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Introdução
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Índice
Introdução ........................................................................................................................................ 3
1. O CONCEITO ............................................................................................................................. 4
1.1. Literatura ................................................................................................................................... 4
1.2. Literatura infantil ...................................................................................................................... 5
1.3. O carácter literário da literatura infantil .................................................................................... 9
1.4. Paraliteratura ........................................................................................................................... 10
2. TIPOLOGIA TEXTUAL ........................................................................................................... 11
2.1.O conto popular........................................................................................................................ 11
2.2. Tipo de Linguagem utilizada .................................................................................................. 12
2.2.1. O Mito .................................................................................................................................. 12
3. NARRATIVAS DA TRADIÇÃO ORAL AFRICANA ............................................................ 13
3.1. Reflexões sobre as narrativas de tradição oral ....................................................................... 14
I. CONTOS AFRICANOS............................................................................................................. 17
TEXTO 1: A terra do Goana era boa que se fartava ...................................................................... 17
Guião de leitura do aluno ............................................................................................................... 19
Texto 2: O coelho e o leão ............................................................................................................. 26
TEXTO 3: A MENINA BONITA ................................................................................................. 27
TEXTO 4: OS DOIS ÓRFÃOS ..................................................................................................... 29
TEXTO 5: OS TRÊS IRMÃOS ..................................................................................................... 31
TEXTO 6: OS FILHOS DA COBRA BONA ............................................................................... 35
CONTOS ORIENTAIS ................................................................................................................. 40
AS MIL E UMA NOITES ............................................................................................................. 40
TEXTO 1: O REI SHARIAR E SEU IRMÃO O REI CHAHZAMAN ........................................ 40
GUIÃO DE LEITURA DO ALUNO ............................................................................................ 44
TEXTO 2: O MERCADOR E O GÊNIO ...................................................................................... 50
TEXTO 3: ALI-BABA E OS QUARENTA LADRÕES .............................................................. 53
Bibliografia .................................................................................................................................... 59
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Introdução
1. O CONCEITO
1.1. Literatura
Por volta da penúltima década do século XVIII, a palavra “literatura” passou a designar o
fenômeno literário em geral, criação estética por meio da palavra, específica categoria intelectual
e específica forma de conhecimento.
- Eis a evolução semântica do vocábulo “literatura” até ao limiar do romantismo.
Tal evolução, porém, não se quedou aí, mas prosseguiu ao longo dos séculos XIX e XX.
Vejamos, em rápido esboço, as mais relevantes acepções adquiridas pela palavra neste período
de tempo:
b) Conjunto de obras que se particularizam e ganham feição especial quer pela sua
origem, quer pela sua temática ou pela sua intenção: literatura feminina, literatura de terror,
literatura revolucionária, literatura de evasão, etc.
d) Retórica, expressão artificial. Verlaine, no seu poema Art poétique, escreveu: “Et tout
le reste est littérature”, identificando pejorativamente “literatura” e falsidade retórica. Este
significado depreciativo do vocábulo data do final do século XIX e é de origem francesa. Com
fundamento nesta acepção de “literatura”, originou-se e tem-se difundido a antinomia “poesia-
literatura”, assim formulada por um grande poeta espanhol contemporâneo: “[...] ao demônio da
Literatura, que é somente o rebelde e sujo anjo caído da Poesia.”1
e) Por elipse, emprega-se simplesmente “literatura” em vez de história da literatura.
f) Por metonímia, “literatura” significa também manual de história da literatura.
1
Gerardo Diego, Poesía Española Contemporánea, Madrid, Taurus, 1959, p. 387.
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As obras literárias destinadas às crianças com dois a quatro anos de idade possuem
apenas grupos de palavras e/ou poucas e simples frases. Aqui, os livros são coloridos e/ou
possuem muitas imagens e/ou fotos, tanto porque a criança está apenas a começar a aprender a
ler, bem como estimula a criança por mais livros/histórias. Os livros dedicados a leitores entre
quatro a seis anos apresentam maiores grupos de palavras organizados em um texto, sem abrir
mão aos estímulos visuais mencionados acima. Aqui podem ser incluídas algumas histórias em
quadrinhos, como a Turma da Mônica, por exemplo. Já as obras literárias feitas para crianças
entre sete a dez anos começam a possuir cada vez menos cores e imagens, e apresentam textos
cada vez maiores e fatos cada vez mais complicados e explicativos, uma vez que o jovem leitor,
agora já em fase escolar, é estimulado a encontrar respostas por ele mesmo - o começo da
racionalização.
O que é Literatura Infantil?
A designação infantil faz com que esta modalidade literária seja considerada "menor" por
alguns, infelizmente.
Principalmente os educadores vivenciam de perto a evolução da criança. O contato com textos
recheados de encantamento faz-nos perceber quão importante e cheia de responsabilidade é toda
forma de literatura.
Para pensar a literatura infantil é necessário pensar no seu leitor: a criança. Até o Século
XVII as crianças conviviam igualmente com os adultos, não havia um mundo infantil, diferente e
separado, ou uma visão especial da infância. Não se escrevia, portanto, para as crianças.
A concepção de uma faixa etária diferenciada, com interesses próprios e
necessitando de uma formação específica, só acontece em meio à Idade Moderna. Esta mudança
se deveu a outro acontecimento da época: a emergência de uma nova noção de família, centrada
não mais em amplas relações de parentesco, mas num núcleo unicelular, preocupado em manter
sua privacidade (impedindo a intervenção dos parentes em seus negócios internos) e estimular o
afeto entre seus membros
A partir da Idade Moderna a criança é vista como um indivíduo que precisa de
atenção especial demarcada pela idade.
O adulto passa a idealizar a infância. A criança é o indivíduo inocente e dependente
do adulto devido à sua falta de experiência da realidade. Até hoje muitos ainda têm essa
concepção da infância como o espaço da alegria, da inocência e da falta de domínio da realidade.
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Os livros que trazem essa concepção são escritos, então, com o objetivo de educar e de ajudar as
crianças a enfrentar a realidade.
A partir da Psicologia da Aprendizagem a infância é tratada como uma etapa de
preparação do pensamento para a vida adulta. O pensamento infantil não tem ainda uma lógica
racional. A literatura infantil é, nesta concepção, adequada às fases do raciocínio infantil (que é
dividido em idade cronológica).
Essas duas concepções de infância convivem até hoje e podemos vê-las até no modo
como os livros são selecionados e catalogados pelas editoras.
No entanto, uma outra concepção de infância tem sido defendida e com ela uma
nova postura da literatura infantil. É preciso entender que a criança é também cheia de conflitos,
medos, dúvidas e contradições não por desconhecer a realidade, mas por trazer em si a imagem
projetada do adulto:
Se a imagem da criança é contraditória, é precisamente porque o adulto e a sociedade
nela projetam, ao mesmo tempo, suas aspirações e repulsas. A imagem da criança é, assim, o
reflexo do que o adulto e a sociedade pensam de si mesmos. Mas este reflexo não é ilusão; tende,
ao contrário, a tornar-se realidade. Com efeito, a representação da criança assim elaborada
transforma-se, pouco a pouco, em realidade da criança. Esta dirige certas exigências ao adulto e à
sociedade, em função de suas necessidades essenciais
Quanto ao seu desenvolvimento cognitivo, a ênfase não pode ser naquilo que a
criança ainda não dá conta, mas sim naquilo que só ela é capaz de fazer.
Se lhe falta a completa capacidade abstrativa que a capacite para as complexas redes
analítico-conceituais, sobra-lhe espaço para a vasta mente instintiva, pré-lógica, inclusiva,
integral e instantânea que só opera por semelhanças, correspondências entre formas, descobrindo
vínculos de similitude entre elementos que a lógica racional condicionou a separar e a excluir.
Correspondências, sinestesias. Todos os sentidos incluídos.
Uma literatura que tenha essa concepção de infância vai, então, privilegiar o lado
espontâneo, intuitivo, analógico e concreto da natureza humana e ver o seu leitor como um ser de
desejos e pensamentos próprios.
os projetos mais arrojados de literatura infantil investem, não escamoteando o
literário, nem o facilitando, mas enfrentando sua qualidade artística e oferecendo os melhores
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produtos possíveis ao repertório infantil, que tem a competência necessária para traduzi-lo pelo
desempenho de uma leitura múltipla e diversificada.
Partindo dessa visão dá para entender a vertente que entende a literatura infantil
como um estilo literário (dominante estilística), pois o objetivo não é falar para uma
determinada faixa etária, mas trabalhar o texto para preencher desejos que existem em
todos os seres humanos.
Como já foi dito, os primeiros livros infantis foram escritos por pedagogos e professores
com o objetivo de estabelecer padrões comportamentais exigidos pela sociedade burguesia que
se estabelecia.
A relação entre literatura e a escola é forte desde o início até hoje. Diversos
estudiosos defendem o uso do livro em sala de aula, mas atualmente o objetivo não é transmitir
os valores da sociedade e sim propiciar uma nova visão da realidade.
A escola é, hoje, o espaço privilegiado, em que deverão ser lançadas as bases para a
formação do indivíduo. E, nesse espaço, privilegiamos os estudos literários, pois, de maneira
mais abrangente do que quaisquer outros, eles estimulam o exercício da mente; a percepção do
real em suas múltiplas significações; a consciência do eu em relação ao outro; a leitura do mundo
em seus vários níveis e, principalmente, dinamizam o estudo e conhecimento da língua, da
expressão verbal significativa e consciente - condição sine qua non para a plena realidade do ser.
A literatura infantil torna-se, deste modo, imprescindível. Os professores dos
primeiros anos da escola fundamental devem trabalhar diariamente com a literatura pois esta se
constitui em material indispensável, que aflora a criatividade infantil e desperta as veias artísticas
da criança. Nessa faixa etária, os livros de literatura devem ser oferecidos às crianças, através de
uma espécie de caleidoscópio de sentimentos e emoções que favoreçam a proliferação do gosto
pela literatura, enquanto forma de lazer e diversão
Ainda assim podemos ver o sentido pedagógico atribuído à literatura infantil
(estimular o exercício da mente, despertar a criatividade...). O que importa, entretanto, é ver que
o livro pode ser um objeto para que a criança reflita sua própria condição pessoal (e a imagem
projetada nela pelo adulto) e a sociedade em que vive.
