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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM

THAIS LEAL RODRIGUES

Colocação pronominal em textos escritos no português do Brasil

Niterói, 2020.
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
INSTITUTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM

THAIS LEAL RODRIGUES

Colocação pronominal em textos escritos no português do Brasil

Tese de doutorado apresentada ao Programa


de pós-graduação em Estudos de Linguagem,
da Universidade Federal Fluminense, como
quesito para obtenção do título de doutora em
Estudos de Linguagem.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Edila Vianna da Silva

Niterói, 2020.
THAÍS LEAL RODRIGUES

Colocação pronominal em textos escritos no português do Brasil

Tese de doutorado apresentada ao Programa de


pós-graduação em Estudos de Linguagem, da
Universidade Federal Fluminense, como quesito
para obtenção do título de doutora em Estudos de
Linguagem.

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Edila Vianna da Silva (orientadora) – UFF

____________________________________________________________
Prof. Dr. Ricardo Stavola Cavaliere – UFF

____________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Sílvia Rodrigues Vieira – UFRJ

___________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Mônica Maria do Rio Nobre – UFRJ

____________________________________________________________
Prof. Dr. Marcos Luiz Wiedemer – UERJ

_____________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Maria Cristina Rigoni Costa – UNIRIO (suplente)

______________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Nilza Barrozo Dias – UFF (suplente)
AGRADECIMENTOS

A minha mãezinha, pelo exemplo de amor, fé e garra; a minha irmã amada, por sempre me
alentar e ser a minha dose de força diária; a minha sobrinha Poliana, por alegrar, adoçar e
colorir minha vida. Vocês são minha razão de viver!

À professora Edila Vianna da Silva, pela confiança, competência e compreensão com que me
atendeu; enfim, pela brilhante orientação, mas, sobretudo, pelo exemplo de profissional, de
amiga, de ser humano. A ela, meus mais sinceros e eternos sentimentos de gratidão, respeito,
admiração e amizade.

À amiga Idrissa, pelo incentivo e solicitude, pela ajuda com documentos, sugestões e
indicações; pelas longas conversas pessoal ou virtualmente; e, principalmente, pela amizade
verdadeira e apoio incondicional, por estar presente nos bons e maus momentos.

Às colegas Lorena Cardoso e Monique Débora Lima, que gentilmente se dispuseram a me


ensinar a usar o programa Goldvarb. Suas ajudas foram de grande valor! Fico feliz em
conhecer pessoas com o bom coração que vocês têm.

Aos professores Mônica do Rio Nobre e Ricardo Cavaliere, que tanto me ajudaram com suas
valorosas contribuições na Qualificação.

A minhas amigas Cristiane, Mônica e Shirley e minhas primas Gabriela e Janaína, por me
apoiarem, nos momentos de fraqueza. Especialmente a esta última, por me auxiliar no que diz
respeito a normas técnicas.

Muito obrigada!
“Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro.”

(Oswald de Andrade)

“A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros


Vinha da boca do povo na língua errada do povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil
Ao passo que nós
O que fazemos
É macaquear
A sintaxe lusíada.”

(Manuel Bandeira)
LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Variantes linguísticas do fenômeno analisado ....................................................... 14

Quadro 2: Pronomes oblíquos átonos no PB, segundo a norma padrão ................................. 35


LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1: Formas verbais com clíticos em todo o corpus ..................................................... 72


Gráfico 2: Posição do pronome com formas verbais simples ................................................ 73
Gráfico 3: Posição do pronome com verbos simples por gênero textual ............................... 76
Gráfico 4: Posição do pronome com verbos simples por categoria pronominal ................... 78
Gráfico 5: Tempo/forma verbal em verbos simples ............................................................. 80
Gráfico 6: Posição do pronome com verbos simples por contexto morfossintático ............... 85
Gráfico 7: Influência do fator Contexto morfossintático nos casos de próclise a verbos simples
............................................................................................................................................ 86
Gráfico 8: Influência do fator Contexto morfossintático nos casos de ênclise a verbos simples
............................................................................................................................................ 87
Gráfico 9: Posição do pronome com locuções verbais ......................................................... 95
Gráfico 10: Posição do pronome com locuções verbais por gênero textual ........................... 97
Gráfico 11: Posição do pronome com locuções verbais por forma pronominal ................... 100
Gráfico 12: Forma do verbo principal nas locuções em todo o corpus ............................... 104
Gráfico 13: Posição do pronome com locuções verbais por forma contexto morfossintático
................................................................................................................................................ 107
LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Distribuição dos dados com formas verbais simples, da pesquisa de Vieira (2002),
no corpus escrito do PB ......................................................................................................... 52
Tabela 2: Distribuição dos dados com locuções verbais, da pesquisa de Vieira (2002), no
corpus escrito do PB .............................................................................................................. 53
Tabela 3: Posição pronominal com verbos simples por gênero textual................................. 73
Tabela 4: Posição pronominal com verbos simples por categoria pronominal ..................... 77
Tabela 5: Posição pronominal com formas verbais simples por forma pronominal ............. 78
Tabela 6: Posição pronominal com formas verbais simples por tempo ou forma verbal ...... 80
Tabela 7: Posição pronominal com formas verbais simples por contexto morfossintático ... 83
Tabela 8: Uso da próclise segundo a variável contexto morfossintático ............................... 90
Tabela 9: Próclise segundo a variável gênero textual ........................................................... 92
Tabela 10: Próclise segundo a variável forma pronominal ................................................... 92
Tabela 11: Próclise segundo a variável categoria pronominal .............................................. 94
Tabela 12: Posição pronominal com locuções verbais por gênero textual ............................ 95
Tabela 13: Posição pronominal com locuções verbais por categoria pronominal ................ 97
Tabela 14: Posição pronominal com locuções verbais por forma pronominal ..................... 99
Tabela 15: Posição pronominal com locuções verbais por tempo/forma verbal do V1 ....... 102
Tabela 16: Posição pronominal com locuções verbais por forma do V2 ............................. 103
Tabela 17: Posição pronominal com locuções verbais por contexto morfossintático .......... 105
Tabela 18: Presença de preposição entre os verbos da locução ............................................ 107
Tabela 19: Próclise ao principal segundo a variável gênero textual ..................................... 109
Tabela 20: Próclise ao principal segundo a variável categoria pronominal ......................... 109
LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Representação do contínuo dos gêneros textuais na fala e na escrita ............ 34


Figura 2: Continuum de posição pronominal, segundo o grau de formalidade dos gêneros
textuais ........................................................................................................................... 75
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

PB: português brasileiro


PE: português europeu
GT: gramática tradicional
CV: complemento verbal
OD: objeto direto
OI: objeto indireto
INDET.: índice de indeterminação do sujeito
APASS.: pronome apassivador
PIV: parte integrante do verbo ou pronome inerente
CN: complemento nominal
SUJ.: sujeito
PCN: Parâmetros curriculares nacionais
MEC: Ministério da Educação e da Cultura
PR: peso relativo
V1: primeiro verbo/ verbo auxiliar
V2: segundo verbo/ verbo principal
RODRIGUES, Thaís Leal. Colocação pronominal em textos escritos no português do Brasil.
Tese (Doutorado Estudos de Linguagem). Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2020.

RESUMO

A colocação pronominal é um fenômeno variável em língua portuguesa,


frequentemente apontado como diferenciador de suas variedades brasileira e lusitana. As
variantes dessa variável são as posições que o pronome pode ocupar com relação ao verbo que
acompanha, quais sejam, proclítica, enclítica ou mesoclítica – quando os pronomes se
relacionam a formas verbais simples – e proclítica ao verbo auxiliar ou ao principal e enclítica
ao verbo auxiliar ou ao principal – quando ligados a locuções verbais. Nesta pesquisa, que se
apoia nos preceitos teóricos e metodológicos da Sociolinguística Variacionista, com base na
análise de alguns gêneros textuais escritos, buscamos investigar a colocação dos clíticos, com
o intuito de descrever e caracterizar sociolinguisticamente cada uso. Desse modo, objetivamos
apontar os elementos favorecedores de cada variante, de acordo com os resultados obtidos por
meio do programa estatístico computacional Goldvarb 2001. Os gêneros escolhidos para a
análise foram: artigo científico, crônica jornalística, reportagem de revista e edital de abertura
de concurso público. A metodologia utilizada no desenvolvimento desta pesquisa foi, além de
quantitativa – pois apoiada em dados, porcentagens e estatísticas apontadas pelo mencionado
programa – igualmente qualitativa, com base na análise descritiva desses dados, a partir de
especificamente três critérios: natureza pronominal, gênero textual e contexto morfossintático
antecedente ao clítico. Constatamos que a próclise é a posição preferida, na companhia de
verbos simples, em todos os gêneros estudados, até mesmo nos mais formais. No caso de
pronomes que acompanham locuções verbais, encontramos uma preferência equilibrada das
posições proclítica e enclítica ao verbo principal.

Palavras-chave: Variação linguística. Colocação pronominal. Língua escrita. Gêneros


textuais. Continuum.
RODRIGUES, Thaís Leal. Colocação pronominal em textos escritos no português do Brasil.
Thesis (PhD – Language Studies). Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2020.

ABSTRACT

Pronoun placement is a variable phenomenon in Portuguese language, often viewed as


a factor of differentiation between Portuguese from Brazil and Portugal. The variants of this
variable are the positions the pronoun can take in relation to the accompanying verb, that is,
proclitic, enclitic or mesoclitic – when pronouns relate to simple verbal forms – and proclitic
to the auxiliary verb or to the main verb and enclitic to the auxiliary verb or to the main verb –
when linked to verbal phrases. This research complies with the theoretical and methodological
guidelines of Variationist Sociolinguistics. Thus, based on the analysis of some written textual
genres, we sought to investigate the placement of clitics, in order to describe and characterize
each use sociolinguistically. Hence, we aimed to point out the elements that favour each
variant, according to the results yielded by Goldvarb 2001 computer program. The genres
chosen for the analysis were scientific articles, newspaper chronicles, magazine articles and
civil service entrance examination call notices. The methodology used in the development of
this research in addition to the quantitative method – based on data, percentiles and statistics
elicited by the abovementioned program – was qualitative, based on the descriptive analysis
of this data, from three criteria, more specifically: pronoun nature, textual genre and
morphosyntactic context preceding the clitics. We have found that the proclitic is the most
preferred placement, when accompanying simple verbs, in all studied genres, even more
formal ones. In the case of pronouns accompanying phrasal verbs, we have encountered a
balanced preference towards the proclitic and enclitic placements in relation to the main verb.

Keywords: Linguistic variation. Pronoun placement. Written language. Textual genres.


Continuum.
Sumário

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 15
1 Definição da pesquisa .......................................................................................................... 18
1.1 Objetivos ......................................................................................................................... 18
1.2 Problema e hipótese ........................................................................................................ 19
2 Fundamentação teórica ....................................................................................................... 21
2.1 A Sociolinguística lavobiana .......................................................................................... 21
2.2 Norma padrão e norma culta ........................................................................................... 24
2.3 Língua falada e língua escrita ......................................................................................... 28
2.4 Gêneros textuais .............................................................................................................. 31
3 Revisão bibliográfica ........................................................................................................... 36
3.1 A posição do clítico segundo gramáticas do português .................................................. 37
3.2 Locuções verbais ............................................................................................................. 46
3.3 Pesquisas sobre a posição do clítico em português ......................................................... 51
4 Metodologia .......................................................................................................................... 57
4.1 O corpus .......................................................................................................................... 58
4.2 Procedimentos de análise de dados ................................................................................. 64
5 Análise do corpus ................................................................................................................. 73
5.1 Formas verbais simples ................................................................................................... 74
5.1.1 Análise inicial ........................................................................................................... 74
5.1.2 Ponderação estatística .............................................................................................. 89
5.2 Locuções verbais ............................................................................................................. 95
5.2.1 Análise inicial ........................................................................................................... 96
5.2.2 Ponderação estatística ............................................................................................ 109
6 Considerações finais .......................................................................................................... 111
REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 118
Anexo...................................................................................................................................... 124
15

INTRODUÇÃO

É sabido que a colocação dos clíticos pronominais constitui um fenômeno em


variação na língua portuguesa, tanto no Brasil quanto em Portugal (VIEIRA, 2007, p.
121). Diferentemente do que ocorre no português europeu (PE), no português brasileiro
(PB), os clíticos pronominais costumam preceder e não seguir a forma verbal. Isso se
justifica devido ao fato de se tratar de variedades que possuem diferentes padrões
rítmicos. Sobre isto Vieira (2007, p. 121) tece um importante comentário:

A colocação pronominal constitui um fenômeno variável ‘aquém e além- mar’. No


português do Brasil, a colocação pré-verbal, a preferida, e a pós-verbal constituem
variantes possíveis, formas alternantes para um mesmo contexto estrutural. Por isso, é
preciso conhecer os elementos favorecedores de cada variante, sejam eles de natureza
linguística ou extralinguística, na língua portuguesa como um todo e na variedade
brasileira em particular.

Em língua portuguesa, o pronome átono pode ocorrer em posição proclítica,


enclítica ou mesoclítica ao verbo, isto é, podem antepor-se, pospor-se ou entrepor-se a
ele, quando acompanham formas verbais simples. Nos casos em que o clítico se
encontra adjacente a uma locução verbal, existem também três posições possíveis: antes
do verbo auxiliar (V1), depois do verbo principal (V2), e entre o verbo auxiliar e o
principal. Designamos as duas primeiras posições como próclise ao V1 e ênclise ao
verbo V2, respectivamente. No entanto, na última circunstância, o pronome átono pode
ligar-se tanto ao V1, quanto ao V2, nomeando-se como ênclise a V1 e próclise a V2, na
mesma ordem. Para ilustrar, oferecemos os seguintes exemplos extraídos do corpus:

Quadro 1: Variantes linguísticas do fenômeno analisado.


Forma verbal Posição (variantes) Exemplo
Próclise “Os candidatos que se declararem...” (Edital 1)
Simples Ênclise “Fala-se de Getúlio Dornelles...” (Reportagem 4)
Mesóclise “Aplicar-se-á o disposto no Decreto...” (Edital 5)
Próclise a V1 “...a mãe o estava esperando. (Crônica 7)
Composta Ênclise a V1 “Assim, pode-se dizer...” (Artigo 1)
Próclise a V2 “Vai me desculpar, mas...” (Crônica 12)
Ênclise a V2 “...continuei a encará-lo.” (Crônica 17)
16

Neste trabalho, trataremos de estabelecer os fatores que favorecem cada posição


pronominal, na variedade brasileira do português, em sua modalidade escrita,
especificamente nos gêneros crônica jornalística, reportagem de revista, artigo
acadêmico e edital de abertura de concurso público, a fim de verificar a extensão da
variabilidade da norma culta com relação ao cumprimento dos preceitos da norma
padrão de colocação pronominal em tais textos, considerando a diversidade de gêneros.
Optamos por estudar a modalidade escrita da língua, por ainda haver poucos trabalhos
que contemplem meios escritos, como também observaram Vieira e Lima (2019, p. 6):
“Embora haja vasta literatura sobre os usos relativos a fenômenos diversos na fala
brasileira, percebe-se que o mapeamento de dados em meios escritos segundo estilos
variados e contemplando diversos tópicos gramaticais ainda está por ser construído”.
Os textos escolhidos para a análise foram extraídos, respectivamente, de páginas
pessoais e livros de cronistas brasileiros; revistas de grande circulação no Brasil, nas
suas versões digitais; páginas de periódicos científicos e banco de publicações da
Universidade Federal do Rio de Janeiro; e de sites de bancas organizadoras de
concursos. Vale salientar que, no caso das crônicas, os textos foram publicados
originalmente em jornais e revistas de grande circulação no Brasil e, posteriormente,
divulgados nas páginas pessoais de seus autores ou editados em formato de livro.
Apresentamos nossa pesquisa da forma que segue. Preferimos inicialmente
definir o trabalho, por meio da apresentação dos seus objetivos, problema e hipótese. A
seguir, abordamos a base teórica que sustenta esta investigação. Em primeiro lugar,
discorremos sobre a Sociolinguística Variacionista, corrente linguística na qual nos
fundamentamos, e, em seguida, delimitamos alguns conceitos aqui utilizados, a fim de
informar como são tratadas, entendidas e utilizadas, neste trabalho, certas terminologias
linguísticas, cuja acepção pode variar segundo a abordagem teórica. Assim,
esclarecemos, primeiramente, que, nesta pesquisa as modalidades escrita e falada da
língua não são compreendidas como pares opositivos, embora reconheçamos as
diferenças e especificidades de cada uma. Isso porque não é possível delimitar as
fronteiras entre as modalidades de uso da língua, já que, muitas vezes se interpenetram.
Também comentamos a conceituação de gênero textual, aqui definido de acordo com
Bakhtin (1997) e Marcuschi (2002). Cremos necessário elucidar nossa concepção de
“norma culta” e “norma padrão”, diferenciando e caracterizando cada expressão. Por
último, explicitamos nosso ponto de vista sobre o conceito de locuções verbais.
17

No capítulo 3, oferecemos uma revisão da literatura sobre o tema da colocação


do clítico pronominal, composta pela apresentação e descrição feita não só em
gramáticas do português, mas também em investigações acadêmicas que abordam tal
fato linguístico. O quarto capítulo trata da metodologia utilizada para realizar a análise a
que nos propusemos. Nessa seção, caracterizamos metodologicamente a pesquisa,
apresentamos o corpus selecionado e descrevemos os procedimentos utilizados. No
quinto capítulo, expomos e discutimos os resultados da pesquisa empreendida e, no
sexto, apresentamos nossas considerações finais. Ao final, encontram-se as referencias
bibliográficas.
18

1 Definição da pesquisa

Este trabalho, conforme já informado, consiste em uma pesquisa quali-


quantitativa, cujo tema é a colocação pronominal no português escrito brasileiro. A
pesquisa parte da observação de Perini, em sua gramática, a respeito da necessidade de
um “levantamento do uso dos clíticos no padrão brasileiro moderno” (2001, p. 230).
Vieira (2007, p. 122) também fez referência a tal carência: “Ademais, não se pode
afirmar que já se encontrem registradas as normas de uso referentes à ordem dos
clíticos”. A partir de então, algumas pesquisas têm sido realizadas com esse intuito,
sobretudo no âmbito da língua falada. Este trabalho se diferencia, portanto, com relação
à modalidade de língua e aos gêneros escolhidos para constituírem o corpus de
investigação.
Muitos estudos e inclusive as gramáticas do português (algumas de maneira mais
categórica, outras como observações relacionadas ao uso brasileiro), como veremos no
capítulo 3, apontam que, no PB, no que tange a clíticos que acompanham formas
verbais simples, a colocação pré-verbal é a preferida, a pós-verbal também é de uso
relevante em textos escritos e a mesóclise é pouco usada. Já no que diz respeito a
pronomes adjacentes a locuções verbais, sabemos que a posição mais frequente é a
próclise ao verbo principal. Considerando esse fenômeno variável, ambicionamos, nesta
pesquisa, estabelecer os elementos favorecedores de cada variante, em textos escritos
em norma culta do PB, de modo a comparar a escolha da posição pronominal em cada
gênero pesquisado, a fim de averiguar em quais deles há maior ou menor conformação
com a norma padrão. Os princípios da teoria sociolinguística variacionista foram a base
de execução desta investigação, cujos procedimentos tiveram o suporte da ferramenta
computacional Goldvarb 2001, programa que gera resultados numéricos associados a
diferentes fatores, de forma que tais números aferem o efeito relativo de cada fator no
fenômeno.

1.1 Objetivos

Nosso objetivo geral é fazer um levantamento quantitativo e qualitativo do uso de


cada posição pronominal em textos atuais escritos em língua portuguesa do Brasil de
gêneros representativos da norma culta, buscando os fatores condicionadores dessa
19

variável e comparando os resultados em cada gênero, a fim de verificar se há uma


conformação com a norma padrão na redação dos textos. Os objetivos específicos são:
analisar o fenômeno da colocação pronominal por contexto morfossintático
(forma/tempo verbal, existência ou ausência dos ditos “atratores”, posição do clítico no
período, tipo de oração); por tipo de clítico (pessoa gramatical do pronome, função
sintática); e por gênero textual, de modo a comparar a escolha da posição pronominal
em cada gênero pesquisado, a fim de verificar em quais deles há maior ou menor
conformação com a norma padrão. Para subsidiar nossas afirmações a respeito das
normas de colocação pronominal, buscamos respaldo em gramáticas da língua
portuguesa, tanto as prescritivas, quanto as que essencialmente descrevem o seu uso.

1.2 Problema e hipótese

A pergunta de pesquisa que norteia nosso estudo é: segue-se a norma padrão de


colocação pronominal na redação dos textos que constituem o corpus deste trabalho?
Teoricamente, a modalidade escrita, que é o objeto desta análise, associa-se a um ideal
de comportamento linguístico atrelado a um compromisso normativo. No entanto,
supusemos que encontraríamos considerável variação no que concerne à colocação
pronominal nos diversos gêneros escritos analisados, tendo em vista as diferentes
naturezas que possuem. Portanto, investigamos os gêneros textuais escritos nos quais é
possível encontrar maior ou menor conformação com a norma padrão. Nossa hipótese
era a de que nos mais formais, segundo os critérios propostos por Marchushi (2001),
como editais e artigos acadêmicos, seria acatada a norma canônica de colocação
pronominal e, em gêneros escritos mais informais, como a reportagem de revista e a
crônica, a norma de colocação se aproximaria mais da modalidade falada. Mais
especificamente, acreditamos, por exemplo, que em gêneros mais formais
encontraríamos algumas escassas ocorrências de mesóclise e considerável uso da
ênclise, sobretudo em início de período, seguindo os preceitos da gramática normativa.
Por outro lado, tínhamos a hipótese de que, nos gêneros informais, a próclise seria de
uso generalizado, nem sempre condicionada por partículas proclisadoras. Já com relação
aos pronomes ligados a locuções verbais, supúnhamos que a posição predominante seria
20

a próclise ao verbo principal, independentemente da presença de elementos atratores, e


que a ênclise à forma nominal prevaleceria quando estivesse associada a um infinitivo.
Outro fator que consideramos relevante no condicionamento da escolha da
posição do pronome foi a tipologia pronominal, como, por exemplo, a possibilidade de
o clítico acusativo de terceira pessoa favorecer a ênclise. Cremos também que a forma
verbal pode influenciar o posicionamento do pronome, no sentido de que certas formas
nominais seriam possíveis condicionadores da ênclise. Por último, temos a hipótese de
que a ocorrência prévia de elementos ditos atratores, tais como pronome relativo,
conjunção subordinativa e palavra negativa, seria um fator de influência quase
categórica no uso da variante pré-verbal, seguindo os preceitos da abordagem
tradicional.
21

2 Fundamentação teórica
Com relação aos pressupostos teóricos, esta pesquisa se fundamenta na
Sociolinguística Variacionista, corrente linguística que teve início nos Estados Unidos,
na década de 1960. Os principais conceitos dessa teoria encontram-se descritos na seção
2.1. Faz-se necessário ainda elucidar a definição de alguns termos adotados nesta
pesquisa. Este capítulo, portanto, dedica-se também a fixar nossas concepções de língua
falada e língua escrita – suas diferenças e características; de gêneros textuais; de norma
padrão e norma culta, e de locuções verbais.

2.1 A Sociolinguística lavobiana

O linguista William Labov é o principal expoente da Sociolinguística


Variacionista e apresenta, no livro Padrões sociolinguísticos (1972), os conceitos
fundamentais da teoria, bem como a metodologia de sua proposta. Essa teoria concebe a
língua como um fato social e está relacionada a outros campos do conhecimento, como
a Antropologia, a Sociologia e a Geografia linguística. A respeito da perspectiva social
de língua, Labov explica:

A língua é uma forma de comportamento social: declarações nesse sentido


podem ser encontradas em qualquer texto introdutório. Crianças mantidas em
isolamento não usam a língua; ela é usada por seres humanos num contexto
social, comunicando suas necessidades, ideias e emoções uns aos outros. (...)
É questionável se frases que nada comunicam a ninguém façam parte da
língua. (LABOV, 2008, p. 215)

Segundo essa disciplina, a língua é um sistema heterogêneo, como são


heterogêneos os seus falantes: “A própria singularidade inscrita na determinação da
natureza humana conduz à previsibilidade da variação, da dessemelhança, da
heterogeneidade, da instabilidade.” (ANTUNES, 2009, p. 209). Isso, contudo, não
implica de nenhuma forma um caos linguístico, uma vez que há normas subjacentes a
toda variação, que, deste modo, pode ser sistematizada. A Sociolinguística laboviana é
também conhecida como Teoria da Variação e Mudança, por fornecer material
metodológico para sistematizar a variação linguística, que é definida como “o processo
pelo qual duas formas podem ocorrer no mesmo contexto linguístico com o mesmo
22

valor referencial, ou com o mesmo valor de verdade.” (COELHO, 2010, p. 23). Essas
formas que concorrem na variação são denominadas variantes. Dizemos que há
variação estável quando não se verifica predominância de uma variante sobre a(s)
outra(s) e, assim, a variação tende a se manter ainda por tempo. Por outro lado, é
possível afirmar que há uma mudança em curso, quando uma das variantes prevalece
categoricamente sobre a(s) outra(s), de modo que esta(s) tenderia(m) a cair em desuso,
configurando uma tendência à resolução do processo de variação.
Portanto, para Labov, a heterogeneidade não é aleatória e não significa ausência
de regras. Pelo contrário, a variação é sempre governada por um conjunto de regras e o
papel do cientista da língua é desvendar tais mecanismos. Toda língua possui regras
categóricas – como a posição do artigo com relação ao substantivo, sempre anterior, em
português (exemplo: o menino) – e regras variáveis, como a alternância entre tu e você,
como tratamento de segunda pessoa do discurso ou o preenchimento do objeto direto
que possui quatro variantes para a terceira pessoa: categoria vazia, objeto direto
anafórico, pronome ele ou clítico acusativo. Ambos os fenômenos referem-se ao
português do Brasil. Enfim, de acordo com esse modelo teórico-metodológico, um
fenômeno em variação jamais pode ser considerado irrelevante. Toda língua é
constituída de diferentes e legítimas formas de uso e todas estas têm a complexidade
necessária para cumprir suas funções. Portanto, o que muitos consideram “erro”, para o
sociolinguista é uma variante, isto é, uma possibilidade na língua em questão. As
variantes que materializam o fato variável são chamadas de variáveis dependentes. A
variação no uso das diversas formas linguísticas é condicionada por um conjunto de
fatores denominado variável independente. Tais fatores podem ser de ordem linguística
ou extralinguística. Exemplo do primeiro tipo de condicionamento é a pronúncia surda
ou sonora da consoante [s], a depender do contexto fonológico em que ocorre, isto é, se
antecede uma consoante surda, sua pronúncia também será surda; se, ao contrário,
precede uma consoante sonora, sua pronúncia será sonora, como em: raspa (surda) e
rasga (sonora). Por outro lado, os fatores extralinguísticos são, por exemplo, origem
geográfica; status socioeconômico; grau de escolarização; idade; sexo; profissão.
Labov (2008, p. 193) propõe uma estratégia para o estudo empírico das
mudanças linguísticas baseada em três problemas: a transição, o encaixamento e a
avaliação. O primeiro consiste em “encontrar o caminho pelo qual um estágio de uma
mudança linguística evolui a partir de um estágio anterior” (LAVOB, 2008, p. 193),
tendo em vista que as formas linguísticas não são imediatamente substituídas por novas,
23

ou seja, a mudança é um processo. A fase da transição, portanto, é aquela em que as


variantes linguísticas do fenômeno em variação coexistem e concorrem. Pode ser que,
com o tempo, uma delas deixe de ser usada e o processo de mudança se complete.
Segundo Coelho et.al. (2010, p. 101): “Um dos propósitos do problema empírico de
transição é descobrir como pode a mudança linguística passar de um estágio a outro (de
uma sincronia a outra) sem interferir na comunicação entre os membros de uma
comunidade de fala”. Para isso, é preciso investigar tais estágios, tanto no que diz
respeito à transmissão da nova forma de uma comunidade à outra, como de uma geração
à outra. O segundo problema diz respeito às correlações entre elementos do sistema
linguístico e entre estes e o sistema de comportamento social. Trata-se, pois, de buscar
os fatores condicionantes da mudança, sejam internos ou externos à língua, e apontar
suas conexões, explicar em que grau a variação está encaixada na estrutura linguística
ou social (grupo socioeconômico, idade, sexo, escolaridade, etnia, localização
geográfica). Por sua vez, o problema da avaliação está relacionado à investigação das
atitudes dos informantes com relação ao seu próprio comportamento linguístico, o que
pode ser um fator relevante na determinação da mudança. Ao linguista cabe, então,
“medir as reações subjetivas inconscientes dos informantes aos valores da própria
variável linguística” (LABOV, 2008, p. 193). As diferentes variedades e variantes de
uma língua recebem avaliações por parte da sociedade, de maneira que algumas são
consideradas formas prestigiadas de uso, enquanto outras são estereotipadas. Labov
(2008, p. 360) define estereótipo como “formas socialmente marcadas, rotuladas
enfaticamente pela sociedade”.
A Sociolinguística busca não somente investigar a variação linguística, mas
também combater o preconceito linguístico, que está intrinsecamente relacionado ao
preconceito social, já que, “de acordo com Bourdieu (1977), as manifestações
linguísticas recebem um valor do que ele denominou ‘mercado linguístico’, aliado a
renda, sexo, faixa etária e nível escolar...” (MOLLICA, 2015, p. 29). Em outras
palavras, julga-se a variedade de determinado falante de acordo com o status que ele
recebe, na sociedade em que se insere. Assim, “empregos linguísticos prestigiados
acham-se preferencialmente em indivíduos com prestígio social alto” (MOLLICA,
2015, p. 28), ao passo que os usos estigmatizados da língua são relacionados a pessoas
ou comunidades estigmatizadas também socialmente.
A variação se percebe em diferentes situações comunicativas, de acordo com o
contexto (falantes, interlocutores, relação entre eles, tema da comunicação, local etc.);
24

em diferentes épocas e momentos históricos; em diferentes locais ou regiões geográficas


e em diferentes estratos ou grupos sociais. Esses diversos tipos de variação denominam-
se, respectivamente, variação diafásica, variação diacrônica, variação diatópica e
variação diastrática. Por sua vez, os falares de uma comunidade são chamados de
variedades e equivalem a dialeto ou norma; por exemplo, as variedades gaúcha, baiana
e fluminense do PB, ou ainda as variedades brasileira e lusitana do português. Podemos
ainda falar em variedades populares e variedades cultas, variedades rurais e variedades
urbanas etc. Bortoni-Ricardo (2004 e 2005) analisa a variação linguística no português
brasileiro a partir de um modelo de três continua: o rural-urbano, o de oralidade-
letramento e o de monitoração estilística. De acordo com essa visão, as variantes
linguísticas se distribuem de um polo a outro de cada uma das três linhas imaginárias, o
que nos ajuda a apreender de forma mais segura a complexa situação sociolinguística do
português do Brasil.
O continuum de urbanização corresponde a variedades que vão desde a rural
geograficamente isolada até a urbana culta, compreendendo, na interseção dos dois
polos, as denominadas variedades “rurbanas”1. Deve-se levar em consideração a rede de
relações sociais2 que o falante tenha para situá-lo ao longo do continuum. O segundo
abrange as práticas sociais orais ou letradas. A posição do falante com relação a cada
polo depende de seu contato com a cultura do letramento, pois é esta que lhe propicia o
domínio de variantes de prestígio. O terceiro continuum diz respeito ao estilo mais ou
menos cuidado adotado pelo falante (grau de atenção e de planejamento conferidos pelo
falante à sua interação), em cada situação comunicativa. Este contínuo comporta vários
fatores (BORTONI-RICARDO, 2005, p. 41): “a) a acomodação do falante ao seu
interlocutor; b) o apoio contextual na produção dos enunciados; c) a complexidade
cognitiva envolvida na produção linguística; d) a familiaridade do falante com a tarefa
comunicativa que está sendo desenvolvida”.

2.2 Norma padrão e norma culta

1
Bortoni-Ricardo (2005, p. 92) se vale do conceito de rurbano “para definir populações rurais com
razoável integração com a cultura urbana e populações urbanas com razoável preservação de seus
antecedentes rurais”.
2
Para maior esclarecimento acerca da análise de redes sociais, consultar Bortoni-Ricardo (2005).
25

De acordo com Faraco (2002, p.40), no Brasil, a instituição da norma padrão se


deu no século XIX, com o intuito de estabelecer um padrão que gerasse unidade
linguística e visava a combater as variações e mudanças linguísticas. Membros letrados
das altas camadas da sociedade determinaram que a norma seria estabelecida a partir
dos usos de escritores portugueses (dos séculos XVI ao XIX) e não a partir da fala de
brasileiros cultos, como era de se esperar. Percebe-se que as motivações que subjazem à
instauração da norma padrão, no Brasil, não demonstram apenas uma tentativa de
neutralizar e controlar as mudanças linguísticas, mas revelam uma maneira de negar a
miscigenação étnica e cultural brasileira.
De acordo com Lucchesi (2017, p. 371), a partir da segunda metade do século
XIX, há um aprofundamento da normatização linguística, especialmente no contexto do
universo urbano do Rio de Janeiro, “com a criação da cátedra de língua portuguesa no
Colégio Pedro II, em 1871; a proliferação das gramáticas normativas, na década de
1880; e a criação, em 1897, da Academia Brasileira de Letras”. Segundo o linguista,
esse processo normatizador ocorreu sob a ótica de uma “mentalidade purista
lisitanizante” (LUCCHESI, 2017, p. 371) e se manifestou, na literatura, no Movimento
Parnasiano. Tal pensamento durou até as primeiras décadas do século seguinte, quando
surge o Movimento Modernista. De fato, ambas as escolas literárias, antagônicas entre
si em suas propostas, delinearam dois momentos da história da língua portuguesa no
Brasil. A primeira foi marcada pela exigência de uma “forma perfeita” quanto à
construção e à sintaxe. Desse modo, preconizava a correção gramatical, o preciosismo
vocabular e o purismo linguístico. A segunda escola se caracterizou pela busca da
identidade brasileira. Isso significava reconhecer nossa miscigenação étnica e valorizar
a língua nacional, uma variedade do português diferente da de Portugal. Dessa forma,
havia, na literatura modernista, uma preocupação em registrar a sintaxe e o vocabulário
do PB, bem como uma aproximação com a linguagem falada, marcada por expressões
idiomáticas.
Pagotto (1999, p. 55) parece se referir ao mesmo conceito ao constatar:
“Podemos, então, agora, localizar a constituição da norma culta no século XIX no
processo histórico e político da constituição da nação” e ainda: “o que chama a atenção
no caso do Brasil é que todo um arsenal discursivo é acionado no sentido de ‘construir’
a norma culta à imagem e semelhança do português de Portugal” (PAGOTTO, 1999, p.
56). O autor (1999, p. 56) ainda ressalta o fato de não se buscarem as raízes de nossa
língua, num retorno ao passado, para estabelecer a partir daí a nossa norma culta, como
26

tentou fazer José de Alencar. Ao contrário, o que se observou, segundo o linguista


(PAGOTTO, 1999, p. 56) foi que o modelo tomado foi “justamente a norma culta
portuguesa moderna”.
Conquanto seja comum o emprego das expressões norma culta e norma padrão
como sinônimos, usamos esses termos, neste trabalho, para nominar conceitos distintos.
Cumpre ainda ressaltar que há um uso metalinguístico muito diversificado de tais
expressões entre os linguistas. Buscaremos, contudo, esclarecer nossa concepção de tais
designações.
A norma padrão, também denominada “norma canônica” ou “norma exemplar”,
corresponde a uma convenção que visa à padronização dos usos da língua, como a
própria denominação sugere, a fim de estabelecer um modelo a ser seguido,
especialmente na modalidade escrita da língua. Não se trata, porém, de uma receita de
pureza linguística. Esse modelo, socioculturalmente definido e valorizado, é
recomendado nas gramáticas tradicionais, não para simplesmente imputar regras
distantes do uso concreto da língua e inibir outros usos, mas para oferecer um
paradigma útil e facilitador da comunicação, uma orientação para adequação do uso.
Logo, uma norma padrão, em termos conceituais, não seria uma maneira de
impor uma variedade artificial, abstrata e inalcançável, mas sim uma forma de propiciar
uma melhor comunicação entre usuários tão diversos de uma mesma língua, tendo em
vista a realidade multidialetal do PB. O papel das gramáticas tradicionais ou normativas
deve ser o de estabelecer um padrão que cumpra um efeito unificador da língua, mas
sem desprezar a existência de outras variedades igualmente importantes. E cumpre à
escola não apenas ensinar norma padrão, mas a língua em uso, em toda a sua
multiplicidade, como afirma Neves (2017, p. 90):

Acredito que, na conclusão, a única certeza plena que se terá é a de que a


escola tem de ser garantida como o lugar privilegiado de vivência de língua
materna: língua falada e língua escrita, língua padrão e língua não-padrão,
nunca como pares opositivos, ou como atividades em competição; enfim,
uma vivência da língua em uso em sua plenitude: falar, ler, escrever.

