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Introdução à Agronomia: Conceitos Básicos e Exercícios

Prof. Carlos R. Spehar

Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária, FAV

Universidade de Brasília, UnB

spehar@unb.br

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Índice Página
Introdução 4
Solos: Base da Agricultura 5
Rochas: Material de Origem dos Solos 5
Rochas Ígneas ou Magmáticas 5
Rochas Metamórficas 8
Rochas Sedimentares 9
Detríticas 10
Quimiogênicas 11
Biogênicas 11
Rochas, Intemperismo e Solo 11
Corretivos e Fertilizantes 12
Calagem 13
Gessagem 15
Fertilização 16
Desenvolvimento da Agropecuária no Cerrado e o Ambiente Natural 17
Domesticação de Plantas e Animais 21
Centros de Origem das Plantas e dos Animais Domésticos 22
Centro Chinês 24
Centro Indiano 25
Centro Indo Malaio 25
Centro Asiático Central 25
Centro Oriental Próximo ou Crescente Fértil 25
Centro Mediterrânico 26
Centro Abissínio 27
Centro Mexicano do Sul e Centro-Americano 27
Centro Sul Americano 28
Centro Ilha de Chiloé (Extensão do Centro Sul Americano) 28
Centro Brasileiro Paraguaio (Extensão do Centro Sul Americano) 28
Classificação Binomial: Plantas, Animais e Micro-organismos 30
Relações Atmosféricas, Radiação Solar e a Vida no Planeta Terra 32
Densidade Média do Fluxo Energético 33
Composição Espectral 33
Interação com a Terra 34
Absorção Atmosférica e o Efeito Estufa 34
Transmissão da Energia 35
O Equilíbrio Energético no Planeta 35
Mudanças Climáticas, Ambientais e Impacto Global 37
Relações entre Atmosfera Terrestre e Radiação Solar 38
Atividade Humana e Alterações Atmosféricas 38
Consequências das Emissões de Gases 39
Evidências de Mudanças 40
Variações Climáticas, Protocolos e Acordos Internacionais 40
Ações para Reverter o Problema 41
Cenários 42
Aquecimento Global e a Teoria de Gaia 43
Sistemas de Preparo do Solo 44
Diversidade e Agricultura 45
Agricultura em Ambiente Tropical – Evolução no Cerrado 48
Consequências do Preparo Contínuo do Solo 50

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Evolução dos Sistemas de Cultivo no Brasil 51
Sistemas integrados de cultivo 51
Aperfeiçoamento do plantio direto e outras práticas 55
Benefícios Associados ao Plantio Direto 55
Premissa para Adoção do Plantio Direto 56
Evolução da Mecanização, da Agropecuária e da Sociedade 56
Tráfego Controlado e Conservação do Solo 58
Criação de Oportunidades 58
Diversificação Agropecuária e o Futuro 59
Melhoramento Genético e Ganhos na Agropecuária 60
Modo de Reprodução na Genética e no Melhoramento 61
Plantas anuais 63
Plantas perenes 63
Avanços na Agropecuária e Ciência 64
Soja Adaptada às Baixas Latitudes 64
Fixação Biológica de Nitrogênio (FBN) na Família Fabaceae 65
Zootecnia: Importância e Visão geral 67
Ruminantes: Bovino, Caprinos, Ovinos, Bubalinos e Camelídeos 67
Equinos, Asininos e Muares 70
Suinos 70
Aves 71
Aquicultura 72
Agronegócio 73
Insumos 73
Produção 73
Distribuição 74
Alimentos 74
Biocombustíveis 74
Fibras 74
Madeira 74
Questão Ambiental 74
Questão social 75
Características dos Módulos de Produção 76
Pequenas e Médias Áreas 76
Grandes Áreas 76
Relação entre Nutrição da Planta e Produção de Grãos: Soja 77
Exercícios e Definições 78
Desafios aos Estudantes que Iniciam Agronomia 80
Referências e Literatura Consultada 81

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Introdução

Este texto reúne pontos relevantes e de interesse aos estudantes que


iniciam o curso de agronomia, tendo sido preparado a partir de compilações de
aulas, palestras e práticas ministradas durante os semestres letivos. Espera-se,
com a apresentação de conceitos básicos, despertar o interesse daqueles que
optaram por enveredar pelas ciências agrárias, criando expectativas.
O que está por vir, ao longo do curso, depende da semente. Por
oportuno, lembra-se aqui a parábola do semeador, recomendada à leitura na
íntegra (Lucas 8:4-8): “Saiu o semeador para semear a sua semente. Quando
semeava, uma parte da semente caiu à beira do caminho; foi pisada, e as aves
do céu a comeram. Outra caiu sobre a pedra; e tendo crescido, secou, porque
não havia umidade. Outra caiu no meio dos espinhos; com ela cresceram os
espinhos, e sufocaram-na. Outra caiu na boa terra e, tendo crescido, deu fruto
a cento por um”. Cada um de nós é como a semente. O segredo para
desenvolver e produzir bons frutos reside em fertilizar sonhos, aqueles
poderosos que marcarão nossas vidas. Cultivando-os, despertaremos forças
interiores, nos manteremos inspirados, exercitando o pensamento rumo à
superação de nossas limitações e a plena realização profissional.

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Solos: Base da Agricultura

A agricultura, atendendo a demanda por alimentos fibras e outras


matérias primas, tão essenciais à sociedade humana, não existiria sem os
solos. Ele serve de suporte às plantas, fornecendo-lhes água, nutrientes e
abrigando macro e micro-organismos que de alguma forma contribuem para o
crescimento e desenvolvimento das plantas. Dentre os micro-organismos
citam-se bactérias nitrificadoras e fixadoras de nitrogênio, fungos do grupo das
micorrizas, que contribuem para a disponibilização, fixação ou absorção de
elementos químicos nutrientes, como o nitrogênio e o fósforo, por exemplo.
Há vários tipos de solos, segundo o material de origem. As
características físicas, químicas e biológicas, próprias de cada tipo de solo, são
o ponto focal para o manejo de forma sustentável. O conhecimento de como o
solo funciona é imprescindível à agricultura em base econômica, equilibrada
com o meio ambiente. Portanto conhecer o solo, sua origem e seus principais
componentes é uma necessidade na formação do engenheiro agrônomo.

Rochas: Material de Origem dos Solos

Os solos se originaram das rochas, as quais podem ser ígneas,


metamórficas e sedimentares. Eles representam o resultado de intemperismo –
ação dos componentes ambientais: temperatura e atmosfera (umidade, gases
e outros) que atuam nas rochas (material de origem), levando à sua
decomposição ao longo do tempo. A seguir, será apresentada uma síntese
sobre as características de cada tipo de rocha, enfatizando-se a composição. A
composição das rochas tem ligação direta com as propriedades dos solos que
delas se originam.

Rochas Ígneas ou Magmáticas

As rochas magmáticas ou ígneas se originam no interior do planeta


sendo produto da solidificação do magma pastoso. O magma é fluido, de
fundição parcial ou total, composto por silicatos, silícios e substâncias e
elementos voláteis, como, vapor d´água, cloretos, hidrogênio, flúor dentre
outros. Estas rochas são muito resistentes constituindo-se na matéria prima do
embasamento rochoso dos continentes. São as mais antigas, reportando à
origem do planeta Terra, estimada por ter ocorrido há 4,6 bilhões de anos.
Associadas ao resfriamento da crosta terrestre são consideradas as mais
antigas. Entretanto, via o vulcanismo, tem havido formação dessas rochas
durante todo esse período da existência de nosso planeta.

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A

Figura 1. Granito (A), de reação ácida e basalto (B), de reação básica


rochas magmáticas.

Das rochas magmáticas destacam-se granito, gabro, diabásio e basalto


(Figura 1). Toda vez que ocorrem erupções vulcânicas que expelem lava pela
superfície, formam-se novas quantidade dessas rochas primárias. Neste caso
vale acrescentar que, as rochas graníticas são classificadas como ácidas e o
diabásio, o glabro e o basalto se caracterizam por serem de reação básica.
Certamente, os solos que terão origem a partir destas rochas, por efeito da
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ação dos elementos climáticos, refletirão a sua composição e reação química,
como será visto. Sempre é bom lembrar que no início da formação de nosso
planeta, as forças do intemperismo eram muito mais exacerbadas, com
vulcanismo enriquecendo a atmosfera de gases e detritos, originando chuva
ácida que atuava sobre as rochas.
O processo de solidificação das rochas, a partir do magma, com o
resfriamento do planeta, pode ocorrer quando este atinge a superfície ou
quando no interior da crosta terrestre, permitindo classificá-las em rochas
intrusivas ou extrusivas. Esse processo, em menor escala, tem ocorrido nos
tempos mais recentes. Veja-se o exemplo de erupções vulcânicas; com o
escorrimento de lava, que solidifica, inicia-se o processo que, depois de
milhões de anos, leva à formação dos solos.
As rochas extrusivas formam-se a partir da ejeção do magma em erupções
vulcânicas, tendo um rápido resfriamento ao atingir a superfície, passando do
estado líquido ou gasoso ao sólido em pouco tempo. Desta forma, sua
estrutura será vítrea, impossibilitando a cristalização dos minerais.
O basalto e a obsidiana são exemplos de rochas extrusivas, a primeira de
reação básica. Por que é interessante classificar as rochas quanto à reação
química? Os solos delas originados terão reação proporcional à da rocha de
origem. Não seria surpresa descobrir-se que os solos encontrados no Cerrado
se originaram de rochas ácidas, com baixa disponibilidade de elementos
químicos nutrientes às plantas. Tem-se como exemplos os latossolos com
baixa fertilidade medida pelos teores de fósforo (P), potássio (K), cálcio (Ca),
magnésio (Mg), enxofre (S) e elementos requeridos em menores quantidades,
como zinco (Zn), cobre (Cu), manganês (Mn), molibdênio (Mo), boro (B).
As rochas intrusivas, também chamadas de plutônicas, resultam de lento
resfriamento do magma. Estas rochas são originárias de regiões profundas no
subsolo onde formam cristais.
Quando o magma apresenta grandes quantidades de gases e elementos
voláteis, as rochas que se formam são os pegmatitos. A forma bem fluida do
magma possibilita a formação de cristais de grande dimensão.
As rochas magmáticas, com reações ácidas, básicas ou de reação neutra,
apresentam diferenciação relacionada ao teor de silício (Si) na rocha. Com
teores acima de 65% a rocha será ácida, formando-se silicatos e cristais de
quartzo. Nas rochas neutras o teor de silício varia entre 52 a 65%, enquanto
nas rochas básicas o teor de silício situa-se entre 45 e 52%, condição em que
não se forma o quartzo. O quartzo é rocha cristalina, rica em silício, que ao se
decompor, contribui para o teor de areia dos solos.
Portanto, as rochas magmáticas ou ígneas podem variar na sua
composição e apresentar reações próprias variando entre ácidas, neutras e
básicas. Sua decomposição ao longo do tempo, na fase mais avançada, origina
o solo. Assim, solos provenientes de rochas basálticas, são básicos e ricos em
nutrientes, contrastando com as rochas graníticas, originando solos ácidos e
pobres em elementos químicos nutrientes às plantas e animais. Conhecer este

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ciclo é de grande valor, pois norteia a decisão de como atuar, corrigindo e
fertilizando o solo antes de sua incorporação à agropecuária.
Exemplo do que foi dito é a ocorrência de solos férteis em parte do Paraná,
São Paulo, Minas Gerais e Goiás oriunda da extrusão de magma (rochas
basálticas, de reação básica). O fenômeno ocorreu entre 251 e 65 milhões de
anos AEA. Em São Paulo e no Paraná eles receberam o nome de “terra roxa”,
apresentando elevada fertilidade natural. O nome foi dado pelos imigrantes
italianos que, chegando ao nosso país, se surpreendiam com a forte cor dos
mesmos. A denominação, ainda adotada popularmente, vem de “rosso”,
significando vermelho no idioma dos imigrantes, a cor real desse tipo de solo.
Antes da agricultura contemporânea praticada no Cerrado, incorporando
uso de corretivo (calcário e gesso) e fertilizante (nitrogênio, fósforo, potássio e
micronutrientes), a produção agropecuária no Brasil concentrava-se em solos
naturalmente férteis. Estes solos presentes no Nordeste brasileiro, Sul de
Minas Gerais, Norte de São Paulo e outras partes do Brasil, se constituíram em
base da nossa cafeicultura. Ou seja, até os anos 1950, era baixo o uso de
corretivos e fertilizantes no Brasil.
Portanto, imensas áreas de Mata Atlântica próximas ao litoral e de outras
partes do Brasil, com solos naturalmente férteis, deram lugar a grandes cultivos
como o da cana-de-açúcar. Desde os tempos coloniais, os solos massapé no
Nordeste Brasileiro, também originados de rochas ricas em elementos
químicos nutrientes às plantas, têm sido explorados na agropecuária. Ademais,
em tempo não muito distante do atual, há 60-70 anos, imensas áreas antes
cobertas por vegetação exuberante na floresta de araucária – o pinheiro
brasileiro – Araucária brasiliensis, foram desmatadas para a expansão agrícola.
Tudo isto sem o critério de manterem-se reservas – áreas virgens,
remanescentes da vegetação original, uma exigência legal na atualidade.

Rochas Metamórficas

Rochas metamórficas se originam da transformação de outras rochas


por efeito de condições específicas de temperatura e pressão (Figura 2).

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Figura 2. Mármore, rocha metamórfica formada a partir da transformação
da calcita ou carbonato de cálcio (CaCO3).

Estas rochas se originam de outras que, submetidas à pressão e


temperaturas diferenciadas, transformam-se e modificam suas características
em um processo denominado metamorfismo. O fenômeno ocorre em camadas
medianas e profundas da crosta terrestre ou em regiões vulcânicas.
A metamorfose das rochas pode ocorrer na mineralogia, com a formação
de novos tipos de compostos minerais e na textura, com alterações nos tipos
de cristalização, alinhamento, clivagem e outros. Durante o metamorfismo,
ocorre diferença de temperatura e pressão não havendo a fusão, que seria
equivalente à transformação em magma.
O metamorfismo, quando ocorre em rochas sedimentares, estas
denominam rochas parametamórficas; quando são oriundas de rochas ígneas,
são chamadas de ortometamórficas, existindo ainda aquelas originadas de
outras rochas metamórficas.
As rochas metamórficas podem manter algumas características de suas
rochas formadoras (protólitos), como a base de alguns minerais, a sua
estruturação e composição química. Assim, o protólito é determinante para as
características das rochas metamórficas.
Exemplos importantes de rochas metamórficas são: o gnaisse, proveniente
do granito; a ardósia, formada a partir do xisto (rocha metamórfica), e o
mármore, que é a transformação do calcário (rocha sedimentar). \

Rochas Sedimentares

Rocha sedimentar é constituída de sedimentos os mais variados como areia,


argila, silte, seixos, mistura destes e componentes orgânicos (Figura 3).

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Figura 3. Penhascos formados por rochas sedimentares.

A matéria transportada e acumulada em várias situações, como, por


exemplo, às margens de um rio, por efeito de temperatura, passa por
diagênese ou litificação. Os sedimentos se agregam de forma estável,
transformando-se em rocha. Além de cursos d’água, lagos, baías, lagunas,
estuários, deltas e fundo de mares e oceanos podem contribuir para a
formação desse tipo de rocha.
Este tipo de rocha depende da composição dos sedimentos. Os fósseis
de animais e vegetais, que tanto contribuem para entender a dinâmica da vida
em nosso planeta através do tempo, são associados com as rochas
sedimentares. Em geral, aparecem envolvidos entre a matéria constitutiva do
sedimento rochoso. As rochas sedimentares ocorrem em camadas da crosta
terrestre, representando aproximadamente 75% do material exposto à
superfície.
A rocha sedimentar abundante na crosta terrestre é denominada de
clástica ou mecânica. Há outro tipo sedimentar cuja matéria que o forma é
predominantemente orgânica, com destaque para litificação de restos
orgânicos, como os do carvão, denominado rocha sedimentar orgânica.
Quando ocorre a precipitação de elementos químicos por sais como o
carbonato de cálcio (calcário) ou halita (sal de cozinha), onde se encontram
dissolvidos na água de lagos, lagunas, mares rasos, por evaporação da água.
Estas são as rochas sedimentares químicas.
A classificação baseada no processo em que se formam se contrapõe a
classificação por material componente das rochas. Assim, têm-se rochas
sedimentares com a seguinte definição:

Detríticas – quando em sua constituição predominam detritos de outras


rochas, resultantes da sua fragmentação ou "meteorização". Rochas
sedimentares detríticas apresentam-se como i) não consolidadas, como

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depósito de balastros, areias, siltes e argilas; ii) consolidadas, formadas pela
consolidação destes mesmos sedimentos detríticos por diagênese.

Quimiogênicas - originárias do processo de precipitação de minerais em


solução. Neste grupo temos o calcário, o gesso e o sal-gema.

Biogênicas - são rochas constituídas de sedimentos de origem biológica,


resultado dos restos de seres vivos ou de sua atividade. Exemplos de rochas
sedimentares biogênicas são o xisto e o carvão.

A importância econômica das rochas sedimentares deve ser destacada


levando-se em conta a sua grande utilização na agricultura e na construção
civil. Estas rochas são as fontes de petróleo e hidrocarbonetos, de importância
na matriz energética do mundo atual. Por outro lado, a calagem, prática comum
no Cerado, é a aplicação de rocha sedimentar moída, para corrigir o solo.

Rochas, Intemperismo e Solo.

As forças dos componentes ambientais que atuam no planeta Terra são


grandes causadoras de mudanças. Assim, rochas, independentemente da
formação, estão expostas às variações de agentes naturais como radiação,
temperatura e umidade dentre outros. Como visto, o intenso vulcanismo
existente no início da formação da Terra foi acompanhado por grande emissão
de gases. Estes passaram a contribuir na formação de chuva ácida, além de
manterem-se temperaturas elevadas. Esse conjunto levou à intensificação do
intemperismo. O planeta era uma verdadeira caldeira no início dos tempos.
O intemperismo tem mostrado seus efeitos, tornando-se perceptíveis na
comparação de tipos de solos. Na decomposição, as rochas, inicialmente, se
fragmentam. Cada rocha apresenta especificidade relativa à forma como se
cristalizou e à sua composição. Os cristais de quartzo apresentam zonas de
clivagem ou pontos a partir dos quais ocorre fragmentação em partes menores.
Outras formações rochosas apresentam pontos suscetíveis de ruptura ou
fragmentação, como cisalhamento, diaclases, falhas, foliações, dobras,
deformações e estratos. Em cada caso dividem seguindo um padrão, expondo
maior superfície e acelerando o processo. Imagine-se que, a cada
fragmentação, expõem-se superfícies que antes estavam ocultas no material
de origem. Esse aumento de superfície acelera a frequência do processo. Tudo
isto resultado das variações de água, temperatura, pressão e composição
atmosférica.

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Figura 4. Sequência ilustrando a formação do solo a partir da rocha.

O intemperismo, durante milhões de anos, leva à formam-se partículas


menores que darão origem aos componentes dos solos. Os componentes
físicos dos solos, de forma geral dividem-se em areia, silte e argila, os quais
ocorrerão em proporção direta à composição da rocha matriz. Enfatizando,
aquelas ricas em silicatos, graníticas, originam solos arenosos, nos quais a
fração argila é reduzida tendo-se como exemplo o neossolo quartzarênico (solo
arenoso) no Cerrado do Oeste Baiano.
Por outro lado, rochas basálticas originam solos com argila
quimicamente ativa, retendo cátions, além de possuírem em sua composição
elementos químicos essenciais à nutrição mineral das plantas, como potássio
(K), fósforo (P), além daqueles requeridos em menor quantidade (micro
elementos). A capacidade de reter os cátions, propriedade de cada solo, é
diretamente proporcional à atividade da argila. Em regiões tropicais do mundo,
onde o intemperismo tem atuado de forma intensa por milhões de anos e as
rochas (material de origem) são ácidas, os solos apresentam menor
capacidade de troca de cátions (CTC). O conceito de capacidade de troca de
cátions será desenvolvido ao longo do curso de agronomia. Assim,
conhecendo-se como o solo funciona, busca-se solução para adequá-lo ao
cultivo – uso de corretivos (calcário e gesso), fertilizantes. Em especial no
Cerrado, com baixa fertilidade, maneja-se a matéria orgânica – fator de
estruturação do solo e aumento da CTC, retentor de nutrientes e água.

Corretivos e Fertilizantes

Os corretivos e fertilizantes são necessários para modificações químicas no


solo, em especial os solos ácidos e desprovidos de nutriente, como os que
predominam no Cerrado. Corretivos são basicamente os calcários e o gesso
agrícola. O calcário tem a característica de elevar o pH do solo e suprir os

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elementos cálcio (Ca) e magnésio (Mg), quando adicionado moído, em
partículas finas que aumentam a superfície de contato e a reação com a água
do solo. O gesso, de aplicação rotineira há cerca de 30 anos, dissocia na água
do solo e com ela se movimenta, alterando quimicamente o perfil ou as
camadas componentes do solo.

Calagem

Nome que se dá ao processo de aplicar calcário ao solo. O calcário é rocha


moída, formada por carbonatos e cálcio e de magnésio, que, incorporada ao
solo reage liberando Ca e Mg. Na atualidade, a calagem se realiza com
implementos específicos que espalharão o produto sobre o solo. Em seguida
se fará a incorporação ao solo, mediante aração e gradagem.

Figura 5. Rocha Dolomita: moída e distribuição no solo (calagem).

