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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

KARINA BARBOSA CANCELLA

O ESPORTE E AS FORÇAS ARMADAS NA PRIMEIRA REPÚBLICA: das atividades


gymnasticas às participações em eventos esportivos internacionais (1890-1922)

RIO DE JANEIRO

2013
Karina Barbosa Cancella

O ESPORTE E AS FORÇAS ARMADAS NA


PRIMEIRA REPÚBLICA: das atividades gymnasticas
às participações em eventos esportivos internacionais
(1890-1922).

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de


Pós-Graduação em História Comparada da
Universidade Federal do Rio de Janeiro como requisito
parcial à obtenção do título de Mestre em História
Comparada.

Orientador: Prof. Dr. João Manuel Casquinha Malaia Santos.

RIO DE JANEIRO

2013
FICHA CATALOGRÁFICA

Cancella, Karina Barbosa


O esporte e as Forças Armadas na Primeira República: das
atividades gymnasticas às participações em eventos esportivos
internacionais (1890-1922). / Karina Barbosa Cancella. – 2013.
219 f.: il.
Dissertação (Mestrado em História Comparada) –
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de História,
PPGHC, Rio de Janeiro, 2013.
Orientador: Prof. Dr. João Manuel Casquinha Malaia Santos

1.Esporte Militar. 2.Forças Armadas. 3.Primeira República. –


Teses.
I. Malaia, João Manuel C.(Orient.). II. Universidade Federal do
Rio de Janeiro, Instituto de História, Programa de Pós-
Graduação em História Comparada. III. Título.
Karina Barbosa Cancella

O ESPORTE E AS FORÇAS ARMADAS NA


PRIMEIRA REPÚBLICA: das atividades gymnasticas
às participações em eventos esportivos internacionais
(1890-1922).

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de


Pós-Graduação em História Comparada da
Universidade Federal do Rio de Janeiro como requisito
parcial à obtenção do título de Mestre em História
Comparada.

Aprovada em: ___/___/___

________________________________________________________
Prof. Dr. João Manuel Casquinha Malaia Santos
PPGHC – Universidade Federal do Rio de Janeiro
Orientador

________________________________________________________
Prof. Dr. Victor Andrade de Melo
PPGHC – Universidade Federal do Rio de Janeiro

________________________________________________________
Prof. Dr. Paulo André Leira Parente
PPGH – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

________________________________________________________
Profa. Dra. Gracilda Alves (suplente)
PPGHC – Universidade Federal do Rio de Janeiro

________________________________________________________
Prof. Dr. Rafael Fortes Soares (suplente)
Lab. Comunicação e História - Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha mãe, expressando em algumas linhas minha profunda e
amorosa gratidão, uma vez que superando todos os desafios, dedicou sua vida a me dar bons
exemplos e apoio em todas as minhas decisões, mesmo que por muitas vezes não as
compreendesse de imediato. Foi mãe, pai, amiga, conselheira, tudo o que precisei e muito
mais do que podia entender em diversos momentos. Por tudo isso, pelo que representa na
minha vida e pela pessoa maravilhosa que é, agradeço do fundo do coração.
AGRADECIMENTOS

Ao Prof. Dr. João Manuel Casquinha Malaia Santos, orientador deste trabalho, por sua
total dedicação e pelas preciosas contribuições para esta pesquisa e para minha vida
profissional e acadêmica, meu profundo e sincero agradecimento.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo
apoio financeiro durante o período de realização deste Mestrado.
Aos Prof. Dr. Victor Andrade de Melo e Prof. Dr. Paulo André Leira Parente por suas
considerações que foram fundamentais para o desenvolvimento qualitativo deste trabalho.
Aos meus companheiros do Sport: Laboratório de História do Esporte e do Lazer
(UFRJ) por todas as discussões teóricas e contribuições para o aprimoramento da pesquisa.
A todos os professores, funcionários e colegas de Mestrado e Doutorado do Programa
de Pós-Graduação em História Comparada da Universidade Federal do Rio de Janeiro por
toda a atenção ao longo deste curso.
Aos inúmeros mestres que, desde o início de minha caminhada acadêmica, me
auxiliaram na construção dos conhecimentos que serviram como base para este trabalho.
Ao Ministério da Defesa e à Comissão Desportiva Militar do Brasil (CDMB) pela
atuação em prol do desenvolvimento do esporte militar brasileiro e as atenções dispensadas ao
longo da coleta dos materiais para a pesquisa.
À Marinha do Brasil, aos comandantes e subordinados das organizações militares
“Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha (DPHDM)”, “Centro de
Educação Física Almirante Adalberto Nunes (CEFAN)” e “Comissão de Desportos da
Marinha (CDM)” pelo apoio, contribuições e disponibilização de materiais fundamentais para
o desenvolvimento da pesquisa.
Ao Exército Brasileiro, aos comandantes e subordinados das organizações militares
“Escola de Educação Física do Exército (EsEFEx)”, “Comissão de Desportos do Exército
(CDE)”, “Instituto de Pesquisa da Capacitação Física do Exército (IPCFEx)” e “Museu do
Desporto do Exército” pelas colaborações e acesso aos materiais disponíveis.
À Força Aérea Brasileira, aos comandantes e subordinados das organizações militares
“Universidade da Força Aérea (UNIFA)” e “Comissão de Desportos da Aeronáutica (CDA)”
pela disponibilidade e atenção ao longo da pesquisa.
Aos funcionários da Biblioteca Nacional pela atenção de sempre.
Dedico agradecimentos especiais a minha família que, de formas diferentes, contribuiu
para meu amadurecimento e equilíbrio, fundamentais a esta caminhada.
Ao Léo (ou Prof. Dr. Mataruna), ao meu amado companheiro, amigo, parceiro de
todas as horas, incentivador incansável, sempre orientador e crítico e muito mais confiante do
que eu em minhas capacidades, agradeço pelo apoio e dedicação em todo esse tempo juntos.
Aos meus amigos pelo carinho de sempre e pela paciência e compreensão das
ausências em tantos momentos.
EPÍGRAFE

MARINHA DO BRASIL
“Para nós officiaes de marinha essa corrente de symphatia pelos exercícios vigorosos é de
inestimável alcance, porque la encontraremos um viveiro abundante de moços fortes,
habituados ao mar, e aos trabalhos, no dia em que a Pátria ameaçada chame a postos seus
filhos para defenderem-na. Nesse dia então essa mocidade toda affeita as lutas, nessa
aprendizagem continua, mais forte, mais rija, tem para secundar o seu enthusiasmo pela pátria
o pulso mais vigoroso e o olhar mais excitado”. (Revista Marítima Brazileira. 2o. Semestre de
1902, p. 381-388).

EXÉRCITO BRASILEIRO
“Como se vê, é, pois, o football, o desporto do soldado, por excellencia! É elle, dentre todos
os desportos, o que melhor unifica todas as vontades; o que melhor disciplina os
temperamentos, modificando os vários instinctos dos que praticam [...] É no revigorar, com
elle, o physico da mocidade brazileira, civil ou militar o seja, cultivemos com amor, as bellas
qualidades moraes que nos inspiram os seus empolgantes torneios: Mens sana in corpore
sano”. (O Imparcial 22 de janeiro de 1920, p. 8)
RESUMO

CANCELLA, Karina Barbosa. O esporte e as Forças Armadas na Primeira República: das


atividades gymnasticas às participações em eventos esportivos internacionais (1890-1922).
Rio de Janeiro, 2013. Dissertação (Mestrado em História Comparada) – Programa de Pós-
Graduação em História Comparada, Instituto de História, Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro, 2013. 219f.

O esporte atualmente é um fenômeno consagrado e praticado no meio militar em todo


o mundo como ferramenta de preparação do corpo e também na forma competitiva e de lazer,
além de elemento de projeção do poder e força das instituições. Ao longo de todo o século
XX, a prática do esporte e da atividade física nas Forças Armadas brasileiras ampliou-se de
maneira significativa, tendo participado do processo de estabelecimento das primeiras escolas
de formação em Educação Física do país e atuaram de forma significativa na organização dos
primeiros megaeventos esportivos no Brasil, como o caso dos Jogos do Centenário de 1922.
Esta pesquisa tem como objetivo principal analisar comparativamente o processo de
introdução e organização do esporte na Marinha do Brasil e no Exército Brasileiro e suas
relações com os processos de reestruturação que cada uma destas instituições empreendia na
Primeira República. Utilizando os pressupostos da História Comparada e o método de análise
crítica de documentos, este trabalho operou com fontes documentais e de imprensa a fim de
identificar as diferentes etapas de introdução das práticas esportivas no Exército e na Marinha
e suas relações com a atuação das instituições militares na sociedade entre os anos de 1890 e
1922.
Palavras-Chave: Esporte Militar; Forças Armadas; Primeira República.
ABSTRACT

CANCELLA, Karina Barbosa. O esporte e as Forças Armadas na Primeira República: das


atividades gymnasticas às participações em eventos esportivos internacionais (1890-1922).
Rio de Janeiro, 2013. Dissertação (Mestrado em História Comparada) – Programa de Pós-
Graduação em História Comparada, Instituto de História, Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro, 2013. 219f.

In the present time, sport is a long-standing phenomenon and it is played in the


military environment all around the world as a tool for body preparation and also in the form
of entertainment and competition, as well as a means of propagating the institutions, power
and force. Throughout the 20th century, the practice of sports and exercises in the Brazilian
Military Forces enlarged considerably. The Brazilian Military Forces took part in the
institution process of the first Physical Education formation schools in the country and played
a very significant role in the organization of the first sport mega-events in Brazil, just like the
Centennial Games in 1922. The main objective of this study is to analyze by comparison the
process of sport institution and organization in the Brazilian Navy and in the Brazilian Army
and their relations with the re-structural processes that each one of those institutions
undertook during the First Republic. Using the presuppositions from the Comparative History
and the method of documentary critical analysis, this paper worked with documentary and the
press sources in order to identify the different steps towards the introduction of sport practice
in the Army and in the Navy and their relations with the military institutions’ performance in
the society from 1890 to 1922.
Keywords: Military Sports; Armed Forces; First Republic.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1: Fotografias em sequência com as imagens de Sada Miyako e seu ajudante M.