É inegável que os estudos linguísticos também têm contribuído para uma


produção de gramáticas que levam em consideração a realidade da língua. Percebe-se
uma notável mudança nas gramáticas tradicionais, que já apontam usos diferentes do
padrão nela prescrito. Além disso, hoje, o mercado editorial oferece gramáticas do PB,
27

gramáticas do português falado, gramáticas de uso etc, o que demonstra um profundo


avanço decorrente da influência das pesquisas científicas.
Deve-se ressaltar também que as prescrições da norma padrão também mudam
com o tempo e o que hoje é considerado uma legítima construção da língua pode não ter
sido outrora, assim como um uso que atualmente é condenado pode ter sido prestigiado
antes. Portanto, há de se reconhecer a “relativização do valor propriamente linguístico
de uma norma prescritivista” (NEVES, 2017, p. 46).
A norma culta, por sua vez, é comumente designada como a variedade utilizada
pelas pessoas que têm mais contato com a modalidade escrita da língua e um acesso
maior à educação e cultura, isto é, as pessoas consideradas falantes cultos, que não
necessariamente seguem as prescrições da gramática normativa. Portanto, a norma culta
é apenas uma das variedades existentes. Faraco (2008, p. 43) afirma que “não é simples
conceituar e identificar, no Brasil, a norma a que se dá o qualificativo de culta”. Esta
norma se identifica com as variedades urbanas, em contraste com as variedades rurais e
rurbanas (nos termos de Bortoni-Ricardo, 2005).
A variedade culta falada do português do Brasil foi o objeto de estudo do Projeto
NURC (Norma Urbana Culta), que surgiu em 1969, com a finalidade de descrever os
usos dos falantes cultos do país. Os dados dessa pesquisa foram coletados em cinco
cidades brasileiras – Recife, Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre – por
meio de entrevistas a falantes com nível superior completo e, atualmente, constituem o
corpus de vários trabalhos científicos, contribuindo amplamente para o avanço do
conhecimento do português brasileiro. Os dados dessa pesquisa revelaram, segundo
Faraco (2008, p. 46), uma realidade surpreendente: “a norma culta brasileira falada se
identifica, na maioria das vezes, com a linguagem urbana comum, ou seja, com aquela
utilizada pelos falantes que estão fora do grupo dos chamados (tecnicamente) de
cultos”, ao contrário do pensamento de alguns estudiosos que acreditavam que em
situações de fala mais monitoradas, os falantes cultos usariam uma variedade mais
acorde com as diretrizes da gramática normativa.
Portanto, neste trabalho, usamos a expressão norma padrão para referir-nos às
prescrições da gramática normativa e, norma culta, para designar a variedade da língua
usada por falantes com grau de escolaridade superior.
Sobre tudo o que foi exposto, cumpre ainda enfatizar a importância dos estudos
linguísticos que se pautam na norma culta brasileira, sobretudo com relação à língua
escrita, já que, como afirmam Vieira e Lima (2019, p. 10): “parece inegável assumir que
28

a delimitação da norma-padrão depende necessariamente do conhecimento detalhado


das chamadas variedades cultas”. Esse, sem dúvida, é o melhor caminho para o bom
êxito das orientações normativas, como postulam as autoras. Ainda concordamos com
as autoras (VIEIRA e LIMA, 2019, p. 11) quando atestam que somente o mapeamento
dos fenômenos variáveis, consoante diversos gêneros textuais, dispostos em um
continuum de oralidade-letramento ou fala-escrita, segundo o modelo sociolinguístico
defendido por Bortoni-Ricardo e detalhado na seção anterior (2.1), podem fundamentar
o estabelecimento de uma norma-padrão operacional.

2.3 Língua falada e língua escrita

É sabido que a modalidade escrita se relaciona e sempre se relacionou com o


bom uso, sempre foi tomada como exemplo de correção e, durante muito tempo,
segundo Neves (2017, p. 44), a língua falada foi tratada como a variedade que abriga
“todas as tolerâncias” e admite qualquer transgressão, “como se a língua falada não
tivesse norma, quase como se não tivesse gramática”. Sabemos que todas as variedades
das línguas naturais têm uma gramática, ou seja, uma regra de funcionamento, e que o
fato de a modalidade escrita ser tomada como modelo – inclusive, na maioria das
gramáticas, os exemplos dados são extraídos de textos escritos – se deve à sua
perenidade e não deve refletir nenhum julgamento de valor de uma modalidade sobre a
outra. Neves (2017, p. 44) ainda comenta que a escola criou um grande abismo entre as
variedades:

...instituiu-se que a fala (em princípio, a modalidade do aluno) é imperfeita


por natureza, e que a língua escrita (em princípio, a modalidade do professor)
é a meta a ser atingida, como se não houvesse modalidade-padrão também na
fala e como se o conhecimento de um padrão prestigiado, na língua falada,
não fosse também desejável.

A pertinente observação de Neves evidencia que fala e escrita não podem ser
entendidas como pares antagônicos, em que a língua falada corresponde ao não padrão e
a língua escrita ao padrão, já que, na verdade, há textos orais em norma canônica e há
textos escritos em norma não canônica. Callou (2018, p.20) tece o seguinte comentário
acerca da tradicional dicotomia:
29

E essa multiplicidade diz respeito também à oposição fala e escrita, com suas
especificidades, semelhanças e diferenças. Hoje em dia, a posição que
prevalece é a de que representam códigos distintos, uma vez que, na fala,
lidamos com instabilidade, naturalidade, rapidez de produção, riqueza de
prosódia e, na escrita, com a sistematicidade e o permanente.

Algumas características da língua falada são: repetições, hesitações, quebras e


retomadas da sequência discursiva. A escrita, por sua vez, é mais cuidada, pensada e
planejada. Portanto, cada modalidade tem características específicas que as definem.
Contudo, não podemos pensar que elas são totalmente opostas entre si. Deve-se
considerar que tanto a escrita quanto a fala podem apresentar-se de diversas formas; não
há um padrão único.
Dessa forma, cumpre esclarecer que nossa concepção de língua não nos permite
tratar de língua falada e língua escrita de forma dicotômica. De acordo com o ponto de
vista aqui assumido, existe um contínuo que une fala e escrita, não sendo possível
demarcarem-se nitidamente as fronteiras entre tais modalidades (BORTONI-
RICARDO, 2005; MARCUSCHI, 2001). Em cada uma das pontas desse contínuo
existe, de um lado, o enunciado prototípico de língua falada e, de outro, o enunciado
prototípico de língua escrita. Entre os eixos, encontram-se diferentes graus de usos de
cada uma dessas modalidades. Prova disso é a existência de gêneros limítrofes, como a
letra de canção, que é oralizada e escrita. Portanto, é preciso ter cuidado ao classificar
um texto dentro de uma posição rígida, porque isso não refletiria o real uso linguístico.
Antunes (2009, p. 207) comenta a importância de um ensino de língua materna
que parta do reconhecimento da variação linguística na modalidade escrita:

...a língua escrita ainda não recebeu esse ‘olhar’ que enxerga as suas
diferenças de uso; ou seja, ainda parece subsistir a impressão de uma língua
escrita uniformemente, totalmente estável, sem variações. Tal impressão é
naturalmente reforçada pelo viés da ortografia oficial, um padrão rígido e
inalterável, com mudanças pouco significativas em intervalos muito longos
de tempo. A visão de uma escrita uniforme repercute no trabalho da escola,
que, assim, privilegia o ensino de esquemas rígidos, em cujas formas todos os
textos têm de se encaixar.

Fica claro que não se pode caracterizar a língua falada estritamente como
informal e a língua escrita como formal, visão de língua que por muitos anos
influenciou o ensino. Como afirma Neves (2017, p. 94): “É importante no ensino que se
vejam mais as similaridades entre as modalidades do que as diferenças, e é preciso,
especialmente, rever o tratamento feito exclusivamente em termos de pares opositivos”.
30

As diferenças no uso de cada uma das modalidades da língua derivam das situações em
que os enunciadores se inserem, ou seja, o contexto de produção textual é responsável
pelos diferentes graus de planejabilidade do discurso, o que determinará as escolhas que
caracterizarão o texto. Cada pessoa produz o texto de acordo com seleções
condicionadas por fatores extralinguísticos relacionados às exigências da interação,
conforme comenta Antunes (2008, p. 208):

Seja em relação à oralidade, seja em relação à escrita, a consideração do


fenômeno da variação linguística implica, necessariamente, a inclusão dos
muitos fatores pragmáticos envolvidos na interação. Quer dizer, se a
realização da língua comporta variações, é, sobretudo, por determinação de
elementos extrínsecos a ela, elementos constituintes da situação social em
que a atividade verbal se insere, tais como o estatuto social dos
interlocutores, o tipo de relação que se estabelece entre eles, os propósitos em
causa, o espaço cultural em que acontece o evento comunicativo, entre
outros.

A palavra-chave, então, é adequação. Logo, não podemos afirmar que língua


falada é aquela livre, na qual tudo é permitido e válido, o que constituiria uma atitude
preconceituosa com relação à língua falada, na medida em que a reduziria a uma
modalidade de menos valor. Convém registrar a afirmação de Callou (2018, p.20) sobre
o tema: “A ideia de que na fala ‘vale tudo’, contudo, é uma total ficção. O que ocorre é
que, na fala, a busca por formas claras, objetivas, adequadas e precisas de emprego dos
recursos da língua é visível, audível, portanto, mais perceptível”. Fica evidente que não
é lícito associar a modalidade falada estritamente ao registro informal e a modalidade
escrita ao registro formal, incorrendo novamente no erro de dicotomizá-las. Pensemos,
por exemplo, em um discurso, em uma palestra ou conferência. Sabemos que, nesse tipo
de situação, há de se monitorar mais a fala, sendo impossível dizer que se trata de um
uso informal da língua. Por outro lado, também não podemos enquadrar a língua escrita
em um molde no qual a formalidade sempre predomina, já que quando escrevemos, por
exemplo, um bilhete ou uma mensagem em aplicativos de chat para um familiar ou
amigo, geralmente não usamos um registro formal da língua.
Portanto, torna-se evidente a necessidade de que se reconheça a heterogeneidade
da língua, inclusive na sua modalidade escrita:

Pode-se admitir, portanto, o princípio de que a língua varia também na sua


modalidade escrita, em decorrência da imposição de adequar-se às diferentes
situações de uso em que se insere. As línguas existem para essas situações,
em função de suas solicitações interacionais (ANTUNES, 2009, p. 209. Grifo
da autora).
31

Percebe-se, desse modo, que a língua também é estudada, sob a ótica da


sociolinguística variacionista, a partir de usos na modalidade escrita, que também é
variável, muito embora a língua falada seja o objeto fundamental dessa ciência. Logo, a
crença na existência de uma escrita uniforme, inteiramente padronizada, é um mito, uma
vez que, “além das determinações do sistema linguístico, a interação verbal por meio da
escrita está sujeita também às determinações dos contextos socioculturais em que essa
atividade acontece” (ANTUNES, 2009, p. 209). A escrita, como a fala, é plural e se
concretiza nos mais variados e quase incontáveis gêneros textuais.

2.4 Gêneros textuais

Bakhtin (1997, p. 280) defende que é impossível se comunicar verbalmente a


não ser por algum gênero, já que todas as esferas da atividade humana estão sempre
relacionadas à utilização da língua. Para ele:

A riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas, pois a


variedade virtual da atividade humana é inesgotável, e cada esfera dessa
atividade comporta um repertório de gêneros do discurso que vai
diferenciando-se e ampliando-se à medida que a própria esfera se desenvolve
e fica mais complexa. (BAKHTIN, 1997, p. 280)

Desse modo, Bakhtin (1997, p. 280) define os gêneros do discurso como


“enunciados (orais e escritos), concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou
doutra esfera da atividade humana” e refletem

as condições específicas e as finalidades de cada uma dessas esferas, não só


por seu conteúdo (temático) e por seu estilo verbal, ou seja, pela seleção
operada nos recursos da língua (...), mas também, e sobretudo, por sua
construção composicional. (BAKHTIN, 1997, p. 280)

De acordo com Marcuschi (2002, p. 19), os gêneros textuais são entidades sócio-
discursivas, o que torna inegável sua característica variável ou, nas palavras do linguista
(2002, p. 19), “maleável, dinâmica e plástica”. Outro aspecto importante relacionado
aos gêneros textuais e mencionado por Marcuschi (2002, p. 19) é o fato de serem
fenômenos históricos e, portanto, efêmeros. Os gêneros surgem e desaparecem
conforme as necessidades de comunicação e as atividades da cultura na qual são
utilizados. Consequentemente, relacionam-se também aos eventos tecnológicos, como a
32

invenção da imprensa, do telefone, do computador e da internet, que ocasionou a


criação de novos gêneros a eles relacionados, tais como editoriais, telefonemas,
videoconferência, chats etc. Por outro lado, podemos perceber que, com o boom da
internet, gêneros de outros suportes, como telegrama, cartão postal e mensagem de fax
têm se tornado obsoletos. Sobre isso comenta Marchuschi (2002, p. 20):

Como afirmado, não é difícil constatar que nos últimos dois séculos foram as
novas tecnologias, em especial as ligadas à área da comunicação, que
propiciaram o surgimento de novos gêneros textuais. Por certo, não são
propriamente as tecnologias per se que originam os gêneros e sim a
intensidade dos usos dessas tecnologias e suas interferências nas atividades
comunicativas diárias. Assim, os grandes suportes tecnológicos da
comunicação tais como o rádio, a televisão, o jornal, a revista, a internet, por
terem uma presença marcante e grande centralidade nas atividades
comunicativas da realidade social que ajudam a criar, vão por sua vez
propiciando e abrigando gêneros novos bastante característicos.

No entanto, os gêneros que surgem não são realmente inovadores, já que o que
ocorre na verdade é a assimilação de um gênero por outro, ou seja, o surgimento de um
novo gênero a partir da reformulação de outro, como é o caso do e-mail que guarda
similaridades com a carta. Bakhtin (1997) chamou esse fato de transmutação dos
gêneros.
De acordo com a exposição feita na Introdução desta tese, os gêneros dos textos
aqui analisados são: crônica jornalística, reportagem de revista de informação, artigo
acadêmico e edital de abertura de concurso público. Descrevemos cada um a seguir.
A crônica (do grego khroniká, relativo ao tempo) é um gênero narrativo, que
conta fatos históricos ou atuais. Geralmente, são publicadas em jornais e revistas, mas
também são encontradas no formato de livros e coletâneas. Destinam-se à leitura diária
ou semanal e tratam de acontecimentos cotidianos. A notícia distingue-se da crônica, já
que a primeira busca relatar os fatos de maneira objetiva e exata, ao passo que a
segunda os analisa, imprimindo-lhes subjetividade e revelando a impressão pessoal do
cronista com respeito ao acontecimento observado. O tema pode constituir-se de
notícias muito comentadas até uma situação simples e corriqueira do mundo
contemporâneo, geralmente da vida urbana, eventos narrados de modo a revelar uma
perspectiva peculiar do ocorrido, com o uso de uma linguagem trabalhada. Por esses
motivos, costuma-se afirmar que a crônica é um gênero que mistura jornalismo e
literatura. As personagens da crônica não se apresentam por meio de uma descrição
33

psicológica profunda, mas por uma caracterização genérica; tampouco costumam ser
nomeadas.
A reportagem é um gênero textual que informa sobre determinado fato, atual ou
antigo, de interesse do leitor a que se destina a revista. O gênero pode conter
depoimentos, opiniões, entrevistas e dados estatísticos, que corroboram os
acontecimentos. A reportagem não é uma simples narração de um evento, pois o
repórter apresenta também sua própria interpretação. A linguagem utilizada é impessoal
e objetiva, com a intercalação entre discursos direto e indireto, de modo a registrar os
diferentes pontos de vista dos sujeitos envolvidos nos fatos. Sua estrutura mais comum
é: a) título: anuncia o fato abordado; b) subtítulo: busca atrair o interesse para o assunto;
c) lead: apresenta o resumo da matéria, normalmente, no primeiro parágrafo da
reportagem; d) corpo: expõe o fato, em nível mais amplo. É comum também o uso de
fotos que complementam a matéria. Bahia (1990, p. 49-50) aponta algumas diferenças
entre a notícia e a reportagem, dentre as quais se destacam: a notícia expõe o fato no
mesmo dia em que ele ocorre ou no dia seguinte, a reportagem mostra como isso se deu;
a notícia não vai além da notificação, a reportagem extrapola a mera notificação e
apresenta o detalhamento, o questionamento de causa e efeito, a interpretação e o
impacto dos fatos.
O artigo científico é um gênero que serve para a divulgação dos resultados de
pesquisas científicas. Surgiu com a criação do primeiro periódico científico, na década
de 60. A ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) é o órgão responsável por
elaborar as normas que regem esse tipo de publicação quanto à sua organização. Na
NBR 6022/2003, a associação conceitua esse gênero como “parte de uma publicação
com autoria declarada, que apresenta e discute ideias, métodos, técnicas, processos e
resultados nas diversas áreas do conhecimento” (ABNT, 2003, p.2). Consequentemente,
o artigo científico serve como via de comunicação entre pesquisadores, profissionais,
professores e alunos de graduação e de pós-graduação. Dada a sua natureza, a
linguagem empregada no artigo científico é sempre formal, objetiva e clara, a fim de
que possa ser acessível a um amplo público.
O gênero edital é um documento muito utilizado por instituições públicas e
privadas do país, com o intuito de divulgar determinada notícia, fato ou ordenança, por
meio da imprensa ou sítios públicos, para conhecimento geral. Estruturalmente, o edital
é composto por muitos itens e subitens, que variam de acordo com o tipo e são “detalhes
necessários para uma possível resposta do interlocutor, ou seja, do interessado, pelo fato
34

ou propósito que determina o edital” (SANTOS; NASCIMENTO, 2011, p. 6). O


assunto, portanto, é tratado de maneira exaustiva, a fim de dar o máximo de informação
necessária com relação ao fato anunciado. Além disso, um edital também deve conter,
em sua estrutura, a designação do órgão/unidade que comunica e o título do edital, com
letras maiúsculas, seguido de número de ordem e da data. Por ser um documento oficial,
a linguagem utilizada deve estar de acordo com o nível de formalidade do texto,
“devendo-se caracterizar pela impessoalidade, pela clareza, concisão, formalidade e
uniformidade” (SANTOS; NASCIMENTO, 2011, p. 7). Alguns tipos de editais são: de
abertura de concurso para provimento de cargos públicos, de ciência, de concorrência,
de convocação, de disponibilidade, de habilitação, de inscrição, de intimação, de notícia
(arrecadação de bens), de praça (de leilão ou hasta pública), de publicação, de licitação
e de resultado. O tipo estudado neste trabalho é edital de abertura de concurso público.
Na obra Da fala para a escrita: atividades de retextualização, Marcuschi (2001)
defende a ideia de um contínuo tipológico entre as modalidades falada e escrita de uso
da língua, que vai desde os gêneros mais informais aos mais formais, orais e escritos,
considerando as situações comunicativas em que se inserem, contemplando, assim, a
noção escalar de Bortoni-Ricardo (2004 e 2005), comentada em 2.1, relativamente aos
contínuos de oralidade/letramento e de monitoração estilística. O autor comenta que é
comum o tratamento de gêneros textuais numa perspectiva dicotômica, de fala e escrita,
e afirma ser equivocado este tipo de polarização, uma vez que alguns gêneros ocupam
uma posição intermediária, um ponto de interseção do contínuo e, por isso, é difícil
alocá-los precisamente em uma ou outra modalidade. Em síntese, o modelo proposto
por Marchuschi abrange tanto os gêneros textuais mais prototípicos de um ou outro polo
do contínuo, como aqueles mais híbridos. Esse modelo é formulado da seguinte
maneira:
35

Figura 1: Representação do contínuo dos gêneros textuais na fala e na escrita

Fonte: (MARCUSCHI, 2001, p.41)

Indubitavelmente, Marcuschi elabora uma útil e didática representação dos


gêneros orais e escritos dentro desse contínuo. Esta visão plural vem ao encontro dos
atuais estudos científicos da linguagem, que reconhecem e valorizam a natureza
multifacetada das línguas naturais, e aponta um caminho para se estudar a variação
linguística, a partir da correlação entre gênero textual e grau de formalidade, na medida
em que propõe níveis crescentes de formalidade no eixo da fala e no eixo da escrita.
O esquema apresenta uma relevante proposta de abordagem pedagógica dos
gêneros textuais e de variação linguística, uma vez que deixa claro que assim como os
gêneros textuais orais e escritos são diversos (e incontáveis), a língua neles utilizada
também varia. Por este motivo, optamos por investigar o fenômeno variável da
colocação pronominal a partir de diferentes gêneros, com diferentes graus de
formalidade, a fim de sistematizá-lo, tendo em vista também a inegável importância
deste tipo de estudo para o ensino de língua portuguesa. Para Vieira e Lima (2019, p.
12): “é preciso admitir que não se dispõe de parâmetros seguros para a determinação
prévia de relações claras entre cada gênero e determinado nível de monitoração
estilística ou de determinado grau de formalidade”, considerando que a relação entre
gênero e grau de formalidade, para elas, é um tema de pesquisa a ser desenvolvido.
36

3 Revisão bibliográfica

Os pronomes oblíquos átonos se comportam como uma sílaba não acentuada


inicial ou final dos vocábulos, constituindo com o vocábulo ao qual se liga o que
Camara Jr. (1975) chamou de vocábulo fonológico. No caso de a ligação ser com o
elemento subsequente, o clítico atua como uma sílaba pretônica e, no caso de a conexão
ser com o elemento anterior, o pronome desempenha o papel de uma sílaba postônica,
no âmbito do vocábulo fonológico. É sabido que, no PE, a preferência é pelo último tipo
de ligação e, no PB, pelo primeiro, ou seja, a variedade lusitana apresenta uma
tendência à ênclise, ao passo que a nossa variedade se inclina para a próclise. Uma
motivação para esse fato seria o enfraquecimento das vogais não acentuadas e, assim,
uma pronúncia efetivamente átona dos pronomes em questão, no PE, o que favorece a
ênclise. Por outro lado, há uma tendência brasileira à pronúncia forte de vogais
pretônicas, o que faz com que os clíticos sejam pronunciados como semitônicos ou
menos átonos. O problema está no fato de que muitos manuais e gramáticas tomam a
norma europeia como padrão para o ensino e não a norma culta brasileira, o que gera
confusão.
Têm sido apontados como elementos favorecedores de cada possível posição do
pronome fatores estruturais, estilísticos e rítmicos, isto é, fatores que advêm de
diferentes níveis gramaticais. Por isso, buscamos verificar como tem sido abordado esse
tema nas gramáticas de português. Comecemos por apresentar o quadro de pronomes
pessoais oblíquos átonos, como são apresentados normalmente pela GT:

Quadro 1: Pronomes oblíquos átonos no PB, segundo a abordagem tradicional.


Pessoa do discurso Pronome de OD Pronome de OI Pronome reflexivo

1ª pessoa singular me me me

2ª pessoa singular te te te

3ª pessoa singular o, a lhe se

1ª pessoa plural nos nos nos

2ª pessoa plural vos vos vos

3ª pessoa plural os, as lhes se

Fonte: elaborado pela autora.


37

3.1 A posição do clítico segundo gramáticas do português

Evanildo Bechara, em sua Moderna Gramática Portuguesa (2003, p. 587), de


longa tradição no ensino de norma padrão, trata do tema da colocação dos pronomes
pessoais átonos, como uma questão de fonética sintática. Segundo o gramático, “durante
muito tempo viu-se o problema apenas pelo aspecto sintático, criando-se a falsa teoria
da ‘atração’ vocabular...” Ele ainda afirma que muitas das regras impostas aplicavam-se
ao falar lusitano e não ao nosso, e admite que a Gramática, por fundamentar-se na
tradição literária, ainda não reconhece estruturas típicas do falar culto brasileiro.
Finalmente, esclarece que, em sua gramática, considerará somente as normas
concernentes à língua escrita e a falada pelas pessoas cultas. O gramático conta, como
corpus exemplificativo, com obras literárias brasileiras e portuguesas contemporâneas e
também clássicas.
Desse modo, Bechara (2003, p. 587) começa a descrever as possibilidades de
posicionamento do pronome átono com relação ao verbo, em português. Segundo o
autor, são três as posições possíveis: posposto ao vocábulo tônico (ênclise); anteposto
ao vocábulo tônico (próclise) e interposto ao vocábulo tônico (mesóclise). Os exemplos
dados são os seguintes (BECHARA, 2003, p. 587 - 588):

Deu-me a notícia.
Não me deu a notícia.
Dar-me-ás a notícia.

Em seguida, o gramático (2003, p. 588) aponta cinco critérios para a colocação


do clítico, começando pelos casos em que o pronome se relaciona a um só verbo. O
primeiro critério arrolado é: “Não se inicia período por pronome átono” (BECHARA,
2003, p. 588). São apresentadas algumas observações a respeito dessa regra inicial.
Primeiramente, Bechara (2003, p. 588) comenta que “este princípio é, em nosso falar
espontâneo, desrespeitado” e menciona o fato de alguns modernistas usarem a próclise
inicial, inclusive, segundo o gramático, de maneira exagerada, já que iniciam períodos
com os clíticos acusativos de terceira pessoa, que segundo Bechara (BECHARA, 2003,
p. 588) são usados sempre pospostos ao verbo em início de período. A observação
seguinte diz respeito à adoção do critério de oração e não de período, isto é, segundo
38

este critério não se devem iniciar nem períodos, nem orações com pronome átono.
Assim, os que adotam tal critério condenam o uso de pronome no início de oração
dentro do período. A terceira e última observação ressalta o uso comum do pronome em
início de período, em expressões populares cristalizadas. O exemplo dado é a frase
popular “Te esconjuro!”.
O segundo critério apontado é: “Não se pospõe, em geral, pronome átono a
verbo flexionado em oração subordinada: Confesso que tudo aquilo me pareceu
obscuro” (BECHARA, 2003, p. 588). A essa regra também é acrescentada uma
observação. Bechara (2003, p. 588) observa que é comum ocorrer a ênclise do pronome
átono: 1) na segunda oração subordinada, quando esta está coordenada à outra; 2)
quando na subordinada se intercalam palavras ou oração, exigindo uma pausa antes do
verbo.
Dando continuidade, Bechara (2003, p. 589) apresenta um terceiro critério: “Não
se pospõe pronome átono a verbo modificado diretamente por advérbio (...) ou
precedido de palavra de sentido negativo”. Em seguida, esclarece que, no caso de haver
uma pausa depois do advérbio, a posição do clítico é opcional. O quarto princípio
aplica-se à posição do clítico junto a verbos conjugados no futuro do presente ou do
pretérito, com os quais não se usa ênclise, segundo o gramático (BECHARA, 2003, p.
589), e as outras posições podem ocorrer quando as outras regras não são infringidas. O
último critério diz respeito a orações iniciadas por palavras interrogativas ou
exclamativas, casos em que se deve empregar a próclise.
Já com relação aos casos em que o pronome se relaciona a mais de um verbo,
isto é, a uma locução verbal, duas situações são levadas em conta: aquelas em que o
auxiliar se une a um infinitivo ou a um gerúndio e aquelas em que o auxiliar se une a
particípio. No primeiro contexto, segundo Bechara (2003, p. 589 - 590), o pronome
átono pode aparecer, desde que não sejam refutados os princípios antes mencionados,
proclítico ou enclítico ao auxiliar ou enclítico ao principal. Os exemplos dados para
cada situação, respectivamente, são (BECHARA, 2003, p. 590):

Eu lhe quero falar.


Eu lhe estou falando
Eu quero-lhe falar.
Eu estou-lhe falando.
Eu quero falar-lhe.
39

Eu estou falando-lhe.

Note-se que, nos casos em que o clítico se intercala aos verbos ou a eles se
pospõe, usa-se o hífen, nesses exemplos. No entanto, o gramático observa o uso
frequente entre os brasileiros, tanto na modalidade oral quanto na escrita, da próclise ao
verbo principal – sem hífen, na escrita – e esclarece que esse uso só é aceito pela
gramática clássica se o infinitivo estiver precedido de preposição, como no exemplo
dado: “Começou a lhe falar” (BECHARA, 2003, p. 590).
O segundo contexto considerado por Bechara (2003, p. 590), auxiliar seguido de
particípio, resume-se ao princípio de que “jamais se pospõe pronome átono a particípio”
(BECHARA, 2003, p. 590). Portanto, o clítico pode encontrar-se antes ou depois do
auxiliar. Nesse último caso, prescreve-se, na gramática em questão, o uso do hífen,
muito embora haja a seguinte nota: “Entre brasileiros também ocorre a próclise ao
particípio” (BECHARA, 2003, p. 590).
Bechara também expõe dois casos em que a posição do pronome é fixa: 1) com
gerúndio precedido da preposição em e 2) nas orações exclamativas ou optativas, com
sujeito anteposto a verbo no subjuntivo. Um célebre exemplo da primeira circunstância
é a expressão “em se plantando tudo dá”, que remete à Carta escrita por Pero Vaz de
Caminha ao rei Dom Manuel, na qual descreve suas impressões sobre o Brasil. Com
relação ao segundo caso, um dos exemplos dados por Bechara (2003, p. 591) é o
seguinte: “Bons ventos o levem!”.
Bechara (2003, p. 591) finaliza a seção com uma explicação sobre a colocação
dos pronomes átonos no Brasil. Vale a pena citar o comentário a seguir:

Nos princípios anteriormente comentados vimos certas tendências brasileiras


que nem sempre a Gramática agasalha como dignas de imitação, presa que
está a um critério de autoridade que a linguística moderna pede seja revisto.
(BECHARA, 2003, p. 591)

Linhas adiante, Bechara (2003, p. 591) afirma que, no Brasil, é possível começar
período com o clítico, na linguagem coloquial. Contudo, não fica claro o que ele
considera linguagem coloquial, pois não menciona fatores importantes para esta
definição, tais como: gênero textual, situação comunicativa, modalidade da língua etc. É
40

indiscutível que a escolha do posicionamento do pronome envolve variáveis que


ultrapassam a questão de simples coloquialismo.
Outra gramática considerada tradicional em que buscamos respaldo para nossa
pesquisa foi a de Celso Cunha e Lindley Cintra (2001), por também ser muito adotada
por professores, no ensino da norma padrão portuguesa. Segundo Cunha e Cintra (2001,
p.309), o pronome átono pode estar, em relação ao verbo: enclítico (posposto),
proclítico (anteposto) e mesoclítico (no meio do verbo). Para os autores (CUNHA e
CINTRA, 2001, p.309), a posição “lógica, normal” do pronome de objeto direto ou
indireto é a ênclise; contudo, há “casos em que, na língua culta, se evita ou se pode
evitar essa colocação”, o que diferencia as variedades lusitana e brasileira do português.
As regras apresentadas pelos gramáticos (CUNHA e CINTRA, 2001, p.309-316) para
tais casos podem ser resumidas da seguinte forma:
A- Mesóclise: Só é possível com verbos no futuro do presente ou futuro do
pretérito. Nestes casos, permite-se também a próclise (CUNHA e CINTRA, 2001,
p.310).
B- Próclise: com um só verbo, a próclise é utilizada nos seguintes casos:
a) nas orações que contêm palavra negativa, quando entre ela e o verbo não há
pausa.
b) nas orações iniciadas com pronomes e advérbios interrogativos.
c) nas orações iniciadas por palavras exclamativas, bem como nas orações que
exprimem desejo.
d) nas orações subordinadas desenvolvidas.
e) com gerúndio regido da preposição “em”.
f) com verbo antecedido de certos advérbios (bem, mal, ainda, já, sempre, só,
talvez etc).
g) quando a oração na ordem inversa se inicia por objeto direto ou predicativo.
h) quando o sujeito da oração, anteposto ao verbo, contém o numeral “ambos”
ou algum dos pronomes indefinidos.
i) nas orações alternativas.
Quanto ao uso do pronome átono com locuções verbais com verbo principal no
infinitivo ou no gerúndio, Cunha e Cintra (2001, p. 314-316) apresentam as seguintes
normas:
A- A ênclise:
a) ao verbo principal: sempre é permitida.
41

b) ao verbo auxiliar: é permitida quando não se verificam as condições que


aconselham a próclise.
B- A próclise:
a) ao verbo auxiliar: é permitida “quando ocorrem as condições exigidas para a
anteposição do pronome a um só verbo” (2001, p. 314), apresentadas acima.
Com locuções verbais com verbo principal no particípio, Cunha e Cintra (2001,
p. 316) prescrevem que “o pronome átono não pode vir depois dele. Virá, então,
proclítico ou enclítico ao verbo auxiliar, de acordo com as normas expostas para os
verbos na forma simples.”
Nessa gramática, os autores apresentam uma seção que trata especialmente da
colocação dos pronomes átonos no Brasil (2001, p. 316). Dois aspectos apontados são
importantes de ser mencionados aqui:
1) a possibilidade, no português brasileiro, de se iniciarem frases com os
pronomes átonos.
2) a próclise ao verbo principal (sejam eles infinitivo, particípio ou gerúndio) nas
locuções verbais, muito comum em nossa variedade da língua portuguesa.
Também buscamos averiguar como o fenômeno em análise é descrito em uma
gramática de usos. Para isso, escolhemos a Gramática do Português Brasileiro, do
linguista Ataliba T. de Castilho (2010), que é, como o seu título revela, uma gramática
que assume descrever a língua dos mais de 200 milhões de falantes, no Brasil. Castilho
(2010, p. 483, 484) afirma que os pronomes átonos, no PB, colocam-se
preferencialmente antes do verbo, diferentemente do que ocorre no PE, em que se
observam as posições proclítica e enclítica, com predomínio da última. Com relação ao
uso do pronome átono com perífrases verbais e tempos compostos, percebe-se uma
maior ocorrência do clítico anteposto ao verbo principal, no PB, segundo essa
Gramática (CASTILHO, 2010, p. 484). Neste aspecto, PB e PE também se diferenciam,
pois nesta última variedade há uma preferência pela ênclise ao auxiliar (CASTILHO,
2010, p. 484).
O gramático (2010, p. 483) também revela uma mudança diacrônica no
posicionamento do clítico em português: “predominando inicialmente a ênclise, até o
século XIV, começando então o domínio da próclise, até o século XVI”. Essa oscilação
entre as posições do pronome, ao longo da história do português, mostra, segundo
Castilho (2010, p. 484) o quão complexa é a língua e que a mudança linguística não tem
um fim. Em seguida, são apresentadas algumas pesquisas de linguistas sobre colocação
42

pronominal, em PB e PE, com ênfase no estudo diacrônico até a década de 90. Não há
uma descrição minuciosa do fenômeno no PB atual.
Azeredo (2010), em sua Gramática Houaiss, descreve as regras de colocação dos
pronomes oblíquos átonos, que, segundo ele, “está condicionada a fatores de três
ordens: sintática, prosódica e sociocomunicativa” (AZEREDO, 2010, p. 258). Tal
gramática, segundo se informa em sua Apresentação, tem como objeto de estudo a
variedade padrão do português brasileiro escrito em uso. O corpus analisado é formado
por obras literárias, técnicas, científicas, ensaísticas e jornalísticas, publicadas a partir
da segunda metade do século XIX.
Essa obra considera a variação no uso e posicionamento dos pronomes. O
gramático (AZEREDO, 2010, p. 259) comenta que há duas variáveis prosódicas do
fenômeno da sínclise pronominal: “o padrão que determina a distribuição dos acentos de
intensidade; e de que modo os vocábulos átonos se subordinam aos que contêm sílaba
tônica para a formação dos vocábulos fonológicos”.
Por outro lado, no que diz respeito aos fatores sociocomunicativos de
condicionamento da escolha da posição dos pronomes, Azeredo (2010, p. 259) afirma
que é necessário levar em consideração a variedade de língua empregada e a situação
discursiva. O gramático (2010, p. 259) comenta as diferenças entre as variedades culta e
popular e entre os registros formal e informal da língua, no que concerne a esse tema.
Salienta que os clíticos acusativos de terceira pessoa, foneticamente raros (tendo em
vista que se constituem de uma única vogal, ao passo que a maioria dos átonos tem a
estrutura CV), são adquiridos por ação da escola e só são usados em situações formais e
de discurso planejado.
Ainda com relação ao ponto de vista prosódico, Azeredo (2010, p. 259) afirma
que a próclise é a posição pronominal “mais favorecida pelo ritmo da frase no português
do Brasil”. Essa posição favorece o relevo fonético dos pronomes, tornando-os
semitônicos. É, pois, a posição natural, no PB, segundo o gramático (AZEREDO, 2010,
p. 259).
Não é outra a razão do conhecido hábito brasileiro de ‘começar frase com
pronome átono’, fato que em épocas não tão remotas causava horror aos
gramáticos mais puristas.

Em contrapartida, a ênclise do pronome é, segundo o gramático, “um traço de


formalismo”, seja na fala ou na escrita. Portanto, trata-se de uma escolha relacionada
43

com a situação comunicativa, que “pode revelar alto grau de monitoramento (...),
quando não certo artificialismo do discurso” (AZEREDO, 2010, p. 260).
No que tange ao condicionamento sintático, Azeredo (2010, p. 260) aponta três
aspectos a considerar: se o pronome se relaciona a uma forma verbal simples ou a uma
locução verbal; se o pronome é complemento, parte integrante do verbo ou índice de
indeterminação; ou se há alguma particularidade que imponha a posição do pronome.
Levando em consideração os três fatores mencionados, registra as seguintes normas de
colocação do clítico:
1) Pronome atrelado à forma simples do verbo
a) A próclise é o uso padrão generalizado, inclusive na variedade culta, se o
pronome é antecedido imediatamente de advérbio ou pronomes de
significação negativa e de conectivo de subordinação (especialmente com
verbo no subjuntivo).
b) As variantes -lo, -la, -los, -las dos pronomes de terceira pessoa são sempre
enclíticas ao infinitivo e às formas terminadas em -s e -z.
c) As variantes -no, -no, -nos, -nas dos pronomes de terceira pessoa são sempre
enclíticas às formas terminadas em vogal ou ditongo nasal e são de uso
estritamente formal.
d) Com verbos no futuro do presente ou do pretérito e sujeito explícito, usa-se a
próclise.
e) A regra anterior possui variantes ultraformais, restritas à modalidade escrita,
a saber, o uso do pronome mesoclítico ao verbo.

