Você está na página 1de 12

Resumo de Aula

Águas Subterrâneas
Rubem La Laina Porto
Kamel Zahed Filho
Águas Subterrâneas

Resumo de Aula

Objetivo: O objetivo das aulas sobre águas subterrâneas no curso de Hidrologia


Aplicada é apresentar conceitos básicos sobre o tema uma vez que a limitação de
tempo não permite maior aprofundamento. Alunos interessados no assunto são
aconselhados a consultar as referências citadas no final destas notas.

1. HIDROLOGIA DE ÁGUAS SUBTERRÂNEAS

ontem: ciência que estuda a ocorrência, distribuição e movimentação da água na parte


subterrânea da terra.

hoje: a definição deve ser ampliada para incluir aspectos de qualidade da água, poluição e
descontaminação.

O Ciclo Hidrológico é um sistema (constituído de partes física ou funcionalmente integradas).


A separação em hidrologia superficial e subterrânea é artificial e imposta pela necessidade de
simplificar os estudos.

2. CARACTERÍSTICAS

# movimento lento relativamente a águas superficiais:

 velocidades típicas: 1 m/dia (águas subterrâneas)


1 m/s (águas superficiais)
 relação: dezenas de milhares de vezes

 fluxo: água subt.> laminar água superf.> turbulento

 tempo de residência médio: 280 anos (até dezenas de milhares de anos)

 recarga muito pequena

 enorme volume de poros

# consequências:

1. reserva grande e confiável (imune a variações climáticas de curto e médio prazos) e


naturalmente protegidas contra poluição.

2. em contrapartida, uma vez poluído pode levar séculos para se auto-descontaminar

2
através de seus mecanismos de fluxo. Os métodos de descontaminação artificial são
lentos e muito caros.

3. ESTIMATIVA DAS RESERVAS

As estimativas das reservas mundiais variam consideravelmente entre autores (entre 4 e 60


milhões de km3) mas de qualquer forma são muito grandes.

No Brasil a estimativa é de 100.000 km3 dos quais cerca de 50% na bacia do Paraná.

Nos EUA mais de 50% da água potável é proveniente de águas subterrâneas.

No Brasil as estatísticas são incompletas. No ESP existem mais de 10.000 poços tubulares.

4. VANTAGENS DO USO DE ÁGUAS SUBTERRÂNEAS PARA ABASTECIMENTO

 imune a flutuações climáticas (secas prolongadas por exemplo)


 relativamente protegida contra poluição
 geralmente dispensa tratamento e grandes adutoras
 escalonamento no tempo é mais flexível (os poços vão sendo construidos na medida
das necessidades)

5. AQUÍFEROS, AQUITARDES E AQUICLUDES

Aquíferos: formação geológica capaz de armazenar e transmitir "quantidades significativas " de


água sob gradientes naturais.

Quantidades significativas: são aquelas economicamente viáveis, por exemplo para suprir:

 abastecimento municipal: 500 a 10.000 m3/dia


 abastecimento rural: 20 a 100 m3/dia
 abastecimento residencial: 5 a 20 m3/dia

Conceito de aquífero é portanto relativo ( em regiões desérticas 5 m3/dia pode caracterizar uma
camada geológica como aquífero).

Tipicamente:

 areias e cascalhos em regiões costeiras e planícies aluviais


 arenitos
 basaltos fraturados
 calcáreos

3
Aquitardes: são formações que armazenam água mas não a transmitem com facilidade
(tipicamente argilas e folhelhos). Uma ou duas ordens de grandeza menos permeáveis que os
aquíferos.

Não são importantes do ponto de vista de produção de água mas podem ser do ponto de vista
de poluição (concentrações muito pequenas, da ordem de partes por bilhão de benzeno ou
organoclorados podem causar danos à saúde).

Aquicludes: caso extremo de aquitarde; podem ser considerados impermeáveis em termos


práticos.

Observação: a necessidade de considerar problemas de poluição não permite tratar nenhuma


formação geológica como impermeável.
A poluição por solventes pode aumentar significativamente a permeabilidade de argilas.

6. CLASSIFICAÇÃO DOS AQUÍFEROS

Freáticos ou não-confinados: possuem uma superfície freática, ou lençol freático, que é


a superfície superior da zona de saturação sujeita à pressão atmosférica (vide aquífero A na
Figura 1).

Artesianos ou confinados: são camadas geológicas permeáveis sujeitas a uma pressão maior que
a atmosférica devido à presença de camadas relativamente impermeáveis acima e abaixo do
aquífero. É a camada B da Figura 1. A área de afloramento 1 é a área de recarga. Nesta área o
aquífero é freático.