Kakihara; Sensuke, o criado de bordo; e os marinheiros apresentando os golpes koshimago e
kesagatame................................................................................................................................92

Figura 2: O “Almirante Negro”................................................................................................96

Figura 3: Imagens publicadas na Careta dando destaque ao gol da vitória feito pelo Tenente
Benjamin Sodré para o Botafogo............................................................................................115

Figura 4: Fotografias publicadas na revista Careta da Festa Esportiva Militar realizada entre
Exército e Marinha no campo do Clube de Regatas Flamengo – Taça Flamengo 1920........142

Figura 5: Fotografias publicadas na revista Careta da Festa Esportiva Militar realizada entre
Exército e Marinha no campo do Clube de Regatas Flamengo – Taça Flamengo 1921........143

Figura 6: Fotografias publicadas na Revista Careta retratando as competições esportivas


realizadas no festival em homenagem ao retorno da Divisão Naval de Guerra.....................145

Figura 7: Equipe de Tiro nos Jogos Olímpicos da Antuérpia: Fernando Soledade, Tenente
Guilherme Paraense, Afrânio Costa, Tenente Mário Maurity e Dario Barbosa.....................152

Figura 8: Jogos Recreativos de marinheiros a bordo do São Paulo........................................152

Figura 9: Fotografias da parada desportiva do Centenário ocupando página inteira da Revista


da Semana, com destaque na primeira fotografia para o Tenente Guilherme Paraense,
campeão mundial de revólver ao lado de Alberto Fontan, campeão mundial de fuzil...........165

Figura 10: Fotografias dos campeões de Tiro, das provas de atletismo e boxe dos Jogos do
Centenário. Em destaque na foto com número 5 o marinheiro Góes Neto, classificado como o
melhor pugilista do Brasil.......................................................................................................169
LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Comparativo vantagens e desvantagens de utilização de bicicletas e cavalos.........68

Quadro 2: Comparativo do número de soldados por milhar de habitantes em tempo de


paz...........................................................................................................................................104

Quadro 3: Provas e locais de realização nos Jogos do Centenário de 1922...........................162

Quadro 4: Programa dos Jogos Internacionais Navais...........................................................167


LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ACM: Associação Cristã de Moços

CBD: Confederação Brasileira de Desportos

CISM: Conseil International du Sport Militaire (Conselho Internacional de Esporte Militar)

COI: Comitê Olímpico Internacional

EB: Exército Brasileiro

EF: Educação Física

EsEFEx: Escola de Educação Física do Exército

FAB: Força Aérea Brasileira

FFAA: Forças Armadas

JMM: Jogos Mundiais Militares

LEM: Ligas Esportivas Militares

LMF: Liga Militar de Football

LMSA: Liga Metropolitana de Sports Athleticos

LSE: Liga de Sports do Exército

LSM: Liga de Sports da Marinha

MB: Marinha do Brasil

RMB: Revista Marítima Brasileira

5º. JMM: 5º Jogos Mundiais Militares


SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO..........................................................................................01

1.1 Aspectos Teóricos da pesquisa...............................................................................04

1.2 Alguns estudos sobre Esporte Militar no Brasil e no Mundo.................................06

1.3 O esporte e as FFAA brasileiras: problemas e questões da pesquisa......................11

1.4 Conceitos fundamentais..........................................................................................17

1.5 Aspectos Metodológicos da pesquisa......................................................................22

1.6 Estruturação do Trabalho........................................................................................27

CAPÍTULO 2 - AS FORÇAS ARMADAS E O CORPO: A UTILIZAÇÃO DA


GYMNASTICA NOS PROCESSOS DE FORMAÇÃO MILITAR (1890-1908)...............28

2.1 Os militares e a Proclamação da República: novo papel na sociedade, novas


preocupações.................................................................................................................30

2.2 Para um soldado mais forte e preparado, uma formação melhor: medidas para
reformulação do processo de treinamento dos militares brasileiros.............................43

2.3 Primeiras atuações na divulgação esportivas: os militares, o remo e o turfe..........47

2.4 Tensões políticas e busca constante por reformas: as Revoltas da década de 1890 e
os projetos de melhorias para as FFAA........................................................................54

2.5 Oligarquias no poder, desprestígio militar: o problema da formação segue em


debate............................................................................................................................64

2.6 Povo forte e cidade renovada: os projetos do governo Rodrigues Alves e suas
relações com o esporte e as FFAA................................................................................73

2.7 Forças Armadas: “grandes escolas de educação physica, intellectual e moral da


mocidade”.....................................................................................................................77
CAPÍTULO 3 - UMA NOVA ESTRUTURA PARA AS FORÇAS ARMADAS
BRASILEIRAS: OS IMPACTOS DAS INFLUÊNCIAS ESTRANGEIRAS E O PAPEL
DO ESPORTE ENTRE OS MILITARES (1909-1915).......................................................85

3.1 O olhar para o estrangeiro: influências externas no processo de organização das


Forças Armadas brasileiras no início do século XX.....................................................86

3.2 Revoltas e tensões: os Marinheiros, o Contestado e a Primeira Guerra.................94

3.3 Reformar e recrutar para aprimorar......................................................................102

3.4 Os militares, as “ginásticas” e o esporte antes da fundação das Ligas


Esportivas....................................................................................................................107

CAPÍTULO 4 - ORGANIZAÇÃO ESPORTIVA MILITAR NO BRASIL: UMA


ANÁLISE COMPARADA DAS AÇÕES DA LIGA DE SPORTS DA MARINHA E DA
LIGA MILITAR DE FOOTBALL EM SEUS PRIMEIROS ANOS DE ATUAÇÃO
(1916-1922).............................................................................................................................118

4.1 Atuação das Ligas Esportivas Militares: fundação e primeiras ações de promoção
do esporte....................................................................................................................119

4.1.1 Fundação e regulamentação institucional das Ligas Esportivas


Militares..........................................................................................................120

4.1.2 A prática esportiva e a hierarquia militar: conviver, mas nunca descer a


familiaridade...................................................................................................134

4.1.3 A Taça Flamengo...................................................................................139

4.1.4 O novo contexto: necessidades de ampliação das atividades físicas a


partir das observações das experiências na Primeira Grande Guerra.............146

4.2 Militares nos Jogos Olímpicos: a primeira representação brasileira nos Jogos da
Antuérpia de 1920 e os Jogos Olímpicos do Centenário............................................150

4.2.1 Os militares nos Jogos da Antuérpia......................................................150

4.2.2 As Ligas Esportivas Militares e os Jogos do Centenário de 1922.........153

4.2.3 As Escolas de Educação Física das Forças Armadas.............................170

CAPÍTULO 5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................174


REFERÊNCIAS....................................................................................................................179

Fontes.........................................................................................................................180

Leis e Decretos...............................................................................................180

Relatórios Ministeriais....................................................................................180

Diários Oficiais da União...............................................................................183

Revistas Institucionais Militares.....................................................................184

Periódicos........................................................................................................185

Registros das Ligas Esportivas Militares........................................................191

Referências analisadas...............................................................................................191

Obras de Referência.........................................................................................191

Obras sobre Esporte.........................................................................................193

Obras sobre História Militar............................................................................195

Teses e Dissertações........................................................................................196

Artigos publicados em periódicos ou anais de eventos...................................196

Sites Institucionais...........................................................................................203
1

1
INTRODUÇÃO
2

Permitte jogos e exercícios sportivos nos navios, corpos e estabelecimentos de


Marinha
Snr. Chefe de Estado Maior da Armada, declaro-vos, para fins convenientes, que,
approvando os intuitos da Liga de Sports da Marinha, associação fundada por
officiais com o fim de concorrer para o desenvolvimento physico do pessoal da
Armada, por meio dos jogos e exercícios, com campeonatos annuaes, resolvi
permittir que a citada Liga se corresponda com as autoridades da Marinha, em
relação ao que for necessário a seus fins, e que as autoridades lhe facilitem os meios
de acção, sem prejuízo para o serviço, fazendo-se os jogos sob direção da referida
Liga e seus representantes nos navios, corpos, estabelecimentos, ficando a acção
destes últimos sujeita a approvação dos respectivos commandantes. Saúde e
fraternidade. Assignado Alexandrino Faria de Alencar.1

Ministério da Guerra - N°. 966 - Rio de Janeiro, 22 de junho de 1915.


Sr. chefe do Departamento da Guerra - Declaro-vos que permito o funccionamento da
“Liga Militar de Football”, cujo projecto de estatutos a este acompanha, sendo
facultado ao pessoal dos corpos do Exercito nella se inscrever. Saúde e fraternidade.
José Caetano de Faria.2

Os dois trechos acima declaram o reconhecimento oficial das primeiras entidades


reguladoras da prática esportiva entre os militares no Brasil: a Liga de Sports da Marinha e a
Liga Militar de Football. A fundação de Ligas Esportivas3 no interior das Forças Armadas
(FFAA)4 marcou um período de significativas aproximações entre o esporte e tais instituições,
sendo também o principal instrumento de controle destas práticas nas FFAA nos anos iniciais
do século XX.
O esporte5 militar, nas últimas décadas do século XX e início do século XXI,
apresentou grande projeção em todo o mundo. As estruturas ligadas a este movimento
passaram a se equiparar às organizações esportivas de alta performance, assim como seus
torneios e campeonatos a ser inseridos com maior frequência no campo dos Megaeventos

1
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha de 1916. Anexo A, p. 1.
2
BRASIL. Diário Oficial da União de 29 de junho de 1915, Seção 1, p. 5.
3
A organização esportiva tendo como base a criação de ligas foi um movimento constante em fins do século
XIX e início do século XX em todo o mundo, não estando o Brasil distante deste processo. As ligas esportivas
podem ser compreendidas como instituições responsáveis pela administração dos interesses dos clubes das
diferentes modalidades, atuando como normatizadoras das práticas através de regras impostas (e aceitas) pelas
equipes integrantes das ligas. O aceite por parte dos clubes das determinações com relação à organização dos
campeonatos, sistemas de promoção e rebaixamento eram partes fundamentais para o efetivo funcionamento
destas instituições. As primeiras ligas esportivas fundadas no mundo foram a Liga Inglesa de Futebol e a Liga
Norte-Americana de Beisebol, ambas no ano de 1871 (MALAIA, 2010). As estruturas específicas das Ligas
Esportivas Militares brasileiras, suas principais áreas de atuação e sua organização interna serão detalhadas e
discutidas na quarta parte desta dissertação.
4
A partir deste momento, a sigla FFAA será utilizada para Forças Armadas.
5
O termo “esporte moderno” foi forjado em contraponto às práticas corporais identificadas desde a Antiguidade.
No caso desta pesquisa, como mecanismo para garantir maior fluidez ao texto, o termo “esporte” estará sempre
se referindo ao conceito de “esporte moderno”. Este conceito, de acordo com Victor Melo (2010), pode ser
definido como um movimento característico da modernidade, organizado em torno de entidades representativas
com regras definidas e calendário de atividades próprio. Estas práticas envolveriam, ainda, diferentes áreas de
atenção como treinadores, gestores, profissionais de saúde. Esta estrutura em torno da atividade é o principal
ponto de diferenciação com as demais práticas corporais.
3

Esportivos.6 O Brasil, em 2011, foi palco de um dos mais consagrados eventos esportivos
militares: os 5º. Jogos Mundiais Militares - Os Jogos da Paz,7 realizados na cidade do Rio de
Janeiro no período de 16 a 24 de julho.
Atualmente, percebe-se o esporte como um fenômeno consagrado e praticado no meio
militar em todo o mundo como ferramenta de preparação do corpo e também na forma
competitiva e de lazer, além de elemento de projeção do poder e força das instituições. Ao
longo de todo o século XX, a prática do esporte e da atividade física nas FFAA ampliou-se de
maneira significativa, tendo participação inclusive no processo de estabelecimento das
primeiras escolas de formação em Educação Física do país e atuação significativa na
organização de megaeventos esportivos no Brasil, caso dos Jogos do Centenário de 1922.
Entretanto, algumas questões sobre este processo suscitam interesses para os pesquisadores do
tema: de que forma o movimento esportivo, ao se estabelecer no Brasil no século XIX,
introduziu-se nas Forças Armadas? Que instrumentos as FFAA utilizaram para introdução e
legitimação deste movimento no interior de suas corporações? Quais foram as semelhanças e
8
diferenças na institucionalização do esporte na Marinha do Brasil (MB) e no Exército
Brasileiro (EB) 9?
Estes questionamentos sugerem a necessidade de uma análise do processo de inserção
da prática de atividade esportiva nas FFAA a fim de compreender os interesses e instrumentos
envolvidos na difusão deste movimento. Para tanto, vislumbra-se a possibilidade de analisar
comparativamente o processo de institucionalização do esporte nas FFAA no Brasil, assim
como de seus principais antecedentes.

