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REVISTA OBSERVATORIO DE LA ECONOMIA LATINOAMERICANA

Curitiba, v.21, n.6, p. 5072-5089. 2023.

ISSN: 1696-8352

As múltiplas faces do racismo ambiental no Brasil: uma revisão


sistemática

The multiple faces of environmental racism in Brazil: a systematic


review
DOI: 10.55905/oelv21n6-099

Recebimento dos originais: 23/05/2023


Aceitação para publicação: 28/06/2023

Karina Leonardo do Nascimento


Mestranda em Ecologia Humana e Gestão Socioambiental
Instituição: Universidade do Estado da Bahia, Programa de Pós-Graduação em Ecologia
Humana e Gestão Socioambiental (UNEB – PPGECOH)
Endereço: Av. Dr. Chastinet Guimarães, S/N, São Geraldo Juazeiro - BA
E-mail: prof.karinaleonardo@gmail.com

Sérgio Luiz Malta de Azevedo


Doutor em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
Instituição: Universidade Federal de Campina Grande, Centro de Humanidades
(UFCG) - Unidade Acadêmica de Geografia
Endereço: R. Aprígio Veloso, 882, Universitário, Campina Grande - PB,
CEP: 58429-900
E-mail: maltaslma@gmail.com

Maria do Socorro Pereira de Almeida


Doutora em Literatura e Cultura
Instituição: Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE)
Endereço: Av. Gregório Ferraz Nogueira, s/n, Serra Talhada - PE, CEP: 56909-535
E-mail: socorroalmeidaletras@gmail.com

RESUMO
Este artigo, por meio de uma revisão bibliográfica sistemática, objetiva discutir como a
literatura científica tem abordado a temática do racismo ambiental no Brasil. Buscou-se
obras indexadas nas bases de dados da Scopus Elsevier e da Web of Science. Após
aplicados os critérios de inclusão: artigos com publicações que tratem sobre o tema no
Brasil; e exclusão: artigos de revisão; indexados repetidos; realizados em outros países e;
que não respondem à questão da pesquisa, foram selecionados 14 artigos. Observou-se,
nos estudos, a interferência da sociedade burguesa sobre o racismo e que o racismo
ambiental combina o passado colonial com a contemporaneidade, com consequências em
diversas áreas, como a saúde, a educação, o direito, afetando não só as pessoas e
comunidades, mas também o meio ambiente e pode ser gerado por ações com
intencionalidades racistas ou não. Ancoramos nosso olhar teórico-crítico em vários

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estudiosos, entre eles conferimos Almeida (2019), Souza (2021), Herculano; Santos
(2007), Pacheco (2008), Melo et al (2021) e outros. Ao longo do estudo foi possível
perceber que, dentro do escopo da justiça ambiental, o racismo pode ser percebido quando
os riscos e impactos ambientais são distribuídos de forma desigual entre as populações,
recaindo mais sobre grupos socialmente vulneráveis como, negros, indígenas, mulheres,
crianças, ribeirinhos, povos de florestas, pessoas LGBTQIA+, como uma estratégia
sistemática de exclusão, negação e anulação desses povos e populações.

Palavras-chave: racismo ambiental, justiça ambiental, povos vulnerabilizados.

ABSTRACT
This article, through a systematic literature review, aims to discuss how the scientific
literature has addressed the issue of environmental racism in Brazil. We searched for
works indexed in the Scopus Elsevier and Web of Science databases. After applying the
inclusion criteria: articles with publications on the theme in Brazil; and exclusion: review
articles; repeated indexed; carried out in other countries and; that did not answer the
research question, 14 articles were selected. It was observed, in the studies, the
interference of bourgeois society on racism and that environmental racism combines the
colonial past with contemporaneity, with consequences in several areas, such as health,
education, law, affecting not only people and communities, but also the environment and
can be generated by actions with racist intentions or not. We anchored our theoretical-
critical look in several scholars, among them we confer Almeida (2019), Souza (2021),
Herculano; Santos (2007), Pacheco (2008), Melo et al (2021) and others. Throughout the
study it was possible to realize that, within the scope of environmental justice, racism can
be perceived when environmental risks and impacts are unequally distributed among
populations, falling more on socially vulnerable groups such as, blacks, indigenous
people, women, children, riverine people, forest peoples, LGBTQIA+ people, as a
systematic strategy of exclusion, denial and annulment of these peoples and populations.

Keywords: environmental racism, environmental justice, vulnerable peoples.