Por que se faz calagem? Os solos brasileiros, em especial os do Cerrado,


são ácidos e pobres em nutrientes. Associe-se o conceito de rochas de origem
que ficará claro. Além de se originarem de rochas ácidas, estas são pobres em
elementos minerais necessários ao crescimento e reprodução das plantas,
como fósforo (P), potássio (K), enxofre (S), cálcio (Ca), Magnésio (Mg) e
elementos menores ou micronutrientes. Estes são menos exigidos em
quantidade, fazendo parte de enzimas dos ciclos da planta. Se não estiverem
disponíveis, têm impacto negativo no rendimento das culturas.
Por intemperismo contínuo, mesmo depois da decomposição das rochas,
até mesmo as partículas menores como argila se decompõem, liberando
alumínio (Al) que faz parte do material de origem. Este elemento é o que se
encontra em maior quantidade. Quando o cátion Al3+ torna-se disponível às
raízes das plantas, causa toxidez aos cultivos e os torna. inviáveis
economicamente. Portanto, a calagem tem for finalidade torná-lo indisponível,
por elevação do pH.
A análise de solos é essencial para se entender os seus componentes
químicos e físicos, além de possibilitar a definição do quanto se aplicará de
calcário e fertilizante. Tornando-se necessária antes de se iniciar o cultivo, ela
é o ponto de partida para a tomada de decisão sobre realizar o manejo físico e
químico dos solos. A análise dos solos torna-se imprescindível antes de
incorporá-los ao cultivo. Sem ela, o manejo da fertilidade do solo será empírico,
causando excessos e indisponibilidade de nutrientes, alterando o pH a níveis
que inviabilizam a exploração em base econômica da agropecuária.

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Tabela 1. Características físico-químicas de solo de Cerrado (Latossolo)
natural (virgem) e depois de corrigido/fertilizado. Planaltina, DF.

Característica
Solo Física Química
Areia Silte Argila M.O.* pH Al+3 (Ca+Mg)+2 P K
g dm-3 cmolc+ mg dm-3
Virgem 340 190 450 20 4,7 1,9 0.4 0,9 15

Corrigido 5,8 0,0 3,4 9,0 62


*M.O. = Matéria orgânica.

A análise dos componentes físicos e químicos dos solos é essencial à


atividade agropecuária (Tabela 1). Os componentes físicos já mencionados:
areia, silte e argila indicam a textura do solo, ou seja, se ele é arenoso, argiloso
ou intermediário. Observa-se, ainda, a proporção de matéria orgânica (MO).
Mesmo quando presente em baixa quantidade relativa, a MO representa a vida
do solo, influenciando sua estrutura, retenção de água e de nutrientes. Nos
solos de Cerrado, a MO responde por grande parte da capacidade de troca de
cátions (CTC). As partículas de matéria orgânica ativa (húmus) apresentam
carga negativa, funcionando como um grande ânion, respondendo pela CTC
em especial nos solos de Cerrado. Quanto maior a CTC, maior a retenção de
elementos químicos que atuam como nutrientes, tendo efeito direto na
fertilidade dos solos.
Percebe-se que mesmo depois de corrigido com calcário (Tabela 1), o pH
do solo ainda é ligeiramente ácido, enquanto o alumínio intercambiável ou
trocável está zerado. Observa-se ainda elevação no nível de Ca+2 e Mg+2 de
forma considerável (Tabela 1).
Observa-se que a aplicação de calcário neutraliza (torna indisponível) o
alumínio (Al+3), presente na maioria dos solos brasileiros, em especial nos
latossolos do Cerrado, eleva o pH e fornece cálcio (Ca) e magnésio (Mg) como
nutrientes.
Ca e Mg são imprescindíveis à planta, o primeiro integra a parede celular,
refletindo no alongamento das raízes e o segundo é componente da molécula
de clorofila (Mg). Ou seja, sem eles as plantas não aprofundam suas raízes no
solo, deixando de absorver água e nutrientes e não realizam fotossíntese.
O calcário é um dos insumos agrícolas mais baratos. Se por um lado os
solos de Cerrado são ácidos e desprovidos de nutrientes, por outro, há
abundância de rochas calcárias no bioma, tornando sua exploração acessível.
Essa foi uma dádiva da natureza, mostrando que há solução para os
problemas decorrentes da acidez dos solos e a mesma está ali mesmo no
ambiente de produção.
O calcário é composto por carbonatos de cálcio (CaCO3) e de magnésio
(MgCO3), sais que se originam da reação entre base com força química
intermediária [Ca(OH)2] e ácido orgânico, com fora química fraca (H2CO3).

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Diferente de sal originário de base forte com ácido forte, o calcário não dissocia
em água. A reação que ocorre leva tempo, daí a importância de se fazer
calagem com antecedência ao plantio.

Gessagem

Para completar o conceito de correção dos solos, tem-se a gessagem ou


aplicação de gesso agrícola (CaSO4). Este sal, prontamente dissociável, à
semelhança de KCl, fornece Ca e S que são necessários à nutrição das
plantas, movimentando-se com a água (também denominada solução do solo),
criando condições para o crescimento radicular em profundidade, melhorando o
aproveitamento de água e nutrientes que tenham lixiviado (movimentado com a
água)para as camadas mais profundas do solo.

A aplicação de gesso tem se tornado rotineira a partir de estudos que


demonstraram a baixa disponibilidade e distribuição de cálcio no perfil do solo
(RITCHEY ET AL., 1982). Com aplicação de gesso, resultando em
movimentação de Ca, houve maior crescimento radicular, tornando as plantas
resistentes a períodos de seca (veranicos) em plena fase reprodutiva das
culturas (CARVALHO, M.; van RAIJ, 1997).

Figura 6. Distribuição de raízes em solo sem e com gesso (CaSO4)

Portanto calagem e gessagem são condicionantes, induzindo reações


químicas que elevam o pH, aumentam a disponibilidade de elementos químicos
no perfil do solo, preparando o ambiente para o cultivo.

Fertilização

Calcário e gesso são tratados como corretivos ou condicionantes do solo,


por sua ação sobre o pH, elevando-o e, por consequência, contribuindo para
indisponível o Al e movimentação de Ca no perfil do solo. Interferem naa

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fertilidade do solo, por aumentar os níveis de Ca, Mg e S. Outros nutrientes,
como o potássio (K) são supridos por fertilizantes, sais como cloreto ou sulfato
de potássio. Na planta, o K está ligado diretamente ao transporte de produtos
da fotossíntese.
Na planta, o fósforo (P), está ligado ao nucleotídeo adenosina trifosfato
(ATP). Absorvido em menores quantidades que K e nitrogênio (N), o P mostra-
se necessário ao crescimento e à produção vegetal. Interfere nos processos de
fotossíntese, respiração, armazenamento e transferência de energia, divisão e
crescimento das células. Contribui para o crescimento prematuro das raízes,
qualidade de frutas, verduras, grãos e formação das sementes. O elemento é
suprido por superfosfatos ou fontes naturais, como fosfato reativo de Gafsa
(Tunísia, Norte da Africa).
O nitrogênio (N), requerido em grandes quantidades, faz parte da molécula
de aminoácidos, alguns dos quais contém enxofre (S), compndo a cadeia de
proteínas das células. São fontes de nitrogênio a uréia, o sulfato de amônio, a
matéria orgânica, resíduos vegetais e aquele retirado do ar por fixação
biológica, em um processo simbiótico. Os micronutrientes Zn, Cu, Mo, Mn, B,
Fe, requeridos em muito pequenas quantidades, comparativamente a N, P e K,
participam da composição de enzimas. Sem esses elementos, ou quando estão
em baixo nível nos solos, as plantas deixam de atingir produtividades
econômicas.
Para entender como ocorrem as liberações de nutrientes no solo, toma-se o
exemplo da reação entre base forte com ácido forte como, por exemplo, NaOH
+ HCl => NaCl + H2O, origina-se o sal de cozinha ou halita. Quando colocado
em água, rapidamente dissocia, assim como KCl, este utilizado como fonte de
potássio. O fenômeno da dissociação se deve à polaridade da molécula de
água (Figura 7). Portando, assim como em água, ocorre similar reação na
solução do solo, tornando o cátion K livre, podendo ser retido por cargas
negativas (matéria orgânica, por exemplo) ou ser lixiviado às camadas mais
profundas do solo ou levado por enxurradas, quando o solo se satura por água,
originando o escorrimento.

Dissociação

Cátion Molécula de Água Ânion

K+ H Cl-
O
K+ H Cl-

Figura 7. Representação esquemática da molécula de água (H2O) e do sal


(fertilizante) KCl dissociado, onde o cátion é atraído pelo átomo de
oxigênio (O) e o ânion é atraído pelo átomo de hidrogênio (H).

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O exemplo é dado para que o estudante se interesse por compreender
como funcionam os solos e os fertilizantes – fontes de nutrientes essenciais às
plantas. Assim, valorizará o estudo de química e, depois, de bioquímica (a
química da vida), pois perceberá conexão entre teoria e prática à medida que
avança no conhecimento.
Quanto ao elemento Al, não é utilizado pelas plantas, causando toxidez e
reduzindo crescimento radicular, contrapondo-se ao Ca e o Mg, necessários
como nutrientes. Ademais, os níveis de fósforo (P) em solos virgens de
Cerrado são geralmente baixos (Tabela 1), requerendo intensa adubação
fosfatada inicial para elevar os níveis de P. O potássio (K), assim como cátions
de outros sais dissociáveis, está sujeito à lixiviação, dependendo de manejo do
solo e da planta, além do regime hídrico.
No Cerrado, depois de corrigidos e fertilizados com calcário, gesso fósforo,
potássio e micronutrientes, os solos estão prontos ao cultivo. A tecnologia
definindo níveis de calagem, gessagem e de adubação com N, P e K tem
norteado o estabelecimento de agricultura com elevado nível tecnológico, em
ambiente antes explorado com pecuária extensiva, em baixos índices de
eficiência. As grandes mudanças realizadas por tecnologia originária de
pesquisa serão abordadas em detalhes nas disciplinas de solos. As bases
químicas para compreender o funcionamento serão vistas quando o estudante
seguir o fluxograma do Curso de Agronomia.

Desenvolvimento da Agropecuária no Cerrado e o Ambiente Natural

O Cerrado compreende um dos grandes biomas brasileiros em diversidade,


superado apenas pelo da Amazônia. Depois do desenvolvimento da agricultura
em seu domínio responde por mais da metade da produção de soja e do milho
no Brasil, graças à aplicação de tecnologia de correção, fertilização, manejo e
conservação dos solos e do melhoramento genético das plantas. Os detalhes
de como se manejam os solos de Cerrado do ponto de vista físico, químico e
biológico serão vistos no decorrer do curso de agronomia.
O manejo dos solos compreende as ações para os cultivos tornando-os
viáveis, ao mesmo tempo em que são mantidas suas propriedades físicas,
químicas e biológicas. O estudante aprenderá que o solo não é apenas um
suporte para as plantas e que, do ponto de vista físico, a manutenção de sua
estrutura e porosidade são fundamentais, diante de cultivo intensivo como o
praticado no Cerrado.
Compare-se o funcionamento do solo em ambiente natural do Cerrado, com
o das áreas agrícolas no mesmo bioma – produto da intervenção humana. No
ambiente natural, há um equilíbrio, mantendo-se o fluxo da água. Como
ilustrado em aula, as grandes área planas, conhecidas como “chapadas” são
captadoras de água. A água penetra e percorre o grande volume de solo até
atingir as camadas impermeáveis formadas pelas rochas. Assim, não é em vão
que o Cerrado seja denominado de “caixa d’água”, alimentando as nascentes

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de grandes rios das bacias Paraná-Prata, São Francisco, Tocantins-Araguaia e
Amazônica (Figura 8). Ainda que o ambiente natural seja desfavorável ao
cultivo de espécies de interesse para o ser humano, como as culturas de milho,
feijão e soja, por exemplo, a ocorrência e a distribuição de vasto número de
espécies originadas neste ambiente, demonstra a adaptabilidade das plantas
ao ecossistema a que pertencem, onde evoluíram.

aa
a
a

Solo – Perfil Radicular

Reservatório Alimentador de

Nascentes, Cursos D’água

Rocha b

(impermeável

)
Figura 8. Ambiente de Cerrado: a) vegetação e paisagem; b) solo,
raízes, reservatório de água e rocha impermeável (material de origem).

Tolerantes aos condicionantes de acidez dos solos, escassez de nutrientes


minerais e ao longo período de seca, as plantas do Cerrado povoam as áreas
com seus sistemas radiculares próprios, explorando diferentes volumes de
solo. Mantêm-se, neste conjunto, a porosidade que permite a infiltração de
água, e a estrutura dos solos (Figura 9). No Cerrado, estes são, em geral,
profundos antes de atingir a camada impermeável formada pelas rochas. Aí se
encontra o grande reservatório de água que permite alimentar as nascentes
durante o ano, mesmo em plena época de seca.

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Nuvem

Chuva (precipitação)

Figura 9. Chuva no Cerrado: Quantidade, em valores médios, suficiente


para atender a demanda das plantas, porém concentra-se em seis meses.

Neste ponto, coloca-se um tema para reflexão. Quando os solos são


mal- manejados, com preparo e cultivos repetitivos, compactando-se a camada
superior ou arável (0-20 cm), a água reduz a infiltração, não se recarrega o
reservatório subterrâneo, as nascentes escasseiam e secam, os rios tornam-se
intermitentes. Ou seja, diminuem a vazão no período da seca e transbordam no
período chuvoso. A produção agropecuária em solo compactado fica
comprometida, com erosão e perda de nutrientes. Como agravante, reduz-se a
geração de energia, a navegação fluvial, a irrigação no período da seca;
finalmente, morrem os rios, levando junto todos que deles dependem.
Certamente, quando se abordarem temas específicos como irrigação e
drenagem, manejo e conservação dos solos, percebe-se que, como
mencionado em aula, a forma de aprendizagem é cartesiana. O objetivo maior
da formação é juntar ou integrar as partes para formar o todo – o coroamento
da busca que se inicia na introdução à agronomia. Esse conceito de
aprendizagem, conhecendo as partes que são integradas para gerar o todo,
domina o comportamento humano nas ciências, tendo sido desenvolvido por
René Descartes no século XVII (DESCARTES, 1996). O pensador estabeleceu
as bases da ciência moderna, junto com outros da mesma época, como
Francis Bacon e, antes deles, Galileu Galilei.

Domesticação de Plantas e Animais

O que se entende por domesticar? O ato de domesticar ou de controlar


plantas e animais é o resultado da interferência humana sobre plantas e
animais direcionando os tipos que se adaptam aos seus interesses. Diferente
da teoria evolucionista, que define a seleção natural como agente, favorecendo
a sobrevivência do mais adaptado (Darwin, 1859). Como foi visto em aula, as
plantas e animais passaram por uma etapa de cultivo e domesticação,

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respectivamente, quando nossos ancestrais deixaram de ser nômades. Isto
ocorreu logo depois do fim da última grande glaciação continental, ou era
geológica denominada de Holoceno, ocorrida há 12.000 anos. Nesse período
teve início o cultivo das plantas e dos animais e surgiram as primeiras
ferramentas, precursoras da mecanização da agricultura, aumentando a
capacidade e eficiência de trabalho.
A cultivação ou domesticação, isto é a seleção de plantas e animais por
características de interesse ao ser humano, teve início em várias partes do
planeta, por iniciativa de comunidades. Ao deixar a vida nômade de caçador e
coletor, o ser humano se fixou em um lugar, formando comunidades. Surgiram
as cidades e a civilização.
A domesticação foi um processo praticado por nossos ancestrais que se
tornaram essencialmente agricultores, convivendo com as plantas e os
animais. Em tempos modernos, quando se pratica agricultura com altos níveis
de tecnologia, as plantas e animais melhorados tiveram sua base no legado
dos ancestrais. Ou seja, o melhoramento genético foi moldando as culturas
para atender necessidades do ser humano. Com o passar do tempo, a
humanidade tornou-se mais urbana do que rural. Nos tempos atuais, a
convivência com plantas e animais, que foram base da domesticação, tem,
gradativamente, sido abandonada. Perguntas que caberiam aqui: Como será a
domesticação/cultivo do futuro, considerando-se a existência de inúmeras
espécies de interesse para a humanidade e que se encontram em estado
silvestre? Quantas plantas e animais que poderiam contribuir para melhorar a
existência humana estarão disponíveis, dentre milhares identificadas pela
ciência?
A propósito, como se diferenciam as plantas cultivadas daquelas existentes
na natureza. Algumas delas são associadas aos cultivos como as plantas
daninhas ou invasoras. Na tabela 2 encontram-se algumas características
diferenciadoras de plantas cultivadas e silvestres. Verifica-se que, em linhas
gerais, as plantas cultivadas dependem inteiramente do ser humano, ou seja,
não se reproduzem espontaneamente. Outra pergunta que se poderia formular.
Seria possível infestar áreas agrícolas com sementes soja ou milho?
Comparem-se as características das plantas domesticadas e das plantas
daninhas e veja-se, por exemplo, que o ser humano, ao domesticar, foi
moldando as plantas, eliminando dormência. Sementes dormentes germinam
ao longo do tempo, enquanto as de soja ou feijão germinam quando semeadas,
dependendo do ser humano para crescer e reproduzir.

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Tabela 2. Características de separação entre espécies de plantas
silvestres e domesticadas.
Característica Espécie
Silvestre Cultivada
Altura de planta Elevada Reduzida
Ramificação Intensa Pequena
Maturação Indefinida Coincidente
Semente Dormente/Menor Não-dormente/Maior
Deiscência Presente Ausente
Trilha Difícil Fácil
Germinação Não-Sincronizada Sincronizada
Dormência Presente Ausente
Pelos, Espinho Presentes Ausentes
Substância Tóxica Presente Ausente

Os animais, à semelhança das plantas, foram domesticados por seres


humanos, visando atender aos seus interesses em tração (trabalho), fontes de
alimentos, de fibras, em proteção e lazer. Assim, alguns como cães e gatos
têm servido à humanidade marcando sua presença em vários períodos da
história. Veja-se a diversidade de raças (variações da mesma espécie) de
cães. Estima-se que cães e humanos estejam juntos há pelo menos 20.000
anos, antes mesmo do final da grande glaciação e da domesticação de plantas,
com o subsequente desenvolvimento da agricultura.
Sua função, como companheiro, na defesa e como condutor de
rebanhos, fez com que seleções fossem conduzidas em várias partes do
mundo. A variação, com diferentes formas e tamanhos, teria surgido do lobo,
ancestral dos cães. Igualmente, o boi teria se originado de espécies ancestrais,
como o auroque (Bos primigenius), dando origem a Bos taurus subespécie
indicus e B. taurus subespécie taurus e suas diversas raças. O mesmo
raciocínio é estendido aos animais que servem ao ser humano, tendo sido
selecionados (modificados) para atender ao seu interesse. Citam-se, entre as
características, docilidade, força, tamanho, tipo, produção (leite, carne e ovos).

Figura10. Bos primigenius, ancestral de B. taurus subespécie


indicus (indiano) e B. taurus subespécie taurus (europeu e africano).

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Os animais domesticados dependência do ser humano, diferenciando
dos animais silvestres que, independentemente, se multiplicam e vivem em sua
própria busca por alimentos. Característica marcante nos animais silvestres é
seu instinto de ataque e defesa, tornando-os hábeis em defender seu território,
além da busca por saciarem a fome na caça (animais carnívoros).

Centros de Origem das Plantas e dos Animais Domésticos

As plantas e animais cultivados que hoje são o legado de nossos ancestrais


tiveram sua origem em diversas partes do planeta. O surgimento de
civilizações, a partir da vida sedentária, quando o ser humano deixou o
comportamento nômade, foi fruto dessa proximidade entre seres humanos e a
vida ao redor. Ao conviver com as plantas e animais, espécies e variedades da
mesma espécie foram selecionadas para atender a necessidade humana em
alimentos, fibras, madeira, combustível, cosméticos, medicinais, decoração
dentre os inúmeros usos
Com o crescente intercambio entre povos, a variabilidade, tão necessária
ao processo contínuo foi se dispersando para além dos centros de origem. Na
atualidade, pode-se afirmar que os seres humanos são cosmopolitas. Em uma
refeição, por exemplo, no Brasil: quando comemos arroz, este teve origem e foi
domesticado na Ásia. O feijão em outras partes do continente americano. A
complementação por salada contendo hortaliças – alface, tomate, cebola, alho
– também são espécies exóticas. Ao se incluir carne de boi (originário da Ásia)
ou de porco (originário da Ásia - Oceania), pão de trigo (originário da Ásia),
descobre-se que nossa sustentação depende de plantas e animais que têm
origem em alguma parte do planeta Terra. Por outro lado, quando comemos
produtos e derivados da mandioca, do milho, amendoim, castanha de caju,
jabuticaba, goiaba, abacaxi e maracujá, estamos prestigiando os produtos da
terra brasilis, (antes da descoberta da América, terrae incognitae)
domesticados pelas populações indígenas que nos antecederam.
No século XIX, De Candole e Darwin (DARWIN, 1959) realizaram os
primeiros estudos sobre as origens das plantas cultivadas. Por volta de 1885,
De Candole afirmou que nos centros de origem as plantas ainda seriam
encontradas no seu estado selvagem e com a máxima diversidade genética.
Contudo, foi um agrônomo russo, Nicolai Ivanovich Vavilov, quem efetivamente
definiu centros de origem das plantas cultivadas.
Vavilov realizou estudo minucioso da sistemática, da morfologia, da
genética, da citologia e da imunologia das plantas cultivadas. Entre 1920 e
1950, como pesquisador do Instituto de Fitotecnia de Leningrado, comandou a
equipe de pesquisadores que concluiu os levantamentos, chegando às cartas
da diversificação das plantas (Figura 11).

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Figura 11. Centros de origem das espécies cultivadas (VAVILOV,
1992), primeira aproximação dando origem a outras pesquisas.