6
Roche (2000 apud Dinces, 2005) define os Megaeventos como grandes eventos culturais, sejam comerciais ou
desportivos, com intenso caráter dramático, apelo popular de massa e importância internacional. A preparação de
um megaevento esportivo pode ser compreendida em três etapas: processo de planejamento e organização que o
antecede; a execução real e apresentação do evento; e seus impactos a longo prazo. O autor ainda destaca que os
megaeventos urbanos são normalmente concebidos e produzidos por grupos poderosos das elites locais e
apresentam poucas oportunidades democráticas de entrada de cidadãos no processo de elaboração política dos
projetos. Estas características de megaevento serão debatidas no quarto capítulo desta dissertação ao serem
analisadas as ações de organização dos Jogos Esportivos do Centenário da Independência do Brasil, no ano de
1922.
7
Os Jogos Mundiais, idealizados pelo Conseil International du Sport Militaire (CISM – Conselho Internacional
de Esporte Militar), instituição regulamentadora internacional do esporte militar fundada em 1948, ocorrem a
cada 4 anos, no ano anterior ao dos Jogos Olímpicos de Verão, com primeira edição em 1995 em Roma (ITA),
seguido de Zagreb (CRO) em 1999, Catânia (ITA) em 2003 e Hyderabad (IND), em 2007. Em 2010 foram
realizados os 1º. Jogos Mundias Militares de Inverno no Vale de Aosta (ITA) e os Jogos Mundiais de Cadetes
em Ankara (TUR).
8
A partir deste momento, a sigla MB passará a ser utilizada em referência à Marinha do Brasil.
9
A partir deste momento, a sigla EB passará a ser utilizada em referência ao Exército Brasileiro.
4

1.1 Aspectos Teóricos da pesquisa

A presente pesquisa transita nos campos da História do Esporte e da História Militar,


utilizando como abordagem as propostas da História Comparada. O surgimento do campo de
estudos específicos sobre a história do fenômeno esportivo ao redor do mundo traz como
bases os pressupostos da Nova História Cultural ao colocar em evidência para análises
históricas aspectos da Cultura e de suas diversas práticas. À parte das discussões se a História
do Esporte seria uma subdisciplina consolidada ou em vias de consolidação ou mais um dos
domínios da História que podem surgir ou desaparecer com rapidez de acordo com as
necessidades ou “modas” dos períodos, Victor Melo (2007a) destaca as características de
consolidação do campo a partir do levantamento de diversas sociedades nacionais e
internacionais dedicadas ao estudo da História do Esporte, além de periódicos e eventos
científicos específicos sobre a temática.10
A consolidação e ampliação das discussões teóricas e metodológicas no campo da
História do Esporte destacam significativas aberturas para análise de diferentes aspectos deste
movimento, não somente por historiadores, mas também por profissionais de diferentes
formações acadêmicas. Os estudos sobre a história do fenômeno esportivo ganharam maior
projeção no Brasil no final da década de 1990 e principalmente nos anos 2000, sendo
conduzidos “se não somente [...] por 'historiadores de formação', certamente por
pesquisadores que, independente de sua filiação acadêmica original, procuram fazer uso das
discussões metodológicas do campo da História” (MELO, 2007b, p. 13).
Em relação à História Militar, campo colocado em diálogo com a História do Esporte
neste trabalho, identifica-se o acompanhamento dos movimentos de novos objetos e
abordagens, passando a incorporar novas discussões em suas pesquisas. Comumente dedicada
aos estudos das guerras e batalhas e das instituições militares, este campo tem passado por
significativas mudanças com a introdução de novas metodologias que possibilitam a
compreensão das “múltiplas interfaces da História Militar, tais como social, institucional,
cultural, econômica, tecnológica, religiosa, sociológica ou política, entre outras” (PARENTE,
2009, p. 3).

10
Sociedades nacionais como a North American Society of Sport History e internacionais como a International
Society for the History of Physical Education and Sport; Periódicos como Internation Journal, Sport History
Review e Journal of Sport History; de eventos científicos como o Congresso Internacional do Comitê Europeu
de História do Esporte (MELO, 2007a, p. 12-13).
5

As aproximações entre a História Militar e a História Social propiciaram um fecundo


campo na historiografia atual possibilitando uma compreensão mais ampla das relações das
instituições e fenômenos militares com a vida cotidiana das sociedades, deixando de lado a
pura História Batalha. Parente (2009) propõe que, dentro das novas perspectivas dos estudos
militares, incorporando propostas metodológicas não somente da História Social, mas também
da História das Instituições, História das Ideias e estudos de Memória, temáticas antes não
contempladas passaram a ocupar espaço central nas discussões, tais como: origens geográfica,
social e familiar dos militares; influências educacionais; experiências administrativas das
FFAA; relações familiares; participação dos militares nas redes políticas, econômicas e
intelectuais tanto no interior dos quartéis como fora deles; estudo de relações entre as
diferentes FFAA; inserção das instituições militares no cotidiano das diferentes regiões do
país; estudos sociais de gênero; análises das origens sócio-econômicas das diferentes camadas
hierárquicas; mentalidade militar em diferentes momentos históricos; relações entre a guerra e
a sociedade; estudos dos símbolos, gestos, comemorações, cantigas e elementos presentes na
memória militar; construção dos “vultos”, dos ícones; e também algo bem específico destas
novas propostas, o estudo do “oposto da memória: o esquecimento, os tabus, o que não é dito”
(PARENTE, 2009, p. 12).
Dentre estas novas possibilidades de estudo em História Militar, este autor não faz
referência direta às práticas físicas ou esportivas. No entanto, no amplo universo de temáticas
que tem emergido neste campo e levando em consideração a ampliação da relevância dos
estudos sobre esporte na atualidade, considero que este movimento (o esporte) passa a ser um
objeto de importância significativa para a compreensão das relações das instituições militares
brasileiras com as questões do corpo e das competições através do esporte. Este trabalho vem,
portanto, contribuir no aprofundamento das análises sobre a inserção do esporte na estrutura
das FFAA brasileiras em fins do século XIX e início do século XX e seus impactos na
organização interna destas instituições, assim como nas relações com a sociedade civil.
6

1.2 Alguns estudos sobre Esporte Militar no Brasil e no Mundo

Os estudos sobre história do esporte militar em países estrangeiros têm recebido


atenção dos pesquisadores desde a década de 1980. No processo de levantamento
bibliográfico sobre este movimento, foram localizadas produções que se dedicaram a analisar
a inserção das práticas esportivas entre os militares dos Estados Unidos, das Forças Armadas
Britânicas, da França e da extinta União Soviética.
Robert Baumann, no ano de 1988, publicou o artigo “The Central Army Sports Club
(TsSKA) Forging a Military Tradition in Soviet Ice Hockey” no Journal of Sport History
onde debate o processo de inserção dos esportes no Exército Soviético, culminando com as
análises sobre o desempenho superior dos militares no ice hockey. No artigo, Baumann afirma
que o esporte e a ginástica passaram a fazer parte do cotidiano do Exército Soviético ainda no
século XIX, quando em 1844 a ginástica e a natação passaram a integrar o Programa Oficial
de formação dos Cadetes. Na década de 1870 foi instituído o serviço militar universal na
União Soviética e os chamados “tiros de ginástica” passaram a ser fortemente estimulados
pelo governo como instrumento para formar competências para bons soldados. As atenções
com a condição física se intensificaram também pela entrada no Exército de indivíduos sem
grande aptidão física por ocorrência do serviço militar universal. A partir de 1898, os
militares passaram a apoiar associações esportivas como forma de estimular o preparo dos
jovens para servir. Esse processo ampliou o movimento esportivo competitivo na Rússia com
esportes como futebol, iatismo, tênis, ciclismo, patinação no gelo. O autor prossegue no artigo
analisando brevemente as fases do esporte entre os militares soviéticos, dedicando espaço
para observações sobre o processo de organização esportiva no interior do Exército e seus
reflexos sobre o desempenho em competições, analisando especificamente o caso do ice
hockey (BAUMANN, 1988).
Wanda Wakefield, em sua obra “Playing Win: sports and the American Military,
1898-1945”, publicada em 1997, reforça que nos Estados Unidos, assim como no restante do
mundo ocidental, a cultura esportiva se desenvolveu no final do século XIX, beneficiada pelas
melhorias no transporte, pelo crescimento dos meios de comunicação, particularmente os
jornais mais baratos, pela urbanização e industrialização. Em 1898, o esporte já fazia parte do
calendário nacional e garantia atenção de diferentes grupos da população para competições de
baseball e football. No entanto, a aproximação dos militares destas práticas somente ocorreria
na entrada dos Estados Unidos no conflito com a Espanha, conhecido como Guerra Hispano-
Americana, pelo controle das colônias espanholas no Golfo do México, no ano de 1898.
7

