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Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS

Instituto de Pesquisas Hidráulicas - IPH

FUNDAMENTOS DE
HIDROLOGIA
Disciplina IPH01104 – Hidrologia
Curso de Engenharia Civil

Autor: Prof. Julio Sánchez


Porto Alegre, Brasil, 2009
Capitulo 7.- Águas
subterrâneas
Definições e conceitos

Distribuição da água no solo


Podem-se considerar duas
grandes zonas dentro do solo,
chamadas de aeração e de
saturação. Na zona de saturação
todos os vazios do solo estão
totalmente ocupados por água,
submetida à pressão hidrostática; e
chamada também de zona de água
subterrânea.
Na zona de aeração, os espaços
porosos do solo estão parcialmente
cheios de água e parte de ar,
coexistindo os dois meios e dando
lugar, portanto, à ação de forças de
tensão superficial, pressão osmó-
tica e fenômenos de capilaridade.
Definições e conceitos

Dependendo da força predominante, a zona de aeração pode ser


subdividida em três zonas secundárias:

o A zona de água do solo começa na superfície do terreno e abrange


até a máxima profundidade da qual a água pode retornar à superfície
por capilaridade ou pela ação das raízes das plantas. Sua
profundidade total é variável e depende do tipo de solo e da
vegetação. Três categorias de água podem ser definidas dentro desta
zona: água higroscópica, absorvida do ar; água capilar, retida pelas
forças de tensão superficial, e água gravitacional, ou água drenando
através do solo.

o A zona intermediária inicia-se apos a anterior e se estende até


atingir a franja capilar; sua espessura pode variar de praticamente
zero até varias centenas de metros. É uma região de ligação entre a
superfície e as proximidades do lençol freático, através da qual
passam os fluidos que infiltram.
Definições e conceitos

A zona capilar, colocada imediatamente acima da zona de saturação, e


definida pela elevação capilar, função da textura e granulometria do
terreno e da viscosidade da água. Assimilando os diâmetros dos poros a
tubos capilares, pode-se usar a relação deduzida para a elevação
capilar:
hc = 4σCos  / d

onde: σ = coeficiente de tensão superficial


 = ângulo de contato do menisco com a
parede do tubo
 = peso específico do fluido
d = diâmetro do capilar
Solo hc (cm)
Areia grossa 12 – 15
Areia média 40 - 50 Na tabela apresentam-se valores
Areia fina 90 - 100 máximos de hc medidos em
Silte arenoso 175 - 200 laboratório para diferentes tipos
Argila arenosa 225 - 250 de solo.
Argila 120 - 938
Quantidade de água no solo

A quantidade de água no solo e geralmente referida a duas situações


caracteristicas de umidade:
a Reserva permanente, que corresponde a água que não pode ser
removida do solo por capilaridade, gravidade ou osmose, e é medida pelo
Ponto de murchamento permanente (PMP), valor em geral constante para
diversas plantas e um mesmo tipo de solo (tabela), e
a Capacidade de campo, que corresponde à umidade retida num solo
previamente saturado após sua drenagem natural por gravidade. Esta
ultima inclui, naturalmente, a reserva permanente e uma certa quantidade
de umidade disponível, mantida pela ação capilar. As grandezas da tabela
são expressas em mm de água por metro de profundidade de solo
Solo PMP Capacidade de
(mm/m) campo (mm/m)

areia 25 100

Areia fina 30 115

Argila arenosa 50 160

Silte arenoso 115 280

argila 210 325


Propriedades hidrológicas dos solos

Ao penetrar no solo, a água percola atingindo camadas cada vez mais


profundas até encontrar estratos impermeáveis que impeçam esse
movimento vertical, acumulando-se em lençóis subterrâneos:

Quando um lençol
subterrâneo se esta-
belece em uma forma-
ção suficientemente
porosa para admitir
uma quantidade com-
siderável de água e
permitir seu escoa-
mento em condições
favoráveis para utili-
zação, recebe o nome
de Aquifero
Tipos de aqüíferos

Quando o lençol subterrâneo apresenta uma superfície livre, recebe a


designação de lençol freático ou aquifero freático e a superfície livre,
onde reina a pressão atmosférica, e conhecida como superfície freática.

