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Hidráulica dos solos

1. Generalidades;
Na natureza existe um sistema de circulação de água que envolve processos de precipitação
(chuva ou neve), condensação e evaporação. Este sistema, denominado ciclo hidrológico. Parte
do volume de água precipitado atinge diretamente o solo, parte cai em rios , lagos e mares, e
parte é interceptada pela vegetação. Do volume de água que é interceptado pela vegetação,
parte retorna para a atmosfera por evapotranspiração e o restante ou é absorvido pela própria
vegetação ou cai no terreno. Do volume de água que cai na superfície do solo, parte infiltra e
parte flui superficialmente (runoff) ou fica retido em depressões superficiais. A infiltração de
água no solo altera as condições de umidade da região não saturada, podendo inclusive alterar
a posição da superfície freática, e, dependendo da estratigrafia, chega a gerar um fluxo sub-
superficial.(Selby, 1982).
O estudo de fluxo de água nos solos é de vital importância para o engenheiro, pois a água ao
se mover no interior de um maciço de solo exerce em suas partículas sólidas forças que
influenciam o estado de tensão do maciço.
De acorodo com Marangon (2018) O estudo dos fenômenos de fluxo de água em solos se apóia
em três pilares:
I - conservação da energia (Bernoulli),
Ii - permeabilidade dos solos (Lei de Darcy)
Iii - conservação da massa.
2. Cargas hidráulicas;
De acordo com Gerscovich Para o estudo do movimento de água é necessário conhecer seu
estado de energia, ou seja, seu potencial. O movimento de água pode ser estudado como a
resultante de uma diferença de potencial, tomado sempre em relação a um referencial
Qualquer partícula de água em repouso ou em movimento possui uma determinada
quantidade de energia, a qual pode ser subdividida em 3 componentes:

O conceito de carga total está ligado à quantidade de energia, portanto define-se carga como:
3. Lei de Darcy
Para obter uma relação fundamental para a quantidade de infiltração através de uma massa
de solo sob uma dada condição, Darcy em 1856 derivou uma fórmula empírica para o
comportamento do escoamento através de solos saturados. Ele descobriu que a quantidade
de água q por segundo fluindo através de uma área de seção transversal do solo sob gradiente
hidráulico i pode ser expressa pela fórmula
Q=kia
Darcy realizou um experimento com um arranjo similar ao mostrado na Figura 1.5 para estudar
as propriedades do fluxo de água através de uma camada de filtro de areia

Este experimento deu origem a lei que correlaciona a taxa de perda de energia da água
(gradiente hidráulico – “i”) no solo com a sua velocidade de escoamento “v” (Lei de Darcy). Os
níveis de água relativos à entrada e a saída no solo (de comprimento L, de área constante) são
mantidos constantes e o fluxo de água ocorre através do solo. Medindo o valor da taxa de fluxo
que passa através da amostra (vazão de água) “q”, para o comprimento de amostra (L) e de
diferença de potencial (Δh), Darcy descobriu que a vazão “q” era proporcional à razão
(gradiente hidráulico da água, “i”). Observa-se que a existência do gradiente hidráulico fará
com que haja percolação.

A vazão (q) dividida pela área transversal do solo (A) indica a velocidade com que a água
“percola” o mesmo. O valor da velocidade de fluxo da água no solo (v) é dado por:
A lei de Darcy é válida para um escoamento do tipo “laminar”, tal como é possível, sendo
considerado tal escoamento na maioria dos solos naturais

4. Fluxo unidimensional e bidimensional;


A. Fluxo Bidimensional
Quando a água segue um caminho em duas direções, porém contidos em planos paralelos,
temos um fluxo bidimensional. A equação diferencial de fluxo é a base para o estudo de
percolação bidimensional. Através da equação diferencial de fluxo e considerando que
somente haja vazão de água no subsolo nas direções x e z, ou seja, que qy=0, temos

Foram feitas ainda as seguintes hipóteses:


- Solo homogêneo;
- Coeficiente de permeabilidade constante nas direções x e z;
- Válida a lei de Darcy.
- o solo é isotrópico em relação a permeabilidade, ou seja, o coeficiente de permeabilidade é
o mesmo em todas as direções