Para chegarem a estas conclusões os pesquisadores associaram, aos


estudos de botânica das plantas, preciosos dados históricos que indicavam a
área de sua ocorrência antes dos movimentos comerciais e da agricultura.
Onze zonas de diversificação foram definidas e exploradas, entre 1923 e 1933,
por missões de pesquisadores russos e, entre 1935 e 1939, por missões de
pesquisadores alemães.
Vavilov relatou, em sua obra, que as onze zonas de diversificação das
plantas cultivadas podiam ser agrupadas em oito centros de origem. Esses
centros de origem foram por ele definidos como independentes, ou seja,
separados por algum tipo de barreira geográfica como desertos, oceanos,
cadeia de montanhas etc., cada um sendo identificado por grupos de espécies
nele originadas.
Em cada centro de origem foram identificadas dezenas e às vezes
centenas de espécies vegetais relacionadas com as plantas cultivadas. Dessas
algumas têm importância para a agricultura brasileira e são citadas depois dos
breves comentários sobre cada centro. Nesta relação de centros de origem e
respectivas espécies, aparecem os gêneros e famílias botânicas.

Centro Chinês

Considerado como o maior de todos os centros de origem das plantas


cultivadas, onde Vavilov listou 136 espécies das quais algumas são
apresentadas a seguir:
• Alho e Cebola (Allium spp. - várias espécies, Alliaceae)
• Bambu (Bambusa spp. - várias espécies, Poaceae)
• Rami (Bohemeria nivea, Urticaceae
• Couves, Repolhos (Brassica spp. - várias espécies, Brassicaceae)
• Laranja e Limão (Citrus spp., Rutaceae, centro secundário)

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• Caqui (Diospyrus kaki, Ebenaceae)
• Soja (Glycine max L. (Merrill), Fabaceae)
• Ameixa, Nectarina e Pêssego (Prunus spp. - várias espécies,
Rosaceae)
• Pera (Pirus comunis - várias espécies afins, Rosaceae)
• Rabanete (Raphanus sativus, Brassicaceae)

Centro Indiano

Segundo centro em importância, com 117 espécies cultivadas


conhecidas, dentre as quais se destacam:
• Mostarda-negra (Brassica nigra, Brassicaceae)
• Guandu (Cajanus cajan L. Fabaceae)
• Grão-de-bico (Cicer arietinum L., Fabaceae)
• Laranja e Limão (Citrus spp. - várias espécies, Rutaceae)
• Coco (Cocus nucifera, Arecaceae
• Pepino (Cucumis sativus, Cucurbitaceae)
• Cará (Dioscorea spp., Dioscoreaceae)
• Inhame (Colocasia esculenta, Araceae)
• Algodão (Gossypium herbaceum, Malvaceae)
• Manga (Mangifera indica, Anacardiaceae)
• Arroz (Oryza sativa, Poaceae)
• Pimenta-do-reino (Piper nigrum, Piperaceae)
• Cana-de-açúcar (Saccharum spp., Poaceae)
• Sorgo (Sorghum vulgare, Poaceae, centro secundário)

Centro Indo Malaio

Pode-se considerar este centro de origem como extensão do Centro


Indiano, incluindo todas as ilhas da Malásia e da Indonésia. Listam-se as
seguintes espécies de interesse para a agricultura brasileira:
• Coco
• Inhame (várias espécies)
• Banana (Musa spp. - várias espécies, Musaceae)
• Pimenta-do-reino
• Cana-de-açúcar

Centro Asiático Central

Este centro, sendo menor do que os anteriores, abrange o oeste da China e


a região que corresponde ao Cazaquistão, Quirguistão, Tajiquistão,
Uzbequistão, Turcomenistão e Afeganistão. Dentre as espécies mais
importantes que teriam sido domesticadas, destacam-se:

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• Cebola
• Alho
• Grão-de-bico
• Melão (Cucumis melo L., Cucurbitaceae, centro secundário)
• Cenoura (Daucus carota, Apiaceae)
• Algodão
• Lentilha (Lens culinaris, Fabaceae)
• Linho Têxtil (Linum usitatissimum, Linaceae)
• Pera
• Ervilha (Pisum sativum L., Fabaceae)
• Rabanete
• Centeio (Secale cereale, Poaceae, Centro Secundário)
• Espinafre (Espinaca oleraceae, Amaranthaceae)
• Trigo (Triticum spp., Poaceae - várias espécies)
• Feijão-fava (Vicia faba L., Fabaceae)
• Uva (Vitis vinifera, Vitaceae)

Centro Oriental Próximo ou Crescente Fértil

Este centro tem, como região mais importante, aquela que é denominada
Ásia Menor, oriente médio, ou Crescente Fértil. Inclui o território onde se
encontra o Iraque, antiga Mesopotâmia, e o Iran, também conhecido como
Pérsia, considerado um dos importantes centros de origem da agricultura. Essa
região, na atualidade, tem sido conturbada por guerras e conflitos armados. As
espécies domesticadas mais importantes são:
• Cebola (Centro Secundário)
• Alho-porro (Allium apeloprasum var. porrum, Alliaceae)
• Aveia (Avena sativa L., Poaceae)
• Beterraba (Beta vulgaris L., Amaranthaceae, centro secundário)
• Repolho (Brassica oleraceae, Brassicaceae)
• Mostarda-negra
• Melão
• Grão-de-bico
• Cenoura
• Figo (Ficus carica L., Moraceae)
• Alface (Lactuca sativa L., Asteraceae)
• Lentilha (várias espécies)
• Linho têxtil
• Alfafa (Medicago sativa L., Fabaceae)
• Pera (várias espécies)
• Ervilha (centro secundário)
• Centeio (Secale cereale L. - várias espécies)

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• Trigo (Triticum spp. - várias espécies)
• Uva
• Maçã (Malus domestica, Rosaceae - várias espécies)

Centro Mediterrânico

Este centro agrupa o Norte da África e o Sul da Europa, ou seja, toda região
do Mar Mediterrâneo. Algumas espécies originadas nesta região do mundo
são:
• Cebola
• Alho-porro
• Alho (Centro Secundário)
• Aspargo (Asparagus officinalis L., Asparagaceae)
• Beterraba Silvestre
• Beterrabas (hortaliça e açucareira)
• Nabo (Brassica rapa L., Brassicaceae)
• Mostarda-negra
• Repolho
• Grão-de-bico
• Alface
• Lentilha
• Tremoço (Lupinus spp. - várias espécies, Fabaceae)
• Ervilha
• Trigo (Triticum spp. - várias espécies)
• Feijão-fava

Centro Abissínio

Região da África atualmente conhecida como Etiópia, distinguindo-se pelo


grande número de cereais, com destaque para as espécies:
• Grão-de-bico
• Café (Coffea arabica L., Rubiaceae)
• Quiabo (Abelmoschus esculentus, Malvaceae)
• Cevada (Hordeum vulgare L., Poaceae)
• Lentilha
• Linho Têxtil
• Ervilha
• Mamona (Ricinus communis, Euphorbiaceae)
• Sorgo
• Trigo (Triticum spp., Poaceae - várias espécies)
• Feijão-fava (Centro Secundário)
• Caupi (Vigna sinensis L., Fabaceae)

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• Tef (Eragrostis tef (L.) Moench, Poaceae)

Centro Mexicano do Sul e Centro-Americano

Este centro engloba também as Antilhas. Muitas das espécies têm origem e
são adaptáveis a condições de solo e clima (edafoclimáticas) das regiões
brasileiras. Na realidade algumas espécies, como para outros centros, são de
ocorrência mais abrangente do que se previa na época de Vavilov. São elas:
• Sisal (Agave sisalana, Agavaceae)
• Caju (Anacardium occidentale L., Anacardiaceae)
• Feijão-de-porco (Canavalia ensiformis, Fabaceae)
• Pimenta e Pimentão (Capsicum spp., Solanaceae, várias espécies)
• Mamão (Carica papaya L., Caricaceae)
• Abóboras (Cucurbita spp., Cuicurbitaceae, várias espécies)
• Algodão (Gossypium hirsutum, G. barbadense, Malvaceae)
• Batata-doce (Ipomea batatas L., Convolvulaceae)
• Abacate (Persea gratissima L., Lauraceae)
• Feijão "Ayocote" (Phaseolus coccineus L., Fabaceae)
• feijão-de-lima (Phaseolus lunatus, Fabaceae)
• Feijão (Phaseolus vulgaris L., Fabaceae)
• Goiaba (Psidium guajaba L., Myrtaceae)
• Cacau
• Milho (Zea mays L., Poaceae)

Centro Sul Americano

Este centro estende-se pela região da Cordilheira dos Andes,


especialmente Bolívia, Colômbia, Equador e Peru. Algumas das espécies de
maior importância são:
• Abóbora (Cucurbita pepo, Cucurbitaceae, várias espécies)
• Algodão
• Tomate (Solanum lycopersicum, Solanaceae)
• Fumo (Nicotiana tabacum L., Solanaceae várias espécies)
• Maracujá (Passiflora edulis L. - várias espécies)
• Feijão-de-lima - Sementes grandes (Centro Secundário)
• Feijão (Centro Secundário)
• Goiaba
• Batata (Solanum tuberosum L., Solanaceae - várias espécies)
• Milho (centro secundário)
• Batata Doce

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Ligados ao Centro Sul Americano, encontram-se, por extensão os centros
da Ilha de Chiloé e Brasileiro-Paraguaio.

Centro Ilha de Chiloé

Extensão do Centro Sul-Americano, o menor de todos não só pela pequena


extensão territorial, mas no número de espécies: apenas quatro, com destaque
para:
• Batata (Solanum tuberosum)

Centro Brasileiro-Paraguaio

Subdivisão do Centro Sul-Americano onde se destacam as seguintes


espécies:
• Caju
• Abacaxi (Ananas comosus L. - várias espécies)
• Amendoim (Arachis hyopogeae L., Fabaceae)
• Castanha-do-pará (Bertholletia Excelsa L., Lecythidaceae)
• Seringueira (Hevea brasiliensis L., Euphorbiaceae)
• Erva-mate (Ilex paraguaiensis L., Aquifoliaceae)
• Mandioca (Mniot esculenta L., Euphorbiaceae)
• Jabuticaba (Myrciaria cauliflora, Myrtaceae)
• Maracujá (Passiflora spp., Passifloraceae)
• Cacau (Theobroma spp., Ssterculiaceae - várias espécies)
• Cupuaçu (Theobroma grandiflorum, Sterculiaceae)

Na imensa lista de espécies domesticadas, algumas aparecem mais de


uma vez nos centros de origem, demonstrando duplicação. Poderia se
perguntar, relativo a algumas espécies: Como é possível cacau ter origem em
uma região tão vasta como a América Tropical? Ou, cevada tendo se originado
em Ásia e África, igualmente uma imensa área? Outras espécies não
aparecem, como o girassol, dentre as referenciadas por Vavilov. Onde surgiu
ou tem maior diversidade? Trata-se de uma das poucas espécies, originária da
América do Norte (Estados Unidos), de domesticação relativamente recente.
Aparecem ainda espécies madeireiras, como eucalipto (Eucalyptus spp.,
Myrtaceae, várias espécies) também não listadas por Vavilov. Esta planta,
originária da Austrália, grande acumuladora de celulose tem sido base da
produção de papel no Brasil e outras regiões tropicais e subtropicais do mundo.
Modernamente, alguns autores têm sugerido modificações na proposta
original de Vavilov, especialmente em razão da sobreposição que ocorre entre
os centros em relação a muitas espécies. Obviamente, como mencionado, a
teoria foi formulada há quase 100 anos, quando os meios de comunicação não
eram tão fáceis. Também, não se levava em conta o modo de reprodução e

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propagação das espécies. Assim, o algodão apresenta espécies asiáticas ou
africanas e espécies americanas. Uma teoria seria a associação dessas
espécies com ambiente insular (de ilhas). As sementes flutuam e podem ser
levadas por correntes oceânicas, dispersando e dando origem a espécies e
variedades. Imagine-se coqueiro (Cocus nucifera), tendo se originada na Ásia
tropical, em áreas litorâneas. Os frutos secos quando caem flutuam e são
levados pelas correntes, dispersando e ampliando sua ocorrência no mundo
tropical.
Modernamente, sugere-se mudança de terminologia usando-se o nome
de Centros de Diversidade Genética em lugar de Centros de Origem.
Considerando que centros de origem são definidos como a região ou local
onde as plantas passaram do estado silvestre para o de cultivadas, e que nem
sempre ficou delimitado, entende-se a polêmica.
Os trabalhos de identificação e definição dos centros de origem das
plantas foram feitos na primeira metade do século XX, ou seja, recentemente,
em comparação a existência e domesticação das espécies. Assim, muitos
autores preferem considerar centros de diversidade genética a partir dos quais
houve a dispersão das espécies.
Por outro lado, por formas de propagação – mecanismo de dispersão:
estrutura da semente (com plumas, aladas, flutuantes), vetores (insetos,
pássaros e outros animais, incluindo o próprio ser humano), houve dispersão
aumentando a área de abrangência. Desde antes da história, tem havido
intercâmbio entre populações de humanos. Possivelmente, esta foi uma forma
efetiva de ampliar-se a área de abrangência e diversidade nas espécies
cultivadas.
Um exemplo é a quinoa cujo centro de origem primário seriam os
arredores do Lago Titicaca. O lago situa-se a 3.800m de altitude sobre o nível
do mar. Entretanto, existe quinoa nos vales (2.000-3.000 m) e em outras partes
da cordilheira dos Andes. No apogeu do império Inca, pouco antes da
conquista espanhola, cultivava-se quinoa desde o Sul da Colômbia até o Norte
da Argentina e do Chile. A introdução do cultivo em locais com grande variação
de ambiente (clima e solo) fez surgirem novos recombinantes genéticos,
aumentando a variabilidade. Esta seria uma forma de gerar diversidade,
extrapolando aos centros de origem (SPEHAR et al., 2014).
O mesmo fenômeno pode ter ocorrido com as espécies cultivadas com
amplos usos (alimentação e matéria prima – alimento animal, fibra etc.), como
milho, algodão, soja, cevada e aveia.
Dos animais domesticados, destacam-se os asininos (asno ou jumento),
os equinos (cavalo), os bovinos (boi), os suínos (porco), os caprinos (cabra), os
ovinos (ovelha) e as aves (galináceos). Domesticados na Ásia, representam
parcela considerável da produção de carne, leite, ovos e derivados consumidos
em todo o mundo. Algumas das espécies de grande porte se destacam na
tração animal, muito comum no passado. Existem outros animais domesticados
regionalmente, como o camelo, a lhama e a alpaca (camelídeos).

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De uma forma geral e para facilitar nossa percepção, associem-se
espécies de origem tropical e de ambiente de clima temperado, com os
respectivos continentes de origem. Assim, as várias espécies, perenes, de
citros (Citrus spp.), maçã e pera (Pirus spp.) foram domesticadas na Ásia
subtropical, bem como a soja, o arroz, o trigo, a aveia, o grão-de-bico, espécies
anuais. O feijão (Paseolus vulgaris), o milho (Zea mays), espécies anuais foram
domesticados no continente americano, assim como o cacau (Teobroma
cacao), o caju (Anacardium ocidentale), perenes, no ambiente tropical.

Classificação Binomial de Plantas Animais e Micro-organismos

Até o século XVIII, as plantas e os animais eram classificados por seus


nomes comuns. Isto causava problemas devidos aos regionalismos e
significados, dificultando sua identificação correta. Nas ciências biológicas
começaram esforços, a partir do século XVVII, no sentido de se criar uma
denominação que universalizasse os nomes, usando critérios científicos.
Surge, no século seguinte a nomenclatura binomial ou nomenclatura binária
designa o conjunto de normas que regulam a atribuição de nomes científicos às
espécies de seres vivos. O nome binominal porque cada espécie é
denominada por duas palavras: o gênero e o epíteto específico, normalmente
um adjetivo que qualifica género. Tome-se o exemplo do arroz que recebe a
classificação de Oryza sativa L. Entendendo como se compõe a classificação:
Oryza – nome dado ao gênero; sativa a espécie deste gênero. Utilizaram-se
latim e grego para designar os nomes em sistemática. Na tradução literal,
significa arroz cultivado. Assim, tem-se Oryza, gênero, que neste caso, em
latim, é feminino. A espécie sofre a flexão de gênero e recebe o nome de sativa
(cultivada). O exemplo de uso do masculino vem de Pisum sativum L. Pisum,
gênero, significando ervilha, enquanto sativum (cultivado) flexiona com o
gênero. Oberve-se que os nomes sào grafados em itálico e depois do nome
binomial, aparece o nome de quem classificou. Seguem outros exemplos para
ilustrar: Phaseolus vulgaris L. (significando feijão comum ou popular). O L. é a
abreviatura de Linaeus ou Lineu. Manihot esculenta Crantz. é binômio de
gênero e espécie para mandioca, significando mandioca comestível. Crantz,
depois do nome se refere a Heinrich Johann Nepomuk von Crantz, taxonomista
do século XVIII.
Com estes exemplos e definições, objetivamos demonstrar que a
nomenclatura binomial se tornou referência para a classificação científica das
plantas inicialmente e de todos os seres vivos sendo regulada pelos códigos
específicos da nomenclatura botânica, zoológica e bacteriológica. Foi
primeiramente proposta pelo naturalista suíço Gaspard Bauhin, no século XVII
e formalizada por Carl Von Linné no século seguinte. Os nomes utilizados são
em latim, ou numa versão latinizada da palavra ou das palavras que se
pretende utilizar. O nome genérico e o epíteto específico são escritos em tipo

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itálico, ou, alternativamente, ser sublinhados, seguidos pelo autor ou autores da
descrição.
Embora no âmbito do esforço de unificação da nomenclatura biológica os
conceitos tenham sido fundidos, tendo hoje o mesmo significado,
tradicionalmente, no campo da zoologia, o conceito é referido como
"nomenclatura binominal", enquanto que, no campo da botânica, da micologia e
da bacteriologia, o conceito é, geralmente, apelidado "nomenclatura binária"
ou, por vezes, "nomenclatura binomial".
Como exemplos de micro-organismo, temos o fungo Cercospora sojina
Hara ou mancha olho-de-rã, que causa doença em soja. Cercospora vem do
grego kerkos (Κέρκος), cauda e spório (σπόριο). Portanto, esporo com cauda e
soutzína (σουτζίνα) da soja. Hara foi o micologista Kanesuke Hara quem
classificou o patógeno (causador de doença). Dentre as bactérias patogênicas
tem-se Xanthomonas albilieans (Ashby) Dowson em cana-de-açucar, do grego,
xanthos = amarelo; monas = unidade ou ξανθόμων; albilineans do latim =
linhas brancas. A taxonomia foi primeiramente definida por Ashby e depois por
Dowson.
A nomenclatura binomial é o método universalmente aceito para a
atribuição do nome científico a espécies (com excepção dos vírus). Como o
termo "binomial" sugere, o nome científico de uma espécie é formado pela
combinação de dois termos: o nome do género e o descritor específico. Apesar
de alguns pormenores diferirem consoante o campo da biologia em que a
espécie se insere, os traços determinantes do sistema são comuns e
universalmente adaptados:
As espécies são identificadas por um nome composto por dois nomes: um
nome genérico e um descritor específico. Nenhum outro taxon pode ter nomes
compostos por mais de um complemento.
As subespécies têm um nome composto por três nomes, ou seja, um
trinome, colocados pela seguinte ordem: nome genérico, descritor específico e
descritor subespecífico. Exemplos: Rhea americana alba, onde alba é a
subespécie; Canis lúpus (lobo), recebe o nome trinomial de Canis lupus
familiaris, ou cão doméstico; Equus asinus var. catalana é o nome do jumento
da Catalunha, Espanha.
Todos os taxa hierarquicamente superiores à espécie tem nomes
compostos por uma única palavra, ou seja, um "nome uninominal".
O primeiro termo, o nome genérico é sempre escrito começando por uma
maiúscula, enquanto o descritor específico (em zoologia, o nome específico,
em botânica o epíteto específico) nunca começa por uma maiúscula, mesmo
quando seja derivado de um nome próprio ou de uma designação geográfica.
:Nestes casos, Carolus Linnaeus usava maiúscula no descritor específico,
sendo prática comum até princípios do século XX capitalizar o descritor
específico se este derivasse de um nome próprio.

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Figura 12 Fac-símile de Species Plantarum e Sistema Naturae, livros
publicados pelo taxonomista Caroli Linnaei (Carl Nilsson Linnæus) no
século XVIII.

Relações Atmosféricas, Radiação Solar e a Vida no Planeta Terra

Radiação solar, ou energia radiante emitida pelo Sol, é a transmitida por


ondas eletromagnéticas. Aproximadamente, metade desta energia é emitida
como luz visível na parte de frequência mais alta do espectro eletromagnético e
o restante na do infravermelho próximo e como radiação ultravioleta. A
radiação solar fornece anualmente para a atmosfera terrestre 1,5 x 1018 kWh
de energia. Esta, além de suportar a vasta maioria das cadeias tróficas ou
alimentares, tem sustentado a vida na Terra, sendo a principal responsável
pela dinâmica da atmosfera terrestre e pelas características climáticas do
planeta.

Densidade Média do Fluxo Energético

A densidade média do fluxo energético proveniente da radiação solar é


de 1.367 W/m2, quando medida num plano perpendicular à direção da
propagação dos raios solares no topo da atmosfera terrestre. O valor médio, ou
constante solar, foi adotado como padrão pela Organização Meteorológica
Mundial. Mesmo assim, flutua durante o dia e cada dia, além de variar com a
constante alteração da distância da Terra ao Sol, consequência da forma
elíptica da órbita terrestre e das alterações na superfície do Sol (cromosfera e

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coroa solar). Ali surgem pontos mais aquecidos e frios em constante mutação,
associadas a erupções cromosféricas e outros fenómenos que se traduzem na
formação das manchas solares e na complexa dinâmica dos ciclos solares.
A Terra recebe energia que é determinada pela projeção da sua
superfície sobre um plano perpendicular à propagação da radiação (π R2, onde
R é o raio da Terra). Como o planeta roda em torno do seu eixo, esta energia é
distribuída, embora de forma desigual, sobre toda a sua superfície (4 π R 2). Daí
a radiação solar média recebida sobre a terra, ou insolação, corresponde a 342
W/m2, a quarta parte da constante solar. O valor real recebido à superfície
terrestre depende da latitude e da época do ano (em função da posição da
Terra ao longo da eclíptica), do estado de transparência da atmosfera sobre o
lugar, em particular da nebulosidade. Na atualidade, a radiação solar se mede
com radiómetros que registam a composição espectral e a energia recebida.