Se se
constituir
entre cama-
das imper-
meáveis e
for mantido
sob pres-
são, deno-
mina-se
aqüífero
artesiano
ou
confinado.
Tipos de aquiferos

Aquiferos carsticos
(em rochas calcarias)
Os rios podem ser influentes ou efluentes conforme
contribuam para o aqüífero ou sejam por ele alimentados; essa
condição varia segundo o estado do rio, em função do nível
d'água no leito fluvial.

Rio efluente: é alimentado Rio influente: alimenta o


pelo aquifero aquifero
O nível de água em um poço perfurado em um aqüífero freático
indicará a posição da superfície freática naquele ponto. Um poço
artesiano indicará o nível da superfície piezométrica.

A quantidade de água acumulada na zona saturada é função da


porosidade do solo (n), expressa como

n = Vv/V

sendo Vv o volume de vazios e V o volume total de solo.

Retenção específica Re. Volume retido por forças moleculares e pela


tensão superficial; este volume é geralmente expresso em porcen-
tagem do volume de solo. Fisicamente equivale à capacidade de
campo.

Contribuição específica Ce à relação entre o volume de água cedido


pelo solo e o seu volume total.
assim, a porosidade pode ser expressa como

n = Re + Ce

Na tabela embaixo apresentam-se valores comparativos da re-


tenção e contribuição especifica para vários tipos de solo, veri-
ficando-se a grande influência que a estrutura do solo tem na
disponibilidade de água para exploração do recurso.

Tipo de n (%) Ce (%)


solo
argila 45 - 55 3
silte 40 - 50 3
Areia fina 30 - 40 10
média
pedregulho 30 - 40 25
arenito 10 – 20 10
calcário 1 - 10 -
Princípios básicos do escoamento subterrâneo: Lei de Darcy

Henry Darcy, examinando as características do fluxo através de filtros


de areia, concluiu que a vazão é diretamente proporcional à carga
hidrostática e inversamente proporcional à espessura da camada (lei
de Darcy)

Q = KA( z/L) = KAJ

ou V = Q/A = KJ

onde:
A = área total da seção do es-
coamento (incluindo os
sólidos)
K = coeficiente de permeabili-
dade de Darcy
J = z/L = perda de carga
V = velocidade média, aparente
Como se aprecia na figura anterior, a taquicarga é desprezada, já
que as velocidades são de fato muito baixas, havendo um
predomínio das forças de viscosidade sobre a inércia, o que
caracteriza um escoamento laminar. A aplicabilidade da lei de Darcy
está limitada aos casos nos quais o Numero de Reynolds Nr do
escoamento é menor do que um, calculando Nr como

N r = Vd/
onde:
d = diâmetro médio dos grãos de solo
V = velocidade media do escoamento
 = viscosidade cinemática do fluido

Na grande maioria dos problemas práticos relacionados com a


exploração de aqüíferos, observa-se a validade da lei de Darcy.
O coeficiente de permeabilidade

A equação
Q = KA ( z/L) = KAJ

define um coeficiente de permeabilidade K (ou condutividade hidráulica)


com as dimensões de uma velocidade, dependendo não só das
características do meio poroso como do fluido em escoamento. Podemos
separar K em duas componentes, uma relativa ao meio e outra ao fluido:
1.- A permeabilidade intrínseca ou especifica k,
função do meio unicamente, é k=Cd2

onde d é o diâmetro médio das partículas e


C é um fator de forma associado à distribuição dos grãos de solo.

2.- Assim, a condutividade hidráulica pode ser dada como


sendo  = peso especifico da água
K=k/  = viscosidade dinâmica
As dimensões de k são L2, e a unidade adotada é o darcy,
correspondente a 0,987 x 10-8 cm2. Valores de K e de k:

Tipo de solo Permeabilidade Permeabilidade


K (m/s) a 15°C intrínseca k (darcys)
Cascalho limpo 1 – 10-2 105 - 103
Areia limpa; 10-2 – 10-5 103 - 1
Cascalho +areia
Areia muito fina; silte, argila 10-5 – 10-9 1 – 10-4
estratificada
Argila não perturbada 10-9 – 10-10 10-4 – 10-5

