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Figuras de semântica ou pensamento

Adjetivação Utilização expressiva e recorrente da classe dos adjetivos.

Ex.: «Leve, breve, suave,/ Um canto de ave» (Fernando Pessoa)


Alegoria Expressão de uma ideia abstrata, um conceito ou ideia através da sua materialização,
tornando-a mais clara, muitas vezes a partir de uma acumulação de metáforas.

Ex.: Sermão de Santo António (Padre António Vieira): vício dos peixes – vício dos homens.
Antítese Oposição entre o significado de duas ou mais palavras ou expressões, com a finalidade de
destacar o contraste entre ideias.

Ex.: «Nem rei nem lei, nem paz nem guerra» (Fernando Pessoa, Mensagem)
«Ouvi-la alegra e entristece» (Fernando Pessoa, “A ceifeira”)
Apóstrofe ou Interpelação de um destinatário, que pode ser (ou não) humano real ou fictício, presente
invocação ou ausente, através do vocativo. Aproxima o discurso do tom coloquial.

Ex.: «Não pares, coração» (Miguel Torga)


«E, vós, Tágides minhas, pois criado/ Tendes em mi um novo engenho ardente»
(Luís de Camões)
Comparação Uma analogia entre dois termos, uma aproximação explícita de duas ideias ou realidades
para destacar as suas semelhanças ou diferenças através da conjunção como ou de verbos
e expressões a ela equivalentes (parecer, lembrar, assemelhar-se, assim como,
mais/menos… do que…)

Ex.: «São como um cristal, as palavras» (Eugénio de Andrade, “As palavras”)


«Eles não sabem que o sonho/ é uma constante da vida/ tão concreta e definida/
como outra coisa qualquer/ como esta pedra cinzenta» (António Gedeão, Poesia
Completa)
Eufemismo Utilização de palavras ou expressões que suavizam uma realidade desagradável ou
agressiva.

Ex.: «Tirar Inês ao mundo determina» (Luís de Camões, Os Lusíadas)


«Subitamente, el-rei compreende que a sua vida será curta, (…) que muita gente
morreu e morrerá antes que se acabe de construir Mafra, que ele próprio poderá fechar os
olhos para todo o sempre.» (José Saramago, Memorial do Convento)
Gradação Uma enumeração, uma apresentação de palavras ou conceitos por uma ordem crescente
ou decrescente.

Ex.: «O tempo acaba o ano, o mês e a hora» (Luís de Camões, Rimas)


«de um elemento tão puro, tão claro e tão cristalino como o da água»
(Padre António Vieira, “Sermão de Santo António”)
Hipálage Consiste na transferência de características de um sujeito para outra realidade, ou seja,
atribuição a uma entidade de uma característica(s) que se refere a outra, expressa ou
subentendida no discurso e à qual não se adequa em termos semânticos.

Ex.: «Dá-me cá esses ossos honrados, honrado inglês» (Eça de Queirós, Os Maias)
«fumar antes do almoço um pensativo cigarro» - porque pensativo refere-se ao
fumador e não a um cigarro. (Eça de Queirós, Os Maias)
«À dolorosa luz das grandes lâmpadas» (Álvaro de Campos, “Ode Triunfal”)
Hipérbole Exagero na apresentação ou caracterização de uma realidade, com objetivos elogiosos ou
satíricos e, igualmente, com o fim de acentuar determinado aspeto.

Ex.: «Presença serena que a tormenta amansa» (Luís de Camões, Rimas)


«Abram mais janelas do que todas as janelas que há no mundo!»
(Álvaro de Campos, “Ultimatum”)
«Esta angústia que trago há séculos em mim» (Álvaro de Campos)
Interrogação Enunciação de uma pergunta para enfatizar o assunto e não para obter uma resposta.
retórica Sugere a reflexão, já que pretende chamar a atenção do destinatário para algum assunto,
ou a introdução de um novo tópico temático.

«Que faria neste caso o ânimo generoso do grande António?»


