Você está na página 1de 38

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS EXATAS E


TECNOLÓGICAS

LÓGICA FUZZY

Germano José Carvalho Santos

Ilhéus, Bahia
2003
Germano José Carvalho Santos

LÓGICA FUZZY

Monografia apresentada à Disciplina Seminário em


Matemática do Departamento de Ciências Exatas
e Tecnológicas – DCET, da Universidade Esta-
dual de Santa Cruz – UESC, como um dos pré-
requisitos para obtenção do grau de Bacharelado
em Matemática.

Ilhéus, Bahia
2003
Germano José Carvalho Santos

LÓGICA FUZZY

Monografia apresentada, julgada e aprovada pelo Corpo Docente do


Departamento de Ciências Exatas e Tecnológicas da Universidade
Estadual de Santa Cruz como parte dos requisitos de conclusão do curso
de Bacharelado em Matemática.

João Paulo Attie, Msc.


Orientador

Eurivalda Ribeiro dos Santos Santana, Msc.

André Nagamine, Msc.

Ilhéus, Bahia
2003
A meus pais, minha irmã por tudo e em especial à Tia
Augusta e a Tio Alberto por toda força durante essa
minha caminhada.
AGRADECIMENTOS

Agradeço ao orientador João Paulo Attie pela atenção e disponibilidade


no decorrer deste trabalho.

E de forma especial, agradeço aos meus colegas Cı́nthia, Wanderson,e


aos professores Nagamine e Eurivalda, pela imensa colaboração nas diversas
fases da elaboração desta monografia.

Agradeço a Deus, por tudo.


RESUMO

Este trabalho tem como objetivo introduzir um estudo a respeito da


Lógica Fuzzy, lidando com variáveis lingüı́sticas e propriedades que pos-
sibilitem desenvolver raciocı́nios mais próximos do humano em estruturas
matemáticas computacionais.
ABSTRACT

This paper has the intention to introduce an analysis about fuzzy lo-
gic, working with linguistic variables and properties which makes possible
the development of reasonings near the human thought using mathemati-
cal/computational structures.
Índice

1 Introdução 3

2 Lógica Fuzzy 4

2.1 História da Lógica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4

2.2 Por que Lógica Fuzzy? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6

2.3 O que é a Lógica Fuzzy? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

3 Comparações da Teoria Fuzzy com outras Teorias 10

3.1 Teoria da Lógica Booleana X Teoria da Lógica Fuzzy . . . . . . . . . . . . 10

3.2 Lógica Fuzzy X Teoria da Probabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12

4 Conjuntos Fuzzy 14

4.1 Função de Pertinência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

4.2 Variáveis Linguı́sticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

4.3 Tipos de Inclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

5 Sistemas Fuzzy 19

5.1 Regras Fuzzy . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

5.2 Processos de decisão fuzzy . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

5.3 Sistema de inferência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

5.4 Controle Nebuloso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26

6 Caracterı́sticas da Lógica Fuzzy 28

6.1 Vantagens . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
6.2 Desvantagens . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

6.3 Perspectivas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

Bibliografia 31
3

1 Introdução

Se analisarmos um dicionário ou uma gramática, descobriremos que uma linguagem


é definida como um sistema de sı́mbolos que serve como meio de comunicação. Nota-se
que isso não se restringe à comunicação entre humanos: hoje em dia existem dezenas
de linguagens de programação, que, poderı́amos dizer, servem também para comunicar
instruções de um humano a uma máquina. Estas seriam exemplos de linguagens artifici-
ais, ao contrário do português, inglês, e assim por diante, que são chamadas linguagens
naturais ou lı́nguas. Sendo a linguagem um instrumento muito complexo e subjetivo, o
emprego desta, bem como a sua interpretação podem ser causas de certos erros. Uma
palavra pode designar uma ampla classe de coisas ou acontecimentos fı́sicos, levando desta
forma, a ter vários significados a depender do contexto.

Lidar com situações que envolvem fatores como ambigüidade, incerteza e informações
vagas na resolução de problemas é caracterı́stica do pensamento humano, que usa o seu
conhecimento, experiências do cotidiano, intuição e até mesmo senso comum para lidar
com esses fatores. Nos problemas de difı́cil solução, em que se faz necessário o auxı́lio
matemático computacional, modelar tais fatores é extremamente complicado. A lógica
clássica possui uma fragilidade muito grande ao lidar com situações rodeadas de impre-
cisão, pois utiliza um conceito binário, em que só são aceitáveis dois valores, verdadeiro
ou falso. Para lidar com isso de forma matemática, foi desenvolvida por Lotfi Zadeh,
um professor de Engenharia e Ciência da Computação, a Lógica Fuzzy, uma lógica em
que o enfoque em relação aos valores foi modificado. Nessa teoria, é permitido tratar
matematicamente os nı́veis de incerteza e ambigüidade. A lógica difusa, como também
é conhecida, vem tornando possı́vel cada vez mais aproximar a máquina ao raciocı́nio
humano. E propondo soluções cada vez mais realistas a problemas que antes só o cérebro
humano era capaz de interpretar e resolver.
4

2 Lógica Fuzzy

Para iniciar o estudo sobre lógica fuzzy, faz-se necessário passar pela história da lógica
mostrando seu surgimento e evolução. E fazer também uma abordagem sobre “O porquê
da lógica fuzzy”e “O que é lógica fuzzy? ”. É o que aborda este capı́tulo.

2.1 História da Lógica

Aristóteles, filósofo grego (383-322 a.C.), foi o fundador da ciência da lógica apresen-
tando a primeira sistematização da lógica da qual se tem notı́cia. É claro que já antes
de Aristóteles havia uma certa preocupação com a questão da validade dos argumentos,
por exemplo, por parte dos sofistas e de Platão. Mas estes pensadores, embora se tenham
ocupado um pouco de tais questões, de fato nunca desenvolveram uma teoria lógica -
nunca se preocuparam em fazer um estudo sistemático dos tipos de argumento válido. A
“lógica aristotélica”permaneceu incólume, sem alterações significativas, por mais de mil
anos. O filósofo Immanuel Kant (1724-1804) chegou mesmo a dizer que, em matéria de
lógica, provavelmente, nada mais poderia ser acrescentado ao que fez Aristóteles. A partir
de meados do século retrasado, no entanto, matemáticos como George Boole (1815-1864)
e Gottlob Frege (1845-1925) deram contribuições significativas no sentido da criação da
lógica matemática, e o marco inicial foi a publicação, em 1849, de “Investigação sobre as
Leis do Pensamento”, de George Boole. Este livro deu inı́cio à “simbolização”, ou “mate-
matização”da lógica, o que se constitui fazer numa linguagem simbólica, artificial, o que
Aristóteles havia começado em grego, uma linguagem natural. Boole, na verdade, apresen-
tou um cálculo lógico (hoje bastante conhecido também como álgebra booleana) contendo
um número infinito de formas válidas de argumentos. Daı́ em diante, a lógica tornou-se
essencialmente matemática, tendo alcançado um desenvolvimento extraordinário com im-
plicações em praticamente todos os campos do saber humano.
No entanto, mesmo com tal desenvolvimento, os princı́pios básicos da lógica de tradição
aristotélica não foram questionados, dentre elas o chamado Princı́pio da Não Contradição,
5