2) Pronome atrelado a locuções verbais


a) Os pronomes me, te, se, lhe, nos, lhes ocorrem majoritariamente proclíticas
ao verbo principal. Ocorre a ênclise ao verbo principal quando este é
gerúndio ou infinitivo, em contextos de formalidade. Igualmente, em
registros formais, especialmente da modalidade escrita, ocorrem a ênclise ou
a próclise ao verbo auxiliar.
b) Os clíticos acusativos de terceira pessoa, o, a, os, as, são, segundo o
gramático, restritas ao uso formal e podem ocorrer proclíticas ao auxiliar, se
a este não segue uma preposição, ou enclíticas ao gerúndio. Já as suas
variantes -lo, -la, -los, -las são necessariamente enclíticas ao infinitivo.
44

c) Finalmente, o clítico se, quando é indeterminador do sujeito ou apassivador,


liga-se ao verbo conjugado, proclítica ou encliticamente.

Em conclusão, pode-se afirmar que já se observa certa mudança em termos de


descrição da realidade do PB, nas gramáticas mais tradicionais, fruto dos avanços da
pesquisa Sociolinguística. Nas últimas décadas, muitos estudos vêm descrevendo
sociolinguisticamente o PB, o que nos oferece um conhecimento da nossa realidade
linguística, tanto no tocante à modalidade falada, quanto, em menor escala, à
modalidade escrita. E, assim, parece que o abismo existente entre as descrições
gramaticais que servem de base para o ensino de português e a língua realmente
praticada no Brasil tende a diminuir. Porém, ainda há um caminho a ser percorrido,
resta mudar a perspectiva, o foco, deixar de tomar a variedade europeia como modelo de
correção e passar a voltar o olhar para as variedades cultas brasileiras (com ênfase ao
plural). É preciso partir do entendimento de que não há uma única norma culta, que a
língua é variável, tanto na fala quanto na escrita. Esse reconhecimento implica uma
produção de gramáticas menos prescritivas e mais descritivas da língua, a partir de
exemplos de textos autênticos e atuais de vários gêneros discursivos. Os estudos
científicos que partem da noção dos três contínuos, proposta por Bortoni-Ricardo (2004
e 2005), contribuem e contribuirão muito nesse sentido. É indiscutível que já temos
muitas gramáticas com essas características. Talvez o que se deva mudar é a escolha
daquela que servirá de base para o ensino e para a elaboração de provas de concursos
públicos.
Na Moderna Gramática Portuguesa, Evanildo Bechara (2003) se propõe a
descrever as normas concernentes à língua escrita e falada pelas pessoas cultas, como se
comentou no início desta seção. No entanto, lista regras de colocação pronominal, que
mais se aproximam das normas referentes à variedade lusitana do português, como, por
exemplo, o primeiro critério apresentado: “Não se inicia período por pronome átono”
(BECHARA, 2003, p. 588). Porém, mais adiante Bechara afirma que este é um
princípio desrespeitado na nossa fala espontânea e usado por modernistas, segundo ele,
de maneira até exagerada. O que Bechara não comenta é que até hoje a colocação do
clítico em início de período é utilizada por muitos escritores, como veremos na análise
dos dados desta tese. A questão que fica de fora é: quando não se inicia período por
pronome átono? Em que situação discursiva? Em que contextos? Só na escrita? Em
todos os gêneros? Somente uma teoria com base na discussão sobre os diferentes
45

gêneros textuais e a variação existente, tanto nos gêneros orais, quanto nos escritos
(MARCUSCHI, 2001), consegue dar conta desses questionamentos.
Cunha e Cintra (2001, p. 309) são ainda mais tradicionais ao afirmarem que a
posição “lógica, normal” do clítico é a ênclise. Por que lógica? E normal para quem?
Isso não é discutido. Portanto, mesmo que mais adiante reconheçam que há casos em
que, na língua culta, se evita tal uso, no PB, fica clara a visão implícita de que a
variedade tomada como padrão/modelo é a lusitana, uma vez que, como já comentamos,
a preferência pela ênclise no PE e pela próclise, no PB, tem explicações que se baseiam
nos padrões rítmicos, na prosódia de cada variedade. Falta, então, uma argumentação
mais rigorosa para essa afirmação. Destacamos o seguinte comentário sobre esse tema:

Apesar de já haver no início do século, como se pode observar, a consciência


de que as regras de colocação pronominal brasileiras divergem das
portuguesas, as gramáticas prescritivas atuais ainda estabelecem normas que,
aparentemente, se aplicariam tanto no Brasil quanto em Portugal. Essas
gramáticas, embora admitam casos conflitantes entre PB e PE, propõem a
ênclise como regra geral (VIEIRA, 2007, p. 124).

A Nova Gramática do Português Contemporâneo, assim como a gramática de


Bechara, também reserva um espaço para os comentários acerca da colocação
pronominal em PB, com destaque para dois fatos: a tendência brasileira a usar a próclise
em início de período e a preferência pela próclise ao verbo principal. O fato de a
descrição do PB estar em uma seção à parte se justifica por serem gramáticas que se
baseiam na língua portuguesa como um todo e não apenas na nossa variedade. Contudo,
há de se frisar que, quando descrevem os usos particularmente brasileiros, mencionam
que não são aceitos pela gramática clássica, como a próclise ao verbo principal, tão
comum, tanto na oralidade, quanto na escrita brasileira, caracterizada pela ausência de
hífen, nesta última modalidade (BECHARA, 2003, p. 590). Espera-se, reafirmamos, que
as gramáticas que se propõem a descrever a língua portuguesa de maneira abrangente
não tomem apenas uma variedade como modelo de correção e bom uso, mas apresentem
as várias normas cultas das diferentes variedades. Portanto, não basta reconhecer as
diferenças de usos, é necessário rever o critério de prestígio.
Por outro lado, a gramática de Castilho (2010) se propõe a descrever a variedade
brasileira da língua portuguesa. Dessa forma, parte de uma apresentação das nossas
regras de uso culto, afirmando que a próclise é a posição preferencial no PB. Referente
às ocorrências de clítico adjacente à locução verbal, afirma que a posição preferida é a
46

próclise ao verbo principal. Nos dois casos, comenta que são aspectos em que o PB se
diferencia do PE. Temos, pois, um ponto de vista descritivo bastante diferente.
A gramática Houaiss também visa à descrição do PB e toma como corpus textos
de diferentes gêneros. Azeredo (2010) parte de uma explicação prosódica para afirmar
que a próclise é a posição preferida no PB. Além disso, conclui que a ênclise é um traço
de formalismo. Trata-se, portanto, de uma perspectiva bem diferente das gramáticas
tradicionais, pois toma os usos brasileiros como ponto de partida. O gramático
(AZEREDO, 2010) considera também, além de fatores de ordem prosódica e sintática,
os de ordem sociocomunicativa. Como já comentamos, quando apresenta a norma
brasileira de posicionamento do clítico, leva em conta as diferenças entre variedades
culta e popular, registro formal e informal, modalidade escrita e falada, situação
comunicativa e grau de monitoramento: uma inovação.

3.2 Locuções verbais

Sabe-se que os verbos podem ocorrer, na oração, em formas simples ou


compostas. Quando a forma verbal é composta, há sempre um verbo chamado de
principal, que se realiza em uma forma nominal, particípio, gerúndio ou infinitivo, e
comporta a maior carga semântica da locução. O outro verbo aparece conjugado em
algum tempo e é conhecido como auxiliar. Existem também locuções com mais de dois
verbos. É importante frisar, todavia, que não é qualquer ocorrência de verbos seguidos
que pode ser considerada locução, ainda que um verbo esteja conjugado e o outro esteja
em uma forma nominal.
Perini (2010, p. 237) descreve as locuções verbais da seguinte maneira: “Alguns
verbos podem se combinar com o gerúndio, o infinitivo ou o particípio de outro verbo,
criando sequências semântica e valencialmente semelhantes a formas verbais simples”.
Portanto, somente quando há esta equivalência, podemos considerar a sequência verbal
uma locução. Isso não ocorre, segundo o gramático, em resolvemos cantar, por
exemplo, pois nesta sequência estão presentes as valências3 de ambos os verbos. Por

3
Perini (2010, p. 135) define valência verbal como o conjunto delimitado de construções em que um
verbo pode ocorrer. Isso abrange os complementos compatíveis com cada verbo, sua forma sintática e
seus papéis temáticos.
47

conseguinte, o primeiro verbo não é um auxiliar e há, então, dois verbos e duas orações,
neste caso. Perini (2010, p. 238) inclui no grupo de locuções verbais os tempos
compostos (inclusive a forma ir + infinitivo, que ele denomina como futuro composto, e
também estar/andar/vir + gerúndio, que são chamados por ele de tempos progressivos).
Além de ter, ir, estar, andar e vir, antes mencionados, Perini (2010, p. 238) também
considera verbos auxiliares os modais, pois apresentam “comportamento sintático e
valencial análogo ao dos demais auxiliares”.
Quanto aos verbos modais, há aqueles que exprimem uma noção semântica e
aspectual de início, fim ou continuidade do evento. Estes se unem a um infinitivo por
meio de preposição, como: começar a, acabar de, terminar de, continuar a, parar de.
Nesta lista também se incluem os que se unem a um gerúndio, sem a necessidade de
uma preposição. Os exemplos dados por Perini (2010, p. 239) são os seguintes: 1)
“Continuou chovendo o dia todo”; e 2) “O rapaz acabou brigando com os colegas”.
Outros verbos citados pelo gramático como modais são dever, ter (que) e querer. O
primeiro, para Perini, só é modal quando significa “ser provável”. Quando tem sentido
de obrigação não é auxiliar, na opinião do gramático. O segundo é modal quando
expressa obrigação, dever ou necessidade, como em: 1) “Esse menino tem que estudar
mais”; e 2) “Tem que chover, senão vamos perder a safra”. O terceiro verbo é modal
quando é acompanhado do auxiliar estar, numa locução de três verbos: 1) “Está
querendo chover”.
Perini aponta algumas diferenças entre os verbos auxiliares modais e os não
modais, dentre elas, o fato de um não modal acrescentar “ao verbo principal um
ingrediente semântico que não é previsível a partir de seu significado quando tomado
separadamente” (PERINI, 2010, p. 240); ao passo que um modal continua com seu
significado, mesmo quando é um auxiliar. Como exemplo, cita os verbos ir e andar, que
expressam movimento, porém, como auxiliares, perdem esse valor semântico. Por outro
lado, menciona o modal começar que continua dando ideia de início, inclusive como
auxiliar.
Por outro lado, Bechara (2003, p. 230) define locução verbal como “a
combinação das diversas formas de um verbo auxiliar com o infinitivo, gerúndio ou
particípio de outro verbo que se chama principal” e ressalta que às vezes o auxiliar
“empresta um matiz semântico ao verbo principal, dando origem aos chamados aspectos
dos verbos”. Comenta que entre o auxiliar e o verbo principal pode haver ou não uma
preposição e que, muitas vezes, tal preposição pode alternar, como ocorre com o
48

auxiliar começar a/de. O emprego (ou não) depende tão somente da arbitrariedade do
uso.
Em seguida, Bechara (2003, p. 230) descreve as aplicações dos verbos
auxiliares, em português, começando pelas ocorrências em tempos compostos. Aponta
os verbos ter, haver e ser, como auxiliares que se combinam com o particípio para
formarem tempos compostos, embora os dois últimos sejam menos comuns. Afirma,
ainda, que tais tempos denotam que a ação verbal está concluída. Sobre o verbo ser
esclarece que se associa, geralmente, a verbos de movimento, “em combinações que
lembram os depoentes latinos” (BECHARA, 2003, p. 231), como em: “Era chegada a
ocasião da fuga”.
Mais adiante, Bechara comenta a aplicação de auxiliares na formação da voz
passiva. São eles os verbos ser, estar e ficar, que se combinam a particípios. Depois, o
gramático lista os verbos auxiliares que se unem ao infinitivo ou ao gerúndio de um
verbo principal, exprimindo uma noção aspectual de: início da ação (começar a, pôr-se a
etc. + infinitivo); iminência da ação (estar por/para, pegar a/de etc. + infinitivo);
continuidade de ação (continuar + gerúndio/continuar a + infinitivo); desenvolvimento
gradual da ação/duração (estar + gerúndio/estar a + infinitivo; andar + gerúndio, vir +
gerúndio, ir + gerúndio); repetição de ação (tornar a, costumar + infinitivo); e término
de ação verbal (acabar de, cessar de, deixar de, parar de e vir de + infinitivo, etc.).
Observa o autor que vir de + infinitivo é construção em desuso.
Por último, Bechara (2003, p. 232) discorre sobre os auxiliares modais, que se
combinam com o infinitivo ou o gerúndio de um verbo principal, para determinar, como
a nomenclatura sugere, o modo como se realiza a ação verbal, de maneira que
exprimem, segundo o gramático, sentido de:
1) Necessidade, obrigação, dever: haver de, ter de, dever, precisar (de) +
infinitivo, com a observação de que, atualmente, usa-se também ter/haver
que.
2) Possibilidade ou capacidade: poder + infinitivo.
3) Vontade ou desejo: querer, desejar, odiar, abominar + infinitivo.
4) Tentativa ou esforço: buscar, pretender, tentar, ousar, atrever-se a +
infinitivo.
5) Consecução: conseguir, lograr, etc. + infinitivo.
6) Aparência, dúvida: parecer + infinitivo.
7) Movimento para realizar um intento futuro: ir + infinitivo.
49

8) Resultado: vir a, chegar a + infinitivo.

Castilho (2010, p. 444), em sua gramática, descreve o que chama de “o problema


da auxiliaridade”. Nesse item, menciona alguns testes que são aplicados para a
identificação dos verbos auxiliares, quais sejam: sujeito da expressão, escopo da
negação, inserção de expressões entre o auxiliar e o principal e alterações do sentido
lexical do auxiliar. Abaixo se resumem os comentários tecidos pelo autor acerca de tais
testes.
1) Sujeito da perífrase: trata-se de verificar se, na ocorrência de dois verbos
adjacentes, ambos têm o mesmo sujeito ou cada um possui um sujeito
diferente, como ocorre na oração: Eu mandei-o ir embora.
2) Escopo da negação: “Se a negação toma por escopo os dois verbos, e não
apenas um deles, V1 é um verbo auxiliar” (CASTILHO, 2010, p. 445).
Exemplos: Ele estava falando que a topografia da cidade é muito bonita. /
Ele não estava falando que... /*Ele estava não falando que...
As orações anteriores revelam a coesividade sintática que existe entre
ambos os verbos, já que não é possível a negação do verbo principal
somente. Logo, constituem uma perífrase.
3) Alterações semânticas do verbo auxiliar: Nesse item, Castilho (2010, p. 245)
comenta a existência de pesquisas sobre as alterações semânticas que sofrem
os auxiliares e afirma que há casos em que “o sentido de V1 foi mantido,
juntamente com casos em que o sentido de V1 foi comprometido. No
primeiro caso, houve composicionalidade semântica, no segundo, não-
composicionalidade” (CASTILHO, 2010, p. 445). Exemplos: Ele vai
caminhar até o centro da cidade. / Ele vai ficar de pé.

Nas duas frases, aparece o verbo ir seguido de um infinitivo, mas, no primeiro


exemplo, ambos os verbos são de movimento e, no segundo, não. Segundo o autor, no
primeiro caso, houve composicionalidade de sentido e, no segundo, não houve. Para ele,
“uma perífrase de futuro assenta em pelo menos dois processos semânticos”
(CASTILHO, 2010, p. 446), diferenciando a primeira ocorrência de ir, que ele chama de
auxiliante, da segunda, caso em que considera o verbo ir um auxiliar. Em seguida,
Castilho (2010, p. 446) menciona alguns testes que permitem avaliar os graus de
esvaziamento semântico do primeiro verbo de um sintagma verbal composto, por meio
50

da combinação de complementos e adjuntos com o complexo verbal. Esses graus vão


desde um sentido ligeiramente alterado do primeiro verbo, até a perda total do sentido
original, o que dá origem a um sintagma de significado totalmente novo. Castilho
(2010, p. 447) ainda discute as várias nomenclaturas que os complexos verbais recebem
e cita: locução verbal, torneio, tempo composto, formas analíticas e conjugação
perifrástica.
Barroso (1994, p. 61) prefere designar os grupos locucionais como complexos
verbais, fazendo distinção entre este conceito e o de perífrases verbais, da seguinte
forma:

Estas estruturas gramaticais (=perífrases verbais) opõem-se (...) aos


chamados ‘complexos verbais’ (caracterizados pela significação disjunta, por
terem dois sujeitos e pelo não comportamento em bloco diante das
transformações passiva e interrogativa), porque, ao contrário destes, se
definem pela significação conjunta, por terem um único sujeito e pelo
comportamento em bloco diante das ditas transformações. Numa palavra:
o(s) verdadeiro(s) complexo(s) verbal(ais) perifrástico(s) possui(em) unidade
semântica, sintáctica e funcional.

Adotamos, neste trabalho, a designação mais tradicional, locução verbal, em


contraste com forma verbal simples. São consideradas locuções verbais as estruturas de
voz passiva (auxiliar ser + particípio); as que exprimem noção aspectual (auxiliares que
indicam o momento da ação: começar, estar, continuar, acabar etc.); as perífrases
temporais que expressam futuro (ir + infinitivo); as formas modais, isto é, aquelas que
exprimem a atitude do locutor em relação ao que diz ou ao interlocutor (auxiliares
modais, como dever, precisar, poder etc) e as volitivas (auxiliares que expressam
vontade, como querer, pretender etc.), bem como os tempos compostos (ter/haver +
particípio). Não são contabilizadas como locução e sim como verbos simples as
construções verbais causativas (auxiliares deixar, mandar, fazer etc) e sensitivas
(auxiliares ver, ouvir, olhar, sentir etc.).
Com relação à posição do clítico – que é o tema deste trabalho – tanto em
locuções verbais como nas formas simples, a hipótese mais comum é a de que existe
uma motivação de natureza prosódica que rege o uso nas variedades brasileira e lusitana
do português. No nosso caso, os pronomes ditos átonos se comportam, na verdade,
como partículas semitônicas ou de atonicidade menor, diferentemente da variedade
europeia, cujos pronomes oblíquos são efetivamente átonos, “e, portanto, são
normalmente incorporados ao elemento linguístico adjacente, em relação ao qual
funcionam de forma semelhante a sufixos em palavras morfologicamente complexas”
51

(VIEIRA, 2005, p. 1004). Daí o PB ser predominantemente proclítico e, nas locuções


verbais, favorecer a colocação do pronome antes do verbo principal, como afirma
Castilho (2010, p. 484): “enquanto em Portugal se diz tinha-me chamado, no Brasil se
diz e se escreve tinha me chamado” (grifo do autor). Rocha Lima (1999, p. 590)
também afirma que é “sintaxe brasileira a interposição do pronome átono nas locuções
verbais, sem se ligar por hífen ao auxiliar”.
Nesta tese, como analisamos língua escrita, não temos como determinar a
prosódia utilizada em cada dado, ou seja, a prosódia não pode ser um fator de definição
da posição pronominal nesta pesquisa. Desse modo, adotamos como critério para
classificar a colocação pronominal, nas locuções verbais, e diferenciar a ênclise ao
verbo auxiliar da próclise ao principal, o uso do hífen. Assim, a primeira variante ocorre
quando há o uso do hífen ligando o clítico ao verbo auxiliar, e a segunda, quando não há
marca da conexão entre o verbo e o pronome por meio de sinal gráfico.

3.3 Pesquisas sobre a posição do clítico em português

Muitas pesquisas já têm sido desenvolvidas com o objetivo de caracterizar


sociolinguisticamente o fenômeno da cliticização pronominal em português,
especialmente no âmbito da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Podemos citar, por
exemplo, trabalhos recentes como os de Nunes (2009 e 2014), que descreveu a variação
na ordem dos clíticos pronominais em locuções verbais, em PB e PE; e os de Vieira
(2011 e 2016), nas quais analisa a variável em questão na oralidade. Também
destacamos as pesquisas de Petterson (2010), que aborda a colocação pronominal no
gênero cartas de leitor; e Rodrigues (2011), que faz uma análise sociolinguística de
cartas escolares, entre outros. Esta tese, contudo, diferencia-se por analisar o fenômeno
a partir de diferentes gêneros da modalidade escrita culta do PB, com o propósito de
traçar um contínuo estilístico da variação na realização da colocação do clítico, a partir
dos textos investigados. Com relação a essa proposta, cumpre mencionar o projeto que
se desenvolve atualmente na UFRJ, sob a coordenação da professora Silvia Rodrigues
Vieira, intitulado Contínuos de/em variedades do Português: análises contrastivas, o
qual também se baseia na abordagem da norma no modelo de continuum de gêneros.
52

Tal trabalho tem o objetivo de sistematizar diversas regras variáveis em uso no


Português do Brasil, com base em gêneros textuais tomados como expressões de usos
cultos, principalmente dos domínios jornalístico e acadêmico, levando em consideração
os continua oralidade-letramento e fala-escrita (BORTONI-RICARDO, 2044 e 2005;
MARCUSCHI, 2008). O projeto já rendeu a publicação do livro Variação, gêneros
textuais e ensino de Português: da norma culta à norma-padrão, organizado por Vieira
e Lima (2019), no qual se apresentam alguns resultados. Entretanto, esta obra ainda não
aborda o tema da colocação pronominal.
Nesta seção, apresentamos um resumo de duas pesquisas que abordam o
fenômeno da colocação pronominal em língua portuguesa, uma um pouco mais antiga,
de 2002, e outra bem mais recente, de 2016. A primeira é a tese doutoral da professora
Silvia Rodrigues Vieira, cujo título é Colocação pronominal nas variedades europeia,
brasileira e moçambicana: para a definição da natureza do clítico em Português,
defendida na Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. A segunda é também
uma tese de doutorado, fruto de pesquisa realizada na Universidade Estadual Paulista
‘Júlio de Mesquita Filho’ – UNESP – de autoria da pesquisadora Caroline Carnielli
Biazolli.
Vieira (2002) analisou o fenômeno da colocação do pronome átono nas
variedades europeia, brasileira e moçambicana, com base em corpus de língua falada e
escrita. Com relação à ultima modalidade e à variedade brasileira do português, contou
com 201 casos de pronomes adjuntos a verbos simples e 21, com locuções verbais. Seu
corpus constitui-se de textos dos gêneros editoriais, crônicas e artigos de opinião.
Com relação às ocorrências relacionadas a uma só forma verbal, a pesquisa
confirma que tal fenômeno é um fator fortemente diferenciador entre fala e escrita, já
que, nos dados de língua falada, a próclise era quase categórica, ao passo que, nos dados
de língua escrita, observou-se um uso equilibrado das duas variantes. Podemos
sistematizar a distribuição das ocorrências da seguinte maneira, com base nas tabelas
elaboradas pela autora:
53

Tabela 1: Distribuição dos dados com forma verbais simples, da pesquisa de


Vieira (2002), no corpus escrito do PB.
Variante Verbos simples
Frequência Percentual
Próclise 108/201 54%
Ênclise 93/201 46%
Mesóclise 0/201 0%

Concluiu-se que o contexto inicial de oração praticamente impediu a próclise


(houve apenas uma ocorrência de próclise inicial, em artigo de opinião). A variante pré-
verbal, por sua vez, predominou em contextos em que havia alguma partícula atratora
tradicional (84%) e de pronome antecedido de sintagma nominal sujeito (64%). Em
outros contextos, também se registrou a próclise, porém, de maneira menos expressiva.
A linguista também encontrou ocorrências de ênclise em contextos em que a GT
prescreve a próclise, como com presença prévia de palavra negativa, possivelmente,
como forma de hipercorreção. Embora nesta tese não pesquisemos outras variedades do
português que não a brasileira, ainda vale a pena comentar que, na investigação de
Vieira (2002), a mesóclise só apareceu nos dados do português europeu e do português
moçambicano e foram escassos. Tal improdutividade é atribuída pela autora à
preferência pelas perífrases verbais de futuro (ir + infinitivo). Com relação ao critério
de tipo de pronome, a linguista observou que, tanto no corpus oral, quanto no escrito, “o
pronome o/a(s) atua no sentido de favorecer a colocação pós-verbal” (VIEIRA, 2002, p.
163). Os resultados da mencionada pesquisa, relativos aos casos com formas verbais
simples, são assim resumidos pela autora, juntamente com Freire (2014) em outra obra:

Na escrita, tem-se outro sistema de colocação pronominal com forte


condicionamento morfossintático, sensível ao contexto de verbo em posição
inicial, certa atuação das partículas atratoras tradicionais, além do tipo de
clítico. De todo modo, é relevante a diferença da escrita do letrado brasileiro
em relação ao que se propõe na norma gramatical, tendo em vista duas
características que podem ser destacadas: (i) a presença expressiva de
próclise em contextos sem tradicionais atratores, em particular diante de
sujeito; e (ii) a presença, menos expressiva mas não desprezível, de ênclise
em contextos com tradicionais atratores (VIEIRA e FREIRE, 2014, p. 101).

Vieira (2002) também investigou a atuação dos diferentes valores atribuídos ao


pronome se com relação à posição do pronome átono e concluiu que:
54

Quanto ao PB, verifica-se que a partícula apassivadora ocorre com o menor


índice de realização da próclise (42%), seguida do índice de indeterminação
(50%). O <se> reflexivo/inerente apresenta o índice mais alto da variante
pré-verbal (66%), conforme a tendência registrada em outros estudos e
indicada nos comentários sobre a modalidade oral (VIEIRA, 2002, p. 173).

No que diz respeito às construções com locuções verbais, Vieira (2002)


considerou três variantes: posição anterior ao verbo auxiliar (cl V1 V2), posição entre
verbos (V1 cl V2) e posição posterior ao verbo principal (V1 V2 cl). O corpus escrito
utilizado ofereceu um número reduzido de pronomes adjacentes a locuções verbais,
como demonstrado na Tabela 2:

Tabela 2: Distribuição dos dados com locuções verbais, da pesquisa de Vieira


(2002) no corpus escrito do PB.
Variante Locuções verbais
Frequência Percentual
cl V1 V2 6/21 29%
V1 cl V2 11/21 52%
V1 V2 cl 4/21 19%

Vieira (2002, p. 314), constata que há uma preferência, no PB, pela variante
“intra-complexo verbal” (assim como na modalidade oral). A linguista informa que essa
ordem pronominal é “registrada até em contextos com tradicionais operadores de
próclise ou após a forma do futuro do pretérito do indicativo” (VIEIRA, 2002, p. 314).
Essa última situação sugere, segundo a autora, que o pronome posto entre dois verbos
de uma locução se une ao verbo principal e não ao auxiliar, dada a inviabilidade de
ligação do clítico à direita de verbo no futuro e ressalta que a ausência de hífen,
constatada na maioria dos casos, confirma a hipótese. Vieira (2002, p. 314) ainda
comenta uma ocorrência com verbo ser, conjugado no presente, inserido entre os dois
verbos da locução (“Não pode é se repetir”), “antes do pronome, o que assegura que não
se trata, efetivamente, de pronome ligado ao primeiro verbo”. Por outro lado, constatou-
se, no que diz respeito ao tipo de clítico, preferência pela ênclise ao verbo principal com
os pronomes o, a(s).
Biazolli (2016) investiga o fenômeno da posição dos clíticos pronominais em
quatro gêneros textuais jornalísticos – entrevista na TV, noticiário de TV, carta do leitor
55

e editorial – produzidos nos primeiros anos do século XXI, a fim de avaliar a


contribuição do modelo de continua para o entendimento de processos em variação. Os
continua abordados em sua tese são: estilístico, fala/escrita e de gêneros textuais. A
linguista observou o comportamento das variantes do fenômeno, de modo a desenvolver
um estudo descritivo-comparativo entre o português europeu e o português brasileiro.
Biazolli (2016) propôs a hierarquização dos gêneros: “do extremo da fala, de menor
monitoramento e formalidade, ao extremo da escrita, de maior monitoramento e
formalidade” (BIAZOLLI, 2016, p. 313) e sua pesquisa revelou que os resultados da
variedade brasileira se mostraram intimamente ligados às gradações de estilo sugeridas.
De acordo com os resultados obtidos, o PB mostrou um comportamento mais
diferenciado em cada gênero estudado, tanto no que diz respeito às análises de lexias
verbais simples como de lexias verbais complexas, comparativamente ao PE. Sua
pesquisa contou com 922 ocorrências de pronomes ligados ao primeiro tipo de forma
verbal e 201 clíticos atrelados ao segundo tipo, totalizando 1.123 dados do PB.
No que tange aos clíticos ligados a verbos simples, registrou predomínio da
próclise, sobretudo nas entrevistas e nos noticiários, sendo que “nas entrevistas,
apontou-se a generalização da posição pré-verbal, sobreposta, inclusive, a
condicionamentos morfossintáticos” (BIAZOLLI, 2016, p. 316). Nos gêneros escritos,
cartas e editoriais, essa tendência não se verificou em contextos de início de
oração/período, logo, “confirmou-se a interferência de modelos que ditam as normas
idealizadas de colocação” (BIAZOLLI, 2016, p. 317). No corpus escrito também foi
relevante a atuação dos elementos atratores. Segundo a pesquisadora, os proclisadores
não tradicionais4 condicionaram a ênclise, com a ressalva das preposições,
diferentemente do que observou nas entrevistas e nos noticiários, gêneros [+orais].
Outro fator importante foi as diferentes atribuições do pronome se:

...o se inerente/reflexivo se relacionou de modo expressivo ao segundo verbo,


proclítico ou enclítico a ele, já que, comumente, é o verbo que domina o
pronome sintaticamente. Os se apassivador/se indeterminador permaneceram
mais cliticizados ao primeiro verbo. (BIAZOLLI, 2016, p. 317).

Nas cartas, Biazolli (2016) constatou que o tipo de clítico também é uma
variável que interfere de maneira relevante no posicionamento do clítico,

4
A autora considera proclisadores não tradicionais: “SNs sujeitos, SPreps, preposições/locuções
prepositivas, conjunções coordenativas e certos advérbios/locuções adverbiais (aqueles considerados não
canônicos ou terminados em –mente)” (BIAZOLLI, 2016, p. 89).
56

desfavorecendo a próclise, nos casos de pronomes acusativo e dativo de terceira pessoa.


Além disso, a não adjacência entre proclisador e grupo verbo-clítico e formas infinitivas
também atuaram nesse sentido. Com relação aos editoriais, mostraram-se importantes
os grupos função do clítico e forma verbal do hospedeiro: “a função argumental e
formas verbais gerundivas e infinitivas motivaram a colocação do pronome à direita do
verbo” (BIAZOLLI, 2016, p. 317).
No que diz respeito às formas verbais compostas, a pesquisa de Biazolli (2016)
revelou que são significativos na variação do fenômeno os grupos de fatores “tipo de
elemento (proclisador) que antecede o grupo cl V1 V2 ou V1(-)cl V2 ou V1 V2-cl, tipo
de clítico, função do clítico e forma do segundo verbo” (BIAZOLLI, 2016, p. 317). Na
amostra de gêneros escritos, somente o clítico acusativo de terceira pessoa não
favoreceu a posição intra-CV. Outra variável que atuou nesse sentido foi a presença de
proclisadores tradicionais antes do verbo, os quais favoreceram a próclise ao verbo
auxiliar. Também contribuíram à adjacência dos clíticos ao primeiro verbo as
construções com o segundo verbo no gerúndio ou no particípio.
Como se pode notar, há um grande avanço no que tange à caracterização da
colocação pronominal, em PB. De maneira geral, muitos especialistas reconhecem que
já se tem avançado bastante no sentido de promover a sistematização das regras
variáveis em uso no PB. Diversos livros brasileiros apresentam análises e estudos
sociolinguísticos sobre vários fenômenos do PB, tanto no aspecto fonético-fonológico
quanto no morfossintático, de diferentes variedades brasileiras, das mais populares às
mais cultas. Entretanto, a descrição das variáveis a partir da correlação entre gênero
textual e grau de formalidade, baseada na noção de contínuos proposta por Bortoni-
Ricardo (2004 e 2005) constitui relevante frente de trabalho a ser perseguida por
pesquisadores de todo o país, segundo Vieira e Lima (2019, p. 6), ponto de vista que
esposamos. Esperamos que este trabalho possa contribuir para aplacar tal carência.
57

4 Metodologia
Este estudo fundamentou-se em um corpus formado por textos escritos dos
gêneros reportagem de revista, artigos acadêmicos (de pós-graduação de vários cursos e
áreas, da Universidade Federal do Rio de Janeiro), editais de concursos e crônicas,
selecionados entre 2018 e 2019 e encontrados em suportes da internet e da imprensa
brasileira. Vale lembrar que todos os textos possuem publicação relativamente recente,
conforme se detalhou na descrição do corpus.
Quanto à análise dos dados, utilizamos as metodologias quantitativa e
qualitativa. A principal diferença existente entre as duas metodologias é o fato de a
quantitativa empregar métodos estatísticos, enquanto a qualitativa não o faz. Segundo
Bortoni-Ricardo (2008), a investigação construída sob a ótica quantitativa deriva do
positivismo, ao passo que a pesquisa constituída de acordo com o paradigma
qualitativo, provém do interpretativismo. Na metodologia quantitativa, as descobertas se
dão por meio da observação empírica e as regras são apreendidas pela observação das
regularidades (BORTONI-RICARDO, 2008, p. 14). Por sua vez, o paradigma
qualitativo “procura entender; interpretar fenômenos sociais inseridos em um contexto”
(BORTONI-RICARDO, 2008, p. 34).
Desse modo, podemos classificar nossa pesquisa como quantitativa, pois foi
realizado o tratamento estatístico dos dados, a partir da aferição de tendências apontadas
pelo programa computacional Goldvarb 2001; mas também qualitativa, já que
analisamos e interpretamos os resultados obtidos. Objetivamos, conforme sugerem
Vieira e Freire (2014, p. 100 - 101), “proceder a uma apuração quantitativa e qualitativa
detalhada do fenômeno por gênero textual, por contexto morfossintático e por tipo de
clítico”.
O Goldvarb 2001, ferramenta escolhida para análise dos dados, fornece
resultados numéricos com relação aos fatores selecionados como possíveis
influenciadores do fenômeno. Um desses números é o peso relativo, que aponta o efeito
de cada fator sobre o uso da variante investigada. Esse valor é mensurado entre 0 e 1,
de modo que 0 significa que a variante em questão não ocorre na presença do fator e 1
indica que ela sempre ocorre. Está relacionado ao nível geral de uso da variante, o input.
Segundo Scherre e Naro (2015, p. 165): “o input funciona como um ponto de referência
para o fenômeno variável, e o efeito de cada fator pode ser interpretado como uma
medida do desvio deste ponto de referência associado ao fator”.
58

4.1 O corpus

O corpus desta investigação é constituído por textos dos gêneros: crônica


jornalística, reportagem de revistas de informação, artigo científico de programas de
pós-graduação e edital de abertura de concurso público. Todos os textos foram
publicados no presente século, isto é, a partir dos anos 2000, conforme descrito mais
adiante. Nossa intenção foi selecionar gêneros diversificados e atuais, com o intuito de
traçar um contínuo das normas de uso atuais, todas no âmbito das variedades cultas,
relacionadas ao fenômeno aqui estudado, de modo a responder à questão problema
proposta nesta pesquisa. Dessa maneira, pareceu-nos que os gêneros escolhidos
cumpriram bem esse papel, visto que possuem graus de formalidade diferentes e
crescentes. A variação estilística dos gêneros é considerada da seguinte maneira, do
mais informal ao mais formal:

Crônica Reportagem Artigo Edital

Todos os gêneros correspondem à modalidade escrita da língua, como já


afirmamos, e também ao meio gráfico, contudo, correspondem a domínios diferentes,
nos termos de Marcuschi (2001), levando em consideração o postulado de concepção.
Os dois primeiros correspondem a domínios mistos, em função de fatores como, por
exemplo, o uso do discurso direto. Encontramos, nas crônicas, falas de personagens, que
são uma representação da oralidade; e, nas reportagens, trechos de entrevistas, respostas
dadas originalmente de forma oral, pelos entrevistados e, depois, redigidas. Já os dois
últimos gêneros são mais prototípicos da escrita, por não possuírem as características
anteriores. Além disso, para avaliar o grau de formalidade dos textos, leva-se em
consideração o possível público-leitor e os objetivos (entreter, retratar a realidade,
informar, divulgar resultados científicos, descrever/detalhar um processo) de cada
gênero. Também foi um critério, para tal classificação, avaliar o posicionamento do
escritor (+/- subjetivo, +/- objetivo) com relação ao seu texto, considerando que quanto
mais objetivo mais formal é o texto.
Do gênero crônica, selecionamos, para análise, 27 textos, 9 de cada um dos 3
autores escolhidos. Os cronistas foram eleitos por seu prestígio no meio literário e
59

jornalístico, tendo em vista que atuam ou atuaram em renomados periódicos brasileiros,


além de serem ganhadores de prêmios de Literatura. São eles:
1) Fabrício Carpinejar: nasceu em Caxias do Sul, RS, em 23 de outubro de
1972; é poeta, cronista, jornalista e professor universitário, autor de trinta e
quatro livros. Atua como comentarista do programa Encontro com Fátima
Bernardes, da Rede Globo, e como colunista dos jornais Zero Hora e O
Globo. Ganhou o prêmio Jabuti de Literatura, em 2009.
2) Mário Prata: nasceu em Uberaba, MG, em 11 de fevereiro de 1946; é um
escritor, dramaturgo, cronista e jornalista brasileiro, autor de telenovelas e
peças teatrais de sucesso, como por exemplo, a novela Estúpido Cupido.
Suas crônicas já foram publicadas em vários jornais e revistas, como O
Pasquim, Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Istoé, Época e Última
Hora.
3) Martha Medeiros: nasceu em Porto Alegre, RS, em 20 de agosto de 1961 e é
formada em Comunicação Social. Publicou vários livros, inicialmente, de
poesias e, posteriormente, de crônicas. Ganhou três vezes o Prêmio
Açorianos de Literatura, sendo o último em 2018. Suas obras já foram
publicadas em vários países. É colunista dos jornais Zero Hora e O Globo,
além de colaborar para outras publicações.