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Daí a urgência que vemos na conscientização e organização de uma crítica literária para a
literatura infantil brasileira.
1.4. Paraliteratura
O termo paraliteratura designa todas as formas não canónicas de literatura (auto-ajuda,
folhetins romanescos, literatura cor-de-rosa, romance ultra-light, literatura de cordel, literatura
oral e tradicional, banda desenhada, literatura marginal, pornográfica, policial e popular, etc.)
que em regra não são aceites por certos eruditos, certas instituições académicas ou certos meios
de comunicação. A vantagem da designação paraliteratura (em vez de infraliteratura) reside no
tom não depreciativo que o prefixo para- tem, uma vez que remete para tudo aquilo que fica na
margem de e não necessariamente tudo aquilo que não entra na categoria de um clássico, por
exemplo. Também não fica garantido que um género paraliterário não se torne numa dada época
um género maior de literatura.
Os géneros principais (romance, textos de poesia e textos de teatro) não foram géneros
maiores em todas as épocas. O que permanece hoje é a ideia de que todo o texto que se refugie
numa categoria não convencional é porque pertence a um género marginal de literatura a que
convém então o nome de paraliteratura. O problema é que muitas vezes esta classificação
resulta da aplicação arbitrária de um critério de qualidade que não corresponde inteiramente ao
rigor de uma classificação científica.
Um romance policial, por exemplo, pode ter grande qualidade, pode ser uma obra-prima
e pode rivalizar com qualquer outro tipo de romance no que respeita ao domínio das mais
apuradas técnicas literárias. Ora, daqui se infere que atribuir a todos os romances policiais a
categoria de paraliteratura pode ser uma atitude redutora e ideologicamente reprovável. Esta
designação corre os mesmos riscos de todas as sub-classificações do texto literário que estão à
mercê do juízo de comunidades de leitores.
Por outro lado, pode-se argumentar que o que faz a literatura ser maior ou menor não é o
juízo do leitor, porque a obra em si mesma transporta uma literariedade que é incompatível com
juízos de valor subjectivos. Qualquer adversário da estética da recepção defenderá esta posição.
Como a realidade nos mostra que muitas vezes a literatura existe enquanto for entendida como
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produto de difusão, desprezar o papel do leitor na decisão do que deve ser literatura e o que deve
ser paraliteratura pode ser inconsequente.
O caso da ficção científica pode ser pertinente: o género fixou-se de tal forma como
espaço literário autónomo e perfeitamente resguardado de preconceitos em relação à sua índole
literária que se torna difícil aceitar hoje que se trate de paraliteratura como sempre foi visto.
2. TIPOLOGIA TEXTUAL
salientar que realidade não quer dizer simplicidade ou rusticidade; os contos respeitam rituais de
transmissão e possuem complexidade, arte e capacidade de seduzir os seus ouvintes.
Os contos populares, de acordo com Leal (1985), apresentam características formais bem
definidas;
O modo de começar as narrativas segue uma espécie de modelo, cujo objetivo principal é
apresentar as personagens;
O modo de acabar os relatos também segue um modelo e o seu fecho pode ser interno ou
externo; O fecho interno é aquele que apenas termina a narrativa sem nenhum acréscimo;
Já o fecho externo é aquele no qual há o acréscimo de uma intervenção do narrador através de
uma moral ou apenas alguns versinhos rimados e cômicos, que marcam para os ouvintes o final
da história. Outra característica da linguagem dos contos populares é a expressão corporal,
utilizada pelos contadores como um instrumento para auxiliar a palavra e encantar seu público;
Além disso, nos contos populares, há o predomínio da coordenação sobre a subordinação e, por
fim a repetição, cujo objetivo é enfatizar, intensificar ou, muitas vezes, apenas ser fiel às
fórmulas mágicas que, para serem eficazes, dependem justamente da sua repetição.
2.2.1. O Mito
O Mito é uma narrativa sagrada que tem por personagens seres sobrenaturais, e que procura dar
ao homem respostas vitais para sua existência e ao mesmo tempo tem a capacidade de sacralizar
o espaço do real por ser ele próprio uma forma de irrupção do sagrado no profano.
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interdições formam conjuntos que variam segundo as culturas, mas apresentam algumas
constantes demonstrando que as narrativas na tradição oral, em geral, estão ligadas à própria
vida. Entende-se vida aqui como todos os sistemas de elementos que concorrem para a
sobrevivência da comunidade: os sistemas de parentesco, a fecundidade, o funcionamento do
cosmos, (a alternância dos dias e das noites, as estações, as chuvas, a seca, as cheias, etc.).
A narrativa funciona igualmente como um dos principais veículos de transmissão do
conhecimento, mantendo a ligação entre as gerações de uma mesma comunidade. Os valores que
são transmitidos a gerações posteriores não podem sofrer transgressões.
Se tal facto acontecer, põe em perigo a coesão e a sobrevivência histórica do próprio
grupo. A continuidade da cadeia de valores pode ser, por exemplo, detectada na preocupação de
enunciar fórmulas codificadas no princípio e no fim da narração bem como a introdução de
canções em certos momentos da intriga, sendo as letras dessas canções, muitas vezes, versos
cristalizados que pouco têm a ver com a própria narrativa que está sendo actualizada num
determinado momento.
Considerando a situação de oralidade, a narrativa é um dos meios pedagógicos mais
poderosos. O seu funcionamento como tal dá-se a dois níveis: por um lado, pelo facto de, através
da narrativa, a memorização se tornar mais fácil por causa da curiosidade e do prazer. Assim,
aprendizagem e compreensão são rápidas e o ensinar torna-se fácil. Chamaremos a isto de função
de nível explícito. Por outro lado, a narrativa não é um simples instrumento metodológico de
transmissão de conhecimentos. Ela transporta dentro de si própria, através da exemplaridade, o
próprio objecto de ensinamento que se quer transmitir. Chamaremos a isto, a função de nível
implícito.
Cada indivíduo que ouve a narrativa está apto a compreender que os conflitos
apresentados na intriga podem perfeitamente ter lugar no próprio universo do grupo de que faz
parte. Daí o carácter universal das narrativas de tradição oral porque são ao mesmo tempo e em
qualquer lugar, um grande ponto de interrogação sobre os problemas com que o indivíduo se
defronta no dia a dia, na sua sociedade. Ao mesmo tempo, todos os elementos da comunidade
percebem que os conflitos veiculados pelas narrativas representam um universo simbólico, o que
lhes permite criar o distanciamento necessário para a reflexão. Por isso mesmo, o momento da
narração não é um momento de comunicação simples entre o emissor e o receptor. O contador e
os ouvintes funcionam de uma forma complexa em termos de comunicação, embora aquele seja
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I. CONTOS AFRICANOS
4. Lê o texto em silêncio.
4.1. Faz uma segunda leitura e sublinha as palavras que não entendes.
5. Passa as palavras que não entendes para o teu caderno e indica o que te parece que querem
dizer.
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TABELA INFORMATIVA
Há palavras que têm uma significação idêntica ou quase semelhante, diferindo umas
das outras por certos cambiantes de significação. Tais palavras chamam-se sinónimas. O
critério que permite identificar os sinónimos é o facto de estes serem substituíveis num
mesmo contexto.
Ex. Os montes Nairuco são grandiosos.
Os montes Nairuco são monumentais.
Os antónimos implicam uma relação de oposição ou de contrariedade entre duas ou
mais unidades lexicais (ideias opostas). Só há antónimos se os termos associados contiverem
traços comuns, ou seja, o termo janela não se pode opor a limão, assim como branco não se
pode opor a redondo.
Ex. Ela está presente. Ele está vivo.
Ela está ausente. Ele está morto.
6.1. Liga as duas colunas, associando a palavra da coluna da esquerda com o seu sinónimo na
coluna da direita.
6.2. Liga as duas colunas, associando a palavra da coluna da esquerda com o seu antónimo na
coluna da direita.
7. Volta a ler o texto. Deves ler de uma forma fluida, sem pausas desnecessárias. Não leias
demasiado rápido, nem demasiado lento. Deves respeitar os sinais de pontuação presentes no
texto.
Deves adequar o teu tom de voz e o ritmo de leitura à mensagem do texto, sendo claro.
8. Por que razão era a terra do Goana “boa que se fartava”? Selecciona a alínea correcta.
a) A terra do Goana era “boa que se fartava”, porque tinha acesso às águas do rio.
b) A terra do Goana era “boa que se fartava”, porque os grandes agricultores produziam muito.
c) A terra do Goana era “boa que se fartava”, porque Vírgula Oito vivia nela.
9. Qual é o elemento da natureza que contribui para que a terra do Goana seja fértil?
Selecciona a alínea correcta.
a) Vírgula Oito.
b) O rio Incomáti.
c) As reservas indígenas.
10. O que significa a frase: “uma corrida contra a baixa de preço que surgiria quando os
armazéns da vila se enchessem com o milho dos grandes agricultores” (linhas 6-7). Selecciona a
alínea correcta.
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11. Na frase que se segue está presente uma personificação: “Em volta das povoações
os celeiros entumesciam rapidamente durante as manhãs para, durante a tarde, vomitarem as
espigas para a debulha” (linhas 7 a 9). Explica o que significa, de acordo com o contexto, a
palavra “vomitarem”. Selecciona a alínea correcta.
a) Ficarem maldispostos, agoniarem.
b) Transportarem as espigas de comboio.
c) Deitarem, mandarem.
12. Quais são os principais produtos cultivados nas terras do Goana? Selecciona a alínea
correcta.
a) Milho, arroz, tabaco e batata.
b) Milho, capim e micaia.
c) Milho, arroz e tabaco.
13. Explica, por palavras tuas, a expressão sublinhada, de acordo com o contexto: “De
malha finíssima a nuvem rodeava as árvores, as casas e os animais num halo azulado, sem
contudo depositar nas superfícies indícios de humidade” (linhas 21-22).
14. Na frase que se segue está presente a personificação dos sons do mato (ver palavras
sublinhadas). Substitui as palavras sublinhadas por outras de valor equivalente: “Saudando o
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dia, os sons do mato, ainda vagos bocejos roucos e, por vezes, estridentes, ziguezagueavam
preguiçosos, saltitando de folha em folha e ecoando surdamente até se perderem na
profundidade do véu de vapor” (linhas 24 a 26).
