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Universidade de Brasília

Epistemologia da Ciências Sociais e Humanas- ter/qui 19:00 – 21:50

Prof.: Cristian Arão

Discente: Thaisy Costa Amancio

Matrícula: 180131435

QUESTÕES QUE PERMEIAM A REFLEXÃO ACERCA DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

A ideia de que a qualquer momento iremos alcançar um tipo de inteligência


autônoma capaz de desenvolver outras máquinas inteligentes e aperfeiçoar a si
mesma1 tem sido uma constante na literatura, nos filmes, nos laboratórios de
pesquisa, e acima de tudo nas reuniões entre os CEO’s das maiores startups e
empresas globais de tecnologia que atualmente se aglomeram no Vale do Silício,
localizado nos EUA.

“Os pesquisadores que trabalham nesses projetos com


frequência afirmam que estão progredindo lentamente em direção a uma
inteligência artificial mais geral. Muitos deles acreditam que estão nos
levando numa viagem cada vez mais próxima à chamada “singularidade”, o
ponto no qual os computadores se tornam tão inteligentes quanto nós.”
(SUMPTER, David. Dominados pelos números do facebook e google às fake
news : os algoritmos que controlam nossa vida. 2019. p.219)

Desde a metade do século passado, cientistas, escritores e visionários já


calculavam a possibilidade de realização desse projeto, mas foi somente no final da
década dos anos 90 que os pesquisadores finalmente conseguiram chegar num
esboço do que viria a ser a Inteligência Artificial tal como acessamos hoje em dia.

1
Dominados pelos números. Cap. 16. o cérebro bacteriano
Nesse ponto já podemos pensar na IA como uma realidade deste século e
possivelmente, também, como a anunciadora de uma das mudanças mais drásticas
que já ocorreram na história da humanidade.

Todavia quando se fala em inteligência artificial existe ainda uma aura um tanto
quanto mística que envolve o tema. Especulações mirabolantes avaliam que esses
sistemas ainda dominarão tudo, que se voltarão contra a humanidade e nós,
mortais, passaremos de senhores a meros escravos subjugados pelas máquinas;
também pensamos saber como elas operam, e por esse equívoco a atmosfera de
poder que envolve essas máquinas termina por se fortalecer e tornar-se ainda mais
mitológica. Na maior parte do tempo são as máquinas que olham para nós ao invés
de nós olharmos para ela, e diante do que esse olhar assimila e reflete,
frequentemente as pessoas crêem estar diante de uma genuína e incontestável
forma autônoma de conhecimento.

(...) A hipótese da singularidade afirma que, uma vez que esse ponto seja
alcançado, uma vez que os computadores sejam capazes de desenvolver
outras máquinas inteligentes e aperfeiçoarem a si próprios, então nossa
sociedade mudará dramaticamente e para sempre. As máquinas podem até
nos considerar supérfluos. (SUMPTER, David. Dominados pelos números do
facebook e google às fake news : os algoritmos que controlam nossa vida.
2019. p.219)

Raramente alguém se pergunta o que existe para além dessas camadas que se
enredam por detrás de cada resposta pronta que chega via Chat Gpt. Mais vale
antes se perguntar a que tipo de inteligência estamos nos referindo, quando falamos
em “Inteligência Artificial”, do que somente decifrar os códigos - indecifráveis a nível
humano - que compõem cada parte desse sistema. Seria esta uma inteligência
como a humana? Que tipo de inteligência é essa que chamamos de "racional”?
Poderia existir mesmo uma máquina capaz de pensar sozinha sem que ninguém a
programasse? Essa máquina já existe? Qual o trajeto percorrido por uma IA para
chegar a conclusão de determinado resultado? Quão longe estamos de criar uma
inteligência que de fato possa ser equiparada à inteligência humana?

A partir das perguntas que vão surgindo, aos pouco podemos começar a distinguir
diferentes tipos de abordagem, podemos pensar em três delas:
A primeira é a perspectiva técnica e epistemológica, que se pode dizer que é a
principal via de estudo da atualidade no que diz respeito à inteligência artificial. Por
essa perspectiva faz sentido todas as perguntas que levantamos na primeira parte
do texto. Aqui existe uma tentativa de compreender os mecanismos e limites da IA e
de alguma forma tentar englobá-la como parte possível do aparato técnico da
realidade, buscando respaldo científico para sustentação da legitimidade dessa
ferramenta. Pensando dessa forma podemos compor a ideia de certos níveis de
inteligência que se almejam alcançar, nesses termos, o que nos separa de fato de
uma Inteligência Geral nada mais é do que uma limitação técnica, que pode a
qualquer momento ser superada, desde que possamos compreender inteiramente
os mecanismo de atuação da máquina e também da inteligência humana, é uma
questão de tempo até alcançar esse estágio. A pergunta não é “se”, mas “quando?”.