Do gênero reportagem de revista, foram selecionados 6 textos de revistas de


informação, de grande circulação nacional, Época, Exame, Istoé e Superinteressante,
publicados em edições digitais, entre agosto de 2018 e janeiro de 2019.
Do gênero artigo científico, compõem o corpus 4 textos, um de cada periódico,
os quais são vinculados a programas de pós-graduação nas áreas de Letras, Medicina,
Geociências e Contabilidade, da UFRJ. Estes textos foram publicados entre 2017 e
2018. A escolha de tal universidade se deve ao fato de ser, no estado do Rio de Janeiro,
uma das que mais se destacam, além de ter ficado em sexto lugar no ranking das
melhores do país, segundo dados do Inep.5
Do gênero edital de abertura de concursos, analisamos 5 editais publicados entre
2017 e 2018: 1) do Instituto Federal Fluminense, concurso para seleção de corpo

5
Informação retirada do site da revista Exame (18/12/2018), disponível em:
https://exame.abril.com.br/carreira/as-melhores-faculdades-e-universidades-do-brasil-segundo-o-mec-2/.
Acesso em: 20/02/2019.
60

docente efetivo; 2) da Câmara Municipal de Goiânia, concurso para o provimento do


quadro permanente e formação de cadastro de reserva; 3) da Prefeitura Municipal de
Blumenau, concurso para preenchimento de vagas temporárias da Secretaria Municipal
de Educação; 4) da Universidade Federal do Oeste da Bahia, concurso para provimento
de quadro de pessoal permanente; e 5) da Agência de Defesa Agropecuária e Florestal
do Estado do Amazonas – ADAF – concurso para compor o quadro de pessoal
permanente da agência. Buscamos escolher editais de concursos de áreas e abrangências
diferentes.
Embora discrepante, a quantidade diferente de textos de cada gênero se explica
pelo fato de que, numa pesquisa sociolingúistica, o que importa é o número de
ocorrências do fenômeno estudado. Então, de alguns gêneros selecionamos poucos
textos, por apresentarem número relevante de ocorrências, ao passo que em outros
gêneros encontramos menos clíticos e, por isso, foi necessário consultar um número
maior de textos. A título de contextualização, as crônicas analisadas são constituídas de
cerca de uma página; as reportagens contêm em torno de 5 páginas; os artigos possuem
mais ou menos 15 páginas; e os editais têm uma média de 40 páginas 6. Assim, fica claro
que a assimetria é apenas aparente.
A fim de facilitar a citação dos textos, nós os numeramos de acordo com o
gênero. Primeiramente, do gênero crônica, a numeração é feita por autor, como segue.

1) De Fabrício Carpinejar:

As crônicas analisadas neste trabalho estão disponíveis em seu blog


(http://carpinejar.blogspot.com) e foram publicadas originalmente nos jornais Zero
Hora e O Globo, além do portal UOL, entre novembro de 2013 e junho de 2018. Os
títulos das crônicas são os seguintes:

Crônica 1: Não existe dia ruim


Crônica 2: A invisibilidade da limpeza
Crônica 3: O umbigo no celular
Crônica 4: O quanto amo minha filha para entender sua implicância
Crônica 5: O cheiro da mãe

6
Ver Anexo.
61

Crônica 6: O rosto desaparecido


Crônica 7: O menino dono da bola
Crônica 8: Beijo diário de despedida
Crônica 9: A vida não mais nos pertence.

2) Mário Prata:

Os textos selecionados para esta pesquisa se encontram em seu site


(https://marioprata.net/cronicas) e foram publicados originalmente em jornais e revistas,
como O Estado de S. Paulo, Época e Vogue, entre janeiro de 2002 e maio de 2007. Os
títulos das crônicas são os seguintes:

Crônica 10: Espirrando a crônica


Crônica 11: Perfume de gardênia
Crônica 12: O cravo
Crônica 13: Bêbado: o amador e o profissional
Crônica 14: A mulher de oitenta
Crônica 15: A mulher que fuma
Crônica 16: A mulher de quarenta
Crônica 17: Chico Buarque em Paris
Crônica 18: Os corruptos brasileiros ficaram indignados.

3) Martha Medeiros:

As crônicas aqui analisadas estão em seu livro Coisas da vida, lançado pela
L&PM, com edição em 2005, mas foram publicadas originalmente nos jornais Zero
Hora e O Globo, entre setembro de 2003 e setembro de 2005. Os títulos das crônicas
são os seguintes:

Crônica 19: Todo o resto


Crônica 20: A interferência do tempo
Crônica 21: Melhorar para pior
Crônica 22: Apaixonados
Crônica 23: Prós e contras da ponderação
62

Crônica 24: Perder a viagem


Crônica 25: Os lúcidos
Crônica 26: Fugir de casa
Crônica 27: A morte por trás de tudo.

Em segundo lugar, apresentamos os títulos e as informações relativas aos textos


do gênero reportagem de revista.

Reportagem 1: Marina Silva, a candidata invisível: os desafios de uma campanha sem


dinheiro, sem tempo de TV e sem alianças – Época, 03/08/2018, por Aline Ribeiro.
Reportagem 2: Grupo de escolas de elite divulga carta crítica ao ministro da
Educação – Exame, 07/01/2019, por Clara Cerioni.
Reportagem 3: Até onde vai o choque cultural – Isto é, 03/01/2019, por Cilene Pereira.
Reportagem 4: Os riscos da mitificação – Isto é, 03/01/2019, por Antônio Carlos
Prado.
Reportagem 5: Sonda chinesa faz o primeiro pouso no lado “escuro” da Lua –
Superinteressante, 03/01/2019, por Bruno Vaiano.
Reportagem 6: A crônica dos últimos dias do Ministério do Trabalho, criado por
Vargas há 88 anos e extinto por Bolsonaro – Época, 06/01/2019, por Natália Portinari.

Quatro artigos publicados em revistas científicas, vinculadas à Universidade


Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, compõem o corpus deste trabalho. Os trabalhos e
periódicos são das áreas de Letras, Medicina, Geociências e Contabilidade e estão
listados a seguir:

Artigo 1: Da solidão do deserto ao caos das trevas exteriores: ascese e invenção em


Paulo Leminski.
Autor: Everton de Oliveira Moraes
Revista: Alea: Estudos Neolatinos – organizada pelo Programa de Pós-Graduação em
Letras Neolatinas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) – v.20, n. 2
(2018). Visa à divulgação de trabalhos de pesquisa originais provenientes das diversas
áreas de produção de conhecimento relacionadas com as Letras Neolatinas. Avaliada
63

pela CAPES com Qualis A1, nas versões impressa e online, e indexada em SciELO,
Scopus, Thomson Reuters e outras bases regionais como Latindex e Redalyc.

Artigo 2: Impacto da estimulação cerebral profunda na qualidade de vida e humor em


pacientes com doença de Parkinson.
Autores: Gabriel Kledeglau Jahchan Alves, Lorena Broseghini Barcelos, Vanderci
Borges, Ricardo Silva Centeno, Henrique Ballalai Ferraz e Murilo Martinez Marinho.
Revista: Revista Brasileira de Neurologia − do Instituto de Neurologia (INDC-UFRJ)
em associação com a Associação de Neurologia do Rio de Janeiro (ANERJ) – v. 54 n.
1, 2018. De periodicidade trimestral, publica artigos técnico-científicos originais, de
revisão, notas históricas, relatos de casos, imagens e opiniões. Apresenta divulgação
on-line pelo LILACS EXPRESS e utiliza o sistema de arquivamento LOCKSS.

Artigo 3: Identificação e descrição das primeiras ferramentas de controle contábil


através da Ciberarqueologia.
Autores: Paulo Schmidt e José Luiz dos Santos.
Revista: Sociedade, Contabilidade e Gestão, revista eletrônica quadrimestral do
Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis – v. 13, n. 1 (2018). Recebe artigos
na área de auditoria, perícia contábil, contabilidade financeira, contabilidade gerencial,
contabilidade ambiental, relatórios sociais, marketing, finanças, estratégia,
organizações, logística, gestão de pessoas, gestão da informação, gestão de inovação e
tecnologia e áreas congêneres. Atualmente, é indexada no DOAJ, no SPELL, no
EBSCOhost e no Google Acadêmico. Sua qualificação mais atual no qualis periódicos
da CAPES é B2.

Artigo 4: Avaliação dos Modelos HEC-RAS e GRASS na Identificação de Áreas


Vulneráveis a Inundações em Áreas Urbanas.
Autores: Patrícia Antunes dos Reis e Marcio Augusto Reolon Schmidt
Revista: O Anuário do Instituto de Geociências divulga as atividades educacionais e
científicas nos diferentes ramos das Ciências da Terra, tais como questões ambientais,
antropológicas, geomorfológicas, geológicas, paleontológicas e meteorológicas; de
professores, pesquisadores e discentes de graduação e pós-graduação do Instituto de
Geociências da universidade. v. 40 n. 1 (2017).
64

Analisamos 5 editais publicados entre 2017 e 2018. Os documentos são os


seguintes:

Edital 1: Instituto Federal Fluminense – Edital n.º 235, de 28 de dezembro de 2017 –


Concurso Público para Provimento de Cargos da Carreira de Professor do Ensino
Básico, Técnico e Tecnológico.

Edital 2: Câmara Municipal de Goiânia - Edital n.º 01/2018 – Concurso Público para o
provimento do quadro permanente e a formação de Cadastro de Reserva.

Edital 3: Prefeitura Municipal de Blumenau – Edital n.º 001/2018 – Concurso Público


para preenchimento de vagas temporárias para o quadro de pessoal da Secretaria
Municipal de Educação.

Edital 4: Universidade Federal do Oeste da Bahia – UFOB – Edital n.º 38/2018 -


Concurso Público para provimento de cargo do Quadro Permanente de Pessoal Técnico
Administrativo.

Edital 5: Agência de Defesa Agropecuária e Florestal do Estado do Amazonas – ADAF


– Edital de abertura n.º 01/2018 – Concurso Público para compor o quadro de pessoal
permanente da agência.

4.2 Procedimentos de análise de dados

Em primeiro lugar, é necessário destacar que foram consideradas separadamente


as ocorrências com verbos simples e as com locuções verbais, a fim de viabilizar a
análise quantitativa. A separação dos dados se deve ao fato de a colocação pronominal
nos casos de verbos simples e de locuções verbais ser condicionada por variáveis
distintas, além de não possuírem igual quantidade de variantes, sendo impossível, assim,
estabelecer os mesmos grupos de fatores para o tratamento das duas estruturas.
Empreenderam-se, em ambos os casos, dois níveis de análise. Primeiramente, rodamos
todos dados, com todas suas variantes e as variáveis controladas.
65

As variantes linguísticas do fenômeno estudado são as posições que o clítico


pode ocupar com relação ao verbo. Nos casos de pronomes atrelados a formas verbais
simples, são três variantes: pré-verbal, intraverbal ou pós-verbal, exemplificadas abaixo:
Próclise: “E eu que te considerava um profissional…” [Crônica 13]
Ênclise: “Imagino-me caminhando lentamente,...” [Crônica 2]
Mesóclise: “Admitir-se-á um único recurso por questão.” (Edital 4)
Com o propósito de verificar se os usos corresponderiam ao que é estabelecido
pela norma-padrão e levando em consideração os resultados de estudos anteriores sobre
o tema da colocação pronominal, selecionamos os seguintes grupos e variáveis:

1) Gênero textual
 Crônica
 Reportagem
 Artigo
 Edital

2) Categoria pronominal
 Objeto direto
 Objeto indireto
 Pronome apassivador
 Parte integrante do verbo ou pronome inerente
 Índice de indeterminação do sujeito
 Complemento nominal
 Sujeito

3) Forma pronominal
 Me
 Te
 Se
 Lhe/lhes
 O/a/lo/la (s)
 Nos
66

4) Tempo/forma verbal
 Presente
 Pretérito
 Futuro
 Forma nominal
 Imperativo

5) Contexto morfossintático
 Início absoluto de período
 Início de oração em período
 Oração reduzida de infinitivo
 Oração reduzida de gerúndio
 Oração subordinada desenvolvida
 Oração coordenada sindética aditiva, alternativa e adversativa
 Início de item
 Presença de palavra negativa
 Presença de advérbio
 Presença de pronome interrogativo ou indefinido
 Gerúndio precedido de preposição em
 Ausência de elemento condicionador de próclise (atrator).

Portanto, controlamos, no primeiro nível de análise, a influência de quatro


fatores de ordem linguística – categoria pronominal, forma pronominal, tempo/forma
verbal e contexto morfossintático – e um fator de ordem extralinguística, qual seja, o
gênero dos textos que constituem o corpus. O programa computacional Goldvarb 2001
forneceu os percentuais de ocorrência de cada posição pronominal relacionado aos
fatores.
Já apresentamos, na seção anterior, os textos escolhidos para a análise e
comentamos os motivos que nos levaram a eleição dos gêneros que compõem o corpus
desta investigação, bem como os caracterizamos na seção 2.4. Escolhemos gêneros de
diferentes níveis de formalidade, a fim de testar nossa suposição de que as opções pelas
posições pronominais variariam bastante em função do gênero, de acordo com o grau de
formalidade de cada um, tendendo a uma menor observância dos preceitos da norma
67

padrão nos gêneros mais informais, tendo em vista os fatores explicitados na seção
anterior (caráter descontraído, presença de discurso direto, maior subjetividade, público
leitor etc).
Com relação ao segundo grupo de fatores, optamos por reunir, num mesmo
grupo, classificações relacionadas a funções sintáticas exercidas pelos clíticos e
designações morfológicas, tendo em vista a improdutividade da separação de tais
variáveis, considerando o número reduzido de certas categorias. O grupo Categoria
Pronominal ficou, então, formado pelos fatores:
Objeto direto: “...que a constituem secretamente,...” [Artigo 1]
Objeto indireto: “...que uma boa samaritana me fez...” [Crônica 10]
Pronome apassivador: “Recomenda-se avaliações em diferentes tempos...” [Artigo 4]
Parte integrante do verbo ou pronome inerente: “Me lembro quando era garoto...”
[Crônica 10]
Índice de indeterminação do sujeito: “...proibindo terminantemente que se escrevesse
no...” [Crônica 10]
Complemento nominal: “...que nos são sagrados...” [Crônica 23]

O controle dessa variável se baseia na hipótese de que estruturas com pronome


se indeterminador do sujeito e apassivador condicionariam o uso da ênclise, ao contrário
de outras funções pronominais.
O terceiro grupo de fatores, Forma Pronominal, foi constituído com base no
pressuposto de que os clíticos acusativos de terceira pessoa (o e flexões), forma
pronominal foneticamente rara (considerando sua estrutura silábica V ou VC, no plural,
em oposição aos outros clíticos que possuem o padrão CV ou CVC), favoreceria o uso
da variante pós-verbal, conforme apontam estudos sociolinguísticos como o de Vieira
(2002). Já o grupo Tempo/forma verbal foi controlado, sob a hipótese de que o futuro
(do pretérito e do presente do Indicativo) seria o único tempo verbal que condicionaria o
uso de mesóclise.
As hipóteses que nos levaram a compor o grupo Contexto Morfossintático estão
relacionadas à verificação da obediência às regras da norma padrão quanto à colocação
pronominal, nos textos analisados. Assim, controlamos a influência dessa variável, a
fim de verificar o condicionamento dos elementos considerados atratores no uso da
próclise. Outra hipótese investigada foi a de que contextos de orações reduzidas
68

influiriam no uso da variante pós-verbal. Além disso, investigamos se os contextos de


início de oração e período proporcionariam o uso da ênclise.
Designamos como Início de item, os contextos de orações subordinadas
adverbiais desenvolvidas, coordenadas entre si, em que os verbos se encontram
conjugados no futuro do subjuntivo e as orações do período complexo aparecem
distribuídas em tópicos como no exemplo a seguir:
“Será eliminado do concurso o candidato que:
c) ausentar-se do recinto de qualquer prova ou atividade sem a devida permissão;
h) recusar-se a retirar os óculos escuros ou quaisquer acessórios de chapelaria, tais
como chapéu, boné, gorro etc. ou outros objetos similares;” [Edital 2]

Já o fator Ausência de elemento condicionador de próclise corresponde aos


contextos que não constituem início de período ou oração e em que não há nenhum
elemento atrator do pronome, ou seja, contextos de sujeito explícito seguido de verbo na
voz ativa. Como exemplo desse tipo de frase, podemos citar:
“A participação no Processo Seletivo iniciar-se-á pela inscrição do candidato.” (Edital
3)
“O poeta assume-se como...” [Artigo 1]
“Minha filha me deixa...” [Crônica 4]
“Nossa longa e ampla experiência na escola nos impele...” [Reportagem 2]

Ainda é necessário esclarecer que consideramos apenas as orações coordenadas


sindéticas aditiva, alternativa e adversativa, nesse grupo de fatores, porque não
registramos presença de pronome átono com verbos simples em contextos de orações
coordenadas sindéticas explicativas e conclusivas.
Em se tratando de formas verbais locucionais, a variável dependente se constitui
de quatro variantes: próclise ao verbo principal7, ênclise ao verbo principal, próclise ao
auxiliar e ênclise ao auxiliar. Os grupos de fatores controlados para a análise dos dados
contam com duas variáveis a mais que aqueles propostos para os casos de formas
verbais simples: forma do verbo principal e interposição de preposição ou outro
elemento entre os verbos da locução. Os grupos são os seguintes:

7
Quanto ao critério adotado para classificar a posição do pronome como próclise ao principal ou ênclise
ao auxiliar, ver capítulo 3 desta tese.
69

1) Gênero textual
 Crônica
 Reportagem
 Artigo
 Edital

2) Categoria pronominal
 Objeto direto
 Objeto indireto
 Pronome apassivador
 Parte integrante do verbo ou pronome inerente
 Índice de indeterminação do sujeito

3) Forma pronominal
 Me
 Se
 Lhe (s)
 O/a/lo/la (s)
 Nos

4) Tempo/forma verbal do verbo auxiliar


 Presente
 Pretérito
 Futuro
 Formal nominal

5) Forma do verbo principal


 Infinitivo
 Gerúndio
 Particípio

6) Contexto morfossintático
 Início absoluto de período
70

 Início de oração em período


 Oração reduzida de infinitivo
 Oração reduzida de gerúndio
 Oração subordinada desenvolvida
 Oração coordenada sindética adversativa e aditiva
 Presença de palavra negativa
 Presença de advérbio
 Ausência de elemento condicionador de próclise (atrator).

7) Interposição de preposição ou outro elemento entre os verbos da locução


 Sim
 Não.

A hipótese inicial que motivou a escolha da variável Gênero textual foi a de que
em gêneros mais informais a opção preferencial seria pela próclise ao verbo principal,
tendo em vista que essa é a tendência do PB apontada pelos gramáticos mencionados no
capítulo 3 desta tese (AZEREDO, 2010 e CASTILHO, 2010). Esperávamos também
que tal variante fosse bastante recorrente inclusive nos textos mais formais.
Com relação à variável Categoria pronominal, nossa hipótese se baseava nas
observações de Azeredo (2010). Por exemplo, diz o gramático que “se o pronome se,
quer na função indeterminadora do sujeito, quer no papel de pronome apassivador, vem
integrado numa sequência de verbo finito + forma verbal no infinitivo, gerúndio ou
particípio, é ao redor do verbo finito que o pronome se coloca preferencialmente, ora
proclítico ora enclítico” (AZEREDO, 2010, p. 263).
O terceiro grupo de fatores corresponde à forma do pronome que acompanha as
locuções verbais. Essa variável se faz importante na investigação da influência que a
substância fônica do pronome pode exercer no condicionamento da colocação
pronominal, especialmente no que diz respeito ao pronome acusativo de terceira pessoa,
que possui uma estrutura silábica fora do padrão, como já comentamos na seção 4.1.
Destacamos a hipótese de Vieira (2002) sobre o assunto:
Ressalte-se, apenas, que a sugestão de que a constituição silábica do clítico
de 3a pessoa (do tipo V), inviabilizaria determinadas posições se reveste de
fundamental importância no caso dos complexos verbais – em que a vogal do
pronome pode aglutinar-se a outros segmentos sonoros do complexo, como
por exemplo em <comecei a o observar>. (VIEIRA, 2002, p. 252).
71

Monitoramos a variável Tempo/forma verbal do verbo auxiliar, com a suposição


de que o único tempo verbal que implicaria um comportamento diferenciado dos
pronomes seria o futuro (do presente e do pretérito do Indicativo), no sentido de impedir
a variante pós-forma finita no verbo. A segunda hipótese aventada foi a de que formas
nominais favoreceriam o uso da variante enclítica ao verbo auxiliar.
A hipótese que nos levou a considerar a variável Forma do verbo principal
relevante para o tratamento do fenômeno em questão foi a de que a forma infinitiva
favoreceria a variante pós-locucional.
O grupo de fatores Contexto morfossintático se justifica pelo intuito de verificar:
i) a influência dos elementos proclisadores na colocação pronominal com verbos
locucionais e ii) a relevância dos contextos de início de período e oração, no sentido de
inibir a posição inicial do pronome.
Também controlamos a presença de elemento entre os verbos que formam a
locução, a fim de verificar sua interferência no condicionamento da colocação
pronominal. Vejamos alguns exemplos de locuções verbais com preposição
interveniente:

Próclise ao auxiliar: “...para que se aprenda a viver.” [Artigo 1]

Próclise ao principal: “...com os olhos dos lábios, não deixaremos de nos procurar...”
[Crônica 8]; “Os dois demoraram a se conhecer...” [Reportagem 1]

Ênclise ao principal: “...e que, no caso de vir a exercê-lo,...” [Edital 3]; “...sem saber
por que continuei a encará-lo.” [Crônica 17]

O segundo nível de análise é a rodada em que se obtém a ponderação estatística


dos dados. Para realizá-la, deve-se escolher apenas duas variantes da variável
dependente, pois o Goldvarb só gera os pesos relativos em rodadas binárias. Também é
preciso optar por uma delas como valor de aplicação. Além disso, faz-se necessário
descartar ou reagrupar os fatores que apresentam baixo número de dados ou regra
categórica, isto é, 0 ou 100% de ocorrências, uma vez que “o instrumental quantitativo
que produz pesos relativos é apropriado exclusivamente para fenômenos linguísticos
72

variáveis” (SCHERRE e NARO, 2015, p. 152). Todos esses procedimentos são


exigências do programa.
Empreendidas as mudanças e realizada a rodada, o Goldvarb gera os pesos
relativos e seleciona os fatores que são mais relevantes para o fenômeno. O peso
relativo é uma medida que estima “o efeito comparativo de cada fator em relação à
primeira variante especificada na rodada” (SCHERRE e NARO, 2015, p. 164). Quando
esse número está abaixo de 0,50 é considerado desfavorecedor da variante. Também, na
rodada de ponderação estatística, o programa seleciona alguns fatores como mais
relevantes ao fenômeno. Desse modo, apresentamos, nas seções correspondentes,
apenas a análise de tais variáveis, com as devidas alterações necessárias, conforme
estabelecem os requisitos do programa utilizado.
73

5 Análise do corpus

O corpus desta pesquisa é constituído de textos escritos de quatro gêneros: 27


crônicas jornalísticas, 6 reportagens de revista, 4 artigos científicos e 5 editais de
abertura de concurso público. Não obstante seja assimétrico o total de textos de cada
gênero, esses números – reiteramos – se justificam pela quantidade de pronomes
oblíquos átonos encontrados, que é o dado mais relevante em uma pesquisa
sociolinguística.
A análise apresentada a seguir conta com um total de 742 pronomes oblíquos
átonos. O quantitativo de ocorrências em cada gênero é o seguinte:
1) artigo científico: 135
2) crônica: 178
3) edital: 225
4) reportagem: 74

Como informamos, foram consideradas separadamente as ocorrências com


verbos simples, que totalizam 612 dados, e as com locuções verbais, que somam 130
pronomes. Há, portanto, uma predominância geral do uso de clíticos com as formas
verbais simples em relação às compostas, o primeiro grupo com 82% das ocorrências e
o segundo, com 18%, considerada a totalidade dos gêneros, como mostra a
representação gráfica a seguir:

Gráfico 1: Formas verbais com clíticos em todo o corpus

18% formas verbais simples


locuções verbais
82%

Formas simples x Locuções verbais


74

5.1 Formas verbais simples

Nas 612 ocorrências de pronomes adjacentes a formas verbais simples,


constatou-se uma tendência generalizada à próclise (67%), e um uso significativo da
ênclise (31%); a mesóclise, como previsto, é de uso escasso (2%), aparecendo apenas no
gênero edital de concurso público. Tais dados podem ser assim representados:

Gráfico 2: Posição do pronome com formas verbais simples

2% Próclise

31% Ênclise

67% Mesóclise

5.1.1 Análise inicial

A Tabela 3, a seguir, demonstra a distribuição dos dados em relação a cada uma


das variantes, com seus respectivos percentuais de uso, na primeira rodada.

Tabela 3: Posição pronominal com verbos simples por gênero textual

Gênero Próclise Ênclise Mesóclise Total

Nº de % Nº de % Nº de %
dados dados dados
Artigo 81 60% 54 40% 0 0 135 (22%)
Crônica 158 89% 20 11% 0 0 178 (29%)
Edital 111 49% 101 45% 13 6% 225 (37%)
Reportagem 57 77% 17 23% 0 0 74 (12%)
Total 407 67% 192 31% 13 2% 612
75

A partir dos dados da Tabela 1, é possível comprovar que a próclise (67%) é a


posição mais usada em toda a amostra, que contém 612 ocorrências. Em segundo lugar,
está a ênclise (31%), e a mesóclise somente é utilizada no gênero edital de abertura de
concurso, com 13 dados (2%), os quais apresentamos a seguir.
Exemplo 1: “A comprovação dos requisitos mínimos pelo candidato dar-se-á no
momento...” (Edital 1)
Exemplo 2: “...subitem, considerar-se-á que o candidato tenha atingido...” (Edital 1)
Exemplo 3: “Facultar-se-á ao candidato dirigir-se...” (Edital 1)
Exemplo 4: “... da nomeação, prosseguir-se-á a convocação dos candidatos...” (Edital
2)
Exemplo 5: “A participação no Processo Seletivo iniciar-se-á pela inscrição do
candidato...” (Edital 3)
Exemplo 6: “A apresentação dos Títulos far-se-á da seguinte forma...” (Edital 3)
Exemplo 7: “Admitir-se-á um único recurso por candidato.” (Edital 4)
Exemplo 8: “Admitir-se-á um único recurso por questão.” (Edital 4)
Exemplo 9: “...pertencerão ao regime jurídico estatutário, e reger-se-ão pelas
disposições da Lei...” (Edital 5)
Exemplo 10: “5.1.4 Aplicar-se-á o disposto no Decreto nº 83.936...” (Edital 5)
Exemplo 11: “5.9.7 Aplicar-se-á o disposto no Decreto nº 83.936...” (Edital 5)
Exemplo 12: “Admitir-se-á um único recurso por candidato.” (Edital 5)
Exemplo 13: “Admitir-se-á um único recurso por questão.” (Edital 5)

Como se pode verificar, há repetição de algumas frases nos editais, característica


desse gênero que prima pela exposição exaustiva de informações e explicação
minuciosa das características do concurso a que se refere, a fim de que o texto tenha o
máximo de clareza e assim se evitem processos judiciais por parte dos participantes do
processo seletivo. Todos os verbos que acompanham os pronomes estão conjugados no
futuro do presente do Indicativo. Destaca-se também o fato de grande parte dos casos
ocorrer em início absoluto de período. Tais circunstâncias demonstram uma
conformação desse gênero com os preceitos da tradição gramatical. Outros aspectos
desses dados serão comentados mais adiante.
Comparando-se as ocorrências dos clíticos em cada gênero, percebemos que a
próclise é de uso predominante em todos os gêneros textuais escritos estudados, com
uma porcentagem maior nos gêneros mais informais, ao passo que a posição enclítica é
76

mais usada nos textos escritos mais formais, conforme foi previsto em nossas hipóteses.
Os dados de próclise têm percentuais decrescentes, segundo o grau de formalidade:
crônica (89%), reportagem (77%), artigo (60%), e edital (49%). Por outro lado, a ênclise
apresenta resultados crescentes: crônica (11%), reportagem (23%), artigo (40%), e
edital (45%). Portanto, nos gêneros mais informais, crônica e reportagem, a próclise é
de uso predominante. Já nos gêneros mais formais, edital e artigo, a ênclise apresenta
uma porcentagem relevante. Desse modo, é possível propor um contínuo de
apresentação das ocorrências das variantes aqui analisadas, de acordo com o grau de
formalidade dos gêneros textuais, como mostra a Figura 1.

Figura 2: Continuum de posição pronominal, segundo o grau de formalidade dos


gêneros textuais

-formal __________________________________________________________ +formal

+Próclise +Ênclise Algumas mesóclises

Crônica Reportagem Artigo Edital

Em resumo, quanto [-formal] o texto, maior a prevalência da variante pré-verbal


sobre a pós-verbal e, quanto [+formal], mais equilíbrio no uso de ambas as posições.
Em outras palavras, nos gêneros mais formais, a próclise continua predominando,
porém, percebe-se um nível mais alto de ocorrência de ênclise. O gráfico seguinte
permite uma melhor compreensão do fato.
77

Gráfico 3: Posição do pronome com verbos simples por gênero textual

100%
90%
80%
70%
60%
Próclise
50%
Ênclise
40%
Mesóclise
30%
20%
10%
0%
Crônica Reportagem Artigo Edital

A tabela 4 mostra as ocorrências de cada posição pronominal relacionadas à


natureza categorial do clítico. O controle dessa variável se baseia na hipótese de que
estruturas com pronome se indeterminador do sujeito e apassivador condicionariam o
uso da ênclise, ao contrário de outras funções pronominais.
78

Tabela 4: Posição pronominal com verbos simples por categoria pronominal8

Tipo de Próclise Ênclise Mesóclise Total


pronome

Nº de % Nº de % Nº de %
dados dados dados
OD 171 74% 59 26% 0 0 230 (38%)
OI 40 91% 4 9% 0 0 44 (7%)
APASS. 20 26% 44 58% 12 16% 76 (12%)
PIV 156 69% 69 31% 1 0,4% 226 (37%)
INDET. 16 50% 16 50% 0 0 32 (5%)
CN 3 100% 0 0 0 0 3 (0,5%)
SUJ. 1 100% 0 0 0 0 1 (0,2%)
Total 407 67% 192 31% 13 2% 612

Como vemos, há uma predominância de pronomes na função de objeto direto,


com 230 dados (38%) – aí incluídos os casos de pronomes reflexivos – sendo que 171
(74%) aparecem antepostos ao verbo, e 59 (26%), pospostos. Percentual semelhante têm
os pronomes classificados como parte integrante do verbo, 226 (37%) no total, com
predomínio de próclise, 156 casos (69%). Há 69 dados de ênclise (31%) com pronomes
inerentes ao verbo. Há apenas um caso desse tipo de pronome na posição mesoclítica
(0,4%). As demais ocorrências de mesóclise, 12 casos (16%), ocorrem com pronomes
apassivadores, como em “Facultar-se-á ao candidato dirigir-se...” (edital 1). A maioria
dos exemplos desse emprego de pronome aparece enclítico ao verbo, 44 casos (58%), e
apenas 20 (26%) ocorrem em próclise, totalizando 76 dados de pronome apassivador
(12%). Essa é a única categoria pronominal, em cujas ocorrências a próclise não
prevalece.
Já os casos de pronomes empregados como objeto indireto totalizam 44
ocorrências (7%), sendo 40 proclíticos (91%) e 4 enclíticos (9%). Os casos em que o
clítico é índice de indeterminação do sujeito representam 5% de todos os dados (32
ocorrências) e, neste caso, há igualdade de uso das posições pronominais: 16 antepostos
e 16 pospostos ao verbo. Ademais, encontramos apenas 3 pronomes na função de
complemento nominal (0,5%), todos proclíticos ao verbo, como no exemplo: “que nos
8
Legenda da Tabela 2: OD = objeto direto; OI = objeto indireto; APASS. = pronome apassivador; PIV=
parte integrante do verbo; INDET. = índice de indeterminação do sujeito; CN = complemento nominal.
79

são sagrados” (crônica 23). Por último, há um caso de clítico na função de sujeito de
oração reduzida de gerúndio: “é ela ao me perceber partindo" (crônica 8).
Comentaremos mais a fundo esse grupo de fatores no item 5.1.2. Por ora, vejamos os
dados anteriores representados em um gráfico.

Gráfico 4: Posição do pronome com verbos simples por categoria pronominal

120%

100%

80%
Próclise
60%
Ênclise
40% Mesóclise

20%

0%
OD OI APAS. PIV INDET. CN SUJ.

Com relação à natureza do clítico, controlamos a variável forma pronominal no


condicionamento da colocação pronominal. Obtivemos os seguintes resultados:

Tabela 5: Posição pronominal com formas verbais simples por forma pronominal

Pessoa Próclise Ênclise Mesóclise Total


pronominal

Nº de % Nº de % Nº de %
dados dados dados
me 52 95% 3 6% 0 0 55 (9%)
te 4 100% 0 0 0 0 4 (0,7%)
se 278 62% 156 35% 13 3% 447
(73%)
lhe(s) 10 83% 2 17% 0 0 12 (2%)
o, a, lo, la (s) 31 50% 31 50% 0 0 62 (10%)
nos 32 97% 0 0 0 0 32 (5%)
Total 407 67% 192 31% 13 2% 612
80

Pode-se perceber que há uma ocorrência muito maior de pronome se, 446
ocorrências, a grande maioria proclítico ao verbo (62%). Temos a teoria de que o uso
desse pronome é mais expressivo, porque é mais impessoal e pode ser empregado com
vários valores (índice de indeterminação do sujeito, apassivador e reflexivo). Vale
ressaltar que todas as ocorrências de mesóclise registradas são com o pronome se.
A tabela revela ainda que a próclise predomina com todos os tipos de pronomes,
exceto os clíticos acusativos de terceira pessoa (o e flexões), que apresentam a mesma
quantidade de dados para próclise e ênclise. O uso do pronome de segunda pessoa te
registrou somente quatro ocorrências em próclise e se restringe ao gênero crônica. Vale
salientar que há inclusive um dado de próclise em início absoluto de período (Exemplo
14). O caráter descontraído desse gênero justifica a predominância da variante mais
corrente até mesmo no contexto mencionado. Os dados são os seguintes:
Exemplo 14: “Te deixam na cama.” [Crônica 10]
Exemplo 15: “E eu que te considerava um profissional…” [Crônica 13]
Exemplo 16: “... na sua cara, te dedando,...” [Crônica 13]
Exemplo 17: “...te culpando.” [Crônica 13]

A maioria absoluta dos pronomes de primeira pessoa do singular ocorre em


próclises, também levando em consideração que seu uso prevalece em gêneros mais
informais, sobretudo, crônicas. Há apenas três dados de ênclises com esse tipo de
clítico, os quais se apresentam abaixo:
Exemplo 18: “...e disse ‘vou-me embora’.” [Crônica 26]
Exemplo 19: “Faça-me o favor!” [Crônica 13]
Exemplo 20: “Imagino-me caminhando lentamente,...” [Crônica 2]

Todas essas ocorrências são em início de oração e salientamos que as duas


primeiras estruturas parecem representar um uso já cristalizado.
Para o pronome lhe registraram-se somente duas ocorrências da variante pós-
verbal, a maioria se realiza proclítica ao verbo. Por último, a maioria dos dados de
pronome nos também está na posição proclítica e há um caso da variante enclítica.
No que diz respeito à variável tempo/forma verbal, constatamos uma presença
relevante do presente do Indicativo no corpus estudado, possivelmente devido à
peculiaridade que tem esse tempo verbal de expressar verdade absoluta, o que coincide
81

com os propósitos e características dos gêneros edital e artigo científico aqui estudados 9.
O gráfico a seguir ilustra tal fato.

Gráfico 5: Tempo/forma verbal em verbos simples

0%
Presente
23% 45% Pretérito
14% Futuro
18%
Forma nominal
Imperativo

A Tabela 6 mostra os números e percentuais de ocorrência de cada posição


pronominal segundo essa variável.

