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A ECONOMIA

POLÍTICA DA ÁREA
DA DEFICIÊNCIA EM
MOÇAMBIQUE
José Jaime Macuane
João Vembane
Rafaela Andrade

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 1


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A ECONOMIA
POLÍTICA DA ÁREA
DA DEFICIÊNCIA EM
MOÇAMBIQUE
José Jaime Macuane
João Vembane
Rafaela Andrade

Iniciativa

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 3


A ECONOMIA
POLÍTICA DA ÁREA
DA DEFICIÊNCIA EM
MOÇAMBIQUE
José Jaime Macuane
João Vembane
Rafaela Andrade

TÍTULO
A ECONOMIA
POLÍTICA DA ÁREA DA
DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE
AUTORES
JOSÉ JAIME MACUANE
JOÃO VEMBANE
RAFAELA ANDRADE
EDIÇÃO
FUNDAÇÃO MASC
DESIGN E PAGINAÇÃO
FUNDAÇÃO MASC
REVISÃO LINGUÍSTICA
ALMIRO LOBO
ENDEREÇO DO EDITOR
AVENIDA DO ZIMBABWE
Nº 1374, C.P 4296 MAPUTO - MOÇAMBIQUE

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AGRADECIMENTOS

A equipa que realizou este estudo agradece o inestimável apoio dado pela Fundação MASC,
seus parceiros e a todos os entrevistados e entrevistadas, assim como às entidades que
aceitaram colaborar para uma melhor compreensão da área da deficiência.
No entanto, o exposto neste relatório é de inteira responsabilidade dos seus autores.

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SIGLAS E ABREVIATURAS
ACAMO Associação dos Cegos e Amblíopes de Moçambique
ADEMO Associação dos Deficientes de Moçambique
AFs Agregados Familiares
AJODEMO Associação dos Jovens Deficientes de Moçambique
AMUSAM Associação Moçambicana dos Usuários de Saúde Mental
APDs Associações de Pessoas com Deficiência
AR Assembleia da República
ARI African Rehabilitation Institute/Instituto Africano de Reabilitação
AU/UA African Union/ União Africana
BdPES Balanço do Plano Económico e Social
CAE Classificação das Actividades Económicas
ICF/CIF International Classification of Functioning, Disability and
Health/Classificação Internacional de Funcionalidade, Deficiência e Saúde
CINSFLU Censo de Instituições Sem Fins Lucrativos
CNAD Conselho Nacional para a Deficiência
CNAS Conselho Nacional de Acção Social
CNDH Conselho Nacional de Direitos Humanos
CREI Centros de Recursos de Educação Inclusiva
CRM Constituição da República de Moçambique
DFID Department for International Development/Departamento para o
Desenvolvimento Internacional (Reino Unido)
EEIDCD Estratégia de Educação Inclusiva e Desenvolvimento da Criança com Deficiência
EEP Estudo de Economia Política
EGFAE Estatuto Geral dos Funcionários e Agentes do Estado
ENSSB Estratégia Nacional de Segurança Social Básica
FAMOD Fórum das Associações Moçambicanas dos Deficientes
FMO Fórum de Monitoria do Orçamento
FNUAP Fundo das Nações Unidas para a População
FRELIMO Frente de Libertação de Moçambique
HIV/SIDA Vírus de Imunodeficiência Humana/Síndrome de Imunodeficiência Adquirida
IFPELAC Instituto de Formação Profissional e Estudos Laborais Alberto Cassimo
INAS Instituto Nacional de Acção Social
INE Instituto Nacional de Estatísticas
ILO/OIT International Labour Organization/ Organização Internacional do Trabalho
INEFP Instituto Nacional de Emprego e Formação Profissional
IPAJ Instituto de Patrocínio e Assistência Jurídica
MAEFP Ministério da Administração Estatal e Função Pública
MASC Mecanismo de Apoio à Sociedade Civil
MDG/ODM Millennium Development Goals/Objectivos de Desenvolvimento do Milénio
MDM Movimento Democrático de Moçambique
MGCAS Ministério do Género, Criança e Acção Social
MINEDH Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano

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MISAU Ministério da Saúde
MITESS Ministério do Trabalho, Emprego e Segurança Social
MJD Ministério da Juventude e Desportos
MOPHRH Ministério das Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos
NEE Necessidades Educativas Especiais
OAM Ordem dos Advogados de Moçambique
ODI Overseas Development Institute
ODS Objectivos de Desenvolvimento Sustentável
OE Orçamento do Estado
WHO/OMS World Health Organization/Organização Mundial da Saúde
ONG Organização Não Governamental
ONU Organização das Nações Unidas
OPDs Organizações de Pessoas com Deficiência
OSCs Organizações da Sociedade Civil
PASD Programa Apoio Social Directo
PASP Programa Acção Social Produtiva
PcD Pessoa(s) com Deficiência
PSCM-PS Plataforma da Sociedade Civil Moçambicana para a Protecção Social
PES Plano Económico e Social
PIB Produto Interno Bruto
PNAD Plano Nacional para a Área da Deficiência
PPPD Política da Pessoa Portadora de Deficiência
PSSAS Programa de Serviços Sociais de Acção Social
PSSB Programa Subsídio Social Básico
RAVIM Rede de Assistência às Vítimas de Minas
RBC Reabilitação Baseada na Comunidade
RENAMO Resistência Nacional de Moçambique
ROSC Fórum da Sociedade Civil para os Direitos da Criança
SDSMAS Serviço Distrital de Saúde, Mulher e Acção Social
SISTAFE Sistema de Administração Financeira do Estado
TARV Tratamento Antirretroviral
UGEA Unidade Gestora de Aquisições
UNCRPD/ United Nations Convention on the Rights of Persons with Disabilities
CNUDPD /Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência
UEM Universidade Eduardo Mondlane
UNESCO United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization
(Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura)
UNICEF United Nations Children’s Fund (Fundo das Nações Unidas para a Infância)
WFP/PMA World Food Programme/ Programa Mundial de Alimentação
WG Washington Group (Grupo de Washington)

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SUMÁRIO EXECUTIVO

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SUMÁRIO EXECUTIVO

O interesse na área da deficiência tem crescido nos últimos anos, no mundo assim como em
Moçambique. Nesta perspectiva, o país aderiu e ratificou os principais instrumentos regionais
e internacionais da área, que têm sido convertidos em políticas, estratégias e planos nacionais.
Dentre os instrumentos a que o país aderiu destacam-se a Década Africana Dedicada às Pessoas
com Deficiência e a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiên-
cia (CNUDPD).

Porém, a despeito dessa crescente atenção, a garantia dos direitos das pessoas com deficiência
(PcD) ainda enfrenta desafios, tanto em Moçambique como no mundo. A exclusão deste grupo
populacional não só é uma violação aos direitos humanos, como também constitui um problema
sério de desenvolvimento.

É neste contexto que o presente estudo de economia política (EEP) da área da deficiência em
Moçambique se enquadra, cujo objectivo é identificar as barreiras para as pessoas com deficiência
e as potenciais áreas de intervenção, com foco no empoderamento político. O EEP identifica ele-
mentos importantes para o empoderamento das PcD em Moçambique e levanta questões críticas
na dinâmica do sector no que concerne à prestação de serviços, resposta às demandas dos prin-
cipais beneficiários e potenciais cursos de acção com vista ao empoderamento político dos actores
do sector de deficiência. Neste sentido, o estudo identifica questões à volta: das ideologias e do
legado histórico que enformam a dinâmica do sector; da legislação, políticas e estratégias; dos prin-
cipais actores, instituições e relações de poder; do financiamento do sector; da oferta de serviços; e
de como estes elementos influenciam o empoderamento das PcD. Estes aspectos são a base para
a apresentação das recomendações do estudo.

Para se responder às questões do estudo, tomou-se como base o modelo desenvolvido pelo Over-
seas Development Institute (ODI), no seu quadro analítico para o entendimento da economia políti-
ca de sectores e arenas, adoptado pela Fundação MASC, na sua metodologia padrão de EEP.
A análise das organizações, instituições e actores, que olha para a história, os processos de mu-
dança, os aspectos estruturais, o poder e as ideologias constituem os principais aspectos do quadro
analítico do estudo. Em termos metodológicos, foi conduzida uma revisão bibliográfica, que passou
pela consulta de documentos e estudos relevantes do sector. A revisão bibliográfica foi cruzada e
complementada com entrevistas semi-estruturadas administradas a informantes-chave da área da
deficiência, dentre representantes de entidades do governo, representantes de organizações de
pessoas com deficiência (OPDs), organizações internacionais com intervenções na área, parceiros
de cooperação com histórico de financiamento ao sector e representantes do sector privado. Os
entrevistados foram escolhidos com base no seu papel e conhecimento do sector. Entretanto, a
falta de dados quantitativos específicos sobre a área da deficiência, tais como estatísticas mais
actualizadas e informação sobre orçamentos e volumes de financiamento ao sector constituíram as
principais limitações do estudo.

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Os principais resultados do EEP da deficiência incluem o seguinte:

• A questão da salvaguarda dos direitos da PcD é, de certa forma, uma preo cupação cres-
cente no Estado Moçambicano, sobretudo a partir do período da abertura ao multiparti-
darismo e o alargamento dos direitos fundamentais e cívicos dos cidadãos, tendo como
marco principal a aprovação da Constituição de 1990. Desde essa altura, verificam-se
cada vez mais provisões constitucionais específicas sobre a deficiência, a adesão a polí-
ticas e mecanismos regionais e internacionais, a adopção de políticas específicas para o
sector, para além de uma legislação sectorial abordando o assunto. A adesão à Década
Africana para as Pessoas com Deficiência e à CNUDPD pelo país, abriram espaço para o
desenvolvimento da política da deficiência e dos Planos de Acção do Sector da Deficiência
(PNAD), principais instrumentos de acção multissectorial neste sector. Outros instrumentos
são a Estratégia Nacional de Segurança Social Básica (ENSSB) e também existem instru-
mentos sectoriais, como os da área da educação inclusiva. Também foi aprovada legislação
específica, como a da acessibilidade a lugares públicos. Porém, há que reconhecer que
ainda persiste a necessidade da implementação efectiva destes mecanismos, de modo a
assegurar a inclusão e plena participação das PcD nas arenas política, económica e social.
• A adopção de instrumentos de acção nesta área tem sido influenciada pelos valores sociais
e políticos e pela história do país, e pelos modelos de intervenção nesta área que foram
sendo adoptados no mundo. No contexto social vigente, persiste uma visão negativa da
deficiência, decorrente das crenças sociais, que é apontada como fruto de maldição, feitiço
e outros males. No contexto internacional, as abordagens evoluíram de médicas e assisten-
cialistas, atreladas à ideia de que a deficiência é uma doença que deve ser tratada medi-
camente, para visões e abordagens mais sociais (como fruto do meio físico e social em que
as pessoas vivem) e agora fala-se de abordagens baseadas em direitos. Em Moçambique,
as abordagens sobre a deficiência foram historicamente influenciadas pelo modelo médico e
assistencialista. A adesão do país aos instrumentos internacionais, como a Década Africana
da Deficiência, as declarações de Salamanca (sobre a educação inclusiva) e, mais recente-
mente, a CNUDPD, influenciaram a elaboração dos instrumentos de política para a área da
deficiência mais alinhados com a perspectiva social e de direitos, pelo menos em princípio.
No entanto, o continuado baixo conhecimento sobre as abordagens da deficiência no sector
público, os interesses políticos estratégicos dos actores que controlam o poder, remetem es-
sas ideias apenas para a esfera formal, continuando as abordagens de âmbito mais médico
e caritativo dominantes na actuação do Governo nesta área.
• Um aspecto crítico na definição de políticas é a existência de dados estatísticos fiáveis so-
bre as pessoas com deficiência, que, em parte, decorre do uso de metodologias inadequa-
das de recolha de informação. Isso leva a divergências entre as OPDs e o Instituto Nacional
de Estatísticas (INE) sobre o número real de PcD. No entanto, decorrem já actividades de
capacitação do INE no sentido de adoptar metodologias adequadas (como a do Grupo de
Washington) nos seus censos e recolha de informação sobre este grupo e há mecanismos
de diálogo com as OPDs.
• Existem vários actores e instituições estatais, da sociedade civil e agências da cooperação

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para o desenvolvimento que actuam na área da deficiência. Alguns destes têm papéis mais
visíveis e específicos na garantia dos direitos das pessoas com deficiência, dependendo
de vários factores, dentre os quais a forma como as próprias entidades foram estrutura-
das e os incentivos existentes para a criação de capacidade de resposta às questões das
PcD em cada uma delas.
• O Ministério do Género, Criança e Acção Social (MGCAS) é o principal órgão do governo
que tutela os assuntos do sector da deficiência. Entretanto, este papel é limitado por fracas
dotações orçamentais, assim como por dificuldades de autoridade para assegurar a coor-
denação de políticas que demandam a intervenção de múltiplos sectores, como é o caso
da área da deficiência. Outro factor apontado como crítico é a falta de representantes ou
deficiente representação das PcD no MGCAS, o que faz com que haja baixo conhecimento
e sensibilidade desta entidade para as questões deste grupo. Este assunto não é pacífico,
havendo reacções contrárias à plausibilidade da ideia de que o atendimento das necessi-
dades das PcD depende da sua representatividade nas entidades públicas responsáveis
pela implementação das políticas do sector.
• Está em curso a reformulação dos mecanismos de coordenação do sector, com a criação
do Conselho Nacional de Acção Social (CNAS), com representantes do sector público
(vários sectores), da sociedade civil (incluindo as OPDs) e sector privado, em que a área
de deficiência estará sob a responsabilidade de uma Comissão de trabalho específica
(Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência). No entanto, este órgão ainda está a
ser estabelecido e persistem os desafios de recursos para a sua operacionalização. Tam-
bém existem mecanismos de coordenação sectoriais, como no Ministério da Educação e
Desenvolvimento Humano (MINEDH), ligados à área da educação inclusiva.
• O movimento da sociedade civil do sector é composto por Organizações de Pessoas com
Deficiência (OPDs) nacionais frágeis e pouco articuladas, lideradas pelo Fórum das Associa-
ções Moçambicanas dos Deficientes (FAMOD), que tem também as suas lacunas, e poucas
ONGs internacionais, com destaque para a Handicap International e a Light for the World.
• O financiamento do sector é limitado, tanto para o Governo como para a sociedade civil.
A classificação do orçamento também não permite a identificação dos recursos alocados
à área da deficiência, tanto junto dos grandes programas dos parceiros, como no sector
público. A informação existente é esparsa, incompleta e normalmente integrada em rubricas
orçamentais ou programas de áreas mais amplas como acção social e protecção/segurança
social. No sector público, verifica-se um significativo abrandamento tendencial de dotação or-
çamental para áreas de segurança e acção social entre 2014 (com 5.2%) a 2017 (com 1.8%).
• No que concerne às fontes de financiamento, em 2017 o sector de Acção Social era inte-
gralmente financiado por recursos internos, tornando Moçambique um dos poucos países
com uma área de protecção social básica sustentável. Entretanto, o nível de cobertura
ainda está a 0.4% do PIB, aquém das referências mundiais de 1.1% do PIB, e da meta na-
cional de 2.24% do PIB em 2024. O MGCAS também dispõe de financiamento pela via das
receitas próprias e proveniente de alguns parceiros de cooperação, nomeadamente o Ban-
co Africano de Desenvolvimento, os Fundos das Nações Unidas para a Criança (UNICEF)
e para a População (FNUAP), a Agência Catalã e, a partir de 2019, contará com fundos de

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DFID. Além das entidades acima apontadas, existem outras fontes de financiamento à área
da deficiência, directos e indirectos, principalmente da parte de organizações internacio-
nais, com destaque para a Itália, A União Europeia, a USAID (IREX) e outras entidades que
financiam a Estratégia Nacional de Segurança Social Básica. Uma tendência dominante é
incluir o financiamento dentro da rubrica de protecção social, o que dilui a alocação dos
recursos para a área da deficiência.
• As dinâmicas de financiamento da área, tanto do sector público como das OPDs não con-
tribuem para o empoderamento das PcD. O financiamento das OPDs é essencialmente de
fundos externos, seja directamente pelos parceiros de cooperação, ou por intermédio de
organizações não-governamentais internacionais, e tem sido predominantemente na base
de pequenos projectos e como parte de programas mais amplos e sem um foco específico
na área da deficiência. As OPDs nacionais queixam-se de que os concursos para finan-
ciamento externo estão enviesados a favor das organizações internacionais; da falta de
legado de capacidade na cooperação com as organizações internacionais; e da falta de fi-
nanciamento para capacitação para poderem ser competitivas na busca de financiamento.
Por outro lado, as alocações per capita são ainda desfavoráveis para algumas províncias.
Além de este padrão de alocação poder contribuir para a reprodução dos padrões de po-
breza, para alguns sugere também a existência de critérios políticos de alocação, em que
as províncias onde a oposição é forte continuam penalizadas.
• Os factores acima indicados influenciam a prestação de serviços, que tem sido no geral de-
ficiente, fortemente voltada para o assistencialismo e para o tratamento de certos tipos de
deficiência (como a física) e pouco sensível à abordagem dos direitos. O próprio governo
reconhece que a implementação do principal instrumento de provisão de serviços nesta área,
o PNAD II 2012-2019, está aquém do planeado, devido, entre outras coisas, ao fraco conhe-
cimento e apropriação deste instrumento como referência para a planificação, a fraca coorde-
nação entre os diversos intervenientes e insuficiência de recursos para a sua implementação.
• A consequência cumulativa dos vários elementos aqui indicada é o fraco empoderamento
das PcD na prossecução dos seus direitos e a fraqueza do Estado na sua garantia.
• Em 2018 houve avanços positivos na articulação entre os que actuam no sector. O Gover-
no, a sociedade civil e as OPDs trabalharam juntos na definição de uma agenda nacional
da deficiência para os próximos anos, no âmbito da participação do país na Cimeira Global
da Deficiência, realizada em Julho de 2018 em Londres. Nesta, o Governo apresentou uma
lista dos compromissos do país, elaborada com a sociedade civil, que deverá ser a base
para a agenda do sector para os próximos anos. No entanto, a sua implementação e finan-
ciamento devem ser devidamente enquadrados numa reflexão das dinâmicas do sector
que impedem o empoderamento das PcD, sob pena de não ser efectiva.
Dos aspectos arrolados no relatório sobre a situação do sector, decorrem três principais
consequências: (i) dificilmente os poderes públicos poderão ser bem-sucedidos na res-
posta às demandas de um grupo cujas dimensões e necessidades desconhecem e com
fraca capacidade de organização da acção colectiva para lutar pelos seus direitos; (ii)
sem o apoio necessário e adequado, a marginalização das PcD tende a persistir e a repro-
duzir-se; (iii) decorrente das duas primeiras, num contexto de falta de informação sobre a

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dimensão e necessidades das PcD, em que a capacidade destas de reivindicar aos seus
representantes e detentores os deveres e à sociedade a garantia dos seus direitos é limita-
da, abre-se espaço para a contínua negligência dos seus interesses, que se pode reflectir
tanto na total ausência de respostas às suas demandas, assim como na existência destas,
na forma de planos, na sua fraca implementação, ou numa implementação selectiva, de-
pendendo dos interesses estratégicos dos actores que têm poder decisório.

As principais recomendações do estudo são as seguintes:

• Capacitação das OPDs e organizações que defendem as PcD para uma acção e activismo
mais efectivos na defesa dos direitos, para assegurar melhoria do conhecimento da defi-
ciência na sua multidimensionalidade e sua tradução em legislação, práticas e comporta-
mento sociais, instrumentos de política e melhor defesa das pessoas com deficiência;
• Contribuição no processo de capacitação dos mecanismos de coordenação intersectorial
e implementação sectorial das políticas voltadas às PcD, como o CNAS e os de âmbito
sectorial;
• Formar alianças estratégicas e potenciar actores com alto incentivo para promover a agen-
da da deficiência, sobretudo na promoção dos direitos das PcD, através de, por exemplo,
apoiar campeões na implementação de políticas do sector, ou com alta motivação para o
efeito;
• Desenvolvimento de mecanismos de financiamento para as OPDs e organizações que tra-
balham com PcD, que incluem a capacitação das entidades nacionais, buscando sinergias
entre as organizações internacionais e as nacionais mais consolidadas e as de menor ca-
pacidade.
• Potenciar os actuais processos de orçamentação de forma a serem mais sensíveis às
questões da deficiência.

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ÍNDICE
Agradecimentos 5

Siglas e Abreviaturas 6

Sumário Executivo 10

Índice de Figuras e Tabelas 17

1. Introdução 20

1.1. Foco do Estudo 21

1.2. Metodologia e Quadro Analítico do Trabalho 21

1.3. Organização do Trabalho 22

2. Breve Análise Contextual do País 24

3. A Área da Deficiência: Quadro Internacional, Perspectivas e Conceitos 28

3.1. O Quadro Internacional Sobre a Deficiência 28

3.2. Perspectivas de Abordagem da Deficiência 30

3.3. Conceitos e Teorias 33

4. A Área da Deficiência em Moçambique 36

4.1. Actores, Instituições e Organizações: mandatos, responsabilidades e capacidades 37

4.1.1. Actores Estatais 37

4.1.2. Organizações de Pessoas com Deficiência 43

4.1.3. Sector Privado 46

4.1.4. Considerações sobre a Capacidade dos actores 46

4.2. Actores e instituições informais 48

4.3. Legislação, Políticas e Estratégias 48

4.3.1. Legislação 48

4.3.2. Políticas 49

4.3.3. Estratégias e Planos Nacionais para a Área da Deficiência 50

4.3.4. Acesso à Justiça e ao Direito 53

4.3.5. Participação das Pessoas com Deficiência nas Políticas, Planos e Legislação 54

4.4. Financiamento do Sector 56

4.4.1. Financiamento ao sector público 56

4.4.2. Financiamento da sociedade civil 59

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4.4.3. O Papel dos Parceiros de Desenvolvimento no Financiamento do Sector 61

4.4.4. Dinâmicas de Financiamento 62

4.5. Prestação de Serviços e Opinião dos Seus Beneficiários 63

4.5.1. Serviços de Protecção Social 63

4.5.2. Educação Inclusiva 65

4.5.3. Emprego e Formação Profissional 67

4.5.4. Serviços de Saúde 68

4.5.5. A Economia Política da Prestação de Serviços da Área da Deficiência e Seus Resultados 69

4.5.6. Prestação de Serviços e Implicações nos Direitos das PcD 71

5. Síntese da Economia Política do Sector da Deficiência 74

5.1. Síntese da Economia Política da Área da Deficiência 74

5.2. Elementos da Economia Política da Área da Deficiência 76

5.2.1. Valores e Ideologias 76

5.2.2. Actores, Processos e Poderes Formais 79

5.2.3. Actores, Processos e Poderes Informais 81

5.2.4. Instituições 81

5.2.5. Incentivos Para Manter o Status Quo e para a Mudança 82

6. Implicações para a Acção: Questões Críticas e Pontos de Entrada 90

6.1. Valores e ideologias: 90

6.2. Instituições 91

6.3. Actores e incentivos 91

6.4. Recursos 92

7. Referências Bibliográficas e Documentais 94

8. Anexos 98

8.1. Marcos e Eventos da História do Sector da Deficiência em Moçambique 98

8.2. Lista de Organizações de Pessoas com Deficiência do FAMOD 100

8.3. Compromissos do Governo de Moçambique na Cimeira Global da Deficiência 2018 104

8.4. Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde 108

8.5. Pequeno Conjunto de Questões do Grupo de Washington 110

8.6. Pessoas Entrevistadas 111

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ÍNDICE DE FIGURAS E TABELAS
Figura 1: Orçamento Alocado ao MGCAS e INAS, 2008-2017 57

Tabela 1: Despesas da área de Segurança e Acção Social

segundo a Classificação Funcional do Relatório de Execução do OE, 2014-2017 57

Tabela 2: Pessoas com Deficiência Beneficiadas pelos Programas de Segurança Social Básica 64

Tabela 3: % de Agregados familiares beneficiários

de Programas do INAS que São Chefiados por Pessoas com Deficiência 64

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18 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE
1. INTRODUÇÃO

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1. INTRODUÇÃO

A área da deficiência tem merecido atenção nas últimas décadas, tanto a nível nacional, como re-
gional e global. Neste sentido, Moçambique aderiu e ratificou os principais instrumentos regionais e
mundiais nesta área, que têm sido sistematicamente traduzidos em políticas, estratégias e planos no
contexto nacional. O crescimento da importância da deficiência na agenda do desenvolvimento teve
o seu ponto mais alto com a realização da Cimeira Global da Deficiência, em Julho de 2018, na qual
o Governo de Moçambique participou, apresentando os compromissos do País, elaborados com a
participação da sociedade civil.

Porém, a despeito dessa crescente atenção, a garantia dos direitos das pessoas com deficiência
(PcD) ainda enfrenta desafios, tanto em Moçambique como no mundo. A exclusão deste grupo po-
pulacional não é só uma violação dos direitos humanos, como também constitui um problema sério
de desenvolvimento. É neste contexto que se enquadra o interesse dos parceiros da Fundação Me-
canismo de Apoio à Sociedade Civil (MASC), assim como desta organização, de abordar a questão
da inclusão da deficiência no pensamento sobre o desenvolvimento em Moçambique. Numa primeira
fase, em resposta à esta demanda, o MASC produziu uma nota conceptual sobre o Empoderamento
Político, Económico e Social das pessoas com deficiência, que tem como uma das suas prioridades a
realização de um estudo de economia política (EEP), com o objectivo de identificar barreiras para as
pessoas com deficiência e as potenciais áreas de intervenção com foco no empoderamento político.

Este estudo enquadra-se neste desiderato e está integrado na visão expressa no Plano Estratégi-
co 2015-2020 do MASC, de uma “sociedade civil credível, transparente, vibrante e sustentável que
contribui para a democratização do Estado e do espaço público, justiça social e o bem-estar dos
cidadãos moçambicanos”1.

No geral, o objectivo deste estudo é a geração de uma lista de questões e actores associados
com o sector da deficiência, que deverá guiar a Fundação MASC na definição de questões prio-
ritárias a serem exploradas de forma a dinamizar a governação participativa e o empoderamento
das pessoas com deficiência. Nesta perspectiva e de forma mais específica, o estudo irá de-
bruçar-se sobre algumas áreas com vista a entender a dinâmica do sector, nomeadamente: a
prestação de serviços, a identificação de stakeholders, o financiamento pelos actores públicos e
privados, as relações de poder, o legado histórico, a corrupção e a busca de renda, as ideologias
e valores, o processo decisório.

Os elementos propostos para a análise fazem parte do “An Analytical Framework for Understan-
ding the Political Economy of Sectors and Policy Arenas” (Moncrieffe & Luttrell, 2005), que foram
em grande medida adoptados pelo MASC, na sua metodologia padrão de EEP. Este quadro é
composto por três principais estágios de análise, nomeadamente: 1) a Análise do País, olhando
para os aspectos históricos e fundacionais; 2) a análise das organizações, instituições e actores,
que olha para a história, processos de mudança, aspectos estruturais, poder e ideologias; 3) os

1
Terms of Reference/Guidelines for Sector-focused Political Economy Analysis.

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principais resultados e conclusões e as recomendações para a acção.

A recomendação dos Termos de Referência é de que o Estudo olhe principalmente para o estágio
2, porque os elementos do estágio 1 serão parte de um estudo separado. No entanto, os pesqui-
sadores são encorajados a explorar os elementos contextuais do nível macro da governação, de
modo a entenderem o que ocorre a nível sectorial.

Os elementos que constituem o foco do estudo são identificados a seguir.

1.1. FOCO DO ESTUDO

O foco do presente estudo é a identificação de elementos importantes para o empoderamento


das pessoas com deficiência, com vista à sua participação no desenvolvimento, o que implica
olhar para os seguintes aspectos:

• A definição do sector – esta parte inclui a definição das fronteiras e o mapeamento dos
principais actores/jogadores do sector a ser estudado;
• Análise intrassectorial – a definição dos papéis e responsabilidades dos actores, orga-
nizações e instituições existentes, das estruturas da gestão e liderança, dos padrões de
financiamento, os incentivos e motivações dos actores e as capacidades existentes;
• As relações entre os principais actores do sector – a natureza da relação entre os principais
jogadores; como os actores influenciam o processo político (políticas públicas), nomeada-
mente, a formulação, negociação de políticas e implementação de políticas, a resposta às
demandas, os canais de prestação de contas e as relações de poder.

Estes elementos fornecerão a base para a identificação de questões críticas na dinâmica do sec-
tor no que concerne à prestação de serviços, resposta às demandas dos principais beneficiários
e potenciais cursos de acção com vista ao empoderamento político dos actores do sector de
deficiência. Também constituirão a base para a recolha e sistematização da informação e dados
a serem analisados no estudo com vista ao alcance dos objectivos preconizados, conforme será
descrito na metodologia.

1.2. METODOLOGIA E QUADRO ANALÍTICO DO TRABALHO

Para se responder às questões gerais do estudo, assim como às questões específicas do sec-
tor, conforme adiantado, a base é o modelo desenvolvido pelo ODI e adoptado pela Fundação
MASC. As fontes de informação e os dados usados são retirados de fontes escritas, nomeada-
mente: documentos e estudos da área, informação e estatísticas oficiais, programas de Governo
e de instituições financiadoras e organizações que actuam na área e respectivos planos, orça-
mentos e relatórios da sua execução. As fontes escritas foram submetidas à análise documental

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 21


e bibliográfica, com base na qual se retiraram aspectos importantes para responder às questões
do estudo. Além de fontes escritas, também foram realizadas entrevistas semi-estruturadas e em
profundidade, com pessoas e actores-chave da área da deficiência. As entrevistas visavam a
compreensão de elementos relacionados com a dinâmica do sector que não existem nas fontes
escritas, assim como triangular a informação obtida em diferentes fontes, incluindo de outros en-
trevistados. Os entrevistados foram escolhidos com base no seu conhecimento da área e também
em função da recomendação de outros entrevistados, tendo em conta a sua relevância para o
estudo. Os principais grupos de entrevistados são os seguintes: representantes de entidades do
governo, representantes de organizações de pessoas com deficiência, tanto nacionais como in-
ternacionais, organizações internacionais com intervenções na área da deficiência, parceiros de
cooperação com histórico de financiamento à área e representantes do sector privado.

A informação obtida através das fontes escritas e das entrevistas foi posteriormente sistematizada
de modo a responder às questões do estudo.

O estudo tem as suas limitações, sendo a principal a falta de dados quantitativos específicos
sobre a área da deficiência, tais como estatísticas mais actualizadas, pois os resultados do Cen-
so de 2017 ainda não estão disponíveis; orçamentos e volumes de financiamento. Isto faz com
que não seja possível consubstanciar muitos dos elementos com informação quantitativa. No
entanto, tentou-se mitigar esta lacuna a partir das entrevistas e da triangulação de informação
com recurso a diferentes fontes, entre escritas e orais. Algumas dessas lacunas, como o volume
de financiamento da área, padrões de financiamento e capacidades das organizações por tipo
de deficiência precisam de mais tempo para o seu rastreamento, diagnóstico e sistematização, o
que estava fora do escopo deste estudo, devido ao seu tempo limitado de realização.

1.3. ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO

O presente estudo é composto por esta secção introdutória e outras cinco secções, nomea-
damente: na segunda secção apresenta-se uma breve análise contextual do país, seguida do
quadro internacional e conceptual da deficiência, na terceira secção. A delimitação da área da
deficiência, no que concerne aos seus actores, políticas e quadro legislativo, financiamento e
serviços é feita na secção quatro, à qual se segue a síntese dos elementos que influenciam a di-
nâmica da área, a propriamente dita economia política do sector da deficiência, na quinta secção.
O estudo fecha com a sistematização das principais questões críticas ao empoderamento das
pessoas com deficiência e os pontos de entrada e propostas de área de actuação, na sexta sec-
ção. O trabalho também contém anexos a que vale a pena prestar atenção, dentre os quais um
resumo dos principais eventos e marcos da área da deficiência e a lista dos Compromissos para
a área da deficiência firmados pelo País na Cimeira Global da Deficiência, realizada em Londres,
nos dias 23 e 24 de Julho de 2018.

