o P L A N A S A q u e
e ra a u to s u s te n ta b ilid a d e d o s is te m a .16_17 O su b síd io c ru z a d o co m o
m e c a n is m o d a u n iv e rsa liz a ç ã o foi p re ju d ic a d o , p o is co m a d im in u iç ã o
d e re c u rs o s p riv ile g io u -se os in v e stim e n to s n a s re g iõ e s d e m a io r
re n ta b ilid a d e em d e trim e n to d a q u e la s d efic itá rias.

3 O FIM DO PLANASA E A TRANSIÇÃO PARA UM NOVO


REGIONALISMO

E m q u e pese te r sido fo rm alm en te extinto em 1992, desde a d écad a


de 1980 j á h av ia u m esv aziam en to do p lan o p elas razõ es j á expostas. N o
entanto, h á u m re co n h ecim en to de que o P L A N A S A a v an ço u n a q u estão da
co b ertu ra d e ág u a potável, m as n ão foi capaz d e av a n çar d e fo rm a definitiva
n a p restação dos serviços de esg o tam en to sanitário.

16 Art. 3°, a) do Decreto n° 82.587/78.


17 O modelo iniciado na década de 1970 se esgotou em consequência da crise
econômica e da hiperinflação dos anos 1980, que afetaram gravemente a viabilidade
econômico-financeira das companhias de saneamento. O controle do reajuste de tarifas,
entendido como medida anti-inflacionária relevante, passou a ser adotado, levando a
situações de receitas de serviços insuficientes para cobrir os custos operacionais, de
acordo com Motta e Moreira (2004). O ambiente hiperinflacionário enfraqueceu a
capacidade de investimento do SFS, culminando com a extinção do BNH em 1986. In
SANTOS, Gesmar Rosa dos e outros. Regulação e investimento no setor de
saneamento no Brasil: trajetórias, desafios e incertezas. Texto para discussão /
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Rio de Janeiro: Ipea, 2020. p. 13. Disponível
em: http://repositorio.ipea.gov.br/handle/11058/10222. Acesso em: 26 abr. 2021.

44
A e d iç ã o da L ei 8 .9 8 7 /9 5 , que n o rm a tiz o u no â m b ito
in fra c o n s titu c io n a l o art. 175 d a C o n stitu iç ã o F e d e ra l n ã o foi c a p a z de
im p u ls io n a r a e n tra d a m a c iç a de a g e n te s p riv a d o s no s e to r de
sa n e a m e n to n o p aís. A lei d e c o n c e ssõ e s in ic io u u m m o v im e n to d e a tra ir
o ca p ita l p riv a d o p a ra o se to r d e in fra e stru tu ra n o país. N o e n tan to , a
p e rm a n ê n c ia d as C E S B s co m os c o n tra to s d e lo n g o p razo , a in e x istê n c ia
d e u m a e s tru tu ra re g u la tó ria a d e q u a d a e a in d a in c e rte z a s ju ríd ic a s q u a n to
a titu la rid a d e d o s a n e a m e n to a fa sto u a e n tra d a d e n o v o s p re sta d o re s dos
se rv iç o s d e á g u a e esgoto.
A C o n stitu iç ã o F e d e ra l p ro m u lg a d a em 1988 ao n ã o d e fin ir
ta x a tiv a m e n te q u e o m u n ic íp io se ria o en te fe d e ra tiv o titu la r do
sa n e a m e n to n ã o tro u x e a s e g u ra n ç a ju ríd ic a n e c e ssá ria a p re sta ç ã o do
se rv iç o p ú b lic o d e á g u a e esg o to .
V a le d estac ar, q u e a A D I 1.842 p ro to c o la d a em 1998 p e lo P D T
q u e s tio n o u d iv e rso s d isp o sitiv o s d a L ei C o m p le m e n ta r n° 8 7 /8 9 q u e
in s titu iu a re g iã o m e tro p o lita n a d o R io d e Ja n e iro e a m ic ro rre g iã o dos
lag o s. O s d isp o sitiv o s q u e stio n a d o s atrib u ía m a o E sta d o d o R io de
Ja n e iro c o m p e tê n c ia s p ró p ria s d o s m u n ic íp io s.
O q u e stio n a m e n to so b re a le g a lid a d e d a c ria ç ã o d a re g iã o
m e tro p o lita n a tro u x e c o n sig o , p o rta n to , a d isc u ssã o so b re a titu la rid a d e
d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e á g u a e esg o to . O ju lg a m e n to so m e n te foi
c o n c lu íd o em 2 013 co m e n te n d im e n to d o S T F d e q u e a titu la rid a d e é dos
m u n ic íp io s, d e v e n d o se r c o m p a rtilh a d a e n tre o E s ta d o e os m u n ic íp io s
n a s re g iõ e s m e tro p o lita n a s. V e ja q u e o p ro n u n c ia m e n to d a m a is alta
c o rte d o p a ís so b re a c o m p e tê n c ia n o sa n e a m e n to se d eu 25 an o s ap ó s a
p ro m u lg a ç ã o d a C o n stitu iç ã o F e d e ra l, se n d o c e rto q u e o ju lg a m e n to d a
A D I le v o u 15 an o s p a ra se r c o n c lu íd o .18

18 Decisão na ADI 1842: Por maioria, julgou parcialmente procedente a ação para
declarar a inconstitucionalidade da expressão “a ser submetido à Assembleia
Legislativa”, constante do inciso I do art. 5°; além do § 2° do art. 4°; do parágrafo único
do art. 5°; dos incisos I, II, IV e V do art. 6°; do art. 7°; do art. 10; e do § 2° do art. 11,
todos da LC n° 87/1997-RJ, bem como dos artigos 11 a 21 da Lei n° 2.869/1997-RJ.

45
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

4 A LEI N° 11.445/2007 E O MARCO LEGAL DO SANEAMENTO

A p ó s o fim d o P L A N A S A , co m in d ic a d o re s n a d a an im a d o re s
p a ra a p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s d e á g u a e esg o to , n ã o h a v ia u m a d ire triz
so b re o s a n e a m e n to n o p a ís q u e o rie n ta sse o p la n e ja m e n to e a e x e c u ç ã o
d e u m a p o lític a p ú b lic a ca p a z d e u n iv e rs a liz a r os serv iço s. P e rm a n e c ia m
as C E S B s e a lg u m a s in ic ia tiv a s iso la d a s d e d e se sta tiz a ç ã o c o n v iv e n d o
co m o s S erv iço s d e Á g u a e E sg o to s lo c a is (S A E s).
N e ste c e n á rio fo i e d ita d a a L e i n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 q u e c rio u o
c h a m a d o M a rc o L e g a l d o S an ea m e n to . S e g u n d o R a g a z z o , “ O P a p e l d a
L e i d e D ire triz e s N a c io n a is (o u seja, a L e i n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ) se ria o de
e la b o ra r u m m a rc o ju ríd ic o p a ra o B ra sil q u e p o ssa to rn a r c o n c re ta a
re v e rs ã o d o q u a d ro d e in se g u ra n ç a ju ríd ic a d o seto r, v ia b iliz a n d o n ã o só
m a is in v e stim e n to s, m a s ta m b é m in c e n tiv a n d o e fic iê n c ia , a c c o u n ta b ility
e q u a lid a d e p a ra os se rv iç o s p re sta d o s p a ra o u su á rio . C o m isso , o
a rc a b o u ç o ju ríd ic o te ria o c o n d ã o d e c ria r u m a e stru tu ra ju ríd ic a e
e c o n ô m ic a (e, ló g ico , re g u la tó ria ) p a ra m itig a r as fa lh a s d e m e rc a d o e de
g o v e rn o n o setor. O d e sa fio ta m b é m p re se n te é o d e fa z e r isso tu d o ,
re s p e ita n d o a a d o ç ã o d e m é to d o s q u e p re se rv e m as n e c e ssid a d e s
d e c o rre n te s d as p e c u lia rid a d e s lo c a is e /o u re g io n a is.” 19
No e n tan to , o m a rc o re g u la tó rio do sa n e a m e n to - L ei
1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 - n ã o crio u u m a m b ie n te ju ríd ic o ca p a z d e a tra ir o
in v e s tim e n to p riv a d o em m assa. O s c o n tra to s d e p ro g ra m a d e lo n g o
p ra z o e u m a c e rta d isp e rsã o re g u la tó ria a in d a eram im p e d itiv o s de
in v e s tim e n to s p riv ad o s. Por o u tro lad o , a b a ix a c a p a c id a d e de
in v e s tim e n to p ú b lic o n ã o fo i c a p a z d e e x p a n d ir o siste m a d e fo rm a
su sten táv el. A ssim , o o b je tiv o d o m a rc o re g u la tó rio p re v isto n a re d a ç ã o
o rig in a l d a lei n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , q u e foi a c ria ç ã o d e u m a m b ie n te ju ríd ic o
p a ra u n iv e rs a liz a ç ã o d a p re sta ç ã o d o serv iço , n ã o foi a lca n çad o .

19 RAGAZZO, Carlos Emmanuel Joppert. Regulação Jurídica, Racionalidade


Econômica e Saneamento Básico. Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2011. p. 302.

46
5 O NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO E A
PRESTAÇÃO REGIONALIZADA

A L ei n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , n a su a re d a ç ã o o rig in al, tro u x e p a ra o


â m b ito leg al a d e fin iç ã o d e p re sta ç ã o re g io n a liz a d a , c o m o a q u e la em q u e
u m ú n ic o p re s ta d o r se rv iç o d e sa n e a m e n to b á sic o a te n d e a d o is o u m ais
titu la re s .20-21
N a su a a n tig a re d a ç ã o o art. 14, in c iso I d a L ei n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7
d is p u n h a que:

Art. 14. A prestação regionalizada de serviços públicos de


saneamento básico é caracterizada por: (Revogado pela
Lei n° 14.026, de 2020)
I - um único prestador do serviço para vários Municípios,
contíguos ou não;
II - uniformidade de fiscalização e regulação dos serviços,
inclusive de sua remuneração; (Revogado pela Lei n°
14.026, de 2020)
III - compatibilidade de planejamento. (Revogado pela Lei
n° 14.026, de 2020)

O d is p o sitiv o foi in te ira m e n te re v o g a d o , e o te m a fo i tra ta d o n o


art. 7° d a L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 d eu n o v a re d a ç ã o ao m e n c io n a d o art. 3°
e stru tu ra n d o o c o n c e ito d e p re sta ç ã o re g io n a liz a d a d a se g u in te form a:

VI - prestação regionalizada: modalidade de prestação


integrada de um ou mais componentes dos serviços
públicos de saneamento básico em determinada região
cujo território abranja mais de um Município, podendo ser
estruturada em:

20 Art. 3°, VI da Lei 11.445/2007.


21 O texto original do inciso IV do art. 2° foi revogado pela Lei n° 14.026/2020, que
incluiu como princípio fundamental dos serviços públicos de saneamento básico, o
inciso XIV no art. 2° da Lei n° 11.445/2007 que assim dispõe: XIV - prestação
regionalizada dos serviços, com vistas à geração de ganhos de escala e à garantia da
universalização e da viabilidade técnica e econômico-financeira dos serviços.

47
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

a) região metropolitana, aglomeração urbana ou


microrregião: unidade instituída pelos Estados mediante
lei complementar, de acordo com o § 3° do art. 25 da
Constituição Federal, composta de agrupamento de
Municípios limítrofes e instituída nos termos da Lei n°
13.089, de 12 de janeiro de 2015 (Estatuto da Metrópole);
b) unidade regional de saneamento básico: unidade instituída
pelos Estados mediante lei ordinária, constituída pelo
agrupamento de Municípios não necessariamente limítrofes,
para atender adequadamente às exigências de higiene e saúde
pública, ou para dar viabilidade econômica e técnica aos
Municípios menos favorecidos;
c) bloco de referência: agrupamento de Municípios não
necessariamente limítrofes, estabelecido pela União nos
termos do § 3° do art. 52 desta Lei e formalmente criado
por meio de gestão associada voluntária dos titulares; 22_23

A re d a ç ã o o rig in al d a L e i n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 tro u x e d o P la n a s a a
id e ia d e u m a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a fo c a d a n a fig u ra d o p re sta d o r. N o
P la n a sa , co m o m e n c io n a d o , o fo c o da p o lític a p ú b lic a e ra a
re g io n a liz a ç ã o p o r m e io d o fo rta le c im e n to d as C E S B s. E n tã o , a lei n°
1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 m a n te v e o c o n c e ito d e re g io n a liz a ç ã o n a a tu a ç ã o do
p re s ta d o r q u e a te n d e sse a m a is d e u m titu la r.
A in o v a ç ã o tra z id a p e la L ei n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 é a fo rm a ç ã o de
e stru tu ra s ju ríd ic o -a d m in is tra tiv a s a p a rtir d o s e n tes fe d e ra tiv o s p a ra a
p re s ta ç ã o d o serv iço . O s arra n jo s e n tre m u n ic íp io s e esta d o p a ra fo rm a r
re g iõ e s foi p re s tig ia d o p e lo n o v o m a rc o re g u la tó rio .
M as não só isso, n o exercício d a titularidade, n o que tange as regiões
m etropolitanas, h á tam b ém outro elem ento im p o rtan te para definição da
p restação regional que é o com partilham ento de infraestruturas.

22 Podemos incluir como mais uma estrutura jurídico-administrativa a prestação


regionalizada por meio da Região Integrada de Desenvolvimento (Ride) com a inclusão
do §5° no art. 3° da Lei n° 11.445/2007 feita pela Lei n° 14026/2020.
23 Em que pese estar no art. 8° da Lei n° 11.445/2007, com a redação dada pela Lei n°
14.026/2020, a gestão associada, por meio de consórcios intermunicipais, também
constitui estruturas jurídico-administrativas para a prestação regionalizada.

48
A lei fa z u m a d istin ç ã o e n tre se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to
b á s ic o d e in te re sse c o m u m e d e in te re sse local.

Art. 3° Para fins do disposto nesta Lei, considera-


se: (Redação pela Lei n° 14.026, de 2020)
XIV - serviços públicos de saneamento básico de interesse
comum: serviços de saneamento básico prestados em regiões
metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões
instituídas por lei complementar estadual, em que se verifique
o compartilhamento de instalações operacionais de
infraestrutura de abastecimento de água e/ou de esgotamento
sanitário entre 2 (dois) ou mais Municípios, denotando a
necessidade de organizá-los, planejá-los, executá-los e operá-
los de forma conjunta e integrada pelo Estado e pelos
Munícipios que compartilham, no todo ou em parte, as
referidas instalações operacionais; (Incluído pela Lei n°
14.026, de 2020).
XV - serviços públicos de saneamento básico de interesse
local: funções públicas e serviços cujas infraestruturas e
instalações operacionais atendam a um único
Município; (Incluído pela Lei n° 14.026, de 2020).

O b se rv e q u e a d e fin iç ã o d e serv iç o p ú b lic o d e in te re sse co m u m


é a q u e le p re s ta d o em re g iõ e s m e tro p o lita n a s, a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e
m ic ro rre g iõ e s em q u e h a ja c o m p a rtilh a m e n to d e in fra e stru tu ra s. A L ei
n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 p o sitiv o u o q u e o ST F j á h a v ia d e c id id o n o â m b ito d a
A D I 1.8 4 2 -R J. P a ra M a rc a re n h a s, a d e c isã o d o S T F so b re a titu la rid a d e
e n g lo b a o c o n c e ito d e c ic lo d o sa n e a m e n to :24

“Pois bem, tal Adin foi julgada e, a nosso ver, o que decidiu
o STF foi o seguinte: quando o ciclo do saneamento básico
se der no território de um mesmo município, o titular será o
município. Quando isso não for possível, o titular será o
colegiado representativo da região metropolitana ou

24 MASCARENHAS, Rodrigo Tostes de. A Ana e a Federação por Água Abaixo: notas
sobre o novo marco legal do saneamento, Direito do Estado, 31/8/20, disponível em:
http://www.direitodoestado.com.br/colunistas/rodrigo-tostes-mascarenhas/a-ana-e-a-
federacao-por-agua-abaixo-notas-sobre-o-novo-marco-legal-do-saneamento. Acesso
em: 27 abr. 2021.

49
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

microrregião na qual os municípios estiverem inseridos. Por


“ciclo” do saneamento consideramos a captação, tratamento
e distribuição da água e a coleta, transporte, tratamento e
disposição do esgoto.”

É fa to q u e a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a a lc a n ç o u n a n o v a lei o


s ta tu s d e p rin c íp io fu n d a m e n ta l, c o n fo rm e d isp õ e o art. 2° X IV d a L ei n°
1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 co m re d a ç ã o d a d a p e la L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 .

Art. 2° Os serviços públicos de saneamento básico serão


prestados com base nos seguintes princípios fundamentais:
XIV - prestação regionalizada dos serviços, com vistas à
geração de ganhos de escala e à garantia da universalização e
da viabilidade técnica e econômico-financeira dos
serviços; (Incluído pela Lei n° 14.026, de 2020).

O in c iso X IV d o art. 3°, m e n c io n a d o acim a, in c lu iu n a re d a ç ã o


d o d isp o sitiv o , além d a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a , os seu s o b je tiv o s q u e
são : g e ra ç ã o de g a n h o s de esc ala, g a ra n tia d a u n iv e rs a liz a ç ã o e
v ia b ilid a d e té c n ic a e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira .
E s s e s o b je tiv o s ta m b é m e sta v a m e n tre os d o P L A N A S A 25. E m
re la ç ã o ao s g a n h o s d e esc ala, a L ei n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , n a su a re d a ç ã o
o rig in al, so m en te m e n c io n a v a o te rm o ao tra ta r d o s su b síd io s p a ra
u s u á rio s sem c o n d iç õ e s de p a g a m e n to e p a ra as lo c a lid a d e s n ã o

25A idéia do Planasa era de que os “estados apresentariam “maior capacidade técnica e
financeira que os municípios, e a operação por uma mesma empresa de um conjunto de
sistemas municipais seria mais eficiente e viável economicamente. Haveria ganhos com
economias de escala e escopo. As empresas estaduais estariam mais próximas das
fronteiras tecnológicas, do “estado das artes” das políticas públicas, e ofereceriam
melhores remuneração e possibilidades de carreira, o que atrairia profissionais
qualificados”. In: CANÇADO, Vanessa Lucena e Costa, Geraldo Magela. A Política
de Saneamento Básico: Limites e Possibilidades de Universalização. Artigo. X
Seminário sobre Economia Mineira. Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/
6519824.pdf. Acesso em: 29 abr. 2021.

50
a u to s s u s te n tá v e is.26 A L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , d eu n o v a re d a ç ã o ao §2° do
art. 2 9 q u e tra ta d a s u ste n ta b ilid a d e d o siste m a e re tiro u a a sso c ia ç ã o
e n tre su b síd io (ta rifá rio o u n ã o ) e fa lta d e escala.
T al m e d id a , se c o a d u n a co m a id e ia d e a u to su ste n ta b ilid a d e do
siste m a p o r m e io d a re g io n a liz a ç ã o p ro p o sto n o n o v o m a rc o leg al. A
id e ia d o m o d e lo é d e q u e a re g io n a liz a ç ã o v ia b iliz a rá a e sc a la e o
m e c a n is m o d o su b síd io cru zad o , to rn a n d o o siste m a a u to ssu ste n tá v e l.
O g a n h o d e e sc a la n a L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 ta m b é m a p a re c e n o
n o v o te x to d a lei c o m o u m d o s o b je tiv o s d a p o lític a fe d era l de
sa n e a m e n to p o r m e io d o in c iso X IV d o art. 49, n a q ual a u n iv e rsa liz a ç ã o
p re te n d id a s e rá a lc a n ç a d a p o r m e io g a n h o s d e e sc a la n a fo rm a ç ã o d e
b lo c o s d e re ferê n cia. 27
A id e ia g eral d e re g io n a liz a ç ã o p ro p o sta n o n o v o m arc o ,
p o rta n to , p a re c e se r u m p ro c e sso irre v e rsív e l d e a sso c ia ç ã o fe d e ra tiv a
p a ra a p re s ta ç ã o d o s serv iç o s, p o r m e io d e g a n h o s d e esc ala, su b síd io s
c ru z a d o s e in c e n tiv o s a u m a m a io r u n ifo rm id a d e re g u la tó ria.

6 CONCLUSÃO

A p re sta ç ã o re g io n a liz a d a d e serv iç o p ú b lic o d e san e am en to ,


e s p e c ia lm e n te d e á g u a e e sg o ta m e n to san itário , d e sd e su a o rig e m se c u la r
fo i u m a a tiv id a d e p re d o m in a n te m e n te lo cal. S o m e n te a p a rtir d a d é c a d a
d e 1970, h á o s u rg im e n to d e u m a p o lític a n a c io n a l d e p re sta ç ã o re g io n a l
d e á g u a e e sg o to p o r m e io d as C o m p a n h ia s E sta d u a is d e S a n e a m e n to
B á s ic o (C E S B ), o P L A N A S A . A re g io n a liz a ç ã o p o r m e io d a c ria ç ã o de
fu n d o s esta d u a is so m a d o ao e n fra q u e c im e n to fisca l d o s m u n ic íp io s

26 Art. 29, § 2° Poderão ser adotados subsídios tarifários e não tarifários para os usuários
e localidades que não tenham capacidade de pagamento ou escala econômica suficiente
para cobrir o custo integral dos serviços.
27 Art. 49. São objetivos da Política Federal de Saneamento Básico: (...) XIV -
promover a regionalização dos serviços, com vistas à geração de ganhos de escala, por
meio do apoio à formação dos blocos de referência e à obtenção da sustentabilidade
econômica financeira do bloco; (Incluído pela Lei n° 14.026, de 2020).

51
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

v ia b iliz o u u m m o d e lo d e re g io n a liz a ç ã o b a se a d o n o fin a n c ia m e n to


p ú b lic o p a ra e x p a n sã o d a in fra e stru tu ra d e p re sta ç ã o d o s se rv iç o s e
fo rta le c im e n to d as so c ie d a d e s d e e c o n o m ia m is ta p re sta d o ra s d e serviço.
C o n tu d o , esse m o d e lo e sta g n o u -se co m o fim d a c a p a c id a d e de
in v e s tim e n to d o p o d e r p ú b lico . A p a rtir d e u m a n o v a n e c e ssid a d e de
re a rra n jo in s titu c io n a l c o m e ç o u -se a p e n s a r n u m n o v o m o d e lo de
re g io n a liz a ç ã o a p a rtir d a L ei n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 . M e sm o co m av a n ço s, a
m a n u te n ç ã o d a id e ia d e re g io n a liz a ç ã o a p a rtir d e u m ú n ic o p re sta d o r
a lia d o a m a n u te n ç ã o d e u m a m b ie n te d e n e g ó c io s q u e im p e d e a e n tra d a
d e n o v o s a to re s n ã o fo i c a p az d e a tra ir in v e stim e n to s p riv a d o s de
m a n e ira su sten táv el.
A ssim , o n o v o m a rc o re g u la tó rio p ro p õ e u m m o d e lo de
re g io n a liz a ç ã o q u e p riv ile g ia a a rtic u la ç ã o e n tre os titu la re s e a fo rm a ç ã o
d e e stru tu ra s ju ríd ic a s -a d m in is tra tiv a s e n tre os titu la re s d o san e am en to .
V e ja m o s se e sse n o v o m o d e lo se rá ca p a z d e p ro d u z ir u m siste m a
a u to ssu ste n tá v e l c a p az d e tra z e r a tã o e sp e ra d a u n iv e rsa liz a ç ã o .

REFERÊNCIAS

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p a ra o se rv iç o d a lim p e z a d as c a sa s d a C id a d e d o R io d e Ja n e iro , e do
e sg o to d as ág u a s p lu v ia is, em v irtu d e d o q u e d isp õ e o § 3.° d o A rt. 11 do
d e c re to n. 7 1 9 d e 28 d e se te m b ro d e 1853. C o le ç ã o d e L e is d o Im p é rio
d o B ra sil - 1857, P á g in a 161 V ol. 1 C ol. 1 (P u b lic a ç ã o O rig in al). S en ad o
F ed eral. D isp o n ív e l em : h ttp ://le g is.se n a d o .le g .b r/n o rm a /3 9 4 7 1 4 /p u b lic
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52
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R e fo rm a A d m in is tra tiv a e d á o u tra s p ro v id ê n c ia s. P re s id ê n c ia d a
R e p ú b lic a . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /d e c re t
o -le i/d e l0 2 0 0 .h tm . A c e sso em : 2 7 abr. 2021.

________. Decreto n° 82.587, 6 de novembro de 1978. R e g u la m e n ta a


L e i n° 6 .5 2 8 , d e 11 d e m a io d e 1978, q u e d isp õ e so b re as ta rifa s dos
se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to e d á o u tra s p ro v id ê n c ia s. P re s id ê n c ia
d a R e p ú b lic a . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /d e c
re to /D 8 2 5 8 7 im p re ssa o .h tm . A c e sso em : 2 7 abr. 2 0 2 1 .

________. Lei n° 5.318, 26 de setembro de 1967. In stitu i a P o lític a


N a c io n a l d e S a n e a m e n to e c ria o C o n se lh o N a c io n a l d e S an ea m e n to .
P re s id ê n c ia d a R e p ú b lic a . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .p lan a lto .g o v .b rZ c
c iv il_ 0 3 /le is /1 9 5 0 -1 9 6 9 /l5 3 1 8 .h tm . A c e sso em : 25 abr. 2021.

________. Lei n° 8.987, 13 de fevereiro de 1995. D is p õ e so b re o re g im e


d e c o n c e ssã o e p e rm issã o d a p re sta ç ã o d e se rv iç o s p ú b lic o s p re v isto n o
art. 175 d a C o n stitu iç ã o F e d e ra l, e d á o u tra s p ro v id ê n c ia s. P re sid ê n c ia
d a R e p ú b lic a . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /le is
/l8 9 8 7 c o n s.h tm . A c e sso em : 25 abr. 2021.

________. Lei n° 11.445, 5 de janeiro de 2007. E sta b e le c e as d ire triz e s


n a c io n a is p a ra o sa n e a m e n to b ásico ; c ria o C o m itê In te rm in iste ria l de
S a n e a m e n to B á sic o ; a lte ra as L e is n o s 6 .7 6 6 , d e 19 d e d e z e m b ro de
1979, 8.6 6 6 , d e 21 d e ju n h o d e 1993, e 8 .9 8 7 , d e 13 d e fe v e re iro d e 1995;
e re v o g a a L e i n° 6 .5 2 8 , d e 11 d e m a io d e 1978. (R e d a ç ã o d a d a p e la
L e i n° 14.026, d e 2 0 2 0 ). P re s id ê n c ia d a R e p ú b lic a . D isp o n ív e l em :
h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /_ a to 2 0 0 7 -
2 0 1 0 /2 0 0 7 /le i/l1 1 4 4 5 .h tm . A c e sso em : 2 9 abr. 2 0 2 1 .

53
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

________. Lei n° 14.026, 15 de julho de 2020. A tu a liz a o m a rc o leg al


d o sa n e a m e n to b á s ic o e a lte ra a L ei n° 9 .9 8 4 , d e 17 d e ju lh o d e 2 0 0 0 ,
p a ra a trib u ir à A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to B á sic o (A N A )
c o m p e tê n c ia p a ra e d ita r n o rm a s d e re fe rê n c ia so b re o se rv iç o de
sa n e a m e n to , a L ei n° 10.768, d e 19 d e n o v e m b ro d e 2 0 0 3 , p a ra a lte ra r o
n o m e e as a trib u iç õ e s d o c a rg o d e E s p e c ia lis ta em R e c u rso s H íd ric o s, a
L e i n° 11.107, d e 6 d e ab ril d e 2 0 0 5 , p a ra v e d a r a p re sta ç ã o p o r c o n tra to
d e p ro g ra m a d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e q u e tra ta o art. 175 d a C o n stitu iç ã o
F e d e ra l, a L e i n° 11.445, d e 5 d e ja n e ir o d e 2 0 0 7 , p a ra a p rim o ra r as
c o n d iç õ e s e stru tu ra is d o sa n e a m e n to b á sic o n o P aís, a L e i n° 12.305, de
2 d e ag o sto d e 2 0 1 0 , p a ra tra ta r d o s p ra z o s p a ra a d isp o siç ã o fin al
a m b ie n ta lm e n te a d e q u a d a d o s re je ito s, a L e i n° 13.089, d e 12 d e ja n e ir o
d e 2 0 1 5 (E sta tu to d a M e tró p o le ), p a ra e ste n d e r seu â m b ito d e ap lic a ç ã o
às m ic ro rre g iõ e s, e a L e i n° 13.529, d e 4 d e d e z e m b ro d e 2 0 1 7 , p a ra
a u to riz a r a U n iã o a p a rtic ip a r d e fu n d o co m a fin a lid a d e e x c lu s iv a de
fin a n c ia r se rv iç o s té c n ic o s esp e c ia liz a d o s. P re s id ê n c ia d a R e p ú b lic a .
D is p o n ív e l em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /_ a to 2 0 1 9 -
2 0 2 2 /2 0 2 0 /le i/l1 4 0 2 6 .h tm . A c e sso em : 2 9 abr. 2 0 2 1 .

CEDAE. História do Abastecimento. D isp o n ív e l em : h ttp s://c e d a e .c o


m .b r/a b a s te c im e n to /tip o /h isto ria -d a -a g u a . A c e sso em : 28 abr. 2020.

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h ttp ://m a p a .a n .g o v .b r/in d e x .p h p /d ic io n a rio -p rim e ira -re p u b lic a /6 1 4 -
e n g e n h e iro -re p a rtic a o -fisc a l-d o -g o v e rn o -ju n to -a -th e -rio -d e -ja n e iro -
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54
A rtig o . X S e m in á rio so b re E c o n o m ia M in e ira . D isp o n ív e l em :
h ttp s ://c o re .a c .u k /d o w n lo a d /p d f/6 5 1 9 8 2 4 .p d f. A c e sso em : 2 9 abr. 2021.

G L E IZ E R , Ordenamento institucional da gestão dos


S im o n e.
serviços de saneamento: o c a so d o m u n ic íp io d e A n g ra d o s R eis.
D is s e rta ç ã o (M e stra d o em A d m in istra ç ã o ) - E s c o la B ra s ile ira de
A d m in is tra ç ã o P ú b lic a e d e E m p re sa s, F u n d a ç ã o G e tú lio V a rg a s - F G V ,
R io d e Jan e iro , 2 0 0 0 . D isp o n ív e l em : h ttp ://h d l.h a n d le .n e t/1 0 4 3 8 /3 4 2 9 .
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Revista do Programa de Pós-Graduação em
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Arquitetura e Urbanismo: FAUUSP, S ão P a u lo , v. 1, n. 2, p. 2 1 -3 4 ,
dez. 1992. D is p o n ív e l em : h ttp s://w w w .re v ista s.u sp .b r/p o sfa u /a rtic le /v i
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M A S C A R E N H A S , R o d rig o T o ste s de. A A n a e a F e d e ra ç ã o p o r Á g u a


A b a ix o : n o ta s so b re o n o v o m a rc o leg al d o sa n e a m e n to , Direito do
Estado, 31 ago. 2 0 2 0 . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .d ire ito d o e s ta d o .c o m .
b r/c o lu n is ta s /ro d rig o -to ste s-m a sc a re n h a s/a -a n a -e -a -fe d e ra c a o -p o r-
a g u a -a b a ix o -n o ta s-so b re -o -n o v o -m a rc o -le g a l-d o -sa n e a m e n to . A c e sso
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RAGAZZO, C a rlo s Regulação Jurídica,


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2 0 1 0 . D is p o n ív e l em : h ttp ://w w w .sc ie lo .b r/sc ie lo .p h p ? sc rip t= sc i_ a rtte x

55
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

t& p id = S 0 1 0 4 -0 6 1 8 2 0 1 0 0 0 0 1 0 0 0 0 4 & ln g = e n & n rm = iso . A c e sso em : 29


abr. 2 0 2 1 .

S A N T O S , G e sm a r R o s a d o s e t al. Regulação e Investimento no Setor


de Saneamento no Brasil: T ra je tó ria s, D e sa fio s e In c e rte z a s. T e x to p a ra
d iscu ssão . R io d e Jan e iro : Ip ea, 2 0 2 0 . D isp o n ív e l em : h ttp ://re p o sito rio .
ip e a .g o v .b r/h a n d le /1 1 0 5 8 /1 0 2 2 2 . A c e sso em : 2 6 abr. 2021.

56
O M UNICÍPIO E OS IMPACTOS DA LEI FEDERAL n°
14.026/2020

A p a re c id o H ojaij*
F ra n c isc o d o s S an to s Lopes*

A L ei F e d e ra l 1 4 .0 2 6 /2 0 c a u so u u m a g ra n d e m o v im e n ta ç ã o do
c e n á rio d o s a n e a m e n to b ra sile iro , p rin c ip a lm e n te en tre os g e sto re s dos
p re s ta d o re s m u n ic ip a is e os titu la re s d as re sp e c tiv a s p re fe itu ra s. T al
in q u ie ta ç ã o te m c o m o m o te a d ú v id a so b re c o m o os d ita m e s d a n o rm a
serão a p lic a d o s em c a d a m u n ic íp io , v is to q u e n ã o foi re a liz a d o u m
p ro c e s s o d e d e b a te e le v a n ta m e n to d e in fo rm a ç õ e s q u e p o ssib ilita sse
a fe rir a real c o n d iç ã o p a ra c o lo c a r em p rá tic a a L ei em q u estão . T al
in s e g u ra n ç a re sta m a te ria liz a d a n a s d iv e rsa s A D Is - A ç ã o D ire ta de
In c o n s titu c io n a lid a d e a ju iz a d a s n o ST F - S u p re m o T rib u n a l F ed eral
so b re o n o v o m a rc o leg al d o san e am en to , sendo, in c lu siv e , a A D I 6583
d e a u to ria d e s ta en tid ad e.
C o m o se p o d e p e rc e b e r, as q u e stõ e s m u n ic ip a is tê m g a n h a d o
d e s ta q u e p o r c o n ta d a e sc a sse z d e re c u rso s d o s p ró p rio s e n tes fe d e ra d o s,
e a c o n s e q u e n te d e p e n d ê n c ia d a U n iã o e d o s E sta d o s, n ã o só n o q u e se
re fe re ao sa n e a m e n to , m a s ta m b é m a o u tro s asp e cto s, c o n fe rin d o
c o m p le x id a d e à g e stã o d o s M u n ic íp io s. O s d e sa fio s d iá rio s e n fre n ta d o s
p o r e ste s e n tes fe d e ra d o s são re fle tid o s n a p o p u la ç ã o lo cal, v isto q u e a
s a tis fa tó ria e s tru tu ra ç ã o d as p re fe itu ra s é n e c e ssá ria p a ra g a ra n tir o
fu n c io n a m e n to d o s se rv iç o s p ú b lic o s, p rio riz a n d o a q u a lid a d e d e v id a
dos m u n íc ip e s. T al c o n sta ta ç ã o é c o m e n ta d a por C o sta (2 0 1 5 ),
re s sa lta n d o q u e o M u n ic íp io p o d e ser e n te n d id o c o m o a b a se d a
o rg a n iz a ç ã o p o lític a d e m o c rá tic a , p o is, é aí q u e está o elo e n tre a
so c ie d a d e e o p o d e r p ú b lico .

*
Presidente da Assemae.
*
Advogado Secretário executivo da Assemae.

57
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

P a ra a p ro fu n d a r u m p o u c o m a is so b re a o rig e m d o M u n ic íp io s,
c ite m o s o q u e e n sin a C o sta (2 0 1 5 ). O a u to r le m b ra q u e o te rm o
M u n ic íp io te v e o rig e m c o m o m u n ic íp iu m o u m u n ic ip ia ro m an o . L ú c io
C o rn é lio S ila (1 3 8 -7 8 a. C .) foi o re sp o n sá v e l p e la p rim e ira le g isla ç ã o
q u e d e fin iu as c a ra c te rístic a s d e ssa en tid ad e . O rig in a lm e n te , e x istia u m
C o n se lh o M u n ic ip a l, co m ele iç õ e s p e rió d ic a s p a ra a e sc o lh a dos
in te g ra n te s, os c h a m a d o s d e c u riõ e s. J á as leis, q u e d isc ip lin a v a m a v id a
lo cal, fic a v a a c a rg o d a C uria. O a u to r re la ta q u e o c a rá te r d e fin itiv o do
M u n ic íp io fo i d e se n h a d o p e lo g o v e rn o d e Jú lio C é sa r (1 0 0 -4 4 a.C .), com
o c é le b re J u lia M u n ic ip a lis , q u e e ste n d e u este siste m a d e g o v e rn o lo cal
p a ra as c o lô n ia s ro m a n a s d a Itá lia e, d ep o is, p a ra os p a íse s co n q u ista d o s,
c o m o a G ália, a G ré cia, a Á frica, e a H isp â n ia .
A q u e d a d o M u n ic íp io c o m o in stitu iç ã o , d e a c o rd o co m o au to r,
v e io ju n to co m o e n fra q u e c im e n to d a v id a u rb a n a d u ra n te o p e río d o
fe u d al (sé c u lo V I ao sé c u lo X V ), p o is o p o d e r p o lític o p a sso u a ser
se d ia d o n o c a ste lo d o b a rã o , e a d in â m ic a d a ec o n o m ia , p o r su a vez,
e sta v a v o lta d a p a ra a ag ric u ltu ra.
N a sequência histórica, o reap arecim en to d a cidade au tô n o m a
aco n teceu n o p erío d o d en o m in ad o standestaat, defin id o p o r P o g g i (1981)
co m o c o m u n id ad e p o lítica de estados, com classes sociais rep resen tad as nas
an tig as assem b leias (ou cortes). A s cidades, assim estruturadas, fo rm a
in tro d u zid as n as A m éric as p elo s eu ropeus q u an d o a d ec ad ên c ia já atingia
os M u n icíp io s d este povo. É im p o rtan te ressaltar que os M u n icíp io s tiv eram
u m g ran d e papel n as n açõ es europeias du ran te o p erío d o colonial. N a
In g late rra e n o s E stad o s U n id o s, os M u n icíp io s contaram com plen o
d esen v o lv im en to, e chegaram a servir de b a se p ara o d esen v o lv im en to das
in stitu içõ es d em o cráticas n o rte-am ericanas.
C o sta é enfático ao afirm ar que o M u n icíp io tev e gran d e
d esen v o lv im en to n a E uro p a, com d estaq u e p a ra a F ra n ç a após a re fo rm a de
1804 (com N a p o le ã o B onaparte). No caso da G rã-B retanha, o
fo rtalecim en to do M u n icíp io se d eu com as ev o lu çõ es políticas entre os anos
de 1832 a 35, lev an d o outras n açõ es a adotarem o M u n icíp io co m o fo rm a

58
de g o v ern o local. S eg u n d o o autor, “ as instituições m u n icip ais estão h oje
p resen tes n o m u n d o m o d ern o e, cad a v e z m ais, g an h am espaço com o
v eto res do d esen v o lv im en to político-institucional, co m o esco la da
d em o cracia e d a re sp o n sab ilid ad e cívica” . (C O S T A , 2015, p. 29).
D an d o continuidade, este aponta q u e o M unicípio tem a
possibilidade de construir patrim ônio próprio, adm inistrando interesses
próprios, p o d en do adquirir direitos e obrigações, sendo o responsável pelos
b en s públicos e serviços de interesse local, e os encargos destes. N a
sequência, C o sta cita q u e o M un icíp io po d e ser considerado com o u m a
organização política p essoa jurídica de D ireito P úb lico interno, com território
definido, “ en globando u m conjunto de vizinhos com interesses locais e
com uns, com autonom ia política, adm inistrativa e financeira garantida pela
C onstituição que lhe define a com petência” . (C O S T A , 2015, p. 11-12).
Já M ello é claro sobre o fato de q u e a ideia original de autogoverno
sobre determ inadas m atérias de interesse da respectiva com unidade que
cu lm in o u com a criação, pelos rom anos, das estruturas conhecidas com o
m unicípios é a m esm a q u e m otiva os governos locais da atualidade.

[...] a possibilidade de participação política, inerente à ideia


de governo local, também contribui não só para a
continuidade da instituição municipal como também para o
grande número de unidades de governos locais em muitos
países. Isso explica em boa parte as 600 mil vilas da Índia,
com os seus conselhos ou panchayats; os quase 80 mil
governos locais dos EUA; as 38 mil comunas francesas; as
9 mil municipalidades espanholas; as sete mil comunas
italianas e os quase 4 mil Municípios brasileiros. A principal
lógica desses números está na resistência à supressão do
mais concreto e acessível canal de participação do cidadão
na vida política (MELLO, 1987, p. 797).

A tu a liz a n d o a in fo rm a ç ã o o fe re c id a p o r M e llo so b re o n ú m e ro
d e M u n ic íp io s b ra sile iro s, fo i fe sta p e sq u isa n o sítio in stitu c io n a l do
IB G E - In stitu to B ra sile iro de G e o g ra fia e E sta tístic a

59
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

(h ttp s ://w w w .ib g e .g o v .b r/c id a d e s-e -e sta d o s.h tm l), e lá c o n sta que, n o
a n o d e 2 0 1 6 , fo ra m c o n ta b iliz a d o s 5 .5 7 0 M u n ic íp io s (IB G E , 2016).
Na m esm a d ireç ão , T o c q e v ille (1 9 7 7 ) id e n tific o u c in co
c o n d iç õ e s p a ra o d e se n v o lv im e n to d o s E sta d o s U n id o s. O p rin c íp io d a
d iv isã o d a a u to rid a d e p o lític a ; a g ra n d e a tra ç ã o d as in stitu iç õ e s lo cais, as
c o m u n a s (M u n ic íp io s); o siste m a fe d era l d e g o v e rn o o p o sto ao g o v e rn o
c e n tra liz a d o r; a in d e p e n d ê n c ia d a im p re n sa , tid a c o m o sím b o lo d a
lib e rd a d e p o lític a d a so cied a d e, e p o r ú ltim o , a lib e rd a d e d e a sso c ia ç ã o ,
c o m o fo rm a de d iv e rsific a ç ã o d o v ín c u lo social. É im p o rta n te re ssa lta r
q u e o au to r d eu d e sta q u e , em seu s e stu d o s so b re a c o m p re e n sã o das
in s titu iç õ e s n o rte -a m e ric a n a s, ao p ap e l d o M u n ic íp io .
P o n to im p o rtan tíssim o p erceb id o p o r este autor é o fato q u e a
p o lítica n o rte-am erican a é fu n d a m e n tad a n a v id a local e seus problem as, o
que serve de lição p ara to d o o m undo, inclusive p ara o B rasil, o u seja, é
n ecessário rep en sar a p o lítica en x e rg an d o o M u n icíp io co m o esc o la de vida.
M e ire lle s (2 0 0 6 ) c o n sid e ra q u e o M u n ic íp io te m so frid o , n o
m undo m o d e rn o , d iv e rsa s m o d ific a ç õ e s no que d iz re sp e ito às
a trib u iç õ e s e à estru tu ra . O q u e n ã o se p o d e n eg a r, d e a c o rd o co m o au to r,
é q u e o M u n ic íp io é o re sp o n sá v e l p e la o rd e n a ç ã o d a cid ad e , in c lu in d o -
se aí os se rv iç o s p ú b lic o s lo c a is e, ta m b é m a p ro te ç ã o a m b ie n ta l, que
so fre a te n ta d o s c o n sta n te s p o r co n ta d a u rb a n iz a ç ã o q u e a c a b a in v a d in d o
b a irro s , c a u sa n d o a d e g ra d a ç ã o co m h a b ita ç õ e s cla n d e stin a s, sem os
se rv iç o s p ú b lic o s e sse n c ia is ao b e m -e s ta r d a p o p u la ç ã o .
D e a c o rd o co m B ra z (2 0 0 3 ) o M u n ic íp io é u m a c ria ç ã o ju ríd ic a
q u e se a s s e n ta n o p rin c íp io de d ire ito n atu ra l, c o n sistin d o n a m e n o r
u n id a d e territo ria l d a F e d e ra ç ã o . A o rig e m d o s M u n ic íp io s, em su a
a b o rd a g e m so c io ló g ic a , v e m d o e s p írito a sso c ia tiv o d o h o m e m e de suas
re la ç õ e s d e v iz in h a n ç a . B ra z (2 0 0 3 ) d e sta c a q u e

Como instituição das modernas organizações políticas, o


Município teve suas atribuições originárias condensadas em
normas de direito positivo. Com o advento do Estado moderno,

60
o direito natural transmudou-se para uma delegação de poderes,
como uma benesse do poder estatal (BRAZ, 2003. p. 30).

A p a rtir d e ste s co n to rn o s, p a rtim o s p a ra o q u e d e te rm in a a


C o n s titu iç ã o F e d e ra l d e 1988 so b re a q u e stã o d o s m u n ic íp io s. S eg u n d o
C o s ta (2 0 1 5 ), “ O s d iv e rso s a sp e c to s e p e c u lia rid a d e s fiz e ra m co m q u e
fo s s e m fin a lm e n te re c o n h e c id a s no te x to c o n stitu c io n a l suas
s in g u la rid a d e s e a u to n o m ia s” . (C O S T A , 2 0 1 5 , p. 74)
O a u to r e x p õ e q u e o m a is re le v a n te a sp e c to foi c la ssific á -lo
com o in te g ra n te da F e d e ra ç ã o b ra sile ira , isso no 1° a rtig o da
C o n s titu iç ã o d e ste p aís, o n d e se d e fin e a fo rm a ç ã o d a R e p ú b lic a
F e d e ra tiv a d o B rasil: “ [...] fo rm a d a p e la u n iã o in d isso lú v e l d o s E sta d o s
e M u n ic íp io s e d o D is trito F e d e ra l, c o n stitu i-se em E sta d o D e m o c rá tic o
d e D ire ito .” . E n o seu 18° artig o , está e x p re sso q u e a “ o rg a n iz a ç ã o
p o lític o -a d m in istra tiv a d a R e p ú b lic a F e d e ra tiv a d o B ra sil c o m p re e n d e a
U n iã o , os E sta d o s, o D istrito F e d e ra l e os M u n ic íp io s, to d o s a u tô n o m o s” .
P o r su a v ez , M e ire lle s (2 0 0 6 ) a p o n ta q u e a C F d e 1988 co rrig e
fa lh a s c o n sta n te s n a s e d iç õ e s a n te rio re s, ao in c lu ir o M u n ic íp io co m o
en te fe d era d o , j á q u e o m e sm o se ria p e ç a p rim o rd ia l d a o rg a n iz a ç ã o
p o lític o -a d m in istra tiv a d o país.

A característica fundamental da atual Carta é a ampliação da


autonomia municipal no tríplice aspecto político,
administrativo e financeiro, conforme estabelecido nos arts.
29-31, 156, 158 e 159, outorgando-lhe, inclusive, o poder de
elaborar sua lei orgânica (Carta Própria) [...]. Extinguiu
também a nomeação de prefeitos para qualquer Município,
manteve a eleição direta para vereadores (art.29), e vedou a
criação de Tribunais, Conselhos ou órgãos de Contas
municipais (art. 31, § 4°) (MEIRELLES, 2006, p. 44-45).

L ev a n d o em co n sideração a definição de M u n icíp io n a C F, S ilva


(2 0 1 3 ) d estaca que o ente fe d erad o consiste em “ entidade estatal in teg ran te
d a F ed eração , co m o entidade político-adm inistrativa, d o tad a d e au to n o m ia
política, ad m in istrativ a e fin an ceira” , (S IL V A , 2013, p. 646). A p ó s isso, ele

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

cita os arts. 18, 29 e 34 d a C.F. p ara trata r de au to n o m ia dos M unicípios,


que é en ten d id a com o a co n d ição de g erir os p ró p rio s negócios, d en tro de
u m círcu lo p ré -fix ad o p o r entidade superior. A au to n o m ia em questão
en g lo b aria q u atro vertentes: au to -o rg an ização com lei o rg ân ica própria;
au to g o v ern o ; autogoverno, p ela eleição do p refeito e dos vereadores; auto
leg islação m ed ian te co m p etên cia de elab o ração d e leis m u n icip ais sobre as
áreas que são reservadas à sua c o m p etên cia ex clu siv a e suplem entar; e ainda
a cap acid ad e auto ad m in istrativ a com o objetivo de m an ter e p restar os
serviços de in teresse local.
M eirelles (20 0 6 ) co n sid era que, sociologicam ente, o M u n icíp io é
o ag ru p am en to d e pessoas, nu m m esm o território, com in teresses com uns,
que, reu n id o s em sociedade, b u scam satisfazer as n ecessid ad es individuais,
além de d ese m p e n h ar atribuições coletivas d e in teresse local. N o aspecto
político, o M u n icíp io p o d e ser en ten d id o co m o entidade estatal com
atrib u içõ es p ró prias e g o v ern o autônom o, ligado ao E stad o -m e m b ro p o r
laço s constitu cionais indissolúveis, o q u e está p rev isto nos arts. 18, 29, e 34,
V II, c, d a C arta M agna. E , p o r últim o, o M u n icíp io é p e sso a ju ríd ica de
direito p ú b lico interno, de acordo com a C F, art. 14, III, com cap acid ad e
civil p len a p ara ex ercer direitos e co n trair o b rig açõ es em seu p ró p rio n om e,
resp o n d en d o p o r to d o s os atos de seus agentes.
N e sta m e sm a direção, M ac h ad o re ite ra que entre os dev eres da
U n ião está o d e p re serv ar a au to n o m ia m unicipal, d e aco rd o com o previsto
n o art. 34, V II, ‘c ’, d a C .F., ten d o a o b rigação de in terv ir n o s E stad o s p ara
“ [...] asse g u rar esse p rin cíp io constitucional, co m o entre outros m otivos,
p ara asse g u rar a en treg a pelo s E stad o s aos M u n icíp io s, das receitas
trib u tárias fix ad as n a C onstituição, com a o b serv ân cia dos prazo s fixados
em lei (art. 34, V, ‘b ’, d a C F )” . (M A C H A D O , 2016, p. 446).
Em a n á lise d eta lh a d a , e n te n d e -se c la ra m e n te que os
M u n ic íp io s, co m as in o v a ç õ e s n a C F /8 8 a m p lia ra m a su a a u to n o m ia e
fo ra e le v a d o à c a te g o ria d e e n te fe d e ra d o . A e x p re ssã o m á x im a d esta
a u to n o m ia e a p ro m u lg a ç ã o d e su a L e i O rg â n ica.

62
A id e ia d e a u to n o m ia é tra ç o fu n d a m e n ta l q u e o M u n ic íp io
p re c is a a s s u m ir p a ra q u e p o ssa se r id e n tific a d o c o m o u m a o rg a n iz a ç ã o
p o lítica . S o b re isso , C o sta id e n tific a q u e esta a u to n o m ia p o d e ser
a d m in istra tiv a , fin a n c e ira , p o lític a e d e a u to -o rg a n iz a ç ã o .
D a n d o se g u im e n to a isso , im p o rta n te frisa r q u e a a u to n o m ia
a d m in is tra tiv a fo i a p rim e ira a se r a trib u íd a ao M u n ic íp io , c o n sistin d o
em lh e c o n c e d e r co n d iç õ e s p a ra e x e c u ç ã o d e se rv iç o s lo cais. E sta
p e rm ite q u e seja e la b o ra d a u m a lista g e m in icial d e n e c e ssid a d e s e e le g e r
as p rio rid a d e s n a c o n d u ç ã o d o s in te re sse s p ú b lic o s lo cais. Já a a u to n o m ia
fin a n c e ira s ig n ific a a a trib u iç ã o d e re c e ita s e a lib e rd a d e p a ra gerir. J á a
a u to n o m ia p o lític a co n siste n a e le tiv id a d e dos d irig e n te s p o lítico s. P o r
fim a a u to n o m ia de a u to -o rg a n iz a ç ã o p e rm ite ao M u n ic íp io a
c o n s titu iç ã o d e le is lo cais. A ssim , d e fin e C o sta os M u n ic íp io s:

[...] município pode ser entendido com a organização política,


pessoa jurídica de Direito Público Interno, com base
territorial determinada, englobando um conjunto de vizinhos
com interesses locais comuns, com autonomia política,
administrativa e financeira garantida pela Constituição, que
lhe define a competência (COSTA, 2014, p. 85-86).

É c o n se n so q u e o M u n ic íp io te m a c a p a c id a d e d e e rg u e r
p a trim ô n io p ró p rio , a d m in istrá -lo d e a c o rd o co m as su as n e c e ssid a d e s e
in te re sse s, além d e p o d e r a d q u irir d ire ito s e c o n tra ir o b rig a ç õ e s, sendo,
ao m e sm o te m p o , o re sp o n sá v e l p o r to d o s os b e n s p ú b lic o s e se rv iç o s de
in te re ss e lo cal d en tro da su a te rrito ria lid a d e . T am bém sã o da
re s p o n sa b ilid a d e d o M u n ic íp io os e n c a rg o s d estes serv iço s.
A C o n stitu iç ã o d e 1988 a trib u iu ao s M u n ic íp io s c o m p e tê n c ia s
q u e o c o lo c a n o m e sm o p la n o q u e os d e m a is en tes fe d e ra d o s. (C O S T A ,
2 0 1 5 . p. 86). N e ste sen tid o , a atu al C a rta M a g n a a d o to u o siste m a de
e sta b e le c e r as c o m p e tê n c ia s e x c lu siv a s à U n iã o e aos M u n ic íp io s,
fic a n d o os re m a n e sc e n te s p a ra os E s ta d o s-m e m b ro s. T ais p o d e re s

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

re s e rv a d o s p o d e m se r ex p líc ito s, q u a n d o d e v id a m e n te e n u m e ra d o s e
im p líc ito s q u a n d o d e ste s re su ltam .

Na verdade, o sistema é complexo e exige algumas regras


básicas. Em primeiro lugar, a competência municipal
expressa e exclusiva barra a competência federal e
estadual, sendo tais consideradas exorbitantes. Em
segundo, a competência municipal implícita prevalece
sobre os poderes remanescentes dos Estados, mas é
afastada pela competência estadual explícita e federal
expressa ou implícita. Em terceiro, a competência
concorrente da União prevalece sobre a estatal e esta sobre
a municipal, sendo o único caso em que há tal
escalonamento (COSTA, 2014, p. 87).

E v id en te que a co m p etên cia d o M u n icíp io é d irecio n ad a p ara os


assu n to s de in teresse local, dev en d o se sob rep o r sobre as com petências
fed erais e estaduais. O s in ciso s I e II d o art. 30 d a C F diz que o M u n icíp io
é co m p eten te p ara “leg islar sobre assuntos de in teresse lo cal” e su p lem en tar
a leg islação federal e estadual n o que couber” (C O S T A , 2015. p. 87).
O te o r d o art. 30 d a C F é esse n c ia l p a ra a sse g u ra r a a u to n o m ia
m u n ic ip a l, p o is, o d isp o sitiv o atrib u i ao e n te d a fe d e ra ç ã o o p o d e r de
in s titu ir e a rre c a d a r trib u to s d e su a co m p e tê n c ia , além d e a p lic a r as
ren d as. O M u n ic íp io ta m b é m p o d e fix a r os im p o sto s te rrito ria is e
p re d ia is u rb a n o s, so b re a tra n sm issã o d e títu lo s, e se rv iç o s d e v e n d a s de
q u a lq u e r n atu re za. “P o d e , ain d a, fix a r ta x a s, em ra z ã o d o e x e rc íc io do
p o d e r d e p o líc ia o u p e la u tiliz a ç ã o , e fe tiv a o u p o te n c ia l, d e serv iç o s
p ú b lic o s e sp e c ífic o s e d iv isív e is, p re sta d o s ao c o n trib u in te o u p o sto s à
su a d is p o s iç ã o .” (C O S T A , 2 0 1 4 . p. 89). É im p o rta n te le m b ra r q u e os
M u n ic íp io s ta m b é m tê m a p re rro g a tiv a d e c ria r d istrito s, se n d o q u e o
o b je tiv o d a s u b d iv isã o g e o g rá fic a b u s c a a a d m in istra ç ã o lo c a liz a d a . E m
o u tro p o n to , o a u to r frisa q u e :

Compete ao Município, nos termos do inciso V do art. 30


da Constituição Federal, organizar e prestar, diretamente

64
ou sob o regime de concessão ou permissão, os serviços
públicos de interesse local, incluindo o transporte público,
que tem caráter essencial (COSTA, 2015, p. 90).

Na m esm a d ireç ão , ao d isc o rre r so b re as c o m p e tê n c ia s


m u n ic ip a is, F e rra ri (2 0 1 4 ) re a firm a q u e a C F d e te rm in a q u e os en tes
fe d e ra d o s tê m c a p a c id a d e de au to g o v e rn o , a u to le g isla ç ã o ,
a u to a d m in istra ç ã o , e a u to -o rg a n iz a ç ã o , le m b ra n d o q u e a a u to n o m ia
m u n ic ip a l se re fe re ao s a sp e c to s p o lític o s, a d m in istra tiv o s e fin a n c e iro s.
N o to c a n te à a u to n o m ia a d m in istra tiv a , a c o m p e tê n c ia está d ire ta m e n te
lig a d a à o rg a n iz a ç ã o e p re sta ç ã o d e se rv iç o s p ú b lic o s d e in te re sse lo cal,
d e a c o rd o co m o art. 30 d a C a rta M a g n a , q u e ta m b é m d e te rm in a q u e a
c o m p e tê n c ia d a U n iã o é e x p re ssa e e n u m e ra d a e a d o s M u n ic íp io s está
lig a d a aos in te re sse s lo c a is . J á a d o s E sta d o s é fo rm a d a p o r a q u ilo q u e
re m a n e s c e d o q u e é p re v isto p a ra os M u n ic íp io s e a U n ião .

No plano horizontal, a Constituição, além de enumerar as


competências da União e dos Municípios, deixa aos
Estados-membros as remanescentes, cujo significado leva
a aceitar que cada uma de nossas esferas federativas possui
competências legislativas e administrativas, que devem ser
exercidas com exclusão das demais, exceto no caso,
expresso, de possibilidade de delegação, previsto no
parágrafo único de seu art. 22 (FERRARI, 2014, p. 172).

S o b re o p la n o v e rtic a l, a a u to ra fa z os se g u in te s a p o n ta m e n to s:

No plano vertical, propriamente dito, tem-se uma área


comum de competências, na qual tanto podem atuar a
União como os demais entes federativos, tomando por
base o princípio da preponderância do interessem ou seja:
cabe à União tratar das matérias de interesse nacional, aos
Estados das de interesse regional e aos Municípios das de
interesse local (FERRARI, 2014, p. 173).

Em se tra ta n d o d e in te re sse lo cal, este está d ire ta m e n te


re la c io n a d o à c irc u n sc riç ã o d a c o m p e tê n c ia d o M u n ic íp io , p o ré m , surge,

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

a p a rtir d e sta d e lim ita ç ã o , o q u e stio n a m e n to so b re a p o ssib ilid a d e de


d e te rm in a r u m in te re sse q u e seja e x c lu siv a m e n te lo cal, sem q u e o
m e s m o e s te ja lig a d o ao s in te re sse s d as d e m a is e sfe ra s (re g io n a l e U n ião ).
S o b re isso , F e rra ri a firm a que:

A expressão interesse local deve ser reconhecida dentre


aquelas que indicam o que se denomina de conceito jurídico
indeterminado, vale dizer, ao falar em interesse local,
quando se analisa a estrutura do Estado federal brasileiro, se
está frente a dois pontos de certeza: um de certeza positiva,
quando se reconhece que aqui existe a predominância do
interesse local; no lado oposto, porém, reside a certeza
negativa, ou seja, neste caso não existe a predominância do
interesse local (FERRARI, 2014, p. 175).

É ce rto q u e en tre as d u as c e rte z a s h á a p o ssib ilid a d e d e su rg ire m


d iv e rsa s h ip ó te se s o n d e n ã o se a p lic a n e n h u m a d as d u as ce rteza s, só
sen d o p o ssív e l a a n á lise d e ca so s c o n c re to s. H á d e se re g is tra r q u e n as
C o n s titu iç õ e s a n te rio re s à d a C F d e 1988, a c o m p e tê n c ia m u n ic ip a l era
tra ta d a c o m o “ p e c u lia r in te re ss e ” , o q u e p o d e ria se r e n te n d id o co m o
in te re ss e e x c lu siv o d o M u n ic íp io , sem q u e isso p u d e sse e sta r lig a d o aos
in te re ss e s re g io n a l e d a U n iã o .
F errari afirm a q u e “N ã o h á a n tin o m ia en tre in tere sse s lo c a is e
in tere sse s g erais. O tra ç o q u e to rn a d iferen te o in tere sse lo cal d o in tere sse
geral é a p r e d o m in â n c ia , ja m a is a e x c lu siv id a d e ” . (F E R R A R I, 2 0 1 4 , p.
175). S eg u n d o a autora, aq u ilo q u e seria “p e c u lia r in te re sse ” , assu n to de
in tere sse lo cal, se re fere ao a g ru p a m e n to d e p esso a s em d e te rm in a d a
d elim ita ção territo rial, m as tam b ém se re fere aos in tere sse s d o s E sta d o s e
d e to d a a U n ião . P a ra M e ire lle s (2006), o in tere sse local é tra d u z id o n a
p re d o m in â n c ia d o in te re sse m u n icip al so b re aq u e le d e in te re sse d o E sta d o
o u d a U n ião . F errari re ite ra q u e o art. 30, 1 d a C F atribui ao M u n ic íp io s a
c o m p e tê n c ia d e le g isla r sobre aq u ilo q u e s re fe re ao in te re sse local,
p o d en d o , ainda, “ o rg a n iz a r e prestar, d ire ta m e n te o u sob re g im e de
co n c essão ou p e rm issã o os serv iço s p ú b lico s d e in te re sse lo c a l” .

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C o sta (2 0 1 5 ) re ite ra q u e a a u to n o m ia m u n ic ip a l está lig a d a à
su a co m p e tê n c ia , e q u e q u a n d o este p o d e r foi g a ra n tid o ao M u n ic íp io ,
n a C F d e 1891, h o u v e a n e c e ssid a d e d e e sta b e le c e r o lim ite d e su a
atu aç ão , sen d o q u e o te rm o “ p e c u lia r in te re ss e ” fo i su b stitu íd o p o r
“ in te re ss e lo c a l” n a C F d e 1988, m a s m a n te n d o o m e sm o se n tid o d e
e n te n d im e n to . A ssim , d e fin e :

A expressão anterior, peculiar interesse, já tinha merecido


longa e laboriosa análise dos mais importantes juristas
brasileiros, de modo que cedo seu verdadeiro sentido foi
encontrado. O vocábulo peculiar, assim, não era entendido
como excludente, posto que a Federação faz com que o
interesse local não se choque com o interesse regional ou
o geral, ainda que seja uma preocupação de todas as
entidades federadas (COSTA, 2015, p. 99).

P o r fim , este a u to r d e fin e os in te re sse s lo c a is c o m o “ aq u e le s


re la c io n a d o s ao c o tid ia n o d a v id a m u n ic ip a l, q u e d iz e m re sp e ito
d ire ta m e n te ao s p ro b le m a s v iz in h o s sen d o p r e d o m in a n te m e n te , a
c o m p e tê n c ia d o M u n ic íp io so b re ta is m a té ria s” . (C O S T A , 2 0 1 5 , p. 99).
P ara Puccinelli Jú n io r (2014), o critério fundam ental p ara a
definição daquilo onde o M unicípio p o d e atuar está ligado diretam ente ao
interesse local. “ O bviam ente, n ão se cuida de u m interesse exclusivo, até
p o rq u e to d o assento afeto a u m a com unidade local, acabará, com m aio r ou
m en o r in tensidade repercutindo tam b ém nos interesses das com unidades
regionais e n acional” . (P U C C IN E L L I JÚ N IO R , 2014, p. 493).
S o b re o assu n to , M e n d e s re ite ra q u e :

Consideram-se interesse local as atividades e a respectiva


regulação legislativa, pertinentes a transportes coletivos
municipais, coleta de lixo, ordenação do solo urbano,
fiscalização das condições de higiene de bares e
restaurantes, entre outros (MENDES, 2014, p. 830).

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

M e ire lle s (2 0 0 6 ) d e fe n d e q u e o c rité rio d o in te re sse lo cal é


se m p re re la tiv o ao d as d e m a is e n tid a d e s estata is, e q u e se so b re
d e te rm in a d a m a té ria p re d o m in a o in te re sse d o M u n ic íp io em re la ç ã o ao
d o E s ta d o -m e m b ro e d a U n iã o , tal m a té ria é d a c o m p e tê n c ia do
M u n ic íp io , in d isc u tiv e lm e n te .
D e a c o rd o co m M e ire lle s (2 0 0 6 ) In te re sse lo cal n ã o é sin ô n im o
d e in te re ss e e x c lu siv o d o M u n ic íp io , n ã o sen d o , ta m b é m , in te re sse
p riv a tiv o d a lo c a lid a d e , n e m in te re sse ú n ic o d o s M u n ic íp io s. O a u to r
le m b ra q u e n ã o h á in te re sse m u n ic ip a l q u e n ã o seja ta m b é m d a u n iã o e
d o E s ta d o -m e m b ro , assim c o m o n ã o h á in te re sse re g io n a l o u n ac io n a l
q u e n ã o te n h a re fle x o n o s M u n ic íp io s, c o m o p a rte s in te g ra n te s d a
F e d e ra ç ã o b ra sile ira , se n d o o q u e d e fin e e c a ra c te riz a o in te re sse lo cal,
com o d o g m a co n stitu c io n a l, é a p re d o m in â n c ia d o in te re sse dos
M u n ic íp io s so b re o d o estad o , o u d a U n ião . S e g u n d o o au to r, o serv iç o
d e c o m p e tê n c ia m u n ic ip a l é to d o a q u e le q u e se e n q u a d ra n a a tiv id a d e
so cial re c o n h e c id a do M u n ic íp io , de a c o rd o co m o c rité rio da
p re d o m in â n c ia d e seu in te re sse em re la ç ã o a o u tra s a tiv id a d e s estatais.
A resp eito d a au to n o m ia do M un icíp io , B raz (2003) afirm a q u e tal
con stitu i-se n a facu ld ad e de trata r sobre os assuntos d e seu interesse, através
de suas p ró p rias leis, e a a u to n o m ia p arte do p rin cíp io n atural de u m a n o rm a
legal. O p rin cíp io q u e se b a se ia n o direito n atural é o fu n d am en to d a norm a,
a b ase de su sten tação dos p receitos que ela estabelece. O M u n icíp io n asceu
antes do estad o e originou-se, ativas os clãs patriarcais, co n stitu in d o -se n a
b ase d a o rg an ização ad m inistrativa do E stado.
B ra z (2 0 0 3 ) re ite ra q u e a C o n stitu iç ã o B ra s ile ira e sta b e le c e as
fo rm a s d e re la c io n a m e n to en tre os e n tes fe d e ra tiv o s, c o n h e c id o c o m o o
fe d e ra lis m o c o o p e ra tiv o . O s n ív e is d e c o m p e tê n c ia s se en tre la ç a m
v is a n d o o e q u ilíb rio d o d e se n v o lv im e n to e d o b e m -e s ta r d e to d o s.
A C F d e sta c a n o s arts. 21 e 2 2 as c o m p e tê n c ia s d a U n ião . O s
E s ta d o s -m e m b ro s te m su as c o m p e tê n c ia s e le n c a d a s n o art. 25. J á n o art.
30, e stã o as c o m p e tê n c ia s m u n ic ip a is. P o r su a v ez, o a rtig o 23 tra ta d a
c o m p e tê n c ia co m u m d as trê s e sfe ra s e d o D istrito F e d e ra l, e o art. 24

68
e n u m e ra as c o m p e tê n c ia s c o m u n s re se rv a d a s à U n iã o , ao s E sta d o s-
m e m b ro s e ao D is trito F ed eral. A p e sa r d a h ie ra rq u ia a se r o b se rv a d a , o
M u n ic íp io p o d e le g is la r em to d o s os a ssu n to s d e in te re sse lo cal, d esd e
q u e n ã o u ltra p a sse os lim ite s im p o sto s p e la s n o rm a s g e ra is e d ita d a s p e la
u n iã o e p e lo estad o .
E is q u e d iz o te x to c o n stitu c io n a l:

Art. 30. Compete aos Municípios:


I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência,
bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da
obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos
prazos fixados em lei;
IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a
legislação estadual;
V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão
ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído
o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;
VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da
União e do Estado, programas de educação infantil e de
ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda
Constitucional n° 53, de 2006);
VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União
e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;
VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento
territorial, mediante planejamento e controle do uso, do
parcelamento e da ocupação do solo urbano;
IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local,
observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

S o b re a a u to n o m ia a d m in istra tiv a , C o sta e sc la re c e q u e esta


c o m p re e n d e a g e stã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s lo cais, o n d e o in te re sse
m u n ic ip a l se so b re p õ e ao fe d era l o u estad u a l, le m b ra n d o que o
M u n ic íp io e s tá d en tro d o P a ís, e n ã o e x iste p o siç ã o o p o sta e n tre os d o is
in tere sse s. “ C ab em à m u n ic ip a lid a d e os se rv iç o s p ú b lic o s lo c a is, em q u e
e x iste u m in te re sse p re p o n d e ra d a m e n te lo cal so b re o estad u a l e o fe d era l,
in c lu s iv e o s se rv iç o s d e u tilid a d e p ú b lic a ” . (C O S T A , 2 0 1 5 , p. 128).

69
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A pred om inância dos interesses dos habitantes de determ inada área


é requisito prim eiro p ara a determ inação do interesse local. O M unicípio, p o r
sua vez, tem m aiores condições de resolver as questões locais e im plem entar
ações nessas localidades que as dem ais entidades federadas.
É im e n sa a g a m a d e a tiv id a d e s a trib u íd a s ao s a g e n te s p ú b lic o s
do M u n ic íp io , se n d o -lh e s fix a d a s c o m p e tê n c ia s de n a tu re z a
a d m in istra tiv a , m a s ta m b é m p o lític a , o n d e se re ssa lv a su a a u to n o m ia,
o b se rv a d o s o s c rité rio s d e c o n v e n iê n c ia e o p o rtu n id a d e , q u e n e m se q u e r
o Ju d ic iá rio p o d e v io la r (C O S T A , 2 0 1 5 , p. 127).
E m seguida, o au to r ressalta q u e a org an ização dos serviços
p ú b lico s lo cais está d irecio n ad a p ara aqueles q u e dizem resp eito à v id a
urb an a, em especial n aq u ilo q u e é relativo a transporte, in stru ção prim ária,
saúde, água, saneam ento, p ronto-socorro, sinalização das v ias públicas,
lo g rad o u ro s de u so co m u m do povo, assistên cia social e m u ito s outros que
aten d am às n ecessid ad es com uns e ao b em -e sta r dos m unícipios.
C o s ta d e sc re v e c o m o se rv iç o s p ú b lic o s d o M u n ic íp io aq u e le s
e x e rc id o s d ire ta o u in d ire ta m e n te , re la c io n a d o s ao in te re sse lo cal, q u e se
e n te n d e n ã o c o m o ex c lu siv id a d e , m a s c o m o a p re d o m in â n c ia do
in te re ss e m u n ic ip a l so b re o in te re sse fe d e ra l o u estad u al. O a u to r d á
d e s ta q u e ao se rv iç o d e á g u a e esg o to :
O se rv iç o d e á g u a e e sg o to é d o â m b ito d o M u n ic íp io , sen d o
q u e d e m u ita im p o rtâ n c ia . O a b a ste c im e n to d e água, em g eral, d e v e ser
p re s ta d o a tra v é s d e d e le g a ç ã o , c a b e n d o à m u n ic ip a lid a d e o c o n tro le do
m esm o . N o m e sm o sen tid o , o se rv iç o d e e sg o to d e v e se r fe ito com
m á x im a ca u te la, p a ra im p e d ir q u e h a ja a p o lu iç ã o d o s m a n a n c ia is
h íd ric o s (C O S T A , 2 0 1 5 , p. 229).
O art. 21 d a C F d e te rm in a q u e c o m p e te à U n iã o in s titu ir as
d ire triz e s n a c io n a is p a ra o sa n e a m e n to b á sic o . P o ré m , le m b ra C o sta , n o
art. 30, e s tá d e te rm in a d o q u e c o m p e te ao M u n ic íp io le g isla r so b re os
in te re ss e s lo c a is e o rg a n iz a r, p re sta r d ire ta m e n te o u sob c o n c e ssã o ou
p e rm issã o , os se rv iç o s p ú b lic o s d e in te re sse lo cal. O a u to r re ite ra q u e a
L e i F e d e ra l n° 1 1 .4 4 5 /0 7 fix a as d ire triz e s n a c io n a is p a ra o sa n e a m e n to

70
b á sic o . D e a c o rd o co m o te x to leg al, sa n e a m e n to b á s ic o é e n te n d id o
c o m o o c o n ju n to d e serv iço s, in fra e stru tu ra s e in sta la ç õ e s o p e ra c io n a is
d e a b a s te c im e n to d e á g u a (in c lu in d o -se aí as a tiv id a d e s, in fra e stru tu ra s
e in sta la ç õ e s n e c e ssá ria s ao a b a ste c im e n to p ú b lic o d e á g u a p o tá v e l,
d e sd e a c a p ta ç ã o até lig a ç õ e s p re d ia is e m e d iç ã o ) e e sg o ta m e n to
sa n itá rio (c o leta, tra n sp o rte , tra ta m e n to e d isp o siç ã o final).
C o sta in fo rm a q u e a p re sta ç ã o d e se rv iç o s d e sa n e a m e n to p o r
e n tid a d e s alh e ia s à a d m in istra ç ã o p ú b lic a d e p e n d e d e co n tra to , c o n fo rm e
e s ta b e le c id o em n o rm a le g a l, n ã o sen d o p o ssív e l su a re a liz a ç ã o p o r m e io
d e p arceria , o u o u tro s in stru m e n to s p re c á rio s. N e sse sen tid o , h á ta m b é m
0 e s ta b e le c im e n to d e re g ra s p a ra a v a lid a d e d o co n tra to , a saber:
e x is tê n c ia d o p la n o d e sa n e a m e n to b á s ic o ; estu d o d e v ia b ilid a d e té c n ic a
e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira d a p re sta ç ã o d o serv iço ; e x istê n c ia d e n o rm a s de
re g u la ç ã o q u e e sta b e le ç a m fo rm a s p a ra o c u m p rim e n to d as d ire triz e s d a
re fe rid a lei; re a liz a ç ã o d e c o n su lta p ú b lic a so b re o ed ital d e lic ita ç ã o e o
c o n tra to d e co n c essão .

1 A LEI 14.026/20 E O SANEAMENTO MUNICIPAL

A p ó s a v a s ta re v isã o b ib lio g rá fic a acim a, p a ssa m o s à a n á lise d a


L e i 1 4 0 2 6 /2 0 . A A sso c ia ç ã o N a c io n a l d o s S e rv iç o s M u n ic ip a is de
S a n e a m e n to (A sse m a e ) a ju iz o u n o d ia 15 d e o u tu b ro , n o S u p rem o
T rib u n a l F e d e ra l, aç ão d ire ta d e in c o n s titu c io n a lid a d e (A D I) c o n tra
d is p o s itiv o s d a L e i n° 14.026, d e 15 d e ju lh o , q u e " a tu a liz a o M a rc o
L e g a l d o S an ea m e n to ". T al aç ão a te n d e à fin a lid a d e in stitu c io n a l d a
e n tid a d e p re v ista em seu estatu to , q u e é, p rin c ip a lm e n te , 'lu ta r p e la
m a n u te n ç ã o d a titu la rid a d e m u n ic ip a l e p e la g e s tã o p ú b lic a d o s serv iç o s
d e sa n e a m e n to , d e fe n d e n d o o seu c a rá te r e sse n cial". Isso se d eu p e lo
e n te n d im e n to in stitu c io n a l, m u n id a d e am p lo s e stu d o s a c e rc a d a n o rm a,
d e q u e a a u to n o m ia m u n ic ip a l e stá so fre n d o a m e a ç a p e la s im p o siç õ e s
leg ais, a fe ta n d o o d ire ito leg al a o san e am en to .

71
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

L e m b ra n d o q u e o o b je tiv o d a A D I 6 5 8 3 /2 0 te m fo c o n a
p re s e rv a ç ã o d a titu la rid a d e m u n ic ip a l d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to , em
c o n s o n â n c ia co m as c o n sid e ra ç õ e s d o s a u to re s cita d o s n a re v isã o
b ib lio g rá fic a . O p e d id o d a A sse m a e se ju s tif ic a p o is a n o v a le g isla ç ã o
d e s re s p e ita d ire ta m e n te a C o n s titu iç ã o F e d e ra l b ra sile ira , co m d e sta q u e
p a ra a e x tra p o la ç ã o de c o m p e tê n c ia d a U n iã o , e sv a z ia m e n to de
c o m p e tê n c ia m u n ic ip a l, a b u so d e p o d e r e c o n ô m ic o , in te rv e n ç ã o fed era l
so b re a a u to n o m ia m u n ic ip a l e v io la ç ã o ao p a c to fe d e ra tiv o .
E n tre os v á rio s e n tra v e s im p o sto s p e la L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 é a
im p o s iç ã o d e u m a ú n ic a fo rm a p a ra d e le g a r o se rv iç o d e san e am en to ,
sen d o esta a co n c e ssã o , o q u e o b v ia m e n te e x tra p o la a c o m p e tê n c ia d a
U n iã o , p ro ib in d o a g e stã o c o m p a rtilh a d a d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to p o r
c o n só rc io o u c o n v ê n io , m e d ia n te au to riz a ç ã o , o q u e n a p rá tic a sig n ific a
q u e a lei ra sg o u o a rtig o 241 d a C o n stitu iç ã o F ed eral. A lei, d e fo rm a
e q u iv o c a d a , im p ô s u m m o d e lo ú n ic o d e p riv a tiz a ç ã o : o u o m u n ic íp io
p re s ta so z in h o o se rv iç o ou, se ele d e c id ir c o o p e ra r co m q u a lq u e r
m u n ic íp io , v ai te r q u e c o n c e d e r o serviço.

2 PRINCIPAIS PONTOS DA ADI 6583

P a ra fu n d a m e n ta r a d e c la ra ç ã o d e in c o n stitu c io n a lid a d e d a L ei
1 4 .0 2 6 /2 0 , a A D I 6583 e stá b a s e a d a em a rtig o s d a C o n stitu iç ã o F e d e ra l
b ra s ile ira e n a ju ris p ru d ê n c ia d o S T F so b re a ssu n to s re la c io n a d o s ao
te m a d o san e am en to . S e n d o assim , a p e tiç ã o d e m o n stra q u e : 1

1) A c o m p e tê n c ia p a ra re g u la r, o rg a n iz a r e p re s ta r se rv iç o de
in te re sse lo cal é d o m u n ic íp io (a rtig o 23, IX c/c a rtig o 30,
in c iso s I e V /C F ).
2 ) O s a n e a m e n to b á s ic o é se rv iç o d e in te re sse lo c a l (A D I n°
2 .3 4 0 /S C );
3) A "e ssê n c ia d a a u to n o m ia m u n ic ip a l c o n té m p rim o rd ia lm e n te
a u to -a d m in istra ç ã o , q u e im p lic a c a p a c id a d e d e d e c isó ria q u a n to

72
ao s in te re sse s lo c a is, sem d e le g a ç ã o o u a p ro v a ç ã o h ie rá rq u ic a "
(A D I n° 1 .842/R J);
4 ) A autonom ia m unicipal p ara serviços de interesse local n ão po d e ser
afastada ou elim inada, seja quando se criam regiões m etropolitanas
- hipótese n a qual a autonom ia m unicipal deve ser exercida pelo
v o to no conselho deliberativo, seja quando são utilizados recursos
dos dem ais entes p ara a construção e m anutenção dos referidos
serviços (A D I n° 1.842/R J c/c A D I n° 2.077/B A );
5) A e ssê n c ia d o c o n te ú d o m a te ria l d a c o m p e tê n c ia re g u la tó ria
m u n ic ip a l e n v o lv e q u a tro v a riá v e is b á sic a s: a) e n tra d a n o
m erc ad o ; b ) q u alid ad e ; c) preço . e d) in fo rm a ç ã o (a rtig o 23, IX
c/c a rtig o 30, in c iso s I e V /C F );
6) O s E sta d o s só podem " in stitu ir re g iõ e s m etro p o lita n a s,
a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e m ic ro rre g iõ e s" q u a n d o o in te re sse lo cal
se tra n s fo rm a r em in te re sse c o m u m d o s " a g ru p a m e n to s de
m u n ic íp io s lim ítro fe s" (§3°, a rtig o 2 5 /C F );
7) O §3° d o a rtig o 2 5 /C F n ã o co n stitu i u m a a u to riz a ç ã o p a ra o
E s ta d o e n c a m p a r o serv iç o m u n ic ip a l, m a s a p e n as p a ra c ria r u m
m e c a n ism o d e c o o rd e n a ç ã o p a ra q u e os e n te s e n v o lv id o s
p o ssa m c o o rd e n a r su as açõ es, sem ja m a is s u b ju g a r o m u n ic íp io
(A D I n° 1.8 4 2 /R J, A D I n° 2 .3 4 0 /S C e A D I n° 2 .0 7 7 /B A );
8) O E s ta d o n ã o p o ssu i c o m p e tê n c ia c o n stitu c io n a l p a ra c ria r á reas
d e p re sta ç ã o re g io n a liz a d a d e sa n e a m e n to b á s ic o q u a n d o os
m u n ic íp io s e n v o lv id o s j á e sta b e le c e ra m g e stã o a sso c ia d a;
9) O E s ta d o n ã o p o ssu i c o m p e tê n c ia c o n stitu c io n a l p a ra c ria r á reas
d e p re sta ç ã o re g io n a liz a d a d e sa n e a m e n to b á s ic o n a a u sê n c ia de
in te re sse c o m u m e a U n iã o n ã o p o ssu i esta c o m p e tê n c ia m e sm o
n a p re s e n ç a d o in te re sse co m u m ;
10) O a rtig o 175/C F p e rm ite ao m u n ic íp io d e le g a r q u a lq u e r serv iç o
p ú b lic o , m e sm o e sse n cial, p o r m e io d e c o n c e ssã o o u p erm issão ;

73
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

11) O artig o 2 4 1 /C F p e rm ite ao m u n ic íp io re a liz a r a g e stã o


a s s o c ia d a d e q u a lq u e r se rv iç o p ú b lic o p o r m e io d e c o n só rc io
p ú b lic o o u co n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o co m o u tro s e n tes fe d e ra d o s;
12) A c o n c e ssã o o u a p e rm issã o , co m ex c lu siv id a d e , re q u e re m a
re a liz a ç ã o d e lic ita ç ã o (a rtig o 175/C F ), e n q u a n to a g e stã o
c o m p a rtilh a d a p o r c o n só rc io o u c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o re q u e r
a p e n a s a u to riz a ç ã o (a rtig o 2 4 1 ); n o en tan to ,
13) A L ei n° 14.026/20 im põe unilateralm ente aos m unicípios a decisão
da U nião, p o r m eio d a A g ên cia N acional de Á g u a (A N A ), sobre
to d as as variáveis regulatórias relevantes n a prestação do serviço de
saneam ento básico, esvaziando p o r com pleto a com petência
m unicipal (artigo 23, IX, c/c artigo 30, incisos I e V /C F);
14) A L ei n° 14.026/20 im p õ e que a ú n ic a fo rm a de d eleg a r o serviço
de san eam en to b ásico seja p o r m eio d e co n cessão (artigo 175/C F),
ex trap olando a co m p etên cia d a U n ião ao p ro ib ir a g estão
co m p artilh ad a do serviço de saneam ento p o r co n só rcio ou
convênio, m ed ian te autorização, esv azian d o o artigo 241/C F ; e
15) A L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 v io la d ire ito s fu n d a m e n ta is ao p re ju d ic a r
co n tra to s em v ig o r e, p o rta n to , ato s ju ríd ic o s p erfeito s.

E , p o r fim , a c re d ita m o s q u e os m u n ic íp io s b ra sile iro s p o ssa m


g o z a r d e seu s d ire ito s p le n a m e n te , co m c o n d iç õ e s d e o fe re c e r q u a lid a d e
d e v id a e sa ú d e à p o p u la ç ã o , p o r m e io d a g e stã o p ú b lic a d e q u a lid a d e
d o s se rv iç o s m u n ic ip a is d e sa n e a m e n to , ru m o à u n iv e rsa liz a ç ã o .

REFERÊNCIAS

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74
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T O C Q U E V IL L E , A le x is de. A democracia na América. 2. ed. B e lo


H o riz o n te : L iv ra ria Itatiaia, 1977.

75
O NOVO MARCO LEGAL REGULATÓRIO DO
SANEAMENTO BÁSICO: as inovações trazidas p ela Lei
14.026/2020

B e n e d ito G o n ç a lv e s**
R e n a to C e sa r G u e d e s G rilo*

1 INTRODUÇÃO

O n o v o M a rc o L eg a l d o S a n e a m e n to B á sic o foi m a te ria liz a d o


p o r m e io d a L e i 14.026, d e 15 d e ju lh o d e 2 0 2 0 , a lte ra n d o a re d a ç ã o d e
d iv e rsa s le is a n te rio re s q u e tra ta v a m so b re o te m a .
A n o v a lei a tu a liz o u o m a rc o leg al d o sa n e a m e n to b á sic o ,
p ro m o v e n d o p ro fu n d a s a lte ra ç õ e s n a L e i 9 .9 8 4 , d e 17 d e ju lh o d e 2 0 0 0 ,
p a ra a trib u ir à A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to B á sic o (A N A )
c o m p e tê n c ia p a ra in s titu ir n o rm a s d e re fe rê n c ia p a ra a re g u la ç ã o dos
se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b ásico .
A lé m d isso , a L ei 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 a lte ra ta m b é m : (i) a L ei 10.768,
d e 19 d e n o v e m b ro d e 2 0 0 3 , p a ra a lte ra r o n o m e e as a trib u iç õ e s d o ca rg o
d e E s p e c ia lis ta em R e c u rso s H íd ric o s; (ii) a L ei 11.107, d e 6 d e ab ril d e
2 0 0 5 , p a ra v e d a r a p re sta ç ã o p o r c o n tra to d e p ro g ra m a d o s serv iç o s
p ú b lic o s d e q u e tra ta o art. 175 d a C o n stitu iç ã o F e d e ra l; (iii) a L ei
1 1 .445, d e 5 d e ja n e ir o d e 2 0 0 7 , p a ra a p rim o ra r as c o n d iç õ e s e stru tu ra is
d o sa n e a m e n to b á sic o n o P aís; (iv ) a L e i 12.305, de 2 d e ag o sto d e 2 0 1 0 ,
p a ra tra ta r d e p ra z o s p a ra a d isp o siç ã o fin al a m b ie n ta lm e n te a d e q u a d a
d o s re je ito s; (v ) a L ei 13.089, d e 12 d e ja n e ir o d e 2 0 1 5 (E sta tu to d a

* Mestre em Direito, Especialista em Direito Processual Civil, Bacharel em Direito pela


UFRJ. Membro Honorário do IAB. Ministro do STJ. Ministro Substituto do TSE.
* Doutorando e mestre em Direito pelo Centro Universitário de Brasília. Professor da
pós-graduação lato sensu da Faculdade Presbiteriana Mackenzie - Brasília. Procurador
da Fazenda Nacional (PGFN/AGU). Assessor de Ministro do Superior Tribunal de
Justiça (STJ).

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

M e tró p o le ), p a ra e ste n d e r seu â m b ito d e a p lic a ç ã o a u n id a d e s re g io n a is;


e (v i) a L ei 1 3 .529, d e 4 d e d e z e m b ro d e 2 0 1 7 , p a ra a u to riz a r a U n iã o a
p a rtic ip a r d e fu n d o co m a fin a lid a d e e x c lu siv a d e fin a n c ia r se rv iç o s
té c n ic o s esp e c ia liz a d o s.
N e ss e artig o , fa re m o s u m a e x p o siç ã o g eral so b re c a d a u m a das
le g is la ç õ e s alterad as, n a q u ilo q u e fo r m a is re le v a n te p a ra as fin a lid a d e s
p e rs e g u id a s p e lo n o v o M a rc o L e g a l d o S a n e a m e n to B á sic o (L ei
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 ).

2 ALTERAÇÕES PROMOVIDAS NA LEI N° 9.984, DE 17 DE


JULHO DE 2000: a nova Agência Nacional de Águas e
Saneamento Básico

A A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s (A N A ), a u ta rq u ia em re g im e
e sp e cial, era a e n tid a d e d a A d m in istra ç ã o In d ire ta F e d e ra l re sp o n sá v e l
p e la im p le m e n ta ç ã o d a P o lític a N a c io n a l d e R e c u rs o s H íd rico s.
A g o ra , co m as a lte ra ç õ e s p ro m o v id a s p e lo N o v o M a rc o do
S a n e a m e n to B á sic o , a a u ta rq u ia p a ssa a se r c h a m a d a d e A g ê n c ia
N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to B á sic o (q u e p e rm a n e c e c o m o A N A ),
co m c o m p e tê n c ia p a ra e d ita r n o rm a s d e re fe rê n c ia p a ra a re g u la ç ã o d o s
se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b ásico .
A s n o rm a s a serem e d ita d a s p e la A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e
S a n e a m e n to B á sic o serão in stitu íd a s d e fo rm a p ro g re ssiv a , d e m o d o a
e fe tiv a r a p ro m o ç ã o d e u m a p re sta ç ã o a d e q u a d a d o s serv iç o s, com
a te n d im e n to p le n o ao s u su á rio s, a sse g u ra n d o a p re sta ç ã o c o n c o m ita n te
d o s se rv iç o s d e a b a ste c im e n to d e á g u a e d e e sg o ta m e n to san itário . N o s
te rm o s do N ovo M a rc o do S a n e a m e n to B á sico , serão firm a d o s
p a râ m e tro s d e fisc a liz a ç ã o d o c u m p rim e n to d as m e ta s d e c o b e rtu ra e dos
in d ic a d o re s d e q u a lid a d e e ao s p a d rõ e s d e p o ta b ilid a d e d a á g u a , além de
c rité rio s lim ita d o re s d e c u sto s a serem p a g o s p e lo u su á rio final.
D e a c o rd o co m o art. 4 °-A d a L e i 9 .9 8 4 /2 0 0 0 , in se rid o p e la L ei
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , as n o rm a s d e re fe rê n c ia e serem e sta b e le c id a s p e la A N A ,

78
d ev e rão , d e n tre o u tro s p o n to s re le v a n te s e stim u la r a liv re c o n c o rrê n c ia ,
a co m p e titiv id a d e , a e fic iê n c ia e a su ste n ta b ilid a d e e c o n ô m ic a n a
p re s ta ç ã o d o s serv iç o s, b e m c o m o e stim u la r a c o o p e ra ç ã o e n tre os en tes
fe d e ra tiv o s co m v ista s à p re sta ç ã o , à c o n tra ta ç ã o e à re g u la ç ã o dos
se rv iç o s d e fo rm a a d e q u a d a e e fic ien te, a fim d e b u s c a r a u n iv e rsa liz a ç ã o
d o s se rv iç o s e a m o d ic id a d e ta rifá ria.
A n o rm a s d e re fe rê n c ia d a A N A ta m b é m d e v e rã o in c e n tiv a r a
re g io n a liz a ç ã o d a p re sta ç ã o dos serv iç o s, p a ra c o n trib u ir p a ra a
v ia b ilid a d e té c n ic a e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira , a c ria ç ã o d e g a n h o s de
e sc a la e d e e fic iê n c ia e a u n iv e rsa liz a ç ã o d o s serv iç o s, e d e v e rã o trata r,
e n tre o u tro s assu n to s, so b re p a d rõ e s d e q u a lid a d e e e fic iê n c ia , re g u la ç ã o
ta rifá ria , re d u ç ã o p ro g re s s iv a e c o n tro le d a p e rd a d e á g u a e re u so dos
e flu e n te s sa n itá rio s tra ta d o s, em c o n fo rm id a d e co m as n o rm a s
a m b ie n ta is e d e sa ú d e p ú b lica.
N a esfera d a reg u lação tarifária, serão estabelecidos m ecan ism o s
de su b síd io s p ara as p o p u laçõ es de b a ix a renda, p ara p o ssib ilitar a
u n iv ersalização dos serviços, e, qu an d o couber, o co m p artilh am en to dos
g an h o s d e p ro d u tiv id ad e das em p resas com os usuários.
C o m a fin a lid a d e d e fix a r as n o rm a s d e re fe rê n c ia , a A N A
d e v e rá a v a lia r as m e lh o re s p rá tic a s re g u la tó ria s d o setor, re a liz a r
c o n su lta s e a u d iê n c ia s p ú b lic a s e c o n stitu ir g ru p o s d e tra b a lh o co m a
p a rtic ip a ç ã o d as e n tid a d e s re g u la d o ra s e fisc a liz a d o ra s e d as e n tid a d e s
re p re s e n ta tiv a s m u n ic ip a is.
C a b e rá à A N A e sta b e le c e r e fisc a liz a r o c u m p rim e n to d e re g ras
d e u s o d a ág u a, a fim d e a sse g u ra r os u so s m ú ltip lo s d u ra n te a v ig ê n c ia
d a situ a ç ã o c rític a d e e sc assez, b e m c o m o d e c la ra r a situ a ç ã o c rític a de
e sc a sse z q u a n tita tiv a o u q u a lita tiv a d e re c u rso s h íd ric o s em rio s de
d o m ín io d a U n ião .
P o d erá h av e r o destacam ento de servidores de órgãos e de entidades
d a adm inistração pública federal p ara a A N A pelo M inistério d a E conom ia.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

3 ALTERAÇÕES PROMOVIDAS NA LEI N° 10.768, DE 19 DE


NOVEMBRO DE 2003: disposições sobre o quadro de pessoal da ANA

A L ei 1 0 .7 6 8 /2 0 0 3 d isp õ e so b re o q u a d ro d e p e sso a l d a a n tig a


A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s (A N A ), a u ta rq u ia em re g im e esp e cial, q u e
p a s s a a se r c h a m a d a d e A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to
B á s ic o (A N A ).
O N o v o M a rc o d o S a n e a m e n to B á sic o a lte ro u e s p e c ific a m e n te
as d is p o s iç õ e s n o rm a tiv a s re la tiv a s ao c a rg o d e E s p e c ia lis ta em
R e g u la ç ã o d e R e c u rso s H íd ric o s, que p a ssa a se r cham ado de
E s p e c ia lis ta em R e g u la ç ã o d e R e c u rso s H íd ric o s e S a n e a m e n to B ásico .
A L e i p re v ê as a trib u iç õ e s d o c a rg o d e E s p e c ia lis ta em
R e g u la ç ã o d e R e c u r s o s H íd ric o s e S a n e a m e n to B á s ic o - o q u a l, a n te s
d o N o v o M a rc o d o S a n e a m e n to , e ra c h a m a d o d e E s p e c ia lis ta em
R e g u la ç ã o d e R e c u r s o s H íd ric o s . C o m a n o v a re d a ç ã o d a d a p e la L e i
1 0 .0 2 6 /2 0 2 0 , e s tã o d e n tre as a trib u iç õ e s d e re fe rid o c a rg o (a rt. 3° d a
L e i 1 0 .7 6 8 /2 0 0 3 ): a e la b o r a ç ã o d a s n o rm a s d e re fe rê n c ia , re g u la ç ã o ,
o u to rg a , in s p e ç ã o , fis c a liz a ç ã o e c o n tro le d o u s o d e re c u rs o s h íd ric o s
e d a p r e s ta ç ã o d e s e rv iç o s p ú b lic o s n a á r e a d e s a n e a m e n to b á s ic o ;
im p le m e n ta ç ã o e a v a lia ç ã o d o s in s tru m e n to s d a P o lític a N a c io n a l d e
R e c u r s o s H íd ric o s ; d e s e n v o lv im e n to d e p ro je to s s o b re d e s p o lu iç ã o d e
b a c ia s h id ro g rá fic a s , e v e n to s c r ític o s em re c u rs o s h íd ric o s e
p ro m o ç ã o d o u s o in te g ra d o d e so lo e á g u a ; e p ro m o ç ã o d e a ç õ e s
e d u c a c io n a is e d e p e s q u is a s c ie n tífic a s e te c n o ló g ic a s .
O c a rg o d e E s p e c ia lis ta em R e g u la ç ã o d e R e c u rs o s H íd ric o s e
S a n e a m e n to B á sic o te m p o d e r d e p o lícia, n o e x e rc íc io d as fisc a liz a ç õ e s,
p a ra in te rd ita r e sta b e le c im e n to s, in sta la ç õ e s o u eq u ip a m e n to s, b e m
c o m o a p re e n d e r b e n s o u p ro d u to s, e p a ra re q u is ita r o a u x ílio d e fo rç a
p o lic ia l, q u a n d o n e c e ssá rio (A rt. 3°, §2°, d a L e i 1 0 .7 6 8 /2 0 0 3 , co m a
re d a ç ã o d a d a p e la L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 ).

80
4 ALTERAÇÕES PROMOVIDAS NA LEI 11.107, DE 6 DE
ABRIL DE 2005: normas de contratação de consórcios públicos

A L e i n° 11.107, d e 6 d e ab ril d e 2 0 0 5 , tra ta so b re n o rm a s g erais


d e c o n tra ta ç ã o d e c o n só rc io s p ú b lic o s, te n d o ta m b é m sid o a lte ra d a p e la
L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 .
A s n o rm a s g e ra is d e c o n tra ta ç ã o d e c o n só rc io s p ú b lic o s
ta m b é m p o d e rã o ser a p lic a d a s ao s c o n v ê n io s d e c o o p e ra ç ã o , q u e
p o d e rã o ser firm a d o s p o r b lo c o s d e m u n ic íp io s p a ra a c o n tra ta ç ã o dos
se rv iç o s d e sa n e a m e n to d e fo rm a co letiv a.
D e acordo com o §8° d o art. 13 d a L ei 11.107/2005, in serid o p ela
n o v a L ei 14.026/2020, estão p roibidos os ch am ad o s contratos de p ro g ram a
p ara p restação dos serviços p ú b lico s de san eam en to básico. N o m o d elo dos
co n trato s d e p rogram as, até então em vigor, prefeito s e go v ern ad o res
p o d eriam firm ar term o s d e p arceria d iretam en te com as em presas estatais,
sem licitação. C o m a n o v a L ei, que constitui o M arco L eg al do N o v o
S an eam en to B ásico, será o b rig ató ria a ab ertu ra d e licitação, n a qual p o d erão
co n co rrer p restad o res de serviço p ú b lico s o u privados.

5 ALTERAÇÕES PROMOVIDAS NA LEI N° 11.445, DE 5 DE


JANEIRO DE 2007: diretrizes nacionais para o saneamento
básico no País

A L ei n° 11.445, d e 5 d e ja n e ir o d e 2 0 0 7 , e sta b e le c e as d ire triz e s


n a c io n a is p a ra o s a n e a m e n to b á s ic o n o p aís, e foi o d ip lo m a n o rm a tiv o
m a is a lte ra d o p e la L ei 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 .
A L ei d e D ire triz e s p a ra o S a n e a m e n to B á sic o tra ta d ire ta m e n te
so b re as c o n d iç õ e s e stru tu ra is d o sa n e a m e n to b á sic o , a p a rtir dos
s e g u in te s p rin c íp io s fu n d a m e n ta is, c o n fo rm e d isp o siç ã o d o seu art. 2°
(c o m a re d a ç ã o d a d a p e la L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 ): u n iv e rsa liz a ç ã o d o a c e sso e
e fe tiv a p re s ta ç ã o d o serv iç o ; in te g ra lid a d e , c o m p re e n d id a c o m o o
c o n ju n to d e a tiv id a d e s e c o m p o n e n te s d e c a d a u m d o s d iv e rso s se rv iç o s

81
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

de sa n e a m e n to que p ro p ic ie à p o p u la ç ã o o ac e sso a eles em


c o n fo rm id a d e co m su as n e c e ssid a d e s e m a x im iz e a e fic á c ia d as a ç õ e s e
d o s re su lta d o s; a b a ste c im e n to d e água, e sg o ta m e n to san itário , lim p e z a
u rb a n a e m a n e jo d o s re síd u o s só lid o s re a liz a d o s d e fo rm a a d e q u a d a à
sa ú d e p ú b lic a , à c o n se rv a ç ã o d o s re c u rso s n a tu ra is e à p ro te ç ã o d o m e io
a m b ien te; d isp o n ib ilid a d e , n a s á reas u rb a n a s, d e se rv iç o s d e d re n a g e m e
m a n e jo d as ág u a s p lu v ia is, tra ta m e n to , lim p e z a e fisc a liz a ç ã o p re v e n tiv a
d as re d es, a d e q u a d o s à sa ú d e p ú b lic a , à p ro te ç ã o d o m e io a m b ie n te e à
s e g u ra n ç a d a v id a e d o p a trim ô n io p ú b lic o e p riv a d o ; a d o ç ã o d e m éto d o s,
té c n ic a s e p ro c e sso s q u e c o n sid e re m as p e c u lia rid a d e s lo c a is e re g io n a is;
a rtic u la ç ã o c o m as p o lític a s d e d e se n v o lv im e n to u rb a n o e re g io n a l, de
h a b ita ç ã o , d e c o m b a te à p o b re z a e d e su a erra d ic a ç ã o , d e p ro te ç ã o
a m b ie n ta l, d e p ro m o ç ã o d a saú d e, d e re c u rso s h íd ric o s e o u tras de
in te re ss e so cial re le v a n te , d e stin a d a s à m e lh o ria d a q u a lid a d e d e v id a,
p a ra as q u ais o s a n e a m e n to b á s ic o se ja fa to r d e te rm in a n te ; e fic iê n c ia e
s u s te n ta b ilid a d e e c o n ô m ic a ; e stím u lo à p esq u isa , a o d e se n v o lv im e n to e
à u tiliz a ç ã o d e te c n o lo g ia s ap ro p ria d a s, c o n sid e ra d a s a c a p a c id a d e de
p a g a m e n to d o s u su á rio s, a a d o ç ã o d e so lu ç õ e s g ra d u a is e p ro g re ssiv a s e
a m e lh o ria d a q u a lid a d e co m g a n h o s d e e fic iê n c ia e re d u ç ã o d o s c u sto s
p a ra os u su á rio s; tra n s p a rê n c ia d as açõ es, b a s e a d a em siste m a s de
in fo rm a ç õ e s e p ro c e sso s d e c isó rio s in stitu c io n a liz a d o s; c o n tro le social;
seg u ran ça , q u a lid a d e , re g u la rid a d e e co n tin u id a d e ; in te g ra ç ã o das
in fra e s tru tu ra s e d o s se rv iç o s c o m a g e stã o e fic ie n te d o s re c u rso s
h íd ric o s; re d u ç ã o e c o n tro le d as p e rd a s d e água, in c lu siv e n a d istrib u iç ã o
d e á g u a tra ta d a , e stím u lo à ra c io n a liz a ç ã o d e seu c o n su m o p e lo s u su á rio s
e fo m e n to à e fic iê n c ia en e rg é tic a , ao re u so d e e flu e n te s san itá rio s e ao
a p ro v e ita m e n to d e ág u a s d e c h u v a .
F o ra m in c lu íd o s p e la L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 os se g u in te s p rin cíp io s:
p re s ta ç ã o re g io n a liz a d a d o s serv iç o s, c o m v ista s à g e ra ç ã o d e g a n h o s de
e sc a la e à g a ra n tia d a u n iv e rs a liz a ç ã o e d a v ia b ilid a d e té c n ic a e
e c o n ô m ic o -fin a n c e ira d o s serv iço s; se le ç ã o c o m p e titiv a d o p re sta d o r d os

82
serv iç o s; e p re sta ç ã o c o n c o m ita n te d o s se rv iç o s d e a b a ste c im e n to de
á g u a e d e e s g o ta m e n to san itário .
As d ire triz e s da L ei n° 1 1 .4 4 5 / 2 0 0 7 fu n c io n a m com o
re fe rê n c ia s p a ra a A N A n a e la b o ra ç ã o d a s n o rm a s d e re g u la ç ã o d o s
s e rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b á sic o . P e la n o v a re d a ç ã o d a d a p e la
L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , a o s a rtig o s 14 a té 1 8 -A (q u e tra ta m d a p re s ta ç ã o
re g io n a liz a d a d e s e rv iç o s p ú b lic o s d e s a n e a m e n to b á sic o ), o s iste m a de
s a n e a m e n to p o d e se r e s tru tu ra d o p o r re g iõ e s m e tro p o lita n a s , p o r
u n id a d e s re g io n a is, in s titu íd a s p e lo s e sta d o s e c o n s titu íd a s por
m u n ic íp io s n ã o n e c e s s a ria m e n te lim ítro fe s, e p o r b lo c o s d e re fe rê n c ia
c ria d o s p e lo s m u n ic íp io s d e fo rm a v o lu n tá ria p a ra g e s tã o a s s o c ia d a d o s
s e rv iç o s (A rt. 3°, in c is o V I, d a L e i 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , c o m a r e d a ç ã o d a d a
p e la L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 ).
D e a c o rd o co m o art. 11-B d a L e i 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , as e m p re sa s
d ev e m a m p lia r o fo rn e c im e n to d e á g u a p a ra 9 9 % d a p o p u la ç ã o e d a
c o le ta e tra ta m e n to d e e sg o to p a ra 9 0 % d a p o p u la ç ã o , até o fin al d e 2033.
E n tre ta n to , h á a p o s s ib ilid a d e d e e x te n sã o d e sse p ra z o até 2 0 4 0 , c a so se
c o m p ro v e a in v ia b ilid a d e té c n ic a o u fin an c eira.
Im p o rta n te d e sta c a r q u e foi c ria d o o C o m itê In te rm in iste ria l de
S a n e a m e n to B á s ic o (C IS B ), q u e será p re sid id o p e lo M in isté rio do
D e se n v o lv im e n to R e g io n a l, p a ra a sse g u ra r a im p le m e n ta ç ã o d a p o lític a
(A rtig o 5 3 -A d a L e i 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ).

6 ALTERAÇÕES PROMOVIDAS NA LEI N° 12.305, DE 2 DE


AGOSTO DE 2010: Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos

A L ei n° 12.305, de 2 de agosto de 2010, que instituiu a P olítica


N acio n al de R esíduos Sólidos, tam b ém foi alterada pela L ei 14.026/2020.
C o n fo rm e o in c iso X IX , d o art. 19 d a L ei 1 2 .3 0 5 /2 0 1 0 , in c lu íd o
p e la L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , os p la n o s m u n ic ip a is d e g e stã o in te g ra d a de
re s íd u o s só lid o s d e v e rã o ser re v isa d o s, n o m á x im o , a c a d a d ez anos.

83
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

P ela n o v a redação d ad a ao artigo 54, a L ei 12.305/2010 estabelece


u m p razo p ara o fim dos lixões no país. P ara m unicípios que n ão elaboraram
planos de resíduos sólidos, esse prazo é 31 de dezem bro de 2020. P ara os
m unicípios com planos elaborados, o prazo é 2 de agosto de 2021 p ara
capitais e regiões m etropolitanas; 2 de agosto de 2022, p ara cidades com m ais
de 100 m il habitantes. Já em cidades entre 50 e 100 m il habitantes, os lixões
devem ser elim inados até 2 de agosto 2023; e em cidades com m enos de 50
m il habitantes, o prazo é 2 de agosto de 2024.
C o n fo rm e d isp o siç ã o d o §2°, d o art. 54 d a L ei 1 2 .3 0 5 /2 0 1 0 , n o s
c a so s em q u e a d isp o siç ã o d e re je ito s em a te rro s san itá rio s fo r
e c o n o m ic a m e n te in v iá v e l, p o d e rã o se r a d o ta d a s o u tra s so lu çõ es,
o b se rv a d a s n o rm a s té c n ic a s e o p e ra c io n a is p a ra e v ita r d a n o s o u risc o s à
sa ú d e p ú b lic a e à s e g u ra n ç a e m in im iz a r os im p a c to s am b ien tais.

7 CONCLUSÃO

O n o v o m a rc o leg al d o sa n e a m e n to b á sic o p ro m o v e u m ú ltip la s


a lte ra ç õ e s em d iv e rso s d ip lo m a s n o rm a tiv o s, co m a fin a lid a d e de
m o d e rn iz a r a p re sta ç ã o d o se rv iç o p ú b lic o n o país.
A s d isp o siç õ e s n o v a s m e re c e m ser e stu d a d a s e en fre n ta d a s
p e lo s a d m in istra tiv ista s, q u e p e sq u isa m a q u e stã o d a m o d e rn iz a ç ã o e
a tu a liz a ç ã o d a p re sta ç ã o d e se rv iç o s p ú b lic o s n o B rasil.
D e in ício , n o s p arece q u e as n o v as alteraçõ e s têm o g ra n d e m érito
d e e stim u la r a co n c o rrê n c ia en tre ag e n te s ec o n ô m ic o s, d e m o d o a
in c re m e n ta r e q u a lific a r o am b ien te re g u lató rio . A o e n fatizar a p re sta ção
re g io n a liz a d a do serv iço , b e m co m o com a p re v isã o d e m etas de
d e se m p e n h o e d as am b icio sas m e ta s d e u n iv ersa liz açã o , cu id a-se d e um
d esa fio im p o rta n te p a ra te n ta r re so lv e r os p ro b le m a s h istó rico s d o setor.
A re a lid a d e q u e se b u s c a a lc a n ç a r está n a m a te ria liz a ç ã o d a
u n iv e rs a lid a d e d o sa n e a m e n to b á s ic o p a ra to d a s as fa m ília s b ra sileiras.
E s p e ra m o s q u e e ssa re a lid a d e se a lca n ce, o m a is b re v e m e n te p o ssív el, a
p a rtir d as n o v a s d isp o siç õ e s n o rm a tiv a s d a L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 .

84
REGIÕES METROPOLITANAS E O NOVO MARCO DO
SANEAMENTO

B e rn a rd o Santoro*
D o u g la s E stevam *

RESUMO: O te x to te m p o r e sc o p o a n a lisa r os n o v o s d isp o sitiv o s


in tro d u z id o s n o M a rc o d o S a n e a m e n to B á sic o n o q u e ta n g e às re g iõ e s
m e tro p o lita n a s , p o r m e io d e p e sq u isa d o c u m e n ta l a te x to s le g a is,
d e c isõ e s ju d ic ia is e a rtig o s cien tífico s. S eg u n d o o e x a m e d as n o rm a s em
c o m en to , a p re se n ta r-se -á a n e c e ssid a d e d e in te rp re tá -la s c o n fo rm e a
C o n s titu iç ã o F e d e ra l, a A D I n.° 1 .8 4 2 /R J e o E sta tu to d a M e tró p o le .
C o n tu d o , a p e s a r d a c o n so lid a ç ã o fe ita p e la L e i n.° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , p e rc e b e -
se q u e o te m a m e tro p o lita n o a in d a c a re c e d e m e lh o r c o m p re e n sã o p ela
d o u trin a e p e lo P o d e r L e g isla tiv o .

H á a lg u m a s d éc ad as, a e m e rg ê n c ia d as m e tró p o le s e n q u a n to
fe n ô m e n o p o lític o -a d m in is tra tiv o 1 te m c h a m a d o a a te n ç ã o d a c lasse
ju ríd ic a *12. C o m a c re sc e n te u rb a n iz a ç ã o , as cid a d e s p a ssa ra m a
c o m p a rtilh a r se rv iç o s e fu n ç õ e s p ú b lic a s n u m c o n tín u o e sp a ç o de
re le v â n c ia so cial, p o lític a e ec o n ô m ic a.

* OAB/RJ 145.938. Mestre em Teoria e Filosofia do Direito pela Universidade do


Estado do Rio de Janeiro - UERJ. Presidente do Instituto Rio Metrópole - IRM.
* OAB/RJ 229.341. Mestrando em Direito da Cidade pela Universidade do Estado do
Rio de Janeiro - UERJ. Assessor Técnico da Diretoria de Planejamento e Projetos do
Instituto Rio Metrópole - IRM.
1 GRAU, Eros Roberto. Regiões metropolitanas: uma necessária revisão de concepções.
Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 68, n. 521, p. 13, mar. 1979.
2 DALLARI, Dalmo de Abreu. Novos polos administrativos afetando a federação brasileira.
In: BONAVIDES, Paulo. As tendências atuais do direito público: estudos em homenagem
ao professor Afonso Arinos de Melo Franco. Rio de Janeiro: Forense, 1976. p. 86.

85
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

N a C o n stitu iç ã o F e d e ra l d e 1988, foi p re v is ta a p o ssib ilid a d e de


e sta d o s fe d e ra d o s c ria re m re g iõ e s m e tro p o lita n a s, c o n d ic io n a d a s à
e x is tê n c ia d e fu n ç õ e s p ú b lic a s d e in te re sse c o m u m :

Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas


Constituições e leis que adotarem, observados os
princípios desta Constituição.
§ 1° São reservadas aos Estados as competências que não
lhes sejam vedadas por esta Constituição.
§ 2° Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante
concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei,
vedada a edição de medida provisória para a sua regulamentação.
§ 3° Os Estados poderão, mediante lei complementar,
instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas
e microrregiões, constituídas por agrupamentos de
municípios limítrofes, para integrar a organização, o
planejamento e a execução de funções públicas de
interesse comum.3

C om efeito , e ssa p re v isã o e sp e lh a um “ fe d e ra lism o de


in te g ra ç ã o ” 4, c a ra c te rístic o d e u m q u a d ro c o n stitu c io n a l em q u e as
c o m p e tê n c ia s c o m u n s e c o n c o rre n te s são m a is re le v a n te s q u e as
c o m p e tê n c ia s e x c lu siv a s, ju sta m e n te co m o o b je tiv o d e in te g ra r os
in te re ss e s p ú b lic o s lo c a is, re g io n a is e n ac io n a is.
N a p e rs p e c tiv a c o n stitu c io n a l, p o rta n to , a g e stã o c o m p a rtilh a d a
d e fu n ç õ e s p ú b lic a s g a ra n te a m a io r sa tisfa ç ã o e e fic iê n c ia d o s in te re sse s
c o m u n s d o s e n tes fe d e ra tiv o s, d e m o d o q u e a a u to n o m ia m u n ic ip a l
e n c o n tra -s e co n d ic io n a d a , d esd e su a o rig em , ao e sta b e le c im e n to das
re g iõ e s m e tro p o lita n a s.

3 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.


Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompil
ado.htm. Acesso em: 24 jan. 2021.
4 ALVES, Alaôr Caffé. Regiões Metropolitanas, Aglomerações Urbanas e
Microrregiões: Novas Dimensões Constitucionais da Organização do Estado
Brasileiro. Disponível em: http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/revi
sta/tes1.htm. Acesso em: 24 jan. 2021.

86
Sendo o planejamento metropolitano um processo
logicamente necessário à realização das funções públicas de
interesse comum, legitimado por força do art. 25, § 3°, da
Constituição Federal, não é possível, em nenhum momento,
alegar-se a incompatibilidade daquele planejamento com a
autonomia municipal. O planejamento é expressamente
citado no texto constitucional. Neste sentido, ao conceber-se
juridicamente a autonomia municipal, no âmbito de nosso
ordenamento positivo, está implícito, de imediato, o dever de
o Município acatar as diretrizes e prioridades metropolitanas,
aliás fixadas com a sua indispensável participação nas
decisões em nível regional-metropolitano. Deste modo,
quanto aos Municípios metropolitanos, não há uma
autonomia originária eventualmente restringida, mas sim uma
autonomia condicionada, desde a origem, ao possível
estabelecimento de regiões metropolitanas, nos termos da
disposição constitucional, quando houver condições objetivas
que justifiquem a medida.5

A p a rtir d o s an o s 2 0 0 0 , co m a p ro m u lg a ç ã o d o E sta tu to d a
C id a d e 6, a c ria ç ã o d o M in isté rio d as C id a d e s7, a a p ro v a ç ã o d a L e i dos
C o n só rc io s P ú b lic o s 8 e a C a m p a n h a P la n o D ire to r P a rtic ip a tiv o 9, o te m a

5 Idem.
6 BRASIL. Estatuto da Cidade: Lei n.° 10.257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta
os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política
urbana e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03
/leis/leis_2001/l10257.htm. Acesso em: 17 fev. 2021.
7 BRASIL. Lei n.° 10.683, de 28 de maio de 2003 (Conversão da Medida Provisória
n° 103, de 2003). Dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos
Ministérios, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/cciv
il_03/LEIS/2003/L10.683.htm#:~:text=LEI%20No%2010.683%2C%20DE%2028%2
0DE%20MAI0%20DE%202003.&text=Disp%C3%B5e%20sobre%20a%20organiza
%C3%A7%C3%A3o%20da,Minist%C3%A9rios%2C%20e%20d%C3%A1%20outra
s%20provid%C3%AAncias. Acesso em: 17 fev. 2021.
8 BRASIL. Lei dos Consórcios Públicos: Lei n.° 11.107, de 6 de abril de 2005. Dispõe
sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos e dá outras providências.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-
2006/2005/lei/l11107.htm. Acesso em: 17 fev. 2021.
9 MINISTÉRIO DAS CIDADES. Plano Diretor Participativo. Brasília: Ministério
das Cidades, 2005. 92 p. Disponível em: http://planodiretor.mprs.mp.br/arquivos/plan
oparticipativo.pdf. Acesso em: 17 fev. 2021.

87
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

m e tro p o lita n o v o lto u à to n a, p o is os p ro b le m a s d e m u ito s m u n ic íp io s j á


n ã o p o d ia m m a is ser re so lv id o s iso la d a m e n te . S o m a d o a isso , a d e fin iç ã o
d e re g iõ e s m e tro p o lita n a s c o m o c rité rio d e p ro g ra m a s fe d e ra is fe z su rg ir
o u tra s n o v a s p e lo B ra sil afo ra, sem q u e u m d e b a te e stru tu ra d o so b re o
te m a a in d a tiv e sse sid o estab e lecid o .
C o n tu d o , o a ssu n to só v o lta ria à d isc u ssã o co m m ais
in te n s id a d e a p a rtir d e 2 0 1 3 , co m o P ro je to de L ei d o E sta tu to d a
M e tró p o le (P L 2 .4 6 0 /2 0 0 4 ) e a d e c isã o d o S u p re m o T rib u n a l F e d e ra l n a
A ç ã o D ire ta d e In c o n stitu c io n a lid a d e n.° 1 .8 4 2 /R J101, so b re u m a lei
flu m in e n s e d e 1 9 9 7 11 q u e d e fin ia re g ra s p a ra os se rv iç o s d e sa n e a m e n to
b á s ic o e tra n s p o rte m e tro v iá rio 12
D e n tro d e sse d u e lo fe d e ra tiv o em sed e d e c o n tro le a b stra to de
c o n stitu c io n a lid a d e , su sc ito u -se , a fa v o r d o M u n ic íp io d o R io d e Jan e iro ,
a v io la ç ã o à a u to n o m ia m u n ic ip a l, ao p a c to fe d e ra tiv o e às c o m p e tê n c ia s
c o n s titu c io n a lm e n te a sse g u ra d a s p a ra le g isla r e g e rir in te re sse s lo cais,
in c lu s iv e a d isc ip lin a d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e in te re sse m u n ic ip a l,
d e n tre o s q u ais o d e sa n e a m e n to b á s ic o fa z ia parte.

10 Apesar de ter sido ajuizada em 10.6.1998, transitou em julgado apenas em


15.12.2020. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI n.° 1.842/RJ. Relator Ministro
Luiz Fux. Relator para acórdão Ministro Gilmar Mendes. Tribunal Pleno. Julgado em
28 fev. 2013. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp7inridenteM
714588. Acesso em: 17 fev. 2021.
11 RIO DE JANEIRO. Lei Complementar n.° 87, de 16 de dezembro de 1997. Dispõe
sobre a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, sua composição, organização e gestão,
e sobre a Microrregião dos Lagos, define as funções públicas e serviços de interesse
comum e dá outras providências. Disponível em: http://alerjln1.alerj.rjgov.br/contlei.
nsf/a99e317a9cfec383032568620071f5d2/eb26342129c7ae9203256571007be153?Op
enDocument. Acesso em: 17 fev. 2021.
12 RIO DE JANEIRO. Lei n.° 2.869, de 18 de dezembro de 1997. Dispõe sobre o
regime de prestação do serviço público de transporte ferroviário e metroviário de
passageiros no Estado do Rio de Janeiro, e sobre o serviço público de saneamento
básico no Estado do Rio de Janeiro, e dá outras providências. Disponível em:
http://alerjln1.alerj.rjgov.br/contlei.nsf/69d90307244602bb032567e800668618/nf08
nce731f9c103256572005919bb?OpenDocument#:~:text=DISP%C3%95E%20SOB
RE%20O%20REGIME%20DE,JANEIRO%2C%20E%20D%C3%81%20OUTRAS
%20PROVID%C3%8ANCIAS. Acesso em: 17 fev. 2021.

88
P o r o u tro lad o , o E sta d o d o R io d e Ja n e iro su ste n to u q u e a
c o m p e tê n c ia p a ra a in stitu iç ã o d e re g iõ e s m e tro p o lita n a s, p o r lei
c o m p le m e n ta r, a b so rv e ria c o m p e tê n c ia s m u n ic ip a is, que e n tão
p a s s a ria m a ser m e tro p o lita n a s . A lé m d isso , as m a té ria s cu jo in te re sse
co m u m u ltra p a ssa sse o â m b ito lo cal re c la m a ria m , n e c e ssa ria m e n te p a ra
su a d isc ip lin a , u m a in stâ n c ia a d m in istra tiv a d istin ta d a m u n icip al.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITU CIONALIDADE.


INSTITUIÇÃO DE REGIÃO METROPOLITANA E
COMPETÊNCIA PARA SANEAMENTO BÁSICO.
1. Ação direta de inconstitucionalidade contra Lei
Complementar n. 87/1997, Lei n. 2.869/1997 e Decreto n.
24.631/1998, todos do Estado do Rio de Janeiro, que
instituem a Região Metropolitana do Rio de Janeiro e a
Microrregião dos Lagos e transferem a titularidade do
poder concedente para prestação de serviços públicos de
interesse metropolitano ao Estado do Rio de Janeiro.
2. Preliminares de inépcia da inicial e prejuízo. Rejeitada
a preliminar de inépcia da inicial e acolhido parcialmente
o prejuízo em relação aos arts. 1°, caput e § 1°; 2°, caput;
4°, caput e incisos I a VII; 11, caput e incisos I a VI; e 12
da LC 87/1997/RJ, porquanto alterados substancialmente.
3. Autonomia municipal e integração metropolitana. A
Constituição Federal conferiu ênfase à autonomia
municipal ao mencionar os municípios como integrantes
do sistema federativo (art. 1° da CF/1988) e ao fixá-la junto
com os estados e o Distrito Federal (art. 18 da CF/1988).
A essência da autonomia municipal contém
primordialmente (i) autoadministração, que implica
capacidade decisória quanto aos interesses locais, sem
delegação ou aprovação hierárquica; e (ii) autogoverno,
que determina a eleição do chefe do Poder Executivo e dos
representantes no Legislativo. O interesse comum e a
compulsoriedade da integração metropolitana não são
incompatíveis com a autonomia municipal. O
mencionado interesse comum não é comum apenas aos
municípios envolvidos, mas ao Estado e aos municípios
do agrupamento urbano. O caráter compulsório da
participação deles em regiões metropolitanas,
microrregiões e aglomerações urbanas já foi acolhido
pelo Pleno do STF (ADI 1841/RJ, Rel. Min. Carlos

89
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

Velloso, D J 20.9.2002; ADI 796/ES, Rel. Min. Néri da


Silveira, DJ 17.12.1999). O interesse comum inclui
funções públicas e serviços que atendam a mais de um
município, assim como os que, restritos ao território de
um deles, sejam de algum modo dependentes,
concorrentes, confluentes ou integrados de funções
públicas, bem como serviços supramunicipais.
4. Aglomerações urbanas e saneamento básico. O art. 23,
IX, da Constituição Federal conferiu competência comum
à União, aos estados e aos municípios para promover a
melhoria das condições de saneamento básico. Nada
obstante a competência municipal do poder concedente do
serviço público de saneamento básico, o alto custo e o
monopólio natural do serviço, além da existência de várias
etapas - como captação, tratamento, adução, reserva,
distribuição de água e o recolhimento, condução e
disposição final de esgoto - que comumente ultrapassam
os limites territoriais de um município, indicam a
existência de interesse comum do serviço de saneamento
básico. A função pública do saneamento básico
frequentem ente extrapola o interesse local e passa a ter
natureza de interesse comum no caso de instituição de
regiões m etropolitanas, aglomerações urbanas e
microrregiões, nos term os do art. 25, § 3°, da
Constituição Federal. Para o adequado atendimento do
interesse comum, a integração municipal do serviço de
saneamento básico pode ocorrer tanto voluntariamente,
por meio de gestão associada, empregando convênios de
cooperação ou consórcios públicos, consoante o arts. 3°, II,
e 24 da Lei Federal 11.445/2007 e o art. 241 da
Constituição Federal, como compulsoriamente, nos termos
em que prevista na lei complementar estadual que institui
as aglomerações urbanas. A instituição de regiões
m etropolitanas, aglomerações urbanas ou
microrregiões pode vincular a participação de
municípios limítrofes, com o objetivo de executar e
planejar a função pública do saneamento básico, seja
p ara atender adequadam ente às exigências de higiene
e saúde pública, seja p ara d ar viabilidade econômica e
técnica aos municípios menos favorecidos. Repita-se
que este caráter compulsório da integração
m etropolitana não esvazia a autonom ia municipal.
5. Inconstitucionalidade da transferência ao estado-
membro do poder concedente de funções e serviços

90
públicos de interesse comum. O estabelecimento de região
metropolitana não significa simples transferência de
competências para o estado. O interesse comum é muito
mais que a soma de cada interesse local envolvido, pois
a má condução da função de saneamento básico por
apenas um município pode colocar em risco todo o
esforço do conjunto, além das consequências para a
saúde pública de toda a região. O parâmetro para
aferição da constitucionalidade reside no respeito à divisão
de responsabilidades entre municípios e estado. É
necessário evitar que o poder decisório e o poder
concedente se concentrem nas mãos de um único ente para
preservação do autogoverno e da autoadministração dos
municípios. Reconhecimento do poder concedente e da
titularidade do serviço ao colegiado formado pelos
municípios e pelo estado federado. A participação dos
entes nesse colegiado não necessita de ser paritária, desde
que apta a prevenir a concentração do poder decisório no
âmbito de um único ente. A participação de cada
Município e do Estado deve ser estipulada em cada região
metropolitana de acordo com suas particularidades, sem
que se permita que um ente tenha predomínio absoluto.
Ação julgada parcialmente procedente para declarar a
inconstitucionalidade da expressão “a ser submetido à
Assembleia Legislativa” constante do art. 5°, I; e do § 2°
do art. 4°; do parágrafo único do art. 5°; dos incisos I, II,
IV e V do art. 6°; do art. 7°; do art. 10; e do § 2° do art. 11
da Lei Complementar n. 87/1997 do Estado do Rio de
Janeiro, bem como dos arts. 11 a 21 da Lei n. 2.869/1997
do Estado do Rio de Janeiro.
6. Modulação de efeitos da declaração de
inconstitucionalidade. Em razão da necessidade de
continuidade da prestação da função de saneamento básico,
há excepcional interesse social para vigência excepcional das
leis impugnadas, nos termos do art. 27 da Lei n. 9868/1998,
pelo prazo de 24 meses, a contar da data de conclusão do
julgamento, lapso temporal razoável dentro do qual o
legislador estadual deverá reapreciar o tema, constituindo
modelo de prestação de saneamento básico nas áreas de
integração metropolitana, dirigido por órgão colegiado com
participação dos municípios pertinentes e do próprio Estado
do Rio de Janeiro, sem que haja concentração do poder
decisório nas mãos de qualquer ente.

91
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

(ADI 1842, Relator: LUIZ FUX, Relator p/ Acórdão:


GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em
6.3.2013, publicado em 16.9.2013)

P e lo a c ó rd ã o 13, a titu la rid a d e d o s se rv iç o s c o m u n s d e v e ria


p e rte n c e r ao c o le g ia d o fo rm a d o p e lo s M u n ic íp io s e p e lo E sta d o , ao p a sso
q u e o in te re ss e co m u m e a o b rig a to rie d a d e d e in te g ra ç ã o m e tro p o lita n a
seria m c o n s titu c io n a lm e n te c o m p a tív e is co m a a u to n o m ia m u n ic ip a l.
E m su a d ec isã o , o P le n á rio d o S u p re m o T rib u n a l F ed eral
e sta b e le c e u q u e as fu n ç õ e s p ú b lic a s d e in te re sse co m u m , n a s re g iõ e s
m e tro p o lita n a s d o p aís, in c lu siv e os se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o ,
d e v e ria m se r o rg a n iz a d a s p o r u m a e n tid a d e m e tro p o lita n a , q u e, p o r su a
vez, c o n g re g a ria o e sta d o fe d e ra d o , os d iv e rso s m u n ic íp io s e n v o lv id o s e
a so c ie d a d e civil.
E m su m a, o ju lg a d o c o n stitu iu p a râ m e tro s p a ra to d a s as re g iõ e s
m e tro p o lita n a s, e s c la re c e n d o a p e n a s q u e , e m b o ra a p a rtic ip a ç ã o dos
e n tes n o c o le g ia d o n ã o d e v e sse ser n e c e ssa ria m e n te p a ritá ria , o p o d e r
d e c isó rio e o p o d e r c o n c e d e n te n ão p o d e ria m se c o n c e n tra r n a s m ã o s d e
u m ú n ic o en te fe d e ra tiv o .
A o la d o d a d ec isã o , o d ire ito b ra s ile iro ta m b é m c o n ta co m o
E s ta tu to d a M e tró p o le 14, q u e d e fin e as d ire triz e s q u e re g e m to d a s as
re g iõ e s m e tro p o lita n a s d o p aís. A lé m d o s p rin c íp io s q u e d e v e rã o ser
re s p e ita d o s p e la g o v e rn a n ç a in te rfe d e ra tiv a , o d ip lo m a n o rm a tiv o
ta m b é m e s ta b e le c e su a e stru tu ra b á s ic a 15.

13 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade n.°


1.842/RJ. Diário da Justiça Eletrônico, Brasília, n. 181, 16 set. 2013.
14 BRASIL. Estatuto da Metrópole: Lei n.° 13.089, de 12 de janeiro de 2015. Institui
o Estatuto da Metrópole, altera a Lei n.° 10.257, de 10 de julho de 2001, e dá outras
providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2015/lei/l13089.htm. Acesso em: 14 abr. 2021.
15 A questão acerca do melhor modelo institucional às regiões metropolitanas segue em
discussão na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.° 5.155/BA, cujos autos estão
conclusos ao Ministro Relator Kassio Nunes desde 5.11.2020, quem substituiu o
Ministro Celso de Mello. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?
incidente=4614803. Acesso em: 14 abr. 2021.

92
E n tretanto, ap e sar d a n o v id ad e leg islativ a traz id a p ela L ei n.°
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 16, cu m p re ressaltar q u e alguns d e seus disp o sitiv o s precisam
ser in terp retad o s de aco rd o c o m o direito m etro p o litan o co n so lid ad o nos
ú ltim o s anos. D e início, v erifica-se a ex istên cia de u m a n o v a entidade
ju rídica, in clu íd a n o E statu to d a M etró p o le, q u e n ão se co n fu n d e com região
m etro p o litan a, ag lo m eração u rb a n a nem m icro rreg ião :

Art. 1° Esta Lei, denominada Estatuto da Metrópole,


estabelece diretrizes gerais para o planejamento, a gestão
e a execução das funções públicas de interesse comum em
regiões metropolitanas e em aglomerações urbanas
instituídas pelos Estados, normas gerais sobre o plano de
desenvolvimento urbano integrado e outros instrumentos
de governança interfederativa, e critérios para o apoio da
União a ações que envolvam governança interfederativa
no campo do desenvolvimento urbano, com base nos
incisos XX do art. 21, IX do art. 23 e I do art. 24, no § 3°
do art. 25 e no art. 182 da Constituição Federal.
§ 1° Além das regiões metropolitanas e das aglomerações
urbanas, as disposições desta Lei aplicam-se, no que couber:
I - às microrregiões instituídas pelos Estados com
fundamento em funções públicas de interesse comum com
características predominantemente urbanas;
II - (VETADO).
III - às unidades regionais de saneamento básico

16 BRASIL. Marco Legal do Saneamento Básico: Lei n.° 14.026, de 15 de julho de


2020. Atualiza o marco legal do saneamento básico e altera a Lei n° 9.984, de 17 de
julho de 2000, para atribuir à Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA)
competência para editar normas de referência sobre o serviço de saneamento, a Lei n°
10.768, de 19 de novembro de 2003, para alterar o nome e as atribuições do cargo de
Especialista em Recursos Hídricos, a Lei n° 11.107, de 6 de abril de 2005, para vedar a
prestação por contrato de programa dos serviços públicos de que trata o art. 175 da
Constituição Federal, a Lei n° 11.445, de 5 de janeiro de 2007, para aprimorar as
condições estruturais do saneamento básico no País, a Lei n° 12.305, de 2 de agosto de
2010, para tratar dos prazos para a disposição final ambientalmente adequada dos
rejeitos, a Lei n° 13.089, de 12 de janeiro de 2015 (Estatuto da Metrópole), para estender
seu âmbito de aplicação às microrregiões, e a Lei n° 13.529, de 4 de dezembro de 2017,
para autorizar a União a participar de fundo com a finalidade exclusiva de financiar
serviços técnicos especializados. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_0
3/_Ato2019-2022/2020/Lei/L14026.htm#art6. Acesso em: 14 abr. 2021.

93
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

definidas pela Lei n° 11.445, de 5 de janeiro de 2007.


(Incluído pela Lei n° 14.026, de 2020).

A m e s m a en tid a d e e n c o n tra -se a g o ra p re v ista n o M a rc o L eg a l


d o S a n e a m e n to B á sico . E n tre ta n to , se g u n d o a d e c isã o n a A D I n.°
1 .8 4 2 /R J, a titu la rid a d e do se rv iç o de sa n e a m e n to b á sic o é
o rig in a ria m e n te d o s e n te s m u n ic ip a is e, o n d e h o u v e r a in stitu iç ã o de
re g iã o m e tro p o lita n a p o r lei c o m p le m e n ta r, a titu la rid a d e será d e seu
ó rg ã o d e lib erativ o . Isto é, n e m o esta d o fe d e ra d o n e m a U n iã o p o ssu e m
c o m p e tê n c ia so b re ta l se rv iç o m as, a c o n tra rio se n su , p re c e itu a m os
d is p o s itiv o s in tro d u z id o s p e la n o v a lei:

Art. 3° Para fins do disposto nesta Lei, considera-se:


[...]
VI - prestação regionalizada: modalidade de prestação
integrada de um ou mais componentes dos serviços
públicos de saneamento básico em determinada região
cujo território abranja mais de um Município, podendo ser
estruturada em:
a) região metropolitana, aglomeração urbana ou
microrregião: unidade instituída pelos Estados mediante
lei complementar, de acordo com o § 3° do art. 25 da
Constituição Federal, composta de agrupamento de
Municípios limítrofes e instituída nos termos da Lei n°
13.089, de 12 de janeiro de 2015 (Estatuto da Metrópole);
b) unidade regional de saneamento básico: unidade
instituída pelos Estados m ediante lei ordinária,
constituída pelo agrupam ento de Municípios não
necessariamente limítrofes, p a ra atender
adequadam ente às exigências de higiene e saúde
pública, ou p a ra d ar viabilidade econômica e técnica
aos Municípios menos favorecidos;
c) bloco de referência: agrupamento de Municípios não
necessariamente limítrofes, estabelecido pela União nos
termos do § 3° do art. 52 desta Lei e formalmente criado
por meio de gestão associada voluntária dos titulares;
[...]
XIV - serviços públicos de saneamento básico de interesse
comum: serviços de saneamento básico prestados em
regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e

94
microrregiões instituídas por lei complementar estadual,
em que se verifique o compartilhamento de instalações
operacionais de infraestrutura de abastecimento de água
e/ou de esgotamento sanitário entre 2 (dois) ou mais
Municípios, denotando a necessidade de organizá-los,
planejá-los, executá-los e operá-los de forma conjunta
e integrada pelo Estado e pelos Munícipios que
compartilham, no todo ou em parte, as referidas
instalações operacionais.
[•••]
§ 5° No caso de Região Integrada de Desenvolvimento
(Ride), a prestação regionalizada do serviço de
saneamento básico estará condicionada à anuência dos
Municípios que a integram.

Isto é, o art. 3.°, V I, b, atribui aos estados fed erad o s o p o d e r de


in stitu ir u n id ad e regional de saneam ento b ásico p o r m eio d e lei ordinária.
P o rém , co m o j á m encionado, so m en te os entes m u n icip ais ou o órgão
d elib erativ o d a região m etro p o litan a p o ssu em co m p etên cia sobre a m atéria
de san eam en to b ásico e, portanto, ja m a is p o d eriam estar sob o ju g o do ente
estadual, com q uem n ão têm n en h u m a relação de h iera rq u ia federativa.
A m e s m a q u e stã o se re p e te n a a lín e a seg u in te, d a n d o o p o d e r à
U n iã o 17 d e e sta b e le c e r b lo c o d e re fe rê n c ia . M e sm o q u e se tra te d e u m a
e n tid a d e fo rm a lm e n te c ria d a p o r m e io d e g e stã o a sso c ia d a e v o lu n tá ria ,
seu e s ta b e le c im e n to ja m a is p o d e ria e sta r n a e sfe ra ju ríd ic a d a U n ião ,
afin a l d e co n tas, so m e n te os e n tes m u n ic ip a is o u o ó rg ã o d e lib e ra tiv o d a
re g iã o m e tro p o lita n a p o ssu e m c o m p e tê n c ia so b re a m atéria .
T a n to a ssim o é que, d o art. 3.°, X IV , d e v e -se d e p re e n d e r q u e a
o rg a n iz a ç ã o , o p la n e ja m e n to , a e x e c u ç ã o e a o p e ra ç ã o d o s serv iç o s
p ú b lic o s de sa n e a m e n to b á s ic o de in te re sse co m u m d ev e m ser
c o m p a rtilh a d o s d e n tro d a e stru tu ra d e g o v e rn a n ç a in te rfe d e ra tiv a d a

17 v. BRASIL. Marco Legal do Saneamento Básico: Lei n.° 14.026, de 15 de julho de


2020. “Art. 52. A União elaborará, sob a coordenação do Ministério do
Desenvolvimento Regional: § 3° A União estabelecerá, de forma subsidiária aos
Estados, blocos de referência para a prestação regionalizada dos serviços públicos de
saneamento básico”.

95
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

re g iã o m etro p o lita n a . Q u a lq u e r le itu ra d iv e rsa c o n tra ria fro n ta lm e n te o


art. 25, §3.°, d a C o n stitu iç ã o F ed eral.
Por ú ltim o , c o n sig n e -se que R e g iã o In te g ra d a de
D e se n v o lv im e n to - R ID E é e n tid a d e ju ríd ic a d istin ta da re g iã o
m e tro p o lita n a 18. A o c o n trá rio d esta, q u e é c ria d a p o r lei c o m p le m e n ta r
estad u a l, a R ID E p o d e se r in stitu íd a p e la U n iã o , co m o e sc o p o d e g e rir
p o lític a s d e d e se n v o lv im e n to re g io n a l e re d u z ir d e sig u a ld a d e s sociais.
N e ss e sen tid o , é p o ssív e l e n c o n tra r n o v o s d isp o sitiv o s n o
M a rc o L eg a l d o S a n e a m e n to q u e n e c e ssita m d e u m a le itu ra m a is aten ta,
a fim d e a d e q u á -lo s à s n o rm a s q u e re g e m as re g iõ e s m e tro p o lita n a s,
te n d o a C o n s titu iç ã o F e d e ra l c o m o p a râ m e tro , j á q u e é a c a rta d e d ire ito
q u e o rg a n iz a as c o m p e tê n c ia s d e c a d a e n te fe d e ra tiv o .

Art. 8° Exercem a titularidade dos serviços públicos de


saneamento básico:
I - os Municípios e o Distrito Federal, no caso de interesse local;
1 1 - 0 Estado, em conjunto com os Municípios que
compartilham efetivamente instalações operacionais
integrantes de regiões metropolitanas, aglomerações
urbanas e microrregiões, instituídas por lei complementar
estadual, no caso de interesse comum.
§ 1° O exercício da titularidade dos serviços de saneamento
poderá ser realizado também por gestão associada,
mediante consórcio público ou convênio de cooperação,
nos termos do art. 241 da Constituição Federal, observadas
as seguintes disposições:
I - fica admitida a formalização de consórcios
intermunicipais de saneamento básico, exclusivamente
composto de Municípios, que poderão prestar o serviço
aos seus consorciados diretamente, pela instituição de
autarquia intermunicipal;
II - os consórcios intermunicipais de saneamento básico terão
como objetivo, exclusivamente, o financiamento das

18 cf. CAVALCANTE, Luiz Ricardo. Regiões Metropolitanas e Regiões Integradas


de Desenvolvimento: em busca de uma delimitação conceitual. Brasília: Núcleo de
Estudos e Pesquisas/CONLEG/Senado, abril/2020 (texto para discussão n.° 273).
Disponível em: https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-
de-estudos/textos-para-discussao/td273. Acesso em: 7 abr. 2021.

96
iniciativas de implantação de medidas estruturais de
abastecimento de água potável, esgotamento sanitário,
limpeza urbana, manejo de resíduos sólidos, drenagem e
manejo de águas pluviais, vedada a formalização de contrato
de programa com sociedade de economia mista ou empresa
pública, ou a subdelegação do serviço prestado pela autarquia
intermunicipal sem prévio procedimento licitatório.
§ 2° Para os fins desta Lei, as unidades regionais de
saneamento básico devem apresentar sustentabilidade
econômico-financeira e contemplar, preferencialmente,
pelo menos 1 (uma) região metropolitana, facultada a sua
integração por titulares dos serviços de saneamento.
§ 3° A estrutura de governança para as unidades regionais
de saneamento básico seguirá o disposto na Lei n° 13.089,
de 12 de janeiro de 2015 (Estatuto da Metrópole).
§ 4° Os Chefes dos Poderes Executivos da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios poderão
formalizar a gestão associada para o exercício de funções
relativas aos serviços públicos de saneamento básico,
ficando dispensada, em caso de convênio de cooperação, a
necessidade de autorização legal.
§ 5° O titular dos serviços públicos de saneamento básico
deverá definir a entidade responsável pela regulação e
fiscalização desses serviços, independentemente da
modalidade de sua prestação.
Art. 8°-A. É facultativa a adesão dos titulares dos serviços
públicos de saneamento de interesse local às estruturas das
formas de prestação regionalizada.
Art. 8°-B. No caso de prestação regionalizada dos
serviços de saneamento, as responsabilidades
administrativa, civil e penal são exclusivamente
aplicadas aos titulares dos serviços públicos de
saneamento, nos termos do art. 8° desta Lei.

N a s re g iõ e s m e tro p o lita n a s, a titu la rid a d e do serv iç o de


sa n e a m e n to b á s ic o p e rte n c e à in stâ n c ia d e lib e ra tiv a fo rm a d a p e lo estad o
fe d e ra d o , p e lo s m u n ic íp io s m e tro p o lita n o s e p e la so c ie d a d e civil, n o s
te rm o s d o art. 8.°, II, d o E sta tu to d a M e tró p o le . É p o r esse m o tiv o que,
ao se tra ta r a u n id a d e re g io n a l d e sa n e a m e n to b á s ic o c o m o n o v o in stitu to
leg al, su rg e m a lg u m a s q u e stõ e s q u e n e c e ssita m d e so lu ç ã o ju ríd ic a .

97
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A re b o q u e , o art. 8.°, II, d o M a rc o L e g a l d o S a n e a m e n to B á sic o


d ev e se r in te rp re ta d o em c o n so n â n c ia co m o c o m p a rtilh a m e n to de
re s p o n sa b ilid a d e s e a ç õ e s n o â m b ito d a re g iã o m etro p o lita n a . P o r o u tro
lad o , além d a in c o n stitu c io n a lid a d e d o art. 3.°, V I, b, j á m e n c io n a d a , os
§§2.° e 3.° d o art. 8.° ta m b é m e sta b e le c e m a n e c e ssid a d e d e in te g ra ç ã o
da u n id a d e re g io n a l de s a n e a m e n to b á s ic o na o rg a n iz a ç ã o , no
p la n e ja m e n to e n a e x e c u ç ã o d o se rv iç o p ú b lic o - c u ja a n tin o m ia se
re p e te n o art. 47, §§1.° e 2.°.
À v is ta d isso , q u e stio n a -se se (i) a u n id a d e re g io n a l de
sa n e a m e n to b á s ic o p o s s u iria in s tâ n c ia d e lib e ra tiv a p ró p ria , o u (ii) se os
e n tes m u n ic ip a is q u e a c o m p u se sse m in te g ra ria m a in s tâ n c ia d e lib e ra tiv a
d e re g iã o m e tro p o lita n a j á ex isten te. O ra, ju s ta m e n te em ra z ã o d a
a ssis te m a tic id a d e re su lta n te d a in tro d u ç ã o d o n o v o in stitu to , re c o n d u z -
se à d e sc o o rd e n a ç ã o d o o rd e n a m e n to ju ríd ic o b ra sile iro , tra z e n d o m ais
p ro b le m a s d o q u e so lu ç õ e s p ráticas.