ou seja, uma declaração é falsa ou verdadeira, não podendo ser ao mesmo tempo parcial-
mente verdadeira ou parcialmente falsa. Como por exemplo, “Está chovendo”e “Não está
chovendo”uma delas tem que ser falsa, ou seja, elas não podem ser verdadeiras simulta-
neamente. Em suma, de acordo com a lógica clássica, binária, não se pode tolerar uma
contradição. Aristóteles estabeleceu um conjunto de regras rı́gidas para que conclusões
pudessem ser aceitas como logicamente válidas, neste caso não poderiam ser verdadeiras
ao mesmo tempo as proposições “Está chovendo”e “Não está chovendo”.

Na década de 60, um afegão, professor de engenharia elétrica e ciências da computação


da Universidade da Califórnia, em Berkeley, chamado Lotfi A. Zadeh, observou que muitas
regras que as pessoas usavam para fazer inferências não eram conscientes, ou seja, não
podiam ser explicadas pelas pessoas que as usavam. Por exemplo, podemos olhar para
uma pessoa e dizer “ela parece ter em média vinte e cinco anos”, entretanto não estamos
preparados para explicar como se chegou a essa conclusão. Observou, além disso, que os
recursos tecnológicos disponı́veis eram incapazes de automatizar as atividades relacionadas
a problemas de natureza industrial, biológica ou quı́mica, que compreendessem situações
ambı́guas, não passı́veis de processamento através da lógica computacional fundamentada
na lógica booleana. Procurando solucionar esses problemas o professor Zadeh desenvolveu
uma variação da tradicional teoria dos conjuntos e lógica booleana, tornando a análise e
controle de sistemas complexos mais tratáveis. Publicando, em 1965, um artigo resumindo
os conceitos dos Conjuntos Fuzzy, revolucionou o assunto com a criação de sistemas fuzzy.
A ele é atribuı́do o reconhecimento como grande colaborador do Controle Moderno.

Em 1975, os professores Mamdani e Assilian, do Queen Mary College, de Londres,


publicaram um trabalho na “Revista Internacional de Estudos Homem-Máquina”, deno-
minado “Um Experimento em Sı́ntese Lingüı́stica com um Controlador Fuzzy”, descre-
vendo um sucesso em controlar o funcionamento de uma máquina a vapor utilizando uma
aplicação fuzzy. O artigo descreve também as inúmeras tentativas frustradas de controle
com tipos distintos de controladores, incluindo o PID, proporcional-integral-derivativo.
Esse sucesso serviu de alavanca para muitas outras aplicações, como em 1980, no controle
Fuzzy de operação de um forno de cimento. Estimulados pelo desenvolvimento e pelas
enormes possibilidades práticas de aplicações que se apresentaram, os estudos sobre sis-
temas Fuzzy e controle de processos avançaram rapidamente, culminando com a criação
em 1984, da Sociedade Internacional de Sistemas Fuzzy, constituı́da, principalmente, por
pesquisadores dos paı́ses mais avançados tecnologicamente. A propósito disto, e apenas a
tı́tulo de ilustração, mais de trinta por cento dos artigos até hoje publicados são de origem
japonesa. O desenvolvimento de técnicas de Inteligência Artificial nos últimos anos, ocupa
6

cada vez mais posição de destaque em pesquisas na área de controle de processos industri-
ais e, aos poucos, começam a ser implantadas em plantas industriais com enorme sucesso.
Dentre as técnicas mais comumente utilizadas, além do controle Fuzzy, pode-se destacar
as redes neuronais aplicadas a sistemas de controle, que estão atualmente em tamanha
evidência que os japoneses as consideram como duas das mais promissoras técnicas para
o século XXI.

2.2 Por que Lógica Fuzzy?

No mundo real usamos palavras como: muito, pouco, grande, pequeno, freqüente-
mente, raramente, etc. para descrever situações. Estas situações não são nitidamente
definidas e não podem ser precisamente descritas. Por exemplo, as frases abaixo são de
uso corrente em nossa linguagem, e apesar de transmitirem informações imprecisas elas
são usadas em tomadas de decisões:

· O carro está andando muito rápido, pise no freio.

· Ele é uma pessoa muito feliz.

· Esta sala é pequena para todos os alunos, reserve outra maior.

· Nesta cidade a temperatura freqüentemente está alta, gastamos muita energia nos
condicionadores de ar.

A descrição completa de um sistema real em muitos casos requer dados extremamente


detalhados e muito além do que um ser humano poderia simultaneamente, processar e
entender. No entanto, freqüentemente executamos tarefas complexas que para serem des-
critas necessitam destes termos imprecisos que não podem ser modelados pela matemática
tradicional de conjuntos. Podemos citar exemplos simples, que encontramos no nosso dia
a dia.

· Preparar alguns pratos a partir de receitas.

· Estacionar um carro.

· Controlar uma carteira de investimentos.

Nessas atividades, especialistas usariam frases como:

· Coloque no forno até ficar no ponto.

· Vire o volante um pouco para a direita.


7

· Se a taxa de juros subir muito e o déficit for alto, teremos uma recessão branda.

· Se estivermos na hora o rush, aumente muito a freqüência de trens.

· Se temos muita roupa suja na máquina de lavar, aumente o tempo de lavagem.

· Se a terra está muito seca e temperatura está alta, regue durante muito tempo.

Daı́ a necessidade de se fazer um estudo sobre como lidar com ambigüidades, incer-
teza e informações vagas na resolução de problemas em que se faz necessário o auxı́lio
matemático computacional.

