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Índice

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Título
direito autoral
Conteú do
Agradecimentos
Prefá cio
1. O primeiro sonho
2. Joã o Bosco sonha com a prova mensal
3. O sonho da pastora
4. O futuro do Orató rio
5. Três Má rtires
6. A Futura Igreja de Sã o Francisco de Sales
7. Dois meninos atacados por um monstro
8. Laços Mortais
9. A perdiz e a codorna
10. O Precioso Lenço da Pureza
11. Um gato com chifres
12. Um elefante diabó lico
13. Mensageiro da Morte
14. Corvos ferozes e uma pomada curativa
15. Amado discípulo de Dom Bosco, Sã o Domingos Sávio
16. Um sonho sobre Sã o Domingos Sávio
17. Presentes de meninos para a Bem-Aventurada Virgem Maria
18. Inocência preservada pela penitência
19. Na Terra da Provaçã o
20. Um Poço Medonho
21. Dez Colinas
22. Demô nios na Igreja
23. A Cobra e o Rosá rio
24. As Quatorze Tá buas
25. Uma Pequena Marmota
26. Um cachorro feroz
27. Um Mastim Gigante
28. Consciências Reveladas
29. Um bando de monstros
30. O Cavalo Vermelho
31. Uma videira misteriosa
32. Para o inferno e de volta
33. A Pérgula Rosa
34. As lutas da sociedade
35. A Filoxera
36. O touro, as carruagens e os pregos
37. O Primeiro Sonho Missioná rio (1872)
38. O Anjo de Arphaxad (Segundo Sonho Missioná rio)
39. O Futuro das Missõ es Salesianas (Quinto Sonho Missioná rio)
40. As Duas Colunas no Mar
Uma carta escrita por Sã o Joã o Bosco sobre a educaçã o
Uma nota para os Salesianos
As memó rias biográ ficas em resumo
QUARENTA SONHOS
DE
ST. JOÃ O BOSCO

“E eu vos darei pastores segundo o meu coração, e eles vos


alimentarão com conhecimento e doutrina.”
—Jeremias 3:15
Sã o Joã o Bosco 1815-1888
Fundador da Ordem Salesiana
Apó stolo da Juventude
QUARENTA SONHOS
DE
ST. JOÃ O BOSCO
O APÓ STOLO DA JUVENTUDE
Das Memórias Biográficas de
Sã o Joã o Bosco

Compilado e editado por


Pe. J. Bacchiarello, SDB

“Mas os que são instruídos brilharão como o resplendor do


firmamento; e aqueles que instruem muitos à justiça, como estrelas
por toda a eternidade.”
—Daniel 12:3

TAN Books
Charlotte, Carolina do Norte
Nihil Obstat: E. Gutiérrez, SDB

21 de agosto de 1969

Imprimatur: Stephen Ferrando, SDB, DD

Bispo de Shillong, Índia

21 de setembro de 1969

Este livro foi publicado anteriormente por volta de 1969, na Índia, e impresso no Instituto
Salesiano de Artes Gráficas de Madras.

Reeditado e republicado pela TAN Books and Publishers, Inc. em 1996 com permissão do Rev.
Joseph Aind, agora Bispo de Dibrugarh (Assam), e por acordo com Salesiana Publishers, New
Rochelle, Nova York. Re-composto novamente em 2007 pela TAN.

A tipografia deste livro é propriedade da TAN Books and Publishers, Inc. e, exceto por breves
seleçõ es, não pode ser reproduzida sem permissão por escrito da Editora.

Cartão de catálogo da Biblioteca do Congresso nº: 96-61323

ISBN: 978-0-89555-597-7

Impresso e encadernado nos Estados Unidos da América.

Foto da capa de São João Bosco e dos Meninos do Orató rio reproduzida com permissão do Pe.
Aurélio Maschio, SDB

TAN Books
Charlotte, Carolina do Norte
1996
“O professor que só aparece na sala de aula, e em nenhum
outro lugar, é professor e nada mais; mas deixe-o ir com seus
meninos para recreaçã o e ele se tornará um irmã o.”
( Páginas 217–218)
CONTEÚDO
Reconhecimentos
Prefá cio
1. O primeiro sonho
2. Joã o Bosco sonha com a prova mensal
3. O sonho da pastora
4. O futuro do Orató rio
5. Três Má rtires
6. A Futura Igreja de Sã o Francisco de Sales
7. Dois meninos atacados por um monstro
8. Laços Mortais
9. A perdiz e a codorna
10. O Precioso Lenço da Pureza
11. Um gato com chifres
12. Um elefante diabó lico
13. Mensageiro da Morte
14. Corvos ferozes e uma pomada curativa
15. Amado discípulo de Dom Bosco,
Sã o Domingos Sávio
16. Um sonho sobre Sã o Domingos Sávio
17. Presentes de meninos para a Bem-Aventurada Virgem Maria
18. Inocência preservada pela penitência
19. Na Terra da Provaçã o
20. Um Poço Medonho
21. Dez Colinas
22. Demô nios na Igreja
23. A Cobra e o Rosá rio
24. As Quatorze Tá buas
25. Uma Pequena Marmota
26. Um cachorro feroz
27. Um Mastim Gigante
28. Consciências Reveladas
29. Um bando de monstros
30. O Cavalo Vermelho
31. Uma videira misteriosa
32. Para o inferno e de volta
33. A Pérgula Rosa
34. As lutas da sociedade
35. A Filoxera
36. O touro, as carruagens e os pregos
37. O Primeiro Sonho Missioná rio (1872)
38. O Anjo de Arphaxad (Segundo
Sonho Missioná rio)
39. O Futuro das Missõ es Salesianas
(Quinto Sonho Missioná rio)
40. As Duas Colunas no Mar
Uma carta escrita por Sã o Joã o Bosco sobre a educaçã o
Uma nota para os Salesianos
As memó rias biográ ficas em resumo
Agradecimentos
PELA traduçã o para o inglê s dos sonhos selecionados dos Volumes
I-IX e XI, estamos profundamente gratos ao Rev. Padre Diego Borgatello
e seus colaboradores na traduçã o das Memórias Biográficas do italiano.
Os volumes sã o um verdadeiro monumento, “mais duradouro que o
bronze”, erguido ao nosso santo Padre, Dom Bosco.
As Memórias Biográficas podem ser obtidas em: Salesiana
Publishers
130 Main Street
New Rochelle, NY 10801
Alguns desses sonhos foram reimpressos de panfletos publicados
pela Casa Salesiana de Tirupattur (Arcot Norte); outros sã o de livros do
Padre Motta impressos pela Escola Tang King Po (Hong Kong); outros
sã o novas traduçõ es. A visã o de Dom Bosco sobre Sã o Domingos Sávio é
copiada de uma traduçã o do Rev. Padre Terence O'Brien, SDB, em seu
livro Domingos Sávio, Apóstolo Adolescente , Parte II: Apêndice.
Para maiores detalhes sobre os sonhos de Dom Bosco, consulte o
capítulo “Sonhos, Visõ es e Ê xtases” em Pe. Livro de Ceria Dom Bosco
com Deus .
Prefácio à edição de 1969
Queridos leitores,
Esta segunda ediçã o de Sonhos de Dom Bosco chega até vocês dez
anos depois da primeira ediçã o, que se esgotou há sete anos.
A pedido de muitos amigos, revisei e ampliei este novo volume
acrescentando muitos outros sonhos de especial interesse e utilidade
para você.
Uma palavra sobre os sonhos de Dom Bosco: Deus falou com Dom
Bosco em sonhos. Quem ignoraria sonhar sonhos que o profeta Joel
conta entre os dons que deveriam alegrar, por uma generosa efusã o do
Espírito Santo, os últimos dias , isto é, como explica Sã o Pedro, os dias
do Messias? ( Atos 2:17). Os ouvintes de Dom Bosco reuniram mais de
150 sonhos.
Alguns sonhos de Dom Bosco sã o proféticos, outros sã o
pedagó gicos e alguns sã o pará bolas. Alguns dizem respeito à Igreja,
alguns à s naçõ es, outros à Congregaçã o Salesiana, à s missõ es, ao
Orató rio (a primeira instituiçã o salesiana), etc.
A maior parte dos sonhos de Dom Bosco sã o certamente
acontecimentos sobrenaturais. Aqui estã o algumas provas:
1. À s vezes dizia que “foi um sonho em que se pode saber o que se
faz; pode ouvir o que é dito, pode fazer e responder perguntas.” Isso nã o
acontece nos sonhos naturais comuns.
2. Ele geralmente tinha um guia e um intérprete. Quem era ele? À s
vezes, Domingos Sávio ou Louis Colle ou um Anjo, ou Sã o Francisco de
Sales, ou outra pessoa. Suas explicaçõ es sã o sempre precisas e
instrutivas. Isso nã o acontece nos sonhos habituais.
3. Freqü entemente ele via as coisas secretas da consciência, e o
teste sempre provava que isso era verdade; os eventos futuros previstos
(incluindo mortes) realmente ocorreram. Este Dom Bosco considerou “
uma graça extraordinária concedida em benefício de todos os filhos do
Oratório ”.
4. Dom Bosco narrava os seus sonhos com um grande espírito de
humildade, pensando apenas no benefício espiritual dos seus ouvintes.
Os bons efeitos foram evidentes: especialmente um maior horror ao
pecado, melhores Confissõ es, Confissõ es Gerais, Comunhõ es mais
frequentes. Foi, como ele à s vezes dizia, “ A Falência do Diabo ”.
5. Nos sonhos naturais nã o existe uma ordem ló gica. Tudo o
contrá rio acontece nos sonhos de Dom Bosco. Imagens e palavras estã o
tã o bem conectadas que parece ouvir coisas vistas com os olhos
abertos.
6. Os sonhos de Dom Bosco continham uma revelaçã o clara e exata
dos acontecimentos futuros. Todas as profecias que ele fez sobre todos
os tipos de coisas aconteceram antes ou depois de sua morte. Inú meros
exemplos podem ser lidos nas Memórias Biográficas (vinte grandes
volumes).
7. No dia 17 de fevereiro de 1871, Dom Bosco disse com franqueza
a alguns Salesianos que “ estas coisas são certamente singulares e devem
ser faladas apenas entre nós ( na Casa Salesiana ) , porque se fossem
contadas a alguém de fora, essas pessoas certamente os apelidou de
fábulas. Mas sempre temos como norma que, quando algo acontece para
o bem de nossas almas, certamente vem de Deus, não de Satanás .”
No 11º volume das Memórias Biográficas , pá gina 239, lemos: “Os
sonhos de Dom Bosco tornaram-se como uma 'instituiçã o doméstica'
no Orató rio. A expectativa de novos sonhos estava sempre presente. A
notícia de outro sonho despertou expectativa entre jovens e idosos: sua
narraçã o foi ouvida com atençã o; seus efeitos salutares nã o tardaram a
chegar.”
Que a leitura da seguinte seleçã o de sonhos traga benefícios
semelhantes ainda hoje.
Deus esteja com você.
F R. _ J OSEPH B ACCHIARELLO , SDB
S AVIO J UNIORATE
M AWLAI , S HILLONG – 793008
1
O PRIMEIRO SONHO
( Memórias Biográficas , Vol. I, página 94)

JOÃ O BOSCO, nascido em 1815, passou os primeiros anos na feliz


liberdade dos campos de Becchi, uma pequena aldeia no Piemonte,
Itá lia. Como pequeno pastor, ele brincava com seus jovens
companheiros, afastando-os do mal e conduzindo-os à virtude.
Em 1823 ele queria estudar na cidade de Castelnuovo, a poucos
quilô metros de distâ ncia; mas o seu meio-irmã o ignorante, de vinte
anos, impediu-o, porque queria mã os para trabalhar nos campos e na
vinha.
Mas durante o inverno de 1824-1825, quando no Piemonte nã o há
trabalho nos campos nevados, a mã e de Joã o Bosco mandou-o para a
escola numa aldeia pró xima. Ali um sacerdote de grande piedade
ensinou-o a ler e a escrever e, sobretudo, ensinou-lhe o catecismo e
preparou-o para a sua primeira Confissã o. Sob a orientaçã o deste
sacerdote, o jovem Joã o Bosco aprendeu os meios necessá rios para
preservar a graça de Deus na alma através da oração e da mortificação.
Uma vez capaz de ler, John costumava ser visto com um livro nas
mã os, mesmo enquanto observava os animais no pasto. Certa ocasiã o,
alguns outros pastores queriam que Joã o participasse dos jogos, mas
ele recusou e eles o espancaram. Ele poderia ter pago de volta. Mas o
perdã o foi sua vingança. Ele lhes disse: “Nã o posso brincar porque
preciso estudar; Quero me tornar padre.”
Depois disso, eles o deixaram em paz. Admirando sua paciência e
mansidã o, tornaram-se seus amigos, e assim Joã o Bosco os instruía no
catecismo e os ensinava a cantar hinos à nossa Mã e Santíssima.
Depois, quando Joã o Bosco tinha nove anos, teve um sonho que lhe
revelou a sua vasta e providencial missã o futura pelos meninos durante
a sua laboriosa vida. Ele mesmo narra esse sonho em suas Memórias do
Oratório.
Joã o Bosco escreveu as suas Memórias do Oratório de São Francisco
de Sales por ordem explícita do Santo Padre. Depois de um breve
prefá cio ao manuscrito para seus Salesianos, narra o seguinte sonho:

Parte I. Comandos de Jesus


Quando eu tinha cerca de nove anos, tive um sonho que me marcou
profundamente pelo resto da vida. Sonhei que estava perto de minha
casa, num campo de jogos muito grande onde uma multidã o de crianças
se divertia. Alguns riam, outros brincavam e muitos xingavam. Fiquei
tã o chocado com a linguagem deles que pulei no meio deles,
balançando-me descontroladamente e gritando para que parassem.
Naquele momento apareceu um Homem, nobremente trajado, de porte
viril e imponente. Ele estava vestido com um manto branco esvoaçante,
e Seu rosto irradiava tanta luz que eu nã o conseguia olhar diretamente
para Ele. Ele me chamou pelo nome e me disse para me colocar como
líder daqueles meninos, acrescentando estas palavras:
“Você terá que conquistar esses seus amigos nã o com golpes, mas
com gentileza e gentileza. Entã o comece agora mesmo a mostrar-lhes
que o pecado é feio e a virtude bela.”
Confuso e com medo, respondi que era apenas um menino e nã o
conseguia conversar com aqueles jovens sobre religiã o. Naquele
momento a briga, os gritos e os xingamentos cessaram, e a multidã o de
meninos se reuniu em torno do Homem que falava. Quase
inconscientemente, perguntei:
“Mas como você pode me ordenar a fazer algo que parece tã o
impossível?”
“O que parece tã o impossível você deve conseguir sendo obediente
e adquirindo conhecimento.”
"Mas onde? Como?"
“Eu lhe darei um Professor sob cuja orientaçã o você aprenderá e
sem cuja ajuda todo conhecimento se tornará tolice.”
"Mas quem é você?"
“Eu sou o Filho daquela que sua mã e lhe ensinou a cumprimentar
três vezes ao dia.”
“Minha mã e me disse para nã o falar com pessoas que nã o conheço,
a menos que ela me dê permissã o. Entã o, por favor, me diga seu nome.
“Pergunte à minha mã e.”

Parte II. Maria, sua professora


Naquele momento vi ao lado Dele uma Senhora de aparência
majestosa, vestindo um lindo manto, brilhando como se estivesse
enfeitada de estrelas. Ela viu minha confusã o aumentar, entã o me
chamou até ela. Pegando minha mã o com muita gentileza, ela disse:
"Olhar!"
Eu fiz. Todas as crianças haviam desaparecido. No lugar deles vi
muitos animais: havia cabras, cachorros, gatos, ursos e vá rios outros.
“Este é o seu campo; é aqui que você deve trabalhar”, disse-me a
Senhora. “Torne-se humilde, firme e forte. E o que você verá acontecer
com esses animais você terá que fazer pelos meus filhos.”
Olhei novamente; os animais selvagens transformaram-se em
muitos cordeiros - cordeiros gentis e brincalhõ es - balindo de boas-
vindas para aquele Homem e Senhora.
Neste ponto do meu sonho, comecei a chorar e implorei à Senhora
que explicasse o que tudo isso significava, porque eu estava totalmente
confuso. Ela entã o colocou a mã o na minha cabeça e disse:
“No devido tempo, tudo ficará claro para você.”
Depois de ela ter dito estas palavras, um barulho me acordou; tudo
havia desaparecido. Fiquei completamente desnorteado. De alguma
forma, minhas mã os ainda doíam e minhas bochechas ainda doíam por
causa de toda a luta. Além disso, minha conversa com aquele homem e
aquela senhora perturbou tanto minha mente que nã o consegui dormir
mais naquela noite.
De manhã mal podia esperar para contar meu sonho.
O primeiro sonho-visão de São João Bosco, ocorrido quando ele tinha nove anos. Neste sonho,
Nosso Senhor chamou João Bosco para ensinar aos meninos que a virtude é bela e o pecado é
feio. Nosso Senhor também prometeu dar Sua Mãe a João Bosco como guia e ajudadora.
Quando meus irmã os ouviram isso, começaram a rir. Contei entã o para
minha mã e e minha avó . Cada um que ouviu deu uma interpretaçã o
diferente. Meu irmã o Joseph disse:
“Você se tornará pastor e cuidará de cabras, ovelhas e gado.”
O comentá rio da minha mã e foi: “Quem sabe? Talvez você se torne
padre.”
Secamente, Anthony murmurou: “Você pode se tornar o líder de
uma gangue de ladrõ es”.
Mas minha avó , muito religiosa e analfabeta, deu a ú ltima palavra:
“Você nã o deve prestar atençã o aos sonhos”.
Eu sentia o mesmo, mas nunca consegui tirar esse sonho da
cabeça. O que estou prestes a relatar pode fornecer uma nova visã o
sobre isso. Nunca toquei no assunto e meus parentes nã o deram
importâ ncia a isso. Mas em 1858, quando fui a Roma para conversar
com o Papa sobre a congregaçã o salesiana, Pio IX pediu-me que lhe
contasse tudo o que pudesse ter a menor relaçã o com o sobrenatural.
Entã o, pela primeira vez, contei-lhe o sonho que tive quando tinha nove
anos. O Papa ordenou-me que o escrevesse detalhadamente para
encorajamento dos membros da Congregaçã o, por causa dos quais eu
tinha ido a Roma.
Este sonho voltou a Joã o Bosco repetidas vezes durante um
período de dezoito anos; mas a cada repetiçã o sempre havia muitas
novidades. A cada novo panorama, ele pô de vislumbrar com mais
clareza nã o só a implantaçã o do seu Orató rio e a difusã o da sua obra,
mas também os obstá culos que surgiriam, os estratagemas dos seus
inimigos e o modo de superá -los.
2
JOÃO BOSCO SONHA COM
A PROVA MENSAL
( Memórias Biográficas , Vol. I, página 190)

D UURANTE os anos do ensino mé dio, Joã o Bosco, alé m da


inteligê ncia e da memó ria, possuía ainda outro talento, extraordiná rio
e muito valioso. Aqui está um dos muitos incidentes:
Certa noite, John sonhou que seu professor havia aplicado um teste
mensal para determinar a classificaçã o da turma e que ele estava
fazendo esse teste. Assim que acordou, pulou da cama e escreveu a
prova, que era uma passagem em latim, e começou a traduzi-la com a
ajuda de um padre amigo seu. Acredite ou nã o, naquela mesma manhã
o professor fez uma prova, e era a mesma passagem de latim com a qual
John havia sonhado! Assim, muito rapidamente e sem precisar de
dicioná rio, ele o traduziu como havia feito ao acordar do sonho. Claro, o
resultado foi excelente. Quando o professor o interrogou, ele contou-lhe
francamente o que tinha acontecido, para espanto do professor.
Em outra ocasiã o, John entregou a prova tã o rapidamente que a
professora duvidou seriamente que o menino conseguisse resolver
todos os seus problemas gramaticais em tã o pouco tempo. Entã o ele
examinou o teste de John com muito cuidado. A professora havia
preparado aquele teste apenas na noite anterior. O teste ficou bastante
extenso e, portanto, o professor ditou apenas metade dele: ainda assim,
no caderno de redaçã o de John, o teste foi escrito na íntegra, até a
ú ltima palavra! Como isso poderia ser explicado? John nã o poderia tê-lo
copiado durante a noite, nem poderia ter invadido a casa do professor,
que ficava a uma distâ ncia considerável de onde John morava. E entã o?
Ele confessou: “Eu sonhei!” Foi por esta razã o que seus colegas de
escola o apelidaram de “O Sonhador”.
3
O SONHO DA
PASTORA
( Memórias Biográficas , Vol. II, página 190)

JOÃ O BOSCO foi ordenado em 5 de junho de 1841. O ministé rio


sagrado foi o ideal de toda a sua vida; o objetivo há muito desejado foi
finalmente alcançado. Ele tinha vinte e seis anos. Ele passou os
primeiros meses de seu sacerdó cio em Castelnuovo, sua terra natal,
com seu amado pá roco, Padre Cinzano. Sobre esses meses, lemos o
seguinte em suas memó rias:
Naquele ano de 1841, como meu pastor estava sem assistente,
servi como assistente por cinco meses. Tive grande prazer neste
trabalho. Pregava todos os domingos, visitava os enfermos e
administrava os Sacramentos, mas nã o ouvia Confissõ es, pois ainda nã o
estava autorizado a fazê-lo. Realizei serviços funerá rios, mantive os
registros paroquiais em ordem e emiti certidõ es conforme necessá rio.
Mas a minha maior alegria era ensinar catecismo à s crianças, passar o
tempo com elas e conversar com elas. Muitas vezes vinham de Murialdo
me visitar e, sempre que eu voltava para casa, eles se aglomeravam ao
meu redor. Também em Castelnuovo os jovens começaram a fazer
amizade comigo e a procurar a minha companhia. Sempre que saía da
reitoria era escoltado por uma multidã o de rapazes, que me
acompanhava por onde quer que eu fosse.
Dom Bosco recebeu três ofertas de nomeaçã o com generosas
remuneraçõ es. Para compreender a vontade de Deus, foi a Turim
procurar o conselho do Pe. (hoje Sã o José Cafasso, seu guia espiritual,
que foi docente do Convitto Ecclesiastico, instituiçã o de formaçã o de
jovens sacerdotes para a vida pastoral. Pe. Cafasso o aconselhou a
matricular-se no Convitto Eclesiástico. Foi a partir daí que Dom Bosco
iniciou o Catecismo Dominical para as crianças pobres, no dia 8 de
dezembro de 1841. Durante vá rios anos foi um Orató rio errante;
ninguém queria ser perturbado pelos gritos de centenas de meninos
brincando. Assim, Dom Bosco e seus meninos tiveram que mudar vá rias
vezes de local. (Cf. Memórias Biográficas, Vol. 2, Cap. 6 e 7.) Mas um
sonho maravilhoso revelando eventos futuros veio a ele e o confortou.
Narremos esse sonho com suas pró prias palavras, extraídas das
pá ginas de suas memó rias:
No segundo domingo daquele ano (1844), eu deveria dizer aos
meus meninos que o Orató rio 1 estava sendo transferido para a á rea de
Valdocco. Eu estava, no entanto, verdadeiramente preocupado porque
nã o tinha certeza sobre o local exato, os meios e as pessoas que
poderiam me ajudar. No sá bado à noite tive um novo sonho, que
parecia ser uma continuaçã o daquele que tive em Becchi quando tinha
cerca de nove anos. Acho melhor escrever literalmente.
Sonhei que estava no meio de uma multidã o de lobos, cabras,
cabritos, cordeiros, ovelhas, carneiros, cã es e pá ssaros. Todo o
zooló gico levantou um alvoroço, uma confusã o, ou melhor, um barulho
que teria assustado até o homem mais corajoso. Queria fugir, quando
uma Senhora vestida de pastora me fez sinal para que a seguisse e
acompanhasse o estranho rebanho que ela conduzia.
Vagueamos sem rumo, fazendo três paradas ao longo do caminho,
em cada uma das quais muitos daqueles animais se transformavam em
cordeiros, de modo que o nú mero de cordeiros aumentava
continuamente. Depois de uma longa caminhada, encontrei-me em uma
campina, onde aqueles animais pastavam e brincavam, sem fazer
nenhuma tentativa de morder uns aos outros.
O sonho de São João Bosco com a Pastora (Nossa Senhora), que apontou sua vocação para
educar e cuidar dos meninos.
Eu estava exausto e queria sentar à beira da estrada, mas a Pastora
me convidou a continuar caminhando. A pouca distâ ncia, deparei-me
com um grande parque infantil rodeado de pó rticos, com uma igreja
numa das extremidades. Aqui notei que quatro quintos desses animais
tinham se tornado cordeiros. O nú mero deles agora era muito grande.
Naquele momento, muitos jovens pastores vieram vigiá -los, mas
permaneceram pouco tempo e foram embora. Entã o aconteceu uma
coisa maravilhosa. . . muitos cordeiros se transformaram em pastores e
cuidaram do rebanho. Quando os pastores se tornaram numerosos, eles
se separaram e foram para outro lugar a fim de agrupar outros animais
estranhos em currais.
Quis ir embora, porque pensei que já era hora de celebrar missa,
mas a Pastora pediu-me que olhasse para sul. Ao fazer isso, vi um
campo onde haviam sido plantados milho, batata, repolho, beterraba,
alface e muitos outros vegetais. “Olhe de novo”, disse ela. Eu fiz isso e
contemplei uma igreja monumental. No coro vi coristas e mú sicos que
pareciam me convidar para cantar a missa. Numa serpentina branca
dentro da igreja estava gravado em letras grandes: HIC DOMUS MEA;
INDE GLORIA MEA —“Esta é a minha casa; daqui sairá minha gló ria.”
Ainda sonhando, perguntei à Pastora onde eu estava e o significado de
toda essa caminhada, das paradas, daquela casa, da igreja e depois de
outra igreja. “Você entenderá tudo”, respondeu ela, “quando com os
olhos do corpo você contemplar tudo o que agora vê em sua mente”.
Achei que estava acordado e disse: “Vejo claramente e com meus olhos
corporais; Eu sei para onde estou indo e o que estou fazendo.” Nesse
momento o sino da Igreja de Sã o Francisco de Assis tocou a “Ave Maria”
e eu acordei.
O sonho durou quase toda a noite e houve muitos outros detalhes.
Na época eu entendia pouco porque, desconfiando de mim mesmo,
depositava pouca fé nisso. À medida que as coisas gradualmente
começaram a tomar forma, comecei a entender. Na verdade, mais tarde,
esse sonho, junto com outro, formou a base do meu planejamento
enquanto estava no Rifugio.
——————
1. Dom Bosco chamava aos seus encontros dominicais de meninos “Orató rio”, isto é, lugar de
oração, pela sua finalidade primeira, ou seja, ensiná-los a ir à igreja e a rezar. Seus objetivos eram a
prática da religião e da virtude, a educação moral dos meninos e, consequentemente, a salvação de
suas almas. Recreação, entretenimento, canto e escolaridade, que se seguiram no devido tempo,
foram apenas os meios. (Para mais informaçõ es sobre isto, ver Volume 2, Capítulos VII e XI das
Memórias Biográficas .)
4
O FUTURO DO
ORATÓRIO
( Memórias Biográficas , Vol. II, página 232)

SÃ O JOÃ O BOSCO teve outro sonho reconfortante, ou melhor, uma


sé rie de sonhos, quando foi ordenado a desocupar os aposentos
cedidos ao Orató rio no “Rifugio” da Marquesa Barolo. Assim o narrou
em 1875 a alguns sacerdotes salesianos:

Jovens lutando
Eu parecia estar em uma vasta campina com uma enorme multidã o
de meninos que brigavam, xingavam, roubavam e faziam outras coisas
condenáveis. O ar estava cheio de pedras voadoras, atiradas por jovens
que lutavam. Eram todos meninos abandonados, desprovidos de
princípios morais. Eu estava prestes a me virar quando vi uma senhora
ao meu lado. “Vá até aqueles meninos”, disse ela, “e trabalhe”.
Aproximei-me deles, mas o que poderia fazer? Eu nã o tinha onde
reuni-los, mas queria ajudá -los. Continuei recorrendo a algumas
pessoas que observavam à distâ ncia e que poderiam ter vindo em meu
auxílio, mas ninguém prestou atençã o ou me deu qualquer ajuda. Entã o
me virei para a Senhora. “Aqui está um lugar”, disse ela, e apontou para
uma campina. “Isso é apenas uma campina”, eu disse.
Ela respondeu: “Meu Filho e Seus Apó stolos nem sequer tinham
onde reclinar a cabeça”. (Cf. Mateus 8:20). Comecei a trabalhar naquela
campina, aconselhando, pregando, ouvindo Confissõ es, mas vi que
quase todos os meus esforços foram em vã o. Eu precisava de um prédio
onde pudesse reunir e abrigar os abandonados pelos pais e os
desprezados e rejeitados pela sociedade. Entã o a Senhora me levou um
pouco mais para o norte e disse: “Olha”.
As Igrejas – Os Mártires
Fiz isso e vi uma pequena igreja com telhado baixo, um pequeno
pá tio e um grande nú mero de meninos. Retomei o meu trabalho, mas
como a igreja estava a ficar demasiado pequena, voltei a apelar à
Senhora, e ela indicou-me outra igreja, muito maior, e uma casa
adjacente a ela. Depois ela me levou para mais perto de um campo
cultivado e que ficava quase em frente à fachada desta nova igreja.
“Neste lugar”, acrescentou, “onde os gloriosos má rtires de Turim,
Adventor e Otávio sofreram o martírio, sobre estes torrõ es encharcados
e santificados pelo seu sangue, desejo que Deus seja honrado de uma
maneira muito especial”. Dizendo isso, ela esticou o pé e apontou para o
local exato onde os má rtires haviam caído. Queria deixar ali um
marcador para encontrar o lugar novamente quando voltasse, mas nã o
consegui ver um ú nico pedaço de pau ou pedra. Mesmo assim, mantive
o lugar claramente em mente. Coincide exatamente com o canto interno
da capela dos Santos Má rtires, anteriormente conhecida como Capela
de Santa Ana; é o canto frontal esquerdo de frente para o altar-mor da
Igreja de Maria Auxiliadora.
Entretanto, vi-me rodeado por um nú mero vasto e cada vez maior
de rapazes, mas à medida que olhava para a Senhora, as instalaçõ es e os
meios também cresciam em conformidade. Vi entã o uma grande igreja
no local exato que ela havia apontado como o local onde os soldados da
legiã o tebana haviam sido martirizados. Havia muitos edifícios ao redor
e no centro havia um belo monumento.

A fita da obediência
Enquanto estas coisas aconteciam e eu ainda sonhava, vi que
padres e clérigos me ajudavam; mas depois de um tempo eles foram
embora. Tentei de tudo para que os outros ficassem, mas depois de um
tempo, eles também me deixaram em paz. Entã o voltei-me mais uma
vez para a Senhora em busca de ajuda. “Quer saber o que fazer para
mantê-los?” ela perguntou. “Pegue esta fita e amarre suas testas com
ela.” Reverentemente, peguei a fita branca da mã o dela e notei a palavra
OBEDIÊ NCIA escrita nela. Imediatamente tentei e comecei a amarrar a
testa desses voluntá rios. A fita fez maravilhas. À medida que prosseguia
a missã o que me fora confiada, todos os meus ajudantes desistiram de
me deixar e ficaram. Assim nasceu a nossa Congregaçã o.
Vi muitas outras coisas, mas nã o há necessidade de relatá -las
agora. Basta dizer que desde entã o tenho caminhado em terreno
seguro no que diz respeito aos Orató rios, à Congregaçã o e à maneira de
lidar com os estranhos, independentemente da sua posiçã o. Já previ
todas as dificuldades que vã o surgir e sei como superá -las. Vejo
perfeitamente, pouco a pouco, o que vai acontecer e sigo em frente sem
hesitar. Só depois de ter visto [em sonhos] igrejas, escolas, parques
infantis, rapazes, clé rigos e padres a ajudar-me e ter aprendido como
fazer avançar todo o apostolado, é que comecei a mencioná -lo aos
outros e a falar dele como uma realidade. . É por isso que tantas
pessoas pensaram que eu estava falando tolices e acreditaram que eu
era louco. 1
——————
1. Cfr. Vol. II, página 319 e vol. XV das Memórias Biográficas .
5
TRÊS MÁRTIRES
( Memórias Biográficas , Vol. II, página 268)

O Oratório Errante

DURANTE OS primeiros cinco anos (1841-1846), o Orató rio de


Dom Bosco foi um “orató rio errante” (cf. Memórias Biográficas , vol. 2,
262ss). Ou porque o local nã o era grande o suficiente para acomodar
centenas de meninos brincando, ou porque os vizinhos estavam
perturbados, ele teve que se deslocar com seu rebanho de um lugar
para outro, perseguido por alguns, admirado e ajudado por outros. Mas
Nossa Senhora o consolou e guiou em todas essas andanças.
Um de seus sonhos revelou-lhe mais uma visã o maravilhosa. Ele
revelou isso brevemente e apenas a alguns íntimos em 1884, mas seus
aspectos mais marcantes escaparam de seus lá bios em diversas
ocasiõ es, sempre que, durante um período de vinte anos, ele olhava
com grande emoçã o e quase em êxtase para a Igreja de Maria,
Auxiliadora. dos cristã os. Nó s, ao seu lado, valorizamos suas palavras e
as anotamos cuidadosamente a cada vez, e entã o fomos capazes de
reconstruir seu sonho da seguinte forma:
Dom Bosco parecia estar no limite norte do círculo “Rondo” ou
Valdocco. Olhando para o rio Dora, ao longo das altas á rvores que entã o
margeavam o bulevar hoje conhecido como Corso Regina Margherita,
ele viu, a cerca de sessenta metros de distâ ncia, perto da atual Via
Cottolengo, três belos jovens, resplandecentes de brilho. Eles estavam
num campo entã o plantado com batatas, milho, feijã o e repolho, e
estavam precisamente no local que num sonho anterior lhe havia sido
apontado como o lugar onde os três soldados da Legiã o Tebana haviam
sofrido gloriosamente o martírio. . Eles fizeram um gesto para que ele
se juntasse a eles. Dom Bosco apressou-se e, com muita bondade,
levaram-no até ao extremo daquele campo, onde hoje se encontra a
majestosa Igreja de Maria Auxiliadora.
São João Bosco com “Mama Margarita” (sua mãe) e “Grigio” - o cachorro milagroso que
aparecia do nada quando São João Bosco precisava de proteção. Mamãe Margarita tornou-se
uma mãe dedicada aos muitos meninos aos cuidados de São João Bosco.
Maria o tranquiliza
Durante aquela breve caminhada, Dom Bosco viu maravilha apó s
maravilha e finalmente se deparou com uma Senhora
extraordinariamente bela e majestosa, esplendidamente vestida, em
torno da qual estavam homens veneráveis que pareciam um senado de
príncipes. Centenas de pessoas em formaçõ es brilhantes formavam seu
séquito como se ela fosse uma rainha; e outras multidõ es semelhantes
eram visíveis até onde a vista alcançava. A Senhora fez sinal a Dom
Bosco para que se aproximasse. Quando ele estava perto dela, ela lhe
disse que os três jovens que o acompanhavam eram os três má rtires
Solutor, Adventor e Otávio, e ele interpretou isso como significando que
seriam os santos padroeiros daquele lugar.
Depois, com um sorriso encantador e palavras afetuosas, ela o
encorajou a nunca abandonar seus meninos, mas a continuar com ainda
mais determinaçã o o grande trabalho que havia começado. Ela
informou-lhe que encontraria muitos obstá culos sérios, mas que todos
seriam superados e eliminados pela sua firme fé na Mã e de Deus e no
seu Divino Filho.
Finalmente, ela lhe indicou uma casa que realmente existia e que
mais tarde ele descobriu que pertencia a um homem chamado Pinardi.
Ela também lhe mostrou uma pequena igreja no mesmo local onde hoje
se encontra a Igreja de Sã o Francisco de Sales e seus edifícios
adjacentes. Ela entã o levantou a mã o direita e com uma voz
infinitamente melodiosa disse: HAEC EST DOMUS MEA; INDE GLORIA
MEA —“Esta é a minha casa; daqui sairá minha gló ria.” Ao ouvir estas
palavras, Dom Bosco ficou tã o comovido que acordou. A Santíssima
Virgem, pois realmente era ela, e toda a visã o desapareceu lentamente
de vista como a névoa do amanhecer.
O sonho de São João Bosco com Maria, Auxiliadora, rodeada pelos três mártires Solutor,
Adventor e Otávio, além de uma multidão de outros Santos. As palavras latinas Hic domus
mea; inde gloria mea traduz: “Esta é minha casa; daqui sairá minha gló ria.”
6
A FUTURA IGREJA DE
ST. FRANCISCO DE VENDAS
( Memórias Biográficas , Vol. II, página 318)

AS DIFICULDADES nunca dissuadiram Dom Bosco da sua


determinaçã o: esta foi uma característica sua que durou toda a vida.
Uma vez tomada uma decisã o, apó s longa reflexã o e consulta com os
seus superiores e outras pessoas prudentes, nunca desistiu até
completar a sua tarefa. Mas ele nã o começou nada por motivos
puramente humanos. Enquanto dormia, ele foi favorecido com visõ es
que ofereciam iluminaçã o. Estas ele narrou ao Padre Michael Rua e
outros nos primeiros anos de seu trabalho.
À s vezes dava por si a contemplar alguns edifícios e uma igreja,
todo o complexo idê ntico ao actual Orató rio de Sã o Francisco de Sales
(Casa Mã e da Sociedade Salesiana). 1 Na fachada da igreja constava a
legenda: HAEC EST DOMUS MEA; INDE GLORIA MEA —“Esta é a minha
casa; daqui sairá minha gló ria.” Meninos, seminaristas e padres
entravam e saíam pelos seus portais. Esta visã o à s vezes dava lugar a
outra. No mesmo local apareceria a pequena Casa Pinardi, e ao seu
redor pó rticos contíguos a uma igreja, e um grande nú mero de
meninos, clé rigos e padres. “Mas nã o pode ser assim”, disse Dom Bosco
a si mesmo. “Isso é bom demais para ser verdade. Isso é uma ilusã o
diabó lica?” Entã o ele ouviu claramente uma voz que lhe dizia: “Você
nã o sabe que o Senhor pode enriquecer o seu povo com os despojos
dos egípcios?” (Cf. 1 Mach. 1:20.)
Outras vezes parecia estar na Via Cottolengo. À sua direita ficava a
casa dos Pinardi, no meio de uma horta, rodeada de campos; à sua
esquerda, quase em frente à casa Pinardi, ficava a casa Moretta com os
parques e campos adjacentes, onde mais tarde se estabeleceriam as
Filhas de Maria Auxiliadora. Dois pilares erguiam-se no portã o
principal do futuro Orató rio de Sã o Francisco de Sales, e sobre eles Dom
Bosco podia ler a seguinte inscriçã o: HINC INDE GLORIA MEA – “Daqui e
dali sairá a minha gló ria”. Este foi evidentemente o primeiro indício de
uma congregaçã o irmã que floresceria ao lado dos Salesianos. Se ele viu
esta ú ltima, nã o é provável que também tenha visto as irmã s? Seja
como for, ele estava poupando palavras nesses assuntos, entã o nã o
disse nada naquele momento.
Enquanto isso, o primeiro sonho (Vol. II, p. 190f) que teve no
Convitto estava prestes a se confirmar. Dom Bosco deveria fazer trê s
paradas antes de encontrar residê ncia permanente. A primeira foi no
Rifugio, 2 e o segundo no Molini Dora. A casa Moretta 3 com seu “prado”
seria o terceiro. Que Deus seja abençoado.
——————
1. Nas páginas seguintes, a palavra “Orató rio” significa o primeiro internato de Dom Bosco no
bairro de Valdocco, em Turim. Começou como “Orató rio Festivo”, mas depois o nome foi aplicado
igualmente ao estabelecimento de internato agregado ao Orató rio Festivo, também chamado de
“Casa Mãe”.
2. “Rifugio” ou “Pia Opera del Rifugio” (“Pia Obra do Refú gio”) foi uma das muitas instituiçõ es de
caridade abertas e doadas pela Marquesa Barolo. Incluía o Hospital Santa Filomena. Quando Dom
Bosco foi nomeado Capelão Adjunto do Rifugio, foi autorizado a utilizar para o seu Orató rio
Festivo algumas salas do Hospital Santa Filomena, que ainda não haviam sido inaugurados. (Cf.
Memórias Biográficas Vol. II, Cap. 4.)
3. Moretta (Casa): casa em Valdocco onde Dom Bosco alugou quartos para aulas noturnas e
dominicais do Orató rio quando teve que deixar o Rifugio. (Cf. Memórias Biográficas II, Cap. 37.)
7
DOIS MENINOS ATACADOS
POR UM MONSTRO
( Memórias Biográficas , Vol. II, página 396)

D ON BOSCO teve este sonho quando convalescia em casa, em Becchi,


depois de uma doença grave. O nú mero de meninos do Orató rio era
entã o de 629. Durante sua ausê ncia, Padre Borel e outros ajudantes
dirigiram o Orató rio Festivo. (Cf. Vol. II, pá ginas 380-399.)
Só houve dois casos em que Dom Bosco nã o pô de permanecer
imperturbável: quando as almas estavam em perigo ou se perderam, e
quando Deus foi ofendido.
Naquela época, Joseph Buzzetti contou-nos que Dom Bosco teve
um sonho que o deixou muito infeliz. Viu dois rapazes, que reconheceu,
saírem de Turim para visitá -lo; mas quando chegaram à ponte sobre o
Pó , uma criatura horrível e repulsiva os atacou. Depois de babar sobre
eles, jogou-os no chã o, arrastando-os por uma certa distâ ncia pela lama,
de modo que ficaram cobertos de sujeira da cabeça aos pés. Dom Bosco
contou este sonho a vá rios dos meninos que estavam com ele,
mencionando os nomes dos meninos que tinha visto no sonho. Os
acontecimentos posteriores provaram que o sonho era algo mais do que
mera imaginaçã o, porque aqueles dois infelizes rapazes abandonaram o
Orató rio e entregaram-se a uma vida dissoluta.
8
LAÇOS MORTOS
( Memórias Biográficas , Vol. IX, página 278)

SONHEI que saía do meu quarto e instantaneamente me


encontrava na igreja. Estava lotado com os alunos do Orató rio, Lanza e
Mirabello, alé m de muitos jovens que eu desconhecia. Os meninos nã o
estavam orando em voz alta, mas pareciam estar se preparando para a
Confissã o. Observei um grande nú mero de pessoas aglomerando-se em
torno do meu confessioná rio sob o pú lpito e comecei a me perguntar
como poderia ouvi-los todos. Suspeitei que pudesse estar sonhando.
Para ter certeza de que estava acordado, bati palmas e ouvi claramente
o barulho que faziam. Para ter certeza absoluta, estendi as mã os e senti
a parede atrá s do meu confessioná rio. Sem margem para dú vidas, disse
a mim mesmo: “É melhor começar”. E entã o comecei a ouvir
Confissõ es. Logo, preocupado com o nú mero de meninos, levantei-me
para ver se havia outros confessores, mas nã o havia nenhum, entã o fui
até a sacristia, na esperança de encontrar ajuda. Foi entã o que notei
que alguns meninos tinham uma corda no pescoço que quase os
sufocava.
“Para que serve essa corda?” Perguntei. "Tire." Em resposta, eles
apenas me encararam.
“Você”, eu disse a um jovem, “vá até aquele garoto e tire esse laço
do pescoço dele”.
O menino foi, mas voltou dizendo: “Nã o consigo tirar. Alguém está
segurando. Venha e veja."

Gatos Feios
Examinei mais de perto aquela enorme multidã o de meninos e
pensei ter visto dois chifres muito longos projetando-se atrá s de muitos
deles. Aproximei-me do que estava mais pró ximo e, parando atrá s dele,
vi um gato horrível agarrado com força ao laço. Surpreso com o ato,
tentou agachar-se e esconder o focinho entre as patas. Perguntei a esse
menino e aos outros seus nomes, mas eles nã o responderam. Eu
questionei aquela fera assustadora, mas ela apenas se agachou.
“Vá até a sacristia e peça á gua benta ao padre Merlone”, ordenei a
um dos meninos.
Ele logo voltou com ele, mas enquanto isso descobri que atrá s de
cada menino estava agachado um gato tã o horrível quanto o primeiro.
Continuei esperando que fosse um sonho. Aproveitando o sprinkler,
virei-me para um daqueles grandes felinos.
“Diga-me quem você é”, ordenei.
Abrindo e fechando alternadamente as mandíbulas, o animal
hediondo rosnou e se preparou para atacar.
"Responda-me!" Eu insisto. "O que você está fazendo aqui? Nã o
temo sua raiva. Você vê esta á gua benta? Eu vou encharcar você
completamente com isso.”
Consternado, o monstro começou a contorcer-se em contorçõ es
inacreditáveis e mais uma vez pareceu pronto para saltar sobre mim.
Fiquei de olho nele e percebi que ele segurava vá rios laços na pata.
"O que você está fazendo aqui?" Perguntei novamente, enquanto
ameaçava com á gua benta. O monstro entã o relaxou sua posiçã o tensa
para fugir.
"Parar!" Eu exigi. “Você fica aqui!”
“Olhe entã o”, ele rosnou e me mostrou seus laços. "O que eles sã o?
O que você quer dizer?" Perguntei.
“Você nã o entende? Eu incito esses meninos a fazerem confissõ es
ruins. Com estes laços eu arrasto nove décimos da humanidade para o
Inferno.”
“Entã o, em nome de Jesus Cristo, fale!”
Contorcendo-se horrivelmente, o monstro respondeu: “Com o
primeiro laço faço os meninos esconderem seus pecados na Confissã o”.
“E com o segundo?”
“Eu os faço confessar sem verdadeira tristeza.”
“E com o terceiro?”
"Eu nã o vou te contar."
“É melhor você contar, ou você ficará encharcado com esta á gua
benta!”
“Nã o, nã o, nã o vou! Já falei demais!” E rosnou de fú ria.
“Diga-me para que eu possa informar os diretores de nossas
escolas”, exigi, levantando o sprinkler.
Chamas e até algumas gotas de sangue saíram dos olhos da fera
enquanto ela murmurava a contragosto: “Com o terceiro laço eu os
impedi de tomar uma resoluçã o firme e de seguir o conselho de seu
confessor”.
“Sua fera horrível”, exclamei. Eu queria questionar ainda mais o
monstro e forçá -lo a dizer como eu poderia remediar esse grande mal e
compensar seus esforços diabó licos, mas todos aqueles gatos horríveis,
que até agora tinham feito o má ximo para permanecerem escondidos,
começaram a murmurar e entã o irromperam. em altos gritos contra
aquele que havia falado. Em meio ao alvoroço geral, percebi que nã o
conseguiria mais nada do monstro. Portanto, erguendo o aspersor e
jogando á gua benta sobre aquele que havia falado, ordenei: “Vá
embora”, e ele desapareceu. Entã o borrifei á gua benta por toda parte e,
no pandemô nio que se seguiu, todos aqueles gatos fugiram. O barulho
me acordou e me vi na cama.

