Você está na página 1de 46

1

Número 7
Setembro de 2021
Primavera

Bogdan Skorupa Ribeiro dos Santos Edição (inclusa capa)


Projeto gráfico e diagramação
Adaptação (texto 1)
Redação (texto 2)
Thiago Corrêa de Freitas Revisão
Redação (texto 2)
Igor Mottinha Fomin Revisão técnica
Ana Clara Miranda Capa (foto base)
Renato Callegari Fotos (capa e texto 2)
Marcos Schmitz
Ivan Guimarães Redação (texto 1)
William Castle Redação (texto 3)
Pollyanna Hartmann Vincenzi Tradução (texto 2 e 3)

Licença

Este trabalho está licenciado com Exceção


uma Licença Creative Commons: Texto 3 de William Castle, in-
Atribuição (by) 4.0 Internacional. cluindo as fotos, está licenciado
Esta licença permite que outros re- com uma Licença Creative Com-
mixem, adaptem e criem a partir mons - Atribuição-NãoComercial-
do seu trabalho, inclusive para fins SemDerivações 4.0 Internacional.
comerciais, desde que atribuam o E onde mais for especificado como
devido crédito ao autor original. CC-BY-NC-ND.
......................................................................................

FALE CONOSCO

Revista virtual issuu.com/cafecomluteria


Site cafecomluteria.com
Email cafecomluteria@gmail.com
Instagram @cafecomluteria

Os indicados pela Redação assumem responsabilidade pelo respectivo conteúdo redigido


nesta revista. Em nenhum momento representa a opinião do restante do corpo editorial.
Toda escrita é adequada ao padrão da revista e revisada, regida pelas Orientações para
Autores e Polı́ticas Internas.
2
Leia neste número

Bogdan Skorupa R. dos S.


4
Editorial

Marcos Schmitz
6 Ivan Guimarães

Texto 1

Bogdan Skorupa Ribeiro dos Santos


14 Thiago Corrêa de Freitas

Texto 2

William Castle
22
Texto 3

32
Referências e Extras

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
Conteúdo
3

Por uma árvore genealógica da luteria brasileira


Editorial

Luteria ı́talo-brasileira: traços do passado


História

Violinos e outras histórias


História

Trabalho em processo
Materiais & Ferramentas

Referências

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
Por uma árvore genealógica
da luteria brasileira
4
Por Bogdan Skorupa Ribeiro dos Santos

Nesta edição ficamos muito contentes em rece- Em resumo, os dois primeiros textos permitem
ber textos de grande qualidade técnica. Ao mesmo criar um traçado da história de alguns dos luthi-
tempo, são fenomenais trocas de ideias e mostras ers ı́talo-brasileiros de forma situada, inclusive,
dos bons frutos que a colaboração pode gerar. com suas obras. Não consigo deixar de lado a
Para o primeiro texto desta edição, Marcos ideia de descendência da prática, o que mereceria
Schmitz e Ivan Guimarães traçam uma história da uma árvore genealógica, ainda mais depois de ver
luteria ı́talo-brasileira. O conteúdo do artigo foi aquela que habita a edição de 1891 da revista The
apresentado originalmente na revista The Strad, Strad. Os nomes e informações que relacionamos
entretanto, aqui estará enriquecido de novas in- ainda permitem criar uma árvore muito vaga, com
formações até então não publicadas. ramos esparsos, tal qual todos os luthiers men-
O segundo texto parte da mesma motivação cionados guardam relações entre si. Além disto,
em descobrir “quem foram os luthiers italianos muitas outras histórias precisam ser investigadas
que trabalharam no Brasil”, mas, oportunamente, e compiladas, aumentando a quantidade de nomes
mostrando exemplos de violinos e outros materiais que atuaram no Brasil do começo do séc. XX.
construı́dos no século passado. Cada violino é Vale lembrar que a luteria ı́talo-brasileira é
acompanhado de informações sobre o contexto de uma parte da luteria brasileira. Longe de ser sua
seu autor, através de documentos que pudemos completude, ainda mais porque falamos de violinos.
ter acesso. Nem todos os instrumentos com caracterı́sticas
Por fim, uma imersão no ateliê de William italianas foram construı́dos apenas por italianos
Castle que é um deleite para qualquer constru- imigrantes e seus descendentes. Certamente, mui-
tor de violinos, mas que também trará discussões tos nomes precisam ser adicionados. Mais uma
interessantes para os amantes do trabalho em ma- vez: a história da luteria brasileira possui mui-
deira. Na continuidade da colaboração com a tas peças ainda esperando para serem juntadas e
BVMA Newsletter, trazemos a descrição completa ampliarem nosso conhecimento sobre o tema.
da construção de violino com ferramentas possi- Aliás, uma dica extra para leitura desta edição;
velmente usadas do passado. especialmente, o texto de William Castle. Leia,
Tanto quanto produtos da intenção dos cons- leia, leia... releia, trabalhe e descubra. O Mutus
trutores, os instrumentos musicais são produtos liber também acaba sendo válido aqui: aqueles que
dos métodos utilizados? Das ferramentas e dos conhecem o trabalho da luteria poderão aproveitar
modos particulares de as utilizar? O desafio e muito mais do texto. E não é também um mote
experimentação propostos pelo Sr. Castle fariam para quando escrevemos a história da luteria?
parte de um curso especial com os membros da Para isto, contamos com apoio de todos vocês,
British Violin Making Association. Por conta da amantes e profissionais! Conhece alguma história
pandemia, o curso não pode ser realizado. En- da luteria brasileira, ou quer contar a sua própria
tretanto, não foi menor o desejo do Sr. Castle história?
compartilhar as técnicas e ferramentas tão pecu- Veja como participar nas próximas páginas...
liares que utilizou, levando-nos para um passeio
prático pela história da luteria. Editor

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
Como participar?
Para começar:
5
Acesse nosso site

Registre-se no nosso blog como membro e não


perca os novos números e textos no blog

Registre-se

Quer publicar na revista?

Escreva Orientações detalhadas


Para fazer um texto INÉDITO, podem ser to-
Siga as orientações para autores ao escrever o madas bases em experiências e reflexões sobre
seu texto. Prezamos pela autoria própria e pela instrumentos musicais de corda com corpo e braço
sinceridade, pois queremos ler aquilo que você tem feitos em madeira.
a dizer sobre um assunto da luteria. Cada texto (inédito ou de resposta) recebido
Em resumo, começamos com um texto de até pelo grupo editorial será conferido se é adequado
3 páginas em formato editável (.doc; .docx; .odt) ao escopo da revista.
com a seguinte formatação: Depois de revisar a gramática, concordância,
coerência e estrutura, os textos são retornados aos
• Fonte Times New Roman;
autores para correções e aprovação. A versão final
• Tamanho 12pt; é adequada ao modelo da revista através do editor
LATEX.
• Justificado; As publicações acontecem por ordem de envio
• Espaçamento simples entre as linhas; e contato com os autores, no máximo, 3 textos por
número. Se houver mais textos, serão publicados
• Espaço entre parágrafos 0pt; num próximo número.
• Sem ilustrações, listas ou tabelas, pois serão
incluı́das depois.
Escolha pelo menos 6 ilustrações de sua pre-
ferência! Também uma foto sua para divulgação.

Envie

Escreva para nosso e-mail e anexe o seu texto


num formato editável (.doc; .docx; .odt)

cafecomluteria@gmail.com

Basta aguardar pela revisão.

Revise

Queremos mostrar textos bem estruturados e


organizados.
Por isto, quando receber o e-mail com suges-
tões, revise o texto conosco!
Aguarde a publicação no próximo número, as-
sim como a disponibilização do exemplar virtual.

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
Luteria ı́talo-brasileira:
traços do passado
6 Por Marcos Schmitz e Ivan Guimarães

Nas últimas décadas as tradições


da luteria europeia têm sido vas-
tamente pesquisadas e documenta-
das. Mais recentemente o mesmo
se passa com a luteria americana.
Em contrapartida, a história dos
luthiers brasileiros tem sido negli-
genciada, mesmo que os instrumen-
tos de arco e seus construtores es-
tejam presentes no Brasil desde os
primeiros dias do Império (1822-
1889), e provavelmente desde os
tempos da Colônia (1500-1808).
Propaganda pela imigração de italianos: “Na América,
Terra no Brasil para todos os italianos. Navio parte todas
as semanas do Porto de Gênova. Venha construir seu sonho
com a famı́lia.” [1].

Luthiers portugueses possivelmente trouxeram europeus como terra de oportunidades. Trabalha-


as técnicas da luteria e começaram a ensiná-las dores que sofriam dificuldades viram uma chance
por aqui, uma vez que desde a colonização havia de recomeçar a vida no Brasil, onde suas habili-
demanda por música de câmara e de pequenas or- dades poderiam ser reconhecidas e aproveitadas.
questras, demandando instrumentos musicais e os Muitos fazendeiros preferiram contratar imigran-
respectivos trabalhos de construção e manutenção. tes europeus a pagar salários para seus ex-escravos,
Sobre esses primeiros luthiers, muita pesquisa agora alforriados. Por essa razão, o governo brasi-
ainda precisa ser feita. Entretanto, a tradição leiro criou uma campanha para trazer imigrantes
da luteria brasileira parece ter se afirmado com da Europa. É preciso deixar um grande capı́tulo
a vinda dos imigrantes italianos. Os imigrantes em aberto aqui, onde seria preciso abordar com
começaram a vir para o Brasil em maior número a cautela as motivações e projetos do governo para
partir do fim do séc. XIX, perı́odo que contempla a vinda de imigrantes para o Brasil, especialmente
o fim do Império e inı́cio da República. na República Velha.
É bom destacar, em primeiro lugar, que no A riqueza e o trabalho concentravam-se nos
século passado não houve documentação organi- estados do Rio de Janeiro e de São Paulo, conse-
zada sobre a luteria brasileira. O que existe é um quentemente, foram esses os primeiros a atrair mão
conjunto de informações fragmentadas e incom- de obra estrangeira. Os ı́talo-brasileiros são os des-
pletas, muitas vezes informações passadas boca a cendentes da grande massa de imigrantes italianos
boca, de um professor para seu aluno. Em segundo que chegaram ao Brasil e, em 2013, estimava-se
lugar, a história do Brasil, nessa mesma época, que 31 milhões de brasileiros (15% da população),
foi marcada por perı́odos de instabilidade: uma eram descendentes de imigrantes italianos, sendo
revolta armada (1924), uma revolução constitu- metade deles residentes no estado de São Paulo.
cionalista (1932), o perı́odo ditatorial de Getúlio O fluxo de imigrantes foi mais ou menos constante
Vargas (1937-1945), e finalmente duas décadas até 1960, quando entrou em declı́nio, em parte,
de regime militar (1964-1985). Cada um desses com a “crise” que assolou o paı́s com o inı́cio da
perı́odos afetou o modo de vida dos brasileiros, era militar, a partir de 1964.
bem como a economia do paı́s, o que consequente- Os italianos logo se tornaram uma força de
mente também afetou a vida dos luthiers brasilei- trabalho importante com a industrialização, que
ros [2]. ocorreu principalmente em boa parte do estado de
No final do séc. XIX o Brasil era visto pelos São Paulo. A influência italiana rapidamente se

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
fez presente na cultura local, arquitetura e música.
No caso da cidade de São Paulo, os imigrantes
fixaram-se em bairros tradicionais, influenciando
até a lı́ngua falada, muitas vezes dialetos de regiões
7
especı́ficas do mediterrâneo. Entre os imigrantes
italianos, estavam também os luthiers italianos.
O primeiro luthier ı́talo-brasileiro de quem se
tem registro foi Lorenzo Fritelli (1863-1928), por
vezes, também grafado como: Lourenço Fritelli
ou Lorenzo Frittelli. Formado em Arquitetura
em Roma, emigrou para São Paulo antes de 1900.
Construiu inúmeros instrumentos ao longo de sua
vida, e seus violinos são objetos de desejo entre
os músicos de hoje. De acordo com jornais da
época, em 1921 Fritelli ganhou uma competição
de teste às cegas em Bruxelas. Ele tinha seu mo-
delo pessoal, com a bombatura alongada, partindo
desde o filete, praticamente sem a tradicional “re-
curva”côncava entre o filete e o inı́cio da parte
convexa do tampo ou fundo, e sempre usando um
verniz à álcool de tonalidade marrom1 .
Vincenzo Lo Turco (1891-1968), por vezes gra-
fado Loturco e também L’Oturco, nasceu em Bron-
te, Sicı́lia, em 1891, e chegou em São Paulo em
1910, junto com seu pai. Ambos conseguiram tra-
balho como construtores de bandolins na fábrica
de instrumentos Giannini, empresa em atividade
próspera até hoje, que na época já tinha 10 anos
de fundação, de propriedade do famoso fabricante
de violões, o italiano Tranquillo Giannini. Sabe-
Foto de Lorenzo Fritelli em São Paulo e etiqueta de violino se de pelo menos um violino feito em São Paulo
(1910). Fonte: os autores. em 1913, atribuı́do a Lo Turco; embora bastante
rústico, ele apresentava sinais claros de alguém
que possuı́a grande habilidade como luthier.
Lo Turco retornou para a Itália por um perı́odo,
viajando de volta para o Brasil em 1920. Em so-
ciedade com Ettore Marani (sobre quem até o
momento deste texto não se conhece absoluta-
mente nada), ele fundou o ateliê Casa Stradivari,
no Rio de Janeiro, na época, Capital do paı́s. A
Casa Stradivari tinha as caracterı́sticas de um
ateliê profissional, e provavelmente foi o primeiro
ateliê bem estruturado do Brasil. Lo Turco deve
ter trabalhado com um mestre luthier durante
seu perı́odo na Itália, pois desde aquela data seu
trabalho pode ser considerado de primeira classe.
Ao mesmo tempo que trabalhou com muitos re-
paros e restaurações, construiu metodicamente
uma série de instrumentos de altı́ssima qualidade.
Sempre usando madeira de qualidade, de origem
europeia, acessórios de alta qualidade, e com duas
principais variações de tipo de etiqueta. Todos os
instrumentos eram numerados e fornecidos com
um certificado de autenticidade. Construiu cerca
de 80 instrumentos.
Não se sabe exatamente quando, mas num
1 N.E. Conhecida como sguscia.