1 INTRODUÇÃO
A ideologia que sustenta a criação dos problemas ambientais e,
consequentemente, do racismo no Brasil está posta na relação do Capital mercantilista
com a apropriação dos recursos naturais da terra e com a objetificação das pessoas
historicamente inferiorizadas pelas desigualdades capitalistas (negros, indígenas,
mulheres, pessoas com deficiência, crianças e LGBTQIA+). Neste sentido, o racismo não
configura um problema restrito das relações sociais, suas consequências se espraiam para
o meio ambiente como um todo e se caracteriza quando os impactos das injustiças

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ambientais são sentidos distintamente por grupos sociais vulneráveis além de outras
pessoas individual e igualmente vulneráveis.
Através da relação entre racismo e justiça ambiental, este escrito visa responder a
seguinte questão: como a literatura científica tem abordado a temática do racismo
ambiental no Brasil1? Trata-se de uma revisão Bibliográfica Sistemática Integrativa nas
bases de dados da Scopus Elsevier e da Web of Science. Como critério de inclusão e
exclusão adotamos como estratégia de busca a utilização dos descritores em inglês:
"ENVIRONMENTAL RACISM" OR "ENVIRONMENTAL JUSTICE"; dos estudos
observados, 14 foram selecionados. A partir da análise dos dados, elaboramos um quadro
ilustrativo apresentando o título do estudo, autores, ano de publicação, base de dados e
revistas publicadas, além de uma síntese das principais constatações de cada artigo. Em
seguida realizamos uma análise integrativa dos estudos selecionados.

2 METODOLOGIA
Este estudo trata de uma Revisão de Literatura que utiliza o método da Revisão
Bibliográfica Sistemática Integrativa, a qual permite que diversos estudos já publicados,
sobre um fenômeno específico, sejam analisados tanto para uma melhor compreensão
sobre o assunto, quanto para revisão de novos conceitos, teorias e metodologias. (Souza
et al., 2010); (Sousa et al., 2017).
De acordo com Botelho (2011), o método requer que as etapas da pesquisa sejam
definidas e observáveis. Deste modo, para este estudo seguimos as seguintes etapas:
identificação do problema e elaboração da pergunta da pesquisa; definição dos critérios
de inclusão e exclusão e levantamento bibliográfico; categorização dos estudos
escolhidos; análise e interpretação dos resultados; síntese do conhecimento.
Partindo da relação entre racismo ambiental e justiça ambiental como tema central
da pesquisa, este estudo visa responder a seguinte questão: como a literatura científica
tem abordado a temática do racismo ambiental no Brasil?

1
O termo Racismo ambiental foi criado em 1981 pelo Dr. Benjamin Franklin Chavis Jr., líder afro-
americano de direitos civis em meio as manifestações de protesto sobre questões socioambientais nos EUA.

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O levantamento bibliográfico foi realizado no mês de agosto de 2022, nas bases


de dados da Scopus Elsevier e da Web of Science, considerando como critério de
inclusão: artigos com publicações que tratem sobre o tema no Brasil, como critérios de
exclusão adotamos: artigos de revisão; indexados repetidos; realizados em outros países
e os que não respondem à questão da pesquisa. Objetivando alcançar o máximo de
produções científicas, adotamos como estratégia de busca o operador booleano2 "OR",
bem como a utilização dos descritores em inglês: "ENVIRONMENTAL RACISM" OR
"ENVIRONMENTAL JUSTICE".
A identificação dos artigos indexados repetidos foi realizada pelo software
Rayyan.ai (Intelligent System Review), que também foi utilizado na etapa de
identificação dos textos, quando proporciona ao revisor acesso rápido aos títulos e
resumos dos estudos selecionados. Em seguida, ocorreu a leitura completa dos artigos
selecionados para inclusão dos artigos indexados que respondessem à pergunta problema
deste estudo. Na caracterização e análise dos estudos selecionados, inicialmente
elaboramos uma tabela organizada cronologicamente pelo ano de publicação, contendo o
título, autores, ano, base de dados, revista de publicação e a síntese dos estudos. Para esta
última, foi considerada a metodologia utilizada a amostragem, os objetivos e as principais
constatações de cada estudo em relação à temática do racismo ambiental no Brasil.
Posteriormente foi realizada uma análise integrativa dos estudos, visando a promoção do
diálogo entre as várias áreas de pesquisas apresentadas.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na coleta de dados dos estudos foram identificados 309 artigos, dos quais 143
estavam na base de dados da Web of Science e 166 na Scopus. Desse total, 86 artigos
duplicados foram excluídos de acordo com a identificação do software Rayyan, restando

2
Os operadores booleanos são as palavras que direcionam a estratégia de busca nas bases de dados, como
uma espécie de linguagem dos sistemas de buscas, eles são: AND, OR e NOT, (E, Ou e Não
respectivamente). O Operador booleano AND serve para buscar pesquisas com palavras-chaves restritas,
isto é, apenas as que contém as palavras citadas no espaço de busca, ex: Racismo ambiental AND Justiça
ambiental, já o OR serve como estratégia de expansão da busca, quando aceita artigos com um OU/OR
outro tema, por fim o operador booleano NOT é utilizado para casos de exclusão, neste caso inclui o
primeiro termo e exclui o segundo.

