Você está na página 1de 48

12

1 - INTRODUÇÃO:

O presente trabalho vem definir o que é extrativismo vegetal, quais benefícios o


extrativismo do coco macaúba geram à comunidade de Riacho D’anta e quais os benefícios
podem trazer para a agricultura familiar no Norte de Minas Gerais. A atividade do
extrativismo do coco macaúba é antiga, porém era feita para a alimentação dos animais. O
Coco Macaúba (Acrocomia aculeata (Jacq.) Lood. ex Mart.) é uma palmeira frutífera,
tipicamente brasileira e com ampla distribuição geográfica no Brasil.
Esta espécie apresenta ampla utilidade e mais recentemente seu fruto tem despertado
grande interesse sócio-econômico por sua capacidade de produção de óleo vegetal. A
utilização do óleo de macaúba para a produção de biodiesel com a participação a agricultura
familiar elevaria a demanda por esta planta e ajudaria a promover o desenvolvimento sócio-
econômico de muitas regiões problemáticas no país. Em meio a várias utilidades da macaúba,
são relatados os usos medicinais, alimentícios, cosméticos, oferecendo também potencial para
produção de biodiesel, e proporcionando vantagens ambientais, econômicas e sociais. Através
de programas de geração de empregos e renda para os agricultores, essa nova fonte de
extrativismo poderá contribuir também para erradicação da miséria, freando correntes
migratórias internas por contribuir com a fixação das famílias a terra.
Neste contexto, este trabalho tem como tema e objetivo geral analisar o extrativismo do
coco macaúba com desenvolvimento sustentável e preservação ambiental na comunidade de
Riacho D’anta, zona rural de Montes Claros – MG. Como objetivos específicos, procuramos
investigar as diversas formas de emprego e renda que podem ser gerados pelo extrativismo na
comunidade; relatar os usos e potencialidades do coco macaúba; informar localização,
características e aspectos da comunidade estudada; descrever a prática do extrativismo na
comunidade e o associativismo na exploração do coco macaúba.
A macaúba foi escolhida para o desenvolvimento desse estudo, devido sua importância
para comunidade de Riacho D’anta e para as comunidades vizinhas, por ser uma das
principais fontes de óleo vegetal no Brasil e pelo potencial que tem de mudar a vida das
pessoas. Assim, a macaúba precisa ser melhor explorada no Norte de Minas Gerais para que
possa ser responsável pela melhoria na qualidade de vida de muitas famílias na região. Este
trabalho tem ainda como justificativa informar que o aproveitamento da biodiversidade nativa
é uma estratégia importante na promoção de benefícios sociais e ambientais. Presente no
Cerrado, a macaúba tem grande potencial de ser usada como alternativa ao desmatamento,
13

pois seus frutos podem ser transformados em diversos produtos, e contribuindo assim para um
desenvolvimento sustentável e para a preservação ambiental.
Para fazermos uma análise mais profunda do tema, utilizamos primeiramente, a pesquisa
e análise bibliográfica para a fundamentação teórica. Além disto, o trabalho configura-se na
pesquisa oral, para relatar fatos e dados representativos sobre a temática, fazendo uso de
entrevistas com associados e pessoas que estão diretamente ligados ao extrativismo do coco
macaúba. Utilizamos também a pesquisa empírica, tendo como procedimentos técnicos a
coleta de dados e informações juntos à associação comunitária, a Unidade de Beneficiamento
de Coco Macaúba – UBCM, a órgãos públicos e instituições.
14

2 - EXTRATIVISMO DO COCO MACAÚBA - BREVES CONSIDERAÇÕES

O Extrativismo são todas as atividades de coleta de produtos naturais, sejam estes


produtos de origem animal, vegetal ou mineral. É a mais antiga atividade humana,
antecedendo a agricultura, a pecuária e a indústria. Praticada mundialmente através dos
tempos por todas as sociedades.
Até o início do século XIX o conceito de extrativismo baseava-se nas idéias dos
Naturalistas, nas grandes descobertas científicas, nas grandes viagens, enfim, na "mãe
natureza" e na riqueza nela contida, pensamento que foi reforçado pela Revolução Industrial e
pelas teorias de Karl Marx, onde tudo era produto e que os recursos naturais passaram a ser
chamados de matérias-primas, tidas como inesgotáveis e seu consumo controlável pelo
homem.
Já no século XX com o avanço das tecnologias e do crescimento populacional, o
homem começou a perceber que esta matéria-prima oriunda dos recursos naturais eram
esgotáveis. Desta maneira surgiram novas idéias com relação a sustentabilidade dos
ecossistemas, as quais foram colocadas em prática através dos chamados projetos de
desenvolvimento sustentável.
Assim, um novo perfil sobre as atividades extrativistas no mundo começou a ser
delineado e as ações do homem com relação ao extrativismo sofreram profundas alterações, o
que inicialmente tinha apenas um caráter ideológico passou à prática e as ações de
sustentabilidade tornaram-se perceptíveis. Baseado nessas atividades extrativistas e em ações
de sustentabilidade iniciou-se o extrativismo do coco macaúba.
A palmeira macaúba (Acrocomia aculeata (Jacq.) Lood. ex Mart.), também muito
conhecida por bocaiuva, é uma espécie arborescente perene, frutífera, nativa das florestas
tropicais, tipicamente brasileira, com ampla distribuição geográfica, e cuja principal
característica é a presença de espinhos escuros, longos e pontiagudos na região dos nós.
A macaúba possui o nome científico de Acrocomia aculeta. Sua etimologia refere-se à
acrocomia – que significa “mecha na altura”, e aculeata – espinhenta – pois em geral ela
possui espinhos ou acúleos em seu caule. A espécie acrocomia aculeata, ex-família Palmae,
está classificada atualmente dentro da família Arecaceae, sendo o gênero Acrocomia
constituído por apenas duas espécies – A. aculeata (Jacq.) Lodd. ex Mart. e A. hassleri (B.
Rodr.) W. J. Hahn. Estas espécies diferem basicamente pelo tamanho dos indivíduos e por sua
localização geográfica. Essa palmeira pode variar de 5 a 20 metros de altura e o período de
15

floração é de setembro a janeiro. O fruto leva de 13 a 14 meses para amadurecer. A. aculeata


possui porte maior, estando amplamente presente nas regiões secas da América Tropical. A
macaúba tem distribuição que se estende do México à Argentina, embora sua ocorrência seja
mais abundante nas Antilhas, Costa Rica, Paraguai e Brasil.

2.1 - A ocorrência do coco macaúba no Brasil e em Minas Gerais

No Brasil, o coco macaúba é abundantemente encontrado nos estados do Ceará, Minas


Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do
Sul. Bondar apud CETEC - Centro Tecnológico de Minas Gerais (1983) considera algumas
das denominações como sinonímias botânicas, e que são reconhecidas apenas 15 espécies, das
quais 10 são encontradas no Brasil. No Paraguai, o mbocaiá ou coquito, denominações
vulgares da Acrocomia total Mart. forma extensos adensamentos naturais, sobretudo nas
zonas central e norte do País, onde se estima uma população superior a seis milhões de
palmeiras espalhadas numa área em torno de 300 mil hectares. Fonseca (1954) relata que no
decorrer de milhões de anos as palmeiras adaptaram-se às condições mais variadas do clima e
do solo. A maioria prosperou no clima equatorial quente e úmido. Outras suportaram
prolongados estios dando-se bem no clima árido, semidesértico. Outras ainda, saíram do
cinturão tropical, suportando temperatura abaixo de zero. Crescem no solo bom, próprio para
agricultura. Adaptaram-se também aos solos ácidos, silicosos, estéreis, nos quais nenhuma
planta econômica cultivada poderia se desenvolver. Elas crescem nos brejos, como também
nos rochedos secos, sem solo decomposto algum.
Do ponto de vista econômico, nos últimos anos, em razão dos altos preços do óleo de
babaçu, importadores brasileiros vêm demonstrando crescente interesse na aquisição do óleo
de amêndoas do mbocaiá para fins cosméticos. Essa nova perspectiva econômica que tem, na
verdade, contribuído para a expansão da indústria de óleos no Paraguai, vem beneficiando em
contrapartida alguns setores fabricantes de equipamentos no Brasil, cujas vendas e assistência
técnica àquele país têm aumentado significativamente nos anos recentes.
16

n a A m é ric a

Figura 01 – Distribuição geográfica da espécie Acrocomia aculeata pela América


Tropical (Fonte: NEW WORLD FRUITS, 2006 – adaptado).

Embora a presença da macaúba seja verificada em quase todas as regiões do território


brasileiro, os povoamentos naturais mais densos da palmeira localizam-se em Minas Gerais,
Goiás e nos estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, notadamente nas áreas menos
colonizadas.
Novaes apud CETEC assinala também que:
Havia ocorrência nativa da macaúba em quase todos os municípios de São
Paulo, principalmente nas regiões circunvizinhas a Mogi-Guassu, Barretos,
Franca e Ribeirão Preto, onde aí aparecia com maior incidência. No entanto,
essas reservas da palmeira foram depois praticamente extintas para dar lugar
aos plantios sistemáticos de café. (CETEC, p. 16, 1983).

No Amazonas e Pará, a macaúba é encontrada segundo cognominações diferentes


mocajá, macujá ou bocaiuva, estendendo-se sua ocorrência aos estados do Nordeste,
especialmente Paraíba e Pernambuco, onde recebem a denominação vulgar de macaíba.
Mas é em Minas Gerais onde se verificam as maiores concentrações da macaúba, cuja
população distribui-se predominantemente em três microrregiões do Estado – Abaeté,
Jaboticatubas e Brasília de Minas.
Dentro do gênero Acrocomia, a espécie Aculeata apresenta como sinonímia botânica
vários nomes, entre todas, a Sclerocarpa é a palmeira de maior dispersão no País,
constituindo-se na espécie mais típica entre as palmáceas de Minas Gerais. No entanto, por ter
17

sido a primeira denominação do gênero, que foi introduzido por Martius em 1824, essa
variedade tem sido freqüentemente associada a outras espécies sem sofrer contestações. As
razões que se alegam para as eventuais dificuldades de identificação botânica da palmeira
estão relacionadas com a carência ou pouca disponibilidade de material representativo nos
herbários. Daí, ocasionalmente, confundir-se até mesmo as variedades mais disseminadas do
País, A. sclerocarpa e A. intumescens, que segundo Arens citado pela CETEC (1983)
possivelmente são espécies polimorfas. Além da diversificação de espécies, a dispersão de sua
ocorrência em quase todas as regiões do País resultou na multiplicidade de denominações
vulgares da palmeira, embora todas sejam subordinadas ao gênero Acrocomia (Quadro 01). A
sinonímia estrangeira é também vasta: coyol (Costa Rica, Panamá), Corozo (Venezuela),
Catey (República Dominicana), Mbocaiá ou Coquito (Paraguai, Argentina).

