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TRAUMATOLOGIA FORENSE II

Ferimentos produzidos por projéteis de


arma de fogo

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Noções de Balística
 Quando nos referimos aos tipos de
instrumentos que podem produzir lesões no
homem, citamos os perfuro-contundentes,
isto é, aqueles que perfuram e contundem
simultaneamente, e demos como exemplo as
lesões causadas pelas “armas de fogo”.
 Agora trataremos das lesões perfuro-
contusas, ou seja, aquelas produzidas por
arma de fogo, porém, trataremos da
superficialmente da “Balística Forense” para
interpretar com melhor propriedade alguns
conceitos de medicina legal.
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1. Conceito de Balística
 Trata-se da disciplina que estuda basicamente
as armas de fogo, as munições, os fenômenos
e os efeitos de seus disparos, com finalidade
de auxiliar o Poder Judiciário. Portanto,
podemos dizer que a Balística:
“é a parte do conhecimento criminalístico
e médico-legal que tem por objeto especial
o estudo das armas de fogo, da munição e
dos fenômenos e efeitos próprios dos tiros
dessas armas, no que tiverem de útil ao
esclarecimento e à prova de questões de
fato, no interesse da justiça”. (Eraldo
Rabello)
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2. Armas de fogo
 Conceitualmente, armas de fogo são
engenhos mecânicos destinados a lançar
projéteis no espaço pela ação da força
expansiva dos gases oriundos da
combustão da pólvora. Sua principal
característica é a de aproveitar a grande
quantidade de gases oriundos da reação
química de combustão da pólvora
(propelente), para obtenção de energia
mecânica e consequente arremesso do
projétil. (Del Campo)
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2.1 Revólver
Mira Cano Tambor Alça de mira

Orelha do cão
Chave do tambor

Haste do extrator Corpo da arma

Suporte do tambor Cabo


Gatilho
Guarda-Mato
Apud – Del-Campo – ob. cit. – p. 168

 O revolver pode ser definido como uma arma curta, de repetição,


não automática. O comprimento do cano, o número de raias e sua
direção, capacidade do tambor e o tipo de mecanismo, variam de
arma para arma e são particularidades que servem para sua
identificação. Na imagem acima observamos um típico revólver
calibre 38, cuja característica principal é a de apresentar um único
cano e várias câmaras de combustão (tambor). (Cristiano Arantes)
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 O mecanismo de ação de um revólver ocorre da seguinte forma: o
disparo ocorre quando o cão é liberado pela pressão ao gatilho e seu
percussor atinge a espoleta na base do cartucho, iniciando o
processo de disparo do projétil.
 Na sequência, para a realização de um segundo disparo, novamente
é pressionado o gatilho que afasta o cão e ao mesmo tempo
rotaciona o tambor, alinhando nova câmara de combustão
(carregada com outro cartucho), e o processo se repete.
 Desta forma, os revólveres podem funcionar em ação simples ou
dupla:
a. Na ação simples o agente recua manualmente o cão até sua
posição máxima posterior, engatilhando a arma, bastando leve
pressão no atilho para que este (cão) se libere, o que irá produzir o
disparo.
b. Na ação dupla, o agente pela pressão ao gatilho faz com que o cão
recue em um primeiro estágio, ao mesmo tempo em que o tambor é
rotacionado, e em segundo momento libera o cão para o disparo,
tudo em uma única sequência.
Exemplo de revólveres: Calibre 22, 32, 38, Magnum 44, etc.

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Revólver

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2.2 Pistolas semiautomáticas
Massa de
Mira Alça de
Ferrolho mira
Cano
Cão
Registro de
Segurança