22 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


2. BREVE ANÁLISE
CONTEXTUAL DO PAÍS

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 23


2. BREVE ANÁLISE CONTEXTUAL DO PAÍS

Moçambique é um país considerado de renda baixa, com uma população de 28 861 863 de ha-
bitantes e uma esperança de vida ao nascimento de cerca de 54,4 anos.2 A sua história política
desde a segunda metade do século XX é marcada por conflitos armados e também profundas
mudanças políticas e económicas. O país passou por dois grandes conflitos armados nos últi-
mos 50 anos, sendo o primeiro a luta de libertação nacional liderada pela Frente de Libertação
de Moçambique (Frelimo) contra o colonialismo português, que durou 10 anos (1964-1974), e o
segundo uma guerra civil de 16 anos (1976-1992), opondo o Governo da Frelimo à Resistência
Nacional de Moçambique (Renamo) e que paralisou a provisão de serviços e deixou mais de um
milhão de pessoas mortas.

Após o fim da guerra civil em 1992, o país teve um significativo crescimento económico e grandes
progressos nos principais indicadores sociais, tendo em conta o legado de destruição das in-
fraestruturas económicas e sociais e a ruptura dos serviços públicos durante a guerra. Entre 2011
e 2015, Moçambique cresceu à uma taxa média anual de 7%, um dos melhores desempenhos
de África. Mas esse crescimento registou um abrandamento em 2016 para 3,8% e mais ainda em
2017 para 3,7%3 , devido à crise económica que o país atravessa. A considerável dívida externa,
a retirada de doadores após a chamada “crise das dívidas ocultas”, a inflação elevada e a depre-
ciação da moeda contribuíram para um crescimento mais lento em 2016-17. As taxas de pobreza
decaíram significativamente entre 1996 (69,7%) e 2014 (46,1%). Entretanto, o número absoluto de
pessoas em situação de pobreza manteve-se relativamente constante. A pobreza também afecta
mais as zonas e populações rurais e as mulheres encontram-se numa situação de maior vulne-
rabilidade que os homens. Outros grupos vulneráveis, que são afectados de forma mais intensa
pela pobreza, são as crianças, os idosos e as pessoas com deficiência.

Espera-se, entretanto, que o crescimento se catapulte por causa das descobertas de grandes
quantidades de recursos como o carvão, minérios e gás. A descoberta de grandes reservas de
gás natural na Bacia do Rovuma colocou Moçambique na posição de um dos países que oferece
melhores oportunidades para se investir em África. Estas descobertas têm servido de atractivo
para grandes investimentos. Por outro lado, isto vem aumentando a demanda por uma força de
trabalho qualificada. A grande maioria dos moçambicanos não possui as qualificações neces-
sárias, o que coloca desafios à sua integração nessa nova economia dominada por empresas
multinacionais, com padrões de qualidade muito exigentes. No entanto, as perspectivas socioe-
conómicas do país dependem fortemente da forma como o governo irá gerir os novos ganhos
que virão assim que os projectos de gás natural comecem a produção após 2020 (Deloitte, 2016).

Politicamente, após a guerra civil, o país adoptou a democracia multipartidária e passou a realizar
eleições regulares desde 1994. No entanto, a política continuou a ser dominada pelos partidos
políticos dos dois beligerantes: a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), a base de apoio
do Governo desde a independência, e a Resistência Nacional de Moçambique (Renamo), o maior

2
Instituto Nacional de Estatística, disponível em http://www.ine.gov.mz/ [acesso a 23 de Julho de 2018]
3
The World Bank Group, Disponível em http://www.worldbank.org/pt/country/mozambique/overview [acesso a 26 de Julho de 2018].

24 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


partido da oposição. O surgimento do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) em 2009
sinalizou uma promessa do fim do domínio bipartidário que não se cumpriu porque, apesar do
crescimento da representação deste partido no parlamento entre as duas últimas eleições gerais
(2009 e 2014) e de ter ganho as eleições autárquicas de 2013 em quatro municípios, as grandes
decisões políticas ainda são tomadas pela Frelimo e as questões de negociação do conflito por
este partido e a Renamo. Deste modo, a política pós-guerra civil foi marcada por um biparti-
darismo dominado pelas forças outrora beligerantes. Apesar da realização regular de eleições,
Moçambique não completou a transição democrática e a cultura política herdada do monoparti-
darismo, de que os que não estão alinhados com o partido do dia estão contra o mesmo, ainda
prevalece. Do período monopartidário e socialista também se herdou a cultura de controlo, como
uma preocupação do partido no poder e do Governo em influenciar as decisões não só no Es-
tado e na política, mas também na arena económico-empresarial e até na sociedade civil. Nesta
última, historicamente, a Frelimo teve as suas organizações da juventude e da mulher e muitos
líderes eleitos em associações económicas e até no desporto têm ligações ou são membros deste
partido.

A aprovação da Constituição de 1990 e a abertura política que a acompanhou também incluíram


a aprovação da lei das associações – a Lei 8/91, de 18 de Julho – o que abriu espaço para o
surgimento de organizações da sociedade civil já fora da órbita do partido Frelimo. A partir de
1991, o número de associações cresceu em quantidade e diversidade, sendo de vários tipos e
representando vários grupos existentes na sociedade. Segundo dados do Instituto Nacional de
Estatística (INE), do Censo de Instituições sem Fins Lucrativos – CINSFLU (Instituto Nacional de
Estatística, 2017), em 2014-2015 existiam no país pouco mais de 11 mil instituições sem fins lu-
crativos, das quais 8 e 5% eram das áreas de serviços sociais e de saúde humana e acção social
respectivamente. De acordo com a Classificação das Actividades Económicas (CAE) adoptada
pelo INE no CINSFLU, nestes grupos é onde potencialmente estão organizações que lidam com
reabilitação física, apoio às pessoas com doenças mentais e com deficiência. No que concerne
à sua forma jurídica, 50% das entidades inquiridas tinham a forma de associação, 6.4% de Or-
ganização Não-Governamental – ONG (nacional e estrangeira), 1.5% de fundação e cooperativa.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 25


26 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE
3. A ÁREA DA DEFICIÊNCIA:
QUADRO INTERNACIONAL,
PERSPECTIVAS E CONCEITOS

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 27


3. A ÁREA DA DEFICIÊNCIA: QUADRO INTERNACIONAL,
PERSPECTIVAS E CONCEITOS

Grande parte dos fracassos dos países na abordagem da área da deficiência deve-se à pouca
compreensão da sua complexidade e multidimensionalidade, o que faz com que sejam adopta-
das soluções inadequadas. Esta secção apresenta algumas das questões abordadas pelo qua-
dro internacional de normas e políticas sobre a deficiência, assim como as perspectivas e concei-
tos adoptados nos principais instrumentos orientadores desta matéria, que servem de referências
para a intervenção dos países, organizações internacionais e nacionais nesta área.

3.1. O QUADRO INTERNACIONAL SOBRE A DEFICIÊNCIA

A Organização Mundial da Saúde (2011) estima que mais de 15,3% (mais de 1 bilhão) da popu-
lação mundial convive com algum tipo de deficiência, dos quais 80% estão nos países em desen-
volvimento e a maioria nas zonas rurais (OMS, 2011). Da população global com deficiência, 20%
(mais de 200 milhões de pessoas) experimenta desafios funcionais consideráveis. A situação
deverá piorar no futuro próximo, com o aumento da incidência devido a vários factores: aumento
do número de pessoas que entram na terceira idade, aumento global de doenças crônicas (dia-
betes, doenças cardíacas, câncro e desafios mentais). As pessoas com deficiência estão entre as
mais marginalizadas, estigmatizadas e discriminadas no acesso ao bem-estar social básico, por
isso, vivem em pobreza extrema (Groce, 2004). A grande maioria das pessoas com deficiência
enfrenta barreiras significativas de acesso à assistência médica, educação, oportunidades de
emprego e ainda pouco ou quase nunca recebem os serviços compatíveis com as suas necessi-
dades, tendo em conta as suas deficiências, e são excluídas da vida social (OMS, 2011). Apesar
da expansão da protecção social no mundo, até em países pobres como Moçambique, a nível
global, apenas 28% das pessoas com uma deficiência severa têm acesso a algum benefício so-
cial ligado à sua condição (United Nations, 2018).

Em 2004, a Organização Mundial da Saúde (OMS), a Agência das Nações Unidas para a Edu-
cação, a Ciência e à Cultura (UNESCO) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) obser-
varam que há uma forte correlação entre a deficiência e a pobreza. Segundo estas instituições, a
pobreza leva ao aumento da deficiência e incapacidade, o que por sua vez leva a um aumento da
pobreza. De acordo com o Departamento (do Reino Unido) para o Desenvolvimento Internacio-
nal (DFID), “50% das deficiências são evitáveis e estão directamente ligadas à pobreza” (DFID,
2000, p. 3). Por outro lado, estudos apontam que, no mundo, 5% das crianças e 46% das pessoas
idosas têm alguma deficiência e que as mulheres tendem a ter mais deficiências que os homens,
porque vivem mais tempo (United Nations, 2018, pp. 48, 63).

Pesquisas têm observado que as pessoas com deficiência levam um padrão de vida inferior ao
das pessoas sem deficiência com o mesmo nível de rendimentos, devido às suas necessidades
diferentes – tanto para bens ou materiais especialmente desenhados para as pessoas com de-

28 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


ficiência, em necessidade de meios de compensação (cadeiras de rodas, bengalas, muletas,
etc.), como pela maior necessidade por bens e serviços gerais (transporte,, assistência médica
e medicamentosa, etc.) (Braithwaite & Mont, 2009). Portanto, já ao nível da economia familiar,
verifica-se que as famílias com membros com alguma deficiência têm mais gastos sobre estes
bens e serviços, desviando o consumo de outros bens e serviços que iriam ajudar a elevar o seu
padrão de vida geral (ibid.). Segundo um relatório das Nações Unidas (United Nations, 2018),
o acesso aos benefícios de deficiência é baseado numa avaliação essencialmente médica, ba-
seada na ideia de que a inaptidão para o trabalho torna a pessoa elegível ao benefício, e muitas
vezes se negligencia os factores sociais que contribuem para que a pessoa tenha barreiras mais
severas para além da sua incapacidade. Ademais, os benefícios sociais ajudam às pessoas com
deficiência a suprirem algumas necessidades básicas, mas não cobrem os custos relacionados
com a deficiência e a permanência fora do mercado de trabalho.

O artigo 23 (1) da Declaração Universal dos Direitos Humanos afirma que “Toda a pessoa tem
direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a justas e favoráveis condições de trabalho e
à protecção contra o desemprego”(ONU, 1948, p. 12). Contudo, a OIT observa que o direito
das pessoas com deficiência ao trabalho e ao emprego é frequentemente negado, sendo que
“[…] muitos deles enfrentam obstáculos significativos à igualdade de oportunidades no mundo
do trabalho, que vão desde barreiras atitudinais e físicas até as barreiras informacionais” (ILO,
2015). Conforme Caswell, “mesmo onde existe legislação para o sistema de quota favorecendo
o emprego de PcDs, infelizmente, esta legislação é ou subutilizada ou não é aplicada” (Tsengu,
Brodtkorb, & Al, 2006, p. 54).

É neste contexto que, em 1999, os Estados-membros da então Organização da Unidade Africana


e posteriormente União Africana (UA), declararam a Década Africana para as Pessoas com De-
ficiência (de 1999 a 2009). Esta medida tem por objectivo promover a plena participação, igual-
dade e empoderamento de pessoas com Deficiência em África. O mandato para a organização
das actividades relativas à Década, para o Período de 1999 –2009 foi dado ao Instituto Africano
de Reabilitação (ARI), uma agência especializada da UA. O ARI partilha a responsabilidade pelo
“Plano de Acção da Década Africana das Pessoas Portadoras de Deficiência” com as respectivas
organizações”, governos e outras organizações continentais dedicadas à área da deficiência.. A
Primeira Conferência dos Ministros Responsáveis pelo Desenvolvimento Social, que teve lugar
em Windhoek, Namíbia, de 27 a 31 de Outubro de 2008, prorrogou a Década Africana dedica-
da a Pessoas Portadoras de Deficiência para o Período de 2010 a 2019.4 O principal objectivo
desta medida era “analisar a situação das pessoas portadoras de deficiência, com vista a for-
mular medidas que favorecem a equiparação de oportunidades, plena participação, inclusão e
independência na sociedade” (Comissão da União Africana, 2010, p. 9) das mulheres e homens
com deficiências, em suma, estabelecer condições conducentes à sua inclusão. Como forma de
operacionalização, os membros desta organização avançaram ainda com objectivos e planos
concretos que culminaram com o estabelecimento de planos de implementação por cada país.

A OMS (2011) nota que, a partir dos anos 1970, as respostas aos desafios das pessoas com
4
Comissão da União Africana – Departamento dos Assuntos Sociais, Plano de Acção da Década Africana das Pessoas Portadoras de Deficiências
(2010-2019)

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 29


deficiência têm vindo a mudar significativamente, estimuladas essencialmente pela crescente
organização das pessoas com deficiência, assim como uma mudança de consciência social que
tem resultado no enquadramento da questão da deficiência no quadro geral dos direitos huma-
nos. A abordagem de resposta aos desafios da pessoa com deficiência tem vindo a mudar de
um atendimento segregacionista (ao exemplo de instituições de abrigo e escolas especiais) para
a construção de comunidades e da inclusão. As actuais abordagens privilegiam mais soluções
interactivas, “que reconhecem que as pessoas se tornam incapacitadas devido a factores am-
bientais e também por causa de seus corpos” (OMS, 2011, p. 03). Como resultado disso, iniciati-
vas nacionais e internacionais têm incorporado os direitos humanos das pessoas com deficiência,
o que veio a culminar com a adopção da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência (CNUDPD) em 2006. Este instrumento é actualmente a principal refe-
rência dos países na elaboração de legislação e políticas visando a efectivação dos direitos das
pessoas com deficiência e o seu empoderamento. Moçambique ratificou esta convenção em
Outubro de 2010.

O caminho levado até a Convenção consistiu historicamente em diferentes perspectivas de abor-


dagem da deficiência, ligadas a conceitos sobre esta, que vale a pena sintetizar.

3.2. PERSPECTIVAS DE ABORDAGEM DA DEFICIÊNCIA

Até recentemente, a deficiência era dominantemente vista sob a perspectiva de um modelo mé-
dico, segundo o qual as pessoas com deficiência são fisicamente incapazes de realizar funções
sociais devido à sua condição. Devido à esta abordagem, as pessoas com deficiência foram
excluídas da vida social. Os governos preferiram dar-lhes benefícios sociais em vez de empre-
go, por exemplo. A crença geral era de que as pessoas com deficiência não eram capazes
de produzir como as demais pessoas. Às crianças não foram dadas oportunidade de serem
educadas ou, quando acontecia, foram educadas em escolas separadas – uma visão de mera
institucionalização e integração. O modelo médico compreende uma deficiência como um dano
físico ou mental do indivíduo e suas consequências pessoais e sociais. Este modelo considera
as limitações enfrentadas pelas pessoas com deficiência como resultantes principalmente, ou
unicamente, das suas incapacidades. Actualmente, o modelo médico é raramente defendido,
mas muitas vezes adotado de forma irreflectida por profissionais de saúde, bio-eticistas e todos
aqueles que ignoram ou subestimam a contribuição de factores sociais e outros factores am-
bientais para as limitações enfrentadas pelas mulheres e pelos homens, incluindo crianças com
deficiências (Talesco, 2013).

No entanto, o advento do modelo social mudou a compreensão da deficiência, ao estabelecer


que fornecer instalações, cuidados de saúde e benefícios sociais não são as únicas soluções.
Como um forte contraste com o modelo médico, o modelo social fornece a estrutura adequada
para incluir as pessoas com deficiência na sociedade, reconhecendo-as como potencialmente
produtivas e capazes de trabalhar. De facto, o modelo social prescreve que a deficiência é uma
construção social, por factores externos (ex. estigma), que determinam as limitações da pessoa

30 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


com deficiência. Este modelo, portanto, prevê que é a sociedade que deve mudar e não a pessoa
com deficiência, porque esta é uma relação entre o indivíduo e seu ambiente social, que pode
resultar na exclusão de pessoas com certas características físicas e mentais dos principais domí-
nios da vida social. A sua exclusão manifesta-se não apenas na segregação deliberada, mas em
um ambiente construído e uma actividade social organizada que impede ou restringe a participa-
ção de pessoas vistas ou rotuladas como tendo deficiências (Talesco, 2013).

Associado ao modelo social, está a abordagem da deficiência baseada em direitos humanos,


que estende os direitos para toda a pessoa humana, sem discriminação. A abordagem baseada
em direitos humanos toma em consideração “todo o aparato do direito: civil, cultural, económico,
político e social” e, por isso, estabelece a garantia de que as pessoas com deficiências “têm os
seus direitos à boa saúde, educação, habitação, Estado de Direito, protecção social, participação
política, e direitos de protestar” (Talesco, 2013, p. 88). Deste modo, a falta de reconhecimento dos
direitos humanos das pessoas com deficiência é uma forma de a sociedade praticar discrimina-
ção contra este segmento social, excluindo-a do acesso às oportunidades e bens sociais que lhe
são devidos por direito (Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2008, p. 29).

A CNUDPD é um instrumento construído sob este modelo social e baseado em direitos humanos,
que também estimulou as directrizes de Reabilitação Baseada na Comunidade (RBC) estabeleci-
das pela Organização Mundial de Saúde. Outros instrumentos também foram desenvolvidos pe-
las organizações internacionais com participação da sociedade civil, organizações das pessoas
com deficiência, académicos e outros especialistas. Destes instrumentos, destaque vai para a
Classificação Internacional de Funcionalidade, Deficiência e Saúde e as Questões do Grupo de
Washington que, pela sua importância, vale a pena referir, para um melhor enquadramento da
análise do caso moçambicano.

A Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF), Deficiência e Saúde da OMS (ICF, 2001)


enfatiza que a deficiência é uma “interacção dinâmica entre condições de saúde e factores am-
bientais e pessoais”. Essa definição afirma que a limitação (ou incapacidade) individual e o meio
social são causas suficientes da deficiência. Este modelo apresenta-se como modelo biológi-
co-psíquico-social, uma espécie de compromisso entre a componente médica e a social. A CIF
considera factores ambientais (dentre os quais o ambiente natural e construído, tecnologias, polí-
ticas públicas) e pessoais (motivação, auto-estima) que podem ser facilitadores ou bloqueadores
da funcionalidade dos indivíduos, assim como afectam também a sua participação na vida em
sociedade. A CIF também distingue entre capacidade de uma pessoa para o desempenho de
uma certa acção e o seu desempenho efectivo, o que permite aferir em que medida a mudança
do ambiente pode contribuir para o desempenho de uma pessoa. A CIF é universal porque cobre
toda a funcionalidade humana e não categoriza as pessoas entre deficientes e não deficientes,
mas trata a deficiência como um contínuo e uma questão de “mais ou menos”, do que de “sim
ou não” (OMS, 2012). Esta classificação distingue três elementos: (i) alterações das estruturas e
funções corporais (problemas de funções corporais ou alterações de estruturas do corpo, como
paralisia ou cegueira); (ii) limitações, que são dificuldades em executar certas actividades, como

5
Veja anexo 8.4.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 31


caminhar ou comer; e (iii) restrições à participação, como quando enfrenta discriminação no em-
prego ou nos transportes. Neste âmbito, a deficiência constitui-se nas dificuldades encontradas
em uma ou todas as três áreas acima indicadas e não distingue entre o tipo e a causa da deficiên-
cia, se física ou mental6 (OMS, 2012).

Ainda na esteira da identificação dos elementos que constituem a deficiência, em 2001 foi criado
um grupo de trabalho das Nações Unidas, denominado Grupo de Washington/Washington Group
(WG) de Estatísticas da Deficiência, que desenvolveu um conjunto de questões7, visando o le-
vantamento de dados sobre a deficiência.8 O objectivo do WG era promover a cooperação na
área das estatísticas de saúde no geral e da deficiência, em particular, colmatar as lacunas de
estatísticas sobre a deficiência no mundo, dentre as quais as diferenças de métodos de colecta
de dados, baixa qualidade e fiabilidade das estatísticas no mundo em geral e particularmente
nos países em desenvolvimento, o que dificulta a definição e monitoria, avaliação e prestação de
contas sobre as estratégias e políticas da área.

Deste modo, o pequeno conjunto de questões do WG visa identificar, em formato de censo ou in-
quérito, pessoas com deficiência. O pressuposto subjacente a estas questões é de que pessoas
com deficiência têm um risco maior, comparativamente ao resto da população, de ter restrições
de participação devido à existência de dificuldades em seis domínios funcionais importantes,
caso os ajustes necessários não sejam feitos. O conjunto de questões do WG captura o possível
impacto das condições de saúde nas habilidades funcionais e questiona se a pessoa tem difi-
culdades em desempenhar actividades universais básicas como caminhar, ver, ouvir, cognição,
cuidar de si mesmo e comunicação, e foram originalmente desenhadas para o uso da população
no geral. O pequeno conjunto de questões do WG não foi desenhado para ser usado isolado,
mas em combinação com outros instrumentos de medição, num questionário de um inquérito ou
levantamento mais amplo, de forma a permitir a desagregação por outras medidas e indicadores
como empregabilidade, conquistas na educação, etc., por estado de deficiência. Devido à com-
plexidade da deficiência, as questões não foram desenhadas para medir todos os aspectos da
dificuldade na funcionalidade que as pessoas podem enfrentar, mas para aqueles domínios de
funcionamento que melhor permitem identificar a maioria das pessoas com risco de enfrentar res-
trições na participação na vida em sociedade. As questões do WG são desenhadas para serem
analisadas em combinação com outra informação, de modo a que incorporem o modelo integral
biopsicossocial de deficiência.

A necessidade de empoderamento das pessoas com deficiência implica a definição de legisla-


ção, políticas, planos, assim como a criação e capacitação de organizações que possam materia-
lizar o reconhecimento dos direitos humanos deste grupo populacional. Deste modo, a definição
de critérios para a classificação das pessoas com deficiência é um elemento importante para o
conhecimento da área, a partir da produção de estatísticas e outro tipo de informação que alimen-
ta o quadro legislativo e de políticas. Os critérios CIF têm sido usados para este fim, assim como
as questões do Grupo de Washington.

6
Nos últimos tempos também se tem usado a expressão “deficiência intelectual”. No entanto, o termo “deficiência mental” ainda é usado. Ambas as
expressões serão usadas neste trabalho.
7
Veja anexo 8.5.

32 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


3.3. CONCEITOS E TEORIAS

Neste trabalho, dois conceitos são importantes: o conceito da deficiência e o de empoderamento


De acordo com o artigo 1 da CNUDPD, Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedi-
mentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação
com diversas barreiras, podem obstruir a sua participação plena e efectiva na sociedade em
igualdades de condições com as demais pessoas.

A deficiência é um conceito em evolução, e é actualmente entendida como associada à condição


humana (OMS, 2011) e como resultante da interacção entre as pessoas com deficiência e as
barreiras atitudinais e ambientais, que impedem a sua participação plena e efectiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas. Na perspectiva da CNUDPD, a deficiên-
cia deve ser entendida como parte do desenvolvimento social e dos direitos humanos, o que
implica conferir às pessoas com deficiência “uma dimensão mais personalizada e social”, o que
“traduz a noção de que a pessoa, antes de sua deficiência, é o principal foco a ser observado e
valorizado, assim como sua real capacidade de ser o agente activo de suas escolhas, decisões
e determinações sobre sua própria vida” (Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2008, pp.
28-29). Portanto, a partir desta concepção é reconhecida a pessoa com deficiência como sujeito
também activo sobre o meio físico e sociocultural e as condições (favoráveis ou não) que este
ambiente lhe oferece. É esta base que fundamenta a necessidade da remoção das barreiras para
a inclusão da pessoa com deficiência no desenvolvimento da sociedade, o que passa pelo seu
empoderamento.

O empoderamento é entendido na perspectiva de Helander (1993) como sendo “um processo


contínuo, que permite que um indivíduo possa cumprir e prestar contas relativamente aos seus
deveres e responsabilidades e proteger os seus direitos na sociedade” (Tsengu, Brodtkorb, & Al,
2006, p. 50). Este processo passa por, entre outras coisas, “fornecer às pessoas os recursos, as
oportunidades, o conhecimento e habilidade necessários para aumentar a sua capacidade para
determinar o seu próprio futuro e participar plenamente na vida comunitária” (ibid). O empode-
ramento das mulheres e homens com deficiências consistiria, portanto, em oferecer-lhes uma
variedade de oportunidades para se auto descobrirem, compreenderem o seu ambiente, estarem
cientes dos seus direitos e assumirem o controlo de suas vidas, assim como participarem na to-
mada de decisões importantes que afectem as suas vidas.

Estes conceitos de forma alguma encerram a discussão conceptual sobre a complexidade e


multidimensionalidade da deficiência. Apenas são aqui adoptadas como referências válidas para
a análise proposta neste trabalho, no que concerne ao empoderamento para a efectivação dos
direitos das pessoas com deficiência no contexto moçambicano.

8
Detalhes e instrumentos operacionais do Grupo de Washington podem ser encontrados aqui, de onde foi retirada a informação usada neste relatório:
http://www.washingtongroup-disability.com/washington-group-question-sets/short-set-of-disability-questions/.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 33


34 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE
4. A ÁREA DA DEFICIÊNCIA
EM MOÇAMBIQUE

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 35


4. A ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE

De acordo com o Censo de 2007 9, as pessoas com deficiência perfaziam 475.011, o que equi-
vale a 2,3% do total da população moçambicana, das quais 249.752 (52,6%) eram homens e
225.259 (47,4%) mulheres.10 Porém, outros estudos realizados com participação do INE estimam
que pessoas com deficiência em Moçambique atingem cerca de 6%. Isto faz com que algumas
OPDs e activistas da área defendam que, provavelmente, o censo foi bastante limitado no levan-
tamento de dados exactos. Por outro lado, a população contabilizada no Censo não toma em
conta as pessoas na terceira idade (5% da população nacional11) e pessoas com deficiências
invisíveis, que enfrentam desafios significativos no seu dia-a-dia, iguais ou piores aos dos seus
pares. A OMS tem notado limitações de dados sobre a deficiência nos países da África Subsaa-
riana em geral (OMS, 2011). Isso em grande parte tem a ver com as questões metodológicas de
levantamento de informação que foram abordadas acima.

Importa referir que Moçambique é um dos países com maiores índices de insegurança rodoviá-
ria, acidentes com minas terrestres, baixa cobertura dos serviços de saúde, com uma taxa de
pobreza absoluta de 46%, baixos índices de literacia, insegurança alimentar, doenças crónicas e
endémicas. Nesta base, o país encaixa-se muito bem nos países em que, segundo as estimativas
da Organização Mundial de Saúde (OMS), as pessoas com deficiência podem chegar a perfazer
entre 15% a 20% da população. De facto, apontam-se como causas da deficiência em Moçambi-
que, a doença (57.9%), deficiência à nascença (33.1%) e outras (6.8%). Um estudo feito em 2007
e 2008 observou que, dentre as causas da deficiência em Moçambique, a pobreza do sistema de
saúde está na liderança com 75,7%, sendo que 52% de deficiências resultam de doenças mal ou
não tratadas devidamente e 23,7% de complicações à nascença (SINTEF, FAMOD e INE, 2009).

Do total da população com deficiência apurada pelo Censo de 2007, os principais tipos de defi-
ciência são a surdez (12.7%), a cegueira (9.4%), a deficiência mental (8.5%), membros amputa-
dos – braços (8.2%) e pernas (20.7%), a paralisia (7.3%) e outras (35.2%). O facto de a classifi-
cação “Outra” ter registado o maior número de pessoas com deficiência sugere a existência de
uma parte considerável deste grupo que não pode ser classificada nas categorias mais comuns,
com base nos métodos existentes de recolha de informação.

A maioria das pessoas com deficiência em Moçambique vive nas zonas rurais (79,3%), onde os
níveis de pobreza são mais elevados, os serviços de saúde, educação e outros com eles rela-
cionados são bastantes escassos ou mesmo ausentes (INE, 2009). Associado a isto, as PcD são
também vítimas de discriminação e estigmatização, aliadas a algumas crenças e preconceitos
que prevalecem no seio das famílias, comunidades e na sociedade em geral. As condições de
vida das pessoas com deficiência são mais difíceis que as do resto da população, como resul-
tado do baixo nível de acesso aos serviços básicos, perpetuado pelas barreiras socioculturais e
pelas difíceis condições de acessibilidade do ambiente físico12. Em termos de acesso ao empre-
go e/ou trabalho, estudos indicam que a taxa bruta de desemprego é mais alta nas pessoas com

9
Instituto Nacional de Estatísticas (2007).
10
Dados a serem actualizados com os resultados definitivos do Senso 2017.
11
Projecção do Instituto Nacional de Estatísticas para 2018.

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deficiência (39% contra 9% no restante da população)13, o que faz com que elas se encontrem
no grupo dos mais pobres e vulneráveis. O Ministério da Mulher e Acção Social (MMAS) nota
que a taxa bruta de desemprego é mais alta nas pessoas com deficiência (39%) em relação ao
resto da população (9%) (Ministério da Mulher e da Acção Social/MMAS, 2012). Explica ainda
o MMAS (2012) que as pessoas com deficiência enfrentam constrangimentos económicos e de
infraestruturas adaptáveis e adequadas para participarem na vida social e beneficiarem de ser-
viços básicos. Estes factos levam-nos a concluir que parte significativa das mulheres e homens
com deficiência formam o grupo dos mais pobres dos pobres e mais vulneráveis dos vulneráveis.

4.1. ACTORES, INSTITUIÇÕES E ORGANIZAÇÕES: MANDATOS,


RESPONSABILIDADES E CAPACIDADES

Existem vários actores que actuam ou fazem parte da área da deficiência, com destaque para as
entidades estatais, as organizações da sociedade civil e os parceiros de cooperação.

4.1.1. ACTORES ESTATAIS

A deficiência, vista numa perspectiva de direitos humanos, atravessa várias áreas de mandato
das entidades estatais, pelo que grande parte, se não todas as instituições do Estado, desem-
penham potencialmente um papel preponderante no empoderamento e garantia dos diretos das
PcD. No entanto, algumas dessas entidades têm papéis mais visíveis e específicos na garantia
dos direitos das pessoas com deficiência, com destaque para as seguintes: o Ministério do Gé-
nero, Criança e Acção Social (MGCAS); o Instituto Nacional de Acção Social (INAS); o Ministério
da Educação e Desenvolvimento Humano (MINEDH); o Ministério das Obras Públicas, Habitação
e Recursos Hídricos (MOPHRH); o Ministério do Trabalho, Emprego e Segurança Social (MITESS);
o Ministério da Administração Estatal e Função Pública (MAEFP), o Instituto Nacional de Estatís-
tica (INE) e a Comissão Nacional dos Direitos Humanos (CNDH). Estas entidades têm diferentes
graus de capacidade para desempenharem o seu mandato dentro da área de deficiência. O
grau de capacidade de cada uma destas entidades depende de vários factores, dentre os quais
a forma como as próprias entidades foram estruturadas e os incentivos existentes para a criação
de capacidade de resposta às questões das PcD em cada uma delas. Abaixo segue uma breve
descrição de cada uma delas.

MINISTÉRIO DO GÉNERO, CRIANÇA E ACÇÃO SOCIAL

O Ministério do Género, Criança e Acção Social (MGCAS) é o principal órgão do governo que tu-
tela os assuntos do sector da deficiência e, por isso, se concentra, entre outros, na coordenação
de actividades de outros sectores relacionados com a disseminação de políticas já estabelecidas
e a supervisão de sua implementação. Para o efeito, na estrutura orgânica do MGCAS, a deficiên-
cia está sob a responsabilidade da Direcção Nacional de Acção Social, mais precisamente de
um Departamento.

12
Handicap International, 2010.
13
Plano Nacional de Acção para a Área da Deficiência, 2012.

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A senioridade política dos ministérios do sector desempenha um papel importante na sua capa-
cidade de coordenar a agenda transversal da área. Num estudo de 2005 sobre a capacitação
de organizações da área de deficiência, um entrevistado no então Ministério da Mulher e Acção
Social, notava que o ministério era um “membro júnior do governo”, com pouca capacidade de
influenciar outros ministérios (Ncube, 2005, p. 18). Esta situação não mudou até hoje, tendo em
conta as dotações orçamentais do sector, assim como as dificuldades que o mesmo enfrenta
para coordenar políticas que demandam a intervenção de múltiplos sectores, como as da área da
deficiência. A fraca coordenação da área é reconhecida num documento do próprio MGCAS, que
é o Informe de Implementação do Plano Nacional da área, como será visto adiante.