Todo profissional do direito, ao interpretar ou aplicar uma


norma que não esteja de acordo com o restante do sistema,
procurará adaptá-la de modo a conformá-la com as outras.
Ocasionalmente, os profissionais do direito, em seu conjunto,
podem assim, na verdade, até anular a intenção do legislador,
não por desrespeito ao direito, mas porque sua técnica os leva
a privilegiar o que ainda é a parte predominante do direito e a
inserir nele um elemento estranho, transformando-o de modo
a harmonizá-lo com o conjunto.19

A lé m d isso , n o q u e d iz re sp e ito ao art. 8.°-B , c o n sid e ra n d o que,


n a s re g iõ e s m e tro p o lita n a s, o titu la r d o se rv iç o d e sa n e a m e n to b á s ic o é
o ó rg ã o d e lib e ra tiv o , c o m u m e n te sem p e rso n a lid a d e ju ríd ic a - e,
p o rta n to , sem c a p a c id a d e ju ríd ic a p a ra c o n tra ir o b rig a ç õ e s - , q u e stio n a -
se a q u em se ria p o ssív e l im p u ta r cu lp a em ta is casos.

19 HAYEK, Friedrich A. Direito, legislação e liberdade: normas e ordem - vol. I.


Tradução de Henry Maksoud. São Paulo: Visão, 1985. p. 166.

98
N o c a so d a R e g iã o M e tro p o lita n a d o R io d e Ja n e iro , o In stitu to
R io M e tró p o le , p e sso a ju ríd ic a d e d ire ito p ú b lic o c o n stitu íd a sob a fo rm a
a u tá rq u ic a , é o re p re se n ta n te leg al d a re g iã o m e tro p o lita n a 20 e o ú n ic o
ó rg ã o c a p a z d e a d q u irir d ire ito s e c o n tra ir o b rig a ç õ e s, e m b o ra n ã o se
c o n fu n d a co m o C o n se lh o D e lib e ra tiv o , q u e é o ó rg ã o d e te n to r d a
titu la rid a d e d o se rv iç o d e sa n e a m e n to b á s ic o .
N a s re g iõ e s m e tro p o lita n a s d e sp ro v id a s d e q u a lq u e r ó rg ã o com
p e rs o n a lid a d e ju ríd ic a , a a p lic a ç ã o d o art. 8.°-B - b e m c o m o a d o art. 45,
§7.°, d o M a rc o L e g a l d o S a n e a m e n to B á sic o - e sta ria a d strita à
re s p o n sa b ilid a d e so lid á ria d e to d a s as p e sso a s q u e v ie re m a c o m p o r seu
ó rg ã o d e lib e ra tiv o , in c lu siv e os re p re se n ta n te s d a so c ie d a d e civ il, p o r
a n a lo g ia ao p rin c íp io d a re sp o n sa b ilid a d e ilim ita d a e so lid á ria n as
s o c ie d a d e s em co m u m , p re v is ta n o art. 990, d o C ó d ig o C ivil.
L o g o em seg u id a, e n c o n tra -se o u tro d isp o sitiv o v io la d o r de
n o rm a s m e tro p o lita n a s:

Art. 11-A. Na hipótese de prestação dos serviços públicos


de saneamento básico por meio de contrato, o prestador de
serviços poderá, além de realizar licitação e contratação de
parceria público-privada, nos termos da Lei n° 11.079, de
30 de dezembro de 2004, e desde que haja previsão
contratual ou autorização expressa do titular dos serviços,
subdelegar o objeto contratado, observado, para a referida
subdelegação, o limite de 25% (vinte e cinco por cento) do
valor do contrato.
[•••]
§ 4° Os Municípios com estudos para concessões ou
parcerias público-privadas em curso, pertencentes a
uma região metropolitana, podem dar seguimento ao

20 RIO DE JANEIRO. Lei Complementar n.° 184, de 27 de dezembro de 2018.


Dispõe sobre a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, sua composição, organização
e gestão, define as funções públicas e serviços de interesse comum, cria a autoridade
executiva da Região Metropolitana do Rio de Janeiro e dá outras providências.
Disponível em: http://www3.alerj.rj.gov.br/lotus_notes/default.asp?id=52&url=L2Nv
bnRsZWkubnNmL2E5OWUzMTdhOWNmZWMzODMwMzI1Njg2MjAwNzFmN
WQyLzE4NjVlMmM1NjVlMWU1NDc4MzI1ODNkMTAwNWRhOTlmP09wZW5
Eb2N1bWVudA==. Acesso em: 17 fev. 2021.

99
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

processo e efetivar a contratação respectiva, mesmo se


ultrapassado o limite previsto no caput deste artigo, desde
que tenham o contrato assinado em até 1 (um) ano.

O ra, se a c o m p e tê n c ia m u n ic ip a l so b re sa n e a m e n to b á sic o está


c o n d ic io n a d a à in stitu iç ã o de re g iã o m e tro p o lita n a , c o n fo rm e
e n te n d im e n to n a A D I n.° 1 .8 4 2 /R J, p o rta n to , ap ó s su a c ria ção , a
titu la rid a d e fic a a c a rg o d o ó rg ã o d e lib e ra tiv o fo rm a d o p e lo esta d o
fe d e ra d o , p e lo s m u n ic íp io s m e tro p o lita n o s e p e lo s re p re se n ta n te s d a
so c ie d a d e civil. A ssim , se os m u n ic íp io s p e rte n c e n te s a re g iõ e s
m e tro p o lita n a s d e ix a m d e ser titu la re s d o se rv iç o d e sa n e a m e n to b á sic o ,
lo g o , o art. 11-A , §4.°, v io la c o m p e tê n c ia co n stitu c io n a l, se g u n d o
e n te n d im e n to d o S u p rem o T rib u n a l F ed eral.
N o caso d a R eg ião M etropolitana do R io de Janeiro, existe previsão
expressa n a L ei C om plem entar n.° 184, de 27 de dezem bro de 2018, em
p erfeita h arm o n ia com as diretrizes m etropolitanas, cuja leitura é elucidativa:

Art. 27 A assunção das atribuições do Conselho


Deliberativo da Região Metropolitana em relação a
saneamento poderá ser parcialmente postergada, por
decisão do próprio Conselho, pelo prazo máximo de 04
(quatro) anos, a contar da data de entrada em vigor desta
Lei, com o objetivo de garantir a continuidade e a
qualidade dos serviços, observados o direito adquirido, o
ato administrativo perfeito e a coisa julgada, nos termos do
art. 5°, XXXVI, da Constituição da República.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não afasta a
possibilidade de imediata assunção dos serviços, quando
determinada pela ausência de soluções consensuais ou por
manifesta necessidade e interesse público.

D e m a is a m ais, é im p o rta n te re s sa lta r q u e a d e fin iç ã o dos


su b síd io s d e stin a d o s a u su á rio s de b a ix a re n d a, n o c a so de re g iõ e s
m e tro p o lita n a s, d e v e rá se r d e c id id a em su a in s tâ n c ia d elib erativ a :

100
Art. 31. Os subsídios destinados ao atendimento de
usuários determinados de baixa renda serão, dependendo
da origem dos recursos:
I - (revogado);
II - tarifários, quando integrarem a estrutura tarifária, ou
fiscais, quando decorrerem da alocação de recursos
orçamentários, inclusive por meio de subvenções; e
III - internos a cada titu lar ou entre titulares, nas
hipóteses de prestação regionalizada.
[ .]
Art. 45. As edificações permanentes urbanas serão
conectadas às redes públicas de abastecimento de água e
de esgotamento sanitário disponíveis e sujeitas ao
pagamento de taxas, tarifas e outros preços públicos
decorrentes da disponibilização e da manutenção da
infraestrutura e do uso desses serviços.
[•••]
§ 9° P ara fins de concessão da gratuidade prevista no § 8°
deste artigo, caberá ao titular regulamentar os critérios
para enquadramento das famílias de baixa renda,
consideradas as peculiaridades locais e regionais.

P o r fim , m as n ão m en o s im portante, cu m p re co n sig n ar q u e a


P o lítica F ed eral de S an eam en to B ásico, d en tro do d ip lo m a n o rm ativ o em
análise, está co n d icio n ad a à g estão p len a d a reg ião m etro p o litan a - art. 14,
caput, do E statu to d a M etrópole: (i) in stitu ição m ed ian te lei co m p lem en tar
estadual; (ii) estru tu ra de g o v ern an ça in terfed erativ a própria; e (iii) p lan o de
d esen v o lv im en to u rb a n o integrado ap ro v ad o m ed ian te lei estadual, nos
term o s do art. 2.°, III, do E statu to d a M etrópole.

Art. 50. A alocação de recursos públicos federais e os


financiamentos com recursos da União ou com recursos
geridos ou operados por órgãos ou entidades da União
serão feitos em conformidade com as diretrizes e objetivos
estabelecidos nos arts. 48 e 49 desta Lei e com os planos
de saneamento básico e condicionados:
[...]
§ 4° Os recursos não onerosos da União, para subvenção
de ações de saneamento básico promovidas pelos demais

101
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

entes da Federação, serão sempre transferidos para


Municípios, o Distrito Federal ou Estados.

Q u a n to às tra n sfe rê n c ia s m e n c io n a d a s n o art. 50, §4.°, estas


p ro v a v e lm e n te serão fe ita s à p e s s o a ju ríd ic a v in c u la d a ao ó rg ã o
d e lib e ra tiv o d a re g iã o m e tro p o lita n a e e n c a rre g a d a d e e x e c u ta r as
p o lític a s p ú b lic a s afe ta s ao sa n e a m e n to b ásico .
D e sse m odo, feitas as análises aos disp o sitiv o s m en cio n a d o s ao
lo n g o d este texto, p erceb e -se que alguns enunciados n o rm ativ o s incluídos
n o M arco L eg al do S an ea m e n to B ásico dev erão sofrer controle de
constitu cio n alid ade, o que d em o n stra a necessid ad e d a d ev id a atenção ao
te m a m etro p o litan o p o r p arte d a d o u trin a ju ríd ica, a fim de com patibilizá-lo
às recen tes alterações do ord en am en to ju ríd ic o brasileiro.
C o n clui-se, portanto, q u e de to d o s os dispositivos analisados, seis
d ev erão ser d eclarad o s inconstitucionais, o ra p o r u su rp a r co m p etên cia
m un icip al de in teresse local o ra p o r v io la r titu larid ad e do serviço de
san eam en to p o r p arte do órgão deliberativo m etropolitano. Isto posto,
con trariam a C o n stitu ição F ederal os seguintes enu n ciad o s no rm ativ o s
in tro d u zid o s n o M arco L eg al do S aneam ento B ásico: art. 3.°, VI, b; art.
3.°, VI, c; art. 8.°, §2.°; art. 8.°, §3.°; art. 11-A, §4.°; e art. 52, §3.°.
P o r o u tro lad o , alg u n s d isp o sitiv o s d o m e sm o d ip lo m a leg al
d e v e rã o so fre r c o n tro le d e c o n s titu c io n a lid a d e p o r m e io d a té c n ic a de
in te rp re ta ç ã o c o n fo rm e a C o n stitu iç ã o , a fim d e h a rm o n iz á -lo s ao re g im e
art. 3.°, XIV; art. 8.°,
ju ríd ic o d as re g iõ e s m e tro p o lita n a s, q u ais sejam :
II; art. 8.°-B; art. 31, III; art. 45, §7.°; art. 45, §9.°; art. 47, §1.°; art.
47, §2.°; e art. 50, §4.°.
A ssim , c o n sid e ra n d o q u e a c o m p e tê n c ia so b re sa n e a m e n to
b á s ic o fo i a q u e stã o c e n tral a n a lisa d a p e lo S u p re m o T rib u n a l F e d e ra l n a
A ç ã o D ire ta d e In c o n stitu c io n a lid a d e n.° 1 .8 4 2 /R J, em q u e se d e fin ira m
p a râ m e tro s p a ra a o rg a n iz a ç ã o d as re g iõ e s m e tro p o lita n a s, v islu m b ra -se
a n e c e s s id a d e d e in te rp re ta ç ã o d o M a rc o L eg a l d o S a n e a m e n to B á sic o à
lu z d o s p re c e ito s co n stitu c io n a is.

102
UNIVERSALIZAÇÃO DA REGULAÇÃO E OS DESAFIOS DO
NOVO MARCO DO SANEAMENTO

C a rlo s R o b e rto d e O liveira*

1 INTRODUÇÃO

A L e i F e d e ra l n° 11.445, d e 05 d e ja n e ir o d e 2 0 0 7 , in stitu iu as
d ire triz e s n a c io n a is p a ra o sa n e a m e n to b á sic o e p a ra a p o lític a F ed eral
d e sa n e a m e n to b á sic o , re p re se n ta n d o im p o rta n te in stru m e n to d e a v a n ç o
ju ríd ic o e d e te c n ic id a d e p a ra o se to r d e sa n e a m e n to b á sic o , cria n d o
re g ra s o b je tiv a s p a ra te m a s re c o rre n te m e n te a p o n ta d o s co m o
d e fic iê n c ia s se to ria is: p la n e ja m e n to , re g u la ç ã o e c o n tro le social.
N o to c a n te a o p la n e ja m e n to d a p re sta ç ã o d e se rv iç o s de
sa n e a m e n to (art. 19), su b m e te o m u n ic íp io à o b rig a ç ã o d e p la n e ja r suas
aç õ es n o â m b ito lo c a l (a tra v é s d o p la n o m u n ic ip a l d e s a n e a m e n to )1 ou
n o â m b ito re g io n a l (c o m o p la n o d e d e se n v o lv im e n to u rb a n o in te g ra d o -
P D U I)*12, em se tra ta n d o d e re g iõ e s m e tro p o lita n a s, a g lo m e ra d o s u rb a n o s
o u m ic ro rre g iõ e s. E m lin h a s g e ra is, o p la n e ja m e n to d o sa n e a m e n to
b á sic o , q u e se m p re te v e p o u c a a te n ç ã o d a A d m in istra ç ã o P ú b lic a , p a sso u
a fig u ra r c o m o e le m e n to e sse n cial p a ra o p ro c e sso d e c o n stru ç ã o d a
u n iv e rs a liz a ç ã o e d o se rv iç o ad eq u ad o .

*Doutor e Mestre pela Faculdade de Direito da USP. Pesquisador-Doutor da Escola Nacional


de Administração Pública - ENAP. Diretor da Agência Reguladora ARES-PCJ (SP).
1 O conceito de plano municipal de saneamento básico pode ser extraído da Portaria n°
118, de 14 de fevereiro de 2012, da Fundação Nacional da Saúde - FUNASA que define
como “O Plano Municipal de Saneamento Básico, nos termos da Lei n° 11.445, de 05
de janeiro de 2007 e Decreto n° 7.217, de 21 de junho de 2010, tem como diretrizes a
promoção da equidade social, o estímulo à adequada regulação dos serviços, o
planejamento com base em indicadores epidemiológicos e de desenvolvimento social,
a qualidade de vida e o desenvolvimento urbano e regional dentre outros fatores focados
na qualidade dos serviços, visando sua universalização”.
2 Cf. art. 12 da Lei Federal n° 13.089/2015 - Estatuto da Metrópole.

103
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

N o to c a n te ao a c o m p a n h a m e n to d a q u a lid a d e d o s se rv iç o s e
re g ra s ta rifá ria , q u e m u ita s d as v e z e s e sta v a m su b m e tid a s a d ec isõ e s
m e ra m e n te p o lític a s e sem e stu d o s cla ro s q u e a v a lia sse m as re ais
n e c e s s id a d e d e u n iv e rs a liz a ç ã o e d e m e lh o ria s, a n o rm a F e d e ra l in o v a e
su b o rd in a o p re s ta d o r a o s a c o m p a n h a m e n to s té c n ic o s e e c o n ô m ic o s de
u m a a g ê n c ia re g u la d o ra in d e p e n d e n te 3.
O m o d elo ju ríd ico de regulação dos serviços públicos de
saneam ento b ásico difere d a estruturação de outros m ercados e serviços
públicos regulados, em especial p ela titularidade m unicipal para os serviços
de água, esgotam ento sanitário, resíduos sólidos e drenagem pluvial urbana.
E sse reconhecim ento advém do próprio texto constitucional, p o r
interpretação de interesse local p ara os serviços de saneam ento b ásico (art.
30, I, d a C o n stituição F ederal), com exceção das hipóteses em que o
M un icíp io integre região m etropolitana, aglom erado urbano ou m icrorregião,
o que tran sfo rm a a titularidade local em titularidade com partilhada com os
dem ais integrantes d a região m etropolitana e com o E stado4.
A titu la rid a d e m u n ic ip a l p o s s ib ilita v a ria d a s fo rm a s ju ríd ic a s
p a ra os re g u la d o re s in fra n a c io n a is 5, c o m o d e sta c a F lo ria n o d e A z e v e d o
M a rq u e s N e to 6:

3 Cf. art. 21 e seguintes da Lei Federal n° 11.445/2007.


4 Cf. ADI 1.842/RJ - Supremo Tribunal Federal, publicada em 16/09/2013.
5 A nomenclatura infranacional tem sido adotada para designar as agências reguladoras que
não foram criadas pela União. São as agências reguladoras de saneamento básico, que
podem ser constituídas no âmbito do município (agências municipais), por união de
municípios formando consórcios públicos (agências intermunicipais) ou no âmbito do
Estado da Federação (agências estaduais). Essa particularidade na modelagem da agência
decorre da titularidade municipal dos serviços públicos de saneamento básico e teve
tratamento disciplinado pelo art. 31 do Decreto Federal n° 7.217/2010. A tese da titularidade
municipal dos serviços de saneamento básico resulta de interpretação do art. 30, inc. V, da
Constituição Federal, segundo o qual: “Compete aos Municípios: [...] V - organizar e
prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de
interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial; [...]”
6 MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. A regulação no setor de saneamento. In:
CORDEIRO, B. S. (coord.). Lei Nacional de Saneamento Básico: perspectivas para

104
Importante lembrar que a Lei abre várias alternativas de
configuração do ente que exercerá a regulação. A mais
importante, pelo seu caráter inovador, talvez seja a delegação
das competências regulatórias pelo titular do serviço para um
ente de administração indireta de outra esfera da federação. É
o que vem previsto no § 1° do art. 23. Por este dispositivo,
alguns requisitos devem ser observados. O primeiro requisito
é que a entidade reguladora delegatária pertença à
administração indireta de um ente situado dentro dos limites
territoriais do estado. Isso significa que, sendo os serviços de
saneamento municipais, o poder local poderá delegar a
regulação para um ente de outro município do mesmo estado,
para um consórcio de municípios situados nos lindes
estaduais ou para ente regulador do respectivo estado.
Remanescería a dúvida quanto a saber se poderia haver
delegação da regulação de um município para um ente da
administração Federal. Na minha opinião, isto não se põe
conveniente ou legalmente possível. É inconveniente porque
a regulação do saneamento pressupõe proximidade com as
circunstâncias locais (urbanísticas, ambientais, sociais) que
são incompatíveis com um ente de abrangência mais ampla.
É legalmente inviável, pois, do ponto de vista legal, interpreto
o art. 23, § 1° (“entidade reguladora constituída dentro dos
limites do respectivo Estado”) de forma a excluir os entes da
administração Federal, pois ela é constituída com limites
obviamente mais amplos do que os estaduais.

E m q u e p e se a re g u la ç ã o c o n sta r c o m o o b rig a ç ã o a trib u íd a aos


m u n ic íp io s p e la L ei F e d e ra l n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , a in d a e n fre n ta d e sa fio s p a ra
a su a co n so lid a ç ã o , co m o se v e rá ad ian te.
O u tro av an ço fo i a particip ação d a sociedade n o saneam ento
básico , n o m in ad a p ela L e i co m o controle social, q u e d ev e ser entendido
co m o o ac o m p an h am en to e v erificação das ações e m etas d a g estão p ú b lica
n a ex ecu ção das po líticas públicas, através d a av aliação dos objetivos,
p ro cesso s e resu ltad o s. O m o d elo de aco m p a n h am en to d a sociedade está
ex p o sto n o art. 47 d a P o lítica N acio n al d e S an eam en to B ásico.

as políticas e gestão dos serviços públicos. Brasília: Secretaria Nacional de Saneamento


Ambiental, 2009. v. 1, p. 179-180.

105
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A p ro p o sta foi e lo g ia d a d e sd e o seu in íc io em v irtu d e d a tím id a


tra n s p a rê n c ia p a ra os ato s de g e stã o no san e am en to , já que,
h isto ric a m e n te , e x iste u m d é fic it d e p a rtic ip a ç ã o so cial n a fo rm u la ç ã o e
fis c a liz a ç ã o d as p o lític a s p ú b lic a s d e sa n e a m e n to b á sic o .
O p ro c e sso d e a m p la tra n s p a rê n c ia e a in se rç ã o d o s u su á rio s e
d o s c id a d ã o s n a d isc u ssã o d o s ru m o s d o sa n e a m e n to a in d a c a re c e m de
a p rim o ra m e n to s, p o ré m , o c u rso e a ro ta d as aç õ es m e re c e m elo g io s.
C o m a L ei n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 e o seu D e c re to re g u la m e n ta d o r
tiv e m o s o in íc io d e u m ciclo v irtu o so d e m u d a n ç a s n o setor, co m a b u s c a
p e la p ro fis s io n a liz a ç ã o - em c o n tra p o n to à a n te rio r p o litiz a ç ã o - ,
in s tru m e n to s p a ra h a rm o n ia e n tre o p la n e ja m e n to e a re g u la ç ã o d a
p re s ta ç ã o d e ste s se rv iç o s p ú b lic o s e o c o n tro le so cial p a ra g a ra n tir a
tra n s p a rê n c ia d as ações.
M e s m o em p ro c e sso d e co n so lid a ç ã o , a P o lític a N a c io n a l de
S a n e a m e n to B á sic o foi a lv o d e u m a g ra n d e c a m p a n h a d e re v isã o , e o
p ro p ó s ito e ra re v is ita r m u ito s p o n to s d a L e i F e d e ra l n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ,
sen d o d e n o m in a d o d e “ n o v o m a rc o re g u la tó rio d o sa n e a m e n to b á s ic o ” .
A id e ia d e re v isã o d a n o rm a fra c a sso u em d u as o p o rtu n id a d e s:
co m a M e d id a s P ro v isó ria s n° 844, d e 06 d e ju lh o de 2018 e,
p o ste rio rm e n te , co m a M e d id a P ro v is ó ria n° 868, d e 2 7 d e d e z e m b ro de
2 0 1 8 , q u e p e rd e ra m v ig ê n c ia p o r fa lta d e co n se n so .
A p ó s m u ita s n e g o c ia ç õ e s n a C â m a ra e S en ad o , o te x to do
P ro je to d e L ei - P L n° 4 .1 6 2 /2 0 1 9 foi a p ro v a d o , co m a d e c o rre n te san ç ão
d a L ei F e d e ra l n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , q u e a lte ro u s ig n ific a tiv a m e n te a L ei
F e d e ra l n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 .
A s alte ra ç õ e s tra z id a s c o m a L ei tro u x e ra m sig n ific a tiv a s
m udanças em p ila re s já c o n so lid a d o s na P o lític a N a c io n a l de
S an ea m e n to , q u e p o d e m ser d iv id id a s em trê s b lo c o s d e c o n te ú d o
n o rm a tiv o , e n te n d id o s co m o : i) N o v a s a trib u iç õ e s re la tiv a s a re c u rso s
h íd ric o s p a ra a A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s (q u e p a ssa a se r n o m in a d a
c o m o A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to B á sic o ); ii) D e le g a ç ã o
d e c o m p e tê n c ia s p a ra e d iç ã o d e n o rm a s d e re fe rê n c ia re la tiv a s à

106
re g u la ç ã o d o sa n e a m e n to b á sic o à A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e
S a n e a m e n to B á sic o ; e iii) R e g ra m e n to s re fe re n te s à c o n tra tu a liz a ç ã o d a
p re s ta ç ã o d e se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á s ic o , co m d e sta q u e p a ra a
fo rm a ç ã o d e b lo c o s re g io n a is 7 p a ra g a n h o d e e sc a la 8.
N e sse cenário ainda de grande acom odação dos novos conceitos
ju ríd ico s é g estado o presente artigo, com o propósito de aprofundar o debate
em relação ao papel do ente regulador infranacional n a nova form atação do
setor, com especial ênfase para a u niversalização da regulação.

2 A REGULAÇÃO COMO POLÍTICA PÚBLICA INDUTORA


DE SEGURANÇA JURÍDICA, PREVISIBILIDADE E
TECNICIDADE PARA O SANEAMENTO BÁSICO

A re g u la ç ã o c h e g a ta rd ia m e n te ao sa n e a m e n to b á s ic o - ao
c o n trá rio de o u tro s se rv iç o s re g u la d o s, com o e n e rg ia e lé tric a e
te le c o m u n ic a ç õ e s - , n o ta d a m e n te p e la o p ç ã o c o n stitu c io n a l c o n sa g ra d a
d e re c o n h e c e r ao se rv iç o d e sa n e a m e n to b á sic o a titu la rid a d e lo cal, com
d e c isã o m u n ic ip a l n a e sc o lh a d o p re s ta d o r (art. 175 d a C o n stitu iç ã o
F e d e ra l) e a d e fin iç ã o d o re g u la d o r q u e d e v e fa z e r o a c o m p a n h a m e n to e
fis c a liz a ç ã o d e sse s se rv iç o s (art. 31 d o D e c re to F e d e ra l n° 7 .2 1 7 /2 0 1 0 ).
M esm o d ia n te de c rítica s d ire c io n a d a s ao s re g u la d o re s
in fra n a c io n a is, em e sp e cial p e la fa lta d e p a d ro n iz a ç ã o re g u la tó ria -
c la s s ific a d a c o m o in se g u ra n ç a ju ríd ic a - , d e v e m o s d e sta c a r q u e a

7 Nesse sentido o Decreto Federal n° 10.588/2020: “Art. 2°. A prestação regionalizada


de serviços de saneamento visa à geração de ganhos de escala e à garantia da
universalização e da viabilidade técnica e econômico-financeira dos serviços, com
uniformização do planejamento, da regulação e da fiscalização” .
8 A ideia de ganho de escala com agrupamento de município para prestação
regionalizada tem sido incentivada e bastante estudada, sendo um dos fomentadores o
Banco Mundial. Cf. WORLD BANK GROUP. 2017. Joining Forces for Better
Services: when, why, and how water and sanitation utilities can benefit from working
together. World Bank, Washington, DC. Disponível em: https://openknowledge.world
bank.org/handle/10986/28095. Acesso em: 13 maio 2021.

107
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

re g u la ç ã o d o sa n e a m e n to é in stru m e n to a b so lu ta m e n te p o sitiv o . A
re g u la ç ã o in d e p e n d e n te tro u x e te c n ic id a d e , tra n s p a rê n c ia e c o n tro le
so cial p a ra u m se to r h is to ric a m e n te d e sre g u la m e n ta d o e p a u ta d o em
d e c isõ e s lo c a is e p o lítica s.
N e s s e s e n tid o , p r e o c u p o u -s e a L e i em a s s e g u ra r g a r a n tia s
in s titu c io n a is ao r e g u la d o r in fra n a c io n a l, com o in d e p e n d ê n c ia
d e c is ó ria , a u to n o m ia f in a n c e ira e m a n d a to fix o a o s s e u s d irig e n te s ,
c o m v is ta s a e n f re n ta r te m a s s e n s ív e is , n o ta d a m e n te n a s p o lític a s
ta r if á r ia s e q u a lid a d e d o s s e rv iç o s p ú b lic o s , q u e tê m im p a c to d ire to
n o s u s u á r io s - c o n s u m id o r e s .
H á d e se d e sta c a r, ain d a, q u e a o b rig a to rie d a d e d e in d ic a ç ã o de
re g u la d o r p a ra o c o n tra to (art. 11, III, d a L e i F e d e ra l n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ) ou
p a ra a p re s ta ç ã o d ire ta d o s serv iç o s, a tra v é s d e a u ta rq u ia o u se c re ta ria
m u n ic ip a l (art. 8°, §5°, d a L ei F e d e ra l n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ), serv e p a ra
in c re m e n ta r se g u ra n ç a ju ríd ic a e e sta b ilid a d e às re la ç õ e s e x iste n te s n o s
se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b á sic o , q u e são p re sta d o s em re g im e de
m o n o p ó lio 9 n a tu ra l10 e p re sc in d e m de su p e rv isã o re g u la tó ria ,
in d e p e n d e n te m e n te d o m o d e lo ju ríd ic o d e p re sta ç ã o - se p e lo p riv a d o ou
p e lo p o d e r p ú b lico .

9 Nos dizeres de Carlos Roberto de Oliveira: “Enquanto delegatária de atribuições


inerentes ao poder público, a concessionária submete-se a um regime rígido de deveres,
que devem ser pautados sempre pela continuidade dos serviços. Evidente que grande
parte do atrativo para a empreitada das empresas em tais atividades é a interessante
retribuição por atuar em ramo de atividade - na maioria dos casos -, acobertada pela
exploração de atividades estatal em regime de monopólio natural, o que incentiva
muitos a assumirem o risco de operação”. Cf. OLIVEIRA, Carlos Roberto de.
Contratos de concessão e terceirização: tensões entre o público e o privado. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2020, p. 30.
10 Os monopólios naturais, como ressalta Richard Posner: “ [...] tem relação direta com
a tecnologia de produção, pois a redução do custo da tecnologia ou mesmo sua
modificação é capaz de minorar os efeitos da economia de escala, possibilitando a
quebra do monopólio”. Cf. POSNER, Richard. Natural monopoly and its regulation.
Washington: Cato Institute, 1999. p. 1.

108
P o r fim , a re g u la ç ã o in c re m e n ta p re v isib ilid a d e e te c n ic id a d e n a
m e d id a em q ue, d ia n te d o seu p o d e r n o rm a tiv o 11, re c o n h e c id o p e lo art.
23 d a L ei F e d e ra l n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , cria re g ra s se to ria is e im p õ e p a d rõ e s
e re g u la m e n ta ç õ e s até en tã o in ex isten tes.

3 A UNIVERSALIZAÇÃO DA REGULAÇÃO

À p rim e ira v is ta o te m a d a d e fin iç ã o d o e n te re g u la d o r p o d e


p a re c e r u m a d isc u ssã o e x te m p o râ n e a , j á q u e p a s s a d a m a is d e u m a
d é c a d a d e sd e a ed iç ã o d a L ei d as D ire triz e s N a c io n a is p a ra o
S a n e a m e n to B á sico . O te m a , in fe liz m e n te é b a s ta n te atu al, p o is m u ito s
m u n ic íp io s a in d a n ã o d isp õ e m d e a g ê n c ia re g u la d o ra in fra n a c io n a l
in d e p e n d e n te e d e ix a m d e a te n d e r ao c o m a n d o d a L ei F e d e ra l n°
1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , o q u e to rn a a d isc u ssã o d o a ssu n to atu al e o b rig ató ria .
O s re c e n te s d e b a te s q u e e n v o lv e ra m o n o v o m a rc o re g u la tó rio
d o sa n e a m e n to b á s ic o se m p re d e sta c a ra m a re le v â n c ia d e p a d ro n iz a ç ã o
d as p rá tic a s n o rm a tiv a s dos e n tes re g u la d o re s in fra n a c io n a is,
e n c a rre g a n d o a A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to B á sic o -
A N A d o s esfo rç o s p a ra a u n id a d e n o rm a tiv a n ac io n a l, d o ta n d o a
so c ie d a d e d e s e g u ra n ç a ju ríd ic a e p re v isib ilid a d e . 1

11 Destacam Wladimir Antônio Ribeiro e Ivan César Ribeiro11: “[...] a posição hoje
hegemônica é a que reconhece o poder normativo das agências, entendendo que a
Constituição permite à lei reconhecer essa competência. Não se confunde o poder
regulamentar, do chefe do Poder Executivo, com a competência de editar normas,
muitas delas de conteúdo técnico ou previstas em contratos ou outros instrumentos. A
lei genérica e abstrata do constitucionalismo clássico é insuficiente para os desafios
sociais e econômicos atuais, sendo natural que se reconheça a órgãos do Executivo o
poder de editar normas que completem o seu sentido, inclusive garantindo que
alcancem eficácia”. Cf. RIBEIRO, Wladimir Antônio; RIBEIRO, Ivan César. Análise
de impacto regulatório no Brasil. Migalhas, 21 set. 2010. Disponível em:
http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI117582,31047- Analise+de+impacto+regu
latorio+no+Brasil. Acesso em: 20 maio 2021.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

E n tre ta n to , te m a d e p o u c a v isib ilid a d e e n e g lig e n c ia d o n o s


d e b a te s d o s ú ltim o s an o s foi a b a ix a a d e sã o b ra s ile ira à re g u la ç ã o do
sa n e a m e n to b ásico .
E s ta tístic a p o u c o e x p lo ra d a e co m re la tiv a fa lta d e p re c isã o
n u m é ric a , a p o n ta q u e a p ro x im a d a m e n te 1.700 m u n ic íp io s 12 b ra sile iro s
a in d a n ã o c o n ta m co m u m e n te re g u la d o r p a ra fis c a liz a r e n o rm a tiz a r a
p re s ta ç ã o d e se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b á s ic o (á g u a , esg o to ,
re s íd u o s só lid o s e d re n a g e m u r b a n a 13). E m se tra ta n d o d e re g u la ç ã o
e sp e c ífic a d e se rv iç o s d e re síd u o s só lid o s a a u sê n c ia d e re g u la ç ã o está
p ró x im a d e 9 9 % d as cid a d e s b ra sile ira s, co m ra ríssim o s casos.
A fa lta d e a d e sã o à re g u la ç ã o n ã o e stá lig a d a à d e se stru tu ra ç ã o ,
ta m p o u c o à fa lta d e re c u rso s fin a n c e iro s d o E s ta d o o u d o s M u n ic íp io s,
p o is te m o s c a so s em b le m á tic o s, c o m o o c o rre co m o E sta d o d e S ã o P au lo ,
q u e so m a m a is d e 2 5 0 cid a d e s q u e n ã o tê m e n te re g u la d o r p a ra o
sa n e a m e n to b á sic o , o u seja, q u a se 4 0 % d o E sta d o m a is d e se n v o lv id o d a
n a ç ã o sem e n tid a d e té c n ic a d e re g u la ção .
A d e m a is, a q u e stã o d a b a ix a a d e sã o à in d ic a ç ã o d a re g u la ç ã o
n ã o está lig a d a so m e n te a o d e sin te re sse p e lo c u m p rim e n to d e u m a
n o rm a , e se m p re ex istiu d e b a te ju ríd ic o - a n o sso v e r d e fácil su p eraçã o
- , q u e q u e s tio n a v a a v ia b ilid a d e d e re g u la ç ã o p a ra os ca so s d e p re sta ç ã o
d o s se rv iç o s d e fo rm a d ire ta (p o r S e c re ta ria o u D e p a rta m e n to ) o u p o r
en te d a A d m in istra ç ã o In d ire ta d o p ró p rio P o d e r P ú b lic o (a tra v é s de
a u ta rq u ia o u e m p re sa p ú b lic a )14.

12 Nesse sentido, conferir: OLIVEIRA, Carlos Roberto de. A regulação infranacional e


o novo marco regulatório. In: OLIVEIRA, Carlos Roberto de; GRANZIERA, Maria
Luiza Machado (org.). Novo marco do saneamento básico no Brasil. São Paulo:
Editora Foco, 2021, p. 75-77.
13 Cf. art. 3°, da Lei Federal n° 11.445/2007.
14 Ao discorrer sobre a hipótese de regulação de prestadores públicos de serviços
públicos, destaca André Saddy: “É certo que tal modelo possui vantagens em relação
àqueles em que o ente se autorregula sozinho, afinal, é uma pessoa externa em
comparação com o prestador que impõe, restringe e permite determinadas condutas.
Mas é bem verdade que esse tipo de regulação não costuma surtir efeito satisfatório à
população. O problema dessa forma de regulação é que a Administração direta não

110
P o r e ssa ló g ica, m u ito s eram os d e fe n so re s d e q u e a re g u la ç ã o
p ú b lic a so m e n te c a b e ria d ia n te d e u m a d e le g a ç ã o d e u m a a tiv id a d e
estata l, a tra v é s d e co n tra to , p a ra u m a e m p re sa p riv a d a (c o n c e ssio n á ria ).
N e ss e sen tid o , o P o d e r P ú b lic o (C o n c e d e n te ) tra n s fe re e d e le g a ao
p riv a d o a p re sta ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s p o r d e te rm in a d o p e río d o
(m e d ia n te c o n tra to d e c o n c e ssã o ) e re s e rv a p a ra si a fisc a liz a ç ã o d a
q u alid ad e , d as m e ta s e re q u isito s fin a n c e iro s, o q u e se fa z p o r en tid a d e
re g u la d o ra , d o ta d a d e in d e p e n d ê n c ia d e c isó ria e a u to n o m ia 15.
R e s p e ita d a s as p o siç õ e s d e fe n d id a s, a te se se m p re n o s p a re c e u
e q u iv o c a d a , p o is d á a im p re ssã o q u e a re g u la ç ã o d o sa n e a m e n to só d ev e
o c o rre r em c o n tra to s, d e sp re z a n d o q u e o v e rd a d e iro o b je tiv o d a L e i é
in s titu ir u m a p o lític a p ú b lic a p a ra a p rim o ra m e n to d o sa n e a m e n to
b á s ic o 16, co m fisc a liz a ç ã o d o s serv iço s, m e ta s a serem o b se rv a d a s e c la ra
p o lític a ta rifá ria , p e n sa d a p a ra a c e sso ao s m a is p o b re s, p o ré m com

possui a especialização técnica devida e, pior, é titularizada por agentes políticos, o que,
em muitos casos, ocasiona uma grande instabilidade e pouca racionalidade ao setor
regulado. E tal ocorrência costuma levar a uma incapacidade de predizer cenários e de
desenhar políticas e diretrizes. Em suma, o mercado regulado pela Administração
direta, em geral, fica sem instrumentos de coordenação e de controle e, por isso, acaba
por possibilitar abuso dos prestadores”. Cf. SADDY, André. Regulação do saneamento
básico: obrigatoriedade da existência de uma entidade que preste e outra que regule e
fiscalize os serviços de saneamento básico. In: SADDY, André; CHAUVET, Rodrigo
da Fonseca (Coord.). Aspectos jurídicos do saneamento básico. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2017, p. 140-141.
15 Cf. art. 21, da Lei Federal n° 11.445/2007.
16 Tais dificuldades são realçadas por Carlos Ari Sundfeld: “Em outra oportunidade,
deixei registrada a complexidade da regulação do setor apontando para três aspectos:
“(a) as enormes externalidades (positivas e negativas) dos serviços de saneamento
ambiental, que tornam dificultoso seu tratamento como atividade meramente
econômica; (b) o fato de estarem envolvidas atividades indivisíveis, dificultando a
delegação da prestação diretamente ao usuário final; e (c) as peculiaridades na definição
do ente público titular do serviço”. Cf. SUNDFELD, Carlos Ari. As parcerias público-
privadas no saneamento ambiental, In: SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Parcerias
Público-Privadas. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 311.

111
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

e v id e n te eix o d e su ste n ta b ilid a d e p a ra os in v e stim e n to s n e c e ssá rio s à


u n iv e rs a liz a ç ã o e m e lh o ria d o s siste m a s e x is te n te s 17.
P e n s a r a re g u la ç ã o n ã o a p e n a s p a ra os c o n tra to s, m a s p a ra a
p re s ta ç ã o dos se rv iç o s p ú b lic o s de sa n e a m e n to b á sic o -
in d e p e n d e n te m e n te d a m o d e la g e m ju ríd ic a a d o ta d a p a ra a p re sta ç ã o dos
serv iç o s, se p ú b lic a o u p riv a d a - p re ssu p õ e re c o n h e c e r u m a u n id a d e de
a tu a ç ã o p a ra to d o s os b ra sile iro s, g a ra n tin d o q u e os se rv iç o s sejam
re g u la d o s e fisc a liz a d o s, co m ta rifa s té c n ic a s, e n ã o d e c isõ e s p o lític a s e
ele ito re ira s, o q u e ta n to se alm eja.
N e ss e sen tid o , a e x p re ssã o q u e c u n h a m o s e ta n to d e fe n d e m o s
n o s ú ltim o s anos, a c h a m a d a “u n iv e rs a liz a ç ã o d a re g u la ç ã o ” , foi
a te n d id a p e lo n o v o m a rc o re g u la tó rio e in s e rid a co m a L e i F e d e ra l n°
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , a tra v é s d o §5° d o art. 8°:

Art. 8° [...]
§ 5° O titular dos serviços públicos de saneamento básico deverá
definir a entidade responsável pela regulação e fiscalização
desses serviços, independentemente da modalidade de sua
prestação. (Incluído pela Lei n° 14.026, de 2020).

Sob e ssa n o v a p e rsp e c tiv a , co m v ista s ao a p rim o ra m e n to d a


p o lític a p ú b lic a d e re g u la ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to
b á sic o , p a s s a a se r o b rig a ç ã o d e to d o m u n ic íp io b ra sile iro e s c o lh e r18 o

17 Na avaliação de Verônica Cruz: “A instauração de aparato regulatório capaz de


prevalecer sobre os vícios detectados anteriormente na administração pública ganhou
corpo e assim as agências se multiplicaram e, atualmente no Brasil, controlam os mais
distintos setores, de audiovisual a vigilância sanitária, passando por telecomunicações,
saúde, energia e transportes”. Cf. CRUZ, Verônica. Estado e regulação: fundamentos
teóricos. In: RAMALHO, Pedro Ivo Sebba (Org.) Regulação e agências reguladoras:
governança e análise de impacto regulatório, Brasília: Anvisa, 2009. p. 56.
18 Nos termos do art. 31 do Decreto Federal n° 7.217/2010, foi definido: “As atividades
administrativas de regulação, inclusive organização, e de fiscalização dos serviços de
saneamento básico poderão ser executadas pelo titular: I - diretamente, mediante órgão
ou entidade de sua administração direta ou indireta, inclusive consórcio público do qual
participe; ou, II - mediante delegação, por meio de convênio de cooperação, a órgão ou

112
en te re g u la d o r p a ra os seu s se rv iç o s p ú b lic o s d e ág u a, e sg o to , re síd u o s
só lid o s e d re n a g e m u rb a n a , in d e p e n d e n te m e n te d a m o d e la g e m da
p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s - se g e re n c ia d o s p e lo p ú b lic o o u p e lo p riv ad o .
O d e sa fio p a ra a u n iv e rs a liz a ç ã o d a re g u la ç ã o está p o sto ,
c a b e n d o a g o ra u m a p o lític a d e in c e n tiv o s e d e e sc la re c im e n to s so b re as
b e n é fic a s aç õ es q u e serão d e se n c a d e a d a s co m a e sc o lh a d e u m ó rg ã o
té c n ic o e in d e p e n d e n te p a ra a c o m p a n h a m e n to d o s serviços.
E sp e ra -se , co m a re g io n a liz a ç ã o d a p re sta ç ã o d o s serv iç o s
p ú b lic o s, q u e m u ito s m u n ic íp io s - sem q u a lq u e r e sp é c ie d e re g u la ç ã o
d e fin id a - b u s q u e m a d e rir à re g u la ç ã o , p o r m e io d e co n v ê n io d e g e stã o
a ss o c ia d a co m a a g ê n c ia re g u la d o ra estad u a l o u p o r m e io d e co n só rc io
p ú b lic o d e re g u la ç ã o fo rm a d o p o r m u n ic íp io s p e rte n c e n te s ao m e sm o
e sta d o d a fe d e ra ç ã o , p o ssib ilita n d o a g e ra ç ã o d e g a n h o s d e e sc a la e a
g a ra n tia d a u n ifo rm iz a ç ã o d as fu n ç õ e s a d m in istra tiv a s d a re g u la ç ã o e d a
fis c a liz a ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b ásico .

4 O S D E S A F IO S R E G U L A T Ó R IO S D O N O V O M A R C O D O
SANEAM ENTO

C o m o d e sta c a d o , a p re rro g a tiv a d e in d ic a ç ã o d o e n te re g u la d o r


in fra n a c io n a l p o r p a rte d o E x e c u tiv o M u n ic ip a l se d á p e lo c o m a n d o
c o n s titu c io n a l19 q u e d e fin e o M u n ic íp io c o m o titu la r (re sp o n sá v e l) p e la s
p o lític a s p ú b lic a s lo c a is v in c u la d a s ao sa n e a m e n to b á sic o . N e sse se n tid o
d isp õ e a P o lític a N a c io n a l d e S a n e a m e n to B á sic o :

entidade de outro ente da Federação ou a consórcio público do qual não participe,


instituído para gestão associada de serviços públicos”.
19 A competência legislativa para instituir “diretrizes para o desenvolvimento urbano,
incluindo habitação, saneamento básico e transporte urbano” pertence à União,
conforme art. 21, inc. XX, da Constituição Federal; já no tocante à titularidade e
execução de serviços públicos de interesse local, conforme art. 30, inc. IV, da Carta
Magna, é de competência o Município, notadamente para: “organizar e prestar,
diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse
local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial”.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

Art. 9° O titular dos serviços formulará a respectiva política


pública de saneamento básico, devendo, para tanto:
[ .]
II - prestar diretamente ou autorizar a delegação dos
serviços e definir o ente responsável pela sua regulação e
fiscalização, bem como os procedimentos de sua atuação.

D ia n te d e ssa m o d e la g e m d e c o m p e tê n c ia s, c a b e ao M u n ic íp io -
T itu la r e le g e r o m o d e lo m a is a d e q u a d o 20 p a ra a fo rm a ta ç ã o ju ríd ic a do
seu en te re g u la d o r21, p o d e n d o o p ta r p o r u m a a u ta rq u ia m u n ic ip a l
(a u ta rq u ia in te g ra n te d a a d m in istra ç ã o in d ire ta d o M u n ic íp io ), p o r
in te g ra r u m a a g ê n c ia d e a tu a ç ã o re g io n a l, co m fo rm a to d e co n só rc io
p ú b lic o d e d ire ito p ú b lic o , c o n fig u ra n d o u m a a u ta rq u ia in te rfe d e ra tiv a
(c o n fo rm e L e i F e d e ra l n° 1 1 .1 0 7 /2 0 0 5 ) o u atra v é s d e co n v ê n io de
c o o p e ra ç ã o co m e n te re g u la d o r estad u a l (ta m b é m re sp a ld a d o p e la L ei
F e d e ra l n° 1 1 .1 0 7 /2 0 0 5 ).
A liá s , c o n s id e r a -s e c o m o e n tid a d e d e re g u la ç ã o , q u a lq u e r
ó rg ã o ou e n tid a d e d e d ire ito p ú b lic o q u e p o s s u a c o m p e tê n c ia s

20 Rememora, com precisão, Ricardo Dip: “Não há um tipo uniforme ou modelo de ente
regulador no direito brasileiro vigente, e ausência de previsão da natureza jurídica do
instituto empolgou ao ponto de pretender-se admiti-lo sob o regime de uma pessoa
jurídica de direito privado, ou seja, ao modo de uma descentralização social ou até a
privatização. A experiência foi repulsada pelo STF (no julgamento plenário da ADI
1.717), que, declarando a inconstitucionalidade de vários dispositivos da Lei
9.649/1998, assentou conclusão no sentido da indelegabilidade, a uma entidade
privada, de atividade típica do Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e
de punir”. Cf. DIP, Ricardo Henry Marques. Os entes reguladores estaduais e
municipais no Brasil. In: FREITAS, Vladimir Passos de; SILVA, Fernando Quadros
da (coord.). Agências reguladoras no direito brasileiro. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2014, p. 294.
21 Preconiza o art. 31 do Decreto Federal n° 7.217/2010 (que regulamentou a Lei
Federal n° 11.445/2007): “As atividades administrativas de regulação, inclusive
organização, e de fiscalização dos serviços de saneamento básico poderão ser
executadas pelo titular: I - diretamente, mediante órgão ou entidade de sua
administração direta ou indireta, inclusive consórcio público do qual participe; ou, II -
mediante delegação, por meio de convênio de cooperação, a órgão ou entidade de outro
ente da Federação ou a consórcio público do qual não participe, instituído para gestão
associada de serviços públicos”.

114
p ró p r ia s d e n a tu re z a re g u la tó ria , in d e p e n d ê n c ia d e c is ó r ia e n ã o
a c u m u le fu n ç õ e s d e p r e s ta d o r d o s s e rv iç o s re g u la d o s (in c is o IV , art.
2°, d o D e c re to n° 7 .2 1 7 /2 0 1 0 )22.
P o rta n to as e n tid a d e s re g u la d o ra s c o n tin u a m sen d o d e fin id a s
p o r le g is la ç ã o d o titu la r, p o d e n d o in c lu siv e o e x e rc íc io d a fu n ç ã o
re g u la d o ra e fis c a liz a d o ra d a p re sta ç ã o d o serv iç o p ú b lic o d e sa n e a m e n to
b á s ic o se r d e le g a d a p a ra e n tid a d e re g u la d o ra d e o u tro e n te d a fe d e ra ç ã o ,
e n o ca so d e g e stã o a sso c ia d a o u p re sta ç ã o re g io n a liz a d a d o s serv iço s,
os titu la re s p o d e rã o a d o ta r os m e sm o s c rité rio s e c o n ô m ic o s, so ciais e
té c n ic o s d a re g u la ç ã o em to d a a á re a d e a b ra n g ê n c ia d a a sso c ia ç ã o o u d a
p re s ta ç ã o (art. 2 4 d a L N S B ), ra z ã o p e la qual p o d e rã o c o e x istir m a is de
u m a a g ê n c ia re g u la d o ra atu an d o , n o â m b ito d a m e s m a p re sta ç ã o
re g io n a liz a d a d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b ásico .
C o m o a d v e n to d a L ei F e d e ra l n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , a c o m p e tê n c ia
m u n ic ip a l p a ra a e sc o lh a d o en te re g u la d o r in fra n a c io n a l foi re fo rç a d a -
a p e n a s re s e rv a d a a e x c e ç ã o d a re g io n a l m e tro p o lita n a , co m titu la rid a d e
c o m p a rtilh a d a - , p o ré m alg u n s c e n á rio s fu tu ro s p o d e m ser p ro je ta d o s
sob a p e rs p e c tiv a d o n o v o m arco.
O p rim e iro c e n á rio é q u e os c o n c e ito s d e g a n h o de e sc a la e de
re g io n a liz a ç ã o p a ra p re sta ç ã o d o s se rv iç o s te n d e m a e n fra q u e c e r o
m o d e lo m u n ic ip a l d e p re sta ç ã o e re g u la ç ã o , j á q u e as le is o rd in á ria s
e sta d u a is cria m u n id a d e s re g io n a is (art. 8°, §2°, d a L ei F e d e ra l n°
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 ) e p re stig ia m p la n e ja m e n to e p re sta ç ã o d e se rv iç o s com
g a n h o d e esc ala. A te n d ê n c ia n a tu ra l será a c o n so lid a ç ã o d a s a g ê n c ia s
re g u la d o ra s esta d u a is e o c re sc im e n to s ig n ific a tiv o d e c o n só rc io s
p ú b lic o s p a ra a tu a ç ã o n a s u n id a d e s re g io n a is, em su a c o n d iç ã o de
a u ta rq u ia s in te rfe d e ra tiv a s.

22 Logo, as entidades reguladoras continuam sendo criadas por lei, sob a forma de
autarquia especial ou de associação pública, sendo que sua atuação, no território de
cada município, dar-se-á por definição do titular dos serviços públicos de saneamento
básico, no âmbito de sua política pública de saneamento básico (art. 9°, II da LNDSB).

115
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

O se g u n d o c e n á rio é q u e os e n tes re g u la d o re s a in d a em fa se de
e stru tu ra ç ã o te rã o u m a p re ssã o p o r p a rte d o s p re sta d o re s e titu la re s p a ra
a d e q u a ç ã o às n o rm a s d e re fe rê n c ia e d ita d a s p e la A N A 23, sob p e n a d e
p re ju íz o à fo n te de fin a n c ia m e n to s p ú b lic o s fe d e ra is p a ra os
in v e s tim e n to s d e u n iv e rs a liz a ç ã o . N e ss e sen tid o , to d a s as a g ê n c ia s com
b a ix a n o rm a tiz a ç ã o e c o m p ro c e sso s a in d a in c ip ie n te s d e fisc a liz a ç ã o e
re g u la ç ã o d o s se rv iç o s te n d e m a p e rd e r e sp a ç o . E s s a a d a p ta ç ã o n ã o será
ta re fa fácil p a ra as e n tid a d e s re g u la d o ra s in fra n a c io n a is, m u ita s em fa se
d e a m a d u re c im e n to in stitu c io n a l, p o ré m , u m a p a rtic ip a ç ã o a tiv a n a
e la b o ra ç ã o d e ssa s n o rm a s fa c ilita rá o p ro c e sso d e in te g ra ç ã o .
O te rc e iro c e n á rio e n v o lv e o fu tu ro d a re g u la ç ã o lo c a l d ian te
d as p re s sõ e s le g isla tiv a s p a ra u m n o v o m o d e lo d e p re sta ç ã o e re g u la ç ã o
p a u ta d o s n o g a n h o d e e sc a la e re g io n a liz a ç ã o . A te n d ê n c ia é b u s c a r
arra n jo s d e re g u la ç ã o q u e sa tisfa ç a m o n o v o m o d e lo d e c o n tra tu a liz a ç ã o
re g io n a liz a d a , co m v is ta s a g a ra n tir ao s p re sta d o re s d o s se rv iç o s a
p o s s ib ilid a d e d e a c e sso a re c u rso s fe d e ra is 24. E s s e m o d e lo d e in d u ç ã o
p a re c e e n fra q u e c e r d o c e n á rio d e p o ssib ilid a d e s a c ria ç ã o d e n o v a s
a g ê n c ia s re g u la d o ra s m u n ic ip a is.
P o r fim , o q u a rto c e n ário , b a sta n te c o n tro v e rso p a ra a
re g u la ç ã o , te m a v e r co m a p o ssib ilid a d e e a tu a ç ã o d e u m re g u la d o r em
o u tro E s ta d o de F e d e ra ç ã o (art. 23, §1°-A , da L ei F e d e ra l n°
1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ). A o n o sso v e r a n o rm a a p re se n ta m u ito s p ro b le m a s
ju ríd ic o s e p o u c o s re su lta d o s p rá tic o s, j á q u e a c o n d ic io n a n te d e a d e sã o
ao re g u la d o r d e o u tro E s ta d o d e p e n d e d a in e x is tê n c ia d e re g u la d o r n o
E s ta d o o u q u e n ã o a te n d a à n o rm a d e re fe rê n c ia . A s a g ê n c ia s re g u la d o ra s
e sta d u a is e stã o p re se n te s em m a is d e 9 0 % d o te rritó rio n a c io n a l, o q u e
to rn a a n o rm a p o u c o p ro v á v e l d e p ro d u z ir e fe ito s p rá tic o s.
P o r fim , in d e p e n d e n te m e n te d o m o d e lo ju ríd ic o d e fo rm a ta ç ã o
d o re g u la d o r in fra n a c io n a l, p e rc e b e m o s u m c írc u lo v irtu o so p a ra

23 Cf. art. 23, caput, da Lei Federal n° 11.445/2007.


24 Cf. art. 50, § 1°, da Lei Federal n° 14.026/2020.

116
s e g u ra n ç a ju ríd ic a e p a d ro n iz a ç ã o d a re g u la ç ã o . A liás, a p ró p ria A N A ,
te m a g id o co m tra n s p a rê n c ia e fra n c o d iá lo g o co m as a g ê n c ia s e sta d u a is,
re g io n a is e m u n ic ip a is e to d o s e stã o c o n v e n c id o s d a n e c e ssid a d e d e
a p o ia r a c o n c re tiz a ç ã o d a A g e n d a R e g u la tó ria (R e so lu ç ã o n° 6 4 /A N A ,
d e 1° d e m a rç o d e 2 0 2 1 25).
A p articip ação d a reg u lad o ra federal será decisiv a n esse pro cesso
e ag u ard am o s que as “n o rm as de referên cia” estim ulem a coo p eração entre
os en tes fed erativos, a livre concorrência, a com petitividade, a eficiência e
a su sten tab ilid ade ec o n ô m ic a n a p restação dos serviços, b em co m o
p o ssib ilite a ad o ção de m étodos, técn icas e p ro cesso s adeq u ad o s às
p ecu liarid ad es locais e regionais, in cen tiv em a regio n alização d a p restação
dos serviços com o estab elecim en to de m etas de co b ertu ra e do aten d im en to
aos in d icad o res d e qualidade, p ro m o v am a p restação ad eq u ad a dos serviços,
com aten d im en to p len o aos usuários, o b serv ad o s os prin cíp io s da
regu larid ad e, d a continuidade, d a eficiência, d a segurança, d a atualidade, d a
g en eralid ad e, d a cortesia, d a m o d icid ad e tarifária, d a utilização racional dos
recu rso s h íd rico s e d a u n iv ersa liz açã o dos serviços, estab eleça critérios
lim itad o res d a so b reposição d e custos ad m in istrativ o s ou g erenciais a serem
p ag o s p elo u su ário final, in d ep en d en tem en te da co n fig u ração de
su b co n trataçõ es ou d e su b d eleg açõ es e assegure a p restação co n co m itan te
dos serviços de abastecim en to de ág u a e d e esg o tam en to sanitário (art. 4-A ,
§3°, d a L ei F ed eral n° 9.984/2000).

5 CONCLUSÃO

A p ro p o sta d o a rtig o fo i a p re se n ta r os im p a c to s d o n o v o m a rc o
re g u la tó rio d o sa n e a m e n to (L ei F e d e ra l n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 ) n a s ag ê n c ia s
re g u la d o ra s in fra n a c io n a is seto riais.

25 Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/retificacao-307010471. Acesso


em 20 abr. 2021.

117
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A s n o vas persp ectiv as alm ejad as de p ad ro n iz açã o re g u lató ria


(atrav és de n o rm as de referência), regio n alização d a p restação d e serviços
p o r m eio de u n id ad es regionais - com v istas ao g an h o de escala n a p restação
dos serviços - , e a in d u ção ao m o d elo reg io n alizad o de regulação, ten d em
a g a n h a r esp aço n o s debates ju ríd ic o s a p artir de agora.
R e c e b e u ê n fa se a im p o rtâ n c ia d o fo rta le c im e n to d a re g u la ç ã o
in fra n a c io n a l, p o is m e sm o d ia n te d o cu rto p e río d o d e im p la n ta ç ã o d a
re g u la ç ã o d o s a n e a m e n to b á sic o , p o d e -s e p e rc e b e r a in d u ç ã o d e b o a s
p rá tic as, p ro fis sio n a liz a ç ã o d o setor, p re v isib ilid a d e e te c n ic id a d e p a ra o
sa n e a m e n to b ásico .
F o i re g istra d o , ain d a, o p ro b le m a a in d a n ã o so lu c io n a d o d a
u n iv e rs a liz a ç ã o d a re g u la ç ã o , e se q u e re m o s p a d ro n iz a ç ã o p re c isa m o s
p a rtir d a p re m issa q u e a re g u la ç ã o é u m a re a lid a d e p re s e n te em to d o s os
m u n ic íp io s b ra sile iro s, o q u e n ã o o c o rre a tu alm en te. N e ss e se n tid o a L ei
n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 d eu p a sso d e c isiv o e e x istin d o in stru m e n to s d e in c e n tiv o ,
te re m o s u m m o d e lo re g u la tó rio u n ifo rm e p a ra o sa n e a m e n to b ra sile iro .
P a u ta de g ra n d e re le v â n c ia deve surgir, ain d a, co m a
acom odação d as m ú ltip la s m o d e la g e n s de e n tes re g u la d o re s
in fra n a c io n a is d e sa n e a m e n to (m u n ic ip a is, in te rm u n ic ip a is e e sta d u a is)
fre n te ao n o v o m arc o , q u e a lte ra c o n sid e ra v e lm e n te os c o n c e ito s
h is tó ric o s d e d e c isõ e s lo c a is e p re rro g a tiv a s m u n ic ip a is p a ra os serv iço s.
A n o v a le g isla ç ã o , ao a p o sta r em re g io n a liz a ç ã o e g a n h o d e escala,
p ro p õ e n o v a o rd e m d e d e fin iç ã o p a ra as p o lític a s p ú b lic a s d e sa n e a m e n to
b á s ic o (ág u a, esg o to , re síd u o s só lid o s e d re n a g e m p lu v ia l u rb a n a ), o q u e
tra z re fle x o d ire to n a m o d e la g e m ju ríd ic a d o s re g u la d o re s setoriais.
P o r fim , é im p o rta n te d e sta c a r q u e as a lte ra ç õ e s in tro d u z id a s
p e la L e i F e d e ra l n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , n ã o re tira m a trib u iç õ e s e ta m p o u c o
b u s c a m e lim in a r a re g u la ç ã o seto rial. O q u e se e sp e ra é u m a m a io r
te c n ic id a d e d a s a g ê n c ia s seto riais, q u e in c o rp o ra rã o u m a série d e
o b rig a ç õ e s im p o sta s e q u e im p lic a m em m u d a n ç a s n a fo rm a d e atu ação ,
sen d o que m u ita s a g ê n c ia s p re c isa rã o adequar su a o rg a n iz a ç ã o
a d m in is tra tiv a e suas e stru tu ra s té c n ic a s d e p e sso a l, p ro m o v e n d o

118
m e lh o ria s n o asp e c to d a g o v e rn a n ç a re g u la tó ria e n a fo rm a d e fisc a liz a r
a p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b ásico .

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B ra sília : A s s o c ia ç ã o B ra sile ira d as A g ê n c ia s d e R e g u la ç ã o , 2020.

119
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

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w h e n , w h y , a n d h o w w a te r a n d sa n ita tio n u tilitie s ca n b e n e fit fro m
w o rk in g to g e th e r. W o rld B an k , W a sh in g to n , D C . D isp o n ív e l em :
h ttp s ://o p e n k n o w le d g e .w o rld b a n k .o rg /h a n d le /1 0 9 8 6 /2 8 0 9 5 . A c e sso em :
13 m a io 20 2 1 .

121
A IMPLEMENTAÇÃO DO NOVO MARCO LEGAL DO
SANEAMENTO BÁSICO SOB A PESRSPECTIVA DA
REGULAÇÃO CONTRATUAL

C h ristia n n e D ia s F e rre ira *


C in tia L e a l M arinho*

RESUMO: O d e sa fio d a re g u la ç ã o d o sa n e a m e n to b á s ic o p e rp a ssa


n e c e s s a ria m e n te p e la re fle x ã o a c e rc a d a n e c e ssid a d e d e e stru tu ra r de
fo rm a c la ra e p re c isa a m a triz d e risc o d o s c o n tra to s. A fix a ç ã o d e m etas,
in v e s tim e n to s e p e n a lid a d e s d e se n h a d o s sob a é g id e d e u m a rc a b o u ç o
m e to d o ló g ic o e ju ríd ic o é im p o rta n te p a ra tra z e r p re v isib ilid a d e p a ra os
c o n tra tan tes. P o ré m , é p re c iso q u e ao la d o d a e s ta b ilid a d e os co n tra to s
tra g a m c o n sig o c e rta m a rg e m d e fle x ib ilid a d e p a ra a c o m o d a r os
in te re ss e s d o E sta d o , d o s c o n c e ssio n á rio s e d a so c ie d a d e d ia n te de
ev e n to s e x tra o rd in á rio s que e n se je m um ev e n tu a l re e q u ilíb rio
e c o n ô m ic o -fin a n c e iro .

Palavras-chave: R e g u la ç ã o c o n tra tu al. F le x ib ilid a d e . R e e q u ilíb rio


e c o n ô m ic o -fin a n c e iro .

1 INTRODUÇÃO

Q u a n d o se fa la em m elh o ria do am b ien te d e n eg ó cio s e segurança


ju ríd ica, é p reciso se fa la r n ecessariam en te em regulação. E stab ilid ad e de
n o rm as, seg u ran ça n o s contratos e reg ras claras são o que se esp era de u m a
b o a reg u lação , além d e tran sp a rên c ia e previsibilidade. E sses elem entos
co n trib u em p ara u m am b ien te atrativo p ara os in v estid o res do setor privado,

* Diretora-Presidente da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico.


* Assessora da Diretoria e Economista de carrier da Agência Nacional de Águas e
Saneamento Básico.

123
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

esp ecialm en te nu m m o m en to em q u e o v o lu m e de in v estim en to s p recisa


fa zer fren te às n ecessid ad es d a população, os quais n ão p o d em ser
sup o rtad o s tão so m en te p o r recu rso s fiscais.
A d e m a n d a d a so cied a d e e x ig e q u e se av a n ce em d iv erso s
setores, m o rm e n te o d o sa n e am en to b ásico . N e sse contexto, to rn a -se ain d a
m a io r o d esa fio das a g ê n cias re g u la d o ra s d e in c e n tiv a r o d ese n v o lv im en to
ec o n ô m ic o co m se g u ra n ç a e estab ilid ad e, estim u la n d o os in v estim e n to s
n o P aís, de m o d o a p ro p ic ia r ao s b ra sileiro s o am p lo ac esso ao s b en s e aos
serv iço s re g u lad o s, co m q u alid ad e e eq u ilíb rio n a ju sta d istribuição.
É , p o is, d e e x tre m a im p o rtâ n c ia , n e ste m o m e n to em q u e a á g u a
a ssu m e o p ro ta g o n ism o n o c o m b a te à p a n d e m ia q u e te m ca u sa d o
m ilh a re s d e m o rte s em to d o o m u n d o e n o s a le rta d o a c e rc a d e su a
e ss e n c ia lid a d e p a ra a v id a h u m a n a , q u e o a c e sso à á g u a e ao sa n e a m e n to
se ja e x p a n d id o p a ra a p o p u la ç ã o . Á g u a tra ta d a e c o le ta e tra ta m e n to de
e sg o to p re v in e m d o en ç as, p ro m o v e m a saú d e, p ro p ic ia m p ro d u tiv id a d e
n o tra b a lh o e p ro te g e m o m e io a m b ie n te , sendo, p o rta n to , fu n d a m e n ta is
p a ra o d e s e n v o lv im e n to e c o n ô m ic o d as n a ç õ e s, ao te m p o em q u e
c o n stitu e m in d ic a d o re s d e b e m -e s ta r d as so cied a d es.
E m b o ra o B ra sil d e te n h a 12% (d o z e p o r c e n to ) d a á g u a d o ce do
m u n d o , sa b e m o s q u e su a d istrib u iç ã o n o te rritó rio é d esig u al. S o m a -se a
isso a fre q u e n te o c o rrê n c ia d e ev e n to s h id ro ló g ic o s crítico s, c o n fo rm e
o b se rv a m o s p e lo s re c e n te s p e río d o s d e ra c io n a m e n to n o c o n su m o de
água. A q u a lid a d e d o s rio s ta m b é m vem se n d o c a d a d ia m ais
c o m p ro m e tid a p e la p o lu iç ã o c a u sa d a p o r la n ç a m e n to de esg o to s
d o m é s tic o s sem tra ta m e n to .
N e sse cenário, é preciso aum entar a disponibilidade hídrica em
term o s quantitativos e qualitativos e am pliar a eficiência do seu u so n a
alocação entre os diferentes usuários. D ecisões de investim ento do setor
p rivado e políticas públicas interferem n a disponibilidade e d em an d a hídrica.
O c o rre q u e o B ra sil a p re se n ta g ra n d e d é fic it d e a te n d im e n to d a
p o p u la ç ã o n o q u e se re fe re a c o le ta e tra ta m e n to d e esg o to . U m em ca d a
d o is b ra s ile iro s n ã o te m c o le ta d e esg o to . S ão 35 m ilh õ e s d e p e sso a s sem

124
ac e sso a á g u a trata d a. M e n o s d a m e ta d e d o esg o to g e ra d o é tra ta d o , e
c o n ta m o s co m p e rd a d e á g u a d a o rd e m d e 3 7 % (trin ta e sete p o r cento).
A p e sa r de o sa n e a m e n to b á s ic o p o s s u ir um a in te rfa c e
d ire ta m e n te re la c io n a d a co m a sa ú d e p ú b lic a 1, este se to r foi, ao lo n g o
d o s an o s, o se to r d a á re a d e in fra e stru tu ra co m as m e n o re s ta x a s de
in v e stim e n to . P o d e -se o b se rv a r q u e o se to r in v e stiu m e n o s d a m e ta d e
q u e os seto re s d e te le c o m u n ic a ç õ e s e tra n sp o rte s e n tre 2 0 1 7 e 2 0 1 8 , e
m e n o s d e u m te rç o q u e o se to r d e e n e rg ia .2
A la c u n a d e in v e stim e n to s d e c o rre p a rc ia lm e n te d e u m a
o rg a n iz a ç ã o fra g m e n ta d a , d e frág il g o v e rn a n ç a e d e e n tra v e s le g a is q u e
d ific u lta m a c o m p e tiç ã o p e lo m e rc a d o e a a tra ç ã o d e n o v o s p la y e r s . N o s
te rm o s d a L ei n° 11.445, d e 2 0 0 7 , a g ra n d e m a io ria d o s m u n ic íp io s
d e le g a a p re s ta ç ã o d e se rv iç o s d e a b a ste c im e n to d e á g u a e e sg o ta m e n to
sa n itá rio às c o m p a n h ia s e sta d u a is d e san e am en to . E n q u a n to 7 0 % das
o p e ra d o ra s são e m p re sa s e sta d u a is, o se to r p riv a d o está em a p e n a s 6%
d o s m u n ic íp io s.
N e s s e asp e cto , c o n sid e ra n d o q u e e x iste m p re sta d o re s p ú b lic o s
e p riv a d o s e fic ie n te s e v ic e -v e rsa , fa to é q u e p re d o m in a n o s ch a m a d o s
co n tra to s d e p ro g ra m a a a u sê n c ia d e m e ta s claras, in d ic a d o re s de
q u a lid a d e e re g ra s ta rifá ria s, fa c u lta n d o um a re g u la ç ã o m ais

1 Estudos mostram que a redução na incidência de coliformes reduz as mortes de


crianças com menos de 1 ano de idade em um para cada dez mil nascidos vivos.
GIAMBIAGI,
2 Tabela 2: Evolução da taxa de investimento anual (fluxo) em infraestrutura. em % do PIB
SETOR 1970-1980 1981-1990 1991-2000 2001-2010 2011-2016 2017-20181

Telecomunicações 0,93 0,38 0,71 0,63 0,47 0,45

Energia 2,47 1,26 0,68 0,57 0,68 0,65


Saneam ento 0,53 0,2 0,15 0,17 0,19 0,2
Transportes 2,36 1,26 0,57 0,59 0,85 0,47
Total 6,29 3,1 2,11 1,96 2,19 1,77

Fonte: Série de 1970-2016 de IPEA. Desafios da nação: artigos de apoio, volume 1. 2018.
Série 2017-2018 de Pezco. Infrawatch novembro de 2018. 2018.

125
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

d is c ric io n á ria q u e c o n tra tu a l, o q u e to rn a im p e rio sa a p re s e n ç a de


re g u la d o re s e fic ien tes, co m g ra u d e m a tu rid a d e e a u to n o m ia c o n d iz e n te s
co m a ta re fa d e a la v a n c a r o se to r ru m o à d isp o n ib iliz a ç ã o d o s serv iç o s
p a ra to d o s os cid ad ã o s.
A tu a lm e n te , a e x istê n c ia d e a p ro x im a d a m e n te 70 ag ê n c ia s
re g u la d o ra s in fra n a c io n a is, co m p ro d u ç ã o d iv e rsa d e n o rm a s, c o n trib u i
p a ra u m a m b ie n te d e in c e rte z a s e im p õ e e le v a d o s c u sto s ao s o p erad o re s,
os q u a is m u ita s v e z e s são su b m e tid o s a d ife re n te s n o rm a s re g u la tó ria s.
N e ss e sen tid o , é lo u v á v e l o e sfo rç o d o n o v o m a rc o leg al do
sa n e a m e n to d e te r e n c o n tra d o u m m o d e lo d e g o v e rn a n ç a q u e p re se rv e a
titu la rid a d e m u n ic ip a l3, m a s q u e ao m e sm o te m p o c o n te m p le in c e n tiv o s
p a ra u m a p re s ta ç ã o re g io n a liz a d a d o s serv iço s, os q u a is d e v e m ser
su b m e tid o s a u m a u n ifo rm iz a ç ã o e p a d ro n iz a ç ã o d e re g ra s m e d ia n te a
p ro d u ç ã o d e n o rm a s d e re fe rê n c ia p o r u m a a g ê n c ia d e â m b ito n ac io n a l,
n a p e rs p e c tiv a d o e x e rc íc io d e fe d e ra lism o c o o p e ra tiv o p o r to d o s os
e n tes fe d era tiv o s.

2 OS TRÊS PILARES DO NOVO MARCO LEGAL DO


SANEAMENTO BÁSICO: universalização, competição e regulação

O n o v o m arco do san eam en to b ásico (Lei n° 14.026, de 2 0 2 0 ) tem


co m o m issã o a u n iv ersa liz açã o do serviço de saneam ento b ásico n o B rasil.
A s n o v as reg ras alteram sete leis q u e estão in terco n ectad as e, em conjunto,
b u scam criar u m am b ien te favorável p ara atrair v u lto so s in v estim en to s que
n ão p o d em ser suportados tão som ente p elo setor público.

3 Ação Direta de Inconstitucionalidade 1842 RJ.

126
Figura 1: In te rre la ç õ e s L e g a is d o N o v o M a rc o d o S a n e a m e n to B á sic o

Regulação
• Lei 9.984/2000
• Lei 10.789/2003

r ^ r ^
Contratação do Serviço Estruturação do Serviço
• Lei 11.445/2007 • Lei 13.089/2015
• Lei 11.107/2005 • Lei 12.305/2010
• Lei 13.529/2017
• Lei 14.026/2020
h__________________________________________ A k__________________________________________ á

F o n te: E la b o ra ç ã o P ró p ria

A fig u ra 1 a c im a a p re se n ta co m o as a lte ra ç õ e s le g a is tra z id a s


p e lo n o v o m a rc o se e stru tu ra ra m e se fu n d a m e n ta ra m p a ra a a tra ç ã o de
in v e s tim e n to s que p e rm ita m a u n iv e rsa liz a ç ã o do s e to r. E sse s
fu n d a m e n to s podem se r tra d u z id o s p o r trê s g ra n d e s b lo c o s , q u e
in te ra g e m c o n s ta n te m e n te n a b u s c a p o r alte ra ç õ e s e av a n ço s q u e o u tro s
seto re s d a in fra e stru tu ra j á a lca n çaram .
O p rim e iro b lo c o é re p re se n ta d o p e la R e g u la ç ã o e as alte ra ç õ e s
n a L ei n° 9 .9 8 4 , d e 17 d e ju lh o d e 2 0 0 0 , q u e a trib u e m à A g ê n c ia N a c io n a l
d e Á g u a s e S a n e a m e n to B á sic o - A N A a c o m p e tê n c ia p a ra e d ita r n o rm a s
d e re fe rê n c ia p a ra o se rv iç o d e sa n e a m e n to b ásico ; e as alte ra ç õ e s n a L ei
n° 1 0 .788, d e 19 d e n o v e m b ro d e 2 0 0 3 , q u e a lte ra m o n o m e e as
a trib u iç õ e s d o c a rg o d e E s p e c ia lis ta em R e c u rso s H íd ric o s, in c lu in d o e
e x p lic ita n d o a a tiv id a d e d e re g u la ç ã o e d e s a n e a m e n to n o n o m e d o carg o ,
o q u e a s s e g u ra q u e os se rv id o re s d a A N A e x e rç a m suas atrib u iç õ e s
ta m b é m re la c io n a d a s à re g u la ç ã o de s a n e a m e n to b ásico .

127
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

O seg u n d o b lo co trata de u m a m a io r ab ertu ra d o m erc ad o p o r m eio


d a ex ig ên cia d e p ro ced im en to licitatório p a ra a seleção dos prestad o res de
serviços, em substituição aos ch am ad o s contratos de program a, acordo
firm ad o d iretam en te entre entidades p ú b licas. A s alterações fo ram inseridas
n a L ei n° 11.107, de 6 de abril d e 2005, em atenção ao art. 175 da
C o n stitu ição F ederal, e n a L ei n° 11.445, de 5 d e ja n e iro d e 2007, p ara
ap rim o rar as co n d içõ es estruturais do saneam ento básico.
E m c o n ju n to , os re fe rid o s n o rm a tiv o s, ao p e rm itire m a e n tra d a
d o p a rc e iro p riv a d o d e fo rm a m a is e n fá tic a n o se to r a p a rtir d a v e d a ç ã o
d a re n o v a ç ã o d o s c o n tra to s d e p ro g ra m a , c u lm in a ra m p o r in c lu ir
ta m b é m , p a ra to d o s os p re sta d o re s, a p a rid a d e d e re q u isito s co m o
c lá u su la s e sse n c ia is, m e ta s d e u n iv e rsa liz a ç ã o e a v a lia ç ã o d a c a p a c id a d e
e c o n ô m ic o -fin a n c e ira .4
O u tro p o n to d e d e sta q u e é a in c lu sã o d as n o rm a s d e re fe rê n c ia
e d a re g io n a liz a ç ã o c o m o re q u isito p a ra a a lo c a ç ã o d e re c u rso s p ú b lic o s
fe d e ra is e p a ra fin a n c ia m e n to s co m re c u rso s d a U n iã o , o u p o r ela
g e rid o s, o q u e g a ra n te m a io r c a p a c id a d e d e a d e sã o às re g ras, v in c u la n d o
su a o b serv ân cia.
E m co m plem entação, o v eto do § 6° d o art. 13 d a L ei n° 11.107,
de 2005, foi de ex trem a im portância, pois acab a com a ex tin ção do contrato
de p ro g ram a em caso de alienação do controle do p re sta d o r público. E sse
p arágrafo, q u an d o em vigor, im p ed ia a p riv atização das co m panhias
p ú b licas po is o v alo r d a em p resa subsiste, essencialm ente, n o s contratos de
p restação do serviço, sendo u m ativo intangível que rep resen ta quase a
to talid ad e d o v a lo r das co m p an h ias p restadoras do serviço.
D e ssa form a, ao p re v er a extinção do contrato d e p restação do
serviço de san eam ento em caso de alienação d a em p resa estatal, esta p erd e

4 Entende-se que a avaliação da capacidade econômico-financeira do prestador privado


já é realizada no momento do processo licitatório, o que não ocorre para o prestador
público. Assim, a lei vem equiparar esses dois prestadores para garantir os
investimentos necessários para a universalização do serviço.

128
a atratividade, pois seu v alo r reside, essencialm ente, n a cap acid ad e de
g eração d e receita p ela o ferta do serviço. P o r outro lado, o contrato de
p ro g ram a é u m in stru m en to p ara p actu ação de atividades entre dois entes
p ú b lico s e n ão p o d e ser co n tinuado n o rm alm en te caso u m p riv ad o assu m a
a operação. P a ra so lu cio n ar essa questão, a L ei n° 14.026, de 2020, tra z no
art. 14 a p rev isão de que, n o caso de alienação d e controle acionário, esses
co n trato s serão substituídos pelo s contratos d e concessão, p ela ab so rção d a
resp o n sab ilid ad e de p restar o serviço após p ro ced im en to licitatório, e
g aran tin d o a co n tin u id ad e e o aten d im en to d a população.
O te rc e iro b lo c o d e ta lh a e e sta b e le c e u m a rc a b o u ç o p a ra q u e a
p re m is s a d a u n iv e rsa liz a ç ã o seja a lca n çad a . O n o v o m a rc o tra z a
p ro p o s ta d a re g io n a liz a ç ã o c o m o u m a re s p o sta ao su p o sto fim do
su b s íd io cru zad o , d o q u al n ã o se te m a re s p e c tiv a c o n ta b ilid a d e e
c o n h e c im e n to . C o m efeito , p a ra v ia b iliz a r o g a n h o d e e sc a la co m a
a g lu tin a ç ã o d e m u n ic íp io s su p e ra v itá rio s e d e fic itá rio s, n o s m o ld e s do
p ro c e s s o de c o n c e ssã o p e lo qual os ae ro p o rto s p a ssa ra m , a
re g io n a liz a ç ã o te ria a fin a lid a d e d e p ro m o v e r u m a rra n jo o n d e n e n h u m
m u n ic íp io fo s s e d e ix a d o p a ra trás.
C o n tu d o , e sse p ro c e sso de re g io n a liz a ç ã o depende da
s o b re p o siç ã o d e in d ic a d o re s té c n ic o s d e v ia b ilid a d e e re fe re n c ia is de
c o m p a rtilh a m e n to d e in fra e stru tu ra , n ú m e ro d e h a b ita n te s, c a p a c id a d e
d e p a g a m e n to d a p o p u la ç ã o , d e n tre o u tro s, m as so b re tu d o d o a p o rte
p o lític o d o s G o v e rn a d o re s n o p ro c e sso d e c o n v e n c im e n to d o s p re fe ito s
e g e sto re s a c e rc a d a n e c e ssid a d e e d as v a n ta g e n s d o m o d elo .
A ssim , in c lu iu -se n a L ei n° 13.089, d e 12 d e ja n e ir o d e 2 0 1 5 ,
q u e tra ta d o E sta tu to d a M e tró p o le , a fig u ra d a u n id a d e re g io n a l de
sa n e a m e n to b á sic o , p a ra p e rm itir ao E sta d o u m d e se n h o co m v ia b ilid a d e
e c o n ô m ic a e té c n ic a , p o d e n d o in c lu ir m u n ic íp io s que não sejam
n e c e s s a ria m e n te lim ítro fe s.
A L ei n° 12.305, d e 2 de agosto d e 2010, foi alterad a p a ra tra ta r de
n o v o s p razo s p a ra a d isp o sição final am b ien talm en te ad eq u ad a dos rejeitos.

129
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A lém disso, g ran d e p arte das reg ras p ara o serviço de ab astecim ento de ág u a
e esg o tam en to sanitário tam b ém se ap lica ao setor de resíd u o s sólidos.
A L ei n° 13.529, d e 4 de d ezem b ro de 2017, foi ajustada p ara
re tira r o lim ite p a ra a particip ação d a U n iã o em fu n d o com a fin alid ad e de
fin an ciar serviços técn ic o s pro fissio n ais especializados. O lim ite anterior,
de R $ 180 m ilhões, lim itav a a estruturação de p ro jeto s de co n cessõ es e
p arcerias p o r m eio do F E P -C aixa. A retirad a desse lim ite p ossibilitará
v iab iliz ar div ersos projetos, n ão som ente d a área de saneam ento básico.
C o m p lem en tan d o os ajustes d o n o v o m arco, as alterações da
p ró p ria L ei n° 14.026, d e 15 de ju lh o d e 2020, nos artigos 12 a 24,
co m p lem en tam a estruturação do serviço às alterações citadas
an teriorm ente. E sses p ontos são de su m a im p o rtân cia pois, além de
p ro p o rcio n arem a estruturação d a A N A pelo rem a n ejam en to d e cargos,
in d icam a fo rm a co m o a U n ião p re sta rá apoio técn ico e fin an ceiro p ara
ad ap tação d o s serviços às disp o siçõ es d a L ei, in clu in d o tam b ém a prev isão
de u m a tran sição p a ra o caso d e alienação do controle acionário d a em p resa
p ú b lica o u so cied ad e d e ec o n o m ia m ista, e de p razo p ara a U n ião p u b licar
os B lo co s de R efe rên c ia p a ra a p restação re g io n alizad a do serviço.
E m c o n ju n to , to d a s essa s a lte ra ç õ e s tra z id a s p e lo n o v o m arc o
b u s c a m a lc a n ç a r se g u ra n ç a ju ríd ic a , p re v isib ilid a d e e a u m e n to dos
in v e s tim e n to s no se to r de sa n e a m e n to b á s ic o p a ra p e rm itir a
u n iv e rs a liz a ç ã o d o serviço.

3 A REGULAÇÃO CONTRATUAL

De a c o rd o co m o D ia g n ó s tic o do S iste m a N a c io n a l de
In fo rm a ç õ e s so b re S a n e a m e n to B á sic o - S N IS d e 2 0 1 9 5, o ín d ic e m é d io
d e a te n d im e n to co m re d e n o B ra sil é d e 8 3 ,7 % 6 p a ra a te n d im e n to to tal

5 Consultado em http://app4.mdr.gov.br/serieHistorica/.
6 IN055.

130
d e a b a ste c im e n to d e água, d e 5 4 ,1 % 7 p a ra c o le ta d e e sg o to s e d e 4 9 ,1 % 8
p a ra tra ta m e n to d e e sg o to g erad o .
E s s e p a n o ra m a a p re se n ta u m a e v o lu ç ã o p o u c o s ig n ific a tiv a em
re la ç ã o ao s d a d o s d o a n o a n te rio r (2 0 1 8 ), co m u m c re sc im e n to d e 0,1
p o n to p e rc e n tu a l no ín d ic e de a te n d im e n to to ta l com re d e de
a b a ste c im e n to d e á g u a (IN 0 5 5 ) e u m c re sc im e n to d e 0,9 p o n to
p e rc e n tu a l n o ín d ic e to ta l p a ra o a te n d im e n to to ta l c o m re d e d e esg o to s
(IN 0 5 6 ). J á n o in d ic a d o r m é d io n a c io n a l d e tra ta m e n to d o s esg o to s
g e ra d o s (IN 0 4 6 ), o b se rv o u -se u m a u m e n to d e 2 ,8 p o n to s p e rc e n tu a is em
re la ç ã o ao o b se rv a d o em 2018.
O s d a d o s m o stra m q u e, a p e sa r d e v e rific a rm o s u m a ev o lu ç ã o
n o a te n d im e n to d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , e sse a v a n ç o é
p e q u e n o e a q u é m d o n e c e ssá rio p a ra a tin g ir as m e ta s d e in v e stim e n to
tra z id a s p e lo n o v o m a rc o d o sa n e a m e n to b ásico .
A ta b e la a b a ix o a p re se n ta os in v e stim e n to s re a liz a d o s em 2 0 1 9 ,
d e a c o rd o co m as in fo rm a ç õ e s d e se rv iç o s d o s p a rtic ip a n te s d o SN IS.

Tabela 1: In v e stim e n to s re a liz a d o s em 2 0 1 9


Despesas
Água Esgotos Outros
Macrorregiâo ca p italizá ve is
(RS mi) (RS mi) (R$ mi) (R$ mi}
Norte 2,5 391.6 142,8 52,4 589,3 3,7%
N ordeste 227,2 1.224,9 870,7 1.381,8 3.704.5 23,6%
Sudeste 317,1 2.607,1 2.680,0 2.225,4 7.829.6 49,8%
Sul 37,0 901,0 1.148,2 192,9 2.279,0 14,5%
C e ntro -O e ste 83,4 635,9 491,3 116,0 1.326.7 8,4%
667,2 6.760,5 5.333,0 3.968,5 16.729,2
Brasil
4,2% 36,6% 33,9% 25,2% 100, 0 %

F o n te : D ia g n ó s tic o S N IS 2 0 1 9

C o n fo rm e v e rific a d o n a ta b e la 1, os in v estim e n to s re alizad o s n o


an o d e 2 0 1 9 são d a o rd em de R $ 15,7 b ilh õ es, v a lo r m u ito ab a ix o d a m é d ia

7 IN023.
8 IN046.

131
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

d o P la n o N a c io n a l d e S an ea m e n to B á sic o (P L A N S A B )9, n ec essário à


u n iv e rsa liz a ç ã o d o setor, cu ja m e ta é d e R $ 25,5 b ilh õ es. N e sse ritm o, a
u n iv e rsa liz a ç ã o d o seto r só o c o rre rá em 2 0 5 5 101, 2 2 an o s após a m e ta de
20 3 3 , e stab e lecid a p e lo P L A N S A B e p e la L ei n° 14.026, d e 2020.
P a ra g a ra n tir q u e esse s in v e stim e n to s sejam re a liz a d o s, o n o v o
m a rc o tro u x e a o b rig a to rie d a d e d e q u e essa s m e ta s e ste ja m p re v ista s n o s
co n tra to s p a ra g a ra n tir a efe tiv id a d e , além d e p re v e r a p o ssib ilid a d e de
c a d u c id a d e d o c o n tra to c a so se v e rifiq u e seu d e sc u m p rim e n to em p e lo
m e n o s trê s an o s n u m in te rv a lo d e cin c o anos.
Um p o n to im p o rta n te e que pode c o n trib u ir c o n tra o
a tin g im e n to d e ssa s m e ta s é a g ra n d e q u a n tid a d e d e o p e ra ç õ e s co m
d e le g a ç ã o v e n c id a o u m e sm o sem co n tra to . C o n sid e ra n d o c o m o d a ta de
c o rte o a n o d e 2 0 1 8 p a ra os d a d o s c o n su lta d o s n o S N IS , em 2 0 1 8 fo ram
id e n tific a d o s 698 c o n tra to s co m d e le g a ç ã o v e n c id a , o u seja, c e rc a de
2 0 % (v in te p o r c e n to ) d o s o p e ra d o re s q u e p o ssu e m c o n tra to d e p ro g ra m a
o p e ra m de fo rm a irre g u la r. O u tro s 1.780 que p re sta m se rv iç o
d ire ta m e n te n ã o p o ssu e m u m a p a c tu a ç ã o c la ra a c e rc a d a n a tu re z a d a
a v e n ç a e d e seu s re sp e c tiv o s d esd o b ra m e n to s.
N e s s e c e n ário , é d e sta q u e a im p o rtâ n c ia d e q u e as re g ras,
q u a is q u e r q u e sejam , v e n h a m p re fe re n c ia lm e n te p a c tu a d a s n o b o jo do
c o n tra to d e p re sta ç ã o d o serv iço , u m a v e z q u e é sa b id o q u e os co n tra to s
são sile n te s e in c o m p le to s 11 p o r n atu re za. A in d a q u e se le v e em
c o n sid e ra ç ã o n ã o se r p o ssív e l p re v e r to d o s os ev e n to s q u e p o d e m
a c o m e te r a re la ç ã o e n tre as p a rte s c o n tra ta n te s d u ra n te a v ig ê n c ia d e u m
c o n tra to d e lo n g o p razo , se m p re é p o ssív e l c o n ta r c o m a p o ssib lid a d e de
u m re e q u ilíb rio e x tra o rd in á rio d o co n trato .

9 Disponível em: https://antigo.mdr.gov.br/images/stories/ArquivosSDRU/ArquivosP


DF/Versao_Conselhos_Resolu%C3%A7%C3%A3o_Alta_-_Capa_Atualizada.pdf.
10 KPMG/Abcon. Quanto custa universalizar o saneamento no Brasil? (2020).
11 HOLMSTROM, B. Moral Hazard and Observability. The Bell Journal of
Economics, 10(1), 74, 1979. https://doi.org/10.2307/3003320.

132
P a ra ta n to , é d e su m a im p o rtâ n c ia q u e a m a triz d e risc o e ste ja
b e m d elim ita d a, p a ra e v ita r a re p e tiç ã o d e u m a c u ltu ra d e re e q u ilib ra r
co n tra to s em d e c o rrê n c ia d e p re sta d o re s q u e n ã o p o ssu e m u m a real
c a p a c id a d e d e in v e s tim e n to c o n fo rm e v e n tila d o n o m o m e n to d o le ilã o
ou, p o r o u tro lad o , q u e u m a re n e g o c ia ç ã o d e ix e d e se r fe ita , im p o n d o u m
ônus d e sn e c e ssá rio ao u su á rio do se rv iç o p o r fo rç a d e b re c h a s
c o n tra tu ais. U m a m a triz d e risc o b e m e q u a c io n a d a p o d e se r g a ra n tia d a
c o n tin u id a d e d a p re sta ç ã o d o serviço.
S e p o r u m lado contratos b em desenhados proporcionam m aio r
segurança ju ríd ic a p ara que os investim entos sejam realizados, p o r outro, a
regulação do setor e as norm as de referência p odem colaborar p ara o alcance
das m etas de universalização, estabelecendo norm as e incentivos, m orm ente
p o r m eio de u m a regulação tarifária que perm ita a ju s ta rem uneração do
investim ento. A m b o s constituem instrum entos p ara garantir que as m etas
estabelecidas n a lei sejam alcançadas em prol de u m a disponibilização de
b en s e serviços essenciais ao exercício dos direitos fundam entais.

4 A RELAÇÃO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO


COM A REGULAÇÃO CONTRATUAL

A m e n ç ã o ao e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro está p re v ista n as


n o rm a s d e re fe rê n c ia q u a n d o se tra ta d o te m a d e re g u la ç ã o ta rifá ria , e
q u a n d o se fa la n a p a d ro n iz a ç ã o d o s in stru m e n to s n e g o c ia is q u e p re c isa m
tra z e r o s m e c a n ism o s d e m a n u te n ç ã o d e sse e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -
fin a n c e iro d as ativ id ad es.
S o b re a m a n u te n ç ã o d o e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro n o
c o n tra to d e co n c e ssã o , é im p o rta n te d e sta c a r q u e a C o n s titu iç ã o F ed eral
d e 1988 n ã o re c o n h e c e o p rin c íp io d a p ro te ç ã o d o e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -
fin a n c e iro d as c o n c e ssõ e s d e se rv iç o p ú b lic o , n e m d a ju s ta re m u n e ra ç ã o ,
te n d o d e ix a d o ao le g isla d o r o rd in á rio o e sta b e le c im e n to d e n o rm a s so b re
o re g im e e c o n ô m ic o -fin a n c e iro d e sse s c o n tra to s, n o b o jo d e u m a
d e te rm in a d a p o lític a ta rifá ria , c o n fo rm e o art. 175 d a C o n stitu iç ã o .

133
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

N e s s e asp e cto , a re fe rê n c ia q u e tra z a C o n stitu iç ã o F e d e ra l de


m a n u te n ç ã o d a p ro p o s ta o rig in a l re sid e n o art. 37 d a L e i n° 8.666, de
1993, e as re g ra s p a ra as c o n c e ssõ e s d e se rv iç o p ú b lic o e stão p o sta s p e lo
art. 175 d a C o n stitu iç ã o , re g u la m e n ta d a s p e la L e i n° 8 .9 8 7 , d e 1995.
P o rta n to , a te o ria d a im p re v isã o im p õ e ao p o d e r p ú b lic o c o n tra ta n te u m
d e v e r d e re c o m p o siç ã o a p e n a s p a rc ia l d as p re m issa s e c o n ô m ic a s
v ig e n te s a n tes d a s u p e rv e n iê n c ia d o e v e n to q u e d ev e se r p a u ta d a p e la
n e c e s s id a d e d e a te n d e r à c o n tin u id a d e d o se rv iç o p ú b lic o 1213.
A fin a l, “o d im e n sio n a m e n to d a m e d id a d e re c o m p o siç ã o tem
p o r g u ia e lim ite o q u a n to n e c e s s á r io p a r a u m a c o n tín u a e a d e q u a d a
p r e s ta ç ã o d o s e r v iç o p ú b lic o ”n . D e ss a fo rm a , e ssa re c o m p o siç ã o d ev e
se r p a u ta d a p e la n e c e ssid a d e d e c o n tin u id a d e d o se rv iç o p ú b lico , sen d o
a re c o m p o s iç ã o a m e d id a su fic ie n te p a ra isso.
N e s s e sen tid o , a m a triz d e risc o é u m c o m p o n e n te e sse n cial do
a rra n jo e c o n ô m ic o -fin a n c e iro d e c o n c e ssõ e s p a ra a lo c a r os risc o s en tre
o c o n c e s s io n á rio e o p o d e r c o n c e d e n te , e sp e c ific a n d o d ia n te d e q u ais
ev e n to s fu tu ro s o b e m ju ríd ic o e sta rá p ro te g id o , ao te m p o em q u e
co n trib u i p a ra um a adequada p re sta ç ã o do serv iç o p ú b lic o de
sa n e a m e n to v o lta d a p a ra a m o d ic id a d e ta rifá ria e p a ra p re se rv a r o
c o n c e s s io n á rio d e te r q u e su p o rta r a o c o rrê n c ia d e q u a lq u e r fa to r q u e
im p a c te a c o n c e ssã o p o r m e io d a re c o m p o siç ã o tarifá ria.
E n tre ta n to , em co n tra to s d e lo n g o p ra zo , c o m o as co n c e ssõ e s
p a ra s a n e a m e n to b á sic o , e s p e c ia lm e n te d e p re sta ç ã o d o s se rv iç o s de
a b a ste c im e n to d e á g u a e e sg o ta m e n to san itário , a su b sistê n c ia d e u m a
T axa In te rn a de R e to rn o (T IR ) p ré -fix a d a pode o n e ra r
d e s p ro p o rc io n a lm e n te o u su á rio , g e ra n d o lu c ro s e x tra o rd in á rio s p a ra o
co n tra tad o . Is s o p o rq u e o m é to d o d a T IR p ré -fix a d a p o d e c o la b o ra r p a ra

12 KAERCHER LOUREIRO, Gustavo. Estudos sobre o Regime Econômico-


Financeiro de Contratos de Concessão. São Paulo: Quartier Latin, 2020.
13 KAERCHER LOUREIRO, Gustavo. Estudos sobre o Regime Econômico-
Financeiro de Contratos de Concessão. São Paulo: Quartier Latin, 2020.

134
a d e fin iç ã o d e u m e q u ilíb rio in icial, m a s n ã o te m o c o n d ã o d e g a ra n tir a
re la ç ã o e n tre e n c a rg o s e re c o m p e n s a d a T M A .
A ssim , em não havendo c lá u su la c o n tra tu al p re v e n d o a
im u ta b ilid a d e d a ta x a in te rn a d e re to rn o , n ã o h á re sp a ld o p a ra m a n te r a
T IR o rig in a l p o r to d a a v ig ê n c ia d o co n tra to , e u m ev e n tu a l e x c e sso de
re n ta b ilid a d e d e c o rre n te d o p a g a m e n to d e ta rifa s p ú b lic a s p o d e e d ev e
se r re v isto . A fin a l, a ta rifa n ã o p o d e e s ta r d isso c ia d a d a s co n d iç õ e s
e c o n ô m ic a s d e u m d e te rm in a d o co n tex to .
L o g o , as la c u n a s c o n tra tu a is q u e d e ix a m em a b e rto p re v isã o de
m e c a n is m o s de re v isõ e s o rd in á ria s podem v ia b iliz a r que a
im p re v is ib ilid a d e p ro v e n ie n te d e u m a á re a e c o n ô m ic a q u e co m u m e n te
a c o m e te co n tra to s d e lo n g o p ra z o sejam g a tilh o s p a ra q u e o c o n tra to
fiq u e su sce tív el à s v a ria ç õ e s d as c o n d iç õ e s in ic ia is d e eq u ilíb rio .
O m e sm o ra c io c ín io a p lic a d o p a ra d e fe n d e r re v isã o d e ta rifa
p a ra re p a s s a r os g a n h o s e x tra o rd in á rio s d e u m lu c ro d e sp ro p o rc io n a l
ta m b é m é a p lic a d o à s a lte ra ç õ e s n o c u sto d e o p o rtu n id a d e d o n e g ó c io
p a ra o o p erad o r. N e sse sen tid o , é im p o rta n te g a ra n tir u m co n tra to
eq u ilib ra d o , q u e a c o m p a n h e as m u d a n ç a s o c o rrid a s n o p e río d o d a
co n c e ssã o , co m p re v isib ilid a d e d e re g ra s p a c tu a d a s, q u e p o d e m ser
m e to d o ló g ic a s , su je ita s à s v a ria ç õ e s d o a m b ie n te d e n e g ó c io s, d e fo rm a
a p e rm itir a c o n tin u id a d e d a p re sta ç ã o d o s serv iço s.
C o m o o b je tiv o d e g a ra n tir u m a re g u la ç ã o tra n sp a re n te e com
s e g u ra n ç a ju ríd ic a p a ra p ro p o rc io n a r o a u m e n to d o s in v e stim e n to s n o
seto r, a in c o rp o ra ç ã o d a m a triz d e risc o s n o c o n tra to é ele m e n to
im p re sc in d ív e l p a ra d a r p re v isib ilid a d e e p e rm itir ao re g u la d o r a tu a r de
fo rm a m ais tra n sp a re n te , p e rm itin d o a iso n o m ia n e sse p ro c esso .

5 CONCLUSÃO

O a u m e n to d e in v e stim e n to s p a ra o se to r d e sa n e a m e n to b á sic o
b u s c a a u n iv e rsa liz a ç ã o d o s se rv iç o s e p a ssa p e la n e c e ssid a d e de

135
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

e sta b e le c e r u m a m b ie n te p ro p íc io e atra tiv o p a ra q u e se ja p o ssív e l c o n ta r


co m o a p o rte d o ca p ita l p riv a d o n e sse p ro c esso .
A estab ilid ad e das re g ras p o stas e a se g u ra n ç a ju ríd ic a an d a m de
m ão s d ad as e d ev e m ser p ré -req u isito s p a ra q u e e ssa tra n sfo rm a ç ã o n o
seto r ocorra. A re g u la ç ã o d o seto r, e sp e cialm en te p o r m eio das n o rm as de
re ferên cia, d ev e in c e n tiv a r q u e os c o n tra to s tra g a m n ão so m en te cláusulas,
m as as m eto d o lo g ia s q u e serão u tiliz a d a s em ca d a p ro c e sso regulatório.
E s s a p re v isib ilid a d e re d u z a in se g u ra n ç a ju ríd ic a e a u m en ta a atra tiv id ad e
do s in v estim e n to s p ara se alc a n ç a r a u n iv ersa liz açã o .
A n e c e ssid a d e d e u m a re g u la ç ã o m a is c o n ta tu a l te m sid o ca d a
v e z m a is m en c io n a d a . C o m o o p ró p rio n o m e diz, a re g u la ç ã o c o n tra tu al
d ev e ser v is ta c o m o u m m e c a n ism o n o qual as re g ra s e stão p o stas,
p a c tu a d a s n o c o n tra to a ssin ad o , e s p e c ia lm e n te as m e to d o lo g ia s q u e
serão a p lic a d a s p e la a g ê n c ia re g u la d o ra.
P o r re g ra s p a c tu a d a s em c o n tra to d e v e m o s e n te n d e r c o m o
m e to d o lo g ia s . P o r e x e m p lo , a m e to d o lo g ia q u e s e rá u s a d a p a ra
in d e n iz a ç ã o d o s in v e s tim e n to s n ã o a m o rtiz a d o s ; a fó r m u la q u e se rá
a p lic a d a a n u a lm e n te p a ra o s re a ju s te s ta r if á r io s ; o u a fó r m u la u s a d a
p a r a c á lc u lo d o W A C C 14 (w e i g h t e d a v e r a g e c o s t o f c a p ita l), co m
p a r â m e tro s p ré -d e fin id o s .
E ssa pactu ação estab elecid a no in ício do contrato não significa
n ecessariam en te u m a T IR pré-fixada, co m o m en cio n a d o acim a, pois é
possível p re v er ou v in c u la r com tax as pós-fixadas, d e acordo com as
co n d içõ es d a econom ia. O im p o rtan te n esse caso é a previsibilidade, p actu ar
as reg ras no in ício do contrato, e d ar ao in v estid o r as regras claras perante
as quais ele irá estab elecer sua estratégia p a ra d ecid ir en trar n o negócio.
D e s s a fo rm a , ta m b é m se fa z n e c e ssá rio a n a lisa r os ca so s de
re e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro à lu z d o s c o n tra to s e d e u m a p o ssív el
m e to d o lo g ia q u e seja ca p a z d e tra z e r u m a c e rta u n ifo rm id a d e e
c o n fo rm id a d e n a b u s c a d e u m a e sta b ilid a d e p a ra o a m b ie n te d e n eg ó cio s.

14 O custo médio ponderado do capital determina a remuneração do capital investido.

136
A ssim , o p ro c e sso d e v e ser se p a ra d o em d u as fases: a p rim e ira , q u e
a v a lia a d is trib u iç ã o d o s risco s; e a seg u n d a , q u e im p le m e n ta a
m e to d o lo g ia p a ra aju ste d o co n tra to , p re v ia m e n te p ac tu a d a.
E m sum a, re ssa lta -se q u e o re e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin an c eiro
so m en te p o d e ser re q u e rid o em c a rá te r ex tra o rd in ário , d ian te d e u m ev en to
a d v e rso q u e m o d ifiq u e as re la çõ es o rig in alm en te co n tratad as, d e m o d o a
im p o r u m ô n u s a u m a das p artes, q u e n ão estav a in ic ia lm e n te previsto.
L o g o , u m a re g u la ç ã o e fic ie n te d e m a n d a in d e p e n d ê n c ia do
re g u la d o r fre n te ao c o n c e d e n te , e sta b ilid a d e d e n o rm a s, p re v isib ilid a d e
n o s p ro c e sso s d e tra b a lh o , tra n s p a rê n c ia e a c c o u n ta b ility . P o ré m , m ais
im p o rta n te ain d a, u m a re g u la ç ã o e fic a z tra z c o n tra to s b e m elab o rad o s,
co m p re v is ã o c la ra d e re p a rtiç ã o d e risc o s e fle x ib ilid a d e p a ra a c o m o d a r
a d a p ta ç õ e s p o r re e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro .

137
A REGIONALIZAÇÃO DO SANEAMENTO BÁSICO:
instrum ento p ara p ro m o ve r a universalização e
fortalecer o federalism o cooperativo

C ristia n e B raz*

P artin d o do p ressu p o sto d e q u e a m aio ria d a p o p u lação b rasileira


n ão u su fru i do direito h u m an o à ág u a e ao saneam ento, n a fo rm a p rev ista
n a R eso lu ção A /R es/6 4 /2 9 2 d a O N U e v isan d o aten d e r ao O b jetiv o de
D e se n v o lv im e n to S ustentável (O D S 6), a L ei n° 11.445/2007, que
estab elece as d iretrizes nacio n ais e p a ra a p o lítica federal d o san eam en to no
B rasil, p asso u p o r m o d ificaçõ es significativas, m o rm en te n o que tan g e aos
in stru m en to s d irecio n ad o s à p ro m o çã o d a u n iv ersa liz açã o do acesso a tais
direitos, cu lm in an d o n a ed ição d a L ei n° 14.026/2020.
A L ei n° 14.026/2020, d en o m in ad a co m o N o v o M arco L egal do
S aneam ento, tem co m o fim p recíp u o g aran tir o acesso ao saneam ento
b ásico a to d as as pessoas, ou seja, to rn a r possível a sua u n iv ersa liz açã o de
fo rm a p ro g ressiva, com d estaq u e p ara os co m p o n en tes de abastecim en to de
ág u a p o tável e esg o tam en to sanitário, os quais, respectivam ente, devem
alcan çar o s p ercen tu ais de 9 9 % e 90% , até 31/12/2033.
P a ra ta n to , fo ra m e le ito s alg u n s p ila re s fu n d a m e n ta is, q u ais
sejam , o in c re m e n to d e n o v o s ca p ita is p a ra in v e stim e n to n o seto r
a d v in d o s d a á re a p riv a d a , em ra z ã o d a lim ita ç ã o d o s re c u rso s p ú b lico s;
a se g u ra n ç a ju ríd ic a , m e d ia n te a c o n tra ta ç ã o co m a d e fin iç ã o d e
o b rig a ç õ e s e m e ta s claras, c u jo d e sc u m p rim e n to e n se ja c o n se q u ê n c ia s
ao s co n tra ta d o s, assim c o m o a u n ifo rm id a d e d e re g u la ç ã o , v isa n d o à
m itig a ç ã o d e risco s; a p ro te ç ã o a m b ie n ta l, h a ja v is ta a im p o rtâ n c ia dos

* Procuradora Federal da AGU, em exercício na FUNASA. Especialista em


Saneamento pelo Instituto de Ciências Jurídico-Políticas da Faculdade de Direito da
Universidade de Lisboa.

139
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

re c u rs o s h íd ric o s p a ra su ste n ta b ilid a d e d o p ró p rio se rv iç o d e fo rm a


e fic ie n te e, p o r fim , a re g io n a liz a ç ã o .
N o p re se n te artig o , tra ta re m o s d o p ila r d a re g io n a liz a ç ã o co m o
u m in s tru m e n to in d isp e n sá v e l p ara, além d e g e n e ra liz a r o ac e sso aos
se rv iç o s d e sa n e a m e n to , e n q u a n to m e d id a d e c o rre ç ã o d e d isto rç ã o
so cial, em fa c e d a im p o s sib ilid a d e o u in c a p a c id a d e so cial d e g ra n d e
p a rc e la d a p o p u la ç ã o em a rc a r co m os c u sto s sem p re ju íz o d o g o z o de
o u tro s d ire ito s ta m b é m fu n d a m e n ta is, m a s ta m b é m c o m o fo rm a de
c o rro b o ra r a a d o ç ã o d o fe d e ra lism o c o o p e ra tiv o n o B rasil.
C o n c e itu a lm e n te , n o c o n te x to em q u e e sta m o s a b o rd an d o ,
p o d e m o s a firm a r q u e re g io n a liz a ç ã o é u m a ag re g a ç ã o , u m a ju n ç ã o de
M u n ic íp io s, te n d o c o m o e sc o p o o d e se n v o lv im e n to d e u m a fu n ç ã o
p ú b lic a re c o n h e c id a c o m o d e in te re sse c o m u m re la tiv a ao sa n e a m e n to
b á sic o , c u jo se rv iç o d e v e ser p re sta d o d e fo rm a e fic ie n te e com
s u s te n ta b ilid a d e ec o n ô m ic a.
A d e fin iç ã o d e fu n ç ã o p ú b lic a d e in te re sse com um foi,
in ic ia lm e n te , d e se n v o lv id a p e la ju ris p ru d ê n c ia do STF, na aç ão
p a ra d ig m á tic a , q u e é a A D I 184 2 /R J, que, c o n q u a n to v o lta d a às re g iõ e s
m e tro p o lita n a s, ta m b é m o fe re c e su ste n tá c u lo p a ra o u tras m o d a lid a d e s d e
re g io n a liz a ç ã o . S e ria m a q u e la s a tiv id a d e s q u e ate n d a m a m a is d e u m
M u n ic íp io o u q ue, e m b o ra re strita s ao te rritó rio d e u m ú n ic o ente, sejam
d e p e n d e n te s, c o n c o rre n te s, c o n flu e n te s o u in te g ra d o s d e fu n ç õ e s q u e
e x tra p o la m o seu te rritó rio . E m d e c o rrê n c ia d e sta d ec isã o , foi e d ita d a a
L e i n° 1 3 .0 8 9 /2 0 1 5 (E sta tu to d a M e tró p o le ), q u e a d e fin e co m o a p o lític a
p ú b lic a o u ação, c u ja re a liz a ç ã o seja in v iá v e l d e fo rm a is o la d a o u q u e
c a u se im p a c to em M u n ic íp io s lim ítro fe s.
No san e am en to , e m b o ra h a ja um p o sic io n a m e n to m ais
a sse n ta d o d e q u e o M u n ic íp io se ja o titu la r d o serv iço , o d é fic it h istó ric o
n a su a p re s ta ç ã o e a re a lid a d e n a c io n a l fiz e ra m co m q u e o le g isla d o r
in d u z is s e a a tu a ç ã o in te g ra d a d o s e n tes fe d e ra tiv o s. Isso d e c o rre do
re c o n h e c im e n to d e q u e a im p la n ta ç ã o d a in fra e stru tu ra e x ig id a p a ra o
fu n c io n a m e n to d o se rv iç o d e sa n e a m e n to ex ig e alto s in v e stim e n to s, n ão

140
s u p o rta d o s p e la m a io ria dos M u n ic íp io s b ra sile iro s, alia d a às
d e fic iê n c ia s d a c a p a c id a d e té c n ic o -o p e ra c io n a l e x ig id a s p a ra a su a
c o n c reç ão . A lé m d e tal c o n d iç ã o d o e n te fe d e ra d o , n ã o se p o d e o lv id a r a
p e c u lia rid a d e d o s se rv iç o s em c o m en to , c u jas a tiv id a d e s n a s q u a is se
d e sm e m b ra m q u a se se m p re e x tra p o la m os lim ite s te rrito ria is das
u n id a d e s g e o p o lític a s, b e m c o m o p e lo fa to d e q u e a fo rm a d e sua
re a liz a ç ã o o u o m issã o d e su a p re sta ç ã o em d e te rm in a d a á re a in te rfe re
d ire ta m e n te em o u tras, e x ig in d o -se , p o rta n to , u m o lh a r m a is a b ra n g e n te
n a re a liz a ç ã o d e sta p o lític a p ú b lica.
E m tal c e n ário , a re g io n a liz a ç ã o se d e sta c a c o m o in stru m e n to
p a ra fo rta le c e r o e x e rc íc io d as c o m p e tê n c ia s d o M u n ic íp io , h a ja v is ta q u e
p ro m o v e a ra c io n a liz a ç ã o d o s cu sto s, m e d ia n te o seu c o m p a rtilh a m e n to
e n tre o s e n tes fe d e ra d o s, o q u e in clu i as e stru tu ra s a d m in istra tiv a s p a ra a
re a liz a ç ã o d a g e stã o e p la n e ja m e n to . D a m e s m a fo rm a , em ra z ã o d a
in te g ra ç ã o , to rn a -o v iá v e l sob os p rism a s e c o n ô m ic o e té c n ic o , situ a ç ã o
q u e c o n trib u i p a ra o a u m e n to d a c o m p e titiv id a d e d o s in te re ssa d o s n a
p re s ta ç ã o d o se rv iç o e p a ra e q u a liz a ç ã o d a re la ç ã o ju ríd ic a en tre
c o n c e d e n te e co n c e ssio n á rio . O u tro p o n to a se re ssa lta r é o seu
d ire c io n a m e n to p a ra a o b s e rv â n c ia do p rin c íp io re la c io n a d o à
m o d ic id a d e d e ta rifa s e, so b re tu d o , p a ra p ro m o ç ã o d e g a n h o s d e cu n h o
am b ie n ta l e d e sa ú d e p ú b lic a , c o n sid e ra n d o os im p a c to s d a p o lític a
p ú b lic a em to d a a re g iã o , o q u e re fo rç a a e x istê n c ia d o in te re sse co m u m .
C o m fu lc ro em ta is re a lid a d e s, o le g is la d o r n a c io n a l fo m e n ta a
re g io n a liz a ç ã o d as fu n ç õ e s d o sa n e a m e n to b á sic o n o B ra sil, a ssim co m o
elev a, a p re s ta ç ã o d o se rv iç o d e fo rm a re g io n a liz a d a , te n d o co m o
o b je tiv o s a g e ra ç ã o d e g a n h o s d e esc ala, a g a ra n tia d a u n iv e rsa liz a ç ã o e
a v ia b ilid a d e té c n ic a e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira d o s serv iç o s, à c o n d iç ã o de
p rin c íp io fu n d a m e n ta l. O a tin g im e n to d estes o b je tiv o s d e v e se r la stre a d o
em estu d o s téc n ic o s, q u e p o d e m c o m b in a r d iv e rso s c rité rio s co m o
e c o n ô m ic o s, g e o g rá fic o s, de en g e n h a ria , b a c ia s h id ro g rá fic a s,
in fra e stru tu ra , d e n tre o u tro s, q u e c o n d u z a m à c o n c lu sã o d e q u e a
in te g ra ç ã o p ro p o sta é a q u e se re v e la m a is ad e q u ad a.

141
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

D e sd e já , em fa c e d as re p e rc u ssõ e s a d v in d a s d a in te rp re ta ç ã o
d a lei d o s a n e a m e n to e d o seu re g u la m e n to , h á q u e se d istin g u ir a
re g io n a liz a ç ã o d a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a , eis q u e esta é a p e n a s u m dos
d e s d o b ra m e n to s d a re g io n a liz a ç ã o .
E n q u a n to a re g io n a liz a ç ã o é m a is a m p la e a b a rc a a fu n ç ã o
p ú b lic a d e p lan eja r, fisc a liz a r, re g u la r e p re sta r o serv iço , a p re sta ç ã o
re g io n a liz a d a é m o d a lid a d e d e p re sta ç ã o in te g ra d a d e u m o u m ais
c o m p o n e n te s d o serv iç o d e sa n e a m e n to em m a is d e u m M u n ic íp io . O
e fe ito p rá tic o e d ire to d e tal d ife re n c ia ç ã o e n c o n tra -se a tu a lm e n te
e sta m p a d o n a e x ig ê n c ia d e re g io n a liz a ç ã o p a ra se te r ac e sso ao s re c u rso s
fe d e ra is n ã o -o n e ro so s o u d e o p e ra ç ã o d e c réd ito , o q u e n ã o im p lic a a
o b rig a to rie d a d e d a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a d o serv iço .
P o d e r-se -ia até d iz e r q u e o ideal b u sc a d o p e la lei é reg io n alizar,
in clu siv e a p re sta ç ã o d o serviço, m as a re a lid a d e d istin ta d e cad a
m o d a lid a d e d e re g io n a liz açã o , cu jo s critério s d e a g ru p a m e n to n ão são
co in cid en tes, em d e c o rrê n c ia das p artic u la rid ad es dos entes e n v o lv id o s e
d o h istó ric o do san e am en to em ca d a lo calid ad e, com fo rm a s d e p re sta ção
d istin tas, n ão se p e rm ite in te rp re ta r q u e h a ja u m a im p o siç ã o em tal
sentido. O o b jetiv o é in teg rar, m a s n ã o o co rre de fo rm a au to m ática,
d e p e n d e n d o d e d ec isã o das re sp e c tiv a s estru tu ra s d e go v ern an ça.
A re g io n a liz a ç ã o , e m b o ra b a sta n te a la rd e a d a n o s ú ltim o s
te m p o s, em fa c e d o p ra z o e s ta b e le c id o ao s E sta d o s-m e m b ro s p a ra sua
c o n fig u ra ç ã o (1 5 /0 7 /2 0 2 1 ), n ã o é te m á tic a n o v a n o n o sso o rd e n a m e n to
ju ríd ic o n e m ta m p o u c o n o â m b ito d o sa n e a m e n to b ásico . C o m efeito , de
m o d o g eral, a C o n stitu iç ã o F e d e ra l d e 1988 p re v iu a re g io n a liz a ç ã o , n o
§° d o art. 25, n o q u e ta n g e à in stitu iç ã o d e re g iõ e s m e tro p o lita n a s,
m ic ro rre g iõ e s e a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s, a ssim c o m o a g e stã o a sso c ia d a
d e se rv iç o s p ú b lic o s, sob a fo rm a d e c o n só rc io s e c o n v ê n io s de
c o o p e ra ç ã o , no seu art.2 4 1 . C om o não p o d e ria se r d ife re n te , a
re g io n a liz a ç ã o p re v ista n a lei d e v e d e riv a r d este m o d e lo co n stitu c io n a l,
q u e e le n c a as p o ssib ilid a d e s d e re p a rtir as fu n ç õ e s d e in te re sse co m u m .

142
N o seto r d o san eam en to , a p re sta ç ã o re g io n a liz ad a, o u seja, o
a g ru p a m e n to d e M u n ic íp io s p a ra g e ra r esc ala ad v é m d esd e a d éc ad a de
70, co m o P L A N A S A (P lan o N a c io n a l de S an eam en to ), p o ssib ilitan d o
q u e as c o m p an h ia s estad u a is de san e am en to re alizassem a p re sta ç ã o do
serv iço nos M u n icíp io s, u tiliz a n d o -se do su b síd io c ru z a d o . T al
re g io n a liz a ç ã o era re strita à p re sta ç ã o do serviço, te n d o cu n h o m ais
d ese n v o lv im en tista, o u seja, era v o lta d a à u rb a n iz a ç ã o d as cidades
b ra sile ira s e não h a v ia um p la n e ja m e n to co m u m en v o lv en d o os
M u n icíp io s, q u e co n tin u av a m a e x e rc e r as c o m p etê n cias d e fo rm a isolada.
N a m e sm a to a d a , a n te s d a ed iç ã o d a L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , a
re d a ç ã o d a L ei n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 j á p re v ia a re g io n a liz a ç ã o d a p re sta ç ã o
d o s se rv iç o s (u m ú n ic o p re s ta d o r p a ra v á rio s M u n ic íp io s, c o n tíg u o s ou
n ão ), o q u e j á re p re se n to u u m g ra n d e a v a n ç o em re la ç ã o ao re g im e
an terio r, eis q u e ta m b é m se e x ig ia a u n ifo rm id a d e d e fisc a liz a ç ã o e
re g u la ç ã o e a c o m p a tib ilid a d e d o p la n e ja m e n to .
C o n fo rm e foi dito, atu a lm e n te , a re g io n a liz a ç ã o é u m co n c e ito
m a is a b ra n g e n te e v is a à in te g ra ç ã o d a fu n ç ã o p ú b lic a d e in te re sse
co m u m , e n g lo b a n d o o p la n e ja m e n to , a fisc a liz a ç ã o , a re g u la ç ã o e a
p re s ta ç ã o d o serv iç o , c a b e n d o à c a d a e stru tu ra d e g o v e rn a n ç a d e fin ir as
a tiv id a d e s q u e serão e fe tiv a m e n te c o m p a rtilh a d a s.
Sob o p o n to d e v is ta e strita m e n te ju ríd ic o , a re g io n a liz a ç ã o é
u m a fo rm a d e e x e rc íc io c o n ju n to d e c o m p e tê n c ia s co n stitu c io n a is.
D e sta rte , co m fu lc ro n o art.2 3 , IX , d a C F, o le g isla d o r n a c io n a l ele g e u a
re g io n a liz a ç ã o n o sa n e a m e n to c o m o m e io d e re a liz a ç ã o d a c o m p e tê n c ia
co m u m da U n iã o , E sta d o s, D istrito F e d e ra l e M u n ic íp io s p a ra
p ro m o v e re m as m e lh o ria s nas c o n d iç õ e s de sa n e a m e n to , c u ja
c o m p e tê n c ia p a ra a p re sta ç ã o d o se rv iç o é d o M u n ic íp io , n o s m o ld e s do
art.3 0 , V , d a C a rta M ag n a .
N o se to r d o san e am en to , a a tu a ç ã o c o n ju n ta e c o la b o ra tiv a dos
e n tes fe d e ra d o s se m o s tra im p re sc in d ív e l p a ra v ia b iliz a r os av a n ç o s
a lm e ja d o s co m o n o v o m a rc o leg al, d e sta c a n d o -se , in c lu siv e , q u e n a
p o lític a fe d e ra l, u m a d a s d ire triz e s é o e stím u lo à im p le m e n ta ç ã o de

143
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

in fra e s tru tu ra s e se rv iç o s c o m u n s a M u n ic íp io s, m e d ia n te m e c a n ism o s


d e c o o p e ra ç ã o e n tre e n tes fe d e ra d o s, assim c o m o u m d o s o b je tiv o s é
p ro m o v e r a lte rn a tiv a s d e g e stã o q u e v ia b iliz e m a a u to ssu ste n ta ç ã o
e c o n ô m ic a e fin a n c e ira d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to , co m ê n fa se n a
c o o p e ra ç ã o fe d e ra tiv a .
N o c o n te x to d a s c o m p e tê n c ia s, re sto u a sse n ta d o p e lo S T F , n a
A D I 1 8 4 2 /R J, q u e se to rn o u p a ra d ig m a , a c o m p e tê n c ia d o s M u n ic íp io s
p a ra a p re s ta ç ã o d o se rv iç o d e in te re sse lo cal, c u jo e x e rc íc io é fe ito de
fo rm a c o n ju n ta n o ca so d e re g io n a liz a ç ã o , a q ual em n a d a fe re a
a u to n o m ia do e n te m u n ic ip a l. T al e n te n d im e n to foi, in clu siv e,
c o n firm a d o , em d e z e m b ro d e 2 0 2 0 , ap ó s a ed iç ã o d a L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 ,
q u a n d o d o ju lg a m e n to d o s E m b a rg o s d e D e c la ra ç ã o n a m e s m a ação,
o c o rrid o em sessã o v irtu a l d e 13 a 2 0 d e n o v e m b ro d e 2020.
U m a v ez que as dem ais form as de regionalização previstas n o novo
m arco d evem ser pautadas no interesse com um , a A D I 1842/R J continua a
ser o p arâm etro p ara interpretação das estruturas derivadas dos com andos
constitucionais. C om efeito, em b reve síntese, p ode-se afirm ar que é
caracterizado u m interesse com um no saneam ento, que n ão se identifica com
o sim ples som atório dos interesses locais, quando a sua condução p o r u m
M un icíp io p o ssa colocar em risco to d o o esforço do conjunto, b em com o
en sejar consequências negativas para a saúde e m eio am biente de to d a a
região. E sta atuação com partilhada e em cooperação pelos entes federados
n ão transfere a com petência dos M unicípios p ara o E stado, nem tam pouco
fere a au to n o m ia daqueles, o que se garante m ediante a criação de órgão
colegiado, que, em b o ra não se exija a participação paritária, n ão pode
co ncentrar o p o d er de decisão em u m ún ico ente.
E m c o te jo co m a d e c isã o d o ST F, n o q u e se re fe re à d e fin iç ã o
d e in te re ss e co m u m p a ra a p re sta ç ã o d o s serv iço s, o b se rv a -se q u e o n o v o
m a rc o a d o to u u m p o sic io n a m e n to d istin to , h a ja v is ta q u e o lim ita àq u e le
p re s ta d o nas re g iõ e s m e tro p o lita n a s, a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e
m ic ro rre g iõ e s; ex ig e q u e M u n ic íp io s c o m p a rtilh e m , n o to d o o u em p arte,
d e in sta la ç õ e s o p e ra c io n a is d e in fra e stru tu ra e se re fe re a p e n a s aos

144
c o m p o n e n te s d e a b a ste c im e n to d e á g u a e e sg o ta m e n to san itário . E m
c o n tra p o n to , d e fin e o se rv iç o d e in te re sse lo cal c o m o fu n ç õ e s p ú b lic a s e
serv iç o s, c u jas in sta la ç õ e s ate n d a m a u m ú n ic o M u n ic íp io . O le g isla d o r,
fa z e n d o u m p a ra le lo co m ta is co n c eito s, e sta b e le c e a titu la rid a d e p e lo
serv iço , e s ta tu in d o q u e, n a p rim e ira situ ação , se rá d o s M u n ic íp io s em
c o n ju n to co m o E sta d o e, n o seg u n d o , e x c lu siv a m e n te d o M u n ic íp io .
T a is d isp o siç õ e s d a lei m e re c e m d iv e rsa s críticas, eis q ue, além
d e n ã o a te n d e re m ao s in d ic a d o re s c o n stitu c io n a is j á e sta b e le c id o s p e lo
S T F p a ra v e rific a ç ã o d o in te re sse co m u m , n ã o a b ra n g e m to d a s as fo rm a s
d e re g io n a liz a ç ã o , a ssim c o m o n ã o tra ta m d o s d e m a is c o m p o n e n te s dos
se rv iç o s d e san e am en to , sen d o re strito ao a b a ste c im e n to d e á g u a e ao
e sg o ta m e n to san itário . D o m e sm o m o d o , ta m b é m se v e rific a u m a
d is c re p â n c ia co m a L e i n° 1 3 .0 8 9 /2 0 1 5 , q u e é esp e cial n o q u e ta n g e ao
tra ta m e n to d o in te re sse c o m u m n a s re g iõ e s m e tro p o lita n a s e em
a g lo m e ra ç õ e s u rb a n as, c u jo s c o n flito s id e n tific a d o s p o d e m fra g iliz a r e
até d ific u lta r a a p lic a ç ã o d a L ei n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 .

1 D A S M O D A L ID A D E S D E R E G I O N A L I Z A Ç Ã O

C o n so a n te j á foi d ito alh u re s, a re g io n a liz a ç ã o é u m a a g re g a ç ã o


d e M u n ic íp io s, c u ja ú ltim a fin a lid a d e é a lc a n ç a r a u n iv e rsa liz a ç ã o .
O c o rre q ue, c o m o sig n ific a o c o m p a rtilh a m e n to d e c o m p e tê n c ia s
co n stitu c io n a is, o seu su b stra to p a ra te r v a lid a d e d e v e se r p re v isto n a
C o n s titu iç ã o F ed eral.
N e ste c e n ário , a C a rta M a g n a a d m ite o e x e rc íc io c o n ju n to
d e sta s c o m p e tê n c ia s d o s e n tes fe d e ra d o s em d u as situ açõ es: re g iõ e s
m e tro p o lita n a s, a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e m ic ro rre g iõ e s (§3° d o a rt.2 5 ) e
g e s tã o a s s o c ia d a d e serv iç o s, a tra v é s d e c o n só rc io s e c o n v ê n io de
c o o p e ra ç ã o (a rt.2 4 1 ). C o m efeito , as e stru tu ra s p re v ista s n a L e i n°
1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , a lte ra d a p e la L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 d ev e m se r d e riv a d a s
d e ste s m o d e lo s c o n stitu c io n a is.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

No â m b ito leg al, as c o m p e tê n c ia s que podem ser


c o m p a rtilh a d a s n a re g io n a liz a ç ã o são aq u e la s p ró p ria s d o titu la r, ao
fo rm u la r a p o lític a p ú b lic a d o sa n e a m e n to , as q u a is g a n h a m d im e n sã o
te rrito ria l p a ra a lc a n c e de to d o s os M u n ic íp io s, d e n tre o u tras,
d e s ta c a n d o -s e as se g u in te s: a e la b o ra ç ã o d o p la n o d e sa n e a m e n to , com
p re d o m ín io d o p la n o re g io n a l so b re o m u n ic ip a l, a ser o b se rv a d o n a
e x e c u ç ã o d o serv iço ; a p re sta ç ã o d ire ta d o se rv iç o o u su a co n c e ssã o , b e m
c o m o a d e fin iç ã o d a e n tid a d e re g u la d o ra e d e fisc a liz a ç ã o , in d e p e n d e n te
d a m o d a lid a d e d e p re sta ç ã o ; o e sta b e le c im e n to d o s m e c a n ism o s de
c o n tro le so cial e a im p le m e n ta ç ã o d o siste m a d e in fo rm a ç õ e s a c e rc a dos
se rv iç o s e, p o r fim , a p o ssib ilid a d e d e in te rv e n ç ã o e d e re to m a d a d a
o p eraçã o , q u a n d o e x e c u ta d o em d e sc o n fo rm id a d e co m as n o rm a s
p re v ia m e n te e stab e lecid as.
R essalta-se, todavia, que n em to d as as co m p etên cias precisam ser
com p artilh ad as, cab en d o à estru tu ra d e g o v ern an ça defini-las, inclusive
com a p o ssib ilid ad e de realizá-las d e fo rm a p rogressiva, co m o deve
aco n tecer p rin cip alm en te n o que tan g e à p re sta ção dos serviços, em face d a
d iv ersid ad e ex istente n o s M unicípios. F u n d am en tal é o d irecio n am en to p ara
u m a in teg ração das fu n çõ es p úblicas, com p lan ejam en to e d efin ição de ente
re g u la d o r ú n ico, sendo as decisões v o ltad as ao aten d im en to do interesse
co m u m , q u e d ev e p re v alece r sobre o local.
N o â m b ito d a re g io n a liz a ç ã o , os e stu d o s d e v ia b ilid a d e té c n ic a
e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira são d e g ra n d e re le v o , ta n to p a ra se d e fin ir os
fa to re s d e a g re g a ç ã o d o s M u n ic íp io s, o u seja, p a ra a p ró p ria fo rm a ç ã o
d a re g iã o , a ssim c o m o p a ra fo rm u la r o p la n e ja m e n to d a e x e c u ç ã o das
fu n ç õ e s em c a d a u m d o s c o m p o n e n te s d o serv iço . A lé m d este fa to r
té c n ic o , a d im e n sã o p o lítica , o u seja, o d iá lo g o in te rfe d e ra tiv o , c a p a z d e
c o n d u z ir a u m a c o n v e rg ê n c ia d e in te re sse s e à p a rtic ip a ç ã o e fe tiv a dos
M u n ic íp io s, é o p o n to fu lcral d o q u al d e p e n d e a a m p lia ç ã o d o s se rv iç o s
p a ra p ro m o ç ã o d a u n iv e rsa liz a ç ã o .
S e g u n d o a L ei d o S a n e a m e n to , a re g io n a liz a ç ã o p o d e ser
e stru tu ra d a nas se g u in te s m o d a lid a d e s: a) re g iã o m e tro p o lita n a ,

146
a g lo m e ra ç ã o u rb a n a o u m ic ro rre g iã o ; b ) u n id a d e s re g io n a is; c) b lo c o de
re fe rê n c ia e d) re g iõ e s in te g ra d a s d e d e se n v o lv im e n to e c o n ô m ic o (R id e).
A lé m d estas, o D e c re to n° 10.588, d e 2 4 d e d e z e m b ro d e 2 0 2 0 ain d a
re c o n h e c e c o m o tal o c o n só rc io in te rm u n ic ip a l p a ra os se rv iç o s de
lim p e z a u rb a n a , d e m a n e jo d e re síd u o s só lid o s u rb a n o s o u d e d re n a g e m
u rb a n a e m a n e jo d e ág u a s p lu v iais.
D etalh ando tais estruturas, tem os a região m etropolitana,
aglom eração u rb an a ou m icrorregião, q u e é instituída pelos Estados,
m ed ian te lei com plem entar, nos term os do §3° do art. 25 d a C onstituição
F ederal e se refere a u m agrupam ento de M unicípios lim ítrofes, estando
atualm ente reguladas p elo E statuto d a M etrópole, originado d a A D I 1842/RJ.
A ju n ç ã o d o s M u n ic íp io s n e ste tip o d e re g io n a liz a ç ã o d e v e ser
p re c e d id a d a re a liz a ç ã o d e estu d o s téc n ic o s, p o r m e io d o s q u a is d ev e m
se r e x p lic ita d o s os c rité rio s a d o ta d o s p a ra a d e fin iç ã o d o s e n te s e das
fu n ç õ e s p ú b lic a s d e in te re sse co m u m , a ssim c o m o d e au d iê n c ia s
p ú b lic a s, co m a m p la p a rtic ip a ç ã o d as p o p u la ç õ e s en v o lv id as.
A p ó s su a co n c lu sã o , e d ita -se lei c o m p le m e n ta r p e lo E sta d o ou
p e lo s E s ta d o s ao s q u a is p e rte n c e m os M u n ic íp io s d e v id a m e n te
id e n tific a d o s, cu ja p a rtic ip a ç ã o é co m p u lsó ria , sem c o m p ro m e tim e n to
d a a u to n o m ia , n a fo rm a j á d e fin id a p e lo ST F, n a A D I 1 8 4 1 /R J e n a
18 4 2 /R J. A re fe rid a lei ta m b é m d ev e in d ic a r q u ais são as fu n ç õ e s
p ú b lic a s d e in te re sse co m u m q u e ju s tific a m a c ria ç ã o d a u n id a d e
te rrito ria l; o s m e io s d e c o n tro le social d o e x e rc íc io d e ta is fu n ç õ es, assim
c o m o a c o n fo rm a ç ã o d a e stru tu ra d e g o v e rn a n ç a in te rfe d e ra tiv a .
A reg io n alização im p õ e a g o v ern an ça interfederativa, q u e consiste
b asica m en te n este co m p artilh am en to de resp o n sab ilid ad e e ações entre os
entes d a fed eração, p ara organização, p lan ejam en to e ex ecu ção d a função
p ú b lica de in teresse com um . D e n tre seus prin cíp io s e diretrizes, im p o rtan te
ressaltar que d ev e ser re g id a p ela p re v alên cia d o in teresse co m u m sobre o
local e o b serv ân cia das p ecu liarid ad es regionais e locais; d ev e p re z a r p ela
au to n o m ia m un icipal, b e m co m o deve h av e r m eio de co m p artilh am en to d a
o rg an ização ad m inistrativa, com rateio dos custos.

147
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

P a ra a su a m a te ria liz a ç ã o , o u seja, p a ra a a rtic u la ç ã o e to m a d a


d e d e c isõ e s d ev e ser c ria d a u m a e stru tu ra d e g o v e rn a n ç a p ró p ria , q u e é
u m ó rg ã o c o le g ia d o , c o m p o sto p o r re p re se n ta n te s d o s e n tes p o lític o s
(in s tâ n c ia e x e c u tiv a ), p o r re p re se n ta n te s d a so c ie d a d e civ il (in stâ n c ia
c o le g ia d a ); o rg a n iz a ç ã o p ú b lic a co m fu n ç õ e s té c n ic o -c o n su ltiv a s; e
siste m a in te g ra d o d e a lo c a ç ã o d e re c u rso s e d e p re sta ç ã o d e c o n ta s.
P o n tu a -se que, c o n so a n te d e sta c a d o n o s v o to s p ro fe rid o s p elo s
M in istro s, n a A D I 1 8 4 2 /R J, a p a rtic ip a ç ã o d o s e n tes fe d e ra d o s n e ste
ó rg ã o c o le g ia d o n ão n e c e s s ita se r p a ritá ria , p o d e n d o se r p ro p o rc io n a l à
im p o rtâ n c ia e c o n ô m ic o -so c ia l d e c a d a um , sen d o re le v a n te , n o en tan to ,
q u e n ã o h a ja a c o n c e n tra ç ã o d o p o d e r d e c isó rio em ú n ic o e n te .
A d e m a is, d e fin iu -se q u e esta e s tru tu ra n ã o a ssu m e id e n tid a d e
p o lític o -in stitu c io n a l p ró p ria , o u seja, n ã o e x e rc e n e n h u m a c o m p e tê n c ia
p ró p ria , m a s sim d eriv a d a, te n d o n a tu re z a m e ra m e n te a d m in istra tiv a .
S egundo o v o to do M in istro R ic a rd o L e w a n d o w sk i, a re g iã o
m e tro p o lita n a c o rre sp o n d e a um a a u ta rq u ia territo ria l,
in te rg o v e rn a m e n ta l e p lu rifu n c io n a l, sem p e rso n a lid a d e p o lític a . A lei
c o m p le m e n ta r p o d e lh e c o n fe rir p e rso n a lid a d e ju ríd ic a , d e n a tu re z a
te rrito ria l-a u tá rq u ic a e lh e a trib u ir a titu la rid a d e d o s se rv iç o s p ú b lic o s de
in te re ss e c o m u m . N o m e sm o sen tid o , o M in istro J o a q u im B a rb o s a se
m a n ife sta n o se n tid o d e q u e a titu la rid a d e d o e x e rc íc io d as fu n ç õ e s
p ú b lic a s d e in te re sse c o m u m p a ssa p a ra a n o v a e n tid a d e p ú b lic o -
te rrito ria l a d m in istra tiv a , d e c a rá te r in te rg o v e rn a m e n ta l.
A o u tra e stru tu ra é a d e n o m in a d a u n id a d e re g io n a l de
sa n e a m e n to b á sic o , in stitu íd a p o r lei o rd in á ria e stad u a l, a q ual d e fin e a
re u n iã o d e u m g ru p o d e M u n ic íp io s n ã o n e c e ssa ria m e n te co n tín u o s
te rrito ria lm e n te . A su a e stru tu ra d e g o v e rn a n ç a d e v e se g u ir o d isp o sto n a
L e i n° 1 3 .0 8 9 /2 0 1 5 e te m p o r fin a lid a d e a te n d e r a d e q u a d a m e n te às
e x ig ê n c ia s d e h ig ie n e e sa ú d e p ú b lic a , o u p a ra d a r v ia b ilid a d e e c o n ô m ic a
e té c n ic a ao s M u n ic íp io s m e n o s fa v o re c id o s, e sta n d o em c o n so n â n c ia ,
p o rta n to , c o m o o b je tiv o d a re g io n a liz a ç ã o p re v isto n a A D I 1842/R J.

148
A u n id a d e re g io n a l a d v é m d o art. 2 4 1 , d a C F , d e m o d o que,
m e d ia n te a lei estad u a l, c ria -se u m c o n so rc ia m e n to e n tre os M u n ic íp io s,
c u ja p a rtic ip a ç ã o e fe tiv a d e p e n d e d a a d e sã o v o lu n tá ria d e c a d a ente.
P o n tu a -s e q u e a ed iç ã o d a lei ju n ta m e n te co m a d e c la ra ç ã o fo rm a l do
P re fe ito M u n ic ip a l a d e rin d o à e stru tu ra , c o n fo rm e p re v isto n o D e c re to
n° 1 0 .5 8 8 /2 0 2 0 , j á é su fic ie n te p a ra a p e rfe c tib iliz a ç ã o d e sta m o d a lid a d e
de re g io n a liz a ç ã o , p a ra fin s de a lo c a ç ã o de re c u rso s p ú b lico s.
C o n s id e ra n d o q u e o d isp o sitiv o c o n stitu c io n a l, d o q ual d e riv a a u n id a d e
re g io n a l, e x ig e q u e a fo rm a ç ã o d e c o n só rc io o u c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o
se ja p re c e d id a d e a u to riz a ç ã o le g is la tiv a d o ente, a e x ig ê n c ia d e m e ra
d e c la ra ç ã o d o P re fe ito , p a ra ad e são , p o d e e v e n tu a lm e n te ser o b je to de
q u e s tio n a m e n to n a v ia ju d ic ia l.
P a ra a su a in stitu iç ã o , é fu n d a m e n ta l q u e seja d e m o n stra d a a
s u s te n ta b ilid a d e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira , além de o D e c re to n°
1 0 .7 1 0 /2 0 2 1 , c o rrig in d o a o b rig a to rie d a d e p re v is ta n o D e c re to n°
1 0 .5 8 8 /2 0 2 0 e sta b e le c e r que, p re fe re n c ia lm e n te , d e v e rá in te g rá -la , p e lo
m e n o s, u m a re g iã o m e tro p o lita n a . E m b o ra n ã o se ja u m a im p o siç ã o
in tra n sp o n ív e l, o b se rv a -se que, nas situ a ç õ e s em que a re g iã o
m e tro p o lita n a c o m p u se r a u n id a d e re g io n a l, p o d e g e ra r u m a in se g u ra n ç a
ju ríd ic a , ca so n ã o h a ja u n ifo rm id a d e e n tre as le is c o m p le m e n ta r e
o rd in á ria d o E stad o .
P o r d isp o siç ã o leg al, as re g ras a tin e n te s à re g iã o m e tro p o lita n a
e às a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s, p re v ista s n o E sta tu to d a M e tró p o le , ta m b é m
são ap lic á v e is às u n id a d e s re g io n a is, se n d o ce rto q u e aqui d ev e m re sso a r
as m e sm a s o b se rv a ç õ e s q u a n to à p e rso n a lid a d e ju ríd ic a e à e stru tu ra de
g o v e rn a n ç a in te rfe d e ra tiv a j á a b o rd a d a s a n te rio rm e n te .
O b lo c o d e re fe rê n c ia , p o r su a v ez, é u m a a g lu tin a ç ã o de
M u n ic íp io s n ã o n e c e ssa ria m e n te co n tíg u o s, d e c o rre n te d e ato d o P o d e r
E x e c u tiv o fe d e ra l, a p a rtir d e d e lib e ra ç ã o d o C o m itê In te rm in iste ria l de
S a n e a m e n to B á sic o - C isb , a tu a n d o a U n iã o a p e n a s d e fo rm a su b sid iá ria
ao E sta d o , q u a n d o n ã o fo r c ria d a e stru tu ra re g io n a liz a d a até o p ra z o de
u m a n o d a p u b lic a ç ã o d a L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , p o rta n to , até 15/0 7 /2 0 2 1 .

