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ÚRSULA

MARIA FIRMINA DOS REIS

https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Maria_firmina_(detailed).jpg

1. DADOS BIOGRÁFICOS
Maria Firmina dos Reis nasceu na Ilha de São Luís, no Maranhão, em 1822. Sua
mãe, a preta forra Leonor Felippa, havia sido escrava do comendador Caetano José Teixeira,
rico comerciante e dono de terras na vila de São José de Guimarães.
Sua avó era também escrava alforriada, Engrácia Romana da Paixão. Firmina tinha
parentesco também com o professor, gramático e filólogo Sotero dos Reis.
Ainda criança mudou-se para a Vila de Guimarães, município de Viamão,
morando com uma tia de melhores condições financeiras.
No entanto, Maria não deixava de ser uma mulher negra de poucas posses,
que fora educada em casa tendo acesso limitado aos livros, e à cultura letrada.
Mesmo em meio a essas limitadas condições de estudo, em 1847, Firmina é
aprovada no concurso público para a Cadeira de Instrução Primária de Guimarães, Firmina
foi a primeira mulher a alcançar o posto de professora de primeiras letras de Viamão, aos 25
anos de idade.
Além do exercício do magistério, Maria Firmina dos Reis participou da vida
intelectual maranhense: colaborou na imprensa local, especialmente nos jornais literários, “A
Verdadeira Marmota”, “Semanário Maranhense”, “Pacotilha”, entre outros, também publicou
livros, participou de antologias. Foi ainda musicista e compositora.
Ao se aposentar, no início da década de 1880, Firmina ainda teve a disposição para
fundar na vila de Maçaricó, a primeira escola mista e gratuita do Maranhão e uma das
primeiras do país. Mesmo obrigada a encerrar as atividades da escola depois de apenas dois
anos e meio de funcionamento, o feito é de inegável valor histórico.
Sem nunca ter se casado, Maria Firmina faleceu em 1917, cega e pobre, aos 95
anos, em Guimarães. Restaram poucos documentos pessoais seus, não tendo sido encontrada
nenhuma foto sua até o momento. Firmina é a única mulher dentre os bustos que
homenageiam escritores maranhenses na Praça do Pantheon, situada na cidade de São Luís,
imagem que abre esta análise.

2. OBRAS
Em 1859, Firmina publicou “Úrsula”, seu primeiro livro, sob o pseudônimo de
“UMA MARANHENSE”.
Em 1861, no jornal literário O Jardim dos Maranhenses publicou sua segunda obra,
o romance indianista “Gupeva”.
Em 1871, publica o livro de poesias “Cantos à beira-mar”.
Em 1887, publica pela Revista Maranhense o conto abolicionista, “A Escrava”.
Em 1888, compôs o “Hino da abolição dos escravos”.

3. CARREIRA LITERÁRIA
Maria Firmina dos Reis alcançou um relativo sucesso em seu tempo, sendo
recebida com alguns elogios, mas também ressalvas negativas, da imprensa local, e por
ocasião de suas publicações. Todavia, durante muitos anos, sua obra literária foi esquecida,
como, aliás, a de outras mulheres que produziram literatura no século XIX.
O romance Úrsula foi (re)descoberto, em 1962, por Horácio de Almeida em um
sebo do Rio de Janeiro. O pesquisador ficou interessado em descobrir a identidade de uma
escritora escondida pelo pseudônimo de“Uma maranhense”, que constava na capa do livro.
Ao pesquisar sobre o assunto, Horácio identificou a identidade da romancista, fazendo então
uma edição facsimilar do texto. No prólogo desta edição, Almeida acusa a ausência do nome
de Maria Firmina nos estudos críticos dedicados à literatura maranhense e brasileira. Segundo
os estudos de Horácio, o único historiador da Literatura a mencioná-la foi o literato
Sacramento Blake.
Após esse lançamento, foi encontrado um diário de recordações entregue ao
pesquisador Nas cimento Filho por um dos filhos adotivos de Maria, chamado Leude
Guimarães. Esta reunião de textos foi publicada por ele em 1975, intitulado de “Álbum”.
O “Álbum” é um diário íntimo, composto de pequenos textos, sobre temas
variados, como a dor da partida, a tristeza da separação, os estados d’alma, a infância, a
solidão, além de refletir sobre os problemas da educação patriarcal que se destinava às
mulheres brasileiras de seu tempo.

4. CARACTERÍSTICAS DA AUTORA
Maria Firmina é uma escritora que, por seu estilo geral e aparente, se enquadra
perfeitamente à estética do Romantismo, então em voga no Brasil de seu tempo.
Todavia, a escritora apresenta importantes singularidades que marcam a sua obra. A
mais importante delas é o fato de que em livros como “Úrsula”, o negro é mostrado em sua
dimensão humana. Maria em sua obra confere ao escravo uma posição de sujeito de
discurso, revelando identificação com o negro escravizado.

5. ESTUDO DA OBRA
5.1. Contexto Histórico
O NEGRO NA ECONOMIA DO BRASIL E DO MARANHÃO
Entre os séculos XVII e XIX os negros constituíam dois terços da população maranhense,
sendo os principais responsáveis pela produção de grande parte de sua riqueza. Mesclando
trabalhos e tratamento desumano de seus senhores, a vida média produtiva dos escravos era
de apenas dez anos.

A EDUCAÇÃO NO BRASIL DO SÉCULO XIX


A maior parte do povo brasileiro era analfabeta, havia poucas escolas, e estas, na sua
maioria, voltada aos homens. Portanto, mesmo às mulheres brancas e ricas, ainda assim a
educação era limitada no Brasil do século XIX. A educação oferecida às mulheres sempre foi
diferenciada. Sob a égide do discurso patriarcal, a educação das meninas tinha como objetivo
formar mães e esposas, recatadas, obedientes e do lar. Sendo o acesso à educação plena tão
cerceado às mulheres, quanto mais ainda o acesso à vida e à produção artística e literária.

A LEITURA NO BRASIL DO SÉCULO XIX


A própria circulação dos jornais naqueles tempos era em número muito reduzido.
Segundo dados da época, mesmo a tiragem do “Jornal do Comércio” tendo passado em 1827
de 400 exemplares/ano para 15.000 em 1871, ainda assim esse número atingia a cerca de 5%
da população da corte.

ESCRITORES E ESCRITORAS NEGRAS


Em virtude desse contexto excludente, foi sempre reduzido número de mulheres e,
principalmente, de mulheres negras que tiveram acesso à educação formal. Por óbvio, menor
ainda o número de mulheres, e, sobretudo, de mulheres negras, que tiveram oportunidade de
desenvolver uma carreira literária.
Imensas eram, portanto, as dificuldades para uma mulher escrever, publicar, atingir e
conquistar o público leitor de sua época.
Por essas e outras razões, ganha importância extraordinária o fato de Maria Firmina ter
rompido a barreira de exclusão social, racial e de gênero de sua época para se tornar escritora,
bem como o fato de sua obra chegar a nós, e continuar a ser lida e reconhecida atualmente.
Ela faz parte daqueles Afrodescendentes que conseguiram se manifestar por meio da
cultura e da literatura, erguendo suas vozes contra injustiças, barbáries e desigualdades entre
os brasileiros. Na trajetória da literatura das minorias, especialmente das mulheres afro-
brasileiras, Maria Firmina dos Reis tem papel de precursora e de preponderância.

5.2. Aspectos estruturais


Ano de publicação: 1859
Gênero literário: Romance
Escola Literária: Romantismo (regionalista)
Foco narrativo: 3° pessoa
Número de páginas: 250 aproximadamente
Número de capítulos: 20
1 Prefácio e 1 Epílogo.