Foto de Vincenzo Lo Turco no ateliê do Rio de Janeiro.


Fonte: os autores.

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
determinado ponto da sua vida, entrou para a
Sociedade Brasileira de Eubiose (cuja atividade
8 gira em torno de uma sı́ntese de Filosofia, Religião
e Ciência). Viveu seus últimos anos de vida en-
clausurado na sede da Eubiose em Minas Gerais,
falecendo em 1968.
O estilo de Lo Turco sempre seguiu a escola
tradicional italiana. Nos primeiros instrumentos
usou um verniz relativamente pobre em qualidade,
mas após o seu perı́odo de permanência na Itália,
passou a usar um verniz à óleo de excelente quali-
dade, com um pigmento vermelho escuro de muito
destaque. Sabe-se por relatos que Lo Turco apren-
deu sua técnica de verniz com italiano Giuseppe
Fiorini2 , com quem se correspondeu por algum
tempo. O seu primeiro encontro com ele pode ter
Etiqueta descrevendo o perı́odo da sociedade com Ettore
sido na Itália, ou possivelmente quando Fiorini
Marani e, mais abaixo, atribuı́da apenas a Lo Turco. Fonte:
esteve no Rio de Janeiro, como jurado num con-
os autores.
curso que ocorreu durante a famosa feira mundial
de 1922. É possı́vel que a evolução do trabalho de
Lo Turco tenha tido influência direta de Fiorini e
sua grande experiência.
Entre os aprendizes de Lo Turco destacou-se
Luciano Rolla (1908-2006), que começou a traba-
lhar com ele aos 14 anos. Depois da morte do
mestre, Rolla abriu seu próprio atelier no Rio de
Janeiro3 e trabalhou quase que exclusivamente
como restaurador, e ficou famoso como um dos
melhores restauradores que o Brasil já teve – cons-
truiu apenas seis instrumentos durante sua vida.
Um dos mais influentes luthiers, Guido Pascoli
(1905-1987) nasceu em Itobi, no interior do estado
de São Paulo. Filho dos italianos Pedro Pascoli
e Serafina Pascoli, começou trabalhando como
aprendiz de marceneiro com seu irmão Benvenuto
Pascoli (1896-1952), possivelmente logo depois
que se mudaram para Poços de Caldas (a cerca de
60km de Itobi, no estado de Minas Gerais). Ali,
uma cidade com grande movimento musical, os
dois irmãos tiveram contato com manutenção de
instrumentos, sejam tocados com arco, ou instru-
mentos dedilhados, ao prestar serviços para Guido
Rocchi (1865-1940). O próprio Rocchi fazia traba-
lhos como luthier, além de ser uma influente figura
para a música em geral. O primeiro a trabalhar
com ele foi Benvenuto, em 1915, seguido de Guido
em 1918 [2].
Por volta de 1920, Benvenuto muda-se para
São Paulo, seguindo por seu irmão, na época, com
17 anos. Ambos trabalhavam como marceneiros
durante o dia e, à noite, ele e o irmão traba-
lhavam finalizando e envernizando instrumentos
2 Luthierde grande reputação, nascido em Bolonha, com
trabalho consagrado e que pode ser considerado um marco Guido Pascoli com um dos violinos do quarteto brasiliano
para a luteria bolonhesa de violino do século XX. e, abaixo, etiqueta de violino de sua autoria. Fonte: os
3 Estabeleceu-se na Rua das Marrecas 40/803, onde
autores.
trabalhou até sua morte, contando com a ajuda do filho,
Newton Rolla, quando possı́vel. Newton mantém o ateliê,
principalmente, com manutenções hoje em dia.

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
na fábrica Di Giorgio. Além do trabalho, Guido com ele na Wurlitzer, mas Guido não queria sair
estudava no Liceu de Artes e Ofı́cios na cidade. do Brasil, e recomendou dois de seus alunos para
Este treinamento no trabalho em madeira fez com
que ambos desenvolvessem suas técnicas, esta-
ir em seu lugar: Francisco (Frank) Torres e Luiz
Bellini (1935-2015). Ambos aceitaram o convite e
9
belecendo padrão impecável. Somente em 1922 Bellini se tornou um dos mais conhecidos luthiers
os irmãos Pascoli conseguiram fundar a Casa de de Nova Iorque.
Música e Liuteria Cremona, onde trabalharam Para o concurso de 1960, Guido fez um quar-
inclusive em conjunto construindo instrumentos. teto de instrumentos, conhecido como Brasili-
Em 1928, mudam-se para o Rio de Janeiro. ano, em homenagem a Brası́lia, inaugurada no
Nos anos 30 (não muito diferente dos dias de mesmo ano. Os instrumentos foram desenhados
hoje, ainda que dispomos de cartão de crédito e com linhas que se assemelhavam às formas arqui-
internet para facilitar), importar madeiras da Eu- tetônicas criadas por Oscar Niemeyer, que proje-
ropa era um processo complexo. Oportunamente, tou os palácios e anexos da cidade de Brası́lia.
quando o Theatro Lyrico do Rio de Janeiro estava Já tendo formado inúmeros alunos, entre eles
sendo demolido, Guido descobriu que muitas das Torres e Bellini, em 1967, Guido começou a tra-
colunas de madeira que compunham a estrutura balhar na ideia de uma escola nacional de luteria,
do teatro, eram feitas de abeto europeu de boa através de vários departamentos governamentais.
qualidade, e acabou adquirindo todas. Essa ma- Três anos depois fundou a Escola de Lutheria.
deira foi utilizada em diversos instrumentos dos Localizada no Rio de Janeiro e com respaldo da
irmãos Pascoli, que chegaram a escrever em alguns Funarte, o conceito da escola era abranger todo o
certificados: “Instrumento feito com madeira do território nacional. Os alunos graduados seriam
Theatro Lyrico”. incentivados a ensinar a arte da luteria em outras
Benvenuto também inventou um modelo de cidades do paı́s, onde a Funarte tivesse uma sede.
barra harmônica ajustável, que inclusive foi do- Por volta de 1980 o projeto já havia se espalhado
cumentado em 1937. Escreveu um documento e funcionava em várias unidades, mas principal-
para Benito Mussolini dando ciência deste novo mente no Rio e em Brası́lia. Muitos estudantes
sistema regulável por ele criado. Um instrumento preferiram se transferir para o Rio e Brası́lia, onde
com este mecanismo foi mandado para a Itália e as instalações eram melhores, e o próprio Guido
colocado à disposição no Conservatório de Santa Pascoli ministrava o curso. Portanto, o traba-
Cecı́lia em Roma para que pudesse ser testado. lho didático de Guido, levou o conhecimento da
No mês de julho de 1939, recebeu do Cônsul Geral luteria, principalmente para aprendizes carentes
da Itália uma carta comunicando o agradecimento de oportunidades - alguns deles em atividade até
a respeito do instrumento doado ao Conservatório hoje.
de Santa Cecı́lia em Roma. Escreveu diversos ar- Em meados dos anos 1980, Guido perdeu a
tigos relacionados à construção e manutenção de visão, mas continuou ensinando e conferindo os
violinos, textos estes que nunca foram publicados. trabalhos dos alunos apenas pelo toque das mãos.
Benvenuto se casou em 1922 com Beatriz Ca- Infelizmente, faleceu em 1987 na cidade de Guara-
drobbi (nascida em Genebra em 1901) e faleceu pari - Espı́rito Santo, e o projeto foi descontinuado.
em 18 de junho de 1952, acometido de um infarto Outro luthier importante nesse perı́odo foi
do miocárdio, tendo sido sepultado no cemitério Marcello Martinenghi (1907-2000). Filho e apren-
do Araçá, em São Paulo. diz de Stelio Martinenghi (mãe: Marcélla Marilli
Ao contrário do irmão, Guido construiu mais Martinenghi), nasceu em Veneza e trabalhou em
de 300 instrumentos, quase todos seguindo a tra- Milão em 1932 e, depois, em Bassano del Grappa,
dição italiana. Ele fez experiências com o uso de perto de Veneza, em 1943. Participou de inúmeros
madeiras brasileiras, como a Perobinha do campo concursos e exibições internacionais, e ganhou me-
(Acosmium dasycarpum), para o fundo, faixas e dalhas de prata e ouro em competições em Roma,
braço, e o Pinho do Paraná (Araucaria angustifo- Florença e Pádua. Ele foi treinado no estilo da lu-
lia), para o tampo. Essas madeiras foram muito teria clássica italiana milanesa, e usava um verniz
usadas por seus alunos em sala de aula. Guido de cor âmbar, muito transparente.
também usou vários tipos de vernizes, desde o Martinenghi já estava no Brasil em 1951 [Anexo
mais claro (âmbar), até vernizes de cores bem A], onde continuou construindo excelentes e ro-
acentuadas. bustos instrumentos. Ele formou grande amizade
Guido participou duas vezes do Concurso Inter- com Agostinho Paparotti, seu único aprendiz co-
nacional de Luteria de Liège, na Bélgica. Em 1958 nhecido, com quem ele viveu no interior de São
ele ficou entre os premiados e impressionou muito Paulo até sua morte em 2000.
o renomado Simone Sacconi, que naquele tempo Enzo Bertelli (1918-1999) nasceu em Verona,
trabalhava no atelier de Rembert Wurlitzer, em filho e pupilo de Luigi Bertelli (1886-1968). Ele se
Nova Iorque. Sacconi o convidou para trabalhar tornou um bem conhecido luthier na Itália, antes

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
de vir para o Brasil (saiu da Itália em 1948 [Anexo
B]), e se juntar com o irmão Gaetano Bertelli,
10 também luthier, que já havia chegado por aqui
anos antes. Em janeiro de 1953, seu pai Luigi
também desembarcou no Brasil para trabalhar
com os filhos, mas retornou para a Itália dois anos
depois, levando consigo cinco instrumentos. Dois
desses ganharam medalhas no Concurso Nacional
de Luteria Moderna em 1956 - uma de ouro e uma
de prata.
Enzo e Gaetano continuaram trabalhando jun-
tos, tornando-se os luthiers oficiais da Orquestra
Sinfônica do Estado em 1968. Gaetano retornou
à Itália em 1982 e Enzo permaneceu no Brasil.
Enzo construiu instrumentos seguindo a escola ita-
liana clássica de Cremona, usando um rico verniz
com tonalidades que variavam entre o âmbar e o
amarelo dourado.
Em 1980 ele foi convidado para lecionar no
curso de luteria do Conservatório Musical e Dramá-
tico de Tatuı́ “Dr. Carlos de Campos”. Graças ao
empenho e dedicação de Enzo e seu filho Luigi (que
se graduou na escola de Cremona em 1981) a escola
de Tatuı́ se tornou um atrativo para formação em
luteria no Brasil, com estudantes de todo o paı́s e
também do exterior.
Mais uma vez, o Brasil passou a ter uma escola
bem estruturada e equipada para o ensino e di-
vulgação da luteria, que também contribuiu para a
pesquisa de madeiras regionais para a construção
de instrumentos. Em 2008 a escola promoveu e
organizou o primeiro concurso nacional de lute-
ria batizado de “Enzo Bertelli”. Os instrumentos
ganhadores integraram o patrimônio do conser-
vatório, formando uma coleção de instrumentos,
para serem tocados pelos alunos da instituição.
Os resultados do trabalho destes luthiers po-
dem ser vistos até hoje. Seja através de instru-
mentos construı́dos, ou aqueles mantidos pelas
restaurações, mas também pelos seus aprendizes.
Com certa esperança de continuidade da cons-
trução e restauração de violinos de qualidade, seus
esforços devem superar a tendência a episódios
intermitentes da história da luteria brasileira. E
que este texto seja motivação para escrever ou-
tras tantas histórias de luthiers que, por agora,
deixaram de ser contadas!