Tabela 6: Posição pronominal com formas verbais simples por tempo ou forma verbal

Tempo/forma Próclise Ênclise Mesóclise Total


verbal

Nº de % Nº de % Nº de %
dados dados dados
Presente 222 81% 51 19% 0 0 273 (45%)
Pretérito 88 80% 22 20% 0 0 110 (18%)
Futuro 45 53% 27 32% 13 15% 85 (14%)
Forma 51 36% 91 64% 0 0 142 (23%)
nominal
Imperativo 1 50% 1 50% 0 0 2 (0,3%)
Total 407 67% 192 31% 13 2% 612

Como se observou, o maior percentual de ocorrência dos clíticos se refere aos


que acompanham verbo conjugado no presente: 273 casos (45%). Com esse tempo
prevalece o uso da variante proclítica, com 222 ocorrências (81%); da variante enclítica

9
Veja-se item 2.4 desta tese.
82

encontramos 51 dados (19%). Com verbos no pretérito, a próclise também é a posição


predominante, com 88 casos (80%), e a ênclise com 22 (20%), totalizando 110
ocorrências (18%).
Previsivelmente, o futuro foi o único tempo verbal com o qual se registrou o uso
da mesóclise: 15% dos dados (ver exemplos 21 e 22), mas a posição que predomina
também com esse tempo é a próclise, com 52% das ocorrências (ver exemplos 23 a 29),
a ênclise apresenta-se em 32% dos casos (ver exemplo 30), todos com verbo no futuro
do subjuntivo. Assim, com o futuro, temos 85 ocorrências (14%) de pronomes.
Exemplo 21: “A comprovação dos requisitos mínimos pelo candidato dar-se-á no
momento...” [Edital 1]
Exemplo 22: “Admitir-se-á um único recurso por candidato.” [Edital 4]
Exemplo 23: “Essa teleologia jamais se completaria...” [Artigo 1]
Exemplo 24: “Só o olfato já o acalmará.” [Crônica 5]
Exemplo 25: “...há um apenas que lhe dará segurança.” [Crônica 5]
Exemplo 26: “O choro vem porque nunca mais o verei...” [Crônica 6]
Exemplo 27: “...as contas, quem me cuidará quando...” [Crônica 25]
Exemplo 28: “...candidatos com deficiência que se submeterão...” [Edital 1]
Exemplo 29: “A classificação dos candidatos se dará em ordem...” [Edital 1]
Exemplo 30: “o candidato que... apresentar-se após o horário estabelecido” [Edital
3]
Os exemplos 21 e 22 demonstram que a mesóclise é empregada tanto em
contextos de início quanto de interior de período, desde que não esteja presente algum
elemento proclisador. Na presença de palavras atratoras, registra-se a próclise, como
vemos nos exemplos 23 a 28. Contudo, essa variante também é utilizada em contextos
sem atrator, como no exemplo 29.
O uso das formas nominais do verbo propiciou a ênclise, na maioria dos casos:
91 ocorrências (64%), como se observa nos exemplos 31 a 33. Esse fenômeno talvez se
explique pelo fato de muitos desses dados ocorrerem em início de oração (exemplo 31)
e até mesmo em início absoluto de período (exemplo 33), contextos que exigem o uso
da variante pós-verbal, segundo a norma padrão. Já a próclise teve 51 ocorrências
(36%), ilustradas nos exemplos 34 e 35. O total de casos de uso de forma nominal é 142
(23%).
Exemplo 31: tentativa de, colocando-se como [Artigo 1]
Exemplo 32: capaz de descrevê-la [Artigo 1]
83

Exemplo 33: “Relacionando-se com animais...” [Artigo 1]


Exemplo 34: “...ainda assim é possível se divertir com o cachorro...” [Crônica 1]
Exemplo 35: “Raivoso, atacando e se defendendo...” [Crônica 17]

Por último, com verbos no imperativo, encontramos apenas 2 ocorrências


(0,3%), uma com próclise e outra com ênclise, ambas no gênero crônica, a saber:
Exemplo 36: “Faça-me o favor!” [Crônica 13]
Exemplo 37: “Me responda: existe alguma coisa...” [Crônica 14]

O primeiro dado já foi apresentado anteriormente (Exemplo 19), nos


comentários acerca da variável forma pronominal e, reiteramos, parece representar um
uso de ênclise em uma expressão cristalizada na língua. O segundo exemplo mostra,
mais uma vez, um caso de próclise em início absoluto de período, no gênero crônica.
Com relação à variável contexto morfossintático, a análise computacional gerou
os seguintes números.
84

Tabela 7: Posição pronominal com formas verbais simples por contexto morfossintático

Contexto Próclise Ênclise Mesóclise Total


morfossintático

Nº de % Nº de % Nº de %
dados dados dados
Or. Subord. 179 98% 4 2% 0 0 183
desenvolvida (30%)
Início de 8 21% 23 61% 7 18% 38 (6%)
período
Início de oração 12 24% 36 72% 2 4% 50 (8%)
Palavra 62 100% 0 0 0 0 62 (10%)
negativa
Advérbio 11 100% 0 0 0 0 11
(1,8%)
Or. reduzida de 28 42% 39 58% 0 0 67 (11%)
infinitivo
Or. reduzida de 9 17% 45 83% 0 0 54 (9%)
gerúndio
Pron. indef. ou 5 100% 0 0 0 0 5 (0,8%)
interrogativo
Or. Coord. 15 75% 4 20% 1 5% 20 (3%)
sindética
Início de item 3 11% 24 89% 0 0 27 (4%)
Gerúndio 1 100% 0 0 0 0 1 (0,2%)
precedido de
“em”
Ausência de 74 79% 17 18% 3 3% 94 (15%)
atrator
Total 407 67% 192 31% 13 2% 612

A análise por contexto morfossintático mostrou que o uso da próclise é mais


expressivo em contextos de existência de elementos atratores: orações subordinadas
desenvolvidas (97%), presença de palavra negativa (100%), advérbio (100%), pronomes
indefinido ou interrogativo (100%). Frise-se que, nos três últimos casos, a próclise é de
uso categórico. As orações abaixo exemplificam tais contextos, na mesma ordem em
que foram elencadas.
85

Exemplo 38: “Talvez esteja aí uma das questões que a impedem de estar mais bem
estruturada.” [Reportagem 1]
Exemplo 39: “...o Instituto AOCP não se responsabiliza por...” [Edital 5]
Exemplo 40: “Depois se amansa e vira...” [Crônica 8]
Exemplo 41: “Houve quem se emocionasse.” [Reportagem 1]
Exemplo 42: “quem me cuidará quando...” [Crônica 25]

Além disso, registrou-se o forte domínio da variante pré-verbal, em orações


coordenadas sindéticas aditivas, alternativas e adversativas (76%) – exemplos 43 ao 46
– e em contextos de sujeito explícito seguido de verbo na voz ativa, sem presença
anterior de conectivos oracionais (79%) – exemplo 47.
Exemplo 43: “...da cidade e a tornava via...” [Artigo 1]
Exemplo 44: “...dilema de desistir da candidatura ou se lançar por...” [Reportagem 1]
Exemplo 45: “...Definitiva ou entregá-la em branco...” [Edital 5]
Exemplo 46: “...mas se lembram do passado como se fosse ontem.” [Crônica 14]
Exemplo 47: “Ela se envolveu naquele período em dois episódios críticos...”
[Reportagem 1]
Como se pode ver, o último exemplo não constitui início de período ou oração e
nele não há nenhum elemento atrator do pronome. Nesses contextos, encontramos
também 17 ênclises (18%) e 3 mesóclises (3%). Alguns exemplos são:
Exemplo 48: “Marina calou-se diante de temas cruciais.” [Reportagem 1].
Exemplo 49: “A apresentação dos Títulos far-se-á da seguinte forma...” [Edital 3]

Encontramos apenas um uso de gerúndio precedido de preposição “em”, no


gênero edital. Neste caso, o pronome aparece proclítico, conforme descrevem as
gramáticas. Eis a ocorrência:
Exemplo 50: “Em se tratando de candidato, que esteja na data de publicação da
convocação, em licença...” [Edital 1]

A ênclise, por sua vez, prevalece nos contextos de início de período (61%) ou de
oração (72%) e de orações reduzidas (infinitivo 58%, gerúndio 83%). No gênero edital,
também encontramos um uso frequente de ênclise em contextos que denominamos de
início de item (89%). Como foi explicado, trata-se de orações subordinadas
desenvolvidas coordenadas entre si, em que os verbos se encontram conjugados no
86

futuro do subjuntivo e as orações do período complexo aparecem distribuídas em


tópicos, como no exemplo a seguir:
Exemplo 51: “Será eliminado do concurso o candidato que:
c) ausentar-se do recinto de qualquer prova ou atividade sem a devida permissão;
h) recusar-se a retirar os óculos escuros ou quaisquer acessórios de chapelaria, tais
como chapéu, boné, gorro etc. ou outros objetos similares;” [Edital 2]

Apesar de tratar-se de orações subordinadas, contexto sintático que favorece a


próclise, a posição pronominal que prevalece nesses casos é a ênclise, muito
possivelmente para que não se tenha a impressão de que se utilizou o clítico em início
de período, devido à posição inicial dos verbos em cada oração coordenada, isto é, cada
item.
A fim de proporcionar uma melhor compreensão da influência do fator Contexto
morfossintático sobre o fenômeno da colocação pronominal, propomos o seguinte
gráfico.

Gráfico 6: Posição do pronome com verbos simples por contexto morfossintático

120%

100%

80%

60%
Próclise
40% Ênclise
Mesóclise
20%

0%

Analisando separadamente a atuação do fator Contexto morfossintático, nos


casos de próclise e de ênclise, buscamos verificar a influência dos elementos ditos
87

“atratores” – segundo as prescrições gramaticais comentadas no capítulo 3 desta tese –


do pronome oblíquo átono, isto é, elementos que favoreceriam a próclise.
Começando pelos casos de próclise a formas simples, a análise revelou que há
uma ocorrência maior desta posição em orações subordinadas desenvolvidas, sobretudo
orações adjetivas, como se vê a seguir:

Gráfico 7: Influência do fator Contexto morfossintático nos casos de próclise a verbos


simples

Palavra negativa

Início de período

0% 1% Início de oração
4%
9% 15% 2% Oração sub. Desenvolvida
3%
18% Advérbio

Pronome Indefinido ou
interrogativo
44% Ausência de elemento atrator
1%
Oração coord. sind.
3%
Oração reduzida

Gerúndio precedido de "em"

Início de item

Observamos que há muitos casos de próclise em que não se verifica nenhum


elemento condicionador (18%) e também algumas ocorrências em início de oração ou
período (3% e 2%, respectivamente), uso condenado pelos gramáticos mais tradicionais,
em se tratando de gêneros escritos, além de casos de próclise em orações reduzidas
(9%).
No que concerne aos casos de ênclise, a análise por contexto morfossintático
demonstrou relativa conformação com as normas do português padrão. Observou-se um
uso predominante da ênclise em orações reduzidas. Também, notou-se um uso relevante
em início de oração e em início absoluto de período. É preciso frisar que os casos de
orações reduzidas de gerúndio também constituem casos de início de oração ou período,
como nos exemplos:
88

Exemplo 52: “Calculando-se a média, temos entre todos os pacientes, temos um escore
de 56,5...” (Artigo 2)
Exemplo 53: “...prevalência estimada no Brasil de 3,3%, tornando-se um problema
cada vez maior no País...” (Artigo 2)
As ocorrências de ênclise, em contextos em que o verbo na voz ativa segue um
sujeito explícito (9%), como no exemplo a seguir, é previsto pela gramática tradicional,
como vimos no capítulo 3, já que não há nenhum elemento proclisador.

Exemplo 54: “O Concurso público destina-se ao provimento...” (Edital 1)


No gênero edital, aparecem muitos usos de ênclise em contextos de início de
item, com orações desenvolvidas, em que os verbos se encontram conjugados no futuro
do subjuntivo, em orações coordenadas entre si, organizadas na forma de itens, como já
comentamos na seção 4.2. Já os casos de orações subordinadas e coordenadas
representaram apenas 2% dos dados de ênclise, cada variável. Ressalte-se que apenas as
conjunções subordinativas são tradicionalmente consideradas elementos proclisadores.
Vejamos a sistematização desses dados no gráfico seguinte:

Gráfico 8: Influência do fator Contexto morfossintático nos casos de ênclise a verbos


simples

Início de período
Início de oração
2% Oração reduzida de infinitivo
2%
9% 12% Oração reduzida de Gerúndio
13% 19% Início de item
Oração coord. sind.
23%
20% Or. Sub. Desenvolvida
Ausência de atrator

Assim, pode-se concluir, resumidamente, que, a partir dos dados aqui analisados,
constatou-se forte preferência pela variante proclítica ao verbo, em todos os gêneros
textuais escritos estudados. Em gêneros com grau de formalidade menor, constataram-
89

se, inclusive, casos de próclise em início de período, contrariando a célebre regra “não
se inicia período com pronome átono”, tão preoconizada nas escolas e cursos
preparatórios e enfatizada em manuais de ensino de LP e em gramáticas tradicionais,
como demonstramos na seção 3.1. Obviamente, deve-se ressaltar que já se observa um
avanço na descrição do fenômeno linguístico da clitização pronominal, considerando
que a maioria das gramáticas já reconhece usos tipicamente brasileiros. Porém, tais usos
são descritos em seção à parte, como característicos da fala informal e não
recomendáveis do ponto de vista da norma padrão. Além disso, como já comentamos, a
ênclise ainda é apontada, nas GTs, como a posição lógica e recomendável, na ausência
dos chamados “atratores”, pressuposto que também não se confirmou nesta pesquisa.
Observamos o uso frequente de próclise em contextos em que tais elementos não
apareciam, como depois de sujeito explícito e depois de conjunções coordenativas
adversativas e aditivas, as quais não são tradicionalmente consideradas proclisadores.
Claro, está, portanto, que essas regras não se aplicam à língua escrita de maneira geral e
que a norma culta escrita brasileira acolhe usos diferentes dos prescritos na GT.
Feitas essas considerações, passamos à descrição da segunda etapa da análise de
dados, na qual obtivemos os percentuais relativos, ou seja, uma medida da influência de
cada fator sobre cada variante do fenômeno estudado, por meio ainda do instrumental
quantitativo Goldvarb 2001.

5.1.2 Ponderação estatística

Numa segunda fase de análise, foram descartados ou reagrupados os fatores


considerados irrelevantes no condicionamento das variantes do fenômeno aqui
estudado, como os que apresentam baixo número de dados. Também foram excluídas da
análise as variáveis que apresentaram regra categórica, isto é, 0 ou 100% de ocorrências.
Assim, primeiramente, foi retirada dessa rodada, do grupo da variável dependente, a
variante intraverbal, tendo em vista o fato de o Goldvarb só gerar pesos relativos em
rodadas binárias e as restrições observadas quanto a seu uso, no primeiro exame. Basta
rever as tabelas apresentadas no item anterior para verificar-se que não há ocorrências
de tal variante relacionadas a vários fatores, como por exemplo, no primeiro grupo de
fatores, o de gêneros textuais, em que só houve ocorrência de mesóclise no gênero edital
de abertura de concurso público.
90

Também foi conveniente retirar da análise o único caso de pronome na função


de sujeito e os três casos em que aparecem na função de complemento nominal (ex.
“que nos são sagrados”, crônica 23), nos quais os clíticos estavam na posição pré-
verbal. Igualmente foram descartados os quatro dados de pronomes de segunda pessoa,
que ocorreram apenas no gênero crônica e em próclise. Já os casos de primeira pessoa
do plural foram amalgamados com os de primeira pessoa singular, já que 100% dos
dados de plural ocorreram em uma única posição, a proclítica. Por último, no que diz
respeito ao grupo de fatores relativo a contexto morfossintático, foi mais proveitoso
juntar os fatores oração subordinada desenvolvida, presença de palavra negativa,
advérbio e pronome indefinido ou interrogativo em uma só categoria correspondente à
presença de elemento atrator. Foi retirada desse grupo a única ocorrência de pronome
precedido de preposição em, que aparece proclítico, de acordo com as prescrições
gramaticais.
Efetuadas as mudanças, procedemos à segunda rodada de dados, utilizando a
variante pré-verbal (68% dos dados) como valor de aplicação, em oposição à variante
pós-verbal (32% dos dados). O programa selecionou como mais relevantes,
respectivamente, as variáveis contexto morfossintático, gênero textual, forma
pronominal e categoria pronominal; as demais foram excluídas da análise.
91

Tabela 8: Uso da próclise segundo a variável contexto morfossintático


Fator Próclise (input 0.87)
Frequência Percentual Peso
relativo
Início de 8/31 26% 0.00
período
Início de 12/48 25% 0.02
oração
Oração 9/54 17% 0.03
reduzida de
gerúndio
Oração 28/67 42% 0.09
reduzida de
infinitivo
Início de item 3/27 11% 0.04
Presença de 257/261 99% 0.95
atrator
Oração 15/19 79% 0.64
coordenada
sindética
Sem atrator 74/91 81% 0.41

Os dados demonstrados na tabela evidenciam os condicionamentos que regulam


o uso da próclise, nos gêneros escritos estudados: presença prévia de elemento atrator,
marcantemente favorecedor (0.94), e orações coordenadas sindéticas aditivas,
alternativas e adversativas (0.64). Lembremos que o primeiro fator inclui orações
subordinadas desenvolvidas (nas quais há, claro, presença de conjunções e,
principalmente, pronomes relativos) e presença de advérbio, palavra negativa, pronome
interrogativo ou indefinido. Tal tendência demonstra um cumprimento das prescrições
da norma padrão, que prevê a próclise na presença de tais vocábulos. Por sua vez, no
que diz respeito aos contextos de orações coordenadas sindéticas, a gramática
tradicional já observa uma tendência à próclise no caso de orações alternativas
(CUNHA; CINTRA, 2001, p. 313), mas não com relação aos demais tipos de orações
coordenadas. Os resultados desta pesquisa parecem então revelar que, além dos
atratores tradicionais, certas conjunções coordenativas atuam também como elementos
92

proclisadores, na norma escrita culta do português brasileiro, no que diz respeito aos
gêneros aqui abordados.
São desfavorecedoras da próclise as circunstâncias seguintes: início de período
ou oração, orações reduzidas, ausência de elemento atrator (casos de sujeito seguido de
verbo, sem conectivo anterior) e início de item (orações subordinadas coordenadas entre
si, distribuídas em tópicos). Esta última situação motivaria, em tese, a próclise, já que
constituem contextos de orações subordinadas, mas, conforme prevíamos, condiciona a
variante pós-verbal, como uma forma de impedir que o leitor pense que se iniciou
período com pronome átono, uso condenado pela gramática normativa. Por esse motivo,
essas orações foram analisadas como um fator à parte, separadamente das demais
orações subordinadas.
Levando em consideração o contexto morfossintático das orações, observa-se,
então, um comportamento linguístico singular do escritor culto brasileiro. A próclise é
evidentemente a variante preferida, inclusive em contextos em que não há operadores de
próclise tradicionais. Classes de palavras que não são comumente apontadas como
proclisadores pareceram exercer também esse papel, como certas conjunções
coordenativas. Além disso, registramos o uso dessa variante até mesmo em contexto
inicial de oração/período, embora de maneira pouco expressiva. Ainda é importante
frisar, apesar de o peso relativo ser inferior a 0.50, o significativo percentual de próclise
em contextos de sujeito seguido de verbo na voz ativa, sem presença prévia de
elementos atratores (81%) tradicionais ou conjunções coordenadas, mesmo porque o PR
0.41 não é tão baixo. A ênclise, por sua vez, mais frequente nos gêneros formais, é
utilizada de maneira acorde com o padrão estabelecido, segundo o contexto em que
ocorrem. Porém, há um contexto particular do gênero edital, em que a GT prevê a
próclise, e os resultados desta pesquisa mostraram que favorece a ênclise. Trata-se do
fator denominado Início de item, em que ocorre, de maneira generalizada, a ênclise,
apesar de possuir conjunções subordinativas, que teoricamente ocasionariam a próclise.
93

Tabela 9: Próclise segundo a variável gênero textual


Fator Próclise (input 0.87)
Frequência Percentual Peso
relativo
Crônica 158/178 89% 0.82
Reportagem 57/74 77% 0.52
Artigo 81/135 60% 0.46
Edital 111/212 52% 0.23

Como vemos, nossa hipótese de que os gêneros mais formais condicionariam


maior obediência aos preceitos da tradição gramatical, ao passo que os mais informais
revelariam um uso mais aproximado das variedades não padrão se confirma nos dados
apresentados na tabela anterior. A crônica, por exemplo, tem uma ocorrência de próclise
de 89% e peso relativo 0.82. É, portanto, um gênero fortemente influenciador dessa
posição pronominal. Por outro lado, o edital desfavorece tal variante, em detrimento da
ênclise, com peso relativo 0.23. Lembremos que as ocorrências de mesóclise,
encontradas em tal gênero, foram retiradas dessa etapa da análise. Já os gêneros
reportagem e artigo apresentaram pesos relativos medianos. O primeiro licencia a
próclise em mais da metade dos casos (0.52) e o segundo apresenta PR um pouco
abaixo de 0.50, mas não o suficiente (0.46) para afirmar-se que desfavorece a variante
de referência.

Tabela 10: Próclise segundo a variável forma pronominal


Fator Próclise (input 0.87)
Frequência Percentual Peso
relativo
me 52/55 95% 0.86

se 278/434 64% 0.54

lhe (s) 10/12 83% 0.15

o/a/lo/la (s) 31/62 50% 0.09


94

Fica evidente a partir da análise dos dados anteriores que os clíticos acusativos
de terceira pessoa desfavorecem o uso da próclise (0.09), assim como o pronome
lhe/lhes (0.15). Registramos a seguir as ocorrências deste último pronome.
Exemplo 54: “...aquele que lhes fornecia...” [Artigo 1]
Exemplo 55: “... televisão, ninguém lhe pergunta o...” [Crônica 14]
Exemplo 56: “há um apenas que lhe dará segurança.” [Crônica 5]
Exemplo 57: “...observadas as normas que lhes regem.” [Edital 1]
Exemplo 58: “evento que lhe disser respeito...” [Edital 3]
Exemplo 59: “evento que lhes disser respeito...” [Edital 4]
Exemplo 60: “evento que lhes disser respeito...” [Edital 5]
Exemplo 61: “...faz quando lhe perguntam algo que julga...” [Reportagem 1]
Exemplo 62: “...os círculos que lhes são mais próximos...” [Reportagem 4]
Exemplo 63: “... para propiciar-lhe a...” [Artigo 1]
Exemplo 64: “...responsabilidade e fazer-lhes pequenos reparos.” [Edital 5]
Exemplo 65: “...capaz de lhe conferir uma...” [Artigo 1]

Como vemos, quase todas as ocorrências proclíticas da forma lhe (exceto uma)
seguem um elemento condicionador de próclise, sobretudo pronome relativo. Portanto,
fica claro que, neste caso, não é a forma pronominal que influi na posição do clítico e
sim a presença prévia de elemento atrator. Os dois dados de pronome lhe enclítico são
precedidos de infinitivo, que como comentamos anteriormente parece favorecer a
variante pós-verbal.
Em contrapartida, as formas me e se atuam a favor da variante pré-verbal (0.86 e
0.54, respectivamente). Como já comentamos no item anterior, parece-nos que o
condicionamento da próclise pelo pronome me está vinculado ao grau de formalidade
dos textos, já que essa forma só é usada no gênero mais informal, a crônica. Esse
gênero, como observamos nos comentários acerca da primeira variável, propicia o uso
da próclise, de forma expressiva.
95

Tabela 11: Próclise segundo a variável categoria pronominal


Fator Próclise (input 0.87)
Frequência Percentual PR10
Objeto direto 171/230 74% 0.62

Objeto indireto 40/44 91% 0.83

Apassivador 20/64 31% 0.15

Inerente 156/225 69% 0.47

Indeterminador 16/32 50% 0.23

A projeção feita pelo programa confirma nossa hipótese inicial de que o uso do
pronome se como índice de indeterminação do sujeito e apassivador favoreceria a
variante pós-verbal. Como é possível observar, esses pronomes apresentam baixo peso
relativo e, portanto, desfavorecem a próclise. Já o PR dos pronomes inerentes (parte
integrante do verbo) se mostrou mediano, sutilmente abaixo de 0.50. Já os pronomes
que exercem função de objeto direto e objeto indireto favorecem a variante pré-verbal,
com peso relativo 0.62 e 0.83, respectivamente.

5.2 Locuções verbais

Foram encontradas 130 ocorrências de locuções verbais no corpus analisado.


Destas apenas um caso é de locução constituída de três verbos, no seguinte contexto:
“...havia deixado de se preocupar” (Artigo 1). Todos os demais dados são de locuções
formadas por dois verbos.
A variável dependente das ocorrências de clíticos adjuntos a locuções verbais se
constitui de quatro variantes: próclise ao verbo principal, ênclise ao verbo principal,
próclise ao auxiliar e ênclise ao auxiliar. O critério adotado para determinar se a ligação
do pronome é ao primeiro ou ao segundo verbo da locução é a existência de hífen, como
se detalhou no capítulo 3. Constatou-se um equilíbrio no uso das primeiras variantes:
obtivemos 50 dados da primeira e 56 da segunda, com predomínio desta última. A
terceira posição mais encontrada foi a próclise ao auxiliar, com 21 casos e, por último,

10
PR = peso relativo
96

apenas 3 ocorrências de ênclise ao auxiliar. Os resultados estão expostos no seguinte


gráfico:

Gráfico 9: Posição do pronome com locuções verbais

16%
43% Próclise ao auxiliar
Próclise ao principal
39%
Ênclise ao auxiliar
Ênclise ao principal

2%

5.2.1 Análise inicial

A posição do pronome em relação ao verbo, nas formas verbais complexas,


mostrou-se bastante variável, em função do gênero textual analisado. Vejamos a tabela a
seguir que contempla a influência da variável gênero textual na posição do clítico.

Tabela 12: Posição pronominal com locuções verbais por gênero textual

Gênero Próclise ao Próclise ao Ênclise ao Ênclise ao Total


auxiliar principal auxiliar principal

Nº de % Nº de % Nº de % Nº de %
dados dados dados dados
Artigo 4 27% 6 40% 3 20% 2 13% 15
(12%)
Crônica 2 6% 26 81% 0 0 4 13% 32
(25%)
Edital 14 21% 5 7% 0 0 49 72% 68
(52%)
Reportagem 1 7% 13 87% 0 0 1 7% 15
(12%)
Total 21 16% 50 39% 3 2% 56 43% 130
97

O maior número de dados da variante enclítica ao verbo predicador pode


associar-se ao fato de a maioria das ocorrências de pronome unido à locução verbal
registradas em nossa pesquisa apresentar-se no gênero edital, no qual tal posição
predominou (49 dados, 72%). Vejamos um exemplo dessa variante:
Exemplo 66: “para realizar a prova deverá indicá-lo no ato...” [Edital 1]

Claro que, neste caso, outros fatores contribuem para o uso da variante, como o
fato de o verbo predicador estar no infinitivo e de o clítico ser do tipo acusativo de
terceira pessoa, além do verbo auxiliar estar no futuro, estrutura que dificilmente se
construiria de outra forma. Na verdade, temos uma atuação conjunta de fatores, que
ficará mais clara, no decorrer da análise.
Registraram-se também, nos editais analisados, 14 casos de próclise ao auxiliar
(21%), 5 de próclise ao principal (7%) e nenhuma ênclise ao auxiliar. Em todos os
demais gêneros, prevalece a variante pré-verbo temático.
No gênero artigo, encontramos 4 exemplos de próclise ao auxiliar (27%), 6 de
próclise ao verbo principal (40%), 3 ocorrências de ênclise ao auxiliar (20%) e 2 de
ênclise ao principal (13%). Note-se que as três primeiras posições se distribuem de
maneira bem equilibrada nesse gênero. Este é o único gênero em que aparece a ênclise
ao auxiliar. Todos os casos são com o pronome se e modal poder, construção
formulaica e típica da escrita. Seguem exemplos.
Exemplo 67: “Assim, pode-se dizer...” [Art1]
Exemplo 68: “...dados, pode-se concluir que...” [Art2]
Exemplo 69: “Na primeira exposição, pode-se observar que...” [Art4]

Nas crônicas, gênero mais informal, os dados de próclise ao principal (81%)


superam significativamente as outras posições: 2 próclises ao auxiliar (6%) e 4 ênclises
ao verbo predicador (13%). Nas reportagens, houve apenas um caso de próclise ao
auxiliar (7%), 13 de próclise ao principal (87%) e 1 de ênclise ao auxiliar (7%), de
modo que a posição predominante também é a próclise ao principal. Esses dados estão
sistematizados no gráfico seguinte.
98

Gráfico 10: Posição do pronome com locuções verbais por gênero textual

100,00%
90,00%
80,00%
70,00%
60,00% Próclise ao auxiliar

50,00% Próclise ao principal

40,00% Ênclise ao auxiliar

30,00% Ênclise ao principal

20,00%
10,00%
0,00%
Crônica Reportagem Artigo Edital

A tabela 13 exibe a interferência da variável categoria pronominal no


condicionamento das quatro variantes.

Tabela 13: Posição pronominal com locuções verbais por categoria pronominal

Tipo de Próclise ao Próclise ao Ênclise ao Ênclise ao Total


pronome11 auxiliar principal auxiliar principal

Nº de % Nº de % Nº de % Nº de %
dados dados dados dados
OD 2 3% 25 39% 0 0 38 59% 65
(50%)
OI 12 67% 4 22% 0 0 2 11% 18
(14%)
APASS. 1 33% 0 0 0 0 2 67% 3 (2%)
PIV 0 0 21 60% 0 0 14 40% 35
(27%)
INDET. 6 67% 0 0 3 33% 0 0 9 (7%)
Total 21 16% 50 39% 3 2% 56 43% 130

11
Legenda da Tabela 7: OD = objeto direto; OI = objeto indireto; APASS. = pronome apassivador; PIV=
parte integrante do verbo; INDET. = índice de indeterminação do sujeito; CN = complemento nominal.
99

Com relação à categoria do pronome que acompanha cada locução verbal,


observamos uma maior recorrência de pronomes na função de objeto direto, com 65
ocorrências, o que representa a metade de todos os dados (50%). Desses a maioria
ocorreu em ênclise ao principal, com 38 casos (59%), seguido de próclise ao principal
(39%) e apenas 2 casos de próclise ao auxiliar (3%). Foram encontrados 18 pronomes
na função de objeto indireto (14%), sendo 12 em próclise ao auxiliar (67%), a maioria,
portanto. Os casos de próclise ao principal foram apenas 4 (22%) e, por fim, 2
ocorrências da variante pós-locução (11%) nessa função.
Houve somente três ocorrências de pronome apassivador (2%), 1 em próclise ao
auxiliar e dois em ênclise ao principal. Os clíticos que funcionam como índice de
indeterminação do sujeito apareceram, em sua maioria, proclíticos ao auxiliar (60%), 6
casos e houve 3 casos de ênclise ao auxiliar (40%), isto é, apenas 9 ocorrências (8%).
Por último, recolhemos 35 dados de clíticos inerentes, ou seja, os que são parte
integrante do verbo. Desses casos, 21 pronomes ocorrem proclíticos ao verbo
predicador (60%) e 14, enclíticos a esse verbo (40%).
Nossa hipótese acerca dessa variável, baseada nas observações de Azeredo
(2010), se confirmou em parte. Todos os dados de pronome indeterminador do sujeito,
como o exemplo 70, ratificam sua afirmação de que se o clítico se “vem integrado numa
sequência de verbo finito + forma verbal no infinitivo, gerúndio ou particípio, é ao redor
do verbo finito que o pronome se coloca preferencialmente, ora proclítico ora enclítico”
(AZEREDO, 2010, p. 263).
Exemplo 70: “...que se poderia chamar de...” [Artigo 1]

No que tange aos clíticos apassivadores, que também estão inclusos nesse
critério de Azeredo (2010, p. 263), muitas ocorrências corroboram a hipótese, como a
do exemplo que segue:
Exemplo 71: “...onde se procura ampliar a compreensão...” [Artigo 3]

Não obstante, registramos 2 dados com ligação enclítica à forma nominal, os


quais se apresentam a seguir.
Exemplo 72: “...poderá, eventualmente, alterar-se a classificação...” [Edital 4]
Exemplo 73: “Caso haja ..., poderá, eventualmente, alterar-se a...” [Edital 5]
100

É necessário, contudo, fazer algumas observações. Percebe-se que os contextos


em que ocorrem tais registros são idênticos. Em ambos, há interposição de advérbio
entre os verbos da locução. Isso impossibilitaria a posição pós-verbo auxiliar, mas não a
ligação à esquerda desse verbo. Além disso, nesses casos, o auxiliar está no futuro,
condição que inviabilizaria a colocação pré- ou pós-V1.
Cabe comentar ainda que as únicas ocorrências da variante enclítica ao verbo
conjugado foram com índices de indeterminação do sujeito, ou seja, todos os dados
dessa posição registraram-se com esse tipo de pronome (ver exemplos 67 a 69). Quanto
aos demais pronomes, comentaremos suas ocorrências mais adiante, na análise da
próxima variável.

Tabela 14: Posição pronominal com locuções verbais por forma pronominal

Contexto Próclise ao Próclise ao Ênclise ao Ênclise ao Total


morfossintático auxiliar principal auxiliar principal

Nº de % Nº de % Nº de % Nº de %
dados dados dados dados
me 0 0 12 100% 0 0 0 0 12
(9%)
se 7 10% 30 42% 3 4% 32 44% 72
(55%)
lhe (s) 12 100% 0 0 0 0 0 0 12
(9%)
o/a/lo/la (s) 2 8% 0 0 0 0 24 92% 26
(20%)
nos 0 0 8 100% 0 0 0 0 8
(6%)

Para melhor compreensão da atuação da variável forma pronominal sobre o


fenômeno, propomos ainda o gráfico seguinte.
101

Gráfico 11: Posição do pronome com locuções verbais por forma pronominal
120%

100%

80%

60% Próclise ao auxiliar


Próclise ao principal
40% Ênclise ao auxiliar
Ênclise ao principal
20%

0%

Os resultados expostos na tabela e no gráfico revelam que o clítico acusativo de


terceira pessoa inadmite a colocação intralocucional e é favorável à posição pós-locução
(92%), o que corrobora os resultados da pesquisa de Vieira (2002): “...registra-se,
também para o PB escrito, o comportamento particular do pronome <o, a (s)>, no
sentido de favorecer a variante pós-CV” (VIEIRA, 2002, p. 313). Todos os pronomes
possuíam as formas lo, la, los, las, portanto, estavam ligadas a infinitivo. Encontramos
somente 2 casos de clítico acusativo de terceira pessoa em próclise ao auxiliar, nos
gêneros mais informais. O primeiro tem verbo principal no gerúndio e o segundo, no
particípio. Vejamos os dados:
Exemplo 74: “...a mãe o estava esperando.” [Crônica 7]
Exemplo 75: “...pequenos partidos que a tinham cortejado...” [Reportagem 1]

No segundo exemplo, a forma nominal no particípio impede a ênclise a esse


verbo, além disso, a locução é precedida de um elemento atrator, o que pode favorecer a
próclise ao auxiliar. Já a ênclise ao verbo auxiliar, como já afirmamos, é bastante rara
no PB, sobretudo neste caso em que a forma verbal termina em consoante m e, logo,
implicaria a forma no do pronome, ainda mais escassa. Explica-se, então, a opção da
colocação pronominal. Em síntese, somente o clítico o(s)/a(s) refreou a alta frequência
102

de próclise ao principal. Por questões fonológicas, esse tipo de clítico não é produtivo
entre os verbos.
A forma me somente apareceu na posição proclítica ao verbo principal. Com a
forma nos, também tivemos a ocorrência categórica dessa variante que é a preferida no
PB, segundo o gramático Ataliba de Castilho (2010, p. 484), conforme já comentamos
no capítulo 3. O mesmo aponta a pesquisa de Vieira (2002), tanto para a língua falada
quanto para gêneros escritos, com relação ao PB. Levando em consideração o fato de
essas formas só terem aparecido nos gêneros mais informais, é possível vislumbrar uma
explicação para o fenômeno. Parece que o uso categórico das formas de primeira pessoa
na posição anteposta à forma nominal está relacionado mais ao grau de formalidade do
texto que à estrutura fonética dos pronomes.
Outro pronome que apresentou uso categórico foi a forma lhe, cuja totalidade de
ocorrências se deu em próclise ao auxiliar, contrariando nossa hipótese inicial de que
essa forma teria comportamento semelhante ao da forma me, por apresentarem a mesma
estrutura fonética: consoante + vogal. Vejamos os contextos em que ocorrem:
Exemplo 76: “...das prerrogativas que lhe são facultadas...” [Edital 1]
Exemplo 77: “...em que lhe sejam assegurados o contraditório...” [Edital 1]
Exemplo 78: “...em que lhe sejam assegurados...” [Edital 1]
Exemplo 79: “...atribuições que lhe são conferidas...” [Edital 2]
Exemplo 80: “...para que lhe seja providenciado...” [Edital 3]
Exemplo 81: “...para que lhe seja providenciado...” [Edital 3]
Exemplo 82: “após procedimento administrativo em que lhe sejam assegurados...”
[Edital 4]
Exemplo 83: “...em que lhe sejam assegurados...” [Edital 4]
Exemplo 84: “...procedimento administrativo em que lhe sejam assegurados...”
[Edital 4]
Exemplo 85: “...prerrogativas que lhes são facultadas no...” [Edital 5]
Exemplo 86: “ ..., recusar a vaga que lhe for disponibilizada...” [Edital 5]
Exemplo 87: “...em que lhe sejam assegurados o contraditório...” [Edital 5]

Primeiramente, destacamos que, assim como nos casos de formas verbais


simples, todas as ocorrências da forma pronominal lhe aparecem precedidas de
pronomes relativos e conjunções subordinativas, elementos considerados atratores do
pronome. Em segundo lugar, todos os dados se registram no gênero edital, que é o mais
103

formal dos analisados. Além disso, é relevante o fato de todas as estruturas serem de
voz passiva analítica (verbo SER + particípio). Não podemos também desconsiderar as
repetições regulares das estruturas, o que é comum nesse gênero textual.
Já no que diz respeito ao pronome se, verificamos poucas ocorrências da
variante pré-locucional (10%). Os dados de ênclise ao verbo auxiliar também foram
escassos (4%). Ressalte-se que essa variante só se realizou com a forma pronominal se,
no papel de indeterminador do sujeito, como comentamos anteriormente. A maioria dos
dados desse pronome se apresentou equilibradamente nas posições adjacentes ao verbo
temático: 44% à sua direita e 42% à sua esquerda.