2.3 O que é a Lógica Fuzzy?

O termo fuzzy significa nebuloso, difuso, algo que não está claro, e se refere ao fato de,
em muitas casos, não conhecermos completamente os sistemas que estamos analisando.
Em muitos problemas em fı́sica e matemática, nós não temos dificuldade em classificar
elementos como pertencentes ou não a um dado conjunto clássico. Dessa forma, dado
um conjunto A e um elemento x do conjunto universo U conseguimos muitas vezes dizer
se x ∈ A ou x 6∈ A. Podemos, por exemplo, afirmar sem receio que o número 7 ∈ N e
que −7 6∈ N. Este é um caso sobre o qual não se tem dúvida, sendo a lógica booleana
perfeitamente aplicável. No entanto, podemos discordar quanto ao fato de 6,5 pertencer
ou não ao conjunto dos números aproximadamente iguais a 7. Neste caso a resposta
não é única e objetiva, pertencer ou não vai depender do tipo de problema que estamos
analisando.

Para ilustramos esta situação, suponhamos que um aluno obteve média 6,5. O pro-
fessor nessa situação poderá analisar o caso levando em consideração a capacidade do
aluno, a sua dedicação durante o curso. E pode decidir pela aprovação do aluno mesmo
não tendo atingido a média 7. Note que, neste caso, o número 6,5 está sendo considerado
como pertencente ao conjunto dos aproximadamente iguais a 7.

Existem inúmeras situações em que a relação de pertinência não está bem definida, e
nestes casos, não sabemos dizer se o elemento pertence ou não a um determinado conjunto.
A intenção de Zadeh foi justamente trabalhar de forma a flexibilizar a pertinência de
elementos aos conjuntos, criando uma idéia de grau de pertinência. Podendo, assim, um
determinado elemento pertencer parcialmente a um conjunto. Esta idéia foi publicada
por Zadeh em 1965, ano que pode ser considerado o marco do nascimento da teoria dos
conjuntos fuzzy.
8

Se desejarmos, por exemplo, construir o conjunto dos números aproximadamente


iguais a 5, citado acima, como deverı́amos proceder? Será que os números 2 e 10 perten-
ceriam a este conjunto? Claramente esta resposta dependerá do contexto.

O que Zadeh nos propõe é considerarmos um função que nos forneça o quanto um
determinado número pertence ao conjunto considerado. Sendo assim, chamando de K o
conjunto dos números aproximadamente iguais a 5, no universo dos números naturais N,
podemos propor por exemplo uma função de pertinência onde:

10 ∈ K com grau de pertinência 0,00 (corresponde a não pertinência clássica).

2 e 8 ∈ K com grau de pertinência 0,25

3 e 7 ∈ K com grau de pertinência 0,50

4 e 6 ∈ K com grau de pertinência 0,75

5 ∈ K com grau de pertinência 1,00 (corresponde a pertinência total).

Esta extensão da função caracterı́stica da lógica clássica para o intervalo [0,1], originou
os conjuntos fuzzy e possibilitou, entre outras coisas, a utilização de variáveis lingüı́sticas,
permitindo a exploração do conhecimento humano no desenvolvimento de vários sistemas.

A figura abaixo, apresenta a função de pertinência de conjunto fuzzy que corresponde


aos números aproximadamente iguais a 5. Note que nesse casso a função de pertinência
é discreta, mas também pode ser contı́nua.

Lógica Difusa ou Lógica Nebulosa, também pode ser definida, como a lógica que su-
porta os modos de raciocı́nio que são aproximados, ao invés de exatos, como estamos
naturalmente acostumados a trabalhar. Ela está baseada na teoria dos conjuntos nebu-
losos e difere dos sistemas lógicos tradicionais em suas caracterı́sticas e detalhes. Nesta
lógica, o raciocı́nio exato corresponde a um caso limite do raciocı́nio aproximado, sendo
interpretado como um processo de composição nebulosa.
9

1,00

0,75

0,50

0,25

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Figura 1: Números aproximadamente iguais a 5


10

3 Comparações da Teoria Fuzzy


com outras Teorias

Neste capı́tulo é feita uma comparação entre as teorias da lógica fuzzy, lógica booleana
e teoria da probabilidade.

3.1 Teoria da Lógica Booleana X Teoria da Lógica


Fuzzy

A lógica de Aristóteles estabelece um conjunto de regras rı́gidas para que as conclusões


sejam aceitas como logicamente válidas; seguindo uma linha de raciocı́nio baseada em
premissas e conclusões. Como por exemplo:
“Todo ser vivo é mortal”(premissa 1)
“Paulo é um ser vivo”(premissa 2),

Como conclusão temos:


“Paulo é mortal”.

Esta lógica formal é considerada binária, pois uma declaração é falsa ou verdadeira,
não podendo ser ao mesmo tempo parcialmente verdadeira e parcialmente falsa. Obriga-
toriamente, uma declaração deve fazer parte de apenas um conjunto, o das declarações
verdadeiras ou o das declarações falsas. Esta suposição é o Princı́pio da Não-Contradição,
que coloca A e não A cobrindo todas as possibilidades, sendo considerada a base do
pensamento lógico tradicional.

A Lógica Fuzzy viola estas suposições. O conceito de dualidade estabelece que algo
pode e deve coexistir com o seu oposto; o que faz a Lógica Fuzzy parecer natural e
até mesmo inevitável. A lógica booleana trata com valores “verdade”das afirmações,
classificando-as como verdadeiras ou falsas. Mas, muitas das experiências humanas não
podem ser classificadas simplesmente como verdadeiras ou falsas, sim ou não, branco
ou preto. Por exemplo, é aquele homem alto ou baixo? A taxa de risco para aquele
11

empreendimento é grande ou pequena? Um sim ou um não como resposta a estas questões


é, na maioria das vezes, incompleta. Na verdade, entre a certeza de ser e a certeza de não
ser, existem infinitos graus de incerteza. Ao contrário da lógica booleana, a lógica fuzzy
não impõe limites bruscos, mas proporciona graus de pertinência de elementos a uma
determinada categoria. Para exemplificar, utilizaremos a palavra meia-idade. É comum
classificarmos uma pessoa de meia idade ou não, apesar de não se saber exatamente
quando começa e termina esse perı́odo. Vamos assumir que o perı́odo vai de 35 a 55 anos.
Pela lógica tradicional, uma pessoa de 34 anos só pertenceria ao grupo de meia-idade
depois de dia de seu aniversário de 35 anos. Da mesma maneira, uma pessoa de 56 anos
não pertenceria mais a este grupo. A figura abaixo mostra a definição de meia idade
segundo a lógica convencional:

Meia idade

15 25 35 55 65 idade
Figura 2: Definição conjuntos convencionais de meia idade

Mas não é desejada tamanha precisão em relação a este conceito, pois o limite de
meia-idade não pode ser definido precisamente. Note que os limites do conjunto acima
são muito rı́gidos. O ideal é ter limites graduais, onde são associados graus de certeza
que uma pessoa seria ou não de meia idade. A figura 3 mostra a definição de meia-idade
segundo a lógica fuzzy:
12

MEIA IDADE

0
15 25 35 45 55 65 idade

Figura 3: Definição fuzzy de meia idade

3.2 Lógica Fuzzy X Teoria da Probabilidade

É muito comum quando somos apresentados à teoria de conjuntos fuzzy confundirmos


esta com a teoria de probabilidades. Freqüentemente trocamos grau de pertinência por
probabilidade e pensamos na função de pertinência como sendo uma função de distribuição
estatı́stica. Esta confusão surge por haver uma estreita relação entre as duas teorias e, sob
certos aspectos a teoria fuzzy se apresenta muito similar à teoria de probabilidades. De
fato, a teoria de medidas nos indica que a medida de probabilidade é um caso particular de
medida fuzzy, onde esta possui a propriedade de aditividade. É importante, no entanto,
perceber a diferença entre as duas teorias para melhor compreendermos como elas podem
ser complementares, resultando em uma ferramenta bastante interessante.