Gatilho
Cabo

Guarda-Mato

Pente
Apud – Del-Campo – ob. cit. – p. 169

 A pistola é uma arma de fogo portátil, leve, de cano curto, raiado e que se pode
manejar com uma só mão. É uma arma pequena e de fácil manuseio, feita
originalmente para uso pessoal (uso por uma pessoa) em ações de pequeno-
alcance. Definida também como arma curta, as pistolas apresentam as mesmas
características dos revólveres, porém com diferença básica de não possuírem
tambor e sim pente de alimentação da câmara de combustão única. Por essa
característica são chamadas de semiautomáticas, em face de usarem os gases do
disparo anterior para ejetar o cartucho disparado e recarregar um novo em sua
câmara de combustão. (Cristiano Arantes)
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 No revólver esta força é perdida uma vez que a culatra é fixa e
serve apenas para impedir que o estojo saia pela parte de trás,
já as pistolas utilizam-se desta força, levando para trás o
ferrolho, como dito, retiram e ejetam o cartucho velho e pela
força da mola existente no pente posicionam novo projétil, em
uma única e rápida sequência, deixando o cão em posição
engatilhado. Bastando, desta forma leve pressão no gatilho
para novo disparo. (Del Campo)
 Existem também alguns modelos totalmente automáticos, que
podem disparar vários tiros enquanto se mantiver o gatilho
pressionado.
 Exemplos de pistolas: Glock (Áustria); .40 (Smith & Wesson);
9mm (Mauser)
 Obs: Existe uma espécie de classificação de armas que é pelo
calibre da arma. Calibre é a medida utilizada para indicar o
diâmetro interno do cano e a munição correspondente. Calibre
nominal é o valor empregado comercialmente e Calibre real é
a medida efetiva do diâmetro interno do cano. Existem vários
sistemas, o mais conhecido é o americano (Ex: 22, 32, 38, 44
etc.) e o sistema métrico (ex: 9mm, 7.65 mm, etc.)
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Prof. Florestan - Toledo - 2015 11
Pistolas semiautomáticas

Prof. Florestan - Toledo - 2015 12


Prof. Florestan - Toledo - 2015 13
2.3 Escopeta e Espingarda
 O termo escopeta é designado às armas de cano curto e grosso
calibre e alma lisa, ou seja, cano sem raias (diferente dos
revólveres e pistolas que os tem raiado), e segundo leciona Del
Campo, o termo espingarda é para as de cano longo, alma lisa e
calibres menores. Geralmente de uso militar ou bélico, possui
normalmente um único barril de tiro e um recarregador externo
que deve ser acionado manualmente para preparar o próximo
disparo. Costuma-se referir às escopetas como a famosa “12”,
uma alusão ao conhecido modelo PKS-12.
 O que no Brasil denomina-se espingarda recebe o nome de
caçadeira em Portugal, lá, espingarda é o mesmo que fuzil para os
brasileiros. Seu nome deriva do francês “espingarde”, que
designa qualquer arma de cano longo e alma lisa.
 No Brasil a espingarda é uma arma longa, de cano não raiado, de
nome popular “cartucheira”. Utiliza, em geral, munições
carregadas com múltiplos “balins” esféricos de chumbo, mas,
dependendo da finalidade, podem empregar também projétil
singular (balote).
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Outras armas de fogo
 Carabina: origem italiana, é uma arma portátil e de
repetição, com cano longo e de alma raiada. O cano mede
entre 45 cm a 51 cm. Seu comprimento menor, o a faz
diferente das espingardas e escopetas. A alimentação e o
carregamento das carabinas são feitos pelo sistema de
alavanca.
 Rifle: são armas longas, portáteis, de carregamento manual
(não automático) ou de repetição, cano longo e de alma
raiada. O rifle é maior que a carabina (o cano tem
aproximadamente 61 cm). O rifle possui dois canos e o
sistema de carregamento é por alavanca e pode ser também
semiautomático
 Fuzil: é uma arma longa, portátil e automática, com alma
raiada, calibre potente e que tem, normalmente, uso
militar. Tem uma cadência de tiro entre 650 a 750 disparos
por minuto Ex: Ak 47 (Russo), Fal (Belga), AR15 - M16 (EUA)

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Escopeta

Espingarda
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Carabina

Rifle

Fuzil

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3. Munição
 O termo munição é o que designa o
cartucho como um todo considerado. Este
é composto por:
1- Estojo;
2- Espoleta (com mistura iniciadora)
3- Pólvora (propelente)
4- Projétil (propriamente dito)
5- Embuchamento (casos de armas de alma
lisa)
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 Assim, munição é o conjunto de cartuchos
necessários ou disponíveis para uma arma
ou uma ação qualquer em que serão
usadas arma de fogo. Cartucho é o
conjunto do projétil e os componentes
necessários para lançá-lo, no disparo.