Marcello Martinenghi no seu ateliê em São Paulo; abaixo,


Enzo e Gaetano Bertelli no ateliê que mantinham também
em São Paulo. Fonte: os autores.

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
Marcos Schmitz nasceu em Ivan Guimarães nasceu em
São Paulo. O trabalho em madeira fazia Salvador e cresceu no Rio de Janeiro.
parte desde a infância, seja nas férias
escolares passadas nas empresas do avô,
Começou aprendendo a tocar violino
com 12 anos de idade motivado por 11
seja como marceneiro. Em 2002, iniciou seu pai, que tocava violino e bandolim.
seus trabalhos no mundo da luteria, logo Como conta, tocar violino levou a co-
conseguindo valiosa orientação de Rafael nhecer, em 1978, o luthier João Bruno,
Sando. Trabalhou por 10 anos no Ate- autodidata que fazia trabalhos de ma-
lier Musikantiga, mantido pelo luthier nutenção dos instrumentos de seu pai
Ivan Guimarães, fazendo reparações e e construiu violinos, violas, violonce-
restaurações, eventualmente vendo de los, bandolins e outros instrumentos de
perto instrumentos como Stradivarius, corda. Foi assim que iniciou o interesse
Guarneri Del Gesù, Bergonzi, Vuillaume, pela luteria. Na mesma época, conhe-
e muitos outros instrumentos antigos ceu Guido Pascoli e sua escola de luteria
e modernos. Logo, abre a própria ofi- na Funarte. Em 1986, mudou-se para
cina e dedica-se à fabricação de violino. São Paulo, onde abriu o ateliê Musikan-
Em 2008, ganhou o segundo prêmio no tiga, especializado em violinos, violas,
Primeiro Concurso Nacional “Enzo Ber- violoncelos e arcos. Construiu instru-
telli” de Luteria. Em 2009, participou mentos, ainda que se interesse mais pela
da 12a edição da Trienalle Internacio- restauração, reparo e manutenção, neste
nal de Construção de Instrumentos de sentido, buscando aperfeiçoamento em
Cordas - Fondazione Antonio Stradivari, workshops na Alemanha, Bélgica e Itália.
Cremona, Itália. Hoje, em São Paulo, Muito interessado pela história da lu-
dedica-se apenas à construção de violi- teria no Brasil, tem pesquisado desde
nos e violas. 1997 especialmente sobre a luteria intro-
duzida aqui pelos imigrantes.

Este artigo foi enviado diretamente pelos autores para a revista Café com Luteria. Grande parte das informações aparecem
no artigo enviado à revista The Strad [4], entretanto, o texto passou por incrementos e revisão completa, incorporando
fatos pontuais, especialmente quanto às datas de nascimento e morte dos luthiers. Também foram referenciados fatos sobre
o aprendizado e trabalho dos irmãos Pascoli e sua relação com outros luthiers. Para o texto feito em 2017, gostarı́amos de
deixar o agradecimento tardio a Luigi Bertelli que colaborou contando histórias que vivenciou junto ao pai e durante sua
carreira. Também prestamos agradecimento póstumo a Takeshi Nishi, pelas histórias que contou a M. Schmitz durante as
aulas de violino. Rafael Sando também colaborou fortemente com esta edição, conferindo e fornecendo informações e fotos,
assim como sanando questões sobre o seu artigo na VSA [2]. Agradecemos a Rudson di Cavalcanti pela disposição em ouvir
nossas dúvidas e por informações pontuais; estamos ansiosos pelos complementos que poderá prestar às edições futuras!

Da esquerda para direita, Marcos Schmitz, Luigi Bertelli e Ivan Guimarães. Foto: Renato Callegari.

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
ANEXO A
12 Registro de Estrangeiros - Marcello Martinenghi (1950)

A data de expedição do registro geral brasileiro é de 1951, dado no documento de Registro de Estrangeiros
(mesma fonte, 1954). Brasil, Cartões de Imigração, 1900-1965. Arquivo Nacional, Rio de Janeiro; Group 4 >
004914344 > image 99 of 204. Disponı́vel em: FamilySearch : 8 mai 2019.

ANEXO B
Ficha Consular de Qualificação - Enzo Bertelli (1948)

Brasil, Cartões de Imigração, 1900-1965. Arquivo Nacional, Rio de Janeiro; Group 8 > 004916943 > image 176
of 203. Disponı́vel em: FamilySearch : 8 mai 2019.

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
Ficha Consular de Qualificação - Luigi Bertelli (1952)

13

Brasil, Cartões de Imigração, 1900-1965. Arquivo Nacional, Rio de Janeiro; Group 8 > 004916943 > image 28 of
203. Disponı́vel em: FamilySearch : 8 mai 2019).

Registro de Estrangeiros - Luigi Bertelli (1953)

Brasil, São Paulo, Cartões de Imigração 1902-1980. Arquivo Público do Estado de São Paulo; B > Bertagna-
Berthier > image 475 of 816. Disponı́vel em: FamilySearch : 20 ago 2021.

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
Violinos e outras histórias
14 Por Bogdan Skorupa e Thiago C. de Freitas

O trabalho de pesquisa de luthiers, músicos e outros


curiosos pela luteria tem trazido à tona histórias da
profissão no Brasil. Novas informações tem mostrado
a importância, por exemplo, dos italianos imigrados
ao Brasil, refletindo na produção de instrumentos
musicais, como no caso dos violinos.

Para escrever sobre a história da luteria brasileira, ainda


precisamos juntar peças de um quebra-cabeça no qual mui-
tas são faltantes. Das novas descobertas sobre a luteria
de antes do séc. XX, podemos citar a pesquisa feita por
Saulo Dantas-Barreto, a qual mostra um cenário prolı́fico
de construção e manutenção de instrumentos no Rio de Ja-
neiro de meados do século XIX, então capital do Império
[5]. Os destaques ficaram para os luthiers José dos Santos
Couceiro e João Gomes Braga, ambos portugueses estabele-
cidos por aqui. Saulo utilizou-se de documentos da época,
artigos e anúncios em jornais e uma pequena quantidade de
instrumentos conservados, sendo um deles já apresentado
aqui4 .
Parte das peças faltantes desta história são instrumentos
musicais. A ausência de exemplares disponı́veis, fotografados
ou, pelo menos, listados, dificulta escrever objetivamente
sobre os feitos de luthiers do passado. Por isto, dedicamos a
esta seção algumas fotografias de instrumentos, pelas quais
agradecemos a Marcos Schmitz e Ivan Guimarães por dispo-
rem das fotos de seu acervo (tiradas na época da elaboração
do artigo para a The Strad [4] por Renato Callegari). Apro-
veitando a menção dos autores dos instrumentos (L. Fritelli,
V. Lo Turco, B. Pascoli, G. Pascoli, E. Bertelli e M. Mar-
tinenghi), outros luthiers podem ser citados, ampliando a
gama de nomes relacionados à história.
O primeiro violino (foto ao lado) foi construı́do por Lo-
renzo Fritelli em 1914. Em 2017 fazia parte da coleção do
atelier Musikantiga. Pela própria foto é possı́vel notar a bom-
batura com sguscia 5 bastante rasa, finalizando praticamente
convexa até a borda, que também é bastante estreita. O
verniz apresenta transparência e traz a impressão de acender
as ondulações naturais do acero, assim como raios medulares
(possivelmente utilizava ambar para seu verniz, algo que uma
investigação mais profunda poderia confirmar).
Fritelli morou na Rua do Theatro 40, São Paulo, ao me-
nos durante o ano de 1911, data do documento em que pede
migração de sua mãe para o Brasil [Anexo C] (grafado como
Frittelli). Além deste endereço, temos a Rua da Consolação
458 como local de seu trabalho nos entornos dos anos de 1910,
4 Exemplo de um bandolim feito por José dos Santos Couceiro [5]
5 N.E. Recorremos ao termo em italiano, nome conhecido pelos
brasileiros, para a concavidade da bombatura próxima à borda.

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


Violino feito por Lorenzo Fritelli em 1914 [6].
em processo.
Edição de Primavera
mudando-se depois para Rua Caio Prado 11, como aparece
inscrito num violino seu de 1926 e num cartaz bastante pecu-
15
liar em que Fritelli faz propaganda de seu trabalho [Anexo D].
No mesmo cartaz, conseguimos saber preços dos arcos para
violino, violoncelo e contrabaixo: 100 mil-réis, o equivalente
a pouco mais de 1500 reais hoje [Anexo E]; acrescido de
5 mil-réis se quiser uma cabeça “inquebrável”(sic). Uma
das caracterı́sticas notáveis de seu trabalho é a produção
de violinos com comprimento de caixa acústica menor que
356mm (medida padrão), no caso, com 355mm, 354mm e
até tamanhos proporcionais a 7/8 (343mm).
O segundo violino, datado de 1938, foi feito por Vincenzo
Lo Turco. Sobre seu sócio, Ettore Marani, há uma certidão de
óbito [Anexo F], possivelmente correspondente a sua pessoa.
Sua profissão é descrita como escriturário, ainda que devamos
lembrar que a sociedade já havia sido desfeita há mais de
20 anos. O documento dá a data de 1967 para falecimento
de Ettore Marani, “com 85 anos de idade”, possibilitando
estimar a data de nascimento em 1882.
Muitos cavaletes podem ser encontrados sob a marca
“MARANI & LO TURCO : RIO”; mas poucos instrumentos
associados a Marani são encontrados, levando a supor que seu
trabalho era mais voltado para a restauração e manutenção.
Alheio a isto, poderemos encontrar arcos feitos por Marani
sob a mesma sociedade.

Cavaletes e arco produzidos no ateliê Marani & Lo Turco. Foto: acervo


de Ivan Guimarães.

Fundo do violino de Fritelli de 1914 [6].


Café com Luteria No 7, Set/2021
Curitiba, Brasil
16

Violino feito por Vincenzo Lo Turco em 1938. Violino feito por Vincenzo Lo Turco em 1938.
Já mostra os desenvolvimento da construção e Já mostra os desenvolvimento da construção e
do verniz depois da estadia na Itália [6]. do verniz depois da estadia na Itália [6].

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
O violino de Benvenuto Pascoli (ao lado), com fei-
tura estimada à década de 1920, quando em São Paulo, é
17
um exemplo daqueles sem etiqueta, assinados à lápis. O
formato esguio do corpo, as éfes e borda são algumas das
marcas de seu trabalho que possibilitam o reconhecimento
da autoria. Ainda assim, é possı́vel encontrar instrumentos
seus com etiquetas. À mesma época da mudança para o
Rio, começo dos anos 1930, Benvenuto começava a se envol-
ver com ideias do movimento fascista, em crescimento na
Itália – explicando a motivação posterior para escrever a
Benito Mussolini. As dissidências entre os irmãos parecem
ter contribuı́do à separação na década de 1940.
Em uma certidão de casamento de 1947 veremos a menção
a Guido Pascoli, pai de Rosa Goulart de Almeida (nome
de casada, nascida em 1927), “41 anos de idade, profissão
marcineiro”(sic) [Anexo G. Pascoli nunca abandonara o tra-
balho em madeira, ainda que esta tenha sido uma época de
reclusão, com menor ritmo de trabalho. O trabalho como
luthier retorna com força junto ao de professor; começa a
ensinar Luiz Bellini, entre 1955 e 1960 [7], no ateliê da Rua
da Consolação em São Paulo. O Guido Pascoli de 1957
foi feito neste ateliê, ao lado de diversos outros instrumentos
construı́dos com Luiz Bellini e Frank Torres.
Guido Pascoli se considerava um luthier brasileiro, e era
atento ao desenvolvimento nacional, como no caso da criação
do modelo brasiliano à época da fundação da capital em
Brası́lia, 1960. Sabe-se de pelo menos uma viola do modelo
brasiliano que estava no Brasil com Marcelo Nébias em 2013.
Outra viola (c.1960-65) do mesmo modelo foi encontrada
por Frits Schutte em Amsterdam, segundo relatado à revista
The Strad. n. 1, 2018.
Também se esforçou para criar uma escola de luteria
nacional. Já no Rio de Janeiro em 1962, o professor assumiu
cargo ligado ao Ministério da Cultura (como luthier, pela
primeira vez de que se tem registro), levando para frente a
criação de escolas de luteria. Tentou criar uma escola em
Brası́lia, mas sem sucesso, voltando ao Rio no começo da
década de 70. A escola foi efetivamente criada no Rio de
Janeiro em 1976, oferecendo bases para trabalhos de novos
luthiers, como Wellington F. Barbosa, Pedro de L. Souza,
Fernando Cardoso, Orlando Ramos – e teve ramificações.
Caso do projeto em parceria com a então unidade da Funa-
bem em Caxambu - Minas Gerais, onde Jonas Caldas tomou
parte do aprendizado em construção de violinos, violas e
violoncelos [8].
As histórias do final da vida de Pascoli, quando já estava
praticamente cego, podem ser inspiradoras e significativas
para os artesãos que trabalham em madeira. Rodolfo Bettio
contou para a Café, que quando o visitou no Rio de Janeiro
na década de 1980, observou a habilidade de Pascoli em
reconhecer, apenas com o tato, o acabamento e mesmo for-
mato das peças produzidas pelos aprendizes que ensinava [9].
Orlando Ramos, um dos aprendizes da oficina-escola, relatou
algo parecido para Leonardo Coelho, complementando ainda
que o professor sabia quando estavam errando apenas pelo
som que a ferramenta fazia ao cortar [10].
Violino construı́do na década de 1920 por
Benvenuto Pascoli, em São Paulo [6].