20. Qual o tipo da seguinte frase: “a colheita já tinha sido iniciada.” (linha 3)
22. Explica, por palavras tuas, e de um modo sequencial (por ordem) o que aconteceu a
Vírgula Oito.
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23. Proponho-te agora uma tarefa de expressão oral. Para tal, lê a tabela informativa
que se segue:
TABELA INFORMATIVA
Desde que o homem começou a conviver, usou a palavra como meio de dar a
conhecer ao outro as suas vivências no mundo e como forma de o convencer.
Argumentar é agir sobre o receptor, no sentido de o convencer, persuadir, fazer
aceitar, fazer crer, fazer mudar de opinião e de levar a uma determinada acção.
Um Texto Argumentativo tem como objectivo persuadir (convencer) alguém das nossas
ideias.
23.2. Já terminaste? Então, junta-te aos teus colegas que têm a mesma letra que tu (A
ou B) e compara as tuas respostas com as deles.
24. Agora vamos realizar uma actividade de expressão escrita. Deves escolher um dos
seguintes temas (A, B ou C) e redigir um texto que contenha entre 10 e 15 linhas. Para melhor
fazeres este trabalho, lê com atenção a tabela informativa.
TABELA INFORMATIVA
TEMAS
B. Redige um texto sobre a terra onde habitas, realçando os seus aspectos positivos.
Naquela povoação nunca tinha aparecido uma menina tão bonita. Todos os rapazes
daquela povoação e das povoações vizinhas que a conheciam tentaram, em vão, casar com ela. A
todos ela dizia que não e acrescentava: «Nenhum dos que me apareceu vale alguma coisa. Ainda
não apareceu aquele de quem hei-de gostar».
Um dia, a quizumba (parente da hiena), que tinha ouvido falar na rapariga, resolveu pôr-
se bonito: «Vou pôr um casaco, bons sapatos e os meus óculos».
A rapariga logo que viu aquele rapaz, achou-o bonito e foi ter com a mãe: «Olha mãe, é
aquele rapaz bonito que eu gosto, vou aceitá-lo como marido». A mãe nada disse.
Tudo foi tratado dentro da normalidade e segundo os costumes.
Chegou a vez de a rapariga, como noiva, ir visitar a casa dos futuros sogros e lá passar
uma temporada. E segundo os costumes também, a rapariga levou consigo o irmão mais novo.
Quando lá chegaram, a rapariga ficou espantada pois não viu ninguém da família do marido.
Perguntou: «Ó marido, onde estão os meus futuros sogros», o noivo respondeu: «Espera e logo
verás». A rapariga não compreendeu. A quizumba estava a referir-se ao projecto que tinha de vir
a devorar a rapariga. Ela não fez mais perguntas. À noite, como estava cansada, adormeceu logo.
O irmão, porém, ficou preocupado e resolveu desvendar aquele mistério. Era meia-noite,
chegaram os familiares da quizumba. E começaram logo a discutir: «Ela está bem gordinha, para
quê engordá-la mais?» Dizia a mãe da quizumba. «Sim, vamos devorá-la», concordavam os
outros. Mas o noivo opôs-se com força à pretensão dos familiares e propôs um prazo de três
semanas. «Além disso, ela não pode fugir daqui sem que seja apanhada».
No dia seguinte, a rapariga acordou bem disposta e ficou radiante por ver uma série de
animais de caça mortos, no quintal. Arrependeu-se de ter pensado mal do noivo e mostrou ao
irmão a carne dizendo: «Estás a ver como o meu marido é bom?» Mas o rapaz respondeu: «Tu é
que não sabes o que se passa. Eu vi com os meus próprios olhos, não te iludas, os familiares do
teu marido não passam de bichos selvagens que querem devorar-nos». A irmã ficou muito
indignada com aquela revelação. Não acreditou e ameaçou mandá-lo embora de volta: «O que tu
queres é desfazer o meu casamento com intrigas, se voltas a repetir o que disseste mando-te para
casa o mais depressa possível». O irmão viu que não podia insistir e calou-se.
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Passaram-se duas semanas e sempre que a rapariga perguntava pelos sogros, o noivo
respondia: «Não falta muito e verás». Embora andasse intrigada, estava feliz porque não faltava
boa carne que todas as manhãs encontrava no quintal.
Entretanto, o irmão da rapariga vendo que não conseguia convencer a irmã, foi
preparando uma arca com as peles dos animais. Sempre que esfolava um animal, ele ficava com
a pele, com a qual construía uma arca.
Passaram-se as três semanas. Na véspera do dia aprazado, o rapaz atou um fio no polegar
da irmã que entretanto dormia a sono solto. Logo que os bichos entraram, o irmão puxou o fio e
a irmã acordou, ficou porém petrificada ao ver os bichos e ouvir o que diziam: «Ah! Ah! já não
era sem tempo, está mesmo gordinha. Amanhã vai ser uma grande festa».
No dia seguinte, a rapariga só chorava, de tão desesperada que ela estava. Não tinha
qualquer hipótese de fuga. A casa dos pais estava bem longe e seriam facilmente alcançados se
tentassem fugir.
De nada lhe servia pedir desculpas ao irmão pois o caso estava perdido. Este fingia que
estava muito aflito. Quando chegou a hora marcada pelos animais para a festa, o rapaz mandou
que a irmã carregasse a arca com todas as coisas que possuíam bem como muitas provisões.
Depois entraram e na altura em que as quizumbas iam deitar a mão à arca ele ordenou-a que
levantasse voo, o que aconteceu.
Os bichos estavam desesperados e lamentaram o tempo que perderam na engorda dos
dois irmãos.
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Conforme se faz entre as pessoas quando dois irmãos não têm pai, nem mãe, nem família
chegada, o rapaz é que tem de olhar pela rapariga. Assim, chegou a hora de casar e o rapaz tinha
a responsabilidade de velar pelo bom casamento da irmã.
O rapaz aconselhava a irmã para aceitar para marido de entre os rapazes conhecidos que
estavam desejosos de casar com ela. Mas ela era esquisita. A todos dizia sempre: «Não quero,
falta-te isto, falta-te aquilo».
Um dia apareceu um rapaz todo bem vestido e com um ar estranho. A rapariga ficou
muito bem impressionada e aceitou logo.
O rapaz ficou preocupado, mas não podia contrariar a vontade da irmã: «Tu é que sabes,
espero que tenhas feito uma boa escolha, apesar de ser um homem desconhecido».
Como também é hábito entre as pessoas, a partir de certa altura, a rapariga deve deslocar-
se a casa dos futuros sogros para conhecê-los e mostrar as suas qualidades. Assim fez, os sogros
fizeram uma grande festa, mataram galinhas que em tempo normal dava para comer durante um
mês, além de cabritos e outros animais domésticos.
Mas antes de a rapariga ter partido, o irmão plantou um arbusto e disse-lhe: «Tu vais, eu
fico em cuidado, se algum dia começares a correr perigo, verei por este arbusto. Se começar a
murchar é porque ainda estás viva, mas em perigo; se secar por completo é porque já morreste».
Em dada altura, a rapariga começou a estranhar o comportamento do marido porque não
dormiam juntos e nunca pediu que lhe fosse esfregar as costas quando estava a tomar banho.
O irmão viu que algumas folhas estavam a ficar levemente murchas e não esperou mais,
foi logo ter com ela à povoação do marido. Quando chegou, a irmã contou-lhe que nunca dormia
com o marido e que este nunca se despia na sua presença. Assim o rapaz quis apurar mais
alguma coisa para verificar por que razão corria perigo a sua irmã. Nessa noite ele ficou
acordado. À meia-noite viu o marido da irmã a aproximar-se dela, engoli-la e passado algum
tempo tirá-la. Os pais dele estavam perto e afinal eram leões. Eles perguntaram ao filho: «Como
é que está a carne?» Ele respondeu: «Ainda não está à medida do meu estômago, mais uns dias e
ficará».
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No dia seguinte, o rapaz contou o que se tinha passado. A irmã não acreditou, disse que o
que o irmão queria era destruir o casamento dela: «Por que não vais embora daqui? Desde que
aqui chegaste que me andas a meter coisas nos ouvidos, já vi que não queres a minha felicidade
com este homem, queres-me para os teus amigos que eu rejeitei». O irmão suplicou-lhe que não
se deixasse adormecer naquela noite para que ela própria pudesse confirmar o que ele lhe dizia.
A rapariga acedeu sem vontade.
À noite viu bem que o marido não era gente mas sim leão. Então o rapaz construiu uma
gaiola onde se meteram com muitos haveres e cantou a seguinte canção:
Gaiola, gaiola
Tu que prendes os passarinhos
Gaiola, gaiola
Livra-nos deste lugar
Gaiola, gaiola
Leva-nos para a nossa mãe
E a gaiola levantou voo e transportou os dois irmãos para a terra onde tinha nascido.
A rapariga arrependeu-se de não ter seguido os conselhos do seu irmão apesar de ser mais
novo. Jurou obedecer-lhe sempre. Desde então vivem juntos felizes e contentes.
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Uma mulher que tinha três filhos vivia sozinha, sem marido. A sua idade não permitia
cuidar bem do campo de milho. No entanto ela verificou que havia bichos estranhos que davam
cabo da sua plantação.
Um dia, resolveu mandar o filho mais velho verificar o que se passava. O rapaz partiu. O
rapaz andou, andou e a meio do caminho encontrou uma velha leprosa que pedia comida. O
rapaz disse: «Deixa-me em paz, velha horrenda, tenho pressa». Dizendo isso empurrou-a com
um pé. Quando chegou à «machamba» viu muitos cavalos do céu a comerem o milho. O rapaz
ficou assustado, fugiu e voltou para junto da mãe, contou o que vira e recusou-se a voltar lá.
A mãe ficou muito triste porque o filho mais velho não tinha coragem. Mandou então o
filho do meio. Este andou, andou. E encontrou uma velha leprosa que lhe pediu de comer. O
rapaz disse: «Deixa-me em paz, velha leprosa, que tenho pressa». E deu-lhe um
pontapé. Lá no campo, encontrou os cavalos do céu. O campo estava a desaparecer. Eles
eram muito vorazes. O rapaz fugiu e foi contar à mãe o que vira, jurando que nunca mais lá
punha os pés. A mãe lamentou a cobardia dos filhos. Só lhe restava o mais novo. No
fundo, ela já não tinha esperanças de salvar fosse o que fosse do campo de milho.