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3.1 Estojo
 Trata-se de um componente indispensável às armas modernas.
O estojo possibilita que todos os componentes necessários ao
disparo fiquem unidos em uma peça facilitando o manejo da
arma e acelera o intervalo em cada disparo.
 Atualmente, a maioria dos estojos são construídos em metais
não-ferrosos, principalmente o latão (liga de Cobre e Zinco –
CuZn), mas também são encontrados estojos construídos com
diversos tipos de materiais como plásticos (munição de
treinamento e de espingardas), papelão (espingardas) e
outros.
 A forma do estojo é muito importante, pois as armas
modernas são construídas de forma a aproveitar as suas
características físicas.

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3.2 Espoleta (com mistura
iniciadora)
 A espoleta é um recipiente que contém a
mistura detonante e iniciadora. A mistura
detonante, é um composto que queima
com facilidade, bastando o atrito gerado
pelo amassamento da espoleta contra a
bigorna, provocada pelo percussor (cão). A
queima dessa mistura gera calor, que passa
para o propelente, através de pequenos
furos no estojo, chamados eventos.
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3.3 Pólvora (propelente)
 Propelente ou carga de projeção é a fonte de
energia química capaz de arremessar o projétil a
frente, imprimindo-lhe grande velocidade,
aumentada pelos raios do cano que o faz girar
sobre seu próprio eixo de forma a romper mais
facilmente a resistência do ar.
 A energia é produzida pelos gases resultantes da
queima do propelente, que possuem volume muito
maior que o sólido original e seu rápido aumento
de volume de matéria no interior do estojo gera
grande pressão para impulsionar o projétil. A
queima do propelente no interior do estojo, gera
pressão suficiente para destacar o projétil e
avançá-lo pelo cano, sem causar danos à arma.
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 Atualmente, o propelente usado nos cartuchos é a
pólvora química ou pólvora sem fumaça. Desenvolvida
no final do século passado, substituiu com grande
eficiência a pólvora negra, que hoje é usada apenas em
velhas armas de caça e réplicas. Esse tipo de pólvora
produz pouca fumaça e muito menos resíduos que sua
precursora, além de ser capaz de gerar muito mais
pressão, com pequenas quantidades.
 Dois tipos de pólvoras sem fumaça são utilizadas
atualmente em armas de defesa:
1. Pólvora de base simples: fabricada a base de
nitrocelulose, gera menos calor durante a queima,
aumentando a durabilidade da arma; e
2. Pólvora de base dupla: fabricada com nitrocelulose e
nitroglicerina, que tem maior conteúdo energético.
 O uso de ambos tipos de pólvora é muito difundido e a
munição de um mesmo calibre pode ser fabricada com
um ou outro tipo.
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3.4 Projétil
 O projétil é o que conhecemos vulgarmente por “bala”. Os
primeiros foram esféricos, hoje, os projéteis podem ser de
inúmeros tipos: cilíndricos, cônicos, ogivais, etc.
 Projétil é qualquer objeto sólido que pode ser ou foi
arremessado, lançado. No universo das armas de defesa, o
projétil é a parte do cartucho que será lançada através do
cano.
 O projétil pode ser dividido em três partes:
1- Ponta: parte superior do projétil, fica presa sempre
exposta, fora do estojo;
2- Base: parte inferior do projétil, fica presa no estojo e está
sujeita à ação dos gases resultantes da queima da pólvora;
3- Corpo: cilíndrico, geralmente contém canaletas
destinadas a receber graxa ou para aumentar a fixação do
projétil ao estojo.
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3.4.1 Espécies de projéteis
Os projéteis são geralmente de chumbo,
mas existem projéteis especiais
(encamisados) que podem ter outros
materiais (ex: aço, cobre, zinco, etc.). Os
projéteis podem ser, em princípio,
múltiplos ou únicos.

