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Roteiro - O Cortiço

Adaptação da obra O Cortiço de Aluísio Azevedo

Capítulo 1

João Romão entra em cena, chegando até onde Bertoleza está, em sua quitanda.

João Romão: Poderia dar-me um prato de iscas de fígado.

Toda atrapalhada, limpando as mãos em seu avental, apressou-se para preparar o prato.
João Romão percebeu e aproveitou o momento para conversar com ela.

João Romão: Parece confusa… atordoada, em verdade. O que aconteceu?

A mulher, sensível e à espera de uma abertura para conversa, soltou o que fazia e colocou-
se a conversar.

Bertoleza: Não sei se sabes, mas o português dono da carroça faleceu junto da mesma
hoje pela manhã. Era um homem muito útil, amigo de grande importância…

João Romão: Minhas condolências por sua lástima, é uma perda muito dolorosa. - porém
no rosto do homem não possuía sofrimento.- Mas, quando diz que ele era útil, o que ele
fazia de tão importante?

Bertoleza: Ele era responsável por levar meus fretes para pagar minha carta de alforria.

João Romão: Foi, realmente, uma grande perda. Estarei aqui caso precise. - a mulher
sorriu e entregou o pedido, ele acenou e se retirou.

Muda de cena para João Romão e Bertoleza passando pelo cenário em uma conversa.

Bertoleza: Agradeço por todo o apoio, sabes que confio grandemente no senhor e, por
isso, peço-lhe que fique responsável por guardar meus vintes-mil réis e entregar ao meu
senhorio. Sei que é um bom homem e que poderei contar com o senhor para tais ações.

João Romão: Recebo este cargo com orgulho, abrirei uma conta corrente e quando
precisares de dinheiro sabes a quem pedir.

Muda de cenário para os dois conversando, agora, depois de um tempo.

João Romão: Quero propor-lhe algo, que possamos morar juntos. O que achas?

Bertoleza: Ainda me indagas tal pergunta, Seu João! Sabes que não há outra resposta
para esta que o “sim".

João Romão: Será uma casinha, ao lado esquerdo da venda, de duas portas, dividida ao
meio paralelamente à rua, sendo a parte da frente destinada à quitanda e a do fundo para
um dormitório.

Bertoleza: É uma honra fazê-la, juntamente de um outro português.

João Romão: Agora, as coisas vão correr melhor para você! Vai se tornar forra, eu entrarei
com o que falta.

Bertoleza: Não sabes o quanto sou grata.


Bertoleza sai de cena e João Romão faz cara de nojo, porém maléfico por ter enganado a
mulher.

João Romão: Devo arranjar um papel velho e enganá-la com uma carta falsa de alforria,
assim, conseguirei ficar com todo o dinheiro que ela vem entregando. - fala se retirando da
cena.

Entram em cena João Romão com um papel na mão, passou a língua no selo e pregou no
papel.

João Romão: Bertoleza, venha aqui!

A mulher veio às pressas, limpando as mãos no avental sujo.

João Romão: Você agora não tem mais senhor! Agora está livre. Doravante o que você
fizer é só seu e mais de seus filhos, se os tiver. - disse ao ler a carta em suas mãos e
concluiu - Acabou-se o cativeiro de pagar os vinte mil-réis à peste do cego!

Bertoleza: Coitado! Ele, como meu senhor, tinha todo o direito de exigir o que era seu.

João Romão: Acabou-se! Vida nova, vamos abrir uma garrafa de vinho do Porto!

E Bertoleza sai de cena para pegar a garrafa e João Romão levanta-se passando a mão
pelos cabelos.

João Romão: O que me acalenta é saber que o velho está morto e enterrado, mesmo que
seus filhos não vão querer uma crioula, que mesmo que seja herança deles, não a vê a
anos.

Muda de cena para João Romão e Bertoleza roubando materiais de construção para
construir.

Bertoleza: Mas, para quê, esses materiais?

João Romão: Vou construir algumas casinhas, para podê-las alugar e conseguir mais
dinheiro. Agora, vamos, leve isto. - entrega o material e saem de cena.

Mudança de cenário para Miranda e seu colega , na nova casa.

Miranda: É realmente uma bela casa, muito arejada e agradável. - pontua com os braços
cruzados atrás das costas, observando o local.

Dono da casa: Concordo plenamente, mas quais motivos tirou o senhor do centro da
cidade?

Miranda: Nada demais, Zulmirinha está muito pálida e necessita tomar corpo, encontramos
o local perfeito. - diz desconfiado e surpreso pela pergunta do homem.

Dono da casa: Se já cumpri o que precisavas, me vou. Boa estalagem! - se tira de cena
deixando Miranda e passa por Estela que caminha em direção ao marido. - Dona.

Cumprimenta com a cabeça e a mesma o cumprimenta com desdém.