O rapaz mais novo lá foi. Andou, andou. Encontrou a velha leprosa: «Bom dia, avó»,
disse o rapaz e tratou-lhe das feridas, tirou do seu pão e partiu metade e deu-o à velha.
A velha ficou muito agradecida e disse-lhe: «Vai e não temas».
Ele não sabia que aquela velha era uma feiticeira e apareceu ali para ver se ele tinha bom
coração.
Chegou ao campo e viu os cavalos do céu a comerem o milho. O rapaz arranjou um corno
curvo e soprou com força, como se fosse uma trombeta. Os cavalos fugiram. E ele colheu o
milho que restava e levou-o para junto da mãe.
Os irmãos ficaram despeitados e disseram: «Agora a nossa mãe só vai ter olhos para o
nosso irmão mais novo e tudo o que de bom ela tiver irá para ele. Não estamos aqui a fazer nada,
vamo-nos embora». E foram comunicar à mãe.
O irmão mais novo disse: «Eu quero ir convosco». Eles responderam: «Não, tu ficas com
a tua mãe, porque és o filho querido». Mas o rapaz insistiu. A mãe concordou que fossem os três
32
porque podia acontecer alguma coisa. É que a mãe sabia que os dois mais velhos não
conseguiriam salvar-se dos perigos sem a ajuda do mais novo que era esperto.
Os dois irmãos mais velhos ficaram furiosos e atiraram pedras contra o mais novo e
disseram: «Se este miúdo nos seguir nós matamo-lo». A mãe ficou triste mas sabia que o
rapazinho havia de conseguir livrar-se dos perigos, por isso não disse nada.
Andaram, andaram e foram ter a uma terra onde já não havia gente. Nessa terra havia um
gigante de muitas cabeças que tinha devorado as pessoas de todas as povoações. De dia, o
gigante apresentava-se só com uma cabeça e parecia gente. Mas quando escurecia transformava-
se então e comia tudo quanto fosse gente. Os dois irmãos mais velhos chegaram e pediram
emprego. O gigante ficou muito satisfeito, pois havia muito tempo que não comia gente.
Pouco depois apareceu o irmão mais novo e pediu também emprego. O gigante aceitou
logo. Mas o rapaz percebeu logo que aquele patrão era o gigante de muitas cabeças. Mas não
disse nada aos irmãos.
Os dois irmãos foram ter com o patrão e disseram: «Não aceites este rapaz, ele é
preguiçoso e intriguista». Mas o gigante queria comê-los, por isso não se importou.
Quando a noite chegou, deu-lhes uma casa para dormirem. O gigante preparou-se para ir
buscá-los quando adormecessem. O rapaz apercebeu-se disso. Arranjou um candeeiro e pôs
petróleo.
Esse candeeiro falava. E o rapaz passou a noite a conversar com o candeeiro.
Chegou o gigante, bateu à porta e perguntou: «Por que razão não dormem?» O rapaz
respondeu: «Não dormimos porque o barulho das árvores incomoda-nos. Donde viemos não há
árvores, só capim e arbustos». O gigante foi-se embora furioso. Na manhã seguinte, mandou
abater todas as árvores.
No outro dia, à noite, o gigante apareceu de novo. O rapaz conversava com o candeeiro.
Os dois irmãos dormiam. O gigante bateu e perguntou: «Por que razão não dormem?» O rapaz
respondeu: «Não dormimos porque o canto dos galos nos incomoda.
Donde viemos não há galos, só galinhas».
Na manhã seguinte, o gigante mandou matar todos os galos. Na noite seguinte, foi o
gigante e perguntou: «Por que razão não dormem?» O rapaz respondeu: «Não dormimos porque
está muito frio e não temos cobertores. Donde viemos faz calor todo o ano».
Na manhã seguinte, o gigante trouxe muitos cobertores e deuos aos três irmãos.
33
Na outra noite, o gigante foi de novo e o rapaz disse: «Não dormimos porque os
mosquitos não deixam. Donde viemos não há mosquitos».
O gigante ficou desesperado porque sabia que o rapaz estava a mentir. Em todas as terras
deste mundo existem mosquitos. E ele não podia eliminar todos os mosquitos. Eles eram o
exército nocturno das chuvas e das águas.
Tentar matar todos os mosquitos era a mesma coisa que tentar secar os rios ou parar a
chuva. Ninguém consegue. Por isso resolveu que no dia seguinte entraria na cabana onde os
rapazes estavam, quer estivessem a dormir quer não.
O rapaz apercebeu-se disso. À noite, pegou nos irmãos às costas porque estavam num
sono profundo, foi pô-los na casa onde estavam a dormir os filhos do gigante. E pegou nos filhos
do gigante foi pô-los na casa onde eles estavam. O gigante chegou devagarinho, chamou e
ninguém respondia. Entrou e matou os que estavam a dormir sem se aperceber que eram os seus
próprios filhos, foi chamar a mulher e saborearam-nos.
No dia seguinte, o gigante reparou que os seus filhos tinham desaparecido e desconfiou
logo do rapazinho. Procurou por eles, mas eles também tinham fugido.
Andaram, andaram e chegaram a uma povoação. Pediram emprego e foram aceites. Mas
os dois irmãos continuavam despeitados e procuravam vingar-se. Disseram ao novo patrão: « O
nosso irmão é muito esperto. Ele conseguiu vencer o gigante de muitas cabeças. Se quiseres, ele
é capaz de te trazer em três dias um carneiro que o gigante tem». O patrão ficou muito espantado,
mas como queria forçosamente o carneiro, mandou-o buscá-lo. O rapaz ficou triste com as
intrigas dos irmãos mas obedeceu. Pediu um cacho de bananas maduras e foi ter perto do lugar
onde o pastor do gigante costumava apascentar o seu gado. Começou a atirar as bananas; e o
pastor gostava muito de bananas, foi apanhando uma a uma cada vez mais longe do gado. O
rapaz deu a volta e foi buscar o carneiro, partiu e foi entregá-lo ao patrão. Este ficou deveras
espantado com a esperteza do rapaz e recompensou-o.
Mas os irmãos continuaram despeitados e passado algum tempo disseram: «O nosso
irmão é um verdadeiro assombro, se quiseres ele traz-te a cama do gigante de várias cabeças». O
patrão que estava necessitado de uma cama condigna, não hesitou, mandou
o rapaz.
O rapaz foi e antes de chegar a casa do gigante pensou, pensou e descobriu uma forma:
foi ter com o chefe dos percevejos e pediu que fossem picar o gigante durante toda a noite. O
34
gigante não conseguiu dormir e no dia seguinte pôs a sua cama ao sol. O rapaz foi e roubou a
cama.
Os irmãos disseram: «Para esta casa falta um papagaio que fale. O nosso irmão pode
perfeitamente ir buscar o papagaio do gigante». O patrão mandou-o.
Entretanto o gigante andava desconfiado de que o rapaz regressaria em qualquer altura
para ir buscar mais alguma coisa.
Assim, foi, escondeu-se e apanhou-o. Ficou muito contente porque finalmente iria comer
gente. Amarrou-o muito bem e deixou-o ao pé da mulher e foi chamar os sogros para a festa. A
mulher do gigante começou a rachar lenha para assar o rapaz. Este disse: «Eu quero ajudar-te,
assim acabas mais depressa e assas-me mais rapidamente e quando o teu marido chegar já me
terás aprontado para ser devorado; mas, para te ajudar, preciso que me aligeires as cordas. De
qualquer forma não poderei fugir». A mulher do gigante assim fez. O rapaz foi cortando lenha,
foi cortando lenha e foi atirando para longe, para longe. Às tantas, começou a atirar cada vez
para mais perto de si. A mulher do gigante ia apanhado a lenha que o rapaz cortava. Cada vez
mais perto, tão perto, que cortou a cabeça da mulher do gigante.
Soltou-se, assou-a, pegou no papagaio e foi-se embora.
Quando o gigante chegou mais os sogros, encontrou a própria mulher assada. Os sogros
ficaram furiosos e foram-se embora sem lhe dirigir palavra. No entanto os irmãos do rapaz
ficaram tão irritados que disseram ao patrão: «Como vês o nosso irmão tem esperteza para tudo.
O nosso irmão é tão esperto que até é capaz de trazer o próprio gigante». O patrão estava muito
entusiasmado e mandou-o. O rapaz não sabia o que fazer. Então resolveu vestir-se como
Administrador. Foi ter com o gigante e disse: «Olha, sou o Administrador, vem comigo porque o
rei quer-te conhecer, a tua fama chegou longe». O gigante ficou satisfeito por o rei ter pedido
para que ele fosse conhecê-lo. O gigante andava com vontade de casar com a filha do rei. Mas
logo que o gigante subiu na carroça o rapaz trancou-o e tirou o disfarce. Quando chegou à
povoação do patrão ninguém quis acreditar.
Houve festa rija, porque o gigante tinha sido preso. O rapaz pegou em petróleo, regou a
carroça e incendiou-a, morrendo o gigante.
Desde esse dia, o rapaz foi feito rei de todas aquelas povoações e os seus irmãos feitos
escravos e servidores. É por isso que hoje já não há gigantes de muitas cabeças.
35
pescavam e brincavam com as outras crianças. Mas desde logo a mãe reparou que
Donsa tinha o coração duro e que Chicote, seu irmão, era bondoso.
Quando chegou a altura de os rapazes irem para longe tratar da vida e trabalhar a
mãe levou-os ao feiticeiro. Este tratou deles e eles ficavam a salvo de muitos perigos que
neste mundo espreitam a quem trabalha. Mas o feiticeiro disse: «O meu tratamento é
seguro.
Porém quem não cumprir com aquilo que vos recomendo, terá duro castigo. O
meu tratamento exige que tenhais um coração bondoso, ameis os desgraçados, sejais os
últimos a meter a mão no prato e os primeiros a socorrer a virgem que corre perigo.
Nunca escolhereis as melhores coisas, guardai o pior porque dele sai sempre o prémio.
Não deveis comer peixe Nsomba que habita nas cavernas de Bona nosso Mambo. Ide e
ganhai muito riqueza para a vossa mãe».
