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Agradecimento
Diário de Natal
De Repente, Natal
Agradecimento
Com amor,
Gi e Bru Baldassari
Catorze dias para o Natal
Inclusive em casa.
Por que aquela música tinha que ser tão melancólica e chata?
Charlie detestava as músicas de Natal, sempre a deixavam triste.
— Mesmo?
— Uhum.
O problema era que Jane também sabia disso. Sabia que Charlie
aceitaria fazer qualquer coisa para agradá-la, mas ela não queria
que o Natal fosse uma obrigação. Então se muniu com o propó-
sito de, nas semanas restantes antes das festividades, despertar o
espírito natalino em Charlie.
9. Ir ao teatro
6. Patinar no gelo
5. Noite de jogos
4. Noite do pijama
1. Andar de trenó
— Você gostou?
— Engraçadinha.
Mas Jane parecia bem real, a casa que dividiam parecia bem real
e aquele pinheiro colossal, sem dúvidas, parecia bem real também.
Falando nele, Charlie tinha que admitir que estava sendo diver-
tido decorá-lo, e ver o sorriso da namorada fazia tudo valer a pena.
— Na verdade, não.
O plano para o oitavo dia antes do Natal era construir uma ca-
sinha de biscoito de gengibre.
Certo?
— Você acha?
— E está sendo.
— Eu amo muffin.
— Eu sei.
Era tão evidente que Jane estava feliz, que Charlie não conse-
guia evitar se sentir feliz também. Talvez, no fim das contas, esse
fosse o espírito natalino que Jane tanto queria que a namorada
sentisse.
Jane não estava habituada com o gelo, mas tinha muita inti-
midade com o patins de rodinha, essa era uma das coisas que ela
fazia com frequência quando morava em San Francisco.
— Que bom que você gostou do item de hoje. Está sendo meu
dia preferido também.
Isso era algo que Charlie sentia que poderia aproveitar, afinal,
ela amava ler um bom livro próxima a lareira. E somar Jane a essa
equação só melhoraria ainda mais a experiência.
— Vejamos.
— E o outro?
Jane soltou uma risada. É claro que Charlie iria querer um mis-
tério de Natal.
Agatha
E Charlie continuou.
— Ou de tinta.
— De tinta?
— Não foi pra isso que você comprou a Giulietta? — ela per-
guntou se referindo ao Alfa Romeo Spider de Charlie. — Pra que
você precisa de um carro veloz se não pra uma ocasião como essa?
Jane abriu ainda mais o sorriso e pensou que nada, nada mesmo,
poderia estragar aquele dia.
***
Charlie tentava usar os pés para guiar, mas devido à alta velo-
cidade não conseguia ter precisão suficiente para ter controle do
movimento e o trenó ziguezagueava desenfreadamente.
Os olhos de Jane se arregalaram quando, em vez de neve
branca, eles viram apenas troncos.
Assim que tirou a bota e a meia deu para notar que já estava
inchando e, se Jane tivesse que apostar, apostaria que em questão
de minutos estaria roxo também.
— Dói?
— Charlie…
— Mesmo assim.
Manhã de Natal
A primeira coisa que ela percebeu é que Charlie não estava dei-
tada ao seu lado, e que o local onde ela deveria estar estava gelado.
— Feliz Natal!
Fim.
Pati
— Tem razão, amor, você tá pronta pra posar pra capa da Boa
Forma.
— É uma gripe — falo para ela. — Logo passa, mas hoje você
vai ter que descansar.
Foi perfeito!
Helena está semi deitada, com as costas apoiadas a uma mon-
tanha de travesseiros. Coloco a mão na sua testa para ver se está
com febre — está — e aproveito para fazer um cafuné.
Nos seus votos, a Helena disse que eu não pertenço a ela e nem
ela a mim, porque isso implicaria em não ter escolha. Mas acho
que talvez a gente pertença um pouquinho uma à outra, sim. Acho
que o casamento vai mesclando nossos gostos, medos, desejos,
alegrias, memórias… e quando você vê, está dividindo tudo que
antes carregava sozinha.