Miranda: O que queres agora? - disse enfiando as mãos nos bolsos da calça.

Dona Estela: Quintal maior, apenas cumpra isto. - resmungou se retirando.


Estela se retira e Miranda suspira alto.

Miranda: Que castigo! Além de mentir para todos pelo motivo de estar aqui, a desgraçada
ainda faz pouco de falar comigo. Trezes anos e devo ter que tomar medidas para que essa
fêmea se afaste dos meus caixeiros e, consequentemente, de seus amantes.

Miranda encerra a fala e entra João Romão.

João Romão: Como vai, Miranda? Estava querendo falar comigo?

Miranda: Sim, estava. Gostaria de propor-lhe uma oferta. Como sabe, minha casa não
possui quintal, e minha filha está precisando de mais espaço. Vende-me este pedaço de
terra vazio que possui entre os fundos de sua casa e a pedreira?

João Romão: De forma alguma, meu senhor. Está perdendo seu tempo, tanto não cedo
sequer uma polegada de minha terra como também compro o pedaço de terra ao fundo de
sua casa, se tiveres interessado.

Mirada: Ora, mas deixe-se disso! Diga quanto quer, que eu lhe pago e ficamos
conversados. Ceda, ao menos dez braças, se

João Romão: Já disse, não cedo de forma alguma.

Miranda: Mas que diabos! Que podes fazer ai? Um pedaço de terra horrível colado em
minha casa!

João Romão: Pois hei de lhe mostrar se não tem o que fazer ali!

Miranda: Passe bem!

João Romão: Adeus!

João Romão sai e Miranda fica sozinho.

Miranda: Mas que diabos! Como se já não bastasse aquele pilantra enriquecer com uma
velha escrava, agora também não cede a porcaria de um pedaço de terra! Mas essa
ambição não tem limites, hein? O safado já construiu mais de 90 casas, o que custava um
simples pedacinho de terra? Enquanto isso, estou preso àquela megera pra não apodrecer
em meio à pobreza. E ainda tenho que suportar aquela menina, que sabe-se lá se sou o
pai!

Capítulo 2

Todos saem e agora estão na lavanderia, Paula, Leocádia, Isabel, Rita Baiana e Augusta.

Isabel: Graças à abundância de água que temos no cortiço, finalmente temos um lugar para
lavar nossas roupas.

Leocádia: É verdade, olha essa grande lavanderia que se formou!

Rita Baiana: Então, enquanto Pombinha, a sua menstruação já veio?

Isabel: Não, Rita. Ela ainda é uma moça muito jovem, mas se tudo correr como espero, ela
já está prometida.
Rita Baiana: Eu, se fosse a senhora, casava-os assim mesmo! Bom, deixem-me ir, tenho
coisas a tratar.

Isabel: Ainda metida com Firmo, filha? Ou com outros. - a velha negava com a cabeça e
Rita Baiana apenas ria.

Augusta: Aquela não endireita mais, cada vez fica até mais assanhada. Parece que tem
fogo no rabo! Pode haver o serviço que houver, aparecendo pagode, vai tudo pro lado! Olha
o que saiu o ano passado com a festa da Penha!

Paula: Então agora, com este mulato, o Firmo, é uma pouca-vergonha! Estes dias, pois
você não viu? levaram aí numa bebedeira, a dançar e cantar à viola, que nem sei o que
parecia! Deus te livre!

Isabel: Bom coração tem ela, até demais, que não guarda nada pro dia de amanhã. Parece
que o dinheiro lhe faz comichão no corpo!

Todos saem de cena e agora estão no estabelecimento de João Romão, João Romão e
seu funcionário atendendo os clientes, quando chega Jerônimo, até então estranho.

Jerônimo: Boa tarde, cavalheiros. Gostaria de falar com o senhor João Romão, ele está?

João Romão: Aqui estou. O que deseja comigo?

Jerônimo: Gostaria de lhe fazer uma proposta, e se possível conversar com o senhor em
particular.

João Romão: Pois bem, siga-me.

Jerônimo e João Romão se afastam um pouco e o restante sai de cena.

Jerônimo: Estou em busca de emprego, senhor, e estive pensando em trabalhar para a


pedreira. Peço que não se assuste com isso, mas gostaria de um salário de setenta mil
réis.- Diz, e em seguida João demonstra espanto.

João Romão: Mas este é um valor muito alto, não acha? Ofereço-lhe cinquenta mil réis.

Jerônimo: Pense bem, meu senhor. Eu sou uma oportunidade única, se me contratar, trarei
muito mais lucro para o senhor. Dei uma passada por lá antes de vir para cá, e notei um
certo desprezo por parte de seus funcionários, eles não estão valorizando como deviam o
seu negócio! É um trabalho muito mal feito, sem coragem. A pedreira, por outro lado, é uma
mina de ouro! É um ótimo local de trabalho, e possui a oportunidade de ter um sucesso
extraordinário. O que me diz?