Regressaram a casa e logo Donsa disse: «Mãe, a minha hora chegou, vou eu
primeiro ganhar alguma coisa. O Chicote fica contigo». A mãe disse que sim. Donsa
plantou um arbusto e disse ao Chicote: «Todos os dias vem regar esta planta. Enquanto
ela tiver folhas abertas e flores bonitas, não te preocupes. Mas quando a vires murchar, é
sinal de que corro grande perigo. Vem atrás de mim e salva-me». Donsa partiu. Andou
três dias e três noites. Não bebeu nem comeu. Encontrou uma cabana e à porta da cabana
uma velha que tinha um só dente, um só olho e um só buraco do nariz.
Donsa disse: «Bom dia, avó». A velha não respondeu, mandou que lhe estendesse
a esteira num monte onde havia muita formiga. Donsa disse: «Ó avó, mas não vês que as
formigas te ferram?» E não fez o que a velha mandara. Pegou na esteira da velha e
estendeu-a debaixo de uma árvore frondosa. Foi buscar a velha e pô-la à sombra. E logo
caíram frutos da árvore que eram enormes e mataram a velha. Donsa prosseguiu a
viagem, andou mais três dias e três noites sem comer nem beber. Encontrou outra velha
cheia de fome. Donsa disse: «Bom dia avó». A velha não respondeu, mandou que fosse
buscar o farelo para preparar o almoço. Donsa disse: «Ó avó, o farelo não enche a
barriga». E matou uma galinha, foi buscar farinha de mapira cozeu-a e deu-a à velha.
Esta, que estava sem forças para levar a comida à boca, ao tentar fazê-lo engasgou-se e
morreu. O rapaz comeu o resto sózinho.
Donsa prosseguiu viagem, andou mais três dias e três noites e encontrou uma
velha ao pé de um rio. O rio tinha muita corrente. A velha tinha só uma perna. Donsa
disse: «Bom dia, avó». A velha não respondeu, mandou que entrasse na cabana e fosse
36
buscar um cão e uma azagaia. Donsa entrou na cabana e viu um cão todo tinhoso e uma
azagaia toda enferrujada. Ao lado havia um bonito cavalo aos pinotes com uma
espingarda que tinha muitos canos. Donsa pensou, pensou, pensou. Achou melhor levar o
cavalo e a espingarda. A velha disse: «Quando passares o rio hás-de ver dois caminhos,
um tem muitas flores e é largo, outro está pejado de fezes e cheira mal». Donsa passou o
rio e o cavalo começou a levantar as patas quando ele tentou meter-se pelo caminho
estreito e mal cheiroso. Meteu o cavalo pelo caminho largo, e ele foi a toda a velocidade.
Chegou a uma aldeia onde em todas as casas estavam pessoas a chorar. Donsa perguntou:
«O que se passa?» Os da povoação responderam: «Todas as raparigas virgens e bonitas
da nossa povoação estão a ser entregues ao gigante de sete cabeças. Hoje vamos entregar
a filha do rei, a única que ficou para o fim». Donsa prometeu salvar a rapariga e mostrou
a sua espingarda de vários canos. Foi logo conduzido para junto do rei. O rei estava
sentado na esteira e quando ouviu que estava aí um rapaz que queria salvar a sua filha,
levantou-se logo e veio ter com ele, prometendo-lhe muita riqueza e casamento com ela.
Entretanto Chicote começou a regar a planta que o irmão deixou e logo no terceiro
dia ao da sua partida verificou que ela estava a murchar levemente. Foi ter com a mãe e
disse: «Vais ter que ficar sozinha por algum tempo». A mãe perguntou a chorar: «Para
onde é que tu vais?» «Vou ganhar a vida, já não aguento mais ficar à espera que o meu
irmão regresse para eu partir também», fingiu Chicote, sem querer denunciar que Donsa
corria perigo. A mãe resignou-se e disse que sim. Chicote partiu, andava velozmente. E aí
onde Donsa levou três dias e três noite, Chicote levou apenas um dia e uma noite. E
encontrou a mesma velha, com um olho, um dente, um buraco no nariz. Chicote disse:
«Bom dia, avó». A velha não respondeu e mandou que lhe estendesse a esteira num
morro onde havia muitas formigas. Chicote não retorquiu, obedeceu e as formigas
devoraram a velha. A chefe das formigas disse: «Conta connosco». Chicote partiu andou
tão depressa, um dia e uma noite e encontrou outra vez uma velha. Chicote não comia
nem bebia, tinha muita pressa. Mas parou quando viu a velha. Disse Chicote: «Bom dia,
avó». A velha não respondeu, mandou que Chicote cozesse farelo para o almoço. Chicote
não fez perguntas nem discordou. Pronto o farelo, a velha desapareceu. E Chicote não se
atrapalhou, pegou na farinha de mapira que havia e guardou, pegou no farelo já preparado
e guardou. Prosseguiu viagem. Andou, andou. Um dia e uma noite e chegou ao rio. Viu
uma terceira velha. Chicote não sabia que aquelas velhas eram uma mesma pessoa e que
apareciam para ver se ele obedecia às ordens dos mais velhos. Mas Chicote obedecia a
tudo e estava a ultrapassar bem as provas todas. E Chicote disse: «Bom dia, avó». A
velha não respondeu, apontou para a cabana edisse: «Se queres atravessar o rio entra na
cabana e escolhe os meios». Chicote entrou e viu um cão tinhoso e fraco, cheio de fome,
uma azagaia meio partida. Viu também um lindo cavalo cheio de pêlos e uma espingarda
com vários canos, os cartuchos para meter à frente e tudo. Chicote hesitou, mas lembrou-
se dos ensinamentos do feiticeiro. Escolheu o cão tinhoso e a azagaia. Quando pegou
neles, quase que se desfaziam, de podre. Mas não desanimou. A velha disse: «Vai e não
temas, atravessa o rio e verás dois caminhos, um cheio de flores outro cheio de fezes,
escolhe o que te convier». Chicote foi. Do outro lado do rio, o cão estava limpo sem
tinha. O rio tinha lavado o cão. A azagaia estava brilhante. Chicote estava contente. E
37
escolheu o pior caminho. O mau cheiro era tão forte que estava quase a vomitar, mas fez
esforço e não vomitou.
Chegou à aldeia, toda a gente estava a chorar. Perguntou o que se passava,
disseram-lhe: «É hoje que vamos entregar a filha do rei». «A quem?» perguntou Chicote.
Os da aldeia responderam: «Desde há longos anos, de seis em seis meses temos que
entregar uma donzela ao gigante de sete cabeças. Ele vive nas profundezas do rio. Na
noite da trovoada ele vem e exige a donzela mais bonita da povoação. Se não a
entregarmos, ele destrói tudo, casas, culturas, homens, mulheres, crianças, velhos,
cabritos, galinhas, tudo, tudo. Já entregámos todas as donzelas. Restava, apenas, a filha
do rei. Hoje é a vez dela. Depois disso, só nos espera a destruição. Felizmente que
apareceu um rapaz com cavalo e espingarda e está disposto a matar o gigante».
Chicote percebeu logo que aquele rapaz era Donsa, o seu irmão, e que não tinha a
mínima hipótese de vencer o gigante. Mas não disse nada. Perguntou se havia algum sítio
para descansar, pois andou três vezes mais depressa que o irmão para chegar à aldeia. Os
da povoação disseram: «Não nos aborreças, temos outros problemas em que pensar, vai-
te embora». E pegaram em pedras. E os cães da povoação também atacaram o seu cão. E
Chicote teve de se refugiar nas margens do rio. Viu uma cabana, entrou nela. Tirou do
farelo que trazia, comeu e deu algum ao seu cão. Era meia noite veio muito vento e
chuva. No céu os clarões aumentaram. Era o gigante que vinha das profundezas do rio
buscar a donzela. A noite ficou tão escura que Chicote pensou que estava cego. E o
gigante cantou:
«Sou dono dos rios e das chuvas
Sou o gigante de sete cabeças
Quero hoje a filha do rei
Toda a povoação estava apavorada. A filha do rei chorava porque tinha chegado a
sua hora. Donsa pegou na sua espingarda e foi-se postar na margem do rio onde o gigante
iria emergir para pegar na donzela. A primeira cabeça surgiu das águas. Donsa disparou a
sua espingarda: «pam, pam». O gigante bradou: «Que formiga é essa que me está a fazer
cócegas? Que formiga é essa que me está a fazer cócegas? Que formiga é essa que me
está a fazer cócegas?» E Donsa disparou: «pam, pam». O gigante avançava. Toda a gente
percebeu que Donsa não conseguiria matar o gigante, as esperanças desvaneceram-se e os
choros redobraram.
Entretanto Chicote arranjou um saco, pegou na sua azagaia e disse para o cão:
«Vamos, chegou a nossa hora». E foi, o gigante já tinha seis cabeças cá fora. Faltava uma
38
e depois os braços que eram enormes. Para apanhar a donzela. Chicote deixou que Donsa
esgotasse os cartuchos que não fizeram nada ao gigante. Donsa fugiu e foi-se esconder.
Chicote atirou a primeira azagaiada, cortou a primeira cabeça do gigante e as formigas
devoraram-na logo. O gigante gritava: «Que formiga é essa que me está a picar? Que
formiga é essa que me está a picar?» E Chicote atirou a segunda azagaiada. A segunda
cabeça rolou pelo chão e as formigas devoraram-na de imediato. Essas formigas eram as
mesmas que Chicote tinha ajudado. E o gigante continuava a avançar bradando. Chicote
foi atirando as azagaiadas todas e todas as cabeças foram sendo devoradas pelas
formigas. Entretanto o cão ia apanhando as caveiras e metia-as no saco que Chicote tinha
arranjado. Assim, até à última cabeça cair e o gigante foi vencido caindo mesmo aos pés
da filha do rei. Chicote entretanto tinha desaparecido, tendo levado consigo as sete
cabeças no saco. No saco meteu também as roupas ensanguentadas. Donsa reapareceu
todo ufano. Houve grande algazarra na povoação. Donsa foi levado aos ombros pela
povoação. O rei fez festa e deu em casamento a sua filha. Porém a filha do rei tinha visto
que quem havia lutado e vencido o gigante não era aquele rapaz da espingarda. Ficou
muito triste pelo facto de ele ter desaparecido e teve que se submeter à vontade do pai:
Mas chorava dia e noite, inconsolável. Uma velha com quem a rapariga tinha falado, em
segredo, da sua desconfiança em relação ao autor da proeza foi procurar o rei e disse:
«Senhor rei, todo o caçador quando vem do mato e traz alguma caça, tem o orgulho de
mostrar a cabeça dos bichos mortos. Este que vai ser teu genro, matou o gigante e livrou-
nos a todos da desgraça e da morte. Seria bom que no dia do casamento ele apresentasse
as cabeças do gigante para todo o povo ver». O rei achou óptima ideia e comunicou o seu
desejo a Donsa. Este ficou aflito, porque sabia que nunca seria capaz de apresentar as
cabeças. E na véspera da grande festa, Donsa desapareceu.