Eu sei que posso falar qualquer coisa pra ela. Qualquer medo,
qualquer sonho, qualquer coisa besta que eu teria vergonha de falar
para outra pessoa. Sei que ela vai estar ali sempre que eu precisar.
Se eu ficar doente ou se eu realizar um sonho. Se eu tiver um dia
bom ou ruim. Se eu estiver feliz ou deprimida.
Bem, talvez no fim das contas ela esteja mesmo certa — como
quase sempre — e a gente não pertença uma à outra. Porque per-
tencimento remete a uma hierarquia, em uma ser dona da outra.
E não é isso.
E o pior que nem foi só comigo e com o Ju. Sobrou sermão até
para o Pepa, que nem tinha ido conosco, mas, de acordo com a
Helena, tinha incentivado o Ju a começar a surfar. O pobrezinho
deve ter se arrependido até o último fio de cabelo de ter vindo vi-
sitar o Ju nesse período, e demorou dois meses para ter coragem
de olhar para Helena de novo.
Percebo que ela está mal mesmo quando nem ao menos per-
gunta pelo café. Helena ama café preto sem açúcar.
Sinceramente, não sei como ela pode achar que está em con-
dições de sair de casa. Não chego a ficar preocupada porque sei
que ela vai melhorar logo, mas me dá certa angústia ver ela nesse
estado.
— Então, é por isso que acho que não vamos conseguir ir hoje.
Ela tá bem gripada e tá dormindo agora.
— Você pede para ela ligar pra gente depois? — Juju pergunta.
— A gente também!
— Já tão lá no Luneta…
Ele passa uns dez minutos me contando das aventuras dos dois
e do programa que farão hoje. Logo a Mari diz para ele que já
está na hora de eles saírem.
Olho o meu relógio e calculo que já deve ser perto das quatro
da tarde lá. Desejo feliz Natal para os dois e desligo.
***
— Ótima.
— Não.
— Fico.
Deixo a água bem quente, mesmo sendo verão, porque ela está
com febre e não seria nada bom ter um choque térmico.
Típico Helena.
Mas ela está mesmo com uma carinha de dar pena e sei que
deve estar se sentindo ainda pior.
— Se continua funcionando…
Prendo meu cabelo para não molhar, e ela abre um sorriso
levado, até meio infantil, quando termino de tirar a roupa.
Abraço ela pela cintura e a puxo para mais perto e ela deita a
cabeça no meu peito e entrelaça nossos dedos.
— Falei que você estava gripada e não queria passar para eles.
— Mas a gente devia ir hoje — ela fala, mas não soa como
uma imposição, na verdade, tenho a impressão de que ela está
quase dormindo outra vez.
A Helena pode falar o que quiser da Lara, mas elas não são tão
diferentes assim. A Helena também é bem controladora.
Esse é o primeiro Natal que vamos passar os quatro juntos como
uma família, já que ano passado, embora já estivéssemos morando
juntas, eu passei o Natal com os meus pais e a minha avó. E sei
que a Helena estava toda agitada porque queria que tudo saísse
perfeito. Esse pensamento faz com que eu a aperte mais um pouco
contra mim e dê um beijinho na sua têmpora. Ela não acorda.
— E se não combinar?
— Tem razão…
Eles estavam discutindo algo entre eles que, como peguei pela
metade, não consegui acompanhar.
— Daora!
Ela se virou para mim e eu fiz que sim com a cabeça. Ela sorriu
antes de responder:
— Claro.
Ela fez uma careta meio assustada, mas disse que sim para o
filho.
Não acho que a Lara aprovaria a nossa árvore, mas, para mim,
era a árvore mais bonita que eu já tinha visto.
Mila: Acabei! Senti que ela estava dormindo. Ela parece com
a cabeça bem pesada, acho que está congestionada, então fiquei
mais tempo ali. Se ela estiver dormindo pode deixar ela assim mais
um pouco, depois acorda ela devagar.
— Hmm?
— A gente já chegou?
— Aonde?
— No Luneta?
— Ótima.
Eu sei que ela vai responder isso todas as vezes, mas agora ela
parece menos irritada, o que significa que ela está melhor que da
última vez que perguntei.