João Romão: Pensando assim, posso lhe contratar, se puder garantir que terei mais lucro.

Jerônimo: Pois bem, trarei o sucesso para seu negócio, senhor!

João Romão: Mas antes, preciso que venha morar no cortiço, para assim ter uma garantia
de que os 20 mil a mais terão algum retorno para mim,

Jerônimo: Então, negócio fechado!

Capítulo 3
Mudança de cenário para a chegada de Piedade e Jerônimo no cortiço, enquanto Paula e
Leocádia falam sobre o casal.

Leocádia: Paula, quem é este pedaço de homem? - disse ao observar o casal passando.

Paula: Veio para trabalhar na pedreira, esteve de muita conversa com João Romão ontem.

Leocádia: E a mulher? Será casada com ele? - Paula concordou com a cabeça - Eles
sejam lá quem for, são gente arranjada. Isso não se lhes pode negar!

Paula: Quem não vê cara, não vê coração…

Leocádia: Mas o número 35 não estava ocupado por aquele homem muito amarelo que
fazia charutos?

Paula: Estava, sim. Porém, creio que de tanto dever a João Romão, acabou por ser-lhe
expulso.

Leocádia: Pois será mais um nessa maldita casa mau agourada! Fosse por mim, nem de
graça eu ia querer!

Paula: Anda, que estão vindo!

Paula e Leocádia saem de cena, enquanto Jerônimo e Piedade chegam para olhar a casa
que vão morar.

Jerônimo: Bom, parece que é aqui que iremos morar. O que achas?

Piedade: Parece-me aceitável, porém algo me incomoda. Vamos entrar, para dar uma
olhada no interior?

Ambos saem de cena e entra João Romão.

João Romão: Mas não é que aquele homem estava certo? Minha pedreira nunca lucrou
tanto!

João Romão sai de cena, enquanto moradores do cortiço aparecem tocando instrumentos,
bebendo e jogando. Rita Baiana aparece e vai cumprimentando a todos. Pombinha termina
de escrever a última carta e entrega uma carta para cada pessoa ali presente. Por fim, Rita
Baiana anuncia a todos que a verdadeira festa seria amanhã.

Capítulo 4

Todos saem, e agora temos Firmo, Porfiro e Rita Baiana. Firmo com um violão, e Porfiro
com um cavaquinho. Ambos entraram na casa de Rita Baiana.

Rita Baiana: Guardem seus paletós aqui e sentem-se. - Ambos retiram seus paletós e se
sentam nas poltronas.

Firmo e Porfiro ficam tocando baixinho enquanto chegam os outros convidados (Leonie,
Paula, Leocádia, Isabel, Pombinha e Marciana) aos poucos e Rita Baiana atende-os
enquanto prepara as bebidas. Rita Baiana começa a servir as bebidas no balcão, e inicia-se
um diálogo com Leocádia.

Leocádia: A festa está maravilhosa, Rita!


Rita Baiana: Pois sim, sabes se todos vinham mesmo?

Leocádia: Nem todos, não entendi muito bem, mas parece que Jerônimo não estava se
sentindo bem e decidiram ficar um tempo a sós.

Rita Baiana: Vou dar uma passada lá amanhã, ver como ele está.

Leocádia: O faça, temos que enturmá-los com todos. Assim, saberemos se são gente
boa… - Firmo chegou passando a mão pela cintura de Rita Baiana - Ora veja quem chegou,
minha deixa para ir.

Firmo: Vamos beber e dançar! - puxando-a para a roda e dançando junto dela. - Veja,
aquele homem não deixa de espiar.

Miranda espreitava na janela, quando percebeu que era observado se retirou.

Rita Baiana: Que espie o quanto quiser, estou no meu lugar, bebendo do meu próprio suor!

Firmo: Se estão incomodados com a gente, os incomodados são os que se mudam! Ora
pistolas!

Todos saem, e agora tem duas pessoas conversando na rua.

Paula: Você viu, minha senhora, o que se sucedeu com Jerônimo? Parece que não está
muito bem.

Isabel: Fiquei sabendo, Dona Paula. Inclusive, venho de lá, havia ido deixar-lhe uns
remédios para ver se ele melhora.

Libório: Podem me dar uma esmola pra eu comprar um pão, por favor?

Isabel entrega umas moedas à Libório. Em seguida, ambas saem conversando e passam
por Rita Baiana, que estava indo à casa de Jerônimo. Piedade a recebe.

Rita Baiana: Onde ele está?

Piedade: Aqui no quarto, venha! - Ambas vão até Jerônimo, que estava de cama.

