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Nº 04 – Dezembro/2020

Lei Aldir Blanc: formulação e


aplicação no município de
Franca.

Matheus Fernandes Alves Lopes

Rafael de Oliveira Guaranha Garcia


Universidade Estadual Paulista – UNESP NOTAS DE TRABALHO – LAP é uma publicação
Câmpus de Franca do Laboratório de Análise de Política do
Programa de Pós-Graduação em Planejamento
e Análise de Políticas Públicas. Seu objetivo é
Diretor divulgar a um público amplo – acadêmico e
Prof. Dr. Murilo Gaspardo não-acadêmico – informações básicas acerca
de políticas públicas levadas a efeito por
diferentes setores.
Vice-Diretora
Profa. Dra. Nanci Soares Editor Responsável
Profa.Dra. Clauciana Schmidt Bueno de Moraes
Prof. Dr. Agnaldo de Sousa Barbosa
Programa de Pós-Graduação em
Planejamento e Análise de Políticas Públicas
Lopes, Matheus Fernandes Alves.
Lei Aldir Blanc : formulação e aplicação no
Coordenação
município de Franca / Matheus Fernandes Alves
Prof. Dr. Agnaldo de Sousa Barbosa
Lopes e Rafael de Oliveira Guaranha Garcia. –
Franca : UNESP-FCHS-Programa de Pós-
Vice-Coordenação
Profa. Dra. Vânia de Fátima Martino
Graduação em Planejamento e Análise de
Políticas Públicas, 2020.
Conselho de Curso de Pós-Graduação
Prof. Dr. Agnaldo de Sousa Barbosa 20 p. – (Notas de trabalho, nº 04)
Profa. Dra. Vânia de Fátima Martino ISSN: 2448-0509
Prof. Dr. Alexandre Marques Mendes
Profa. Dra. Maria Madalena Gracioli 1. Políticas públicas. 2.Cultura. I. Garcia,
Rafael de Oliveira Guaranha. II. Título. III.
Série.

CDD – 350
LAP – Laboratório de Análise de Política
Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária
Andreia Beatriz Pereira – CRB8/8773

As opiniões emitidas nesta publicação são de


exclusiva e inteira responsabilidade dos
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Bairro: Jd. Dr. Antonio Petráglia ponto de vista do programa de pós-graduação
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cas fins comerciais são proibidas.
Notas de Trabalho L A P | PPG-PAPP

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO............................................................................................................. 02
RESUMO......................................................................................................................... 03
ABSTRACT...................................................................................................................... 03
LEI ALDIR BLANC: FORMULAÇÃO E APLICAÇÃO NO MUNICÍPIO DE FRANCA................ 04
1. Introdução.................................................................................................................. 04
2. Metodologia............................................................................................................... 05
3. Histórico, conceito e funcionamento......................................................................... 06
4. O ciclo e sua aplicação no município de Franca......................................................... 08
Considerações Finais...................................................................................................... 11
Anexo............................................................................................................................. 15
Referências.................................................................................................................... 16
Sobre os autores............................................................................................................ 18
Notas de Trabalho L A P | PPG-PAPP

APRESENTAÇÃO

O Laboratório de Análise de Política (LAP) do Programa de Pós-Graduação em


Planejamento e Análise de Políticas Públicas (PPG-PAPP) da UNESP/Câmpus de Franca é o
responsável pela edição de "Notas de trabalho – LAP". O objetivo dessa publicação é propiciar
a um público amplo – acadêmico e não-acadêmico – o acesso a informações básicas acerca de
políticas públicas levadas a efeito em diferentes setores. Como o seu próprio título anuncia,
trata-se de notas de trabalho, ou seja, apontamentos elementares ou impressões incipientes
de reflexões acerca de uma temática, que pesquisadores trazem a público com o intuito de
fornecer conhecimento inicial sobre determinado assunto. Com isso, pretende-se abrir ao
leitor as portas para um tipo de análise que ambiciona ultrapassar as fronteiras da informação
gerada pelos meios de comunicação convencionais e, ao mesmo tempo, oferecer caminhos
para o aprofundamento por meio da interlocução com a literatura científica.
"Notas de trabalho – LAP" não tem periodicidade regular, tendo sua publicação
vinculada à dinâmica de investigação e produção científica dos pesquisadores associados ao
Laboratório de Análise de Política (LAP).
As edições do ano de 2021 são resultados de projetos realizados nas disciplinas
Metodologia – Análise Política do Prof. Dr. Agnaldo de Sousa Barbosa e Administração e
Gestão Estratégica da Profa. Dra. Clauciana Schmidt Bueno de Moraes, ministradas na turma
do PPG-PAPP 2020.

