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Condutos livres

Prof. Vinícius Kühn


Profa. Dra. Germana Menescal

1. Condutos Livres

O escoamento em condutos livres é caracterizado por apresentar pelo menos um


ponto de sua seção de escoamento submetido à pressão atmosférica. Eles também são
denominados de canais e normalmente apresentam uma superfície livre de água em contato
com a atmosfera.

Este tipo de escoamento tem um grande número de aplicações em engenharia,


estando presente em áreas como o saneamento, a drenagem urbana, a irrigação,
hidroeletricidade, navegação, etc.

São considerados canais todos os condutos que conduzem água com uma superfície
livre, com seção aberta ou fechada.

2. Tipos de Escoamento

O escoamento de fluidos em condutos livres pode ser classificado segundo o seu


comportamento:

UNIFORME
PERMANENTE GRADUALMENT
VARIADO ERAPIDAMENTE
ESCOAMENTO
NÃO PERMANENTE
Tipos de Escoamento

Uniforme
Permanente
No escoamento permanente, a vazão não se altera em qualquer
gradualponto determinado
os parâmetros não variam com o tempo Variado
de um líquido em movimento: rápido
Não Permanente Uniforme
os parâmetros variam com o tempo gradual
Variado
rápido
No escoamento permanente uniforme, além da vazão, a profundidade e a velocidade
devem ser constantes:

No escoamento permanente variado, admite-se um gradiente de velocidades devido à


aceleração ou retardamento, que altera as profundidades:

No escoamento permanente variado gradualmente, além da vazão constante, admite-


se um moderado gradiente de velocidades devido à aceleração ou retardamento, que altera as
profundidades.

No escoamento permanente variado rapidamente, admite-se um significativo


gradiente de velocidades devido à aceleração ou retardamento, que altera sensivelmente as
profundidades.

O escoamento não permanente ou transitório ocorre com mudanças nas suas


propriedades, ou seja, a profundidade numa dada posição varia ao longo do tempo,
constituindo-se, assim, a forma de representação próxima da realidade. Apenas em alguns
casos interpreta-se o escoamento como um transitório devido a sua complexidade, como:
enchimento e esvaziamento de eclusas, golpe de aríete, ondas de maré, ondas de vento,
pororoca, etc.:

Os escoamentos são fenômenos tridimensionais, transitórios e complexos, mas na


prática, é normal utilizar hipóteses simplificadoras para analisar adequadamente o problema,
sem sacrificar a precisão ou a validade dos resultados.
3. Elementos que Caracterizam os Condutos Livres

Seção Transversal e Área Molhada

A seção transversal (S) engloba toda a área de escavação para a construção do canal e
a área molhada (Am) corresponde à seção transversal perpendicular à direção do escoamento
ocupada pela água e pode variar de acordo com a vazão de alimentação do conduto.

Perímetro Molhado

O perímetro molhado (Pm) é a linha que limita a seção molhada junto às paredes e ao
fundo do canal. Quanto maior o perímetro molhado do canal, maior será a superfície de
contato entre a água que escoa e as paredes e o atrito ocasionado por esse contato contribui
para reduzir a velocidade média do escoamento.

Largura Superficial

A largura superficial (B) é a largura da superfície de contato com a atmosfera.

Profundidade Hidráulica

A profundidade hidráulica (yh) é a razão entre a área molhada e a largura superficial,


ou seja,

Raio Hidráulico

O raio hidráulico (Rh) é a relação entre a área molhada (Am) e o perímetro molhado
(Pm) de um canal, ou seja,

Forma dos Condutos

Os condutos livres podem ser abertos ou fechados, apresentando-se na prática com


uma grande variedade de seções.

Os condutos de pequenas proporções geralmente são executados com a forma


circular. A seção em forma de ferradura é comumente adotada para grandes arquedutos.

Os canais escavados em terra normalmente apresentam uma seção trapezoidal que se


aproxima tanto quanto possível da forma semi-hexagonal. O talude das paredes laterais
depende da natureza do terreno (condições de estabilidade).