149
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

D ife ren te d a u n id ad e regional, o b lo co de referê n cia só se to rn a


p erfeito ap ó s a criação p elo s M unicípios, p rev isto s n o ato d a U nião, de u m
co n só rcio ou de u m con v ên io d e cooperação, am bos to talm en te reg id o s p ela
L ei n° 11.107/2005, in clu siv e qu an to às estruturas de governança.
C om o se p erceb e , o ato da U n iã o tra z apenas um
d ire c io n a m e n to , u m a o rie n ta ç ã o p a ra o a d e n sa m e n to te rrito ria l d o s en tes
m u n ic ip a is, o q ual d e v e rá se r p a u ta d o em c rité rio s téc n ic o s, q u e
in d iq u e m as v a n ta g e n s e a v ia b ilid a d e d a in te g ra ç ã o p ro p o sta. C a b e rá à
U n iã o , n o P la n o N a c io n a l d e S a n e a m e n to , e sta b e le c e r os o b je tiv o s e
m e ta s ta n to n a c io n a is q u a n to as re g io n a liz a d a s d e cu rto , m é d io e lo n g o
p ra z o s p a ra a u n iv e rsa liz a ç ã o , o q u e fo rta le c e a e x ig ê n c ia d e u m
p la n e ja m e n to c o n sta n te q u a n to a o tem a.
O s c o n só rc io s, n a fo rm a p re v ista n a L e i n° 1 1 .1 0 7 /2 0 0 5 ,
a d q u ire m p e rs o n a lid a d e ju ríd ic a d e a sso c ia ç ã o p ú b lic a o u d e p e sso a
ju ríd ic a d e d ire ito p riv a d o sem fin s e c o n ô m ic o s, sen d o que, n o â m b ito
d o sa n e a m e n to b á sic o , a d m ite -se a p e n a s os d e n a tu re z a p ú b lic a , os q u ais
p o d e rã o p re s ta r o se rv iç o d e fo rm a d ire ta ao s c o n so rc ia d o s p e la
in s titu iç ã o d e a u ta rq u ia in te rm u n ic ip a l, q u e in te g ra a a d m in istra ç ã o
in d ire ta d e to d o s.
O c o n só rc io p ú b lic o é c o n stitu íd o p o r co n tra to , q u e d e v e ser
a n te c e d id o p e la su b sc riç ã o d o p ro to c o lo d e in te n ç õ e s, n o q ual d e v e rá
co n star, d e n tre o u tras, a p re v isã o d e q u e a a sse m b le ia g eral é a in stâ n c ia
m á x im a d o c o n só rc io p ú b lic o , o n ú m e ro d e v o to s p a ra as suas
d e lib e ra ç õ e s e o n ú m e ro d e v o to s d e c a d a e n te d a fe d e ra ç ã o , g a ra n tin d o -
se a p a rtic ip a ç ã o e fe tiv a d o s M u n ic íp io s.
C o n q u a n to a L ei n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 n ã o te n h a p re v isto a R e g iã o
In te g ra d a d e D e se n v o lv im e n to (R id e ) fo rm a lm e n te e n tre as m o d a lid a d e s
d e re g io n a liz a ç ã o , h á d isp o siç ã o n o se n tid o d e se a p ro v e ita r aq u e la s
e stru tu ra s j á cria d as, n a fo rm a d o art.43 d a C o n stitu iç ã o F e d e ra l, p a ra
p ro m o v e r a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a d o serv iç o d e sa n e a m e n to , d e sd e q u e
h a ja a a n u ê n c ia d o s M u n ic íp io s in te g ra n te s d a m esm a. A d e m a is,
v e rific a -s e q u e, n o P la n o N a c io n a l d e S an ea m e n to , j á d e v e rá c o n te r os

150
p la n o s re g io n a is d e sa n e a m e n to b á sic o , e la b o ra d o s e e x e c u ta d o s em
a rtic u la ç ã o co m os E sta d o s, D is trito F e d e ra l e M u n ic íp io s e n v o lv id o s.
Em re la ç ã o ao s c o n só rc io s p ú b lic o s e os c o n v ê n io s de
c o o p e ra ç ã o , re g u la d o s p e la L e i n° 1 1 .1 0 7 /2 0 0 5 , c o m o fo rm a s v o lu n tá ria s
d e a g ru p a m e n to d e e n tes fe d e ra d o s p a ra re a liz a ç ã o d e o b je tiv o s de
in te re ss e co m u m , o N o v o M a rc o e o D e c re to n° 1 0 .5 8 8 /2 0 2 0 , n o â m b ito
do sa n e a m e n to b á sic o , e sta tu íra m re g ra m e n to s esp e cífico s.
De in ício , te m -se que os c o n só rc io s a d m itid o s são
e x c lu s iv a m e n te os in te rm u n ic ip a is, os q u a is p o d e rã o p re s ta r os serv iç o s
d ire ta m e n te , m e d ia n te a in stitu iç ã o d e u m a a u ta rq u ia in te rm u n ic ip a l, ou
p o r c o n tra ta ç ã o , p re c e d id a de licita ção .
T ais e n tes se d ife re n c ia m , p a ra e fe ito d e re c o n h e c im e n to d a
re g io n a liz a ç ã o , n o â m b ito d a p o lític a fe d e ra l de sa n e a m e n to , a d e p e n d e r
de o o b je to e n v o lv e r os c o m p o n e n te s a b a ste c im e n to de água e
e sg o ta m e n to sa n itá rio (p rim e iro g ru p o ) o u aq u e le s c o n c e rn e n te s aos
se rv iç o s de lim p e z a p ú b lic a , de m a n e jo de re síd u o s só lid o s u rb a n o s ou
de d re n a g e m e m a n e jo de ág u a s p lu v ia is (se g u n d o g ru p o ).
O s co n só rc io s p ú b lic o s o u c o n v ê n io s d e c o o p e ra ç ã o d este
s e g u n d o g ru p o de se rv iç o s são re c o n h e c id o s c o m o m o d a lid a d e s de
re g io n a liz a ç ã o , m e d ia n te a fo rm a liz a ç ã o p re v is ta n a L e i n° 1 1 .1 0 7 /2 0 0 5 ,
d e sd e q u e a re u n iã o v ise à g e ra ç ã o d e g a n h o s d e esc ala, à g a ra n tia de
u n iv e rs a liz a ç ã o e d a v ia b ilid a d e té c n ic a e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira , com
u n ifo rm iz a ç ã o do p la n e ja m e n to , d a re g u la ç ã o e d a fisc a liz a ç ã o . E m se
tra ta n d o de c o n só rc io a tin e n te ao s se rv iç o s de re síd u o s só lid o s u rb a n o s,
d e v e rá te r a d e stin a ç ã o a m b ie n ta lm e n te adequada com o c rité rio
o rie n ta d o r d a re g io n a liz a ç ã o .
Já em se tra ta n d o d e c o n só rc io s p ú b lic o s o u c o n v ê n io s de
c o o p e ra ç ã o do p rim e iro g ru p o in stitu íd o s, a n tes da ed iç ã o do D e c re to n°
1 0 .5 8 8 /2 0 2 0 , n ã o são re c o n h e c id o s c o m o e stru tu ra s d e re g io n a liz a ç ã o de
fo rm a au tô n o m a. P a ra ta n to , d e p e n d e m d a ed iç ã o d e lei o rd in á ria
e sta d u a l o u d e ato d a U n iã o , in stitu in d o u n id a d e re g io n a l o u b lo c o de
re fe rê n c ia , re s p e c tiv a m e n te , e sta n d o c o n d ic io n a d o s ain d a à c o n sta ta ç ã o

151
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

de que não p re ju d iq u e m a v ia b ilid a d e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira da


u n iv e rs a liz a ç ã o e a re g io n a liz a ç ã o d a p a rc e la re sid u a l d o s M u n ic íp io s do
E sta d o , assim c o m o n ã o os c o m p o n h a m M u n ic íp io s in te g ra n te s de
re g iã o m etro p o lita n a .
O D e c re to n° 1 0 .7 1 0 /2 0 2 1 , p o r su a v ez , p a sso u a re c o n h e c ê -lo s
c o m o m o d a lid a d e d e re g io n a liz a ç ã o , d e fo rm a a u tô n o m a , d e sd e q u e
te n h a sid o fe ita a re g io n a liz a ç ã o d e to d o o te rritó rio d o E sta d o e as
e stru tu ra s a p re se n ta re m v ia b ilid a d e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira .
A in d a n o c o n te x to d a p o lític a fe d e ra l d e sa n e a m e n to , a
re g io n a liz a ç ã o se d e sp o n ta c o m o d ire triz e c o m o o b jetiv o , se n d o u m a
d as c o n d ic io n a n te s p a ra a a lo c a ç ã o d e re c u rso s p ú b lic o s fe d e ra is e p a ra
fin a n c ia m e n to s co m re c u rso s g e rid o s o u o p e ra d o s p o r ó rg ã o s ou
e n tid a d e s d a U n iã o , o q u e a c a b a re p re s e n ta n d o u m e stím u lo p a ra a
a d e sã o v o lu n tá ria às e stru tu ra s.
A ssim , p a ra se te r ac esso ao s re c u rso s fe d e ra is, é im p re sc in d ív e l
d e m o n s tra r a e stru tu ra ç ã o d a re g io n a liz a ç ã o , c o m a c o n stitu iç ã o d a
e n tid a d e d e g o v e rn a n ç a e a a d e sã o à e stru tu ra d e g o v e rn a n ç a , n o ca so de
u n id a d e re g io n a l, b lo c o d e re fe rê n c ia e n a h ip ó te se d e c o n só rc io de
a b a ste c im e n to d e á g u a e e sg o ta m e n to san itário , q u a n d o o E sta d o n ão
e stiv e r to ta lm e n te re g io n a liz a d o .
A c o m p ro v a ç ã o d a e s tru tu ra ç ã o d a re g io n a liz a ç ã o v a r ia a
d e p e n d e r d a m o d a lid a d e , se n d o a e d iç ã o d a le i c o m p le m e n ta r , n o c a so
d e re g iã o m e tro p o lita n a , a g lo m e r a ç ã o u r b a n a o u m ic ro rr e g iã o ; a
d e c la ra ç ã o fo rm a l d o P re f e ito d o M u n ic íp io d e a d e s ã o a o s te rm o s d a
g o v e r n a n ç a e s ta b e le c id a n a lei o rd in á ria , n o c a s o d a s u n id a d e s
re g io n a is , e a a s s in a tu ra d o c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o o u c o m a
a p r o v a ç ã o d o c o n s ó rc io p o r le i d o M u n ic íp io , em se tr a ta n d o d e b lo c o
d e re fe rê n c ia ; c o n s ó r c io r e la tiv o a o s s e rv iç o s d e lim p e z a p ú b lic a , d e
m a n e jo d e re s íd u o s s ó lid o s u r b a n o s o u d e d re n a g e m e m a n e jo d e
á g u a s p lu v ia is o u c o n s ó rc io p a r a á g u a e e s g o to , q u a n d o o E s ta d o j á
e s tiv e r to ta lm e n te re g io n a liz a d o .

152
A e x ig ê n c ia d a re g io n a liz a ç ã o , p a ra fin s d e a lo c a ç ã o de
re c u rso s, foi d isp e n sa d a n a h ip ó te se d e e m e n d a p a rla m e n ta r p o r m e io de
tra n s fe rê n c ia esp e c ia l p re v is ta n o in c iso I d o c a p u t d o a rt.1 6 6 -A d a
C o n s titu iç ã o F e d e ra l e, te m p o ra ria m e n te , n o p ra z o p re v isto n o §1° do
art.1 1 -B d a L e i n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , o u seja, até 3 1 /0 3 /2 0 2 2 , p a ra os
M u n ic íp io s em q u e ain d a n ã o e steja m re g io n a liz a d o s.

R E F E R Ê N C IA S

B R A S IL . C o n s titu iç ã o F ed eral (1 9 8 8 ). D isp o n ív e l em :


h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /c o n s titu ic a o /c o n s titu ic a o .h tm .
A c e sso em : 16 m a io 2 0 2 1 .

B R A S IL , D e c re to n° 1 0 .5 8 8 , d e 2 4 d e d e z e m b r o d e 2 0 2 0 . D isp o n ív e l
em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /_ a to 2 0 1 9 -
2 0 2 2 /2 0 2 0 /d e c re to /D 1 0 5 8 8 .h tm . A c e sso em : 31 m a io 2021.

B R A S IL , D e c r e to n° 1 0 .7 1 0 , d e 31 d e m a io d e 2 0 2 1 . D isp o n ív e l em :
h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /_ a to 2 0 1 9 -
2 0 2 2 /2 0 2 1 /D e c re to /D 1 0 7 1 0 .h tm A c e sso em : 31 m a io 2021.

B R A S IL , L e i n° 1 1 .1 0 7 , d e 06 d e a b r i l d e 2 0 0 5 . D isp o n ív e l em :
h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /_ a to 2 0 0 4 -
2 0 0 6 /2 0 0 5 /le i/l1 1 1 0 7 .h tm A c e sso em : 16 m a io 2021.

B R A S IL , L e i n° 1 1 .4 4 5 , d e 05 d e j a n e i r o d e 2 0 0 7 . D isp o n ív e l em :
h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /_ a to 2 0 0 7 -
2 0 1 0 /2 0 0 7 /le i/l1 1 4 4 5 .h tm A c e sso em : 16 m a io 2021.

B R A S IL , L e i n° 1 3 .0 8 9 , d e 12 d e j a n e i r o d e 2 0 1 5 . D isp o n ív e l em :
h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /_ a to 2 0 1 5 -
2 0 1 8 /2 0 1 5 /le i/l1 3 0 8 9 .h tm . A c e sso em : 16 m a io 2 0 2 1 .

153
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

B R A S IL , L e i n° 1 4 .0 2 6 , d e 15 d e j u l h o d e 2 0 2 0 . D isp o n ív e l em :
h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /_ a to 2 0 1 9 -
2 0 2 2 /2 0 2 0 /le i/l1 4 0 2 6 .h tm A c e sso em : 16 m a io 2021.

B R A S IL , S u p rem o T ribunal F ederal (T ribunal P leno). A ç ã o D ir e ta d e


In c o n s titu c io n a lid a d e n° 1842. R elato r M in. L u iz F ux, R e d a to r do
A córdão: M in. G ilm ar M endes. B rasília, 06 d e m arç o de 2013.

154
A SINTONIA COM A NATUREZA NA PRESERVAÇÃO DOS
CORPOS HÍDRICOS E NO MANEJO DAS ÁGUAS PLUVIAIS

D e m e trio s C h risto fid is*

1 IN T R O D U Ç Ã O

O p r o p ó s ito d e s te te x to é o d e a p r e s e n t a r a s a titu d e s ,
v i r t u d e s e m o d o s d e a tu a ç ã o q u e e s te ja m e m h a r m o n i a c o m a
n a t u r e z a e a p r e s e n t e m s in to n ia c o m a s á g u a s , q u e p o te n c ia liz a m os

* PÓS-DOUTORADO: Tema: Das Soluções Baseadas na Natureza para Manejo


Sustentável das Águas Pluviais e Gestão das Águas em Sintonia com a Natureza;
Programa de Pós-Graduação: em Saúde Pública e Meio Ambiente - Escola Nacional de
Saúde Pública Sérgio Arouca / FIOCRUZ (2018/19). DOUTORADO: Tema -
Desenvolvimento Sustentável em Gestão Ambiental - Gestão e Políticas Públicas de
Recursos Hídricos - Centro de Desenvolvimento Sustentável / Universidade de Brasília
(2001). MESTRADO: Engenharia de Irrigação e Drenagem, pela Universidade de
Southampton (1986-1987). GRADUAÇÃO: Saneamento Básico; em Engenharia Civil,
Universidade de Brasília (1969-1974). CATEGORIA FUNCIONAL: Especialista Sênior
em Infraestruturas - Recursos Hídricos, do Ministério da Economia. FUNÇÃO ATUAL:
Atua como Especialista em Infraestrutura Sênior, na Secretaria Nacional de Segurança
Hídrica do Ministério de Desenvolvimento Regional. ATIVIDADES ATUAIS:
Participação nos Grupos de: 1) Elaboração da Proposta de Política Nacional de Segurança
Hídrica 2) Concepção da Política Nacional de Infraestrutura Hídrica - PNIH; 3)
Formulação dos Objetivos de Desenvolvimento Urbano Sustentável - PDUS.
ATIVIDADES ANTERIORES: 2017/18 no Ministério do Meio Ambiente, no Plano
Nacional de Recursos Hídricos, nas Prioridades de 2016-2020, na Concepção do
Programa de Preservação e Recuperação de Rios Urbanos. 2012/17 no Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA, como Coordenador-Geral de Irrigação.
Atuou no Conselho Nacional de Recursos Hídricos, como Presidente das Câmaras
Técnicas de Ciências e Tecnologia; e da CT de Educação e Mobilização Social. De 1980
a 2017, atuou como Professor de Ensino Superior na UnB / FT, Departamento de
Engenharia Civil e Ambiental, áreas de Gestão dos Recursos Hídricos, Saneamento
Básico e Ambiental, Irrigação e Drenagem Agrícola, Manejo Sustentável das Águas
Pluviais Urbanas, Drenagem Urbana, Manejo de Resíduos Sólidos e Políticas Públicas de
Recursos Hídricos. Atuação nos temas de desenvolvimento sustentável, gestão ambiental
e dos recursos hídricos, sistemas de irrigação e drenagem, drenagem urbana sustentável,
preservação e restauração de rios urbanos e bacias hidrográficas.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

c o m p o n e n te s da p re se rv a ç ã o dos e c o s s is te m a s h íd r ic o s por
v a l o r i z a r e m a d i v e r s id a d e , a s e s p e c ific id a d e s e c o m p le m e n ta r id a d e s
in e r e n te s às d in â m ic a s e c o s s is tê m ic a s dos co rp o s h íd r ic o s ,
a p e r f e iç o a n d o os a s p e c to s d a L e i n° 1 4 .0 2 6 , d e 15 d e j u l h o d e 2 0 2 0 ,
e m e s p e c ia l, n o m a n e jo d a s á g u a s p lu v ia is .
C o n sid e ra , d e n tre as m e to d o lo g ia s o d e se n v o lv im e n to das
c a p a c id a d e s h u m a n a s em a d o ta r e p ro m o v e r as b a se s p a ra p a rtic ip a ç ã o ,
m o b iliz a ç ã o , d isc e rn im e n to e a c o n sc ie n tiz a ç ã o d o s m o ra d o re s, dos
ag e n te s, a n a listas, e sp e c ia lista s, to m a d o re s de d ec isõ e s, p a ra
c o n sid e ra re m a p le n itu d e dos co rp o s h íd ric o s em o fe rta re m os serv iç o s
e c o s s is tê m ic o s co m a m p la s m e lh o ria s das c o n d iç õ e s h íd ric a s, em
q u a n tid a d e , q u a lid a d e , re g u la rid a d e e em d in â m ic a de flu x o ,
p o te n c ia liz a n d o a s e g u ra n ç a h íd ric a p e la s fu n ç õ e s in trín s e c a s , das b a c ia s
h id ro g rá fic a s e dos aq u ífe ro s, em se rv ir co m c o n d iç õ e s d e h ig ie n e e
salu b rid ad e , q u e d isse m in e m sa ú d e em p le n itu d e .
D e sp e rta a im p o rtâ n c ia do re sp e ito , da c o n te m p la ç ã o e
p e rc e p ç ã o ao m o d o d o s ec o ssiste m a s, d e sta c a q u e a a tu a ç ã o ‘co m o
s e n t i r ’ e o ‘e s ta r em sin to n ia co m a s á g u a s ’, p o ssib ilita o a flo ra m e n to d a
p e rc e p ç ã o do do m em se rv ir d á d iv a s q u e os e c o ssiste m a s h íd ric o s
p o ssu e m em servir. In s p ira so b re a n e c e ssid a d e em re sp e ita r os serv iç o s
o fe rta d o s p e lo s e n tes d a n a tu re z a , so b re a im p o rtâ n c ia d as fo rm a s de
c o n v iv e r em h a rm o n ia co m a n a tu re z a e so b re a p e rc e p ç ã o d a p le n itu d e
d o s c ic lo s d a n a tu re z a , d e m o d o h a ja in te rn a liz a ç ã o clara, im e d ia ta e
e sp o n tâ n e a , a m p lia n d o as o rie n ta ç õ e s e a lc a n c e das d e c isõ e s so b re os
o b je tiv o s e fin a lid a d e s d e c o rre n te s d a a tu a liz a ç ã o do m a rc o le g a l do
sa n e a m e n to b á sic o , c o n f o r m e o r ie n ta d o s p e la L e i n° 1 4 .0 2 6 , d e 15 d e
j u l h o d e 2 0 2 0 . E m su m a o fe re c e fu n d a m e n to s p a ra q u e as c o n c e p ç õ e s e
o m a n e jo d as á g u a s p lu v ia is, o c o rra m co m d isc e rn im e n to e c o n sc iê n c ia ,
co m p ro p ó s ito s co le tiv o s e d e d ic a ç ã o ao b e m co m u m .
A b o r d a g e m c o n t r i b u i , c o m p l e m e n t a r m e n t e à L e i n° 1 4 .0 2 6 ,
d e 2 0 2 0 , a o a te n d im e n to à A g e n d a 2 0 3 0 , e m e s p e c ia l, a o se x to
O b je tiv o do D e s e n v o lv im e n to S u s te n tá v e l / O DS, que v is a a

156
asse g u ra r a d is p o n ib ilid a d e e g e s tã o s u s te n tá v e l da água e
s a n e a m e n to p a r a to d o s - m e t a 6.1. a c e sso u n iv e r s a l e e q u ita tiv o à
á g u a p o tá v e l, s e g u r a e a c e s s ív e l p a r a to d o s; m e ta 6 .4 . a u m e n ta r
su b sta n c ia lm e n te a e fic iê n c ia d o u so d a á g u a em to d o s o s s e to r e s e
a s s e g u r a r r e tir a d a s s u s te n tá v e is e o a b a ste c im e n to d e á g u a d o c e p a r a
e n fr e n ta r a e s c a sse z d e água, e r e d u z ir su b sta n c ia lm e n te o n ú m e ro d e
p e s s o a s q u e s o fre m co m a e sc a sse z d e á g u a ; e m e ta 6 .6 . p r o te g e r e
r e s ta u r a r e c o s s iste m a s r e la c io n a d o s co m a água, in c lu in d o m o n ta n h a s,
flo r e s ta s , z o n a s ú m id a s, rios, a q u ífe ro s e la g o s.
O s asp e c to s tra ta d o s c o a d u n a m , ta m b é m , co m as m etas: 6.1.
a c e s s o u n iv e r s a l e e q u ita tiv o à á g u a p o tá v e l, se g u r a e a c e s s ív e l p a r a
to d o s; 6 .2 . a c e sso a s a n e a m e n to e h ig ie n e a d e q u a d o s e e q u ita tiv o s p a r a
todos, e a c a b a r co m a d e fe c a ç ã o a c é u a b erto , c o m e s p e c ia l a te n ç ã o
p a r a a s n e c e s s id a d e s d a s m u lh e re s e m e n in a s e d a q u e le s em s itu a ç ã o d e
v u ln e r a b ilid a d e ; 6 .3 . m e lh o r a r a q u a lid a d e d a água, r e d u zin d o a
p o lu iç ã o , e lim in a n d o d e s p e jo e m in im iz a n d o a lib e ra ç ã o d e p r o d u to s
q u ím ic o s e m a te r ia is p e r ig o s o s , r e d u zin d o à m e ta d e a p r o p o r ç ã o d e
á g u a s r e s id u a is n ã o tra ta d a s, e a u m e n ta n d o su b sta n c ia lm e n te a
r e c ic la g e m e r e u tiliza ç ã o se g u r a g lo b a lm e n te ; e 6 .5 . im p le m e n ta r a
g e s tã o in te g r a d a d o s re c u r so s h íd ric o s em to d o s o s n íveis, in c lu siv e v ia
c o o p e r a ç ã o tra n sfro n te iriç a , c o n fo rm e a p ro p ria d o ; e 6.6. p r o te g e r e
r e s ta u r a r e c o s s iste m a s r e la c io n a d o s co m a água, in c lu in d o m o n ta n h a s,
flo r e s ta s , z o n a s ú m id a s, rios, a q u ífe ro s e la g o s.

2 A P E R S P E C T IV A D O M A N E JO D A S Á G U A S P L U V IA IS S O B
A L E I N° 1 4 .0 2 6 / 2 0 2 0

A s experiências m undiais, que apresentam resultados benéficos às


iniciativas associadas a orientações em p reservação de ecossistem as hídricos,
po ssu em propósitos com uns e com plem entares, lastreados no plen o respeito
aos conceitos relacionados com a percepção integral do significado em
considerar “A D iversid a d e n a U nidade e a U nidade n a D ive rsid a d e”.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

E s s a fo rm a , a m p lia d a e le v a d a d e olh ar, d e c o rre n te d a sab e d o ria,


d a a m p lia ç ã o d a c o n sc iê n c ia d o p re p a ra e d isp õ e o Ser, p ara, com
d isc e rn im e n to , v a lo riz a r e re a liz a r, d e fo rm a p rio ritá ria , d o is C o n ju n to s
am p lo s d e P rio ritá rio s d e P ro p ó sito s:

2.1 U m p r i m e i r o c o n ju n to d e P r o p ó s ito s “ P ”, co m os p rin c íp io s de


P re c a u ç ã o , P re se rv a ç ã o e P ro te ç ã o , atu an d o , co m o rien ta çõ es, cu id a d o s
e a trib u to s c o n c e b id o s co m m e d id a s e stru tu ra is e estru tu ra n te s, q u e
in c lu e m , n o s p la n e ja m e n to s d as o c u p a ç õ e s a n tró p ic a s, n o s u rb a n ism o s
d as n o v a s cid ad e s, b a irro s, seto res, lo te a m e n to s, c o n d o m ín io s e esp aço s,
p ro p o s to s à o c u p a ç ã o h u m a n a s, a titu d e s c o n stitu íd a s p o r arran jo s,
co m p o siç õ e s, o rie n ta ç õ e s, c ó d ig o s d e o b ra s e p o stu ra s em q u e são
a d o ta d o s v a lo re s in trín se c o s e d e e x istê n c ia e c o n sid e ra ç õ e s p a ra co m os
e n tes d a n atu re za, em suas essê n cias, d e m o d o a ev o lu íre m em suas
p le n itu d e s, p o r elo s a se n sib ilid a d e s ec o ssistê m ic a s, d e c o rre n te s d e u m
m o d o d e a g ir c o o p e ra tiv o e h a rm ô n ic o , que: •

• C ria co n d içõ es p ropícias à in teg ração dos p ro jeto s u rb an ístico s


com as especificidades e dinâm icas d a n atu re za e das águas nas
reg iõ es onde são im p lem en tad o s os em preendim entos: com
ativ id ades resultantes que co n tem p lam com p lem en tarid ad es
deco rrentes do o b serv ar e ap ren d er com a n atureza, p erceb en d o os
sinais do q u e é ap ro p riad o a q u e a criação das infraestruturas
artificiais (as cinzas), p ossam , de fo rm a inteligente, servir-se do
o fertado p elo m eio natu ral. U m a in tu ição q u e lev e a obter, com
ab so lu ta e elev ad a certeza, a ex istên cia de m u itas v an tag en s da
conexão, que re su lta d a p arceria entre as “in fra estru tu ra s c in z a ”,
com a natureza, p o r m eio de suas “in fra estru tu ra s verde e a z u l”,
p ro p o rcio n an d o g aran tia de seg u ran ça h íd rica e am p liação da
co n ex ão aos conceitos de d esen v o lv im en to seja sustentável;

158
• A m p lia d e fo rm a p ré v ia , p e la d iv e rsid a d e d e alte rn a tiv a s
p re e x iste n te s, as p o ssib ilid a d e s d e a d e q u a d a s to m a d a s de
d e c isã o so b re o ‘u so e o c u p a ç ã o d o s o l o ’, p a ra q u e d e sd e as
fa se s in iciais, d e a p ro v a ç ã o d o s p ro je to s u rb a n ístic o s, d o s de
san e am en to , d o s d e in fra e stru tu ra h íd ric a e v á rio s o u tro s, q u e
in te rfe re m n o s c o rp o s h íd ric o s, sejam n a fa se d e c o n c ep çã o ,
p e la p re c a u ç ã o co m as m e d id a s p ré v ia s a sso c ia d a s à
u rb a n iz a ç ã o , se ja p e la adoção de opções a sso c ia d a s aos
c o n c e ito s de c id a d e s su ste n tá v e is, sejam ad o ta d o s
p la n e ja m e n to s q u e v a lo riz e m m o d o s d e se n sív e is às ág u as, q u e
re p e rc u te m p a ra q u e as c ria ç õ e s a rtific ia is sejam c o o p e ra tiv a s e
in te g ra d a s ao e x iste n te e o fe rta d o p e la n a tu re z a ;
• A d o ta c o m o esse n cial q u e a c o n c e p ç ã o , a m o d e rn iz a ç ã o e a
im p le m e n ta ç ã o dos siste m a s de sa n e a m e n to (d e s d e o
fo rn e c im e n to d e á g u a p o tá v e l, a so lu ç ã o so b re os esg o to s
san itário s, o m a n e jo dos re síd u o s líq u id o s, o m a n e jo das ág u a s
p lu v ia is, o m a n e jo dos re síd u o s só lid o s, e a o fe rta d e seus
c o rre s p o n d e n te s serv iç o s), sejam a d o ta d o s in stru m e n to s,
m e c a n ism o s e m e d id a s e stru tu ra is (b a cias de d eten ç ão ,
re te n ç ã o , la g o s e la g o a s, p o ç o s d e in filtra ç ã o , su p e rfíc ie s
p e rm e á v e is, e n tre o u tro s) e m e d id a s não e stru tu ra is
(p la n e ja m e n to , n o rm a s, in ic ia tiv a s d e in d u ç ã o à in o v a ç õ e s,
te c n o lo g ia s, co m p re m ia ç õ e s, p ro je to s d e m o n stra tiv o s e de
c ré d ito s p a ra fin a n c ia m e n to p a ra im p le m e n ta r e stru tu ra s físicas,
ed u c açã o , d e se n v o lv im e n to de ca p a c id a d e s, m o b iliz a ç ã o ,
d ifu sã o d e b o a s p rá tic as, p ro je to s d em o n stra tiv o s, in stru m e n to s
ec o n ô m ic o s, fo rm a s in d u to ra s d e b o a s p rá tic as, le g isla ç õ e s,
in s tru m e n to s in d u to re s e in c e n tiv a d o re s, q u e em c o n ju n to com
o s re g u la d o re s e os d e c o m a n d o e c o n tro le e d e fisc a liz a ç ã o
p ro p o rc io n e m re su lta d o s b e n é fic o s ao b e m c o m u m e esteja m
em s in to n ia co m as ág u a s e a n a tu re z a e a p o ie m a p ro m o v e r

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

m o d o s su ste n tá v e is d e re a liz a r o m a n e jo su ste n tá v e l d as ág u a s


p lu v ia is, a m p lia n d o a re g u la riz a ç ã o d a o fe rta d e á g u a d u ra n te
as ch u v as, p e la s m e d id a s q u e a tu em b a se a d a s n a v is ã o de
“ a b u n d â n c ia ” , ev ita n d o a ‘e s c a s s e z ’ h íd ric a re c o rre n te em
n o ssa s cid ad e s e ativ id a d e s p ro d u tiv a s;
• G e ra n o v o s m o d o s d e p la n e ja r a c o n c e p ç ã o d o s e sp a ç o s
u rb a n o s, p e la m e lh o ria n a c o m p re e n sã o d o s e m p re e n d im e n to s,
d e su as c o n e x õ e s e in te rd e p e n d ê n c ia s co m os ec o ssiste m a s
a q u á tic o s e suas c irc u n v iz in h a n ç a s, o n d e o e n te n d im e n to
e sse n cial, a se r p e rc e b id o , está lig a d o aos ciclo s d e v id a e a
d in â m ic a d o s p ro c e sso s h íd ric o s n a tu ra is q u e in te ra g e m em
re la c io n a m e n to s te m p o ra is, d e lo c a liz a ç ã o e d e seu s re g im e s,
q u e c o n trib u e m p a ra as co n d iç õ e s v ita is d o s co rp o s h íd ric o s;
• In d ica que os p lanejadores d ev em considerar, desd e as fases
iniciais dos em p reendim entos, o m o d o d e d efin ir e criar as
u n id ad es constituintes do sistem a, co nsiderando as especificidades
e características d e u n id ad es ‘p a rc e la re s’, dos lotes individuais,
co n d o m ínios, con tem p lan d o m o d o s basead o s no co n h ecim en to de
h arm o n ização com a n atu re za p a ra que sejam adotadas m edidas
desd e ‘a f o n t e ’, ou seja, a ad oção d e atitudes e estratégias de
soluções inteligentes, desd e a fase d e prim eiro contato das águas
d a chuva, com a su p erfície cin za recep to ra;
• A d o ta r co m o re g ra q u e os e m p re en d im en to s d ev e m seguir, com o
b a se fu n d a m e n tal, os p r in c íp io s d e p re c a u ç ã o , d e m o d o a
p ro p o rc io n a r a p re se rv a ç ã o das co n d içõ e s dos eco ssistem as,
ev o lu in d o p a ra c o n sid e ra r a in clu são d e c o m p o n en te s que
p o ssib ilitem o fe rta r p ro teç ão ao am b ien te u rb a n o e aos
ec o ssistem a s circ u n v izin h o s co rrelato s, in flu en c ia n d o
fa v o ra v e lm e n te n a re g u la rid a d e d a d isp o n ib ilid a d e qu an titativ a,
q u alitativ a, n o reg im e, n a d in â m ic a d as águas, p ro p o rcio n an d o
co n se rv aç ão da in te g rid a d e dos p an o ram as estético s das

160
p aisag en s, sejam em esp a ço s rurais, sejam n o s u rb a n o s, n as áreas
de sen sív eis de in flu ên cia, in cen tiv an d o , p ro m o v en d o , com
in stru m e n to s ec o n ô m ic o s, de p ersu asão , p re m ia çõ es e outros
in cen tiv o s, m é to d o s e m e c a n ism o s o fo m e n to à p a rtic ip a ç ã o da
p o p u laçã o e d o seto r priv ad o , n a ad o ç ã o d e m e d id a s p ro tetiv as,
seja n a c ria ção de p arq u es u rb a n o s, m a rg e a n d o os corpos
h íd rico s, seja com áreas de a m o rte c im e n to e d e re c a rg a híd rica,
de m o d o a g e ra r c o n d içõ e s p ro p ícias, a seg u ran ça h íd rica, com
b a se n o m a n e jo su sten táv el das em ág u a s p lu v ia is; e
• P ro m o v e co n d içõ e s p a ra q u e os cid ad ã o s se id en tifiq u em com os
‘se rv iç o s’ o fe rtad o s p elo s co rp o s h íd rico s, v a lo riz a n d o as águas,
atu an d o d e fo rm a co m p ro m e tid a, m o b iliza n d o , p a rtic ip a n d o e
am p lian d o os cu id ad o s p a ra com ág u a s p lu v iais, p a ra que
aten d am , em p len itu d e, os d esa fio s d ec o rre n te s em to d o s os
co m p o n en te s dos serv iço s d e ág u a s p lu v iais, c o n f o rm e c ita d o s
n a L e i n° 14.026, d e 2 0 2 0 , e m se u a r tig o 3° - D , q u e a f ir m a :
“C o n s id e ra m -se se rv iç o s p ú b lic o s de m a n e jo das águas
p lu v ia is u r b a n a s a q u e le s c o n stitu íd o s p o r 1 (u m a ) o u m a is das
s e g u in te s a tiv id a d e s: I - d re n a g e m u r b a n a ; I I - tra n sp o rte d e
á g u a s p lu v ia is u r b a n a s ; I I I - d e te n ç ã o o u r e te n ç ã o d e á g u a s
p lu v ia is u r b a n a s p a r a a m o r te c im e n to d e va zõ e s d e c h e ia s; e I V
- tr a ta m e n to e d isp o siç ã o f i n a l d e á g u a s p lu v ia is u rb a n a s. ”

2 .2 U m s e g u n d o c o n ju n to d e P r o p ó s ito s “ R ” q u e d e c o rre d as situ açõ e s


d e e le v a d a d e g ra d a ç ã o d o s c o rp o s h íd ric o s e d o s seus p ro b le m a s
d e c o rre n te s, em q u e e x iste n e c e ssid a d e d e sse s e g u n d o c o n ju n to d e açõ es
a sso c ia d a s às n e c e ssid a d e s d e re a b ilita ç ã o , rec u p e ra ç ã o , re v ita liza çã o ,
ta n to d a d re n a g e m n a tu ra l, q u a n to d a d re n a g e m artific ia l im p la n ta d a
p e lo s m é to d o s c o n v e n c io n a is (F ig u ra 1).

161
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

F i g u r a 1: O s P ro p ó sito s a sso c ia d o s à p re se rv a ç ã o d o s c o rp o s h íd ric o s

E ssas o rie n ta ç õ e s, m e d id a s e stru tu ra is e de g e stã o , são


c o m p a tív e is ao q u e é m u n d ia lm e n te c o n c e itu a d o co m o r e s ta u r a ç ã o de
co rp o s h íd ric o s o u d e b a c ia s u rb a n a s, e são d e fin id o s c o m o “a u x ílio s à
re c u p e r a ç ã o d a in te g rid a d e e c o ló g ic a em u m a b a c ia h id ro g rá fic a , p o r
m e io do re e s ta b e le c im e n to dos p ro cesso s n a tu r a is h id ro ló g ic o s,
g e o m o r fo ló g ic o s e eco ló g ic o s, e p e la re c u p e ra ç ã o de e le m e n to s
b io ló g ic o s p e r d id o s , d a n ific a d o s o u a m e a ç a d o s ”. C o m p re e n d e n d o : •

• A ç õ e s d e ‘R e v is ã o ’ em m o d o u ltra p a ssa d o d e a tu a r re q u e re n d o
u m a R e v e rs ã o d as a titu d e s d e su b m issã o a n tró p ic a d as ág u a s
p lu v ia is d e c o rre n te s em u m m o d o d e a g ir q u e p ro v o c a as
in a d e q u a d a s c o n d iç õ e s d e ‘e sc a sse z h íd ric a ’, e m b o ra n a tu re z a
v e n h a o fe rta n d o á g u a s em ‘a b u n d â n c ia ’, re v e n d o o p re c o n c e ito
p re d o m in a n te a d o ta d o co m as ág u a s ‘p lu v ia is ’;

162
• O s p ro p ó sito s “R ” , q u e e n v o lv e m a re sta u ra ç ã o , p a rc ia l o u to tal,
d as c o n d iç õ e s d in â m ic a s, flu x o s, o sc ila ç õ e s d o s n ív e is n a tu ra is
e v a z õ e s d as fa se s a n te rio re s à o cu p a ção , q u e p la n e ja d a ou
d e so rd e n a d a , h o je é c o n sid e ra d a in a d e q u a d a à re a lid a d e atu al e
q u a lid a d e d e v id a d ese ja d a.
• O ap ren d izad o q u e p ro v ém d a ex p eriên cia p ro p o rcio n ad a aos
esp ecialistas e acadêm icos, ob serv an d o as inad eq u açõ es dos
sistem as trad icio n ais e d e suas falhas n o re alizar a d renagem
u rb a n a e co leta e disp o sição final d as ág u a s pluviais, e, a p artir das
lições apreendidas, p assaram a ad o tar n o v as orientações que
lev aram ao ap erfeiço am en to dos com ponentes, in serin d o
ap rim oram entos, n om inados, in icialm ente, co m o o 'r e tr o fit’, aos
itens constituintes dos sistem as d e co leta d e ág u a s pluviais e das
red es de esco am en to de d ren ag em pluvial, p a ra m in im iza r as
in ad eq u açõ es e falhas que os sistem as co n v encionais ap resen tam ;
• O s av an ço s in serid o s q u e p ossibilitam elev ar os n íveis das
in stalações d e trata m e n to de esgotos, p ara serem com patíveis com
as capacidades d e dep u ração dos corpos h íd rico s receptores e
p assaram a ser m ais efetivos n as n o rm as e fiscalizações das redes
de sistem as de esgotos p rediais e co n d o m in iais v isan d o red u ção de
lig açõ es clandestinas de resíd u o s líq u id o s e realizaram orientações
e p rem iaçõ es p ara a restau ração das m arg en s e d as áreas lim ítrofes
que se m o strav am sensíveis à restauração, q u an d o a m an u ten ção
o fertada era p len a e h av ia resp eito a d in âm ica natural dos corpos
hídricos. C riaram , assim , co n d içõ es p ara que as po p u laçõ es
p u d essem u su fru ir os espaços, os corpos h íd rico s com condições
de v id a aquática, la z e r e red u ção de riscos à saúde em g eral; e
• O b se rv a m -se , h o je, em d iv e rsa s re g iõ e s d o m u n d o , o n d e
o c o rre ra m a p e rfe iç o a m e n to s b e n é fic o s, q u e fo ra m a c o lh e d o re s
d as sin a liz a ç õ e s e d o s c a m in h o s q u e a n a tu re z a ta lh o u ao lo n g o
d e lo n g o s p e río d o s, em tra je tó ria s, d e u m a c o n sta n te u n iã o

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

c o n s tru tiv a co m a n a tu re z a , m in e ra l e v e g e ta l, d o s ‘ca m in h o s


d as á g u a s ’, q u e n a tu ra is, e stá v e is e seg u ro s, m o d o s d e m o ld a r
em c o n ju n to , q u e p o d e n o s e n s in a r a fo rm a ta r os ca m in h o s
a d e q u a d o s u m m u n d o su sten táv el, p e lo m o d e la m e n to d e u m a
‘e n g e n h a ria d e s e g u ra n ç a h íd ric a ’.

3 A PERSPECTIVA ECOHIDROLÓGICA NA GESTÃO DA ÁGUAS

A s so lu ç õ e s ro b u sta s, efetiv as, d u rá v e is, m u ltip lic a d o ra s e


su ste n tá v e is a s so c ia d a s c o rp o s h íd ric o s são co n stitu id a s, em p arte , p o r
m e d id a s n ã o e stru tu ra is, c o m o : in fo rm a ç ã o , co n h e c im e n to , ed u c açã o ,
p a rtic ip a ç ã o , m o b iliz a ç ã o , to m a d a d e c o n sc iê n c ia = > h id ro c o n c iê n c ia ,
se n tid o d e p e rte n c im e n to e re sp o n sa b ilid a d e = > h id ro c id a d a n ia , de
c o o p e ra ç ã o = > h id ro c o o p e ra ç ã o , é tic a = > h id ro é tic a .
H á um a a b o rd a g e m no m a n e jo su ste n tá v e l d o s re c u rso s
h íd ric o s, b a se a d a , n o q u e F a lk e n m a rk e R o c k stro m (2 0 0 4 ) d e n o m in a ra m
p o r g e s tã o ‘e c o h id r o ló g ic a ’, c o n sid e ra d a a g e stã o eficaz, p o r p o ssib ilita r
m a io r se g u ra n ç a e m e lh o r in c o rp o ra ç ã o d e d iv e rsa s fu n ç õ e s (se rv iço s,
fin a lid a d e s ) p a ra le la s q u e a á g u a p o ssu i n a tu ra lm e n te e q u e supre, ta n to
a so c ie d a d e c o m o a o s e c o ssistem a s.
N o referen te a com p atib ilização das ab o rdagens social, eco ló g ica
e eco n ô m ica, os referidos autores, destacam que; ‘p a r a a lca n ce d e um
fu tu r o p o s itiv o n a d isp o n ib ilid a d e d e águas, existe u m a série de
p e rsp e c tiv a s à a n a lisa r; a p e rsp e c tiv a so c ia l so b re o q u e a p o p u la ç ã o
n ec essita e o q u e e la está p re d isp o sta a aceitar; a p e rsp e c tiv a ec o ló g ica
que im p lica e m lid a r co m e c o ssistem a s sa d io s onde ex iste m á rea s
p ro te g id a s d e va lo ra çã o específica; e co m resiliên cia e a ca p a cid a d e d e
a b so rve r a ltera çõ e s in evitá veis e im p revista s sem que h a ja a ltera çã o d e
se u s esta d o s o rig in a is ”.
Sob a p e rsp e c tiv a s o c ia l sugerem que “p e lo m e n o s três fr e n te s de
a ç ã o d evem se r d esenvolvidas: (1) a red u ç ã o d a m o rb id a d e p o r m e io d o

164
su p rim en to seg u ro d e á g u a p o tá v e l e d e sa n ea m en to ; (2) a seg u ra n ç a
a lim en ta r; e (3) a g a ra n tia d a re n d a f a m i l i a r ” T ais objetivos p o d em ser
alcançados, seg u n d o F a lk en m ark e R o ck stro m (2004), co n cen tran d o os
esfo rço s de gestão, em con ju n to com a p e rsp e c tiv a ecológica, p a ra entre
outros, p o ssib ilitar a:

- E lim in a ç ã o de c o n flito s : Com um a e stra té g ia de


c o m p a rtilh a m e n to d a s á g u a s, re c o n c ilia ç ã o d e d is p u ta s en tre
u s u á r io s (h id ro fra te rn id a d e ) e u so d e a sp e c to s a s s o c ia d o s à
é tic a d a á g u a u n iv e rsa lm e n te a c e ito s ;
- R e d u ç ã o d a p o lu iç ã o : C o m a d e q u a d o m a n e jo d o s re síd u o s
líq u id o s e s ó lid o s e d o s re síd u o s q u ím ic o s a g ríc o la s; e
- E lim in a ç ã o d a d e g ra d a ç ã o d a fe rtilid a d e d o s s o lo s : In te g r a n d o
g e s tã o d e solo, á g u a e n u trie n te s.

F alk en m ark e R o ck stro m (2 0 0 4 ), esclarecem que “deve existir


u m a d ec la ra ç ã o d e p rin c íp io s e um p r o c e s so d e p a rtic ip a ç ã o legitim ado
u m a vez q ue to das a s d iversa s fin a lid a d e s d e á g u a p o d e m n ã o a p rese n ta r
co n d içõ e s p a r a serem a m p la m en te a ten d id a s a o m e sm o tem po ”. A firm am
que “a co m p lexid a d e q u e envolve o s m e io s e o s in stru m en to s p a r a que os
o b jetivo s com uns, co letivo s e a s fin a lid a d e s seja m alcançados, no
rela cio n a m e n to entre a n ec essid a d e h u m a n a d e á g u a e a seg u ra n ç a
am biental, d ev e existir u m a n o v a g e ra ç ã o d e p e s s o a s resp o n sá ve is e
co m prom etidas, q u e sã o o s ‘h id ro c id a d ã o s’ o u seja, tem que o co rrer o que
d en o m in a ra m p o r ‘h id ro c id a d a n ia ’, in sp ira d a em p rin c íp io s ético s d e
co m p a rtilh a m en to d a s á g u a s e d e n ã o d e ex istê n cia d e rivalidades. ”
P a ra F a lk e n m a rk e R o c k stro m (2 0 0 4 ) "as d ire trize s p a r a q u e a
‘h id ro s o lid a r ie d a d e ’ o c o rra e s e ja d e s e n v o lv id a s c o m su ce sso , tem c o m o
base, o s p r in c íp io s d e d ir e ito s h u m a n o s, d e im p a rc ia lid a d e , d e eq u id a d e,
e d e ig u a ld a d e ”.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

4 A PERSPECTIVA DA HIDROÉTICA

C h ris to fid is (2 0 0 9 ), a p re s e n ta , em te x to que tr a ta de


‘e d u c a ç ã o e m o b iliz a ç ã o s o c ia l e m sa n e a m e n to , o s c o n c e ito s , as
c a ra c te rís tic a s , as in te rfa c e s e se is “e ix o s h o l í s ti c o s ” c o m o p r o p ó s ito
d e f a c i l i t a r a o s q u e c u id a m d a s á g u a s e a o s a g e n te s d e s a n e a m e n to
b á s ic o a in te r n a liz a ç ã o d a n e c e s s id a d e d e a d o ta r e m u m p a d r ã o d e
p a r c e r ia , d e c o o p e r a ç ã o , d e in te g r a ç ã o e u m a d in â m ic a c r i a t i v a ”.
E s s a s , s u g e s tõ e s a u x ilia m n a o rie n ta ç ã o d a s d e c is õ e s so b re d iv e rs o s
a s p e c to s e em e s p e c ia l n a im p le m e n ta ç ã o d a r e g io n a l iz a ç ã o q u e
c o m p õ e o m a rc o le g a l d o s a n e a m e n to b á s ic o d e f in id o p e la L e i n°
1 4 .0 2 6 , d e 15 d e ju l h o d e 2 0 2 0 , a lé m d e p ro p o r c io n a r o a lc a n c e d o s
o b je tiv o s d a s d iv e rs a s p o lític a s p ú b lic a s q u e lid a m com a água,
s u g e rin d o q u e e s sa s p o lític a s te n h a m n a ‘p a r tic ip a ç ã o o c o m b u s tív e l
p a r a u m a d in â m ic a h íd r ic a c ria tiv a .
C h ris to fid is (2 0 0 9 ) su g e re q u e s u g e rin d o q u e as p o lític a s
s e g u in te s p o lític a s te n h a m n a ‘p a r tic ip a ç ã o o c o m b u s tív e l p a r a u m a
d in â m ic a h íd r ic a c r ia tiv a ; a P o lític a N a c io n a l d o M e io A m b ie n te , a
P o lític a N a c io n a l de R ecu rso s H íd ric o s , in c lu in d o as p o lític a s
e s ta d u a is e D is trita l d e re c u r s o s h íd ric o s ; a P o lític a N a c io n a l d e
E d u c a ç ã o A m b ie n ta l, o E s ta tu to d a s C id a d e s , e o a r c a b o u ç o le g a l e
re g u la m e n ta r d o s e to r d e s a ú d e e p o ta b ilid a d e d a s á g u a s). D e sta c o u ,
ta m b é m , q u e h á e f e tiv a n e c e s s id a d e d a c o m p le m e n ta r id a d e e n tre os
s e to re s , e n tre o s p la n o s e as a ç õ e s s e to ria is d a s á g u a s, te n d o c o m o e lo
a e d u c a ç ã o a m b ie n ta l.
Na o p o rtu n id a d e (C h ris to fid is , 2 0 0 9 ), a p r e s e n to u um
c o n ju n to d e “p r in c íp io s o r ie n ta d o r e s e m f o r m a d e o lh a r e s q u e se
c o m p le m e n ta m e s e p o t e n c i a l i z a m ”, d e s ta c a n d o q u e; “d esde que a
in te g r a ç ã o d a s e s fe r a s d e o lh a r e s o c o r r e s s e d e f o r m a p le n a , h a v e r ia
a f o r m a ç ã o d e te r r itó r io s d e a m p lia ç ã o d a c o m p re e n s ã o , fa v o r e c e n d o
a e d u c a ç ã o e o d e s e n v o lv im e n to d e c a p a c id a d e s r e s u lta n d o em

166
m e lh o ria s n a p a r tic ip a ç ã o , p r o p o rc io n a n d o a s b a ses de um n o v o
m o d o de entender, de fo r m a s e lev a d a s de a g ir e de v a lo riza r a vida,
que m o d ific a m o p e rc u rso , hum ano, que p a s s a a se r o de um c a m in h a r
c o n sc ie n te e um m o d o de o lh a r a m p lia d o so b re o va lo r d a s á g u a s
p e lo s a g e n te s de g e stã o h íd r ic a ”.
S u g e re “um p ercu rso para a h id ro c o n sc ie n tiza ç ã o ”,
c o m p o n d o as e s tra té g ia s d e c u id a r d a s á g u a s e v a lo r iz a r os rio s
u rb a n o s : A fir m a q ue: “a p e r c e p ç ã o p le n a p o r c a d a a g e n te e n vo lv id o
com a s águas, de um e sp e c ífic o setor, em c a d a ciclo e em ca d a
‘co n ju n to de p r in c íp io s o rie n ta d o re s ’, depende, a lém de té c n ic o s com
exp eriên cia , c o n h e c im e n to e n ív e l de fo r m a ç ã o ad eq u a d o s, tam bém ,
do ‘h id ro a g e n te ’ a tu a n d o com ‘sa b e d o r ia ’ p a r a e n co n tra r os
c a m in h o s id e a is de c o n stru ç ã o de u m a p‘ a r tic ip a ç ã o c o n s c ie n te ’, de
o lh a r p re se n te , c o m p ro m e tid o e cria tivo : se re s com ‘um sa b e r e um
q u e re r ’ c u id a r co n ju n to d a s á g u a s ’. ”
C o m o o s rio s u r b a n o s e s u a s á g u a s sã o e s s e n c ia is p a ra
s u p o rta r a v id a , p a r a p ro p o r c io n a re m s a ú d e p le n a , n u triç ã o sa d ia ,
p ro d u ç ã o d e a lim e n to s , g e r a ç ã o d e p ro d u ç ã o e re n d a , e x is tê n c ia d a s
fu n ç õ e s d o s e c o s s is te m a s te r r e s tr e s e a q u á tic o s , d e v e - s e d e d ic a r a q u e
h a ja a in te rn a liz a ç ã o d e u m a c u ltu ra d e " h id r o so lid a rie d a d e " q u e
re p re s e n te a p re d is p o s iç ã o , a b o a v o n ta d e , a v o lu n ta rie d a d e , a
c o o p e ra ç ã o , a p ercep ção do s e n tid o in d iv id u a l e p lu ra l de
p e r te n c im e n to c o m a titu d e s p ro a tiv a s , d e p r e v e n ç ã o /p r e c a u ç ã o , d e u m
m o d o d e S e r e d e E s ta r p r e d is p o s to p a r a e n te n d e r a ló g ic a d o s o u tro s
(d o s a g e n te s , d o s e c o s s is te m a s , d a flo ra , d a fa u n a ), c o m p re e n d e n d o ,
em v a lo riz a n d o e o fe re c e n d o p re fe rê n c ia em a ç õ e s q u e p o te n c ia liz e m
e o fe re ç a m a lib e rd a d e d o s "o u tro s " p a r a e x e rc íc io p le n o d e su a s
fu n ç õ e s e su a s v o c a ç õ e s .
A s o rie n ta ç õ e s e m o d o d e v a lo r iz a r as á g u a s e o a m b ie n te ,
d e f e n d id a s d e F a lk e n m a r k e R o c k s tro m (2 0 0 4 ), le v a ra m a c o n c e itu a r
a ' a titu d e h id r o é tic a ’, q u e é e n te n d id a p o r C h ris to fid is (2 0 1 8 );

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

“to m a d a c o n s c iê n c ia d o q u e a c o n te c e c o m a á g u a e m c o n d iç õ e s d e
e fe tiv a p r e s e n ç a d o s a g e n te s , c o m c o m p ro m e tim e n to , n ã o -o m is s ã o ,
c o m c o n s c iê n c ia d o v a lo r d a u tiliz a ç ã o c o le tiv a d a á g u a , c o n h e c e n d o
p r o fu n d a m e n te a s á g u a s r e s u lta n te s d a s u tiliz a ç õ e s q u e s e r v ir a m
p a r a a te n d im e n to à c e r ta s f u n ç õ e s e s p e c ífic a s . ”
Na r e fe rê n c ia H id r o é tic a : Água, é tic a e a m b ie n te
(C h ris to fid is , 2 0 1 8 ), sã o d e s ta c a d o s a s p e c to s e s s e n c ia is e ú te is a
s e re m c o n s id e r a d o s em in ic ia tiv a s d e d ic a d a s à recu p eração e
p re s e rv a ç ã o d e rio s u rb a n o s .
H id r o é tic a “é u m a a titu d e d e a te n ç ã o , d e p r e s e n ç a e d e
c u id a d o c o m a á g u a , v is a n d o q u e h a ja o a lc a n c e d e h a r m o n ia n o s
e c o s s is te m a s e m to d o s o s n ív e is d e r e a lid a d e ”. E c o m p le m e n ta : “O
c o n c e ito d e h id r o é tic a , a m p lia -s e c o m a p e r c e p ç ã o h u m a n a d a s
c a r a c te r ís tic a s q u e a s á g u a s d e v e m p o s s u ir , p a r a p o s s ib ilita r a s
n e c e s s á r ia s f u n ç õ e s (e m q u a n tid a d e , e m q u a lid a d e , e m o p o r tu n id a d e ,
e m f l u x o , e m d in â m ic a ...), p a r a p o s s ib ilita r a s n e c e s s á r ia s f u n ç õ e s e
c o n d iç õ e s p a r a s e r v ir e m s a ú d e a o s o u t r o s ” (C h ris to fid is (2 0 1 8 ),
c o n fo rm e ilu s tr a d o (F ig u ra 2).
O c o n c e ito d e h id r o é tic a , c o n s id e ra , p o rta n to , a c o n s c iê n c ia ,
o s a b e r p le n o , a a titu d e re s p o n s á v e l e s u s te n tá v e l c o m o q u e a c o n te c e
c o m a á g u a a p ó s a te n d e r as n e c e s s id a d e s d e c a d a c o rp o , d o s d iv e rs o s
c o rp o s , p o r tu d o q u e c o n s titu i u m a c e rta c o n s titu iç ã o f ís ic a e
fu n c io n a l, o c o n ju n to d e u m c e rto c ic lo d e in f lu ê n c ia (e s p a ç o físic o ,
p ro p r ie d a d e , m o ra d ia , e s p a ç o d e re la ç õ e s , fa m ília , a m ig o s, c o le g a s,
a tiv id a d e s , o b je to s , d e s e jo s , fu n ç õ e s , se rv iç o s , ...), e q u e c o n d iç õ e s
h íd ric a s sã o ‘o f e r e c id a s ’ a o s “o u tr o s " . S e n d o “o s o u t r o s "; o m e io
a m b ie n te ; o s e c o s s is te m a s ; a fa u n a ; a flo ra , os se re s re la c io n a d o s à
á g u a , a in flu e n c ia m em su a q u a n tid a d e , em su a q u a lid a d e , em se u
re g im e , em su a d in â m ic a .

168
F i g u r a 2: O c o n c e ito d e h id ro é tic a a p lic a d o ao o lh a r sistê m ic o

5 O R IE N T A Ç Õ E S E C O M P O N E N T E S D E R E S T A U R A Ç A O E
D E Á G U A S P L U V IA IS

N a s so lu ç õ e s q u e tra d ic io n a lm e n te tê m sid o a d o ta d a s n o s
e m p re e n d im e n to s q u e lid a m co m os co rp o s h íd ric o s, e ág u a s p lu v ia is
p re d o m in a m , as m e d id a s e stru tu ra is (o b ra s e eq u ip a m e n to s),
c o m p o n e n te s asso c ia d o s, re d es d e tu b u la ç õ e s de ág u as, siste m as
c o le to re s e c o n d u to re s d e re síd u o s líq u id o s.
A s a lte rn a tiv a s a d o ta d a s p a ra os c o rp o s h íd ric o s e as ág u a s
p lu v ia is u rb a n a s c a ra c te riz a m -se p o r serem “re a tiv a s ” e n ã o c o n d iz e n te s
co m a ra c io n a lid a d e d e a titu d e s “p ro a tiv a S " e d as q u e re sp e ita m os
p rin c íp io s d a p re c a u ç ã o e d o d e se n v o lv im e n to su ste n tá v e l.
O m o d o u ltra p a ssa d o d e te n ta r lid a r co m os c o rp o s h íd ric o s, em
g eral, c a u sa ; a in te rn a liz a ç ã o d e lu c ro s e b e n e fíc io s p a ra p o u c o s e
e x te rn a liz a ç ã o d e c u sto s e p re ju íz o s p a ra a c o le tiv id a d e .

169
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

P a ra lid a r co m as ág u a s p lu v ia is e os co rp o s h íd rico s, p re c o n iz a -
se u m o lh a r m a is am p lo , q u e co n sid ere: (1 ) a tra n sd isc ip lin a rid a d e (o
d iá lo g o e n tre as d isc ip lin a s) e (2) a in te g ra ç ã o in te r in s titu c io n a l; (3 ) o
d e s e n v o lv im e n to d e ca p a c id a d e s, ed u c a çã o , in fo rm a çã o , m o b iliza ç ã o , e
c o n sc ie n tiza ç ã o , c o m o b a se s d e u m o lh a r sistê m ic o , a d o ta n d o -se ,
c o m p le m e n ta rm e n te , d iv e rsa s m e d id a s n ã o e stru tu ra is a sso c ia d a s às
m e d id a s e stru tu ra is (C h risto fid is, 2 0 0 9 ).
E s s a s m e d id a s tê m c o m o fu n d a m e n to s o a te n d im e n to ao ciclo
n a tu ra l, d e c o o p e ra ç ã o e d e d iálo g o co m o s e n tir a n a tu r e z a e co m o viv e r
a s á g u a s d e m o d o a o c o rre r a ‘h id r o c o n v iv ê n c ia ’.
O s sustentáculos m ais ro b u sto s d essas m ed id as são: a m a io r
p articip ação d a população; a am pliação d a inform ação, o co n h ecim en to das
d esv an tag en s d e não alterar a situação tendencial d e d egradação das águas;
a co m u n icação am p la sobre os ben efício s das soluções verdes; as m ed id as
p ro ativ as do p o d er p úblico n a área de p lan ejam en to e n a leg islação que
v alo rize o s eco ssistem as e o coletivo; as re g u lam en taçõ es que am pliem os
incentivos; as p rem iações; a difusão de b o as práticas; os planos preventivos
e de resp eito à d in âm ica d a natureza; os cu id ad o s com os ecossistem as
aquáticos; a v alo rização e a ad m iração p ela estética dos espaços urbanos.
A s p r i n c i p a is m e d id a s q u e o P o d e r P ú b lic o p o d e c o n s i d e r a r ,
c o n d iz e n te s a o s n o v o s p a r a d i g m a s a s s o c ia d o s a o s rio s u r b a n o s e às
á g u a s p lu v ia is , sã o : •

• E la b o ra r, a p ro v a r e fa z e r c u m p rir le is e sp e c ia is d e o c u p a ç ã o do
u s o so lo e em p a rtic u la r d as á reas sen sív e is h id ric a m e n te e d as
áreas d e risco ;
• P ro m o v e r estu d o s d e n o v a s á reas p a ra o c u p a ç ã o q u e sejam m ais
seg u ras e p o ssib ilite m c u id a r d e fo rm a e fic a z do m e io a m b ie n te
e d as ág u a s, fa v o re c e n d o e in c e n tiv a n d o as lo c a liz a ç õ e s dos
a sse n ta m e n to s, b a se a n d o -se no re sp e ito e na m a io r
se n sib ilid a d e à v a lo riz a ç ã o d as c o n d iç õ e s h íd rica s,

170
c o n sid e ra n d o : q u a n tid a d e s, q u a lid a d e s, re g im e s, d in â m ic a s e
p u lsa ç õ e s d as águas;
• A d o tar instrum entos que levem a harm onização e respeito à
natureza, ofertando consentim ento, estando em “sentim ento com ” a
plenitude dos seres constituintes dos ecossistem as hídricos; e
• C o n s c ie n tiz a r e d e se n v o lv e r c a p a c id a d e h u m a n a p a ra u m o lh a r
e le v a d o ao s a m b ie n te s h íd ric o s, su p e ra n d o a v isã o d e tu rp a d a d a
fo rm a c o n v e n c io n a l d e re a liz a r o ‘u so e o c u p a ç ã o ’ d o s solos.

6 P R O G R A M A S D E R E S T A U R A Ç Ã O D E C O R P O S H ÍD R IC O S
E D A S Á G U A S P L U V IA IS

A s p r i n c i p a is p r o p o s t a s p a r a P r o g r a m a s d e su c e sso n a
r e s t a u r a ç ã o e r e c u p e r a ç ã o d o s c o r p o s h íd r ic o s u r b a n o s e d a s á g u a s
p lu v ia is , o r i e n t a m p a r a os s e g u in te s a s p e c to s b á s ic o s :

• A recuperação das águas pluviais e dos rios im plica n a recuperação


das b acias de hidrográficas de influências (a recíproca é verdadeira),
devendo h av e r a prom oção d a valorização e adm iração p ela estética
e pelo p anoram a paisagístico hídrico-urbano, com u m o lh ar cíclico
e contínuo que alterne e com patibilize; “á g u a -n a -cid a d e” O
“á g u a -n a -b a cia -h id ro g rá fica ” O “á g u a -n a -cid a d e”, visando
“á g u a p a r a o bem viver!"
• S ã o su g erid a s d u as e sfe ra s d e aç ão e sse n c ia is, c o m p le m e n ta re s
e c o o p e rativ as: A e sfe ra ‘T é c n ic a ’ v in c u la d a ao s asp e c to s
físic o s d o s p ro je to s d e e n g e n h a ria , as d e n o m in a d a s “s o lu ç õ e s
c in z a s ” cu jo d e se n v o lv im e n to re q u e r a d e q u a ç õ e s, c o n stru ç õ e s
e d e sc o n stru ç õ e s, c o m p a tib iliz a n d o a m b ie n te -so lo s-v e g e ta ç ã o -
á g u a -h o m e m , em c o n ju n to co m “a s so lu ç õ e s v e r d e s ”, v isa n d o
a re v ita liz a ç ã o , o re e sta b e le c im e n to d o re g im e flu v ia l e sua

171
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

d in â m ic a as v a z õ e s ec o ló g ic a s, am b ie n ta is, o “h id ro g ra m a
e c o ló g ic o ” , e outras.
• A se g u n d a e sfe ra é a ‘P o l í ti c a ’, q u e d ev e a p o ia r a e sfe ra T é c n ic a
e, am b as, a ssu m ire m os n o v o s p a ra d ig m a s a sso c ia d o s ao s rio s
u r b a n o s d ire c io n a n d o p a ra q u e as to m a d a s d e d e c isã o so b re a
ocupação e u so dos so lo s re sp e ite m a se n sib ilid a d e dos
a m b ie n te s a q u á tic o s, c o m m e lh o ria s n a g e stã o , in c lu in d o
p ro m o ç ã o d as m u d a n ç a s d e v a lo re s d a c o m u n id a d e d a b a c ia e
da cid ad e, e n v o lv e n d o os u so s d as ág u a s, to rn a n d o
d e m o c rá tic a s e p lu ra is as d e c isõ e s p o lític a s que venham
in te rfe rir n a d in â m ic a n a tu ra l d o a m b ie n te e d a água.
• D eve haver um e n v o lv im e n to co o p e ra tiv o , re sp o n sá v e l,
p a rtic ip a tiv o tra n sp a re n te , p re c iso e efetiv o , n o u s o e a p lic a ç ã o
d o s p o d e re s d o E sta tu to d as C id a d e s, d o s P la n o s D ire to re s
M u n ic ip a is, d o s in stru m e n to s d as p o lític a s esta d u a is e n ac io n a l
d e re c u rso s h íd ric o s, d a p o lític a a m b ie n ta l, d as p o lític a s de
sa n e a m e n to b á sic o e d e re síd u o s só lid o s, co m os p la n o s (d e
ág u as, e seto riais), d as o u to rg a s (d e c a p ta ção , d e la n ç a m e n to e
d e a lte ra ç ã o re g im e d as ág u a s), d e in fo rm a ç õ e s so b re as ág u as,
d o e n q u a d ra m e n to (c o m m e ta s p ro g re ssiv a s), d o c o n tro le das
fin a lid a d e s e fu n ç õ e s d a s ág u a s e d o s u so s, d a e fic iê n c ia , d a
ra c io n a liz a ç ã o , d o re u so d as ág u as, d o s p re c e ito s p a ra e v ita r os
ab u so s, c o rre la c io n a n d o m e ta s co m os p o te n c ia is lim ite s de
re n o v a ç ã o d as ág u as, p re v a le c e n d o a s e n sib ilid a d e dos
u rb a n ista s e a g e n te s d o s d e m a is seto re s en v o lv id o s, p a ra com
o s e c o ssiste m a s e os c o rp o s h íd rico s.
• A o rien tação d ev e ser n o sentido de g erar as condições d e u m o lh ar
m ais am p lo alcance, e que observe além dos rios urbanos, ou do
co rp o hídrico, m as seja ca p az d e u m a v isão que o bserve o papel
que o s corpos hídricos representam e ap ro fu n d ar a p ercep ção de

172
m o d o q u e os eco ssistem as hídricos sejam v isto s co m o v alio so s e
p ro v ed o res de m u itas v an tag e n s que, em geral, n ão são percebidas.
• D e sta c a m -se os v e rd a d e iro s te so u ro s e lista n d o a en o rm e
q u a n tid a d e d e b e n e fíc io s q u e c o rp o s h íd ric o s o fe re c e m e q u e
são in e re n te s à cid ad e , à sa ú d e h u m a n a , à fa u n a, à flo ra , ao m e io
a m b ie n te , p ro m o v e n d o as a titu d e s q u e le v a m a q u e h a ja saú d e
e d is p o n ib ilid a d e q u a n tita tiv a , q u a lita tiv a e re sp e ita n d o o
re g im e d as á g u a s u rb a n a s, c o n tra p o n d o -se às a titu d e s de
o m issã o , de d e sc o n h e c im e n to de su a e x istê n c ia e de
d e s c o n sid e ra ç ã o e v ita n d o q u e sejam v is to s a p e n a s co m o lo c a is
p a ra la n ç a m e n to d e re síd u o s o u c o m o c o rp o s p a ra c a rre a m e n to
d e re s íd u o s líq u id o s e só lid o s d e d iv e rsa s o rig en s.
• C om b a se n e ssa re a lid a d e , d ev e -se, ta m b é m , a n a lisa r os
c o n te x to s so c ia is e e c o n ô m ic o s d as re c u p e ra ç õ e s, p o r ex e m p lo ,
seja em p a rc e ria co m a p o p u la ç ã o lo cal, os m o ra d o re s, o u em
c o n ju n to co m u m a p a rc e ria p ú b lic o p riv a d a , q u e co m os
p ro p rie tá rio s le v a ria a v a lo riz a r, c u id a r o u c o n c e d e r e sp a ç o s às
m a rg e n s c o rp o s h íd ric o s re c u p e ra d o s d e fo rm a q u e ap ó s a
re s ta u ra ç ã o h o u v e sse a in d u ç ã o p a ra q u e a sso c ia ç õ e s, e n tid a d e s
e o u em p re sas, p u d e sse m re a liz a r a g e stã o d e sse s esp a ço s
re v ita liz a d o s, c o rre sp o n d e n te s as re g iõ e s h íd ric a s e suas
c irc u n v iz in h a n ç a s, co m a c ria ç ã o d e e sp a ç o s d e co n v iv ê n c ia ,
co m c o m p o n e n te s e stético s, re sp e ita n d o -se os c rité rio s de
s u s te n ta b ilid a d e p a ra m e lh o ria d a q u a lid a d e d e v id a.
• S u g e re -se q u e as a ç õ e s p o ssa m e v o lu ir p a ra ir além da
re c u p e ra ç ã o / re sta u ra ç ã o / re v ita liz a ç ã o d o s c o rp o s h íd rico s,
p o d e n d o in flu e n c ia r n a g e ra ç ã o d e u m a n o v a, p u ja n te e
a g ra d á v e l cid ad e , c o n te m p la n d o , n o s ca so s d e lo c a is d e risc o ou
su jeito s a in u n d a ç õ e s p e rió d ic a s, o p ç õ e s co m c o m p o n e n te s e
s u b p ro g ra m a s de re a lo c a ç ã o de p esso a s. P ro p õ e -se seja
re a liz a d o d e fo rm a p ro p o sitiv a co m in stru m e n to s in d u to re s à

173
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

re d u ç ã o d o c u sto em n o v o s lo te a m e n to s, situ a d o s em lo c a is
m a is seg u ro s e m e n o s p re ju d ic ia is ao a m b ie n te a q u á tic o u rb an o .
• U m in stru m e n to in d u to r m a is co m u m é o d a re d u ç ã o d e p a rc e la
d o Im p o sto p re d ia l U rb a n o - IP T U p a ra os n o v o s lo te a m e n to s e
e le v a ç ã o d e im p o sto n a q u e le s lo c a is q u e a p re se n ta m risc o s m ais
e le v a d o s o u altas p o ssib ilid a d e s d e d a n o s a m b ien tais. H á
ta m b é m , a lte rn a tiv a s a sso c ia d a s à seg u ro s, q u e seria m p a g o s
ao s m o ra d o re s d o s lo c a is se n sív e is a ac id e n tes. O b v ia m e n te o
seg u ro se ria m a is o n e ro so p a ra o c u p a ç õ e s em lo c a is co m alto s
risco s, in d u z in d o o p ç õ e s p o r lo c a is seg u ro s.
• F in a lm e n te , u m g ra n d e in d u to r à m u d a n ç a q u e d e v e ser
c o n sid e ra d o é a o fe rta d e d iv e rsa s fa c ilid a d e s ao s n o v o s
lo te a m e n to s, d e m o d o a cria re m c o n d iç õ e s d e v id a s m e lh o ra d a s
(e sc o la s, h o sp ita is, p o sto s d e saúde, m e trô , siste m a s u rb a n o s,
co m ércio s, la z e r e tc.) g e ra n d o , assim , m a io r p re d isp o siç ã o e
a tra tiv id a d e p a ra q u e a p o p u la ç ã o d e c id a a sair d as á reas de
risco , q u e são a lc a n ç a d a s p e rio d ic a m e n te , p e la s ch e ia s, e u m a
a tra tiv id a d e d as n o v a s áreas, q u e re su lta em u m a c o o p e ra ç ã o
am p la, p a ra a m e lh o ria d o s co rp o s h íd ric o s , c o n trib u in d o p a ra
m e lh o ria da d is p o n ib ilid a d e d as ág u as, em q u an tid ad e ,
q u a lid a d e e re g u la rid a d e , n o a lc a n c e d e u m a c id a d e su sten táv el
e em tra n sfo rm a ç õ e s q u e g eram m e lh o ria s n a q u a lid a d e d e v id a.

R E F E R Ê N C IA S

A N D R A D E , L iz a M a ria S o u za de. C o n e x ã o d o s P a d r õ e s E s p a c ia is d o s
E c o s s is te m a s U r b a n o s : A c o n stru ç ã o d e u m m é to d o co m en fo q u e
tra n s d is c ip lin a r p a ra o p ro c e sso d e d e se n h o u rb a n o sen sív el à á g u a n o
n ív el d a c o m u n id a d e e o n o n ív el d a p a isa g e m . T ese d e d o u to rad o ,
F A U /U n B . B ra sília : ju n h o d e 2014.

174
A N D R A D E , L iz a M a ria S o u za de. B r a s ília S e n sív e l à Á g u a . E n c o n tro
d a A s s o c ia ç ã o N a c io n a l d e P e s q u is a e P ó s-G ra d u a ç ã o em A rq u ite tu ra e
U rb a n ism o , S e ssã o T em á tica : Á g u a & A m b ie n te C o n stru íd o , P o rto
A leg re, 20 1 6 .

C H R IS T O F ID IS , D e m e trio s, O u tro s O lh a re s so b re as Á g u a s. In:


F O N S E C A , F e rn a n d o O liv e ira d a (o rg .). Á g u a s E m e n d a d a s . B rasília:
S E D U M A , 2 0 0 8 . p. 3 5 1 -3 5 4 . IS B N 9 7 8 -8 5 -6 1 0 5 4 -0 0 -7 .

C H R IS T O F ID IS , D e m e trio s, E d u c a ç ã o am b ie n ta l e m o b iliz a ç ã o social


em san e am en to . In: C O R D E IR O , B e re n ic e de Souza (co o rd .).
C o n c e ito s , c a r a c te r í s t ic a s e in te r f a c e s d o s s e rv iç o s p ú b lic o s d e
s a n e a m e n to b á s ic o . B ra sília : B R A S IL . M in isté rio d as C id ad es, S N S A
- P M S S , 2 0 0 9 , IS B N 9 7 8 -8 5 -6 0 1 3 3 -9 4 -9 .

C H R IS T O F ID IS , D e m e trio s, E sc a sse z h íd rica : q u a n tid a d e , q u a lid a d e e


o p o rtu n id a d e . R E A L P , P o rtu g a l, n. 5, set. 2012.

C H R IS T O F ID IS , D e m e trio s, H id ro é tic a : Á g u a , é tic a e m e io am b ien te.


In: S G A N Z E R L A , A n o r; R E N K , V a lq u iria E .; R A U L I, P a tríc ia M . F.
(o rg .). B io é tic a A m b ie n ta l. C u ritib a : P U C P R E S S , 2 0 1 8 . p. 2 0 9 -2 3 3 .
IS B N 9 7 8 -8 5 -5 4 9 4 5 -1 0 7 .

C O M IS S Ã O E U R O P É IA , H a c i a la g e s tió n s o s te n ib le d e lo s r e c u r s o s
h íd r ic o s - U n E n fo q u e E stra té g ic o . B ru x e la s: C o m issã o E u ro p é ia , 2003.
IS B N : 9 2 -8 9 4 -4 4 8 6 -X .

E L G IN , D u a n e , A D in â m ic a d a E v o lu ç ã o H u m a n a , S ão P au lo : E d.
C U L T R IX , 2 0 0 3 . IS B N : 8 5 -3 1 6 -0 4 7 0 -2 .

175
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

F A L K E N M A R K , M a lin ; R O C K S T R O M , Jo h an , B a la n c e W a t e r f o r
H u m a n s a n d N a t u r e - T h e n e w a p p ro a c h in E c o h y d ro lo g y . L o n d re s:
E a rth sc a n , 2 0 0 4 . IS B N : 1 -8 5 3 8 3 -9 2 7 -2 .

O K I, T aik a n ; K A N A E , S h in jiro , G lo b al H y d ro lo g ic a l C y c le s a n d W o rld


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I n t e g r a d a d e B a c ia H id r o g r á f ic a . B ra sília : M M A /S Q A , 2 0 0 6 . IS B N
8 5 -7 7 3 8 -0 4 7 -5 .

U N E S C O , S o lu ç õ e s B a s e a d a s n a N a tu r e z a p a r a a G e s tã o d a Á g u a -
F a to s e D a d o s, W W D R -2 0 1 8 , R e la tó rio M u n d ia l d as N a ç õ e s U n id a s
so b re D e se n v o lv im e n to d o s R e c u rso s H íd ric o s 2 0 1 8 , e la b o ra d o p elo
W W A P , E n g in K o n c a g u l, M ic h a e l T ran, R ic h a rd C o n n o r e S tefan
U h le n b ro o k , P e rú g ia , Itália, S C -2 0 1 8 /W S /5 , C L D 3 5 0 .1 8 .

U N E S C O , S o lu ç õ e s B a s e a d a s n a N a tu r e z a p a r a a G e s tã o d a Á g u a -
R e s u m o E x e c u tiv o , W W D R -2 0 1 8 , R e la tó rio M u n d ia l d as N a ç õ e s
U n id a s so b re D e se n v o lv im e n to d o s R e c u rso s H íd ric o s 2 0 1 8 , e la b o ra d o
p e lo W W A P , R ic h a rd C o n n o r e D a v id C o ates, S te fan U h le n b ro o k e
E n g in K o n c a g u l, P e rú g ia , Itália, S C -2 0 1 8 /W S /2 , C L D 3 5 2 .1 8 .

176
SANEAMENTO BÁSICO E O PLANEJAMENTO
BRASILEIRO: um a b reve análise da legislação pátria

G u sta v o M a n so d e O liv e ira *


R o g e rio B o rb a d a Silva*

1 IN T R O D U Ç Ã O

N o B ra sil a p e n a s 4 5 % d o e sg o to p a ssa p o r a lg u m p ro c e sso de


tra ta m e n to , o q u e sig n ific a q u e 5 5 % d o s d e je to s são e lim in a d o s n a
n a tu re z a sem q u a lq u e r c u id a d o , o q u e e q u iv a le a 5,2 b ilh õ e s d e m e tro s
c ú b ic o s ao a n o (S N IS , 2 0 1 6 ), tra z e n d o m u ito s p ro b le m a s ta n to so ciais
c o m o d e sa ú d e p a ra a p o p u la ç ã o b ra sile ira . F a z -s e n e c e ssá rio , en tão , o
estu d o do d ire ito ao san e am en to , e s ta b e le c id o por le g isla ç õ e s
in te rn a c io n a is e p e la P o lític a N a c io n a l d e S a n e a m e n to B ásico .
A R e p ú b lic a F e d e ra tiv a d o B ra sil, p o r m e io d e seu s g o v ern o s,
c o m u n id a d e a c a d ê m ic a e p a rte d a so c ie d a d e civil, tê m e m p e n h a d o
e sfo rç o s n o se n tid o d e so lu c io n a r os g ra v e s p ro b le m a s re su lta n te s d a
fa lta o u in e fic iê n c ia em m a té ria d e sa n e a m e n to b á sic o . C o n tu d o , ap e sa r
d o s p re c e ito s e d ire triz e s e sta b e le c id o s p e la n o ssa c a rta m aio r, n o ssa
re a lid a d e a in d a e stá m u ito d ista n te d o s re su lta d o s d e se ja d o s p e lo p e la
n o s s a C o n s titu iç ã o F e d e ra l d e 1988 e d e m a is le g isla ç õ e s v ig e n te s. Isso
se d á e s p e c ia lm e n te p o r q u e stõ e s p o lític a s, n o rm a lm e n te a sso c ia d a s aos

* Advogado. Professor da Universidade do Grande Rio - UNIGRANRIO e Professor


das Faculdades Integradas Simonsen. Mestre em Humanidades pela Universidade do
Grande Rio - UNIGRANRIO. Especialista em Direito Processual Civil pela
Universidade Cândido Mendes - UCAM e em Docência do Ensino Superior pela
Universidade Cândido Mendes - UCAM.
* Advogado. Professor do Centro Universitário IBMEC e do Centro Universitário
Carioca. Mestre em Direito pelo Centro universitário Fluminense - UniFLU e Doutor
em Sociologia pela UCAM - IUPERJ. Membro da Comissão Especial de Saneamento,
Recursos Hídricos e Sustentabilidade da CFOAB. Membro das Comissões de Direito
Administrativo e Ambiental do IAB.

177
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

in te re ss e s g o v e rn a m e n ta is q u e co lo c a m o te m a em se g u n d o p la n o de
p rio rid a d e s, e c u ltu ra is p o r p a rte d e n o ssa p o p u la ç ã o q u e d e m o n stra
p o u c o o u n e n h u m in te re sse p e lo assu n to , se n ã o p ro v o c a d o p e la g estã o
p ú b lic a , e s p e c ia lm e n te p e la im p le m e n ta ç ã o d o s P la n o s d e M o b iliz a ç ã o ,
C o m u n ic a ç ã o , C o n tro le e P a rtic ip a ç ã o S o c ia l. S e n d o este m e c a n ism o
u m a re le v a n te fe rra m e n ta d e a p ro x im a ç ã o d o c id a d ã o e d a so c ie d a d e p o r
m e io d e seu s re p re se n ta n te s p a ra a a tu a ç ã o e p a rtic ip a ç ã o n a c ria ç ã o de
c rité rio s e n a im p le m e n ta ç ã o d e aç õ es e d o serv iç o p ro p ria m e n te d ito .
Com o q u e stã o d e p e sq u isa p ro c u ra -se e n te n d e r c o m o se
c o n stitu i a le g isla ç ã o b ra s ile ira so b re S a n e a m e n to B á sic o .
N e ste a rtig o a p re se n ta re m o s os p rin c ip a is m a rc o s le g a is q u e
e sta b e le c e m o sa n e a m e n to b á s ic o c o m o d ireito , em esp e cial, c o m o este
m a rc o le g a l p re v ê a p a rtic ip a ç ã o so cial c o m o u m a sp e c to in e re n te às
p o lític a s p ú b lic a s p a ra a g a ra n tia d o d ire ito à á g u a e ao sa n e a m e n to , o
m a rc o re g u la tó rio b ra sile iro , e x p lo ra n d o as d e te rm in a ç õ e s da
C o n s titu iç ã o F e d e ra l de 1988, as D ire triz e s N a c io n a is p a ra o
S a n e a m e n to B á sic o (L ei n° 1 1 .4 4 5 /0 7 ) e o P la n o N a c io n a l de
S a n e a m e n to B ásico .

2 O S A N E A M E N T O B Á S IC O N A C O N S T I T U I Ç Ã O F E D E R A L

O s a n e a m e n to b á s ic o é tra ta d o p e la C o n stitu iç ã o d a R e p ú b lic a


F e d e ra tiv a d o B ra sil (C R F B /8 8 ) e p e la L ei 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 (P o lític a
N a c io n a l d e S a n e a m e n to B á sic o ), sen d o c o m p le m e n ta d a in ic ia lm e n te
p e la M e d id a P ro v is ó ria M P 8 4 4 /2 0 1 8 , q u e in c o rp o ra os p re c e ito s
c o n stitu c io n a is, n a q ual a tu a lm e n te se e n c o n tra em fa se d e a tu a liz a ç ã o
p o r m e io d o P ro je to d e L e i n° 3 .2 6 1 /2 0 1 9 , d e a u to ria d o S e n a d o r T asso
q ue, ap ó s a d e v id a a p ro v a ç ã o su b stitu irá c o m p le m e n ta rá a n o rm a citada.
O A rt. 6° d e n o ssa c a rta m a io r v e rs a so b re os d ire ito s so ciais
com o g a ra n tia s fu n d a m e n ta is a to d a s as p esso a s, n a c io n a is ou
e stra n g e ira s q u e se e n c o n tre m em te rritó rio b ra sile iro .

178
Art. 6° São direitos sociais a educação, a saúde, a
alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a
segurança, a previdência social, a proteção à maternidade
e à infância, a assistência aos desamparados, na forma
desta Constituição.

Os d ire ito s so ciais são in tra n sm issív e is, irre n u n c iá v e is,


im p re sc ritív e is, im p e n h o rá v e is, irre d u tív e is e in e g o c iá v e is. E m b o ra n ão
fa ç a m q u a lq u e r m e n ç ã o à e x p re ssã o “ á g u a ” , ta m p o u c o ao “ sa n e a m e n to
b á s ic o ” , ca b e o b se rv a r q u e as g a ra n tia s à “ saú d e” “ a lim e n ta ç ã o ” e
“ p ro te ç ã o à m a te rn id a d e e a in fâ n c ia ” a ssim c o m o a a s sistê n c ia aos
d e sa m p a ra d o s, d e p e n d e m d o s b e n e fíc io s tra z id o s p e lo sa n e a m e n to
b á sic o , c o m o g a ra n tid o r d a sa ú d e d as p e sso a s, d ire ta m e n te , e p o r
c o n se g u in te , a m a n u te n ç ã o d o s d e m a is b e n e fíc io s d o artigo.
H á ta m b é m o a rtig o 21 (v in te e u m ) d a C F /8 8 , a c e rc a d a
c o m p e tê n c ia d a U n iã o , d e sta c a n d o o in c iso X X , n o q u a l d e te rm in a a
in s titu iç ã o d e d ire triz e s p a ra o d e se n v o lv im e n to u rb a n o q u a n to ao
sa n e a m e n to b á sic o , b e m c o m o a h a b ita ç ã o e o tra n sp o rte u rb a n o , a sab e r:

Art. 21 - Compete à União:


XX - instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano,
inclusive habitação, saneamento básico e transportes
urbanos. (BRASIL, Constituição da Republica Federativa).

N e ste asp e cto , a in d a so b re a c o m p e tê n c ia p a ra re g u la m e n ta r e


e x e c u ta r os se rv iç o s so b re a m a té ria , te m o s o A rt. 23, q u e e sta b e le c e a
p ro m o ç ã o d o s p ro g ra m a s d e c o n stru ç ã o d e m o ra d ia s, b e m co m o ,
a tre la d o a este b e n e fíc io , a m e lh o ria d as c o n d iç õ e s d e sa n e a m e n to b á sic o
p a ra ta is re s id ê n c ia s . V e ja m o s :

Art. 23 - É competência comum da União, dos Estados, do


Distrito Federal e dos Municípios:
IX - promover programas de construção de moradia e a
melhoria das condições habitacionais e de saneamento
básico. (BRASIL, Constituição da Republica Federativa).

179
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A s n o rm a s c o n tid a s n o art. 30 e seus in c iso s, e s p e c ific a m e n te o


in c is o V , atrib u i ao M u n ic íp io a c o m p e tê n c ia p a ra le g is la r so b re os
a ssu n to s d e in te re sse lo c a is, e n e ste â m b ito se in se re a q u e stã o do
sa n e a m e n to b á sic o , n o q u e se re fe re a o rg a n iz a ç ã o e p re sta ç ã o d e fo rm a
d ire ta o u ain d a, sob a fo rm a d e c o n c e ssã o o u p e rm issã o , estes serv iç o s
p ú b lic o s d e in te re sse co letiv o , in verbis:

Art. 30 - Compete aos Municípios:


I - legislar sobre os assuntos de interesse local;
V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de
concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse
local, incluindo o de transporte coletivo, que tem caráter
essencial. (BRASIL, Constituição da República
Federativa).

N o to c a n te ao d isp o sitiv o c o n tid o n o art. 182, re fe re n te à


p o lític a d e d e se n v o lv im e n to u rb a n o , q u e será e x e c u ta d a p e lo P o d e r
P ú b lic o m u n ic ip a l, e sta sen d o m a is u m a c o m p e tê n c ia s p ró p ria d o m e sm o
e em c o n fo rm id a d e s c o m as d ire triz e s g e ra is fix a d a s p o r m e io d e lei
p ró p ria d e c a d a re g iã o , te n d o a in d a c o m o o b je tiv o o rd e n a r o p le n o
d e s e n v o lv im e n to d as fu n ç õ e s so c ia is d e c a d a cid ad e , g a ra n tin d o o b e m -
e sta r d a p o p u la ç ã o lo cal, v ejam o s:

Art. 182 - A política de desenvolvimento urbano,


executada pelo Poder Público municipal, conforme
diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o
pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e
garantir o bem-estar de seus habitantes.
Parágrafo primeiro - O plano diretor, aprovado pela
Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de
vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de
desenvolvimento e expansão urbana. (BRASIL,
Constituição da República Federativa).

A in d a so b re o art. 182, o seu p a rá g ra fo ú n ic o , c o n c e itu a e n o s


re v e la u m a im p o rta n te c a ra c te rístic a a c e rc a d o P la n o D ire to r, sen d o o

180
m e s m o o in s tru m e n to fu n d a m e n ta l q u e a sse g u ra e c ria as d ire triz e s p a ra
o d e s e n v o lv im e n to e e x p a n sã o u rb a n a, d e v e n d o se r a p ro v a d o p e lo p o d e r
le g is la tiv o m u n ic ip a l (C â m a ra M u n ic ip a l) p a ra os m u n ic íp io s com
p o p u la ç ã o su p e rio r a 2 0 .0 0 0 (v in te m il) h ab itan tes.
P ro s s e g u in d o a d e sc riç ã o d o s a rtig o s c o n stitu c io n a is so b re a
m a té ria d o sa n e a m e n to b á sic o , te m o s o art. 196 d a C F /8 8 , q u e re c o n h e c e
o d e v e r d o E s ta d o n a g a ra n tia d este d ire ito p o r m e io d e p o lític a s so ciais
e e c o n ô m ic a s, o b je tiv a n d o a re d u ç ã o d o s risc o s d e d o e n ç a s e d e o u tras
c o n se q u ê n c ia s, a sse g u ra n d o a in d a a to d o s o a c e sso u n iv e rsa l e ig u a litá rio
à s aç õ es e se rv iç o s d e stin a d o s à su a p ro m o ç ã o , p ro te ç ã o e re c u p e ra ç ã o ,
p a rtim o s ao te x to le g a l:

Art. 196 - A saúde é um direito de todos e dever do Estado,


garantido mediante políticas sociais e econômicas que
visem à redução do risco de doença e de outros agravos e
ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para
sua promoção, proteção e recuperação. (BRASIL,
Constituição da Republica Federativa).

N ã o d iv o rc ia n d o d o art. 196, tra z e m o s em c o n tin u id a d e a re g ra


e le n c a d a n o art. 198 d a C F /8 8 , so b re a m e s m a d ire triz leg isla tiv a ,
e sc la re c e n d o a c e rc a d a s re fe rid a s a ç õ e s e se rv iç o s p ú b lic o s m e n c io n a d a s
no a rtig o an terio r, sen d o d e fin id a s com o um siste m a ú n ic o e
h ie ra rq u iz a d o sen d o o rg a n iz a d o p o lític a e ju rid ic a m e n te em
c o n fo rm id a d e co m trê s d ire triz e s fu n d a m e n ta is, ta is com o a
d e s c e n tra liz a ç ã o d a ação , sen d o d irig id a in d iv id u a lm e n te em c a d a e sfe ra
d e g o v e rn a m e n ta l, a in te g ra lid a d e d o ate n d im e n to , p rio riz a n d o as
a tiv id a d e s e a ç õ e s p re v e n tiv a s além d as a ssiste n c ia is e p o r fim , p o ré m
não m enos im p o rta n te , p re c o n iz a n d o a p a rtic ip a ç ã o so cial da
c o m u n id a d e c o m o fo rm a d e in te g ra liz a ç ã o n a so m a d o s e sfo rç o s ou
m e s m o a o b s e rv a ç ã o p o p u la r so b re a q u a lid a d e e e fic á c ia d o serv iç o
p ú b lic o p re sta d o . P a rtim o s p a ra a an á lise d o d isp o sitiv o :

181
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

Art. 198 - As ações e serviços públicos de saúde integram uma


rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema
único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
I - descentralização, com direção única em cada esfera
de governo;
II - atendimento integral, com prioridade para as atividades
preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;
III - participação da comunidade.
(BRASIL, Constituição da Republica Federativa).

E p o r d e rra d e iro , c h e g a m o s ao art. 2 0 0 d a C F /8 8 , q u e tra ta p e lo


a sp e c to c o n stitu c io n a l d e u m a d as d iv e rsa s a trib u iç õ e s d o S iste m a Ú n ic o
d e S aú d e - S U S , em q u e d e sta c a m o s o re c o n h e c im e n to d o sa n e a m e n to
b á s ic o p o r m eio , n ã o só d a C F, m a s in c lu siv e p e la s le g isla ç õ e s q u e
n o rm a tiz a m o S iste m a Ú n ic o d e S aúde, c o m o u m d ire ito fu n d a m e n ta l e
u m se rv iç o esse n c ia l p a ra a m a n u te n ç ã o e q u a lid a d e d a v id a h u m a n a .
A ssim , o art. 2 0 0 d a C F, em seu c a p u t, d e te rm in a a c o m p e tê n c ia e
a trib u iç ã o d o S U S , e le n c a n d o em seu s a rtig o s c a d a d ire triz n o rm a tiv a e
a n a lis a n d o o in c iso IV , in se rin d o a p a rtic ip a ç ã o d o S U S n a fo rm u la ç ã o
d a p o lític a e d a e fe tiv a e x e c u ç ã o d o sa n e a m e n to b á sic o , V e ja m o s:

Art. 200 - Ao sistema único de saúde compete, além de


outras atribuições nos termos da lei:
IV - participar da formulação da política e da execução das
ações de saneamento básico; (BRASIL, Constituição da
República Federativa).

A ssim , v e rific a m o s os a sp e c to s c o n s titu c io n a is d o sa n e a m e n to


b á sic o , sob a ó tic a d o s d ire ito s h u m a n o s p rin c íp io b a s ila r p re c o n iz a d o
p o r n o s s a le g isla ç ã o m a io r, n a qual p o s ic io n a -s e firm e m e n te co m o
d ire triz p a ra as d e m a is le g isla ç õ e s e n o rm a s so b re a m atéria . N e ste
sen tid o , as le g isla ç õ e s p e rtin e n te s ao sa n e a m e n to b á s ic o e sta b e le c e m e
d eterm in am as diretrizes específicas e esp ecializad as sobre o estudo,
to d avia, n ão seria possível estab elecer q u alq u er en sin am en to ou co m an d o
legal sem a d ev id a e in d isp en sáv el o rien tação d e n o ssa carta m ag n a
co n fo rm e estu d am os n este tópico.

182
3 D IR E T R IZ E S N A C IO N A IS P A R A O S A N E A M E N T O B Á S IC O

O co n ceito m ais atualizado sobre o san eam en to b ásico foi


in stitu íd o com o adv en to d a L ei n° 11.445/07, D iretrizes N a cio n ais de
S an eam en to B ásico, q u e é o in stru m en to leg islativ o d ev id am en te atualizado
que co n ceitu a am p lam en te este serviço, estab elecen d o os eixos e suas
resp ectiv as definições, esp ecialm en te n o to can te à u n iv ersalização do
serviço sobre o san eam en to básico.
E ste in stru m en to legal estabeleceu tam b ém certas com petências
q u an to à co o rd en ação e atu ação dos in ú m ero s entes e agentes envolvidos
n o p lan ejam en to e ex ecu ção d a P o lítica d e S an eam en to B ásico n o país. N o
b o jo do A rt. 52, o d ispositivo legal atribui ao G o v ern o F ederal, sob a
co o rd en ação do M in isté rio das C id ad es, a resp o n sab ilid ad e p ela elaboração
do P la n o N acio n al de S aneam ento B á sic o (P lansab).
Já o caput da Lei apresenta sua finalidade legal e seus instrum entos
operacionais para o alcance efetivo do benefício, b em com o atualiza a
legislação vigente acerca da m atéria em questão. A m esm a redação com põe o
artigo inicial d a Lei (Art. 1°), dando início a esta estrutura legislativa, vejam os:

Estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico,


cria o Comitê Interministerial de Saneamento Básico, altera a
Lei n° 6.766, de 19 de dezembro de 1979, a Lei n° 8.036, de
11 de maio de 1990, a Lei n° 8.666, de 21 de junho de 1993,
e a Lei n° 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, e revoga a Lei n°
6.528, de 11 de maio de 1978. (Redação dada pela Medida
Provisória n° 844, de 2018)
Art. 1°. Esta Lei estabelece as diretrizes nacionais para o
saneamento básico e para a política federal de saneamento
básico. (planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-
2010/2007/lei/11.445).

T o m ando com o ponto de p artida o te o r do A rt. 2°, b u scam os através


do m esm o co m preender em seu bo jo os princípios basilares do saneam ento
básico, p assando a u m a análise sistem atizada do m esm o, in verbis:

183
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

Art. 2°. Os serviços públicos de saneamento básico serão


prestados com base nos seguintes princípios fundamentais:
I - universalização do acesso;
II - integralidade, compreendida como o conjunto de todas as
atividades e componentes de cada um dos diversos serviços de
saneamento básico, propiciando à população o acesso na
conformidade de suas necessidades e maximizando a eficácia
das ações e resultados;
III - abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza
urbana e manejo dos resíduos sólidos realizados de formas
adequadas à saúde pública e à proteção do meio ambiente;
IV - disponibilidade, em todas as áreas urbanas, de serviços de
drenagem e de manejo das águas pluviais adequados à saúde
pública e à segurança da vida e do patrimônio público e privado;
V - adoção de métodos, técnicas e processos que considerem
as peculiaridades locais e regionais;
VI - articulação com as políticas de desenvolvimento urbano e
regional, de habitação, de combate à pobreza e de sua
erradicação, de proteção ambiental, de promoção da saúde e
outras de relevante interesse social voltadas para a melhoria da
qualidade de vida, para as quais o saneamento básico seja fator
determinante;
VII - eficiência e sustentabilidade econômica;
VIII - utilização de tecnologias apropriadas, considerando a
capacidade de pagamento dos usuários e a adoção de soluções
graduais e progressivas;
IX - transparência das ações, baseada em sistemas de
informações e processos decisórios institucionalizados;
X - controle social;
XI - segurança, qualidade e regularidade;
XII - integração das infraestruturas e serviços com a gestão
eficiente dos recursos hídricos;
XIII - adoção de medidas de fomento à moderação do
consumo de água.

O a rtig o 2° tra z em seu c a p u t os p rin c íp io s fu n d a m e n ta is do


sa n e a m e n to b á sic o in ic ia n d o p e lo in c iso p rim e iro (I) q u e fa la d a
“u n iv e rs a liz a ç ã o d o a c e sso ” c o m o sen d o o o b je tiv o p rin c ip a l d a L ei, ou
seja, a s s e g u ra r a to d o s os c id a d ã o s o ac e sso ao sa n e a m e n to b á sic o . O
a lc a n c e a to d a s as m o ra d ia s d este serv iç o a tra v é s d e to d o s os seu s e ix o s:

184
fo rn e c im e n to d e água, c o le ta d e esg o to s, lim p e z a u rb a n a e c a p ta ç ã o e
d e s tin a ç ã o d as ág u a s p lu v iais.
P a rtin d o p a ra o in c iso seg u n d o (II), este a sse g u ra a
in te g ra lid a d e d o sa n e a m e n to b á s ic o em seu s q u a tro eix o s. E ste s são
e n te n d id o s co m o o c o n ju n to d e a tiv id a d e s in e re n te s ao sa n e a m e n to
b á sic o , g a ra n tin d o à p o p u la ç ã o a m á x im a e fic á c ia d a q u a lid a d e dos
se rv iç o s p re sta d o s, u m a v e z q u e h a v e ria d e fic iê n c ia d o se rv iç o em
fu n ç ã o d e su a n ã o to ta lid a d e n a a u sê n c ia d e q u a lq u e r u m d o s eix o s
c o m p re e n d id o s n a L ei.
A in d a d e n tro d o art. 2° e su as d e fin iç õ e s p rim á ria s e p rin c ip a is
so b re o s a n e a m e n to b á sic o , te m o s o in c iso IV , q u e d e te rm in a a
d is p o n ib ilid a d e d o serv iç o em to d a s as áreas u rb a n a s, d o s se rv iç o s de
d re n a g e m e d e m a n e jo d as á g u a s p lu v ia is a d e q u a d o s à sa ú d e p ú b lic a e à
s e g u ra n ç a d a v id a e d o p a trim ô n io p ú b lic o e p riv ad o . E n ã o d iv o rc ia n d o
d o s e n sin a m e n to s e le n c a d o s n o s d isp o sitiv o s a n te rio re s, o in c iso V
e sta b e le c e a a d o ç ã o d e m é to d o s, té c n ic a s e p ro c e sso s a d e q u a d o s q u e
c o n sid e re m as p e c u lia rid a d e s lo c a is e re g io n a is.
S eg u in d o as o rie n ta ç õ e s e le n c a d a s n o in c iso an terio r, te m o s a
d e te rm in a ç ã o d o in c iso V I, q u e e sta b e le c e e d e te rm in a u m a a rtic u la ç ã o
co m as p o lític a s d e d e se n v o lv im e n to u rb a n o e re g io n a l, d e h ab ita ç ã o , de
c o m b a te à p o b re z a e d e su a e rra d ic a ç ã o , b e m c o m o d e p ro te ç ã o
a m b ie n ta l, d e p ro m o ç ã o d a sa ú d e e ta m b é m o u tra s d e re le v a n te in te re sse
so cial v o lta d a s p a ra a m e lh o ria d a q u a lid a d e d e v id a, p a ra as q u ais o
sa n e a m e n to b á s ic o se ja fa to r d e te rm in a n te . D e n tro d esse c o n tex to , te m -
se co m o p a râ m e tro p a ra a re a liz a ç ã o d e ste s p re c e ito s a e fic iê n c ia e
s u s te n ta b ilid a d e e c o n ô m ic a , c o n fo rm e a p o n ta d o p e lo in c iso V II, do
re fe rid o d ip lo m a legal.
N o ta -s e a p ro p rie d a d e d o u trin á ria do a rtig o seg u n d o , e
ig u a lm e n te c o m o a e s tru tu ra d e ste siste m a le g a l é b e m am a rra d a , te n d o
c o m o re fe rê n c ia o te o r d o in c iso V III, q u e e sta b e le c e e o rie n ta a
u tiliz a ç ã o d e te c n o lo g ia s a p ro p ria d a s, c o n sid e ra n d o a c a p a c id a d e de
p a g a m e n to d o s u su á rio s e a a d o ç ã o d e so lu ç õ e s g ra d u a is e p ro g re ssiv a s,

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

e n o c o m a n d o d o in c iso IX , d e v e n d o -se a p lic a r p rio rita ria m e n te a


tra n s p a rê n c ia d as açõ es, b a s e a d a em siste m a s d e in fo rm a ç õ e s e
p ro c e s s o s d e c is ó rio s in stitu c io n a liz a d o s.
A d e m a is, te m o s a d ire triz e le n c a d a n o in c iso X , re fe re n te ao
c o n tro le so cial, p o d e n d o ser in te rp re ta d a c o m o u m a p a rtic ip a ç ã o d a
so c ie d a d e n o se n tid o d e fisc a liz a ç ã o e a c o m p a n h a m e n to d e to d o o
p ro c e s s o d e p la n e ja m e n to e e x e c u ç ã o d o serv iço . E c o m o crité rio d e
fin a lid a d e d este se rv iç o e a g a ra n tia d a u n iv e rsa lid a d e d o m e sm o , te m o s
as d ire triz e s e le n c a d a s n o in c iso X I, n o q u e se re fe re à seg u ran ça ,
q u a lid a d e e re g u la rid a d e .
P o r fim , v islu m b ra m o s no in c iso X II a in te g ra ç ã o das
in fra e s tru tu ra s e serv iç o s, co m a g e stã o e fic ie n te d o s re c u rso s h íd ric o s,
sen d o este c o m a n d o u m e sfo rç o c o n ju n to e in te g ra d o d as d u as p o lític a s
p ú b lic a s co m o o b je tiv o c o m u m d e fo rn e c e r á g u a se g u ra e co n stan te ,
bem com o a d e v id a c o le ta e tra ta m e n to do e sg o to , de fo rm a
u n iv e rs a liz a d a e in in te rru p ta .
P o r d e rra d e iro , o c o m a n d o d o in c is o X III, n o s tr a z c o m o
p a r â m e tro a a d o ç ã o d e m e d id a s d e fo m e n to à m o d e ra ç ã o d o c o n s u m o
d e á g u a , c o m o fo r m a d e e d u c a ç ã o p a r a o c o n s u m o c o n s c ie n te e s e g u ro
d e s te re c u rs o fu n d a m e n ta l, c o n tro la n d o e e v ita n d o o d e s p e rd íc io p o r
p a r te d o s u s u á r io s e ta m b é m p o r o c a s iã o d e re d e s d e á g u a s a n tig a s e
m a l c o n s e rv a d a s , o b s e r v a n d o ig u a lm e n te q u a n to às a m e a ç a s d a s
lig a ç õ e s c la n d e s tin a s .
A P o lítica N acio n al d e S aneam ento B ásico, n o A rt. 3° destaca a
“u n iv ersa liz açã o d o acesso ” , q u e v em claram en te esp ecificad a n o inciso
p rim eiro do referid o artigo. Tal dispositivo, aqui exposto n a fo rm a de
co m an d o legal, tem su m a im p o rtân cia n o contexto ju ríd ic o e social, visto
que a u n iv ersalização é p receito de q u e to d o s têm direito ao saneam ento
básico , co m p reen d en d o este em seus eixos, atendendo às prerro g ativ as
fu n d am en tais de disponibilidade, segurança, qu alid ad e e preços acessíveis.
A L e i ta m b é m o rie n ta q u a n to à p re sta ç ã o re g io n a liz a d a d e
se rv iç o s p ú b lic o s de sa n e a m e n to b á sic o , que se c a ra c te riz a p e la

186
p o s s ib ilid a d e d e p re sta ç ã o d o serv iç o p o r u m ú n ic o p re sta d o r, a te n d e n d o
v á rio s m u n ic íp io s o u n ão , b e m c o m o a u n ifo rm id a d e d e fisc a liz a ç ã o e
re g u la ç ã o d o s serv iço s, in c lu siv e d e su a re m u n e ra ç ã o , a c o m p a tib ilid a d e
d e p la n e ja m e n to , n o q u al tra ta re m o s co m m a is p ro fu n d id a d e ad ian te,
n e ste tra b a lh o , em re la ç ã o ao s e fe ito s d a lei em seu s asp e c to s re g io n a is.
T ra n s c re v o a b a ix o os e ix o s d e fin id o s p e la P o lític a N a c io n a l d e
S a n e a m e n to B á s ic o (L ei 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ), c o m p le m e n ta d o s e atu a liz a d o s
p e la n o v a re d a ç ã o d e fin id a p o r m e io d a M e d id a P ro v is ó ria M P 8 4 4 /2 0 1 8 ,
n o q u al e s ta b e le c e os se g u in te s c o n c e ito s a c e rc a d e ste serv iço , a sab e r:

I) Abastecimento de água potável, constituído pelas atividades,


pela disponibilização, pela manutenção, pela infraestrutura e
pelas instalações necessárias ao abastecimento público de água
potável, desde a captação até as ligações prediais e os seus
instrumentos de medição;
II) Esgotamento sanitário, constituído pelas atividades, pela
disponibilização e pela manutenção de infraestrutura e das
instalações operacionais de coleta, transporte, tratamento e
disposição final adequados dos esgotos sanitários, desde as
ligações prediais até a sua destinação final para a produção de
água de reuso ou o seu lançamento final no meio ambiente;
III) Limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, constituídos
pelas atividades, pela infraestrutura e pelas instalações
operacionais de coleta, transporte, transbordo, tratamento e
destino final dos resíduos sólidos domiciliares e dos resíduos
de limpeza urbanas; e
IV) Drenagem e manejo das águas pluviais urbanas,
constituídos pelas atividades, pela infraestrutura e pelas
instalações operacionais de drenagem de águas pluviais, de
transporte, detenção ou retenção para o amortecimento de
vazões de cheias, tratamento e disposição final das águas
pluviais drenadas, contempladas a limpeza e a fiscalização
preventiva das redes;

C o m p re e n d e m o s q u e estes e ix o s/d ire triz e s são a e sp in h a d o rsal


d a P o lític a N a c io n a l d e S a n e a m e n to B á sico . E m b o ra o sa n e a m e n to
b á s ic o seja c o m p re e n d id o c o m o u m se rv iç o e u m d ire ito d istin to do
d ire ito à á g u a p o tá v e l, n o o p e ra c io n a l e le g isla tiv o , am b o s estão

187
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

in tim a m e n te lig a d o s e d e p e n d e m te c n ic a m e n te u m d o ou tro . Se n ão


te m o s á g u a p o táv el, n ã o c u m p rim o s u m a d as d ire triz e s d a P N S B , sem
e la é im p o ssív e l a a lim en taçã o , a d e sse d e n ta ç ã o d e p e sso a s e a n im a is e,
é p e la m e s m a q u e c u id a m o s d e n o ssa h ig ie n e p e sso a l e h a b ita c io n a l,
p re v e n in d o a c o n ta m in a ç ã o e tra n sm issã o d e d o en ç as. A ssim , fa la r em
á g u a p o tá v e l é fa la r em sa n e a m e n to e v ise v ersa.
O san eam en to b ásico é um fa to r in d isp en sáv el ao
d esen v o lv im en to eco n ô m ico e social de q u alq u er país, a b o a execu ção dos
serviços de trata m e n to d a água, d a co leta e trata m e n to dos esgotos
m elh o ram a q u alidade de v id a das populações, esp ecialm en te n o q u e se
refere a saúde infantil, red u ção os riscos de m o rtalid ad e n esta fase d a vida,
m elh o ran d o a educação, au m en tan d o a saúde do trab a lh ad o r e
co n seq u en tem en te a su a cap acid ad e de au ferir renda, v alo rização de
im ó v eis e lo g rad o u ro s habitacionais, p o r m eio d a d espoluição dos rios e
p reserv ação dos recu rso s hídricos, e p o r fim , au m en tan d o a qu alid ad e dos
recu rso s naturais, fa to r este q u e in flu en c ia esp ecialm en te o ra m o d o turism o.
A P o lítica N acio n al de S aneam ento B á sic o estab elece n o C apítulo
II, “D o E x ercício d a T itu larid ad e” , em seu artigo 9° q u e “ o titu lar dos
serviços fo rm u lará a re sp ectiv a p o lítica p ú b lica de san eam en to básico,
devendo, p a ra tan to ” , co m o d efin e o inciso I, “ elab o rar os plan o s de
san eam en to básico, nos term o s d esta L e i” . N o C ap ítu lo IV, que trata sobre
o P lan ejam en to , ap resen ta o artigo 19, com cinco incisos e no v e parágrafos:

Art. 19. A prestação de serviços públicos de saneamento


básico observará plano, que poderá ser específico para
cada serviço, o qual abrangerá, no mínimo:
I - diagnóstico da situação e de seus impactos nas condições
de vida, utilizando sistema de indicadores sanitários,
epidemiológicos, ambientais e socioeconômicos e apontando
as causas das deficiências detectadas;
II - objetivos e metas de curto, médio e longo prazos para
a universalização, admitidas soluções graduais e
progressivas, observando a compatibilidade com os
demais planos setoriais;

188
III - programas, projetos e ações necessárias para atingir os
objetivos e as metas, de modo compatível com os respectivos
planos plurianuais e com outros planos governamentais
correlatos, identificando possíveis fontes de financiamento;
IV - ações para emergências e contingências;
V - mecanismos e procedimentos para a avaliação
sistemática da eficiência e eficácia das ações programadas.
§ 1° Os planos de saneamento básico serão aprovados por
ato dos titulares e poderão ser elaborados com base em
estudos fornecidos pelos prestadores de cada serviço.
(Redação dada pela Medida Provisória n° 868, de 2018).
§ 2o A consolidação e compatibilização dos planos
específicos de cada serviço serão efetuadas pelos
respectivos titulares.
§ 3o Os planos de saneamento básico deverão ser
compatíveis com os planos das bacias hidrográficas em
que estiverem inseridos.
§ 4o Os planos de saneamento básico serão revistos
periodicamente, em prazo não superior a 4 (quatro) anos,
anteriormente à elaboração do Plano Plurianual.
§ 5o Será assegurada ampla divulgação das propostas dos
planos de saneamento básico e dos estudos que as
fundamentem, inclusive com a realização de audiências ou
consultas públicas.
§ 6o A delegação de serviço de saneamento básico não
dispensa o cumprimento pelo prestador do respectivo plano
de saneamento básico em vigor à época da delegação.
§ 7o Quando envolverem serviços regionalizados, os
planos de saneamento básico devem ser editados em
conformidade com o estabelecido no art. 14 desta Lei.
§ 8o Exceto quando regional, o plano de saneamento
básico deverá englobar integralmente o território do ente
da Federação que o elaborou.
§ 9°-A Os Municípios com população inferior a vinte mil
habitantes poderão apresentar planos simplificados com
menor nível de detalhamento dos aspectos previstos nos
incisos I ao V do caput, conforme regulamentação do
Ministério das Cidades. (Incluído pela Medida Provisória
n° 868, de 2018).
Art. 20. (VETADO).
Parágrafo único. Incumbe à entidade reguladora e
fiscalizadora dos serviços a verificação do cumprimento dos
planos de saneamento por parte dos prestadores de serviços,
na forma das disposições legais, regulamentares e contratuais.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

O c o n tro le so cial d as a ç õ e s d e sa n e a m e n to é p re v isto em v á rio s


a rtig o s d a P o lític a N a c io n a l d e S a n e a m e n to B á sico . Já n o A rtig o 2°,
in c is o IV , a lei d e fin e c o n tro le so cial, com o:

conjunto de mecanismos e procedimentos que garantem à


sociedade informações, representações técnicas e
participação nos processos de formulação de políticas, de
planejamento e de avaliação relacionados com os serviços
públicos de saneamento básico; (Redação dada pela
Medida Provisória n° 868, de 2018).

A e x istê n c ia d o c o n tro le so cial é u m a d as c o n d iç õ e s p a ra a


v a lid a d e d o s c o n tra to s q u e te n h a m p o r o b je to a p re sta ç ã o d e serv iç o s
p ú b lic o s d e s a n e a m e n to b á sic o , c o m o e sta b e le c e r o A rtig o 11. H á
ta m b é m u m C a p ítu lo d a P N S B e sp e c ia lm e n te d e d ic a d o à p a rtic ip a ç ã o de
ó rg ã o s c o le g ia d o s n o c o n tro le so cial, q u e v isib iliz a m a c e n tra lid a d e d a
m o b iliz a ç ã o so cial p a ra as p o lític a s d e san e am en to .

CAPÍTULO VIII
DA PARTICIPAÇÃO DE ÓRGÃOS COLEGIADOS NO
CONTROLE SOCIAL
Art. 47. O controle social dos serviços públicos de
saneamento básico poderá incluir a participação de órgãos
colegiados de caráter consultivo, estaduais, do Distrito
Federal e municipais, assegurada a representação:
I - dos titulares dos serviços;
II - de órgãos governamentais relacionados ao setor de
saneamento básico;
III - dos prestadores de serviços públicos de saneamento básico;
IV - dos usuários de serviços de saneamento básico;
V - de entidades técnicas, organizações da sociedade civil
e de defesa do consumidor relacionadas ao setor de
saneamento básico.
§ 1o As funções e competências dos órgãos colegiados a
que se refere o caput deste artigo poderão ser exercidas por
órgãos colegiados já existentes, com as devidas adaptações
das leis que os criaram.
§ 2o No caso da União, a participação a que se refere o
caput deste artigo será exercida nos termos da Medida

190
Provisória no 2.220, de 4 de setembro de 2001, alterada
pela Lei no 10.683, de 28 de maio de 2003.

4 P L A N O N A C IO N A L D E S A N E A M E N T O B Á S IC O

O P la n o N a c io n a l de S a n e a m e n to B á sic o - PN SB, foi


d e v id a m e n te in stitu íd o p o r m e io d a L e i 11.445 d e 2 0 0 7 , d e c a rá te r
o b rig a tó rio cu ja re sp o n sa b ilid a d e p e la su a e la b o ra ç ã o e c o o rd e n a ç ã o
ca b e e x c lu s iv a m e n te ao M in isté rio d as C id a d e s .
E m seu bojo, o P N S B tra z as diversas m etas e objetivos a serem
alcançados, incluindo os respectivos tem p o s para o devido cum prim ento q u e
po d em ser d e curto, m édio e lo n g o prazo. A presenta igualm ente projetos,
pro g ram as e tarefas necessárias ao cum prim ento de tais m etas, b em com o
identifica as respectivas fontes financiadoras das ações m encionadas.
A d e m a is, o P N S B in fo rm a os re sp e c tiv o s p ro c e d im e n to s de
a v a lia ç ã o p e rió d ic a an u al d e seu cu m p rim e n to , d e v e n d o se r re a v a lia d o
em u m p e río d o d e c a d a q u a tro a n o s.
O E s ta tu to d as C id a d e s tra z d e fin e n o a rt. 2o, in c iso s I e X V III,
q u e é d e v e r d o E stad o : “ o rd e n a r o p le n o d e se n v o lv im e n to d as fu n ç õ e s
so c ia is d a c id a d e e d a p ro p rie d a d e u rb a n a, m e d ia n te as seg u in tes
d ire triz e s g e ra is:
I - garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido
como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento
ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos
serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes
e futuras gerações; (CIDADES, Lei n° 10.257/01).
XVin - tratamento prioritário às obras e edificações de
infraestrutura de energia, telecomunicações, abastecimento de
água e saneamento,” (CIDADES, Lei n° 10.257/01).

C abe destacar tam bém o Art. 3o, inciso III, que transfere a
com petência à U nião, além de outras atribuições de interesse da política urbana,

[...] promover, por iniciativa própria e em conjunto com os


Estados, o Distrito Federal e os Municípios, programas de

191
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

construção de moradias e melhoria das condições


habitacionais, de saneamento básico, das calçadas, dos
passeios públicos, do mobiliário urbano e dos demais
espaços de uso público. (CIDADES, Lei n° 10.257/01).

A in d a so b re os p rin c íp io s q u e d ão re le v a n te fu n d a m e n to ao
p la n e ja m e n to e g e stã o so b re o serv iç o d e sa n e a m e n to b á sic o diz re sp e ito
à d e m o c ra tiz a ç ã o d e sta g e stã o d o s re fe rid o s se rv iç o s p o r m e io d a
“P a rtic ip a ç ã o , C o m u n ic a ç ã o e d o C o n tro le S o c ia l” . T ra d ic io n a lm e n te a
g e s tã o d e serv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o e stá a tre la d a a u m a a tm o sfe ra
té c n ic o -a d m in istra tiv a , e sta n d o a in d a v irtu a lm e n te iso la d o d e p ro c e sso s
p o lític o s e so c io e c o n ô m ic o s q u e le g isla m , e stru tu ra m e e sta b e le c e m o
m o d o d e o p e ra ç ã o e o rg a n iz a ç ã o d e ste s se rv iç o s.
N e ste sentido, estab elecer relaçõ es entre o cidadão com o
in d ividuo, a p o p u laçã o co m o u m to d o e o p o d e r p ú b lico é u m p ro ced im en to
n o tad am en te com plexo, trab a lh o so e longo, u m a v ez q u e estes se situam em
p o siçõ es d e ex trem id ad e ten d o co m o centro e lin h a de co n ex ão a esfera
técn ic a m ed ian d o os contrapontos existentes d e cad a lad o .
P a ra se c o n c re tiz a r a m a te ria lid a d e ao p rin c íp io em q u e stã o e a
su a a p lic a b ilid a d e ao p ro c e sso d e e la b o ra ç ã o d o P L A N S A B , são
e sta b e le c id a s d iv e rsa s d ire triz e s em c o n fo rm id a d e co m a n e c e ssid a d e ,
te m p o e as c a ra c te rístic a s lo cais. E sta s d ire triz e s são su b d iv id id a s em
p ro c e s s o s q u e te m c o m o e ta p a s re u n iõ e s, d isc u ssõ e s, c o n su lta s p o p u la re s
d e n tre o u tra s . N o P L A N S A B , p o r e x e m p lo c h e g o u -se a d iv isã o em
q u in z e m a c ro d ire triz e s, d e sta c a n d o -se a P a rtic ip a ç ã o e c o n tro le social,
o b je to d este estu d o co m o v e re m o s a g o ra .
O P la n o N a c io n a l d e S a n e a m e n to B á sic o , o u P L A N S A B ,
d e te rm in a em seu te x to a e x ig ê n c ia d e d a e stru tu ra ç ã o d e m e c a n ism o s e
fe rra m e n ta s d e p a rtic ip a ç ã o e c o n tro le so cial n a in c o rp o ra ç ã o d as aç õ es
d e p o lític a s p ú b lic a s so b re sa n e a m e n to b á s ic o . E s ta e x ig ê n c ia j á e sta v a
p re c e itu a d a p e la C o n stitu iç ã o F e d e ra l d e 1988, sen d o a in d a c o n so lid a d a
p e lo te x to d a L ei n o 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , q u e re g u la as D ire triz e s N a c io n a is p a ra
o S a n e a m e n to B ásico .

192
V a le re s sa lta r q u e a p a rtic ip a ç ã o e C o n tro le social são m a n e ira s
d is tin ta s d e a tu a ç ã o d a so c ie d a d e e d o c id a d ã o p e ra n te as P o lític a s
p ú b lic a s e n o rm a lm e n te estes p ro c e d im e n to g e ra m c o n fu sã o p o r se
asse m e lh a re m , co n tu d o , a P a rtic ip a ç ã o re fe re -s e ao e le m e n to de
a p ro x im a ç ã o , d e b a te e d e b a te e n tre o c id a d ã o e d e m a is re p re se n ta n te s d a
so c ie d a d e co m o E sta d o , d e v e n d o ser p a rte in te g ra n te d o p ro c e sso de
e la b o ra ç ã o d as p o lític a s, b e m c o m o d o p ro c e sso d e d e c isã o fa z e n d o u so
d o s re c u rs o s n e c e ssá rio s p a ra a g re g a r o m a io r n ú m e ro d e c o m p o n e n te s,
d e a c o rd o co m as c a ra c te rístic a s lo c a is e fa z e n d o u so d e v a ria d a s
te c n o lo g ia s a d e q u a d a s p a ra este fim e sp e c ífic o .
J á o c o n tro le so cial tra ta -se d e u m a fo rm a d e a tu a ç ã o p o p u la r
c u jo o b je tiv o é e s ta b e le c id o n o a c o m p a n h a m e n to e fisc a liz a ç ã o d a g e stã o
p ú b lic a , c o m o ta m b é m d a s a ç õ e s g o v e rn a m e n ta is e d o s e n tes p ú b lic o s
e n v o lv id o s . P a ra ta n to , n o rm a lm e n te e x ig e -se u m g ra u m a is e le v a d o de
fo rm a ç ã o e c o n h e c im e n to d o s seu s m e c a n ism o s.
S o b re e sse p o n to , le m b re m o s q u e o sa n e a m e n to b á sic o co m o
seto r, p o ssu i d e sd e suas o rig e n s e n o rm e s e v a ria d a s d ific u ld a d e s n o q u e
se re fe re a im p le m e n ta ç ã o d o s m e c a n ism o s d e p a rtic ip a ç ã o e c o n tro le
so cial, p o r d iv e rso s m o tiv o s : d e sc o n h e c im e n to d a p u la ç ã o p e lo te m a ;
a u s ê n c ia de um a c u ltu ra só lid a de p a rtic ip a ç ã o da so c ie d a d e ;
d e s ig u a ld a d e s so ciais e re g io n a is, e com o a g ra v a n te in te re sse s
c o rp o ra tiv o s e a s u p e rv a lo riz a ç ã o d a d im e n sã o té c n ic a e p o r fim , as
c a ra c te rístic a s e ritm o s d ife re n te s d e c a d a reg ião .
A ú ltim a v ersão re v isa d a e atu alizad a do P L A N S A B ap resen ta o
elem en to d a p articip ação e do controle social n o setor san eam en to num
co n tex to h istórico, traç an d o u m a co m p aração com os d ados e in fo rm açõ es
d isp o n ív eis e lev an tad o s ao tem p o d a rev isão com as m esm as in fo rm açõ es
ob tid as ao tem p o d a edição d a v ersão original d o P lano, ten d o com o
ob jetiv o p erceb e r a d in âm ica e o d esen v o lv im en to d esta dim ensão. V ale
in fo rm ar ain d a que o cenário d a particip ação e do controle social se
m o d ifico u m u ito desd e a p u b licação do P L A N S A B . D e acordo com a
M u n ic 2017, p o d em o s n o tar que são p o u co s os m u n icíp io s b rasileiro s cujo

193
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

os m eca n ism o s de particip ação e controle social n ão estão im plem entados,


o estu d o acred ita que esse fen ô m e n o se d á p o r ca u sa de u m a possível
d eso rg an ização d a p restação dos pró p rio s serviços.
Q u a tro an o s ap ó s a p u b lic a ç ã o d a L e i n o 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , m ais
e x a ta m e n te n o a n o d e 2 0 1 1 , e x istia m n o te rritó rio b ra sile iro so m e n te 195
c o n se lh o s m u n ic ip a is so b re sa n e a m e n to b ásico . N o a n o d e 2 0 1 7 p o d e -se
c o n s ta ta r u m a u m e n to sig n ific a tiv o d o n ú m e ro d e c o n se lh o s, c h e g a n d o a
95 8 , o u seja, u m c re sc im e n to d e a p ro x im a d a m e n te c in c o v e z e s se
c o m p a ra d o ao n ú m e ro d e c o n se lh o s n o p e río d o d e 2 0 1 1 . E ste re le v a n te
a u m e n to d e c o n se lh o s co m a fin a lid a d e d e a tu a r n o c o n tro le so cial d a
p re s ta ç ã o d e se rv iç o s d e sa n e a m e n to p o d e ser a trib u íd o ao D e c re to n o
7 .2 1 7 /2 0 1 0 , q u e e sta b e le c e u em seu te x to o a n o lim ite d e 2 0 1 4 , p a ra
ac e sso e re c e b im e n to d e re c u rso s fe d e ra is, p a ra a e la b o ra ç ã o p o r p a rte
d o s re s p o n sá v e is p e lo s serv iço s, b e m co m o , d e e n tid a d e s c o le g ia d a s com
fin a lid a d e ao c o n tro le social.
A d e m a is, se c o n sid e ra m o s a n o B ra sil te m o s 5 .5 7 0 m u n ic íp io s,
este n ú m e ro n o s p a re c e b a ix o , d ista n te d o id eal em te rm o s d e n aç ão ,
to d av ia, são in ú m e ro s c o n se lh o s q u e in se re m o sa n e a m e n to b á s ic o en tre
su as p rio rid a d e s, em e sp e c ia l os c o n se lh o s d e saú d e, m e io a m b ie n te e
d e s e n v o lv im e n to u rb a n o . P a ra c o rro b o ra r, n o a n o d e 2011 j á se
c o n ta v a m em to rn o d e 3 .5 8 2 e n o a n o d e 2 0 1 7 estes p a ssa ra m p a ra 3 .6 5 0 ,
isso sem m e n c io n a r os p ró p rio s c o n se lh o s m u n ic ip a is d e san e am en to .
P o r esta an á lise , a M u n ic 2 0 1 7 d e d u z q u e a m a n e ira m a is p rá tic a e c é le re
e n c o n tra d a p o r alg u n s titu la re s d o s se rv iç o s p a ra im p le m e n ta r o c o n tro le
so cial n a s ativ id a d e s d e sa n e a m e n to a c a b o u sen d o o d e e ste n d e r as
c o m p e tê n c ia s e a trib u iç õ e s d o s c o n se lh o s j á e x iste n te s e im p le m e n ta d o s.
T a l p ro c e d im e n to foi ú til, em p a rtic u la r, n a re g iã o N o rd e ste . A ssim , o
estu d o co n c lu i q u e a in stitu c io n a liz a ç ã o d e ste s c o n se lh o s e stá p re se n te e
b a s ta n te c o n s o lid a d a em g ra n d e p a rte d o s m u n ic íp io s b ra sile iro s,
co n tu d o , n e c e s sita -se d e u m a c o m p a n h a m e n to d e ste s in d ic a d o re s p a ra
fa z e r u m a a n á lise m a is c rite rio sa so b re o e fe tiv o fu n c io n a m e n to dos
c o n se lh o s ex isten tes.

194
O u tro d a d o re le v a n te tra z id o p e la M u n ic 2 0 1 7 é que a
m a c ro rre g iã o Sul é a q u e p ro p o rc io n a lm e n te p o ssu i u m m a io r n ú m e ro de
c o n se lh o s d e s a n e a m e n to n o p aís, em c o n tra p a rtid a a N o rd e s te é a q u e
p o ssu i o m e n o r n ú m e ro , o u tro ssim , n o q u e se re fe re ao s c o n se lh o s
tra n sv e rsa is, e x iste u m e q u ilíb rio m a io r e n tre as m a c ro rre g iõ e s, e sta n d o
to d a s co m ín d ic e d e m a is d e 60% . E p o r fim , a M u n ic e sc la re c e ain d a
q u e d e n tre os c o n se lh o s so b re sa n e a m e n to e sta b e le c id o s n o a n o d e 2 0 1 7 ,
1 6 ,1 % eram , c o n c o rre n te m e n te d e c a rá te r n o rm a tiv o , d e lib e ra tiv o e
fis c a liz a d o r e a p e n a s 8 3 ,9 % c o m o se n d o c o n su ltiv o s. P o r fim esta
d is trib u iç ã o d a a tu a ç ã o em m a té ria d e s a n e a m e n to b á s ic o en tre os
d iv e rso s c o n se lh o s e x iste n te s é d e m o stra d a n a T a b e la 4.3 4 . d o re fe rid o
d o c u m e n to , o n d e p o d e m o s o b se rv a -se q u e os C o n se lh o s M u n ic ip a is de
S a n e a m e n to e de S aú d e c o n c e n tra m re g io n a l e n a c io n a lm e n te a
p a rtic ip a ç ã o n o setor. A b a ix o , u m a ta b e la d e m o n stra n d o os M u n ic íp io s
co m C o n s e lh o atu a n te s em S a n e a m e n to B á sic o :
A in d a seg u n d o a M u n ic 2017, existem alguns m eca n ism o s de
p articipação, que estão m en o s consolidados, n este sentido, som ente 4 5 ,6 %
dos m u n icíp io s u tilizaram algum m eca n ism o de particip ação n ão sendo
co leg iad o em perío d o relativo d e u m ano, co n tan d o com audiências
p úblicas, d eb ates e consultas públicas, o u ain d a realizaram alg u m a
co n ferên cia das cidades d en tro de u m p erío d o d e quatro anos até 2017.
A d e m a is, além dos m e c a n ism o s cita d o s a n te rio rm e n te ,
d e sta c a m o s ain d a d o is m e c a n ism o s q u e tiv e ra m re le v a n te a trib u to ta n to
n o a sp e c to d a p a rtic ip a ç ã o q u a n to d o c o n tro le social. P rim e ira m e n te
re fe rim o -n o s a p a rtic ip a ç ã o d a p o p u la ç ã o n a c ria ç ã o d o s p la n o s de
sa n e a m e n to , to rn a d a o b rig a tó ria p e lo a d v e n to d a L ei n o 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ,
b e m c o m o d o D e c re to n o 7 .2 1 7 /2 0 1 0 q u e re g u la m e n ta a m esm a.
E em se g u n d o são os C o n s e lh o s d as C id a d e s, e sta b e le c id o s n o
a n o d e 2 0 0 4 , se n d o os m e sm o s in te g ra d o s à e stru tu ra ç ã o d o M in isté rio
d as C id a d e s, en tã o e x iste n te s à ép o c a, co m c a ra c te rístic a c o n su ltiv a e
d e lib e ra tiv a , e c u ja fin a lid a d e , d e n tre o u tras, é a d e e la b o ra ra e
a c o m p a n h a r a im p le m e n ta ç ã o e e x e c u ç ã o d a p o lític a n a c io n a l de

195
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

d e s e n v o lv im e n to u rb a n o n o a sp e c to g eral e a d o sa n e a m e n to b á s ic o em
se n tid o m a is d ireto.
A d e m a is, so b re o C o n se lh o d as C id ad es, este foi b a sta n te
p a rtic ip a tiv o n o se to r a té o a n o d e 2 0 1 7 , re su lta n d o n a to ta lid a d e de
c in q u e n ta e c in c o re u n iõ e s (o rd in á ria s e e x tra o rd in á ria s), sen d o c e n á rio
d e d e b a te s c a lo ro so s e n tre os p rin c ip a is ato re s e n v o lv id o s n o te m a
sa n e a m e n to , a e la b o ra ç ã o d e d e z e n a s d e re so lu ç õ e s a c e rc a d o s m ais
v a ria d o s a ssu n to s in e re n te s às p o litic a s e x e c u ta d a s sob a ég id e d o e n tão
e x iste n te M in isté rio d as C id ad es, se n d o e sp e c ia lm e n te p o r m e io d e sta s
re u n iõ e s d o C o m itê T é c n ic o d e S a n e a m e n to A m b ie n ta l (C T S A ). P o r
d e rra d e iro , d e se ja m o s q u e u m a fu tu ra C o n fe rê n c ia N a c io n a l d as C id a d e s
se ja re a liz a d a a in d a n o a n o d e 2 0 1 9 , d e a c o rd o co m o e s ta b e le c id o p e lo
D e c re to n o 9 .0 7 6 /2 0 1 7 .

5 C O N S I D E R A Ç Õ E S F IN A I S

O p resen te trab alh o tev e co m o escopo a análise do P la n o de


M o b iliz açã o e particip ação Social, a lu z d o P la n o M u n icip al de D u q u e de
C axias, o b serv an d o a efetiva realização dos p ro ced im en to s prev isto s n a
leg islação e su a d ev id a aplicabilidade n o p ro cesso de elaboração do
d o cu m en to em questão. A n tes de m ais nada, cab em o s ressaltar que o P la n o
de M o b iliz açã o e P articip aç ão Social é u m a im p o rtan te fe rram e n ta de
in teg ração d a sociedade ju n to ao p o d e r p ú b lico em m atéria de saneam ento
básico. T rata-se, co n tex tu alm en te co m o u m dos critérios fu n d am en tais p ara
a elab o ração e im p lem en tação dos P la n o s M u n icip ais de S aneam ento
B ásico , cujo fu n d a m e n to en co n tra-se n o tex to d a C o n stitu ição d a R ep ú b lica
F ed erativ a do B rasil (C R F B /88), sendo relev an tem en te trata d o co m o u m a
das d iretrizes e garantias fu n d am en tais traz id as pelo tex to m aior. P artin d o
d a n o rm a co n stitucional com o fonte principal e p rim aria d e to d a legislação
v ig en te sobre o tem a, tem o s ain d a as leg islaçõ es derivadas e pertin en tes à
m atéria co m o a L ei 11.445/2007 q u e estab elece o P la n o M unicipal de
S an eam en to B ásico (P L A N S A B ), a L ei n° 12.305/2010, que re g u la a

196
P o lítica N a cio n al de R esíd u o s S ólidos e a L ei 10.257/2001 q u e tra ta do
E statu to das C id ad es e o D e creto n° 7.217/2010.

R E F E R Ê N C IA S

A M B IE N T A L , P o lític a N a c io n a l d e E d u c a ç ã o . L e i n° 9 .7 9 5 /1 9 9 9 .
B R A S IL . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /L E IS /L
9 7 9 5 .h tm . A c e sso em : 2 0 out. 2018.

B A R R O S , A n a C ristin a. O C o n t r o l e S o c ia l n o B ra s il. F u n d a ç ã o
D e m ó c rito R o c h a - T rib u n a l d e C o n ta s d o E sta d o d o C eará. 2016.

B Á S IC O , P o lític a N a c io n a l de S an ea m e n to . L e i n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 .
B R A S IL . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /L E IS /L
1 1 4 4 5 .h tm . A c e sso em : 2 0 out. 2018.

B IO L O G IA , P la n e ta . O q u e é s a n e a m e n to b á s ic o - im p o rtâ n c ia - tu d o
sobre. M a té ria . D isp o n ív e l em : h ttp s://p la n e ta b io lo g ia .c o m /o -q u e -e -
s a n e a m e n to -b a s ic o -im p o rta n c ia -tu d o s o b re /. A c e sso em : 06 set. 2018.

B R A S IL , C o n s titu iç ã o d a R e p ú b lic a F e d e ra tiv a d o . D isp o n ív e l


em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /c o n stitu ic a o /c o n stitu ic a o c o m
p ila d o .h tm . A c e sso em : 2 0 out. 2018.

B R A S IL . L e i n° 1 0 .2 5 7 /2 0 0 1 . E sta tu to d as C id ad es. D isp o n ív e l em :


h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /L E IS /L 1 0 2 5 7 .h tm . A c e sso em : 20
out. 2 0 1 8 .

B R A S IL . M in isté rio d a S aú d e do. S iste m a Ú n ic o d e S aúde. L e i n°


8 .0 8 0 /9 0 . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /L E IS /L
8 0 8 0 .h tm . A c e sso em : 2 0 out. 2018.

197
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

B R A S IL , O P A S /O M S . O P A S /O M S B r a s il - O M S : 2,1 b ilh õ e s de
p e sso a s n ã o tê m á g u a p o tá v e l em c a sa e m a is d o d o b ro n ã o d isp õ e m de
sa n e a m e n to seg u ro . D isp o n ív e l em : h ttp s ://w w w .p a h o .o rg /b ra /in d e x .p h
p ? o p tio n = c o m _ c o n te n t& v ie w = a rtic le & id = 5 4 5 8 :o m s-2 -1 -b ilh o e s-d e -
p e s s o a s-n a o -te m -á g u a -p o ta v e l-e m -c a sa -e -m a is-d o -d o b ro -n ã o -d isp õ e m -
d e -sa n e a m e n to -se g u ro . A c e sso em : 30 ago. 2018.

B R A S IL E IR O S , P ro b le m a s. R e v is ta , a n o 55, n° 4 4 7 , F e c o m e rc io -S P ,
ag o ./set. 2 0 1 8 .

C A X IA S , C M D C /C â m a ra M u n ic ip a l d e D u q u e de. H i s t ó r i a d e D u q u e
d e C a x ia s . M atéria . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .c m d c .rj.g o v .b r/? p a g e _ i
d = 1155. A c e s s o em : 2 0 out. 2018.

D O W B O R , L ad islau . O q u e é o P o d e r L o c a l? E d iç ã o re v is ta e
a tu aliza d a. É tica. M A . 2016.

F A IR C L O U G H , N o rm an . A n álise C rítica d o D iscu rso co m o m éto d o em


p esq u isa social científica. In: M E Y E R , W o d a k e M e th o d s o f c ritic a l
d is c o u rs e a n a ly sis. 2a ed. L ondres: Sage, 2005. p. 121-128.

FA ZEN D A , Iv a n i C a ta rin a A ra n tes. In te rd isc ip lin a rid a d e e


T ra n s d is c ip lin a rid a d e n a F o rm a ç ã o d e P ro fe sso re s, A rtig o , Id e a ç ã o -
R e v is ta d o C e n t r o d e E d u c a ç ã o e L e t r a s - U n io e s te , C u ritib a , v. 10,
n. 1, p. 9 3 -1 0 3 , 2008.

G U E R R A , S id n ey ; D ir e ito I n t e r n a c i o n a l A m b ie n ta l: B re v e R eflex ã o .
R e v is ta D ire ito s F u n d a m e n ta is & D e m o c ra c ia .

G O M E S , E d u a rd o B ia c c h i G o m e s e B U L Z IC O , B e ttin a B u lzico . 2 0 1 0 ,
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P la n o M u n ic ip a l d e S a n e a m e n to B á sic o : A p o rte s c o n c e itu a is e

198
m e to d o ló g ic o s. L ei N a c io n a l D e S a n e a m e n to B ásico : P e rsp e c tiv a s P a ra
A s P o lític a s E A G e stã o D o s S e rv iç o s P ú b lic o s - In stru m e n to s das
p o lític a s e d a g e stã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e S a n e a m e n to B ásico .
L IV R O I. B rasil. M in isté rio d as C id ad es. S e c re ta ria N a c io n a l de
S a n e a m e n to A m b ien tal. B ra sília . 2009.

M O R A E S , L u iz R o b e rto S antos. P o lític a e P la n o M u n ic ip a l d e


S a n e a m e n to B á sic o : A p o rte s c o n c e itu a is e m e to d o ló g ic o s. L ei N a c io n a l
D e S a n e a m e n to B ásico : P e rsp e c tiv a s P a ra A s P o lític a s E A G e stã o D o s
S e rv iç o s P ú b lic o s - In stru m e n to s d as p o lític a s e d a g e stã o d o s serv iç o s
p ú b lic o s d e S a n e a m e n to B á sico . L IV R O I. B rasil. M in isté rio das
C id ad es. S e c re ta ria N a c io n a l d e S a n e a m e n to A m b ie n ta l. B rasília. 2009.

M O R A E S , G u ilh e rm e P en a. C u r s o d e D ir e ito C o n s titu c io n a l. 8a ed.


S ão P au lo : G e n /A tla s, 2016.

N a c o e s u n id a s .o rg /a sse m b le ia -g e ra l-d a -o n u -re c o n h e c e -sa n e a m e n to -


c o m o -d ire ito -h u m a n o -d istin to -d o -d ire ito -a -á g u a -p o ta v e l/. D isp o n ív e l
em : h ttp s ://a c o e s u n id a s .o rg /a s s e m b le ia -g e ra l. P u b lic a d o e a tu a liz a d o em
04 ja n . 2 0 1 6 . A c e sso em : 30 ago. 2018.

O B S E R V A T Ó R IO L E G IS L A T IV O D A IN T E R V E N Ç Ã O F E D E R A L
N A S E G U R A N Ç A P Ú B L IC A D O R IO D E JA N E IR O . D e s ig u a ld a d e
n a B a ix a d a F lu m in e n s e . D isp o n ív e l em : h ttp ://o le rj.c a m a ra .le g .b r/re tr
a to s -d a -in te rv e n c a o /d e sig u a ld a d e -n a b a ix a d a flu m in e n se . A c e sso em : 20
out. 2 0 1 8 .

S IL V A , Jo sé A fo n so da. C u r s o d e D ir e ito C o n s titu c io n a l P o s itiv o . R io


d e Jan e iro : E d . M a lh e iro s, 2014.

S IR V IN S K A S , L u ís P a u lo . M a n u a l d e D ir e ito A m b ie n ta l. 8a ed. S ão
P au lo : S araiv a, 2010.

199
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

TO RRES, E lo ísa. PM SB e ERSB. 2014. D isp o n ív e l em :


h ttp s ://p m s b g u a n a b a ra .file s.w o rd p re ss.c o m /2 0 1 4 /0 9 /p re sta c a o _ d e _ c o n t
a s_ a g o sto _ 2 0 1 4 .p d f. A c e sso em : 01 ju n . 2019.

U N W -D P A C - P r o g r a m a d a D é c a d a d a Á g u a d a O N U -Á g u a s o b r e
A d v o c a c ia e C o m u n ic a ç ã o . D isp o n ív e l em O N U -B ra sil.c o m .

V E L A S C O , C lara. S a n e a m e n to av a n ça, m a s B ra sil a in d a jo g a 5 5 % do


e sg o to q u e c o le ta n a n a tu re z a , d iz estu d o . G 1 , 18 abr. 2 0 1 8 . D isp o n ív e l
em : h ttp s://g 1 .g lo b o .c o m /e c o n o m ia /n o tic ia /sa n e a m e n to -a v a n c a -m a s-
b ra sil-a in d a -jo g a -5 5 -d o -e sg o to -q u e -c o le ta -n a -n a tu re z a -d iz -
e s tu d o .g h tm l. A c e sso em : 30 ago. 2018.

Z O R Z I, L o re n zo ; T U R A T T I, L u c ia n a e M A Z Z A R IN O , Ja n e M árcia. O
d ireito h u m a n o de ac esso à á g u a p o táv el: U m a an á lise co n tin en tal b a se a d a
n o s F ó ru n s M u n d ia is d a Á gua. A m b ie n te & Á g u a - A n I n te r d is c ip lin a r y
J o u r n a l o f A p p lie d S cien ce , L aje ad o /R S , v. 11, n. 4, out. /dez. 2016.

200
ANOTAÇÕES SOBRE O NOVO MARCO REGULATÓRIO
DO SANEAMENTO BÁSICO

H u m b e rto M artins*

R E S U M O : O tra b a lh o p re te n d e a p o n ta r os p o n to s d e m a io r re le v â n c ia
n a s a lte ra ç õ e s d o M a rc o R e g u la tó rio d o S a n e a m e n to B á sic o b ra sile iro ,
d e c o rre n te s d as m u d a n ç a s p ro m o v id a s p e la L ei n. 14.026, d e 17 d e ju lh o
d e 2 0 2 0 , sob o p o n to d e v is ta d a A g e n d a 2 0 3 0 e d o s O b je tiv o s de
D e se n v o lv im e n to S u ste n táv el (O D S ). R e s s a lta d a a im p o rtâ n c ia d a
u n iv e rs a liz a ç ã o d e a c e sso ao sa n e a m e n to , e s p e c ia lm e n te à á g u a p o táv el
e ao se rv iç o d e esg o to , p e rp a ssa m as n o v id a d e s re g u la tó ria s em n ív el
fe d era l, co m a n o v a c o m p e tê n c ia d a A g ê n c ia N a c io n a l d e A g u a is
(A N A ), b e m c o m o a re g io n a liz a ç ã o d o se rv iç o d e sa n e a m e n to co m seu
n o v o m o d e lo co n tra tu a l e ta rifá rio . O d e se n v o lv im e n to su ste n tá v e l com
0 q u al o B ra sil se c o m p ro m e te u p rin c ip io lo g ic a m e n te n a C o n stitu iç ã o
F e d e ra l de 1988 e n c o n tra c o n so n â n c ia nos O b je tiv o s de
D e se n v o lv im e n to S u ste n táv el (O D S ), p re te n d e n d o re a liz a r-se n o â m b ito
fá tic o em d e c o rrê n c ia d a s a lte ra ç õ e s d o n o v o M a rc o d o S an ea m e n to .

P a la v r a s - c h a v e : S a n e a m e n to b á s ic o . D e se n v o lv im e n to su s te n tá v e l.
A lte ra ç ã o do m a rc o le g a l. U n iv e rs a liz a ç ã o . R e g u la ç ã o . U n id a d e s
re g io n a is . C o n c e s s ã o . M o d e lo ta rifá rio .