A teoria de probabilidades e a teoria de conjuntos fuzzy lidam, em geral, com tipos de


incertezas distintos. Na teoria de probabilidades temos o evento muito bem definido e a
dúvida paira sobre a ocorrência do evento. No entanto, uma vez que o evento ocorreu não
existirá mais dúvida alguma. Podemos calcular qual a probabilidade de, em uma urna
contendo nb bolas brancas e nv bolas vermelhas, sortearmos uma bola vermelha. Todavia,
uma vez sorteada a bola, não há nada mais a fazer, a bola será branca ou vermelha,
e a incerteza desaparecerá. No entanto, supomos que haja em uma urna várias bolas
com diversos tons de rosa, variando do vermelho ao branco. Neste caso não poderemos
simplesmente perguntar qual a chance de sortearmos uma bola branca, pois terı́amos
dificuldades para decidir sobre as bolas rosas. Na verdade, não poderemos fazer uma
pergunta de caráter puramente estatı́stico pois o evento não está bem definido, existirão
bolas quase vermelhas, bolas quase brancas e bolas com diversos tons de rosa (o que
configura uma situação de imprecisão). Precisamos saber nestes casos qual é a pergunta
13

a ser realizada e como respondê-la.

Um outro aspecto que diferencia as duas teorias é o fato da teoria de probabili-


dades não considerar subjetividade, como por exemplo caracterı́sticas psicológicas dos
indivı́duos. É muito comum as pessoas jogarem na Loto ou na Sena, inclusive profissio-
nais da área de estatı́stica. É conhecido também que raramente as pessoas apostam um
conjunto de números seqüenciados como 1, 2, 3, 4, 5 e 6. As pessoas, de uma forma geral,
têm a sensação de que um jogo assim é muito menos provável de acontecer do que um
conjunto de números sortidos. E estranhamente elas têm razão em sentir-se assim, uma
vez que este evento dificilmente é verificado (quase nunca ocorre um sorteio de números
seqüenciados). No entanto, sabemos que a probabilidade de ocorrer qualquer combinação
de números é a mesma. E se perguntarmos a um estatı́stico que joga na Sena ou na Loto
que tipo de jogo ele faz dificilmente obteremos uma seqüencia ordenada de números! Ou
seja, mesmo sabendo que a probabilidade deste jogo é a mesma que a de qualquer outro
ele não se sente confortável em jogá-lo, ainda que se jogasse teria grande chance de ganhar
sozinho! Desejamos com este exemplo apenas ilustrar que, parafraseando (Ortega, 2001),
as pessoas não são meramente estatı́sticas, elas são também estatı́sticas. Sendo assim, a
depender do objeto que estamos analisando a teoria de probabilidades pode não ser su-
ficiente, havendo a necessidade de utilizarmos outras técnicas para abordar as incertezas
envolvidas no processo. Vale ressaltar que a estatı́stica Bayesiana costuma lidar bem com
os exemplos citados acima, todavia, a principal diferença consiste na habilidade da lógica
fuzzy em tratar incertezas não estatı́sticas.

Observando, por exemplo, o sistema diagnóstico, temos que o raciocı́nio médico parece
estar muito mais baseado em graus de possibilidade do que de probabilidade, uma vez
que seria humanamente impossı́vel para o médico guardar todas as informações exatas
sobre as freqüências dos sintomas nas doenças, tanto quanto a prevalência das doenças em
uma dada população. A probabilidade está associada à chance de um determinado evento
ocorrer, enquanto a possibilidade está relacionada com o quão razoável é a chance de um
dado evento. Os médicos raramente expressam suas impressões com valores numéricos,
utilizando termos lingüı́sticos tanto para se expressar quanto para associar cognitivamente
os sintomas/doenças.

Não obstante a rejeição inicial, as teorias de probabilidade e possibilidade, como


também a lógica fuzzy, têm se demonstrado muito mais complementares do que concor-
rentes.
14

4 Conjuntos Fuzzy

Neste capı́tulo são apresentados os fundamentos da teoria dos conjuntos fuzzy, bem
como sua definição.

Na teoria clássica dos conjuntos, há uma rigidez de tal forma que um dado elemento
do universo em discurso (domı́nio) pertence ou não pertence ao referido conjunto. Na
teoria dos conjuntos nebulosos existe um grau de pertinência de cada elemento a um
determinado conjunto. Este conceito parece ser bastante natural e facilmente percebido
ao examinarmos a lista de conjuntos abaixo:

conjunto dos números naturais (I)

conjunto dos números inteiros (I)

conjuntos dos números naturais aproximadamente iguais a 7 (II)

conjunto dos clientes com alta renda (II)

conjunto das homens altos (II)

Observando os exemplos acima, percebe-se claramente que existe uma diferença funda-
mental entre os conjuntos do tipo (I) e os conjuntos do tipo (II). Por exemplo, apresentado
um número podemos afirmar sem nenhuma discussão ou dúvida se esse número pertence
ou não pertence ao conjunto dos números inteiros.

Esta questão não é tão simples quando lidamos, por exemplo, com o conjunto dos
homens altos. Uma pessoa que tenha 1,74 metros de altura, seria considerada como
pertencente a esse conjunto? E a de 1,75 ? Tomando como padrões a definição de homem
alto pela medida maior ou igual a 1,80, mediano pela medida 1,70 e baixo pela medida
1,60, veremos claramente na figura 4 que não existe uma fronteira bem definida que separe
os elementos do conjunto dos homens altos dos elementos do conjunto dos homens não
altos.

Os conjuntos fuzzy são conjuntos que não possuem fronteiras bem definidas e que
15

foram introduzidas devido ao fato de os conjuntos clássicos apresentarem limitações para


lidar com problemas onde a transição de uma classe para outra deve acontecer de forma
suave.
valores lingüisticos

Baixo Mediano Alto


1

0.8

0.6

0.4

0.2

0 x
1.6 1.7 1.8
Figura 4: Estatura.

