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TUTORA: Paula Carreira

UNIDADE CURRICULAR: Elites e Movimentos Sociais

NOME:

TURMA:

N.º DE ESTUDANTE:

CURSO: Licenciatura Ciências Sociais

DATA DE ENTREGA: 15/05/2023

3,1/4
A aluna começa de forma original, reportando-se ao próprio trabalho jornalístico e à sua
origem para demonstrar desde logo a evolução da papel da mulher na sociedade. Descreve
um bom aparato bibliográfico final, o que demonstra pesquisa e interesse pelo trabalho. Faz
um enquadramento histórico do movimento feminista e pontua a reflexão com dados
relevantes que ajudam na sua fundamentação. Apresenta algumas questões relevantes que
poderiam ter sido desenvolvidas (e.g. a diferente aplicabilidade do movimento feminista em
contextos culturais diversos, como é o caso do afegão ou o da mulher negra). A sua própria
perspetiva deveria ter sido mais aprofundada criticamente, reforçando a conclusão. A escrita
denota cuidado, ainda que persistam alguns erros de construção frásica que, por vezes,
tornam as frases menos claras
Palavras: 1649

Paula Cosme Pinto escreve, em 2023, um artigo de opinião: O que aconteceria ao


mundo se as mulheres entrassem em greve, no jornal Expresso. Portanto estamos a falar
de um texto escrito por uma mulher, num dos jornais de maior tiragem em Portugal 1 e
com uma temática pró feminista. Se atualmente não nos causa estranheza (pelo menos
em Portugal), nem sempre ocorreu desta forma, já que o primeiro jornal em Portugal,
nasce em 1640, por ordem de D. João IV 2 escrito apenas por homens, é apenas 200 anos
depois que acontecem as primeiras colaborações femininas (1812) (Lopes. A, (2005), in
Silveirinha, M,,2012).

Se a entrada das mulheres nesta profissão foi “lenta e difícil” (Silveirinha, M, (2012)
mesmo não sendo preciso uma formação especifica, podemos apenas imaginar a
dificuldade de estas ingressarem no mundo universitário, aliás a primeira mulher a
frequentar o ensino superior em Portugal acontece em apenas em 1890. As mulheres
sofriam uma misoginia, estavam submissas aos elementos do sexo masculino, sem
liberdades e com escassos direitos, aliás era dominadas pela “cultura dominante de
matriz católica”(Bessa,2022), que colocava a mulher numa posição de
doméstica/procriadora.

Foi em 1792, por Mary Wollstonecraf na sua obra: A Vindication of the Rights of
Woman, que se inicia a luta “pública” da mulher pela paridade de oportunidades seja na
educação, no trabalho ou na política 3. Através de greves e protestos as mulheres lutaram
para obter igualdade de direitos incluindo o direito ao voto, politicamente podemos
afirmar que as mulheres eram silenciadas, já que estas não podiam eleger representantes

1
Expresso é a publicação mais vendida (pelo sexto ano consecutivo) - Expresso
2
Foi o primeiro jornal português. E ajudou D. João IV a consolidar o poder em 1640 (expresso.pt)
3
feminismo - Infopédia (infopedia.pt)
que defendessem os seus direitos. O direito ao voto apenas foi conquistado no início do
século XX, impulsionado pela primeira guerra mundial4

Na primeira guerra mundial, cerca de 60 milhões de soldados (homens) foram para a


guerra deixando postos de trabalho sem substitutos, assim para se conseguir manter a
funcionar as indústrias consideradas essenciais, recorreu-se às mulheres, estas saíram do
seu estatuto de mãe/esposa e asseguraram a continuidade de produção nas indústrias
bélicas e até da sua própria subsistência, pois até esta data o homem era o principal
provedor da casa

Como “recompensa” deste trabalho as mulheres foram alvos de uma valorização e


conseguiram adquirir uma voz política conseguindo o direito ao voto, contudo esta
conquista não foi uniforme a nível mundial, já que por exemplo as mulheres na Arabia
Saudita votaram pela primeira vez em 20155.

É após a segunda -guerra mundial, que se inicia um período de “transição


paradigmática” (Stock,2005) onde há uma alteração no panorama político, onde a
população se torna “mais interventiva, participativa e exigente” (Stock,2005), surgindo
aqui dois tipos de rumos: o projeto neoconservador (que defendem a autonomia/reforço
da sociedade civil ) e os novos movimentos sociais, em que existiu o desenvolvimento
de novas formas de política sem as influências de partidos políticos tradicionais
(Stock,2005). É neste último, principalmente na segunda metade do século XX que se
insere o Feminismo, que busca a emancipação da mulher em todas as esferas sociais: na
família, no trabalho, política e cultura.

