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Disciplina: Introdução à Bíblia

Professor: Dr. Leandro Lima


AULA 03 – INSPIRAÇÃO

AULA 03 – INSPIRAÇÃO: O REGISTRO SAGRADO

Instruções:

1) Ore a Deus, pedindo iluminação no estudo dessa aula.


2) Leia a aula atentamente, sem pressa, estudando o texto.
3) Com a Bíblia aberta, leia todos os textos bíblicos indicados, verificando o
sentido em que estão sendo usados na aula.
4) Medite sobre os assuntos aqui estudados e, se puder, compartilhe algo com
os colegas.

Introdução

Deus se revelou de muitas formas, como diz a Bíblia (Hb 1.1-2), porém, houve
um processo pelo qual esta revelação foi registrada, ou seja, escrita e preservada nas
páginas da Escritura Sagrada. Esse registro é o que recebeu o nome que chamamos de
“Inspiração".
Na revelação de Deus há o momento do ato propriamente dito em que Deus
revelou algo de si mesmo. Esse ato foi uma tarefa exclusiva de Deus. A inspiração foi
o momento de registrar essa revelação. Portanto, o registro foi uma tarefa divina e
humana.
Inspiração precisa ser definida como a influência divina sobre os escritores da
Bíblia a fim de preservá-los de erros, e para que registrassem com toda a fidelidade os
eventos revelatórios de Deus.
Nalgumas vezes, os escritores presenciaram os atos revelatórios (Boa parte dos
Evangelhos e de Atos, por exemplo). Em alguns casos, como nos salmos, o ato da
revelação coincidiu com a escrituração, pois, no momento em que o salmista
meditava sobre algum assunto, tomava a pena para escrever e acontecia
simultaneamente a revelação e o registro. Isto pode ser visto também nas epístolas.
Mas em outros casos, houve momentos de intervalo entre o ato divino da revelação e
sua escrituração, como por exemplo, quando o profeta recebia a visão, e somente a
registrava posteriormente. É só lembrar que ninguém estava presente quando os
eventos de Gn 1.1-2 aconteceram, mas a inspiração garantiu que o escritor do Gênesis
registrasse o evento. De qualquer forma, todo o processo, desde o ato revelatório até o
momento da escrituração é revelação de Deus. A inspiração não é uma atividade à
parte da revelação. Fazemos essa distinção nesse estudo apenas para entender os dois
momentos, que as vezes aconteceram juntos e as vezes separados.

I. Fatores que contribuíram para o registro


No ato de registrar a revelação é perfeitamente possível que alguns fatores
tenham contribuído. Porém, isso não anula, nem torna desnecessária a atuação divina.
Os principais fatores que contribuíram para o registro da revelação, especialmente nos
registros posteriores aos eventos, foram a tradição oral e a tradição escrita.
A tradição oral foi muitas vezes uma intermediária entre os eventos antigos e o
registro inspirado. A tradição oral pode ter tido um papel muito importante antes da
invenção da escrita. Histórias que passavam de pai para filho podiam conduzir às
gerações subsequentes momentos importantes da revelação de Deus. É provável que
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Adão tenha transmitido coisas que havia recebido diretamente de Deus a seus filhos, e
esses às gerações seguintes. Desta forma o conhecimento a respeito do Jardim do
Éden, da expulsão do Jardim, da torre de Babel, do Dilúvio, foi transmitido de pai
para filho, e provavelmente assim essas histórias chegaram até Moisés, que escreveu
o Pentateuco (Js 4.6, 21). Porém, também chegaram em outros lugares e pessoas. Isto
explicaria o fato de haver relatos antigos em outras culturas primitivas, que se
parecem com os relatos bíblicos da criação e do dilúvio. É importante, porém, que
seja notado que estas tradições podem muitas vezes ter sido danificadas ao longo da
história. De qualquer modo, não significa que Moisés e os outros escritores bíblicos
fizeram seus registros sobre a base exclusiva destas tradições. É possível que as
tradições tenham colaborado, mas foi a inspiração divina que garantiu que fosse
registrada a pura e exclusiva verdade divina.
Quanto à tradição escrita, sabe-se que há muitos escritos antigos que não são
bíblicos, mas que eram tidos em grande consideração, e por certo, continham dados
históricos bastante precisos. Estes livros podem ter sido usados como ajuda no
processo de registro da Escritura. São exemplos bem claros disto os seguintes livros:
O Livro das Guerras do SENHOR (Nm 21.14). O Livro dos Justos (Js 10.13; 2Sm
1.18). O Livro das Crônicas de Samuel, o vidente; Natã, o vidente; e Gade, o vidente
(1Cr 29.29). O Livro da História de Salomão (1Rs 11.41). O Livro da História de
Semaías, o profeta e de Ido, o vidente (2Cr 12.15). Você já havia pensado a respeito
desses livros citados? Não é interessante que os escritores bíblicos os tenham
mencionado? Porém, eles não eram inspirados. Todos esses livros se perderam, e
nenhum mais existe, porém, foram úteis no registro da revelação de Deus.
Um excelente exemplo do uso de tradições escritas e orais para o registro da
revelação de Deus vem do Novo Testamento, para ser mais preciso, dos escritos de
Lucas. Ele escreveu: “Visto que muitos houve que empreenderam uma narração
coordenada dos fatos que entre nós se realizaram, conforme nos transmitiram os que
desde o princípio foram deles testemunhas oculares e ministros da palavra,
igualmente a mim me pareceu bem, depois de acurada investigação de tudo desde sua
origem, dar-te por escrito, excelentíssimo Teófilo, uma exposição em ordem, para que
tenhas plena certeza das verdades em que foste instruído” (Lc 1.1-4). Lucas diz
claramente que tinha conhecimento de outros escritos que relatavam a vida de Jesus, e
que fez uma longa e acurada pesquisa histórica para relatar os fatos. Isso em hipótese
alguma tornou desnecessária a inspiração, porém, transparece no texto essa pesquisa
histórica, pois de fato, Lucas é o que tem mais detalhes da vida de Jesus,
especialmente de seu nascimento e infância. Provavelmente, só uma conversa com a
própria Maria poderia render todas as informações que Lucas registra. Será que ele se
encontrou pessoalmente com Maria, e ela contou todas aquelas coisas para ele?