4.1 Função de Pertinência

A função de pertinência mostra o grau de pertinência de um elemento em relação a


um determinado conjunto. Também chamada de função caracterı́stica, ela associa cada
elemento x pertencente a U um número real µA (x) no intervalo [0 , 1]. Este valor repre-
senta o grau de possibilidade de que o elemento x venha a pertencer ao conjunto A, isto
é, o quanto é possı́vel para o elemento x pertencer ao conjunto A.

Sua definição, propriedades e operações são obtidas a partir da generalização da teoria


dos conjuntos clássicos. Observamos que os conjuntos clássicos são um caso particular
da teoria de conjuntos fuzzy. A teoria dos conjuntos clássicos está baseada na função
caracterı́stica clássica, dada por:
(
1, se e somente se x ∈ A
µA (x) =
0, se e somente se x 6∈ A
16

onde U é o conjunto universo, A é um subconjunto de U e x é um elemento de U , ou seja,


a função caracterı́stica é um mapeamento do conjunto universo no conjunto {0,1}.
Essa função caracterı́stica, discrimina entre todos os elementos de U aqueles que, segundo
algum critério, pertencem ao subconjunto A, dividindo o conjunto universo em duas par-
tes com fronteiras bem definidas.
Para obtermos os conjuntos fuzzy e suas operações basta generalizarmos a função ca-
racterı́stica da lógica clássica para o intervalo [0, 1], ou seja, µA (x) : U → [0, 1] , o que
implica em considerarmos um contı́nuo de valores de pertinência e não apenas pertence
e não pertence. O elemento x pertencerá ao subconjunto A com um grau de pertinência
que é um valor no intervalo [0,1].
Definição: Um conjunto fuzzy A em um conjunto universo U é um conjunto de pares
ordenados de um elemento genérico x e seu grau de pertinência µA (x) da forma:

A = {(x, µA (x)) \ x ∈ U }

4.2 Variáveis Linguı́sticas

Além da função de pertinência, há um outro conceito bastante importante relacio-


nado com conjuntos nebulosos, que é o de variável lingüı́stica. Entende-se por variável
um identificador que pode assumir um dentre vários valores. Deste modo, uma variável
lingüı́stica pode assumir um valor lingüı́stico dentre vários outros em um conjunto de ter-
mos lingüı́sticos. Estas variáveis têm seu valor expresso qualitativamente por um termo
lingüı́stico (que fornece conceito à variável) e quantitativamente por uma função de per-
tinência.

De fato, uma variável lingüı́stica é caracterizada por n, T , X, m(n) onde n é o


nome da variável (por exemplo, temperatura, pressão, febre, etc.), T é o conjunto de
termos lingüı́sticos de n (elevado, baixo, pouco, extenso, etc.), X é o domı́nio (Universo)
de valores de n sobre o qual o significado do termo lingüı́stico é determinado (a febre
pode estar, por exemplo, entre 35 e 40o C) e m(t) é uma função semântica que assinala
para cada termo lingüı́stico t ∈ T o seu significado, que é um conjunto fuzzy em X (ou
seja, m : T → X onde X é o espaço dos conjuntos fuzzy). A figura abaixo mostra um
exemplo de variável lingüı́stica. O nome n da variável é Febre. Os termos lingüı́sticos
t ∈ T que atribuem um significado semi-quantitativo a Febre são: baixa , média e alta. O
domı́nio X da variável é o intervalo [36, 40]. Cada termo lingüı́stico tem a ele associado
17

um conjunto fuzzy m(t) que o caracteriza. Note que, na formulação clássica, os termos
lingüı́sticos atribuı́dos para febre são: presente e ausente.

valores lingüisticos

Baixa Media Alta


1

0.8

0.6

0.4

0.2

0 36
37 38 39 40
c˚(variável
base)

Figura 5: Febre.

As variáveis utilizadas em lógica fuzzy são chamadas de lingüı́sticas por não terem
valores precisos, podendo ser definidas como na linguagem, representando um espectro de
valores. Por exemplo, quando dizemos que a temperatura está normal, isso não significa
um valor exato, mas um intervalo. Desta forma, definimos as variáveis fuzzy através de
conjuntos para representar os intervalos conforme entendemos através das variáveis.

4.3 Tipos de Inclusão

Inclusão com grau - Um elemento pertence a um conjunto com um determinado grau


de certeza. Alguns elementos são mais representativos da idéia central do conjunto que
outros.Para exemplificar esta idéia, veja a seguintes conjuntos: Observe que, em cada um
dos conjuntos, os elementos possuem graus que indicam a sua representatividade dentro
do conjunto.

- alunos excelentes = (Maria, 0.8), (João, 0.9), (Alan, 0.9), (Paulo, 1.0)
18

- muito altos = (Oscar, 0.95), (Michael Jordan, 0.95), (Junior Baiano, 0.8)

Inclusão em diversos conjuntos - Um elemento pode ser membro parcial de mais de


um conjunto. Observe que neste caso, o elemento pertence a mais de um conjunto, só que
com graus diferentes.

- crianças = Pedro, Ana, Paulo, Marta

- adolescentes = Pedro, Mateus, Joaquim

- crianças (Pedro) = 0,2

- adolescentes (Pedro) = 0,8


19

5 Sistemas Fuzzy

Este capı́tulo ocupa-se em mostrar o sistema de inferência fuzzy e controlador fuzzy;


passando pelas regras fuzzy e processos de decisão fuzzy.

5.1 Regras Fuzzy

As regras fuzzy são estruturas vastamente utilizadas em várias abordagens da teoria


fuzzy e podem ser entendidas de diversas maneiras. Conceitualmente, as regras fuzzy
descrevem situações especı́ficas que podem ser submetidas a análise de um painel de
especialistas, e cuja inferência nos conduz a algum resultado desejado. A inferência base-
ada em regras fuzzy pode também ser compreendida como um funcional que mapeia um
conjunto de entradas do sistema para um conjunto de saı́das (como em um esquema de
interpolação).

A regra fuzzy é uma unidade capaz de capturar algum conhecimento especı́fico, e um


conjunto de regras é capaz de descrever um sistema em suas várias possibilidades. Cada
regra fuzzy, da mesma forma que uma afirmação clássica, é composta por uma parte
antecedente (a parte Se) e uma parte conseqüente (a parte Então), resultando em uma
estrutura do tipo

Se antecedentes Então conseqüentes.

