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Mas, aí, Nhô Augusto calou, com o peito cheio; tomou b) Um aspecto que afasta o conto da tradicional prosa
um ar de acanhamento; suspirou e perguntou: sertaneja do conto de Guimarães Rosa é sua
— Mais galinha, um pedaço, amigo? temática. Não se trata mais da idealização do amor
como era no Romantismo ou do espírito engajado e
— ’Tou feito. político como era no Segundo Tempo Modernista. O
— E você, seu barra? que ocorre aqui é a utilização de uma fábula
— Agradecido... ’Tou encalcado... ’Tou cheio até à (entende-se por fábula uma narrativa que encerra
tampa! simbolicamente uma moral, uma mensagem, tal qual
Enquanto isso, seu Joãozinho Bem-Bem, de cabeça as parábolas do Novo Testamento. Devemos, pois,
entendê-la como uma representação, com a intenção
entornada, não tirava os olhos de cima de Nhô Augusto. de trabalhar com temas universais de caráter
E Nhô Augusto, depois de servir a cachaça, bebeu metafísico. Esse caráter é nítido no presente conto já
também, dois goles, e pediu uma das papo-amarelo, a partir da referência constante a elementos
para ver: religiosos. Seu protagonista, Augusto, o nome da
— Não faz conta de balas, amigo? Isto é arma que cursa personagem, à primeira vista, se opõe ao seu caráter
tosco. No entanto, até o final da narrativa será
longe... estabelecida uma perfeita coerência com a
— Pode gastar as óito. Experimenta naquele pássaro ali, personalidade que irá adquirindo. Especifique a
na pitangueira... trajetória da personagem, estabelecendo a relação
— Deixa a criaçãozinha de Deus. Vou ver só se corto o entre o nome da personagem e o seu destino.
galho... Se errar, vocês não reparem, porque faz tempo
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que eu não puxo dedo em gatilho... “(…) E, páginas adiante, o padre se portou ainda mais
Fez fogo. excelentemente, porque era mesmo uma brava criatura.
— Mão mandona, mano velho. Errou o primeiro, mas Tanto assim, que, na despedida, insistiu:
acertou um em dois... Ferrugem em bom ferro! – Reze e trabalhe, fazendo de conta que esta vida é um
dia de capina com sol quente, que às vezes custa muito
a passar, mas sempre passa. E você ainda pode ter muito
ROSA, J. G. Sagarana. 71 ed. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 2001. p. 394-395.
pedaço bom de alegria… Cada um tem sua hora e a sua
vez: você há de ter a sua.”
a) Observe o segmento: João Guimarães Rosa, A hora e a vez de Augusto Matraga,
Já Nhô Augusto, incansável, sem querer esperdiçar em Sagarana. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001, p. 380.
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E como seria
Odiar a mim mesma
E a mim mesma temer
Texto II
TRANSFORMA-SE O AMADOR
NA COUSA AMADA
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a) Identifique a temática comum aos dois textos: fingindo uma dor no coração.
b) Camões é considerado um representante do — Fulô! Fulô! Ó Fulô!
“Maneirismo”. Explique o que foi o “Maneirismo” e A sinhá burra e besta perguntou
como ele se apresenta na poesia de Camões. onde é que tava o sinhô
Considere o fragmento bem como outros sonetos que o diabo lhe mandou.
— Ah, foi você que matou!
como suporte para sua resposta.
— É sim, fui eu que matou —
disse bem longe a Fulô
18. pro seu nego, que levou
Essa Negra Fulô ela pro mato, e com ele
O sinhô foi açoitar aí sim ela deitou.
sozinho a negra Fulô. Essa nega Fulô!
A negra tirou a saia Esta nossa Fulô!
e tirou o cabeção,
SILVEIRA, O. Outra nega fulô. Cadernos negros: os
de dentro dele pulou
melhores poemas. São Paulo: Quilombhoje, 1998. p. 109-110.
nuinha a negra Fulô
Essa negra Fulô! a) A leitura do poema permite estabelecer um diálogo
Essa negra Fulô! com o poema de Jorge de Lima. Explique em que
(…) medida essa relação ocorre:
Cadê, cadê teu Sinhô b) Que características modernas presentes nos dois
que nosso Senhor me mandou? poemas podem ser observadas?