Quadro 01 – Distribuição do gênero Acrocomia no Brasil


Classificação Nome vulgar Ocorrência

A. sclerocarpa Mart. Macaúba, Coco Catarro, Coco Minas Gerais, Mato Grosso,
Baboso Pará,
Goiás, Rio de Janeiro

A. intumescens Drude Macaíba, Palmeira Barriguda, Pernambuco, Paraíba, Pará,


Macaíba Macujá, Macaúba Rio
de Janeiro

A. glaucophylla Drude Bacaiúba, Bacaiaúba, Macujá, Amazonas, Goiás e Mato


Bocaiúva Grosso

A. mokayayba Barb. Rodr. Bocaiúva, Macajaíba, Mato Grosso


Mbocaiúva
A. odorata, Barb. Rodr. Bocaiúva dos Pantanais Mato Grosso

A. microcarpa Barb. Mbocaiá, Mucujá, Mucajuba Amazonas


Rodr.
A. eriocantha Barb. Rodr. Mocajá-Mirim, Mocaiúba, Amazonas
Mucajá
A. wallaceana Drude Mocajá, Mucajá Pará, Amazonas

A. totai Mart. Mbocaiá Sul do Brasil, Paraguai,


Argentina
Fonte: CETEC, 1983.

O coco macaúba ainda é uma palmeira muito utilizada em Minas Gerais. Devido suas
várias utilidades, foi necessário conhecer melhor os locais de ocorrência desta palmeira.
A CETEC realizou estudos referentes ao zoneamento preliminar dos maciços naturais de
macaúba em Minas Gerais e eles foram desenvolvidos em três regiões do Estado: Região de
18

Belo Horizonte, Região de Abaeté e Região de Brasília de Minas, conforme destacado no mapa
1.

      

Regiões
de grande ocorrência
do coco macaúba
 

 
em Minas Gerais
 

 
N
 

 
Região de Brasília de Minas

Região da Grande Belo Horizonte Fonte: CETEC, 1983.


Org: COSTA, 2008.
 

 
Região de Abaeté
100 0 100 Km
200 Kilometers

      

Mapa 01 – Distribuição geográfica da macaúba em Minas Gerais

A pesquisa local nas áreas vizinhas da Grande Belo Horizonte revelou a existência de
densos povoamentos de macaúba em Betim, Igarapé, Santa Luzia, Esmeraldas, Jaboticatubas e
arredores da Serra do Cipó. As informações coletadas junto às saboarias ali existentes, ou
obtidas de moradores locais, prevêem nessa região um potencial anual de pelo menos 20 mil
toneladas de frutos. Algumas experiências de cultivo racional da macaúba, embora em escala
pouco significativa, foram realizadas em Jaboticatubas e na Serra do Cipó por duas saboarias
locais, através do transplante direto de pés nativos, com seis meses de idade, para as áreas de
teste, segundo espaçamento de 6 x 8 m aproximadamente. Outros municípios próximos de Belo
Horizonte, tais como Baldim, Santana do Riacho e Taquaraçu de Minas, possuem
adensamentos da palmeira onde se estima uma disponibilidade anual superior a 10 mil
toneladas de frutos.
A Região de Abaeté onde estão os municípios mineiros de Abaeté, Tiros, São
Gotardo e Matutina, de solos heterogêneos e sobretudo os cambissolos distróficos, latossolos
vermelho escuro e vermelho amarelo, caracteriza-se pela ocorrência abundante de densas
19

formações de macaúba, certamente as maiores do Estado, cujo potencial pode atingir números
superiores a 60 mil toneladas anuais de cocos. As concentrações da palmeira, nessa região de
forte influência agropastoril, foram calculadas em 100, 50 e 25 pés por hectare. Tendo em vista
a capacidade de regeneração da palmeira, a exploração racional e sustentada desses
povoamentos nativos, de forma a comportar não mais de 100 palmeiras por hectare, implicaria
no duplo aproveitamento de solo já que a área se prestaria ainda a outras finalidades, tais como
pastagens ou cultivo de plantios intercalares.
Na Região de Brasília de Minas o levantamento preliminar dos maciços nativos da
macaúba, de tipologia de cerrado, mostrou a presença de adensamentos da palmeira próximos à
sede do município e estendendo-se a ocorrência a outras áreas, em manchas esparsas e
descontínuas, principalmente em direção a Coração de Jesus, Mirabela e Montes Claros, e cuja
disponibilidade anual de frutos foi estimada em pelo menos 10 mil toneladas.
Segundo a CETEC (1983) as observações de campo sobre as formações nativas e
homogêneas da palmeira, como as verificadas em Igarapé, Tiros e Brasília de Minas,
demonstraram a incidência média de 4 cachos por pé e 300-500 frutos por cacho, a despeito
de esses maciços espontâneos não exigirem o emprego de qualquer prática agrícola. É lógico
presumir, portanto, que mediante a introdução de pequenos melhoramentos agrícolas, obter-
se-iam maiores rendimentos nas populações da palmeira já existentes no Estado.
A adaptação da macaúba nos solos menos férteis do cerrado, freqüentemente sujeitos as
grandes oscilações climáticas e pluviométricas, para sustentar os mesmos níveis de
produtividade verificados nos solos mais privilegiados, vai depender naturalmente da
utilização de práticas agronômicas dirigidas com ênfase na preparação e correção do solo.
Neste sentido, no estudo do CETEC (1983, p.23) consta que

as observações levantadas nas três regiões pesquisadas, através de informações colhidas


junto aos moradores dessas localidades ou durante as visitas realizadas às saboarias,
revelam que a disponibilidade média de cocos, diretamente comercializados às usinas
ou processados artesanalmente nas fazendas para diversos fins, não chega a ser superior
a 3 mil toneladas anuais. Essa oferta de matéria-prima oleaginosa é pouco significativa
se comparada com o potencial produtivo de frutos obtidos nos adensamentos da
palmeira existentes no Estado, atualmente estimado entre 100 mil a 150 mil toneladas
anuais de cocos, o que representa cerca de 20 mil a 30 mil toneladas de óleo.

As vantagens advindas do cultivo da macaúba, além da obtenção de insumos energéticos


ou alimentícios em rendimentos pouco vistos em outras espécies vegetais, residem ainda no
possível aproveitamento dos espaços desocupados entre as palmeiras com plantios intercalares
de outras oleaginosas, como pinhão-manso ou mamona, ou de culturas para fins alimentícios.
Outra possibilidade atrativa seria destinar essas áreas livres para pastagens, o que exigiria,
20

contudo, a introdução prévia de sistemas de captação dos frutos, como redes ou cestos,
posicionados no tronco da palmeira, a 1,5 ou 2,0 m do solo, de modo a impedir o consumo dos
frutos recém-caídos pelo gado e outros animais.
A densa ocupação do solo por vegetação diferente é um fator limitante ao crescimento da
macaúba, sendo poucos os pés que conseguem sobreviver nessas formações. Além do mais, as
possibilidades de germinação da semente são maiores nos terrenos cultivados e isentos de
plantas invasoras e que possam competir com a palmeira.
Constatou-se, além disso, nas áreas de maior concentração da palmeira, a predominância
dos cocais nas encostas elevadas e partes mais altas, enquanto nas baixadas a densidade de
palmeiras foi sempre pouco expressiva. Desta forma o CETEC (1983) afirma que conforme foi
observado nas três microrregiões visitadas, a distribuição da macaúba é bastante variável,
dependendo do grau de utilização agrícola do terreno, da fertilidade do solo e fatores limitantes
ao crescimento. Os maiores adensamentos da palmeira estão nos locais mais sujeitos ao manejo
agrícola.
Há autores como Motta, Curi, Oliveira-Filho e Gomes (2002) que afirmam que o Estado
de Minas Gerais possui outras três grandes regiões de ocorrência de macaúba: Alto Paranaíba,
Zona Metalúrgica e Montes Claros. A região de Montes Claros é relativamente mais quente e
mais seca do que as outras duas, porém as diferenças macroclimáticas regionais não chegam a
representar um fator limitante à ocorrência da macaúba.

1.2 - Potencialidades do coco macaúba e o extrativismo como forma de desenvolvimento


sustentável

Existe uma variedade muito grande de árvores frutíferas no cerrado brasileiro, muitas
delas inteiramente desprezadas ou mal aproveitadas, como é o caso da macaúba. Há várias
possibilidades para aproveitar o coco da macaúba e o valor econômico representado pela
macaúba pode ser avaliado em função das amplas possibilidades de seu aproveitamento
integral.
O extrativismo da macaúba deve ser incentivado, mas com a preservação do meio-
ambiente e não destruindo tudo ao seu redor.
A estrutura da macaúba é composta pelo a estirpe, as folhas, os espinhos, flores e
frutos.
A estirpe é freqüentemente utilizada no meio rural na confecção de calhas, moirões, ou
ripas e caibros para a construção civil. Além do palmito, muito consumido pelos moradores
21

das regiões de grande incidência da palmeira, obtém-se do cerne do estipe uma fécula
nutritiva que, cozinhada e fermentada, produz um vinho bastante apreciado nos países da
América Central.

Figura 02: Estirpe da macaúba


Autor: COSTA, 2008.

As folhas são empregadas como forrageiras aos animais, mormente nos períodos de
seca, ou matéria-prima na obtenção de fibras destinadas à produção de linhas, cordas e redes.
Do pecíolo das folhas, depois de separado em tiras, são feitos cestos, balaios e chapéus.

Figura 03: Folhas da macaúba com espinhos


22

Autor: COSTA, 2008.

Os espinhos, duros e resistentes, prestam-se como alfinetes para rendeiras, que também
utilizam o endocarpo na confecção dos bilros. Até mesmo as flores da palmeira têm emprego
na decoração das árvores de Natal.

Figura 04: Flores da macaúba


Autor: COSTA, 2008.

Mas na verdade, são os frutos da macaúba o produto economicamente mais


representativo da palmeira. A polpa do coco, adocicada e suavemente aromática, muito
apreciada pelas crianças, é também consumida em sua forma natural pelos ruminantes, como
os bovinos, que ingerem todo o fruto, que é expelido despolpado através do tubo digestivo,
seja pelo bucho ou pelos intestinos, cujo meio favorece, conforme se acredita a germinação da
semente e constitui uma forma efetiva de disseminação da palmeira.
23

Figuras 05, 06, 07, 08: Coco com casca e coco sem casca, coco partido ao meio, castanha do coco e o óleo de
coco macaúba.
Autor: COSTA, 2008.