Composição Espectral

Espectro da irradiância solar acima da atmosfera (azul) e à superfície


terrestre (amarelo).
A radiação solar que atinge o topo da atmosfera terrestre provém da região da
fotosfera solar, uma camada ténue de plasma com aproximadamente 300 km
de espessura e com uma temperatura superficial da ordem de 5 800 K (5800 K
− 273,15 = 5526,85 °C).
A dependência entre composição espectral e temperatura faz com que o
espectro da luz solar corresponda, aproximadamente, ao de um corpo negro
aquecido a cerca de 6 000 K. Mesmo assim, apresenta assimetria resultante da
maior absorção da radiação de comprimento de onda mais curto pelas
camadas exteriores do Sol.
Em termos de comprimentos de onda, a radiação solar ocupa a faixa
espectral de 100 nm a 3.000 nm (3 μm), tendo uma máxima densidade
espectral em torno dos 550 nm, comprimento de onda que corresponde
sensivelmente à luz verde amarelada, A parte mais alongada do espectro, tem
a sua máxima intensidade na banda dos infravermelhos próximos, decaindo
lentamente com a diminuição da frequência. Quanto à radiação mais
energética, isto é, ondas de comprimento curto, apesar da maior parte ser
absorvida pela atmosfera, a radiação ultravioleta (UV) é suficiente efeitos
danosos sobre os seres humanos.
Plantas são submetidas a luz solar durante o dia, expostas à radiação.
Os raios UV causam danos, porém elas possuem um forte mecanismo de
proteção. Na verdade, elas utilizam um que os humanos também usam, mas
de forma bem mais eficaz, e foi isso que um novo estudo publicado na revista
Nature Communications mostrou. O mecanismo funciona assim: o DNA é
formado por duas fitas (hélices, no nome “científico”) que formam uma espécie
de espiral. Quando esse DNA é danificado pelos UV, proteínas responsáveis
pelo conserto a trocam por uma nova. Esse processo é chamado de reparo por

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excisão (remoção) de nucleotídeo — que são as unidades do DNA formada
pelas bases adenina (A), guanina (G), citosina (C) e timina (T). Esse processo
é chamado de reparo por excisão (remoção) de bases ou nucleotídeos

Interação com a Terra

A energia solar incidente sobre a atmosfera e a superfície terrestre


segue um de três destinos: ser refletida, absorvida ou transmitida. Parte
substancial da energia recebida sobre a superfície terrestre é reenviada para o
espaço sob a forma de energia refletida. Nuvens, massas de gelo, neve e a
superfície terrestre atuam como refletores, reenviando para o espaço entre 30
e 40% da radiação recebida (enquanto a Lua reflete sob a forma de luar
apenas 7 a 12% da radiação incidente). A razão entre radiação refletida e
incidente chama-se albedo.

Absorção Atmosférica e o Efeito Estufa

Entre a irradiância do Sol medida fora da atmosfera e a energia que


atinge a superfície da Terra, existem diferenças substanciais resultantes da
absorção atmosférica. Esta é seletiva, atingindo o seu máximo em torno dos
pontos centrais dos espectros de absorção dos gases atmosféricos. Considere-
se a elevada absorção do ozónio (O3) atmosférica na banda dos UV e no efeito
do vapor de água (H2O) e do dióxido de carbono (CO2), estes atuando
essencialmente sobre os comprimentos de onda maiores.
A absorção seletiva está na origem do efeito de estufa, devido ao fato da
radiação terrestre, resultante do retorno da radiação solar ao espaço por via do
aquecimento da Terra, ser feita essencialmente na banda dos infravermelhos
longos, para a qual o CO2 tem grande capacidade de absorção.
A parcela absorvida dá origem, conforme o meio, aos processos de foto
conversão e termo conversão. Na foto conversão, a energia absorvida é
remetida, embora em geral com frequência diferente, sendo os novos fótons
em geral sujeitos a absorções, em efeito cascata, terminando em termo
conversão - captura de energia e conversão em calor, passando o material
aquecido a emitir radiação com um espectro correspondente à sua
temperatura, o que, no caso da Terra, corresponde à radiação infravermelha
que forma o grosso da radiação terrestre.

Transmissão da Energia
De toda a radiação solar que chega às camadas superiores da
atmosfera, apenas uma fração atinge a superfície terrestre, devido à reflexão e
absorção dos raios solares pela atmosfera. A fração que atinge o solo é
constituída por uma componente direta (ou de feixe) e por uma componente
difusa. Dessas componentes, se a superfície receptora estiver inclinada com

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relação à horizontal, haverá uma terceira componente refletida pelo ambiente
circundante (nuvens, solo, vegetação, obstáculos, terreno).
Antes de atingir o solo, as características da radiação solar (intensidade,
distribuição espectral e angular) são afetadas por interações com a atmosfera
devido aos efeitos de absorção e espalhamento. Essas modificações são
dependentes da espessura da camada atmosférica atravessada (a qual
depende do ângulo de incidência do Sol, variável ao longo do dia). Este efeito é
em geral medido por um coeficiente designado por Coeficiente de Massa de Ar,
o qual é complementado por um fator que representa as condições
atmosféricas e meteorológicas existente no momento.

O Equilíbrio Energético no Planeta

Em valores médios, da radiação solar incidente (sobre o sistema


Terra/atmosfera), tem-se que:

* 19 % são perdidos por absorção pelas moléculas de oxigénio e ozónio da


radiação ultravioleta (de alta energia) na estratosfera (onde a temperatura
cresce com a altitude);
* 6% são perdidos por difusão da luz solar de menor comprimento de onda,
azul e violeta, explicando a cor azul que se vê no céu.
* 24% são perdidos por reflexão - 20% nas nuvens e 4% na superfície. (O
albedo do planeta é de 30% (6% difusão+24% reflexão);
* 51% sãos absorvida pela superfície. Os valores apresentados representam a
média. Nos polos (norte e sul terrestres) a reflexão da radiação solar incidente
é geralmente maior do que 24% e nos oceanos é menor do esse valor.
A energia radiada pela superfície da Terra, em raios infravermelhos,
corresponde a cerca de 117% do total de radiação solar incidente (sobre o
sistema Terra/atmosfera). Dessa energia, apenas 6% é emitida diretamente
para o espaço (emissão terrestre) e 111% é absorvida pelos gases de estufa
da atmosfera, que reemite depois, de volta para a superfície, uma energia
correspondendo a 96% da radiação solar incidente. Finalmente, a energia de
64% da radiação solar incidente é emitida pela atmosfera para o espaço
(emissão atmosférica). Estes números traduzem o equilíbrio no sistema
Terra/atmosfera: a radiação emitida para o espaço é igual à radiação solar
incidente [24% (reflexão) + 6% (difusão) + 64% (emissão atmosférica) + 6%
(emissão terrestre) = 100%].
No entanto, em média, a superfície absorve mais radiação da que emite
e a atmosfera radia mais energia do que a que absorve. Em ambos os casos, o
excedente de energia é de cerca de 30% da radiação solar incidente no
sistema Terra/atmosfera: a) superfície - energia absorvida: 147% (51% do Sol
+ 96% da atmosfera); energia emitida: 117%; b) atmosfera - energia absorvida:

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130% (19% ultravioleta. + 111% emissão terrestre); emitida: 160% (64% para o
espaço + 96% para a superfície).
A partir desta constatação se concluiria, que a superfície aqueça e a
atmosfera arrefeça. Isso não acontece porque existem outros meios de
transferência de energia da superfície para a atmosfera que representam, no
seu conjunto, uma transferência líquida de 30% do total de radiação solar
incidente que equilibra o cômputo de energia no planeta.
O ar quente que se eleva a partir da superfície transfere calor para a
atmosfera. Essa transferência de calor (o fluxo de calor sensível) corresponde
a um valor de energia que é 7% do total de radiação solar incidente.
A evaporação da água na superfície do planeta corresponde a uma
extração de calor que acaba por ser liberado durante o processo de
condensação na atmosfera (que dá origem à formação das nuvens). Essa
transferência de calor (o fluxo de calor latente) corresponde a um valor de
energia que é 23% do total de radiação solar incidente.

Figura 13. Radiação solar incidente e relações com a atmosfera, a


superfícies terrestre, a refletida para o espaço e a retida na atmosfera,
(infravermelha e ultravioleta) que eleva a temperatura e gera efeito estufa.

Mudanças Climáticas, Ambientais e Impacto Global

Mudanças climáticas, alterando a composição da atmosfera, têm afetado o


clima em escala global, e regional durante a existência do Planeta Terra. Os
fatores de aferição são: temperatura, precipitação, nebulosidade, ventos e
outros, podendo ter causas naturais ou antropogênicas. Estas últimas
constituem evento recente, se intensificando no último século.

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As causas naturais correspondem ao ciclo solar, variação orbital, deriva dos
continentes, efeitos el Niño e la Niña relacionados a correntes oceânicas,
influenciando esfriamento e aquecimento globais causando glaciações e o
derretimento do gelo em geleiras e nos polos. Enquanto o vulcanismo, menos
intenso na atualidade, em termos geológicos, pode também exercer influência
sobre o clima. Um exemplo de história recente, ocorrido em 1887, foi a erupção
do vulcão Cracatoa, situado em ilha da Indonésia próximo a Java. A atividade
foi tão intensa, lançando cinza na atmosfera, visível em várias partes da Terra.
Naquele período não foi possível determinar os seus efeitos sobre o clima, algo
que acabou passando despercebido.
As causas antropogênicas são ligadas ao ser humano ou à atividade
humana: aumento de poluição e queimadas: emissão de gases de efeito estufa
por vários meios, entre eles, o mais importante tem sido a queima de
combustíveis fósseis. O efeito estufa é consequência da absorção das
radiações ultravioleta e infravermelha pelos gases da atmosfera terrestre,
fazendo com que o planeta se aqueça. Regula a temperatura e permite a
proliferação da vida; sem esse fenômeno não haveria vida na Terra. Entretanto,
quando a proporção desses gases é < 1%, na composição da atmosfera,
rompe-se o equilíbrio entre energia que entra e a que sai, causando aumento
da temperatura.

Relações entre Atmosfera Terrestre e Radiação Solar

Como foi visto, a radiação incidente chega à superfície da Terra e depois,


parte dela transformada em calor, retorna ao espaço. A atmosfera atua como
regulador da temperatura na superfície do planeta. Sem atmosfera a superfície
de nosso planeta seria comparável ao que ocorre na Lua ou, em menor escala,
nos desertos – durante o dia a temperatura aumenta e à noite baixa a níveis
inferiores a zero grau 0C. A presença de gases e de água na atmosfera
contribui para regular as variações em temperatura.
O interessante a se ressaltar é que a atmosfera se compõe de 78 % de
nitrogênio, 21 % de oxigênio, 0,0385 % de CO2, 0,9 % de Argônio e 0,0615 %
dos demais gases. Portanto, a título de curiosidade, quando respiramos, o
nitrogênio entra e sai de nossos pulmões em grande quantidade; do ar
retiramos apenas o oxigênio que é devolvido ao espaço combinado com
carbono (CO2). Ainda que, a proporção de CO2 na atmosfera seja
extremamente baixa, apresenta elevado poder de causar impacto negativo,
caso continue a aumentar.

Atividade Humana e Alterações Atmosféricas

A atividade humana, com base em sua matriz energética, tem contribuído


para um aumento crescente da temperatura global. Com a intensificação do
uso de combustíveis fósseis (carvão e petróleo), a partir do século XIX, a

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emissão de gases tem aumentado, alterando a composição da atmosfera. O
impacto tem sido maior por aumento nas emissões de CO 2, porém outros
gases se somam, causando o efeito estufa. O efeito estufa corresponde às
alterações no comportamento da luz incidente que chega ao planeta Terra,
proveniente do sol. Parte da radiação que refletiria de volta ao espaço, se
difunde pela atmosfera, aquecendo-a.
Desde fins do século XIX e início do XX, a principal matriz energética tem
continuado no uso de combustíveis fósseis, verificando-se relação da
temperatura com aumento significativo na quantidade de poluentes na
atmosfera. Dentre estes se destacam o dióxido de carbono (CO2), Metano
(CH4) e os óxidos de nitrogênio (NOx). A maior parte das emissões de CO2 é
proveniente dos combustíveis fósseis, respondendo por cerca de 80 % do
aquecimento global. Entretanto, as emissões de metano (CH4) e óxido nitroso
(NO2) são provenientes do aumento gradual da temperatura e de atividade
agrícola.
As principais fontes de metano são: emanação de vulcões; de lama e falhas
geológicas; decomposição de resíduos orgânicos; fontes naturais (pântanos);
extração de combustível mineral; digestão de animais herbívoros – “arroto do
boi”; ação de bactérias; aquecimento ou combustão de biomassa anaeróbica.
O Brasil, com o maior rebanho bovino do mundo, seria um poluidor em
escala. Contudo, é necessário levar em conta o balanço entre o que é emitido e
o imobilizado, no caso o corpo do animal. Esse balanço é importante, como se
verá em seguida, pois a agropecuária tem sido algumas vezes apontada como
vilã, contribuindo para aumentar a emissão de gases de efeito estufa. Por
outro lado, como consequência do aquecimento, regiões imensas em áreas de
clima temperado sofrem com o degelo. Assim, lagos e pântanos passam a
liberar metano, antes imobilizado no gelo. No hemisfério norte, acima do círculo
polar ártico, isto tem se evidenciado no degelo da camada abaixo da superfície,
atingindo o pergelissolo (permafrost, em ingês). Portanto, o aquecimento global
contribui para se intensificarem as emissões, como reação em cadeia.
Quanto ao óxido nitroso (N2O) há uma ligação entre ele e o uso de
fertilizantes nitrogenados. Em 1950 eram utilizados 3 106 t no mundo; hoje a
proporção é maior do que 50 106 t. Quanto ao potencial de causar o efeito
estufa, uma molécula de N2O equivale a 250 moléculas de CO2. Na conversão
de florestas em pastagens – emissão de CO2 (fogo e não assimilação daquele
existente) há aumento na disponibilidade imediata de N (mineralização pelo
fogo), com liberação significativa de N2O. A atividade agropecuária que se
estabelece, a partir da abertura de novas áreas nos biomas pode e deve ser
conduzida para integrar a tecnologia existente e levar a um balanço positivo.
Este tem sido o foco da nova agropecuária, tema que será desenvolvido ao
longo do curso de agronomia.

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Consequências das Emissões de Gases

Com o aumento da temperatura pela absorção da energia solar na


atmosfera alterada por gases de efeito estufa, há o derretimento da calota
polar, de geleiras, além do pergelissolo, elevando o nível dos oceanos. Os
desertos tendem a aumentar, por irregularidades cada vez maiores na
distribuição das chuvas. Em consequência, muitos países com baixas altitudes
e extensos litorais perderão parte de seu território e os situados em regiões
semiáridas terão a produção de alimentos inviabilizada. A produção
agropecuária, dependente da distribuição de chuvas ficará mais ameaçada, por
aumento nas inconstâncias climáticas. Comprometendo-se a produção
agropecuária, crescerá a degeneração a condição de vida e, no final, se as
alterações atmosféricas intensificarem, todos os humanos sucumbirão.
Observações têm demonstrado que geleiras diminuem enquanto os
desertos aumentam. O próprio desbalanceamento atmosférico, contribui para
gerar instabilidades, alterando movimento de ventos e influenciando variações
climáticas. Explicitamente, os eventos ocorrem em cadeia, de forma
interdependente.
Safras agrícolas têm sido reduzidas por secas prolongadas ou excesso de
chuvas em períodos de colheita. Com a perda da produção, os alimentos e
matérias primas gerados pela agricultura escasseiam e há um aumento nos
preços, comprometendo o acesso a parcela considerável da população com
menor poder aquisitivo. As crises de abastecimento e fome tenderão a crescer,
ainda que no presente não sejam notórias em nível global.

Evidências de Mudanças

Aferições sobre variações no clima tem indicado aumento na


temperatura média, diminuição no número de dias com geada em todos
continentes, secas e chuvas em proporções maiores do que o previsto em
ambientes diferentes e aumento de 12 a 22 cm no nível dos oceanos.
Ademais, a espessura da camada de gelo no Ártico está 40% mais fina
nas últimas décadas e tem diminuído a 2,7% por década; a duração do gelo e
extensão da camada de gelo tem diminuído em algumas regiões. No
Hemisfério Norte – plantas têm florescido mais cedo, aves migratórias chegam
antes e o acasalamento se antecipa; insetos aparecem mais cedo e têm um
período mais longo para se multiplicar. Secas e aumento de temperatura no
verão têm causado queimadas na Sibéria (Círculo Polar Ártico). Nos oceanos
tem ocorrido o branqueamento (morte) de corais. Estes e outros eventos têm
ocorrido com rapidez jamais vista.

Variações Climáticas, Protocolos e Acordos Internacionais

Diante de evidências e preocupações crescentes sobre as mudanças


climáticas e seus impactos, surgiu um tratado internacional em 1997, o

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Protocolo de Kyoto, estabelecendo compromissos para reduzir a emissão dos
gases de efeito estufa (GEE). Foi aberto para assinatura em 1997 e ratificado
em 1999, por 55% dos países que produzem 55% das emissões. Entrou em
vigor a partir de 16/02/2005. O protocolo estabelece calendário para reduzir
emissões por países-membros (desenvolvidos) em pelo menos 5,2%, relativos
aos níveis de 1990, entre 2008 e 2012.
Entretanto, as metas de redução não têm sido homogêneas entre países.
Mais recentemente, surgiu o acordo de Paris, um tratado no âmbito da
Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima
(CQNUMC), que rege medidas de redução de emissão de gases estufa a partir
de 2020, a fim de conter o aquecimento global abaixo de 2 ºC,
preferencialmente em 1,5 ºC, e reforçar a capacidade dos países de responder
ao desafio, num contexto de desenvolvimento sustentável.
O acordo foi negociado em Paris e aprovado em 12 de dezembro de 2015,
acertando comprometimento dos países poluidores, com ações concretas para
a mudança da matriz energética global. Investimentos em fontes alternativas,
como energia eólica e solar fotovoltaica. Mesmo diante de evidências,
demonstradas pela ciência, mais recentemente (2017), Donald Trump,
presidente dos Estados Unidos da América, decidiu, de forma unilateral e à
revelia de cientistas, políticos e empresários daquele país, a retirada do acordo
de Paris.
Na esfera mundial, o Brasil ocupa a quarta posição entre os países
poluidores, correspondendo à terça parte gerada pelos Estados Unidos da
América, maior poluidor que responde por mais de 15 % das emissões de
gases de efeito estufa, com população total que representa 4% da população
global
No Brasil, as emissões são relacionadas às queimadas, frequentes na
época da seca nas regiões Centro-Oeste e Norte. Isto se pode evitar e reduzir,
diferente do que ocorre em países como Estados Unidos, China e Indonésia,
onde a as emissões por queima de combustíveis fósseis na indústria e nos
veículos automotores é grande poluidora e requer maior tempo para
adequações. Mais recentemente, a China com seu espetacular crescimento
econômico, tem sido responsável pelo aumento nas emissões, pois, igualmente
aos demais, emite gases queimando combustível fóssil: petróleo e carvão.

Ações para Reverter o Problema

Em decorrência, das tendências de aumento da temperatura, surgiu o


Painel Internacional sobre Mudanças Climáticas (International Panel for Climate
Change - IPCC). O IPCC foi estabelecido em 1988 pela Organização
Meteorológica Mundial (OMM) e o Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (PNUMA). É um órgão intergovernamental aberto para os países
membros do PNUMA e da OMM.

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Esse painel tem como propósitos avaliar as mudanças na composição da
atmosfera e alterações no clima terrestre; propor soluções de mitigação do
efeito estufa causado pela atividade humana; e projetar cenários sobre o que
pode ocorrer na Terra. O IPCC apresenta três grupos de trabalho: o GT1
recupera a informação científica a respeito da mudança do clima; o GT2 avalia
os impactos ambientais e socioeconômicos da mudança do clima; o GT3
formula estratégias de resposta às MCG (adaptação e mitigação – atenuação).
Como consequência das emissões de gases, tem-se associado mudança
na composição da atmosfera com o aumento da temperatura média global,
chegando a 0,74 0C nos últimos 100 anos. No quarto relatório do IPCC, projeta-
se um aumento da temperatura média global entre 1,8 e 4,0 0C nos próximos
100 anos, se nada for feito.
Ações para contornar o problema do aquecimento global, requerem
investimento em pesquisa nas áreas prioritárias de melhoramento genético das
culturas para resistência à seca; seleção de plantas tolerantes ou resistentes a
pragas e doenças que devem intensificar com o aumento da temperatura e de
irregularidades nas precipitações pluviométricas (chuvas).
As emissões têm de ser reduzidas, seguindo um planejamento global,
mitigando a intensificações das irregularidades climáticas. Deve crescer a
busca por crédito de carbono, quando se estabelecem reservas ou plantios
florestais. Países poluidores negociam com outros menos desenvolvidos e com
potencial agropecuário para se estabelecerem áreas em que florestas ou
outros cultivos permanentes sequestram carbono do ar, imobilizado na
biomassa vegetal.
Por outro lado, deve intensificar a busca por mudanças na matriz energética
– uso de energia eólica (aproveitando o movimento do vento) e solar. As
emissões de metano devem ser o foco de pesquisa, buscando formas de
reduzir as emissões pelos seres vivos (ruminantes) e por áreas naturais que
passam por degelo, por exemplo. O sequestro de carbono (C), fixando o
elemento na biomassa deve contribuir para reduzir a proporção de gás
carbônico entre os gases atmosféricos.
Assim, as florestas e outras formas de agricultura que permitam sua
imobilização na biomassa devem intensificar. Por último, deve-se buscar o
desenvolvimento de agricultura em sistemas integrados que permitam
sequestrar grandes quantidades de carbono que é retirado da atmosfera. Em
essência, busca-se, via aproveitamento da energia solar incidente e a
capacidade das plantas de realizar fotossíntese, retirar carbono da atmosfera,
compensado pelas emissões por queima de combustível fóssil.
Portanto, a agricultura deverá desempenhar papel preponderante no
balanço energético e nas emissões de gases de efeito estufa. Neste sentido o
Brasil, por seu potencial agrícola e pecuário deverá se destacar, tornando-se
referência mundial. Aos futuros agrônomos existe a oportunidade de contribuir
com tecnologia que leve ao equilíbrio, minimizando os efeitos causados pela

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atividade humana, oferecendo serviços vitais à sobrevivência humana,
salvando o planeta Terra.