NARRADOR – VOZ AUTORAL


A história apresenta um narrador em terceira pessoa, mas que faz inferências ao longo
do enrerndo, emitindo juízos e comentários, expressando, às vezes, sua indignação.
O narrador além de revelar o íntimo das personagens também mostra-se portador da
voz autoral, sendo evidente que suas avaliações espelham as posturas e visão de mundo da
própria autora.

ESTILO e LINGUAGEM
Maria Firmina utiliza uma linguagem poética, como no excerto que segue:

São vastos e belos os nossos campos, porque inundados pelas torrentes do


inverno semelham o oceano em bonançosa calma. [...] E sua beleza é amena
e doce, e o exíguo esquife, que vai cortando as águas hibernais mansas e
quedas, e o homem, que sem custo o guia, uma vaga sensação de
melancólico enlevo desprende um canto de harmoniosa saudade,
despertando pela grandeza dessas águas, que sulca (REIS, 1988, p. 15).

A linguagem da obra se adequa perfeitamente à estética romântica,


especialmente no tom emocional e no uso abundante de adjetivos. A autora se inspira no
discurso poético de seu tempo, lembrando a poesia grandiloquente e de tom oratório dos
românticos:

“-Senhor Deus! Quando calará no peito do homem a tua sublime


máxima –ama a teu próximo como a ti mesmo- e deixará de oprimir
com tão repreensível injustiça ao seu semelhante!” (REIS, 1988, p. 23).
Esse tom oratório lembra a poesia “condoreira”, grandiloquente, comum aos
escritores abolicionistas da 3ª geração romântica. Porém é importante lembrar: o romance de
Firmina foi publicado em 1859, quando nosso principal poeta condoreiro, Castro Alves, tinha
apenas 12 anos de idade, e sua obra “Espumas Flutuantes”, viria a ser publicada somente em
1870.
Ainda no que diz respeito à linguagem, pode-se notar em Úrsula a preocupação
com a correção da linguagem, inclusive na fala dos personagens escravos.
No romance de Firmina inexiste diferenciação entre a fala do narrador e a dos
escravos. Alguns críticos vêem nessa estratégia a perda da oportunidade de representar a
linguagem do escravo de maneira mais verossímil, outros analisam tal indiferenciação como
uma forma de reafirmar a nobreza de sentimentos dos personagens negros, expressos num
status elevado de língua, isso apontaria para a igualdade dos homens de corações retos, como
Túlio e Tancredo, independente da cor ou condição social de ambos.
Outros estudiosos, porém, consideram que, no tempo em que a obra foi escrita,
Firmina não poderia escrever de forma diferente, pois se o tivesse feito os escravos de seu
romance se expressarem numa linguagem próxima do discurso oral dos mesmos, a autora
certamente estaria dando mais um motivo para ser rejeitada por leitores e a crítica de sua
época.
De qualquer forma, independente das divergências entre os estudiosos, o que fica
é que a linguagem usada pela autora é de extremo cuidado com a correção gramatical, sendo
uniforme na modulação narrador x personagens, e marcada por enorme clareza (isto,
obviamente, para os padrões da língua portuguesa praticada nos meios intelectuais brasileiros
do século XIX).

PRÓLOGO
No prólogo, apresentação que a autora faz de sua obra ao público e à crítica, os
sinais de modéstia são muitos. O livro é descrito por ela como “mesquinho e humilde”, é
“pobre avezinha silvestre”, “tímida e acanhada”, “sem dotes da natureza”...
Mas traz um trecho importante que pode servir como chave para um
entendimento diferenciado:

Sei que pouco vale este romance, porque escrito por uma mulher, e
mulher brasileira, de educação acanhada e sem o trato e
conversação dos homens ilustrados [...] com uma instrução
misérrima [...] e pouco lida, o seu cabedal intelectual é quase nulo.
(REIS, 2004, p.13, daqui em diante todos os grifos nossos ).

Comparando o prólogo de Úrsula com os de outros livros românticos


contemporâneos seus, constata-se que tal postura era muito comum. Porém, quando Maria
Firmina enfatiza a falta de instrução formal satisfatória não apenas sua, mas das mulheres
brasileiras daquela época, o prólogo abre a possibilidade de ser lido como um sutil e ao mesmo
tempo veemente tom de reprovação às estruturas sociais de seu contexto. Uma denúncia
daquela realidade, daquele desigual quadro educacional brasileiro, do que era ofertado em
relação aos pobres e, especialmente, em relação às mulheres.

PERSONAGENS
Úrsula: jovem bela, correta, órfã de pai, vive com sua mãe, paralítica, Luiza B. em uma casa
interiorana.
Tancredo: jovem belo e rico, traído por sua noiva com seu próprio pai.
Luiza B.: mãe de Úrsula, senhora paralítica, na juventude casou-se com Paulo B, angariando
para ambos a ira do irmão, Comendador, que não aprovava a união.
Paulo B.: esposo de Luiza B, pai de Úrsula, que lhe fora infiel, gastando seu dinheiro e a
tratando de maneira desonrada.
Comendador Fernando P.: irmão de Luiza B, homem cruel e despótico, desenvolve uma paixão
doentia pela própria sobrinha, Úrsula.
Pai de Tancredo: homem ardiloso e cruel, engana o próprio filho.
Mãe de Tancredo: mulher bondosa, ama o filho, sofre com os maus tratos do marido.
Adelaide: moça interesseira e dissimulada, trai a mãe de Tancredo e o filho para ficar com o
pai do rapaz, em razão de ele ser homem de posses.
Túlio: jovem escravo de caráter nobre e conduta ilibada.
Preta Susana: escrava que trazia em sua memória todas as agruras da escravidão e da diáspora
negra no Brasil.
Antero: escravo alcóolatra, que encontrava na bebida o escape para sua vida de amargura e
privações.

TEMPO
Não há menção exata do tempo da narrativa, provavelmente a história se passa no
século XIX, num período, obviamente, anterior à abolição. O tempo da enunciação é linear, do
momento em que Tancredo e Úrsula se conhecem até seu final trágico, num período que
poderia corresponder presumivelmente a alguns meses, ou mesmo semanas. Dois anos depois
da morte de ambos, temos um epílogo que narra a morte do Comendador.
Há, no entanto, dentro do enredo linear, a inserção de vários flashbacks, revelando o
passado de alguns personagens, suas subtramas e narrativas “de encaixe”.

ESPAÇO
Sobre o espaço da história, não há uma marcação clara de onde se passa ação narrativa.
Podemos, no entanto, inferir que a história se dá numa região do interior do Brasil, o que
configura a obra como enquadrada no Regionalismo Romântico.
Com relação ao espaço também é importante observar que em vários momentos se
destaca a natureza local exuberante, vide a cena em que Tancredo se declara para Úrsula, à
sombra de um Jatobá, o qual aparece reiteradas vezes na história como refúgio da
protagonista.
Além da natureza local, temos ainda dois espaços bastante mencionados: a Fazenda
Santa Cruz, de propriedade do Comendador, e o Convento de ***, onde Úrsula se refugia de
Fernando.
Lembrar que esses asteriscos eram uma convenção do Romantismo, em que o autor
usava tais sinais para supostamente “poupar a identidade” de pessoas e lugares reais que
apareciam em suas histórias.