O Feminismo surge a par nos movimentos coletivos que tentam intervir coletivamente
em situações polémicas e especificas (Stock,2005), a sua luta é construída através de
uma tentativa de pedagogia da sociedade, esforço de influência de opinião pública e
uma busca de um compromisso político. É de realçar que o Feminismo como qualquer
outro movimento coletivo é um conjunto de pessoas, que se reconhecem e se
identificam entre si, com alguma organização, que defendem um conjunto de ações
contra os opinativos contrários (Stock,2005). Neste caso em concreto, contra um cariz
tradicional que defendia que existia papéis sociais rígidos atribuídos para cada sexo,

4
Como 1ª Guerra Mundial impulsionou direitos das mulheres - BBC News Brasil
5
Há eleições na Arábia Saudita mas a notícia é que as mulheres também podem votar | Arábia Saudita |
PÚBLICO (publico.pt)
sendo que o feminismo, ou aliás o que este defendia (e defende), colocava em risco a
ordem social existente na época (Bessa,2002).

Não se pode falar sobre feminismo sem falar de Simone de Beauvoir (1908-1986), esta
escritora tornou-se uma referência neste movimento, e trouxe uma perspetiva que até
então não tinha sido abordada, estamos a falar “da liberdade sexual, da maternidade e
do aborto”(Bessa,2002), é Beauvoir, na introdução do seu livro “O Segundo Sexo”,
acaba por afirmar que as mulheres herdam todo um pesado legado e que estas se
esforçam para o ultrapassar. É o peso dos desses hábitos antigos e opressores que o
feminismo luta para alterar.

As conquistas das mulheres foram feitas lentamente século após século, havendo ainda
muito para alcançar. Se analisarmos ainda no ano de 2022, em Portugal, as mulheres
ainda ganham menos que os homens, sofrem mais com o desemprego, estão em menos
cargos dirigentes, em minorias no governo português (apesar da Lei da Paridade), e
continuam com a maior carga de tarefas domésticas6.

Em Portugal, há mais de 30 anos que existem mais mulheres no ensino superior que os
homens7, os números de doutoradas e investigadoras aumentou duplicando entre 2001 e
20098, contudo em 2021 continuam a ser estas (à imagem na União Europeia) a que
mais trabalham em tempo parcial, com prejuízo da carreira profissional, levando a
menores rendimentos, seja no momento (colocando-as em uma posição de
dependência), seja no futuro com acesso a menores pensões. A socióloga Anália Torres,
afirma que existem três motivos principais para as mulheres, que embora que estudem
mais, dominem profissões mais prestigiantes, ganhem menos, desde a entrada no
mercado laboral sentindo até mais dificuldade em obter cargos de liderança.

O primeiro é já o preconceito que existe contra a mulher, esta é encarada com menos
disponibilidade comparativamente com o homem, pois a priori mesmo que não tenha
filhos poderá vir a ter, e a empresa poderá sair” lesada” pelo absentismo da mulher. O
segundo motivo é que efetivamente a mulher tende a ocupar cargos mais mal
remunerados que o homem, nos sectores de serviço, indústrias, e no serviço público
onde a remuneração é baixa.

6
2023_02_20_IC_Paginados A4 (cig.gov.pt)
7
Há mais mulheres do que homens com Ensino Superior em Portugal | Mais Superior - Sabe mais!
8
Portal do INE
O terceiro motivo apontado é a compatibilização familiar, já que o trabalho doméstico e
o cuidado de pessoas dependentes recai sobre o elemento feminino do agregado, por
exemplo quando os filhos ficam doentes 63,7% ficam com as mães comparando com os
pais que ficam apenas 9,3% das vezes9. Embora, como Paula Cosme afirme que a:
“partilha de responsabilidades na esfera doméstica e familiar tem vindo a aumentar”
(Cosme,2023), existindo assim uma mudança de paradigma, contudo ainda se confunde
a diferença entre ajudar, que significa oferecer ajuda ou auxílio com a palavra partilhar
que significa: fazer a divisão.

A realidade é que a mulher acaba por trabalhar em jornadas duplas, acabando por
trabalhar mais de uma hora por dia que os homens 10, fazendo tarefas essenciais, contudo
desvalorizadas pela sociedade, por exemplo lavar/estender a roupa é algo subvalorizado
pela sociedade, contudo para as mulheres significa mais uma tarefa e para o homem
roupa pronta a vestir no dia seguinte. São estas tarefas que as mulheres ao assumirem a
seu encargo se sacrificam profissionalmente, e que ao longo do tempo que acaba por
beneficiar os homens, ficando estes disponíveis mentalmente e fisicamente para
investirem em si próprios.

