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Não obstante a correta crítica ao exagero de uso do termo "inteligente" nos dias de
hoje, a visão e os argumentos apresentados parecem ter se fixado em apenas uma
parte da extensão do tópico "inteligência", não ter considerado apropriadamente uma
multitude de pesquisadores e pesquisas existentes e, eventualmente, não ter
aprofundado suficientemente o debate em seus aspectos filosófico e técnico. Não
fosse a possibilidade, certamente não intencional, de alguma desqualificação de
pesquisas em Ciência Cognitiva e da Computação que tratam de inteligência artificial
com seriedade, o presente artigo seria desnecessário. Esperamos, portanto, trazer
algumas visões e informações que ampliem este tão interessante debate.
Inteligência Artificial - O termo Inteligência Artificial (IA) foi cunhado por John
McCarthy em 1956, que definiu IA como "a ciência e engenharia de fazer máquinas
inteligentes". Mas o interessante é que pelo menos uma década antes do surgimento
desse termo já havia importantes trabalhos na área, a maioria em modelos
conexionistas conhecidos hoje por redes neurais artificiais. Conexionismo, como
proposto, é uma forma de pensar sistemas nos quais a inteligência emerge de
estruturas de aprendizado representadas por redes compostas de unidades de
processamento simples. A inspiração dos conexionistas foi/é o cérebro, que nada
mais é que uma rede imensa, dinâmica auto-organizável de células nervosas
altamente especializadas (mas simples) - os neurônios, que por sua vez se conectam
a milhares de outros resultando num processamento amplamente paralelo e não
linear.
É razoável afirmar que por um longo tempo houve confrontos ideológicos entre
modelos conexionistas e simbólicos, mas atualmente a visão dominante é integrativa,
como em sistemas híbridos; por exemplo, nós humanos podemos manipular símbolos
mas nossa representação de conhecimento é completamente distribuída. E nesse
processo de amadurecimento, a área de IA evoluiu bastante e incorporou muitos
novos modelos e abordagens com diferentes estruturas de aprendizado. Isso
possibilitou a representação e resolução de vários tipos de problemas que exigem
habilidades cognitivas não triviais, tais como classificação, busca, processamento de
linguagem natural, etc. Mas, importante, em qualquer um desses casos, não há o que
se discutir: a inteligência dos sistemas não é um produto de programação explícita de
regras. Ela emerge de estruturas de aprendizado artificiais. Pensar que a inteligência
é fruto direto da programação é retroceder ao pensamento talvez de Ada (Lovelace)
nos primórdios da Computação, como bem refuta Turing em seu artigo para a revista
Mind na década de 50 (ver a seguir).
A busca por um modelo geral de inteligência que incorpore todos os outros e
eventualmente permita que sistemas se igualem ou excedam as habilidades
cognitivas humanas ficou conhecida como IA forte. O que se convencionou chamar de
IA fraca, por outro lado, consiste no uso de sistemas inteligentes em problemas
(muitas vezes extremamente complexos) que envolvam a necessidade de
aprendizado mas que não necessariamente incorporem aspectos de consciência,
ética, crenças, desejos e intencionalidade.
Outro tipo comum de crítica à IA, tão inocente quanto creditar a inteligência do
sistema ao programador, é questionar se um sistema inteligente pode revelar
Inteligência quando se compõe apenas de programas (imutáveis) de computador, um
sistema operacional e hardware que não são inteligentes individualmente. Ora, esse
argumento nega as evidências de existência da evolução e da inteligência (humana)
como fenômeno emergente. Encontramos uma grande quantidade de fenômenos
emergentes inteligentes na natureza, a começar pelo próprio homem. Estruturas de
aprendizado naturais estão apoiadas sobre uma infraestrutura química/biológica que
não são necessariamente, de longe, inteligentes.
Aliás, há uma década tivemos (Fernando) o privilégio de, num mesmo mês, assistir o
embate de ideias de Searle e Daniel Dennett, exatamente sobre o tema desse artigo.
Lá, debateu-se assuntos certamente mais importantes que saber se os estádios
brasileiros vão ficar prontos para a Copa de 2014: "the ghost in the machine",
epifenomenologia, solipsismo, livre-arbítrio, cibernética e muitos outros.