Segundo Wakefield, após a derrota da Espanha no conflito, os comandantes americanos


criaram intencionalmente oportunidades para os soldados e marinheiros praticarem baseball,
corrida e experiências com outras competições atléticas. Neste movimento, líderes nacionais,
como o presidente Theodore Roosevelt e o General Leonard Wood, passaram a dar exemplos
pessoais das vantagens derivadas de aptidão física. O General Wood iniciou ainda um
processo para garantir unidades no Exército Regular e na Guarda Nacional com equipamentos
envolvidos em treinamento físico compatível com as exigências para os soldados do país no
futuro. Determinando este momento descrito acima como o ponto de partida, a autora
prossegue em sua obra discutindo as diferentes fases do movimento esportivo no interior do
Exército Americano, relacionando-os com os diversos conflitos onde o país esteve atuando ao
longo do século XX, seguindo até a Segunda Grande Guerra (WAKEFIELD, 1997).
Ainda observando as produções sobre esporte militar em outras nações, a obra “Sport
and the Military: the British Armed Forces 1880-1960”, de autoria de Tony Mason e Eliza
Riedi e publicada em 2010, dedica-se a analisar o processo de estabelecimento das práticas
esportivas entre os militares britânicos. Os autores iniciam a obra afirmando que, ainda nos
dias de hoje, o esporte não é tema central de estudos de História Militar, sendo citado (quando
citado) como parte de um pacote de reformas destinadas a melhorar a preparação do soldado
comum, de estímulo para recrutamento nas últimas décadas do século XIX ou como um
elemento de diversão que poderia ser desfrutado pelos soldados do serviço ativo nas pequenas
guerras do período imperial. As análises dos autores apresentam a inserção do esporte entre os
militares britânicos como um dos itens de um movimento que buscava o desenvolvimento de
recreações racionais entre os soldados e marinheiros, envolvido em um aumento da oferta
educativa com a ampliação de bibliotecas e salas de leitura, e ambientes para pausas e
repousos livres de álcool. A expansão do esporte organizado no Exército e Marinha pode ser
vista como parte deste movimento para elevar o padrão moral e intelectual dos militares
britânicos e, como afirmado pelos autores, é principalmente neste contexto que os
historiadores das Forças Armadas têm discutido o esporte. No entanto, os esportes em serviço
somente tiveram aprovação oficial no final do período Vitoriano e Eduardiano e o pessoal de
Ginástica do Exército forneceu ajuda preciosa. Antes de 1914 o esporte foi promovido por
entusiastas pela prática e encontrou terreno principalmente entre os oficiais subalternos e suas
bases. Por esta razão, afirmam Mason e Riedi, o movimento se desenvolveu de forma desigual
entre navios e regimentos, e entre portos e guarnições. Assim como os demais autores já
discutidos, prosseguem por toda a obra relacionando o desenvolvimento da prática esportiva
8

com as diversas atuações das FFAA britânicas no período compreendido pela pesquisa
(MASON e RIEDI, 2010).
Para o caso francês, foi localizado uma Tese de Doutoramento defendida na
Universidade de Lion em 2010, de autoria de Arnaud Waquet intitulada “Football en guerre:
l’acculturation sportive de la population française pendant La Grande Guerre (1914-1919)”.
No trabalho, Waquet dedica-se a discutir o processo de aculturação esportiva ocorrido durante
a Primeira Guerra, identificando uma significativa redução na prática da ginástica e ampliação
do que chama de “desporto inglês”, com especial atenção para o futebol. Partindo desta
premissa, analisa as relações entre o futebol e a guerra e seus impactos sobre a população
francesa (WAQUET, 2010).
Como é possível perceber com estes breves relatos de estudos, as análises sobre
esporte militar na Europa e nos Estados Unidos abarcam diferentes aspectos do movimento e
suas relações com as FFAA e a sociedade. No caso brasileiro, as pesquisas bibliográficas
sobre a temática desta pesquisa apontaram uma significativa lacuna quanto a estudos
historiográficos sobre esporte militar. Apesar do processo histórico do fenômeno esportivo ter
atraído a atenção de áreas múltiplas, a inserção deste fenômeno no interior das estruturas das
instituições militares brasileiras e seu desenvolvimento ainda mostram-se pouco visitados
pelos pesquisadores. Foram localizados alguns estudos que se configuram como Dissertação
de Mestrado na área da Educação Física (EF), artigos publicados em revistas científicas e
obras de caráter enciclopédico também quase que totalmente produzidas por estudiosos da
área de EF.
Celso Castro, em seu artigo “In corpore sano - os militares e a introdução da educação
física no Brasil” publicado em 1997 na revista Antropolítica, dedica-se a tratar as
iniciativas militares para a introdução da educação física de forma sistematizada e
obrigatória no Brasil, na primeira metade do século XX. É examinada a
institucionalização da educação física tanto no Exército quanto nos estabelecimentos
civis de ensino, sua vinculação a concepções de defesa nacional e a tentativa de se
criar um “Método Nacional”, adaptado ao “temperamento” brasileiro (CASTRO,
1997, p. 61).

Com abordagem essencialmente política, Castro discute as questões internas e as


influências internacionais que propiciaram o processo de desenvolvimento da EF no interior
do Exército e que possibilitaram a sua influência na educação brasileira.
Victor Melo, estudioso da História do Esporte, em parceria com Randeantony
Nascimento, tem trabalho dedicado à discussão do papel dos militares no desenvolvimento da
formação profissional na Educação Física brasileira, apresentado em Congresso de História da
Educação em 2000, onde são trabalhadas também as questões relacionadas à atuação dos
9

militares no processo de formação de professores civis e militares para atuação na educação


básica e sua influência na fundação de outras escolas de formação em EF no país. O trabalho
discute questões políticas e analisa o contexto de atuação dos militares no campo da EF no
Brasil antes e depois da fundação da Escola Nacional de Educação Física e Desportos (MELO
e NASCIMENTO, 2000).
Com relação ao esporte na Marinha, apenas um artigo foi localizado analisando o
processo histórico das regatas e do Grêmio de Vela da Escola Naval desde sua fundação, em
1943, até a situação no momento de produção do trabalho. O artigo de autoria de Fernando
Garrido foi publicado na Revista de Villegagnon da Escola Naval, no ano de 2007. O
trabalho, com a mesma característica dos demais analisados, não se propõem a discutir as
questões relacionadas ao esporte militar enquanto movimento mais amplo, focando uma
apresentação mais cronológica do desenvolvimento da modalidade “Vela” na Marinha do
Brasil (GARRIDO, 2007).
Em artigo da Revista de Educação Física publicada pelo Exército, André Morgado
Ribeiro discute as contribuições da Missão Militar Francesa para o desenvolvimento do
esporte no Exército Brasileiro, enfocando as influências da estrutura francesa neste processo
de difusão do esporte na instituição (RIBEIRO, 2009).
Renato Soeiro, em dissertação de Mestrado no Programa de Pós-Graduação em
Ciência da Motricidade Humana da Universidade Castelo Branco defendida em 2003, aborda
as contribuições da Escola de Educação Física do Exército (EsEFEx) para o Esporte Nacional
tendo como recorte temporal o período de 1933 a 2000. O autor apresentou como
preocupações principais o levantamento das ações e influências da EsEFEx no contexto
esportivo nacional, realizando um breve histórico sobre o panorama do esporte no Brasil antes
da fundação da referida Escola e organizando o período posterior em cinco fases, segundo os
objetivos de atuação identificados pelo autor.11 Ao longo do trabalho, enfoca prioritariamente
as relações entre o Exército e os diferentes governos federais de seu recorte, realizando
contextualizações também de cunho essencialmente político do panorama internacional. O
autor ainda realiza em alguns momentos uma listagem cronológica das competições
promovidas ou com participação de militares do Exército (SOEIRO, 2003). Apesar de existir
atuação no campo esportivo da Marinha e da Força Aérea Brasileira (FAB), após sua

11
Fase da busca da Eugenia e de influência na formação de profissionais de Educação Física e de Medicina
Esportiva (1933 a 1941); Fase do uso do esporte na preparação para guerra e influência na administração
esportiva (1942 a 1967); Fase de cientificação do treinamento esportivo (1968 a 1979); Fase de valorização dos
esportes militares (1980 a 1989); Fase de reestruturação no sentido da ciência do esporte (1990 a 2000).
10

fundação em 1941, não se registra na obra qualquer discussão (e até mesmo menção) a
respeito do desenvolvimento deste movimento nas demais FFAA brasileiras.
Duas obras publicadas entre os anos de 2005 e 2007 merecem observações. De
organização de Lamartine Pereira DaCosta, o “Atlas do Esporte no Brasil”, publicado em
2005, tem como estrutura a composição de um catálogo de artigos sobre diferentes aspectos
do movimento esportivo no Brasil ao longo da história.12 Esta obra tem capítulos dedicados às
relações dos militares com o esporte, organizados internamente de forma exclusivamente
cronológica, apresentando as diferentes etapas de desenvolvimento do movimento nas FFAA
e Forças Auxiliares.13 A obra, apesar de não aprofundar discussões sobre as relações e
influências ocorridas durante o processo de estabelecimento do movimento esportivo nas
instituições, aponta informações e caminhos importantes.
A segunda obra de destaque é o “Dicionário Enciclopédico Tubino do Esporte”,
organizado por Manoel Tubino, Fábio Tubino e Fernando Garrido, publicado em 2007, e
estrutura-se, como o título da obra indica, em formato de dicionário. Composto por verbetes
elaborados por diversos pesquisadores, dedica espaços para a apresentação das diferentes
modalidades de esportes militares e as principais instituições ligadas ao movimento. Como as
demais, não realiza discussões mais complexas sobre os diferentes processos de
estabelecimento e institucionalização destas práticas.
Esta breve revisão bibliográfica buscou apresentar um levantamento do que já se
produziu sobre a temática do esporte militar no Brasil, assim como as principais abordagens e
enfoques destas produções. Como foi possível perceber na exposição, o material localizado
apresenta características de enfocar apenas uma temática ou uma instituição e suas relações
com o esporte, não discutindo o panorama mais amplo do movimento esportivo no interior

12
Artigos sobre a relação do esporte com as FFAA e Forças Auxiliares:
BOUCAS, Renato; RABELO, Adalberto; LACERDA, Rogerio. Polícias Militares do Brasil – Atividades físicas
e esportivas. In: DACOSTA, Lamartine. (Org.) Atlas do Esporte do Brasil. Rio de Janeiro: Shape, 2005.
CORREIA, Roberto. Comissão Desportiva Militar do Brasil – CDMB. In: DACOSTA, Lamartine. (Org.) Atlas
do Esporte do Brasil. Rio de Janeiro: Shape, 2005.
GARRIDO, Fernando; LAGE, Ângela. O Esporte na Marinha do Brasil. In: DACOSTA, Lamartine. (Org.) Atlas
do Esporte do Brasil. Rio de Janeiro: Shape, 2005.
MOREIRA, Sergio. Aeronáutica – esporte, Educação Física e aptidão física. In: DACOSTA, Lamartine. (Org.)
Atlas do Esporte no Brasil. Rio de Janeiro: Shape, 2005.
PUBLIO, Nestor Soares; CATALANO, Ivens Martini. Escola de Educação Física da Polícia Militar do estado de
São Paulo. In: DACOSTA, Lamartine. (Org.) Atlas do Esporte do Brasil. Rio de Janeiro: Shape, 2005.
SILVA, José da. Corpo de Bombeiros no Brasil – esporte e Educação Física. In: DACOSTA, Lamartine. (Org.)
Atlas do Esporte do Brasil. Rio de Janeiro: Shape, 2005.
SOEIRO, Renato. Exército Brasileiro – Atividades físicas e esportivas. In: DACOSTA, Lamartine. (Org.) Atlas
do Esporte no Brasil. Rio de Janeiro: Shape, 2005.
SOEIRO, Renato; PINHEIRO, Rafael. Escola de Educação Física do Exército – EsEFEx. . In: DACOSTA,
Lamartine. (Org.) Atlas do Esporte no Brasil. Rio de Janeiro: Shape, 2005.
13
Forças Auxiliares é o termo utilizado para designar as Polícias Militares e o Corpo de Bombeiros.
11

das FFAA. Por esta percepção, destaca-se mais uma vez a relevância do desenvolvimento de
uma pesquisa em perspectiva comparada dos processos de inter-relação e de influências que
ocorreram entre Exército e Marinha ao longo do desenvolvimento das práticas esportivas. A
contextualização destes processos com o panorama do esporte no Brasil no período mostra-se
fundamental com vistas a garantir uma compreensão mais aprofundada da complexidade e
dos objetivos no estabelecimento de tais práticas entre os militares.