A polpa oleosa, como ração animal, tem maior emprego na engorda de suínos, aliás,
uma prática intensamente difundida nas fazendas com cocais, fato que efetivamente tem
contribuído para a preservação dos adensamentos da palmeira em Minas Gerais. Tanto o óleo
de polpa como das amêndoas têm bom mercado na indústria de sabões, podendo ambos, no
entanto, serem usados para consumo humano, desde que haja seleção de frutos, recém
colhidos e não deteriorados.
Neste sentido Nucci (2007, p.13) afirma que:
24

O óleo de soja utilizado na culinária pode ser perfeitamente substituído pelo óleo de
macaúba, e os resíduos gerados podem ser usados na produção de ração para suínos,
aves e caprinos. Este óleo ainda pode ser usado como lubrificante para máquinas,
combustível, em substituição ao óleo diesel, como carvão, piche, entre outros,
reforçando que a palmeira macaúba apresenta grande potencial para produção de óleo
com vasta aplicação nos setores industriais e energéticos, com vantagens sobre outras
oleaginosas, principalmente com relação à sua maior rentabilidade agrícola e
produção total de óleo.

O farelo da amêndoa, subproduto da extração do óleo, tem considerável valor nutritivo


pelo seu alto teor de proteína, o que leva seu emprego como componente de rações animais
balanceadas.

Figura 09: Rações de bovinos, ovinos, suínos e aves feitas da torta do coco macaúba.
Fonte: UBCM, 2008.

O endocarpo duro tem sido empregado in natura como insumo energético, nas regiões
de maior ocorrência da macaúba, para consumo doméstico nos fogões de lenha, em escala
industrial para a produção de carvão e também pode ser utilizado como brita. Silva (2001)
relata que inúmeros trabalhos já realizados revelaram que a carbonização do endocarpo de
algumas palmáceas poderá fornecer um carvão de excelente qualidade quando comparado
25

com o carvão mineral, notadamente no que se refere ao seu baixo teor de cinzas, ausência de
enxofre, elevada densidade e controlável teor de carbono fixo e de matérias voláteis.

Figura 10: Endocarpo da macaúba


Autor: COSTA, 2008.

Em Minas Gerais, a exploração industrial do coco macaúba é limitada ao


aproveitamento parcial dos aglomerados nativos, próximos a Belo Horizonte e Abaeté, por
algumas saboarias que adquirem o coco de fornecedores diversos. Tendo em vista a dispersão
da matéria-prima, o sistema de coleta do fruto é oneroso e instável o que restringe o pleno
desenvolvimento das usinas que processam o coco macaúba.
Ainda hoje, no entanto, por razões econômicas, desconhecimento tecnológico ou
comodismo, as usinas de Minas Gerais têm processado o coco macaúba em estado
deteriorado, após a sua fermentação ao ar. Essa prática certamente, facilita a extrusão da polpa
do caroço nas tradicionais despolpadeiras, o que não acontece com o fruto fresco, cujas fibras
na polpa são mais intensamente aderidas ao caroço.
Dessa forma, o óleo extraído de frutos pubados ou fermentados, de forte cheiro
rançoso, contém de 40 a 60% de ácidos graxos livres, que, embora não se preste ao consumo
humano, tem grande aplicação na fabricação de sabões. De modo geral, os frutos da macaúba
são deixados amontoados ao ar, durante vários meses, antes de serem submetidos à extração
nas prensas hidráulicas.
26

De modo a obter-se um óleo cujas qualidades tornem-no adequado ao uso comestível


ou para emprego em motores de combustão interna, os frutos da macaúba devem ser
processados imediatamente após a coleta, assim como ocorre com os frutos do dendê.
Segundo a CETEC (1983) além da inexistência de um processo racional e rápido de
coleta de frutos, a pouca familiaridade com o seu cultivo ou mesmo a falta de interesse dos
órgãos de pesquisa agrícola, ainda hoje emperram qualquer tentativa de racionalização de
plantio da macaúba ou de industrialização do óleo de polpa de baixa acidez. Outro fator que
desestimula o crescimento da indústria de óleo de macaúba é a sazonalidade dos cocais
nativos, cuja colheita de frutos só acontece cinco meses ao ano, de dezembro a abril.
Em Minas Gerais, notadamente nos municípios limítrofes a Belo Horizonte, a colheita
dos frutos é realizada por mulheres e crianças, que se distribuem pelos campos: inicialmente,
elas amontoam os cocos espalhados; depois, transporta-os em balaios aos cargueiros ou
carroças que, afinal os conduzem até as saboarias, onde os vendem a preços irrisórios.
O sistema de coleta terá de ser otimizado, para permitir o rápido beneficiamento do
coco e não da forma rudimentar atual, eminentemente extrativista.
O processamento do coco macaúba apresenta algumas dificuldades, comumente não
encontradas em outras espécies oleaginosas, devidas à estrutura e composição do fruto. O
transporte dos cocos até à usina deve ser feito o mais rapidamente possível e com bastante
cuidado para evitar a ruptura da casca, com que se acelera a fermentação e a liberação de
ácidos graxos livres.
Visando ao fomento do extrativismo natural do coco macaúba em moldes mais
racionais, proporcionando um produto de maior qualidade, que possa, inclusive, ter destinação
como insumo energético ou alimentício é necessário buscar novas formas de coletas e de
armazenamento. Os problemas e dificuldades acima citados são concernentes ao
aproveitamento industrial do coco macaúba.
Outra potencialidade do coco macaúba que está sendo divulgada nos últimos anos é a de
ser uma das oleaginosas que mais podem contribuir para a produção do biodiesel. O potencial
da macaúba para os Cerrados é comparável ao do dendê para Amazônia.

Nucci (2007. p.14) afirma que:

A macaúba oferece ainda outras vantagens sobre outras plantas que ocupam
hoje posição de destaque no Brasil na produção de biodiesel, como a soja e o
dendê. A macaúba, sendo uma palmeira rústica, necessita de pouca água.
Com relação à mão-de-obra, a macaúba evitará o inchaço das cidades das
regiões produtoras de cana-de-açúcar, outra matéria-prima de combustível.
27

A macaúba atende a três premissas ainda pouco consideradas pela maioria dos
envolvidos com a cadeia produtora dos biocombustíveis. A primeira delas é que diante da
expectativa de uma demanda cada vez maior, provocada pelas crescentes dificuldades de
exploração dos combustíveis fósseis e também por sua utilização como arma política, um
programa para os biocombustíveis terá cada vez mais que levar em conta a utilização de
plantas de alta produtividade de matéria-prima.
Outra consideração é que assim como as fontes energéticas, a questão da água também
adquire importância cada vez maior, lembrando vários indicadores preocupantes de problemas
climáticos e escassez de água. A terceira premissa mencionada é a necessidade de frear as
correntes migratórias internas, garantindo emprego às populações em suas regiões de origem.
Como a macaúba exige trabalho manual para ser colhida, a cultura contribuiria para garantir a
fixação das famílias a terra.
Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior – MDIC
Instituto Euvaldo Lodi/Núcleo Central - IEL/NC (2006) a pesquisa com macaúba não
avançou muito, porém tem sido priorizada nas instituições de pesquisa, sobretudo após da
criação em 2004 do Programa Nacional de Biodiesel.
Outro uso e potencialidade do coco macaúba é a fabricação da farinha, que só pode ser
obtida de frutos absolutamente frescos. A Universidade Federal do Mato Grosso do Sul –
UFMS e o Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico – CNPq (2006)
fizeram um guia completo de como se faz a farinha de macaúba. Segundo estas instituições o
processo ocorre conforme anexo 01.
De acordo com a UFMS e a CNPq (2006) a farinha pronta pode ser comercializada
nas feiras, além de ser empregada em uma série de receitas, como: vitaminas, sorvetes,
geléias, bolos, doces, cocadas em tabletes, cremes, mingaus, paçocas, pudins e licores de
macaúba.
O coco macaúba apresenta propriedades importantíssimas do ponto de vista nutritivo.
Ele possui alto valor protéico, grande quantidade de vitamina A, essencial para visão, muitos
carotenóides, elevado valor energético e ainda possui ômegas 3, 6 e 9. Adicionem-se à lista
anterior vantagens como: alto teor em fibras, excelente palatabilidade e grande concentração
de carboidratos. Por todas essas vantagens, a farinha de polpa de macaúba é muito indicada
para a alimentação infantil.
28

Quadro 02 – Usos associados a distintas partes de Acrocomia aculeata.

Partes da planta usadas Categoria de usos Finalidade de usos


plântulas (parte aérea) Medicinal diurético, hipotensor
Raízes Medicinal Diurético
Estirpe Estirpe parede, caibro, ripas, calhas para água, mourão, estacas
Estirpe (medula) Alimento fécula nutritiva
Estirpe (meristema apical) Alimento Palmito
Estirpe (seiva) Alimento Vinho
Estirpe (seiva) Medicinal Febrífuga
Folha Forragem gado bovino, eqüino,ração animal
Folha Fibra chapéu, balaio, linha de pesca, redes
Folha Outro cobertura de casas
fruto (mesocarpo) Medicinal Fortificante
fruto (mesocarpo) alimento fruta, goma de mascar, doces, paçocas, geléias e cocadas

fruto (óleo do mesocarpo) Alimento licor, sorvete


fruto (óleo do mesocarpo) Medicinal analgésico (dor de cabeça e nevralgias)
fruto (óleo do mesocarpo) Cosmético hidratante capilar
Semente Outro substitui a brita no concreto
Semente Artesanato confecção de botões
semente (amêndoa) Alimento coco, paçoca
semente (óleo da amêndoa) Alimento óleo de cozinha
semente (óleo da amêndoa) combustível lamparina, produção de energia
semente (óleo da amêndoa) Cosmético hidratante capilar
semente (óleo da amêndoa) Medicinal Laxante
semente (óleo da amêndoa) Outro ingrediente de sabão
Fonte: NUCCI, 2007.