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• Projéteis múltiplos (balins): são utilizados em armas de alma
lisa (ex: espingardas), sendo também conhecidos por “balins”
ou vulgarmente por “cartucho de munição”. São
compreendidos por chumbos de formato esférico e de
tamanho variável, sendo identificado por números ou letras
(Ex: Cartucho calibre 12). Os cartuchos de projéteis múltiplos
possuem também buchas de plástico ou de papelão, o que é
chamado de “embuchamento”, que tem função de impulsionar
os projéteis pelo cano da arma e manter a carga de balins
agrupada o maior tempo possível.
• Projéteis únicos ou unitários: são aqueles utilizados em armas
de alma raiada (ex: revólveres ou pistolas), onde o cartucho é
constituído de um único projétil. Podem ter liga de chumbo,
encamisados, de cobre, etc. Apresentam um formato
cilíndrico, ogival, pontiagudo, etc.

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Fechamento
Projétil
Projéteis (balins)

Estojo Tubo (plástico ou papelão)

Bucha
Pólvora (propelente)
Propelente
Estojo de metal
Iniciador Base

Espoleta Espoleta

 A figura acima mostra as principais partes de um cartucho


de munição para armas de cano com alma raiada
(projéteis unitários) e para aquelas de cano com alma lisa
(projéteis múltiplos).

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Mecanismo de expansão do
projétil

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Projéteis múltiplos

Projéteis antimotins: são aqueles que tem por


finalidade demonstrar força em tumultos violentos
através de munições que não causem ferimentos
letais (ex: projétil de latex que é chamado de
munição de elastômero)
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3.4.2 Projéteis Especiais
(encamisados ou jaquetados)
 São projéteis construídos por um núcleo
recoberto por uma capa externa chamada camisa
ou jaqueta. A camisa é normalmente fabricada
com ligas metálicas como: Cobre e Níquel (CuNi),
Cobre (Cu), Níquel e Zinco (NiZn); Cobre e Zinco
(CuZn), Cobre, Zinco e Estanho (CuZnSn) ou Aço.
O núcleo é constituído geralmente de Chumbo
(Pb) praticamente puro, conferindo o peso
necessário e um bom desempenho balístico.

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 Os projéteis encamisados podem ter sua capa externa aberta na
base e fechada na ponta (projéteis sólidos) ou fechada na base e
aberta na ponta (projéteis expansivos).
 Os projéteis sólidos têm destinação militar, para defesa pessoal
ou para competições esportivas. Destaca-se sua maior capacidade
de penetração e alcance.
 Os projéteis expansivos são aqueles conhecidos popularmente
como “balas dum dum”, destinam-se à defesa pessoal, pois ao
atingir um alvo humano é capaz de amassar-se e aumentar seu
diâmetro, obtendo maior capacidade lesiva. Os projéteis
expansivos podem ser classificados em totalmente encamisados
(a camisa recobre todo o corpo do projétil) e semi-encamisados (a
camisa recobre parcialmente o corpo), deixando sua parte
posterior exposta.
 Esse tipo de projétil (expansivo) teve seu uso proibido para fins
militares pela Convenção de Genebra.

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Projéteis especiais

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4. Lesões perfuro-contusas
 Após as noções gerais de balística, vamos analisar as
lesões causadas por instrumentos perfuro-
contundentes, isto é, aqueles que perfuram e
contundem simultaneamente (lesões perfuro-
contusas);
 Esses ferimentos apresentam bordas irregulares, com
grande predomínio da profundidade sobre a
superfície e caráter penetrante ou transfixante.
 As lesões perfuro-contusas mais típicas são aquelas
produzidas por projéteis acionadas por arma de fogo,
estes, agindo por impulsão e rotação, determinam a
formação de um orifício e de zonas de contorno
junto a pele. A forma desse orifício e de suas zonas
de contorno depende da incidência do tiro (oblíquo,
perpendicular, tangencial) e de sua distância.
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Apud – CAMARGO JUNIOR – ob. cit. – p. 67

