Docente: Valdonilson Santos Discente: Melissa Dias da Silva Siqueira Referência do livro: ROBERTO DA MATTA. O que faz o brasil, Brasil? Rio De Janeiro: Rocco, 2001.
ATIVIDADE AVALIATIVA – Resumo/ Resenha
Capítulo 1 – O que faz o brasil, Brasil? A questão da identidade
Afinal, o que faz o brasil, Brasil?. O capítulo se inicia destacando a necessidade de distinguir um "brasil" com letra minúscula, que se refere a um objeto inanimado, como uma madeira ou uma feitoria exploratória, e o "Brasil" com letra maiúscula, que representa um país, uma cultura, valores, e ideais de vida, o"brasil" com letra minúscula é visto como uma entidade em inércia, enquanto o "Brasil" é complexo e cheio de vida. Com esta introdução então, DaMatta aborda como alguns teóricos sociais do século XIX viam o Brasil como uma mistura doentia de raças condenada à degeneração, mas argumenta que o Brasil com letra maiúscula é uma entidade viva e consciente, com uma abrangente cultura quando diz que “o Brasil com B maiúsculo é algo muito mais complexo. É país, cultura, local geográfico, fronteira e território reconhecidos internacionalmente, e também casa, pedaço de chão calçado com o calor de nossos corpos, lar, memória e consciência de um lugar com o qual se tem uma ligação especial, única, totalmente sagrada.” Ele descreve o Brasil como uma sociedade com valores e julgamentos únicos, onde as pessoas seguem um padrão próprio e explora a ideia de que o Brasil está em toda parte, não apenas em questões políticas e econômicas, mas também na comida, na cultura, nas relações pessoais e na religião. DaMatta argumenta que o Brasil se define por seu estilo e modo de fazer as coisas, e que a identidade social se constrói por meio de afirmativas e negativas diante de questões específicas, ele destaca a importância de reconhecer que o Brasil é uma sociedade que se liga tanto aos dados quantitativos modernos quanto aos dados sensíveis e qualitativos, criando assim uma identidade complexa, e enfatiza a capacidade do Brasil de misturar o antigo com o moderno, o tradicional com o contemporâneo, e como essa capacidade relacional é a chave para entender a sociedade brasileira. Assim, Damatta conclui que o Brasil é como uma moeda com dois lados, e que é importante compreender como essas duas faces se relacionam para entender verdadeiramente o que faz o Brasil ser o que é. Capítulo 2 – A casa, a rua e o trabalho No capítulo dois, DaMatta observa a questão da rotina brasileira, e sua forte presença em nossa cultura, e descreve a interação entre a casa e a rua, destacando como esses dois espaços desempenham papéis fundamentais na vida social e na cultura brasileira. A casa é vista como um local de tranquilidade, tradição, valores familiares, e intimidade, onde as relações são calorosas e pessoais, é um espaço onde as pessoas são únicas e insubstituíveis, e há um forte sentido de defesa dos bens materiais e dos membros frágeis da família, a casa é um lugar moral, repleto de símbolos que marcam a identidade social. Por outro lado, a rua é um espaço de movimento, contraste com a calma da casa. Ela é vista como um local de luta, onde as pessoas são frequentemente desconhecidas e onde a autoridade legal exerce controle. A rua é associada à insegurança e à falta de respeito, onde as relações são mais impessoais. O texto também discute a complexa relação entre trabalho, casa e rua no Brasil, destacando como o trabalho é percebido de maneira ambivalente na sociedade brasileira, devido à influência da escravidão e da moralidade nas relações de trabalho, e cita como nossos heróis normalmente são o malandro, o renunciador, e o santo, que fogem de um estereótipo trabalhista. Além disso, o texto ressalta como casa e a rua são mais do que simples espaços físicos, mas também perspectivas através das quais os brasileiros interpretam o mundo. A casa representa a harmonia, enquanto a rua simboliza a dura realidade da vida, esses espaços se complementam e influenciam as relações sociais e a cultura brasileira de maneira complexa e profundamente enraizada na sociedade. A casa e a rua são elementos essenciais na vida social e cultural brasileira, moldando as interações e as percepções das pessoas.