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223 artigos selecionados para avaliação prévia. Após a leitura dos títulos e resumos, 179
artigos foram excluídos por não apresentarem relação com a pergunta problema deste
estudo, ficando 44 artigos elegíveis para leitura completa dentre os quais 30 artigos foram
excluídos, pois não tratavam do racismo ambiental apesar de abordarem a temática da
justiça ambiental. Assim, 14 artigos foram selecionados para o estudo, 12 deles estão na
Web of Science e 2 na Scopus. Processo ilustrado na Figura 1.

Figura 1. Fluxograma baseado no modelo PRISMA com os resultados da seleção dos artigos.

Fonte: autores.

Quanto ao ano de publicação, dos 14 estudos selecionados, 1 aparece em inglês,


datado do ano de 2008 o qual inicia a discussão sobre racismo ambiental no Brasil3, sendo
3 estudos realizados em 2018, dos quais 2 estão em português e 1 em inglês; 1 estudo em
português no ano de 2019; 3 estudos no ano de 2020, desses 2 estão em português e 1 em

3
Observou-se um intervalo de dez anos entre o primeiro estudo publicado no ano de 2008 e o segundo
estudo no ano de 2018.

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inglês; 4 estudos no ano de 2021, 3 em português e 1 em inglês; e por fim, 2 estudos


publicados até agosto de 2022, estando 1 em inglês e 1 em português.
Em relação aos periódicos de publicação, foram encontradas as seguintes revistas:
Clínica Internacional; Sustainability Science; Geoambiente On-Line; Remea-Revista
Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental; Ambiente e Sociedade; Saúde e
Sociedade; Ecos - Estudos Contemporâneos da Subjetividade; Praxis & Saber; Ateliê
Geográfico; Veredas do Direito e; Wiley Interdisciplinary Reviews-Climate Change.
Entre os artigos selecionados, 10 deles utilizam a categoria ecologia política como
referencial teórico-crítico. Para Empinotti et al. (2021) a ecologia política é compreendida
como um referencial teórico crítico das relações socionaturais, que expõem as
degradações e violências dos processos de transformação da natureza decorrentes das
práticas do projeto de desenvolvimento da sociedade vigente. Neste sentido, a Ecologia
política reconhece que os problemas ambientais são decorrentes, também, da manutenção
das relações coloniais quanto aos modos de disputa, exploração, apropriação e controle
dos recursos naturais.
Assim, os estudos correlacionam o racismo ambiental com a formação sócio-
histórico, política e econômica brasileira; com elementos étnicos, culturais, de gênero e
de classe; com políticas sociais de saúde, habitação educação, meio ambiente, conforme
exposto no Quadro 1 que destaca os estudos organizados conforme o ano de publicação
e as informações sobre o título, autores, idioma, bases de dados/ revista de publicação e
a síntese dos estudos selecionados.

Quadro 1. Quadro apresentando a descrição dos estudos incluídos na revisão integrativa, segundo título,
autores, ano de publicação, idioma base de dados/ revista de publicação e síntese dos principais
resultados encontrados.
Base de dados/
Autores/ Revista de
Título Ano Idioma publicação/ Síntese

Building Apresenta o processo de formação sócio-


environmental justice histórico, político e ambiental brasileiro,
in Brazil: A Scopus/ apontando como estes contribuem para geração
preliminary discussion Herculano e Sociologia de injustiças no aludido processo. Amplia o
of Environmental Pacheco Clínica conceito de racismo ambiental, expandindo-o
Racism (2008) Inglês Internacional para além de propósitos étnicos.