Foi constatado que para fortes


declividades, o regime de escoa-
mento pode tornar-se turbulento
e então a Lei de Darcy deixa de
ser válida.
A tabela da direita mostra as
velocidades limites para mudan-
ça de regime (com base no valor
Re = 10).
O coeficiente de Transmissividade T

É o produto da condutividade
hidráulica K pela espessura
do aqüífero b:

T=Kb

Suas unidades são m2/s


ou cm2/s e permite estimar muito rapidamente as reservas de água de
um aqüífero, usando a equação da lei de Darcy, na qual se substitui A
por bL para se obter a vazão:
Q = TLJ

Exemplo: num estudo de um aqüífero determinou-se T = 2 m2/s sendo o


gradiente hidráulico igual a 0.0038 e a largura do aqüífero 11700 m; nessas
condições, a vazão é

Q = 2 x 0,0038 x 11700 = 88.9 m3/s


Escoamento em regime permanente

Uma vez admitida a validade da lei de Darcy e a homogeneidade e


isotropia dos meios porosos, podem-se equacionar com relativa
facilidade os problemas mais comuns que surgem no aproveitamento
dos lençóis subterrâneos.

Escoamentos bidimensionais

Neste caso existirá escoamento nas direções x e y, por exemplo, e a


lei de Darcy pode ser generalizada para

u = - K (H/x) v = - K (H/y)

onde o sinal (-) indica a ocorrência de escoamento no sentido dos


valores decrescentes de H, e o uso do mesmo valor de K nos dois
sentidos reflete a aceitação de um meio isotrópico. A equação da
continuidade para um escoamento permanente e fluido incompressível
é
(u/x) + (v/y) = 0
Escoamento em regime permanente

Combinando as três equações anteriores e generalizando aos três


eixos x, y e z, teremos a equação geral do fluxo:

2H 2H 2H


  0
x 2
y 2
z 2

No caso de um aqüífero
artesiano horizontal, como
O da figura, onde não há
escoamento no sentido ver-
tical, v = w = 0

u = - K dH / dx

e portanto
2H
0
x 2
Escoamento em regime permanente

A equação 2H 2H 2H


  0
x 2
y 2
z 2

também chamada de Laplace, pode ser representada genericamente num


escoamento bidimensional como
 2  2
 2
 0
x 2
y 2

num escoamento bidimensional. A equação de Laplace é satisfeita por


duas funções harmônicas conjugadas  e . As curvas  (x,y) =
constante, são ortogonais às curvas  (x,y) = constante.

A função  (x,y) é o potencial de velocidade, e


a função  (x,y) é a função corrente, definida como

u
 
v
y x
Escoamento em regime permanente

Combinando adequadamente as equações anteriores é possível


mostrar que
   
 
x y e que y x

que são as equações de Cauchy-Riemann.

As linhas de corrente (x,y) são tangentes ao vetor velocidade em


cada ponto da trajetória das partículas.

 (x,y) = constante, significa que o escoamento entre duas dessas linhas


é constante.

por isso, valores altos de velocidade revelam-se através do estrei-


tamento do espaço entre linhas.

As curvas (x,y)=constante são chamadas equipotenciais e interceptam


as linhas de fluxo em ângulo reto, formando redes de corrente ou de
fluxo
Redes de corrente

As curvas (x,y)=constante são chamadas equipotenciais e


interceptam as linhas de fluxo em ângulo reto, formando redes de
corrente ou de fluxo.

Uma rede de fluxo é


composta, então, por uma
familia de linhas de
corrente e a familia corres-
pondente de linhas equi-
potenciais, com as cons-
tantes variando em pro-
porção aritmética (c).