Outra das causas da fraqueza na abordagem da deficiência é o seu locus institucional, que
influenciou no seu grau de especialização e capacidade das instituições responsáveis. Após
a independência, a área da deficiência foi alocada à área de saúde e, posteriormente, se criou
a Secretaria de Estado da Acção Social, no início dos anos 1990, em resposta aos desafios de
reabilitação e apoio psicossocial decorrentes da guerra civil. Após as primeiras eleições gerais
multipartidárias de 1994, em 1995 foi criado o Ministério da Mulher e Acção Social (MMAS), que
assumiu a área de acção social, que agora está sob o MGCAS.14 O enquadramento da deficiên-
cia em cada um dos sectores foi condicionado pelas ideias em relação à deficiência e também
influenciou a forma como a área é vista. Assim, no passado, o enquadramento da deficiência no
sector de saúde deveu-se à sua consideração como uma doença. Actualmente, o seu enquadra-
mento no MGCAS, apesar da retórica mais progressista no sentido social e de direitos em voga,
está ligado à persistência da visão da deficiência como assunto de caridade e ligado à pobreza.

A mudança no enquadramento institucional também influenciou na capacidade para lidar com


as diferentes áreas da deficiência. Assim, quando o sector passou para o Ministério da Mulher
e Acção Social, a segmentação da deficiência e a sua abordagem por áreas (auditiva, visual,
física) que existia na saúde foi perdida, passando a ser apenas uma componente ou sub-área
da protecção social. Isto também levou à diluição da capacidade de resposta às várias verten-
tes da deficiência. Segundo as OPDs, o peso da entidade orgânica do ministério em que a área
está colocada – um pequeno departamento da Direcção Nacional de Acção Social – e a sua
classificação como apenas uma parte das responsabilidades amplas do ministério que tem a
responsabilidade de lidar com a vulnerabilidade social, contribui para a diluição da importância
da deficiência, sinaliza a sua baixa priorização nas políticas do Estado e limita a capacidade de
resposta às demandas das PcD (FAMOD, AIFO & ARCO, 2017). A mesma lógica é apontada aos
órgãos de coordenação interministerial. Assim, quando a coordenação intersectorial da área da
deficiência estava a cargo do Conselho Nacional para a Deficiência (CNAD), uma entidade inter-
sectorial criada pelo Decreto 78/2009 de 15 de Dezembro e que estava acima do nível ministerial,
em consonância com as recomendações da Declaração da Década Africana para as Pessoas
com Deficiência, o movimento das pessoas com deficiência fazia-se sentir mais. No actual man-
dato, o Governo dissolveu essa entidade e criou, através do Decreto 38/2015 de 31 de Dezembro,
o Conselho Nacional de Acção Social (CNAS), que congrega várias áreas, dentre as quais a área
da deficiência, mas que passa a ser coordenada, a nível operacional, por uma comissão dos

14
Para detalhes sobre os principais eventos e marcos da área, vide anexo 8.1.

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direitos das pessoas com deficiência chefiada pelo MGCAS. Há um certo cepticismo por parte
de algumas OPDs sobre a eficácia deste modelo, o que é agravado pela recorrente reivindicação
de que a capacidade deste ministério responder às suas demandas seria melhor se as PcD esti-
vessem representadas no sector, mesmo de forma activa, em termos de influência directa no seu
funcionamento (FAMOD, AIFO & ARCO, 2017).

CONSELHO NACIONAL DE ACÇÃO SOCIAL (CNAS)

De acordo com o artigo 1 do Regulamento aprovado pelo Decreto 38/2015 de 31 de Dezembro,


o Conselho Nacional da Acção Social (CNAS) é um órgão criado para fazer a coordenação e arti-
culação intersectorial dos assuntos da criança, acção social e segurança social básica. A criação
do CNAS implicou a revogação do Decreto 78/2009, que criou o CNAD, passando as funções
deste a serem exercidas pelo novo órgão, através da Comissão dos Direitos das Pessoas com
Deficiência. Já à partida, fica claro que o enquadramento dado à área da deficiência é como
uma sub-área da acção social ou da segurança social básica, continuando o padrão já existente
de uma abordagem caritativa desta área, apesar de Moçambique ter ratificado a CNUDPD em
Outubro de 2010. O CNAS é presidido pelo Primeiro-Ministro, sendo o seu vice-presidente o mi-
nistro que superintende a área do Género, Criança e Acção Social, e integra ainda os ministros
que superintendem esta última área, assim como Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos,
Saúde, Educação e Desenvolvimento Humano, Trabalho, Emprego e Segurança Social e Agricul-
tura e Desenvolvimento Rural. O CNAS é também composto por 8 representantes de OSCs, na
proporção de dois, das áreas da criança, do idoso, da segurança social básica e das PcD; três
representantes de instituições religiosas reconhecidas e um do sector privado. Dentro do novo
quadro institucional criado pelo CNAS, a área da deficiência estará sob a Comissão dos Direitos
das Pessoas com Deficiência. O órgão executivo do CNAS é o Conselho Técnico, que é presidido
pelo vice-presidente e composto pelas Comissões de direitos das diferentes áreas, representan-
tes dos conselhos técnicos dos ministérios e outras entidades que fazem parte da sua composi-
ção. As comissões, cujos coordenadores serão nomeados pelo vice-presidente do CNAS, terão
a função de propor acções, emitir pareceres, acompanhar planos e programas e acompanhar a
informação sobre as atividades desenvolvidas nas áreas específicas.

Uma das razões que levou à extinção do CNAD foi a insubordinação dos ministérios que eram
convocados pelo ministro da área que superintende a Assistência Social, no caso o MGCAS.
Isso corrobora o que foi referido anteriormente sobre a senioridade deste ministério e a sua ca-
pacidade para coordenar uma agenda multissectorial. Deste modo, com o CNAS presidido pelo
Primeiro-Ministro, espera-se que o problema de autoridade seja resolvido.

Desde que foi criado, o CNAS ainda não começou a funcionar. Neste momento está a trabalhar-
-se com o Ministério da Função Pública na elaboração e aprovação do quadro de pessoal para
o CNAS e as comissões de trabalho, passo importante para o funcionamento desta entidade.
Depois haverá o desafio de assegurar recursos para o seu funcionamento. Enquanto isso, no
MGCAS existe um núcleo de Gestão, que organizou a realização do primeiro encontro do Comité

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Técnico, no qual se discutiu o regulamento e outros elementos de funcionamento desta entidade.
No entanto, ainda persistem os receios entre as OPDs de que o enquadramento da área da de-
ficiência dentro do Conselho Nacional de Acção Social, nos actuais moldes, como uma simples
comissão de trabalho, fará com que persista a baixa priorização desta área pelo Governo (FA-
MOD, AIFO & ARCO, 2017).

INSTITUTO NACIONAL DE ACÇÃO SOCIAL (INAS)

O Instituto Nacional de Acção Social (INAS) foi criado pelo Conselho de Ministros, através do De-
creto n° 28/97 de 10 de Setembro, como uma instituição com personalidade jurídica e autonomia
administrativa, para proporcionar assistência directa às populações mais carentes, contando ac-
tualmente com 30 delegações ao nível do país. De acordo com o Decreto em referência, os seus
principais objectivos são: (1) garantir a assistência social e económica directa ou outra julgada ne-
cessária aos grupos ou indivíduos mais carentes e impedidos de, por meios próprios, conseguir
a satisfação das suas necessidades básicas; (2) executar programas de assistência directa aos
grupos-alvo em coordenação com instituições governamentais de Acção Social e com organiza-
ções não-governamentais envolvidas neste campo de actividade; e (3) promover nos indivíduos
uma atitude de auto-estima, de dignidade e motivação para a utilização das suas capacidades
individuais ou de grupo, no desenvolvimento e mudança da sua situação social e económica.
A 13 de Dezembro de 2016, na sua 43ª Sessão Ordinária, o Conselho de Ministros aprovou o
Decreto que reestrutura o INAS, tendo em vista adequar a sua estrutura aos desafios impostos
pela Estratégia Nacional de Segurança Social. O INAS é responsável pela implementação dos
programas de assistência social que são parte do Eixo 1 da Estratégia Nacional de Segurança
Social Básica (ENSSB) II 2016-2024, a serem detalhados adiante, e que beneficiam as PcD.

O INAS tem sob sua responsabilidade a implementação de programas que transferem benefícios
a centenas de milhares de pessoas, cujo número tem vindo a crescer nos últimos anos e opera
até ao nível das comunidades. No entanto, a entidade enfrenta alguns desafios. O principal é a
capacidade em recursos humanos e a limitada presença no país. Actualmente, o Instituto tem
30 delegações para atender os mais de 150 distritos do país. A expansão do número de benefi-
ciários não está a ser acompanhada do aumento de pessoal. Há quatro anos, o INAS era consi-
derado uma estrutura ineficiente, com custos administrativos (incluindo gastos com pessoal) de
implementação de alguns dos seus programas sociais, chegando a 30% do seu orçamento (Fran-
cisco & Sugahara, 2015). No entanto, actualmente os gastos com pessoal e alguns custos admi-
nistrativos estão abaixo de 5%, o que para alguns é reflexo da falta de contratação de pessoal
necessário para dar conta dos desafios de gestão dos programas em expansão, o que se reflecte
na sua ineficiência na prestação de serviços (UNICEF, OIT, FMO, PSCM-PS, ROSC, 2017). A
implementação dos programas de protecção social básica também tem padecido de problemas
de coordenação Institucional a todos os níveis (nacional, provincial e distrital). O relacionamento
entre o MGCAS e outros sectores relevantes a nível central, assim como entre o SDSMAS e o
INAS, e os sectores de educação, saúde e acção social é considerado fraco (Hodges, Pellerano,
Guimarães, Matos, & Selvester, 2014). O sistema de pagamentos também é precário e obriga à

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movimentação de grandes somas de dinheiro para os subsídios, pagos de forma directa nas co-
munidades onde estão os beneficiários, num país com uma limitada rede bancária, com todos os
riscos que daí podem advir. No entanto, há planos de terceirização do sistema de pagamentos.

MINISTÉRIO DA SAÚDE

O Ministério da Saúde (MISAU) é o principal responsável pela oferta dos serviços de reabilitação
física, que inclui o estabelecimento de, entre outros, centros de reabilitação e serviços de saúde
ocular. Por seu turno, o MGCAS é responsável pela coordenação de actividades de reinserção
e assistência psicossocial e económica, que inclui a Reabilitação Baseada na Comunidade.
Ambos os Ministérios compartilham responsabilidades pelo fornecimento de serviços de fisiote-
rapia e ortopedia. Com efeito, o MISAU estabeleceu centros de reabilitação em quase todas as
capitais provinciais.

MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO ESTATAL E FUNÇÃO PÚBLICA

Este ministério é que responde pelos assuntos relacionados com a administração pública e foi
responsável, na qualidade de Ministério da Função Pública, pela elaboração da Estratégia da
Pessoa Portadora de Deficiência na Função Pública 2009-2013, ficando também responsável por
coordenar com o então Ministério da Mulher e Acção Social a sua monitoria. Dentre os elementos
definidos nesta Estratégia cabe também a este sector a definição e fiscalização das normas de fun-
cionamento da Administração Pública e a fiscalização do seu cumprimento. Na estratégia estavam
definidas quotas mínimas que variam de 1.5 a 5%, dependendo da quantidade de funcionários no
quadro de pessoal15, reservadas à contratação pelas entidades públicas de pessoas com deficiên-
cia. Pouco foi feito nesta estratégia, tanto em termos de acções articuladas de formação, investi-
mentos visando a adaptação e criação de condições para o trabalho das PcD. Também não existe
nenhum relatório sobre a implementação da estratégia, porém, a equipa deste estudo obteve in-
formação de que existem movimentações no sector no sentido de revitalizar a sua implementação.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO HUMANO (MINEDH)

No contexto da área da deficiência, o Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano (MINE-


DH) é responsável pela área da educação inclusiva, que tem como foco a inclusão das crianças
e PcD nas escolas regulares.

No que concerne às capacidades, o sector ressente-se da ausência de metodologias consisten-


tes de atendimento às crianças, dentre as quais a falta de equipas integradas e de meios para
diagnosticar a deficiência da criança, de modo a prepará-la para a escola e também capacitar a
família para que possa participar e apoiar na educação inclusiva.

Nos últimos tempos, o sector tem tentado criar condições para a materialização do ensino inclusi-
vo, tendo recentemente sido aprovada a Estratégia para a Educação Inclusiva e Desenvolvimento

A Estratégia recomenda a reserva de 1.5% de vagas nas entidades com 100 a 500 funcionários; 3% para entidades com 600 a 900 funcionários, e
15

5% para 1000 ou mais funcionários.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 41


das Crianças com Deficiência, cujos detalhes serão dados adiante, na análise dos serviços. Nes-
te sector, também foi criado um grupo multissectorial para a implementação da Estratégia acima
indicada. O MINEDH partilha com o Ministério do Trabalho a responsabilidade pela formação
técnico-profissional.

MINISTÉRIO DO TRABALHO, EMPREGO E SEGURANÇA SOCIAL E O IFPELAC

O Ministério do Trabalho Emprego e Segurança Social (MITESS) tem a responsabilidade de


promover o desenvolvimento da formação profissional adequada às pessoas com deficiência.
Portanto, cabe a este Ministério coordenar com o MINEDH para assegurar a formação profis-
sionalizante às pessoas com deficiência. A parte da formação no sector está sob a responsabi-
lidade do Instituto de Formação Profissional e Estudos Laborais Alberto Cassimo (IFPELAC). O
IFPELAC tem centros de formação próprios e delegações espalhadas pelo país e organiza cursos
de formação profissional para pessoas com deficiência. No entanto, ainda persistem desafios de
capacidade, mas também existem oportunidades de capacitação. Uma delas provém do apoio
que a Cooperação Italiana está a promover na área de tecnologias de informação e comunicação
inclusivas, voltadas apara as necessidades das PcD.

A instituição que precedeu o IFPELAC, O Instituto Nacional de Emprego e Formação Profissional


(INEFP), era uma instituição subordinada ao ministério, o que reduzia o seu poder decisório e
de autonomia e a possibilidade de os gestores do ministério interferirem na sua gestão. Com a
criação do IFPELAC e a mudança do seu estatuto de instituição subordinada para tutelada, cuja
tutela é exercida pelo(a) Ministro(a), com a possibilidade de delegação da sua autoridade tute-
lar para o Secretário Permanente, o poder decisório da entidade aumentou, o que lhe deu mais
espaço de manobra para poder decidir de forma mais autónoma. Isso permitiu a esta instituição
ser mais proactiva no desenho e implementação de programas de formação profissional, o que é
apontado pela sua direcção como tendo sido instrumental na criação de programas direcionados
às pessoas com deficiência. A autonomia do IFPELAC também foi crucial na sua escolha como
instituição para albergar o programa de formação profissional, emprego e tecnologias de infor-
mação e comunicação voltado para a educação inclusiva, financiado pela cooperação italiana,
porque nesta instituição houve mais abertura para albergar a iniciativa nos centros de formação e,
aliado ao histórico mais consistente de trabalho com as PcD e de educação inclusiva, isso tornou
a parceria mais viável.

COMISSÃO NACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS

A Comissão Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) foi criada em 2009 e começou a funcionar
em 2012, quando 11 comissários tomaram posse. No entanto, esta entidade só começou mesmo
a operar em 2015 quando foram criadas as condições mínimas de trabalho.

A CNDH está a criar escritórios nas províncias e projecta ter delegações até ao nível do distrito, à
semelhança do Instituto de Patrocínio e Assistência Jurídica (IPAJ).

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Neste momento, a entidade enfrenta constrangimentos de recursos, porque, dentre outras coi-
sas, não executa o seu orçamento, devido ao seu limitado quadro de pessoal, que foi aprovado
recentemente e ainda não foi completado. Isto foi agravado pelas restrições de contratação de
pessoal para a função pública desde 2016, decorrentes da crise económica que o país vive. Do
quadro de pessoal aprovado de 75 pessoas, neste momento estão apenas preenchidas 9 vagas,
com a perspectiva de que este ano este número chegue a 10 pessoas, o que ainda é insuficiente.
Apenas para gerir o Sistema de Administração Financeira do Estado (SISTAFE) é necessário ter
pelo menos 5 funcionários e ainda será necessário ter pessoal diferente para a Unidade Gestora
de Aquisições (UGEA), para o procurement. Devido a esses constrangimentos, o orçamento da
CNDH vem sendo gerido pelo Ministério da Justiça e só em 2019 é que se perspectiva que a Co-
missão assuma a gestão destes recursos. Esta entidade ainda tem outro constrangimento institu-
cional: o seu orçamento é aprovado pelo executivo, o que potencialmente limita a sua autonomia
e capacidade para fiscalizar, de forma independente, aquele poder, sem receio de restrições de
recursos para limitar a sua actuação.

4.1.2. ORGANIZAÇÕES DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA

O Censo de Instituições Sem Fins Lucrativos (CINSFLU) de 2014-2015 não tem uma categoria espe-
cífica para as OPDs, podendo-se enquadrá-las em dois grupos, de acordo com a Classificação das
Actividades Económicas (CAE) usada pelo INE: os de serviços sociais e de saúde humana e acção
social. Os dados do CINSFLU 2014/2015 incluem a análise de capacidades organizacionais (como
recursos humanos) e financiamento, mas devido à amplitude do tipo de organizações que podem
ser enquadradas na CAE adoptada, estes dados não seriam informativos das características destas
OPDs. Esta pode ser uma potencial área de advocacia nos próximos tempos: a inclusão de uma
classificação mais precisa das OPDs no CINSFLU.

O movimento da sociedade civil que opera em questões de direitos de pessoas com deficiência é
composto por OPDs nacionais geralmente com fracas capacidades organizacionais e institucionais
e poucas ONGs internacionais, com destaque para a Handicap International e a Light for the World.

O movimento associativo das pessoas com deficiência remonta a 1989, quando foi criada a Asso-
ciação dos Deficientes de Moçambique (ADEMO). Posteriormente, com a aprovação da Lei das
Associações em 1991 e o fim da guerra civil em 1992, surgiram várias organizações representan-
do grupos específicos de pessoas com deficiência, nomeadamente: Associação de Deficientes
Militares e Paramilitares de Moçambique (ADEMIMO), Associação dos Cegos e Amblíopes de
Moçambique (ACAMO), Associação dos Jovens Deficientes de Moçambique (AJODEMO), den-
tre outras. A necessidade de coordenação dos diferentes interesses e de garantia da existência
de um único interlocutor com o Governo na área da deficiência levaram à criação do Fórum das
Associações Moçambicanas dos Deficientes (FAMOD) em 2000.16

O FAMOD congrega actualmente cerca de 30 organizações (vide anexo 7.1)17 e funciona como
um “guarda-chuva” que alberga as OPDs em Moçambique. Os membros do FAMOD cobrem
O trabalho para a criação do FAMOD começou em 1998, mas só em 2000 é que ocorreu a Assembleia Constituinte(FAMOD, AIFO & ARCO, 2017, p. 3).
16

A equipa não conseguiu recolher informação consistente sobre os membros do FAMOD e a lista apresentada no anexo aqui referido é apenas
17

uma tentativa de sistematização da informação recolhida junto ao próprio FAMOD, que ainda está fragmentada.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 43


organizações que lidam com todos os tipos de deficiência, e as suas actividades cobrem todo
o país. A visão do FAMOD é a de fortalecer o interesse dos membros das associações através
de cursos e seminários para (i) mudar as atitudes da sociedade com referência às pessoas com
deficiência; (ii) integrar os temas de deficiência em projectos e programas de desenvolvimento
nacional; e (iii) coordenar e partilhar as informações com parceiros que trabalham com pessoas
com deficiência.

Muitas destas organizações são essencialmente baseadas em membros, pelo que têm uma forte
componente de defesa dos interesses dos seus filiados, o que, em grande parte, difere de muitas
organizações da sociedade civil (OSC) existentes no país.

Não existe informação fiável sobre a distribuição geográfica das OPDs, mas diferentes fontes en-
trevistadas apontam que as organizações se concentram em Maputo, existem algumas na cidade
da Beira (onde fica a sede da ACAMO) e, no geral, as organizações concentram-se nas capitais
provinciais e poucas operam nas zonas rurais. O padrão de distribuição geográfica foi em parte
influenciado pelo apoio das organizações internacionais como a Handicap International, a Light
for the World, a KEPA e a extinta Power International. Estas organizações internacionais tiveram
grande parte das suas intervenções ligadas ao apoio às Associações de Pessoas com Defi-
ciência (APDs) nas grandes cidades, com maior foco nas Cidades de Maputo, Beira e Chimoio.
Algumas das organizações criadas nesses polos abriram sucursais em outras partes do país.

A informação disponível em relatórios18 e recolhida ao longo deste estudo sugere que, a nível ad-
ministrativo, as organizações são bastante frágeis. Existe uma confusão entre a parte técnica e os
órgãos sociais. As organizações nacionais, muitas vezes, não têm uma estrutura de organização
interna, as suas estruturas são incipientes, há falta de segmentação de funções. Há também pro-
blemas de governação, como a pouca alternância de poder nas organizações. Também existem
muitos membros que não têm informação sobre o que está a acontecer nas organizações, os
líderes são os que, na maioria das vezes, detêm a informação e se engajam mais no dia-a-dia da
organização. Há falta de formação escolar das pessoas com deficiência que gerem as organiza-
ções. A ADEMO e a ACAMO estão entre as poucas excepções que têm no seu quadro pessoas
com formação superior, capacidade administrativa e também instituições de governação interna
funcionais. A ADEMO beneficia do facto de ter sido a organização-mãe do sector, de onde muitas
saíram ou se inspiraram para formar organizações de área mais específicas, como a ACAMO.
A fraca capacidade das OPDs, aliada à fraca priorização da deficiência na agenda do desen-
volvimento, tem contribuído para o baixo nível de financiamento destes actores. Os parceiros de
cooperação, quando apoiam as OPDs, salvo algumas excepções, não têm priorizado a capaci-
tação nas suas abordagens e tendem a focalizar os seus apoios a projectos e de forma pontual.
Isso contribui para perpetuar a fraca capacidade existente.

Mas mesmo o FAMOD, criado para representar as OPDs no diálogo com o Governo e parceiros
e para influenciar a agenda pública, não está bem organizado para poder promover melhor os
interesses do grupo. Um diagnóstico recente (FAMOD, AIFO & ARCO, 2017) feito a esta organi-
18
Vide FAMOD, AIFO & ARCO, 2017.

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zação refere que a mesma padece dos problemas das OPDs que deve representar, como falta
de capacidade técnica, fraca comunicação entre o FAMOD e as organizações e estas com os
seus membros. Durante muito tempo, houve dificuldades em criar consciência da necessidade
de empenho em torno dos objectivos comuns entre OPDs, e estas tendiam a engajar-se apenas
na sua organização e com o seu grupo-alvo e menos nas causas comuns do Fórum19. Ademais,
um histórico de má governação e de problemas internos de organização reduziu a confiança
dos membros e parceiros em relação ao FAMOD. Estas fraquezas limitam a capacidade deste
fórum de mobilizar recursos, de aproveitar as oportunidades a nível nacional e internacional e
limita a sua capacidade de organizar a acção colectiva. O diagnóstico refere que o Presidente da
República já manifestou interesse em visitar o Fórum, mas problemas de organização do mesmo
fizeram com que o convite para o efeito não tenha sido formulado, adiando, assim, a oportuni-
dade de poder dialogar e, eventualmente, influenciar o governo no seu mais alto nível decisório.
Quando a CNDH começou a funcionar em 2012, o FAMOD concorreu para ser membro, mas a
sua candidatura não foi aprovada (FAMOD, AIFO & ARCO, 2017).

A tentativa de articulação e networking entre as organizações é feita essencialmente pelo FA-


MOD. Durante o estudo, a equipa não teve acesso à informação ou identificou casos de trabalho
em rede, envolvendo certos tipos de deficiência, mas teve acesso a organizações que são rela-
tivamente mais fortes em função da sua maturidade (por existirem já há um tempo considerável),
por terem tido acesso a oportunidades de financiamento e por terem alianças estratégicas ou se-
rem preferencialmente escolhidas para trabalharem com organizações internacionais. Mas pode
também ocorrer que a organização ganhe uma certa proeminência sem ter a sua capacidade
consolidada. Este é o caso da AJODEMO, que trabalha com o IFPELAC na formação técnico-pro-
fissional para os jovens com deficiência,, mas ainda não tem capacidade efectiva de desenvolver
a organização ou levar a cabo acções mais amplas que atendam às preocupações desses jo-
vens. A sua força reside no seu foco na sensibilização das pessoas de que os jovens deste grupo
são capazes de ocupar postos de trabalho e participar no desenvolvimento do país, incluindo na
esfera económica. A liderança da AJODEMO ocupa neste momento a presidência do FAMOD.
Também existem casos de áreas claramente negligenciadas, tanto pelo Governo como pelos fi-
nanciadores. Dentre estas destaca-se a área da deficiência mental ou intelectual20. A Associação
Moçambicana dos Usuários de Saúde Mental (AMUSAM), que representa as pessoas com este
tipo de deficiência, é uma organização pequena que só foi fundada em 2013 e que só está pre-
sente na capital do país. A associação teve alguma participação e adesão de membros quando
beneficiou de fundos da OSCISA em 2013, aquando da sua criação, mas, com o fim dos fundos,
os membros dispersaram, por falta de recursos. A isso se aliam os desafios inerentes a este tipo
de deficiência, dentre os quais o tipo de tratamento, que afecta as suas capacidades de trabalho,
principalmente intelectual. Neste momento, a organização tem poucos membros activos, porque
muitos deles estão numa situação de pobreza extrema. De acordo com representantes da AMU-
SAM, nem no Governo nem entre as OPDs existem mecanismos adequados para lidar com essa
deficiência, que ainda é vista com muito preconceito, mesmo entre as deficiências, devido em
parte ao pouco conhecimento existente sobre ela.21

19
Informação obtida numa entrevista.
20
Há muita terminologia: deficiência mental, deficiência psicossocial, deficiência intelectual, usuários de saúde mental.
21
Informação obtida numa entrevista.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 45


4.1.3. SECTOR PRIVADO

Não há muita informação sobre o sector privado, e a sua participação na definição e implemen-
tação de políticas na área da deficiência é mínima. Isso não é surpreendente, tendo em conta
a fraqueza deste actor, mesmo na influência de políticas mais específicas do sector privado no
país. Mesmo a nível da Confederação das Associações Económicas (CTA)22 não há uma posi-
ção oficial sobre a acção e papel deste sector na área da deficiência. No entanto, há que referir
a participação do sector privado no CNAS e também no processo que levou à elaboração dos
compromissos do País apresentados na Cimeira Global da Deficiência.

4.1.4. CONSIDERAÇÕES SOBRE A CAPACIDADE DOS ACTORES

A deficiência é um assunto transversal que requer a articulação e coordenação de várias entida-


des para que os direitos das PcD sejam garantidos. No entanto, de forma geral, a capacidade do
sector público em termos de conhecimento da legislação e, sobretudo, coordenação das várias
entidades, ainda é fraca. Os sectores actuam dentro dos seus mandatos ou são simplesmente
omissos em relação às suas responsabilidades, como será visto adiante. A falta de instituições
com um nível adequado de autoridade para coordenar múltiplos sectores faz com que haja um
vazio de autoridade, mesmo quando as competências de coordenação são claramente definidas
num instrumento legal. O MGCAS enfrenta desafios de capacidade e também de autoridade no
seu poder formal de articulação com as várias entidades que actuam na área. Uma das justifica-
ções é de que, por estar ao mesmo nível dos outros ministérios, a sua autoridade não é facilmente
aceite. Por outro lado, há uma percepção errónea de que assuntos da deficiência são mandato
da acção social. Por exemplo, quando pessoas com deficiência se dirigem a uma entidade pú-
blica para tratar do assunto relacionado com esta, quando apresentam dificuldades devido à
sua deficiência, são remetidos à Acção Social, mesmo que o seu assunto não tenha a ver e nem
possa ser resolvido por este sector.23 A criação do CNAS visa resolver esta lacuna, mas, a nível
operacional, os desafios continuarão, porque ainda caberá ao MGCAS coordenar os outros sec-
tores, sem contar que, na qualidade de vice-presidente, o ministro que superintende a área do
género, criança e acção social poderá, por delegação, ser o presidente do CNAS de facto. Na
perspectiva das PcD e OPDs24, a ineficiência do MGCAS e outras entidades públicas na resposta
às suas necessidades e demandas deve-se à falta de representação deste grupo no sector, o
que limita o conhecimento e sensibilidade em relação aos problemas a resolver. Este assunto, por
ser recorrente, merece uma breve reflexão.

As discussões sobre a eficácia da representação de interesses pela via da existência de pes-


soas com as mesmas características do grupo social representado na administração pública
(representação sociológica), são parte da discussão académica da administração pública.25 Uma
das questões que se levanta é se a representação sociológica resulta de facto na resposta dos
interesses do grupo representado. No caso de Moçambique, os exemplos existentes no passado
sugerem experiências diferentes sobre a eficácia deste modelo de representação. Por exemplo,

22
A equipa realizou uma entrevista com um representante do sector privado, indicado pela CTA (vide lista de entrevistados no anexo).
23
Informação obtida numa entrevista.
24
Esta posição foi também tomada no Seminário de diagnóstico institucional do FAMOD (FAMOD, AIFO & ARCO, 2017).
25
Meier & O’Toole Jr., 2006.
46 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE
a experiência da existência na Assembleia da República (AR) de um deputado com deficiência,
como o deputado Esaú Menezes, pode não ter tido a devida influência em tornar o legislativo mais
sensível a este grupo, mas é apontada como tendo sido influente na aprovação de instrumentos
como políticas e legislação com impacto mais a nível do executivo. Entretanto, a existência de
um vice-presidente com deficiência física, o deputado da Renamo e segundo vice-presidente
da AR Younusse Amad, chamou a atenção daquela casa para esta área, o que também contri-
buiu para a criação de alguma consciência quanto à legislação proposta sobre a deficiência. É
recorrentemente referido que o Deputado Younusse Amad foi crucial para que a Assembleia da
República retirasse da agenda a aprovação da proposta de Lei de Promoção e dos Direitos da
Pessoa com Deficiência, que havia sido aprovada pelo Governo sem consultas com a sociedade
civil. Isto abriu espaço para mais consultas, desta vez com a participação da sociedade civil.
Também há referências ao bom desempenho do Director Provincial de Acção Social de Sofala,
José Diquissone, que é uma pessoa com deficiência, que é apontada como estando a ter uma
boa contribuição para o avanço dos direitos deste grupo populacional. No sentido contrário, no
âmbito político e decisório, por exemplo, a representação das mulheres em Moçambique é alta
em comparação com os outros países do mundo e da região. No entanto, essa representação
nem sempre se reflecte numa maior defesa dos direitos das mulheres. O mesmo se pode dizer
da representação das diferentes regiões nas esferas decisórias do Estado e, principalmente, do
partido Frelimo, como forma de garantir a unidade nacional. Se essa representação fosse eficaz,
não existiria a recorrente reclamação sobre as persistentes assimetrias regionais no desenvolvi-
mento socioeconómico, o baixo nível de desenvolvimento sócio-económico da província de Gaza,
que historicamente teve mais líderes na Frelimo e no Estado e tem sido até aqui a província mais
eleitoralmente alinhada ao poder do dia.

Deste modo, a representação das PcD nas esferas de tomada de decisão pode ser influente
na resposta às suas demandas, mas ela em si não é suficiente. Há também outros factores que
devem ser levados em conta e que favorecem uma representação mais efectiva, nomeadamente
os que têm a ver com as relações com os actores que, de facto, têm poder decisório no contexto
moçambicano. Destes, há que se destacar o poder executivo, historicamente mais forte que o
legislativo, o partido no poder e o alinhamento com o mesmo ou não, a existência ou a ausência
de uma ameaça ao seu poder como elementos mais importantes para influenciar decisões, do
que apenas a representação sociológica de certos grupos. Neste contexto, um dos elementos
referidos de forma recorrente é de que há momentos em que o activismo das PcD na defesa pelos
seus direitos é rotulado de trabalho da oposição, o que limita o espaço para o diálogo e acolhi-
mento das suas demandas. Mas também existem referências ao poder de persuasão e influência
de que gozam as PcD desmobilizadas de guerra, que combina tanto uma história de serviço
ou contestação ao Estado, assim como a sua capacidade de mobilizar meios de violência para
fazer valer as suas reivindicações. No campo do activismo cívico, isso remete também para as
abordagens de advocacia que podem ser mais eficazes: se as de confrontação ou de alinhamen-
to/engajamento com o Governo. Algumas experiências bem sucedidas, como a experiência de
trabalho das OPDs com o INE para inclusão nos censos de questões visando uma melhor recolha
de dados sobre a deficiência, assim como a cooperação da TV Surdo com o Ministério da Saúde

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 47


no trabalho sobre acesso aos serviços de saúde para as PcD e as experiências dos sectores do
trabalho e da educação, mostram o potencial que as abordagens de engajamento podem ter.
Finalmente, é preciso aprofundar o significado dos efeitos da representação aqui reivindicada,
uma vez que há um reconhecimento de que, pela sua natureza, a escassez de recursos, e devido
a intervenções direccionadas desta área, os beneficiários principais e primários do activismo
das OPDs têm sido os seus membros e só depois outras pessoas deste grupo populacional.
Deste modo, uma representação na administração pública, para ser eficaz, sob o ponto de vista
de garantia dos direitos das PcD, teria que estar baseada em fundamentos mais inclusivos de
atendimento às demandas deste grupo e não continuar com as tendências actuais de resposta
prioritária aos membros das OPDs.