Capítulo 3 – A ilusão das relações raciais
No século XVIII, o autor Antonil observou a sociedade brasileira dividida entre senhores, escravos e mulatos e declarou: "O Brasil é um inferno para os negros, um purgatório para os brancos e um paraíso para os mulatos." No entanto, essa afirmação não deve ser interpretada estritamente em termos biológicos ou raciais, mas sim como uma reflexão sobre aspectos sociológicos da sociedade. Ela aponta para uma compreensão mais profunda das relações raciais no Brasil, indo além da mera questão de raça, o contexto das teorias raciais predominantes na época, que eram racistas e eurocêntricas, a mistura racial era vista com horror, e a miscigenação era considerada prejudicial. Teóricos como o Conde de Gobineau acreditavam que a mistura de raças levaria ao declínio da sociedade, no entanto, DaMatta observa como Antonil destaca a singularidade do "racismo à brasileira" ao considerar o valor positivo da miscigenação, Gobineau e outros teóricos do racismo viam a mistura como algo a ser evitado a todo custo, e a palavra "mulato" era associada a algo híbrido e incapaz de reproduzir-se. O preconceito dessas teorias era baseado na proibição do contato íntimo entre raças vistas como diferentes, no entanto, o capítulo aborda a questão de forma simbólica, associando o branco ao purgatório, o negro ao inferno e o mulato ao paraíso. Ele reconhece o valor positivo da categoria intermediária representada pelo mulato e a capacidade brasileira de aceitar e celebrar essa ambiguidade, a sociedade brasileira não se encaixa em um sistema dualista estrito, como o dos Estados Unidos, mas permite a coexistência de uma ampla variedade de categorias intermediárias, o autor também aponta que a sociedade brasileira não se baseia em igualdade jurídica, mas em hierarquia e graduações, tornando o preconceito mais sutil e difícil de combater. No entanto, ele defende que a democracia racial só será possível quando todos os brasileiros forem iguais perante a lei, desafiando a mitologia das "três raças formadoras" e reconhecendo a desigualdade subjacente à sociedade brasileira. Em resumo, o texto aborda a complexidade das relações raciais no Brasil, destacando como o "racismo à brasileira" difere do "racismo à europeia" ou "racismo à americana". DaMatta enfatiza a importância de reconhecer as raízes históricas e sociológicas do preconceito no país e a necessidade de garantir igualdade perante a lei para alcançar uma verdadeira democracia racial.
Capítulo 4 – Sobre comidas e mulheres...
No capítuloquatro o autor enfatiza a importância dos alimentos, da comida e da cozinha na sociedade brasileira, ressaltando a relação entre esses elementos e a construção de identidades culturais e sociais. DaMatta destaca também a influência do antropólogo Claude Lévi-Strauss, que relacionou os processos naturais do "cru" e "cozido" não apenas aos alimentos, mas também a transformações sociais, a comida é vista como um símbolo que permite entender a sociedade, integrando aspectos intelectuais e sensoriais, unindo olhar, gosto e cheiro. A relação entre o "cru" e o "cozido" é usada como metáfora para compreender o dilema entre a pressa (selvageria) e a calma (civilização), e a distinção entre "alimento" e "comida" é destacada, onde o primeiro se refere à simples ingestão para sobrevivência, enquanto o segundo envolve prazer e comensalidade, marcando identidades e estilos de vida. O texto também aborda a relação entre comida e sexualidade, destacando como a metáfora de "comer" se aplica ao ato sexual, onde o comido é absorvido pelo comedor, mulheres desempenham um papel crucial nessa metáfora, com algumas sendo consideradas "comidas" e outras sendo as responsáveis pela cozinha e pela comensalidade na casa. A culinária brasileira é caracterizada pela preferência por alimentos cozidos que misturam elementos sólidos e líquidos, refletindo a mistura e a relação entre diferentes culturas e raças no Brasil, a comida é vista como um ato coletivo que reforça relações sociais e hierarquias na sociedade. No geral, o texto explora a complexa relação entre comida, sexo, cultura, identidade e sociedade no Brasil, destacando como a comida é mais do que apenas uma necessidade física, mas um elemento essencial na construção da cultura brasileira e das relações interpessoais.
Capítulo 5 – O carnaval ou o mundo como teatro do prazer
O quinto capítulo explora a dualidade entre a rotina e os momentos extraordinários na vida das sociedades, onde o autor destaca como todas as culturas alternam entre esses polos, como trabalho e festa, ordem e caos, memória e esquecimento. A mudança da rotina para o extraordinário é influenciada por diversos fatores e é fundamental para a formação da memória individual e social, no contexto brasileiro, Roberto DaMatta enfatiza que a rotina está associada ao trabalho, obrigações e castigos, enquanto o extraordinário, exemplificado pelo carnaval, é uma oportunidade de escapar dessa rotina e de se libertar por um curto período de tempo da rotina, que é quase como um castigo pro indivíduo brasileiro. O carnaval é descrito como um evento de liberdade, alegria e inversão das normas sociais, onde as pessoas podem expressar sua individualidade e se libertar das hierarquias rígidas que dominam o cotidiano, a festa permite a troca de uniformes por fantasias, a competição e a crítica social aberta, rompendo com as convenções habituais. O autor argumenta que o carnaval é uma reviravolta positiva e desejada na vida social, onde as pessoas podem experimentar o mundo como um excesso de prazer e liberdade, além disso, o carnaval é visto como uma forma de solidariedade, onde as diferenças são temporariamente superadas em prol da celebração coletiva. Em resumo, o texto discute a importância dos momentos extraordinários, como o carnaval, na vida das sociedades, destacando como esses eventos permitem a inversão das normas sociais e a expressão da individualidade, criando um senso de liberdade e igualdade temporárias.