1.3 O esporte e as FFAA brasileiras: problemas e questões da pesquisa

Ainda no início do século XX, registra-se a criação das primeiras instituições


reguladoras da prática esportiva dentro do EB e da MB no ano de 1915: a Liga Militar de
Football e a Liga de Sports da Marinha.14 No entanto, desde meados do século anterior,
algumas atividades físicas e esportivas foram introduzidas no cotidiano destas instituições de
forma gradativa através de medidas normativas como a inserção sistemática destas práticas no
currículo das diferentes escolas de formação militar.
O movimento republicano, em fins do século XIX, defendia a construção de um Brasil
moderno, civilizado e distante de práticas desorganizadas e descontroladas que, segundo os
grupos republicanos que criticavam a Monarquia, eram características do período imperial. As
transformações políticas, econômicas e sociais marcaram a história do país neste período,
sendo introduzidos diferentes elementos em todas as instâncias da sociedade visando a
assemelhação às “modernas” nações europeias (CARVALHO, 1987). Neste novo formato de
sociedade que se buscava construir, as práticas de atividades físicas e esportivas foram
identificadas como importantes contribuintes, “já que traz[iam] em suas bases o controle
sobre corpo, mente e emoções, um equilíbrio visto como necessário nos indivíduos para a
contribuição no crescimento e desenvolvimento do país” (CANCELLA, 2010, p. 8).

14
Este período da década de 1910 foi marcado também pelas discussões sobre a criação da primeira entidade
esportiva nacional no Brasil, a Confederação Brasileira de Desportos (CBD). A fundação das Ligas esportivas
nas FFAA, portanto, estava acompanhando um movimento maior que se desenvolvia no panorama do esporte no
Brasil. Este processo de fundação da CBD e a atuação dos militares neste movimento de criação de entidades
esportivas serão mais aprofundados ao longo deste trabalho.
12

Como trabalhado por mim em estudo anterior,


o desenvolvimento deste movimento esportivo no Brasil teve como pano de fundo
uma sociedade em momento de transformação, onde se iniciava um processo de
mudança no perfil do país, em destaque para a capital, buscando aproximá-la das
grandes cidades européias com processos de urbanização e sanitarização no final do
século XIX e início do século XX, introdução de hábitos considerados civilizados,
como as práticas esportivas, e que privilegiassem atitudes saudáveis, buscas por
crescimento econômico e desenvolvimento do país, além da criação de um Estado
Laico, visando deixar para trás as características que ligavam a sociedade ao
Império, classificado como símbolo do atraso (CANCELLA, 2010, p. 9).

A cidade do Rio de Janeiro, então capital federal, foi a “porta de entrada” principal das
práticas esportivas, desde meados do século XIX, disseminando entre suas elites o apreço por
tais práticas (MALAIA, 2010). As condições que levaram o Rio de Janeiro a ser uma “cidade
esportiva” 15 foram analisadas por Victor Andrade de Melo, destacando as características que
propiciaram a introdução e disseminação das práticas esportivas na sociedade carioca no
século XIX e ao longo do século XX. Esta cidade, principal canal de entrada das novidades
europeias oitocentistas, passou por processos de mudança desde as primeiras décadas daquele
século que favoreceram a ascensão das ideias de necessidade de “civilizar e modernizar” o
país, iniciando as ações pela capital (MELO, 2001).
O desenvolvimento da industrialização, o crescimento da zona urbana e o surgimento
de outras camadas sociais, como os industriais, alteraram a estrutura sociocultural da cidade,
criando um ambiente propício ao crescimento do movimento esportivo, principalmente a
partir da segunda metade do XIX, com a ampliação das práticas esportivas vinculadas ao
cotidiano das cidades, como o caso do remo (MELO, 2001).16
Ao longo do processo de difusão do movimento esportivo no Brasil, inúmeras
instituições como clubes, escolas e também as FFAA, até então Exército e Marinha17, que
originalmente não apresentavam qualquer ligação com o esporte passaram a inserir tais
atividades entre suas funções.

15
Conceito cunhado por Victor Andrade de Melo em sua tese de Doutoramento, posteriormente publicada como
a obra “Cidade Sportiva: primórdios do esporte no Rio de Janeiro” no ano de 2001.
16
Este processo de intensificação das práticas esportivas nas áreas urbanas do Rio de Janeiro será discutido no
Capítulo 2.
17
A Força Aérea Brasileira foi criada em janeiro de 1941 através do Decreto-Lei N°. 2.961 que estabelecia a
criação do Ministério da Aeronáutica, efetivando a transferência de todos os militares que compunham a Arma
de Aeronáutica do Exército e o Corpo de Aviação Naval para a subordinação daquele Ministério. Como este
trabalho tem por objetivo analisar as ações dos militares brasileiros no campo esportivo no período
compreendido entre 1890 e 1922, a Força Aérea Brasileira não será alvo de observações.
13

O esporte passou, então, a figurar no seio das atividades das FFAA brasileiras, tendo
alguns militares participado do processo de difusão e regulamentação de diferentes
modalidades na sociedade.18 Além de contribuir para a ampliação do movimento esportivo no
Brasil, as FFAA ainda atuaram na introdução no país dos chamados “esportes militares”,
atividades criadas especificamente dentro das corporações militares envolvendo práticas
específicas onde são simuladas partes do treinamento funcional exigido pela atividade
militar.19 (CANCELLA e MATARUNA, 2012b).
A ginástica foi introduzida e passou a fazer parte do cotidiano dos militares brasileiros
e, mesmo após sua implementação em meio civil, ainda guardava muito das características
militarizadas. Como afirma Soares,
a ginástica, portanto, como expressão da cultura e como forma especifica e mais
especializada de uma educação do corpo urbano, guardou, assim, em seu conteúdo,
relações próximas e mesmo de dependência de instituições bastante fortes no
período, como a militar e a médica. Da primeira, cabe repetir, guardou as paradas, as
ordens coletivas, os uniformes, as bandeiras, as vozes de comando, as destrezas
arrojadas como forma de espetáculo coletivo, as ações ligadas ao salvamento de
pessoas, o auxílio a enfermos e proteção dos fracos, o transporte de pessoas e
utensílios em situações de perigo, como inundações, incêndios, desabamentos etc.;
da segunda, apropriou-se do universo de conhecimentos, privilegiando aqueles
consagrados na esfera científica do período e que se localizavam, sobretudo, na
anatomia, fisiologia, mecânica e higiene (2009, p. 145).

Os militares passaram a não somente praticar as ginásticas e os esportes no interior de


suas corporações, mas também desempenharam importante papel de fomentadores no meio
civil, por meio da atuação na função de instrutores de ginástica em escolas civis, assim como
na participação como esportistas em competições de diferentes modalidades e também no
papel de liderança em entidades reguladoras esportivas (GARRIDO e LAGE, 2005; SILVA e
MELO, 2011).
No processo de difusão das práticas das atividades ginásticas e esportivas, os militares
desempenharam importantes papéis, não somente em fins do século XIX, quando ainda se
posicionavam no controle político do país, mas também nos anos iniciais do século XX. As
análises desta pesquisa terão como ambiente a cidade do Rio de Janeiro por algumas razões:

18
O remo e o iatismo são exemplos de esportes onde registra-se a participação de militares em seus processos de
institucionalização no Brasil. Estas ações serão detalhadas no Capítulo 2 desta dissertação.
19
Atualmente, o CISM reconhece como integrantes da categoria “esportes militares” de verão as modalidades:
Orientação, Paraquedismo, Pentatlo Aeronáutico, Pentatlo Naval, Pentatlo Militar e Tiro Esportivo. No entanto,
outras modalidades hoje já consagradas em meio civil e até mesmo integrantes do quadro dos Jogos Olímpicos
de Verão foram inicialmente praticadas quase que exclusivamente por militares, sendo posteriormente difundidas
para não-militares. Alguns exemplos são a Esgrima, Hipismo e o Tiro Esportivo. Nos 5º JMM, as competições
ocorreram em 20 modalidades organizadas em 05 categorias: Esportes Individuais (Atletismo, Natação,
Hipismo, Pentatlo Moderno, Vela, Triatlo), Esportes Coletivos (Basquete, Futebol, Vôlei), Esporte de Exibição
(Vôlei de Praia), Esportes Militares (Pentatlo Aeronáutico, Pentatlo Militar, Pentatlo Naval, Paraquedismo, Tiro,
Orientação), Esportes de Combates (Boxe, Esgrima, Judô, Taekwondo). (CISM, 2011; RIO2011, 2011).
14

sua característica de principal ponto de entrada e disseminação da prática esportiva no país,


por questões já anteriormente apresentadas; seu importante papel de capital da República e
sede das instituições militares; e por ser o local de fundação e também principal área de
atuação das Ligas Esportivas Militares (LEM).20
Importante também destacar que o recorte temporal adotado por este trabalho se define
por questões políticas do país (processo de proclamação e estabelecimento da República no
Brasil) e aspectos específicos do processo de desenvolvimento e difusão das atividades físicas
e esportivas na estrutura das Forças Armadas. O ponto inicial, situado no ano de 1890, foi
selecionado por ser o primeiro ano da República do Brasil com governo de base militar, além
de ser o ano em que foram reforçadas as medidas normativas de introdução das atividades
gymnasticas e natação nos currículos de ensino no Brasil, tanto em instituições militares como
civis através da Reforma de Benjamin Constant.21 Já o recorte final, o ano de 1922, marca o
encerramento de um primeiro ciclo de atividades das Ligas Esportivas Militares e mudanças
nos processos de atuação a partir da participação nos Jogos do Centenário, como será
apresentado a seguir.
Das práticas de ginástica no interior dos quartéis ao desempenho de funções de
instrutores nas escolas civis, os militares, durante a década final do Oitocentos e inicial do
novecentos, atuaram de forma ativa na divulgação destas práticas para a sociedade. As
preocupações com o processo de formação destes instrutores, fortemente influenciadas por
grupos militares estrangeiros, fomentaram as primeiras medidas para criação de escolas de
formação em Educação Física no Brasil na primeira década do século XX.
Do período das atividades ginásticas até a criação das Ligas Esportivas Militares, a
prática de esporte de forma competitiva não era normatizada ou regulamentada pelas
instituições. A partir de 1915, as LEM assumiram este papel de entidades regulamentadoras
da prática esportiva entre os militares brasileiros, sendo responsáveis por ações de difusão e
normatização de tais práticas. De 1915 a 1922, os processos de organização esportiva e
institucionalização das atividades fizeram com que o esporte adquirisse novas preocupações e
investimentos no interior das instituições militares. Com a ampliação da abrangência do
esporte competitivo, os militares passaram a especializar as práticas e garantiram espaço de
representação entre as principais equipes esportivas do país e até mesmo em seleções