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The map of conflicts Pesquisa qualitativa de revisão literária que


related to discute as representações do mapa de conflitos
environmental Web of Science/ ambientais elaborado no ano de 2008,
injustice and health in Rocha et Sustainability relacionando as injustiças e racismo ambientais
Brazil al.(2018) Inglês Science com a saúde no Brasil.
Pesquisa qualitativa exploratória que utilizou
dados censitários do IBGE do ano de 2010 das
regiões urbanas próximo a bacia do Córrego de
Morro "S" e identificou a relação proporcional
entre o aumento dos índices de injustiça
Mapeamento da ambiental com o número de pessoas negras e
justiça ambiental e indígenas afetadas pelas desigualdades
racismo ambiental na ambientais, decorrente do processo de exclusão
bacia do Córrego do Web of Science/ histórico-social dessas populações. Note-se, que
Morro do “S”, São Morato et Geoambiente On- os autores concluíram se tratar de racismo
Paulo/SP al.(2018) Português Line ambiental.
Educação ambiental, Estudo de caso com um grupo de educadoras
justiça ambiental e ambientais populares de Magé-RJ que, através da
questões de gênero: a Web of Science/ vivência cotidiana dessas trabalhadoras, buscou
perspectiva de um Remea-Revista perceber a relação entre educação ambiental com
grupo de educadoras Eletrônica do as desigualdades sociais sofridas pela
ambientais Oliveira e Mestrado em comunidade. Traz elementos do impacto do
comunitárias de Magé, Sanchez Educação racismo ambiental sobre as mulheres e crianças
RJ. (2018) Português Ambiental negras da comunidade.
Pesquisa qualitativa que aborda como a discussão
da justiça ambiental e do racismo ambiental
Diálogos entre a Web of Science/ aparece na formação docente de professores de
Formação Inicial Revista biologia. A pesquisa foi realizada com estudantes
Docente em Biologia e Eletrônica do de Biologia do último período de uma faculdade
a temática da Justiça, Stortti e Mestrado em em Duque de Caxias - RJ e constatou a
conflitos e Racismo Sanchez Educação dificuldade dos estudantes em apresentar
Ambiental. (2019) Português Ambiental. elementos sobre o racismo ambiental.
Pesquisa exploratória que correlaciona os dados
censitários sobre condições territoriais e de
trabalho das pessoas infectadas e dos óbitos por
Covid 19 na cidade de São Paulo - SP.
Observando que a maior incidência de
Scopus/ contaminação ocorreu com as populações pretas
The virus, the disease Travassos et Ambiente e e pardas de comunidades periféricas da cidade de
and the inequality al. (2020) Inglês Sociedade São Paulo.
Racializando o olhar Pesquisa bibliográfica exploratória que,
(sociológico) sobre a apresentando dados do Censo de 2010, discorre
saúde ambiental em sobre como a falta de acesso à política de
saneamento da saneamento básico pela população negra se
população negra: um configura como racismo ambiental. Finaliza,
continuum colonial Web of Science/ concluindo que é preciso incluir a questão racial
chamado racismo Saúde e do saneamento nos determinantes sociais da
ambiental Jesus (2020) Português Sociedade saúde.

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Pesquisa qualitativa, exploratória que discute


sobre os desiguais impactos do processo de
urbanização e as iniquidades em saúde no Brasil.
Percebe o racismo ambiental como elemento que
Web of Science/ impacta a saúde da população negra, causado por
Urbanização, modos Dimenstein Ecos-Estudos um conjunto associados de fatores que atrelam o
de vida e produção da e Siqueira Contemporâneos crescimento urbano desordenado com aspectos
saúde na cidade (2020) Português da Subjetividade econômicos, sociais, culturais e ambientais.
Pesquisa qualitativa, que através da abordagem
da Interseccionalidade de gênero, raça e classe
discute o cuidado em territórios de exclusão
Care in a territory of social na cidade de Cubatão/ SP. Com a
social exclusion: Web of Science/ realização de oficinas e entrevistas com mulheres
covid-19 exposes Camilo et Saúde e líderes comunitárias e profissionais da atenção
colonial marks al.(2021) Português Sociedade primária dos SUS.
Pesquisa qualitativa exploratória que estuda a
relação de resistência da comunidade quilombola
de Barreiros de Itaguaçu-BA com o racismo
ambiental, percebido nas privações de acesso ao
"Se acabar o rio, a território no entorno do Rio Verde. Finaliza
comunidade acaba": Melo e apresentando o importante saber da comunidade
dimensão pedagógica Barzano Web of Science/ no combate ao racismo e na preservação do meio
do racismo ambiental (2021) Português Praxis & Saber ambiente e da cultura.
Racismo ambiental,
cidadania e
biopolítica: O artigo trata de uma revisão literária sobre
considerações gerais racismo ambiental, trazendo para a discussão
em torno de Web of Science/ elementos como a biopolítica, cidadania e a
espacialidades Filgueira, Ateliê correlação entre o racismo estrutural e o racismo
racializadas (2021) Português Geográfico ambiental.
Pesquisa exploratória qualitativa, que discorre
sobre a relação da Bio-necropolítica em Foucault
com as questões de injustiça ambiental. Através
dos dados do levantamento realizado pela Defesa
civil de Juiz de Fora (MG) entre os meses de maio
The Bio-Necropolitics Web of Science/ e junho de 2010. Concluiu-se que as áreas de
of environmental Gomes et Veredas do maior incidência de risco ambiental são habitadas
injustices in Brazil al.(2021) Inglês Direito por pessoas negras.
Pesquisa qualitativa de revisão narrativa que
articula a climatologia urbana com a justiça
Web of Science/ ambiental, argumentando que as cidades são os
A call for a critical Wiley principais locais de racismo e desigualdade
urban climatology: Beray- Interdisciplinary ambiental. Estabelece relação das características
Lessons from critical Armond Inglês/Geog Reviews-Climate biofísicas das cidades com a interseccionalidade:
physical geography (2022) rafia Change gênero, classe e raça.
Pesquisa exploratória que analisa a relação dos
dados epidemiológicos da pandemia do Covid 19
no estado do Piauí como racismo ambiental.
Racismo ambiental e Web of Science/ Associa o racismo ambiental à necropolítica
saúde: a pandemia de Lorena et al. Português/S Saúde e quando as estratégias de contenção da
covid-19 no Piauí (2022) aúde Sociedade contaminação não consideraram as