1 IN T R O D U Ç Ã O

O N o v o M a rc o R e g u la tó rio d o S a n e a m e n to B á sico , in tro d u z id o


p e la L ei n. 14.026, d e 17 d e ju lh o d e 2 0 2 0 , p ro m o v e u sig n ific a tiv a s
m u d a n ç a s n a L e i n. 9 .9 8 4 , d e 17 d e ju lh o d e 2 0 0 0 , p a ra a trib u ir à A g ê n c ia
N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to B á sic o (A N A ) c o m p e tê n c ia p a ra

* Ministro e Presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

201
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

in s titu ir n o rm a s d e re fe rê n c ia p a ra a re g u la ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s de
sa n e a m e n to b á sic o , assim c o m o n a L e i n. 10.768, d e 19 d e n o v e m b ro de
2 0 0 3 , p a ra a lte ra r o n o m e e as a trib u iç õ e s d o c a rg o d e e sp e c ia lista em
re c u rs o s h íd rico s.
A a tu a liz a ç ã o le g isla tiv a n ã o p a ro u p o r ai, p o is ta m b é m altero u
a L ei n. 11.107, d e 6 d e abril d e 2 0 0 5 , p a ra v e d a r a p re sta ç ã o p o r c o n tra to
d e p ro g ra m a d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e q u e tra ta o art. 175 d a C o n stitu iç ã o
F e d e ra l; a L ei n. 11.445, d e 5 d e ja n e ir o d e 2 0 0 7 , p a ra a p rim o ra r as
c o n d iç õ e s e stru tu ra is d o sa n e a m e n to b á s ic o n o P a ís; a L e i n. 12.305, de
2 d e ag o sto d e 2 0 1 0 , p a ra tra ta r d e p ra z o s p a ra a d isp o siç ã o fin al
a m b ie n ta lm e n te a d e q u a d a d o s re je ito s; a L ei n. 13.089, d e 12 d e ja n e iro
d e 2 0 1 5 (E sta tu to d a M e tró p o le ), p a ra e ste n d e r seu â m b ito d e ap lic a ç ã o
a u n id a d e s re g io n a is; e a L ei n. 13.529, d e 4 d e d e z e m b ro d e 2 0 1 7 , p a ra
a u to riz a r a U n iã o a p a rtic ip a r d e fu n d o co m a fin a lid a d e e x c lu siv a de
fin a n c ia r se rv iç o s té c n ic o s esp e c ia liz a d o s.
D o m e sm o m o d o , a a lv issa re ira d iv isa re g u la tó ria ta m b é m
g e ro u im p a c to s em o u tro s te x to s n o rm a tiv o s c o m o o D e c re to n. 8.141 d e
2 0 d e n o v e m b ro d e 2 0 1 3 1; a P o rta ria In te rm in iste ria l n. 571 d e 5 de
d e z e m b ro d e 2 0 1 3 12; e o D e c re to n. 7 .2 1 7 d e 21 d e ju n h o d e 2 0 1 0 .3
N o s s a p ro p o sta , n e ssa s a n o ta ç õ e s, será a a n á lise p o n tal d a L ei
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 sob o p rism a d a A g e n d a 2 0 3 0 e d o s O b je tiv o s de
D e se n v o lv im e n to S u ste n tá v e l (O D S )4. P a ra isso , n o sso p o n to d e p a rtid a
será a id e n tific a ç ã o d as p rin c ip a is n o v id a d e s tra z id a s p e la lei, so b re tu d o
n o q u e se re fe re à u n iv e rsa liz a ç ã o d a á g u a p o tá v e l, à c o le ta e ao
tra ta m e n to d o esg o to ; à A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to
B á sic o ; à m a io r e fe tiv id a d e d as p o lític a s p ú b lic a s e o n o v o m o d e lo de

1 Dispõe sobre o Plano Nacional do Saneamento Básico - PNSB, institui o Grupo de


Trabalho Interinstitucional de Acompanhamento da Implementação do PNSB e dá
outras providências.
2 Aprova o Plano Nacional de Saneamento Básico (PNSB).
3 Regulamenta a Lei n 11.445, de 5 de janeiro de 2007, que estabelece diretrizes
nacionais para o saneamento básico, e dá outras providências.
4 Http://www.agenda2030.com.br/ods/6/.

202
sa n e a m e n to b ásico ; às u n id a d e s re g io n a is o u os b lo c o s d e re fe rê n c ia ; e,
p o r fim , ao n o v o m o d e lo c o n tra tu al e à n o v a ta rifa d e serviço.

2 D A U N IV E R S A L IZ A Ç Ã O D A À G U A

O p rin c ip a l c o n te x to d o N o v o M a rc o L e g a l d o S a n e a m e n to
B á s ic o (L ei n. 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 ) é o o b je tiv o d e v ia b iliz a r a u n iv e rsa liz a ç ã o
d o s se rv iç o s d e fo rn e c im e n to d e á g u a e d e c o le ta e tra ta m e n to dos
re s íd u o s até o d ia 31 d e m a rç o d e 2 0 2 2 , a s se g u ra n d o o a te n d im e n to de
9 9 % d a p o p u la ç ã o co m á g u a p o tá v e l e d e 9 0 % d a p o p u la ç ã o co m c o le ta
e tra ta m e n to d e esg o to (a rtig o s 10-B e 11-B d a L e i n. 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ).
A re s p e ito d o p rim e iro p o n to , fa z -se v e r fa c ilm e n te q u e a m e ta
d e u n iv e rs a liz a ç ã o d e á g u a p o tá v e l, c o le ta e tra ta m e n to d e esg o to , além
de o u tras m e ta s q u a n tita tiv a s re fe re n te s à não in te rm itê n c ia do
a b a ste c im e n to , d e re d u ç ã o d e p e rd a s e d e m e lh o ria d o s p ro c e sso s de
tra ta m e n to 5, e stá in se rid a e n tre os 17 O b je tiv o s d e D e se n v o lv im e n to
S u ste n tá v e l d a A g e n d a 2 0 3 0 d a O N U , m a is e sp e c ific a m e n te o O b je tiv o
n. 6, “ á g u a p o tá v e l e s a n e a m e n to ” , q u e tra ta d a g e stã o su sten táv el d a
á g u a e d o s a n e a m e n to p a ra to d o s.
E m re la ç ã o ao s co n tra to s em v ig o r q u e n ã o p o ssu e m m e ta s de
u n iv e rs a liz a ç ã o d e á g u a p o tá v e l, a n o v a lei d eu tra ta m e n to esp e c ífic o ,
u m a v e z q u e esse s c o n tra to s d e v e ria m se r a d ita d o s p a ra in clu ir, n a fo rm a
d o § 1° d o a r t . 1 1 -B , r e f e r ê n c ia s a p r a z o s d e a b a s te c im e n to e c o le ta
d e r e s íd u o s d e m o d o u n iv e r s a liz a d o . A e x c e ç ã o à a d e q u a ç ã o dos
co n tra to s em v ig o r à n o v a p o lític a p ú b lic a (§ 2° d o m e sm o te x to le g a l)
fic a p o r c o n ta d o s c o n tra to s firm a d o s p o r m e io d e p ro c e d im e n to s
lic ita tó rio s q u e p o ssu a m m e ta s d iv e rsa s d a q u e la s p re v ista s n a n o v a lei,

5 Confira arts. 10-B e 11-B, Lei n. 11.445/2007, com a redação alterada pela Lei n.
14.026/2020.

203
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

m a s q ue, d e to d o m o d o , e stã o su jeito s a m e d id a s a lte rn a tiv a s p a ra


v ia b iliz a r o a tin g im e n to d o s o b je tiv o s6.
D e n tro d esse c o n tex to , a u n iv e rs a liz a ç ã o d o a b a ste c im e n to de
á g u a e c o le ta d e re síd u o s lig a -se ao p ró p rio p rin c íp io d a d ig n id a d e d a
p e s s o a h u m a n a (art. 1°, in c iso III, d a C F ), ao ac e sso a u m m e io a m b ie n te
e c o lo g ic a m e n te e q u ilib ra d o (art. 225 d a C F ), à sa ú d e (art. 2 0 0 , in c iso IV ,
d a C F ), e n tre o u tra s c o n d iç õ e s a d e q u a d a s à sad ia q u a lid a d e d e v id a , n a
q u al o s se rv iç o s p ú b lic o s o u p riv a d o s d e sa n e a m e n to b á sic o , co m o
a b a ste c im e n to d e á g u a p o tá v e l, e sg o ta m e n to san itário , lim p e z a u rb a n a e
m a n e jo d e re s íd u o s só lid o s, e d re n a g e m e m a n e jo d e ág u a s p lu v ia is
u rb a n a s se re v e la m im p re sc in d ív e is à v id a sau d á v el e digna.
P o r certo , o sa n e a m e n to b á s ic o e o d e se n v o lv im e n to u rb a n o são
c o m o g ê m e o s siam eses, u m c o n e c ta d o ao o u tro . D e sse m o d o , o art. 21,
in c is o X X , d a C F, q u a n d o e m p re g a o a d v é rb io “ in c lu s iv e ” p a ra se re fe rir
ao sa n e a m e n to b á sic o , o fa z c o m o p a rte in te g ra n te d as d ire triz e s p a ra o
d e s e n v o lv im e n to u rb a n o .
A té aqui, porém , p o d em o s co n clu ir que o san eam en to básico,
en q u an to serviço essencial, d ev e ser p restad o de fo rm a adequada, eficiente,
seg u ra e contínua, n o s term o s do art. 2 2 d a L ei n. 8.078/1990, consoante
ju risp ru d ê n c ia do S uperior T ribunal d e Justiça, v alen d o destacar:

Aplicação do Código de Defesa do Consumidor às


relações entre usuários e concessionárias de serviço
público. (...) II - Aplica-se o Código de Defesa do
Consumidor às relações mantidas entre usuário e
concessionara de serviços públicos, nos termos do art. 7°
da Lei 8.987/95. Agravo regimental improvido. (AgRg no

6 De acordo com um estudo recente da KPMG Brasil, elaborado em conjunto com a


ABCON SINDCON, o investimento total necessário para atingir a meta de universalização
dos serviços de saneamento até 2033 é estimado em R$ 753 bilhões. Isso significa mais de
R$ 50 bilhões de investimentos anuais - mais de quatro vezes o investimento médio anual
de R$ 12 bilhões no setor nos últimos cinco anos. Disponível em:
https://www.linkedin.com/posts/sindcon_brasil-busca-futuro-com-%C3%A1gua-limpa-
activity-6797517139050840065-n6iK. Acesso em: 10/05/2021.

204
Ag n. 1.022.587-RS, relator Ministro Sidnei Beneti,
julgamento em 21/8/2008.)7

E n fim , a lé m d e ssa s lig a ç õ e s co m o D ire ito d o C o n su m id o r, o


se rv iç o d e fo rn e c im e n to d e á g u a e c o le ta d e re síd u o s ta m b é m e stá afeto
ao D ire ito A m b ie n ta l, ao D ire ito S an itário , c o m o p o r v e z e s re c o n h e c id o
p e lo S u p e rio r T rib u n a l d e J u s tiç a 8.

3 D A A G Ê N C IA N A C IO N A L D E Á G U A S E S A N E A M E N T O

A g o ra é te m p o d e p a ssa r ao se g u n d o p o n to , q u e r d izer, tra ta r d a


a lte ra ç ã o o c o rrid a a rtig o 1° d a L ei n. 9 .9 8 4 /2 0 0 0 , q u e e s ta b e le c e u a
c ria ç ã o d a A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to B á sic o (A N A ),
e n tid a d e fe d e ra l d e im p le m e n ta ç ã o d a P o lític a N a c io n a l d e R e c u rso s
H íd ric o s, in te g ra n te d o S iste m a N a c io n a l d e G e re n c ia m e n to d e R e c u rso s
H íd ric o s (S in g re h ) e re sp o n sá v e l p e la in stitu iç ã o de n o rm a s d e re fe rê n c ia
p a ra a re g u la ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b á sic o , atra v és d a
ed iç ã o d e n o rm a s d e re fe rê n c ia p a ra a re g u la ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s
d e sa n e a m e n to b ásico .
D e sd e en tão , a A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to
B á s ic o (A N A ) g a n h o u n o v a fo rm a ta ç ã o e se to rn o u re sp o n sá v e l p e la
in s titu iç ã o d e n o rm a s d e re fe rê n c ia q u e re g u la rã o o s se rv iç o s p ú b lic o s de
sa n e a m e n to b á sic o , o b se rv a n d o os p rin c íp io s da re g u la rid a d e ,
co n tin u id a d e , e fic iê n c ia , seg u ran ça , a tu a lid a d e , g e n e ra lid a d e ,
m o d ic id a d e ta rifá ria , u tiliz a ç ã o ra c io n a l dos re c u rso s h íd ric o s e
u n iv e rs a liz a ç ã o d o s se rv iç o s (a rtig o 4°-A , § 3°, I, d a L e i n. 9 .9 8 4 /2 0 0 0 ).
E m se g u n d o lu g ar, ta m b é m fic o u claro n o te x to leg al q u e a
re g u la ç ã o está su b o rd in a d a ao s p rin c íp io s d e tra n sp a rê n c ia , te c n ic id a d e ,
c e le rid a d e e o b je tiv id a d e d as d e c isõ e s, d e fo rm a a e sta b e le c e r p a d rõ e s

7 MARQUES, Claudia Lima et al. Comentários ao Código de Defesa do


Consumidor. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 543.
8 REsp n. 1.833.349-RJ (2019/0248836-1).

205
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

d e a tu a ç ã o p a ra a sse g u ra r o c u m p rim e n to d as m e ta s e co n d iç õ e s
p re v is ta s n o s c o n tra to s, p la n o s m u n ic ip a is o u d e p re sta ç ã o re g io n a liz a d a ;
p re v e n ir e re p rim ir o a b u so d o p o d e r e c o n ô m ic o ; e d e fin ir ta rifa s v isa n d o
ao e q u ilíb rio c o n tra tu al e à m o d ic id a d e ta rifá ria (a rtig o s 21 e 2 2 d a L ei
n. 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ).
L o g o , a fim d e e sta b e le c e r u m a o rd e m , o N o v o M a rc o L eg a l
p ro c e d e u a p ro fu n d a s tra n sfo rm a ç õ e s n o siste m a d e fo rm u la ç ã o de
p o lític a s p ú b lic a s d e san e am en to , in stitu in d o u m ó rg ã o c o le g ia d o
re sp o n sá v e l p e la c o n c re tiz a ç ã o d as in ic ia tiv a s.
O C o m itê In te rm in iste ria l d e S a n e a m e n to B á sic o (a rtig o 5 3 -A
d a L ei n. 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ) é u m ó rg ã o c o le g ia d o que, sob a p re sid ê n c ia do
M in isté rio d o D e se n v o lv im e n to R e g io n a l, te m a fin a lid a d e d e a sse g u ra r
a im p le m e n ta ç ã o d a p o lític a fe d e ra l d e sa n e a m e n to b á sic o e d e a rtic u la r
a a tu a ç ã o d o s ó rg ã o s e d as e n tid a d e s fe d e ra is n a a lo c a ç ã o d e re c u rso s
fin a n c e iro s em aç õ es d e sa n e a m e n to , o u seja, co m re sp o n sa b ilid a d e d e
c o o rd e n a r, em e sc a la fe d era l, o P la n o N a c io n a l d e S a n e a m e n to B á sico ,
além d e e la b o ra r estu d o s té c n ic o s q u e su b sid ie m as d e c isõ e s q u a n to a
a lo c a ç ã o d e re c u rso s fe d e ra is e p ro m o v e r a o b se rv â n c ia d as n o rm a s de
re fe rê n c ia e d ita d a s p e la A N A (a rtig o 5 3 -B d a L ei n. 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 e
a rtig o s 2° e 3° d o D e c re to n. 1 0 .4 3 0 /2 0 2 0 ), se m p re co m o o lh a r v o lta d o
às p e c u lia rid a d e s re g io n a is.

4 D A S D IS T I N T A S M O D I F I C A Ç Õ E S D A L E I

A s a lte ra ç õ e s d e c o rre n te s d a L e i F e d e ra l n. 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 ao
M a rc o L e g a l d o S a n e a m e n to B á sic o B ra sile iro p re te n d e m , além de
su p e ra r o s d é fic its n a im p le m e n ta ç ã o d e se rv iç o s p ú b lic o s e su p rir
q u e stõ e s re g u la tó ria s, a tra ir cap ita l, n a b u s c a d e m a io r e fe tiv id a d e d a
p o lític a p ú b lic a d e san e am en to .
N o q u e se re fe re às m o d ific a ç õ e s d a L e i n. 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7
d e c o rre n te s d a L ei 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , o rol d e p rin c íp io s re g e n te s d a p o lític a
d e sa n e a m e n to b á sic o foi e x p a n d id o co m a in c lu sã o d a p re sta ç ã o

206
re g io n a liz a d a 9 p a ra g a ra n tia d e g a n h o s d e esc ala, u n iv e rsa liz a ç ã o e
v ia b ilid a d e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira , in c e n tiv o à c o m p e titiv id a d e dos
se rv iç o s e p re sta ç ã o c o n ju n ta d o s se rv iç o s d e á g u a e esg o ta m e n to
san itário . E sses e le m e n to s são fu n d a d o re s do novo m o d e lo do
sa n e a m e n to b ra sile iro .
P ara co m p re en d er o direito ao saneam ento básico, é preciso
co n ceitu ar o p ró p rio saneam ento. T rab alh o s em en g en h aria c iv il101trazem o
co nceito da O rg an ização M u n d ial d a S aú d e (O M S ) segundo o qual
“ san eam en to é o controle de to d o s os fato res do m eio físico do h om em , que
ex ercem o u p o d em ex ercer efeitos n o civ o s sobre seu b em -e sta r físico,
m en tal e social” 11. E m o utra o b ra sobre “A b astecim en to de ág u a p ara
co n su m o h u m ano", H e lle r e P á d u a co n ceitu am tam b ém o saneam ento
am b ien tal com o algo m ais ab ran g en te q u e saneam ento básico, u tilizan d o de
co nceito elab o rado pela F U N A S A , q u e o d efine com o:

[...] o conjunto de ações socioeconômicas que têm por


objetivo alcançar níveis de salubridade ambiental, por
meio de abastecimento de água potável, coleta e
disposição sanitária de resíduos sólidos, líquidos e
gasosos, promoção da disciplina sanitária do uso do solo,
drenagem urbana, controle de doenças transmissíveis e
demais serviços e obras especializadas, com finalidade de
proteger e melhorar as condições de vida urbana e rural.12

9 Embora a prestação regionalizada não seja uma novidade, ela era realizada sem uma
institucionalização legislativa.
10 BARROS, Raphael Tobias de Vasconcelos; CHERNICHARO, Carlos Augusto de
Lemos; HELLER, Léo; SPERLING, Marcos Von. Manual de Saneamento e
Proteção Ambiental para os Municípios. 1. ed. Belo Horizonte: Escola de Engenharia
da UFMG, 1995. v. 2, p. 13.
11 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE - OMS. [World Health Organization -
WHO]. Guidelines On Sanitation and Health. Geneva: World Health Organization;
2018. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/noticia/oms-lanca-diretrizes-sobre-
saneamento-e-saude. Acesso em: 12 maio 2021.
12HELLER, Léo; PÁDUA, Valter Lúcio de (org.). Abastecimento de água para consumo
humano. 2. ed. rev. e atual. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010. v. 1, Cap. 1. p. 33.

207
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

L e g a lm e n te , o sa n e a m e n to b á sic o fo i d e fin id o n o art. 3° d a L ei


1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , c o n h e c id a co m o M a rc o d o S an ea m e n to .
O c o n c e ito le g a l d e sa n e a m e n to b á s ic o ta m b é m se to rn o u m ais
e sp e c ífic o e té c n ic o ao serem e le n c a d a s e d ife re n c ia d a s as a tiv id a d e s de
c a d a u m d o s e le m e n to s d o se rv iç o d e sa n e a m e n to b á sic o (a b a ste c im e n to
d e ág u a, e s g o ta m e n to san itário , lim p e z a u rb a n a e m a n e jo d e re síd u o s
só lid o s, m a n e jo d e ág u a s p lu v ia is u rb a n a s) n o art. 3° d a L ei 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 .
N o e n tan to , re s sa lta -se d o re fe rid o d isp o sitiv o leg al a in c lu sã o d o te rm o
“ p re s ta ç ã o re g io n a liz a d a ” , a n te rio rm e n te c o m p re e n d id a com o o
a te n d im e n to d e u m p re sta d o r a d o is o u m a is titu la re s d o serv iço ,
p a s s a n d o a se r e n c a ra d a com o:

[...] modalidade de prestação integrada de um ou mais


componentes dos serviços públicos de saneamento básico
em determinada região cujo território abranja mais de um
Município, podendo ser estruturada em região
metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião,
unidade regional de saneamento básico ou bloco de
referência, conceito este a ser definido pela reguladora.13

N e s s e sen tid o , o E sta tu to d a M e tró p o le re p e rc u te n a p o lític a de


sa n e a m e n to co m a a d o ç ã o d a id e ia d e re g iã o m e tro p o lita n a , u m a v e z q u e
a m e n s le g is d e se jo u in c e n tiv a r a p re sta ç ã o em u n id a d e s re g io n a is,
c o n g lo b a n d o a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e m ic ro rre g iõ e s, as q u a is co stu m a m
e sta r em u m a m e s m a b a c ia h id ro g rá fic a , d e m o d o q u e u m m u n ic íp io
afete o o u tro , e s p e c ia lm e n te se e stiv e re m co n u rb ad o s. O o b je tiv o do
N o v o M a rc o d o S a n e a m e n to é c ria r u n id a d e s re g io n a is o u b lo c o s de
re ferê n cia. T al p rá tic a j á te m sid o in c o rp o ra d a em le ilõ e s re c e n te s de
co n c e ssã o , co m o o d a C E D A E .

13 GOMES. Camila Nicolai. Os modelos público e híbrido de prestação dos serviços


de saneamento básico: uma análise comparativa de eficiência do saneamento nos
estados de Goiás e Tocantins. 2020. 288 f. Mestrado - Universidade Federal de Goiás,
Faculdade de Direito (FD), Programa de Pós-Graduação em Direito e Políticas
Públicas, Goiânia, 2020. f. 45.

208
O c o rre n e ste p o n to q u e, em ca so d e a d o ç ã o d a re g io n a liz a ç ã o ,
a lei p re v ê a a lte ra ç ã o d a titu la rid a d e d o serv iço , q u e d e ix a d e ser
m u n ic ip a l e p a ssa a ser e s ta d u a l14, c o n fo rm e a n o v a re d a ç ã o d o art. 8° d a
L e i 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , u m a v e z q u e o se rv iç o d e ix a rá d e se r d e in te re sse
e m in e n te m e n te lo cal, p a ssa n d o a se r re g io n a l.
O m o d e lo co n tra tu a l d a s c o n c e ssõ e s em s a n e a m e n to ta m b é m
fo i alterad o , sen d o p o r u m la d o v e d a d a a re a liz a ç ã o d e c o n tra to s de
p ro g ra m a , co n v ê n io , te rm o d e p a rc e ria o u q u a lq u e r in stru m e n to de
n a tu re z a p re c á ria , e, p o r o u tro , p e rm itid a a re a liz a ç ã o d e s u b d e le g a ç ã o
d e p a rte d o serv iço . A ssim , n a v ig ê n c ia d o N o v o M a rc o , to d o s os
se rv iç o s d e p re sta ç ã o d e s a n e a m e n to b á s ic o p o r e n tid ad e s q u e n ã o
in te g re m a a d m in istra ç ã o d o titu la r e sta rã o c o n d ic io n a d o s à re a liz a ç ã o
de c o n c o rrê n c ia p a ra que h a ja co n c e ssã o , havendo, en tre tan to ,
p o s s ib ilid a d e d e q u e o p ró p rio e n te p re ste o se rv iç o co m o ú n ic a o p çã o
sem a c e le b ra ç ã o d e c o n tra to d e c o n c essão .
A in o v a ç ã o v e io a c o m p a n h a d a d a p re v isã o d e u m rol de
c lá u su la s c o n tra tu a is e sse n c ia is n o art. 1 0 -A d o N o v o M a rc o , sob p e n a
d e n u lid a d e co n tra tu al, p re v e n d o in c lu siv e o e sta b e le c im e n to d e m e ta s
d e a te n d im e n to e a p re v isã o fin a n c e ira d e p o ssív e is fo n te s d e re c e ita s
a lte rn a tiv a s, c o m p le m e n ta re s o u ac e ssó ria s, m e to d o lo g ia d e cá lc u lo de
ev e n tu a l in d e n iz a ç ã o re la tiv a aos b e n s re v e rsív e is n ã o am o rtiz a d o s p o r
o c a siã o d a e x tin ç ã o d o c o n tra to e re p a rtiç ã o d e risc o s e n tre as p arte s, o
q u e g e ra u m a m b ie n te d e se g u ra n ç a ju ríd ic a .
P o r fim , a q u e la m u d a n ç a q u e m a is in te r e s s a a o c o n s u m id o r é
f o r m a d e ta r if a ç ã o d o se rv iç o . O N o v o M a r c o p r e te n d e s u b s titu ir o
m o d e lo d e ta r if a c ru z a d a , n o q u a l o lu c ro p ro v e n ie n te d a a tiv id a d e em

14 A alteração da titularidade do serviço de saneamento já está sendo debatida no


Supremo Tribunal Federal quanto à possível inconstitucionalidade por violar a regra de
competência. Tramitam no STF a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 6.492,
apresentada ao STF pelo PDT (STF, 27/7/2020), e a ADI n. 6.536, proposta pelos
partidos PC do B, PSOL, PSB e PT (STF, 1710/2020).

209
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

c id a d e s re n tá v e is c o m p e n s a o p re ju íz o d a s c id a d e s d e fic itá ria s ,


g e r a n d o u m a ta r if a ú n ic a n o s e s ta d o s o n d e im p e ra m as c o n c e s s õ e s
com e m p re s a s e s ta d u a is. A r e g io n a liz a ç ã o b e m e s tru tu ra d a e a
p re v is ã o d a c ria ç ã o d e u m fu n d o c o m p e n s a tó rio f in a n c ia d o p e lo P o d e r
P ú b lic o F e d e ra l, a c o m p a n h a d a s d a p rio riz a ç ã o d e re g iõ e s c o m m e n o r
ín d ic e de d e s e n v o lv im e n to , p re te n d e m g a r a n tir a expansão da
u n iv e rs a liz a ç ã o d o sa n e a m e n to .
A f o r m a ta ç ã o d o n o v o m o d e lo ta r if á r io d is p o s ta n o s arts. 2 9
e 3 0 d a L e i 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 p re v ê a c o b r a n ç a d e ta r if a em c o n fo rm id a d e
c o m o p rin c íp io d a s u s te n ta b ilid a d e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira , s e n d o
m a n tid o o s u b s íd io 15 n o p a r á g ra fo 2° d o art. 2 9 e n o art. 3 1 , ta m b é m
c h a m a d o d e ta r if a so c ia l, p a r a g a r a n tir o a c e s s o a o s e rv iç o p e lo s
h ip o s s u fic ie n te s e c o n ô m ic o s .
A L e i F e d e ra l n. 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 a p re se n ta d iv e rsa s v a n ta g e n s com
a a lte ra ç ã o d o m a rc o re g u la tó rio d o sa n e a m e n to b á sic o , m a s c a b e rá à
so c ie d a d e civ il a c o b ra n ç a d o a c e sso ao se rv iç o e n q u a n to d ireito
fu n d a m e n ta l à v id a d ig n a, e s p e c ia lm e n te n o c o n te x to d a p a n d e m ia de
c o v id -1 9 , em q u e o ac e sso ao se rv iç o b á s ic o d e sa n e a m e n to c o n trib u i
p a ra e v ita r a p ro life ra ç ã o d a d o en ç a, p e rm itin d o a h ig ie n iz a ç ã o a d e q u a d a
p a ra g a ra n tia d a saúde.

5 C O N S I D E R A Ç Õ E S F IN A I S

É um im p e ra tiv o ao d e se n v o lv im e n to d o B ra sil b u s c a r a
in o v a ç ã o in s titu c io n a l em pro l d e e n c o n tra r so lu ç õ e s p a ra te m a s tã o
c o m p le x o s c o m o o sa n e a m e n to b á sic o e a u n iv e rsa liz a ç ã o d o ac e sso a
á g u a p o tá v e l d e n tro d e u m a m b ie n te e c o lo g ic a m e n te e q u ilib ra d o . O
d e n o m in a d o M a rc o L e g a l d o S a n e a m e n to B á sic o tro u x e sig n ific a tiv a s

15 Lei n. 11.445/2007. Art. 3° - “VII - subsídios: instrumentos econômicos de política


social que contribuem para a universalização do acesso ao saneamento básico por parte
de populações de baixa renda”.

210
m u d a n ç a s em to d o o siste m a d e g estão , c o n tro le e re g u la ç ã o d as p o lític a s
fe d e ra is d e sa n e a m e n to b ásico .
A á g u a está n o c e n tro d o d e se n v o lv im e n to su sten táv el. O s
re c u rso s h íd ric o s e os serv iç o s a eles a sso c ia d o s su sten tam os esfo rço s
p a ra a e rra d ic a ç ã o d a p o b re za, b e m co m o p a ra o c re sc im e n to ec o n ô m ic o
e a su ste n ta b ilid a d e am b ien tal. O ac esso à á g u a e ao sa n e a m e n to im p o rta
p a ra to d o s o s asp e cto s d a d ig n id a d e h u m an a: d a se g u ra n ç a a lim e n ta r e
e n e rg é tic a à saú d e h u m a n a e a m b ie n ta l16.
A adoção dos d e z e sse te O b je tiv o s de D e se n v o lv im e n to
S u ste n tá v e l (O D S ), d e sd o b ra d o s em 169 m e ta s e 231 in d ic a d o re s
e sta b e le c id o s p e la s N a ç õ e s U n id a s n a A g e n d a 2 0 3 0 , e stá em p e rfe ita
c o n fo rm id a d e c o m a E s tra té g ia N a c io n a l d e u n iv e rsa liz a ç ã o d a á g u a e
c o le ta d e re síd u o s, u m a v e z q u e e stá d ire ta m e n te re la c io n a d a à d ig n id a d e
da p esso a hum ana, à sa ú d e e à cid a d a n ia . D evem os avançar
c o n tin u a m e n te n a d ia n te ira d as a ç õ e s q u e irã o re fle tir em sig n ific a tiv a s
m e lh o ria s p a ra o c id ad ã o , q u e é se m p re n o sso o b je tiv o m aior.

R E F E R Ê N C IA S

B A R R O S , R a p h a e l T o b ia s d e V a sc o n c e lo s; C H E R N IC H A R O , C arlo s
A u g u s to d e L em o s; H E L L E R , L éo ; S P E R L IN G , M a rc o s V on. M a n u a l
d e S a n e a m e n to e P r o te ç ã o A m b ie n ta l p a r a os M u n ic íp io s . 1. ed. B e lo
H o riz o n te : E s c o la d e E n g e n h a ria d a U F M G , 1995. v. 2.

B R A S IL . L ei n. 11.445, d e 5 d e ja n e ir o d e 2 0 0 7 . E s ta b e le c e d ire triz e s


n a c io n a is p a ra o s a n e a m e n to b á sic o ; a lte ra as L e is n. 6 .7 6 6 , d e 19 de
d e z e m b ro d e 1979, 8 .0 3 6 , d e 11 d e m a io d e 1990, 8.666, d e 21 d e ju n h o
d e 1993, 8 .9 8 7 , d e 13 d e fe v e re iro d e 1995; re v o g a a L e i n. 6 .5 2 8 , d e 11
d e m a io d e 1978; e d á o u tra s p ro v id ê n c ia s. D iá r io O fic ia l d a U n iã o ,
B ra sília , 2 0 0 7 . S eção 1, p. 3.

16 Disponível em: http://www.agenda2030.com.br/ods/6/. Acesso em: 10/05/2021.

211
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

BRASIL. Lei n. 13.089, de 12 de janeiro de 2015. Institui o Estatuto da


Metrópole, altera a Lei n. 10.257, de 10 de julho de 2001, e dá outras
providências. D iá r io [d a ] R e p ú b lic a F e d e r a t i v a d o B r a s i l , Brasília, 12
jan. 2015. p. 2.

BRASIL. Lei n. 14.026, de 15 de julho de 2020. Atualiza o marco legal do


saneamento básico e altera a Lei n. 9.984, de 17 de julho de 2000, para atribuir
à Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) competência para
editar normas de referência sobre o serviço de saneamento, a Lei n. 10.768, de
19 de novembro de 2003, para alterar o nome e as atribuições do cargo de
Especialista em Recursos Hídricos, a Lei n° 11.107, de 6 de abril de 2005, para
vedar a prestação por contrato de programa dos serviços públicos de que trata
o art. 175 da Constituição Federal, a Lei n. 11.445, de 5 dej aneiro de 2007, para
aprimorar as condições estruturais do saneamento básico no País, a Lei n°
12.305, de 2 de agosto de 2010, para tratar dos prazos para a disposição final
ambientalmente adequada dos rejeitos, aLei n. 13.089, de 12 dejaneiro de 2015
(Estatuto da Metrópole), para estender seu âmbito de aplicação às
microrregiões, e a Lei n. 13.529, de 4 de dezembro de 2017, para autorizar a
União a participar de fundo com a finalidade exclusiva de financiar serviços
técnicos especializados. D iá rio O ficial d a U n iã o , Brasília, 16 de julho 2020.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI n. 6.492 - MC/DF. Relator:


Ministro Luiz Fux. D iá r io d e J u s t i ç a E le tr ô n ic o - D J E n. 194,
Brasília, 4 ago. 2020. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/processos/d
etalhe.asp?incidente=5965908. Acesso em: 20 nov. 2020.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. A D I n . 6 .5 3 6 M C /D F . Relator:


Ministro Luiz Fux. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/processos/det
alhe.asp?incidente=5965908. Acesso em: 20 nov. 2020.

GOMES. Camila Nicolai. O s m o d e lo s p ú b lic o e h íb r id o d e p r e s ta ç ã o dos


se rv iç o s d e s a n e a m e n to b á s ic o : uma análise comparativa de eficiência do

212
san eam en to n o s estados de G oiás e T ocantins. 2020. 288 f. M estra d o -
U n iv ersid a d e F ederal de G oiás, F acu ld ad e de D ire ito (FD ), P ro g ra m a de
P ó s-G ra d u açã o em D ire ito e P o líticas P úblicas, G oiânia, 2020.

H E L L E R , L éo ; P Á D U A , V a lte r L ú c io d e ( o r g ) . A b a s te c im e n to d e
á g u a p a r a c o n s u m o h u m a n o . 2. ed. rev. e atual. B e lo H o riz o n te :
E d ito ra U F M G , 2 0 1 0 . v. 1. C ap .1 . p. 33.

O R G A N IZ A Ç Ã O M U N D IA L D E S A Ú D E - O M S . [W o rld H e a lth
O rg a n iz a tio n - W H O ]. G u id e lin e s O n S a n ita tio n a n d H e a lth . G en ev a:
W o rld H e a lth O rg a n iz a tio n , 2 0 1 8 . D isp o n ív e l em : h ttp s://p o rta l.fio c ru z .
b r/n o tic ia /o m s -la n c a -d ire triz e s-so b re -sa n e a m e n to -e -sa u d e . A c e sso em :
12 m a io 20 2 1 .

213
REFLEXÕES SOBRE A M ANUTENÇÃO AO VETO DO ART.
21 NO NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO BÁSICO

J o e lm a G o n ç a lv e s R ibeiro*

R E S U M O : E s te a rtig o te m p o r o b je tiv o d isc u tir a d e c isã o d o C o n g re sso


N a c io n a l em m a n te r o v e to p re sid e n c ia l ao n o v o m a rc o d e san e am en to .
E s s a d isc u ssã o p e rp a ssa p e la m a n u te n ç ã o d o v e to ao art. 21, d isp o sitiv o
q u e d e te rm in a v a a c o m p e tê n c ia d o M u n ic íp io p a ra o L ic e n c ia m e n to
A m b ie n ta l d as a tiv id a d e s, e m p re e n d im e n to s e se rv iç o s d e S a n e a m e n to
B á sic o , bem com o p e lo d isp o sitiv o em d isso n â n c ia co m a L ei
C o m p le m e n ta r 140/11, q u e d e te rm in o u a c o m p e tê n c ia co m u m d o s en tes
fe d e ra tiv o s. A c o n c lu sã o v is lu m b ra m u ita s d isc u ssõ e s, p rin c ip a lm e n te ,
so b re a “ situ a ç ã o e x c e p c io n a l” q u e n ã o tra n sp a re c e o c o n c e ito e n e m os
lim ite s d e a p lic a b ilid a d e .

P a l a v r a s c h a v e s : V e to art. 21, N o v o M a rc o S a n e a m e n to B á sico ,


L ic e n c ia m e n to A m b ie n ta l.

1 IN T R O D U Ç Ã O

D e sd e os p rim ó rd io s d as c iv iliz a ç õ e s e n fre n ta m o s p ro b le m a s de


o rig e m b á s ic a e in e re n te a u m a sa lu ta r q u a lid a d e d e v id a. P ro b le m a s
sa n itá rio s q u e n ã o são e x c lu siv o s d o B ra sil. A fa lta d e sa n e a m e n to b á sic o
se to rn o u p a lc o d e g ra n d e s d isc u ssõ e s m u n d ia is o n d e m e ta s e aç õ es
g lo b a is são te m a s d e c a rá te r h u m a n itá rio .

* Advogada. Mestranda em Ciências Ambientais pela Universidade de Vassouras/RJ.


Presidente da Comissão Especial de Governança dos Oceanos da OAB/RJ. Presidente
da Comissão de Direito Ambiental da 14° OAB/RJ. Presidente do COMDEMA Levy
Gasparian/RJ.

215
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

N o B ra sil m e sm o em m e io a u m a c rise sa n itá ria m u n d ia l


c a u s a d a p e lo v íru s S ars-C o v -2 q u e re su lto u n a e n fe rm id a d e n o m e a d a
C O V ID -1 9 , fo i sa n c io n a d o o N o v o M a rc o d e S a n e a m e n to B á sico ,
e d ita d o atra v é s d a L ei 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , q u e v is a a u n iv e rs a liz a r o a c e sso à
á g u a tra ta d a , e sg o ta m e n to san itário , lim p e z a u rb a n a /m a n e jo d e re síd u o s
só lid o s e d re n a g e m e m a n e jo d as ág u a s p lu v ia is p e la p o p u laçã o .
P o ré m alg u n s d isp o sitiv o s d a L ei 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 fo ra m v e ta d o s,
c o n fo rm e m e n sa g e m p re sid e n c ia l n° 3 9 6 d e 15 d e ju lh o d e 2 0 2 0 . D e v id o
a esse v eto , a b o rd a re i a m a n u te n ç ã o , p e la C â m a ra d o s D e p u ta d o s
F e d e ra is, ao v e to d o art. 21 q u e d e rru b a a c o m p e tê n c ia d o e n te M u n ic ip a l
p a ra a re a liz a ç ã o d o L ic e n c ia m e n to A m b ie n ta l d o s e m p re e n d im e n to s de
S a n e a m e n to B á sic o fre n te à L ei C o m p le m e n ta r 140/11.
A L e i C o m p le m e n ta r 140/11 p o r fo rç a d o P a rá g ra fo Ú n ic o do
art. 23 d a C o n stitu iç ã o F e d e ra l v e io tra ta r d as n o rm a s d e c o o p e ra ç ã o
e n tre os en tes fe d e ra tiv o s p a ra a p ro te ç ã o d o m e io a m b ie n te e o co m b a te
d a q u a lq u e r fo rm a d e p o lu ição .
O L ic e n c ia m e n to A m b ie n ta l foi in c o rp o ra d o ao o rd e n a m e n to
ju ríd ic o p o r m e io d a P o lític a N a c io n a l d e M e io A m b ie n te , L e i 6 .938/81
e re g u la m e n ta d o p e la R e so lu ç ã o C onam a n° 2 3 7 /9 7 , com o um
im p o rta n te in s tru m e n to d e c o m a n d o e c o n tro le das ativ id a d e s com
p o te n c ia l c a p a c id a d e d e c a u sa r d e g ra d a ç ã o ao M e io A m b ien te.
E ste artig o , p o rta n to , d isc u te os d ip lo m a s le g a is q u e c u id a m d a
m a té ria , tra z e n d o à lu z a p ro b le m á tic a em e sfe ra d o u trin á ria e
ju ris p ru d e n c ia l, além d a e x p o siç ã o d a m in h a p e rs p e c tiv a so b re o assu n to .

2 M ANUTENÇÃO DO V ETO P R E S I D E N C I A L A O A R T . 21
PELA CAM ARA DOS DEPUTADOS

O n o v o m a rc o d o S a n e a m e n to B á sic o fo i sa n c io n a d o em ju lh o
d e 2 0 2 0 . O P re sid e n te d a R e p ú b lic a v eto u , e n tre o u tro s p o n to s, o
d is p o s itiv o q u e re g u la v a a c o m p e tê n c ia d o e n te m u n ic ip a l p a ra e x e rc e r

216
lic e n c ia m e n to am b ie n ta l d as ativ id a d e s, e m p re e n d im e n to s e se rv iç o s de
sa n e a m e n to b ásico .
O C ongresso N acional m anteve os vetos presidenciais, e isso deve
acelerar a reg ulam entação da legislação, visto que se to rn a im portante atração
de in vestim entos n o pós-pandem ia, pois o saneam ento básico é o últim o setor
de infraestrutura que não h av ia sido liberalizado.
A decisão do C ongresso foi acertada, pois o v eto traz conform idade
à obrigatoriedade d a própria dicção d a n o rm a constitucional, com o condição
p ara a cooperação entre os entes federativos.
C o m o ced iço , n ã o h á h ie ra rq u ia e n tre L e i C o m p le m e n ta r e L ei
O rd in á ria, n o e n ta n to a n o rm a leg al in v o c a d a n o P a rá g ra fo Ú n ic o d o art.
23, n ã o p o d e n d o o le g is la d o r em n o rm a o rd in á ria p re v e r m a té ria a fe ta a
o u tro d isp o sitiv o leg al ta x a tiv a m e n te e le n c a d o n a C o n stitu iç ã o F ed eral,
sob p e n a d e in c o rre r em flag ran te a fro n ta ao P rin c íp io D e m o c rá tic o e ao
D e v id o P ro c e s so L e g a l, e sta m p a d o s n o s arts. 1°, cap u t, p a rá g ra fo ú n ico ,
2°, cap u t, 5°, cap u t, e L IV , d a C o n stitu iç ã o d a R e p ú b lic a .
N o entanto, p o r fo rça d a alín ea a do art. 9° d a L C 140/11, o alcance
e a lim itação d e atuação dos M u n icíp io s p a ra licen ciarem saneam ento
b ásico estão n itid am en te d elim itadas, lev an d o em co n sid eração os critérios
de porte, p o ten cial p o lu id o r e n atu re za d a atividade.

3 L E I C O M P L E M E N T A R 140/11

A p ó s 23 an o s d e la c u n a n o rm a tiv a e u m a g a m a d e c o n flito s n o
d e s e m p e n h o d a p ro te ç ã o ao m e io a m b ie n te , a L ei C o m p le m e n ta r 140/11
v e io re g u la m e n ta r e fix a r as n o rm a s d e c o o p e ra ç ã o e n tre os e n tes d a
fe d e ra ç ã o , e v ita n d o a so b re p o siç ã o d e a tu a ç õ e s e c o m p etê n cia.
C e rta s e stip u la ç õ e s d a d a s p e la L C 140/11, co n tu d o , a fro n tam
alg u n s p ro p ó s ito s c o n te m p la d o s n a C o n stitu iç ã o F e d e ra l, c o m o à
v io la ç ã o ao P a c to F e d e ra tiv o e à liv re lib e rd a d e d o e x e rc íc io d e a tiv id a d e
e c o n ô m ic a d o s e n tes d a fed era ção .

217
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

N o q u e ta n g e ao lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l, n o ta d a m e n te q u a n to
à c o m p e tê n c ia d o s M u n ic íp io s p a ra o re fe rid o ex e rc íc io , o art. 9° X IV ,
d e ix o u a c a rg o dos C o n se lh o s E sta d u a is a re sp o n sa b ilid a d e por
d e te rm in a r a tip o lo g ia d o q u e é im p a c to am b ie n ta l d e â m b ito local.
Q u e stio n a-se: o E sta d o fic o u re sp o n sá v e l por fa z e r o
re g ra m e n to d as a tiv id a d e s de lic e n c ia m e n to do M u n íc ip io ? Os
C o n se lh o s E sta d u a is fo ra m le g a lm e n te c o n stitu íd o s p a ra d e fin ir o q u e é
im p a c to a m b ie n ta l em â m b ito lo cal?
O art. 9°, X IV d a L C 140/11 é n itid a m e n te in c o n stitu c io n a l, a
p re te x to d e so lu c io n a r e sta c e le u m a, e sse g a rg a lo d o lic e n c ia m e n to
am b ie n ta l n o B ra sil, c o m e te u g ra v e e in to le rá v e l a te n ta d o à C o n stitu iç ã o ,
ao d e te rm in a r q u e o M u n ic íp io se su je ita sse d e m o d o su b a lte rn o e
su b ju g a d o ao s E sta d o s-m e m b ro s.
N o ta - s e q u e o p ila r p a r a a d e te r m in a ç ã o d o L ic e n c ia m e n to
a m b ie n ta l d o e n te m u n ic ip a l tr a ta d o p e la L C 140/11 e s tá em fla g r a n te
v io la ç ã o a o art. 1° d a C o n s titu iç ã o F e d e ra l, q u e e s tip u la o P rin c íp io
d a S o b e ra n ia .

4 L IC E N C IA M E N T O A M B IE N T A L

O s an o s 70 e 80 fo ra m p a lc o s d e in te n sa s tra n sfo rm a ç õ e s,
p rin c ip a lm e n te co m o fim d o re g im e m ilita r e foi n e sse c e n á rio q u e foi
s a n c io n a d a a P o lític a N a c io n a l d e M e io A m b ie n te , L ei 6 .9 3 8 /8 1 ,
re fle tin d o u m se n tim e n to d e m a io r e q u ilíb rio e n tre o d e se n v o lv im e n to
e c o n ô m ic o e a p re se rv a ç ã o d o M e io A m b ien te.
A C o n stitu iç ã o F e d e ra l p ro m u lg a d a em 88 a lic e rç o u esta
in s p ira ç ã o n o s arts. 225 e 170, d irig in d o a n o v a so cied a d e, im b u íd a s de
u m a v is ã o p a n te ísta , p a ra u m h o riz o n te tra n s fo rm a d o r a n c o ra d o s n o s
P rin c íp io s d a liv re in ic ia tiv a e d a d ig n id a d e h u m an a.
A principal intenção d a P olítica N acional do M eio A m biente é a
p reservação do m eio am biente natural, assegurando condições dignas para

218
u m a v id a saudável, associadas ao desenvolvim ento sustentável e econôm ico,
b em com o estabelecer m ecanism os voltados ao equilíbrio am biental.
O L ic e n c ia m e n to A m b ie n ta l o rig in o u -se c o m o u m in stru m e n to
d a P o lític a N a c io n a l d e M e io A m b ie n te co m o o b je tiv o d e d isc ip lin a r o
uso d o s re c u rso s n a tu ra is d e a tiv id a d e s c o n sid e ra d a s e fe tiv a s ou
p o te n c ia lm e n te p o lu id o ra s, c o n fo rm e c o n c e ito re d ig id o p e la R e so lu ç ã o
C o n a m a n° 2 3 7 , em seu art. 1°, in c iso I.
V e ja m o s o a rc a b o u ç o leg al b ra sile iro re sp o n sá v e l p ela
d is trib u iç ã o re la c io n a d a ao L ic e n c ia m e n to A m b ie n ta l:

Lei 6.938/81
Art. 10 - A construção, instalação, ampliação e
funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras
de recursos ambientais, considerados efetiva e
potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob
qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão
de prévio licenciamento de órgão estadual competente,
integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente -
SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, em caráter
supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis.
§ 1° - Os pedidos de licenciamento, sua renovação e a
respectiva concessão serão publicados no jornal oficial do
Estado, bem como em um periódico regional ou local de
grande circulação.
§ 2° Nos casos e prazos previstos em resolução do
CONAMA, o licenciamento de que trata este artigo
dependerá de homologação do IBAMA.
§ 3° O órgão estadual do meio ambiente e o IBAMA, esta
em caráter supletivo, poderão, se necessário e sem prejuízo
das penalidades pecuniárias cabíveis, determinar a redução
das atividades geradoras de poluição, para manter as
emissões gasosas, os efluentes líquidos e os resíduos
sólidos dentro das condições e limites estipulados no
licenciamento concedido.
§ 4° Compete ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
Recursos Naturais Renováveis - IBAMA o licenciamento
previsto no caput deste artigo, no caso de atividades e
obras com significativo impacto ambiental, de âmbito
nacional ou regional (grifo nosso).

219
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

D e sta c a -se que a re g u la m e n ta ç ã o q u a n to à a tu a ç ã o dos


m e m b ro s in te g ra n te s d o S IS N A M A co u b e ao C O N A M A (C o n se lh o
N a c io n a l d o M e io A m b ie n te ), ó rg ã o c o n su ltiv o e d e lib e ra tiv o d o qual
p a rtic ip a m re p re se n ta n te s d as trê s e sfe ra s d e g o v ern o .
T al ato se firm o u co m a ed iç ã o d a R e so lu ç ã o n° 2 3 7 /9 7 , q u e
v e io a d is c ip lin a r os c rité rio s p a ra o e x e rc íc io d a c o m p e tê n c ia p a ra o
lic e n c ia m e n to a q u e se re fe re o art. 10 d a L e i 6 .9 3 8 /8 1 .
A re p a rtiç ã o d e ssa s atrib u iç õ e s, p o r su a v ez, re sto u fu n d a d a n o
c rité rio d a “ p re d o m in â n c ia d o in te re ss e ” , c o m b a se n o s im p a c to s
a m b ie n ta is d as a tiv id a d e s o u em p re e n d im e n to s.
N essa sen d a, a R e s o lu ç ã o 237 do CONAMA atrib u i
c o m p e tê n c ia ao IB A M A p a ra o lic e n c ia m e n to dos se g u in te s
e m p re e n d im e n to s e ativ id ad es:

Art. 4° - Compete ao Instituto Brasileiro do Meio


Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA,
órgão executor do SISNAMA, o licenciamento
ambiental, a que se refere o artigo 10 da Lei n° 6.938, de
31 de agosto de 1981, de empreendimentos e atividades
com significativo impacto ambiental de âmbito
nacional ou regional, a saber:
I - localizadas ou desenvolvidas conjuntamente no Brasil e em
país limítrofe; no mar territorial; na plataforma continental; na
zona econômica exclusiva; em terras indígenas ou em unidades
de conservação do domínio da União.
II- localizadas ou desenvolvidas em dois ou mais Estados;
III- cujos impactos ambientais diretos ultrapassem os
limites territoriais do País ou de um ou mais Estados;
IV- destinados a pesquisar, lavrar, produzir, beneficiar,
transportar, armazenar e dispor material radioativo, em
qualquer estágio, ou que utilizem energia nuclear em
qualquer de suas formas e aplicações, mediante parecer da
Comissão Nacional de Energia Nuclear - CNEN;
V- bases ou empreendimentos militares, quando couber,
observada a legislação específica.
§ 1° - O IBAMA fará o licenciamento de que trata este artigo
após considerar o exame técnico procedido pelos órgãos
ambientais dos Estados e Municípios em que se localizar a

220
atividade ou empreendimento, bem como, quando couber, o
parecer dos demais órgãos competentes da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios, envolvidos no
procedimento de licenciamento.
§ 2° - O IBAMA, ressalvada sua competência supletiva,
poderá delegar aos Estados o licenciamento de atividade
com significativo impacto ambiental de âmbito regional,
uniformizando, quando possível, as exigências.

A o órgão E stadual, co n fo rm e art. 5° d a m e sm a R esolução, a saber:

Art. 5° - Compete ao órgão ambiental estadual ou do


Distrito Federal o licenciamento ambiental dos
empreendimentos e atividades:
I - localizados ou desenvolvidos em mais de um Município
ou em unidades de conservação de domínio estadual ou do
Distrito Federal;
II - localizados ou desenvolvidos nas florestas e demais
formas de vegetação natural de preservação permanente
relacionadas no artigo 2° da Lei n° 4.771, de 15 de setembro
de 1965, e em todas as que assim forem consideradas por
normas federais, estaduais ou municipais;
III - cujos impactos ambientais diretos ultrapassem os
limites territoriais de um ou mais Municípios;
IV - delegados pela União aos Estados ou ao Distrito
Federal, por instrumento legal ou convênio.
Parágrafo único. O órgão ambiental estadual ou do Distrito
Federal fará o licenciamento de que trata este artigo após
considerar o exame técnico procedido pelos órgãos
ambientais dos Municípios em que se localizar a atividade
ou empreendimento, bem como, quando couber, o parecer
dos demais órgãos competentes da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, envolvidos no
procedimento de licenciamento.

N a m e sm a to a d a , ao e n te M u n ic ip a l o art. 6° d a R e so lu ç ã o
C O N A M A 2 3 7 estab e lece u :

Art. 6° - Compete ao órgão ambiental municipal, ouvidos


os órgãos competentes da União, dos Estados e do Distrito
Federal, quando couber, o licenciamento ambiental de

221
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

empreendimentos e atividades de impacto ambiental local


e daquelas que lhe forem delegadas pelo Estado por
instrumento legal ou convênio.
Art. 7° - Os empreendimentos e atividades serão
licenciados em um único nível de competência, conforme
estabelecido nos artigos anteriores.
[ .]
Art. 16 - O não cumprimento dos prazos estipulados nos
artigos 14 e 15, respectivamente, sujeitará o licenciamento
à ação do órgão que detenha competência para atuar
supletivamente e o empreendedor ao arquivamento de seu
pedido de licença.

O b s e rv a -s e p e la tra n s c riç ã o d o s d is p o s itiv o s q u e o le g is la d o r


d is trib u iu as a trib u iç õ e s lic e n c ia tó ria s p e lo c rité rio d a e x te n sã o im p a c to
a m b ie n ta l.
Im p o rta n te ao d e s ta c a r a d ife re n ç a e n tre c o m p e tê n c ia c o m u m
am b ie n ta l e c o m p e tê n c ia p a ra lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l, p o is o art. 23, V I
d a C o n s titu iç ã o F e d e ra l, p re c o n iz a a c o m p e tê n c ia co m u m d o s e n tes d a
fe d e ra ç ã o p a ra p ro te g e r o m e io a m b ie n te e c o m b a te r a p o lu ição ,
c o n s a g ra n d o assim o P rin c íp io d a M á x im a P ro te ç ã o .
N ã o h á co m o co n fundir-se com a co m p etên cia p a ra licen ciam en to
am biental que foi p reco n izad a n a L ei 6.938/81 e n a R eso lu ção 237/97,
estab elecen d o os casos d a atribuição do ente fed erativ o p a ra p ro c ed er ao
licen ciam en to am biental, u tilizan d o -se d a p re d o m in â n cia do interesse,
co n su b stan ciad o n a ex tensão d o im p acto seja ele a nível nacional, regional
ou local d a ativ idade ou em p reen d im en to .
É p o ssív e l a firm a r q u e a d e fin iç ã o do ó rg ã o am b ie n ta l
c o m p e te n te p a ra p ro m o v e r o lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l d e d e te rm in a d a
a tiv id a d e o u e m p re e n d im e n to d e v e rá le v a r em c o n ta o c rité rio d a
e x te n s ã o d o s im p a c to s d e c o r r e n te s d o d a n o a m b ie n ta l, c o n so a n te
d e te rm in a d o p e la L e i 6 .9 3 8 /8 1 e R e so lu ç ã o 2 3 7 d o C O N A M A .
Ao re fletir, p o ré m , com o fic a m os e m p re e n d im e n to s de
S a n e a m e n to B á sic o ?

222
C o m o b em assev erad o F ran c o (2020), o n o v o m arco alterou o § 1°
do artigo 44 d a L ei n° 11.445/2007, p assa n d o a d isp o r q u e o licen ciam en to
am biental de u n id ad es de trata m e n to d e esgotos sanitários, de efluentes
g erad o s n o s p ro cesso s de trata m e n to de ág u a e das instalações integrantes
dos serviços p ú b lico s d e m an ejo d e resíd u o s sólidos d ev erá ser p riorizado
p ela au to rid ad e am biental que estab elecerá p ro ced im en to s sim plificados em
fu n ção do p o rte das unidades, dos im p acto s am bientais esp erad o s e da
resiliên cia de su a área d e im plantação.
E é n e sse c o n te x to q u e a ssu m e im p o rtâ n c ia o d e b a te a c e rc a do
P ro je to d e L e i n° 3 .7 2 9 /2 0 0 4 , N o v a L e i G e ral d o L ic e n c ia m e n to
A m b ie n ta l, q u e d isp õ e so b re o lic e n c ia m e n to am b ie n ta l e re g u la m e n ta o
in c is o IV , d o § 1° d o a rtig o 225 d a C o n stitu iç ã o F e d e ra l, q u e c u id a do
E s tu d o d e Im p a c to A m b ie n ta l - E IA , u m a v e z q u e o n o v o m a rc o de
sa n e a m e n to p re c isa se r c o m p a tib iliz a d o co m as re g ra s em d iscu ssão .
A propósito, a 4a versão do T exto B ase prevê no artigo 11 que o
licenciam ento sim plificado e prioritário p ara as atividades ou
em preendim entos de saneam ento básico, e, no seu parágrafo único,
estabelece q ue a exigência de E stu d o de Im pacto A m biental (E IA -R im a)
som ente se dará em situações excepcionais, devidam ente ju stificad as pela
autoridade licenciadora. A ntevem os, portanto, u m intenso debate sobre o
conceito de “ situação excepcional”, ju stificad o ra d a dispensa de E IA - R im a.
Im prescindível que o licenciam ento am biental trag a ao
em p reen d ed o r u m m ínim o de segurança ju ríd ic a a fim de m inim izar os riscos
de questionam entos adm inistrativos e ju d iciais de projetos dessa natureza.
A p rio ridade e a relevância que o n o v o m arco de saneam ento e o
p rocesso de licenciam ento devem g u ard ar estão em consonância com os
princípios d a celeridade e eficiência, tidos n o art. 37 d a C onstituição Federal.

6 CONCLUSÃO

A L e i C o m p le m e n ta r q u e su rg iu co m o o b je tiv o d e m itig a r os
c o n flito s d e c o m p e tê n c ia co m u m d isc u tid o s n o s 23 an o s a n tes d e su a

223
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

p ro m u lg a ç ã o foi in e fic a z ao d e fin ir a c o m p e tê n c ia d o e n te m u n ic ip a l


p a ra lic e n c ia r a tiv id a d e s e e m p re e n d im e n to s p a ssív e is d e o c a sio n a r
a p e n a s im p a c to lo cal.
M e s m o co m a e d iç ã o d a L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 , n o v o m a rc o de
sa n e a m e n to b á s ic o tal c o n flito a in d a será p a lc o d e g ra n d e s d iscu ssõ es. A
m a n u te n ç ã o do v e to p e lo C o n g re sso N a c io n a l so m e n te g u a rd a
c o n s o n â n c ia co m os ato s n o rm a tiv o s, p o is a p ro p o s ta o fe rta d a se
s u je ita v a à a p ro v a ç ã o p o r L ei C o m p le m e n ta r.
O n o v o m a rc o d e lic e n c ia m e n to am b ie n ta l p o d e, a p rim e iro
m o m e n to , s o lu c io n a r p a rte d o p ro b le m a c o n c e itu a n d o o q u e é im p a c to
am b ie n ta l n o â m b ito lo cal, u m a v e z q u e a a fe riç ã o d a e x te n sã o d o d an o
am b ie n ta l a n tes d o e fe tiv o d e se n v o lv im e n to d a a tiv id a d e o b je to d a
licen ç a, n o s e m p re e n d im e n to s q u e n e c e ssita m d e E IA /R IM A , são
d e te rm in a d o s “ em a b stra to ” . C o n tu d o , n ã o v is lu m b ra a “ situ açã o
e x c e p c io n a l” , u m a v e z q u e n ã o tra n s p a re c e o c o n c e ito e n e m os lim ite s
d e a p lica b ilid ad e .

R E F E R Ê N C IA S

A M A D O , M a rc o A u re lio N a sc im e n to . C rité rio s le g a is p a ra d e fin iç ã o do


en te fe d e ra tiv o co m a trib u iç ã o p a ra p ro m o v e r o lic e n c ia m e n to a m b ien tal
d o m in ia lid a d e d o b e m o u e x te n sã o d o im p acto . C o n te ú d o J u r í d i c o , 4
fev. 2 0 1 1 . D isp o n ív e l em : h ttp ://c o n te u d o ju rid ic o .c o m .b r/c o n su lta /A rti
g o s/2 3 4 0 8 /c rite rio s-le g a is-p a ra -d e fin ic a o -d o -e n te -fe d e ra tiv o -c o m -
a trib u ic a o -p a ra -p ro m o v e r-o -lic e n c ia m e n to -a m b ie n ta l-d o m in ia lid a d e -
d o -b e m -o u -e x te n sa o -d o -im p a c to . A c e sso em : 2 9 abr. 2021.

B E C K , U lrick. R is k Society: tow ards a n ew m odernity. L ondres: Sage, 1992.

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tra n s p o rte s /2 0 2 0 /0 7 /n o v o -m a rc o -d e -sa n e a m e n to -e -sa n c io n a d o -e -
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D is p õ e so b re c rité rio s b á sic o s e d ire triz e s g e ra is d a a v a lia ç ã o de
im p a c to s am b ien tais. B ra sília : D O U , 1986.

B R A S IL . R e so lu ç ã o C O N A M A n° 05, d e 15 d e j u n h o d e 1988. D ispõe


sobre licenciam ento am biental de obras de saneam ento. B rasília: D O U , 1988.

B R A S IL . R e s o lu ç ã o C O N A M A n° 2 3 7 , d e 19 d e d e z e m b r o d e 1997.
D is p õ e so b re a re v isã o e a c o m p le m e n ta ç ã o d o s p ro c e d im e n to s e
c rité rio s u tiliz a d o s p a ra o lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l. B ra sília : D O U , 1997.

B R A S IL . R e s o lu ç ã o C O N A M A n° 3 7 7 , d e 09 d e o u t u b r o d e 2 0 0 6 .
D is p õ e so b re o lic e n c ia m e n to am b ie n ta l p a ra siste m a s d e e sg o ta m e n to
san itário . B ra sília : D O U , 2006.

225
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

B R A S IL . V e to s P L . 3 .7 2 9 /2 0 0 4 . C â m a ra d o s D e p u ta d o s. D isp o n ív e l
em : h ttp s ://w w w .c a m a ra .le g .b r/p ro p o sic o e sW e b /p ro p _ m o stra rin te g ra 7 c
o d te o r= 6 3 5 3 6 5 & file n a m e = P R L + 1 + C M A D S . A c e sso em : 1° m a io 2021.

B R A S IL . S u p rem o T rib u n a l F e d e ra l (T rib u n a l P le n o ). A D I 3.499.


R e lato r: M in . L u iz F u x , 30 d e a g o sto d e 2 0 1 9 , D J E , 5 dez. 2019.

B R A S IL . S u p rem o T ribunal F ed eral (T ribunal P leno). A D I 5.374. R elator:


M in. R o b erto B arroso, 24 de fev ereiro de 2021. D J E , 12 m ar. 2021.

B R A S IL . S u p rem o T ribunal F ed eral (T ribunal P leno). A D I 4.615. R elator:


M in. R o b erto B arroso, 20 de setem b ro d e 2019. D J E , 28 out. 2019.

CARVALHO, D é lto n W in te r de. D ano a m b ie n ta l f u tu r o : a


re s p o n sa b iliz a ç ã o civ il p e lo risc o a m b ien tal. R io d e Jan e iro : F o re n se
U n iv e rs itá ria , 2008.

F A R IA , T ald en . A m b ie n te ju ríd ic o lic e n c ia m e n to am b ien tal. R e v is ta


C o n s u lt o r J u r í d i c o , 19 nov. 2 0 1 6 . D isp o n ív e l em : h ttp s ://w w w .c o n ju r.
c o m .b r/2 0 1 6 -n o v -1 9 /a m b ie n te -ju rid ic o -lic e n c ia m e n to -a m b ie n ta l-p e lo s-
m u n ic ip io s -lc -1 4 0 2 0 1 1 . A c e sso em : 2 9 abr. 2021.

F R A N C O , A n a C láu d ia. L ic e n c ia m e n to n o m a rc o d e S an ea m e n to .
A E S B E , 21 out. 2 0 2 0 . D isp o n ív e l em : h ttp s://a e sb e .o rg .b r/lic e n c ia m e n t
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F R O T A , L e a n d ro M e llo ; H O S K E N , R o d rig o S an to s (c o o r d ) . C a r t i l h a
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226
HUM BERT, G e o rg es. L ic e n c ia m e n to a m b ie n ta l, m u n ic ip a l e a
in c o n s titu c io n a lid a d e d a lei c o m p le m e n ta r 140/11. J u s B r a s i l , 2011.
D is p o n ív e l em : h ttp s://g e o rg e sh u m b e rt.ju sb ra sil.c o m .b r/a rtig o s/1 8 8 7 8 8
7 0 0 /lic e n c ia m e n to -a m b ie n ta l-m u n ic ip a l-e -a -in c o n stitu c io n a lid a d e -d a -
le i-c o m p le m e n ta r-1 4 0 -1 1 . A c e sso em : 1° m a io 2021.

M A C H A D O . P a u lo A ffo n so L em e . D ir e ito A m b ie n ta l B r a s ile ir o . 18.


ed. S ão P au lo : M a lh e iro s, 2010.

P A S C H O A L , S a n d ra R e g in a R e m o n d i In tro c aso ; V IE IR A JU N IO R ,
F e rn a n d o A m o re lli. T e o ria d o risc o ab stra to c o m o in stru m e n to efic az
p a ra g a ra n tir u m m e io a m b ie n te e c o lo g ic a m e n te e q u ilib rad o . Â m b ito
J u r í d i c o , 1 abr. 2 0 1 0 . D isp o n ív e l em : h ttp s://a m b ito ju rid ic o .c o m .b r/c a
d e rn o s/d ire ito -a m b ie n ta l/te o ria -d o -risc o -a b stra to -c o m o -in stru m e n to -
e fic a z -p a ra -g a ra n tir-u m -m e io -a m b ie n te -e c o lo g ic a m e n te -e q u ilib ra d o /.
A c e sso em : 2 7 abr. 2021.

O R G A N IZ A Ç Ã O DAS NAÇÕES U N ID A S (O N U ). P la ta fo rm a
A g e n d a 2 0 3 0 . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .a g e n d a 2 0 3 0 .o rg .b r/. A c e sso
em : 2 9 abr. 2 0 2 1.

O S re fle x o s a m b ie n ta is d o N o v o M a rc o L e g a l d o S a n e a m e n to B ásico .
L ic e n c ia m e n to B r a s il, 5 out. 2 0 2 0 . D isp o n ív e l em : h ttp s://w w w .lic e n c
ia m e n to b ra s il.c o m .b r/o s-re fle x o s-a m b ie n ta is-d o -n o v o -m a rc o -le g a l-d o -
sa n e a m e n to -b a sic o /. A c e sso em : 2 4 abr. 2021.

S A R A IV A , L e g is la ç ã o de D ir e ito A m b ie n ta l: C o n stitu iç ã o da
R e p ú b lic a F e d e ra tiv a d o B ra sil. 12. ed. S ão P au lo : S a ra iv a Jur, 2019.

227
NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO BÁSICO:
considerações iniciais sobre a possibilidade de prestação
regionalizada dos serviços públicos e seus impactos em
relação aos Municípios de pequeno e médio porte

Jo sé P a e s N e to *
V â n ia S ic ilia n o A ieta*

R E S U M O : O fo c o d o p re se n te a rtig o se rá c o m o as n o v a s re g ra s fix a d a s
p e lo n o v o m a rc o leg al d o san e am en to , q u e n ã o a p e n a s a u to riz a m , co m o
e stim u la m , d e n tre o u tro s, a fo rm a ç ã o d e b lo c o s d e m u n ic íp io s p a ra
c o n tra ta ç ã o d o s se rv iç o s d e fo rm a c o le tiv a , p o d e m a u x ilia r n a a tra ç ã o de
n o v o s in v e s tim e n to s p a ra u n iv e rs a liz a r e q u a lific a r a p re sta ç ã o dos
se rv iç o s n o setor, em e sp e cial n a s p e q u e n a s e m é d ia s cid a d e s b ra sile ira s.
A p re se n te p e s q u isa é im p o rta n te e se ju s tif ic a d ia n te d a situ a ç ã o q u e o
B ra sil a in d a e x p e rim e n ta no d e se n v o lv im e n to dos se rv iç o s de
sa n e a m e n to b á s ic o . H á u m g ra n d e d é fic it n a u n iv e rsa liz a ç ã o dos
serv iç o s, a g ra v a d o s e n siv e lm e n te p e la d ific u ld a d e que os en tes
fe d e ra tiv o s, em e sp e cial os m u n ic íp io s d e m é d io e p e q u e n o po rte,
p o ssu e m p a ra in v e s tir n a c o n c re tiz a ç ã o d e u m se rv iç o m in im a m e n te de
q u a lid a d e à p o p u la ç ã o . O o b je tiv o p rin c ip a l é c o m p re e n d e r se o n o v o

* Doutorando e Mestre em Direito da Cidade pela Universidade do Estado do Rio de


Janeiro - UERJ. Ex-Procurador Geral do Município de Campos dos Goytacazes - RJ.
Membro da Comissão de Direito Constitucional da OAB/RJ. Professor do ISECENSA.
* Doutora em Direito Constitucional pela PUC-SP, com estágio de pós-doutorado pela
Universidade de Santiago de Compostela - Espanha e pela PUC-Rio. Mestre em Direito
Constitucional pela PUC-Rio. Secretária-Geral da Comissão Especial de Saneamento
e Recursos Hídricos da OAB Federal. Professora do PPGD da Faculdade de Direito da
UERJ. Pesquisadora internacional do CESEG (Universidade de Santiago de
Compostela - Espanha) e do Laboratório I2J (Universidade Lusófona do Porto,
Portugal). Professora da Universidade Veiga de Almeida (UVA). Visiting Researcher
na Universidade de Santiago de Compostela, Espanha e Visiting Scholar na Universitá
La Sapienza, Roma, Itália.

229
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

m a rc o re g u la tó rio d o sa n e a m e n to b á sic o n o B ra sil, n o q u e to c a às re g ra s


d e p re s ta ç ã o re g io n a liz a d a e c o le tiv a d o s serv iç o s, é a d e q u a d o p a ra
e stim u la r a p a rtic ip a ç ã o d o se to r p riv a d o n a p re sta ç ã o d o s se rv iç o s de
sa n e a m e n to b á sic o , com o m e c a n ism o p a ra o e n fre n ta m e n to do
fin a n c ia m e n to e sc a sso .

1 IN T R O D U Ç Ã O

E m lin h a s g erais, o te m a d a p e sq u isa é a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a


d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b á sic o , à lu z d a lei n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 ,
q u e a lte ro u as re g ra s d o setor. O fo c o d e estu d o d e sse te m a será c o m o as
n o v a s re g ra s fix a d a s p e lo n o v o m a rc o leg al d o sa n e a m e n to , q u e n ão
a p e n a s au to riz am , c o m o e stim u la m , d e n tre o u tro s, a fo rm a ç ã o d e b lo c o s
d e m u n ic íp io s p a ra c o n tra ta ç ã o d o s se rv iç o s d e fo rm a co letiv a, p o d e m
a u x ilia r n a a tra ç ã o d e n o v o s in v e stim e n to s p a ra u n iv e rs a liz a r e q u a lific a r
a p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s n o setor, em e sp e cial n a s p e q u e n a s e m é d ia s
cid a d e s b ra sile ira s.
T a m b é m é fo c o d e estu d o c o m o o n o v o p ap e l d a a n tig a A g ê n c ia
N a c io n a l d e Á g u a s, a g o ra re n o m e a d a c o m o A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s
e S a n e a m e n to B á sic o - A N A , in flu e n c ia rá n o d e se n v o lv im e n to d a
p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s re g io n a liz a d o s d e s a n e a m e n to b ásico .
O o b je to p e sq u isa d o é p e rc e b id o em c o n fo rm id a d e co m a
d o u trin a so b re a e x istê n c ia d e u m v ín c u lo in d isso c iá v e l e n tre sa n e a m e n to
b á s ic o e d ire ito s fu n d a m e n ta is, e x ig in d o -se d o E sta d o , em ra z ã o disso,
u m a a tu a ç ã o ativ a, o rie n ta d a n o se n tid o d e g a ra n tir p le n a fru iç ã o d a
c o n d iç ã o h u m an a. C o n so a n te Ju ste n F ilh o (2 0 0 5 , p. 17):

[...] Nesse contexto, é evidente o vínculo indissociável


entre saneamento básico e direitos fundamentais. Os
direitos fundamentais se traduzem na atribuição a todo e
qualquer indivíduo de condições de sobrevivência como
“sujeito” (e não como “objeto”) da vida. Isso envolve o
fornecimento de utilidades materiais e imateriais que

230
assegurem a existência saudável e a proteção possível
contra os fatores nocivos do meio-ambiente circundante,
de modo a propiciar o desenvolvimento de todas as
potencialidades individuais e coletivas.

O u tro ssim , o te m a d a p e s q u is a ta m b é m p re ssu p õ e o a c e rto d a


d o u trin a p a ra a q ual a p e rtin ê n c ia d ire ta d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to
b á s ic o co m os d ire ito s fu n d a m e n ta is im p e d e a re striç ã o de su a
titu la rid a d e e x c lu siv a m e n te a u m a c a te g o ria d e e n te s fe d e ra tiv o s.
E ssa q uestão j á foi problem atizada p o r Justen F ilho (2005, p. 20):

A relação direta e imediata entre saneamento básico e


direitos fundamentais gera a impossibilidade de
circunscrever competências federativas nesse tema. Não é
cabível restringir exclusivamente a um dos entes federados
a titularidade da competência para promover direitos
fundamentais. Ou seja, deve prevalecer uma interpretação
sistemática no sentido de que todos os entes federados são
titulares de competências relativamente a saneamento
básico, ainda que a organização e a prestação dos serviços
públicos possam ser da titularidade do ente local. Portanto,
a existência de dispositivos constitucionais indicando que
certos entes federados são investidos em determinados
poderes relativamente a atividades pertinentes ao
saneamento básico não significa a exclusão da atuação dos
demais entes no mesmo âmbito.

N o m e sm o sen tid o , é o e n te n d im e n to d e C h ie c o (2 0 1 7 , p. 304):

“a própria Constituição Brasileira impõe a todos os entes


da Federação a obrigação de zelar pelo setor de
saneamento básico, premeditando a prestação adequada e
cooperada dos serviços públicos essenciais à população.
Trata-se da chamada colaboração federativa, que
estabelece a cada um dos entes federativos a obrigação de
agir para que outro possa agir, possibilitando ainda a
atuação conjunta voluntária”.

231
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

T am bém é pressuposto d a pesquisa relativa ao te m a do saneam ento


básico a inquestionável insuficiência dos recursos e esforços isolados dos
diversos entes federais locais para assegurar serviços satisfatórios nesse
segm ento. O trabalho pressupõe o acerto d a doutrina ao reconhecer que a
d im ensão dos investim entos necessários ultrapassa a capacidade econôm ica
d a esm ag ad o ra m aio ria dos m unicípios brasileiros.
N e s s e sen tid o , a in d a q u e se p o ssa re c o n h e c e r a e x istê n c ia d e u m
se rv iç o p ú b lic o c u ja p re sta ç ã o se lim ite ao te rritó rio m u n ic ip a l, e x iste m
situ a ç õ e s em q u e o M u n ic íp io n ã o d isp õ e d e c o n d iç õ e s e c o n ô m ic a s p a ra
p ro m o ç ã o d as a tiv id a d e s p ertin e n te s.
D e a c o rd o co m o S iste m a N a c io n a l d e In fo rm a ç õ e s so b re
S a n e a m e n to (S N IS ), d e 2 0 1 0 até 2 0 1 9 , a m é d ia em b ilh õ e s de
in v e s tim e n to ca iu c o n sid e ra v e lm e n te , p a ssa n d o d e R $ 13 b ilh õ e s p a ra
R $ 10,96 b ilh õ e s em 2 0 1 7 , se n d o q u e o c u sto p a ra u n iv e rs a liz a r o ac e sso
a q u a tro se rv iç o s d o sa n e a m e n to (ág u a, esg o to s, re síd u o s e d re n a g e m )
fo i e stim a d o em R $ 508 b ilh õ e s, n o p e río d o d e 2 0 1 4 a 2 0 3 3 , p e lo P la n o
N a c io n a l d e S a n e a m e n to B á sic o (P N S B ), e x ig in d o , p o rta n to , u m a m é d ia
d e a p ro x im a d a m e n te R $ 18 b ilh õ e s anuais.
C o m o e x p lica , É d iso n C a rlo s (2 0 1 7 , p. 74),

um outro ponto importante quando estudamos os


problemas ligados à infraestrutura de saneamento é a
desproporcionalidade dos investimentos pelas regiões
brasileiras. No último Ranking do Sanea mento do Trata
Brasil, publicado em fevereiro de 2017, os levantamentos
mostraram que num período de 5 anos (2011 a 2015), as
26 capitais presentes no diagnóstico (com exceção de
Palmas) investiram, juntas e em valores de 2015, a quantia
de R$ 19,44 bilhões, ou seja, 63% do que investiram as
100 maiores cidades (R$ 30,8 bilhões) e 32% do que o país
todo investiu no mesmo período (R$ 60,6 bilhões). Apesar
da concentração de investimentos nas capitais, em termos
dos indicadores mais críticos, 24 capitais não tratam mais
de 80% dos seus esgotos (somente Brasília 82% e Curitiba
91%), e as grandes cidades do Norte ocupam as últimas

232
colocações do Ranking do Saneamento com números bem
abaixo da média nacional na maioria dos indicadores.

P e rc e b e -se , p o rta n to , a e x istê n c ia d e s u b fin a n c ia m e n to das


p o lític a s p ú b lic a s re la tiv a s ao sa n e a m e n to b á sic o , em esp e cial n o s
m u n ic íp io s d e p e q u e n o e m é d io p o rte. A s n o v a s re g ra s d a lei n°
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 b u sc a m e stim u la r a p a rtic ip a ç ã o d o se to r p riv a d o n a
p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , c o m o m e c a n ism o p a ra o
e n fre n ta m e n to d o fin a n c ia m e n to esc asso , re c o n h e c e n d o , d e ce rto m o d o ,
a in c a p a c id a d e fin a n c e ira d o se to r p ú b lico .
C o n tu d o , ain d a n ã o e stá claro se ta is re g ra s d e p re sta ç ã o
c o le tiv a e re g io n a liz a d a d o serv iç o e fe tiv a m e n te a sse g u ra rã o u m a m a io r
p a rtic ip a ç ã o d a in ic ia tiv a p riv a d a n o setor, se n d o n e c e ssá rio in te rp re ta r
a n o v a le g is la ç ã o d e fo rm a a g a ra n tir m a io r se g u ra n ç a ju ríd ic a p a ra
aq u e le s q u e d e se ja m p re s ta r os serv iço s.

2 U M A B R E V E A N Á L IS E S O B R E O S E N T R A V E S J U R Í D I C O S
D A G E S T Ã O D O S S E R V I Ç O S D E S A N E A M E N T O B Á S IC O
N O B R A S IL

R e c o rre n d o -se às p a la v ra s d e G u stin (2 0 0 6 , p. 6), te m -s e q u e


u m a p e s q u is a “p r o c u r a [ ...] re s p o s ta s p a r a p e r g u n ta s o u p r o b le m a s
p r o p o s to s que não e n c o n tra m so lu ç õ e s im e d ia ta s na lite ra tu ra
e sp e c ia liz a d a so b re o a s s u n to ” . N o c a so d o p ro b le m a q u e o ra se p ro p õ e
p e sq u isa r, n ã o é d iferen te.
A lite ra tu ra e sp e c ia liz a d a so b re os a sp e c to s ju ríd ic o s atin e n te s
ao s se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b á s ic o é efic az em d isse c a r e
d e s c re v e r os e n tra v e s ju ríd ic o s e e c o n ô m ic o s d a g e stã o d o s se rv iç o s de
sa n e a m e n to b á sic o n o B ra sil e, c o n se q u e n te m e n te , os lim ite s d a
p a rtic ip a ç ã o p riv ad a , c o m o em C a rv a lh o (2 0 1 0 , p. 335):

Na verdade, à questão da competência federativa, somam-


se: as características da indústria do saneamento básico; as

233
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

funções relativas à saúde pública e ao meio ambiente que


ele desempenha; e a dimensão intergovernamental que a
sua gestão exige (principalmente nas grandes áreas
urbanas), para compor um quadro que limita a constituição
de um sistema baseado primordialmente na prestação
privada desses serviços. Esse sistema deveria viabilizar a
combinação do interesse público pela universalização e a
qualidade dos serviços com retorno financeiro esperado
pela iniciativa privada e, ao mesmo tempo, garantir ao
poder público instrumento de regulação e controle da
atividade privada. Enfim, não se trata apenas de
resistências políticas ou da falta de ajustes institucionais
para consolidar um novo modelo. Como observamos ao
longo deste trabalho, no caso do saneamento básico,
questões de natureza econômica, dilemas relacionados à
regulação concorrencial e contratual, e como veremos
neste capítulo, a forte dimensão social e institucional,
ligada à sua caracterização como serviço público, impõem
sérias restrições ao movimento ” privatizante” no setor.

N esse diapasão, tem -se q u e a literatura é capaz de reconhecer a


im p o rtân cia de u m a regulação m ais clara e coordenada, não apenas n o cam po
d a execução dos serviços, m as tam bém n o q u e diz respeito à norm atização e
estabelecim ento das políticas públicas de saneam ento básico, m erecendo
anotação m ais u m a v ez as considerações de C arvalho (2010, p. 392):

Surge assim, uma nova dimensão cooperativa e


coordenada coerente com os princípios constitucionais.
Insere-se uma abordagem associativista que não se dirige
apenas à execução de serviços públicos e respectivas
concessões, mas também à normatização (como a
disciplina regulamentar e administrativa do uso e
ocupação do solo, a fixação de parâmetros, padrões, etc.,
ou seja, a regulação), o estabelecimento de políticas
públicas (diretrizes, planos, projetos programas, bem
como políticas de financiamento, operação de fundos, etc.)
e os controles (medidas operacionais, licenças,
autorizações, fiscalização, polícia administrativa, etc.).
Para evitar que determinadas superposições ineficazes
ocorram, os poderes públicos devem partilhar, mediante o
exercício de funções complementares e coordenadas, a

234
gestão dos serviços, controlando-os e fiscalizando-os em
suas respectivas fases, etapas ou dimensões (local, micro-
regional, regional, estadual ou nacional).

P o r outro lado, a doutrina especializada é hábil em descrever a


n atu reza ju ríd ic a dos consórcios públicos, com o em D i P ietro (2019, p. 602):

A lei n° 11.107/05 veio mudar a natureza jurídica do


instituto ao estabelecer, no artigo 6°, que “o consórcio
público adquirirá personalidade jurídica: I - de direito
público, no caso de constituir associação pública, mediante
a vigência das leis de ratificação do protocolo de
intenções; II - de direito privado, mediante o atendimento
dos requisitos da legislação civil”.
Se tiver personalidade de direito público, constitui-se
como associação púbica (art. 6°, caput, inciso I) e “integra
a Administração Indireta de todos os entes da Federação
consorciados” (conforme §1° do art. 6°) [...] Se tiver
personalidade jurídica de direito privado, o consórcio, que
constituirá “mediante o atendimento dos requisitos da
legislação civil” (artigo 6°, inciso II), “observará as normas
de direito público no que concerne à realização de
licitação, celebração de contratos, prestação de contas e
admissão de pessoal, que será regido pela Consolidação
das Leis do Trabalho - CLT” (art. 6°, § 2°)

N ã o o b stan te, a lite ra tu ra é c a p a z d e d isse c a r as v a n ta g e n s e


lim ita ç õ e s d o s c o n só rc io s p ú b lic o s n o q u e d iz re sp e ito ao s se rv iç o s de
sa n e a m e n to b á sic o . V id e as c o n sid e ra ç õ e s d e C h ie c o (2 0 1 7 , p. 299):

Importante destacar que, com base na Lei n. 11.107/05, a


perspectiva de cooperação entre as esferas de governo, seja
vertical ou horizontal, através da formação de consórcios
públicos, tende a oferecer um fortalecimento na resolução de
problemas e na execução de ações de interesse gerais,
garantindo respostas mais eficientes a questões ligadas à falta
de recursos financeiros e estruturais, capacitação de recursos
humanos estruturantes. Outrossim, a cooperação certamente
confere aos municípios consorciados maior poder de pressão
junto aos governos estadual e federal, possibilitando aos

235
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

mesmos a execução de obras, serviços e outras atividades


inerentes à sua função, mas que antes não poderiam ser
realizados com recursos exclusivamente municipais.
Todavia, apesar da previsão constitucional para a gestão
associada de serviços públicos, bem como a edição da Lei
n. 11.107, de 06 de abril de 2005, definindo as normas
gerais para a contratação de consórcios públicos, pode-se
afirmar que, ao menos até a entrada em vigor da Lei n.
11.445/07, que estabelece as novas diretrizes nacionais
para o saneamento básico nacional, não existiam muitos
casos de consórcios públicos em tal setor, pelo menos se
comparado com o setor da saúde.

T o d av ia , a p e sq u isa so b re as novas re g ra s a tin e n te s a


titu la rid a d e e re g u la ç ã o d o serv iç o d e sa n e a m e n to b á s ic o e su a p re sta ç ã o
d e fo rm a re g io n a liz a d a e co letiv a, fix a d a s p e la lei n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , n o
q u e d iz re s p e ito a su a c a p a c id a d e de e stim u la r a p a rtic ip a ç ã o d a in ic ia tiv a
p riv a d a n a p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , em esp e cial n as
m é d ia s e p e q u e n a s c id a d e s b ra sile ira s, a in d a está em fa se e m b rio n á ria,
te n d o -s e c iê n c ia a p e n a s d e a rtig o s e ca p ítu lo s esp a rso s, em c o le tâ n e a s de
a ssu n to s v a ria d o s, q u e m u ita s v e z e s o b se rv a m o a ssu n to a p e n a s so b re o
p ris m a d a a tiv id a d e re g u la tó ria d a U n ião .
D a m e sm a fo rm a , a in d a n ã o h á c o n h e c im e n to d e p e sq u isa s
so b re a in flu ê n c ia d as n o v a s re g ra s d a lei n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 n a fo rm a ç ã o de
n o v o s co n só rc io s p ú b lic o s p a ra o e x e rc íc io d a titu la rid a d e d o s se rv iç o s
de s a n e a m e n to p o r g e stã o asso c ia d a , em esp e c ia l n as p e q u e n a s e m é d ia s
cid a d e s b ra s ile ira s.
P o rta n to , tra ta -se d e a u sê n c ia d e a n á lise lite rá ria e sp e c ífic a
so b re o te m a e, m e sm o de fo rm a m a is g e n é ric a , de an á lise in su fic ie n te ,
n a m e d id a em q u e a le g isla ç ã o o b je to d e estu d o a in d a é b a sta n te recen te.
C o m o G ustin (2006, p. 56) explica, só existem pesquisas
científicas q u an d o estas “sã o p re c e d id a s d e u m a situ a çã o -p ro b lem a d e re a l
im p o rtâ n cia q u e n ã o p o s s a se r reso lvid a a p a r tir d e sim p les co n su lta s
bibliográficas, n em p re sc in d ir d e to d a sistem a ticid a d e que envo lve u m a
in vestig a çã o ” . É o caso d a situ ação -p ro b lem a d a p esq u isa que o ra se propõe.

236
C o m efeito , a situ a ç ã o -p ro b le m a d a p e sq u isa p ro p o sta p o d e ser
re p re s e n ta d a p e la s se g u in te s in d ag aç õ es: A lei n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , a n te s das
a lte ra ç õ e s d a lei n° 14.026, n ã o e ra c a p a z d e re g u la m e n ta r co m se g u ra n ç a
e e fic iê n c ia a p re sta ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , d e m o d o a
a tra ir a p a rtic ip a ç ã o d a in ic ia tiv a p riv a d a ? A s n o v a s re g ra s a tin e n te s a
titu la rid a d e d o se rv iç o d e s a n e a m e n to b á s ic o e su a p re sta ç ã o d e fo rm a
re g io n a liz a d a e co letiv a, fix a d a s p e la lei n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , tê m o co n d ã o
d e e s tim u la r a p a rtic ip a ç ã o d a in ic ia tiv a p riv a d a n a p re sta ç ã o dos
se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , em e sp e cial n a s m é d ia s e p e q u e n a s
cid a d e s b ra sile ira s? Se a U n iã o n ã o é a titu la r d o s se rv iç o s de
sa n e a m e n to , q u ais são os im p a c to s d a su a a p re se n ta ç ã o , p e la lei n°
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , co m o a p rin c ip a l re sp o n sá v e l p o r e sta b e le c e r n o rm a s so b re
o te m a ? A fo rm a ç ã o d e c o n só rc io s in te rm u n ic ip a is, te n d o em v is ta o
n o v o m a rc o leg al d o sa n e a m e n to b á sic o , é in stru m e n to ju ríd ic o efic az
p a ra g a ra n tir a p re sta ç ã o d o se rv iç o d e fo rm a re g io n a liz a d a ?
A s in d a g a ç õ e s são o p o rtu n a s, em ra z ã o d a d e fin iç ã o do
e x e rc íc io d a titu la rid a d e d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b á sic o
p e lo s m u n ic íp io s, n o c a so d e in te re ss e lo cal (art. 8°, I, d a L ei
1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ), o u d o E sta d o , em c o n ju n to co m os M u n ic íp io s q u e
c o m p a rtilh a m e fe tiv a m e n te in sta la ç õ e s o p e ra c io n a is in te g ra n te s de
re g iõ e s m e tro p o lita n a s, a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e m ic ro rre g iõ e s,
in s titu íd a s p o r lei c o m p le m e n ta r e stad u a l, n o c a so d e in te re ss e co m u m
(art. 8°, II, d a L e i 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ), fic a n d o ta m b é m a u to riz a d o o e x e rc íc io
d a titu la rid a d e dos se rv iç o s d e sa n e a m e n to p o r g estã o asso c ia d a,
m e d ia n te c o n só rc io p ú b lic o o u c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o , n o s te rm o s d o
art. 241 d a C o n stitu iç ã o F e d e ra l (art. 8°, § 1°, d a L e i 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ).
D e n tre d esse c o n tex to , p a re c e o p o rtu n o a v a lia r o a rtig o 4°-A , d a
L e i n° 9 .9 8 4 /2 0 0 0 , se g u n d o o qual a a n tig a A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s,
a g o ra re n o m e a d a c o m o A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to
B á s ic o - A N A , in stitu irá “ n o rm a s d e re fe rê n c ia ” p a ra a re g u la ç ã o dos
se rv iç o s p ú b lic o s d e s a n e a m e n to b á s ic o p o r seus titu la re s e suas
e n tid a d e s re g u la d o ra s e fisc a liz a d o ra s, bem com o a v a lia r as

237
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

c o n s e q u ê n c ia s ju ríd ic a s d e ssa re g u la m e n ta ç ã o n o p ro c e sso d e p re sta ç ã o


re g io n a liz a d a e c o le tiv a d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , e o p ap e l dos
c o n só rc io s in te rm u n ic ip a is n e sse cen ário .
N e ste p o n to , v e ja -s e as p o n d e ra ç õ e s q u e F ig u e ire d o (2 0 1 7 , p.
4 3 5 ) fa z a re s p e ito d a n e c e ssid a d e d e u m o lh a r m a is a te n to ao esp írito
fe d e ra tiv o n o â m b ito d o sa n e a m e n to b á s ic o :

A falta de uma preocupação normativa abrangente para


conhecer, diagnosticar e enfrentar as políticas
intersetoriais de saneamento básico, ambiental, e as
políticas de saúde também, a nosso juízo contribui para
uma anomia no setor.
Dir-se-á que temos leis que tratam do tema. É verdade, mas
esparsas, e muitas sem a necessária conexão e
interdependência para enfrentar o saneamento com uma
visão holística.
Desse modo, de um lado, temos a segmentação das
competências, com demarcação rígida de limites ao
enfrentamento dos problemas. De outro, uma produção
esparsa e segmentada de leis que tratam dos temas como
saúde, água, saneamento, meio-ambiente, de forma não
integrada. Tudo isso contribui para uma falta de
cooperação mais efetiva entre as entidades políticas.

D e ssa form a, é pressuposto d a pesquisa que a interpretação das


regras do n o vo m arco legal do saneam ento básico conduza ao
estabelecim ento de u m com preensivo sistem a que viabilize, além d a atração
de investim entos ao setor, a m elhoria dos serviços de saneam ento.
C o m o e x p lic a F ig u e ire d o (2 0 1 7 , p. 435):

[...] é preciso compreender que quando pensamos em solução


para os problemas de saneamento básico no Brasil estamos nos
referindo a um compreensivo sistema que atenda de forma
conjugada os maiores desafios ligados a: (a) fornecimento e
tratamento de água potável à população com adequada gestão
de recursos hídricos e ambientais; b) adequada gestão de
políticas de saúde ligadas ao saneamento; e c) adequada gestão,
tratamento e destino final dos resíduos.

238
A in te p re ta ç ã o n o se n tid o d e re c o n h e c e r a c o n s titu c io n a lid a d e
d e ssa s n o v a s a trib u iç õ e s, co m o b je tiv o d e c o n fe rir se g u ra n ç a ju ríd ic a ao
p ro c e s s o de p re sta ç ã o re g io n a liz a d a e c o le tiv a dos se rv iç o s de
sa n e a m e n to b á sic o é d e fu n d a m e n ta l im p o rtâ n c ia p a ra o a v a n ç o do
in v e s tim e n to p riv a d o n o seto r.
O u tro ssim , será im p o rta n te c o m p re e n d e r o p ap e l q u e os
c o n só rc io s p ú b lic o s a ssu m irã o d ian te d a n o v a ló g ic a d o p ro c e sso de
p re s ta ç ã o re g io n a liz a d a e c o le tiv a fix a d o p e la L ei n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 .

3 O D É F IC IT N A U N IV E R S A L IZ A Ç Ã O D O S S E R V IÇ O S D E
SAN EA M EN TO B Á S IC O E A N E C E S S ID A D E DE AÇÃO
IN T E G R A D A D O S E N T E S F E D E R A T IV O S P A R A A T R A Ç Ã O
D E IN V E S T IM E N T O S A O S E T O R

C o m o se v ê, o a p ro fu n d a m e n to d o s estu d o s so b re o n o v o m arc o
leg al é im p o rta n te e se ju s tif ic a d ia n te d a situ a ç ã o q u e o B ra sil ain d a
e x p e rim e n ta n o d e se n v o lv im e n to d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b ásico .
H á u m g ra n d e d é fic it n a u n iv e rsa liz a ç ã o d o s serv iç o s, a g ra v a d o
se n siv e lm e n te p e la d ific u ld a d e q u e os e n te s fe d e ra tiv o s, e m esp e c ia l os
m u n ic íp io s de m é d io e p e q u e n o p o rte , p o s s u e m p a ra in v e stir n a
c o n c re tiz a ç ã o d e u m se rv iç o m in im a m e n te d e q u a lid a d e à p o p u laçã o .
E s s e q u ad ro , c e rta m e n te foi a g ra v a d o em ra z ã o d a in e fic iê n c ia
d a a tu a ç ã o d a U n iã o e d o s E sta d o s n o q u e d iz re sp e ito ao in v e stim e n to
n o d e s e n v o lv im e n to de in fra e stru tu ra e p ro g ra m a s e fic a z e s n o se to r do
sa n e a m e n to b á sic o , com a tra n sfe rê n c ia da re sp o n sa b ilid a d e
a d m in is tra tiv a p e la e x e c u ç ã o d o s se rv iç o s ao s m u n ic íp io s.
No B ra sil, a d in â m ic a g e o g rá fic a a p re se n ta in ú m e ro s
m u n ic íp io s de m é d io e, e sp e c ia lm e n te , de p e q u e n o p o rte , se ja e m te rm o s
e sp a c ia is o u p o p u la c io n a is, fo rm a d o s, e m su a m aio ria, p o r p o p u la ç õ e s
d e b a ix a ren d a, fa to que, em reg ra, in v ia b iliz a a p re sta ç ã o sa tisfa tó ria dos
se rv iç o s de sa n e a m e n to b á sic o , e m ra z ã o d o a c e n tu a d o v o lu m e de

239
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

in v e s tim e n to s em in fra e stru tu ra , os q u ais esse s e n tes fe d e ra tiv o s


c o stu m a m n ã o te r c o n d iç õ e s d e p ro m o v er.
H á q u e se v e rific a r, p o r co n se g u in te , se e c o m o o n o v o m a rc o
leg al d o sa n e a m e n to b á s ic o p e rm ite o tim iz a r a c a p ta ç ã o d e in v e stim e n to
p a ra p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s n a s m é d ia s e p e q u e n a s cid a d e s b ra sile ira s, a
p a rtir d o e s tím u lo à su a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a e se e c o m o os
c o n só rc io s p ú b lic o s p o d e m o c u p a r p ap e l re le v a n te n e sse p ro c esso .
O d e s e n v o lv im e n to d o tem a, c o m o v isto , d e v e rá se r tra ta d o
c o m o m e io d e se c o n fe rir c o n c re tu d e ao s d ire ito s fu n d a m e n ta is, q u e se
tra d u z e m n a a trib u iç ã o a to d o e q u a lq u e r in d iv íd u o d e c o n d iç õ e s a u m a
e x is tê n c ia sau d á v el e a p ro te ç ã o p o ssív e l c o n tra os fa to re s n o c iv o s do
m e io -a m b ie n te circ u n d a n te , d e m o d o a p ro p ic ia r o d e se n v o lv im e n to de
to d a s as p o te n c ia lid a d e s in d iv id u a is e co letiv as.
N e ss e d ia p a sã o , a h ip ó te se q u e se fo rm u la é a d e q u e as n o v a s
re g ra s d a L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 a p re se n ta m n o v a s p o ssib ilid a d e s de
p re s ta ç ã o re g io n a liz a d a d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o que, se p o r
u m la d o são ca p a z e s d e a u x ilia r a a tra ç ã o d e in v e s tim e n to s fin a n c e iro s,
em e sp e cial p a ra as m é d ia s e p e q u e n a s cid ad e s, p o r o u tro , ex ig e m u m
a m b ie n te re g u la tó rio estáv e l e co m se g u ra n ç a ju ríd ic a , p a ra fin s d a su a
efetiv açã o . E , p a ra se c o n c e b e r e sse c e n á rio d e esta b ilid a d e , é n e c e ssá rio
re c o n h e c e r a im p o rtâ n c ia d o p ap e l re g u la tó rio A g ê n c ia N a c io n a l de
Á g u a s e S a n e a m e n to B á sic o - A N A
O racio cín io que se desen v o lv eu p a ra se ch e g ar a essa hip ó tese n os
p arece sim ples. D e u m lado a L ei n° 14.026/2020 reco n h eceu q u e o
exercício d a titu larid ad e dos serviços p ú b lico s d e saneam ento b ásico é dos
m un icíp io s, n o caso d e in teresse local, o u do E stad o , em con ju n to com os
M u n icíp io s q ue co m p artilh am efetiv am en te in stalaçõ es operacionais
in teg ran tes de reg iõ es m etropolitanas, aglom erações urb an as e
m icro rreg iõ es, instituídas p o r lei co m p lem en tar estadual, n o caso de
in teresse com um , fican d o tam b ém autorizado o exercício d a titu larid ad e dos

240
serviços de san eam en to p o r g estão associada, m ed ian te co n só rcio p úblico
ou co n v ên io d e cooperação, nos term o s do art. 241 d a C onstituição.
C o n tu d o , p o r o u tro lad o , e x istiria a p o s sib ilid a d e d e re g u la ç ã o
d o s se rv iç o s p o r c a d a u m d e sse s e n tes fe d e ra tiv o s. E sse s re g ra m e n to s
lo c a is co stu m a m ser m a is su sc e tív e is a in te rfe rê n c ia s d e c u n h o p o lític o -
eleito ra l. A lé m d isso , so b re tu d o n o s p e q u e n o s e m é d io s m u n ic íp io s
b ra sile iro s, h á u m d é fic it d e c a p a c ita ç ã o té c n ic a d o s serv id o res, o q u e
p re ju d ic a a q u a lid a d e d a s re g u la m e n ta ç õ e s.
Isso p arece sig n ificar a p e rsistê n c ia d e u m ce n ário d e in se g u ra n ç a
ju ríd ic a , co m a p o ssib ilid a d e de co n flito en tre as n o rm a s re g u la tó rio s d a
U n iã o e ev e n tu a is re g ra m e n to s locais, o q u e p o d e ria in ib ir a p re sta ção
re g io n a liz a d a d os serv iç o s e os in v estim e n to s p riv a d o s n o setor.
P o rta n to , a fim d e a fa sta r e ssa in se g u ra n ç a , n e c e ssá rio q u e as
n o v a s re g ra s d a L ei n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 sejam in te rp re ta d a s a p a rtir d e u m
o lh a r m a is a te n to ao e s p írito fe d e ra tiv o , d e g o v e rn a n ç a c o m p a rtilh a d a ,
p a ra fin s d e c o n c re tiz a ç ã o d o s d ire ito s fu n d a m e n ta is, o fe re c e n d o u m a
n o v a m a n e ira d e e n x e rg a r a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a e c o le tiv a dos
se rv iç o s d e s a n e a m e n to b á sic o , b e n e fic ia n d o em esp e cial as m é d ia s e
p e q u e n a s cid a d e s b ra sile ira s, que, em re g ra, c a rec em d e re c u rso s
té c n ic o s e fin a n c e iro s p a ra o d e se n v o lv im e n to d o setor.
É ju sta m e n te den tro desse v iés cooperativo, que g an h a relevo o
papel reg u lató rio d a U nião, através d a A g ê n cia N acio n al de Á g u as a p artir
d a L ei n° 14.026/2020, m ere cen d o ser o bjeto de estu d o s m ais aprofundados
a atu ação que a ag ên cia p assa rá a te r sobre o seto r e os eventuais conflitos
que su rgirão em razão d essa n o v a d in âm ica d e regulação.
D o m e sm o m o d o , p a re c e q u e a fo rm a ç ã o d e c o n só rc io s p ú b lic o s
p a ra a tu a ç ã o e sp e c ífic a n a á rea d e sa n e a m e n to ta m b é m re p re se n ta rá
im p o rta n te m e c a n ism o p a ra g e stã o re g io n a liz a d a d o s serv iço s, p o d e n d o
v ir a ser in s tru m e n to e fic a z p a ra a tra ç ã o d e in v e stim e n to s p riv ad o s.

241
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

4 CONCLUSÃO

C o m o se v ê, a in d a h á m u ito a ser fe ito n o se to r d o sa n e a m e n to


b á s ic o p a ra fin s d e u n iv e rsa liz a ç ã o d o s serv iç o s, em e sp e cial n as
p e q u e n a s e m é d ia s c id a d e s b ra sile ira s, em e sp e cial em ra z ã o d a esc a sse z
d e re c u rs o s n o se to r.
O n o v o m a rc o re g u la tó rio d o setor, in stitu íd o p e la L e i n°
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , a p o sta n a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a d o s se rv iç o s co m o
in s tru m e n to fu n d a m e n ta l p a ra a tra ç ã o d e n o v o s in v e stim e n to s p riv ad o s.
A in d a n ã o e stá cla ro se a n o v a le g isla ç ã o te rá o c o n d ã o de
a c e le ra r o p ro c e sso d e u n iv e rsa liz a ç ã o e d e m e lh o ria d a q u a lid a d e dos
serv iço s. P a re c e , co n tu d o , q u e o n o v o p ap e l re g u la tó rio a se r e x e rc id o
p e la A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to B á sic o - A N A , será de
fu n d a m e n ta l im p o rtâ n c ia p a ra g a ra n tir a n e c e ssá ria s e g u ra n ç a ju ríd ic a ao
se to r e c o n s e q u e n te m e n te e stim u la r a p re s e n ç a d a in ic ia tiv a co m o
p re s ta d o ra d o s serv iço s.
N o m e sm o sen tid o , p a re c e q u e a c ria ç ã o d e c o n só rc io s p ú b lic o s
p a ra fin s d e p re sta ç ã o re g io n a liz a d a d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to seja o
c a m in h o m a is a d e q u a d o p a ra fin s d e in te g ra ç ã o d o s e n tes fe d era tiv o s.
C ontudo, diante d a n o v a leg islação ain d a ser b astan te recente,
n ecessário ap ro fu n d ar os estudos, com a análise das novas experiências de
p restação do serviço q u e certam en te advirão nos p ró x im o s anos, a fim de
que ev en tu ais ajustes de in terpretação das n o rm as do n o v o m arco legal
p o ssam ser form ulados, garantindo-se, assim , sua m a io r efetividade.

R E F E R Ê N C IA S

C A R L O S , E d iso n . O sa n e a m e n to b á sic o n o B ra sil ap ó s 10 an o s d a lei n.


1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 e g a n h o s co m a u n iv e rsa liz a ç ã o . I n : D A L P O Z Z O , A u g u sto
N e v e s; O L IV E IR A , Jo sé R o b e rto P im e n ta ; B E R T O C C E L L I, R o d rig o
d e P in h o (co o rd .). T r a t a d o s o b r e o m a r c o r e g u la t ó r i o d o s a n e a m e n to
b á s ic o n o d ir e ito b r a s ile ir o . S ão P au lo : C o n tra c o rre n te , 2 0 1 7 . p. 73-82.

242
C A R V A L H O , V in íc iu s M a rq u e s de. O d ir e ito d o s a n e a m e n to b á sic o .
S ão P a u lo : Q u a rtie r L a tin , 2 0 1 0 . v. 1, p. 3 3 5 -3 9 2 . (C o le ç ã o d ireito
e c o n ô m ic o e d e se n v o lv im e n to ).

C H IE C O , T h ia g o A lv es. O p ap e l d o s c o n só rc io s p ú b lic o s n o se to r de
sa n e a m e n to b á sic o à lu z d a lei n. 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 e d o d e c re to n.
7 .2 1 7 /2 0 1 0 . In: D A L P O Z Z O , A u g u sto N e v e s; O L IV E IR A , Jo sé
R o b e rto P im e n ta ; B E R T O C C E L L I, R o d rig o d e P in h o (c o o rd .). T r a t a d o
so b re o m a rc o r e g u la t ó r i o do s a n e a m e n to b á s ic o no d ir e ito
b r a s ile ir o . S ão P au lo : C o n tra c o rre n te , 2 0 1 7 . p. 2 9 5 -3 4 9 .

P IE T R O , M a ria S y lv ia Z a n e lla . D ir e ito A d m in is tr a tiv o . 3 2 a E d. R io de


Jan e iro : F o re n se . 2019.

F IG U E IR E D O , M a rc e lo . O s d e sa fio s d o s a n e a m e n to b á s ic o n o B rasil: A
n e c e s s id a d e d e u m o lh a r m a is a te n to ao e sp írito fe d e ra tiv o . In: D A L
POZZO, A u g u sto N e v e s; O L IV E IR A , Jo sé R o b e rto P im e n ta ;
B E R T O C C E L L I, R o d rig o d e P in h o ( c o o r d ) . T r a t a d o s o b r e o m a r c o
r e g u la t ó r i o d o s a n e a m e n to b á s ic o n o d ir e ito b r a s ile ir o . S ão P au lo :
C o n tra c o rre n te , 2 0 1 7 . p. 4 3 1 -4 3 8 .

G U S T IN , M . B . S. (R e ) p e n s a n d o a p e s q u is a j u r í d i c a : te o ria p rática. 2a
ed. rev. am p l. atual. B e lo H o riz o n te : D e l R e y , 2006.

J U S T E N F IL H O , M a rç a l. P a r e c e r . C o n s u lta re a liz a d a p e lo M in isté rio


d as C id ad es. D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .b v sd e .p a h o .o rg /b sa c d /c d 6 3 /d ir
e triz e s/m a rc a l1 8 .p d f. A c e sso em : 09 nov. 2020.

243
TRANSFERÊNCIA DA RESPONSABILIDADE CIVIL POR
PASSIVOS AM BIENTAIS DECORRENTES DE
CONCESSÕES DE SANEAMENTO

L u c ia n a G il**
P a tríc ia M e n d a n h a D ias*
T a tia n a d a S ilv a S o u za T eixeira*

R E S U M O : O n o v o m a rc o re g u la tó rio d o sa n e a m e n to b á sic o , in stitu íd o


p e la L ei n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , p re ste s a c o m p le ta r 1 a n o d e v ig ê n c ia , te v e
com o m o te cen tral a u n iv e rsa liz a ç ã o do sa n e a m e n to no B rasil,

* Graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Direito


Ambiental pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Colaboradora
da Comissão de Meio Ambiente da OAB/RJ, Membro da Diretoria da União Brasileira
de Advocacia Ambiental (UBAA) e da Associação Brasileira de Direito de Energia e
Meio Ambiente (ABDEM), integrante do Comitê de Licenciamento de Energias
Renováveis. Coautora das obras “Súmulas Ambientais do STJ Comentadas” (2019),
"Prática do Direito Ambiental na Defesa dos Interesses de Empresas Privadas” (2019)
“Direito Ambiental e os 30 Anos da Constituição de 1988” (2018), “Aspectos Jurídicos
dos contratos de seguro ano II e III: “(Im)Previsibilidade do Risco Ambiental”
(Dez/2013) e “O pool de cosseguro no âmbito dos riscos ambientais: advertências e
vantagens” (abril/2015) “Getting the Deal Through: Environment in 22 jurisdictions
worldwide” (2013). Autora de diversos artigos publicados na imprensa brasileira.
* Mestranda pelo programa de Mestrado Profissional em Engenharia Ambiental e
Urbanística da PUC-Rio. Especialista em Direito Processual pelo programa de pós-
graduação latu sensu da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Aperfeiçoamento em Direito Minerário e em Direito Ambiental pelo Centro de Direito
Internacional - CEDIN. Coautora das obras “Súmulas do STJ em Matéria Ambiental
Comentadas, 2019”, “Direito Ambiental e os 30 Anos da Constituição de 1988, 2018”,
“Direito da Mineração: Questões Ambientais, Minerárias e Tributárias, 2017” e autora
de diversos artigos na área de Direito Ambiental e Processual. Advogada no
Departamento de Direito Ambiental no escritório Bichara Advogados.
* Especialista em Direito Ambiental Brasileiro pela Pontifícia Universidade Católica
do Rio de Janeiro. Aperfeiçoamento em Direito Processual Civil pelo Curso Fórum, em
Compliance Ambiental, Social, de Governança e de Proteção de Dados (ESg&D) pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, e em Gestão e Direito de Resíduos
Sólidos pela Trevisan Escola de Negócios. Advogada no Departamento de Direito
Ambiental no escritório Bichara Advogados.

245
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

g a ra n tin d o -se , até 2 0 3 3 , o a te n d im e n to d e 9 9 % d a p o p u la ç ã o co m á g u a


p o tá v e l e 9 0 % co m se rv iç o s d e c o le ta e tra ta m e n to d e esg o to . P a ra tan to ,
d e n tre o u tro s m e c a n ism o s re g u la tó rio s, fo ra m e sta b e le c id o s
in s tru m e n to s le g a is p a ra a u m e n to da c o n c o rrê n c ia p o r m e io da
d e s e s ta tiz a ç ã o e d as c o n c e ssõ e s p ú b lic a s. A p a r d o s d e sa fio s q u e e stão
p o r v ir e d a e x p e c ta tiv a d o se to r so b re o in íc io d as ro d a d a s d e licita ção ,
o te m a am b ie n ta l g a n h a re le v o ao se c o n sid e ra r o s p a ssiv o s a m b ie n ta is
que serão re c e b id o s p e la s e m p re sa s c o n c e ssio n á ria s dos se rv iç o s
p ú b lic o s e q ue, n ã o ra ra s v e z e s, são n e g lig e n c ia d o s n o s ed itais e d u ra n te
o p ro c e sso d e co n c e ssã o . C o n sid e ra n d o e sse co n te x to , n e sse artig o
p re te n d e -s e d isc o rre r so b re os lim ite s d a re sp o n sa b iliz a ç ã o civ il p elo s
p a s s iv o s a m b ie n ta is d o sa n e a m e n to , o e n te n d im e n to já e sta b e le c id o n o s
T rib u n a is P á trio s so b re o te m a , a im p o rtâ n c ia d a d e lim ita ç ã o d o s d an o s
p re té rito s nos in stru m e n to s co n tra tu a is, co n sid e ra n d o , ain d a, as
m o d ific a ç õ e s tra z id a s p e la n o v a L ei d e L ic ita ç õ e s n° 1 4 .1 3 3 /2 0 2 1 .

P a la v r a s - c h a v e : R e s p o n s a b ilid a d e civ il a m b ie n ta l. T ra n sfe rê n c ia de


p a s s iv o s a m b ie n ta is . S a n e a m e n to b á s ic o .

S U M A R IO : 1 In tro d u ç ã o . 2 O ce n á rio d o sa n e a m e n to b á s ic o n o B rasil


e o s p a ssiv o s a m b ie n ta is a serem g e re n c ia d o s . 3 P re ssu p o sto s d a
re s p o n sa b ilid a d e civ il p o r p a ssiv o s a m b ie n ta is d o san e am en to . 3.1
C o n c e ito d e d a n o am b ie n ta l e e n te n d im e n to s so b re p re su n ç ã o d e dano.
3 .2 A to ilíc ito : lic itu d e d a c o n d u ta n ã o a fa sta re sp o n sa b ilid a d e civil
a m b ie n ta l. 3.3 N e x o d e ca u sa lid a d e , lim ite s d a re sp o n sa b iliz a ç ã o e
o b rig a ç õ e s p r o p te r r e m . 4 D e sa fio s p a ra o setor: id e n tific a ç ã o p ré v ia de
p a ssiv o s, d e lim ita ç ã o n o s in stru m e n to s c o n tra tu a is e m o d ific a ç õ e s
tra z id a s p e la n o v a L e i d e L ic ita ç õ e s. 5 C o n sid e ra ç õ e s F in a is .

246
1 IN T R O D U Ç Ã O

E m 2 0 1 5 , líd e re s d e 193 p a íse s lid e ra d o s p e la s O rg a n iz a ç ã o d as


N a ç õ e s U n id a s p o r m e io d o P ro g ra m a d as N a ç õ e s U n id a s p a ra o
D e se n v o lv im e n to (P N U D ) a ssu m ira m o c o m p ro m isso , c o m p ila d o s n a
c h a m a d a “ A g e n d a 2 0 3 0 ” , d e a lc a n ç a r 17 o b je tiv o s e 169 m e ta s de
D e se n v o lv im e n to S u ste n táv el. D e n tre eles, o 6° o b jetiv o , ta m b é m
ra tific a d o p e lo B ra sil, c o n sistiu em , até 2 0 3 0 , g a ra n tir o ac e sso u n iv e rsa l
e e q u ita tiv o à á g u a p o tá v e l e ao sa n e a m e n to b á sic o , m e lh o ra n d o ta m b é m
a q u a lid a d e d a água, a e fic iê n c ia e g e stã o in te g ra d a d e seu u s o 1.
A re a lid a d e atu al, e n tre ta n to , e v id e n c ia q u e, tra n s c o rrid o s 5
an o s d e sd e a c e le b ra ç ã o d o c o m p ro m isso e re sta n d o a p e n a s m a is u m a
d é c a d a p a ra a tin g ir su a m eta, o B ra sil a in d a está a lé g u a s d e a lc a n ç a r a
u n iv e rs a liz a ç ã o e u s o ra c io n a l d a á g u a n o P aís.
N e sse contexto da necessidade de atingim ento de m eta
internacionalm ente estabelecida e, tendo com o pano de fundo a total
p recariedade do serviço especialm ente evidenciada desde 2020 em razão da
crise p an d êm ica do novo S A R s C O V ID -19 (crise sanitária e de saúde
púbica), a publicação d a L ei n° 14.026, de 15 de ju lh o de 2020, denom inada
de “N o v o M arco do S aneam ento B ásico ” , que em breve com pleta 1 ano de
vigência, p ro m oveu expressivas alterações estruturais e regulatórias p ara o
setor, m od ificando a m aio r parte d a sistem ática prevista n a L ei n°
11.445/2007 e em dispositivos de legislação suplem entar.
D e n tre o u tro s a sp e c to s, a n o v el re g u la m e n ta ç ã o , q u e j á p o ssu i
4 A ç õ e s D ire ta s d e In c o n stitu c io n a lid a d e a ju iz a d a s q u e stio n a n d o a

1Disponível em: https://nacoesunidas.oig/pos2015/agenda2030/, acesso em 12 set. 2020.

247
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

c o n s titu c io n a lid a d e 2, in c e n tiv a a p riv a tiz a ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s 3,


e sta b e le c e re g ra s m a is ríg id a s p a ra o fim d o s lix õ e s 4 e d e fin e m e ta s d e
u n iv e rs a liz a ç ã o p a ra até 31 d e d e z e m b ro d e 2 0 3 3 , te n d o sid o e d ita d o
re c e n te D e c re to n° 10.710, d e 31 d e m a io d e 2 0 2 1 , fix a n d o m e to d o lo g ia
e p ra z o p a ra c o m p ro v a ç ã o d a c a p a c id a d e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira p e lo s
p re s ta d o re s d e serv iç o d e sa n e a m e n to , co m o o b je tiv o d e g a ra n tir o
c u m p rim e n to d as m e ta s d e u n iv e rsa liz a ç ã o .
O p a n o d e fu n d o d o setor, e n tre ta n to , n ã o é fa v o rá v e l. A fa lta
de se rv iç o s efic ie n te s, os p a ssiv o s a m b ie n ta is já e x iste n te s, a

2 ADI 6.492 - questiona suposto monopólio do setor provado nos serviços de


saneamento, em prejuízo da universalização do acesso e modicidade de tarifas,
enfraquecimento das empresas estatais de saneamento, além de ofensa ao princípio
federal, por meio da atribuição de regulamentação tarifaria e padronização de
instrumentos negociais pela Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA).
ADI 6.536 - questiona a atribuição da competência para editar normas de referência
nacional para prestação de serviços públicos, com a possibilidade de estabelecer
regulação tarifária de serviços, padronização de instrumentos negociais e critérios de
contabilidade regulatória à ANA.
ADI 6.583 - questiona extrapolação de competência da União ao fixar a delegação de
serviço de saneamento básico exclusivamente por concessão, intervindo na autonomia
municipal, violando o pacto federativo.
ADI 6.882 - questiona a fixação da delegação de serviço de saneamento básico
exclusivamente por concessão, violando competência municipal que permite ao ente
organizar sob regime de concessão ou permissão, serviços públicos de interesse local.
3 Desde a publicação do marco legal, foram realizados 2 leilões para prestação de
serviços de água e esgoto. O primeiro, em 09/2020, envolvendo 13 cidades da região
metropolitana de Maceió- AL; e o segundo, em 04/2021 (leilão da CEDAE),
envolvendo 35 municípios do Estado do RJ, incluindo a capital. Disponível em:
https://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/2020/09/30/empresa-vence-leilao-da-casal-
com-lance-de-r-2-bilhoes.ghtml; e https://g1.globo.com/rj/rio-de-
janeiro/noticia/2021/04/30/leilao-da-cedae-entenda-o-maior-e-mais-importante-
projeto-de-infraestrutura-recente-no-pais.ghtml, acesso em 06 jun. 2021.
4 Entre 17/03 e 18/04/2021, a ANA promoveu consulta pública para a 1a norma de
referência. O tema consultado visa a regulação do serviço público de manejo de
resíduos sólidos urbanos, para a instituição instrumentos de cobrança nos municípios
brasileiros, e abrange os aspectos de regime, estrutura e parâmetros de cobrança pela
prestação dos serviços (art. 35). Disponível em: https://www.gov.br/ana/pt-
br/assuntos/noticias-e-eventos/noticias/ana-abre-consulta-publica-sobre-norma-de-
referencia-para-contribuir-para-o-fim-dos-lixoes, acesso em 06 jun. 2021.

248
p re c a rie d a d e d o s siste m a s d e lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l n o s m u n ic íp io s e
os p ró p rio s g a rg a lo s de in fra e stru tu ra d as cid a d e s im p o rta rá no
re c e b im e n to , p e la in ic ia tiv a p riv a d a , d e im p o rta n te s e sério s p ro b le m a s
a m b ie n ta is q ue, in e v ita v e lm e n te , se e v id e n c ia m c o m o d an o s p a ssív e is de
re s p o n sa b iliz a ç ã o p e la leg islaçã o .
D ia n te d isso , o o b je tiv o d e ste tra b a lh o é a n a lisa r e e x p o r o atual
e n te n d im e n to so b re a re sp o n sa b ilid a d e civ il p e lo d a n o a m b ie n ta l sob a
ó tic a d o s c o n tra to s d e c o n c e ssã o d e se rv iç o s p ú b lic o s, e v id e n c ia n d o o
e n te n d im e n to d e d o u trin a e ju ris p ru d ê n c ia so b re a p o ssib ilid a d e de
tra n s fe rê n c ia d o s p a ssiv o s e su a re sp e c tiv a re sp o n sa b iliz a ç ã o p a ra o n o v o
c o n c e s s io n á rio d o serv iç o , o q u e se rá a sp e c to d e e x tre m a se n sib ilid a d e
p a ra as e m p re sa s q u e a ssu m irã o a titu la rid a d e d o s serv iç o s, m e sm o
c o n s id e ra n d o as re c e n te s m o d ific a ç õ e s tra z id a s p e la n o v a L ei de
L ic ita ç õ e s n° 1 4 .1 3 3 /2 0 2 1 .

2 C E N Á R I O D O S A N E A M E N T O B Á S IC O N O B R A S I L E D O S
P A S S IV O S A M B I E N T A I S A S E R E M G E R E N C I A D O S

S e g u n d o d a d o s d o S is te m a N a c io n a l d e In fo rm a ç õ e s so b re
S a n e a m e n to (S N IS ), n o a n o d e 2 0 1 8 , a p e n a s 6 0 ,9 % d a p o p u la ç ã o
b ra s ile ira e ra a te n d id a p o r re d e d e esg o to . D o q u a n tita tiv o d e esg o to
g erad o , a p e n a s 4 6 ,3 % foi tra ta d o . N o asp e c to d a g e stã o d e risco , os d ad o s
a in d a e v id e n c ia m que apenas 2 8 ,3 % dos m u n ic íp io s fa zem
m o n ito ra m e n to d e d a d o s h id ro ló g ic o s, 6 7 ,7 % n ã o p o ssu e m m a p e a m e n to
d e áreas d e risc o e so m e n te 15,1% c o n ta m co m siste m a s d e alertas d e
risc o s h id ro ló g ic o s 5.
E ssa p re sta ç ã o de serv iç o s, se g u n d o dados do In stitu to
B ra s ile iro de G e o g ra fia e E s ta tís tic a (IG B E ) de 2017, o co rre
m a jo rita ria m e n te p o r S o c ie d a d e s d e E c o n o m ia M is ta (4 6 % ) o u p e la

5 Disponível em: http://www.snis.gov.br/painel-informacoes-saneamento-


brasil/web/painel-setor-saneamento, acesso em 13 set. 2020.

249
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A d m in is tra ç ã o D ire ta d o m u n ic íp io (2 6 % ). A s e m p re sa s p riv a d a s


p o ssu ía m , n a q u e le ano, a p e n a s 2 ,7 % d e p a rtic ip a ç ã o n o se to r6.
A in d a em 2 0 1 7 , o IB G E re a liz o u o le v a n ta m e n to d o s 5 .5 7 0
m u n ic íp io s b ra sile iro s, q u e stio n a n d o -o s so b re a e x istê n c ia de
lic e n c ia m e n to am b ie n ta l p a ra as a tiv id a d e s d e a b a ste c im e n to d e ág u a,
e sg o ta m e n to san itário , m a n e jo d e á g u a s p lu v ia is e m a n e jo d e re síd u o s
só lid o s. N e s s e u n iv e rso d e d ad o s, a p e sq u isa a p o n to u q u e 2 .2 8 0 n ão
p o ssu ía m lic e n ç a am b ie n ta l p a ra to d a s o u a lg u m a s d e ssa s a tiv id a d e s. Isto
é, c e rc a d e 4 0 % d as a tiv id a d e s re la c io n a d a s ao sa n e a m e n to b á s ic o p o d e m
e sta r se n d o re a liz a d a s há an o s sem c o n tro le p e lo lic e n c ia m e n to
am b ie n ta l e serão a ssim tra n sfe rid a s p e la in ic ia tiv a p riv a d a 7:

Municípios, total e com licenças ambientais relativas aos sistemas de saneamento básico,
segundo as Grandes Regiões e as classes de tamanho da população dos municípios - 2017
Municípios
G ra n d e s Com licença ambiental para pelo menos um dos sistemas
R egiões e Manejo de
classes de Abastecimento Esgotamento Manejo de
resíduos
ta m a n h o de água sanitário águas pluviais
da
sólidos Sem
T o ta l
população A com pan A com pan A com pan A com pan licença
dos h a o p raz o h a o p raz o h a o p raz o h a o p raz o

municípios T o ta l de T o ta l de T o ta l de T o ta l de
v ig ê n c ia v ig ê n c ia v ig ê n c ia v ig ê n c ia
d a l ic e n ç a d a l ic e n ç a d a l ic e n ç a d a l ic e n ç a

Norte 450 190 149 58 48 38 28 88 80 246


Nordeste 1794 532 383 276 201 108 92 300 247 1138
Sudeste 1668 1100 889 917 771 299 258 835 767 361
Sul 1191 660 504 351 288 201 167 583 519 357
Centro-
Oeste 467 248 173 142 102 98 84 127 106 178
Brasil 5570 2730 2098 1744 1410 744 629 1933 1719 2280
F o n te : IB G E (2 0 1 7 ). A d a p ta d o

6 Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/pesquisa/30/84366, acesso em 12 set 2020.


7 Vale ressalvar que, a depender da tipologia e classificação da atividade, tal poderá ser
dispensada de licenciamento ambiental nos termos da Lei Complementar n° 140/2011 e
respectiva legislação federal, estadual e municipal e, de toda forma, ter sido enquadrada no
índice no IBGE como “desprovida de licença”. Independentemente dessa ressalva, os
números absolutos são relevantes para compreensão do cenário do setor no País.

250
P a ra além disso, dos 5.567 m u n icíp io s b rasileiro s existentes
(IB G E , 2 0 1 0 8) ap en as 1.116 estão d ev id am en te hab ilitad o s p ara licen ciar
(P ro ced im en to s d e L icen ciam en to A m biental - M M A , 2 0 1 6 9), isto é,
so m en te 2 0 ,0 1 % dos M u n icíp io s, em 2016, en co n trav am -se aptos a
d ese m p e n h ar a ativ id ad e d e licen ciam en to am biental em seu territó rio 101.
E sses d ados estatísticos, p a ra além d e d e m o n strar a p recaried ad e
d o seto r n o B rasil e a necessid ad e das alterações estruturais q u e serão
im p lem en tad as a p artir d o N o v o M arco, confirm am o cenário d e passivos
am b ien tais a ser recep c io n a d o p ela in iciativ a privada, q u e abran g erá u m a
en o rm id ad e d e d anos já im p lem en tad o s a serem sanados, tais com o
lan çam en to s d e esgoto in natura, co n tam in açõ es d e solo, ág u a e o lençol
freático, d an o s em áreas esp ecialm en te protegidas, in clu in d o as Á reas de
P rese rv açã o P erm an e n te (A P P ) e as U n id ad es d e C onservação.
O u seja, m u ito em b o ra , o art. 44, §1°, d o m a rc o le g a l11 te n h a
d e te rm in a d o que a a u to rid a d e am b ie n ta l lic e n c ia d o ra p rio riz e e
e sta b e le ç a p ro c e d im e n to s sim p lific a d o s p a ra o lic e n c ia m e n to de
u n id a d e s d e tra ta m e n to d e esg o to s san itário s, d e e flu e n tes g e ra d o s nos
p ro c e sso s d e tra ta m e n to d e á g u a e d as in sta la ç õ e s in te g ra n te s dos
se rv iç o s p ú b lic o s d e m a n e jo d e re síd u o s só lid o s, os e n tra v e s co m re la ç ã o

8 Tabela 1.1. Sinopse Censo 2010. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/so


ciais/saude/9662-censo-demografico-2010.html?=&t=resultados, acesso em 20 set. 2020.
9 Procedimentos de Licenciamento Ambiental No Brasil. Disponível em
http ://pnla. mma. gov .br/images/2018/08/VERS%C3 %83O -FINAL-E-B OOK-
Procedimentos-do-Lincenciamento-Ambiental-WEB.pdf, acesso em 20 set. 2020.
10 O levantamento do MMA considerou apenas como aptos a licenciar os municípios
autorizados para tanto por meio de edição de regulamentações estaduais posteriores a
LC n° 140/2011, que fixou normas de cooperação entre a União, Estados e Município
nas ações de proteção ao meio ambiente, dentre elas, o licenciamento ambiental.
11 Art. 44. § 1° A autoridade ambiental competente assegurará prioridade e estabelecerá
procedimentos simplificados de licenciamento para as atividades a que se refere
o caput deste artigo, em função do porte das unidades, dos impactos ambientais
esperados e da resiliência de sua área de implantação.

251
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

ao lic e n c ia m e n to re m a n e sc e m , p o is além de depender de um a


re g u la m e n ta ç ã o , c o m o d e sta c a d o , a c o m p le x id a d e d a q u e stã o u ltra p a ss a
o in s tru m e n to d e re g u la ç ã o , a lc a n ç a n d o o p a ssiv o am b ie n ta l ex isten te.
A liás, so b re o te m a , fo i in c lu íd o n o te x to d o P ro je to d e L e i n °
3 .7 2 9 /2 0 0 4 d a L e i G eral d e L ic e n c ia m e n to 12 a p o ssib ilid a d e d e d isp e n sa
d e lic e n c ia m e n to d e siste m a s e e sta ç õ e s d e tra ta m e n to d e á g u a e de
esg o to . D e v id o à g ra n d e p o lê m ic a q u e o p ro je to em si, e a p ró p ria
d is p e n s a e stã o e n v o lv id o s, ev e n tu a l re g ra m e n to d e d isp e n sa e/ou
sim p lific a ç ã o p o d e m se r o b je to d e q u e stio n a m e n to , n ã o se re v e la n d o
c o m o fe rra m e n ta , a c u rto e m é d io p ra zo , p a ra a u x ílio p a ra so lu ç ã o dos
e n tra v e s d o lic e n c ia m e n to am b ien tal.
A s s im , o d e s a fio d o s e to r s e rá n ã o a p e n a s re la c io n a d o à
im p la n ta ç ã o d a in f r a e s tr u tu r a n e c e s s á r ia p a ra a consecução do
c o n tra to d e c o n c e s s ã o , c o m o ta m b é m - e p rin c ip a lm e n te -, o d e
id e n tif ic a r e g e r ir os p a s s iv o s a m b ie n ta is que já e ste ja m
im p le m e n ta d o s e, a ssim , se ja m p a s s ív e is d e a ç õ e s im e d ia ta s d e
re c u p e r a ç ã o , r e g e n e r a ç ã o o u in d e n iz a ç ã o .
A situ a ç ã o fic a a g ra v a d a ao v e rific a r as m a triz e s n o rm a tiv a s e
ju ris p ru d e n c ia is em m a té ria de re sp o n sa b ilid a d e civ il am b ien tal,
e s p e c ia lm e n te d ia n te d o c o n c e ito a b ra n g e n te d e dan o , a p o ssib ilid a d e de
re s p o n sa b iliz a ç ã o d ia n te d e ato lícito , a e la stic id a d e d o n e x o ca u sal, a
tra n s fe rê n c ia d e p a ssiv o s sob ó tic a d a o b rig a ç ã o p r o p te r re m , b e m co m o
a s o lid a rie d a d e n a re c u p e ra ç ã o d o dano.

12 Vide art. 8°, VII, do substitutivo aprovado pela Câmara dos Deputados em
13/05/2021. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostra
rintegra;jsessionid=node0i1dbg69tn2321ur65r5elietw14000681.node0?codteor=2007
884&filename=Tramitacao-PL+3729/2004. Acesso em: 05 jun. 2021.

252
3 PRESSUPOSTOS DA R E S P O N S A B IL ID A D E C IV IL POR
P A S S IV O S A M B I E N T A I S D O S A N E A M E N T O

C o n so lid o u -se , n o â m b ito d o P o d e r Ju d ic iá rio , o e n te n d im e n to


d e q u e a re s p o n sa b ilid a d e civ il am b ie n ta l é re g id a p e la te o ria d o risc o
in teg ra l, p o r m e io d a q u al é d isp e n sa d a a c o m p ro v a ç ã o d a o c o rrê n c ia do
e le m e n to su b je tiv o (d o lo o u cu lp a), h a v e n d o n e c e ssid a d e a p e n a s de
c o m p ro v a ç ã o d a o c o rrê n c ia d o ato e d o re sp e c tiv o lia m e d e c a u sa lid a d e
co m o d a n o a m b ie n ta l13. E s s a teo ria , e n tre ta n to , n ã o d isp e n sa a
d e m o n stra ç ã o , n o c a so co n c reto , d o d a n o im p le m e n ta d o e d o n e x o d e
c a u s a lid a d e co m a c o n d u ta p ra tic a d a p e lo ag en te.
O c o rre q u e p e la d in a m ic id a d e d as situ a ç õ e s e n a te n ta tiv a d e se
b u s c a r o re s u lta d o p rá tic o d e re c u p e ra ç ã o d o dan o , ta is c o n c e ito s d e d an o
e n e x o são o b je to d e in te n so d e b a te e d iv e rg ê n c ia s n o Ju d ic iá rio e n as
aç õ es in te n ta d a s p e lo M in isté rio P ú b lic o , o q u e to rn a a d isc u ssã o n o
â m b ito d as c o n c e ssõ e s d o sa n e a m e n to a in d a m a is c o m p lex a , c o n fo rm e
p a s s a a d isco rrer.

3.1 C o n c e ito d e d a n o a m b i e n t a l e e n te n d im e n to s s o b r e p r e s u n ç ã o
de dano

A te rm in o lo g ia “ d a n o a m b ie n ta l” n ã o é c o n c e itu a d a p e la
le g is la ç ã o b ra sile ira , q u e se lim ita a d e fin ir o q u e se e n te n d e p o r
p o lu iç ã o , c o n siste n te n a d e g ra d a ç ã o d a q u a lid a d e am b ie n ta l re su lta n te
d e a tiv id a d e s q u e d ire ta o u in d ire ta m e n te p re ju d iq u e m a saúde, a
s e g u ra n ç a e o b e m -e s ta r d a p o p u la ç ã o , crie m c o n d iç õ e s a d v e rsa s às

13 Os danos ambientais são regidos pela teoria do risco integral, colocando-se aquele
que explora a atividade econômica na posição de garantidor da preservação ambiental,
sendo sempre considerado responsável pelos danos vinculados à atividade, descabendo
questionar sobre a exclusão da responsabilidade pelo suposto rompimento do nexo
causal (fato exclusivo de terceiro ou força maior). STJ. REsp 1612887/PR, Rel.
Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 28/04/2020, DJe 07/05/2020.

253
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

a tiv id a d e s so c ia is e e c o n ô m ic a s, afe te m d e s fa v o ra v e lm e n te a b io ta , as
c o n d iç õ e s e sté tic a s o u san itá ria s d o m e io a m b ie n te o u la n c e m m a té ria s
o u e n e rg ia em d e sa c o rd o co m os p a d rõ e s a m b ie n ta is e s ta b e le c id o s 14.
A d o u trin a especializada, p o r sua vez, estab elece que dano
am biental é o dano ao m eio am b ien te ou o con ju n to de condições, leis,
in flu ên cias e in teraçõ es de ordem física, q u ím ica e biológica, que perm ite,
ab rig a e reg e a v id a em to d as as suas fo rm a s15. A firm am , ainda, q u e a
in ex istên cia d e p rev isão exp ressa do conceito de d an o am biental fav o rece
u m a co n stru ção d in âm ica de seu sentido n a in teração entre a d o u trin a e os
tribunais, aten d en d o à n ec essária p o n d eração dos interesses em jo g o e à
g aran tia d a q u alid ad e de v id a asseg u rad a co n stitu cio n alm en te16.
F a to é que, in d e p e n d e n te m e n te do c o n c e ito ju ríd ic o , a
ju ris p ru d ê n c ia p á tria m a jo ritá ria c o m u n g a o e n te n d im e n to d e q u e q u e
n ã o h á re s p o n sa b ilid a d e sem dano.
A d iv e rg ê n c ia su rg e, en tão , so b re su a c o n fig u ra ç ã o n o caso
c o n c re to : e m b o ra n a m a io r p a rte d o s ju lg a d o s se re c o n h e ç a a n e c e ssid a d e
d e c o m p ro v a ç ã o té c n ic a d o d a n o e n q u a n to v u ln e ra ç ã o o u p e rd a d a
q u a lid a d e am b ie n ta l em ra z ã o d o ato p ra tic a d o p o r a q u e le q u e se
p re te n d e a c o n d e n a ç ã o , a in d a p e rsiste m p le ito s ju d ic ia is em q u e a
re s p o n sa b iliz a ç ã o é p le ite a d a e d e te rm in a d a co m fu n d a m e n to na
p re s u n ç ã o d o d a n o :

APELAÇÃO CÍVEL. LICENCIAMENTO AMBIENTAL.


ATERRO SANITÁRIO. NÃO ATENDIMENTO DE
EXIGÊNCIAS NORMATIVAS. ATIVIDADE DE
DESCARTE DE RESÍDUOS QUE OPERA HÁ 07 ANOS
SEM A DEVIDA AUTORIZAÇÃO. Os elementos
contidos nos autos demonstram que desde o vencimento
de sua última licença de operação, em 2012, o município
opera o aterro municipal sem licenciamento. As

14 Art. 3°, III da Lei 6.938/1981.


15 ANTUNES. Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 18 ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 608.
16 CARVALHO. Delton Winter de. Dano Ambiental Futuro: a responsabilização civil
pelo risco ambiental. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2013. p. 102.

254
informações prestadas pela FEPAM apontam a existência
de diversas irregularidades que não foram atendidas pelo
Município, impedindo a concessão de licença. Operando
o aterro sem a devida autorização, com diversas não
conformidades relacionadas, é presum ido o dano
am bien tal causado, cabendo ao responsável a sua
reparação. APELAÇÃO DESPROVIDA. SENTENÇA
MANTIDA EM REMESSA NECESSÁRIA.17

[...] 7. Responsabilidade civil ambiental, objetiva e


integral. O poluidor responde integralmente pelos danos
causados, tendo por consequência a prescindibilidade da
investigação de culpa, a irrelevância da licitude da
atividade e a inaplicabilidade das excludentes de
ilicitude, devendo ainda ser considerada a potencialidade
de danos que a atividade traz ao meio ambiente. [...] 9.
Incontrovérsia a respeito da ineficiência do sistema de
tratamento de esgoto sanitário no grupamento de
prédios que pertencem ao Complexo Penitenciário de
Gericinó, que apesar de possuir 05 (cinco) estações de
tratamento, despejava diariamente toneladas de esgoto
não tratado no Rio Cabral.18

P a ra e n fre n ta m e n to d e ssa p re su n ç ã o , h á n e c e ssid a d e , p o is, de


u m a c la ra d istin ç ã o e n tre im p a c to s a m b ie n ta is que, in e v ita v e lm e n te
d e c o rre m d o e x e rc íc io d a a tiv id a d e , d e d a n o s a m b ie n ta is, este sim
p a s s ív e is d e re s p o n sa b iliz a ç ã o 17819.
D e p ro n to , a p re m is s a q u e se d e v e e sta b e le c e r é q u e im p a c to
am b ie n ta l é o p re ssu p o sto d a a tiv id a d e p o te n c ia lm e n te p o lu id o ra ou

17 TJRS. Apelação e Reexame Necessário N° 70081640294, Vigésima Primeira


Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marcelo Bandeira Pereira, Julgado
em: 19-06-2019.
18 TJ-RJ - APL: 02798749620108190001, Décima Sexta Câmara Cível, Relator:
Des(a). Marco Aurélio Bezerra de Melo, Data de Julgamento: 18/02/2020.
19 A esse respeito, o TJSP: Dano ambiental. Não cabe confundir o impacto com o dano
ambiental; o primeiro decorre da própria atividade humana em qualquer grau, o
segundo decorre de agravos mais sérios ao ambiente. TJSP; Apelação Cível 0143810­
58.2008.8.26.0000; Relator (a): Torres de Carvalho; Órgão Julgador: 1a Câmara
Reservada ao Meio Ambiente; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 11a. Vara da
Fazenda Pública; Data do Julgamento: 31/01/2013; Data de Registro: 22/02/2013.

255
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

u tiliz a d o ra d e re c u rso s n a tu ra is p assív e l d e lic e n c ia m e n to a m b ien tal,


a v a lia d o p o r m e io d e E stu d o d e Im p a c to A m b ie n ta l e re sp e c tiv o
R e la tó rio d e Im p a c to d e Im p a c to A m b ie n ta l (E IA /R IM A ) n o s c a so s de
e m p re e n d im e n to s o u a tiv id a d e s d e sig n ific a tiv o im p a c to a m b ie n ta l, n o s
te rm o s d o artig o 225 d a C R F B /8 8 20:

Se somente estão sujeitos ao licenciamento aquelas


atividades consideradas efetiva ou potencialmente
poluidoras, como as que se utilizam dos recursos
ambientais ou que simplesmente são capazes de causar
degradação ambiental, o importante para determinar se
uma atividade deve se sujeitar ao licenciamento ambiental
ou não está no aferimento do seu impacto ambiental. Logo,
impacto ambiental é o conceito-chave para a determinação
das atividades sujeitas ao licenciamento.21

Isto é, h av e n d o im p acto am biental deco rren te do exercício


ativ id ad e e, d e acordo com classificações d e p o rte e potencial poluidor,
sendo p assível de p ré v ia licen ça am biental, o p ro cesso d e licen ciam en to
afig u ra-se co m o o in stru m en to p elo q ual são avaliados os im pactos
cau sad o s ao m eio socioam biental e a v iab ilid a d e do em preendim ento, sendo
estip u lad as as m ed id as de controle, m itig ação e co m p en sação n ecessárias.
E m o u tra s p alav ras: p a rtin d o -se d a p re m is s a q u e o im p a c to é o
“ c o n c e ito -c h a v e ” p a ra q u e a a tiv id a d e seja lic e n c ia d a , a v a lia -se n o
p ro c e s s o d e lic e n c ia m e n to as m e d id a s a d e q u a d a s e su fic ie n te s p a ra
im p e d ir q u e tal im p a c to n ã o re p re se n te d a n o am b ien tal:

20 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público
e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
[...] IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente
causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto
ambiental, a que se dará publicidade.
21 FARIAS. Talden. Licenciamento Ambiental: aspectos teóricos e práticos. 6. ed.
Belo Horizonte: Fórum, 2017. p. 51.

256
É exatamente por este instrumento, o licenciamento
ambiental, que o Poder Público, ao examinar os projetos a ele
submetidos, verifica sua adequação aos princípios da Política
Nacional do Meio Ambiente. Para tanto, avalia, em termos
ambientais, as consequências positivas e negativas de sua
implantação tendo em vista o bem comum e decide pela
autorização ou não da sua implantação, formulando as
exigências cabíveis para minimização de seus impactos
ambientais negativos ou maximização de seus impactos
positivos, inclusive do ponto de vista socioeconômico.22

Já o dano a m b ie n ta l, com o a n te rio rm e n te c o n c e itu a d o ,


u ltra p a ss a a e s fe ra d o s im p a c to s d e c o rre n te s d a a tiv id a d e , c o n sistin d o em
v e rd a d e ira v u ln e ra ç ã o d o s re c u rso s n a tu ra is e re su lta n d o em p re ju íz o s ao
m e io a m b ie n te o u à sa ú d e d a p o p u la ç ã o , p o d e n d o d e c o rre r ta n to d a
a u s ê n c ia d e m e d id a s m itig a d o ra s d o s im p a c to s (q u a n d o a a tiv id a d e n ão
é s u b m e tid a ao lic e n c ia m e n to , p o r e x e m p lo ) c o m o d e fa to s e x c e p c io n a is
n ã o p re v is to s n o lic e n c ia m e n to .
O u seja, d a n o d ife re d e im p a c to a m b ie n ta l e n ã o p o d e ser
p re s u m id o p e la m e ra o p e ra ç ã o sem lic e n ç a o u p o r d e sc u m p rim e n to de
m e d id a s d e c o m p e n sa ç ã o o u m itig a ç ã o . D e v e ser d e m o n stra d o n a
p rá tic a, p o r p ro v a té c n ic a e sp e c ífic a .
T ra ta -se d e u m a d ife re n ç a q u e e m b o ra p o ssa p a re c e r sim p les,
a in d a é o b je to d e in te n s a c o n fu sã o n o â m b ito d o P o d e r Ju d ic iá rio e
ó rg ã o s d e fisc a liz a ç ã o , re ssa lv a d o s alg u n s c a so s q u e a d istin ç ã o é
re a liz a d a d e fo rm a n ítid a , c o n fo rm e se e v id e n c ia n o s ju lg a d o s a b a ix o
em e n ta d o s, g rifo s n o s s o s :

[...] A responsabilidade civil objetiva por dano ambiental


não exclui a comprovação da efetiva ocorrência de dano e
do nexo de causalidade com a conduta do agente, pois
estes são elementos essenciais ao reconhecimento do
direito de reparação. 3. Em regra, o descumprimento de
norma administrativa não configura dano ambiental

22 OLIVEIRA. Antonio Inagê de Assis. Introdução à Legislação Ambiental


Brasileira e Licenciamento Ambiental. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 287.