Cenários

O IPCC tem projetado cenários sobre o que pode ocorrer por


interferência das ações humanas. O cenário mais pessimista prevê um mundo
em constante crescimento populacional e aumento nas emissões de gases de
efeito estufa. Em geral, a matriz energética continuará baseada nos
combustíveis fósseis. As tecnologias para minorar as emissões são de
desenvolvimento lento e a temperatura deve elevar-se em 5,4º C até 2100.

No cenário menos pessimista, a população aumenta em um ritmo menor e


as mudanças tecnológicas ocorrem em um ritmo acelerado, com diversificação
de sistemas produtivos vegetais e animais, diminuindo as emissões. A
temperatura pode elevar-se em até 3,8º C. Mesmo diante dessa menor
mudança, os efeitos se prolongarão. Ou seja, se não houvesse mais emissão
por ação humana, os gases ainda permaneceriam um longo tempo na
atmosfera. Esse é o dilema, pois ações encetadas na atualidade apenas
produzirão efeito em médio a longo prazo.
Implicações das ações humanas alterando a composição da atmosfera: o
clima vai se tornar cada vez mais imprevisível, como períodos de seca
alternados por excesso de chuvas. As safras poderão se perder ou por falta ou
por elevada umidade. Isto leva à maior incidência de pragas e doenças, pois as
plantas ficarão mais frágeis e suscetíveis. A consequência direta sobre os
animais domésticos será evidente, principalmente na produção de suínos e
aves, que, em consequência terão os custos de produção elevados, limitando o
consumo por preços igualmente elevados.
Com as safras frustradas ou rendendo menos, o agricultor se vê ameaçado,
diminuindo sua receita líquida (lucro=receita bruta-custos para produzir) e
aumentando epidemias por problemas de sanidade vegetal e animal. Os
produtos, para melhor remunerar produtores, compensando por azares
climáticos, terão de ser comercializados com preços maiores. Ademais, a
qualidade se restringirá por efeito de resíduos de agrotóxicos. Assim, por
último, se pagará mais por produtos da agricultura e pecuária que nem sempre
atenderão os padrões de qualidade exigidos. Além de mais caros os produtos
contendo resíduos de agrotóxicos colocarão a saúde humana em risco. Tem-
se, desta forma, outra relação de causa e consequência: produtos mais caros,
com menor qualidade, ameaçado a saúde. Daí, maiores problemas sanitários e
sociais resultarão, como reação em cadeia.
Menciona-se ainda que os níveis dos oceanos subirão, inundando áreas
costeiras imensas. Por outro lado, o aumento da temperatura trará como
consequência a perda de espécies marítimas e fluviais, as quais podem
desmontar as cadeias alimentares, limitando a sobrevivência de espécies

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utilizadas como alimento pelo ser humano. De novo, a reação em cadeia,
ameaçará o equilíbrio entre as formas de vida.

Aquecimento Global e a Teoria de Gaia

A teoria de Gaia seria confirmada. Estaríamos testando a sua hipótese? A


Teoria de Gaia foi criada pelo cientista e ambientalista inglês James Ephraim
Lovelock, no ano de 1969. Contou com os estudos da bióloga norte-americana
Lynn Margulis. O nome da teoria é uma homenagem à deusa Gaia, divindade
que representava a Terra na mitologia grega. O autor formulou a hipótese de
que a Terra seja um imenso organismo, com as partes interdependentes.

A princípio a teoria não conseguiu impressionar cientistas tradicionais,


sendo aceita, inicialmente, por ambientalistas e defensores da ecologia. Porém,
atualmente, com o problema do aquecimento global, se aceitam partes dessa
teoria. Ou seja, o Planeta Terra se apresenta como um grande organismo. Não
há fatos isolados, pois se uma parte é atingida, o todo sofre alteração. De
acordo com esta teoria, nosso planeta possui a capacidade de se sustentar. Ou
seja, gerar, manter e alterar suas condições ambientais.
Mas, o ajustamento ocorre em novos patamares, diferentes dos que
existem em um dado momento. Certamente, a teoria incorpora o conceito de
cadeias alimentares. Portanto, a extinção de espécies pode acarretar perdas
de outras delas dependentes e assim sucessivamente, até se atingir um novo
ponto de equilíbrio. Como seres vivos e tendo, por nossa própria inteligência,
capacidade de interferir em Gaia, estamos à mercê das forças reguladoras que
em seu novo patamar podem excluir os agentes perturbadores – seres
humanos. Recomenda-se a leitura de textos sobre o tema, assim como os que
se contrapõem à teoria. Compreender os efeitos da ação humana sobre o
planeta nos prepara para o exercício da profissão de engenheiro agrônomo em
tempos de mudanças. Assim, como em informação, os eventos evoluem com
rapidez e as alterações que causamos poderão acelerar as ameaças à
sobrevivência.

Sistemas de Preparo do Solo

No cultivo convencional, com revolvimento do solo e preparo para a


semeadura, evoluindo desde a pré-história, a agricultura tem se praticado da
seguinte forma: ara-se e gradeia-se o solo, tornando-o poroso e leve (fofo) para
a semeadura. O conceito desenvolvido ao longo do tempo é de que a semente
e a planta que dela se origina precisam de solo sem obstáculo físico para o
crescimento de raízes. Esta prática se estendeu ao mundo agrícola, em várias
partes do planeta, independentemente de tipo de solo e clima. Desta forma,
nas regiões temperadas e nos trópicos se exercitou o preparo do solo de
diversas formas.
Nos trópicos, com elevadas temperaturas e chuvas por vezes torrenciais, as
ameaças decorrentes do preparo do solo têm atingido níveis preocupantes.
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Erosões, com perdas de solo e, consequentemente, corretivos e fertilizantes
têm sido causa de declínio de áreas produtivas, além de causar assoreamento
e eutrofia (em grego eutrophía ευτροφία=bem nutrido ou enriquecido de
nutrientes) em corpos d’água, como rios e lagos, alterando as condições de
vida aquática.
O grande desafio no manejo dos solos em agricultura tropical é como
conservá-los, impedindo que haja erosão e lavagem superficial. Estes estão
por sua vez relacionados à forma de trabalhar o solo. Com operações
repetitivas, compacta-se a camada abaixo da superficial (pé-de-grade, ou pé-
de-arado), criando oportunidade a processos erosivos do solo. Além do mais, a
compactação, torna o solo menos poroso, diminuindo a capacidade de
infiltração e de armazenamento de água, impedindo as raízes das plantas de
se desenvolverem em profundidade.
Esse cenário marcou o inicio da agricultura de escala no Cerrado. Áreas
grandes, período curto para realizar preparo do solo e plantio levou a desastres
iniciais, com grande perda de solos e dos meios de produção.
Como avanço da tecnologia de manejo do solo tem-se o plantio direto.
Evento moderno, que vem se aperfeiçoando desde sua adoção e difusão nos
últimos 30 anos e, mais recentemente, a integração lavoura-pecuária.

Diversidade e Agricultura

O fim do Holoceno, a era geológica que precedeu o presente, há cerca de


12.000 anos, culmina com o término da última grande glaciação (era do gelo)
do planeta. Grandes áreas, antes cobertas por gelo, passaram ao domínio de
plantas e animais que se multiplicaram – uma verdadeira explosão de
diversidade surgiu nessa colonização de novas áreas. Daí, nas diversas partes
de nosso planeta, iniciou-se a interferência humana sobre as plantas e os
animais, domesticando-os. Acumularam-se variedades de animais e plantas
selecionados a partir das espécies, desenvolvendo-se cultivos que atendiam a
demanda de comunidades rurais, com excedentes que eram comercializados
ou armazenados. Com a evolução do cultivo, também surgem os implementos
para preparar a terra, como o arado.

Figura 14. Populações humanas convivendo e aproveitando a diversidade


de plantas e animais na pré-história.

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A agricultura surgiu com a domesticação de plantas e, com ela, o cultivo
- preparo do solo antes da semeadura. Desde a antiguidade, os seres humanos
desenvolveram o conceito de que a germinação das sementes deitadas ao solo
e a emergência das plântulas seriam mais eficientes se o solo estivesse
preparado. Assim, como visto, o solo fofo, por interferência mecânica na sua
estrutura e textura passou a ser prática na agricultura mundial, gerando
tradições específicas de cada cultivo e povo.
Os indícios são de que o arado tenha surgido concomitante à agricultura
e domesticação de plantas, ou seja, há cerca de 10.000-12.000 anos. Os locais
prováveis foram os grandes rios como no Tigre e Eufrates (Mesopotâmia, hoje
Iraque), China (Yang Tse, ou Rio Amarelo) e Índia e Paquistão (rios Ganges e
Indus). Do Oriente, chegou à Europa e Norte da África (Egito).
Inicialmente o arado foi composto alavanca terminada por madeira com
ponta que servia para romper o solo. Esse instrumento foi descrito pelos
antigos egípcios em suas ilustrações há mais de 3.000 anos.

Figura 15. Arado de alavanca tracionado por boi e utilizado pelos


egípcios, há cerca de 3.000 anos.

Depois se incorporou metal e sofreu ajustes até chegar à forma como


se conhece. A forma mais comum por séculos foi o de tombamento ou inversão
das camadas ou leivas do solo, também chamado arado de aiveca. Composto
por uma lâmina cortante e inclinada teve, por muito tempo, tração animal.

Figura 16. Arado de aiveca com tração por cavalos.

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Em seguida tendo evoluindo para tração por máquinas desenvolvidas
pelo ser humano, os tratores, o seu uso se intensificou a partir da Revolução
Industrial entre os séculos XVIII e XIX. A força ou potência dos primeiros
tratores era consideravelmente menor do que os atuais e o volume das
mesmas maior. Eram tratores movidos a vapor, de combustão externa.
Somente no final do século XIX surgem os primeiros tratores com motor de
combustão interna, A capacidade de trabalho aumentou consideravelmente
com a incorporação de novos arados, como os de disco rotativo

Figura 17. Arado de disco rotativo e de aiveca tracionados a trator.

Na América Pré-Colombiana sugiram outros instrumentos como a


chaquitaclla, desenvolvida pelos incas, como arado de pé, em forma de
alavanca. Os incas não conheceram a tração animal, mas chegaram à idade do
bronze, do qual eram feitas suas ferramentas.

Figura 18. Contraste entre chaquitaclla, ferramenta desenvolvida


pelos incas e grade de disco no preparo do solo.

O preparo do solo assumiu importância maior em regiões temperadas do


mundo, onde há inverno rigoroso e o solo permanece coberto por gelo. Na
primavera, aração, expondo o solo à radiação solar, contribui para o seu
aquecimento, favorecendo o plantio e a germinação das sementes mais cedo.
Nessas mesmas regiões, a incorporação ao solo dos resíduos vegetais
contribui para sua decomposição, transformando em matéria orgânica ativa.
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Em regiões de tropicais de chuvas intensas os problemas de erosão
podem se intensificar causando erosão. Esta depende do tipo de solo, do seu
manejo, do declive, do manejo de planta e cobertura vegetal. No ambiente de
clima temperado, com alternância entre baixas temperaturas e elevadas
durantes o ano, os problemas de conservação do solo, demoraram mais tempo
para se tornarem visíveis, diferente da dinâmica que ocorre nos trópicos.

Agricultura em Ambiente Tropical – Evolução no Cerrado

O mesmo procedimento de preparar o solo, que evoluiu e se aperfeiçoou


com a mecanização dos tempos modernos, foi transferido para as regiões
tropicais do mundo, entre elas se destaca o Cerrado. Nestes ambientes, as
características de solo e clima são peculiares, favorecendo a perda de matéria
orgânica, em função do preparo viciado e repetitivo, como será visto em
disciplinas específicas durante o curso de agronomia.
Até os anos 1970, o Cerrado representava uma grande área de savanas,
com solo ácido e extremamente pobre em nutrientes, sendo utilizado para
pastejo com gado bovino. Imensas áreas ricas em espécies pouco conhecidas
e estudadas, incluindo algumas da família Poaceae compondo as pastagens
nativas, eram queimadas em anos alternados e submetidas ao pastejo na
rebrota das plantas. Esse procedimento se manteve por cerca de trezentos e
cinquenta anos em um processo, podendo-se afirmar, semelhante à
garimpagem. Neste caso garimpagem de nutrientes que eram escassos nos
solos predominantes. Os latossolos, como são classificados, pobres em
nutrientes e ácidos, não podem ser cultivados sem aplicação corretivos e
fertilizantes.
A região do Cerrado permaneceu esparsamente populada, pois os
habitantes que lá se estabelecerem foram, inicialmente, garimpeiros de fato,
em busca de ouro. Cidades como Cuiabá no Mato grosso e Goiás (hoje
denominada Goiás Velho), surgiram quase na mesma época (início do século
XVIII, anos 1700). Ficaram por muito tempo ilhadas no interior do bioma
Cerrado, onde a produção de alimentos se limitava às margens dos rios –
feijão, mandioca, milho, arroz, batata doce, além da bovinocultura em áreas
extensas de pastagens naturais, com baixo suprimento de forragem aos
animais. O sistema era pouco eficiente, daí a baixa população. Em outras
partes do Brasil os cerrados eram terras sem valor. Em 1970, em aulas de
introdução à agronomia, se dizia literalmente “há umas terras que não servem
para nada – só servem para aumentar a distância entre duas cidades: o
Cerrado.
Vale a pena comentar-se que agricultura no Brasil, até o início da
década de 1970, era praticada em solos naturalmente férteis. O conceito de
corrigir e fertilizar o solo não se havia desenvolvido. Os biomas em que se
desenvolveu agropecuária antes desse período compreendiam a Mata
Atlântica, a Floresta Umbrófila Mista com predominância de pinheiros típicos

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(Araucaria angustifolia, da família Ariocaraceae) no norte do Paraná, interior de
São Paulo e Minas Gerais (Serra da Mantiqueira) de outras partes do Brasil.

Figura 19. Paisagem de Cerrado Típico.

Com o aumento da demanda por alimentos e o esgotamento das terras


naturalmente férteis do Brasil, o Cerrado passou à condição de fronteira
agrícola brasileira. Nos anos 1960 e 1970, iniciou-se o plantio de pastagens
artificiais. Áreas de cerrado começaram a ser desmatadas para dar lugar ao
plantio de arroz. Esse cultivo, arroz de sequeiro dependendo das chuvas,
atendia a dois propósitos: i) suprir a região e o Brasil do cereal, importado em
grandes proporções para atender a demanda interna crescente; ii) contribuir na
formação de pastagem. Surge aí a primeira integração lavoura – pecuária,
ainda que tivesse baixo índice de tecnologia. O procedimento consistia em
cultivar arroz por dois a três anos e no último, sementes de arroz eram
misturadas a sementes de braquiária (Urochloa decumbens, Poaceae). Por
haver diferença na velocidade de crescimento, o arroz terminava o ciclo em
tempo de ser colhido, enquanto a pastagem seguia crescendo até estar pronta
ao pastejo.
Naquele período, antes do plantio do arroz, depois do desmate, fazia-se
uma calagem parcial (abaixo do nível recomendado para a produção com
rendimento econômico de soja e milho) e a adubação, aplicada durante a
semeadura, visava atender ao rendimento esperado da cultura de arroz, que
era 1,5 t ha-1. O nível de rendimento era baixo; porém, por haver demanda os
preços eram atrativos e a atividade lucrativa, além de se incluírem incentivos
governamentais à produção. Entretanto havia riscos – veranicos (períodos de
seca em plena estação chuvosa), incidência de doenças. Ambos contribuíam
para diminuir a qualidade do arroz colhido que, no entanto encontrava
mercado, dado à escassez.
A semeadura simultânea de arroz e semente de forrageiras tinha um
propósito maior – estabelecer pastagem artificial com maior capacidade de
suporte animal, melhorando os índices zootécnicos e de rendimento obtidos

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com a queima das pastagens nativas. Assim, o cultivo de arroz era uma forma
ou um meio de amortizar o custo de implantação de pastagem, objetivo final do
produtor que, em geral era um pecuarista.
O procedimento para essa prática se baseava no preparo tradicional do
solo: aração ou gradagem pesada, seguida por discagens e semeadura. A
calagem era parcial, pois não havia moinhos de calcário na região, mesmo
diante de imensas jazidas do mineral nas condições exigidas para a correção
do solo.
Nesse cenário se formaram as grandes áreas de pastagem artificial as
quais, na atualidade, se encontram em alguma fase de degradação, onde a
principal causa tem sido o esgotamento do solo. Não tem havido reposição de
nutrientes, reduzindo-se o nível de eficiência dessas pastagens, acrescido da
proliferação de cupins de montículo. Contudo, esse sistema tem inspirado o
desenvolvimento da integração lavoura-pecuária com uso de tecnologia
avançada e criando perspectiva de exploração sustentável.
Exploração sustentável significa maximizar os retornos financeiros por
unidade de insumo (por exemplo: calcário, fertilizante, semente) causando o
menor impacto negativo possível ao ambiente e conservando os meios de
produção (solo e água). Ademais, são mantidas áreas de Cerrado, gerando a
agroecologia. Essa é a tendência do futuro.

Figura 20. Área de cultivo (verde claro) no Bioma Cerrado:


Produção de alimentos com tecnologia e conservação ambiental.

Consequências do Preparo Contínuo do Solo

A agricultura no Cerrado se estabeleceu em larga escala, dependente de


máquinas e implementos para o preparo do solo: tratores com potência para
tracionar distribuidores de calcário, arados e grades; plantadeiras e
adubadoras, pulverizadores; colhedoras automotrizes com eficiência de
colheita. O descompasso entre preparo do solo, semeadura, cultivo e colheita,
com frequência contribuía para surgirem problemas de erosão. Ou seja, é
muito mais rápido preparar o solo do que a operação de semeadura. As

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velocidades e o tempo requerido são diferentes, havendo atrasos por excesso
de chuva e expondo o solo desnudo e preparado a chuvas causadoras de
erosão.

O preparo ocorria quando as chuvas ainda não se intensificavam e em


velocidade maior do que a de semeadura. Esta se realizava em menor
velocidade quando o solo se encontrava saturado de umidade e, com
frequência, havia interrupções devidas às chuvas. Assim, partes da área em
cultivo ficavam descobertas, ou eram semeadas com atraso. Esse conjunto de
ações, correndo contra o tempo, resultava desastroso para o sistema produtivo.
Raramente, se explorava o potencial produtivo das culturas, mesmo em solos
corrigidos e fertilizados para atender a demanda das plantas, devido ao
descompasso entre o preparo e a semeadura.
Entretanto, preparo repetitivo causava zonas de compactação no perfil
(camadas) do solo, além de sua exposição a elevadas temperaturas na
entressafra. Esse conjunto de ações tem sido a perda de matéria orgânica e
atividade química (retenção de cátions), compactação e erosão do solo. As
plantas cultivadas, com o sistema radicular afetado pela camada compactada,
apresentavam suscetibilidade à seca, por explorarem reduzidos volumes de
solo.
Em resumo: O preparo convencional e repetitivo tem sido a causa da
menor infiltração de água no solo, devida ao adensamento por pulverização
das partículas e perda da estrutura e porosidade. O adensamento cria barreira
física à penetração de raízes das plantas cultivadas e perdas de nutrientes por
movimento horizontal da água, resultando em erosão. Com erosão, a água que
escorre causa inundação, contaminando e assoreando (assoreamento=
deposição de sedimentos) de corpos d’água, reduzindo o fluxo das nascentes e
causando intermitência de rios. O assoreamento compromete a geração de
energia e irrigação, além de outros impactos negativos ao ambiente.

Evolução dos Sistemas de Cultivo no Brasil

Os sistemas de cultivo no Brasil caminharam no sentido de se aprender


com os erros. Os efeitos do mau preparo, com ações repetitivas, com uso de
arado e grades, causaram sérios problemas de conservação do solo.
Desde quando se iniciaram as primeiras experiências, nos anos 1970, o
plantio direto como opção lógica ao sistema convencional, passou por muitos
estudos e testes, destacando-se o papel dos produtores pioneiros. Estes
atuaram em integração tecnológica com órgãos de pesquisa, indústrias de
insumos e máquinas, assistência técnica oficial e privada e outros serviços
ligados à agricultura. Esse conjunto de ações permitiu superar de forma
profícua, dificuldades e construir uma sólida base de conhecimentos e
referências.