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particularidades das populações negras, indígenas


e quilombolas, permitindo maior
exposição desses grupos ao vírus SARS-CoV 2.

Fonte: autores.

No que concerne à área de pesquisa, a maior concentração de estudos está na área


da saúde com 6 estudos, a educação aparece com 4 estudos, a área de Geografia com 3
estudos e Direito com 1 estudo.
Nas discussões apresentadas pelos trabalhos selecionados o racismo ambiental
aparece dentro do escopo teórico da justiça ambiental, a qual surge nos anos de 1980
decorrente da luta do movimento negro nos Estados Unidos, quando estes denunciavam
a poluição dos seus territórios com produtos químicos lançados pela indústria no meio
ambiente (Herculano & Pacheco, 2008).
De acordo com o pensamento de Morato et al. (2018); Herculano e Pacheco,
(2008); Habermann e Gouveia (2008); Rocha et al. (2018), o conceito de justiça ambiental
se internacionaliza quando defende que as populações vulneráveis não sejam
desigualmente afetadas pelos problemas ambientais em seus locais de residência, como
áreas de alagamento e deslizamentos de terra; exposição a produtos químicos que
contaminam o meio ambiente, além de pouco ou nenhum acesso a infraestruturas urbanas
como água tratada, coleta de lixo e tratamento de esgoto.
De acordo com os autores dos estudos supracitados (quadro 1), o debate sobre
justiça ambiental ganha notoriedade no Brasil a partir da Rede Brasileira de Justiça
Ambiental (RBJA), criada em 2001 como fruto da organização dos movimentos sociais
e sindicatos, pesquisadores, populações indígenas e quilombolas. A RBJA, através da
articulação com os diversos atores da luta por justiça ambiental, busca promover ações,
construir estratégias de enfrentamento à injustiça e ao racismo ambiental, se empenhando
na luta pela implementação de políticas públicas e sociais direcionadas para a justiça
ambiental. Foi a RBJA que definiu o conceito de racismo ambiental adotado neste estudo.

[...] como “aquelas injustiças sociais e ambientais que recaem


desproporcionalmente sobre grupos étnicos vulneráveis”, observando que o

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racismo ambiental não se limitou a intenções racistas, mas também está


presente em “ações que têm efeitos colaterais raciais, independentemente de
sua intenção original”. Como as histórias apresentadas durante o seminário
mostraram claramente, o racismo não era simplesmente uma função da cor da
pele ou das origens étnicas. Com origem na desigualdade e no preconceito,
fazia, de fato, parte de um cenário cujas questões subjacentes eram muito mais
amplas. (Herculano & Pacheco, 2008, p. 259, tradução nossa) 4