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
18 .

Violino de 1957, construı́do por Guido Pascoli


em São Paulo [6]. Violino de 1957, construı́do por Guido Pascoli
em São Paulo [6].

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
Por fim, dois violinos. O primeiro, um violino de Mar-
cello Martinenghi de 1931. Na época da foto, estava
19
sendo tocado por uma musicista em São Paulo, mas atu-
almente pertence ao acervo de Ivan Guimarães. Foi o ins-
trumento com que Martinenghi ganhou a medalha de prata
em concurso de Roma. O segundo, feito por Enzo Bertelli
em 1966, mostra da qualidade técnica do luthier, estava
em posse de seu filho, Luigi Bertelli. Nos quase 20 anos
antes de assumir o cargo como professor do recém-criado
Conservatório de Tatuı́, trabalhou no ateliê em São Paulo
acompanhado do irmão. Nos anos 80 e 90, trabalhou cada vez
menos construindo novos instrumentos. Mais abaixo, uma
etiqueta de Enzo Bertelli adquirida numa visita de Helcio
Fomin ao seu antigo mestre de luteria em São Paulo, numa
situação peculiar. Helcio pegou duas etiquetas discretamente
e as colocou no bolso da camisa, e Enzo apenas disse em
tom de brincadeira: – Pensa que não vi? Mas não as quis de
volta. Pode-se ler a referência ao prêmio que Enzo ganhou e,
ao lado, provavelmente a imagem da medalha do concurso.

Violino de 1931 (acima), construı́do por


Marcello Martinenghi [6]. Violino de 1966 (ao
lado), construı́do por Enzo Bertelli [6].
Etiqueta de Enzo Bertelli (ao lado e abaixo)
sem uso e guardada por seu discı́pulo Helcio
desde a década de 1990. Foto: Igor M. Fomin.

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
ANEXO C
20 Imigração - Luı́sa Bartelini (mãe de Fritelli*)
*Grafia diferente: Frittelli. Note a testemunha escolhida: Romeo Di Giorgio. Ele mesmo, o
luthier de violões, negociante e fundador da empresa existente até hoje com seu sobrenome.

ANEXO D
Propaganda de Lorenzo* Fritelli
*Grafia do nome é diferente: Lourenço Fritelli.

Foto: acervo de Ivan Guimarães. Imagem editada, sem corte do conteúdo original.

ANEXO E
Método para conversão de Mil-réis para Real
Mil-réis (Rs) Rs p/ U$ U$ U$1,00 (hoje) Inflação R$ (hoje)
Valor do arco 100 0,21 21,00 14,17 297,57 1563,14
vendido em 1920

Valor do Real em Dólar em 1920. HOLLOWAY, T. H. Imigrantes para o Café. Paz e Terra, 1984.
Valor do Real em Dólar em 1920 (tabela). Câmbio Real > Dólar - Média Anual
Valor do Real em Dólar em ago/2021. IEGV dólar
Valor do Dólar, corrigida a inflação. CPI calc

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
ANEXO F
Registro de óbito - Ettore Marani 21

Brasil, Rio de Janeiro, Registro Civil, 1829-2012. Corregedor Geral da Justicia, Rio de Janeiro; São Gonçalo >
Segundo Distrito > Óbitos 1967, Nov-1971, Mar > image 13 of 601. Disponı́vel em: FamilySearch : 7 jan 2019.
Imagem editada, sem corte do conteúdo original

ANEXO G
Registro de Casamento - Rosa Goulart de Macedo

Brasil, Rio de Janeiro, Registro Civil, 1829-2012. Corregedor Geral da Justicia, Rio de Janeiro; Rio de Janeiro >
12a Circunscrição > Matrimônios 1947, Fev-Jul. Disponı́vel em: FamilySearch : 18 dez 2017.

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
Trabalho em processo
22 Por William Castle

Como parte do curso da BMVA


Westhope, eu tinha a intenção
de construir um violino utili-
zando tantos métodos diferentes
(e possivelmente mais historica-
mente autênticos) quanto conse-
guisse, como um experimento com
os outros construtores de violino
presentes, afim de adicionar suas
ideias. O curso não aconteceu,
então decidi prosseguir com o pro-
jeto em casa. Fig. 1 - A forma de nogueira. Foto: o autor.

Para voltar ao passado, experimentar ferramentas, o del Gesù: suas imprecisões; então qualquer erro
técnicas e etapas que poderiam ser mais autênticas, da minha parte poderia ser justificado como um
minha principal motivação foi explorar uma per- “estilo del Gesù”!
cepção de que: os instrumentos do passado são um Durante o processo, ficou claro que faço as
produto dos seus métodos de construção, tanto coisas numa combinação entre decisões conscien-
quanto da intenção do construtor. Examinei al- tes, para alterar ou melhorar o jeito como traba-
gumas dessas intenções, o contexto cultural e al- lho, combinadas com uma ajuda considerável da
gumas consequências práticas em dois artigos re- inércia, visto que alguns métodos mudaram pouco
lacionados [BVMA Newsletter, jun e set 2014] desde que eu saı́ da faculdade.
sob o tı́tulo The Spirit of Classical Violin Making,
os quais você também pode ler no meu site [11]. A Forma
Outro incentivo foi a fala inspiradora de An-
drew Atkinson, no 25o aniversário da BVMA em Um exemplo tı́pico dessa inércia foi meu uso contı́-
Newark. Ao contrário de nós, treinados para nuo de compensado para as formas, embora nos
construir instrumentos utilizando ferramentas mo- últimos vinte anos elas tenham adquirido furos
dernas, Andrew começou a copiar ferramentas e menores para prender as laterais das cês, usando
técnicas vistas em imagens do passado, além de pinos de madeira e corda. Para os bojos eu conti-
usar pontos de referência mais comuns, como os nuei usando grampos. Neste instrumento, entre-
materiais do Museu de Cremona. A sua abor- tanto, precisava de uma nova forma para utilizar
dagem, similar à arqueologia experimental, tem os pinos e corda por toda a lateral.
muito o que se elogiar, mas também demanda Pela primeira vez, utilizei um pedaço de ma-
muito tempo. Não querendo reduzir tanto mi- deira maciça para forma, que é muito mais agradá-
nha produção, para o violino decidi me concentrar vel de trabalhar do que o compensado, com seu
em métodos e técnicas como um primeiro passo, pó preenchido de cola e bordas que lascam facil-
mas antes, utilizando minhas ferramentas existen- mente. Eu tinha um pedaço de nogueira, que foi
tes, exceto quando as versões modernas têm um retirada de um piano antigo quando eu tinha 14
funcionamento diferente. anos (então ela quase teve tempo o suficiente para
Outro princı́pio foi não trabalhar com muita secar!) e se ela encolher ou expandir um milı́metro
antecedência, mas permitir que o processo fluı́sse aqui ou acolá, isso realmente importa? [Fig. 1].
com naturalidade, usando minha experiência, in- Para marcar o contorno, utilizei um pequeno
tuição e ferramentas para me guiarem. Escolhi gabarito apenas para a área dos blocos, secondo
um del Gesù que já construı́ diversas vezes antes: Stradivari, ao invés de marcar os blocos a partir
o Alard, de 1742, que está no Musée de la Musique de um gabarito completo com metade do contorno.
em Paris. Tenho boas informações acerca deste Quando marcados em ambos os lados, os blocos de
violino, mas há mais uma vantagem em escolher salgueiro (eu sei que del Gesù usava abeto) podem

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
ser cortados em qualquer direção, sem recorrer a
um esquadro que tende a tornar a estrutura das
de colagem, passo cola nesta parte da lateral e
prendo com a corda. Em seguida, removo a outra
23
laterais muito semelhante à uma construção fabril. extremidade e colo, certificando-me de empurrar
Para dobrar as laterais, usei ferro de dobrar e a lateral firmemente contra a forma.
colei-as com corda, da maneira usual. Para a lateral do bojo superior numa peça
só, comecei prendendo-a ao taco superior, ainda
Colando as laterais sem cola, nivelada à forma, prendendo nos blocos
das pontas em seguida. Antes de colar, deixei
Para aqueles que ainda não experimentaram, co- a lateral fixa num dos blocos da ponta, corrigi
lar as laterais com corda parece ser um negócio sua posição, desprendi dos outros blocos e colei a
complicado em comparação com os grampos, ar- lateral a eles, começando pelo bloco superior por
riscando que elas deslizem para todos os lados, razões óbvias, só então colando a primeira ponta
mas é bastante simples quando você se acostuma. que estava presa. Para o bojo inferior, conveni-
Uma vez que as laterais estão dobradas e secas, entemente, del Gesù usou laterais em uma peça
primeiro, prendo cada lateral, deixando-a alguns inteira, que são certamente mais fáceis de fazer do
milı́metros mais compridas para me prevenir con- que uma junta entre as laterais no bloco inferior.
tra algum posicionamento impreciso. Fazer as Desde que construı́ o violino del Gesù, também fiz
laterais dessa forma é uma técnica antiga para uma viola utilizando os mesmos métodos, só que
mim; prendo a forma entre a borda da bancada com uma junta no bloco inferior.
e a barriga, seguro o bloco de colagem6 contra a Neste caso, em vez de usar a fita adesiva –
lateral com a mão esquerda, enquanto enrolo a onipresente, mas historicamente duvidosa – para
corda em torno do bloco de colagem com a mão manter as laterais juntas sob o bloco de colagem,
direita (no lado direito). Finalmente, prendo a prendi a primeira peça da lateral do bojo inferior
extremidade da corda enrolando-a duas vezes em ao bloco inferior, verificando o alinhamento da
um corte de serra do bloco de colagem. Então, sua extremidade com a linha de centro, ao mesmo
troco de mão, segurando tudo no lugar com a mão tempo que a outra peça da lateral está aproxima-
direita enquanto enrolo a corda (no lado esquerdo) damente no lugar sob o bloco de colagem, apenas
com a mão esquerda. Se a lateral se mover, você para mantê-lo nivelado com a forma. Em seguida,
ainda pode deslizá-la para que fique reta, se quiser, colei a primeira pela de lateral ao bloco da ponta,
antes de prender a outra extremidade da lateral só depois colando ao bloco inferior, conferindo o
da mesma maneira. [Fig. 2] alinhamento à linha de centro e se não havia cola
em excesso que pudesse colar a segunda peça de
lateral no bloco inferior (ainda presa a ele). Então,
colei a extremidade da segunda peça de lateral
ao bloco da ponta. Removi os blocos de colagem
das pontas depois de uma hora, quando ainda
seria fácil descolar a lateral utilizando vapor, caso
tivesse escorregado. Feito isso, colei a segunda
lateral ao bloco inferior, certificando-me da junta
com a primeira lateral. Novamente, removi o bloco
de colagem após uma hora para verificar se a junta
estava boa.
Nesse estágio, as laterais ficam salientes de
ambos os lados dos blocos, o que pode variar no
decorrer do contorno do instrumento. Dependendo
se as laterais estão niveladas com as bordas da
Fig. 2 - Consigo amarrar a lateral inferior ao bloco segu-
forma e/ou se os blocos foram cortados no es-
rando a forma contra a bancada, mantendo a lateral e o
quadro, o contorno do tampo e do fundo serão
bloco de colagem no lugar com a mão esquerda, enquanto
diferentes um do outro, o que é uma caracterı́stica
a corda é enrolada com a direita. Foto: o autor.
comum dos antigos instrumentos italianos [Fig. 3
e Fig. 4].
Quando parecer tudo OK, removo um bloco
Para colar as contrafaixas, geralmente uso pe-
6 N.E. Traduzido de clamping block, normalmente, um quenos grampos C, mas seguindo o exemplo de
bloco de madeira que encaixa sobre as laterais, com formato Andrew Atkinson, confeccionei alguns grampos
próximo à sua curva, fazendo pressão sobre toda a área
colagem.
como grandes prendedores de roupa, embora eu
não conheça nenhuma evidência histórica do seu

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
24 uso. Tentei usar alguns prendedores de roupa de
estilo cigano, cortados de uma cerca viva, e usei
barbante em vez de metal para evitar que partis-
sem. Como a madeira era verde, rachavam e não
ficavam paralelos para uma boa fixação. Então, no
lugar, cortei algumas peças de ash seco na serra
fita (opa... quis dizer, na serra São José!) e reduzi
a espessura dos lados até que tivessem uma boa
flexibilidade. Ficaram mais rápidos para usar do
que os grampos C e tão eficientes quanto [Fig. 5].