Editores

Profa. Dra. Clauciana Schmidt Bueno de Moraes


http://lattes.cnpq.br/3559496026857773
Professora Assistente Doutora e Pesquisadora – IGCE/UNESP.
Docente permanente do Programa de Pós-Graduação
em Planejamento e Análise de Políticas Públicas - UNESP (Franca)

Prof. Dr. Agnaldo de Sousa Barbosa


http://lattes.cnpq.br/7871008221742180
Professor Associado – Livre-Docente – DECSPP/UNESP-Franca
Coordenador e Docente permanente do Programa de Pós-Graduação
em Planejamento e Análise de Políticas Públicas - UNESP (Franca)

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RESUMO
Este estudo trata-se de uma análise exploratória e teve como proposta a compreensão e reflexão sobre
o processo de formulação, implementação da Lei Aldir Blanc e sua aplicação no município de Franca,
identificando os entraves e oportunidades encontrados até o momento. O trabalho teve como marco
legal o documento de aprovação da Lei Aldir Blanc - 14.017/20, sendo o documento produzido pela
deputada Benedita da Silva e sua equipe denominado “Cartilha, Memória e Análise da Lei Aldir Blanc
– 2020” utilizado como principal referência na descrição dos desdobramentos devido a sua riqueza no
relato da trajetória da lei e sua tramitação em âmbito federal, juntamente a bibliografia especializada
na área. Foi possível identificar obstáculos encontrados pela gestão municipal em sua aplicação nos
setores de gestão de recursos e reconhecimento do setor cultural, assim como pelos profissionais da
cultura beneficiados que enfrentam problemas acarretados pelos atrasos de pagamento e incertezas
com relação às possibilidades de aplicação do recurso. Ao fim, são apontadas propostas para a
resolução dessas questões, assim como a proposição de novas iniciativas que podem ser realizadas a
partir das oportunidades geradas pela política.
Palavras-Chave: Política Pública, Lei Aldir Blanc, Cultura.

ABSTRACT
This study is an exploratory analysis and its proposal was to understand and reflect on the formulation
process, implementation of the Aldir Blanc Law and its application in the municipality of Franca,
identifying the obstacles and opportunities encountered so far. The work was based on the legal
approval document for the Aldir Blanc Law - 14.017/20, and the document produced by
Congresswoman Benedita da Silva and her team called “Cartilha, Memória e Análise da Lei Aldir Blanc
– 2020” used as the main reference in description of the developments due to its richness in reporting
the trajectory of the law and its handling at the federal level, together with the specialized bibliography
in the area. It was possible to identify obstacles encountered by the municipal administration in its
application in the sectors of resource management and recognition of the cultural sector, as well as by
the benefited culture professionals who face problems caused by late payments and uncertainties
regarding the possibilities of application of the resource. At the end, proposals are made to resolve
these issues as well as the proposition of new initiatives that can be carried out based on the
opportunities generated by the policy.
Key-words: Public Policy, Aldir Blanc Law, Culture.

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LEI ALDIR BLANC: FORMULAÇÃO E APLICAÇÃO NO MUNICÍPIO DE FRANCA.

1. Introdução

A Lei Aldir Blanc1 nº 14.017, 2020, teve seu projeto (PL 1075/20) proposto inicialmente
pela Deputada Federal Benedita da Silva (PT- RJ) em meados de março de 2020. Durante esse
período, o aumento no número de fatalidades e casos de contágio da Covid-19 fazia com que
governos estaduais e municipais decretassem a suspensão de atividades comerciais e
culturais. Os prédios públicos também não deveriam mais ser utilizados, constando nestes
importantes equipamentos culturais como teatros, bibliotecas, centros culturais, museus
entre outros. Não haveria a possibilidade, por exemplo, de execução de editais, premiações
e outras formas de incentivo público para a realização de atividades culturais que contassem
com presença de público. Importante ressaltar que não apenas o artista em si acaba por ser
atingido com a suspensão de seu espetáculo ou obra, mas toda a cadeia de serviços técnicos
e complementares que envolve a realização de projetos artísticos e culturais. O momento de
suspensão e paralisação de pagamentos e atividades demanda adequação das secretarias
culturais municipais e estaduais referentes aos recursos de editais, premiações e fomentos
aprovados e projetos em execução. Esses processos foram congelados e não possuem, em sua
grande maioria, previsão de continuidade até o presente momento.
Conformando a emergência do problema e agravando o momento de crise, é
importante ressaltar a constante desmobilização do setor cultural promovida pelo governo
federal desde o início de sua atual gestão. O Ministério da Cultura foi transformado em pasta
do então recém-criado Ministério da Cidadania (decreto n º 9.674, de 2 de janeiro de 2019) e,
no ano de 2020, foi transformado em Secretaria Especial de Cultura do Ministério do Turismo.
Essas alterações e um considerável rebaixamento na hierarquia administrativa do setor
cultural na esfera administrativa federal tendem a influenciar negativamente nas suas