257
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

presumido. 4. Ressalva-se a possibilidade de se manejar


ação própria para condenar o particular nas sanções por
desatendimento de exigências administrativas, ou eventual
cometimento de infração penal ambiental. 5. Recurso
especial não provido.23

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA


AMBIENTAL - LANÇAMENTO IRREGULAR DE
ÁGUA RESIDUAL DE LAVAGEM DE VEÍCULOS EM
CÓRREGO E COMÉRCIO DE COMBUSTÍVEIS SEM A
RENOVAÇÃO TEMPESTIVA DA LICENÇA DE
OPERAÇÃO - ATIVIDADE POTENCIALMENTE
CAUSADORA DE DEGRADAÇÃO AO MEIO
AMBIENTE - CONDENAÇÃO EM OBRIGAÇÃO DE
FAZER DE PROVIDENCIAR A LICENÇA DE
OPERAÇÃO - DANO AMBIENTAL NÃO
EVIDENCIADO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE
PREJUÍZO E NEXO DE CAUSALIDADE -
IMPOSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO POR
DANOS MORAIS COLETIVOS - RECURSO
DESPROVIDO. Em que pese a comprovação do ato ilícito,
consubstanciado no despejo de efluentes não tratados
diretamente em córrego, em decorrência da lavagem de
veículos, bem como a continuidade às atividades de
comércio de Combustíveis sem a renovação tempestiva da
Licença de Operação, não restou demonstrada a
degradação ao meio ambiente, o que afasta o nexo causal, a
surgir, objetivamente, o dever de indenização na forma do § 1°
do art. 14 da lei n. 6.938/8124.
[...] 26. Nesse contexto, observa-se que a condenação da
recorrente em compensação se operou por ter deixado de
demonstrar o recolhimento diário e a efetiva e adequada
dos resíduos por ele gerados, e não por ter gerado um dano
ambiental, este, durante todo o decurso processual, nunca
foi comprovado. 27. O r. Acórdão sustenta que a falta de
demonstração do recolhimento e destinação dos
resíduos produzidos pela recorrente durante o período
de 2006 a 2009, já configuraria, por si só. dano
ambiental, passível de indenização. Em outras

23 STJ. REsp 1140549 MG 2009/0175248-6. DJe 14/04/2010.


24 TJ-MT - AC: 00080382320188110055 MT, Relator: HELENA MARIA BEZERRA
RAMOS, Data de Julgamento: 14/09/2020, Primeira Câmara de Direito Público e
Coletivo, Data de Publicação: 17/09/2020.

258
palavras: o descumprimento de norma administrativa
configura dano ambiental presumido. 28. Ocorre que esse
pensamento não encontra respaldo no atual
ordenamento jurídico. 29. A própria Constituição
Federal, no § 3o do art. 225, prevê a possibilidade de o
agente poluidor se submeter, de forma independente,
às sanções administrativas e penais e ao dever de
reparação civil, sendo que no caso da reparação civil,
conforme já dito, é fundamental que se comprove a
ocorrência de dano, o que não aconteceu na hipótese.
30. No caso dos autos, repisa-se, não há comprovação de
dano ambiental, não sendo cabível a responsabilização da
recorrente conforme conta no r. Acórdão25.

E ssa discussão sobre a ocorrência p resu m id a do dano am biental


q u ando h á operação sem licença tam b ém acontece, especialm ente n o âm bito
das atividades de saneam ento, em razão de lançam entos de efluentes em solo
ou curso d ’ág u a em desconform idade com lim ites de em issão estabelecidos
n a legislação nacional e norm as técnicas correlatas. U tilizando-se de
interpretação literal n o supracitado artigo 3°, III d a L ei n° 6.938/198126 h á
ações em que se defende que o sim ples lançam ento em desconform idade é
suficiente p ara configuração do dano e, consequentem ente, da
responsabilização civil, com o exem plifica o ju lg a d o abaixo:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AMBIENTAL. LEI


6.938/81. ESGOTAMENTO SANITÁRIO.
IRREGULARIDADE COMPROVADA. DESPEJO IN
NATURA NA REDE PLUVIAL. CONDUTA
OMISSIVA DA PARTE RÉ. ART. 6°, VIII DO CDC E
ART. 21 DA LEI 7.347/85. DESPROVIMENTO. 3. A
autonomia e elevada proteção ao meio ambiente garantida
pela nova ordem constitucional fizeram com que a
responsabilidade civil nessa seara fosse instituída como

25 STJ - REsp 1463864 RN 2014/0155822-4, Decisão monocrática, Min. Assusete


Magalhães, DJe, 14/06/2016.
26 Artigo 3°. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: III - poluição, a degradação
da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: e) lancem
matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos.

259
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

objetiva pelo ordenamento jurídico, sendo desnecessário


aferir o elemento subjetivo do agente poluidor, conforme
se verifica do art. 14, §1° da Lei 6.938/81. [...] 6 . Em que
pese a ausência de realização de perícia, fato é que, com
fundamento nos princípios da precaução e da
prevenção, aquele que cria ou assume o risco de danos
ambientais tem o dever de repará-los. transferindo-se
a ele o encargo de provar que sua conduta não foi
lesiva. [...] 7. Resta comprovada a conduta de esgotamento
sanitário irregular, in natura nas redes pluviais, bem como
o prejuízo ambiental, tendo em vista que a parte ré em
nenhum momento desincumbiu da demonstração do
contrário. 8. Recurso de apelação desprovido27.
“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO.
AMBIENTAL. CONSUMIDOR. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
MUNICÍPIO DE VAZANTE X COPASA. SERVIÇO DE
ESGOTAMENTO SANITÁRIO. PRESTAÇÃO
INCOMPLETA, DANO AMBIENTAL E NEXO DE
CAUSALIDADE. [...] Comprovados, na espécie, que o
serviço de esgotamento sanitário é prestado de forma
incompleta - com emissão de efluentes não totalmente
tratados. espuma e gases odoríferos -. há dano ambiental e
o nexo de causalidade. sendo correta a condenação da
COPASA a regularizar o funcionamento da Estado de
Tratamento de Esgoto. a se abster de não lançar efluentes
e gases. a revitalizar o rio e a indenizar o dano ambiental28.

P o rta n to , em se tra ta n d o d e p a ssiv o s a m b ie n ta is d e c o rre n te s de


a tiv id a d e s de sa n e a m e n to , a p rim e ira p re m is s a que d ev e ser
c o m p re e n d id a p e lo s fu tu ro s e a tu a is c o n c e ssio n á rio s é q u e o c o n c e ito de
d a n o a m b ie n ta l a in d a é o b je to d e d e b a te n o Ju d ic iá rio , in c lu siv e so b re a
p o s s ib ilid a d e d e ser p re su m id o d ia n te d a o p e ra ç ã o sem licen ç a, d e
irre g u la rid a d e em la n ç a m e n to s, e n tre o u tro s c a so s e sp e c ífic o s.

27 TRF-2 - AC: 01111883820144025101 RJ 0111188-38.2014.4.02.5101, Relator:


ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES, Data de Julgamento: 21/03/2018,
VICE-PRESIDÊNCIA, Data de Publicação: 23/03/2018.
28 TJ-MG - AC: 10710110006917002, Relator: Alberto Vilas Boas, Data de
Publicação: 06/08/2019.

260
3 .2 A to ilíc ito : lic itu d e d a c o n d u t a n ã o a f a s t a r e s p o n s a b i li d a d e civ il
a m b ie n ta l

E m b o ra ain d a h a ja d iv e rg ê n c ia n o s T rib u n a is, a p re m issa p a ra


re s p o n sa b iliz a ç ã o civ il é de que o d e sc u m p rim e n to de n o rm a
a d m in is tra tiv a o u a sim p le s o p e ra ç ã o sem lic e n ç a n ã o g e ra o d an o
p assív e l d e re p a ra ç ã o civ il, d a m e s m a fo rm a q u e a re g u la rid a d e ou
lic itu d e d a c o n d u ta n ã o a fa sta a p o ssib ilid a d e d e re sp o n sa b iliz a ç ã o do
a g e n te q u e c a u sa r p re ju íz o am b ien tal.
O u seja, a e x istê n c ia d e lic e n ç a am b ie n ta l n ã o e x o n e ra o
e m p re e n d e d o r d e re p a ra r o d an o , ca so o te n h a c a u sa d o :

A licença ambiental não libera o empreendedor licenciado


de seu dever de reparar o dano ambiental. Essa licença, se
integralmente regular, retira o caráter de ilicitude
administrativa do ato, mas não afasta a responsabilidade
civil de reparar. A ausência de ilicitude administrativa irá
impedir a própria Administração Pública de sancionar o
prejuízo ambiental, mas nem por isso haverá
irresponsabilidade civil. 29

T ra ta -se d e situ a ç ã o em q u e o c o rre o c h a m a d o a b u so d e d ire ito


p re v is to n o art. 187 d o C ó d ig o C iv il30, q u e se c a ra c te riz a , se g u n d o a
d o u trin a civ ilista , q u a n d o h á e x tra p o la ç ã o d o e x e rc íc io d o d ire ito - n o
caso , d a a u to riz a ç ã o p a ra o p e ra ç ã o d e u m a a tiv id a d e - “c a u sa n d o
p r e ju íz o a o u trem , p r a tic a a to ilícito, f ic a n d o o b rig a d o a r e p a r a r ” 31.
N e ss e c o n tex to , m e sm o c o n sid e ra n d o u m ríg id o p ro c e sso de
lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l, n a h ip ó te se d e u m im p a c to g e ra d o p e la
a tiv id a d e p o lu id o ra n ã o ser so lu c io n a d o p e la m e d id a m itig a d o ra p re v ista

29 MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. Malheiros


Editores, 2013. p. 420.
30 Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede
manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou
pelos bons costumes.
31 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Responsabilidade Civil. Saraiva, 2007. p. 49.

261
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

n o s estu d o s am b ie n ta is, e p ro v o c a r u m d a n o a m b ie n ta l, c a b e rá a
re s p o n sa b iliz a ç ã o d o p o lu id o r (art. 3°, IV , d a L e i n° 6.93 8/1 9 8 132), seja
ele p e s s o a fís ic a o u ju ríd ic a , sen d o e x ig id a a re p a ra ç ã o d o p re ju íz o
p ro v o c a d o ao m e io a m b ie n te 33 e /o u terc eiro s.
A re s p o n sa b iliz a ç ã o civ il am b ie n ta l (te o ria d o risc o in te g ra l34 -
a m a is a c e ita n a ju ris p ru d ê n c ia atu al), n e ssa h ip ó te se , está lig a d a
d ire ta m e n te a re s sa rc ir a v io la ç ã o de um d ireito
(d ifu s o /in d iv id u a l/c o le tiv o ) re su lta d o d o a b u so d e seu ex e rc íc io , o q u e
in d e p e n d e d e v o n ta d e d o a g e n te o u d a re g u la rid a d e d o a to /fa to g e ra d o r
d o d a n o p a ssív e l d e re p ara ção .
É o q u e se o b se rv a em p re c e d e n te d o S u p e rio r T rib u n a l de
J u s tiç a (“ S T J” ) 35, p o r m e io d o qual u m a c o n c e ssio n á ria d e e n e rg ia
e lé tric a n o R io P a ra n a p a n e m a /P R fo i c o n d e n a d a a p a g a r in d e n iz a ç ã o a
u m g ru p o d e p e sc a d o re s. M u ito e m b o ra d e se m p e n h a sse c o n c e ssã o
re g u la rm e n te , te n d o im p le m e n ta d o m e d id a s p a ra g a ra n tir a m a n u te n ç ã o
d e fa u n a a q u á tic a, d e a c o rd o co m o ju lg a d o , a o p e ra ç ã o d a a tiv id a d e te ria
re s u lta d o n a a lte ra ç ã o d a b io ta m a rin h a , o q u e p ro v o c o u d im in u iç ã o n o
v a lo r d o p e sc a d o , e ju s tif ic o u o d e v e r d e in d e n iz a r os atin g id o s.
A in d a q u e o p reced en te ac im a trate de ação indenizatória, o
racional u tilizad o p ela C o rte S uperior tam b ém se ap lica a situações

32 Art 3° - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: [...] IV - poluidor, a pessoa
física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente,
por atividade causadora de degradação ambiental.
33 Na seara ambiental, a reparação se dá por meio da restauração natural,
preferencialmente, adoção de medida compensatória, ou indenização pecuniária, senão
vejamos: “Assim, uma vez impossibilitada a reparação (ou restauração) em espécie,
que é prioritária, dever-se-á partir para uma compensação ambiental ou, em último
caso, para a indenização em pecúnia”. (AMADO, Frederico Augusto Di Trindade.
Direito ambiental esquematizado. Forense, 2011, p. 346).
34 A adoção da teoria do risco integral traz como consequências principais a facilitar o
dever ressarcitório: (a) a prescindibilidade de investigação de culpa; (b) a irrelevância
da licitude de atividade; e (c) a inaplicabilidade de excludentes de causalidade.
(MILARE, Edis. Direito do ambiente. Revista dos Tribunais, 2015. p. 434).
35 REsp 1371834/PR, Rel. Ministra Maria Isabel GaUotti, Quarta Turma, julgado em
05/11/2015, DJe 14/12/2015.

262
sem elh an tes o corridas n o d esem p en h o das atividades d e saneam ento, com o
j á p ro n u n ciaram o T JR S e o T JM G ao con d en arem as co n cessio n árias em
razão d a in stalação de estad o de trata m e n to d e efluentes:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL


DO ESTADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. INSTALAÇÃO DE ESTAÇÃO DE
TRATAMENTO DE EFLUENTES PELA CORSAN.
BAIRRO PARQUE MARINHA. MUNICÍPIO DE RIO
GRANDE. MAU CHEIRO E PROLIFERAÇÃO DE
MOSQUITOS EM ÁREA PRÓXIMA E NO ENTORNO.
DANO MORAL IN RE IPSA. [...] Evidenciado que a
CORSAN, ao instalar Estação de Tratamento de Efluentes
- ETE no Município de Rio Grande, causou danos morais
aos moradores de área próxima, daí resulta o dever de
indenizar. Danos morais \in re ipsa\, decorrentes das
condições insalubres de moradia a que ficou exposta a
parte autora em face do mau cheiro e da proliferação de
mosquitos e outros insetos em área lindeira e adjacente a
da ETE, produzidos pelo sistema inicialmente adotado
pela CORSAN para o tratamento do esgoto.36
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DE
DANOS MORAIS E MATERIAIS - ESTAÇÃO DE
TRATAMENTO DE ESGOTO - MAU CHEIRO -
FATO INCONTROVERSO - CONCESSIONÁRIA -
RESPONSABILIDADE - FIXAÇÃO DO QUANTUM -
RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. - São
notórios os constrangimentos, transtornos e abalos
provocados à pessoa que convive por anos com forte mau
cheiro em sua própria casa, restando, pois, nítida a
configuração do dano moral puro, que deve ser reparado -
Nestes casos, segundo o Superior Tribunal de Justiça, em
recente julgado, o dano moral se configura in re ipsa, isto é,
prescinde de prova, sendo suficiente a prova da ocorrência de
ato ilegal, uma vez que o resultado danoso é presumido.37

36 TJ-RS - AC: 70071991178 RS, Relator: Miguel Ângelo da Silva, Data de


Julgamento: 22/02/2017, Nona Câmara Cível, Data de Publicação: 02/03/2017.
37 TJ-MG - AC: 10470090588133002, Relator: Paulo Balbino, 8a Câmara Cível, Data
de Publicação: 30/10/2017.

263
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

E ste e n te n d im e n to e v id e n c ia ao s fu tu ro s c o n c e ssio n á rio s q u e o


fa to de o s e rv iç o /e m p re e n d im e n to o b je to da c o n c e ssã o te r sido
p re v ia m e n te lic e n c ia d o n ã o im p lic a n a ise n ç ã o d e re sp o n sa b ilid a d e caso
h a ja d a n o a m b ie n ta l. E m v e rd a d e , o q u e se b u s c a n a re sp o n sa b ilid a d e
civ il am b ie n ta l é a re c u p e ra ç ã o e /o u in d e n iz a ç ã o d o m e io a m b ie n te
d ia n te d a o c o rrê n c ia d o dan o , seja ele d e c o rre n te - o u n ã o - d e ato ilíc ito ,
o q u e to rn a a in d a m a is c o m p le x a a te m á tic a am b ie n ta l n e sse asp ecto .

3 .3 N e x o d e c a u s a lid a d e , lim ite s d a r e s p o n s a b iliz a ç ã o e o b r ig a ç ã o


p r o p te r r e m

F ix a d a a p re m is s a de q u e a re sp o n sa b ilid a d e civil a m b ien tal


in d e p e n d e se o ato p ra tic a d o foi líc ito o u n ão , b e m c o m o q u e h á
n e c e s s id a d e de c o m p ro v a ç ã o d o d a n o ao m e io a m b ie n te (e m b o ra h a ja
d iv e rg ê n c ia ju ris p ru d e n c ia l so b re su a p re su n ç ã o em d e te rm in a d o s
ca so s), n o q u e se re fe re ao n e x o d e ca u sa lid a d e , a d ific u ld a d e em se
e sta b e le c e r b a liz a s se g u ra s so b re os re q u isito s d a c o n d e n a ç ã o p o r d a n o
am b ie n ta l ta m b é m p a re c e a in d a n ão e s ta r re so lv id a .
P re lim in a rm e n te , e m b o ra a in d a e x ista m d iv e rg ê n c ia s, v ale
p o n tu a r que p a u la tin a m e n te a ju ris p ru d ê n c ia te m a p rim o ra d o o
e n te n d im e n to de q u e em m a té ria de re sp o n sa b ilid a d e civ il am b ien tal,
e m b o ra o b je tiv a e re g id a p e la te o ria d o risc o in teg ra l, é co g e n te a
c o m p ro v a ç ã o d o n e x o de ca u sa lid a d e , id e n tific a d o q u a n d o o d a n o é
e fe ito n e c e s s á rio e a d e q u a d o de u m a c a u sa (a ç ã o o u o m issão ).
Isto é, assim c o m o n a re g ra g eral d a re sp o n sa b ilid a d e civ il, o
n e x o de c a u sa lid a d e d ev e se r a p re c ia d o à lu z d a te o ria d a c a u sa lid a d e
a d e q u a d a , re c e p c io n a d o n o d ire ito b ra sile iro p e lo art. 403 d o C ó d ig o
C iv il ao p re v e r, n o T ítu lo IV , q u e a c o n d e n a ç ã o em p e rd a s e d a n o s só
p o d e rá in c lu ir os p re ju íz o s e fe tiv o s e os lu c ro s c e ssa n te s p o r e fe ito d ela
d ire to e im ed iato .
N o âm b ito do S T J o caso p arad ig m a sobre o te m a foi p ro ferid o em
sede de ações ind en izató rias p ro p o stas contra ad q u iren tes de carga

264
tran sp o rta d a p elo N a v io V icu n a em razão d e acid en te p o r ele causado no
P o rto de P ara n ag u á p re ju d ican d o n eg ativ am en te a b io ta aq u ática local e
co n seq u en tem ente, im p lica n d o n a v ed a ção d a atividade p esq u e ira n o local.
A pós d e c isã o p e lo T J P R p e la c o n d e n a ç ã o d as e m p re sa s
re q u e rid a s ao p a g a m e n to d e in d e n iz a ç ã o , a d e m a n d a foi su b m e tid a ao
S T J sob re la to ria d o M in . V ila s B o a s C u êv a, te n d o firm a d o o
e n te n d im e n to q u e n ã o h a v e ria n e x o d e c a u sa lid a d e en tre o ato d e a d q u irir
a c a rg a tra n s p o rta d a e a o c o rrê n c ia d o fa to d an o so , c o n fo rm e se v e rific a
p e lo tre c h o a b a ix o e m e n ta d o :

É dizer, a lei é coerente com o direito comparado e com o


escólio doutrinário acerca de que "[a] obrigação de reparar
o dano surge tão somente do simples exercício da atividade
que, em vindo causar danos a terceiros, fará surgir, para o
agente que detenha o controle da atividade, o dever de
indenizar" (MELO, Nehemias Domingos de. Da culpa e do
risco como fundamentos da responsabilidade civil. 2 ed. São
Paulo: Atlas, 2012, p. 30). A teoria da equivalência das
condições (teoria da conditio sine qua non) atribui a toda e
qualquer circunstância, que haja concorrido para produzir o
dano, a qualidade de uma causa. Assim, qualquer das causas
pode ser considerada capaz para gerar o dano. A abalizada
doutrina especializada em responsabilidade civil é uníssona
ao afirmar que, na seara da responsabilidade civil, inclusive
no tocante ao risco integral, para aferir se um dano pode ser
imputado a outrem em razão de sua conduta, não há falar
em invocação da teoria da equivalência das condições, de
índole generalizadora, admitida apenas no âmbito penal. A
teoria da causalidade adequada revela-se a mais adequada
para justificar o nexo de causalidade no plano jurídico. Isso
tanto pelo exame do direito positivo, mas também pela
concepção de que a causalidade adequada "constitui o
retrato mais próximo do modelo nomológico científico da
explicação causal". (CARPES, Artur Thompsen. A prova do
nexo de causalidade na responsabilidade civil. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2016, p. 53-55) Com efeito, na
aferição do nexo de causalidade, "a doutrina majoritária de
Direito Civil adota a teoria da causalidade adequada ou do
dano direto e imediato, de maneira que somente se considera

265
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

existente o nexo causal quando o dano é efeito necessário e


adequado de uma causa (ação ou omissão). (...).38

N a e s fe ra d o s T rib u n a is In fe rio re s v e rific a -s e ju lg a d o s seg u in d o


a m e s m a lin h a, e x ig in d o -se o lia m e d e c a u sa lid a d e e n tre o ato p ra tic a d o
p e lo R é u e o d a n o q u e se b u s c a re p a ra ç ã o c i v i l 39:

RECURSO DE APELAÇÃO - DIREITO


AMBIENTAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA -
OBRIGAÇÃO DE FAZER - RESPONSABILIDADE
CIVIL AMBIENTAL - TEORIA DO RISCO
INTEGRAL - NEXO DE CAUSALIDADE. 1. Trata-se
de ação civil pública ajuizada pelo MINISTÉRIO
PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, a partir do
Inquérito Civil n.° 09/1996 e n.° 09/1999, em que se
constatou a irregularidade do escoamento de esgoto,
bem como a inadequação do sistema de drenagem de
águas pluviais do Loteamento "Presidente Collor",
ocasionando danos ambientais no local. 2. Afastada a
responsabilidade do SAAE de São Carlos, porquanto
não se constatou qualquer problema em relação ao
sistema de esgoto. Inteligência do art. 1° da Lei
Municipal n.° 17.444/2015. 3. A responsabilidade civil
por dano ambiental é objetiva e informada pela teoria
do risco integral. Precedentes do C. Superior Tribunal
de Justiça. Imprescindível a constatação do nexo de
causalidade entre o dano ambiental observado e o
comportamento do agente. Recurso do SAAE provido.389

38 STJ. REsp 1602106/PR, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Segunda Seção,
julgado em 25/10/2017, DJe 22/11/2017.
39 “O dano só pode gerar responsabilidade quando seja possível estabelecer um nexo
de causalidade entre ele e o seu autor”. TRF-2. APELAÇÃO CÍVEL
200751010012787. 5a Turma. Des. Fed. Fernando Marques. DJe 22/12/2010.
“ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. [...] NEXO DE
CAUSALIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO. O nexo de causalidade entre o fato
gerador do evento danoso, o dano e o sujeito a quem se pretende atribuir a
responsabilidade se revela elemento indispensável para que possa surgir o dever de
indenizar”. TRF-2. APELAÇÃO CÍVEL 200051010211376 RJ 2000.51.01.021137-6.
DJe 23/11/2010.

266
Recursos do Ministério Público e de Airton Garcia
Ferreira desprovidos.40
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APELAÇÃO.
Responsabilidade civil. Indenização por danos materiais e
morais. Município de Assis. Autores que exploravam um
pesqueiro ('pesque-pague') ao lado de estação de tratamento de
esgoto da SABESP. [..] 2. Dano causado pelo fluxo intenso e
imprevisto de chuvas no dia, caracterizada a força maior que
funciona como causa excludente da responsabilidade estatal.
Inexistência de nexo de causalidade entre a atividade
realizada pela apelada SABESP e os danos sofridos pelos
embargantes. Manutenção da r. sentença de improcedência41.

D e to d o m o d o , v a le re s sa lta r q u e o p o sic io n a m e n to ta m b é m n ão
é p a c ific a d o . A in d a e x iste m ju lg a d o s , n ã o raro s, q u e fle x ib iliz a m
e x c e s s iv a m e n te o lia m e d e c a u sa lid a d e p a ra q u e a re sp o n sa b ilid a d e
p o s s a re c a ir so b re q u a lq u e r a g e n te q u e te n h a e n v o lv im e n to co m o dan o ,
s e ja p o r p a rtic ip a ç ã o em su a o c o rrê n c ia (m e sm o q u e in d ire ta ) o u d ian te
d a o b te n ç ã o d e b e n e fíc io s em ra z ã o d o e v e n to d a n o so .
T a m b é m n o S T J, a n te rio rm e n te ao c a so d o N a v io V ic u n ã , o
M in is tro H e rm a n B e n ja m in re la to u c a so q u e a té h o je é a p lic a d o em
ju lg a d o s d a p ró p ria C o rte e p e lo s d em ais T rib u n a is, n o qual o c o n c e ito
d e p o lu id o r p a ra fin s d e c o n d e n a ç ã o civ il p e lo d a n o am b ie n ta l foi
a m p lia d o p a ra as m ais d iv e rsa s esp é c ie s d e ativ id a d e s v in c u la d a s ao
d an o , tra n s c re v e -se :

PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. NATUREZA


JURÍDICA DOS MANGUEZAIS E MARISMAS.
TERRENOS DE MARINHA. ÁREA DE
PRESERVAÇÃO PERMANENTE. TERRO ILEGAL DE
LIXO. DANO AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE
CIVIL OBJETIVA. OBRIGAÇÃO PROPTER REM.
NEXO DE CAUSALIDADE. AUSÊNCIA DE

40 TJ-SP 00060606220088260566 SP 0006060-62.2008.8.26.0566, Relator: Nogueira


Diefenthaler, 1a Câmara Reservada ao Meio Ambiente, Data de Publicação: 06/04/2018.
41 TJ-SP - EMBDECCV: 1001362-49.2018.8.26.0047, Relator: Oswaldo Luiz Palu,
Data de, 9a Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 10/06/2020.

267
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

PREQUESTIONAMENTO. PAPEL DO JUIZ NA


IMPLEMENTAÇÃO DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL.
ATIVISMO JUDICIAL. MUDANÇAS CLIMÁTICAS.
DESAFETAÇÃO OU DESCLASSIFICAÇÃO JURÍDICA
TÁCITA. SÚMULA 282/STF. VIOLAÇÃO DO ART. 397
DO CPC NÃO CONFIGURADA. ART. 14, § 1°, DA LEI
6.938/1981. [...] 13. Para o fim de apuração do nexo de
causalidade no dano ambiental, equiparam-se quem faz,
quem não faz quando deveria fazer, quem deixa fazer, quem
não se importa que façam, quem financia para que façam, e
quem se beneficia quando outros fazem. 14. Constatado o
nexo causal entre a ação e a omissão das recorrentes com o
dano ambiental em questão, surge, objetivamente, o dever
de promover a recuperação da área afetada e indenizar
eventuais danos remanescentes, na forma do art. 14, § 1°, da
Lei 6.938/81. [...]42

P o rtanto, nos casos das n o v as co n cessões dos serviços de


san eam en to b ásico p a ra além d a id en tificação d a re g u larid ad e d a co n d u ta e
d a o co rrên cia de dan o am biental, será fu n d a m e n tal v erific ar q u al ato
p raticad o cau so u a d eg rad ação d a q u alid ad e am biental, de fo rm a a d elim itar
fato s e ord em cro n o ló g ica de resp o n sáv eis p o r sua ocorrência, m in im izan d o
eventual im p u g n açã o g en eralizad a de resp o n sab ilid ad e p ara os n o vos
titu larid ad es dos serviços que n ão ten h am praticad o a co n d u ta danosa.
E ste é o e n te n d im e n to d e É d is M ila ré e R ita M a ria B o rg e s
F ra n c o , q u e e sc la re c e m q u e o c o rre a tra n s fe rê n c ia d e re sp o n sa b ilid a d e
so b re o s p a s s iv o s a m b ie n ta is re la c io n a d o s à o p e ra ç ã o p re té rita d e ativ o s
tra n s fe rid o s p o r m e io d e c o n tra to d e c o n c e ssã o q u a n d o : ( i) in trín se c o s ao
o b je to d a c o n c e ssã o ; (ii) c o n siste n te s em o b rig a ç õ e s p re v ista s n o ed ital
e n o c o n tra to d e co n c e ssã o , b e m co m o ; (iii) re la tiv o s a fa to s q u e o n o v o
c o n c e s s io n á rio te n h a c iê n c ia a n tes d a a ssu n ç ã o d o c o n tra to e q u e
im p o rta ra m n a v a lo ra ç ã o d o p re ç o d a p ro p o sta , c ite -se :

Dentre esses pontos que devem ser lembrados e que


configuram verdadeiro impasse à viabilidade das novas

42 STJ. REsp 650.728/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA


TURMA, julgado em 23/10/2007, DJe 02/12/2009.

268
concessões está a discussão quanto à transferência dos
passivos ambientais relacionados à operação pretérita do
ativo, que podem estar relacionados tanto a pendências de
licenciamento ambiental como a danos propriamente ditos.
(...) É preciso também que o contrato de concessão
delimite os riscos e as responsabilidades que acompanham
o ativo, impedindo que o novo concessionário responda
por obrigações alheias ao objeto específico do contrato, de
forma a não ser surpreendido por pretensões que, pela sua
natureza, acarretam, senão o dever de reequilíbrio
econômico-financeiro do contrato. [...]Com isso em vista,
é necessário destacar que nem todos os riscos relativos à
prestação de serviço público devem ser atribuídos ao novo
concessionário. O contrato de concessão delimita esses
riscos e a responsabilidade que os acompanha. Essa é a
consequência da manutenção da titularidade pública do
serviço. Em outras palavras, o novo concessionário, em
regra, não responderá por obrigações alheias ao objeto
específico da delegação produzida no contrato de
concessão, nem mesmo será responsável por passivos
ambientais causados pelo concessionário anterior pelo
simples fato de lhe suceder na gestão do ativo.43

E ste ta m b é m foi o e n te n d im e n to a p lic a d o p e lo S T F, d e n tre as


ra z õ e s d e d e c isã o m o n o c rá tic a d o M in . R ic a rd o L e w a n d o w s k i44,
a firm a n d o p e la in a d m issib ilid a d e d a tra n sfe rê n c ia de o b rig a ç ã o ao
c o n c e s s io n á rio c a u sa d a a n tes da co n c e ssã o , n o ta d a m e n te quando
in e x iste n te p re v isã o e x p re ssa n o in stru m e n to c o n tra tu a l.
A liás, a d isc u ssã o so b re a tra n s m issib ilid a d e d as o b rig a ç õ e s
a lc a n ç a to d a a c a d e ia de su c e ssã o d a co n c e ssã o , o c a sio n a n d o e n o rm e
in s e g u ra n ç a ju ríd ic a . E x e m p lo d isso , são as re c o rre n te s aç õ es ju d ic ia is
e n v o lv e n d o a le g itim id a d e e n tre as c o n c e ssio n á ria s su c e sso ra s e

43 MILARE, Edis e FRANCO, Rita Maria Borges. Concessão e Passivos Ambientais.


Publicado no Valor Econômico em 09 maio 2019. Disponível em: https://www.valo
r.com.br/legislacao/6246301/concessoes-e-passivos-ambientais.
44 STF. ACO n° 2042 - DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Decisão monocrática
proferida em 04.04.2017.

269
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

su c e d id a s p a ra c o m p o r o p o lo p a ssiv o d e aç õ es c iv is p ú b lic a s v is a n d o a
re s p o n sa b iliz a ç ã o p o r d a n o s a m b ien tais.

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Meio ambiente Substituição


processual Extinção do contrato de concessão de serviço
público da demandante com o Poder Público no curso do
processo Ingresso da nova empresa concessionária
contratada Cabimento Intimação Admissibilidade
Proteção ao interesse público Manutenção do objeto da
ação Recurso provido.
Voto
Compulsando os autos, verifica-se que foi ajuizada a
presente ação civil pública pela ora agravante em período
que figurava como concessionária de serviço público,
almejando a recuperação ambiental e a reintegração de
posse devido a uma ocupação irregular de área que fora
declarada de utilidade pública para a formação de
reservatório artificial. No entanto, no transcurso do
processo, sobreveio a rescisão do contrato de
concessão, seguida de contratação de nova empresa
através de licitação. [...] A aludida Lei n° 8.987/95, ao
dispor sobre a concessão e prestação de serviços públicos,
estabelece que às concessionárias incumbe zelar pela
integridade dos bens ligados ao serviço que será prestado,
assim como que, quando houver extinção da concessão,
“haverá a imediata assunção do serviço pelo poder
concedente”, o que mostra a manutenção do interesse
público e a possibilidade de sua proteção pela agora
contratada. Diante do interesse coletivo que se está
buscando proteger, bem como considerando que são
diversas as ações envolvendo esta concessionária, ora
agravante, e incontroversa a legitimidade da empresa que
a substituiu, merece acolhimento o pedido de intimação
para seu ingresso no polo ativo da ação.45

C o m o se ev id en cia do ju lg ad o , acim a, obrigações relacio n ad as ao


o b jeto d a co ncessão, tais com o, g estão e co n serv ação das áreas n o entorno
d o reserv ató rio e, p o r conseguinte, eventual resp o n sab ilid ad e am biental p o r

45 TJSP - AI n° 2111969-64.2015.8.26.0000, Rel. Des. Álvaro Passos, 2a Câmara


Reservada ao Meio Ambiente. Julgamento em 17/09/2015.

270
recu p eração de p rejuízos ao m eio am b ien te o riundos d essas obrigações, são
tran sm itid o s ao co n cessio n ário sucessor, o que co n firm a a leg itim id ad e da
co n cessio n ária su cesso ra em substituição à sucedida.
O c o rre q u e em se tra ta n d o d e d a n o a m b ie n ta l, p a ra além dos
c o n c e ito s d e ato, d a n o e n e x o cau sal, a p lic a -se o e n te n d im e n to d o S T J
d e q u e as o b rig a ç õ e s a m b ie n ta is p o ssu e m n a tu re z a p r o p te r rem , p o d e n d o
se r c o b ra d a d o p ro p rie tá rio o u p o s s u id o r atu al e /o u d o s an terio res, à
e sc o lh a d o c re d o r (S ú m u la 623 d o S T J46).
A v a lia n d o o e n u n c ia d o em q u estão , R o b e rta J a rd im 47 esc la re c e
q u e as o b rig a ç õ e s p r o p te r re m e a re sp o n sa b ilid a d e civ il am b ie n ta l se
tra ta m d e in s titu to s d ife re n te s, v e z q u e n a re sp o n sa b ilid a d e civil
am b ie n ta l h á n e c e ssid a d e d e c o m p ro v a ç ã o d o d a n o e d o n e x o de
c a u s a lid a d e e n tre a a tiv id a d e e x e rc id a p e lo su je ito e o d a n o em q u estão ,
ao p a sso q u e o b rig a ç õ e s p r o p te r re m re c a e m em re la ç ã o ao b e m so b re o
q u al o titu la r d o d ire ito e x e rc e d o m ín io ex c lu siv o , m o tiv o p e lo q ual o
d o m ín io se m o stra im p re sc in d ív e l p a ra su a in c id ê n c ia .
Em ra z ã o disso, p a ra fin s d e tra n s m is s ã o d as o b rig a ç õ e s
a m b ie n ta is - d a d a a n a tu re z a p r o p te r re m - m a is q u e a sim p le s aferiçã o
d o s e le m e n to s c a ra c te riz a d o s d a re sp o n sa b ilid a d e civ il, h a v e ria q u e se
e sta b e le c e r d is tin ç õ e s em ra z ã o d o m o m e n to d a o c o rrê n c ia d o d a n o : se
a n tes o u d ep o is d a tra n s m is s ã o d o d ire ito real so b re a coisa.
Isto é, p ara d anos causados em im óvel antes de eventual alienação
do im óvel (ou tran sferê n cia d a co n cessão ) a o b rig ação d e restab elecer as
co n d içõ es d o im óvel é tran sm itid a ao adquirente. T odavia, n ão sendo
p o ssível a recu p eração do dan o e/ou se en ten d a p ela in d en ização

46 As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las


do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor.
47 MORAIS. Roberta Jardim. Obrigações Ambientais possuem natureza propter rem,
sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à
escolha do credor. In: Súmulas do STJ em Matéria Ambiental Comentadas. Org.
JACCOUD. Cristiane. GIL Luciana. MORAIS. Roberta Jardim. Londrina: Thoth, 2019.

271
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

co n co m itan tem en te48 (S ú m u la 629 do S T J49), essa eventual in d en ização é


d ev id a p elo p ro prietário anterior, v e z q u e a ob rig ação p ec u n iá ria tem p o r
fu n d a m e n to apenas a re sp o n sab ilid ad e civil am biental.
S itu a ção d ife re n te é q u a n d o o d a n o o c o rre ap ó s a a lien a ção , em
q u e a re s p o n sa b ilid a d e é d ire ta d a q u e le q u e p o ssu i o im ó v e l. P o r fim ,
te n d o o dano o c o rrid o p o r p ro p rie tá rio o u p o s s u id o r a n te rio r e,
tra n s m itid o a te rc e iro q u e n ã o o re c u p e ra e o tra n s fe re p a ra u m a q u a rta
p esso a , a re s p o n sa b ilid a d e é tra n sm itid a , se n d o ev e n tu a l in d e n iz a ç ã o
d e v id a p e lo c a u sa d o r d o d a n o .
E m se tra ta n d o d e c o n c e ssõ e s d e sa n e a m e n to b á sic o , a e q u a ç ã o
se to rn a a in d a m a is c o m p le x a : sa b e -se q u e p o d e m e x istir c a so s em q u e
e m b o ra o d a n o se ja c a u sa d o em ra z ã o d a p re sta ç ã o d e serv iç o , foi
p e rp e tra d o em im ó v e l d e te rc e iro (c u ja titu la rid a d e n ã o é n e m d o titu la r
a n te rio r d o se rv iç o - n o rm a lm e n te o P o d e r P ú b lic o - n e m p e lo n o v o
c o n c e s s io n á rio - a in ic ia tiv a p riv ad a ).
P a re c e q u e n e sse caso, as o b rig a ç õ e s a m b ie n ta is d e v e rã o ser
re g id a s a p e n a s p e la s re g ra s d a re sp o n sa b ilid a d e civil, sen d o n e c e ssá ria a
c o n firm a ç ã o d o d a n o e n e x o cau sal co m a c o n d u ta d o ag e n te . Isto é, se a
o b rig a ç ã o am b ie n ta l p r o p te r re m p a rte d o p re ssu p o sto d a e x istê n c ia de
u m d ire ito real so b re a co isa, so m e n te p o d e rá se r a p lic a d a n o s c a so s em

48 A hipótese de indenização mesmo na hipótese de recuperação ambiental tem origem na


interpretação do vocábulo “ou” do art. 3° da Lei de Ação Civil Pública como sendo aditivo,
e na abrangência do conceito de dano indenizável (dano interino/intermediário, dano moral
coletivo e dano residual), na forma do acórdão de relatoria do Ministro Herman Benjamin
(REsp 1.180.078/MG) norteada pela teoria da reparação integral dos danos ambientais, e a
dificuldade de se identificar os limites para tal reparação. Embora essa interpretação tenha
sido objeto de súmula pelo STJ, não é unanimidade na própria Corte, já que remanescem
decisões afirmando o cabimento de indenização na hipótese de impossibilidade de
regeneração total da área degradada. (DIAS. Patrícia Mendanha. GIL. Luciana. SANTOS.
Julia Bahera Rabinovici. Cumulatividade das obrigações de indenização e recuperação
ambiental. In: Súmulas do STJ em Matéria Ambiental Comentadas: um olhar
contemporâneo do direito ambiental no judiciário. Coordenadoras: GIL, Luciana.
JACCOUD. Cristiane. MORAIS. Roberta Jardim. Editora Thoth, 2019).
49 Quanto ao dano ambiental, é admitida a condenação do réu à obrigação de fazer ou
à de não fazer cumulada com a de indenizar.

272
q u e o d a n o é c a u sa d o a u m im ó v e l d e titu la r d o c o n c e ssio n á rio , sob p e n a
d e se d e s v irtu a r a a p lic a ç ã o d o in stitu to , tal qual v e rific a -s e d o v e rb e te
s u m u la r 623 d o S T J, e a c a b a re fle tin d o n a Ju risp ru d ê n c ia P á tria , j á q u e
o te m a está lo n g e d e se r p a c ific a d o o u firm a d o em p re m issa s co e ren tes.
D e n tre os ca so s a v a lia d o s p e lo Ju d ic iá rio , h á p re c e d e n te s com
fu n d a m e n to s c o m p le ta m e n te d istin to s, se ja p a ra a fa sta r a
re s p o n sa b ilid a d e d o n o v o c o n c e ssio n á rio , se ja p a ra c o n firm á -la .
E m 2 0 1 6 , n o â m b ito d o T R F d a 3a R e g iã o , sob re la to ria d a
D e se m b a rg a d o ra M ô n ic a N o b re , a le g itim id a d e p a ssiv a d a S A B E S P -
e n q u a n to c o n c e ssio n á ria d e se rv iç o p ú b lic o d e sa n e a m e n to - foi
c o n firm a d a d ia n te da n a tu re z a p r o p te r re m da re sp o n sa b ilid a d e
a m b ie n ta l, se n d o afirm a d o , a d ic io n a lm e n te , q u e o sim p le s fa to de, ap ó s
a ss u m ir o im ó v e l e o p a ssiv o , te r sid o o m itid o em su a re c u p e ra ç ã o , j á
se ria s u fic ie n te p a ra c a ra c te riz a r o n e x o causal:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ÁREA


DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DANO
AMBIENTAL. RECUPERAÇÃO. PRELIMINAR DE
ILEGITIMIDADE PASSIVA DA SABESP REJEITADA.
[...] A COMPANHIA DE SANEAMENTO BÁSICO DO
ESTADO DE SÃO PAULO - SABESP é parte legítima da
ação. Nesse sentido, quanto ao cometimento de danos
ambientais e ao dever de repará-los, tem-se que as obrigações
decorrentes de eventuais prejuízos ou interferências negativas
ao meio ambiente são propter rem, possuindo caráter
acessório à atividade ou propriedade em que ocorreu a
poluição ou degradação. Está claro que o
adquirente/possuidor é responsável pelo passivo ambiental do
imóvel adquirido. Caso contrário, a degradação ambiental
dificilmente seria reparada, uma vez que bastaria cometer-se
a infração e desfazer-se do bem lesado para que o dano
ambiental estivesse consolidado e legitimado, sem qualquer
ônus reparatório - Cabe reconhecer, na realidade, que o
simples fato de o novo proprietário/possuidor se omitir no que
tange à necessária regularização ambiental é mais do que
suficiente para caracterizar o nexo causal. Ademais, sua ação
ou omissão, além de não garantir a desejada reparação,

273
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

permitirá a continuidade do dano ambiental iniciado por


outrem. Daí, ser inegável sua responsabilidade civil. [...]50.

D e sta c a -se q u e n e sse ju lg a d o , h á c o n fu sã o e n tre os in stitu to s,


q u e são d istin to s, c o n fo rm e tra ta d o acim a. Isto é, se a tra n sm issã o fo sse
em ra z ã o d a o b rig a ç ã o se r p r o p te r re m em re la ç ã o ao im ó v el, o n e x o de
c a u s a lid a d e q u e se ria e x ig id o p a ra fin s d e re sp o n sa b iliz a ç ã o se ria a
a ssu n ç ã o d o im ó v e l e seu re sp e c tiv o d o m ín io , n ã o n e c e ssa ria m e n te a
p rá tic a e fe tiv a d o d a n o . Isto , é claro, a p e n a s em re la ç ã o à s o b rig a ç õ e s d e
re c u p e ra ç ã o , j á q u e n o a sp e c to d a in d e n iz a ç ã o (c a s o a re c u p e ra ç ã o n ã o
se ja v iá v e l), a re sp o n sa b iliz a ç ã o d e v e ria se r im p u ta d a ao seu ca u sad o r,
h ip ó te s e em q u e a c o n d e n a ç ã o d a S A B E S P d e v e ria se r a fa sta d a .
E ste foi o m e sm o e n te n d im e n to d o T R F d a 1a R e g iã o ao m a n te r
n o v a titu la r d o im ó v e l tra n sfe rid o p o r m e io d e T e rm o d e C e s s ã o d e U so
de A te rro S an itário . No ca so co n c re to , sob a R e la to ria do
D e se m b a rg a d o r K á ssio N u n e s, a p o ssu id o ra d o im ó v e l q u a n d o do
a ju iz a m e n to d a a ç ã o fo i m a n tid a em ra z ã o d a c o n tin u id a d e d a a g re ssã o
ao m e io a m b ie n te e d a e x istê n c ia d e p e d id o s a tu a is d e a b ste n ç ã o de
la n ç a m e n to d e e flu e n te s:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL


E AMBIENTAL. ATERRO SANITÁRIO. MANEJO DE
RECURSOS SÓLIDOS. PARCERIA PÚBLICO
PRIVADA. CHAMAMENTO AO PROCESSO DA
EMPRESA QUE FIRMOU TERMO DE CONCESSÃO
DE USO. POSSIBILIDADE. AGRAVO NÃO
PROVIDO. 1. A ação civil pública em questão versa
sobre responsabilidade ambiental pela poluição do corpo
hídrico identificado como Igarapé Sabino ou da Ribeira
e da faixa de manguezal que se interliga com a
comunidade de Tibiri, na capital do Estado do Maranhão,
os quais estão sendo afetados pelo lançamento de
efluentes provenientes do Aterro Sanitário da Ribeira. 2.

50 TRF-3 - ApCiv: 00061841620104036106 SP, Relator: DESEMBARGADORA


FEDERAL MÔNICA NOBRE, Data de Julgamento: 30/05/2019, QUARTA TURMA,
Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1, 18/06/2019.

274
Segundo o Município de São Luís, foi firmado Termo de
Concessão de Uso do Aterro da Ribeira com a SLEA
Engenharia Ambiental através do contrato n.° 46/2012,
pelo qual a empresa assumiu a responsabilidade pelo
manejo de recursos resíduos sólidos urbanos da cidade e
pela adequação recuperação e encerramento do Aterro da
Ribeira. 3. A empresa alega a inexistência de
responsabilidade sua na presente demanda,
argumentando que os documentos relativos ao dano
ambiental são prévios ao seu contrato e que eventual
responsabilização só poderia ocorrer caso houvesse
imputação de descumprimento do contrato. 4. A
agravante deve permanecer no polo passivo da demanda,
haja vista que a ação diz respeito não somente a danos
causados em período anterior a 2012, mas, ao contrário,
discute também sobre a continuidade da agressão ao meio
ambiente, tanto que um dos pedidos consiste na
abstenção de lançamento de poluentes. 5. Agravo de
instrumento a que se nega provimento.51

P o r fim , n o â m b ito d o T R F d a 4 a R e g iã o , em a n á lise d e d an o


tra n s fe rid o em ra z ã o d e c o n c e ssã o d e U s in a H id re lé tric a , sob re la to ria do
D e s. R o g é rio F a v re to , foi c o n firm a d a a le g itim id a d e p a ssiv a d e n o v a
c o n c e s s io n á ria d a U s in a sob o fu n d a m e n to d a o b rig a ç ã o p r o p te r rem ,
a in d a q u e e la n ã o te n h a ca u sa d o o dan o , sem p re ju íz o d a so lid a rie d a d e
e n tre o s v á rio s c a u sa d o re s d o d a n o .

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO


DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE
SENTENÇA. DANO AMBIENTAL. MATA CILIAR.
OBRIGAÇÃO PROPTER REM. NOVA
CONCESSIONÁRIA RESPONSÁVEL PELO
EMPREENDIMENTO. LEGITIMIDADE PASSIVA. - O
meio ambiente é um direito fundamental revestido da
efetividade da tutela constitucional ambiental, pelo que a
responsabilidade civil por danos ao meio ambiente
encontra respaldo nos arts. 37, § 6°, e 225, § 3°, da
Constituição Federal, art. 14, § 1°, da Lei n.° 6.938/81, art.

51 TRF-1 - AI: 00279182320144010000, Relator: Desembargador Federal Kassio Nunes


Marques, Data de Julgamento: 29/02/2016, Sexta Turma, Data de Publicação: 04/03/2016.

275
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

7° da Lei n.° 7.661/88, e art. 2°, § 1°, do Código Florestal,


e ostenta natureza objetiva e solidária, independentemente
de culpa, porquanto fundada nos princípios do poluidor-
pagador, da prevenção e da precaução. - Com esteio no
princípio da reparação integral do dano ambiental, deve o
dano ocasionado ao meio ambiente ser recuperado em sua
integralidade, mercê da proteção maior ao bem jurídico
meio ambiente ecologicamente equilibrado, mesmo diante
da eventual dificuldade de identificação do causador,
devendo-se escolher, entre todas as opções possíveis, por
aquela que mais possibilita alcança tal finalidade. - A
obrigação de recompor o meio degradado, inerente à
função socioambiental da propriedade, é propter rem e
acompanha o imóvel, podendo ser exigida da nova
concessionária responsável pelo empreendimento, ainda
que, pessoalmente, não tenha causado o dano ecológico,
sem prejuízo da solidariedade entre os vários causadores
do dano, sendo inviável qualquer alegação de direito
adquirido à degradação.52

D e ss e ju lg a d o , sa lie n ta -se q u e a p e sa r d e n ã o v e rs a r so b re
c o n c e ssã o re la tiv a ao sa n e a m e n to b á sic o , h á c o n fu sã o n ã o a p e n a s em
re la ç ã o ao in stitu to da o b rig a ç ã o p r o p te r re m e d as re g ra s da
re s p o n sa b ilid a d e civil a m b ie n ta l, c o m o d a p ró p ria so lid a rie d a d e em se
tra ta n d o d e d a n o am b ie n ta l, n o rm a lm e n te la stre a d a n o s su p ra c ita d o s
v e rb e te s su m u la re s 623 e 6 2 9 d a C o rte S u p erio r. T ra ta -se d e c o n ju g a ç ã o
d e fa to re s q u e n ã o é ra ro n o â m b ito d o s p le ito s em A ç õ e s C iv is P ú b lic a s,
e q u e ta m b é m p o d e rá se r a le g a d a p a ra p re te n sõ e s em fa c e fu tu ro s
c o n c e s s io n á rio s p o r d a n o s p re té rito s e j á e x iste n te s q u a n d o d a co n c e ssã o ,
o c a s io n a n d o g ra n d e in c e rte z a q u a n to ao s lim ite s d as o b rig a ç õ e s d as
c o n c e s s io n á ria s su c e sso ra s e su c e d id a s.
D e fato, n ã o se n e g a a n e c e ssid a d e d e q u e o m e io a m b ie n te
e q u ilib ra d o p a ra as p re se n te s e fu tu ra s g e ra ç õ e s se ja a lin h a n o rte a d o ra
d e ssa tip o d e ação, o q u e se q u estio n a , e n tre ta n to , é a d e tu rp a ç ã o de

52 TRF4, AG 5006762-02.2017.4.04.0000, Terceira Turma, Relator Rogerio Favreto,


juntado aos autos em 20/07/2017.

276
in s titu to s p a ra que, em q u a lq u e r c a so e in d e p e n d e n te m e n te d a e x istê n c ia
d e titu la rid a d e d e im ó v e l o u d e n e x o d e c a u sa lid a d e co m c o n d u ta
p ra tic a d a , se ja im p u ta d a ao c o n c e ssio n á rio atu al a re sp o n sa b ilid a d e p o r
d a n o s q u e n ã o cau so u , o q u e a p e n a s g e ra in s e g u ra n ç a ju ríd ic a e p o d e rá
d ific u lta r o u im p e d ir u m siste m a efetivo.

4 D E S A F I O S P A R A O S E T O R : id e n tif ic a ç ã o p r é v ia d e p a s s iv o s ,
d e lim ita ç ã o n o s in s t r u m e n t o s c o n t r a t u a i s e a n o v a le i d e lic ita ç õ e s

Em sín tese, d ia n te da c o m p le x id a d e dos re q u isito s da


re s p o n sa b ilid a d e civ il p o r d a n o a m b ie n ta l, p o d e -se d iz e r que, d o p o n to
d e v is ta a m b ie n ta l, os p rin c ip a is d e sa fio s p a ra a im p le m e n ta ç ã o das
c o n c e ssõ e s e stão re la c io n a d o s a id e n tific a ç ã o p ré v ia d o s p a ssiv o s
a m b ie n ta is (a n á lise ro b u s ta d o s ativ o s e risc o s p a ra e fe tiv a ç ã o do
n e g ó c io ), e a fix a ç ã o dos lim ite s da re sp o n sa b iliz a ç ã o dos
c o n c e s s io n á rio s p elo s p a ssiv o s d e v id a m e n te m ap ea d o s.
O p rim e iro d e sa fio d iz re sp e ito a a te n ç ã o d isp e n sa d a ao
m a p e a m e n to d o s risc o s a m b ie n ta is (p a s siv o s ) q u e e n v o lv e m o o b je to d e
c o n c o rrê n c ia p ú b lica.
N e s s e asp e cto , a d u e d ilig e n c e 53 p ré v ia à a ssu n ç ã o d o serv iç o
m o s tra -s e fu n d a m e n ta l p a ra in v e stig a ç ã o d as q u e stõ e s a m b ie n ta is,
e s p e c ia lm e n te suas c o n se q u ê n c ia s n a e x e c u ç ã o d a p re sta ç ã o d e serv iço ,
n ã o p o d e n d o se lim ita r à c o n fe rê n c ia d e lic e n ç a s/a u to riz a ç õ e s e a p o n ta r
e x is tê n c ia d e aç õ es civ is p ú b lic a s a m b ie n ta is e n v o lv id a s 54.

53 Auditoria em português. “No entanto, uma due diligence nada mais é do que uma
auditoria, uma investigação, uma análise detalhada da situação de uma empresa ou de
um projeto”. (VENTURA, Luiz Henrique. Contratos Internacionais: dicionário
jurídico bilíngue: português -inglês/ inglês-português: terminologia jurídica: modelos
de cláusulas e contratos. Edipro, 2011, p. 57).
54 A Lei Geral de Concessões (Lei 8.987/4995) nada trata sobre o tema, nem mesmo
sobre a necessária obtenção de licença ambiental para execução da obra/serviço público
pela concessionária. Somente com a edição da legislação sobre Parceria Público-
Privada (PPP), por meio da Lei n° 11.079/200454 que a emissão de licença e/ou a

277
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A p rá tic a, e n tre ta n to , e v id e n c ia que a m a io r p a rte das


c o n c e ssõ e s são p re c e d id a s d a sim p le s in c lu sã o em d a ta ro o m , q u a n d o
m u ito , d as lic e n ç a s e x iste n te s, aç õ es ju d ic ia is ou p ro c e d im e n to s
a d m in is tra tiv o s sa n c io n a tó rio s re fe re n te s ao se rv iç o .
E ntretanto, considerando o gran d e v olum e de serviços que serão
transferidos p ara a iniciativa p riv ad a e da enorm idade de passivos am bientais
envolvidos, é apenas pela realização de com plexa auditoria am biental prévia
ao ch am am en to público que poderão ser m inim izadas as chances de
“ surpresas” ao longo do procedim ento de licenciam ento am biental ou, até
m esm o, do desequilíbrio econôm ico-financeiro do contrato55.
Is s o p o rq u e , q u a lq u e r situ a ç ã o n ã o a v a lia d a p o d e im p lic a r n o
a tra so d e o b ten çã o , p o r ex e m p lo , d a lic e n ç a a m b ie n ta l p a ra a a tiv id ad e,
im p a c ta n d o no c ro n o g ra m a fin a n c e iro (a tra so no re c e b im e n to de
c o n tra p a rtid a p e c u n iá ria ), o c a sio n a n d o d e se q u ilíb rio e p leito s
a d m in is tra tiv o s e ju d ic ia is d e re c o m p o siç ã o d o c o n tra to 56.
N e ss e sen tid o , c o m o re fo rç o p a ra o e n fre ta m e n to d e sse p rim e iro d esafio ,
a n o v a L ei d e L ic ita ç õ e s n° 14.133, d e 1° d e ab ril d e 2 0 2 1 , p re v ê

expedição de diretrizes para o licenciamento do empreendimento, “sempre que o objeto


do contrato exigir”, foi incluída na legislação pertinente a temática das concessões. A
esse respeito: RIBEIRO, Maurício Portugal. Riscos Ambientais em Concessões e PPPs.
In: RIBEIRO, Maurício Portugal (org.). 20 anos da Lei de Concessões e 10 anos da
Lei de PPPs. Disponível em: file:///E:/artigo%20saneamento/Lei_PPP___Lei_Conces
soes_Prova03.indd.pdf. Acesso em: 27 set. 2020.
55 Equação econômico-financeira do contrato é a relação de adequação entre o objeto e
o preço, que deve estar presente ao momento em que se firma o ajuste. Quando é
celebrado qualquer contrato, inclusive o administrativo, as partes se colocam diante de
uma linha de equilíbrio que liga a atividade contratada ao encargo financeiro
correspondente. Mesmo podendo haver certa variação nessa linha, o certo é que no
contrato é necessária a referida relação de adequação. Sem ela pode dizer-se, sequer
haveria o interesse dos contratantes no que se refere ao objeto do ajuste. (CARVALHO
FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Atlas, 2014, p. 199).
56 A recomposição é o procedimento destinado a avaliar a ocorrência de evento que
afeta a equação econômico-financeira do contrato e promove adequação das cláusulas
contratuais aos parâmetros necessários para recompor o equilíbrio original. (JUSTEN
FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos.
Dialética, 2004, p. 389).

278
m o d ific a ç õ e s re la c io n a d a s ao p ro c e d im e n to d e lic e n c ia m e n to am b ie n ta l
d as co n c e ssõ e s, d e n tre elas, a n e c e ssid a d e de d e sc riç ã o de
p o s s ív e is im p a c to s a m b ie n ta is e re sp e c tiv a s m e d id a s m itig a d o ra s (e ta p a
p re lim in a r a lic ita ç ã o 57), q u e p o d e m a u x ilia r n a id e n tific a ç ã o d e risc o s
p a ra o n e g ó c io . T a m b é m em ra z ã o d isso , su rg e o se g u n d o d e sa fio p a ra
os n o v o s co n tra to s d e co n c e ssã o , c o n siste n te n a d e fin iç ã o e x p re ssa e
o b je tiv a d as re sp o n sa b ilid a d e s d o n o v o c o n c e ssio n á rio .
C o m re la ç ã o a e sse ú ltim o d esa fio , in c lu siv e , a n o v a L e i de
L ic ita ç õ e s a trib u iu a o P o d e r P ú b lic o , a o b rig a ç ã o d e o b te n ç ã o d e lic e n ç a
p ré v ia , “q u a n d o c a b ív e l”, a n tes d o edital, n a s c o n tra ta ç õ e s d e o b ra s e
se rv iç o s de e n g e n h a ria “ se m p r e ” que a re sp o n sa b ilid a d e p elo
lic e n c ia m e n to am b ie n ta l se ja d a a d m in istra ç ã o p ú b lic a 58. E , ain d a, caso
n ã o sejam c u m p rid a s o b rig a ç õ e s a m b ie n ta is a trib u ív e is à a d m in istra ç ã o
p ú b lic a re la c io n a d a s ao lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l, o c o n tra ta d o te m
d ire ito a re q u e re r a e x tin ç ã o d o c o n tra to 59.

57 Art. 18. A fase preparatória do processo licitatório é caracterizada pelo planejamento


e deve compatibilizar-se com o plano de contratações anual de que trata o inciso VII
do caput do art. 12 desta Lei, sempre que elaborado, e com as leis orçamentárias, bem
como abordar todas as considerações técnicas, mercadológicas e de gestão que podem
interferir na contratação, compreendidos: (...) § 1° O estudo técnico preliminar a que se
refere o inciso I do caput deste artigo deverá evidenciar o problema a ser resolvido e a
sua melhor solução, de modo a permitir a avaliação da viabilidade técnica e econômica
da contratação, e conterá os seguintes elementos: (...) XII - descrição de possíveis
impactos ambientais e respectivas medidas mitigadoras, incluídos requisitos de baixo
consumo de energia e de outros recursos, bem como logística reversa para desfazimento
e reciclagem de bens e refugos, quando aplicável;
58 Art. 115. (...) §4°. Nas contratações de obras e serviços de engenharia, sempre que a
responsabilidade pelo licenciamento ambiental for da Administração, a manifestação prévia
ou licença prévia, quando cabíveis, deverão ser obtidas antes da divulgação do edital. Esse
dispositivo havia sido vetado pelo Presidente da República, contudo, o Congresso Nacional
rejeitou o veto na sessão do dia 01/06/2021. Disponível em: https://www.congressonacional.
leg.br/materias/vetos/-/veto/detalhe/14085. Acesso em: 06 jun. 2021.
59 Art. 137. (...) § 2° O contratado terá direito à extinção do contrato nas seguintes
hipóteses: (...) V - não liberação pela Administração, nos prazos contratuais, de área,
local ou objeto, para execução de obra, serviço ou fornecimento, e de fontes de
materiais naturais especificadas no projeto, inclusive devido a atraso ou

279
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

N a d a ob stan te a im p o rtan te inovação, o tex to tro u x e circunstâncias


n ão esclarecid as que preju d icam a in terp retação d a n o rm a e/ou dep en d e de
reg u lam en tação : quais seriam as h ip ó teses a licen ça p ré v ia n ão seria cabível
(e sp ecialm en te co n sid eran d o o tex to do P L d a L ei geral d e L icenciam ento,
já co m en tad o aqui, é u m te m a to rm en to so ), quais as situações a
ad m in istração seria co n sid erad a a responsável pelo licen ciam en to ?
T ra ta -se d e q u e stio n a m e n to s, q u e p re c isa m se r re sp o n d id o s, até
p o rq u e , a lei ta m b é m p re v ê que o ed ital p o d e rá a trib u ir ao
c o n tra ta d o /c o n c e ssio n á rio a re sp o n sa b ilid a d e p e la o b te n ç ã o de
lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l60, e q u e o atra so d a lic e n ç a /im p o ssib ilid a d e de
o b tê -la 61, o c a s io n a a e x tin ç ã o d o c o n tra to 62.
A d ic io n a lm e n te , a lei in c lu iu o im p e d im e n to d a e x e c u ç ã o de
o b ra /se rv iç o , em ra z ã o d e a tra so n a c o n c lu sã o d e p ro c e d im e n to s
re la c io n a d o s ao lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l, “p o r c irc u n stâ n c ia s a lh e ia s a o
c o n tr a ta d o ” , c o m o situ a ç ã o p a ssív e l d e re e q u ilíb rio fin a n c e iro do
c o n tra to 63. M a is u m a v ez, a c o m p le ta in te rp re ta ç ã o d a n o rm a, d e p e n d e

descumprimento das obrigações atribuídas pelo contrato à Administração relacionadas


a desapropriação, a desocupação de áreas públicas ou a licenciamento ambiental.
60 Art. 25. O edital deverá conter o objeto da licitação e as regras relativas à convocação,
ao julgamento, à habilitação, aos recursos e às penalidades da licitação, à fiscalização
e à gestão do contrato, à entrega do objeto e às condições de pagamento. (...) § 5° O
edital poderá prever a responsabilidade do contratado pela: I - obtenção do
licenciamento ambiental.
61 Art. 137. Constituirão motivos para extinção do contrato, a qual deverá ser
formalmente motivada nos autos do processo, assegurados o contraditório e a ampla
defesa, as seguintes situações (...) VI - atraso na obtenção da licença ambiental, ou
impossibilidade de obtê-la, ou alteração substancial do anteprojeto que dela resultar,
ainda que obtida no prazo previsto.
62 BURMANN, Alexandre; DE BRITO, Felipe. Desenvolvimento nacional sustentável
e aspectos ambientais na Lei de Licitações. Revista Consultor Jurídico, 15 abr. 2021.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/2021-abr-15/burmann-brito-aspectos-
ambientais-lei-licitacoes. Acesso em: 06 jun. 2021.
63 Art. 124. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas
justificativas, nos seguintes casos: (...) II - por acordo entre as partes (...) d) para restabelecer
o equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato em caso de força maior, caso fortuito
ou fato do príncipe ou em decorrência de fatos imprevisíveis ou previsíveis de

280
d e m a io r e s c la re c im e n to so b re as e sp é c ie s d e c irc u n stâ n c ia s n ã o serão
c o n s id e ra d a s d e re sp o n sa b ilid a d e d o c o n c e ssio n á rio .
E m lin h a s g e r a is , a n o v a L e i d e lic ita ç õ e s c e r ta m e n te a ju d a
a d ir im ir d ú v id a s r e la c io n a d a s à re s p o n s a b ilid a d e p e lo lic e n c ia m e n to
a m b ie n ta l e seus d e s d o b r a m e n to s , no e n ta n to , c o n s id e r a n d o o
c e n á r io a tu a l, m esm os esses im p o r ta n te s d is p o s itiv o s , quando
v ig e n te s , não s o lu c io n a r ã o to d a s as q u e s tõ e s r e la tiv a s à
r e s p o n s a b iliz a ç ã o d o n o v o c o n c e s s io n á rio . I s s o p o rq u e , a lé m d a
d if ic u ld a d e de id e n tif ic a ç ã o dos r is c o s /p a s s iv o s a m b ie n ta is
e n v o lv id o s , d e v id o à p ró p r ia n a tu r e z a d o s im p a c to s e n v o lv id o s n a s
a tiv id a d e s d e s a n e a m e n to a m b ie n ta l, c o m o v is to , h á c r ité r io s em
a b e rto , q u e p r e c is a m d e e s c la r e c im e n to / re g u la m e n ta ç ã o .
A lé m d isso , a d e s p e ito d a s p o s s ív e is c o n trib u iç õ e s d a n o v a
L e i d e L ic ita ç õ e s , c o n s id e r a n d o a v a c a tio le g is d e 2 a n o s, o im p a c to
d e s s a s m o d ific a ç õ e s , s o m e n te p o d e r á se r p e r c e b id o n o s c e rta m e s
e d ita d o s , a p a r tir d e a b ril/2 0 2 3 .
Em s e n d o a ssim , e m b o ra se r e c o n h e ç a o e n te n d im e n to
ju r is p r u d e n c ia l d e q u e a c lá u s u la c o n tra tu a l so b re re s p o n s a b ilid a d e
n ã o v in c u la o P o d e r J u d ic iá r io q u e, c o n fo rm e v is to a n te rio rm e n te ,
p o d e r á e x ig ir d a s n o v a s c o n c e s s io n á ria s as m e d id a s p a r a c e s s a ç ã o d e
d a n o s , a d e lim ita ç ã o d e r e s p o n s a b iliz a ç ã o p e r m ite q u e a e m p re s a
p riv a d a a c io n e o P o d e r P ú b lic o e /o u te rc e iro s p a r a re s s a rc im e n to d o s
g a s to s e f e tiv a d o s c o m a s s u n ç ã o d e p a s s iv o a m b ie n ta l n ã o e n g lo b a d o
n o s a ju s te s d a c o n c e ssã o .

consequências incalculáveis, que inviabilizem a execução do contrato tal como pactuado,


respeitada, em qualquer caso, a repartição objetiva de risco estabelecida no contrato. (...) §
2° Será aplicado o disposto na alínea “d” do inciso II do caput deste artigo às contratações
de obras e serviços de engenharia, quando a execução for obstada pelo atraso na conclusão
de procedimentos de desapropriação, desocupação, servidão administrativa ou
licenciamento ambiental, por circunstâncias alheias ao contratado.

281
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

5 C O N S I D E R A Ç Õ E S F IN A I S

A s alte ra ç õ e s d o n o v o m a rc o d o sa n e a m e n to b á s ic o n o B ra sil, a
p a r d as a lte ra ç õ e s re g u la tó ria s em re la ç ã o ao s n o v o s co n tra to s de
co n c e ssã o , im p lic a m n a n e c e ssid a d e d e a te n ç ã o e sp e cial p e la s e m p re sa s
q u e p re te n d e m in g re s s a r n o m e rc a d o e n a s ro d a d a s d e lic ita ç ã o a c e rc a
d o s p a s s iv o s a m b ie n ta is q u e serão a ssu m id o s c o m a c o n c e ssã o .
E s p e c ia lm e n te p o rq u e , a s iste m á tic a d a re sp o n sa b iliz a ç ã o
am b ie n ta l d e lin e a d a p e lo a rc a b o u ç o d o u trin á rio e ju risp ru d e n c ia l
e sp o sa d o d e ix a c la ra q u e os c rité rio s d e re sp o n sa b ilid a d e civ il p o r d an o
am b ie n ta l são c o m p le x o s e im p lic a m n a p o ssib ilid a d e d e c o n d e n a ç ã o p o r
d a n o p re su m id o , in d e p e n d e n te m e n te d e o rig in a d o d e ato ilíc ito , b e m
c o m o ser tra n s fe rid o ao n o v o titu la r em ra z ã o d a e la stic id a d e d o c o n c e ito
d o n e x o ca u sal p e lo Ju d ic iá rio , b e m c o m o n a a p lic a ç ã o d e re g ra s d e
re s p o n sa b ilid a d e so lid ária, p r o p te r re m (S ú m u la 623 d a e. C o rte
S u p e rio r) e, ain d a, a c u m u la tiv id a d e d as o b rig a ç õ e s d e re p a ra r e
in d e n iz a r (S ú m u la 6 2 9 d o e. S T J) .
C o m isso, co n sid eran d o to d as as q u estões am b ien tais objeto de
g eren ciam en to pelo s n o v o s concessionários, tais co m o lan çam en to s de
esg o to in natura, co n tam in açõ es d e solo, ág u a e o lençol freático, d anos em
áreas esp ecialm en te protegidas, in clu in d o as A P P s e U C s, a sensibilidade
do seto r n ão está ad strita apenas à im p lan tação d a in fraestru tu ra p ara
ex ecu ção dos serviços públicos, m as a id en tificação dos p assiv o s
am b ien tais p rev iam en te existentes e n ão tratados, os quais serão passíveis
de ações im ed iatas d e recuperação, reg en eração ou indenização.
D e s s a fo rm a , p a ra o e n fre ta m e n to p e lo se to r d o s d e sa fio s
a m b ie n ta is d e m a n d a d o s p e la s c o n c e ssõ e s n a v ig ê n c ia d o N o v o M a rc o ,
m e sm o c o n s id e ra n d o as im p o rta n te s m o d ific a ç õ e s a d v in d a s c o m a n o v el
le g is la ç ã o d e lic ita ç õ e s, re v e la -se n e c e ssá ria a re fo rm u la ç ã o d o m o d u s
o p e r a n d i d o c o n tin g e n c ia m e n to d o s p a ssiv o s a m b ie n ta is, p o r m e io de
d u e d ilig e n ce, co m p le x a s, q u e p e rm itirã o a e la b o ra ç ã o /n e g o c ia ç ã o de

282
c lá u su la s c o n tra tu a is p a ra lim ita ç ã o d a re sp o n sa b iliz a ç ã o a m b ie n ta l n o
c a so a caso , sob p e n a d e in v ia b iliz a ç ã o d a e x e c u ç ã o d o p ro je to v e n c e d o r.

R E F E R Ê N C IA S

AMADO. F re d e ric o A u g u sto Di T rin d ad e . D ir e ito A m b ie n ta l


E s q u e m a tiz a d o . 2. ed. S ão P au lo : E d ito ra M é to d o , 2 0 1 1 . p. 3 4 6 -4 9 4 .

A N A ab re c o n su lta p ú b lic a so b re n o rm a d e re fe rê n c ia p a ra c o n trib u ir


p a ra o fim d o s lix õ es. G o v .b r , 17 m ar. 2021. D isp o n ív e l em :
h ttp s://w w w .g o v .b r/a n a /p t-b r/a ssu n to s/n o tic ia s-e -e v e n to s/n o tic ia s/a n a -
a b re -c o n su lta -p u b lic a -so b re -n o rm a -d e -re fe re n c ia -p a ra -c o n trib u ir-p a ra -
o -fim -d o s-lix o e s. A c e sso em : 06 ju n . 2021.

A N T U N E S . P a u lo d e B e ssa . D ir e ito A m b ie n ta l. 18a ed. rev ., atual. e


am p l. S ão P au lo : A tlas, 2 0 1 6 , p. 50 e 51.

B R A S IL . C o n stitu iç ã o RFB (1 9 8 8 ). C o n s titu iç ã o da R e p ú b lic a


F e d e r a l d o B r a s il d e 5 d e o u t u b r o d e 1988. B ra sília : P re s id ê n c ia d a
R e p ú b lic a , [1 988]. D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0
3 /c o n s titu ic a o /c o n stitu ic a o .h tm . A c e sso em : 13 set. 2020.

__________. L e i n° 6 .9 3 8 , d e 31 d e a g o s to d e 1981. P o lític a N a c io n a l do


M e io A m b ie n te . B ra sília : P re s id ê n c ia d a R e p ú b lic a , [1981]. D isp o n ív e l
em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /le is /L 6 9 3 8 .h tm . A c e sso em
13 set. 2 0 2 0 .

_________ . L e i n° 7.347, d e 24 d e ju lh o d e 1985. L ei de A ção Civil


Pública. B rasília: P residência d a R epública, [1985]. D isponível em: http://w
w w .planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7347orig.htm . A cesso em: 13 set. 2020.

283
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

__________. L e i n° 1 0 .4 0 6 , d e 10 d e j a n e i r o d e 2 0 0 2 . C ó d ig o C ivil.
B ra sília : P re s id ê n c ia d a R e p ú b lic a , [2002]. D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .
p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /le is/2 0 0 2 /L 1 0 4 0 6 c o m p ila d a .h tm . A c e sso em :
13 set. 2 0 2 0 .

__________. L e i n ° 1 4 .1 3 3 , d e 1° d e a b r il d e 2 0 2 1 . L ei d e L ic ita ç õ e s e
C o n tra to s A d m in istra tiv o s. B ra sília : P re s id ê n c ia d a R e p ú b lic a , [2021].
D is p o n ív e l em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /_ A to 2 0 1 9 -
2 0 2 2 /2 0 2 1 /L e i/L 1 4 1 3 3 .h tm # a rt1 9 3 . A c e sso em : 2 0 set. 2020.

__________. P o rta l N a c io n a l de L ic e n c ia m e n to A m b ie n ta l.
P ro c e d im e n to s d e L ic e n c ia m e n to A m b ie n ta l N o B rasil. D isp o n ív e l em :
h ttp ://p n la .m m a .g o v .b r/im a g e s/2 0 1 8 /0 8 /V E R S % C 3 % 8 3 O -F IN A L -E -
B O O K -P ro c e d im e n to s-d o -L in c e n c ia m e n to -A m b ie n ta l-W E B .p d f,
A c e sso em : 2 0 set. 2020.

_________ . S is te m a N a c io n a l d e In fo rm a ç õ e s s o b r e S a n e a m e n to . 2019.
D isponível em: http://w w w .snis.gov.br/painel-inform acoes-saneam ento-
brasil/w eb/painel-setor-saneam ento. A cesso em : 13 set. 2020.

__________. C â m a ra d o s D e p u ta d o s. P a r e c e r p r o f e r i d o e m P le n á r i o a o
PL n° 3 7 2 9 /2 0 0 4 . B ra sília : C â m a ra dos D e p u ta d o s, [2004].
D is p o n ív e l em : h ttp s://w w w .c a m a ra .le g .b r/p ro p o sic o e sW e b /p ro p _ m o st
ra rin te g ra ;js e s s io n id = n o d e 0 i1 d b g 6 9 tn 2 3 2 1 u r6 5 r5 e lie tw 1 4 0 0 0 6 8 1 .n o d e
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287
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

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R elator: C arlo s H e n riq u e P erp é tu o B raga. B e lo H orizonte, 24 de o u tu b ro de
2019, D J e , 31 out. 2019.

__________. __________ A C 1 0 6 7 2 9 8 0 1 7 0 3 7 3 0 0 2 /M G . R e la to r: M a rc e lo
R o d rig u e s. B e lo H o riz o n te , 17 d e m a rç o d e 2 0 2 0 . D J e , 18 m ar. 2020.

__________. __________ A C 1 0 6 7 2 9 8 0 1 7 0 3 7 3 0 0 2 /M G . R e la to r: M a rc e lo
R o d rig u e s. B e lo H o riz o n te , 17 d e m a rç o d e 2 0 2 0 . D J e , 18 m ar. 2020.

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M IL A R E , E d is; F R A N C O , R ita M a ria B o rg es. C o n c e ssã o e P a ssiv o s


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w w w .v a lo r.c o m .b r/le g isla c a o /6 2 4 6 3 0 1 /c o n c e sso e s-e -p a ssiv o s-
a m b ie n ta is . A c e sso em : 18 ju n . 2019.

M O R A IS . R o b e rta Jard im . O b rig a ç õ e s A m b ie n ta is p o ssu e m n a tu re z a


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JA C C O U D . C ristia n e. M O R A IS . R o b e rta Jard im . ( c o o r d ) . S ú m u la s d o
S T J e m M a t é r i a A m b ie n ta l C o m e n ta d a s : u m o lh a r c o n te m p o râ n e o do
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A C 0 1 1 1 1 8 8 3 8 2 0 1 4 4 0 2 5 1 0 1 /R J. R e lato r: A lu isio G o n ç a lv e s d e C a stro
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__________ __________ (6a T u rm a E sp e c ia liz a d a ). APELREEX


0 0 0 2 0 3 3 5 7 2 0 1 1 4 0 2 5 1 1 7 /R J. R e lato r: G u ilh e rm e C o u to d e C astro . D a ta
d e Ju lg a m e n to : R io d e Jan e iro , 13 d e fe v e re iro d e 2020.

R IO D E J A N E IR O (E stad o ). T rib u n a l d e J u stiç a d o E sta d o (3a C â m a ra


C ív el). A C 0 0 9 6 6 9 8 -1 2 .2 0 1 3 .8 .1 9 .0 0 0 1 . R elato r: D e s. R e n a ta M a c h a d o
C o tta. R io d e Jan e iro , 2 9 d e ju n h o d e 2016.

289
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

__________. ___________ (1 6 a C â m a ra C ív el). APL


0 2 7 9 8 7 4 9 6 2 0 1 0 8 1 9 0 0 0 1 . R e lato r: D e s(a). M a rc o A u ré lio B e z e rra d e
M elo . B ra sília , 18 d e fe v e re iro d e 2020.

R IO G R A N D E D O S U L (E stad o ). T rib u n a l d e J u stiç a d o E sta d o (9a


C â m a ra C ív el). 7 0 0 7 1 9 9 1 1 7 8 /R S , R e lato r: M ig u e l  n g e lo d a Silva.
P o rto A leg re, 2 2 d e fe v e re iro d e 2 0 1 7 . D J e , 02 m ar. 2017.

__________. __________ (21a C â m a ra C ív el). A p e la ç ã o e R eexam e


N e c e s s á r io , N ° 7 0 0 8 1 6 4 0 2 9 4 . R e lato r: M a rc e lo B a n d e ira P e re ira . P o rto
A leg re, 19 d e ju n h o d e 2019.

__________. T rib u n a l R e g io n a l F e d e ra l d a 4 a R e g iã o (3a T u rm a). A C


5 0 0 8 1 4 0 3 4 2 0 1 1 4 0 4 7 2 0 0 /S C R e la to r: M a rg a In g e B a rth T essler. P o rto
A leg re, 17 d e o u tu b ro d e 2017.

__________. __________ . (3a T u rm a). A G 5 0 0 6 7 6 2 -0 2 .2 0 1 7 .4 .0 4 .0 0 0 0 .


R e lato r: R o g e rio F a v re to . ju n ta d o ao s a u to s em 2 0 ju l. 2017.

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S A N T A C A T A R IN A (E stad o ). T rib u n a l d e J u stiç a d o E sta d o (1a


C â m a ra d e D ire ito P ú b lic o ). A C 0 9 0 0 4 4 8 2 0 2 0 1 5 8 2 4 0 0 2 0 /C ric iú m a .
R e lato r: P a u lo H e n riq u e M o ritz M a rtin s d a S ilva. F lo ria n ó p o lis, 10 de
m a rç o d e 2 0 2 0 .

S Ã O P A U L O (E stad o ). T rib u n a l d e J u stiç a d o E sta d o (1a C â m a ra


R e s e rv a d a ao M e io A m b ie n te ). A p e la ç ã o C ív e l 0143810­
5 8 .2 0 0 8 .8 .2 6 .0 0 0 0 . R elato r: T o rres d e C a rv a lh o . S ão P a u lo , 31 de
ja n e ir o d e 20 1 3 .

290
__________. __________ (1a C â m a ra R e se rv a d a ao M e io A m b ien te).
A p e la ç ã o C ív e l 0 1 4 3 8 1 0 -5 8 .2 0 0 8 .8 .2 6 .0 0 0 0 . R e lato r: T o rre s de
C arv a lh o . S ão P au lo , 31 d e ja n e ir o d e 2013.

__________. __________ (2a C â m a ra R e se rv a d a ao M e io A m b ien te).


A g r a v o d e I n s t r u m e n t o n° 2 1 1 1 9 6 9 -6 4 .2 0 1 5 .8 .2 6 .0 0 0 0 . R e lato r: D es.
Á lv a ro P a sso s. S ão P a u lo , 17 d e se te m b ro d e 2 0 1 5 .

__________. __________ (9a C â m a ra d e D ire ito P ú b lic o ). A p e la ç ã o C ív e l


0 0 0 2 2 6 8 -8 6 .2 0 1 2 .8 .2 6 .0 4 9 3 . R elato r: C a rlo s E d u a rd o P a c h i; S ão P au lo ,
18 d e m a io d e 2016.

__________. __________ (1a C â m a ra R e s e rv a d a ao M e io A m b ie n te )


0 0 0 6 0 6 0 6 2 2 0 0 8 8 2 6 0 5 6 6 /S P . R e lato r: N o g u e ira D ie fe n th a le r, D a ta de
Ju lg a m e n to : S ão P au lo , 05 d e abril d e 2 0 1 8 . D J e , 06 abr. 2018.

S Ã O P A U L O (Estado). Tribunal R egional F ederal d a 3a R egião (4a Turm a).


A p C iv 0 0 0 6 1841620104036106/S P , R elator: D es. F ederal M ô n ica N obre.
São P aulo, 30 de m aio de 2019 e -D JF 3 J u d ic ia l 1, 18 jun. 2019.

V E N T U R A , L u iz H e n riq u e . C o n tra to s In te rn a c io n a is : d ic io n á rio


ju ríd ic o b ilín g u e : p o rtu g u ê s-in g lê s/in g lê s-p o rtu g u ê s: te rm in o lo g ia
ju ríd ic a : m o d e lo s d e c lá u su la s e c o n tra to s. S ão P a u lo : E d ip ro , 2011.

291
EXTINÇÃO DO REGIME PÚBLICO DE PRESTAÇÃO DOS
SERVIÇOS DE SANEAMENTO BÁSICO & O DESAFIO DA
INDENIZAÇÃO DOS BENS REVERSÍVEIS

M a rc o s P a u lo M a rq u e s A raújo*

R E S U M O : O N M R S B p ro m o v e u a m ig ra ç ã o d o re g im e p ú b lic o p a ra
p riv a d o , sem d e fin ir a m o d e la g e m d a in d e n iz a ç ã o d o s b e n s re v e rsív e is
d e c o rre n te s d o s se rv iç o s fo rm a liz a d o s n o te m p o d o P L A N A S A . O
o b je tiv o d este artig o é e x a m in a r a tra n siç ã o e n tre e ste s re g im e s, e a p o n ta r
e stra té g ia s p a ra a su p e ra ç ã o d o d e sa fio in d e n iz a tó rio . A m e to d o lo g ia
u tiliz a d a fo i a re v isã o b ib lio g rá fic a . E s p e ra -s e c o n trib u ir p a ra o d e b a te
d e sta in d e n iz a ç ã o d o re g im e p ú b lico .

P a la v r a s - c h a v e s : S a n e a m e n to b ásico . R e g im e p ú b lico . R e g im e p riv ad o .


In d e n iz a ç ã o . B e n s re v e rsív e is.

A B S T R A C T : T h e N M R S B p ro m o te d th e m ig ra tio n fro m th e p u b lic to


th e p riv a te re g im e , w ith o u t d e fin in g th e m o d el fo r th e in d e m n ific a tio n o f
th e re v e rsib le asse ts re su ltin g fro m th e serv ic es fo rm a liz e d at th e tim e o f
P L A N A S A . T h e p u rp o se o f th is a rtic le is to e x a m in e th e tra n sitio n
b e tw e e n th e s e re g im e s, a n d to p o in t o u t stra te g ie s fo r o v e rc o m in g th e
in d e m n ity c h a lle n g e. T h e m e th o d o lo g y u se d w a s th e b ib lio g ra p h ic
re v ie w . It is e x p e c te d to c o n trib u te to th e d e b a te o n th is in d e m n ity fro m
th e p u b lic reg im e.

K e y w o rd s : S an itatio n . P u b lic reg im e. P riv a te reg im e. In d e m n ity .


R e tu rn a b le assets.

* Advogado; Assessor Jurídico junto à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro


(ALERJ). Mestre em Direito da Cidade (UERJ); Especialista em Direito da Administração
Pública (UFF); e, Especialista em Direito Ambiental Brasileiro (PUC-Rio).

293
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

S U M A R IO : 1 In tro d u ç ã o . 2 R e g im e p ú b lic o d a p re sta ç ã o d o s serv iç o s


d e sa n e a m e n to b á sic o a n te s d o a d v e n to d o n o v o m a rc o re g u la tó rio do
sa n e a m e n to b á sic o . 2.1 G e stã o A sso c ia d a . 2 .2 C o n v ê n io d e co o p e raç ão .
2.3 C o n tra to d e p ro g ram a. 3 A e x tin ç ã o d o re g im e p ú b lic o p a ra p re sta ç ã o
d o s se rv iç o s d e s a n e a m e n to b á sic o co m o a d v e n to d o n o v o m a rc o
re g u la tó rio d o sa n e a m e n to b ásico . 3.1 V e d a ç ã o à p re sta ç ã o p re c á ria dos
se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o p o r m e io d e co n tra to d e p ro g ra m a . 3.2
M a n u te n ç ã o d a v ig ê n c ia d o c o n tra to d e p ro g ra m a n a d a ta d a ed iç ã o do
novo m a rc o re g u la tó rio do sa n e a m e n to b á sic o . 4 O d e sa fio da
in d e n iz a ç ã o d o s b e n s re v e rsív e is n a tra n siç ã o d o re g im e p ú b lic o p a ra o
p riv a d o da p re sta ç ã o dos se rv iç o s de sa n e a m e n to b á sic o . 5
C o n s id e ra ç õ e s fin ais. R e fe rê n c ia b ib lio g rá fic a .

1 IN T R O D U Ç Ã O

O B ra sil a p re se n ta u m q u a d ro crític o n a g e stã o d o s se rv iç o s de


sa n e a m e n to b á sic o , e a p o p u la ç ã o so fre co m a a u sê n c ia d a c o b e rtu ra
d e ste s serv iço s. N e sta q u a d ra atu al, o c e n á rio p io ria, p o is a p o p u la ç ã o se
v ê im p a c ta d a p e lo risc o d a c o n ta m in a ç ã o p e lo n o v o c o ro n a v íru s
(C O V ID -1 9 ) dada a fa lta de ac e sso à água p a ra h ig ie n iz a ç ã o ,
e s p e c ia lm e n te os m e n o s a b a sta d o s re sid e n te s n a s p e rife ria s d as C id ad es
em c rise q u e n ã o são a te n d id o s p o r estes serviços.
O S iste m a N a c io n a l d e In fo rm a ç õ e s so b re S a n e a m e n to (S N IS ),
da S e c re ta ria N a c io n a l de S a n e a m e n to (S N S ), d o M in isté rio do
D e se n v o lv im e n to R e g io n a l, d a U n iã o , em seu D ia g n ó s tic o d o s S erv iço s
d e Á g u a e E s g o to s d e 2 0 1 8 1, ap o n ta, co m re sp a ld o n o c o n ju n to de
m u n ic íp io s c u jo s p re sta d o re s d e se rv iç o s re sp o n d e ra m ao S N IS , re le v a
q ue, n a m é d ia d o p aís, o ín d ic e de a te n d im e n to co m re d e de

1 BRASIL - Ministério do Desenvolvimento Regional - Secretaria Nacional de


Saneamento - Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNS.): 24°
Diagnóstico dos Serviços de Água e Esgotos - 2018. Brasília: SNS/MDR, 2019.

294
a b a ste c im e n to d e á g u a é d e 8 3 ,6 % , e n q u a n to o ín d ic e d e a te n d im e n to
to ta l c o m re d e p a ra c o le ta d e e sg o to a m é d ia d o p a ís é d e 53,2% .
E m re la ç ã o ao in d ic a d o r m é d io n a c io n a l d e tra ta m e n to de
esg o to s, q u e re p re se n ta a p a rc e la d o s e sg o to s g e ra d o s q u e é tra ta d a a
p a rtir d o v o lu m e d e á g u a co n su m id o , o ín d ic e é d e 4 6 ,3 % . P o r o u tro lado,
o ín d ic e m é d io d e tra ta m e n to d o s esg o to s c o le ta d o s, q u e re p re se n ta a
p a rc e la d o v o lu m e d e esg o to s tra ta d o s em re la ç ã o ao v o lu m e d e esg o to s
co leta d o , é d e 74,5% .
N o to c a n te à g e stã o d o s re síd u o s só lid o s, o S N IS , p o r m e io do
D ia g n ó s tic o d o M a n e jo d e R e síd u o s S ó lid o s U rb a n o s d e 2 0 1 8 2, a p o n ta
q ue, em 2 0 1 8 , o p a ís c o n ta v a co m 7 5 ,6 % d e a te rro s san itá rio s p a ra u m
to ta l d e 5 .5 7 0 M u n ic íp io s b ra sile iro s, e n q u a n to os lix õ e s re p re se n ta v a m
13% , e os a te rro s c o n tro la d o s 11,4% . E ste s ú ltim o s, os aterro s
co n tro la d o s, são, n a v e rd a d e , lix õ e s q u e re c e b e m u m a p rim o ra m e n to
té c n ic o co m co b e rtu ra.
A so lu ção p a ra superação deste desafio adveio com a edição da
L ei F ed eral n.° 14.026, de 15 de ju lh o de 2020, d esig n ad a de N o v o M arco
R eg u lató rio do S aneam ento B ásico (N M R S B ), que realizo u a
re co n fig u ração d a g estão dos serviços de saneam ento b ásico m ed ian te a
ad o ção de u m p ro cesso d e d esregulação, flex ib ilização e lib eralização com
v ista à co m m o tização destes serviços p a ra assen tar o im p erativ o do capital.
E m d e sd o b ra m e n to d isto , o N M R S B p ro m o v e u a e x tin ç ã o do
re g im e p ú b lic o d e p re sta ç ã o d o s se rv iç o s d e s a n e a m e n to b á sic o , que, até
en tão , vig ia, sem , p o ré m , a sse g u ra r g a ra n tia s m ín im a s p a ra a tra n siç ã o
p a ra o re g im e p riv a d o d a p re sta ç ã o d estes serv iç o s, in c lu s a a in d ic a ç ã o
d e re g ra s c la ra s so b re o p a ssiv o d as in d e n iz a ç ã o p e lo s b e n s re v e rsív e is
q u e fo ra m c o n stitu íd a s n a é p o c a d o P la n o N a c io n a l d e S a n e a m e n to

2 BRASIL - Ministério do Desenvolvimento Regional - Secretaria Nacional de Saneamento


(SNS) - Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS): Diagnóstico do
Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos - 2018. Brasília: SNS/MDR, 2019.

295
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

B á s ic o (P L A N A S A ); o que, in v a ria v e lm e n te , a c a b o u p o r e n se ja r
q u e s tio n a m e n to ju n to ao E g ré g io S u p re m o T rib u n a l F e d e ra l (E. S T F)..
N e ste c o n tex to , é fu n d a m e n ta l re v is ita r a a rq u ite tu ra ju ríd ic a do
re g im e p ú b lic o d e p re sta ç ã o dos se rv iç o s de sa n e a m e n to b á sic o
a ss e n ta d a n a g e stã o a sso c ia d a n o v ié s d o c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o
a g re g a d o ao c o n tra to d e p ro g ram a. P o r c o n se g u in te , fa z -se n e c e ssá rio
a fe rir as re g ra s d e b a rre ira im p o sta s, p e lo N M R S B , p a ra e n c e rra r este
re g im e p ú b lic o sem a d e v id a tra n siç ã o ; o que, re p ita -se , so fre
c o n te s ta ç ã o ju d ic ia l. P o r fim , n ã o se p o d e d e ix a r d e a p re se n ta r o d e sa fio
im p o s to p e la in d e n iz a ç ã o p e lo s b e n s re v e rsív e is d a p re sta ç ã o p re c á ria
q u e ad v é m d e sd e a é p o c a d o P L A N A S A .
O u tro ssim , e sp e ra -se q u e este tra b a lh o p o ssa c o n trib u ir p a ra o
in íc io d e re fle x õ e s, d e b a te s e d isc u ssõ e s crític a s a re sp e ito d a tra n siç ã o
do re g im e p ú b lic o p a ra o p riv a d o e s ta b e le c id o p e lo NM RSB,
e s p e c ia lm e n te o d e sa fio d o p a g a m e n to d as in d e n iz a ç õ e s d o s b e n s
re v e rsív e is. E s te é o d e sa fio d o p re se n te trab a lh o . 2

2 R E G IM E P Ú B L IC O D A P R E S T A Ç Ã O D O S S E R V IÇ O S D E
S A N E A M E N T O B Á S IC O A N T E S D O A D V E N T O D O N O V O
M A R C O R E G U L A T Ó R I O D O S A N E A M E N T O B Á S IC O

2.1 G e s tã o A s s o c ia d a

A g e s tã o a sso c ia d a co n stitu i fo rm a d e c o o p e ra ç ã o fe d era tiv a,


q u e b u s c a im p le m e n ta r, p e la v ia d a c o n se n su a lid a d e , as a tiv id a d e s de
g e s tã o dos se rv iç o s p ú b lic o s, isto é, p la n e ja m e n to , re g u la ç ã o ,
fis c a liz a ç ã o e p re sta ç ã o d e se rv iç o s p ú b lic o s, p o d e n d o se r a c o m p a n h a d a
ou não d a tra n sfe rê n c ia , to ta l ou p a rcial, d e e n c a rg o s, serv iç o s
ad m in istra tiv o s, p e sso a l o u b e n s a tin e n te s ao s se rv iç o s p ú b lico s.
A g e s tã o a sso c ia d a te m sed e c o n stitu c io n a l n o art. 2 4 1 , d a
C o n s titu iç ã o d a R e p ú b lic a F e d e ra tiv a d o B ra sil d e 1988 (C R F B /1 9 8 8 ),
c u ja re d a ç ã o fo i a lte ra d a p e la E m e n d a C o n stitu c io n a l n.° 19/1998 (E C n.

296
°19/98). E ste d isp o sitiv o c o n stitu c io n a l te v e a su a e fic á c ia in te g ra d a p e la
L e i F e d e ra l n.° 11.107, d e 06 d e abril d e 2 0 1 5 , L e i d e C o n só rc io s
P ú b lic o s (L C P ), que, p o r su a v ez , foi re g u la m e n ta d a p e lo D e c re to
F e d e ra l n.° 6 .0 1 7 , d e 17 d e ja n e ir o d e 2007.
O D e c re to F e d e ra l n.° 6 .0 1 7 /2 0 0 7 , em seu art. 2°, inc. IX ,
c o n c e itu a a g e stã o a sso c ia d a d e se rv iç o s p ú b lic o s d a se g u in te form a:

exercício das atividades de planejamento, regulação ou


fiscalização de serviços públicos por meio de consórcio
público ou de convênio de cooperação entre entes
federados, acompanhadas ou não da prestação de serviços
públicos ou da transferência total ou parcial de encargos,
serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos
serviços transferidos.

E m u m v ié s v o lta d o p a ra os se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , o
inc. IX , d o art. 2°, d o D e c re to F e d e ra l n .°7 .2 1 7 , d e 21 d e ju n h o d e 2 0 1 0 ,
q u e re g u la m e n to u a L ei F e d e ra l n .°1 1 .4 4 5 , d e 05 d e ja n e ir o d e 2 0 0 7 , L ei
D ire triz e s N a c io n a is d e S a n e a m e n to B á sic o (L D N S B ), d e fin e a g e stã o
a ss o c ia d a c o m o “a sso c ia ç ã o v o lu n tá ria d e e n te s fe d e r a d o s , p o r c o n v ê n io
d e c o o p e r a ç ã o o u c o n só rc io p ú b lic o , c o n fo rm e d is p o s to n o art. 2 4 1 d a
C o n s titu iç ã o ” . In te re ssa -n o s, p a ra os fin s d e ste item , d o p re se n te
tra b a lh o , o e x a m e e strito e o b je tiv o d a g e stã o a sso c ia d a c o n c re tiz a d a p e la
v ia d o c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o a g re g a d o ao c o n tra to d e p ro g ra m a , que,
ju n to s , c o n fo rm a m o re g im e ju ríd ic o p ú b lic o d a p re sta ç ã o d o s serv iç o s
d e sa n e a m e n to b ásico .
Im p o rtan te ressaltar q u e a L ei F ederal n.°14.026, de 15 de ju lh o de
2020, d esig n ad a de N o v o M arco R eg u lató rio do S aneam ento B ásico
(N M R S B ), p ro m o v eu u m a re co n fig u ração d a g estão dos serviços de
san eam en to b ásico p ara su a d esregulação, flex ib ilização e lib eralização com
v ista à co m m o tização destes serviços p a ra aten d er ao im p erativ o

297
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

extrativ ista3. C o m isso, o N M R S B realizo u u m a p ro fu n d a alteração n ão só


n a L D N S B , m as tam b ém em outras políticas p ú b licas intersetoriais q u e são
influ en ciad as, e in flu en ciam o san eam en to básico, a ex em p lo d a L C P.

2 .2 C o n v ê n io d e c o o p e r a ç ã o

A n te s d o a d v e n to d o N M R S B , o co n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o n ão
tin h a sid o o b je to d e ta lh a m e n to p e la L C P , q u e só fe z re fe rê n c ia a este
in s tru m e n to d e c o o p e ra ç ã o fe d e ra tiv a n o s §4° até §6°, d o art. 13, d a L C P .
O D e c re to F e d e ra l n.° 6 .0 1 7 /2 0 0 7 , além d e te r re ite ra d o o p a rc o
d e lin e a m e n to leg al e x p re sso n a L C P a re sp e ito d o c o n v ê n io de
c o o p e ra ç ã o (arts. 31, §1° e §2°; e, 34, d o D e c re to F e d e ra l n.° 6 .0 1 7 /2 0 0 7 ),
e sta b e le c ia q u e este in stru m e n to ju ríd ic o “ n ã o p r o d u z ir á e fe ito s e n tre o s
e n te s d a F e d e r a ç ã o c o o p e ra n te s q u e n ã o o te n h a m d isc ip lin a d o p o r lei"
(art. 31, §4°, d o D e c re to F e d e ra l n.° 6 .0 1 7 /2 0 0 7 ).
N e ste c o n tex to , o inc. V III, d o art. 2°, d o D e c re to F e d e ra l n°
6 .0 1 7 /2 0 0 7 d e fin ia o c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o c o m o o “p a c to fir m a d o
e x c lu s iv a m e n te p o r e n te s d a F e d e r a ç ã o , co m o o b je tiv o d e a u to r iz a r a
g e s tã o a s s o c ia d a de s e rv iç o s p ú b lic o s , d e sd e que r a tific a d o ou
p r e v ia m e n te d isc ip lin a d o p o r le i e d ita d a p o r c a d a u m deles"".
T ra ta v a-se , assim , d e a c o rd o a d m in istra tiv o q u e c o n c re tiz a v a a
re la ç ã o ju ríd ic a e n tre os e n tes p o lític o s co m a d e fin iç ã o d as p re rro g a tiv a s
e d ev eres. C o m isso , a s s e g u ra v a -se a c o n v e rg ê n c ia d e in te re sse s em p ro l
d a g e stã o d e se rv iç o p ú b lic o p ro p ria m e n te dito, sem , p o ré m , a c a rre ta r a
fo rm a ç ã o d e n o v a p e sso a ju ríd ic a .

3 Trata-se, como pode-se compreender do pensamento de BAUMAN, de uma estratégia


de derretimento dos “sólidos" para dar espaço para os “líquidos”, a fim de soltar o freio
econômico do setor de saneamento básico com sua liberação e flexibilização para
atender ao nexo do capital liberal e extrativista. Esta estratégia envolve, ainda, a
conformação do pensamento da sociedade líquida para um viés unitarista que dê a
impressão que a liberação do setor de saneamento constitui novos líquidos, mas, na
verdade, continuam o mesmo sólidos reconfigurado pelo liberalismo. BAUMAN,
Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001, p. 7 até 11.

298
A s u ste n ta b ilid a d e ju ríd ic a e in stitu c io n a l d o c o n v ê n io de
c o o p e ra ç ã o e ra a lc a n ç a d a m e d ia n te o d isc ip lin a m e n to , p o r lei, d a su a
m o d e la g e m p o r c a d a e n te p o lític o c o n v e n e n te , sob p e n a d e n ã o serem
p ro d u z id o s o s e feito s n o o rd e n a m e n to ju ríd ic o . A in d a q u e n ã o h o u v e sse
le g is la ç ã o d e re fe rê n c ia d o c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o e d ita d a p elo s
co n v e n e n te s, era m a is d o q u e re c o m e n d á v e l, que, d e p o is d a su a
m o d e la g e m a p a rtir d a c o n v e rg ê n c ia d e v o n ta d e d e sse s c o n v e n e n te s,
h o u v e sse , p e lo m e n o s, a ra tific a ç ã o p e lo L e g isla tiv o , p o ssib ilita n d o a
a d e sã o fo rm a l e e x p re ssa d e c a d a c o n v e n e n te em p ro l d a g e stã o
a ss o c ia d a d o s se rv iç o s p ú b lico s.
O N M R S B in clu i o §4° ao art. 1°, d a L C P , q u e p a ssa a p re v e r
q u e “a p lic a m -se a o s c o n v ê n io s d e co o p e ra çã o , n o q u e couber, a s
d is p o s iç õ e s d e s ta L e i re la tiv a s a o s c o n só r c io s p ú b lic o s ” .
C o m p le m e n ta rm e n te , o §4°, d o art. 8°, d a L D N S B co m a
re d a ç ã o d a d a p e lo N M R S B p re v iu q u e os C h e fe s d o E x e c u tiv o p o d e rã o
fo rm a liz a r a “g e s tã o a ss o c ia d a p a r a o e x e rc íc io d e fu n ç õ e s r e la tiv a s a o s
s e r v iç o s p ú b lic o s d e s a n e a m e n to básico, f ic a n d o d isp e n sa d a , em c a so d e
c o n v ê n io d e c o o p e ra çã o , a n e c e ssid a d e d e a u to riza ç ã o le g a l” .
P o r co n se g u in te , o N M R S B c o n fe riu n o v a re d a ç ã o ao §2°, do
art. 11, d a L C P p a ra sin a liz a q u e a “ r e tir a d a o u a e x tin ç ã o d e c o n só rc io
p ú b lic o o u c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o n ã o p r e ju d ic a r á a s o b r ig a ç õ e s já
c o n stitu íd a s, in c lu siv e o s co n tra to s, c u ja e x tin ç ã o dependerá do
p a g a m e n to d a s in d e n iza ç õ e s e v e n tu a lm e n te d e v id a s ” .
P e rc e b e -se , assim , q u e o N M R S B re c o n fig u ro u in te g ra lm e n te o
c o n v ê n io de c o o p e ra ç ã o co m o seu e sv a z ia m e n to p e la v ia da
d e sreg u laçã o .
T u d o le v a a c re r q u e o c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o c o n tin u a a
e n se ja r u m a c o n v e rg ê n c ia d e in te re sse s em p ro l d a g e stã o d e serv iç o
p ú b lic o p ro p ria m e n te d ito; o q u e n ã o p o d e ria ser d iferen te, em ra z ã o d a
c la ra p re v is ã o c o n stitu c io n a l p re v ista n o art. 2 4 1 , d a C R F B /1 9 8 8 .
P o r u m lado, a e q u ip a ra ç ã o d o c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o ao
c o n só rc io p ú b lic o em sed e d a L C P p o d e re p re s e n ta r u m av a n ço , v e z q u e

299
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

o c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o p a sso u a co n tar, n o q u e co u b e r, co m u m a
m o d e la g e m m ín im a e sta b e le c id a n o art. 4°, d a L C P , in c lu s a as
re s p o n sa b ilid a d e s e d ire ito s d o s p a rtíc ip e s. D e o u tro , o c o n v ê n io de
c o o p e ra ç ã o p e rd e em se g u ra n ç a ju ríd ic a , p o sto q u e n ã o d etém m a is a
ra tific a ç ã o leg islativ a.
A d e m a is, o c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o , ao c o n trá rio d o co n só rc io
p ú b lic o , p e rm a n e c e , sa lv o m e lh o r ju íz o , a n ã o e n se ja r a fo rm a ç ã o d e u m a
p e s s o a ju ríd ic a , em ra z ã o d o a fa sta m e n to d a ra tific a ç ã o leg al q u e é u m
p re s su p o s to esse n c ia l p a ra a fo rm a ç ã o d o c o n so rc ia m e n to .
R e p a re -se q u e a re d a ç ã o o rig in a l d o §2°, d o art. 11, d a L C P se
re feria , so m en te, a c o n tin u id a d e d as o b rig a ç õ e s d e c o rre n te s d o c o n tra to
d e p ro g ra m a , a in d a q u e h o u v e sse a e x tin ç ã o d o co n só rcio . A g o ra , o
té rm in o d o c o n só rc io o u d o c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o n ã o p re ju d ic a m ais
as o b rig a ç õ e s d e c o rre n te s d as re la ç õ e s c o n tra tu a is p riv a d a s c o n stitu íd a s
n a v ig ê n c ia d e ste s in stru m e n to s. E m ca so d o té rm in o d o c o n tra to p riv a d o
co m a v ig ê n c ia e ste n d id a , d e v e -se p ro m o v e r o p a g a m e n to das
in d e n iz a ç õ e s ex ig ív eis.
O c o rre q u e a re la ç ã o e sta b e le c id a e n tre o c o n só rc io o u o
c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o co m o c o n tra to d e p ro g ra m a te m sede
c o n stitu c io n a l p o r m e io d a g e stã o asso c ia d a, e n se ja n d o , assim , u m a
re la ç ã o p ú b lic o -p ú b lic o . P o rta n to , o té rm in o d o c o n só rc io p ú b lic o o u do
c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o n ã o te m o c o n d ã o d e e sv a z ia r e sta re la ç ã o
p ú b lic o -p ú b lic o , q u e p o d e ria p e rm a n e c e r p o r in te rm é d io d o co n tra to de
p ro g ra m a , q u e, co m o será v isto ad ian te , e n se ja c o n tra ta ç ã o d ireta.
E s ta ló g ica, p o ré m , p a re c e n ã o se a p lic a r ao s c o n tra to s p riv ad o s.
P rim e iro , a fo rm a liz a ç ã o d e ste s c o n tra to s p re ssu p õ e p ré v ia lic ita ç ã o p a ra
a fo rm a ç ã o d e u m a re la ç ã o p ú b lic o -p riv a d a . S e g u n d o o e n c e rra m e n to d a
re la ç ã o d e o rig e m a c a rre ta in v a ria v e lm e n te o té rm in o d o co n tra to
p riv ad o . T o m e -se c o m o e x e m p lo o ca so d e u m c o n só rc io p ú b lic o q u e
c o n c e d e a p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s d e u m c o m p le x o d e tra ta m e n to de
re s íd u o s só lid o s. E x tin to o c o n só rc io , o c o n tra to d e c o n c e ssã o d e v e rá ser
e n c e rra d o , sob p e n a d e in sta la r-se u m a re la ç ã o p re c á ria sem a p ré v ia

300
lic ita ç ã o ; o q u e v io la d o art. 175, d a C R F B /1 9 8 8 . A n o v a re d a ç ã o d o §2°,
d o art. 11, d a L C P , d a d a p e lo N M R S B p arece , sa lv o m e lh o r ju íz o , q u e re r
v a lid a r e ste s tip o s d e situ açõ es.

2 .3 C o n t r a t o d e p r o g r a m a

O art. 13, §1° até §6°, d a L C P d e lin e ia a fo rm a d o c o n tra to de


p ro g ra m a , q ue, p o r su a v ez, foi o b je to d e d e ta lh a m e n to p e lo D e c re to
F e d e ra l n.° 6 .0 1 7 /2 0 0 7 , e s p e c ia lm e n te d o art. 30 até art. 36.
O art. 2°, inc. X V I, d o D e c re to F e d e ra l n.° 6 .0 1 7 /2 0 0 7 re ite ra o
d is p o s to n o art.1 3 , c a p u t, d a L C P e, m a is d o q u e isso , c o n c e itu a o
co n tra to d e p ro g ra m a c o m o o “ in stru m e n to p e lo q u a l d e v e m se r
c o n s titu íd a s e r e g u la d a s a s o b rig a ç õ e s q u e u m e n te d a F e d e ra ç ã o ,
in c lu s iv e s u a a d m in istra ç ã o in d ireta , te n h a p a r a co m o u tro en te d a
F e d e ra ç ã o , o u p a r a co m c o n só rc io p ú b lic o , n o â m b ito d a p r e s ta ç ã o d e
s e r v iç o s p ú b lic o s p o r m e io d e c o o p e ra ç ã o fe d e r a tiv a ” .
A p a rtir d a a n á lise d o c o n c e ito leg al d o c o n tra to d e p ro g ra m a ,
fic a c la ro q u e a fo rm a liz a ç ã o d e sse co n tra to , c u jo o b je to é a p re sta ç ã o de
u m se rv iç o p ú b lic o , p re ssu p õ e a p ré v ia in sta la ç ã o d o a m b ie n te de
c o o p e ra ç ã o fe d e ra tiv a , se ja m e d ia n te c o n tra ta ç ã o d e c o n só rc io p ú b lic o
se ja p o r m e io d e fo rm a liz a ç ã o d e c o n v ê n io d e c o o p e raç ão .
O c o n tra to d e p ro g ra m a p o d e rá te r c o m o p a rte s as in stâ n c ia s
q u e seg u e m atre la d a s o ra ao c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o o ra ao c o n só rc io
p ú b lic o (a rt.1 3 , c a p u t, e §5°, d a L C P ; e, arts. 2°, incs. X V I, 30, c a p u t e
31, §1°, d o D e c re to F e d e ra l n.° 6 .0 1 7 /2 0 0 7 ), a saber:

> Q u a n d o fo r fo rm a liz a d o o c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o , p o d e rã o ser


p artíc ip e s: (1 ) e n tes p o lític o s co n v e n ia d o s; (2 ) e n te p o lític o
c o n v e n ia d o co m e n tid a d e d a A d m in istra ç ã o P ú b lic a in d ire ta
q u e in te g re e n te p o lític o c o n v e n ia d o ; ou, (3 ) e n tid a d e s d a
A d m in istra ç ã o P ú b lic a in d ire ta que p e rte n ç a m ao s en tes
p o lític o s c o n v e n ia d o s; e,

301
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

> Q u an d o fo r re alizad a a co n tratação d e consórcio público, as partes


serão: (1) entes p olíticos consorciados; (2) consórcio p ú b lico com
ente p o lítico consorciado; (3) consórcio p ú b lico com en tid ad e da
A d m in istraçã o P ú b lic a in d ireta que in teg re ente político
co nsorciado; (4) ente po lítico co n so rciad o com entidade d a
A d m in istraçã o P ú b lic a in d ireta q u e p erten ça a ente político
co nsorciado; ou, (5) entidades d a A d m in istraçã o P ú b lic a in d ireta
q u e in teg rem entes p olíticos co n so rciados.

O c o n tra to d e p ro g ra m a , p o r p re ssu p o r a su a fo rm a liz a ç ã o em


a m b ie n te d e g e stã o a sso c ia d a m a te ria liz a d a p o r c o n só rc io p ú b lic o o u p o r
c o n v ê n io de c o o p e ra ç ã o , e sta b e le c e um v ín c u lo que g e ra um a
c o n v e rg ê n c ia d e in te re sse s c o m u n s, em q u e as p a rte s e sta b e le c e m , em
re g im e co n tra tu a l d e d ire ito s e o b rig a ç õ e s re c íp ro c o s, m e ta s p a ra o
a lc a n c e d e sse s in te re sse s. “P e la s u a fis io n o m ia e p e lo s f i n s a q u e se
p r e o r d e n a , o c o n tra to d e p r o g r a m a o s te n ta a n a tu re za ju r íd ic a d e a ju s te
d e c a r á te r c o o p e ra tiv o , à s e m e lh a n ç a d a n a tu r e z a q u e ta m b é m q u a lific a
o s c o n v ê n io s e o u tro s n e g ó c io s ju r íd ic o s a n á lo g o s'’"4.
A fo rm a liz a ç ã o d o c o n tra to d e p ro g ra m a e n tre os e n tes p o lític o s
e /o u as e n tid a d e s d a A d m in istra ç ã o P ú b lic a in d ire ta d e sse s e n tes n ão
p re c is a rá se r p re c e d id a d e p ré v io p ro c e sso lic ita tó rio , p o rq u e , c o m o está
in s ta la d o o a m b ie n te d e g e stã o a sso c ia d a, n ã o h á c o m p e titiv id a d e en tre
as p artes, m as, sim , o so m a tó rio d e e sfo rç o s c o n v e rg e n te s em p ro l d a
e x e c u ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lico s.
D a í, o inc. X X V I, d o art. 24, d a L L C A , c u jo c o n te ú d o é
re ite ra d o p e lo art. 32, d o D e c re to n.° 6 .0 1 7 /2 0 0 7 , a sse g u ra a c o n tra ta ç ã o
d ire ta m e d ia n te d isp e n sa d e lic ita ç ã o d a p re sta ç ã o d e se rv iç o s p ú b lic o s

4 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Consórcios Públicos (Lei n.° 11.107, de
06.04.2005, Decreto n.° 6.017, de 17.01.2001). Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris,
2009, p. 130.

302
em a m b ie n te d e g e stã o asso c ia d a, n o s te rm o s a u to riz a d o s p e lo co n tra to
d e c o n só rc io p ú b lic o o u p e lo c o n v ê n io d e co o p e raç ão .
A fo ra a d e te rm in a ç ã o d o c o n tra to d e p ro g ra m a se r su b m etid o ,
n o q u e co u b e r, ao re g im e ju ríd ic o d as c o n c e ssõ e s e p e rm issõ e s, as
c lá u su la s d e sse c o n tra to d e v e rã o a te n d e r ao d isp o sto n o s in cs. I e II, do
§1°, d o a rtig o 13, d a L C P , que, p o r su a v ez , fo ra m o b je to d e a m p lia ç ã o
p e lo s in cs. I a X V I, d o art. 33, d o D e c re to F e d e ra l n.° 6 .0 1 7 /2 0 0 7 .
C a so o c o n tra to d e p ro g ra m a e n v o lv a a tra n sfe rê n c ia , to tal ou
p a rcial, d e en c arg o s, d e se rv iç o s a d m in istra tiv o s, d e p e sso a l e d e b en s,
d e v e rá a te n d e r, ain d a, ao s c o m a n d o s d o s in c iso s I a V I, §2°, d o art. 13,
d a L C P , c u jo c o n te ú d o é re p e tid o n o s incs. I a V I, d o §1°, d o art. 33, do
D e c re to F e d e ra l n.° 6 .0 1 7 /2 0 0 7 .
O contrato de p ro g ram a está proibido de trazer cláusulas que
prevejam , ainda que indiretam ente, a transferência das funções de
planejam ento, de regulação e de fiscalização inerentes ao titular dos serviços
públicos p ara o prestador, segundo previsto no art. 13, §3°, d a L C P , que, p o r
sua vez, foi reiterado pelo art. 33, §3°, do D ecreto F ederal n.° 6.017/2007.
T ra ta -se, assim , d e a p lic a ç ã o d ire ta e im p e ra tiv a d o s p rin c íp io s
d a se g re g a ç ã o d e ó rg ã o s e d a irre n u n c ia b ilid a d e d e fu n ç õ es, em q u e o
titu la r d o s se rv iç o s p ú b lic o s, ao ser d o ta d o d e a u to n o m ia d e c o rre n te d a
C R F B /1 9 8 8 p a ra o rg a n iz a r e d irig ir os seu s serv iç o s, e stá im p e d id o de
re n u n c ia r ao s p o d e re s d e d ire ç ã o in e re n te s a eles, a o s serv iço s. P o rta n to ,
o titu la r d o s se rv iç o s p ú b lic o s p o d e até d e le g á -lo s p a ra te rc e iro s, os
q u ais, p o r su a v ez , te m a m e ra in c u m b ê n c ia d e p re stá -lo s sob a tu te la
e /o u a fis c a liz a ç ã o d a q u e le , d o titu la r d o s serv iço s.
A e x tin ç ã o d o c o n só rc io p ú b lic o o u d o c o n v ê n io de c o o p e raç ão ,
q u e in sta la ra m o a m b ie n te d a g e stã o asso c ia d a, n ão im p o rta n o té rm in o
d o co n tra to d o p ro g ra m a (art.1 3 , §4°, d a L C P ; e, art. 34, d o D e c re to
F e d e ra l n.° 6 .0 1 7 /2 0 0 7 ). O u seja, a in d a q u e se ja d e sfe ito o a m b ie n te de
g e s tã o asso c ia d a, o c o n tra to d e p ro g ra m a n ão so fre rá as c o n se q u ê n c ia s
d o té rm in o d e ssa c o o p e ra ç ã o fe d e ra tiv a , v e z q u e a p e re n id a d e d esse
c o n tra to tem co m o o b je tiv o a c o n tin u id a d e d a p re sta ç ã o d o s serv iç o s

303
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

p ú b lic o s, a sse g u ra n d o -se , assim , a m a n u te n ç ã o d o s d ire ito s e das


o b rig a ç õ e s a ssu m id a s p e la s p a rte s em p ro l d o s u su á rio s.
S e m p re ju íz o d a p ró p ria c lá u su la d e v ig ê n c ia d o c o n tra to de
p ro g ra m a , este será a u to m a tic a m e n te e x tin to q u a n d o o p re sta d o r, q u e fo r
e n tid a d e d a A d m in istra ç ã o P ú b lic a in d ire ta d e e n te p o lític o p a rtic ip a n te
d o a m b ie n te d e g e stã o asso c ia d a, d e ix a r d e in te g rá -la , seja p o r ex tin ç ã o
se ja m e d ia n te a lte ra ç ã o d o seu c o n tro le ac io n ário .
C o n s o a n te será v isto e a p ro fu n d a d o ad ian te , o NM RSB
c o n sid e ro u o c o n tra to d e p ro g ra m a c o m o in s tru m e n to p re c á rio p a ra
p re s ta ç ã o p a ra os se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , v e d a n d o a su a
fo rm a liz a ç ã o p a ra tan to .

3 A E X T IN Ç Ã O D O R E G IM E P Ú B L IC O P A R A P R E S T A Ç Ã O
DOS S E R V IÇ O S DE SAN EA M EN TO B Á S IC O COM O
ADVENTO DO NOVO M ARCO R E G U L A T Ó R IO DO
S A N E A M E N T O B Á S IC O

3.1 V e d a ç ã o à p r e s ta ç ã o p r e c á r i a d o s s e rv iç o s d e s a n e a m e n to b á s ic o
p o r m e io d e c o n t r a t o d e p r o g r a m a

O N M R S B c o n fe riu n o v a re d a ç ã o ao art. 10, d a L D N S B , e


p a s s o u a p re v e r q u e a p re sta ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to
b á s ic o p o r e n tid a d e q u e n ã o in te g re a a d m in istra ç ã o p ú b lic a m u n ic ip a l
d e p e n d e d a c e le b ra ç ã o d e co n tra to d e co n c e ssã o , p re c e d id o d e p ré v ia
lic ita ç ã o , n o s te rm o s d o art. 175, d a C R F B /1 9 8 8 . C o m isso , re sto u
v e d a d a a fo rm a liz a ç ã o d e c o n tra to d e p ro g ra m a , c o n v ê n io , te rm o de
p a rc e ria o u o u tro s in stru m e n to s d e n a tu re z a p re c á ria p a ra a p re sta ç ã o dos
se rv iç o s d e san e am en to .
Ju s ta m e n te p o r isso , o N M R S B a lte ro u a re d a ç ã o d o §8°, d o art.
13, d a L C P p a ra v e d a r, d e fo rm a ex p re ssa , a fo rm a liz a ç ã o d e fu tu ro s
c o n tra to s d e p ro g ra m a p a ra v e ic u la re m a p re sta ç ã o d o s se rv iç o s de
sa n e a m e n to b á sic o . E ste s se rv iç o s d e v e rã o se r o b je to d e p re sta ç ã o

304
c o n tra ta d a n a m o d a lid a d e c o n c e ssã o p re c e d id a d e p ré v io p ro c e sso
lic ita tó rio , s e g u n d o p re v isto n o art. 175, d a C R F B /1 9 8 8 .
T odavia, os d em ais serviços públicos, co m o exem plo, saúde,
p o d em ser o bjeto d e contrato d e p ro g ram a p reced id o d a in stalação da
am b iên c ia d a g estão asso ciad a p o r m eio de co n só rcio p ú b lico ou convênio
de co o p eração, nos term o s ex p o sto s n o item anterior, d este trabalho.
N e ste m e sm o sentido, o N M R S B m o d ifico u in teg ralm en te a
red ação do art. 8°, d a L N D S B , e estabelece, n o §1°, do art. 8°, d a L N D S B ,
que o exercício d a titu larid ad e dos serviços d e saneam ento b ásico p o d erá
o co rrer p o r m eio d a g estão associada, que, p o r sua vez, p o d erá ser
im p le m e n tad a p elo consórcio p ú b lico ou p elo co n v ên io de cooperação, nos
term o s do art. 241, d a C R F B /1988. T odavia, o N M R S B co n d icio n a a
m o d elag em d esta g estão asso ciad a p ara os serviços de saneam ento básico.
P rim e iro , a d m ite -se a fo rm a liz a ç ã o d e c o n só rc io s p ú b lic o s
in te rm u n ic ip a is p a ra g e s tã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , q u e
d e v e rã o se r p re sta d o s, d ire ta m e n te , p o r in te rm é d io de a u ta rq u ia
in te rm u n ic ip a l, p a ra os seu s M u n ic íp io s c o n so rc ia d o s (inc. I, d o §1°, do
art. 8°, d a L N D S B ).
E m o u tras p a la v ra s, a p re sta ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to
b á sic o , p e lo c o n só rc io p ú b lic o d e D ire ito P ú b lic o in te rm u n ic ip a l - que,
p o r su a v ez , re p re s e n ta a sso c ia ç ã o p ú b lic a co m n a tu re z a ju ríd ic a de
a u ta rq u ia in te rfe d e ra tiv a (art. 41, inc. IV , d a L e i F e d e ra l n.° 10.406, de
10 d e ja n e ir o d e 2 0 0 2 , C ó d ig o C iv il - C .C .) -, d e v e rá o co rrer, d e fo rm a
d ireta, p a ra o s M u n ic íp io s c o n so rciad o s.
O c o rre que, a n te s d o a d v e n to d o N M R S B , a p re sta ç ã o dos
se rv iç o s de sa n e a m e n to b á sic o , p e lo s c o n só rc io s p ú b lic o s
in te rm u n ic ip a is, p a ra os M u n ic íp io s c o n so rc ia d o s o c o rria p o r m e io d e
c o n tra to d e p ro g ra m a , q u e e sta b e le c ia d ire ito s e re sp o n sa b ilid a d e p a ra as
p arte s, se g u n d o a u to riz a d o p e lo p ró p rio c o n tra to d e c o n só rc io p ú b lico .
C o m a v ig ê n c ia d o N M R S B , o co n tra to d e p ro g ra m a re sto u v ed a d o ,
ra z ã o p e la qual n ã o h á m a is in stru m e n to ju ríd ic o a d e q u a d o p a ra re g u la r
a re la ç ã o ju ríd ic a tra v a d a e n tre as p artes.

305
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

S e g u n d o os c o n só rc io s in te rm u n ic ip a is p a ra a g e stã o dos
se rv iç o s de sa n e a m e n to b á s ic o d e v e rã o te r com o o b jetiv o ,
e x c lu siv a m e n te , o fin a n c ia m e n to d as in ic ia tiv a s d e im p la n ta ç ã o de
m e d id a s e stru tu ra is de sa n e a m e n to b ásico . C o n tu d o , v e d a -se a
fo rm a liz a ç ã o d e c o n tra to d e p ro g ra m a co m so c ie d a d e d e e c o n o m ia m ista
o u e m p re s a p ú b lic a , a ssim c o m o a su b d e le g a ç ã o d o se rv iç o p re sta d o p e la
a u ta rq u ia in te rm u n ic ip a l sem p ré v io p ro c e d im e n to lic ita tó rio (inc. II, do
§1°, d o art. 8°, d a L N D S B ).
E m su m a, o N M R S B e n q u a d ro u o c o n tra to d e p ro g ra m a co m o
in s tru m e n to d e n a tu re z a p re c á ria , e v e d o u o seu e m p re g o p a ra a e x e c u ç ã o
d o re g im e p ú b lic o d e p re sta ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o ,
ex tin g u in d o , assim , a m a te ria liz a ç ã o da re la ç ã o p ú b lic o -p ú b lic o
re c o n h e c id a p e lo art. 2 4 1 , d a C R F B /1 9 8 8 .
R essa lte -se q u e a p re c a riz a ç ã o do co n tra to d e p ro g ra m a com a
v e d a ç ã o ao seu em p re g o p a ra a p re sta ção do serv iço s d e san e am en to
b ásic o p e lo N M R S B é o b jeto d e c o n testa ção p e la A ç ão D ire ta de
In c o n stitu c io n a lid a d e n.° 6492, do D istrito F ed eral (A D I n.° 64 9 2 /D F ),
p ro p o sta p e lo P a rtid o D e m o c rá tic o T ra b alh ista (P D T ), e p e la A ç ã o D ire ta
d e In c o n stitu c io n a lid a d e n.°6536, do D istrito F ed eral (A D I n.° 65 3 6 /D F ),
p ro p o sta p e lo P a rtid o C o m u n ista d o B rasil (P C do B ), p e lo P artid o
S o cialism o e L ib e rd a d e (P S O L ), p elo P a rtid o S o cialista B ra sile iro (P S B )
e p elo P artid o dos T ra b alh ad o re s, am b as com p e d id o de m e d id a cautelar,
p eran te o E g ré g io S u p rem o T rib u n al F ed eral (E. STF).
A A D I n.° 64 9 2 /D F sustenta, d entre outros aspectos relativos à
in co n stitu cio n alid ad e do N M R S B , que a ex tin ção ab ru p ta do contrato de
pro g ram a, q ue é firm ad o entre os m u n icíp io s e as em presas estaduais e
m u n icip ais p a ra a p restação dos serviços de ab astecim en to de ág u a potável
e esg o tam en to sanitário, im p o rtaria em en fraq u ecim en to destas em presas
públicas. Isso p orque, a au sên cia d e prev isão de u m perío d o de tran sição
acarretaria o esv aziam en to do p atrim ô n io destas em presas, lev an d o -se em
co n sid eração a im p o ssib ilid ad e de am o rtização gradual dos in vestim entos
j á realizados. D aí, contesta-se, n o co njunto dos arg u m en to s ap resentados

306
n esta ação, a co n stitu cio n alid ad e do arts. 3°; 5°; 7°; 11; 13, caput, V, V I e §
2°; 14, ca p u t e §§ 1° e 2°; e, 18, caput, do N M R S B .
E m o u tro v iés, a A D I n.° 6 5 3 6 /D F co n testa , d e n tre o u tro s
asp e cto s, a c o n stitu c io n a lid a d e d a e x c lu sã o d o c o n tra to d e p ro g ra m a p a ra
a p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , v in d o a se r su b stitu íd o
p e lo c o n tra to d e c o n c essão . Isso p o rq u e , im p o rta ria u m a m u d a n ç a d a
ó tim a d o siste m a atu al co m a p re v a lê n c ia d o in te re sse p riv ad o ,
c o lo c a n d o -se , assim , em risc o c o n c re to a d ig n id a d e d a p e s s o a h u m an a,
o c o m b a te à p o b re z a e a p re se rv a ç ã o d o a m b ie n te n a tu ra l, c u ja
e sp e c ia liz a ç ã o , p a ra o se to r d e sa n e a m e n to b á sic o , tra d u z -s e na
u n iv e rs a liz a ç ã o d o ac e sso ao s se rv iç o s e n a m o d ic id a d e d e tarifa . D aí,
a leg a -se, n e s ta p arte , a in c o n stitu c io n a lid a d e d o s arts. 10; 10-A ; 10-B ;
11, II; e 11-B , §§ 2° e 8°, d a L D N S B e, ain d a, d o art. 13, § 8°, d a L C P .
O M in istro L u iz F u z, re la to r d a A D I n.° 6 4 9 2 /D F e d a A D I n.°
6 5 3 6 /D F , c o n sid e ro u , em sed e d e m e d id a ca u te lar, q u e a m a té ria v e rs a d a
n e s ta s aç õ es d ire ta s d e in c o n stitu c io n a lid a d e d etém g ra n d e re le v â n c ia , e
a p re s e n ta e sp e cial sig n ific a d o p a ra a o rd e m so cial e a se g u ra n ç a ju d ic ia
d o p aís. D a í, o R el. M in . L u iz F u x in d e fe riu as m e d id a s ca u te lare s, e
re m e te u , em c o n ju n to , e sta s aç õ es d ire ta s d e in c o n stitu c io n a lid a d e p a ra
ju lg a m e n to em d e fin itiv o p e lo P le n á rio d o T rib u n al, o b se rv a d o , p o ré m ,
o d e v id o rito p ro c e ssu a l a b re v ia d o , n o s te rm o s d o art. 12, d a L e i F ed eral
n.° 9 .8 6 8 , d e 10 d e n o v e m b ro d e 1999.
A p ó s a in te rp o siç ã o d a A D I n.° 6 4 9 2 /D F e d a A D I n.° 6 5 3 6 /D F ,
a A s s o c ia ç ã o M u n ic ip a l d o s S e rv iç o s d e S a n e a m e n to (A S S E M A E )
in te rp ô s a A ç ã o D ire ta d e In c o n stitu c io n a lid a d e n.° 6 5 8 3 , d o D istrito
F e d e ra l (A D I n.° 6 5 8 3 /D F ), a qual, n o p o n to q u e in te re ssa , su ste n ta q u e
a U n iã o , ao im p o r q u e a ú n ic a fo rm a d e d e le g a r o se rv iç o d e sa n e a m e n to
b á s ic o seja p o r m e io d e c o n c e ssã o em sed e d o N M R S B , (art. 175, d a
C R F B /1 9 8 8 ), e x tra p o lo u a su a c o m p e tê n c ia co m a p ro ib iç ã o da
fo rm a liz a ç ã o d a g e stã o a sso c ia d a d o se rv iç o d e sa n e a m e n to por
c o n só rc io ou c o n v ê n io , m e d ia n te a u to riz a ç ã o ; o que re p re se n to u
e sv a z ia m e n to d o art. 2 4 1 , d a C R F B /1 9 8 8 . M a is d o q u e isso , o N M R S B

307
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

p ro m o v e u a v io la ç ã o d o s d ire ito s fu n d a m e n ta is ao p re ju d ic a r co n tra to s


em p ro g ra m a em v ig o r e, p o rta n to , ato s ju ríd ic o s p erfeito s. D a í, a A D I
n.° 6 5 8 3 /D F a le g a a in c o n stitu c io n a lid a d e d o s arts. 2°, 3°, 5°, 7°, 9°, 11,
13 e 15, d o N M R S B , d e n tre o u tro s p o r a rrastam en to .
A A D I n.° 6 5 8 3 /D F foi a p e n sa d a co m a A D I n.° 6 4 9 2 /D F e a
A D I n.° 6 5 3 6 /D F , e s u b m e tid a ao rito p ro c e ssu a l a b re v ia d o , n o s te rm o s
d o art. 12, d a L ei F e d e ra l n.° 9 .8 6 8 /1 9 9 9 .

3 .2 M a n u t e n ç ã o d a v ig ê n c ia d o c o n t r a t o d e p r o g r a m a n a d a t a d a
e d iç ã o d o n o v o M a r c o R e g u la tó r io d o S a n e a m e n to B á sic o

O N M R S B fe z in s e rir u m §3° n o art. 10, d a L D N S B , q u e


a ss e g u ra a v ig ê n c ia d o s a tu a is c o n tra to s d e p ro g ra m a a té o seu term o .
Ig u a lm e n te , o art. 17, d o N M R S B p re v iu q u e os co n tra to s d e p ro g ram a,
q u e p o ssu a m co m o b je to a p re sta ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o ,
e e steja m em v ig o r n a d a ta d a su a p u b lic a ç ã o , isto é, 16 d e ju lh o d e 2 0 2 0 ,
c o n tin u a rã o a v ig o ra r até o a d v e n to d o seu te rm o co n tra tu al.
R e s s a lte -se que o art. 16 e seu p a rá g ra fo , do N M R S B
e sta b e le c ia m p ra z o e c o n d iç õ e s d e tra n s iç ã o d o re g im e p ú b lic o p a ra o
p riv a d o d e p re sta ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o . O d isp o sitiv o
c ita d o fo i fru to d e n e g o c ia ç ã o p o lític a tra v a d a n o C o n g re sso N a c io n a l, a
fim d e a s s e g u ra r u m a tra n siç ã o a d e q u a d a e re v e stid a d e se g u ra n ç a
ju ríd ic a e n tre os re g im e s. T o d av ia , o E x e c u tiv o fe z v a le r o seu v e to à
n o rm a , e o C o n g re sso N a c io n a l m a n te v e o v eto . R e p ita -s e q u e a a u sê n c ia
d e u m p e río d o d e tra n s iç ã o d o re g im e p ú b lic o p a ra o p riv a d o n a
p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o é o b je to d e c o n te sta ç ã o n a
A D I n.° 6 4 9 2 /D F , re p ita -se.
D e q u alq u er form a, os contratos de program a, considerados
v álid o s n o s term o s do N M R S B , estarão con d icio n ad o s à co m p ro v ação d a
cap acid ad e ec o n ô m ico -fin an ceira d a em p resa estatal de saneam ento básico,
p o r recu rso s p ró p rio s ou p o r co n tratação de dívida, com v ista a v iab iliz ar a

308
u n iv ersalização dos serviços até 31 de d ezem b ro de 2033. E sta m eto d o lo g ia
p ara co m p ro v ação d a cap acid ad e eco n ô m ico -fin an ceira ainda d ep en d e de
reg u lam en tação (art. 10-B e seu p arág rafo ú nico, d a L D N S B ).
E stes contratos de program a deverão v eicu lar m etas de
universalização dos serviços, q u e com preendem o q u e segue: (i) garantia de
atendim ento de 99% da população com ág u a potável; e, (ii) cum prim ento de
9 0 % d a pop u lação com coleta e tratam ento de esgotos, am bas devem ser
alcançadas até 31 de dezem bro de 2033. A fo ra isso, deve-se p rev er m etas
q u antitativa de não interm itência do abastecim ento, de redução de perdas e
d a m elh o ria dos processos de tratam ento (art. 11- B , d a L D N S B ).
Se, porventura, o contrato de p ro g ram a n ão contem plar estas m etas
(§1°, do art. 11- B , d a L D N S B ), deve-se p ro m o v er o devido aditivo contratual
até 31 de m arço de 2022 p ara v iabilizar esta inclusão, sob p en a de serem
considerados irregulares e precários (§8°, do art. 11- B , d a L D N S B ).
A s m e ta s d ev e m se r v o lta d a s p a ra o â m b ito m u n ic ip a l (§6°, do
art. 11- B , d a L D N S B ), e serem c a lc u la d a s d e m a n e ira p ro p o rc io n a l n o
p e río d o c o m p re e n d id o e n tre a a ssin a tu ra d o te rm o a d itiv o e o p ra z o de
31 d e d e z e m b ro d e 2 0 3 3 , d e fo rm a p ro g re ssiv a . E s ta é a reg ra. T o d av ia,
as m e ta s p o d e m se r a n te c ip a d a s c a so as re c e ita s a d v in d a s d a p re sta ç ã o
e fic ie n te d o s se rv iç o s a ssim o p e rm ite m , n o s te rm o s d a re g u la m e n ta ç ã o
a ser e d ita d a (§8°, d o art. 11- B , d a L D N S B ).
O utrossim , o contrato de program a, q u e estiver em v ig o r n a data
d a p u b licaç ão do N M R S B em 16 d e ju lh o d e 2020, co n tin u a válido.
T odavia, d ev e rá ser objeto d e term o aditivo até 31 de m arç o de 2022 p ara
ad eq u ar-se às m etas d e u n iv ersa liz açã o dos serviços d e ab astecim ento de
ág u a p o tável e esg o tam en to sanitário, sob p en a d e ser de co n sid erad o ilegal.

309
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

4 O DESAFIO DA INDENIZAÇÃO DOS BENS REVERSÍVEIS NA


TRANSIÇÃO DO REGIME PÚBLICO PARA O PRIVADO DA
PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS DE SANEAMENTO BÁSICO

O art. 42, caput, d a L D N S B p re v ê q u e os v alo res investidos, pelos


p restadores, em b en s rev ersív eis co n stitu ição em crédito peran te o titular,
p o d e m ser recu p erad o s m ed ian te a ex p lo ração dos serviços de saneam ento
básico, seg u n d o v ie r a d isp o r as n o rm as regulam entares, contratuais e,
q u an d o fo r o caso, a leg islação p ertin en te à sociedade p o r ações.
N ão constitui em crédito a ser suportado p elo titu lar os
in v estim en to s feito s sem ô n u s p a ra o prestador, sejam aqueles decorrentes
de ex ig ên cias leg ais aplicáveis à im p lan tação de em p reen d im en to s
im o b iliário s sejam os p ro v en ien tes de su b v en çõ es ou d e transferências
fiscais v o lu n tárias, seg u n d o p re v ê o §1°, do art. 42, d a L D N S B .
Os in v estim en to s realizados, os v alo res am ortizados, a
d ep reciação e os resp ectiv o s saldos serão an u alm en te au d itad o s e
certificad o s p ela en tid ad e de re g u lação (§2°, do art. 42, d a L D N S B ).
C o m p lem en tarm en te, os créditos d eco rren tes destes in vestim entos
certificad o s p o d erão rep resen tar em g aran tia d e op eração financeira, isto é,
em p réstim o , p elo prestador, d esd e que os recu rso s sejam aplicados
ex clu siv am en te n a p restação co n tratad a dos serviços de san eam en to básico.
L o g o , o M u n ic íp io 5, ao fo rm a liz a r a p re sta ç ã o co n tra tad a,
d ev e rá, em tese, re s sa rc ir os in v e stim e n to s fe ito s p e lo p re sta d o r, d esd e
q u e estes in v e stim e n to s n ã o te n h a m sid o re c u p e ra d o s ao lo n g o d a
e x e c u ç ã o d o s serv iço s. E s ta é a re g ra g eral. E x c e p c io n a lm e n te , os
M u n ic íp io s n ã o te rã o q u e a rc a r co m q u a lq u e r in d e n iz a ç ã o , d e sd e q u e os

5 O inc. I, do art. 8°, da LDNSB, com a redação dada pelo NMRSB, positivou, com
respaldo no interesse local, o Município e o Distrito como titulares dos serviços de
saneamento básico. Se, porém, o interesse ultrapassar o local, e avançar para o comum,
a titularidade será do Estado em conjunto com os Municípios integrantes da aglutinação
municipal (leia-se, região metropolitana, aglomerados urbanos e microrregiões), em
sede da gestão compartilhada, segundo prevê o inc. II, do inc. I, do art. 8°, da LDNSB.

310
in v e s tim e n to s sejam fe ito s sem ô n u s p a ra o p re sta d o r. P a ra ta n to , é
in d isp e n sá v e l q u e os in v e stim e n to s re a liz a d o s, p e lo p re sta d o r, te n h a m
sid o d e v id a m e n te c e rtific a d o s e au d ita d o s, p e la e n tid a d e d e re g u la ç ã o ,
a n u a lm e n te , ao lo n g o d e to d a a p re sta ç ã o d o s serv iço s.
N e ste c o n tex to , os in v e stim e n to s fe ito s, p e la s e m p re sa s
p ú b lic a s e sta d u a is, ao lo n g o d a v ig ê n c ia d o c o n tra to d e p ro g ra m a , n o s
se rv iç o s d e s a n e a m e n to b á sic o , p o d e rã o ser re ssa rc id o s p e lo M u n ic íp io ,
se, p o rv e n tu ra , h o u v e r a su a re to m a d a.
Im p o rta n te re s sa lta r q u e o N M R S B a c re sc e n to u o §5° ao art. 42,
d a L D N S B , q u e p a sso u a p re v e r q u e a tra n s fe rê n c ia d o s se rv iç o s de
sa n e a m e n to b á s ic o d e u m p re sta d o r p a ra o o u tro fic a co n d ic io n a d o , em
q u a lq u e r h ip ó te se , à in d e n iz a ç ã o d o s in v e stim e n to s v in c u la d o s ao s b e n s
re v e rsív e is a in d a n ã o a m o rtiz a d o s o u d e p re c ia d o s. A d ic io n a lm e n te ,
fa c u lta -s e ao titu la r d o serv iç o a tra n sfe rê n c ia d o p a g a m e n to d esta
in d e n iz a ç ã o p a ra n o v o p re sta d o r.
P o rta n to , o M u n ic íp io só p o d e rá fa z e r a tra n s fe rê n c ia dos
se rv iç o s d e s a n e a m e n to b á sic o d a e m p re sa e sta d u a l p a ra u m fu tu ro
p re sta d o r, se, p o rv e n tu ra , h o u v e r o p a g a m e n to d a in d e n iz a ç ã o p e lo s b e n s
re v e rsív e is. P a ra ta n to , o M u n ic íp io p o d e rá a trib u ir o p a g a m e n to d esta
in d e n iz a ç ã o ao n o v o p re sta d o r; o que, em tese, p o d e rá c o n s titu ir em
e le v a ç ã o d o s v a lo re s d a s ta rifa s a serem co b ra d a s d o s u su á rio s,
d e p e n d e n d o d a fo rm a q u e fo r p ro m o v id a a c o m p o siç ã o ta rifá ria.
N ã o o b stan te, h á u m d e sa fio a se r su p e ra d o q u e ta n to o c o n tra to
d e p ro g ra m a q u a n to o N M R S B n ã o re so lv e m , a p rin c íp io . T ra ta -se d a
in d e n iz a ç ã o d o s in v e stim e n to s fe ito s, p e la s e m p re sa s e stad u a is, a n tes d a
v ig ê n c ia d o c o n tra to d e p ro g ra m a , em p ro l d a p re sta ç ã o d o s se rv iç o s de
sa n e a m e n to b á sic o , q u e p o d e rá a b a rc a r d e sd e o p e río d o d a c ria ç ã o d estas
em p re sa s, n a d é c a d a d e 70, n a e d iç ã o d o e x tin to P la n o N a c io n a l d e
S a n e a m e n to B á sic o (P L A N A S A ). E x p liq u e -se .
N a q u e la ép o ca, p ro m o v e u -se um a e n g e n h o sa a rtic u la ç ã o
in s titu c io n a l e ju ríd ic a , m a s im p o s ta d ita to ria lm e n te , q u e im p o rto u n a

311
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

fo rm a liz a ç ã o d e re la ç ã o ju ríd ic a e n tre os M u n ic íp io s co m as c o m p a n h ia s


e stad u a is, co m a in te rv e n iê n c ia d o s E sta d o s, p a ra p ro m o v e r a e x p a n sã o
d o s se rv iç o s de a b a ste c im e n to de á g u a e de e sg o ta m e n to sa n itá rio . E sta s
re la ç õ e s ju ríd ic a s fo ra m fo rm a liz a d a s em b a se s frág eis, q u e, em reg ra,
n ã o tra ta v a m d a in d e n iz a ç ã o d o s b e n s re v e rsív e is, n e m se q u e r c h e g a v a m
a re a liz a r a id e n tific a ç ã o , a c e rtific a ç ã o e a a u d ita g e m d e ste p a trim ô n io 6.
C o m o p a ssa r o te m p o , e sta s re la ç õ e s ju ríd ic a s fo rm a liz a d a s sob
a ég id e d o P L A N A S A ca d u c a ra m , e tiv e ra m o p ra z o d e v ig ê n c ia
ex p ira d o . A p a rtir d a e d iç ã o d a L D N S B , e sta s situ a ç õ e s d e fa to fo ram
su c e d id a s p e lo c o n tra to de p ro g ra m a , sem te r o co rrid o , p o ré m , a
re s o lu ç ã o d a in d e n iz a ç ã o d o s in v e stim e n to s.
A re s p o sta p a ra este d e sa fio p o d e e n c o n tra r a sse n to n o art. 42,
c a p u t, d a L ei F e d e ra l n.° 8987, d e 13 d e fe v e re iro d e 1995, L e i de
C o n c e ssõ e s e P e rm issõ e s (L C P ’s), que, p o r su a v ez, p re v ê q u e as
c o n c e ssõ e s d e se rv iç o s p ú b lic o s o u to rg a d a s a n te rio rm e n te à su a e n tra d a
em v ig o r, isto é, 14 d e fe v e re iro d e 1995, serão c o n sid e ra s v á lid a s p e lo
p ra z o fix a d o n o c o n tra to o u n o ato d e o u to rg a. V e n c id o este p ra zo , o
se rv iç o p o d e rá se r p re sta d o , p e lo titu la r d o serv iço , de fo rm a d ire ta ou
c o n ta ta d a (§1°, d o art. 42, d a L C P ’s).
T o d a v ia , isso só será p o ssív e l se o se rv iç o tiv e r sid o o u to rg a d o
m e d ia n te p ré v ia lic ita ç ã o ap ó s a v ig ê n c ia d a C R F B /1 9 8 8 . A o re v és, a
p re s ta ç ã o d o se rv iç o se rá c o n sid e ra d a e x tin to , a in d a q u e p o s s u a o b ra s ou
se rv iç o s j á in ic ia d o s (art. 43 e seu p a rá g ra fo ú n ic o , d a L C P ’s).
P o rtanto, o M u n icíp io d ev eria te r declarad o a ex tin ção da
p restação d o s serviços de saneam ento b ásico p ela em p re sa estadual após a
en trad a em v ig o r d a C R F B /1988, v e z que, salvo m elh o r ju íz o , n ão era

6 Para um aprofundamento sobre a historicidade da gestão e do gerenciamento dos


serviços de saneamento básico, inclusive a implementação do PLANASA com o seu
trágico desfecho, ver: TEIXEIRA, Raul. A Trajetória do Saneamento Básico no Brasil
- Aspectos Históricos, A Questão da Titularidade e o Novo Marco Regulatório do
Setor. Fórum Municipal e Gestão de Cidades, Belo Horizonte, ano 2, n. 3, p. 14-31,
set./out. 2013.