(Padre António Vieira, “Sermão de Santo António”)
«O mistério das coisas, onde está ele?/ Onde está ele que não aparece/ Pelo menos a
mostrar-nos que é mistério?» (Alberto Caeiro, “O Guardador de Rebanhos”)
Ironia Utilização de determinadas palavras, expressões ou frases com um sentido contrário
àquele com que são habitualmente usadas, sugerindo crítica, troça, desdém.

Ex.: «O Eusebiozinho com o craniozinho calvo de sábio curvado sobre as letras garrafais da
boa doutrina» (Eça de Queirós, Os Maias)
«Se faltava um guardanapo ou um copo, fingia-se espantado:
Como! A D. Juliana esqueceu-se! Uma pessoa tão perfeita»
(Eça de Queirós, O Primo Basílio)
Metáfora Aproximação de duas realidades ou dois conceitos diferentes que são assemelhadas,
atribuindo à primeira uma qualidade pertencente à segunda.

Ex.: «A vida/ é o bago de uva/ macerado/ nos lagares do Mundo» (Carlos de Oliveira)
«Iam ser, outra vez, o rebanho que se levanta com o dia»
(Manuel da Fonseca, «Sempre é uma companhia»)
«Amor é fogo que arde sem se ver» (Luís de Camões, Rimas)
Metonímia Referência a uma realidade através de uma palavra que remete para uma outra com a
qual mantém determinadas relações. Pode assumir diversas modalidades: a causa pelo
efeito e vice-versa; o concreto pelo abstrato e vice-versa; o instrumento pela pessoa que o
utiliza; o autor pela obra; o lugar de procedência pelo objeto.

Ex.: «Camões e Pessoa estão na primeira estante/ Mesmo indisposta, ela terminou o seu
prato.»
«Já ouvi todo o Mozart, ainda não li todo o Fernando Pessoa.»
Paradoxo ou Utilização de palavras ou ideias contraditórias na apresentação de uma realidade. Os dois
oxímoro termos que para ela remetem excluem-se mutuamente, destacando o seu carácter
excecional.

Ex.: «Amor é um fogo que arde sem se ver/ é ferida que dói e não se sente»
(Luís de Camões, Rimas)
Personificação Atribuição de características humanas a seres inanimados, abstratos ou animais.
ou
prosopopeia Ex.: «Carregado de tristeza, o entardecer demora anos» (Manuel da Fonseca, «Sempre é
uma companhia»)
«O céu abriu-se num sorriso» (Miguel Torga)
«Breve, a aldeia ficará adormecida» (Manuel da Fonseca, “Sempre é uma
companhia”)
Perífrase Substituição de uma palavra ou conceito breve por uma expressão mais longa.

Ex.: «Ouvindo tinha aos Fados que viria/ Hua gente fortíssima de Espanha» - refere-se aos
portugueses (Luís de Camões, Os Lusíadas)
«Pelo neto gentil do velho Atlante» - refere-se a Mercúrio (Luís de Camões, Os
Lusíadas)
«O plantador das naus a haver» - refere-se a D. Dinis (Luís de Camões, Os Lusíadas)
Pleonasmo Repetição da mesma ideia por palavras ou expressões diferentes, de modo a realçá-la.

Ex.: «Vi, claramente visto, o lume vivo» (Luís de Camões, Os Lusíadas)


«Ele desceu para baixo»; «Ela entrou para dentro»; «Tinha o monopólio exclusivo»
Sinédoque Referência ao significado de uma palavra através de outra que com ela mantém uma
relação de inclusão: consiste em tomar a parte pelo todo ou vice-versa; o singular pelo
plural e vice-versa; o género pela espécie ou vice-versa; a matéria pelo objeto; o traço
físico pelo ser. Substituição de um termo por outro.

Ex.: «Que, da Ocidental praia lusitana» - refere-se a Portugal (Luís de Camões, Os


Lusíadas)
«fica com o seu pão garantido quem souber de artes de padeiro» – refere-se à
sobrevivência (José Saramago, Memorial do Convento)
Sinestesia Manifestação, através de uma expressão, de sensações ligadas a sentidos diferentes.