Como foi relatado anteriormente, especificamente para a população das áreas rurais dos
países tropicais em desenvolvimento, palmeiras como a macaúba, constitui importantíssima fonte
de recursos, os quais são utilizados como alimentos, combustível, medicamentos caseiros, na
cobertura das casas ou confecção de utensílios e adornos domésticos e, em alguns casos, como
matéria-prima para as indústrias locais.
Segundo Lorenzi (2006), a exploração de produtos florestais não-madeiráveis (PFNM)
como palmeiras frutíferas, frutas, fibras, sementes, plantas medicinais e aromáticas, materiais
para artesanato, entre outros, tem se apresentado como capaz de prover mudanças
significativas na vida de muitas comunidades tradicionais. Milhões de chefes de família ao
redor do mundo dependem fortemente de PFNM para sua subsistência ou fonte de renda. Em
nível local, a exploração de PFNM também fornece matéria-prima para processamento em
larga escala industrial. Diversos registros demonstram que pequenos produtores de países em
desenvolvimento podem obter benefícios econômicos com a venda direta de PFNM e do
acesso aos mercados regionais e internacionais.
No Brasil também se registram muitos exemplos positivos neste sentido. Existem
comunidades que estão vivendo da exploração de produtos que são direcionados para a indústria
29

farmacêutica e cosmética, produção de artesanato, indústria alimentícia ou ainda para a produção


de oleaginosas com a finalidade de aproveitamento na geração de biodiesel (CAA-NM 1,
comunicação pessoal).
Apesar da expressiva contribuição dos povos indígenas e das populações tradicionais à
descoberta de novos produtos no campo da farmacologia e indústria de modo geral, estas
comunidades não se beneficiam ética ou economicamente com a aplicação de seu saber.
Adicionalmente, o conhecimento das espécies florestais e suas potencialidades de uso, com a
possibilidade de inferir importância e vantagens comerciais na atitude conservacionista,
poderão satisfazer a necessidade que o homem tem de obter pretextos econômicos para
quaisquer ações. Ou seja, ao estimar o valor econômico da vegetação, reconhecido tanto pela
importância de recursos genéticos, florísticos, hídricos e edáficos (RIBEIRO, 1998), torna-se
possível motivar a sociedade a conservar os diferentes ecossistemas. Afinal, como defende
Silva et al. (2001), a estratégia mais racional para a conservação do meio ambiente é resultado
da apresentação do potencial de uso e a importância socioeconômica das espécies ali
presentes.
Entretanto, muitas espécies, inclusive as palmeiras têm se tornado alvo da exploração
indiscriminada, quando se prioriza o aspecto econômico e neglicencia-se os aspectos cultural e
ecológico associados a elas.
A macaúba é exemplo disso, foi muito retirada em vários estados brasileiros, principalmente
em São Paulo, para a introdução da atividade cafeeira. Hoje as comunidades viram a importância
do ponto de vista ecológico e econômico, e partiram para a preservação das palmeiras ali
existentes.
As informações obtidas, juntamente com aquelas de cunho botânico e auto-ecológico,
podem formar base consistente para a proposição de alternativas de renda para comunidades
tradicionais, contribuindo para a conservação ambiental e para a implementação de estratégia de
desenvolvimento sustentável na região em estudo. Mas o desenvolvimento sustentável não será
obtido pela simples preservação. É preciso mais, é preciso criar para reverter à marcha rumo à
redução das condições de sobrevivência em nosso planeta. E, se não formos nós os criadores,
deles seremos dependentes.

1
Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas (Montes Claros, MG).
30

3 - A COMUNIDADE DE RIACHO D’ANTA – UMA ÁREA DE EXPLORAÇÃO DO


COCO NO NORTE DE MINAS

A prática do extrativismo do coco macaúba na comunidade do Riacho D’Anta e nas


comunidades vizinhas é muito antiga, porém era voltada para a criação de suínos e aves.
A comunidade do Riacho D’anta iniciou a prática de extrativismo com a finalidade de
obtenção de renda para o homem do campo e a manutenção dele e sua família no meio rural.
Essa prática começou com outra matéria-prima do cerrado, o pequi. Porém esta atividade não
deu certo devido à falta de apoio técnico dos órgãos do município e do estado. Em 2005
iniciou-se o beneficiamento do coco macaúba, com o apoio do Instituto Grande Sertão, do
Centro de Agricultura Alternativa (CAA) e do Programa de Pequenos Programas Ecossociais
(PPP-ECOS).
A comunidade do Riacho D’anta, com ajuda dos órgãos citados, percebeu que a
exploração do coco macaúba seria uma fonte de renda e emprego, e que poderia fixar o homem
no campo, evitando assim a ida desses moradores para as cidades em busca de emprego.

3.1 - Localização da comunidade e algumas características da sua formação

A comunidade do Riacho D’Anta no município de Montes Claros – MG tem sua posição


geográfica determinada pelo paralelo 16º 23’ de latitude sul, em sua intercessão com o
meridiano 44º 14’ de longitude oeste. Localiza-se cerca de 65 Km da cidade de Montes Claros
- MG, na porção noroeste, na zona rural deste município. A comunidade do Riacho D’anta
fica também a 21 Km ao sul da cidade de Mirabela - MG, 36 Km a sudeste da Cidade de
Brasília de Minas e 42 Km a nordeste de Coração de Jesus - MG. Limita-se com as
comunidades de Taboquinha, Santa Cruz, Riachão, e fica próximo das comunidades de Salto,
Borá, e dos povoados de Alvação, Esporas e Riacho das Pedras.
31

C o m u n id ad e d e R iach o D ’a n ta

Figura 11: Localização da comunidade de Riacho D’anta e dos municípios da Bacia do Rio Riachão.
32

Conforme dados fornecidos pela associação de moradores, residem na comunidade


cerca de 40 famílias com média de quatro pessoas por família, sendo que na década de 1950 a
1970 esse número era o dobro. Esta redução foi devido à migração de famílias em busca de
emprego para a cidade de São Paulo a partir da década de 1970 e para Montes Claros nos
últimos 20 anos.
A população de moradores que vivem na comunidade é formada por filhos dos
primeiros moradores que se instalaram na comunidade e ali constituíram família e por pessoas
de comunidades vizinhas que adquiriram terras ali.
Quanto à infra-estrutura, a comunidade dispõe de três caixas d’água que abastecem a
população, através da canalização que foi feita ligando os três poços tubulares, até a casa dos
moradores. As casas em sua maioria são de alvenaria e o lixo produzido nas mesmas é jogado
em sumidouros e queimado, não existindo locais adequados para esta prática.
A luz elétrica chegou para alguns moradores da comunidade desde 1985, através de
parceria da prefeitura de Mirabela - MG e os moradores que possuíam parte do capital
necessário para instalação. Hoje, através de programas governamentais todos os moradores
dispõem deste serviço.
Em relação aos meios de transporte existentes na comunidade, estes são variados, existe
a maioria deles, automóveis, motocicletas, ônibus de linha com destino à Montes Claros e
com destino à Mirabela e ainda existem os mais antigos, como cavalos, burros e carros de boi.
As estradas que cortam a comunidade estão em péssimas condições, gerando vários
problemas para os moradores. Entre os problemas existentes por causa das condições das
estradas, podemos citar: o simples deslocamento das pessoas às outras comunidades e aos
povoados, transporte dos alunos às escolas, escoamento da produção e as viagens até as
cidades de Mirabela e Montes Claros.
Quanto aos meios de comunicação, existe telefone na associação comunitária que é
usado por muitos e com a instalação da telefonia celular na cidade de Mirabela, nos pontos
mais altos da comunidade o sinal é captado pelos aparelhos celulares normais, sem
necessidade de antena rural. Praticamente, em todas as casas existem rádios e televisões.
Em relação à educação, as crianças estudam na escola da comunidade vizinha de
Riachão até a 8ª série e, posteriormente, vão para Mirabela em um ônibus escolar ou vão
morar e estudar em Montes Claros.
No caso da saúde, a comunidade conta com agentes do Programa Saúde da Família
(PSF), que sempre visitam as casas das pessoas e marcam consultas com os médicos na
33

comunidade. Com isso diminui à procura aos hospitais em Mirabela e Montes Claros pelas
causas menos graves, pois são atendidos em muitos casos na própria casa.
Mesmo com algumas limitações, a comunidade representa um refúgio de tranquilidade
para aqueles que lá residem e também para aqueles que foram morar em Mirabela e Montes
Claros, pois por ser perto dessas cidades quase todos os finais de semana estão descansando
na comunidade. È um recanto onde os moradores vivem e se agregam por valores, crenças,
comportamentos e idéias que os identificam como uma coletividade.

3.2 - Aspectos físicos da comunidade e sua economia local

A Comunidade de Riacho D’anta, Zona Rural de Montes Claros/MG, também é


conhecida por Riachão, isto devido estar no Vale do Rio Riachão, é divisa dos municípios de
Montes Claros, Mirabela, Coração de Jesus e fica próximo também a divisa de Mirabela e
Brasília de Minas.
O Vale do Riachão abrange parte dos municípios de Montes Claros, Mirabela, Coração
de Jesus e Brasília de Minas, terra do famoso Zé Coco do Riachão, folião, violeiro, rabequeiro
e sanfoneiro, fabricador de instrumentos, conhecido como o “Bethoven do Sertão” e terra de
cultura e tradições centenárias, onde a relação entre as pessoas e o ambiente se desenvolveu
de forma complementar.
O clima é o tropical semi-úmido, com duas estações bem definidas. As maiores
ocorrências de chuvas se fazem em seis meses do ano, período da primavera e verão, e outros
seis meses, período do outono e inverno, ocorre o período de seca, onde os níveis de chuva
são baixíssimos ou quase não ocorrem.
A vegetação da área do Riacho D’anta é a do cerrado, sendo encontrado nessa área
árvores de pequeno porte nas áreas de morros, de grande porte e gramíneas nas áreas mais
planas, além de veredas. A maioria da plantas e árvores frutíferas do cerrado brasileiro é
encontrada na região. O pequi, a cagaita, o araçá, o murici, o panã, o ipê roxo, ipê amarelo, a
aroeira, entre outros são alguns exemplos.
A paisagem encontrada na bacia do Rio Riachão, como também na comunidade do
Riacho D’anta, é recortada por uma malha hídrica alimentada por pequenas veredas e olhos
d’água que vão formando os córregos, hoje, em sua maioria, intermitentes. Segundo
informações dos moradores mais antigos, dos 47 afluentes do Riachão, apenas 15 ainda
mantêm a perenidade. Um quadro generalizado de escassez de água se instala,
comprometendo e ameaçando a vida por quase todos os cantos na sub-bacia do Riachão.
34

C o m u n id a d e d o R ia c h o D ’a n ta

C oração de Jesus M ontes C laros

Figura 12: Localização da comunidade de Riacho D’anta na Sub-Bacia do Rio Riachão.