Sinceridade – Tristeza – Resolução


Meus queridos meninos, eu nunca teria pensado que tantos de
vocês tivessem laços no pescoço. Você sabe o que eles representam. O
primeiro laço envergonha um menino, fazendo-o esconder os pecados
na Confissã o ou mentir sobre o nú mero de vezes - por exemplo,
acusando-se de cometer um pecado três ou quatro vezes, quando eram
exatamente quatro vezes. Isso é tã o insincero quanto esconder pecados.
A segunda representa a falta de tristeza e a terceira a falta de uma
resoluçã o firme. Se quisermos nos livrar desses laços e arrancá -los das
garras do diabo, confessemos todos os nossos pecados e sintamos
verdadeiramente pesar por eles.
Pouco antes de ficar furioso, o monstro me disse: “Veja quanto
bons meninos tiram da Confissã o! Se você quer saber se eu os
mantenho na coleira ou nã o, veja se eles estã o melhorando.”
Também forcei o diabo a me dizer por que ele estava agachado nas
suas costas. “Para que eu nã o possa ser visto”, respondeu. “Dessa forma,
será mais fá cil para mim arrastá -los para o Inferno.” Aqueles de vocês
que tinham esses monstros nas costas eram muito mais numerosos do
que eu teria acreditado.
Faça o que quiser com esse sonho, mas é fato que verifiquei essas
coisas e descobri que o que sonhei era bem verdade. Aproveitemos,
portanto, esta oportunidade de obter a indulgência plená ria fazendo
uma boa Confissã o e Comunhã o. Façamos tudo o que estiver ao nosso
alcance para nos libertarmos das cordas do diabo.
Por ocasiã o do Jubileu de Ouro da sua ordenaçã o, o Santo Padre
concedeu indulgência plená ria a todos aqueles que no pró ximo
domingo, 11 de abril, depois de receberem os Sacramentos, rezarem
pela sua intençã o. No pró ximo sá bado, o Cavaleiro Oreglia terá uma
audiência privada com o Santo Padre e oferecer-lhe-á um á lbum com as
suas assinaturas e as dos meninos que frequentam as nossas escolas e
orató rios. Entretanto, veja se as suas Confissõ es anteriores foram bem
feitas. Lembrarei de todos vocês na minha Santa Missa no pró ximo
domingo.
9
A PERDIZ
E A CODOR
( Memórias Biográficas , Vol. 8, página 9)

VOU lhe contar um sonho que tive na noite de anteontem. Eu estava


caminhando com todos você s e muitos outros que nã o conhecia.
Paramos em um vinhedo para nos refrescarmos e todos se espalharam
para colher frutas, banqueteando-se com uvas, figos, pê ssegos e
ameixas. Eu estava com você , colhendo uvas e figos para você comer.
Eu parecia estar sonhando e de alguma forma me arrependi de ter
sido apenas um sonho. “De qualquer forma”, disse a mim mesmo, “deixe
os meninos se fartarem”. Através das fileiras de vinhas avistávamos o
viticultor.
Depois de satisfeitos, retomamos a marcha pelas vinhas, mas
tivemos dificuldade em atravessar os sulcos profundos que percorrem
toda a extensã o da vinha. Os meninos mais robustos conseguiram pular
de uma fileira para outra; os menores nã o conseguiam sobreviver e
geralmente caíam em um sulco profundo. Simpatizando com a situaçã o
deles, procurei outra saída e notei uma estrada de terra ao lado do
vinhedo. Fui com todos vocês, mas o viticultor me impediu. “Escute-
me”, disse ele. “Fique fora dessa estrada. É rochoso, lamacento,
espinhoso e esburacado – absolutamente impossível. Permaneça no
caminho que você seguiu.”
“Eu gostaria”, respondi, “mas esses pequeninos nã o conseguem
atravessar os sulcos”.
"Nã o tem problema." ele rebateu. “Deixe os meninos maiores
carregarem os mais novos. Eles ainda serã o capazes de pular de uma
fileira para outra.”
Nã o convencido, segui pela estrada de terra com todos os meninos,
apenas para descobrir que era realmente proibitiva e intransitável.
Voltando-me para o Padre Francesia, observei: “Estamos entre o diabo e
o mar azul profundo”. Nã o tivemos escolha senã o continuar
atravessando aqueles sulcos por um caminho paralelo à estrada de
terra. Quando finalmente chegá mos à ú ltima fila de vinhas, depará mo-
nos com uma espessa sebe de espinhos. Abrindo uma passagem com
grande dificuldade, descemos uma margem elevada até uma campina
exuberante e arborizada.
No seu centro avistei dois ex-alunos do Orató rio que, ao me
reconhecerem, vieram me cumprimentar. Conversamos um pouco.
Entã o, um deles, segurando dois pá ssaros, disse: “Veja o que encontrei!
Eles nã o sã o fofos?
"O que eles sã o?" Perguntei.
“Esta é uma perdiz e esta é uma codorna!”
“A perdiz está viva?”
"Claro!" E ele colocou um lindo filhote em minhas mã os.
“Ele pode se alimentar sozinho?”
“Sim, acabou de começar.” Enquanto o observava comer, notei que
seu bico estava dividido em quatro partes. Surpreso, perguntei ao
menino sobre isso.
“Quer dizer que você nã o sabe?” ele respondeu. “O bico de quatro
partes simboliza a mesma coisa que a pró pria perdiz.”
"Eu nã o entendo."
"Você deve! Afinal, você é bem educado. Qual é a palavra latina
para perdiz?
“ Perdice .”
"Bem, entã o você conseguiu!"
“Eu ainda nã o entendo! Diga-me."
“Tudo bem, eu vou. Considere o que cada letra significa:
'P': Perseverantia— 'Perseverança.'
'E': Æternitas te expectat— 'A eternidade espera por você.'
'R': Referet unusquisque secundum opera sua prout gesit: sive
bonum, sive malum —'Todos devem prestar contas de seus atos, sejam
eles bons ou maus.'
'D': Dempto nomine—'Sem levar em conta seu nome, fama
mundana, gló ria, conhecimento ou riqueza.'
'Eu': Ibit - 'Ele irá .' Agora você também sabe o que significa o bico
de quatro partes: As Quatro Ú ltimas Coisas.
“Entendo, mas o que significa ‘X’, a ú ltima letra?”
“Você nã o consegue adivinhar? Você nã o estudou matemá tica?
"Tudo bem! 'X' representa uma quantidade desconhecida.”
"Bom! Agora substitua a palavra quantidade por destino e você
terá 'destino desconhecido'. Ibit in locum suum – ' Ele irá para seu
destino desconhecido.'”
Espantado, mas também convencido por esta explicaçã o,
perguntei-lhe: “Posso ficar com esta perdiz?”
“Você é bem-vindo”, ele respondeu. “Você gostaria de dar uma
olhada na codorna também?” Ele adicionou.
"Sim, deixe-me ver."
Ele entregou para mim. Parecia ser um pá ssaro muito bonito, mas
ao levantar as asas vi que estava coberto de feridas. [Quanto mais eu
examinava,] mais horrível, purulento e fedorento ele se tornava.
"O que aconteceu?" Eu perguntei ao rapaz.
“Você é sacerdote e estudou as Sagradas Escrituras, mas nã o
entende? Você nã o se lembra que quando os israelitas reclamaram no
deserto, Deus lhes enviou um rebanho de codornizes? Os israelitas
festejaram com eles, mas enquanto comiam, Deus puniu milhares deles.
Esta codorna lhe diz que a gula é mais mortal que a espada e é a fonte
da maioria dos pecados.”
Agradeci a ele por esta explicaçã o.
Entretanto, um grande nú mero de outras perdizes e codornizes
apareciam por todas as sebes, á rvores e prados. Vocês, rapazes,
atacaram-nos e prepararam uma refeiçã o. Retomamos entã o a nossa
marcha. Os que se alimentaram de perdizes sentiram-se fortes e
seguiram-me; aqueles, em vez disso, que se banquetearam com
codornizes permaneceram no vale e se espalharam. Nã o os vi mais.
No dia 18 de janeiro, Dom Bosco falou assim aos meninos:
Eu sei que você gostaria de ouvir mais sobre o sonho que lhe
contei outra noite. Divulgarei apenas o que representam a perdiz e a
codorna. Em resumo, a perdiz representa a virtude e a codorna o vício.
Nã o preciso lhe dizer que a bela aparência da codorna, mascarando as
feridas pú tridas sob suas asas, simboliza a impureza. Os rapazes que se
alimentam avidamente de codornizes, apesar do seu estado podre, sã o
os que se entregam a há bitos pecaminosos, enquanto os rapazes que
comem perdizes sã o os que amam e praticam a virtude.
Vi meninos segurando uma codorna em uma mã o e uma perdiz na
outra, mas alimentando-se exclusivamente de codorna. Esses rapazes
conhecem a beleza da virtude, mas recusam-se a usar os meios dados
por Deus para se tornarem bons. Outros, em vez disso, alimentavam-se
de perdizes, mas continuavam a olhar com saudade para as codornizes.
Sã o aqueles que trilham o caminho da virtude, mas sem entusiasmo,
pela força. A menos que mudem a sua perspectiva, mais cedo ou mais
tarde cairã o.
Notei também que codornizes ficavam esvoaçando na frente dos
meninos comendo perdizes, mas esses rapazes simplesmente as
ignoravam. Estes sã o os que seguem a virtude e que detestam e
desprezam o vício. Depois havia meninos que comiam perdizes e
codornizes. Esses sã o os sujeitos que passam do vício para a virtude e
vice-versa, enganando-se e acreditando que afinal nã o sã o tã o ruins.
“Quem de nó s estava comendo o quê?” você pode perguntar. Eu
contei a muitos ontem. Quanto ao resto, deixe-os vir até mim e eu lhes
direi também.
O que diremos agora sobre o sonho acima narrado? Dom Bosco,
como era seu há bito, nã o o explicou completamente, limitando-se ao
que dizia respeito aos meninos e a algumas reflexõ es sobre o futuro.
Mas, se nã o nos enganamos, ao estudar as suas palavras vemos no seu
sonho o Orató rio, a sociedade salesiana e as ordens religiosas em geral.
A perdiz: A esperteza é uma característica desta ave. Cornélio á
Lapide, de facto, comentando o capítulo 17 de Jeremias, cita Santo
Ambró sio (Carta 47) onde descreve os truques inteligentes e muitas
vezes bem sucedidos da perdiz para escapar à s armadilhas do caçador
e salvar a sua ninhada. Uma das frases frequentes de Dom Bosco aos
seus alunos era: “Sejam espertos!” A inferência foi que o pensamento da
eternidade lhes sugeriria como escapar das armadilhas do diabo.
A codorna: Símbolo das coisas impuras. Além disso: a gula mata
vocações.
10
O PRECIOSO
LENÇO DA PUREZA
( Memórias Biográficas , Vol. VI, página 582)

ESTE SONHO dos lenços adverte-nos para reagirmos rapidamente


contra as tentaçõ es impuras. Permanecer sem fazer nada levaria
algué m ao pecado. Quem pode apagar o fogo quando toda a casa está
em chamas?
O vento da tentaçã o sopra? Vire imediatamente para a direita, ou
seja, peça ajuda a Maria. Aqueles meninos imprudentes que mantinham
os lenços da Rainha das Virtudes expostos ao vento, à chuva e ao
granizo logo os encontraram esburacados, disformes e sem qualquer
beleza.
Um dos homens que estava perto da Senhora (talvez um ministro
de Deus) gritou: “Vire à DIREITA.” Quase todos obedeceram e viraram-
se para a direita: isto é, fizeram boas Confissõ es. Entã o eles
consertaram seus lenços. Mas os lenços, embora remendados, nã o
tinham formato mais regular. Deus perdoa, mas a natureza pune!
Há bitos de impureza sempre terã o consequências ruins. Só o tempo, a
boa vontade e a graça de Deus poderã o reparar os danos. É preciso
cultivar a piedade, a humildade, o espírito de sacrifício e praticar boas
obras por amor de Jesus Cristo. Aqueles que continuam com maus
há bitos correm grande risco de condenaçã o eterna.
Aqui está o resumo da palestra proferida por Dom Bosco em 18 de
junho de 1861, sobre os preciosos lenços:
Na noite de 14 de junho, mal adormeci, fui surpreendido por uma
forte pancada na cama, como se alguém a tivesse atingido com uma
tá bua. Eu pulei e imediatamente pensei que fosse um raio. Olhei em
volta, mas nã o encontrei nada de incomum. Convencido de que
provavelmente estava sonhando, tentei dormir novamente. Mal comecei
a cochilar quando um segundo golpe me assustou novamente. Desta
vez, levantei-me da cama e procurei por todo o lado – debaixo da cama,
debaixo da secretá ria e nos cantos do quarto – mas nã o encontrei nada
de errado. Confiando-me à proteçã o de Deus, benzei-me com á gua
benta e deitei-me na cama. Foi entã o que minha mente começou a
divagar e vi o que vou lhe contar.

Um vale imenso
Parecia que eu estava no pú lpito da nossa igreja, prestes a começar
um sermã o. Todos os meninos estavam sentados em seus lugares
habituais, olhando para cima e esperando, mas eu nã o tinha ideia sobre
o que pregar. Minha mente estava completamente em branco. Por um
tempo fiquei ali perplexo e consternado. Nunca algo assim aconteceu
comigo em todos os anos de meu ministério. Entã o, de repente, os
muros e os meninos desapareceram, e a igreja se transformou num
imenso vale. Eu estava fora de mim e nã o conseguia acreditar no que
via. "O que é isso?" Eu questionei. “Há um momento eu estava no
pú lpito da igreja e agora estou em um vale. Estou sonhando? O que está
acontecendo comigo?"
Resolvi ir, na esperança de encontrar alguém e descobrir onde
estava. Depois de um tempo, cheguei a um palá cio imponente. As suas
muitas varandas e amplos terraços harmonizam-se lindamente com o
edifício e a paisagem. Em frente ao palá cio havia uma grande praça.
Num canto, à direita, muitos rapazes aglomeravam-se à volta de uma
Senhora que distribuía lenços, um a cada rapaz. Ao pegar a deles, os
meninos subiram até o terraço e se posicionaram ao longo do
parapeito. Aproximando-me da Senhora, ouvi-a dizer a cada rapaz
enquanto lhe entregava um lenço: “Nã o o desdobre quando estiver
ventando, mas se for surpreendido pelo vento, vire imediatamente para
a direita, nunca para a esquerda. ”

A tempestade
Continuei olhando para aqueles meninos, mas naquele momento
nã o reconheci nenhum deles.
Depois de distribuídos todos os lenços, os meninos ficaram todos
alinhados no terraço em completo silêncio. Enquanto eu observava, um
menino tirou seu lenço e o desdobrou. Outros seguiram seu exemplo e
logo todos os eliminaram. Os lenços eram muito grandes e
primorosamente bordados em ouro. Em cada uma delas,
longitudinalmente, estava escrito em ouro: Regina Virtutum — “Rainha
das Virtudes”.
De repente, uma brisa suave veio do norte – isto é, da esquerda.
Gradualmente ficou mais forte; entã o se tornou um vento. Alguns dos
meninos dobraram imediatamente os lenços e os esconderam,
enquanto outros viraram rapidamente para a direita. Outros, em vez
disso, os deixaram expostos e balançando ao vento. Enquanto isso, a
perturbaçã o ganhou força, enquanto nuvens sinistras se acumulavam
no alto e escurecevam o céu. Relâ mpagos brilharam e estrondos
estrondosos e assustadores rolaram pelos céus, seguidos por granizo,
chuva e neve. Inacreditavelmente, muitos meninos ainda mantinham os
lenços balançando na tempestade. O granizo, a chuva e a neve os
atingiram impiedosamente. Em pouco tempo eles estavam cheios de
buracos, rasgados e irreconhecíveis.
Fiquei atordoado, sem saber o que fazer com isso. No entanto, eu
estava prestes a ter um choque ainda maior. Ao me aproximar dos
meninos para ver melhor, reconheci cada um deles. Eles eram meus
pró prios meninos do Orató rio. Corri até um deles e perguntei: “O que
diabos você está fazendo aqui? Você nã o é fulano de tal?”
“Sim”, ele respondeu, “eu sou”. E entã o, apontando para vá rios
outros, acrescentou: “Fulano e fulano também estã o aqui!”
Fui entã o até a Senhora que havia distribuído os lenços. Vá rios
homens estavam ao seu redor.
"O que tudo isso significa?" Eu perguntei pra eles.
A pró pria Senhora, ouvindo minha pergunta, virou-se para mim.
“Você nã o viu a inscriçã o nesses lenços?” ela perguntou. “Ora, sim,
minha senhora”, respondi: “ Regina virtutum ”.
"Você entende agora?" "Sim eu faço!"

Recurso imediato à oração


Todos aqueles rapazes expuseram a sua pureza ao vento da
tentaçã o. Alguns, ao perceberem o perigo, fugiram imediatamente.
Esses sã o os meninos que dobraram e esconderam os lenços. Outros,
apanhados de surpresa e sem conseguirem dobrar os lenços, viraram-
se para a direita. Sã o estes os rapazes que recorrem prontamente à
oraçã o quando estã o em perigo e dã o as costas ao inimigo. Outros, em
vez disso, mantiveram seus lenços abertos ao má ximo da tentaçã o e
caíram em pecado.
Entristecido com essa visã o e ao perceber que tã o poucos dos
meus meninos se mantiveram puros, quase comecei a chorar. Quando
consegui me controlar novamente, perguntei: “Por que até as gotas de
chuva e os flocos de neve crivavam os lenços? Nã o sã o símbolos do
pecado venial?”
Um dos homens respondeu: “Você nã o sabe que no que diz
respeito à pureza, non datur parvitas materiae —'nã o há matéria que
nã o seja considerada grave'? No entanto, nã o desanime; venha e veja."
Ele foi até a varanda e, sinalizando para os meninos com a mã o,
gritou: “Vire-se!” Quase todos obedeceram; mas alguns nã o se
mexeram. Seus lenços foram rasgados em pedaços. Notei também que
os lenços daqueles que viraram para a direita tinham encolhido e
estavam cobertos de manchas. Eles nã o tinham buracos, mas eram
lamentavelmente disformes.
“Esses meninos”, explicou a Senhora, “tiveram a infelicidade de
perder a pureza, mas recuperaram a graça de Deus através da
Confissã o. Os poucos que nã o se mexeram sã o aqueles que persistem
no pecado e talvez irã o para a perdiçã o.” Finalmente, ela me disse:
“Nemini dicite, sed tantum admone” – “Nã o conte a ninguém em
particular, mas dê apenas um aviso geral”.
11
UM GATO COM CHIFRE
( Memórias Biográficas , Vol. 8, pp. 20 e 25)

DUAS OU TRÊ S noites atrá s eu tive um sonho. Você gostaria de ouvir


isso? Você é muito querido para mim e por isso está sempre em meus
sonhos. Parecia que eu estava no parquinho com você s fervilhando ao
meu redor. Cada um segurava uma rosa, um lírio, uma violeta, ou uma
rosa e um lírio, ou alguma outra flor. De repente, apareceu um gato
enorme e feio, preto como carvã o. Tinha chifres, olhos vermelhos como
brasas, garras longas e afiadas e uma barriga repugnantemente
inchada. Esta fera feia aproximou-se furtivamente de você e
rapidamente arranhou suas flores no chã o. Quando avistei esta criatura
horrível pela primeira vez, fiquei apavorado, mas para minha surpresa
você parecia totalmente despreocupado. Ao vê -lo rastejar em minha
direçã o para derrubar minhas flores, imediatamente me virei para sair
correndo, mas algué m me impediu. “Nã o fuja”, disse ele. “Apresse-se em
dizer aos seus meninos para levantarem os braços bem alto, fora do
alcance da fera.”
Eu fiz o que ele me disse. O monstro tentou muito pular, mas seu
peso o fez cair desajeitadamente no chã o.
O lírio, meus queridos filhos, simboliza a bela virtude da pureza,
contra a qual o diabo trava uma guerra sem fim. Ai daqueles que
mantêm a flor baixa! O diabo vai arrebatar isso deles. Tais sã o aqueles
que mimam a sua carne comendo demais ou comendo entre as
refeiçõ es, que se esquivam do trabalho e desperdiçam o seu tempo, que
gostam de certas conversas ou livros e que evitam a abnegaçã o . . . Pelo
amor de Deus, meus filhos, lutem contra esse inimigo ou ele os
escravizará .
Essas vitó rias sã o difíceis de conquistar. Mas a Sagrada Escritura
nos diz os meios a serem usados: “Este tipo (de demô nio) só pode ser
expulso pela oraçã o e pelo jejum”. (Mateus 17:20). Levante o braço e sua
flor estará segura. A pureza é uma virtude celestial. Quem quiser
salvaguardá -lo deve elevar-se ao céu. A oraçã o é a sua salvaçã o. Por
oraçã o quero dizer as oraçõ es da manhã e da noite com devoçã o, a
meditaçã o e a Santa Missa, a Confissã o e a Comunhã o frequentes, os
sermõ es e exortaçõ es, as visitas ao Santíssimo Sacramento, o Rosá rio e
os seus deveres escolares. Pela oraçã o você subirá ao céu. Assim você
salvaguardará a mais bela das virtudes. Tente o quanto quiser, o diabo
nã o conseguirá arrancar de você.
(Para mais comentários de Dom Bosco, pode-se ler um longo
discurso de “Boa Noite” nas páginas 25-28 do mesmo Vol. 8, 1865, 6 e 13
de fevereiro.)
12
UM ELEFANTE DIABÓNICO
( Memórias Biográficas , Vol. VII, página 212)

A S DE 1º de janeiro de 1863, a Sociedade de Sã o Francisco de Sales


contava com trinta e nove membros, incluindo Dom Bosco. A maioria
deles eram jovens clé rigos, dos quais vinte e dois se consagraram a
Deus com votos trienais. Eram seis sacerdotes: cinco professos e um
sem votos.
Dom Bosco começou o novo ano apelando ao pú blico por ajuda
financeira. As receitas da loteria, embora substanciais, nã o permitiram
a construçã o da nova ala ao longo da via della Giardiniera, a
manutençã o das fronteiras do Orató rio e a realizaçã o de outras grandes
obras que Dom Bosco vinha planejando há algum tempo. Os primeiros
na lista de discussã o estavam os ministros, a família real e seu esmoler,
Pe. Camillo Pelletta de Cortanzone.
Dom Bosco ainda devia aos seus meninos a estreia anual, 1 e ao
mesmo tempo sentiu que devia revelar-lhes algo extraordiná rio para o
seu bem-estar espiritual. As mortes que ele previu no final do ano
reformaram muitos coraçõ es, mas nã o todos. Vá rios alunos novos e
alguns antigos ainda se recusavam a fazer as pazes com Deus e
continuavam a viver irrefletidamente, apesar da maravilhosa
misericó rdia de Deus. “Bom e reto é o Senhor”, diz o salmista: “ Ele
mostra o caminho aos pecadores, guia os humildes à justiça, ensina aos
humildes o seu caminho ”. ( Sl. 24:8-9). Isso já vimos e continuaremos a
ver.
Nã o tendo podido entregar a Estreia anual aos seus alunos no
ú ltimo dia do ano, Dom Bosco prometeu fazê-lo na noite da Festa da
Epifania. Portanto, na terça-feira, 6 de janeiro de 1863, depois das
oraçõ es noturnas, enquanto todos os artesã os e estudantes o
esperavam ansiosamente, Dom Bosco subiu na plataforma e dirigiu-se a
eles:
Esta noite eu deveria lhe dar a estreia. Todos os anos, perto do
Natal, peço regularmente a Deus que sugira uma estreia que possa
beneficiar a todos vocês. Tendo em vista o aumento do seu nú mero,
dobrei minhas oraçõ es este ano. O ú ltimo dia do ano (quarta-feira)
chegou e passou, assim como quinta e sexta-feira, mas nada me
ocorreu. Na noite de sexta-feira, 2 de janeiro, fui para a cama exausto,
mas nã o consegui dormir. Na manhã seguinte, levantei-me da cama
exausto e quase morto, mas nã o me senti perturbado por isso. Em vez
disso, fiquei exultante, sabendo por experiências anteriores que uma
noite muito ruim geralmente é um aviso de que Nosso Senhor está
prestes a revelar algo para mim. Naquele dia continuei meu trabalho no
Borgo Cornalese; no dia seguinte, no início da noite, voltei para cá .
Depois de ouvir Confissõ es, fui para a cama. Cansado do trabalho em
Borgo e de nã o ter dormido na noite anterior, logo cochilei. Agora
começou o sonho que lhe dará a sua força.

O enorme elefante
Meus queridos meninos, sonhei que era uma tarde de festa e que
vocês estavam todos ocupados brincando, enquanto eu estava em meu
quarto com o professor Thomas Vallauri (lexicó grafo contemporâ neo,
destacado literato e querido amigo de Dom Bosco) discutindo literatura
e religiã o . De repente, houve uma batida na minha porta. Levantei-me
rapidamente e abri. Minha mã e – morta há seis anos – estava ali. Sem
fô lego, ela engasgou: “Venha e veja! Venha e veja!"
"O que aconteceu?" Perguntei.
"Vir! Vir!" ela respondeu.
Corri para a varanda. Lá embaixo no parquinho, cercado por uma
multidã o de meninos, estava um enorme elefante.
"Como isso aconteceu?" exclamei. "Vamos descer!" O professor
Vallauri e eu nos entreolhamos surpresos e alarmados e depois
descemos correndo.
Como era natural, muitos de vocês correram para o elefante.
Parecia manso e manso. Ele andava de um lado para o outro,
brincalhã o, acariciando os meninos com a tromba e obedecendo
habilmente à s suas ordens, como se tivesse nascido e sido criado no
Orató rio. Muitos de vocês continuaram seguindo-o e acariciando-o, mas
nã o todos. Na verdade, a maioria de vocês ficou com medo e fugiu para
um local seguro. Finalmente, você se escondeu na igreja. Eu também
tentei entrar pela porta lateral que dá para o parque infantil, mas
quando passei pela está tua de Nossa Senhora ao lado do bebedouro e
toquei a bainha do seu manto para me proteger, ela levantou o braço
direito. Vallauri fez o mesmo do outro lado da está tua, e a Virgem
levantou o braço esquerdo. Fiquei pasmo, sem saber o que pensar de
algo tã o extraordiná rio.

O Inimigo da Eucaristia
Quando o sinal tocou para o culto na igreja, todos vocês entraram.
Eu os segui e vi o elefante parado na parte traseira, perto da entrada
principal. Depois das Vésperas e do sermã o, subi ao altar, auxiliado pelo
Pe. Alasonatti e Pe. Sávio, para dar a bênçã o. No momento solene em
que todos vocês se curvaram profundamente para adorar o Santíssimo
Sacramento, o elefante – ainda de pé no final do corredor central –
também se ajoelhou, mas de costas para o altar.
Terminada a missa, tentei correr até o parquinho e ver o que
aconteceria, mas fui detido por alguém. Pouco depois, saí pela porta
lateral que dá para os pó rticos e vi vocês nos seus jogos habituais. O
elefante também saiu da igreja e foi até o segundo playground, onde a
nova ala está em construçã o. Marque bem isso, porque este é
precisamente o lugar onde ocorreu a cena horrível que vou descrever.
Naquele momento, no fundo do recreio, vi uma faixa seguida em
procissã o por rapazes. Trazia em letras enormes a inscriçã o Sancta
Maria, succurre miseris! - “Santa Maria, ajude seus filhos
desamparados!” Para surpresa de todos, aquela fera monstruosa, antes
tã o domesticada, de repente ficou louca. Tocando furiosamente, ele
avançou, agarrou os meninos mais pró ximos com sua tromba,
arremessou-os no ar ou jogou-os no chã o e depois pisoteou-os. Embora
horrivelmente espancadas, as vítimas ainda estavam vivas. Todo mundo
correu para salvar sua vida. Gritos, berros e pedidos de ajuda surgiram
dos feridos. Pior – você acreditaria? – alguns meninos que foram
poupados pelo elefante, em vez de ajudar seus companheiros feridos,
juntaram-se ao monstruoso bruto para encontrar novas vítimas.

Sob seu manto


Enquanto tudo isso acontecia (eu estava junto ao segundo arco do
pó rtico, perto do bebedouro), a pequena está tua que vocês veem ali (a
está tua da Santíssima Virgem) ganhou vida e cresceu até atingir o
tamanho natural. Depois, quando Nossa Senhora levantou os braços, o
seu manto abriu-se para exibir inscriçõ es magnificamente bordadas.
Inacreditavelmente, ela se estendia por toda parte para abrigar todos
aqueles que se reuniam abaixo dela. Os melhores meninos foram os
primeiros a correr para lá em busca de segurança. Vendo que muitos
nã o tinham pressa em correr até ela, Nossa Senhora gritou em voz alta:
“Venite ad me omnes!” - “Venham todos para mim!” Seu chamado foi
atendido e, à medida que a multidã o de meninos sob o manto
aumentava, o manto se espalhava ainda mais. No entanto, alguns jovens
continuaram correndo e ficaram feridos antes que pudessem chegar em
segurança. Corada e sem fô lego, a Santíssima Virgem continuou a
implorar, mas cada vez menos eram os meninos que corriam para ela. O
elefante, entretanto, continuou a matança, auxiliado por vá rios rapazes
que corriam, empunhando uma ou duas espadas e impedindo os seus
companheiros de correrem para Maria. O elefante nem sequer tocou
nesses ajudantes.
O sonho de São João Bosco com O Elefante Diabó lico, que, representando o diabo,
arremessava meninos para o alto ou os jogava no chão e depois os pisoteava. Somente foram
salvos aqueles meninos que se abrigaram sob o manto de Maria. (O elefante está na
extremidade esquerda desta imagem.)
Entretanto, instigados pela Santíssima Virgem, alguns rapazes
abandonaram a segurança do seu manto em rá pidas saídas para
resgatar algumas vítimas. Assim que os feridos foram colocados sob o
manto de Nossa Senhora, foram curados instantaneamente. Repetidas
vezes, vá rios daqueles bravos rapazes, armados com porretes, saíram e,
arriscando as suas vidas, protegeram as vítimas do elefante e dos seus
cú mplices, até que quase todos foram resgatados.
O parque infantil estava agora deserto, exceto por alguns jovens
caídos quase mortos. Numa extremidade do pó rtico, uma multidã o de
meninos permanecia em segurança sob o manto da Virgem. Do outro
lado estava o elefante com cerca de dez ou doze rapazes que o ajudaram
a causar tantos estragos e que ainda brandiam espadas insolentemente.
De repente, erguendo-se sobre as patas traseiras, o elefante
transformou-se num horrível espectro de chifres longos e lançou uma
rede negra sobre seus miseráveis cú mplices. Entã o, enquanto a fera
rugia, uma espessa nuvem de fumaça os envolveu, e a terra subitamente
se abriu sob eles e os engoliu.

Promessas e Máximas
Procurei minha mã e e o professor Vallauri para conversar com
eles, mas nã o os localizei em lugar nenhum. Entã o me virei para olhar
as inscriçõ es no manto de Maria e notei que vá rias delas eram citaçõ es
ou adaptaçõ es reais de textos bíblicos. Eu li alguns deles:

Qui elucidant me vitam aeternam habebunt – “Aqueles que me


explicam terã o vida eterna.” ( Eclesiastes 24:31).
Qui me invenerit, inveniet vitam – “Quem me encontra, encontra a
vida”. ( Pv 8:35).
Si quis est pravulus, veniat ad me – “Quem for pequenino, venha até
mim”. ( Provérbios 9:4).
Refugium peccatorum – “Refú gio dos pecadores”.
Salus credentium – “Salvaçã o dos crentes”.
Plena omnis pietatis, mansuetudinis et misericordiae – “Cheio de
piedade, mansidã o e misericó rdia”. Beati qui custodiunt vias meas –
“Bem-aventurados os que guardam os meus caminhos.” (
Provérbios 8:32).

Evite conversa suja


Tudo estava quieto agora. Depois de um breve silêncio, a Virgem,
aparentemente exausta de tantas sú plicas, confortou e animou
suavemente os meninos e, citando a inscriçã o que eu havia feito na base
do nicho, Qui elucidant me, vitam aeternam habebunt, continuou:
“Você atendeu ao meu chamado e foi poupado da matança infligida
pelo diabo aos seus companheiros. Você quer saber o que causou a
ruína deles? Sunt colloquia prava: Conversas sujas e açõ es sujas. Você
também viu seus companheiros empunhando espadas. Sã o aqueles que
buscam a sua condenaçã o eterna, afastando você de mim, assim como
fizeram com alguns colegas seus.
Mas quos Deus ditius exspeciat durius malnat – “aqueles por quem
Deus continua esperando, Ele pune com mais severidade”. O demô nio
infernal os enredou e os arrastou para a perdiçã o eterna. Agora vá em
paz, mas lembre-se das minhas palavras: Fuja de companheiros que
fazem amizade com Sataná s, evite conversas obscenas, tenha confiança
ilimitada em mim. Meu manto sempre será seu refú gio seguro.”
Nossa Senhora entã o desapareceu; apenas sua amada estatueta
permaneceu. Minha falecida mã e reapareceu. Novamente foi
desfraldada a faixa com a inscriçã o Sancta Maria, succurre miseris .
Marchando atrá s em procissã o, os meninos cantaram Laudate
Maria, O lingue fideli - “Louvai Maria, ó línguas fiéis”. Pouco depois, o
canto diminuiu e toda a cena desapareceu. Acordei suando. Esse era o
meu sonho.
Meus filhos, agora cabe a vocês desenhar a sua pró pria estrela.
Examine sua consciência. Você saberá se estava seguro sob o manto de
Maria, ou se o elefante o lançou ao ar, ou se você estava empunhando
uma espada. Posso apenas repetir o que disse a Virgem: Venite ad me
omnes – “Vinde todos a mim”. Volte-se para ela; chame-a em qualquer
perigo. Posso assegurar-lhe que suas oraçõ es serã o ouvidas. Aqueles
que foram tã o maltratados pelo elefante devem aprender a evitar
conversas obscenas e má s companhias; aqueles que se esforçam para
atrair seus companheiros de Maria devem mudar de atitude ou sair de
casa imediatamente. Se alguém quiser saber o papel que ele
desempenhou, venha ao meu quarto e eu lhe direi. Mas repito: os
cú mplices de Sataná s devem ou consertar os seus caminhos ou partir!
Boa noite!
Dom Bosco falou com tanto fervor e emoçã o que durante uma
semana inteira os meninos continuaram discutindo esse sonho e nã o o
deixaram em paz. Todas as manhã s lotavam seu confessioná rio; todas
as tardes eles o importunavam para saber que papel tinham
desempenhado no sonho misterioso.
Que isto nã o era um sonho, mas uma visã o, o pró prio Dom Bosco
admitiu indiretamente quando disse: “Peço regularmente a Deus que
sugira. . . Uma noite muito ruim costuma ser um aviso de que Nosso
Senhor está prestes a me revelar algo.” Além disso, ele proibiu qualquer
pessoa de fazer pouco caso do que ele havia narrado.
Mas há mais. Nesta ocasiã o fez uma lista dos feridos e dos que
empunhavam uma ou duas espadas. Ele deu a Celestine Durando,
instruindo-o a vigiá -los. O clérigo entregou-nos a lista e ela ainda está
em nossa posse. Os feridos foram treze – provavelmente aqueles que
nã o foram resgatados e abrigados sob o manto de Nossa Senhora.
Dezessete rapazes empunhavam uma espada; apenas três tinham dois.
Notas marginais espalhadas ao lado do nome de um menino indicam
uma mudança de vida. Além disso, devemos ter em mente que o sonho,
como veremos, referia-se também ao futuro.
Que isso refletia o verdadeiro estado das coisas foi admitido pelos
pró prios meninos:
“Nã o imaginava que Dom Bosco me conhecesse tã o bem”, afirmou
um deles. “Ele revelou minha condiçã o espiritual e minhas tentaçõ es
com tanta exatidã o que nã o consegui encontrar nada a acrescentar.”
Dois outros meninos foram informados de que empunhavam
espadas. “É bem verdade”, admitiram cada um. “Eu sabia disso o tempo
todo.” Eles consertaram seus caminhos.
Uma tarde, enquanto falava deste sonho e comentava que alguns
meninos já haviam saído do Orató rio e outros logo o seguiriam, para
nã o prejudicarem os companheiros, Dom Bosco chegou a mencionar a
sua pró pria “feitiçaria”, como a chamava. Neste contexto, ele contou o
seguinte incidente:
Há algum tempo, um rapaz escreveu para casa e acusou falsamente
os padres e superiores da casa de graves irregularidades. Temendo que
Dom Bosco visse a carta, guardou-a até poder enviá -la secretamente.
Naquele mesmo dia, logo depois do jantar, mandei chamá -lo. No meu
quarto, contei-lhe o seu delito e perguntei por que ele havia contado
tais mentiras. Descaradamente, ele negou tudo. Deixei-o falar e entã o,
palavra por palavra, repeti o conteú do da carta para ele. Envergonhado
e assustado, ele se ajoelhou aos meus pés em lá grimas. “Minha carta foi
interceptada?” ele perguntou.
“Nã o”, respondi. “Sua família provavelmente já o recebeu e cabe a
você consertar a situaçã o.”
Os meninos ao seu redor perguntaram como ele havia descoberto
isso. “Oh, é minha magia”, ele respondeu com uma risada. Essa magia e
seu sonho, que revelou nã o apenas a atual condiçã o espiritual dos
meninos, mas també m o seu futuro, devem ter sido a mesma coisa. 2
——————
1. Um presente de Ano Novo habitual na Itália. Desde o início do Orató rio, Dom Bosco iniciou o
costume de dar uma estreia ou presente espiritual aos seus meninos e colaboradores no ú ltimo dia
do ano. Assumia a forma de um lema ou slogan a ser praticado no ano que estava prestes a
amanhecer. Este costume ainda é mantido pelos sucessores de Dom Bosco.
2. Para comentários adicionais podem-se ler as páginas 217-220 do Vol. VII.
13
MENSAGEIRO DA MORTE
( Memórias Biográficas , Vol. VII, página 76)

NO DIA 21 DE MARÇO DE 1862, segundo a crô nica de Dom Bonetti,


Dom Bosco subiu em sua pequena plataforma para dar o discurso de
“Boa Noite” aos meninos. Depois de alguns momentos de silê ncio,
como que para recuperar o fô lego, ele começou:
Devo lhe contar um sonho. Tentem imaginar o Orató rio na hora do
recreio, cheio de jovens alegres e barulhentos. Eu parecia estar
debruçado na janela do meu quarto, observando os meninos brincando
alegremente, correndo e correndo pelo parquinho. De repente, ouvi um
barulho alto na entrada principal. Olhei e vi um velho alto; ele tinha
uma testa larga, olhos estranhamente fundos, uma longa barba branca e
mechas brancas caindo sobre os ombros. Ele estava envolto em um
lençol, que segurava firmemente na mã o esquerda, enquanto na direita
segurava uma tocha azul escura. Ele avançava lenta e gravemente,
parando à s vezes para procurar curvado, como se tentasse encontrar
um objeto perdido; sem ser visto, ele perambulou vá rias vezes por todo
o parquinho, enquanto os meninos continuavam com suas brincadeiras.
Estupefato e perplexo, continuei observando-o. Foi até a
carpintaria, parou diante de um menino que jogava barra rotta (uma
espécie de jogo de polícia e ladrã o) e, estendendo o braço esguio,
ergueu a tocha até o rosto do rapaz. “É ele, tenho certeza”, ele
murmurou e assentiu bruscamente duas ou três vezes. Entã o,
abruptamente, ele encurralou o menino e entregou-lhe um bilhete
tirado das dobras de sua mortalha. Pegando-o, o menino o desdobrou e
empalideceu visivelmente ao lê-lo.
"Quando?" ele perguntou. "Breve?"
“Agora”, foi a resposta horrível.
“Nã o posso terminar o jogo?”
“Você pode ser pego enquanto estiver jogando.”
Isso significou uma morte sú bita. Tremendo, o menino tentou dizer
alguma coisa, implorar, mas nã o conseguiu. Desabotoando o manto, o
estranho apontou para o pó rtico com a mã o esquerda: “Olha”, disse ele.
“Você vê aquele caixã o? É para você! Rá pido, vamos! No centro da
passagem que levava ao pomar havia um caixã o.
"Eu nã o estou preparado . . . Ainda sou muito jovem para morrer! o
menino gritou. Silenciosamente, o estranho afastou-se rapidamente.
Enquanto tentava descobrir quem ele era, acordei. Pelo que eu
disse, vocês podem muito bem entender que um de vocês deve se
preparar, porque o Senhor em breve o chamará para a eternidade. Eu
sei quem ele é, porque vi tudo. Conheço o menino a quem o estranho
entregou o bilhete. Ele está aqui agora me ouvindo, mas nã o contarei a
ninguém até depois de sua morte. No entanto, farei tudo o que puder
para prepará -lo para uma morte feliz. Deixe cada um de vocês cuidar de
si mesmo, pois enquanto ele se pergunta quem é, ele mesmo pode ser o
ú nico. Eu lhe contei isso porque, se nã o o fizesse, o Senhor me
perguntaria: “Por que você nã o fala na hora certa?” Portanto, que cada
um se corrija, especialmente durante estes ú ltimos três dias da novena
que antecede a Festa da Anunciaçã o. Reze especialmente para este fim
e, durante estes três dias, diga pelo menos uma “Salve, Rainha Santa” à
Santíssima Virgem pelo menino que vai morrer. Quando ele partir desta
vida, nossas centenas de oraçõ es o ajudarã o muito.
A Crô nica Bonetti continua:
Quando Dom Bosco deixou o cargo, alguns lhe pediram em
particular que lhes dissesse pelo menos se aquele menino morreria
logo. Ele respondeu que isso aconteceria infalivelmente antes de dois
dias de festa começando com a letra “P” e talvez até antes da primeira
dessas festas; pode demorar duas ou três semanas.
Este sonho causou arrepios; todos temiam que ele pudesse ser o
escolhido. Como em ocasiõ es semelhantes anteriores (ver Vol. VI, pp.
484-89 – “Consciências reveladas”), fez muito bem. Cada um cuidou do
seu bem-estar espiritual e, no dia seguinte, os rapazes confessaram-se
em maior nú mero do que o habitual.
Durante vá rios dias, muitos rapazes tentaram pessoalmente fazer
com que Dom Bosco lhes contasse o seu destino, mas perguntaram em
vã o. Duas coisas ficaram muito claras em suas mentes: a morte seria
repentina e ocorreria antes de dois dias de festa solene começando com
a letra “P” – obviamente Pasqua (Pá scoa) e Pentecostes. A primeira caiu
em 20 de abril.
Houve grande rebuliço no Orató rio no dia 16 de abril de 1862,
quando um menino de doze anos, Luís Fornasio de Borgaro Torinese,
morreu em casa. Há vá rias coisas a serem ditas sobre ele. Quando Dom
Bosco anunciou a morte de um dos meninos, este rapaz, embora nã o
fosse mau, começou a ser um modelo de bom comportamento. Nos
primeiros quatro dias apó s o anú ncio, ele importunou Dom Bosco para
que o deixasse fazer uma Confissã o Geral. Relutante no início, porque o
jovem já tinha feito uma antes, Dom Bosco finalmente cedeu como um
favor especial e ouviu a sua Confissã o em duas ou três sessõ es
diferentes. Além disso, no mesmo dia em que pediu o favor, ou no dia
em que iniciou as suas Confissõ es, o jovem começou a sentir-se
ligeiramente enjoado, e esse estado persistiu durante os dias seguintes.
Neste momento, dois de seus irmã os vieram visitá -lo e, vendo que
estava doente, obtiveram permissã o de Dom Bosco para levá -lo para
casa por um tempo. Neste mesmo dia – ou no dia anterior – Fornasio
terminou a sua Confissã o Geral e também recebeu a Sagrada
Comunhã o. Ele foi para casa com eles, ficou de pé por alguns dias, mas
depois teve que dormir. Sua doença logo piorou, afetando seu cérebro e
privando-o da fala e, à s vezes, da consciência. É claro que ele nã o podia
confessar-se nem receber a Comunhã o. Quando Dom Bosco, bom pai,
lhe fez uma visita, Fornasio o reconheceu e tentou dizer alguma coisa,
mas depois de esforços vã os, começou a soluçar, enquanto toda a
família chorava com ele. Ele morreu no dia seguinte.
Quando esta notícia chegou ao Orató rio, vá rios clérigos
perguntaram a Dom Bosco se Fornasio era o menino do sonho. Dom
Bosco fez-lhes compreender que nã o o era. No entanto, muitos
acreditavam que a morte deste menino tinha cumprido a prediçã o. No
discurso de “Boa Noite” daquela mesma noite, 16 de abril, Dom Bosco
anunciou a morte de Fornasio, observando que ela ensinou a todos uma
importante liçã o: “Façam feno enquanto o sol brilha”, disse ele. “Nã o
permitamos que o diabo nos iluda fazendo-nos pensar que podemos
colocar a nossa consciência em ordem no momento da morte.” Quando
alguém lhe perguntou publicamente se Fornasio era o menino
destinado a morrer, ele respondeu que nã o diria nada por enquanto.
Acrescentou, porém, que era habitual no Orató rio os meninos
morrerem aos pares - um chamando o outro - e que, portanto, ainda
deveríamos estar atentos e seguir o conselho de Nosso Senhor:
“Estejam prontos, porque na hora que vocês nã o espere, o Filho do
homem virá .” (Mateus 24:44).
Ao descer da plataforma, disse claramente a alguns padres e
clérigos que Fornasio nã o era o menino do sonho.
No dia 17 de abril, durante o recreio depois do jantar, uma
multidã o de meninos insistia em importunar Dom Bosco: “Diga-nos o
nome do menino que vai morrer!” Sorrindo, Dom Bosco continuou
balançando a cabeça, mas eles insistiram: “Se você nã o quer nos contar,
diga pelo menos ao Pe. Rua.” Dom Bosco continuou a balançar a cabeça.
“Basta nos dizer a inicial dele, entã o”, insistiram vá rios.
“Tudo bem, vou satisfazê-lo nisso”, respondeu ele. “Ele tem a
mesma inicial do nome de Maria.”
A divulgaçã o se espalhou como um incêndio, mas ainda era difícil
adivinhar. Mais de trinta meninos tinham sobrenomes começando com
“M”.
Também havia alguns cépticos, porque um rapaz chamado Louis
Marchisio estava gravemente doente e havia grandes receios pela sua
vida. Na verdade, no dia seguinte, 18 de abril, foi levado para casa. Estes
céticos, adivinhando que Dom Bosco se referia a ele, comentavam:
“Bem, também nó s podemos prever que alguém cujo nome começa com
'M' vai morrer!”
O Bonetti Chronicle continua (Vol. VII, pp. 81-83):
No domingo de Pá scoa, 29 de abril de 1862, Dom Bosco adoeceu
gravemente. Ele estava tã o fraco que mal conseguia ficar de pé ou falar.
Mesmo assim, ele saiu do quarto e ouviu Confissõ es das seis e meia à s
nove.
Um mês se passou desde a previsã o, e a apreensã o saudável que
ela gerou estava agora diminuindo. Mesmo assim, muitos ficavam se
perguntando: “Quem morrerá e quando? Pasqua – o primeiro ‘P’ –
desapareceu!”
De forma bastante inesperada, no dia 25 de abril, Victor Maestro
de Viora, Mondovi, aos treze anos, morreu de derrame. Ele era um
rapaz muito bom, que comungava vá rias vezes por semana. Até o dia da
prediçã o de Dom Bosco ele estava bem, mas duas semanas antes de sua
morte seus olhos começaram a incomodá -lo e sua visã o escureceu à
noite. Dois ou três dias antes do derrame, ele queixou-se de leves dores
no peito, para as quais o médico receitou um sono mais prolongado.
Certa manhã , Dom Bosco encontrou-o na escada. “Você gostaria de
ir para o céu?” ele perguntou.
“Claro”, respondeu o Maestro.
“Entã o prepare-se!” O menino se assustou por um momento, mas
depois, pensando que Dom Bosco havia falado em tom de brincadeira,
recuperou a compostura. Contudo, Dom Bosco, mantendo-se pró ximo
dele durante os dias seguintes, preparou-o adequadamente e induziu-o
a fazer uma Confissã o geral e consoladora.
No dia 24 de abril, um menino notou o Maestro sentado na
varanda da enfermaria. Impulsivamente, aproximou-se de Dom Bosco.
“É verdade que Maestro é o menino que quer morrer?” ele perguntou.
"Como eu iria saber!" Dom Bosco respondeu. "Pergunte a ele!"
O rapaz foi até a varanda e fez exatamente isso. O Maestro soltou
uma gargalhada e, descendo, pediu a Dom Bosco que o deixasse ir para
casa por alguns dias. “Certamente”, concordou Dom Bosco, “mas antes
de ir, peça ao médico que lhe dê um relató rio escrito sobre sua doença”.
O menino sentiu-se aliviado. Ele disse consigo mesmo: “ Alguém vai
morrer no Oratório. Se eu for para casa, não poderei ser eu. Terei férias
de Páscoa mais longas e voltarei em perfeita forma .”
No dia seguinte, sexta-feira, 25 de abril, o Maestro levantou-se com
os demais e ouviu a missa; entã o, sentindo-se bastante cansado, voltou
para a cama, depois de dizer aos colegas como estava feliz por poder
voltar para casa.
Quando tocou o sinal para as aulas, à s nove, seus amigos lhe
desejaram boas férias e um bom retorno, despediram-se e foram para a
escola. Maestro ficou sozinho no dormitó rio. Por volta das dez horas, o
enfermeiro apareceu para avisar que o médico era esperado em breve e
que ele deveria se levantar e ir à enfermaria.
O médico chegou em breve. Um menino do dormitó rio contíguo,
que também precisava consultar o médico, foi ao dormitó rio do
Maestro e chamou-o em voz alta da porta. Nã o ouvindo resposta, ele
ligou novamente. Ainda nã o houve resposta. Pensando que o Maestro
dormia profundamente, foi até a cabeceira da cama e sacudiu-o,
chamando-o pelo nome. O Maestro estava imó vel. Assustado além das
palavras, o rapaz gritou: “Maestro está morto!” e saiu correndo para
ligar para alguém. O primeiro que conheceu foi o Pe. Rua, que correu
até a cabeceira do Maestro a tempo de absolvê-lo quando ele morreu.
Pe. Alassonatti, o prefeito, foi informado imediatamente e Bonetti foi
telefonar para Dom Bosco.
A notícia se espalhou como um raio pelas salas de aula e oficinas.
Os meninos vieram correndo e se ajoelharam em oraçã o. Outros,
esperando que o Maestro ainda estivesse vivo, trouxeram aquecedores
e cordiais para reanimá -lo, mas foi tudo inú til. À primeira vista, Dom
Bosco soube que o menino estava morto. Todos ficaram com o coraçã o
partido, principalmente porque o Maestro morreu sem nenhum amigo
seu. Conhecendo a dor dos meninos, Dom Bosco garantiu-lhes a
salvaçã o eterna do Maestro. Ele havia recebido a Comunhã o na quarta-
feira e, desde a festa de Todos os Santos, tinha um comportamento
especial e estava devidamente preparado para a morte. Um fluxo
constante de clérigos e meninos prestou-lhe suas ú ltimas homenagens.
Enquanto choravam por ele, perceberam que sua morte havia cumprido
a previsã o de Dom Bosco.
Naquela noite, o discurso de “Boa Noite” de Dom Bosco levou todos
à s lá grimas. Ele chamou a atençã o para o fato de que nos ú ltimos nove
ou dez dias Deus havia levado dois de nossos companheiros, e nenhum
deles teve a oportunidade de receber os ú ltimos Sacramentos. “Como as
pessoas estã o enganadas”, exclamou ele, “em adiar a limpeza da
consciência até o fim da vida. Agradeçamos ao Senhor por ter chamado
assim para a eternidade dois companheiros que, temos certeza,
estavam espiritualmente preparados. Quanto mais lamentaríamos se
outros tivessem sido presos, cuja conduta é bastante insatisfató ria.”
A morte do Maestro foi uma bênçã o do Senhor. No sá bado de
manhã e à noite, um grande nú mero de rapazes queria fazer uma
Confissã o Geral. Com duas ou três palavras, Dom Bosco tranquilizou-os.
Mais tarde ele disse muito claramente: “Maestro foi o menino que vi
receber o bilhete em meu sonho. . . . O que me consola profundamente é
que ele foi aos Sacramentos naquela manhã de sexta-feira, como vá rios
rapazes me garantiram. Sua morte foi repentina, mas nã o inesperada.”
O corpo do Maestro foi enterrado na manhã de domingo, 27 de
abril. Um incidente notável cumpriu a previsã o até o ú ltimo detalhe. O
misterioso estranho do sonho entregou um bilhete ao Maestro quando
ele estava no pó rtico, de frente para o corredor que levava ao pomar. De
lá , ele apontou para o menino o caixã o no corredor, a poucos metros de
distâ ncia.
Quando o agente funerá rio e os seus ajudantes chegaram,
carregaram o corpo pela escada central, ao longo do pó rtico até aquele
corredor. Aí pararam, mandaram buscar cadeiras e colocaram o caixã o
sobre elas enquanto esperavam o padre e os estudantes que
escoltariam o corpo até ao cemitério.
(Assim se lê na crô nica de Bonetti.) 1
Devemos salientar também que John Cagliero (entã o diá cono), ao
passar, ficou angustiado com este arranjo porque, em outros funerais, o
caixã o costumava ser colocado na extremidade do pó rtico, perto da
porta da escada contígua ao igreja. Ele ficou ainda mais descontente ao
saber que os pró prios agentes funerá rios haviam removido as cadeiras
de seus lugares habituais. Ele insistiu que o caixã o fosse colocado no
local habitual, mas os homens recusaram rispidamente.
Foi entã o que Dom Bosco saiu da igreja. Olhando com muita
tristeza para o caixã o, ele comentou com Joã o Batista Francesia e
outros: “Que coincidência! Foi assim que vi no sonho!”
——————
1. Cfr. Vol. VI, páginas 339-431.
14
CORVOS FEROZES E
UMA SALVA DE CURA
( Memórias Biográficas , Vol. VII, páginas 391-393)

HÁ MAIS de um mê s, conta a crô nica de Ruffino, Dom Bosco sofreu de


uma persistente doença ocular que o obrigou a usar ó culos escuros.
Mesmo assim, ele continuou trabalhando e incentivando seus padres e
jovens clé rigos a fazerem o mesmo. “Coragem”, disse ele. “Vamos
trabalhar de todo o coraçã o pela juventude. Façamos tudo o que
pudermos para a gló ria de Deus e o bem-estar das almas. Lá em cima
nos espera uma grande recompensa, a mesma que foi prometida a
Abraã o: 'Eu sou. . . sua recompensa é muito grande.' (Gênesis 15:1). À s
vezes podemos nos sentir cansados, exaustos ou oprimidos por
doenças, mas devemos ter coragem, porque lá em cima descansaremos
para sempre”. E levantava a mã o direita em direçã o ao Cé u, num gesto
de plena confiança no Senhor.

A riqueza é uma tentação


Os seus colaboradores discutiam frequentemente com ele o campo
de atividades que a Divina Providência provavelmente lhes confiaria.
Numa dessas ocasiõ es, em 3 de abril de 1864, a conversa mudou para a
possibilidade de um dia realizar um internato para filhos de famílias
nobres. “Ah, nã o”, interrompeu Dom Bosco. “Nã o enquanto eu viver!
Nunca, se eu puder evitar! Se fosse apenas uma questã o de
administraçã o, poderíamos considerar isso. Caso contrá rio, nã o. Isso
iria arruinar-nos, tal como arruinou muitas ordens religiosas ilustres
que começaram com os pobres e terminaram com os ricos. O resultado
foi que eles enfrentaram inveja, ciú me e tentativas de suplantá -los.
Riqueza e confraternizaçã o com os ricos sã o tentaçõ es comuns. Se
continuarmos a trabalhar pelos rapazes pobres, ficaremos em paz, pelo
menos porque alguns nos tolerarã o com pena e outros talvez nos
elogiem. Ninguém cobiçará nossos bens. Eles nã o se importariam com
nossos trapos.”

O retiro
No dia 4 de abril, Dom Bosco comunicou aos meninos que o retiro
espiritual anual começaria no dia 11 de abril. A essência da sua palestra
foi esta: “Para fazer um bom retiro, é preciso estar preparado. A menos
que você comece a fazer planos definitivos agora, sua retirada será
apenas um flash na panela. 'Vou recuperar o sono', alguém pode dizer,
ou 'farei o meu melhor para me divertir lendo algum livro interessante
ou mastigando alguma coisa', ou 'vou usar meu tempo para revisar
algum assunto. ' Outros podem dizer: 'Quero colher alguns frutos
espirituais e pensar na minha vocaçã o'. Esta é a coisa inteligente a fazer.
O que podemos dizer dos outros? O que podemos dizer a eles? Meus
queridos rapazes, este retiro pode muito bem ser o seu ú ltimo. Pense
nisso!
A programaçã o do retiro foi divulgada no dia 11 de abril. Foi a
ú ltima vez que as artesã s fizeram o retiro com os alunos.
Posteriormente, o aumento de matrículas exigiu o agendamento de dois
retiros separados. O pregador foi o Pe. Iná cio Arro.