Tabela 15: Posição pronominal com locuções verbais por tempo/forma V1

Tempo/forma Próclise ao Próclise ao Ênclise ao Ênclise ao Total


verbal auxiliar principal auxiliar principal

Nº de % Nº de % Nº de % Nº de %
dados dados dados dados
Presente 17 29% 28 48% 3 5% 10 17% 58
(45%)
Pretérito 2 13% 12 75% 0 0 2 13% 16
(13%)
Futuro 2 4% 6 12% 0 0 42 84% 50
(39%)
Forma 0 0 4 67% 0 0 2 33% 6
nominal (5%)

Total 21 16% 50 39% 3 2% 56 43% 130

Como já afirmamos, essa variável foi considerada sob a hipótese de que o único
tempo verbal que implicaria um comportamento diferenciado dos pronomes seria o
futuro (do presente e do pretérito do Indicativo), no sentido de impedir a variante pós-
V2, o que se concretiza parcialmente. De fato, não houve ocorrência de tal posição com
verbos no futuro, mas também não a registramos com outros tempos. O único tempo
verbal que registrou casos dessa última posição foi o presente e apenas três dados. A
maioria dos pronomes atrelados a locuções verbais com verbo principal no presente
ocorreu em próclise ao principal (48%), 28 casos; 17 casos em próclise ao auxiliar
(29%); 10 em ênclise ao principal (17%) e 3 em ênclise ao auxiliar (5%).
104

Com futuro, houve 50 casos (38%): 2 com pronomes em próclise ao auxiliar


(4%); 11 em próclise ao principal (22%) e a maioria em ênclise ao principal, 37 casos
(74%). Os casos de verbo auxiliar no pretérito foram apenas 15 (12%): 2 de próclise ao
auxiliar (13%); 11 de próclise ao principal (73%) e 2 de ênclise ao principal (13%).
As ocorrências de verbo auxiliar em alguma forma nominal foram 6 (5%): 4 de
próclise ao principal (67%) e 2 de ênclise ao principal (33%), sendo que, nestas duas
ocorrências, o verbo principal está no infinitivo, o que parece favorecer tal posição
(exemplos 89 e 90). Os dados se apresentam a seguir:
Exemplo 88: “Décio Pignatari, chegando a se afirmar, algumas vezes, como
continuador [Artigo 1]
Exemplo 89: “...eles não têm nenhuma obrigação de ficar me elogiando.” [Crônica 2]
Exemplo 90: “...ter o candidato se utilizado de processo ilícito.” [Edital 4]
Exemplo 91: “Fez um mea-culpa por não ter se envolvido mais com política...”
[Reportagem 1]
Exemplo 92: “...do interior de peças arqueológicas sem precisar danificá-las,...”
[Artigo 3]
Exemplo 93: “...devendo atentar-se apenas para...” [Edital 5]

Tabela 16: Posição pronominal com locuções verbais por forma do V2

Forma Próclise ao Próclise ao Ênclise ao Ênclise ao Total


nominal auxiliar principal auxiliar principal

Nº de % Nº de % Nº de % Nº de %
dados dados dados dados
Infinitivo 7 7% 33 34% 3 3% 55 56% 98
(76%)
Particípio 13 65% 6 30% 0 0 1 5% 20
(15%)
Gerúndio 1 8% 11 92% 0 0 0 0 12
(9%)
Total 21 16% 50 39% 3 2% 56 43% 130

No que diz respeito à forma nominal do verbo principal, encontramos 98


ocorrências com infinitivo (76%); 20 com particípio (15%) e 12 com gerúndio (9%),
conforme se vê no gráfico a seguir.
105

Gráfico 12: Forma do verbo principal nas locuções em todo o corpus

Forma do verbo principal nas locuções

15%
9%
Infinitivo
Gerúndio
76%
Particípio

Monitoramos esse grupo, com base no pressuposto de que a forma infinitiva


favoreceria a variante pós-locucional, o que se comprova na análise. Das ocorrências
com infinitivo, 7 pronomes aparecem proclíticos ao auxiliar (7%); 38 em próclise ao
principal (38%); 3 em ênclise ao auxiliar (3%) e a maioria em ênclise ao principal: 50
casos (51%).
Quanto aos casos de gerúndio, não houve ocorrência de ênclise, nem ao auxiliar,
nem ao principal. A variante dominante foi a próclise ao principal, com 11 casos (92%).
Houve apenas 1 caso de próclise ao auxiliar (11%). Das locuções com verbo principal
no particípio, encontramos 13 casos (65%) de próclise ao auxiliar e 6 de próclise ao
principal (30%). Surpreendentemente, foi registrada uma ocorrência de ênclise ao
principal no particípio, a qual se apresenta abaixo:
Exemplo 94: “o DBS tem firmado-se como...” [Artigo 2]

Tal uso contraria as prescrições da gramática tradicional (BECHARA, 2003, p.


590; CUNHA e CINTRA, 2001, p.316), como descrito no capítulo 4 desta tese, bem
como vai de encontro ao que têm apontado as pesquisas sociolinguísticas. Sobre isso
Vieira (2018, p. 135), afirma: “A forma do particípio, dado o seu caráter não temporal
(‘detensivo’), não acolhe pronome posposto”. Ressalte-se ainda que a ocorrência se
realizou no gênero artigo acadêmico, que possui grau de formalidade elevado. Pode-se
presumir que esse uso constitua um caso de hipercorreção, já que a ênclise é um traço
de formalismo que indica forte monitoramento, como observa Azeredo (2010, p. 260)12.
Portanto, opta-se pela variante mais formal, na tentativa de demonstrar maior
observância das regras gramaticais e imprimir mais formalidade ao texto e incorre-se
em uma inadequação, do ponto de vista normativo.

12
Ver página 41 desta tese.
106

Tabela 17: Posição pronominal com locuções verbais por contexto morfossintático

Contexto Próclise ao Próclise ao Ênclise ao Ênclise ao Total


morfossintático auxiliar principal auxiliar principal

Nº de % Nº de % Nº de % Nº de %
dados dados dados dados
Or. Subord. 17 49% 9 26% 0 0 9 26% 35
desenvolvida (27%)
Início de 0 0 7 100% 0 0 0 0 7 (5%)
período
Início de 0 0 4 27% 3 20% 8 53% 15
oração (12%)
Palavra 1 8% 5 42% 0 0 6 50% 12
negativa (9%)
Advérbio 2 14% 6 43% 0 0 6 43% 14
(11%)
Or. reduzida 0 0 2 67% 0 0 1 33% 3 (2%)
de infinitivo
Or. reduzida 0 0 1 50% 0 0 1 50% 2
de gerúndio (1,5%)

Or. coord. 0 0 3 38% 0 0 5 63% 8 (6%)


sind.
Ausência de 1 3% 13 38% 0 0 20 59% 34
atrator (26%)
Total 21 16% 50 39% 3 2% 56 43% 130

Não foram encontrados clíticos em início de oração ou período, ou seja, casos de


próclise ao auxiliar. Em todas as ocorrências de início de período, 7 casos, registramos
próclise ao verbo principal. Vejamos alguns exemplos:
Exemplo 95: “Vai me desculpar, mas não...” [Crônica 12]
Exemplo 96: “Ia se desfolhando como...” [Crônica 7]

Já nas de início de oração, houve maior recorrência de ênclise ao principal, 8


casos (53%); seguindo-se a próclise ao principal, 4 ocorrências (27%) e ênclise ao
auxiliar, com 3 ocorrências (20%). Seguem exemplos na mesma ordem:
Exemplo 97: “...prova, poderá fazê-lo...” [Edital 4]
107

Exemplo 98: “Corremos no calçadão, procuramos nos alimentar decentemente...”


[Crônica 27]
Exemplo 99: “Na primeira exposição, pode-se observar que...” [Artigo 4]

A presença de palavra negativa ocasionou um uso equiparado de próclise e


ênclise ao principal, a primeira variante ocorreu em 5 (42%) dos 12 casos e a segunda,
em 6 (50%). Também houve 1 ocorrência de próclise ao auxiliar (8%) e nenhuma de
ênclise ao auxiliar. Na presença de advérbio, registraram-se 6 casos de próclise ao
principal (43%), e 6 de ênclises ao principal (43%), também a ocorrência de 2 próclises
ao auxiliar (14%). Assim, tais elementos ditos atratores, palavra negativa e advérbio,
não favoreceram o uso da próclise ao auxiliar, nas ocorrências de clíticos junto a
locuções verbais.
Por outro lado, o contexto morfossintático de orações subordinadas
desenvolvidas parece ter favorecido o uso da próclise ao auxiliar: 17 casos (49%). Nesse
contexto, houve igualdade de número de próclise ao principal e ênclise ao auxiliar, com
9 ocorrências (26%) cada. Não foi registrado nenhum uso de ênclise ao auxiliar, com
orações subordinadas desenvolvidas.
Foram encontradas 3 ocorrências de clítico com locução verbal em oração
reduzida de infinitivo, 1 na posição posterior e 2 na posição anterior ao verbo principal.
Há ainda um caso que merece ser comentado, pois não foi contabilizado como contexto
morfossintático de oração reduzida de infinitivo e entrou na contagem no critério
“presença de palavra negativa”. Essa ocorrência é da variante pré-verbo temático. Segue
a oração:
Exemplo 100: “Fez um mea-culpa por não ter se envolvido mais com política...”
[Reportagem 1]

Com oração reduzida de gerúndio, houve dois casos, um de próclise ao principal


e outro de ênclise ao principal. No contexto de oração coordenada sindética aditiva e
adversativa, foram registradas 5 ocorrências de ênclise ao principal (63%) e 3 de
próclise ao principal. Por fim, em contextos em que não apareceu nenhum elemento
atrator, registraram-se 20 ocorrências de ênclise ao principal (59%); 13 de próclise ao
principal (38%) e 1 de próclise ao auxiliar (3%). Por meio da visualização do gráfico
13, é possível compreender melhor o comportamento da variável contexto
morfossintático no condicionamento da colocação pronominal.
108

Gráfico 13: Posição pronominal com locuções verbais por contexto morfossintático

120%

100%

80%

60%
Próclise ao auxiliar

40% Próclise ao principal


Ênclise ao auxiliar
20%
Ênclise ao principal
0%

A próxima variável controlada diz respeito à presença de elemento interveniente


à locução, a fim de verificar seu comportamento com relação ao fenômeno em variação
analisado.
Tabela 18: Presença de preposição entre os verbos da locução

Próclise ao Próclise ao Ênclise ao Ênclise ao Total


auxiliar principal auxiliar principal

Nº de % Nº de % Nº de % Nº de %
dados dados dados dados
Presença 1 3% 14 45% 0 0 16 52% 31
(24%)
Ausência 20 20% 36 36% 3 3% 40 40% 99
(76%)
Total 21 16% 50 39% 3 2% 56 43% 130

Como vemos na tabela anterior, na presença de elemento interposto à locução


verbal, não observamos casos de ênclise ao auxiliar. Isso comprova, como afirma Vieira
(2002, p.314), que, no PB, a ligação do pronome intralocucional se dá com o segundo
verbo da locução. Em outras palavras, o PB revela uma tendência à próclise ao
principal, em detrimento da ênclise ao auxiliar. Além disso, a única ocorrência de
próclise ao auxiliar em locuções com preposição intermediária corrobora a hipótese de
109

Perini (2001, p. 232) de que “o clítico antes do Aux teria aceitabilidade mais ou menos
reduzida”. Já nos dados sem preposição, encontramos considerável número de
ocorrências dessa posição (20%).
A tabela também revela que a presença ou ausência de elemento entre os verbos
da locução não altera o equilíbrio relativo de dados de próclise e ênclise ao principal.
Vemos que essas posições predominam no corpus e seus usos se equiparam, em termos
de porcentagem, independentemente da intervenção de elemento entre os verbos.
Registraram-se 45% de próclise ao principal e 52% de ênclise ao principal, com
preposição. Já sem preposição, foram 36% de próclise ao principal e 40% de ênclise ao
principal, números bem próximos.

5.2.2 Ponderação estatística

Também para análise de ocorrências de pronomes átonos com locuções verbais,


foi necessário realizar algumas alterações para a segunda rodada de dados, a fim de
obter os pesos relativos dos fatores. Como dissemos no item 4.2, essa rodada deve ser
binária. Assim, tivemos de optar por apenas duas variantes da variável dependente.
Nossa eleição foi pelas posições que apresentaram maior número de ocorrências,
próclise e ênclise ao verbo principal, com 50 (47%) e 56 (52%) dados, respectivamente.
Usamos a primeira variante como valor de aplicação.
Outra mudança necessária foi a retirada dos fatores em que havia uma
quantidade insignificante de dados, bem como os casos de KnockOut, isto é, aqueles em
que há regra categórica (0 ou 100% dos dados) em algum fator. Desse modo, foram
excluídas, no grupo de fatores categoria pronominal, as funções pronominais de índice
de indeterminação do sujeito e pronome apassivador, pelo número reduzido de dados
das variantes selecionadas; no grupo forma do verbo principal, as ocorrências de
gerúndio, por não apresentarem dados de ênclise ao principal. No grupo contexto
morfossintático, foi necessário amalgamar os casos de início absoluto de período com
os de início de oração, considerando o resultado categórico do primeiro fator. Teve de
ser excluído desta análise o grupo forma pronominal, pois todas as ocorrências das
formas me e nos se encontram proclíticas ao verbo principal; as de pronome acusativo
de terceira pessoa não apresentam dados de próclise ao principal; e as do clítico lhe
representam uso categórico da variante pré-locução.
110

Realizada a rodada binária, o Goldvarb selecionou, entre todos os grupos de


fatores controlados, apenas dois como relevantes para o fenômeno. Por ordem de
importância, são eles: gênero textual e categoria pronominal. O primeiro grupo
apresentou os valores expressos na seguinte tabela.

Tabela 19: Próclise ao principal segundo a variável gênero textual


Fator Próclise ao principal (Input 0.44)
Frequência Percentual PR
Crônica 26/30 87% 0.91
Reportagem 13/14 93% 0.95
Artigo 6/8 75% 0.83
Edital 5/54 9% 0.08

Vemos que o gênero edital, mais formal, desfavoreceu o uso da variante


selecionada, considerando seu percentual de 9% e baixíssimo peso relativo (0.08). Nos
demais gêneros, prevalece o uso de próclise ao verbo principal, já que todos possuem
peso relativo significativo, o que quer dizer que favorecem tal variante.

Tabela 20: Próclise ao principal segundo a variável categoria pronominal


Fator Próclise ao principal (Input 0.44)
Frequência Percentual PR
OD 25/63 40% 0.32
OI 4/6 67% 0.62
PIV 21/35 60% 0.78

Nesse grupo, fez-se necessário eliminar alguns fatores, como comentamos


anteriormente. Restaram apenas as categorias de objeto direto, objeto indireto e parte
integrante do verbo. Nessa conjuntura, observamos que a primeira função mostrou-se
desfavorável à realização da variante selecionada (peso relativo 0.32), enquanto as
demais são mais produtivas em relação ao fenômeno. Ressaltemos que as formas do
clítico acusativo de terceira pessoa estão incluídas na categoria OD e são favorecedoras
da ênclise ao principal, como vimos em 5.2.1.
111

6 Considerações finais

Esta tese tem como tema a colocação pronominal no português escrito brasileiro
e, como objeto de estudo, textos de quatro gêneros de diferentes graus de formalidade:
crônica jornalística, reportagem de revista, artigo acadêmico e edital de concurso
público. Nossa hipótese inicial era a de que encontraríamos relevante variação na
colocação pronominal nos gêneros estudados, de modo que os mais formais
apresentariam maior conformação com a norma padrão e os mais informais tenderiam a
uma aproximação com a modalidade falada. Nossa hipótese se confirmou.
Pudemos constatar que no gênero mais formal, edital de abertura de concurso – e
com estruturas indeterminadoras – sobrevive a mesóclise. A ênclise apresentou dados
que superam os de próclise nesse gênero. Por outro lado, o gênero mais informal, a
crônica jornalística, favoreceu fortemente a ocorrência da variante proclítica (PR 0.82),
em detrimento da enclítica.
Nas reportagens de revista e nos artigos acadêmicos o peso relativo da variante
pré-verbal é mediano, tendo em vista que apresentam ocorrências equilibradas de
próclise e ênclise. Assim, pudemos traçar um contínuo do uso das posições pronominais
com formas verbais simples em função do grau de formalidade dos gêneros, que vai do
menos ao mais formal. Entendemos que perseguir o propósito de contribuir com a
sistematização do comportamento das variedades em função dos continua de oralidade-
letramento, monitoração estilística e urbanização seja “essencial para que o profissional
de ensino possa avaliar a extensão da variabilidade interna à norma culta e, assim,
consequentemente, repensar suas práticas de orientação normativa” (VIEIRA e LIMA,
2019, p. 10). Esperamos, então, que esta pesquisa possa colaborar com essa importante
frente de trabalho que, segundo as autoras, ainda está por ser feita.
Nos casos de clítico acompanhado de locução verbal, foi possível confirmar
nossa hipótese de que, em gêneros mais informais, a preferência seria pela próclise ao
verbo principal, tendência já apontada nas gramáticas do PB (por exemplo, AZEREDO,
2010 e CASTILHO, 2010). Nos gêneros crônica e reportagem, o percentual geral de
ocorrência dessa posição foi de 81% e 87%, respectivamente, com peso relativo de 0.91
e 0.95, na mesma ordem. Nos artigos, essa também foi a posição preferida, porém, com
percentual total menor, de 40%. Mesmo assim, mostrou-se favorecedora da variante,
com peso relativo de 0.83. Apenas no gênero edital, a próclise ao principal não
112

prevaleceu, sendo mais usada a ênclise ao verbo principal, com 72% de dados. É,
portanto, o único gênero desfavorecedor da variante mais corrente no PB, com peso
relativo de 0.08.
As variantes proclíticas e enclíticas ao verbo auxiliar apresentaram poucos
dados, sobretudo a segunda, da qual encontramos apenas 3 ocorrências, todas no gênero
artigo acadêmico e restritas a estruturas com a forma pronominal se e modal poder,
corroborando os resultados de Vieira (2002):
Fica confirmado, também para o “corpus” escrito do PB, que a variante
supostamente enclítica a V1, prescrita pela gramática tradicional, ocorre em
contextos muito particulares, como o de início de oração e, ao que parece,
restrita à estrutura do tipo verbo <poder + se>, na qual não se costuma
omitir, inclusive, o hífen, que sinaliza essa ligação. (VIEIRA, 2002, p. 315)

Diante do exposto, damos por alcançados os seguintes objetivos específicos


propostos inicialmente: averiguar em que contextos a mesóclise ainda é utilizada no
português escrito brasileiro e comparar a escolha da posição pronominal em cada gênero
pesquisado, a fim de verificar em quais há maior ou menor conformação com a norma
padrão. Havia ainda outro objetivo: analisar o fenômeno da colocação pronominal por
contexto morfossintático (forma/tempo verbal, existência ou ausência dos ditos
“atratores”, posição do clítico no período, tipo de oração) e por tipo de clítico (pessoa
gramatical do pronome, função sintática). Acreditamos que este também foi atingido,
considerando as conclusões que seguem.
No que diz respeito à análise de ocorrências de clíticos com verbos simples, o
fator contexto morfossintático se mostrou ainda mais relevante que o gênero textual, na
ponderação estatística. A presença de elemento atrator (advérbios, pronomes
interrogativos ou indefinidos, palavra negativa, conjunção subordinativa ou pronome
relativo) realmente constitui um fator de influência quase categórica no
condicionamento da próclise, com peso relativo de 0.94. É importante observar que
nesse fator se incluem as orações subordinadas desenvolvidas, justamente por serem
iniciadas por uma dessas classes de atratores (conjunções subordinativas ou pronome
relativo). Contudo, os resultados mostraram que a próclise não é condicionada, no
corpus, somente pelos elementos tradicionalmente considerados atratores, segundo a
GT. Nas orações coordenadas (encontramos no corpus apenas orações alternativas,
adversativas e aditivas, com pronomes átonos acompanhados de formas verbais
simples), por exemplo, também houve preferência pela variante pré-verbal, com peso
relativo de 0.64. Os casos de ocorrência de pronome átono precedido de sujeito
113

explícito, sem a presença prévia de elemento também apresentaram alto percentual da


variante pré-verbal (81%), embora a GT prescreva a ênclise, nestes casos. As
circunstâncias que desfavoreceram a próclise em detrimento da ênclise foram: início de
oração ou período, oração reduzida de infinitivo e gerúndio e início de item. Esse último
contexto contraria as prescrições da gramática normativa, já que são orações
subordinadas coordenadas entre si, porém, se justifica, provavelmente, pela tentativa de
evitar a impressão de que se iniciou período com pronome átono, considerando sua
distribuição em tópicos (ver item 5.1.1).
Os resultados revelam que o escritor culto entende que os contextos de início de
oração/período e orações reduzidas impedem a próclise e está atento a isso, mas
demonstra um comportamento vacilante, já que faz próclise onde a GT manda usar
ênclise, em número expressivo de dados, embora com tendência mediana (PR). E ele faz
ênclise onde a gramática manda colocar próclise também, embora com pouca
expressividade e a depender do grau de formalidade do gênero textual. Ocorre que o
escritor culto possui um conhecimento multidialetal, uma gramática mista, ou, segundo
os formalistas, existem gramáticas em competição em sua mente.
O fator contexto morfossintático não foi apontado como relevante no
condicionamento da colocação pronominal, nas ocorrências com formas verbais
locucionais. O tempo ou forma do verbo não se mostrou pertinente, nem com verbos
simples, nem com locuções verbais.
O tipo de clítico também foi um critério importante na análise estatística, tanto
nos dados de formas verbais simples quanto de locuções. No primeiro caso, dois fatores
relacionados ao tipo do pronome foram selecionados pelo programa Goldvarb: a forma
e a categoria pronominal. No primeiro fator, as formas me (o uso dessa forma parece
estar relacionado a gêneros textuais mais informais e por isso, talvez, propicie a variante
pré-verbal) e se (quando não indeterminador ou apassivador) tenderam a favorecer a
próclise e as formas lhe(s) e o (e variantes) a desfavorecem. Quanto à categoria do
pronome, os resultados mostram que os pronomes de objeto direto e indireto são
propensos à posição proclítica e os pronomes apassivadores e indeterminadores
evidenciaram um favoritismo à ênclise. Já nos dados de locução verbal, o clítico se
indeterminador ou apassivador apresentou reduzido número de dados, pelo que foi
preciso eliminá-los da rodada binária, em que o programa selecionou somente a variável
categoria pronominal como significativa e mostrou que os pronomes em função de
objeto direto são desfavorecedores da próclise ao principal, ao passo que os de objeto
114

indireto e os que são parte integrante do verbo a favorecem, com 0.62 e 0.78 de peso
relativo, respectivamente.
De maneira genérica, esta pesquisa ratificou que a próclise a verbos simples é a
posição preferida no PB, mesmo em gêneros escritos. Por outro lado, mais
especificamente, a análise das variáveis mostrou que são aspectos relevantes no
emprego da ênclise: o grau elevado de formalidade do texto, o contexto inicial de
oração/período e o tipo de clítico, sendo o pronome se indeterminador ou apassivador e
o clítico acusativo de terceira pessoa condicionadores da variante pós-verbal.
Nos casos de locução verbal, houve uso equilibrado das variantes proclítica e
enclítica ao verbo principal. Em termos de tendências gerais, é preciso destacar que a
variante inovadora do PB, a próclise ao V2, é expressiva na escrita culta e a segunda
variante está condicionada ao clítico acusativo de terceira pessoa e aos gêneros mais
formais. Quanto às demais posições, é importante mencionar que não se observa
efetivamente efeito proclisador, com locuções verbais (nem a norma-padrão é tão
explícita nesse caso). Quando acontece próclise ao primeiro verbo, trata-se da estrutura
de indeterminação e/ou voz passiva; quando acontece ênclise ao primeiro verbo, há uma
estrutura cristalizada – pode-se/deve-se + infinitivo. Na análise de pesos relativos,
destacaram-se como significativas as variáveis Forma pronominal e Gênero textual.
Somente os casos de próclise e ênclise a V2 foram analisados, nessa rodada. O gênero
crônica é altamente condicionador da primeira variante, enquanto o edital propiciou o
uso da segunda. Quanto à forma pronominal, todos os dados do pronome de primeira
pessoa singular e plural, usados em gêneros mais informais, posicionaram-se antes do
verbo principal. Em contrapartida, os clíticos acusativos de terceira pessoa, foram
usados majoritariamente em ênclise ao principal (92%) e os dativos, absolutamente em
próclise ao auxiliar.
Finalmente, enfatizamos nosso desejo de que, além de descrever um fato
linguístico e suas variantes, esta pesquisa possa contribuir para a prática pedagógica, no
que tange ao tema da colocação pronominal, uma vez que o ensino da posição dos
pronomes, em PB, tem se mostrado um tema um tanto controverso, em virtude das
divergentes abordagens do assunto. Acreditamos que seja importante ensinar as regras
da norma padrão, relacionando-as sempre ao gênero textual, orientando o discente sobre
a possibilidade de variação na opção pela posição dos pronomes adequada ao gênero. É
inquestionável que a reflexão sobre a prática do professor não é possível sem o
conhecimento detalhado do fenômeno da sínclise pronominal (VIEIRA, 2018, p.121). É
115

a partir da análise da descrição e caracterização desse fenômeno que se devem traçar


maneiras de abordar o tema.
Diante disso, é preciso frisar que os PCN preconizam um ensino de língua
materna que parta dos diversos gêneros textuais, orais e escritos, de modo a desenvolver
no discente a competência de leitura e produção textual, o que torna imprescindível a
descrição das variedades do PB, sejam relacionadas à variação diatópica, diafásica ou
diastrática. Nesse sentido, convém aplicar, em sala de aula, o princípio dos três continua
proposto por Bortoni-Ricardo (2004).
Também é importante que o professor mostre ao aluno que a eleição do gênero
no qual se produzirá o texto se dá em função do contexto em que ocorre e dos objetivos
dos interlocutores da situação comunicativa e, do mesmo modo, “as determinações
linguísticas de um texto têm raízes nas condições reais de sua produção e recepção”
(ANTUNES, 2009, p. 210), ou seja, produzem-se textos de acordo com fatores
contextuais presentes na situação comunicativa. Consequentemente, é indiscutível que o
papel da escola e, especificamente, do professor de língua materna não é ensinar apenas
a norma padrão, mas ensinar a ler, compreender e produzir textos dos mais diversos
gêneros, utilizando diversas formas de linguagem e língua. A escola é, pois, lugar de
todas as modalidades de uso.
De tudo o que foi exposto depreende-se que, embora a escrita seja comumente
vista como mais uniforme que a fala, é incontestável a sua diversidade. A escrita é
plural, porque é um ato social, uma atividade interativa e dialógica. Não é produto, é
processo, e, por isso, não possui modelos pré-definidos ou moldes que se seguidos
levam à perfeição. Ensinar a escrever, portanto, vai muito além de uma aula de redação.
Ensinar a escrever é ensinar a enxergar a diversidade linguística e dos gêneros, é ensinar
a produzir textos adequados ao seu contexto, é ampliar a competência
linguística/comunicativa do aluno e não limitá-la.
Durante muito tempo, a metodologia de ensino de colocação pronominal
consistiu em listar regras do que se pode e do que não se pode fazer. Duas dessas regras
que se tornaram célebres são “não se começa frase com pronome átono” e “o advérbio
de negação atrai o pronome”. De acordo com essa visão, cabe ao aluno memorizar as
prescrições e pô-las em prática, ainda que sem entendê-las bem, pois isso significa saber
escrever bem e gera bons resultados e boas notas em Redação. Desse modo, não se
levam em consideração alguns questionamentos dos alunos, como: Por que não posso
começar frases com pronome, se, ao falar, todos os brasileiros fazem isso? Ou: Por que
116

o “não” atrai o pronome? O que significa isso? Ou seja, trata-se de uma pedagogia
mecânica, que não vê o discente como ser pensante e que nada tem a ver com a proposta
dos PCN de conduzir os estudantes à reflexão sobre sua própria língua.
É do senso comum que a escola é lugar de letramento, que é missão da escola
ensinar a escrever, já que os alunos já sabem falar. Contudo, o ensino da disciplina
Redação urge mudar. É necessário que se deixe de enxergar a produção textual como
uma técnica ou um método infalível, que conduz a um bom resultado em provas e
vestibulares. Escrever é muito mais que isso. A dissertação de concursos não é o único
gênero textual que tem de ser aprendido. Esse método leva ao pensamento de que todos
os gêneros têm de ser escritos da mesma forma, o que não é verdade. A variação deve
ser contemplada no ensino de língua materna e de produção textual. É preciso mudar de
foco e deixar de centrar o ensino na norma padrão da língua, como afirma Antunes
(2009, p. 214): “É necessário que o foco do ensino de LM deixe de ser a ‘correção’
gramatical, a ‘higiene ortográfica das palavras’.” Não é que tais questões não devam ser
abordadas nas aulas, mas sim que a gramática ensinada tem de ser a gramática de cada
gênero específico, ou seja, uma gramática variável, “uma gramática mais próxima das
operações que as pessoas realizam quando usam a língua em situações concretas de
comunicação” (ANTUNES, 2009, p. 214). Isso torna o aprendizado mais prazeroso,
natural, descomplicado e alcançável, pois o conteúdo seria mais compreensível e
acessível.
O primeiro aspecto a ser mudado, no ensino de língua materna, é o conceito que
se tem da própria língua. Muitos alunos e até mesmo professores afirmam que o
brasileiro não sabe falar português. Ora, que língua falamos então? Como nos
entendemos? Confundem-se, portanto, os conceitos de língua e de variedade padrão.
Sobre isso afirma Neves (2017, p. 48): “... na própria visão do povo, que, como
percebemos claramente nos dias de hoje, fala como pode, mas considera e aceita que
não fala como deve, quando não tem o padrão autorizado”. Essa ideia representa uma
visão limitada. O conceito de língua precisa ser ampliado. É necessário que se entenda
que todas as línguas apresentam variação e se distribuem em contínuos. Portanto, é
natural que o falante adquira primeiro a variedade vernacular, a partir de contextos
informais. O papel da escola não é condenar e eliminar a variedade do aluno e sim levá-
lo, gradativamente, ao conhecimento e domínio de variedades mais formais, orais e
escritas, fazendo-o percorrer o contínuo linguístico e entender a necessidade de
adequação sociocultural do uso da língua.
117

É preciso gerar a consciência da necessidade de um ensino de língua materna


baseado na reflexão sobre a realidade sociolinguística brasileira e que tenha como
objetivo a ampliação da competência comunicativa do corpo discente. Desse modo, não
se pode confundir ensino de português com ensino de norma padrão, pois esta é apenas
uma idealização, uma convenção, uma abstração. Ensinar língua materna é ensinar a ler,
compreender e escrever em português, nas suas diversas formas, é provocar a reflexão
no aluno sobre sua própria língua e seu modo de falar. Como colocar isso em prática
tem sido o questionamento de muitos professores que já reconhecem a necessidade de
um ensino multidialetal, mas não sabem como fazê-lo. Acreditamos e confiamos na
solução proposta na Apresentação do livro Ensino de português e sociolinguística
(MARTINS et. al., 2014, p.12,13):
Ao professor, cabe conhecer o perfil das variantes com que lida diariamente
nas produções de seus alunos, avaliar sua natureza e orientar os estudantes na
busca da adequação dos textos que produzem em relação ao gênero e à
situação interacional em que se encontram e no reconhecimento de variantes
pouco familiares nos textos que leem [...] Em outras palavras, é preciso que o
professor domine um contínuo de normas que, segundo Bortoni-Ricardo
(2004, 2005, 2008), vai (i) do mais monitorado/formal ao menos
monitorado/informal (contínuo de monitoração estilística); (ii) do mais rural
ao mais urbano (contínuo de urbanização); e (iii) do mais oral ao mais escrito
(contínuo oralidade-letramento).

O primeiro passo a ser dado pelo professor é, portanto, o reconhecimento da


realidade linguística multifacetada do português e da necessidade de trabalhar com essa
realidade, em sala de aula, a fim de que os alunos realmente aprendam e não somente
memorizem e consigam desempenhar-se bem nas mais variadas tarefas comunicativas.
É conveniente começar pelas práticas orais e, logo, as escritas. O segundo passo é
selecionar bem os textos com os quais e a partir dos quais trabalhará. Cabe ao professor
avaliar as tarefas propostas e os textos escolhidos como modelo linguístico, nos
materiais didáticos que utiliza, seja por opção, seja por imposição da escola. Caso não
utilize material didático, terá maior liberdade de escolha e poderá selecionar textos que
efetivamente condigam com o português culto atual e real, de gêneros presentes no dia a
dia do brasileiro. Somente com a utilização de uma pedagogia pautada na pluralidade de
normas do PB, o processo de ensino-aprendizagem fará sentido para o aluno e,
consequentemente, surtirá o efeito esperado. Portanto, as orientações normativas, no
contexto escolar, precisam estar relacionadas ao conhecimento detalhado das chamadas
variedades cultas, em diversos gêneros textuais.
118

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PORTINARI, Natália. A crônica dos últimos dias do Ministério do Trabalho, criado por
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Disponível em: https://epoca.globo.com/a-cronica-dos-ultimos-dias-do-ministerio-do-
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PRADO, Antônio Carlos. Os riscos da mitificação. Revista Isto é, São Paulo, nº 2558,
03/01/2019. Disponível em: https://istoe.com.br/os-riscos-da-mitificacao/. Acesso em:
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RIBEIRO, Aline. Marina Silva, a candidata invisível: os desafios de uma campanha sem
dinheiro, sem tempo de TV e sem alianças. Revista Época [on-line], Rio de Janeiro,
03/08/2018. Disponível em: https://epoca.globo.com/marina-silva-candidata-invisivel-
os-desafios-de-uma-campanha-sem-dinheiro-sem-tempo-de-tv-sem-aliancas-22942713.
Acesso em: 17 ago. 2018.

VAIANO, Bruno. Sonda chinesa faz o primeiro pouso no lado “escuro” da Lua. Revista
Superinteressante [on-line], São Paulo, 03/01/2019. Disponível em:
https://super.abril.com.br/ciencia/sonda-chinesa-faz-o-primeiro-pouso-no-lado-escuro-
da-lua/. Acesso em: 04 jan. 2019.

II) Artigo

BEZERRA, Valéria Cristina. Ao correr dos olhos: presença de fatores nacionais e


estrangeiros nas crônicas de José de Alencar. MOARA (UFPA). 2017, n. 48, p. 12-22.
Disponível em: https://periodicos.ufpa.br/index.php/moara/article/view/4712. Acesso
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GERÔNIMO, Valéria Vicente; DIAS, Alexandra Pereira. O sincretismo semiótico do


gênero charge sobre as manifestações políticas no Brasil. Prolíngua (UFPB). 2017,
v.12, n.2, p. 36-49. Disponível em:
http://www.periodicos.ufpb.br/index.php/prolingua/article/view/38230. Acesso em: 23
jan. 2019.

MORAES, Everton de Oliveira. Da solidão do deserto ao caos das trevas exteriores:


ascese e invenção em Paulo Leminski. ALEA (UFRJ), 2018, v.20, n.2. p.74-91.
Disponível em: https://revistas.ufrj.br/index.php/alea/article/view/18665. Acesso em: 23
jan. 2019.

TRAJANO, Raphael de Morais. A materialidade significante da musicalidade: uma


proposta discursiva de teorização, metodologia e análise. Cadernos do IL (UFRGS),
2017, n.55, p. 148-163. Disponível em:
https://seer.ufrgs.br/cadernosdoil/article/view/67742. Acesso em: 23 jan. 2019.

III) Edital
BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Federal Fluminense. Edital n.º 235/2017.
Disponível em: https://concursos.iff.edu.br/. Acesso em: 01 fev. 2018.
123

GOIÂNIA (GO). Câmara Municipal. Edital n.º 01/2018. Disponível em:


https://centrodeselecao.ufg.br/2018/concurso_camara_goiania/editais/114-edital-n-01-
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BLUMENAU (SC). Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal de Administração.


Edital n.º 001/2018. Disponível em:
http://www.furb.br/concurso/lista_concurso.php?tipo=1. Acesso em: 22 fev. 2019.

BRASIL. Ministério da Educação. Universidade Federal do Oeste da Bahia – UFOB.


Edital n.º 38/2018. Disponível em: http://www.in.gov.br/materia/-
/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/36863772/do3-2018-08-15-edital-n-38-de-
14-de-agosto-de-2018-concurso-publico-36863759. Acesso em: 25/08/2018.

AMAZONAS. Governo do Estado. Agência de Defesa Agropecuária e Florestal do


Estado do Amazonas – ADAF . Edital n.º 01/2018. Disponível em:
http://www.adaf.am.gov.br/concurso-adaf/. Acesso em: 02 out. 2018.

IV) Crônica

CARPINEJAR, Fabrício. Não existe dia ruim; A invisibilidade da limpeza; O umbigo


no celular; O quanto amo minha filha para entender sua implicância; O cheiro da mãe;
O rosto desaparecido; O menino dono da bola; Beijo diário de despedida; A vida não
mais nos pertence. Disponível em: http://carpinejar.blogspot.com. Acesso em: 01 set.
2018.

MEDEIROS, Martha. Todo o resto; A interferência do tempo; Melhorar para pior;


Apaixonados; Prós e contras da ponderação; Perder a viagem; Os lúcidos; Fugir de casa;
A morte por trás de tudo. In: Coisas da vida. Porto Alegre: L&PM, 2005. p.8-22.

PRATA, Mário. Espirrando a crônica; Perfume de gardênia; O cravo; Bêbado: o


amador e o profissional; A mulher de oitenta; A mulher que fuma; A mulher de
quarenta; Chico Buarque em Paris; e Os corruptos brasileiros ficaram indignados.
Disponível em: https://marioprata.net/cronicas. Acesso em: 01 set. 2018.
124

Anexo
Exemplos dos textos que constituem o corpus

A seguir apresentam-se exemplos dos textos selecionados para compor o corpus


de nossa análise, os quais seguem a numeração proposta no item 1.4 desta tese. Todas
as ocorrências de pronomes oblíquos átonos estão destacadas nos textos. Primeiramente,
propomos três exemplos do gênero crônica, um de cada autor: O menino dono da bola,
de Fabrício Carpinejar; Bêbado: o amador e o profissional, de Mário Prata; e Os
Lúcidos, da cronista Martha Medeiros.
Em segundo lugar, apresentamos um texto do gênero reportagem intitulado
Marina Silva, a candidata invisível: os desafios de uma campanha sem dinheiro, sem
tempo de TV e sem alianças, de autoria da jornalista Aline Ribeiro e publicado na
revista Época, em 03/08/2018.
Dos gêneros artigo acadêmico e edital de abertura de concurso público, optamos
por apresentar apenas um fragmento de cada um, considerando a extensão de tais textos.
O primeiro excerto é do artigo Da solidão do deserto ao caos das trevas exteriores:
ascese e invenção em Paulo Leminski, publicado na revista ALEA, da UFRJ, em 2018,
escrito por Everton de Oliveira Moraes, que é vinculado à Universidade Estadual do
Paraná. É importante frisar que não computamos as ocorrências de pronomes em
citações de outro autor.
O segundo trecho é do edital nº 01/2018, de abertura do Concurso Público para
provimento do quadro permanente e a formação de Cadastro de Reserva da Câmara
Municipal de Goiânia, cuja banca organizadora foi o Centro de Seleção da Universidade
Federal de Goiás (UFG). Seguem os textos.

