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6 de Março de 2020

Vendi um veículo e não transferi, o que pode ser feito


agora?

Artigo escrito pelo Dr. Bruno C. Goveia

Imagine comigo a seguinte situação: você vende seu veículo para um


particular, outra pessoa, faz ou não o contrato de compra e venda, a
pessoa lhe paga à vista ou de forma parcelada, você não faz o
comunicado de venda ao órgão de trânsito, também, não fica com uma
cópia do DUT/CRV, pois, o comprador disse que faria no dia seguinte a
transferência.

Passado um tempo, você começa a receber multas de trânsito, avisos de


não pagamento de impostos, inscrição em dívida ativa, chega até a ter a
suspensão do direito de dirigir por ter atingido o limite máximo de
pontos permitidos pela lei, enfim, um tremendo problema, conhece
alguém que esteja nessa situação ou você leitor, já passou ou passa por
situação parecida?

Hoje vamos tentar trazer uma luz sobre esse tema, complicado, que
pode gerar muita dor de cabeça e que a princípio, parece não ter
solução, mas vamos mostrar que é possível resolver a questão, desde
que, se dedique um pouco de tempo, paciência e em não raros os casos,
dinheiro.
Em princípio temos que lembrar que a obrigação de comunicar a venda
do veículo é do vendedor, isso é o que consta na redação do artigo 134
do Código de Trânsito Brasileiro, portanto, já de início é algo que não
pode ser ignorado:

“Art. 134. No caso de transferência de propriedade, o


proprietário antigo deverá encaminhar ao órgão
executivo de trânsito do Estado dentro de um prazo de
trinta dias, cópia autenticada do comprovante de
transferência de propriedade, devidamente assinado e
datado, sob pena de ter que se responsabilizar
solidariamente pelas penalidades impostas e suas
reincidências até a data da comunicação.”

Assim, cabe ao vendedor, no prazo de 30 dias, informar ao órgão


competente da venda do veículo, caso não o faça, poderá ser
responsabilizado de forma solidaria (em conjunto) sobre todos os
débitos oriundos daquele veículo, podendo inclusive ser
responsabilizado criminalmente caso o veículo se envolva em algum
ilícito – um atropelamento ou para a prática de crimes, por exemplo.
*Este artigo também pode ser lido AQUI

Certo é que muitos compradores e vendedores acabam por ignorar essa


etapa, deixando para depois – e por fim, esquecendo – não é de hoje
que muitos cartórios, com a intenção de facilitar o procedimento,
evitando que a parte se desloque até o DETRAN, já possuem a
ferramenta de informação online de venda, a pessoa preenche o
DUT/CRV com os dados das partes, assina e reconhece firma e o
cartório já informa o órgão correspondente, por certo, que tal
procedimento só é feito se ocorrer o pagamento da respectiva taxa.

Vendi veículo e não transferi, e agora?


Apenas a título de curiosidade, no DETRAN, aqui do estado do Paraná,
é possível efetuar o comunicado de venda através dos correios
mediante o envio de um formulário junto com cópia autenticada do
documento oficial com foto e CPF do vendedor e cópia autenticada do
Certificado de Registro de Veículo (CRV), com firmas do vendedor e
comprador reconhecidas por autenticidade; pelos cartórios
conveniados e finalmente, indo diretamente até uma das unidades de
atendimento do DETRAN espalhadas pelo estado.

Mas, voltando para o nosso exemplo, não foi realizada a comunicação


de venda e nem a transferência, de quem é a responsabilidade sobre os
débitos do veículo e, principalmente, como fazer para que esses débitos
passem para o respectivo comprador?

Veja, se a cobrança dos débitos está sendo feita em nome do antigo


proprietário, o vendedor no nosso exemplo, é perfeitamente possível,
afinal, para todos os fins este ainda é o real proprietário do veículo,
apesar de não ter mais a posse do bem.

Para resolver o problema são necessários alguns procedimentos e


algumas etapas, pois, tudo depende se o caso ainda pode ser resolvido
na via administrativa ou se apenas na esfera judicial, mas, como assim?
Ora, se ainda cabem recursos das infrações de trânsito, é possível faze-
los informando da venda e juntando no recurso todos os documentos
que demonstrem de forma inequívoca que houve a venda do bem, tais
como o contrato de compra e venda, recibo de transferência bancária
com o valor do bem, em tempos de uso frenético do WhatsApp as
conversas podem se tornar um excelente meio de prova, em resumo,
todos os documentos que indiquem ter sido celebrado o negócio são
válidos no recurso administrativo.

?s recursos são divididos em etapas, primeiro a defesa prévia ou defesa


de autuação, que deve ser apresentada até a data limite informada na
notificação; recurso para a JARI (junta administrativa de recurso de
infrações) e por último o recurso em segunda instância para o conselho
estadual de trânsito e CETRAN. Importante lembrar que mesmo
perdendo o prazo para apresentar e defesa prévia, é possível apresentar
recurso à JARI, até a data de vencimento da multa, pois, o recurso em
segunda instância só é possível se houver decisão negativa anterior, por
certo que se houver um deferimento do recurso não é necessário
recorrer novamente.