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A iniciativa em torno do plantio direto, exemplo para os países tropicais de
todo o mundo, tem refletido na mudança de comportamento dos produtores e
técnicos na busca da sustentabilidade da agricultura. Resultou maior
profissionalismo pela incorporação de tecnologias e melhorias gerenciais dos
fatores e processos de produção. Na atualidade, tem sido reconhecida
alternativa para que se estabeleçam políticas, favorecendo o desenvolvimento
ambientalmente sustentável, voltadas para a prosperidade da agricultura, com
evidentes benefícios para toda a sociedade.
Destaca-se nesse contexto a expressiva expansão do plantio direto no
Brasil, evoluindo de cerca de um milhão de hectares com culturas anuais, no
início da década de 1990, para mais de 12 milhões no ano 2000. Além disso, o
sistema passou a ser utilizado em todas as culturas perenes, na cana-de-
açúcar, na recuperação de pastagens por meio da rotação entre lavouras e
pastagens, no reflorestamento, na fruticultura, na olericultura (cultivo de
hortaliças), constituindo-se em importante alternativa para a economia de
operações manuais, de tração animal, por tratores ou aéreas. Dessa forma, fica
evidente a universalidade e abrangência, ensejando sua escolha como o mais
potente instrumento a ser fomentado no manejo racional das bacias
hidrográficas.
Para que essa fantástica expansão pudesse trazer os benefícios
desejáveis, em um ambiente mais favorável a sua adoção e seu
aprimoramento, celebraram-se os mais variados compromissos e parcerias,
conforme os exemplos dos Clubes Amigos da Terra (CATs) e similares
(cooperativas, associações, fundações, grupos etc.). O objetivo principal
perseguido é o desenvolvimento de agricultura sustentável, próspera e cada
vez mais limpa. Abrem-se novas oportunidades de cooperação nas áreas de
pesquisa, ensino e de melhor equacionamento das pendências existentes no
agronegócio brasileiro.
O plantio direto compreende um conjunto de técnicas integradas que visam
melhorar as condições ambientais (água-solo-clima) para explorar da melhor
forma possível o potencial genético de produção das culturas (Primavesi,
2000). Para tanto, deem ser respeitados três requisitos mínimos - não
revolvimento do solo, rotação de culturas e uso de espécies que deixam
grandes quantidades de resíduos. Culturas de cobertura do solo, para
formação de palhada protetora, associam-se ao manejo integrado de pragas,
doenças e plantas daninhas.

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Figura 21. Plantio direto na palha, com revolvimento do solo apenas na
linha de plantio.

Contudo, o plantio direto não deve ser visto como uma receita universal,
mas como um sistema que exige adaptações locais. Estas têm sido executadas
por iniciativa dos próprios agricultores, com a integração contínua de esforços
envolvendo pesquisadores e técnicos, possibilitando avanços palpáveis no
desenvolvimento e na transferência de tecnologias.
A adoção do plantio direto expressa um anseio antigo, permitindo ao ser
humano se harmonizar com a natureza, proporcionando economias
significativas para a sociedade como um todo. Torna-se possível, assim, a
minimização de custos por unidade produzida a partir da maximização da
produtividade de insumos e de mão-de-obra.
Associam-se aos fatores favoráveis do plantio direto a diminuição
significativa de consumo de petróleo (60 a 70 % a menos de óleo diesel), o
aumento do sequestro de carbono (aumento do estoque no solo e da matéria
orgânica em decomposição na superfície), a diminuição expressiva da perda de
solo por erosão (90 % a menos nas perdas estimadas em 10 t solo/t de grãos
produzidos). Ademais, o plantio direto evidencia a necessidade de se obter
uma agricultura limpa, produzindo mais alimentos de qualidade, com menor
impacto negativo sobre o meio ambiente e o ser humano.
O sistema de plantio direto permite o cumprimento do calendário agrícola,
validando as recomendações do zoneamento e sendo um atrativo para as
seguradoras, viabilizando a atividade por semeaduras e colheitas previsíveis.
Por suas reconhecidas características, comprovadas amplamente pela
pesquisa agropecuária brasileira, o plantio direto tem sido a mais importante
ação ambiental brasileira em atendimento às recomendações da conferência
da Organização das Nações Unidas (Eco-92) e da Agenda 21 brasileira, indo
ao encontro do que foi acordado na assinatura do Protocolo Verde. O Protocolo
Verde, por definição, é uma carta de princípios assinada em 1995, no qual
instituições bancárias públicas e privadas brasileiras assumiram o
compromisso de cumprir com um conjunto de medidas socioambientais que
estabelecem políticas e práticas bancárias em harmonia com desenvolvimento
justo e sustentável.

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Sistemas integrados de cultivo

O conceito de sistemas integrados de cultivo evoluiu a partir da agricultura


familiar e associada a práticas tradicionais de povos indígenas. Um exemplo é
o cultivo praticado pelos índios brasileiros. Neste, é comum o consórcio de
milho, mandioca, feijão comum (Phaseolus vulgaris) ou fava (Phaseolus
lunatus), amendoim (Arachis hypogaea) de forma associada na mesma área. A
ação lembra a diversidade que ocorre na natureza exuberante dos trópicos.
Pode-se dizer que esta forma seria a principal característica da agricultura
primordial que ocorreu em algum ponto da história dos povos por todo o
mundo, com espécies locais domesticadas. Em tempos modernos, os
consórcios de pequena agricultura no Brasil incluem milho + feijão de corda
(caupi – Vigna unguiculata), mandioca + caupi, milho + feijão, mandioca +
feijão, milho + amendoim.
Quando se pensa em escala, os sistemas de consórcio ficam limitados pela
área possível de manejo. Em pequena extensão, típica da agricultura familiar,
os consórcios são praticados com o uso de mão de obra familiar. Quando se
pensa em áreas extensas como no Cerrado, há outras formas de consórcio.
No conceito de consórcio, duas ou mais espécies de plantas ocupam a
mesma área ao mesmo tempo. Isto pode ocorrer por todo o tempo de cultivo ou
em parte dele. Assim, viabiliza-se em áreas maiores. Por exemplo: cultiva-se
milho e pastagem na mesmaque área, usando-se de artifícios, como
semeadura em diferentes profundidades ou em diferentes épocas. Por
exemplo, na semeadura do milho e pastagem, as sementes de milho são
colocadas mais próximas à superfície do solo em relação às da forrageira.
Ademais, a forrageira apresenta crescimento inicial lento, permitindo que o
milho se estabeleça e cresça rapidamente antes de sofrer competição por
água, luz e nutrientes, ocasionada pela forrageira.
O sistema permite se colha o milho em níveis de produtividade comparáveis
ao cultivo solteiro (apenas milho), deixando uma pastagem estabelecida.
Assim, protege-se o solo e se obtém alimento para o rebanho na época mais
crítica (entressafra).

Figura 22. Consórcio milho e forrageira (Urocloa decumbens) com


aproveitamento do pasto no período seco de entressafra.

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O sistema praticado na atualidade representa um aprimoramento do
consórcio pioneiro, realizado no início da exploração do Cerrado. Naquele
momento, havia escassez de calcário, ainda que houvesse imensas jazidas de
rocha. O consórcio preconizado e que funcionava era baseado em semeadura
simultânea de arroz e semente de forrageira (Brachiaria decumbens), em solo
parcialmente corrigido com calcário e fertilizante. Colhia-se o arroz e sobrava a
pastagem formada.

Estas pastagens da ocupação pioneira do Cerrado constituem as imensas


áreas degradadas que somam 50-60 106 hectares, ou o equivalente à área do
Estado de Minas Gerais. São áreas imensas que podem ser incorporadas à
produção comercial, em sistema conservacionista como o do plantio direto.
Portanto, o sistema atual de integração, visando proteger o solo, incorpora
diversificação com o emprego de espécies alternativas, produtoras de
biomassa para a exploração econômica.
O manejo da fertilidade do solo se ajusta quando se tem dois cultivos
simultâneos na mesma área. Na adubação, leva-se em conta a produtividade
esperada de milho e a exploração da pastagem. De novo, há que se
recordarem os conceitos apresentados em aula. O solo responde à medida que
nele se disponibilizam os nutrientes.
De forma simplificada para o entendimento, funciona como conta bancária:
o saque somente se torna possível se houver saldo. Este representa a
imobilização de elementos químicos nas plantas, da qual parte é exportada na
forma de grãos, animais, madeira. Estes levam nutrientes para fora do sistema.
Daí, a necessidade de se repor por adubações anuais, ou manutenção da
fertilidade. Assim, na prática o sistema produtivo se mantém e responde com
produtividade.

Aperfeiçoamento do Plantio Direto e Outras Práticas

Depois de descompactado, caso exista camada compactada resultante


do uso repetitivo de implementos agrícolas, com o solo corrigido e fertilizado
em base à tecnologia e de acordo com análise química, parte-se para o plantio
direto. Para descompactar utiliza-se a subsolagem ou se escarifica,
dependendo da profundidade em que ocorrem: maior ou menor,
respectivamente. A prática do plantio direto nada mais é do que realizar a
dessecação das plantas daninhas, pastagem etc. A semeadura se realiza com
reduzido revolvimento do solo (apenas na linha de semeadura). Parte desses
implementos pode ser vista na área de mecanização da Fazenda Água Limpa.
Os princípios são os mesmos, independentemente dos implementos, sejam
maiores ou menores.

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Benefícios Associados ao Plantio Direto

O plantio direto, além de contribuir para a realização do calendário


agrícola com semeadura na época recomendada, permite explorar o potencial
do cultivo principal e a segunda safra, com maior retorno ao agricultor. Pode-se
definir como serviço ambiental, contribuindo para: maior infiltração de água das
chuvas; redução da erosão; maior retenção de água no solo; estabilidade da
produção; manutenção da produtividade; redução dos custos operacionais;
maior lucratividade; viabilização da segunda safra no mesmo período de
chuvas; ciclagem de nutrientes; redução no uso de combustível, corretivos e
fertilizantes; redução na emissão de gases de efeito estufa; sequestro de
carbono na matéria orgânica do solo; “produção de água” na propriedade rural;
e mitigação do desmatamento.

O plantio direto permite cumprir o planejado pelas vantagens na


operacionalidade, semeando na época em que as culturas atingem o máximo
rendimento econômico. Um exemplo é o da soja: quando semeada na época
recomendada (novembro), atinge-se o potencial de rendimento, permitindo uma
segunda safra em grandes extensões do Cerrado.
Entretanto, o sistema depende do uso de herbicidas, entre eles o
glifosato. Como tem sido empregado intensivamente em cultivos com espécies
resistentes (transgênicas) existe ameaça do desenvolvimento de resistência
nas espécies competidoras (invasoras ou daninhas). Daí a importância de
rotação para a cobertura do solo com resíduos (palhada) para a sinergia no
controle de plantas daninhas e proteção na entressafra.

Premissa para Adoção do Plantio Direto

O plantio direto depende de solo corrigido física e quimicamente; de


resíduos de cultivos para a proteção da superfície do solo; de rotação de
culturas, acrescentando diversidade botânica ao sistema produtivo;
manutenção e/ou aumento da matéria orgânica, com impacto positivo nas
características físicas (estrutura e porosidade que permitem o fluxo de água),
químicas (retenção de nutrientes) e biológicas (micro-organismos e fauna do
solo). Ou seja, o plantio direto permite traçar e cumprir metas de práticas
necessárias que nem sempre são possíveis quando se utiliza o sistema
convencional de cultivo.

Evolução da Mecanização, da Agropecuária e da Sociedade

Desde a pré-história, o ser humano tem se preocupado em aumentar a


eficiência da produção. No início, com uso de implementos (ferramentas)
rudimentares, como o riscador de madeira e depois arado, houve um avanço
na extensão de área que um agricultor podia cultivar. Ao se incluir tração

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animal aumentando a potência de trabalho, houve avanço, representando a
primeira revolução agrícola.
Incluem-se ainda nesse período, os métodos de irrigação que permitiram
antigas civilizações de utilizar a água abundante em áreas desérticas. Este é o
exemplo das civilizações orientais (China, Índia) dos Medos (Oriente Próximo)
e dos Egípcios (África). A engenhosidade do ser humano em criar novas
máquinas e alternativas para o uso da terra tem uma história de 10 a 12 mil
anos. Ou seja, a domesticação de plantas e animais, as técnicas de uso de
solo e da água e as máquinas e equipamentos agrícolas, evoluíram
conjuntamente, permitindo avanços antes impensáveis.
O aprimoramento contínuo dos processos resultou em uma segunda
fase ou revolução com sistemas de cultivo mais evoluídos, ampliando-se a área
irrigada, adaptando-se plantas a esses sistemas, intensificando-se a
mecanização por tração animal. Esta consistiu em uma nova possibilidade de
produzir alimentos e matérias-primas a partir da atividade agropecuária. Estes
avanços possibilitaram a evolução da sociedade humana, que culminou com o
término da idade média e o surgimento do iluminismo (renascença).
A revolução que sobreveio culminou com avanços na mecanização que
se acentuou nos séculos XVIII e XIX. Neste período, graças à ciência aplicada,
conceberam-se e criaram grandes máquinas a vapor, permitindo que se
ampliasse ainda mais o potencial de trabalho individual. Esta fase, ou terceira
revolução, levou ao melhoramento genético, com seleção de plantas e de
animais para adaptá-los ao cultivo em escala.
Estes ganhos foram sucedidos por crescimento populacional, maior
organização social e desenvolvimento humano. Em decorrência, os as
descobertas na ciência tornaram possível entender melhor os processos
biológicos, a compreender os fatores genéticos e a hereditariedade, a definir
métodos de melhoramento de plantas e de animais, aprimorar o conhecimento
do solo e de como interferir para melhorar o seu desempenho, a definir formas
de propagação e sistemas de produção de sementes para as diferentes
espécies de interesse comercial. Estes avanços foram acompanhados pela
crescente mecanização das atividades agropecuárias. Novas máquinas mais
potentes ampliaram o potencial de cultivo, caracterizando os grandes avanços
ocorridos no século passado (XX).
Na atualidade, os ganhos têm se acentuado, incorporando às máquinas
informatização por tecnologia embarcada. Máquinas mais potentes (tratores,
plantadeiras, pulverizadores e colhedoras), informatizadas com GPS para
fertilização e controle fitossanitário diferenciados nas áreas de cultivo
representam o avanço mais atual. Tudo isto tende a se aprimorar em
velocidade que surpreende. Nada se compara com o ritmo de ganhos que têm
sido obtidos, destacando-se, por exemplo, a última versão de trator –
autônomo, sem operador, comandado por sistemas informatizados.

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Figura 23. Trator autônomo, georreferenciado, sem operador.

Este cenário permite que áreas, potencialmente mecanizáveis, sejam


cultivadas com mínimo uso de mão de obra. Desta forma, tem-se o cultivo
intensificado de grandes áreas planas, como no Meio Oeste dos Estados
Unidos e dos cerrados brasileiros.

Tráfego Controlado e Conservação do Solo

Como parte dos esforços de diminuir o impacto por ação de máquinas,


mesmo em sistema de conservação do solo, como o plantio direto, tem-se o
evento mais recente da agricultura mundial.

Trata-se do tráfego controlado em fazenda. Este se baseia na


sistematização do tráfego, estabelecendo relação entre os sistemas de plantio
e manejo das plantas até à colheita com as máquinas e implementos utilizados
na produção.
Visa à manutenção das propriedades dos solos, mesmo diante de
movimentação de máquinas nas áreas em produção agropecuária. A
preocupação maior é com a rodagem dos tratores e veículos usados entre a
semeadura e a colheita.
A rodagem dos tratores, por exemplo, tende a aumentar a superfície de
contato, melhor distribuindo o peso da máquina, evitando-se a compactação do
solo. Os estudos têm avançado para redefinir os tipos de pneu e rodagem.
Assim, por exemplo, máquinas que rodam com esteiras distribuem melhor o
peso. Isto exige adaptação da indústria. Portanto, trata-se de uma área da
pesquisa onde produtores de máquinas e implementos se associam com a
pesquisa.

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Figura 24. Tráfego controlado em fazenda.

Criação de Oportunidades

O plantio direto permite dinamizar a produção criando oportunidade para


sistemas integrados de lavoura-pecuária e lavoura-pecuária-floresta. Um
exemplo típico é o cultivo da soja seguido pelo do milho ou sorgo + semente de
forrageira.
Colhido o milho, a pastagem se estabelece e permite o pastoreio com
produção de carne ou leite, dependendo do tipo de exploração pecuária. A
necessidade de manter o solo permanentemente coberto (protegido) leva à
diversificação – novas espécies de cultivos podem ocupar espaço em um
sistema diversificado.
Na integração lavoura-pecuária-floresta, inicia-se com produção de
grãos e plantio de espécies florestais, eucalipto sendo a mais comum. Depois,
introduz-se pastagem e mantém-se a floresta que se forma enquanto o uso da
pastagem na bovinocultura permite sua amortização até o desfrute.

Figura 25. Sistema produtivo Integrado: Lavoura-pecuária-floresta.

A diversidade de cultivos permite gerar novos produtos e criar mercado,


estabelecendo a cadeia produtiva para espécies potenciais e ainda não
integrantes de sistemas produtivos. Os exemplos são de amaranto
(Amaranthus spp., Amaranthaceae), quinoa (Chenopodium quinoa,
Amaranthaceae, sub-família Chenopodioideae) , kenaf (Hibiscus cannabinus,
Malvaceae) , tef (Eragrostis tef, Poaceae) Gergelim (Sesamum indicum,

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Pedaliaceae), grão de bico (Cicer arietinum, Fabaceae) dentre várias outras
opções (Spehar, et al.,2014; Spehar; Trecenti, 2011

Figura 26. Opções para diversificação agropecuária e alimentar.

Diversificação Agropecuária e o Futuro

Ainda que diversificação seja uma oportunidade de aprimorar o plantio


direto e sistemas integrados de produção, as opções de espécies para atingir
esse objetivo têm sido pouco pouco estudadas em nossa agricultura. Existe
carência de tecnologia para sua inclusão, nos sistemas produtivos. Ademais,
essas espécies não apresentam cadeia produtiva definida e não têm demanda
dos mercados mundiais – como as “commodities”.

Isto significa que os agricultores se restrinjam quanto ao seu cultivo, pois


não há previsão de demanda. Esse é um desafio à diversificação que nas
gerações atuais pode-se resolver com os maios de comunicação. Um agricultor
bem assessorado pode tornar-se conhecido no mundo virtual e colocar seu
produto onde é demandado. Essa diferença poderá alavancar alguns cultivos
menores como a quinoa, o amaranto, o grão de bico, o gergelim, a chia e a
linhaça, dentre inúmeros outros.
A limitação tecnológica, pois falta informação sobre métodos de cultivo
disponibilidade de cultivares, associada à inexistência de cadeia produtiva para
a maioria delas, poderá ser contornada. Quando se compara com soja ou
milho, classificadas como commodities, as opções menos conhecidas não
integram as bolsas para cotação de valores de referência mundial (a de
Chicago, por exemplo). O mercado pontual limita a expansão dos seus
respectivos cultivos para aprimorar a diversificação.
Pode-se afirmar que, o Brasil dispõe, na atualidade, um mínimo de
tecnologia para produzir quinoa, amaranto, kenaf, grão de bico, gergelim, chia
e outras espécies das quais pouco se ouve falar, visando atender ao mercado
interno, não muito grande, e à exportação (Artiaga et al., 2015; Spehar;
Trecenti, 2011). Com a inserção dessas espécies, há perspectiva de maiores
retornos financeiros ao produtor, associada aos impactos positivos sobre o

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ambiente. Ademais, contribuirão para melhorar a dieta alimentar de humanos e
animais domésticos, na produção de fibras e energia, além de outras matérias
primas demandadas no país e no mundo. As comunicações serão fortes
aliadas ao resgate da diversidade produtiva na agricultura moderna.

Melhoramento Genético e Ganho na Agropecuária

Além de auxiliar no entendimento de como funcionam os solos e como


manejá-los, a pesquisa tem contribuído com avanços no melhoramento
genético de plantas e animais, adaptando as grandes culturas à produção com
elevados rendimentos. Os ganhos se refletem em rendimentos que são
suficientes para pagar todos os custos de produção, gerando uma receita
líquida atrativa aos produtores.
As plantas cultivadas dividem-se em anuais e perenes. As anuais
recebem esse nome porque são semeadas, germinam, emergem, crescem,
reproduzem e senescem (terminam o ciclo) em um mesmo ano agrícola. Como
exemplos de plantas anuais temos o milho, o feijão, a soja o arroz, o sorgo, a
quinoa, o trigo, a cevada, a ervilha, o grão de bico, a lentilha.
O período em que iniciam e completam o ciclo é de 3-5 meses, findos os
quais, as plantas entram em senescência. Isto é, na fase reprodutiva, à medida
que os produtos da fotossíntese não drenados aos frutos e sementes, as
plantas perdem as folhas e secam completamente na maturação, atingindo o
ponto após o qual os frutos secam e permitem a colheita. As plantas encerram
seu ciclo e não voltam a vegetar.
Algumas culturas foram anualizadas, como o algodão e a mandioca. Ou
seja, a planta se reproduz no período de seis meses a um ano, porém não
ocorre senescência, como nas mencionadas. Assim, as plantas permanecem
vivas. Isto traz implicações na incidência de pragas e doenças, requerendo
manejo ou eliminação das plantas. No caso do algodão, as plantas
remanescentes permanecem vivas depois da colheita, também chamadas de
socas, tornando-se necessário eliminá-los antes de outro cultivo em rotação.
Em mandioca, colhem-se os tubérculos, interrompendo-se o ciclo da planta que
permaneceria viva por período maior do que um ano, indicando a perenidade.
Por outro lado têm-se as plantas perenes – espécies florestais, cana-de-
açúcar, café, as fruteiras - entre elas, citros (exemplos: laranjas, limões,
tangerinas etc.), manga, abacate etc. O período útil de exploração varia
conforme a espécie. Em cana de açúcar, depois de cinco a seis anos, renova-
se o plantio; em citros e café, dependendo do manejo, a exploração ocorre por
períodos superiores a 10 anos. Em outras fruteiras e espécies arbóreas para
exploração de madeira o período de cultivo pode ser ainda mais elástico ou
extenso – exemplos: eucalipto, seringueira, mangueira, abacateiro etc.