4.2. ACTORES E INSTITUIÇÕES INFORMAIS

Os actores e instituições informais que são importantes para a área da deficiência e que influenciam
a forma como esta é vista são os líderes religiosos, as autoridades tradicionais, os médicos tradicio-
nais, que podem influenciar as percepções da sociedade e dos indivíduos, disseminando crenças
e mitos que contribuem para uma visão e pensamento sobre a deficiência, que posteriormente
influenciam os comportamentos sociais. Este assunto será explorado adiante, na sub-secção 5.2.1.

4.3. LEGISLAÇÃO, POLÍTICAS E ESTRATÉGIAS

A CNUDPD, ratificada por Moçambique em Outubro de 2010, estabelece a necessidade de ac-


ções concretas a serem empreendidas pelos estados para assegurar a inclusão política, eco-
nómica e social, bem como a protecção das pessoas com deficiência. O mesmo ocorre com a
Declaração da Década Africana das Pessoas com Deficiência, a qual o país aderiu em 2006, e
desde então tem desenvolvido planos de acção nacional alinhados com este instrumento. Desde
1990 e depois em 2004, com a integração de cláusulas específicas sobre a protecção de pes-
soas com deficiência na Constituição da República, Moçambique tem aprovado instrumentos
visando melhorar as condições de vida das pessoas com deficiência. Os principais instrumentos
aprovados desde os anos 1990 são descritos abaixo, nomeadamente a legislação, as políticas
relevantes, as estratégias e os planos.

4.3.1. LEGISLAÇÃO

Os dispositivos relevantes para esta área cobrem questões de acesso aos serviços e também a
certos direitos das PcD, dentro do quadro normativo consagrado pela Constituição, de garantia
dos direitos a este grupo populacional.

Neste contexto, a Lei n.º 23/2007, de 21 de Agosto de 2007, que aprova a Lei do Trabalho, con-
tém disposições importantes relativas ao emprego de pessoas com deficiência. De acordo com
a Lei, os empregadores devem: promover a adopção de medidas apropriadas que permitam aos
funcionários com deficiência ou doenças crónicas ter os mesmos direitos e deveres que os de-

48 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


mais funcionários, com relação ao acesso ao emprego, treinamento e promoção profissional, bem
como condições de trabalho adequadas; capacitá-los a realizar actividades socialmente úteis,
levando em conta as circunstâncias específicas de sua capacidade de trabalho. Também define
o papel do Estado, em coordenação com associações sindicais e patronais e organizações re-
presentativas de pessoas com deficiência para promover o emprego, e leva em conta os meios
e recursos disponíveis, estimula e apoia acções que levem à reabilitação profissional de pessoas
com deficiência e a sua colocação em trabalhos adequados às suas capacidades. Assim, me-
didas especiais para proteger o acesso ao emprego para pessoas com deficiência devem ser
instituídas e implementadas pelo Estado.

Por sua vez, o Decreto 53/2008 de 30 de Dezembro define os aspectos técnicos de acessibilidade
aos serviços públicos para as pessoas com deficiência na República de Moçambique (Vembane,
Manjate, & Sambo, 2017). O documento decorre do reconhecimento do governo de Moçambique
da necessidade de estabelecer dispositivos técnicos que permitam a acessibilidade, a circulação
e o uso de sistemas de serviços e locais públicos de pessoas em geral e, em particular, pessoas
com deficiência ou pessoas com mobilidade limitada. Nessa perspectiva, o documento é bastan-
te abrangente ao fornecer medidas de vários aspectos dos espaços públicos, incluindo rampas,
calçadas, passagens, escadas, estacionamento, etc. Por exemplo, o artigo 5 fornece orientações
detalhadas sobre a construção de rampas, nas quais medidas métricas são especificadas.

Um outro dispositivo legal digno de menção é o Decreto n.º 11/2009, de 29 de Maio de 2009, que
aprova o Regulamento do Transporte Automóvel, e estabelece a isenção e redução das taxas
nas áreas urbanas e interurbanas e os transportes públicos para pessoas com deficiência. Isto
é baseado em princípios constitucionais não discriminatórios e delineia direitos específicos para
pessoas com deficiência. Entretanto, uma percentagem considerável de pessoas com deficiên-
cia mora em áreas rurais e é limitada na sua capacidade de se mudar para longe de casa para
procurar atendimento médico ou para atender a outras situações, devido a custos de transporte,
sendo os serviços predominantemente encontrados nas cidades.

4.3.2. POLÍTICAS

Em 1998 o Governo aprovou a Política Nacional da Acção Social, através da Resolução 12/98 de 9
de Abril – que estabelece um conjunto de princípios e acções de instituições públicas e privadas
na provisão de assistência social a indivíduos, populações e grupos sociais vulneráveis e social-
mente excluídos (Conselho de Ministros, 1998). Nesta política são estabelecidas prioridades e
acções específicas viradas para a pessoa com Deficiência.

Em Junho de 1999, o Conselho de Ministros de Moçambique aprovou a Política da Pessoa Porta-


dora de Deficiência (PPPD) e da sua implementação (Resolução 20/99), desenvolvida em colabo-
ração com actores que operam no sector da deficiência, incluindo as organizações de pessoas
com deficiência. Esta política visa assegurar que as pessoas com deficiência são habilitadas para
participar efectivamente em todos os aspectos da vida social, com particular ênfase para o desen-

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 49


volvimento económico. A PPPD tem como pano de fundo a promoção da formação profissional e o
estabelecimento de condições de integração e inclusão das pessoas com deficiência no mercado
do trabalho. A PPPD estabelece que o sistema de emprego em Moçambique deve assegurar o
seguinte: i) promover e desenvolver formação profissional específica para pessoas com deficiên-
cia, em condições técnicas, humanas e pedagógicas adequadas; ii) criar condições que permitam
a manutenção profissional, integração ou inserção de pessoas com deficiência no mercado de
trabalho, através das medidas de reabilitação profissional; iii) a necessidade de criar progressi-
vamente, através de mecanismos e metas percentuais, a garantia de acesso das pessoas com
deficiência nos sectores público e privado; e iv) a necessidade de criar formas alternativas de
emprego para pessoas com deficiência e assegurar a implementação das medidas adoptadas.

Desde 2004, o Governo moçambicano tem vindo a tentar desenvolver uma estratégia de assistên-
cia às vítimas de minas e outras com ferimentos causados pela guerra civil, no âmbito da imple-
mentação da Convenção sobre a Proibição do Uso, Armazenamento, Produção e Transferência
de Minas anti-pessoais e sobre a sua Destruição, mais conhecida como Tratado de Ottawa. Com
efeito, além de estarem proibidos de usar minas anti-pessoais, os Estados-Parte têm o dever de,
na medida das suas possibilidades, prestar assistência na remoção de minas, e de se engajarem
em programas de sensibilização, tratamento e reabilitação das vítimas das minas. Outro aspecto
relevante é que o Tratado abre janelas de oportunidades de busca de recursos externos para
implementar os seus programas, através da cooperação para o desenvolvimento.

4.3.3. ESTRATÉGIAS E PLANOS NACIONAIS PARA A ÁREA DA DEFICIÊNCIA

O PLANO NACIONAL PARA A ÁREA DA DEFICIÊNCIA

O Plano Nacional da Açção para a Área da Deficiência (PNAD) tem sido o instrumento de planifica-
ção, orçamentação, monitoria e avaliação das actividades dos diferentes actores sociais do sector,
e visa fundamentalmente a promoção da plena participação, igualdade e empoderamento das
pessoas com deficiência e assegurar o princípio de igualdade de direitos e de oportunidades a
este grupo social. Até aqui foram aprovados dois PNADs, sendo que o primeiro foi de 2006 a 2010,
e o segundo iniciou a sua implementação em 2012 e vai até 2019. No PNAD II, dos três objectivos
gerais estabelecidos, os dois primeiros almejam a plena participação, igualdade e empoderamen-
to das mulheres e homens com deficiência. Indo mais ao detalhe, é bem visível a preocupação
com a necessidade de empoderar economicamente as pessoas com deficiência logo nas primei-
ras quatro áreas de intervenção da longa lista descrita ao detalhe no documento: i) Orientação
vocacional e formação profissional; ii) Educação básica e alfabetização de jovens e adultos; iii)
Acesso ao Emprego; e iv) Segurança Social Básica (Redução da pobreza). A implementação do
PNAD envolve vários sectores, que devem enviar regularmente informação ao MGCAS, que é a
entidade responsável pela monitoria integrada. Conforme será explicado na secção 4.5.5, isso não
tem ocorrido conforme planeado.

ESTRATÉGIA DA PESSOA PORTADORA DEFICIÊNCIA NA FUNÇÃO PÚBLICA

50 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


Mais associado à Legislação do Trabalho e ao PNAD, o Governo de Moçambique adoptou a
Estratégia da Pessoa Portadora de Deficiência na Função Pública (2009 – 2013), aprovado pela
Resolução n°68/2009 de 27 de Novembro – que visa promover e melhorar a acessibilidade, em-
pregabilidade, manutenção e capacitação/formação profissional para as pessoas com deficiência
na Função Pública, estabelecendo por objectivos estratégicos: i) promover o desenvolvimento de
educação profissional específica em condições pedagógicas, técnicas e humanas apropriadas
para a Pessoa Portadora de Deficiência (PPD); ii) criar condições que permitam a manutenção, in-
tegração ou reinserção profissional da PPD na função pública, através de medidas de reabilitação
e reconversão técnico-profissional; iii) permitir a introdução progressiva de um mecanismo de per-
centagens tendentes a garantir a admissão daqueles cidadãos no sector público; e iv) incentivar o
desenvolvimento de carreiras e progressão de Pessoas Portadoras de Deficiência nas Instituições
da Função Pública (Governo de Moçambique, 2009).

ESTRATÉGIA PARA A EDUCAÇÃO INCLUSIVA E DESENVOLVIMENTO


DAS CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA

O Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano é o principal responsável pela monitoria de


políticas e implementação de estratégias, para assegurar que as pessoas com deficiência tenham
acesso à educação básica e formação habilitadora. A legislação em vigor, principalmente a Lei
nº 6/92, de 6 de Maio, enuncia o direito das crianças com deficiência à educação e prevê turmas
especiais nas escolas regulares, garantindo o direito de as crianças com deficiências múltiplas ou
desafios mentais graves beneficiarem da educação adaptada às suas necessidades e capacida-
des, de forma personalizada. O artigo 29 (3) da Lei estabelece que a formação profissional deve
ser oferecida às crianças com deficiência, a fim de auxiliar a sua integração na sociedade e no
mercado de trabalho. Os sucessivos planos estratégicos do Sector nos últimos anos, assim como
a recentemente aprovada Estratégia para a Educação Inclusiva e Desenvolvimento das Crianças
com Deficiência (EEIDCD), abordam os desafios de atendimento da PcD na educação.

A ESTRATÉGIA NACIONAL DE SEGURANÇA SOCIAL BÁSICA (ENSSB)

A área de segurança social básica é um outro ponto de entrada das intervenções que incluem o
sector da deficiência.

O Decreto n.º 52/2011, de 12 de Outubro, regulamenta as condições de acesso aos subsídios


da segurança social básica em Moçambique, fornecida a nacionais sem meios próprios de
subsistência, incluindo pessoas com deficiência, que vivem em pobreza absoluta. Este sistema
é gerido pelo MGCAS, através do Instituto Nacional da Acção Social (INAS). Este instrumento,
juntamente com a sua estratégia, a Estratégia Nacional de Segurança Social Básica (ENSSB)
II 2016-2024, foram desenvolvidos com uma forte colaboração entre o Governo, os actores
sociais e a sociedade civil e de cooperação, incluindo os da área da deficiência.

A ENSSB II visa assegurar a distribuição dos ganhos do crescimento da economia moçambicana,

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 51


beneficiando todos os cidadãos, com enfoque nos que vivem em situação de pobreza e de vulne-
rabilidade (MGCAS, 2016a). Para tal, a Estratégia é construída sobre quatro eixos, a saber:

• Reforçar o nível de consumo e a resiliência das camadas pobres e vulneráveis da


população;
• Contribuir para o desenvolvimento do capital humano, através da melhoria da nutrição e
do acesso aos serviços básicos de saúde e educação das camadas pobres e vulneráveis
da população;
• Prevenir e responder aos riscos de violência, abuso, exploração, discriminação e exclusão
social, através de serviços de acção social; e
• Desenvolver a capacidade institucional para a implementação e a coordenação do sub-
-sistema de segurança social básica.

As pessoas com deficiência são tidas em conta no quadro de beneficiários da ENSSB, que
reconhece, entre outros, a deficiência como um dos “factores de vulnerabilidade que limitam o
acesso à educação e ao emprego e que conduzem a uma situação de marginalização social”
(MGCAS, 2016a, p. 11), e assume um compromisso de, a longo prazo, assegurar “o acesso
aos subsídios para todos os agregados ou indivíduos que cumprem com os requisitos de elegi-
bilidade” (MGCAS, 2016a, p. 25). Os programas da ENSSB II destinados ao apoio às PcD são
principalmente os de protecção social básica, e estão a ser implementados desde a ENSSB I
2010-2014, nomeadamente:

• Programa “Subsídio Social Básico” (PSSB) – um programa de transferências monetárias


regulares e por tempo indeterminado para os agregados familiares pobres, permanente-
mente incapacitados para o trabalho, dentre as quais os idosos e PcD em estado crónico;
• Programa “Apoio Social Directo” (PASD) – transferências feitas para agregados familiares
em espécie (kits de alimentos) e por tempo determinado, em resposta a situações de vul-
nerabilidade, podendo ser: (i) incapacidade temporária para o trabalho (como agregados
chefiados por crianças até atingirem a maioridade, ou com adultos acamados); (ii) por tem-
po determinado em resposta à AFs com adultos em TARV e/ou crianças com desnutrição
crónica (em complementaridade com outras medidas contra a desnutrição e até esta pas-
sar); (iii) em resposta a uma situação pontual (por exemplo, calamidades, acidentes), po-
dendo ser multiforme, incluindo apoio em despesas, distribuição de meios de compensa-
ção, despesas de funeral, dentre outras formas. As formas de apoio do PASD são referidas
como PASD prolongado e PASD pontual, dependendo da sua natureza e temporalidade;
• Programa “Acção Social Produtiva” (PASP) - este programa é uma intervenção de transfe-
rência de renda com foco nos indivíduos com capacidade para o trabalho. Nos agregados
familiares beneficiados, pelo menos um membro deve ter capacidade para o trabalho. O
programa combina transferências directas de renda e auxílio em espécie com actividades
de capacitação para o trabalho de forma a permitir às famílias a capacidade de proverem
o seu auto sustento. As famílias são beneficiadas por três anos e, findo este período, po-
dem graduar do mesmo. O PASP inclui os AFs liderados por pessoas com deficiência com

52 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


capacidade para o trabalho (MGCAS, 2014).

Destes programas, os dois primeiros (PSSB, PASD) são de acção social directa e têm como
foco atender às situações de vulnerabilidade e choque, tanto de forma pontual como prolon-
gada, enquanto o PASP é que tem maior potencial de criação de capital humano e bases para
um maior empoderamento económico. Além destes programas, existe um eixo voltado para
a nutrição e serviços sociais de acção social (PSSAS), com foco na saúde e educação. Um
elemento importante a levar em conta na protecção social em Moçambique é a confusão que
é feita com o assistencialismo ou assistência social: de mitigação da pobreza, que decorre de
uma perspectiva reactiva compensadora das perdas que as pessoas sofrem em função das
mudanças sociais e económicas, em detrimento de uma abordagem mais prospectiva, como
parte integrante do processo de desenvolvimento económico (Francisco, Ali, & Ibraimo, 2011).

4.3.4. ACESSO À JUSTIÇA E AO DIREITO

No concernente ao acesso à justiça e ao direito, não há um programa específico, mas existem


iniciativas neste sentido por parte de entidades como a Faculdade de Direito da Universidade
Eduardo Mondlane (UEM), a CNDH e a Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM), que
têm dado especial atenção a esta matéria. Por exemplo, a Faculdade de Direito da UEM intro-
duziu a questão da deficiência nos seus cursos de mestrado como módulo, numa das suas
disciplinas. A OAM, no seu relatório anual sobre os direitos humanos, tem abordado a situação
das PcD. A CNDH está a trabalhar no sentido de melhorar a conscientização, a mudança da
cultura jurídica que decorre da má compreensão da complexidade da deficiência, a mudança
legislativa de forma a ajustar o quadro legal à CNUDPD e aos desafios de garantia dos direitos.
Também opera no sentido de garantia dos direitos, através da criação de condições para o
exercício do direito à informação para as PcD, dentre outras iniciativas. A CNDH é a entidade
que, neste momento, tem um programa mais articulado de acesso à justiça, que também inclui
a monitoria das violações dos direitos das PcD. No entanto, esta Comissão ainda enfrenta os
seus próprios problemas de capacidade e está na fase de instalação, como foi anteriormente
referido. Em geral, existem vários obstáculos à aplicação do direito de acesso à justiça no país,
entre outros tantos: a pobreza e, portanto, a incapacidade de pagar taxas legais, associada à
falta de consciência por parte das pessoas com deficiência e membros das suas famílias; a
corrupção; a inacessibilidade dos edifícios e dos meios de transporte. Existem algumas insti-
tuições e programas em Moçambique concebidos para fornecer assistência jurídica gratuita,
como o IPAJ e a própria OAM, que, em geral, podem beneficiar pessoas com deficiência, mas
estas ainda enfrentam dificuldades de acesso a essas oportunidades, devido aos obstáculos
de capacidade tanto dos fornecedores desses serviços como por parte dos beneficiários. No
caso destes últimos, o conhecimento da legislação e da existência dos serviços oferecidos são
alguns dos obstáculos.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 53


4.3.5. PARTICIPAÇÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NAS POLÍTICAS, PLANOS
E LEGISLAÇÃO

Não existe consenso quanto ao grau de participação das PcD no desenvolvimento dos dife-
rentes instrumentos de intervenção na área, sendo que enquanto o Governo defende que há
participação, a mesma opinião não é partilhada pelas PcD.

Neste contexto, os documentos dos PNAD I e II, assim como a política da área (PPPD) indicam
a importância da participação das PcD na sua elaboração e implementação. No entanto, a par-
ticipação das PcD na discussão das políticas e leis relacionadas com os seus direitos nem sem-
pre é automática, havendo situações em que o Governo é acusado de ignorar a contribuição
deste grupo. Por exemplo, actualmente está em curso a discussão da proposta da nova lei do
desporto que começou sem a participação de representantes das PcD, que só posteriormente
foram envolvidos, depois da reivindicação do Comitê Paralímpico, que agora faz parte do grupo
que está a elaborar a proposta.

Uma situação similar ocorreu na discussão da proposta de lei de Protecção dos Direitos das
Pessoas com Deficiência, que havia sido aprovada pelo Conselho de Ministros e encaminhada
para o Parlamento para aprovação, sem consultas à sociedade civil e às OPDs, em particular. O
processo foi travado graças à contribuição do activismo do segundo vice-presidente da Assem-
bleia da República e das organizações da área, que pressionaram pela retirada da proposta,
que era considerada lacunosa e sem as perspectivas dos actores do sector. Agora, a discus-
são já envolve as OPDs, a CNDH e outros parceiros nacionais e internacionais.

O MGCAS reitera que, no sector, existem mecanismos de planificação em que participam as


OPDs, nos quais também se partilham experiências e desafios existentes na implementação
das políticas do sector. No entanto, esses espaços são vistos pelas OPDs como apenas para
legitimar as políticas do sector junto dos parceiros, uma vez que a sua participação não é re-
flectida na orçamentação e implementação. Apesar de anualmente se elaborar um relatório do
PNAD, as OPDs não têm capacidade para monitorar as actividades implementadas pelo Gover-
no. A falta de representação das PcD é vista como a principal causa desta fraqueza, o que faz
com que os planos sejam ineficazes e, em alguns casos, ineficientes, como quando edifícios
públicos recém-construídos devem ser parcialmente refeitos para garantir a acessibilidade a
este grupo populacional.

As políticas da área são tidas como preteridas na distribuição de recursos, mesmo quando dão
mostras de um bom desempenho. Por exemplo, o desporto paraolímpico tem dado medalhas
ao país a nível continental e mundial, mas, ainda assim, o investimento no mesmo ainda é limita-
do. Aponta-se que há um ano não há actividades relevantes neste desporto, o que é justificado
pelo Governo com a falta de recursos decorrente da actual crise económica, mas no desporto
convencional tem havido mais esforço e apoio no sentido de o pôr a funcionar.

54 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


Existe um grande potencial de influenciar plataformas da sociedade civil que participam no
debate de políticas, mas que não é explorado, provavelmente devido à fraca capacidade do FA-
MOD. Por exemplo, este fórum aderiu ao Movimento de Educação para Todos (MEPT) em 2006
e também é membro da Plataforma da Sociedade Civil para a Protecção Social, onde também
participam outras duas OPDs – ADEMO, RAVIM (Rede de Assistência às Vítimas das Minas) e
AJODEMO. Esta plataforma, por sua vez, participa no Fórum de Monitoria do Orçamento, que
tem sido influente na discussão de questões sobre finanças públicas, no geral e orçamento, em
particular, que inclui uma análise do OE que tem sido adoptada pela Comissão do Plano e Orça-
mento da Assembleia da República, nos seus pareceres que enformam as decisões deste órgão
sobre a matéria. No entanto, apesar da participação das OPDs nestes fóruns, os assuntos das
PcD não têm uma grande proeminência nestes espaços e nas áreas de políticas onde actuam.

Esta situação não é estranha ao quadro mais amplo de participação das organizações da so-
ciedade civil (OSC) nas políticas públicas em Moçambique, que apresenta um quadro similar.
Um estudo de 2012 sobre o tema apontava que a fraca capacidade técnica das OSC, os baixos
níveis de financiamento e as estratégias adoptadas pelos parceiros de desenvolvimento para
financiarem estes actores, com particular ênfase para o uso de mecanismos conjuntos e de
organizações internacionais da sociedade civil, tende a limitar a capacidade e proeminência
das organizações nacionais e a colocá-las a reboque das agendas dos doadores, uma vez
que precisam de atrair fundos para sobreviverem. Ademais, o estudo afirma que a forma mais
efectiva de participação nas políticas é pela via de plataformas temáticas da sociedade civil,
redes e alianças (ITAD & COWI, 2012).

A fraca participação das OPDs nos fóruns acima indicados e os desafios que enfrentam suge-
rem que estes actores estão sujeitos às dinâmicas similares às que foram aqui descritas.
No entanto, há que apontar a existência de alguns sectores onde as OPDs conseguem ter al-
guma influência, devido à existência de mecanismos de articulação, principalmente com o Go-
verno. São os casos dos ministérios dos sectores de Acção Social, Educação, Saúde, Trabalho
e Emprego e Juventude e Desportos: com o MGCAS porque a deficiência está inserida directa-
mente no seu mandato; na Saúde devido ao facto de as PcD usarem os serviços de saúde, ao
histórico de alocação da deficiência neste sector e, mais recentemente, a partir de iniciativas
da TV Surdo voltadas para a promoção do acesso aos serviços pelas PcD em parceria com o
Ministério da área; na educação, o ponto de entrada é a educação inclusiva, cuja estratégia
busca envolver as PcD na sua implementação; na área de emprego e formação profissional, a
AJODEMO forma jovens em empreendedorismo e criação de negócios, e áreas técnicas como
electricidade, inglês, em parceria com o IFPELAC. As OPDs também têm alguma presença no
Ministério da Juventude e Desportos (MJD), devido aos desportos paraolímpicos. Neste âmbi-
to, o documento de avaliação da implementação do PNAD II refere que a implementação da
Política e a Estratégia do Desporto contribuiu para a promoção do desporto para a PcD, o que
resultou no surgimento de várias associações desportivas desta área.26 Com os outros ministé-
rios há uma tentativa constante das PcD de trabalhar com os mesmos, usando o pressuposto
de que a deficiência é um assunto transversal, mas ainda há fortes barreiras, porque muitas
26
MGCAS, 2016b, p. 15.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 55


vezes se defende a ideia de que este é um assunto do MGCAS.

4.4. FINANCIAMENTO DO SECTOR

O financiamento do sector é considerado limitado, em comparação com outras áreas, tanto


para o Governo como para a sociedade civil. A classificação ou detalhamento do orçamento
também não permite a identificação dos recursos alocados à área da deficiência, tanto junto
dos grandes programas dos parceiros, como no sector público. A informação existente é espar-
sa, incompleta e normalmente integrada em rubricas orçamentais ou programas de áreas mais
amplas, como acção social e protecção social. Devido a essas lacunas, não há informação
sobre o orçamento global da área, pelo que esta parte apenas vai apresentar volumes globais
de financiamento nas áreas de protecção e acção social e, sempre que possível, os dados
desagregados da sub-área de deficiência, quanto estes estão disponíveis. Por não ser possível
fornecer dados sobre os recursos financeiros alocados à área da deficiência, esta parte visa
apenas apresentar as tendências gerais de financiamento com base na informação disponível
nas áreas de acção social e protecção social, assim como as dinâmicas por detrás do financia-
mento do sector, tanto no governo/sector público como na sociedade civil.

4.4.1. FINANCIAMENTO AO SECTOR PÚBLICO

No que concerne ao governo, não existe um orçamento específico para a área da deficiência,
mas, tendo em conta a natureza transversal da deficiência, de princípio cada sector deveria
orçamentar acções específicas para esta área. A filosofia por detrás disso, expressa por uma
das entidades públicas entrevistadas, é de que se está a lutar para a inclusão e não para a
distinção e isso reflecte-se na filosofia da orçamentação. Por exemplo, quando se constrói uma
escola, o sector da educação é sensibilizado a incluir no orçamento os custos para a criação
de condições de acessibilidade das infraestruturas e também material didáctico que possa
ser usado pelas pessoas com deficiência. Esta filosofia tem se revelado pouco eficaz porque,
embora o papel de coordenação das acções da assistência social, onde a deficiência se en-
quadra, esteja no MGCAS, a capacidade de coordenação de outros sectores não se faz sentir,
o que explica a não materialização da abordagem acima indicada.

No que concerne ao financiamento público, a informação da área da deficiência pode ser encon-
trada, de forma directa e indirecta, nos documentos do Orçamento do Estado (OE) e respectivos
relatórios de execução, nos Planos Económicos e Sociais (PES) e respectivos balanços (BdPES).
Quanto ao orçamento, a informação pode ser encontrada em classificadores funcionais (por área,
como educação, saúde, género, criança e acção social; segurança e accão social) ou orgânicos
(por exemplo, indicando o MGCAS, ou o INAS) do orçamento. No entanto, isso não resolve o
problema, porque a classificação das despesas, que incluem a área da deficiência, pode mudar
de ano para ano. Nesse âmbito, o Fórum de Monitoria do Orçamento e o Informe Orçamental
do Sector de Acção Social notam que a agregação das áreas de Acção Social e do Trabalho
torna confusa a distinção das despesas específicas da primeira área. Isso ainda é agravado pela

56 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


ausência de informação orçamental dos principais programas da área de Protecção Social, no-
meadamente o PSSB, PASD e os Programas de Serviços Sociais de Acção Social e o PASP. Mais
ainda, até 2015 os subsídios que cobriam os défices de exploração das empresas públicas eram
classificados erroneamente na área de acção social (FMO, 2016, p. 8 e 9; UNICEF et al, 2016, p.
4). Portanto, a forma de classificação da despesa nesta área não fornece os elementos necessá-
rios para se ter uma imagem mais clara do seu financiamento. A informação aqui apresentada é a
baseada em classificadores funcionais e orgânicos, com as lacunas acima indicados.

Entre 2014 e 2017, o orçamento da área de segurança e acção social variou entre 1.8 a 6.9% do
orçamento total, como pode ser visto na tabela 1 abaixo.

Tabela 1: Despesas da área de Segurança e Acção Social Segundo a Classificação Funcional


do Relatório de Execução do OE, 2014-2017

2014 2015 2016 2017


Peso no OE 5.20% 6.90% 3.80% 1.8
Execução do OE 96.30% 91.80% 96.10% 81.20%
Fonte: Relatório de Execução do Orçamento do Estado 2015-2017

O orçamento alocado ao MGCAS e ao INAS, que é responsável pela implementação dos Pro-
gramas de Protecção Social Básica, cresceu de 0.84% para 2.23% do OE de 2008 até 2015,
tendo decrescido para 1.60% do OE em 2016 e retomado um ligeiro crescimento para 1.74%
em 2017, conforme pode ser visto na Figura 1 abaixo. A figura também mostra que a alocação
ao MGCAS passou de 77.4% do volume de recursos para o sector em 2008 para 8% em 2017,
sendo o restante valor alocado ao INAS. O volume total de recursos alocados à protecção cres-
ceu consistentemente de 2008 a 2016 (de 433 milhões para 3481 milhões de meticais), quando
houve uma ligeira redução em 2016 (para 3044 milhões) e, em 2017, voltou a registar-se a
tendência de crescimento (para 3210 milhões) (UNICEF et al, 2017). Isso mostra uma evolução
positiva nos recursos canalizados aos beneficiários da acção social.

Figura 1: Orçamento Alocado ao MGCAS e INAS, 2008-2017


PERCENTAGEM DO ORÇAMENTO

2,50
Orçamento total INAS
2,00 Orçamento total MGCAS

1,50 2,01
1,47
1,43 1,61
1,00
DO ESTADO (%)

1,11
0,19 0,79
0,30
0,50 0,68
0,65 0,35
0 0,49 0,30 0,28 0,17 0,20 0,17 0,22 0,17 0,13
2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017

Fonte: UNICEF, OIT, FMO, PSCM-PS, ROSC, 2017, p. 7

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 57


No que concerne às fontes de financiamento, em 2017 o sector de acção social era integralmen-
te financiado por recursos internos. Moçambique é, assim, um dos poucos países com uma área
de protecção social básica sustentável, embora a sua cobertura ainda esteja a 0.4% do PIB,
aquém das referências mundiais, definidas pelo Banco Mundial para os países em desenvolvi-
mento em 1.1% do PIB, e também da meta do Governo, definida na ENSSB 2016-2024, de atingir
os 2.24% do PIB em 2024. Apesar do crescimento positivo nos recursos alocados à segurança
social básica, estes apenas cobrem 15% dos agregados familiares (AF) em situação de vulne-
rabilidade, o que está aquém das metas definidas nos principais instrumentos do país, como o
Plano Quinquenal do Governo (PQG) 2015-2019 e a Estratégia Nacional de Desenvolvimento
2015-35, cujas metas de cobertura são de 25% e de 75% dos AF em situação de vulnerabilidade
em 2019 e 2035, respectivamente (UNICEF, OIT, FMO, PSCM-PS & ROSC, 2016; 2017).

Nos programas do INAS, que têm informação desagregada dos benefícios alocados aos AFs
chefiados por pessoas com deficiência, os padrões de alocação de recursos mantiveram-se
mais ou menos os mesmos nos últimos 4 anos e, em 2017, eram os seguintes: o PSSB tem
alocado 53% dos recursos da Segurança Social básica, o PASD e o PASP receberam 22% e o
PSSAS apenas 2%.

Contudo, no que concerne à equidade em termos de alocação geográfica de recursos, embora


o INAS tenha introduzido critérios de alocação demográficos e com base na incidência da po-
breza, as alocações per capita ainda são desfavoráveis para algumas províncias. Por exemplo,
em 2017 as províncias de Sofala, Nampula, Zambézia e Niassa tinham uma média de alocação
de recursos nos quatro programas de protecção social abaixo da média nacional. Em 2016,
as províncias de Maputo, Inhambane, Zambézia e Nampula tinham uma alocação per capita
abaixo da média nacional, tendo em conta a população pobre (UNICEF et al, 2016; 2017). Além
de este padrão de alocação poder contribuir para a reprodução dos padrões de pobreza, para
alguns sugere também a existência de critérios políticos de alocação: as províncias onde a
oposição é forte continuam penalizadas (Buur & Salimo, 2018).