 O verdadeiro agente vulnerante das lesões


perfuro-contusas, no caso de armas de fogo, é o
projétil (a bala ou os grãos de chumbo), sempre
impulsionados pela carga, pela força expansiva
dos gases, que ocorre no momento da
deflagração, do disparo ou da detonação do tiro,
da combustão da pólvora.
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 O projétil de arma de fogo é um agente mecânico
perfurocontundente, que determina uma lesão de natureza
perfurocontusa.
 O estudo das lesões produzidas pela ação de projéteis de arma de
fogo, sejam eles unitários ou múltiplos, apresenta relevância
especial, primeiro porque constituem número expressivo de
ocorrências, em grande número de etiologia criminosa. Além
disso, pela multiplicidade de facetas e características, geralmente
fornecem elementos preciosos à investigação, determinação da
causa jurídica do evento ou ainda da possível autoria.
 Na análise dos ferimentos produzidos por projéteis de arma de
fogo, quatro são os pontos que devem merecer atenção:
a) determinação e descrição dos ferimentos de entrada e saída;
b) a trajetória do projétil no interior do corpo, bem como a
descrição das lesões internas;
c) a orientação do disparo em relação à posição do corpo; e
d) a distância provável do disparo.
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Ferimentos de entrada
 As características dos ferimentos de entrada produzidos
por projéteis de arma de fogo dependem, basicamente,
de três fatores principais, quais sejam: tipo de munição
empregada (projétil unitário ou projéteis múltiplos),
ângulo de incidência e distância de tiro.

do tipo de munição projétil único


As características empregada projéteis múltiplos
do ferimento de
entrada dependem do ângulo de incidência
da distância em que foi
efetuado o disparo

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Ferimentos de saída
 Os ferimentos de saída somente existem, por óbvio, se
o projétil transfixar o corpo. Não têm grande
importância, salvo na determinação da trajetória,
porque não possuem características próprias.
 Como regra, o ferimento de saída é irregular, maior que
o de entrada, até porque o projétil frequentemente se
deforma em sua passagem pelos tecidos orgânicos, e
tem as bordas voltadas para fora.
 Alguns projéteis especiais, de alta energia, com
velocidades superiores a 750 m/s, em razão das ondas
de choque produzidas pelo seu deslocamento,
costumam produzir ferimentos de saída de grandes
proporções.

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Ferimentos produzidos por
projéteis múltiplos (balins)
 Nos disparos efetuados com cartuchos de
munição de projéteis múltiplos (armas de alma
lisa), o aspecto da lesão depende, basicamente,
da distância em que foram realizados e da
consequente abertura do cone de dispersão.
 Em tiros muito próximos ou encostados, os
projéteis múltiplos causam grande destruição
tecidual, muitas vezes acompanhada de
significativa perda de substância.

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 Nos disparos efetuados a distância, o que observamos é a
existência de lesões múltiplas, como se produzidas por
vários disparos unitários, distribuídas ao redor de um
ponto central, e que se afastam mais uma da outra
quanto maior for a distância entre o atirador e o alvo.
 O ângulo de tiro irá determinar o formato da lesão única
(se o tiro for a curta distância) ou do desenho formado
pela distribuição das múltiplas lesões (nos tiros a
distância), que poderá ser circular, nos disparos
perpendiculares ao alvo, e elíptico ou cônico, quando a
carga de projéteis incidir de maneira oblíqua sobre o alvo.

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Ferimentos produzidos por
projéteis unitários
 A lesão de entrada produzida por projétil de
arma de fogo é geralmente circular, na
dependência do ângulo de incidência e das
linhas de tensão que atuam sobre a pele (Leis
de Filhós e Langer). Excepcionalmente, podem
ter formato de diverso, atípico, quando o
projétil se deforma, ou perde sua trajetória,
para penetrar no corpo com sua face lateral,
cilíndrica, determinando, assim, um ferimento
de entrada com formato de letra “D”.
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 A lesão também terá conformação atípica quando
o projétil atingir tangencialmente a pele, “de
raspão”, hipótese em que o ferimento irá
apresentar-se como uma escoriação de formato
alongado. Nesse caso, é claro, não se pode falar em
ferimento de entrada, pois o projétil não penetrou
o corpo.
 Apesar de haver certa correspondência de forma
entre a seção do projétil e o ferimento, não é
possível determinar o calibre da arma pelo
diâmetro da lesão, visto que, em razão da
elasticidade da pele e das linhas de tensão, o
orifício de entrada pode ser menor, maior ou igual
ao diâmetro do projétil que lhe deu origem.