1
A Lei Emergencial da Cultura carrega o nome de Aldir Blanc, importante compositor brasileiro que faleceu em
maio de 2020 após estar internado com a Covid-19 e sofrer complicações. Notável pelo seu grande talento e
pelas parcerias musicais com grandes nomes do cenário brasileiro musical e artístico brasileiro, Aldir Blanc
também é reconhecido pela sua participação em movimentos contra a ditadura militar brasileira e composições
que se tornaram hinos dos movimentos contra o regime ditatorial e pela anistia.

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capacidades de operação e de coordenação de grandes políticas e programas nacionais,


dificultando uma estrutura administrativa robusta capaz de lidar com questões de grande
escala e agravadas pela crise pandêmica.
Considerando esse contexto, a Lei Aldir Blanc, nº 14.017/20 foi a principal proposta
aplicada pelo governo para o enfrentamento do impacto econômico e social no setor cultural
ocasionado pela pandemia instaurada pela Covid-19 e o estado de emergência vivido no país
a partir de meados de março de 2020. A lei consiste no repasse do valor de
R$3.000.000.000,00 (três bilhões) de reais da União aos demais entes federados para sua
distribuição direcionada ao setor artístico e cultural local através de auxílios emergenciais,
editais de premiações e financiamento de propostas de projetos artísticos e culturais.

2. Metodologia
Para compreender o processo de formulação e implementação da Lei Aldir Blanc,
foram utilizados os documentos oficiais de governo da Lei nº 14.017/2020, as notas oficiais da
Deputada Federal Benedita da Silva (PT-RJ), o documento “Cartilha, Memória e Análise da Lei
Aldir Blanc – 2020” e os editais e ações publicados em Diário Oficial pelo governo municipal
de Franca, São Paulo. Para organizar e compreender os processos da política e posterior
reflexão sobre os seus possíveis entraves, atuais e futuros, a política é observada conforme a
bibliografia utilizada2, a partir de seu ciclo (policy cicle), considerando os seguintes momentos:
a) Identificação do Problema; b) Inserção na agenda; c) Formulação da política e d)
Implementação. Não se pretende aqui gerar conclusões com relação à avaliação da política
como um todo, tendo em vista que a mesma ainda está a ser aplicada. É importante ressaltar
que tal processo de análise é utilizado em momentos de normalidade, portanto o que se
apresenta neste artigo uma adaptação desta perspectiva analítica considerando o atual
estado emergencial e o impacto do mesmo no processo de formulação da Lei Aldir Blanc

2
Gestão Estratégica Pública/Organizadores: Renato Dagnino, Paula Arcoverde Cavalcanti, Greiner Costa. – São
Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2016.

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3. Histórico, conceito e funcionamento.


No que é relatado em nota oficial da Deputada Federal Benedita da Silva, presidente
da Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados (CD) à época (início de 2020 e
posteriormente aos decretos estaduais de fechamento e suspensão de atividades), o setor
artístico e cultural da sociedade civil já organizava suas propostas em conjunto com seu
gabinete e de outros partidos que buscavam uma alternativa o impacto econômico negativo
da suspensão de atividades culturais. Este processo de formulação contou com esforços
conjuntos entre movimentos organizados da sociedade civil, assim como secretários de
cultura estaduais e núcleos de assessores parlamentares. A lei foi sancionada em 29 de junho
de 2020 após uma tramitação de aprovação quase unânime na câmara e no senado, e é
considerado pelos autores e atores envolvidos um importante momento de união entre os
parlamentares para sua aprovação.
A Lei consiste no repasse do valor de R $3.000.000.000,00 (três bilhões de reais) da
União diretamente para os municípios e estados brasileiros, de acordo com os índices
populacionais e critérios do Fundo de Participação dos Estados e Fundo de Participação dos
Municípios. Tendo os critérios de divisão do repasse determinados, a política consiste na
execução realizada pelos entes mais próximos da população, os agentes e representantes
locais municipais e estaduais. A capacidade de formulação de normas e requisitos para uma
modalidade de fomento de uma secretaria municipal cultural teria, em tese, maior
sensibilidade e capacidade de adequação administrativa-burocrática com os seus
beneficiários do que o governo federal, por exemplo. Tal processo de descentralização pode
ser observado em outros programas e políticas culturais como, por exemplo, a Política
Nacional de Cultura Viva e a ação de promoção de Pontos de Cultura. Porém, para que esse
processo seja realizado de forma adequada, a lei impõe responsabilidades administrativas e
orçamentárias aos municípios e estados para garantir tanto a sua boa execução quanto a sua
transparência.
Conforme exposto no texto da lei 14.017 e no documento “Cartilha, Memória e Análise
da Lei Aldir Blanc”, podem ser considerados aqui os principais pontos e normativas da lei: A
transferência ser realizada a um fundo público cultural ou capaz de operar o recurso de acordo
com seu regimento; a necessidade de cadastro em sistema nacional, municipal ou estadual de