ENREDO
CAPÍTULO 1
O romance inicia-se com uma detalhada e poética descrição da natureza de um lugar
não nominado, mas que percebe-se ser o interior brasileiro. É descrito então um jovem que se
chama Tancredo, rico e belo cavaleiro, triste e melancólico, viajando por uma estrada. Seu
cavalo, cansado, cai morto e fica sobre o rapaz. Túlio, um escravo negro, salva a vida do jovem.
A partir deste fato, o narrador deixa claro que apesar das diferenças ambos compartilham o
mesmo espírito bondoso.
Quando questionado sobre a melhor forma de ser recompensado, Túlio afirma só
desejar que os escravos que cruzarem o caminho de Tancredo sejam tratados com respeito.
Tancredo não só concorda como se mostra incomodado com a situação daquele que o
salvou e de seus iguais. Mais que agradecimento, como forma de gratidão com aquele
que chamou de amigo, também devolveu a Túlio sua liberdade.
CAPÍTULO 2
Tancredo é levado para chácara de Úrsula e sua mãe, por Tulio, e lá recebe os cuidados
da moça. Úrsula é descrita como doce, bela e cheia de compaixão, não possui pai e divide a
solidão com sua mãe doente. Durante sua convalescença, Tancredo delira, falando sobre uma
mulher que ele amava, mas que o traíra.

CAPÍTULO 3
Túlio recebe o dinheiro de Tancredo para comprar sua alforria. Tancredo declara seu
amor para Úrsula e começa a revelar o seu passado, o que se conclui no capítulo seguinte.

CAPÍTULO 4
Tancredo revela a Úrsula que fora apaixonado por uma moça chamada Adelaide, órfã de
mãe e pai, filha de uma prima da mãe do rapaz, que foi por ela amparada e adotada com muito
carinho. Porém, quando Tancredo resolve casar-se com a moça, esbarra no autoritarismo e
patriarcalismo de seu rude pai. Arrogante e cruel, o pai além de humilhar a esposa, se mostra
completamente contrário à união do filho com Adelaide.

CAPÍTULO 5
Adelaide diz amar Tancredo, insistindo com o pai, e este, mesmo mantendo a arrogância
e o sarcasmo, abre uma concessão. O pai permitiria a união desde que seu filho passasse um
ano fora trabalhando em outra cidade, a fim de que a moça ganhasse mais idade para casar-se
com ele.

CAPÍTULO 6
Tancredo despede-se da mãe e parte para o exílio forçado.

CAPÍTULO 7
Na outra cidade recebe cartas da mãe, sempre cheias de ternura e carinho. Adelaide
também manda cartas carinhosas, porém, com o tempo elas vão se espaçando cada vez mais
até cessarem por completo. Nas cartas da mãe, nada se mencionava sobre Adelaide, o que
deixava o moço cada vez mais triste e desesperado.
Ainda fora da casa paterna, recebe a notícia de que a mãe, que sempre sofrera com os
maus tratos do marido, havia falecido.
Tancredo volta, enfim, para casa e quando reencontra Adelaide, descobre que a mesma
havia se casado com seu pai. O mancebo, revoltado, maldiz a moça e o pai, saindo de casa.
Terminado o flashback, Tancredo toca a mão de Úrsula.

CAPÍTULO 8
Neste capítulo, numa conversa com Tancredo, a mãe de Úrsula, Luiza B, conta sua
história. Fora casada, a contragosto da família, especialmente de seu irmão, Comendador F. da
P., o qual ficara revoltado com a união e que não o via desde aquela época, há aproximadamente
18 anos, idade de sua filha. Luiza casou-se com um homem chamado Paulo B., pai de Úrsula,
que era um péssimo marido, sendo infiel e gastando sua fortuna, mas que quando estava
decidido a se regenerar devido ao nascimento da filha, fora misteriosamente assassinado.
Ao fim dessa conversa, Tancredo diz amar Úrsula e querer casar-se com ela. Apesar de
num primeiro momento ser contra, por estarem em situações sociais diversas, a mãe dá ao casal
o seu consentimento e sua benção.

CAPÍTULO 9
Túlio se despede de sua mãe de criação, Preta Susana, para acompanhar Tancredo.
Neste momento, a personagem da escrava assume a voz narrativa e conta todo o seu passado
de sofrimento e escravidão.
CAPÍTULO 10
Tancredo parte com Túlio para a cidade onde tinha um trabalho a resolver. Nesse interim
Úrsula vai passear pela floresta e conhece um caçador misterioso, homem mais velho, que ao
encontrá-la e supostamente vê-la pela primeira vez, jura-lhe amor eterno. A moça, com medo,
foge do homem. Quando fica sozinho, o caçador em seus pensamentos revela ao leitor ser o
Comendador Fernando de P., tio de Úrsula, o qual havia assassinado seu pai e que agora
prometia ficar com a sobrinha ou matá-la, caso a moça assim não consentisse.

CAPÍTULO 11
O irmão de Luiza manda uma carta, dizendo que precisa falar com ela. Até então, Úrsula
não sabia que seu tio e o caçador eram a mesma pessoa. Quando ele chega na casa, ao ouvir
sua voz, a moça foge para a floresta. O tio revela à irmã o desejo de desposar a sobrinha e vai
embora. Depois disso, a Preta Susana vai buscar Úrsula na floresta, dizendo que sua mãe estava
nas últimas e queria dar-lhe um último beijo e um derradeiro conselho.

CAPÍTULO 12
Úrsula volta para casa apenas a tempo de ouvir sua mãe revelar que fora o tio que havia
matado seu pai e que ela fugisse dele o quanto antes. Em seguida, Luiza B falece.

CAPÍTULO 13
Úrsula é encontrada no cemitério desmaiada sobre o túmulo da mãe, por Tancredo e
Túlio que retornaram de viagem.

CAPÍTULO 14
Narra conversa entre Tulio e Tancredo, na qual o primeiro revela que sua mãe era
escrava predileta da mãe de Úrsula e por ela tratada com muita humanidade, porém, fora
comprada pelo Comendador, na sua ânsia de vingança da irmã nos tempos de seu casamento e
falência financeira. Quando sua mãe foi retirada dele, Túlio foi entregue por ela aos cuidados da
Preta Susana. Tempos depois, o jovem escravo recebe a notícia de que sua mãe morrera.

CAPÍTULO 15
Úrsula é deixada num convento como refúgio, lugar onde os jovens pretendem em
seguida se casar.

CAPÍTULO 16
Fernando chega à casa de Úrsula para tomar a sobrinha como esposa, mas não a
encontra. Pergunta onde ela estava à Preta Susana, que diz estar a moça no cemitério (o que
era verdade), porém ao chegar lá e não encontrá-la, pois Úrsula já havia partido com Túlio e
Tancredo, o Comendador, pensando que Susana o enganara, ordena que a escrava seja
castigada fisicamente e depois jogada num cárcere.

CAPÍTULO 17
Tancredo e Úrsula irão se casar no convento, porém dão pela falta de Túlio. O escravo
que estava andando pelos arredores do convento é capturado pelo Comendador, que interroga-
o sem sucesso para saber onde estava a sobrinha. O comendador deixa Túlio em cárcere aos
cuidados do escravo alcoólatra, Antero.

CAPÍTULO 18
Túlio da dinheiro para Antero comprar bebida e aproveita-se de sua embriaguez para
fugir. Túlio corre para avisar da chegada de Fernando e salvar o casal amigo, porém, quando
encontra e se aproxima de ambos, é alvejado com dois tiros nas costas pelo Comendador.
Tancredo e Comendador entram em luta física. Fernando, com a ajuda de seus capangas,
mata o jovem. Antes de falecer, porém, Tancredo consegue dar o primeiro e último beijo em
sua amada.

CAPÍTULO 19
Fernando leva Úrsula, porém, ela começa a dar sinais de loucura, assim como o
Comendador passa a dar indícios de remorso por todas as suas crueldades, crimes e pecados.