Gênero crônica

Crônica 7 – Fabrício Carpinejar: O MENINO DONO DA BOLA

A bola era cara antes dos anos 80. Não se reproduzia em série como hoje, não
havia oferta do produto por diferentes marcas, não se adquiria a bola oficial da Copa, da
Libertadores, do Campeonato Brasileiro e do Gaúcho, não podia ser encontrada em
125

camelôs, muito menos tinha a aparência como a conhecemos: impermeável, sem


costura, realmente esférica e de várias cores.
A bola tinha gomos de couro, que caíam conforme o uso. Ia se desfolhando
como massa de pastel, até aparecer a bexiga, que saía para fora como uma espinha
gigante pronta a estourar. Não durava muito. Costurada à mão, artesanal mesmo, exigia
cuidados especiais, como esfregar sebo no couro, assim como um surfista passa parafina
em sua prancha. Tudo para deixá-la mais resistente aos paralelepípedos e campos de
terra batida.
O risco de perdê-la costumava ser imenso. Jogávamos também nas ruas, com
traves de tijolos e, invariavelmente, diante do chute desesperado do zagueiro para
desafogar o ataque, a bola quebrava uma vidraça ou parava no pátio de alguma
residência, e os vizinhos não a devolviam, para compensar o prejuízo. Isso quando não
terminava atropelada por um carro. O estouro ou a apreensão de uma bola poderia
significar o término da brincadeira por meses, suspender o campeonato do bairro, pois a
turma não desfrutava de condições de comprar outra.
Receber uma bola de presente costumava ser uma dádiva da classe média alta
para cima. Coisa rara para nós, molecada descalça. O que criou condições para o
surgimento de uma figura odiada no meu tempo: o menino rico que dava carteiraço
porque trazia a bola. Ele nunca jogava nada, inábil e desastrado, com alma perna de pau,
mas mandava e desmandava nas partidas. Agia como um híbrido de gandula, técnico e
cartola. Abusava da autoridade de sua posse. A pelada só começava quando ele
autorizava, do lado do time que ele desejava, com o regulamento inesperado de seu
humor. Quando perdia, ele apitava o fim do duelo. Do nada, estragava a disputa,
enervava o adversário dizendo que não havia vencedor já que o jogo foi suspenso e
corria para casa com a desculpa de que a mãe o estava esperando. Queríamos bater em
sua lata esnobe, enchê-lo de porrada devido a sua tirania, oferecer uma lição ao seu
egoísmo filhinho da mamãe, porém pensávamos melhor e aceitávamos a cartolagem,
passivos e obedientes, porque só ele possuía a bola, no raio de 10 quilômetros.
Todas as pessoas de que não gosto na vida, eu as imagino com uma bola debaixo do
braço fugindo para casa. Nunca me recuperei dessa submissão na infância.

Publicada em Jornal Zero Hora em 19/12/2017.

Crônica 13 – Mário Prata: BÊBADO: O AMADOR E O


PROFISSIONAL

Sim, minha amiga, existem os amadores e os profissionais. E são facilmente


reconhecidos. Pra começar, o profissional está sempre penteado. Despenteou, esteja
certa de estar diante de um bêbado amador.
O amador é chato. E não tem exceção. Ele pode até não ser chato quando sóbrio.
Mas passou de terceira dose, é dose.
Não sei como, mas o bêbado profissional nem hálito etílico exala. Pelo contrário,
chega a ser até perfumado. Já o bafo do amador chega até mesmo antes dele. Pior que
hálito de bêbado amador, só mesmo de bêbada amadora. É mesmo uma desgraça.
O profissional jamais – jamais! – bate em mulher. Pelo contrário, chega com fala
mansa e diz palavras leves. Geralmente leva. Apareceu falando alto, te cuida, é amador.
O BP (vamos chamar assim o bêbado profissional) sempre chega em casa
dirigindo sem bater. Não se lembra como, é claro, mas chega. O BA nem acha o carro.
126

E nem se lembra no dia seguinte. Acorda tentando reconstituir a noite para saber em que
gole ficou a viatura.
BP que se preza jamais fala no ouvido da gente e muito menos coloca a mão no
ombro da pessoa a quem se dirige. Já o BA é especialista em ouvidos, ombros e – mais
tarde – colos. Também costuma conversar segurando na sua mão, seja homem ou
mulher.
Quando um deles vem chegando com aquele olhar de bebum, basta olhar nos
sapatos. O do BP está limpo. Do BA está – inclusive – desamarrado.
No tempo em que eu bebia – e me considerava profissionalíssimo – um
conhecido escritor e BP foi até a minha casa. Servi um uísque para nós dois e ele
perguntou:
– Quantas garrafas você tem em casa?
Diante de tal pergunta imaginei que ele fosse mamar (BP odeia essa expressão) mais
que uma.
– Mas essa está cheia!..
– Você é amador! – e deu uma golada e uma gargalhada. – Amador! E eu que te
considerava um profissional…
Fiquei indignadamente sóbrio:
– Como amador??? Como???
– Meu querido, um profissional do álcool não tem apenas uma garrafa em casa.
– Bem, eu tenho mais uma guardada.
– Oito, meu filho, oito!!! Um bom bebedor tem que ter no mínimo oito garrafas em
casa. E da mesma marca.
– Mas eu não bebo nem uma por dia…
Ele, se servindo de mais uma dose:
– Pois é aí que mora o perigo, a culpa! Veja essa garrafa. Você fica bebendo e vendo ela
se esvaziar rapidamente. De manhã ela estava cheia, de tarde já pela metade. De noite
vazia. Ou seja, você fica bebendo e vendo o quanto você bebeu! Dá culpa, você se sente
um alcoólatra. Se fosse um profissional, teria uma aqui na mesinha, outra ao lado do
computador, outra no criado-mudo, na cozinha, na sala de jantar, uma perto da
biblioteca e até uma no quarto das crianças. Não é a garrafa que deve circular pela casa.
E sim o copo. E você. Assim, meu querido amador, você não sente a garrafa se
esvaziando em algumas horas, na sua cara, te dedando, te culpando. Cada uma que você
pega estará sempre quase cheia. E não dá culpa. Pensando bem, você nem percebe que
está de pilequinho. Me serve outra. Olha aí, já bebemos metade. Assim não é possível!
Faça-me o favor!
Publicada em: Revista VogueRG, 07/05/2002.

Crônica 20 – Martha Medeiros: OS LÚCIDOS

Lúcidos, nós?? Certo está o Celso: não há a mínima chance. Podemos, quando
muito, disfarçar, tentar, arriscar uma lucidez rapidinha para ajudar um filho a decidir um
caminho, ou para escolher o nosso, mas com que garantias? Somos todos franco-
atiradores diante dos medos, dos riscos, dos erros.
Acordo de manhã desejando fazer a mala, colocá-la no meu carro e pegar uma
estrada que me leve para longe de mim, mas ao meio-dia estou sentadinha na sala de
jantar comendo arroz, feijão, bife e batatas fritas com um sorriso no rosto e
127

cronometrando as horas para não me atrasar para a mamografia: uma mulher lúcida,
extremamente.
Tem noites em que o sono não vem, me reviro na cama deixando que me
invadam os piores prognósticos: não sobreviverei ao dia de amanhã, não terei como
pagar as contas, quem me cuidará quando eu for velha, o que faço com aquela camiseta
tenebrosa que comprei, não posso esquecer de telefonar, de dizer, de avisar, e o escuro
do quarto pesa sobre minha insensatez, até que o dia amanheça e me traga de volta a
lucidez.
Quando alguém diz que você é muito lúcido, seu ego fica massageado, não fica?
Lucidez, num mundo insano como este, é ouro em pó. Outro dia me disseram que eu era
muito lúcida e foi como se tivessem dito que eu era uma jóia rara. Enfiei o elogio no
bolso e voltei pra casa me sentindo a tal. Depois do jantar, abri um livro de poemas do
meu amigo Celso Gutfreind, que além de poeta é psiquiatra, mas não atentei para o
perigo da combinação. No meio da leitura, encontrei lá um verso que dizia: "Nada neste
mundo é mais falso do que um lúcido". Meu castelo de cartas ruiu.
Enquanto trabalho com ar de moça séria e ajuizada, minha cabeça parece uma
metralhadora giratória, os pensamentos sendo disparados a esmo: digo ou não digo; fico
ou não fico; tento ou não tento - quem de mim é a sã e quem é a louca, por que ontem
eu não estava a fim e hoje estou tão apaixonada, como estarei raciocinando daqui a duas
horas, em linha reta ou por vias tortas? Alguém bate na porta interrompendo meus
devaneios, é o zelador entregando a correspondência, eu agradeço e sorrio, gentil,
demonstrando minha perfeita sanidade.
Que controle tenho eu sobre o que ainda não me aconteceu? E sobre o já acontecido,
que segurança posso ter de que minha memória seja justa, de que minhas lembranças
não tenham sido corrompidas? Quero e não quero a mesma coisa tantas vezes ao dia,
alterno o sim e o não intimamente, tenho dúvidas impublicáveis, e ainda assim me visto
com sobriedade, respondo meus e-mails e não cometo infrações de trânsito, sou
confiável, sou uma doida.
E essa constatação da demência que os dias nos impingem não seria lucidez das mais
requintadas? É de pirar.

Gênero reportagem

Reportagem 1: Marina Silva, a candidata invisível: os desafios de uma


campanha sem dinheiro, sem tempo de TV e sem alianças – Época
POR ALINE RIBEIRO
03/08/2018

Sem o séquito de costume, a ex-senadora Marina Silva chegou abatida a um


ginásio de esportes em Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte, numa noite
do começo de julho. Vinha de uma sequência interminável de compromissos, com o
visual de sempre: trajes neutros — casaco branco de risca de giz e calça azul-marinho
—, cabelo amarrado num coque e olheiras disfarçadas por uma maquiagem suave. Ao
discursar para uma plateia de cerca de 300 pessoas, errou um nome — Almickin por
Alckmin —, trocou a idade de um correligionário — 60 em vez de 70 — e fundiu as
palavras Deus e Jesus — Jeus. A campanha nem bem começou e Marina já está
128

cansada. Sem dinheiro, acorda às 4 horas da manhã para pegar o voo mais barato do dia
e dorme de favor na casa de apoiadores quando viaja para compromissos.
Em sua fala, Marina enfatizou que esta será a mais difícil de suas três disputas
pela Presidência da República. “Em 2010, pelo menos eu tinha um minuto e 20
segundos (de tempo de TV). Em 2014, dois minutos e 20 segundos. Agora vamos ter
oito segundos. Oito segundinhos. Não dá nem para dizer ‘bom dia’ direito”, afirmou à
plateia. Depois de listar os reveses, ela incorporou o otimismo e desafiou os presentes a
dar início a uma transformação da política: “Será a luta do tostão contra o milhão. De
Davi contra Golias. Mas a gente só precisa de uma pedrinha certeira no dia 7 de
outubro. A pedrinha é o voto consciente de cada um de vocês”, disse, com dedo em riste
e tom mais exaltado que o de costume. Houve quem se emocionasse.
A campanha presidencial deste ano realmente se anuncia a mais difícil da
carreira política de Marina Silva, de 60 anos. Além da escassez de dinheiro e de tempo
na propaganda pelo rádio e pela TV, ela tem um partido para chamar de seu, mas
pequeno e sem uma rede de lideranças capaz de mobilizar eleitores em seu favor. Com
essas condições, e numa disputa pulverizada entre mais candidatos, Marina precisará
superar, acima de tudo, seu modo muito particular, um tanto invisível e quase inócuo de
fazer política. Suas andanças recentes atrás de votos têm sido quase imperceptíveis. Seja
por confusão da equipe de comunicação, seja por suas próprias idiossincrasias, a
performance da candidata pouco alcança o público. Enquanto Jair Bolsonaro, do PSL,
seu concorrente mais bem posicionado nas pesquisas eleitorais, lota aeroportos e arrasta
multidões em eventos populares, Marina se restringe a lançamentos de pré-candidatos
desconhecidos da Rede Sustentabilidade — o partido criado por ela — e palestras para
plateias reduzidas. Para driblar a falta de tempo de TV, há duas semanas começou a
fazer, nas redes sociais, uma espécie de “horário pessoal gratuito” ao vivo.
Se na campanha de 2014 Marina viajava de jatinho alugado pelo PSB e
carregava pelo menos três profissionais da comunicação em cada agenda, nesta anda
mais solitária. Ela foi de avião de carreira a Contagem para o lançamento da candidatura
ao Senado do missionário evangélico e ex-jogador de basquete Kaka Menezes. Estava
acompanhada de apenas dois correligionários da Rede e de uma assessora política. “Por
enquanto, o partido não tem verba sua assessoria de imprensa. Na manhã do evento,
Marina havia passado — ela própria — num sacolão para comprar as frutas que comeria
ao longo do dia. Deu entrevista para uma rádio, visitou uma escola, um asilo e um
centro de reabilitação de viciados e posou para foto ao lado de pré-candidatos mineiros
da Rede. Nenhuma das visitas às instituições estava na agenda divulgada para a
imprensa. Não foram, portanto, noticiadas. Em cima da hora, uma entrevista coletiva foi
antecipada da noite para a tarde — e só os veículos de comunicação locais foram
avisados.
Pouco antes do início do evento, um organizador se desesperou ao saber que, por
restrições médicas, a presidenciável não bebe em copo de plástico. “Meu Deus do céu!
Pega o meu carro, vai na minha casa, faz o que precisar para achar um copo de vidro!”,
ordenou a uma colega. A novidade não havia sido notada nas campanhas anteriores.
Marina chegou com atraso de uma hora e 20 minutos ao ginásio de esportes com
paredes verde-limão e 325 cadeiras de plástico espalhadas. O clima era de
confraternização. Ela fez selfies com potenciais eleitores, distribuiu apertos de mão.
Acompanhou com palmas ritmadas um jingle feito para ela — “Seja bem-vinda,
Marina, o Brasil precisa de gente que quer lutar. Seja bem-vinda, Marina, mulher que
ensina, é fiel e que sabe amar”.
No palco, ela dividiu a atenção da plateia com o pré-candidato da Rede ao
governo de Minas Gerais, João Batista dos Mares Guia, irmão de Walfrido dos Mares
129

Guia, ex-ministro de Lula —, além de Kaka Menezes, a estrela da noite. As falas dos
políticos foram precedidas por depoimentos de ex-viciados que deixaram as drogas
depois de frequentar uma instituição de reabilitação do ex-jogador. Em determinada
altura, a campanha ganhou ares de culto. Um músico dedilhava baixinho um violão
enquanto o ex-jogador discursava, ora suave, ora exaltado, com pausas típicas de
pastores em pregações. Menezes citou versículos da Bíblia — “Bem-aventurados os
pobres de espírito, pois é deles o reino dos céus” — e mencionou Jesus. Marina também
inaugurou sua fala agradecendo a Deus, como faz sempre. Foi aplaudida três vezes em
meia hora de oratória.
A candidata da Rede chega a sua terceira disputa presidencial com a mesma
cabeça das duas primeiras, avessa a uma campanha mais profissional. Sua agenda
prioriza compromissos que não atraem multidões, mas que falam com o eleitor
individualmente, olho no olho. “A construção da agenda da Marina é um problema
crônico: tem efeito político reduzido, atende a interesses paroquiais e só fala para
convertidos”, afirmou um ex-integrante de sua campanha. “Ela acredita demais em seu
carisma. Acha que sua história de superação, por si só, é capaz de criar uma identidade
com o eleitor.”
ÉPOCA comparou a agenda pública dos três candidatos mais bem colocados nas
pesquisas. De abril a junho, Marina teve 43 eventos em nove estados, além de uma
palestra na Inglaterra. No mesmo período, o pré-candidato Ciro Gomes (PDT-CE)
computou 63 — ou 46% a mais — compromissos em 11 estados e três países —
Estados Unidos, Argentina e Suécia. A assessoria de imprensa do deputado Jair
Bolsonaro não divulga sua agenda, por afirmar que “o pré-candidato não está em pré-
campanha”. Em suas redes sociais, entretanto, é possível contabilizar viagens a 11
estados.
Para compreender a lógica política de Marina, é preciso revisitar suas origens.
Ela despertou para a militância e para os movimentos sociais no final dos anos 1970. Ao
lado do ambientalista Chico Mendes, assassinado em 1988, Marina deu início a um
processo para fortalecer politicamente os camponeses da região de Xapuri, no Acre, em
meio ao avanço de desmatadores e latifundiários que derrubavam a Floresta Amazônica
para dar espaço à criação de gado. Esse jeito “marinês” de fazer política — olho no olho
com pequenos grupos — é chamado por estudiosos de grassroots, ou raiz de grama, que
não sai do chão. “Ela e seu entorno preferem falar com um grupelho de estudantes da
Universidade de Brasília a se preparar para aparecer no Jornal coisas, mas não para
ganhar uma campanha presidencial num país continental.”
Enquanto o Fundo Eleitoral da Rede Sustentabilidade tem míseros R$ 10,7
milhões para subsidiar candidatos à Presidência, à Câmara dos Deputados e ao Senado,
a maioria dos partidos concorrentes conta com somas bem maiores. O MDB do ex-
ministro da Fazenda Henrique Meirelles encabeça a lista dos endinheirados, com R$
234,3 milhões. O PSDB de Geraldo Alckmin vem na sequência, com R$ 185,8 milhões.
As legendas de Ciro Gomes (PDT) e Jair Bolsonaro (PSL) terão R$ 61,1 milhões e R$
9,2 milhões, respectivamente. Como Marina, todos terão de dividir esses recursos com
outros candidatos. Ela contará em sua campanha com metade do fundo da sigla, R$ 5
milhões, bem menos do que os R$ 44 milhões gastos em 2014, quando concorreu pelo
PSB. Define sua campanha como “franciscana”. Em meados de julho, Marina lançou
uma vaquinha na internet. A meta era conseguir R$ 100 mil para a realização de eventos
em cinco capitais — objetivo alcançado em cinco dias. A segunda é alcançar R$ 200
mil, que serão usados para combater o que chama de “mentiras, acusações levianas e
notícias falsas” de adversários.
130

Numa noite de junho, Marina se reuniu com potenciais apoiadores na casa do


apresentador de TV Luciano Huck — que até fevereiro era, ele próprio, um potencial
concorrente ao Palácio do Planalto. Estava acompanhada de três pessoas de seu círculo
íntimo. Ao grupo de interlocutores, ainda antes de começar o jantar, contou a quantas
andava a campanha e listou nomes de coordenadores já definidos. Por fim, expôs as
dificuldades da disputa, como escassez de recursos e tempo de TV, além do que
considera uma blindagem feita por três partidos — PT, MDB e PSDB —, quando eles
criaram, no Congresso, o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).
No jantar de três horas e meia, o anfitrião e a mulher, a apresentadora Angélica,
serviram peixe de rio e arroz branco, para atender à rigorosa dieta seguida por Marina,
alérgica a várias substâncias devido a doenças que contraiu quando morou no seringal
no Acre. Embora tenha apresentado os problemas da campanha, em nenhum momento
Marina pediu ajuda financeira ou propagandística a Huck, entusiasta de sua candidatura.
“Marina não pede, não é? Talvez esteja aí uma das questões que a impedem de estar
mais bem estruturada”, afirmou um dos presentes. “Se você é um líder político sério,
com tanto tempo na vida pública e zero de track record negativo, não deveria ter prurido
em pedir.” Huck, por sua vez, não mencionou intenções de colocar a mão no bolso. Fez
um mea-culpa por não ter se envolvido mais com política no passado e reiterou que
participará mais ativamente no futuro.
Às vésperas da convenção nacional da Rede, em plena temporada de costura
política, Marina e seus articuladores pouco têm se reunido com outros partidos em
busca de coligações. Até meados de julho, falaram somente com legendas médias ou
pequenas, como PPS, PHS, PROS e PV. “Marina teve quatro anos para fundar um
partido, e ele só diminuiu”, afirmou uma fundadora que deixou a Rede. “Ela não tem a
mínima condição de manter a candidatura se não fizer coligação com partido forte.” A
candidata se recusa a negociar com os partidos do chamado centrão, aos quais se refere
como “atravessadores do sonho brasileiro”. Com 164 deputados, o centrão tem um dote
eleitoral de entre três e cinco minutos por dia na propaganda gratuita de rádio e TV e
estrutura nos estados. Sem alianças amplas e com só dois deputados no Congresso,
Marina terá oito segundos diários no rádio e na televisão.
Em vez de partidos, ela prefere se relacionar com movimentos, ou os “núcleos
vivos da sociedade”, em marinês. Bem no estilo grassroots, reuniu-se com os
movimentos Agora!, Acredito, Brasil 21, Roda Democrática, Reforma Brasil e Frente
Favela Brasil, de diferentes espectros políticos. O economista e escritor Eduardo
Giannetti, conselheiro econômico de Marina nas campanhas de 2010 e 2014, disse em
entrevista ao Valor Econômico que ela precisa decidir se é uma líder de movimento,
como o americano Martin Luther King e o indiano Gandhi, ou uma candidata a chefe de
Executivo. Por enquanto, Marina ainda não se definiu.
Um dos movimentos mais próximos de Marina é o Agora!. Em janeiro do ano
passado, ela teve seu primeiro encontro com o grupo, com alcance em 17 estados e a
pretensão de renovar a política. Entre seus cerca de 100 membros — empresários,
acadêmicos e ativistas, boa parte na faixa dos 40 anos de idade — o Agora! tem
personalidades como Huck e a cientista política Ilona Szabó, especialista em segurança
e uma das lideranças mais influentes na luta pela legalização das drogas.
Em público, o movimento se diz apartidário e sem posicionamento definido; no
privado, define-se como “liberal progressista 4.0, com uma forte carga tecnológica”,
numa variante do marinês. Desde que foram apresentados, Marina e integrantes do
Agora! se reuniram pelo menos em sete ocasiões. No final de uma tarde de junho, no
Rio de Janeiro, Marina discursou para um pequeno grupo de membros da Roda
Democrática, organização com cerca de 2 mil integrantes em sete estados, alguns deles
131

filiados a partidos como PSDB, PPS e Novo. O grupo apoia o manifesto por um “polo
democrático e reformista”, assinado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Ao
final do evento, um constrangimento: no palco, o coordenador da Roda no Rio pediu
licença para beijar o rosto de Marina e declarou que a apoiará.
Nacionalmente, porém, o movimento ainda não se decidiu. “Em 2010, Marina
era uma candidata de nicho. Agora, sem abrir mão de seus valores, ampliou o discurso e
está mais assertiva”, disse Tibério Canuto, coordenador nacional da Roda. “Mas ela
precisa se abrir para alianças. Dizer que vai governar com os melhores não é suficiente.”
Segundo um interlocutor frequente da ex-senadora, a aposta de Marina é que,
confirmada a inelegibilidade do ex-presidente Lula, ela herde boa parte dos votos antes
destinados ao líder petista. O eleitor saberá reconhecer, Marina acredita, a semelhança
de suas histórias de vida. De olho nesses votos, evita fazer críticas diretas ao ex-
presidente. De acordo com pesquisa do instituto Datafolha realizada em junho, a
candidata da Rede alcança 15 pontos percentuais em um cenário sem Lula, 4 pontos
atrás de Jair Bolsonaro (PSL), mas derrotaria o capitão reformado em um segundo
turno.
Para manter a boa posição até 7 de outubro, espera aproveitar sua exposição na
TV. Apesar do reduzido tempo na propaganda eleitoral, sabe que terá a chance de
conquistar o eleitor em telejornais e programas de TV. No Jornal Nacional, da Rede
Globo, contará com um minuto e dez segundos por dia a partir de 20 de agosto —
tempo que a emissora dará a todos os candidatos que tiverem mais de 6% nas pesquisas
Datafolha/Ibope feitas na semana anterior ao início da cobertura.
Apesar da resistência de Marina em relação a coligações com grandes partidos,
os líderes estaduais da Rede manifestam uma visão mais pragmática, o que pode
beneficiá-la eleitoralmente. No Rio Grande do Sul, o partido apoia Eduardo Leite,
candidato do PSDB ao governo estadual. No Amapá, a Rede fechou aliança com Davi
Alcolumbre, candidato do DEM ao Palácio do Setentrião, sede do Executivo — o
senador Randolfe Rodrigues será candidato ao Senado pela coligação.
Além da campanha amadora, Marina terá de superar outro infortúnio: convencer
o eleitor de que não é, como a julgam seus ex-aliados, uma metamorfose política. Ela se
elegeu vereadora, deputada estadual e senadora pelo PT, com projetos para dar mais
recursos para estados com Unidades de Conservação e terras indígenas. Foi ministra do
Meio Ambiente do governo Lula, quando ganhou fama de intransigente. Sua gestão foi
dura na concessão de licenças ambientais, o que gerou acusações de travar obras, e bem-
sucedida na criação de mecanismos que resultaram na redução do desmatamento da
Amazônia. Deixou o governo por divergências, rompeu com o PT e se filiou ao Partido
Verde (PV). Candidata à Presidência em 2010, conseguiu inesperados 19,6 milhões de
votos — 17,6% do total. Seu maior ativo, naquele tempo, era apresentar um discurso
que escapava da polarização entre petistas e tucanos. Apareceu como uma alternativa
ecossocialista e ganhou seguidores ávidos por uma renovação na política.
Marina estava bem acompanhada quando estreou na corrida presidencial, em
2010. Seu vice, o empresário Guilherme Leal, fundador e um dos donos da fabricante de
cosméticos Natura, era uma figura benquista pelo mercado e ainda trazia na conta uma
fortuna pessoal de US$ 2,1 bilhões — chegara à lista de bilionários da revista americana
Forbes quatro anos antes, como a 562ª pessoa mais rica do mundo. Além de maior
financiador da campanha — doou R$ 2,275 milhões do próprio bolso —, Leal era uma
peça-chave para quebrar a resistência a Marina no meio empresarial, que a via como
“verde” demais. Os dois demoraram a se conhecer, mas não a encontrar afinidades.
A parceria, no entanto, durou poucos meses. Depois da derrota, Leal se desfiliou
do PV e desistiu da política tradicional. Em sua despedida da curtíssima carreira
132

partidária, declarou que pretendia “ajudar a construir uma política renovada, apoiando o
desenvolvimento de novas lideranças nos bastidores, não mais na linha de frente”. Um
participante da campanha disse que foi um fator pessoal que provocou a desistência. A
mulher de Leal, Samira Farah, não só nunca apoiou sua candidatura, como exigiu seu
afastamento. Ao evento do PV de lançamento da chapa Marina-Leal, Farah não
compareceu. Ao final da campanha, ela passou um tempo nos Estados Unidos, e a
relação dos dois estremeceu. Por fim, Leal escolheu o relacionamento. Em 2015, depois
de 20 anos juntos, os dois oficializaram a união num casamento tão discreto quanto o
casal, na mansão da família, no Jardim Europa, em São Paulo. Procurado, Leal preferiu
não comentar suas decisões.
Marina está mais solitária nesta campanha do que nas anteriores, quando contou
com o apoio do empresário Guilherme Leal (acima, de óculos) e de Maria Alice
Setubal, que não querem mais saber de política. Sua última derrota foi a desfiliação do
deputado federal Alessandro Molon (dir.), que trocou a Rede pelo PSB.
Fora do PV e sem o apoiador de prestígio, Marina foi incapaz de viabilizar seu
próprio partido a tempo de concorrer na eleição de 2014 e teve de lidar com mais
dissidências. Na noite de 3 de outubro de 2013, logo após a derrota sofrida no Tribunal
Superior Eleitoral (TSE), quando a tentativa de registrar sua Rede Sustentabilidade
fracassou, ela se viu diante do dilema de desistir da candidatura ou se lançar por um dos
pequenos partidos que a tinham cortejado. Numa reunião que atravessou a madrugada,
ouviu mais do que falou. A grande maioria dos presentes era contra a candidatura por
outra legenda. No último momento, surpreendeu e anunciou o desejo de propor uma
aliança a Eduardo Campos, então governador de Pernambuco e candidato natural do
PSB à Presidência da República. “A gente ficou decepcionado, muitos deixaram a Rede.
Foi uma brigaiada, uma choradeira. A gente largou todo mundo e foi beber”, disse uma
das fundadoras da Rede, hoje fora da sigla. “Cadê aquela Marina do ‘não vamos ser
programáticos, vamos ser sonháticos’?”
Alçada de vice à candidata presidencial pelo PSB devido à morte de Eduardo
Campos em agosto de 2014, Marina entrou grande na campanha. Chegou a dividir a
liderança das pesquisas com Dilma Rousseff (PT) e, após os ataques violentos que
sofreu da campanha petista, investida comandada pelo marqueteiro João Santana,
terminou na terceira posição, com 20,6% dos votos. Foi quando surpreendeu
novamente. No segundo turno, a despeito da resistência de boa parte dos aliados,
declarou apoio ao tucano Aécio Neves.
Durante o primeiro ato público da nova aliança, Marina apareceu com a
cabeleira solta e um sorriso largo. “Foi muito simbólico ver Marina soltando os
cabelos”, afirmou a fundadora da Rede. “Durante a campanha, tínhamos cansado de
pedir à Marina para soltar os cabelos, para tirar o peso conservador da imagem. Nos
causou náuseas (vê-la assim ao lado de Aécio)”. Dos 12 membros da Executiva
Estadual da Rede, sobraram quatro. Os outros oito deixaram não só seus cargos, mas
também o partido.
A maior perda depois da ressaca de 2014 foi a amiga e confidente Maria Alice
Setubal, a Neca, socióloga e uma das acionistas do Banco Itaú. Ponte de Marina com
financiadores na última campanha, Setubal disse que manterá uma “postura apartidária”
neste ano e que as duas continuam amigas. Interlocutores de Setubal atribuem sua saída
às críticas internas que sofreu ao longo do massacre do PT na campanha. Ela se
envolveu naquele período em dois episódios críticos. Numa entrevista à Folha de
S.Paulo, afirmou que Marina reafirmaria os compromissos feitos anteriormente por
Eduardo Campos a respeito de conceder autonomia, por lei, ao Banco Central. Nem
Campos nem Marina haviam ainda se posicionado sobre o assunto após o anúncio da
133

aliança. Setubal pretendia fazer um aceno ao mercado, mas, inexperiente na política,


deu munição ao adversário. O PT colocou no ar um comercial no qual sugeria que
Marina entregaria aos bancos um papel que é do presidente da República. No vídeo, a
comida desaparecia dos pratos na refeição de uma família. “Significa entregar aos
banqueiros um grande poder de decisão sobre sua vida e de sua família”, dizia o locutor.
“Você quer dar a eles esse poder?”. Mesmo prejudicada, Marina bancou Setubal.
Em outro episódio, Setubal foi a responsável por escrever o capítulo sobre
direitos LGBT do plano de governo de Marina. Um dia depois de lançar o plano, a
coordenação da campanha amenizou o tom liberal do conteúdo. Após declarar apoio à
criminalização da homofobia e à adoção de crianças por casais do mesmo sexo, voltou
atrás e refez o texto. Marqueteiros adversários usaram o recuo para acusar Marina de
inconstância. No meio da confusão, Setubal viajou para sua fazenda em Itu, no interior
de São Paulo, e passou dois dias sem atender o telefone. “Ela não participou de
nenhuma discussão para conter a crise”, disse um integrante da campanha à época.
Marina, mais uma vez, defendeu a amiga. “Marina nem sequer permitia que alguém
levasse até ela essa questão.” Setubal não atendeu ao pedido de entrevista de ÉPOCA.
Tão logo deixou a eleição passada, com um capital político de 22 milhões de
votos, Marina desapareceu. As conversas corriqueiras com ambientalistas deixaram de
acontecer. Sua agenda esvaziou. “Ela se enfurnou, não participou de mais nada da vida
político-partidária até o final do ano passado”, afirmou uma ex-integrante da campanha.
“Ficava um tempo no Acre com a família, às vezes no meio do mato, sem sinal de
celular. Desmarcava um monte de compromissos, não dava mais entrevistas.” Marina
ficou avessa à imprensa. No começo de 2015, recusou um convite do jornal Folha de
S.Paulo para voltar a ser articulista. Quando, durante uma reunião, um aliado a
questionou se não seria interessante repensar a decisão, um vocal de Marina disse:
“Marina vai continuar falando no blog e nas redes sociais dela”. A discussão acabou.
Marina calou-se diante de temas cruciais. Demorou a se posicionar até mesmo
diante da maior tragédia ambiental do Brasil. Quando a barragem da empresa Samarco
rompeu e a lama da mineração engoliu uma cidade inteira em Minas Gerais, a Rede
soltou uma nota à imprensa. Marina nada falou. O ex-ministro da Educação Renato
Janine Ribeiro cobrou-a em público. “Marina Silva é a mais importante política verde
do país. Quem mais deveria, agora, alertar para isso e propor alternativas consistentes
— repito, consistentes — para essa política de alienação dos minérios que vem desde o
ciclo do ouro é ela e a Rede”. Marina só se manifestou 22 dias depois da catástrofe, em
artigo no Valor Econômico. Sua mudez virou piada. Em entrevista recente ao Pânico, o
humorista Carioca perguntou se ela é como álbum da Copa, que só aparece de quatro
em quatro anos.
Na vida partidária, os articuladores de Marina davam início a conversas para
engordar a Rede com nomes de relevância política. Entre outros, sondavam o deputado
federal Alessandro Molon, o mais votado no PT fluminense em 2014. Uma conversa
entre ele e Marina foi marcada. O ponto definitivo que fez com que Molon aceitasse
trocar o PT pela Rede dizia respeito ao impeachment da então presidente Dilma
Rousseff, àquela altura já em discussão avançada. “Ela respondeu: ‘Não, em absoluto,
não há essa hipótese’. Era uma posição de firmeza, de convicção. Molon saiu do
encontro feliz e decidido a mudar de partido”, contou um ex-aliado que acompanhou as
tratativas. Marina era favorável à cassação da chapa Dilma-Temer pelo Tribunal
Superior Eleitoral se comprovado o uso de caixa dois na campanha, mas não ao
afastamento de Dilma.
Uma semana antes de o impeachment ser votado na Câmara, Marina, de
Chicago, nos Estados Unidos, onde participava de uma conferência organizada por
134

estudantes brasileiros no exterior, gravou um vídeo recomendando ao partido votar a


favor do impeachment. “Ficamos chocados”, disse o ex-aliado. “Se Marina não tivesse
assumido aquela posição oportunista, poderia ser hoje um nome capaz de unir a
esquerda e o centro. Estar numa posição forte, como substituta quase que natural do
Lula.” Em fevereiro deste ano, Molon trocou a Rede pelo PSB.
Na manhã seguinte ao evento mineiro, Marina conversou com ÉPOCA no
aeroporto de Confins. Mais descansada, disse que aceitou sair candidata “por seu
compromisso com o Brasil”, que precisa com urgência sair da “grande crise política que
estamos vivendo”. Durante cerca de 20 minutos de conversa, foi interrompida três vezes
para fotos por admiradores. Irritou-se ao ser indagada sobre seu sumiço e, como sempre
faz quando lhe perguntam algo que julga inconveniente, devolveu o questionamento.
“Talvez facilite se disser quais foram os temas nos quais eu não me posicionei.” Então
emendou: “Estratégias marqueteiras começaram a dizer que eu estou sumida. Porque
você transforma algo positivo, que é não estar presente no noticiário policial, em algo
negativo. Estou, de fato, sumida da Operação Lava Jato. Estou sumida na briga do
poder pelo poder, de ficar buscando alianças incoerentes. Estou presente no debate, e
não no embate. Estou sumida na prática de fazer fake news contra os adversários”.
A terceira candidatura à Presidência de Marina se dá num outro Brasil, com a
política devastada pela Lava Jato e um profundo vácuo de poder. A seu favor, a pré-
candidata é uma das poucas lideranças a terem passado incólumes por operações de
combate à corrupção. Mas terá de enfrentar barreiras enormes, como a falta de estrutura
partidária. Em vários de seus discursos, Marina diz apostar nesta eleição na sociedade
para promover a mudança. “Agora tem uma diferença. A sociedade sabe a verdade. A
Lava Jato sabe a verdade, a mídia sabe a verdade”, disse, sem explicitar a qual verdade
se referia.
Na noite do evento mineiro, Marina relembrou uma passagem de sua trajetória
política para mostrar como é possível derrotar os poderosos com pouco. Em 1994, no
Acre, estava em último lugar na pesquisa eleitoral para o Senado e sem nenhum tostão
para a campanha. A fim de falar com o povo, subia num tablado adaptado no teto de seu
carro, uma Brasília velha, e parava no ponto de ônibus para fazer um discurso de um
minuto. Seu slogan, inspirado numa música da cantora Daniela Mercury, dizia: “Para o
Senado, avisa lá que eu vou”. Marina parava, discursava, cantava e erguia o punho
cerrado. Aos poucos, eleitores que cruzavam com ela na rua devolviam o gesto. Marina
foi eleita, assim, a senadora mais jovem da República. Para a Presidência, porém,
precisará de mais do que uma Brasília e um tablado.