Estava toda a gente na praça, para a festa pois não sabiam que Donsa tinha
desaparecido e que a festa do casamento corria o risco de não se realizar. O rei mandou
chamar o noivo e este não aparecia. A filha do rei ficou contente porque sabia que aquele
rapaz não era o seu herói. E o rei comunicou a todos que vinham à festa que o rapaz tinha
ido buscar as cabeças. Mas Donsa não aparecia. As pessoas começaram a inquietar-se.
Então o rei mandou comunicar que daria a sua filha ao primeiro rapaz que lhe
apresentasse as cabeças do gigante, uma vez que o Donsa tinha desaparecido.
Muitos rapazes apareceram. Quando despejavam o saco, apareciam cabeças de
gazela, coelhos, macacos, cobras, tudo, menos as cabeças do gigante.
A todos os impostores o rei mandava matar.
Entretanto Chicote estava na cabana junto ao rio. E ouviu dizer que o rei pedia as
cabeças do gigante. Chicote disse para o cão: «Vamos, chegou a nossa hora». E partiram.
Quando chegou junto do rei, este olhou-o com desprezo: «Se vieram tantos valentes
apresentar-me cabeças de bichos vulgares, como te atreves tu, frangalhote, a vir
incomodar-me como o presumível vencedor do gigante?» Os conselheiros tentaram
acalmar o rei que estava muito zangado. E o rei disse: «Se as tuas cabeças forem falsas,
mando que sejas morto duas vezes». (O rei queria dizer que seria morto de uma forma
cruel)».
39
GUIÃO DE LEITURA
1. Depois de ler a teoria sobre a classificação dos contos de Lourenço, classifica os
textos apresentados, em função da morfologia e da temática dos mesmomos.
40
CONTOS ORIENTAIS
Conta-se - mas só Alá sabe tudo - que havia nas dobras do tempo e dos séculos um
rei da dinastia dos Sassan que reinava nas ilhas da Índia e da China. E tinha dois filhos:
Shariar e Chahzaman. Ambos eram governantes justos, e os seus povos amavam-nos.
2 Certo dia, Shariar sentiu uma irresistível saudade do irmão e enviou o seu
5 vizir para o convidar. Chahzaman respondeu: “Ouço e obedeço”. Fez os preparativos
necessários, encarregou o vizir de governar na sua ausência e partiu. No meio do
caminho, lembrou-se de que havia esquecido um documento que queria mostrar ao irmão
e voltou para apanhá-lo. Ao chegar ao palácio, encontrou a mulher deitada no seu leito
imperial
3 com um escravo negro. Pensou: “Se tais coisas acontecem quando ainda não saí
10 da cidade, qual não será a conduta desta devassa se demorar-me muito tempo no reino de
meu irmão?” Sacou da espada, cortou as duas cabeças e retomou viagem.
Mas uma grande tristeza apoderou-se dele. Emagreceu, empalideceu. Ao vê-
lo assim, o irmão preocupou-se e indagou-o sobre as causas da sua depressão. Ele não
quis
3
contar. Para o distrair e divertir, Shariar organizou uma excursão de caça e um safari,
15 em sua honra. Assim mesmo, no último momento, desculpou-se, e o seu irmão saiu
sozinho com os convidados. No palácio do rei, havia janelas que davam para o jardim. O
rei Chahzaman olhou através de uma delas e viu vinte escravas saírem do palácio
acompanhadas
2 por vinte escravos e dirigirem-se para um açude no meio do jardim. E
ficou
2 espantado ao reconhecer no meio do grupo a própria esposa do irmão, a qual, num
20 determinado momento, chamou a si um negro gigante e entregou-se a ele na presença de
todos, dando assim sinal para que escravos e escravas se juntassem e imitassem a rainha.
Observando tudo isso, Chahzaman pensou: “Por Alá, a minha desgraça é menos pesada
que a do meu irmão”. E, instantaneamente, a alegria voltou-lhe ao coração e as cores às
faces
2 pálidas. Quando Shariar voltou, alegrou-o ver o irmão recuperado e quis saber a
25 causa dessa mudança tão repentina. “Posso contar-te a causa da minha depressão, não do
meu restabelecimento”, disse Chahzaman. E contou-lhe o que acontecera entre ele e a sua
mulher. Mas o irmão queria saber também o segredo do seu restabelecimento e insistiu.
Chahzaman acabou por lhe contar o que observara da janela do palácio.
- Primeiro, gostaria de ver tudo isso com os próprios olhos, disse Shariar.
3
30 -É fácil, replicou o irmão. Proclama que estás viajando para um país
longínquo, sai publicamente da cidade e a ela volta em segredo, e poderás assistir a tudo
da janela como fiz.
41
5
regressaram aos seus palácios. Shariar mandou cortar a cabeça da sua esposa e dos
quarenta escravos e escravas. E a fim de prevenir qualquer futura traição, decidiu casar-se
cada noite com uma nova donzela e mandar matá-la na aurora. Em três anos, centenas de
moças foram assim sacrificadas. A tristeza e o horror encheram o reino. As famílias
fugiam para salvar as filhas. Até que, um dia, o vizir, encarregado de conseguir uma nova
1
10 donzela procurou e nada encontrou. Voltou para casa abatido e receoso do que o rei faria
com ele. Ora, este vizir tinha ele mesmo duas filhas que superavam todas as demais
moças em beleza, charme, finura, educação e inteligência. A mais velha chamava-se
Sherazade e a mais nova Dinarzade. Sherazade havia lido inúmeros livros e conhecia a
história
2 dos povos, reis, poetas dos tempos antigos e modernos. Era eloquente, e sua voz
15 tinha um timbre melodioso muito agradável.
Vendo o pai assim infeliz, perguntou-lhe qual era a causa da sua infelicidade.
Contou-lhe. Então disse Sherazade: “Por Alá, pai, deve casar-me com este rei. Não
importa que morra ou sobreviva, saberei livrar as filhas dos muçulmanos desta
calamidade”. O vizir atendeu à vontade da filha e levou-a ao rei Shariar. Entretanto,
20 Sherazade dera as seguintes instruções à irmã: “Quando estiver com o rei, mandarei
chamar-te. Assim que o rei acabar o seu acto comigo, dizei: Conta-nos, querida irmã,
uma daquelas histórias maravilhosas que fazem o tempo passar de maneira tão deliciosa.”
Então, contarei as minhas histórias, e quiçá resgatarei assim as filhas dos muçulmanos.”
25 Quando o rei se aprontava para deitar com Sherazade, começou ela a chorar. - Que tens?
Perguntou o rei. – Ó meu soberano, tenho uma jovem irmã de quem gosto muito e queria
despedir-me dela antes de morrer. O rei mandou vir Dinarzade. Dinarzade chegou e
jogou-se nos braços da irmã; depois, ficou encolhida ao pé da cama até que o rei acabasse
de 3 arrebatar a virgindade de Sherazade. Depois, Dinarzade disse à irmã: “Alá te
30 acompanhe, ó querida irmã. Por que não nos contas uma das tuas maravilhosas histórias
para que a noite passe mais agradavelmente?”
- Fá-lo-ei com prazer se o meu soberano permitir.
-Sim, conta-nos uma de tuas histórias, disse o rei a Sherazade, esperando
suavizar assim a sua habitual insônia.
E Sherazade pôs-se a falar...
43
Vocabulário
1.1.3. A que língua parece pertencerem os nomes dos reis que constam do título do texto?
R: Alemão Italiano
Árabe Espanhol
Chinês Francês
2. Actividades de leitura
Actividades a serem feitas em grupos de três a cinco membros, dependendo da dimensão
da turma.
2.1. Os reis Shariar e Chahzaman eram governantes justos, e os seus povos amavam-nos.
Relacionem, com setas, os factos e as acções da tabela 1 com as consequências da tabela 2.
45
Tabela 1
Shariar sente saudade Tabela 2
do irmão Com os seus olhos Shariar
A mulher de Chahzman assiste à orgia da sua mulher, das
trai o rei suas escravas e escravos
Chahzman anda triste e Chahzman mata a rainha e o
pálido escravo
Chahzman assiste a Chahzman melhora da
uma orgia da rainha sua depressão e sente-se bem
cunhada O rei manda o seu vizir para
Shariar simula uma convidar o irmão a visitá-lo
viagem longa Os dois reis abandonam os
Os dois reis sentem-se seus palácios
desgraçados por serem traídos Os dois reis sentem-se
pelas mulheres. reconfortados e voltam aos seus
Conhecem sexualmente palácios
a mulher de um afrit e ouvem a Shariar organiza uma
sua história excursão para alegrar o irmão
46
R:
Características diabólicas
Características divinas
Características terrenas
2.7.Preencham a tabela com três formas verbais do primeiro parágrafo e três do segundo
parágrafo.
Formas verbais Pretérito imperfeito Pretérito perfeito Parágrafo
3. Actividades de Pós-Leitura
3.1. Oralidade
Esta actividade deve ser previamente preparada, de maneira que até ao dia
previsto haja material suficiente e que os alunos estejam preparados para
desenvolverem autonomamente o tema proposto.
3.1.1. Objectivo:
Desenvolver um debate reflectindo os vários aspectos problemáticos
apresentados no texto, no que se refere à mulher, relacionando-os com o
estatuto social da mesma na sociedade moçambicana.