Fonte: UBCM e adaptado por Costa 2008.
35

O Riacho D’anta é um afluente do Rio Riachão, dá nome a esta comunidade, e que,


devido ao desmatamento e ao assoreamento ocorrido principalmente a partir da década de
1970, não é mais perene. Possui maior vazão em alguns dias nos períodos chuvosos. Este
afluente que dá nome a esta comunidade é o limite dos municípios de Montes Claros e
Mirabela, sendo que o seu lado direito faz parte de Mirabela e o esquerdo há Montes Claros.
Já o Rio Riachão nesta comunidade é o limite dos municípios de Montes Claros e Mirabela
com Coração de Jesus, sendo que todo lado esquerdo do Rio pertence à Coração de Jesus.
Foi no Riachão também que se travou um dos mais emblemáticos embates
sócioambientais do Brasil, conhecido como a campanha “SOS Riachão”, origem do “MSA” –
Movimento dos Sem Água. Tudo isso por causa da implantação de pivôs centrais para
irrigação em larga escala de monoculturas de goiaba, manga e capim, realizada sem nenhum
critério ambiental por grandes fazendeiros na cabeceira da bacia, do início da década de 1980
até o início da década de 2000. Esse projeto econômico chegou a causar o secamento total do
Riachão e de vários de seus afluentes. Este fato gerou a mobilização das comunidades, que,
por meio de protestos e articulações regionais, conseguiram a interdição dos projetos de
irrigação.
Contudo, a tensão com as forças políticas favoráveis a tais projetos ainda persiste, sendo
que mais recentemente as monoculturas de eucalipto também começaram a causar sérios
problemas sociais e ambientais em algumas comunidades da bacia do Riachão. Portanto, faz-
se necessária uma estratégia de luta que conte, inclusive, com alternativas econômicas
sustentáveis, como o aproveitamento da macaúba, de forma a beneficiar as 62 comunidades
que se espalham pelos quase 100 mil hectares da bacia do Riachão e, ao mesmo tempo,
preservar seus ecossistemas naturais.
A economia da comunidade está muito voltada para a agricultura, mas existem
moradores que trabalham nas escolas e postos de saúde das comunidades vizinhas. Muitos
professores, serviçais e agentes de saúde possuem seus empregos fixos nas prefeituras de
Mirabela e Montes Claros, não dependendo assim sua subsistência à agricultura. Há na
comunidade também aposentados e viúvas, que possuem uma renda certa, e que não
dependem exclusivamente da agricultura. Mas todos os citados acima também utilizam suas
terras para a agricultura familiar.
A maioria dos moradores da comunidade tem sua subsistência na agricultura familiar. O
termo “agricultura familiar” é muito usado por muitos estudiosos e já está sendo falado pelos
próprios agricultores. Alguns estudiosos fazem algumas definições como:
36

A exploração familiar corresponde a uma unidade de produção agrícola, onde


propriedade e trabalho estão intimamente ligados à família, em um processo que cria
uma interligação entre propriedade, trabalho e família. (LAMARCHE, 1997, p. 5).

A agricultura familiar na comunidade envolve todos os integrantes da família, e possui suas


atividades ligadas à criação de aves, suínos e bovinos. Seus moradores vivem do plantio de
grãos, como feijão, milho e arroz, no período das chuvas. Há também o plantio da cana-de-
açúcar, do sorgo e de capineiras para o longo período de estiagem que ocorre na região, sendo
esses necessários para alimentação do rebanho.
Ainda ocorre o plantio de verduras e hortaliças. Outra característica comum na agricultura
familiar é de aproveitamento de frutas nativas, das ervas e dos artesanatos locais.
Autores, como Abramovay (1992), afirmam que existem na agricultura familiar grupos
familiares que utilizam técnicas e métodos avançados para obter uma grande produção na
agricultura. Estes grupos para muitos não fazem parte da agricultura familiar e sim das
chamadas empresas familiares, isto devido não serem sinônimo de pequena produção ou de
agricultura camponesa. E nas duas últimas décadas, a discussão sobre a produção rural familiar
tem ganhado força devido à capacidade que essa categoria social possui em relação à geração
de emprego e renda no meio rural. No entanto, também é reconhecida a dificuldade que os
produtores familiares têm em se posicionar no mercado, sendo a comercialização de seus
produtos o objetivo mais difícil de alcançar.
Muitos projetos são feitos para ajudar a agricultura familiar. Alguns deles não
deram certo, exemplo disso foi o projeto para a pecuária leiteira feita no Norte de Minas
Gerais.
Os agricultores da comunidade do Riacho D’anta e de outras comunidades
vizinhas participaram desse projeto do governo federal, porém este projeto somente
prejudicou os pequenos produtores rurais, pois estes não foram assistidos por
tecnologias, técnicos e pessoas especializadas, e muitos acabaram se endividando e
tiveram que vender seus rebanhos ou até mesmo suas terras para quitar as dívidas com
os bancos.2
A produção rural familiar mesmo com todos os problemas que enfrenta ocupa 30,5% da
área total dos estabelecimentos rurais, produz 38% do Valor Bruto da Produção (VBP)
nacional e ocupam 77% do total de pessoas que trabalham na agricultura, segundo dados do
2
O projeto acima citado foi o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - PRONAF. Este
projeto foi realizado em 2006 e se baseava em empréstimos bancários aos produtores rurais de diversas
comunidades rurais do país, através do Banco do Nordeste, para o desenvolvimento da pecuária leiteira na sua
propriedade.
37

Censo Agropecuário (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, 1995/96). Por


isso, essa categoria social é considerada uma alternativa eficaz de reduzir a migração do
campo para a cidade, principalmente nos contextos em que demonstram a forte coesão entre o
conjunto de agricultores, organizados nas mais diferentes formas, como comunidades,
associações e cooperativas. E nesse sentido Singer (2002, pág. 87) também fala que não
cabe dúvida de que hoje ainda predomina na maioria dos países a agricultura familiar,
praticada em pequenas e médias propriedades, sobretudo pelos próprios proprietários e
seus familiares, isso se deve aos efeitos do cooperativismo, que dão à agricultura
familiar competitividade e, portanto, possibilidade de resistir e se reproduzir.
A agricultura familiar é também considerada uma alternativa para o desenvolvimento
sustentável na agricultura, pois nela é incentivado o uso de técnicas que não destrói o meio
ambiente, o aproveitamento de plantas e frutas nativas para geração de renda e a proteção dos
recursos naturais.
38

4 - O COCO MACAÚBA ENQUANTO ALTERNATIVA NO DESENVOLVIMENTO


SUSTENTÁVEL NA COMUNIDADE DE RIACHO D’ANTA

O aproveitamento da biodiversidade nativa é uma estratégia importante na promoção de


benefícios sociais e ambientais. No caso do Cerrado, diversos frutos têm grande potencial de
serem usadas como alternativas ao desmatamento.
A macaúba (Acrocomia aculeata) é uma palmeira abundante nos cerrados de Minas
Gerais, especialmente na bacia do Rio Riachão, e seus frutos podem ser transformados em
diversos produtos, contribuindo para uma economia sustentável. De acordo com Nucci (2007,
p.09):
Esta espécie apresenta ampla utilidade e mais recentemente seu fruto tem despertado grande
interesse sócio-econômico por sua capacidade de produção de óleo vegetal, considerando-se
que a macaúba é citada como umas das principais fontes deste óleo no Brasil. Em meio a suas
várias utilidades são relatados usos medicinais, alimentícios, cosméticos, entre outros.
Entretanto a mais promissora e que mais se destaca é sua capacidade de produção de óleo
vegetal que pode chegar a quatro mil litros por hectare por ano, lembrando que através de
plantios racionais e de programas de melhoramento este valor pode aumentar
consideravelmente, oferecendo potencial para produção de biodiesel, proporcionando
vantagens ambientais, econômicas e sociais.

O coco macaúba que é encontrado na comunidade de Riacho D’anta e nas comunidades


vizinhas, faz parte de uma grande área de ocorrência, o vale do Riachão, localizada entre os
municípios de Montes Claros, Mirabela, Coração de Jesus e principalmente em Brasília de
Minas. Foram feitos levantamentos dos maciços nativos da macaúba na região de Brasília de
Minas, de tipologia de cerrado, onde a CETEC (1983) mostrou a presença dos maiores
adensamentos da palmeira próximos à sede do município e estendendo-se a ocorrência a
outras áreas, em manchas esparsas e descontínuas, principalmente em direção a Coração de
Jesus, cuja disponibilidade anual de frutos foi estimada em pelo menos 10 mil toneladas.
Embora a maioria dos solos da área pesquisada seja da classe areia quartzosa, a existência do
Latossolo Vermelho Escuro Eutrófico, exatamente onde é maior a incidência da palmeira,
evidencia a correlação existente entre produtividade agrícola e fertilidade do solo.
A adaptação da macaúba nos solos de cerrado, freqüentemente sujeitos as grandes
oscilações climáticas e pluviométricas, para sustentar os mesmos níveis de produtividade
verificados nos solos mais privilegiados, vai depender naturalmente da utilização de práticas
agronômicas dirigidas com ênfase na preparação e correção do solo.
A idéia do coco macaúba como fonte alternativa no desenvolvimento sustentável na
comunidade de Riacho D’anta, se deu a partir das lutas das comunidades do vale do Rio
Riachão contra pivôs centrais de irrigação. Era necessário buscar formas de a comunidade se
39

desenvolver, porém sem destruir o meio ambiente, algo que era tanto defendido por eles.
Assim surgiu a idéia de utilizar matéria-prima do próprio cerrado brasileiro.
Com o Programa de Pequenos Projetos Ecossociais (PPP-ECOS) que concede pequenas
doações a organizações não governamentais e de base comunitária para atividades que se
enquadrem nas áreas focais e nos programas operacionais do Programa para o Fundo do Meio
Ambiente Mundial (GEF) e que, ao mesmo tempo, resultem na melhoria da qualidade de vida
das comunidades locais, a comunidade começou se dedicar ao extrativismo do coco macaúba.
O PPP-ECOS focaliza as inter-relações entre comunidades carentes e o meio ambiente, com
ênfase nas promoções de modos de vida sustentáveis, que contribuam com benefícios
ambientais globais, conforme os acordos internacionais para os quais o GEF é o mecanismo
financeiro. O PPP-ECOS apóia projetos no Cerrado, priorizado como hot spot (ponto quente)
global por causa de sua rica diversidade biológica e as fortes pressões a que está sujeito em
função da expansão da fronteira agropecuária, das obras de infra-estrutura e do crescimento
urbano. São contemplados projetos em áreas nucleares e isoladas de Cerrado e nas áreas de
transição entre Cerrado e Caatinga, Amazônia ou Pantanal.
O PPP-ECOS possui duas categorias de apoio a projetos. Pequenos Projetos de até
US$30.000 para apoio geral dentro das áreas operacionais do GEF e Projetos de Consolidação
de até US$50.000 para beneficiar um conjunto de organizações a partir de uma
experiência/projeto que tenha resultados e impactos positivos comprovados e que podem ser
ampliados a um público maior. Os projetos de consolidação podem ser regionais/territoriais
e/ou temáticos.
A comunidade do Riacho D’anta e as comunidades vizinhas se beneficiaram muito com
os pequenos projetos do PPP-ECOS, pois foi possível a compra de máquinas novas e mais
modernas para o beneficiamento do coco macaúba. Beneficiaram-se, também com
pensamentos defendidas pelo PPP-ECOS, pois os agricultores associados ou que tinham
alguma ligação com a Unidade de Beneficiamento do Coco Macaúba - UBCM mudaram o
seu pensamento quanto ao meio ambiente, se tornaram pessoas mais conscientes e
responsáveis.
40

4.1 - Descrevendo a prática do extrativismo do coco macaúba na comunidade

O extrativismo do coco macaúba vem sendo utilizado há séculos no Brasil pelos


pequenos agricultores para a alimentação própria e dos animais.
O processo de extrativismo na comunidade iniciou-se no ano de 2005 e hoje beneficia
40 comunidades além da comunidade do Riacho D’anta. São 218 famílias de agroextrativistas
da bacia do Riachão envolvidas e pretende-se ampliar esse número para 620 famílias. Este
processo envolve muitas pessoas da comunidade e de comunidades vizinhas.