Rita Baiana: O que é isto, vizinho? Caiu-se doente com a minha chegada? - Jerônimo riu -
Deixe-me ver… já sei! Espere-me, que vou preparar algo para você.

Rita Baiana sai do quarto e prepara café com pinga para Jerônimo, Piedade havia saído do
quarto e estava na mesa, escrevendo em um papel. Rita volta e entrega o café para
Jerônimo, enquanto Piedade fica só olhando, desconfiada e preocupada. Jerônimo tenta
“investir” nela [...]

Jerônimo: Gostei muito de vê-la dançando ontem…

Rita Baiana: Então, que me diz agora? Sente-se ou não melhorzinho? - fala
desconversando.

Jerônimo passou os braços em volta de Rita Baiana que ficou inquieta.

Rita Baiana: Olha que peste! Faça-se de tolo, que digo à sua mulher, hein? Ora vamos lá!

Piedade entra em cena e os dois se afastam prontamente.


Rita Baiana: Agora é tratar de dormir e mudar de roupa, se suar outra vez. Até logo!

Todos saem e agora Leocádia está andando tranquilamente até que aparece Henrique,
com um coelho branco.

Henrique: E então, minha querida, o que me diz? - Diz, se aproximando. Leocádia começa
a aceitar e vai se aproximando também. Até que chega Bruno, marido de Leocádia, que
começa um escândalo. Henrique foge, e Bruno começa a brigar com Leocádia.

Bruno: Vai ser assim, né? Então nem volte mais para casa, dê o fora agora mesmo, sua
mal-agradecida.

Leocádia: Pois vou mesmo! E tem mais! - Grita, enquanto volta para casa e começa a
quebrar tudo. Os moradores do cortiço aparecem e ficam apenas olhando e fofocando.

Por fim, Leocádia arruma suas coisas em uma mala e vai embora. Todos saem fofocando,
alguns rindo.

Capítulo 5

Jerônimo aparece andando pelo cortiço, indo para a casa de Rita Baiana, que o recebe e
convida para um café.

Rita Baiana: Bom dia, Jerônimo! Sente-se, vou preparar um café como aquele do outro dia
para você. - Puxa a cadeira para Jerônimo se sentar e vai preparar o café com pinga.

Jerônimo: Como está, Dona Rita?

Rita responde enquanto serve as bebidas e senta-se junto a Jerônimo.

Rita Baiana: Tô bem, anda logo homem, beba!

Os dois saem de cena e muda para Jerônimo e Piedade, a mesma entregando a janta ao
marido.

Jerônimo: Ora, Piedade, por que não preparas comidas típicas de cá, mulher? - disse ao
levantar-se com a comida e uma cara de nojo.

Piedade: Mas… eu não sei - falou seguindo-o.

Jerônimo: Pede então a Rita que ensine!

Os dois saem de cena e entram novamente, Jerônimo vem reclamando com Piedade.

Piedade: Mas, por que estás assim? - disse segurando em seu braço e o virando para ela.

Jerônimo: Não queria te dizer, mas tem que tomar banhos todos os dias! Aqui não é como
lá… É preciso lavar o corpo ou senão, cheira mal. - afastou-se dela.

A mulher colocou-se a chorar saindo de cena.

Jerônimo: Olhe não me venham com choro agora! Espere!

Os dois saem de cena. Piedade foi à procura de Paula para saber sobre o marido.

Paula: Vá entrando.
Piedade: Diga-me porque meu marido anda tão distante de mim, quero motivos.

Paula: Ele tem a cabeça virada por uma mulher trigueira.

Piedade: É o diacho da Rita Baiana! nem sei que virá a ser de mim neste mundo de
Cristo!... Ensine-me alguma coisa que me puxe o Jeromo!

Paula: Tome banho todos os dias, coloque algumas gotas da água da lavagem em seu
café. Faça o que lhe digo.

As duas saem de cena e entram Jerônimo e Rita, quando Firmo passa por eles com um
olhar de desgosto e de rivalidade saindo de cena em seguida.

Rita Baiana: Fique atento com Firmo, mas com cautela, sei bem o que ele faz sob
influência de ciúmes.

Saem todos de cena e entram Léonie e Augusta.

Augusta: É de grande alegria sua volta e a de Juju, está tão linda e elegante.

Léonie: Ele é uma boa menina,Augusta. Agora, diga-me, e Pombinha onda se encontra?

Augusta: Está por chegar, saiu com a mãe para a sociedade de dança. Foi lá que ela
conheceu o Costa…

Léonie: Quem é Costa?

Augusta: O noivo! Acho que em breve se casará.

Léonie: E aquilo já veio?

Augusta: Não é por falta de boa vontade da parte delas, coitadas! Agora mesmo a velha
fez uma nova promessa a Nossa Senhora da Anunciação, mas não há meio!