CAPÍTULO 20
Susana é enterrada, não resistiu aos suplícios infligidos a ela pelo Comendador. O
padre com quem Fernando conversa constantemente confronta-o com sua culpa pela morte da
escrava, e em seguida ambos vão ao quarto de Úrsula que também, delirando de loucura, morre.

EPÍLOGO
Dois anos se passaram depois da última cena. Fernando se enclausura no
convento dos carmelitas. O homem se dá a alcunha de Frei Luís de Santa Úrsula. Instado pelo
padre, o vilão, em lágrimas, arrepende-se de todos os seus crimes e pecados. Em seguida fala-
se sobre o desfecho de Adelaide, que fora infeliz com o pai de Tancredo, o qual morreu
desgostoso, amaldiçoando a hora em que amara a moça. Depois disso, casou-se com outro
homem, que a arrastou para o desespero e aflição.
O último parágrafo foca o túmulo da protagonista onde na lápide se lia:
“- Orai pela infeliz Úrsula.”

5.3. Aspectos temáticos


NARRATIVAS DE ENCAIXE
O encaixe de narrativas é a técnica que consiste em várias narrativas entrelaçadas a um
enredo principal. Em Úrsula, além da história central que envolve Tancredo e Úrsula, temos as
histórias de Tancredo com Adelaide, a história de Luiza B. com Paulo B., a história de Antero, de
Túlio e sua mãe, bem como a história da Preta Susana, certamente a mais significativa e singular
do romance, principalmente, pela maneira como é narrada.

MANIQUEÍSMO ROMÂNTICO SINGULAR


O maniqueísmo romântico (oposição nítida entre o bem e o mal, o herói e o vilão) se faz
bastante evidente no romance de Maria Firmina. É clara a oposição diametral entre o herói,
Tancredo, e os vilões, Seu Pai, e, principalmente, O Comendador. Todavia, mesmo parecendo
seguir a regra romântica, podemos notar em Úrsula uma singularidade, uma particularidade na
confecção dessas personagens, que garante a originalidade da autora, bem como reforça sua
forma sutil e ao mesmo tempo veemente de tecer críticas sociais sob o véu de uma ficção
aparentemente descomprometida.
Analisemos, então, a figura do herói e do vilão principal da trama.
O Comendador F. de P***, além de ser uma criatura prepotente e ignorante, entre
outras crueldades, assassina o escravo Túlio e o jovem Tancredo.
A personagem é caracterizada como obcecado, de extrema maldade extrema. Apesar
do enquadramento convencional desta personagem no maniqueísmo romântico, cumprindo a
função de vilão do enredo, o Comendador representa uma singularidade em relação ao modelo
romântico, pois Maria Firmina coloca como símbolo da maldade extrema na trama ficcional
exatamente o representante do máximo poder local do Brasil colonial do século XIX, ou seja,
o proprietário de terras, o senhor de escravos. Não raramente aquele que impingia sofrimento
a tantas pessoas, em decorrência da escravidão e outros, na vida real da sociedade brasileira
daquele tempo.
Desse modo, a escolha do antagonista não parece aleatória, mas configura como mais
uma maneira da autora visibilizar e contestar as desigualdades sociais do país, especialmente
os desmandos, arbitrariedades e crueldades de suas classes dominantes. Talvez seja mais do
que simplesmente curioso lembrar que o dono da mãe da autora Maria Firmina era também
um “Comendador”.
Em oposição à personagem do Comendador está a figura de Tancredo, que é elaborada,
também à primeira vista, seguindo o padrão tipicamente do herói romântico. A personagem
tem caráter justo e generoso. Além de ser rico, Tancredo é apaixonado e corajoso, possuindo
ainda o sentimento de gratidão a Túlio, que o salva no início da narrativa:

“Recebe amigo, este pequeno presente que te faço e compra com ele sua
liberdade” (REIS, 2004, p. 42).

Porém, aqui mais uma vez Maria Firmina parece usar de um mecanismo geral do clichê
romântico para construir um herói dotado de singularidade dentro do seu contexto de
produção. Pois o comportamento convencional de herói romântico de Tancredo denota uma
rara exceção dentro de uma sociedade extremamente preconceituosa como a
maranhense/brasileira daqueles tempos.
O heroísmo de Tancredo está mais em suas ações frente ao contexto brasilero, do que
no valor delas em si mesmas. Tancredo apresenta como imensa virtude não possuir a mácula
do preconceito, tanto em relação aos escravos quanto em relação às mulheres. Duas classes
tão vitimadas por homens brancos ricos como o Comendador e o Pai de Tancredo.
O narrador confirma isso ao relatar o que Túlio diz de Tancredo, comentando que o
jovem “era o primeiro branco que tão doces palavras lhe havia dirigido” (p. 29) e, também, mais
adiante, que ele era o “único que soube compreender a amargura do escravo!” (p. 38)
Tancredo também é retratado como o único que compreende a situação da mulher,
especialmente mulheres em condição de fragilidade social.
Ao contar a visita de Tancredo a Luísa B..., por exemplo, o narrador afirma que o jovem
“era a primeira pessoa que a visitava em sua triste morada, e que em face de sua enfermidade
a não desdenhava, nem sentia repugnância da sua miséria e do seu penoso estado” (p. 97).
Portanto, por trás, tanto do vilão quanto do herói aparentemente convencionais de
Maria Firmina, estavam virtudes e vícios que se não eram exclusivos, pelo menos eram muito
característicos da realidade brasileira de então.

TÚLIO E ANTERO: A DIGNIDADE HUMANA


Túlio também é uma personagem bastante singular e importante dentro da obra. Mais
singular ainda que os dois citados anteriormente e mais relevante nas leituras contemporâneas
do que eles, mesmo que não seja protagonista da história.
Túlio é um jovem inconformado com sua condição de escravo, mas sua revolta não abala
em nada sua retidão de caráter, sua alma nobre. Evidencia isso o encontro inicial de Túlio e
Tancredo, que são chamados de duas almas generosas. No aperto de mão que ambos trocam
quando Tancredo agradece a Túlio por ser salvo por ele, o narrador de Firmina nos brinda com
uma cena bela e simbólica, de que negro e branco podem se unir num mesmo espírito de
generosidade. Tal cena é uma eloquente e comovente contestação das posturas racistas de
então.
Túlio tem um papel fundamental na narrativa, pois por intermédio dele e também da
Preta Susana, a autora vai construir uma imagem do negro diferente da que se tinha
comumente na literatura da época. A partir deles, Maria Firmina estabelece uma ruptura do
estereótipo de personagens negras dos romances em voga, geralmente retratadas como
malandras, coitadas, preguiçosas ou sensualizadas, construindo, ao contrário, em Túlio e
Susana, uma verdadeira exaltação à raça negra:

O homem que assim falava era um pobre rapaz, que ao muito parecia contar vinte e
cinco anos, e que na franca expressão de sua fisionomia deixava adivinhar toda a
nobreza de um coração bem formado. O sangue africano refervia-lhe nas veias; o
mísero ligava-se à odiosa cadeia da escravidão; e embalde o sangue ardente que
herdara de seus pais, e que o nosso clima e a escravidão não puderam resfriar,
embalde – dissemos – se revoltava; porque se lhe erguia como barreira – o poder do
forte contra o fraco!... (REIS, 2004, p. 22)

Temos aí a descrição de uma personagem humanizada, sensível e de bom caráter.