Tampo e fundo
Fig. 3 - As laterais de um violino Andrea Guarneri, mos- Desde a escola, continuei a fazer contorno e filetes
trando o quão fora do esquadro podem ser nos instrumentos de tampo e fundo antes da bombatura, usando-os
clássicos e o porquê do contorno do tampo e fundo serem como referência, um método conveniente quando
frequentemente tão diferentes. Foto: o autor. se copia bombaturas, já que você está recriando
tudo o que vê em um instrumento já existente.
No entanto, há muitas evidências de que os filetes
e sguscia 7 eram feitos com o corpo montado, um
método bastante comum entre luthiers de hoje
também, mas um pouco assustador de fazer na
primeira vez.
Até a bombatura, os outros estágios de con-
fecção do tampo e fundo eram os mesmos, exceto
quando cortei o contorno usando minha morsa
Moxon e uma serra São José (sério, eu usei!) com
uma lâmina estreita, o que é muito mais rápido
Fig. 4 - As laterais de um Strad; mais precisas, porém do que usar uma serra de arco8 .
ainda fora do esquadro. Foto: o autor. Nos últimos dez anos, usei exclusivamente plai-
nas scrub para a bombatura9 , seguida de plaini-
nhas e raspilhas. As plainas scrub permitem uma
remoção de madeira rápida e precisa, além da pos-
sibilidade de balancear a espessura do corte com
a dureza da madeira e sua própria força. Outra
vantagem é que com as marcas retas e suaves da
plaina, ao invés dos canais transversais produzidos
pela goiva, a forma da bombatura pode ser vista
em cada estágio. Na maior parte do tempo, você
trabalha ao longo da grã, o que ajuda a juntar os
cortes longitudinais, especialmente se você tende a
confiar em gabaritos de bombatura transversais10 .
Apesar da plaina scrub ser uma ferramenta
muito prática e funcional, como eu descrevi no
The Spirit of Classical Violin Making [11], eu não
conhecia nenhuma evidência de seu uso em um
instrumento original. Como resultado desse ar-
tigo, Hubert de Launay me enviou fotos de longas
marcas de plaina no interior de dois instrumentos,
7 N.E. Novamente, nome dado à concavidade da bomba-

tura próxima à borda, que traduzimos para italiano, por


ser conhecido pelos brasileiros.
8 BVMA Newsletter, set 2020.
9 N.E. Tipo de plaina, em geral, com base reta, lâmina

com bisel bastante convexo e boca mais larga que o conven-


Fig. 5 - Autênticos ou não, grampos de roupa são rápidos cional, possibilitando corte de mais madeira por passada.
10 N.E. Também chamados de moldes das quintas.
de confeccionar e fáceis de usar. Foto: o autor.

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
um baixo Montagnana e um violoncelo Grancino
[Fig. 6], não apenas mostrando que as plainas
meus traçadores (de curva) de nı́vel, raramente
usados, mas, incapaz de encontrá-los, fiz um furo
25
scrub eram usadas na fabricação de instrumentos num pedaço de madeira macia para o lápis e um U
italianos dos séculos XVII e XVIII, mas também (com uma serra apropriada). Além das linhas de
tendendo a refutar a teoria de que o tampo e o contorno usuais, após escavar levemente a concavi-
fundo eram escavados antes de a bombatura ser dade próxima à borda, também usei os traçadores
feita. A plaina scrub é uma ótima ferramenta de nı́vel para marcar uma linha com a mesma
para iniciar a bombatura, mas por causa de sua espessura da borda, denotando onde a bombatura
precisão, continuo utilizando-a por mais tempo teoricamente se tornaria côncava (sguscia).
antes de finalizar o contorno, filetamento e sguscia, Finalmente, quando a bombatura estava quase
quando eu já teria mudado para uma plaininha. concluı́da, trapaceei um pouco e fiz a sguscia até
onde o filete iria por 2 polegadas, apenas para tes-
tar. Embora essas etapas desacelerem o processo
e possam parecer frescura para uma pessoa já
acostumada com uma forma de trabalhar, não fui
tão lento porque minha bombatura “bruta” com
a plaina scrub não ficou tão bruta assim. Quanto
à parte de raspilhar, também fiquei surpreso com
a rapidez do processo, porque a área da sguscia
só precisava de uma raspagem superficial, princi-
palmente à medida que a raspilha continua seu
caminho desde a bombatura.
Com a bombatura completa, percebi que não
havia terminado a espessura da borda [Fig. 7]. Só
precisaram de uma ou duas plainadas em alguns
lugares com a plaininha antes de limar em toda
a volta. Ao fazer isso, notei que, sem ter tentado
fazê-lo, a espessura da borda na cintura (cês) era
meio milı́metro mais grossa do que nos bojos, uma
caracterı́stica de muitos instrumentos clássicos
italianos.

Fig. 6 - O interior do fundo de um violoncelo Gran-


cino, mostrando longas e moderadamente largas marcas de
plaina. Foto: o autor.

Neste violino, primeiro eu confeccionei a bom-


batura um pouco acima da altura final, com silhu-
eta longitudinal de boa aparência e ainda bastante Fig. 7 - A bombatura bem encaminhada. Nesse estágio,
madeira nos flancos. Sem o fundo da sguscia como as quinas estavam vivas devido à plaina. Foto: o autor.
referência, tive que concentrar noutra coisa, e a
parte óbvia era a seção central. Essa parte da
bombatura é, talvez, a mais importante, determi- Escavando
nando a largura central e sua curvatura, assim
Para escavar tampo e fundo, usei minhas ferra-
como o ângulo de caimento em direção à borda.
mentas de corte normais, plainas scrub e plaini-
No entanto, sem a borda, criar o arqueamento foi
nhas, mas evitei usar espessı́metros modernos. Em
como trabalhar vendado, então, por segurança, re-
vez disso, construı́ o que gosto de chamar de um
corri ao máximo de ajuda que pude. Os gabaritos
“perfurador pontudo”11 , usando uma ponta de me-
de bombatura ainda foram úteis, pois é fácil ver
tal que fiz na faculdade, que estava esquecida há
uma lacuna irregular abaixo deles, mesmo quando
décadas numa caixa. Depois de marcar as posições
a borda está ainda grossa, segurando-os cerca de
11 N.E. Chamado por aqui de espessı́metro de batimento.
1,5mm acima da bombatura. Também procurei

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
26 dos tacos superior e inferior, usei o “espessı́metro
de lápis”12 para marcar uma linha onde a peça
tem mesma espessura de onde ficaria o limite da
sguscia. Então, com a peça presa num suporte
de escavação, que segura as extremidades, mas
é vazado no meio, comecei a afiná-la da minha
maneira de sempre: plaina scrub de base longitu-
dinalmente curva, trabalhando no sentido da fibra
em cada extremidade. Usando plaininhas de dife-
rentes tamanhos para trabalhar a espessura, afinei
até cerca de 6mm, antes de retirá-lo do suporte e
fazer os furos [Fig. 8 e Fig. 9].
Em seguida, coloquei-o novamente no suporte
para aplainar mais, removendo a madeira nas
marcas perfuradas, abaixando o perfurador meio Fig. 8 - O espessı́metro de batimento em ação. Foto: o
milı́metro de cada vez e mudando para uma plaini- autor.
nha menor cerca de um milı́metro antes de chegar
na espessura final. Nessa etapa, molhei o tampo
para inchar as marcas perfuradas que, por estarem
amassadas, davam impressão que a madeira es-
tava com sarampo. Depois que afiei a ponta, mal
comprimia a madeira e isto não aconteceu mais. À
medida que o tampo ia chegando à espessura final,
usei o perfurador duas vezes na mesma espessura
e fui mais cuidadoso no uso das plaininhas.
Com a espessura uniforme pelo que pude ver,
raspilhei para remover as marcas de plaina, como
se estivesse terminando a parte interna. No Museo
del Violino em Cremona há três estilos diferentes
de espessı́metro, embora, devido a inadequações
de catalogação – e eu suspeito também duma Fig. 9 - Marcas da plaina scrub e buracos amassados de
falta de ensino em relação às ferramentas – não ponta cega. Foto: o autor.
está claro se elas vieram de um fabricante do
perı́odo clássico ou do século XIX. Decidi forjar
os espessı́metros dentro das minhas capacidades,
que funcionam como uma tesoura, junto de uma
cunha de madeira marcada com espessuras ao
longo do comprimento. Uma das extremidades
destes espessı́metros é pressionada suavemente no
tampo ou fundo e, então, a cunha é inserida na
extremidade mais distante (mantida ao redor do
tampo) até que começa a se prender, como num
calibrador de folga [Fig. 10].
Os espessı́metros revelaram uma ligeira irregu-
laridade no tampo, então, raspilhei as áreas mais
grossas e repeti o processo mais uma vez. Satis-
feito com a espessura, peguei meus espessı́metros Fig. 10 - Medindo a espessura do tampo com o espessı́metro
modernos e descobri que o tampo estava uniforme tipo “tesoura” a longa cunha de faia. Foto: o autor.
com uma variação de 0,2 mm. Preciso o suficiente,
na minha opinião, e suspeito que seja melhor para
o som do que uma espessura mais uniforme. Deci-
dir a espessura final, no entanto, foi mais difı́cil
do que o normal porque estou acostumado a flexi-
onar a peça, bater para ouvir a vibração e, porque
12 N.E. Riscador ou traçador de curva de nı́vel.

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
conheço a densidade, pesá-la. Mas com contor-
nos mais grossos, todos esses pontos de referência
dades. Depois, trabalhei gradualmente para fora,
afinando mais à medida que avançava.
27
eram diferentes, fazendo-me perceber o quanto Poucos meses depois de construir o del Gesù,
tendemos a construir uma sensação ligada à nossa voltei a usar o mesmo método para a viola (aquela
maneira usual de trabalhar. da lateral inferior em duas partes). Assim como
Escavar o fundo foi um pouco diferente. Pri- no violino, escavei um suporte para acomodar en-
meiro, fiz um furo no meio do fundo com um arco quanto era filetada e entalhada, mas sem pensar
de pua e uma broca que modifiquei: limei a rosca nisso, comecei a usá-la para segurar a peça en-
da broca (verruma, que tem a função de puxar quanto escavava. Isso funcionou bem até quando
a madeira), então, ela virou apenas uma ponta quis usar meus espessı́metros tipo “tesoura”: sem
cônica saliente 5,5mm além do inı́cio da parte o suporte, para tirar a peça, eu precisava de uma
cortante de maior diâmetro. Em seguida, perfu- terceira mão – uma para segurar o suporte, outra
rei apenas até que a ponta aparecesse na parte para segurar os espessı́metros e a terceira para a
externa do fundo, usando uma raspilha de aço cunha de medição. Então, me ocorreu que também
na parte externa para evitar que a broca fosse poderia usar o espessı́metro de batimento no fundo.
longe demais [12]. A vantagem deste furo ventral Por algum motivo, presumi que fosse adequado
tornou-se imediatamente perceptı́vel quando es- apenas para o tampo, que é mais macio, mas re-
cavei o fundo, porque, ao usar a plaina scrub ao corri à Sacconi, que menciona marcas no interior
longo da fibra da madeira, sua base curva combi- de ambas as peças (tampo e fundo).
nada com os três pontos fixos do furo e as duas Enquanto entalhava o fundo da viola no su-
áreas dos tacos, permitem a remoção rápida e porte, descobri que precisava prender ambas as
despreocupada da madeira, sem medo de retirar extremidades da peça com um grampo, o que me
muito material [Fig. 11]. Se eu tivesse escavado lembrou da representação das ferramentas de um
a madeira com uma goiva perpendicularmente às luthier na Encyclopédie de Diderot (1751) que
fibras, o furo ventral teria sido muito menos útil, mostra um suporte com um parafuso vertical fi-
fornecendo apenas orientação no centro da peça. xado em cada extremidade, com uma porca de
Posteriormente, limei a ponta da broca para um madeira para segurar a peça [Fig. 12]. No entanto,
cone mais estreito, facilitando furar a madeira este suporte também tem um espaço embaixo, su-
e furar enquanto o fundo é mantido no suporte portando os bojos ao redor do ponto mais largo,
de escavação; assim, à medida que chego perto permitindo que os espessı́metros alcancem por
da profundidade correta, posso procurar sentir a baixo todas as áreas.
ponta a cada meia volta do arco de pua.