Confissão
Dom Bosco passava horas intermináveis no confessioná rio. “Neste
ministério”, afirma o Cardeal Cagliero, “a sua bondade para com os
jovens e os idosos foi excepcional, inabalável e admirável. Quase todos
nó s fomos até ele para nos confessarmos por causa de sua sempre
benigna e paciente gentileza e caridade. Ele foi mais indulgente do que
severo e encorajou-nos a confiar na misericó rdia de Deus, enquanto
inspirava o santo temor de Deus em nossos coraçõ es”.
Os corvos ou demônios
No dia 14 de abril, Dom Bosco fez o discurso de “Boa Noite” aos
estudantes e na noite seguinte aos artesã os. Para cada grupo ele narrou
dois sonhos que, segundo ele, o surpreenderam. O primeiro sonho veio
antes do retiro, o segundo depois.
Ele falou o seguinte:
Na noite de sá bado, 2 de abril, véspera de Domingo Baixo, parecia
que eu estava na varanda observando você brincar. De repente, um
vasto lençol branco pairou sobre todo o playground. Entã o veio um
enorme bando de corvos que voou sobre o lençol até encontrar uma
abertura nas bordas, mergulhou por baixo e voou para o rosto dos
meninos, arrancando-lhes os olhos, rasgando-lhes a língua e bicando-
lhes a testa e o coraçã o! Que visã o lamentável! Incrivelmente, porém –
eu nã o conseguia acreditar – ninguém chorou ou lamentou. Todos
pareciam entorpecidos e ninguém se preocupou em se defender. " Estou
sonhando? ”Eu me perguntei:“ Devo estar. De que outra forma esses
meninos poderiam se deixar ser massacrados daquele jeito, sem sequer
choramingar? ”Logo, porém, ouvi um coro de gritos e gritos, lamentos e
choramingos, enquanto os feridos começavam a rastejar para longe dos
outros. Eu nã o sabia o que pensar de tudo isso. “ Talvez ”, pensei, “ já
que é Domingo Baixo, o Senhor queira nos mostrar que Ele nos protegerá
com Sua graça. Esses corvos podem ser demônios .” Minha reflexã o foi
repentinamente interrompida quando um barulho me acordou. Era dia
e alguém batia à minha porta.
Fiquei surpreso na segunda-feira quando nã o foram tantos como
de costume para a Comunhã o. Houve menos comunhõ es na terça-feira e
muito poucas na quarta-feira, quando, no meio da missa, as Confissõ es
terminaram. Decidi nã o dizer nada, porém, porque esperava que, com o
retiro espiritual prestes a começar, as coisas fossem resolvidas.
Ontem à noite, 14 de abril, tive outro sonho. Tenho ouvido
Confissõ es durante o dia e, como sempre, fiquei pensando no seu bem-
estar espiritual. Fui para a cama, mas nã o consegui dormir e apenas
cochilei por algumas horas. Finalmente, quando adormeci, parecia mais
uma vez estar na varanda observando você brincar. Eu pude identificar
aqueles que foram feridos pelos corvos. De repente, apareceram dois
personagens: um segurava um pequeno pote de unguento, o outro um
pano de limpeza. Eles imediatamente começaram a cuidar dos feridos.
Assim que a pomada tocou as feridas, os meninos ficaram curados
instantaneamente. Vá rios, porém, recusaram-se a ser tratados e
rastejaram para trá s à medida que os dois personagens se
aproximavam deles. O que mais me desagradou foi que havia muitos
desses meninos. Fiz questã o de anotar os nomes, pois conhecia todos,
mas, enquanto escrevia, acordei. Como no meu sonho eu estava
escrevendo seus nomes, eles ainda estavam claros em minha mente. Na
verdade, eles estã o claros agora, embora eu possa ter esquecido alguns
– muito poucos, tenho certeza. Aos poucos, falarei com esses meninos –
como já fiz com alguns – e tentarei convencê-los a tratarem seus
ferimentos.
Faça o que quiser deste sonho. Tenho certeza de que nenhum dano
espiritual lhe acontecerá se você acreditar plenamente. Mas por favor
nã o deixe isso fora do Orató rio. Sou bastante aberto com vocês, mas
quero que guardem essas coisas para vocês.
15
ALUNO AMADO DE DOM BOSCO
ST. DOMINICO SÁVIO
D OMINIC nasceu em Riva di Chieri em 1842. Ainda com sete anos de
idade recebeu pela primeira vez Jesus no coraçã o e, no ardor do seu
amor angelical, tomou entã o as seguintes resoluçõ es:
1. Meus amigos doravante serã o Jesus e Maria.
2. Morte em vez de pecado.
Na escola brilhou como um maravilhoso exemplo de virtude e de
aplicaçã o, e no final do ensino fundamental deixou a casa do pai para
atender ao chamado do alto.

O primeiro encontro de Domingos com Dom Bosco


A cena desse encontro é realmente comovente. O pró prio Dom
Bosco nos transmitiu isso na vida dos jovens angélicos. Imediatamente
descobriu que a alma de Domingos estava inteiramente entregue a
Deus e exclamou: “ Aqui está um bom material para formar um santo ”.
A partir daquele dia o menino depositou toda a sua confiança em
Dom Bosco, que por sua vez o transformou num novo Sã o Luís. Dominic
decidiu se tornar um santo. A sua oraçã o constante a Dom Bosco era:
“Pai, ajuda-me a ser santo”. Ele muitas vezes manifestou o desejo de sua
alma de ajudar outros a fazer o bem com as seguintes palavras: “Oh, se
eu pudesse ganhar todos os meus amigos e companheiros para Deus!
Quã o feliz eu ficaria entã o.” Também nã o se contentava apenas com as
palavras, pois as suas oraçõ es, as suas conversas, os seus estudos e até
os seus jogos eram um exemplo luminoso, uma escola viva do
apostolado divino. Os seus conselhos, as suas admoestaçõ es, as suas
oraçõ es e sobretudo os seus sofrimentos foram dirigidos com o ú nico
fim de afastar do mal os seus companheiros e de os aproximar cada vez
mais de Deus.
Muitas vezes ele ficava extasiado durante a Sagrada Comunhã o. Ele
consagrou seu coraçã o a Maria Imaculada.

A morte feliz de Dominic


Uma flor tã o brilhante, um fruto tã o saboroso da graça divina nã o
poderia permanecer por muito tempo na terra. Logo estava maduro
para o céu. Assim, as brilhantes esperanças nele centradas estavam
fadadas ao desapontamento, pois o fim do seu exílio estava pró ximo e o
alvorecer da luz eterna aproximava-se rapidamente para ele,
Ele sabia que seus dias estavam contados e ansiava pela morte com
um rosto sorridente. Quando, no dia 9 de março de 1857, em Mondonio
d'Asti, o reló gio da Providência bateu a hora, ele faleceu exclamando
feliz: “ Oh, que belo espetáculo! ”Ele tinha entã o 15 anos.
Seus restos mortais jazem na Basílica de Maria Auxiliadora, em
Turim.
Depois da morte de Domingos, Dom Bosco escreveu um relato da
sua vida, e agradou a Deus glorificar os jovens com milagres e favores
especiais concedidos por sua intercessã o.
Foi canonizado no ano de 1954.
——————
O leitor é calorosamente exortado a ler e reler uma das muitas vidas de São Domingos Sávio. Por
exemplo, 1) Vida de São Domingos Sávio , de São João Bosco, com notas de Pe. Aronica, publicado
pela Editora Salesiana; 2) O Desafio de Daniel Higgins (estudo do personagem de São Domingos
Sávio), publicado pela Editora Salesiana; 3) Vida de São Domingos Sávio, SIGA, Madras 600 010; 4)
Dominic Savio, Teenage Saint , de Peter Lappin, publicado pela Bruce Publishing Company.
16
UM SONHO COM
ST. DOMINICO SÁVIO
João Bosco teve este sonho em 1876,
vinte anos depois da morte de Domingos Sávio.
( Memórias Biográficas , Vol. XII, página 586)

N A NOITE de 6 de dezembro, sonhei o seguinte: Parecia-me que


estava no alto de uma colina, olhando para uma imensa planície que se
estendia até a distâ ncia invisível. Era tã o azul quanto o mar em perfeita
calma, mas o que eu olhava nã o era á gua; parecia cristal, imaculado e
brilhante.
Longas e largas avenidas dividiam a planície em grandes jardins de
indescritível beleza, nos quais havia gramados, bosques de á rvores
ornamentais, arbustos floridos e canteiros com uma incrível variedade
de flores ornamentais. O que você viu nos jardins pode lhe dar pouca
ideia de como tudo isso foi maravilhoso. Havia á rvores cujas folhas
pareciam de ouro, os galhos e troncos de pedras preciosas.
Espalhados aqui e ali nos jardins havia edifícios cuja aparência e
magnificência rivalizavam com o ambiente em que se encontravam. Eu
nã o poderia estimar as imensas somas de dinheiro que mesmo uma
dessas teria custado para construir. O pensamento passou pela minha
cabeça: “Se eu pudesse ter qualquer um desses prédios para meus
filhos, eles ficariam muito felizes”.
Enquanto eu estava ali, maravilhado, o som de uma mú sica doce e
fascinante encheu o ar; todos os instrumentos possíveis pareciam
combinar-se em maravilhosa harmonia, e junto com eles coros de
cantores.
Vi entã o um grande nú mero de pessoas no jardim, algumas
caminhando, outras sentadas, todas radiantemente felizes. Alguns
cantavam, outros tocavam instrumentos, e era ó bvio que sentiam o
mesmo prazer em ouvir os outros e na mú sica que eles pró prios faziam.
Eles cantavam em latim estas palavras: “Toda honra e gló ria a Deus, o
Pai Todo-Poderoso — Criador de todos os tempos, que foi, que é e que
virá para julgar os vivos e os mortos em todos os tempos”.
De repente apareceu um grande exército de rapazes. Conheci
muitos deles, rapazes que estiveram comigo no Orató rio ou numa das
nossas escolas; mas a maioria eu nã o conhecia. Essa fila interminável
começou a se mover em minha direçã o; à sua frente estava Domingos
Sávio; depois dele vá rios padres e muitos outros padres e irmã os, cada
um à frente de um grupo de meninos.
Eu nã o sabia se estava acordado ou sonhando; Bati palmas e senti
meus braços e peito na tentativa de ver quã o real era o que eu estava
vendo.
Uma luz intensa e brilhante agora brilhava ao redor. Todos os
meninos estavam radiantes de felicidade; brilhava em seus olhos, e seus
rostos tinham uma expressã o de paz e contentamento inefáveis. Eles
sorriram para mim e pareciam que iam dizer alguma coisa, mas
nenhuma palavra foi pronunciada.
Dominic agora avançou sozinho até ficar perto de mim. Ele ficou ali
em silêncio por um momento, sorrindo e olhando para mim. Quã o
maravilhoso ele estava, quã o primorosamente ele estava vestido! A
tú nica branca que chegava até seus pés estava entrelaçada com fios
dourados e joias cintilantes. Na cintura trazia uma larga faixa vermelha,
também entrelaçada com pedras preciosas de todas as cores, que
cintilavam e cintilavam em mil luzes. Em seu pescoço havia um colar de
flores silvestres, mas as flores eram feitas de pedras preciosas e a luz
que refletiam iluminava ainda mais a beleza e a dignidade do rosto de
Dominic. Seus cabelos, coroados de rosas, caíam até os ombros e
completavam o efeito indescritível de sua aparência total.
O sonho de São João Bosco em que encontra São Domingos Sávio na gló ria celestial.
Os outros estavam vestidos com vá rios graus de esplendor, todos
com seu pró prio significado simbó lico que você nã o entenderia. Uma
coisa que todos tinham em comum era a larga faixa vermelha na
cintura.
Pensei comigo mesmo: “ O que tudo isso significa? — Onde diabos
estou? ” E fiquei ali em silêncio, sem ousar dizer uma palavra.
Dominic entã o falou:
“Por que você está aí parado como se fosse burro? Nã o é você
aquele que conheci, que sempre foi destemido, capaz de suportar
perseguiçõ es, calú nias e perigos de todo tipo? Você perdeu a coragem?
Por que você nã o fala?
Meio gaguejando, respondi:
"Eu nã o sei o que dizer. Você é realmente Dominic Sávio?
"Sim, de fato. Você nã o me reconhece?
“Como é que você está aqui?”
“Vim falar com você”, Dominic respondeu afetuosamente.
“Conversamos muitas vezes quando eu estava vivo; você sempre foi tã o
gentil e generoso comigo, e eu respondi ao seu amor com toda a minha
confiança e carinho. Pergunte-me o que quiser.
"Onde estou?" Perguntei.
“Você está em um lugar de felicidade”, respondeu ele, “onde tudo o
que é belo pode ser apreciado”.
“Isto é o Céu, entã o?”
“Nã o, tudo o que está aqui é da terra, embora melhorado além da
concepçã o pelo poder de Deus. Nenhuma pessoa viva poderá ver ou
imaginar as maravilhas da eternidade.”
“Seria possível ter luz natural mais brilhante do que esta?”
“Sim, bem possível. . . olhe lá ao longe.”
Olhei e de repente apareceu um raio de luz, tã o penetrante e de tal
brilho que tive que fechar os olhos, e gritei tã o alarmado que acordei o
padre que dormia no quarto pró ximo. Abri os olhos depois de um
momento e disse:
“Mas isso é certamente um raio da luz divina. . .”
“Nã o, mesmo isso nã o lhe dá a menor ideia. No Céu desfrutamos de
Deus, e isso em tudo.”
Eu já havia me recuperado do meu espanto inicial e estava olhando
para Dominic enquanto ele estava diante de mim. Eu disse: “Por que
você está usando essa tú nica branca deslumbrante?”
Domingos nã o respondeu, mas os coros de vozes lindamente
sustentadas pelos muitos instrumentos cantaram em latim: “ Eles
cingiram os lombos e lavaram as túnicas no sangue do Cordeiro ”.
“O que significa a faixa vermelha que você usa?” Eu entã o
perguntei. Novamente Domingos nã o respondeu, e uma voz solitá ria
cantou as palavras: “ Eles são virgens e seguem o Cordeiro onde quer que
Ele vá ”.
Percebi entã o que a faixa vermelho-sangue era um símbolo dos
grandes esforços e sacrifícios feitos, do quase martírio sofrido, para
viver uma vida completamente pura. Simbolizava também o espírito de
penitência, que purifica a alma das suas faltas. O branco deslumbrante
da tú nica representava uma vida desde o Batismo até a morte sem
qualquer rejeiçã o séria a Deus.
Meus olhos foram atraídos para as fileiras cerradas de meninos
atrá s de Dominic e perguntei a ele:
“Quem sã o esses meninos e por que sã o tã o radiantes e
resplandecentes?”
A resposta veio dos pró prios meninos, que começaram a cantar
numa harmonia maravilhosa:
“ Estes são como os anjos de Deus no céu . . .”
Dominic, embora o mais jovem, era obviamente o líder,
destacando-se bem à frente deles. Por isso perguntei-lhe:
“Por que você tem precedência sobre os outros?” "Eu sou o mais
velho."
“Mas você nã o é”, respondi; “há muitos aqui muito mais velhos que
você.”
“Eu sou o embaixador de Deus.”
O significado do que estava acontecendo de repente me ocorreu e
me apressei em dizer:
“Vamos conversar sobre o que me preocupa e meu trabalho. Talvez
você tenha algo importante para me dizer. . . Fale-me do passado,
presente e futuro do nosso trabalho e dos meus queridos filhos. . .”
“No que diz respeito ao passado, a sua Congregaçã o fez claramente
muito bem. Veja ali a grande reuniã o de meninos.”
Olhei e disse para ele:
“Quantos eles sã o e quã o felizes!”
“Veja o que está escrito na entrada daquele jardim”, disse Dominic.
Olhei e vi escrito:

Jardim Salesiano
“Todos aqueles aí sã o salesianos, ou aqueles que foram educados
por você e seus filhos, ou que de uma forma ou de outra foram enviados
no caminho de Deus e sua salvaçã o se tornou realmente possível.
Conte-os se puder! Mas seriam muitos, muitos mais ainda, se você
tivesse maior fé e confiança em Deus. . .”
Soltei um grande suspiro ao ouvir essa advertência e decidi nã o
estabelecer limites à minha confiança em Deus para o futuro.
Dominic entã o segurou diante de mim um magnífico ramo de
flores; eram rosas, violetas, girassó is, lírios, ramos de sempre-vivas e, o
que é mais incomum para um buquê, espigas de trigo. Ele me ofereceu e
disse:
"Olhar."
“Estou olhando”, respondi, “mas nã o entendo nada”.
“Certifique-se de que todos os seus meninos o tenham e que o
defendam destemidamente contra qualquer um que tente tirá -lo deles.
Com essas flores seguras em sua posse, eles nunca deixarã o de ser
felizes.”
“Ainda nã o entendo; Por favor explique . . .”
“Estas flores representam as virtudes e qualidades que os vossos
meninos necessitam para poderem viver para Deus e nã o para si
mesmos. A rosa é o símbolo do amor, a violeta da humildade, o girassol
da obediência, a genciana da penitência e da autodisciplina, as espigas
de milho da comunhã o frequente, o lírio da pureza, os ramos de
sempre-verde da constâ ncia e da perseverança.
“Ninguém foi adornado melhor com essas flores do que você”, eu
disse a ele. “Diga-me qual foi o seu maior consolo quando você morreu.”
"O que você acha?" ele respondeu.
Fiz vá rias tentativas de tentar dizer o que pensei que poderia ser,
como ter vivido uma vida tã o pura, ter acumulado tantos tesouros no
Céu com todas as suas boas obras, e assim por diante, mas para todos
ele balançou a cabeça com um sorriso.
“Diga-me, entã o”, eu disse, bastante desanimado com meu fracasso;
"o que foi isso?"
“O que mais me ajudou e me deu maior alegria quando estava
morrendo”, respondeu Domingos, “ foi o carinho e a ajuda da grande
Mãe de Deus. Diga a seus filhos para nã o deixarem de ficar perto dela
enquanto estiverem vivos. Mas rá pido, o tempo está quase acabando.”
“E quanto ao futuro?” Perguntei.
“No pró ximo ano você terá grandes tristezas para suportar. Ao
todo, oito dos seus filhos morrerã o. Mas tenha bom coraçã o – eles
deixarã o esta vida para o Céu. Deus está sempre com você e lhe dará
outros filhos igualmente dignos”.
“E a Congregaçã o Salesiana?”
“Deus tem grandes coisas reservadas para isso. No pró ximo ano
começará algo que se estenderá por todo o mundo, de norte a sul, de
leste a oeste. Este é apenas um dos muitos grandes desenvolvimentos
do futuro. No entanto, isto só pode acontecer com a condiçã o de que os
vossos filhos sigam o caminho e o plano de Deus, e nã o os seus
pró prios. 1
“ Se os seus sacerdotes puderem ser fiéis à missão e ao modo de vida
que Deus lhes mostrou, o futuro da Congregação Salesiana será
extraordinário e não haverá como contar o número daqueles que foram
trazidos a Deus através dela. Há, porém, uma outra condição muito
importante: que todos vocês permaneçam sempre próximos da grande
Mãe de Deus e proclamem sempre destemidamente, pelo seu exemplo, a
dignidade de uma vida pura e casta, que tanto agrada a Deus ”.
“E a Igreja em geral?” Eu entã o perguntei.
“O que está reservado para a Igreja só Deus sabe. Estas sã o coisas
que Ele reserva para Si mesmo e nã o podem ser comunicadas de
antemã o a nenhum ser criado.”
“E Pio IX?” Perguntei.
“Isso eu posso dizer. Ele nã o terá que perseverar na terra por
muito mais tempo. Deus o recompensará por seu serviço fiel. A Igreja
nã o será submersa pelas dificuldades atuais”.
“E eu?” Perguntei.
“Você ainda tem muitas tristezas e dificuldades pela frente. . . mas
apresse-se, pois meu tempo está quase acabando.”
Estendi as mã os para detê-lo, se pudesse, mas elas agarraram
apenas o ar. Dominic sorriu e disse:
"O que você está tentando fazer?"
“Nã o quero deixar você ir”, eu disse, “mas você está fisicamente
aqui? Você é realmente meu filho Dominic?
“É assim que as coisas sã o. Se pela providência de Deus alguém
que está morto tem que aparecer para alguém que ainda está vivo, ele é
visto em sua aparência corporal normal e em suas características
distintivas. Ele nã o pode, porém, ser tocado corporalmente, pois é um
espírito puro. Ele mantém esta aparência corporal até que se reú na com
seu corpo na Ressurreiçã o.”
“Uma ú ltima coisa”, eu disse agora. “Todos os meus meninos estã o
vivendo como filhos de Deus? Diga-me algo que me permitirá ajudá -los
mais.”
“Você pode dividir seus meninos em três grupos”, respondeu
Dominic, “e estas três folhas de papel indicam como”. Ele me entregou o
primeiro. Nele estava escrito em caracteres grandes:

Invicto
Esta folha continha os nomes daqueles que nunca foram vencidos
pelo mal. Eles eram muito numerosos. Eu vi todos eles antes de mim.
Muitos deles eu conhecia; muitos eu vi pela primeira vez. Vi como eles
viveram as suas vidas para Deus, destemidamente e inabalavelmente,
apesar das enormes dificuldades e perigos que encontraram. Era como
se estivessem viajando por uma estrada e fossem continuamente
emboscados; eles foram muito prejudicados e molestados pela
barragem, mas nunca foram derrubados ou feridos.
Dominic entã o me deu a segunda folha, na qual estava escrito em
caracteres grandes:

Vítimas
Nesta folha estavam os nomes daqueles que ofenderam
gravemente a Deus, foram gravemente feridos na viagem, mas
recuperaram o equilíbrio e curaram as feridas com uma boa Confissã o e
Comunhã o, e tentavam prosseguir novamente, embora alguns
mostrassem sinais de desanimados com sua experiência. Eles eram
mais numerosos do que na primeira folha. Eu vi todos eles e mais uma
vez reconheci muitos deles.
Estendi a mã o para a terceira folha onde pude ver escritas as
palavras:

Vencido pelo Mal


Na folha estavam os nomes daqueles que haviam rejeitado a Deus
por meio de pecados graves e continuavam a fazê-lo, contentes por
permanecerem privados de Sua amizade. Eu estava muito ansioso para
saber quem eles poderiam ser e tentei tirar a folha de Dominic.
“Espere um momento”, ele me disse sinceramente. “Quando você
abrir este lençol, um fedor terrível será exalado, que nem você nem eu
poderíamos suportar. É igualmente intolerável para os anjos de Deus e
para o pró prio Deus.”
“Como pode ser isso”, eu disse, “os Anjos e Deus sendo espíritos
puros?”
“Isso significa”, respondeu ele, “que assim como você procura
colocar a maior distâ ncia possível entre você e o que o enjoa, aqueles
que rejeitam a Deus por meio de pecados graves estã o separados Dele
cada vez mais”.
Ele entã o me entregou a folha, dizendo:
“Olhe para isso e tente fazer bom uso disso para seus filhos. Nunca
se esqueça do ramo de flores e tente ao má ximo garantir que todos
tenham um e nunca o deixe ir.” Dizendo isso, ele se afastou de mim e se
juntou aos outros que estavam agrupados atrá s dele.
Desdobrei a folha. . . Nã o vi nenhum nome, mas num piscar de
olhos vi diante de mim todos aqueles cujos nomes estavam escritos. Eu
olhei para eles com o coraçã o pesado. A maioria deles eu conhecia;
pertenciam ao Orató rio ou a outra das nossas escolas. Muitos deles
eram normalmente considerados bons meninos e alguns até mesmo
entre os melhores. . . tais eles estavam longe de ser!
Quando o papel foi desdobrado, surgiu dele um fedor tã o horrível
que fiquei completamente dominado. Minha cabeça latejava
agonizantemente e comecei a vomitar com tanta violência que pensei
que fosse morrer.
Tudo ficou escuro e a visã o nã o existia mais. Um relâ mpago
penetrante rasgou o céu e, enquanto o estrondo assustador do trovã o
reverberava em meu ouvido, acordei tremendo de medo.
O fedor ainda estava presente no meu quarto, grudado nas paredes
e nos mó veis, e ali permaneceu por vá rios dias. Assim, repugnante a
Deus é o pró prio nome daqueles que O rejeitam e se entregam aos
horrores da auto-indulgência.
Sempre que a lembrança daquele fedor volta à minha mente, sou
novamente tomado por dores e ná useas, e consigo com dificuldade
evitar vomitar.
Falei com alguns dos meninos cujos nomes vi escritos nas listas e
tenho certeza de que o que vi no sonho é totalmente verdadeiro.
——————
1. A referência é provavelmente ao Boletim Salesiano, que começou em 1877. Difundiu-se por todo
o mundo. É o ó rgão de formação e informação da terceira família salesiana, os Cooperadores
Salesianos, e deu a sua valiosa contribuição à vida familiar cristã em muitos países do mundo.
17
PRESENTES DE MENINOS PARA
A SANTA VIRGEM MARIA
( Memórias Biográficas , Vol. VIII, página 73)

NO ANO DE 1865, enquanto decorria a construçã o da igreja de Maria


Auxiliadora, Dom Bosco foi afligido por uma grande dor pela doença
incurável de quatro dos seus sacerdotes. Um desses santos sacerdotes
foi o Pe. Alasonatti, seu primeiro colaborador. Mas nossa Mã e
Santíssima veio trazer algum conforto à sua devotada serva durante o
mê s de maio. As devoçõ es de maio foram celebradas com muito fervor
por todos no Orató rio.
Dos discursos de Dom Bosco à comunidade durante o mês, apenas
um foi preservado na crô nica: o do dia 30, e é muito precioso. Aqui está
um resumo disso:
Sonhei que vocês, meninos, iam em procissã o em direçã o a um
altar elevado e ricamente decorado de Nossa Senhora. Todos vocês
cantavam os mesmos hinos para ela, mas nã o da mesma maneira:
muitos cantavam lindamente, outros um tanto mal e alguns totalmente
desafinados. Vi também que alguns se mantinham em silêncio,
desviavam-se das fileiras, bocejavam ou continuavam a incomodar os
outros.
Todos levaram presentes, principalmente flores, para Nossa
Senhora. Os buquês diferiam em tipo e tamanho. Havia buquês de rosas,
cravos, violetas e assim por diante. Alguns meninos carregavam
presentes muito estranhos, como cabeças de porco, gatos, sapos
viscosos, coelhos, cordeiros e assim por diante. Um belo jovem estava
perto do altar. Um olhar mais atento mostraria que ele tinha asas. Ele
pode ter sido o Anjo da Guarda do Orató rio. Enquanto vocês, meninos,
apresentavam seus presentes, ele pegou cada um e colocou-os no altar.
O primeiro a chegar ao altar ofereceu lindos buquês, que o Anjo
colocou silenciosamente sobre ele. De outros buquês, porém, ele teve
que retirar flores podres ou sem perfume, como dá lias, camélias e
similares, porque Maria nã o se contenta com meros olhares. Alguns
buquês tinham até espinhos ou pregos, que eram prontamente
arrancados e jogados fora.
Quando um menino que carregava uma cabeça de porco se
aproximou, o Anjo lhe disse: “Como ousa oferecer isso a Nossa
Senhora? Você nã o sabe que este animal simboliza o feio vício da
impureza? Maria Puríssima nã o pode tolerar tal pecado. Afaste-se. Você
nã o é digno de ficar na presença dela.”
Para quem oferecia gatos, o Anjo disse: “Vocês nã o sabem? Um gato
representa roubo, e você ousa apresentá -lo a Mary? Aqueles que tomam
o que nã o lhes pertence, aqueles que roubam a comida de casa, rasgam
a roupa por despeito ou desperdiçam o dinheiro dos pais por nã o
estudarem como deveriam, nã o passam de ladrõ es!” Estes também o
Anjo ordenou que se retirassem. Ele ficou igualmente indignado com os
meninos oferecendo sapos. “Os sapos simbolizam o vergonhoso pecado
do escâ ndalo, e você ousa oferecê-los a Nossa Senhora? Afaste-se. Junte-
se aos indignos.” Esses meninos também se retiraram
vergonhosamente.
Alguns rapazes apareceram com uma faca enfiada no coraçã o,
símbolo de sacrilégio. “Você nã o percebe que há morte em sua alma?” o
Anjo lhes perguntou. “Se nã o fosse pela misericó rdia de Deus, você
estaria perdido para sempre. Pelo amor de Deus, tire essa faca do seu
coraçã o.
Por fim, o restante dos meninos chegou ao altar e apresentou seus
presentes – cordeiros, coelhos, peixes, uvas e assim por diante. O Anjo
pegou-os e colocou-os diante de Nossa Senhora. Depois alinhou diante
do altar todos os meninos cujos presentes haviam sido aceitos. Percebi,
para meu pesar, que aqueles que foram obrigados a se afastar eram
muito mais numerosos do que eu pensava.

Coroas de rosas
Dois outros anjos apareceram agora em cada lado do altar,
carregando cestos ornamentados cheios das mais lindas e
extremamente belas coroas de rosas. Nã o eram rosas terrenas, mas
crescidas no céu, simbolizando a imortalidade. Com estas o Anjo da
Guarda coroou todos os meninos dispostos diante do altar de Nossa
Senhora. Notei entre eles muitos que nunca tinha visto antes. Outra
coisa notável é esta: algumas das coroas mais bonitas foram para
meninos que eram tã o feios que chegavam a ser repulsivos.
Obviamente, a virtude da santa pureza, que eles possuíam
eminentemente, compensava amplamente sua aparência pouco
atraente. Muitos dos meninos também possuíam essa virtude, embora
nã o no mesmo grau. Os jovens que se destacaram na obediência, na
humildade ou no amor a Deus também foram coroados de acordo com
os seus méritos.
O Anjo dirigiu-se entã o a todos os rapazes da seguinte forma: “Foi
desejo de Nossa Senhora que hoje fossem coroados com estas lindas
rosas. Certifique-se de que eles nunca sejam tirados de você.
Humildade, obediência e castidade irã o protegê-los para você. Com
estas três virtudes você sempre encontrará o favor de Maria e um dia
receberá uma coroa infinitamente mais bela do que a que você usa
hoje”.
Todos vocês cantaram entã o a primeira estrofe da Ave Maris Stella
– “Salve Estrela do Mar!” Depois você se virou e saiu como havia vindo,
cantando o hino Laudate Maria – “Louvado seja Maria” – com tanto
entusiasmo que fiquei realmente surpreso. Eu te segui por um tempo;
depois voltei para dar uma olhada nos meninos que o Anjo havia
afastado, mas eles nã o estavam mais lá .
Meus queridos filhos, sei quem foi coroado e quem foi rejeitado. A
estes ú ltimos avisarei em particular, para que se esforcem em trazer
presentes agradáveis a Nossa Senhora.
Façamos algumas observaçõ es:
1. Todos vocês carregavam uma variedade de flores, mas
infalivelmente, cada buquê tinha sua cota de espinhos – alguns mais,
outros menos. Depois de muito pensar, cheguei à conclusã o de que
esses espinhos simbolizam atos de desobediência, como guardar
dinheiro em vez de depositá -lo no Padre Prefeito, pedir licença para ir a
um lugar e depois ir para outro, chegar atrasado à escola, comer no
astutamente, frequentar dormitó rios de outros meninos (embora
sabendo que isso é sempre estritamente proibido), permanecer na
cama depois da hora de acordar, negligenciar prá ticas prescritas de
piedade, conversar em momentos de silêncio, comprar livros e nã o
submetê-los à aprovaçã o, enviar ou receber cartas à s escondidas e
comprando e vendendo coisas entre vocês. É isso que os espinhos
representam.
“É pecado quebrar as regras da casa?” muitos perguntarã o. Depois
de considerar seriamente esta questã o, minha resposta é um firme
“Sim”. Nã o direi se é mortal ou venial. As circunstâ ncias determinarã o
isso, mas certamente é um pecado.
Alguns podem argumentar que os Dez Mandamentos nã o dizem
nada sobre obedecer à s regras da casa. Bem, o Quarto Mandamento diz:
“Honra teu pai e tua mã e”. Você sabe o que pai e mã e representam? Nã o
só os pais, mas também aqueles que ocupam o seu lugar. Além disso,
nã o diz a Sagrada Escritura: “Obedeçam aos seus superiores”? (Hebreus
13:17). Se você deve obedecê-los, segue-se que eles têm o poder de
comandar. É por isso que temos regras e estas devem ser obedecidas.
2. Alguns buquês tinham pregos entre as flores, os pregos que
crucificaram Jesus. Como poderia ser? Como sempre, começa-se com
coisas pequenas e passa-se para coisas mais sérias. . . Ele se permite
liberdades indevidas e cai em pecado mortal. Foi assim que os pregos
conseguiram entrar naqueles buquês, como crucificaram Jesus
novamente, como diz Sã o Paulo: “. . . crucificando novamente. . . o Filho
de Deus.” (Hebreus 6:6).
3. Muitos buquês continham flores podres ou sem perfume,
símbolos de boas obras realizadas em estado de pecado mortal – e,
portanto, sem mérito – ou por motivos humanos, como ambiçã o ou
apenas para agradar professores e superiores. Por isso o Anjo, depois
de repreender aqueles meninos por ousarem oferecer tais coisas a
Nossa Senhora, mandou-os voltar para enfeitar os buquês. Só depois de
terem feito isso é que o Anjo os aceitou e os colocou no altar. . . Ao
retornarem ao altar, esses meninos nã o seguiram nenhuma ordem, mas
foram até o Anjo assim que terminaram de enfeitar seus buquês, e
depois juntaram-se a eles para serem coroados.
Neste sonho eu vi seu passado e seu futuro. Já falei sobre isso para
muitos de vocês. Da mesma forma contarei o resto. Enquanto isso, meus
filhos, cuidem para que a Santíssima Virgem receba sempre de vocês
presentes que ela nã o terá que recusar.
18
INOCÊNCIA PRESERVADA
PELA PENITÊNCIA
(Memó rias Biográficas, Vol. XVII, App. 22)

Pessoas e lugares

NO MÊ S de julho de 1884, Dom Bosco teve um sonho que durou toda


a noite. Parecia ter diante de si uma imensa e bela encosta, verde de
vegetaçã o, toda lisa e regular. No limite inferior, este prado terminava
num degrau baixo por onde se entrava no caminho onde estava Dom
Bosco. Parecia um paraíso terrestre, brilhantemente iluminado por
uma luz mais pura e brilhante que a luz do sol. Esta encosta era toda
coberta de erva tenra e fresca, enfeitada com mil espé cies de flores e
sombreada por inú meras e belas á rvores que, entrelaçando os seus
ramos, se estendiam como grandes festõ es. No meio do jardim,
chegando até as bordas, estendia-se um tapete de cor má gica que,
embora nã o fosse brilhante, deslumbrava a vista; tinha vá rios
quilô metros de largura e parecia majestosamente magnífico.
A título de ornamentaçã o, na faixa que acompanhava a orla, havia
diversas inscriçõ es em letras de ouro. De um lado estava escrito: Beati
immaculati in via, qui ambulant in lege Domini — “Bem-aventurados
aqueles que passam pela jornada da vida imaculados, que seguem a lei
do Senhor”. Do outro lado estava escrito: Non privabit bonis eos qui
ambulant in inocenteia - “Para vidas inocentes Ele nunca recusará Sua
generosidade”. No terceiro lado estava escrito: Non confundentur in
tempore malo; in diebus famis saturabuntur —“Eles nã o ficarã o
consternados com a adversidade; em tempos de fome, eles ficarã o bem
contentes.” No quarto lado: Novit Dominus morre immaculatorum, et
hereditas eorum in aeternum – “Ciosamente o Senhor zela pela vida dos
inocentes: eles manterã o suas terras para sempre”. Nos quatro cantos
do tapete, em torno de uma grande e magnífica rosa, havia outras
quatro inscriçõ es: Cum simplicibus sermocinatio eius — “Sua conversa é
com os simples”. Proteget gradientes simpliciter - “Ele protegerá os que
andam na simplicidade.” Qui ambulant simpliciter ambulant confidenter
- “Aqueles que andam sinceramente andam com confiança.” Voluntas
eius in iis qui simpliciter ambulant - “Ele estará naqueles que andam
sinceramente.” Entã o no meio do tapete estava escrito este ú ltimo: Qui
ambulat simpliciter salvus enit – “Aquele que anda sinceramente será
salvo”.
No meio da encosta, na parte mais alta do tapete brilhante, havia
uma bandeira brilhante na qual estava escrito em letras douradas: Fili,
to sempre mecum es, omnia mea tua sunt – “Filho, tu está s sempre
comigo , e tudo o que tenho é teu.”
Se Dom Bosco se maravilhou ao ver este jardim, a sua atençã o foi
ainda mais atraída por duas lindas donzelas de cerca de doze anos,
sentadas na beira do tapete onde a encosta terminava num degrau.
Todo o seu comportamento gracioso exalava uma modéstia celestial.
Em seus olhos, sempre voltados para cima, nã o havia apenas uma
simplicidade ingênua como uma pomba, mas brilhava um ardor do
mais puro amor e uma alegria de bem-aventurança celestial. Suas
testas, abertas e serenas, pareciam ser a sede da franqueza e da
sinceridade; em seus lá bios havia um sorriso doce e encantador. Suas
feiçõ es revelavam coraçõ es ternos e amorosos. O movimento gracioso
da sua pessoa conferia-lhes um ar de dignidade soberana e nobreza,
que contrastava com a sua juventude.
Um manto branco e puro chegava até seus pés e nele nã o se viam
manchas nem vincos, nem a menor partícula de poeira. Eles estavam
cingidos com uma faixa vermelha brilhante, com franjas douradas.
Sobre esta faixa brilhava uma guirlanda de flores composta por lírios,
violetas e rosas. Como colar usavam uma guirlanda semelhante,
composta pelas mesmas flores, mas de formato diferente. Nos pulsos
usavam pulseiras de margaridas brancas.
Todas essas coisas e flores tinham forma, cor e beleza impossíveis
de descrever. Todas as pedras mais preciosas do mundo, embora
lapidadas com a mais requintada habilidade, pareceriam apenas lama
em comparaçã o. Seus sapatos brancos eram bordados com fita branca
entrelaçada com ouro e formando um lindo laço no centro. Brancos,
com pequenos fios de ouro, eram também os cordõ es com que eram
amarrados.
Seus longos cabelos eram presos por uma coroa que circundava
suas testas, e era tã o grosso que se enrolava em ondas por baixo da
coroa e caía sobre seus ombros.

Louvores à Pureza
Eles haviam iniciado um diá logo: agora falariam alternadamente;
agora eles faziam perguntas uns aos outros e soltavam exclamaçõ es.
Agora ambos estariam sentados; agora um permanecia sentado
enquanto o outro ficava de pé, e à s vezes andavam de um lado para
outro. Mas eles nunca saíram daquele tapete brilhante e nã o tocaram
nem na grama nem nas flores.
No seu sonho, Dom Bosco era um espectador. Ele nã o disse uma
palavra à quelas donzelas, nem elas notaram sua presença. Um disse ao
outro com voz muito doce: “ O que é a inocência? ” “O estado feliz de
graça santificadora preservada por meio da observâ ncia constante e
exata da lei divina. E a pureza preservada da inocência é a fonte e fonte
de todo conhecimento e virtude.”
A primeira: “Que brilho, que gló ria, que esplendor de virtude viver
entre os ímpios e ainda preservar a pureza da inocência e a integridade
da moral!” A segunda levantou-se e, parando perto de sua companheira,
exclamou: “Feliz aquele jovem que nã o dá ouvidos aos conselhos dos
ímpios e nã o segue o caminho dos pecadores, mas cujo deleite é a lei de
Deus, na qual ele medita dia e noite. Ele será como a á rvore plantada
perto das á guas correntes da graça de Deus, que dará , no seu devido
tempo, frutos copiosos de boas obras; apesar do sopro dos ventos, as
folhas das boas intençõ es e dos méritos nã o cairã o dele, e tudo o que
ele fizer terá bons resultados. Cada circunstâ ncia de sua vida coopera
para aumentar sua recompensa.”
Assim dizendo, apontou para a á rvore do jardim carregada de
lindos frutos, que espalhavam pelo ar um perfume delicioso, enquanto
riachos cristalinos corriam ora entre duas margens cobertas de flores,
ora caindo em pequenas cascatas, ora formando pequenas cascatas.
piscinas, banhando os troncos das á rvores, com um murmú rio como o
som misterioso de uma mú sica distante.
A primeira donzela respondeu: “Ele é como um lírio entre
espinhos, que o Senhor colhe em seu jardim para torná -lo um
ornamento em Seu coraçã o, e ele pode dizer ao seu Senhor: 'Meu
amado para mim e eu para Ele, pois Ele alimenta-se entre lírios.'
”Dizendo isso, ela apontou para um grande nú mero de lindos lírios, que
erguiam suas taças brancas como a neve entre a grama e as outras
flores, enquanto, ao longe, uma sebe verde muito alta cercava todo o
jardim. Esta sebe era feita de espinhos pró ximos, e atrá s dela podiam-se
ver monstros repugnantes vagando como fantasmas, tentando entrar
no jardim, mas eram impedidos pelos espinhos da sebe.
"Isso está certo! Que verdade há em suas palavras!” acrescentou o
segundo. “Feliz o jovem que for encontrado sem defeitos! Quem é ele e
vamos elogiá -lo? Pois ele fez grandes coisas em sua vida; ele foi
provado e considerado perfeito e terá gló ria eterna. Ele poderia ter
pecado e nã o pecou; ele poderia fazer coisas má s e nã o as fez. Portanto
os seus bens estã o estabelecidos no Senhor, e toda a Igreja dos Santos
declarará as suas boas obras”. “E que gló ria Deus reservou para eles na
terra! Ele os chamará : lhes dará um lugar em Seu Santuá rio como
Ministros de Seus Mistérios, e lhes dará um nome eterno, que jamais
perecerá”, concluiu o primeiro.
A segunda levantou-se e exclamou: “Quem pode descrever a beleza
de uma alma inocente? Tal alma está esplendidamente vestida como um
de nó s, adornada com a estola branca do Batismo. Seu pescoço e braços
resplandecem com joias divinas; ele tem no dedo o anel da uniã o com
Deus. Ele caminha com leveza em seu caminho para a eternidade; além
disso, estende-se diante dele uma estrada adornada com estrelas. . .
“Um taberná culo vivo do Espírito Santo, com o Sangue de Jesus nas
veias, colorindo as faces e os lá bios; com a Santíssima Trindade no seu
coraçã o imaculado, ele derrama torrentes de luz, que o vestem com o
brilho do sol; uma chuva de flores cai do alto e enche o ar. Ao redor
estã o flutuando doces melodias de mú sica dos Anjos, ecoando sua
oraçã o. Maria Santíssima está ao seu lado, pronta para defendê-lo. O
céu está aberto para ele. É um espetá culo encantador para a imensa
legiã o de santos e espíritos bem-aventurados que o recebem e acolhem.
Deus, no esplendor inacessível da sua gló ria, aponta com a mã o direita
o trono que lhe preparou, enquanto na mã o esquerda segura a coroa
brilhante que o adornará para sempre.
“O inocente é o desejo, a alegria, o aplauso do Paraíso. Seu rosto
está adornado com uma alegria inefável. Ele é filho de Deus; ele tem
Deus como pai e o Paraíso como herança. Ele está continuamente com
Deus: vê-O, ama-O; ele o possui e desfruta dele; ele tem um raio das
delícias do Céu: ele possui todos os Seus dons e Suas perfeiçõ es”.
“É por isso que a inocência nos Santos do Antigo Testamento, nos
Santos do Novo Testamento e especialmente nos Má rtires parece tã o
gloriosa!
“Ó Inocência, como você é linda! Quando tentado, você aumenta
em perfeiçã o; quando humilhado você se eleva mais sublime; no
combate você sai vitorioso; e na morte você voa para sua coroa. Na
escravidã o você é livre; nos perigos você está tranquilo e seguro;
acorrentado você está feliz. Os poderosos se curvam diante de você; os
governantes lhe dã o as boas-vindas; e os grandes te procuram. Os bons
obedecem a você; os ímpios invejam você; seus rivais imitam você; seus
adversá rios sucumbem a você. Se os homens te condenarem
injustamente, você sempre sairá vitorioso.”
A delicadeza da castidade,
as desgraças de quem a perde
As duas donzelas pararam por um instante, como que para
recuperar o fô lego depois de um esforço tã o ardente, e entã o se
agarraram pela mã o e, olhando uma para a outra, continuaram:
“Oh, se os jovens soubessem o que é o precioso tesouro da
inocência, com que zelo guardariam a estola do Santo Batismo desde o
início da vida! Mas infelizmente eles nã o refletem e nã o imaginam o que
significa manchá -lo!”
“A inocência é uma bebida muito preciosa, mas está encerrada num
vaso de barro frá gil.”
“A inocência é uma joia muito preciosa, mas seu valor nã o é
conhecido; é perdido e facilmente trocado por um objeto sem valor.”
“A inocência é um espelho dourado que reflete a imagem de Deus.
Mas basta uma lufada de ar ú mido para escurecê-lo, e é preciso mantê-
lo coberto com um véu.”
“A inocência é um lírio.”
“Mas o simples toque de uma mã o á spera estraga tudo.”
“A inocência é um manto branco: Omni tempore sint vestimenta tua
candida - 'Deixe suas roupas serem brancas e brilhantes em todos os
momentos.'”
“Mas uma ú nica mancha é suficiente para sujá -la; portanto, é
preciso caminhar com muita precauçã o.”
“Inocência é integridade; perde-se se for estragado por um ú nico
pecado e perde o tesouro da sua beleza.”
“Apenas um pecado mortal é suficiente e, uma vez perdido, estará
perdido para sempre.”
“Que pena que todos os dias tantos percam a inocência! Quando
um menino cai em pecado, o Paraíso se fecha; a Santíssima Virgem e
seu Anjo Guardiã o desaparecem; a mú sica cessa; a luz se apaga; Deus
nã o está mais em seu coraçã o; a estrada estrelada que ele percorreu
desaparece; ele cai e permanece num ponto como uma ilha no meio do
mar, um mar de fogo, que se estende até o horizonte mais distante da
eternidade e desce até as profundezas do caos. Acima de sua cabeça, no
céu escurecido, o relâ mpago da Justiça Divina brilha ameaçadoramente.
Sataná s avançou sobre ele e o carregou com correntes, colocou o pé em
seu pescoço e, erguendo seu focinho horrivelmente feio, gritou: 'Eu
venci! Seu filho é meu escravo; ele nã o pertence mais a você! A alegria
acabou para ele. Se, naquele momento, a justiça de Deus tirar aquele
ponto que o sustenta, ele estará perdido para sempre”.
“Ele pode se levantar novamente! A misericó rdia de Deus é infinita.
Uma boa Confissã o devolverá a graça de Deus e o título de filho de
Deus”.
“Mas chega de inocência! E que consequências do primeiro pecado
permanecerã o nele! Ele conhece o mal, que antes nã o conhecia; ele
sentirá quã o terríveis sã o suas inclinaçõ es bá sicas; sentirá a enorme
dívida que contraiu com a Justiça Divina; nos combates espirituais ele
será mais fraco. Ele experimentará o que nunca experimentou antes; a
saber, vergonha, tristeza e remorso.”
“E pensar que antes dele foi dito: 'Deixai vir a mim as criancinhas.
Eles serã o como os Anjos de Deus no Céu'. . . 'Filho, dê-me seu coraçã o. .
.'”

“Ai daqueles que causam escândalo!”


“Oh, que crime terrível é cometido por aqueles desgraçados por
cuja culpa uma criança perde a inocência! Jesus disse: 'Aquele que
escandalizar um destes pequeninos que crêem em mim, seria melhor
para ele que uma pedra de moinho fosse pendurada em seu pescoço e
que ele se afogasse nas profundezas do mar.' 'Ai do mundo por causa
dos escâ ndalos!' «Nã o é possível evitar escâ ndalos; mas ai daquele por
cuja culpa surge o escâ ndalo. . .' 'Cuidado, nã o desprezes nenhum destes
pequeninos, pois eu te digo que seus Anjos no Céu sempre veem a face
de Meu Pai, que está no Céu, e exigem vingança.'”
“Infeliz é o escandaloso, mas nã o menos infeliz é aquele que se
deixa roubar a sua inocência!”

Meios para preservar a inocência


Aqui as duas donzelas começaram a andar. O assunto da conversa
foi sobre os melhores meios de preservar a inocência. Um deles disse:
“Um grande erro que os meninos cometem é pensar que a
penitência deve ser praticada apenas pelos pecadores. A penitência é
necessá ria também para preservar a inocência. Se Sã o Luís nã o tivesse
feito penitência, certamente teria caído em pecado mortal. Isto deve ser
continuamente pregado, inculcado e ensinado à s crianças. Quantos
mais preservariam a sua inocência, enquanto atualmente sã o tã o
poucos!”
“O Apó stolo diz que devemos levar conosco em todos os lugares a
mortificaçã o de Jesus Cristo em nossos corpos, para que também a vida
de Jesus se manifeste em nó s”.
“E Jesus, o Santo, o Imaculado, passou a vida em privaçõ es e
sofrimentos.”
“O mesmo fez Maria Santíssima; o mesmo aconteceu com todos os
santos.”
“Era para dar exemplo a todos os jovens. Sã o Paulo diz: ' Se viveres
segundo a carne, morrerás; mas se, segundo o espírito, você der o golpe
mortal nas inclinações da carne, você viverá .' ”
“Portanto, sem penitência a inocência não pode ser preservada .”
“E ainda assim muitos gostariam de preservar a sua inocência e
viver uma vida fá cil e livre. . .”
“Tolos! Nã o está escrito: 'Ele foi levado para que a maldade nã o
contaminasse seu espírito, nem a seduçã o levasse sua mente ao erro?'
Porque o encanto da vaidade nã o traz nenhum bem, e o redemoinho da
concupiscência afoga a alma inocente. Assim, os inocentes têm dois
inimigos: 1) as falsas má ximas e as má s conversas dos ímpios, e 2) a
concupiscência. Nã o diz o Senhor que a morte precoce é uma
recompensa ao inocente, para afastá -lo dos combates? 'Porque agradou
a Deus, ele foi amado, e porque vivia entre pecadores, foi levado
embora. Sendo aperfeiçoado em pouco espaço, ele cumpriu muito
tempo. Porque a sua alma agradou a Deus; portanto, Ele se apressou em
tirá -lo do meio das iniqü idades. Ele foi levado embora para que a
maldade nã o alterasse seu entendimento ou o engano enganasse sua
alma.' ” (Sab. 4:10-14).
“ Felizes aqueles filhos que abraçarão a cruz da penitência e com
uma firme resoluçã o dirã o com Jó : Donec deficiam, non recedam ab
inocenteia mea – 'Até que eu morra, nã o me afastarei da minha
inocência.'”
“ Daí a mortificação em superar o cansaço na oração. Está escrito:
Sallam et intelligam na via immaculata; . . . quando venies me ad? . . .
Petite et accipietis. Padre Noster! -'Eu cantarei e entenderei de maneira
imaculada. Quando você virá ? Peça e você receberá . Nosso pai!'"
“ Mortificação do intelecto pela humilhação: Obedecendo aos
Superiores e à s regras.
“Também está escrito: Si mei non fuerint dominati tunc
immaculatus ero et emundabor a delicto maximo - 'Se eles nã o tiverem
domínio sobre mim, entã o ficarei sem mancha.' (Sl. 18:14). E esse
domínio pecaminoso é o orgulho. 'Deus resiste aos orgulhosos e dá Sua
graça aos humildes'; 'Aquele que se humilha será exaltado, e aquele que
se exalta será humilhado!'”
“ Obedeça aos seus superiores .”
“ Mortificações em dizer sempre a verdade, em revelar os pró prios
defeitos e os perigos em que se pode encontrar. Entã o sempre teremos
conselhos adequados, especialmente do confessor. Pro anima tua non
confundaris dicere verum —'Pelo amor da sua alma, nã o tenha vergonha
de dizer a verdade.' Pois há um rubor que traz consigo o pecado, e há
um rubor que traz gló ria e graça.”
“ Mortificações do coração, controlar seus movimentos irrefletidos,
amar tudo pelo amor de Deus, afastar-se resolutamente de qualquer
pessoa que percebamos estar colocando em risco a nossa inocência.
Jesus disse: 'Se as tuas mã os e os teus pés te escandalizarem, corta-os e
lança-os para longe de ti. É melhor para você entrar na vida com um pé
ou uma mã o faltando, do que com ambas as mã os e ambos os pés ser
lançado no fogo eterno.'”
“Mortificaçã o em apoiar com coragem e franqueza a zombaria do
respeito humano: Exacuerunt ut gladium linguas suas; intenderunt
arcum, rem amaram, ut sagittent in occultum immaculatum —'Eles
afiaram a língua como uma espada; eles armaram seu arco, uma coisa
amarga, para atirar em segredo nos imaculados.'”
“Este respeito humano, que zomba enquanto teme ser descoberto
pelos Superiores, será conquistado pensando nas terríveis palavras de
Jesus Cristo: ' Quem se envergonhar de Mim e das Minhas palavras, dele
se envergonhará o Filho do Homem, quando Ele vier em Sua majestade. . .
'”
“ Mortificação dos olhos, da aparência, da leitura, evitando
literatura ruim e inadequada .”
“Um ponto essencial: 'Fiz um contrato com os olhos de nunca olhar
para uma donzela.' E nos Salmos: 'Desvia os teus olhos para que nã o
vejam a vaidade.'”
“ Mortificação do ouvir, nunca ouvir conversas más, imprudentes ou
ímpias. No Eclesiástico lemos: Sepi aures tuas spinis, linguam nequam
noli audire – 'Coloque uma cerca de espinhos em volta dos ouvidos e
nã o dê ouvidos à língua perversa.'”
“ Mortificação na fala, nã o se deixar vencer pela curiosidade.”
“Também está escrito: 'Coloque uma porta e tranque sua boca.
Tome cuidado para nã o pecar com a língua, para que você nã o caia no
chã o à vista dos inimigos que se opõ em a você e para que sua queda
nã o seja incurável e mortal.'”
“ Mortificação em comer e beber, nã o comer nem beber demais. O
excesso de comida e bebida provocou o dilú vio universal sobre a terra,
e o fogo sobre Sodoma e Gomorra, e mil castigos sobre os hebreus.”
“ Em suma, mortificar-se em tudo o que acontece ao longo do dia:
frio e calor, e nunca procurar a nossa satisfaçã o pessoal: 'Mortifique os
seus membros terrenos'. Lembre-se do que Jesus ordenou: ' Si quis vult
post me venire, abneget semetipsum, tollat crucem suam, et sequatur me'
- 'Se alguém quiser vir apó s mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz
e siga-me.' ”

Sagrada Comunhão e
Devoção a Maria
“O pró prio Deus, com Sua mã o providente, cinge Seus inocentes
com cruzes e espinhos, como fez com Jó , José, Tobias e outros santos.
Quia acceptus eras Deo, neccesse fuit ut tentatio probaret te -'Porque
foste aceitável a Deus, foi necessá rio que a tentaçã o te provasse.'”
“O caminho dos inocentes tem as suas provaçõ es e os seus
sacrifícios, mas tem a sua força na Sagrada Comunhã o, porque quem
comunica frequentemente tem a vida eterna: está em Jesus, e Jesus está
nele. Aquele que vive a mesma vida que Jesus será ressuscitado por Ele
no ú ltimo dia. Este é o trigo dos eleitos e o vinho que produz virgens.
Parasti in conspectu tuo mensam adversus eos qui tribulant me. Cadent a
latere tuo mille, et decem milia a dexteris tuis: ad te autem non
appropinquabunt - 'Preparaste uma mesa diante de ti, contra os que me
afligem. Mil cairã o ao teu lado, e dez mil à tua direita, mas eles nã o
chegarã o a ti.'”
“E a Virgem dulcíssima, amada por ele, é para ele uma Mã e. Ego
mater pulchrae dilectionis et timoris et agnitionis et sanctae spei. In me
gratia omnis viae et veritatis; em mim omnis spes vitae et virtutis. O ego
me diligente, diligo. Qui elucidant me vitam aeternam habebunt.
Terribilis ut castrorum acies ordinata —'Eu sou a mã e do belo amor, do
medo, do conhecimento e da santa esperança. Em mim está toda graça
do caminho e da verdade, em mim está toda esperança de vida e de
virtude. Eu amo aqueles que me amam. Aqueles que me explicarem
terã o vida eterna. Terrível como um exército em formaçã o.'”
As duas donzelas entã o se viraram e subiram lentamente a
encosta; e um deles exclamou:
“A segurança dos justos vem do Senhor, e Ele é seu protetor nos
tempos de tribulaçã o. O Senhor os ajudará e os libertará ; Ele os tirará
das mã os dos pecadores e os salvará , porque eles esperaram Nele”.
“Deus me cingiu de força”, continuou o outro, “e tornou imaculado
o caminho que sigo”.
Quando as duas donzelas chegaram ao meio do magnífico tapete,
elas se viraram.
“Sim”, gritou um deles, “ a inocência coroada com penitência é a
rainha das virtudes. ” E o outro exclamou:
“Quã o gloriosa e bela é a geraçã o casta! Sua memó ria é imortal e
conhecida tanto por Deus como pelos homens. As pessoas o imitam
quando está presente e o desejam quando ele partiu para o Céu,
coroado triunfantemente na eternidade, tendo conquistado a
recompensa de seus castos combates.
“E que triunfo, que alegria apresentar a Deus imaculada a estola do
Santo Batismo, depois de tantos combates, entre os aplausos, os hinos e
o esplendor das hostes celestes!”
Enquanto falavam assim da recompensa que está preparada para a
“inocência preservada pela penitência”, Dom Bosco viu aparecerem
bandos de Anjos que desciam sobre o brilhante tapete branco e se
juntavam à s duas donzelas, que permaneciam sempre no centro. Eles
eram uma grande multidã o e cantavam:
Benedictus Deus et Pater Domini Nostri Jesu Christi QUI BENEDICIT
NOS . . . in ipso ante mundi constitucionalem ut essemus sancti et
immaculati in conspectu ejus in caritate, qui praedestinavit nos in
adoptem filiorum per Jesum Christum —“Bendito seja Deus e Pai de
Nosso Senhor Jesus Cristo, que nos abençoou. . . Nele antes da fundaçã o
do mundo, para que fô ssemos santos e imaculados diante dele na
caridade, o qual nos predestinou para a adoçã o de filhos por meio de
Jesus Cristo”.