Poços perfurados em aquíferos confinados apresentam o fenômeno de artesianismo, ou seja, o


nível d'agua se eleva até atingir a linha piezométrica. Poços artesianos podem ser surgentes ou
não, dependendo da posição da linha piezométrica em relação à superfície do solo.

7. ÁGUA NO SOLO

Porosidade: é o volume de vazios em uma amostra de solos. Em porcentagem tem-se:

4
Vv
n= x 100
V

Porosidade efetiva: refere-se à quantidade de água que drena de uma amostra saturada apenas

Vg
ne = x 100
V

pela ação da gravidade


Retenção específica: é o volume que não drena por gravidade, nr, também chamada capacidade

n = ne + nr

de campo.

Tabela 1 - Valores aproximados de porosidade e porosidade efetiva para diversos materiais

Material Porosidade Porosidade efetiva


(%) (%)

Argila 45 3
Areia 35 25
Pedregulho 25 22
Pedregulho e areia 20 16
Arenito 15 8
Calcáreo e folhelho 5 2
Quartzito e granito 1 0.5

8. MOVIMENTO DA ÁGUA NO SOLO

Os vazios do solo são geralmente interconectados e permitem, portanto, que a água se mova
através deles. A facilidade ou dificuldade que um solo tem em transmitir água é a sua
propriedade hidrogeológica mais significativa. Este parâmetro chamado de condutividade
hidráulica, K, tem a dimensão de velocidade.

O tamanho dos poros e o grau de interconexão entre eles condicionam o valor deste parâmetro.

Exemplos:

 Areia e pedregulho têm grande condutividade hidráulica pois seus poros são grandes e
interconectados.

 Basalto vesicular tem muitos poros que entretanto não são conectados e portanto sua
permeabilidade é pequena.

5
 Argila tem porosidade grande mas os poros são muito pequenos e a água tem dificuldade
para movimentar-se.

A Tabela 2 apresenta faixas de valores de K para diversos tipos de solo.

Tabela 2 - Faixas de variação da condutividade hidráulica para diversos materiais

Material Permeabilidade Condutividade


Intrínseca (cm/s)
(darcys)

Argila 10-6 a 10-3 10-9 a 10-6


Silte, silte arenoso e areia 10-3 a 10-1 10-6 a 10-4
argilosa
Areias siltosas, areias finas 10-2 a 1 10-5 a 10-3
Areia de granulometria 1 a 102 10-3 a 10-1
variada
Pedregulho de granulometria 10 a 103 10-2 a 1
variada

( h a - h b) dh
Q=KA =-KA( )
L dl

Q
K=
dh
A( )
dl

O Experimento de Darcy

g
K = Ki ( )

K é função do meio poroso e do fluido

6
onde:

Ki = condutividade intrínseca
μ = viscosidade dinâmica
ρ = densidade do fluido
g = aceleração da gravidade

Quanto maior as aberturas menor a resistência ao movimento. A quantidade de vazios é função

2
Ki = C Dm

do quadrado do diâmetro médio dos grãos do solo Dm:


C é o fator de forma que depende do arranjo dos grãos no solo. Ki tem dimensão de área.

Dh
Va = K
Dl

É comum a apresentação da Lei de Darcy na forma:


onde por analogia com a equação da continuidade substituiu-se Q/A por Va.

Va é a velocidade aparente e não representa a velocidade média do fluido pelos poros mas a
vazão por unidade de área.

Va
Vn =
n

A velocidade média da água é:

9. HIDRÁULICA DE POÇOS

em regime permanente:

Se um poço atravessa totalmente um aquífero freático extenso, isotrópico e homogêneo, no


qual o lençol é horizontal, ao ser iniciado um bombeamento forma-se uma depressão circular
pois não poderá haver escoamento em direção ao poço se não houver gradiente hidráulico.
Esta depressão é chamada de cone de depressão e o abaixamento do nível de água Z chama-se
rebaixamento.

Sendo Y a espessura original do aquífero e Y - Z = y, pode-se calcular a vazão afluente ao

dy
Q= 2 x yK
dx

poço a uma distância x deste poço pela lei de Darcy:

A = 2 x y

sendo
onde
A = área do cilindro através do qual se verifica o escoamento
7
Ks = condutividade hidráulica
dh/dx = gradiente hidráulico

Perfurando-se poços de observação a distâncias r1 e r2 do poço que está sendo bombeado e se os


valores de y nesses poços forem d1 e d2, a integração da equação 10 dará, após algumas

K Y (d 2 - d 1 ) T (d 2 - d 1 )
Q = 2.72 = 2.72
log ( r 2 ) log ( r 2 )
r1 r1

simplificações:

T=K xY

Esta fórmula foi proposta por Dupuit (1863).