Figura 13: Sede da Associação Comunitária e da Unidade de Beneficiamento do coco macaúba – UBCM na
comunidade de Riacho D’anta.
Fonte: COSTA 2008.

Atualmente trabalham fixos na UBCM sete pessoas, sendo que o presidente e o vice-
presidente da associação comunitária também participam diretamente em todas as etapas do
extrativismo.
O processo de extrativismo na comunidade é dividido em três etapas: a coleta, o
beneficiamento e a venda do produto.
A primeira etapa é a coleta. Nesta etapa, os catadores da comunidade e de outras
comunidades coletam os cocos macaúba existentes na sua propriedade, e os vendem à UBCM.
No início, este coco que era coletado, e levado à UBCM pelos próprios catadores, mas isso
41

mudou, com a doação de um caminhão pelo Banco do Brasil à associação. Hoje, basta o
catador coletar e ligar para a UBCM que o caminhão vai até sua casa buscar o coco macaúba.
O valor aproximado da caixa do coco macaúba comprado pela UBCM está em torno de
R$4,003. Existem catadores em vários municípios vizinhos, e devido à existência do
caminhão, já estão buscando o coco macaúba em municípios mais distantes, como é o
exemplo das cidades de Japonvar-MG e São João do Pacuí-MG. A unidade de beneficiamento
informou que possuem aproximadamente 28 catadores cadastrados no município de Montes
Claros-MG, 67 catadores no município de Brasília de Minas-MG, 40 catadores em Coração
de Jesus-MG e 12 catadores no município de Mirabela-MG. Informou ainda que, no período
dos meses de março e abril de 2008 compraram desses catadores, aproximadamente 5000
caixas do coco macaúba.

Figura 14 e 15: Área de coleta do coco macaúba na comunidade de Santa Cruz - Zona rural de Montes Claros-
MG e do caminhão da UBCM usado no transporte do coco.
Fonte: Costa 2008.

O beneficiamento do coco macaúba, comprado dos catadores, é a próxima etapa. O


coco é armazenado em galpões (figura 15) e separado de acordo com estado de maturação. Do
coco mais velho retira-se um óleo da polpa de pior qualidade. Depois de separados, os cocos
são levados a despolpadeira (figura 16), esta máquina separa a polpa e o endocarpo (castanha
com a semente). A polpa da macaúba retirada pela despolpadeira é levada à prensa (figura
20), obtendo assim o óleo da polpa do coco macaúba. Esta máquina tem uma capacidade de
3
Valor do real no ano de 2009.
42

despolpar 150 kilos/hora. Nesta separação o endocarpo é levado para o britador (quebrador de
castanha) que quebra o endocarpo (figura 17). Este tem a capacidade de quebrar 180
kilos/hora. Após ser quebrado o endocarpo e a semente não se separam completamente. Por
isso são levados ao tanque de separação do endocarpo (figura 18), tanque este que é feito de
cimento e tijolos e assim enche-se ele de água. As sementes que são leves flutuam na água e o
endocarpo fica no fundo do tanque, e assim se faz a separação do endocarpo e da semente.
Após serem separadas do endocarpo, as sementes são levadas a um local com uma grande tela
de pequena abertura, onde é atingida pelo sol para serem secadas. Secas as sementes, podem
ir diretamente para a prensa. Na UBCM antes de ir à prensa, elas são levadas ao tostador
(figura 19), nele as sementes são torradas, e retirando o óleo mais facilmente na prensa. Na
prensa (figura 20) é feita a separação do óleo e a massa da semente. Esta massa da semente e
a massa da polpa são utilizadas para se fazer rações para animais. Esta ração tem adição de
outros ingredientes e é misturada no misturador de rações (figura 22). Da torta da macaúba
obtida são feitas rações para aves, suínos, bovinos e ovinos.
O óleo da semente obtido da prensa ainda é levado para uma máquina de filtro de óleo
(figura 21) onde é filtrado. Obtidos os óleos da semente da polpa e da semente, estes são
armazenados em vasilhames separados, onde poderão ser vendidos ou usados para fazerem
sabão e outros produtos. Na fabricação do sabão do óleo polpa ou do sabão do óleo da
semente, os ingredientes são misturados aos óleos numa máquina chamada de reator (figura
23), logo após os ingredientes já misturados são levados a estrusora (figura 24), uma máquina,
que modela o sabão e deixa-o com aquela forma conhecida por todos.
Portanto na UBCM, é fabricado o sabão preto e amarelo feitos do óleo da polpa e o
sabão branco, o sabão pastoso e o sabão líquido são feitos a partir do óleo da semente. Do
óleo da semente obtido na UBCM ainda é feito outros produtos como o xampu capilar, xampu
automotivo, óleo capilar, óleo corporal, amaciante e o detergente. Portanto nessa etapa de
beneficiamento do coco macaúba, a UBCM obtém vários produtos que podem ser
comercializados. Assim chegamos à última etapa do extrativismo na comunidade, a venda dos
produtos do coco macaúba.
43

Figura 16: Galpão de armazenamento do coco Figura 17: Despolpadeira do coco macaúba

Figura18: Britador ou quebrador de castanha Figura 19: Tanque de separação do endocarpo

Figura 20: Tostador de semente do coco Figura 21: Prensa de obtenção do óleo da semente e da polpa
44

Figura 22: Filtro do óleo da semente Figura 23: Misturador de rações

Figura 24: Reator- Mistura os ingredientes do sabão Figura 25: Extrusora - Processa o sabão na forma de venda
Fonte: Costa 2008.

Nesta etapa citaremos vários produtos que estão sendo vendidos pela UBCM. Entre os
produtos vendidos estão rações feitas da torta da polpa e da semente para animais bovinos,
para os suínos, para as aves e para os ovinos, que são embaladas e armazenadas em locais
ideais para a manutenção da qualidade do produto. Outros produtos como o sabão preto e
amarelo feitos do óleo da polpa e o sabão branco, o sabão pastoso, o sabão líquido, o xampu
capilar, o xampu automotivo, o óleo capilar, o óleo corporal, o amaciante e o detergente feitos
a partir do óleo da semente são vendidos pela UBCM. Estes produtos obtidos do óleo da polpa
45

e do óleo da semente descritos anteriormente são embalados, empacotados com o selo com
nome da UBCM e armazenados em uma sala com ambiente ideal para os produtos.4
Os produtos do coco macaúba são vendidos na própria UBCM, em pequenos armazéns
nos povoados vizinhos. No dia 01/05/2009 foi concedido pela vigilância sanitária de Montes
Claros à UBCM o Alvará para comercialização dos produtos do coco macaúba. Estes poderão
estar sendo vendidos nos supermercados dessa cidade e de outras cidades que já
demonstraram interesse nos produtos. Está ocorrendo também à venda do próprio coco
macaúba. Segundo Agnaldo Fonseca da Costa, presidente da Associação Comunitária do
Riacho D’anta, a UBCM no final de 2008 fechou contrato com a Universidade federal de
Viçosa - UFV, e onde venderão à universidade 5000 caixas do coco macaúba. A UFV
desenvolve as mudas do coco macaúba para uma empresa alemã que mantém parceria com
ela.

Figura 26: Alguns dos produtos fabricados na UBCM Figura 27: Sabão preto feito da borra do óleo da polpa

4
Outros produtos como desinfetante e água sanitária são feitos na UBCM também, porém não leva nenhum
produto do coco macaúba.
46

Figura 28: Sabão amarelo fabricado do óleo da polpa do coco.


Fonte: Costa 2008.
47

Coco macaúba

Despolpadeira

Castanha
Polpa do do coco
coco

Britador(quebrador
da castanha)

Semente do Tanque de Endocarpo


coco separação

Prensa Tostador de Prensa


semente

Filtração do óleo
da semente

Óleo da
Òleo Torta da Óleo da Torta da Carvão, brita
Endocarpo
polpa Polpa semente semente e outros

Figura 29 - Fluxograma da extração de óleo da macaúba na UBCM, na comunidade de


Riacho D’anta, zona rural de Montes Claros – MG. Fonte: Costa 2008.
48

Figura 30 - Fluxograma do processamento dos produtos obtidos do coco macaúba na UBCM, na comunidade de Riacho D’anta, zona rural de
Montes Claros – MG. Fonte: Costa 2008.

Óleo e borra Torta da Óleo da Torta da Endocarpo


do óleo da Polpa semente semente
polpa

Desintegrador
Reator Desintegrador Reator

Misturador
Extrusora de rações
Extrusora Misturador
de rações

Sabão Sabão Rações diversas Sabão Sabão Sabão Ração para


amarelo preto para bovinos, branco pastoso líquido aves Carvão Brita
ovinos, suínos e
aves
Shampoo capilar e óleo capilar e Amaciante Detergente
Shampoo automotivo óleo corporal
49

Nas três etapas descritas, a etapa de vendas é o principal problema da UBCM, pois falta
organização nas vendas, pessoas especializadas em administração e no comércio. Este
problema foi detectado pelos associados, vice-presidente e presidente da associação
comunitária. O vice-presidente da associação comunitária, Waldomiro Cardoso da Silva,
relata esse problema na sua fala:
Precisamos de pessoas na fábrica que tem conhecimento, de pessoas novas,
inteligentes e que nos ajudem a desenvolver a fábrica, a nossa comunidade e
a trazer benefícios para nós produtores da agricultura familiar. Espero os
próprios filhos dos associados sejam essas pessoas nos ajude na fábrica,
também para que não precisem deixar o campo e ir para cidade em busca de
emprego. Nós não tivemos muita oportunidade de estudar, mas temos
experiência, e queremos pessoas estudadas para ajudar. (SILVA, 2008)

A associação tem buscado algumas formas de divulgar seus produtos, seu associado tem
participado de feiras no nosso estado de Minas Gerais e também em outros estados. Eles levam os
produtos feitos, vídeos mostrando o processo de extrativismo e além também de folder. Eles
também fazem explicações sobre o assunto.