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 O ferimento de entrada tem geralmente bordos
invertidos, voltados para o interior do corpo,
característica contrária à dos ferimentos de saída, que
possuem as bordas evertidas, levantadas, indicando
claramente o sentido de sua trajetória.
 Como exceção, temos a câmara de Hoffmann ou câmara
de mina, observada nos tiros encostados em regiões que
recobrem tábuas ósseas, em que o ferimento de entrada
tem os bordos evertidos, voltados para fora.
 Além do aspecto morfológico, ao redor dos ferimentos de
entrada produzidos por projéteis de arma de fogo,
podemos observar algumas espécies de orlas (ou halos) e
zonas, fenômenos que se apresentam de fundamental
importância tanto para a caracterização da natureza do
ferimento como para a determinação da distância em que
foi realizado o disparo.
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 As orlas (ou halos) são regiões circunscritas, regulares,
que circundam o ferimento como pequenas auréolas,
dando-lhe características especiais que permitem
diferenciar as lesões produzidas por projétil de outras
determinadas por instrumentos diversos.
 As zonas compreendem áreas maiores, irregulares, que
podem ou não estar presentes e que terão importância
fundamental na determinação da distância do disparo.
escoriação
orlas ou halos contusão
Ferimento de entrada
enxugo
de projétil
esfumaçamento
zonas chamuscamento
tatuagem

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Orlas ou halos de contusão,
escoriação e enxugo
 A pele é constituída por duas camadas distintas, a
epiderme e a derme. A primeira é mais fina e menos
elástica, rompendo-se de imediato pelo embate do
projétil. A segunda, a derme, mais elástica, acompanha o
projétil, encapsulando-o parcialmente antes de se
romper, para depois voltar à posição original.

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Orla de contusão
 Em que pese o projétil ser mais ou menos
pontiagudo, para ele penetrar ao corpo, tem que
forçar a pele, produzindo ali uma contusão,
 Assim, a primeira orla produzida é a de contusão,
que corresponde a “região equimótica”
decorrente da lesão ocasionada pelo embate do
projétil na pele. Trata-se de um halo (círculo)
róseo que circunda o orifício de entrada e que é
mais evidente nas pessoas de pele clara, sendo
difícil de observar em peles de tonalidade mais
escura.
Prof. Florestan - Toledo - 2015 54
Orla de escoriação
 Como a epiderme é menos elástica que a derme, após a
passagem do projétil é possível observar uma pequena
retração com consequente exposição da derme, como se
tivéssemos dois anéis, um, de diâmetro maior, formado
pela ruptura da epiderme (orla de contusão), e um outro, de
diâmetro menor, formado pela exposição da derme. A esse
anel (de exposição da derme) denominamos orla ou halo de
escoriação
 A orla de escoriação é originada durante a formação do
túnel de penetração do projétil, quando pequenos vasos
sanguíneos são tracionados e rompidos, formando
escoriações em torno do ferimento. Esta orla, que consiste
um túnel hemorrágico, permite determinar o trajeto do
projétil.
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 OBS: os autores costumam agrupar as orlas de
contusão e de escoriação como se formassem uma
única, apresentando, também, como sinônimos os
termos orla erosiva (Piedelièvre e Desoille) e anel ou
orla de Fisch (Croce).
 Na verdade, a orla de escoriação corresponde à
diminuta exposição da derme sobre a lesão causada na
epiderme, em razão da diferença de elasticidade entre
as camadas. A orla de contusão, por outro lado, indica
uma área maior, que circunda o ferimento, e é formada
pelo halo decorrente da lesão dos vasos capilares da
área atingida pelo embate do projétil.

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Orla de enxugo
 Quando o projétil passa pelo cano da arma, ele
“se suja” com as impurezas ali existentes, e ao
atravessar a pele, “se lava e enxuga”, deixando
na epiderme a sua marca. É caracterizada por
uma aréola apergaminhada, milimétrica, que
circunda a borda do orifício, resultante do
impacto e da pressão rotatória feita pelo projétil
contra a pele, antes de rompê-la, limpando-o da
ferrugem, óleo ou fumaça que traz. E geralmente
de cor escura, circular nos tiros perpendiculares e
ovular ou elíptica nos tiros oblíquos.
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 Assim, ao atravessar a derme, o projétil
literalmente se enxuga. Limpa-se das sujeiras e
impurezas trazidas do cano da arma, restos de
pólvora e fuligem depositados em sua superfície,
deixando na derme um anel enegrecido a que se
convencionou chamar de orla de enxugo e que
normalmente impede que observemos a orla de
escoriação, que fica parcialmente sobreposta a ela.