O Cântico da Inocência
As duas donzelas começaram entã o a cantar um hino incrível, com
palavras e notas que somente os Anjos que estavam mais pró ximos do
centro poderiam fazer. Os outros também cantavam, mas Dom Bosco
nã o ouvia as suas vozes, embora fizessem gestos, mexessem os lá bios e
modelassem a boca como se cantassem. As donzelas cantaram:
Me propter inocenteiam suscepisti et confirmati me in conspectu tuo
in aeternum. Benedictus Deus a saéculo. Fiat! Fiat! - “Tu me sustentaste
em razã o da minha inocência e me estabeleceste à Tua vista para
sempre. Bendito seja Deus de eternidade em eternidade. Que assim
seja! Que assim seja!"
Enquanto isso, ao primeiro grupo de Anjos juntavam-se outros em
nú meros cada vez maiores; seus vestidos tinham uma encantadora
variedade de cores e ornamentos, cada um diferente dos outros,
principalmente dos das donzelas. Mas a riqueza e magnificência eram
divinas. A beleza de cada um deles era tal que nenhuma mente humana
pode imaginar sequer a sua sombra; todo o espetá culo desta cena nã o
pode ser descrito; mas acrescentando palavras a palavras, é possível, de
alguma forma, dar pelo menos uma ideia imperfeita disso.
Quando as donzelas pararam de cantar, ouviu-se todo o grupo
entoar em conjunto um imenso câ ntico, tã o harmonioso que nunca se
ouviu igual na terra, nem jamais o será . Eles cantaram:
Ei qui potest vos conservare sine peccato et constituere ante
conspectum gloriae suae imaculatos in exultatione, in adventu Domini
Nostri Jesu Christi: soli Deo Salvatori Nostri per Jesum Christum
Dominum nostrum, gloria et magnificia, imperium et potestas ante omne
saeculum et nunc et in omnia saecula saeculorum. Amém - “À quele que é
capaz de preservá -los sem pecado e apresentar-vos imaculados diante
da presença de Sua gló ria com grande alegria na vinda de Nosso Senhor
Jesus Cristo: ao Ú nico Deus, Nosso Salvador, por meio de Jesus Cristo
Nosso Senhor, seja gló ria e magnificência, império e poder, antes de
todos os tempos, e agora, e para todos os tempos. Amém."
Enquanto cantavam, mais e mais Anjos se juntavam a eles
continuamente, e quando o câ ntico terminou, pouco a pouco todos eles
se elevaram e desapareceram; assim desapareceu toda a visã o.
19
NA TERRA DO JULGAMENTO
( Memórias Biográficas , Vol. XI, página 239ss.)

NO SEU discurso de “Boa Noite” de 30 de abril de 1875, Dom Bosco


exortou os meninos a fazerem com devoçã o as devoçõ es de maio.
Depois de exortá -los, portanto, a um maior zelo no cumprimento dos
seus deveres e na escolha de algum ato especial de devoçã o em honra
de Maria, acrescentou que tinha um sonho de lhes contar, mas como já
era tarde, contaria. isso no domingo seguinte.
Os meninos estavam fora de si de impaciência. A curiosidade deles
foi ainda despertada por outro adiamento de dois dias porque Dom
Bosco estava ocupado. Finalmente, na noite de 4 de maio, a curiosidade
foi satisfeita. Depois da oraçã o, Dom Bosco dirigiu-se a eles como
sempre, do pequeno pú lpito:
Aqui estou para cumprir minha promessa. Você sabe que os sonhos
surgem durante o sono. À medida que se aproximava a hora do retiro,
fiquei pensando como meus meninos conseguiriam e o que eu deveria
sugerir para torná -lo frutífero. Na noite de domingo, 25 de abril,
véspera do retiro, fui para a cama com esse pensamento na cabeça.
Adormeci imediatamente e parecia estar sozinho em um vasto vale
cercado em ambos os lados por altas colinas. No extremo do vale, ao
longo de um dos lados onde o terreno se elevava abruptamente, havia
uma luz pura e brilhante; o outro lado estava na semi-escuridã o.
Enquanto eu olhava a planície, Buzzetti e Gastini aproximaram-se de
mim e disseram: “Dom Bosco, você terá que montar um cavalo. Pressa!
Pressa!"
"Você está brincando?" Eu disse: “Você sabe quanto tempo se
passou desde a ú ltima vez que andei a cavalo”. Eles insistiram, mas na
tentativa de me desculpar, eu repetia: “Nã o quero andar a cavalo; Eu fiz
isso uma vez e caí.
Gastini e Buzzetti me pressionaram cada vez mais e disseram:
“Suba no cavalo e rá pido. Nã o há tempo a perder."
“Mas suponha que eu monte um cavalo, para onde você está me
levando?”
"Você vai ver. Agora, apresse-se e monte.”
“Mas onde está o cavalo? Eu nã o vejo nenhum.
“Aí está”, gritou Gastini, apontando para um lado do vale. Olhei e vi
um corcel lindo e espirituoso. Tinha pernas longas e fortes, crina
espessa e pelagem muito brilhante.
“Bem, já que você quer que eu monte, eu irei. Mas ai de você se eu
cair. . .” Eu disse.
“Nã o se preocupe”, eles responderam, “estaremos aqui com você
em caso de emergência”.
“E se eu quebrar meu pescoço, você terá que consertar”, eu disse a
Buzzetti.
Buzzetti começou a rir. “Nã o é hora de rir”, murmurou Gastini.
Caminhamos até o cavalo. Mesmo com a ajuda deles, tive muita
dificuldade em montar, mas finalmente consegui subir na sela. Quã o
alto aquele cavalo parecia ser entã o! Era como se eu estivesse
empoleirado no topo de um monte alto, de onde pudesse observar todo
o vale de ponta a ponta.
Entã o o cavalo começou a se mover. Estranhamente, enquanto isso
acontecia, eu parecia estar no meu pró prio quarto. Eu me perguntei:
“Onde estamos?” Vindo em minha direçã o vi padres, clérigos e outros;
todos pareciam assustados e sem fô lego.
Depois de uma longa cavalgada, o cavalo parou. Entã o vi todos os
sacerdotes do Orató rio e muitos clérigos se aproximando. Eles se
reuniram em torno do cavalo. Reconheci o Pe. Rua, Pe. Cagliero e Pe.
Bolonha entre eles. Quando chegaram até mim, pararam e olharam
silenciosamente para meu cavalo. Notei que todos pareciam
preocupados. A inquietaçã o deles era tal que eu nunca tinha visto antes.
Acenei para o Pe. Bolonha.
“Pe. Bolonha”, eu disse, “você é responsável pela entrada principal;
você pode me contar o que aconteceu? Por que você parece tã o
chateado?
“Nã o sei onde estou ou o que estou fazendo”, disse ele. “Estou todo
confuso. . . Algumas pessoas entraram. . . falei e fui embora. . . Há tanta
confusã o de pessoas indo e vindo na entrada principal que nã o sei o
que está acontecendo.”
“Será possível”, pensei, “que algo muito incomum possa acontecer
hoje?”
Nesse momento alguém me entregou uma trombeta, dizendo que
eu deveria segurá -la porque iria precisar dela.
"Onde estamos agora?" Perguntei.
“Toque a trombeta!”
Eu fiz isso e ouvi estas palavras: “Estamos na terra da provaçã o”.

Forcados e Batalha
Entã o vi uma multidã o de rapazes – creio que mais de 100 mil –
descendo as colinas. Houve um silêncio absoluto. Carregando forcados,
eles corriam em direçã o ao vale. Reconheci entre eles todos os meninos
do Orató rio e os das nossas outras escolas; mas havia muitos mais
desconhecidos para mim. Só entã o, de um lado do vale, o céu escureceu
e hordas de animais semelhantes a leõ es e tigres apareceram. Essas
feras ferozes tinham corpos grandes, pernas fortes e pescoços longos,
mas suas cabeças eram bem pequenas. Eles eram aterrorizantes. Com
os olhos injetados de sangue saltando das ó rbitas, eles se atiraram
contra os meninos, que imediatamente ficaram prontos para se
defender. À medida que os animais atacavam, os rapazes mantinham-se
firmes e espancavam-nos com os seus forcados pontiagudos, que
baixavam ou levantavam conforme necessá rio.
Incapazes de dominá -los com este primeiro ataque, as feras
agarraram as pontas dos garfos, apenas para quebrarem os dentes e
desaparecerem. Alguns dos meninos, porém, tinham garfos com apenas
um dente e ficaram feridos. Outros tinham forcados com cabos
quebrados ou comidos por vermes, e outros ainda se atiravam contra os
animais com as mã os nuas e caíam vítimas; alguns deles foram mortos.
Muitos tinham forcados com duas pontas e cabos novos.
Enquanto isso acontecia, desde o início enxames de serpentes
deslizaram em volta do meu cavalo. Chutando e batendo os pés, o
cavalo esmagou-os e expulsou-os: ao mesmo tempo, ficou cada vez mais
alto.
Perguntei a alguém o que simbolizavam os garfos de duas pontas.
Recebi um garfo. Nas pontas li: Confissã o, em um; Comunhã o, por outro.
“Mas o que significam as pontas?”
“Toque a trombeta!”
Eu fiz e ouvi estas palavras: “Boa Confissã o e boa Comunhã o”.
Toquei novamente a trombeta e ouvi estas palavras: “Cabo quebrado:
Confissõ es e Comunhõ es sacrílegas. Cabo comido por vermes:
Confissõ es defeituosas.”

Mortos e Feridos
Agora que o primeiro ataque terminou, passei pelo campo de
batalha e vi muitos mortos e feridos. Vi que alguns dos mortos foram
estrangulados e seus pescoços estavam inchados e deformados. Os
rostos dos outros estavam horrivelmente desfigurados; outros ainda
morreram de fome enquanto comida atraente estava ao seu alcance. Os
meninos estrangulados sã o aqueles que infelizmente cometeram alguns
pecados na infâ ncia e nunca os confessaram: os que têm o rosto
desfigurado sã o glutõ es; e os meninos que morreram de fome sã o
aqueles que se confessam, mas nunca seguem o conselho ou
admoestaçã o do seu confessor.

Os espinhos
Ao lado de cada menino cujo forcado tinha o cabo carcomido, uma
palavra se destacava. Para alguns foi Orgulho ; para outros, Preguiça ;
para outros ainda, Imodéstia , etc. . . Devo acrescentar também que em
sua marcha os meninos tiveram que caminhar sobre um canteiro de
rosas. Eles gostavam, mas depois de alguns passos soltavam um grito e
caíam no chã o, mortos ou feridos por causa dos espinhos escondidos
embaixo. Outros, em vez disso, pisotearam corajosamente aquelas rosas
e, encorajando-se mutuamente, marcharam para a vitó ria.

Nova Batalha e Vitória


Entã o o céu escureceu novamente. Instantaneamente, hordas
ainda maiores dos mesmos animais ou monstros apareceram. Tudo isso
aconteceu em menos de três ou quatro segundos. Meu cavalo estava
cercado. Os monstros aumentaram além da conta e eu também comecei
a ficar assustado. Eu podia senti-los me arranhando! Entã o alguém me
entregou um forcado e eu também comecei a lutar contra eles, e os
monstros foram forçados a recuar. Espancados no primeiro ataque,
todos desapareceram.
Entã o toquei a trombeta novamente e estas palavras ecoaram pelo
vale: “Vitória! Vitória!"
"Vitó ria?" Perguntei-me: “como é possível com tantos mortos e
feridos?”
Toquei a trombeta mais uma vez e ouvimos as palavras: “Tré gua
para os vencidos!” O cé u iluminou-se e um arco-íris tornou-se visível.
Era tã o lindo e tã o colorido que nã o consigo descrever. Era imenso,
como se uma das pontas estivesse em cima do Superga 1 e o seu arco
esticou-se e esticou-se até chegar ao topo de Moncenisio. Devo
acrescentar també m que todos os meninos que foram vitoriosos
usavam coroas tã o brilhantes e tã o brilhantes e de cores variadas que
era uma visã o inspiradora. Seus rostos també m eram
resplandecentemente bonitos. No extremo do vale havia uma espé cie
de varanda, abrigando pessoas cheias de alegria e de uma beleza tã o
variada que ultrapassava a minha imaginaçã o.
Uma senhora muito nobre, vestida de forma majestosa,
aproximou-se da grade da varanda e gritou: “ Venham, meus filhos, e
abriguem-se sob o meu manto ”. Enquanto ela falava, um imenso manto
se estendeu e todos os meninos correram para se protegerem sob ele.
Alguns realmente voaram; estes tinham a palavra Inocência na testa.
Outros apenas caminharam; e alguns rastejaram. Também comecei a
correr e, naquela fraçã o de segundo – nã o poderia ter sido mais do que
isso – disse a mim mesmo: “É melhor que isto acabe ou morreremos”.
Eu tinha acabado de dizer isso e ainda estava correndo quando acordei.

Explicação
Por motivos posteriormente explicados, Dom Bosco voltou a este
tema no dia 6 de maio, festa da Ascensã o. Ele reuniu os estudantes e os
artesã os para as oraçõ es noturnas e entã o falou o seguinte:
Outra noite nã o pude dizer tudo porque tínhamos visitantes entre
nó s. Estas coisas devem ser mantidas entre nó s e ninguém deve
escrever a amigos ou parentes sobre elas. Confio tudo a você, até meus
pecados.
O vale, aquela terra de provação, é este mundo. A semi-escuridã o é o
lugar da perdiçã o; os dois montes sã o os Mandamentos de Deus e da
Igreja; as serpentes sã o os demô nios; os monstros, tentaçõ es malignas;
o cavalo, eu acho, é o mesmo que atingiu Heliodoro 2 e representa
nossa confiança em Deus. Os meninos que passaram por cima das
rosas e caíram mortos sã o aqueles que se entregam aos prazeres deste
mundo que matam a alma; aqueles que pisotearam as rosas sã o
aqueles que rejeitam os prazeres mundanos e, portanto, sã o vitoriosos.
Os meninos que voaram sob o manto sã o aqueles que preservaram a
sua inocê ncia batismal.
Para o bem de quem quiser saber, aos poucos contarei aos
interessados que tipo de arma portavam e se foram vitoriosos ou nã o,
mortos ou feridos. Nã o conhecia todos os meninos, mas reconheci os do
Orató rio. E se os outros viessem aqui, eu os reconheceria
imediatamente no momento em que os visse.

Questões
Pe. Berto, secretá rio de Dom Bosco que anotou este sonho,
escreveu que nã o conseguia se lembrar de muitas coisas que Dom
Bosco havia narrado e explicado longamente. Na manhã seguinte, 7 de
maio, quando estava com Dom Bosco, perguntou-lhe: “ Como você pode
se lembrar de todos os meninos que viu em seu sonho e contar a cada um
o estado em que se encontrava e identificar seus defeitos? “ Oh ”,
respondeu Dom Bosco, “por meio de Otis Botis Pia Tutis”. Esta era uma
frase sem sentido que ele costumava usar para evitar perguntas
embaraçosas.
Quando Pe. Barberis também abordou o mesmo assunto, Dom
Bosco disse gravemente: “ Foi muito mais que um sonho ”; e
interrompendo a conversa, ele passou para outras coisas.
Pe. Berto termina o seu relató rio com estas palavras: “Eu também,
o redator deste relató rio, perguntei-lhe sobre a minha parte neste
sonho. Sua resposta foi tã o direta que comecei a chorar e disse: 'Um
anjo do céu nã o poderia ter atingido melhor a verdade.'”

Mais perguntas
Mais uma vez este sonho foi tema de outro discurso de “Boa Noite”
no dia 4 de junho. A comunidade esteve presente neste diá logo entre
Pe. Barberis e Dom Bosco.
Pe. Barberis: “Com a sua permissã o, Dom Bosco, esta noite gostaria
de fazer algumas perguntas. Nã o me atrevi a perguntar nestas ú ltimas
noites porque tivemos visitas. Gostaria de alguns esclarecimentos sobre
seu ú ltimo sonho.”
Dom Bosco: “Vá em frente. Já faz algum tempo desde a ú ltima vez
que mencionei isso, mas nã o importa.
Pe. Barberis: “Você disse no final do seu sonho que alguns voaram
para o manto de Maria, alguns correram, outros caminharam devagar e
alguns chapinharam na lama, ficaram salpicados e mal conseguiram se
proteger sob o manto. Você já nos disse que aqueles que voavam eram
os puros. Podemos entender facilmente aqueles que fugiram, mas o que
significa aqueles que ficaram presos na lama?”
Dom Bosco: “Aqueles que ficaram presos na lama e que, em sua
maioria, nã o conseguiram alcançar o manto de Nossa Senhora
simbolizam os apegados à s coisas deste mundo. Sendo egoístas,
pensam apenas em si mesmos; e por isso se sujam de lama e nã o
conseguem mais sair do chã o e aspirar à s coisas do Céu. Eles veem a
Santíssima Virgem chamando-os e desejam ir até ela. Eles dã o alguns
passos, mas a lama os segura. Sempre acontece assim. O Senhor diz: '
Onde estiver o teu tesouro, aí também estará o teu coração .' ( Mateus
6:21). Aqueles que nã o se elevam aos tesouros da graça colocam o
coraçã o nas coisas deste mundo. Prazeres, riquezas, sucesso nos
negó cios, vangló ria é tudo em que pensam. O céu é simplesmente
ignorado.”
Pe. Barberis: “Há outra coisa que o senhor nã o nos contou, Dom
Bosco. Você mencionou isso para alguns em particular e gostaria que
você nos informasse também. É isto: Alguém te perguntou se ele estava
entre os que corriam ou entre os que caminhavam devagar, e se ele se
abrigou sob o manto de Maria, e se o cabo do seu forcado estava comido
por vermes ou quebrado. Você respondeu que nã o conseguia ver
claramente porque havia uma nuvem entre você e ele.”
Dom Bosco: “Você é teó logo e deveria saber. Bem, havia de facto
alguns rapazes, embora nã o muitos, que eu nã o conseguia ver
claramente. Eu vi cada um deles bem o suficiente para reconhecê-los,
mas isso foi tudo. Esses são os meninos que são calados com seus
superiores; eles não abrem seus corações para eles; eles nã o sã o sinceros.
Sempre que vêem um Superior vindo em sua direçã o, em vez de
encontrá -lo, partem na direçã o oposta. Alguns deles vieram me
perguntar em que estado eu os tinha visto no sonho. Mas o que eu
poderia dizer a eles? Eu poderia ter dito: vocês nã o confiam nos seus
superiores; você nunca abre seu coraçã o para eles. Agora todos vocês se
lembrem disso! Não há nada que possa ser de maior ajuda para vocês do
que abrir seus corações aos seus Superiores, ter maior confiança neles e
ser totalmente sinceros .”
Pe. Barberis: “Há mais uma coisa que gostaria de perguntar, mas
temo que você possa dizer que estou muito curioso.”
Dom Bosco: “Isso nã o é bastante conhecido? (risadas gerais). No
entanto, você sabe que existe um certo tipo de curiosidade que é
saudável, como por exemplo, quando um menino ansioso por aprender
fica fazendo perguntas sobre coisas sérias a pessoas que talvez saibam.
Em vez disso, há outros que ficam parados como tolos. Eles nunca têm
perguntas a fazer. Esta nã o é uma boa reflexã o sobre eles.”
Pe. Barberis: “Bem, nã o serei assim. Há muito tempo que queria
fazer-lhe esta pergunta sobre o sonho. Você viu apenas o passado de
cada menino, ou viu também o seu futuro, ou seja, a sua vocaçã o e o seu
possível sucesso?”
Dom Bosco: “Vi mais que o passado; Eu também vi o futuro que
seria deles. Cada menino tinha vá rios caminhos à sua frente. Algumas
eram estreitas e espinhosas; outros estavam cobertos de pregos
afiados, mas a bênçã o de Deus também havia sido espalhada por esses
caminhos. Todos esses caminhos levavam a um jardim de rara beleza
repleto de todas as delícias.”
Pe. Barberis: “Entã o isso significa que você pode dizer qual
caminho cada um deve seguir, ou seja, você conhece a vocaçã o de cada
um de nó s, como iremos terminar e qual caminho iremos seguir”.
Dom Bosco: “Nã o. Nã o seria sensato dizer a cada um qual caminho
seguirá ou como terminará . Nada de bom resultará em dizer a um
menino: 'Você seguirá o caminho da maldade.' Isso só iria assustá -lo. O
que posso dizer é o seguinte: se alguém segue um determinado
caminho, pode ter certeza de que está no caminho para o Céu, ou seja,
no caminho para o qual foi chamado; e, se alguém nã o seguir esse
caminho, nã o estará no caminho certo. Algumas estradas sã o estreitas,
irregulares e repletas de espinhos; no entanto, tenham coragem, meus
queridos filhos, com os espinhos está também a graça de Deus, e tanta
felicidade nos está reservada no final da nossa jornada que em breve
esqueceremos toda a nossa dor. Sinceramente, gostaria que todos vocês
se lembrassem disso: isso foi um sonho, ninguém é obrigado a
acreditar. Notei, no entanto, que aqueles que me pediram explicaçõ es
aceitaram em boa parte as minhas sugestõ es. No entanto, faça como diz
Sã o Paulo: Probate spiritus et quod bonum est tenete – 'Examine
cuidadosamente, retenha o que é bom.' (1 Tes. 5:21). Outra coisa que
gostaria que vocês nã o esquecessem é rezar pelo seu pobre Dom Bosco,
para que as palavras de Sã o Paulo: Cum aliis praedicaverim, ego
reprobus afficiar —''Depois de pregar aos outros, eu mesmo deveria ser
rejeitado' ( 1 Cor. 9:27) pode se aplicar a mim. Ou seja, depois de pregar
para você, posso acabar com os condenados. Estou fazendo o possível
para avisá -lo, me preocupo com você e lhe dou conselhos, mas temo
estar agindo como uma galinha choca que caça grilos, minhocas,
sementes e outros alimentos para seus filhotes enquanto ela mesma
pode morrer de fome , a menos que ela receba uma boa nutriçã o.
Portanto, rogai a Deus por mim para que isso nã o aconteça, mas que,
em vez disso, eu adorne meu coraçã o com muitas virtudes e seja
agradável a Deus, para que um dia todos nó s possamos ir ao Céu para
desfrutá -Lo e glorificá -Lo. Boa noite."
——————
1. Superga: uma colina a cerca de cinco quilô metros a leste de Turim. Do cume da colina, 2.205 pés
acima do nível do mar, quando o tempo está bom, pode-se olhar para Turim ou para o amplo
semicírculo dos Alpes cobertos de neve que se erguem como uma parede num raio de trinta milhas
ou mais. No topo desta colina ergue-se uma famosa basílica. (Cf. Memórias Biográficas , Vol. II, p.
298.)
2. 2 Macabeus , cap. 3.
20
UM POÇO MEDORESSO
( Memórias Biográficas , Vol. VII, páginas 333-334)

No dia 13 de novembro de 1863, no discurso de “Boa Noite”, Dom


Bosco disse: Ontem de manhã fizemos o Exercício para uma morte
feliz. Agora temo que alguns de você s nã o tenham se saído bem. Deixe-
me contar um sonho que tive ontem à noite.
Eu estava com vocês no parquinho enquanto todos brincavam.
Depois fomos todos dar um passeio até uma campina, onde você
retomou seus passatempos, principalmente jogos de salto. De repente,
avistei um buraco desprotegido no centro da campina e corri para me
certificar de que era seguro. Ao olhar para ele, vi uma serpente curta,
com manchas amarelas e de aparência cruel, enrolada na parte inferior.
Parecia tã o grande quanto um cavalo ou até mesmo um elefante. Eu
pulei para trá s assustado.
Enquanto isso, um bom nú mero de vocês começou a pular do poço.
Curiosamente, nunca me ocorreu detê-lo ou alertá -lo sobre o perigo.
Percebi que enquanto os meninos mais novos saltavam agilmente sobre
ele, os mais velhos, sendo mais pesados, muitas vezes caíam
desajeitadamente na beirada. Cada vez que isso acontecia, a serpente
atacava, beliscava o pé, a perna ou outra parte do corpo da vítima e
rapidamente desaparecia de vista. Despreocupados, esses rapazes
imprudentes continuaram pulando, embora quase nunca saíssem
ilesos. Enquanto isso acontecia, um menino, apontando para um
companheiro, disse: “Ele vai pular uma vez e mal consegue. Entã o ele
pulará de novo e isso será o seu fim.”

Arriscando
Entristecido ao ver meninos caídos feridos nas pernas, nos braços
e até no coraçã o, perguntei: “Por que você pulou do buraco e continuou
assim mesmo depois de se machucar?”
“Ainda nã o somos muito bons em pular”, responderam eles com
um suspiro.
“Entã o você nã o deveria ter pulado!”
“Nã o pudemos evitar. Simplesmente nã o somos muito bons nisso.
Além disso, nã o achamos que fosse tã o arriscado.”
Um menino em particular realmente me abalou – o rapaz que me
foi indicado. No segundo salto, ele falhou e caiu na cova. Momentos
depois ele foi vomitado, preto como carvã o, embora ainda respirando e
capaz de falar. Todos nó s olhamos para ele aterrorizados e continuamos
fazendo perguntas.
A crô nica de Ruffino nã o diz mais nada. Silencia totalmente a
interpretaçã o do sonho e as advertências, ainda mais necessá rias no
início de um novo ano escolar, que Dom Bosco sem dú vida deu aos
meninos pú blica e privadamente. O que devemos dizer? Podemos
oferecer uma explicaçã o?

Explicação
A cova é aquela mencionada na Sagrada Escritura: “. . . um fosso
profundo”, “um poço estreito” (Pv 23:27), “o poço da destruiçã o” (Sl
54:24). Nele reside o demônio da impureza , como nos diz Sã o Jerô nimo
em sua décima primeira homilia sobre a primeira carta de Sã o Paulo
aos Coríntios. Aparentemente, o sonho nã o aponta para almas já
escravizadas pelo pecado, mas para aquelas que se colocam em perigo
de pecar. Neste ponto, a alegria, a diversã o e a paz de coraçã o começam
a desaparecer. Os meninos mais novos saltam com agilidade e
segurança sobre o fosso, porque suas paixõ es ainda estã o adormecidas.
Felizmente inocentes, eles estã o totalmente absortos em seus jogos e
seus Anjos da Guarda protegem sua inocência e simplicidade. O sonho,
porém, nã o diz que eles continuaram pulando do poço. Talvez eles
tenham seguido o conselho de um amigo.
Os rapazes mais velhos também querem saltar, mas estã o sem
prá tica e nã o sã o tã o á geis como os seus companheiros. Além disso, eles
sentiram a tensã o das suas primeiras batalhas contra a carne e nã o
estã o cientes da emboscada da serpente. “ Pular aquele buraco é
realmente tão terrivelmente arriscado? ”eles parecem perguntar. E entã o
o jogo começa. Seu primeiro salto pode começar a se materializar
quando eles começarem a formar amizades emocionais, aceitar livros
questionáveis e nutrir fortes apegos. Sendo demasiado livres e
turbulentos, afastam-se dos bons companheiros e desrespeitam regras
ou admoestaçõ es à s quais os superiores atribuem grande importâ ncia
na salvaguarda da sua moral.
O primeiro salto termina com a picada de uma serpente. Alguns
meninos escapam do perigo e prudentemente nã o correm mais riscos.
Outros, desconsiderando precipitadamente um perigo real, voltam a
ele. Parece que cair na cova e ser jogado fora novamente simbolizava
uma queda em pecado mortal, mas com chance de recuperação por meio
dos Sacramentos. Daqueles que caíram e permaneceram na cova, nada
mais precisa ser dito do que: “ Aquele que ama o perigo perecerá nele ”. (
Eclesiastes 3:27).
——————
NB De grande interesse para os educadores é o capítulo que segue a narração acima, páginas 335-
340 do Vol. VII.
21
DEZ MONTES
( Memórias Biográficas , Vol. VII, páginas 467-470)

OUTUBRO DE 1864: Dom Bosco parecia estar num vasto vale


fervilhando de milhares e milhares de meninos – tantos, na verdade,
que seu nú mero superava a crença. Entre eles ele podia ver todos os
alunos antigos e atuais; o resto, talvez, ainda estava por vir. Espalhados
entre eles estavam padres e clé rigos que entã o estavam no Orató rio.
Uma margem elevada bloqueava uma extremidade do vale.
Enquanto Dom Bosco se perguntava o que fazer com todos aqueles
meninos, uma voz lhe disse: “Você vê aquele banco? Bem, você e os
meninos devem chegar ao cume.”
Ao comando de Dom Bosco, todos aqueles jovens precipitaram-se
em direçã o ao banco. Os sacerdotes também subiram a encosta
correndo, empurrando os meninos para frente, levantando os que
caíam e içando nos ombros os que estavam cansados demais para subir
mais. Pe. Rua, com as mangas arregaçadas, continuou trabalhando duro,
agarrando dois meninos de cada vez e literalmente arremessando-os
para o alto da margem, onde eles caíram de pé e correram alegremente.
Enquanto isso, Pe. Cagliero e Pe. Francesia correu de um lado para o
outro incentivando os jovens a escalar.
Nã o demorou muito para que todos chegassem ao topo. “ Agora o
que devemos fazer? — perguntou Dom Bosco.
“Todos vocês devem escalar cada uma das dez colinas à sua frente”,
respondeu a voz.
"Impossível! Muitos meninos jovens e frá geis nunca conseguirã o!”
“Aqueles que nã o puderem serã o carregados”, rebateu a voz.

O inocente
Nesse exato momento, no outro extremo da margem, apareceu
uma linda carroça de formato triangular, linda demais para ser
expressada em palavras. Suas três rodas giravam em todas as direçõ es.
Três hastes erguiam-se de seus cantos e uniam-se para sustentar uma
bandeira ricamente bordada, trazendo em letras grandes a inscriçã o
Innocentia — “Inocência”. Uma larga faixa de material rico estava
pendurada na carroça, trazendo a legenda: Adiutorio Dei Altissimi, Patris
et Filii et Spiritus Sancti – “Com a ajuda do Deus Altíssimo, Pai, Filho e
Espírito Santo”.
Brilhando com ouro e pedras preciosas, a carroça parou no meio
dos meninos. A uma determinada ordem, quinhentos dos menores
subiram nele. Entre os incontáveis milhares, apenas algumas centenas
ainda eram inocentes.

O Penitente
Enquanto Dom Bosco se perguntava que caminho seguir, uma
estrada larga e plana, repleta de espinhos, abriu-se diante dele. De
repente, apareceram também seis ex-alunos vestidos de branco,
falecidos no Orató rio. Segurando no alto outra esplêndida bandeira com
a inscriçã o Penitentia – “Penitência” – colocaram-se à frente da
multidã o, que deveria percorrer todo o caminho. Quando foi dado o
sinal para avançar, muitos sacerdotes agarraram a proa da carroça e
abriram caminho, seguidos pelos seis rapazes vestidos de branco e pelo
resto da multidã o. Os rapazes na carroça começaram a cantar Laudate
pueri Dominum – “Louvai ao Senhor, filhos” (Sl 112:1) – com uma
doçura indescritível.
Dom Bosco continuou avançando, encantado com a melodia
celestial, mas, num impulso, virou-se para saber se os meninos o
seguiam. Para seu profundo pesar, ele notou que muitos ficaram para
trá s no vale, enquanto muitos outros voltaram. Com o coraçã o partido,
ele quis refazer seus passos para persuadir aqueles meninos a segui-lo
e ajudá -los, mas estava absolutamente proibido de fazê-lo. “Esses
pobres meninos estarã o perdidos!” ele protestou.
“Pior para eles”, disseram-lhe. “Eles também receberam a ligaçã o,
mas se recusaram a segui-lo. Eles viram a estrada que tinham que
percorrer. Eles tiveram sua chance.” Dom Bosco insistiu, implorou e
implorou, mas em vã o. “Você também deve obedecer”, disseram-lhe. Ele
teve que seguir em frente.

Inocência perdida
Ele ainda estava sofrendo com essa dor quando tomou consciência
de outro fato triste: um grande nú mero dos que viajavam na carroça
havia caído gradualmente, de modo que apenas 150 ainda estavam sob
a bandeira da inocência. Seu coraçã o estava doendo com uma dor
insuportável. Ele esperava que fosse apenas um sonho e fez todos os
esforços para despertar, mas infelizmente era tudo muito real. Ele bateu
palmas e ouviu o som deles; ele gemeu e ouviu seus suspiros ressoarem
pela sala; ele queria banir essa visã o horrível, mas nã o conseguiu.
“Meus queridos meninos”, exclamou ele neste ponto de sua
narraçã o, “reconheci aqueles de vocês que ficaram para trá s no vale e
aqueles que voltaram ou caíram da carroça. Eu vi todos vocês. Você
pode ter certeza de que farei o meu melhor para salvá -lo. Muitos de vó s,
a quem exortei a confessar-se, nã o aceitaram o meu convite. Pelo amor
de Deus, salvem suas almas.”

A Oitava Colina
Muitos dos que caíram da carroça juntaram-se aos que
caminhavam. Enquanto isso, o canto na carroça continuava, e era tã o
doce que aos poucos foi diminuindo a dor de Dom Bosco. Sete colinas já
haviam sido escaladas. Quando os meninos chegaram ao oitavo,
encontraram-se numa aldeia maravilhosa, onde pararam para um breve
descanso. As casas eram indescritivelmente lindas e luxuosas.
Ao falar aos meninos desta aldeia, Dom Bosco observou: “Eu
poderia repetir o que Santa Teresa disse sobre as coisas celestiais: falar
delas é menosprezá-las. Eles sã o lindos demais para palavras. Direi
apenas que as ombreiras dessas casas pareciam ser feitas de ouro,
cristal e diamante ao mesmo tempo. Eram uma visã o maravilhosa,
satisfató ria e agradável. Os campos estavam pontilhados de á rvores
carregadas simultaneamente de flores, botõ es e frutos. Estava fora
deste mundo!
Os meninos se espalharam por todo lado, ansiosos para ver tudo e
provar a fruta. Aqui outra surpresa aguardava Dom Bosco. Seus
meninos de repente pareciam velhos: desdentados, enrugados, de
cabelos brancos, curvados, coxos, apoiados em bengalas. Ele ficou
atordoado, mas a voz disse: “Nã o se surpreenda. Já se passaram anos e
anos desde que você deixou aquele vale. A mú sica fez sua viagem
parecer tã o curta. Se você quer uma prova, olhe-se no espelho e verá
que estou dizendo a verdade.” Dom Bosco recebeu um espelho. Ele
pró prio envelheceu, com o rosto profundamente enrugado e os poucos
dentes restantes cariados.
A marcha recomeçou. De vez em quando os meninos pediam
permissã o para parar e olhar as novidades ao seu redor, mas ele
continuava incentivando-os. “Nã o temos fome nem sede”, disse ele.
“Nã o precisamos parar. Vamos continuar!
Ao longe, na décima colina, surgiu uma luz que se tornou cada vez
maior e mais brilhante, como se emanasse de uma porta gigantesca. O
canto foi retomado, tã o encantador que só pode ser apreciado no
Paraíso. Foi simplesmente indescritível, porque nã o veio de
instrumentos ou de gargantas humanas. Dom Bosco ficou tã o feliz que
acordou e se viu na cama.
Ele entã o explicou seu sonho assim: “ O vale é este mundo; o banco
simboliza os obstáculos que temos de superar para nos desligarmos dele;
a carroça é evidente. Os jovens a pé eram aqueles que perderam a
inocência, mas se arrependeram dos seus pecados.” Ele também
acrescentou que as dez colinas simbolizavam os Dez Mandamentos,
cuja observâ ncia leva à vida eterna. Concluiu dizendo que estava pronto
para contar confidencialmente a alguns meninos o que eles estavam
fazendo no sonho: se haviam permanecido no vale ou caído da carroça.
——————
PS Para interpretaçõ es deste sonho, leia também o Vol. VII, páginas 470ss.
22
DIABOS NA IGREJA
( Memórias Biográficas , Vol. VI, página 627)

D ON BOSCO ajudaram eficazmente os novos alunos a lançar as bases


para um ano escolar frutífero (1861-1862). No dia 28 de novembro,
como pe. Ruffino conta que Dom Bosco falou assim aos meninos:
Sonhamos quando dormimos. Portanto, enquanto dormia,
encontrei-me na igreja com todos os meninos. No início da missa,
muitos demô nios com mantos vermelhos e chifres começaram a
circular entre os meninos, tentando chamar a atençã o deles com
brinquedos, livros, guloseimas, cenas de casa e tudo o que cada menino
tinha um gosto particular. Cada rapaz tinha um diabinho ao seu lado
tentando distraí-lo da missa. Diabinhos estavam empoleirados nos
ombros de alguns meninos, acariciando-os e acariciando-os. Quando o
sino sinalizou a Elevaçã o, os meninos baixaram a cabeça e os demô nios
desapareceram. Porém, aqueles rapazes que tinham demô nios nos
ombros viraram as costas para o altar em vez de adorar. Apó s a
Elevaçã o, cada demô nio voltou ao seu trabalho.
Acredito, meus queridos meninos, que este sonho me mostrou
todas as distraçõ es a que sã o submetidos pelo diabo na Missa. O fato de
alguns demô nios nã o terem desaparecido na Elevaçã o significa que
aqueles meninos estavam em pecado mortal. O diabo nã o precisava
mais distraí-los; eles já sã o dele. Ele apenas continua acariciando-os.
Aqueles meninos nã o conseguem mais orar.
Cerca de um mês depois – no ú ltimo dia do ano – Dom Bosco
entregou aos meninos a estreia anual do novo ano de 1862. Pe. A
crô nica de Bonetti registra o discurso de “Boa Noite” da seguinte forma:
Decidi vir vê-lo e falar com você esta noite porque sabia que, caso
contrá rio, teria que esperar até o pró ximo ano. (Risada). O ano de 1861
já passou. Aqueles que o gastaram bem se alegrarã o; outros podem
sentir tristeza e se arrepender, mas nunca mais terã o este ano de volta.
Fugit irreparabile tempus – “O tempo voa irreparavelmente.” Na ú ltima
noite de cada ano, costumo dar algumas sugestõ es aos meus filhos para
o ano novo. Aqui está o que recomendo para o ano de 1862,
Faça o má ximo para ouvir a Missa com devoçã o; exortar outros a
fazerem o mesmo. Este ano, quero muito seriamente que você leve a
sério esta minha sugestã o, porque estou falando sério. Grandes
desastres pairam sobre nó s. A Santa Missa é o grande meio para
apaziguar a Deus e evitar Seu castigo. Cumpramos, portanto, o salutar
conselho do Sagrado Concílio de Trento: “ Mantenhamo-nos sempre em
estado de graça para estarmos prontos para receber a Sagrada
Comunhão ao assistirmos à Missa, e assim participarmos mais
plenamente deste augusto Sacrifício . ” (Vol. VI, página 631).
23
A SERPENTE E O ROSÁRIO
( Memórias Biográficas , Vol. VII, páginas 143-145)

DEVEMOS agora basear-nos nas notas de Francis Provera: “A vida


de um homem na terra é uma guerra”. (Jó 7:1).
Nestes dias, Dom Bosco recebeu mais uma prova dos ataques
incessantes e devastadores do demô nio contra as almas e da
necessidade de repeli-lo constantemente e libertar as suas vítimas. Em
meados de agosto, cerca de 100 alunos retornaram ao Orató rio para as
aulas de verã o. No discurso de “Boa Noite” de 20 de agosto de 1862,
Dom Bosco, depois de fazer algumas advertências disciplinares, dirigiu-
lhes assim:
Quero contar-lhes um sonho que tive há algumas noites, muito
provavelmente na véspera da Assunçã o. Sonhei que estava na casa do
meu irmã o, em Castelnuovo d'Asti, com todos os meus filhos. Enquanto
eles brincavam, um estranho veio até mim e me pediu para ir com ele.
Ele me levou até uma campina ao lado do parquinho e apontou para
uma cobra enorme e feia, com mais de seis metros de comprimento,
enrolada na grama. Assustado, tive vontade de fugir, mas o estranho me
impediu. “Aproxime-se e dê uma boa olhada”, disse ele.
"O que?" Eu suspirei. “Você nã o percebe que o monstro poderia
saltar sobre mim e me devorar num piscar de olhos?” “Nã o tenha medo!
Nada disso acontecerá ; apenas venha comigo.
“Nada fazendo! Eu nã o sou louco!"
“Entã o fique onde está”, respondeu o estranho. E ele foi buscar uma
corda.
“Pegue esta ponta”, disse ele ao retornar, “e segure-a firmemente
com as duas mã os. Eu seguro a outra ponta e a deixamos pendurada
sobre a cobra.”
"E entã o?"
“Entã o vamos quebrá -lo nas costas.”
"Você deve estar louco; a cobra saltará e nos despedaçará”.
“Nã o, nã o vai. Deixe isso comigo.
"Nã o conte comigo! Nã o tenho intençã o de arriscar minha vida por
uma emoçã o desse tipo!”
Novamente tentei fugir, mas o estranho mais uma vez me garantiu
que eu nã o tinha nada a temer, porque a cobra nã o me faria mal. Ele
falou de forma tã o persuasiva que eu continuei e concordei com seu
plano. Ele deu a volta para o outro lado do monstro. Esticamos a corda e
a passamos nas costas da cobra. O monstro imediatamente se levantou
e atacou a corda, mas, ao fazê-lo, ficou preso como se fosse um laço.
"Aguentar!" o estranho gritou. “Nã o solte!” Ele correu até uma
pereira pró xima e amarrou nela a ponta da corda. Entã o ele veio até
mim e amarrou minha ponta na grade de ferro de uma janela da casa. A
cobra continuou lutando furiosamente para se libertar, contorcendo-se,
debatendo-se e debatendo-se. Em sua fú ria, ele se despedaçou,
espalhando sua carne pela á rea, até que foi reduzido a um mero
esqueleto.
O estranho entã o desamarrou a corda e enrolou-a: “Agora observe
com muito cuidado!” ele disse enquanto colocava em uma caixa e
fechava. A essa altura, os meninos já haviam me cercado. Em poucos
momentos ele abriu a caixa. Olhamos para dentro e ficamos surpresos
ao ver a corda moldada com as palavras Ave Maria – “Ave Maria”.
"Como isso aconteceu?" Perguntei.
“A cobra”, respondeu o homem, “é um símbolo do diabo, enquanto
a corda representa a Ave Maria, ou melhor, o Rosá rio, uma sucessã o de
Ave-Marias com as quais podemos atacar, conquistar e destruir todos
os demô nios do Inferno. ”
O que se seguiu é ainda mais estranho e surpreendente, mas agora
é tarde demais para contar. Vou deixar para amanhã . Enquanto isso,
pensemos no que o estranho disse sobre a Ave Maria e o Rosá rio.
Rezemos com devoçã o uma Ave-Maria sempre que formos tentados e
teremos a certeza de vencer. Boa noite.
parte II
(pá gina 416)
Lemos na crô nica do Ir. Francisco Provera: No dia 21 de agosto de
1862, depois das oraçõ es noturnas, estávamos todos ansiosos por ouvir
a segunda parte do sonho que Dom Bosco havia descrito como estranho
e interessante, mas ficamos decepcionados. “Ontem à noite – disse Dom
Bosco – afirmei que lhes contaria a segunda parte do sonho, mas
infelizmente nã o creio que seja oportuno cumprir a minha promessa. . .”
No dia seguinte, 22 de agosto, nó s novamente o importunamos
para que nos contasse, pelo menos em particular, a parte do sonho que
ele nã o havia revelado. Ele nã o queria mudar de ideia, mas depois de
muita insistência de nossa parte, finalmente cedeu e prometeu que nos
contaria mais naquela noite. No discurso de “Boa Noite”, ele falou o
seguinte:
Cedendo à s suas repetidas sú plicas, contarei a segunda parte do
sonho, ou pelo menos o pouco que puder. Primeiro, devo deixar claro
que ninguém deverá escrever ou falar sobre isso fora desta casa.
Discutam entre vocês, riam, façam o que quiserem, mas apenas entre
vocês.
Agora, enquanto conversava com aquele estranho sobre a corda, a
cobra e o que elas simbolizavam, me virei e vi meninos pegando
pedaços de carne de cobra e comendo-os. "O que você está fazendo?"
Eu gritei. "Você está louco? Essa carne é venenosa.”
“É delicioso!” Eles responderam.
E, no entanto, assim que o engolissem, caíam no chã o e seus corpos
inchavam e endureciam como pedra. Fiquei desamparado porque,
apesar disso, cada vez mais rapazes continuavam a comer aquela carne.
Gritei e berrei com eles, e até dei tapas e socos neles, para impedi-los de
comer, mas em vã o. Para cada um que caiu no chã o, outro tomou o seu
lugar. Entã o chamei os clérigos e disse-lhes que fossem até os meninos
e fizessem tudo o que pudessem para que parassem de comer aquela
carne. Meu pedido foi ineficaz; pior ainda, alguns clérigos começaram a
comê-lo e também caíram no chã o.
Quase enlouquecido ao ver tantos garotos deitados ao meu redor
em um estado tã o lamentável, virei-me para o estranho. "O que isto
significa?" Perguntei. “Esses meninos sabem que esta carne vai matá -
los, mas eles a comem. Por que?"
“Porque 'o homem sensual nã o percebe as coisas que sã o de Deus!'
É por isso!" Ele respondeu.
“Mas nã o há alguma maneira de salvar esses meninos?”
"Sim existe."
"O que?"
“Bigorna e martelo.”
“Bigorna e martelo? Pelo que?"
“Para colocar os meninos de volta em forma.”
“Você quer dizer que devo colocá -los em uma bigorna e bater neles
com o martelo?”
“Olha”, disse o estranho, “essa coisa toda é um símbolo. O martelo
simboliza a Confissã o e a bigorna simboliza a Sagrada Comunhã o. Esses
sã o os remédios que você deve usar.”
Fui trabalhar e achei o tratamento muito eficaz, mas nã o para
todos. Embora a maioria dos rapazes tenha recuperado a vida e se
recuperado, alguns nã o o fizeram, porque as suas Confissõ es eram má s.
Entre as observaçõ es do historiador (pá ginas 147-148) lemos: “A
carne venenosa daquela cobra monstruosa pode muito bem simbolizar
o escâ ndalo que destró i a fé, ou leituras imorais e irreligiosas. Da
mesma forma, o que mais a desobediência, o colapso, o inchaço e o
endurecimento poderiam significar senão orgulho, obstinação e amor ao
pecado? ”As oraçõ es e os sacrifícios dos justos devem primeiro pedir
que a graça de Deus aqueça e amoleça os coraçõ es endurecidos, para
que os Sacramentos da Penitência e da Sagrada Eucaristia exerçam a
sua eficá cia divina. . . Assim, os golpes do martelo e o apoio da bigorna
trarã o a cura de um coraçã o cheio de ú lceras, mas agora dó cil. À medida
que as faíscas voam, o coraçã o é recondicionado.
24
AS QUATORZE MESAS
( Memórias Biográficas , Vol. VII, página 410f )

NO DIA 5 DE AGOSTO DE 1860, Dom Rua cantou sua primeira Missa


solene, assistido por Dom Bosco. Durante todo o dia, enquanto lhe
gritavam “Vivas”, ele tentava desviar os aplausos para Dom Bosco. A
celebraçã o do dia foi uma demonstraçã o maravilhosa de verdadeiro
amor fraternal. Ningué m que nã o esteve presente pode imaginar a
intensa alegria de todos.
Dom Bosco encerrou a celebraçã o contando o seguinte sonho no
discurso de “Boa Noite”:
Vi meus meninos em um lindo jardim, sentados em quatorze
mesas compridas dispostas em forma de anfiteatro em três níveis
diferentes, semelhantes a terraços. As mesas mais altas eram tã o altas
que mal podiam ser vistas.
Bem no fundo, um certo nú mero de meninos estava sentado a uma
mesa vazia, exceto por pedaços de pã o rançoso e mofado misturados
com lixo e cascas. Esses pobres meninos pareciam porcos no cocho. Eu
queria dizer-lhes para jogarem fora aquele lixo, mas em vez disso
perguntei-lhes por que lhes serviam um lixo tã o repugnante. Eles
responderam: “Temos que comer o pã o que provemos para nó s
mesmos. É tudo o que temos.”
Esta mesa simbolizava o estado de pecado mortal. Como afirma a
Sagrada Escritura: “Eles odiaram o conhecimento e nã o escolheram o
temor do Senhor; eles ignoraram Meu conselho, rejeitaram toda Minha
reprovaçã o. . . Agora comem do fruto à sua maneira e à sua vontade se
fartam.” ( Pv 1:29-31).
Quanto à s mesas postas nos níveis mais altos, os meninos sentados
nelas pareciam mais felizes e comiam pã o melhor. Eles eram muito
bonitos, com uma beleza e um brilho cada vez maiores. Suas mesas
também eram ricamente postas com lençó is especiais, candelabros
brilhantes, louças cintilantes e flores indescritivelmente lindas. As
travessas continham comidas deliciosas e iguarias raras. O nú mero
desses meninos era muito grande. Essas mesas simbolizavam o estado
dos pecadores arrependidos.
Por ú ltimo, a mesa de cima tinha uma espécie de pã o que nã o
consigo descrever. Parecia dourado e vermelho, assim como as roupas e
os rostos dos meninos, que brilhavam com uma luz brilhante. Todos
esses meninos pareciam radiantemente felizes; cada um procurou
compartilhar sua alegria com os outros. A beleza deles, o brilho e o
esplendor de suas mesas superavam em muito todos os outros. Estas
mesas simbolizavam o estado daqueles que mantiveram a sua inocência
batismal. Como diz a Sagrada Escritura sobre o inocente e o pecador
arrependido: “Aquele que me obedece habita em segurança, em paz,
sem medo do mal”. ( Pv 1:33).
O aspecto mais surpreendente deste sonho é que eu conhecia cada
um dos rapazes, de modo que, ao ver um deles agora, tenho
imediatamente a impressã o de vê-lo sentado numa daquelas mesas.
Ao ficar fascinado por aquela visã o excepcional, notei um homem a
alguma distâ ncia. Corri até ele para fazer perguntas, mas tropecei no
caminho e acordei na cama. Você me pediu para lhe contar um sonho e
eu obedeci. Nã o dê a isso mais importâ ncia do que os sonhos merecem.
No dia seguinte, Dom Bosco disse a cada menino em particular em
que mesa ele estava sentado no sonho. Para mostrar-lhes quã o alto ou
baixo eles estavam, ele os classificou da mesa mais alta para a mais
baixa. Questionado sobre se era possível passar de uma mesa inferior
para uma superior, respondeu afirmativamente, exceto a mesa mais
alta. . O nú mero deles era pequeno, enquanto muitos meninos
sentavam-se nas outras mesas. (Cf. pá gina 411.)
25
UMA PEQUENA MARMOTA
( Memórias Biográficas , Vol. VI, página 160)