20
A partir deste ponto a sigla LEM passará a ser utilizada em referência a Ligas Esportivas Militares.
21
Reforma proposta pelo então Ministro da Instrução Pública, Correios e Telégrafos, o General Benjamin
Constant, e aprovada pelo Decreto n°. 981 de 08 de novembro de 1890 que previa uma reestruturação do ensino
público no Brasil. Dentre suas propostas, defendia o espaço das aulas de gymnastica nos dois ciclos da escola
primária, no currículo da Escola Normal e do Gymnasio Nacional. As propostas e os desdobramentos desta
reforma serão detalhados no Capítulo 2.
15

nacionais em eventos esportivos internacionais, como nos Jogos Olímpicos da Antuérpia em


1920 (GARRIDO e LAGE, 2005).
Com este processo no início da década de 1920, em 1922 as Ligas Militares foram
reconhecidas oficialmente como entidades representativas pela Confederação Brasileira de
Desportos (CBD), responsável pelo esporte nacional naquele momento. Este reconhecimento
foi efetivado em decorrência das funções desempenhadas por estas instituições no processo de
organização dos primeiros Jogos Multiesportivos Internacionais realizados no Brasil: os Jogos
Esportivos do Centenário, competição maior onde também foram realizados os Jogos
Internacionais Militares. Estes eventos ocorreram durante os festejos pelo centenário da
Independência do Brasil, comemorados naquele ano de 1922, e no processo de organização
foi criada uma Comissão Militar para as Festas Esportivas do Centenário, presidida pelo
Coronel Estellita Werner que, em parceria com a CBD, foi responsável pela realização dos
Jogos.22
A participação das LEM na organização deste evento foi uma experiência fundamental
para mudanças significativas nas perspectivas de atuação das Ligas Militares. Estas mudanças
envolviam a ampliação das preocupações não somente com a organização esportiva, mas
também com investimentos em processos de capacitação dos envolvidos na prática, com a
contratação de técnicos estrangeiros para diferentes modalidades, e a criação de escolas de
formação em Educação Física nas duas instituições.
O ano de 1922, portanto, é compreendido como o encerramento de um primeiro ciclo
de atuações das LEM, sendo um marco significativo no redirecionamento de suas abordagens
e atividades. Esta pesquisa encerra suas análises com a participação dos militares na
organização deste evento esportivo internacional, destacando as principais mudanças nas
estruturas organizacionais das ligas, além das alterações na interpretação das funções destas
entidades tanto no meio militar como no civil. Indicarei, ainda, as próximas etapas de
desenvolvimento das LEM já identificadas e que ainda requerem maiores investigações, mas
que este estudo no momento não apresenta condições de abarcar tais discussões devido aos
limites deste trabalho.
As FFAA, portanto, passaram em aproximadamente três décadas das atividades
ginásticas restritas ao interior dos quartéis para o processo de divulgação de tais práticas em
meio civil, fazendo a transição para a implantação e regulamentação de competições
esportivas, inicialmente entre seus militares e algumas equipes civis. Da organização

22
BRASIL. Diário Oficial da União de 26 de julho de 1922, seção 1, p. 1-4.
16

esportiva interna, passou à participação e organização de grandes eventos esportivos


internacionais. Este processo, apesar de ter se desenrolado de maneira similar entre as duas
Forças Armadas em atividade naquele momento, apresentou peculiaridades por características
específicas de cada uma destas instituições. O desenvolvimento da pesquisa na perspectiva
comparada, trabalhando com as duas instituições militares, pode “iluminar” as principais
abordagens e influências de cada uma com relação à estruturação do movimento esportivo
ampliando a compreensão deste processo e destacando as similaridades e especificidades
identificadas em seu desenvolvimento em ambas as instituições.
Esta pesquisa tem como objetivo principal analisar comparativamente o processo de
introdução e organização do esporte na Marinha do Brasil e no Exército Brasileiro, suas
relações com os processos de reestruturação que cada uma destas instituições empreendia na
Primeira República e os papéis que buscavam desempenhar na sociedade. Além deste objetivo
central, foram identificadas algumas questões a investigar que direcionaram os “olhares” ao
longo do desenvolvimento da pesquisa:
1. Quais foram os instrumentos e discursos utilizados pela Marinha do Brasil e Exército
Brasileiro para a introdução das atividades físicas e esportivas de forma regular no interior
de suas instituições?
2. Como e por que as questões do corpo e de seu preparo passaram a ser alvo de preocupação
e de atenções normativas nas Forças Armadas?
3. As influências estrangeiras tiveram papel significativo no desenvolvimento do esporte nas
FFAA brasileiras?
4. Como as determinações internas de hierarquia e disciplina foram tratadas no contexto das
práticas esportivas?
5. Como se desenvolveu a transição da prática de atividades físicas com objetivos de
preparação do corpo para as práticas esportivas competitivas?
6. Qual foi o modelo de Liga esportiva adotado em cada uma das FFAA quanto à organização
e estruturação?
7. Quais foram as circunstâncias que levaram o esporte militar a adquirir condições de
representação nacional na década de 1920, com participação em eventos esportivos
internacionais?
8. Quais foram os desdobramentos das ações dos militares nestas primeiras décadas de
estruturação das atividades ligadas à prática esportiva para o Esporte e a Educação Física
nas FFAA?
17

Como já apontado, o problema central a ser discutido nas análises reside nas relações
estabelecidas entre as práticas esportivas e seu papel de preparo do corpo, promoção da saúde
e difusão dos preceitos da modernidade com os projetos de reestruturação desenvolvidos por
cada uma das instituições militares em atividade no período. Neste contexto, percebe-se como
importante observar como estas Forças se organizaram no início da República e como
passaram a enxergar suas funções nesta nova sociedade brasileira que se buscava construir,
destacando o papel atribuído ao esporte e à atividade física neste processo de ressignificação
de funções.

1.4 Conceitos fundamentais

Para a estruturação desta pesquisa, destaca-se a necessidade de utilização de alguns


conceitos-chave para a compreensão dos processos de desenvolvimento das práticas
esportivas na sociedade brasileira e no interior das FFAA.
O conceito de “esporte moderno” tem sido alvo de debates a fim de definir suas
origens e principais características. Não ignorando as contribuições significativas destes
debates, mas compreendendo que esta perspectiva não é o objetivo foco das propostas aqui
defendidas, esta pesquisa compreende o “esporte moderno” a partir das análises de Victor
Melo que em recente trabalho observa as diferentes fases de construção do conceito ao longo
dos séculos XIX e XX, apontando algumas características principais deste fenômeno. Melo
afirma que, no século XIX,
conforma-se um conceito moderno de esporte, marcado pelas novas dimensões
culturais relacionadas às classes médias, uma prática que, em linhas gerais, atende a
algumas características.
• Organiza-se em entidades representativas (locais, nacionais e internacionais); o
club, que se delineara nos “coffee shops” e “public houses” ingleses do século
XVIII, será a unidade fundamental de estruturação. A palavra surgiu no século XIII
e é somente no século XVII que ganhou a acepção de associação de pessoas para um
fim em comum. Os clubes se estruturaram como bases da sociedade civil, uma
forma de conformar novas identidades (de categoria, de classe, nacional, regional,
local). [...]
• Possui um calendário próprio, já não mais seguindo estritamente outros tempos
sociais ou rituais.
• Envolve um corpo técnico especializado cada vez maior (treinadores, preparadores
físicos, dirigentes, gestores, psicólogos, médicos, entre muitos outros).
• Gera um mercado ao seu redor, que extrapola até mesmo o que a princípio poderia
ser considerado específico da prática esportiva (2010b, p. 4).
18

Este perfil de organização das práticas esportivas surgiu na sociedade europeia


acompanhando as tendências de regulamentação presentes naquele momento em diferentes
espaços sociais. Estas práticas, rapidamente difundidas na Europa e em diversas regiões do
planeta onde o Velho Mundo exercia influência, traziam em suas bases características de
distinção social e modernidade, sendo assimilados e ressignificados pelos diferentes grupos
sociais. O esporte seria, então, um esforço da sociedade inglesa do século XIX de normatizar
as atividades físicas, criando os desportos, destacando a visão de estabelecimento de um
processo social onde as regras de convivência e comportamentos determinariam as etapas de
civilização alcançadas pelos indivíduos (ELIAS e DUNNING, 1992).
Este esporte é característico de uma sociedade moderna, sociedade esta que deveria ser
regulada e controlada, principalmente com relação às atividades de tempo livre, tendo como
bases, naquele momento, preocupações com a produtividade, competição, especialização das
funções, resultados, estabelecimento de regras. Estas regras, difundidas nas mais diferentes
áreas da vida dos ingleses, podem ser compreendidas como “restrições de comportamento que
permitem a vida em sociedade, controlam os interesses individuais em nome do bem comum”
(FRANCO JUNIOR, 2007, p. 25).
Sendo o esporte compreendido como uma dos elementos da dita “modernidade”
almejada pelas sociedades ao redor do globo no século XIX e início do século XX, a definição
deste conceito é vista como significativa. Este trabalho compreende a modernidade a partir
das contribuições de Norbert Elias. O conceito de modernidade, para Elias, está interligado à
sua teoria dos processos civilizadores. Ao analisar a sociedade, destaca as mudanças nas
formas de controle social, principalmente com relação a hábitos cotidianos, vestuário, práticas
corporais, aspectos da educação formal e até mesmo a relação familiar como esquemas de
distinção social através do conhecimento e utilização de determinados hábitos que se
configuravam como elementos diferenciadores. A questão principal da “modernidade” seria a
criação de uma “ordem social” com a disseminação de práticas que favorecessem novas
formas de sociabilidade, priorizando o refinamento das ações dos indivíduos com vistas ao
desenvolvimento de habilidades de respeitar as regras, de reconhecer a necessidade de um
forte autocontrole de suas ações e emoções, além da convivência em grupo e compreensão
dos espaços individuais e coletivos de atuação. Estes sistemas, associados ao processo de
complexificação das redes de interdependência entre os grupos da sociedade, seriam as chaves
para a compreensão da ideia de sociedade moderna (ELIAS, 1990).
19