Gênero artigo científico

Artigo 1: Da solidão do deserto ao caos das trevas exteriores: ascese e


invenção em Paulo Leminski
Everton de Oliveira Moraes (Universidade Estadual do Paraná - Curitiba – Brasil)

ALEA | Rio de Janeiro | vol. 20/2 | p. 74-91 | mai-ago. 2018


135

Resumo

A partir de meados da década de 1970, o poeta Paulo Leminski escreve alguns ensaios
manifestando sua preocupação com o problema do esgotamento dos “recursos naturais”,
a iminente catástrofe ambiental, a possível hecatombe nuclear, e com a consequente
crise dos modos de vida dominantes no mundo moderno-ocidental. Leminski se dedica,
sobretudo, a investigar o modo como a literatura participa desse momento histórico de
escassez. Buscando pensar o lugar da arte nessa crise, ele recorre a uma série de
personagens conceituais e históricos que, sob o signo da ascese, se contrapõem à cultura
da afluência, ao ativismo e à teleologia progressista, que caracterizam a sociedade
brasileira da década de 1970, e seu correlato artístico: as literaturas engajadas, tanto nas
suas versões experimentais como nas ideológicas. Esse artigo busca pensar que tipo de
experiência do tempo está em jogo nessa ascese poética leminskiana.

Palavras-chave: Paulo Leminski, literatura, tempo, catástrofe ambiental.

Ascese e escassez
Em 1977, Paulo Leminski publica no caderno Anexo13, suplemento cultural do
jornal Diário do Paraná, um ensaio chamado “Ascese e escassez” (LEMINSKI, 1977a:
5), que faz parte do imenso repertório de escritos que o poeta publicou em periódicos 14,
parcialmente reeditados nas coletâneas Ensaios e anseios crípticos (vol. 1 e 2). No
texto, Leminski se questiona, na esteira dos desdobramentos do relatório do Clube de
Roma15 e da intensa mobilização ecológica que a ele se seguiu, a respeito das exigências
que o “esgotamento dos recursos naturais” e a catástrofe ambiental em curso fazem aos
modernos. Pergunta-se, por exemplo, sobre quem mais sofreria com a escassez e quem
estaria mais preparado para a situação histórica em que a palavra “economia” deixaria
de significar “gestão eficaz dos recursos” para adquirir o status de “poupança” urgente
daquilo que havia restado dos elementos fundamentais à manutenção da vida humana
(LEMINSKI, 1977a: 5).
A finitude dos “recursos naturais”, de acordo com Leminski, colocaria um limite
à teleologia progressista da modernidade, bem como aos modos de existência que
corresponderiam a ela. A realização da utopia desenvolvimentista, segundo a qual, no
futuro todos os seres humanos poderiam desfrutar dos benefícios do desenvolvimento e
do progresso, estaria comprometida:

Nunca o desenvolvimento tecnológico (quantitativo, progressivo, inexorável, tomado


como um Absoluto Onipotente) vai poder estender a todos os homens de todas as raças
aquele nível de vida hollywoodiana (carros na garagem, um aposento para cada filho,
geladeira cheia): os recursos naturais vão acabar bem antes (LEMINSKI, 1977a: 5).

13
Trata-se de um suplemento criado por iniciativa do poeta e jornalista Reynaldo Jardim e no qual Paulo
Leminski era editor de texto e responsável, em grande medida, pela proposta editorial.

14
Além do Diário do Paraná, publicou também diversos ensaios e poemas na Folha de São Paulo e no
Correio de Notícias, além de jornais alternativos como Pólo Cultural e Raposa.

15
3 Documento composto por cientistas, industriais e políticos, destinado a apontar os efeitos
devastadores da ação do ser humano sobre o meio ambiente global, propondo limites para o crescimento
econômico.
136

Essa utopia progressista teria algumas de suas imagens mais bem acabadas no
cinema hollywoodiano da época, nos filmes em que figuravam famílias estruturadas,
com seus jardins bem plantados, farto entretenimento, em um cotidiano tranquilo, só
eventualmente interrompido por problemas vindos de “fora”. Para Leminski, essa
teleologia jamais se completaria, já que a racionalidade progressista esgotaria a
“natureza” e suas “matérias-primas” bem antes disso. Por isso, na visão leminskiana é
preciso aprender a viver com menos:

Exaustos os recursos, irremediavelmente abalado o equilíbrio do meio ambiente, vamos


todos ter que nos contentar com menos. Menos coisas. Menos títulos. Menos. Quando o
grande Abalo Sísmico vier, os primeiros a senti-lo serão exatamente aqueles cuja
desmesurada ambição de fartura excessiva provocaram o Grande Abalo. Não é a
indústria automobilística o principal responsável pelo emporcalhamento das águas e dos
ares deste planeta? Os que sempre se contentaram com menos, com pouco, ou até com
nada (em termos de possuir coisas), sofrerão menos. Nessa hora, quanto menos você
possuir coisas, mais estará imune ao Abalo (LEMINSKI, 1977a: 5).

O que hoje se convencionou chamar de “catástrofe ambiental”, e que Leminski


nomeia “Grande Abalo”, atingiria em maior grau aqueles cujos modos de vida estariam
mais fundamentados na afluência e na apropriação virtualmente ilimitada do planeta, na
ação contínua sobre o mundo. Para o poeta, portanto, impõe-se a urgência de pensar em
modos de vida que renunciem à abundância, à grandiloquência e ao desejo, tipicamente
moderno, de “fazer algo”, de se manter ativo, não ficar parado. A este desejo, que aqui
nomeio “ativismo”, Leminski opõe a figura do asceta como um exemplo de uma forma
de vida mais adequada ao tempo que vem:

Um eremita das vastidões da Tebaida, um dos chamados Padres do Deserto, era


alimentado miraculosamente por um corvo, que lhe trazia, todo dia, uma maçã no bico.
Perto da gruta do monge, corria um riacho onde ele jogava a casca da maçã trazida pelo
corvo. Assim foi por muitos anos. Um belo dia, o monge achou que tinha atingido o
cúmulo da santidade e partiu do lugar. Descendo ao longo do riacho, encontrou outra
gruta, habitada por um monge da sua idade.
Na conversação sobre as coisas do céu, o primeiro monge mencionou, com uma ponta
de orgulho, a graça singular com que o Senhor reconhecera sua perfeição: durante 70
anos, um corvo lhe trouxera, todo dia, uma maçã. O outro monge disse que, em matéria
de favores divinos, não ficava atrás: ele se alimentara, por 70 anos, de uma casca de
maçã que, miraculosamente, vinha boiando no riacho, todos os dias. Temos sido o
primeiro monge. Vamos, logo, ter que ser o segundo. (LEMINSKI, 1977a: 5)

O personagem conceitual que o poeta evoca como “representante” de um modo


de vida outro, mais preparado para a existência pós-catastrófica, é o “asceta”, uma
figura historicamente marcada tanto pela renúncia de si como pela tentativa de,
colocando-se como “fim de sua própria existência”, criar um “equipamento de defesa”
contra as adversidades da vida (FOUCAULT, 2006: 400). A ascese deve ser aqui
entendida, nesse sentido, enquanto conjunto de práticas e técnicas rigorosas de relação
consigo mesmo, através das quais o sujeito visa à sua própria transformação, seja ela
espiritual ou corporal (FOUCAULT, 1998: 83). Nos ensaios leminskianos, este
personagem aparece recorrentemente (com diversas variantes), sempre pautado por uma
tentativa de fazer muito com pouco, experimentar o máximo de intensidade com o
mínimo de matéria, criar “força estética” (LEMINSKI, 1997: 83) e existencial a partir
do “quase nada”, como na anedota dos monges e da maçã. Desse modo, é possível
afirmar que, mais do que se contentar com o pouco que resta, existiria, segundo
Leminski, uma nova geração “preparando” seu equipamento “econômico-mitológico”
para a adoção de uma estética da “escassez”:
137

Concomitantemente, está ocorrendo uma mutação na espécie, a olhos vistos, invisível


apenas aos menos avisados. Uma nova geração (pelo menos suas camadas mais
inventivas e atuantes) desistiu de possuir, preparando a espécie para o impacto que o
Abalo e o Colapso acarretarão. Eles estão preparando o equipamento psíquico-
existencial, sócio-pedagógico e econômico-mitológico para o Grande Transe. Esta gente
será o amortecedor entre os tempos passados da Pluto-Utopia e a Nova Era de Ascese.
A Era de Aquário, meu camarada, não será festival, não (LEMINSKI, 1977a: 5).

Ascese é o nome que Leminski, inspirado pelos monges cristãos (mas também
pelos pensadores cínicos da antiguidade, hippies, xamãs, poetas de haikai, etc.), dá à
nova condição a que todos estariam submetidos em um horizonte que se aproxima cada
vez mais rapidamente. Para encará-lo, segundo ele, seria preciso inventar novas formas
de viver, muito mais próximas da poesia do que da prosa: trabalhar a si mesmo para que
se aprenda a viver com menos coisas, menos espaço, menos títulos, menos crescimento,
tal como o “hippie de estrada” (LEMINSKI, 1977a: 5), ou ainda como a poesia ou o
haikai, que exigem um intenso trabalho sobre suas formas para que funcionem dentro de
uma métrica, de uma medida, de um modo de dizer. Seria fundamental, portanto, de
acordo com o poeta, privilegiar a intensidade, a multiplicação das formas (de dizer e de
viver), produzir a partir do mínimo, do “lixo”. O que o poeta afirma, portanto, é algo
análogo ao que diz Günther Anders quando reivindica a necessidade de ultrapassar a
capacidade atual de imaginação do ser humano, para então imaginar a possibilidade de
inexistência do “contexto” mesmo no qual se fala, diante de sua iminente destruição
(ANDERS, 2013: 5) e, a partir disso, formular novas formas de existência.
Literatura e escassez
Apesar de seus inúmeros ensaios sobre a situação político-ecológica do mundo
contemporâneo, é no campo das discussões literárias que Leminski mais investe na
crítica do ativismo, questionando sua dimensão poética. Tal crítica se constitui como
um afastamento dos modos de orientação temporal teleológicos que pautam grande
parte do pensamento literário de seu momento histórico. Segundo o poeta curitibano, a
literatura/poesia de seu tempo vive uma situação de esgotamento, em que já não haveria
mais tempo para “gestos inaugurais” (LEMINSKI, 1993, p. 44), como teriam sido
aqueles da poesia concreta, da Antropofagia, da Tropicália, nem para posturas
emancipacionistas, como aquela da literatura social, que pretendia fazer da escrita uma
forma de provocar transformações na sociedade. Nesses tempos em que não haveria
mais tempo, “as certezas se evaporam” (LEMINSKI, 1993: 44):

Aí está uma bela questão. A mais bela de todas para os que vivem do verbo. Quem
escreve, vive hoje um ofício sem definições. A literatura, mãe de todas as técnicas de
escrever, morreu: foi atropelada por um trocadilho. A divisão da literatura em gêneros
(poesia/prosa) está agora com seus limites borrados: já não se sabe, na prática do texto
novo, o que é prosa, o que é poesia. Parece que a extensão de um texto define seu
caráter de “prosa” e a brevidade seu caráter de “poesia”. Mas não há mais certeza
(LEMINSKI, 1975).

A partir da análise do conjunto de ensaios de Leminski que abordam esse tema, é


possível pensar que aquilo que o poeta afirma ter morrido não é tanto a literatura em
sentido amplo, mas o que ele chama de “discurso jorno-naturalista” (LEMINSKI, 2012:
102), uma forma de literatura que tinha no romance naturalista e no texto jornalístico
suas expressões mais características. Tais discursos seriam pautados por um desejo de
“neutralidade”, de objetividade na descrição da realidade e controle da imaginação
poética, e encontrariam ressonância, por exemplo, no discurso acadêmico ou no
138

discurso ativista/panfletário do escritor do social. É essa literatura que Leminski afirma


ter encontrado seus limites históricos, e é ela que já não seria mais capaz de “castrar” a
“fantasia” e o “mito” que a constituem secretamente, não se distinguindo mais da poesia
e da ficção.
Ao aproximar a poesia/literatura da publicidade ou do design, os concretos já
haviam abandonado a ideia de uma especificidade do “literário” enquanto dimensão
distanciada da realidade (e por isso capaz de descrevê-la com justeza), e devolvido a
literatura a esta realidade, como participante ativa dela. A antiliteratura concreta, na
visão de Leminski, desferia o golpe final na literatura jorno-naturalista. Não deveria
surpreender, portanto, a transformação da prosa moderna, assim como dos recursos
naturais, em mercadorias altamente valorizadas, já que elas constituiriam “bens
inestimáveis da humanidade” (LEMINSKI, 1977a: 5) em processo acelerado de
rarefação: “o texto tradicional está em crise, a despeito de sua relativa aceitação como
mercadoria (ou por isso mesmo). Poderia o texto ainda estar vivo e passando bem no
interior do circuito elétrico?” (LEMINSKI, 1975).
Nesse cenário de incertezas, os escritores ativistas da literatura social buscariam
reafirmar o caráter objetivo e comunicativo da literatura e fazer dela um instrumento da
luta pelo progresso social e pela superação do subdesenvolvimento do país. De acordo
com Leminski, no entanto, a busca por superação do atraso e do atavismo tomaria como
instrumento uma forma não apenas em vias de extinção, mas também intimamente
ligada ao exercício do poder da classe social que responsabiliza por este
subdesenvolvimento, a burguesia. A luta pela “revolução” ou pela “transformação
social” se constitui a partir de um desejo de retorno a uma linguagem que representaria
a objetividade racionalista, a ordem e a estabilidade do mundo burguês (LEMINSKI,
201: 102).
Esses escritores sociais aos quais Leminski se refere faziam parte de uma
esquerda artística que se poderia chamar, de maneira um pouco canhestra, de “esquerda
ideológica”. Se após o golpe militar, com a instalação da Ditadura, caía por terra a
possibilidade de um pacto com a “burguesia” que, até certo ponto, havia incentivado e
até financiado a chegada e a permanência dos militares no governo, esses intelectuais
mantinham ainda no horizonte a ideia de superação de um atraso e da conquista da
autonomia nacional, não apenas política e econômica, mas também capaz de dar conta
da produção de uma consciência e de saberes próprios, adaptados ao contexto nacional.
A arte, nesse pensamento, deveria estar a serviço de um “fim” (comunicação eficiente
e didática com as “massas” alienadas), orientada, ao lado de outros saberes, na direção
de um objetivo: a transformação social, nos seus mais diversos significados, da
revolução ao reformismo progressista. Nessa concepção de arte e de escrita literária, o
escritor teria, portanto, o papel de fornecer orientação temporal ao “povo
subdesenvolvido”. Tal modo de orientação temporal, insistentemente denunciado por
Leminski como autoritário, poderia ser denominado “desenvolvimentismo”.
Se a relação de Leminski com os escritores sociais é, via de regra, a do choque, a
sua relação com os concretos é mais complexa. Afinal, o poeta foi, desde a juventude,
muito próximo a Augusto e Haroldo de Campos e Décio Pignatari, chegando a se
afirmar, algumas vezes, como continuador do projeto da poesia concreta e até como
“mais concreto que os poetas concretos” (LEMINSKI, 1993: 36). Para a geração
setentista, aliás, o concretismo não se configura como um movimento histórico do
passado recente, mas como uma força atuante no seu presente. Tanto que conceitos
como “invenção”, “diluição”, “novo”, “informação são correntemente utilizados e
ressignificados pelos jovens poetas experimentais da década de 1970, sem que maiores
139

considerações históricas e críticas sejam feitas. Leminski, que no começo dos anos 1960
havia aderido ao concretismo, vai aos poucos, a partir de sua experiência com os
tropicalistas e com todo um conjunto de artistas que repensaram o significado de fazer
arte no Brasil, questionando o pensamento concreto, especialmente o seu caráter
prometeico e racionalista. No final dos anos 1970, quando escreve “Ascese e escassez”,
já acredita experimentar o “depois do concretismo”, ainda que permaneçam, no seu
discurso, alguns traços do ativismo que criticava nos concretos, como a afirmação da
necessidade de “superar” certos modos de fazer poesia ou a significativa imagem da
“central elétrica” (usada para descrever um modelo de produção artística inspirado em
Maiakovski). Ao se referir à sua geração, Leminski afirma que ela havia priorizado o
humor em detrimento do épico, e deixado de se preocupar com “planos-projetos-
manifestos-plataforma [...] excludentes” (LEMINSKI, 1978b, s/p). Talvez tenha sido
este um dos motivos pelos quais tenha publicado, em conjunto com Régis Bonvicino e
Antônio Risério, o Plano Pirata, uma paródia do Plano Piloto da Poesia Concreta, no
qual buscava, ainda que em tom de brincadeira, “afirmar os caminhos próprios”
(LEMINSKI, 1977b, p. 3) de sua geração, tomando assim um distanciamento crítico em
relação aos concretos.
Em carta a Régis Bonvicino, escrita em julho de 1977, Leminski dá uma pista de
como entender seu desejo de fazer algo que estaria “depois do concretismo”. Ali, o
poeta afirma ser preciso “meter paixão em nossas constelações”, ainda que “sem abdicar
dos rigores da linguagem” (LEMINSKI, 1993, p. 37). Se os rigores vanguardistas dos
concretos teriam permitido a Leminski e à sua geração escapar às tentações autoritárias
da “poesia de comunicação”, eles funcionariam agora como lei, conjunto de limites que
bloqueariam a multiplicidade dos possíveis. Em 1984, em uma visita a Brasília, tomada
pelos poetas concretos como modelo de experimentação arquitetônica, Leminski
escreve um poema sobre a cidade, que explicita algo do modo como o poeta se relaciona
com seus “mestres”:

Em Brasília, admirei.
Não a niemeyer lei,
a vida das pessoas
penetrando nos esquemas
como a tinta sangue
no mata-borrão,
crescendo o vermelho gente
entre pedra e pedra,
pela terra a dentro.
Em Brasília admirei.
O pequeno restaurante clandestino,
criminoso por estar
fora da quadra permitida.
Sim, Brasília.
Admirei o tempo
que já cobre de anos
tuas impecáveis matemáticas.
Adeus, Cidade.
O erro, claro, não a lei.
Muito me admirastes,
muito te admirei (LEMINSKI, 2013: 192).
140

A crítica de Leminski ao concretismo e ao pensamento desenvolvimentista


expresso pela cidade não se dá como ruptura ou recusa, uma vez que, para falar como o
poeta, a produção poética de seu tempo o deglute e o pressupõe, mas fazendo uma
experiência radical da poesia/cidade experimental. O desenvolvimentismo de Brasília e
da poesia concreta não deveria, portanto, ser contraposto a um drop out ou ao retorno a
um envolvimento original, mas subvertido por um “reenvolvimento cosmopolítico”
(VIVEIROS DE CASTRO, 2011: 3) tramado a partir do erro, do clandestino, do crime
que penetrava nos esquemas assépticos da cidade e a tornava viva, subdesenvolvida.
Leminski não explicitou a ligação de suas críticas à literatura social ativista e ao
pensamento concreto com sua denúncia do modo de vida ocidental. No entanto, é
possível imaginar que se trata, nos dois casos, de uma crítica dos limites do pensamento
progressista e de seu desejo de aceleração, do tempo linear do gesto viril que pretende
superar o passado e refundar a história. Assim como o modo de vida ocidental, que
exaure os recursos naturais em nome de um desejo de abundância, os modos de
produção literária desenvolvimentistas buscam sempre uma expansão sobre os múltiplos
territórios da realidade, fazendo da literatura um modo de intervir na sociedade, seja de
modo mais preciso, pontual e eficaz (concretos), seja de modo massivo e abrangente
(escritores sociais). Mas se Leminski prescrevia a ascese como modo de vida capaz de
lidar com a escassez de recursos naturais, qual seria o modo de composição poética que
corresponderia a uma ascese literária?
[...]

Gênero edital de concurso público

Edital 2: Câmara Municipal de Goiânia - Edital n.º 01/2018 –


Concurso Público para o provimento do quadro permanente e a
formação de Cadastro de Reserva.

(...)
2 DA INSCRIÇÃO, DA ISENÇÃO DO PAGAMENTO E DA
HOMOLOGAÇÃO
2.1 Da inscrição
2.1.1 A inscrição no presente concurso implica automaticamente o pleno
conhecimento e a tácita aceitação das condições estabelecidas neste Edital e demais
instrumentos reguladores, dos quais o candidato ou seu procurador legal não poderão
alegar desconhecimento.
2.1.2 As inscrições serão realizadas durante o período que consta no Cronograma do
Concurso (Anexo I), exclusivamente pela rede mundial de computadores (internet), no
endereço eletrônico <www.cs.ufg.br>.
2.1.3 O candidato, antes de realizar a inscrição, deverá preencher o formulário de
cadastro de dados pessoais, disponível na página deste concurso.
2.1.3.1 O candidato já cadastrado na base de dados do Centro de Seleção deverá conferir
seus dados pessoais e, caso necessite recuperar sua senha pessoal, clicar no link –
“Esqueci a Senha”.
141

2.1.4 Para efetuar a inscrição, o candidato deverá:


a) acessar a página eletrônica do concurso a partir da data de abertura de inscrição
até o último dia do prazo informado no Cronograma do Concurso (Anexo I);
b) preencher todos os campos do formulário de inscrição, conferir os dados
digitados e confirmá-los, de acordo com as orientações e os procedimentos contidos na
página;
c) indicar a modalidade para concorrer às vagas oferecidas: Ampla Concorrência
(AC) ou Pessoa com Deficiência (PcD);
d) imprimir o formulário de inscrição. O formulário é o documento que certifica ao
candidato a efetivação, no sistema do Centro de Seleção, da solicitação de inscrição no
cargo escolhido, com seus respectivos dados;
e) imprimir o boleto bancário, exceto candidatos beneficiados com a isenção do
pagamento da inscrição;
f) efetuar o pagamento da taxa de inscrição unicamente por meio do boleto
bancário impresso, que poderá ser pagável em qualquer agência bancária.
2.1.5 As informações prestadas no formulário de inscrição são de inteira
responsabilidade do candidato, sendo direito da Comissão do Concurso ou do Centro de
Seleção da UFG excluir do concurso em qualquer fase, mesmo que já aprovado em
todas as provas, independentemente de qualquer aviso ou diligência, o candidato que
fornecer dados comprovadamente inverídicos, resguardada a ampla defesa, conforme o
subitem 13.3 do Edital.
2.1.6 As inscrições para o concurso de que trata este Edital serão encerradas às
23h59min do último dia de inscrição.
2.1.7 O valor da inscrição será de:
a) R$ 85,00 (oitenta e cinco reais) para os cargos de nível médio;
b) R$ 140,00 (cento e quarenta reais) para os cargos de nível superior.
2.1.8 O pagamento da taxa de inscrição deverá ser efetuado impreterivelmente dentro
do limite de prazo previsto para este ato no Cronograma do Concurso (Anexo I), mesmo
que o último dia para o pagamento coincida com feriado.
2.1.8.1 A solicitação de inscrição cujo pagamento não for efetuado até essa data será
cancelada.
2.1.9 O candidato deverá efetuar o pagamento da taxa de inscrição somente depois de
certificar-se de que preencheu corretamente todos os dados do formulário e de que
possui todos os requisitos exigidos para ingresso no cargo, uma vez que não haverá
devolução do valor recolhido, salvo os casos previstos no subitem
2.1.13 do Edital.
2.1.10 O Centro de Seleção não se responsabilizará por solicitação de inscrição não
recebida por motivos de ordem técnica dos computadores, falhas de comunicação,
142

congestionamento das linhas de comunicação ou de outros fatores, alheios ao Centro de


Seleção, os quais impossibilitem a transferência dos dados.
2.1.11 É vedada a inscrição condicional e a extemporânea, bem como a realizada por
via postal, por fax ou correio eletrônico.
2.1.12 O candidato que efetuar pagamento de inscrição em mais de um cargo será
inscrito somente naquele que corresponde à data de pagamento mais recente, sendo
cancelada automaticamente a(s) outra(s) e não haverá devolução do valor pago.
2.1.12.1 Caso os pagamentos tenham sido efetuados no mesmo dia, será
automaticamente validada a inscrição mais recente, resguardando-se ao candidato o
direito de solicitar a homologação daquela de sua preferência após a divulgação do
resultado preliminar das Inscrições Homologadas.
2.1.12.1.1 Para a homologação da inscrição de sua preferência, o candidato deverá
protocolar recurso no prazo previsto no Cronograma (Anexo I) e solicitar a alteração da
homologação da inscrição.
2.1.13 O candidato que pagar em duplicidade a taxa de inscrição para o mesmo cargo
ou o fizer fora do prazo determinado ou, ainda, em caso de cancelamento do concurso
pela Câmara Municipal de Goiânia poderá solicitar devolução do pagamento de
inscrição, conforme orientação da Comissão do Concurso por meio dos telefones (62)
3209-6330 e 3209-6331 e e-mail cs@ufg.br.
2.1.14 Se, após a confirmação dos dados da inscrição, o candidato verificar erro na
opção do cargo e/ou número do CPF, poderá efetuar nova inscrição, respeitado o prazo
fixado no Cronograma do Concurso (Anexo I).
(...)
2.3 Da homologação da inscrição
2.3.1 Efetuada a inscrição, os dados cadastrais do candidato ficarão disponíveis para
consulta, conferência e acompanhamento na página do concurso no endereço eletrônico
<www.cs.ufg.br>.
2.3.1.1 Compete ao candidato, após o pagamento da taxa ou da concessão de sua
isenção, acompanhar na página do concurso a confirmação de sua inscrição, verificando
a sua regularidade.
2.3.1.2 A opção de alteração dos dados cadastrais ficará disponível para o candidato até
a data estabelecida no Cronograma do Concurso (Anexo I), com exceção do nome,
número do Cadastro de Pessoa Física (CPF) e do cargo para o qual se inscreveu.
2.3.2 A inscrição será homologada somente após o envio do arquivo retorno sobre o
pagamento da inscrição pela rede bancária, procedimento que pode demorar cinco dias
úteis.
2.3.3 As inscrições serão analisadas pelo Centro de Seleção, sendo indeferidas aquelas
que não estiverem de acordo com as condições estabelecidas neste Edital.
143

2.3.4 A relação preliminar das inscrições homologadas será divulgada na data prevista
no Cronograma do Concurso (Anexo I) por meio do número de inscrição, do nome do
candidato e pela opção de concorrência.
2.3.4.1 Caso a inscrição não seja homologada, o candidato deverá interpor recurso
conforme orientações disponíveis na página do concurso, no período estabelecido no
Cronograma do Concurso (Anexo I), sendo responsável por eventuais prejuízos de não
o fazer. Em caso de dúvidas, o candidato poderá entrar em contato com o Centro de
Seleção pelos telefones (62) 3209-6330 e 3209-6331 para instruções acerca do
procedimento para homologação da inscrição.
2.3.5 Todas as informações complementares estarão disponíveis na página do
concurso na internet.

3 DA PARTICIPAÇÃO COMO CANDIDATO COM DEFICIÊNCIA


3.1 Às pessoas com deficiência é assegurado o direito de inscrição para o
preenchimento de vagas cujas atribuições do cargo sejam compatíveis com a
deficiência, nos termos do inciso VIII, do art. 37, da Constituição Federal; da Lei n.º
7.853, de 24 de outubro de 1989, regulamentada pelo Decreto n.º 3.298, de 20 de
dezembro de 1999, e suas alterações e da Súmula n.º 377-STJ, de 22 de abril de 2009.
3.2 São previstas aos candidatos com deficiência o mínimo de 5% das vagas
oferecidas, na forma da Lei Federal n.º 7.853, de 24 de outubro de 1989 e do Decreto n.º
3.298, de 20 de dezembro de 1999, observando- se na aplicação do percentual, o
disposto no § 2° do Art. 37 do referido decreto, desde que não ultrapasse o limite
máximo de 20% permitido em Lei, de acordo com entendimento do STJ (MS8.417/DF)
e STF (MS 26.310/DF).
3.2.1 Caso a aplicação do percentual de que trata o subitem anterior resulte em
número fracionado, igual ou superior a 0,5 (cinco) décimos este será arredondado até o
primeiro número inteiro subsequente.
3.3 Para este concurso, fica assegurada 1 (uma) vaga aos candidatos que
comprovarem a condição de pessoa com deficiência, conforme estabelecido no Anexo
II.
3.4 Na contratação para o cargo em que há vaga reservada para candidatos com
deficiência, a convocação do candidato aprovado ocorrerá para ocupar a 5ª (quinta)
vaga para o cargo ao qual concorreu.
3.5 Na hipótese de não haver candidatos com deficiência classificados para ocupar a
vaga reservada, esta será revertida para a ampla concorrência (AC) e será preenchida
pelos demais candidatos aprovados, observada a ordem de classificação no concurso.
3.6 As pessoas com deficiência, resguardado o que prevê o Decreto n.º 3.298, de 20
de dezembro de 1999, particularmente em seu Art. 40, participarão do concurso em
igualdade de condições com os demais candidatos, no que se refere ao conteúdo das
provas, à avaliação e aos critérios de aprovação, ao dia, ao horário e local de aplicação
das provas e à nota mínima exigida para todos os candidatos.
144

3.6.1 O candidato que em razão da deficiência necessitar de condições especiais de


atendimento no dia das provas, tais como ledor de prova, prova ampliada, ledor de tela,
aplicador para preencher o Cartão-Resposta, mobiliário especial para fazer a prova,
excluindo-se o atendimento domiciliar, deverá proceder de acordo com o especificado
no item 4 deste Edital.
3.7 Para concorrer como candidato com deficiência, antes de inscrever-se, o
candidato deverá acessar a página do concurso no endereço eletrônico
<www.cs.ufg.br>, imprimir o formulário do Laudo Médico (Anexo III) e solicitar a um
médico especialista na área de sua deficiência que o preencha, conforme as instruções
descritas no subitem 3.18 deste Edital.
3.8 Para concorrer como pessoa com deficiência, no ato de sua inscrição, o
candidato deverá:
a) declarar que é pessoa com deficiência, nos termos do art. 2º da Lei n.º 13.146, de
06 de julho de 2015, no Decreto Federal n.º 3.298, de 20 de dezembro de 1999, nos
parágrafos 1º e 2º da Lei n.º 12.764, de 27 de dezembro de 2012 (Transtorno do
Espectro Autista) e da Súmula n.º 377 – STJ, de 22 de abril de 2009, e que deseja
concorrer como candidato com deficiência;
b) assinalar o tipo de deficiência;
c) fazer o upload do Laudo Médico (Anexo III) original, devidamente preenchido
pelo médico especialista na área de sua deficiência e os exames exigidos, conforme o
subitem 3.18 deste Edital.
3.8.1 Os arquivos referidos na alínea “c” do subitem 3.8 deverão estar legíveis, no
formato PDF e ter tamanho máximo de 10,0 MB. O envio da documentação digitalizada
deverá ocorrer durante o período de inscrição previsto no Cronograma (Anexo I).
3.9 O Centro de Seleção não se responsabilizará por solicitação não recebida por
motivos de ordem técnica dos computadores, falhas de comunicação, congestionamento
das linhas de comunicação ou de outros fatores.
3.10 O candidato que se declarar com deficiência no ato da inscrição e não anexar o
Laudo Médico (Anexo
III) e os exames exigidos conforme o subitem 3.18 será desconsiderado como pessoa
com deficiência participando somente da ampla concorrência e não poderá,
posteriormente, alegar essa condição para reivindicar qualquer garantia legal no
concurso.
3.11 O candidato que não assinalar a opção de concorrer como pessoa com
deficiência ou não cumprir os procedimentos descritos neste Edital perderá o direito à
vaga reservada e, consequentemente, concorrerá apenas à vaga da ampla concorrência.
3.12 As datas de divulgação do resultado preliminar e do resultado final dos
candidatos que apresentarem a documentação exigida para concorrer às vagas
reservadas às pessoas com deficiência constam no Cronograma do Concurso (Anexo I).
3.12.1 O candidato poderá interpor recurso contra o resultado preliminar dos candidatos
que apresentaram a documentação exigida para concorrer à vaga do cadastro de reserva
145

às pessoas com deficiência na página do concurso no endereço eletrônico


<www.cs.ufg.br>.
3.13 O candidato que, no ato da inscrição, se declarar pessoa com deficiência, se
aprovado dentro do número de vagas estipulado no Anexo II, figurará em duas listas, a
de ampla concorrência e a lista específica dos candidatos com deficiência.
3.14 Os candidatos com deficiência, se aprovados dentro do número de vagas
oferecidas à ampla concorrência (AC) não preencherão vagas reservadas aos candidatos
com deficiência (PcD).
3.15 Caso o candidato com deficiência, por qualquer motivo, desistir da vaga
reservada, esta será preenchida pelo candidato com deficiência posteriormente
classificado.
3.16 Após a investidura no cargo, a deficiência declarada no ato da inscrição não
poderá ser arguida para justificar a concessão de aposentadoria, ou remoção por motivo
de saúde do servidor, salvo casos excepcionais de agravamento imprevisível da
deficiência, os quais impossibilitem a permanência do servidor em atividade.
3.17 Aos candidatos com deficiência são assegurados os seguintes direitos: tempo
adicional, conforme subitem 3.19, e condições especiais para realização das provas,
conforme item 4 deste Edital.
(...)

11 DA CONVOCAÇÃO E NOMEAÇÃO
11.1 O candidato aprovado e classificado no certame será convocado para posse no
cargo por meio de Edital próprio, publicado, na íntegra, no Diário Oficial do Município
e por extrato em jornal de circulação local. Também será convocado por via postal
(Aviso de Recebimento – AR), no endereço informado no Formulário de Inscrição. A
convocação estará disponível, ainda, no endereço eletrônico
http://www.goiania.go.leg.br/.
11.2 O candidato deverá manter atualizado o endereço no seu cadastro no Centro de
Seleção da UFG, no endereço eletrônico <www.cs.ufg.br>, desde a inscrição até o
Resultado Final do concurso. A partir desse resultado, o Centro de Seleção repassará à
Comissão do Concurso os dados cadastrais do candidato que, se aprovado, deverá
manter seu endereço atualizado, durante todo prazo de validade do Concurso Público.
11.3 A Câmara Municipal não se responsabilizará por eventuais prejuízos aos
candidatos decorrentes de:
a) correspondência devolvida pela Empresa Brasileira de Correio e Telégrafos
(ECT);
b) correspondência recebida por terceiros;
c) endereço não atualizado.
146

11.4 A ordem de convocação dos candidatos aprovados obedecerá a ordem de


classificação.
11.5 O candidato classificado dentro do número de vagas fixado neste Edital terá
direito subjetivo à nomeação, desde que preencha todos os requisitos para a nomeação.
11.6 O candidato aprovado e classificado será convocado para nomeação, até o limite
do prazo de validade do Concurso, observando-se o exclusivo interesse da
Administração Municipal.
11.7 O candidato convocado que, por qualquer motivo, não tomar posse no prazo
estipulado será declarado sem efeito o ato de provimento, nos termos estabelecidos § 8°
do art. 18 da Lei Complementar n.º 011, de 11 de maio de 1992.
11.8 Nos casos de não comparecimento do candidato ou de desistência formal da
nomeação, prosseguir-se-á a convocação dos candidatos habilitados, observada a ordem
classificatória.

12 DA POSSE
12.1 O candidato tem o direito subjetivo à posse, devendo, para tanto, ser convocado,
obedecendo à rigorosa ordem classificatória, condicionada à observância das
disposições legais pertinentes e das vagas ofertadas.
(...)

13 DAS PENALIDADES
13.1 Será eliminado do concurso o candidato que:
a) chegar aos locais de realização das provas e da perícia médica após o horário
estabelecido;
b) faltar às provas, às convocações ou à perícia médica, caso convocado;
c) ausentar-se do recinto de qualquer prova ou atividade sem a devida permissão;
d) mantiver conduta incompatível com a condição de candidato ou ser descortês
com qualquer dos supervisores, coordenadores, aplicadores de provas, aplicadores de
reserva ou autoridades e pessoas incumbidas da realização do concurso;
e) sair da sala de aplicação de prova com quaisquer anotações antes do horário
permitido;
f) for surpreendido, durante a realização das provas, em comunicação (verbal,
escrita, eletrônica ou gestual) com outras pessoas, bem como estiver utilizando fontes de
consulta, tais como livros, calculadoras equipamentos de cálculo, anotações, impressos
ou ainda, usando óculos escuros ou quaisquer acessórios de chapelaria (chapéu, boné,
gorro etc.) ou outros materiais similares;
147

g) for surpreendido, dentro do prédio de realização da prova, com a embalagem


violada ou aberta, na qual o celular ou o equipamento eletrônico foram guardados ou
estiver usando durante a qualquer tipo de arma salvo os casos previstos em lei, relógio
de qualquer espécie, aparelhos eletrônicos, tais como telefone celular, MP3 e similares,
agenda eletrônica, notebook e similares, palmtop, receptor, gravador, filmadora,
máquina fotográfica, calculadora, pager, tablet, Ipod, etc;
h) recusar-se a retirar os óculos escuros ou quaisquer acessórios de chapelaria, tais
como chapéu, boné, gorro etc. ou outros objetos similares;
i) ultrapassar o tempo limite previsto neste Edital para execução das provas;
j) levar consigo o cartão-resposta, ao retirar-se da sala;
k) não permitir a coleta da impressão digital, como forma de identificação, e/ou a
filmagem;
l) fizer, em qualquer documento, declaração falsa ou inexata;
m) prestar, no ato da inscrição, declaração falsa ou inexata;
n) deixar de apresentar qualquer um dos documentos que comprovem o
atendimento dos requisitos fixados neste Edital;
o) não comparecer para a nomeação no cargo nas datas e nos horários fixados no
ato convocatório;
p) praticar atos que contrariem as normas do presente Edital;
q) não atender às determinações do presente Edital e aos seus atos complementares.
13.2 Se, após às provas, for constatado, por meio eletrônico, estatístico, visual ou
grafológico, que o candidato utilizou processos ilícitos, sua prova será anulada, sendo
este automaticamente eliminado do concurso, devendo responder criminalmente pelo
ato.
13.3 Fica assegurado aos candidatos excluídos após a aplicação das penalidades que
constam no subitem 13.1 o direito à ampla defesa conforme orientações dispostas
mencionado no subitem 8.1.11 do Edital.
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