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Modo de Reprodução na Genética e no Melhoramento

O modo de reprodução, tanto em culturas anuais como perenes,


determina os métodos de estudo genético e de seleção visando atender às
exigências de cada espécie. Neste sentido, o conhecimento da biologia floral
da espécie que se pretende melhorar geneticamente é essencial. As flores
podem ser completas, isto é reunir todas as partes, incluindo androceu e
gineceu. Flores assim constituídas são chamadas de hermafroditas. As flores
podem ainda ser femininas e masculinas, quando o gineceu e o androceu
estão situados em partes separadas da mesma planta. Estas espécies são
classificadas como monóicas. Havendo ainda espécies cujos órgãos masculino
e feminino se encontram em plantas diferentes, sendo classificadas como
dióicas. Esse conhecimento permite definir técnicas de hibridação,
independente do objetivo, tendo em conta que nas espécies cultivadas visa-se
elevar rendimento, qualidade resistência a pragas e doenças dentre outras.

Figura 27. Flores: representação esquemática; de feijão, completa,


fechada, autopolinização; milho, flor masculina separada de feminina,
polinização cruzada ou alogamia; algodão, flor aberta com heterostilia
(diferença de tamanho dos órgãos reprodutores), de alogamia parcial.

A característica alvo dos programas de melhoramento genético é a


produtividade. Porém, esta por si só não é suficiente. Acresce-se arquitetura da
planta adequada ao manejo, ausência de acamamento, resistência a doenças
e insetos-pragas, resistência a fatores limitantes do solo como alumínio tóxico e
escassez de nutrientes.
Os estudos de herança genética indicam se a característica em estudo é
condicionada por um ou poucos pares de genes (genética mendeliana) ou se
são vários (genética quantitativa). Estes estudos, quando realizados
previamente, permitem traças estratégias de melhoramento.
Quando as plantas são autógamas, no melhoramento, depois de
conhecida a herança genética, realizam-se hibridações entre genitores
previamente selecionados, seguindo-se métodos de seleção por indivíduos e
suas progênies até que se obtenham homozigotos.
Em seguida, conduzem-se experimentos com as linhagens selecionadas
para determinar a estabilidade. Ou seja, com base em um conjunto de testes
que representam a região onde se pretende recomendar – obtêm-se cultivares
disponibilizados aos agricultores. Como exemplos de plantas autógamas têm-
se: feijão, soja, arroz, trigo, ervilha, cevada. Nestes casos, a flor contém os
órgãos masculino e feminino, sendo fechada, o que impede a polinização

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externa. Há espécies de plantas com alogamia parcial, em geral por efeito de
insetos polinizadores, como algodão.

Figura 28. Hibridação em soja, etapa do melhoramento genético.

Quando as plantas são alógamas, isto é, de polinização aberta, os


cruzamentos são controlados, fazendo-se seleção de plantas e de suas
progênies (filhos). O método é recorrente, onde plantas selecionadas passarão
por autofecundação controlada e teste e progênies. Existem vários ajustes
destes métodos, a depender da espécie. O exemplo clássico de planta
alógama é o milho. Há outras como girassol (Helianthus anuus), abóbora
(Cucurbita máxima) e outras da mesma família (Cucurbitaceae), maracujá
(Passiflora edulis).
O milho (Zea mays) é uma espécie monóica, isto é, os órgãos
reprodutivos encontram-se separados na mesma planta, onde o pendão, na
parte superior da planta representa o órgão masculino, enquanto a espiga
representa o órgão feminino. O interessante é que cada estigma (no conjunto,
popularmente conhecido como cabelo) será fecundado independentemente,
originando cada grão ou semente da espiga de milho.

Plantas Anuais

Estudos de genética e melhoramento em culturas anuais são facilitados


pela rapidez com que as plantas completam seu ciclo. Assim, milho, alógama,
e feijão, autógama, completam o ciclo em alguns meses, permitindo colherem-
se dados e analisar resultados para iniciar novo ciclo de seleção. Ou seja, em
cerca de 10 anos, considerando-se todas as etapas, obtém-se e disponibiliza
novo cultivar de feijão ou soja e novo híbrido de milho a ser disponibilizado aos
agricultores.
No caso do milho, é possível realizar-se melhoramento populacional –
originando milho variedade. Este é de polinização aberta e permite o uso de
sementes pelos agricultores, os quais podem realizar seleção (empírica) para
atender às condições de cultivo locais. Esta tem sido a prática de agricultores
de pequena escala desde a domesticação da espécie (Zea mays).
Enquanto o emprego de milho híbrido tem sido prática comum aos
agricultores de grande escala. Os híbridos expressam vigor de heterozigoto,
quando linhas homozigotas obtidas por autofecundação controlada são
utilizadas em hibridações. Inconveniente para o produtor, as sementes de
híbridos modernos incorporando eventos transgênicos são caras e não se pode

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utilizar a segunda geração (F2). Isto quer dizer que o valor das sementes
ocupa considerável proporção dos custos de produção.

Plantas perenes

As espécies perenes levam mais tempo para que novos cultivares sejam
obtidos. Imagine-se o ciclo de uma mangueira. Realizados cruzamentos entre
genitores que apresentem complementaridade, por exemplo, produtividade
(genitor A) com resistência a doenças (genitor B). Depois de obtido o fruto
híbrido, semeia-se para obter-se a planta F1 (primeira geração após
cruzamento). Até que ela cresça e se reproduza, serão necessários três a
quatro anos. Só aí é que se pode identificar se a planta híbrida combina os
alelos de genes que buscamos.
Não é em vão que manga, assim como abacate, ambos perenes e com
alogamia, são multiplicados via propagação clonal. Neste caso a planta mãe,
híbrido em F1, será multiplicada por enxertia.
Outra possibilidade é a propagação vegetativa direta ou enraizamento de
ramos da planta mãe, como em eucalipto e café robusta (Coffea canephora),
ambas alógamas. O café Coffea arábica do qual o Brasil é o maior produtor
mundial, é autógama. Por seleção a partir de progênies se obtêm linhas quase
homozigotas, o que consome tempo. Imagine-se que cada geração leve dois a
três anos para a primeira produção; a quarta geração (F4) será atingida em 8-
12 anos, dependendo da espécie e do ciclo reprodutivo da mesma. Portanto, o
tempo para a obtenção de cultivar é longo, devido ao método de seleção e a
necessidade de se avaliar antes da recomendação. Daí, a importância de se
definirem os cruzamentos e seleção associada à propagação vegetativa nas
espécies perenes.

Avanços na Agropecuária e Ciência

O Brasil tem se destacado na agricultura, com exemplos no melhoramento


genético de espécies importantes para agricultura e pecuária. Nosso ambiente,
único, solos ácidos de clima tropical, com regime de chuvas bem definido. A
tecnologia para modificar esses solos, elevando seu potencial produtivos tem
sido desenvolvida visando atender à exigência de plantas selecionadas via o
melhoramento genético.

Figura 29. Uso da variabilidade genética no melhoramento de plantas e


o engenheiro agrônomo Norman Borlaug, prêmio Nobel da Paz (1970).

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As ciências contribuem de forma interativa, associando tecnologias
decorrentes das diferentes especialidades. Assim, os ganhos providos por
química resultaram no domínio da modificação do solo para produzir em nível
econômico. As plantas têm sido adaptadas aos sistemas de cultivo, com o uso
da genética. As ações que levam à obtenção de rendimentos viáveis, tem ainda
a contribuição da economia, da física e, sobretudo, da matemática. Em aula o
tema tem sido comentado, com exemplos para explicar o crescimento das
plantas, o nível de suprimento de nutrientes com máximo retorno econômico e
outros.
Os avanços têm sido tão relevantes na modificação e uso de solos ácidos
como os do Cerrado, que países africanos e asiáticos têm se interessado por
intercâmbio. Esse conjunto de tecnologia forma o arcabouço do sucesso no
agronegócio brasileiro. Os exemplos a seguir são notórios e confirmam o valor
da ciência para a sociedade.

Soja Adaptada às Baixas Latitudes

Dentre as plantas anuais adaptadas ao ambiente tropical, destaca-se a


cultura da soja. A soja (Glycine max (L.) Merrill) é o exemplo mais destacado,
colocando nosso país como referência mundial na produção desta leguminosa
(Fabaceae) em regiões tropicais (Spehar et al., 2012). O Brasil, prestes a se
tornar o maior produtor mundial, saltou em 40 anos de alguns milhões de
toneladas para mais de de 110 milhões na safra 2019-2020. Boa parte dessa
produção está localizada em solos de Cerrado, corrigido e fertilizado para
atender à demanda da planta, com expectativa de rendimento em exploração
comercial.
Soja é uma planta sensível à variação no comprimento do dia (fotoperíodo),
sendo cultivada quando os dias aumentam o comprimento e florescendo com
seu encurtamento. Originária de elevadas latitudes (Manchúria, China e Coréia,
entre 38 a 41º LN), quando introduzida e semeada nos trópicos (Cerrado, com
coordenadas variando entre 20 a 5º L), florescia precocemente, crescendo e
produzindo pouco.
O que se realizou: primeiramente foram identificados genótipos (variedades)
que se mostravam “insensíveis” ao fotoperíodo; nestas as plantas cresciam em
qualquer época de semeadura. Em seguida, realizaram-se cruzamentos entre
genitores produtivos e adaptados a latitudes maiores (Sul do Brasil) com os
“insensíveis” às variações no comprimento dos dias. Por seleção, obtiveram-se
genótipos que combinavam as características desejadas, os quais originaram
os primeiros cultivares. A aparente insensibilidade ao fotoperíodo se deve ao
retardamento na fisiologia da planta.
Depois de ciclos de seleção para elevar rendimento e estabilidade, o
Cerrado Brasileiro responde por mais da metade da soja produzida no país,
viabilizando a exploração agropecuária (Spehar et al., 2015). Na realidade,
não há insensibilidade ao fotoperíodo em soja. Existem fatores genéticos

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relacionados à maturidade fisiológica da planta, retardando-a. Assim, as
plantas crescem para, somente quando atingirem a maturidade, mostrar
resposta ao encurtamento dos dias. Maior informação de como funciona o
florescimento em soja será vista oportunamente, à medida que o estudante
curse os semestres mais avançados.

Fixação Biológica de Nitrogênio (FBN) na Família Fabaceae.

Existem bactérias de vida livre, outras que infectam plantas, causando


doenças e aquelas que se hospedam e associam às raízes, em simbiose.
Dentre elas encontram-se Rhizobium leguminosarum, que fixam nitrogênio (N)
do ar na planta de feijão, ervilha etc., Bradyrhizobium japonicum, que fixam N
na planta de soja. Essa fixação apresenta vantagens para ambos o hóspede e
hospedeiro (Spehar et al., 2012).
Para se avaliar a importância dessas bactérias basta afirmar que o Brasil,
segundo maior produtor de soja mundial, se aproximando de 100 milhões de
toneladas, não recomenda o uso de fertilizantes nitrogenados, resultando em
grande eficiência econômica. Considerando-se que para produção de uma
tonelada de soja, exporta-se 50 kg de N no grão ou semente. Quando o
rendimento for de 3,5 t/ha, são exportados 175 kg de nitrogênio. Na produção
brasileira temos 100 106 x 50 = 5 109 = cinco bilhões de kg, ou cinco milhões de
toneladas de N, inteiramente retirados da atmosfera pela fixação biológica ou
simbiótica.

Figura 30. Nódulos formados nas raízes de plantas da família Fabaceae


por infecção das raízes com bactérias fixadoras de nitrogênio.

Este resultado representa um avanço da pesquisa, contribuindo para


originar um produto rico em proteínas como a soja. Como se sabe, as proteínas
contribuem com aminoácidos, os mesmos que formam a cadeia proteica de
cada ser vivo. Os aminoácidos têm em sua molécula o N que foi retirado do ar,
incorporado à proteína da planta que utilizada pelo ser humano e animais
domésticos incorpora-se à cadeia própria de cada indivíduo.. Assim, em rações
de suínos e aves tem-se o uso da soja, viabilizando a produção de carne.
Da mesma forma, investimentos no melhoramento do milho e do feijão
resultaram agricultura competitiva. O mesmo se passou com plantas perenes
como cana-de-açúcar, citros, café, eucalipto, espécies forrageiras.

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Como consequência, a agroindústria brasileira desenvolveu-se, baseada na
suinocultura, avicultura, bovinocultura e outros animais domésticos. Assim, a
dieta alimentar brasileira passou por avanços, com maior qualidade e
quantidade de produtos. Da mesma forma, o melhoramento animal seguiu-se
ao das plantas cultivadas. Portanto, o melhoramento genético associado ao
uso de tecnologia produtiva tem salvado a economia nacional, medida pela
eficiência do agronegócio.
Ademais, esse sucesso da agropecuária tem permitido ao Brasil sobreviver
às crises, dentre elas a político-econômica. Ficou evidente em período
conturbado em que se a nação brasileira dependesse apenas dos políticos o
Brasil estaria irremediavelmente perdido. Os políticos conseguiram frustrar
expectativas. Faliram empresas estatais, em esquemas de corrupção
raramente vistos; mostraram nosso lado vergonhoso que muitas vezes tem
ficado oculto. Diante de tudo isto, está uma agropecuária que segue pujante, a
mostrar que podemos superar a nós mesmos – este é o maior desafio a
permear gerações.

Zootecnia: Importância e Visão Geral

Dentre as opções que contribuem para o agronegócio encontram-se as


produções de animais domésticos, cujo estudo é abrangido pela grande área
da zootecnia. Em zootecnia se estuda a criação dos animais domésticos de
pequeno e de grande porte, de interesse para o ser humano como fonte de
alimento e lazer, além de crustáceos, peixes e outros animais e plantas
aquáticos.
Em cada caso, os estudos serão concentrados em melhoramento animal,
reprodução, características desejáveis a serem usadas em seleção, exigências
nutricionais e preparo de rações balanceadas (que provêm de forma
equilibrada, as necessidades alimentares de animais de criação). Sanidade
animal e rendimento seja de carne, leite, ovos e outros derivados de animais
para o consumo humano.

Ruminantes: Bovino, Caprinos, Ovinos, Bubalinos e Camelídeos

Bovinos

O Brasil se destaca, possuindo o segundo maior rebanho bovino no mundo.


A sua criação se destina a produzir carne, couro, leite e derivados, além de
ossos e seus usos, inclusive como fertilizante.
Na criação de bovinos e outros ruminantes, os sistemas podem ser
extensivos, em pastagens ou intensivo em confinamento. No primeiro, os
animais permanecem no campo, obtendo a forragem de que necessitam para
sobreviver e produzir. No confinamento, depois de atingirem o tamanho final de
adulto, serão mantidos em ambiente com pouca mobilidade e recebendo

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alimento previamente preparado, consistindo por forragem enriquecida. Esses
animais apresentam grande capacidade de conversão alimentar, por possuírem
o estômago dividido em quatro partes: a pança ou rúmen; barrete ou retículo;
folhoso ou omaso e coagulador ou abomaso. No rúmen desses animais há
bactérias que atuam sobre a forragem transformado produtos ricos em celulose
e carboidratos em outras substâncias como proteínas.

Figura 31. Bos taurus subespécie taurus, B. taurus subesp. Indicus.

Caprinos

Os caprinos, ruminantes apresentam ampla adaptação a diversos


ambientes produzindo carne, couro, leite e derivados como queijo, e
fermentados. Seu cultivo no Brasil concentra-se no nordeste brasileiro, em
ambiente semiárido. Sua capacidade de conversão de forragem em proteínas e
carboidratos os torna opção para ambiente com escassez de água. Das
diversas raças existentes existem as que foram selecionadas para leite e
carne, nos ambientes de produção. Tem-se as raças nativas e rústicas
adaptadas ao semiárido nordestino e inúmeras outras com aptidão para
produzir leite e carne.

Figura 32. Caprinos: raças locais (NE, Brasil), Alpina (suíça), Anglo-
Nubiana (Inglesa).

Ovinos

Os ovinos (ovelhas) são animais ruminantes com ampla adaptação em nível


mundial. As raças adaptadas a regiões frias desenvolvem uma pelagem
própria. A lã é derivada do pelo da ovelha que, depois de tosquiado, é
processado industrialmente para usos têxteis, limpeza e coloração.

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Figura 33. Raças de ovinos: Merino (Portugal – lã e carne), Morada
Nova, Santa Inês (NE, Brasil) e Dorper (Africa do Sul – carne).

O tecido produzido com fibras de lã serve como isolante térmico, não


esquenta tanto sob o sol (mantém a temperatura do corpo em média 5 a 8
graus mais baixa em comparação com tecidos sintéticos expostos ao sol),
como luvas, gorros e cachecóis. Em regiões de clima subtropical a temperado,
selecionaram-se raças para a produção de lã enquanto em regiões semiáridas
e quentes, como o nordeste brasileiro, as raças adaptadas são desprovidas de
lã, por razão óbvia – se fossem cobertas por lã, não tolerariam o ambiente de
elevadas temperaturas. Surgiram de mutações, em decorrência das tentativas
de se introduzirem ovinos nesses ambientes. Esses genes (alelos mutantes)
condicionam ausência de lã e maior adaptabilidade. Daí, serem mantidas,
formando novo rebanho. Dentre as raças deslanadas que surgiram por mutante
que condiciona a ausência de lã encontram-se Morada Nova e a Santa Inês
(brasileiras) e Dorper e Somalis (africanas)

Bubalinos

Animal ruminante típico, o búfalo asiático, Bubalus bubalis L. que têm sido
utilizados pelo ser humano para a produção de carne, leite e derivados. Inclui-
se ainda a sua função de tração para mover implementos usados no plantio, na
condução de lavouras, auxiliando no cultivo e na colheita.
Existem outras espécies de ruminantes que, ainda sendo denominados
búfalos, não apresentam proximidade genética e não geram híbridos férteis.

Figura 34. Búfalo doméstico (Bubalus bubalis), bisão (Bison bison) e


búfalo africano (Cincerus caffer).

Camelídeos

Classificados como ruminantes, ainda que tenham algumas diferenças, se


encontram os camelídeos. Estes animas da família Camelidae distinguem-se
dos restantes dos ruminantes por terem o estômago dividido em três câmaras.

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Os mais conhecidos mundialmente são camelos, com as espécies Camelus
dromedarius e Camelus bactrianus, originários de áreas desérticas quentes e
desertos frios. Da mesma família (Camelidae) encontram-se a Llama (Lllama
glama) e a Alpaca (Vicugna pacos) domesticados na cordilheira dos Andes.

Figura 35. Camelídeos: dromedário e camelo bacteriano (Ásia, África),


llama, vicunha ou alpaca (América do Sul).

Esse agrupamento de ruminantes, animais essencialmente herbívoros. se


fez no intuito de unificar o tratamento. Mesmo diante de diferenças de
constituição, anatômicas e de comportamento, apresentam aparelho digestivo
complexo em que o processamento alimentar, com a participação de micro-
organismos, se torna mais eficiente na conversão da ingesta no produto
esperado, como carne, couro, leite e derivados.

Equinos, Asininos e Muares

Neste grupo de animais herbívoros monogástricos, pertencentes à Ordem


Perissodactyla, Família Equidae, encontram-se o cavalo, o asno ou jumento e
os muares que são híbridos interespecíficos, entre cavalo e jumento.
Enquanto os equinos correspondem ao cavalo (macho) e às éguas
(fêmeas), os asininos são os conhecidos como jumentos e jumentas; já os
muares dizem respeito aos burros (machos) e mulas (fêmeas), assim como os
bardotos machos e fêmeas.
Os muares (burros e mulas) decorrem do cruzamento de um jumento
(Equus asinus) com uma égua (Equus caballus). Os bardotos machos e
fêmeas recebem esse nome quando o cruzamento se dá entre um cavalo e
uma jumenta. Todos os muares são animais híbridos e consequentemente
estéreis, ou seja, incapazes de se reproduzir.

Figura 36. Cavalo (Equus caballus), asno (E. asinus) e mula (E. caballus x
E. asinus).

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Interessante ressaltar que esses animais são igualmente herbívoros
como os ruminantes ainda que monogástricos, enquanto os ruminantes são
também classificados como poligástricos.
Nos herbívoros monogástricos, os micro-organismos que atuam na digestão da
celulose são bactérias e estão presentes no intestino grosso, geralmente em uma
região chamada ceco ou apêndice cecal. Este apêndice é alongado, dando abrigo às
bactérias que atuam na digestão de fibras. Além dos cavalos, jumentos e muares,
encontram-se as zebras e os coelhos.

Suinos

O porco ou suíno, teria sido introduzido com os primeiros colonizadores, no século


XVI, como animal de produção. As primeiras criações no Brasil eram de porcos
campestres ou caipiras aos quais se davam os restos alimentares, plantas e grãos.
Tinham vida livre e levavam muito tempo para atingir o ponto de abate.
Os suínos são mamíferos onívoros com aparelho digestivo semelhante ao do ser
humano. Requer balanceamento alimentar, com diversidade proteica. Assim, como
integrantes de ração tem-se as misturas de soja e de milho, além de outros
componentes. Os suínos precisam ingerir em sua ração aminoácidos essenciais, em
número de nove (valina, leucina, isoleucina, fenilalanina, histidina, metionina, treonina,
arginina e triptofano). Isto nas proporções para integrar a sua própria cadeia proteica.
Nesse aspecto diferem dos herbívoros que, como vimos, auxiliados por micro
organismos, sintetizam proteínas completas em aminoácidos essenciais. Portanto, a
criação de suínos, ou suinocultura, é uma atividade que exige formação profissional
voltada ã nutrição, à sanidade, ao manejo e à reprodução. No melhoramento genético,
busca-se seleção para precocidade, rendimento de carcaça, maior proporção de carne
do que gordura, entre outras características.