312
o b jeto d e licitação. T odavia, isso n ão foi feito, n a m aio ria dos casos. E , os
serviços co n tin uaram a ser executados, e to rn aram -se, assim , precários.
O §2°, do art. 42, d a L C P ’s b u sco u re g u la rizar estas relações
p restacio n ais p recárias, e asseg u ro u a v alid ad e d elas p elo p ra zo n ecessário
à realização dos lev an tam en to s e das avaliações in d isp en sáv eis à
o rg an ização dos p ro cesso s licitatórios q u e p reced eriam a o u to rg a das
co n cessõ es q u e as substituiríam . E ste p razo n ão p o d eria ser in ferio r a 24
m eses. Isso tam b ém n ão foi realizado, e a p recaried ad e contínuo.
A in d a assim , a v ig ê n c ia d e ste s in stru m e n to s p re c á rio s re sto u
e ste n d id a até 31 d e d e z e m b ro d e 2 0 1 0 , d esd e que, an tes, até 30 d e ju n h o
d e 2 0 0 9 , tiv e s s e m sid o to m a d a s as p ro v id ê n c ia s p re v ista s n o s incs. I até
III, d o §3°, d o art. 42, d a L C P ’s, co m a re d a ç ã o d a d a p e lo art. 58, d a
L D N S B . F in d o este p ra z o ou, an tes, se o M u n ic íp io tiv e r p e rm a n e c id o
o m isso , d e v e r-se -ia b u s c a r a fo rm a d e p re sta ç ã o c o n tra ta d a .
V ale, aqui, ab rir u m parên tese p a ra sinalizar q u e o art. 58, d a
L D N S B , q ue alterou a L C P ’s p ara co n v alid ar as co n cessões precárias, foi
o b jeto de co n testação n a A ç ão D ire ta d e In co n stitu cio n alid ad e n.° 4058, do
D istrito F ed eral (A D I 4 0 5 8 /D F ) peran te o E. STF. E ste C o len d o T ribunal
n ão co n h eceu d a A D I n.° 40 5 8 /D F em relação ao disp o sto nos §3° até §5°,
do art. 42, d a L C P ’s, v e z q u e o p razo m áx im o de co n v alid ação destas
co n cessõ es p recárias j á tin h a expirado. T odavia, co n feriu in terpretação
co n fo rm e à C o n stitu ição quanto ao §1°, do art. 42, d a L C P ’s p ara exigir a
realização de p ré v ia licitação p a ra n o v a d eleg ação à terceiros.
O c o rre que, e x tin to s to d o s e ste s p ra zo s, os serv iç o s
c o n tin u a ra m a ser p re sta d o s, e, re p ita -se , fo ra m su c e d id o s p e lo co n tra to
d e p ro g ra m a , sem , p o ré m , c o n te m p la r a in d e n iz a ç ã o d este p assiv o .
T ra ta -se, assim , d e situ a ç õ e s p re c á ria s, c u jo s in stru m e n to s c o n tra tu a is
e x iste n te s o u n ã o re p re se n ta m “ ato s n ã o c o n su m a d o s” , p o is n ã o se
c o n s u m a ra m p o r serem d e sd o b rá v e is n o tem p o . D a í, e x ig e -se a ap lic a ç ã o
d ire ta e im e d ia ta d e re g ra s ju ríd ic a s q u e p o ssa m c o n fe rir se g u ra n ç a

313
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

ju ríd ic a p a ra u m fato, q u e, a p rin c íp io , m ere ce, e p re c isa d e c o n v a lid a ç ã o


ju ríd ic a , sem p re ju íz o d o p ro n u n c ia m e n to fin al p e lo J u d ic iá rio 7.
P a ra tanto, o §4°, d o art. 42, d a L C P ’s p re v ê que as indenizações
dos in v estim en to s realizados n o p erío d o d a p restação p re cária devem
o co rrer p o r av aliação do seu v a lo r ec o n ô m ico ou re av aliação patrim onial,
d ep reciação e am o rtização dos ativos im o b ilizad o s definidos pelas
leg islaçõ es fiscal e das sociedades p o r ações, efetu ad a p o r em p resa de
au d ito ria in d ep en d en te esco lh id a de co m u m aco rd o pelas partes.
O §5°, d o art. 42, d a L C P ’s e sta b e le c e q u e p a g a m e n to d esta
in d e n iz a ç ã o será re a liz a d o , m e d ia n te g a ra n tia real, p o r m e io d e 04
p a rc e la s an u a is, ig u a is e su ce ssiv a s, d a p a rte a in d a n ã o a m o rtiz a d a d e
in v e s tim e n to s e d e o u tra s in d e n iz a ç õ e s re la c io n a d a s à p re sta ç ã o dos
serv iç o s, re a liz a d o s co m ca p ita l p ró p rio d o c o n c e ssio n á rio o u d e seu
c o n tro la d o r, o u o rig in á rio s d e o p e ra ç õ e s d e fin a n c ia m e n to , o u o b tid o s
m e d ia n te e m issã o d e açõ es, d e b ê n tu re s e o u tro s títu lo s m o b iliá rio s, com
a p rim e ira p a rc e la p a g a a té o ú ltim o d ia ú til d o e x e rc íc io fin a n c e iro em
q u e o c o rre r a re v ersão .
S e, p o rv e n tu ra , h o u v e r a c o rd o e n tre a p a rte s, o p a g a m e n to d e sta
in d e n iz a ç ã o p o d e rá se r a rc a d o p e lo n o v o p re sta d o r, seg u n d o v ie r a ser
d is p o s to n o fu tu ro c o n tra to (§6°, d o art. 42, d a L C P ’s).
O u tro ssim , o v a lo r d a in d e n iz a ç ã o a se r su p o rta d a p e lo
M u n ic íp io em fa c e d o s in v e stim e n to s re a liz a d o s, p e la e m p re sa p ú b lic a
estad u a l, n o p e río d o q u e ab a rq u e o te m p o d o P L A N A S A a té a v ig ê n c ia
d o c o n tra to d e p ro g ra m a , d ev e se r c a lc u la d o n a fo rm a d o s §4° até §6°, do
art. 42, d a L C P ’s.

7 No mesmo sentido, ver: MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Eficácia nas Concessões,
Permissões e Parcerias. 2a ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2011. p. 226-234.

314
5 C O N S I D E R A Ç Õ E S F IN A I S

O N M R S B re co n fig u ro u in teg ralm en te o co n v ên io de co o peração


m aterializad o r d a g estão associada, esv azian d o -o p ela v ia d a desregulação.
O N M R S B eq u ip aro u o co n v ên io d e coo p eração com o consórcio público,
im p o rtan d o em in crem en to d a p arca m o d elag em daquele, do con v ên io de
cooperação. T o davia, afastou a ex igibilidade de ratificação leg islativ a do
co n v ên io de co operação, esv azian d o a sua seg u ran ça ju ríd ica. A dem ais, o
N M R S B , ao co n ferir n o v a re d açã o ao §2°, do art. 11, d a L C P , parece q u erer
v alid ar a co n tin u id ad e das co n cessõ es p riv ad as m esm o após o en cerram en to
dos co n só rcio s públicos, im plicando, assim , em eventual relação precária
sem a p rév ia licitação.
O N M R S B categorizou o contrato de p ro g ram a co m o in stru m en to
de n atu reza precária, e v e d o u a sua fo rm alização p ara co n secu ção do reg im e
p ú b lico d a g estão dos serviços d e san eam en to básico, encerram ento, assim ,
a m aterialização d a relação p ú b lico -p ú b lico re co n h ec id a p elo art. 241, da
C R F B /1 9 8 8 . E , n ão se estabeleceram regras d e tran sição p a ra o regim e
privado; o que é alvo d e co n testação p ela A D I n.° 6492/D F , p ela A D I n.°
6 5 3 6 /D F e p ela A D I n.° 6583/D F , que, porém , tiv eram os p ed id o s de
m ed id as cau telares indeferidos, m as serão subm etidas à ap reciação do
P len ário , do E. STF, em rito p rocessual abreviado.
C o n tu d o , o N M R S B p re v iu q u e o c o n tra to d e p ro g ra m a , q u e
e stiv e r em v ig o r n a d a ta d a p u b lic a ç ã o d o N M R S B em 16 d e ju lh o de
2 0 2 0 , c o n tin u a v álid o . C o n tu d o , este c o n tra to d e v e rá se r o b je to d e te rm o
a d itiv o até 31 d e m a rç o d e 2 0 2 2 , a fim d e a d e q u a r-se às m e ta s d e
u n iv e rs a liz a ç ã o d o s se rv iç o s d e a b a ste c im e n to d e á g u a p o tá v e l e
e sg o ta m e n to san itário , sob p e n a d e re s ta in v álid o .
R e s s a lte -se q u e e x iste m p re sta ç õ e s d e se rv iç o s d e sa n e a m e n to
b á s ic o p re c á ria s q u e se p ro tra e m n o te m p o d e sd e a d é c a d a d e 70, n a
é p o c a d o P L A N A S A , e c h e g a ra m a se r su c e d id o s p e lo c o n tra to de
p ro g ra m a , sem , p o ré m , h a v e r u m a d e fin iç ã o q u a n to ao p a ssiv o d a
in d e n iz a ç ã o p e lo s b e n s re v e rsív e is. E n c o n tra -se , assim , d ia n te de

315
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

situ a ç õ e s p re c á ria s, c u jo s in stru m e n to s c o n tra tu a is e x iste n te s o u n ão


re p re se n ta m “ ato s n ã o c o n su m a d o s” , p o is n ã o se c o n su m a ra m p o r serem
d e sd o b rá v e is n o tem p o .
A so lu ç ã o p a ra o d e sa fio p o sto p a re c e e n c o n tra r a sse n to d o s §4°
até §6°, d o art. 42, d a L C P ’s, q u e p o d e rá c o n fo rm a r o v a lo r d a
in d e n iz a ç ã o a se r su p o rta d a p e lo M u n ic íp io em fa ce d o s in v e stim e n to s
re a liz a d o s, p e la e m p re sa p ú b lic a estad u a l, n o p e río d o q u e a b a rq u e o
te m p o d o P L A N A S A até a v ig ê n c ia d o c o n tra to d e p ro g ram a.

R E F E R Ê N C IA S

A R A Ú JO , M arco s P au lo M arq u es e Z V E IB IL , V icto r Z ular. A R elação


T itu lar/P restad o r nos S erviços de S aneam ento B ásico. In: C O R D E IR O , B.
S. (org.). L e i N a c io n a l d e S a n e a m e n to B ásico: P ersp ectiv as p ara as
P o líticas e a G estão dos S erviços P úblicos. B rasília: M in istério das C idades,
S ecretária N acio n al de S aneam ento A m b ien tal (S N S A ), P ro g ra m a
M o d ern iz açã o do S etor de S aneam ento (P M S S ), 2009. v. 3, p. 469-485.

B A U M A N , Z ygm unt. M o d e r n id a d e L íq u id a . R io de Janeiro: Z ahar, 2001.

B R A S IL . M in isté rio d o D e se n v o lv im e n to R e g io n a l. S e c re ta ria N a c io n a l


d e S an ea m e n to . S is te m a N a c io n a l d e I n f o r m a ç õ e s s o b r e S a n e a m e n to
(S N S ): 24° D ia g n ó stic o d o s S erv iço s d e Á g u a e E s g o to s - 2 0 1 8 . B rasília:
S N S /M D R , 20 19.

B R A S IL . M in isté rio d o D e se n v o lv im e n to R e g io n a l. S e c re ta ria N a c io n a l


d e S an ea m e n to . S is te m a N a c io n a l d e I n f o r m a ç õ e s s o b r e S a n e a m e n to
(S N IS ): D ia g n ó s tic o d o M a n e jo d e R e síd u o s S ó lid o s U rb a n o s - 2018.
B ra sília : S N S /M D R , 2019.

B R A S IL . S u p rem o T ribunal F ederal (T ribunal P leno). A ç ão D ire ta de


In co n stitu cio n alid ad e n.° 4058/D F . R elator: M in. A lex a n d re M oraes,

316
B rasília, 19 de d ezem b ro de 2018. D Je , 14 fev. 2019. D isponível em : https
://jurisp ru d en cia.stf.jus.br/pages/search/sjur398264/false. A c esso em : 01°
m aio 2021.

B R A S IL . S u p rem o T rib u n a l F e d e ra l. A ção D i r e ta de


I n c o n s ti t u c i o n a l i d a d e n.° 6 4 9 2 /D F . R elato r: M in . L u iz F u x . D isp o n ív e l
em : h ttp ://p o rta l.stf.ju s.b r/p ro c e sso s/d e ta lh e .a sp ? in c id e n te = 5 9 6 5 9 0 8 -
A cesso em : 01° m aio 2021.

B R A S IL . S u p re m o T rib u n a l F e d e ra l. A ção D i r e ta de
I n c o n s ti t u c i o n a l i d a d e n.° 6 5 3 6 /D F . R elato r: M in . L u iz F u x . D isp o n ív e l
em : h ttp ://p o rta l.s tf.ju s .b r/p ro c e s s o s /d e ta lh e .a s p ? in c id e n te = 5 9 7 7 4 5 8 .
A cesso em : 01° m aio 2021.

B R A S IL . S u p re m o T rib u n a l F e d e ra l. A ção D i r e ta de
I n c o n s ti t u c i o n a l i d a d e n.° 6 5 8 3 /D F . R elato r: M in . L u iz F u x . D isp o n ív e l
em : h ttp ://p o rta l.s tf.ju s .b r/p ro c e s s o s /d e ta lh e .a s p ? in c id e n te = 6 0 2 8 2 9 7 .
A cesso em : 01° m aio 2021.

C A R V A L H O F IL H O , J o sé d o s S antos. C o n s ó rc io s P ú b lic o s (L e i n.°


1 1 .1 0 7 , d e 0 6 .0 4 .2 0 0 5 , D e c re to n.° 6 .0 1 7 , d e 1 7 .0 1 .2 0 0 1 ). R io de
Jan e iro : E d ito ra L u m e n Ju ris, 2009.

M O T T A , C a rlo s P in to C o elh o . E f ic á c ia n a s C o n c e s s õ e s , P e rm is s õ e s e
P a r c e r i a s , 2 a ed. atual. B e lo H o riz o n te : D e l R e y , 2011.

T E IX E IR A , R aul. A T rajetória do S aneam ento B ásico n o B rasil - A spectos


H istóricos, A Q uestão d a T itularidade e o N o v o M arco R egulatório do Setor.
F ó r u m M u n ic ip a l e G e stã o d e C id a d e s, B elo H orizonte, ano 2, n. 3, p. 14­
31, set./out. 2013.

317
QUAL A FINALIDADE DO NOVO MARCO REGULATÓRIO
DO SANEAMENTO?

M a ria Isa b e lle S o u to L e ite *


L e a n d ro M e llo Frota*

R E S U M O : O N o v o M a rc o d o S a n e a m e n to B á sic o n o B ra sil, e d ita d o


a tra v é s d a L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , p re te n d e re g u la m e n ta r os se rv iç o s p ú b lic o s
d e a b a s te c im e n to d e á g u a p o tá v e l, e sg o ta m e n to san itário , lim p e z a
u rb a n a /m a n e jo d e re síd u o s só lid o s, além d a d re n a g e m e m a n e jo das
ág u a s p lu v iais. D ia n te d e sta ed iç ã o leg isla tiv a , b u sc a -se aqui a p re se n ta r
a sp e c to s - e im p a c to s - d as m u d a n ç a s a p re se n ta d a s, n o â m b ito n a c io n a l
e d e seu s d e s d o b ra m e n to s fá tic o s e ju ríd ic o s n o m erc ad o .

P a la v r a s - c h a v e : S an ea m e n to . Á g u a. N o v o M arco .

S U M A R IO : 1 H istó rico . 2 D ad o s. 3 O n o v o papel d a A g ê n c ia N a cio n al


d e Á g u as. 4 T itu la rid ad e e p re sta ção re g io n a liz ad a. 5 C o n c e ssã o dos
serv iço s d e san e am en to b ásico . 6 A lte ra ç ã o d a P o lític a N a c io n a l de
R e síd u o s S ólidos. 7 O b jetiv o s do D e se n v o lv im e n to S u sten táv el - O D S 6.
8 C o n clu são . R eferên cias.

1 H IS T Ó R IC O

E m p le n o séc u lo 21 o p a ís p a ssa p o r u m a g ra v e c rise de


sa n e a m e n to b á sic o . A a p ro v a ç ã o d o n o v o m a rc o re g u la tó rio , d ep o is de
u m lo n g o co n se n so , v e m te n ta r tra z e r u m p o u c o d e e sp e ra n ç a em

*Advogada. Especialista em Direito Público: Constitucional, Administrativo e Tnúutário.


Membro da Comissão Especial de Assuntos Regulatórios da CFOAB.
Advogada na Mello Frota Assessoria e Consultoria.
* Advogado. Doutorando em Ciência, Tecnologia e Inovação em Agropecuária-
UFFRJ. Mestre em Ciência Política e Relações Internacionais-IUPERJ.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

re s o lv e r u m p ro b le m a se c u la r d e n o sso país. O m u n d o p a ssa p o r g ra n d e s


tra n s fo rm a ç õ e s n a fo rm a d e v e r e n o tra to d o m e io a m b ie n te . Sob o
s lo g a n “ O g ra n d e re in ic io ” , o F ó ru m E c o n ô m ic o M u n d ia l re u n iu líd e re s
em p re sa ria is, g o v e rn a m e n ta is e d a so c ie d a d e p a ra d e b a te r a crise
a d v in d a d a C o v id -1 9 e a re to m a d a d a e c o n o m ia m u n d ial. E o q u e o
sa n e a m e n to b á s ic o te m a v e r co m isso ?
S e g u n d o o re la tó rio d o F u n d o d as N a ç õ e s U n id a s p a ra a
In fâ n c ia (U N IC E F ) e d a O rg a n iz a ç ã o M u n d ia l d a S aú d e (O M S ), ce rc a
d e 2 ,2 b ilh õ e s d e p e sso a s em to d o o m u n d o n ã o tê m se rv iç o s d e á g u a
tra ta d a , 4 ,2 b ilh õ e s d e p e sso a s n ã o tê m se rv iç o s d e sa n e a m e n to ad e q u a d o
e 3 b ilh õ e s d e p e sso a s n ã o p o ssu e m in sta la ç õ e s b á sic a s p a ra a
h ig ie n iz a ç ã o d as m ão s.
O re la tó rio a in d a re v e la que, e m b o ra te n h a m sid o fe ito s
im p o rta n te s p ro g re sso s p a ra a lc a n ç a r o a c e sso u n iv e rsa l à ág u a, ao
sa n e a m e n to b á s ic o e a h ig ie n e , e x iste m la c u n a s n a q u a lid a d e dos
se rv iç o s p re sta d o s. A D ire to ra a sso c ia d a d o P ro g ra m a d e Á g u a ,
S a n e a m e n to e H ig ie n e , em c o m u n ic a d o , sa lie n to u que: “M e ro a c e sso n ão
é o su ficien te . Se a á g u a n ã o é lim p a , n ã o é se g u ra p a ra b e b e r o u fic a
a fastad a, e se o a c e sso a o b a n h e iro é in s e g u ro o u lim ita d o , en tã o n ão
e sta m o s e n tre g a n d o o q u e é n e c e ssá rio p a ra as c ria n ç a s d o m u n d o . A s
c ria n ç a s e su as fa m ília s n a s c o m u n id a d e s p o b re s e ru ra is co rrem o m a io r
risc o d e se r d e ix a d a s p a ra trás. O s g o v e rn o s d ev e m in v e stir n as
c o m u n id a d e s d elas, se q u ise rm o s u n ir essa s d iv isõ e s e c o n ô m ic a s e
g e o g rá fic a s e e n tre g a r e sse d ire ito h u m a n o esse n cial".
E m re su m o , u m a em c a d a trê s p e sso a s n o m u n d o n ã o te m ac esso
a á g u a p o táv el. A O rg a n iz a ç ã o d as N a ç õ e s U n id a s (O N U ) j á re c o n h e c e u
q u e o a c e sso à á g u a p o tá v e l e ao sa n e a m e n to b á s ic o são d ireito s
e sse n c ia is h u m a n o s, a tra v é s d a R e so lu ç ã o n. A /R E S /6 4 /2 9 2 . E m 2015,
os 193 p a íse s m e m b ro s a p ro v a ra m , p o r c o n se n so , a a g e n d a 2 0 3 0 , q u e
te m com o p rin c ip a l p ila r os 17 O b je tiv o s de D e se n v o lv im e n to
S u ste n tá v e l - O D S , sen d o a á g u a e o esg o to a O D S 6 , co m a m e ta de
u n iv e rs a liz a ç ã o n o a n o d e 2 0 3 0 . M as, e a situ a ç ã o d o B ra sil?

320
A p o lític a p ú b lic a d o sa n e a m e n to fra c a sso u em to d o s os
g o v e rn o s, o se to r é p re d o m in a n te m e n te p ú b lico . O E sta d o d e m o n stro u
q u e so z in h o n ã o c o n se g u e fa z e r os in v e stim e n to s n e c e ssá rio s p a ra a
u n iv e rs a liz a ç ã o d o s se rv iç o s d e á g u a e esg o to . S ão a p ro x im a d a m e n te
100 m ilh õ e s d e p e sso a s sem ac e sso ao e sg o to e 35 m ilh õ e s sem a c e sso à
água. E m 2 0 1 8 fo ra m re g istra d o s m a is d e 2 3 0 m il in te rn a ç õ e s p o r
d o e n ç a s d e v e ic u la ç ã o h íd ric a , se n d o g a sto s m a is d e R $ 9 0 .0 0 0 .0 0 0 ,0 0
(n o v e n ta m ilh õ e s) co m in te rn a ç õ e s n o SU S.
O s in v e stim e n to s fo ra m m u ito a b a ix o d o e sp e ra d o , se g u n d o o
estu d o “B u r o c r a c ia e e n tra v e s no s e to r de sa n ea m e n to '’", da
C o n fe d e ra ç ã o N a c io n a l d a In d ú s tria - C N I, ca so o p a ís c o n tin u a sse com
o m e s m o ritm o d e in v e stim e n to s, a á g u a só seria u n iv e rs a liz a d a em 2043
e o e sg o to em 2054.

2 DADOS

ESGOTO

• C erca de 53% dos brasileiros têm acesso à coleta de esgoto, ou sej a,


quase 100 M ilhões de brasileiros n ão têm acesso a este serviço;
• C e rc a d e 13 m ilh õ e s d e c ria n ç a s e a d o le sc e n te s n ã o tê m ac esso
ao s a n e a m e n to b ásico ;
• 3 ,1 % d as c ria n ç a s e d o s a d o le sc e n te s n ã o tê m sa n itá rio em casa;
• 36 m u n ic íp io s n a s 100 m a io re s c id a d e s d o p a ís tê m m e n o s de
6 0 % d a p o p u la ç ã o co m c o le ta d e esg o to ;
• No B ra sil, a p ro p o rç ã o de m u n ic íp io s co m se rv iç o de
e s g o ta m e n to sa n itá rio p a sso u d e 4 7 ,3 % , em 1989,
p a ra 6 0 ,3 % , em 20 1 7 ;
• E m a p e n a s 6 d as 2 7 U n id a d e s d a F e d e ra ç ã o , a p ro p o rç ã o de
re s id e n c ia is co m e sg o ta m e n to sa n itá rio foi m a io r q u e 50% em

321
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

2 0 1 7 . S ão elas: S ão P a u lo , D istrito F e d e ra l, M in a s G erais,


P ara n á, E sp írito S an to e G o iás;
• N o N o rte , 1 0,49% d a p o p u la ç ã o tê m a c e sso a o s esg o to s;
• 2 8 ,0 1 % d o s n o rd e stin o s tê m a te n d im e n to d e esg o to s;
• 7 9 ,2 1 % d o s m o ra d o re s re g iã o S u d e ste tê m o e sg o to co leta d o ;
• A p a rc e la d a p o p u la ç ã o co m c o le ta d e esg o to n a re g iã o Sul é
d e 4 5 ,1 7 % ;
• C entro O este atende 52,89% d a população com coleta de esgoto;
• 4 6 % d o s esg o to s d o p a ís são tra ta d o s;
• S o m e n te 21 m u n ic íp io s n a s 100 m a io re s cid a d e s d o p a ís tra ta m
m a is d e 8 0 % d o s esg o to s;
• Em 2017 o p a ís la n ç o u a p ro x im a d a m e n te 5.622
p isc in a s o lím p ic a s d e e sg o to n ã o tra ta d o n a n atu re za;
• O tra ta m e n to d e e sg o to é d e 2 1 ,7 0 % n a re g iã o N o rte ;
• O N o rd e s te tra ta 3 6 ,2 4 % d o s esg o to s;
• O e s g o to tra ta d o n o S u d este é d e 5 0 ,0 9 % ;
• O Sul tra ta 4 5 ,4 4 % d o s esg o to s;
• O ín d ic e d e tra ta m e n to d e e sg o to é d e 5 3 ,8 8 % n o C e n tro O e ste

ÁGUA

• 8 3 ,6 2 % d o s b ra sile iro s são a te n d id o s co m a b a ste c im e n to de


á g u a trata d a;
• S ão q u a se 35 m ilh õ e s d e b ra s ile iro s sem o a c e sso a e ste
se rv iç o b á sic o ;
• E m 2 0 1 6 , 1 em c a d a 7 m u lh e re s b ra sile ira s n ã o tin h a a c e sso à
água. N o c a so d o s h o m e n s, 1 em c a d a 6 n ã o tin h a m água;
• 1 4,3% d as c ria n ç a s e d o s a d o le sc e n te s n ã o tê m a c e sso à água;
• 6 ,8 % d as c ria n ç a s e d o s a d o le sc e n te s n ã o c o n ta m co m siste m a
d e á g u a d e n tro d e suas casas;

322
• 2 7 m u n ic íp io s n a s 100 m a io re s c id a d e s b ra sile ira s p o ssu e m
1 00% d a p o p u la ç ã o a te n d id a co m á g u a p o táv el;
• Q uase todos os m unicípios abasteciam a população com água
tratad a desde 2008 (93,4% ). E m 2017, esse percentual foi 94,9% ;
• O c o n su m o m é d io d e á g u a n o p a ís é d e 154,9 litro s p o r
h a b ita n te ao dia;
• O E s ta d o d o R io d e Ja n e iro é o q u e m a is c o n so m e água, ce rc a
d e 2 5 4 ,9 litro s d e á g u a é u s a d a p o r h a b ita n te s;
• 110 litro s /d ia é a q u a n tid a d e s d e á g u a su fic ie n te p a ra a te n d e r as
n e c e s sid a d e s b á sic a s de um a p e sso a , se g u n d o a ONU
(O rg a n iz a ç ã o d as N a ç õ e s U n id as);
• 7 ,5 % d as c ria n ç a s e d o s a d o le sc e n te s tê m á g u a em casa, m as
n ã o é filtra d a o u p ro c e d e n te d e fo n te seg u ra;
• E m 2 0 1 7 , o v o lu m e m é d io d e á g u a c o n su m id a p o r d ia era
d e 4 2 0 ,1 L , p o ré m co m g ra n d e v a ria ç ã o re g io n a l: em g eral, os
v o lu m e s c o n su m id o s fo ra m m a io re s n a R e g iã o N o rte , e
m e n o re s n a R e g iã o N o rd e ste ;
• N o N o rte , 5 7 ,0 5 % d a p o p u la ç ã o é a b a ste c id a co m á g u a trata d a;
• O a b a ste c im e n to d e á g u a a c o n te c e p a ra 7 4 ,2 1 % d a p o p u la ç ã o
n o N o rd e ste ;
• A região Sudeste abastece 91,03% d a p opulação com água tratada;
• N o Sul, o ín d ic e d e a te n d im e n to to ta l d e á g u a é d e 9 0 ,1 9 % ;
• O C entro-O este, abastece 88,98% d a população com ág u a tratada;
• A o d istrib u ir á g u a p a ra g a ra n tir co n su m o , os siste m a s so fre m
p e rd a s na d istrib u iç ã o , que na m é d ia n a c io n a l
a lc a n ç a m 3 8 ,4 5 % ;
• 7,1 m il piscinas olím picas de água potável são perdidas todos os dias;
• O N o rte p e rd e 5 5 ,5 3 % d a á g u a p o táv el;
• A s p e rd a s d e á g u a são d e 4 5 ,9 8 % n o N o rd e ste ;
• A n te s d e c h e g a r as re sid ê n c ia s, 3 4 ,3 8 % d a á g u a é p e rd id a n a
re g iã o S udeste;

323
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

• O ín d ic e d e p e rd a s n a re g iã o Sul é d e 3 7 ,1 4 % ;
• O C e n tro O e ste p e rd e 3 5 ,6 7 % d a á g u a p o tá v e l a n te s d e c h e g a r
as re sid ê n cias;
• O total de água extraída em poços é de 17,580 M m 3/ano, vo lu m e
suficiente para abastecer a p opulação b rasileira p o r 1 ano;
• 1 8 % d a á g u a s u b te rr â n e a é u tiliz a d a p a r a a b a s te c im e n to
p ú b lic o u rb a n o ;
• O s c u sto s e n v o lv id o s n a p e rfu ra ç ã o e in sta la ç ã o d e p o ç o s
tu b u la re s so m a m m a is d e R $ 75 b ilh õ e s, v a lo r e q u iv a le n te a 6,5
an o s d e in v e stim e n to s d o B ra sil em á g u a e esg o to s;
• E x is te m m a is d e 2,5 m ilh õ e s d e p o ç o s tu b u la re s;
• 8 8 % d o s p o ç o s tu b u la re s são c la n d e stin o s;
• 5 .5 7 0 m u n ic íp io s b ra sile iro s são a b a ste c id o s por ág u a s
su b terrân ea s;
• O su b solo do p aís receb e cerca de 4.329 Mm3 de esgotos p o r ano;
• C e rc a d e 6 m il á reas d e a q u ífe ro s e ág u a s su b te rrâ n e a s e stão
c o n ta m in a d a s n o e sta d o d e S ão P au lo .

A s d isc u ssõ e s d o n o v o m a rc o leg al d o sa n e a m e n to b á sic o


tiv e ra m in íc io n o G o v e rn o d o P re sid e n te T e m e r co m as ed iç õ e s das
M e d id a s P ro v isó ria s n os. 844 e 868, am b a s d e 2 0 1 8 .
E m q u e p e se q u e os re q u isito s d a M e d id a P ro v is ó ria são
u rg ê n c ia e re le v â n c ia , a m u d a n ç a n ã o se fe z v iá v e l em v irtu d e de
p ro v o c a r a lte ra ç õ e s q u e atin g e m m ilh a re s d e m u n ic íp io s d o p a ís e a v id a
d e m ilh õ e s d e p esso a s, sem u m p ro fu n d o d e b a te co m a so cied a d e. S em
o co n se n so e ap o io p o p u la r, ta is m e d id a s p e rd e ra m a e fic á c ia d ia n te d a
p ro p o s ta d e d u as a ç õ e s d ireta s d e in c o n stitu c io n a lid a d e s, as A D Is n os
5993 e 6 0 0 6 , ju lg a d a s e x tin ta s sem a a n á lise d o m érito .
A u rg ê n c ia em re so lv e r o p ro b le m a d o sa n e a m e n to fe z co m q u e
fo s s e p ro p o sto o P ro je to d e L ei n. 4 1 6 2 d e 2 0 1 9 , a u to ria d a C â m a ra dos
D e p u ta d o s , e n te n d e n d o a im p o rtâ n c ia d a m a té ria , re a liz o u A u d iê n c ia s

324
P ú b lic a s n a C â m a ra a ssim c o m o em to d a s as re g iõ e s d o p a ís, in c lu siv e
co m a p a rtic ip a ç ã o d o C o n se lh o F e d e ra l d a O rd e m d o s A d v o g a d o s do
B ra sil, p o r m e io d a su a C o m issã o E sp e c ia l d e S a n e a m e n to e R e c u rso s
H íd ric o s . A p ó s lo n g o s d e b a te s h o u v e a su a a p ro v a ç ã o n a C â m a ra dos
D e p u ta d o s, seg u in d o p a ra o S e n a d o F e d e ra l.
O m u n d o te v e a n e c e ssid a d e d e se a d a p ta r à p a n d e m ia do
C o v id -1 9 . O C o n g re sso N a c io n a l p a sso u a d e b a te r p a u ta s e m e rg e n c ia is
v o lta d a s à su a p re v e n ç ã o e ao seu co m b ate . O c e n á rio e ra p re o c u p a n te e
p a re c ia q u e o m a rc o re g u la tó rio seria esq u e cid o .
E m ra z ã o d a n e c e ssid a d e d o iso la m e n to , o S e n a d o F ed eral
a p ro v o u o siste m a d e d e lib e ra ç ã o re m o ta , u m a in o v a ç ã o fa z e n d o com
q u e o s P a rla m e n ta re s v o ta sse m o P L n. 4 1 6 2 /2 0 1 9 e o u tra s m e d id a s
im p o rta n te s d e c o m b a te à p an d e m ia .
O M a rc o R e g u la tó rio d o S a n e a m e n to B á sic o foi sa n c io n a d o n o
d ia 15 d e ju lh o d e 2 0 2 0 , te n d o c o m o p rin c ip a is m e ta s, u n iv e rsa liz a r, em
até 9 9 % a á g u a p o tá v e l e 9 0 % o tra ta m e n to d e esg o to até o d ia 31 de
d e z e m b ro d e 2 0 3 3 , p o d e n d o se r p ro rro g a d o a té 2 0 4 0 , te n d o co m o
p rin c ip a is a lte ra ç õ e s:

a. R e g u la ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á s ic o ;
b. T itu la rid a d e e p re sta ç ã o re g io n a liz a d a ;
c. C o n c e s sã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á s ic o ;
d. A lte ra ç ã o n a P o lític a N a c io n a l d e R e síd u o s S ólidos.

3 T IT U L A R ID A D E E P R E S T A Ç Ã O R E G IO N A L IZ A D A

A L e i n. 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , em a rtig o 8o, tro u x e o e n te n d im e n to


p ro fe rid o p e lo S u p re m o T rib u n a l F e d e ra l, a q u em c o m p e te o e x e rc íc io
d a titu la rid a d e d o sa n e a m e n to b á sic o , a sse n ta n d o q u e a c o m p e tê n c ia
so b re o se rv iç o d e sa n e a m e n to b á s ic o é m u n ic ip a l, m a s a fu n ç ã o p ú b lic a
d este se rv iç o fre q u e n te m e n te e x tra p o la o in te re ss e lo cal e p a ssa a te r
n a tu re z a d e in te re sse co m u m .

325
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

Art. 8° Exercem a titularidade dos serviços públicos de


saneamento básico:
I - os Municípios e o Distrito Federal, no caso de interesse local;
II - o Estado, em conjunto com os Municípios que
compartilham efetivamente instalações operacionais
integrantes de regiões metropolitanas, aglomerações
urbanas e microrregiões, instituídas por lei complementar
estadual, no caso de interesse comum.

4 E X E R C ÍC IO D A T IT U L A R ID A D E

S e rv iç o s d e in te r e s s e lo c a l

• In fra e stru tu ra s ate n d e m a u m ú n ic o m u n ic íp io ;


• A u to n o m ia m u n ic ip a l plena.

S e rv iç o s d e in te r e s s e c o m u m

• In fra e stru tu ra s c o m p a rtilh a d a s e n tre m a is d e u m m u n ic íp io ;


• P o d e se r in s titu íd a re g iã o m e tro p o lita n a , a g lo m e ra ç ã o u rb a n a
ou m ic ro rre g iã o .

A le g isla ç ã o p re v iu trê s fo rm a s d e p re sta ç õ e s re g io n a liz a d a s. A s


re g iõ e s m e tro p o lita n a s, u n id a d e re g io n a l d e s a n e a m e n to b á sic o cria d as
p e lo s e sta d o s e m e d ia n te a L ei O rd in á ria e b lo c o s d e re fe rê n c ia ,
e sta b e le c id o s p e la U n iã o , por g e stã o a sso c ia d a v o lu n tá ria dos
m u n ic íp io s, s o m e n te se n d o e x e rc id a ca so as u n id a d e s re g io n a is n ão
sejam c ria d a s n o p ra z o d e u m a n o .

326
5 R E G IÕ E S M E T R O P O L IT A N A S

• In stitu íd a s p o r lei c o m p le m e n ta r estad u a l;


• E s tu d o s té c n ic o s q u e c o m p ro v e m o in te re sse com um no
sa n e a m e n to b ásico ;
• N ã o d e p e n d a m d a a d e sã o d o s m u n ic íp io s;
• P o d e m te r o u n ão p e rso n a lid a d e ju ríd ic a ;
• N ã o são ó rg ã o s o u e n tid a d e s e sta d u a is, m a s in te rfe d e ra tiv o s;
• D e c is ã o n ã o d e p e n d e d e c o n se n so e n tre os m u n ic íp io s;
• Q u e m a d e re à u n id a d e re g io n a l é a re g iã o co m o u m to d o e n ão
c a d a m u n ic íp io iso la d a m e n te .

6 C O N C E S S Ã O D O S S E R V IÇ O S D E S A N E A M E N T O B Á S IC O

O n o v o m a rc o e x tin g u iu a m o d a lid a d e d e c o n tra to d e p ro g ram a,


q u e e ra o c o n tra to fe ito d ire to p e la c o n c e ssio n á ria estad u a l co m os
m u n ic íp io s sem a d e v id a licita ção . A p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s será p o r
c o n c e ssã o e p re c e d id a d e lic ita ç ã o , re sp e ita n d o as re g ra s d a L ei
8 .6 6 6 /1 9 9 3 , a c o m p a n h a d a d e c o m p ro v a ç ã o d a c a p a c id a d e e c o n ô m ic a e
fin a n c e ira d a c o n tra ta d a , co m a o b rig a to rie d a d e d e u n iv e rs a liz a r n o
p ra z o d e d e z e m b ro d e 2033.
A a lte ra ç ã o v is a im p o r a c o n c o rrê n c ia e n tre o se to r p ú b lic o e
p riv a d o , fo c a n d o em e fic iê n c ia , re sp e ito as m e ta s e tra z e n d o m ais
s e g u ra n ç a ju ríd ic a .
S ã o c o n d iç õ e s d e v a lid a d e d o s c o n tra to s a e x istê n c ia d e p la n o
d e s a n e a m e n to b á sic o , a e x istê n c ia d e n o rm a s d e re g u la ç ã o e a re a liz a ç ã o
p ré v ia d e a u d iê n c ia e d e c o n su lta p ú b lic a s so b re o ed ital d e licita ção .

327
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

7 ALTERAÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS


SÓLIDOS

A P o lític a N a c io n a l d e R e síd u o s S ó lid o s (P N R S ) tin h a co m o


su a p rim e ira g ra n d e m e ta o fim d o s lix õ e s em to d o s os m u n ic íp io s
b ra s ile iro s até 2 0 1 4 . O n o v o m a rc o leg al tra to u so b re o p ra z o p a ra a
d e s tin a ç ã o fin al a m b ie n ta lm e n te ad eq u ad a.
A P N R S , em seu a rtig o 3o, e n te n d e u o c a rá te r m u ltid is c ip lin a r
d a g e stã o d o s re síd u o s, d e fin in d o c o m o o “ c o n ju n to d e aç õ es v o lta d a s
p a ra a b u s c a d e so lu ç õ e s p a ra os re síd u o s só lid o s, d e fo rm a a c o n sid e ra r
as d im e n s õ e s p o lític a , e c o n ô m ic a , a m b ie n ta l, cu ltu ra l e so cial, com
c o n tro le so cial e sob a p re m issa d o d e se n v o lv im e n to su ste n tá v e l” .
O n o v o m arco estabeleceu com o regra, para o fim dos fam igerados
lixões, a data de 31 de dezem bro de 2020. A s exceções são os m unicípios que
j á ten h am elaborado u m plano m unicipal de resíduos sólidos, ten d o o prazo
de 02 de agosto de 2021 e 02 de agosto de 2024, aplicáveis de acordo com
critérios de tam anho e localização do m unicípio.

8 OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL - ODS 6

O P acto G lobal foi lan ça d o em 2000 p elo secretário-geral das


O rg an izaçõ es d as N a ç õ e s U n id as - O N U , K ofi A nnan. S ua criação tem
co m o o b jetiv o o alin h am en to do setor p riv ad o com os prin cíp io s u n iv ersais
dos D ireito s H u m an o s, T rabalho, M eio A m b ien te e A n tico rru p ção p ara o
co m b ate do s g rav es p ro b lem as d a sociedade. E m 2015, os países m em b ro s
ap ro v aram a ag en d a 2030. O papel das O D S é te n ta r ac ab ar com a pobreza,
p ro teg e r o m eio am b ien te e o clim a e g aran tir que to d o s p o ssam desfrutar
de p az e p ro speridade. A p ro fesso ra C atarin a de A lbuquerque, p ro fesso ra
licen ciad a d a U n iv ersid ad e d e L isboa, em v isita ao B rasil com o
rep resen tan te d a O N U D ireito s H u m an o s, nos ensina: “S em á g u a p o tá v e l
o u sa n ea m e n to básico, m u ito s o u tro s D ire ito s H u m a n o s, inclusive o D ire ito
à vida, n ã o p o d e m se r g a ra n tid o s ”.

328
A o to d o são 17 O b je tiv o s, a O D S q u e tra ta d o s se rv iç o s d e á g u a
e esg o to é a d e n ú m e ro seis e te m c o m o fin a lid a d e , c o n fo rm e a O N U ,
“A s s e g u r a r a d isp o n ib ilid a d e e g e s tã o s u s te n tá v e l d a á g u a e s a n e a m e n to
p a r a t o d o s ”. A s m e ta s p re v e e m m e lh o ra n a q u a lid a d e d e água, fim d a
d e fe c a ç ã o em lo c a is in a p ro p ria d o s, sa n e a m e n to p a ra to d o s e d istrib u iç ã o
d e á g u a d e fo rm a ig u a litá ria .
São eles: i) até 2030, alcan çar o acesso universal e eq u itativ o a
ág u a p o tável e seg u ra p ara todos; ii) até 2030, alcan çar o acesso a
san eam en to e h ig ien e adequados e equitativos p a ra todos, e ac ab ar com a
d efecação a céu aberto, com especial atenção p a ra as n ecessid ad es das
m u lh eres e m en in as e d aq u eles em situação de v u lnerabilidade; iii) até 2030,
m elh o ra r a q u alid ad e d a água, re d u zin d o a poluição, elim in an d o d esp ejo e
m in im izan d o a lib eração d e p ro d u to s q u ím icos e m ateriais perigosos,
red u zin d o à m etad e a p ro p o rção de águas resid u ais n ão tratad as e
au m en tan d o su b stan cialm en te a reciclag em e reu tilização segura
glob alm en te; iv ) até 2030, au m en tar su b stan cialm en te a eficiên cia d o u so
d a ág u a em to d o s os setores e asseg u rar retiradas sustentáveis e o
ab astecim en to d e ág u a d o ce p a ra en fren tar a escassez d e água, e re d u zir
su b stan cialm en te o n ú m ero d e p esso as que sofrem com a escassez d e água;
v ) até 2030, im p le m e n tar a g estão in teg rad a dos recu rso s h íd rico s em todos
os níveis, in clu siv e v ia coo p eração transfro nteiriça, co n fo rm e apropriado;
v i) até 2020, p ro teg e r e re stau rar ecossistem as relacionados com a água,
in clu in d o m o n tanhas, florestas, zo n as ú m id as, rios, aquíferos e lagos; vi. a)
A té 2030, am p liar a coo p eração internacional e o apoio à cap acitação p ara
os p aíses em d ese n v o lv im en to em atividades e p ro g ram as relacio n ad o s à
ág u a e san eam ento, in clu in d o a co leta d e água, a dessalinização, a eficiência
n o u so d a água, o trata m e n to d e efluentes, a reciclagem e as tecn o lo g ias d e
reuso; vi. b ) A p o iar e fo rtalecer a particip ação das co m u n id ad es locais, p ara
m elh o ra r a g estão d a ág u a e d o saneam ento.

329
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

9 CONCLUSÃO

A s p re v isõ e s d e in v e stim e n to s a p e n a s n o se to r d e á g u a e esg o to


e stã o c a lc u la d a s en tre R $ 5 0 0 e R $ 7 0 0 b ilh õ e s d e reais, u m a m é d ia anual
d e R $ 5 0 b ilh õ e s. S ão a p ro x im a d a m e n te 7 0 0 m il e m p re g o s d ire to s e a
c ria ç ã o d e c u rso s d e fo rm a ç ã o em to d o s os n ív e is p a ra s u p o rta r a
d e m a n d a p o r q u a lific a ç ã o .
A o b rig a to rie d a d e d e c o n tra to d e co n c e ssã o , p o s s ib ilid a d e de
c o b ra n ç a d e ta rifa n a c o n ta d e c o n su m o , re g u la ç ã o p e la A g ê n c ia
N a c io n a l d e Á g u a s, fo rm a ç ã o d e c o n só rc io s p ú b lic o s e fim d o s lix õ e s
são m u d a n ç a s im p o rta n te s tra z id a s p e lo n o v o m arco .
C o m o fim d o c o n tra to d e p ro g ra m a , a te n d ê n c ia é d e le ilõ e s em
to d o B rasil. D e sd e q u e o m a rc o en tro u em v ig o r j á fo ra m trê s g ra n d e s
le ilõ e s co m v a lo re s m u ito a c im a d o esp e rad o . E s tá em a n d a m e n to a
c o n c e ssã o d a C ed ae, a m a io r d o p a ís até o m o m e n to . O g o v e rn o p re te n d e
a rre c a d a r R $ 1 0 b ilh õ e s d e re a is em o u to rg a e m a is R $ 3 0 b ilh õ e s em
in v e s tim e n to s em du to , c o le ta e e sta ç ã o d e tra ta m e n to . O B N D E S tem
em su a c a rte ira d e in v e stim e n to s R $ 5 5 b ilh õ e s p a ra as p ró x im a s ro d a d a s
d e licita ção . V iv e m o s o g ra n d e “b o o m ” d as P P P s (P a rc e ria P ú b lic o
P riv a d a ) co m a re to m a d a d o s in v e stim e n to s em in fra e stru tu ra . O m a rc o
re g u la tó rio d o sa n e a m e n to te m a c o n d iç ã o d e a q u e c e r a e c o n o m ia e fa z e r
co m q u e o p a ís c re sç a d e fo rm a su ste n tá v e l, seg u in d o os O b je tiv o s do
D e se n v o lv im e n to S u ste n tá v e l - O D S . E sta m o s d ia n te d o n o v o “P ré S al”
e co m ch a n c e s re a is d e re so lv e rm o s p ro b le m a s c rô n ic o s e se c u la re s de
n o s s o p aís. N in g u é m m e re c e fic a r p a ra trás.

R E F E R Ê N C IA S

B R A S IL . A s 5 tecn o lo g ias q u e estão re v o lu cio n an d o o san eam en to no


B rasil. P o r ta l S a n e a m e n to B ásico . D isponível em : h ttp s://w w w .san eam e
n to b asico .co m .b r/tecn o lo g ias-san eam en to -b rasil/. A cesso em : 16 fev. 2021.

330
B R A S I L .D e c re to n° 9 .2 5 4 /2 0 1 7 , D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g
o v .b r/c c iv il_ 0 3 /_ A to 2 0 1 5 -2 0 1 8 /2 0 1 7 /D e c re to /D 9 2 5 4 .h tm . A c e sso em
09 m ar. 20 2 1 .

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saneam ento-e-sancionado-e-garante-avancos-para-o-pais/ . A cesso em: 12
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B R A S IL . O r g a n iz a ç ã o d a s N a ç õ e s U n id a s - O N U . D isp o n ív e l em :
h ttp s ://b ra s il.u n .o rg /. A c e sso em : 09 fev. 2021.

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n e ls a n e a m e n to .o rg .b r/. A c e sso em : 03 m ar. 2021.

B R A S IL . S is te m a N a c io n a l d e I n f o r m a ç õ e s s o b r e S a n e a m e n to -
S N IS . D isp o n ív e l em : h ttp ://s n is .g o v .b r/. A c e sso em : 10 fev. 2021.

B R A S IL , F u n d a ç ã o In stitu to d e A d m in istra ç ã o - F IA - S o c ie d a d e 5.0:


o que é, O b je tiv o s e C om o fu n c io n a D isp o n ív e l em :
h ttp s ://fia .c o m .b r/b lo g /s o c ie d a d e -5 -0 /. A c e sso em 16 fev. 2021.

B R A S IL , F u n d a ç ã o N a c io n a l d a S a ú d e - F u n a s a - D isp o n ív e l em :
h ttp ://w w w .fu n a sa .g o v .b r/to d a s-a s-n o tic ia s/-
/a s s e t_ p u b lis h e r/lp n z x 3 b JY v 7 G /c o n te n t/-c a d a -re a l-g a sto -e m -
sa n e a m e n to -e c o n o m iz a -n o v e -e m -sa u d e -d isse -m in istro -d a -
s a u d e ? in h e ritR e d ire c t= fa ls e . A c e sso em 10 m ar. 2 0 2 1 .

331
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

B R A S IL . G o v .b r. M in is té r io d o D e s e n v o lv im e n to R e g io n a l. A g ê n c ia
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h ttp s ://w w w .g o v .b r/a n a /p t-b r. A c e sso em : 01° m ar. 2021.

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ir.stf.ju s.b r/p a g in a d o rp u b /p a g in a d o r.jsp ? d o c T P = A C & d o c ID = 6 3 0 0 2 6 .
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F R O T A , L e a n d ro M e llo ; H O S K E N , R o d rig o S an to s (c o o r d ) . C a r t i l h a
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D isponível em: http://w w w .agenda2030.org.br/. A cesso em: 08 fev. 2021.

R E IS . H é le n . S a n e a m e n to 4.0: O q u e e sp e ra r co m a in d ú stria 4 .0 e a
S o c ie d a d e 5.0. E n g e n h a r i a 360. D isp o n ív e l em : h ttp s ://e n g e n h a ria 3 6 0 .
c o m /s a n e a m e n to -4 -0 -o -q u e -e sp e ra r-c o m -a -in d u stria -4 -0 -e -a -so c ie d a d e -
5 -0 /,/ . A c e s s o em : 16 fev. 2021.

332
O CAMPO DE VIGÊNCIA DOS FUNDAMENTOS DECISÓRIOS
DO RECURSO ESPECIAL REPETITIVO N ° 1.339.313/RJ
FRENTE À LEI N ° 14.026/20, QUE ATUALIZA O MARCO
LEGAL DO SANEAMENTO BÁSICO BRASILEIRO

M a u ro C a m p b e ll M arques*

R E S U M O : O p re se n te estu d o te r p o r o b je to o e x a m e d a L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0
— N o v o M a rc o L e g a l d o S a n e a m e n to B á sic o B ra s ile iro sob a ó tic a d a
re g u la ç ã o , d a titu la rid a d e d o s se rv iç o s e d a fo rm a c o m o eles serão
p re s ta d o s , p a ra e x a m in a r o c a m p o d e v ig ê n c ia d o R e c u rso E sp e c ia l
R e p e titiv o n° 1 .3 3 9 .3 1 3 /R J.

P a la v r a s - c h a v e : N o v o M a rc o L e g a l. S a n e a m e n to B á s ic o . Im p a c to s .
R e c u rs o E s p e c ia l. P o lític a T arifária.

A B S T R A C T : T h is aim s th e e x a m in a tio n o f L a w N o . 1 4 ,0 2 6 /2 0 — N e w
L e g a l F ra m e w o rk o f B ra z ilia n B a sic S a n ita tio n fro m th e p e rsp e c tiv e o f
re g u la tio n , o w n e rsh ip o f serv ic es a n d h o w th e y w ill b e p ro v id e d , in o rd e r
to e x a m in e th e fie ld o f v a lid ity o f T h e S p ecial R e p e titiv e R e so u rc e n°
1 .3 3 9 .3 1 3 /R J.

K e y w o rd s: N ew L egal F ra m e w o rk . S a n ita tio n . Im p a c ts . S pecial


F e a tu re . T a r if f P o lic y .

* Bacharel em direito pelo Centro Universitário Metodista Bennett (Unibennett). Foi


Procurador-Geral de Justiça do Ministério Público do Estado do Amazonas e ex-
Secretário de Segurança Pública do mesmo ente federativo. Foi Corregedor-Geral da
Justiça Federal entre 2016-2017. É ministro do Superior Tribunal de Justiça e do
Tribunal Superior Eleitoral.

333
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

1 IN T R O D U Ç Ã O

E m 2 0 2 0 , a n o q u e o m u n d o e n fre n ta a m a is g ra v e c rise sa n itá ria


d o séc u lo - p a n d e m ia d o C o ro n a v íru s (C O V ID -1 9 ) - e n tra em v ig ê n c ia
o n o v o m a rc o leg al d o sa n e a m e n to b á sic o , a L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 (N M L S B ).
O m a rc o leg al a n tes v ig e n te p a ra o se to r d e sa n e a m e n to b á sic o b ra sile iro
e ra d e te rm in a d o n a L e i F e d e ra l n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 — c o n h e c id a c o m o L ei
d e D ire triz e s N a c io n a is d e S a n e a m e n to B á sic o (L N S B ) — re g u la m e n ta d a
p e lo D e c re to F e d e ra l n° 7 .2 1 7 /2 0 1 0 .
E n tre os p rin c íp io s fu n d a m e n ta is de am b a s as n o rm as,
so b re le v a -se a u n iv e rsa liz a ç ã o d o a c e sso e e fe tiv a p re sta ç ã o d o s serv iç o s
d e san e am en to . A u n iv e rsa liz a ç ã o , in ic ia lm e n te c o n c e itu a d a p e la p ró p ria
n o rm a co m o a a m p lia ç ã o p ro g re ssiv a d o a c e sso d e to d o s os d o m ic ílio s
ocupados ao s a n e a m e n to b á s ic o (art. 3°, III), ap ó s a a lte ra ç õ e s
p ro m o v id a s p e lo n o v o m a rc o leg al d o s a n e a m e n to b á s ic o (N M L S B ),
re c e b e u n o v a ro u p a g e m , d e fo rm a a e sp e c ific a r q u ais seria m esses
serv iço s: a b a s te c im e n to d e á g u a e /o u e sg o ta m e n to san itário , in c lu íd o s o
tra ta m e n to e a d isp o siç ã o fin al a d e q u a d o s d o s e sg o to s san itário s.
Sob a p e rsp e c tiv a d o n o v o m a rc o leg al seto rial, o sa n e a m e n to
b á s ic o co m p õ e o c o n ju n to dos se g u in te s se rv iç o s p ú b lic o s 1: i)
a b a ste c im e n to d e á g u a p o tá v e l, ii) e sg o ta m e n to san itário , iii) lim p e z a
u rb a n a e m a n e jo d e re síd u o s só lid o s e iv ) d re n a g e m e m a n e jo d as ág u a s
p lu v ia is u rb a n as.
In te re ssa m ao p re se n te estu d o d o is deles: o a b a ste c im e n to de
á g u a p o tá v e l e o e sg o ta m e n to san itário . O ú ltim o , c o n stitu íd o p elas
a tiv id a d e s e p e la d isp o n ib iliz a ç ã o e m a n u te n ç ã o d e in fra e stru tu ra s e
in s ta la ç õ e s o p e ra c io n a is n e c e ssá ria s à co leta , ao tra n sp o rte , ao
tra ta m e n to e à d isp o siç ã o fin al a d e q u a d o s d o s esg o to s san itário s, d esd e

1 Nos termos do art. 2°, III, da Lei n° 11.445/2007, antes das alterações implementadas
pela Lei n° 14.026/2020, o serviço público de saneamento básico englobava limpeza
urbana e manejo de resíduos sólidos.

334
as lig a ç õ e s p re d ia is a té su a d e stin a ç ã o fin al p a ra p ro d u ç ã o d e á g u a de
re u so o u seu la n ç a m e n to d e fo rm a a d e q u a d a n o m e io am b ien te.
A o lo n g o d o estu d o , tra ta r-s e -á d o n o v o m a rc o seto rial co m o
u m a im p o rta n te fe rra m e n ta leg isla tiv a , a p ta a im p u ls io n a r p o lític a s
p ú b lic a s e fic aze s, em p ro l d o s c o m p ro m is so s a ssu m id o s p e lo B ra sil, n o
p la n o in te rn a c io n a l, e n q u a n to sig n a tá rio d a A g e n d a 2 0 3 0 2 .
S o b re a A g e n d a 2 0 3 0 c a b e u m ad en d o : os se rv iç o s re la c io n a d o s
ao s a n e a m e n to b á s ic o c o rre la c io n a m -se co m trê s d o s d e z e sse te o b je tiv o s
p ro p o sto s, a saber: o O b je tiv o 1, q u e firm a c o m p ro m isso co m o co m b a te
à p o b re z a ; o O b je tiv o 3 q u e v is a a sse g u ra r u m a v id a sau d á v el e a
p ro m o ç ã o ao b e m -e s ta r p a ra to d o s e o O b je tiv o 6 q u e a sse g u ra a
d is p o n ib ilid a d e e a g e stã o su ste n tá v e l d e á g u a e sa n e a m e n to p a ra to d o s.
A e s tru tu ra d o p re se n te e stu d o p e rp a ssa p e lo rá p id o ex a m e das
n o v a s c o m p e tê n c ia s n o rm a tiv a s d a L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 e d as m o d a lid a d e s
dos se rv iç o s de sa n e a m e n to b á s ic o in e re n te s ao s se rv iç o s de
a p ro v e ita m e n to d e á g u a p o tá v e l e e sg o ta m e n to san itário .
O p o n to n o d al v is a re s p o n d e r u m a in d a g a ç ã o , e x tra ív e l d e u m
d e b a te em to rn o d e u m a d e m a n d a re p lic á v e l em in ú m e ro s litíg io s n o s
q u ais c o n s u m id o re s q u e stio n a m a n ã o u n iv e rsa liz a ç ã o d o s se rv iç o s d e
sa n e a m e n to b á s ic o p re sta d o s p o r c o n c e ssio n á ria s: c o n sid e ra n d o o fa to
d e o N o v o M a rc o L eg a l d o S a n e a m e n to B á sic o e n g lo b a r os se rv iç o s de
ac e sso a á g u a p o tá v e l e e sg o ta m e n to san itário , q ual o c a m p o d e v ig ê n c ia
d o R e c u rs o E sp e c ia l R e p e titiv o n° 1 .3 3 9 .3 1 3 /R J?

2 O Brasil é signatário da Agenda 2030 da ONU para o Desenvolvimento Sustentável, cujos


objetivos e metas traçados foram reunidos no documento “Transformando o Nosso Mundo:
a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável”. A agenda é composta por dezessete
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) a serem implementados até o ano de
2030. Dentre eles, cita-se o Objetivo 6.1 quem tem como propósito: “Até 2030, alcançar o
acesso universal e equitativo a água potável e segura para todos.” Disponível em:
http://www.rio20.gov.br/documentos/documentos-da-conferencia/o-futuro-que-
queremos/at_download/the-future-we-want.pdf. Acesso em: 20 maio 2021.

335
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

2 C O M P E T Ê N C IA S L E G IS L A T IV A S NO NOVO M ARCO
L E G A L D O S A N E A M E N T O B Á S IC O B R A S I L E I R O

N o atu al E sta d o d e D ire ito C o n stitu c io n a l, o e x e rc íc io d o p o d e r


p o lític o e s tá su b m e tid o a re g ra s ju ríd ic a s (C A N O T IL H O , 2 0 0 3 ) e p a ra
q u e essa s sejam tra d u z id a s em aç õ es e fe tiv a s n o m u n d o d o ser, q u a n to
m a is c la ro fo r u m c o m p ê n d io n o rm a tiv o , m e lh o re s serão os re su lta d o s
a lc a n ç a d o s, so b re tu d o em p o lític a s p ú b lic a s re la c io n a d a s a sen sív eis
seto re s d e g o v e rn o .
A n o rm a até então v ig en te - L ei n° 11.445/2007 - assentava-se n a
g estão asso ciad a dos serviços, explicável p ela necessid ad e de co operação
in terfed erativ a dos entes p ú b lico s3; e n a reg u lação dos serviços p o r
en tid ad es reg u lad o ras locais. C ontudo, a desp eito de existir atividade
regulatória, era p aten te a fa lta d e u m a clara d efin ição quantos aos lim ites de
co m p etên cia d o s entes reguladores, ocasionado, so bretudo p ela au sên cia de
u m a en tid ad e reg u la d o ra federal em m atéria de saneam ento.
A e x p e riê n c ia d e m o n stro u que e ssa a u sê n c ia g e ra v a u m
descom passo n a c io n a l, ta n to q u a n to ao s c rité rio s p a ra o

3 A gestão associada do serviço público de saneamento foi examinada pelo STF que a
justificou: “O art. 23, IX, da Constituição Federal conferiu competência comum à União,
aos estados e aos municípios para promover a melhoria das condições de saneamento
básico. Nada obstante a competência municipal do poder concedente do serviço público de
saneamento básico, o alto custo e o monopólio natural do serviço, além da existência de
várias etapas - como captação, tratamento, adução, reserva, distribuição de água e o
recolhimento, condução e disposição final de esgoto - que comumente ultrapassam os
limites territoriais de um município, indicam a existência de interesse comum do serviço de
saneamento básico. A função pública do saneamento básico frequentemente extrapola o
interesse local e passa a ter natureza de interesse comum no caso de instituição de regiões
metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, nos termos do art. 25, §3°, da
Constituição Federal. Para o adequado atendimento do interesse comum, a integração
municipal do serviço de saneamento básico pode ocorrer tanto voluntariamente, por meio
de gestão associada, empregando convênios de cooperação ou consórcios públicos,
consoante o arts. 3°, II, e 24 da Lei Federal 11.445/2007 e o art. 241 da Constituição Federal,
como compulsoriamente, nos termos em que prevista na lei complementar estadual que
institui as aglomerações urbanas.” (ADI n° 1.842, Rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes,
Tribunal Pleno, DJe 13.09.2013).

336
c o m p a rtilh a m e n to d o a b a ste c im e n to d e á g u a p o tá v e l, q u a n to em m a té ria
d e p re s ta ç ã o ig u a litá ria d o s se rv iç o s d e e sg o ta m e n to san itário . A
in d e fin iç ã o re g u la tó ria d o se to r era, in c lu siv e , a p o n ta d o p o r m u ito s
e stu d io s o s 4 c o m o u n s dos g ra n d e s re sp o n sá v e is — c o n so a n te d ad o s
d iv u lg a d o s p e lo C o n se lh o E m p re sa ria l B ra sile iro p a ra o
D e se n v o lv im e n to S u ste n tá v e l (C E B D S ) em p u b lic a ç ã o la n ç a d a n o
F ó ru m d a Á g u a: g e stã o e stra té g ic a n o se to r e m p re sa ria l — p e lo fa to d e o
p a ís o c u p a r o 112° lu g a r n o r a n k in g d as in fra e stru tu ra s d e sa n e a m e n to
e n tre os 2 0 0 p a íse s p e s q u is a d o s 5 e c o n ta r co m m a is d e 35 (c in c o ) m ilh õ e s
d e b ra s ile iro s sem a c e sso à á g u a p o tá v e l d istrib u íd o s d e fo rm a n ão
e q u â n im e e n tre as 100 m a io re s c id a d e s d o p a ís 6 .
N o in tu ito d e n o rm a tiz a r a q u e stã o n a c io n a lm e n te , o N M L S B
p ro m o v e u sig n ific a tiv a s m u d a n ç a s n a le g isla ç ã o . E n tre elas, so b re le v a -
se a a m p lia ç ã o d o rol d e c o m p e tê n c ia d a j á e x iste n te A g ê n c ia N a c io n a l
d e Á g u a s (A N A ), d o ra v a n te A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a e S a n e a m e n to
B á sico . R e fe rid a a u ta rq u ia a ssu m iu a re sp o n sa b ilid a d e p e la in stitu iç ã o
d e n o rm a s d e re fe rê n c ia p a ra a re g u la ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e
sa n e a m e n to b á sic o a n ív el n ac io n a l. N a q u a lid a d e d e in te g ra n te do
S iste m a N a c io n a l d e G e re n c ia m e n to d e R e c u rso s H íd ric o s, re c e b e u
a in d a o m u n u s d e im p le m e n ta r a P o lític a N a c io n a l d e R e c u rso s H íd ric o s
e d e c o n trib u ir p a ra a a rtic u la ç ã o e n tre o P la n o N a c io n a l d e S a n e a m e n to
B á sic o , o P la n o N a c io n a l d e R e síd u o s S ó lid o s e o P la n o N a c io n a l de
R e c u rs o s H íd rico s.

4 Sobre escolhas administrativas e a atividade regulatória estatal vide GUERRA, Sérgio.


Discricionariedade, regulação e reflexividade. 5. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2018.
5 CEBDS - Conselho Empresarial Brasileiro para Desenvolvimento Sustentável.
Disponível em: https ://cebds.org/setor-empresarial-discute-gestao-estrategica-da-agua.
Acesso em: 20 maio 2021.
6 Dados do Instituto Trata Brasil, junto ao Sistema Nacional de Informações sobre
Saneamento - SNIS 2019. Disponível em: http://www.tratabrasil.org.br/saneamento/p
rincipais-estatisticas/no-brasil/agua. Acesso em: 20 maio 2021.

337
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

À s a g ê n c ia s re g u la d o ra s lo c a is fic o u re se rv a d o o p ap e l d e san a r
la c u n a s n o rm a tiv a s d e in te re sse lo cal, co m ê n fa se n a e sc o lh a e n o
p la n e ja m e n to d a p re sta ç ã o d o s se rv iç o s d e su a titu la rid a d e .
A a lte ra ç ã o le g is la tiv a v ai ao e n c o n tro d o q u e d e te rm in o u o
S u p rem o T rib u n a l F e d e ra l (S T F ), na A D I n° 1.842. No c itad o
p re c e d e n te , o S T F firm o u c o m p re e n sã o n o se n tid o d e que, em m a té ria
d e s a n e a m e n to b á sic o , as m a té ria s d e in te re sse lo cal são d e c o m p e tê n c ia
d o s M u n ic íp io s, c a b e n d o à U n iã o e sta b e le c e r d ire triz e s se to ria is7.
O u tra q u e stã o d e a lta re le v â n c ia tra ta d a n o n o v o m a rc o
re g u la tó rio d o se to r c o n siste n a d e fin iç ã o d e titu la rid a d e d o s se rv iç o s
p ú b lic o s q u e lh e são c o rre la to s q u e — em d e c o rrê n c ia ló g ic a do
fe d e ra lis m o d e c o o p e ra ç ã o 8 q u e p e rm e ia as re la ç õ e s e n tre o en te
fe d e ra d o s — se g u iu as m e sm a s b a se s e stru tu ra is a d o ta d a s p e la d e fin iç ã o
d e c o m p e tê n c ia s d as a g ê n c ia s re g u la d o ra s seto riais, e n a s d e fin iç õ e s d e
q u ais e n tid a d e s re sp o n sa b iliz a r-se -ã o p e la su a o p e ra c io n a liz a ç ã o .
O N M L S B tro u x e u m a n o v a fo rm a d e p restação dos serviços nas
h ip ó teses de co m p artilh am en to in term unicipal de infraestruturas: a
p r e s ta ç ã o d ir e ta dos se rv iç o s m e d ia n te c o n só rc io s p ú b lic o s
in te rm u n ic ip a is d e san eam en to b ásico m ed ian te in stitu ição de a u t a r q u i a
in te rm u n ic ip a l. A ad o ção d essa m o d alid ad e p assa a im p lica r v ed a ção da
fo rm alização de contrato de p ro g ram a com sociedade de eco n o m ia m ista ou
em p re sa pública, ou a su b d eleg ação d o serviço p restad o p ela au tarq u ia
in term u n icip al sem p rév io p ro ced im en to licitatório.

7 ADI n° 1.842, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, DJe 13.09.2013.
Especificamente em relação aos serviços de saneamento básico, a competência material
para a sua prestação é do ente municipal, já que seu âmbito de incidência é, a priori,
local. A tal respeito ver: BARROSO, Luís Roberto. Saneamento básico: competências
constitucionais da União, Estados e Municípios. Revista Eletrônica de Direito
Administrativo Econômico (REDAE), Salvador, n. 11, ago./out. 2007. Disponível e
m: http://www.direitodoestado.com.br/redae.asp. Acesso em: 20 maio 2021.
8 Sobre federalismo de cooperação e sua adoção pelo Estado Brasileiro, vide
BERCOVICI, Gilberto. Dilemas do Estado federal brasileiro. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2004.

338
A p re sta ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s p o r e n tid a d e q u e n ã o in te g re
a a d m in is tra ç ã o d o titu la r re sta m a n tid a , m e d ia n te a ssin a tu ra d e c o n tra to
de co n c e ssã o . C o n tu d o , novas c o n d ic io n a n te s são im p o sta s aos
p a rtíc ip e s d o setor, p o r m e io d a in c lu sã o d e n o v a s c lá u su la s esse n ciais.
É im p o rta n te re g is tra r q u e os c o n tra to s a in d a em v ig ê n c ia , em
su a m a io ria , fo ra m firm a d o s p e lo s titu la re s d o s se rv iç o s (m u n ic íp io s)
co m as e m p re sa s e sta d u a is d e á g u a e esg o to , sob os a u sp íc io s d o c o n tra to
d e p ro g ra m a , q u e fa c u lta v a , a té en tão , à s e n tid a d e s d a a d m in istra ç ã o
p ú b lic a in d ire ta a a s s u n ç ã o d o s s e rv iç o s se m c o n c o r r ê n c ia (lic ita ç ã o ).
O n o v o m arc o , v is a n d o to rn a r o se to r m a is a tra tiv o à in ic ia tiv a
p riv a d a , to rn o u o b rig a tó rio q u e n o s n o v o s co n tra to s d e co n c e ssã o , sejam
eles firm a d o s co m e m p re sa s p ú b lic a s ou p riv a d a s, h a ja re g u la r
su b m issã o a p ro c e sso lic ita tó rio , em ig u a ld a d e d e co n d içõ e s, n a
m o d a lid a d e co n c o rrê n c ia .
O ex a m e d e to d o o a rc a b o u ç o n o rm a tiv o e v id e n c ia u m a
a p ro x im a ç ã o d o le g is la d o r co m u m a re g u la ç ã o re fle x iv a , n a q u al o
E s ta d o “ d e ix a d e se r u m a d ju d ic a d o r d e d ire ito s e p a s s a a se r u m
m e d ia d o r de in te re sse s, sem p e rd e r a fu n ç ã o de tu to r das
h ip o s s u fic iê n c ia s so c ia is” . (M A R Q U E S N E T O , 2 0 0 2 ).

3 BREVES NOTAS QUANTO À POLÍTICA TARIFÁRIA DO SETOR

A n o rm a até e n tã o v ig e n te fa c u lta v a ao s e n tes p ú b lic o s, n as


h ip ó te s e s d e o p ç ã o p e la p re sta ç ã o d ireta, a g e stã o a sso c ia d a d o serv iç o
p o r m e io d e u m c o n só rc io p ú b lic o , v ia c o n tra to d e p ro g ra m a . A L e i n°
1 1 .1 0 7 /0 5 , ao e sta b e le c e r q u e re fe rid o c o n tra to d e p e n d e ria d e p ré v ia
s u b sc riç ã o d e p ro to c o lo d e in te n ç õ e s, fe z p ré v ia e x ig ê n c ia n o se n tid o de
q u e a g e s tã o a sso c ia d a d o s se rv iç o s tiv e sse c rité rio s té c n ic o s p a ra o
c á lc u lo d e ta rifa s e d e o u tro s p re ç o s p ú b lic o s re fe re n te ao s se rv iç o s de
a b a ste c im e n to d e á g u a e e sg o ta m e n to san itário .
N e s s e in te rre g n o , e ra p o ssív e l que, p a ra o c á lc u lo d o v a lo r das
ta rifa s fo sse c o n sid e ra d o , e n tre o u tro s fa to res, a a d o ç ã o d o m e c a n ism o

339
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

d e n o m in a d o “ su b síd io c ru z a d o ” 9 c u jo p ro p ó sito era p o ssib ilita r a


u n iv e rs a liz a ç ã o d o se rv iç o p a ra a q u e le s in d iv íd u o s que, em tese, n ão
te ria m c o n d iç õ e s d e a rc a r co m os c u sto s n e c e ssá rio s p a ra u s u fru ir dos
se rv iç o s d e a b a ste c im e n to d e á g u a e d e c o le ta d e e s g o to .10
Na p rá tic a, re fe rid o crité rio buscava a e q u iv a lê n c ia na
c o m p o s iç ã o d o v a lo r d a ta rifa p e lo c u sto m é d io d a to ta lid a d e dos
serv iç o s, o q u e e n c o b re tre c h o s c u jo m e rc a d o n ã o c o n se g u iria su p o rta r
seu s c u sto s reais, em d e trim e n to d e o u tro s c u jo s c o n su m id o re s n ã o tã o
sen sív e is ao p re ç o (P O R T E R , 2005).
A p rá tic a, até en tã o v ig e n te , d e m o n stro u q u e o d e sa fio e sta ria
em c ria r su b síd io s q u e in d u z isse m as c o n c e ssio n á ria s d e se rv iç o de
sa n e a m e n to a a te n d e r ta m b é m os m a is p o b re s, j á q u e a eles o serv iç o
p ú b lic o re fe re n te a to d a a ca d e ia d e a b a ste c im e n to d e á g u a e e sg o ta m e n to
sa n itá rio n ã o a lc a n ç a v a (K E L M A N , 2 0 0 3 ).

4 DO CAM PO DE V IG Ê N C IA DO RECURSO E S P E C IA L
R E P E T I T I V O N° 1 .3 3 9 .3 1 3 /R J

A situ a ç ã o p ro v o c a d a p e la c o m p le x id a d e d a p o lític a ta rifá ria do


se to r e p e la n ã o u n iv e rsa liz a ç ã o d o s se rv iç o s d e á g u a e e sg o to e n se jo u
in ú m e ra s a ç õ e s ju d ic ia is p ro p o sta s p o r c o n su m id o re s d o E sta d o d o R io
d e Ja n e iro em d e sfa v o r d a C o m p a n h ia E sta d u a l d e Á g u a s e E sg o to s
(C E D A E ). O te m a foi a lç a d o ao S u p e rio r T rib u n a l d e J u stiç a q u e o
ju lg o u sob o rito d o art. 5 4 3 -C d o C ó d ig o d e P ro c e s so C iv il d e 1973, n o
R e c u rs o E s p e c ia l R e p e titiv o n° 1 .3 3 9 .3 1 3 /R J.

9 Subsídio é um instrumento econômico que tem como proposito estimular o consumo


ou a produção de bens e serviços. Consiste basicamente na diferença entre o preço real
de um bem ou serviço e o preço que é cobrado do consumidor por esse bem ou serviço.
10 A própria Lei n 11.455/2007 em seu art. 3°, VII, prevê o subsídio como “instrumento
econômico de política social para garantir a universalização de acesso ao saneamento
básico, especialmente para populações e localidades de baixa renda”.

340
A p e sa r d e a q u e stã o c e n tral g ira r em to rn o d a p o ssib ilid a d e de
c o b ra n ç a in te g ra l d a ta rifa d e e sg o to n o s c a so s em q u e a c o n c e ssio n á ria
a p e n a s re a liz a a c o le ta e o tra n sp o rte d o s d ejeto s, sem p ro m o v e r o
tra ta m e n to sa n itá rio d o m a te ria l c o le ta d o a n te s d o d esá g u e, ao fim e ao
cab o , a c a u sa d e p e d ir in d ire ta re la c io n a v a -se ao fa to d e a u n iv e rsa liz a ç ã o
d o s se rv iç o s e s ta r o u n ã o c o n e c ta d a co m a p o lític a ta rifá ria d o seto r.
N o re fe rid o ju lg a d o , o S u p e rio r T rib u n a l e x a m in a n d o o art. 3°
d a L ei n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 e o art. 9° d o D e c re to n° 7 .2 1 3 /2 0 1 0 , a p e sa r d e as
v a ria n te s n o rm a tiv a s q u a n to à c o m p o siç ã o d o p re ç o d a ta rifa n ã o te re m
sid o o b je to d e ex am e, a sse n to u a te se d e q u e

a legislação que rege a matéria dá suporte para a cobrança


da tarifa de esgoto mesmo ausente o tratamento final dos
dejetos, principalmente porque não estabelece que o
serviço público de esgotamento sanitário somente existirá
quando todas as etapas forem efetivadas, tampouco proíbe
a cobrança da tarifa pela prestação de uma só ou de
algumas dessas atividades.

D e sd e en tão , a ju ris p ru d ê n c ia d o S u p e rio r T rib u n a l d e Ju stiç a


p a c ific o u -s e n o sen tid o d e q u e

há que se considerar prestado o serviço público de


esgotamento sanitário pela simples realização de uma ou
mais das atividades arroladas no art. 9° do referido decreto,
de modo que, ainda que detectada a deficiência na
prestação do serviço pela ausência de tratamento dos
resíduos, não há como negar tenha sido disponibilizada a
rede pública de esgotamento sanitário.

N o p re se n te e stu d o , p re te n d e -se , p o is, e x a m in a r se fre n te ao


n o v o m a rc o le g a l d e sa n e a m e n to b á sic o a in d a h a v e rá e sp a ç o leg al p a ra
a p lic a ç ã o d esse e n te n d im e n to d o STJ. E m o u tras p alav ras: é p o ssív e l q u e
o v a lo r d a ta rifa d e á g u a e e sg o to , m e sm o d ia n te d a n ã o in sta la ç ã o de
to d a a c a d e ia d e a tiv id a d e s in e re n te s ao setor, c o n tin u e sen d o u tiliz a d o
c o m o fe rra m e n ta a p ta a a lc a n ç a r a q u a lid a d e d o se rv iç o em si p re sta d o ?

341
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

Sob os auspícios d a re d açã o original d a L ei n° 11.445/07, o serviço


de san eam en to p o d eria ser p restad o d iretam en te p elo titu lar d o serviço (ente
d a fed eração q u e p o ssu a co m p etên cia p ara a p restação desse serviço
p úblico), m ed ian te contrato d e p ro g ram a (h ip ó tese de g estão asso ciad a) e,
p o r fim , m ed ian te contrato de co n cessão firm ad o v ia d eleg ação à in iciativ a
p riv ad a (arts. 9°, II, e 10 d a referid a lei). N e ssa s hipóteses, o in stru m en to
contratual seria o u contrato concessão de serviços p ú b lico s (m ed ian te p rév ia
licitação ) ou o contrato de program a, este ú ltim o q u an d o se tra ta r de g estão
associada, m ed ian te celeb ração de con v ên io entre os entes p ú b lico s titulares
do serviço. (arts. 8° e 11, § 2°, d a m e sm a lei).
O art. 11, §2°, d a L e i n° 1 1 .4 4 5 /0 7 fa z ia p re v isã o e x p re ssa n o
se n tid o d e q u e as n o rm a s re g u la d o ra s d e v e ria m p re v e r, além d a s m e ta s
p ro g re s s iv a s e g ra d u a is d e e x p a n sã o d o s serv iç o s, as c o n d iç õ e s de
s u s te n ta b ilid a d e e e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro d a p re sta ç ã o dos
serv iç o s, em re g im e d e efic iê n c ia , in c lu in d o , e n tre o u tras m e d id as: o
siste m a d e c o b ra n ç a e c o m p o siç ã o d e ta x a s e ta rifa s; a siste m á tic a de
re a ju ste s e d e re v isõ e s d e ta x a s e ta rifa s; a p o lític a d e s u b s íd io s .11*IV
P o r o u tro lad o , a le g isla ç ã o até e n tã o d e re g ê n c ia c o m e te u o
e q u ív o c o d e c o n fe rir ao s in stru m e n to s c o n tra tu a is a s iste m á tic a de
re a ju ste s e d e re v isõ e s d e ta x a s e ta rifa s, a p o lític a d e su b síd io s e as m e ta s
d e u n iv e rsa liz a ç ã o .
C o m o o b je tiv o d e c o rrig ir a d isto rç ã o d o siste m a, n o ta d a m e n te
q u a n to ao v o lu m e d e n o rm a s d e c o n c e ito s ju ríd ic o s in d e te rm in a d o s,
s o b re tu d o q u a n to a d e lim ita ç ã o de m e ta s as serem a lc a n ç a d a s,
p a d ro n iz a ç ã o d e se rv iç o s a serem p re sta d o s, p o lític a ta rifá ria seto rial e

11 Alguns estados da federação regulamentaram, via decreto, a estrutura do sistema tarifário


dos serviços a serem prestados pelos concessionários. A exemplo do Decreto n° 41.446, de
16/12/1996, que dispõe sobre o regulamento do sistema tarifário dos serviços prestados pela
SABESP. No cálculo do valor da tarifa, estabeleceu como critérios os seguintes fatores: I -
categorias de uso; II - capacidade de hidrômetro; III - característica de demanda e consumo;
IV - faixas de consumo: V - custos fixos e variáveis; VI - sazonalidade; VII - condições
socioeconômicas dos usuários residenciais.

342
d e lim ita ç ã o d e re sp o n sa b ilid a d e s en tre p a rtíc ip e s d e to d a a ca d eia, o
n o v o m a rc o leg al im p lic a c o n sid e rá v e is av a n ço s, se n d o a m a is in o v a d o ra
aq u ela, c o m o j á a n te c ip a d o , q u e c o n fe re à A N A a c o m p e tê n c ia p a ra a tu a r
c o m o e n tid a d e re g u la d o ra a n ív el n ac io n a l.
N e s s e p o n to , lo g o d e in ício , p e rc e b e -se o e sfo rç o le g isla tiv o em
c ria r p a râ m e tro s m a is só lid o s ao s fu tu ro s co n tra to s d e c o n c essão . D e u m
lad o , a fo rç a n o rm a tiv a d o s n o v o s in stru m e n to s c o n tra tu a is p e rd e e sp a ç o
p a r a o p o d e r n o r m a tiv o d o s n o v o s a g e n te s r e g u la tó r io s ; d e o u tro , fic a
cla ro q ue, a d e s p e ito d e a s m e ta s s e r e m im p le m e n ta d a s d e f o r m a
p r o g r e s s iv a , o s e u d e s c u m p r im e n to p e lo c o n t r a t a n t e d a r á e n s e jo à
im p o s iç ã o d e i n ú m e r a s e a d e q u a d a s p e n a lid a d e s .
N o n o v o rol d e c o m p e tê n c ia s d as e n tid a d e s re g u la d o ra s lo cais,
o b se rv a d a s as d ire triz e s d e te rm in a d a s p e la A N A , a L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0
e sta b e le c e u in o v a ç õ e s n o c a m p o n o rm a tiv o : a) p a d rõ e s e in d ic a d o re s d e
q u a lid a d e d a p re sta ç ã o d o s serv iç o s; b ) re q u isito s o p e ra c io n a is e de
m a n u te n ç ã o d o s siste m as; c) m e ta s p ro g re ssiv a s d e e x p a n sã o e de
q u a lid a d e d o s se rv iç o s e os re sp e c tiv o s p ra zo s; d ) r e g im e , e s t r u t u r a e
n ív e is t a r i f á r i o s , e os p r o c e d im e n to s e p r a z o s d e s u a f ix a ç ã o , r e a j u s te
e re v is ã o ; e) m e d iç ã o , f a t u r a m e n t o e c o b r a n ç a d e s e rv iç o s; f)
m o n ito ra m e n to d o s cu sto s; g ) a v a lia ç ã o d a e fic iê n c ia e e fic á c ia dos
se rv iç o s p re s ta d o s e h ) su b síd io s ta rifá rio s e n ã o ta rifá rio s.
N ã o h á d ú v id a q u a n to ao in te re sse d o le g isla d o r, in té rp re te
o rig in á rio d a n o rm a , em fo rta le c e r o p ap e l d o E sta d o c o m o ag e n te
re g u la d o r, e n ã o co m o ex e cu to r, d o serv iç o d e sa n e a m e n to b ásico .
E m o u tras p a la v ra s, a v o n ta d e p ú b lic a atu al é b u sc a r, em u m
a m b ie n te co m séria s b a rre ira s q u e o m o n o p ó lio n a tu ra l im p õ e à liv re
in ic ia tiv a e à liv re c o n c o rrê n c ia , a a m p lia ç ã o d o siste m a d e sa n e a m e n to
b á s ic o p o r m e io d e re c u rso d a in ic ia tiv a p riv ad a . P a ra to rn á -lo u m se to r
m in im a m e n te atra en te, u m a d as so lu ç õ e s e n c o n tra d a s foi, n a m a io r
b re v id a d e p o ssív el, e lim in a r d e sa rra z o a d o s p riv ilé g io s u s u fru íd o s p o r
alg u n s a g e n te s d o se to r (ex. c o n tra to s d e p ro g ra m a sem lic ita ç ã o ), j á q u e

343
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

seu alto c u sto d e in sta la ç ã o e m a n u te n ç ã o , so m a d o s à fa lta d e u m re g im e


d e c o m p e tiç ã o e d e lib e rd a d e d e in ic ia tiv a te ria m a fa sta d o o in te re sse d e
re le v a n te s p la y e r s e, por c o n se q u ê n c ia , c o m p ro m e tid o a
o p e ra c io n a liz a ç ã o d o a c e sso u n iv e rsa l d o s serv iço s.
P o r fim , é d e se e sp e ra r que, co m as n o v a s c o n c e ssõ e s seto riais,
re g u la d a s p o r n o v a p o lític a seto rial d e n ív el n ac io n a l, a q u e stã o d a
c o b ra n ç a in teg ra l d a ta rifa em seto re s sem ac e sso a to d a a c a d e ia d e
se rv iç o s te n h a u m a so lu ç ã o e q u â n im e n o c a m p o n o rm a tiv o . E , se assim
o for, o c a m p o d e a p lic a ç ã o d o R e c u rso E sp e c ia l R e p e titiv o n°
1 .3 3 9 .3 1 3 /R J e sta rá c irc u n sc rito ao s c o n tra to s d e p ro g ra m a em v ig o r
q u a n d o d o a d v e n to d a N M L S B , q u e te rã o até 3 1 /3 /2 0 2 2 , p a ra in c lu ir as
m e ta s d e u n iv e rsa liz a ç ã o em seu p ro to c o lo , e até 2033 p a ra e fe tiv a m e n te
im p le m e n ta re m o a c e sso u n iv e rsa l ao s serv iç o s, ta n to d e a c e sso a ág u a
p o tá v e l, q u a n to a tra ta m e n to d e esgoto.

4 CONCLUSÕES

O sa n e a m e n to b á s ic o é d ire ito p ú b lic o fu n d a m e n ta l, sen d o


d e v e r d o E s ta d o c o n c e n tra r to d o s os e sfo rç o s p a ra p ro m o v e r a
u n iv e rs a liz a ç ã o d e su a p re sta ç ã o , d e fo rm a a a sse g u ra r q u e to d o s,
in d e p e n d e n te m e n te d e c la sse social o u lo cal d e m o rad ia , te n h a m ac esso
à in te g ra lid a d e d o s serv iço s.
Sob o a rg u m e n to d e q u e o m o d e lo atu al n ã o fa v o re c ia a
im p le m e n ta ç ã o d o a c e sso u n iv e rsa l e d a in te g ra lid a d e d o s se rv iç o s a
serem p re sta d o s, u m n o v o m a rc o leg al p a ra o se to r foi ap ro v ad o . N e sse
n o v o m o d e lo , fic a c la ra a in te n ç ã o d o le g is la d o r em p ro m o v e r estím u lo s
p a ra q u e os se rv iç o s sejam p re sta d o s p e lo se to r p riv ad o , c a b e n d o ao
E s ta d o o p ap e l d e ag e n te re g u la d o r.
É e sp e ra d o q u e a p o lític a /re g u la ç ã o seto rial a ser im p le m e n ta d a
e m p re e n d a os e sfo rç o s n e c e ssá rio s em pro l d a e fic iê n c ia d o se to r de
fo rm a a g a ra n tir o a c e sso u n iv e rsa l a to d o s os se rv iç o s d a ca d eia. Se, de

344
fato , o o b je tiv o fo r a lc a n ç a d o , d e m a n d a s ju d ic ia is ta is c o m o as tra v a d a s
n o R e c u rs o E sp e c ia l R e p e titiv o n° 1 .3 3 9 .3 1 3 /R J p e rd e rã o terren o .
A d e m a is, c o n sid e ra n d o q u e a d e c isã o ju d ic ia l p ro fe rid a n o
R e c u rs o E s p e c ia l n° 1 .3 3 9 .3 1 3 /R J foi la v ra d a sob os a u sp íc io s d a re d a ç ã o
o rig in a l d a L ei n° 1 1 .4 4 5 /0 7 e q u e e la em n a d a im p a c ta n a s d ire triz e s d a
L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , te m -s e q u e o fu n d a m e n to d e c isó rio ali firm a d o
p e rm a n e c e em v ig o r.
P o rém , n o futuro, espera-se que, caso o Ju d iciário seja in stad o a
re so lv e r con flitos n o cam p o das m etas d e univ ersalização e integralização
dos serviços de saneam ento básico, sejam enfocadas a leg alid ad e das
n o rm as ex p ed id as p elas agências reg u lad o ras e q uestões inerentes aos
co n trato s adm inistrativos, n o tad am en te quanto a pen alid ad es im p o stas aos
co n cessio n ário s descu m p rid o res das regras contratuais, m as não sobre as
reg ras técn icas relacio n ad as à p o lítica tarifá ria d o setor.

R E F E R Ê N C IA S

BA RRO SO , L u ís R o b e rto . S a n e a m e n to b ásico : c o m p e tê n c ia s


c o n s titu c io n a is d a U n iã o , E sta d o s e M u n ic íp io s. R e v is ta E l e t r ô n i c a d e
D ir e ito A d m i n i s tr a t iv o E c o n ô m ic o (R E D A E ), S alv ad o r, n. 11,
ag o ./o u t. 2 0 0 7 . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .d ire ito d o e sta d o .c o m .b r/re d a
e.asp . A c e sso em : 2 0 m a io 2021.

B E R C O V IC I, G ilb e rto . D ile m a s d o E s ta d o f e d e r a l b r a s ile ir o . P o rto


A leg re: L iv ra ria do A d v o g a d o , 2 0 0 4 .

C A N O T IL H O , J o a q u im Jo sé G o m es. D ir e ito C o n s titu c io n a l e T e o r ia


d a C o n s titu iç ã o . C o im b ra: A lm e d in a , 2003.

G U E R R A , S érgio. D i s c r ic io n a r ie d a d e , r e g u la ç ã o e re fle x iv id a d e .
B e lo H o riz o n te : F ó ru m , 2018.

345
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

K E L M A N , J. O su b síd io eficaz. O p e n sa m e n to d o se to r d e sa n e a m e n to
n o B rasil: p e rs p e c tiv a s fu tu ra s. P M S S , B ra sília , v. 16, p. 7 1 -7 8 , 2003.

M A R Q U E S N E T O , F lo ria n o d e A z ev ed o . A n o v a re g u la ç ã o dos
se rv iç o s p ú b lic o s. R e v is ta d e D ir e ito A d m in is tr a tiv o , R io d e Jan e iro ,
n. 2 2 8 , p. 13-29, ab r./ju n . 2002.

P O R T E R , M . E . E s t r a t é g ia c o m p e titiv a : té c n ic a s p a ra a n á lise de
in d ú s tria s e d a c o n c o rrê n c ia . 2. ed. R io d e Jan e iro : E lse v ie r, 2005.

346
PRESTAÇÃO REGIONALIZADA DO SANEAMENTO
BÁSICO NA LEI 14.026/2020: com o assegu rar a
D ignidade Hum ana Constitucional

R a fa e l L a ra M a rtin s *
A ria n a G a rc ia d o N a sc im e n to Teles*

S U M A R IO : 1 In tro d u ç ã o . 2 O a c e sso à á g u a e ao sa n e a m e n to b á sic o e


a D ig n id a d e H u m a n a . 3 P re sta ç ã o re g io n a liz a d a d e S a n e a m e n to B á sic o
a n tes e d e p o is d a L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 . 4 E n tre la ç a m e n to d a D ig n id a d e
H u m a n a co m os fo rm a to s n o v o s d e p re sta ç ã o re g io n a liz a d a d o serv iço .
5 C o n clu são .

1 IN T R O D U Ç Ã O

A L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , d e n o m in a d a N o v o M a rc o R e g u la tó rio do
S a n e a m e n to B á sic o , a lte ro u o se to r e stru tu ra lm e n te , na fo rm a
p re sta c io n a l, co n tra tu a l e re g u la tó ria . O m o d e lo d a L ei 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7
e x iste n te a té e n tã o a m p lia a p re sta ç ã o d o se rv iç o p o r e m p re sa s p riv a d a s,
ao a rg u m e n to d a n e c e ssid a d e d e e fe tiv a u n iv e rsa liz a ç ã o .
D e n tre as d e fin iç õ e s d e sa n e a m e n to d a n o v a lei, este a rtig o
d e s ta c a o a b a s te c im e n to d e á g u a e o tra ta m e n to d e e sg o ta m e n to san itário ,
p o n d e ra n d o so b re a re a liz a ç ã o d a p o lític a p ú b lic a in se rta n o s fo rm a to s

* Advogado.
* Advogada. Procuradora Jurídica da Saneamento de Goiás S.A. Mestre em D. Agrário e
Especialista em D. Constitucional pela Universidade Federal de Goiás, e em D.
Administrativo Contemporâneo pelo Instituto de Direito Administrativo de Goiás em parceria
com a Faculdade do Centro do Paraná. Conselheira Seccional e Presidente da Comissão da
Mulher Advogada da OAB/GO (2016-2018 e 2019-2021). Membro da Comissão Nacional
da Mulher Advogada (2017-2019 e 2020-2022) e da Comissão Especial de Saneamento,
Recursos Hídricos e Sustentabilidade (2020-2022) do CF/OAB.

347
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

d e re g io n a liz a ç ã o d o serv iç o , p re v isto s n o n o v o m arc o , p a ra a c o n c re ç ã o


d a D ig n id a d e H u m a n a .
A im p o rtâ n c ia d este te x to v ai além d e u m a re fle x ã o so b re a
n o v el le g is la ç ã o ; c o n d iz ta m b é m co m a in trín s e c a fin a lid a d e d a O rd e m
d o s A d v o g a d o s d o B ra sil, p e la d e fe sa d o s d ire ito s h u m a n o s, p e la ju s tiç a
so cial e a b o a a p lic a ç ã o d as le is 1.

2 O A C E S S O À Á G U A E A O S A N E A M E N T O B Á S IC O E A
D IG N ID A D E H U M A N A

O acesso a saneam ento b ásico n ão se desvencilha do acesso à água


potável. E m to d o o m undo, segundo R elató rio d a O N U 12 (O rganização das
N açõ es U nidas), são 2 ,2 bilhões de pessoas sem acesso a serviços seguros de
ág u a potável e 4,2 bilhões sem acesso a saneam ento básico3.
A á g u a n ã o é só u m e le m e n to d a n a tu re z a , é ta m b é m u m re c u rso
h íd ric o e u m ativ o n o s p ro c e sso s p ro d u tiv o s. O p rim e iro c o n c e ito n ão
e stá a tre la d o ao u s o d a água, e sim à su a e x istê n c ia em su as fo n te s
su p e rfic ia is o u su b te rrâ n e a s, b e m c o m o a a b u n d â n c ia o u e sc a sse z n o
m e io a m b ien te. E isto in flu e n c ia n o ac e sso d as so c ie d a d e s e p o p u la ç õ e s,
em te rm o s d e q u a n tid a d e e q u a lid a d e .
C o m o re c u rso h íd ric o , a á g u a é b e m e c o n ô m ic o 4, a sso c ia d o a
m ú ltip lo s u so s, p a ra os q u a is, d e v e -se co b rar. L o g o , p a g a r p o r ela
ta m b é m é fo rm a d e d e te rm in a r o ac esso a e sse b em .
C id T o m a n ik P o m p e u 5 c ita c o n c e ito g e o ló g ic o q u e e x p lic a
s in g e la m e n te q u e “ (...) á g u a re fe re -se , re g ra g e ra l, ao e le m e n to n atu ra l,
d e s v in c u la d o d e q u a lq u e r u so o u u tiliz a ç ã o . P o r su a vez, o te rm o re c u rso

1 Lei 8.906/1994: art. 44.


2 ONU lança o novo relatório sobre água. In: https://ideiasustentavel.com.br/relatorio-
mundial-sobre-agua-2019. Acesso em: 22 maio 2021.
3 UMA em cada três pessoas em todo o mundo não tem acesso à água potável. In :
https://news.un.org/pt/story/2019/06/1676671. Acesso em: 24 maio 2021.
4 Lei 9.433/1997: art. 1°, inciso II.
5 Direito das Águas, 2010. p. 71.

348
h íd ric o é a c o n sid e ra ç ã o d a á g u a c o m o b e m e c o n ô m ic o , p assív e l de
u tiliz a ç ã o co m tal fim ” .
A á g u a c o m o fa to r d e d e se n v o lv im e n to é o u tra d e fin iç ã o q u e se
in se re n o c o n te x to d e d isc u ssõ e s d e su a u tiliz a ç ã o n o s p ro c e sso s
p ro d u tiv o s e n o s se rv iç o s p ú b lic o s, A c o n c e p ç ã o d e su ste n ta b ilid a d e
a c o m p a n h a o sen tid o , n o artig o d e A ria n a G a rc ia d o N a sc im e n to T e le s e
R ild o F e rre ira M o u rã o 6:

Essa visão é na verdade cultural. A forma como o ser


humano se apropria da natureza como recurso a lhe servir,
sem se preocupar com sua renovação ou conservação, é um
reflexo da forma como o homem se relaciona com o meio
ambiente, dissociando-se dele, muito longe da concepção de
pertencimento, e cedendo espaço para o paradigma
exploratório e mercadológico dos processos de produção,
ligados a essa concepção de desenvolvimento que, por sua
vez, encaram a terra e seus recursos naturais, como
propriedades individualizadas. Cumpre, todavia, ressaltar
que a água representa, acima de tudo, além de dignidade
humana, sob a análise do ponto de vista do desenvolvimento
econômico e social, também saúde pública. Não só por gerar
meios de viabilizar a vida saudável no planeta, como por
estar umbilicalmente ligada a medidas de higiene e
alimentação que perpassam o consumo humano.

É a in d a a tiv o p a r a o M e r c a d o e n o s p r o c e s s o s p r o d u tiv o s d a
in d ú s tr ia , a g r o n e g ó c io , g eraçã o de e n e rg ia , r e a liz a ç ã o de
s a n e a m e n to b á s ic o , c o m m o d itie s . R ic c a r d o P e tr e lla c o m e n to u em
u m a d e s u a s p u b lic a ç õ e s 7:

6 Sustentabilidade e uso da água nas atividades agrárias e a cultura desenvolvimentista.


Revista da Faculdade de Direito do Sul de Minas, In: https://www.fdsm.edu.br/revi
sta-da-faculdade-de-direito-do-sul-de-minas/artigo/?artigo=264&volume=33.2.
Acesso em: 22 maio 2021.
7 Água, “a commodity final”. In: https://eco21.eco.br/agua-a-commodity-final/. Acesso
em: 22 maio 2021.

349
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A política energética da nossa sociedade não é


primariamente decidida pelas autoridades públicas, mas
pelo preço do petróleo bruto, estabelecido pelos mercados
financeiros. Com sua inserção na Bolsa, o preço da água,
cujo valor para vida vai muito além de sua utilidade
econômica, em breve será um preço mundial. A política
mundial da água, assim como nos níveis regional e
“nacional”, será ditada pelos mercados financeiros
(especulativos). (...)
Depois veio a privatização da água e sua monetização e
financeirização (incluindo bancária).
As autoridades públicas não têm muito a declarar. Estão
em uma posição subordinada em muitos países onde os
poderes decisivos foram transferidos, seguindo a indústria
de privatização dos serviços de água, para as mãos de
companhias privadas para as quais a água é puramente um
produto utilitário. Na União Europeia, com a adoção da
Diretiva-Quadro da Água, em 2000, os reais poderes de
decisão no assunto foram confiados aos stakeholders,
cujas escolhas, especialmente para as corporações
multisserviços e, em qualquer caso, de companhias de
água cotadas na Bolsa de Valores, são avaliadas e julgadas
pelo mercado de ações.

O c e n á rio d o c o m p o rta m e n to d a á g u a n a s re la ç õ e s so ciais,


e c o n ô m ic a s, d e d e se n v o lv im e n to e d e M e rc a d o , sem d ú v id a, im p o rta n ão
só p a ra p ro v e ito e d is p o n ib ilid a d e d a á g u a a to d o s, c o m o ta m b é m p a ra
d e te rm in a r o ac esso ao sa n e a m e n to .
O o lh ar p elo v iés d a D ig n id ad e H u m a n a surge do reflexo desse
pan o ram a, à m ed id a q u e a con creção do direito se d á p elo alcance ao
m ín im o existencial, p ro p iciad o p ela saúde, o d esen v o lv im en to e o b e m -
estar q u e o acesso à ág u a potável e ao saneam ento b ásico co n fere às pessoas.
Logo, as a lte ra ç õ e s do N ovo M a rc o de R e g u la ç ã o do
S a n e a m e n to B á sic o n ã o p o d e m p e rd e r d e v is ta q u e o ac e sso à á g u a
p o tá v e l e ao sa n e a m e n to sig n ific a m c u m p rim e n to d o fu n d a m e n to
c o n stitu c io n a l d a D ig n id a d e H u m a n a 8, e q u a lq u e r q u e seja a v o c a ç ã o d a

8 CF/88: art. 1°, inciso III.

350
lei, m e sm o q u e fo m e n te te rc e iriz a ç õ e s e p riv a tiz a ç õ e s, o in te re sse
p ú b lic o co n tid o n a d ire triz d a “u n iv e rsa liz a ç ã o d o ac e sso e e fe tiv a
p re s ta ç ã o ” d o sa n e a m e n to 9 ja m a is d e v e d a r lu g a r ao in te re sse p riv ad o .
Se o a lc a n c e p o r to d o s, e os m e lh o re s in v e stim e n to s em sa n e a m e n to são
e sse n c ia is p a ra a v id a p le n a e o d e se n v o lv im e n to , a lei d ev e ser
in te rp re ta d a co m o fim d e se fa z e r c h e g a r á g u a e esg o to à p o p u la ç ã o , e
n ã o sob o u tra ótica.
M a rc u s V in íc iu s F u rta d o C o ê lh o 101, e x -p re sid e n te d o C o n se lh o
F e d e ra l d a O A B , m e n c io n o u a im p o rtâ n c ia d o sa n e a m e n to c o m o p o lític a
p ú b lic a e n ã o c o m o in v e stim e n to , ao c ita r a 8a C o n fe rê n c ia N a c io n a l de
S aú d e q u e d is c u tiu a re fo rm a sa n itá ria d e 1986:

A Constituição da República (...) contrapõe à concepção


do saneamento básico enquanto medida de infraestrutura,
a concepção de saneamento básico enquanto medida de
saúde pública. Na primeira, o saneamento apresenta-se
como investimento necessário à reprodução do capital (...).
A segunda, reflexo dos debates sanitaristas da década de
80, encara o saneamento como medida de saúde pública
integrante da agenda de política social.

A p e sa r disto , a u n iv e rsa liz a ç ã o e fe tiv a d o serv iç o até 2 0 3 3 , n o s


p a râ m e tro s le g a is d e 9 9 % d e á g u a e 9 0 % d e e s g o to 11 em to d o â m b ito dos
m u n ic íp io s ju s tif ic o u p a ra o p a rla m e n to a d e c isã o d e fa v o re c e r g ra n d e s
c o m p a n h ia s p re sta d o ra s n o m e rc a d o fin a n c e iro , a q u em os se rv iç o s de
á g u a in te re ssa m p a ra o v a lo r d as ações.
A D ig n id ad e H u m an a, todavia, am p aro u o discu rso am p lam en te
d iv u lg ad o 12, n ão só do p ro jeto leg islativ o de que a L ei 14.026/2020 resulta,

9 Lei 11.445/2007 (aletrada pela 14.026/2020): art. 2o, inciso I.


10 Saneamento Básico como Direito Constitucional. Saneamento Básico. Temas
fundamentais, propostas e desafios. 2017. p. 354-355.
11 Lei 14.026: Art. 11-B.
12 Cf. Instituto Trata Brasil: Ter saneamento básico é um fator essencial para um país
poder ser chamado de país desenvolvido. Os serviços de água tratada, coleta e
tratamento dos esgotos levam à melhoria da qualidade de vidas das pessoas, sobretudo

351
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

co m o os anterio res p ro jeto s e m ed id as p ro v isó rias p ara o setor, razão a m ais


p ara u m a v isão crítica en q u ad ran d o a fin alid ad e de acesso ao saneam ento
n a tô n ica das reg io n alizaçõ es d eterm in ad as n o n o v o m arco. O u estarem os
dian te do silêncio das autoridades pú b licas ao v a lo r q u e os serviços d e á g u a
e esg o to têm p ara o m erc ad o financeiro, co m o dito p o r R icca rd o P etrella,
em d etrim en to d a p o lítica p ú b lica de saneam ento que d ev e orientar, esta
sim , a to m a d a de decisões quanto ao tem a.

3 PRESTAÇÃO R E G IO N A L IZ A D A DE SAN EA M EN TO
B Á S IC O A N T E S E D E P O I S D A L E I 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0

A n te s d e tra ta r d a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a d e sa n e a m e n to b á sic o


d e fin id a n a n o v a lei, ca b e re s u m id a d ig re ssã o h is tó ric a so b re o
sa n e a m e n to n o p aís. O m a rc o c e n tral é o P la n a s a (P la n o N a c io n a l de
S a n e a m e n to ), d e 1968. A n te s d ele, h o u v e u m a fa se d e sre g u la m e n ta d a , e
co m su a e x tin ç ã o até o P la n sa b (P la n o N a c io n a l d e S a n e a m e n to B á sic o ),
o u tra fase. A L ei 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 a n tes d as a lte ra ç õ e s d o n o v o m a rc o re g e
ta m b é m o u tra etap a, e a L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 in stitu i n o v o m o m e n to , ainda,
sem d ú v id a.
C a d a u m d e sse s q u a tro re tra to s h istó ric o s tro u x e su a m a rc a p a ra
o sa n e a m e n to , e le v a n d o ín d ic e s d e a te n d im e n to e m e lh o ra d e v id a às
p o p u la ç õ e s co m a c e sso a a b a ste c im e n to d e á g u a e e sg o ta m e n to san itário .
Se o s se rv iç o s fo ra m p re sta d o s p o r e n tid a d e s d o p o d e r p ú b lic o
o u p riv ad a s, isto é so m e n o s im p o rta n te , p o is em to d o s os p e río d o s d a
h is tó ria d o san e am en to , re su lta d o s b e n é fic o s fo ra m ap re se n ta d o s, o ra
re a liz a d o s p o r titu la re s o u e m p re sa s estatais, o ra p o r e n g e n h e iro s e
e m p re sa s p riv a d a s c o n tra tad as. M a s e stão p re se n te s o b ra s e in o v a ç õ e s,

na saúde Infantil com redução da mortalidade infantil, melhorias na educação, na expansão


do turismo, na valorização dos imóveis, na renda do trabalhador, na despoluição dos rios e
preservação dos recursos hídricos, etc. Disponível em: http://www.tratabrasil.org.br/sanea
mento/o-que-e-saneamento. Acesso em 24 maio 2020.

352
a m p lia ç ã o d e ac esso s, c re sc im e n to d o p erc e n tu a l d e c o b e rtu ra, e, assim ,
c o n s a g ra ç ã o d a D ig n id a d e H u m an a .
A ris tid e s A lm e id a R o c h a 13 n a rra c o n q u ista s e stru tu ra is
s ig n ific a tiv a s 14, nos sé c u lo s p a ssa d o s, in ic ia d a s p e lo s g ra n d e s
m u n ic íp io s n o B ra sil. N a c id a d e d o R io d e ja n e iro , o p rim e iro p o ç o de
a b a ste c im e n to foi em 1561, a p rim e ira ad u to ra , em 1723, lin h a s ad u to ra s
in te rio riz a d a s, em 1 7 4 6 , e o p rim e iro siste m a d e a b a ste c im e n to d e á g u a
d a cap ital, em 1876.
E m São P aulo, os chafarizes entre 1744 a 1790, o S istem a do
C antareira, n a capital, entre 1857 a 1877, a p rim eira E staçã o de T ratam en to
(E T A ) em C am pinas, entre 1887 e 1891, a criação da Sanesp
(S u p erin ten d ên cia de S aneam ento d e São P aulo), em 1967, e só em 1968, a
d a C o m asp (C o m p an h ia M etro p o litan a de Á g u as), n a sequência, a Sabesp
(C o m p an h ia d e S an eam en to B ásico do E stad o de S ão P aulo), em 1969.
Em P orto A legre, em 1871, deu-se o prim eiro sistem a de
abastecim ento de água e em 1920, a prim eira E T A cham ada M oinho de Vento.
C o n tex tu alizan d o G o iás n a história, G o iân ia e A n áp o lis contavam
com serviços d e ág u a e esgoto im p lan tad o s em 1934, p ela em p resa H e rb ert
P ere ira & Cia. A pós, com o D ecreto -L ei 4.756/1941 de P e d ro L u d o v ico
T eixeira, co n trato u -se a M elh o ra m e n to s de G oiás S.A., p ara obras e
ex p lo ração d o s serviços de esgoto, co ncluídas em 1948. E m 1950, o D A E
(D iv isão de Á g u a e E sg o to s d e G oiânia) en cam p o u os serviços e j á em 1960
foi criad o o D E S (D e p artam en to E stadual d e S aneam ento), cu ja atuação
d u ro u até 1967, qu an d o p ela L ei 6.680, a S aneago (S an eam en to de G oiás
S.A ) foi criad a p ara p re sta r os serviços n o E sta d o .15

13 Histórias do Saneamento, 2016.


14 Idem. p. 43-45.
15 Histórico da Companhia. In: https://ri-saneago.mz-sites.com/saneago/historico.
Acesso em: 24/05/2021.

353
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

R au l M ig u e l F re ita s d e O liv e ira 16 a firm a q u e a té 1960, a


p re s ta ç ã o d o se rv iç o d e sa n e a m e n to e ra m a is lo cal, fe ita p e lo s D A E
m u n ic ip a is (D e p a rta m e n to s d e Á g u a e E sg o to ), e a p a rtir d e sta data,
su rg ira m as in ic ia tiv a s re g io n a liz a d a s, p re c u rso ra s d as c o m p a n h ia s
e sta d u a is d e sa n e a m e n to , c u ja c o n so lid a ç ã o em to d o o p aís, c o in c id e p o r
su a v ez, co m a in stitu iç ã o d o P L A N A S A , j á n a d é c a d a d e 1970, n ão
o b sta n te a p rim e ira e m p re sa p ú b lic a d e sa n e a m e n to te r sid o c ria d a n o
E s ta d o d a P a ra íb a , em 1 9 6 2 .17
F o ra m u tiliz a d o s re c u rso s do B N H (B a n c o N a c io n a l de
H a b ita ç ã o ), p a ra o b ra s d e sa n e a m e n to e o p e ra ç ã o d o se rv iç o . L e is
a p ro v a v a m a ex p lo ra ç ã o , in stru m e n ta liz a d a s por c o n tra to s, atos
a d m in is tra tiv o s o u c o n v ê n io s. E m 1990, a p a re c e ra m as c o n c e ssio n á ria s
p riv a d a s em m e n o r e sc a la .
O P L A N A S A c o m e ç o u a fu n c io n a r em 1971, fin a n c ia d o p e lo
F A E (F u n d o p a ra fin a n c ia m e n to d e á g u a e e sg o to ), a fu n d o p erd id o . A s
a rre c a d a ç õ e s d as e m p re sa s e sta ta is co m as ta rifa s eram re a p lic a d a s n o
p ró p rio setor. O sa n e a m e n to e v o lu iu fo rte m e n te , e as in o v a ç õ e s
te c n o ló g ic a s e a g e ra ç ã o d e e m p re g o s fo rta le c e ra m a e c o n o m ia . O seto r
p riv a d o te v e ta m b é m im p u lso c o m a c o n tra ta ç ã o d as o b ra s e se rv iç o s de
e n g e n h a ria e o utros.
V á lid o o te ste m u n h o d e A ristid e s A lm e id a R o c h a 18:

(...) quinze anos depois de implantado o plano, em 1985,


verificavam-se os grandes benefícios trazidos à população
brasileira. (...) Muitas tentativas anteriores para equacionar
o problema do saneamento básico no Brasil falharam,
sendo preciso reconhecer que o Planasa foi o primeiro e
único projeto implantado com abrangência nacional, que
até aquela década ofereceu resultados satisfatórios durante
o período em que esteve vigente (...).

16 A titularidade dos serviços de saneamento básico na lei de atualização do marco legal


do saneamento básico. Novo Marco do Saneamento Básico no Brasil. 2021. p. 159.
17 Histórias do Saneamento, p. 46.
18 Histórias do Saneamento, p. 75-76.

354
E m 1990, foi e x tin to e ap ó s ele, o se to r p a sso u p o r u m p e río d o
de d e sin v e stim e n to , até o PAC (P ro g ra m a de A c e le ra ç ã o do
C re sc im e n to ), p rin c ip a lm e n te d e 2011 em dian te.
A L ei 11.44 5 /2 0 0 7 e stab e lece u d iretriz es n ac io n a is p a ra o
sa n e am en to b ásico , v isa n d o o d e se n v o lv im e n to reg io n al, ap rim o ra n d o e
a m p lian d o a co b e rtu ra d e serv iço s locais, an tes en c o n tra d a a p e n as nos
g ra n d es m u n icíp io s. In stitu iu -se o PLANSAB (P lan o N a cio n al de
S an ea m e n to B ásico ), p e lo D e c re to 8 .1 4 1 /2 0 1 3 , p a ra re g e r a p o lític a de
sa n e am en to p o r 20 anos, co m in v estim e n to s p ro g ra m a d o s d a o rd em d e R $
5 0 8 ,4 b ilh õ e s p a ra u n iv e rsa liz a r e fisc a liz a r os se rv iç o s19; além d o su b síd io
cru zad o p a ra p ro v e r o d e se n v o lv im e n to re g io n al; os co n tra to s de
p ro g ra m a co m m e ta s d e san e am en to m u n icip ais d efin id a s p elo s P M S B
(P lan o s M u n ic ip a is d e S an ea m e n to B ásico ), q u e d ev e riam ser re v isto s de
4 em 4 anos; e c o n so lid o u a g estã o asso c ia d a 20, u n in d o os entes fe d era d o s
n a p re sta ção re g io n a liz ad a. E sse m o d e lo d eu u m s p r in t n a u n iv ersa liz açã o ,
p rin c ip a lm e n te n as re g iõ e s su b d ese n v o lv id as e co m sérios p ro b le m a s de
saú d e d ec o rre n te s d a au sê n c ia d e á g u a e esg o to tratad o s.
A fo rm a re g io n a liz a d a d a p re sta ç ã o d e se rv iç o s p o r e m p re sa s
p ú b lic a s o u so c ie d a d e s d e e c o n o m ia m ista esta d u a is o u m u n ic ip a is
c a ra c te riz a v a -s e a n tes d o n o v o m arc o , p o r u m ú n ic o p re sta d o r p a ra
d iv e rsa s c id a d e s c o n tíg u a s o u não.
O s n ú m e ro s d o sa n e a m e n to b ra sile iro d este m o m e n to estão
siste m a tiz a d o s n o S N IS 21 e os ú ltim o s d a d o s c o le ta d o s são d e 2 0 1 9 , p a ra
á g u a e esg o to . F o ra m R $ 5 ,7 6 b ilh õ e s em p re g a d o s, e in fo rm a ç ã o do
a lc a n c e d e 8 3 ,7 % d e c o b e rtu ra d e á g u a e a te n d im e n to d e 9 7 ,1 % d e to d a
a p o p u la ç ã o , m é d ia s n a c io n a is .22

19 Plano Nacional de Saneamento Básico - PLANSAB, mais saúde, qualidade de


vida e cidadania. In: https://antigo.mdr.gov.br/saneamento/plansab. Acesso em: 25
maio 2021.
20 CF/88: art. 241.
21 Sistema Nacional de Informação Sobre Saneamento.
22PAINEL DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA. In: http://snis.gov.br/painel-informacoes-
saneamento-brasil/web/painel-abastecimento-agua. Acesso em: 04 jun. 2021.

355
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

P a ra e sg o ta m e n to san itário , os n ú m e ro s são m en o re s: a m é d ia


b ra s ile ira d e c o b e rtu ra d o se rv iç o é d e 5 4 ,1 % e 7 5 ,9 % d a p o p u la ç ã o
aten d id a , em q u e p e se os in v e stim e n to s te n h a m sid o d a o rd e m d e R $ 5,33
b ilh õ e s d e re a is.23
O B ra sil te m d im e n sõ e s c o n tin e n ta is e a o n d e se v ê os g ra n d e s
m a n a n c ia is d e á g u a d a re g iã o n o rte, e stão os m e n o re s ín d ic e s de
c o b e rtu ra. O “ g a p ” in te r-re g io n a l é o m a io r d e sa fio d o sa n e a m e n to
b ra s ile iro e os in v e stim e n to s são v u ltu o síssim o s, a tra in d o a in ic ia tiv a
p riv a d a p e la re m u n e ra ç ã o d o se to r p e lo s in v e stim e n to s. T o d av ia , as
d ife re n ç a s re g io n a is h istó ric a s se e n c o n tra m n a re a lid a d e d e o u tras
p e rs p e c tiv a s d e se rv iç o s e fa to re s d e d e se n v o lv im e n to . O s m u n ic íp io s
são os titu la re s d o s se rv iç o s e a g ra n d e p a rte d eles n ã o te m c o n d iç ã o d e
fin a n c ia r os serv iç o s, o fe re c e n d o pouca a tra tiv id a d e às g ra n d e s
c o m p a n h ia s p riv ad a s.
N o m o d e lo a n te rio r à L ei 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , o su b síd io cru zad o
v is a v a re d is trib u ir a a p lic a ç ã o d o s re c u rso s n o s in v e stim e n to s q u e
a te n d ia m a to d o s os m u n ic íp io s, in c lu siv e os m a is p o b re s d a p re sta ç ã o
re g io n a liz a d a . E s s a p o lític a foi ro m p id a co m o n o v o m arc o . O s su b síd io s
p a ssa m a se r e sta b e le c id o s p a ra d e te rm in a re m g a n h o s d e e s c a la 24, e,
c o m o in s tru m e n to s e c o n ô m ic o s, são v o lta d o s p a ra p o p u la ç õ e s d e b a ix a
re n d a e n ã o m a is p a ra lo c a lid a d e s 25.
A L e i 1 4.026 d e fin e a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a c o m o a q u e la fe ita
d e fo rm a in te g ra d a em m a is d e u m m u n ic íp io , n o s fo rm a to s de: a) re g iõ e s
m e tro p o lita n a s, a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e m ic ro rre g iõ e s ; b ) u n id a d e s
re g io n a is d e sa n e a m e n to , q u e n ã o n e c e ssita m e sta r c o n tíg u a s e q u e n este
caso , p o ssa m a te n d e r m u n ic íp io s m e n o s fa v o re c id o s; e c) b lo c o s de
re fe rê n c ia e s ta b e le c id o s p e la U n iã o .26

23 PAINEL DE ESGOTAMENTO SANITÁRIO. In: http://snis.gov.br/painel-informacoes-


saneamento-brasil/web/painel-esgotamento-sanitario. Acesso em: 04 jun. 2021.
24 Lei 11.445/2007 (após alteração): art. 2°, XIV.
25 Idem: art. 3°, VII.
26 Ibidem: art. 3°, VI, alíneas.

356
4 E N T R E L A Ç A M E N T O D A D IG N ID A D E H U M A N A C O M O S
F O R M A T O S N O V O S D E P R E S T A Ç Ã O R E G IO N A L IZ A D A
D O S E R V IÇ O

C o m o dito, o su b síd io cru z a d o d a L e i 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 to rn o u


p o ssív e l in v e s tim e n to s em sa n e a m e n to d e fo rm a a b e n e fic ia r ta m b é m
m u n ic íp io s d efic itá rio s. A q u e b ra d e sta p o lític a co m o n o v o m a rc o a flo ra
o im p a c to do p re ju íz o de ac e sso de p a rte d a p o p u la ç ã o b ra sile ira ,
e sp a lh a d a p o r 5 .5 7 0 m u n ic íp io s em to d o o p aís. S em san e am en to ,
c o m p ro m e te -s e o m ín im o e x iste n c ia l de saú d e, b e m -e s ta r e
d e s e n v o lv im e n to d as p o p u la ç õ e s.
P a tríc ia R e g in a P in h e iro S a m p a io 27 e sc la re c e que, se g u n d o o
IB G E , a p o p u la ç ã o b ra s ile ira q u e e s tá d isp o sta em m u n ic íp io s co m m ais
d e 50 0 m il e co m m a is d e 1 m ilh ã o d e h a b ita n te s são, re sp e c tiv a m e n te ,
3 1 ,7 % e 2 1 ,9 % d o total. O q u e fa z c o n c lu ir q u e 46, 4 % se c o n c e n tra em
m u n ic íp io s co m m e n o s d e 500 m il h ab itan tes.
B o a p a rte d esse s m u n ic íp io s, a p e sa r de d e terem a titu la rid a d e
do se rv iç o de sa n e a m e n to , n ã o tê m c o n d iç ã o de a tra ir in v e stim e n to s à
p re s ta ç ã o lo cal. P o r e sta ra zão , o fo m e n to à s c o m p a n h ia s e sta d u a is, n as
d é c a d a s a n te rio re s, p a ra p re sta re m se rv iç o s de á g u a e e sg o ta m e n to
san itário , em c e n á rio q u e re fle te m o n o p ó lio n atu ra l, ju s ta m e n te p e lo alto
cu sto , g an h a n d o , assim , c o m e c o n o m ia de escala.
S em esc ala, a p o ssib ilid a d e de d u p lic id a d e de e stru tu ra s e
a m o rtiz a ç ã o dos a lto s in v e stim e n to s p a ra p o p u la ç õ e s lo c a is to rn a m o
se rv iç o d e m a s ia d a m e n te caro, ro m p e n d o d e v e z o m o d e lo d a m o d ic id a d e
ta rifá ria , c o m p ro m e te n d o so b re m o d o o a c e sso ao san e am en to , se ja p e la
fa lta d a c o n tra p a rtid a a ser re in v e stid a n o se to r até c u m p rir os d esa fio s
d o s d éficits, seja p e la b a ix a a tra tiv id a d e dos p ró p rio s in v e stid o re s p e la
p re s ta ç ã o lo cal.

27 A reforma do marco legal do saneamento básico e o incentivo à prestação regionalizada


dos serviços. Novo Marco do Saneamento Básico no Brasil, 2021. p. 177.

357
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

E s ta é a e x p lic a ç ã o ló g ic a p a ra o m o d e lo d a L e i 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 de
g e s tã o asso c ia d a , q u e p e rm itiu m u n ic íp io s e E sta d o s so lu c io n a re m o
p ro b le m a , a p lic a d a a e c o n o m ia d e e sc a la e o su b síd io cru zad o ,
c o n te m p la n d o n u m e ro so s m u n ic íp io s in su fic ie n te s.
U m ú n ic o e x p lo ra d o r d o serv iç o c o m p a rtilh a estru tu ra s, g a sto s
e in v e s tim e n to s e re d istrib u i b e n e fíc io s d e m a n e ira m a is e q u â n im e , a
p ro m o v e r o d e se n v o lv im e n to re g io n a l e a c u m p rir o o b je tiv o
fu n d a m e n ta l d e e rra d ic a ç ã o d a p o b re z a e d a m a rg in a liz a ç ã o e re d u ç ã o
d as d e s ig u a ld a d e s so c ia is e re g io n a is. 28
A s m a io re s d isc u ssõ e s n o m o d e lo a n te rio r são q u a n to a o p o d e r
d e c isó rio d o s E sta d o s d as re g iõ e s m e tro p o lita n a s, m a s n ã o h á p ro b le m a s
n a ló g ic a d e in v e stim e n to s co m o su b síd io cru zad o , a to d o s os
m u n ic íp io s en v o lv id o s, a p e sa r d e q u e é d e se o b se rv a r q u e os a v a n ç o s n a
c o b e rtu ra d o s se rv iç o s p o d e ria m te r sid o m aio re s.
A L ei 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 m a n té m este fo rm a to d e re g io n a liz a ç ã o ,
p o ré m o su b síd io c ru z a d o n ã o te m o v ié s so cial d e an tes, a p re se n ta n d o
fin a lid a d e m e ritó ria 29, q u e ta m b é m e stá p re se n te n a s d u as o u tra s fo rm a s
d e re g io n a liz a ç ã o , n ã o c o n su b sta n c ia d a s n a c o n tig u id a d e d e m u n ic íp io s,
p o d e n d o o co rrer, in c lu siv e , in te rn a m e n te a u m só titu lar.
A L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 c ria a in d a as u n id a d e s d e san e am en to ,
fo rm a d a s p o r lei o rd in ária , q u e d e p e n d e d a a d e sã o v o lu n tá ria dos
m u n ic íp io s, e os b lo c o s d e re fe rê n c ia , p o r c ria ç ã o d a U n iã o , h a v id o o
in s u c e s s o d o E s ta d o n a re g io n a liz a ç ã o n o s o u tro s fo rm a to s, p o rtan to ,
su b sid iá ria , ta m b é m in stitu íd o s co m a a d e rê n c ia d o s m u n ic íp io s.
A d e sp e ito d o s q u e stio n a m e n to s d e in c o n stitu c io n a lid a d e dos
re s p e c tiv o s d isp o sitiv o s n a L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , o e n fre n ta m e n to q u a n to a
esse s m o d e lo s d e re g io n a liz a ç ã o é a im p o tê n c ia d e se atin g ir, co m eles,
o a c e sso tã o p re te n d id o ao sa n e a m e n to b á s ic o p e lo s m u n ic íp io s
h ip o ssu fic ie n te s. M e sm o q u e o te x to d a n o v a lei re sg u a rd e a a u to n o m ia

28 CF/88: art. 3°, III.


29 A reforma do marco legal do saneamento básico..., p. 181.

358
m u n ic ip a l, d e ix a n d o m a rg e m p a ra a n ã o a d e sã o v o lu n tá ria , n a p rá tic a, se
os titu la re s n ã o ad e rire m a u m d o s d o is fo rm a to s p ro p o sto s, j á q u e o das
m ic ro rre g iõ e s é c o m p u lsó rio p e la co n tig u id a d e , n ã o a c e ssa m re c u rso s
fe d e ra is ao s a n e a m e n to .30 Se j á é e x tre m a m e n te d ifícil d e se n v o lv e r
sa n e a m e n to n o s m u n ic íp io s m a is v u ln e rá v e is, co m e ssa re ssa lv a , a
situ a ç ã o to rn a fo rç o sa a ad esão .
E n ã o se p o d e p e rd e r d e v is ta o m a is p o ssív e l dos p ro b le m a s
q u e são os m u n ic íp io s m a is ric o s n ã o a d e rirem , a d e p e n d e r d o s d em ais
q u e v ai su sten tar, sem se r se q u e r lim ítro fe , e p o r isso sem c o m p a rtilh a r
o u tro s tra ç o s d e d e se n v o lv im e n to in te g ra d o , p ró p rio s d o s p la n e ja m e n to s
u rb a n o s e m e tro p o lita n o s.
A ssim , se p o r u m la d o a p re v isã o d e u n id a d e s d e sa n e a m e n to e
b lo c o s d e re fe rê n c ia s im u la d e m o n stra r in c e n tiv o d a L ei 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 a
se fu g ir d o s p ro b le m a s j á m e n c io n a d o s d as p re sta ç õ e s lo cais, p o r o u tro ,
ta is fo rm a to s a rrisc a m a o p o rtu n id a d e d o s m u n ic íp io s m e n o s a tra e n te s e
q u e c o n c e n tra m p a rte sig n ific a tiv a d a p o p u la ç ã o d o p a ís fic a r d e n tro d a
re g io n a liz a ç ã o . E , assim , m e sm o a n o v a lei p re v e n d o d ire triz d o g a n h o
d e esc ala, e d e e stru tu ra d e p re sta ç ã o re g io n a liz a d a , a c o m p le x id a d e
p o lític a e o ritm o d o s p ra z o s d a N o rm a p a ra a im p le m e n ta ç ã o d a
re g io n a liz a ç ã o , sem p la n e ja m e n to e sem as re fe rê n c ia s da A N A
(A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s) p o d e -se e sta r d ia n te d e q u a d ro q u e
p ro m o v a a m a io r e x c lu sã o h istó ric a d e p o p u la ç õ e s a in d a sem ac esso a
sa n e a m e n to , e n fra q u e c e n d o a c a m in h a d a d o sa n e a m e n to b ra sile iro ,
p re v a le c e n d o a p e n a s m u n ic íp io s re n tá v e is ao p re s ta d o r in v estid o r.
Patrícia R egina Pinheiro Sam paio31, m ais u m a vez, arrem ata a questão:

(...) a descentralização do tema ao âmbito dos municípios não


teve o condão de trazer o desenvolvimento pretendido,
tornando legítima a expectativa de que novos modelos de
organização intermunicipal possam catalisar esforços e ser
capazes de atrair investimentos privados. A possibilidade de

30 Lei 11.445/2007 (após alteração da Lei 14.026/2020): art. 50, VII.


31 A reforma do marco legal do saneamento básico ..., p. 176.

359
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

se capturar as economias de escala decorrentes da prestação


regionalizada do serviço pode ser um atrativo ao investidor.

O u tro p o n to p a ra d ificu ltar a ad esão dos m u n icíp io s à


re g io n alização nos m o ld es n o v o s é q u e aderido, o p lan ejam en to de
san eam en to p assa a ser reg io n alizad o e n ão m ais m u n icip al32. T odavia, o
serviço é local. A s características de aten d im en to e as n ecessid ad es são de
cad a um , in clu siv e p o rq u e estarão associados m u n icíp io s com coberturas de
serviço diferentes, d em an d an d o m en o s ou m ais estruturas que im p actam a
ta rifa etc. A p ersp ectiv a d o p lan ejam en to reg io n alizad o em detrim en to das
esp ecificid ad es do m unicipal p o d e ser m e lh o r às prestadoras, m as nem
sem p re atin g irá o p ro b lem a d e cad a m u n icíp io em cheio, p rin cip alm en te em
relação à ex p an são d e n o v o s em p reen d im en to s locais.
O s p o n to s tra z id o s, en tão , caem n a m e s m a v a la d e p re o c u p a ç ã o
q u e h a v ia a n tes d o n o v o m a rc o : c o m o a v a n ç a r os ín d ic e s d e co b e rtu ra,
p rin c ip a lm e n te em re la ç ã o ao e sg o ta m e n to sa n itá rio ?
A n o s so en ten d e r, sem a p ro fu n d a r n o s p o ssív e is e q u ív o c o s d a
n o v a lei q u a n to ao su b síd io c ru z a d o co m fin a lid a d e s m e ritó ria s, p a re c e
q u e a re g io n a liz a ç ã o p o r m ic ro rre g iõ e s, a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e re g iõ e s
m e tro p o lita n a s é o fo rm a to q u e m a is se ju s tif ic a im p le m e n ta r. E le p o d e
e n s e ja r d isc u ssõ e s so b re a c o m p u lso rie d a d e d o s m u n ic íp io s ao m o d elo ,
m a s em v e rd a d e e ssa o b rig a to rie d a d e e x iste d is s im u la d a n o s d em ais
m o d e lo s. A q u e stã o é q u e a c o n tig u id a d e en tre os m u n ic íp io s e x p lic a
ta m b é m o u tro s c o m p a rtilh a m e n to s d e fu n ç õ e s p ú b lic a s, ju s tific a n d o
m e lh o r a g e stã o a sso c ia d a p a ra o sa n e a m e n to , o d e se n v o lv im e n to
u rb a n ís tic o re g io n a l e p e rm itin d o q u e as n e c e ssid a d e s lo c a is sejam
aten d id a s, p o rq u e j á se te rá n e c e ssa ria m e n te o c o m p a rtilh a m e n to de
in fra e stru tu ra , p o r se tra ta re m d e m u n ic íp io s lim ítro fe s.
A d e m a is, o d e se n h o d as m ic ro rre g iõ e s p o d e se a d e q u a r em
e x te n sã o e a g lo m e ra ç ã o d e q u a n to s m u n ic íp io s fo re m n e c e ssá rio s p a ra
a b ra n g e r o m á x im o d e cid a d e s in s u fic ie n te s p o ssív e l em to rn o dos

32 Lei 11.445/2007 (alterado pela Lei 14.026/2020): art. 17.

360
su p e ra v itá rio s, in c lu siv e c o n sid e ra n d o -se a m e s m a b a c ia h id ro g rá fic a ou
co rp o s h íd ric o s c o m u n ic a n te s.
E ssa p e rsp e c tiv a p ro p ic ia um a v is ã o re g io n a liz a d a sem
c o m p ro m e te r as q u e stõ e s lo c a is d e c a d a titu la r e p ro m o v e co m m ais
fa c ilid a d e , o a c e sso d e to d o s ao sa n e a m e n to b á sic o , re a liz a n d o , assim ,
d a m a n e ira m a is fiel p o ssív e l, o d ire ito fu n d a n te d o E sta d o D e m o c rá tic o
d e D ire ito à D ig n id a d e H u m an a .

5 CONCLUSÃO

A n o v a lei tem , assim , m a is d e sa fio s q u e a d ic o to m ia p ú b lic o X


p riv a d o p o d e re so lv e r. N ã o é o ca p ita l p riv a d o q u e sa lv a o m u n d o . E n ão
é só o o p e ra d o r d o e n te p ú b lic o q u e d ev e a tu a r co m o v ié s so cial do
ac e sso a o san e am en to .
A in te rp re ta ç ã o d a L ei 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 d e v e c o n sa g ra r u m m o d e lo
e fic ie n te p a ra a u n iv e rsa liz a ç ã o , c o n sid e ra n d o a re a lid a d e c o m p le x a d a
p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s d e á g u a e tra ta m e n to d e esg o to . S u b s titu ir
p re s ta d o re s n ã o te m c o m o c o n se q u ê n c ia ló g ica, o a c e sso ao sa n e a m e n to ,
p o d e n d o se r q u e c ria n ç a s e p o p u la ç õ e s p o b re s, so b re q u em re c a íra m os
o lh a re s q u e d e fe n d e ra m as a lte ra ç õ e s d o n o v o m arc o , c o n tin u e m à
m a rg e m d a D ig n id a d e H u m a n a .
O n o v o m a rc o te m ra c io c ín io s im p o rta n te s, m a s a d o to u ló g ic a s
c o n tra d itó ria s p a ra e x e c u ta -lo s. A s v e d a ç õ e s, as b ru sc a s ru p tu ra s e a
tô n ic a d a p riv a tiz a ç ã o , c o m o v isto , n ã o é o q u e tra z o b rig a to ria m e n te os
re s u lta d o s p a ra q u em n e c e ssita d o serv iç o , re tira n d o d a co n d iç ã o
in d ig n a , m ilh a re s d e b ra sile iro s.
B a s ta m o c u m p rim e n to d e p o lític a s re m u n e ra tó ria s d e escala,
sem p re ju íz o d a m o d ic id a d e ta rifá ria e sem p re ju íz o d o su b síd io cru zad o ,
b e m c o m o o a p e rfe iç o a m e n to d e in stitu to s q u e já ex istiam , c o m o o
m o d e lo m ic ro rre g io n a l d a p re sta ção .
E m p re sa s e sta ta is tê m ta n ta e x p e rtise e re n o m e q u a n to
e m p re sa s p riv ad a s. O ac e sso ao s in v e stim e n to s ta m b é m é o m esm o , v isto

361
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

que n in g u é m v iu a in d a c o m p a n h ia s p riv a d a s u sa re m cap ital


in te rn a c io n a l n o s a n e a m e n to b ra sile iro . D a r re le v â n c ia ao s m e c a n ism o s
im p o s to s p o r lei p a ra d ific u lta r a c o n tin u id a d e d o s n e g ó c io s d a s e sta ta is
e su a p e n e tra ç ã o n o se to r p o d e m u ito c o n trib u ir co m a a b e rtu ra às
p re s ta d o ra s p riv a d a s, ao cap ital q u e o sa n e a m e n to e n v o lv e , m a s isto será
tu d o , se n ã o c o n c re tiz a r o d ire ito d e a c e sso à á g u a p o tá v e l e ao esg o to
tra ta d o às p e sso a s, a o n d e q u e r q u e estejam .

R E F E R Ê N C IA S

COÊLHO, M. V. F. et al. S a n e a m e n to B á sic o co m o D ire ito


C o n stitu c io n a l. In: C O O R D E N A Ç Ã O D E S A N E A M E N T O B Á S IC O
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363
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

F a c u l d a d e d e D ir e ito d o S u l d e M in a s , P o u s o A leg re, v. 33, n. 2, p.


2 9 9 -3 1 7 , ju n ./d e z . 2017.

U M A em cad a três pessoas em to d o o m u n d o n ão tem acesso à ág u a potável.


In: U N IC E F , 2019. D isponível em: https://new s.un.org/pt/story/2019/06/16
76671. A cesso em: 24 m aio 2021.

364
A ESTRUTURA TARIFARIA NOS SERVIÇOS DE AG UA E
ESGOTO

R o d rig o S an to s H o s k e n *
G io v an i M orelli*

E m 2 0 1 0 , o d ire ito à á g u a foi alça d o , p e la O rg a n iz a ç ã o das


N a ç õ e s U n id a s, à c a te g o ria d o s D ire ito s H u m a n o s .1 D e sta fo rm a , c a d a
v e z m a is e v id e n c ia -se a im p o rtâ n c ia d e se p ro m o v e r o a m p lo a c e sso à
á g u a p o táv el.
E m co n tra p a rtid a , d a d o s d o S iste m a N a c io n a l d e In fo rm a ç õ e s
so b re S a n e a m e n to (S N IS ) in d ic a m q u e a p e n a s 8 3 ,7 % d a p o p u la ç ã o é
se rv id a d o s se rv iç o s d e a b a ste c im e n to e 5 4 ,1 % p o ssu i c o le ta e tra ta m e n to
d e esg o to , se rv iç o este fu n d a m e n ta l p a ra a m a n u te n ç ã o d a q u a lid a d e d a
á g u a d is trib u íd a à p o p u laçã o .
N e ste contexto, recen tem en te foram p ro m o v id as pro fu n d as
alteraçõ es n a leg islação b ra sileira n a b u sca d a tã o so n h ad a univ ersalização
dos serviços de ág u a e esgoto, com a definição d e m etas o u sadas p ara o
atin g im en to de tal fim . D e fato, a recen te L ei F ed eral 14.026/2020,

* Membro Consultor da Comissão Especial de Saneamento, Recursos Hídricos e


Sustentabilidade do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Membro da
Comissão Especial de Saneamento, Recursos Hídricos e Gás Encanado do Conselho
Seccional da OAB do Estado do Rio de Janeiro. Coordenador Jurídico da Câmara
Temática de Governança Corporativa e Jurídica da Associação Brasileira de
Engenharia Sanitária (ABES). Representante da ABES-RIO como Subcoordenador da
Câmara Técnica de Instrumentos Legais e de Gestão (CTILG) do Comitê da Bacia do
Rio Guandu (Biênio 2021-2023). Pós Graduado em Direito Tributário pela
Universidade Cândido Mendes (UCAM). Coordenador Consultivo Estratégico da
Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae).
* Advogado Público da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae). Bacharel em
Direito pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).
1 MARQUES, Rui Cunha; MIRANDA, João. Sustainable tariffs for water and
wastewater services. Utilities Policy, v. 64, 2020. Disponível em: https://www.scienc
edirect.com/science/article/abs/pii/S0957178720300497. Acesso em: 15 jan. 2021.

365
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

d en o m in ad a N o v o M a rc o L egal d o S aneam ento B ásico, instituiu com o


ob jetiv o a u n iv ersalização dos serviços até ja n e iro de 2040.
P a ra q u e e ste s o b je tiv o s sejam a lc a n ç a d o s serão n e c e ssá rio s
v u lto s o s in v e s tim e n to s em c u rto e sp a ç o d e te m p o e a so lu ç ã o tra z id a p e lo
le g is la d o r fo i p ro m o v e r a a b e rtu ra d o se to r à p a rtic ip a ç ã o p riv a d a . A
e x p e c ta tiv a é d e q u e sejam d isp o n ib iliz a d o s m a is d e 4 5 b ilh õ e s d e re ais
p a ra o se to r.2 E n tre ta n to , a a tu a ç ã o d e q u a lq u e r p re sta d o r, e sp e c ia lm e n te
o riu n d o d o se to r p riv a d o , d e p e n d e d e u m c o n te x to fa v o rá v e l à se g u ra n ç a
n o re to rn o d o s alto s in v e stim e n to s q u e n e c e ssa ria m e n te d e v e rã o ser
d e s tin a d o s à p re sta ç ã o d o serviço.
N e ste sen tid o , a re c u p e ra ç ã o d o s c u sto s e n v o lv id o s n a p re sta ç ã o
d o se rv iç o e o lu c ro d e se ja d o p o r q u a lq u e r p re s ta d o r serão o riu n d o s,
p rio rita ria m e n te , d a c o b ra n ç a ao s u su á rio s p e lo s se rv iç o s p re sta d o s ao
lo n g o d o te m p o d e co n trato . E s ta c o b ra n ç a será re a liz a d a p o r m e io de
ta x a s, p re ç o s p ú b lic o s o u ta rifa s (art. 29, §1°, L ei 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 ).
P a ra fin s d este e stu d o , in te re ss a a a n á lise d a ta rifa e d as re g ra s
p re v is ta s p a ra a e la b o ra ç ã o d a e stru tu ra ta rifá ria su ste n tá v e l q u e d e fin e o
v a lo r a se r c o b ra d o d o s u su á rio s. É fu n d a m e n ta l q u e a re m u n e ra ç ã o do
p re s ta d o r v e n h a d e sta fo n te 3, o q u e é, in c lu siv e , re c o n h e c id o p e lo
le g is la d o r n o art. 2° d a L e i 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 .
N e ste c o n tex to , d efin id a , p e lo s p o d e re s co m p e te n te s, a fo rm a
d e cá lc u lo d a ta rifa e o seu re sp e c tiv o v alo r, é n e c e ssá rio q u e su a
a p lic a ç ã o seja re a liz a d a sem q u a isq u e r p e rc a lç o s, d e m o d o a p o ssib ilita r
q u e seu s e fe ito s sejam o b se rv a d o s, co m a re c u p e ra ç ã o , p o r p a rte do
p re sta d o r, d e to d o s os c u sto s e n v o lv id o s n a p re sta ç ã o d o serviço.
T a lv e z p o r fa lta d e c o m p re e n sã o a c e rc a d a p re se n te te m á tic a ,
h á e x c e s s iv a ju d ic ia liz a ç ã o d e q u e stõ e s re la tiv a s à c o b ra n ç a d a ta rifa

2 BNDES dá prioridade ao saneamento com R$ 45,8 bilhões. Disponível em


https://www.eosconsultores.com.br/saneamento- basico- bndes/. Acesso em: 15 abr. 2021.
3 MARQUES, Rui Cunha; MIRANDA, João. Sustainable tariffs for water and
wastewater services. Utilities Policy, v. 64, 2020. Disponível em: https://www.scienc
edirect.com/science/article/abs/pii/S0957178720300497. Acesso em: 15 jan. 2021.

366
a p licá v el ao s se rv iç o s d e á g u a e esg o to . A p e n a s n o E sta d o d o R io de
Jan e iro , e x iste m m a is d e 3 .0 0 0 (trê s m il) p ro c e sso s em a n d a m e n to em
q u e se d isc u te este te m a , se n d o q u e , h is to ric a m e n te , a ju risp ru d ê n c ia se
m o s tra b a s ta n te re lu ta n te n a a p lic a ç ã o d as re g ra s ta rifá rias.
A ssim , c o n sid e ra n d o o c o n te x to atu al, em q u e se e sp e ra q u e
h a ja m a io re s in v e stim e n to s n o se to r d e sa n e a m e n to em v ista s d a
e x p a n sã o d o s serv iç o s, m o stra -se d e e x tre m a im p o rtâ n c ia q u e o P o d e r
Ju d ic iá rio ad o te p o s tu ra d e a u to c o n te n ç ã o e m re la ç ã o à s n o rm a s
ta rifá ria s o rig in á ria s d o s re g u la d o re s seto riais. S o m e n te d e ssa fo rm a
h a v e rá a n e c e s sá ria s e g u ra n ç a ju ríd ic a e e s ta b ilid a d e p a ra p ro m o v e r u m
a m b ie n te seg u ro p a ra q u e os in v e stim e n to s e fe tiv a m e n te ac o n te çam .