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cultura (Pontos e Pontões de cultura, inclusão no Sistema Nacional de Informações e


Indicadores Culturais, entre outros); a obrigatoriedade de aplicação dos recursos em parcelas
de auxílio emergencial; recursos para manutenção de espaços, cooperativas e microempresas
culturais e a promoção de chamadas públicas, premiações e editais para atividades culturais
transmitidas via internet.
Outro aspecto que pode ajudar a compreender a origem da política, os agentes
responsáveis pela sua formulação e a tramitação oriunda da organização civil e legislativa é
seu caráter de transferência direta do Estado, sendo este um movimento oposto aos
processos neoliberais de redução e corte em subsídios e investimentos públicos em
programas sociais promovido pelo atual Ministro da Economia. A inércia do governo federal
perante o tema configurou uma oportunidade não apenas para o protagonismo das
organizações culturais e artísticas, mas também dos representantes de governos estaduais e
municipais discutirem e definirem, em conjunto, o escopo da política. Portanto, através da
descentralização da formulação dos modelos de aplicação da política e repasse dos recursos
aos beneficiários, fica em evidência o protagonismo dos gestores locais, secretários estaduais
e municipais e assessores em todos os processos de uma política pública de abrangência
nacional. Juntamente com o cadastro exigido, existe uma oportunidade de reconhecimento e
fortalecimento dos setores culturais locais junto ao poder público. A exigência de fundo ativo
de cultura ou semelhante demanda dos governos municipais e estaduais sua adequação às
normativas administrativas e orçamentárias e de transparência da lei, que muitas vezes são
executadas, porém se tornam nebulosas em sua disponibilização para a sociedade civil.
É uma prerrogativa que existe a oportunidade de aumentar a participação social no
campo da cultura ao considerar que os editais assim como outros processos de fomento
devem passar por comissões avaliadoras em que estejam presentes membros da sociedade
civil. Poderia ser essa tanto uma oportunidade de fortalecimento e incentivo a essa
participação quanto também um potencial momento de absorção da demanda e
direcionamento para núcleos de interesse próprios dos governos locais (casos em que os
participantes das comissões são indicados diretos dos gestores locais).

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4. O ciclo e sua aplicação no município de Franca.


Pode-se considerar que a Lei Aldir Blanc teve o seu ciclo, até o momento, realizado da
seguinte forma:
Identificação do Problema: O problema estava apresentado como situação
emergencial. Os aumentos de casos de fatalidade ocasionados pela COVID-19 foram
fundamentais para a publicação dos decretos estaduais referentes ao fechamento de espaços
públicos e privados e a suspensão de atividades com aglomerações. Desta forma, o setor
artístico e cultural não teria possibilidade de executar projetos privados, projetos públicos
aprovados ou ser remunerado por projetos em andamento, gerando um esvaziamento de
recursos no em toda a cadeia do setor (Figura 01).
Conformação da Agenda: A percepção de que as políticas, mais do que o mercado,
são as responsáveis pelo progresso social envolve o questionamento das relações sociais e
políticas existentes, a consideração tanto das decisões tomadas como das “não decisões”
(Dagnino, Cavalcanti e Costa – 2016). Não é possível considerar, tendo em vista as ações (e
inações) promovidas pelo governo federal, que haja consenso na forma de enfrentamento da
Covid-19 dos agentes do poder executivo. O atraso na promoção de políticas e estratégias
para o combate da pandemia em setores chaves como saúde, economia e segurança pública
tem sido notável. A retenção de dados que dificulta a contabilização de casos de contágio e
mortes, a zombaria da própria doença em rede nacional por parte do Presidente e, mais
recentemente, os entraves para a aquisição e distribuição de vacinas são elementos cruciais
ao considerar o marco atual de mais de 210 mil mortos pela doença. Esses elementos
configuram uma proposta de estratégia de enfrentamento em que se criam obstáculos,
administrativos e de influência de opinião pública, para a “não-tomada de decisão”. Sendo
assim, a mobilização do setor cultural organizado, assim como a dos representantes no setor
legislativo, foi fundamental para a inserção do tema na agenda da Câmara e enviada ao
Senado.
Formulação: Neste caso, tal como a inserção da questão na agenda, os formuladores
da política estão no âmbito legislativo e da sociedade civil. Trata-se de uma proposta de
formulação limitada pelo contexto, tendo em consideração a urgência do enfrentamento do
problema proposto. Não se trata de uma política incremental, tendo em vista que a ação ainda