Dos estudos realizados na área da saúde, o artigo elaborado por Rocha et al. (2018)
aparece como um compilado de explicativo sobre os conflitos ambientais geradores de
racismo e injustiças ambientais, decorrentes do modelo de produção e consumo da
sociedade capitalista vigente. Para os autores, os conflitos ambientais podem ser
classificados como: 1) conflitos de extração e produção de materiais ligados à ocupação
de territórios; a poluição de solos e rios; a apropriação de recursos genéticos –
biopirataria; 2) conflitos de transportes ligados a vazamentos de óleos e construção de
vias, aeroportos e portos para escoamento dos produtos; 3) conflitos causados pelo
descarte de resíduos e a consequente poluição que atravessa fronteira quando os resíduos
de países do capitalismo central são enviados para os aterros sanitários de países
periféricos criando as chamadas zonas de sacrifícios5, que se localizam em áreas habitadas
,em sua maioria, por pessoas pobres e pretas; 4) conflitos ligados à economia verde no
que se refere a comercialização dos mares, florestas, solos e atmosfera e os impactos
ambientais do sequestro de carbono; 5) conflitos relacionados a segurança dos
consumidores, causados pelas tecnologias produtivas e investimentos.
Destaca-se, aqui, o uso de agrotóxicos na produção de alimentos processados e
geneticamente modificados. Nesse contexto, os conflitos ambientais e o racismo

4
“[...] as “those social and environmental injustices which fall disproportionately upon vulnerable ethnic
groups,” observing that environmental racism was not limited to racist intentions, but is also present in
“actions which have racial side-effects, regardless of their original intent.” As the stories presented during
the seminar clearly showed, racism was not simply a function of skin color or ethnic origins. Originating
in inequality and prejudice, it was, in fact, part of a scenario whose underlying issues were much
broader”(Herculano & Pacheco, 2008, p. 259)
5
Entendemos como Zona de Sacrifício o termo adotado pelos movimentos por justiça ambiental e definido
por Rocha et al. como: "[...] áreas onde populações excluídas e discriminadas são obrigadas a viver e
trabalhar em condições perigosas ou degradantes, com falta de saneamento ou expostas a maiores riscos de
poluição – ou mesmo inundações ou grandes impactos em decorrência de terremotos ou grandes acidentes
industriais."(2018 p. 123)

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ambiental afetam o modo de vida das populações, principalmente quando estas são
obrigadas a saírem de seus territórios e acabam se alojando em áreas urbanas de grande
risco ambiental e onde muitos não têm como sobreviver dignamente por falta de emprego.
Os artigos de Dimenstein; Siqueira (2020) e Jesus (2020) discutem o racismo
ambiental dentro do contexto dos determinantes sociais da saúde, numa relação em que
observa a precarização das moradias periféricas urbanas, destacando a fragilidade da
política de saneamento básico e saúde ambiental e como essa afeta os direitos humanos e
a saúde da população negra.
Para Dimenstein e Siqueira (2020), há uma relação do capital imobiliário com o
racismo ambiental, quando aquele demarca os espaços urbanos de moradias, conduzindo
as populações pretas e pobres para os espaços de exclusão. Nesse sentido, Santos (2007)
observa que a sociedade dominante institui linhas, as quais ele nomeia como linhas
abissais, que dividem a sociedade em espaços e contextos de inclusão e exclusão. O
filósofo enfatiza que as linhas abissais:

Consiste num sistema de distinções visíveis e invisíveis, sendo que estas


últimas fundamentam as primeiras. As distinções invisíveis são estabelecidas
por meio de linhas radicais que dividem a realidade social em dois universos
distintos: o "deste lado da linha" e o "do outro lado da linha". A divisão é tal
que "o outro lado da linha" desaparece como realidade, torna-se inexistente e
é mesmo produzido como inexistente. Inexistência significa não existir sob
qualquer modo de ser relevante ou compreensível. Tudo aquilo que é
produzido como inexistente é excluído de forma radical porque permanece
exterior ao universo que a própria concepção de inclusão considera como o
"outro". A característica fundamental do pensamento abissal é a
impossibilidade da co-presença dos dois lados da linha. O universo "deste lado
da linha" só prevalece na medida em que esgota o campo da realidade
relevante: para além da linha há apenas inexistência, invisibilidade e ausência
não-dialética. (Santos, 2007, p. 71)

Percebe-se então que é enfatizada a inobservância do Estado, tanto em regular a


distribuição dos territórios, como em proporcionar políticas de saúde ambiental. Neste
sentido, o racismo ambiental aparece como uma espécie de racismo institucional, pois
"[...] a omissão de políticas públicas favorece que no meio ambiente vigorem
determinantes da desigualdade social e racial, resultando em iniquidades raciais,

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exploração política e enfrentamento dos piores problemas ambientais pelas comunidades


negras” (Jesus, 2020, p. 6).
Nos estudos em que vincula a pandemia do COVID 19 com o racismo ambiental,
desenvolvidos por Travassos et al. (2020); Camilo et al.(2021); Lorena et al. (2022); o
racismo ambiental aparece relacionado com as condições socioeconômicas e de gênero
das populações afetadas, realçado na deficiência de políticas públicas sanitárias, o que
configura, segundo os autores, uma necropolítica, como se vê na fala a seguir:

O racismo ambiental produz muitos mundos de mortes na relação com a saúde,


quando considerada uma necropolítica aplicada a espaços e comunidades
periféricas, seja pelo genocídio escancarado que é produzido pela presidência
da república, ou pela má condução de governos estaduais e municipais em
reconhecer que todos e todas estão vulneráveis na pandemia de covid-19,
sobretudo aquelas que historicamente são afetadas por políticas que deveriam
considerar suas vidas, e não o contrário. (Lorena et al., 2022, p. 6)

Por outro lado, Travassos et al. (2020); Lorena et al. (2022) relacionam o racismo
ambiental às desigualdades sociais e territoriais, evidenciando como as populações
negras, periféricas, indígenas e quilombolas (estudos realizados na cidade São Paulo e no
estado do Piauí, respectivamente) foram mais infectadas pelo vírus e, consequentemente,
correspondem ao grupo de pessoas que mais vieram a óbito pela COVID 19.
Os citados estudiosos consideraram que os cuidados para evitar a infecção da
doença não compreendiam à realidade vivida por essas populações, visto que nos espaços
de moradia das periferias, não era possível fazer isolamento social, nem tampouco manter
a limpeza do ambiente, tanto pela densidade demográfica quanto pela deficiência de
saneamento básico dessas comunidades. Ainda sobre o isolamento, Lorena et al. (2022)
destaca a situação de total isolamento das populações indígenas e quilombolas do Piauí,
principalmente no acesso aos cuidados básicos como a saúde e o acesso à vacina.
Por outro lado, Camilo et al. (2021) discute o cuidado nos territórios de exclusão
caracterizado como "territórios periféricos sem quaisquer condições de vida e de
sustentabilidade"(2021, p. 5). Dessa forma, as mulheres e crianças negras são as mais
afetadas pelas injustiças sociais, fato que se agravou na pandemia do COVID 19, tanto
pelas poucas condições sanitárias, como pelo processo de exclusão social por elas vivido.

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Os artigos da área de Geografia elaborados por Morato et al. (2018); Figueira


(2021); Beray-Armond (2022), se relacionam com o estudo do Direito escrito por Gomes
et al. (2021), quando discutem a ausência de infraestruturas urbanas em áreas periféricas
de população negra, destacando a desigualdade na distribuição dos riscos ambientais e a
ausência do poder público em regular as relações de injustiças sociais, negando a
cidadania das populações negras, pobres, periféricas e promovendo a política de morte
(necropolítica).
Os estudos que se referem à relação educação e racismo ambiental Herculano e
Pacheco (2008); Oliveira e Sanchez (2018) e Stortti e Sanchez (2019) abordam a
Educação Ambiental como estratégia de enfrentamento às injustiças e ao racismo
ambiental. Neste sentido, o trabalho de Herculano e Pacheco (2008) auxilia como
referencial teórico, quando aborda o processo histórico da injustiça e do racismo
ambiental, outrora abordado nesta revisão bibliográfica.
O trabalho de Stortti e Sanchez (2019) reconhece, através da concepção decolonial
e crítica, os impactos causados pelo racismo ambiental na permanência dos/das estudantes
nas instituições educacionais. Para tanto, observa a lacuna das políticas públicas
ambientais bem como da Educação Ambiental e discute o racismo ambiental na formação
docente, conforme observado na pesquisa com os estudantes do penúltimo período do
curso de Biologia de uma faculdade privada localizada no município de Duque de Caxias,
RJ.
No que se refere à dimensão pedagógica da resistência ao racismo ambiental,
Oliveira e Sanchez (2018) abordam a relação entre as desigualdades ambientais, de
gênero e de raça, apresentando as demandas das educadoras populares da comunidade de
Magé - RJ, como um elemento para se pensar numa educação ambiental contextualizada
com as vivências dos grupos excluídos e oprimidos.
Melo e Barzano (2021) trazem para a educação ambiental, a contribuição das
populações afetadas pela injustiça ambiental, destacam a resistência da comunidade
quilombola de Barreiros de Itaguaçu-BA frente ao racismo ambiental vivido com a
apropriação privada do Rio Verde, o que impede o acesso da comunidade às águas. Os
autores ainda afirmam que: "[...] A vida no quilombo é permeada de saberes populares