II. O Processo de Seleção


Nem toda a revelação de Deus foi registrada. Deus superintendeu a todo um
processo de seleção, para que fosse guardado para a posteridade aquilo que Deus
julgou mais importante. Grandes porções de revelação divina se perderam ao longo da
história. Possivelmente fossem revelações apropriadas para uma determinada época,
mas que Deus não julgou relevantes para a posteridade (1Rs 4.32; Nm 11.26-29; 1Rs
22.5-28; Jr 36.1-3, 27-28; Jo 20.30-31; 21.25). Você já havia pensado sobre esses
textos? Eles mencionam atos revelatórios de Deus. Mas Deus não quis que fossem
preservados. Pelo menos duas das cartas do Apóstolo Paulo se perderam. Ele diz ter
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escrito uma carta anterior aos Coríntios (1Co 5.9) e outra para a igreja de Laodicéia
(Cl 4.16). Possivelmente fossem aplicáveis apenas para a situação daquelas igrejas, ou
quem sabe, muito semelhantes com outras cartas de Paulo. O fato é que não temos
como saber o porquê de o Espírito não ter preservado essas cartas para a posteridade.
Só podemos dizer que Deus, em seu processo de seleção, não julgou que elas
deveriam ser preservadas, bem como muitas outras revelações que não chegaram até
nós.
Sobre isso, eu tenho uma pergunta para você: já pensou se a carta de Paulo aos
Laodicenses fosse encontrada hoje? Teríamos que incluí-la na Bíblia? O que você
acha? Eu vou dar a minha opinião no final deste estudo.