O MGCAS também dispõe de financiamento por via das receitas próprias e proveniente de
alguns parceiros de cooperação, nomeadamente o Banco Africano de Desenvolvimento, os
Fundos das Nações Unidas para a Criança (UNICEF) e para a População (FNUAP), a Agência
Catalã e, a partir de 2019, contará com fundos de DFID.

Existem outras fontes de financiamento à área da deficiência, directo e indirecto, principalmente


da parte de organizações internacionais. Assim, a Suécia, a Holanda e o DFID têm um finan-
ciamento conjunto para o reforço do sistema de protecção social que, por sua vez, apoia as
pessoas com deficiência. A Organização Internacional do Trabalho tem financiamento para a
área de protecção social. A Irlanda financiou programas voltados ao empoderamento econó-
mico, com foco na província do Niassa (CONCERN Universal Moçambique & FAMOD, 2014).
O Programa Mundial de Alimentação (PMA) tem intervenções relacionadas com a resposta a
situações de emergência, que inclui a área de deficiência. O Fundo das Nações Unidas para

58 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


a População (FNUAP) tem estado a advogar, sob o ponto de vista de população, a inclusão do
questionário do Washington Group nos diferentes censos e estudos populacionais. A Itália, o
único financiador com informação precisa sobre os valores alocados à área, financia um pro-
grama de formação profissional inclusiva com recurso às tecnologias de informação e comuni-
cação, a ser implementado pelo IFPELAC. Valores do financiamento acima referenciados são
difíceis de descortinar, porque os mesmos fazem parte de programas mais amplos ou são de
intervenções implementadas pontualmente, como parte de projectos mais amplos.

4.4.2. FINANCIAMENTO DA SOCIEDADE CIVIL

O financiamento das OPDs é essencialmente de fundos externos, seja directamente pelos par-
ceiros de cooperação, ou por intermédio de organizações não-governamentais internacionais.
Não existe financiamento governamental para as OPDs. Em alguns casos, mesmo quando exis-
tem oportunidades de financiamento indirecto, a flexibilidade das entidades do sector público
para apoiar estas organizações é reduzida. Por exemplo, mesmo com financiamento parcial, a
TV Surdo passou por um processo longo para conseguir chegar a um acordo com a Televisão
de Moçambique (TVM) para divulgar os seus programas e, devido a essa demora, o fundo
disponibilizado pelo FNUAP acabou sendo perdido em 2014. Só posteriormente é que ambas
as partes chegaram a um acordo, já com o financiamento do IREX, que iniciou em Junho de
2015. Procedimentos de finanças públicas do Estado também são um entrave para o financia-
mento indirecto das OPDs. Estas reportam que o Ministério da Economia e Finanças exige o
pagamento de direitos alfandegários para a recepção de doações, principalmente de meios de
compensação (como cadeiras de rodas), alegando que quando a isenção fiscal respectiva não
está antecipadamente inscrita no orçamento, os receptores ou os doadores devem pagar os
impostos da doação. Esta falta de flexibilidade faz com que algumas doações tenham que ser
recusadas, privando, assim, as PcD de beneficiarem de meios importantes para a melhoria da
sua qualidade de vida.

Alguns parceiros de cooperação bilaterais e multilaterais também financiam ou financiaram


projectos na área da deficiência, mas como parte de programas mais amplos e sem um foco
específico na área da deficiência. Por exemplo, o Programa Provincial de Apoio à Sociedade
Civil da Irlanda já financiou projectos na província do Niassa através da CONCERN e com a par-
ticipação do FAMOD. A União Europeia já concedeu apoio às OPDs através das suas principais
fontes de financiamento à sociedade civil: o programa de Apoio às organizações da sociedade
civil e o Programa de Apoio aos Actores Não Estatais (PAANE), que, neste momento, está na
sua segunda fase. O primeiro fundo beneficiou umas cinco organizações que receberam um
convite para apresentarem propostas e foram bem-sucedidas nesta área. A temática da defi-
ciência apareceu como parte da interpretação das organizações e não como parte da chamada
para os fundos por parte da União Europeia. A Embaixada da Suécia, a partir do Programa
AGIR, financia a ACAMO, por intermédio da organização internacional Diakonia. Através do
programa de apoio aos mídia, IREX, os Estados Unidos financiam a TV Surdo. Esta também já
teve financiamento do Fundo das Nações Unidas para a População, FNUAP. O FAMOD recebe

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 59


financiamento da OSISA e da Abilis Foundation.

O DFID financia a sociedade civil através da Fundação MASC. Este financiamento inclui apoio
às OPDs e respectivo Fórum, particularmente no âmbito do desenvolvimento de capacidade
institucional, técnica e de advocacia, com vista a tornar o movimento mais forte em Moçambi-
que, dotar as OPDs de capacidades de advogar os seus interesses em diversas áreas: política,
económica e social. Outra área que está a ser desenvolvida é a coordenação entre as OPDs por
forma a fortalecer, unificar e dinamizar cada vez mais o movimento e um dos grandes ganhos
obtidos até ao momento foi o trabalho conjunto e bastante activo entre as OPDs e o FAMOD na
elaboração do documento sobre os compromissos de Moçambique apresentados à Cimeira
Global da Deficiência em Londres. O documento final foi elaborado em colaboração com o
Governo. O presente estudo também se enquadra no apoio do DFID ao sector e espera-se que
seja uma ferramenta que disponibilizará uma visão real da situação das OPDs e das PcD no
geral em Moçambique e permitirá a vários stakeholders identificarem pontos de entrada para a
sua acção, tendo em conta os desafios arrolados nesta análise.

No geral, o financiamento das OPDs nacionais tem sido predominantemente na base de pe-
quenos projectos e, às vezes, intermediado por grandes organizações internacionais como a
Handicap Internacional, a UNICEF, a KEPA, a Save the Children, dentre outras. A ADEMO e a
ACAMO estão entre as poucas organizações que têm relativamente mais financiamento que
as outras, o que sugere a existência de alguma relação entre a capacidade administrativa e o
acesso a fundos. Isso explica-se em parte devido às necessidades de prestação de contas dos
fundos, que, por sua vez, depende da capacidade administrativa. Do outro lado, estão as or-
ganizações que tiveram oportunidades de estabelecer parcerias com ONGs internacionais que
operam na área (Handicap International, Light for the World, Abilis), que, no desenvolvimento
dos seus projectos, as têm incluído como sub-implementadores.

Actualmente, o potencial financiamento da área da deficiência pelos parceiros de cooperação é


através do Programa de Protecção Social Básica, que inclui a deficiência como uma sub-área.
A partir deste programa, poderá haver algum financiamento para a sociedade civil.

Uma parte considerável do financiamento é a partir de processos competitivos, com o lan-


çamento de concursos públicos, em que tanto organizações nacionais como internacionais
podem concorrer. Em processos competitivos como este, a capacidade das organizações de
elaborar propostas é fundamental. As OPDs nacionais queixam-se de que os concursos para
financiamento externo estão enviesados a favor das organizações internacionais, mesmo quan-
do apresentam propostas tecnicamente sólidas. Isto é, alegam que os financiadores preferem
conceder os fundos às organizações internacionais do que as nacionais, porque estas podem
melhor promover as suas agendas e que a forma de acesso, competitiva, não favorece as orga-
nizações nacionais, que ainda precisam de criar capacidade. O contraponto deste argumento
tem sido de que os processos são competitivos e que as organizações com mais capacidade
têm tido mais sucesso na obtenção de financiamento. Também se queixam da falta de legado

60 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


de capacidade na cooperação com as organizações internacionais e da falta de financiamento
para a capacitação em desenho e implementação de projectos, para poderem ser competitivas
na busca de financiamento.

4.4.3. O PAPEL DOS PARCEIROS DE DESENVOLVIMENTO NO FINANCIAMENTO


DO SECTOR

No que concerne aos parceiros de cooperação, embora alguns estejam a financiar iniciativas
pontuais, não existe um programa de financiamento para a área da deficiência. Poucos par-
ceiros têm um financiamento direccionado, o que poderá mudar com a maior proeminência do
assunto depois da Cimeira Global da Deficiência realizada em Julho em Londres. Historicamen-
te, o financiamento a esta área esteve ligado a projectos específicos como complementares
a essas intervenções, por exemplo, como parte da área da desminagem, como é o caso da
União Europeia. Com o crescimento da importância da Protecção Social na agenda do desen-
volvimento no mundo e em Moçambique nos últimos tempos, os parceiros de desenvolvimento
tendem também a estruturar o seu financiamento acoplado a esta área, como parte da Estraté-
gia Nacional de Segurança Social Básica. Nos casos em que existe financiamento, o mesmo é
feito maioritariamente pela via de organizações internacionais, que implementam directamente
os programas, ou refinanciam os parceiros nacionais pela via de pequenos projectos. Este é
o caso da USAID que financia o IREX, que inclui o apoio à TV Surdo. Existe também a Coo-
peração Italiana que vai usar ONGs italianas como intermediárias. O DFID e outros parceiros
canalizam parte do seu financiamento para esta área através da UNICEF. Porém, existem casos
de financiamento através de organizações nacionais, como o da Fundação MASC (fundos do
DFID). A União Europeia, através de fundos de apoio à sociedade civil, também financiou direc-
tamente organizações nacionais, mas não porque eram OPDs, mas porque foram elegíveis ao
financiamento e apresentaram propostas consistentes que foram aprovadas para a recepção
dos fundos. No geral, as iniciativas de financiamento da área ainda são fragmentadas. Por isso,
aponta-se a falta de coordenação entre os doadores sobre as áreas de actuação, pois cada
um tem sua área prioritária tanto em termos temáticos como territoriais, o que, algumas vezes,
reduz a efectividade e sustentabilidade das acções. A consequência dessa fragmentação é
que os recursos tendem a ser alocados de forma desigual e desequilibrada e, inclusive, não
abrindo oportunidades para a capacitação dos actores locais, com particular incidência nas
OPDs.Também não existe um mecanismo coordenado de monitoria e avaliação do impacto que
essas intervenções têm no empoderamento das PcD, o que reforça a percepção de que esta é
uma área negligenciada.

A Itália, uma das poucas financiadoras de longa data do sector, o Reino Unido e os Estados
Unidos são, neste momento, os principais parceiros de cooperação que estão a discutir a agen-
da da deficiência. Até quanto foi possível apurar, a tendência da abordagem a ser adoptada é
a inclusão em programas existentes e não como um programa específico.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 61


4.4.4. DINÂMICAS DE FINANCIAMENTO

As dinâmicas de financiamento da área, tanto do sector público como das OPDs, não contri-
buem para o empoderamento das PcD.

É difícil aferir o financiamento da área da deficiência para o sector público, devido à natureza
transversal da área e à implementação das suas acções por uma multiplicidade de actores, sem
uma coordenação institucional forte. Ademais, a falta de informação fiável sobre o número de
PcD não permite estimar em que medida o financiamento cobre as necessidades reais existen-
tes. Este problema não será resolvido facilmente, porque depende também da superação dos
obstáculos existentes na sociedade para se assumir os direitos das pessoas com deficiência
como direitos humanos e da resposta do Governo na recolha de informação fiável, empregando
métodos adequados, e o seu uso para a definição de intervenções voltadas para o empodera-
mento das PcD. Uma das consequências da falta de informação sobre o orçamento canalizado
para esta área é a ausência de debate sobre os padrões de alocação de recursos e de como os
mesmos podem ser mudados com vista ao atendimento efectivo dos desafios existentes. Isso
abre espaço à continuação de uma implementação e orçamentação fragmentadas, baseadas e
voltadas para intervenções necessárias, mas menos sustentáveis no empoderamento das PcD.
Este é o caso da alocação de recursos para intervenções mais assistencialistas, como é o da
área de Protecção Social que tem registado um grande crescimento de recursos e beneficiários
nos últimos anos. Este assunto será desenvolvido na próxima secção.

No que concerne ao financiamento às OPDs, algumas agências internacionais que lidam com a
área da deficiência financiam projectos nesta área a partir das suas organizações congêneres.
Por exemplo, o modelo de financiamento da Cooperação Italiana é pelas Organizações Não-
-Governamentais (ONGs) deste país. Organizações doadoras internacionais canalizam o seu
financiamento maioritariamente pelas ONGs internacionais e algumas organizações do sistema
das Nações Unidas (exemplos: a UNICEF e a OIT) e estas, por sua vez, trabalham com as
poucas OPDs com maior capacidade, como forma de evitar custos de transação e conseguir
maior impacto a nível local. Assim, organizações como Help Age e Handicap International têm
beneficiado de mais financiamento que as organizações nacionais. Uma das explicações da-
das por uma organização doadora é de que essas organizações têm melhor capacidade e, no
caso da Handicap International, também implantação territorial, o que permite a implementação
até ao nível local. O baixo acesso aos fundos por parte das organizações nacionais também
se deve ao facto de muitos mecanismos de financiamento serem internacionais e as organiza-
ções nacionais enfrentarem barreiras linguísticas e de capacidade técnica para apresentarem
propostas competitivas, além dos problemas de capacidade de gestão e governação interna,
apontados em relação a essas organizações, o que reduz a confiança dos parceiros para ca-
nalizarem directamente fundos às mesmas.

A falta de confiança dos financiadores nas organizações, aliada à falta de apoio a projectos que

62 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


incluem capacitação das OPDs contribuem para a reprodução dos mesmos padrões de acesso
aos recursos, que acabam indo para as organizações já em si com maior capacidade. Dentre
as organizações nacionais, as mais bem organizadas e com mais tempo de vida, as que têm
relativamente mais financiamento, muitas delas estão sedeadas em Maputo. Mesmo assim, os
actuais mecanismos de financiamento tornam as organizações mais vulneráveis à agenda dos
financiadores, em detrimento do seguimento das suas, uma vez que os doadores, com raras ex-
cepções, como o da Suécia através do Programa AGIR que financia a ACAMO, não financiam
Planos Estratégicos. Mesmo nos casos em que o financiamento vai para projectos de capacita-
ção pontual, os apoios de grande parte dos doadores não incluem a formação como parte da
capacitação. Deste modo, estes mecanismos de financiamento restringem as possibilidades de
criação de capacidade nas OPDs e a capacidade destas de serem mais efectivas na função de
representar os interesses das PcD.

4.5. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E OPINIÃO DOS SEUS BENEFICIÁRIOS

A prestação de serviços é um elemento importante para a realização dos direitos das PcD. Des-
ta forma, as lacunas na prestação dos serviços afectam negativamente a garantia dos direitos.
Nesta secção serão abordados alguns dos serviços voltados para as pessoas com deficiência,
as lacunas e desafios apresentados pelos mesmos, segundo os seus beneficiários, e suas
causas, tendo como pano de fundo as implicações na garantia dos direitos das PcD. O foco
é nos serviços públicos, estando excluídos aqueles que são prestados pelas entidades priva-
das. A referência é dos serviços previstos no PNAD II, nomeadamente formação profissional e
emprego, educação inclusiva, saúde (HIV/SIDA, sexual e reprodutiva, serviços de reabilitação
médica) e os de protecção social.

Antes de se voltar à prestação de serviços concretos, é importante referir como o modo de


estruturação da oferta de serviços, que depende da abordagem predominante sobre a defi-
ciência, afecta os direitos das PcD.

4.5.1. SERVIÇOS DE PROTECÇÃO SOCIAL

Em princípio, os serviços públicos de assistência social estão disponíveis até ao nível do distri-
to, pela via dos Serviços Distritais de Saúde, Mulher e Acção Social (SDSMAS) e pelo Instituto
Nacional de Assistência Social (INAS), que apenas está presente em 30 distritos do país. Con-
forme foi referido anteriormente, o INAS é o braço executivo da área de acção social e é respon-
sável pela implementação de quatro programas de assistência social, nomeadamente o Pro-
grama “Subsídio Social Básico” (PSSB), o Programa “Apoio Social Directo” (PASD); o Programa
de Serviços Sociais de Acção Social (PSSAS); e o Programa de Acção Social Produtiva (PASP).
Em todos esses programas, são potencialmente contempladas as pessoas com deficiência, no
pressuposto de que fazem parte dos grupos vulneráveis e, por isso, elegíveis aos programas de
protecção social. A tabela 2 abaixo apresenta dados dos programas com informação disponível
sobre beneficiários com deficiência.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 63


Tabela 2: Pessoas com Deficiência Beneficiadas pelos Programas de Segurança Social Básica

Programas 2012 2013 2014 2015 2016 Total

Subsídio Social Básico

(PSSB) 13890 15927 18520 18121 18785 85243

Apoio Social Directo

(PASD) 2616 3184 5625 2435 824 14684

Serviços Sociais de

Acção Social (PSSAS) 482 954 285 134 118 1973

TOTAL 16988 20065 24430 20690 19727 101900


Fonte: Relatório-Balanço do PES do MGCAS/MGCAS, 2016b. p. 10.

A oferta de serviços de segurança social básica cresceu no período de 2012 a 2014, tendo re-
gistado uma ligeira queda em 2015 e retomado o crescimento em 2016. Neste grupo, a maioria
dos beneficiários foi contemplada pelo PSSB, um serviço de transferência de rendas por tempo
indeterminado, para atender a situações de incapacidade para o trabalho.

A tabela 3 abaixo indica a percentagem de agregados familiares beneficiados pelo PASD, que
consiste em respostas a situações temporárias de vulnerabilidade. Com excepcão de 2013 e
2017, há uma proporção maior de famílias a receberem apoio pontual do que prolongado, o que
mostra a predominância do tipo de apoio de curto prazo.

Tabela 3: % de Agregados familiares beneficiários de Programas do INAS que são chefiados


por PcD

Programas 2012 2013 2014 2015 2016 2017

PASD prolongado 9.2 27,62 4.0 5.0 2.0 34.0

PASD Pontual 63.0 10.3 17.0 9.59 46.51 5.0

PSSB 5.07 5.2 5.0 5.04 5.41 5.2


Fonte: Relatórios do INAS 2012-2017.

O programa voltado para o apoio às pessoas com potencial de empregabilidade, que é o PASP,
no período analisado, não inclui indicações de ter beneficiado pessoas com deficiência, ao
menos de acordo com os dados disponíveis. Os dados disponíveis mostram a existência de
um forte foco na componente assistencialista dos programas de protecção social, que não só
cobrem uma parte dos custos de sobrevivência, como não criam uma base sustentável de auto
sustento e empoderamento dos beneficiários.

Os serviços de protecção social, como os subsídios sociais básicos, apesar da expansão,


ainda não cobrem parte substancialdas pessoas com deficiência. Além das limitações finan-

64 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


ceiras, que foram agravadas com a actual crise económica, existem limitações e dificuldades
na identificação das pessoas elegíveis por entidades com mandato como o do INAS, seja por
causa dos métodos empregues, assim como devido às famílias que escondem os seus entes
com deficiênciado olhar da sociedade. Apesar da existência de normas de acessibilidade aos
benefícios de protecção social, a nível local e no terreno os critérios de seleção dos AFs elegí-
veis às vezes são pouco claros, estimulando relações clientelísticas entre os beneficiários, as
lideranças comunitárias e os Permanentes, o pessoal operacional responsável por fazer chegar
os benefícios às comunidades. Em Cabo Delgado, por exemplo, aponta-se a existência de
mecanismos informais que fazem com que a canalização dos benefícios favoreça substancial-
mente os antigos combatentes e seus familiares, que é um grupo historicamente influente na
província e também na política nacional. O efeito dessas dinâmicas sobre as PcD não é claro,
porque não se apurou informação específica sobre este grupo.

Os programas que têm informação sobre as PcD beneficiadas fazem parte do que se chama
acção social directa, dos quais o que tem mais beneficiários é o PSSB. No fim da ENSSB I
(2010-2014), o PSSB tinha alcançado mais de 300 mil, de um total de 427 mil beneficiados, e
havia uma avaliação positiva ao mesmo no que tange à garantia de sobrevivência e dignidade
das pessoas em situação de vulnerabilidade, incluindo as PcD, apesar de o subsídio ser redu-
zido (MGCAS, 2016a). No entanto, a lacuna deste subsídio é que não cria as condições para a
reprodução do capital humano e uma efectiva mudança com vista à autonomia económica dos
agregados beneficiados. Além disso, os programas de apoio social directo, no geral, reprodu-
zem as relações de patronagem baseadas em distribuição de recursos para recompensar a
lealdade política dos apoiantes e para estimular os membros da oposição a apoiarem o partido
no poder (como o Fundo dos Sete Milhões) e excluem o seu acesso a parte dos potenciais be-
neficiários, aumentando, desta forma, as tensões sociais (Buur & Salimo, 2018).

4.5.2. EDUCAÇÃO INCLUSIVA

O MINEDH defende a educação inclusiva, assente na promoção do direito à educação para


todas as pessoas, incluindo aquelas com deficiência sensorial, intelectual, física e/ou dificulda-
des de aprendizagem. Neste contexto, o sector compromete-se a assegurar que os alunos com
necessidades educativas especiais (NEE) – que são dificuldades de aprendizagem, compor-
tamento e emocional, transtornos de fala, deficiências auditiva, visual, mental físico-motor – e/
ou com deficiência, possam frequentar escolas regulares, em vez de serem segregadas em
escolas especiais. Este processo resultou na criação dos Centros de Recursos de Educação
Inclusiva (CREI) voltados aos níveis primário e secundário, abarcando, entre outras, as áreas
de formação e capacitação profissional, serviços de diagnóstico e orientação, de produção
de materiais, mobilização e sensibilização da comunidade, tendo como objectivo a criação de
condições para a educação inclusiva.27 Esta abordagem foi adoptada formalmente em 1998,
com um projecto-piloto financiado pela UNESCO e implementado na Cidade de Maputo e mais
quatro províncias: província de Maputo, Sofala, Zambézia e Nampula. Inicialmente, os estudan-
tes com NEE eram integrados em turmas especiais das escolas regulares e o sistema evoluiu
27
A informação deste histórico e respectivas estatísticas foi retirada de http://www.mined.gov.mz/DN/DIEE/Pages/default.aspx (acedido a 17 de Agosto
de 2018).

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 65


para uma inclusão mais efectiva, por se entender que a separação era discriminatória e pouco
eficaz sob o ponto de vista pedagógico, por privar a estes estudantes de referências positivas
a partir dos seus pares, dentre outros factores. As turmas especiais nas escolas regulares
visavam a escolarização de estudantes com NEE auditivas, visuais e mentais, atendidos por
professores capacitados em competências básicas de língua de sinais moçambicana, sistema
braille e respectivas metodologias de ensino-aprendizagem, complementadas por actividades
extracurriculares e Educação Física, feitas em conjunto com outros estudantes. No período
2003-2005 cerca de 31.000 crianças e jovens com NEE frequentavam as escolas regulares de
todo o país e 418 foram integrados em seis escolas/turmas especiais nas províncias de Ma-
puto, Sofala, Manica, Tete, Zambézia, Nampula e Niassa, porque exigiam uma atenção mais
especializada. O aproveitamento pedagógico destes Alunos/Estudantes situava-se entre 35%
a 40% entre os alunos com NEE auditivas (devido à dificuldade de comunicação) e 70 a 80%
para os de NEE visuais. Segundo dados do sector, no período 2007/2008, 89.125 alunos com
NEE frequentavam as escolas regulares do ensino primário. Em 2012, estavam matriculados
cerca de 100 mil estudantes com NEE em todos os subsistemas de ensino, incluindo os alunos
das CREI.28 Actualmente, a educação inclusiva é a abordagem dominante de atendimento às
PcD no sector de educação e as quatro unidades das escolas especiais existentes – duas na
cidade de Maputo, uma na Beira e Quelimane, respectivamente, cada uma especializada num
tipo específico de deficiência (mental, visual e auditiva) – visam apenas atender os estudantes
com maiores dificuldades de inclusão.

Os números acima mostram um grande progresso no atendimento às PcD na área da educa-


ção, tendo em conta que, entre 1975 e 1990, o efectivo de jovens e crianças com NEE, nas Es-
colas de Educação Especial, as únicas então existentes, oscilava entre 20 a 50 alunos.29 Estes
avanços resultam da intensa capacitação levada a cabo no sector para a criação de condições
para a educação inclusiva. O Informe sobre a implementação do PNAD II refere que, entre
2013 e 2015, foram formados 330 gestores e professores em língua de sinais, sistema braille e
diagnóstico e reorientação, reformados os curricula dos Institutos de Formação de Professores,
com vista à introdução de conteúdos para melhor atendimento a estudantes com NEE, forma-
dos professores dos CREI, integradas mais de 265 PcD adultas em programas de alfabetização
inclusiva (MGCAS, 2016b).

No entanto, ainda existem alguns desafios nesta área, com destaque para três. O primeiro
tem a ver com a capacitação e sua sustentabilidade, uma vez que alguns dos professores ca-
pacitados para o atendimento a estudantes com NEE são sujeitos à mobilidade, o que acaba
comprometendo a capacidade das escolas.30 Há casos de escolas que adoptam a educação
inclusiva e, devido à falta de condições, acabam recorrendo às turmas especiais para albergar
as crianças com deficiência, o que contraria o espírito desta abordagem (ROSC, 2014). Estudos
mostram também que a acessibilidade das escolas para as crianças com deficiência também
é crítica (idem). Entrevistados reportaram as dificuldades enfrentadas por PcD nas escolas, de-
vido à falta de formação adequada dos professores e formadores. O segundo já foi referido na
secção 4.1, que tem a ver com a necessidade de articulação e coordenação de vários actores
28
Idem.
29
Idem.
30
Idem.

66 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


e processos, de forma a garantir um adequado diagnóstico, formas de mitigação e preparação
para o ensino inclusivo, assim como o envolvimento da família e das comunidades no apoio à
PcD para a sua inclusão no sistema de educação. O terceiro desafio é a capacidade das OPDs
de participar efectivamente na elaboração e monitoria de políticas de forma mais efectiva. Uma
das plataformas da sociedade civil da área da educação mais actuante na elaboração e moni-
toria das políticas do sector é o Movimento de Educação Para Todos (MEPT), ao qual o FAMOD
aderiu como membro em 2006. O MEPT já realizou um estudo sobre a criança com deficiên-
ciana educação e teve a participação de pelo menos duas organizações que lidam com as
PcD (ADEMO e Light for the World) na elaboração do seu Plano Estratégico 2015-2019.31 Outra
entidade que congrega as OSCs que se interessam pelo assunto é o ROSC (Fórum da Socie-
dade Civil para os Direitos da Criança). No entanto, a julgar pelos desafios ainda existentes, a
articulação desses actores com as OPDs ainda precisa de mais reforço de modo a levar a cabo
uma participação mais efectiva no sector.

Em Maio de 2018, foi aprovada a Estratégia para Educação Inclusiva e Desenvolvimento das
Crianças com Deficiência (EEIDCD), tendo sido criado o Grupo Multissectorial para a Implemen-
tação da EEIDCD, coordenado pelo MINEDH e composto pelo MGCAS, MISAU, Ministério da
Justiça, Ministério de Trabalho, Emprego e Segurança Social (MITESS), Ministério do Turismo
e Cultura, Ministério das Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos, Ministério da Ciên-
cia e Tecnologia, Ensino Superior e Técnico-Profissional, Universidades (Universidade Eduardo
Mondlane, Universidade Pedagógica), Organizações internacionais como Save The Children e
UNESCO e o Projecto Vamos Ler (financiado pelo Governo Americano, USAID) e OPDs. Esta
estratégia pretende enfrentar os desafios acima indicados, mas ainda caberá às OPDs contribui-
rem para que a sua implementação seja responsiva às demandas dos grupos que representam.

4.5.3. EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL

Na área de emprego e formação profissional, as principais acções estão relacionadas com o


emprego no sector público e a formação técnico-profissional, cujo principal responsável é o
MITESS, através do IFPELAC.

A nível da função pública foi definida uma quota para as pessoas com deficiência, além da cria-
ção de condições para o emprego e promoção das PcD, no âmbito da Estratégia da Função Pú-
blica para a Pessoa Portadora da Deficiência, cuja coordenação da implementação está a cargo
do MAEFP e do MGCAS (anteriormente MMAS). A estratégia não está a ser implementada como
foi planeada e não existe nenhum relatório de implementação que permita aferir o seu progresso,
apesar de já se ter esgotado o seu período de execução, que vai de 2009 a 2013. No entanto,
a equipa deste estudo teve informação de que há movimentações no sentido de revitalizar a
implementação desta estratégia e o MGCAS, no Relatório da avaliação intermédia do PNAD II,
referiu que se estava a fazer a sua avaliação.

O IFPELAC tem criado condições para a formação profissional das PcD, no âmbito da sua
31
Movimento de Educação Para Todos/MEPT, 2014, p. 45.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 67


abordagem de educação inclusiva. Neste contexto, treinou o seu corpo docente e criou as con-
dições materiais para a inclusão das PcD nos seus cursos. De acordo com o relatório intermé-
dio de implementação do PNAD II 2012-2019 (MGCAS, 2016b), dados combinados do INEFP
(actual IFPELAC) e de OSCs nacionais e internacionais indicam que, num total de 1.584 previs-
tas para o período de 2013 a 2015, foram formadas 558 pessoas com deficiência (72,2% são
mulheres) nos diversos cursos, de um total de 1.584, representando uma realização de 35,22%.
Deste número, 79,2% concentram-se nas áreas de artesanato e gestão de pequenos negócios.
Ainda de acordo com a mesma fonte, no âmbito do emprego, foram integradas 1.576 pessoas
com deficiência em actividades sócio-económicas, das 46.200 previstas (apenas 3.4% das
previstas), sendo que 788 (50%) são de vítimas de minas, o que sugere terem sido integradas
por via de projectos específicos e direccionados. Com vista ao atendimento às pessoas com
deficiência auditiva, foram formadas 120 pessoas (88% de realização) em linguagem de sinais
em instituições públicas.

A percepção de algumas PcD é de que a formação profissional no geral e o IFPELAC, em parti-


cular, ainda carecem de capacidade para poderem oferecer educação inclusiva nos seus dife-
rentes centros espalhados pelo país. O IFPELAC será o principal parceiro do programa de forma-
ção profissional e com recurso às TICs como ferramentas de melhoria da acessibilidade às PcD,
a ser financiado pela Cooperação Italiana, abrangendo os centros de Mahlazine, Beira e Pemba.

4.5.4. SERVIÇOS DE SAÚDE

Os Serviços de Saúde previstos no PNAD II consistem de áreas como saúde sexual e reprodu-
tiva, e serviços de reabilitação médica e apoio familiar. Estes últimos incluem a distribuição de
meios de compensação.

Na área da saúde sexual e reprodutiva, do levantamento de necessidades feito junto às associa-


ções de e para as PcD nas regiões sul, centro e norte do país, no âmbito do PNAD II 2012-2019,
constatou-se que a maior parte dos programas de atendimento a este grupo populacional não
contempla esta área e também o HIV/SIDA. Segundo o MGCAS (2016b), no período 2013-2015,
o Tratamento Antirretroviral (TARV) para adultos e crianças atingiu 56 e 49%, respectivamente.

No que concerne aos serviços de reabilitação médica e apoio familiar, o foco é a garantia do
acesso aos serviços de reabilitação e assistência médica e medicamentosa. Neste âmbito, de
2013 a 2015, totalizaram 153.735 pacientes em todo o país, dos quais 145.563 (94.7%) foram
atendidos nos serviços externos de Fisioterapia e os restantes 8.172 (5.3%) nos de serviços
de Ortoprotesia.32 Também foram distribuídos 17.995 (cerca de 13% do previsto) meios de
compensação como próteses, auxiliares de marcha, cadeiras de rodas, botas ortopédicas,
talas para os membros inferior e superior e palmilhas ortopédicas, com uma taxa de realização
de 12.98%. Do total dos beneficiados em meios de compensação, 47.67% são pessoas com
deficiência física (MGCAS, 2016b).