Os princípios de “civilização” e “modernidade” criavam novos esquemas de distinção


social onde o reconhecimento do indivíduo ou grupo social como “civilizado” dependia de
sua capacidade de assimilar e praticar as novas normas sociais, sendo sempre criadas novas
formas de refinamento das ações ao longo do tempo como forma de manter o processo de
distinção entre os grupos.
Como afirma Philippe Ariès, a modernidade não é somente uma mudança na
sociedade que traz em suas bases uma característica de afastamento dos hábitos do passado, é
“e talvez principalmente, a consciência que se vangloria de entrar em um novo mundo. Novo a
ponto de provocar vertigem!, separado por um abismo do tempo precedente” (ARIÈS, 1994,
p. 107, grifo do autor).
Esta concepção de “modernidade” vinculada aos hábitos ordenados, novos, organizada
em torno de um Estado e com espaços sociais de atuação definidos e ao mesmo tempo
interdependentes são as aspirações de grande parte das sociedades oitocentistas no Ocidente,
mantendo-se como referência principalmente Inglaterra e França. A sociedade brasileira,
inserida no contexto de busca por assemelhação aos aspectos socioculturais e políticos
europeus, logo passou a assimilar práticas que garantissem um ar “moderno” ao país. Este
movimento foi o que Nicolau Sevcenko chamou de “febre esportiva” com a ampliação da
ideia de que o engajamento corporal seria responsável pela
realização plena do destino humano. As filosofias da ação, os homens de ação, as
doutrinas militantes, os atos de arrebatamento e bravura se tornam índices nos quais
as pessoas passam a se inspirar e pelos quais passam a se guiar. [...] Os clubes
pululam, com destaque para o futebol, mas envolvendo todos os esportes. As modas
mudam para se tornar esportivas, leves, curtas, coladas ao corpo, expondo amplas
áreas para respiração e a insolação, exibindo os músculos e formas torneadas do
físico. A modelação e o condicionamento do corpo e da mente se tornam uma
obsessão, um culto (SEVCENKO, 1998, p. 568-569)

A entrada do esporte na sociedade brasileira acompanhou estes ideais de modernidade


e, como elemento de distinção social, é primeiramente introduzida entre as atividades das
elites. Peter Burke (1991) define as elites como grupos sociais superiores definidos a partir
dos critérios de status, poder e riqueza. No caso do Brasil nesta virada do século XIX para o
XX, seguindo estes critérios, as “elites” seriam
não somente como os que detinham o poder econômico, mas também e
principalmente o poder de influenciar culturalmente o desenvolvimento da
sociedade. Nesse caso, as elites seriam constituídas tanto por proprietários dos meios
de produção quanto pelo que pode ser chamado de setores médios ou pequena
burguesia. Inicialmente, as elites eram os nobres, políticos e aristocratas ligados à
economia agroexportadora. Posteriormente, também se deve considerar a ascensão
de setores urbanos, como militares, parte da intelectualidade e industriais (MELO,
2001, p. 16-17).
20

Destaca-se esta definição principalmente por inserir entre os grupos de elite os


militares, personagens centrais das propostas de análise deste trabalho.23
As atividades desenvolvidas no interior das FFAA estruturam-se em dois pilares
básicos: hierarquia e disciplina. Apesar de o esporte ter sido inserido no quadro de atividades
das instituições militares acompanhando os ideais de modernidade, as práticas esportivas
também possuem em suas bases aspectos como disciplina, respeito às regras, controle do
corpo e trabalho em grupo. Como afirma Miller (1997), a estrutura do esporte, para que
estivesse em conformidade com os modelos comerciais e industriais estabelecidos ao longo
do século XIX, elaborou significações adicionais para as competições. As representações de
força e energia nas arenas esportivas passaram a compartilhar espaços com aspectos como
disciplina e autocontrole. Os limites de tempo e território impostos pelas determinações do
tamanho dos campos e precisão dos cronômetros passaram a determinar ênfases na
coordenação e trabalho em equipe bem ordenado. As codificações e publicações das regras
dos jogos destacam uma racionalização dos processos envolvidos no esporte, em contraponto
às ações espontâneas. O estabelecimento de hierarquias de autoridade, com os especialistas e
treinadores profissionais no topo, era o modelo de gestão comumente adotado. As afirmações
de Miller sobre o processo de estruturação do esporte evidenciam que as questões
disciplinares, o respeito às regras e a organização hierárquica também são elementos
fundamentais no movimento esportivo.
As semelhanças entre características do esporte e das atividades militares também
foram destacadas por Norbert Elias e Eric Dunning (1992) ao analisarem as disputas
esportivas como competições entre grupos, assim como nas batalhas militares, porém com uso
da violência de forma institucionalizada, regrada e direcionada. Como estes autores definem,
“a peça fulcral da configuração de um grupo envolvido no desporto é, sempre, a simulação de
um confronto, com as tensões por elas produzidas controladas, e, no final, com a catarse, a
liberação de tensão” (ELIAS e DUNNING, 1992, p. 235).
Ao serem inseridas nas FFAA, as atividades esportivas precisaram equilibrar seus
aspectos característicos hierarquia e disciplina com aqueles específicos já existentes dentro
das instituições. No desenvolvimento da pesquisa, percebeu-se a necessidade de dialogar com
estas questões disciplinares internas das FFAA que interferiram ou alteraram as configurações

23
O grupo alvo da pesquisa (militares) é composto por diferentes camadas hierárquicas: praças (soldados,
marinheiros, cabos e sargentos), suboficiais e oficiais (subalternos, intermediários, superiores e generais). A
inserção do esporte no quadro de atividades das FFAA, no entanto, foi uma iniciativa empreendida basicamente
por oficiais, sendo estes os responsáveis pelas decisões normativas e todas as instâncias de organização. Já no
âmbito da prática, os demais grupos (praças e suboficiais) eram participantes e estarão contemplados na
pesquisa, mas não compreendidos como integrantes desta “elite”.
21

iniciais das atividades esportivas. Portanto, identifica-se como importante a definição dos
conceitos de “disciplina” e “hierarquia” para a melhor elucidação destas relações.
A disciplina é neste trabalho compreendida a partir das proposições de Michel
Foucault (1984), sendo esta uma forma de poder e controle sobre o corpo que visa a sua
“domesticação”. Os corpos domesticados, ou dóceis como o autor refere, são de mais fácil
domínio e manipulação. O autor explora a concepção de poder a partir da disciplina. A
sociedade está submetida à força desta e, ao mesmo tempo, assume papel de disciplinadora,
uma vez que é utilizada para manter a ordem e a produtividade. Todas as instâncias da
sociedade buscam regular umas às outras, como um movimento contínuo e circular, onde a
disciplina e o controle assumem o papel principal de ordenadores da sociedade. No caso do
objeto desta pesquisa, a aplicação da disciplina é base de definição da estrutura das FFAA,
desde determinações comportamentais, passando pelos movimentos do corpo e até mesmo em
normas sobre vestimentas (sejam os uniformes ou as roupas fora das organizações militares).
As relações entre esporte e disciplina, utilizando a teoria de Foucault, já foram
debatidas por alguns autores. Edwards e Skinner (2001), analisando as relações de poder em
uma franquia de esporte profissional da Liga Nacional de Rugby australiana, aplicam as
concepções de Foucault sobre as questões disciplinares internas desta entidade esportiva. Os
autores afirmam que o poder disciplinador, dissolvido nas diferentes relações da sociedade,
emerge com as instituições modernas e utiliza basicamente três mecanismos: o exame, o
julgamento normatizado e a observação hierárquica. Para estes autores, estes mecanismos
poderiam ser compreendidos como uma metáfora da internalização dos mecanismos de
controle, sendo mais importante do que a vigilância dos supervisores a autovigilância aceita
pelos indivíduos e a naturalização deste processo. A atenção às regras, a cobrança por
resultados, não é somente feita pelos grupos superiores na hierarquia, mas sim, através de
tecnologias disciplinadoras (exposição de desempenhos individuais, bônus por produtividade,
exclusão de atividades, substituições), é fomentada a autocobrança e o controle sobre seus
companheiros dentro daquela mesma rede de poder.
Estes aspectos disciplinares específicos da organização esportiva e suas relações com
aqueles oriundos da estrutura militar foram alvo de análise ao longo da pesquisa. Como já
afirmado, as determinações hierárquicas também são características fundamentais tanto no
esporte como nas FFAA. A hierarquia é parte dos sistemas sociais que é utilizada como forma
de classificação e ordenamento, estabelecendo fronteiras e delimitando os espaços sociais
daqueles que determinam e daqueles que cumprem. Pode ser identificada nas mais diferentes
esferas sociais como no Estado, na religião, na família, na escola, no trabalho e também nas
22

instituições militares. No caso das FFAA, “a hierarquia é uma segmentação escalonada no


corpo do Exército que determina as possibilidades e limitações de cada indivíduo de acordo
com sua patente” (LEIRNER, 1997, p. 73). As determinações da hierarquia foram
fundamentais tanto no processo de introdução das práticas esportivas nas FFAA como nas
especificações sobre os processos de organização e participação nas atividades, como será
possível perceber ao longo deste trabalho.

1.5 Aspectos Metodológicos da pesquisa

Os novos trabalhos historiográficos na perspectiva comparada, discutindo abordagens


e métodos a serem utilizados nas pesquisas deste campo, têm ampliado as opções de olhares
sobre os objetos, destacando novas e importantes possibilidades de análise. As discussões
sobre outros “comparáveis” criam um novo campo frutífero para pesquisas comparativas
sobre sociedades e tempos afastados entre si.24
No entanto, o desenvolvimento de pesquisas comparativas de sociedades próximas é
avaliado por estudiosos da área como vantajoso já que pode
abrir a percepção do historiador para as influências mútuas, o que também o coloca
em posição favorável para questionar falsas causas locais e esclarecer, por
iluminação recíproca, as verdadeiras causas, interrelações ou motivações internas de
um fenômeno e as causas ou fatores externos. (BARROS, 2007, p. 12).

