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O corpo, esse que a gente toca e vê, é chamado de ara,

e quando morremos ele volta a se fundir com a natureza.


Mas há também o corpo que não vemos, dividido em quatro
partes. A primeira é o emi, o sopro vital que é criado por
Oxalá e que depois de abandonar nosso corpo volta para as
forças controladas por ele, para depois ser usado em outro
corpo. A segunda parte é o orí, a cabeça, onde está nosso
destino e que morre junto com o ara, porque cada pessoa
tem um destino, ninguém herda o destino do outro. A
terceira parte é o orixá, a nossa identidade, que define os
nossos defeitos e as nossas origens, qualidades, forças e
fraquezas, e que é uma parte muito pequenina do orixá
geral, para quem retorna depois da morte do nosso corpo. E
por último existe o egum, que é como se fosse a nossa
memória de passagem pelo ayê, pela terra, o nosso espírito
que volta para o Orum e que depois pode retornar,
nascendo geralmente dentro da mesma família, por muitas
e muitas gerações. São esses espíritos que, de certa
maneira, podemos comparar ao que a minha avó chamava
de vodum, e que, por serem espíritos importantes para uma
família ou um povo, devem ser sempre lembrados e
cultuados. Eu já sabia um pouco de tudo isso, mas foi bom a
Mãezinha explicar desde o início, porque ficou mais fácil
entender o que viria em seguida.

Algumas
pessoas acreditam que o arco-íris é uma serpente das
profundezas que vai beber água no céu, mas a minha avó
dizia que ele é Oxumaré, o que controla o bom tempo. Nos
dias de sol, o orixá se transforma em arco-íris e sobe até o
céu, levando água para o castelo de Xangô, que fica acima
das nuvens. A chuva é a água que ele deixa respingar sobre
a terra, porque as mãos estão sempre ocupadas,
carregando duas serpentes de ferro.

Oxumaré não é homem nem mulher, mas as duas coisas


juntas. Durante seis meses ele vive como homem e mora
perto das árvores, e durante os outros seis é uma mulher
muito bonita que vive nas matas e nas lagoas. No corpo de
mulher, Oxumaré é Dani, que é o nome feminino da cobra
Dan, e a minha avó desenhava Dani como a cobra
enrodilhada que come o próprio rabo. Ela dizia que essa
cobra, sem começo ou fim, é a mesma coisa que o trabalho
de Oxumaré, que não pode parar de levar as águas até o
céu, de onde elas tornam a cair, e para onde ele torna a
levá-las, sem descanso. Era uma Dani que a minha avó
estava tecendo no dia em que os guerreiros apareceram na
nossa casa, em Savalu.

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