D ON BOSCO costumava dar uma “breve palestra à comunidade” apó s


as oraçõ es noturnas, concluindo sempre com a saudaçã o de “Boa
Noite”. Esta tradiçã o continua nas escolas salesianas, e a palestra se
chama “Boa Noite”.
Eis o resumo de uma das muitas “Boas Noites” registradas nos
volumes das Memórias Biográficas:
Uma das primeiras “Boas Noites” que ouvi de Dom Bosco em 1859
foi sobre a recepçã o frequente dos Sacramentos – uma prá tica ainda
nã o assumida geralmente pelos meninos depois das recentes férias de
verã o. Ele narrou um sonho em que parecia estar perto da entrada
principal do Orató rio enquanto os meninos voltavam de casa. Ao
passarem por ele, ele pô de ver o estado de suas almas diante de Deus.
Um estranho também entrou com eles, segurando uma pequena caixa.
Esse estranho se misturou aos meninos e, quando chegou a hora das
Confissõ es, abriu a caixa e, tirando uma pequena marmota, começou a
fazer uma espécie de espetá culo de marionetes. Em vez de irem à igreja,
os meninos aglomeraram-se em volta dele para se divertir, enquanto ele
lentamente se retirava para um canto do parquinho mais distante da
igreja.
Depois, sem nomear ninguém, Dom Bosco passou a descrever a
condiçã o espiritual de muitos meninos. Ele também falou dos esforços e
armadilhas do diabo para distraí-los e desencorajá -los da Confissã o.
Sua descriçã o dos truques da pequena marmota provocou muitas
risadas, mas também fez os meninos refletirem seriamente sobre sua
condiçã o espiritual – ainda mais quando mais tarde ele contou a
investigadores particulares coisas que eles achavam que ninguém
jamais poderia saber.
Este sonho foi fundamental para induzir a maioria dos rapazes a
confessar-se com muito mais frequência – geralmente, uma vez por
semana; naturalmente, a recepçã o da Sagrada Comunhã o também se
tornou muito frequente.
Lembro-me também que certa vez, enquanto Dom Bosco falava da
saú de corporal e da importante necessidade de cuidar dela, o clérigo
Joseph Bongiovanni pediu permissã o para falar. Ao receber licença, ele
disse: “O que devemos fazer, entã o, para gozar de boa saú de e viver uma
vida longa?”
Dom Bosco respondeu: “Vou lhe dar um segredo, ou melhor, uma
receita. Ao mesmo tempo que serve como resposta ao clérigo
Bongiovanni, também beneficiará enormemente a todos vocês. Para
gozar de boa saúde e viver uma vida longa são necessárias quatro coisas:
1. Uma consciência tranquila quando se deita à noite; isto é, sem medo da
eternidade. 2. Moderação na alimentação. 3. Uma vida ativa. 4. Bons
companheiros, ou seja, fugindo dos corruptos .” Ele entã o explicou
brevemente esses quatro pontos.
Como podemos ver, as “Boas Noites” de Dom Bosco governaram
sabiamente o Orató rio. Podem-se ler nesse mesmo capítulo (22) alguns
exemplos da bondosa firmeza de Dom Bosco.
26
UM CÃO FEROZ
( Memórias Biográficas , Vol. VII, página 391)

F R. RUFFINO narra na crô nica de abril de 1864: Nessa é poca havia no


Orató rio um menino chamado P_____ que nada tinha a ver com
Sacramentos ou oraçõ es. Ele estava lá à força. Um dia Dom Bosco
chamou-o à parte.
“Por que sempre há um cachorro feroz rosnando e mordendo
você? ele perguntou a ele.
“Nã o vejo nenhum cachorro.”
"Eu faço! Diga-me, como está sua consciência? O menino baixou a
cabeça.
“Anime-se”, prosseguiu Dom Bosco. “Venha comigo e tudo ficará
bem.”
O jovem tornou-se amigo de Dom Bosco e agora está determinado
a fazer o bem.
No encerramento do retiro espiritual, na noite de 13 de abril, Dom
Bosco expressou o seu pesar por alguns jovens nã o o terem utilizado
para o bem das suas almas. “Durante esses poucos dias”, disse ele, “vi
todos os pecados de cada um de vocês claramente, como se estivessem
escritos na minha frente. Só houve alguma confusã o quando alguns, ao
fazerem a sua Confissã o Geral, tentaram contar-me os seus pecados em
vez de responder à s minhas perguntas. Esta foi uma graça singular que
o Senhor me concedeu nestes poucos dias para o seu pró prio bem.
Agora, muito provavelmente, os poucos que nã o seguiram o meu
conselho perguntar-me-ã o se ainda consigo ler a sua consciência, e a
resposta, infelizmente, é nã o. Eles perderam a chance!
27
UM MASTIFE GIGANTE
( Memórias Biográficas , Vol. VII, página 125)

N JULHO DE 1862, Dom Bosco falou sobre as confissõ es sacrílegas de


meninos que ocultavam deliberadamente os pecados mortais. Ele
esclareceu seu ponto com o seguinte incidente pessoal:
Uma noite sonhei com um menino. Seu coraçã o estava sendo
comido por vermes enquanto ele tentava arrancá -los. Nã o prestei
atençã o ao sonho; mas na noite seguinte vi novamente esse menino.
Agora um mastim gigante montava nele, roendo seu coraçã o. Eu tinha
certeza de que o Senhor tinha alguma graça especial reservada para
esse menino, cuja consciência devia estar muito confusa. Fiquei de olho
nele. Um dia eu o encurralei.
"Você me faria um favor?" Perguntei.
“Claro, se eu puder.”
“Você pode, se quiser.”
"O que é?"
"Você realmente fará isso?"
"Sim, eu vou."
“Diga-me, você já guardou alguma coisa na Confissã o?”
Ele ia negar, mas imediatamente acrescentei: “Por que você nã o
confessa isso e aquilo?” Ele olhou para mim e começou a chorar. “É
verdade”, disse ele, “faz anos que nã o queria confessar isso, mas estou
com muito medo”. Eu o consolei e lhe contei como ele poderia fazer as
pazes com Deus.
28
CONSCIÊNCIAS REVELADAS
( Memórias Biográficas , Vol. VI, página 478)

POR TRÊ S noites consecutivas, estive na zona rural de Rivalta com


Pe. Joseph Cafasso, Silvio Pellico 1 e Conde Charles Cays. 2 Na primeira
noite discutimos temas religiosos atuais; na segunda noite debatemos
e resolvemos casos morais relevantes para a direçã o espiritual dos
jovens. Depois de ter o mesmo sonho duas vezes, decidi que contaria a
você sobre ele, se me ocorresse novamente. Com certeza, na noite de
30 de dezembro, me encontrei mais uma vez com as mesmas pessoas
no mesmo lugar. Deixando de lado outros assuntos, lembrei-me que na
noite seguinte, a ú ltima do ano, teria de vos entregar a habitual estreia
do Ano Novo. Portanto, recorri ao Pe. Cafasso e disse: “Padre, já que o
senhor é um amigo tã o querido, por favor, dê -me a estreia para os meus
meninos”.
“Com uma condiçã o”, respondeu ele: “Primeiro você deve dizer-
lhes para colocarem suas contas em ordem.”
Estávamos em uma sala grande com uma mesa no centro. Pe.
Cafasso, Silvio Pellico e Conde Cays sentaram-se à mesa. Como me havia
sido solicitado pelo Pe. Cafasso, saí para buscar meus meninos. Eles
estavam todos ocupados somando nú meros em um tablet. Quando os
chamei um por um, eles apresentaram seus trabalhos aos senhores
acima mencionados, que verificaram as somas e as aprovaram ou
rejeitaram. Muitos meninos foram rejeitados, tristes e preocupados.
Aqueles cujos totais foram considerados corretos ficaram muito felizes
e correram para jogar. Como a fila de rapazes era longa, o exame
demorou algum tempo, mas acabou por terminar, ou assim me pareceu,
até que reparei que alguns rapazes ainda estavam lá fora e nã o
entravam.
“Por que eles nã o entram?” Perguntei ao Pe. Cafasso.
“Seus comprimidos sã o espaços em branco perfeitos”, respondeu
ele. “Eles nã o têm totais para nos mostrar. Esta é uma questã o de
resumir tudo o que se fez. Deixe-os somar tudo o que fizeram e
verificaremos os totais.”
Depois de todas as contas terem sido verificadas, saí com os três
senhores. Todos os meninos cujos totais foram considerados corretos
estavam correndo e se divertindo, o mais felizes possível. Você nã o
pode imaginar como aquela visã o me alegrou. Alguns meninos, porém,
apenas ficavam afastados, observando melancolicamente os jogos.
Alguns estavam com os olhos vendados; outros tinham uma névoa em
volta dos olhos ou uma nuvem escura em volta da cabeça. A fumaça saía
da cabeça de alguns, outros tinham a cabeça cheia de barro, ou vazia
das coisas de Deus. Reconheci cada menino. A imagem em minha mente
está tã o clara agora que posso nomear cada uma delas. Logo percebi
também que muitos meninos estavam desaparecidos. “Onde estã o
aqueles meninos que tinham mesas vazias?” Eu me perguntei. Procurei
por eles, mas em vã o. Finalmente, avistei alguns meninos num canto
distante do parquinho. Que visã o miserável eles eram!
Um rapaz estava estendido no chã o com a palidez da morte; outros
estavam sentados num banco baixo e imundo; outros ainda
descansavam em colchõ es de palha sujos ou no chã o duro e nu. Esses
eram os meninos cujos totais nã o haviam sido aprovados. Eles tinham
vá rias doenças: suas línguas, ouvidos e olhos estavam repletos de
vermes que os comiam. Um menino tinha a língua podre; a boca de
outro estava cheia de lama; o há lito de um terço estava fétido de
pestilência. Outras doenças afetaram o resto. O coraçã o de um menino
estava destroçado; o de outro estava apodrecido; outros tinham todos
os tipos de feridas. O coraçã o de um rapaz parecia estar todo
mastigado. Toda a cena era um verdadeiro hospital.
A visã o me chocou e eu nã o pude acreditar no que via. "Como isso
pode ser?" Fiquei me perguntando. Aproximei-me de um menino e
perguntei.
"Você é realmente fulano de tal?"
“Sim”, ele respondeu, “sou eu”.
"O que aconteceu com você?"
“É culpa minha, farinha da minha pró pria mã o. Colhi o que
plantei!”
Questionei outro garoto e obtive a mesma resposta. Fiquei
terrivelmente magoado, mas logo seria consolado pelo que estou
prestes a lhe contar.
Enquanto isso, com pena desses meninos, voltei-me para o padre.
Cafasso e implorou por um remédio. “Você sabe o que deve ser feito tã o
bem quanto eu”, respondeu ele. “Descubra você mesmo.”
“Pelo menos me dê uma estreia para os saudáveis”, insisti com
humildade, mas com confiança.
Acenando para que eu o seguisse, ele voltou para a mansã o e abriu
uma porta que dava para um salã o espetacular, ricamente decorado,
brilhando com ouro e prata. Lustres deslumbrantes de mil luzes
inundavam-no com um brilho ofuscante. Até onde a vista alcançava,
estendia-se infinitamente em comprimento e largura. No centro havia
uma mesa gigante repleta de todos os tipos de doces, biscoitos
agridoces enormes e biscoitos. Qualquer iguaria por si só teria
satisfeito uma pessoa. Ao ver isso, impulsivamente fiz vontade de
correr e chamar meus meninos para aproveitar essa bonança, mas Pe.
Cafasso me deteve. "Espere!" ele disse. “Nem todos podem gostar
desses doces, mas apenas aqueles cujos totais foram aprovados.”
Mesmo assim, o salã o encheu-se rapidamente de rapazes. Comecei
a me separar e a distribuir os biscoitos e bolachas, mas novamente o Pe.
Cafasso objetou. “Nem todo mundo aqui pode ter isso”, disse ele. “Nem
todos os merecem.” E ele me apontou alguns meninos: aqueles cujos
totais foram aprovados, mas que tinham névoa nos olhos ou barro no
coraçã o, ou cujos coraçõ es estavam vazios das coisas de Deus. Estes
também foram excluídos, assim como aqueles com feridas que nã o
foram autorizados a entrar no salã o.
Imediatamente implorei ao Pe. Cafasso que me deixe dar alguns
doces também. “Eles também sã o meus queridos filhos”, eu disse. “E
além disso, há bastante.”
“Nã o”, ele repetiu com firmeza. “Só os saudáveis podem saborear
esses doces. Os outros nã o têm gosto por essas iguarias. Eles só
ficariam doentes.”
Nã o disse mais nada e comecei a servir aqueles que me foram
indicados. Quando terminei, dei outra ajuda generosa a todos eles. Devo
dizer que gostei muito de ver os meninos comendo com tanto gosto. A
alegria brilhou em seus rostos e os transfigurou de tal forma que nã o
pareciam mais os mesmos meninos.
Os rapazes no salã o, que nã o tinham permissã o para comer doces,
ficaram em um canto. Tive tanta pena deles que novamente implorei ao
Pe. Cafasso que me deixe dar-lhes também.
“Nã o”, ele respondeu. "Ainda nã o. Faça-os ficar bem primeiro.
Continuei olhando para eles, assim como para muitos outros lá fora. Eu
conhecia todos eles. Notei também que, para piorar a situaçã o, alguns
tinham o coraçã o comido pelas traças. Dirigindo-se ao Pe. Cafasso, eu
disse: “Você poderia me dizer que remédio dar a eles?” Novamente ele
respondeu: “Descubra você mesmo. Você sabe o que fazer!"
Novamente pedi a ele uma estrena para dar a todos os meninos.
“Muito bem”, ele respondeu. "Eu vou te dar um." Virando-se como se
fosse sair, exclamou três vezes, cada vez em voz mais alta: “Cuidado!
Atençã o! Atençã o!" Com estas palavras ele e seus companheiros
desapareceram. Acordei e me vi sentado na cama. Meus ombros
estavam frios como gelo.
Esse é o meu sonho. Faça disso o que você gosta. É apenas um
sonho, mas se alguma coisa nele faz bem à s nossas almas, vamos aceitá -
lo. No entanto, eu nã o gostaria que você falasse sobre isso com pessoas
de fora. Eu contei isso a vocês porque vocês sã o meus filhos. Eu
positivamente nã o quero que você conte isso aos outros.
Enquanto isso, garanto-vos, tenho todos vocês presentes em minha
mente como os vi no sonho, e posso dizer quem estava doente e quem
nã o estava, quem comia aqueles doces e quem nã o estava. Nã o vou
revelar aqui a condiçã o de cada menino, mas farei isso em particular.
Agora aqui fica a estreia do Ano Novo: “ Confissão frequente e
sincera, Comunhão frequente e devota ”.
——————
1. Silvio Pellico (1789-1854), um patriota piemontês, passou a maior parte da sua vida adulta em
Milão, onde se juntou aos “Carbonari”, uma sociedade secreta que trabalhava pela independência
da Itália. Preso pelos austríacos, que então governavam a Lombardia, foi condenado a vinte anos
de trabalhos forçados. Perdoado em 1830, ele retornou a Turim. Até a prisão, Pellico era um
cató lico morno, mas, nas dificuldades da vida na prisão, resolveu amar a Deus e a seus
semelhantes. Em 1832 escreveu a histó ria de sua vida na prisão, Le Mie Prigioni , que se tornou o
livro mais famoso da literatura do “Risorgimento”. Nessa época ele trabalhava como secretário da
marquesa Barolo em Torino.
2. Nascido em Turim em 24 de novembro de 1813, o Conde Cays frequentou a escola secundária
jesuíta local e mais tarde obteve o doutorado em direito na Universidade de Turim. Casou-se e teve
dois filhos, mas ficou viúvo aos 32 anos. De 1857 a 1860 foi deputado no Parlamento piemontês e
defendeu corajosamente os direitos da Igreja contra os anticlericais. Em 1877 tornou-se salesiano;
ordenado sacerdote um ano depois, continuou a prestar uma ajuda inestimável a Dom Bosco.
Morreu no Orató rio no dia 4 de outubro de 1882, aos 69 anos, como ele mesmo havia previsto.
PS Uma nota do historiador:
Neste sonho, Pe. Cafasso parece julgar questõ es relativas à religião e à moralidade; Silvio
Pellico (acadêmico, escritor e político) em questõ es relativas às funçõ es escolares e
profissionais; Conde Cays (um nobre culto e santo que se tornou salesiano aos 60 anos) sobre
assuntos relativos à disciplina.
Os biscoitos doces parecem significar o alimento daqueles que apenas começaram a servir
ao Senhor; amaretti (biscoitos amargos) são para quem avançou no caminho da perfeição.
29
UM PACOTE DE MONSTROS
( Memórias Biográficas , Vol. VIII, página 32)

N O DIA 24 DE FEVEREIRO DE 1865, depois de ter contado à


comunidade o motivo de sua ausê ncia por alguns dias em Cuneo, onde
havia permanecido com o bispo, ele narra o seguinte sonho:
Na primeira noite fui para a cama por volta das onze e adormeci
imediatamente. Como sempre, comecei a sonhar, e como a língua
sempre se transforma em dente dolorido, como diz o ditado, sonhei que
estava no Orató rio com meus queridos meninos. Eu parecia estar
sentado em minha mesa enquanto você se divertia muito brincando,
gritando e correndo. Fiquei muito satisfeito com todo aquele barulho,
pois sei que quando você está brincando o diabo nã o tem chance de te
fazer mal, por mais que tente. Eu estava regozijando-me com esse
rebuliço, quando de repente todo o barulho cessou e um silêncio mortal
caiu sobre o playground. Alarmado, levantei-me para descobrir o que
havia acontecido.
Quando entrei na sala de espera, um monstro horrível irrompeu
pela porta externa. Aparentemente inconsciente da minha presença,
com a cabeça e os olhos baixos no chã o, o monstro avançou para a
frente como uma fera prestes a atacar sua vítima. Tremendo pela sua
segurança, olhei pela janela para ver se alguma coisa havia acontecido
com você. Todo o playground estava cheio de monstros como o da
minha sala de espera, embora menores. Vocês, meus rapazes, foram
forçados a recuar contra as paredes e os pó rticos, mas muitos de vocês
estavam caídos no chã o, aparentemente mortos. Essa visã o lamentável
me assustou tanto que acordei gritando. Acordei todo mundo também,
desde o bispo até o ú ltimo servo.
Meus queridos meninos, de modo geral nã o devemos prestar
atençã o aos sonhos, mas quando eles nos ensinam uma liçã o de moral,
podemos pensar neles. Sempre procurei saber por que certas coisas
acontecem, e farei o mesmo em relaçã o a esse sonho. Esse monstro
pode muito bem ser o diabo, que está sempre tentando nos arruinar.
Alguns meninos foram vítimas dele, enquanto outros saíram ilesos.
Devo mostrar-lhe como nã o temê-lo e enfrentá -lo com sucesso?
Ouça: há duas coisas que o diabo tem medo mortal: comunhões
fervorosas e visitas frequentes ao Santíssimo Sacramento.
Você quer que Nosso Senhor lhe conceda muitas graças?
Visite-O frequentemente.
Você quer que Ele lhe conceda apenas alguns?
Visite-O, mas raramente.
Você quer que o diabo ataque você?
Raramente visite o Santíssimo Sacramento.
Você quer que o diabo fuja de você?
Visite Jesus frequentemente.
Você quer vencer o diabo?
Refugie-se aos pés de Jesus.
Você quer ser vencido pelo diabo?
Desista de visitar Jesus.
Visitar o Santíssimo Sacramento é essencial, meus queridos
meninos, se quiserem vencer o demô nio. Portanto, faça visitas
frequentes a Jesus. Se você fizer isso, o diabo nunca prevalecerá contra
você.
30
O CAVALO VERMELHO
( Memórias Biográficas , Vol. VII, pp. 128-131)

J ULHO DE 1862 foi marcado por novos acontecimentos


surpreendentes centrados em Dom Bosco. A crô nica de Ruffino traz
este registro: “1º de julho de 1862. Hoje, depois do jantar, Dom Bosco
disse a alguns ao seu redor: 'Teremos um funeral este mê s'. Ele repetiu
isso mais tarde, mas sempre para apenas alguns.”
Estas revelaçõ es confidenciais despertaram vivamente a
curiosidade dos clérigos e, assim, durante o recreio, a menos que
fossem designados para outro lugar, eles agrupavam-se em torno de
Dom Bosco, na esperança de recolher outras informaçõ es
surpreendentes. Um dos factos que aprenderam desta forma foi um
plano para abrir também escolas para raparigas. Tanto John Bonetti
quanto César Chiala registraram isso por escrito.
No dia 6 de julho, Dom Bosco narrou um sonho que teve na noite
anterior. Seu pú blico era composto pelo Pe. Joã o Batista Francesia, Pe.
 ngelo Sávio, Pe. Michael Rua, Francis Cerruti, Bartolomeu Fusero, John
Bonetti, Chevalier Frederick Oreglia, John Baptist Anfossi, Celestine
Durando, Francis Provera e alguns outros. Ele falou o seguinte:
Ontem à noite tive um sonho estranho. Com a marquesa Barolo, 1
Parecia que eu estava passeando por uma pequena praça que se abria
para uma vasta planície onde os meninos do Orató rio brincavam
alegremente. Enquanto eu respeitosamente tentava me mover para a
esquerda dela, ela me interrompeu, dizendo: “Nã o, fique onde está”. Ela
entã o começou a falar sobre meus meninos. “É maravilhoso que você
cuide dos meninos”, disse ela. “Deixe-me cuidar das meninas. Deixe
isso comigo, para que nã o haja desentendimentos.”
“Bem”, respondi, “Nosso Senhor nã o veio a este mundo para
redimir meninos e meninas?”
“Claro”, ela respondeu.
“Entã o devo cuidar para que Seu Sangue nã o seja derramado
inutilmente por nenhum dos grupos.”
Enquanto conversávamos, um silêncio estranho de repente caiu
sobre os meninos. Eles pararam de brincar e, parecendo muito
assustados, fugiram desordenadamente. A marquesa e eu ficamos
parados por um momento e depois corremos para saber o que havia
causado o susto. De repente, no outro extremo da planície, vi um
enorme cavalo pousado no chã o. O animal era tã o grande que meu
sangue gelou.
“O cavalo era tã o grande quanto esta sala?” Pe. — perguntou
Francesia.
“Ah, muito maior! Era realmente uma coisa monstruosa – trê s ou
quatro vezes maior que o Palazzo Madama. 2 A marquesa Barolo
desmaiou ao ver isso. Eu mesmo estava tã o abalado que mal conseguia
ficar de pé . Com medo, abriguei-me atrá s de uma casa pró xima, mas os
proprietá rios me expulsaram. "Vá embora!" eles gritaram. "Vá
embora!" Enquanto isso, fiquei pensando: “O que será esse cavalo?
Devo parar de correr e tentar observá -lo de perto.” Ainda tremendo de
medo, me recompus e, refazendo meus passos, caminhei em direçã o à
fera. Que horror ver aquelas orelhas e aquele focinho horrível! À s vezes
parecia carregar um monte de cavaleiros; outras vezes parecia ter asas.
“Deve ser um demô nio!” exclamei.
Outros estavam comigo. “Que tipo de monstro é esse?” Eu
perguntei a um deles.
“ O cavalo vermelho do Apocalipse ”, respondeu ele.
Nesse momento acordei suando frio e me vi na cama. Durante toda
a manhã , enquanto eu rezava a missa ou ouvia Confissõ es, aquela fera
continuava a me assombrar. Agora eu gostaria que alguém verificasse
se um cavalo vermelho é realmente mencionado nas Escrituras e
descobrisse o que ele representa.
Celestine Durando foi escolhida para fazer a pesquisa. Pe. M. Rua,
poré m, observou que um cavalo vermelho - símbolo de perseguiçã o
sangrenta contra a Igreja, segundo Martini, 3 é de fato mencionado no
Apocalipse, capítulo 6, versículo 3-4: “E quando ele abriu o selo
sagrado, ouvi o segundo ser vivente dizer: 'Vem.' E saiu outro cavalo, um
cavalo vermelho; e ao que estava sentado sobre ele foi dado que tirasse a
paz da terra, e que os homens se matassem uns aos outros, e foi-lhe dada
uma grande espada .”
Talvez no sonho de Dom Bosco o cavalo vermelho simbolizasse a
democracia contemporâ nea (europeia) sem Deus que, furiosa contra a
Igreja, avançava continuamente em detrimento da ordem social e
ganhava o controlo sobre os governos nacionais e locais, a educaçã o e
os tribunais.
O seu objectivo era completar a destruiçã o do direito de
propriedade de todas as sociedades religiosas e instituiçõ es de
caridade, que tinha sido iniciada por governos nacionais coniventes.
Dom Bosco costumava dizer: “Para evitar esta calamidade, todos os
fiéis, e também nó s, no nosso pequeno caminho, devemos esforçar-nos
com zelo e coragem para deter este monstro desenfreado”.
Como? Alertando as massas para os seus falsos ensinamentos
através da prá tica da caridade e de publicaçõ es salutares e voltando as
suas mentes e coraçõ es para a Cá tedra de Sã o Pedro - o fundamento
inabalável de toda a autoridade dada por Deus, a chave mestra de toda
a ordem social, a carta imutável dos deveres e direitos do homem, luz
divina que desmascara o engano das má s paixõ es, guardiã o fiel e
poderoso da moralidade natural e cristã , fiador irrevogável da
recompensa e do castigo eternos. A Igreja, a Cá tedra de Sã o Pedro e o
Papa sã o a mesma coisa. Por isso Dom Bosco quis fazer todo o esforço
para fazer aceitar estas verdades. Os seus objectivos eram documentar
plenamente os benefícios incalculáveis trazidos pelos papas à
sociedade civil, refutar todas as calú nias lançadas contra eles e
promover a gratidã o, a lealdade e o amor por eles.
Esta foi a atitude de Dom Bosco. No seu amor pelo Sumo Pontífice,
ele foi verdadeiramente grande, tanto em palavras como em açõ es. Ele
costumava dizer que poderia beijar cada pá gina da Histó ria da Igreja de
Salzano, porque ali este historiador italiano havia demonstrado
claramente o seu amor pelos papas. Aos seus clérigos ele deu uma regra
prá tica na avaliaçã o de um livro: “Se o seu autor for de alguma forma
desfavorável ao Papa, nã o leia o livro”.
A crô nica de Bonetti trazia este verbete para este mesmo ano de
1862:
“Quando Dom Bosco fala dos papas, pode continuar para sempre.
Ele sempre faz novos elogios para eles e fala com tanto charme que
inflama seus ouvintes. Ele está no seu melhor em dois assuntos: a
virtude da pureza e o papado. Ele encanta e surpreende a todos. Para
acreditar nisso basta ler suas obras, especialmente suas Vidas dos Papas
, que consideramos leitura obrigató ria para qualquer pessoa escolhida
pela Providência para escrever a biografia deste fiel servo de Deus.”

O Mistério da Iniquidade
Nas pá ginas seguintes (sonhos do sapo, da videira e do Inferno)
você encontrará Dom Bosco empenhado na luta contra um poder
misterioso que causa estragos entre os filhos dos homens. Você
encontrará um monstro horrível, um sapo nojento do tamanho de um
touro, que quer devorar o pró prio Dom Bosco. Mas em nome de Deus,
com repetidos sinais da cruz e com á gua benta e grandes gritos, Dom
Bosco põ e-na em fuga.
Nã o é fá cil vencer Sataná s. É preciso ter coragem e força. A fé nos
dá força. Mas lembre-se bem de que Sataná s nã o pode fazer nada contra
nó s, a menos que o aceitemos. No entanto, a fraqueza humana é grande.
Nunca confiemos em nó s mesmos, porque o maligno pode muito bem
escolher cada fraqueza da nossa parte.
Sataná s existe, o Inferno existe. A missã o de Jesus Cristo é uma
guerra total contra o poder das trevas.
Dom Bosco relutava em narrar aqueles sonhos terríveis, mas uma
voz do alto lhe diz claramente: “Por que você nã o fala? Diga a eles. . .”
“Portanto, é vontade de Deus que eu lhes conte o que vi”, disse
Dom Bosco.
Este é um aviso claro para os educadores. É preciso falar: o inferno
existe e muitos caem nele. A verdade colocará Sataná s em fuga.
——————
1. Marquesa Juliette Colbert Barolo (1785-1864).
2. O Palazzo Madama, localizado no centro da Piazza Castello, no coração de Turim, é um enorme
edifício composto por três estruturas de origens diferentes – romana, medieval e moderna – que
resumem os dois mil anos de histó ria da cidade. A sua magnífica escadaria interna e a fachada
setecentista de Filippo Juvarra representam uma das melhores criaçõ es do barroco europeu. O
Palazzo Madama foi sede do Senado Subalpino de 1840 a 1860 e do Senado Italiano até 1864.
Atualmente abriga o Museu Municipal de Arte Antiga.
3. Antonio Martini (1720-1809), Arcebispo de Florença, traduziu o Novo Testamento do grego e o
Antigo Testamento da Vulgata para o italiano. Sua versão se tornou mais popular na Itália.
31
UMA VIDEIRA MISTERIOSA
( Memórias Biográficas , Vol. IX, Cap. 75)

Um monstro horrível

MEUS QUERIDOS MENINOS, ontem à noite eu disse que tinha algo


desagradável para lhes contar. É um sonho que tive. Eu nã o ia falar
sobre isso, porque pensei que nã o passava de um sonho e porque,
sempre que narrei meus sonhos, foram feitas observaçõ es e objeçõ es.
Agora, poré m, um segundo sonho me obriga a revelar o primeiro, e
ainda mais considerando que nas ú ltimas noites — especialmente nas
ú ltimas trê s noites — fui repetidamente perturbado por pesadelos.
Você sabe que fui a Lanzo descansar um pouco. Bem, na minha ú ltima
noite lá , assim que adormeci, sonhei que vi um sapo repugnante,
enorme como um boi, entrar no meu quarto e agachar-se aos pé s da
minha cama. Fiquei olhando sem fô lego enquanto suas pernas, corpo e
cabeça inchavam e ficavam cada vez mais repugnantes; seu corpo
verde, olhos ardentes, boca e garganta com linhas vermelhas e
pequenas orelhas ossudas apresentavam uma visã o aterrorizante.
Olhando descontroladamente, continuei murmurando para mim
mesmo: “Mas um sapo nã o tem orelhas”. També m notei dois chifres
saindo de seu focinho e duas asas esverdeadas brotando de suas
laterais. Suas pernas pareciam as de um leã o e sua longa cauda
terminava em uma ponta bifurcada.
No momento, eu nã o parecia nem um pouco assustado; mas
quando aquele monstro começou a se aproximar de mim, abrindo suas
enormes mandíbulas cheias de dentes, fiquei realmente assustado.
Achei que fosse um demô nio do Inferno, porque parecia um. Fiz o Sinal
da Cruz, mas nada aconteceu. Toquei a campainha, mas ninguém
respondeu. Gritei, mas em vã o. O monstro nã o recuaria. “O que você
quer de mim, seu demô nio feio?” Perguntei. Como se em resposta, ele
simplesmente avançou, com as orelhas totalmente esticadas e
apontando para cima. Entã o, apoiando as patas dianteiras no topo da
cama e erguendo-se sobre as patas traseiras, ele parou
momentaneamente, olhou para mim e rastejou para frente na minha
cama até que seu focinho estivesse perto do meu rosto. Senti tanta
repulsa que tentei pular da cama, mas nesse momento o monstro abriu
bem as mandíbulas. Eu queria me defender e empurrar o monstro para
trá s, mas era tã o horrível que, mesmo na minha situaçã o, nã o ousei
tocá -lo. Gritei e procurei freneticamente atrá s de mim a pequena fonte
de á gua benta, mas só bati na parede. Enquanto isso, o sapo
monstruoso conseguiu morder minha cabeça, de modo que metade do
meu corpo ficou dentro de suas mandíbulas imundas. “Em nome de
Deus”, gritei, “por que você está fazendo isso comigo?” Ao ouvir essas
palavras, o sapo recuou e deixou minha cabeça livre. Novamente fiz o
sinal da cruz e, como já havia mergulhado a mã o na fonte de á gua benta,
joguei algumas gotas de á gua no monstro. Com um grito assustador, ele
caiu para trá s e desapareceu, enquanto uma voz misteriosa vinda do
alto dizia claramente: “Por que você nã o conta a eles?”
O diretor de Lanzo, Pe. Lemoyne, acordado por meus gritos
prolongados, ouviu minhas batidas na parede. “Dom Bosco”, perguntou-
me pela manhã , “você teve pesadelos ontem à noite?”
"Por que você pergunta?"
“Porque ouvi seus gritos.”
Percebi que Deus queria que eu revelasse o que tinha visto. Por
isso, e para me livrar desses pesadelos, decidi contar tudo a vocês.
Agradeçamos ao Senhor pela Sua misericó rdia. Enquanto isso,
esforcemo-nos para cumprir Suas admoestaçõ es, nã o importa a
maneira que Ele escolha para torná -las conhecidas para nó s; e usemos
os meios que Ele envia para nos permitir salvar as nossas almas.
Através destes sonhos conheci o estado de consciência de cada um de
vocês.
Desejo, porém, que você mantenha dentro destas paredes o que
vou revelar a você. Peço-lhe que nã o escreva nem fale sobre isso fora de
casa, porque essas coisas nã o devem ser ridicularizadas, como algumas
pessoas podem fazer, e também porque quero evitar possíveis
complicaçõ es desagradáveis. Digo-lhe estas coisas confidencialmente,
como um pai para seus filhos amados, e você deve ouvir como se fosse
seu pró prio pai contando-as a você. Pois bem, aqui estã o os sonhos que
prefiro esquecer, mas devo revelar.
Comecei a ter esses sonhos no domingo, 5 de abril, bem no início
da Semana Santa, e isso durou vá rias noites miseráveis. Esses sonhos
me esgotaram tanto que pela manhã me senti mais esgotado do que se
tivesse trabalhado a noite toda. Eles também me alarmaram e me
aborreceram muito. Na primeira noite sonhei que estava morto; a
segunda, que eu estava no tribunal de Deus para acertar minhas contas.
Depois de cada sonho, acordei e percebi que estava vivo e tinha tempo
para me preparar melhor para uma morte santa. Na terceira noite
sonhei que estava no céu. Certamente gostei disso, mas tudo
desapareceu quando acordei na manhã seguinte. Mesmo assim, senti-
me determinado, custe o que custar, a conquistar o Reino Eterno que
vislumbrei. Até agora, esses sonhos nã o lhe preocuparam nem um
pouco e nã o significariam nada para você. Quando alguém adormece
com algo em mente, sua imaginaçã o entra em açã o e ele sonha com isso.

A videira misteriosa
O sonho da videira misteriosa é uma pará bola.

Parte I. Os Estados de Consciência


a) Todas as folhas apenas. Aparência de boas obras. Na realidade, zero.
Simboliza os meninos que nã o visam agradar a Deus.
b) Cachos grandes de uvas maduras, mas com sabor podre. O pecado
estraga o coraçã o. A tristeza vem depois do pecado. A graça de Deus e
da consciência os curará .
c) Belos cachos de uvas vermelhas. Simboliza os meninos (muito
poucos, infelizmente) que correspondem aos cuidados que lhes sã o
dispensados. Meninos radiantes de alegria.
De qualquer forma, tive outro sonho e é este que devo contar a
vocês. Na noite de Quinta-feira Santa (9 de abril), mal tinha cochilado,
sonhei que estava nestes pó rticos com os nossos padres, clérigos e
meninos ao meu redor. Entã o todos vocês desapareceram e eu pareci
entrar no parquinho apenas com o Pe. Rua, Pe. Cagliero, Pe. Francésia,
Pe. Sávio e a jovem Preti. A pouca distâ ncia estavam Joseph Buzzetti e
Pe. Stephen Rumi, um grande amigo nosso do seminá rio de Gênova.
De repente, o Orató rio, tal como o conhecemos hoje, mudou de
aspecto e ficou como era no seu início, quando ali existiam apenas os
que acabamos de mencionar. Naquela época, nosso playground ficava
ao lado de vastos campos nã o cultivados que se estendiam até os
prados da cidadela, onde nossos meninos muitas vezes se perdiam em
suas brincadeiras.
Sentamo-nos perto da atual marcenaria, sob a janela do meu
quarto, onde antes tínhamos uma horta, e começamos a conversar
sobre a casa e os meninos. De repente, uma linda videira – a mesma que
existia ali – brotou do chã o em frente a este pilar que sustentava a fonte
de á gua perto da entrada do antigo galpã o Pinardi. (A plataforma sobre
a qual Dom Bosco estava apoiado neste pilar.) Ficamos surpresos com o
aparecimento da videira depois de tantos anos e nos perguntamos
como isso poderia ter acontecido. Enquanto isso, a videira continuou
crescendo até a altura de um homem, espalhando incontáveis brotos e
gavinhas em todas as direçõ es, até cobrir todo o playground e se
estender além dele. Estranhamente, os seus rebentos nã o cresciam para
cima, mas espalhavam-se paralelamente ao solo como um caramanchã o
muito vasto, sem qualquer suporte visível. Suas folhas brotando eram
de um verde profundo e seus brotos eram surpreendentemente
saudáveis e fortes. Logo surgiram lindos cachos de uvas, que cresceram
e adquiriram uma cor vermelho-arroxeada.
“Como pode esta videira ter crescido tã o rapidamente?”
perguntamos um ao outro com espanto. "O que tudo isso significa?"
“Vamos esperar para ver”, respondi.
Continuei observando a videira com muito cuidado, quando de repente
todas as uvas caíram no chã o e se transformaram em uma multidã o de
meninos animados e alegres. Em pouco tempo todo o playground e a
á rea coberta pelo cipó se encheram de meninos que pulavam,
brincavam e se divertiam. Foi um espetá culo para ser visto. Ali, sob
aquele inusitado caramanchã o, pude ver todos os meninos que
estiveram, estã o ou estarã o no Orató rio e em outras escolas salesianas.
Muitos eram desconhecidos para mim.
Você sabe que um guia sempre aparece nos meus sonhos. Bem,
neste momento um estranho apareceu ao meu lado e ficou observando
os meninos comigo. Entã o uma misteriosa cortina apareceu
abruptamente diante de nó s, obscurecendo esta cena alegre.
Nã o mais alta que a pró pria videira, esta cortina em toda a sua
largura parecia estar pendurada nos brotos da videira como uma
cortina de palco. Tudo o que podíamos ver agora era a parte superior
da videira estendida como um enorme tapete verde. Nesse ínterim, o
rebuliço alegre dos meninos rapidamente se transformou em um
silêncio sombrio.

A videira com nada além de folhas


"Olhar!" o guia me disse, apontando para a videira.
Eu cheguei mais perto. A linda videira carregada de uvas agora nã o
tinha nada além de folhas, com esta inscriçã o: Nihil inventa ea! - “Ele
nã o encontrou nada nele!” (Mateus 21:19). Intrigado quanto ao seu
significado, perguntei ao meu guia: “Quem é você? O que esta videira
simboliza?”
Em resposta, ele abriu a cortina. Apenas uma parte dos muitos
garotos que eu tinha visto antes estava lá agora, a maioria deles
desconhecida para mim.
“Esses meninos”, explicou ele, “têm muitas oportunidades de fazer
o bem, mas nã o pretendem agradar a Deus. Fazem de conta que estã o
fazendo o bem para manter as aparências, obedecem escrupulosamente
à s regras da casa para evitar repreensõ es ou perda de estima e sã o
respeitosos para com os superiores, mas nã o lucram com seus
ensinamentos, exortaçõ es ou esforços. Tudo o que esses meninos
buscam é alguma posiçã o de destaque e lucrativa no mundo. Nã o se
preocupam em descobrir a sua vocaçã o, rejeitam prontamente o
chamamento do Senhor, ao mesmo tempo que continuam a disfarçar as
suas intençõ es para nã o perderem qualquer vantagem. Em suma, sã o
aqueles que fazem coisas por necessidade e nã o obtêm nenhum bem
para a eternidade.”
Como fiquei decepcionado ao ver naquele grupo vá rios meninos
que eu considerava muito bons, carinhosos e sinceros!

A videira com uvas podres


“Infelizmente, isso nã o é tudo”, continuou meu guia, largando a
cortina. “Olhe lá em cima agora.” E ele apontou para a parte superior do
caramanchã o.
Entre as folhas pude ver cachos de uvas que pareciam muito
saborosos. Felizmente, cheguei mais perto e percebi que as uvas
estavam marcadas, maduras demais, mofadas, com vermes, bicadas,
podres ou murchas - um desastre total. Seu fedor sujava o ar.
Novamente o estranho levantou a cortina. “Olha”, ele disse. Vi outra
multidã o de meninos, mas nã o o nú mero incontável que havia no início
do sonho. Anteriormente muito bonitos, agora pareciam feios,
taciturnos e cobertos de feridas horríveis, e andavam com grande
melancolia, como se estivessem curvados ou esgotados pela idade.
Ninguém falou. Todos foram nossos antigos, presentes e futuros alunos.
Os ú ltimos mencionados foram os mais numerosos. Todos pareciam
abatidos e nã o ousavam levantar os olhos.
Meus companheiros e eu ficamos consternados e sem palavras. "O
que aconteceu?" Finalmente perguntei ao meu guia. “Esses meninos,
antes tã o bonitos e alegres – por que agora sã o tã o feios e
melancó licos?”
“Por causa dos seus pecados”, foi a resposta. E quando esses
meninos passaram por mim, ele acrescentou: “Dê uma boa olhada
neles”.
Percebi entã o que suas testas e mã os traziam o nome do pecado de
cada menino. Para minha grande surpresa, reconheci vá rios meninos.
Sempre acreditei que eles eram muito virtuosos; agora eu estava
descobrindo que feridas horríveis estavam inflamando suas almas.
À medida que passavam, pude ler em suas testas: Falta de recato,
Escâ ndalo, Malevolência, Orgulho, Ociosidade, Gula, Inveja, Raiva,
Vingança, Blasfêmia, Impiedade, Desobediência, Sacrilégio, Roubo.
“Nem todos os meninos sã o como você os vê agora”, observou meu
guia. “Mas eles serã o assim um dia se nã o mudarem seus há bitos.
Muitos desses pecados nã o sã o graves em si mesmos, mas levarã o a
graves quedas e à perdiçã o eterna. Qui spernit modica, paulatim decidet
– “Aquele que despreza as ninharias afundará pouco a pouco”.
(Eclesiastes 19:1). A gula gera impureza; o desprezo pelos superiores
leva ao desprezo pelos sacerdotes e pela Igreja, e assim por diante!
Desanimado com tal visã o, peguei meu caderno e lá pis para anotar
os nomes dos meninos que conhecia e seus pecados — ou pelo menos o
pecado predominante — para que pudesse alertá -los e corrigi-los. Mas
o guia segurou meu braço. "O que você está tentando fazer?" ele
perguntou.
“Quero anotar o que está escrito em suas testas para avisá -los para
que possam corrigir suas vidas”. “Você nã o pode fazer isso.”
"Por que nã o?"
“Eles têm tudo que precisam para passar a vida ilesos. Eles têm
regras internas; deixe-os observá -los. Eles têm superiores; deixe-os
obedecê-los. Eles têm os Sacramentos; deixe-os recebê-los. Eles têm
penitência; que nã o o profanem, ocultando diversos pecados. Eles têm a
Sagrada Eucaristia; que eles nã o participem dela em estado de pecado
mortal. Deixe-os examinar os olhos, evitar má s companhias, livros
ruins, conversas obscenas e assim por diante. Manter as regras da casa
irá salvá -los. Deixe-os obedecer prontamente; deixe-os parar de tentar
enganar seus professores para desperdiçar seu tempo. Deixe-os
obedecer voluntariamente aos seus superiores, em vez de considerá -los
cã es de guarda chatos, conselheiros egoístas ou mesmo inimigos. Que
nã o considerem uma grande vitó ria quando conseguem esconder os
seus erros e escapar ao castigo. Deixe-os ser reverentes na igreja e orar
de boa vontade e devotamente, sem perturbar os outros ou tagarelar.
Deixe-os estudar na hora de estudar, trabalhar na hora de trabalhar e se
comportar sempre. Estudo, trabalho e oraçã o sã o as coisas que os
manterã o bem.”
Apesar da sua proibiçã o, continuei a importunar o meu guia para
que me deixasse escrever os nomes dos rapazes. Com isso, ele pegou
meu caderno e jogou-o no chã o, dizendo: “Pela ú ltima vez, digo que nã o
há necessidade de anotar os nomes deles. A graça de Deus e a voz da
consciência dirã o aos seus meninos o que nã o devem fazer.”
“Isso significa”, perguntei, “que nã o posso contar aos meus
queridos meninos nada do que vi? Você tem alguma sugestã o para eles?
“Você pode contar a eles tudo o que lembrar”, respondeu ele.

A videira com uvas maduras e vermelhas


Ele novamente deixou a cortina cair e mais uma vez vimos a
videira. Seus brotos quase desfolhados continham lindos cachos de
uvas vermelhas e maduras. Cheguei mais perto e descobri que eles
eram tã o bons quanto pareciam. Sua visã o encantadora e seu cheiro
agradável me deram á gua na boca.
Mais uma vez, meu guia levantou a cortina. Sob aquele
caramanchã o vi mais uma vez muitos meninos – nossos alunos atuais,
passados e futuros. Eles eram lindos sem comparaçã o e radiantes de
alegria.
“Estes”, explicou o estranho, “sã o os meninos que, graças aos seus
cuidados, estã o dando ou darã o bons frutos. Sã o aqueles que praticam a
virtude e vos consolarã o grandemente.”
Por mais encantado que estivesse, de alguma forma também fiquei
triste porque o nú mero deles nã o era tã o grande quanto eu esperava.
Enquanto eu os observava, a campainha tocou e os meninos foram
embora. Os clérigos que estavam comigo foram para as suas tarefas.
Olhei ao meu redor e me vi sozinho. A videira desapareceu e meu guia
desapareceu. Nesse momento acordei e pude descansar um pouco.
Sexta-feira, 1º de maio, Dom Bosco continuou sua narrativa:
Como contei ontem à noite, acordei pensando ter ouvido a
campainha tocar, mas depois voltei a dormir. De repente, alguém me
sacudiu. Eu me encontrei no meu quarto, respondendo minha
correspondência. Depois, fui até a varanda, contemplei por um
momento a majestosa cú pula da nossa nova igreja e depois desci e
entrei nos pó rticos. Em curtos intervalos, padres e clérigos vinham de
suas diversas missõ es e se aglomeravam ao meu redor, entre eles o Pe.
Rua, Pe. Cagliero, Pe. Francesia e Pe. Sávio.

Mais uvas podres


Enquanto eu conversava com eles, a Igreja de Maria Auxiliadora e
todos os nossos edifícios atuais desapareceram abruptamente, e nos
encontramos diante do antigo galpã o Pinardi. Como no sonho anterior,
uma videira brotou exatamente no mesmo lugar, como se tivesse as
mesmas raízes, cresceu até a mesma altura e depois espalhou seus
brotos horizontalmente por uma vasta á rea. Os brotos, por sua vez,
brotaram folhas; depois surgiram cachos de uvas que amadureceram
diante dos meus olhos. Mas nenhum menino estava à vista. Os cachos
de uvas eram verdadeiramente enormes, como os da Terra Prometida.
Um deles teria sobrecarregado a força de um homem. As uvas douradas,
perfeitamente maduras, eram oblongas e extraordinariamente grandes,
de modo que uma ú nica delas daria um bocado e tanto.
Resumidamente, eles pareciam tã o bons que davam á gua na boca.
“Coma-me”, eles pareciam dizer.
Pe. Cagliero e os outros padres ficaram maravilhados, enquanto eu
exclamava: “Como eles sã o lindos!”
Sem cerimô nia, Pe. Cagliero colheu algumas uvas e colocou uma na
boca. Assim que ele cravou os dentes nele, cuspiu-o com tanta força que
pensamos que ele estava vomitando. A uva tinha gosto de ovo podre.
“Meu Deus”, ele exclamou depois de muito cuspir. “Que coisa, é o
suficiente para matar um homem.”
Todos ficamos sem palavras. Nesse momento, um homem de
aparência séria saiu da sacristia da velha capela e caminhou
decididamente até mim.
“Como podem uvas tã o lindas ter um gosto tã o podre?” Eu
perguntei a ele. Como que em resposta, ele pegou gravemente um
molho de gravetos, pegou um bem amarrado e ofereceu-o ao Pe. Sávio,
dizendo: “Pegue isso e bata esses brotos”. Pe. Sávio recusou e recuou. O
homem entã o se aproximou do Pe. Francesia, mas ele também recusou.
O estranho entã o se voltou para o Pe. Cagliero e, pegando-o pelo braço,
tentou apertar o bastã o em sua mã o. “Pegue e ataque”, disse ele.
“Thrash e derrubar.” Dizendo isso, ele apontou para um determinado
local. Assustado, Pe. Cagliero recuou. "Você está brincando?" ele
exclamou, batendo com o punho na outra mã o. Mas o estranho insistiu:
“Pegue e ataque”. “Eu nã o”, pe. Cagliero revidou. Entã o ele se escondeu
atrá s de mim com medo.
Frustrado, mas imperturbável, o estranho voltou-se para o Pe. Rua
que, como o Pe. Cagliero, refugiou-se atrá s de mim. O homem entã o veio
até mim. “Pegue este pedaço de pau e bata nesses brotos”, ordenou ele.
Fiz um grande esforço para ver se estava sonhando ou acordado, mas
tudo me parecia muito real.
"Quem é você?" Perguntei. “Por que devo derrubar esses brotos no
chã o? Estou sonhando? Estou imaginando coisas? Você está falando
comigo em nome de Deus?”
“Aproxime-se da videira”, respondeu ele, “e veja o que está escrito
nessas folhas”. Eu obedeci e li: Ut quid terram occupat? — “Por que
ainda sobrecarrega o solo?” (Lucas 13:7).
“Isso vem do Evangelho”, exclamou meu guia.
“Sim”, observei, “mas lembre-se que no Evangelho também lemos
que Nosso Senhor permitiu que o vinhateiro cavasse em volta dela e a
adubasse, adiando a sua destruiçã o até que fossem feitas todas as
tentativas para ajudá -la a dar bons frutos. ”
"Tudo bem. Vamos adiar a puniçã o. Enquanto isso, dê uma olhada.
Dizendo isso, ele apontou para a videira. Olhei, mas nã o consegui
entender o que ele queria dizer.
“Venha aqui”, disse ele, “e leia o que está escrito nas uvas”.
Notei entã o que traziam o nome de cada aluno e seu pecado
predominante. Fiquei horrorizado com o que vi. Fiquei particularmente
assustado com essas inscriçõ es: “ Orgulhoso, infiel às suas promessas,
impuro, duas caras, negligente com seus deveres, caluniador, vingativo,
sem coração, sacrílego, desdenhoso da autoridade, pedra de tropeço,
seguidor de falsas doutrinas”. Vi os nomes daqueles quorum deus venter
est — “cujo deus é o ventre”; daqueles que scientia inflat — “estã o
inchados pelo conhecimento”; daqueles que quaerunt quae sua sunt,
non quae Jesus Christi —“procuram os seus pró prios interesses e nã o os
de Nosso Senhor”; daqueles que tramam contra seus superiores e as
regras da casa. Esses nomes identificaram nossos alunos passados,
presentes e futuros. Os ú ltimos mencionados – um grande nú mero
deles – eram desconhecidos para mim.
“Este é o fruto que colhemos desta vinha”, disse o homem
gravemente – “amargo, mau e prejudicial à salvaçã o eterna”.
Imediatamente tentei anotar alguns nomes em meu caderno, mas
novamente meu guia me impediu. "O que está fazendo para fazer?" ele
perguntou.
“Por favor, deixe-me anotar os nomes das pessoas que conheço,
para que possa avisá -los em particular e corrigi-los”, implorei. Nã o
adiantou. Ele nã o consentiria.
“Se eu contar aos meus meninos o estado lamentável em que se
encontram, eles mudarã o de vida”, insisti.
“Se eles nã o acreditam no Evangelho”, respondeu ele, “também nã o
acreditarã o em você”.
Continuei insistindo que queria fazer algumas anotaçõ es para o
futuro, mas, ignorando-me, ele foi até o padre. Rua com o feixe de
gravetos.
“Pegue um”, disse-lhe ele, “e golpeie a videira”. Cruzando os braços,
Pe. Rua baixou a cabeça e, murmurando “Paciência”, olhou para mim.
Balancei a cabeça em aprovaçã o.
Pe. Rua entã o pegou um pedaço de pau, aproximou-se do cipó e
começou a bater no local indicado. Ele mal havia desferido um golpe
quando o guia fez sinal para que ele parasse e gritou para todos nó s
recuarmos.