A solução geral que satisfizer as condições de contorno de um problema particular de fluxo


constituirá a solução da equação de Laplace para este problema específico.
B. Fluxo Unidimensional
Um escoamento unidimensional é aquele que envolve zero componentes transversais do
escoamento, ou seja, é o escoamento onde todos os parâmetros podem ser expressos em
função do tempo e de uma única coordenada espacial. A coordenada de espaço único é
geralmente a distância medida ao longo da linha central (não necessariamente reta) na qual o
fluido está fluindo. Exemplo: o escoamento em uma tubulação é considerado unidimensional
quando ocorrem variações de pressão e velocidade ao longo do comprimento da tubulação,
mas qualquer variação ao longo da seção transversal é considerada desprezível. No caso de
fluxo 1D a equação de Laplace reduz-se a

5. Permeabilidade dos solos;


Verruijt, A. (2006) define Permeabilidade como a propriedade que o solo apresenta de
permitir o escoamento da água através dele, sendo o grau de permeabilidade expresso
numericamente pelo “coeficiente de permeabilidade”, designado pelo símbolo “k”. O
coeficiente de permeabilidade pode ser visto como equivalente à velocidade de fluxo sob
gradiente unitário.

Marangon (2018) cita como Fatores que afetam a permeabilidade ou condutividade hidráulica
3.2.1.1. Fluido Percolante
A viscosidade do fluido percolante afeta diretamente a k., visto que esta varia com a
temperatura. Quanto maior é a temperatura, menor é a viciosidade e maior a permeabilidade
A) Índice de vazios:
Quanto maior índice de vazios (e) → Maior coeficiente de permeabilidade (k) de um solo.

C) Estrutura do solo:
A combinação de forças de atração e repulsão entre as partículas resulta em diferentes
estruturas de solos, dependentes da disposição das partículas na massa de solo e das forças
entre elas. Estrutura dispersa terá uma permeabilidade menor que a floculada.
D) Grau de saturação:
O coeficiente de permeabilidade de um solo não saturado é menor do que o que ele
apresentaria se estivesse totalmente saturado. Essa diferença não pode, entretanto ser
atribuída exclusivamente ao menor índice de vazios disponível, pois as bolhas de ar existentes,
contidas pela tensão superficial da água, são um obstáculo para o fluxo. Entretanto, essa
diferença não é muito grande.
E) Estratificação do terreno (Meio Heterogêneo):
Em virtude da estratificação (horizontes) do solo, os valores de k são diferentes nas direções
horizontal e vertical. A permeabilidade média do maciço heterogêneo depende da direção do
fluxo em relação à orientação das camadas
6. Redes de fluxos;
A equação de Laplace tem como solução duas famílias de curvas que se interceptam
normalmente. A representação gráfica destas famílias constitui a chamada rede de escoamento
ou rede de fluxo (“flow net”).
A rede de fluxo é um procedimento gráfico que consiste, basicamente, em traçar na região em
que ocorre o fluxo, dois conjuntos de curvas conhecidas com linhas de fluxo ou escoamento,
que são as trajetórias das partículas do líquido e por linhas equipotenciais ou linhas de igual
carga total.
O trecho compreendido entre duas linhas de fluxo consecutivas quaisquer é denominado canal
de fluxo e corresponde a uma acerta porção Q da quantidade total Q de água que se infiltra.
Portanto, a vazão em cada canal de fluxo é constante e igual para todos os canais. A perda de
carga Δh entre as linhas equipotenciais adjacentes denomina-se queda de potencial.
De acordo com Murthy as propriedades de uma rede de fluxo podem ser expressas da seguinte
forma:
1. As linhas de fluxo e equipotenciais são curvas suaves.
2. As linhas de fluxo e as linhas equipotenciais se encontram em ângulos retos entre si
3. No two flow lines cross each other.
4. No two flow or equipotential lines start from the same point.
As redes de fluxo são construídas de forma a manter constante a razão entre os lados de cada
bloco limitado por duas linhas de fluxo e duas linhas equipotenciais. Os métodos para a
determinação das redes de fluxos são:
• • Soluções analíticas, resultantes da integração da equação diferencial do fluxo.
Somente aplicável em alguns casos simples, dada a complexidade do tratamento matemático
quando se compara com outros métodos.
• • Solução gráfica é o mais rápido e prático de todos os métodos, como veremos
adiante.
• • Soluções numéricas, resultantes da utilização de recursos computacionais, através de
métodos números como os de “diferenças finitas”, “métodos dos elementos finitos”, entre
outros
• Determinação gráfica da rede de fluxo Este método foi proposto pelo físico alemão
Forchheimer. Consiste no traçado, a mão livre, de diversas linhas de escoamento e
equipotenciais, respeitando-se as condições de que elas se interceptem ortogonalmente e que
formem figuras “quadradas”. Há que se atender também às “condições limites”, isto é, às
condições de carga e de fluxo que, em cada caso, limitam a rede de percolação.