Os antecedentes descrevem uma condição (premissas), enquanto a parte conseqüente


descreve uma conclusão ou uma ação que pode ser esboçada quando as premissas se
verificam. A diferença entre os antecedentes de uma regra fuzzy e os de uma regra clássica
é que os primeiros descrevem uma condição elástica, ou seja, uma condição que pode ser
parcialmente satisfeita, enquanto os últimos descrevem uma condição rı́gida (a regra não
funciona se os antecedentes não são completamente satisfeitos).

Os antecedentes definem uma região fuzzy no espaço das variáveis de entrada do


sistema. Já os conseqüentes descrevem uma região no espaço das variáveis de saı́da do
20

sistema, qual seja a sua conclusão/ação. Sendo assim, a construção dos antecedentes mui-
tas vezes resulta em um trabalho de classificação, enquanto a elaboração dos conseqüentes
exige um conhecimento, ainda que empı́rico, sobre a dinâmica do sistema. Podemos es-
perar, então, que a elaboração dos conseqüentes de uma regra seja mais complexa do que
a dos antecedentes.

Uma vez construı́do o conjunto de regras fuzzy necessitaremos de uma “máquina


de inferência”para extrair dela a resposta final. Existem vários métodos de inferência
possı́veis e a escolha por um deles depende do sistema que está sendo analisado. No
entanto, a inferência mais comum, e amplamente utilizada no controle de sistemas, é o
Método de Mamdani.

As regras são processadas em paralelo, ou seja, todas as regras (circunstâncias) são


consideradas ao mesmo tempo, e ao final obtemos uma resposta que pode ser tanto um
valor numérico clássico, quanto um conjunto fuzzy ou um funcional, a depender do tipo
de conseqüente utilizado. Às vezes, é necessário que a saı́da do sistema seja um número,
o que é muito comum em controladores fuzzy, pois o sistema precisa ser re-alimentado.
Nestes casos se a saı́da do sistema for um conjunto fuzzy, então se faz necessário um
processo de defuzificação para se obter um número apropriado.

5.2 Processos de decisão fuzzy

Tomar decisões é uma das atividades mais fundamentais dos seres humanos e muitos
estudos têm sido desenvolvidos acerca desse assunto. O objeto de análise de um processo
de decisão é justamente o estudo de quais estratégias utilizar e como escolhê-las de forma
melhor ou mais eficientemente. Estudos desse tipo têm sido amplamente aplicados em
áreas de gerenciamento, onde o processo de decisão assume um papel fundamental, tais
como controle, investimentos, desenvolvimento de novos produtos e alocação de recursos,
entre outros. Entretanto, em geral, os processos de decisão incluem qualquer situação onde
uma escolha ou seleção de alternativas se faz necessária, abrangendo desde as ciências tidas
como exatas até as humanas.

A aplicação da teoria de conjuntos fuzzy em processos de decisão consiste basicamente


na fuzificação da teoria de decisão clássica. Enquanto o processo de decisão sobre condições
de risco têm sido modelado com teorias de decisão probabilı́stica e teoria de jogos, a teoria
de decisão fuzzy procura lidar com as formulações vagas e imprecisas, inerentemente
humanas, quanto à preferências, limitações e objetivos. Um processo de decisão é dito
21

sobre condições de certeza quando o resultado de cada ação pode ser determinado com
precisão. Ele é dito sobre condições de risco quando o conhecimento disponı́vel acerca
do resultado consiste apenas da distribuição de probabilidade condicional, relativo a cada
ação. Por outro lado, quando os resultados devidos a cada ação são caracterizados apenas
aproximadamente, então, o processo de decisão é dito sobre condições de imprecisão. Este
é o caso dos processos de decisão fuzzy.

Os conjuntos fuzzy podem ser introduzidos na teoria de tomada de decisão de diversas


formas. Bellmam e Zadeh sugeriram um modelo fuzzy de tomada de decisão no qual os
objetivos e restrições relevantes são expressos em termos de conjuntos fuzzy, e a decisão
é determinada a partir de um tipo de agregação apropriada desses conjuntos.

5.3 Sistema de inferência

Os sistemas fuzzy são, em geral, o resultado de uma generalização dos sistemas


clássicos, ou seja, nessa abordagem os conceitos nebulosos (vagos) são incorporados a
esses sistemas. Os sistemas difusos estimam funções com descrição parcial do compor-
tamento do sistema, onde especialistas podem prover o conhecimento heurı́stico, ou esse
conhecimento pode ser inferido a partir de dados de entrada-saı́da do sistema. Desta
forma, podemos dizer que os sistemas difusos são sistemas baseados em regras que utili-
zam variáveis lingüı́sticas difusas (conjuntos difusos) para executar um processo de tomada
de decisão. Um Sistema de Inferência pode ser composto de cinco blocos principais:

Descrição dos blocos que compõem um sistema fuzzy:

Base de regras - contém um conjunto de regras/proposições fuzzy onde as variáveis


antecedentes/conseqüentes são variáveis lingüı́sticas e os possı́veis valores de uma variável
lingüı́stica são representados por conjuntos difusos.

Base de dados - define as funções de pertinência do conjunto difuso nas regras fuzzy.
Unidade de Decisão Lógica- realiza operações de inferência, para obter, a partir da ava-
liação dos nı́veis de compatibilidade das entradas com as condições impostas pela base de
regras, uma ação a ser realizada pelo sistema.

Interface de Fuzificação - utilizando as funções de pertinênia pré-estabelecidas, mapeia


cada variável de entrada do sistema em graus de pertinência de algum conjunto difuso
que representa a variável em questão.

Interface de Defuzificação - transforma os resultados difusos da inferência em valores


22

BASE DE CONHECIMENTO

BASE DE BASE DE
DADOS REGRAS

ENTRADA SAÍDA

INTERFACE INTERFACE
FUZIFICAÇÃO DEFUZIFICAÇÃO

UNIDADE DE DECISÃO
LÓGICA

Figura 6: Sistema de inferência Fuzzy.

de saı́da. Calcula a saı́da com base na inferência obtida no módulo Unidade de Decisão
Lógica, com as funções de pertinência das variáveis lingüı́sticas da parte conseqüente das
regras para obter uma saı́da não difusa. Nesta etapa as regiões resultantes são convertidas
em valores de saı́da do sistema.

Neste Sistema de Inferência Fuzzy, consideram-se entradas não-fuzzy, ou precisas -


resultantes de medições ou observações (conjuntos de dados, por exemplo), que é o caso
da grande maioria das aplicações práticas. Em virtude disto, é necessário efetuar-se um
mapeamento destes dados precisos para os conjuntos fuzzy (de entrada) relevantes, o que
é realizado no estágio de fuzificação. Neste estágio ocorre também a ativação das regras
relevantes para uma dada situação.