III. Evidência Bíblica da Inspiração


As principais evidências da inspiração da Bíblia são internas, ou seja, provêm
da própria Bíblia. A Bíblia reivindica para si a Inspiração Divina: “Toda a Escritura é
inspirada por Deus” (2Tm 3.16), disse o Apóstolo Paulo. Pedro diz com relação aos
escritores bíblicos: “Homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo”
(2Pe 1.21). Os escritores do Antigo Testamento tinham a convicção de que escreviam
a Palavra de Deus (Dt 4.2; Am 3.7). O Novo Testamento reconhece claramente a
autoridade divina do Antigo Testamento em todas as citações que faz dele, e na
consciência de Inspiração de seus próprios autores (Jo 20.30-31; At 4.25; 7.37-38;
28.25-26; 1Co 2.13; 7.10, 12, 17, 40; 2Co 13.13; Gl 3.8; 1Ts 2.13; 2Tm 3.16-17; Hb
1.1; Tg 4.5; 1Pe 1.12; 2Pe 1.19-21). Jesus deu testemunho de que a Escritura do
Antigo Testamento era a Palavra de Deus (Mt 5.17-20; Jo 10.33-36; Mt 10.19-20; Jo
16.7,13). Além disto, os escritores do Novo Testamento demonstram ter consciência
da inspiração dos outros escritores do Novo Testamento (1Tm 5.18/Lc 10.7; 2Pe
3.16). Veja que Pedro chamou as cartas de Paulo de "como as demais Escrituras".
Há igualmente evidências externas da inspiração da Bíblia. Muitos argumentos
podem ser usados em favor da inspiração da Bíblia. Por exemplo, a credibilidade da
Bíblia. Suas histórias têm sido comprovadas cientificamente como verdadeiras. As
descobertas arqueológicas não conseguem provar que a Bíblia esteja errada, ao
contrário a confirmam. A sobriedade das Escrituras é outro argumento em favor de
sua Inspiração. Apesar de ser um livro tão antigo, está completamente livre de
absurdos. Todos os livros religiosos antigos dos chineses, dos árabes, dos persas, dos
hindus, dos gregos, etc., estão cheios de superstições e erros históricos, geográficos e
científicos. A Bíblia, porém, não afirma absurdos sobre o sol, a terra, ou as estrelas
como aqueles livros ensinam, ao contrário ensina coisas bem precisas (Jó 26.7; Sl
135.7; Ec 1.7; Is 40.22). O mesmo deve ser falado de sua coerência e unidade. É
difícil imaginar um livro escrito por mais de 40 autores diferentes num espaço de
mais de 1500 anos, que conta uma história homogênea, com começo, meio e fim. A
Bíblia é este livro. Porém, a Bíblia não pretende ser um livro científico. Isso é algo
muito importante a ser lembrado. Ela usa a linguagem do homem comum. Ela narra
eventos a partir da "fenomenologia", ou seja, a partir da "visão comum" das coisas,
como um homem comum vê o universo.

IV. Teorias de Inspiração


Dissemos até aqui que a Inspiração é uma obra divina que conta com a
participação humana. Uma das coisas mais difíceis de explicar é justamente esse
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relacionamento entre o aspecto divino e o aspecto humano na inspiração. (Lembre-se:


por inspiração estamos falando do ato de "registrar" o texto bíblico). Qual é a função
de cada parte? Algumas teorias foram formuladas a respeito desse processo.

Inspiração Mecânica
Essa teoria concebe o ato da Inspiração como uma espécie de ditado divino.
Dessa forma, Deus teria ditado literalmente todas as palavras que foram registradas na
Bíblia. Ao homem não coube qualquer participação emocional ou inteligente na obra.
Ele foi apenas um instrumento, praticamente inanimado, que Deus usou para registrar
sua Palavra. Esta teoria lembra um pouco a ideia espírita da “psicografia”. Ela faz da
Bíblia um livro totalmente divino, uma espécie de “telegrama celestial”.
A principal falha desta teoria pode ser verificada ao se observar que a Bíblia não
tem uma uniformidade literária. É difícil conciliar a ideia de ditado divino com a
percepção de que há aspectos variados e estilos pessoais na Bíblia. Se tudo fosse
“ditado” deveria haver uma uniformidade de estilo, o que não ocorre.
Geralmente, os estudiosos rotulados de “fundamentalistas” advogam esta teoria.
Os “fundamentalistas” são os mais radicais em defesa do conservadorismo bíblico. A
intenção é boa, mas para evitar qualquer possibilidade de erro, concebem a inspiração
como um ditado. Assim a Bíblia seria totalmente divina. Entretanto, essa teoria não
nos parece fazer justiça ao caráter literário da Bíblia.