Os canais abertos em rocha são geralmente de forma retangular, com a largura igual a
cerca de duas vezes a altura. As calhas de madeira ou aço são, em geral, semicirculares ou
retangulares.
Exercício 1: Calcular a área molhada, o perímetro molhado e o raio hidráulico para o canal
esquematizado a seguir (talude: 1 : 0,58)

Área molhada:

Perímetro molhado:

Raio Hidráulico:
Declividade do fundo

A declividade do fundo (i) é dada pela tangente do ângulo de inclinação do fundo do


canal.

Declividade da Superfície

A declividade da superfície (j) é dada pela tangente do ângulo de inclinação da


superfície livre da água.

Velocidade da Água nos Canais

A velocidade adotada nos cálculos será um valor médio, já que, na área molhada, a
velocidade varia com a posição e com a profundidade considerada. Nos condutos livres, o
atrito entre a superfície da água e o ar acentua as diferenças das velocidades nos diversos
pontos da seção transversal.

A distribuição de velocidade no fluido em condutos livres é função, principalmente, da


resistência do fundo e das paredes, resistência superficial da atmosfera e ventos, resistência
interna da viscosidade do fluido e da aceleração da gravidade.

As seguintes relações para a velocidade média geralmente são usadas:

a) A velocidade média em uma vertical geralmente equivale de 80% a 90% da


velocidade superficial;
b) A velocidade a seis décimos de profundidade geralmente é a que mais se aproxima
da velocidade média

c) Com maior aproximação do que a relação anterior, tem-se:

d) A velocidade média também pode ser obtida partindo-se de


Energia Específica

Em qualquer seção transversal de um conduto livre, a carga pode ser obtida através da
seguinte expressão:

Observa-se que, no caso do escoamento livre, a carga de pressão pode ser substituída
pela profundidade do escoamento, com as pressões sendo consideradas como hidrostáticas.
Desta forma, a linha piezométrica é coincidente com a linha d’água e sua declividade
denomina-se gradiente hidráulico.

A soma das diferentes parcelas de carga permite a construção da linha de carga total
ou linha de energia. A perda de carga entre duas seções quaisquer é dada pela diferença das
respectivas cargas totais.

Define-se energia específica como sendo a carga medida a partir do fundo do canal.
Assim, seu valor é definido pela seguinte expressão:

Considerando-se a equação da continuidade, a expressão acima toma a seguinte


forma:

Como a área é função da profundidade, a energia específica torna-se uma função da


profundidade y, para um determinado valor de vazão. Assim:

4. Considerações sobre Projetos de Canais

O projeto de canais considera o movimento como permanente uniforme, sendo


necessárias as seguintes observações:

a) O projeto de canais pode apresentar condições complexas que exigem a


sensibilidade do projetista e o apoio em dados experimentais. O projeto de obras
de grande importância deve contar com a colaboração de um especialista.
b) Sabendo-se que os canais uniformes e o escoamento uniforme não existem na
prática, as soluções são sempre aproximadas, não se justificando estender o
cálculo além de 3 algarismos significativos.
c) Para os canais de grande declividade, recomenda-se a verificação das condições de
escoamento crítico.
5. Perdas de Energia

A perda de energia entre duas seções, distantes um comprimento x entre si, é dada
por:

No movimento uniforme:

Então:

A perda de carga linear é dada por:

Em pequenas declividades, , como é o caso dos canais,

Assim, a declividade do fundo confunde-se com a perda de carga linear:


Considerando a fórmula de Darcy-Weisbach (Universal) para o cálculo da perda de
carga em condutos forçados, tem-se:

O raio hidráulico para condutos circulares é:

Que, substituído na fórmula universal, fornece:

Reescrevendo para a velocidade:

Fazendo:

Pode-se escrever:

Que é a conhecida fórmula de Chezy, onde C é o fator de resistência, para condutos


circulares. O fator de resistência ou atrito, C, é obtido experimentalmente, em função do raio
hidráulico e da natureza das paredes do conduto.

Manning propôs o seguinte valor para o coeficiente C:

Onde n é um coeficiente que depende da natureza das paredes do conduto.