32
Relacionado ao diagnóstico de problemas motores e de postura e a aplicação de meios ortopédicos para a sua correcção,

68 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


Apesar da crescente acessibilidade de alguns serviços, as organizações da área apontam a
existência de alguns elementos críticos. Uma pesquisa feita pela TV Surdo sobre a acessibi-
lidade aos serviços de saúde, encontrou barreiras quotidianas nas Unidades Sanitárias, nas
escolas, nos bairros, nas instituições públicas, não-governamentais e privadas, e na comu-
nicação social na disponibilidade e acesso à informação sobre o HIV/SIDA (TV Surdo, 2017).
No sector público deu-se primazia à acessibilidade física aos edifícios com a construção de
rampas. Mesmo assim, com muitas deficiências, sem seguimento das especificidades técnicas
definidas pelo Decreto 53/2008. No entanto, nos hospitais, pessoas com deficiência visual e au-
ditiva e fala deparam com a falta de funcionários qualificados que os possam atender de forma
adequada. Neste sector não existe pessoal que domina a língua de sinais e as pessoas com
deficiência visual, quando são medicadas, não têm medicamentos com leitura em braille. A
distância entre as residências das PcD e as unidades, numa situação em que falta transporte, é
outro dos obstáculos apontados, que pode fazer com que utentes não acedam aos serviços de
saúde, ou sejam relutantes em voltar, caso haja necessidade de acompanhamento.33 Segundo
um entrevistado, o pessoal de saúde, quando se depara com uma pessoa com deficiência, por
exemplo, de madrugada, quando a supervisão é baixa, evita atendê-la para não ter maçada.
Por outro lado, o fraco conhecimento da deficiência pode distorcer o atendimento. Por exemplo,
as pessoas com deficiência mental ou intelectual são, muitas vezes, confundidas com demen-
tes. Isso tem implicações no tratamento que recebem e nos seus direitos.

4.5.5. A ECONOMIA POLÍTICA DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DA ÁREA


DA DEFICIÊNCIA E SEUS RESULTADOS

A prestação de serviços para as PcD ainda é crítica e o próprio governo reconhece que a im-
plementação do principal instrumento de provisão de serviços nesta área, o PNAD, ainda não
gerou os resultados esperados. No caso do PNAD I 2010-2014, registaram-se alguns avanços,
como na área de promoção de emprego, alívio da pobreza e promoção do bem-estar (através
da formação profissional e integração em actividades de geração de rendimentos, subsídios
de alimentos e outros apoios de várias formas), acesso à educação a crianças e jovens com
deficiência e redução das barreiras ambientais nas escolas com ensino inclusivo; melhoria de
acesso à saúde – assistência médica e medicamentosa, serviços de reabilitação e informação
sobre HIV/SIDA. No entanto, ainda persistem desafios como: fraco nível de criação de emprego,
baixo valor dos subsídios de alimentos (num contexto de aumento dos preços destes), acesso à
informação sobre os programas de saúde, fraca qualidade de atendimento às PcD nos hospitais
públicos, falta de medicamentos nas farmácias públicas, baixa acessibilidade de informação
sobre o HIV/SIDA (República de Moçambique, 2012). Quanto ao PNAD II 2012-2019, o governo
reconhece que a sua implementação está aquém do planeado, devido, entre outras coisas, ao
fraco conhecimento e apropriação deste instrumento como referência para a planificação, fraca
coordenação entre os diversos intervenientes, insuficiência de recursos para a sua implementa-
ção e não discriminação dos dados por género e tipologia de deficiência. Praticamente todas as
áreas aqui apresentadas são apontadas como tendo tido um baixo desempenho em relação ao
que foi planificado, com a excepção da educação. A monitoria da implementação deste instru-

33
Vide estudo sobre o caso de Sofala (Light for the World, 2017).

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 69


mento também tem sido difícil, devido ao envio tardio da informação sobre a implementação das
actividades pelos intervenientes, pouca objectividade da informação, ausência de indicadores
quantitativos para avaliar algumas das actividades previstas (MGCAS, 2016b, p. 16).

O acesso aos serviços não tem uma discriminação com base em aspectos étnicos, regionais ou
de outro tipo que seja visível. As pessoas de renda mais baixa sofrem mais em função da sua
precária situação sócio-económica e falta de meios próprios para colmatar as lacunas de acesso
aos serviços públicos e a um apoio que possa garantir os seus direitos. Nas cidades, as pessoas
têm mais comunicação e informação e isso faz com que tenham mais acesso a serviços que
as que se encontram nas zonas rurais. No entanto, a forma negativa como a deficiência é vista
também faz com que, nas zonas urbanas, as pessoas tenham complexos em aceder a alguns
serviços, incluindo mesmo o apoio para fazer valer os seus direitos.

O sector público ainda não incorporou, na sua prática de prestação de serviços, a essência das
abordagens baseadas em direitos que enformam as principais intervenções de apoio às pessoas
com deficiência, fundadas na CNUDPD. O exemplo dos programas de protecção social mostra
que considerações estratégicas, de índole política, explicam a expansão dos programas que
têm beneficiado algumas das pessoas com deficiência e lhes permitem resolver necessidades
de curto prazo. No entanto, os mesmos não suprem parte substancial dos custos relacionados
com a deficiência e muito menos criam uma base sólida de empoderamento para uma maior
autonomia na provisão do seu próprio bem-estar.

De uma forma geral, na prestação dos serviços públicos, o sector público padece de uma falá-
cia típica da economia política do desempenho – que é o atendimento “a clientes fáceis”, que
são aqueles que, com menos esforço, permitem reivindicar um bom desempenho (Trosa, 2001).
Estas áreas também são importantes para os destinatários finais dos serviços públicos, mas a
sua priorização pode ser feita em detrimento de acções mais complexas, mas necessárias para
a introdução de melhorias profundas. Por exemplo, na área de Protecção Social Básica é notório
o crescimento do número de beneficiários, mas voltado a programas mais assistencialistas que
estruturantes e perenes, como o PASP, cujos resultados também são mais difíceis de atingir. Na
área da educação, nos dados acima indicados, é notório, com base nos dados disponíveis (do
passado), o melhor aproveitamento pedagógico das pessoas com deficiência visual, cuja inte-
gração ou inclusão no ensino é relativamente menos complexa que dos estudantes de deficiên-
cia auditiva. O sector também não consegue vencer um problema crónico da função pública: a
incapacidade de garantir maior sustentabilidade às capacidades criadas, a partir de uma disfun-
cional mobilidade dos funcionários públicos, que afecta negativamente o seu desempenho. Tam-
bém é recorrente o reporte da distribuição dos meios de compensação, o que é apontado por
alguns entrevistados como sendo importante, mas em alguns casos ineficaz, uma vez que alguns
desses meios dependem da criação de condições para o seu uso. Por exemplo, uma cadeira
de rodas ou uma bengala para pessoas com deficiência visual, para serem eficazes, depen-
dem da existência de infraestruturas adequadas como acessibilidade aos edifícios e transpor-
tes públicos, calçadas adequadas, semáforos sonoros, para garantirem uma mobilidade segura

70 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


aos seus beneficiários. Essas condições não estão a ser criadas pelos poderes públicos. Deste
modo, muitos destes serviços, apesar de os números indicarem um crescimento considerável no
atendimento das pessoas com deficiência, o seu grau de empoderamento ou sustentabilidade
pode ser fraco porque apenas atacam os problemas mais fáceis de resolver e os sintomas e não
a causa das questões que restringem a participação das pessoas com deficiência na vida em
sociedade. Os serviços e benefícios atribuídos pelo Estado mostram também que a abordagem
assistencialista e caritativa ainda predomina nas intervenções dos actores públicos.

Por último, um elemento a referir sobre o acesso a alguns serviços e benefícios são aqueles ob-
tidos pela via do activismo das OPDs. Nestes casos, os principais beneficiários são as pessoas
filiadas às organizações, principalmente quando se trata de meios de compensação e acesso
a oportunidades de formação e educação. O activismo desta área tem a particularidade de ser
diferente das outras que, muitas vezes, não é feito por organizações de membros, mas por enti-
dades que apenas trabalham numa certa área sem uma base social fundada nos seus membros.
Isso explica a ligação entre o activismo e o acesso aos benefícios directamente pelos membros.
No entanto, a concentração dos benefícios deste activismo nos membros das OPDs pode ex-
plicar a fraca eficácia na consolidação desses direitos, porque os mesmos podem não ter uma
ressonância maior nos não-membros e na sociedade mais ampla.

4.5.6. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E IMPLICAÇÕES NOS DIREITOS DAS PCD

Um elemento central na forma como os serviços prestados podem contribuir para a garantia dos
direitos tem a ver com a visão e definição prevalecente sobre a deficiência em Moçambique. O
facto de esta não ser compreendida em sua complexidade e diversidade faz com que os serviços
sejam estruturados como se fossem para um grupo homogêneo. No geral, dados estatísticos 34

mostram que a deficiência física tem sido mais beneficiada no acesso aos serviços do que as de
outros tipos. Essa é também a percepção geral entre os entrevistados.

As pessoas com deficiência de carácter auditivo e visual, além do material de compensação,


têm necessidades de acesso a múltiplos serviços básicos e demandam a existência de pessoal
qualificado em línguas de sinais e braille, tanto nas instituições públicas como em outras organi-
zações a nível da sociedade, bem como a adaptação de material físico e tecnológico acessível
em áudio e em braille. Este tipo de serviços requer mais recursos e tende a não ser contemplado
nos serviços públicos. Isso reduz a eficácia dos serviços e a garantia dos direitos porque as
abordagens e estruturas de execução existentes somente respondem às demandas de apenas
alguns grupos e não dão conta da diversidade e complexidade existentes. A título de exemplo,
dado por um dos entrevistados, a Constituição da República de Moçambique (CRM) determina
que a língua oficial do país é o português. Deste modo, uma pessoa que não entenda o portu-
guês e apenas se possa comunicar na língua de sinais não pode fazer pedidos individualizados
às entidades públicas. Portanto, essa pessoa só poderá fazer os seus pedidos por pessoa inter-
posta, o que reduz a sua capacidade de usufruto de direitos plenos como cidadão. Além disso,
apesar da existência de uma lei que consagra o direito à informação, além das barreiras políticas

34
MGCAS, 2016b.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 71


e burocráticas já existentes no acesso à informação, o sector público não está organizado para
garantir o acesso das pessoas com deficiência visual, por exemplo. A prática predominante tam-
bém não favorece a garantia dos direitos laborais. Por exemplo, segundo um líder de uma OPD,
quando uma pessoa adquire uma deficiência no seu local de trabalho, apenas é remetida à Junta
Médica para ser declarada inválida, ao invés de se criar condições para que possa trabalhar
num local de trabalho adaptado.

As PcD também são alvo de exclusão no acesso a recursos públicos devido a uma visão distor-
cida da deficiência. Segundo um representante de uma OPD, alguns dos seus membros recla-
mavam serem alvos de exclusão no acesso ao Fundo de Desenvolvimento Distrital (FDD), vulgar-
mente chamado de “Sete Milhões”, porque se alegava que as pessoas não tinham capacidade
de gestão dos recursos e apresentavam maior risco de não retorno dos valores cedidos. Esta
questão, que configura uma atitude de discriminação, deveria potencialmente ser atendida por
organizações como o IPAJ e a CNDH, mas cuja cobertura e recursos limitam o seu alcance, as-
sim como a falta de conhecimento dos direitos ou dos recursos por parte das PcD para fazerem
valer os seus direitos. Só para ilustrar, são poucas as novas construções, incluindo obras públi-
cas, que têm tomado em conta o direito de acesso às mulheres e homens com deficiência. Isso
deve-se à fraca fiscalização do cumprimento do Decreto 53/2008, em relação ao qual não existe
um relatório sobre a sua implementação e nem informação sobre o que ocorre com as pessoas
que violam este dispositivo. Isso não ocorre só nas obras, mas em um conjunto mais amplo de
serviços providenciados pelo Estado Moçambicano e que são inacessíveis física e socialmente.
Conforme visto, os serviços de educação, transporte, saúde e emprego não estão adaptados às
necessidades das pessoas com deficiência. O direito à informação também é coarctado, uma
vez que os meios de comunicação de massa não dão atenção às necessidades específicas das
pessoas com deficiência. A implementação do PNAD II ainda está aquém do planificado e pro-
blemas como a fraca coordenação e monitoria prejudicam a sua eficácia.

Deste modo, mesmo com a existência dos diversos instrumentos legais e de políticas, o empo-
deramento político e económico das mulheres e homens com deficiência ainda não se verifica
no país. As pessoas com deficiência ainda vivem de caridade, sem emprego e inibidas de par-
ticiparem activamente na vida em sociedade. No geral, a sociedade moçambicana continua a
considerar as pessoas com deficiência como inúteis e incapazes, sujeita-as à constante margi-
nalização e discriminação e não lhes dá espaço para participarem no esforço massivo de recu-
peração e desenvolvimento do país (Chivangue, Vembane, Lihahe, & Manjate, 2017).

72 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


5. SÍNTESE DA ECONOMIA
POLÍTICA DO SECTOR
DA DEFICIÊNCIA

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 73


5. SÍNTESE DA ECONOMIA POLÍTICA DO SECTOR
DA DEFICIÊNCIA

Esta secção visa sintetizar os vários elementos que explicam a baixa eficácia na garantia dos
direitos das pessoas com deficiência e os elementos que obstaculizam o seu empoderamento.
Ao longo do texto foram sendo apontados esses elementos, cabendo aqui fazer uma síntese dos
mesmos, de forma a identificar os pontos de entrada para a acção. A análise será baseada em
elementos-chave que explicam a dinâmica da área da deficiência e os obstáculos existentes ao
empoderamento das PcD.

5.1. SÍNTESE DA ECONOMIA POLÍTICA DO SECTOR DA DEFICIÊNCIA

Nos últimos tempos, com a assinatura e ratificação da CNUDPD, assim como a adesão à Década
Africana para as Pessoas com Deficiência, o país foi desenvolvendo instrumentos legais e de
políticas que abordam a deficiência numa perspectiva social e de direitos. No entanto, como o
hiato entre as políticas e as intervenções concretas mostra, a mudança de paradigma ocorreu
mais ao nível formal, porque, na prática, ainda continuam a prevalecer as abordagens caritativa
e médica e uma visão fragmentada da deficiência. Esta abordagem influencia a forma como o
assunto é tratado dentro da estrutura do governo, com acções dispersas por várias entidades e
coordenadas por um ministério, o MGCAS, que historicamente tem tido pouco poder e influência,
para além da sua área de mandato, o que dificulta a coordenação. Dentro do sector e do Gover-
no, o nível de compromisso é essencialmente formal e de cumprimento de uma agenda nacional
que não é considerada prioritária e de mero alinhamento circunstancial com uma agenda inter-
nacional que está em destaque nos últimos tempos, algo oportuno e estratégico para um país
que, nos últimos tempos, teve a sua ajuda para o desenvolvimento via governo drasticamente
reduzida. Este fraco compromisso reflecte-se no volume limitado de recursos e mesmo no atraso
na elaboração do Relatório de Implementação da CNUDPD. A falta de um arranjo institucional
eficaz na coordenação de uma agenda transversal e de uma efectiva liderança e compromisso
têm contribuído para o limitado conhecimento da agenda da deficiência no sector público, o que
se reflecte na implementação fragmentada das acções desta área pelos seus diferentes interve-
nientes e uma falta de avaliação dos seus resultados a nível macro. Neste contexto, os incentivos
para a implementação de acções da área da deficiência que não estejam alinhadas com as
prioridades sectoriais são mínimas, o que pode contribuir para o nível baixo de implementação
das políticas nesta área. É assim que os sectores da educação, emprego e formação profissio-
nal, saúde e acção social vão implementando as suas acções, principalmente à medida que
estejam alinhadas com as prioridades do sector. Mesmo na área de acção social, por exemplo, o
desempenho dos programas de Protecção Social tem sido mais na componente assistencialista,
com efeitos a curto prazo na redução da vulnerabilidade material, mas pouco efeito no empode-
ramento das pessoas com deficiência para uma melhor garantia dos seus direitos. Na prestação
de serviços, este contexto traduz-se na persistência de uma abordagem limitada da deficiência
que leva à resposta e atendimento aos problemas mais comuns, fáceis de resolver e de reportar

74 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


como evidência de bom desempenho. Daí a predominância de intervenções voltadas apara a
área da deficiência física.

A continuidade dessa situação disfuncional também é favorecida pela existência de uma socie-
dade pouco consciente e informada sobre a deficiência e organizações da sociedade civil, as
OPDs, com baixa capacidade organizacional e de articulação entre elas, resultando disso pouco
poder de influenciar a agenda pública do sector. A criação do FAMOD, em 2000, foi a solução
encontrada para o problema de articulação, mas ainda enfrenta dificuldades no desempenho
do seu papel, decorrentes também dos desafios existentes nas organizações que o compõem,
que, por sua vez, não podem ser desassociadas das condições sociais das PcD. O contexto
social, através das suas representações, obriga as PcD a tornarem-se “invisíveis” na arena pú-
blica, reduzindo, assim a sua relevância como sujeitos políticos e cidadãos a cujas demandas
os poderes públicos devem prestar atenção e dar respostas adequadas. A persistente adopção
de abordagens assistencialistas nas intervenções de apoio às PcD, a despeito da existência de
instrumentos internacionais adoptados pelo país que defendem abordagens mais voltadas aos
direitos e ao empoderamento das pessoas, é uma resposta minimalista e reducionista que, em
parte, decorre dessas visões limitadas sobre a deficiência e também dos interesses políticos
estratégicos dos actores que controlam o poder. A pouca atenção política e dos políticos a que
as PcD são remetidas também resulta das definições formais adoptadas sobre a deficiência que,
por exemplo, enformam o modo como se produz a informação oficial, como as estatísticas e o
orçamento, o que, por sua vez, limita a capacidade de definição de estratégias para uma res-
posta efectiva às demandas deste grupo. O sector, no geral, tem pouco financiamento e poucos
parceiros de desenvolvimento têm projectos direccionados à capacitação das OPDs. Dentre os
parceiros de desenvolvimento que poderiam apoiar as OPDs e também os programas direc-
cionados a este grupo, há pouco interesse pela área e o apoio circunscreve-se a intervenções
pontuais e, normalmente, acopladas a programas maiores, como Protecção Social, desminagem
ou de apoio a um grupo específico (ex. criança). Isso leva à busca por opções menos custo-
sas de implementação, na forma de projectos pontuais que normalmente são implementados
por organizações não-governamentais internacionais, por terem melhor capacidade de gestão e
implantação descentralizada. Estas organizações também servem de intermediadoras para o fi-
nanciamento das organizações nacionais, o que lhe permite condicionar ou influenciar a agenda
de acção destas. Esta dinâmica tende a reduzir as oportunidades de financiamento das OPDs
nacionais e a colocá-las a reboque das suas congéneres internacionais, o que, por sua vez,
contribui para prolongar os seus problemas de capacidade e a sua eficácia na reivindicação de
direitos. As excepções à fraqueza das OPDs são poucas, destacando-se organizações como
ADEMO e ACAMO, mais antigas e melhor estruturadas, e que, por isso, têm relativo sucesso no
acesso ao financiamento, mas mesmo assim se ressentem da falta de fundos para o sector como
um todo. A nível da sociedade, a falta de um processo de educação social mais amplo, no sen-
tido de desmistificar a deficiência, contribui para a perpetuação de práticas sociais que levam à
exclusão das PcD e à sua sistemática violação ou à denegação dos seus direitos.

As consequências destas dinâmicas são três: (i) a primeira é que dificilmente os poderes pú-

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 75


blicos poderão ser bem-sucedidos na resposta às demandas de um grupo cujas dimensões e
necessidades desconhecem e com fraca capacidade de organização de acção colectiva para
lutar pelos seus direitos; (ii) sem o apoio necessário e adequado, a marginalização das PcD
tende a persistir e a reproduzir-se; (iii) decorrente das duas primeiras, num contexto de falta de
informação sobre a dimensão e necessidades das PcD, em que a capacidade destas de reivindi-
car aos seus representantes e detentores de deveres e à sociedade a garantia dos seus direitos
é limitada, abre-se espaço para a contínua negligência dos seus interesses, que se pode reflectir
tanto na total ausência de respostas às suas demandas, como na existência destas, na forma de
planos, na sua fraca implementação, ou numa implementação selectiva, dependendo dos inte-
resses estratégicos dos actores que têm poder decisório. Os avanços significativos conseguidos
na cobertura dos beneficiários da protecção social, o apoio baseado na distribuição de meios
materiais de compensação, as abordagens da educação inclusiva que apenas respondem aos
tipos de deficiência que requerem relativamente menos investimento, com destaque para a defi-
ciência física, são exemplo dessa implementação selectiva.

Um conjunto de elementos influenciam as dinâmicas do sector da deficiência acima descritas,


cujo conhecimento é importante para a identificação de oportunidades de reforma e mudança
com vista ao empoderamento das PcD.

5.2. ELEMENTOS DA ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA

Esses elementos, que influenciam a dinâmica da área da deficiência nos moldes aqui analisados
e que afectam o seu empoderamento, são: os valores e ideologias, o quadro institucional, os
actores e seus incentivos e a dinâmica de fluxo de recursos. O legado histórico é um elemento
que aparece como transversal a todos os outros.

5.2.1. VALORES E IDEOLOGIAS

O conjunto de valores, ideologias e abordagens enformam a eficácia na protecção dos direitos e


empoderamento das pessoas com deficiência. Dentre estes elementos destacam-se os modelos
de abordagem da deficiência, a cultura política, os valores sociais e as abordagens e valores que
enformam as ideias do desenvolvimento internacional.

Após a independência, à semelhança de outras partes do mundo, o modelo médico também


predominou em Moçambique, baseado na ideia de que as pessoas com deficiência devem ser
“reabilitadas” fisicamente de forma a serem integradas na sociedade. Foi esta vertente que terá
dominado a criação do Centro de Reabilitação Física de Nangade, em Cabo Delgado, após
a independência, em 1976, voltado para os desmobilizados da luta armada. O centro incluía
formação profissional, de forma a inserir as pessoas com deficiência na vida civil. Na área da
educação, as escolas especiais perduraram até ao fim dos anos 1990 como o modelo de abor-
dagem para as pessoas com necessidades especiais, quando foi introduzida, de forma piloto, a
educação inclusiva. Com a mudança da área da acção social para a Secretaria do Estado para

76 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


a Açcão Social e, posteriormente, para o Ministério da Mulher e Acção Social nos anos 1990, a
área da deficiência passou a ser parte das responsabilidades deste sector, numa perspectiva de
assistência social, com o tratamento da reabilitação física e disponibilização de meios de com-
pensação, principalmente meios ortopédicos, sob a responsabilidade do Ministério da Saúde.
As abordagens sobre a deficiência focalizadas no modelo médico e assistencialista dominaram
grande parte da história do sector. A adesão do país aos instrumentos internacionais, como a
Década Africana das Pessoas com Deficiência, as declarações de Salamanca (sobre a educa-
ção inclusiva) mais recentemente, a CNUDPD, influenciaram a elaboração dos instrumentos da
política para a área da deficiência que foram aqui apresentados, mais alinhados com a perspec-
tiva social e de direitos, pelo menos em princípio. No entanto, o continuado baixo conhecimento
sobre as abordagens da deficiência no sector público remeteu essas ideias apenas à esfera for-
mal, continuando as abordagens de âmbito mais médico e caritativo dominantes na actuação do
Governo nesta área. Também, apesar de os planos da área adoptarem uma abordagem trans-
versal, na prática, a sua execução segue o padrão rígido das fronteiras orgânicas e funcionais
típicas do sector público. Isso impede que haja uma visão de conjunto, integrada e transversal.
Esta lacuna é que faz com que as OPDs insistam na necessidade da existência de uma estrutu-
ra de coordenação que seja verdadeiramente transversal e também na sua representação nas
estruturas de tomada de decisão e implementação das políticas do sector. A visão caritativa tam-
bém influenciou o foco da prestação de serviços de acção social, que se concentra em atender
situações de vulnerabilidade económica e na distribuição de meios de compensação voltados
para a deficiência física. A visão caritativa também influenciou a cultura jurídica predominante,
cujos reflexos se fizeram sentir a partir de uma actividade legislativa que historicamente privilegia
uma vertente assistencialista.

Quanto à cultura política, a história política do país no período posterior à independência foi
dominada pela Frelimo, enquanto partido libertador e construtor do Estado e da ideia de unida-
de nacional, e que chama a si a responsabilidade da gestão deste Estado. A ideia de unidade
nacional e da responsabilidade histórica sobre o Estado promovida pela Frelimo não se alterou
substancialmente com a democracia multipartidária, mas transformou-se na ideia de que os que
não estão alinhados com as ideias deste partido, expressas através da acção estatal e no con-
texto da arena pública formalmente plural, são inimigos da pátria (anti-patriotas), do projecto
de construção do Estado e do País, ou elementos da oposição. A não-aceitação da pluralidade
de ideias também faz com que o respeito pelos grupos minoritários, que expressam valores e
ideias próprias, seja limitado. Isso também se reflecte na forma como os grupos minoritários são
tratados, mais numa perspectiva de integração do que de aceitação da diferença. Esta cultura
política totalitária influencia a forma como o activismo cívico é visto, essencialmente como oposi-
ção política, e reflecte-se na conotação das PcD e OPDs que reivindicam os seus direitos como
sendo da oposição, o que contribui para retrair a sua participação política no âmbito público.
Desta forma, o poder de influência mudou da esfera cívica para a esfera das relações mais res-
tritas, em que posicionamentos públicos são mais comedidos e complementados com canais
paralelos de comunicação entre representantes de OPDs e o Governo, enfraquecendo, desta
forma, o activismo e a representação das PcD na esfera pública, como cidadãos com direito de

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 77


reivindicar os seus direitos. Nesta lógica de relações, o tratamento das pessoas que participam
no diálogo com o Governo pode ser diferenciado, havendo aquelas que têm acesso aos tais ca-
nais paralelos e aquelas que, no entender de um entrevistado, são vistas como “indesejadas” em
alguns encontros com os Ministérios, se “se quer ter um encontro produtivo com o ministro”. No
entender de alguns entrevistados, algumas lideranças históricas das OPDs estão nesta situação,
o que contribui para diluir o seu inestimável capital político e de se consolidarem como exemplos
de luta, superação, sucesso e reivindicação de direitos, o que poderia ter um maior efeito mobi-
lizador e, desta forma, fortalecer o movimento cívico nesta área.

No que concerne aos valores sociais, a deficiência ainda é vista, em muitas famílias, como re-
sultado de espíritos, de feitiço ou maldição. Isso contribui para a forma negativa com que as fa-
mílias tratam os seus entes com deficiência. É comum em famílias de diferentes estratos sociais,
incluindo da classe/média urbana, que têm pessoas com deficiência esconderem-nas das vistas
e do convívio da sociedade. Muitos são os exemplos de famílias que acorrentam os seus entes
com deficiência mental. Em alguns casos, esse tratamento configura-se mesmo em violência
física e psicológica contra a pessoa com deficiência. Em outros casos, tratamentos deste tipo
devem-se ao desconhecimento da necessidade da pessoa com deficiência ser vista como sujei-
to dos direitos. Meneses (2014) aponta a existência de crenças populares, que tendem a olhar
para a deficiência como maldição, destino e má sorte ou azar, que influenciam as representa-
ções e discursos colectivos, que apontam inúmeras lendas e crenças populares que explicam
a deficiência numa pessoa ou família, dentre as quais: (i) uma intervenção divina para punir os
vícios ou hábitos imorais dos pais; (ii) um diferendo entre inimigos vingados com recurso à ma-
gia negra; e (iii) uma maldição de origem mística (Meneses, 2014). Essas ideias são difundidas
dentro das famílias, pelos curandeiros, líderes tradicionais e religiosos e contribuem para que as
pessoas com deficiência se retraiam ou sejam suprimidas da vida social, artificialmente diminuin-
do, desta forma, a sua importância social através da sua “invisibilidade”.

Relativamente aos valores e ideias que enformam o desenvolvimento internacional, o crescimen-


to da importância da questão da deficiência no mundo influenciou a aprovação da Convenção
das Nações Unidas sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência e também a sua ratificação por
Moçambique. Em alguns países parceiros estratégicos de cooperação, como o Reino Unido, a
assistência aos extremamente pobres e a questão da inclusão das pessoas com deficiência têm
sido prioridades da agenda do desenvolvimento que são integrados nos valores organizacionais
de entidades como o Departamento para o Desenvolvimento Internacional (DFID) e nas estraté-
gias de apoio aos países. A Itália tem uma grande tradição de apoio ao país na área da deficiên-
cia, por conta da sua importância na agenda pública daquele país. É por esta via que a questão
da deficiência também vem ganhando uma grande importância por parte dos parceiros de coo-
peração. O outro elemento a ter em conta é a crescente importância da agenda de Protecção
Social no mundo e em Moçambique (Francisco & Sugahara, 2015; Buur & Salimo, 2018), na qual
o Governo tem tido um sucesso considerável em termos de garantia do financiamento e aumento
do número de beneficiários (incluindo PcD), mesmo em momentos de crise fiscal, após o conge-
lamento de apoio directo ao Estado decorrente das dívidas ocultas. Os parceiros de cooperação

78 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


também têm manifestado um interesse crescente em apoiar a Protecção Social, e muitos deles
tendem a acoplar o apoio à deficiência dentro desta área, sem as devidas qualificações.

5.2.2. ACTORES, PROCESSOS E PODERES FORMAIS

Existe um conjunto de actores e processos que são fundamentais à tomada de decisões no sec-
tor e às potencialidades de reforma, nomeadamente, os poderes do executivo na definição de
políticas públicas e a sua primazia no processo orçamental; a dinâmica subjacente à mobilização
de recursos pelas OPDs; o formato de representação das OPDs às pessoas com deficiência; e
os modelos de financiamento dos parceiros internacionais.

A permeabilidade das esferas decisórias às questões da deficiência é também condicionada


pelo quadro político mais amplo, que dita a sua inclusão na agenda política e eventualmente a
sua perenidade. A experiência das políticas públicas em Moçambique sugere que o executivo
é mais dominante, tanto sob o ponto de vista de sua aprovação como da sua implementação.
Deste modo, a influência relativa que uma certa figura pode ter ao nível legislativo, como o caso
do segundo vice-Presidente da AR (da Renamo), pode ter algum papel em mudanças dirigidas
no legislativo, mas a não ser que possa gerar o mesmo grau de sensibilidade a nível do executi-
vo, a sua eficácia será menos visível. Ser do partido no poder também tem um impacto diferente,
comparativamente a ser da oposição. Embora a existência de um líder na Assembleia esteja a
contribuir para uma maior sensibilidade em relação às questões da deficiência neste órgão, a
sua filiação política (da oposição) acaba tendo um efeito redutor da eficácia do seu activismo.
Deste modo, alguns posicionamentos em defesa das pessoas com deficiência acabam sendo
conotados como “aproveitamento político”, ou “coisas da Renamo”, ou de “pessoas confusas”. A
persistência desta situação é consistente com as impressões de uma entrevistada sobre as limi-
tações a que o activismo nesta área está sujeita. Nas palavras da mesma: “E quando as pessoas
dos grupos de pressão, das pessoas com deficiência do movimento associativo questionam, são
conotadas como pessoas da oposição.”

O Executivo também tem poderes orçamentais que podem contribuir para o condicionamento
de outras instituições do Estado. Por exemplo, a definição do orçamento de entidades como a
CNDH depende do executivo. Esse poder de influência do executivo pode ser um factor limitante
na actuação de entidades como esta, cuja função muitas vezes envolve criticar o governo, o que
pode ter implicações no volume do orçamento, como forma de limitar a sua acção. A alternativa
a isso tem sido apontada como a aprovação do orçamento de entidades deste tipo feita directa-
mente pelo Parlamento, mediante proposta da entidade beneficiária.

Deste modo, o poder de influência sobre as políticas públicas e a sua implementação depende
do quadro político mais amplo que, historicamente, tem maior predominância do executivo no
processo decisório, e também da bipolarização política entre os da situação e da oposição.
Esse ambiente condiciona a aceitação das propostas que criticam o status quo, assim como
dos posicionamentos dos grupos de defesas das PcD, quando estes tomam uma postura mais

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 79


reivindicativa em relação às políticas da área.

A capacidade de mobilizar recursos, a capacidade técnica, a participação em redes e a visibili-


dade das organizações também influenciam o poder das organizações na definição da agenda.
Assim, as organizações internacionais, além de serem destinatários preferenciais do financia-
mento, são as que lideram os processos de advocacia e de participação na definição da agen-
da pública. De acordo com um entrevistado, o processo de advocacia normalmente começa
com uma organização internacional que estimula as organizações nacionais a reivindicarem os
seus direitos. São as organizações internacionais que normalmente definem as estratégias de
intervenção e as organizações nacionais apenas são seguidoras, devido à falta de recursos. A
fraqueza das OPDs na advocacia é também apontada como decorrente da sua incapacidade de
usar role models como base para se promover as causas do grupo.