3.1.2. Estratégia:
Formam-se dois grupos opostos, de preferência, os alunos são livres de
escolher o grupo a que querem pertencer. Um dos grupos é encarregue de fazer
uma recolha de dados referentes ao tema: A discriminação da mulher nas
sociedades patriarcais e machistas. Este grupo pode recorrer a entrevistas
com as direcções da mulher e a acção social, podem ler Niketche de Paulina
Chiziane.
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O outro grupo pode fazer uma recolha de dados ou relatos sobre o tema:
A malvadez da mulher e a necessidade da sua submissão. Este grupo pode
recorrer a entrevistas com anciãos e com pessoas conservadoras das culturas
tradicionais. Pode falar sobre a importância do lobolo, da poligamia, entre
outros aspectos. Pode recorrer ainda a livros sagrados como a Bíblia e o
Alcorão.
Ao voltar, perguntei por eles. Minha esposa respondeu: “ A mulher morreu, e teu filho
fugiu para não sei onde.” “Um ano inteiro fiquei chorando, o coração reduzido a pedaços.
No Dia do Sacrifício, pedi a meu pastor que me trouxesse uma vaca gorda. Trouxe-me a
vaca que havia sido minha concubina. Mal me aproximei dela para matá-la, pôs-se a
gemer e chorar. Parei, e pedi ao pastor que a degolasse. Cumpriu a ordem, mas não
encontramos na vaca nem carne nem gordura, mas apenas pele e ossos. “Tive remorsos,
inúteis como a maioria dos remorsos, e pedi ao pastor trazer-me um bezerro bem gordo.
Trouxe-me meu próprio filho enfeitiçado. Quando me viu, rebentou a corda e jogou-se a
meus pés com gemidos e lágrimas. Tive pena dele e ordenei que fosse substituído. Mas a
malvada filha de meu tio disse: “Devemos sacrificar é este bezerro mesmo. Está gordo
como convém.” Obedecendo a não sei que instinto ofereci, antes, o bezerro de presente a
meu pastor. “No dia seguinte, o pastor procurou-me e disse: Vou revelar-te um segredo
que te alegrará e me valerá sem dúvida uma recompensa.” “O que é?” perguntei.
Respondeu “Minha filha é feiticeira. Ontem, quando me deste o bezerro, levei-o para a
casa de minha filha. Mal o viu, cobriu o rosto com o véu e censurou-me: “Pai, agora estás
me expondo aos olhos de homens estranhos?” Perguntei: “Onde vês homens estranhos?”
Respondeu: “Este bezerro é o filho de nosso amo, mas está encantado. E foi a mulher de
nosso amo que o encantou, ele e a sua mãe!” “Fui imediatamente com o pastor à casa de
sua filha, e perguntei-lhe: “É verdade o que contaste a teu pai acerca desse bezerro?”
- Sim, respondeu.
- Ó gentil e compassiva adolescente, se libertares meu filho, dar-te-ei todo meu
gado e todas as propriedades que teu pai administra. “Sorriu e disse: “Ó amo generoso,
aceitarei estas riquezas com duas condições: que me cases com teu filho e que me
permitas enfeitiçar tua mulher. Sem isso, não tenho a certeza de poder prevalecer contra
as suas perfídias.”
- Seja, respondi.
“Apanhou então uma bacia de cobre encheu-a de água e pronunciou conjurações
mágicas. Em seguida, aspergiu o bezerro com a água, dizendo-lhe: “Se Alá te criou
bezerro, permanece bezerro; mas se estás enfeitiçado, volta a tua forma verídica, com a
permissão de Alá.” Após tremer e agitar-se, o bezerro recuperou a forma humana. Era
meu filho! Joguei-me em seus braços e cobri-o de beijos. Depois casei-o com a filha do
pastor, e ela encantou a minha esposa e metamorfoseou-a nesta gazela.”
Bem espantosa, a tua história, bradou o Afrit. Concedo-te o terço do sangue deste
malvado. O segundo xeque adiantou-se então e disse: “Ó rei dos gênios, se te contar a
história destes dois cachorros e a achares tão espantosa quanto a da gazela, conceder-me-
ás um terço do sangue deste homem?”
- Vai falando, disse o Afrit. “Saberás, ó senhor dos reis dos gênios”, disse o
segundo xeque, que estes dois cachorros são irmãos meus. Quando nosso pai morreu,
deixou-nos três mil dinares. Com a minha parte, abri uma loja e comecei a comprar e
vender. “Meus irmãos preferiram a aventura e viajaram com as caravanas por um ano
inteiro. Quando voltaram, tinham desperdiçado todo o seu capital. Estavam pobres e
tinham aspecto lamentável”. Tive pena deles. Mandei-os ao hammam, comprei-lhes
roupas finas e, pondo meu capital de lado, dividi com eles, em igualdade, todo o lucro
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daquele ano. E moramos juntos por muito tempo. Mas de novo queriam partir e insistiram
para que fosse com eles. Embora os resultados de sua primeira viagem não fossem
alentadores, consenti em acompanhá-los com uma condição: dividir o dinheiro que
tínhamos - 6 mil dinares - em duas partes iguais; deixar a metade escondida para nos
amparar em caso de necessidade e partilhar a outra metade entre nós três. Concordaram e
agradeceram-me. Com os 3 mil dinares, compramos as mercadorias mais indicadas,
alugamos um navio, e embarcamos. Após viajarmos um mês, chegamos a uma cidade
portuária onde vendemos nossas mercadorias com um lucro de dez por um. Quando
voltamos ao porto para embarcar, encontramos lá uma mulher mal vestida que se
aproximou de mim e beijou-me a mão, dizendo: “Mestre, aceitas ajudar-me e me salvar?
Por favor, casa-te comigo e me leva, e tudo farei para agradar-te.” Aceitei. Levei-a para o
navio, vesti-a com esmero e partimos.
“Pouco a pouco fui tomado de um grande amor por ela. Não conseguia separar-me
dela nem de dia nem de noite, e preferia sua companhia à de meus irmãos. Por sua vez,
revelou-se uma mulher linda, inteligente, devotada e de nobre caráter”. Infelizmente,
meus irmãos me invejavam cada dia mais e, uma noite, quando estava deitado com minha
mulher, insinuaram-se em nosso aposento, apanharam-nos e jogaram-nos em alto mar.
Minha mulher despertou nas águas e, de repente, transformou-se numa Afrita e carregou-
me nos ombros até uma ilha.
Depois, desapareceu e só voltou na manhã seguinte, ainda mais bela, e disseme: “
Não me reconheces? Sou tua esposa. Como vês, sou uma Afrita. Amei-te desde o
primeiro instante em que te vi. Tiveste pena de mim e te casaste comigo. Agora salvei-te
da morte com a permissão de Alá. Estamos quietos. Quanto aos teus irmãos, sinto-me
cheia de ódio contra eles e vou afundar o navio em que estão e matá-los.” Muito me
custou convencê-la a não os matar. Carregou-me então nos ombros, ergueu-se no espaço
e depositou-me em minha casa. Retirei os 3 mil dinares de seu esconderijo, reabri minha
loja e comprei novas mercadorias. “Quando voltei para casa, achei estes dois cachorros
presos num canto. Ao me verem levantaram-se e começaram a chorar e agarrar-se às
minhas vestes. “São teus irmãos,” disse minha mulher. “Pedi à minha prima, que é mais
versada em encantamentos do que eu, para dar-lhes esta forma, da qual só poderão
libertar-se daqui a dez anos.” “É por isto, ó poderoso gênio, que me encontro neste lugar.
Estou a caminho da morada daquela prima de minha mulher a quem vou pedir que
restitua a meus irmãos sua forma anterior, pois os dez anos já decorreram.”
Exclamou o Afrit: “Tua história também é surpreendente. De coração, concedo-te
mais um terço do sangue deste maldito. Mas vou tirar-lhe o terço que me é ainda devido”.
O terceiro xeque, o da mula, interveio então dizendo: “Ó grande Afrit, se te contar uma
história ainda mais maravilhosa que essas duas, conceder-me-ás o último terço do sangue
deste homem?” O Afrit, que gostava muito de histórias raras, acedeu, dizendo: “Qual é a
tua história?” O terceiro xeque falou: “Ó sultão e chefe de todos os gênios, esta mula que
vês aí é minha esposa. Uma vez, tive que fazer uma longa viagem, e quando voltei, certa
noite, achei-a deitada com um escravo negro na minha própria cama”. Estavam
conversando, rindo, beijando-se e excitando-se mutuamente com pequenos jogos. Assim
que me viu, lançou sobre mim uma água mágica que me transformou em cão e me
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expulsou de casa. Saí a errar pela cidade. Um açougueiro apanhou-me e levou-me para
sua família. “Assim que a sua filha me viu, cobriu a face com o véu e censurou o pai por
expô-la a um homem estranho. “Onde vês homens?” Perguntou o pai. Ela respondeu:
“Este cão é um homem. Uma mulher o enfeitiçou, e eu sou capaz de libertá-lo.”
“-Liberta-o, então, minha filha, pelo amor de Alá. “Ela pegou uma vasilha de
água, pronunciou certas palavras mágicas sobre a água, aspergiu-me com algumas gotas e
disse: “Sai desta forma e retoma tua forma primeira.” “Logo, voltei a ser homem e,
beijando a mão da rapariga, disse-lhe que desejava muito que minha mulher fosse
enfeitiçada do modo como me enfeitiçara. ““É fácil,” disse a filha do açougueiro. E deu-
me num vidro um pouco da água que usara para me salvar, dizendo: “Se encontrares a tua
mulher adormecida, borrifa-a com esta água, e ela tomará a aparência que tu indicares.”
“Fui para casa, encontrei minha mulher dormindo, aspergi-a com a água mágica,
dizendo-lhe: “Sai dessa forma e toma a forma de uma mula.” Num instante, transformou-
se numa mula, como podes verificar, ó sultão e chefe dos reis dos gênios.”
O Afrit virou-se para a mula e perguntou: “É verdade?” Ela abanou a cabeça como
para responder: “Sim, é verdade”. Ao escutar essa história, na qual o mal era punido, o
gênio estremeceu de emoção e prazer e concedeu ao xeque a graça do último terço do
sangue do mercador. O mercador, muito feliz, agradeceu aos três xeques e ao Afrit, e os
xeques o felicitaram por sua salvação. E cada um voltou para sua terra.