Principalmente que essas características positivas se devem exatamente por causa do sangue
africano que corre em suas veias, herdado de seus ancestrais e não “apesar” dele.
Nem mesmo os horrores do cativeiro tiveram o poder de tornar Túlio um ser
corrompido, maldoso ou embrutecido. Isso vai ser reafirmado adiante, por meio do seguinte
comentário feito pelo narrador:

O mísero sofria; porque era escravo, e a escravidão não lhe embrutecera a alma;
porque os sentimentos generosos, que Deus lhe implantou no coração,
permaneciam intactos, e puros como a sua alma. Era infeliz; mas era virtuoso; e
por isso seu coração enterneceu-se em presença da dolorosa cena, que se lhe
ofereceu à vista. (REIS, 2004, p. 23)

É preciso destacar que, apesar de menos relevante na trama, Antero também apresenta
uma outra faceta da humanização do negro na obra de Maria Firmino. O escravo alcóolatra é
visto como vítima de um contexto em que uma das poucas saídas possíveis para aplacar a dor
da escravidão era o álcool. Antero, portanto, mostra uma outra faceta humanizada das agruras
vivenciadas pelos negros no sistema escravagista.

PRETA SUSANA – A MEMÓRIA e VOZ DA DIÁSPORA NEGRA


A temática do negro e da escravidão em Maria Firmina dos Reis, entretanto, ganha ainda
maior força na construção da personagem Preta Susana. Nela a postura inovadora da
romancista se amplifica quando Susana assume efetiva e simbolicamente a voz narrativa.
Isso se dá no capítulo IX, em que a escrava narra a saída forçada da África, o abandono
da família e os horrores vividos num navio negreiro:

– Sim, para que estas lágrimas?!...Dizes bem! Elas são inúteis, meu Deus; mas é um
tributo de saudade, que não posso deixar de render a quem me foi caro! [...]
Tranquila no seio da felicidade, via despontar o sol rutilante e ardente do meu país.
Ah, Túlio, tudo me obrigaram os bárbaros a deixar! oh! tudo, até a própria liberdade
(REIS, 2004, p. 115).

A terra natal é lembrada quando o escravo Túlio conta sobre sua alforria e liberdade
dada por Tancredo:

–Tu! Tu livre? Ah não me iludas! –exclamou a velha africana abrindo uns grandes
olhos. Meu filho, tu és já livre?...
– Iludi-la! –respondeu ele, rindo-se de felicidade – e para quê? Mãe Susana, graças
à generosa alma deste mancebo é hoje livre, livre como o pássaro, como as águas:
livre como o éreis na vossa pátria (REIS, 2004, p. 114).

A personagem acrescenta:

Meteram-me a mim e a mais trezentos companheiros de infortúnio e de cativeiro no


estreito e infecto porão de um navio. Trinta dias de cruéis tormentos, e de falta
absoluta de tudo quanto é necessário à vida passamos nessa sepultura até que
abordamos as praias brasileiras. Para caber a mercadoria humana no porão fomos
amarrados em pé para que não houvesse receio de revolta, acorrentados como
animais ferozes das nossas matas que se levam para recreio dos potentados da
Europa (REIS, 2004, p. 117).

Suas memórias da felicidade vivida com a família na África e os horrores vividos no porão
do navio que a trouxe:

Davam-nos água imunda, podre e dada com mesquinhez, a comida má e ainda mais
porca: vimos morrer ao nosso lado muitos companheiros à falta de alimento e de
água. È horrível lembrar que criaturas humanas tratem a seus semelhantes assim e
que não lhes doa a consciência de levá-los à sepultura asfixiados e famintos! (REIS,
2004, p. 117).

É evidente que, pela voz de Susana, Maria Firmina está fazendo um veemente protesto
em relação ao tratamento desumano dispensado aos negros no Brasil e no mundo:

[...] O comendador P... foi o senhor que me escolheu. Coração de tigre é o seu! Gelei
de horror ao aspecto de meus irmãos... os tratos, porque passaram, doeram-me até
o fundo do coração! O comendador P. derramava sem se horrorizar o sangue dos
desgraçados negros por uma leve negligência, por uma obrigação mais tibiamente
cumprida, por falta de inteligência! (REIS, 2004, p. 118).

Neste trecho, temos pela primeira vez na literatura brasileira a voz do negro
escravizado denunciando o conquistador europeu.
Assim temos em Susana, em Tulio e na obra de Maria Firmina, a primeira voz literária
brasileira da Diáspora africana, também chamada de Diáspora Negra. Nome que se dá ao
fenômeno sociocultural e histórico que ocorreu devido à imigração forçada do povo africano,
para fins escravagistas mercantis que penduraram da Idade Moderna até o final do século XIX.
Mulheres e homens africanos que, por séculos, foram arrancados de suas nações, separados de
suas famílias e dispersos por diversos países do mundo.
É importante ressaltar ainda a escolha de Maria por uma escrava mulher, salientando
aqui de maneira sobreposta à questão do negro, também a questão do gênero.
Preta Suzana representa a voz do escravo, mas também a voz feminina, da mulher que
não aceita a exploração, a humilhação, a perda da liberdade, da vida e da identidade.

A BARBÁRIE DO BRANCO
Ainda falando sobre o relato de Susana, em dado momento ela diz:

– E logo dois homens apareceram, e amarraram-me com cordas. Era uma prisioneira
- era uma escrava! Foi embalde que supliquei em nome de minha filha, que me
restituíssem a liberdade: os bárbaros sorriam-se de minhas lágrimas, e olhavam-me
sem compaixão... Julguei enlouquecer, julguei morrer, mas não me foi possível...
(REIS, 2004, p. 117).

Chama a atenção a reversão no sentido dessas palavras, pois Mãe Susana, ao denunciar
a violência do aprisionamento, por duas vezes denomina como bárbaros os estrangeiros que a
capturaram e demonstra que o que ela deixa para trás, ao ser trazida para o Brasil, não é uma
barbárie, mas uma sociedade organizada na qual ela tinha plantações, família, amigos...

1º ROMANCE ABOLICIONISTA – 1º ROMANCE AFROBRASILEIRO


Úrsula é, portanto, considerado o primeiro romance abolicionista da literatura
brasileira, e também o primeiro romance da literatura afrobrasileira, entendida esta como
produção de autoria afrodescendente, que tematiza o assunto do negro a partir de uma
perspectiva interna e comprometida politicamente em discutir a condição dos negros no
Brasil.

A CONDIÇÃO DA MULHER
Além da condição do escravo, o romance evidencia também a posição das mulheres,
inclusive, burguesas, como é o caso da mãe de Tancredo e da própria Luiza B. No contexto social
refletido no livro, destas mulheres era exigido que fossem sempre os idealizados “anjos de
virtude”, para o cuidado do lar e da família. Constantemente subestimadas, traídas e alvo de
violência física e psicológica por parte de seus maridos, essas personagens femininas do
romance refletiam e, por conseguinte, denunciavam o regime patriarcal vigente no Brasil
daqueles tempos:

“Ah! Ela temia seu esposo, respeitava-lhe a vontade férrea; mas com uma
abnegação sublime quis sacrificar-se por seu filho” (REIS, 2004, p. 63).