Figura 37. Raças de porcos (Sus scrofa domesticus) para produção.

Na demanda por proteína animal, a carne suína tem liderado no consumo


mundial, em virtude da sua versatilidade e do baixo teor de gordura,
comparativamente menor que em alguns cortes de aves. Nesse cenário internacional,
o Brasil se mantém firme como o quarto maior produtor e exportador, se aproximando
de US$ 2,5 bilhões previstos para 2020, mesmo diante de ameaças à economia
devidas à pandemia Covi-19.

Aves

A criação de aves ou avicultura, especificamente, galináceos, teria chegado ao


Brasil em 1503, com Gonçalo Coelho, que atracou no Rio de Janeiro. A criação de
galinha era parte da atividade rural, fornecendo carne, ovos e outros produtos. A

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produção comercial teria surgido em Minas Gerais, por volta de 1860, com o despacho
galináceos para outras regiões brasileiras. A criação do frango, no entanto, era
campestre. As aves (crioulas ou galinhas caipiras) viviam soltas e demoravam até seis
meses para atingir o peso de abate, na faixa de 2,5 quilos ou mais.
A modernização com produção em escala da avicultura na década de 1930, em
razão da necessidade de abastecer os mercados demandantes. A partir dos anos
1950, a avicultura brasileira ganhou impulso com os avanços da genética, o
desenvolvimento das vacinas, nutrição e equipamentos específicos para sua criação.
As agroindústrias avícolas brasileiras ganharam estrutura no início dos anos 1960.
Na atualidade, os frangos de corte são abatidos com cerca de 40 dias de idade e
peso médio de 2,4 quilos. O crescimento da avicultura comercial brasileira, tem se
baseado no melhoramento genético, introdução do sistema de produção integrada,
nutrição balanceada, manejo adequado e controle sanitário. A qualidade da carne e
dos ovos se destaca como façanha do agronegócio nacional.
O Brasil se destaca como o segundo maior produtor e exportador de carne de
frango. Produziu em 2002, 7,6 milhões de toneladas e exportou 1,3 milhão. O
consumo interno per capita de frango chegou a 34 quilos em 2019. Enquanto isso, a
produção de ovos, ultrapassou 21 bilhões de unidades e o consumo per capita atingiu
125 unidades.

Figura 38. Frango de corte, ganinhas poedeiras (diferentes raças).

Aquicultura

Como um ramo da zootecnia, tem-se a aquicultura, isto é a criação de


animais e plantas aquáticos. No Brasil, a aquicultura desponta como atividade
futura de grande expressão. A produção de peixes e outros animais aquáticos
consumidos pelo ser humano passam a ter um enfoque racional, diferente da
atividade extrativista. O aumento da população mundial e a necessidade de
diversificar a alimentação com fontes saudáveis levam ao desenvolvimento da
atividade.

Figura 39. Tanques (água doce) e gaiolas (mar) para criação de peixes,
moluscos, crustáceos, anfíbios, répteis e plantas aquáticas.

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Em aquicultura se estuda a produção racional de organismos aquáticos,
como peixes, moluscos, crustáceos, anfíbios, répteis e plantas aquáticas para
uso do ser humano. Os animais de aquacultura são alimentados de ração.
Nessa área, os estudantes de agronomia têm a opção de atuar como
profissionais, assessorando a produção de peixes crustáceos, algas e
moluscos que são demandados como alimentos em muitas partes do mundo. A
aquicultura pode aumentar a oferta e contribuir para melhorar a dieta alimentar
de brasileiros.
A pesquisa tem o seu lugar na aquicultura, contribuindo para o estudo da
biologia dos animais e plantas aquáticos, definindo formas de exploração
econômica. Os alunos de agronomia têm nesta área a possibilidade de
contribuir para aumento do conhecimento e na especialização, visando à
atividade profissional.

Agronegócio

Tem-se como definição de agronegócio as operações envolvidas do


ciclo da agricultura e pecuária. Compreende a produção, os serviços
financeiros, transporte, marketing, seguros, o valor dos produtos (bolsas de
mercadorias) Costuma-se dividir o estudo do agronegócio em três partes: na
primeira, os negócios à montante da agropecuária, ou da "pré-porteira",
representados pela indústria e comércio que fornecem insumos para a
produção rural, como, por exemplo, os fabricantes de fertilizantes, defensivos
químicos, equipamentos, bancos e financeiras.
Trata dos negócios agropecuários na propriedade ou "dentro da
porteira", representados pelos produtores rurais, sejam eles pequenos, médios
ou grandes, constituídos na forma de pessoas físicas - fazendeiros ou
camponeses - ou de pessoas jurídicas.
Por último trata das atividades externas à propriedade atividades à jusante dos
negócios agropecuários, ou "depois da porteira", onde estão a compra,
transporte, beneficiamento e venda dos produtos agropecuários até o
consumidor final. Enquadram-se, nesta definição, os armazéns, as
transportadoras, as indústrias de transformação (frigoríficos, têxteis, calçados,
empacotamento, mercados e distribuidores de alimentos.

Insumos

Insumos são fatores de produção diretos: sementes, fertilizantes,


produtos químicos para controle de pragas, doenças e plantas daninhas,
máquinas e implementos, combustível, ração; e indiretos mão de obra, energia,
tributos ou impostos empregados na elaboração de bens ou serviços.

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Figura 40. Exemplos de insumos: fertilizante, sementes, fungicida-
inseticida (tratamento) e combustível (diesel).

Produção

A produção é o trabalho do agropecuarista por meio do cultivo do solo


e/ou criação de animais, independentemente do tamanho da área ou método
utilizado. É a transformação do produto agropecuário em subprodutos que
podem ser bens de consumo ou insumos para outros processos, como o leite,
queijos, carnes, embutidos, ração, fios, corantes.

Distribuição

Outra parte da cadeia produtiva corresponde ao transporte,


processamento e distribuição dos bens agropecuários, para o consumidor ou
para intermediários no processo. Como exemplos tem-se a produção de
hortaliças (tomate, couve, alface, couve-flor). Estes produtos podem ser
comercializados pelo produtor diretamente com o consumidor ou fornecer a
intermediários que os processam, e entregam aos mercados ou diretamente
aos mercados onde os produtos chegam ao consumidor ou cliente final.

Alimentos

Quando estes são constituídos por leite, grãos(feijão, arroz) há uma


cadeia da produção, como: frigoríficos, usinas de beneficiamento de leite,
beneficiamento dos grãos, indústria de óleo, rações, empacotadores,
distribuidores de grãos e beneficiadores.

Biocombustíveis

As mesmas plantas que se cultivam como alimentos podem ser


direcionadas a mercados distintos. Um exemplo é o do milho. Parte de sua
composição é de óleo e outra parte considerável é de amido. Ambos podem
ser direcionados ao uso, produzindo biodiesel e etnol. Este e outro setor do
agronegócio que cuida do cultivo e a transformação em combustíveis
orgânicos, os chamados biocombustíveis.

` Fibras

` Algumas plantas industriais se destinam à produção de fibras, como é o


caso do algodão. Este é o ramo industrial, compreendido pelo agronegócio,
que transforma bens agropecuários, como a fibra do algodão em produtos
têxteis, como vestuário, artigos de cama, mesa e banho, bens de decoração e

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insumos para as indústrias moveleira e calçadista. Além do algodão têm se o
linho, o rami, o sisal, como fontes de fibras finas e industriais, Estes produtos
da agropecuária passam a ser insumos ou matéria-prima para a indústria.

Madeira

Na exploração agro-silvo-pastoril em que se tem a combinação de


plantas anuais e perenes, as árvores serão transformadas em madeira,
celulose ou produtos químicos para posterior utilização como matéria-prima de
várias indústrias, como a moveleira e a de construção civil, a indústria
papeleira, ou mesmo a obtenção de lenha para combustível.

Questão Ambiental

O aprimoramento do agronegócio, com aplicação de tecnologia,


aumentou a eficiência dos sistemas produtivos, resultando em maiores
rendimentos. Isto têm contribuído para baixas o preço de alimentos e e outros
produtos derivados da atividade agropecuária, oferecendo à população, maior
poder de consumo e de escolha. Contudo, têm causado problemas relativos às
questões ambientais e sociais.
O grande desafio da atualidade é produzir, em harmonia com o
ambiente, respeitando a conservação de reservas naturais, com o menor
impacto ambiental possível. Estes advêm do uso intensivo da terra, de
agrotóxicos, má conservação e empobrecimento do solo, queimadas,
contaminação de mananciais e do lençol freático, desequilíbrio ecológico e
proliferação de pragas em consequência de monocultvos, como os da soja e do
milho. Estes pontos têm sido utilizados para pressionar para baixo os preços de
produtos agrícolas brasileiros.

Figura 41. Áreas de produção e conservação e controvérsia entre produzir


e conservar.

Contudo, ainda que controverso o código florestal brasileiro prevê a


conservação de parte da área, mantendo a diversidade natural existente, com

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percentual variando de acordo com a região. Esse fator tem sido questionado
por produtores que consideram perdas por deixar de cultivar.

Questão social

Na parcela mais pobre da população rural, envolvida na agricultura


familiar, a modernização da agricultura com tecnologia que aumenta a
eficiência nem sempre tem sido acessível, marginalizando muitos produtores,
principalmente os de subsistência em pequenas propriedades rurais. Os
serviços de assistência técnica e extensão rural por parte do Estado têm
diminuído sua disponibilidade, marginalizando os produtores. Estes são
privados de técnicas e métodos modernos, como irrigação, maquinários e
insumos, perderam a competitividade, levando ao abandono do campo e o
êxodo rural.

Características dos Módulos de Produção

Pequenas e Médias Áreas

Constituem os pequenos e médios produtores que contam com áreas


pequenas e recursos financeiros para incrementar o processo. Nem sempre
têm acesso a crédito provido por programas de governo para estimular este
setor. Porém, modernos empreendedores conseguem produzir em pequenas
áreas maximizando rendimento com produtor de valor agregado, como
cogumelo, morango, hortaliças em sistemas orgânicos com certificação.

Grandes Áreas

As grandes extensões territoriais do Cerrado abrigam propriedades


extensas de monocultura de produtos considerados commodities, como soja,
milho, algodão e bovinocultura de corte. Devido ao tamanho da propriedade o
crescimento de capital se dá pelo ganho em escala e a redução dos custos de
produção. Com uso de tecnologia, maquinaria e infraestrutura, a receita líquida
por unidade de área é elevada. Esta quando multiplicada pelo volume
produzido, permite considerável ganhos econômicos.
A margem de lucro, ou lucro líquido, depende de rendimento e dos
preços de produtos, sejam eles grãos de soja, milho, sorgo, trigo etc., frutas,
cana-de-açúcar; pode ser elevada com a aplicação de tecnologia. Desta forma,
associando com escala, a atividade de produção de soja, por exemplo, pode
tornar-se atrativa. Mesmo quando os preços praticados são baixos o menor
rendimento unitário (R$/ha) pode se compensar pelo volume produzido.
Portanto, margem de lucro associada à escala de produção tem contribuído
para gerar riqueza e prosperidade, fortalecendo a agricultura brasileira e
regional, em especial no Cerrado.

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Figura 42. Empreendimento agrícola: Familiar, Médio e Grande.

Contudo, em áreas de agricultura familiar, de menor escala, há ainda muito


espaço para crescimento dos avanços obtidos nas áreas de mecanização, de
manejo de plantas e de animais, de manejo do solo, de controle fitossanitário
integrado (plantas daninhas, pragas e doenças). Nestas áreas, a organização
dos agricultores é de fundamental importância para produzir com agregação de
valor. Esta é a forma que permite aumentar retorno financeiro por unidade de
área, possibilitando a permanência de pequenos produtores na atividade rural.
A racionalização do uso de insumos como corretivos, fertilizantes,
inseticidas, fungicidas, herbicidas e combustíveis; os investimentos em
máquinas, implementos, armazéns têm sido possíveis pelo uso de tecnologia
Assim, o produtor tende a diminuir custos e aumentar rendimento, viabilizando
o lucro.
Grande parcela do produto interno bruto (PIB) depende do sucesso na
agricultura brasileira, Em especial no Cerrado, onde os investimentos iniciais
para tornar o solo apto a produzir em nível econômico são elevados.
Este cenário, que se apresenta ao estudante de agronomia, é uma amostra
dos temas que serão abordados na área de ciências sociais aplicadas ao
agronegócio, que integra o curso de agronomia.

Relação entre Nutrição da Planta e Produção de Grãos: Soja

Quando se pensa em adubação, depois do solo de Cerrado corrigido, leva-


se em consideração a exigência da cultura (soja, milho, sorgo, feijão etc.) e a
expectativa de rendimento. Ou seja, a exigência da planta para o crescimento e
reprodução e, depois de colhido o produto, grãos no caso, o quanto é
exportado com a retirada destes. Ou seja, a adubação prevê a reposição de
nutrientes que são levados ou exportados, para que o solo continue a manter a
capacidade de rendimento esperado. Conhecendo-se a quantidade de
nutrientes imobilizada/exportada e o rendimento (t/ha) esperado, pode-se
escolher a fórmula de adubação e calcular a quantidade a ser usada.

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Tabela 3. Distribuição de elementos químicos na planta de soja.

Existem várias fórmulas de adubação que visam suprir as exigências


plantas como 4–30–16, 4-14-8, 0-20-20, 20-10-20. Estes números referem-se
aos valores percentuais dos nutrientes: nitrogênio, fósforo e potássio, em
termos de N, P2O5 e K2O. Em 100 kg de fórmula tem-se, respectivamente, 4 de
N, 30 de P2O5 e 16 de K20; 4 de N, 14 de P2O5 e 8 de K20; 0 de N, 20 de P2O5
e 20 de K20; e 20 de N, 10 de P2O5 e 20 de K20. Portanto, quando se pretende
adubar um hectare (ha) de feijão, usando 400 kg da fórmula 4-30-16, tem-se
que serão aplicados 16 kg de N, 120 de P2O5 e 64 de K20.
Em soja a adubação é feita com a fórmula 0-20-20, correspondendo aos
mesmos elementos. A dose zero é porque a soja apresenta em suas raízes
bactérias do gênero Bradyrhizobium.
Estas são inoculadas por ocasião do plantio, adicionando-se às sementes
um substrato, contendo colônias de bactéria (inoculante), produzido
comercialmente. Dessa forma, economiza-se nitrogênio e o custo de produção
da soja cria uma vantagem competitiva.

Exercícios e Definições

Produção de Soja e Adubação

Considere dois agricultores que produziram soja semente e grão. Em áreas


de 100 hectares (ha) para a produção de soja grão e de 200 hectares para a
produção de soja semente, espera-se, em ambos, rendimento de 4,0 t/ha.
Levando-se em conta que, após análise da composição do grão (ou semente),
cada tonelada exporta 20 kg/ha de K2O, quantos quilos (ou toneladas) de
fertilizante 0-20-20 se deve utilizar no total de cada área, para repor o que se
exporta? Qual a receita líquida (total da área) de cada um considerando que: o
produtor de grãos recebe R$1,20 e o de sementes R$1,80 por quilograma de
produto e que o custo de produção seja de R$3.100,00 e de R$2.800,00 por
hectare, respectivamente de sementes e grãos?

Neste exemplo, espera-se no cultivo de soja rendimento 4,0 t/ha. Lembrando


que cada tonelada produzida exporta na seguinte quantidade 1 t =20kg K2O;
como o esperado é 4t= 4 x 20=80 kg/ha.

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A solução, empregando-se cálculo simples regra de três, é como segue:

100 kg - 20
x 80 x=400 kg/ha.
O total de fertilizante:
Área (a) 100 x 400 = 40.000 kg ou 40 t.

Área (b) 200 x 400 = 80.000 ou 80 t.

Receita Líquida (RL) = Receita bruta – Custos, ou

RL(a) = 4,0 t x 100 = 400 t de soja grão ou 400.000 kg x R $ 1,2 = R $


480.000,00 – (R $2.800 x 100) = R $ 200.000,00;

RL(b) = 4,0t x 200 = 800 t de soja semente ou 800.000 kg x 1,8 = 1.440.000 –


(R $ 3.100 x 200) = R $ 820.000,00

Estabelecimento de Pastagem: Consumo de Sementes e Custo

Um lote de semente de capim Tanzânia (Panicum sp., Poaceae) com


valor cultural (VC) de 50% custa R$ 18,00/kg. Considerando que a pesquisa
recomenda uma taxa de 3,0 kg/ha de sementes puras germináveis (SPG) e o
produtor necessita estabelecer uma pastagem com 20 hectares, solicita se:
a) Quantidade de sementes de capim que ele deverá adquirir.
b) Valor (R$) a ser gasto com aquisição das sementes.

VC = 50% SPG = (100 x 3) /50 = 6 kg .


Respostas: a) Quantidade de sementes = 6 x 20 = 120 kg; b) Valor = 120 x
18,00 = R $ 2.160,00

100 – 50

x 3

Definições

Rendimento = produção por unidade de área, tendo como exemplo 4


toneladas de soja produzidas em um hectare, ou 4,0 t/ha.

Hectare (ha) = medida de área, correspondente a 10.000m2. A Fifa adota


como medida padrão de um campo de futebol: 105m x 68m. Portanto, um
campo de futebol soma pouco mais de ¾ de um hectare.

Valor cultural é a proporção de sementes puras x a percentagem de


germinação. Exemplo: um lote de sementes de braquiária apresenta 80 % de
pureza. Isto quer dizer que em 100g, 80g correspondem à semente
propriamente; os 20 % restantes são impurezas, como restos de planta, solo,
pequenas pedras etc. Percentagem de germinação equivale dizer que, de 100

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sementes lançadas ao solo, nem todas germinam; quando 80 delas germinam
e emergem, originando plantas e formando uma lavoura, tem-se 80% de
germinação.

Quando se adquire semente de forrageira tem-se o valor cultural como


indicativo da qualidade. Portanto uma semente com 80 % de pureza e 80 % de
germinação, apresenta valor cultural de 0,8 x 0,8 = 0,64 ou 64 %.

Semente = material de propagação produzido pelas plantas que atende um


mínimo percentual de germinação, vigor e pureza. Exemplos: sementes de
soja, feijão, milho, arroz etc.

Grão = material produzido pelas plantas destinado ao consumo direto de


seres humanos e de animais domésticos e à indústria. Exemplos: grãos de
soja, feijão, milho, arroz etc.

Lucro = total de receita obtida pela produção de grãos de soja, por exemplo,
deduzindo-se os custos para produzir do plantio à colheita, incluindo
beneficiamento, armazenamento e comercialização.

Desafios aos Estudantes que Iniciam Agronomia

Neste texto há inúmeras palavras e termos técnicos específicos da


agronomia. Alguns deles foram definidos; muitos outros são novos para o
estudante. Sugere-se que, com os meios de comunicação, se faça uma busca
e relacione o significado com os eventos ou objetos representados. Espera-se,
com exercícios de autoaprendizagem, que o estudante cresça em
conhecimento e se interesse por desenvolver sua própria base de
conhecimento.
Como enfatizado em aula, aprendizagem é fruto da iniciativa individual, que
por sua vez se origina da motivação. A motivação cria a vontade de aprender,
de ampliar horizontes, a partir da referência existente. A motivação, por sua
vez, advém de sonhos que alimentamos. Sonhemos, alto e forte, pois são os
sonhos que guiam nossa vida. Ao fertilizarmos e cultivarmos esses sonhos
poderosos, encontramos energia para lutar e vencer barreiras.
Em nossa formação cada um de nós monta o arcabouço que servirá como
norteador. Com esse espírito, o conhecimento, antes estático, desligado, passa
a ter uma dinâmica, um ordenamento. O professor neste cenário é um
motivador, esperançoso de que a semente caia no lugar certo; que germine,
origine a planta e reproduza; que seus frutos sejam abundantes e
compartilhados. Quem ainda não o fez, fica a recomendação de que leia a
parábola do semeador (Lucas 8:4-8). Mais ainda, se o fizerem durante o curso,
entenderão o porquê da comunicação Divina.

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Tomem-se como exemplos outros campos de atividade – praticar esporte,
como jogar bola, ouvir música, ler e outros. Com características próprias, cada
campo escolhido permite identificar interesses e desencadeia-se a busca; o
ganho em conhecimento e prática é consequência. Por associação, chega-se
ao domínio mais complexo. Veja-se o uso de celular para obter informação de
interesse; não há limites, correto? De novo, o ganho é rápido, juntando
motivação, vontade, interesse e orientação. Assim, pense em usar os mesmos
recursos para se aprofundar nos temas do curso de agronomia que virão à
medida que cursar as disciplinas. Assim, gradativamente o arcabouço será
preenchido e se terá adquirido a visão do todo.
Isto vale para as disciplinas aplicadas e as básicas. Portanto, se na visão
inicial do curso de agronomia, despertou motivação por um tema, utilize a
vontade decorrente para vencer as barreiras até chegar ao que interessa. Lá
perceberá que as disciplinas aparentando menor importância passam a compor
o cenário de sua formação profissional.
Com este texto, reunindo conceitos básicos, o professor espera que
estudante encontre a motivação inicial para seguir com os desafios. Importante
que se mencione, todas as áreas do conhecimento são marcadas por desafios.
Portanto, independente da agronomia, qualquer campo de estudos terá essa
peculiaridade.
Vencer desafios tem norteado a busca incessante do ser humano. Incorpore
esse conceito à sua formação, imagine-se diante do desconhecido, tentando
entendê-lo. Examine, avalie, pondere as partes e as relações entre elas, como
sugeriu o pensador René Descartes. Ao fazê-lo, perceberá a visão do todo,
conseguirá explicar fenômenos, criará poder de decisão de como intervir. Por
tentativa, a partir do empirismo, cresça em ciência; assim se forma o
profissional. Esta é a esperança maior do professor.

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