1 O S M O D E L O S T A R IF Á R IO S N O S S E R V IÇ O S D E Á G U A E
ESG O TO

A c o b ra n ç a p e lo s se rv iç o s d e á g u a e sg o to p o ssu i d iv e rso s
o b je tiv o s 4, sen d o os p rin c ip a is a serem c o n sid e ra d o s n a e la b o ra ç ã o de
u m a e s tru tu ra ta rifá ria a re c u p e ra ç ã o d e cu sto s, a eq u id ad e , a e fic iê n c ia
e c o n ô m ic a , a m o d ic id a d e ta rifá ria e a sim p lic id a d e .5
E sta co b ran ça é realizad a de aco rd o com a estru tu ra tarifá ria que
p o d e ser d efin id a co m o u m con ju n to de reg ras e pro ced im en to s que irá
d eterm in ar co m o efetu ar a co b ran ça de diferentes categorias d e u su ário s.6
É im p o rta n te d e sta c a r que, in d e p e n d e n te d o m o d e lo ta rifá rio
ad o tad o , a e s tru tu ra ta rifá ria d e v e rá se r su fic ie n te p a ra c o b rir os cu sto s
d o se rv iç o e p o s s ib ilita r o in v e stim e n to em m e lh o ria s v is a n d o à e x p a n sã o

4 FUENTE, David. The design and evaluation of water tariffs: a systematic review.
Utilities Policy, v. 61, 2019. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/a
rticle/pii/S0957178719303285. Acesso em: 22 abr. 2021. p. 01-02 e 07.
5 KAYAGA, Sam; SMOUT, Ian. Tariff structures and incentives for water demand
management. Proceedings of the ICE - Water Management, V. 167, 2014.
p. 449. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/271340628_Tariff_s
tructures_and_incentives_for_water_demand_management. Acesso em: 22 abr. 2021.
6 Idem.

367
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

do siste m a de a b a ste c im e n to de água e c o le ta de esg o to . A


s u s te n ta b ilid a d e d o p re sta d o r é im p o rta n te p a ra o se to r d e sa n e a m e n to
em fu n ç ã o d o a lto v a lo r d o s in v e stim e n to s n e c e ssá rio s, d e v e n d o a ta rifa
p o s s ib ilita r o a tin g im e n to d o e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro .78
P a ra q u e esse s o b je tiv o s sejam a lca n çad o s, são c o m u m e n te
u tiliz a d a s d u as g ra n d e s e sp é c ie s d e m o d e lo s ta rifá rio s. O m o d e lo de
ta rifa em p a rte ú n ic a (s in g le -p a r t ta riff) e o m o d e lo d e ta rifa em d u as
p a rte s (tw o -p a r t t a r i f f ) %
O p rim eiro m o d elo m en cio n a d o p o d e ser aplicado com a co b ran ça
tão so m en te de u m a ta rifa fixa, n o rm alm en te q u an d o n ão h á m edição, ou
com a c o b ran ça b a se a d a apenas n o v o lu m e reg istrad o n o m edidor. D e cad a
u m a d essas possibilidades, ex traem -se alg u m as variações.
A c o b ra n ç a d a ta rifa fix a in d e p e n d e d o c o n su m o e p o d e ser
p ra tic a d a co m b a s e n a e stru tu ra d o im ó v e l (n ú m e ro d e q u arto s,
q u a n tid a d e d e p o n to s d e água, se p o ssu i alto p a d rã o c o n stru tiv o o u não,
e tc.) o u co m b a s e n a e stru tu ra d o siste m a d e a b a ste c im e n to d isp o n ív e l
(d iâ m e tro d o ra m a l, g e ralm en te).
J á a ta rifa b a s e a d a n o m o d e lo e x c lu siv a m e n te v o lu m é tric o
(v o lu m e re g is tra d o n o m e d id o r) p o d e se a p re se n ta r d e trê s p rin c ip a is
fo rm a s d is tin ta s: a ta rifa u n ifo rm e , a ta rifa em b lo c o s e a ta rifa lin ear.
A tarifa un ifo rm e possui com o característica a aplicação de u m
v alo r unifo rm e p a ra cada m etro cúbico consum ido. A conta será, portanto, a
m ultiplicação do v o lu m e consum ido pelo v alo r do m etro cúbico.
A ta rifa em b lo c o s s u b d iv id e -se em b lo c o s c re sc e n te s e b lo c o s
d e c re sc e n te s. E m am b o s os caso s, a e s tru tu ra ta rifá ria é o rg a n iz a d a em

7 ONU. Water: a shared responsibility. The United Nations World Water Development
Report 2. United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO)
and Berghan Books. 2006. p. 413. Disponível em: http://www.unesco.org/new/en/natura
l- sciences/environment/water/wwap/wwdr/wwdr2-2006/. Acesso em: 09 maio 2020.
8 BOLAND, John; FOSTER, Vivien; WHITTINGTON, Dale. Water Tariffs and
Subsidies in South Asia Paper 1: Understanding the Basics. Water and Sanitation
Program. 2002. p. 4. Disponível em: https://www.wsp.org/index.php/library/water-tariffs-
and-subsidies-south-asia-paper-1-understanding-basics. Acesso em: 02 maio 2020.

368
b lo c o s co m v a lo re s e sp e c ífic o s c a so o c o n su m o re g istra d o a lc a n c e o
b lo c o seg u in te. N o c a so d o s b lo c o s c re sc e n te s, o v a lo r d o m e tro c ú b ic o
in ic ia em u m p a ta m a r b a ix o e a u m e n ta n a m e d id a em q u e o c o n su m o
re g is tra d o a lc a n ç a os b lo c o s seg u in tes. J á n o to c a n te aos b lo c o s
d e c re sc e n te s, o v a lo r d o m e tro c ú b ic o in ic ia em p a ta m a r e le v a d o e re d u z
n a m e d id a em q u e o c o n su m o a lc a n ç a os b lo c o s seg u in tes.
P o r fim , a ta rifa lin e a r c a ra c te riz a -se p e la m o d ific a ç ã o n o v a lo r
c o b ra d o se m p re q u e h o u v e r q u a lq u e r v a ria ç ã o n o co n su m o , d e m o d o q u e
c a d a m e tro c ú b ic o c o n su m id o te rá u m v a lo r d ife re n te d o anterior.
O m o d e lo ta rifá rio em d u a s p arte s, p o r su a v ez , u tiliz a -s e d a
c o m b in a ç ã o d e u m a p a rte fix a e d e u m a p a rte v a riá v e l q u e d e p e n d e rá do
c o n s u m o re g is tra d o n o m e d id o r. O u seja, é a ju n ç ã o d o m o d e lo d e ta rifa
fix a co m o m o d e lo v o lu m é tric o .
A p rim e ira p a rte d a e s tru tu ra ta rifá ria é fix a e p o d e c o rre sp o n d e r
a u m a e sp é c ie d e fra n q u ia p e rm itid a p a ra o co n su m o , c o m u m e n te
d e n o m in a d o d e c o n su m o m ín im o . P o d e , ta m b é m , n ã o d isp o n ib iliz a r
q u a lq u e r fra n q u ia , b a se a n d o -se , tã o so m en te, n a e s tru tu ra d o im ó v el,
m o d e lo q u e v e m sen d o d e n o m in a d o d e ta rifa fixa. E s s a co b ran ça , co m o
já e x p licitad o , in d e p e n d e d o v o lu m e d e á g u a c o n su m id o e se m o stra
fu n d a m e n ta l p a ra p ro p ic ia r a re c u p e ra ç ã o d o s c u sto s.9
J á a s e g u n d a p a rte d a e s tru tu ra ta rifá ria p o d e se r b a s e a d a em
q u a lq u e r d o s m o d e lo s v o lu m é tric o s a p re se n ta d o s, a d e p e n d e r dos
o b je tiv o s a serem b u sc a d o s co m a p re c ific a ç ã o d o s se rv iç o s p re sta d o s.
Im p o rta n te d e s ta c a r q u e a ta rifa ç ã o em d u as p a rte s é o m o d e lo
m a jo rita ria m e n te u tiliz a d o n o p a ís e re p re se n ta im p o rta n te m e io p a ra
c o n c ilia r o s o b je tiv o s e c o n ô m ic o s d a d e fin iç ã o d o p re ç o co m a

9 KAYAGA, Sam; SMOUT, Ian. Tariff structures and incentives for water demand
management. Proceedings of the ICE - Water Management, V. 167, 2014.
p. 451. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/271340628_Tariff_s
tructures_and_incentives_for_water_demand_managemen. Acesso em: 22 abr. 2021.

369
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

re c u p e ra ç ã o to ta l d o s c u sto s n e c e ssá ria p a ra a e x p a n sã o d o s se rv iç o s e a


n e c e s s á ria u n iv e rs a liz a ç ã o .10

2 O M O D E L O T A R IF Á R IO A D O T A D O N O B R A S IL A P A R T IR
DO PLA N A SA

A n a lis a n d o -se as e stru tu ra s ta rifá ria s d as p re sta d o ra s dos


se rv iç o s d e s a n e a m e n to d o B ra s il, c o n c lu i-se p e la a d o ç ã o p rin c ip a l do
m o d e lo d e ta rifa ç ã o e m d u as p a rte s, sen d o a p rim e ira p a rte fix a c o m a
p o s s ib ilid a d e d e u m a fra n q u ia d e c o n su m o (c o n su m o m ín im o ), e a
se g u n d a p a rte b a s e a d a n o m o d e lo v o lu m é tric o d e ta rifa ç ã o c re sc e n te em
b lo c o s. S u b sid ia ria m e n te , n o s ca so s em q u e n ão h á a in sta la ç ã o de
m e d id o r, a c o b ra n ç a é b a s e a d a n o m o d e lo d e ta rifa ç ã o em p a rte ú n ic a
co m a c o b ra n ç a d e u m v a lo r fix o em fu n ç ã o d a e stru tu ra d o im ó v el.
A p rim e ira p a rte d a ta rifa , fixa, se ja em fu n ç ã o d e u m c o n su m o
m ín im o se ja em fu n ç ã o d e c rité rio s o u tro s, e x iste p a ra p ro p ic ia r a
re c u p e ra ç ã o d o s c u sto s fix o s re la c io n a d o s ao fu n c io n a m e n to das
em p re sas. J á a se g u n d a p arte , v a riá v e l em fu n ç ã o d o c o n su m o em b lo c o
c re sc e n te (a c h a m a d a p ro g re ssiv id a d e ta rifá ria ), v isa a in c e n tiv a r a
ra c io n a liz a ç ã o d o c o n su m o , d e se stim u la n d o d e sp e rd íc io s e co n su m o s
su p érflu o s, e p ro p ic ia r, p a rc ia lm e n te , a im p la n ta ç ã o d o s c h a m a d o s
su b síd io s cru zad o s.
A e s tru tu ra ta rifá ria seto rial foi im p la n ta d a n o â m b ito d o P la n o
N a c io n a l d e S a n e a m e n to (P L A N A S A ), n a d é c a d a d e 1970, e a ssim se
m a n té m até h o je. D e sta fo rm a , é im p o rta n te d e ta lh a r o q u e fo i d e fin id o
n o p a s s a d o p a ra se e n te n d e r o p re sen te.
N o to c a n te à p o lític a ta rifá ria , o P L A N A S A tro u x e co m o
o b je tiv o s a a u to ssu ste n ta b ilid a d e fin a n c e ira d o p re s ta d o r d o s se rv iç o s e
a im p le m e n ta ç ã o d e ta rifa s c a p a z e s d e a te n d e r à s p o ssib ilid a d e s

10 Idem. p. 451.

370
fin a n c e ira s d o s u su á rio s, p re se rv a n d o , ao m e sm o te m p o , o eq u ilíb rio
e n tre re c e ita s e c u s to s 11.
E s s a p re o c u p a ç ã o co m a su ste n ta b ilid a d e d as C o m p a n h ia s de
S a n e a m e n to d e c o rre d e u m a re a lid a d e n o p e río d o a n te rio r à in stitu iç ã o
d o P L A N A S A em q u e o seto r d e sa n e a m e n to n o B ra sil e ra a lta m e n te
d e fic itá rio , co m a n e c e ssid a d e d e c o n sta n te s su b síd io s d ire to s d o s co fres
p ú b lico s. A s estru tu ra s ta rifá ria s e x iste n te s eram in e fic ie n te s e in c a p a z e s
d e p ro p ic ia r ca p ita l p a ra e x p a n sã o d o s se rv iç o s e, a té m esm o , p a ra c o b rir
os c u sto s m ín im o s .1112
E m te rm o s leg isla tiv o s, o P L A N A S A v e io a ser in stitu íd o em
1978, co m a e d iç ã o d a L e i F e d e ra l 6 .5 2 8 e d o D e c re to F e d e ra l 8 2 .5 8 7 ,
q u e u n ifo rm iz a ra m as e stru tu ra s ta rifá ria s a d o ta d a s p e la s C o m p a n h ia s de
S a n e a m e n to em v ista s ao a tin g im e n to d o s o b je tiv o s d a p o lític a p ú b lic a
d e e x p a n sã o d o s se rv iç o s d e fin id a p a ra o setor.
D a le itu ra d a L ei F e d e ra l 6 .5 2 8 /1 9 7 8 , d e sta c a -se o d isp o sto em
seu art. 4°, q u e im p õ e a o b se rv â n c ia d o e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro
d as C o m p a n h ia s d e S a n e a m e n to n a fix a ç ã o ta rifá ria , além d e in s titu ir o
m o d e lo d e ta rifa m ín im a d e m o d o a a s s e g u ra r o a te n d im e n to ao s u su á rio s
d e m e n o r co n su m o .
Já o D e c re to F e d e ra l 8 2 .5 8 7 /1 9 7 8 , q u e v e io a re g u la m e n ta r a lei
fe d e ra l a c im a m e n c io n a d a , traz , em seu art. 3°, d e n tre os o b je tiv o s
p e rm a n e n te s d o P L A N A S A , a e lim in a ç ã o d o d é fic it, a m a n u te n ç ã o do
e q u ilíb rio e n tre d e m a n d a e o ferta, a a u to ssu ste n ta ç ã o fin a n c e ira d o seto r
e a a d e q u a ç ã o d o s n ív e is ta rifá rio s às p o ssib ilid a d e s d o s u su á rio s, sem
p re ju íz o d o e q u ilíb rio e n tre re c e ita e c u sto d o s serv iço s.

11 COSTA, Álvaro José Menezes da Costa. Companhias Estaduais na prestação de


serviços de saneamento básico. In: PHILIPPI JR., Arlindo (coord.). Gestão do
Saneamento Básico: Abastecimento de água e esgotamento sanitário. São Paulo:
Manole. 2012. p. 85.
12 BRASIL. Plano decenal de desenvolvimento econômico e social. Versão
Preliminar. Rio de Janeiro: Ministério do Planejamento e Coordenação
Econômica. 1967. Tomo VI, V. 3 e 4. p. 45 e ss. Disponível em: http://www2.senado.l
eg.br/bdsf/handle/id/562935. Acesso em: 16 abr. 2020.

371
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A p a rtir d o art. 10 d o D e c re to F e d e ra l 8 2 .5 8 7 /1 9 7 8 , h á u m m a io r
d e ta lh a m e n to da e stru tu ra ta rifá ria a se r seg u id a, o b se rv a n d o -se ,
n o v a m e n te , p re o c u p a ç ã o co m o e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro das
C o m p a n h ia s E sta d u a is (art. 12). D e sta c a -se , ta m b é m , a n e c e ssid a d e d e
c o m p a tib iliz a ç ã o d o s o b je tiv o s e c o n ô m ic o s co m os o b je tiv o s so ciais
a tra v é s d a im p le m e n ta ç ã o d o s su b síd io s cru z a d o s (arts. 10 e 11).
A lém disso, era exigência p ara o setor a existência de estrutura
tarifária única, n ão sendo possível a diferenciação de estruturas de cobrança
a d ep en d er d a região. A ssim , todos as localidades atendidas pelas
C o m panhias de S aneam ento deveriam seguir a m esm a estrutura tarifária.13
M e s m o co m a re v o g a ç ã o d o D e c re to F e d e ra l 8 2 .5 8 7 /1 9 7 8 , em
1991, e d a L e i F e d e ra l 6 .5 2 8 /1 9 7 8 , a le g isla ç ã o q u e se su ce d eu
p e rm a n e c e p a u ta d a n a m e s m a ló g ic a in stitu íd a p e lo P L A N A S A .
D e fato, a L ei F ederal 11.445, denom inada de M arco R egulatório
do S aneam ento B ásico, m antém as m esm as regras tarifárias previstas
anteriorm ente. São m antidas, sobretudo, a preocupação com a
sustentabilidade e com o equilíbrio econôm ico-financeiro d a prestação dos
serviços, além das preocupações sociais decorrentes d a estruturação tarifária.
M e s m o co m a p ro fu n d a a lte ra ç ã o p ro m o v id a p e la L ei F ed eral
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , o c e rn e d o s re g ra m e n to s ta rifá rio s se m a n té m , p o d e n d o -se
o b s e rv a r u m a c o n tin u id a d e n a s p re o c u p a ç õ e s d e c o rre n te s d o m o d e lo
ta rifá rio a se r a d o ta d o n o se to r d e á g u a e esg o to d o país.
Já no art. 2°, V II há a p re v isã o da e fic iê n c ia e da
s u s te n ta b ilid a d e e c o n ô m ic a c o m o p rin c íp io s fu n d a m e n ta is p a ra o setor.
M a is a fren te, d e sta c a -se o d isp o sto n o art. 2 2 q u e d isp õ e q u e a re g u la ç ã o
seto rial terá, c o m o u m d e seu s o b jetiv o s, a d e fin iç ã o d e ta rifa s q u e
a sse g u re m o e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro e a m o d ic id a d e ta rifá ria.
Im p o rta n te m e n c io n a r, ta m b é m , q u e as ta rifa s p o d e rã o se r re v ista s de

13 COSTA, Aroldo João. Metodologia para análise de tarifas de sistemas de


abastecimento de água - SAA com base nos custos de implantação e operação do
sistema 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia Ambiental) - Universidade
Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2003. f. 62.

372
m a n e ira e x tra o rd in á ria ca so id e n tific a d o s fa to s n ã o p re v isto s n o s
co n tra to s, fo ra d o c o n tro le d o s p re sta d o re s d o s serv iç o s, q u e a lte re m o
e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro .
A s re g ra s g e ra is p a ra a e la b o ra ç ã o d e e stru tu ra s ta rifá ria s q u e
a sse g u re m a s u ste n ta b ilid a d e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira d o s se rv iç o s d e á g u a
e esg o to e n c o n tra m -se p re v ista s n o s arts. 2 9 a 31 d o M a rc o R e g u la tó rio .
D e in ício , o p a rá g ra fo 1° d o art. 2 9 tra z as d ire triz e s p a ra a
in s titu iç ã o d as tax as, ta rifa s e p re ç o s p ú b lic o s q u e irã o re m u n e ra r os
se rv iç o s d e á g u a e esg o to , d e sta c a n d o -se a in stitu iç ã o d o s d e n o m in a d o s
su b síd io s c ru z a d o s (art. 29, §1, II e §2°), o q u e é m e lh o r e x p lic ita d o n o
art. 31, e a a u to ssu ste n ta b ilid a d e (art. 29, §1°, III, V e V I), re fo rç a n d o
to d a a ló g ic a tra z id a n o c o rp o d a lei.
Já n o art. 30 h á as re g ra s e sp e c ífic a s p a ra e la b o ra ç ã o d a
e stru tu ra ta rifá ria seto rial, p o n to q u e so fre u sig n ific a tiv a m o d ific a ç ã o
p e la L ei F e d e ra l 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 .
N a re d a ç ã o o rig in a l d o M a rc o R e g u la tó rio d o S an ea m e n to ,
h a v ia a p o s s ib ilid a d e d e e sc o lh a d o m o d e lo ta rifá rio a se r a d o ta d o , com
a p re v is ã o d a ta rifa ç ã o p o r b lo c o s c re sc e n te s (art. 30, I) e d a p a rte fix a
d a ta rifa co m o u sem fra n q u ia d e c o n su m o (30, III e IV ), q u e p o d e ria m
se r a p lic a d o s iso la d a m e n te o u em co n ju n to .
H a v ia , p o rta n to , u m a fa c u ld a d e n a e sc o lh a d e q ual o m o d e lo
ta rifá rio a ser im p le m e n ta d o .14 E isso se co n c lu i fa c ilm e n te d a re d a ç ã o
o rig in a l d o c a p u t d o art. 30. O c o m a n d o u tiliz a d o p e lo le g is la d o r e ra o
“ p o d e rá c o n s id e ra r” . D e sta fo rm a , a e stru tu ra ta rifá ria p o d e ria ser
e la b o ra d a seg u in d o q u a lq u e r m o d e lo d e ta rifa ç ã o e c o n o m ic a m e n te
su ste n tá v e l, o b se rv a n d o -se os re q u isito s d o art. 29.

14 “A lei não determina um critério específico para o método de definição da tarifa, bem
como para definição dos índices de reajuste ou revisão tarifária. A lei federal concedeu
maior liberdade para o titular e o ente regulador definirem os critérios que julgarem
mais adequados à sua realidade.” ARAÚJO, Flávia Camargo de; BERTUSSI, Geovana
Lorena. Saneamento básico no Brasil: estrutura tarifária e regulação. Planejamento e
políticas públicas, Brasília, n. 51, jul./dez. 2018. p. 175.

373
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

C o m a e d iç ã o d a L ei F e d e ra l 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , n ã o h á m a is q u a lq u e r
fa c u ld a d e n a e la b o ra ç ã o d a e stru tu ra ta rifá ria . O c o m a n d o “ d e v e rá ”
u tiliz a d o p e lo le g isla d o r a fa sta a fa c u ld a d e e im p õ e m o d e lo ta rifá rio
ú n ic o b a s e a d o n a ta rifa ç ã o em d u as p a rte s c o m fix a ç ã o d e fra n q u ia de
c o n su m o , o q u e re p re s e n ta u m fre io ao s m o v im e n to s re a liz a d o s p o r
d iv e rsa s p re s ta d o ra s d o se rv iç o n a e la b o ra ç ã o d e e stru tu ra s ta rifá ria s sem
fra n q u ia d e c o n s u m o .15
A ssim , o b serv a-se que o atual M arco R eg u lató rio do S aneam ento
B ásico institui d iretrizes p a ra a elab o ração das estruturas tarifárias q u e se
co ad u n am co m o histó rico do setor n o p aís e p o ssib ilitam a m an u ten ç ão das
reg ras de co b ran ça já existentes desd e a é p o c a do P L A N A S A .
A s d ire triz e s ta rifá ria s e sta b e le c id a s n a le g isla ç ã o fe d era l d e sd e
e n tã o re fle te m -se n a s le g isla ç õ e s e sta d u a is q u e p a ssa ra m a d e ta lh a r co m o
d ev e ser re a liz a d a a c o b ra n ç a p e lo s se rv iç o s d e á g u a e esg o to .
A d o to u -se , m a jo rita ria m e n te , o m o d e lo d e ta rifa ç ã o em d u as
p arte s, co m u m a p a rte fix a co m fra n q u ia m ín im a d e c o n su m o so m a d a a
u m a p a rte v o lu m é tric a c re sc e n te em b lo co s. P a ra a d e fin iç ã o d a p a rte
fix a, a d o to u -s e o c rité rio d e e c o n o m ia s 16 o u u n id a d e s 17 em c o n tra p o siç ã o

15 COPASA, CAESB, SABESP e CASAN, entre outros, ou estão em estudos para


implementar modelo tarifário sem franquia de consumo ou já o implementaram.
16Economia pode ser definido como critério de caracterização das unidades prediais a ser
considerado na definição da parte fixa da tarifa. Pode ser um imóvel domiciliar, tal como
uma casa ou um apartamento, ou um conjunto de lojas ou salas comerciais, por exemplo.
17 No Rio de Janeiro, o Decreto Estadual 553/1976 assim dispõe: Art. 98 - A tarifa
mínima é o produto do consumo mínimo mensal, por economia, pela tarifa unitária.
Parágrafo único - A CEDAE fixará o consumo mínimo mensal de que trata este artigo.
No Distrito Federal, a Lei Distrital 442/1993 prevê o seguinte: Art. 2° - As tarifas serão
diferenciadas segundo as categorias de usuários e faixas de consumo, assegurando-se o
subsídio dos grandes consumidores para os pequenos consumidores, de forma a
compatibilizar os aspectos econômicos com os objetivos sociais. §1° - A conta mínima
de água resultará do produto da tarifa mínima pelo consumo mínimo, que será de 10
m3 mensais por economia, para todas as categorias de consumo. Em São Paulo, o
Decreto 41.446/1996 traz a seguinte redação: Artigo 4.° - O consumo mínimo de água
a ser cobrado por ligação ou economia residencial, nunca será inferior a 10m3 (dez
metros cúbicos) por mês, podendo ser diferenciado por categoria de uso, capacidade de
hidrômetro e características de demanda e consumo, conforme os critérios

374
ao crité rio d a lig açã o , o q u e p re stig ia a re a lid a d e d o s u su á rio s, a iso n o m ia
e a m o d ic id a d e ta rifá ria.
C o m o j á ex p lic ita d o , a c o b ra n ç a p e lo s se rv iç o s d e á g u a e esg o to
d ev e se r s u fic ie n te p a ra re c u p e ra r os c u sto s d o p re sta d o r, re p a rtin d o -o s
e n tre os to d o s u su á rio s e re sp e ita n d o a m o d ic id a d e ta rifá ria , b e m co m o
p o s s ib ilita r a tin g ir as m e ta s d e u n iv e rsa liz a ç ã o p re v ista s n o s p la n o s
m u n ic ip a is o u re g io n a is d e sa n e a m e n to e a in d a n a s m e ta s d o s c o n tra to s
d e c o n c e ssã o o u d e p ro g ram a.
N este sentido, a adoção do critério de econom ias m ostra-se a m ais
adequada, j á que im p lica n a divisão dos custos pelo m aio r denom inador
possível se co m parado ao critério de ligações, o que im plica n a cobrança do
m en o r v alo r possível dos usuários capaz de propiciar a recuperação dos
custos. E isto fica claro ao se im ag in ar o exem plo abaixo.
E m u m d ad o local existem u m a casa e u m co n d o m ín io vertical
com 09 (n o v e u n id ad es) que custeiam o p re sta d o r d e serviço de ág u a e
esgoto. O custo do serviço é X . A casa rep resen ta 0 1 (um a) lig ação e 0 1
(u m a) eco n o m ia e o co n d o m ín io re p resen ta tam b ém 0 1 (um a) ligação, m as
com 09 (nove) econom ias. A o d iv id ir o custo X p elo n ú m ero de ligações,
tan to a casa co m o o co n d o m ín io ficarão resp o n sáv eis p o r 50% (cin q u en ta
p o r cento) d o s custos. Já ao u tiliza r-se o critério de econom ias, o custo X
será rep artid o p elas 1 0 (dez) econom ias, fa zen d o com que cad a u n id ad e seja
resp o n sáv el p o r ap en as 10% (dez p o r cento) do custo total.
P e rc e b e -se , en tão , q u e o crité rio d e fix a ç ã o d a p a rte fix a d a
e stru tu ra ta rifá ria a tra v é s d o crité rio d e e c o n o m ia s re p re se n ta o m e n o r
v a lo r a se r c o b ra d o d e c a d a u n id a d e d e co n su m o , a lé m d e p o ssib ilita r
tra ta m e n to is o n ô m ic o e n tre os u su á rio s fin a is d o s serviços.
R esp eitando-se a necessidade de uniform idade d a estrutura tarifária,
o critério de cobrança acim a descrito é aplicável a todos os usuários,

estabelecidos no artigo 3.°, na forma explicitada em norma interna da SABESP.


Parágrafo único - Para prédios dotados de ligações de esgotos, o consumo considerado
nunca será inferior a 10m3 por economia e categoria de uso. Entre outros.

375
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

in d ependente d a localidade, do p o d er aquisitivo, se u suário individual ou em


condom ínio. T odas as situações devem ser tratadas p o r ela.
E n tre ta n to , ig n o ra n d o to d o o re g ra m e n to esp e c ífic o , ex isten te,
o P o d e r Ju d ic iá rio v e m a tu a n d o em se n tid o to ta lm e n te o p o sto ao p re v isto
n a le g isla ç ã o , p ra tic a m e n te cria n d o u m a e stru tu ra ta rifá ria p ró p ria p a ra
c o n d o m ín io s e q u e v io la a iso n o m ia d e tra ta m e n to en tre u su á rio s,
c ria n d o p riv ilé g io s p a ra alg u n s em d e trim e n to d a c o le tiv id a d e .

3 A ESTRUTURA T A R IF Á R IA DE ÁGUA E ESGOTO NO


JU D IC IÁ R IO E A N E C E S S ID A D E D E A U T O C O N T E N Ç Ã O

N ão é n o v id a d e que h aja, no B ra sil, um e x c e sso de


ju d ic ia liz a ç ã o . E m fu n ç ã o d e ste fe n ô m e n o , o B ra sil alca n ço u , n o fin al do
a n o d e 2 0 1 9 , a e x p re ssiv a m a rc a d e 77,1 m ilh õ e s d e p ro c e sso s em
tra m ita ç ã o em n o ssa s c o rte s d e ju s tiç a 18, o q u e c u lm in o u n o c e n á rio
d e n o m in a d o d e tra g é d ia d a j u s tiç a .19
N a tu ra l, p o rta n to , q u e o c o rra a ju d ic ia liz a ç ã o d e q u e stõ e s
p e rtin e n te s à e stru tu ra ta rifá ria n o se to r d e sa n e a m e n to , o q u e te m se
m o s tra d o e x tre m a m e n te p re ju d ic ia l. O P o d e r Ju d ic iá rio n ã o é o e sp a ç o
a d e q u a d o p a ra q u e sejam tra v a d a s ta is d isc u ssõ e s, j á q u e n ã o h á a
fa m ilia riz a ç ã o d o s m a g istra d o s co m as e sp e c ific id a d e s seto riais. D e sta
fo rm a , e v e n tu a is in te rv e n ç õ e s ju d ic ia is n a p o lític a ta rifá ria p o d e m
re p re s e n ta r g ra v e s risc o s re g u la tó rio s q u e p re c isa m ser m in im iz a d o s a
fim d e q u e se te n h a u m m ín im o d e se g u ra n ç a ju ríd ic a .20

18De acordo com o Relatório Justiça em Números de 2020.


19 WOLKART, Erik Navarro. Análise Econômica do Processo Civil: Como a
economia, o direito e a psicologia podem vencer a tragédia da justiça. São Paulo:
Revista dos Tribunais. 2019. p. 85-89.
20 OLIVEIRA, Matheus Valle de Carvalho e. Judicialização da regulação dos
serviços de água e de esgoto: aspectos jurídicos do modelo da tarifa com partes fixa e
variável. Disponível em: https://tratamentodeagua.com.br/artigo/judicializacao-da-
regulacao-servicos-agua-esgoto/. Acesso em: 18 abr. 2020.

376
A ju ris p ru d ê n c ia b ra s ile ira já e n fre n to u d iv e rso s te m a s
re la c io n a d o s à c o b ra n ç a n o s se rv iç o s d e á g u a e esg o to .
D e sta c a -se , in ic ia lm e n te , a d isc u ssã o e n v o lv e n d o a
p o s s ib ilid a d e d e c o b ra n ç a d a ta rifa m ín im a , d e n o m in a ç ã o c o m u m e n te
a trib u íd a à c o b ra n ç a d a p a rte fix a co m fra n q u ia d e co n su m o . H o u v e
q u em e n te n d e sse que, em h a v e n d o h id rô m e tro in sta la d o , seria e x to rsiv a
a c o b ra n ç a co m c rité rio s o u tro s q u e n ã o o real c o n su m o re g istra d o n o
m e d id o r. In s ta d o a se m a n ife sta r, o S T J e n te n d e u , d e fo rm a re ite ra d a ,
p e la p o s s ib ilid a d e d a c o b ra n ç a d a ta rifa m ín im a 21.
T a m b é m c h e g o u -se a d isc u tir a c o b ra n ç a co m b a s e n a ta rifa ç ã o
p o r b lo c o s cre sc e n te s, c o m u m e n te d e n o m in a d a d e p ro g re ssiv id a d e
ta rifá ria . O s trib u n a is e n te n d ia m que, p o r h a v e r h id rô m e tro in sta la d o ,
n ã o p o d e ria ser p ra tic a d a q u a lq u e r e sp é c ie d e e x a ç ã o q u e n ã o a q u e
c o n sid e re a p e n a s o v o lu m e c o n su m id o 22. C h a m a d o a in te rv ir n a
d isc u ssã o , o S T J se p o sic io n o u d e fo rm a re ite ra d a 23 p e la p o ssib ilid a d e

21 Veja-se, por todos, o seguinte julgado: TARIFA DE AGUA - CONSUMO MINIMO


- POSSIBILIDADE. A COBRANÇA DE TARIFA DE AGUA COM BASE EM
VALOR MINIMO ENCONTRA APOIO LEGAL.RECURSO PROVIDO. (REsp
150.137/MG, Rel. Ministro Garcia Vieira, Primeira Turma, julgado em 17/02/1998, DJ
27/04/1998, p. 93).
22Essa condenação da cobrança com base na progressividade tarifária demonstra a mais
absoluta confusão conceitual. Ao condenar a tarifação por blocos crescentes, o Poder
Judiciário determinava a tarifação em parte única por critérios exclusivamente
volumétricos, como se fossem contrapostos, o que não é o caso.
23 Veja-se, por todos, o seguinte julgado: PROCESSUAL CIVIL.
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIÇO PÚBLICO.
FORNECIMENTO DE ÁGUA. POLÍTICA TARIFÁRIA. TARIFA PROGRESSIVA.
LEGITIMIDADE (LEI 6.528/78, ART. 4°; LEI 8.987/95, ART. 13). DOUTRINA.
PRECEDENTES. PROVIMENTO. 1. O faturamento do serviço de fornecimento de
água com base na tarifa progressiva, de acordo com as categorias de usuários e as faixas
de consumo, é legítimo e atende ao interesse público, porquanto estimula o uso racional
dos recursos hídricos. Interpretação dos arts. 4°, da Lei 6.528/78, e 13 da Lei 8.987/95. 2.
"A política de tarifação dos serviços públicos concedidos, prevista na CF (art. 175), foi
estabelecida pela Lei 8.987/95, com escalonamento na tarifação, de modo a pagar menos
pelo serviço o consumidor com menor gasto, em nome da política das ações afirmativas,
devidamente chanceladas pelo Judiciário (precedentes desta Corte)" (REsp 485.842/RS,
Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 24.5.2004). 3. Recurso especial provido, para se

377
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

d a c o b ra n ç a d e á g u a d e fo rm a p ro g re ssiv a , c u lm in a n d o n a ed iç ã o do
v e rb e te 4 0 7 d e su a sú m u la 24.
M e s m o h a v e n d o p re v isã o leg al p a ra as c o b ra n ç a s d a ta rifa
m ín im a 25 e d a p ro g re ssiv id a d e ta rifá ria 26, o Ju d ic iá rio , co m b a se em
a rg u m e n to s ra so s v in c u la d o s tã o so m e n te ao d ire ito d o c o n su m id o r,
re lu to u p a ra a c e ita r ta is m é to d o s d e ta rifa ç ã o . O m e sm o n ã o se p o d e d iz e r
d a c o b ra n ç a co m b a s e n o re g im e d e ec o n o m ia s.
D e p o is d e m u ita d isc u ssã o p rin c ip a lm e n te n o â m b ito do
T rib u n a l d e J u stiç a d o R io d e Ja n e iro , o S T J e n te n d e u q u e a c o b ra n ç a
n ã o p o d e ser p e lo q u e se c o m u m e n te d e n o m in a “ c o n su m o m ín im o
m u ltip lic a d o p e lo n ú m e ro d e e c o n o m ia s” . E m 2 0 1 0 , n o ju lg a m e n to do
R e c u rs o E sp e c ia l 1 .1 6 6 .5 6 1 /R J, p e la s iste m á tic a d o s re c u rso s esp e c ia is
re p e titiv o s, fo i fix a d o o T e m a 4 1 4 d e su a ju risp ru d ê n c ia v e d a n d o tal
m e to d o lo g ia d e co b ran ça.
O u seja, c o n d e n o u -se o c rité rio d e e sta b e le c im e n to d a p a rte fix a
d a e s tru tu ra ta rifá ria co m b a se n o n ú m e ro d e u n id a d e s c o n su m id o ra s, o
q u e re p re s e n ta p ro fu n d a a lte ra ç ã o n o c á lc u lo a tin e n te à re p a rtiç ã o dos
c u sto s n e c e s s á rio s à p re sta ç ã o d o serv iço .
C om a im p o ssib ilid ad e d a co b ran ça p elo critério legal, as
co n cessio n árias, n o s casos em q u e h o u v e determ in ação judicial, p assaram a
calcu lar a p arte fix a d a ta rifa com b ase n o n ú m ero de ligações, m antendo,

reconhecer a legalidade da cobrança do serviço de fornecimento de água com base na


tarifa progressiva e para julgar improcedente o pedido. (REsp 861.661/RJ, Rel. Ministra
Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 13/11/2007, DJ 10/12/2007, p. 304).
24 “É legítima a cobrança da tarifa de água fixada de acordo com as categorias de
usuários e as faixas de consumo.”
25 Lei Federal 6.528/78: Art. 4° - A fixação tarifária levará em conta a viabilidade do
equilíbrio econômico-financeiro das companhias estaduais de saneamento básico e a
preservação dos aspectos sociais dos respectivos serviços, de forma a assegurar o
adequado atendimento dos usuários de menor consumo, com base em tarifa mínima.
26 Decreto Federal 82.587/78: Art. 14 - As tarifas da categoria residencial serão
diferenciadas para as diversas faixas de consumo, devendo, em função destas ser
progressivas em relação ao volume faturável. Lei Federal 8987/95: Art. 13. As tarifas
poderão ser diferenciadas em função das características técnicas e dos custos
específicos provenientes do atendimento aos distintos segmentos de usuários.

378
contudo, a co n cessão de fran q u ia de co n su m o (ag o ra com b ase n o nú m ero
de 01 lig ação ) e a seg u n d a p arte crescente em b lo co s tam b ém com b ase no
n ú m ero de ligações. E sta p ro v id ên cia ad o tad a levou, n a m a io r parte dos
casos, ao au m en to das faturas, sob retu d o n o s co n d o m ín io s residenciais, em
fu n ção d a red u ção d o b lo co d e entrada, com a aceleração d a d istribuição do
v o lu m e co n su m id o nos d em ais blocos.
In a u g u ro u -se , aí, n o v a d isc u ssã o a c e rc a d a c o b ra n ç a p a ra
co n d o m ín io s, te n d o sid o a d o ta d a a te se d e q u e a c o b ra n ç a d e v e ria
c o n s id e ra r o n ú m e ro d e e c o n o m ia s a p e n a s p a ra a d e lim ita ç ã o d a
e x te n sã o d o s b lo c o s c re sc e n te s (p ro g re ssiv id a d e ta rifá ria ). Isso im p lic a
n o c á lc u lo d a p a rte fix a d a ta rifa co m b a se n o n ú m e ro d e lig açõ e s, m as
co m o s b lo c o s c re sc e n te s c a lc u la d o s co m b a se n o n ú m e ro d e u n id ad es.
N a p rá tic a, a c o b ra n ç a d o s c o n d o m ín io s p a ssa a se r re a liz a d a em v a lo re s
a b a ix o d o d e fin id o co m o n e c e ssá rio p a ra a re c u p e ra ç ã o d o s c u sto s fix o s
d o serv iço , o q u e é e x tre m a m e n te p re ju d ic ia l ao p re sta d o r.
N o c o n te x to atu al, em q u e fic a c a d a v e z m a is e v id e n c ia d a a
n e c e s s id a d e d e se in v e s tir em san e am en to , n ã o se p o d e a d m itir q u e
d e c isõ e s ju d ic ia is in te rfira m d e m a n e ira tã o e x p re ssiv a n a p o lític a
ta rifá ria seto rial, sob p e n a d e in v ia b iliz a r a p re sta ç ã o d o serv iço , se ja p o r
p re s ta d o re s p ú b lic o s o u p riv ad o s.
A lé m d isso , a m o d ific a ç ã o d a e s tru tu ra ta r if á r ia p e la v ia
ju d ic ia l n ã o a lte r a a re a lid a d e d e q u e a p re s ta ç ã o d o s e rv iç o d e á g u a e
e s g o to e n v o lv e c u s to s e le v a d o s q u e n ã o se a lte ra m em fu n ç ã o d e u m a
d e c is ã o ju d ic ia l, le v a n d o à n e c e s s id a d e d e c o m p e n s a ç ã o p o r m e io d e
r e a ju s te s o u re v is õ e s ta r if á r ia s .27

27 “A instituição de uma tarifa reduzida para determinada situação ou para certa classe
de usuários tem por pressuposto que o custo do atendimento dessa situação beneficiada
seja repassado a um terceiro. Isso ocorre porque o serviço delegado é prestado da
mesma maneira, havendo ou não a criação de distinções tarifárias como forma de
proporcionar uma política pública. Em outras palavras, os custos de prestação do
serviço não se alteram em função da instituição de benefícios tarifários. Assim, as
reduções tarifárias derivadas de uma política pública do poder concedente
necessariamente farão com que os custos derivados da prestação do serviço para a

379
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

P o r se tra ta r d e fo rm a d e v ia b iliz a r a c o n se c u ç ã o d e tã o
im p o rta n te p o lític a p ú b lic a , a p o lític a ta rifá ria d e v e se r p re se rv a d a co m o
a p ro v a d a p e lo re g u la d o r, q u e d ev e se m p re se p a u ta r n a le g isla ç ã o . E
n e ste sen tid o , a L e i F e d e ra l 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 re fo rç a as e sc o lh a s té c n ic a s
p a ssa d a s no to c a n te à e stru tu ra ta rifá ria , bem com o a m p lia as
c o m p e tê n c ia s d a A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s (A N A ) p a ra q u e esta
c u m p ra o p ap e l d e re g u la d o r n a c io n a l d o seto r, in c u m b in d o a e sta a
re s p o n sa b ilid a d e p o r e sta b e le c e r n o rm a s d e re fe rê n c ia re la tiv a s, en tre
o u tro s, à re g u la ç ã o ta rifá ria , ao e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro e à
u n iv e rs a liz a ç ã o d o s serv iço s.
E m re la ç ã o à u n iv e rsa liz a ç ã o d o s serv iç o s, re fe rid a lei fed era l
e sta b e le c e c o m o m e ta s o b rig a tó ria s d o s c o n tra to s d e c o n c e ssã o o
a te n d im e n to d e 9 9 % (n o v e n ta e n o v e p o r c e n to ) d a p o p u la ç ã o co m o
a b a ste c im e n to d e á g u a e 9 0 % (n o v e n ta p o r c e n to ) d a p o p u la ç ã o com
c o le ta e tra ta m e n to d e e sg o to até d e z e m b ro 2 0 3 3 , p ra z o p ro rro g á v e l até
1° d e ja n e ir o d e 2 0 4 0 . O a tin g im e n to d estas o u sa d a s m e ta s só será
p o ssív e l atra v és de v u lto s o s in v e stim e n to s que d ep e n d em ,
p rim o rd ia lm e n te , d a re c u p e ra ç ã o d o s c u sto s p o r m e io d as ta rifa s
c o b ra d a s d o s u su á rio s.
P a ra le la m e n te à a tu a ç ã o d a A N A c o m o ó rg ã o re g u la d o r cen tral,
a g ê n c ia s re g u la d o ra s lo c a is p e rm a n e c e rã o a tu a n d o n a fisc a liz a ç ã o e n a
re g u la m e n ta ç ã o d o s p re sta d o re s d o serv iç o , p ro m o v e n d o , n o to c a n te ao
te m a tra ta d o n o p re se n te artig o , re a ju ste s e re v isõ e s ta rifá rio s em pro l d a
m a n u te n ç ã o d o e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro d a s co n c essõ es.
P erceb e-se, assim , q u e a n o v a leg islação v alo riz a o papel da
reg u lação , em prol do atin g im en to das m etas propostas. A ssim , caso as
n o rm ativ as o riundas das entidades reguladoras, esp ecialm en te aquelas
relativ as à estru tura tarifária, n ão sejam respeitadas p elo P o d e r Judiciário,

parcela de usuários beneficiados sejam compensados de outra forma.” SCHWIND,


Rafael Wallbach. Remuneração do particular nas concessões e parcerias público-
privadas 2010. Dissertação (Mestrado em Direito) - Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010. p. 113.

380
as m etas de u n iv ersalização do serviço p revistas n a lei correm o risco de n ão
serem alcançadas. É n ecessário, portanto, que o P o d e r Ju d iciário p reste
d eferên cia às n o rm as tarifárias o riundas dos órgãos com p eten tes p ara fixá-
las, ag in d o apenas em casos d e flag ran te ilegalidade, o que, até o m om ento,
n ão v e m o correndo, co m o pô d e ser v isto acim a.
A d efin ição d e u m a estru tu ra tarifá ria ad e q u ad a e sustentável tem
se m o strad o co m o u m v erd ad eiro desafio g lo b al28, tratan d o -se de m atéria
altam en te com plexa. E p o r se trata r d e te m ática d o tad a de ex trem a
co m p lex id ad e técnica, o prestíg io judicial às decisões técn icas proferidas
p elo s reg u lad o res se im põe, já q u e o P o d e r Ju d iciário n ão detém a estrutura
n ec essária p ara en fren tar tais tem as. C aso decisões ju d ic ia is se aventurem
em tem as co m o o presente, o risco de d esarranjos regulatórios pro v o cad o s
p o r u m a in terv en ção eq u iv o cad a m o stra-se b astan te elev ad o .29
D e s ta fo rm a , m o stra -se in c o n c e b ív e l que, d ia n te d e te m a tã o
re le v a n te e c o m p le x o , u m ó rg ã o d o P o d e r Ju d ic iá rio , sem p o ssu ir
e stru tu ra té c n ic a e in stitu c io n a l p a ra ta n to , d e fin a com o será a
m e to d o lo g ia d e c o b ra n ç a a p licá v el a o se rv iç o d e á g u a e esg o to .
C u m p re ressaltar que o S u p rem o T ribunal F ederal (S T F ) j á se
m an ifesto u acerca d a n ecessid ad e de resp eito às d ecisõ es técn icas oriundas
das en tid ad es reguladoras. D e fato, nas h ip ó teses em que n o ssa C orte
S u p re m a an aliso u o m érito das d em an d as q u estio n an d o decisões das
ag ên cias reg u ladoras, presto u -se d eferên cia às decisões técn icas em 88,7%
dos caso s.30 D en tre elas, m erece m en çã o o p reced en te do A g rav o

28 MARQUES, Rui Cunha; MIRANDA, João. Sustainable tariffs for water and
wastewater services. Utilities Policy, v. 64, 2020. p. 1- 2. Disponível em: https://www.scie
ncedirect.com/science/article/abs/pii/S0957178720300497. Acesso em: 15 jan. 2021.
29 JORDÃO, Eduardo; CABRAL JUNIOR, Renato Toledo. (2018). A teoria da
deferência e a prática judicial: um estudo empírico sobre o controle do TJ RJ à
AGENERSA. REI - Revista Estudos Institucionais. v. 4. p. 541.
30 JORDÃO, Eduardo Ferreira; REIS, Vinícius Cardoso; CABRAL JÚNIOR, Renato
Toledo. O controle das agências reguladoras federais no STF como instância recursal:
um estudo empírico. Revista de Direito Econômico e Socioambiental, Curitiba, v.
11, n. 1, p. 122-155, jan./abr. 2020.

381
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

R eg im en tal n o R ecu rso E x trao rd in ário 1083955, de relato ria d o M in istro


L u iz F ux. E m fu n ção de sua clareza, d estaca-se o seguinte trech o d a em en ta
d a decisão, q u e já se m o stra suficiente p a ra co rro b o rar o q u e o ra se d efende:

(...)1. A capacidade institucional na seara regulatória, a


qual atrai controvérsias de natureza acentuadamente
complexa, que demandam tratamento especializado e
qualificado, revela a reduzida expertise do Judiciário para
o controle jurisdicional das escolhas políticas e técnicas
subjacentes à regulação econômica, bem como de seus
efeitos sistêmicos. 2. O dever de deferência do Judiciário
às decisões técnicas adotadas por entidades reguladoras
repousa na (i) falta de expertise e capacidade institucional
de tribunais para decidir sobre intervenções regulatórias,
que envolvem questões policêntricas e prognósticos
especializados e (ii) possibilidade de a revisão judicial
ensejar efeitos sistêmicos nocivos à coerência e dinâmica
regulatória administrativa. 3. A natureza prospectiva e
multipolar das questões regulatórias se diferencia das
demandas comumente enfrentadas pelo Judiciário, mercê
da própria lógica inerente ao processo judicial. 4. A
Administração Pública ostenta maior capacidade para
avaliar elementos fáticos e econômicos ínsitos à regulação.
Consoante o escólio doutrinário de Adrian Vermeule, o
Judiciário não é a autoridade mais apta para decidir
questões policêntricas de efeitos acentuadamente
complexos (VERMEULE, Adrian. Judging under
uncertainty: An institutional theory of legal interpretation.
Cambridge: Harvard University Press, 2006, p. 248-251).
5. A intervenção judicial desproporcional no âmbito
regulatório pode ensejar consequências negativas às
iniciativas da Administração Pública. Em perspectiva
pragmática, a invasão judicial ao mérito administrativo
pode comprometer a unidade e coerência da política
regulatória, desaguando em uma paralisia de efeitos
sistêmicos acentuadamente negativos. (...)
(RE 1083955 AgR, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma,
julgado em 28/05/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-
122 DIVULG 06-06-2019 PUBLIC 07-06-2019).

382
A alta e sp e c ia liz a ç ã o d as a g ê n c ia s re g u la d o ra s m e n c io n a d a n a
e m e n ta d e sta c a d a , é u m d o s fa to re s le g itim a d o re s d a a u to n o m ia
re g u la tó ria que fu n d a m e n ta a n e c e ssid a d e de a u to c o n te n ç ã o do
Ju d ic iá rio . E é e ssa a u to n o m ia q u e g a ra n te a se g u ra n ç a n e c e ssá ria p a ra
os in v e s tim e n to s d o s p re sta d o re s d e se rv iç o .31
S e d e c isõ e s ju d ic ia is c o n tin u a re m a fa sta n d o as n o rm a s té c n ic a s
re fe re n te s à e s tru tu ra ta rifá ria , h á g ra v e risc o d e q u e os in v e stim e n to s
n e c e s s á rio s à u n iv e rsa liz a ç ã o d o s se rv iç o s n ã o sejam re a liz a d o s e as
m e ta s p ro p o s ta s n ã o sejam c u m p rid a s.
P o rta n to , d e n o ta -se q u e a re v isã o a d v in d a d o Ju d ic iá rio e n se ja
em q u e b ra d a se g u ra n ç a ju ríd ic a e d a p re v isib ilid a d e d o re to rn o dos
in v e s tim e n to s e c u sto s d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , sen d o sem p re
p ru d e n te q u e o e x e rc íc io d a tu te la ju ris d ic io n a l se d ê d e m a n e ira
a b s o lu ta m e n te s u b sid iá ria e so m e n te em fa c e d e fla g ra n te ileg a lid a d e ,
c o m o p o r ex e m p lo , em a u sê n c ia d e rito s e sse n c ia is c o m o c o n su lta s
p ú b lic a s o u a u sê n c ia d e p o ssib ilid a d e d o e x e rc íc io d as g a ra n tia s de
a m p la d e fe sa e c o n tra d itó rio p o r p a rte d o s p re sta d o re s d e serviço.

4 CONCLUSÃO

O p re se n te a rtig o d isp ô s d e fo rm a d id á tic a e h is tó ric a a c e rc a d a


im p o rtâ n c ia d a e stru tu ra ç ã o ta rifá ria p a ra a fin a lid a d e d e p ro m o v e r os
n e c e s s á rio s e v u lto so s in v e stim e n to s em c u rto e sp a ç o d e te m p o d e m o d o
a u n iv e rs a liz a r os se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o . D e sd e o P L A N A S A a
e stru tu ra ç ã o ta rifá ria te m o c o n d ã o d e a u to su ste n ta r su a p re sta ç ã o e
p o s s ib ilita r o a tin g im e n to d as m e ta s c o n sta n te s n o s p la n o s m u n ic ip a is de
sa n e a m e n to , b e m co m o n o s co n tra to s d e c o n c essão .
A fo rm a atu al d e e stru tu ra ç ã o ta rifá ria le v a em c o n sid e ra ç ã o
d u as p arte s, u m a fix a e o u tra v a riá v e l (in c lu siv e co m p ro g re ssiv id a d e

31 SILVA, Leonardo Oliveira da. Autonomia Regulatória. Rio de Janeiro: Lumen


Juris, 2019. p. 53-54.

383
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

ta rifá ria ), sen d o q u e a p rim e ira c o rre sp o n d e a u m a e sp é c ie d e fra n q u ia


p e rm itid a p a ra o c o n su m o , e a se g u n d a p a rte d a e stru tu ra ta rifá ria p o d e
se r b a s e a d a em m o d e lo s v o lu m é tric o s, a d e p e n d e r d o s o b je tiv o s a serem
b u s c a d o s co m a p re c ific a ç ã o d o s se rv iç o s p re sta d o s.
C o n fo rm e d e m o n stra d o , o n o v o m a rc o leg al d o sa n e a m e n to
a tu a liz o u o c o m a n d o le g isla tiv o d e m o d o q u e n ã o m a is se fa c u lta aos
p re s ta d o re s d o se rv iç o d e sa n e a m e n to b á s ic o a e sc o lh a d o m o d e lo a ser
seg u id o . O com ando “ d e v e rá ” u tiliz a d o p e lo le g is la d o r a fa sta a
fa c u ld a d e e im p õ e m o d e lo ta rifá rio ú n ic o b a se a d o n a ta rifa ç ã o em d u as
p a rte s co m fix a ç ã o d e fra n q u ia d e c o n su m o , o q u e re p re s e n ta u m fre io
ao s m o v im e n to s re a liz a d o s p o r d iv e rsa s p re sta d o ra s d o se rv iç o n a
e la b o ra ç ã o d e e stru tu ra s ta rifá ria s sem fra n q u ia d e co n su m o .
D ia n te d esse novo q u a d ro le g isla tiv o d iv e rsa s e stru tu ra s
ta rifá ria s d e v e rã o se r re fe ita s p a ra se a d e q u a re m a o n o v o m a rc o le g a l do
sa n e a m e n to e, n e sse m o m e n to , d e v e rá h a v e r u m a d e fe rê n c ia p o r p a rte
d o s d iv e rso s a to re s e n v o lv id o s n o se to r à s d e c isõ e s té c n ic a s o b je tiv a n d o
a lc a n ç a r o e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro em p ro l d a u n iv e rsa liz a ç ã o
d o s se rv iç o s d e á g u a e e sg o ta m e n to san itário .
Isso , in e x o ra v e lm e n te , p o d e le v a r d iv e rsa s d e m a n d a s ao P o d e r
J u d ic iá rio , o q ual v e m a tu a n d o d e m o d o m a is in c isiv o q u e o n e c e ssá rio ,
m u ita s v e z e s c ria n d o situ a ç õ e s d e q u e b ra d a iso n o m ia , fa z e n d o co m q u e
u su á rio s co m m ais c a p a c id a d e d e p a g a m e n to o u u tiliz a ç ã o d o s serv iço s,
te n h a m , ap ó s d e c isõ e s ju d ic ia is , u m d e v e r d e c o n tra p re sta ç ã o co m as
p re s ta d o ra s d e se rv iç o s p ú b lic o s m e n o r d o q u e o n e c e ssá rio p a ra a
m a n u te n ç ã o d o s serv iço s.
D ia n te d esse q u ad ro , to rn a -se n e c e s s á ria a re fle x ã o d e q u e os
ag e n te s que re a liz a m a e stru tu ra ç ã o ta rifá ria , p o r p o ssu íre m os
in s tru m e n to s té c n ic o s a d e q u a d o s p a ra a lc a n ç a r o v a lo r c o rre to d a tarifa ,
d ev e m se r alv o d e d e fe rê n c ia p o r p a rte d o P o d e r Ju d ic iá rio .
D e m o d o alg u m , isso sig n ific a u m sa lv o c o n d u to p a ra ato s de
c a p tu ra d as A g ê n c ia s R e g u la d o ra s p o r p a rte d as C o n c e ssio n á ria s, sejam
elas p ú b lic a s o u p riv a d a s, m a s sig n ific a d iz e r q u e as e n tid a d e s té c n ic a s

384
q u e p o ssu a m c o m o u m a d e su as fin a lid a d e s e sp e c ífic a s a d e fin iç ã o d a
e stru tu ra ta rifá ria re sp o n sá v e l p e la p re c ific a ç ã o d o s se rv iç o s d ev e m ser
v a lo riz a d a s. D e sta m a n e ira , o P o d e r Ju d ic iá rio e sta rá g a ra n tin d o u m a
m a io r s e g u ra n ç a ju ríd ic a p a ra to d o s os e n v o lv id o s no se to r de
sa n e a m e n to b á sic o , sejam eles os titu la re s dos serv iç o s, os
c o n c e s s io n á rio s o u os u su á rio s.

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d e a b a s te c im e n to d e á g u a - S A A co m b a s e n o s c u sto s d e im p la n ta ç ã o e

385
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

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386
m .b r/a rtig o /ju d ic ia liz a c a o -d a -re g u la c a o -se rv ic o s-a g u a -e sg o to /. A c e sso
em : 18 abr. 2 0 2 0.

O N U . W a te r : a sh a re d re sp o n sib ility . T h e U n ite d N a tio n s W o rld W a te r


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C u ltu ra l O rg a n iz a tio n (U N E S C O ) a n d B e rg h a n B o o k s. 2 0 0 6 . D isp o n ív e l
em : h ttp ://w w w .u n e sc o .o rg /n e w /e n /n a tu ra l- s c ie n c e s/e n v iro n m e n t/w a te
r/w w a p /w w d r/w w d r2 -2 0 0 6 /. A c e sso em : 09 m a io 2020.

S C H W IN D , R a fa e l W a llb a c h . R e m u n e ra ç ã o do p a r tic u la r nas


c o n c e s s õ e s e p a r c e r i a s p ú b l i c o - p r i v a d a s 2 0 1 0 . D isse rta ç ã o (M e stra d o
em D ire ito ) - F a c u ld a d e d e D ire ito d a U n iv e rs id a d e d e S ão P a u lo , S ão
P a u lo , 2 0 1 0 .

S IL V A , L e o n a rd o O liv e ira da. A u to n o m ia R e g u la tó r ia . R io d e Jan e iro :


L u m e n Ju ris, 2 019.

W O L K A R T , E rik N a v a rro . A n á lis e E c o n ô m ic a d o P ro c e s s o C iv il:


C o m o a ec o n o m ia , o d ire ito e a p s ic o lo g ia p o d e m v e n c e r a tra g é d ia d a
ju s tiç a . S ão P au lo : R e v is ta d o s T rib u n ais. 2019.

387
MARCO DO SANEAMENTO: a nova era do
financiam ento p rivad o

R o d rig o T e rra C yrineu*


A rtu r M itsu o M iura*

1 IN T R O D U Ç Ã O

O B rasil, ap esar d e esforços em diferentes sentidos, n u n ca


co n seg u iu u n iv ersa liz ar o acesso ao saneam ento básico. A do to u -se, ao
lo n g o de g o v ern o s e décadas, diferentes estratégias, às v ez es b em -
inten cio n ad as, m as m acu lad as p o r in teresse p olíticos diversos que
in v iab ilizaram o in v estim en to m assiv o que era - e a in d a é - p reciso n o setor.
V iu -s e a p a rtir d o s an o s d e 60 d o sé c u lo p a ssa d o a a lte rn â n c ia
e n tre m o d e lo s q u e p riv ile g ia v a m a in c ia tiv a p riv a d a o u in c u m b ia m ao
E s ta d o a re s p o n sa b ilid a d e p e la im p le m e n ta ç ã o d o sa n e a m e n to b ásico .
D u ra n te o re g im e m ilia r, h o u v e a e d iç ã o d a L e i n°. 4 .3 8 0 , d e 21 d e ag o sto
d e 1964, q u e c ria v a B a n c o N a c io n a l d a H a b ita ç ã o (B N H ), te n d o sido
in a u g u ra d o , n a q u e le ano, um m o d e lo m a is c e n tra liz a d o r de
fin a n c ia m e n to 1, d e ix a n d o à in stitu iç ã o d e fo m e n to re sp o n sá v e l p o r
g e re n c ia r*12 d u ra n te q u a se 30 (trin ta ) an o s, “o d e se n v o lv im e n to d a

* Mestre em Direito Constitucional pelo IDP. Especialista em Direito Administrativo,


Constitucional e Eleitoral pela Fundação Escola Superior do Ministério Público de
Mato Grosso. Advogado em Brasília e Mato Grosso.
* Mestrando em Direito pela Universidade Católica de Brasília - UCB. Advogado no
Paraná e Mato Grosso.
1 FURLAN. Valéria. Principais aspectos do Novo Marco do Saneamento Básico: Lei
Ordinária Federal 14.026, de 16 de Julho de 2020. Revista dos Tribunais, v. 1022, p.
23-38, dez. 2020.
2 Decreto n° 82.587, de 6 de novembro de 1978. Art. 7° - Constituem atribuições do
Banco Nacional da Habitação (BNH), na condição de órgão central e normativo do
Sistema Financeiro de Saneamento (SFS): a) - propor ao Ministério do Interior, a edição
das normas a que se referem as alíneas a e d do artigo 6° deste Decreto; b) - estabelecer
normas complementares às expedidas pelo Ministro de Estado do Interior; c) - analisar

389
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

H a b ita ç ã o e d o S a n e a m e n to B á s ic o n o B ra sil, e n tã o d e fin id o c o m o A g u a


P o tá v e l e E s g o to s U r b a n o s "
N a d écad a seguinte, e co m o dito, g erid o p elo B a n c o N acio n al de
H a b itaç ão (B N H ), foi im p lan tad o o P la n o N acio n al de S aneam ento - O
P L A N A S A - D e creto n° 82.587, de 6 d e n o v em b ro de 1978. E ste plan o
tev e entre seus objetivos, am biciosos e d e lo n g o prazo, alcan çar 100 (cem )
p o r cen to d e atendim ento, isto é, p re te n d ia em ap ro x im ad am en te 3 0 (trinta)
an o s atin g ir a u n iv ersalização d o acesso à á g u a e esgoto.
S e g u n d o C a rlo s A lb e rto R o s ito 4, o P L A N A S A e ra n o rte a d o
p e lo s se g u in te s p rin c íp io s - alg u n s a in d a v á lid o s e c o rre sp o n d e n te s ao
n o v o M a rc o d o S a n e a m e n to B á sic o - : a) E fic iê n c ia e E fic á c ia n a
O p e ra ç ã o ; b ) P la n e ja m e n to ; c) E stu d o d e V ia b ilid a d e G lo b a l; d) E V G
co m 5 an o s d e h o riz o n te e re v isã o a n u a l; e) c a p a c ita ç ã o e q u a lific a ç ã o
d o s R e c u rs o s H u m a n o s, co m 117 m il o p o rtu n id a d e s d e tre in a m e n to en tre
1973 e 1986; f) R e d u ç ã o d e C u sto s, a tra v é s d e G a n h o d e E s c a la e
D e se n v o lv im e n to In stitu c io n a l; g ) S u b síd io C ru z a d o ; e - os F u n d o s d e
Á g u a e E sg o to s; h ) F A E ’s em c a d a estad o , a lim e n ta d o s co m até 5% d a
R e c e ita T rib u tá ria E sta d u a l (R T E ), e p ro je ta d o s p a ra to rn a r au to
s u fic ie n te o fin a n c ia m e n to d o se to r d e n tro d e 2 0 anos.

e aprovar os planos estaduais de saneamento básico, integrante do PLANASA; d) -


exercer a fiscalização técnica, contábil, financeira e do custo dos serviços das
companhias estaduais de saneamento básico; e) - analisar os planos, estudos e propostas
tarifárias elaborados pelas companhias estaduais de saneamento básico, com vistas às
autorizações de reajustes; f) - coordenar, orientar e fiscalizar a execução dos serviços
de saneamento básico; g) - propiciar de acordo com seu orçamento, assistência
financeira necessária à execução das programações estaduais de saneamento básico,
visando a atingir os objetivos e metas do PLANASA; h) - estabelecer normas relativas
as Sistema Financeiro de Saneamento (SFS); i) - aplicar as penalidades e sanções
estabelecidas pelo Ministro de Estado do Interior.
3 Disponível em: https://www.sgpam.com.br/artigos/do-planasa-ao-plansab-os-
ultimos-50-anos-da-agua-e-do-esgoto-no-brasil. Acesso em: 23 mar. 2021.
4 Disponível em: http://abconsindcon.com.br/wp- content/uploads/2019/04/PANORA
MA2019low.pdf. Acesso em: 18 mar. 2021.

390
E ste p lano tev e seu ocaso em 1986, encerrando o últim o m ovim ento
centralizador e estatizante antes d a redem ocratização. Já n a década de 90
iniciou-se u m n ovo ciclo de privatizações. V aléria F urlan assevera que:

Em atenção ao disposto no artigo 175 da CF/88, foi editada


a Lei 8.987/1995, que propiciou a realização de contratos
de concessão-convênio, por meio dos quais os Municípios
concediam às companhias estaduais a prestação dos
serviços públicos de saneamento. No entanto, essa
privatização não alcançou os serviços de saneamento
básico, mantidos sob o modelo de prestação estatal
anterior, considerando-se a resistência, de natureza
política, por parte de Municípios e Estados, aliados à
opinião pública da época, como também a dificuldade de
se criar um ambiente institucional às empresas privadas,
principalmente em razão da “indefinição” das
competências federativas quanto à gestão dos serviços.5

A ssim , as c o m p a n h ia s e sta d u a is, c ria d a s so b re g im e ju ríd ic o


an terio r, a ssu m e m a ta re fa de, a p a rtir d e u m a a u to ssu ste n ta ç ã o ta rifá ria ,
e p o r m e io d e fin a n c ia m e n to s d e b a n c o s e stad u a is, re g io n a is o u fe d era is,
c re d e n c ia d o s p e lo B N H , p ro m o v e r o su p o rte té c n ic o e a p ró p ria
im p la n ta ç ã o d o siste m a d e sa n e a m e n to b á s ic o .6
E m 2 0 1 3 , a p ro v a d o p e lo D e c re to n° 8 .1 4 1 /2 0 1 3 e p e la P o rta ria
In te rm in is te ria l 5 7 1 /2 0 1 3 e d e a c o rd o co m o q u e d e te rm in a v a a L ei n°
1 1 .445, d e 5 d e ja n e ir o d e 2 0 0 7 (q u e re v o g o u a L ei 6 .5 2 8 /1 9 7 8 ) se
in s titu iu a P o lític a N a c io n a l d e S a n e a m e n to B ásico .

5 FURLAN. Valéria. Principais aspectos do Novo Marco do Saneamento Básico: Lei


Ordinária Federal 14.026, de 16 de Julho de 2020. Revista dos Tribunais, v. 1022, p.
23-38, dez. 2020.
6 BERTOCCELLI. Rodrigo De Pinho. Saneamento básico: a evolução jurídica do setor.
In: DAL POZZO, Augusto Neves (coord.). O Novo Marco Regulatório do
Saneamento Básico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021. p, RB-1.2, E-book.

391
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

N ã o é e x a g e ro d iz e r q u e os su c e ssiv o s p la n o s a d o ta d o s, d e sd e a
d é c a d a d e 70 até h o je, p ra tic a m e n te n ã o g a ra n tira m n e n h u m avanço.
S e g u n d o d a d o s c o le ta d o s p e lo S N IS - S iste m a N a c io n a l d e In fo rm a ç õ e s
so b re S a n e a m e n to e as m e ta s d o P L A N S A B (P la n o N a c io n a l de
S a n e a m e n to B á sic o ), em 2 0 1 7 , d e 9,9 b ilh õ e s d e m 3, so m e n te 4 ,4 b ilh õ e s
d e m3 fo ra m tra ta d o s. U m to ta l d e 1,2 b ilh ã o d e m3 d e esg o to n ã o fo ram
tra ta d o s a n tes d e seu la n ç a m e n to nos c o rp o s h íd rico s. Isto sem
m e n c io n a r o s 4,25 b ilh õ e s d e m3 d e e sg o to q u e se q u e r fo ra m c o le ta d o s.7
A ú ltim a P e sq u isa N a cio n al de S aneam ento B ásico, sobre dados
colh id o s em 2017, m as p u b licad a em 2020, ap o n ta q u e 88 (o iten ta e oito)
m ilh õ es d e b rasileiro s seq u er têm o esg o to co letad o e se co n sid erad o as
p esso as n ão atendidas p elo trata m e n to de esgoto, esse contingente sobe p ara
112 (cento e d oze) m ilh õ e s,8 o que significa q u e em b o ra o abastecim en to de
ág u a aten d a 9 2 ,78% das resid ên cias urbanas, so m en te em 58,06% h av ia
co leta de esgoto. E ste n ú m ero ain d a é m e n o r em relação ao esgoto tratad o
se co m p arad o à ág u a consum ida, so m en te 4 6 ,2 5 % 9.
D e ste m o d o , o p re se n te e stu d o , d e n tro d o q u e lh e é p e rm itid o ,
tra ta rá d as m u d a n ç a s im p le m e n ta d a s p e lo N o v o M a rc o L e g a l do
S an ea m e n to , p rin c ip a lm e n te aq u e la s a lte ra ç õ e s q u e c u lm in a ra m n o
fa v o re c im e n to ao in v e stim e n to p riv ad o .
E s p e ra -se q u e a L e i n. 14.026, d e 15 d e ju lh o d e 2 0 2 0 te n h a
c o n s e g u id o e lim in a r g a rg a lo s e in c e n tiv a r v e rd a d e ira m e n te a ev o lu ç ã o
p a ra um s a n e a m e n to b á sic o e fic ien te, a v e sso ao d e sp e rd íc io e,
p rin c ip a lm e n te , u n iv e rsa l.

7 Disponível em: http://abconsindcon.com.br/wp- content/uploads/2019/04/PANORA


MA2019low.pdf. Acesso em: 18 mar. 2021.
8 Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca- catalogo?view=d
etalhes&id=21017340. Acesso em: 23 mar. 2021.
9 Disponível em: https://saneamentobasico.com.br/wp- content/uploads/2020/08/Pano
rama2020-baixa-FINAL.pdf. Acesso em: 23 mar. 2021.

392
2 A DESCENTRALIZAÇÃO FEDERATIVA E RESPONSABILIDA
DE PELO SERVIÇO DE SANEAMENTO BÁSICO

U m d o s m a io re s p e rc a lç o s à u n iv e rsa liz a ç ã o d o sa n e a m e n to
b á s ic o 101e, ta lv e z , até p a ra in c e n tiv o a n o v o s in v e stim e n to s te m sid o - em
e sp e cial p o r c o n ta d o e s c a lo n a m e n to fe d e ra tiv o -, a p ro fu sã o d e d ip lo m a s
le g is la tiv o s (p rin c ip a lm e n te os re g u la tó rio s) q u e tra ta m d o tem a.
P o d e m o s d izer, n a e ste ira d e T h a ís D e B e s s a G o n tijo D e
O liv e ira que quando se tra ta de sa n e a m e n to b á sic o , ex istem
c o m p e tê n c ia s le g isla tiv a s e não le g is la tiv a s .11 A ssim , quando a
C o n s titu iç ã o atrib u i à U n iã o a c o m p e tê n c ia p a ra in s titu ir d ire triz e s p a ra
o d e s e n v o lv im e n to u rb a n o , in c lu siv e sa n e a m e n to b á s ic o (art. 21, X X , d a
C F /1 9 8 8 )12, o fa z c o n fe rin d o a p re rro g a tiv a d e c ria r p ro c e d im e n to s
u n ifo rm e s p a ra d e te rm in a d o assu n to . D e ig u al m o d o , seg u e sen d o
p re rro g a tiv a d a U n iã o le g isla r so b re ág u a s (art. 22, IV , d a C F /1 9 8 8 ). A s
d u as c o m p e tê n c ia s e stã o in trin se c a m e n te lig a d a s, h a ja v is ta q u e o
sa n e a m e n to b á s ic o n ã o p o d e p re s c in d ir d e re c u rso h íd ric o s, h av e n d o ,
p o rta n to , u m c o m p a rtilh a m e n to d e in stitu to s ju ríd ic o s.
Q u a n d o tra ta m o s d e c o m p e tê n c ia s n ã o le g isla tiv a s, h a v e rá
c o n c o rrê n c ia d e re sp o n sa b ilid a d e s e n tre U n iã o , E sta d o s e M u n ic íp io s
p ara, n o s te rm o s d o a rtig o 23, IX d a C F /8 8 , p ro m o v e r m e lh o ria das
c o n d iç õ e s h a b ita c io n a is e d e sa n e a m e n to b á sic o . A p a r d isso , o a rtig o 30,

10 O artigo 2° da lei n° 11.445, de 5 de janeiro de 2007, com as alterações trazidas pela


lei n° 14.026, de 15 de julho de 2020, expandiu os serviços que hoje são considerados
insertos dentro de um programa de saneamento básico: 2°.os serviços públicos de
saneamento básico serão prestados com base nos seguintes princípios fundamentais:
(...) IV - disponibilidade, nas áreas urbanas, de serviços de drenagem e manejo das
águas pluviais, tratamento, limpeza e fiscalização preventiva das redes, adequados à
saúde pública, à proteção do meio ambiente e à segurança da vida e do patrimônio
público e privado;
11 OLIVEIRA. Thaís de Bessa Gontijo. Competências constitucionais em projetos de
saneamento básico o mito do interesse local nos votos do Supremo Tribunal Federal.
Revista de Direito Ambiental, v. 68, p. 75-99, out./dez. 2012.
12 Idem.

393
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

V d a C a rta d a R e p ú b lic a e sta b e le c e q u e c o m p e te ao s M u n ic íp io s


o rg a n iz a r e p re sta r, d ire ta m e n te o u sob re g im e d e c o n c e ssã o ou
p e rm issã o , os se rv iç o s p ú b lic o s de in te re sse lo cal, o que,
tra d ic io n a lm e n te , se ria o c a so d o sa n e a m e n to b á s ic o .
A re d a ç ã o d o a rtig o 30, V d a C F /8 8 c o n v id a a u m a p e q u e n a
in te rv e n ç ã o , o q u e n ã o é to ta lm e n te fo ra d e c o n te x to . É d e se p e n s a r que
os M u n ic íp io s, sob ju g o d a o rg a n iz a ç ã o c o n stitu c io n a l b ra sile ira ,
fo rm a lm e n te d e sc e n tra liz a d a , isto é, fe d e ra tiv a , d e tê m a titu la rid a d e dos
se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o . T o d av ia , C e lo A n tô n io B a n d e ira de
M e llo a d v e rte q u e titu la rid a d e d o s se rv iç o s e titu la rid a d e d a p re sta ç ã o do
se rv iç o n ã o se c o n fu n d e m . S e g u n d o o autor:

O fato de o Estado (...) ser titular de serviços públicos, ou


seja, de ser o sujeito que detém a ‘senhoria’ sobre eles (a
qual, de resto, é, antes de tudo, um dever em relação aos
serviços que a Constituição ou as leis puseram ou venham
a pôr a seu cargo) não significa que deva obrigatoriamente
prestá-los por si ou por criatura sua quando detenha a
titularidade exclusiva dos serviços”13

A ssim , ca b e ao s M u n ic íp io s q u a n d o p re sta re m o se rv iç o de
sa n e a m e n to “p r e s tá -lo s p o r si o u p o r c ria tu ra s u a ”14. T o d av ia , e n ã o é
ra ro q u e ac o n te ce, em E s ta d o s p o p u lo so s lei c o m p le m e n ta r p o d e in stitu ir
re g iõ e s m e tro p o lita n a s, q u a n d o e n tã o o in te re sse p a ssa se r re g io n a l,
c o n c o rre n d o , d esse m o d o , p a ra titu la rid a d e d o serv iç o , o e n te fe d e ra d o
m aio r. O S u p rem o T rib u n a l d e F e d e ra l, em a c o rd ã o e m b le m á tic o de
R e la to ria d o M in istro L u iz F u x , c o n sig n o u q u e 15:

O art. 23, IX, da Constituição Federal conferiu competência


comum à União, aos estados e aos municípios para promover

13 MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Serviços Público e Concessão de Serviço


Público. São Paulo: Editora Malheiros, 2017. p. 87.
14 Idem, p, 87.
15 STF, ADI 1.842, Pleno, rel. Min. Luiz Fux, rel. p/ acórdão, Min. Gilmar Mendes,
DJe, 16.09.2013.

394
a melhoria das condições de saneamento básico. Nada
obstante a competência municipal do poder concedente do
serviço público de saneamento básico, o alto custo e o
monopólio natural do serviço, além da existência de várias
etapas - como captação, tratamento, adução, reserva,
distribuição de água e o recolhimento, condução e disposição
final de esgoto - que comumente ultrapassam os limites
territoriais de um município, indicam a existência de interesse
comum do serviço de saneamento básico.

R o v e n a N e g re iro s, em a rtig o p u b lic a d o n a R e v is ta d o In stitu to


d e P e s q u is a E c o n ô m ic a A p lic a d a (IP E A ), elen ca, n a e ste ira d o q u e foi
a p o n tad o , o s p rin c ip a is d e sa fio s e n fre n ta d o s p a ra a m p lia ç ã o d o serv iç o
d e sa n e a m e n to b á s ic o fre n te à c o n c o rrê n c ia d e re sp o n sa b ilid a d e s
c o n stitu c io n a is, a c o n fe rir:

a) a fragmentação institucional, que gera impactos na


gestão e implementação das FPICs, em que se sobressai a
pulverização da repartição formal de atribuições entre os
entes federados e a autonomia dos governos locais na
solução de problemas de interesse comum; b) o baixo
reconhecimento do papel e do peso na dinâmica
metropolitana de um ou mais municípios (em geral o
município sede), que tende a ser desconsiderado nas
estruturas de governança metropolitana; c) a dificuldade
para implantar mecanismos e instrumentos que ampliem a
participação do setor privado no financiamento de projetos
e ações e d) as disputas político-partidárias e a falta de
identidade metropolitana.16

As d ific u ld a d e s a sse n ta d a s n u m a m u ltip lic id a d e d e en tes


fe d e ra tiv o s, a b stra ta m e n te titu la re s d o serv iço , c o n v o la ra m n u m re g im e
v irtu a lm e n te c a ó tic o e p o u c o c o n v id a tiv o ao in v e stim e n to p riv a d o . V ê -
se co m fre q u ê n c ia a c o n c o rrê n c ia d e d isc u ssõ e s so b re a p re v a lê n c ia o ra

16 NEGREIROS. Rovena. Governança interfederativa: os desafios postos para as


RMs brasileiras a partir do Estatuto da Metrópole. Disponível em: https://www.ipea.g
ov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=3264&catid=29&It
emid=3. Acesso em: 24 mar. 2021.

395
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

do in te re ss e lo cal o ra do in te re sse re g io n a l e, q u iç á n ac io n a l,
p rin c ip a lm e n te em re g iõ e s c u jo s m u n ic íp io s são c o n u rb a d o s 17.
N e sse passo, a fim de pacificar, em alg u m a m edida, as
contro v érsias sobre o te m a e, m orm ente, tra z e r u n ifo rm ização à ab u n d ân cia
legal q u e p aira v a sobre a prestação d e serviços de san eam en to básico, as
M ed id as P ro v isó rias n° 868 e 844 se p ro p u seram a atualizar o M arco L egal *V
I,

17 Ementa: CONSTITUCIONAL. FEDERALISMO E RESPEITO ÀS REGRAS DE


DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA. NORMAS DA CONSTITUIÇÃO DO
ESTADO DA BAHIA, COM REDAÇÃO DADA PELA EMENDA
CONSTITUCIONAL 7/1999. COMPETÊNCIAS RELATIVAS A SERVIÇOS
PÚBLICOS. OCORRÊNCIA DE USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIAS
MUNICIPAIS (ART. 30, I E V). PARCIAL PROCEDÊNCIA. 1. As regras de
distribuição de competências legislativas são alicerces do federalismo e consagram a
fórmula de divisão de centros de poder em um Estado de Direito. Princípio da
predominância do interesse. 2. A Constituição Federal de 1988, presumindo de forma
absoluta para algumas matérias a presença do princípio da predominância do interesse,
estabeleceu, a priori, diversas competências para cada um dos entes federativos -
União, Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios - e, a partir dessas opções,
pode ora acentuar maior centralização de poder, principalmente na própria União (CF,
art. 22), ora permitir uma maior descentralização nos Estados-Membros e nos
Municípios (CF, arts. 24 e 30, inciso I). 3. O art. 59, V, da legislação impugnada, ao
restringir o conceito de “interesse local”, interferiu na essência da autonomia dos entes
municipais, retirando-lhes a expectativa de estruturar qualquer serviço público que
tenha origem ou que seja concluído fora do limite de seu território, ou ainda que
demande a utilização de recursos naturais pertencentes a outros entes. 4. O artigo 228,
caput e § 1°, da Constituição Estadual também incorre em usurpação da competência
municipal, na medida em que desloca, para o Estado, a titularidade do poder concedente
para prestação de serviço público de saneamento básico, cujo interesse é
predominantemente local. (ADI 1.842, Rel. Min. LUIZ FUX, Rel. P/ acórdão Min.
GILMAR MENDES, DJe de 13/9/2013). 5. As normas previstas nos artigos 230 e 238,
VI, não apresentam vícios de inconstitucionalidade. A primeira apenas possibilita a
cobrança em decorrência do serviço prestado, sem macular regras constitucionais
atinentes ao regime jurídico administrativo. A segunda limita-se a impor obrigação ao
sistema Único de Saúde de participar da formulação de política e da execução das ações
de saneamento básico, o que já é previsto no art. 200, IV, da Constituição Federal. 6.
Medida Cautelar confirmada e Ação Direta julgada parcialmente procedente. (ADI
2077, Relator(a): Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgado em 30/08/2019,
PROCESSO ELETRÔNICO DJe-200 DIVULG 13-09-2019 PUBLIC 16-09-2019) No
mesmo sentido: ADI 1842, Relator(a): Luiz Fux, Relator(a) p/ Acórdão: Gilmar
Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 06/03/2013.

396
do S an eam en to atribuindo à “A g ê n c ia N a c io n a l d e A g u a s a co m p etên cia
p a r a ed ita r n o rm a s g e ra is so b re o serviço d e saneam ento, n a L e i n °
10.768/2003, p a r a a ltera r a s a trib u içõ es d o c a rg o d e E sp ec ia lista em
R e c u rso s H ídricos, e n a L e i n ° 11.445/2007, p a r a a p rim o ra r a s co n d içõ es
estru tu ra is d o sa n ea m e n to básico 18
E m razão d a p erd a de eficácia d essas duas M e d id a s P rovisórias,
ap ro v eitan d o -se do clim a político favorável, h o u v e ap rovação do P ro jeto de
L ei n° 4 .1 6 2 /2 0 19, o qual além de co n so lid ar os tex to s das M P s citadas,
traz ia o utros avanços. E ste p ro jeto R esu lto u n o N o v o M arco L egal.

3 A N O V A E R A D O IN V E S T IM E N T O P R IV A D O

3.1 A r e m o ç ã o d e B a r r e i r a s a o I n v e s tim e n to P r i v a d o : O s C o n t r a t o s
d e C o n c e s s ã o e s u a s C lá u s u la s E s s e n c ia is

O A rtig o 175 d a C o n stitu iç ã o F e d e ra l re z a q u e a p re sta ç ã o de


se rv iç o s p ú b lic o s sob re g im e d e c o n c e ssã o o u p e rm issã o fo sse p re c e d id a
d e re g u la r lic ita ç ã o .19 T o d av ia , a in d a q u e a lite ra lid a d e d a n o rm a seja
ev id en te , a in v e n tiv id a d e h e rm e n ê u tic a em terra e b ra silis20 n ã o p o d e ser
s u b e s tim a d a e, c o m o a le rta C in tia L e a l M a rin h o d e A ra ú jo e G a b riel
G o d o fre d o F iu z a d e B ra g a n ç a , e sta “b a rre ira ” “f o i h isto ric a m e n te
c o n to r n a d a p o r in te rp re ta ç õ e s d u v id o s a s d o art. 2 4 1 d a C F q u e
v ia b iliz a r a m o u so in d isc rim in a d o d e c o n tra to s d e p r o g r a m a p a r a
g a r a n tir o a r r a n jo n ã o c o m p e titiv o e x is te n te .”2118920

18 BERTOCCELLI. Rodrigo de Pinho. Saneamento básico: a evolução jurídica do


setor. In: DAL POZZO, Augusto Neves (coord.). O Novo Marco Regulatório do
Saneamento Básico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021. p, RB-1.3, E-book.
19 Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de
concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. CF/88.
20 STRECK. Lenio Luiz. Hermenêutica e ensino jurídico em terrae brasilis. Revista
da Faculdade de Direito UFPR, v. 46, 2007, p. 27-50.
21 ARAUJO. Cintia Leal Marinho de; BRAGANÇA. Gabriel Godofredo Fiuza de. A
Lei 14.026/2020 e a remoção das barreiras ao investimento privado. In: DAL POZZO,

397
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

O c o n tra to d e p ro g ra m a fo i p re v isto , em p rim e iro lu g ar, n o


a rtig o 13 d a L ei n° 11.107, d e 6 d e ab ril d e 2 0 0 5 e p e rm itia q u e u m en te
d a F e d e ra ç ã o c o n stitu ísse o b rig a ç õ e s p a ra co m o u tro e n te d a F e d e ra ç ã o
ou p a ra c o m c o n só rc io p ú b lic o n o â m b ito d e g e stã o a sso c ia d a em q u e
h a ja a p re s ta ç ã o d e se rv iç o s p ú b lico s.
O c o n tra to d e p ro g ra m a , se g u n d o M a rç a l Ju ste n F ilh o , é u m
in s tru m e n to e s p e c ífic o p a ra “ d is c ip lin a r a c o o p e ra ç ã o e n tre o s e n te s d a
fe d e r a ç ã o n o to c a n te à g e s tã o a sso c ia d a d e s e rv iç o s p ú b lic o s. E s s e é um
te m a e s p e c ia lm e n te a g r a v a d o p e lo c re sc im e n to d a s cid a d es. A q u e stã o
f o i r e fe r id a a p r o p ó s ito d o s c o n só rc io s p ú b l i c o s .”22
O s c o n to rn o s ju ríd ic o s d a d o s ao s c o n tra to s d e p ro g ra m a , cujo
id e a liz a ç ã o fo i p e n sa d a p a ra a u x ílio m ú tu o e n tre e n tes fe d e ra d o s e, p o r
isso , lo g ic a m e n te d isp e n sa ria a p ré v ia lic ita ç ã o 23, p e rm itiu que
C o m p a n h ia E s ta d u a is d e S a n e a m e n to B á s ic o d o m in a sse m o m erc ad o .
C o m o c o n se c tá rio ló g ico , esta c o n c e n tra ç ã o d o se to r im p rim iu u m
c e n á rio d e n ã o c o n c o rrê n c ia , o q u e, n ã o seria p re c iso d izer, te m re fle x o s
ó b v io s so b re a q u a lid a d e d o se rv iç o p re s ta d o .24

Augusto Neves (coord). O Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico. São


Paulo: Revista dos Tribunais, 2021. p, RB-20.3, E-book.
22 JUSTEN FILHO. Marçal. Curso de Direito Administrativo. 18. Ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais. 2018. Capítulo 9. Contrato Administrativo. 5.3. Contratos de
programa. E-book.
23 "As características do contrato de programa evidenciam a sua natureza de convênio.
Tanto bastaria para configurar um caso de inexigibilidade de licitação. No entanto e
para evitar controvérsia a Lei 11.107/2005 introduziu o inc. XXVI no art. 24 da Lei
8.666/1993, prevendo a dispensa de licitação”. As distinções entre convênio e
contratações administrativas propriamente ditas conduzem à ausência de exigência de
licitação para aqueles. Exige-se a licitação nas hipóteses em que a avença propiciar a
apropriação de recursos públicos por particulares. Nos convênios entre entidades
públicas, é evidente o descabimento da licitação. Em muitos casos, os convênios não
são excludentes de alternativas semelhantes. É possível existir convênios idênticos com
um número indeterminado de sujeitos. JUSTEN FILHO. Marçal. Curso de Direito
Administrativo. 18. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2018. Capítulo 9. Contrato
Administrativo. 5.3. Contratos de programa e 6.3. A questão da licitação. E-book.
24 Os benefícios de derrubar essa barreira artificial à participação e ao protagonismo
privado no setor são corroborados ao avaliarmos os dados do SNIS. Os dados mais

398
D a n ie la S an d o v al e Jé ssic a A c o c e lla , n e s s a lin h a, a ssin a la m , de
a c o rd o co m d a d o s le v a n ta d o s p e lo S iste m a N a c io n a l d e In fo rm a ç õ e s
so b re S a n e a m e n to (S N IS ) que:

O cenário de não concorrência para prestação dos


serviços de saneamento é apontado como uma das causas
do comprometimento da agenda de investimentos tendo
em vista a universalização. Nesse sentido, de acordo com
o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento
(SNIS), desde 2010, apesar do hiato para a
universalização dos serviços do saneamento, a média de
investimentos caiu consideravelmente, passando a R$
10,96 bilhões em 2017.25

F o i c o m o in tu ito d e a lte r a r e s s e c e n á r io p o u c o c o n v id a tiv o


a o in v e s tim e n to p r iv a d o q u e se a c re s c e u o in íc io X V ao a r tig o 2° d a
L e i n° 1 1 .4 4 5 , d e 5 d e ja n e i r o d e 2 0 0 7 , e r ig in d o a p r in c íp io

recentes do SNIS (2018) mostram que as tarifas médias de água dos prestadores
privados são, geralmente, 15% menores do que as das CESBs. Enquanto a tarifa média
de água do privado é de R$ 3,65/m3, a tarifa média de água das CESBs é de R$
4,17/m3.1. Ao confrontar essas tarifas com a estrutura de custos de operação para a
prestação do serviço de saneamento básico dos prestadores públicos e privados,
verifica-se que essas altas tarifas das CESBs decorrem provavelmente das
proporcionalmente altas despesas salariais (pessoal próprio) pagas pelos prestadores
públicos. Utilizando-se a mesma base de dados, observa-se que o prestador público
compromete 42,73% do total das despesas para a prestação do serviço de saneamento
básico (despesas de exploração) com gastos salariais. Enquanto isso, o valor dos gastos
com salários do prestador privado, proporcionalmente a essas despesas, é de apenas
24,82%. Além disso, o salário médio por empregado nas empresas privadas é quase 1/3
do salário médio por empregado em Companhias Estatais de Saneamento Básico.
ARAUJO. Cintia Leal Marinho de; BRAGANÇA. Gabriel Godofredo Fiuza de. A Lei
14.026/2020 e a remoção das barreiras ao investimento privado. In: DAL POZZO,
Augusto Neves (coord). O Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2021. p, RB-20.3, E-book.
25 SANDOVAL. Daniela; ACOCELLA. Jéssica. Os desafios do saneamento e os
incentivos para o avanço do setor. In : DAL POZZO, Augusto Neves (coord.). O Novo
Marco Regulatório do Saneamento Básico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021.
p, RB-3.4, E-book.

399
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

f u n d a m e n ta l q u e d e v e r e g e r a o s a n e a m e n to b á s ic o a s e le ç ã o
c o m p e titiv a d o p r e s ta d o r d o s s e r v iç o s .26
E s ta a lte ra ç ã o v e io se g u id a d e o u tra, o p e ra d a n o a rtig o 10, q u e
c o n so lid o u a ru p tu ra co m o re g im e an terio r. L á se lê q u e a p re sta ç ã o dos
se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b á sic o p o r e n tid a d e q u e n ã o in te g re a
a d m in is tra ç ã o do titu la r d e p e n d e da c e le b ra ç ã o de c o n tra to de
c o n c e s s ã o , m e d i a n t e p r é v ia lic ita ç ã o , n o s te r m o s d o a r t . 175 d a
C o n s titu iç ã o F e d e r a l, v e d a d a a su a d isc ip lin a m e d ia n te c o n tra to de
p ro g ra m a , c o n v ê n io , te rm o d e p a rc e ria o u o u tro s in stru m e n to s de
n a tu re z a p re c á ria .27
D e sp o n ta m a n ife sta a p re te n sã o d e se p riv ile g ia r o re g im e
c o n c o rre n c ia l, n a m e d id a que, p a ra o in te re sse p ú b lico , a c o m p e tiç ã o
p e la o p o rtu n id a d e d e se firm a r c o n tra to s co m o P o d e r P ú b lic o se m p re foi
in c o m p a tív e l co m os su b je tiv ism o s q u e p a ira v a m so b re os c o n tra to s de
p ro g ra m a , d isp e n sa d o s, p o r su a n atu re za, d a licita ção .
M a rç a l J u ste n F ilh o é p re c iso n a e sc o lh a d as p a la v ra s:

A natureza da função pública é incompatível, como regra,


com o subjetivismo admitido no direito privado. No direito
administrativo, não é admissível escolha irracional e
eivada de subjetivismo. Não são válidos processos
psicológicos arbitrários no desenvolvimento de função
pública. Como regra, a identidade do particular contratado
pela Administração Pública é irrelevante. O que se exige é
o preenchimento de requisitos subjetivos, os quais devem
ser objetivamente definidos. A destinação da licitação é
precisamente esta: selecionar um particular para ser

26 Art. 2°. Os serviços públicos de saneamento básico serão prestados com base nos seguintes
princípios fundamentais: (...) XV - seleção competitiva do prestador dos serviços;
27 Art. 10. A prestação dos serviços públicos de saneamento básico por entidade que
não integre a administração do titular depende da celebração de contrato de concessão,
mediante prévia licitação, nos termos do art. 175 da Constituição Federal, vedada a sua
disciplina mediante contrato de programa, convênio, termo de parceria ou outros
instrumentos de natureza precária.

400
contratado, independentemente de uma preferência
subjetiva dos agentes públicos.28

A in te n ç ã o fic a m a is e v id e n te q u a n d o se v e rific a q u e os
p a rá g ra fo s que p re v ia m ex c e ç õ e s ao caput do a rtig o 10 fo ram
in te ira m e n te re v o g a d o s. A lei n° 14.026, d e 15 d e ju lh o d e 2 0 2 0 , ain d a
in c lu iu o u tro s 4 d isp o sitiv o s q u e p e la im p o rtâ n c ia m e re c e m m e n ç ã o e
e stu d o , a sab er, os a rtig o s 10-A , 10-B , 1 1-A e 11-B .
O a r ti g o 1 0 -A p a sso u a d isc ip lin a r o c o n te ú d o e sse n cial dos
co n tra to s re la tiv o s à p re sta ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to
b á sic o , d e ta lh a n d o d e fo rm a m in u c io s a as c lá u su la s q u e d e v e rã o e star
e x p re s s a m e n te p re v ista s, sob p e n a d e su a n u lid a d e .
A ssim , o p a c to d e v e rá c o n te r d isp o siç ão sobre: a) - m etas de
e x p a n sã o do s serviços, d e re d u ç ã o d e p erd as n a d istrib u iç ã o de á g u a
tratad a, d e q u alid ad e n a p re sta ç ã o dos serviços, d e e fic iê n c ia e de u so
ra cio n al d a água, d a e n e rg ia e de o u tro s re cu rso s n atu rais, d o re ú so de
eflu en tes san itário s e do a p ro v eitam en to d e ág u as d e chuva; b ) p o ssív eis
fo n tes d e re ceitas altern ativ as, c o m p lem en tares o u acessó rias, b e m com o
as p ro v e n ie n tes d e p ro jeto s asso ciad o s, in clu in d o , en tre outras, a alien a ção
e o u so de eflu en tes san itário s p a ra a p ro d u ç ã o d e á g u a d e reúso, com
p o ssib ilid a d e d e as re ceitas serem co m p artilh ad a s en tre o c o n tra tan te e o
co n tratad o ; c) m e to d o lo g ia de cá lc u lo d e ev en tu al in d e n iz a ç ã o re la tiv a aos
b e n s re v ersív eis n ão am o rtiza d o s p o r o ca siã o d a ex tin çã o d o contrato; d)
re p a rtiç ã o d e risco s en tre as p artes, in c lu in d o os re fere n tes a ca so fortuito,
fo rç a m aio r, fa to d o p rín c ip e e á lea ec o n ô m ic a ex tra o rd in á ria .29

28 JUSTEN FILHO. Marçal. Curso de Direito Administrativo. 18. Ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais. 2018. Capítulo 9. Contrato Administrativo. 7.6.5. Classificação
quanto à relevância da identidade do particular. E-book
29 Art. 10-A. Os contratos relativos à prestação dos serviços públicos de saneamento
básico deverão conter, expressamente, sob pena de nulidade, as cláusulas essenciais
previstas no art. 23 da Lei n° 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, além das seguintes
disposições I - metas de expansão dos serviços, de redução de perdas na distribuição de
água tratada, de qualidade na prestação dos serviços, de eficiência e de uso racional da
água, da energia e de outros recursos naturais, do reúso de efluentes sanitários e do

401
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

O p a r á g r a f o 1° d o a r ti g o 1 0 -A a in d a p re v ê q u e os c o n tra to s
q u e e n v o lv e m a p re s ta ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b á sic o
p o d e rã o p re v e r m e c a n ism o s p riv a d o s p a ra re so lu ç ã o d e d isp u tas,
in c lu s iv e a a rb itra g e m . E ste d isp o sitiv o , lid o em c o n ju n to co m o §5° do
a rtig o 4 -A , d a L ei n. 9 .9 8 4 , d e 17 d e ju lh o d e 2 0 0 0 q u e d isp õ e so b re a
A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e S a n e a m e n to B á sic o (A N A ), tra z p ro p o sta
in o v a d o ra p a ra d im in u iç ã o d o s c u sto s d e tra n s a ç ã o p a ra o setor.
O citado §5° do art. 4 -A d a L ei n .9.984/00 p erm ite à A N A atuar
co m o m ed iad o ra ou árbitra nos conflitos q u e en volvam titulares, agências
reg u lad o ras ou p restad o res de serviços p ú b lico s d e san eam en to básico.
P re v is ã o ig u a lm e n te d ig n a d e n o ta, e q u e p o d e rá se rv ir p a ra
tra z e r s e g u ra n ç a ju ríd ic a e n a m e sm a m e d id a se rv ir d e in c e n tiv o à
in ic ia tiv a p riv a d a , c o n sta d o s in c iso s I I e I I I d o a r ti g o 10-A . O s
co n tra to s, a p a rtir d a in c lu sã o d e sta s n o rm a s, d e v e rã o c o n te r m e to d o lo g ia
d e c á lc u lo d e ev e n tu a l in d e n iz a ç ã o re la tiv a ao s b e n s re v e rsív e is n ão
a m o rtiz a d o s p o r o c a siã o d e su a e x tin ç ã o e re p a rtiç ã o d e risc o s e n tre as
p arte s, in c lu in d o os re fe re n te s a c a so fo rtu ito , fo rç a m a io r, fa to do
p rín c ip e e á le a e c o n ô m ic a ex tra o rd in á ria .
E m re la ç ã o ao in c iso II, M a u ríc io Z o c k u n d e sta c a :30

A indenização por investimentos não amortizados é um


tema desafiador, especialmente em vista da longa duração

aproveitamento de águas de chuva, em conformidade com os serviços a serem prestados;


II - possíveis fontes de receitas alternativas, complementares ou acessórias, bem como as
provenientes de projetos associados, incluindo, entre outras, a alienação e o uso de
efluentes sanitários para a produção de água de reúso, com possibilidade de as receitas
serem compartilhadas entre o contratante e o contratado, caso aplicável; III - metodologia
de cálculo de eventual indenização relativa aos bens reversíveis não amortizados por
ocasião da extinção do contrato; e IV - repartição de riscos entre as partes, incluindo os
referentes a caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária.
30 ZOCKUN. Maurício. As competências normativas da Agência Nacional das Águas
e Saneamento Básico (ANA) em razão do advento da Lei Federal 14.026, de 2020,
modificativa do “marco legal” do saneamento. In: DAL POZZO, Augusto Neves
(coord.). O Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2021. p, RB-17-6, E-book.

402
dos contratos de concessão e a inexistência de critério legal
a ser utilizado para esse propósito. Daí porque a fórmula
para o cálculo da indenização por investimento não
amortizado ou depreciado é rotineiramente prevista no
bojo do contrato de concessão, não raramente tão lacônica
como a própria Lei. Essa vicissitude enferma largamente
as relações jurídicas entabuladas entre o poder público e as
pessoas prestadoras do serviço de saneamento: seja como
contrato de programa, seja como concessão.

Já o in c iso III tra z v is ã o m a is re cen te, te n ta n d o im p rim ir alg o


d e e c o n o m ic id a d e ao s a ju ste s firm a d o s co m o P o d e r P ú b lic o , a lg o j á
a d o ta d o p e la L e i n° 11.079, d e 30 d e d e z e m b ro d e 2 0 0 4 , q u e in stitu iu as
p a rc e ria s p ú b lic o -p riv a d a s n o â m b ito d a a d m in istra ç ã o p ú b lica.
A ssim , p a ra além da “d iv isã o d o u tr in á ria e n tre á le a s
o r d in á r ia s e e x tra o rd in á ria s - a q u e la s de re sp o n sa b ilid a d e do
p a r tic u la r e e sta s do E s ta d o e ss a s le is m a is r e c e n te s têm
e x p r e s s a m e n te tra n sfe rid o a o c o n tra to a d iv is ã o d o s ris c o s e n v o lv id o s
n o e x e rc íc io d a a t i v i d a d e ”3
O a r tig o 11, q u e tra z as c o n d iç õ e s d e v a lid a d e d o s co n tra to s
q u e te n h a m p o r o b je to a p re sta ç ã o d e se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to
b á sic o , ta m b é m so fre u p ro fu n d a s a lteraçõ e s. O in c is o I I d e s te a r tig o
a g o ra p re v ê q u e d ev e h a v e r e stu d o q u e c o m p ro v e a v ia b ilid a d e té c n ic a e
e c o n ô m ic o -fin a n c e ira da p re sta ç ã o dos serv iç o s, nos te rm o s
e sta b e le c id o s n o re sp e c tiv o p la n o d e sa n e a m e n to b ásico .
T a m b é m é d estaq u e , n ã o sem a lg u m a crítica , a re g ra c o n tid a n o
§ 5° d o a r ti g o 11 q u e p re v ê a p ro ib iç ã o d e d istrib u iç ã o d e lu c ro s e
d iv id e n d o s, d o c o n tra to em e x e c u ç ã o , p e lo p re s ta d o r d e se rv iç o s q u e
e stiv e r d e s c u m p rin d o as m e ta s e c ro n o g ra m a s e sta b e le c id o s n o c o n tra to
e sp e cífico . O s o b je tiv o s d e estu d o n ã o p e rm ite m o a p ro fu n d a m e n to

31 ARAGÃO. Alexandre Santos de. OLIVEIRA. Rafael Daudt D. Considerações


iniciais sobre a Lei n° 14.026/2020: Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico.
In: DAL POZZO, Augusto Neves (coord.). O Novo Marco Regulatório do
Saneamento Básico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021. p, RB-2-5, E-book.

403
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

d e ssa q u estão , m a s a d ian ta -se: é q u e stio n á v e l a c o n s titu c io n a lid a d e d a


v e d a ç ã o n e sse sentido.
O u tro p o n to q u e m e re c e se r m e n c io n a d o é a p o ssib ilid a d e ,
a g o ra e x p ressa, d e s u b d e le g a ç ã o o u su b c o n c e ssã o , p re v isto n o a r ti g o 11-
A . É v e rd a d e q u e e ra im a g in á v e l, a in d a sob a é g id e d o re g im e d o m a rc o
an terio r, q u e o s c o n tra to s d e p re sta ç ã o d e s a n e a m e n to b á sic o p u d e sse m
se r su b d e le g a d o s, isto p o rq u e e x iste p re v isã o e x p re ssa n o a rtig o 2 6 d a
L e i n. 8 .9 8 7 , d e 13 d e fe v e re iro d e 1995, a L e i d as C o n c e ssõ e s.32 D e to d o
m o d o , o n o v o M a rc o d o S a n e a m e n to re so lv e u re fo rç a r a p o ssib ilid a d e ,
m a s sob a lg u m a s p e c u lia rid a d e s.
A su b d e le g a ç ã o p re v ista n o a rtig o 11-A é lim ita d a a 2 5 % (v in te
e cin c o p o r c e n to ) d o to ta l d o co n trato . E s ta é, n ã o fo sse os v e to s § 5° do
novo a rtig o 11-A , a ú n ic a d ife re n ç a e n tre a su b c o n c e ssã o e
s u b d e le g a ç ã o .33
O p re sta d o r d e serv iço s, p a ra se v a le r d a su b d e le g a ç ã o , d e v e rá
fa z e r c o m p ro v a ç ã o té c n ic a d o b e n e fíc io em te rm o s d e e fic iê n c ia e
q u a lid a d e d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b á s ic o e se m p re d e v e rá
se r p re c e d id a d e licita ção . A lé m d isso , fic a m v e d a d a s su b c o n c e ssõ e s ou
s u b d e le g a ç õ e s q u e im p liq u e m so b re p o siç ã o d e c u sto s a d m in istra tiv o s ou
g e re n c ia is a serem p a g o s p e lo u su á rio final.

32 Art. 26. É admitida a subconcessão, nos termos previstos no contrato de concessão,


desde que expressamente autorizada pelo poder concedente.
33 “Ou seja, se o texto proposto para a norma do § 5° houvesse ingressado no
ordenamento, haveria uma diferença bastante nítida entre subdelegação e
subconcessão. A primeira seria um instrumento claro de fomento à aceleração do
cumprimento da meta de universalização, em especial, em contratos com capacidade
de gerar receita suficiente para, inclusive, sustentar o pagamento de outorga. A segunda
permaneceria intacta como a técnica para transferir parcelas do serviço que, embora
comercialmente viáveis, não comportassem monetização por meio de pagamento de
outorga.” DAL POZZO. Augusto Neves; FACCHINATTO. Renan Marcondes. O
Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico e os modelos de emparceiramento com
a iniciativa privada: a concessão e a parceria público-privada. In: DAL POZZO,
Augusto Neves (coord). O Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2021. p, RB-22-4, E-book.

404
P o r fim , o artigo 11-B d eterm in a que os contratos de p restação
dos serviços p ú b lico s d e san eam en to b ásico d ev erão defin ir m etas de
u n iv ersalização q u e garantam o aten d im en to de 9 9 % (n o v en ta e n o v e p o r
cento) d a p o p u lação com ág u a potável e de 9 0 % (n o v en ta p o r cento) d a
p o p u lação com co leta e tratam en to d e esgotos até 31 de d ezem b ro de 2033,
assim co m o m etas quantitativas de n ão in term itên cia do abastecim ento, de
red u ção de p erd as e d e m elh o ria dos p ro cesso s d e tratam ento.
E sta m e ta am b icio sa d ep e n d erá d a eficiên cia p ela qual o n o v o
reg ram en to d ad o ao S aneam ento B ásico co n sig a atrair n o v o s investim entos.
É sab id o q u e o crescim en to das cidades em cotejo com a n ecessária
ev o lu ção d a in fraestru tu ra d em an d a recu rso s substanciais, o que, ao lo n g o
do tem p o , fico u d em o n strad o q u e n em m esm o as E statais ou tam p o u co o
P o d e r P ú b lic o dispõe.

3.2 Prestação Regionalizada dos Serviços Públicos de Saneamento Básico

C a b e trata r, d e m a n e ira a p a rtad a, a re g io n a liz a ç ã o d a p re sta ç ã o


d e se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , te m a q u e tra z c o n sig o im p o rta n te
p a s s o em d ire ç ã o à u n iv e rsa liz a ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b ásico .
O artig o 49, in c iso X IV d a L e i n° 11.445, d e 5 d e ja n e ir o de
2 0 0 7 ap o n to u e n tre os o b je tiv o s d a P o lític a F e d e ra l d e S a n e a m e n to
B á s ic o a p ro m o ç ã o d a re g io n a liz a ç ã o d o s serv iç o s, co m v ista s à g e ra ç ã o
d e g a n h o s d e esc ala, p o r m e io d o ap o io à fo rm a ç ã o d o s b lo c o s de
re fe rê n c ia e à o b te n ç ã o d a su ste n ta b ilid a d e e c o n ô m ic a fin a n c e ira do
b lo co . E n tã o , está é tô n ic a d a n o v a p o lític a d e san e am en to .
A fim d e a tin g ir este o b jetiv o , e m b o ra p e rm a n e ç a m d ú v id a s de
o rd e m p rá tic a e te ó ric a q u a n to à titu la rid a d e d o s s e rv iç o s34, o a rtig o 8,

34 “O Novo Marco limitou-se a remeter essa pergunta ao Estatuto da Metrópole, o qual,


entretanto, nunca pretendeu respondê-la, sobretudo, como se disse, na específica matéria
dos serviços públicos de interesse comum, entre todas as demais funções públicas de
interesse comum. O Estatuto da Metrópole sequer conhece a expressão serviço público.
Nada obstante, a pergunta remanesce: quem é o Poder Concedente na região legal?

405
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

in c is o II d a L e i n° 1 1 .4 4 5 /0 7 d e te rm in a q u e h a v e n d o c o m p a rtilh a m e n to
d e in s ta la ç õ e s o p e ra c io n a is e n tre M u n ic íp io s in te g ra n te s d e re g iõ e s
m e tro p o lita n a s, a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e m ic ro rre g iõ e s, in stitu íd a s p o r
lei c o m p le m e n ta r e sta d u a l, n o c a so d e in te re sse c o m u m , e x e rc e rã o
c o n c o rre n te m e n te a titu la rid a d e d o s se rv iç o s o E sta d o e os m u n ic íp io s
d a re fe rid a reg ião .
E s ta v ira d a c o p e rn ic a n a e n tre o m o d e lo a n te rio r e o atu al se
ju s tific a p o r fu n d a m e n to s e c o n ô m ic o s e ju ríd ic o s e, n a s p a la v ra s d e
R a fa e l D o m in g o s F a ia rd o V a n z e lla e Jé ssic a S u ru ag y A m aral B o rg e s 35:

A urbanização e a conurbação geram, por isso, uma


interdependência entre os municípios em matéria de
saneamento básico. Aqueles mais adensados geram mais
resultados financeiros (a operação tende a ser mais
econômica) e aqueles menos adensados e circunvizinhos
acabam recebendo, ao menos em parte, as infraestruturas
para atender toda a região. Os municípios mais adensados
perdem sua autonomia operacional, na medida em que a

Seriam as instâncias da estrutura de governança interfederativa? Tais instâncias têm


personalidade jurídica? Ou caberia a tais instâncias criar uma pessoa jurídica, de direito
público ou de direito privado, para o exercício da titularidade comum ou conjunta? A
região legal dispensa ou depende de uma combinação com algum instrumento de gestão
associada, como um consórcio público ou um convênio de cooperação? (...) Há,
adicionalmente, uma segunda lacuna, talvez mais grave e difícil de superar. Identificado
o representante legal da comunhão de entes federativos participantes da região legal,
questiona-se como se dá o processo de formação da sua vontade. Cada município
participante tem um voto válido igual aos demais? Quanto vale o voto do estado, que
compartilha a titularidade dos serviços de saneamento nas regiões legais? Como
solucionar os impasses oriundos das deliberações em que não houver unanimidade ou
consenso? O conteúdo da governança interfederativa está vazio, e o seu desenho não é
simples de ser preenchido. O Novo Marco não ofereceu qualquer diretriz a esse respeito.”.
VANZELLA. Rafael Domingos Faiardo; BORGES. Jéssica Suruagy Amaral. Notas
sobre a prestação regionalizada dos serviços públicos de saneamento básico. In: DAL
POZZO, Augusto Neves (coord.). O Novo Marco Regulatório do Saneamento
Básico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021. p, RB-13-2, E-book.
35 VANZELLA. Rafael Domingos Faiardo; BORGES. Jéssica Suruagy Amaral. Notas
sobre a prestação regionalizada dos serviços públicos de saneamento básico. In: DAL
POZZO, Augusto Neves (coord.). O Novo Marco Regulatório do Saneamento
Básico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021. p, RB-13-3, E-book.

406
paisagem urbana deles faz os reservatórios, as adutoras, as
estações de tratamento, os sistemas de distribuição de
superfície, entre outras infraestruturas, cederem lugar para
empreendimentos imobiliários e equipamentos urbanos.
Nada obstante, ganham escalas financeiras que podem e
devem ser compartilhadas com outros municípios, na
medida em que esses outros suportam um sistema
integrado de prestação de serviços públicos, e é razoável
que aufiram parte das vantagens operacionais de seus
vizinhos mais adensados, já que cederam território para
instalações que atendem também a esses últimos.

O s m e sm o s a u to re s d iv id e m as m o d a lid a d e s d e re g io n a liza ç ã o
em trê s esp e ciais. S ão elas: a) co m p u lsó ria , b ) v o lu n tá ria e c) h íb rid as.
A m o d a lid a d e c o m p u ls ó r ia re su lta d a in stitu iç ã o , p o r lei
c o m p le m e n ta r e stad u a l, n o s te rm o s d o a rtig o 25, §3° d a C R F B /8 8 , de
re g iõ e s m e tro p o lita n a s, a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e m ic ro rre g iõ e s,
c o n s titu íd a s p o r a g ru p a m e n to s d e m u n ic íp io s lim ítro fe s, p a ra in te g ra r a
o rg a n iz a ç ã o , o p la n e ja m e n to e a e x e c u ç ã o d e fu n ç õ e s p ú b lic a s de
in te re ss e c o m u m .36
A m o d a lid a d e v o lu n tá r ia , p o r su a vez, é co n stitu íd a p elo s
co n só rcio s p ú b lic o s e co n v ê n io s d e coo p eração . A s re g ras p ro c ed im en tais
d essa m o d a lid a d e co n stam d a L ei n° 11.107, de 6 d e abril d e 2005 e seu
p o ste rio r reg u la m en to , D e c re to 6 .0 1 7 /2 0 0 7 .37 R afa el D o m in g o s F a ia rd o
V a n z e lla e Jé ssic a S uru ag y A m aral B o rg e s a in d a e x p lica m q u e a tô n ic a de
am b o s os in stitu to s está n a v o lu n taried a d e, ao asse v erarem q u e “ ta n to o
c o n só rc io p ú b lic o q u a n to o co n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o sã o n eg ó c io s
ju r íd ic o s d e d ire ito p ú b lic o que, c o m o tais, a sse n ta m -se n o a c o rd o de
vo n ta d e s en tre a s en tid a d e s fe d e r a tiv a s d e le s p a r tic ip a n te s ” .383678

36 VANZELLA. Rafael Domingos Faiardo; BORGES. Jéssica Suruagy Amaral. Notas


sobre a prestação regionalizada dos serviços públicos de saneamento básico. In: DAL
POZZO, Augusto Neves (coord.). O Novo Marco Regulatório do Saneamento
Básico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021. p, RB-13-7, E-book.
37 Idem, p. RB-13-8. E-book.
38 Idem. p, RB-13-8, E-book

407
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

O artigo 8, §1°, I d a L ei n° 11.445, de 5 de ja n e iro d e 2 007 perm itiu


que fo ssem fo rm alizad o s “ co n só rcio s in term u n icip a is d e sa n ea m en to
básico, exclu siva m en te co m p o sto d e M u n icíp io s, que p o d e r ã o p r e s ta r o
serviço a o s se u s co n so rc ia d o s diretam ente, p e la instituição d e a u ta rq u ia
interm unicipal. ” O inciso II, p o r sua vez, d eterm in a q u e estes C o n só rcio s
terão c o m o o b jetivo o fin an c iam en to d as in iciativ as de im p lan tação de
m ed id as estruturais d e saneam ento básico, v e d a d a a fo rm a liz açã o de
co n trato de p ro g ram a com sociedade d e eco n o m ia m ista ou em p resa
pública, ou a sub d eleg ação do serviço p restad o p ela autarquia
in term u n icip al sem p rév io p ro ced im en to licitatório.
A d errad eira m o d a lid a d e , ain d a segundo R afael D o m in g o s
F aiard o V a n zella e Jéssica S uruagy A m aral B o rg es é aq u ela fo rm a d a entre
as reg iõ es leg ais e os in stru m en to s d e g estão associada, ch am ad a h íb r id a ,
co m p o stas p ela “ un id a d e reg io n a l d e sa n ea m e n to bá sico ” e o “ b loco de
referên cia ” 3 E stes dois m o d elo s estão previstos nas alíneas “b ” e “ c” do
in ciso V I do artigo 3° d a L ei n° 11.445, de 5 de ja n e iro de 2007.
A u n id a d e re g io n a l d e sa n e a m e n to b á s ic o e o b lo c o de
re fe rê n c ia , a in d a q u e n ã o se a sse n te m n a o b rig a to rie d a d e d e ad e são , n ã o
p e rm ite m ac e sso a re c u rso s p ú b lic o s d a U n iã o se n ã o h o u v e r, seg u n d o o
a rtig o 50, V III e IX , “a d e sã o p e lo s titu la re s d o s s e rv iç o s p ú b lic o s d e
s a n e a m e n to b á sic o à e stru tu ra d e g o v e r n a n ç a c o rre sp o n d e n te em a té
1 8 0 (c en to e o ite n ta ) d ia s c o n ta d o s d e s u a in stitu içã o , n o s c a so s d e
u n id a d e r e g io n a l d e s a n e a m e n to básico, b lo c o s d e r e fe r ê n c ia e g e s tã o
a s s o c ia d a ” e a c o n stitu iç ã o d a e n tid a d e d e g o v e rn a n ç a fe d e ra tiv a
ta m b é m n o p ra z o d e 180 (c e n to e o ite n ta ) dias. 39

39 VANZELLA. Rafael Domingos Faiardo; BORGES. Jéssica Suruagy Amaral. Notas


sobre a prestação regionalizada dos serviços públicos de saneamento básico. In: DAL
POZZO, Augusto Neves (coord.). O Novo Marco Regulatório do Saneamento
Básico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021. p, RB-13-9, E-book.

408
3 .3 C o n c lu s ã o P a r c ia l

A a tu a liz a ç ã o d o M a rc o d o S a n e a m e n to B á sic o , em b o a hora,


c o rrig iu fa lh a s na re g u la ç ã o do “ m e rc a d o ” que re su lta v a m em
c o n c o rrê n c ia im p e rfe ita , m o n o p o liz a ç ã o d o se to r n a s m ã o s d e e m p re sa s
e sta ta is e b a ix o s in v e stim e n to s em in fra e stru tu ra , fru to d a c o n sta ta d a
in e fic iê n c ia d e g e s tã o d e re c u rso s.
É p o ssív e l d iz e r q u e os c o n tra to s d e c o n c e ssã o g a n h a ra m u m a
n o v a ro u p a g e m , a d e q u a n d o -se à s altas e x ig ê n c ia s d o se to r p riv a d o , a
g a ra n tir, ao s d e stin a tá rio s do se rv iç o (c id a d ã o s), um a le g ítim a
e x p e c ta tiv a d e c o n sta n te ev o lu çã o , e s p e c ia lm e n te n o d e lic a d o te m a do
tra ta m e n to d a á g u a e d a im p le m e n ta ç ã o u n iv e rsa l d a re d e d e e sg o to .
A re g io n a liz a ç ã o d a p re sta ç ã o d e se rv iç o s d e sa n e a m e n to
b á sic o , co m a a g lu tin a ç ã o d e d o is o u m a is m u n ic íp io s, a g o ra re g u la d a de
fo rm a m in u d e n te , ta m b é m é fa to r d e a tra ç ã o d e in v e stid o re s, d a d a a
seg u ran ça , ta m b é m sob o asp e c to fin a n c e iro , d e ssa s m ic ro rre g iõ e s.
D o p o n to d e v is ta d a re so lu ç ã o d e c o n flito s, re ssa i a arb itra g em ,
in c lu s iv e co m a p o ssib ilid a d e de ser im p le m e n ta d a p e la p ró p ria
a u ta rq u ia , c o m o in c e n tiv o p a ra g ra n d e s in v e stid o re s q u e tê m p a v o r de
d e m a n d a s ju d ic ia is a p re c ia d a s p o r ju lg a d o re s q u e d etém raso , p a ra n ão
d iz e r n e n h u m , c o n h e c im e n to so b re o d e lic a d o te m a d o D ire ito do
S a n e a m e n to e to d a s as su as n u a n c e s e p e c u lia rid a d e s.
D e se ver, p o rtan to , q u e a leg islaçã o , ao la d o d a A g ê n c ia
N a cio n al d e Á g u a s e S an ea m e n to B á sic o (a qual será tra ta d a n o tó p ic o a
seguir), ao g aran tirem u m m in im u m m in im o ru m d e se g u ra n ç a ju ríd ic a , são
in stru m en to s p ro p icia d o res d e u m a n o v a era d o san e am en to n o B rasil,
co m a e n tra d a alv issa re ira d o seto r p riv a d o n a e x e cu çã o d esses serv iço s.

409
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

4 O P A P E L C E N T R A L IZ A D O R N O R M A T IV O D A A G Ê N C IA
N A C I O N A L D E Á G U A S E S A N E A M E N T O B Á S IC O (A N A )

A p a rtir d a e d iç ã o d a L e i n° 9 .4 3 3 , d e 8 d e ja n e ir o d e 1997, q u e
in s titu iu a P o lític a N a c io n a l d e R e c u rso s H íd ric o s, foi p e rm itid o aos
e n tes fe d e ra tiv o s, n o b o jo d e suas p ró p ria s a trib u iç õ e s co n stitu c io n a is,
c ria r “ A g ê n c ia s de Á g u a s” , c u ja s c o m p e tê n c ia s n o rm a tiv a s são
a m p lís s im a s e d e lin e a d a s n o a rtig o 4 4 d a s u p ra c ita d a lei. C o m o se disse,
o sa n e a m e n to b á sic o n ã o se fa z sem re c u rso s h íd ric o s e, b e m p o r isso,
alg u n s in s titu to s ju ríd ic o s são c o m p a rtilh a d o s.
E ste c e n ário , c u m u la d o co m titu la rid a d e irra d ia d a d o s serv iç o s
d e sa n e a m e n to b á sic o , às v e z e s d e fo rm a c o n c o rre n te a d ife re n te s en tes
fe d e ra tiv o s, d eu az o a u m a o d io sa p ro fu sã o d e n o rm a s re g u la tó ria s, sem
q ue, so b re o tem a, h o u v e sse p a d ro n iz a ç ã o , se q u e r so b re ín d ic e s de
q u a lid a d e o u tarifa ção .
C o m ad v e n to d o N o v o M a rc o d o S a n e a m e n to B á sic o , a m p lio u -
se a c o m p e tê n c ia n o rm a tiv a d a A N A , h o je c h a m a d a A g ê n c ia N a c io n a l
de Á g u a s e S a n e a m e n to B á sic o p ara, se g u n d o o a rtig o 4 -A d a L e i n.
9 .9 8 4 , d e 17 d e ju lh o d e 2 0 0 0 , in s titu ir n o rm a s d e re fe rê n c ia so b re os
se rv iç o s p ú b lic o s de sa n e a m e n to b á s ic o p o r seus titu la re s e suas
e n tid a d e s re g u la d o ra s e fisc a liz a d o ra s.
As a g ê n c ia s re g u la tó ria s su rg ira m num c o n te x to de
in te rv e n ç ã o in d ire ta d o P o d e r P ú b lic o so b re a e c o n o m ia . F e rn a n d o
Q u a d ro s d a S ilv a e x p lic a q u e :

“(...) a intervenção direta na economia deixou de ser a


opção preferencial dos governos, passando a fazer parte do
senso comum que a liberalização econômica, reservando-
se ao Estado apenas uma função regulatória, seria a melhor
maneira de aliar eficiência e qualidade na produção de
bens e prestação de serviços. A soberania estatal também
passou por um processo de redefinição que evidenciou a

410
necessidade do Estado buscar novas formas de influenciar
a atividade econômica.”40

A s alte ra ç õ e s n a L ei n. 9 .9 8 4 , d e 17 d e ju lh o d e 2 0 0 0 , tiv e ra m
p o r e sc o p o in tro d u z ir a lg u m a u n ifo rm id a d e so b re as n o rm a s q u e
re g u la m e n ta m o se to r e, a p a rtir d e u m ó rg ã o c e n tra liz a d o , p o r
co n se q u ê n c ia , in te rv ir in d ire ta m e n te so b re c o n c e ssã o d o s se rv iç o s d e
sa n e a m e n to b á sic o , to rn a n d o -o m a is a tra tiv o ao in v e stim e n to p riv ad o .
À A N A cab erá, p o r e x e m p lo , e sta b e le c e r c rité rio s té c n ic o s d e
re g u la ç ã o ta rifá ria d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e sa n e a m e n to b á sic o , com
v is ta s a p ro m o v e r a p re sta ç ã o a d e q u a d a , o u s o ra cio n al d e re c u rso s
n a tu ra is, o eq u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro e a u n iv e rsa liz a ç ã o d o ac esso
ao sa n e a m e n to b á sic o . (art. 4°-A , § 1°, II, d a L ei 9 .9 8 4 /2 0 0 0 ).
T a m b é m c a b e rá à A N A p a d ro n iz a r “ o s in stru m e n to s n e g o c ia is
d e p r e s ta ç ã o d e s e r v iç o s p ú b lic o s d e s a n e a m e n to b á sic o fir m a d o s en tre
o titu la r d o s e r v iç o p ú b lic o e o d eleg a tá rio , o s q u a is c o n te m p la rã o m e ta s
d e q u a lid a d e, e fic iê n c ia e a m p lia ç ã o d a c o b e r tu r a d o s serviço s, b em
com o e sp e c ific a ç ã o da m a tr iz de ris c o s e dos m e c a n ism o s de
m a n u te n ç ã o d o e q u ilíb rio e c o n ô m ic o -fin a n c e iro d a s a tiv id a d e s ”. (art.
4°-A , § 1°, III, d a L ei 9 .9 8 4 /2 0 0 0 ). É n ítid a a in te n ç ã o d e a te n u a r cu sto s
d e tra n s a ç ã o d a s o p e ra ç õ e s, além d e p re c a v e r q u a n to a e v e n tu a is
d isc u ssõ e s, m u ita s v e z e s lo n g a s e cu sto sas, p e ra n te o ju d ic iá rio .
O u tra a lte ra ç ã o im p o rta n te é a q u e la c o n tid a n o art. 4°-A , § 1°,
V II, d a L e i 9 .9 8 4 /2 0 0 0 . O d isp o sitiv o d e te rm in a q u e a A g ê n c ia , n o seio
d e su a c o m p e tê n c ia re g u la m e n ta r, in d ic a rá m e to d o lo g ia s d e cá lc u lo p a ra
in d e n iz a ç õ e s d e v id a s em ra z ã o d o s in v e stim e n to s re a liz a d o s e a in d a n ão
a m o rtiz a d o s o u d e p reciad o s.
P o r fim , te m a j á tratado, m as q u e n ão custa repisar, é a
p o ssib ilid ad e d e a A N A , em ca ráter v o lu n tário e com sujeição à

40 SILVA. Fernando Quadros da. Agências reguladoras: um modelo em constante


aperfeiçoamento. In: SILVA, Fernando Quadros da e t al. Agências Reguladoras no
Direito Brasileiro. 1a ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. e-book.

411
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

co n co rd ân cia entre as partes, fu n c io n a r co m o m ed iad o ra ou árb itra nos


co n flito s q ue en volvam titulares, agências reg u lad o ras ou prestad o res de
serviços p ú b lico s de saneam ento básico. (art. 4°-A, § 5° d a L ei 9.984/2000).
V ê -se, p o is, q u e as a lte ra ç õ e s a lm e ja ra m não so m e n te a
p a d ro n iz a ç ã o n o rm a tiv a , m a s ta m b é m a sim p lific a ç ã o n o tra to dos
a ssu n to s in e re n te s ao san e am en to . D e v e ra s, é salu tar, d o p o n to d e v is ta
d a a tra tiv id a d e d o se to r a in v e stim e n to s p riv a d o s, a e x istê n c ia d e u m a
ú n ic a fo n te d e n o rm a s g e ra is q u e te rã o o c o n d ã o d e d a r u n ifo rm id a d e a
p o n to s sen sív e is d o s c o n tra to s, d ilu in d o e x te rn a lid a d e s e a m e n iz a n d o
c u sto s d e tra n sa ç ã o .

5 CONCLUSÃO

O N o v o M a rc o d e S a n e a m e n to B á sic o p ro p ô s-se a a tu a liz a r


to d o m ic ro s s is te m a le g isla tiv o q u e tra ta v a d a p re sta ç ã o d e se rv iç o s de
san e am en to . O fe z co m v ista s a u n iv e rsa liz a ç ã o d o o fe re c im e n to d e á g u a
p o tá v e l e c o le ta d e e sg o to , p riv ile g ia n d o m e c a n ism o s que, em te se , serão
m a is a tra tiv o s ao in v e stim e n to p riv ad o .
O p re s e n te estu d o , a in d a q u e p a rc ia l, tra to u d e a lg u m a s d e ssa s
a lte ra ç õ e s q ue, à p rim e ira v ista , re d u z e m c u sto s d e tra n sa ç ã o , tra z e m
s e g u ra n ç a ju ríd ic a e, p rin c ip a lm e n te , su g erem a re to m a d a do
in v e s tim e n to em in fra e stru tu ra .
V iu -s e q u e d e te rm in a d o s m o d e lo s d e c o n c e ssã o fa v o re c ia m o
m o n o p ó lio e im p a c ta v a m d ire ta m e n te so b re c u sto s d e g e stã o d o p ró p rio
serv iço . O P a n o ra m a d a P a rtic ip a ç ã o P riv a d a n o S a n e a m e n to 2 0 2 0 41
a p o n to u q u e e m b o ra a p a rtic ip a ç ã o d a in ic ia tiv a p riv a d a re p re se n te
so m e n te 5 ,2 % d o setor, 2 0 % d o to ta l d e in v e stim e n to ad v é m d essa s
em p re sas. A lé m d isso , as c o n c e ssõ e s à in ic ia tiv a p riv a d a têm

41 Disponível em: https://www.abconsindcon.com.br/wp- content/uploads/2020/08/Pa


norama2020-baixa-FINAL.pdf. Acesso em: 29 mar. 2021.

412
d e m o n s tra d o que as ta rifa s são re la tiv a m e n te re d u z id a s quando
c o m p a ra d a s às e m p re sa s estatais.
O m esm o estudo ap o n to u que o in v estim en to n ecessário à
u n iv ersalização é d a o rd em d e R $ 753 b ilh õ es p a ra os p ró x im o s 13 anos.42
N e ste m o n tan te é im p ro v áv el q u e o P o d e r P ú b lic o p o ssa suprir sozinho a
d em an d a p o r investim ento. M e sm o as em p resas estatais, assentadas no
m erc ad o h á b astan te tem po, n ão disp õ e de recu rso s n este patam ar.
E m b o ra h aja, n o a rtig o 11 d a L ei n 8 .9 8 7 , d e 13 d e fe v e re iro de
1995 (L ei d e C o n c e ssõ e s), p re v isã o p o ssib ilita n d o ao p o d e r c o n c e d e n te
p re v er, em fa v o r d a c o n c e ssio n á ria , n o ed ital d e lic ita ç ã o , o u tra s fo n te s
p ro v e n ie n te s d e re c e ita s a lte rn a tiv a s, c o m p le m e n ta re s, a c e ssó ria s o u de
p ro je to s asso c ia d o s, se g u n d o A u g u sto N e v e s D a l P o z z o e R e n a n
M a rc o n d e s F a c c h in a tto 43 esta p re v isã o “n ã o p o d e r ia se r u s a d a p a r a
s u s te n ta r co n tra ta çõ e s, co m a in ic ia tiv a p riv a d a , d e p r o je to s d e
in fr a e s tr u tu r a q u e tivessem , p o r esco p o , a p r e s ta ç ã o d o s se rv iç o s
p ú b lic o s m a r c a d o p e l a la c u n a d e via b ilid a d e , s e rv iç o s p ú b lic o s uti
u n iv e r s i o u a p r e s ta ç ã o d e se r v iç o s d e in fra e stru tu ra p a r a o p r ó p r io
g o v e r n o . N a v isã o d a d o u tr in a tra d icio n a l, so m e n te h á a s c o n c e ssõ e s d e
s e r v iç o s p ú b lic o s u ti sin g u li de p r o je to s fin a n c e ir a m e n te
a u to s s u s te n tá v e is e o s c o n tra to s tra d ic io n a is d e o b ra s p ú b lic a s e d e
p r e s ta ç ã o d e s e r v iç o s ”.
A n e c e ssid a d e d e in v e stim e n to s v u lto so s a sso c ia d a à ain d a
re c e n te m o n o p o liz a ç ã o d o se to r p o r e m p re sa s e sta ta is q u e p o u c o o u n a d a
m u d a m n o p a n o ra m a d o sa n e a m e n to b á s ic o n o p aís re c la m o u a alte ra ç ã o
d e ru m o s. A lé m d a in stitu iç ã o d e u m re g im e c o n c o rre n c ia l, p ro ib in d o os
c h a m a d o s co n tra to s d e p ro g ra m a , se c o n sig n o u em lei p ro p o sta s

42 Idem.
43 POZZO. Augusto Neves Dal. FACCHINATTO. Renan Marcondes. O Novo Marco
Regulatório do Saneamento Básico e os modelos de emparceiramento com a iniciativa
privada: a concessão e a parceria público-privada In : DAL POZZO, Augusto Neves
(coord.). O Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2021. p, RB-22-2, E-book.

413
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

in o v a d o ra s, p e lo m e n o s p a ra o se to r p ú b lic o , c o m o p o r ex e m p lo a
re p a rtiç ã o d e risc o s e n tre P o d e r C o n c e d e n te e P re s ta d o r d e S erviço,
in c lu in d o o s re fe re n te s a ca so fo rtu ito , fo rç a m a io r, fa to d o p rín c ip e e
á le a e c o n ô m ic a ex tra o rd in á ria .
O N o v o M a rc o d o S a n e a m e n to a in d a co n d ic io n o u , n o s te rm o s
d o a rtig o 10-A , “ o s c o n tr a to s em vigor, in c lu íd o s a d itiv o s e ren o v a çõ es,
a u to r iz a d o s n o s te rm o s d e s ta L ei, b em c o m o a q u e le s p r o v e n ie n te s d e
lic ita ç ã o p a r a p r e s ta ç ã o o u c o n c e ssã o d o s s e rv iç o s p ú b lic o s d e
s a n e a m e n to b ásico, e sta rã o c o n d ic io n a d o s à c o m p ro v a ç ã o da
c a p a c id a d e e c o n ô m ic o -fin a n c e ir a d a c o n tra ta d a , p o r r e c u rso s p r ó p r io s
o u p o r c o n tr a ta ç ã o d e dívida, co m v ista s a v ia b iliza r a u n iv e rsa liza ç ã o
d o s s e r v iç o s n a á r e a lic ita d a a té 31 d e d e ze m b ro d e 2 0 3 3 ".
A in d a h á q u e se fa la r d a m u ito b e m -v in d a re g io n a liz a ç ã o dos
se rv iç o s d e sa n e a m e n to , a lte ra n d o o m a rc o o p e ra c io n a l p a ra u m ú n ic o
P o d e r C o n c e d e n te , o q u e , em te o ria e a in d a q u e se te n h a ra z o á v e is
d ú v id a s a re s p e ito d e d ile m a s p rá tic o s, e sp e ra -se h a v e r a s im p lific a ç ã o e
s e g u ra n ç a ju ríd ic a tã o d e se ja d a p e lo se to r p riv ad o .
P o rta n to , é fa ctív el c o n c lu ir q u e o N o v o M a rc o d o S an ea m e n to ,
a p ro v a d o re c e n te m e n te , já n a sc e com a e sp e ra n ç a de tira r os
in v e s tim e n to s em in fra e stru tu ra d a a p a tia e in a u g u ra u m a n o v a e ra p a ra
in ic ia tiv a p riv a d a n e ste se to r tã o esse n c ia l à so c ie d a d e b ra sile ira .

414
O NOVO MARCO LEGAL E AS EXPECTATIVAS PARA A
MELHORA DO SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL

R o g é rio d e P a u la T avares*

A a p ro v a ç ã o d o n o v o m a rc o leg al d o sa n e a m e n to b á s ic o é u m
im p o rta n te a v a n ç o p a ra o B ra sil re v e rte r o triste q u a d ro d o sa n e a m e n to
b á s ic o n o p aís, ao c ria r u m a m b ie n te ju ríd ic o -re g u la tó rio q u e v ia b iliz a a
in je ç ã o de m a is in v e stim e n to s, p a d ro n iz a n o rm a s e ra tific a a
u n iv e rs a liz a ç ã o d o s se rv iç o s d e á g u a e e sg o to a té 2 0 3 3 . O m a rc o foi
s a n c io n a d o p e la lei 1 4.026 d e ju lh o d e 2020.
P a ra se te r u m a id e ia d a m a g n itu d e d o d é fic it d o sa n e a m e n to
b á s ic o n o P a ís e d o s p ro b le m a s o riu n d o s dele, a p e n a s 4 7 % d a p o p u la ç ã o
te m ac esso ao se rv iç o d e c o le ta e tra ta m e n to d e e sg o to , isto é, c e rc a de
100 m ilh õ e s d e p e sso a s n ã o c o n ta m co m esse a te n d im e n to em suas
re sid ê n c ia s. A situ a ç ã o d e a c e sso à á g u a é m e n o s g rav e, co m c o b e rtu ra
p a ra 8 3 ,3 % d o s c id a d ã o s - são c e rc a d e 35 m ilh õ e s d e b ra sile iro s q u e n ão
tê m ac e sso a e sse re c u rso e sse n cial e b á sic o . O B ra sil a in d a n ã o tra ta
4 9 % d o esg o to g erad o , o q u e re p re se n ta jo g a r n a n a tu re z a , to d o s os dias,
5,3 m il p is c in a s o lím p ic a s d e esg o to s sem tra ta m e n to .*1
É u m a re a lid a d e a la rm a n te e p re o c u p a n te e q u e c o lo c a o B rasil
n o ra n k in g d o s p a íse s co m os m e n o re s ín d ic e s d e c o b e rtu ra d o s serv iç o s
d e sa n e a m e n to b á sic o . O a te n d im e n to à p o p u la ç ã o b ra s ile ira é m ais
p re c á rio d o q u e em n a ç õ e s q u e p o ssu e m c e n á rio s a d v e rso s, p o r n a tu re z a
c o m o o M é x ic o o u p o r c o n flito s, c o m o re g iõ e s á rid a s o u q u e v iv e m
situ a ç õ e s d e g u e rra , ta is c o m o M a rro c o s, J o rd â n ia e Ira q u e , o n d e os

* Vice-presidente de Relações Institucionais da AEGEA.


1 Ranking do Saneamento Instituto Trata Brasil 2021 (SNIS 2019). Trata Brasil, São
Paulo, mar. 2021.

415
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

ín d ic e s d e c o b e rtu ra d e a c e sso à á g u a e ao e sg o ta m e n to sa n itá rio fica m


a c im a d e 8 0 % .2
P a ra se te r u m a d im e n sã o d a c o m p le x id a d e d o p ro b le m a , ce rc a
d e 4 ,4 m ilh õ e s d e b ra s ile iro s v iv e m em situ a ç ã o c la ssific a d a co m o
d e fe c a ç ã o ab e rta, o u seja, sem a c e sso se q u e r a v a s o san itário . E ,
o b v ia m e n te , esse c e n á rio a fe ta a p o p u la ç ã o m a is p o b re, a u m e n ta n d o os
risc o s p a ra sa ú d e e a e x p o siç ã o d e ssa s p e sso a s a d o en ç as. D e a c o rd o com
o T ra ta B ra sil, d o s 198 p a íse s an a lisa d o s em estu d o re a liz a d o em 2 0 1 5 ,
118 p o ssu e m u m ín d ic e d e d e fe c a ç ã o a b e rta in fe rio r ao d o B ra s il.3
A p re c a rie d a d e d o sa n e a m e n to b á s ic o n o B ra sil é m ais
a c e n tu a d a n a s re g iõ e s N o rte e N o rd e ste , c o n sid e ra d a s p e la O N U 4 os
te rritó rio s b ra s ile iro s co m ín d ic e s m a is e le v a d o s d e p o b re z a , e q u e
p o ssu ía m , até 2 0 1 1 , a p e n a s 3 ,5 % d e seu s m u n ic íp io s co m e sg o ta m e n to
san itário . A re g iã o N o rte , a in d a q u e te n h a a m a io r b a c ia h id ro g rá fic a do
m u n d o , d isp õ e d o m a io r ín d ic e d e á g u a n ã o tra ta d a n o p aís, d e 25% .
P a ra além d a in d isp o n ib ilid a d e d o sa n e a m e n to b á s ic o p a ra p a rte
s ig n ific a tiv a d a p o p u la ç ã o , d ire ito a sse g u ra d o p e la C o n s titu iç ã o F e d e ra l
e p e la L e i n°. 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , os siste m a s e x iste n te s so fre m co m p ro b le m a s
re c o rre n te s, q u e p re ju d ic a m a q u a lid a d e d a p re sta ç ã o d o s serv iço s. E n tre
eles, p o d e m o s m e n c io n a r a fa lta d e m a n u te n ç ã o , a in te rm itê n c ia n a
d is trib u iç ã o e o alto p e rc e n tu a l d e p e rd a d e água. D a d o s re tira d o s do
S N IS (S is te m a N a c io n a l d e In d ic a d o re s so b re S a n e a m e n to ) a p o n ta m
q ue, em 2 0 1 9 , o B ra sil p e rd e u 3 9 ,2 % 5d e v o lu m e d e á g u a n a d is trib u iç ã o .
O u seja, p a ra c a d a 100 litro s d e á g u a p ro d u z id a n o B ra sil, 39 fo ram

2 Novo estudo mostra que Brasil deixa de gerar benefícios de até 1,2 trilhão com
ausência do saneamento básico. Trata Brasil, São Paulo, fev. 2019.
3 Benefícios econômicos e sociais da expansão do saneamento no Brasil. Instituto
Trata Brasil, São Paulo, nov. 2018.
4 Saneamento básico no Brasil: por que não se investe mais? 2019. Disponível em:
https://www.politize.com.br/saneamento-basico-no-brasil/.
5 Diagnóstico dos Serviços de Água e Esgoto 2019. Ministério do Desenvolvimento
Regional, Secretaria Nacional de Saneamento, Brasília, 2019.

416
e lim in a d o s d ia ria m e n te , o q u e e q u iv a le a 7,1 m il p isc in a s o lím p ic a s de
á g u a s u p rim id a s to d o s os d ia s6.
A s p e rd a s p o d e m ser c h a m a d a s d e re ais o u ap a ren tes: as reais
são as a sso c ia d a s ao s v a z a m e n to s, já as a p a re n te s são d e c o rre n te s d a fa lta
d e h id rô m e tro s, erro s d e m e d ia ç ã o , lig a ç õ e s c la n d e stin a s e ro u b o d e
água. A in d a d e a c o rd o co m os d a d o s d o S N IS , a su p re ssã o d e á g u a
p o tá v e l n o s siste m a s d e d istrib u iç ã o a c a rre to u p re ju íz o s d e m a is d e R $
12 b ilh õ e s só em 2 0 1 8 5, im p a c ta n d o d ire ta m e n te n a s re c e ita s dos
p re s ta d o re s d e se rv iç o s (á g u a e e sg o to ) n o país.
A situação m edieval se p erp etu a p ela fa lta de in v estim en to s e
senso de urgência. U m p ro b lem a h istórico q u e se agravou ao lo n g o dos
ú ltim o s an o s p ela carên cia d e capital e políticas p ú b licas d e saúde e de
san eam en to efetivas que p u d essem im p o r a pressão, o p eso e a u rg ê n cia que
o te m a exige. E n tre 1990 e 2000, a m é d ia de in v estim en to s em in fraestru tu ra
fico u m u ito abaixo d e 0 ,45% do P ro d u to In tern o B ru to (PIB ), m eta
co n sid erad a in ad eq u ad a7. D e ste total, a m e n o r p arcela era rev ertid a p ara o
san eam en to básico. O s n úm eros, p o r si só, d em o n stram a falta de p rio rid ad e
com q u e o te m a era tratado. O tem p o passou, a p o p u lação b ra sileira cresceu,
saltan d o de 190 m ilhões, em 1990, p a ra 211 m ilh õ es em 2019, d e acordo
com o In stitu to B rasileiro de G e o g rafia e E statístic a (IB G E ), e os p ro b lem as
d a esc assez fo ram ficando ain d a m ais urgentes.
E s tu d o d a C o n fe d e ra ç ã o N a c io n a l d a In d ú stria (C N I) a p o n ta
q ue, se m a n tid o s os in v e stim e n to s d o s ú ltim o s o ito anos, em m é d ia de
R $ 13,6 b ilh õ e s 8, a u n iv e rsa liz a ç ã o d o se rv iç o so m e n te será a tin g id a em
2 0 6 0 . A m e ta d e fin id a p e lo P la n o N a c io n a l d e S a n e a m e n to B á sic o
(P lan sab , 2 0 1 3 ), e re fo rç a d a n o n o v o m a rc o leg al, é 2033.