FINGIR SEGUIR O MODELO PARA SUBVERTÊ-LO


Para finalizar, é importante ressaltar que as raras escritoras e escritores negros, mesmo
se opondo à ideologia dominante, conseguiram se apropriar de elementos que pertenciam ao
código literário da época para fazer, a partir dele, uma literatura muitas vezes de crítica,
contestação e resistência ao sistema vigente.
É o que fez Firmina ao aparentemente seguir todas as convenções do Romance
Romântico de seu tempo, para, na verdade, escrever sob o modelo da elite branca uma obra
que contestava seus valores.
Maria Firmina dos Reis entra no sistema, mas como um elemento subversivo.
Inicial e aparentemente, suas estratégias ficcionais buscam a identificação e empatia do
leitor, por aderir supostamente ao gosto comum dele. No entanto, ao mesmo tempo, sutil e
sub-repticiamente, sua narrativa procura exatamente desestabilizar a ordem estabelecida, ao
fazer com que esse leitor pertencente às camadas senhoriais olhasse e quiçá mudasse suas
concepções e posturas com relação ao negro e à mulher.
Isso era inédito e extraordinário para uma escritora mulher, escritora mulher pobre,
escritora mulher pobre e negra, escrevendo para aparentemente agradar a uma elite branca,
mas na verdade, escrevendo essencialmente para colocar um espelho ficcional no qual se
refletisse a triste realidade dessa elite social maranhense/brasileira de seu tempo:
preconceituosa e desumana.
Escrevendo, enfim, para dar visibilidade e voz para aqueles que, como ela, eram os que
menos tinham voz e visibilidade: os negros e as mulheres.

6. TRECHOS DA OBRA
PRÓLOGO
O nosso romance gerou-o a imaginação e não no [sic] soube colorir, nem
aformosentar. Pobre avezinha silvestre anda terra a terra, e nem olha para as planuras
onde gira a águia. Mas ainda assim, não o abandoneis na sua humildade e obscuridade,
senão morrerá à mingua, sentido e magoado, só afagado pelo carinho materno. Ele
semelha à donzela, que não é formosa porque a natureza negou-lhe as graças feminis, e
que por isso não pode encontrar uma afeição pura, que corresponda ao afeto de sua alma;
mas que com o pranto de uma dor sincera e viva, que lhe vem dos seios da alma, onde
arde em chamas a mais intensa e abrasadora paixão, e que embalde quer recolher para a
corrução, move ao interesse aquele que a desdenhou e o obriga ao menos a olhá-la com
bondade.
Deixai, pois que a minha Úrsula, tímida e acanhada, sem dotes da natureza, nem
enfeites e louçanias d’arte, caminhe entre vós. Não a desprezeis, antes amparai-a nos seus
incertos e titubeantes passos para assim dar alento à autora de seus dias, que talvez com
essa proteção cultive mais o seu engenho, e venha a produzir cousa melhor, ou quando
menos, sirva esse bom acolhimento de incentivo para outras, que com imaginação mais
brilhante, com educação mais acurada, com instrução mais vasta e liberal, tenham mais
timidez do que nós. (REIS, 2004, 93-94, prólogo)

CENA DE TÚLIO E TANCREDO


...o mancebo arrancando a luva que lhe calçava a destra, estendeu a mão ao homem que
o salvara. Mas este, confundido e perplexo, religiosamente ajoelhando, tomou respeitoso e
reconhecido essa alva mão, que o mais elevado requinte de delicadeza lhe oferecia, e com
humildade tocante, extasiado, beijou-a.
Esse beijo selou para sempre a mútua amizade que em seus peitos sentiam eles nascer
e vigorar. As almas generosas são sempre irmãs.
— Não foste por ventura o meu salvador? — perguntou o cavaleiro com acento
reconhecido, retirando dos lábios do negro a mão, e malgrado a visível turbação deste
apertando-lhe com transporte a mão grosseira; mas onde descobria com satisfação lealdade, e
pureza.
— Meu amigo — continuou —, podes acreditar no meu reconhecimento, e na minha
amizade. Quem quer que sejas, eu a prometo: sou para ti um desconhecido, e inda assim foste
generoso, e desinteressado. Arrancando-me à morte tens desempenhado a mais nobre missão
de que o homem está incumbido por Deus: a fraternidade. (REIS, 2004, p.176-183)

LINGUAGEM ROMÂNTICA – ADJETIVOS EM CASCATA


O AMOR QUE SE NUTRE no coração do homem generoso é puro e nobre, leal e santo,
profundo e imenso, e capaz de quanta virtude o mundo pode conhecer, de quanta dedicação
se possa conceber. Ele o eleva acima de si próprio, e as suas ações são o perfume embriagador
desse sentimento, que o anima: mas o amor no peito do homem feroz e concupiscente é uma
paixão funesta, que conduz ao crime, que lhe mata a alma e a despenha no inferno. Tal era o
amor que abrasava a alma indômita e malvada de Fernando P. O amor perdera-o. Ele já não
sonhava com a vingança, mas começava a sentir alguma coisa que lhe rasgava o coração.
Seriam os espinhos do remorso? Fernando até ali sopitara esse castigo do céu, e nunca seu
sono fora atribulado. Entretanto agora, cada sombra era um espectro pavoroso e ameaçador,
que lhe erguia os braços descarnados, e acenava-lhe para as feridas gotejantes: e ele fechava
os olhos e via-o ainda, e sempre, e por toda a parte. Então corria espavorido e louco, como se
pretendesse fugir a si mesmo para escapar a tão pungente martírio, mas embalde porque a
sombra de sua vítima o seguia impassível. (REIS, 2004,p.56)

MORTE DE SUSANA
Era o velho sacerdote.
— Vedes? — lhe disse apontando com o dedo na direção do poente.
— É ela, é Susana! O comendador levantou maquinalmente a cabeça e olhou. Em uma
rede velha levavam dois pretos um cadáver envolto em grosseira e exígua mortalha; iam-no
sepultar. Então Fernando P. estremeceu, porque aos ouvidos ecoou-lhe uma voz tremenda e
horrível que o gelou de medo. Era o remorso pungente e agudo, que sem tréguas nem pausa
acicalava o seu coração fibra por fibra. Escondeu o rosto, espavorido, e meneando a cabeça
disse:
— Não! Não fui eu!
— Fostes! — tornou-lhe o padre com o acento do que vai julgar
— A infeliz sucumbiu à força de horríveis tratos. Martirizastes a pobre velha, inocente,
e que não teve parte na desaparição de Úrsula! Não vo-lo provava seu acento de sincera
ingenuidade, sua negativa franca e firme? (REIS, 2004, p.273)
AS CONDIÇÕES PARA A SALVAÇÃO DO COMENDADOR
Fernando! Chorai o pranto do arrependimento: sede caritativo e sincero que são vias
para a remissão de vossos enormes 169 pecados. Ainda é tempo. Escutai por esta boca impura
a voz do Senhor, que na sua extrema bondade talvez o perdoe. Vivei a vida solitário, passai em
ardente e fervorosa oração os dias e as noites. Indenizai os vossos escravos do mal que lhes
haveis feito, dando-lhes a liberdade. Esse ato de abnegação e de caridade cristãs agradará a
Deus, e então talvez na sua misericórdia infinita ele abra para vós os tesouros da sua inefável
graça. (REIS, 2004, p.273)

LOUCURA E MORTE DE ÚRSULA


Ambos caíram prostrados aos pés da infeliz louca, que entregava a alma ao Criador. O
sacerdote murmurava com melancólico acento o salmo dos defuntos; mas o comendador o
não compreendia, porque Úrsula morria, e ele tinha sido a causa. A dor e o remorso tiraram-
lhe os sentidos, e caiu por terra. O padre não deu fé desse acidente e continuou a orar
fervorosamente. E a oração dos seus lábios subia ao céu como nuvem de incenso que por
muito tempo ondula em torno do altar e sobe até Deus. Era o perfume, que precedia à alma
da donzela. E ela, nesse transe supremo, cruzou as mãos sobre o peito, apertando nesse
estreito abraço a florzinha seca de sua capela, murmurou
— Tancredo! —, e com os lábios entreabertos, e onde adejava um sorriso divinal, e como
um anjo deu o último suspiro. (REIS, 2004, p.277)

EPÍLOGO – MORTE DO COMENDADOR


Fez um último esforço, porque sentia as prisões da vida despedaçarem-se, e estendendo
os braços, tomou o crucificado, levou-o aos lábios, e pondo-o sobre o coração, exclamou
demonstrando o mais profundo arrependimento:
— Perdoai-me, Senhor. Porque na hora derradeira sufoca-me a enormidade das minhas
culpas. Lágrimas de sincera dor verteram seus olhos, que para sempre se cerraram; e a morte
imprimiu-lhe no rosto a tranquilidade da contrição. (REIS, 2004, p.283)

FINAL DO LIVRO
De todas estas vítimas do amor, apenas restam vestígios sobre a terra da desditosa
Úrsula. No convento de ***, junto ao altar da Senhora das Dores, encontra-se uma lápide rasa
e singela com estas palavras — Orai pela infeliz Úrsula. (REIS, 2004, p.284)

REFERÊNCIAS
REIS, Maria Firmina dos Reis. Úrsula; A escrava. Florianópolis: Ed. Mulheres; Belo
Horizonte: PUC Minas, 2004.