Na determinação gráfica as linhas de fluxo representam o caminho percorrido pela água. O


espaço delimitado por duas linhas de fluxo é chamado canal de fluxo, onde a vazão é constante.
Nas linhas equipotenciais, as cargas hidraulicas são constantes, havendo uma perda de carga
de uma linha para a próxima (na direção do fluxo). Logo, a perda de carga entre as linhas
equipotenciais sera encontrada dividindo-se a perda de carga total (t) pelo número de faixas
de perda de carga
Δh=h/Nd
Com a rede de fluxo traçada é possível a determinação do gradiente hidráulico e da vazão em
diferentes pontos do maciço.
Gradiente hidráulico
I=Δh/l=h/lnd
Vazão: considerando a área de uma quadrado qualquer na figura ? (bxl)
Q=kia=k(h/lnd)b=k(h/Nd)

7. Ruptura hidráulica;
Ruptura hidráulica é o processo de perda da resistência e da estabilidade de uma massa de
solo por efeito das forças de percolação. Um primeiro tipo de ruptura hidráulica é aquele em
que a perda de resistência do solo decorre da redução das pressões efetivas devido a um fluxo
d`àgua. Nestas condições, a força de percolação gerada pode se igualar às forças gravitacionais
efetivas, desde que os gradientes hidráulicos sejam suficientemente elevados. Assim, a
resultante das forças efetivas será nula, um exemplo seria a liquefação das areias, a chamada
areia movediça.
Um outro tipo de ruptura hidráulica é aquele que resulta do carreamento de partículas do solo
por forças de percolação elevadas, sendo o fenômeno designado, comumente, pelo termo em
inglês “piping” (entubamento). Este fenômeno pode ocorrer, por exemplo, na saída livre da
água no talude de jusante de uma barragem de terra, onde as tensões axiais sendo pequenas,
resultam em valores baixos das forças de atrito Inter partículas que, assim, tornam-se passíveis
de serem arrastadas pelas forças de percolação. Iniciado o processo, com o carreamento de
partículas desta zona do maciço, desenvolve-se um mecanismo de erosão tubular regressiva,
que pode levar ao colapso completo da estrutura.
8. Liquefação das areias
A liquefação das areias é um tipo de ruptura hidráulica, é um fenômeno no qual a areia
saturada solta perde uma grande porcentagem de sua resistência ao cisalhamento e
desenvolve características semelhantes às de um líquido. A diminuição de volume na areia
pode causar um aumento na pressão da água dos poros que não consegue se dissipar sob
condições não drenadas. Se a pressão da água dos poros se tornar igual ao componente de
tensão total máxima, normalmente a pressão de sobrecarga, o valor da tensão efetiva será
zero, ou seja, as forças entre partículas serão zero e a areia existirá em estado líquido com
resistência ao cisalhamento desprezível. Mesmo que a tensão efetiva não caia a zero, a
redução na resistência ao cisalhamento pode ser suficiente para causar falha.
9. Tensões no solo sob fluxo;
Murthy, geotechnical engineering

• Tensões quando o fluxo ocorre através do solo de cima para baixo


O aumento na pressão efetiva devido ao fluxo de água através dos poros do solo é conhecido como
pressão de infiltração. Pode-se notar que h é a perda total de carga à medida que a água flui da
superfície superior da amostra até uma profundidade zr

A perda de carga correspondente na profundidade z é (z/z^h. Como (/z/Zj) = /, o gradiente hidráulico,


a perda de carga na profundidade z pode ser expressa como iz. Portanto, a pressão de infiltração em
qualquer profundidade pode ser expresso como izyw- A pressão efetiva na profundidade z pode ser
escrita como

A distribuição da água dos poros e as pressões efetivas são mostradas na Fig. 5.3(b). Em depósitos
normais de solo, quando o fluxo ocorre na direção da gravidade, haverá um aumento na pressão
efetiva.