A capacidade das OPDs nacionais de influenciarem as decisões depende da sua natureza como
grupo de interesse. Muitas organizações nesta área são baseadas em membros. As OSCs, que
se têm revelado mais eficazes sob o ponto de vista de advocacia, além das capacidades para
competirem pelo financiamento e poderem levar a cabo a sua agenda, têm sido essencialmente
organizações que combinam uma componente forte de produção de evidências e advocacia.
Um dos poucos casos de sucesso de uma organização de membros é a União Nacional dos
Camponeses – UNAC, mas que também faz parte de redes internacionais de advocacia e, de
certa forma, foi alimentada pela existência de pesquisa nessa área sobre questões de terra e
agricultura, mesmo que não fosse direcionada para as suas acções, o que aumentou substan-
cialmente a sua eficácia neste domínio. As OPDs têm sido essencialmente voltadas para os seus
membros e com poucas alianças estratégicas com outras organizações que promovem agendas
mais amplas, como, por exemplo, finanças públicas/FMO, Protecção Social. Mesmo fazendo par-
te destes fóruns, não têm promovido a agenda da deficiência, de tal forma que, nos documentos
de posicionamento e advocacia nestes fóruns, pouco existe sobre esta área.

O modelo de financiamento adoptado pelos parceiros de cooperação até aqui não tem tido
muito impacto no fortalecimento dos actores locais e, em alguns casos, contribui para reproduzir
dinâmicas com baixo impacto, ou que enfraquecem ou deixam de fortalecer as OPDs, conforme
já explicado. O grau de autonomia do Governo no financiamento dos seus programas de Pro-
tecção Social faz com que o grau de influência dos parceiros nesta área mais emblemática de
apoio às pessoas com deficiência seja relativamente menor, comparativamente a outras áreas.
No entanto, a avaliação positiva que os parceiros fazem dos Programas de Protecçao Social,
essencialmente assistencialistas, pode contribuir para consolidar essas abordagens, que têm
pouco impacto na estrutura da situação das PcD. Alguns parceiros com histórico de actuação
na área, com destaque para a Itália, o Reino Unido e os Estados Unidos estão neste momento
a liderar uma reflexão sobre o apoio a esta área. Até aqui, segundo informações apuradas pela
equipa do estudo, as abordagens de financiamento que estão a ser consideradas são mais no
sentido de inserção da questão da deficiência em outros programas, do que um programa sepa-
rado. O posicionamento dos parceiros de desenvolvimento sobre que áreas e que modalidades

80 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


de financiamento serão adoptadas, será um elemento importante para sinalizar onde os recursos
estarão e que abordagens sobre a deficiência serão dominantes, se o actual modelo com uma
forte componente de Protecção Social assistencialista, ou se se criará as condições para a efec-
tivação de uma abordagem mais transversal, que já foi formalmente adoptada, mas ainda não
foi materializada.

5.2.3. ACTORES, PROCESSOS E PODERES INFORMAIS

Os actores que exercem um poder informal no sector são os líderes religiosos, os líderes e médi-
cos tradicionais, cujas ideias sobre a deficiência influenciam a forma como a sociedade encara
esta questão. Por exemplo, a crença de que as pessoas com deficiência devem ser ajudadas ao
invés de serem criadas as condições para que elas possam ser sujeitos na promoção do desen-
volvimento, a ideia de que elas “devem ser curadas” porque têm uma doença, são tão enraiza-
das na sociedade que fazem parte do corpo de valores mesmos dos decisores públicos na forma
como abordam este assunto. Um líder de uma OPD referiu que foi alertado, por uma pessoa de
uma entidade pública com quem interage, de que após os encontros com a entidade em que se
discutia de forma aparentemente aberta as questões dos direitos das PcD com o líder da mesma,
este, no seu dia-a-dia, referia-se aos assuntos da deficiência de forma jocosa e céptica e pouco
empenho mostrava em relação às acções acordadas.

As referências positivas, os role models, também constituem um tipo de autoridade informal vá-
lido na área, num contexto em que boas referências faltam para inspirar o movimento de defesa
das pessoas com deficiência. Assim, pessoas com deficiência que se destacam na sociedade,
como a atleta paraolímpica Edmilsa Governo 35, a fundadora da ADEMO e activista histórica pe-
las pessoas com deficiência Fárida Gulamo, o deputado, académico e cantor Esaú Meneses e
outras pessoas com sucesso profissional e proeminência pública, são tidas como inspiradoras
de pessoas com deficiência, embora também se considere que o poder destas pessoas poderia
ser mais bem explorado para promover os direitos das pessoas com deficiência e para demons-
trar o potencial da sua contribuição para o desenvolvimento.

5.2.4. INSTITUIÇÕES

As relações de poder dentro da estrutura orgânica das instituições estatais é um elemento que
influencia a eficácia das entidades envolvidas na promoção da agenda da deficiência.

Há uma certa economia política da organização institucional que favorece uma maior eficácia na
condução de programas de deficiência que, de certo modo, está a ser seguida no sector público.
Por exemplo, o Departamento de Educação Especial do MINEDH não está subordinado a nenhu-
ma direção, mas sim ao Ministro. O antigo INEFP, e actual IFPELAC, passou de uma instituição
subordinada para uma instituição tutelada pelo Ministro, que pode delegar ao Secretário Perma-
nente. Esta autonomia foi importante na sua flexibilidade para acolher o programa de cooperação
com a Itália, que já foi referido, parceria que não encontrou acolhimento adequado em outras

35
Para detalhes sobre quem é Edmilsa Governo, pode consultar:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Edmilsa_Governo. .

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 81


entidades do sector público que foram contactadas. A experiência destas duas instituições mos-
tra que o seu grau de autonomia dentro do sector e a subordinação a uma entidade mais alta na
hierarquia do processo decisório tem o potencial de permitir uma maior priorização da agenda da
deficiência no sector e também permite ter maior flexibilidade na tomada de decisões e capaci-
dade decisória para articular com os outros sectores e/ou actores externos na implementação da
agenda da deficiência. Esta forma de organização também tem um maior potencial para dar con-
ta da necessidade da transversalidade das intervenções na área da deficiência. A experiência
do MGCAS, de alocação da área da deficiência num departamento, não permite a esta entidade
ter uma abordagem mais estratégica da área e a consequência disso é a fraca coordenação dos
intervenientes e a baixa eficácia na resposta às demandas das pessoas com deficiência.

Um ponto que decorre do baixo desempenho das entidades públicas e merece atenção é a
reivindicação das PcD de estarem representadas naquelas que lidam com os assuntos que lhes
interessam, supostamente porque isso aumentaria a eficácia dessas organizações. A represen-
tação nas entidades responsáveis por dar resposta às demandas das PcD, embora consistente
sob o ponto de vista dos princípios, não pode ser vista de forma linear, uma vez que ela só pode
ser activa se estiver aliada a interesses de actores poderosos na definição e implementação de
políticas públicas, dentre os quais o executivo e o partido no poder. Não se descarta naturalmen-
te o poder que a capacidade de reivindicação do activismo na área pode ter, mas que depende,
em grande parte, da melhoria na capacidade das OPDs de articularem uma acção colectiva
mais ampla, de mudarem as formas de actuação de uma arena restrita de relações entre as
organizações e o Executivo e de transformarem a agenda da deficiência em algo mais amplo
(seja dentro das plataformas sociais em que participa, assim como de uma forma mais ampla na
sociedade como um todo). A transformação de uma questão que até aqui se coloca como uma
agenda de um grupo depende também da transformação dos valores sociais que influenciam a
exclusão das pessoas com deficiência. É neste contexto que os actores e poderes informais, que
influenciam a forma como a sociedade vê a deficiência, são importantes.

5.2.5. INCENTIVOS PARA MANTER O STATUS QUO E PARA A MUDANÇA

O relatório de avaliação intermédia do PNAD II 2012-201936, aprovado pelo Conselho de Mi-


nistros, conclui que a sua fraca implementação se deve aos seguintes factores: a) fraco co-
nhecimento do PNAD; b) fraca apropriação como instrumento de planificação pelos diversos
intervenientes; c) insuficiência de recursos para a sua implementação; d) não discriminação
dos dados por género e tipologia de deficiência; e) fraca articulação entre os intervenientes. O
relatório ainda menciona a falta de colaboração de algumas entidades em fornecer informação
sobre a implementação do PNAD, dentre as quais o FAMOD e o Ministério dos Combatentes.

As conclusões acima expostas sugerem que tem havido pouco empenho e até compromisso
dos actores na implementação de acções na área de deficiência, pelas razões já abordadas
neste estudo.

36
MGCAS, 2016b.

82 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


Os compromissos do País apresentados pelo Governo na Cimeira Global da Deficiência em
Julho de 2018 (vide anexo 8.3), constituem a provável agenda da área nos próximos tempos e
abarcam várias das questões críticas indicadas ao longo deste relatório, dentre as quais: a ne-
cessidade de produção de legislação que combate o estigma e a discriminação; a produção de
estatísticas ajustadas e desagregadas, de acordo com as questões do Grupo de Washington;
as metas de alocação orçamental voltadas para sectores estratégicos em resposta às necessi-
dades das pessoas com deficiência; as medidas de empoderamento económico e criação de
emprego, envolvendo também o sector privado; a criação de condições para a implementação
efectiva da Estratégia de Educação Inclusiva; a revisão da legislação e das políticas; as mudan-
ças nas abordagens de protecção social; e a inclusão de mulheres e raparigas com deficiência.
Em suma, existe uma agenda extensa e ambiciosa que, nos próximos tempos, deverá ocupar
actores estatais, da sociedade civil e do sector privado.

No entanto, a participação do Governo na Cimeira de 2018, em Londres, e o envolvimento da


sociedade civil e do sector privado na elaboração dos compromissos apresentados é também
um sinal de que a agenda da deficiência está a deixar de ser apenas de um grupo para se trans-
formar numa agenda da sociedade. Este interesse do país pode ser visto como a continuidade
da ratificação da CNUDPD e também de um histórico de alinhamento com as grandes agendas
de desenvolvimento internacional, dentre as quais os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio
e os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável. Nesta última, a deficiência é um assunto de
destaque. Este alinhamento não é apenas da ordem dos princípios. Também se configurou his-
toricamente como uma estratégia de sobrevivência de um país pobre e dependente de recursos
externos. Este pensamento estratégico reveste-se de particular importância neste momento de
crise fiscal do Estado, num contexto de alto endividamento público e limitado espaço de mano-
bra de busca de financiamento externo. No caso particular da CNUDPD, o país aderiu, mas não
tem cumprido com os seus preceitos, inclusive com a obrigação da elaboração periódica de
relatórios de sua implementação. Isso muitas vezes é apontado como tendo sido um obstáculo
para a sociedade civil monitorar a implementação desta Convenção, através da elaboração do
seu relatório-sombra. No entanto, é pertinente também creditar essa falta de monitoria à fraqueza
das OPDs. Durante a realização deste estudo, a equipa teve informações de que a sociedade
civil já está a elaborar o seu relatório-sombra sobre a implementação da convenção.

A estrutura de incentivos que contribuiu para o status quo foi descrita e analisada neste relatório.
Um dos aspectos peculiares deste sector é que o Governo reconhece que a implementação das
acções previstas no PNAD está aquém do projectado e reconhece a existência de problemas
dentro do sector público, como o fraco conhecimento, a coordenação, recursos reduzidos e
falta de informação. São raras as situações em que o Governo e a sociedade civil confluem no
diagnóstico das dificuldades de um sector. O facto de isso acontecer nesta área deve ser con-
siderado como um incentivo importante para a mudança e também para um trabalho conjunto e
articulado entre os diferentes actores, dentro e fora do Estado.

Porém, a dinâmica do sector mostra que firmar compromissos e elaborar planos não basta para

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 83


a sua efectivação. Existe um hiato considerável entre as arenas de tomada de decisão e as res-
ponsáveis pela implementação. As motivações e incentivos desses diferentes momentos e dos
actores neles envolvidos são potencialmente diferentes e, em alguns casos, podem até ser con-
traditórios. Na parte remanescente desta secção, serão analisados os incentivos para manter o
status quo e a mudança existentes nos actores dentro do Estado – este como Governo/Executivo
e noutras instituições, na sociedade civil e entre os parceiros de cooperação.

No que tange ao estágio de decisão, tanto o Governo como a sociedade civil, assim como os
parceiros de desenvolvimento têm interesse em que esta agenda seja aprovada e que Moçam-
bique esteja alinhado com uma agenda internacional, porque isso abre espaço para a sua inclu-
são em redes e mecanismos de cooperação e financiamento que respondem aos interesses de
cada tipo de actor. O Governo abre novas possibilidades de financiamento dos seus programas
sociais duramente afectados com a crise da dívida e a decorrente crise fiscal. Os parceiros de
cooperação encontram espaço para financiar um país que passou de exemplo de sucesso da
ajuda ao desenvolvimento num embaraço difícil de explicar nos seus países e seus eleitorados,
alguns deles contrários à ajuda ao desenvolvimento. Deste modo, a presente agenda permite
justificar a continuidade do apoio em nome de uma agenda global prioritária e com contornos
humanistas, uma vez que implica empoderar grupos que têm sido historicamente marginaliza-
dos e que não devem ser negligenciados por conta dos erros do seu governo. Esta tem sido
uma das justificações para a continuação do apoio dos parceiros a Moçambique, usando outras
modalidades que não os sistemas do governo, após a crise das dívidas ocultas. Depois de ter
sido abandonado o apoio directo ao orçamento, os recursos continuaram a fluir, mas pela via de
projectos e com a prioridade de áreas sociais e humanitárias, para não punir as pessoas mais
pobres e vulneráveis. Esta agenda é consistente com a justificação predominante de continui-
dade do apoio a Moçambique e, por isso, fornece incentivos para os parceiros de cooperação
financiarem a área da deficiência. Para a sociedade civil, a motivação é evidente, uma vez que
os compromissos espelham as reivindicações do seu activismo.

É na arena da implementação e operacionalização da agenda da deficiência que estão a maior


complexidade e as diferenças de motivações. Em relação ao governo, será importante haver
incentivos para um maior conhecimento da agenda, assim como para maior cooperação e coor-
denação das acções sectoriais. Até aqui, os incentivos para essa cooperação são baixos, de-
vido à percepção de que a agenda da deficiência “é do sector da acção social” e os sectores
preferem ocupar-se das agendas do seu core business. Isto também afecta a coordenação e
articulação entre os intervenientes, que precisam de um comando central acima dos ministérios e
com autoridade suficiente para fazer avançar a agenda da deficiência como agenda do Governo
como um todo. Segundo os actores que operam no sector – entre OPDs, PcDs e parceiros de
cooperação –, o empenho na implementação da agenda da deficiência depende do compromis-
so da liderança do MGCAS e também da capacidade existente neste ministério. Naturalmente
que o factor mais importante é a liderança, porque dela depende o compromisso com a criação
de capacidade. Mas a estrutura actualmente existente, a alocação da área da deficiência num
departamento de uma direcção nacional do MGCAS não é a forma ideal de criação dessa capa-

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cidade, devido à baixa autoridade de um órgão deste nível para apoiar tecnicamente uma área
tão complexa e transversal.

Objectivamente, a percepção de muitos entrevistados é de que o MGCAS não tem demostrado


grande comprometimento com a área da deficiência. A razão para essa percepção é devida
ao relativamente fraco diálogo do sector com as OPDs na elaboração da legislação, políticas,
planos e orçamentos e, particularmente, por causa da fraca interacção com a direcção máxima
do ministério e ainda a falta de priorização da agenda da deficiência tanto no discurso quanto
na prática. No sentido contrário dessa tendência, é pertinente considerar que a crescente im-
portância da agenda da deficiência no contexto internacional e a participação do Governo na
Cimeira Global podem criar incentivos para um maior empenho e melhor liderança do MGCAS
nesta área. Porém, será importante ter em conta que o sector já tem uma área, a da protecção
social, que é responsiva às demandas das pessoas com deficiência, embora com uma forte
abordagem assistencialista. Dentre os compromissos da Cimeira de Londres consta a melhoria
dos procedimentos de acesso ao PSSB, de modo a melhorar a transparência e o conhecimento
dos beneficiários. Será importante ver em que medida os interesses de uso deste programa para
fins clientelistas e como forma de reprodução de poder serão superados por uma abordagem
mais inclusiva. No actual contexto político, esses incentivos são limitados, mas a existência de
uma maior atenção ao programa por parte da sociedade civil, no geral, e das OPDs, em particu-
lar, pode contribuir para mudar essa estrutura perversa de incentivos.

Outras instituições dentro do poder executivo importantes para a implementação desta agenda
são o INE, o MINEDH, particularmente o Departamento de Educação Especial e o IFPELAC.
Conforme se referiu anteriormente, O INE é uma entidade com credibilidade técnica reconhe-
cida internacionalmente, resultado da sua crescente capacitação ao longo da sua história e do
seu relativo sucesso em se consagrar como uma entidade tecnicamente sólida e independente.
Além das suas responsabilidades na realização do Censo Populacional e de gestão do sistema
estatístico nacional, o INE tem sido responsável pela realização dos instrumentos de medição do
Impacto da Pobreza – o Inquérito do Orçamento Familiar (IOF) – que é o principal instrumento
usado para aferir a eficácia das políticas de combate à pobreza. A experiência de realização do
IOF implicou, às vezes, relações tensas com o Governo na aceitação dos resultados do mesmo,
uma vez que historicamente a redução da pobreza, desde que vem sendo contabilizada por
via de pesquisas aos agregados familiares no final dos anos 1990, foi abaixo do esperado na
retórica governamental. No entanto, a persistência da busca de autonomia técnica por parte do
INE, combinada também com a pressão de parceiros para que os dados sobre a pobreza sejam
fiáveis, fez com que a pressão política sobre o Instituto abrandasse e os resultados dos seus
estudos, mesmo quando envolvessem uma certa polémica, fossem aceites. A experiência com
o IOF é parte de como o INE historicamente construiu a sua credibilidade como uma entidade
gestora do sistema estatístico nacional. A isso alia-se o facto de ter uma liderança mais aberta
ao diálogo com a sociedade civil e outros parceiros. Foi instrumental para a sua abertura o incluir
OPDs na preparação dos próximos censos e o capacitar os seus quadros em metodologias,
visando a recolha de dados da área de deficiência. Deste modo, o INE está entre as instituições

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 85


mais motivadas e com fortes incentivos – o de se consolidar como uma entidade credível na área
de estatísticas nacionais – para a implementação da agenda da deficiência.

Relativamente ao MINEDH e ao IFPELAC, a agenda da deficiência está colocada num nível alto
do sector. No caso do MINEDH, a Estratégia de Educação Inclusiva e Desenvolvimento da Crian-
ça com Deficiência aumenta os incentivos para a sua implementação. Quanto ao IFPELAC, a sua
autonomia e o compromisso da liderança com a área permitiram-lhe avançar na introdução da
formação inclusiva antes desta onda de interesse que actualmente se verifica. O projecto com
a cooperação italiana vem consolidar a área da deficiência no sector. No entanto, é importante
repisar que nos dois sectores haverá o desafio de criação e retenção de capacidades, num
contexto em que a mobilidade dos funcionários públicos, dentre outros elementos, nem sempre
segue a lógica da eficiência. Deste modo, será importante encontrar mecanismos de criação e
consolidação da capacidade para o atendimento das necessidades do sector na implementação
das acções da agenda da deficiência.

Fora do Governo, mas ainda dentro do Estado, há que destacar dois actores estatais: a Assem-
bleia da República (AR) e a CNDH.

Na AR, o assunto da deficiência tornou-se proeminente devido a Younusse Amad, segundo vi-
ce-presidente pela parte da Renamo, que, por ser uma pessoa com deficiência, obrigou à intro-
dução de melhorias de acessibilidade no edifício deste órgão de soberania. A existência desta
figura proeminente na AR, que se autodefine como activista nesta área, contribuiu para que esta
instituição prestasse mais atenção a esta área. Numa fase inicial, isso implicou a adaptação física
das instalações da Assembleia que, ironicamente, apesar de por inerência de funções - ser o
órgão responsável pela ratificação das Convenções internacionais e, por conseguinte, ter ratifi-
cado a CNUDPD em 2010, e de ser a chamada “Casa do Povo”-, não prestava atenção sequer
a questões de acessibilidade física. Num segundo momento, o deputado Younusse foi instru-
mental na retirada da proposta de lei sobre a Promoção e Protecção dos Direitos da Pessoa com
Deficiência, que estava em vias de ser aprovada sem consulta à sociedade civil. Estas acções
talvez tenham criado uma maior consciência sobre o assunto na Assembleia, que poderá ser
importante para a projectada aprovação da legislação que já está a ser revista com a participa-
ção da sociedade civil. Mesmo assim, não está garantido que a AR se torne num campeão da
defesa dos direitos das PcD caso o deputado Younusse não seja reeleito nas próximas eleições
gerais de 2019. Mais ainda: a sua influência nesta área não deve ser tirada do contexto da pola-
rização política entre e a Renamo e a Frelimo e a deficiente cultura democrática do país. Assim,
em certos círculos, o activismo de defesa dos direitos das PcD, devido à actuação do deputado
Younusse, é conotado como “coisas da Renamo” ou “coisas da oposição”, o que contribui para
retrair a receptividade desta agenda no Estado, principalmente naquelas instituições dirigidas
por pessoas mais alinhadas com o partido no poder.

Quanto à CNDH, conforme se mencionou, desde o início do seu funcionamento priorizou a agen-
da da deficiência, que faz parte do seu plano estratégico em elaboração, que inclui a mudança

86 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


da cultura jurídica com implicações na forma como se legisla nesta área, a revisão da legislação
e a protecção dos direitos das pessoas com deficiência.37 Sendo uma organização que está na
sua fase embrionária e com motivação para se consolidar como uma instituição de defesa de
direitos humanos, o nível de motivação para a implementação da agenda de empoderamento
das pessoas com deficiência é muito alto.

Finalmente, no que concerne à sociedade civil e, particularmente, ao activismo ligado à defesa


das PcD, existe um incentivo alto para a implementação desta agenda, porque ela reflecte o ob-
jecto do seu activismo. No entanto, as dinâmicas referentes ao acesso a recursos até aqui exis-
tentes são potencial foco de tensão entre as organizações que são beneficiadas, principalmente
as internacionais e as poucas nacionais com capacidade. Deste modo, será importante encon-
trar formas de intervenção que não exacerbem essas tensões e contribuam para fragmentar o
activismo nesta área, já em si frágil. O outro elemento tem a ver com a natureza de representação
que as OPDs exercem nas suas relações com o Estado, que tem primariamente beneficiado os
seus membros directos e só depois as demais pessoas com deficiência e de forma residual,
sem contar que, provavelmente, as preocupações dos que não estão organizados não são leva-
das às esferas decisoras, conforme expressas pelos mesmos. É importante distinguir-se entre a
motivação do engajamento em representação do interesse próprio e de interesses mais amplos
e difusos do grupo de pessoas com deficiência. Ademais, uma representação meramente so-
ciológica – de pessoas com as mesmas características dos representados – nem sempre será
garantia de eficácia, se não houver poder de decisão ou de influenciar decisões, competência
técnica e responsabilização para a realização das acções que devem responder às demandas
do grupo representado.

37
A equipa não teve acesso ao documento em si, que ainda está em elaboração. Esta informação foi dada na entrevista com o Presidente da CNDH.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 87


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6. IMPLICAÇÕES
PARA A ACÇÃO: QUESTÕES
CRÍTICAS E PONTOS DE ENTRADA

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 89


6. IMPLICAÇÕES PARA A ACÇÃO: QUESTÕES CRÍTICAS E
PONTOS DE ENTRADA

Já foi referido anteriormente que os compromissos do País apresentados em Londres espelham


grande parte dos aspectos críticos levantados neste estudo. Isso não é por acaso: deve-se
ao facto de serem questões persistentes, algumas estruturais e também porque o estudo foi
realizado no mesmo período em que se preparou a participação do país na Cimeira Global da
Deficiência. Deste modo, e também tendo em conta a natureza e o valor acrescentado de um
estudo desta natureza, que é, essencialmente, de aspectos estruturais, as recomendações
serão feitas também ao nível dos aspectos estruturantes desta dinâmica. Esses aspectos são
os seguintes: os valores e ideologias, as instituições, os actores e seus incentivos e os recursos.

6.1. VALORES E IDEOLOGIAS

Questão: Predominância de valores políticos sociais e crenças que estigmatizam, discriminam,


excluem e reduzem o espaço de participação política das PcD. Esses valores estão reflectidos
na cultura jurídica, na cultura social de discriminação das PcD, na rotulação do civismo como
manifestação da oposição, num contexto em que a divergência é vista de forma negativa.

Pontos de Entrada: Melhoria do conhecimento da deficiência na sua multidimensionalidade


e sua tradução em legislação, práticas e comportamentos sociais, instrumentos de política e
melhor defesa das pessoas com deficiência.

- Capacitação das OPDs e organizações que defendem as PcD para uma acção e activismo
mais efectivos na defesa dos direitos. Esta acção depende ou está relacionada com potenciais
intervenções para maior eficácia, nomeadamente:

• Identificação das OPDs que actuam nos diferentes tipos de deficiência e suas capacida-
des, como base para a definição de acções visando a sua capacitação;
• Apoio à inserção da questão da deficiência nos currículos de todos os níveis de ensino e
sobre direitos das PcD nos cursos de Direito;
• Apoio ao activismo na mudança da cultura social e jurídica relacionada com a deficiência;
• Melhoria na produção estatística sobre a deficiência;
• Melhoria na produção de informação desagregada, tendo em conta a deficiência em
áreas-chave como orçamento público, acesso à justiça e prestação de serviços;
• Apoio na fiscalização das instituições públicas e privadas no cumprimento da legislação
que garante os direitos das pessoas com deficiência – apoio à AR, ao Provedor da Justiça
e à Inspecção Administrativa do Estado na fiscalização da Administração Pública;
• Apoio às instituições de Justiça e de defesa dos direitos das PcD – CNDH, OAM, IPAJ.

90 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


6.2. INSTITUIÇÕES

Questão: Diferentes instituições que criam um hiato entre a aprovação e implementação de po-
líticas, devido aos diferentes incentivos que existem nesses dois estágios. Dentre os problemas
de implementação que disso decorrem estão o fraco poder devido à posição funcional dentro
do quadro orgânico das instituições (a área de deficiência do MGCAS, dificuldade na criação e
retenção de capacidade (Educação Inclusiva), coordenação e a responsabilização dos actores
na implementação de políticas (MGCAS e agora CNAS). A fraca capacidade também é enten-
dida como resultado da falta de representação do interesse dos beneficiários nas instituições
de implementação das políticas (em todos os sectores).

Ponto de Entrada: Contribuição no processo de capacitação dos mecanismos de coordenação


intersectorial e implementação sectorial das políticas voltadas para as PcD, como o CNAS e os
de âmbito sectorial, como no MINEDH (Grupo Intersectorial de Educação Inclusiva).

• Capacitação do CNAS e da Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência para
maior efectividade na coordenação de políticas. Isso passa também por uma adequada
representação das perpectivas das PcDs nas instâncias de decisão, implementação e res-
ponsabilização de políticas, de forma a garantir maior coerência entre ambos os estágios.
A representação não significa necessariamente pessoas com deficiência, mas pessoas
qualificadas tecnicamente e cuja função está alinhada com as decisões dos corpos deci-
sórios e de monitoria onde existe representação das PcD.
• Posição da área da deficiência do MGCAS no estatuto orgânico do MGCAS para maior
apoio técnico na coordenação e articulação com os sectores. Por exemplo, na forma de
um Departamento autónomo directamente subordinado a(o) Ministra(o), ou uma Direcção
Nacional, ou a indicação de um director nacional adjunto (na actual direcção nacional onde
se enquadra) que olhe pela área.
• Institucionalização das profissões que lidam com as políticas da deficiência no sistema
de carreiras e remuneração da função pública/ sector público em sectores-chave para a
implementação de políticas, para limitar os efeitos negativos da mobilidade.

6.3. ACTORES E INCENTIVOS

Questão: Actores enfrentam diferentes incentivos que podem favorecer ou bloquear as mudan-
ças positivas na área.

Ponto de Entrada: Fazer alianças estratégicas e potenciar actores com alto incentivo para pro-
mover a agenda da deficiência.

- Apoiar campeões na implementação de políticas do sector, ou com alta motivação para o


efeito, como base para a criação de alianças para a promoção dos direitos das PCD:

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 91


• Revisão das abordagens de protecção social
• CNDH
• IFPELAC
• MINEDH
• MJD (Desporto paralímpico)

6.4. RECURSOS

Questão: O financiamento segue padrões que limitam o acesso das OPDs nacionais a recursos,
privilegiando organizações internacionais e mecanismos amplos, como a protecção social, com
efeito limitado no empoderamento das PcD e, potencialmente, contribuem para criar subordina-
ção e tensões entre os diferentes actores. Também não existe um conhecimento adequado do
volume de recursos alocado às áreas de deficiência no sector público. Quando existe, tende
a olhar para a componente caritativa/assistencialista, que tem marcado as políticas estatais do
sector, que é excludente e potencialmente conflituosa.

Ponto de entrada 1: Mecanismos de financiamento a serem projectados pelos parceiros de


cooperação em função do aumento da importância da agenda da deficiência.

• Desenvolvimento de mecanismos de financiamento para as OPDs e organizações que tra-


balham com PcD, que incluem a capacitação das entidades nacionais, buscando sinergias
entre as organizações internacionais, as nacionais mais consolidadas e as de menor ca-
pacidade. Estes mecanismos devem prestar atenção aos padrões de financiamento exis-
tentes nos diferentes tipos de deficiência, de forma a evitar os desequilíbrios actualmente
existentes, que levam a negligenciar certas áreas (por exemplo, deficiência intelectual).
• Criação de mecanismos de coordenação entre os actores que financiam as intervenções
no sector, que incluem a monitoria e avaliação dos resultados dos programas e projectos
apoiados, tanto os direccionados exclusivamente à área da deficiência, como aqueles que
estão inseridos nos programas sectoriais.

Ponto de entrada 2: Potenciar os actuais processos do orçamento de forma a serem mais sen-
síveis às questões da deficiência.

• Melhoria da capacidade de as OPDs contribuírem melhor em plataformas relevantes como


Protecção Social e de Monitoria do Orçamento, introduzindo questões da deficiência;
• Advocacia por uma melhoria da informação orçamental sobre a área da deficiência no
Orçamento do Estado, assim como nos relatórios da sua execução.