Substituindo esse coeficiente de atrito na equação de Chezy, tem-se a fórmula de Manning:

O coeficiente de Manning, quando aplicado em condutos livres, traduz as perdas de


energia distribuídas e localizadas (singularidades ou acidentais) de um determinado intervalo,
podendo-se majorá-los para representar as características particulares locais.
Tabela 1 – Coeficientes de rugosidade de Manning

Exercício 2: Determinar a velocidade de escoamento e a vazão de um canal trapezoidal com


as seguintes características: inclinação do talude de 1:1,5, declividade do canal de 0,067%,
largura do fundo de 3,5 m e profundidade da lâmina líquida de 1,2 m. Considere um canal
com paredes de terra, reto e uniforme.

6. Método dos Parâmetros Adimensionais


6.1. Canais Retangulares e Trapezoidais

Na figura a seguir estão mostradas as dimensões geométricas da seção transversal,


onde b é a largura do canal, y é a profundidade do escoamento e m é o indicar horizontal do
talude.
A equação de Manning pode ser escrita da seguinte forma:

Para se ter os parâmetros adimensionais com esta equação, divide-se ambos os


membros por uma dimensão linear elevada a uma potência 8/3. Adotando-se a largura b como
dimensão linear, chega-se à seguinte expressão para um canal trapezoidal:

O procedimento para chegar à equação acima é descrito a seguir. A aplicação da


equação de Manning para um canal trapezoidal se apresenta da seguinte forma:

Colocando o segundo membro em função apenas do adimensional (y/b), tem-se:

Para canais retangulares (m = 0), a expressão se torna mais simples:

Considerando apenas a velocidade na equação de Manning:

Dividindo-se ambos os membros por uma dimensão linear elevada a potência 2/3,
tem-se os parâmetros adimensionais. Adotando-se a largura b como dimensão linear, chega-se
à seguinte expressão para um canal trapezoidal:
Para uma seção retangular (m = 0), a expressão se reduz a:

Com base nas equações apresentadas, foram construídas tabelas considerando o


escoamento em regime permanente uniforme com valores do parâmetro adimensional y/b
variando de 0,01 a 1. Existem tabelas onde a dimensão linear adotada pode ser a largura b ou
a profundidade da lâmina líquida y.

Exercício 3: Calcular a vazão e a velocidade de um canal trapezoidal (m = 1) com as


dimensões b = 2 m e y = 1 m. A declividade longitudinal é de 0,0004 m/m e a rugosidade é n
= 0,018.

Da tabela de relação dos parâmetros adimensionais com a vazão (Tabela 14.1):

Então:

Da tabela de relação dos parâmetros adimensionais com a velocidade (Tabela 14.3):

Então:

6.2. Canais Circulares

Em um canal circular, as dimensões geométricas são a profundidade do escoamento y


e o diâmetro D.
Adotando-se a mesma metodologia dos parâmetros adimensionais, foram
confeccionadas tabelas considerando o escoamento em regime permanente uniforme com os
valores do parâmetro adimensional y/D variando de 0,01 a 1. Nas tabelas de dimensionamento
de condutos circulares, a dimensão linear considerada é o diâmetro do canal, D.

Exercício 4: Determinar a profundidade de escoamento de um canal circular (D = 2 m) que


conduz uma vazão de 3 m3/s, conhecendo-se i = 0,0004 m/m e n = 0,013. Qual a velocidade
do escoamento?

Calcula-se o parâmetro adimensional:

Com esta informação, consulta-se a tabela correspondente (Tabela 14.5) e descobre-


se a relação entre a profundidade da lâmina d’água e o diâmetro

Então:

Com o emprego da tabela com a velocidade (Tabela 14.7)

Exercício 5: Um trecho de tubulação de esgoto de seção circular de 0,40m de diâmetro


executado em concreto simples (n = 0,013), está assentado sob uma declividade de 0,3%.
Pede-se calcular a capacidade do trecho quando seu funcionamento for com lâmina líquida
relativa de 75%.

Solução analítica

Os canais circulares possuem as seguintes relações geométricas:


Solução pelos parâmetros adimensionais:

Da Tabela 14.5, tem-se:

Assim:

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