Uma terrível tempestade de granizo.


Granizo Preto e Vermelho:
Impureza e Orgulho
Todos nó s recuamos uma certa distâ ncia. De onde estávamos,
podíamos ver as uvas incharem e, embora mantendo a cor dourada e a
forma oblonga, transformarem-se em massas horríveis, semelhantes a
caracó is sem casca. Novamente o guia gritou: “Observe agora: o Senhor
se vinga”. Imediatamente, o céu escureceu e uma densa neblina cobriu
totalmente a videira de nossa vista. Através da escuridã o, relâ mpagos
brilharam, trovõ es rugiram e raios terríveis atingiram todo o
playground. Os brotos das videiras dobraram-se sob o vento furioso e
todas as folhas foram arrancadas. Finalmente, uma tempestade de
granizo atingiu a videira. Tentei fugir, mas meu guia me impediu. “Olhe
para o granizo”, disse ele.
Notei que as pedras de granizo, grandes como ovos, eram pretas ou
vermelhas, cada uma pontiaguda numa extremidade e achatada na
outra, como um martelo. Os mais pró ximos de mim eram pretos, mas
mais além eu conseguia ver os vermelhos.
“É estranho”, exclamei. “Nunca vi granizo como estes.”
“Aproxime-se”, disse o estranho, “e você verá outra coisa”.
Obedeci, mas um fedor horrível me fez recuar imediatamente. Por
insistência do homem, peguei um para examiná -lo, mas, sem aguentar o
cheiro, deixei-o cair instantaneamente. “Eu nã o consegui ver nada”, eu
disse.
“Tente novamente”, ele respondeu.
Superando minha repulsa, peguei uma pedra de granizo preta e li
nela: “Imodéstia”.
Entã o fui até as pedras de granizo vermelho. Embora gelados, eles
provocavam incêndios onde quer que caíssem. Eu peguei um. Ainda
cheirava muito mal, mas achei mais fá cil ler: “Orgulho”. Um tanto
envergonhado com estas descobertas, perguntei: “Serã o estes os dois
principais vícios que ameaçam esta casa?”
“Esses sã o os dois principais vícios que arruínam a maioria das
almas, nã o só em sua casa, mas em todo o mundo. No devido tempo,
você verá quantos irã o mergulhar no Inferno por causa deles.”
“Entã o o que devo dizer aos meus filhos para fazê-los abominá -
los?”
“Você descobrirá em breve”, disse ele e se afastou de mim.
Enquanto isso, granizo continuava atingindo furiosamente a videira em
meio a trovõ es e relâ mpagos. As uvas estavam agora uma bagunça,
como se tivessem sido completamente esmagadas pelos pés dos
vinicultores em um tanque. O suco sujava o ar com um fedor tã o
enjoativo que mal era possível respirar. Cada uva exalava seu pró prio
cheiro desagradável, cada uma mais repulsiva que a outra, dependendo
da quantidade e do tipo de pecado.
Incapaz de aguentar, coloquei o lenço no nariz e me virei para ir
para o meu quarto. Percebi entã o que estava completamente sozinho.
Pe. Francésia, Pe. Rua, Pe. Cagliero e todos os outros fugiram. Naquele
silêncio e solidã o fiquei tã o assustado que comecei a correr e acordei.
Como você vê, foi um sonho muito desagradável, mas o que
aconteceu na noite seguinte foi muito pior. Eu vou te contar sobre isso
em breve. O que esses sonhos implicam está atualmente além da sua
compreensã o. Explicarei-os oportunamente. Já é tarde e vou deixar
você ir para a cama.
Devemos ter presente que as graves faltas reveladas a Dom Bosco
nã o se referiam todas à quele ano específico, mas também aos anos
futuros. Ele nã o viu apenas todos os seus alunos passados e presentes
do Orató rio, mas inú meros outros, que ele desconhecia, que
frequentariam suas escolas em todo o mundo. Da mesma forma, a
pará bola da videira infrutífera no livro de Isaías abrange vá rios séculos.
Além disso, nã o devemos esquecer nem por um momento o que o
guia disse: “Nem todos os meninos sã o agora como você os vê, mas um
dia o serã o, a menos que melhorem seus hábitos”. O caminho do mal leva
ao abismo.
Queremos salientar também que depois do aparecimento da
videira apareceu um estranho que, embora nã o imediatamente
reconhecido por Dom Bosco, serviu mais tarde como seu guia e
intérprete. Ao narrar estes e outros sonhos, Dom Bosco chamava-o
ocasionalmente de “estranho” para minimizar o que havia de mais
marcante nos seus sonhos e – digamos – o que indicava claramente uma
intervençã o sobrenatural.
Aproveitando a intimidade com que nos honrou, muitas vezes lhe
perguntávamos sobre esse “estranho”. Embora nã o tenhamos obtido
uma resposta clara, convencemo-nos, atravé s de outras pistas, de que o
guia nem sempre era o mesmo. Por sua vez, pode ter sido um Anjo, um
aluno falecido, Sã o Francisco de Sales, Sã o José ou algum outro Santo.
Em certas ocasiõ es, como afirmou explicitamente Dom Bosco, Luís
Comollo, 1Dominique Sávio e Louis Colle 2 atuaram como guias. À s vezes,
també m, outros personagens apareciam junto com eles.
——————
1. Colega seminarista de Dom Bosco. Veja Vol. 249-256, 329-345.
2. Um santo jovem francês que Dom Bosco preparou para a morte em 1881. Ver vol. XI, até XVIII.
32
PARA O INFERNO E DE VOLTA
( Memórias Biográficas , Vol. IX, página 85)

QUE meditaçã o ASSUSTADORA e sé ria é esse sonho no Inferno. Aqui


Dom Bosco é iluminado de cima. Aqui a verdade se torna concreta e
liberta o coraçã o e a mente dos sonhos quimé ricos daqueles que falam
levianamente do pecado e do Inferno. O Guia indica a Dom Bosco uma
linha demarcató ria alé m da qual nã o há mais amor, nem mais amigos,
nem mais conforto. Só desespero para quem segue o mundo dissoluto.
É vontade de Deus que sigamos Dom Bosco para salvar a
juventude. A colheita é imensa; sã o necessá rios mais ceifeiros, ceifeiros
dispostos a trabalhar arduamente, muito arduamente como Dom Bosco,
nosso Pai, sem mania de reformar o sistema de Dom Bosco.
É necessá ria fidelidade.
(Os salesianos farã o bem em reler Memorie Biografiche, Vol. XVII, p.
387.)
Neste sonho sobre o Inferno, é dado um programa claro para a
salvaçã o dos meninos:
“Eles têm seus superiores: deixe-os obedecê-los.
“Eles têm regras: deixe-os observá -las.
“Eles têm os Sacramentos: deixe-os freqü entá -los”.
O sistema salesiano conseguirá isto através da razã o, da religiã o e
da bondade. Requer muita generosidade e paciência. Mas Maria,
Auxiliadora dos Cristã os, ajudará os educadores a esmagar a cabeça da
Serpente maligna e a salvar os jovens.
Na noite de domingo, 3 de maio de 1868, festa do Padroeiro de Sã o
José, Dom Bosco retomou a narraçã o dos seus sonhos:
Tenho outro sonho para vos contar, uma espécie de rescaldo
daqueles que vos contei na quinta e sexta-feira passada e que me
esgotaram totalmente. Chame-os de sonhos ou como quiser. De
qualquer forma, como você sabe, na noite de 17 de abril, um sapo
horrível parecia decidido a me devorar. Quando finalmente
desapareceu, uma voz me disse: “Por que você nã o conta a eles?” Virei-
me naquela direçã o e vi uma pessoa distinta parada ao lado da minha
cama. Sentindo-me culpado pelo meu silêncio, perguntei: “O que devo
dizer aos meus meninos?”
“O que você viu e ouviu em seus ú ltimos sonhos e o que você
queria saber e o que você lhe revelará amanhã à noite!” Ele entã o
desapareceu.
Passei o dia seguinte inteiro me preocupando com a noite
miserável que me aguardava e, quando a noite chegou, relutante em ir
para a cama, sentei-me à minha mesa folheando livros até meia-noite. A
simples ideia de ter mais pesadelos me assustou completamente.
Porém, com muito esforço, finalmente fui para a cama.
Para nã o adormecer imediatamente e começar a sonhar, coloquei
meu travesseiro na cabeceira da cama e praticamente me sentei, mas
logo, exausto, simplesmente adormeci. Imediatamente a mesma pessoa
da noite anterior apareceu ao meu lado. (Dom Bosco costumava chamá -
lo de “o homem do boné”.)
“Levante-se e siga-me!” ele disse.
“Pelo amor de Deus”, protestei, “deixe-me em paz. Eu estou
exausto! Estou com dor de dente há vá rios dias e preciso descansar.
Além disso, os pesadelos me esgotaram completamente. Disse isto
porque a apariçã o deste homem sempre significa problemas, cansaço e
terror para mim.
“Levante-se”, ele repetiu. “Você nã o tem tempo a perder.”
Eu obedeci e o segui. "Para onde você está me levando?" Perguntei.
"Deixa para lá . Você vai ver." Ele me levou a uma planície vasta e
sem limites, verdadeiramente um deserto sem vida, sem uma alma à
vista, uma á rvore ou um riacho. A vegetaçã o amarelada e seca
aumentava a desolaçã o. Eu nã o tinha ideia de onde estava ou o que
deveria fazer. Por um momento, até perdi meu guia de vista e temi estar
perdido e totalmente sozinho. Pe. Rua, Pe. Francesia e os outros nã o
estavam em lugar nenhum. Quando finalmente vi meu amigo vindo em
minha direçã o, suspirei de alívio.
"Onde estou?" Perguntei.
“Venha comigo e você descobrirá !”
"Tudo bem. Eu irei com voce."
Ele foi na frente e eu o segui em silêncio, mas depois de uma
caminhada longa e sombria, comecei a me preocupar se algum dia
conseguiria cruzar aquela vasta extensã o, com dor de dente e pernas
inchadas. De repente, vi uma estrada à frente. "Para onde agora?"
Perguntei ao meu guia.
“Por aqui”, ele respondeu.

A estrada larga
Pegamos a estrada. Era lindo, amplo e bem pavimentado. Via
peccantium complanata lapidibus, et in fine illarum inferi, et tenebrae, et
poenae – “O caminho dos pecadores sã o pedras lisas e no seu final estã o
o Inferno, as trevas e a dor.” (Eclesiastes 21:11). Ambos os lados
estavam alinhados com magníficas sebes verdejantes pontilhadas com
lindas flores. As rosas espiavam especialmente por toda parte através
das folhas. À primeira vista, a estrada era plana e confortável, por isso
aventurei-me nela sem a menor suspeita, mas logo percebi que ela
continuava insensivelmente descendo. Embora nã o parecesse nada
íngreme, eu me vi movendo tã o rapidamente que senti que estava
deslizando pelo ar sem esforço. Na verdade, eu estava planando e quase
nã o usava os pés. Entã o me ocorreu que a viagem de volta seria muito
longa e á rdua.
“Como voltaremos ao Orató rio?” Eu perguntei preocupado.
“Nã o se preocupe”, ele respondeu. “O Todo-Poderoso quer que você
vá . Aquele que o conduz também saberá como conduzi-lo de volta.”
A estrada continuava descendo. À medida que seguíamos o
caminho, ladeados por canteiros de rosas e outras flores, percebi que os
meninos do Orató rio e muitos outros que eu nã o conhecia me seguiam.
De alguma forma, me encontrei no meio deles. Enquanto olhava para
eles, notei ora um, ora outro cair no chã o e ser instantaneamente
arrastado por uma força invisível em direçã o a uma queda assustadora,
distantemente visível, que descia até uma fornalha. “O que faz esses
meninos caírem?” Perguntei ao meu companheiro. Funes extensores em
laqueum; iuxta iter escândaloum posuerunt —“Eles estenderam cordas
como rede; à beira do caminho armaram-me ciladas.” (Salmo 139:6).
“Dê uma olhada mais de perto”, ele respondeu.
Eu fiz. As armadilhas estavam por toda parte, algumas perto do
chã o, outras na altura dos olhos, mas todas bem escondidas. Sem saber
do perigo, muitos meninos foram pegos e tropeçaram; eles se
esparramavam no chã o, com as pernas para cima. Entã o, quando
conseguissem se levantar, corriam pela estrada em direçã o ao abismo.
Alguns ficaram presos pela cabeça, outros pelo pescoço, mã os, braços,
pernas ou lados, e foram puxados para baixo instantaneamente. As
armadilhas terrestres, finas como teias de aranha e pouco visíveis,
pareciam muito frá geis e inofensivas; ainda assim, para minha surpresa,
todos os garotos que eles capturaram caíram no chã o.
Percebendo meu espanto, o guia comentou: “Você sabe o que é
isso?”
“Apenas um pouco de fibra transparente”, respondi.
“Um mero nada”, disse ele, “ simplesmente respeito humano ”. Vendo
que muitos meninos foram apanhados nessas armadilhas, perguntei:
“Por que tantos sã o apanhados? Quem os derruba?”
“Aproxime-se e você verá !” ele me disse.
Segui seu conselho, mas nã o vi nada de peculiar.
“Olhe mais de perto”, ele insistiu.
Peguei uma das armadilhas e puxei. Imediatamente senti alguma
resistência. Puxei com mais força, apenas para sentir que, em vez de
puxar o fio para mais perto, eu mesmo estava sendo puxado para baixo.
Nã o resisti e logo me encontrei na entrada de uma caverna assustadora.
Parei, sem vontade de me aventurar naquela caverna profunda, e
novamente comecei a puxar o fio em minha direçã o. Cedeu um pouco,
mas apenas com grande esforço da minha parte. Continuei puxando e,
depois de um longo tempo, um monstro enorme e horrível emergiu,
segurando uma corda na qual todas aquelas armadilhas estavam
amarradas. Foi ele quem instantaneamente arrastou qualquer um que
fosse pego neles. “Nã o adianta combinar minha força com a dele”, disse
a mim mesmo. “Certamente vou perder. É melhor combatê-lo com o
Sinal da Cruz e com invocaçõ es curtas.”
Entã o voltei para o meu guia. “Agora você sabe quem ele é”, ele me
disse.
“Eu certamente quero! É o pró prio diabo!

Facas
Examinando cuidadosamente muitas das armadilhas, vi que cada
uma trazia uma inscriçã o: Orgulho, Desobediência, Inveja, Sexto
Mandamento, Roubo, Gula, Preguiça, Raiva e assim por diante.
Recuando um pouco para ver quais prendiam o maior nú mero de
meninos, descobri que os mais perigosos eram os da impureza, da
desobediência e do orgulho. Na verdade, esses três estavam
interligados. Muitas outras armadilhas também causaram grandes
danos, mas nã o tanto quanto as duas primeiras. Ainda observando,
notei muitos meninos correndo mais rá pido que outros. “Por que tanta
pressa?” Perguntei.
“Porque sã o arrastados pela armadilha do respeito humano.”
Olhando ainda mais de perto, vi facas entre as armadilhas. Uma
mã o providencial os colocou ali para se libertar. Os maiores,
simbolizando a meditaçã o, eram para serem usados contra a armadilha
do orgulho; outros, nã o tã o grandes, simbolizavam uma leitura
espiritual bem feita. Havia também duas espadas que representavam a
devoçã o ao Santíssimo Sacramento - especialmente através da
frequente Sagrada Comunhã o - e à Santíssima Virgem. Havia também
um martelo simbolizando a Confissã o e outras facas significando a
devoçã o a Sã o José, a Sã o Luís e a outros Santos. Por estes meios, alguns
meninos conseguiram libertar-se ou escapar da captura.
Na verdade, vi alguns rapazes andando com segurança por todas
aquelas armadilhas, seja por meio de um bom timing antes que a
armadilha caísse sobre eles ou fazendo com que ela escorregasse deles
caso fossem pegos.

Espinhos — caminho árduo


Quando o meu guia se convenceu de que eu tinha observado tudo,
fez-me continuar por aquela estrada cercada de rosas, mas quanto mais
avançávamos, mais escassas se tornavam as rosas. Longos espinhos
começaram a aparecer e logo as rosas nã o existiam mais. As sebes
ficaram queimadas pelo sol, sem folhas e cheias de espinhos. Galhos
secos arrancados dos arbustos cruzavam-se ao longo do leito da
estrada, enchendo-a de espinhos e tornando-a intransitável. Tínhamos
chegado a uma ravina cujas encostas íngremes escondiam o que havia
além. A estrada, ainda em declive, tornava-se cada vez mais horrível,
esburacada, esburacada e cheia de pedras e pedregulhos. Perdi o
contato com todos os meus meninos, muitos dos quais haviam deixado
essa estrada traiçoeira por outros caminhos.
Eu continuei; mas quanto mais eu avançava, mais á rdua e íngreme
se tornava a descida, de modo que tropecei e caí vá rias vezes, ficando
prostrado até recuperar o fô lego. De vez em quando meu guia me
apoiava ou me ajudava a subir. A cada passo, minhas articulaçõ es
pareciam ceder e pensei que minhas tíbias iriam quebrar. Ofegante,
disse ao meu guia: “Meu caro, minhas pernas nã o me dã o nem mais um
passo. Eu simplesmente nã o posso ir mais longe.”
Ele nã o respondeu, mas continuou andando. Tomando coragem,
segui até que, vendo-me encharcado de suor e completamente exausto,
ele me levou a uma pequena clareira à beira da estrada. Sentei-me,
respirei fundo e me senti um pouco melhor. Do meu local de descanso, a
estrada que eu já havia percorrido parecia muito íngreme, irregular e
repleta de pedras soltas; mas o que estava por vir parecia tã o pior que
fechei os olhos horrorizado.
“Vamos voltar”, implorei. “Se formos mais longe, como poderemos
voltar ao Orató rio? Nunca conseguirei subir esta encosta.”
“Agora que chegamos tã o longe, você quer que eu te deixe aqui?”
meu guia perguntou severamente.
Diante dessa ameaça, lamentei: “Como posso sobreviver sem a sua
ajuda?”
“Entã o siga-me.”

Edifício Enorme
Continuamos nossa descida, a estrada agora se tornando tã o
íngreme que era quase impossível ficar de pé. E entã o, no fundo deste
precipício, na entrada de um vale escuro, um enorme edifício surgiu à
vista, o seu portal imponente, firmemente trancado, voltado para a
nossa estrada. Quando finalmente cheguei ao fundo, fui sufocado por
um calor sufocante, enquanto uma fumaça gordurosa e esverdeada,
iluminada por flashes de chamas escarlates, subia por trá s daquelas
enormes paredes que se erguiam mais altas que as montanhas.
"Onde estamos? O que é isso?" Perguntei ao meu guia.
“Leia a inscriçã o naquele portal e você saberá .”
Olhei para cima e li estas palavras: Ubi non est redempo – “O lugar
sem indulto”. Percebi que estávamos à s portas do Inferno. O guia me
conduziu por todo esse lugar horrível. A distâ ncias regulares, portais de
bronze como as primeiras descidas íngremes negligenciadas; em cada
um havia uma inscriçã o, como: Discedite, maledicti, in ignem aeternum
qui paratus est diabolo et angelis eius – “Afastai-vos de mim, malditos no
fogo eterno que foi preparado para o diabo e seus anjos”. (Mateus
25:41). Omnis arbor quae non facit fructum bonum excidetur et in ignem
mittetur – “Toda á rvore que nã o dá bons frutos é cortada e lançada ao
fogo”. (Mateus 7:19).
Tentei copiá -los em meu caderno, mas meu guia me conteve: “Nã o
há necessidade. Você tem todos eles nas Sagradas Escrituras. Você
ainda tem alguns deles inscritos em seus pó rticos.”
Diante de tal visã o tive vontade de voltar e voltar ao Orató rio. Na
verdade, recuei, mas meu guia ignorou minha tentativa. Depois de
caminhar penosamente por uma ravina íngreme e interminável,
chegamos novamente ao sopé do precipício de frente para o primeiro
portal. De repente, o guia se virou para mim. Chateado e assustado, ele
fez sinal para que eu me afastasse. "Olhar!" ele disse.

Meninos que correm para baixo


Olhei para cima aterrorizado e vi ao longe alguém correndo pelo
caminho em uma velocidade incontrolável. Fiquei olhando para ele,
tentando identificá -lo, e quando ele se aproximou, reconheci-o como
um dos meus meninos. Seu cabelo desgrenhado estava parcialmente em
pé na cabeça e parcialmente jogado para trá s pelo vento. Seus braços
estavam estendidos como se ele estivesse se debatendo na á gua na
tentativa de se manter à tona. Ele queria parar, mas nã o conseguiu.
Tropeçando nas pedras salientes, ele caiu ainda mais rá pido. “Vamos
ajudá -lo, vamos detê-lo”, gritei, estendendo as mã os num esforço vã o
para contê-lo.
“Deixe-o em paz”, respondeu o guia.
"Por que?"
“Você nã o sabe quã o terrível é a vingança de Deus? Você acha que
pode conter alguém que está fugindo de Sua justa ira?”
Enquanto isso, o jovem voltou seu olhar ardente para trá s, na
tentativa de ver se a ira de Deus ainda o perseguia. No momento
seguinte, ele caiu no fundo da ravina e bateu contra o portal de bronze,
como se nã o conseguisse encontrar refú gio melhor para sua fuga.
“Por que ele estava olhando para trá s aterrorizado?” Perguntei.
“Porque a ira de Deus perfurará os portõ es do Inferno para
alcançá -lo e atormentá -lo mesmo no meio do fogo!”
Quando o menino colidiu com o portal, ele se abriu com um rugido,
e instantaneamente milhares de portais internos se abriram com um
clamor ensurdecedor, como se tivesse sido atingido por um corpo que
tivesse sido impulsionado por um vendaval invisível, violento e
irresistível. Como essas portas de bronze - uma atrá s da outra, embora
a uma distâ ncia considerável uma da outra - permaneceram
momentaneamente abertas, vi ao longe algo como mandíbulas de
fornalha jorrando bolas de fogo no momento em que o jovem se lançou
contra elas. Tã o rapidamente quanto se abriram, os portais se fecharam
novamente. Pela terceira vez tentei anotar o nome daquele infeliz rapaz,
mas o guia novamente me conteve. “Espere,” ele ordenou. "Assistir!"
Três outros meninos nossos, gritando de terror e com os braços
estendidos, rolavam um atrá s do outro como pedras enormes. Eu os
reconheci quando eles também bateram contra o portal. Naquela fraçã o
de segundo, ela se abriu e os outros mil também. Os três rapazes foram
sugados para aquele corredor interminável em meio a um eco interno
prolongado e desbotado, e entã o os portais se fecharam novamente. De
vez em quando, muitos outros rapazes caíam atrá s deles. Vi um menino
azarado sendo empurrado encosta abaixo por um companheiro
malvado. Outros caíram sozinhos ou acompanhados, de braços dados
ou lado a lado. Cada um deles trazia na testa o nome do seu pecado.
Continuei chamando-os enquanto eles desciam, mas eles nã o me
ouviram. Novamente os portais se abririam estrondosamente e se
fechariam com estrondo. Entã o, silêncio mortal!
A causa de muitas condenações
“ Maus companheiros, maus livros e maus hábitos ”, exclamou meu
guia, “sã o os principais responsáveis por tantas pessoas eternamente
perdidas”.
As armadilhas que eu tinha visto antes estavam de fato arrastando
os meninos para a ruína. Vendo tantos indo para a perdiçã o, gritei
desconsolado: “Se tantos dos nossos meninos acabam assim, estamos
trabalhando em vã o. Como podemos evitar tais tragédias?”
“Este é o estado atual deles”, respondeu meu guia, “e é para lá que
eles iriam se morressem agora”.
“Entã o deixe-me anotar seus nomes para que eu possa avisá -los e
colocá -los de volta no caminho para o Céu.”
“Você realmente acredita que alguns deles mudariam se você os
avisasse? Naquele momento, o seu aviso poderá impressioná -los, mas
logo eles o esquecerã o, dizendo: 'Foi apenas um sonho', e farã o pior do
que antes. Outros, percebendo que foram desmascarados, receberã o os
Sacramentos, mas isso nã o será espontâ neo nem meritó rio; outros irã o
se confessar por causa de um medo momentâ neo do Inferno, mas ainda
estarã o apegados ao pecado”.
“Entã o nã o há como salvar esses infelizes rapazes? Por favor, diga-
me o que posso fazer por eles.”
“Eles têm superiores; deixe-os obedecê-los. Eles têm regras; deixe-
os observá -los. Eles têm os Sacramentos; deixe-os recebê-los.
Só entã o um novo grupo de garotos desceu e os portais se abriram
momentaneamente. “Vamos entrar”, disse-me o guia.

A entrada no inferno
Recuei horrorizado, mal podia esperar para voltar correndo ao
Orató rio e avisar os meninos para que outros nã o se perdessem
também.
“Venha”, meu guia insistiu. “Você aprenderá muito. Mas primeiro
diga-me: você quer ir sozinho ou comigo?” Ele pediu isso para me fazer
perceber que eu nã o era corajoso o suficiente e, portanto, precisava de
sua ajuda amigável.
“Sozinho dentro daquele lugar horrível?” Eu respondi. “Como
poderei encontrar a saída sem a sua ajuda?” Entã o um pensamento me
veio à mente e despertou minha coragem. Antes de alguém ser
condenado ao Inferno, disse a mim mesmo, ele deve ser julgado. E ainda
não fui julgado!
“Vamos”, exclamei resolutamente. Entramos naquele corredor
estreito e horrível e passamos por ele na velocidade da luz. Inscriçõ es
ameaçadoras brilhavam assustadoramente em todos os portais
internos. A ú ltima dava para um pá tio vasto e sombrio, com uma
entrada grande e incrivelmente ameaçadora no outro extremo. Acima
dela havia esta inscriçã o: Ibunt impii in ignem aeternum – “E estes [os
ímpios] irã o para o fogo eterno”. ( Mateus 25:46). Todas as paredes ao
redor tinham inscriçõ es semelhantes. Perguntei ao meu guia se poderia
lê-los e ele consentiu. Estas foram as inscriçõ es:
Dabo ignem in carnes eorum ut comburantur in semptiernum —“Eu
darei fogo. . . em sua carne para que possam queimar para sempre.” (
Judite 16:21).
Cruciabuntur die ac nocte in saecula saeculorum – “Eles serã o
atormentados dia e noite para todo o sempre.” ( Apoc. 20:10).
Hic universitas malorum per omnia saecula saeculorum – “ Aqui
todos os tipos de tormentos para todo o sempre.”
Nullus est hic ordo, sed horror sempiternus habitat – “Aqui habitam
a desordem e o horror eterno”. ( Jó 10:22).
Fumus tormentorum suorum in aeternum ascendit – “A fumaça de
seus tormentos sobe para todo o sempre.” ( Apoc. 14:11).
Non est pax impiis – “Nã o há paz para os ímpios”. ( Is . 48:22).
Clamor et stridor dentium – “Haverá choro e ranger de dentes”. (
Mateus 8:12).
Enquanto eu passava de uma inscriçã o para outra, meu guia, que
estava no centro do pá tio, aproximou-se de mim.
“De agora em diante”, disse ele, “ninguém poderá ter um
companheiro prestativo, um amigo reconfortante, um coraçã o amoroso,
um olhar compassivo ou uma palavra benevolente. Tudo isso se foi para
sempre. Você quer apenas ver ou prefere experimentar essas coisas
sozinho?”
“Eu só quero ver!” Eu respondi.

Um corredor estreito e horrível


“Entã o venha comigo”, acrescentou meu amigo, e, puxando-me a
reboque, atravessou aquele portã o e entrou em um corredor em cuja
extremidade havia uma plataforma de observaçã o, fechada por um
enorme painel de cristal ú nico que ia da calçada até o teto. . Assim que
cruzei o seu limiar, senti um terror indescritível e nã o ousei dar mais
nenhum passo. À minha frente pude ver algo parecido com uma imensa
caverna, que gradualmente desaparecia em reentrâ ncias profundas nas
entranhas das montanhas. Eles estavam todos em chamas, mas o fogo
deles nã o era terrestre, com línguas de chamas saltitantes. A caverna
inteira – paredes, teto, chã o, ferro, pedras, madeira e carvã o – tudo era
de um branco brilhante em temperaturas de milhares de graus. No
entanto, o fogo nã o incinerou, nã o consumiu. Simplesmente nã o
consigo encontrar palavras para descrever o horror da caverna.
Praeparata est enim ab heri Thopeth, a rege praeparata, profunda et
dilatata. Nutrimenta eius, ignis et ligna multa; flatus Domini sicut torrens
sulphuris succendens eam —“Pois em Tofete foi preparado de antemã o. .
. um poço fundo e largo, cheio de palha e madeira em abundâ ncia. O
sopro do Senhor, como uma torrente de enxofre, ateará fogo nela”. ( Is.
30:33).
Eu estava olhando perplexo ao meu redor quando um rapaz saiu
correndo por um portã o. Aparentemente inconsciente de mais nada, ele
emitiu um grito estridente, como alguém que está prestes a cair em um
caldeirã o de bronze líquido, e despencou no centro da caverna;
instantaneamente, ele também ficou incandescente e perfeitamente
imó vel, enquanto o eco de seu lamento moribundo permaneceu por
mais um instante.
Terrivelmente assustado, olhei brevemente para ele por um tempo.
Ele me pareceu um dos meus meninos do Orató rio. “Ele nã o é fulano de
tal?” Perguntei ao meu guia.
“Sim”, foi a resposta.
“Por que ele está tã o imó vel, tã o incandescente?”
“Você escolheu ver”, ele respondeu. “Fique satisfeito com isso.
Continue procurando. Além disso, Omnis enim igne salietur et
omnis Victima sale salietur —'Todos serã o salgados com fogo; toda
vítima será salgada.' ” (Marcos 9:48).
Quando olhei novamente, outro garoto entrou correndo na caverna
em uma velocidade alucinante. Ele também era do Orató rio. Quando ele
caiu, ele permaneceu. Ele também emitiu um ú nico grito comovente
que se misturou com o ú ltimo eco do grito que veio do jovem que o
precedeu. Outros garotos continuavam avançando da mesma maneira,
em nú meros crescentes, todos gritando da mesma maneira e depois
ficando igualmente imó veis e incandescentes. Notei que o primeiro
parecia congelado no lugar, uma mã o e um pé levantados no ar; o
segundo menino parecia curvado quase ao meio no chã o. Outros
ficavam de pé ou pendurados em vá rias outras posiçõ es, equilibrando-
se em um pé ou em uma mã o, sentados ou deitados de costas ou de
lado, em pé ou ajoelhados, com as mã os segurando os cabelos.
Resumidamente, a cena lembrava um grande grupo estatuá rio de
jovens colocados em posturas cada vez mais dolorosas. Outros rapazes
foram lançados na mesma fornalha. Alguns eu conhecia; outros eram
estranhos para mim. Lembrei-me entã o do que está escrito na Bíblia no
sentido de que, assim como alguém cai no Inferno, ele permanecerá
para sempre. Lignum, in quocumque loco ceciderit, ibi erit – “Onde a
á rvore cair, ali ficará”. ( Eclesiastes 11:3).
Mais meninos caem
Mais assustado do que nunca, perguntei ao meu guia: “Quando
esses meninos entram correndo nesta caverna, eles nã o sabem para
onde estã o indo?”
“Eles certamente fazem. Eles foram avisados mil vezes, mas ainda
assim optam por correr para o fogo, porque nã o detestam o pecado e
sã o relutantes em abandoná -lo. Além disso, desprezam e rejeitam os
convites incessantes e misericordiosos de Deus para fazer penitência.
Assim provocada, a Justiça Divina os atormenta, persegue e incita, para
que nã o possam parar até chegarem a este lugar.”
“Oh, como esses infelizes meninos devem se sentir infelizes ao
saber que nã o têm mais esperança”, exclamei.
“Se você realmente quer conhecer seu frenesi e fú ria mais íntimos,
vá um pouco mais perto”, observou meu guia.
Dei alguns passos à frente e vi que muitos daqueles pobres
coitados se atacavam selvagemente como cã es loucos. Outros estavam
arranhando o pró prio rosto e as mã os, rasgando a pró pria carne e
jogando-a maldosamente. Só entã o todo o teto da caverna tornou-se tã o
transparente quanto cristal e revelou um pedaço do Céu e seus
companheiros radiantes, seguros por toda a eternidade.

A Misericórdia de Deus Desprezada


Os pobres coitados, furiosos e ofegantes de inveja, ardiam de raiva
porque outrora ridicularizaram os justos. Peccator videbit et irascetur;
dentibus suis fremet et tabescet – “Os ímpios verã o e ficarã o irados. Ele
rangerá os dentes e definhará .” ( Salmo 111:10).
“Por que nã o ouço nenhum som?” Perguntei ao meu guia.
“Aproxime-se!” ele aconselhou.
Encostando o ouvido na janela de cristal, ouvi gritos e soluços,
blasfêmias e imprecaçõ es contra os santos. Foi um tumulto de vozes e
gritos, estridentes e confusos.
“Quando recordam a sorte dos seus bons companheiros”,
respondeu ele, “sã o obrigados a admitir: Nos insensati, vitam illorum
aestimabamus insaniam et finem illorum sine honore. Ecce quomodo
computati sunt inter filios Dei et inter sanctos sors illorum est. Ergo
erravimus a via veritatis —'Tolos que éramos! Consideramos suas vidas
uma loucura e suas mortes desonradas. Veja como eles sã o
contabilizados entre os filhos de Deus; o destino deles é com os santos.
Nó s, entã o, nos desviamos do caminho da verdade.' ”( Sab. 5:4-5).
“É por isso que gritam: Lassati sumus in via iniquitatis et
perditionis. Erravimus per vias difficiles, viam autem Domini
ignoravimus. Quid nobis lucro soberbia? . . . Transierunt omnia illa
tamquam umbra —'Estávamos fartos dos caminhos da maldade e da
ruína. Viajamos por desertos intransponíveis, mas nã o conhecíamos o
caminho do Senhor. O que nosso orgulho nos adiantou? . . . Todas essas
coisas passaram como uma sombra. ”( Sab. 5:7-9).
“Tais sã o os cantos tristes que ecoarã o aqui por toda a eternidade.
Mas os seus gritos, os seus esforços e os seus gritos sã o todos em vã o.
Omnis dolor irruet super eos! - 'Todo o mal cairá sobre eles.' ”( Jó 20:22).
“Aqui o tempo nã o existe mais. Aqui está apenas a eternidade.”
Enquanto eu observava a condiçã o de muitos dos meus meninos
com total terror, um pensamento de repente me ocorreu: “Como esses
meninos podem ser condenados?” Perguntei. “Ontem à noite eles ainda
estavam vivos no Orató rio!”
“Os meninos que você vê aqui”, ele respondeu, “estã o todos mortos
para a graça de Deus. Se eles morressem agora ou persistissem em seus
maus caminhos, seriam condenados. Mas estamos perdendo tempo.
Vamos continuar.

Fogo Inextinguível
Ele me levou embora e descemos por um corredor até uma caverna
inferior, em cuja entrada li: Vermis eorum non morietur, et ignis non
extinguetur – “O seu verme nã o morrerá e o seu fogo nã o se apagará”. (
Is . 66:24). Dabit Dominus omnipotens ignem et vermes in carnes eorum
ut urantur et sentiant usque in sempiternum - “Ele dará fogo e vermes
em suas carnes, para que sintam para sempre.” ( Judite 16:21).
Aqui se via quã o atroz era o remorso daqueles que haviam sido
alunos em nossas escolas. Que tormento foi para eles lembrarem-se de
cada pecado nã o perdoado e de seu justo castigo, dos incontáveis e até
mesmo extraordiná rios meios que tiveram para consertar seus
caminhos, perseverar na virtude e conquistar o Paraíso, e sua falta de
resposta aos muitos favores prometidos e concedidos pela Virgem.
Mary. Que tortura pensar que eles poderiam ter sido salvos tã o
facilmente, mas agora estã o irremediavelmente perdidos, e lembrar das
muitas boas resoluçõ es tomadas e nunca cumpridas. O inferno está
realmente cheio de boas intençõ es!
Nesta caverna inferior, vi novamente aqueles meninos do Orató rio
que haviam caído na fornalha ardente. Alguns estã o me ouvindo agora;
outros sã o ex-alunos ou até estranhos para mim. Aproximei-me deles e
notei que estavam todos cobertos de vermes e vermes, que corroíam
seus ó rgã os vitais, coraçõ es, olhos, mã os, pernas e corpos inteiros com
tanta ferocidade que desafiavam qualquer descriçã o. Indefesos e
imó veis, eram vítimas de todo tipo de tormento. Esperando poder falar
com eles ou ouvir algo deles, cheguei ainda mais perto, mas ninguém
falou ou sequer olhou para mim. Perguntei entã o ao meu guia porquê e
ele explicou que os condenados estã o totalmente privados de liberdade.
Cada um deve suportar completamente o seu pró prio castigo, sem
absolutamente nenhum indulto.
“E agora”, acrescentou ele, “você também deve entrar naquela
caverna”.
"Oh nã o!" Eu me opus aterrorizado. “Antes de ir para o Inferno, é
preciso ser julgado. Ainda nã o fui julgado e por isso nã o irei para o
Inferno!”
“Escute”, disse ele, “o que você prefere fazer: visitar o Inferno e
salvar seus meninos ou ficar do lado de fora e deixá -los em agonia?”
Por um momento fiquei sem palavras. “É claro que amo meus
meninos e desejo salvá -los a todos”, respondi, “mas nã o há outra saída?”
“Sim, há uma maneira”, continuou ele, “desde que você faça tudo o
que puder”.
Respirei com mais facilidade e imediatamente disse para mim
mesmo: Não me importo de trabalhar como escravo se puder resgatar
esses meus amados filhos de tais tormentos.
“Entre entã o”, continuou meu amigo, “e veja como nosso bom e
todo-poderoso Deus amorosamente fornece mil meios para guiar seus
meninos à penitência e salvá -los da morte eterna”.
Pegando minha mã o, ele me levou para dentro da caverna. Ao
entrar, fui subitamente transportado para um magnífico salã o cujas
portas de vidro com cortinas ocultavam mais entradas.
Acima de um deles, li esta inscriçã o: O Sexto Mandamento.
Apontando para ele, meu guia exclamou: “As transgressõ es deste
mandamento causaram a ruína eterna a muitos meninos”.
“Eles nã o se confessaram?”
“Eles o fizeram, mas omitiram ou confessaram insuficientemente
os pecados contra a bela virtude da pureza, dizendo, por exemplo, que
haviam cometido tais pecados duas ou três vezes quando eram quatro
ou cinco. Outros meninos podem ter caído nesse pecado apenas uma
vez na infâ ncia e, por vergonha, nunca o confessaram ou o fizeram de
forma insuficiente. Outros nã o estavam verdadeiramente arrependidos
ou sinceros na sua decisã o de evitá -lo no futuro. Houve até alguns que,
em vez de examinarem a sua consciência, gastaram o seu tempo a
tentar descobrir a melhor forma de enganar o seu confessor. Qualquer
pessoa que morra com esse estado de espírito escolhe estar entre os
condenados e, portanto, está condenada por toda a eternidade.
Somente aqueles que morrem verdadeiramente arrependidos serã o
eternamente felizes. Agora você quer ver por que nosso Deus
misericordioso trouxe você aqui?” Ele levantou a cortina e vi um grupo
de meninos do Orató rio – todos conhecidos por mim – que estavam ali
por causa deste pecado. Entre eles estavam alguns cuja conduta parece
ser boa.
“Agora você certamente me deixará anotar seus nomes para que eu
possa avisá -los individualmente”, exclamei.
“Nã o será necessá rio!”
“Entã o o que você sugere que eu diga a eles?”
“Sempre pregue contra a imodéstia. Um aviso genérico será
suficiente. Tenha em mente que mesmo que você os advertisse
individualmente, eles prometeriam, mas nem sempre com seriedade.
Para uma resoluçã o firme é necessá ria a graça de Deus, que nã o será
negada aos vossos meninos. Se eles orarem, Deus manifesta Seu amor,
especialmente sendo misericordioso e perdoador. De sua parte, ore e
faça sacrifícios. Quanto aos rapazes, deixe-os ouvir as suas advertências
e consultar a sua consciência. Isso lhes dirá o que fazer.”
Passamos a meia hora seguinte discutindo os requisitos de uma
boa Confissã o. Depois, meu guia exclamou vá rias vezes em voz alta: “
Avertere! Avertere! ”
"O que você quer dizer?" Perguntei.
“Mude de vida!”

Apego às coisas terrenas


Perplexo, baixei a cabeça e fiz mençã o de me retirar, mas ele me
conteve.
“Você ainda nã o viu tudo”, explicou ele.
Ele se virou e ergueu outra cortina com esta inscriçã o: Qui volunt
divites fieri, incidunt in tentationem et laqueum diaboli – “Aqueles que
desejam ser ricos sã o vítimas da tentaçã o e das armadilhas do diabo”. (
1 Timóteo 6:9).
“Isto nã o se aplica aos meus meninos”, respondi, “porque eles sã o
tã o pobres quanto eu. Nã o somos ricos e nã o queremos ser. Nã o
pensamos nisso.
Porém, quando a cortina foi levantada, vi um grupo de meninos,
todos conhecidos por mim. Eles estavam com dor, como aqueles que eu
tinha visto antes. Apontando para eles, meu guia comentou: “Como você
vê, a inscriçã o se aplica aos seus meninos.”
"Mas como?" Perguntei.
“Bem”, disse ele, “alguns meninos sã o tã o apegados aos bens
materiais que seu amor a Deus diminui. Assim, pecam contra a
caridade, a piedade e a mansidã o. Até mesmo o mero desejo de
riquezas pode corromper o coraçã o, especialmente se tal desejo levar à
injustiça. Seus meninos sã o pobres, mas lembrem-se de que a ganâ ncia
e a ociosidade sã o maus conselheiros. Um de seus rapazes cometeu
roubos substanciais em sua cidade natal e, embora pudesse fazer a
restituiçã o, nã o se importa. Há outros que tentam arrombar a despensa
ou o gabinete do prefeito ou do ecô nomo, aqueles que vasculham os
baú s dos companheiros em busca de comida, dinheiro ou bens; aqueles
que roubam artigos de papelaria e livros. . .”
Depois de nomear estes meninos e também outros, continuou:
“Alguns estã o aqui por terem roubado roupas, lençó is, cobertores e
casacos do guarda-roupa do Orató rio para mandá -los para casa, para
suas famílias; outros por danos graves e intencionais; outros ainda, por
nã o terem devolvido o que pediram emprestado ou por terem ficado
com quantias de dinheiro que deveriam entregar ao superior. Agora que
você sabe quem sã o esses meninos”, concluiu ele, “admoeste-os. Diga-
lhes para refrear todos os desejos vã os e nocivos, para obedecer à lei de
Deus e para salvaguardar zelosamente a sua reputaçã o, para que a
ganâ ncia nã o os leve a excessos maiores e os mergulhe na tristeza, na
morte e na condenaçã o.”
Eu nã o conseguia entender por que puniçõ es tã o terríveis
deveriam ser aplicadas a infraçõ es nas quais os meninos
menosprezavam, mas meu guia me tirou dos pensamentos dizendo:
“Lembre-se do que lhe disseram quando viu aquelas uvas estragadas na
videira”. Com estas palavras levantou outra cortina que escondia muitos
dos nossos meninos do Orató rio, todos os quais reconheci
instantaneamente. A inscriçã o na cortina dizia: Radix omnium malorum
– “A raiz de todos os males”.
"Você sabe o que isso significa?" ele me perguntou imediatamente.
“A que pecado isso se refere?”
"Orgulho?"
"Nã o!"
“E ainda assim sempre ouvi que o orgulho é a raiz de todos os
males.”
“É , de modo geral, mas, especificamente, você sabe o que levou
Adã o e Eva a cometer o primeiro pecado pelo qual foram expulsos de
seu paraíso terrestre?”
"Desobediência?"
"Exatamente! A desobediência é a raiz de todo mal.”
“O que devo dizer aos meus meninos sobre isso?”

Obediência
“Ouçam com atençã o: os meninos que vocês veem aqui sã o aqueles
que preparam para si um fim tã o trá gico ao serem desobedientes.
Fulano de tal e tal, que você acha que foram para a cama, saem do
dormitó rio mais tarde para passear pelo parquinho e, ao contrá rio de
outros, se perdem em á reas perigosas e sobem em andaimes, colocando
em risco até mesmo seus vidas. Outros vã o à igreja, mas ignorando as
recomendaçõ es, comportam-se mal; em vez de orar, eles sonham
acordados ou causam perturbaçõ es. Há também aqueles que se
acomodam para cochilar durante os cultos e aqueles que apenas fingem
que vã o à igreja. Ai daqueles que negligenciam a oraçã o! Quem nã o ora,
condena-se à perdiçã o. Alguns estã o aqui porque, em vez de cantar
hinos ou rezar o Pequeno Ofício da Santíssima Virgem, lêem livros
frívolos ou – pior ainda – proibidos”. Ele entã o continuou mencionando
outras violaçõ es graves de disciplina.
Quando ele terminou, fiquei profundamente comovido.
“Posso mencionar todas essas coisas aos meus meninos?” Eu
perguntei, olhando para ele diretamente nos olhos.
“Sim, você pode contar a eles tudo o que lembrar.”
“Que conselho devo dar-lhes para protegê-los de tal tragédia?”
“Continue dizendo-lhes que obedecendo a Deus, à Igreja, aos seus
pais e aos seus superiores, mesmo nas pequenas coisas, eles serã o
salvos”.
"Algo mais?"
“Avise-os contra a ociosidade. Por causa da ociosidade, Davi caiu
em pecado. Diga-lhes para se manterem ocupados o tempo todo,
porque o diabo nã o terá chance de tentá -los.”
Baixei a cabeça e prometi. Desmaiado de consternaçã o, só consegui
murmurar: “Obrigado por ter sido tã o bom comigo. Agora, por favor,
tire-me daqui.
“Tudo bem, entã o venha comigo.” De forma encorajadora, ele
pegou minha mã o e me segurou porque eu mal conseguia ficar de pé.
Saindo daquele salã o, em pouco tempo refizemos nossos passos por
aquele horrível pá tio e pelo longo corredor. Mas assim que
atravessamos o ú ltimo portal de bronze, ele se virou para mim e disse:
“Agora que você viu o que os outros sofrem, você também deve
experimentar um toque do Inferno”.
"Nã o nã o!" Eu chorei de terror.

Tocando a Parede do Inferno


Ele insistiu, mas eu continuei recusando.
“Nã o tenha medo”, ele me disse; "Apenas tente. Toque nesta
parede.”
Nã o consegui reunir coragem suficiente e tentei fugir, mas ele me
segurou. “Experimente”, ele insistiu. Agarrando meu braço com firmeza,
ele me puxou para a parede. “Apenas um toque”, ordenou ele, “para que
você possa dizer que viu e tocou as paredes do sofrimento eterno e
para que possa entender como deve ser a ú ltima parede, se a primeira é
tã o insuportável. Olhe para esta parede!
Eu fiz atentamente. Parecia incrivelmente grosso. “Existem mil
paredes entre isto e o verdadeiro fogo do Inferno”, continuou meu guia.
“Mil paredes o cercam, cada uma com mil medidas de espessura e
igualmente distantes da pró xima. Cada medida equivale a mil milhas.
Este muro, portanto, está a milhõ es e milhõ es de quilô metros do
verdadeiro fogo do Inferno. É apenas uma borda remota do pró prio
Inferno.”
Quando ele disse isso, instintivamente me afastei, mas ele agarrou
minha mã o, forçou-a a abri-la e pressionou-a contra a primeira das mil
paredes. A sensaçã o foi tã o insuportável que pulei para trá s com um
grito e me vi sentado na cama. Minha mã o estava ardendo e continuei
esfregando-a para aliviar a dor. Quando acordei esta manhã notei que
estava inchado. Ter minha mã o pressionada contra a parede, embora
apenas em um sonho, parecia tã o real que, mais tarde, a pele da palma
da minha mã o foi arrancada.
Tenha em mente que tentei nã o assustá -lo muito e, portanto, nã o
descrevi essas coisas com todo o horror que as vi e como me
impressionaram. Sabemos que Nosso Senhor sempre retratou o Inferno
em símbolos porque, se o tivesse descrito como realmente é, nã o o
teríamos compreendido. Nenhum mortal pode compreender essas
coisas. O Senhor os conhece e os revela a quem quer.
Nas noites seguintes nã o consegui adormecer porque ainda estava
perturbado por esse sonho terrível. O que eu lhe contei é apenas um
breve resumo de sonhos muito longos. Mais tarde falarei com vocês
sobre o respeito humano, o Sexto e o Sétimo Mandamentos e o orgulho.
Nada mais farei do que explicar esses sonhos, que estã o plenamente de
acordo com as Sagradas Escrituras. Na verdade, sã o apenas um
comentá rio dos ensinos da Bíblia sobre estes assuntos. Algumas noites
atrá s eu lhe contei uma coisa, mas contarei o resto e explicarei sempre
que tiver oportunidade de falar com você.
Dom Bosco cumpriu a sua promessa. Mais tarde, ele narrou esse
sonho de forma condensada aos meninos de nossas escolas de
Mirabello e Lanzo. Na recontagem, ele introduziu variaçõ es, mas nã o fez
alteraçõ es substanciais. Da mesma forma, quando falava dele em
particular aos sacerdotes e clérigos salesianos, com os quais gozava de
maior familiaridade, acrescentava novos detalhes. Ocasionalmente, ele
omitiu detalhes ao conversar com algumas pessoas, revelando-os a
outras. Com relaçã o à s armadilhas do diabo, ao discutir os maus
há bitos, ele elaborou as tá ticas do diabo para atrair as vítimas para o
Inferno. De muitas cenas ele nã o ofereceu nenhuma explicaçã o. Por
exemplo, ele nã o disse nada sobre as figuras majestosas que viu
naquele magnífico salã o, que tendemos a chamar de “o tesouro da
misericó rdia de Deus para salvar meninos que de outra forma
pereceriam”. Foram essas pessoas talvez os principais dispensadores de
inú meras graças?
Algumas variaçõ es em sua narraçã o decorreram da multiplicidade
de cenas simultâ neas. À medida que eles voltavam à sua mente, ele
selecionava o que considerava mais adequado ao seu pú blico. Afinal,
meditar nas Quatro Ú ltimas Coisas era um há bito para ele. Tal
meditaçã o despertou em seu coraçã o uma compaixã o muito viva por
todos os pecadores ameaçados por uma eternidade tã o terrível. Esta
caridade ardente ajudou-o a superar qualquer reticência, ao convidar
prudentemente, mas francamente, até mesmo pessoas muito
proeminentes a corrigirem-se. Também tornou suas palavras tã o
eficazes que geraram muitas conversõ es.
33
A ROSA PERGOLA
Rosas e espinhos
( Memórias Biográficas , Vol. III, página 25; página 19 na Edição em Inglês)

A VISÃ O ocorreu em 1847, mas Dom Bosco a narrou apenas em 1864.