• Tensão quando o fluxo ocorre através do solo de baixo para cima

Há uma diminuição na pressão efetiva devido ao fluxo ascendente de água. Em qualquer


profundidade z, zyb é a pressão do solo submerso agindo para baixo e izyb é a pressão de infiltração
agindo para cima. A pressão efetiva diminui a zero quando essas duas pressões se equilibram, ou seja,
a pressão efetiva se reduz a zero quando o gradiente hidráulico atinge um valor máximo igual à razão
entre o peso unitário do solo submerso e o peso unitário da água. Este gradiente é conhecido como
gradiente hidráulico crítico ic. Nesses casos, os solos sem coesão perdem toda a sua resistência ao
cisalhamento e capacidade de suporte e observa-se uma visível agitação dos grãos do solo.
10. Ensaios de permeabilidade dos solos;
3.2.2.1. Ensaios de Laboratório
Permeâmetro de Carga Constante (alto k)
Em sistemas de carga constante, a vazão e o gradiente hidráulico permanecem constantes ao
longo do tempo. Dois reservatórios onde os níveis de água são mantidos constantes, como
mostra a Figura 1.11. Mantida a carga h, durante certo tempo, a água percolada é colhida e o
seu volume é medido. Conhecidas a vazão (Q) e as dimensões do corpo de prova (comprimento
L e a área da seção transversal A), calcula-se o valor da permeabilidade, k, através da equação:

3.2.2.2. Permeâmetro de Carga Variável (baixa k)


O permeâmetro de nível variável (Figura 1.12) é utilizado para medir a permeabilidade
preferencialmente para solos finos, nos quais o volume d’água que percola através da amostra
é pequeno.
Neste ensaio medem-se os valores h obtidos para diversos valores de tempo decorrido desde
o início do ensaio, como mostra a Figura 1.12. São anotados os valores da temperatura quando
da efetuação de cada medida. O coeficiente de permeabilidade dos solos é então calculado
fazendo-se uso da lei de Darcy:
Q=v.A=k.I.A

Onde:
A – área interna do tubo de carga - bureta (cm2)
A – seção transversal da amostra (cm2)
L – altura do corpo de prova (cm)
H1 – distância inicial do nível d`água para o reservatório inferior (cm)
H2 – distância para o tempo t, do nível d`água para o reservatório inferior (cm)
t – intervalo de tempo para o nível d’água passar de h1 para h2 (cm)
3.2.2.3. Ensaio de Campo
Os ensaios podem ser realizados em furos de sondagem ou em piezômetros.
Furos de Sondagem

Os ensaios de tubo aberto consistem em cravar um tubo de sondagem no terreno até a


profundidade desejada. Posteriormente, esse tubo é enchido com água, medindo-se a
velocidade com que ela escoa pelo tubo e se infiltra no terreno. A medida da vazão é
representada pelo volume d’água absorvido ou retirado, durante um intervalo de tempo, em
função da aplicação de diferenciais de pressão induzida por colunas d’água, resultante da
injeção ou da retirada (bombeamento) de água do furo (Wilson, 1999).

Piezômetro

Este dispositivo (piezômetro), mostrado na Figura 1.21, nada mais é do que um tudo de PVC
com a extremidade perfurada que permite a entrada da água, que devido a um fechamento
(selo, geralmente feito de bentonita) próximo a esta extremidade permitirá o estabelecimento
da coluna de água a ser medida.

Selby, M.J. (1982) Hillslope Materials & Processes - Oxford University Press, Walton Street,
Oxford.
Verruijt, A. (2006) SOIL MECHANICS. Delft University of Technology, Delft.

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