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que educam por meio da prática, das lutas, da memória e da oralidade. Não existe vida
sem território e neste contexto há um rico processo educacional no existir no quilombo. "
(2021, p. 14)
Logo, fica evidente que não se pode pensar em justiça social e até ambiental,
desconsiderando os elementos e particularidades do racismo à brasileira, o qual tem
conduzido as populações pobres e pretas a residirem em moradias insalubres, como em
ocupações em áreas de risco ambiental e acesso precário a infraestruturas sanitárias,
ficando expostas aos riscos ambientais, como foi o caso da covid 19, das enchentes e
outros desastres naturais.
Portanto, o que se pode inferir dos estudos selecionados é o que está posto nas
palavras de Almeida (2019, p. 25) quando afirma que "o racismo é uma forma sistemática
de discriminação que tem a raça como fundamento". Nesse sentido, o racismo ambiental
aparece como uma espécie de continuum do racismo estrutural e até mesmo do
institucional, o qual, sob a égide do capital e da racionalidade colonial, coisificou as
pessoas, seus territórios e o meio ambiente, lançando-os, contraditoriamente, ora à
exploração do mercado, ora ao abandono e a exclusão. Tudo isso com o consentimento
histórico e silencioso do Estado brasileiro, quando na negação do racismo, não garantiu
a essas pessoas e populações o acesso à moradia, à saúde, à educação, ou até mesmo ao
reconhecimento de cidadania.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando a relação racismo e justiça ambiental no Brasil, o que podemos
inferir dos estudos selecionados é que o racismo não afeta apenas as pessoas, atinge
também a territorialidade delas, expandindo-se para as relações ambientais, as quais estão
relacionadas à ideologia da propriedade privada do capital. Destarte, o racismo pode ser
socioambiental e ocorre tanto nos espaços rurais quanto urbanos; não se restringindo
apenas a pessoas negras, afetando outras populações ex: caiçaras, indígenas, pescadores,
afetados por barragens etc.
Assim, o racismo ambiental no Brasil não é um fato recente, pois se inicia no
período colonial e tem suas particularidades na formação histórica, socioeconômica,

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política e cultural do país, tem suas bases na exploração da terra, dos povos originários e
dos africanos escravizados.
Pode-se dizer o que se seguiu da fase inicial do processo histórico até a
contemporaneidade foi a exclusão desses povos e outras populações da participação de
riquezas que produziram, a exemplo do acesso à terra. Pode-se afirmar, também, a
negação do acesso aos direitos sociais e a parte desigual dos impactos das injustiças
ambientais.
Nesse sentido, as comunidades quilombolas, os povos indígenas e outras
comunidades tradicionais enfrentam o racismo ambiental em seus territórios, quando
estes são "valorizados" e cobiçados pelo capital para realização de atividades econômicas
exploratórias, desenvolvidas por mineradoras legais e ilegais; pelo agronegócio;
construções de barragens e hidrelétricas, ou quando os territórios são "desvalorizados",
sendo considerados zonas de sacrifícios e exclusão, ou seja, territórios propícios para
receber rejeitos e outros poluentes. Essas situações são geradoras de conflitos ambientais
que têm levado essas populações a situações diversas de violência e de violações de
direitos, além de expulsões de seus territórios.
Não obstante, esses conflitos ambientais e as relações econômica-predatórias do
capital afetam os espaços urbanos que são influenciados, na medida em que recebem esses
excluídos das terras e os alojam em locais de risco, como: morros, favelas, encostas, áreas
de alagamentos, entre outros. Isso tudo é feito segundo impõem as relações imobiliárias
capitalistas as quais "reservam" as zonas de exclusão para a classe trabalhadora negra e
pobre ou totalmente fora do contexto populacional ou nas áreas "urbanas inchadas".
Assim, essas famílias possuem pouco ou nenhum acesso à água tratada, à rede de
esgotamento sanitário, à coleta regular de lixo, o que afeta a saúde ambiental, sendo as
mulheres e crianças as mais afetadas.
Essas negligências do poder público em garantir condições de infraestrutura
sanitárias e moradias dignas para essas populações, configura as bases do racismo
institucional, sendo caracterizadas por alguns estudos como necropolítica. Isto posto, foi
possível observar nos estudos selecionados, os multivariados impactos do racismo
ambiental sobre a população atingida, tais impactos podem ser sentidos no âmbito da

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saúde, da segurança alimentar, da cultura, da educação, da moradia, dos direitos humanos


e sociais, tudo isto porque o racismo afeta a integralidade dos indivíduos, como uma
estratégia de extermínio físico, mental e social dessas populações.

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