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Não sei se é do conhecimento dos senhores, mas o lapso verbal também


pode ser provocado, induzido, por assim dizer, por sugestão. Uma pequena
história dá testemunho disso. Certa vez, confiou-se a um ator novato o import-
ante papel de anunciar ao rei, em A donzela de Orléans [de Schiller], que “o
condestável devolve sua espada” [Der Connétable schickt sein Schwert zurück].
Durante o ensaio, porém, um dos atores principais, a título de brincadeira, fez
o tímido iniciante trocar várias vezes essa fala por outra: “O cocheiro devolve
seu cavalo” [Der Komfortabel schickt sein Pferd zurück]. Com isso, alcançou seu
objetivo: na apresentação, o infeliz novato debutou pronunciando de fato o an-
úncio modificado, embora tivesse sido suficientemente advertido a não fazê-lo,
ou talvez por isso mesmo.
A teoria da falta de atenção não dá conta de explicar todas essas pequenas
características dos atos falhos. Mas isso não significa que ela esteja errada.
Talvez lhe falte algo, algum complemento que venha a torná-la plenamente
satisfatória. Mas alguns dos atos falhos também podem ser considerados de
outro ponto de vista.
Tomemos aquele que, para nossos propósitos, é o mais apropriado dos atos
falhos: o lapso verbal. Poderíamos muito bem escolher aqui o lapso da escrita
ou o da leitura. O que temos de reconhecer é que, até o momento, só nos per-
guntamos quando e em que circunstâncias cometemos esse lapso, tendo obtido
resposta somente para essa pergunta. Podemos, no entanto, voltar nosso in-
teresse para outra questão e nos perguntar por que o lapso ocorre precisamente
dessa maneira e não de outra; podemos, pois, levar em consideração o que vai
expresso no lapso verbal. Os senhores compreendem que, enquanto não re-
spondermos a essa pergunta, enquanto não esclarecermos o efeito desse lapso,
o fenômeno permanece, do ponto de vista psicológico, uma coincidência,
ainda que se encontre para ele explicação fisiológica. Ao cometer um lapso

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