Esta fórmula também se aplica a aquíferos artesianos com seus termos indicados na Figura 3.

A equação de Dupuit tem aplicações muito limitadas porque:

 para que as linhas de fluxo sejam horizontais é preciso que o poço atravesse todo o aquífero

 admite-se regime de equilíbrio (regime permanente), ou seja, as variáveis do problema não se


alteram com o tempo; esta condição demoraria muito tempo para ocorrer (anos) e na prática
nunca se verifica; para aplicá-la com penetração parcial (resultados aproximados) deve-se ter
r>1.5y e observar uma série de outras condições difíceis de ocorrer na prática.

8
em regime não permanente:

Será analisado somente o caso de aquíferos confinados. A análise de aquíferos freáticos é um


pouco mais complicada, embora seja baseada em conceitos semelhantes.

A água de um aquífero confinado é obtida da expansão elástica da água quando a pressão é


reduzida e pela redução dos poros pela compactação do aquífero.

O parâmetro que caracteriza este processo chama-se armazenamento específico, Se, e é


definido como sendo a quantidade de água liberada por um volume unitário de aquífero
quando a carga piezométrica abaixa 1 m ( unidade metro-1).

Chama-se coeficiente de armazenamento S ao produto do armazenamento específico pela

S = Se x b

espessura do aquífero b:
S é adimensional.

O valor de S é normalmente pequeno. Valores da ordem de 0.001 são típicos. Como a expansão
elástica da água é muito pequena o valor de S depende mais da compressibilidade do aquífero.

Para se obter uma produção significativa de um poço perfurado em aquífero confinado é


necessário uma grande extensão de aquífero e/ou um rebaixamento elevado da linha
piezométrica.

9
Exemplo 1

Um aquífero de 400 Km2 cujo coeficiente de armazenamento é 0,005 contém um único poço.
Qual a quantidade de água produzida se a linha piezométrica for rebaixada de 30 m?

V= 0.005 x 400 x 106 x 30 = 60 x 106 m3

Este volume é suficiente para atender à demanda de uma cidade de 80.000 habitantes durante
10 anos, admitindo consumo de 200 l/hab.dia.

Método de Theis

Admite aquífero isotrópico e homogêneo de espessura constante com o poço penetrando

Q  u2 u3 u4 
h0 - h =  - 0.5772 - ln u + u - + - ...
4T  2 _ 2! 3 _ 3! 4 _ 4! 

totalmente no aquífero.

r2 S
u=
4Tt

onde

Q = vazão de bombeamento constante


h = posição da linha piezométrica após o tempo t
h0 = posição da linha piezométrica antes do início do bombeamento
r = distância do poço de observação ao poço de bombeamento
10
T = transmissividade do aquífero
S = coeficiente de armazenamento

A série infinita entre colchetes é chamada função do poço W(u). A Tabela 3 mostra valores de

Exemplo 2

Um poço está localizado em um aquífero que tem um a condutividade hidráulica de 15m por
dia e coeficiente de armazenamento de 0.005. O aquífero tem 20 m de espessura e está sendo
bombeado com uma vazão constante de 2500 m3/dia. Qual é o rebaixamento a uma distância
de 7 m do poço após 1 dia de bombeamento?

T = 15 m/dia x 20 m = 300 m2/dia

u = (7 m )2 x 0.005 / (4 x 300 m2/dia x 1 dia) = 0.0002

Da Tabela 3 para u= 0.0002, W(u) = 7.94

h0 - h = (2500 m3/dia x 7.94) / (4 x 3.14 x 300 m2/dia) = 5.26 m

W(u) em função de u.

T e S são os parâmetros mais importantes de um aquífero confinado. Eles podem ser obtidos
da equação de Theis através dos chamados testes de bombeamento. Nestes testes bombeia-se o
poço durante um tempo longo (1 a 2 dias) e registra-se o rebaixamento em poço de observação
situado a uma distância r. No sistema formado pelas equações 15 e 16 as únicas incógnitas são
T e S.

A solução não é explícita mas pode ser feita por métodos gráficos e numéricos.

11
12

Você também pode gostar