Capítulo 6 – As festas da Ordem
O sexto capítulo explora e fala sobre o papel das festas na sociedade, destacando como elas permitem oscilações entre uma visão alegre e uma leitura soturna da vida, festas criam temporalidades diferenciadas, promovendo tanto momentos de rápida intensidade, como o carnaval, quanto celebrações lentas e pesadas, como rituais da ordem e formalidades. As festas recriam tempo, espaço e relações sociais, realçando aspectos muitas vezes despercebidos na vida cotidiana, nas festas, aspectos como talento, beleza, classe social, preconceito e alegria são descobertos e destacados, elas proporcionam a consciência de diferenças sociais e a celebração do mundo tal como ele é no dia a dia, DaMatta ainda diferencia festas da ordem, que reforçam a estrutura social existente, daquelas que promovem a "desordem" ou orgias, que desafiam as normas sociais. No contexto brasileiro, as solenidades promovem a ligação entre casa, rua e outro mundo de maneiras específicas, o carnaval busca abrir portas e muralhas, enquanto ritos cívicos e religiosos celebram a ordem social e suas hierarquias. Os rituais religiosos destacam a verticalidade na relação entre Deus, santos e fiéis. Os ritos da ordem buscam manter as diferenças e gradações sociais. O texto também aborda a contenção física e social nos rituais da ordem, enfatizando a rigidez dos gestos e o comportamento solene. Essa contenção visa promover a ordem, o respeito e a uniformidade nas solenidades, além disso, DaMatta explora como os rituais ressaltam a distinção entre o mundo profano e o sagrado. Os rituais também desempenham um papel fundamental em eventos de passagem, como nascimentos, casamentos e funerais e celebram exemplos, modelos e ajudam a dar sentido à vida. Por fim, o autor enfatiza a importância de eventos centrais, como a mesa e o bolo em festas de aniversário, que coordenam a ação e a atenção de todos os participantes e destaca a presença de ritmo social, com oscilações entre forma e conteúdo, continência física e excesso, festas são descritas como momentos eternos ritualizados, sempre passageiros.
Capítulo 7 – O modo de navegação social: A malandragem e o “Jeitinho”
O capítulo discute a relação dos brasileiros com as leis e normas universais, destacando o dilema entre a ordem e o excesso, representado pelo Carnaval e pela malandragem, nele DaMatta argumenta que os brasileiros têm uma tendência a buscar "jeitinhos" para contornar as regras e fazer com que elas se adequem às suas necessidades pessoais, o famoso “jeitinho brasileiro”, e que muitas vezes, fazem isso em detrimento do bom senso e da coletividade. O autor menciona ainda, a oscilação entre as leis universais, que deveriam valer para todos, e as relações pessoais, que funcionam apenas para quem as possui. Essa oscilação resulta em um sistema social dividido entre o sujeito das leis universais e o sujeito das relações sociais, com a malandragem, o "jeitinho" e o famoso "sabe com quem está falando?" sendo estratégias para lidar com essas contradições. Ele também compara a situação no Brasil com países como Estados Unidos, França e Inglaterra, onde as regras são geralmente obedecidas ou não existem, nessas sociedades, a lei é vista como um instrumento que faz a sociedade funcionar bem, em vez de explorar ou submeter o cidadão. Além disso, ele explora o conceito de malandragem como um modo de navegação social brasileiro, destacando que o malandro é alguém que encontra maneiras criativas de lidar com as leis e as normas sociais, muitas vezes usando relações pessoais para alcançar seus objetivos. Por fim, o capítulo enfatiza que a malandragem não é apenas um aspecto cultural sem consequências, mas sim um modo de ser e uma estratégia para encontrar harmonia em um sistema social profundamente dividido, a malandragem é vista como um valor social que permite aos brasileiros conciliar a lei com a realidade social diária, muitas vezes através de jeitos e acordos casuísticos. Em resumo, o texto aborda a relação complexa dos brasileiros com a lei e as normas universais, destacando a malandragem e os "jeitinhos" como estratégias para lidar com essa ambiguidade e encontrar harmonia em um sistema social dividido.