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não existia nem estava prevista no âmbito federal. Trata-se do fruto de uma somatória dos
interesses individuais e coletivos específicos do setor cultural e artístico que gera uma nova
proposta pública de distribuição de recursos. Esse processo se reflete nos formatos de
disposição do recurso. Apesar da obrigatoriedade de alguns pontos de desembolso do
repasse, expostos neste artigo posteriormente, a liberdade de formulação dos editais,
premiações e fomentos a atividades culturais dos municípios e estados potencializa a
capacidade de adequação aos seus beneficiários, dando maior relevância às decisões dos
gestores locais.
Implementação: O projeto de lei, conforme o relato da Deputada Benedita da Silva em
“Cartilha, Memória e Análise da Lei Aldir Blanc”, foi aprovado quase de forma unânime no
Senado. Fora necessários dois requerimentos de urgência para acelerar o processo de
apreciação do PL, sendo o segundo requerimento aprovado na data de 27 do maio de 2020
para inclusão do Projeto de Lei nº 1075 de 2020 na Ordem do Dia, sendo o atraso na
apreciação do PL ocasionado pela necessidade de adequação das novas designações da
Secretaria Especial de Cultura dentro do Ministério do Turismo. Após aprovada a lei e
sancionada em 29 de julho de 2020, os municípios tiveram um prazo para a apresentação do
seu plano de ação relativamente reduzido nº art. 2, § 2º parágrafo, era previsto no PL que os
municípios teriam um prazo máximo de apresentação de proposta de execução dos recursos
de quinze dias após a publicação da lei. Este parágrafo foi vetado e os municípios tiveram um
período um pouco mais alargado para encaminharem suas propostas.
O caráter emergencial e de situação de “gestão de crise” exigia que os prazos para
andamento dos processos burocráticos fosse o mínimo possível. Isto exigiria uma agilidade
dos agentes locais que muitas vezes não condiz com sua própria estrutura administrativa,
sendo esta a realidade da maioria das administrações municipais e estaduais brasileiras. É
possível supor que cada município e estado enfrentaria um obstáculo diferente no que diz
respeito à aplicação da política, devido a suas características administrativas específicas e
realidades diversas dos agentes culturais locais.
Feitas as considerações sobre o surgimento, a dinâmica e funcionamento e o
provimento de verbas, optamos por analisar a Lei Aldir Blanc a partir do município de Franca,
localizado no Estado de São Paulo. Evidenciando que a escolha se deu por dois motivos: há
uma dificuldade de compreensão dos gargalos e problemas da implementação da política

