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HISTÓRIA

1933: Incêndio no Reichstag era golpe na


democracia alemã
As chamas que em 27 de fevereiro de 1933 queimaram o Reichstag, em
Berlim, incendiaram também a frágil democracia alemã. Hitler soube usar
o ataque, conduzido por um jovem holandês, para ampliar e consolidar
seu poder.
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Milhares de berlinenses afluíram na noite de 27 de fevereiro de 1933 ao
Reichstag, em Berlim. Em pouco tempo, a notícia já havia se espalhado: o
prédio do Parlamento alemão estava em chamas. Centenas de policiais
impediam o acesso ao local, enquanto os bombeiros berlinenses tentavam
apagar o fogo. Em vão: o plenário foi completamente destruído pelas chamas.

Curiosos e indignados seguiam rumo ao Reichstag, mas não apenas eles. As


lideranças nazistas também se apressavam. Pouco antes, um nazista agitado
tentara falar com o chanceler do Reich, há pouco dias no cargo, Adolf Hitler:
"Diga a ele que o Reichstag está em chamas". Joseph Goebbles, líder do
partido nazista, o NSDAP, em Berlim, reagiu à mensagem com a pergunta "isso
é uma piada?" Pouco depois, seguiam os dois – Goebbels e Hitler – rumo ao
Reichstag em chamas.
Reichstagsbrand em chamas, em 1933Foto: Getty Images

Hitler estava perturbado quando chegou ao local. Ele não lamentava pelo
Parlamento como instituição, já que sempre desprezou a democracia. O que
mais o incomodava era a suposição de que teriam sido seus arqui-inimigos, os
comunistas, os responsáveis pelo incêndio. A intenção, segundo Goebbels,
era, "por meio do incêndio e do terror, causar tumultos e, em meio ao pânico
geral, tomar o poder".

Em fins de fevereiro de 1933, os nazistas ainda não haviam se consolidado no


poder, pois somente em 30 de janeiro de 1933 é que o presidente do Reich,
Paul von Hindenburg, havia nomeado Hitler para o cargo de chanceler. Hitler
não tinha a menor intenção de deixar o poder, e seu grande receio era uma
possível insurreição dos comunistas. Agora, diante de um Reichstag em
chamas, ele via um suposto fundamento para suas preocupações.
Rapidamente os principais suspeitos começaram a ser ouvidos: dentro do
prédio em chamas, a polícia havia prendido um jovem de nome Marinus van
der Lubbe. O holandês de 24 anos estava há pouco tempo na capital alemã.
Rapidamente, as investigações mostraram que Van der Lubbe mantinha
ligações com os comunistas. Ele confessou ter provocado o incêndio – mas
sozinho, em protesto contra a ascensão ao poder dos nazistas.

Hitler não acreditava nessa versão. Ele teria reagido de maneira totalmente
histérica ao relato de que uma única pessoa teria incendiado o Reichstag. E,
teimosamente, insistiu que uma conspiração comunista estava por trás de tudo.
"Se esse incêndio, como acredito, tiver sido obra dos comunistas, precisamos
exterminar essa peste assassina com punho de ferro", esbravejou o Führer em
um de seus notórios ataques. Hermann Göring, comandante da polícia
prussiana, declarou estado de alarme máximo, autorizando seus subordinados
a usar armas de fogo.
Nazistas colocaram a culpa em seus adversários comunistasFoto: Ullstein
Para os nazistas, o incêndio do Reichstag oferecia uma oportunidade única, o
que Hitler reconheceu de imediato. A população estava profundamente
insegura. E as elites conservadoras de burocratas, políticos e militares temiam
uma tomada de poder pelos comunistas.

Ainda na mesma noite, a polícia recebeu de Göring a instrução de prender


deputados comunistas e funcionários do partido. Especialmente cruel era o
comportamento das tropas nazistas da SA (Sturmabteilung, literalmente
departamento de assalto). Elas levaram incontáveis pessoas para prisões
provisórias, em sua maioria localizadas em porões. Lá, os membros da SA
torturavam os prisioneiros. Alguns não sobreviveram. Até abril, em torno de 25
mil pessoas foram detidas.

Na sede do governo, o tumulto também era grande. Com toda pressa, foi
emitida uma portaria de defesa contra a suposta ameaça comunista. Ou seja,
no dia 28 de fevereiro de 1933, Von Hindenburg assinaria o Decreto do
Presidente do Reich para a proteção do povo e do Estado, que eliminava a
liberdade de expressão, de opinião, de reunião e de imprensa. O sigilo do
correio também era abolido. Além disso, o governo em Berlim ganhava poderes
para "intervir" nos estados, a fim de garantir "a paz e a ordem".

Com o Decreto do Incêndio do Reichstag, como ele ficou conhecido a seguir,


os nazistas passaram a dispor da ferramenta decisiva para combater seus
inimigos. Sem provas nem controle jurídico, eles podiam agora deter qualquer
um que lhes fosse desconfortável. Jornais de oposição, por exemplo, foram
logo proibidos.
Possível mentor do incêndio: Marinus van der Lubbe Foto: Ullstein

Grande parte da população acreditava naquilo que estava escrito nos jornais,
ou seja, que os comunistas tinham tentado dar um golpe. Um periódico bávaro
aplaudia: "Por isso, saudamos as últimas medidas de emergência".

O fim das liberdades democráticas era aceito em silêncio. Hitler deixou-se


festejar como o salvador da Alemanha diante do perigo do comunismo. Uma
sobrevivente de Hamburgo lembra que "a fama de Hitler foi às alturas". A
portaria de emergência do dia 28 de fevereiro de 1933 foi um duro golpe na
frágil democracia da República de Weimar e uma importante etapa na caminho
para a ditadura nazista.

Frequentemente surgem boatos de que os próprios nazistas teriam incendiado


o Reichstag, a fim colocar a culpa nos comunistas. Mas a maioria dos
historiadores afirma que realmente tratou-se de um ato isolado, conduzido por
Marinus van der Lubbe.

Fato é que Hitler reconheceu a oportunidade e fez uso dela. Ao ver o Reichstag
em chamas, ele teria dito: "Agora não há mais piedade. Quem se colocar no
nosso caminho, será eliminado". Nos 12 anos que se seguiriam, ele
transformaria essas palavras em realidade, da maneira mais cruel e horrível
possível. (Marc von Lüpke-Schwarz)

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