Ex.: «Às horas cor de silêncio e angústias» (Álvaro de Campos)


«E fecho os olhos quentes» (Alberto Caeiro, “O Guardador de Rebanhos”)
«E fere a vista com brancuras quentes» (Cesário Verde, «Num Bairro Moderno»)

Figuras de sintaxe
Anáfora Repetição de uma ou mais palavras no início de frases ou versos sucessivos, para
intensificar a ideia por ela(s) expressa.

Ex.: «Tempo de solidão e de incerteza/ Tempo de medo e de traição/ Tempo de injustiça e


de vileza/ Tempo de negação» (Sophia de Mello Breyner Andersen)
«Ninguém sabe que coisa quer/ Ninguém conhece que alma tem»
(Fernando Pessoa, Mensagem)
Anástrofe Inversão da ordem sintática habitual das palavras numa frase para destacar algum
ou Hipérbato elemento ou para criar efeitos rítmicos, rimáticos e de sentido. (ex.: ocorrência do
complemento direto antes do verbo ou do complemento do nome antes do nome)

Ex.: «As rosas amo dos jardins de Adónis» = Amo as rosas dos jardins de Adónis (Ricardo
Reis)
«E, enorme, nesta massa irregular/ De prédios sepulcrais, com dimensões de montes,/
A dor humana busca os amplos horizontes»
(Cesário Verde, “O sentimento dum Ocidental”)
Assíndeto Supressão intencional de elementos de ligação (geralmente as conjunções coordenativas
copulativas) entre palavras de uma frase ou entre palavras.

Ex.: «Eu, que sou feio, sólido, leal,/ A ti, que és bela, frágil, assustada»
(Cesário Verde, O Livro de Cesário Verde)
«Tira a lâmpada, enrosca aí a tomada, puxa o fio que sai da caixa, liga-o»
(Manuel da Fonseca, «Sempre é uma companhia»)
Enumeração Exposição sucessiva de vários elementos relacionados entre si e, geralmente da mesma
classe gramatical, segundo uma determinada linha lógica, de forma a intensificar uma
ideia. A ligação pode ser feita de forma assindética, isto é, sem recurso à conjunção
copulativa (assíndeto), ou de forma polissindética, ou seja, com recurso à conjunção
copulativa (polissíndeto).

Ex.: «Erros meus, má fortuna, amor ardente» (Luís de Camões, Rimas)


«Andam por estas correias de transmissão e por estes êmbolos e por estes volantes,/
Rugindo, rangendo, ciciando, estrugindo, ferreando» (Álvaro de Campos, “Ode Triunfal”)
Paralelismo Repetição de uma frase, de uma ideia ou de uma construção frásica.

Ex.: «Apetece cantar, mas ninguém canta./ Apetece chorar, mas ninguém chora.»
(Miguel Torga)
Polissíndeto Repetição intencional do elemento de ligação entre palavras ou frases (frequentemente a
conjunção coordenativa copulativa)

Ex.: «Vão outros Josés, e Franciscos, e Manuéis, serão os Baltasares, e haverá Joões,
Álvaros, Antónios e Joaquins (…)» (José Saramago, Memorial do Convento)

Figuras fónicas
Aliteração Repetição intencional do mesmo som consonântico em palavras próximas da frase ou do
verso, conferindo ao texto determinados efeitos sonoros e rítmicos, que reforçam o
sentido, aceleram o ritmo e contribuem para a musicalidade do discurso.

Ex.: «Na rua, os ratos roeram a vida» (Manuel Alegre)


«Amo, insensatamente, os ácidos, os gumes/ E os ângulos agudos»
(Cesário Verde, “Contrariedades”)
Assonância Repetição de sons vocálicos idênticos, reforçando o sentido, acelarando o ritmo e
contribuindo para a musicalidade do discurso.

Ex.: «Brilham com brilhos sinistros» (Eugénio de Castro, “Um sonho”)


Onomatopeia Utilização de palavras que reproduzem sons ou ruídos.

Ex.: «Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno!» (Álvaro de Campos)

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