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pública quando tratadas de um ponto de vista muito abrangente; essa dificuldade de detalhar
os problemas na sua implementação se intensifica no momento em que não há um portal ou
diário que trate com transparência as informações sobre as editais, premiações e auxílios dos
municípios e Estados.
Nesse sentido, apresentando esse recorte específico do município de Franca, é
possível identificar gargalos e encontrar saídas factíveis dentro da realidade local. O que torna
o presente artigo muito mais relevante e capaz de municiar a administração pública do
município de Franca para empenhar-se em resolver questões não sanadas até o início de 2021.
Todavia, antes da exposição dos impasses identificados na aplicação da Lei Aldir Blanc em
Franca, é preciso apresentar os caminhos utilizados pela Prefeitura Municipal para
distribuição e aplicação dos R $2.200.000,00 (dois milhões e duzentos mil reais) recebidos pelo
município através dos cofres públicos da União.
O primeiro edital elaborado pela Prefeitura de Franca foi publicado no diário oficial no
dia 03 de outubro de 2020, categorizando o fomento de chamamento público 001/2020 para
seleção de espaços artísticos e culturais, micro e pequenas empresas culturais, cooperativas,
instituições e organizações culturais comunitárias. Em síntese, tinha como objeto a
distribuição de um subsídio mensal no valor mínimo de R $3.000,00 (três mil reais) e máximo
de R $10.000,00 (dez mil reais). O subsídio é direcionado exclusivamente para a cobertura de
gastos relacionados à manutenção dos espaços culturais.
O segundo edital elaborado pela Prefeitura de Franca foi publicado no diário oficial no
dia 10 de outubro de 2020, classificado como o edital de chamamento público 002/2020 para
seleção de agentes culturais (pessoas, grupos ou entidades) que tenham prestado relevantes
serviços ao desenvolvimento artístico ou cultural do município. Tinha como objetivo
selecionar 50 agentes culturais a serem premiados com um valor individual de R $10.000,00
(dez mil reais). As propostas poderiam ser nos seguintes segmentos artísticos e culturais:
cultura digital; artes plásticas ou visuais; artesanato; audiovisual; cultura popular e
manifestações tradicionais; dança; design e moda; fotografia; gestão, pesquisa e capacitação;
grafite; literatura; manifestações circenses; música; ópera; patrimônio histórico e artístico
(material e imaterial); teatro e outras manifestações culturais desde que justificadas.
O terceiro e último edital elaborado pela Prefeitura de Franca também foi publicado
no diário oficial no dia 10 de outubro de 2020, constituindo-se como um fomento para a

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seleção de propostas de atividades artísticas e culturais que possam ser transmitidas pela
internet ou disponibilizadas por meio de redes sociais e outras plataformas digitais. Tinha
como objetivo selecionar 110 propostas com apresentações de duração mínima de 45 minutos
e máxima de 60 minutos. As propostas poderiam ser oferecidas nos mesmos segmentos
artísticos e culturais que o edital 002/2020.
Além dos três editais, foi elaborado um processo seletivo para a distribuição de parcela
dos recursos na modalidade auxílio emergencial (semelhante ao auxílio emergencial aprovado
pela Câmara Federal dos Deputados), no valor de R$ 600,00. Segundo matéria do jornal
Comércio da Franca publicada no portal GCN de notícias em 19 de novembro de 2020, foram
contabilizadas 89 inscrições com a aprovação de 68 auxílios.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Durante a pesquisa para elaboração deste artigo, foi possível perceber que os maiores
impasses com relação à distribuição dos recursos provenientes da Lei Aldir Blanc dizem
respeito à tramitação dentro da estrutura do Poder Público. Tanto pela demora quanto pela
falta de transparência. A falta de transparência pode ser verificada pelas inúmeras
manifestações realizadas pelos agentes culturais do município. Que além de não terem um
cronograma claramente definido para datas de pagamento dos recursos, também não tiveram
apresentadas as especificações para a prestação de contas. Toda essa situação acaba por
deixar os beneficiários em situação de preocupação pelo perigo de terem suas contas
reprovadas, uma vez que não foi apresentado pela prefeitura em tempo quais eram as
demandas para que as contas fossem aprovadas. Em se tratando de recursos públicos, é
perfeitamente compreensível a posição dos agentes culturais, uma vez que as sanções
possíveis podem comprometer futuras participações em editais de fomento.
Com relação a demora, é possível verificar que cria uma situação desconfortável para
os proponentes dos projetos aprovados. Isto pois o tempo destinado à produção artística é
afetado e o artista se coloca em uma situação diferente daquela definida, planejada e
apresentada durante a seleção de projetos. Correndo o risco, inclusive, de incorrer no mesmo
problema descrito acima sobre a prestação de contas, uma vez que a depender do projeto o