Fig. 11 - A plaina scrub de base curva que eu uso para


escavar, e os restos do furo ventral. Foto: o autor.

Com o uso ocasional do meu espessı́metro de


“dedo e polegar”, o fundo foi rapidamente redu-
zido a uma espessura razoavelmente uniforme de
cerca de 6mm. Então, afinei a peça inteira para
um pouco além da espessura final do centro, me-
dindo com os espessı́metros do tipo “tesoura”,
sendo mais preciso no meio do que nas extremi- Fig. 12 - “Luteria, conjunto de ferramentas para feitura

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
28 de instrumentos a arco”. Placa XIII. Fonte original: [13]. outras assimetrias [Fig. 13].

As éfes
Para marcação das éfes, novamente, recorri às
informações parciais de Sacconi e marquei, no
interior do tampo, a posição mais externa dos
olhos inferiores a partir da borda. Para posição
dos olhos superiores, para garantir um espaço
suficiente entre eles, medi a partir da linha de
centro e, em seguida, tracei um arco a partir dos
orifı́cios inferiores para cruzar essa linha.
Normalmente, uso um cortador de éfes com
“orifı́cio piloto”, mas isso parecia muito compli-
cado para o século XVII; um pino pontiagudo
parecia mais provável, junto com uma lâmina fixa Fig. 13 - Goste delas ou não, provavelmente a parte de
para cortar o olho ou algum tipo de aparato di- menor sucesso deste violino: as éfes quase finalizadas, o olho
visor que pudesse ser ajustado para orifı́cios de superior direito notavelmente mais baixo que o esquerdo.
tamanhos diferentes. Tentei também outra broca Foto: o autor.
modificada, desta vez deixando apenas uma quina,
para cortar a circunferência, e o pino central, sem A razão pela qual os olhos não estão nivelados
roscas. Embora funcionasse, poderia ser melho- é porque usei as bordas como ponto de referência
rada. Com os olhos furados, usei uma combinação para os olhos inferiores que, por sua vez, referenci-
de gabaritos de éfes que eu já tinha para marcar a aram a posição dos olhos superiores. Pode ter sido
seção central. Como as éfes no instrumento origi- assim que Strad fez, mas seus contornos eram mais
nal eram muito diferentes uma da outra, eu tinha simétricos do que os de del Gesù, portanto, suas
um gabarito para cada furo, mas neste caso usei éfes também eram. Para este instrumento, não
a metade superior de uma e a metade inferior da quis calcular a geometria subjacente do contorno
outra e o contrário no outro furo, para juntar os e fiz um gabarito inteiro, copiando as excentrici-
olhos da maneira descrita por Roger Hargrave no dades do original, de modo que os olhos inferiores,
livro del Gesù. inevitavelmente, não eram equidistantes da linha
Para cortar os trechos centrais, ao contrário de centro, motivo pelo qual os olhos superiores não
de como fui ensinado, geralmente e primeiro, re- ficarem nivelados. Se tivesse passado um tempo
corto a palheta inferior próxima ao olho inferior. tentando prevenir quaisquer possı́veis problemas,
Em seguida, prossigo para a borda externa da éfe, isso poderia não ter acontecido. Por outro lado,
de modo que a palheta inferior (mais vulnerável) não teria que desenvolver minhas próprias éfes no
seja apoiada até que a serra tenha passado por estilo del Gesù neste instrumento.
ela. Prossigo pela borda interna e, finalmente, Em posterior conversa sobre este violino, Marc
corto a palheta superior. Eu faço desta forma Soubeyran mencionou um colega que havia apon-
para aumentar a velocidade e minimizar a flexão tado vestı́gios de um arco traçado nas palhetas
do tampo enquanto serro. Mas ao cortar a pri- superiores de vários del Gesù na grande exposição
meira dessas éfes, percebi o quanto a palheta é em Nova York, indicando que ele marcou suas éfes
forte, enquanto não tem a sguscia. Então, para do lado de fora, em variação à prática de Stradi-
a segunda éfe, voltei ao modo como fui ensinado vari. Porém, porque ainda usava um compasso a
e cortei primeiro a borda interna. Isso me faz partir do centro do olho inferior, talvez, ele po-
pensar o quanto serrar “por dentro primeiro”seria sicionava os olhos inferiores a partir da linha de
uma daquelas práticas históricas que perduraram centro em vez da borda.
ao longo dos anos, apesar de ser mais seguro e
rápido fazer primeiro o lado de fora, quando já
feita a sguscia na palheta. Talvez vestı́gio de uma Definindo as bordas
época em que “escavar (o tampo) antes de fazer Para arredondar a parte inferior das bordas, usei
a sguscia” era a norma. Embora tenha ficado uma plaininha, criando um chanfro, exceto nas
feliz de maneira geral, um dos olhos superiores seções côncavas, onde usei uma faca. Em seguida,
ficou mais alto que o outro, o que não é uma ca- fui direto para a cavalinha, que normalmente uso
racterı́stica do del Gesù, embora fossem comuns para fazer o acabamento da superfı́cie das peças,

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
mas não para o trabalho nas bordas. Usar um
pedaço inteiro enrolado em uma alma funcionou
29
bem para o fundo, entretanto, como esperado,
afunda demais na textura macia do tampo. É aqui
que as limas se destacam por funcionarem bem
nas grãs duras e macias, ainda que hastes meio
secas de cavalinha coladas em um palito funcionem
muito bem (não tão rapidamente quanto uma lixa).
Desconfio um pouco da teoria de “sempre use uma
ferramenta para a borda”em vez de uma lima, pois
as bordas e os chanfros de muitos instrumentos Fig. 14 - O violino preso em um pedaço de salgueiro
clássicos são limpos demais para saı́rem direto de escavado, pronto para a filetagem. Foto: o autor.
uma faca. E se os relojoeiros usavam limas há
algumas centenas de anos, por que os construtores
de instrumentos não usariam também?
Para montar o corpo, usei pregos, localizando
os blocos superior e inferior, que usei anterior-
mente para desenhar os contornos no tampo e no
fundo. Como a sguscia da borda não estava feita,
a parte superior dos pregos não precisava nivelar
à superfı́cie, nem o fundo precisava de blocos de
fixação, embora eu os usasse no tampo, por ser
mais macio. Meus grampos para fechar o corpo
ainda são os de anos atrás, uma versão refinada
de cilindros de algodão em uma haste de latão,
muito parecidos com as ilustrações de Diderot.
Talvez não tão bonitos quanto os modernos de
plástico, são bastante adequados, embora, toda
vez que eu os use, um ou dois caiam enquanto faço
a colagem. Nesse instrumento ainda sem sguscia,
todos permaneceram no lugar.

Filetagem
Para segurar o instrumento enquanto ele estava
sendo filetado e entalhado, fiz um suporte de sal-
gueiro, vazado para permitir que a bombatura Fig. 15 - Cortando primeiro a linha interna do filete para
ficasse dentro da cavidade [Fig. 14]. Há um exem- minimizar o risco da borda se partir. Com o corpo firme-
plo disso no museu de Cremona, embora tenha mente preso, auxilio a ferramenta com os dedos da minha
adicionado quatro apoios nos parafusos para im- mão esquerda e uso a força da mão e braço direitos para
pedir que a peça se mova. Fiz a filetagem da mover a ferramenta e cortar o canal. Foto: o autor.
minha maneira usual, usando um filetador com
uma única lâmina e limitador de profundidade,
que tem design diferente do exemplo no museu de
Cremona, mas mesma funcionalidade [Fig. 15].
Exceto pelo fato de que o corpo já estava mon-
tado, a sguscia foi feita como de costume. Pri-
meiro, com uma goiva de meia polegada, percorro
a borda até o filete, o que cria uma canaleta muito
boa para trabalhar e evita que a madeira seja
arrancada [Fig. 16].
Depois, trabalho um pouco com uma plaini-
nha, principalmente, para poder usar a mesma
goiva mais tarde, na profundidade final, sem que
a borda interna da goiva fique escondida na ma-
deira. Em seguida, passo uma goiva mais curva Fig. 16 - A primeira goivada em volta do interior dos filetes.
Foto: o autor.

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
30 do lado de fora do filete, mas não até a profun-
didade final. Em seguida, passo-a sobre o filete
teriam feito dessa maneira. No entanto, isso pro-
porcionou outra chance de refinar as espessuras,
até a profundidade final antes de harmonizar a es- raspilhando o lado externo. Depois de tocar e
cavação. Normalmente, eu uso meu espessı́metro empurrar o tampo e o fundo com os polegares
de relógio para medir a parte mais profunda da para avaliar a flexibilidade, entretanto, nenhum
sguscia, pois isso é importante não apenas para o afinamento parecia ser necessário, uma oportuni-
aspecto visual, mas também para tornar as bordas dade perdida de aprendizado, talvez, mas eu não
da bombatura flexı́veis o suficiente. Impossibili- quis deixar o instrumento fino demais em nome
tado de usá-los, verifiquei com a ponta do meu da ciência.
espessı́metro analógico para medir a profundidade Se você leu até aqui, perceberá que esta não é
da sguscia antes das bordas, mas eu poderia ter uma teoria consistente sobre a construção de ins-
usado um gabarito em forma de L se quisesse. trumentos clássicos, nem o trabalho é inteiramente
No del Gesù original, a bombatura não se ali- meu, e sou grato aos outros construtores, incluindo
nha bem com a parte inferior da borda; como Marc aqueles já mencionados por suas observações e
Soubeyran disse poeticamente: “a bombatura ape- ideias. Com a escassez de boas informações so-
nas flutua acima da borda”, o que foi uma das bre ferramentas e métodos, também estou ciente
atrações para usar este modelo, caso eu não tenha de que presumi algum grau de comunalidade no
entendido errado! No entanto, consegui alinhar a método, embora fabricantes da mesma cidade e do
borda e a bombatura melhor do que del Gesù (em- mesmo perı́odo, sem dúvida, tivessem maneiras
bora eu admita que ele tem vantagem em outros diferentes de trabalhar.
aspectos), antes de usar a goiva mais curva sobre
os filetes. Neste instrumento, como no trabalho
de seu irmão, a borda para fora dos filetes é muito
estreita, então, às vezes eu uso a mesma goiva
que uso no olho da voluta. Nas pontas, a borda
fica como um vale profundo, resultado facilmente
obtido graças ao exemplo de Kai Thomas Roth,
ao usar esta mesma goiva vindo da cintura até a
ponta (e depois do bojo até a ponta), virando-a
em ângulo reto no último minuto e quase fincando
ela no final do filete.

