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edições / edição 4
primeira pessoa
Alexander Kluge:
«Temos de arrancar a
madeira dos salões e
construir jangadas»
António Guerreiro
Frankfurt. Foi nesse círculo que manteve uma proximidade intelectual e uma
amizade com Adorno que marcam decisivamente a sua obra. Um livro de 1972,
escrito com Oscar Negt, com um título longo (Öffentlichkeit und Erfahrung. Zur
foi elaborada na sua obra, com uma enorme inteligência, longe das cristalizações
se deixa apreender nas formas canónicas dos géneros. A sua obra literária integra a
percursos sinuosos, não lineares, nesse edifício de muitas entradas, muitas saídas
e virtualmente sem fim. De igual modo, os seus filmes (longas metragens, curtas
cinema foi como estagiário ao lado de Fritz Lang (ao qual foi recomendado por
Adorno). Mas dessa iniciação iria emancipar-se com grande convicção, quando
filmou as suas primeiras curtas metragens, no início dos anos 60. E em 1962
cinematográfica. Com alguma razão ele dirá que é um iconoclasta (mas acrescenta:
«um iconoclasta moderado»). E quando fez uma pausa longa nas lides
que elas estavam, por lei, obrigados a difundir), também aí se revelou um inovador
A passagem à literatura deu-se cedo e não se pode dizer que Kluge prosseguiu as
vias do cinema por outros meios. Sempre afirmou que há uma diferença irredutível
entre a arte das imagens e a arte das palavras e que não transitou de uma para a
outra como se seguisse uma via contínua e directa. Os milhares de páginas da sua
oficina textual), tudo faz parte dessa sinfonia monumental, em vários volumes, que
quase sozinho essa tarefa de lidar com o passado alemão. Não apenas o passado
mais recente: ele achou que devia contar a história infeliz da Alemanha, seguindo
contemporâneo de Ovídio e faz com que o poeta russo Mandelstam também o seja.
Toda a sua obra consiste na criação de cronologias que não são as do calendário
Kluge assumiu com um sentido crítico em relação ao tempo em que vivemos que o
apresentar este livro que tinha acabado de ser publicado em França (uma edição
que não é meramente uma tradução, é uma reconstrução da sua obra literária)
repetia com grande entusiasmo a palavra «inquiétance» (ainda que falasse sempre
Fotogramas de Die Artisten in der Zirkuskuppel: ratlos [Os Artistas sob a Cúpula de Circo: Perplexos], 1968 (detalhes)
mistura de ficção e documentário sobre o raid aéreo que destruiu a sua cidade
uma guerra por meios aéreos. Os aviões de guerra passam por cima e
bombardeiam mutuamente.
distâncias, o que faz com que sejam mais perigosos. E as casas são
AG Chamou ao século XX o «século negro». Não é fácil pensar que é possível subir
nessa escala…
agora esponjosa. E é isso, a essa incerteza sobre o que é real, que chamo
representar.
AK Hoje à noite, haverá uma leitura cénica dos meus textos que se
pessimismo. Por volta de 1900 podia-se ser pessimista, era uma moda.
Mas quando o Titanic se afunda e nós estamos no interior dele não nos
acaba de sair, com o título The Snows of Venice, com textos do próprio
desenhos.
com a cabeça.
AG Refere-se ao facto de eles nem sempre se terem entendido bem, de ter havido
AG Mas o senhor é fiel a essas duas dimensões? Integra a diferença entre Benjamin
e Adorno?
precisa. O que eu faço é também teoria. As palavras não são cavalos com
não são livres. Eu, por exemplo, posso partir de erros para fazer uma
conta que tem em conta Dada e os dadaístas, mas assim que começa a
de Dada na Bauhaus.
teórico e do narrativo.
isso é a literatura. De Ovídio até hoje, dos rabinos na Babilónia até hoje
AK Sim, sim. Os Denkbilder têm uma parte, por baixo, que é alegórica,
poesia faz.
literária.
tiverem força gravitacional, esta força faz com que eles se abreviem uns
exactamente tão bom como antes, mas é outro corpo celeste na força
apesar do seu tamanho não ser maior do que um campo de futebol. Não
uma história neste livro, uma Anna Karenina de 1915, que não se
uma febre, e a mãe não o consegue deixar sozinho. O marido dela chega
uma vitória do filho. Quem vence é quem mais precisa do amor da sua
ópera.
aérea dos EUA e bombardeia Tóquio, e faz com que a cidade arda. E
tem a infelicidade de Tróia sob os seus pés. Ele chega a Cartago e mata
em 1914 e Franz Castorp vai à Grande Guerra. Este é o método que uso
porque já existe a grande literatura. Não devo repetir Musil, embora ele
[...]
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