Ah! foi você que roubou,
Foi você, negra Fulô? 20.
a) No romance “Caminhos cruzados”, Érico Verissimo
Essa negra Fulô!
destaca a questão da escrita e a condição do escritor
Jorge de Lima
no Brasil. Que personagens encarnam essa
discussão? Explique a visão que cada um tem da
a) Considerando a leitura do poema, explique a literatura.
temática comum ao conto “Negrinha” de Monteiro b) No romance “Caminhos cruzados”, o personagem
Lobato. Clarimundo Roxo pode ser considerado uma
b) O trecho é um bom exemplo de como era vista a caricatura da intelectualidade brasileira.
mulher negra dentro daquele contexto social racista Considerando a trajetória desse personagem,
do homem branco. Explique: identifique os impasses e contradições da
intelectualidade perceptíveis na sua trajetória:
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21. A sua obra... Agora ele já não enxerga mais a paisagem.
OUTRA NEGA FULÔ
O mundo objetivo se esvaeceu misteriosamente. Os
olhos do professor estão fitos na fachada amarela da
O sinhô foi açoitar
casa da fronteira, mas o que ele vê agora são as suas
a outra nega Fulô próprias teorias e ideias. Imagina o livro já impresso.
— ou será que era a mesma? Sorri, exterior e interiormente. O leitor (a palavra leitor
A nega tirou a saia, corresponde, na mente de Clarimundo, à imagem dum
a blusa e se pelou. homem debruçado sobre um livro aberto: e esse homem
O sinhô ficou tarado, – extraordinário! – é sempre o sapateiro Fiorello) – o
largou o relho e se engraçou. leitor vai se ver diante dum assunto inédito, diferente,
A nega em vez de deitar original. Tomemos por exemplo uma estrela
pegou um pau e sampou remotíssima; digamos... Sírio. Coloquemos lá um ser
dotado da faculdade do raciocínio e senhor de um
nas guampas do sinhô.
telescópio possante com o qual possa enxergar a Terra...
— Essa nega Fulô!
Como seria a visão do mundo e da vida surpreendida do
Esta nossa Fulô!,
ângulo desse observador privilegiado?”
dizia intimamente satisfeito a) Ao estabelecermos uma análise comparativa entre o
o velho pai João narrador e a personagem Clarimundo Roxo,
pra escândalo do bom Jorge de Lima, considerando a noção do espaço onde vive a
seminegro e cristão. personagem, é possível identificar um traço comum.
E a mãe-preta chegou bem cretina Explique:
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Não deixarei de mim nenhum canto radioso, uma voz a) Qual a importância do fragmento I para o enredo do
matinal palpitando na bruma e que arranque de alguém
seu mais secreto espinho. romance? Como se denomina esse procedimento?
b) Considerando o fragmento II, qual a representação
De tudo quanto foi meu passo caprichoso na vida, simbólica de Moacir?
restará, pois o resto se esfuma, uma pedra que havia em
meio do caminho.
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47. b)
Texto I Texto
Como o imbuí1 na várzea, era o coração do guerreiro
Martim ficou mudo e triste, semelhante ao tronco branco na terra selvagem. A amizade e o amor o
d’árvore a que o vento arrancou o lindo cipó que o acompanharam e fortaleceram durante algum tempo,
entrelaçava. A brisa perpassando levou um murmúrio: mas agora longe de sua casa e de seus irmãos,
— Iracema! sentia-se no ermoí2. O amigo e a esposa não
Era o balido(1) do companheiro; a cerva(2), bastavam mais à sua existência, cheia de grandes
arrufando(3)-se, ganhou o doce aprisco(4). A floresta desejos e nobres ambições.
destilava suave fragrância e exalava arpejos(5)
harmoniosos; os suspiros do coração se difundiram nos (1) imbu: fruto de imbuzeiro
múrmuros do deserto. Foi a festa do amor e o canto do (2) ermo: deserto; despovoado
himeneu(6).
