A Constituição Federal de 1988, em seu Artigo 216, ampliou o conceito de patrimônio
estabelecido pelo Decreto-lei nº 25, de 30 de novembro de 1937, substituindo a
nominação Patrimônio Histórico e Artístico, por Patrimônio Cultural Brasileiro. Essa alteração incorporou o conceito de referência cultural e a definição dos bens passíveis de reconhecimento, sobretudo os de caráter imaterial. A Constituição estabelece ainda a parceria entre o poder público e as comunidades para a promoção e proteção do Patrimônio Cultural Brasileiro, no entanto mantém a gestão do patrimônio e da documentação relativa aos bens sob responsabilidade da administração pública. Enquanto o Decreto de 1937 estabelece como patrimônio “o conjunto de bens móveis e imóveis existentes no País e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico”, o Artigo 216 da Constituição conceitua patrimônio cultural como sendo os bens “de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira”. Nessa redefinição promovida pela Constituição, estão as formas de expressão; os modos de criar, fazer e viver; as criações científicas, artísticas e tecnológicas; as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. O Iphan zela pelo cumprimento dos marcos legais, efetivando a gestão do Patrimônio Cultural Brasileiro e dos bens reconhecidos pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) como Patrimônio da Humanidade. Pioneiro na preservação do patrimônio na América Latina, o Instituto possui um vasto conhecimento acumulado ao longo de décadas e tornou-se referência para instituições assemelhadas de países de passado colonial, mantendo ativa cooperação internacional. Nesse contexto, o Iphan constrói em parceria com os governos estaduais o Sistema Nacional do Patrimônio Cultural, com uma proposta de avanço disseminada de maneira contínua para os estados e municípios em três eixos: coordenação (definição de instância(s) coordenadora(s) para garantir ações articuladas e mais efetivas); regulação (conceituações comuns, princípios e regras gerais de ação); e fomento (incentivos direcionados principalmente para o fortalecimento institucional, estruturação de sistema de informação de âmbito nacional, fortalecer ações coordenadas em projetos específicos). Trabalhando com esses conceitos e visando facilitar o acesso ao conhecimento dos bens nacionais, a gestão do patrimônio é efetivada segundo as características de cada grupo: Patrimônio Material, Patrimônio Imaterial, Patrimônio Arqueológico e Patrimônio Mundial.
Política de Patrimônio Cultural Material
Consolidada pelo Iphan, a Política de Patrimônio Cultural Material (PPCM) foi instituída pela Portaria Nº 375, de 19 de setembro de 2018. Esta normativa servirá de guia para ações e processos de identificação, reconhecimento, proteção, normatização, autorização, licenciamento, fiscalização, monitoramento, conservação, interpretação, promoção, difusão e educação patrimonial relacionados à dimensão material do Patrimônio Cultural Brasileiro. A consulta pública - aberta pelo Iphan - permitiu que toda a sociedade participasse com contribuições que resultaram no texto final do documento. A PPCM consolida princípios, premissas, objetivos, procedimentos e conceitos para a preservação do Patrimônio Cultural Brasileiro de natureza material, que se formaram e modificaram ao longo das décadas. Pessoas físicas e instituições públicas e privadas contribuíram com o texto final, entre elas a Casa de Oswaldo Cruz (Fiocruz), o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), o Grupo de Estudos e Pesquisas em Política e Território (Geoppol/UFRJ), a Vale S.A. – Licenciamento Ambiental, a Rede Paulista de Educação Patrimonial (Repep), e o Museu de Astronomia e Ciências Afins. A Política de Patrimônio Cultural Material traz inovações importantes para os procedimentos que envolvem a preservação e valorização do patrimônio cultural. Mas, permeando todas elas, está o objetivo de promover a construção coletiva dos instrumentos de preservação, garantindo assim a legitimidade das ações do Iphan junto às comunidades e também entre os agentes públicos. Esse objetivo decorre de diversos princípios, sobretudo da indissociabilidade entre os bens culturais e as comunidades, da participação ativa na elaboração de estratégias e da colaboração entre as esferas do Poder Público e a comunidade.
Declaração de Lugares de Memória - Este é instrumento de proteção
inédito: por meio desse reconhecimento, ainda que um bem cultural tenha perdido sua integridade e autenticidade, em consequência da ação humana ou do tempo, o Iphan poderá reconhecer a importância de seus valores simbólicos. Povos e Comunidades Tradicionais - Estão contempladas, na PPCM, as especificidades culturais de povos e comunidades tradicionais. Em relação os povos indígenas, está contemplado o direito de autodefinição de suas próprias prioridades em processos que envolvam a preservação de seu legado cultural. Dessa forma, passa a valer para a política de patrimônio material o princípio que aplicado ao patrimônio imaterial, legando aos detentores dos bens culturais o protagonismo na construção das ações de preservação e contribuindo para a superação da divisão entre as duas vertentes de proteção. Paleontologia e Espeleologia - A normativa clareia alguns pontos em relação às competências do Iphan, como é o caso do patrimônio paleontológico e do espeleológico. De acordo com o texto, a esses bens culturais somente cabe proteção do Iphan quando for constatada a existência de valores referentes à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira. Princípios, Premissas e Objetivos - O documento apresenta 18 princípios, que vão da Humanização, apontando para a melhoria na qualidade de vida do ser humano; até chegar ao Princípio do Controle Social, que estabelece que o cidadão é parte legítima para monitorar as ações desenvolvidas pelo Iphan. Entre as premissas encontram-se a busca da superação da divisão das dimensões materiais e imateriais do Patrimônio Cultural, a compreensão do tempo presente na abordagem dos bens culturais, a leitura do território e das dinâmicas sociais nele existentes, o estímulo ao fortalecimento dos grupos sociais para preservação de seu Patrimônio Cultural e a articulação entre as esferas de governo para compartilhamento de competências. Os cinco objetivos são a qualificação e ampliação das ações e atividades de Preservação do Patrimônio Cultural de Natureza Material; o estabelecimento de práticas para construção coletiva dos instrumentos de preservação; a institucionalização das práticas e instrumentos de preservação sugeridos pelo Comitê do Patrimônio Mundial; o detalhamento dos entendimentos institucionais sobre termos e conceitos específicos; e o fortalecimento da Preservação do Patrimônio Cultural de Natureza Material de povos e comunidade tradicionais.