Voluta
Ao contrário do corpo do violino, eu não tinha
Fig. 17 - Cavalinha sob uma alma. Foto: o autor.
boas ideias para a voluta; usei uma plaina na caixa
de cravelhas ainda reta e cortei-a antes de cortar
grande parte da voluta, mas não percebi nenhuma
vantagem em fazer isso. Para nivelar o entalhe do
dorso ao redor da voluta, onde as superfı́cies con-
vexas são difı́ceis de goivar uniformemente, tentei
usar cavalinha enrolada em uma alma novamente
[Fig. 17].
Trabalhar assim gera arranhões tı́picos da cava-
linha, que podem ser facilmente raspilhados depois.
Usei uma plaininha, em vez de uma lima ou faca,
para a maior parte do chanfro, que funcionou bem
o suficiente nesta madeira lisa e rapidamente pro-
duziu um chanfro robusto e ligeiramente irregular,
adequado para o del Gesù, exigindo apenas um
Fig. 18 - A voluta bruta, os chanfros como foram deixados
pequeno ajuste aqui e ali [Fig. 18].
pela plaininha e estrias longitudinais no entalhe deixadas
Assim que o instrumento ficou pronto, ajustei
pela cavalinha. Foto: o autor.
ele em branco. Geralmente, sou cético quanto a
fazer isso porque parte do trabalho precisa ser
repetido, ou pelo menos limpo umas duas vezes, e Da mesma forma, fontes como Diderot, em
tenho minhas dúvidas se os construtores clássicos Paris, e as ferramentas do museu de Cremona

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
são úteis, mas também devemos ser cautelosos ao O corpo editorial da BVMA gentilmente encami-
igualar gravuras das técnicas francesas do século nhou o texto original para nossa equipe. Mantendo
XVIII com o que podem ser ferramentas italianas
do século XIX, e com as técnicas italianas dos
a parceria da edição passada, fizemos a tradução,
revisamos e publicamos o texto muito próximo do
31
séculos XVII e XVIII. original – todo o conteúdo está sob licença CC-BY-
As melhores pistas para técnicas originais, mui- NC-ND. Agradecemos a William Castle, o autor,
tas vezes, vêm dos próprios instrumentos e, a esse que concordou com a tradução e publicação em
respeito, é uma pena que o trabalho dos fabrican- português; a Renato Carrano pela intermediação
tes menos exigentes, com a possı́vel exceção de e por Emma Hardy pelo profissionalismo e ori-
del Gesù, não tenham sido estudados, catalogados entações valiosas para edição das fotos. Que fique
e discutidos tanto quanto o onipresente Antonio. registrado o agradecimento à Pollyana Vincenzi
Caso tivessem sido, poderı́amos ter uma melhor (luthière) pela tradução.
compreensão dos métodos tradicionais e talvez
ter desenvolvido uma abordagem mais diversa e
menos intimidada na construção contemporânea William Castle Ao se qualifi-
de violinos. Se meu experimento é algo que pode car em 1982 na Newark School of Vio-
ser seguido, uma atitude livre e despreocupada, lin Making, mudou-se para o norte da
usando experiência e intuição em vez de pensar Alemanha para ingressar na oficina Gei-
demais, ele oferece, no mı́nimo, alguns insights genbau Machold, em Bremen. Lá, ele
interessantes. aprendeu as melhores técnicas de encai-
Se minhas observações e possı́veis conclusões xes, ajustes tonais e restauração, e teve
resistirão ao exame minucioso e à experiência a oportunidade de trabalhar e estudar
de outras pessoas é outra questão, então, aceito muitos dos instrumentos clássicos italia-
comentários, sejam aqueles que reforçam, am- nos que passaram pelo ateliê. Em 1985,
pliam ou contradizem qualquer uma das minhas voltou para a Inglaterra e se estabeleceu
sugestões, porque como o tı́tulo indica, ainda é em York, onde trabalhou como restau-
um trabalho em processo. rador e construtor, mas desde que se
mudou para Shropshire em 1996, se con-
Este artigo foi originalmente publicado na centra exclusivamente na construção de
BVMA Newsletter, n. 102, jun. 2021 [14]. novos instrumentos.

Seja também um membro da


British Violin Making Association
bvma.org.uk/membershipoptions

Torne-se membro da BVMA e receba acesso a conteúdos produzidos por profissionais de alto nı́vel. Artigos completos,
informações sobre cursos e muito mais. Foto: BVMA CC-BY-NC-ND [14]

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
Veja mais
32 Referências e conteúdos relacionados

Luteria ı́talo-brasileira: Violinos e outras histórias


traços do passado Bogdan Skorupa Ribeiro dos Santos
Thiago Corrêa de Freitas
Marcos Schmitz
Ivan Guimarães
[5] Artigo em revista: Café com
[1] Cartaz-propaganda pela imi- Luteria
gração italiana Saulo DANTAS-BARRETO. Quando a moder-
Siderópolis. Site. 129 anos de colonização ita- nidade destrói o futuro. Café com Luteria,
liana. Acesso em: 04 set. 2021. n. 4, p. 10-13, mar. 2020. Disponı́vel em:
Este cartaz pode ser encontrado em diversas cafecomluteria.com/...4. Acesso em: 20 set.
fontes, incluindo acervos de museus nos es- 2021.
tados do Sul e Sudeste, exemplo do Site da
Prefeitura de Siderópolis (link acima) e do Ar- [6] Fotos: Acervo
quivo Histórico Municipal de Bento Gonçalves. Renato CALLEGARI. Fotos. Fotografias do
acervo pessoal de Ivan Guimarães e Marcos
[2] Artigo: Os Irmãos Pascoli Schmitz. 2017.
(inglês)
[7] Artigo em revista: Luis Bellini
Maria da G. L. VENCESLAU; Rafael SANDO.
The Pascoli Brothers: Violin making and im- Bogdan S. R. dos SANTOS; Leonardo COE-
migration in 20th-century Brazil. Journal of LHO. Do Brasil para o mundo: Luiz Bellini.
Violin Society of America, v. 28, n. 1, p. Café com Luteria, n. 4, p. 6-9. Disponı́vel
74–93, 2019. Disponı́vel em: vsapapers.org. em: cafecomluteria.com/...4. Acesso em: 21
Acesso em: 20 set. 2021. set. 2021.

[3] Sobre a Sociedade Brasileira [8] Artigo em jornal: Jonas Caldas


Eubiose Mauro VENTURA. Dois sucos e a conta com
Sociedade Brasileira Eubiose. Site. Disponı́vel Jonas Caldas. O Globo (Rio), abr. 2016. Dis-
em: www.eubiose.org.br. Acesso em: 10 set. ponı́vel em: oglobo.globo.com/rio.
2021.
[9] Entrevista: Rodolfo Bettio
[4] Artigo em revista: luteria ı́talo- Bogdan S. R. dos SANTOS; Rodolfo BET-
brasileira (inglês) TIO. Live 24: O princı́pio da manuali-
Marcos SCHMITZ; Ivan GUIMARÃES. Fo- dade, com Rofolfo Bettio. Entrevista gra-
otsteps of The Past (Brazilian Makers). The vada em áudio e vı́deo. Instagram. insta-
Strad, v. 128, n. 1531, p. 50-57, nov. 2017. gram.com/tv/cafecomluteria.

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
33

[10] Artigo em jornal: Brasiliano [14] Artigo revista:


Leonardo COELHO. Instrumento criado Trabalho em processo
para homenagear a construção de Brası́lia William CASTLE. Work in Progress. News-
faz 55 anos. Artigo em jornal. Cor- letter BVMA, n. 102. jun. 2021.
reio Brasiliense. abr. 2013. Disponı́vel em:
correiobraziliense.com.br/app/noticia/diversao- [15] Site: Comitê da BVMA
e-arte. Acesso em: 21 set. 2021.
Também disponı́vel no blog pessoal de Leonardo BRITISH VIOLIN MAKER ASSOCIATION.
Coelho: luteratura.wordpress.com/tag/guido- Conheça o Comitê: O comitê administrativo
pascoli envolve dez membros que, excluindo adminis-
trador e editor da BVMA Newsletter, são volun-
tários para conduzir as atividades da Asso-
Trabalho em processo ciação. Disponı́vel em: bvma.org.uk/meet-the-
William Castle committee

[11] Artigo blog:


O espı́rito clássico da construção
italiana de violinos
William CASTLE. The Spirit of Classical Ita-
lian Violin Makink. Site (Blog). Disponı́vel
em: williamcastle.co.uk/the-spirit-of-classical-
italian-violin-making

[12] Artigo em site:


Mais detalhes sobre o furo ventral
(Figura 15, p. 39)
O artigo traz detalhes históricos sobre a
métodos de construção do passado, dentre eles,
o furo ventral mencionado, feito com o arco de
pua.
Roger HARGRAVE. The Working Methods of
Guarneri del Gesù and their Influence upon
his Stylistic Development. 2008. Disponı́vel
em: roger-hargrave.de

[13] Enciclopédia: Diderot et


d’Alembert
L’Encyclopédie. [2], Lutherie [Texte imprimé]
: [recueil de planches sur les sciences, les arts
libéraux et les arts méchaniques] / Diderot et
d’Alembert. Disponı́vel em: catalogue.bnf.fr

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
Extras
34 Informações selecionadas sobre luteria

British Violin Making poderia se chamar descaso: a Cinemateca Brasi-


leira foi parcialmente queimada no dia 29 de julho
Association de 2021. O Ministério Público já havia processado
A BVMA convida profissionais e amantes da cons- a União por abandono um ano antes e diversos
trução do violino a associarem-se. A Associação, laudos apontavam risco de incêndio iminente.
desde sua criação em 1995, promove a parceria O documentário Fênix: O Voo de Davi, mostra
e contato entre interessados na história e na fei- a construção de instrumentos com madeiras dos
tura de violinos. Podem se associar pessoas de escombros do Museu por Davi Lopes (bombeiro que
todas as partes do globo, que desfrutam da revista ajudou no combate ao fogo que também trabalha
com quatro números anuais, acesso a eventos e como luthier - aprendeu com Regis Bonilha e Lu-
conferências e a oportunidade de expor no evento ciano Borges). Foram feitos um cavaquinho, um
Makers’s Day, que ocorre anualmente. bandolim, um violino e dois violões, ao que foram
convidados 5 músicos para participar do projeto e
documentário, de diferentes estilos musicais (pop,
Seja Membro
choro, samba, clássico e da chamada MPB, em or-
dem): Paulinho Moska, Paulinho da Viola e Nilze
bvma.wildapricot.org/join-us Carvalho, Hamilton de Holanda, Felipe Prazeres,
e Gilberto Gil. Davi tinha uma forte relação com o
Museu e espera contribuir, um pouco que seja, para
Livros e Publicações reconstruir uma memória depois da destruição.

Fênix: O voo de Davi. Documentário set. 2021


www.bvma.org.uk/shop (1h 14min). Direção: Joao Rocha, Roberta Sa-
lomone, Vinı́cius Dônola. Roteiro Joao Rocha,
Roberta Salomone.
Documentário depois da des-
truição do Museu Nacional Orabutã Fine Violins
Por Bogdan Skorupa
Por Moisés Nesi
Aproveitamos esta recomendação também para
A Orabutã é um projeto de promoção da luteria
falar de dois acontecimento que, ainda que não
brasileira. Oferecemos serviços de consultoria para
tenham relação direta com luteria, são motivo de
músicos em busca do que há de melhor no mercado
atenção para como cuidamos da memória de nossa
nacional de instrumentos de cordas. Contamos
cultura.
com a participação de luthiers com história fide-
O Museu Nacional no Rio de Janeiro sofreu um
digna e instrumentos com proveniência conhecida,
incêndio que o destruiu quase completamente (e,
que oferecemos aos músicos interessados. Entre
aproximadamente, 18,5 milhões dos 20 milhões de
em contato para conhecer nossos critérios de com-
itens de seu acervo foram perdidos). Uma perda
pra e venda e profissionais envolvidos.
muito maior do que aquele incêndio que atingiu
a Catedral de Notre-Dame, e isto não somente se Orabutã Fine Violins
contarmos a proporção de destruição, mas também
da importância para a história brasileira e mun-
dial! Sim, haviam itens de valor inestimável. O Luteria - UFPR
Museu foi vı́tima da falta de manutenção. Até
onde se sabe, o incêndio começou depois de um Retomada das aulas de construção presenciais.
curto circuito, que causou sobreaquecimento de O Curso Superior de Tecnologia em Luteria
um ar-condicionado. Se não bastasse, é preciso da UFPR retornou às atividades laboratoriais de
registrar outro resultado da falta de manutenção maneira presencial neste dia 20 de setembro. Alu-
pelos nossos acervos, superando o absurdo do que nos que iniciaram os estudos em 2020 tiveram

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
as atividades suspensas desde março devido ao
contexto da pandemia. Com a retomada, tanto
orquestracriancacidada.org.br/escola
Link para inscrição:
35
veteranos já deram continuidade em seus proje- orquestracriancacidada.org.br/escola/inscrevase
tos para construı́rem violões, guitarras, baixos e
violinos, quanto os calouros poderão finalmente Resultado Concurso Astor Pi-
iniciar seu aprendizado na prática sobre o cava-
quinho. Estão sendo ofertadas as disciplinas de azzolla
Construção e Entalhe do 1o ao 5o perı́odo, Res- Concurso premiou jovens luthiers e começa a cons-
tauração, Eletrônica, Vernizes e Acústica no Setor truir acervo para empréstimo a estudantes de música.
de Educação Profissional e Tecnológica. Instrumentos premiados no concurso:
Violino de Josielly Fomin, com tampo em
abeto, fundo, laterais e braço em Grumixava,
antiquizado.
Violão de Adriano Gisteira, tampo em abeto,
fundo e laterais em madeira brasileira, braço
em cedro-rosa, com escala elevada.
Violão de Fernando Rodrigues, tampo em
abeto, fundo e laterais em madeira brasileira,
braço em cedro-rosa.
Participou do concurso também outro violino
feito por Milena Corrêa, de João Neiva (Espı́rito
Santo), que ficou em segundo lugar.
instagram.com/optimus.cwb
optimus.art.br
(Edital para empréstimo dos instrumentos)

Os organistas da Colônia I
O revisor e seu orientado Matheus dos Santos
publicaram a primeira parte do artigo sobre os or-
ganistas que influenciaram a instalação de órgãos
nas igrejas das antigas colônias polonesas da região
de Curitiba. Nessa primeira parte foram levan-
luteria.ufpr.br
tados os nomes dos músicos que atuaram como
organistas nas igrejas dessas colônias.
Curso de luteria no Recife
Boletim Tak 20
O projeto Orquestra Criança Cidadã está funci-
onando a todo vapor no Recife, com a Escola de
Formação de Luthier e Archethier. O projeto
começou em 2012 e passou a ser coordenado por
Carlos Alberto em 2016, oferecendo aulas de manu-
tenção e construção de violinos e arcos. Em 2021,
novo prédio foi inaugurado com capacidade para
até 50 estudantes. Entretanto, desde o ano pas-
sado, as turmas são reduzidas a 10 participantes
por turno, por razão da pandemia. Os estudantes
passam por orientações individuais e coletivas, e
tem seu crescimento supervisionado pelo profes-
sor, visando a educação de jovens por meio da
luteria. Os interessados podem se inscrever para
a seleção que ocorre semestralmente (veja abaixo)
ou à abertura de novas vagas.