Uma vez obtido o conjunto fuzzy de saı́da através do processo de inferência, que se
baseia no modus ponens generalizado (Modus Ponens é o tipo de argumento em que as
premissas “Se A, então B”e “A”, implicam na conclusão: “B”), no estágio de defuzi-
ficação é efetuada uma interpretação dessa informação. Isto se faz necessário pois, em
aplicações práticas, geralmente são requeridas saı́das precisas. No caso de uma sistema
de controle, por exemplo, em que o controle é efetuado por um sistema de inferência
23

fuzzy (ou controlador fuzzy), este deve fornecer à planta dados ou sinais precisos, já que
a “apresentação”de um conjunto fuzzy à entrada da planta não teria significado algum.
Existem vários métodos de defuzificação na literatura; dois dos mais empregados são o
centro de gravidade e a média dos máximos. Neste, a saı́da precisa é obtida tomando-se a
média entre os dois elementos extremos no universo que correspondem aos maiores valores
da função de pertinência do consequente. Com o centro de gravidade, a saı́da é o valor
no universo que divide a área sob a curva da função de pertinência em duas partes iguais.

As regras podem ser fornecidas por especialistas, em forma de sentenças lingüı́sticas,


e se constituem em um aspecto fundamental no desempenho de um sistema de inferência
fuzzy. Novamente tomando o exemplo de um controlador fuzzy, este só terá um bom
desempenho se as regras que definem a estratégia de controle forem consistentes. Extrair
regras de especialistas na forma de sentenças do tipo se ... então pode não ser uma tarefa
fácil, por mais conhecedores que eles sejam do problema em questão. Alternativamente
ao uso de especialistas para a definição da base de regras, existem métodos de extração
de regras de dados numéricos. Este métodos são particularmente úteis em problemas de
classificação e previsão de séries temporais.

No estágio de inferência ocorrem as operações com conjuntos fuzzy propriamente di-


tas: combinação dos antecedentes das regras, implicação e modus ponens generalizado.
Os conjuntos fuzzy de entrada, relativos aos antecedentes das regras, e o de saı́da, re-
ferente ao consequente, podem ser definidos previamente ou, alternativamente, gerados
automaticamente a partir dos dados.

Um aspecto importante é a definição dos conjuntos fuzzy correspondentes às variáveis


de entrada (antecedentes) e à(s) de saı́da (consequente(s)), pois o desempenho do sistema
de inferência dependerá do número de conjuntos e de sua forma. Pode-se efetuar uma
sintonia “manual”das funções de pertinência dos conjuntos; no entanto, é mais comum
empregarem-se métodos automáticos. A integração entre sistemas de inferência fuzzy e
redes neurais originando os sistemas neuro-fuzzy ou algoritmos genéticos tem se mostrado
adequada para a sintonia de funções de pertinência, assim como para a geração automática
de regras.

5.3.1 Exemplo de Processamento

Deseja-se um sistema fuzzy para controle de temperatura através de condicionador de


ar. Deseja-se que ele regule a temperatura, ou seja, se ela está alta, então o condicionador
de ar terá que baixar a potência para esfriar o ambiente, se a temperatura está boa deve
24

assim permanecer, e se está baixa deve subir.

Dado o problema, estabelecem-se as variáveis T para temperatura e P para potência


do motor do condicionador de ar. A seguir, definem-se as regras:

se T = quente então P = esfriar

se T = normal então P = zero

se T = frio então P = esquentar

Para que se atenda adequadamente as regras desejadas, são definidos os conjuntos


para cada variável. Cada conjunto possı́vel para cada variável será definido como uma
função trapezoidal, conforme apresentado a seguir.

O gráfico para a variável de temperatura (medida em graus Celsius) é descrito con-


forme as possibilidades definidas nas regras:

F(X) FRIO NORMAL QUENTE


1

0.8

0.6

0.4

0.2

0
50 T(˚C)

Figura 7: Variável de temperatura.

Já para a potência em Watt o gráfico é semelhante:


25

ESFRIAR ZERO ESQUENTAR


1

0.8

0.6

0.4

0.2

0
-100 P(w) 100

Figura 8: Potência.

Uma vez definidas as variáveis e seus conjuntos, para dada temperatura x verificamos
os pontos máximo e mı́nimo de intersecção no gráfico 1. Ponto máximo é o maior valor
obtido com resultado de uma das funções, e o mı́nimo é o menor resultado. Por exemplo,
para uma temperatura de 20 graus, o ponto máximo seria dado pela função trapezoidal
do conjunto normal (um valor, digamos, de 0,6). Já o ponto mı́nimo seria o resultado
dado pela função do conjunto frio (suponhamos um valor de 0,25). Então, para uma
temperatura de 20, teremos 0,6 como máximo e 0,25 como mı́nimo, que serão utilizados
na próxima etapa.

De posse dos valores obtidos na etapa anterior, aplicam-se as regras: como o ponto
máximo foi obtido no conjunto normal da temperatura, então será definida uma área
abaixo de 0,6 no conjunto zero da potência; como o ponto mı́nimo veio do conjunto frio,
então a área abaixo de 0,25 no conjunto esquentar da potência. O somatório das áreas
dará a quantidade de potência a ser somada ao motor para tender a potência a zero e,
portanto, colocar a temperatura dentro do normal . O gráfico a seguir ilustra a área a ser
obtida:
26

ESFRIAR ZERO ESQUENTAR


1

0.8

0.6

0.4

0.2

0
-100 100 P(w)

Figura 9: Área.

5.4 Controle Nebuloso

A Lógica Fuzzy pode ser utilizada para a implementação de controladores nebulosos,


aplicados nos mais variados tipos de processos. A utilização de regras nebulosas e variáveis
lingüı́sticas confere ao sistema de controle várias vantagens, incluindo:

· Simplificação do modelo do processo;

· Melhor tratamento das imprecisões inerentes aos sensores utilizados;

· Facilidade na especificação das regras de controle, em linguagem próxima à natural;

· Satisfação de múltiplos objetivos de controle;

· Facilidade de incorporação do conhecimento de especialistas humanos;

Entretanto, tanto as leituras de sensores quanto os sinais esperados pelos atuadores


do sistema de controle, não são nebulosos, são necessários elementos adicionais entre o
controlador nebuloso e o processo a ser controlado. Estes elementos são denominados fuz-
zificador e defuzzificador, e estão posicionados na entrada e saı́da do sistema de controle,
respectivamente. Estes elementos são responsáveis por transformar as medidas obtidas
dos sensores em conjuntos nebulosos (fuzzificador), e em transformar os conjuntos nebulo-
sos obtidos na saı́da do controlador em valores não nebulosos de controle para o processo
27

(defuzzificador). A estrutura básica de um controlador é:

REGRAS

Algoritmo de
controle

INTERFACE PROCESSO INTERFACE


DE ENTRADA DE SAÍDA

Figura 10: Estrutura Básica do Controlador.