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Ferimento de
entrada

Orla de enxugo
Orla de escoriação
Orla de contusão
59
Zonas de chamuscamento,
esfumaçamento e tatuagem
 Quando uma arma é disparada, juntamente com o projétil
são expelidos pela boca do cano um considerável volume de
gases em alta temperatura e em combustão, certa
quantidade de fumaça (que varia de acordo com o
propelente utilizado) e pequenos grãos de pólvora
(combustos, semicombustos ou em combustão), assim
como micropartículas metálicas oriundas da abrasão do
projétil no cano da arma.
 Esses componentes são impelidos juntamente com o
projétil, mas, como têm massa infinitamente menor, não
possuem energia cinética para ir além de uns poucos
centímetros da boca do cano da arma, podendo não atingir
o alvo.
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Zona de chamuscamento
 Resulta da ação do calor e dos gases quentes que saem pelo
cano da arma, queimando os pelos e a epiderme. Também é
chamada de “zona de queimadura”.
 Se o disparo for efetuado muito próximo do alvo, algo em
torno de 5 cm, poderemos ter a zona de chamuscamento,
que nada mais é que uma região onde a pele é literalmente
queimada pela chama que sai pela boca do cano da arma.

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Zona de esfumaçamento
Para uma distância maior, de até 30 cm, a
fumaça decorrente do disparo poderá atingir o
alvo e depositar-se ao redor do ferimento de
entrada, produzindo a chamada zona de
esfumaçamento.

62
Zona de tatuagem
 Finalmente, e exatamente porque têm massa maior
que as partículas de fuligem, restam os grãos de
pólvora e as partículas metálicas decorrentes da
abrasão do projétil no cano da arma, que incidem
sobre o alvo como verdadeiros projéteis secundários,
por vezes incrustando-se na pele de tal maneira que
formam verdadeiras tatuagens (zona de tatuagem).

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• Os fenômenos aqui observados ocorrem porque o calor, a
fumaça e os grânulos de pólvora combusta ou em
combustão, além de outras impurezas que saem do cano da
arma, alcançam a pele. São as hipóteses dos famosos “tiros
à queima roupa” (curta distância).
• Esta nuvem de elementos forma um cone com a base
voltada para o alvo. Esta base será maior quanto mais
afastado do alvo for disparado o projétil, tendendo a
diminuir a medida que esta distância é reduzida. Logo, as
características desse disparo dependem diretamente de
fatores como a munição e o tipo de arma empregada, não
podendo apresentar como regra uma distância categórica.
• O ferimento, nesses casos, é rico em elementos
característicos, sendo formado por um orifício de bordas
invertidas com orla de contusão, escoriação e enxugo, e
zona de esfumaçamento, chamuscamento e de tatuagem.
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 1- Orla de Enxugo;
 2- Orla de escoriação;
 3- Zona de esfumaçamento;
 4- Zona de tatuagem.

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 Nos casos de tiros à distância (além de cinquenta
centímetros ) só o projétil alcança o alvo,
formando um orifício de bordas invertidas com
orla de contusão, escoriação e enxugo, sem as
zonas de chamuscamento, esfumaçamento e de
tatuagem.

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Prof. Florestan - Toledo - 2015 69
Disparos encostados
 Nos disparos encostados temos de diferenciar duas situações
distintas: os disparos que atingem unicamente tecidos moles e os
que incidem sobre partes do corpo que recobrem ossos planos,
por exemplo, os do crânio.
 Quando o disparo encostado atinge unicamente tecidos moles,
além do projétil, todos os demais elementos penetram no
ferimento, causando uma lesão interna de grande monta. As
zonas de chamuscamento, esfumaçamento e tatuagem ficam
todas no interior do corpo, mas o orifício de entrada permanece
com sua configuração circular ou elíptica, com bordas invertidas.
 Por vezes, na dependência da força com que a arma foi
pressionada sobre a região atingida, é possível evidenciar a marca
do cano sobre a pele. Isso é chamado de “Sinal de Werkgaertner”.
Esses ferimentos são frequentemente observados em suicídios.