Na figura, pode-se es-


crever a velocidade como

  c c
vs    
s n s n
Aplicações das redes de corrente

Escoamento através de uma barragem homogênea Escoamento em um aquifero freático

Escoamento por baixo de barragens em solo homogêneo


Utilização das águas subterrâneas: exploração de poços

A exploração das águas


subterrâneas pode ser feita
através de poços, com a
composição de três elementos: a
estrutura do poço em si, a bomba
e o sistema de condução ou
Formação do cone transporte de água.
de depressão

Quando a bomba é ativada, é


removida a água próxima à
estrutura do poço; estabelece-se
então, um fluxo das áreas vizinhas para o poço a fim de substituir os
volumes extraídos. Ocorre uma perda ou dissipação de energia, fazendo
com que a superfície piezométrica adjacente ao poço sofra uma
depressão, produzindo um cone de depressão que se ou propaga até que
sejam restabelecidas as condições de equilíbrio na zona próxima ao poço.
Determinação das propriedades do aquifero

As características hidráulicas de um aqüífero, ou seja a

condutividade K e o
coeficiente de armazenamento S

podem ser determinadas no laboratório ou em testes de campo; quanto


aos últimos, os métodos mais comuns são:

o uso de traçadores,
o emprego de permeâmetros de campo e
os testes de bombeamento.

Pela sua maior difusão, serão estudados estes últimos e as equações


do escoamento que os regem.

Os testes podem ser feitos em condições de equilíbrio e em


condições de não equilíbrio. No primeiro caso, o cone de depressão deve
ter-se estabilizado para deduzir as equações de escoamento, e no
segundo, essa condição não é necessária
Poços em regime permanente

No caso de um aqüífero não


confinado, o fluxo dirigido ao poço é Q
radial e, segundo a lei de Darcy, o fluxo
a uma distância X do poço deve ser
igual ao produto do elemento cilíndrico
de área nessa seção pela velocidade
do escoamento, conforme ilustrado na
figura.

A vazão, portanto é

dy
Q  2xyK
dx
onde
2xy = área da superfície cilíndrica em torno do poço
K = condutividade hidráulica
dy/dx = gradiente da superfície livre a uma distancia x
Q= a vazão do poço
Poços em regime permanente

Integrando a equação anterior entre os dois poços de observação, por


exemplo, se tem
r2 h2
 
dx
Q  2 K ydy
r1 x h1
ou

Q ln (r2/r1) = 2K(h22-h12)/2

ou seja
K (h22  h12 )
Q
ln(r2 / r1 )

de onde Q ln(r2 / r1 )
K
 (h22  h12 )

Fórmula de Dupuit, para cal-


cular a condutividade K do
aquifero.
No caso do aqüífero confinado, a equação do escoamento pode ser
obtida com um raciocínio semelhante ao do caso anterior, incluindo um
valor adicional, a espessura m do aquifero:

dy
A vazão a uma distância x é Q  2xmK
dx

Integrando, obtém-se

h2  h1
Q  2mK
ln(r2  r1 )

de onde se obtém a condutividade:

Q ln(r2  r1 )
K
2m(h2  h1 )
Poços em regime não permanente

Nestas condições é necessário considerar o Coeficiente de


Armazenamento S, parâmetro similar ao rendimento específico.
Pode ser definido como o volume de água absorvido ou expelido
pelo aqüífero por unidade de área superficial, por unidade de variação
da carga piezométrica.
Tem unidades de m3 de água por m2 de aqüífero por m de carga
ou, em essência, é adimensional e pode ser expresso pela seguinte
formulação:
1 dV
S
V dh

Em situação de não equilíbrio, quando não há tempo para esperar a


estabilização do cone de depressão, existem duas possibilidades:

1.- as equações de Theis, ou


2.- o método de Jacob.
Construção dos poços

Poços modernos são mais do que


simples buracos no solo. Um tubo de
aço chamado de revestimento é
colocado no poço escavado para
manter a integridade do escavação.
O revestimento é protegido das
circunvizinhanças do solo com um
revestimento de cimento e uma grade
é colocada no fundo do tubo de
revestimento para permitir que a água
penetre e mantenha material sólido
fora.
Dois tipos de bombas podem ser
usados: o motor da bomba na
superfície do solo e a bomba é
colocada no fundo do poço sobre a
tela. A alternativa é uma bomba
submersa; a água é bombeada para
fora do poço através de um tubo de
descarga.
Construção dos poços

Poço tubular profundo


Construção dos poços

Principais tipos de bombas usadas

Bomba turbina Bombas submersas


Construção dos poços
De toda a água doce disponível
para uso da humanidade, cerca
de 98% está na forma de água
subterrânea.
Contaminação de
aquiferos

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