Figura 31: Oficina do PPP-ECOS em Brasília-DF.


Fonte: UBCM

A associação comunitária e a UBCM precisam ainda de pessoas mais qualificadas, de


mais investimentos na sua infra-estrutura para a ampliação e melhoria da produção, e ainda de
ajuda dos órgãos do governo para alavancar ainda mais esse processo de extrativismo do coco
macaúba, mas uma coisa é inegável, eles trabalham muito bem em associativismo, pois tudo é
decidido entre os associados.
Os associados também têm se beneficiado com outras ações da associação comunitária,
esta tem conseguido vários recursos com o Instituto de Desenvolvimento do Nordeste de
50

Minas Gerais - IDENE, cursos para produtores rurais com o Serviço Nacional de
Aprendizagem Rural - SENAR, a Empresa Brasileira de Extensão Rural - EMATER,
pequenos empréstimos pelo PRONAF e está conseguindo também dinheiro para construção e
reformas de casas.

4.2 - Associativismo na exploração do coco macaúba e preservação ambiental

Antes de iniciar a análise do associativismo do coco macaúba na comunidade


pesquisada, se faz necessária uma discussão sobre o associativismo. Sendo assim, serão
apresentadas algumas definições de associativismo, bem como de associativismo rural.
Para Ricciardi e Lemos (2000), o associativismo rural pode ser entendido, como um
instrumento de luta dos pequenos produtores, proporcionando a permanência na terra,
elevação do nível de renda e de participação como cidadãos. Uma associação não é somente
uma organização de pessoas com objetivos comuns para proporcionar uma melhor reprodução
econômica de seus sócios, mas sim uma organização mais complexa com objetivos também
de caráter social, desempenhando importantes e complexas funções por meio de estatutos e
regimentos.
A expressão associativismo designa por um lado à prática social da criação e gestão
das associações (organizações providas de autonomia e de órgãos de gestão
democrática: assembléia geral, direção, conselho fiscal) e, por outro lado, a apologia
ou defesa dessa prática de associação, enquanto processo não lucrativo de livre
organização de pessoas (os sócios) para a obtenção de finalidades comuns.
(RICCIARDI; LEMOS 2000, p. 82).

De acordo com a definição apresentada, associação é uma organização social de pessoas


com um objetivo definido. Deve-se colocar que ninguém é obrigado a estar associado a
nenhuma associação, sendo esta de livre participação. Outra característica da associação é sua
organização interna, com diretoria e conselho fiscal, subordinado a uma assembléia geral.
Portanto, pode-se concluir que uma associação é uma sociedade civil que não possui fins
lucrativos, onde os indivíduos se organizam para atender aos seus interesses, de forma
democrática. Ela existe porque os associados possuem um objetivo comum, e trabalham em
grupo para a realização desse objetivo.
Outra característica que as associações possuem é que o objetivo de grupo deve ser mais
importante que os objetivos individuais, sob pena de inviabilizar a existência da mesma. As
associações não possuem um dono definido, todos os associados são responsáveis pela gestão
e organização da mesma.
51

É muito comum a confusão entre a associação e a cooperativa. Nesse tocante pode-se


afirmar que a cooperativa, de acordo com Ricciardi e Lemos (2000, p. 60) diferentemente da
associação é uma empresa.
A cooperativa é considerada uma sociedade ou empresa constituída por membros de
um determinado grupo econômico ou social, que conjugando esforços e recursos,
visa promover a elevação dos padrões de qualidade de vida dos que se associam sob
suas regras, prestando efetivo serviço às suas comunidades e a própria sociedade.

Pelas definições, a diferença entre as duas está na geração de renda, ou seja, enquanto a
associação não possui a finalidade de geração monetária, a cooperativa possui objetivos
econômicos. Além desta, a cooperativa é uma empresa, ao passo que a associação é apenas
uma reunião social.
Neste trabalho, será analisado o associativismo rural. Esse tipo de associação possui
uma característica particular: ela deve ser administrada pelos próprios agricultores. Para
Bezerra (2003, p. 51), “a confiança e a participação são os princípios básicos do
associativismo rural”.
Para uma associação comunitária, a confiança se faz necessária para manter a união
entre os produtores associados e a participação é o que vai garantir se os benefícios da
organização da associação serão válidos ou não.
A comunidade de Riacho D’anta tendo este pensamento criou em 14/10/1995 a
Associação Comunitária dos Pequenos Produtores de Riacho D’anta e adjacências, para que
pudessem trazer benefícios aos associados e moradores da comunidade. A associação
começou com poucos associados, mas com o passar do tempo este número aumentou, assim
como os benefícios adquiridos. As reuniões, antes da construção da sua sede e, aconteciam na
residência de Dona Carmelina, sempre todo segundo domingo do mês às 13h00min horas.
A Associação possui estatuto próprio e uma diretoria composta por: presidente, vice-
presidente, secretário, vice-secretário, tesoureiro, vice-tesoureiro e conselho fiscal, constituído
por seis membros. As exigências para participar é ser produtor rural, estar em dia com a
freqüência. Em relação ao pagamento de taxas, existe uma pequena mensalidade formal para
compra de livros de atas e para manutenção da própria associação. Todos os associados são
proprietários de terras, e os laços de amizade entre a maioria deles precedem à fundação da
associação, pois algumas pessoas já moravam na região muito antes da mesma. As relações de
troca e amizade também prevalecem entre as outras associações, que lutam por objetivos
comuns. As relações de parentesco também são fortes na comunidade, e se reproduzem com
os casamentos entre os filhos. Todos se conhecem e as histórias das famílias se misturam.
52

Os associados desta associação comunitária também começaram a participar de lutas


em favor do meio ambiente, tendo assim contato com vários órgãos estaduais, entidades e
ONGS que também participavam. Mais tarde a associação comunitária com auxílio de alguns
dessas entidades, como o Instituto Grande Sertão, o Centro de Agricultura Alternativa e
principalmente do PPP-ECOS - Programa de Pequenos Programas Ecossociais, criou a
Unidade de Beneficiamento do Coco Macaúba (UBCM) para obter e processar o coco
macaúba encontrado nos municípios Brasília de Minas, Coração de Jesus, Mirabela e Montes
Claros.
A sede da Associação Comunitária do Riacho D’antas e Adjacências e da Unidade de
Beneficiamento do Coco Macaúba (UBCM) fica na Fazenda Santa Cruz, Comunidade de
Riacho D’Anta, Zona Rural de Montes Claros - MG, e o espaço foram cedidos por Dona
Carmelina Soares Fonseca, anos antes de falecer. Hoje seus filhos, genros, noras e netos são
associados, participam ativamente na unidade de beneficiamento e em lutas em benefício do
meio ambiente. Outra pessoa que vale destacar na criação da associação, da unidade de
beneficiamento do coco macaúba e da luta em benefício do meio ambiente é Waldomiro
Cardoso da Silva e sua esposa Amélia. Ele foi um dos primeiros presidentes da associação
comunitária, e atualmente é vice-presidente.
A UBCM foi criada em bases semelhantes à do Sr Cinéias Martins Campelo, 76 anos,
produtor rural que através do óleo da macaúba – que era vendido para uma fábrica de
cerâmica – criou toda a família. E fez questão que seus sete filhos – seis homens e uma
mulher – prosseguissem nos estudos. Hoje, a maioria deles tem curso superior e alguns
seguiram carreira acadêmica, fazendo mestrado e doutorado. E tudo isto em uma época que
nem se pensava em fazer pesquisas sobre a macaúba. Literalmente com a sabedoria que Deus
lhe deu, Cinéias vislumbrou no produto toda sua potencialidade econômica aliada ao manejo
sustentável.
Segundo Sr Cinéias, foi na década de 1960 que ele despertou para a possibilidade de
exploração econômica do óleo da macaúba, palmeira abundante na fazenda Montes Verdes,
em Jequitibá (MG), onde vive desde a infância. Depois de ter notícia da criação de uma
fábrica de óleo em Jaboticatubas, ele pensou em criar um maquinário semelhante ao que havia
visto em Sete Lagoas, para extração do óleo. As primeiras experiências não foram bem-
sucedidas. O produtor rural precisou fazer várias adaptações até obter bons resultados.
53

32 33 34

35 36 37
Figuras 32: Velho britador adaptado; Figuras 33, 34: Torrador; Figura 35: Prensa; Figura 36: Óleo obtido; Figura
37: Sr Cinéias.
Fonte: UBCM 2008.

A Associação Comunitária dos Pequenos Produtores de Riacho D’anta e adjacências em


02 de junho de 2007 fez uma homenagem ao Sr Cinéias, que compareceu com a família, e que
viu a primeira unidade de beneficiamento baseada no seu saber.
A Unidade de Beneficiamento do Coco Macaúba (UBCM), como foi visto
anteriormente, está produzindo do óleo da polpa e da semente da macaúba vários produtos, e a
associação vem contribuindo para a valorização da biodiversidade do Cerrado da região, para
a proteção e a recuperação dos recursos naturais.
A associação comunitária de Riacho D’antas adquiriu muita experiência na retirada do
óleo e outros subprodutos do coco macaúba e já foi procurada várias vezes pela Petrobrás para
ser representante na compra, colheita e da negociação com os produtores rurais donos da
matéria-prima. Mas esse contrato entre a associação e a Petrobrás não saiu ainda devido,
alguns impasses, principalmente em relação aos primeiros acordos feitos entre eles, onde o
número de pessoas da comunidade que trabalharia nesse contrato seria bem maior.
A utilização do óleo de macaúba para a produção de biodiesel com a participação da
agricultura familiar elevaria a demanda por esta planta e ajudaria a promover o
54

desenvolvimento sócio-econômico de muitas regiões problemáticas no país, através de


programas de geração de empregos e renda contribuindo para erradicação da miséria, freando
correntes migratórias internas por contribuir com a fixação das famílias a terra.
Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior - MDIC e o
Instituto Euvaldo Lodi - Núcleo Central-2006 - IEL/NC (2006), o biodiesel oferece uma
oportunidade para a integração entre indústria, agricultura familiar e combate à pobreza. Tudo
isso ao lado da conquista de novo padrão energético: sustentável, ambientalmente responsável
e economicamente dinâmico.
A Petrobrás está desempenhando um papel fundamental na estruturação da cadeia de
biodiesel no Brasil e deverá inaugurar até dezembro de 2009 três fábricas de biodiesel em
Quixadá-CE, Candeias-BA e Montes Claros-MG. A Petrobrás produzirá o biodiesel com a
agricultura familiar. A expectativa é que estas três fábricas resultem na inclusão social de
cerca de 75.000 famílias.
Mesmo sem a ajuda ainda da Petrobrás, a demanda pelos produtos da macaúba está
avançando significativamente, porém esbarra na falta de registro pela vigilância sanitária.
Sem tal registro, os produtos não podem ser comercializados em grande parte do mercado. A
Associação já recebeu a visita da vigilância sanitária municipal, que indicou as adequações
necessárias na UBCM, para que se obtenham os registros dos produtos. Este projeto, caso
aprovado, atuará exatamente nessas adequações, de modo a superar esse gargalo e
proporcionar um avanço importante na comercialização e na conquista de mercados pelos
produtos da macaúba.
Outro ponto que se nota é que, os moradores estão trabalhando unidos em torno de obter
recursos para a comunidade e estão conseguindo, o que sozinho dificilmente conseguiria
obter. Assim como,
Quando, por exemplo, agricultores formam um fundo de aval que lhes
permite acesso a recursos bancários que, individualmente lhes seriam
negados, as relações de confiança entre eles e com os próprios bancos
podem ser consideradas como um ativo social capaz de propiciar geração
de renda. (ABRAMOVAY, 2003, pág. 86.)

