Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Começámos a caminhada por volta das 08h40, a partir da Sé do Porto. Até lá, tivemos que
caminhar cerca de 20 minutos e entrar no metro, na Casa da Música, até São Bento,
passando pela Trindade.
A caminhada foi suave até às 10h20, momento em que parámos pela primeira vez para
partilhar um pão com ovo. Fomos caminhando até as 12h00, tomámos um café mas não
trouxemos um carimbo - a senhora tinha aberto o estabelecimento há 5 meses e ainda não
tinha pedido os materiais necessários.
Andámos mais uma hora, até às 13h, altura certa para almoçar. Partilhámos um pão com
rojões e brócolos (que dão força e energia para a loucura que estávamos e íamos continuar
a fazer). Pusemos as pernas para cima e deitámo-nos no chão, para aliviar um pouco as
dores. O Diogo achou que ia falecer mas depois deixou de ser drama queen e recompôs-se
(sem saber o tamanho das bolhas que já tinha no pé).
Depois do almoço, as paragens tornaram-se mais frequentes e cada vez mais urgentes. A
mais proveitosa (pelo menos para mim, Rita), foi aquela em que parámos durante o que me
pareceu ser 3h - na verdade foram uns 15 minutos -, deitada na relva (e, de novo, com as
pernas alçadas) e, sem chegar a adormecer, começar a sonhar.
Apesar de penosa, a tarde foi preenchida com o movimento renascentista introduzido pela
rainha Beyoncé, que nos deu água da fonte da juventude (sim, porque passou um grupo de
peregrinos mais velhos, capaz de nos ultrapassar duas vezes!!!!).
Preocupados com a possibilidade de não conseguir os dois carimbos necessários para a
obtenção da Compostela, uma vez que só teríamos o do albergue, eis que surge… numa
caixinha reluzente… um carimbo da localidade em que estávamos (qual? Que importa?).
Assim continuámos até chegar ao albergue de Vairão às 18h, cheios de dores (nos pés, nas
costas, na cabeça, na alma) e a necessitar um banho que nos devolvesse a sensação de
humanidade.
Uma sopa e uma omelete ao jantar, caminhar novamente até ao albergue, e até amanhã.
Afinal ainda houve tempo para uma maçã partilhada.
Frase do dia: estúpidos de merda que não conseguiam fazer 35kms e acabaram por fazer
30kms. São merecidas as dores que temos.
Uma curiosidade: é encorajador quando achamos que não vamos aguentar e, sem que
nada o preveja, ouvimos alguém gritar “BOM CAMINHO!”.
Dia 7 (17/06) Valença do Minho - O Porriño (21.5km) + caminhada pela noite até Fraela
Depois da noite de ontem, a manhã foi difícil de começar. Ainda assim, sabíamos que a
jornada não era muito exigente e que poderíamos descansar uma vez chegados ao nosso
poiso temporário.
Saímos mais cedo que a maioria dos companheiros, mas vimos todos ao longo do dia - o
Jan que se levantou da cama para fumar um cigarro, para logo depois voltar a dormir; os
dinamarqueses que sempre nos ultrapassam, não sabemos ainda se por terem as pernas
mais longas ou por terem mais resistência; o casal australiano que sempre pára um minuto
para conversar connosco; o casal de holandesas com quem sempre partilhamos as dores; o
Leo, que vai sozinho, mas sempre se alegra quando os nossos caminhos se cruzam.
A chegada a solo espanhol foi especial: o sol ainda não castigava a pele, víamos Portugal
do outro lado do rio, já cumprimentavamos em galego, já podíamos comer tortilla! Assim
que possível, foi essa iguaria que nos deu energia para concluir a última hora da caminhada
que, já com bastante calor, nos iria custar se não tivéssemos o estômago aconchegado e o
galego um pouco mais practicado.
Chegados ao albergue (desta vez, privado, por força de necessidade), fizemos as camas
(com lençóis, pela primeira vez numa semana!), lavamos roupa e a nós próprios. Não
podíamos prever que fosse acabar como acabou. Quando saímos do albergue para ir tomar
algo com os nossos amigos dinamarqueses, rapidamente se tornou num encontro ainda
mais intercional: conhecemos gente da África do Sul e dos EUA e, depois de beber cerveja
galega e comer tortilla, encontrámos casualmente um bar com música ao vivo. Cantavam
em inglês e em ritmos e acordes conhecidos a qualquer ouvido que já tenha conhecido um
Blues. Depois do concerto, ficaram as crianças a brincar na praça, às quais nos juntámos
um pouco, antes de decidir que não queríamos lençóis nem uma noite de sono
rejuvenescedora. Queríamos caminhar JÁ.
Em sete, partimos. Era a Rita, o Diogo, o Leo, o Otto, o Niko, a Cally e o Tiago. Com duas
caras novas, demos vários passos no escuro, procurando apenas as setas amarelas.
Chegados a uma terra com um parque infantil, decidimos parar e descansar ali mesmo, até
sermos acordados pelas gotas de chuva tão tradicionais na Galiza como a música com
gaitas de foles.
Acabámos por esperar pela cessação da chuva enquanto dividimos uma mesa de pedra,
sem nos arrependermos da loucura que havíamos feito, mas já com a noção dos seus
efeitos no corpo.