Nisso entra Pombinha sorridente, abraçando a mulher.

Léonie: Mas veja como está uma lindeza, minha flor!

Pombinha: Saudades suas…

Léonie: Quase não me encontras aqui, mas, mudando de assunto, apareça junto de sua
mão estes dias pela minha casa. Lá é muito sossegado, aproveite e já vá amanhã.

Pombinha: Falarei com ela.

Todos saem, e agora temos Miranda negociando com um senhor em um escritório, este
que estava a escrever e organizar a papelada; Ele carimba um papel, e olha para Miranda,
e diz:

Senhor: Pois bem, seu Miranda, meus parabéns! Aqui recebes o título de barão.

Miranda: Muito obrigado, meu senhor! Darei uma grande festa amanhã para comemorar!

Ambos saem, e agora estamos na festa. Alguns tocando violão, outros bebendo,
conversando. Miranda estava ao lado de sua esposa, Estela, quando decidiu se pronunciar.
Miranda: Peço atenção a todos! - Grita, chamando a atenção de todos - Agradeço a todos
por comparecerem esta noite, e gostaria de anunciar que, oficialmente, fui entitulado pelo
alto grau de nobreza, barão! - Ouve-se grito de todos em comemoração - Podem festejar à
vontade, a bebida é por minha conta!

Todos continuam a festejar por um tempo, até que aos poucos vai se desfazendo a festa.
Quando todos saem de sala, entra João Romão e os moradores do cortiço, em um outro
dia, porém ainda havia alguns vestígios da festa da noite anterior pelo chão.

João Romão: Você aí, sai da minha frente! Não estou bem hoje, então vou ser direto. Aqui
dentro quem manda sou eu, eu sou o monarca aqui! Não quero mais bagunças, então
tratem de limpar logo toda essa sujeira, ora essas! - Diz enquanto anda pelo cortiço. Por
fim, encontra mais um morador e diz também: - Você, tire logo esse lixo daqui! Ora essa!
Vocês estão achando que minha terra é bagunça, é?

Ao lado estavam Rita Baiana e Jerônimo que cochichavam, enquanto Firmo encarava com
desgosto e ciúmes.

Jerônimo: Meu bem! Se você quiser estar comigo, dou uma perna ao demo! - cochichou
novamente.

Firmo levantou-se e caminhou até onde eles estavam, Jerônimo levantou-se prontamente.
Piedade chegou e correu para onde o marido estava.

Jerônimo: Deixe-me, quero saber o que este cabra quer comigo!

Firmo: Dar-te um banho de fumaça, seu galego ordinário!

Iniciou-se uma luta entre os dois, uma espécie de capoeira, até que Firmo tira uma navalha
e acerta Jerônimo. Ouve-se gritos “Matou, matou!”. Em seguida, após tanto lutar, Firmo cai
de fraqueza e dor. Porém, Jerônimo não havia morrido, e consegue puxar uma outra faca
que havia guardado, e rastejando chega até Firmo, e o esfaqueia até a morte.

Capítulo 6

Agora todos estão na delegacia.

João Romão: Senhor delegado, a única explicação plausível para o ocorrido é que este
traste tenha causado o incêndio - Diz apontando para Miranda - Faz um bom tempo que ele
tem inveja da minha riqueza, e sempre que havia alguma festa no cortiço, ele ficava
murmurando de longe, enquanto espiava pela janela de sua casa!

Miranda: Um momento, meu senhor! Não podes sair me acusando assim, nem sequer
estava eu por lá na hora do incêndio, na noite passada saí para jantar com Estela, minha
esposa, e tenho um bom álibi para o ocorrido, se desejares pode ir até o restaurante e
perguntar sobre minha presença.

Estela: Ele está falando a verdade, seu delegado!

Delegado: Pois bem, até o momento não se é possível saber a origem do incêndio - Paula
suspira aliviada, disfarçadamente - Vamos partir para o assassinato. Senhorita Rita, pode-
me explicar o que aconteceu?
Rita Baiana: Não consegui ver muito bem, senhor. - Diz, aos prantos - Meu querido Firmo..
- Diz em voz baixa, chorando.

João Romão: Um momento! Estão se esquecendo do maior problema aqui. Minhas casas,
como ficam? Ah, já sei! Se não vão descobrir o criminoso, a partir de hoje, todos vocês
terão que pagar a mais para cobrir o prejuízo que eu tive! E nem adianta reclamar, já está
decidido!

Todos saem, e agora João Romão entra no escritório de um senhor (este que pode ser o
mesmo que entregará o título de Barão à Miranda).

Senhor: Sente-se, senhor - João Romão puxa uma cadeira e se senta.

João Romão: Obrigado.

O homem, mexendo em sua papelada, carimba um papel e entrega à João Romão.