Conta-se, ó rei afortunado, que viviam antigamente, numa das cidades da Pérsia,
dois irmãos chamados Kassem e Ali-Baba. Quando seu pai morreu, herdaram o pouco
que tinha, gastaram-no e, breve, acharam-se numa completa indigência. Kassem resolveu
seu problema casando-se com uma donzela que possuía casa, comida e beleza. Ali-Baba,
destituído de ambição, fez-se lenhador e, graças a seu empenho e parcimônia, conseguiu
comprar sucessivamente três burros, que usava para transportar a lenha que cortava na
floresta e vendia no mercado. Certo dia, enquanto se preparava para carregar os asnos,
ouviu como o tropel de um exército. Não sabendo o que era e receando o pior, trepou
numa árvore e se escondeu na sua ramagem. De lá, avistou um grupo de cavaleiros
armados que avançavam para o lado onde ele estava. Vendo-os de perto com seu aspecto
feroz, Ali-Baba concluiu que eram salteadores e ladrões. Contou-os. Eram exatamente
quarenta. A um sinal de seu chefe, os homens pararam e apearam. Cada um pegou o
alforje cheio que trazia na garupa e, juntos, andaram até um grande rochedo. O chefe
adiantou-se e, dirigindo-se ao rochedo, gritou: “Abre-te, Sésamo!” Imediatamente, o
rochedo abriu-se em dois, dando acesso a uma gruta interna. Os ladrões entraram, e lá
dentro, o chefe gritou de novo: “Fecha-te Sésamo!” E o rochedo se fechou. Pasmo, Ali-
Baba decidiu permanecer no seu esconderijo até ver o que os quarenta homens fariam
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depois. Breve, a rocha abriu-se, e os quarenta ladrões saíram, carregando seus alforjes
vazios, montaram nos cavalos e foram embora. Após esperar um tempo suficiente, Ali-
Baba desceu da árvore e, levado por uma curiosidade que transformava sua
pusilanimidade habitual em audácia, foi até o rochedo e bradou: “Abre-te, Sésamo!” E a
rocha abriu-se. Com espanto, em lugar de um antro de trevas e horrores, viu uma extensa
galeria que levava a uma sala espaçosa, iluminada por fendas no teto. Entrou e achou-se
diante de tantos tesouros acumulados (tecidos finos, montões de lingotes de ouro, sacos
cheios de moedas, pedras preciosas cobrindo o chão) que teve a certeza de que a gruta e
seus tesouros estavam lá desde o tempo de Soleiman e AI-Iskandar. Passado o primeiro
susto, Ali-Baba encheu três sacos grandes de lingotes e moedas de ouro, carregou-os
sobre seus três burros e foi para casa. Encontrando a porta fechada, gritou: “Abre-te,
Sésamo!” E a porta abriu-se. Diante dos enormes sacos cheios de ouro, a mulher de Ali-
Baba concluiu que ele se tinha associado a uma quadrilha de ladrões e começou a berrar:
“Ai de mim! Que calamidade! A desgraça vai entrar em nossa casa com estes malditos
sacos.” Mas Ali-Baba, após despejar todo o ouro dos sacos no seu pequeno quarto,
contou à mulher de onde vinha esse ouro e arrematou: “É o Retribuidor que quis assim
recompensar nossa pobreza honesta.”
interpela um criminoso: “Sim , continuas a simular pobreza enquanto na tua cabana tens
ainda mais ouro que piolhos e percevejos.” Ali-Baba acabava de esconder o ouro na fossa
e, temendo a maldade e a cupidez do irmão, alegou que não atinava com o que o irmão
dizia. Mas Kassem mostrou lhe o dinar e revelou-lhe o estratagema da mulher. Ali-Baba,
não podendo mais negar e levado por sua bondade natural, respondeu: “Tu és generoso, ó
meu irmão, envia seus benefícios independentemente de nosso merecimento.” E contou
ao irmão a sua aventura na floresta, deixando apenas de citar a frase mágica.
Acrescentou: “Nós somos irmãos. O que me pertence te pertence . Quero oferecer-te a
metade do que trouxe da caverna.”
Mas o malvado Kassem, sem agradecer ao irmão, quis também saber como entrar
e sair da gruta, e Ali-Baba acabou por lhe dizer. Cedo no dia seguinte, Kassem partiu
para a floresta com dez mulas, reconheceu o rochedo, usou a fórmula mágica e entrou na
gruta. Ficou deslumbrado à vista de tantas riquezas amontoadas, e dominou-o o desejo de
tornar-se dono de todos aqueles tesouros. Mas verificou que, para transportá-los,
precisaria de todos os camelos que viajam dos confins da China às fronteiras do Irã.
Contentou-se daquela vez em encher de moedas de ouro tantos sacos quantos suas mulas
podiam carregar. Voltando ao rochedo, gritou: “Abre-te, Cevada!” Mas o rochedo
não se moveu. Kassem deu-se conta de que tinha esquecido, sob o impacto da emoção, o
nome do grão que integrava a fórmula mágica. Tentou todos os nomes que lhe
assomavam à mente: “Abre-te, Centeio!” “Abre-te, Milho!” “Abre-te, Arroz!” Não usou
o único nome certo, e o rochedo permaneceu fechado. Era, literalmente, a aplicação da
advertência do Profeta acerca dos perversos: “Alá privá-los-á do dom da inteligência e
deixá-los-á a tatearem nas trevas. Assim, cegos, surdos e mudos, perderão o caminho do
regresso.” Por volta de meio-dia, os quarenta ladrões retornaram à caverna, encontraram
Kassem no estado de um animal feroz acuado, esquartejaram-no, não se preocuparam
muito em descobrir como entrara e voltaram às estradas em busca de caravanas para
saquear.
Como Kassem não regressasse para casa nem naquela noite nem no dia seguinte,
sua mulher alarmou-se e, com falsas palavras de afeto, foi à casa de Ali-Baba pedir que a
ajudassem a encontrá-lo. Ali-Baba, que amava o irmão, ficou preocupado com ele e foi
procurá-lo na floresta. Chegando à porta do rochedo e vendo lá traços de sangue, mandou
a porta abrir, pressentindo o pior. Encontrou o corpo do irmão cortado em pedaços.
Chorou.
Alá, que pode tudo, iluminou o coração desta alcoviteira e libertou-a de todas as
taras. Aceitou a oferta de Ali-Baba e transformou-se numa mulher de bem. Era
necessário, em primeiro lugar, costurar o corpo. Ali-Baba tinha uma semente chamada
Manara, que era bonita e fértil em recursos. Recorreu ela a um velho remendão de outro
bairro e convenceu-o com seis dinares de ouro a se deixar levar e a executar o serviço de
olhos vendados. E ele costurou o corpo com perfeição. Faltava apresentar a morte trágica
de Kassem como morte natural.
Durante três dias, Manara foi comprar remédios nas farmácias, espalhando a
notícia de que Kassem fora atingido de escarlatina e recolhera-se à casa do irmão. Cada
dia, ao comprar novos remédios, dizia que a doença piorava, de forma que quando, no
terceiro dia, os gritos das mulheres anunciaram a morte de Kassem, a vizinhança aceitou
o fato sem nada suspeitar. Manara lavou o corpo reconstituído, perfumou-o e, com a
ajuda de Ali-Baba, vestiu-o com a mortalha.
E Kassem foi sepultado com todas as honras religiosas e civis. Supondo que o
cadáver do intruso continuava a putrefazer-se na caverna, os quarenta ladrões abstiveram-
se de freqüentar o esconderijo durante um mês inteiro. Quando voltaram à gruta e não
encontraram o cadáver, preocuparam-se e reuniram-se para avaliar o perigo. “O homem
que matamos tinha um cúmplice”, disse o chefe. “Enquanto não o identificarmos e
liquidarmos, nossas vidas e essas riquezas que nossos antepassados e nós temos feito
tantos sacrifícios para juntar estarão correndo perigo. Após discutir longamente o
assunto, concordaram no seguinte plano: enviariam um voluntário deles à cidade para
tentar identificar o intruso. Se conseguisse, seria coberto de louvores. Se falhasse, teria a
cabeça cortada. Um deles ofereceu-se para a tarefa. Disfarçando-se em dervixe, foi à
cidade e, por sorte sua, a única loja que encontrou aberta era a do remendão que costurara
o corpo de Kassem. Entrou, fez-se amigo do homem e felicitou-o pela habilidade com
que estava confeccionando uns chinelos de luxo. Lisonjeado, o remendão replicou: “O
que terias dito se me tivesses visto coser os seis pedaços de um morto e restituir-lhe a
forma?” O falso dervixe ficou encantado com a coincidência, e disse estar curioso por
visitar a casa onde essa operação fora feita.
Ali Baba, sabendo disso, quis retribuir essas gentilezas e convidou Hassan a uma
grande festa em sua casa. Na festa, Manara improvisou-se em dançarina e dançou com
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tanta graça e agilidade que encantou a todos. Dançou a dança dos véus, a do lenço, a do
cajado. Dançou as danças dos judeus, dos gregos, dos etíopes, dos persas, dos beduínos.
Depois, dançou a dança ondulosa da espada, carregando um punhal que ora brandia no ar
ora escondia no seio. De repente, parou na frente de Hassan, saltou sobre ele como uma
gata selvagem e enterrou-lhe o punhal no coração. Indignação e espanto foram as
primeiras reações de Ali-Baba e de seu filho. Mas Manara os acalmou, dizendo:
“Louvores a Alá que guiou o braço de uma rapariga fraca para vos salvar do chefe de
vossos inimigos! Verificai se este suposto mercador Hassan não é, na realidade, o falso
mercador de azeite e o capitão dos quarenta ladrões que há muito vos persegue.” E
arrancou a longa barba postiça com que o bandido se disfarçava. Ali-Baba reconheceu
logo o chefe dos ladrões que havia observado do alto da árvore.
Bibliografia
5. Marcos, Maria Madalena; Silva, Carlos Texeira da Silva. Livros e não-livros. Reflexão
sobre cânone, crítica literária e orientação da leitura. In Quaderns de Filologia Estudi
literaris. 2019, vol. XVIII.
6. Rosário, Lourenço de. A narrativa africana de expressão oral. 1.ª edição, 1989 Angolê ―
Secretaria de Estudo da Cultura de Angola ― LUANDA.