Lemos nas crô nicas: Dom Bosco a relatou pela primeira vez em 1864,
quando uma noite, depois das oraçõ es, como à s vezes era seu costume,
reuniu os membros de sua congregaçã o infantil em sua antessala para
uma conferê ncia. Entre os presentes estavam o Pe. Victor Alasonatti,
Pe. Miguel Rua, Pe. Joã o Cagliero, 1 Pe. Celestine Durando e os dois
clé rigos John Lazzero e Julius Barberis. Depois de falar do desapego do
mundo e da pró pria família para seguir o exemplo de Nosso Senhor,
concluiu:
Já lhe contei vá rias coisas que vi como num sonho. Deles você pode
inferir o quanto Nossa Senhora nos ama e nos ajuda. Mas agora que
estamos todos juntos e sozinhos, vou contar-vos, nã o apenas mais um
sonho, mas algo que a pró pria Nossa Senhora gentilmente me mostrou.
Faço isto para que cada um de nó s se convença de que é Nossa Senhora
quem quer a nossa Congregaçã o. Isto deveria estimular-nos a trabalhar
cada vez mais arduamente para a maior gló ria de Deus. Ela quer que
depositemos toda a nossa confiança nela. Estou confiando em você. Por
favor, nã o mencione o que eu lhe digo a ninguém nesta casa ou a
pessoas de fora, para nã o dar oportunidade a línguas má s.
Um dia, em 1847, depois de ter passado muito tempo refletindo
sobre como poderia ajudar os outros, especialmente os jovens, a Rainha
dos Céus apareceu-me. Ela me levou a um lindo jardim. Ali existia um
pó rtico rú stico, mas amplo e encantador, construído como vestíbulo.
Seus pilares eram revestidos de trepadeiras cujas gavinhas, repletas de
folhas e flores, se estendiam juntas para cima e formavam um gracioso
toldo. O pó rtico abria-se para um lindo passeio que logo se
transformou, até onde a vista alcançava, numa belíssima pérgula
(caramanchã o), cujas laterais estavam forradas de encantadoras rosas
em plena floraçã o. O chã o também estava coberto de rosas. A
Santíssima Virgem me disse: “Tire os sapatos”. Quando terminei, ela
acrescentou: “Ande sob aquela pérgula de rosas, pois este é o caminho
que você deve seguir”. Tirei os sapatos com prazer, porque seria uma
pena pisar em rosas tã o lindas. Dei apenas alguns passos e
imediatamente senti espinhos muito afiados perfurando meus pés e
fazendo-os sangrar. Tive que parar e voltar.
“É melhor eu usar meus sapatos”, disse ao meu guia. “Sim, de fato”,
ela respondeu, “robustos”. Entã o calcei novamente os sapatos e voltei
para a pérgula de rosas, seguido por vá rios ajudantes que tinham
acabado de aparecer e pediram para ir comigo. Eles me seguiram sob a
pérgula de beleza indescritível, mas à medida que avançava notei que
ela estava ficando estreita e baixa. Muitos de seus galhos estavam
pendurados como festõ es; outros, em vez disso, simplesmente caíram
direto. Alguns ramos, aqui e ali, projetavam-se lateralmente dos caules
das rosas, enquanto outros formavam um matagal que bloqueava
parcialmente o caminho; outros ainda rastejaram pelo chã o. Todos os
galhos, porém, estavam cheios de rosas. Havia rosas ao meu redor, rosas
acima de mim e rosas sob meus pés.
Enquanto meus pés me faziam estremecer de dor, nã o pude deixar
de roçar nas rosas ao meu lado, e espinhos ainda mais afiados me
picaram. Mas continuei andando. Minhas pernas dilaceradas, porém,
ficavam presas nos galhos mais baixos. Sempre que eu afastava um
galho que impedia meu caminho, ou contornava as laterais da pérgula
para evitá -lo, os espinhos cravavam-se em mim e me faziam sangrar
por todo o corpo. As rosas acima também estavam cheias de espinhos
que espetavam minha cabeça. Apesar disso, segui em frente encorajado
pela Santíssima Virgem. De vez em quando, porém, alguns espinhos
mais afiados me perfuravam mais do que outros e causavam mais dor.
O sonho de São João Bosco com as rosas e os espinhos simbolizando o fato de que, embora o
caminho dos Salesianos parecesse aos estranhos “coberto de rosas”, também havia muitos
espinhos sob os pés. (Observe os pés descalços de São João Bosco.)
Enquanto isso, aqueles que me observavam passar por baixo
daquele caramanchã o – e eram uma multidã o – faziam comentá rios
como: “Que sorte Dom Bosco é ! Seu caminho está sempre repleto de
rosas. Ele nã o tem nenhuma preocupaçã o no mundo. Sem problemas!
Mas eles nã o conseguiam ver os espinhos que perfuravam minhas
pobres pernas. Chamei muitos sacerdotes, clé rigos 2 e leigos que me
seguissem, e o fizeram com alegria, encantados com a beleza das flores.
Quando, poré m, descobriram que tinham de passar por cima de
espinhos afiados e que nã o havia como evitá -los, começaram a
reclamar em voz alta: “Fomos enganados.” Eu respondi: “Se você
estiver fora por um bom tempo, é melhor voltar. Se nã o, siga-me”,
Muitos voltaram atrá s. Depois de continuar por um tempo, me
virei para olhar para meus seguidores. Você nã o pode imaginar como
me senti quando vi que alguns haviam desaparecido e outros já haviam
voltado e estavam indo embora. Fui atrá s deles e os chamei de volta,
mas foi inú til; eles nem sequer me ouviram. Entã o comecei a chorar e
chorei sem parar enquanto me perguntava: “Devo trilhar este caminho
doloroso sozinho?”
Mas logo fui consolado. Vi um grupo de sacerdotes, clérigos e
leigos vindo em minha direçã o. “Aqui estamos”, disseram eles. “Somos
todos seus e estamos prontos para segui-lo.” Entã o eu os conduzi
adiante. Apenas alguns perderam o â nimo e desistiram; a maioria deles
me seguiu.
Depois de percorrer toda a extensã o da pé rgula, encontrei-me em
outro jardim encantador, e meus poucos seguidores se reuniram ao
meu redor. Eles estavam exaustos, esfarrapados e sangrando, mas uma
brisa fresca curou todos eles. Outra rajada de vento veio e, como num
passe de má gica, me vi cercado por uma vasta multidã o de meninos,
jovens clé rigos, irmã os coadjutores 3 e até padres que começaram a me
ajudar a cuidar de todos aqueles meninos. Muitos desses ajudantes eu
conhecia, mas muitos outros eram estranhos.
Entretanto, cheguei a um ponto mais alto do jardim, onde se erguia
um edifício muito imponente e majestoso. Entrei e me deparei com um
salã o espaçoso e tã o grandioso que duvido que alguém pudesse
encontrar igual em qualquer palá cio real. Rosas frescas e sem espinhos,
espalhadas por todo o salã o, enchiam-no com uma fragrâ ncia muito
delicada. A Santíssima Virgem, que sempre foi minha guia, perguntou-
me agora: “Você compreende o significado do que vê agora e do que viu
antes?”
"Nã o, eu disse. "Por favor, explique-me."
Ela respondeu: “O caminho repleto de rosas e espinhos é uma
imagem da sua missã o entre os meninos. Você deve usar sapatos,
símbolo de mortificaçã o. Os espinhos na terra representam afetos
sensíveis, gostos e desgostos humanos que desviam o educador do seu
verdadeiro objetivo, enfraquecem-no e impedem-no na sua missã o e
impedem o seu progresso e a colheita celestial. As rosas simbolizam a
caridade ardente que deve ser o seu traço distintivo e o dos seus
colegas de trabalho. Os outros espinhos representam obstá culos,
sofrimentos e decepçõ es que você experimentará . Mas você nã o deve
desanimar. A caridade e a mortificaçã o permitir-vos-ã o superar todas
as dificuldades e conduzir-vos-ã o a rosas sem espinhos”.
Assim que a Mã e de Deus terminou de falar, acordei e me encontrei
no meu quarto.
Dom Bosco compreendeu o sentido do sonho e concluiu dizendo
que a partir de entã o sabia exatamente o caminho que deveria seguir.
Ele já conhecia os obstá culos e armadilhas com os quais seus
adversá rios tentariam bloquear seu progresso. Muitos seriam os
espinhos em seu caminho, mas ele tinha certeza, absoluta certeza, da
vontade de Deus no assunto e do sucesso final de seu grande
empreendimento.
O sonho também o advertiu para nã o desanimar com a deserçã o de
alguns que pareciam chamados a ajudá -lo em seu trabalho. Os
primeiros que o abandonaram foram sacerdotes e leigos que nos
primeiros tempos do Orató rio Festivo se ofereceram para ajudá -lo. Os
que vieram depois foram os seus pró prios Salesianos, e o vento
simbolizava a pró xima assistência e conforto divino. Numa ocasiã o
posterior, Dom Bosco revelou que este sonho, ou visã o, foi repetido em
1848 e 1856, cada vez em circunstâ ncias ligeiramente diferentes, que
integramos na nossa narraçã o para evitar repetiçõ es.
Embora em 1847 Dom Bosco guardasse este segredo para si, a sua
devoçã o à Santíssima Virgem tornou-se cada vez mais ardente, como
ouvimos de Joseph Buzzetti. Cada vez mais eficazes foram os seus
esforços para exortar os seus rapazes a celebrarem todas as festas de
Nossa Senhora e o mês de maio para sua pró pria vantagem espiritual.
Era evidente que ele se tinha confiado plenamente à Divina
Providência, tal como uma criança se lança nos braços da mã e. A
determinaçã o sem hesitaçã o que ele demonstrava ao tomar decisõ es
quando assolado por graves problemas ou dificuldades mostrava
claramente que ele estava executando um programa já estabelecido
para ele e que estava seguindo a orientaçã o de cima. Parecia que a
diretriz dada a Moisés: “Cuide de fazê-los de acordo com o modelo que
lhe foi mostrado”, agora havia sido repetida para ele. ( Ex. 25:40).
Poderíamos finalmente acrescentar que, de tempos em tempos,
vá rios comentá rios escapavam de seus lá bios, levando seus associados
mais pró ximos a acreditar que havia mais do que aparentavam. Nessas
ocasiõ es, parecia contemplar com amor a imagem da Santíssima
Virgem, resplandecente nas alturas e convidando toda a humanidade a
recorrer a Ela.
——————
1. João Cagliero entrou no Orató rio em 1851, foi ordenado sacerdote em 1862, tornando-se depois
o primeiro Bispo, Arcebispo e Cardeal Salesiano. Foi o líder da primeira expedição missionária à
América do Sul (1875). Há uma bela biografia em dois volumes, em italiano e um em inglês, do Pe.
Peter Lappin: Conquistador , Salesianos, Madras.
2. “Clérigo” aqui significa membro da Sociedade Salesiana em formação para o sacerdó cio.
3. “Irmão Coadjutor” significa aqui um membro leigo da Sociedade Salesiana.
34
AS LUTAS
DA SOCIEDADE
( Memórias Biográficas , Vol. XIV, p. 123)

UM SONHO PROFÉ TICO foi narrado por Dom Bosco no dia 9 de maio
de 1879. Nele ele viu as lutas incansáveis que teriam que ser
enfrentadas por aqueles que são chamados à Congregação Salesiana, e
recebeu uma sé rie de conselhos ú teis para todos e algumas instruçõ es
salutares para o futuro.
Houve primeiro uma luta feroz e longa entre alguns meninos e
guerreiros de diversos aspectos, formas diversas, com armas estranhas.
No final, houve muito poucos sobreviventes.
Depois ocorreu outra batalha mais feroz e horrível entre monstros
de tamanho gigantesco e homens de alta estatura, bem armados e bem
treinados. Levavam uma bandeira muito alta e larga, no centro da qual
estavam pintadas em ouro estas palavras: MARIA AUXILIUM
CHRISTIANORUM – “Maria, Auxiliadora dos Cristã os”. A batalha foi longa
e sangrenta. Mas aqueles que seguiram a bandeira eram invulneráveis e
permaneceram senhores de uma planície muito vasta.
A estes juntaram-se os rapazes que sobreviveram à batalha
anterior e todos juntos formaram uma espécie de exército, cada um
carregando como arma na mã o direita o santo crucifixo e na mã o
esquerda uma pequena bandeira de Maria, Auxiliadora dos Cristã os,
semelhante ao mencionado acima.
Os novos soldados realizaram muitas manobras naquela vasta
planície; depois separaram-se e alguns partiram para o Leste, alguns
para o Norte e muitos para o Sul.
Tendo estes desaparecido, renovaram-se novamente as mesmas
batalhas, as mesmas manobras e partidas para as mesmas direçõ es.
Reconheci alguns soldados das primeiras batalhas: os que se
seguiram eram-me desconhecidos, mas mostraram que me conheciam
e fizeram-me muitas perguntas.
Logo depois seguiu-se uma chuva torrencial de pequenas chamas
brilhantes de fogo de vá rias cores. Trovejou, e entã o o céu clareou e me
vi num jardim encantador. Um homem parecido com Sã o Francisco de
Sales ofereceu-me um livrinho sem dizer uma palavra. Perguntei quem
ele era. “Leia no livro”, ele respondeu.
Abri o livro, mas mal consegui lê-lo. Pude, no entanto, distinguir
estas palavras precisas:
Aos Noviços: Obediência em tudo. Pela obediência merecerã o a
bênçã o do Senhor e a boa vontade dos homens. Através da diligência
combaterã o e vencerã o as armadilhas dos seus inimigos espirituais.
Aos Professos: Guardar zelosamente a virtude da castidade. Amar
o bom nome dos Irmã os e promover o decoro da Congregaçã o.
Aos Diretores: Todo cuidado, todo cansaço para observar e fazer
observar as Regras pelas quais todos se consagraram a Deus.
Ao Superior: Holocausto absoluto para conquistar a si mesmo e
aos seus sú ditos para Deus.
Muitas outras coisas estavam impressas naquele livro, mas nã o
consegui ler mais, porque o papel e a tinta pareciam azuis.
"Quem é você?" novamente perguntei à quele homem que me
olhava com semblante sereno.
“Meu nome é conhecido por todas as pessoas boas e fui enviado
para comunicar-lhes alguns acontecimentos futuros.”
"Qual?"
“Aqueles já mostrados e aqueles que você vai perguntar.”
“O que devo fazer para promover as vocaçõ es?”
“Os Salesianos terã o muitas vocaçõ es pela sua conduta virtuosa,
tratando os seus alunos com a maior caridade e insistindo na
Comunhã o frequente”.
“O que deve ser observado na aceitaçã o de noviços?”
“Deveríamos excluir os preguiçosos e os glutõ es.”
“Ao admitir os votos?”
“Para observar se há garantia de castidade.”
“Como pode ser melhor preservado o bom espírito em nossas
casas?”
“Escrevendo, visitando, recebendo e tratando com benevolência; e
isso com grande frequência por parte dos Superiores”.
“E a nossa conduta em relaçã o à s Missõ es?”
“Só podem ser enviadas para lá pessoas que tenham certeza da
moralidade; se alguém fosse seriamente suspeito, deveria ser chamado
de volta; estudar como cultivar as vocaçõ es indígenas. “Nossa
Congregaçã o vai bem?”
“ Qui justus est justificetur adhuc. Não progrediu regredi. Qui
perseveraverit salvus erit ”-“Aquele que é justo, seja justificado ainda.
Nã o há progresso e regressã o. Quem perseverar será salvo.”
“Será que vai se expandir muito?”
“Enquanto os Superiores fizerem a sua parte, avançará e ninguém
poderá deter o seu progresso”.
“Vai durar muito?”
“Sua Congregaçã o durará enquanto os membros amarem o
trabalho e a temperança. Se falhar um destes pilares, o seu edifício
desmoronará , esmagando Superiores e inferiores e seus seguidores.”
Neste momento apareceram quatro homens carregando um caixã o.
Eles vieram andando em minha direçã o.
“Para quem é isso?” Perguntei.
"Para você."
"Breve?"
“Nã o pergunte sobre isso: apenas lembre-se de que você é mortal.”
“O que você quer dizer com este caixã o?”
“Que tudo o que você quiser que seus filhos pratiquem depois de
você, você deve fazê-los praticar enquanto você viver. Esta é a herança,
o testamento que você deve deixar aos seus filhos. Mas você deve
prepará -lo e deixá -lo completo e bem praticado.”
“O que nos reserva: flores ou espinhos?”
“Muitas rosas estã o reservadas, muitos consolos, mas iminentes
estã o espinhos muito afiados que causarã o a todos profunda amargura
e angú stia. É necessá ria muita oraçã o!”
“Devemos ir a Roma (para fundar casas)?”
“Sim, mas lentamente, com a maior prudência e com cautela
estudada.”
“O fim da minha vida mortal está pró ximo?”
"Nã o se preocupe com isso. Você tem as Regras, você tem os livros;
faça tudo o que você ensina aos outros. Assistir!"
Eu queria fazer mais perguntas, mas ouvi uma forte explosã o de
trovõ es com relâ mpagos e raios, enquanto alguns homens, ou melhor,
monstros horríveis, avançavam sobre mim para me despedaçar.
Naquele momento, uma escuridã o sombria escondeu tudo da minha
vista. Achei que meu fim havia chegado e comecei a gritar
freneticamente. Entã o acordei e descobri que ainda estava vivo e eram
4h45 da manhã .
Se houver algo que possa ser lucrativo para nó s, aceitemos. E em
todas as coisas, honra e gló ria sejam a Deus para todo o sempre.
35
A FILOXERA
Uma visão onírica sobre murmuração e desobediência,
e o remédio a ser aplicado. Um aviso.
( Memórias Biográficas , Vol. XII, página 475)

Primeira semana de outubro de 1876

O SEGUINTE sonho foi contado por Dom Bosco no final do terceiro


retiro realizado em Lanzo durante as fé rias de 1876, de 1º a 7 de
outubro, e está assim registrado nas crô nicas:
Dom Bosco viu-se num imenso salã o. Ali estavam reunidos em
grande nú mero religiosos de diversas Ordens. Ao chegar, todos os
olhares se voltaram para ele como se fosse esperado. Ele viu também,
no meio da multidã o, um homem com uma vestimenta muito estranha:
sua cabeça estava enrolada em um lenço branco e seu corpo estava
coberto por uma espécie de lençol branco. Ele perguntou quem poderia
ser aquele “louco”; e lhe disseram que “aquele sujeito engraçado” era
ele mesmo: Dom Bosco, o sonhador!
Avançou entre aquela multidã o de religiosos, que formavam um
grande círculo sorridente ao seu redor, sem dizer uma palavra. Ele
olhou para eles com grande surpresa, mas todos continuaram a olhar
para ele, rindo e em silêncio. Finalmente, ele mesmo falou:
"Por que você ri tanto de mim?" ele disse. “Você está brincando à s
minhas custas?”
“De jeito nenhum”, alguns responderam. “Só estamos rindo porque
sabemos o motivo que o trouxe aqui.”
“Como você sabe disso, já que eu mesmo nã o tenho certeza? Na
verdade, sua risada me surpreende.
“O motivo é que você acaba de dar o retiro aos seus clérigos em
Lanzo.”
“E para que isso?”
“Agora você veio descobrir o que dizer a eles em seu discurso
final.”
“Que assim seja, entã o! e eu imploro que você me faça o favor;
Quero para eles alguns bons conselhos, que possam ajudar a prosperar
cada vez mais a Congregaçã o de Sã o Francisco de Sales. Você pode me
dar isso?"
“Faremos apenas uma sugestã o: diga aos seus filhos para se
protegerem contra a ' filoxera '. ”
“A filoxera? O que isso tem a ver com a minha Congregaçã o?”
“ Se você conseguir manter a filoxera longe de sua Congregação, ela
terá uma vida longa, florescerá e fará muito bem a inúmeras almas .”
"Nã o entendo você."
“Nã o é? O flagelo da filoxera arruinou muitas ordens religiosas e
está impedindo muitas outras de atingirem os seus nobres fins.”
“Peço perdã o, mas seu conselho será inú til para mim, a menos que
você o explique. Nã o consigo entender nada disso.
“Entã o nã o valia a pena estudar tanta teologia.”
“Espero ter cumprido meu dever, mas nunca encontrei um tratado
que mencionasse a filoxera.”
“No entanto, a teologia diz muito sobre a filoxera. Qual é o sentido
moral e espiritual desta palavra?”
“Nã o consigo ver nem mesmo um indício distante de qualquer
aplicaçã o espiritual na raiz etimoló gica da palavra.”
“Já que você nã o consegue ler esse mistério, aí vem alguém que irá
explicar para você.”
Neste momento Dom Bosco percebeu um certo movimento na
multidã o; uma passagem estava sendo aberta para alguém. Atualmente,
um recém-chegado apareceu e avançou nas entrelinhas em direçã o a
ele. Dom Bosco examinou suas feiçõ es, mas lhe pareceu um completo
estranho, embora seus modos familiares fossem os de um velho
conhecido. Ele imediatamente se dirigiu ao estranho:
“De nada, se me tirar deste emaranhado em que estes senhores me
colocaram. Eles querem que eu acredite que a filoxera está ameaçando
a destruiçã o de casas religiosas, e querem que eu tome a filoxera como
o tema da ú ltima palestra do retiro.”
“Dom Bosco se considera um homem sá bio?” ele respondeu:
“enquanto ele nã o sabe essas coisas? É mais certo que se lutarem contra
a filoxera com toda a força e conseguirem que os vossos filhos façam o
mesmo, a vossa sociedade nunca deixará de florescer. Você sabe qual é o
flagelo da filoxera?”
“Sei que é uma doença que ataca plantas e á rvores e causa grandes
danos.”
“Qual você acha que é a causa da doença?”
“Uma multidã o infinita de minú sculos germes que se instalam
numa planta e tomam posse dela.”
“Como você pode salvar as plantas vizinhas desta praga?”
“Isso eu nã o sei.”
“Ouça bem o que estou lhe dizendo. A filoxera aparece primeiro em
uma planta ou á rvore, e nã o demora muito para que as vizinhas sejam
atacadas, mesmo que estejam a uma certa distâ ncia. Quando a praga
aparece numa vinha, pomar ou jardim, espalha-se muito rapidamente; e
toda a beleza e esperança dos frutos sã o reduzidas a nada. Você sabe
como isso se espalha? Nã o por contato, porque a distâ ncia o impede,
nã o por rastejar de á rvore em á rvore, pois isso foi comprovado pela
experiência; é o vento que leva a filoxera de uma unidade para outra; e
assim toda a encosta ou a planície sorridente sã o rapidamente
devastadas. Da mesma forma, o vento da murmuraçã o e da calú nia leva
embora a filoxera da desobediência. Você entende?"
“Agora começo a entender.”
“O dano que este tipo de filoxera causa quando espalhado por esse
tipo de vento é incalculável. Primeiro, REFRIGE A CARIDADE MÚ TUA,
mesmo nas casas mais pró speras; o ZELO pela salvaçã o das almas é
escasso; a seguir, a ó cio é galopante; finalmente, todas as VIRTUDES
religiosas desaparecem, e o ESCÂ NDALO pú blico faz daquilo que antes
era reverenciado e admirado um objeto de REPROBAÇÃ O de Deus e dos
homens. Nem é necessá rio que um membro infectado passe de uma
casa para outra para que a praga se espalhe. O vento da fofoca é
suficiente para fazer o trabalho fatal. Acredite e esteja convencido, esta
foi a causa da queda de certas Ordens religiosas.”
“Eu reconheço a verdade de suas palavras. Mas como evitar um
infortú nio tã o grande?”
“Meias medidas nã o vã o ajudar; remédios extremos devem ser
empregados. Muitos meios foram tentados para exterminar a filoxera,
mas em vã o. Cortar e queimar sã o os ú nicos meios eficazes. E isso deve
ser feito prontamente, ao primeiro aparecimento de qualquer sinal
disso. A á rvore infectada deve ser queimada imediatamente com tudo o
que está ao seu redor para salvar a vinha. Se toda a vinha estiver
infectada, entã o toda ela deverá ser reduzida a cinzas, pelo bem das
vinhas vizinhas. Portanto, quando a filoxera da oposição à vontade dos
Superiores, da orgulhosa negligência da Regra, do desprezo pelos deveres
da vida comum , aparecem numa casa, entã o nã o deveis demorar:
arrancai essa casa da sua fundaçõ es, rejeitem os seus membros, nã o se
deixem vencer por uma tolerâ ncia perniciosa. E assim como você lida
com uma casa, lide com qualquer indivíduo. À s vezes pode parecer que
se um membro estiver isolado, ficará curado e voltará a fazer o bem; ou
talvez você nã o queira expô -lo, por causa de seu grande carinho por ele,
ou por causa de suas altas realizaçõ es e habilidades, que poderiam
melhorar o bom nome da Congregaçã o; nã o deixe que tais reflexõ es o
influenciem. Essas pessoas dificilmente mudam há bitos. Nã o direi que a
sua conversã o seja impossível, mas afirmo que isso acontece muito
raramente; tã o raramente, na verdade, que sua possibilidade nã o é
motivo suficiente para um Superior adotar o curso mais brando. Certas
pessoas, pode-se objetar, terã o pior situaçã o no mundo. Essa é a sua
pró pria preocupaçã o; eles suportarão as consequências do seu próprio
orgulho; mas a sua Congregação estará a salvo de danos .”
“E se, mantendo-os na Sociedade, pudessem realmente ser trazidos
de volta ao bom caminho através de muita paciência?”
“Esta é uma suposiçã o vã . É melhor descartar um sujeito orgulhoso
deste tipo do que mantê-lo com a dú vida de que poderá continuar a
semear berbigã o na vinha do Senhor. Tenha esta má xima em mente; em
caso de necessidade, coloque-o firmemente em prá tica. Faça disso um
assunto para palestras especiais com seus Diretores, e deixe que este
seja o tema do seu discurso de encerramento do retiro.”
“Agradeço muito seu gentil conselho. Com a ajuda de Deus farei o
meu melhor para realizá -lo. Mas, por favor, agora me diga quem você é.
“Você nã o me conhece mais? Você nã o se lembra de quantas vezes
nos encontramos e conversamos?
Enquanto o estranho lhe falava assim, os espectadores sorriam.
Neste momento tocou o sino da subida e Dom Bosco acordou.
36
O TOURO, AS CARRUAGENS
E OS PREGOS
( Memórias Biográficas , Vol. XII, p. 463)

NUM dos retiros espirituais realizados em Lanzo (Turim), no mê s de


setembro de 1876, havia cerca de 250 retirantes: eram salesianos,
noviços e aspirantes. No final do retiro, Dom Bosco teve a alegria de
receber trinta e seis profissõ es religiosas (dezoito emitiram votos
temporá rios e dezoito votos perpé tuos).
Como lembrança do retiro, Dom Bosco narrou um sonho simbó lico
– um dos mais instrutivos que teve até entã o.
Pe. Lemoyne fazia anotaçõ es enquanto Dom Bosco falava; depois
escreveu-o mais detalhadamente e mostrou-o a Dom Bosco, que fez
algumas pequenas alteraçõ es no manuscrito de Dom Lemoyne.
Para maior clareza, dividimos a narraçã o em quatro partes.

Parte I: O touro que ruge e a humildade


Muitas vezes dizem-nos para nã o nos preocuparmos com os
nossos sonhos: para ser franco, sou da mesma opiniã o na maior parte
dos casos. No entanto, à s vezes, embora estes sonhos nã o nos revelem o
futuro, certamente nos ajudam a resolver muitos problemas
complicados e nos ensinam a agir com verdadeira prudência nos nossos
diversos empreendimentos. Nesse caso, creio, pode-se extrair desses
sonhos tudo o que se considera bom e ú til.
Gostaria de contar-lhes agora mesmo um sonho que me tem
assombrado durante todo este retiro espiritual e particularmente na
noite passada. Vou narrá -lo exatamente como o sonhei, apenas
condensando algumas partes aqui e ali, para nã o demorar muito,
porque sei que esse sonho está repleto de muitos ensinamentos
benéficos.
Pareceu-me que íamos todos juntos de Lanzo a Turim. Estávamos
viajando em algum veículo; Nã o saberia dizer se era o trem ou o ô nibus,
mas tenho certeza de que nã o íamos a pé. Depois de um tempo, nã o me
lembro em que ponto da estrada nosso transporte parou. Ansioso por
saber a causa desta parada inesperada, desci da carruagem, apenas
para encontrar o olhar de uma pessoa eminente, que, temo, nã o consigo
descrever adequadamente. Ele parecia ser alto e baixo ao mesmo
tempo; tanto gordo quanto magro; embora de pele branca, ele também
era vermelho; ele pisou na terra e ainda caminhou no ar. Fiquei fora de
mim de espanto e, embora sem saber explicar esse fenô meno, criei
coragem e perguntei com ousadia:
"Quem é você?"
Sem prestar atençã o à minha pergunta, ele respondeu: “Venha”.
Eu estava empenhado em saber primeiro quem ele era e o que
queria, mas ele continuou: “Venha, rá pido: vamos transformar o meio
de transporte neste campo”. O estranho nele era que falava alto e baixo
ao mesmo tempo e em vozes diferentes. Isso me deixou maravilhado
por muito tempo.
O campo era imenso e aparentemente bastante plano. Nã o havia
nenhum sulco nele, mas tudo estava achatado como uma eira. Nã o
sabíamos o que dizer e, vendo o personagem tã o resoluto em seus
comandos, viramos o veículo para aquele vasto campo e ordenamos
que todos descessem. Num piscar de olhos, todo o grupo desceu e, para
nossa surpresa, o veículo desapareceu de nossa vista. “Agora que
descemos, você vai me dizer. . . Vossa Excelência terá a gentileza de me
informar. . . Vossa Excelência terá a condescendência em me informar
por que nos deteve neste lugar estranho”, murmurei, sem saber como
me comportar na presença deste augusto personagem. A isto ele
respondeu: “Por uma razã o muito importante; é porque quero evitar de
você um grande perigo.”
“Que perigo?” Eu perguntei.
“O perigo está em um touro enfurecido que mata qualquer pessoa
que encontra. Taurus rugiens quaerens quem devoret ”, disse aquele
indivíduo. “Um touro que ruge procurando a quem possa devorar.”
“Mas, meu caro, você aplica ao touro o que Sã o Pedro na Sagrada
Escritura aplica ao leã o: leo rugiens ”, respondi.
“Isso nã o importa nem um pouco; lá estava Leo rugiens, e aqui
estava Taurus rugiens. O que importa é estar alerta. Chame seus
seguidores para o seu lado. Avise-os com cuidado e peça-lhes que se
deitem com o rosto no chã o assim que ouvirem o rugido ensurdecedor
do touro e que permaneçam nessa posiçã o até que o touro passe. Ai
daquele que nã o dá ouvidos à sua voz. Quem nã o se deitar com o rosto
em terra se perderá ; pois lemos na Sagrada Escritura que “quem se
humilha será exaltado, e quem se exalta será humilhado: qui se humiliat
exaltabitur et qui se exaltat humiliabitur ”.
Depois acrescentou: “Rá pido, rá pido, o touro está para vir; grite,
grite o mais alto que puder e peça a todos que se abaixem. Eu gritei e
ele continuou dizendo: “Continue assim! Tenha coragem e grite ainda
mais alto; grite, grite!
Gritei até ficar rouco e temo ter até acordado o Pe. Lemoyne que
dormia no quarto adjacente; Eu nã o era capaz de fazer mais.
Depois de um momento ouvimos o rugido distante do touro, e
entã o aquele personagem começou: “Cuidado! Olhe! Disponha-os em
duas linhas pró ximas uma da outra, com um espaço entre elas para a
passagem do touro.”
Gritei as ordens exigidas; numa fraçã o de segundo, todos estavam
deitados com o rosto no chã o; do horizonte nebuloso notamos o touro
selvagem avançando rapidamente; embora a maioria de nó s tivesse
caído de cara no chã o, alguns, movidos pela curiosidade, queriam ver
que tipo de coisa era aquele touro e por isso se recusaram a seguir
nosso exemplo.
Esse personagem entã o se virou para mim e disse: “Agora você
verá o que vai acontecer com esses indivíduos; você verá o que eles
receberã o por nã o obedecerem à s ordens, por nã o se humilharem”.
Quis a todo custo avisá -los mais uma vez, gritar-lhes e correr em
seu socorro; mas esse personagem me proibiu de fazê-lo. Mais uma vez
insisti em abordá -los; entã o ele se dirigiu a mim em um tom de
comando. “Você também está obrigado à obediência; para baixo, caia de
cara no chã o imediatamente!
Mal tinha me esticado no campo quando ouvi um grito
ensurdecedor e assustador. O touro estava pró ximo. Todos nó s
tremíamos e alguns perguntavam ansiosamente: “O que vai acontecer a
seguir? Estamos perdidos!" “Nã o tema; deite-se,” eu gritei de volta.
Entretanto, aquela personagem repetia estas palavras: “ Qui se humiliat
exaltabitur, et qui se exaltat humiliabitur. . . qui se humilha. . . qui se
humilha. . . ”Algo muito estranho me deixou muito maravilhado. Foi isto:
embora eu estivesse deitado no chã o com os olhos na poeira, ainda
assim eu era capaz de ver muito bem as coisas que aconteciam ao meu
redor. O touro tinha sete chifres quase em forma de círculo. Havia dois
sob suas narinas; dois no lugar dos olhos; dois no lugar habitual e um
acima destes. Mas eis a maravilha! Esses chifres eram muito fortes,
mó veis para a direita ou para a esquerda ou para frente ao comando da
besta, de tal maneira que tudo o que precisava fazer para derrubar uma
pessoa era avançar sem virar a cabeça para golpear sua vítima. Os
chifres sob as narinas do bruto eram os mais longos e os que causavam
a matança mais pesada.
Agora o animal estava muito perto de nó s. Meu guia entã o gritou:
“Testemunharemos o efeito da humildade”.
Num instante, para nossa grande surpresa, fomos elevados no ar a
uma altura considerável, onde o touro furioso nunca teria conseguido
chegar. Aqueles que nã o se baixaram ao chã o nã o gozaram deste
privilégio. O touro avançou imediatamente para eles e os despedaçou.
Ninguém foi poupado. Nó s, por outro lado, que fomos elevados ao ar,
tememos muito e comentamos: “Se cairmos agora, estaremos perdidos!
Que grupo infeliz é o nosso! Quem sabe o que vai acontecer conosco?!”
O touro furioso, depois de fazer as primeiras vítimas, tentou nos
atingir; ele saltou no ar tentando nos atingir. Mas tudo em vã o. Irritado
com o seu fracasso, decidiu partir em busca de outros touros e parecia
dizer: “ Então juntos escalaremos até lá . . .” e assim dizendo, partiu,
habens ram magnam – “cheio de grande ira”.
Depois voltamos à terra; aquele misterioso personagem ergueu a
voz e gritou: “Voltemo-nos para o sul”.

Parte II: Os Touros Selvagens e o


Santíssimo Sacramento
E eis! uma nova cena diante de nó s! Ao voltar o olhar para o sul, o
nosso olhar perturbado encontrou o Santíssimo Sacramento. O campo
havia desaparecido e sentíamos que estávamos numa igreja enorme,
artisticamente decorada, com um altar todo vivo com velas acesas.
Enquanto estávamos imersos em profunda adoraçã o diante do
Santíssimo Sacramento, apareceram em cena muitos touros selvagens
com chifres horríveis, tentando em vã o cair sobre nó s. Mas eles nã o nos
podiam fazer mal, porque estávamos em oraçã o diante do Santíssimo
Sacramento. Imediatamente iniciamos a recitaçã o do Terço em
homenagem ao Sagrado Coraçã o de Jesus. Depois de um tempo, nos
viramos e descobrimos que os touros haviam ido embora. Viramos
novamente em direçã o ao local onde ficava o altar, e eis! as velas haviam
desaparecido, o Santíssimo Sacramento nã o estava mais exposto; a
igreja também havia desaparecido. “Mas onde estamos?” perguntamos
um ao outro.
Estávamos mais uma vez em nosso antigo campo.
A esta altura você já deve ter entendido que o touro representa o
diabo, o inimigo da nossa alma, que nos odeia muito e tenta
continuamente nos fazer mal. Os sete chifres sã o os sete pecados
capitais. A ú nica maneira de escapar dos chifres desta besta, ou seja,
dos assaltos do diabo, é a prá tica da humildade, fundamento de todas as
virtudes, e da Sagrada Eucaristia, o Pã o dos fortes.
Parte III: Os sucessos futuros da
Congregação Salesiana e
as condições para a sua realização
Admirados com tais prodígios, ficávamos nos olhando; ninguém
ousou falar; nã o sabíamos o que dizer. Todos esperavam que Dom
Bosco ou o augusto personagem dissessem alguma coisa. Neste
momento, meu misterioso guia aproximou-se de mim e sussurrou-me
ao ouvido: “Venha, mostrar-lhe-ei o triunfo que aguarda a Sociedade de
Sã o Francisco de Sales. Suba aquela rocha e veja por si mesmo!”
Escalei aquela pedra enorme, a ú nica naquela planície
ininterrupta. Que espetá culo grandioso encontrou meu olhar! Aquele
campo, que a princípio nã o parecia muito grande, agora parecia tã o
grande quanto toda a terra! Lá vi homens de todas as cores, com todos
os tipos de vestimentas e de todas as naçõ es. Nã o sei se a terra é capaz
de conter o nú mero de pessoas que vi naquela planície. Parei para
observar mais de perto os que estavam mais pró ximos de mim. Eles
estavam vestidos como nó s. Reconheci os que estavam nas primeiras
linhas, entre os quais havia muitos salesianos que lideravam tropas de
meninos e meninas. Outros seguiram com outras tropas, e ainda outros
e outros que eu nã o conhecia nem pude distinguir, pois eram muitos. Ao
sul vi sicilianos, africanos e intermináveis fileiras de gente que nã o
conhecia. Essas pessoas sempre foram guiadas pelos salesianos. Eu
conhecia apenas aqueles que estavam nas primeiras fileiras. Os que
estavam na retaguarda eram totalmente desconhecidos para mim.
“Vire-se”, ordenou meu guia. Outra multidã o interminável de
pessoas chamou minha atençã o. A vestimenta deles era diferente da
nossa; usavam peles em forma de mantos, que à distâ ncia pareciam
veludo de cores diferentes. Pediram-me entã o que me voltasse para os
quatro pontos cardeais; entre as muitas outras coisas que vi no Oriente
estavam mulheres com pés muito pequenos, que lutavam muito para
ficar de pé e achavam difícil andar. A particularidade desta visã o era
que os salesianos de toda parte lideravam grupos de meninos e
meninas, e junto com eles um grande nú mero de outras pessoas.
Reconheci apenas os Salesianos que estavam nas primeiras filas;
aqueles que seguiram eram desconhecidos para mim. Eu nem reconheci
meus missioná rios. Nã o posso lhe dar mais detalhes porque, temo,
minha narraçã o seria muito longa.
O personagem, que até entã o atuou como meu guia, disse: “Olhe e
pondere sobre isso! Você pode nã o entender agora tudo o que lhe digo,
mas preste atençã o. Tudo isto que vistes é a grande colheita que espera
os Salesianos. Você nã o vê sua grandeza? Este imenso campo em que
estais é aquele em que os Salesianos deverã o trabalhar. Os Salesianos
que vês diante de vó s sã o os trabalhadores desta vinha do Senhor.
Muitos estã o realmente trabalhando e você os reconhece, mas à medida
que o horizonte se amplia, você olha para pessoas que nã o conhece; isto
é para vos dizer que os Salesianos nã o só trabalharã o no seu campo
durante este século (1876-1900), mas também no pró ximo (1900-
2000) e nos que virã o. Mas você sabe o que é necessá rio para perceber
isso? Eu contarei; marque minhas palavras. Veja aqui: imprima essas
palavras e deixe que elas sirvam de lema, de senha, de brasã o da sua
Congregaçã o. Tome nota deles: SÓ O TRABALHO E A TEMPERANÇA
FAZÃ O FLORESCER A CONGREGAÇÃ O SALESIANA. Estas palavras
devem ser explicadas, repetidas e insistidas por você. Você deve
imprimir um manual onde você deve explicar isso completamente, e
fazer seus seguidores entenderem que ' Trabalho e temperança ' é o seu
legado à Congregação e ao mesmo tempo a sua glória .”
Acrescentei ansiosamente: “Farei isso de boa vontade; na verdade,
este tem sido o nosso objectivo até agora. É exatamente isso que estou
continuamente recomendando. Nunca deixo de insistir nisso sempre
que surge uma ocasiã o.”
“Entã o você está bastante convencido disso?” perguntou meu guia.
“Você me entendeu perfeitamente? Isto você deve legar aos seus filhos
como um patrimô nio, mas diga-lhes claramente que enquanto viverem
de acordo com este lema, sempre terã o seguidores do Norte, do Sul, do
Oriente e do Ocidente. Agora termine o retiro e mande os seus filhos
para o seu campo de trabalho. Esses seus filhos servirã o de modelo
para aqueles que virã o mais tarde.”
Mal tinha acabado de falar quando alguns veículos apareceram em
cena para nos levar para Turim. Continuei forçando os olhos para ver
que tipo de veículos eram. Eles foram construídos de uma forma muito
estranha; os ú nicos desse tipo que eu já vi. Aqueles que estavam comigo
subiram imediatamente para o meio de transporte; Eu estava um pouco
preocupado com a segurança deles, pois aqueles veículos nã o tinham
tá buas nas laterais, e por isso nã o estava inclinado a deixá -los partir.
Mas o personagem virou-se para mim e disse: “Deixe-os ir embora! Nã o
necessitam de qualquer proteçã o, desde que pratiquem bem os
seguintes conselhos: SOBRII ESTOTE et VIGILATE — 'Esteja só brio e
vigilante.' Se isso for praticado ao pé da letra, posso garantir que
ninguém cairá , mesmo que a carruagem nã o tenha tá buas de proteçã o.”

Parte IV: Males a serem evitados


para garantir a
prosperidade da congregação
Eu estava agora sozinho com aquele augusto personagem. “Venha”,
acrescentou ele prontamente, “venha; Ainda tenho que lhe mostrar o
mais importante; você terá muito que aprender com isso. Você vê
aquela carruagem ao longe?
“Sim”, respondi.
"Você sabe o que é isso?" ele perguntou.
"Sinto muito, nã o consigo entender bem o suficiente."
“Aproxime-se, se quiser ver melhor”, continuou ele. “Você vê aquele
cartaz? Aproxime-se e observe-o minuciosamente; nele está estampado
o seu brasã o, pelo qual você poderá conhecê-lo.”
Aproximei-me e só descobri que o cartaz trazia a pintura de quatro
pregos enormes. Voltando-me para o meu guia, eu disse: “Nunca serei
capaz de entender, a menos que você me explique isso”. A isso ele
respondeu:
“Você nã o vê aqueles quatro pregos? Olhe para eles de perto. Sã o
os quatro pregos que perfuraram e atormentaram cruelmente o nosso
Divino Salvador.”
“O que isso tem a ver conosco?” Eu ansiosamente voltei. Ao que ele
continuou:
“Sã o os quatro pregos que atormentam as Congregações Religiosas.
Se você conseguir evitar esses quatro pregos, ou seja, se a sua
Congregaçã o nã o for atormentada por eles, e você souber como afastá -
los, entã o tenha certeza de que tudo correrá bem e você estará seguro.”
“Mas nã o sou mais sá bio do que antes”, reclamei. “O que esses
pregos simbolizam?”
“Você entenderá melhor se inspecionar esta carruagem que tem os
quatro pregos como emblema. Observe também que o carro possui
quatro compartimentos, cada um dos quais corresponde a um prego
específico.”
“O que esses compartimentos significam?” Perguntei.
“Venha e dê uma olhada no primeiro.”
Aproximei-me e li no cartaz: QUORUM DEUS VENTER EST —
“Aqueles cujo deus é o estô mago”. “Agora começo a entender uma coisa”,
eu disse.
Meu guia entã o começou a me explicar as coisas. “Este é o primeiro
prego que atormenta e destró i muitas Congregaçõ es religiosas. Isso
também causará estragos no seu, se você nã o estiver atento. Lute contra
esse inimigo com severidade e você pode ter certeza de que tudo
correrá bem com você.”
Passamos para o segundo compartimento e li estas palavras acima
do segundo prego: QUAERUNT QUAE SUA SUNT NON QUAE JESU
CHRISTI —“Eles buscam as coisas que lhes sã o pró prias e nã o as coisas
de Jesus Cristo”. “Aqui estã o aqueles”, disse ele gravemente, “que
buscam uma vida fá cil com todos os seus confortos, e que trabalham
para seu pró prio bem ou para o bem de seus pais, em detrimento da
Sociedade pela qual eles realmente deveriam trabalhar como parte de
sua vida. Jesus Cristo. Assistir! Mantendo este flagelo à distâ ncia,
testemunhareis o crescimento da Congregaçã o”.
Passamos entã o para o terceiro compartimento. Isto é o que li
perto do terceiro prego: ASPIDIS LINGUA EORUM – “A língua da víbora é
a língua deles”. O personagem passou a explicar calmamente: “Aqueles
que murmuram e caluniam perfuram a Congregaçã o com um prego
mortal. Eles ficam pouco à vontade até que dêem vazã o à s suas críticas,
certas ou erradas.”
CUBICULUM OTIOSITATIS — “Câ mara da preguiça” é o que li no
quarto compartimento. O misterioso personagem continuou com seu
aviso. “Aqui encontramos um grande nú mero de desocupados. Quando
o demô nio da ociosidade ganha terreno numa casa religiosa, essa
comunidade está bem perto da ruína total. Por outro lado, contanto que
você trabalhe duro e muito, você pode ter certeza de que tal perigo nã o
se abaterá sobre você. Observe agora outra coisa na carruagem, que
muitas vezes é esquecida e à qual desejo que você preste atençã o
especial. Você vê aquele espaço aí, que nã o faz parte de nenhum
compartimento e ainda assim se estende a todos, estando no centro?”
“Sim, entendo”, respondi; “mas nã o há nada além de pedaços de
folhas secas, ervas daninhas altas e grama emaranhada de diferentes
comprimentos.”
“Bom, isso é exatamente o que eu queria apontar para você”,
acrescentou.
“Mas como isso vai ser ú til para mim?” Eu perguntei a ele
ansiosamente.
“Leia com atençã o estas palavras que estã o escondidas aqui.” Fiz o
que me foi ordenado e li: LATET ANGUIS IN HERBA - “Lá se esconde uma
cobra na grama”.
"O que isto significa?" Eu curiosamente perguntei. E explicou:
“Fique atento, porque há alguns que tentam se esconder; eles quase nã o
falam; nunca abrem o coraçã o aos seus Superiores; cuidado! Angústia
tardia em herba. Sã o um flagelo, uma verdadeira praga para a
Congregaçã o. Os maus têm chance de serem corrigidos quando se
revelam; mas estes estã o completamente ocultos. Ninguém percebe
isso; mas o mal ganha força, o veneno aumenta nos coraçõ es desses
infelizes, e se chegarmos a conhecê-los, será sempre tarde demais
quando a destruiçã o causada já for irreparável. . . Familiarize-se com
aquelas coisas que você deve manter longe da Congregaçã o; mantenha
fixo em sua mente tudo o que você ouviu; imponha aos seus seguidores
o dever de explicar e reexplicar detalhadamente todas essas coisas. Se
você seguir este conselho, nã o precisará ficar ansioso com o futuro da
sua Congregaçã o, porque as coisas irã o melhorar a cada dia.
Entã o implorei ao meu guia que me desse algum tempo para fazer
algumas anotaçõ es para nã o esquecer alguma coisa. Mas ele respondeu
secamente: “Você pode tentar fazer isso, mas temo que nã o terá tempo;
e agora fique atento! Eu tinha me preparado para escrever quando ouvi
um som estrondoso e confuso ao longe, que rapidamente se
aproximava. Todo o campo pareceu tremer sob o choque. Ansioso para
saber se algo novo estava acontecendo, me virei, apenas para encontrar
meus meninos que me haviam deixado há pouco voltando assustados;
logo atrá s deles estava o touro rugindo. A visã o do touro pela segunda
vez me assustou tanto que acordei assustado.
Decidi narrar-vos este sonho na véspera da nossa separaçã o,
porque estou convencido de que ele encerrará felizmente o retiro se
decidirmos viver de acordo com o nosso lema: TRABALHO e
TEMPERANÇA; e se tentarmos trabalhar com força e força para evitar
os quatro grandes pregos que marcam a sentença de morte das
sociedades religiosas: o vício da gula, a procura do conforto, a
murmuração e a ociosidade. Permitam-me lembrá -los de serem sempre
francos, claros e confiantes com seus Superiores. Tendo isto como regra
de vida, faremos um mundo de bem primeiro à s nossas almas e depois
à queles que a Divina Providência nos enviar!
Dom Bosco planejou originalmente, e depois prometeu no
decorrer de sua palestra, explicar mais tarde detalhadamente o ponto
sobre a temperança, narrando um apêndice ao sonho. Mas quando ele
começou a segunda parte do discurso, isso deve ter lhe escapado
completamente. Ao ser acordado tã o rudemente pela apariçã o do touro
enfurecido, ele ainda desejava saber mais alguma coisa e isso lhe foi
concedido quando adormeceu novamente. Dom Bosco narrou o resto
deste sonho em Chieri, e Dom Berto, que o ouviu, enviou uma có pia a
Dom Lemoyne.
Eu estava ansioso para ver os efeitos da temperança e da
intemperança e, com esse pensamento em primeiro lugar em minha
mente, deitei-me para descansar. Mal tinha adormecido quando o
personagem apareceu e me convidou a segui-lo para ver os efeitos da
temperança. Fui conduzido a um jardim encantador, cheio de lindas
flores de todos os tipos; foi uma exibiçã o linda. Rosas maravilhosas,
símbolo da caridade, estavam ali em profusã o, cravos, jasmins, lírios,
violetas, sempre-vivas, girassó is e uma infinita variedade de outras
flores, cada uma simbolizando alguma virtude.
"Olhe!" gritou meu guia. Quase imediatamente, o jardim
desapareceu e seguiu-se um barulho profundo e estrondoso.
“O que é tudo isso? De onde vem esse barulho? Eu perguntei.
“Olhe para trá s e veja por si mesmo.”
Obedeci prontamente e eis! que espetá culo estranho! Vi uma
grande carroça, em formato de caixa, puxada por um porco e um sapo
de tamanho enorme. “Aproxime-se e olhe para dentro”, ordenou o
personagem.
Avancei para examinar de perto o conteú do da carruagem: estava
cheia até o topo com os animais mais repugnantes: corvos, serpentes,
escorpiõ es, basiliscos, caracó is, morcegos, crocodilos e salamandras,
todos viscosos e muito repulsivos. Eu nã o poderia mais enfrentar tal
visã o; o fedor nauseante que emanava daquelas feras me forçou a
desviar. Esse afastamento abrupto me acordou sobressaltado, mas o
fedor em minhas narinas persistiu por muito tempo. A impressã o
causada por aquela visã o horrível em minha mente foi suficiente para
me manter acordado pelo resto da noite.
——————
NB Evidentemente, as flores do “Jardim Delicioso” simbolizam as virtudes que florescem no
viveiro da temperança, e os animais repulsivos da carroça representam os vícios que brotam da
intemperança.
Para leituras adicionais sobre temperança , pode-se consultar o índice analítico das
Memórias Biográficas , sob a palavra “Temperança”.
Os Salesianos podem estudar o Pe. O livro de Favini Alle fonti della Vita Salesiana , páginas
139-162, como comentário ao sonho acima.
37
O PRIMEIRO
SONHO MISSIONÁRIO (1872)
( Memórias Biográficas , Vol. X, página 53)

QUANDO começaram as NEGOCIAÇÕ ES entre o governo da


Argentina e Dom Bosco para uma expediçã o missioná ria, o significado
de um certo sonho, ou visã o, que ele tivera anos antes, começou a ficar
claro na mente de Dom Bosco. Assim narrou Dom Bosco:
De repente, fui transportado para alguma regiã o selvagem e
desconhecida. Todo o país formava uma planície imensa e inculta, cuja
planicidade nã o era aliviada por colinas ou montanhas. Vi ali, naquela
planície, imensas multidõ es de homens correndo de um lado para
outro, homens de aspecto feroz e de estatura extraordiná ria, com tez
bronzeada, quase negra, e cabelos longos e duros. Suas ú nicas
vestimentas eram peles de animais, que usavam penduradas nos
ombros, e como armas cada um carregava uma lança rú stica e uma
funda.
Esses grupos de homens, espalhados pela planície, pareciam estar
engajados em diversas ocupaçõ es. Alguns caçavam animais selvagens,
outros marchavam brandindo grandes pedaços de carne
ensanguentada nas pontas das lanças; alguns dos grupos travavam
batalhas campais entre si; outros caíram nas mã os de uma companhia
de soldados em trajes europeus. O chã o ao redor estava repleto de
homens mortos e moribundos.
Fiquei horrorizado com este espetá culo horrível, e entã o, de
repente, de um extremo da planície, apareceram vá rias pessoas que
eram, como imaginei pelo seu vestuá rio e modo de agir, missioná rios
pertencentes a vá rias Ordens da Igreja, que aproximou-se para pregar a
verdadeira religiã o de Cristo. À medida que passavam, examinei-os
atentamente, mas nã o reconheci nenhum deles. Destemidamente, eles
caminharam para o meio dos selvagens, mas estes, ao vê-los, pareceram
lançados em uma fú ria diabó lica. Eles caíram sobre eles, mataram-nos e
esquartejaram-nos, e empalaram grandes pedaços de sua carne ainda
quente nas pontas de suas lanças. Depois disso, as cenas anteriores
foram renovadas – guerra civil contínua e guerra com os povos
vizinhos!
Depois de testemunhar tantas cenas de horror e derramamento de
sangue, disse a mim mesmo: “Como pode um povo tã o brutal e feroz
converter-se à verdadeira Fé?” Quase imediatamente, em resposta ao
meu pensamento, avistei ao longe outro bando de missioná rios que se
aproximava cada vez mais dos selvagens. Esses recém-chegados eram
alegres e alegres, e foram precedidos por uma grande multidão de
meninos animados e alegres.
Observei com medo e tremor, pois tinha certeza de que eles
estavam caminhando para a morte certa. Aproximei-me e olhei-os
atentamente e reconheci naquele grupo missioná rio os nossos pró prios
Salesianos. Os que estavam na frente eu conhecia muito bem, nã o os
que vinham atrá s; mas reconheci que eram todos salesianos.
"Como é que isso aconteceu?" Eu me perguntei; e eu queria gritar
para que parassem de se aproximar mais. Eu esperava a cada momento
vê-los enfrentar o mesmo destino que se abateu sobre os ex-
missioná rios; mas qual nã o foi minha surpresa ao ver que, ao
contemplá -los, uma onda de entusiasmo alegre pareceu penetrar em
todas aquelas tribos selvagens! Largaram as lanças, mudaram o aspecto
feroz e foram receber os missioná rios com todos os sinais de estima e
contentamento.
Espantado com essa mudança repentina, fiquei curioso para ver
como tudo terminaria. Olhando com atençã o, vi como os missioná rios
instruíam e ensinavam os indígenas, que os ouviam com muita atençã o
e interesse. Vi quã o rá pidos eles aprenderam e quã o prontamente
procuraram colocá -lo em prá tica imediatamente.
Observei e observei que os missioná rios começaram a recitar o
Rosário e que os selvagens corriam de todas as direçõ es para participar
nesta oraçã o.
Depois de um tempo, os salesianos dirigiram-se ao centro daquela
enorme multidã o e se ajoelharam. Os selvagens colocaram os braços
aos pés dos missioná rios e ajoelharam-se com eles para orar. Um dos
salesianos entoou entã o o hino: Laudate Mariam, O Linguae Fideles –
“Louvai Maria, ó línguas fiéis”. Os selvagens assumiram o ritmo, verso
apó s verso. Tal era o volume do seu canto vigoroso que me assustou e
acordei.
Agora, quem eram esses selvagens?
Dom Bosco a princípio acreditou que se tratava do povo da Etió pia,
mas assim que teve informaçõ es precisas sobre as características e os
costumes dos etíopes, abandonou a ideia. Depois pensou que poderiam
ser as pessoas do bairro de Hong Kong, mas quando falou com um
missioná rio chinês que tinha vindo a Turim naquela época em busca de
vocaçõ es, soube que estas nã o eram as pessoas dos seus sonhos.
Ele entã o começou a estudar as missõ es australianas, mas ainda
nã o conseguiu localizar as pessoas dos seus sonhos. E quando Roma
pensou em confiar-lhe um vicariato apostó lico na Austrá lia, os seus
pensamentos voltaram-se novamente para os aborígenes negros, mas
ainda assim ele nã o se convenceu.
E quando recebeu convites cada vez mais urgentes da Argentina,
percebeu claramente, e com exclusã o de todas as outras ideias, que
seus filhos foram chamados para realizar seu primeiro trabalho
missioná rio entre os confins da Patagô nia e que era aquele país vazio e
pouco convidativo que ele tinha visto em sua visã o. Na crô nica lemos
que chegavam cada vez mais cartas da Argentina para a festa de Sã o
Francisco de Sales, 29 de janeiro de 1875, e que Dom Bosco, rodeado
pelo seu conselho e pelos vá rios Superiores locais no palco do teatro do
Orató rio, fez com que fossem lidos em voz alta aos seus meninos, pois
desde o início os meninos eram considerados parte da família salesiana
e deviam ser mantidos a par dos grandes acontecimentos que
marcavam o seu destino. Pelas cartas via-se que tudo estava agora
arranjado e que tudo o que se precisava agora era a aprovaçã o do Santo
Padre. Para isso Dom Bosco foi a Roma e teve uma audiência com o
Papa. Sua Santidade confiou todo o negó cio ao Cardeal Franchi e, depois
de ouvir o seu relató rio, sem mais formalidades nem demoras aprovou
e abençoou a nova missã o.
——————
NB Sobre a Primeira Expedição Missionária consultar Memórias Biográficas , Vol. XI e Vol. XII
(1875).
38
O ANJO DE ARPHAXAD
(Segundo Sonho Missionário)
Os desígnios de Deus sobre a Congregação Salesiana
no futuro remoto, narrados por Dom Bosco
ao Conselho Superior, 2 de julho de 1885.)
( Memórias Biográficas , Vol. XVII, página 643ss.)