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Sinal de
“Werkgaertner”

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• Neste tipo de disparo (tiro de encosto), o cano da
arma fica intimamente encostado no alvo. O
ferimento de entrada caracteriza-se por ser um
orifício de bordas denteadas, desarranjadas e
invertidas, sendo este último elemento decorrente
da violenta força expansiva dos gases. A presença
de pólvora na porção inicial do trajeto torna o
orifício enegrecido.

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 Quando, logo abaixo da região atingia, existe uma tábua
óssea, o projétil pode (ou não) conseguir perfurá-la, mas os
gases e as micropartículas certamente não. Nesses casos há
um deslocamento dos tecidos e uma verdadeira explosão,
no sentido inverso (de dentro para fora), pelo refluxo dos
gases, formando um ferimento de conformação estrelada e
de bordos evertidos (para fora), como se fosse uma
“cratera”. Isto é denominado de câmara de mina ou
câmara de Hoffmann.

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Observações conclusivas
 Devemos ainda considerar o Trajeto, que é o caminho percorrido
pelo projétil em seu efeito danoso. Uma variável a ser
considerada em relação a direção do tiro, se ele, o projétil,
“estourou” partes do corpo (ex. tiro na boca, balas Dum-Dum).
Porém, geralmente é retilíneo e cilíndrico e quando transfixante,
termina no orifício de saída. Nas necrópsias, no trajeto percorrido
pelo projétil dentro do corpo, pode-se encontrar restos do
cartucho, como pólvora incombusta, a bucha, ou, ainda,
fragmentos de roupa, pele, pelos, esquírolas ósseas, etc.
 O Orifício de Saída, nas lições de Benedito Soares de Camargo
Júnior, é único e apresenta bordos evertidos (virados para fora), é
irregular ou em fenda, maior que o orifício de entrada e maior
que o diâmetro do projétil. Comumente dá saída às matérias
orgânicas: massa encefálica, ossos, muito sangue, etc. Não
apresentam zonas de tatuagem, chamuscamento ou
esfumaçamento.
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 Comparação esquemática em relação aos achados no orifício de
entrada em comparação com o de saída, que reproduzimos
abaixo:
Entrada Saída
1. Regular 1. Dilacerado
2. Invertido 2. Evertido
3. Proporcional ao projétil 3. Desproporcional ao projétil (maior)
4. Com orlas e zonas 4. Sem orlas e zonas

 Obs: nem sempre as coisas são simples e esquemáticas. Se


aparecer, na saída, uma orla de contusão e ocorrer proximidade
de entrada, já não será tão fácil a diferenciação entre ambos
(entrada e saída). Também, se o projétil antes de penetrar no
organismo tiver sofrido “ricochete”, características da saída
poderão estar presentes na entrada.

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 A diferenciação, entretanto, tem grande importância,
pois pode fornecer subsídios para o estudo da direção do
disparo, de alta valia no estudo da natureza jurídica do
evento letal.
 é imprescindível que o examinador (Médico-Legista),
proceda a minuciosa descrição das características de
ambos os orifícios (se existirem).
 Insta salientar que várias são as questões periciais de
interesse jurídico que se apresentam, dentre as quais
destacamos:
1. Natureza do fato: acidente, suicídio ou homicídio
2. Distância do disparo, para estudo de autoria
3. Identificação da arma, também visando o
estabelecimento da autoria
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Bibliografia da AULA
BENFICA, Francisco Silveira; VAZ, Márcia. Medicina Legal . Porto Alegre: Livraria do
Advogado. Editora, 2008.
CARDOSO, Leonardo Mendes. Medicina Legal para o acadêmico de Direito. Belo
Horizonte: Del Rey, 2006.
CROCE, Delton; CROCE JÚNIOR, Delton. Manual de medicina legal. 6. ed., rev. São
Paulo: Saraiva, 2009.
HERCULES, Hygino de C. Medicina legal: texto e atlas. São Paulo: Atheneu, 2008.
Obs: as figuras e ilustrações deste material foram retiradas das obras indicadas e
de sites da internet
Principais obras cujo conteúdo foi extraído:
ARANTES, Artur Cristiano. Fundamentos de Medicina Legal para o acadêmico de
Direito. São Paulo: Lemos e Cruz, 2007.
ROBERTO, Eduardo ; DEL-CAMPO, Alcântara. Medicina II. 6. ed. São Paulo: Saraiva,
2009.

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