Senhor: Pois bem, aqui está o comprovante do seguro de suas terras. Guarde bem este
papel, pois precisará dele caso algo aconteça.

João Romão: Agradecido, meu senhor.

Ambos saem e muda de cena para Pombinha, Léonie e Dona Isabel.

Léonie: Ora, sentem. Vamos conversar, sente-se aqui, minha florzinha, ao meu lado.

Dona Isabel: Agradeço muito pelo convite, o jantar foi maravilhoso e o vinho mais ainda.

Léonie: Parece cansada, se quiser deitar-se fique à vontade.

Dona Isabel: Não se preocupe, na verdade, estou bem.

Léonie: Está calada, minha amiga… - disse olhando para a Pombinha.

Dona Isabel: Vou deitar-me um pouco se não for incomodo. - Léonie concordou e a
senhora saiu.

Léonie: O que passas? - disse colocando a mão na perna da jovem.

Pombinha: Nada, por que achas isto?

Léonie: Venha comigo que tirarei esse aborrecimento, venha! Não existe nada a temer. -
segurou na mão e puxou a jovem.

Muda de cena para Dona Isabel e Pombinha saindo da casa da mulher.

Dona Isabel: Que tu tens, está calada…

Pombinha: Nada, aborrecimento. Vamos logo!

Saem de cena e agora está Dona Isabel arrumando as coisas e Pombinha chega.

Dona Isabel: Oras, o que foi para tanta carreira? - olhou a jovem de cima a baixo - Veio?

A menina concordou com a cabeça e ela correu para abraçá-la.


Dona Isabel: Bendito e louvado seja o Senhor Jesus Cristo! Minha filha é mulher! É mulher.
- diz a plateia.

[...]

Capítulo 7

Todos saem e agora estão apenas João Romão e Bertoleza em casa, conversando.

Bertoleza: Querido, já viu como aquele cortiço vizinho tá crescendo? É perigoso que seja
uma ameaça ao lucro do nosso cortiço!

João Romão: Não tem com o que se preocupar, querida! Eles não têm porte o suficiente
para ser uma concorrência para nós, é evidente que somos bem maiores que eles. Não
apresentam qualquer risco ao nosso lucro.

Dois entregadores trazem os móveis novos de João Romão, e colocam na sala (um sofá,
por exemplo).

João Romão: Podem colocar aí, cavalheiros.

Os entregadores colocam e saem de cena.

João Romão: Olhe, o que chegou! A nossa nova mobília! Enfim a reforma foi concluída, o
que achou?

Bertoleza: Ficou ótimo!

Miranda chega e João Romão o recebe.

João Romão: Bom dia, meu senhor! Desejas falar comigo?

Miranda: Evidentemente, meu caro. Podemos conversar a sós?

João Romão: Mas é claro, um momento.

Bertoleza sai de cena e deixa os dois a sós.

Miranda: É o seguinte, João. Minha filha, Zulmirinha, já está na hora de se casar com
alguém, e gostaria de saber se o senhor estaria interessado. Ela é uma ótima menina,
calma e serena.

João Romão: Seria uma honra, senhor!

Miranda: Pois bem, depois lhe apresento para ela e preparamos o casamento. Agora tenho
que ir, até mais.

João Romão: Adeus.

Miranda sai e João Romão fica sozinho.

João Romão: E agora, meu Deus!? O que hei de fazer? Bertoleza vai acabar por atrapalhar
completamente meus planos! A não ser que… ela morresse.

João Romão sai.


Capítulo 8

Piedade entra em cena.

Piedade: Mas que diacho! Onde será que aquele homem foi se meter? Maldito seja aquela
ideia ridícula de vir morar no Brasil! Se ainda estivéssemos em nossa terra, Jerônimo não
teria sido corrompido com toda essa safadeza da América! - Diz, com a voz raivosa,
enquanto anda de um lado para o outro à procura de Jerônimo.

Rita Baiana e Jerônimo aparecem, juntos.

Piedade: Mas que pouca vergonha! Sua mequetrefe! Achas que podes ficar com o meu
marido sem nenhuma consequência? Pois agora você vai ver!

Rita Baiana: Pula cá pra fora, perua choca, se és capaz!

Inicia-se uma briga entre as duas, e aos poucos chegam os moradores do cortiço, atiçando
a briga. “Acaba com essa mocoronga, Rita!”, “Pega ela, não tenha Piedade, Piedade!”. Com
o avançar da briga, os moradores vão quebrando as coisas e fazendo barulho. João Romão
aparece e se espanta com a confusão. Anda de um lado para o outro em busca de uma
solução, mas quando percebe que não tem jeito, corre para proteger sua venda. De
repente, chegam dois homens, com vontade de brigar.

Homem 1: Cadê aquele traste! - Grita, e anda em meio à confusão à procura de Jerônimo.
O outro homem que veio com ele, segue-o. Ambos carregavam navalhas.