28

6 Caracterı́sticas da Lógica Fuzzy

Este capı́tulo faz uma abordagem sobre as caracterı́sticas da lógica fuzzy; dando enfase
as vantagens , desvantagens e perspectivas da aplicação desta teoria.

-A Lógica Fuzzy está baseada em palavras e não em números, ou seja, os valores


verdades são expressos lingüisticamente. Por exemplo: quente, muito frio, verdade, longe,
perto, rápido, vagaroso, médio, etc.

- Possui vários modificadores de predicado como, por exemplo: muito, mais ou menos,
pouco, bastante, médio, etc.

- Possui também um amplo conjunto de quantificadores, como por exemplo : poucos,


vários, em torno de, usualmente.

- Faz uso das probabilidades lingüı́sticas, como por exemplo: provável, improvável,
que são interpretados como números fuzzy e manipulados pela sua aritmética.

- Manuseia todos os valores entre 0 e 1, tomando estes, como um limite apenas.

6.1 Vantagens

- O uso de variáveis lingüı́sticas nos deixa mais perto do pensamento humano;

- Requer poucas regras, valores e decisões;

- Simplifica a solução de problemas com variáveis imprecisas;

- Proporciona um rápido protótipo dos sistemas;

- Mais variáveis observáveis podem ser valoradas;

- Mais fáceis de entender, manter e testar,

- São robustos. Operam com falta de regras ou regras defeituosas;

- Acumulam evidências contra e a favor;


29

- Simplifica a aquisição da base do conhecimento.

6.2 Desvantagens

- Necessitam de mais simulações e testes;

- Dificuldades de estabelecer regras corretamente;

- Não há uma definição matemática precisa.

6.3 Perspectivas

Diversas áreas estão sendo beneficiadas pela tecnologia decorrente da Lógica Difusa.
Dentre essas áreas podem ser citadas algumas que tiveram relevância no avanço tec-
nológico e que merecem destaque. O Controle de processos industriais foi a área pioneira,
sendo as primeiras experiências datadas de 1975 quando foi demonstrado no Queen Col-
lege, em Londres, que um controlador fuzzy muito simples conseguiu controlar eficiente-
mente uma máquina a vapor.

Na mesma época, a primeira aplicação industrial significativa foi desenvolvida pela


indústria de cimento F.L.Smidth Corp. da Dinamarca. Hoje em dia, uma grande varie-
dade de aplicações comerciais e industriais estão disponı́veis, destacando-se neste cenário
o Japão e mais recentemente, os EUA e a Alemanha. Dentre os exemplos tı́picos incluem
produtos de consumo tais como geladeiras (Sharp), ar condicionado (Mitsubishi), câmeras
de vı́deo (Canon, Panosonic), máquinas de lavar roupa (Sanyo), aspiradores de pó, etc.
Na indústria automotiva destacam-se transmissões automáticas (Nissam, Lexus), injeção
eletrônica, suspensão ativa, freios antibloqueantes. Sistemas industriais incluem controle
de grupo de elevadores (Hitachi, Toshiba), veı́culos autoguiados e robôs móveis (Nasa,
IBM), controle de motores (Hitachi), ventilação de túneis urbanos (Toshiba),Controle de
tráfego urbano, controle de parada e partida de trens de metrô (Sendai, Tokio). Estas
citações são ilustrativas pois correntemente mais de 1000 patentes envolvendo Lógica Di-
fusa já foram anunciadas. Apesar do uso e da aplicação no Brasil ser incipiente, várias
indústrias e empresas vêm desenvolvendo produtos e serviços (Villares, IBM, Klockner
Moeller, Robertshaw, Yokogawa, HI Tecnologia).

De fato, nos últimos anos o potencial de manuseio de incertezas e de controle de siste-


mas complexos tornados possı́veis pela Lógica Difusa, estão sendo combinados com Redes
30

Neurais artificiais, que por sua vez, possuem caracterı́sticas de adaptação e aprendiza-
gem. A palavra certa para isto é simbiose, que vem gerando novas classes de sistemas e
de controladores neurodifusos, combinando desta forma os potenciais e as caracterı́sticas
individuais em sistemas adaptativos e inteligentes (Gomide et.al. 1992-a). Com certeza
estes sistemas deverão proporcionar uma significativa contribuição para os sistemas de
automação e controle do futuro, principalmente em controle de processos.
31

Bibliografia

[1] DACHLIANV, J.Lógica e Ágebra de Boole.-3.ed-São Paulo:Editora Atlas, 1990.

[2] CERQUEIRA,L.A.; OLIVEIRA,A. Introdução à Lógica-3.ed- Rio de Janeiro: Zahar


Editores,1982.

[3] ORTEGA,N.; OLIVEIRA,A. Tese de Doutorado, USP-São Paulo,2001

[4] HENRI, L.F. Lógica Formal/Lógica Dialética-5.ed-Rio de Janeiro: Editora


Civilização Brasileira,1991.

[5] SALMON, w.c.lÓGICA-5.ed- Rio de Janeiro: Zahar Editores,1981.

[6] FILHO, E.A.Iniciação à Lógica Matemática-2.ed-São Paulo: Editora Nobel,1995.

[7] FILHO,J.I.S.Introdução à Lógica para Ciência da Computação São Paulo: Arte e


Ciência Editora, 2002.

[8] RESENDE,S.O. do. Lógica Fuzzy. html://Labic.icmsc.sc.usp.br/FUZZY/-4k

[9] heloisa, P.A. Lógica Difusa html://www.dc.ufscar.br/ heloisa/LF.pdf

[10] TORNELLIS,O. Lógica Difusa


http://www.din.uem.br/ia/controle/fuz.prin.htn

[11] GEROMINI, M.R. Redes Neorais e Lógica Fuzzy


html://labic.icmc.usp.br/portuguese/

[12] ROCHA, T.G. Lógica Fuzzy html://www.pc.s.usp.br/ pcs571/transp

[13] THALIA, T. Controladores Fuzzy html://thalia.upc.es/de/ecal/Fuzzy

[14] BERNNTON, J.F. Sistema Fuzzy /urlhtml://www.ips.usp.br/neo/navega.htm

[15] CARTRIL, A.L. Lógicas Não Clássicas/urlhtml://www.cwb.matrix.com.br/ddk

Você também pode gostar