92 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


7. REFERÊNCIAS
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E DOCUMENTAIS

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 93


7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E DOCUMENTAIS

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96 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


8. ANEXOS

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 97


8. ANEXOS
8.1. MARCOS E EVENTOS DA HISTÓRIA DO SECTOR DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE

Data Marco/Evento
1975 A área da deficiência está integrada na Área de Acção Social no Ministério da Saúde
1976 É criado o Centro de Reabilitação Física de Nangade (Cabo Delgado), para apoiar as
pessoas com deficiência da guerra de libertação nacional, na reabilitação e capacita-
ção para a sua reinserção social
1989 É criada a Associação dos Deficientes de Moçambique (ADEMO)
1990 É aprovada a Constituição da República de Moçambique que integra direitos fundamen-
tais e cívicos, reservando uma consideração especial para as pessoas com deficiência
1991 É aprovada a Lei das Associações (Lei 8/91, de 19 de Julho)
1992 É aprovada a Lei do Sistema Nacional de Educação (Lei n.º 6/92, de 6 de Maio), que
enuncia o direito das crianças com deficiência à educação e prevê turmas especiais
nas escolas regulares
1994 São realizadas as primeiras eleições multipartidárias do país
1995 É criado o Ministério da Mulher e Acção Social
1998 É introduzida, de forma piloto, a Educação Inclusiva
1998 É aprovada a Política da Acção Social (Resolução 12/98 de Abril)
1998 Começa o trabalho visando a constituição do que viria a ser o FAMOD, envolvendo
as seguintes organizações: ADEMO, ADESU, AMOFAS, ADEMIMO, ACAMO.
1999 Conselho de Ministros de Moçambique aprovou a Política da Pessoa Portadora de
Deficiência e da sua implementação (Resolução 20/99)
1999 União Africana adoptou, na 35ª Sessão da Assembleia dos Chefes de Estado e de
Governo, a Década Africana dedicada às Pessoas com Deficiência (1999–2009) –
Moçambique é Estado-Parte desta deliberação
2000 É realizada a Assembleia Constituinte do Fórum das Associações Moçambicanas dos
Deficientes (FAMOD)
2004 É aprovada a terceira Constituição da República de Moçambique na qual os direitos
das pessoas com deficiência são reafirmados
2004 É aprovado o plano de assistência às vítimas de minas pelo Governo de Moçambique
2005/6 Elaborado e aprovado o primeiro Plano Nacional para a Área da Deficiência (PNAD
2006-2010)
2007 É adoptada a Lei de Protecção Social (Lei n.º 4/2007 de Fevereiro)

98 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


Data Marco/Evento
2007 Assinatura da Convenção das Nações Unidades para os Direitos das Pessoas com
Deficiência
2007 É aprovada a Lei do Trabalho (Lei n.º 23/2007, de 21 de Agosto), contendo disposi-
ções relativas ao emprego de pessoas com deficiência
2008 É aprovado o Regulamento de Construção e Manutenção dos Dispositivos Técni-
cos de Acessibilidade, Circulação e Utilização dos Sistemas de Serviços e Lugares
Públicos a Pessoa com Deficiência Física ou de Mobilidade Condicionada (Decreto
53/2008 de 30 de Dezembro)
2009 É aprovado o Regulamento do Transporte Automóvel (Decreto n.º 11/2009, de 29 de
Maio), que estabelece a isenção e redução das taxas nas áreas urbanas e interurba-
nas e os transportes públicos para pessoas com deficiência
2009 O Governo adopta a Estratégia da Pessoa com Deficiência na Função Pública
(2009 – 2013)
2010 Ratificação da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência
Estratégia Nacional de Segurança Social Básica 2010-2014.
2011 O Conselho de Ministros estabelece os Programas de Segurança Social Básica (De-
creto n.º 52/2011 de 12 de Outubro)
2012 É aprovado o Plano Nacional de Acção da Área da Deficiência – PNAD II 2012-2019.
2015 É criado o Conselho Nacional da Acção Social. A deficiência passa a ser abordada
num comité.
2015 AISC, UEM, MGCAS e FAMOD organizam o seminário sobre a Implementação da
Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência.
2016 É aprovada a Estratégia Nacional de Segurança Social Básica (ENSSB) 2016-2024
2017 É aprovada a Proposta de Lei de Promoção e Protecção dos Direitos da Pessoa com
Deficiência pelo Conselho de Ministros
2017 Sociedade Civil, sob liderança do FAMOD estabelece um grupo de trabalho para a
revisão da Proposta de Lei de Promoção e Protecção dos Direitos da Pessoa com
Deficiência
2018 Cimeira Global da Deficiência em Londres (Julho de 2018). O Governo Moçambicano
apresenta um conjunto de compromissos a implementar a partir de 2018 na área da
Deficiência.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 99


8.2. LISTA DE ORGANIZAÇÕES DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA DO FAMOD

Filiação no
Designação Objecto FAMOD38 Legalização39

1 AMUSAM - Associação Advocacia -Direitos de Filiada Concluída


Moçambicana de Usuários de pessoas com deficiên-
Saúde Mental cia psicossocial

2 ACAMO -Associação de Advocar, promover e Filiada Concluída


Cegos e Amblíopes de proteger direitos e li-
Moçambique berdades fundamentais
adstritos a pessoa com
deficiência visual

3 ADEMO -Associação de Proteger e promover os Filiada Concluída


Deficientes de Moçambique direitos da PcD

4 ADPCDM – Associação de Inclusão e promoção Filiada Concluída


Desporto para Pessoas com dos Direitos das PcD
Deficiência da Cidade de através do Desporto
Maputo

5 AMDV - Associação Moçam- Protecção e promoção Filiada Concluída


bicana de Deficientes Visuais dos direitos das PcD

6 AMOFAS - Associação dos Proteger e promover os Filiada Concluída


Familiares e Amigos dos direitos das pessoas
Surdos de Moçambique. com dificiência auditiva

7 AJODEMO - Associação de Promover e defender os Filiada Concluída


Jovens Deficientes de direitos mais elementares
Moçambique universalmente progra-
mados em defesa dos
jovens com deficiência

8 ATMAR - Associação União Unir as PcD para um Filiada Concluída


dos Irmãos em Paz futuro melhor

9 GAMA - Gabinete de Inspiração e conscien-


Aconselhamento a Mulher, cialização das pessoas
Jovem e Pais de Criança com sobre a importância do
Deficiência auxílo às PcD, promo-
vendo a igualdade de
oportunidade e defesa
dos seus direitos

100 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


Filiação no
Designação Objecto FAMOD38 Legalização39

10 ACRIDEME - Associação de Protecção dos Direitos Filiada Concluída


Pais e Amigos da Criança das PcD
com Deficiência Mental

11 RAVIM - Rede de Apoio a Melhoria da qualidade Filiada Concluída


Vitimas de Minas de de vida das Pessaos
Moçambique com Deficiência e em
especial sobreviventes
de minas e de guerras

12 APEDEM - Associação de Melhoria da vida dos Filiada Não


Pensionistas Deficientes de pensionistas e seus concluída
Moçambique dependentes

13 ADESU - Associação Estu- - Não filiada -


dantes Deficientes no Ensino
Superior

14 N’LHUVUKU – companhia de Sensibilização dos Filiada Não


teatro jovens com deficiência concluída
a participar na área
cultural

15 CPM – Comité Paralímpico de Inclusão de PcD no Filiada Concluída


Moçambique desporto. Preparação
de atletas com defi-
ciência para participa-
rem em competições
regionais e internacio-
nais.

16 ASUMO - Associação de Promoção da Língua Filiada Concluída


Surdos de Moçambique de Sinais e Protecção
da Integração dos Sur-
dos na Sociedade, de
Igual Forma, nas Leis e
nas Políticas

38
Não filiada – organizações que não estão nem formal nem informalmente filiadas ao FAMOD; Por formalizar – organizações que aguar-
dam apenas a Assembleia Geral para formalizar a sua filiação; Filiada – organizações com filiação formalizada.
39
Não iniciada – organização que ainda não deu entrada ao processo de legalização; Não concluída – organizações que estão no processo
de legalização; Concluída – organizações cujos estatutos já foram publicados no BR e têm registo definitivo.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 101


Filiação no
Designação Objecto FAMOD38 Legalização39

17 CINFORTÉCNICA - Asso- Difusão e defesa dos Filiada Concluída


ciação dos Jovens Técnicos direitos dos jovens
com Deficiência de Moçam- técnicos com deficiên-
bique cia de Moçambique

18 AMMD - Associação Moçam- Empoderamento das Filiada Não


bicana de Mulheres Deficien- Mulheres Moçambica- concluída
tes nas com Deficiência

19 Associação Amor à Vida Protecção de Pessoas Filiada Concluída


com Albinismo

20 AMA - Associação Moçambi- Consciencialização da Não filiada Concluída


cana de Autismo sociedade e do go-
verno com relação à
síndrome de autismo
e seu diagnóstico

21 CERCI – Maputo Educação, reabilita- Filiada Concluída


Centro de Educação e Rea- ção e inclusão edu-
bilitação de Cidadão Inadap- cacional de cidadãos
tados inadaptados

22 ADEMIMO - Associação de Sensibilização e inte- Filiada Concluída


Deficientes Militares e Para- gração os deficientes
militares de Moçambique militares na sociedade

23 Albimoz - Associação de Protecção e promoc- Filiada Concluída


Apoio a Albinos de Moçam- ção das Pessoas com
bique Albinismo

24 AMAMUS - Associação Promoção dos direitos Filiada Não


Moçambicana de Mulheres das mulheres, crian- concluída
Surdas ças, adolescentes
e jovens surdos e
contribuir através de
acções de empode-
ramento, lobbys e
advocacia para me-
lhoramento de suas
condições de vida

102 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


Filiação no
Designação Objecto FAMOD38 Legalização39

25 AAIPD – Associação Aeroclu- Promoção dos Direitos Filiada Concluída


be de Inclusão de Pessoas das PcD
com Deficiência

26 Associação TV SURDO Promoção da co- Filiada Concluída


munidade de PcD,
fornecendo-lhes infor-
mação de qualidade
para acelerar a sua
incersão na socieda-
de e melhorar a sua
participação social

27 AJOSMO - Associação de Jo- Trabalho em favor dos Filiada Concluída


vens Surdos de Moçambique jovens com deficiên-
cia, em prol de opor-
tunidades de trabalho
e um futuro promissor

28 AMAED -Associação Moçam- Apoio aos Estudantes Por Não


bicana de Apoio aos Estu- com Deficiência formalizar Concluída
dantes com Deficiência

29 APODEMOS - Associação de Promoção e defesa Filiada Concluída


Combate à Pobreza e Ajuda a dos Direitos das Pes-
Pessoas com Deficiência soas com Deficiência,
sua participação políti-
ca e desenvolvimento
económico inclusivo
em Moçambique

30 COLUAS - Cooperativa Lua- Apoio a crianças com Filiada Concluída


na Semeia Sorrisos deficiência e aos seus
pais

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 103


1.1. COMPROMISSOS DO GOVERNO DE MOÇAMBIQUE NA CIMEIRA GLOBAL DA
DEFICIÊNCIA 2018

REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE

COMPROMISSOS DE MOÇAMBIQUE NA CIMEIRA SOBRE A DEFICIÊNCIA


Moçambique assume os compromissos alinhados na Convenção Internacional Sobre as Pes-
soas com Deficiência, Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, Plano da Década Africana
das Pessoas com Deficiência a partir da Constituição da República que estabelece a igualdade
de Direitos para todos os cidadãos sem qualquer tipo de discriminação.

Para além disso, o País aprovou e implementa um conjunto de dispositivos legais que promo-
vem e defendem os direitos das pessoas com deficiência, nomeadamente políticas, estraté-
gias, planos e programas.

O acesso aos serviços básicos em Moçambique é um direito consagrado na Constituição da


República de Moçambique para todas as pessoas, independentemente da sua condição, sexo,
género e idade. O Estado promove o acesso universal e equitativo para todas as pessoas e em
todos os níveis.

Os compromissos a serem assumidos na Cimeira Mundial sobre Deficiência a ser realizada em


Londres, no dia 24 de Julho de 2018, irão responder aos desafios actuais que existem no país
para o pleno exercício dos direitos humanos pelas Pessoas com Deficiência.

Os onze compromissos que abaixo são apresentados, serão operacionalizados num Programa
de Acção, onde se delineiam medidas destinadas a promover a integração social em áreas que
envolvem actuação do Governos, em prol da não-discriminação, da igualdade e da justiça social.

A. COMBATER O ESTIGMA E A DISCRIMINAÇÃO

A.1. Até 2020, O Estado Moçambicano deve assegurar a aprovação e plena disseminação da
Lei de Promoção e Protecção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, e sua regulamenta-
ção, incluindo a definição do mecanismo de assistência legal e jurídica gratuita;

Impacto antecipado:

a. Pessoas com deficiência gozando plenamente dos seus direitos e com acesso
facilitado aos serviços de protecção

Actividades:

104 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


a.Análise e finalização da proposta de Lei;
b. Submissão da proposta de Lei à Assembleia da República;
c. Após a sua aprovação, concepção do Regulamento e criação de condições para a
sua implementação;
d. Divulgação massiva dos instrumentos aprovados em formatos adequados e inclusivos.

A.2. A partir de 2020, os Planos Económicos e Sociais devem garantir a mobilização e alo-
cação sectorial de recursos financeiros na ordem de, pelo menos, 5% para responder às ne-
cessidades específicas das pessoas com deficiência em cada um dos sectores dos serviços
públicos como educação, saúde, transporte, acção social e tecnologias.

Impacto antecipado:

• Satisfação das necessidades básicas das pessoas com deficiência no país.

Actividades:

a. Definição de intervenções, indicadores-chave e linhas orçamentais para cada sector


que visam satisfazer a inclusão das pessoas com deficiência nas políticas e programas
de cada sector;
b. Cumprimento e monitoria participativa dos planos económicos e sociais dos sectores.

B. EDUCAÇÃO E INCLUSÃO

B.1. Até 2020, o Governo garante a criação de condições operacionais de implementação


efectiva (incluindo orçamentação, divulgação, monitoria e avaliação) da Estratégia de Educa-
ção Inclusiva e Desenvolvimento da Criança com Deficiência.

Impacto antecipado:

• Por uma verdadeira escola inclusiva, onde crianças e jovens com deficiência têm apoio
humano e material de que necessitam e têm prioridade no ingresso à escola.

Actividades:

a. Aquisição de meios de compensação;


b. Implementação de um novo currículo inclusivo para a formação de professores;
c. Testagem do currículo inclusivo para a formação de professores.

C. EMPODERAMENTO ECONÓMICO

C.1. Realizar um estudo de viabilidade da criação e operacionalização de um Fundo para


financiamento de iniciativas da agenda da inclusão da deficiência, através das contribuições
do sector privado.

Impacto antecipado:

• Iniciativas da Sociedade Civil da agenda da deficiência implementadas de forma coorde-


nada e financiadas através do fundo, gerando impactos sobre as pessoas com deficiência.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 105


Actividade:

• Análise da situação da população com deficiência;


• Sistematização de experiências internacionais similares;
• Definição de áreas prioritárias de intervenção;
• Definição da estrutura de funcionamento e fontes de financiamento do Fundo;
• Desenvolvimento de um quadro de cooperação-orientação para a implementação das acções;
• Realização de actividades de sensibilização, consciencialização, lobby e advocacia para
actividades que beneficiam pessoas com deficiência.

C.2. Até finais de 2019, o Governo compromete-se a estruturar e orçamentar o Programa de


Serviços de Acção Social, potenciando metodologias e iniciativas existentes com o objectivo
de garantir a existência de serviços básicos próximos da comunidade e adequados às neces-
sidades das pessoas com deficiência.

Impacto antecipado:

Disponíveis serviços de atendimento, orientação e encaminhamento das pessoas com deficiên-


cia, mais próximo das comunidades, incluindo iniciativas de atendimento domiciliário.

Actividades:

Conceber e implementar o Programa Serviços de Acção Social.

C.3. Até 2020, o Governo garante a revisão de políticas e estratégias (definir uma quota e
mecanismos de monitoria) para o acesso ao emprego pelas pessoas com deficiência.

Impacto antecipado:

• Aumento do número de Pessoas com Deficiência com emprego seguro, em consonância


com as suas capacidades;
• Pessoas com Deficiência desenvolvendo actividades de auto emprego e projectos de ge-
ração de rendimento.

C.4. Até finais de 2019, definir manuais operacionais para implementação dos Programas de
Segurança Social Básica à luz da Estratégia Nacional de Segurança Social Básica 2016-2024
e melhorar os sistemas e mecanismos de acesso aos programas para assegurar a transpa-
rência e o nível do conhecimento dos beneficiários.

Impacto antecipado:

• Pessoas com deficiência beneficiando dos Programas de Segurança Social Básica.

Actividades:

• Rever os mecanismos de identificação e enquadramento das pessoas elegíveis;


• Expansão das acções de advocacia e capacitação de diferentes actores sobre protecção

106 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


social;
• Elaboração dos manuais procedimentos.

D. TECNOLOGIA E INOVAÇÃO

D.1 Até 2020, deve ser melhorado o quadro legislativo sobre as tecnologias inclusivas através
das seguintes medidas:

a) Ratificação do Tratado de Marraquexe para facilitar o acesso a obras publicadas, às pessoas


cegas, com deficiência visual ou com outras dificuldades para aceder ao texto impresso;
b) Revisão pontual do Decreto nº 5/2016 de 8 de Março que aprova o Regulamento de Contrata-
ção de Empreitada de Obras Públicas, Fornecimento de Bens e Prestação de Serviços ao Estado,
para que se garanta a aquisição pelo Governo de equipamentos de tecnologia inclusivos para as
pessoas com deficiência, de acordo com a classificação internacional ISO de ajudas técnicas;
C) Incrementar o sistema de incentivos fiscais e de isenção de taxas aduaneiras na aquisição
de equipamento tecnológicos inclusivos.

Impacto antecipado:

• Disponibilidade de legislação inclusiva no âmbito da tecnologia e comunicação

Actividade:

• Sessões de trabalho multissectorial

D2. A partir de 2019, o Governo compromete-se a promover iniciativas de inclusão de pes-


soas com deficiência no acesso às tecnologias e inovações através de literacia sobre as
Tecnologias de Informação e Comunicação inclusivas, assegurando a divulgação e utilização
do Fundo do Serviço de Acesso Universal, criado através do Decreto n.º 69/2006 de 26 de
Dezembro.

Impacto antecipado:

• Pessoas com deficiência com acesso às tecnologias e conhecimentos da existência do


Decreto n.º 69/2006 de 26 de Dezembro) sobre o Fundo do Serviço de Acesso Universal

Actividade:

• Sensibilização para o uso das novas tecnologias e desenvolvimento de iniciativas inova-


doras;
• Aquisição de equipamento adequado para as pessoas com deficiência.

E. DESAGREGAÇÃO DE DADOS

E.1. Até 2020, o Governo compromete-se a adoptar o instrumento da avaliação da deficiência


do ‘’Washington Group” e assegurar a realização de uma pesquisa orientada da situação da
deficiência em Moçambique.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 107


Impacto antecipado:

• Disponíveis dados estatísticos fiáveis de pessoas com deficiência em Moçambique;


• INE com capacidade adquirida para usar um instrumento e integrar em outras pesquisas.

Actividades:

a. Sessões de trabalho e capacitação multissectorial com o objectivo de se apropriar


do instrumento;
b. Mapeamento de pesquisas existentes com potencial inclusão. Realização de uma
pesquisa sobre as pessoas com deficiência em Moçambique.

F. MULHERES E RAPARIGAS COM DEFICIÊNCIA


F.1. A partir de 2019 assegurar a inclusão de mulheres e raparigas com deficiência em todos
os programas destinados ao empoderamento das pessoas com deficiência, incluindo de pro-
tecção social e de saúde sexual e reprodutiva.

Impacto antecipado:

Mulheres e raparigas com deficiência beneficiando de mais oportunidades de empoderamento


e em programas de protecção social e de saúde sexual e reprodutiva, aumentando a sua parti-
cipação, envolvimento e inclusão.

Maputo, Julho de 2018

8.4. CLASSIFICAÇÃO INTERNACIONAL DE FUNCIONALIDADE, INCAPACIDADE


E SAÚDE

Quadro 1.1. Nova ênfase em fatores ambientais

A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde(CIF) (17)fez avan-


çar a compreensão e a mensuração da deficiência. Ela foi desenvolvida através de um lon-
go processo envolvendo acadêmicos, médicos clínicos, e o mais importante, pessoas com
deficiência (18). A CIF enfatiza os fatores ambientais para a criação de deficiências, o que
é a principal diferença entre essa nova classificação e a Classificação Internacional de Defi-
ciências, Incapacidades e Desvantagens (ICIDH) anterior. Na CIF, os problemas de funcio-
nalidade humana são categorizados em três áreas interconectadas:

• alterações das estruturas e funções corporais significa problemas de funções corpo-


rais ou alterações de estruturas do corpo, corno por exemplo, paralisia ou cegueira;
• limitações são dificuldades para executar certas atividades, por exemplo, caminhar ou co-
mer;
• restrições à participação em certas atividades são problemas que envolvem qualquer
aspecto da vida, por exemplo, enfrentar discriminação no emprego ou nos transportes.
A deficiência refere-se às dificuldades encontradas em alguma ou todas as três áreas da
funcionalidade. A CIF também pode ser usada para compreendermos e mensurarmos os
aspectos positivos da funcionalidade tais como funções corporais, atividades, participação

108 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


e facilitação AmbientaI. A CIF adota uma linguagem neutra e não distingue entre o tipo e a
causa da deficiência, por exemplo, entre saúde “física” e “mental”. Os “problemas de saúde”
são as doenças, lesões, e complicações, enquanto que as “diminuições de capacidade” são
diminuições espedficas das funções e estruturas corporais, geralmente identificadas como
sintomas ou sinais de problemas de saúde.

A deficiência surge da interação entre problemas de saúde e fatores contextuais - fatores


ambientais e pessoais conforme mostra a figura abaixo.

Representação da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e


Saúde

Condição de saúde
(distúrbio ou doença)

Funções e
estruturas corporais Actividades Participação

Factores Factores
ambientais pessoais

A CIF contém unia classificação de fatores ambientais que descreve o mundo no qual pes-
soas com diferentes níveis de funcionalidade devem viver e agir. Esses fatores podem ser
facilitadores ou grandes barreiras. Os fatores ambientais incluem: produtos e tecnologias, o
ambiente natural e o construído, suporte e relacionamentos, atitudes, e serviços, sistemas, e
políticas públicas.

A CIF também reconhece fatores pessoais, tais como motivação e auto-estima, que podem
influenciar o quanto uma pessoa participa da vida em sociedade. Porém, esses fatores ainda
não foram conceitualizados ou classificados. Ela também distingue entre as capacidades de
uma pessoa de desempenhar ações e o desempenho efetivo daquelas ações na vida real,
uma diferença sutil que ajuda a esclarecer o efeito do meio ambiente e como o desempenho
poderia ser melhorado coma modificação do ambiente.

A CIF é universal porque cobre toda a funcionalidade humana e trata a deficiência como um
contínuo. ao invés de categorizar as pessoas com deficiência como um grupo separado: a
deficiência é uma questão de mais ou menos, e não de sim ou não. Porém, a elaboração de
políticas públicas e a entrega de serviços pode requerer que sejam estabelecidos limites
para a gravidade da incapacidade, limitações para realizar ou restrição à participação em
certas atividades.

Ela é útil para uma ampla variedade de finalidades - pesquisa, fiscalização e informação -
relacionadas à descrição e mensuração da saúde e da deficiência, incluindo avaliar a funcio-
nalidade individual, estabelecimento. de metas, tratamento, e monitoração; mensuração dos
resultados finais e avaliação de serviços; determinar a elegibilidade para receber benefícios
da previdência social; e desenvolver pesquisas sobre saúde e deficiência.

Fonte: OMS, 2012, p. 5.

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 109


8.5. PEQUENO CONJUNTO DE QUESTÕES DO GRUPO DE WASHINGTON

The Washington Group Short Set of Questions on Disability

As próximas questões interrogam-se sobre as dificuldades que você pode ter ao desempenhar
certas actividades, por causa de um PROBLEMA DE SAÚDE.
1. Tem dificuldade em ver, mesmo com óculos?
a. Não – nenhuma dificuldade
b. Sim – alguma dificuldade
c. Sim – muita dificuldade
d. Não consigo de nenhuma forma
2. Tem dificuldade em ouvir, mesmo usando um auxiliar auditivo?
a. Não – nenhuma dificuldade
b. Sim – alguma dificuldade
c. Sim – muita dificuldade
d. Não consigo de nenhuma forma
3. Tem dificuldade em andar ou subir escadas?
a. Não – nenhuma dificuldade
b. Sim – alguma dificuldade
c. Sim – muita dificuldade
d. Não consigo de nenhuma forma
4. Tem dificuldade em lembrar coisas ou em se concentrar?
a. Não – nenhuma dificuldade
b. Sim – alguma dificuldade
c. Sim – muita dificuldade
d. Não consigo de nenhuma forma
5. Tem dificuldade (com os seus próprios cuidados como) em se lavar todo ou se vestir?
a. Não – nenhuma dificuldade
b. Sim – alguma dificuldade
c. Sim – muita dificuldade
d. Não consigo de nenhuma forma
6. Usando a sua língua habitual, tem dificuldade em se comunicar, por exemplo, em compreender
e ser compreendido(a)?
a. Não – nenhuma dificuldade
b. Sim – alguma dificuldade
c. Sim – muita dificuldade
d. Não consigo de nenhuma forma

40
Traducão do texto original em inglês retirado de: http://www.washingtongroup-disability.com/wp-content/uploads/2016/01/The-Washington-Group-
-Short-Set-of-Questions-on-Disability.pdf (acedido no dia 22 de Julho de 2018).

110 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


1.1. PESSOAS ENTREVISTADAS

Nome Função e Organização Data

Entidades Públicas

Younusse Amad 2º Vice-Presidente, Assembleia da República (AR) e 23/06/2018


Deputado pela RENAMO.

Luís Bitone Presidente, Comissão Nacional de Direitos Humanos 27/06/2018


(CNDH).

Anastácio Chembeze Director, Instituto de Formação Profissional e Estudos 29/06/2018


Laborais Alberto Cassimo (IFPELAC)

Moisés Comiche Director Nacional da Acção Social, Ministério do Géne- 05/07/2018


ro, Criança e Acção Social (MGCAS).

António Muchave Chefe do Sector da Deficiência, Ministério do Género, 05/07/2018


Criança e Acção Social (MGCAS).

Maria Manguana Chefe do Departamento de Educação Especial, Minis- 09/07/2018


tério da Educação e Desenvolvimento Humano (MINE-
DH).

Rosário Fernandes Presidente, Instituto Nacional de Estatística (INE). 19/07/2018


Acompanhado por: Cirilo Tembe – Coordenador Execu-
tivo do INE; Azarias Nhamuzimo – Director da Adminis-
tração e Recursos Humanos do INE; Mónica Magaua –
Directora Nacional das Contas Nacionais e Indicadores
Globais do INE; Beto Cordeiro – Director Nacional de
Estatísticas Sectoriais e de Empresas do INE; Firmino
Guiliche – Director da Escola de Estatística do INE; Ale-
xandre Marrupi – Director-Adjunto Nacional de Censos
e Inquéritos do INE; Leonete Mabjaia – Directora-Ad-
junta da Escola Nacional de Estatística do INE; Hilário
Minzo – Director-Adjunto Nacional de Administração
e Recursos Humanos do INE; Xadreque Maunze – Di-
rector Nacional de Estatísticas Vitais e Sociais; António
Adriano - Delegado do INE na cidade de Maputo).

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 111


Nome Função e Organização Data

Entidades Públicas

Antónia Charre Chefe da 3ª Comissão, Assembleia da República (AR) e 23/07/2018


Deputada pela FRELIMO

Domingas Licula Técnica do Departamento de Programas de Desenvol- 13/08/2018


Marrumbe vimento do Instituto Nacional de Acção Social (INAS)

Isildo Nhantumbo Técnico do Departamento de Programas de Desenvol- 13/08/2018


vimento do Instituto Nacional de Acção Social (INAS)

Brito Soca Director Nacional de Edifícios do Ministério das Obras 16/08/2018


Públicas, Habitação e Recursos Hídricos (MOPHRH)

Organizações da Sociedade Civil e Organizações de Pessoas com Deficiência

Cantol Pondja Presidente, Fórum das Associações Moçambicanas 20/06/2018


dos Deficientes (FAMOD). e
28/11/2018

Eufémia Maria Presidente, Associação de Mulheres Moçambicanas 21/06/2018


Guila Amela Portadoras de Deficiência (AMMD).

Fárida Gulamo Membro Fundadora, Associação dos Deficientes de 27/06/2018


Moçambique (ADEMO) e Vice-Presidente do Gabinete
de Aconselhamento a Mulher, Jovem e Pais de Crian-
ças com Deficiência (GAMA).

Clodoaldo Coordenador de Projectos, Fórum das Associações 28/06/2018


Castiano Moçambicanas dos Deficientes (FAMOD).

Rui Maquene Assessor para a área da deficiência, Handicap Inter- 29/06/2018


national

Ricardo Moresse Presidente, Associação dos Deficientes de Moçam- 29/06/2018


bique (ADEMO), acompanhado por: Carlos de Jesus
Guedes – Gestor de Projectos da ADEMO.

Sérgio Albuquerque Gestor de Suporte, TV Surdo. 02/07/2018

Sousa Camanguira Director Executivo, TV Surdo. 02/07/2018

112 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


Organizações da Sociedade Civil e Organizações de Pessoas com Deficiência

Sérgio da Conceição Presidente da Associação dos Cegos e Amblíopes de 02/07/2018


Moçambique (ACAMO).

Teresinha da Silva Coordenadora Nacional, Mulher e Lei na África Austral 04/07/2018


– Moçambique (WLSA).

Sérgio Guivala Presidente do Conselho de Direcção, Associação de 01/08/2018


Jovens Técnicos PcD (CINFORTÉCNICA)

Vaz de Sousa Director Executivo Associação Aero Clube para inclu- 01/08/2018
são de PcD (AAIPD)

Zeca José Chaúque Director Executivo, Associação Moçambicana de Estu- 01/08/2018


dantes com Deficiência (AMAED)

Manuel Veloso Secretário Executivo, Associação dos Deficientes Milita- 01/08/2018


res e Paramilitares de Moçambique (ADEMIMO)

Graça de Jesus Secretária Geral, Associação de Pais e Amigos da 01/08/2018


Criança com Deficiência Mental (ACRIDEME)

Victor Daniel Bila Director de Programas de Protecção Social, Rede para 01/08/2018
Assistência a Vítimas de Minas (RAVIM)

João Magaia Presidente, Companhia de Teatro N’LHUVUKO (Desen- 01/08/2018


volvimento).

Wiliamo Tomás Sa- Representante, Associação de Apoio aos Albinos de 01/08/2018


vanguane Moçambique (ALBIMOZ)

Hélio Munguambe Presidente, Associação dos Jovens Surdos de Moçam- 01/08/2018


bique (AJOSMO)

Leta Timbane Secretária Geral, Associação das Mulheres Surdas de 01/08/2018


Moçambique – (AMAMUS)

Fenias Jaime Presidente, Associação Moçambicana de Usuários de 01/08/2018


Malhaule Saúde Mental (AMUSAM) e
28/11/2018

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 113


Organizações da Sociedade Civil e Organizações de Pessoas com Deficiência

Raimundo Presidente, Associação de Desporto da Pessoa com 01/08/2018


Patrocínio Deficiência da Cidade de Maputo (ADPCDM)

Nordino Mucanze Presidente, Associação de Pensionistas Deficientes de 01/08/2018


Moçambique (APEDEM)

Belarmina Tamele Secretária Geral - Associação Amor à Vida 01/08/2018

Fernanda Macombo Coordenadora de um dos Projectos do FAMOD 01/08/2018

Sofia Machivene Intérprete de Língua de sinais e membro da Associação 01/08/2018


de Mulheres Surdas de Moçambique (AMAMUS)

Fátima Manguiane Secretária Administrativa, ADEMO 22/11/2018

Garrido Guambe Presidente, GAMA 22/11/2018

Samito Zunguza Secretário-Geral do FAMOD 28/11/2018

Parceiros de Cooperação

Francesca Bruschi Analista de Política, Agência Italiana de Cooperação 28/06/2018


para o Desenvolvimento em Moçambique.

Stélio Ramos Oficial de Projecto de Formação Vocacional Inclusiva, 29/06/2018


Light for the World (LftW) em Moçambique.

Jonas Pohlmann Assessor de Governação, Departamento Internacional 04/07/2018


para o Desenvolvimento (DFID) em Moçambique.

Magalie Conselheira de Desenvolvimento Social, Departamento 04/07/2018


Rouschmeyer Internacional para o Desenvolvimento (DFID) em Mo-
çambique.

114 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE


Edina Culolo-Kozma Especialista em Protecção à Criança, Fundo das Na- 04/07/2018
ções Unidas para as Crianças (UNICEF) em Moçam-
bique.

Piergiorgio Calistri Gestor do Programa de Apoio à Sociedade Civil, Direitos 05/07/2018


Humanos e Género, União Europeia em Moçambique.

Aksana Varela Directora, Young Africa (YA) em Moçambique 06/07/2018

Inocêncio Macuácua Assessor para a área de Governação, Embaixada da 06/07/2018


Irlanda em Moçambique.

Koeti Seródio Assessora para a área de Vulnerabilidade, Embaixada 06/07/2018


da Irlanda em Moçambique.

Doris Uani Coordenadora dos Programas Provinciais, Embaixada 06/07/2018


da Irlanda em Moçambique.

William Mulhovo Oficial de Programas, Diakonia 09/07/2018

Danilo Jone Oficial de Programas, Diakonia 09/07/2018

Artur Chirindja Analista Financeiro, Agência dos Estados Unidos para o 10/07/2018
Desenvolvimento (USAID) em Moçambique.

Rubén Vicente Gestor de Projecto de Protecção Social, Organização 26/07/2018


Andrés Internacional do Trabalho (ILO) em Moçambique.

Sector Privado

Sofia Cassimo Presidente do Pelouro Mulher Empresária e Empreen- 10/07/2018


dedorismo, Confederação das Associações Económi-
cas de Moçambique (CTA).

A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 115


116 | A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE
A ECONOMIA POLÍTICA DA ÁREA DA DEFICIÊNCIA EM MOÇAMBIQUE | 117

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