Com a confusão cada vez maior, uma das casas começa a pegar fogo. Este, por sua vez,
começa a espalhar-se e não dá sequer sinal de se apagar. Uns tentam jogar água para
apagar, mas nada adiantava. A bruxa estava rindo, realizada, porém a confusão era tanta
que ninguém podia percebê-la (à vista da plateia). Após um tempo, ela cai morta no chão.
Em meio à toda confusão, Libório aparece e disfarçadamente corre para onde passava as
noites (um colchão e um chapéu no chão podem representar o lugar). João Romão
percebe, e decide seguí-lo à espreita para ver o que ele estava indo fazer. Um pouco antes
de Libório chegar, ele para e o fica espiando. Libório, então, tira umas garrafas lotadas de
dinheiro debaixo do colchão, e tenta fugir. João Romão entende do que se tratava e parte
para cima, tentando tomar o dinheiro. Algo cai em cima de Libório devido à confusão, e este
deixa cair as garrafas, as quais João Romão consegue pegar e consegue fugir escondido
em seguida. Todos vão saindo aos poucos e o fogo acaba. No dia seguinte, eles voltam
para olhar como estava o lugar, e os corpos da Bruxa e de Libório ainda estavam lá.
Miranda se aproxima de João Romão.

Miranda: Sinto muito pelo ocorrido, meu bom homem. Depois de tanto sacrifício para
construir tudo isso…

João Romão: Agradeço Miranda, mas acontece que sou um homem prevenido - e começa
a falar em tom de riso, aliviado - após o primeiro incêndio que sucedera, tratei de fazer um
seguro sobre todas as minhas terras, e portanto receberei de volta uma boa parte do
dinheiro que gastei. Inclusive, tenho planos de reconstruí-lo ainda maior!

Miranda: Puxa, mas que livramento, meu senhor!

Todos vão olhando o que restara do incêndio, andando pelo local, e aos poucos cada um
vai saindo de cena.
Capítulo 9

Todos saem e agora João Romão está tomando café em um estabelecimento chique,
quando chega Miranda, percebe que João estava ali e senta-se na mesma mesa que ele.

Miranda: Como vão as coisas, senhor?

João Romão: Vão bem. Notou a expansão de minhas terras?

Miranda: E tem como não notar? O senhor fez um trabalho estupendo! Ainda não consigo
entender como ainda está morando com aquela preta, tens um status social altíssimo!
Case-se com minha filha, e assim terá uma vida melhor, meu homem!

João Romão: Ainda não chegou a hora… um dia, quem sabe.

João Romão pede a conta e em seguida ambos saem do estabelecimento. Quando saem,
passam pela frente da casa de Piedade. Esta estava sentada em uma cadeira, acabada,
com um vidro de pinga na mão. Percebem-na, mas não fazem nada. Ambos saem e em
seguida Piedade sai de cena.

Entram em cena Jerônimo e Rita Baiana, o homem com os braços em volta da mulher e
com sorrisos e suspiros.

Rita Baiana: Agora vamos comer, dançar e aproveitar as bebidas!

Jerônimo: Me sinto viciado, bêbado de amor e felicidade.

Rita Baiana: Então vamos ficar bêbados de verdade!

Os dois saem de cena entra Piedade que está nas ruas procurando algo para fazer, até que
encontra um grupo de pessoas bebendo. Ela se junta e começa a beber.

Piedade: As coisas estão mudando, viu que agora as casinhas aumentaram, que o nome
do velho cortiço é “Avenida São Romão”?

Paula: Vejo muitas coisas mudando, se me der licença, eu já vou. - a mesma olha para o
copo na mão de Piedade e sai de cena.

Piedade: Muitas coisas, as quais não tive o direito de escolher e outras que foram tomadas
de mim… - cala-se ao ver João Romão.

João Romão passava andando pelas ruas, e quando percebeu a bagunça, mandou todo
mundo para casa. Todos saem, cada um para um lado, e resta apenas Piedade. Que logo
se retira. Com a cena vazia, entram João Romão e Bertoleza, prontos para dormir.

João Romão: Boa noite, querida.

Bertoleza: Boa noite, amor.

Bertoleza deita-se no chão, e João Romão continua andando até sua cama. Após ambos se
deitarem, João Romão se senta e fica olhando para Bertoleza.

João Romão: Se você morresse… eu poderia finalmente casar-me com Zulmira. - Diz,
baixinho, olhando para Bertoleza.

Bertoleza ouve e vira-se para a direção de João Romão.


Bertoleza: Disse alguma coisa?

João Romão: Não, pode voltar a dormir. Deve estar ouvindo coisas.

Bertoleza: De fato, farei isso.