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tempo pode não ser suficiente e esse artista pode sofrer alguma sanção administrativa ou até
mesmo na justiça comum pelo descontrole e desorganização do próprio ente público que
intermediou o repasse dos provimentos da Lei Aldir Blanc.
A soma desses elementos, acrescida do fato de que o processo foi nebuloso em vários
aspectos, também acarretou em uma baixa adesão nos dois primeiros editais. Isto pois foi
preciso que os grupos organizados de cultura se empenhassem para viabilizar um número
maior de inscrições no edital. No entanto, esse empenho, em alguns casos se mostrou
frustrado, uma vez que alguns artistas, mesmo cientes da existência do processo, optaram por
não pleitear o recurso. O que acaba por resultar em um outro problema passível de
identificação, a perda ou a contínua falta de credibilidade da Prefeitura junto ao setor cultural,
afinal, com tamanha dificuldade de acessar os recursos e correndo os riscos que já foram
mencionados acima, parte dos profissionais aptos a participarem do edital optaram por não
realizar sua inscrição e não submeter projetos.
Quanto aos nós estratégicos, é preciso deixar claro que identificamos dois deles.
Evidente que levando em consideração a necessidade de estes atenderem aos três critérios
da bibliografia, isto é: (1) o gestor possuir gerência sobre o os problemas, estando em sua
esfera de competências previstas; (2) se desatado, este nó contribuirá significativamente para
a resolução dos gargalos identificados; e (3) a resolução deste gargalo não deve colocar o
gestor em situação de excessivo desgaste perante aos outros poderes e à população. Levando
tais pontos em questão, os nós identificados foram: a melhora da organização da equipe
interna da prefeitura responsável pela aplicação da Lei Aldir Blanc no município; a
democratização do processo com maior participação do Conselho de Cultura.
Para viabilizar a resolução destes nós, propusemos também a utilização de duas teorias
administrativas. A primeira delas pertence à Escola Humanista e se caracteriza como a Teoria
das Relações Humanas, tendo como seu principal expoente o autor Elton Mayo. A opção se
deu justamente pelo fato desta teoria compreender o funcionário, no caso o servidor público,
como um ser social. Ou seja, se o servidor compreende a situação que está colocada no mundo
trabalho pela pandemia e, entendendo que esse processo de quarentena afetou diversos
setores, mas principalmente o setor cultural, este servidor precisa ter a compreensão de que
a transparência e a aplicação da lei não devem falhar. Afinal, estamos falando da subsistência
de parcela relevante dos artistas do município de Franca. Além desses elementos, a proposta

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Notas de Trabalho L A P | PPG-PAPP

pressupõe a utilização dos instrumentos administrativos existentes na Teoria das Relações


Humanas, isto é, os estudos de liderança, a comunicação constante e o exercício da
criatividade.
A segunda teoria administrativa que propusemos pertence à Escola Moderna da
Administração e se caracteriza pela Teoria da Excelência Administrativa. Seu maior expoente
é Robert Monks e sua concepção se orienta pela organização de uma estrutura voltada para
a consolidação de valores éticos e sociais nas organizações. Ou seja, soma à primeira teoria
apresentada e acrescenta os instrumentos da administração estratégica virtual, participativa,
uso de dados e a responsabilidade social.
Deste modo, a resolução dos gargalos encontra um campo mais receptivo através do
uso de ambas as teorias, tanto para responsabilizar os servidores que a execução da lei
garantirá a sobrevivência de parcela do setor, como para facilitar os caminhos de
democratização do processo de construção dos editais e, por consequência, todo o processo
de aplicação da lei no município.
Nesse sentido, as propostas de resolução dos gargalos observados podem se iniciar
através de: (a) integração de uma ou mais secretarias na execução da política, sendo a
Secretaria de Cultura, a Secretaria de Finanças, o Departamento de TI da Prefeitura e a
Secretaria de Administração e Recursos Humanos; (b) gravação de um vídeo apresentando as
motivações de cada um dos editais disponíveis no município, uma vez que permite tornar os
mesmos mais acessíveis e consequentemente aumentar a adesão; (c) construção de um
amplo processo de capacitação para a elaboração de projetos; (d) construção de oficinas para
aplicar uma capacitação que permita organizar o modelo de prestação de contas; (e)
centralização de todas as produções financiadas pelos editais do município, tanto para
projetar as propostas aprovadas, como para garantir que elas estejam acessíveis em um só
canal digital.
Por fim, identificamos para além dos problemas e das propostas, uma janela de
oportunidade que se abre para a Prefeitura de Franca aprimorar seu processo de formulação
e avaliação de políticas públicas no campo da cultura. Isto é, fazer do Mapa Cultural —
demandando pela Lei Aldir Blanc como uma necessidade para distribuição dos recursos da lei
nos municípios — uma política permanente, o que viabilizaria um banco de dados oficial
sempre atualizado e capaz de auxiliar na construção de políticas culturais específicas junto aos

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atores mais habilitados em cada ocasião. O que além de melhorar a qualidade da política
pública ofertada pelo Executivo municipal, também contribuiria para uma maior
transparência dos dados junto à população, tornando acessível informações como: quanto foi
gasto, onde foi gasto, como foi gasto e quais os resultados obtidos em cada uma dessas
políticas.
Essa oportunidade, no entanto, precisa ser encarada de maneira contínua uma vez que
a atualização dos dados fornece ao gestor a capacidade de avaliar o impacto das políticas de
cultura do município em série histórica, destacando os processos bem-sucedidos e os
problemas e nós estratégicos que podem auxiliar no aprimoramento das políticas de cultura
de Franca.