Já a luz da manhã coou na selva densa. A voz grave e ALENCAR, José de. Iracema.
sonora de Poti repercutiu no sussurro da mata:
— O povo tabajara caminha na floresta. Em toda a narração de Iracema, é recorrente o
Iracema arrancou-se dos braços que a cingiam(7) e do emprego de comparações e metáforas.
lábio que a tinha cativa; saltando da rede como a rápida Identifique a ocorrência de uma dessas figuras no
zabelê(8), travou das armas do esposo e levou-o através primeiro período deste excerto e reescreva todo o
da mata. período, transformando a comparação em metáfora,
(1) balido: grito próprio da ovelha ou a metáfora em comparação, e procedendo às
(2) cerva: a fêmea do cervo, animal típico da família dos alterações necessárias para que se mantenha
Cervídeos integralmente o sentido original.
(3) arrufar: encolher
(4) aprisco: caverna; toca; abrigo 48.
(5) arpejo: acorde de sons sucessivos em instrumentos Texto
de cordas
(6) himeneu: casamento; núpcias A LUA CRESCEU
(7) cingir: prender; ligar em volta
(8) zabelê: certo tipo de ave Três sóis havia que Martim e Iracema estavam nas
terras dos pitiguaras, senhores das margens do
ALENCAR, José de. Iracema. Camucim e Acaracu. Os estrangeiros tinham sua rede na
vasta cabana de Jacaúna. 0 valente chefe guardou para
Texto II si o prazer de hospedar o guerreiro branco.
Poti abandonou sua taba para acompanhar seu irmão de
E o mugido lúgubre daquela pobre criatura abandonada guerra na cabana de seu irmão de sangue, e gozar dos
antepunha à rude agitação do cortiço uma nota instantes que sobejavamí1) para a amizade, no coração
lamentosa e tristonha de uma vaca chamando ao longe, do guerreiro do mar.
perdida ao cair da noite num lagar(1) desconhecido e
agreste. Mas o trabalho aquecia já de uma ponta à outra (1) sobejar: sobrar
da estalagem; ria-se, cantava-se, soltava-se a língua; o
formigueiro assanhava-se com as compras para o ALENCAR, José de. Iracema.
almoço; os mercadores entravam e saíam; a máquina de
massas principiava a bufar. E Piedade, assentada à a) Com relação ao "tempo da narrativa", ocorrem no
soleira de sua porta, paciente e ululante(2) como um cão romance Iracema dois "tempos": o tempo
que espera pelo dono, maldizia a hora em que saíra da cronológico e o tempo poético.
sua terra, e parecia disposta a morrer ali mesmo, Caracterize resumidamente cada um desses tempos e
naquele limiar de granito, onde ela, tantas vezes, com a identifique a ocorrência do tempo neste excerto.
cabeça encostada ao ombro do seu homem, suspirava Justifique sua resposta com elementos presentes
feliz, ouvindo gemer na guitarra dele os queridos fados neste excerto.
de além-mar. b) A alegria morava cm sua alma. A filha dos sertões
(1) lagar: estabelecimento utilizado para extração de era feliz, como a andorinha, que abandona o ninho
líquido de certos frutos de seus pais, e peregrina para fabricar novo ninho no
(2) ululante: que uiva; lamentoso país onde começa a estação das flores. Também
Iracema achara ali nas praias do mar um ninho do
AZEVEDO, Aluísio. O Cortiço.
amor, nova pátria para seu coração.
a) Em ambos os excertos, há personagens comparadas
a animais. Considerando as características dos José de Alencar, Iracema.
movimentos literários em que se enquadra cada um
dos romances, esclareça se a animalização em cada No último período deste parágrafo, há duas
um dos excertos é realizada de acordo com os metáforas. Escolha uma delas e esclareça o emprego
mesmos princípios e qual o papel que essa da metáfora escolhida, considerando o romance
animalização cumpre em cada uma dessas situações Iracema no seu todo.
textuais.
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