A desigualdade existe, está espelhada nas estatísticas, a verdadeira questão é como


conseguir alterar estes comportamentos já que: “existe sempre uma parte de nós que
está bem como está” (Teixeira,2008).

Atualmente existem várias versões do feminismo, muito devido à diversidade de cada


país, é importante realçar que existe uma diferença de direitos obtidos entre os países
desenvolvidos e em desenvolvimento e até em relação de etnias, até que ponto se pode
considerar que os interesses das feministas negras são iguais às caucasianas ou latinas?
Ou que a luta das mulheres afegãs é idêntica à luta de uma mulher que viva num país da
União Europeia?

Giddens afirma que não se pode generalizar as “teorias de subordinação”


(Guiddens,2001), já que consoante a comunidade onde se inserem, as mulheres sofrem
de formas de opressão diferentes, por exemplo as feministas negras realçam as
influências prejudiciais que sofrerem na altura da escravatura (Guiddes,2001), ou então

9
2023_02_20_IC_Paginados A4 (cig.gov.pt)
10
Mulheres portuguesas trabalham mais uma hora e 13 minutos que os homens - SIC Notícias
(sicnoticias.pt)
o caso específico das mulheres afegãs que viram recentemente, em 2021, negado o
direito de frequentar o ensino superior11.

Atualmente o feminino é um movimento social a nível global, as redes sociais


conseguiram aproximar todas mulheres independentemente das suas características,
tornando um movimento de “consciencialização em que as mulheres se encorajam
umas às outras para mostrar como são afetadas pela desigualdade” (Reis,2016),
criando assim uma identidade coletiva, revelando, como por vezes, o que sofrem, se
encontra espelhado na outra mesmo em realidades diferentes, conseguindo encontrar
similaridades seja pela desigualdade de remunerações, pelas tarefas domesticas ou pelo
assédio físico/verbal (Reis,2016).

A era digital veio auxiliar a conexão de todas as mulheres do mundo, a greve de 2017
em que “organizadoras de todo o mundo decidiram entrar em greve” (Arruzza,2021)
levou o feminismo para outro patamar, reforçando a sua importância. Afinal quando a
mulher para, suspende-se o trabalho que ela oferece ao mundo, tornando visível o papel
que a mulher exerce e que não se encontra remunerado, mas que o mundo beneficia.

A ONU colocou como quinto objetivo da Agenda 2030: a Igualdade de Género, por si
só revela uma preocupação a nível mundial na busca deste direito, aliás Ban Ki-moon,
enquanto Secretário-Geral da ONU afirmou: “Enquanto os direitos humanos das
mulheres forem violados, a nossa luta não acaba”, é uma luta que irá ser demorada até
chegar ao patamar pretendido: o da igualdade e da equidade para todos
independentemente que sejamos mulheres ou homens, negros ou brancos ou com
características únicas.

Somos nós, geração a viver nesta era os principais responsáveis pela educação das
próximas gerações, tal como Buckminster Fuller afirma: “O propósito da nossa vida é
acrescentar valor à vida das pessoas desta geração e das gerações seguintes” 12,
portanto está nas nossas mãos, nos nossos comportamentos e nos valores que
transmitimos que poderemos fazer a diferença: Criar mais valor para que as próximas
gerações não sofram de estigmas por serem quem são e não tenham necessidade de lutar
por direitos que deviam ser de todos distribuídos de forma igual.

11
Militares já bloqueiam entrada de mulheres nas universidades afegãs | Euronews
12
Frases de Buckminster Fuller - Pensador
Referências:
Agência Lusa (2021, March 4). Mulheres portuguesas trabalham mais uma hora e 13
minutos que os homens - SIC Notícias, In Mulheres portuguesas trabalham mais uma
hora
Arruzza, C., Bhattacharya, T., & Fraser, N. (2019). Feminismo para os 99%: um
manifesto. Boitempo Editorial.
Beauvoir, S. (1967), O Segundo Sexo, II Experiência Vivida. Difusão Europeia do Livro
Bessa, A. M. (2002). Elites e Movimentos Sociais, Lisboa: Universidade Aberta
Braun, J. (2022, March 8). Como 1ª Guerra Mundial impulsionou direitos das mulheres
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