6 Saneamento - Principais estatísticas Brasil. Disponível em: http://www.tratabrasil.or


g.br/saneamento/principais-estatisticas/no-brasil/agua.
7 Déficit de acesso aos serviços de saneamento básico no Brasil. IPEA, Caixa
Econômica Federal, 2006.
8 Saneamento Básico: uma agenda regulatória e institucional. Confederação Nacional
da Indústria, Brasília, jun. 2018.

417
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A lé m d e b a ix o s, os v a lo re s in v e stid o s fica m c o n c e n tra d o s em


p o u c a s cid ad e s, o q u e p e rp e tu a u m c e n á rio d e d e sig u a ld a d e . O T ra ta
B ra sil in d ic a q u e m a is d e 5 0 % d o s in v e stim e n to s são re a liz a d o s em
a p e n a s 100 cid ad e s, d as q u a se 5 .6 0 0 e x iste n te s n o p aís. M e sm o q u e
n e sse s 100 m u n ic íp io s v iv a m m a is d e 4 0 % d a p o p u la ç ã o , e sse d ad o
a ju d a a e x p lic a r o p o rq u ê as cid a d e s m é d ia s e p e q u e n a s, em g eral,
ca re c e m ta n to d e sta in fra e stru tu ra .
P a ra a tin g ir a u n iv e rsa liz a ç ã o até 2 0 3 3 , se g u n d o estu d o d a
K P M G 9, são n e c e ssá rio s R$ 500 b ilh õ e s p a ra c o n stru ir nova
in fra e s tru tu ra e o u tro s R $ 2 0 0 b ilh õ e s p a ra m o d e rn iz a r a re d e j á
e x iste n te , a fim d e m e lh o ra r a e fic iê n c ia o p e ra c io n a l e re d u z ir perd as.
O in v e s tim e n to em sa n e a m e n to c o n trib u i p a ra d im in u ir
d e s ig u a ld a d e s so c ia is e p a ra p ro m o v e r g a ra n tia s b á sic a s d e cid ad a n ia,
d ire ito à v id a e à d ig n id a d e , em c o n so n â n c ia a o s O b je tiv o s do
D e se n v o lv im e n to S u ste n tá v e l (O D S ) d a O N U (O rg a n iz a ç ã o d as N a ç õ e s
U n id a s). O O b je tiv o 6 p re v ê “ a sse g u ra r a d is p o n ib ilid a d e e g e stã o
su ste n tá v e l d a á g u a e sa n e a m e n to p a ra to d a s e to d o s até 2 0 3 0 ".
E s tu d o s d e v á ria s e n tid a d e s d e m o stra m q u e o in v e s tim e n to n o
se to r te m p o te n c ia l d e q u a d ru p lic a r g a n h o s e c o n ô m ic o s, tra z e r a v a n ç o s
im p o rta n te s e a ju d a r a re d u z ir os im p a c to s fin a n c e iro s c a u sa d o s p ela
c rise g e ra d a p e la p a n d e m ia d o n o v o c o ro n a v íru s. E stim a tiv a s da
O rg a n iz a ç ã o M u n d ia l d a S a ú d e (O M S )10 m o stra m q u e os g an h o s,
d e p e n d e n d o d a re g iã o d o g lo b o , p o d e m se r d e a té 34 v e z e s o v a lo r
in v e stid o . D ados c o n so lid a d o s p e lo T ra ta B ra sil a p o n ta m que a
u n iv e rs a liz a ç ã o d o s a n e a m e n to b á s ic o tra ria b e n e fíc io s e c o n ô m ic o s e
so c ia is d e m a is d e R $ 1 trilh ã o em 2 0 anos.

9 Quanto custa universalizar o saneamento no Brasil? ABCON - Associação Brasileira


das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto e KPMG,
São Paulo, jun. 2020.
10 Investimento em saneamento básico traz grande retorno, afirma OMS, Trata Brasil,
2009. Disponível em: http://www.tratabrasil.org.br/blog/2009/06/24/investimento-em-
saneamento-basico-traz-grande-retorno-afirma-oms/.

418
E sses b en efício s p o d em ser o b serv ad o s em diferentes setores da
econom ia. A s obras d e saneam ento b ásico realizad as n o país entre 2 0 0 4 e
2016, p o r exem plo, sustentaram q u ase 70 m il em pregos diretos p o r ano n a
co n stru ção civil, de aco rd o com estim ativ a do T rata B rasil3. C o n sid eran d o
em p reg o s in d iretos e induzidos, os n ú m ero s chegariam a 142 m il p o r ano,
com u m a g eração de receita anual de R $ 13,6 bilhões. O s dados
d em o n stram q ue a cad a R $ 1 in v estid o em saneam ento foi g e ra d a ren d a de
R $ 1,22, ev id en cian d o o efeito m u ltip licad o r do in cen tiv o ao setor.
A lém disso, h á potencial p a ra o B rasil am p liar a atração enquanto
destin o turístico. E ssa ativ id ad e ec o n ô m ic a n ão se desen v o lv e de fo rm a
ad eq u ad a em reg iõ es com falta de ág u a tratada, co leta e trata m e n to de
esgoto. Em co m p aração aos países vizinhos, as eco n o m ias latino-
am erican as com m e lh o r desem p en h o n a área do san eam en to b ásico têm
flu x o s in tern acio n ais e tu rístico s relativ am en te m aiores. E m C uba, C hile e
A rg e n tin a ch eg aram 261, 207 e 138 tu ristas estrangeiros p o r m il h abitantes
em 2014. N o B rasil, esse n ú m ero foi de apenas 31 tu ristas p o r m il habitantes
- d a d o s3 do an o em que o país sediou a C o p a do M u n d o de F uteb o l d a F IF A .
C o m b ase n o m o d elo estatístico, estim a-se que a u n iv ersalização do
san eam en to faria os g an h o s d e re n d a com tu rism o saltarem de R $ 2,1
b ilh õ es em 2016, p a ra R $ 42,8 b ilh õ es em 2036.
E v id e n c ia d a a im p o rtâ n c ia do sa n e a m e n to b á sic o , o n o v o m arc o
re g u la tó rio é u m a o p o rtu n id a d e p a ra re tira r o p a ís d e u m a re a lid a d e
m e d ie v a l e p o s ic io n á -lo d e fin itiv a m e n te n o s te m p o s m o d e rn o s e re fle tir
a im a g e m d e u m a n a ç ã o q u e j á fo i a sé tim a e c o n o m ia d o m u n d o . O m a rc o
d ev e im p u ls io n a r a a tra ç ã o de in v e stim e n to s sig n ific a tiv o s e re c o rre n te s
em in fra e stru tu ra , e sse n c ia is p a ra o d e se n v o lv im e n to e c o n ô m ic o e social
do p aís, p rin c ip a lm e n te n e ste m o m e n to tã o d esa fiad o r, p a ra c o m b a te r a
c rise sa n itá ria a d v in d a p e la p a n d e m ia do n o v o c o ro n a v íru s e c o n trib u ir
co m a re to m a d a ec o n ô m ic a.

419
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

1 P R IN C IP A IS B E N E F ÍC IO S D O M A R C O L E G A L

O p rin c ip a l o b je tiv o d a le g isla ç ã o é u n iv e rs a liz a r a c o b e rtu ra


d o s se rv iç o s d e á g u a e, e sp e c ia lm e n te , d e esg o to e q u a lific a r a p re sta ç ã o
d e sse s se rv iç o s co m o a p rim o ra m e n to e a m o d e rn iz a ç ã o d o se to r até
2 0 3 3 . O te x to ta m b é m p re v ê m a io r se g u ra n ç a ju ríd ic a , n e c e ssá ria p a ra
a tra ir in v e stid o re s, além d a p a d ro n iz a ç ã o d e re g ra s p a ra a tu a ç ã o de
o p e ra d o re s p riv a d o s o u p ú b lico s.
E n tre os p o n to s tra z id o s p e lo n o v o m a rc o leg al d o sa n e a m e n to
b á sic o , d e sta c o os q u e c o n sid e ro p rin c ip a is: titu la rid a d e ; su p e rv isã o d a
re g u la ç ã o em â m b ito fe d e ra l e d e sig n a ç ã o de m e ta s p a ra a
u n iv e rs a liz a ç ã o d o s se rv iç o s até 2033.
O p rim e iro p o n to , d a titu la rid a d e , d a rá m a is a u to n o m ia p a ra as
a d m in is tra ç õ e s p ú b lic a s lo c a is e re g io n a is. O m a rc o to rn a e x p re sso q u e
os titu la re s d o s se rv iç o s são os m u n ic íp io s, p re v ê o e x e rc íc io d a
titu la rid a d e p e lo estad o , em c o n ju n to co m m u n ic íp io s in te g ra n te s de
R e g iõ e s M e tro p o lita n a s, A g lo m e ra ç õ e s U rb a n a s e M ic ro rre g iõ e s
in s titu íd a s p o r L ei C o m p le m e n ta r E sta d u a l. T am bém a u to riz a a
re a liz a ç ã o p o r in stru m e n to s d e g e stã o a sso c ia d a, p o r m e io d e co n só rc io s
p ú b lic o s o u c o n v ê n io s d e c o o p e raç ão .
C o n fo rm e p re v isto n o § 2° d o a rtig o 2° d o D e c re to 1 0 5 8 8 /2 0 2 0 ,
os co n só rc io s p ú b lic o s p a ra a b a ste c im e n to d e á g u a e e sg o ta m e n to
sa n itá rio e x iste n te s, c o n fo rm e L e i 1 1 1 0 7 /2 0 0 5 , e a g e stã o a sso c ia d a
d e c o rre n te d e a c o rd o d e c o o p e ra ç ã o p o d e rã o se r re c o n h e c id o s co m o
b lo c o s re g io n a is, d e sd e q u e n ã o in c lu a m m u n ic íp io s in te g ra n te s d e
re g iõ e s m e tro p o lita n a s.
O tex to prevê u m a m u d an ça sobre o atendim ento aos pequenos
m unicípios, com poucos recursos e sem cobertura de saneam ento. N o m odelo
anterior, as g randes cidades atendidas p o r u m a m esm a em presa ajudavam a
fin anciar a expansão do serviço em m unicípios m enores. A no v a lei
d eterm in a q ue os estados, no intuito de atender aos pequenos m unicípios,
co m p o n h am grupos ou blocos de m unicípios que poderão contratar os

420
serviços de fo rm a coletiva, sendo que n ão precisam ser vizinhos. O s blocos
deverão im p lem entar planos m unicipais e regionais; e a U n ião poderá
oferecer apoio financeiro e técnico p ara a execução d a tarefa.
T rab alhando em parceria com os prestadores de serviço público, o
setor priv ad o po de contribuir p ara a universalização do saneam ento p o r m eio
de três form atos de atuação. O p rim eiro é a C o n cessão P le n a ou Parcial, n a
qual o setor p rivado realiza investim entos, o p era e cobra tarifa do usuário
final. A seg u n d a m odalidade é a subconcessão, que funciona de m aneira
sim ilar a prim eira, m as norm alm ente se relaciona à concessão dos serviços
de u m a sub-região d a em presa pública. O terceiro m olde é o d a P arceria
P ú b lico -P riv ad a (PPP), v ia concessão adm inistrativa, n a qual o operador
p rivado in v este e opera, em geral, parte do sistem a (principalm ente
esgotam ento sanitário), com tarifa cobrada diretam ente pelo p o d er público.
E n tre os b e n e fíc io s d a a tu a ç ã o c o n ju n ta, q u a lq u e r q u e seja a
m o d a lid a d e , e stão a in te ra ç ã o e c o m p le m e n ta rid a d e e n tre o d in am ism o ,
a e fic iê n c ia , a in o v a ç ã o c o m o c o n h e c im e n to lo c a l e o c o m p ro m e tim e n to
so cial; e a a tra ç ã o d e m ais re c u rso s e in v e stim e n to s p a ra a lc a n ç a r a
u n iv e rs a liz a ç ã o tã o n ec essária .
O b e m -su c e d id o le ilã o d e c o n c e ssã o d a C o m p a n h ia E sta d u a l de
Á g u a s e E s g o to s d o R io d e Ja n e iro (C e d a e ) ilu stra b e m c o m o u m a b o a
m o d e la g e m p o d e e stim u la r a c o m p e tiv id a d e e n tre os o p erad o re s,
p ú b lic o s o u p riv a d o s e, p rin c ip a lm e n te , a a tra ç ã o d e in v e stid o re s.
C o n s id e ra d o o m a io r p ro je to d e c o n c e ssã o d e in fra e s tru tu ra de
sa n e a m e n to d o B ra sil, a c o n c o rrê n c ia p a ra a c o n c e ssã o d o s se rv iç o s de
a b a ste c im e n to d e á g u a e c o le ta e tra ta m e n to d e e sg o to d e sp e rto u o
in te re ss e d e v á ria s em p re sa s, g ru p o s e c o n só rc io s em c o n q u ista r u m dos
q u a tro b lo c o s d o leilão , q u e o c o rre u u m a n o ap ó s a a p ro v a ç ã o d o n o v o
m a rc o leg al d o setor.
O g o v e rn o d o R io d e Ja n e iro a rre c a d o u c e rc a d e R $ 2 2 ,7 b ilh õ e s
co m trê s d o s q u a tro b lo c o s le ilo a d o s, an te u m a o u to rg a m ín im a to ta l de
R $ 10,6 b ilh õ e s, e a C e d a e c o n tin u a rá re a liz a n d o os se rv iç o s d e c a p ta ç ã o
e tra ta m e n to d e á g u a n o s m u n ic íp io s d a R e g iã o M e tro p o lita n a . D ia n te

421
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

d o s d e sa fio s d o d é fic it d o sa n e a m e n to , a c o m p le m e n ta rid a d e d e a tu a ç ã o


e n tre p ú b lic o e p riv a d o é u m a a lte rn a tiv a q u e d ev e g a n h a r m ais
re le v â n c ia n a s m o d e la g e n s d e c o n c e ssã o p ó s-a p ro v a ç ã o d o n o v o m arc o
e e s tim u la r a a tra ç ã o d e re cu rso s.
O s inv estim entos para universalizar o abastecim ento de ág u a e a
coleta e tratam ento de esgoto n o E stad o do R io de Janeiro exigirão volum es
de R $ 12 bilhões entre 2022 e 2026 e de R $ 13 bilhões entre 2027 e 2033. A
g ran d eza foi d eterm inada p elas m etas do P lan o N acional de S aneam ento
B ásico e o M arco L egal do S aneam ento - 90% de coleta e tratam ento de
esgoto e 9 9 % de abastecim ento de água até 2033 nas áreas urbanas.
A A E G E A S aneam ento, p o r m eio do consórcio form ado pela
com panhia, G rupo E quipav, G IC (F undo Soberano de Singapura) e Itaúsa,
v en ceu a disputa dos blocos 1 e 4 n o leilão e está preparada p ara enfrentar os
desafios deste projeto e conta com to d a sua experiência, m odelo operacional
e capacidade financeira. E ntre os principais objetivos d a em presa estão a
m elh o ria nos sistem as atuais e a universalização dos serviços nas áreas onde
irá atuar n o E stad o do R io de Janeiro, onde 9,3% (1,6 m ilhão) d a população
n ão possui acesso a água tratada e 35% (6,1 m ilhões) n ão é contem plada com
coleta de esgoto (SN IS 2019).
A lé m d o s v a lo re s a rre c a d a d o s e d a m o d e la g e m d e p a rc e ria en tre
e n tes p ú b lic o s e a in ic ia tiv a p riv ad a , se g u n d o estu d o d o B N D E S , a
c o n c e ssã o d o s trê s b lo c o s le ilo a d o s à in ic ia tiv a p riv a d a p o d e g e ra r ce rc a
d e 4 0 m il e m p re g o s d ire to s e in d ire to s n a re a liz a ç ã o d e o b ra s e o p eraçã o .

2 A G Ê N C IA N A C IO N A L DE ÁGUAS (A N A ) C O M O PEÇA
FUNDAM ENTAL

P a ra o p o n to d e su p e rv isã o d a re g u la ç ã o em â m b ito fe d era l h á


d o is d estaq u e s. O p rim e iro é a c ria ç ã o d o C o m itê In te rm in iste ria l de
S a n e a m e n to B á sic o , q u e te m a a m b iç ã o d e m e lh o ra r a a rtic u la ç ã o
in s titu c io n a l en tre os ó rg ã o s fe d e ra is q u e a tu am n o setor. E s s e c o m itê
será p re s id id o p e lo M in isté rio d o D e se n v o lv im e n to R eg io n al.

422
O o u tro é q u e a A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s (A N A ), v in c u la d a
ao M in isté rio d o D e se n v o lv im e n to R e g io n a l, p a ssa a se r a re sp o n sá v e l
p e la p a d ro n iz a ç ã o re g u la tó ria d o setor. C o m o n o v o p ap e l, a A N A to rn a -
se o ó rg ã o re sp o n sá v e l p e la im p le m e n ta ç ã o d as n o rm a s d e re fe rê n c ia
p a ra o e x e rc íc io d a re g u la ç ã o p e la s a g ê n c ia s su b n ac io n a is.
E s s e p o n to te m o p o te n c ia l d e in c re m e n ta r a se g u ra n ç a ju ríd ica,
c ria n d o u m te rritó rio m a is estáv e l d e a tu a ç ã o p a ra as em p re sa s, e, assim ,
a c e le ra r a a tra ç ã o d e in v e stim e n to s. E ste é u m re su lta d o e sp e ra d o p e lo
se to r co m o d e c o rrê n c ia d a p a d ro n iz a ç ã o d as n o rm a s d e re fe rê n c ia e u m a
m a io r u n ifo rm iz a ç ã o d a a tu a ç ã o d a s a g ê n c ia s in fra n a c io n a is.
A p a d ro n iz a ç ã o d e re g ra s em te rritó rio n a c io n a l to rn a o c e n á rio
m a is p ro p íc io à a m p lia ç ã o d a p a rtic ip a ç ã o d e o p e ra d o re s p riv a d o s com
c a p a c id a d e té c n ic a e fin a n c e ira p a ra le v a r seu s se rv iç o s a d ife re n te s
re g iõ e s d o p aís. N o c a so d a A E G E A é u m a g ra n d e o p o rtu n id a d e : a
e m p re s a te m o d in a m ism o e a so lid e z que p o ssib ilita m o
d e s e n v o lv im e n to de so lu ç õ e s de sa n e a m e n to de a c o rd o co m as
p a rtic u la rid a d e s d e c a d a m u n ic íp io , p a ra p ro je to s d e d ife re n te s p o rte s e
d esa fio s. A tu a lm e n te , p o r ex e m p lo , a c o m p a n h ia a te n d e cid a d e s
p e q u e n a s, m é d ia s e g ra n d e s, co m p o p u la ç õ e s q u e v a ria m d e 3 m il a 2,2
m ilh õ e s d e h ab ita n te s. D e ste m o d o , se m o ld a ao s m u ito s “B ra s is ” n as
re g iõ e s, re s p e ita n d o o m e io a m b ie n te e os d ire ito s d as p esso a s. C la ro q u e
co m a p ró x im a o p e ra ç ã o d o s se rv iç o s n u m a g ra n d e área d a c id a d e e do
E s ta d o d o R io d e Ja n e iro , esse c o n h e c im e n to irá au m en ta r.
C o n sid e ra -se , p o r fim , q u e o n o v o p ap e l d a A N A te m g ra n d e
p o te n c ia l p a ra im p u ls io n a r a a tra ç ã o d e in v e stim e n to s n e c e ssá rio s p a ra
su p e ra ç ã o d o d é fic it d o sa n e a m e n to , in c lu siv e a tra ir n o v o s in v e stid o re s
n a c io n a is e e stra n g e iro s, em ra z ã o d as d iv e rsa s o p o rtu n id a d e s d e n e g ó c io
q u e o se to r o ferece.
V a le re g istra r a d isp o n ib iliz a ç ã o d e aç ão m e d ia d o ra e arb itral
p e la p ró p ria A N A , v is a n d o d irim ir co n flito s e n tre p la y e r s d esse
m erc ad o . E s s a re so lu ç ã o de c o n flito s e n tre poder c o n c e d e n te e
o p e ra d o re s p o d e a c o n te c e r p o r m e io d e p ro c e sso a d m in istra tiv o in s ­

423
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

ta u ra d o p e la s p a rte s in te re ssa d a s, o q u e p o d e rá tra z e r m a is a g ilid a d e à


re s o lu ç ã o d o s litíg io s, u m a v e z q u e p ro c e sso s d o se to r n o rm a lm e n te
a p re se n ta m q u e stõ e s té c n ic a s co m p lex a s.

3 C O M P R O M IS S O C O M A U N IV E R S A L IZ A Ç Ã O

P o r ú ltim o , o m a rc o re fo rç a o c o m p ro m isso d a U n iã o co m a
m e ta d e u n iv e rsa liz a ç ã o d o sa n e a m e n to b á s ic o a té 31 d e d e z e m b ro de
2 0 3 3 : g a ra n tir o a te n d im e n to d e 9 9 % d a p o p u la ç ã o co m á g u a p o tá v e l e
de 90 % , co m tra ta m e n to de esg o to s. A lei p re v ê p o ssív e l e x te n sã o p a ra
2 0 4 0 em c a so s d e in v ia b ilid a d e e c o n ô m ic o -fin a n c e ira .
O m a rc o e sta b e le c e re g ra s m a is c la ra s às o p e ra d o ra s p a ra q u e
as m e ta s sejam a lc a n ç a d a s, co m a d e te rm in a ç ã o de q u e os co n tra to s
d e v e rã o c o n te r c lá u su la s e sse n c ia is c o m o n ã o in te rru p ç ã o d o s se rv iç o s;
re d u ç ã o d e p e rd a s n a d istrib u iç ã o d e á g u a tra ta d a ; q u a lid a d e n a p re sta ç ã o
dos serv iç o s; m e lh o ria nos p ro c e sso s de tra ta m e n to e re u so e
a p ro v e ita m e n to de ág u a s de ch uva. F ic a m e sta b e le c id a s a in d a e x ig ê n c ia s
c o m o a c o m p ro v a ç ã o de q u e a c o n c e ssio n á ria p o ssu i c a p a c id a d e
e c o n ô m ic o -fin a n c e ira p a ra a ssu m ir os serv iç o s, e de q u e os co n tra to s
p re v e ja m as m e ta s d e u n iv e rsa liz a ç ã o até 2033.
H á u m a n ítid a p re o c u p a ç ã o n o se n tid o de q u e as e m p re sa s do
se to r p re c isa m a p re se n ta r n o v a s so lu ç õ e s p a ra a tin g ir re su lta d o s q u e v ã o
além d a u n iv e rsa liz a ç ã o d o sa n e a m e n to em u m a d e te rm in a d a re g iã o . É
p re c iso a te n d e r ao s in d ic a d o re s de q u a lid a d e e ao s p a d rõ e s de
p o rta b ilid a d e , além d a d im in u iç ã o d o ín d ic e de p e rd a s de água, q u e é u m
d o s g ra n d e s g a rg a lo s d o setor.
E ste d e sa fio m o tiv o u a A E G E A a d ese n v o lv e r, em 2 0 1 3 , u m
d e p a rta m e n to e sp e c ia liz a d o em e fic iê n c ia e te c n o lo g ia , co m u m a e q u ip e
m u ltid is c ip lin a r d e 15 e sp e cialista s. E m a p e n a s q u a tro an o s, a e m p re sa
re d u z iu as p e rd a s d e á g u a em 71 m ilh õ e s d e m e tro s cú b ico s. E m C am p o
G ra n d e, ca p ita l d o M a to G ro sso d o Sul, d e sd e 2 0 1 0 , a e m p re sa re d u z iu
o ín d ic e d e p e rd a d e á g u a d e 5 7 % p a ra 19% .

424
O u tra frente im p o rtan te é a atuação de m o d o preventivo, a fim de
g aran tir q u e p ro b lem as op eracio n ais ou d e p erd a de ág u a sejam detectados.
N e ste aspecto, a A E G E A criou o P ro g ra m a In fra Inteligente, q u e u sa
te cn o lo g ia d e p o n ta p a ra a g estão dos seus ativos, v isan d o facilitar a to m a d a
de d ecisõ es o p eracionais e tra z e r m ais celeridade a desafios, co m o os
im p o sto s p rin cip alm en te n a pandem ia, pois d im in u iu a in teração direta
en tre os profissionais. E n tre os recu rso s do In fra Inteligente, h á a u tilização
de d ro n es p ara a digitalização das in stalaçõ es q u e co m p õ em os sistem as de
ab astecim en to de ág u a e esg o tam en to sanitário d a com panhia. E stas
rep resen taçõ es g ráficas em 3D p o ssu em alto nível de detalham ento,
p o ssib ilitan d o u m a v isu alização de dados e análises em u m am b ien te de
realid ad e virtual. C o m isso, a em p resa atua p ara d im in u ir o d éficit do
san eam ento, de fo rm a responsável e inovadora, co rrig ir p ro b lem as que
ag rav am a situação e a g aran tir o acesso aos serviços.
P a ra o G ru p o A E G E A , a e fic iê n c ia o p e ra c io n a l é u m a d e suas
m a is fo rte s c a ra c te rístic a s e g u ia p a ra to d o s os tra b a lh o s re a liz a d o s. A
c o m p a n h ia p re sta se rv iç o s d e q u a lid a d e , re su lta n te s d a im p le m e n ta ç ã o
d e so lu ç õ e s te c n o ló g ic a s e in te lig e n te s a d e q u a d a s ao c o n te x to dos
p ro je to s e às p a rtic u la rid a d e s re g io n a is.
U m p rojeto b em -su c ed id o d a A E G E A p ara o fo rn ecim en to
re g u la r de água, u m dos aspectos essenciais p ara p ro m o çã o d a eficiência,
foi o p lan o d e aten d im en to n o v erão de S anta C atarin a em 2020, g aran tin d o
a co n tin u id ad e d o abastecim en to em S ão F ran cisco do Sul, P enha,
B o m b in h a s e C am boriú, quatro im p o rtan tes cidades do litoral do estado que
ap resen tam p ico s de d em an d as n o p erío d o d e final de ano e n o verão.
E n tre as m e lh o ria s re a liz a d a s p e la em p re sa , e sta v a m o
d e s e n v o lv im e n to d e n o v a s esta ç õ e s d e tra ta m e n to d e á g u a e o tim iz a ç ã o
d as e stru tu ra s d e c a p ta ç ã o , q u e p e rm itiu g a ra n tir o fo rn e c im e n to re g u la r
d e á g u a p a ra p o p u la ç ã o e v isita n te s d e sta s lo c a lid a d e s, em u m p ro je to
b e m -s u c e d id o q u e se rv irá d e re fe rê n c ia p a ra a c o n tin u id a d e d e atu a ç ã o
em c o n d iç õ e s se m e lh a n te s d e a g o ra em dian te. E n tre os re su lta d o s
m e n su rá v e is, em C a m b o riú o n ú m e ro d e re c la m a ç õ e s d e fa lta d ’á g u a

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

re g is tra d a s n o s ú ltim o s d ias d e 2 0 2 0 ca iu 8 5 ,5 % em c o m p a ra ç ã o ao


m e s m o p e río d o d e 2019.
E sta eficiência o peracional d a em p resa j á existia antes m esm o d a
d efin ição do n o v o m arc o reg u lató rio q u e p re v ê o cu m p rim en to das m etas
de u n iv ersalização e n ão in term itên cia do abastecim ento. N o caso do não
atin g im en to das m etas, d ev erá ser in iciad o p ro c ed im en to adm inistrativo
p ela co n ced en te com o objetivo de av aliar as ações a serem adotadas,
in clu íd as m ed id as p a ra su sp en são e can celam en to dos contratos.
E s s a n o v a g o v e rn a n ç a d ev e a u m e n ta r a e fic iê n c ia e tra z e r m ais
c o m p e tiç ã o ao setor, em u m c e n á rio q u e e stim u la a a p rim o ra ç ã o técn ic a,
a e s tru tu ra ç ã o fin a n c e ira e a b u s c a p o r in o v a ç ã o p o r p a rte dos
o p e ra d o re s. É u m a o p o rtu n id a d e d e re sg a ta r e ssa e n o rm e d ív id a social.
H á m u ita s etap a s im p o rta n te s p e la fre n te p a ra q u e os efeito s
e sp e ra d o s a p a rtir d a sa n ç ã o d o n o v o m a rc o leg al sejam a lca n çad o s.
E n tre eles, u m im p o rta n te p a sso é o re c e n te d e c re to d a m e to d o lo g ia p a ra
m e n s u ra r a c a p a c id a d e e c o n ô m ic a e fin a n c e ira das c o n c e ssio n á ria s de
á g u a e esg o to , v isa n d o a fe rir a real p o ssib ilid a d e d e c u m p rim e n to dos
in v e s tim e n to s n e c e ssá rio s à u n iv e rsa liz a ç ã o d o s serv iço s.
A p rev isão é que os projetos d eco rren tes do n o v o m arc o d em orem
en tre dois e cin co anos p a ra ch e g ar ao m ercado, sejam p o r m eio d e P arcerias
P ú b lico -P riv ad as ou co n cessões plenas, essencialm ente.
V a le citar q u e j á h á b o n s ex e m p lo s d e P P P s, q u e em p o u co tem p o
c o n se g u iram re v e rte r p ro b lem a s d a p re sta ç ã o d e serviços. A P P P de
P iracic ab a, n o in te rio r d e S ão P au lo , é u m dos d estaq u e s do ra n k in g do
sa n e am en to d o T ra ta B rasil, n o qual é a 1a co lo c a d a n o s ín d ices de
a ten d im en to to tal de esg o to n o país. E m p o u c o m a is de d o is anos, a co leta
e tra ta m e n to de esg o to n o m u n íc ip io fo ram u n iv e rsa liz a d a s p e la A egea.
O u tro e x e m p lo é a p a rc e ria com o g o v e rn o do R io G ra n d e do Sul e com a
C o m p a n h ia R io g ra n d e n se d e S an ea m e n to (C orsan), q u e aten d e 9 cid ad es
d a re g iã o m etro p o lita n a d e P o rto A leg re, h á p o u c o m ais d e u m ano.
M e s m o a n tes d a n o v a le g isla ç ã o , o m o d e lo d e n e g ó c io d a
AEGEA já e ra b a se a d o nos p ilare s de e fic iê n c ia o p e ra c io n a l,

426
in v e s tim e n to s e stra té g ic o s e c u m p rim e n to de m etas. Toda e ssa
e x p e riê n c ia se rá re p lic a d a n a s re c e n te s c o n q u ista s n o s le ilõ e s d e
C a ria c ic a , n o E sp írito S an to e d a S an esu l, em M a to G ro sso d o Sul.
E m C ariacica, onde in iciam o s recen tem en te as operações em 68
m u n icíp io s de M ato G ro sso do Sul, a A E G E A é responsável p ela p restação
do serv iço de esg o tam en to sanitário. O s in v estim en to s d evem g erar
b en efício s tran sv ersais às reg iõ es com criação de em pregos, m elh o ria das
co n d içõ es d e saúde d a população, aum ento de p ro d u tiv id ad e e red u ção de
d esig u ald ad es sociais. O u seja, o im p o rtan te efeito m u ltip licad o r do
in v estim en to em saneam ento b ásico será v isto n a prática, com potencial de
g erar im p acto social e eco n ô m ico p a ra as n o v as reg iõ es atendidas.
A n a lisa n d o C a ria c ic a (E S ), a o p eraçã o , m a n u te n ç ã o e m e lh o ria s
v ã o b e n e fic ia r d ire ta m e n te m a is d e 4 0 0 m il p esso a s, co m e s tim a tiv a de
in v e s tim e n to em to rn o d e R $ 6 4 0 m ilh õ e s, n o s 30 an o s d e co n c essão .
E s tu d o d a G O A sso c ia d o s in d ic a q u e esse s in v e stim e n to s, c o n c e n tra d o s
n o se to r d e c o n stru ç ã o , tê m p o te n c ia l d e g e ra r d ire ta e in d ire ta m e n te u m a
e x p a n sã o e c o n ô m ic a n o E sp írito S an to n a o rd e m d e R $ 1,987 b ilh ão .
Im a g in e m a g o ra o ca so d o s 68 m u n ic íp io s d o E s ta d o d e M a to
G ro sso d o Sul. L á, a m e ta é a u n iv e rsa liz a ç ã o d o siste m a d e e sg o to n o s
p rim e iro s d ez an o s, co m R $ 800 m ilh õ e s d e in v e stim e n to s b e n e fic ia n d o
1,7 m ilh ã o d e p esso a s. E m C a m p o G ra n d e, os av a n ç o s e in v e stim e n to s
d a A e g e a p e rm itira m u m a re d u ç ã o d e 9 1 % n o n ú m e ro d e in te rn a ç õ e s p o r
d o e n ç a s d ia rre ic a s e n tre 2003 e 2 0 1 5 , c o n sid e ra n d o a ta x a d e in te rn a ç ã o
a c a d a 100 m il h a b ita n te s.
C o m o m arc o , e as e v id ê n c ia s d e ste s casos, p e rc e b e -se q u e a
e n tra d a d e in v e stim e n to s, n a c io n a is e in te rn a c io n a is, e a b u s c a d a
e fic iê n c ia o p e ra c io n a l são im p o rta n te s fa to re s a c e le ra d o re s p a ra a
u n iv e rs a liz a ç ã o do sa n e a m e n to b á sic o . E fic iê n c ia , ao la d o de
su ste n ta b ilid a d e , são in a to s p a ra atu a ç ã o n o se to r a p a rtir d o m a rc o leg al
e c a d a v e z m a is v a lo riz a d a s p o r in v e stid o re s n o m o m e n to d e a p lic a r seu
cap ital. Q u e stõ e s a m b ie n ta is, so c ia is e d e g o v e rn a n ç a são os c rité rio s de

427
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

a tu a ç ã o sin te tiz a d o s p e lo te rm o E S G , d o in g lê s E n v iro n m e n ta l, S o c ia l


a n d G overnance.
E m d estaq u e n o m ercado, os prin cíp io s E S G ajudam investidores
a id en tificarem em presas com u m m o d elo de n eg ó cio s co m petitivo no
lo n go-prazo. O san eam en to está in trin secam en te atrelado à p reserv ação
am biental e n en h u m seg m en to d a in fraestru tu ra cau sa m ais im p acto social
do que este. H oje, a av aliação de u m in v estim en to inclui o im p acto n a
sociedade, além d e ta m b ém co n sid erar risco e rentabilidade.

4 L IC E N Ç A S O C IA L P A R A O P E R A R

P e lo te x to a p ro v a d o , e x iste u m a p re o c u p a ç ã o q u a n to às
q u e s tõ e s so ciais la te n te s c o m o e le m e n to s c ru c ia is p a ra o setor. O n o v o
m a rc o leg al d o sa n e a m e n to b á sic o p rev ê, p o r e x e m p lo , q u e fa m ília s de
b a ix a re n d a re c e b e ria m su b síd io s p a ra c o b rir o s c u sto s d o s se rv iç o s e
g ra tu id a d e n a c o n e x ã o à re d e d e esg o to . O u tro s c rité rio s ta m b é m d e v e rã o
ser a ten d id o s, c o m o n ã o in te rru p ç ã o d o s serv iço s, re d u ç ã o d e p e rd a s e
m e lh o ria n o s p ro c e sso s d e tra ta m e n to d e á g u a e esg o to .
A p re o cu p ação é que dentro das m etas d e u n iv ersalização dos
serviços ex ista u m a aten ção p rio ritária às p o p u laçõ e s m ais vulneráveis, que
tiv eram a n ecessid ad e dos recu rso s p ro v in d o s do saneam ento
p o ten cializad o s du ran te a pandem ia. E ssa co b ertu ra d ev e ser realizad a com
qualidade, de fo rm a a p ro m o v er v id as m ais dig n as e saudáveis às pessoas.
O sa n e a m e n to b á s ic o é u m in d ic a d o r d e d e se n v o lv im e n to dos
m u n ic íp io s e d a q u a lid a d e d e v id a d e seus h a b ita n te s ao g a ra n tir ac esso
à á g u a tra ta d a e à re d e d e c o le ta e tra ta m e n to d e esg o to . C o n trib u i co m a
m e lh o ria d a saú d e d a p o p u la ç ã o , co m a a ssid u id a d e d e c ria n ç a s n a e sc o la
e d e a d u lto s n o tra b a lh o , em ra z ã o d a re d u ç ã o d e d o e n ç a s re la c io n a d a s à
fa lta d e sa n e a m e n to b á sic o , o fe re c e n d o , assim , v id a s m a is p le n a s de
cid ad a n ia. O serv iç o ta m b é m c o o p e ra co m a p re se rv a ç ã o d o m e io
a m b ien te, em e sp e cial d o s c o rp o s h íd ric o s, e co m o d e se n v o lv im e n to de
seto re s im p o rta n te s d a ec o n o m ia , c o m o tu rism o e im o b iliá rio .

428
In d o m u ito além d a co n fo rm id ad e legal, a licen ça social p ara
o p erar é a ch an cela de u m a co m u n id ad e p a ra u m a operadora, p o r m eio da
leg itim ação e aceitação d a p o p u lação im p actad a d iretam en te pelo s serviços.
C o m a v alo rização do papel d a co m u n id ad e n a in terlo cu ção e g estão do
p ro cesso é possível en treg ar soluções com m u ito m ais v alo r ao país.
A A E G E A , p o r m e io d e su as co n c e ssõ e s, b u s c a a lic e n ç a social
p a ra o p e ra r p re z a n d o p e la e x c e lê n c ia d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o
p re sta d o s, b u s c a n d o le g itim id a d e em seu tra b a lh o ; p e la a p ro x im a ç ã o
co m as c o m u n id a d e s p o r m e io do d iá lo g o tra n s p a re n te ; e p e lo
in v e s tim e n to n a m e lh o ria d a q u a lid a d e d e v id a d a p o p u la ç ã o e d o Ín d ic e
d e D e se n v o lv im e n to H u m a n o (ID H ) d o s m u n icíp io s.
P o r m e io d o d iá lo g o tra n sp a re n te co m as c o m u n id a d e s é
p o ssív e l id e n tific a r fo rm a s m a is a sse rtiv a s d e re s p o n d e r à s n e c e ssid a d e s
d o s d ife re n te s “b ra s is ” , c o n sid e ra n d o as d iv ersa s, d ife re n te s e c o m p le x a s
c a ra c te rístic a s te rrito ria is, c lim á tic a s e so c ia is d o p aís. N e ste p ro c e sso ,
h á o re c o n h e c im e n to d a c a p a c id a d e e c o n h e c im e n to d as p o p u la ç õ e s em
c o n trib u ir n a id e n tific a ç ã o d o s v e rd a d e iro s im p a c to s, além d a q u ilo q u e
os e sp e c ia lista s j á sabem .
C o m o P ro g ra m a A flu e n te s, u m a d as m a io re s in ic ia tiv a s d a
A E G E A p a ra e stre ita r a re la ç ã o co m as c o m u n id a d e s, a e m p re sa fa z
re u n iõ e s n o s b a irro s, n a s sed e s e em v isita s à s in sta la ç õ e s. C o m o
A flu e n te s é p o ssív el e n te n d e r as n e c e ssid a d e s lo c a is, m e sm o q u e
m ín im a s, e c o m o os se rv iç o s d a e m p re sa p o d e m a ju d a r a p o p u la ç ã o .
Um e x e m p lo d e sse e stu d o m a is d e d ic a d o foi a so lu ç ã o
e n c o n tra d a p a ra á reas d e p a la fita s fre n te à s a lte ra ç õ e s d o s n ív e is das
ág u a s de rio s. Foi p re c iso d e se n v o lv e r so lu ç õ e s in o v a d o ra s de
a b a ste c im e n to p a ra g a ra n tir a q u a lid a d e d a á g u a e d o s se rv iç o s p re sta d o s
n e ssa s p a rte s d e M a n a u s. O siste m a d e se n v o lv id o p e la c o n c e ssio n á ria
g a ra n te a d is trib u iç ã o em re d e s a é re a s d e a b a ste c im e n to p a ra as
c o m u n id a d e s sem q u e h a ja a c o n ta m in a ç ã o p e la p o lu iç ã o d o s ig ara p és.
O u tro e x e m p lo d e in ic ia tiv a q u e b u s c a fo c a r n o a te n d im e n to aos
v u ln e rá v e is é o p ro g ra m a V e m co m a G e n te, em M a n a u s, n o qual a

429
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A e g e a m a p e ia e lo c a liz a as o p o rtu n id a d e s d e e x p a n sã o d e re d e de
a b a ste c im e n to em re g iõ e s v u ln e rá v e is d o m u n ic íp io e q u e n ã o c o n ta m
co m a b a ste c im e n to re g u la r, c o m o b e c o s, p a la fita s e rip -ra p esp a lh a d a s
p e la cid ad e. M a is d e 1,2 m ilh ã o d e p e sso a s j á fo ra m a te n d id a s p e lo
p ro g ra m a e m a is d e 80 m il m e tro s d e re d e s d e á g u a tra ta d a fo ram
im p la n ta d a s em 38 b a irro s d a cidade.
A A E G E A a tu a d ire ta e in d ire ta m e n te n a v id a d as c o m u n id a d e s
e m u n ic íp io s o n d e o pera. O s p ro je to s d e se n v o lv id o s fo rta le c e m os laço s
co m lid e ra n ç a s c o m u n itá ria s, le v a m e d u c a ç ã o am b ie n ta l p a ra as esco las,
p ro m o v e m a ç õ e s d e c o n sc ie n tiz a ç ã o am b ien tal, o fe re c e m cultura,
estim u la m p ro fe sso re s a tra b a lh a r co m o te m a d o sa n e a m e n to em salas
d e au la e a te n d e m ao s a n se io s d a p o p u la ç ã o além de, in d u z ire m , sem p re
q u e p o ssív el, a ig u a ld a d e e n tre os in d iv íd u o s, so b re tu d o a racial. E ssa s
in ic ia tiv a s, p o n tu a is em c a d a u n id a d e , são fo rm a ta d a s e a lin h a d a s p e la
G e rê n c ia d e R e s p o n s a b ilid a d e S o c ia l C o rp o ra tiv a .
C o m b a se em e fic iê n c ia o p e ra c io n a l e u m o lh a r a te n to p a ra as
n e c e s s id a d e s e sp e c ífic a s d as c o m u n id a d e s, c o m a te n ç ã o e sp e cial à
in c lu s ã o d o s v u ln e rá v e is, a A e g e a re g istro u c re sc im e n to e x p o n e n c ia l em
seu s d ez an o s d e ex istên c ia . S alto u d e seis c o n c e ssõ e s p a ra 153, em 12
e sta d o s e aten d e, ag o ra, m a is d e 21 m ilh õ e s d e p esso a s. N o seu p ro c e sso
d e c re scim en to , a e m p re sa b u s c o u c o n so lid a r só lid o s p ro g ra m a s in te rn o s
co m sistem as, p ro c e d im e n to s e c e rtific a ç õ e s que re fo rç a m seu
c o m p ro m is s o E S G .
A ssim c o m o a em p re sa, h á o u tro s o p erad o re s, p ú b lic o s e
p riv ad o s, q u e e stã o c o n se g u in d o a v a n ç a r p a ra d im in u ir o d é fic it do
san e am en to . O n o v o a rc a b o u ç o leg al d ev e tra z e r m a is c e le rid a d e à
u n iv e rsa liz a ç ã o . P o r isso, é tã o im p o rta n te se g u ir ra p id a m e n te co m os
p ro c e s s o s d e c o rre n te s da a p ro v a ç ã o do novo m a rc o leg al. A
c o n tin u id a d e é fu n d a m e n ta l p a ra n ã o p e rd e r a traç ão . É p re c iso ev o lu ir,
g a ra n tir a s e g u ra n ç a p a ra in v e stid o re s e a p o ia r o p erad o re s. O m o m e n to
é b o m p a ra a v a n ç a r n e sse ca m p o , u m a v e z q u e o te m a e stá em d e sta q u e
e a in fra e s tru tu ra é o p rin c ip a l eix o d e in v e stim e n to p a ra a re to m a d a

430
e c o n ô m ic a d o p a ís se n d o o sa n e a m e n to u m d o s c o m p o n e n te s m ais
p ro c u ra d o s p o r in v e stid o re s n a c io n a is e in te rn a c io n a is. A lé m d isso , este
p e río d o to rn a -se id eal p a ra av a n çar, em u m m o v im e n to sin c ro n iz a d o
e n tre p o d e r c o n c e d e n te , a g ê n c ia s re g u la d o ra s e c o n c e ssio n á ria s p a ra
c o n s e g u im o s le v a r à p o p u la ç ã o b ra sile ira , fin a lm e n te , e sse se rv iç o tã o
e sse n cial e d e n tro d e u m p ra z o digno.

R E F E R Ê N C IA S

B E N E F ÍC IO S e c o n ô m ic o s e so ciais d a e x p a n sã o d o sa n e a m e n to n o
B ra sil. I n s t i t u to T r a t a B r a s il, S ão P au lo , nov. 2 0 1 8 . D isp o n ív e l em :
h ttp ://w w w .tra ta b ra sil.o rg .b r/im a g e s/e stu d o s/itb /b e n e fic io s/R e la t% C 3 %
B 3 rio -B e n e f% C 3 % A D c io s-d o -sa n e a m e n to -n o -B ra sil-0 4 -1 2 -2 0 1 8 .p d f.

D É F IC IT d e a c e sso ao s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á s ic o n o B ra sil. IP E A
e C a ix a E c o n ô m ic a F e d e ra l, B ra sília , 2006. D isp o n ív e l em :
h ttp s://w w w .ip e a .g o v .b r/ip e a c a ix a /p re m io 2 0 0 6 /d o c s/tra b p re m ia d o s/Ip e
a C a ix a 2 0 0 6 _ P ro fissio n a l_ M H 0 2 _ te m a 0 1 .p d f.

D IA G N Ó S T IC O d o s S e rv iç o s d e Á g u a e E sg o to 2 0 1 9 . M in isté rio do
D e se n v o lv im e n to R e g io n a l, S e c re ta ria N a c io n a l de S an ea m e n to ,
B ra sília , 2 0 1 9 . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .sn is.g o v .b r/d o w n lo a d s/d ia g
n o s tic o s /a e /2 0 1 9 /D ia g n o stic o -S N IS -A E -2 0 1 9 -C a p itu lo -0 8 .p d f.

IN V E S T IM E N T O em sa n e a m e n to b á s ic o tra z g ra n d e re to rn o , a firm a
O M S , T r a t a B r a s il, 2 0 0 9 . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .tra ta b ra sil.o rg .b r
/b lo g /2 0 0 9 /0 6 /2 4 /in v e stim e n to -e m -sa n e a m e n to -b a sic o -tra z -g ra n d e -
re to rn o -a firm a -o m s/.

N O V O estudo m o stra que B rasil deixa de g erar b enefícios de até 1,2 trilhão
com ausência do saneam ento básico. T ra ta B ra sil, São Paulo,

431
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

fev. 2019. D isponível em : http://tratabrasil.org.br/im ages/estudos/itb/benefic


ios/P ress_R elease_- _ B enef% C 3% A D cios_do_saneam ento_no_B rasil.pdf.

PERCEPÇÃO d as A g ê n c ia s R e g u la d o ra s In fra n a c io n a is q u a n to à
a tu a liz a ç ã o d o M a rc o R e g u la tó rio d o S a n e a m e n to B á sico . T r a t a B ra s il,
S ão P au lo , fev. 2 0 2 1 . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .tra ta b ra sil.o rg .b r/e stu
d o s/e stu d o s -itb /itb /a s-a g e n c ia s-re g u la d o ra s-e -o -n o v o -m a rc o -le g a l-d o -
san e a m e n to -b a sic o .

P E R D A S d e á g u a 2 0 2 0 (A N O B A S E 2 0 1 8 ) - d e sa fio s à d isp o n ib ilid a d e


h íd ric a e n e c e ssid a d e d e a v a n ç o n a e fic iê n c ia d o san e am en to . G O
A s s o c ia d o s , T ra ta B r a s il e W a te r .o r g , S ão P au lo , ju n . 2020.
D is p o n ív e l em : h ttp ://tra ta b ra sil.o rg .b r/im a g e s/e stu d o s/R e la t% C 3 % B 3 r
io _ F in a l_ -_ E s tu d o _ d e _ P e rd a s_ 2 0 2 0 _ -_ JU N H O _ 2 0 2 0 .p d f.

Q U A N T O c u sta u n iv e rs a liz a r o sa n e a m e n to n o B ra sil? A B C O N -


A s s o c ia ç ã o B ra sile ira d as C o n c e ssio n á ria s P riv a d a s de S erv iço s
P ú b lic o s d e Á g u a e E sg o to e K P M G , S ão P a u lo , ju n . 2 0 2 0 . D isp o n ív e l
em : h ttp s://a s s e ts.k p m g /c o n te n t/d a m /k p m g /b r/p d f/2 0 2 0 /0 7 /k p m g -
q u a n to -c u s ta -u n iv e rs a liz a r-o -s a n e a m e n to -n o -b ra s il.p d f.

R A N K IN G d o S a n e a m e n to In stitu to T ra ta B ra sil 2021 (S N IS 2 0 1 9 ).


T ra ta B r a s il, S ão P a u lo , m ar. 2021. D isp o n ív e l em :
h ttp ://w w w .tra ta b ra sil.o rg .b r/im a g e s/e stu d o s/R a n k in g _ sa n e a m e n to _ 2 0 2
1 /R e la t% C 3 % B 3 rio _ -_ R a n k in g _ T ra ta _ B ra s il_ 2 0 2 1 _ v 2 .p d f

S A N E A M E N T O básico n o B rasil: p o r que n ão se investe m ais? 2019.


D isponível em : https://w w w .politize.com .br/saneam ento-basico-no-brasil/.

SANEAM ENTO B á sic o : um a agenda re g u la tó ria e in stitu c io n a l.


C o n fe d e ra ç ã o N a c io n a l d a In d ú stria , B ra sília , ju n . 2 0 1 8 . D isp o n ív e l em :
h ttp ://w w w .tra ta b ra s il.o rg .b r/u p lo a d s /s a n e a m e n to -b a s ic o -w e b .p d f.

432
A PRESTAÇÃO REGIONALIZADA NO NOVO MARCO
LEGAL DO SANEAMENTO BÁSICO

R ubens N aves*
G u ilh e rm e A m o rim C a m p o s d a Silva*
R o b e rto N ucci*

S U M A R IO : 1 Introdução. 2 D as m o d alid ad es d e prestação re g io n alizad a


trazid as p elo art. 3° in ciso V I, alíneas b e c. 3 R eg iõ es A dm inistrativas,
R eg iõ es criad as p o r L ei e suas m o d alid ad es sob a lu z d a C onstituição
F ederal. 3.1 D a reg ião m etropolitana, ag lo m eração u rb a n a o u m icro rreg ião
(art. 25 §3° d a CF). 3.2 D a u n id ad e regional d e saneam ento b ásico e do
b lo co de referência. 4 D a prestação re g io n alizad a p o r m eio das regiões
criad as p o r lei e suas co m p etên cias d elim itad as p ela C onstituição. 4.1 D a
falta d e sistem ática d e g o v ern an ça das R eg iõ es L eg a is n o N M L S B . 4.2 O s
im p acto s ad v in dos d a exclu são do contrato de p ro g ram a e a lim itação à
au to n o m ia federativa. 4.3 O s im p acto s ad vindos d a ex clusão do contrato de
p ro g ram a e a lim itação à au to n o m ia federativa. 5 C onclusão. R eferências.

1 IN T R O D U Ç Ã O

A L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , sa n c io n a d a em 15 d e ju lh o d e 2 0 2 0 ,
in tro d u z iu o N o v o M a rc o L eg a l d o S a n e a m e n to B á sic o , c u jo in tu ito é

* Advogado, Consultor da COMASP e SABESP (1970-2021). Professor de Teoria


Geral do Estado da PUC/SP (1978-1997), Chefe de Departamento de Teoria do Direito
da PUC/SP (1983-1987). Sócio titular de Rubens Naves, Santos Jr. Advogados.
Membro Comissão Especial de Saneamento, Recursos Hídricos e Sustentabilidade da
OAB Nacional.
* Advogado, Doutor em Direito Constitucional (2010) e Mestre em Direito do Estado
(2002) pela PUC/SP. Professor Titular de Direito Constitucional pela UNINOVE/SP.
Sócio titular de Rubens Naves, Santos Jr. Advogados.
* Advogado, graduado pela PUC/SP (2017) e Pós-Graduando em Direito
Administrativo PUC-SP/COGEAE (2020-2021).

433
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

v ia b iliz a r a u n iv e rsa liz a ç ã o d o s se rv iç o s d e a c e sso à á g u a p o tá v e l e ao


sa n e a m e n to b á sic o até 3 1 /1 2 /2 0 3 3 , em c o n fo rm id a d e co m o p la n o de
aç ão o rg a n iz a d o p e la s N ações U n id a s e seu O b je tiv o de
D e se n v o lv im e n to S u ste n tá v e l 6 d a A g e n d a 2 0 3 0 1.
A re fe rid a le g isla ç ã o te m p o r o b je tiv o a sse g u ra r, em â m b ito
n a c io n a l, o a te n d im e n to d e 9 9 % d a p o p u la ç ã o co m á g u a p o tá v e l e de
9 0 % d a p o p u la ç ã o co m c o le ta e tra ta m e n to d e e sg o to , c o n fo rm e d isp o sto
p o r seu s a rtig o s 10-B e 11-B 12.
P a ra isso , fo ra m re v o g a d a s e m o d ific a d a s p a rc ia lm e n te cin co s
n o rm a s q u e c o m p õ e m o m a rc o leg al d o sa n e a m e n to b á s ic o : a L ei
1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , q u e e sta b e le c e as d ire triz e s n a c io n a is p a ra o sa n e a m e n to
b á sic o , a L e i 1 2 .3 0 5 /2 0 1 0 , q u e c rio u a p o lític a n a c io n a l d e re síd u o s
só lid o s, a L e i 9 .9 8 4 /2 0 0 , q u e tra ta d a A g ê n c ia N a c io n a l d e Á g u a s e
S a n e a m e n to B á sic o , a L ei 1 1 .1 0 7 /2 0 0 5 , q u e re g u la m e n ta a c o n tra ta ç ã o
d e c o n só rc io s p ú b lic o s p a ra p re sta ç ã o d e se rv iç o s p ú b lic o s, a L ei
1 3 .0 8 9 /2 0 1 8 , q u e d isp õ e so b re o e sta tu to d a m e tró p o le , e, p o r fim , a L ei
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , q u e a lte ro u to d a s estas n o rm a s e in se riu n o v a s reg ras.
A L ei 14.026/2020 re co n fig u ro u o M arco L eg al d o S aneam ento
B ásico e suas alterações ab rangem assuntos co m o : (i) a m a io r ab ertu ra de
esp aço p a ra os contratos d e co n cessão e a o b rig ato ried ad e de licitação,
p ro ib in d o -se a u tilização dos contratos d e program a, (ii) o in cen tiv o à

1 Http://www.agenda2030.org.br/ods/6/.
2 Art. 10-B. Os contratos em vigor, incluídos aditivos e renovações, autorizados nos
termos desta Lei, bem como aqueles provenientes de licitação para prestação ou
concessão dos serviços públicos de saneamento básico, estarão condicionados à
comprovação da capacidade econômico-financeira da contratada, por recursos próprios
ou por contratação de dívida, com vistas a viabilizar a universalização dos serviços na
área licitada até 31 de dezembro de 2033, nos termos do § 2° do art. 11-B desta Lei.
Art. 11-B. Os contratos de prestação dos serviços públicos de saneamento básico
deverão definir metas de universalização que garantam o atendimento de 99% (noventa
e nove por cento) da população com água potável e de 90% (noventa por cento) da
população com coleta e tratamento de esgotos até 31 de dezembro de 2033, assim como
metas quantitativas de não intermitência do abastecimento, de redução de perdas e de
melhoria dos processos de tratamento. (...)

434
p restação re g io n alizad a com a in tro d u ção das u n id ad es regionais ou blocos
de m u n icíp io s e (iii) a criação d e u m m arco reg u lató rio com um , p o r m eio
d a ed ição d e n o rm as referen ciais p ela A g ê n cia R eg u lad o ra F ederal.
R e g is tra -se q u e, p a ra o p re se n te artig o , em e sp e cial d ed ic a d o
ao s se rv iç o s d e á g u a e tra ta m e n to d e esg o to s, im p o rta a p ro fu n d a r o
estu d o so b re a p re s ta ç ã o re g io n a liz a d a d o s se rv iç o s in tro d u z id a p e lo
N o v o M a rc o L e g a l, q u e ro m p e u co m o siste m a d e su b síd io c ru z a d o 3
p re v is to p e la a n tig a re g u la ç ã o , em q u e as g ra n d e s cid a d e s p re sta v a m
a u x ílio ao s m u n ic íp io s m a is d e fic ie n te s e p e rife ria s co m ap o io de
e m p re sa s estatais.

2 D A S M O D A L ID A D E S D E P R E S T A Ç Ã O R E G I O N A L I Z A D A
T R A Z ID A S P E L O A R T . 3°, I N C I S O V I, A L Í N E A S B E C D a
L E I N° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0

N o âm b ito do N o v o M a rc o L egal do S an ea m e n to B ásico, ao


tratarm o s d a assistên cia aos m u n icíp io s m ais afastados, q u e g eralm ente
carecem d e recu rso s ou até m esm o n ão dispõem d e u m a co b ertu ra de
san eam ento, a L ei das D iretrizes N a cio n ais p ara o S an ea m e n to B á sic o (Lei
11.445/2007) foi alterad a p ara estab elecer a re g io n alização d o serviço de
san eam en to b ásico co m o u m p rin cíp io fundam ental (inciso X IV , A rt. 2°)4
C om o fo rm a de c o n c re tiz a r o p rin c íp io da p re sta ç ã o
re g io n a liz a d a do se rv iç o de sa n e a m e n to b á sic o , o e x e rc íc io da
titu la rid a d e d e ste se rv iç o foi alterad o , em c o m p a ra ç ã o co m re g im e

3 Subsídio cruzados: forma de cobrança em que uma classe, tipo de consumidor paga
preços mais elevados para subsidiar um grupo específico de consumidores, entendidos
como tendo menos condições de saldar seus compromissos financeiros ou necessidade
de maior estímulo para seu desenvolvimento. (NAVES, Rubens. Água crise e conflito
em São Paulo. 1 Ed., São Paulo: Via Impressa, pag. 46.).
4 Art. 2° Os serviços públicos de saneamento básico serão prestados com base nos seguintes
princípios fundamentais: (...) XIV - prestação regionalizada dos serviços, com vistas à
geração de ganhos de escala e à garantia da universalização e da viabilidade técnica e
econômico-financeira dos serviços; (Incluído pela Lei n° 14.026, de 2020).

435
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

ju ríd ic o a n terio r, d e m o d o a in c lu ir os E sta d o s, em c o n ju n to co m os


M u n ic íp io s, n a h ip ó te se d e in te re sse c o m u m (in c iso II, A rt. 8°)5. O
in te re ss e co m u m é c o n fig u ra d o quando os e n tes fe d e ra tiv o s
c o m p a rtilh a m “ e fe tiv a m e n te in sta la ç õ e s o p e ra c io n a is in te g ra n te s d e
r e g iõ e s m e tr o p o lita n a s ” .
A d em ais, o artigo 3°, in c iso V I6, in tro d u z iu o m o d e lo de
p re sta ção re g io n a liz a d a d o s serv iço s p ú b lico s d e san e am en to b ásico , a ser
p ro m o v id o em u m a d e te rm in a d a re g iã o cujo te rritó rio ab ran ja m ais de um
M u n icíp io . E sse d isp o sitiv o tra to u de estru tu ra r a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a
em três m o d a lid a d e s a p a rtir d as re g iõ e s cria d as p o r lei, sen d o elas: (a)
re g iã o m etro p o litan a, a g lo m eraçã o u rb a n a ou m icro rreg ião ; (b) a u n id a d e
reg io n al d e san e am en to b ásic o e (c) o b lo c o d e referência.
D a s m o d a lid a d e s ap resen tad as, c o n stata -se q u e a n o v id ad e
tra z id a p e lo N o v o M a rc o L eg a l está in se rid a n o s iten s (b) e (c), v isto que
a u n id a d e reg io n a l d e san e am en to b á sic o e o b lo c o d e re fe rê n c ia
ag reg aram à n o rm a leg al u m a fe rra m e n ta p e rm issiv a aos p eq u e n o s *IV

5 Art. 8° Exercem a titularidade dos serviços públicos de saneamento básico:


II - o Estado, em conjunto com os Municípios que compartilham efetivamente
instalações operacionais integrantes de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas
e microrregiões, instituídas por lei complementar estadual, no caso de interesse comum.
6 Art. 3° Para fins do disposto nesta Lei, considera-se:
(...)
VI - prestação regionalizada: modalidade de prestação integrada de um ou mais
componentes dos serviços públicos de saneamento básico em determinada região cujo
território abranja mais de um Município, podendo ser estruturada em:
a) região metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião: unidade instituída pelos
Estados mediante lei complementar, de acordo com o § 3° do art. 25 da Constituição
Federal, composta de agrupamento de Municípios limítrofes e instituída nos termos da
Lei n° 13.089, de 12 de janeiro de 2015 (Estatuto da Metrópole);
b) unidade regional de saneamento básico: unidade instituída pelos Estados mediante
lei ordinária, constituída pelo agrupamento de Municípios não necessariamente
limítrofes, para atender adequadamente às exigências de higiene e saúde pública, ou
para dar viabilidade econômica e técnica aos Municípios menos favorecidos;
c) bloco de referência: agrupamento de Municípios não necessariamente limítrofes,
estabelecido pela União nos termos do § 3° do art. 52 desta Lei e formalmente criado
por meio de gestão associada voluntária dos titulares;

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m u n ic íp io s d e in teg ra rem b lo co s co m o u tras cidades, n ão n ec essaria m e n te
v izin h as, p re te n d e n d o a co n tra taçã o c o letiv a dos serv iç o s co n tan d o com o
ap o io té c n ic o e fin a n c e iro dos E sta d o s M e m b ro e/o u d a U nião.
C a b e d e sta c a r, ain d a, q u e além d e e x istire m as m o d a lid a d e s de
p re s ta ç ã o re g io n a liz a d a cria d as p o r lei, o N o v o M a rc o L e g a l, em
c o n tin u id a d e co m o re g im e ju ríd ic o an terio r, p re v iu a p o ssib ilid a d e d e o
se rv iç o d e sa n e a m e n to b á s ic o ser p re sta d o p o r g e stã o a sso c ia d a (§1°, A rt,
8°), p o r m e io d e c o n só rc io p ú b lic o o u c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o , isto é, a
p re s ta ç ã o o c o rre p o r re la ç ã o co n tra tu al.
N o e n tan to , d ife re n te m e n te d o q u e o c o rria n o re g im e ju ríd ic o
an terio r, a g e stã o a sso c ia d a só p o d e rá se r c o m p o sta p o r M u n ic íp io s e
co m a fin a lid a d e e x c lu siv a de fin a n c ia m e n to d as in ic ia tiv a s de
im p la n ta ç ã o d e m e d id a s e stru tu ra is d o se rv iç o d e sa n e a m e n to b ásico ,
v e d a d a a fo rm a liz a ç ã o p o r c o n tra to d e p ro g ra m a (II, §1°, A rt. 8°).
A ssim , o N ovo M a rc o L eg a l p o s s ib ilita a p re sta ç ã o
re g io n a liz a d a d o se rv iç o d e sa n e a m e n to b á sic o p o r m e io d e re g iõ e s
c ria d a s p o r lei - re g iõ e s m e tro p o lita n a s, a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e
m ic ro rre g iõ e s, u n id a d e re g io n a l e b lo c o d e re fe rê n c ia - e d e g e stõ e s
a sso c ia d a s - c o n só rc io s p ú b lic o s e c o n v ê n io d e c o o p e ra ç ã o , e m b o ra com
a u to n o m ia b a s ta n te lim itad a.
N e ste asp e cto , ca b e a n a lisa rm o s a lg u m a s c irc u n stâ n c ia s
im p o rta n te s q u e a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a p o r m e io d as re g iõ e s cria d a s
por lei, com o o p o ssív e l c o n flito de c o m p e tê n c ia fru to do
e sta b e le c im e n to d o G o v e rn o F e d e ra l c o m o d e te n to r d a m a io ria dos
re c u rs o s fin a n c e iro s, e n a tra n s fe rê n c ia d e c o m p e tê n c ia le g is la tiv a p a ra
a u ta rq u ia p ú b lic a fe d era l, a re fletir, o p o rtu n a m e n te , n a v io la ç ã o d o p a c to
fe d e ra tiv o , q u a n to a re d u ç ã o d as p re rro g a tiv a s d o s M u n ic íp io s, titu la re s
d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b á sic o , e n tre o u tra s q u e stõ e s d e c o rre n te s
d e sta a n á lise in icial.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

3 R E G IÕ E S A D M IN IS T R A T IV A S , R E G IÕ E S C R IA D A S P O R
LEI E SUAS M O D A L ID A D E S SOB A LUZ DA
C O N S T IT U IÇ Ã O F E D E R A L

A C o n stitu iç ã o d a R e p ú b lic a F e d e ra tiv a d o B ra sil d e 1988, ao


tra ta r d a e s tru tu ra b á s ic a d a F e d e ra ç ã o , in stitu iu c o m o e n tes fe d e ra tiv o s
a U n iã o , o s E sta d o s, o D is trito F e d e ra l e os M u n ic íp io s, in o v a n d o com
re la ç ã o as d e m a is C o n stitu iç õ e s b ra sile ira s ao e le v a r o M u n ic íp io co m o
en te fe d e ra tiv o d o ta d o d e a u to n o m ia a d m in istra tiv a e fin a n c e ira .
C om o c o n se q u ê n c ia d e ssa estru tu ra , cada um dos en tes
fe d e ra d o s d e té m g o v e rn o p ró p rio e c o m p e tê n c ia s e x c lu siv a s.
A o d iv id ir as c o m p e tê n c ia s e n tre to d a s as e n tid a d e s fe d e ra tiv a s,
u tiliz o u -s e o p r in c íp io d a p r e d o m in â n c ia d o in te re sse , c o n fo rm e n o s
e n sin a Jo sé A fo n so d a S ilv a7, d e m o d o q u e c a b e rá à U n iã o as m a té ria s
d e p r e d o m in a n te in te re sse g e r a l o u n a c io n a l, ao E sta d o s os a ssu n to s de
p re d o m in a n te in te re sse r e g io n a l e ao s M u n ic íp io s ca b em as q u e stõ e s de
in te re sse lo c a l.
A lé m d isso , o b se rv a -se d a e stru tu ra fe d e ra lista b ra sile ira a
n o ç ã o d e c o o p e ra ç ã o e n tre os e n te s fe d e ra d o s, a p a rtir d a re d istrib u iç ã o
d as c o m p e tê n c ia s en tre to d o s os m e m b ro s d a fe d e ra ç ã o as c h a m a d a s
c o m p e tê n c ia s c o m u n s e c o m p a rtilh a d a s.
A lém das entidades federativas, a C onstituição F ederal previu a
criação de regiões adm inistrativas especiais de desenvolvim ento incentivado
(art. 4 3 ) e m etropolitanas, as aglom erações u rbanas e m icrorregiões (§3°, art.
25), com objetivo de operacionalizar as com petências com uns ou de prestar
serviços públicos que extrapolam a noção de interesse local, m as n ão se
configuram co m o interesse reg io n a l típico.

7 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 39. Ed. São
Paulo: Malheiros, 2016. p. 482.

438
3.1 D a re g iã o m e t r o p o l i t a n a , a g lo m e r a ç ã o u r b a n a o u m i c r o r r e g i ã o
( a r t . 2 5 §3° d a C F )

D is c ip lin a a C o n stitu iç ã o F e d e ra l, em seu a rtig o 2 5 , §3°, q u a n to


a re g iã o m e tro p o lita n a , que:

os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir


regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e
microrregiões, constituídas por agrupamentos de
municípios limítrofes, para integrar a organização, o
planejamento e a execução de funções públicas de
interesse comum.

A re g iã o m e tro p o lita n a p o d e ser d e fin id a c o m o a c a ta liz a d o ra


d a a rtic u la ç ã o d e in te re sse s c o m u n s p a ra além d e u m só M u n ic íp io .
P re s s u p õ e m u ltip lic id a d e in stitu c io n a l, q u e ex ig e a e x e c u ç ã o d e fu n ç õ e s
p ú b lic a s o rien ta d as, d e m o d o u n ific a d o c o n fo rm e o in te re sse co m u m de
re g iã o , in te re ss e e sse que, n o s e n sin a m e n to s d o E. M in istro d o S u p re m o
T rib u n a l F e d e ra l, G ilm a r M e n d e s, a ssim se co n fig u ra:

O interesse comum inclui funções públicas e serviços que


atendam a mais de um Município, assim como os que,
restritos ao território de um deles, sejam de algum modo
dependentes, concorrentes, confluentes ou integrados de
funções públicas, bem como serviços supramunicipais.
(STF, ADI n° 1.842/RJ, rel. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes,
Pleno, j. 6/3/2013).

N a s liç õ e s tra z id a s p o r P e d ro E ste v a m S erran o (2 0 0 9 , p. 190),


o re g im e c o n stitu c io n a l fe d e ra tiv o in tro d u z id o , te n d e a se r in te rp re ta d o
d a seg u in te fo rm a :8

8 SERRANO, Pedro Estevam Alves Pinto. Região Metropolitana e seu regime


constitucional. Verbatim, 2009. p. 209.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

Prerrogativa de decidir quanto ao modo de exercer a


competência que lhe foi outorgada pelo sistema federativo,
autorizando fazê-lo de forma centralizada e solitária ou
realizando-a de forma descentralizada, contando com a
participação dos Municípios. Por ser uma entidade apenas
administrativa, sem personalidade política, a Região
Metropolitana em nada deve interditar a competência do
Município enquanto ente federado. Esta Região significa
apenas um campo de atuação de competência estadual
determinada pela Constituição Federal, não se
configurando com novo ente político capaz de titularizar
competências diferenciadas e, com muito menos razão,
com a prerrogativa de suprimir competências
constitucionalmente estabelecidas”.

A in d a so b re a q u estão , n o s c o m p e te d e s ta c a r a a n á lise q u e se
tra n s c re v e n o e n te n d im e n to d e A la ô r C affé A lv e s, em suas p o n d e ra ç õ e s
p e ra n te o d is p o sitiv o c o n stitu c io n a l s u p ra c ita d o 9:

No âmbito específico que nos interessa agora, o das


regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e
microrregiões, postula-se igualmente a exigência de um
novo conteúdo organizacional de gestão regional, por
força da própria Constituição Federal, onde a cooperação
e a coordenação intergovernamental passam a ter uma
dimensão institucional própria, representada pela
exigência de unidades integradas e personalizadas de ação
pública de interesse comum.

A d v é m , d e sse n o v o m o d e lo d e siste m a re g io n a l in tro d u z id o ,


situ a ç õ e s in u s ita d a s q u a n to ao fe d e ra lism o de in te g ra ç ã o , cu jo
p re s su p o s to p a rte d a ig u a ld a d e en tre os e n te s fe d e ra tiv o s e suas
re s p e c tiv a s c o m p e tê n c ia s co m u m ou m a te ria l, ao re la c io n a m e n to

9 ALVES, Alaôr Caffé. Regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões:


novas dimensões constitucionais da organização do Estado brasileiro. Revista da
Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, edição especial em comemoração aos,
v. 10, 1998. Disponível em: http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/re
vista7tes1.htm.

440
in te rg o v e rn a m e n ta l e às a u to n o m ia s d o s e n tes p o lític o -a d m in istra tiv o s
fe d e ra d o s, te n d o em v is ta q u e a re g iã o m e tro p o lita n a e ra c ria d a p e la
U n iã o n o re g im e c o n stitu c io n a l a n te c e d e n te , se n d o o E sta d o , m e d ia n te
lei c o m p le m e n ta r, o e n te fe d e ra tiv o c o m p e te n te p a ra in s titu i-lo s .
Em com plem ento à C onstituição Federal, a L ei F ederal
13.089/2015 dispôs sobre o E statuto d a M etrópole, que tratou, em seu artigo
2 inciso V, do conceito de R egião M etropolitana d a seguinte form a:

espaço urbano com continuidade territorial que, em razão


de sua população e relevância política e socioeconômica,
tem influência nacional ou sobre uma região que
configure, no mínimo, a área de influência de uma capital
regional, conforme os critérios adotados pela Fundação
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE;

A lém disso, o E statuto d a M etrópole disciplinou, em seus artigos 7°


e 8°, sobre a organização e funcionam ento dessa estrutura interfederativa:
in stância executiva com posta pelos representantes do P o d er E xecutivo dos
entes federativos integrantes das unidades territoriais urbanas; instância
co legiada deliberativa com representação d a sociedade civil; organização
p ú b lica com funções técnico-consultivas; e sistem a integrado de alocação de
recursos e de p restação de contas.
P o rta n to , a p a rtir d e u m a e stru tu ra a d m in istra tiv a q u e c o n g re g a
M u n ic íp io s p e rm e a d o s p o r u m m e sm o c o n te x to so c io e c o n ô m ic o , a
R e g iã o M e tro p o lita n a p e rm ite o p la n e ja m e n to e e x e c u ç ã o d e fu n ç õ e s
p ú b lic a s co m u n s.
P o r sua vez, a ag lo m eração urbana, n o esteio d a con ceitu ação do
artigo 1510 do E statu to d a M etró p o le, em in terp retação sistem ática com o
in ciso V II do cap u t do artigo 2°, e artigo 25, §3° d a C onstituição F ederal, é

10 Art. 15. A região metropolitana instituída mediante lei complementar estadual que
não atenda o disposto no inciso VII do caput do art. 2° desta Lei será enquadrada como
aglomeração urbana para efeito das políticas públicas a cargo do Governo Federal,
independentemente de as ações nesse sentido envolverem ou não transferência de
recursos financeiros.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

to d a reg ião q u e n ão tem p o r objetivo in teg ra r o p lan ejam en to e execução


das fu n çõ es p ú b licas de in teresse com um d a região m etropolitana.
S u a c o n c e itu a ç ã o é im p ró p ria e p o r e x c lu sã o d a d e fin iç ã o de
re g iã o m e tro p o lita n a , se g u n d o o p ró p rio E sta tu to e u tiliz a d a a p e n a s p a ra
e fe ito d as p o lític a s p ú b lic a s a c a rg o do g o v e rn o fe d e ra l,
in d e p e n d e n te m e n te d as a ç õ e s, n e sta p e rs p e c tiv a , e n v o lv e re m ou n ão
tra n s fe rê n c ia d e re c u rso s fin an c eiro s.
A ssim , d e a c o rd o co m M a ria n a M e n c io 11, h á d istin ç õ e s
re le v a n te s a tu a is a serem c o n sid e ra ç õ e s e n tre re g iã o m e tro p o lita n a e
a g lo m e ra ç ã o u rb a n a ap ó s a e n tra d a em v ig o r d o E sta tu to d a M e tró p o le .
N e s ta d ireç ão , re g iã o m e tro p o lita n a p a ssa a se r q u a lific a d a
com o a g lo m e ra ç ã o u rb a n a m e tro p o lita n a e n q u a n to o c o n c e ito de
a g lo m e ra ç ã o u rb a n a p a ssa a d e sig n a r a u n id a d e te rrito ria l u rb a n a
c o n s titu íd a p e lo a g ru p a m e n to d e 2 (d o is) o u m a is M u n ic íp io s lim ítro fe s,
c a ra c te riz a d a por c o m p le m e n ta rid a d e fu n c io n a l e in te g ra ç ã o das
d in â m ic a s g e o g rá fic a s, a m b ie n ta is, p o lític a s e so c io e c o n ô m ic a s.
Q u a n to às m icrorregiões, o leg islad o r federal, ao fix a r requisitos
de in stitu ição das reg iõ es m etro p o litan as e aglo m eraçõ es urb an as, n ão
d efin iu os co n tornos leg ais d este arranjo federativo. E ntretanto, inexistem
ó b ices p a ra a ex ten são dos efeitos d a lei sobre o instituto.
N e sse ponto, em síntese, destacam -se as distinções que po d em ser
aferid as nas fig u ras regionais, seg u n d o o d o u trin ad o r Jo sé A fo n so d a Silva:

Regiões Metropolitanas constitui-se de um conjunto de


Municípios cujas sedes se unem com certa continuidade
urbana em torno de um Município; Microrregiões forma-
se de grupos de Municípios limítrofes com certa

11 MENCIO, Mariana. Consórcios públicos e região metropolitana. Enciclopédia


jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e
André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal
Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire
(coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/61/edicao-
1/consorcios-publicos-e-regiao-metropolitana.

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homogeneidade e problemas administrativos comuns,
cujas sedes não sejam unidas por continuidade urbana.
Aglomerações Urbanas carecem de conceituação, mas de
logo se percebe que se trata de áreas urbanas sem um pólo
de atração urbana, quer tais áreas sejam das cidades-sedes
dos Municípios, como na Baixada Santista, ou não.12

P o rta n to , v e rific o u -se o tra ta m e n to c o n stitu c io n a l e leg al d a d o


à s re g iõ e s m e tro p o lita n a s, a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e m ic ro rre g iõ e s.
A g o ra p a s s a -s e à v e rific a ç ã o d a d isc ip lin a d isp e n sa d a às
u n id a d e s re g io n a is e b lo c o s d e re fe rê n c ia s, in tro d u z id a s p e lo N o v o
M a rc o L e g a l d o S a n e a m e n to B ásico .

3 .2 D a u n i d a d e r e g io n a l d e s a n e a m e n to b á s ic o e d o s b lo c o s d e
r e f e r ê n c ia

O N o v o M a rc o L e g a l, co m a in te n ç ã o d e c ria r e stím u lo s à
p re s ta ç ã o re g io n a liz a d a d o s se rv iç o s d e s a n e a m e n to b á sic o , p e rm itiu q u e
os m u n ic íp io s in te g ra n te s d as u n id a d e s re g io n a is d e sa n e a m e n to b á sic o
e d o s b lo c o s d e re fe rê n c ia n ã o te ria m d e se r lim ítro fe s, c o m o p re v isto
p e la C o n s titu iç ã o F e d e ra l q u a n to as re g iõ e s m e tro p o lita n a s,
a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e m ic ro rre g iõ e s.
A in d a assim , q u a n to a u n id a d e re g io n a l d e sa n e a m e n to b ásico ,
v a le d e s ta c a r q u e e sta d e v e rá se r in stitu íd a p e lo s E s ta d o s m e d ia n te L ei
O rd in á ria, e n q u a n to o b lo c o d e re fe rê n c ia , a p e sa r d e ta m b é m ser
c o n s titu íd o p o r M u n ic íp io s n ã o n e c e ssa ria m e n te lim ítro fe s, p o ssu i a
p a rtic u la rid a d e d e se r in s titu íd o p o r ato n o rm a tiv o e m a n a d o p e la U n iã o
F e d e ra l. O u seja, p o r m e io d e L ei O rd in á ria F e d e ra l, d e fo rm a a ser
re a liz a d o s u b s id ia ria m e n te ao s E sta d o s e m e d ia n te a c o rd o v o lu n tá rio
e n tre o s in te g ra n te s.

12 SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico Brasileiro. 7. ed. São Paulo:
Malheiros, 2012. p. 156.

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Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

N o q u e d iz re sp e ito à c o m p e tê n c ia a c im a e x p lic ita d a , a re sp e ito


d a U n iã o fe d e ra l e su a in stitu iç ã o d o s b lo c o s d e re fe rê n c ia , re ssa lte -se
q u e o n o v o d isp o sitiv o , em seu art. 1 5 13, d e te rm in o u q u e e la só será
e x e rc id a caso as u n id a d e s re g io n a is d e s a n e a m e n to b á s ic o n ã o te n h a m
sid o in s titu íd a s p e lo E s ta d o n o p ra zo d e 1 (u m ) a n o d a p u b lic a ç ã o d a L ei
n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 sa n c io n a d a em 15 d e ju lh o d e 2020.
N e ste sen tid o , a su ste n ta r u m a p o ssív e l d isc o rd â n c ia co m o
p a c to fe d e ra tiv o e seu a rtig o 2 4 1 14, id e n tific a m o s q u e o N o v o M a rc o
L e g a l re s g u a rd a p o r o ra u m e m p e c ilh o n a c o o p e ra ç ã o in te rfe d e ra tiv a
e n tre m u n ic íp io s e e sta d o s n a p re sta ç ã o d o s se rv iç o s p ú b lic o s d e
sa n e a m e n to b á sic o , p o sto q u e a a u to n o m ia m u n ic ip a l co rre risc o d e ser
su fo c a d a p o r ev e n tu a l n e g a ç ã o d e su a titu la rid a d e , n a s h ip ó te se s em q u e
h o u v e r q u a lq u e r tip o d e c o m p a rtilh a m e n to d e in fra e stru tu ra o p e ra c io n a l
d e se rv iç o s d e sa n e a m e n to e n tre m a is d e u m m u n ic íp io .

4 DA PRESTA ÇÃ O R E G IO N A L IZ A D A POR M E IO DAS


R E G I Õ E S C R IA D A S P O R L E I E S U A S C O M P E T Ê N C I A S
D E L IM IT A D A S P E L A C O N S T IT U IÇ Ã O

C o n fo rm e e x p o sto a n te rio rm e n te , a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a do


se rv iç o d e sa n e a m e n to b á s ic o p o d e o c o rre r a p a rtir d a c o n stitu iç ã o de
re g iõ e s cria d as p o r lei o u d e g e stõ e s asso c ia d as, a m b a s co m o o b je tiv o
d e c e n tra liz a r v á ria s titu la rid a d e s d o se rv iç o d e s a n e a m e n to b á s ic o em
u m ú n ic o p o d e r c o n c e d e n te , e le v a d a a p rin c íp io fu n d a m e n ta l ao la d o d a
u n iv e rs a liz a ç ã o d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to b ásico .

13 Art. 15. A competência de que trata o § 3° do art. 52 da Lei n° 11.445, de 5 de janeiro


de 2007, somente será exercida caso as unidades regionais de saneamento básico não
sejam estabelecidas pelo Estado no prazo de 1 (um) ano da publicação desta Lei.
14Art. 241. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de
lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando
a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos,
serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos. (Redação dada
pela Emenda Constitucional n° 19, de 1998).

444
A s re g iõ e s cria d as p o r lei - re g iã o m e tro p o lita n a , a g lo m e ra ç ã o
u rb a n a o u m ic ro rre g iã o - são c a ra c te riz a d a s p o r e x e rc e re m a p e n a s
fu n ç ã o a d m in is tra tiv a e e x e c u tó ria , sem d e te re m p e rso n a lid a d e ju ríd ic a
p ró p ria . A g o v e rn a n ç a d e sta s in stitu iç õ e s se e x p rim e p o r m e io d e ó rg ã o
c o le g ia d o c o m p o sto p e lo s e n tes fe d e ra tiv o s.
A d e m a is, a c o m p u lso rie d a d e , em reg ra, ta m b é m se a p re se n ta
c o m o c a ra c te rístic a d as re g iõ e s c ria d a s p o r lei, j á q u e são im p o sta s p o r
m e io d e lei em se n tid o fo rm a l sem a a n u ê n c ia d o s M u n ic íp io s.
A ssim , a c o n c e n tra ç ã o d e v á ria s titu la re s do se rv iç o de
sa n e a m e n to b á s ic o n ã o fic a a crité rio d e seus d e te n to re s. A e x c e ç ã o fic a
a ca rg o d o b lo c o d e re fe rê n c ia , in stitu íd o p e la U n iã o F e d e ra l, p o r ato
n o rm a tiv o n ã o d e fin id o p e la L e i 1 4 .0 2 6 /2 0 , d esd e q u e h a ja a n u ê n c ia p o r
p a rte d o s M u n ic íp io s.
P o r sua vez, a g estão asso ciad a p o r m eio de co n só rcio ou convenio
de co o p eração se caracteriza p ela criação v o lu n tária de u m a n o v a p esso a
ju ríd ic a a p artir d e u m a relação contratual, em que h á considerável
d iscricio n aried ad e p a ra a co n stru ção d a g o v ern an ça e d a ex ecu ção das
fin alid ad es d essa n o v a p esso a ju ríd ica, co n fo rm e p re v ê a L ei 11.107/2005.
O s m a io re s d e sa fio s se im p õ e m , p o rta n to , p a ra d e lim ita ç ã o do
re g im e ju ríd ic o d as re g iõ e s cria d as p o r lei e su a re la ç ã o co m o N o v o
M a rc o L eg a l, u m a v e z q u e a c o m p u lso rie d a d e c a rre g a m a io r in c e rte z a
so b re a p re s e rv a ç ã o d a a u to n o m ia fe d e ra tiv a d o s M u n ic íp io s.

4.1 A sistemática de Governança da Região Metropolitana e a ADI


1842-RJ

A p re sta ç ã o re g io n a liz a d a p o r m e io d e R e g iã o M e tro p o lita n a ,


a g lo m e ra ç ã o u rb a n a e m ic ro rre g iõ e s e m e rg e d o §3° d o A rtig o 25 d a
C o n s titu iç ã o F e d e ra l, em q u e p re ssu p õ e a c o n c re tiz a ç ã o d e in te re sse
co m u m p a ra a e x e c u ç ã o , o rg a n iz a ç ã o e p la n e ja m e n to s d e fu n ç õ e s
p ú b lic a s e n tre a g ru p a m e n to d e m u n ic íp io s lim ítro fe s.

445
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

A C o n stitu iç ã o F e d e ra l não tra to u da fo rm a de


o p e ra c io n a liz a ç ã o d e ssa s e stru tu ra s ju ríd ic a s . N o e n tan to , a ed iç ã o do
E s ta tu to d a M e tró p o le tra to u d e re g u la m e n ta r o c o n c e ito d e in te re sse
c o m u m 15 e e sta b e le c e r d ire triz e s p a ra a g o v e rn a n ç a d as re g iõ e s
m e tro p o lita n a s e a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s. A g o v e rn a n ç a in te rfe d e ra tiv a
d e te rm in a a c ria ç ã o d e u m ó rg ã o c o le g ia d o d e lib e ra tiv o co m p a rtic ip a ç ã o
d a so c ie d a d e civ il e u m a in s tâ n c ia e x e c u tiv a c o m re p re se n ta n te s do
P o d e r E x e c u tiv o d o s e n tes fe d e ra d o s q u e c o m p õ e m a re g iã o leg al.
O c o rre q u e os d e ta lh e s d e fu n c io n a m e n to d a s in stâ n c ia s de
g o v e rn a n ç a fe d e ra tiv a n ã o fo ra m e x p o sto s n o E sta tu to d e M e tró p o le ,
fic a n d o a c a rg o d as le is in stitu id o ra s q u e cria m as re g iõ e s le g a is
e sp e c ific a r a fo rm a de p a rtic ip a ç ã o do E sta d o -M e m b ro e dos
M u n ic íp io s, o m o d o d e e d iç ã o d o s ato s n o rm a tiv o s p a ra e x e c u ç ã o do
se rv iç o p ú b lic o e, so b re tu d o , q u em c o n g re g a a fig u ra d o P o d e r
C o n c e d e n te : a in stâ n c ia e x e cu tiv a, a in s tâ n c ia c o le g ia d a o u am bas.
R e p is a -se q u e u m d o s o b je tiv o s d a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a é
ju s ta m e n te c o n c e n tra r em u m a ú n ic a in stitu iç ã o ju ríd ic a o P o d e r
C o n c e d e n te , d e m o d o a fa c ilita r a p re sta ç ã o d o se rv iç o p ú b lic o , tra z e n d o
s e g u ra n ç a ju ríd ic a e g a n h o s e c o n ô m ic o s d e escala.
A in d a q u e te n h a o c o rrid o a n te rio rm e n te à e d iç ã o d o E s ta tu to d a
M e tró p o le , o ju lg a m e n to d a A D I 1 8 4 2 /R J p e lo S u p rem o T rib u n al
F e d e ra l tro u x e p a râ m e tro s im p o rta n te s so b re a e stru tu ra e g o v e rn a n ç a d a
re g iã o m e tro p o lita n a e m ic ro rre g iã o , d e fo rm a q u e in flu i a tu a lm e n te n a
an á lise d as re g iõ e s leg ais.
P au lo M o d e sto 16, ao analisar o acórdão p ro ferid o n o âm b ito da
A D I 1842/R J, extraiu alg u m as q uestões q u e m ere cem o dev id o destaque,

15 Art. 2° Para os efeitos desta Lei, consideram-se:


(...)
II - função pública de interesse comum: política pública ou ação nela inserida cuja
realização por parte de um Município, isoladamente, seja inviável ou cause impacto em
Municípios limítrofes;
16 MODESTO, Paulo. Região Metropolitana, Estado e Autonomia Municipal: a
governança interfederativa em questão. Disponível em: http://www.direitodoestado.co

446
q u an to a d iscu ssão acerca d a co m p o sição do co n selh o d ireto r d a R eg ião
M etro p o litan a e su a governança, v isto que, diferente d e outros tem as
ab ordados, este re su lto u em co n tro v érsia p eran te os m in istro s do T ribunal.
O M in istro N e ls o n Jo b im , em seu v o to n a A D I 1842, su b lin h o u
q u e o E s ta d o te ria a p e n a s o p ap e l d e in s titu ir a re g iã o m etro p o lita n a ,
ex e rc e n d o , p o rta n to , c o m p e tê n c ia m e ra m e n te p ro c e d im e n ta l, n ão
d ev e n d o , à v is ta d isso , p a rtic ip a r d o c o n se lh o d e lib e ra tiv o , p o is te ria o
M u n ic íp io e ssa c o m p e tê n c ia p a ra tra ta r d as fu n ç õ e s a d m in istra tiv a s e
e x e c u tiv a s d a re g iã o m e tro p o lita n a e d e te rm in a r seu m o d o d e e x e rcício .
E m co ntrapartida, n a in terp retação constitucional d isp en sad a pelo
M in istro G ilm a r M endes, exp ressam en te d estacad a n a em en ta d o acórdão
d a A D I 1842, o in teresse co m u m se esten d ería co n ju n tam en te aos E stad o s
e aos m u n icíp io s d o ag ru p am en to urbano, m o tiv a n d o o co n h ecim en to d e
seu p o d er co n ced en te e d a titu larid ad e do serviço ao colegiado.
P a ra G ilm a r M e n d e s, o E sta d o fe d e ra d o , n e sta o rg a n iz a ç ã o ,
se ria im p re sc in d ív e l d e m o d o a a tu a r co m o re p re se n ta n te d a q u e le s
m u n ic íp io s q ue, m e sm o n ã o c o m p o n d o a re g iã o , p o ssa m se r d e a lg u m a
fo rm a a fe ta d o s:

Parece-me, portanto, que a gestão compartilhada das novas


regiões, previstas no art. 25, § 3°, da CF, entre os
Municípios e o Estado, é a solução que melhor se
harmoniza com a preservação da autonomia local e a
imprescindível atuação do ente instituidor como
coordenador das ações que envolvam o interesse comum
de todos os integrantes do ente regional.

O S u p rem o T rib u n a l F e d e ra l d e c id iu ser n e c e ssá ria a


p a rtic ip a ç ã o d o E sta d o n o c o le g ia d o d irig en te. E n tre ta n to , fa lh o u em
d e te rm in a r e x p re ssa m e n te o m o d e lo d e g o v e rn a n ç a q u e as re g iõ e s
m e tro p o lita n a s d e v e ria m adotar.

m.br/colunistas/paulo-modesto/regiao-metropolitana-estado-e-autonomia-municipal-
a-governanca-interfederativa-em-questao. Acesso em: 08 abr. 2021.

447
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

D ia n te d isso , é v á lid o re s sa lta r a p o siç ã o d o p ro fe s s o r P a u lo


M o d e s to p o r su a fu n d a m e n ta l re fle x ã o q u a n to a o d e c isu m ex p o sto :

Admitir ou mesmo exigir a participação necessária do


Estado, ou dos Estados envolvidos, no Conselho Dirigente
do organismo administrativo metropolitano, é proposta
tendente a abolir, em concreto, a autonomia municipal.
Afinal, o veículo que formata o processo decisório e o peso
relativo das entidades integrantes da região metropolitana
é a lei complementar estadual, o que pode permitir
alquimia política suficiente para o Estado controlar - com
a adesão de poucos municípios - um conjunto amplo de
unidades políticas municipais ou, mais precisamente, os
seus serviços fundamentais.

E s ta n ã o p a re c e se r a so lu ç ã o q u e m e lh o r se c o a d u n a co m a
p ro p o s ta co n stitu c io n a l, em q u e p e se a re ssa lv a q u e a p o n ta p a ra o risc o
d e fra g m e n ta ç ã o d o s p ro c e sso s d e lib e ra tiv o s, e p o ssív e l fra g ilid a d e
in s titu c io n a l d as re g iõ e s m e tro p o lita n a s e a té m e sm o su a c o lisã o co m os
o b je tiv o s d a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a in stitu íd a p e lo P o d e r P ú b lic o .
C o n tu d o , no â m b ito da ADI 184 2 /R J, n o ta d a m e n te na
fo rm u la ç ã o d o v o to d o M in istro G ilm a r M e n d e s, p re v a le c e u a p o siç ã o
q u e e n te n d e m o s d isp e n sa r so lu ç ã o m a is a d e q u a d a n a p e rsp e c tiv a do
m o d e lo co n stitu c io n a l, p re se rv a n d o a p o ssib ilid a d e d e p a rtic ip a ç ã o do
E s ta d o n a g o v e rn a n ç a d a re g iã o m e tro p o lita n a , d e fo rm a c o m p a rtilh a d a ,
g u a rd a n d o -s e as p e c u lia rid a d e s d e c a d a lo calid ad e .
A o d isp e n sa r in te rp re ta ç ã o às c lá u su la s c o n s titu c io n a is do
m o d e lo d e fe d e ra lism o d e c o o p e ra ç ã o q u e p e rm ite , e fe tiv a m e n te , a
p a rtic ip a ç ã o d o s e n te s d e m a n e ira a p re s tig ia r a g o v e rn a n ç a em fu n ç ã o
d o in te re ss e c o m u m co m v ista s à re g io n a liz a ç ã o , o S u p re m o n ã o d ito u
m o d e lo s n e m ta m p o u c o b a liz a s so b re seu c o n te ú d o , m a s e x p lic ito u
a p e n a s o c o n te ú d o m a te ria l d as n o rm a s c o n s titu c io n a is a tin e n te s à
re a liz a ç ã o d e o b je tiv o s p a c tu a d o s e n tre os e n tes d a fe d era ção .

448
A in d a assim , c o m o a p o n ta R o d rig o F e r r o 17, a p e sa r d a c ria ç ã o
do E s ta tu to da M e tró p o le e sta b e le c e r as d ire triz e s g e ra is de
o p e ra c io n a liz a ç ã o d as fu n ç õ e s p ú b lic a s d e in te re sse c o m u m em re g iõ e s
m e tro p o lita n a s, a lei fo i o m issa q u a n to a g e stã o e x c lu siv a d e fu n ç õ e s
p ú b lic a s de in te re sse co m u m , a fo rm a de in te g ra ç ã o e de
c o m p a tib iliz a ç ã o d o s p la n o s seto ria is co m os p la n o s d ire to re s e co m o
P la n o d e D e se n v o lv im e n to U rb a n o In te g ra d o , c o m p ro m e te n d o em m u ito
a b o a g o v e rn a n ç a in te rfe d e ra tiv a .

4 .2 A f a lt a d e s is te m á tic a d e G o v e r n a n ç a d a s R e g iõ e s L e g a is n o
N o v o M a r c o L e g a l d o S a n e a m e n to B á sic o

A p ro m u lg a ç ã o d o N o v o M a rc o L e g a l d o S a n e a m e n to B á sic o
tro u x e m u d a n ç a s sig n ific a tiv a s n o o rd e n a m e n to ju ríd ic o c o m o : (i) a
a b e rtu ra de m a io r e sp a ç o p a ra os c o n tra to s de c o n c e ssã o e a
o b rig a to rie d a d e d e lic ita ç ã o , p ro ib in d o -se a u tiliz a ç ã o d o s c o n tra to s de
p ro g ra m a , (ii) o in c e n tiv o à p re sta ç ã o re g io n a liz a d a co m a in tro d u ç ã o
d as u n id a d e s re g io n a is o u b lo c o s d e m u n ic íp io s e (iii) a c ria ç ã o d e u m
m a rc o re g u la tó rio co m u m , p o r m e io d a ed iç ã o d e n o rm a s re fe re n c ia is
p e la A g ê n c ia R e g u la d o ra F e d e ra l.
C o m o u m de seus eixos p rincipais é a p restação re g io n alizad a do
serviço d e san eam ento básico, n o q ual se co ncede ao p artic u la r a sua
execução, o N o v o M arco L egal v isa d im in u ir a q u an tid ad e d e M u n icíp io s
p o r m eio de su a co n cen tração em u m a estru tu ra ju ríd ic a e ad m in istrativ a
com a tran sferê n cia d e ex ecu ção ao setor eco n ô m ico priv ad o .
N o e n tan to , q u e stõ e s fu n d a m e n ta is ao d e se n v o lv im e n to e
e x e c u ç ã o d e ste m o d e lo d e c o n c e ssã o r e g io n a liz a d a re sta ra m o m issa s n a
n o v a le g is la ç ã o .

17 FERRO, Rodrigo Rage; SALEME, Edson Ricardo. A fragmentação do poder e a


complexidade de governar nas regiões metropolitanas. Revista Brasileira de Estudos
Urbanos e Regionais, v. 22, 2020.

449
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

E n tre elas, d e sta c a -se a fa lta d e d isp o siç ã o n o rm a tiv a a re sp e ito


d e so b re q u em e c o m o se rá e n c a ra d a a fig u ra d o p o d e r c o n c e d e n te p ela
re g iã o leg al.
C o m efeito , a c o n c e ssã o p e la re g iã o c ria d a p o r lei d a e x e c u ç ã o
d o s se rv iç o s d e sa n e a m e n to o c o rre p o r m e io d a fig u ra d o p o d e r
c o n c e d e n te . O q u e n ã o e stá d e fin id o é se serão os e n tes fe d e ra d o s em
c o n ju n to q u e c o m p õ e m a re g iã o c ria d a p o r lei o u se as su as e stru tu ra s d e
g o v e rn a n ç a é q u e a ssu m irã o a fig u ra d o p o d e r co n c ed en te.
C a s o a re s p o sta seja p o r e sta ú ltim a p o ssib ilid a d e , in d a g a -se
q u ais seria m as e stru tu ra s q u e fic a ria m c o m a in c u m b ê n c ia d e a ssu m ir a
fig u ra d o p o d e r co n c ed en te.
R e p is a -se que, nos c a so s d as re g iõ e s m e tro p o lita n a s e
a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s, o E sta tu to d a M e tró p o le p re v ê, em seus a rtig o s
7° e 8°, a o rg a n iz a ç ã o e fu n c io n a m e n to d e ssa e stru tu ra In te rfe d e ra tiv a :
p o r m e io d e in stâ n c ia e x e c u tiv a c o m p o sta p e lo s re p re se n ta n te s d o P o d e r
E x e c u tiv o d o s e n tes fe d e ra tiv o s in te g ra n te s d as u n id a d e s te rrito ria is
u rb a n a s; in s tâ n c ia c o le g ia d a d e lib e ra tiv a co m re p re se n ta ç ã o da
so c ie d a d e civil; o rg a n iz a ç ã o p ú b lic a co m fu n ç õ e s té c n ic o -c o n su ltiv a s; e
siste m a in te g ra d o d e a lo c a ç ã o d e re c u rso s e d e p re sta ç ã o d e contas.
A ssim , n ã o se sab e ao ce rto se se ria a in s tâ n c ia e x e c u tiv a o u a
d e lib e ra tiv a a c o rre ta p a ra a ssu m ir a fig u ra d o p o d e r co n c ed en te.
A lé m d isso , h á o u tra g ra v e o m issã o q u e re m a n e sc e c a so se
d e c id a q u em se rá o p o d e r c o n c e d e n te d a re g iã o c ria d a p o r lei: d e q u e
fo rm a será o p ro c e sso d e e sc o lh a d e v o n ta d e d o re p re se n ta n te d a re g iã o
c ria d a p o r le i18.
O N ovo M a rc o L eg a l do S a n e a m e n to B á s ic o d e ix a de
d isc ip lin a r, p o r ex e m p lo , asp e c to s e sse n c ia is so b re a g o v e rn a n ç a d as
re g iõ e s cria d as p o r lei c o m o a d e fin iç ã o a c e rc a d o v o to p a ritá rio

18 ALVES, Alaôr Caffé. Regiões Metropolitanas, Aglomerações Urbanas e


Microrregiões: Novas Dimensões Constitucionais da Organização do Estado
Brasileiro. Temas de Direito Ambiental e Público, São Paulo, Ano II, n° 3, p. 13-44.

450
m u n ic ip a l p a ra d e fin ir q u e stõ e s re le v a n te s so b re o p ro je to d e co n c e ssã o ,
c o m o serão d irim id a s q u e stõ e s c o n tro v e rsa s e n tre os p a rtic ip a n te s ou,
ain d a, se o s e n tes fe d e ra d o s p o d e rã o fis c a liz a r e p a rtic ip a r d a e x e c u ç ã o
d o c o n tra to d e c o n c e ssã o .
E m o u tras p a la v ra s, a fo rm a d e g o v e rn a n ç a n ã o foi d e lim ita d a .
A lém disso, co n fo rm e ab o rd ad o an terio rm en te, o E sta tu to d a
M e tró p o le e o S u p re m o T rib u n al F ed eral ta m b é m n ã o an a lisa ram so b re o
co n teú d o e a d isc ip lin a n o rm a tiv a d e g estã o d a e stru tu ra ad m in istrativ a,
re sta n d o c o n tro v e rsa u m a fo rm a c o m p le x a d e g o v e rn a n ç a q u e v is a tra z e r
p la n e ja m e n to n a ex e cu çã o de d eterm in a d o s serv iço s p ú b lico s sem que
v io le o p a c to fe d e ra tiv o - cláu su la p é tre a em n o sso o rd e n a m e n to ju ríd ico .
P o rta n to , in c e n tiv a r a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a co m v is ta s à
c o n c e ssã o c o m o d ire triz fu n d a m e n ta l d o se rv iç o d e sa n e a m e n to b á sic o
sem q u e se a v a n ç a sse em te m a s im p o rta n te s so b re a e stru tu ra e
g o v e rn a n ç a d as re g iõ e s c ria d a s p o r lei, g e ra u m e sp a ç o d e in c e rte z a q u e
p o d e rá se c h o c a r co m o p a c to fe d era tiv o .

4 .3 O s im p a c to s a d v in d o s d a e x c lu s ã o d o c o n t r a t o d e p r o g r a m a e a
lim ita ç ã o à a u to n o m i a f e d e r a tiv a

U m d o s e ix o s c e n tra is d o N o v o M a rc o L e g a l d o S a n e a m e n to
B á sic o , e s ta m p a d o so b re tu d o p e lo a rtig o 10 d a L e i 1 1 .4 4 5 /2 0 07, re sid e
n a c o n c e n tra ç ã o d e titu la rid a d e s n a fig u ra d as re g iõ e s le g a is o u g estã o
a ss o c ia d a p a ra tra n sfe rir, p o r m e io d e co n c e ssã o , a p re sta ç ã o dos
se rv iç o s ao s p a rtic u la re s.
A lé m d o fa to de se p rio riz a r a co n c e ssã o , p ro ib iu -se a
c e le b ra ç ã o d e c o n tra to d e p ro g ra m a , u m a fo rm a e sp e c ífic a d e g estã o
a ss o c ia d a p re v ista in ic ia lm e n te n a L e i 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , q u e p e rm itia a
tra n s fe rê n c ia d a e x e c u ç ã o d o s se rv iç o s d e s a n e a m e n to b á s ic o p a ra o u tro
en te fe d e ra tiv o , isto é, a e x e c u ç ã o p e rm a n e c e n o â m b ito p ú b lico .

451
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

O m o tiv o d e su a a lte ra ç ã o se deu, so b re tu d o , p o r su p o sta m e n te


a tra p a lh a r a liv re c o n c o rrê n c ia , j á q u e o c o n tra to d e p ro g ra m a p re sc in d e
d a re a liz a ç ã o d e lic ita ç ã o :

Em suma, a gestão associada, em que pese reverenciada


pelo sistema inicial da Lei 11.445/2007, parece ter
constituído mais em uma estratégia para justificar, em
termos jurídicos e legais, a dispensa de licitação entre o
titular do serviço e a empresa estatal de saneamento básico
controlada por outro ente federativo. Novamente, mais uma
ferramenta à disposição • da estatização do setor de
saneamento básico, em detrimento das suas potencialidades
de promoção de eficiências atrativas do capital privado, de
modo a enfeixar as concessões regionais19.

N o e n tan to , a n o sso v er, o fim d o s c o n tra to s d e p ro g ra m a


c o n tra ria um dos o b je tiv o s c e n tra is do N ovo M a rc o L eg a l de
S a n e a m e n to B á sic o , q u e é a p re sta ç ã o re g io n a liz a d a .
C o m efeito , o c o n tra to d e p ro g ra m a p e rm ite p o r em p rá tic a a
ló g ic a d o su b síd io cru zad o , n o qual as e m p re sa s esta d u a is são ca p aze s
d e m a n te r a m e s m a ta rifa p a ra to d o s os m u n ic íp io s aten d id o s.
A ssim , as c o m p a n h ia s u tiliz a m as re c e ita s a d v in d a s d as áreas
co m m a io re s a rre c a d a ç ã o e in v e ste m as so b ra s d e sse s re c u rso s n o s
m u n ic íp io s m en o re s.
A lé m d isso , c o n sid e ra -se a in d a m a is g ra v e a p ro ib iç ã o do
c o n tra to d e p ro g ra m a , p o is v io la a a u to n o m ia m u n ic ip a l d e u m a fo rm a
e x o rb ita n te , j á q u e a fa sta a p o ssib ilid a d e d o M u n ic íp io m a n te r n o â m b ito
d a e x e c u ç ã o p ú b lic a o se rv iç o d e sa n e a m e n to b á sic o , u m a v e z q u e só é
p o ssív e l a tu a lm e n te p re sta r d ire ta m e n te o u c o n c e d e r o serviço. *1

19 VANZELLA, Rafael Domingos Faiardo, e BORGES, Jéssica Suruagy Amaral: Notas


sobre a Prestação Regionalizada dos Serviços Públicos de Saneamento Básico. In: DAL
POZZO, Augusto Neves (coord.). Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico.
1. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil. 2020. p. 226 e 227.

452
5 CONCLUSÃO

C o m o tiv em o s a o p o rtu n id ad e de verificar, o n o v o M arco L egal


do S an eam en to B á sic o v isa, d entre outros objetivos, in cen tiv ar a p restação
re g io n alizad a a p artir d a criação de n o vos institutos ju ríd ic o s p a ra este fim:
b lo co de re ferên cia e u n id ad e regional de san eam en to básico.
N o e n tan to , n o p la n o fe d e ra tiv o , h o u v e o c o m p le to d e sa rra n jo
d a c o o p e ra ç ã o c o n stitu c io n a l e n tre os e n tes fe d e ra d o s, b a liz a d a p e lo
p la n e ja m e n to estata l, re sta n d o , n a p rá tic a, a c o n c e ssã o c o m o ú n ic a
a lte rn a tiv a ao s M u n ic íp io s.
In s is ta -se q u e su p rim ir d e u m e n te fe d e ra d o a p o ssib ilid a d e de
c e le b ra r u m a re la ç ã o co n tra tu a l co m o u tro e n te d a fe d e ra ç ã o v io la
fro n ta lm e n te o p a c to fe d e ra tiv o e s ta b e le c id o p e la C o n stitu iç ã o F e d e ra l,
p o is, ao m e s m o te m p o , in frin g e a a u to n o m ia fe d e ra tiv a d o M u n ic íp io e
d e s in c e n tiv a a c o o p e raç ão .
P o rta n to , a e sc o lh a le g is la tiv a d e a te n d e r o p rin c íp io d a liv re
c o n c o rrê n c ia , em u m c o n te x to d e se rv iç o p ú b lic o , p ro ib in d o o M u n ic íp io
d e e s ta b e le c e r re la ç ã o co n tra tu a l co m o u tro e n te fe d e ra d o la n ç a d ú v id a s
so b re a c o n s titu c io n a lid a d e d o m o d e lo ad o tad o .

R E F E R Ê N C IA S

A L V E S , A la ô r C affé. R e g iõ e s m e tro p o lita n a s, a g lo m e ra ç õ e s u rb a n a s e


m ic ro rre g iõ e s: n o v a s d im e n sõ e s c o n s titu c io n a is d a o rg a n iz a ç ã o do
E s ta d o b ra sile iro . R e v is ta d a P r o c u r a d o r i a G e r a l d o E s ta d o d e S ão
P a u lo , ed iç ã o e sp e cial em c o m e m o ra ç ã o aos, v. 10, 1998.

D A L P O Z Z O , A u g u sto N eves. N o v o M a r c o R e g u la tó rio d o S a n e a m e n to


B ásico . 1a edição. São P aulo: T h o m so n R eu ters B rasil. 2020.

453
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

F E R R O , R o d rig o R a g e ; S A L E M E , E d so n R ic a rd o . A fra g m e n ta ç ã o do
p o d e r e a c o m p le x id a d e d e g o v e rn a r n a s re g iõ e s m e tro p o lita n a s. R e v is ta
B r a s i l e i r a d e E s tu d o s U r b a n o s e R e g io n a is . v. 22, 2020.

M E N C IO , M a ria n a . C o n só rc io s p ú b lic o s e re g iã o m etro p o lita n a .


E n c ic lo p é d ia j u r í d i c a d a P U C -S P . C elso F e rn a n d e s C a m p ilo n g o ,
A lv a ro d e A z e v e d o G o n z a g a e A n d ré L u iz F re ire (c o o rd s.). T om o:
D ire ito A d m in istra tiv o e C o n stitu c io n a l. V id al S erran o N u n e s Jr.,
M a u ríc io Z o c k u n , C a ro lin a Z a n c a n e r Z o c k u n , A n d ré L u iz F re ire (coord.
d e to m o ). 1. ed. S ão P a u lo : P o n tifíc ia U n iv e rsid a d e C a tó lic a d e S ão
P a u lo , 2 0 1 7 . D isp o n ív e l em : h ttp s://e n c ic lo p e d ia ju rid ic a .p u c sp .b r/v e rb e
te /6 1 /e d ic a o -1 /c o n so rc io s-p u b lic o s-e -re g ia o -m e tro p o lita n a .

N A V E S , R u b en s. Á g u a c r is e e c o n flito e m S ã o P a u lo . 1. E d. S ão P au lo :
V ia Im p re ssa , 2015.

S IL V A , Jo sé A fo n so da. C u r s o d e D ir e ito C o n s titu c io n a l P o s itiv o . 39.


ed. S ão P au lo : M a lh e iro s, 2016.

S IL V A , Jo sé A fo n so da. D ir e ito U r b a n ís tic o B r a s ile ir o , 7. ed. S ão


P au lo : M a lh e iro s, 2015.

S E R R A N O , P e d ro E ste v a m A lv e s P in to . R e g iã o M e t r o p o l i t a n a e se u
r e g im e c o n s titu c io n a l. V e rb a tim , 2009.

454
CONTROLE SOCIAL DAS PPPs CONTRATADAS E O
NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO BÁSICO

S érg io S ilv e ira B a n h o s *


D a n ie l C a stro G o m e s d a C osta*

S U M A R IO : 1 In tro d u ç ã o . 2 C o n tro le S ocial d as P P P s c o n tra ta d a s com


b a s e n o p e rm is siv o c o n tid o n o art. 11-A , d a L e i n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , in c lu íd o
p e la L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , q u e in stitu iu o N o v o M a rc o L e g a l do
S a n e a m e n to B á sico . 3 C o n clu sõ es.

1 IN T R O D U Ç Ã O

A p ó s a p ro v a ç ã o d o P la n o d e 1977 (M a r del P la ta , 1977) e d a


A g e n d a 21 G lo b al (R io d e Jan e iro , 1992), a O rg a n iz a ç ã o d as N a ç õ e s
U n id a s (O N U ), em 2 0 1 0 , p o r m e io d a R e so lu ç ã o 6 4 /A /R E S /6 4 /2 9 2 ,
d e fin iu o a c e sso à á g u a p o tá v e l e ao e sg o ta m e n to sa n itá rio co m o
“ c o n d iç ã o p a ra o g o z o p le n o d a v id a e d o s d e m a is d ire ito s h u m a n o s ” .
A ssim , c o n sta ta -se que, n o p la n o in te rn a c io n a l, d e sd e a d é c a d a
d e 1970, são d isc u tid a s m e d id a s q u e p e rm ita m g a ra n tir ac e sso a u m a
p ro v is ã o m ín im a d e á g u a p o tá v e l e ao sa n e a m e n to b á s ic o a d e q u a d o e
e q u ita tiv o p a ra to d o s. N e s s a m e sm a d éc ad a, in stitu iu -se , n o B ra sil, o
P la n o N a c io n a l d e S a n e a m e n to (P L A N A S A )1, c ria n d o d ire triz e s de

*Pós-doutor em Direito pela Universidade de Coimbra. Doutor e Mestre pela Pontifícia


Universidade Católica de São Paulo. Ministro do Tribunal Superior Eleitoral.
Subprocurador-Geral da Procuradoria-Geral do Distrito Federal. Advogado.
* Pós-doutor em Direito pela Universidade de Coimbra. Doutor e Mestre pela
Universidade Autónoma de Lisboa. Desembargador Eleitoral do Tribunal Regional
Eleitoral de Mato Grosso do Sul. Advogado.
1 O Decreto-Lei n° 949, de 13 de outubro de 1969, autorizou o extinto Banco Nacional
de Habitação (BNH) a aplicar recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
(FGTS) no custeio do saneamento. BRASIL. Decreto-Lei n° 949, de 13 de outubro
de 1969. Dispõe sobre aplicações de recursos pelo BNH nas operações de

455
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

im p le m e n ta ç ã o , m e d id a s e in fra e stru tu ra s p a ra os re fe rid o s serv iço s, os


q u ais, até en tão , eram p re sta d o s b a sic a m e n te d e fo rm a in d iv id u a l e
fis c a liz a d o s p e lo s m u n ic íp io s p o r m e io d e aç õ es d e v ig ilâ n c ia san itária.
O P L A N A S A in a u g u ro u u m im p o rta n te p ro c e sso d e tra n siç ã o
n o se to r d e sa n e a m e n to n o país. E m b o ra n ã o te n h a c o n se g u id o a tin g ir
a lg u m a s d as m e ta s in ic ia lm e n te p ro p o sta s, ta m p o u c o a lc a n ç a d o a
u n iv e rs a liz a ç ã o d o a c e sso ao s serv iço s, fo i c a p az d e a m p lia r a c o b e rtu ra
d e fo rm a b a s ta n te sig n ificativ a.
A lém disso, o P L A N A S A - ao in stitu ir p o lítica cen tralizan d o os
em p réstim o s do antigo B an co N acio n al d a H a b itaç ão (B N H ), com recursos
do F u n d o d e G a ran tia do T em p o d e S erviço (F G T S ), nas em presas públicas
ou so cied ad es d e ec o n o m ia m ista, criadas pelo s E stad o s p a ra p restar
serviços aos m u n icíp io s - induziu a p ro liferação das co m p an h ias estaduais
de san eam en to b ásico o que, de certa form a, in ib iu as p o ssib ilid ad es de
p articip ação d a in iciativ a p riv ad a n o setor d e san eam en to e im p o rto u em
ex clu são san itária d e p arcela considerável d a população, resid en te em
lo calid ad es ru rais e em m u n icíp io s d e p eq u en o porte.
E x tin to o B N H , em 1986, e e n c e rra d o o P L A N A S A , em 1990,
e sta b e le c e u -s e u m v a z io n o rm a tiv o n o se to r q u e p e rd u ro u até o a n o d e
2 0 0 3 , co m a in stitu iç ã o d e u m M a rc o R e g u la tó rio d e a b ra n g ê n c ia
n a c io n a l, p o r m e io d a L e i n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , e d e u m P la n o N a c io n a l de
S a n e a m e n to B á s ic o (P L A N S A B ), a p ro v a d o p e la P o rta ria
In te rm in is te ria l n° 5 7 1 /2 0 1 3 *2. E m c o m p le m e n to , e d ito u -se a L e i n°

financiamento para Saneamento e dá outras providências. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/1965- 1988/Del0949.htm#:~:text=1
%C2%BA%20Fica%20o%20Banco%20Nacional,13%20de%20setembro%20de%20
1966. Acesso em: 27 maio 2021.
Mais adiante, em 1971, com suporte financeiro do Sistema Financeiro do Saneamento
(SFS), instituiu-se o Plano Nacional de Saneamento (PLANASA), com as atribuições
de planejar a concepção e execução dos serviços de saneamento em nível nacional.
2 Conforme levantamento realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), no
ano de 2018, observou-se que, em não havendo maiores aportes financeiros, a
universalização dos serviços de saneamento básico seria alcançada, na melhor das
hipóteses, apenas após 2050, ou seja, com quase vinte anos de atraso em relação às

456
1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 , a tu a liz a n d o o m a rc o leg al d o sa n e a m e n to b á sic o , te n d o
com o um d o s eix o s p rin c ip a is a a m p lia ç ã o d as p o ssib ilid a d e s de
p a rtic ip a ç ã o d a in ic ia tiv a p riv a d a n o setor. B u sc o u -se , assim , a p rim o ra r
os in d ic a d o re s d e c o b e rtu ra d e s a n e a m e n to b á sic o , q u e co n tin u a v a m
m u ito a q u é m d o d ese já v el.
A p a rtir d e sse d ip lo m a le g a l3, p a sso u -se a p e rm itir q u e os
se rv iç o s p re s ta d o s p e la s e m p re sa s e sta d u a is d e sa n e a m e n to - cu jo s
c o n tra to s d e p ro g ra m a te n h a m sid o re g u la rm e n te firm a d o s co m os
m u n ic íp io s - sejam o b je to d e p a rc e ria p ú b lic o -p riv a d a d e lo n g o prazo ,
tid a c o m o u m m e io e fic a z p a ra m e lh o ria d o s n ív e is d e c o b e rtu ra de
e sg o ta m e n to sa n itá rio e d e su ste n ta b ilid a d e am b ien tal.
A n te a im p o rtâ n c ia e s e n sib ilid a d e d o se to r em q u estão , é
in d isp e n sá v e l q u e a fo rm u la ç ã o d as p o lític a s p ú b lic a s e as d e c isõ e s com
elas re la c io n a d a s, to m a d a s n o â m b ito d a A d m in istra ç ã o P ú b lic a , sejam
s u b m e tid a s a o c o n tro le so cial, o p e ra c io n a liz a d o p o r m e io d e au d iê n c ia s

metas do PLANSAB, e que, para o atingimento das metas previstas no plano, os


investimentos deveriam ser aumentados em 62%. ABAR. Desafios e Soluções para a
Universalização do Esgotamento Sanitário no Brasil. 2019. p. 10. Disponível em:
http://abar.org.br/?mdocs-file=55102. Acesso em: 04 out. 2020.
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Regional. Secretaria Nacional de
Saneamento - SNS. Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento: 24°
Diagnóstico dos Serviços de Água e Esgotos - 2018. Brasília: SNS/MDR, 2019. p. 13,
58- 59. Disponível em: http://www.snis.gov.br/downloads/diagnosticos/ae/2018/Diag
nostico_AE2018.pdf. Acesso em: 04 out. 2020.
3 Art. 11-A. Na hipótese de prestação dos serviços públicos de saneamento básico por
meio de contrato, o prestador de serviços poderá, além de realizar licitação e
contratação de parceria público-privada, nos termos da Lei n° 11.079, de 30 de
dezembro de 2004, e desde que haja previsão contratual ou autorização expressa do
titular dos serviços, subdelegar o objeto contratado, observado, para a referida
subdelegação, o limite de 25% (vinte e cinco por cento) do valor do contrato. BRASIL.
Lei n° 11.445, de 5 de janeiro de 2007. Estabelece as diretrizes nacionais para o
saneamento básico; cria o Comitê Interministerial de Saneamento Básico; altera as Leis
nos 6.766, de 19 de dezembro de 1979, 8.666, de 21 de junho de 1993, e 8.987, de 13
de fevereiro de 1995; e revoga a Lei n° 6.528, de 11 de maio de 1978.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-
2010/2007/Lei/L11445.htm#art11a.0. Acesso em: 04 out. 2020.

457
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

e c o n su lta s p ú b lic a s. S u rg em en tã o a lg u m a s d ific u ld a d e s re la c io n a d a s à


n o rm a a p licá v el e à fo rm a c o m o d ev e se d a r o a te n d im e n to d e ssa
e x ig ên c ia, u m a v e z que:

a) A L e i n° 1 1 .0 7 9 /2 0 0 4 , q u e in stitu iu n o rm a s g e ra is p a ra
lic ita ç ã o e c o n tra ta ç ã o d e p a rc e ria p ú b lic o -p riv a d a n o â m b ito
da A d m in istra ç ã o P ú b lic a , p re v ê , no art. 10, V I, a
n e c e s s id a d e d e q u e a m i n u t a d e e d ita l e d e c o n t r a t o s e ja m
s u b m e tid a s à c o n s u lta p ú b lic a , m e d ia n te p u b lic a ç ã o n a
i m p r e n s a o fic ia l, em jo rn a is d e g ra n d e c irc u la ç ã o e p o r m e io
e le trô n ic o , que d e v e rá in fo rm a r a ju s tific a tiv a p a ra a
co n tra ta ç ã o , a id e n tific a ç ã o d o o b jeto , o p ra z o d e d u ra ç ã o do
c o n tra to e seu v a lo r estim a d o , fix a n d o -se p ra z o m ín im o d e 30
(trin ta ) d ias p a ra re c e b im e n to d e su g estõ es, c u jo te rm o d a r-se -
á p e lo m e n o s 7 (se te ) d ias a n tes d a d a ta p re v ista p a ra a
p u b lic a ç ã o d o e d ita l;
b) A L e i n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 (a lte ra d a p e la L e i n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 ) , q u e
e s ta b e le c e as d ire triz e s n a c io n a is p a ra o s a n e a m e n to b á sic o ,
d isp õ e, n o art. 11, IV , q u e a r e a liz a ç ã o p r é v ia d e a u d iê n c ia
e d e c o n s u lta p ú b lic a s s o b r e o e d ita l d e lic ita ç ã o , n o c a so de
co n c e ssã o , e so b re a m in u ta d o co n tra to , c o n s titu i c o n d iç ã o
d e v a lid a d e dos c o n tra to s que te n h a m p o r o b je to a
p r e s ta ç ã o d e s e rv iç o s p ú b lic o s d e s a n e a m e n to b á s ic o ;
c) A L e i n° 8 .6 6 6 /1 9 9 3 , q u e in stitu i n o rm a s p a ra lic ita ç õ e s e
co n tra to s d a A d m in istra ç ã o P ú b lic a , p re v ê , em seu art. 39,
q ue, se m p re q u e o v a l o r e s tim a d o p a ra u m a lic ita ç ã o o u p a ra
um c o n ju n to d e lic ita ç õ e s sim u ltâ n e a s o u su c e ssiv a s fo r
s u p e r io r a 100 (c e m ) v e z e s o lim ite p r e v is to n o a r t . 23, I,
a lín e a “ c ” , d a m e sm a L ei, q u e é d e R $ 1 .5 0 0 .0 0 0 ,0 0 (u m
m ilh ã o e q u in h e n to s m il re ais), o p ro c e s s o lic ita tó r io s e r á
in ic ia d o , o b rig a to ria m e n te , c o m u m a a u d iê n c ia p ú b lic a
c o n c e d id a p e la a u t o r i d a d e r e s p o n s á v e l c o m a n te c e d ê n c ia

458
m ín im a d e 15 (q u in z e ) d ia s ú te is d a d a t a p r e v is t a p a r a a
p u b lic a ç ã o d o e d ita l, e d iv u lg a d a , co m a a n te c e d ê n c ia
m ín im a d e 10 (d e z) d ia s ú te is d e su a re a liz a ç ã o , p e lo s m e sm o s
m e io s p re v isto s p a ra a p u b lic id a d e d a lic ita ç ã o , à q ual te rã o
a c e sso e d ire ito a to d a s as in fo rm a ç õ e s p e rtin e n te s e a se
m a n ife sta r to d o s os in te re ss a d o s ; e
d) A L e i n° 1 4 .1 3 3 /2 0 2 1 4, em v ig o r d esd e o d ia 1° d e abril de
2 0 2 1 , tra z em seu art. 21 f a c u l d a d e n o s e n tid o d e q u e a
A d m i n i s tr a ç ã o (i) c o n v o q u e a u d iê n c ia p ú b lic a , p re se n c ia l
o u à d istâ n c ia , n a fo rm a e le trô n ic a , so b re lic ita ç ã o q u e
p re te n d a re a liz a r, co m d isp o n ib iliz a ç ã o p ré v ia d e in fo rm a ç õ e s
p ertin e n te s, in c lu siv e de estu d o té c n ic o p re lim in a r e
e le m e n to s do ed ital d e lic ita ç ã o , co m p o ssib ilid a d e de
m a n ife sta ç ã o d e to d o s os in te re ssa d o s; e (ii) s u b m e t a a
lic ita ç ã o a p r é v ia c o n s u lta p ú b lic a , m e d ia n te a
d is p o n ib iliz a ç ã o d e seu s e le m e n to s a to d o s os in te re ssa d o s,
q u e p o d e rã o fo rm u la r su g e stõ e s n o p ra z o fix ad o . 4

4 Importante registrar que a Lei n° 14.133/2021, ao instituir novo regime geral de


licitações e contratações públicas, em substituição ao previsto na Lei n° 8.666/93,
previu regime de transição, indispensável para que o novo arquétipo seja cumprido de
modo proporcional, equânime e eficiente pela Administração, e sem prejudicar os
interesses gerais envolvidos, consubstanciado nas seguintes regras: (i) os contratos
firmados antes do dia 1°.04.2021 continuarão a ser regidos pela Lei n° 8.666/1993 (art.
190); (ii) decorridos 2 (dois) anos da publicação oficial da Lei, i.e., até o dia 1°.04.2023,
a Administração poderá optar por licitar ou contratar diretamente conforme o regime
pretérito, previsto na Lei n° 8.666/93, ou conforme o da legislação nova, devendo
indicar a opção escolhida, de forma expressa, no edital ou no aviso ou instrumento de
contratação direta, vedada a aplicação combinada dos dois regimes, formando um
híbrido (art. 191 c/c art. 193, II); (iii) a seção “Dos crimes e das Penas”, prevista na Lei
n° 8.666/1993, foi revogada a partir de 1°.04.2021 (art. 193, I); e (iv) as Leis n°
8.666/1993, Lei n° 10.520/2002, e os arts. 1° a 47-A, da Lei n° 12.462/2011 estarão
revogados em 1°.04.2023 (art. 193, II).

459
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

2 CONTROLE SOCIAL DAS PPPs CONTRATADAS COM BASE NO


PERMISSIVO CONTIDO NO ART. 11-A, DA LEI N° 11.445/2007,
INCLUÍDO PELA LEI N° 14.026/2020, QUE INSTITUIU O NOVO
MARCO LEGAL DO SANEAMENTO BÁSICO

In ic ia lm e n te , é im p e ra tiv o re g istra r q u e, em c o n tra ta ç ã o d e


p a rc e ria p ú b lic o -p riv a d a , a L e i n° 1 1 .0 7 9 /2 0 0 4 - n o rm a esp e cial
re la tiv a m e n te às L e is n° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 e n° 8 .6 6 6 /1 9 9 3 - n ã o ex ig e a
re a liz a ç ã o d e a u d iê n c ia p ú b lic a , m a s sim d e c o n su lta p ú b lic a , n o s te rm o s
d o art. 10, V I, d a re fe rid a L ei:

Art. 10. A contratação de parceria público-privada será


precedida de licitação na modalidade concorrência ou
diálogo competitivo, estando a abertura do processo
licitatório condicionada a: [...]
VI - submissão da minuta de edital e de contrato à consulta
pública, mediante publicação na imprensa oficial, em
jornais de grande circulação e por meio eletrônico, que
deverá informar a justificativa para a contratação, a
identificação do objeto, o prazo de duração do contrato,
seu valor estimado, fixando-se prazo mínimo de 30 (trinta)
dias para recebimento de sugestões, cujo termo dar-se-á
pelo menos 7 (sete) dias antes da data prevista para a
publicação do edital;5

D a le itu ra d a re fe rid a n o rm a , p e rc e b e -se q u e o p ro c e d im e n to


e sp e c ífic o p a ra a re a liz a ç ã o d e c o n su lta p ú b lic a , p re v isto n a L e i n°
1 1 .0 7 9 /2 0 0 4 , é b e m m a is a b ra n g e n te q u e o d a a u d iê n c ia p ú b lic a ,
e s ta b e le c id o n o art. 39, d a L e i n° 8 .6 6 6 /1 9 9 3 . P o d e -se in fe rir d a le itu ra
d o re fe rid o d is p o sitiv o leg al q u e o le g isla d o r, a o in s titu ir a c o n su lta
p ú b lic a , esc o lh e u su b stitu ir a a u d iê n c ia p ú b lic a a q u e alu d e o art. 39, d a

5 BRASIL, Lei n° 11.079, de 30 de dezembro de 2004. Institui normas gerais para


licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração
pública. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-
2006/2004/lei/l11079.htm. Acesso em: 27 maio 2021.

460
L ei n° 8 .6 6 6 /1 9 9 3 , p o r o u tro m e c a n ism o d e p a rtic ip a ç ã o social,
d ire c io n a d o ao m e sm o fim , p o ré m m a is co m p leto .
D e fa to , ao c o n trá rio d a a u d iê n c ia p ú b lic a p re v ista n a L ei G eral
d e L ic ita ç õ e s (L ei n° 8 .6 6 6 /1 9 9 3 ), o b rig a tó ria a p e n a s p a ra as lic ita ç õ e s
c u jo s v a lo re s su p erem u m d e te rm in a d o v a lo r m ín im o , a c o n su lta p ú b lic a
d a L e i d as P P P s (L ei n° 1 1 .0 7 9 /2 0 0 4 ) se a p lic a a to d a e q u a lq u e r lic ita ç ã o
p a ra a c o n tra ta ç ã o d e P P P , in d e p e n d e n te m e n te d o valo r.
A d e m a is, a e x ig ê n c ia d e p ré v ia d iv u lg a ç ã o d a s m in u ta s do
ed ital e d o co n tra to , p o r n ã o se e n c o n tra r tã o c la ra m e n te e x p re ssa n o art.
39, d a L ei n° 8 .6 6 6 /1 9 9 3 , n e m se m p re é o b se rv a d a . N o ca so d as c o n su lta s
p ú b lic a s, is s o n ã o ocorre.
N ã o b a sta sse , em c o n tra to s co m p le x o s, c o m o os d e p a rc e ria
p ú b lic o -p riv a d a , a d isp o n ib iliz a ç ã o a p e n a s d as m in u ta s d o ed ital e do
co n tra to , c o n fo rm e e x ig id o no art. 39, da L ei n° 8 .6 6 6 /9 3 ,
d e s a c o m p a n h a d o s d o s estu d o s q u e fu n d a m e n ta ra m a su a elab o raçã o ,
p o d e n ã o se r fa z e r su fic ie n te p a ra c o m p re e n sã o c rític a ad e q u ad a,
v a le n d o m e n c io n a r, ain d a, q u e a c o n su lta p ú b lic a d e v e p e rm a n e c e r
a b e rta p o r, n o m ín im o , 30 dias, p ra z o m u ito su p e rio r ao d a a u d iê n c ia
p ú b lic a d o art. 39, d a L e i n° 8 .6 6 6 /9 3 , d e a p e n a s u m dia.
D is c o rre n d o so b re o te m a , M a u ric io P o rtu g a l R ib e iro e L u c a s
N a v a rro P ra d o 6 re g istra m que:

ao adotar procedimento específico de consulta pública


para as PPPs, o inciso VI do art. 10 afastou a aplicação do
art. 39 da Lei 8.666/1993. Tanto a realização da audiência
pública prevista no art. 39 da Lei 8.666/1993 quanto o
procedimento de consulta pública têm o mesmo objetivo e
desempenham a mesma função, de maneira que não faria
sentido exigir a realização de ambos.

6 RIBEIRO, Mauricio Portugal; PRADO, Lucas Navarro. Comentários à Lei de PPP


- Parceria público-privada: Fundamentos econômico-jurídicos. São Paulo:
Malheiros, 2007. p. 266.

461
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

E m c o m p le m e n ta ç ã o , a d u z e m que:

o procedimento de consulta pública nos moldes previstos


na Lei de PPP apresenta, para casos tais, diversas
vantagens em relação à exigência de realização de
audiência pública nos termos do art. 39 da Lei 8.666/1993.
Como os contratos de PPPs são, em regra, contratos
complexos, somente a disponibilização das minutas ao
público por período de vários dias viabiliza entendimento
e crítica adequados.

E s s e e n te n d im e n to e c o a n a ju risp ru d ê n c ia , re p re se n ta d a , d e n tre
o u tro s, p e lo a c ó rd ã o p ro fe rid o p e la 7a C â m a ra d e D ire ito P ú b lic o do
T rib u n a l d e J u stiç a d e S ão P a u lo , em A ç ã o P o p u la r n a q ual se b u sc a v a
in v a lid a r convocação p a ra a u d iê n c ia p ú b lic a so b re c o n c e ssã o
a d m in istra tiv a , em p a rc e ria p ú b lic o -p riv a d a , in verbis:

AÇÃO POPULAR - Anulação de ato administrativo -


Consulta pública na Lei n° 9.666/93 - Inaplicabilidade -
Legislação específica da parceria público-privada - Lei n°
11.079/2004 - Sucumbência indevida - Ausência de
litigância de má-fé - Recurso parcialmente provido. [...]
Como bem fundamentado pelo magistrado sentenciante,
não se aplicam as audiências públicas como pretendido
pelo autor, ao menos na forma como preconizada pela
Lei de Licitações e Contratos. Por se tratar de
procedimento licitatório para concessão, na modalidade
parceria público-privada, há aplicação de lei especial,
onde não há referência à forma pretendida como pedido
exordial. Nos termos da legislação de regência, a
justificativa para contratação deve ser apresentada
concomitantemente e quando da submissão das minutas de
edital e de contrato. Nesse momento se faz a consulta
pública. Consta dos autos que a apelada realizou
audiência pública na forma prevista na lei específica
que regula o caso concreto, observando todas as
exigências prescritas na norma, o que afasta qualquer
alegação de invalidade ou ilegalidade do ato. [...] (TJ-SP -
APL: 00079695220138260506 SP 0007969-

462
52.2013.8.26.0506, Relator: Magalhães Coelho, Data de
Julgamento: 05/12/2016, 7a Câmara de Direito Público,
Data de Publicação: 07/12/2016).

C o m re la ç ã o à L ei n° 1 4 .1 3 3 /2 0 2 1 - q u e in stitu iu n o v o re g im e
d e lic ita ç õ e s e d e c o n tra ta ç õ e s p ú b lic a s, c o n v e rg e n te co m o a n te c e sso r
(L ei n° 8 .6 6 6 /1 9 9 3 ) - , v e rific a -s e q u e o art. 21, c a p u t e p a rá g ra fo ú n ico ,
fa c u lta à A d m in istra ç ã o a p o ssib ilid a d e d e c o n v o c a r a u d iê n c ia p ú b lic a
p a ra d is c u tir co m a so c ie d a d e os te rm o s d e ed ital d e lic ita ç ã o e de
s u b m e tê -lo a p ré v ia c o n su lta p ú b lica. N e s s a situ ação , a d e sv a n ta g e m do
m o d e lo g eral em c o m p a ra ç ã o à le g isla ç ã o esp e cial é a in d a m a is re le v a n te
e e x p lícita, p o r se tra ta r d e m e ra fa c u ld a d e , e n ã o m a is d e o b rig aç ão .
C u m p re re ssa lta r, to d a v ia , q u e o art. 11, IV , d a L ei n°
1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , e m b o ra p re v e ja a re a liz a ç ã o p ré v ia d e a u d iê n c ia e de
c o n s u lta p ú b lic a s, n ã o fa z q u a lq u e r re fe rê n c ia q u a n to ao s p ra zo s, à fo rm a
d e c o n v o c a ç ã o e ao p ro c e d im e n to , d ife rin d o -o s à re g u la m e n ta ç ã o , n o
c a so co n c reto , a c a d a ente, até em ra z ã o d as d iv e rsa s e sp e c ific id a d e s q u e
p e rm e ia m e sse tip o d e c o n tra taçã o .
Em sen d o assim , c o n sid e ra n d o a e sp e c ia lid a d e d a L ei n°
1 1 .0 7 9 /2 0 0 4 fre n te às L e is n o 8 .6 6 6 /1 9 9 3 , n° 14.13 3 /2 0 2 1 e n°
1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 , b e m c o m o a e v id e n te v a n ta g e m em re la ç ã o ao s re sp e c tiv o s
m o d e lo s, te m -s e q u e a le g itim a ç ã o social d o p ro c e sso d e c o n tra ta ç ã o de
p a rc e ria p ú b lic o -p riv a d a , n o s m o ld e s d a a u to riz a ç ã o c o n tid a n o art. 11-
A , d a L e i n.° 1 1 .4 4 5 /2 0 0 7 (in c lu íd o p e la L ei n° 1 4 .0 2 6 /2 0 2 0 ), e sta rá
re s g u a rd a d a a p a rtir d a re a liz a ç ã o d e c o n su lta p ú b lic a , n a fo rm a p re sc rita
n o art. 10, V I, d a L e i n° 1 1 .0 7 9 /2 0 0 4 .

3 CONCLUSÕES

As a u d iê n c ia s e c o n su lta s p ú b lic a s são im p o rta n te s


in s tru m e n to s d a c id a d a n ia p a rtic ip a tiv a , p e rm itin d o ao c id a d ã o o
e x e rc íc io d o c o n tro le e d a fisc a liz a ç ã o d as p o lític a s p ú b lic a s, q u e serão

463
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

m a te ria liz a d a s a p a rtir d as c o n tra ta ç õ e s d a A d m in istra ç ã o P ú b lic a.


T o d av ia , os d ip lo m a s le g a is que a b o rd a m a te m á tic a tê m sid o
fre q u e n te m e n te c o n tra sta d o s co m o o b je tiv o d e v e rific a r a su a ap lic a ç ã o
n o ca so co n creto .
D e n o ta r q u e a L e i n° 1 4 .1 3 3 /2 0 2 1 in tro d u z iu a p rim o ra m e n to s
ao d ire ito à p a rtic ip a ç ã o p o p u la r n o â m b ito d as c o n tra ta ç õ e s p ú b lic a s,
ta is c o m o a p o s sib ilid a d e d e re a liz a ç ã o c u m u la tiv a d as a u d iê n c ia s e
c o n su lta s p ú b licas. E n tre ta n to , a p re se n to u re tro c e sso s ao p re v e r q u e
esse s in s titu to s n ã o m a is seria m v in c u la n te s, e sim d isc ric io n á rio s.
D e to d o m o d o , c o n fo rm e d e m o n stra d o n o d e c o rre r d o artig o , o
re fe rid o re tro c e sso n ã o se a p lic a ao p ro c e sso d e c o n tra ta ç ã o d e p a rc e ria s
p ú b lic o -p riv a d a s p o r e m p re sa s p ú b lic a s o u so c ie d a d e s d e e c o n o m ia
m is ta e sta d u a is, a tu a n te s n o se to r d e sa n e a m e n to , n a m e d id a em q u e h á
le g is la ç ã o e s p e c ífic a q u e re g u la a q u e stã o (L ei n° 1 1 .0 7 9 /2 0 0 4 ). E m
sen d o assim , n ã o h á d isc ric io n a rie d a d e p a ra re a liz a ç ã o d as c o n su lta s
p ú b lic a s, e sim a o b rig a to rie d a d e n o s te rm o s d o art. 10, V I, d a
m e n c io n a d a lei, re sta n d o p re stig ia d a , ao fim , a c id a d a n ia p a rtic ip a tiv a .

R E F E R Ê N C IA S

A B A R . D e sa fio s e S o lu ç õ e s p a r a a U n iv e r s a liz a ç ã o d o E s g o ta m e n to
S a n i t á r i o n o B ra s il. 2019. p. 10. D isp o n ív e l em : h ttp ://a b a r.o rg .b r/7 m d
o c s-file = 5 5 1 0 2 .

B R A S IL , D e c r e to - L e i n° 9 4 9 , d e 13 d e o u t u b r o d e 1969. D isp õ e so b re
a p lic a ç õ e s d e re c u rso s p e lo B N H n a s o p e ra ç õ e s d e fin a n c ia m e n to p a ra
S a n e a m e n to e d á o u tra s p ro v id ê n c ia s. D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .p la n a
lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /d e c re to - le i/1 9 6 5 - 1 9 8 8 /D e l0 9 4 9 .h tm # :~ :te x t= 1 % C
2 % B A % 2 0 F ic a % 2 0 o % 2 0 B a n c o % 2 0 N a c io n a l,1 3 % 2 0 d e % 2 0 se te m b ro %
2 0 d e % 2 0 1 9 6 6 . A c e sso em : 04 out. 2020.

464
B R A S IL , L e i n° 1 1 .0 7 9 , d e 3 0 d e d e z e m b r o d e 2 0 0 4 . In stitu i n o rm a s
g e ra is p a ra lic ita ç ã o e c o n tra ta ç ã o d e p a rc e ria p ú b lic o -p riv a d a n o â m b ito
d a a d m in is tra ç ã o p ú b lic a . D isp o n ív e l em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r7 c
c iv il_ 0 3 /_ a to 2 0 0 4 -2 0 0 6 /2 0 0 4 /le i/l1 1 0 7 9 .h tm . A c e sso em : 04 out. 2020.

B R A S IL , L e i n° 1 1 .4 4 5 , d e 5 d e j a n e i r o d e 2 0 0 7 . E sta b e le c e as
d ire triz e s n a c io n a is p a ra o sa n e a m e n to b á sic o ; c ria o C o m itê
In te rm in is te ria l d e S a n e a m e n to B á sic o ; a lte ra as L e is n o s 6 .7 6 6 , d e 19
d e d e z e m b ro d e 1979, 8 .6 6 6 , d e 21 d e ju n h o d e 1993, e 8.987, d e 13 de
fe v e re iro d e 1995; e re v o g a a L e i n° 6 .5 2 8 , d e 11 d e m a io d e 1 9 7 8 .
D is p o n ív e l em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /_ A to 2 0 0 7 -
2 0 1 0 /2 0 0 7 /L e i/L 1 1 4 4 5 .h tm # a rt1 1 a .0 . A c e sso em : 04 out. 2020.

B R A S IL , L e i n° 14.133, d e 1° d e a b r il d e 2021. L ei de L icitaçõ es e


C o n trato s A dm inistrativos. D isp o n ív el em : http://w w w .p lan alto .g o v .b r/cci
v il_ 0 3 /_ ato 2 0 1 9 -2 0 2 2 /2 0 2 1 /lei/L 1 4 1 3 3 .h tm . A cesso em : 04 out. 2020.

B R A S IL , L e i n° 8 .6 6 6 , d e 21 d e j u n h o d e 1993. R e g u la m e n ta o art. 37,


in c is o X X I, d a C o n stitu iç ã o F e d e ra l, in stitu i n o rm a s p a ra lic ita ç õ e s e
co n tra to s d a A d m in istra ç ã o P ú b lic a e d á o u tra s p ro v id ê n c ia s. D isp o n ív e l
em : h ttp ://w w w .p la n a lto .g o v .b r/c c iv il_ 0 3 /le is /l8 6 6 6 c o n s .h tm . A c e sso
em : 04 out. 2 0 20.

B R A S IL . M in isté rio d o D e se n v o lv im e n to R e g io n a l. S e c re ta ria N a c io n a l


d e S a n e a m e n to - S N S. S is te m a N a c io n a l d e I n f o r m a ç õ e s s o b r e
S a n e a m e n to : 24° D ia g n ó s tic o d o s S e rv iç o s d e Á g u a e E sg o to s - 2018.
B ra sília : S N S /M D R , 2019. p. 13, 58-59.

N A Ç Õ E S U N ID A S . R e p o r t o f th e U n ite d N a tio n s W a t e r C o n f e r e n c e ,
M a r d e P la ta , 14-25 M a rc h 1977. U n ite d N a tio n s P u b lic a tio n s, S ales
N o .E .7 7 . II.A .1 2 . P a rte I, C ap. I. D isp o n ív e l em : h ttp s ://g o o .g l/s jH x fT .
A c e sso em : 04 out. 2020.

465
Marco Regulatório do Saneamento Básico: Lei n° 14.026/2020

R IB E IR O , M a u ric io P o rtu g a l e P R A D O , L u c a s N a v a rro . C o m e n tá r io s


à L e i d e P P P - P a r c e r i a p ú b l i c o - p r i v a d a . F u n d a m e n to s e c o n ô m ic o -
ju ríd ic o s . S ão P au lo : M a lh e iro s, 2007.

U N IT E D N A T IO N S . A g e n d a 21. D isp o n ív e l em : h ttp s://w w w .u n .o rg /e


sa/d sd /a g e n d a 2 1 /. A c e sso em : 04 out. 2020.

466
o
I Editora

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