-ME que estava diante de uma montanha muito alta, em cujo topo
estava um anjo, resplandecente com uma luz tã o brilhante que
iluminava os países mais distantes. Ao redor da montanha havia um
vasto reino de tribos desconhecidas.
Em sua mã o direita, o Anjo segurava no alto uma espada que
brilhava como uma chama muito brilhante, enquanto com a mã o
esquerda ele apontava para mim as regiõ es ao redor. Ele estava me
dizendo: Angelus Arphaxad vocat vos ad proelianda bella Domini et ad
congregandos populos in horrea Domini —“O Anjo de Arphaxad 1 chama
você para travar as guerras do Senhor e reunir o povo nos celeiros do
Senhor.” Sua palavra, poré m, nã o foi em forma de comando, como nas
outras ocasiõ es, mas em forma de proposta.
Uma multidã o maravilhosa de anjos, cujos nomes eu nã o sabia ou
nã o conseguia lembrar, cercou-o. Entre eles estava Louis Colle, 2 ao
redor do qual estava em pé , como uma coroa, uma multidã o de
meninos, aos quais ele ensinava a cantar hinos a Deus; ele també m
cantou com eles.
Ao redor da montanha, no seu sopé e nas suas encostas, vivia
muita gente. Todos conversavam entre si, mas era uma língua estranha
e eu nã o conseguia entendê-la. Eu só pude entender o que o Anjo disse.
Nã o consigo descrever o que vi. Sã o coisas que podemos ver, podemos
compreender, mas nã o podemos explicar. Ao mesmo tempo, eu podia
ver objetos separados simultaneamente, o que mudaria continuamente
o espetá culo que estava diante de mim.
Portanto, agora me parecia que aquela era a planície da
Mesopotâ mia, agora uma montanha muito alta; e aquela mesma
montanha em que o Anjo de Arphaxad estava de pé tomaria mil e um
aspectos a cada momento, de modo que as pessoas que ali viviam
pareciam apenas sombras errantes.
Diante desta montanha e durante todo este percurso, pareceu-me
que fui elevado a uma altura imensa, como acima das nuvens, num
espaço imenso. Quem pode expressar em palavras essa altura, essa
amplitude, essa luz, esse brilho, esse espetá culo! Uma visã o que se pode
desfrutar, mas que nã o pode ser descrita!
Neste e noutros locais foram muitos os que me acompanharam,
exortando-me a ter coragem, e que encorajaram também os Salesianos,
para que nã o parassem no caminho. Entre aqueles que me puxaram
ansiosamente, por assim dizer, pela mã o, para que eu pudesse seguir
em frente, estava o querido menino Louis Colle e bandas de Anjos que
ressoavam as cançõ es daqueles meninos que o rodeavam.
Entã o pareceu-me que estava no centro da Á frica, num deserto
muito vasto; ali no chã o estava escrito em grandes letras transparentes:
Negros. No meio estava o Anjo de Cham, que dizia: “Cessabit maledictum
—'A maldiçã o cessará'—e a bênçã o do Criador descerá sobre Seus
filhos réprobos, e o mel e o bá lsamo curarã o as picadas das cobras;
entã o será coberta a torpeza dos filhos de Cham.” Todas aquelas
pessoas estavam nuas.
E entã o me pareceu que estava na Austrá lia. Aqui também estava
um Anjo que caminhava e fazia as pessoas caminharem em direçã o ao
Sul. A Austrá lia nã o era um continente, mas um conjunto de muitas
ilhas, cujos habitantes eram todos diferentes em cará ter e aparência.
Uma multidã o de crianças que ali viviam tentava vir em nossa direçã o,
mas eram impedidas pela distâ ncia e pelo mar que as separava. Mas
estenderam as mã os a Dom Bosco e aos Salesianos, dizendo: “Vinde em
nosso auxílio! Por que você nã o termina o trabalho que seus pais
começaram?” Muitos deles pararam, mas outros com esforço incrível
cruzaram entre animais ferozes e vieram se misturar com os Salesianos
que eu nã o conhecia, e todos começaram a cantar: Benedictus qui venit
in nomine Domini! — “Bem-aventurado aquele que vem em nome do
Senhor!”
A alguma distâ ncia podiam-se ver massas de inú meras ilhas; mas
nã o consegui distinguir detalhes deles. Pareceu-me que tudo o que vi
significava que a Divina Providência oferecia uma parte daquele campo
evangélico aos Salesianos, mas numa data futura. O seu trabalho será
frutífero, porque a mã o do Senhor estará constantemente com eles,
desde que não se tornem indignos dos Seus favores.
Se eu pudesse embalsamar e preservar vivos cinquenta dos
Salesianos que agora estã o aqui conosco, em 500 anos eles verã o que
destino estupendo a Providência reserva para os Salesianos, se formos
fiéis!
Dentro de 150 ou 200 anos, os Salesianos serã o os donos do
mundo inteiro (isto é, os líderes em todo o mundo)!
Seremos sempre aceitáveis até mesmo para os ímpios, porque
nosso campo especial é tal que atrai a simpatia e a boa vontade de
todos, bons e maus. Poderã o surgir alguns que queiram ver-nos
destruídos, mas serã o tentativas isoladas e sem o apoio de outros.
A condiçã o é que os salesianos não se deixem levar pelo amor ao
conforto e, portanto, evitem o trabalho. Mesmo guardando apenas as
obras que temos em mã os e nã o nos entregando ao vício da ganância ,
elas terã o uma certeza, uma garantia, de longa duraçã o.
A Sociedade Salesiana prosperará materialmente se nos
esforçarmos para sustentar e difundir o Boletim, obra dos “ Filhos de
Maria, Auxiliadora dos Cristãos ”, e promovê-lo. Algumas dessas crianças
sã o tã o boas! A sua instituiçã o é a que nos dará confrades valentes,
firmes na sua vocaçã o (vocaçõ es tardias).
Estas sã o as coisas que Dom Bosco viu com mais clareza, que
melhor recordou e narrou da primeira vez. Mais tarde, porém, ele falou
a Don Lemoyne sobre muitas outras coisas vistas numa visã o rá pida e
passageira. Viu naçõ es, cidades, mares, povos, ilhas, há bitos dos povos,
espetá culos impossíveis de descrever. Foi uma viagem circular pela
parte sul do hemisfério. (Cf. pá g. 646).
O Anjo de Arphaxad: Arphaxad era um dos netos de Noé. ( Gênesis
10:22). Seguindo as divisõ es etnográ ficas, alguns dizem que ele foi o pai
do povo da Mesopotâ mia; outros, em vez disso, vêem nele o pai dos
povos da Índia e da China. Ele foi certamente o antepassado de alguma
raça asiá tica. Dom Bosco relacionou o Anjo de Arphaxad com a China e,
depois desta visã o, falou muitas vezes dele em conexã o com as missõ es
salesianas. Ele viu nesta visã o uma confirmaçã o dos sonhos anteriores
sobre as missõ es. (Cf. Vol. XVII, p. 647.)
——————
1. Arfaxade era filho de Sem e neto de Noé. (Gênesis 10:22).
2. Luís Colle era um jovem santo que tinha morrido uma morte santa e costumava aparecer a Dom
Bosco para lhe revelar coisas secretas.
39
O FUTURO DAS
MISSÕES SALESIANAS
(Quinto Sonho Missionário)
( Memórias Biográficas , Vol. XVIII, página 72)

NOUTRA ocasiã o, Dom Bosco teve um vislumbre das grandes


coisas que o futuro reservava para as missõ es salesianas. Ele tinha ido,
em 1886, em visita a Barcelona, e durante sua estada de vá rias
semanas, foi tratado com bondade ilimitada, e quase veneraçã o, por
um grande nú mero de admiradores fervorosos.
Certa noite, pareceu-lhe que estava vagando sem rumo no meio de
muitas pequenas alturas arborizadas, quando de repente foi
surpreendido por um alvoroço que vinha de uma grande multidã o de
crianças que corriam em sua direçã o e gritavam com alegria
arrebatadora: “ Aqui está finalmente! Esperamos por você há muito
tempo e agora nã o vamos deixar você ir embora de nó s! Dom Bosco
ficou ali confuso e sem saber o que fazer, quando de repente apareceu -
como relata Dom Viglietti, a quem Dom Bosco contou o sonho - um
grande rebanho de ovelhas aos cuidados de uma pastora. Ela
imediatamente começou a trabalhar para organizar todos os seus
protegidos de lã em um lado do espaço em que estavam, enquanto os
meninos estavam alinhados no outro. Depois voltou-se para Dom Bosco
e perguntou: “Vês tudo o que está aqui diante de ti?”
“Certamente”, disse Dom Bosco. “Eu vejo tudo claramente.”
"Bom. E você se lembra daquele sonho que teve quando tinha
quase dez anos de idade?
“Nã o consigo me lembrar disso no momento; minha mente está
muito cansada.”
“Basta pensar um pouco e logo você se lembrará de tudo”, disse a
Pastora.
Depois disse a Dom Bosco e aos meninos que a seguissem para um
lado e ordenou: “Olhem agora daqui; olhem todos vocês e me digam o
que vocês veem escrito. O que você vê?"
“Vejo”, disse Dom Bosco, “algumas montanhas e depois o mar,
depois algumas colinas, mais montanhas e depois o mar novamente”.
“E eu”, disse um dos meninos, “posso ver Valparaíso”.
“E eu”, disse outro, “Santiago”.
“E posso ler essas duas palavras”, disse um terceiro.
“Bem, agora”, continuou a Pastora, “comece deste ponto e você terá
uma ideia de quanto os Salesianos farã o no futuro. Vire-se agora para
este lado; desenhe uma linha mentalmente a partir daqui e depois olhe
novamente.”
“Vejo montanhas, colinas e mares!” exclamou Dom Bosco.
Os meninos também forçaram os olhos na direçã o indicada e
exclamaram em coro: “Podemos ler Pequim!”
Entã o Dom Bosco viu uma grande cidade através da qual corria um
largo rio, atravessado por vá rias pontes.
“Muito bem”, disse a donzela, que parecia ser a professora, “agora
trace uma linha de uma extremidade à outra, isto é, de Pequim a
Santiago; faça com que sua linha toque um ponto no centro da Á frica e
você terá uma ideia exata do trabalho que será realizado pelos
Salesianos”.
“Mas”, objetou Dom Bosco, “como podemos fazer tanto? As
distâ ncias sã o imensas; os locais indicados sã o de muito difícil acesso; e
os salesianos sã o poucos”.
“Nã o se preocupe com isso”, respondeu a Pastora. “Tudo isso será
feito por seus filhos e pelos filhos de seus filhos. Apenas que
permaneçam firmes na observâ ncia da Regra e do espírito da Sociedade
Salesiana”.
“Mas”, continuou Dom Bosco, “de onde vem toda esta gente?”
“Apenas venha e veja. Lá você tem 500 missioná rios, todos prontos
e dispostos a trabalhar duro. Além deles você pode ver mais e ainda
mais. Basta traçar uma linha de Santiago até o centro da África e agora o
que você vê?”
“Vejo”, respondeu Dom Bosco, “dez estações ou centros”.
“Muito bem”, disse a Pastora. “Esses centros que vocês veem serão
casas de estudo e noviciados e, com o tempo, produzirão multidões de
missionários para trabalhar nesses países. E agora, apenas vire aqui;
aqui você tem mais dez centros do meio da Á frica até Pequim. Estes
fornecerã o missioná rios para outros países. Aí você tem Hong Kong,
Calcutá e mais longe aqui Madagascar. Além disso, estes e outros
centros terã o suas casas, casas de estudo e noviciados”.
Dom Bosco ficou absorvendo cada palavra e olhando atentamente
cada ponto indicado. Entã o ele disse novamente: “Mas ainda nã o vejo
de onde virã o tantas pessoas. E como serã o enviados os missioná rios
para esses lugares? Aí temos selvagens que vivem de carne humana, aí
temos hereges e pagã os – como, face a tais dificuldades, pode ser feito
tanto?”
“Ouça e eu lhe direi. Esforce-se sempre para ter uma grande boa
vontade. Depois disso, há apenas uma outra coisa: fazer com que meus
filhos cultivem assiduamente e constantemente a própria virtude de
Maria .”
“Penso”, disse Dom Bosco, “que compreendo tudo o que me
disseste e pregarei os teus conselhos em todo o lado e a todos”.
“E esteja alerta”, continuou a Santíssima Virgem (pois aquela
Pastora deve ter sido a pró pria Nossa Senhora) “contra um erro que
agora é muito prevalente: a tendência entre os estudantes de misturar as
artes divinas e humanas; a ciência do Céu não deve ser misturada com as
coisas terrenas .”
Dom Bosco estava a ponto de falar novamente quando toda a visã o
se desvaneceu. Seu sonho estava no fim.
“Como nossa Mã e Maria nos ama!” foi o comentá rio de Dom Bosco
quando terminou de contar aos seus Salesianos de Barcelona o que
tinha visto.
40
AS DUAS COLUNAS
NO MAR
( Memórias Biográficas , Vol. VII, Cap. XVIII, página 169ss.)

NO DIA 14 DE MAIO DE 1862, Dom Bosco teve a alegria de receber as


primeiras profissõ es religiosas de vinte e dois membros da Sociedade
Salesiana recé m-constituída.
Depois, entre os demais, disse aos neoprofessos que tinha provas
seguras de que a Sociedade Salesiana, pela vontade de Deus,
prosperaria. E ao falar-lhes manifestou uma satisfaçã o extraordiná ria.
Alguns dias depois, no dia 30 de maio, narrou o seguinte sonho.
Diz respeito à s batalhas da Igreja contra muitos adversá rios, aos
sofrimentos do Papa e ao triunfo final através da devoçã o à Sagrada
Eucaristia e a Maria, Auxiliadora dos Cristã os.
Quero te contar um sonho. É verdade que quem sonha nã o
raciocina; de qualquer forma, eu, que até te contaria os meus pecados
se nã o tivesse medo de que eles fizessem todos vocês fugirem e
fizessem a casa desabar, digo isso para o seu lucro espiritual. Tive o
sonho há alguns dias.

O sonho
Imaginem-se comigo à beira-mar, ou melhor, numa rocha isolada e
nã o vendo nenhum pedaço de terra além do que está sob seus pés. Em
toda aquela vasta extensã o de á gua você vê uma frota incontável de
navios em ordem de batalha. As proas dos navios sã o formadas em
pontas afiadas, semelhantes a lanças, de modo que, onde quer que
sejam empurradas, elas perfuram e destroem completamente. Esses
navios estã o armados com canhõ es, com muitas espingardas, com
materiais incendiá rios, com outras armas de todos os tipos, e também
com livros, e avançam contra um navio muito maior e mais alto do que
eles e tentam arremeter contra ele com as proas. ou queimá -lo ou de
alguma forma causar-lhe todos os danos possíveis.

O Navio da Igreja
Como escoltas daquele majestoso navio totalmente equipado,
existem muitos navios menores, que recebem comandos por sinal dele
e realizam movimentos para se defenderem da frota adversá ria.

As Duas Colunas
No meio da imensa extensã o do mar, duas poderosas colunas de
grande altura erguem-se um pouco distantes uma da outra. No topo de
uma delas está a está tua da Virgem Imaculada, de cujos pés pende um
grande cartaz com esta inscriçã o: Auxilium Christianorum — “Ajuda dos
Cristã os”; do outro, que é muito mais alto e maior, está uma Hó stia de
grande tamanho proporcional à coluna e abaixo está outro cartaz com
as palavras: Salus Credentium – “Salvaçã o dos Fiéis”.

O Santo Padre
O comandante supremo do grande navio é o Soberano Pontífice.
Ele, ao ver a fú ria dos inimigos e os males em que se encontram seus
fiéis, decide convocar ao seu redor os capitã es dos navios menores para
realizar um conselho e decidir o que fazer.

No Conclave
Todos os capitã es sobem a bordo e se reú nem em torno do Papa.
Eles realizam uma reuniã o, mas enquanto isso o vento e as ondas se
juntam em tempestade, entã o eles sã o enviados de volta para controlar
seus pró prios navios.
O famoso sonho profético de João Bosco sobre As Duas Colunas no Mar, que se referia a uma
grande batalha que ocorreria no futuro entre a Igreja e seus inimigos.
Há uma breve pausa; pela segunda vez o Papa reú ne os capitã es à
sua volta, enquanto a nau capitâ nia segue seu curso. Mas a terrível
tempestade retorna.
O Papa está ao leme e todas as suas energias estã o direcionadas
para conduzir o navio em direçã o à quelas duas colunas, do topo das
quais e de todos os lados pendem numerosas â ncoras e grandes
ganchos, presos a correntes.

A batalha
Todos os navios inimigos se movem para atacá -lo e tentam de
todas as maneiras detê-lo e afundá -lo: alguns com escritos ou livros ou
materiais inflamáveis, dos quais estã o cheios; outros com armas, com
rifles e com aríetes. A batalha se intensifica cada vez mais
implacavelmente. As proas inimigas avançam violentamente, mas os
seus esforços e impacto revelam-se inú teis. Fazem tentativas em vã o e
desperdiçam todo o seu trabalho e muniçã o; o grande navio segue seu
caminho com segurança e tranquilidade. À s vezes acontece que,
atingido por golpes formidáveis, fica com fendas grandes e profundas
nas laterais; mas assim que o dano é causado, uma brisa suave sopra
das duas colunas e as rachaduras se fecham e as lacunas sã o
interrompidas imediatamente.

Destruição do Inimigo
Enquanto isso, as armas dos agressores sã o explodidas, os rifles e
outras armas e proas sã o quebrados; muitos navios sã o destruídos e
afundam no mar. Entã o, os inimigos frenéticos se esforçam para lutar
corpo a corpo, com punhos, com golpes, com blasfêmias e com
maldiçõ es.
De repente, o Papa cai gravemente ferido. Imediatamente, aqueles
que estã o com ele correm para ajudá -lo e o levantam. Uma segunda vez
que o Papa é atingido, ele cai novamente e morre. Um grito de vitó ria e
de alegria ressoa entre os inimigos; de seus navios surge uma zombaria
indescritível.

Um Novo Papa
Mas dificilmente o Pontífice morre e outro Papa toma o seu lugar.
Os pilotos, reunidos, elegeram o Papa tã o prontamente que a notícia da
morte do Papa coincide com a notícia da eleiçã o do sucessor. Os
adversá rios começam a perder a coragem.

Refúgio de descanso
O novo Papa, derrotando o inimigo e superando todos os
obstá culos, guia o navio até as duas colunas e pá ra entre elas; ele o
prende com uma leve corrente que vai da proa até uma â ncora da
coluna sobre a qual está a Hó stia; e com outra corrente leve que pende
da popa, prende-a na extremidade oposta a outra â ncora pendurada na
coluna sobre a qual está a Virgem Imaculada.

Derrota do Inimigo
Entã o ocorre uma grande convulsã o. Todos os navios que até entã o
lutaram contra o navio do Papa estã o espalhados; eles fogem, colidem e
se despedaçam uns contra os outros. Alguns afundam e tentam afundar
outros. Vá rios pequenos navios que lutaram galantemente pela corrida
do Papa para serem os primeiros a ligarem-se à quelas duas colunas.
Muitos outros navios, tendo recuado por medo da batalha,
observam cautelosamente de longe; tendo os destroços dos navios
quebrados sido espalhados nos redemoinhos do mar, eles, por sua vez,
navegam com seriedade até aquelas duas colunas e, tendo chegado a
elas, prendem-se aos ganchos que delas pendem e ali permanecem.
seguro, juntamente com o navio principal, no qual está o Papa. Sobre o
mar reina uma grande calma.

Dom Bosco explica


Neste momento Dom Bosco perguntou ao Padre Rua:
“O que você acha da histó ria?”
D. Rua respondeu: “Parece-me que o navio do Papa pode significar
a Igreja, da qual ele é o chefe: os navios, homens; o mar, este mundo.
Aqueles que defendem o grande navio sã o os bons, carinhosamente
ligados à Santa Sé; os demais sã o seus inimigos, que tentam com todo
tipo de arma aniquilá -la. As duas colunas da salvaçã o parecem ser a
devoçã o a Maria Santíssima e ao Santíssimo Sacramento da Eucaristia”.
Dom Rua nã o falou do Papa que caiu e morreu, e Dom Bosco
também se calou sobre ele. Ele simplesmente acrescentou: “Você está
certo! Só devo corrigir uma expressã o. Os navios inimigos sã o
perseguiçõ es. As provaçõ es mais graves para a Igreja estã o pró ximas. O
que aconteceu até agora nã o é quase nada em face do que deve
acontecer. Seus inimigos sã o representados pelos navios que tentaram
afundar o navio principal, se pudessem. Só lhe restam dois meios para
salvá -la em meio a tanta confusã o: a DEVOÇÃ O A MARIA SANTÍSSIMA e
a COMUNHÃ O FREQUENTE, valendo-se de todos os meios e fazendo o
possível para praticá -los e fazer com que sejam praticados em todos os
lugares e por todos.”
(Dom Bosco nã o deu outras explicaçõ es.)
UMA CARTA ESCRITA
POR ST. JOÃO BOSCO
SOBRE A EDUCAÇÃO
( Memórias Biográficas , Vol. XVII, Cap. III)

ESTE ESCRITO é um tesouro que, junto com o breve tratado sobre o


Sistema Preventivo e o Regulamento das Casas Salesianas, formam a
trilogia pedagó gica deixada por Dom Bosco como herança aos seus
filhos. É uma pedagogia ao mesmo tempo simples e sublime que,
quando bem compreendida e bem executada, pode fazer dos institutos
de educaçã o lugares de alegria, refú gios de inocê ncia, lares de virtude,
centros de estudo, creches de excelentes cristã os, de bons cidadã os. e
de eclesiá sticos dignos. Boa vontade e sacrifício, poré m, sã o muito
necessá rios. -D. Cé ria
Meus queridos filhos em Jesus Cristo,
Esteja eu perto ou longe de você, você é sempre o objeto dos meus
pensamentos. Meu ú nico desejo é ver você feliz no tempo e na
eternidade; e foi esse pensamento, esse desejo, que me levou a escrever
esta carta para você. Estar longe de vocês, meus queridos meninos, é
um fardo muito pesado para mim, e vocês nã o imaginam a dor que me
causa nã o poder vê-los e ouvi-los.
É por isso que eu gostaria de ter escrito estas linhas para você há
uma semana, mas minhas ocupaçõ es constantes me impediram de fazê-
lo. De qualquer forma, embora faltem apenas alguns dias para o meu
retorno, quero antecipar a minha vinda entre vocês e, como nã o posso
fazê-lo pessoalmente, deverá ser por carta. Estas minhas palavras sã o
palavras de quem te ama com ternura em Jesus Cristo, de quem tem o
dever de falar contigo, com a liberdade de um pai. Você, eu sei, vai me
deixar fazer isso, nã o vai? E você vai ouvir o que tenho a dizer e colocar
em prá tica.
Sonho – O Oratório Antes de 1870
Eu disse que você é o ú nico objeto constante dos meus
pensamentos. Pois bem, algumas noites atrá s eu me retirei para o meu
quarto e, enquanto me preparava para dormir, comecei a fazer as
oraçõ es que minha boa mã e me ensinou.
Entã o nã o tenho certeza se fui dominado pelo sono ou distraído:
parecia estar diante de dois ex-alunos do Orató rio. Um dos dois veio até
mim e, apó s me cumprimentar carinhosamente, disse:
“Dom Bosco, você me conhece?”
“Claro que conheço você”, respondi,
“E você ainda se lembra de mim?” Ele continuou.
“Lembro-me de você e de todos os outros; você é Valfrè e esteve no
Orató rio antes de 1870”.
“Diga-me”, continuou ele, “você gostaria de ver os meninos que
estiveram no Orató rio na minha época?”
"Oh sim! deixe-me vê-los”, respondi. Isso me daria muito prazer.”

A Visão do Passado
Valfrè entã o me mostrou os meninos como eram naquela época:
iguais em aparência, altura e idade. Parecia que estava no antigo
Orató rio durante o recreio: era um cená rio animado, cheio de
movimento e alegria. Alguns corriam, alguns saltavam ou faziam outros
saltar; aqui eles estavam jogando salto, lá bararotta ou futebol. Num
determinado local havia um grupo de rapazes que ouviam atentamente
um sacerdote que lhes contava uma histó ria; em outro lugar, havia um
Irmã o no meio de um grupo de meninos que brincava com eles. Houve
cançõ es e risadas de todos os lados; Padres e Irmã os estavam por toda
parte, e ao redor deles os meninos brincavam alegremente. Era
evidente que existia a maior cordialidade e confiança entre os rapazes e
os seus Superiores. Fiquei encantado com tudo isso, e Valfrè me disse:
“Veja, a afabilidade traz carinho e confiança: é isso que abre o coraçã o
dos meninos, e eles manifestam tudo sem o menor medo aos seus
professores, assistentes e superiores. Tornam-se sinceros na Confissã o
e fora dela, e sã o dó ceis a tudo o que lhes é ordenado pelo seu Superior,
de cujo amor por eles estã o plenamente seguros.

O Grande Contraste
Naquele momento o outro ex-aluno, de barba branca, aproximou-
se de mim e disse: “Dom Bosco, gostaria de ver e conhecer os meninos
que estã o atualmente no Orató rio?” “Sim”, respondi, “faz um mês que
nã o os vejo”. E entã o Joseph Buzzetti os mostrou para mim. Vi o
Orató rio e todos vocês em recreaçã o, mas nã o havia mais gritos e
cantos alegres, nã o havia mais toda aquela atividade animada da
primeira cena.
Podia-se ver a insatisfaçã o nas açõ es e no rosto de muitos meninos
– um cansaço, um desâ nimo e uma desconfiança que doeram meu
coraçã o. É verdade que vi muitos meninos correndo e brincando de
maneira completamente despreocupada; mas vi muitos outros
sozinhos, apoiados em pilares, enterrados em pensamentos desolados;
outros ainda ficavam nas escadas e nos corredores ou nas varandas
voltadas para o jardim, para evitar a recreaçã o comum. Havia alguns
outros passeando em grupos, conversando em voz baixa entre si,
lançando olhares nervosos e mal-intencionados, sorrindo
ocasionalmente; mas junto com o sorriso veio um olhar maligno, que
nos convenceu sem dú vida de que Sã o Luís teria corado ao se encontrar
em tal companhia. E mesmo entre aqueles que participavam dos jogos,
havia alguns que jogavam com tanta relutâ ncia que deixavam bem claro
que nã o tiravam nenhum prazer da sua recreaçã o.
"Você vê seus meninos?" — perguntou o ex-aluno.
“Sim,” eu suspirei.
“Quã o diferente do que já fomos!” ele exclamou.
“Infelizmente, sim! Que falta de entusiasmo nesta recreaçã o!”
E é por isso que muitos sã o frios na sua abordagem aos
Sacramentos; causa a sua negligência relativamente à s prá ticas de
piedade na igreja e noutros lugares, e a sua relutâ ncia em permanecer
no lugar onde a Providência Divina derrama sobre eles tudo o que é
bom para o seu corpo, alma e intelecto. Daí que muitos nã o
correspondam à sua vocaçã o; assim também a sua ingratidã o para com
os Superiores, bem como o seu comportamento dissimulado e as suas
queixas, com todas as suas consequências deploráveis.
O remédio
“Sim, entendo”, respondi. “Mas como posso fazer com que meus
meninos recuperem a antiga vivacidade, alegria e franqueza?” “Com
caridade!”
“Com caridade? Mas os meus filhos nã o sã o suficientemente
amados? Você sabe que eu os amo. Você sabe o quanto tive que
suportar por causa deles durante quarenta anos e o quanto ainda sofro
até agora. Quantas privaçõ es, quantas humilhaçõ es, quanta oposiçã o e
perseguiçã o para que tivessem comida e abrigo, para que tivessem
professores e, acima de tudo, para que o seu bem-estar espiritual fosse
garantido. Fiz tudo o que pude pelos meus meninos; eles sã o a menina
dos meus olhos.
"Eu nã o estava falando sobre você."
“De quem entã o você fala? Daqueles que tomam o meu lugar? Os
reitores, prefeitos, professores e assistentes? Você nã o vê que eles sã o
má rtires do dever e do estudo? Veja como eles passam os anos de sua
juventude por aqueles que a Divina Providência lhes confiou!
"Sim, eu sei disso. Mas nã o é suficiente – ainda falta algo melhor.”
"E o que é isso?"
“Nã o basta que os meninos sejam amados: eles pró prios devem
saber que sã o amados.”
“Mas eles nã o têm olhos na cabeça? Eles nã o têm inteligência? Nã o
percebem que tudo o que é feito por eles é feito por amor a eles?”
"Nã o; Repito, isso nã o é suficiente.”
“Bem, entã o, o que é exigido de nó s?”
“Isto: satisfazendo-os nas coisas de que gostam, pela participaçã o
nas suas inclinaçõ es juvenis, eles aprenderã o a ver o seu amor por eles
naquelas coisas que naturalmente nã o gostam, como disciplina, estudo
e automortificaçã o; e aprenderã o a fazer essas coisas com prazer e
amor.”
“Eu nã o entendo direito.”
“Dê uma olhada nos meninos na recreaçã o.”
Olhei e respondi: “O que há de tã o especial para ver?”
“Você nã o entende depois de todos esses anos educando
meninos?”
“Olhe com mais atençã o. Onde estã o os nossos Salesianos?” Olhei e
notei que poucos padres e irmã os se misturavam com os meninos e
menos ainda participavam de suas brincadeiras. Os Superiores já nã o
eram a alma da recreaçã o. A maioria deles caminhava e conversava sem
se importar com o que os alunos faziam; outros assistiam aos jogos,
sem pensar nos meninos; outros ainda supervisionavam à distâ ncia,
sem perceber muitas pequenas perturbaçõ es, enquanto alguns
notavam, mas de maneira ameaçadora, e mesmo assim apenas
raramente. Houve alguns salesianos que gostariam de se juntar a alguns
grupos de meninos, mas vi que esses meninos faziam o possível para se
afastarem dos professores e dos superiores. Aí meu amigo disse:
“Nos velhos tempos do Orató rio, você nã o estava sempre entre os
meninos, principalmente nas recreaçõ es? Você se lembra daqueles
grandes anos? Foi um pedacinho do Céu, uma época que sempre
lembramos com amor, porque o amor era a regra de nossas vidas e nã o
guardávamos segredos de vocês.”
"Sim, de fato. E entã o tudo foi uma alegria para mim; os meninos
gostavam de vir até mim para me ouvir falar e tinham um desejo vivo
de receber meus conselhos e agir de acordo com eles. Mas agora você
vê como sou afastado deles por causa de visitas e ocupaçõ es contínuas
e pela minha saú de debilitada.”
"Muito bem; mas se nã o o consegues, por que os teus salesianos
nã o te imitam? Por que você nã o insiste, exige que eles tratem os
meninos como você os tratou?
“Falo até ficar rouco, mas infelizmente muitos nã o se sentem
capazes de suportar a tensã o como nó s.”
“E entã o eles negligenciaram seu método simples e entã o
perderam o fruto de seu trabalho. Deixe-os amar o que os meninos
gostam, e os meninos passarã o a amar o que os Superiores gostam, e
isso facilitará o seu trabalho. Antigamente os coraçõ es estavam abertos
aos Superiores, e os meninos os amavam e obedeciam; mas agora os
Superiores sã o considerados Superiores e nã o mais como pais, irmã os e
amigos, e por isso sã o temidos e nã o amados. Portanto, se queres que
todos voltem a ser unidos de coraçã o e alma, pelo amor de Jesus, essa
barreira fatal da desconfiança deve ser removida e a confiança filial
deve tomar o seu lugar. Entã o deixe a obediência guiar os alunos como
uma mã e conduz seu filho, e a paz e a alegria reinarã o mais uma vez no
Orató rio”.
“Mas como vamos remover essa barreira?”
“Familiaridade com os meninos, principalmente nas recreaçõ es.
Sem familiaridade nenhum amor pode ser demonstrado, e sem esta
manifestaçã o de amor nã o pode haver confiança. Quem deseja ser
amado deve primeiro demonstrar o seu amor. Jesus Cristo, ao lidar com
os pequeninos, tornou-se como um deles e tomou sobre si as nossas
enfermidades. Ele é nosso exemplo de familiaridade. O professor que só
aparece na sala de aula, e em nenhum outro lugar, é professor e nada
mais; mas deixe-o ir com seus meninos para a recreaçã o e ele se
tornará um irmã o.
“Se alguém é visto apenas pregando do pú lpito, pode-se dizer que
ele está fazendo apenas o que é seu estrito dever; mas deixe-o dizer
uma boa palavra na recreaçã o, e essa é a palavra de um coraçã o
amoroso. Quantas conversõ es foram provocadas por aquelas suas
poucas palavras espontâ neas sussurradas no ouvido de um menino
enquanto ele estava absorto em suas brincadeiras! Se um menino sabe
que é amado, ele retribuirá o amor; e se o Superior for amado, ele pode
conseguir tudo — principalmente dos meninos. Esta confiança cria uma
corrente eléctrica entre os rapazes e os seus Superiores; o coraçã o dos
meninos se abre, suas necessidades sã o conhecidas e seus sentimentos
revelados. Esta confiança torna a tarefa mais leve e, com ela, a
ingratidã o, os problemas, as faltas e as falhas dos meninos tornam-se
suportáveis.
“Jesus Cristo nã o esmagou a cana quebrada nem apagou o pavio
fumegante. Aí está o seu modelo! E assim ninguém será visto
trabalhando por vangló ria; ninguém punindo apenas para justificar o
amor pró prio ferido; ninguém evita ajudar os meninos por medo
ciumento da popularidade dos outros; ninguém criticando seus irmã os
com o objetivo de obter o amor e a estima dos meninos exclusivamente
para si mesmo - sem ganhar nada, na verdade, a nã o ser o desprezo dos
meninos e talvez um sorriso mentiroso. Você nã o encontrará ninguém
permitindo que seu coraçã o seja capturado por qualquer menino e
negligenciando os outros para atendê-lo; ninguém se esquivando de seu
dever obrigató rio de vigilâ ncia por amor à facilidade e conforto, ou
abstendo-se, por respeito humano, de admoestar quando a
admoestaçã o é necessá ria.
“Se este amor reinar, todos buscarã o apenas a gló ria de Deus e a
salvaçã o das almas. É quando esse amor esfria que as coisas começam a
dar errado. Por que você quer substituir a caridade pela rigidez de
algumas regras? Por que os Superiores evitam a observâ ncia das regras
de educaçã o que lhes estabelecestes? Por que é que o sistema de
vigilâ ncia amorosa e preventiva está sendo substituído por um sistema
de regras de enquadramento – um sistema menos pesado e mais
conveniente para o Superior? Se as regras sã o aplicadas através de
puniçã o, elas acendem o ó dio e dã o origem ao desagrado; ao passo que,
se a sua observâ ncia nã o for aplicada, geram desprezo pelos Superiores
e causam graves transtornos.
“A Jangada Salvadora: Guerra ao Pecado.” Esta imagem simboliza a proteção de São João
Bosco aos seus meninos em meio à turbulência das tentaçõ es mundanas.
“Isso está fadado a acontecer onde nã o há espírito de família.
Portanto, se você deseja que aqueles velhos tempos felizes voltem ao
Orató rio, deixe o antigo sistema ser praticado novamente. Que o
Superior seja tudo para com todos, sempre pronto a ouvir qualquer
reclamaçã o ou dú vida dos meninos, exercendo uma vigilâ ncia paternal
sobre a sua conduta; e que seu coraçã o esteja voltado para a busca do
bem-estar espiritual e temporal daqueles a quem a Providência lhe
confiou. Entã o os coraçõ es dos meninos se abrirã o; entã o aquele ar de
sigilo e tendência mortal de esconder tudo desaparecerá . Somente em
matéria de escâ ndalo que o Superior seja inexorável: é melhor correr o
risco de mandar embora um menino inocente do que manter aquele
que é motivo de escâ ndalo. Os Assistentes devem considerar como
estrita obrigaçã o de consciência dar a conhecer ao Superior tudo o que
possa de alguma forma constituir uma ofensa a Deus!”
Entã o perguntei-lhe: “Qual é o melhor meio para fazer florescer
novamente entre nó s a familiaridade, o amor e a confiança? “A exata
observâ ncia do Regimento da Câ mara.”
"Nada mais?"
“O melhor aperitivo em um jantar é o rosto sorridente das pessoas
ao seu redor.”
Enquanto meu velho amigo encerrava a conversa, com o coraçã o
pesado continuei assistindo aquela recreaçã o sem vida; mas aos poucos
fui me sentindo exausto e oprimido por uma sensaçã o de opressã o, que
foi aumentando a tal ponto que voltei a mim. Descobri que estava de pé
ao lado da minha cama. Minhas pernas estavam tã o rígidas e doloridas
que eu nã o conseguia mais ficar de pé. Já era tarde demais. Portanto, fui
para a cama determinado a escrever estas linhas aos meus meninos.
Desejo nã o ter esses sonhos, pois eles me deixam completamente
exausto. Durante todo o dia seguinte, senti-me extremamente fraco e
ansiava pela chegada da noite para poder ter um sono calmo e
profundo. Mas assim que fui para a cama, o sonho recomeçou. Diante de
mim estavam o pá tio, os atuais meninos do Orató rio e o mesmo ex-
aluno do Orató rio, a quem voltei a questionar imediatamente:
“Nã o deixarei de informar aos Salesianos tudo o que me disseste,
mas o que direi aos meninos do Orató rio?”
“Diga-lhes”, disse ele, “que devem compreender tudo o que os
Superiores, mestres e assistentes fazem por eles e o quanto trabalham
por eles; se nã o fosse pelo seu amor, nunca se sujeitariam a tantos
sacrifícios. Lembre-lhes que a humildade é a fonte de toda felicidade;
diga-lhes para suportarem os defeitos dos outros, pois a perfeiçã o nã o
pode ser encontrada neste mundo. É uma coisa do Paraíso. Eles devem
parar com todos os tipos de resmungos que congelam o coraçã o. Acima
de tudo, diga-lhes que o seu principal esforço deve ser viver na graça de
Deus. Quem nã o está em paz com Deus nã o está em paz consigo mesmo
nem com os outros”.
“Você me diz, entã o, que alguns dos meus meninos nã o estã o em
estado de graça?”
“Esta é a principal causa deste lamentável estado de coisas – este e
outros dos quais você tem conhecimento sem que eu os mencione, e
que você deve remediar. Só quem tem alguns segredos desconfia dos
outros, pois tem sempre medo de que esses segredos se tornem
conhecidos e tem plena consciência de que, se se tornassem pú blicos,
ficaria coberto de vergonha e confusã o. Além disso, se o seu coraçã o
nã o estiver em paz com Deus, ele ficará inquieto e perturbado,
intolerante à obediência, facilmente perturbado por absolutamente
nada; tudo parece estar contra ele, e como ele pró prio nã o sente amor,
chegará à conclusã o de que os Superiores nã o o amam”.
“E, no entanto, quantos meninos frequentam diariamente os
Sacramentos da Confissã o e da Comunhã o!”
“É verdade; muitos confessam-se, mas o que falta absolutamente é
firmeza nas suas resoluçõ es. Eles se confessam, mas trazem sempre as
mesmas faltas, as mesmas ocasiõ es de pecado, os mesmos maus
há bitos, os mesmos atos de desobediência e negligência do dever. E
continuam assim mês apó s mês, e até mesmo durante anos; alguns
continuam assim até o final dos dias escolares. Estas Confissõ es valem
pouco ou nada e, portanto, nenhuma paz de alma é obtida delas; e se
um menino fosse chamado em tal estado perante o tribunal de Deus,
seria realmente um assunto sério.”
“Há muitos assim no Orató rio?”
“Nã o, considerando o grande nú mero de meninos que você tem na
Câ mara, nã o sã o muitos. Olhe para eles." E ele os apontou para mim. Eu
observei e vi aqueles meninos, um por um. Mas naqueles poucos
meninos notei coisas que entristeceram profundamente meu coraçã o.
Nã o quero escrevê-los no papel, mas quando voltar quero explicá -los a
cada um dos interessados. Por enquanto, direi apenas que rezem e
tomem resoluçõ es firmes, mostrando pelo seu comportamento que sã o
sinceros, e façam com que Comollos, os Domingos Sávios, os Besucco e
os Saccardis voltem a viver entre nó s. Como palavra final ao meu amigo,
perguntei: “Tem mais alguma coisa para me dizer?”
“Dizei a todos, jovens e velhos, que eles sã o filhos de Maria,
Auxiliadora dos Cristã os”, disse ele, “que ela os trouxe aqui para
protegê-los dos perigos do mundo, para que se amem como irmã os. e
dai gló ria a Deus e a ela pela sua boa conduta. Dizei-lhes que é Nossa
Senhora quem, por um fluxo interminável de favores e graças, lhes
proporciona o pã o e tudo o que necessitam para os estudos. Lembrem-
se de que estã o à s portas da festa da sua Santa Mã e e que é com a sua
ajuda que essa barreira deve cair, a barreira da desconfiança que o
diabo tã o astuciosamente levantou entre os Superiores e os meninos
para usá -la como um meio para a ruína de certas almas.”
“E conseguiremos remover a barreira?”
“Certamente”, respondeu ele, “se ao menos jovens e velhos
estiverem dispostos a sofrer alguma pequena mortificaçã o pelo amor
de Maria, e se colocarem em prá tica o que eu lhe disse”.
Enquanto isso, continuei a olhar para meus meninos e, ao ver
aqueles que via caminhando para a perdiçã o eterna, meu coraçã o ficou
tã o dolorido que acordei. Gostaria de lhes contar muitas outras coisas
que também sã o de grande importâ ncia, mas nã o tenho tempo nem
oportunidade agora.
Uma imagem que ilustra que o segredo do sucesso de São João Bosco foi a sua singular
devoção à Bem-Aventurada Virgem Maria.
Agora eu deixo você. Você conhece o ú nico desejo deste velho que
passou a vida pelos seus queridos meninos? Nada mais senã o que, na
medida do possível, voltem os dias felizes do antigo Orató rio: os dias de
carinho e confiança cristã entre os meninos e os Superiores; os dias de
condescendência e tolerâ ncia mú tua pelo amor de Jesus Cristo; os dias
em que os coraçõ es estavam abertos com toda a simplicidade e
franqueza, os dias de caridade e de verdadeira felicidade para todos.
Preciso do consolo da sua promessa de que fará tudo o que lhe
peço para o bem da sua alma. Você nã o percebe suficientemente a
grande sorte que tem em estar abrigado no Orató rio. Diante de Deus,
garanto-vos que basta um menino entrar numa casa salesiana e a
Santíssima Virgem o acolhe imediatamente sob a sua especial proteçã o.
Sejamos, portanto, unâ nimes. Caridade de quem manda, caridade de
quem obedece; e o resultado será o espírito de Sã o Francisco de Sales
reinando em nosso meio.
Meus queridos meninos, aproxima-se o tempo em que devo
separar-me de vocês e ir para a eternidade, por isso tenho um desejo
ardente de deixar vocês, sacerdotes, irmã os e queridos meninos, no
caminho que o pró prio Senhor deseja para vocês.
Para este fim, o Santo Padre, que encontrei na sexta-feira, 9 de
maio, envia-vos de todo o coraçã o as suas bênçã os. A Festa de Maria
Auxiliadora me encontrará de volta convosco diante da imagem de
nossa Mã e Santíssima. Desejo que esta festa seja celebrada com a maior
solenidade possível. Deixo isso para o Pe. Lazzero e Pe. Marchisio para
solenizá -lo também no refeitó rio. A Festa de Maria, Auxiliadora, deve
ser um prelú dio daquela festa eterna que celebraremos juntos um dia
no Céu.
Roma, 10 de maio de 1884
Atenciosamente, em Jesus Cristo,
FR. JOÃ O BOSCO
UMA NOTA PARA OS SALESIANO
Aqui estã o alguns sonhos-visõ es monitoriais especiais, muito
importantes para os Salesianos.
Das Memórias Biográficas:
1. Volume CH. A RODA : Sobre vocaçõ es e outros assuntos
VI 67

2. Volume CH. UMA CAMINHADA PARA O CÉ U


VI 65

3. Tomo CH. PURGATÓ RIO: Conselhos para todos


VIII 71

4. Tomo CH. A JANGADA SALVADORA: Guerra ao pecado (Pedagó gico)


VIII 22

5. Volume CH. OS DEZ DIAMANTES


XV 5

6. Volume CH. UM CONSELHO DIABÓ LICO CONTRA A CONGREGAÇÃ O


XVII 14

7. Volume O TERCEIRO SONHO MISSIONÁ RIO (Edição Italiana, p. 299 e


XVII Annali, p. 501)

8. Volume O QUARTO SONHO MISSIONÁ RIO (Edição Italiana, p. 643 e


XVII Annali, p. 551)

9. Os Salesianos podem encontrar uma seleçã o de cerca de quarenta


sonhos marianos no capítulo VII do Pe. Carta circular de P. Ricaldone
sobre Nossa Devoção a Maria Auxiliadora ; e també m no Salesianum
, janeiro de 1953.
Num relance: AS MEMÓ RIAS BIOGRÁ FICAS DE SÃ O JOÃ O BOSCO.
As referências referem-se à ediçã o original italiana.
Volume Período Pá ginas Sonhos Autor Impresso
em

EU 1815–41 547 10 G. 1898


Lemoyne

II 1841–47 597 6 G. 1901


Lemoyne

III 1847–49 663 4 G. 1903


Lemoyne

4 1850–54 766 - G. 1904


Lemoyne

V 1854–58 953 9 G. 1905


Lemoyne

VI 1858–61 1.102 17 G. 1907


Lemoyne

VII 1862–64 931 15 G. 1909


Lemoyne

VIII 1865–67 1.110 12 G. 1912


Lemoyne

IX 1868-70 1.032 17 G. 1917


Lemoyne

X 1871–74 1.389 17 A. 1939


Amadei

XI 1875 627 5 E. Ceria 1930

XII 1876 714 9 E. Ceria 1931


XIII 1877–78 1.021 6 E. Ceria 1932

XIV 1879–80 859 6 E. Ceria 1933

XV 1881–82 882 6 E. Ceria 1933

XVI 1883 735 2 E. Ceria 1935

XVII 1884–85 920 20 E. Ceria 1935

XVIII 1886-88 897 21 E. Ceria 1937

XIX 1888-1938 454 - E. Ceria 1939

XX Anal. Índice 620 - E. Foglio 1948

20 72 anos, 5 meses, 15 16.830 179 4 50 anos.


volumes. dias período
Índice
Cobrir
Título
direito autoral
Conteú do
Agradecimentos
Prefá cio
1. O primeiro sonho
2. Joã o Bosco sonha com a prova mensal
3. O sonho da pastora
4. O futuro do Orató rio
5. Três Má rtires
6. A Futura Igreja de Sã o Francisco de Sales
7. Dois meninos atacados por um monstro
8. Laços Mortais
9. A perdiz e a codorna
10. O Precioso Lenço da Pureza
11. Um gato com chifres
12. Um elefante diabó lico
13. Mensageiro da Morte
14. Corvos ferozes e uma pomada curativa
15. Amado discípulo de Dom Bosco, Sã o Domingos Sávio
16. Um sonho sobre Sã o Domingos Sávio
17. Presentes de meninos para a Bem-Aventurada Virgem Maria
18. Inocência preservada pela penitência
19. Na Terra da Provaçã o
20. Um Poço Medonho
21. Dez Colinas
22. Demô nios na Igreja
23. A Cobra e o Rosá rio
24. As Quatorze Tá buas
25. Uma Pequena Marmota
26. Um cachorro feroz
27. Um Mastim Gigante
28. Consciências Reveladas
29. Um bando de monstros
30. O Cavalo Vermelho
31. Uma videira misteriosa
32. Para o inferno e de volta
33. A Pérgula Rosa
34. As lutas da sociedade
35. A Filoxera
36. O touro, as carruagens e os pregos
37. O Primeiro Sonho Missioná rio (1872)
38. O Anjo de Arphaxad (Segundo Sonho Missioná rio)
39. O Futuro das Missõ es Salesianas (Quinto Sonho Missioná rio)
40. As Duas Colunas no Mar
Uma carta escrita por Sã o Joã o Bosco sobre a educaçã o
Uma nota para os Salesianos
As memó rias biográ ficas em resumo

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