Inspiração “Mental”:
Essa teoria é praticamente o oposto da teoria da inspiração mecânica. Muitos
teólogos defendem a ideia de que os pensamentos dos autores bíblicos foram
inspirados, mas que eles foram livres para registrar suas ideias. A inspiração mental
advoga inspiração apenas dos conceitos e não das palavras.
É no liberalismo teológico que a idéia da Inspiração Mental encontra maior
aceitação. Uma vez que os teólogos liberais têm dificuldades em acreditar que Deus
se revelou através de atos e principalmente de palavras, preferem pensar que foi o
autor quem teve uma espécie de “elevação” em seu raciocínio, o qual desta forma
pode ser considerado inspirado. Esta ideia elimina completamente a noção de uma
ação direta do Espírito sobre os homens na produção dos livros da Bíblia. O autor
bíblico seria inspirado como qualquer outro autor pode ser na composição de uma
poesia ou de uma música. Desse modo, Deus não é o autor da Bíblia, ele apenas é a
fonte da vida dos autores bíblicos que falaram, com palavras imperfeitas, aquilo que
vem de Deus.
No conceito mental de inspiração, a Bíblia está condicionada à cultura de cada
povo, e às vezes não passa do registro da experiência religiosa de um povo numa
determinada situação. Porém, pode haver momentos em que o escritor se elevou de si
mesmo e produziu algo que pode ser considerado divino. Neste sentido, as vezes se
fala no liberalismo que somente algumas coisas na Bíblia seriam a “pura” Palavra, e o
resto é palavra de homens. Daí o método “desrespeitoso” como abordam a Bíblia,
ainda que prefiram dizer “científico”, procurando aqui ou ali indicações de
imprecisões ou pistas que os remetam a outras situações históricas, que consideram
mais importantes e dignas de crédito do que aquilo que a Bíblia relata.
Essa teoria não faz justiça ao que a Bíblia representa para a fé cristã, e é
extremamente perigosa.

Inspiração Dinâmica ou Orgânica


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A Inspiração Orgânica não diz que a Bíblia é exclusivamente humana e nem


exclusivamente divina, mas que é divina e humana ao mesmo tempo.
O Espírito Santo usou homens como organismos vivos e não como meras
máquinas. Deus não ditou palavras para serem escritas, e nem simplesmente os
homens tiveram “elevações” que registraram. Deus agiu no ser humano usando todos
os recursos pessoais, superintendendo a todo o processo, de modo a garantir a
veracidade absoluta dos escritos.
Assim, esses escritos podem ser considerados humanos, porque foram
produzidos por homens, e também divinos, porque foram dirigidos pelo Espírito
Santo.
O Espírito usou um homem da corte como Isaías, um boiadeiro como Amós, um
músico como Davi, um sábio como Salomão, um general como Josué, um homem
formado na corte egípcia como Moisés, um pescador como Pedro, um erudito como
Paulo, um médico como Lucas, ou um cobrador de impostos como Mateus. Em cada
texto, o estilo pode ser diferente um do outro, mas o resultado final é o mesmo: um
registro totalmente verdadeiro.
O Espírito fez uso das faculdades humanas, adequando-as, para que o produto
final, embora contendo traços do perfil humano, fosse a exata expressão da vontade
de Deus. Deus usou os recursos humanos, como por exemplo, a capacidade de
pesquisa, o raciocínio, a arte ou a musicalidade de um autor bíblico, mas,
superintendeu a todo o processo a fim de que Sua Vontade fosse expressamente
revelada. Há uma ideia de cooperação, pois Deus age no homem, dirigindo-o,
controlando-o, como que energizando-o, de tal forma que, como Seu instrumento, ele
fica acima de si mesmo, pois escreve algo que nunca conseguiria sozinho,
permanecendo debaixo da direção de Deus. Deus fala a mesma coisa de forma
diferente e por autores diferentes. O produto final é sua palavra inspirada e inerrante.
Essa é a concepção conservadora de Inspiração. Ela evita os extremos das duas
anteriores, e faz justiça ao ensino e ao caráter das Escrituras

Conclusão
A Escritura é um livro maravilhoso justamente porque foi inspirado por Deus. É
um livro único. Excepcional. Apesar de conter vários livros nele, no fundo, tem uma
única história. Foi escrito para nos dar conhecimento da salvação.
Agora, a minha opinião sobre a Carta aos Laodicenses. Mesmo que ela fosse
encontrada hoje, não deveria ser incluída na Escritura. Aquela carta, apesar de ter
saído da pena de Paulo, não deve ser considerada "inspirada". Nem tudo o que Paulo
escreveu foi inspirado. Ele deve ter escrito muitas notas sobre produtos que deviam
ser comprados para construir tendas, ou mesmo outros conselhos para seus discípulos.
Devemos ver a inspiração ligada à preservação. O mesmo Espírito que inspirou o
texto, o preservou para a igreja inteira. Se a carta fosse encontrada hoje, ela não teria
sido preservada para a igreja inteira. Portanto, poderíamos lê-la e aprender com ela,
mas não deveríamos considerá-la como "Bíblia".

Recurso adicional:

Mensagem: Teologia que valoriza a Palavra


https://www.youtube.com/watch?v=C4ArBvX_gxA

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