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
36 Leituras Ivan Guimarães recomenda...
Marcos Schmitz recomenda... Aqui estão algumas sugestões de literatura sobre
luteria, inclusive, fontes para consulta:
Para quem se interessa por construção de violinos,
o seguinte livro é minha primeira recomendação.
Além dele, minha segunda recomendação é um
livro mais recente, de 2013, um verdadeiro tratado
sobre o violino.

Cyril WOODCOCK.
Dictionary of Contem-
Chris JOHNSON; Roy porary Violin and Bow
COURTNALL. The Makers. Amati. 1 ed.
Art of Violin Making. 1965.
1 ed. 1999.

David SHOENBAUM.
The Violin: The William H. Hill.
social history of the Antônio Stradivari:
world’s most versatile Sua vida e seu trabalho
instrument. 1 ed. (1644-1737). Cabral. 1
2013. ed. Português. 2004.

No meu ponto de vista, com o conhecimento Luigi LANARO. La


histórico abordado nesses 2 livros, mais os 3 livros Liuteria Classica e
que recomendei na edição passada da Café com Il Liutaio Moderno.
Luteria (2 da Casa Hill, 1 de Franz Farga) e uma Zanibon. 2017.
tabela de medidas, qualquer pessoa estará bem
embasada na área. Claro que todos os outros livros
de referências, fotos e técnicas, só vão agregar mais
conhecimento.

O primeiro, é um ótimo dicionário, que inclui


alguns dos brasileiros citados neste número da
revista: Bellini, Martinenghi (ı́talo-brasileiro) e
os dois irmãos Pascoli. O segundo livro é uma
tradução daquele feito pela famı́lia Hill e interes-
sante não somente sobre Antônio Stradivari, mas
sobre o que acontecia na época, explicando acon-
tecimentos em torno da produção de cada um dos
violinos que os Hill tiveram em mãos. Também
conta histórias sobre os parceiros de Amati e Strad
(o sumário da contracapa é de autoria de Ivan).
Por último, um ótimo livro com dicas sobre cons-
trução de violinos, incluindo informações sobre
fı́sica e tecnologia da madeira

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
Renato Carrano recomenda... livro de Bagatella, no qual pude utilizar algumas
informações (especialmente as que consegui com-
37
Ótimo livro com fotografias em alta qualidade de
preender, junto da aula com Pabst) para fazer o
instrumentos da famı́lia Amati, em ângulos dife-
desenho de violinos efetivamente. É um empenho
rentes das fotos frontais de tampo e fundo, que
interessante para quem quiser entender o porquê
tornam o livro ainda mais interessante.
das coisas estarem onde estão no violino, lado a
lado aos trabalhos de François Denis.
Il DNA degli Amati:
Una dinastia di liutai Antonio BAGATELLA.
a Cremona (italiano e Regole per la costru-
inglês). Consorzio Liu- zione de’ violini vi-
tai Antonio Stradivari ole, violoncelli e vio-
Cremona. 2006. 224 p. lini; memoria presen-
tata all’. Accademia
di scienze, lettere ed
arti di Padova al con-
Conta um pouco da história da famı́lia Amati, corso del premio dell’
suas gerações e como influenciaram a construção arti dell’ anno MDC-
de violino como vemos hoje. Discute caracterı́sticas CLXXXII. Pádua, A.
especificas do estilo Amati. Além disso, trás fotos spese dell’ Academia.
dos instrumentos da exposição de 2006, organizada 1786. Disponı́vel em:
em Cremona pelo Ente Triennale Internazionale loc.gov/resource
degli Strumenti ad Arco, tendo nomes de peso na
comissão curadora e cientı́fica como Charles Beare
e Carlo Chiesa. Ao final do livro, pode-se apreciar Tem alguma informação que acha rele-
uma tabela comparativa de medidas de referência vante aparecer aqui? Entre em contato .
dos instrumentos da exposição. Confira as instruções para escrever seu
texto.
Andrea Spada recomenda...
Um livro essencial para investigações históricas,
possui diversos conceitos interessantes e que po-
dem ser inéditos para muitos. Certamente, o tra-
balho de Dipper foi aprofundado e construı́do sobre
uma pesquisa histórica bastante consistente.

Andrew DIPPER. Li-


brem Segreti de Bvt-
tegha: A Book of
Workshop Secrets: The
violin and its fabrica-
tion, in Italy, circa
1725-1790. Minneapo-
lis, Dipper Press. 2013.

Bogdan Skorupa recomenda...


Em julho deste ano participei de um workshop vir-
tual com Christian Pabst, no qual apresentou o
método pelo desenho de violino de Antonio Baga-
tella. Sim, foi uma oportunidade em tanto onde
acompanhamos o desenho do começo ao fim! De-
pois disto, resolvi empenhar todo meu italiano no

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
Colaboradores
Que participaram junto à Café com Luteria
38 desde a última edição

A atuação (ao lado da foto) descreve a atividade prin- Bogdan Skorupa


cipal e a famı́lia com que mais trabalha:
Obs. 1: violino se refere à famı́lia, podendo envolver
violino, viola, violoncelo e/ou contrabaixo, assim como
serviços em arcos.
Obs. 2: violão se refere à famı́lia, podendo envolver
violões nylon, aço e/ou variações de modelos, assim como
cavaquinho e/ou ukulele. Construção/restauração violino
Obs. 3: dedilhados engloba famı́lia do violão, bandolim
e/ou demais instrumentos acústicos. Curitiba/Ponta Grossa - PR, Brasil
Obs. 4: arco se refere ao trabalho exclusivo com arcos
bogdanskorupa@gmail.com
da famı́lia do violino e/ou demais friccionados.
+55 (42) 9 91 31 79 12
@luthierskorupa
Andrea Spada skorupaluthier

British Violin Making Association

Construção/restauração violino

Santa Teresa, Rio de Janeiro - RJ, Brasil Associação de construtores


(Ateliê Liuteria d’Autore)
+55 21 9 87 55 70 70 Londres - Inglaterra
www.liuteriadautore.com @the bvma
/ www.andreaspada.com www.bvma.org.uk
@andrea.spada.liutaio admin@bvma.org.uk
liuteriadautore
liuteriadautore@gmail.com Christiano Mannes

Andreas Hellmann

Construção/restauração violino
João Planincheck 1403, Jaraguá do Sul - SC,
Restauração/construção violino Brasil
+55 (47) 32 75 36 78 (fixo)
Munique - Alemanha
+55 (47) 9 88 06 98 98
(atual trabalho, em empresa de restauração)
Curitiba - PR, Brasil
(trabalho anterior, autônomo) Carlos Alberto Gomes Filho
+49 17 6 86 67 26 44
consertodeviolinos@gmail.com
@luthierandreashellmann
ateliehellmanncuritiba
Prof. de luteria
Recife - PE, Brasil
+55 (81) 9 97 79 81 93
@luthier.carlosalberto

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
Fabio Vanini Marcos Schmitz 39

Construção/restauração violino Construção violino

Rua Gaspar Fernandes 134, São Paulo - SP, São Paulo - SP, Brasil
Brasil mschmitzviolino@gmail.com
+55 (11) 22 19 01 71 (fixo) @schmitzm
+55 (11) 9 88 91 06 02
@fabiovanini76 Pedro Fioramonte
fabio.vanini.330

Gedson Bravim Frade

Construção violino

Mittenwald - Alemanha
+49 16 28 81 62 10
Construção violino pedroazf@hotmail.com
@fioramonte violin
São João del-Rei - MG, Brasil
+55 (32) 9 91 67 81 55 Pollyanna Hartmann Vincenzi
gfrade2@hotmail.com
@gedsonbravim
gedson.frade

Igor M. Fomin Construção/manutenção violão

Curitiba - PR, Brasil


+55 (41) 9 96 82 64 96
pollyannax@gmail.com
Construção/restauração arco @polly.vincenzi

Prof. de Luteria Renato Carrano


(Universidade Federal do Paraná)
Curitiba - PR, Brasil
fomin@ufpr.br

Ivan Guimarães R. Oliveira Construção/restauração violino

Junior Restorer (Stringers of London)


Londres - Inglaterra
Merton College (estudou construção de violino)
Luthier instrumentos de arco +44 073 87 88 60 21
@renatocarrano
Av. Paulista 2073 cj. 223, São Paulo - SP, Brasil renatocarrano@gmail.com
@ateliermusikantiga
musikantiga.com
ateliermusikantiga

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
40 Rogério Fagundes Neto Thales Gonçalves Barros

Construção/restauração violino Construção dedilhados

Heitor Penteado 1049, São Paulo - SP, Brasil Feitura de modelos autorais
luteriafagundes Curitiba - PR, Brasil
Luteria Rogério Fagundes barrosluteria@gmail.com
contato@rogeriofagundes.com.ne @barrosluteria
+55 (11) 9 53 76 55 10
contato@rogeriofagundes.com.ne Thiago Corrêa de Freitas

Rudson Di Cavalcanti

Prof. de acústica/revisor

Construção/restauração violino (Universidade Federal do Paraná)


Curitiba - PR, Brasil
Prof. de luteria tcf@ufpr.br
São Paulo - SP, Brasil @thcfreitas
+55 (11) 9 52 78 56 44
@rudsondicavalcantili
Túlio Lima
rudsondicavalcanti@hotmail.com

Saulo Dantas-Barreto

Construção/restauração violino

Prof. de luteria
Construção violino (Studio Liutai)
Petrópolis - RJ, Brasil
São Paulo - SP, Brasil +55 (24) 9 81 44 58 57
+55 (11) 9 98 93 54 54 @tuliolima.luthier
saulo@dantasbarreto.com.br tuliolima

Tércio Santos Túlio Pires

Prof. violino/Spalla O.S.V./ Luthier Violoncelista/ Prof. de música

Vilhena-RO Orlando Provasi 74, Tatui - SP, Brasil


@tercio dsantos +55 (15) 9 81 64 65 69
violinartbrasil @Tulio Cello
tercio bmx@hotmail.com Tulio Pires

Luteria ı́talo-brasileira, Violinos e outras histórias e Trabalho


em processo.
Edição de Primavera
Vinicius Fachinetti 41

Construção violino

Consultoria de projetos sociais


Prof. de Luteria (Conservatório de Tatuı́)
Professor Genaro De Oliveira 215, Tatuı́ - SP,
Brasil
+55 (15) 9 88 11 31 97
+55 (27) 9 88 07 11 87
@vinicius.fachinetti
viniciusfachinetti@gmail.com

Vlamir Devanei Ramos

Prof. de luteria

(Conservatório de Tatuı́)
R. Humaitá 274, Tatuı́ - SP, Brasil
+55 (15) 9 81 28 25 36

Wilfred Amaral

Construção/manutenção violino

João Pessoa - PB, Brasil


+55 (83) 9 86 62 00 20
wilfredamaral@gmail.com
@wilfred amaral
wilfred.amaral

Café com Luteria No 7, Set/2021


Curitiba, Brasil
——- Estas páginas foram propositalmente deixadas
em branco ——–

Você também pode gostar