DUARTE, Eduardo de Assis. Posfácio. Maria Firmina dos Reis e os primórdios da


ficção afro-brasileira (posfácio). In: REIS, Maria Firmina dos Reis. Úrsula; A escrava.
Florianópolis: Ed. Mulheres; Belo Horizonte: PUC Minas, 2004.
QUESTÕES

1. (Enem 2022) A escrava


– Admira-me –, disse uma senhora de sentimentos sinceramente abolicionistas —; faz-me até
pasmar como se possa sentir, e expressar sentimentos escravocratas, no presente século, no
século dezenove! A moral religiosa e a moral cívica aí se erguem, e falam bem alto esmagando
a hidra que envenena a família no mais sagrado santuário seu, e desmoraliza, e avilta a nação
inteira! Levantai os olhos ao Gólgota, ou percorrei-os em torno da sociedade, e dizei-me:
– Para que se deu em sacrifício, o Homem Deus, que ali exalou seu derradeiro alento? Ah!
Então não era verdade que seu sangue era o resgate do homem! É então uma mentira
abominável ter esse sangue comprado a liberdade!? E depois, olhai a sociedade... Não vedes
o abutre que a corrói constantemente!... Não sentis a desmoralização que a enerva, o cancro
que a destrói?
Por qualquer modo que encaremos a escravidão, ela é, e sempre será um grande mal. Dela a
decadência do comércio; porque o comércio e a lavoura caminham de mãos dadas, e o escravo
não pode fazer florescer a lavoura; porque o seu trabalho é forçado.

REIS, M. F. Úrsula outras obras. Brasília: Câmara dos Deputados, 2018.

Inscrito na estética romântica da literatura brasileira, o conto descortina aspectos da


realidade nacional no século XIX ao
a) revelar a imposição de crenças religiosas a pessoas escravizadas.
b) apontar a hipocrisia do discurso conservador na defesa da escravidão.
c) sugerir práticas de violência física e moral em nome do progresso material.
d) relacionar o declínio da produção agrícola e comercial a questões raciais.
e) ironizar o comportamento dos proprietários de terra na exploração do trabalho.

2. (Ufrgs 2022) No bloco superior abaixo, estão listados títulos de romances; no inferior,
aspectos do enredo a eles relacionados.
Associe adequadamente o bloco inferior ao superior.
1. Cadernos de memórias coloniais
2. Ponciá Vicêncio
3. Úrsula

( ) A personagem trabalha muito bem o barro, produzindo objetos que contam a história
das origens ancestrais de sua família e dos descendentes de escravizados da comunidade rural
onde nasceu.
( ) O relato é centralizado na figura do pai, personificação da lógica de dominação patriarcal
que estrutura o processo colonizador.
( ) Tulio, Suzana e Antero são personagens representados em sua identidade negra, no
contexto da sociedade escravocrata brasileira.
( ) A colonização portuguesa em Moçambique é narrada, evidenciando episódios de violência
física, verbal e sexual, sofrida por negras e negros, testemunhados pela autora quando criança.

A sequência correta de preenchimento dos parênteses, de cima para baixo, é


a) 2 – 3 – 1 – 2.
b) 3 – 2 – 1 – 2.
c) 1 – 2 – 3 – 1.
d) 3 – 1 – 3 – 2.
e) 2 – 1 – 3 – 1.
3. (Ufrgs 2020) Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as seguintes afirmações sobre o
romance Úrsula, de Maria Firmina dos Reis.

( ) O romance é narrado em primeira pessoa por Úrsula, jovem negra escrava, que aprendeu
a ler com a patroa, D. Susana.
( ) Adelaide é a menina pobre que busca ascensão social através do casamento, como muitas
mulheres faziam na época.
( ) A crítica ao modelo patriarcal está especialmente centrada nas figuras de Tancredo e de
seu pai.
( ) O romance caracteriza-se como transgressor à produção romanesca do período, ao
apresentar Túlio e Antero como sujeitos constituídos de humanidade.

A sequência correta de preenchimento dos parênteses, de cima para baixo, é


a) V – V – F – F.
b) V – F – F – V.
c) F – V – V – V.
d) F – F – V – V.
e) V – V – V – F.

4. (Ufrgs 2019) No bloco superior abaixo, estão listados os títulos dos livros de Maria Firmina
dos Reis e Carolina Maria de Jesus; no inferior, trechos desses livros.

Associe adequadamente o bloco inferior ao superior.


1. Úrsula
2. Quarto de despejo

( ) Eu estava pagando o sapateiro e conversando com um preto que estava lendo um jornal.
Ele estava revoltado com um guarda civil que espancou um preto e amarrou numa arvore. O
guarda civil é branco. E há certos brancos que transforma preto em bode expiatorio. Quem
sabe se guarda civil ignora que já foi extinta a escravidão e ainda estamos no regime da
chibata?
( ) [...] dois homens apareceram, e amarraram-me com cordas. Era uma prisioneira – era
uma escrava! Foi embalde que supliquei em nome de minha filha, que me restituíssem a
liberdade: os bárbaros sorriam das minhas lágrimas, e olhavam-me sem compaixão. Julguei
enlouquecer, julguei morrer, mas não me foi possível... a sorte me reservava ainda longos
combates.
( ) Davam-nos a água imunda, podre e dada com mesquinhez, e comida má e ainda mais
porca: vimos morrer ao nosso lado muitos companheiros à falta de ar, de alimento e de água.
É horrível lembrar que criaturas humanas tratem a seus semelhantes assim e que não lhes doa
a consciência de levá-los à sepultura asfixiados e famintos!
( ) Ontem eu comprei açucar e bananas. Os meus filhos comeram banana com açucar, porque
não tinha gordura para fazer comida. Pensei no senhor Tomás que suicidou-se. Mas, se os
pobres do Brasil resolver suicidar-se porque estão passando fome, não ficaria nenhum vivo.

A sequência correta de preenchimento dos parênteses, de cima para baixo, é


a) 1 – 2 – 2 – 1.
b) 2 – 1 – 1 – 2.
c) 2 – 1 – 2 – 1.
d) 1 – 2 – 1 – 2.
e) 1 – 1 – 2 – 2.
5. (Ufrgs 2019) Considere as seguintes afirmações sobre Maria Firmina dos Reis e seu
romance Úrsula.