Bertoleza volta a dormir. João Romão, inquieto, se levanta e pega uma faca que estava
guardada por perto, e vai em direção à Bertoleza. Para perto dela e fica olhando, pensando.
Ela acorda, assustada, e olha para ele.

Bertoleza: Aconteceu alguma coisa? Porque está de pé ainda, homem? Não ias dormir? -
João Romão esconde a faca em suas costas.

João Romão: Eu ia, mas me deu sede, me levantei para beber água. Se tranquilize e volte
a dormir.

João Romão sai e Bertoleza fica olhando para ele, assustada. Após um tempo ela também
sai de cena. João Romão passa pelo palco e em um momento para e diz:

João Romão: Como farei para me livrar dela, oras? A mulher parece grudada como
carrapato ao cachorro! Tenho que pensar, pensar… - para um momento de frente ao
público e fala - Já sei! Como não pensei nisso antes? Apenas basta que eu a denuncie ao
seu dono, pois a carta de alforria que lhe arranjei era falsa! Assim poderei casar-me com a
filha de Miranda, sem receios que dê errado por conta daquela fêmea

João Romão sai com um sorriso malicioso no rosto.

Entra em cena Paula e Augusta, conversando sobre Pombinha.

Augusta: Dois anos de casada e faz tão coisa! Dizem que Dona Isabel sente profundo
desgosto.

Paula: No início, ela ficou com desgosto, tentou reatar os dois e a menina disse que se
cansou do macho! Tu crees? Então se meteu com Léonie que é bem falada pela gente e se
tornou prostituta também. São as duas damas da cidade e ganham dinheiro dessa forma.

Augusta: É de profundo desgosto de Dona Isabel, não sei como não morreu com tal
notícia, esta é enfurnada com a mesma na cidade.

As duas saem de cena e muda para Piedade entrando em cena.

Piedade: Fui despejada. Perdi meu marido, minha casa, nem as roupas do corpo são
minhas agora, fedem a bebida e frustração. Estou sozinha e inconsciente, talvez seja esse
o momento que me assemelho a um animal selvagem, mas a diferença é que ele ainda é
livre, apesar de tudo, ele ainda é superior a mim.

Sai de cena cambaleando e chorando alto. Entram João Romão, Miranda e Estela.

Miranda: Vamos passear, bom homem. Ao lado de fora se encontra sua prometida, a qual
tenho a honra de dar-lhe a bênção para a união.

João Romão: Certamente que sim, sinto-me honrado por tamanha confiança e
consideração.

Miranda: Então vamos, vamos. Daremos uma volta pela Lagoa de São Francisco. -
estendeu a mão para Estela e todos saíram de cena.
Muda de cena para João Romão recebendo os guardas e um homem em sua casa.

João Romão: O que desejas, homem? - disse trêmulo e desconfiado.

Herdeiro de Bertoleza: Venho buscar minha escrava, mostre-me onde ela se encontra.

João Romão: Deve estar lá dentro, tenha a bondade de entrar.

Bertoleza entra em cena carregando uma bacia de peixes e uma faca para cortar os
mesmo, é surpreendida pelos dois homens e pela fala que se segue.

Herdeiro de Bertoleza: Pegue-na! É ela, vamos, prendam-a.

Bertoleza jogou a bacia no chão e ficou imóvel vendo os homens se aproximaram, a faca
que se encontrava dentro foi o objeto que a mesma utilizou para tirar a vida, enfiando a faca
em si mesma até cair e morrer. João Romão diante disso fechou os olhos e cobriu o rosto.
Apaga-se as luzes e troca de cenário para João Romão recebendo uma encomenda.

Entregador: Somos da comissão de abolicionistas e gostaria de entregar um diploma de


benemérito para vossa senhoria.

João Romão: Vão entrando, vamos para a sala.

Muda de cenário pela última vez para Bertoleza toda cheia de sangue.

Bertoleza: Se parar para pensar nada disso teria acontecido se eu não tivesse sido uma
mulher emocionada, preconceituosa e até mesmo ignorante comigo mesma. Porém, as
coisas acontecem em decorrência de um fluxo de outras e não podemos nos arrepender de
algo que não se pode voltar. João Romão passou por todos os estágios até descobrir o que
sempre fora: ambicioso. E a ambição é o desejo insaciável, que pode custar pessoas e
vidas, mas no fim o mérito e o prestígio podem recompensar, até todos verem a sua
verdadeira face e o seu verdadeiro eu. Como vimos neste cortiço acontece todos os dias,
maridos traindo esposas, mulheres se entregando a vícios, ao mundo e se perdendo dentro
de si mesma. Vemos os ciúmes descontrolados, vemos como nos comportamos como em
um ambiente animal e que a única coisa que nos diferencia é o pensamento, o qual está
em uma linha tênue com a irracionalidade.

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