Porém, pensar a partir dessa perspectiva nos leva a certas descobertas acerca do
método de funcionamento das IA’s, isto é, um método indutivo que se baseia num
sistema de reconhecimento de dados e indução probabilística, algo que também
escancara ainda mais o processo mitológico que envolve o advento das
inteligências artificiais, expõe o aspecto de crença que está contido no cerne dessa
experiência que na realidade representa uma cega fé nos números e nos cálculos
efetuados pelas máquinas. A descoberta de que a “inteligência” da IA é baseada
puramente em cálculos, e que no fundo todos esses algoritmos, por enquanto, não
passam apenas de opiniões quantificadas, já muda completamente os rumos da
investigação, pois revela algo que num primeiro instante pode passar um tanto
despercebido ao olhos, mas que já se encontra pressuposto em todo trajeto até a
concepção da primeira inteligência artificial. Trata-se da metafísica que sustenta não
apenas a artificialização do mundo como também a matematização da realidade.
Partindo dessa perspectiva, uma segunda forma de abordar a inteligência artificial é
tomando-a como a realização a nível global de uma empreitada ontológica: O
projeto ocidental de Esclarecimento. Podemos pensá-la como um esboço final da
tentativa de corrigir o pensamento (omoiosis) e extrair inteligibilidade das coisas a
qualquer custo. Num nível além podemos pensar a metafísica ocidental como uma
espécie de pré história da inteligência artificial. A pergunta aqui deixa de ser sobre
os aspectos técnicos da coisa, e passa a ser sobre aonde se quer chegar com
tamanha tarefa? O que existe por trás desse desejo de capturar e instrumentalizar a
verdade das coisas? De dar nome, significado e descrição a elas? Será que esse é
mesmo um desejo universal? Todos os indivíduos ambicionam e manifestam essa
mesma forma racional de inteligência? A IA representa que tipo de pensamento?

Assim como o advento da fotografia fez revolucionar toda a vertente artística no


século XX, obrigando os artistas a se reinventarem em suas pinturas e formas de
representar o Real, a incorporação da Inteligência Artificial no corpo da sociedade,
já impõe como primeiro desafio a necessidade de revisão e reinvenção daquilo que
definimos como inteligência humana. Pois, se a inteligência humana de fato se tratar
apenas de cálculos, então o pensamento humano poderia facilmente ser substituído
pela máquina, e, no limite, a IA poderia representar o próprio fim do pensamento por
conta da terceirização de uma considerável parte das operações mentais que eram
antes atribuídas a seres humanos. Mas se, ao contrário, a inteligência não for
apenas cálculo, então é preciso trazer à tona quais são os pilares dessa grande
mentira que está tomando conta da realidade a nível material, concreto, e nos
fazendo pensar que não somos mais do que números. Desse modo, é de extremo
interesse geral perguntar a quem serve essa narrativa que reduz o pensamento a
mero cálculo, para em seguida se perguntar a que serve a inteligência artificial?

Por fim, uma forma mais neutra de abordar o assunto seria pela perspectiva
estética, pensando principalmente na reprodução e processamento técnico de
imagens para os fins de aprendizado de máquina. Esse terceiro ponto pode ser
inserido como tópico nas duas primeiras abordagens como forma de diagnóstico e
sustentação de tese, mas por si só não é suficiente para trazer clara compreensão
acerca do que são as IA’S.

O campo de pesquisa que aborda as inteligências artificiais ainda é


consideravelmente recente no meio da filosofia, muitas perguntas começam a surgir
à medida que avança o desenvolvimento de especulações acerca das redes
autônomas de inteligência, no entanto as respostas ainda são escassas e o melhor
que se pode fazer até o momento é levantar esses diagnósticos e hipóteses,
tentando tornar de alguma forma “legível” esse universo algorítmico que em última
instância excede a nós mesmos. Esse trabalho se limita apenas a apresentar o
amplo leque de questões que surgem nesse contexto, talvez ainda seja cedo para
tentar responder perguntas que envolvem tanta complexidade, mas sem dúvida,
esse não é mais um tema que pode ser ignorado e tratado com menor importância,
afinal estamos presenciando uma mudança sem precedentes na história da
humanidade, buscar compreender o que está ocorrendo pode ser a chave entre a
vitória ou o completo fracasso da humanidade na tentativa de resolução dos
problemas que cada vez mais se intensificam na sociedade.

BIBLIOGRAFIA

● Dominados pelos números [recurso eletrônico] : do facebook e google às fake


news : os algoritmos que controlam nossa vida / David Sumpter ; tradução Anna
Maria Sotero, Marcello Neto. -1. ed. - Rio de Janeiro : Bertrand Brasil, 2019.

● https://www.ignicaodigital.com.br/o-que-e-vale-do-silicio/

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