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ANEXO

Figura 01. Fluxograma das causas, problemas e consequências da aplicação da Lei Aldir Blanc
no Município de Franca-SP.

Fonte: Elaborado pelos autores, 2021.

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REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 14.017, de 29 de junho de 2020. Dispõe sobre as medidas de emergência a


serem adotadas durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto
Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020. Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/Lei/L14017.htm . Acesso em 05/
2021

DAGNINO, Renato. CAVALCANTI, Paula Arcoverde. COSTA, Greiner. (orgs) Gestão Estratégica
Pública. São Paulo, 2016, Editora Fundação Perseu Abramo.

FRANCA (SP). Edital de Chamamento Público nº 001/2020, de 3 de outubro de 2020. Edital de


chamamento público para a seleção de espaços artísticos e culturais, microempresas e
pequenas empresas culturais, cooperativas, instituições e organizações culturais
comunitárias que tiveram as suas atividades interrompidas por força das medidas de
isolamento social. Disponível em:
https://www.franca.sp.gov.br/index.php?option=com_phocadownload&view=file&id=7775:
editais-artes-cultura-esporte-e-lazer&Itemid=1925&start=20 Acesso em: 01/2020

FRANCA (SP). Edital de Chamamento Público nº 002/2020, de 10 de outubro de 2020. Edital


de chamamento público para seleção de propostas de atividades artísticas e culturais que
possam ser transmitidas pela internet ou disponibilizadas por meio de redes sociais e outras
plataformas digitais. Disponível em:
https://www.franca.sp.gov.br/index.php?option=com_phocadownload&view=file&id=7800:
selecao-de-agentes-culturais&Itemid=1925&start=20 Acesso em: 01/2020

FRANCA (SP). Edital de Chamamento Público nº 003/2020, de 10 de outubro de 2020. Edital


para seleção de agentes culturais (pessoas, grupos ou entidades) que tenham prestado

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relevante contribuição ao desenvolvimento artístico ou cultural do município. Disponível


em:https://www.franca.sp.gov.br/index.php?option=com_phocadownload&view=file&id=78
01:selecao-de-proposta-de-atividades-artisticas-e-culturais&Itemid=1925 Acesso em:
01/2020

GAVIRA, Muriel de Oliveira; MORAES, Clauciana Schmidt Bueno; DADARIO, Andrew Maranhão
Ventura (orgs.) Administração e gestão sustentável: contexto e ferramentas. São Carlos,
2017, RiMa Editora.

SILVA, Benedita da. Cartilha, Memória e Análise da Lei Aldir Blanc. - 2020. Disponível em:
https://www.satedsp.org.br/wp-content/uploads/2020/07/Memoria-e-Analise-sobre-a-Lei-
Aldir-Blanc.pdf . Acesso em: 05/2021

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SOBRE OS AUTORES

Matheus Fernandes Alves Lopes é Bacharel e Licenciado em História pela Universidade


Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP/Franca) e aluno do programa de mestrado
profissional em Planejamento e Análise de Políticas Públicas da Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho”. Sua pesquisa analisa o Plano Diretor como um instrumento para
qualificar a gestão do patrimônio histórico em cidades médias brasileiras. Já atuou como
representante da macrorregião de Franca no Sistema Estadual de Museus de São Paulo
(SISEM-SP) e atualmente é bolsista da Universidade Virtual do Estado de São Paulo (UNIVESP).

Rafael de Oliveira Guaranha Garcia é Bacharel em Ciências e Humanidades e em Políticas


Públicas pela Universidade Federal do ABC, atualmente aluno no programa de mestrado
profissional em Planejamento e Análise de Políticas Públicas da Universidade Estadual “Júlio
de Mesquita Filho” (UNESP/Franca). Sua pesquisa trata da ação Pontos de Cultura no
município de São Bernardo do Campo. Com trajetória no campo social e da cultura, já atuou
no setor de gestão interna em produtoras culturais e consultoria de avaliação de projetos
sociais. No setor privado, atuou como estagiário nos setores de análise de operações e BI. No
setor público, atuou durante o período de 1 ano e 8 meses na Secretaria Municipal de Cultura
da PMSP. Inicialmente, diretamente no Pro-Mac (Programa Municipal de Apoio a Projetos
Culturais) e posteriormente como Assessor de gabinete. Atualmente, é analista de Customer
Success free-lancer e tradutor em empresa de e-commerce.

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