Capítulo 8 – Os caminhos para Deus
Neste capítulo, DaMatta destaca a importância dos espaços religiosos na sociedade brasileira e como eles são considerados fundamentais, a casa e a rua são citadas como espaços onde as pessoas vivem suas vidas cotidianas, enquanto os espaços religiosos, como igrejas, capelas, terreiros, sinagogas, templos e cemitérios, marcam as fronteiras entre o mundo dos vivos e o "outro mundo" habitado por mortos, espíritos e divindades. DaMatta ressalta que a comunicação com o divino difere da comunicação no mundo cotidiano, e que enquanto na vida comum usamos a linguagem do dinheiro e números, na religião, buscamos uma comunicação mais direta com Deus, santos e outras entidades divinas, envolvendo preces, súplicas e rituais formais. As formas coletivas de comunicação incluem a cantoria, que reúne os pedidos em uma só voz para "subir" aos céus, a verticalidade é destacada, relacionando o "alto" com tudo o que é nobre e poderoso, habitado por anjos e santos, enquanto o "baixo" representa a terra, onde vivemos. As práticas religiosas buscam ligar essas esferas, permitindo a comunicação entre o mundo terreno e o divino, ele também menciona a importância das promessas e oferendas como parte da comunicação com o divino, pois elas representam um compromisso mais profundo e dramático. A relação com Deus e entidades divinas é baseada na sinceridade, humildade e promessas de renunciar às pompas terrenas. O texto discute a variedade de religiões no Brasil, com ênfase no catolicismo e em outras tradições, incluindo religiões afro-brasileiras e o espiritismo kardecista. Apesar das diferenças, todas compartilham a ênfase na comunicação com o divino e a importância das relações pessoais com entidades protetoras. Além disso, o texto explora como a religião oferece explicações para infortúnios e injustiças, assim como marca momentos significativos na vida das pessoas, como nascimentos, casamentos e funerais. A religião serve para legitimar a organização da sociedade e explicar as diferenças de poder, com uma ressalta a pessoalidade na relação dos brasileiros com o divino, destacando a importância de santos e entidades protetoras. A pluralidade de crenças e práticas religiosas no Brasil é vista como complementar, refletindo a comunicação íntima e direta entre os fiéis e o divino, em suma, DaMatta enfatiza como a religião desempenha um papel fundamental na vida e na cultura brasileira, proporcionando uma conexão entre o mundo terreno e o espiritual, com ênfase na pessoalidade e nas diversas formas de comunicação com o divino.
Resenha final sobre o livro
Quando se pensa na antropologia, buscamos compreender coisas que parecem mais complexas ou desconhecidas da cultura e da sociedade, mas coisas que parecem simples, e rotineiras da nossa vida e do dia a dia, também podem ser absolutamente deliciosas de se estudar e compreender, nisto, o autor Roberto DaMatta tem total maestria. Seu livro “O que faz do brasil, Brasil”, é puro suco nacional,com todos os seus âmbitos, do doce ao salgado, do amargo ao azedo, mas tudo em um puro sabor do Brasil. Não do brasil, com “b” minúsculo, mas sim do país Brasil, descrito magnificamente por ele. DaMatta destrincha a rotina brasileira, os resquícios da terrível escravidão, a relação do brasileiro com o trabalho, o dogma da casa e a boêmia das ruas, o preconceito presente no Brasil e a miscigenação como grande debate teórico, debate o famosíssimo “jeitinho brasileiro” e como somos acostumados a corrupção da lei por meio da lábia, a nossa forte conexão cultural com a comida, e como a comida de une principalmente ao contexto e conotação sexual brasileiros como algo quente, cozido, ou cru, a libertação social momêntanea que o carnaval nos oferece em meio as suas músicas, fantasias e sua forte ligação com a rua. E por fim, sua análise absolutamente fantático do brasileiro e da religião, onde o brasileiro cria sua porta entre o mundano e o divino, o mundo dos vivos e o mundo dos mortos, em todas as suas religiões, que o influenciam diretamente. DaMatta é direto, e traz uma leitura dinâmica, ao qual o leitor se identifica como brasileiro, e solta breves sorrisos sinceros ao ler, pois cata o diário, a vivência e a essência brasileira de modo fantástico, é com certeza um ouro antropológico atemporal , perfeito para quem busca reconhecer a identidade nacional.