I. O romance Úrsula foi publicado no Maranhão, em 1859, sob o pseudônimo de “Uma


Maranhense”, e quase não se tem notícia de sua circulação à época da publicação. Recuperado
na segunda metade do século XX, só então o livro passa a ser reeditado e minimamente
debatido no meio literário.
II. Nas primeiras páginas do romance, uma voz que pode ser lida como a da autora apresenta,
a modo de prólogo, seu livro ao leitor, consciente das limitações que seriam impostas a ele
por ter sido escrito por uma mulher brasileira de educação acanhada.
III. A circulação limitada de Úrsula dá mostras de que, associados ao valor estético, fatores
como classe social, gênero e raça do escritor também participam da definição do cânone
literário.

Quais estão corretas?


a) Apenas I.
b) Apenas III.
c) Apenas I e II.
d) Apenas II e III.
e) I, II e III.

6. A respeito da vida de Maria Firmina dos Reis, da obra Úrsula e do contexto


histórico-literário no qual ela está inserida, some as alternativas corretas:

01) O romance aponta conflitos psicológicos e de sentimento no âmbito familiar da


protagonista e Tancredo. O rapaz reconheceu na personagem da moça Adelaide seu primeiro
amor, entretanto, este lhe é negado pelo pai devido às diferenças sociais entre seu filho e
Adelaide.
02) A obra trata de valores como a nobreza dos sentimentos, do comportamento coerente
com os princípios cristãos, da coragem, da amizade, entretanto possui um fim pessimista, com
o enlouquecimento de Úrsula, o assassinato de seu amado Tancredo, o julgamento, a prisão e
morte do tio Comendador.
04) Maria Firmina dos Reis impressionou a comunidade em que viveu fundando uma escola
mista, algo inédito para a época.
08) A educação da autora transcendeu a formação das mulheres de seu tempo, o que pode
ser comprovado nos relatos dos muitos escritos deixados pela autora, os quais obtiveram em
seu tempo amplo reconhecimento nacional.
16) A valorização da obra de Maria Firmina serve como reconstituição histórica do papel da
mulher negra na sociedade do século XIX no Brasil, o mais das vezes relegado a um plano de
invisibilidade e submissão, algo que não acontecia com as mulheres de alta classe social, como
bem mostrado no romance.
32) Maria Firmina dos Reis, escritora e musicista, poeta e cronista fez parte da Academia
Maranhense de Letras.

7. A respeito da vida de Maria Firmina dos Reis, da obra Úrsula e do contexto histórico-
literário no qual ela está inserida, some as alternativas corretas:
01) Seu livro Úrsula denuncia a condição das mulheres e do negro na sociedade do século XIX,
demonstrando uma nova ótica no tratamento dado à questão de caracterização do africano
sequestrado pelos colonizadores, em uma época de teorias de “superioridades raciais” e
preconceito.
02) Uma característica fundamental da literatura romântica consistia na valorização do
sentimento, assim percebemos que a sensibilidade aparece como o mais legítimo título de
nobreza das almas, inferindo-se que a bondade e a virtude são atributos naturais das almas
sensíveis, como as de Tancredo e Tulio, Úrsula e Preta Susana, independente da questão racial.
04) O acesso à verificação de novas fontes históricas, como as literárias, permite
abranger diversas “vozes” dos excluídos da história, como as mulheres e os negros,
é o que encontramos na obra de Maria Firmina.
08) A obra de Maria Firmina coaduna-se com estímulo liberal presente em poemas
de autores seus contemporâneos que também se uniam aos mesmos ideais de luta
contra a escravidão, como é o caso de Castro Alves (1847-1871). Nesse sentido ambos
são enquadrados na 3ª geração da poesia condoreira de nosso Romantismo, sendo
Alves influenciador da obra de Maria.
16) No romance Úrsula vemos que o narrador externa sua opinião ao fundo histórico da
narrativa, pois estiliza a percepção de um grupo social “invisível’ e “oprimido”, os negros
escravos.
8. A respeito da vida de Maria Firmina dos Reis, da obra Úrsula e do contexto histórico-
literário no qual ela está inserida, some as alternativas corretas:
01) Em fins do século XIX, o tema da escravidão era espinhoso, pois demonstrava os fortes
resquícios da cultura colonial em um país que aspirava ideais de liberalismo. Porém, obras
como as de Maria Firmino e Bernardo Guimarães, autor de A Escrava Isaura, dão destaque à
voz do povo negro oprimido, algo que aproxima as personagens dos dois autores.
02) Notamos na narrativa a consciência da memória, o conceito de liberdade e a própria visão
de mundo, o que nos permite refletir sobre o passado histórico frente à colonização nos
diversos continentes, principalmente na África e o reconhecimento da formação de nossa
própria civilização.
04) Em Úrsula, o discurso literário e o discurso histórico abarcam a questão da escravidão nos
moldes convencionais do romance romântico do século XIX, sem que nele haja nenhuma
singularidade que os distinga de seus pares.
08) As personagens negras da obra têm participações importantes, mesmo que ocupando o
plano principal das ações tenhamos o triângulo amoroso retratado por Tancredo e o tio de
Úrsula Comendador.
16) Nas figuras do Pai de Tancredo e do Comendador Fernando da P., percebemos o olhar
crítico e interpretativo da autora aos representantes do poder centralizado, ao mandato
patriarcal escravocrata no Brasil colonial, nas falas e entrelinhas do discurso das personagens.

9. A respeito da vida de Maria Firmina dos Reis, da obra Úrsula e do contexto histórico-
literário no qual ela está inserida, some as alternativas corretas:
01) A caracterização e a relação amorosa impossível de um casal de jovens de condições
socioeconômicas distintas comprovam o caráter realista da obra.
02) O romance lido pela perspectiva contemporânea traz a questão das “vozes dissonantes e
esquecidas” e dos condicionantes históricos que relegaram os negros e a mulher à submissão
social.
04) A contribuição de pesquisadores empenhados no resgate de vozes esquecidas da nossa
literatura vai, aos poucos, construindo um instigante suplemento à história nacional. No caso
de Úrsula, também um suplemento de gênero, que desconstrói a narrativa eminentemente
masculina até então em vigor.
08) Autores “esquecidos” como é o caso d Maria Firmina dos Reis, merecem a revisitação da
história literária que é dinâmica e sempre um ponto de vista que desperta questionamentos e
expande as possibilidades de leitura.
16) A escritora maranhense contribuiu de forma definitiva ao resgate das minorias com a
marca do discurso afrodescendente e feminino na literatura brasileira, merecendo, assim,
uma visão ampliada da literatura.
32) No romance Úrsula, a autora acrescentou importantes elementos discursivos de
recuperação da memória afro descendente a partir de uma perspectiva interna e no resgate
da condição da identidade negra no Brasil.

10. A respeito da vida de Maria Firmina dos Reis, da obra Úrsula e do contexto histórico-
literário no qual ela está inserida, some as alternativas corretas:
01) A visão de Maria Firmina a respeito da mulher negra é bem distante daquilo que
geralmente acontecia em nossa literatura. Em seu romance, na personagem Preta
Susana, ela escapa ao estereótipo da “mulata sensual” (como a Rita Baiana, de Aluísio
Azevedo) como o principal ponto de interesse nos enredos sobre a raça negra.
02) O enredo principal do livro é muito romântico. Os temas são os do amor e morte,
castigos e loucura. Porém sua principal singularidade e riqueza não está na trama
convencional, envolvendo os protagonistas.
04) De modo geral, a autora também segue as regras do gênero romance do
Romantismo: as personagens da trama central são jovens, belas, apaixonadas,
brancas e de boa índole.
08) A questão da escravidão aparece nas personagens que protagonizam a trama.
16) A fala de Mãe Susana é realmente um dos pontos altos do romance e o tom de paixão,
saudade e dor que transparecem deste texto bem mostram o engajamento de Maria Firmina
na defesa do negro.

Gabarito:

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
B E C B E 04 07 26 62 23

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