Você tem que aprender a ler a Helena se quiser viver com ela.
Percebo que ela não está mais quente e acho que a febre passou.
Mas ela ainda está com a voz meio fanha.
Ela me olha como quem pede desculpa, mas solto uma risada
da cena.
— Não, mas você vai ter que se esforçar mais do que isso pra
me convencer que está liberada para ir pro Luneta.
— Eu gosto de desafios.
— Com legumes?
— Uhum…
— Acho que sim. Diz aqui que a comida vai chegar em dez
minutos.
***
— Tadinha, não!
— Só um pouquinho.
Ela solta uma risada porque sabe que eu estou brincando. Adoro
implicar com as duas e falar que são igualmente mandonas.
— Nossa.
Sei que ela está falando em um sentido “não tira o corpo fora
dessa, porque você que escolheu fazer parte”, mas sempre me
derreto toda quando ela diz “nossa família”.
***
— Mamãe, você tá bem? A tia Lara disse que você ia falar que
sim mesmo que não tivesse. E a tia Lu disse que você era muito
teimosa pra ficar doente por muito tempo. E a tia Mila disse… —
Juju não parava de falar. Helena teve que cortar ela com um abraço.
O que eu mais gosto nas irmãs é que todas elas embarcam nas
maluquices da Mila. Por exemplo, todas aceitam a teoria da Mila
de que a Elvira é a encarnação da avó delas sem questionar.
— E sempre gostou de ruivos — Mila completa. — O vovô
era ruivo e aquele terceiro namorado dela depois que ele morreu
também era.
— Qual?
— Esse.
— Porque eu pedi pra ver, ué. A culpa não é minha que vocês
eram desgarradas da família quando ela estava viva.
Fico feliz por ele, se tem um cara que merece ser feliz é o
Chiquinho.
— Diverticulite???
— Aaah!
— Bom, você que explique pra sua filha daqui a alguns anos
que batizou ela em homenagem a uma cadela!
— Se você quer saber, a Luna e a Luna se dão muito bem. Tem
uma conexão única.
— Te internar em um manicômio!
— Como é?
— Cristo.
***
Por causa das crianças — e dos adultos que não aguentam até
a meia-noite para comer — a ceia é servida lá pelas nove horas.
Comprei um par de patins para ela, que já está com cinco anos.
A Lara provavelmente vai querer me matar ou dar com os patins
na minha cabeça, mas dá última vez que a Alícia foi lá em casa
ela ficou obcecada pelos patins da Juju e não parou de falar disso.
E eu não me importo de ensinar ela a patinar. Eu, a Helena, o Ju
e a Juju patinamos quase todos os domingos no calçadão, e ela
poderá vir com a gente sempre que quiser.
— Eu jurava que era eu, porque você não me deixou nem dar
uma espiadinha no que era — Sofia comenta.
Sim, um sorriso.
— Vocês tem que entender que metade das pessoas aqui são
irmãs dela — Sofia comenta.
Lara não fala nada, mas vejo ela enxugando uma lágrima. A
Helena adora pegar todo mundo desprevenido e mostrar que ela
se importa mais do que todos, embora disfarce isso muito bem a
maior parte do tempo.
É a cara da Mila.
— Tipo, de vidente?
— Isso.
— E funciona?
— Sim.
— Não.
De mim?
Abraço ele tão forte, que fico com medo de ter quebrado os
ossinhos da costela dele.
***
— Muito.
Não sei direito por onde começar, mas agora sinto minha gar-
ganta meio fechada e meu peito pesado. Tento respirar fundo
antes de explicar:
— Por que foi você que… que adotou eles e, hmm, sei lá,
eu apareci depois e vocês tem um vínculo lindo… eu… eu não
quero… não quero me intrometer, mas eu amo eles…
— Eu acho que chorei por três dias a primeira vez que a Juju
me chamou de mãe — ela confessa.
— Foi o que eu falei para ele — Ela faz um carinho com a mão
que está na minha cintura. — No fundo, vocês dois estavam com
o mesmo medo. O que é uma tremenda besteira, porque é óbvio
que eles são loucos por você e você por eles.
— Eu te amo.
— Eu também.
Fim.