E se o prazo para recurso


administrativo já tiver se esgotado?
Ainda é possível resolver?
Claro, mas nesse caso, será necessária a contratação de um
advogado, pois, só ele é quem poderá ingressar em juízo para pleitear
em nome do proprietário, novamente, é preciso que o vendedor
prejudicado reúna toda a documentação sobre o caso, contrato, recibo
de transferência bancária e outros, para que o poder judiciário possa
fazer uma análise completa do caso.

O advogado, munido da documentação necessária vai buscar resolver o


problema nos seguintes moldes; incluir uma restrição judicial e
bloquear a geração de débitos futuros – no caso de desconhecer o
paradeiro do comprador; transferir o veículo para o comprador
juntamente com todas as dívidas posteriores à venda – no caso de
existir contrato de compra e venda ou o preenchimento do DUT.

Quem vai poder lhe dizer qual caminho percorrer é seu advogado,
como já tido, ele é o profissional que, com conhecimento técnico,
poderá analisar a documentação e as peculiaridades do caso concreto e
definir qual é a melhor estratégia.

O que deve ser reafirmado é que só se entende como venda


efetivamente realizada após o registro do bem, ou seja, o comprador só
passa a ser verdadeiramente dono do veículo após o registro deste em
seu nome, e o caso é tão sério, que veículos vendidos mas não
registrados pelo novo comprador respondem por dívidas trabalhistas:

AGRAVO DE PETIÇÃO. EMBARGOS DE TERCEIRO.


ALIENAÇÃO DE VEÍCULO SEM REGISTRO DA
TRANSFERÊNCIA DE TITULARIDADE JUNTO AO
DETRAN. PENHORA. POSSIBILIDADE. Sabe-se que, no caso
de veículos automotores, a comprovação da propriedade é feita
mediante registro da venda no Detran, nos exatos termos do
disposto nos arts. 123, I e § 1º da Lei nº 9.503/97 (Código de
Trânsito Brasileiro) c/c 129 e 130, item 7º da Lei nº 6.015/73 (Lei de
Registros Publicos). Em outras palavras, se o adquirente de veículo
particular não o transfere para o seu nome em trinta dias contados
da compra, a venda se aperfeiçoa, mas não se transfere legalmente
a propriedade. Nessa contextura, se, juridicamente, o bem não
deixa o patrimônio do executado, responde pelas dívidas
trabalhistas. Apelo parcialmente provido.

(TRT-1 – AP: 01004448420195010046 RJ, Relator: ROSANA


SALIM VILLELA TRAVESEDO, Data de Julgamento: 25/09/2019,
Quinta Turma, Data de Publicação: 15/10/2019)
Vejamos que a decisão apresentada é recente, outubro de 2019,
portanto, certamente os tribunais ainda irão comungar deste
pensamento quando da análise de casos semelhantes, mas, voltamos a
orientar, o melhor conselho será aquele apresentado pelo advogado do
caso.

Mas, e o que fazer para evitar esses


inconvenientes?
Para isso, sempre efetue um contrato de compra e venda, elaborado
por um advogado de sua confiança, lá irão constar cláusulas que
obriguem e tragam segurança para ambas as partes da negociação;
antes de finalizar a compra e venda, preencha o DUT/CRV do seu
veículo, pegando a assinatura do comprador e autenticando ambas em
cartório, logo em seguida, realize a comunicação da venda, lembrando
que vários cartórios já fazem isso online, tornando mais rápido, fácil e
cômodo para as partes.

Finamente, é possível incluir dentro do valor da negociação, a


transferência de propriedade, neste caso, a venda já abrange o
pagamento de todas as taxas exigíveis pelo DETRAN para que seja
efetuada imediatamente a alteração de proprietário junto ao órgão
responsável. Desta forma, o veículo só seria entregue ao interessado,
depois de transferido, evitando todos os problemas que apresentamos
aqui.

E, por último, mas não menos importante, reforçamos mais uma vez,
sempre busque a orientação de seu advogado de confiança, afinal, o
valor da consulta cobrada será infinitamente menor que os honorários
e custas judiciais para a solução dos problemas que podem se originar
da negligência quanto a transferência do bem, afinal, a relação de
confiança com o comprador não é motivo relevante para você deixar de
adotar procedimentos simples de prevenção como a consulta a um
advogado e a comunicação de venda.
Artigo escrito pelo Advogado Bruno Cichella Goveia, graduado em
Direito pelo Centro Universitário UNINTER, pós-graduando em
Direito do Trabalho pela ENA – Escola Nacional da Advocacia 2020,
atuante na área trabalhista, mas seu escritório também atua nas áreas
previdenciária, cível, família e consumidor, na cidade de Curitiba –
Paraná.

www.goveiaegoveia.com.br / goveia@goveiaegoveia.com.br /
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Goveia Advogados

*Este artigo é de propriedade do site/blog Divulgando Direitos e


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