É importante mencionar também que a Associação tem vários parceiros, como por
exemplo, a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba -
CODEVASF, que aprovou projeto feito pela associação. Neste projeto a associação estará
construindo um viveiro, no qual pretende produzir muda da macaúba e de outras espécies
nativas e exóticas (baru, pequi, faveira, maracujá-nativo, cagaita, panã, coquinho azedo,
acerola, manga, goiaba, cajá, tamarindo etc.). Vale lembrar que a associação tem estimulado,
55

junto aos agricultores da região, o plantio de cultivos tradicionais (milho, feijão, mandioca
etc.) consorciado com a macaúba e outras espécies nativas.
Existem também outros parceiros importantes, como um projeto da Unimontes (Universidade
Estadual de Montes Claros), liderado pelo Prof. Leonardo Monteiro Ribeiro (bolsista da
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais - FAPEMIG), que vem
pesquisando os aspectos de desenvolvimento da macaúba, produção de mudas, consórcio com
outras espécies, desenvolvimento de produtos etc. Caso este projeto seja aprovado pelo PPP-
ECOS, pretende-se incrementar ainda mais essas iniciativas, com vistas à proteção e
recuperação do Cerrado como um todo.
Vale lembrar que, com a valorização do coco macaúba e ainda de outras espécies
nativas, os seus produtos adquiriram valor comercial e novos valores de uso, e os agricultores
beneficiados passaram a proteger as áreas em que ocorrem, e também a plantá-los para
recuperação de áreas degradadas.
Por isso um importante passo para a sustentabilidade econômica da UBCM é a
conquista de mercados para comercialização dos produtos da macaúba. Sabemos que esse
empreendimento deve atingir sua sustentabilidade, de forma que continue gerando renda para
a comunidade de Riacho D’anta e para as comunidades vizinhas e continue valorizando a
biodiversidade da região.
56

5 - Considerações finais

Com o desenvolvimento da pesquisa constatamos que o coco macaúba é uma palmeira


muito encontrada na região estudada e que já era utilizado por muito moradores da
comunidade de Riacho D’antas e nas comunidades vizinhas de diversas maneiras, desde
alimentação de animais até construções de casas.
Verificamos que, a comunidade descobriu que a macaúba possuía um enorme potencial,
assim começou explorá-lo. Para isso foi necessária a criação de uma unidade de
beneficiamento do coco macaúba pela associação comunitária de Riacho D’antas. Ela vem
recebendo investimentos e ajuda de diversos órgãos e programas, como o PPP-ECOS através
de financiamentos de pequenos projetos ecossociais, a Unimontes através de desenvolvimento
de pesquisas sobre o coco macaúba, a Fundação Banco do Brasil que dou um caminhão para a
colheita do coco, a CODEVASF que aprovou um projeto para um viveiro de mudas e para a
compra de novos maquinários para o beneficiamento do coco macaúba, além de vários outros
órgãos como a EMATER, SENAR, IDENE, etc..
Com essa ajuda a UBCM, o processo de extrativismo da macaúba teve rápido
crescimento e difusão, pessoas que antes não aproveitavam o coco, passaram a olhar para ele
com mais carinho e como uma possível fonte de renda. As comunidades vizinhas começaram
a acreditar que aquela idéia poderia dar certo e passaram a também fornecer a matéria-prima a
UBCM. A unidade de beneficiamento começou a processar então vários produtos.
Os produtos do coco macaúba fabricados na UBCM são vendidos nos comércios de
comunidades e povoados vizinhos, e estava aguardando liberação, que ocorreu no 01/05/2009,
da vigilância sanitária de Montes Claros para vender seus produtos nos supermercados desta
cidade e de cidades vizinhas. Ocorrea venda do próprio coco macaúba para Universidade
Federal de Viçosa, que vem desenvolvendo mudas para uma empresa alemã.
A comunidade de Riacho D’antas, com a associação comunitária e a UBCM, está
sempre lutando pela defesa do meio ambiente e pela preservação do ecossistema cerrado,
sendo que essa luta foi reconhecida, e em várias vezes beneficiada com recursos financeiros e
materiais doados pela Promotoria do Meio Ambiente da cidade de Montes Claros-MG.
57

Referências

ABRAMOVAY, R. Paradigmas do capitalismo agrário em questão. Rio de Janeiro:


HUCITEC, 1992.

ABRAMOVAY, Ricardo. O futuro das regiões rurais.- Porto Alegre: Editora da UFRGS,
2003. (Coleção Estudos Rurais).

BEZERRA, L. M. C. Agricultura familiar em Orizona (GO): a Associação dos Pequenos


Agricultores da Marta Velha, Água Grande e Coqueiro – APAMAC. 2003. 121 f. Dissertação
(Mestrado em Geografia) – Instituto de Geografia, Universidade Federal de Uberlândia, 2003.

FERNANDES, B. M. Agricultura camponesa e/ou agricultura familiar. In: ENCONTRO.


NACIONAL DE GEOGRAFIA, XIII., 2002, João Pessoa. Anais... João Pessoa: AGB,

FONSECA, E.T. Frutas no Brasil. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1954, 281 p..

FUNDAÇÃO CENTRO TECNOLÓGICO DE MINAS GERAIS. Programa Energia.


Produção de combustíveis líquidos a partir de óleos vegetais. Relatório final. Belo Horizonte,
1983, 1 e 2 v.

LAMARCHE, H. A agricultura familiar. Tradução: Ângela Maria Naoko Tijiwa. 2. ed.


Campinas: Unicamp, 1997.

LORENZI, G. M. A. C., Acrocomia aculeata (Jacq.) Lodd. ex Mart. – Arecaceae: bases para
o extrativismo sustentável. Curitiba, 2006, 172f. Tese (Doutorado em Ciências Agrárias)
Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2006.

Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior – MDIC Instituto Euvaldo


Lodi – IEL/Núcleo Central-2006. O Futuro da Indústria: Biodiesel. Coletânea de Artigos.
Série Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior – 14

MOTTA, P. E. F.; CURI, N.; OLIVEIRA-FILHO, A. T.; GOMES, J. B. V. Ocorrência da


macaúba em Minas Gerais: relação com atributos climáticos, pedológicos e vegetacionais.
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.37, n.7, p.1023-1031, jul. 2002.

NUCCI, Stella Maris. Desenvolvimento, caracterização e análise da utilidade de marcadores


microssatélites em genética de população de macaúba. 2007. 84f. Dissertação (Mestrado em
Genética, Melhoramento Vegetal e Biotecnologia) – Pós-Graduação – IAC.
58

RIBEIRO, J. F. Cerrado: matas de galeria. Planaltina: Embrapa – CPAC, 1998. 164p.

RICCIARDI, L.; LEMOS, R. J. Cooperativa, a empresa do século XXI: como os países em


desenvolvimento podem chegar a desenvolvidos. São Paulo: LTr, 2000.

SILVA, J.C. Macaúba: fonte de matéria prima para os setores alimentíceo, energético e
industrial. Viçosa: CEDAF/DEF/UFV, 1994. 41 p.

SILVA, D. B.; SILVA, J. A.; JUNQUEIRA, N. T. V.; ANDRADE, L. R. M. Frutas do Cerrado.


Brasília: EMBRAPA, 178p. Informação Tecnológica, 2001.

SINGER, Paul. Introdução à economia solidária- 1ª ed. – São Paulo: Editora Fundação Perseu
Abramo, 2002.

SINGER, Paul.; SOUZA, André Ricardo de. A economia solidária no Brasil: A auto gestão
como resposta ao desemprego. 2ª ed.- São Paulo: Contexto, 2003- (Coleção economia).

Universidade Federal do Mato Grosso do Sul – UFMS, Conselho Nacional de Pesquisa e


Desenvolvimento Tecnológico – CNPq. Farinha da polpa de macaúba: Guia completo e livro
de receitas. Parte integrante do projeto de extensão intitulado: Exploração auto-sustentável da
bocaiúva no Pantanal Sul-Mato-Grossense: Geração de renda e equilíbrio do meio-ambiente.
Mato Grosso do Sul, 2006, 20 p.
59

Anexo 01:
Manual de como se faz a farinha do coco macaúba

Faça a coleta manual de quantidade suficiente dos melhores frutos, evitando aquele com
fissuras nas cascas, após leve-os em sacos plásticos para o local de processamento, neste local
lave-os em água corrente até retirar a terra e outras impurezas. Em uma vasilha grande faça a
solução para cada litro de água uma colher de água sanitária, em seguida coloque as macaúbas
nessa solução por 30 minutos, para matar todos os microorganismos que possam estar
presentes. Lave novamente as frutas em água corrente e deixe-as em uma peneira até secar.
Retire então a casca fina do fruto e retire a polpa com uma faca bem afiada. Pegue toda a
polpa retirada e coloque em uma assadeira de alumínio, esta será levada a uma estufa com
fluxo de ar, também chamado de desidratador, com temperatura que deve estar próxima de
65ºC, até secar completamente. Pode-se secar a polpa ao sol também, deixe-a
aproximadamente 5 dias até que ela esteja totalmente seca. Depois que a polpa estiver toda
seca, coloque-a em um pilão para fazer a maceração do material. Essa polpa deve ficar
totalmente triturada em pequenos grãos, o mais fino possível. Essa trituração também pode ser
feita com liquidificador. Agora é só peneirar essa farinha grossa e obter uma farinha fina, que
deverá ser conservada em sacos plásticos na falta de um sistema de embalagem a vácuo.

Você também pode gostar