Ao iniciar uma pesquisa em História Comparada, as primeiras preocupações do


historiador devem ser a definição dos objetos e como observá-los, sendo neste caso um duplo
ou múltiplo campo de observação. O pesquisador recairá sobre duas ou mais realidades com
características distintas, necessitando repensar sua abordagem e metodologia levando em
consideração não somente semelhanças, mas também (e principalmente) as diferenças entre
estas realidades. Importante destacar que o pesquisador comparativista precisa ter em vista
que, ao observar as diferentes realidades, não se pode estabelecer qualquer delas como
“modelo”, a fim de evitar uma hierarquização na análise (BARROS, 2007).
A utilização do comparativismo em pesquisas históricas possibilita analisar o objeto a
partir de diferentes pontos de observação, deixando de lado uma visão individual, passando da
descrição para a explicação dos fenômenos históricos. Esta abordagem deve mover-se em
torno da definição de um conjunto de problemas que servem como diretriz para o olhar do
24
Um dos autores mais significativos nesta linha é Marcel Detienne, que em sua obra “Comparar o Incomparável”
defende a ampliação da ideia de comparação até então aceita nas pesquisas históricas analisando o conceito de
“comparável” na História e defendendo o rompimento dos tempos e espaços nas análises comparativas.
23

pesquisador sobre as diferentes realidades analisadas. Este enfoque também possibilita o


controle das hipóteses da pesquisa, eliminando aquelas que não se comprovaram, ampliando
as discussões sobre as que se efetivaram e apresentando novas explicações localizadas ao
longo das análises (THEML e BUSTAMANTE, 2007).
A análise histórica em perspectiva comparada pressupõe uma separação no processo
de observação dos casos a serem comparados para um melhor conhecimento dos objetos da
pesquisa. No entanto, é fundamental a observância das inter-relações entre os casos (se e
quando existirem) incorporando-os à análise como fatores que influenciaram as semelhanças
ou diferenças entre os objetos que estão sendo comparados. De acordo com Kocka (2003), os
propósitos desta abordagem podem ser categorizados em quatro grupos: 1) heurísticos,
permitindo identificar questões e problemas que não seriam percebidos em outras abordagens;
2) descritivos, ampliando a compreensão de casos específicos através do contraste com outros
casos; 3) analíticos, possibilitando a resposta a questões causais; 4) paradigmáticos, afastando
o historiador de seu ponto de observação que tem mais domínio, ocasionando a
desreferencialização do pesquisador.
Seguindo estes referenciais metodológicos, esta pesquisa baseia-se na possibilidade de
observação definida por Barros (2007) como “iluminação recíproca”, quando duas realidades
são confrontadas visando, através da acentuação de suas características fundamentais, colocar
em destaque os aspectos do outro fazendo “iluminar” as presenças ou ausências de
determinados elementos. Analisando o desenvolvimento esportivo no interior das duas
instituições militares a partir de um conjunto de problemas definido e dentro de um mesmo
recorte temporal, é possível trazer à luz as diferenças ocorridas ao longo do processo de
introdução e institucionalização da prática esportiva entre os militares. Destaca-se ainda a
relevância da História Comparada nesta análise por seu caráter heurístico e pelo processo
descritivo, defendidos por Kocka (2003), uma vez que pelo contraste das atividades
desenvolvidas pelas LEM pode-se perceber as perspectivas adotadas pelas instituições,
destacando suas inter-relações e lançando o olhar também para suas dinâmicas internas
específicas, para a compreensão das circunstâncias que motivaram seus enfoques e
abordagens.
Não perdendo de vista suas vantagens, contribuições ou limitações, é necessário
também abordar os principais problemas encontrados no desenvolvimento de uma pesquisa
comparativa. Com afirma Gortázar (1992), um dos grandes entraves encontrados pelos
pesquisadores é o acesso a fontes primárias e obras secundárias em igual proporção para os
objetos de análise. O autor afirma que “es difícil, si no imposible, disponer del tiempo, las
24

aptitudes y el conocimiento requeridos para usar com eficacia amplios conjuntos de material
de archivo en más de una cultura, a no ser que el tema de la investigación esté muy
estrictamente” (GORTÁZAR, 1992, p. 53). A afirmação do autor refere-se às problemáticas
do método comparativo, mas sua observação pode ser também aplicada ao processo de
consulta à documentação. No caso desta pesquisa, o acesso e a preservação de fontes foram os
principais problemas identificados. O conjunto documental analisado para as atividades
desenvolvidas pela Liga de Sports da Marinha (LSM) no período de 1915 a 1923 é composto
por registros de atas das reuniões de diretoria, assembleias de representantes, comunicados de
organização de competições e resultados. Documentações similares não foram localizadas
para as atividades da Liga Militar de Football (1915-1920) e para a Liga de Sports do
Exército (1920-1929). As atividades desenvolvidas pela entidade diretiva de esportes no
Exército foram identificadas e analisadas a partir de registros de correspondências e
resultados de competições integrantes das atas da LSM; menções em relatórios e boletins
ministeriais e Diários Oficiais; e a partir das publicações efetivadas no jornal “O Imparcial”,
declarado como o órgão oficial de divulgação desta entidade esportiva.25 Em contraponto à
ausência de documentações específicas sobre o esporte no EB, identificou-se maior
ocorrência de pesquisas acadêmicas e obras publicadas sobre as atividades desta instituição na
área esportiva e em suas demais atuações ao longo da História do Brasil. No aspecto
bibliográfico, a defasagem foi identificada nas publicações sobre as atividades da Marinha do
Brasil, havendo também um desequilíbrio de material disponível. Considerando este aspecto
como uma problemática reconhecida da abordagem histórica em questão, esta pesquisa
procurou minimizar as possíveis deficiências através de observações e análises qualitativas
cuidadosas sobre os materiais selecionados, levando em conta as diferenças de quantitativo
aqui apresentadas.
O Corpus documental selecionado para esta pesquisa compreende documentos de
diferentes categorias. Segundo a definição de Pinsky (2006), existem pelos menos seis
categorias de fontes: fontes documentais, fontes arqueológicas, fontes impressas, fontes orais,
fontes biográficas e fontes audiovisuais. Para esta proposta, destacamos as categorias
documentais e impressas (englobando as fontes da imprensa na compreensão da autora), pois
foram as que se apresentaram mais profícuas à pesquisa.

25
O Imparcial 01 de outubro de 1915, p. 9.
25

As fontes documentais, de acordo com Bacellar (2006), são encontradas em acervos


de arquivos públicos e privados. Nesta categoria, destacam-se os Livros Históricos do
Departamento de Esportes da Marinha; Leis e Decretos relacionados ao processo de
institucionalização das práticas esportivas e da Educação Física; Diários Oficiais da União;
Relatórios e Boletins do Ministério da Guerra e do Ministério da Marinha (1890-1923). As
publicações realizadas nos documentos acima listados que se referiam ao esporte foram
observadas a partir da concepção de que eram recortes do que o governo e as lideranças
militares desejavam que fosse a público. A preocupação, ao verificar tais fontes, era de
localizar os instrumentos utilizados para a defesa dos ideais com relação ao esporte. O foco
era a discussão das propostas e dos instrumentos e não a identificação de seus efetivos
cumprimentos.
As fontes impressas, ou fontes de imprensa, foram utilizadas com vistas a identificar
os processos de aproximação entre os militares e a prática esportiva e as medidas para
divulgação do esporte no interior das instituições. Nesta categoria, destacam-se os periódicos
institucionais: Revista Marítima Brasileira26 e Revista Militar.27 Estas publicações, apesar de
serem categorizadas como fontes de imprensa, também receberam o tratamento de fonte
institucional, uma vez que sua circulação era praticamente interna e utilizada como
instrumento de divulgação de informações, visões e propostas sobre as mais diversas
temáticas das instituições militares, inclusive assuntos esportivos. Além disso, as revistas
ilustradas Careta e Fon-Fon e o jornal “O Imparcial” foram utilizados visando identificar
como estava o processo de aproximação dos militares das práticas esportivas observando as
formas de divulgação de suas ações neste campo para o meio civil. Para o uso desta categoria
de fonte, é necessário considerar que os periódicos são produzidos por grupos sociais com
posições próprias e muitas vezes são utilizados como veículos de seus ideais. Seguindo as
sugestões metodológicas de Luca (2006), faz-se necessário observar os aspectos da
materialidade dos impressos, compreendendo quais as condições de produção vigentes na
época e as opções feitas pelos impressos analisados. A autora ainda destaca que é preciso
verificar a função social destes documentos, para que públicos se destinam, como chega aos

26
Publicação oficial da Marinha do Brasil desde 1851, editada trimestralmente com artigos de autores nacionais
e estrangeiros sobre assuntos históricos, técnicos e estratégicos até os dias atuais. Nesta pesquisa serão utilizadas
publicações do período entre 1890 e 1922.
27
Primeiro periódico científico oficial do Exército, criada em 1882 com o nome de Revista do Exército
Brasileiro com a atribuição de ser o veículo oficial do conhecimento produzido na instituição. Circulou entre
1882-1888, sendo interrompida a publicação e reiniciada em 1899 com o título de Revista Militar entre 1899-
1908. Em 1911 a publicação é retomada com o nome de Boletim Mensal do Estado Maior do Exército,
circulando até 1923.
26

leitores e que linguagens e instrumentos utilizam em sua estrutura interna para informar e
formar opiniões.28
O tratamento das fontes e a metodologia de análise no desenvolvimento de uma
pesquisa podem ter diferentes configurações. Este trabalho, seguindo a caracterização de Silva
e Menezes (2001), do ponto de vista da abordagem do problema, caracteriza-se como
qualitativo, uma vez que se propõe a compreender os fenômenos em seu contexto, de forma
descritiva, levando em conta a complexidade da relação entre objetos e meio, relação esta que
não pode ser caracterizada apenas em dados quantificáveis ou estatísticos.
Para o processo de coleta de dados, foram empreendidas pesquisas bibliográficas com
vistas a contextualizar o período analisado e pesquisas documentais para caracterizar o
processo de introdução e desenvolvimento do movimento esportivo no país e no interior das
FFAA, em suas instâncias organizacionais e normativas, assim como as abordagens adotadas.
Gil (1987) define a pesquisa bibliográfica como aquela desenvolvida a partir de fontes
secundárias, livros ou artigos científicos, publicados sobre a temática. Já a pesquisa
documental seria efetivada a partir do tratamento de fontes primárias inéditas ou revisitadas
sob novos olhares.
Os materiais relacionados anteriormente na categoria de “fontes documentais” foram
analisados a partir do método de “análise crítica de documentos”. Este método foi
empreendido em duas etapas: a crítica externa, a fim de identificar a efetiva relação da
produção com a datação do documento informada; e a crítica interna, onde é observado o
conteúdo informado na fonte, o objetivo de produção do documento, as características do
produtor e as circunstâncias em que foi produzido, além de seu público alvo (CALADO e
FERREIRA, 2005).
A definição e observação deste corpus documental, compreendendo documentos
oficiais e de imprensa, buscou coletar informações sobre o processo de organização interna do
esporte nas FFAA, através dos registros de suas Ligas Esportivas, e como as instituições
repassavam seus ideais sobre esporte e Educação Física aos seus militares, por meio de suas
“revistas institucionais”. Destaca-se também a identificação de como a imprensa da época
retratava e informava a sociedade carioca sobre as atividades destes grupos, tanto em suas
funções institucionais de defesa de território e garantia da lei e da ordem, como em questões
sociais e no campo esportivo.

28
Nas transcrições de trechos dos documentos será preservada a grafia original utilizada à época.
27

1.6 Estruturação do Trabalho

A estrutura de apresentação deste trabalho seguiu uma configuração em cinco


capítulos, sendo o Capítulo 1 com a parte introdutória e o Capítulo 5 com as considerações
finais. Os Capítulos 2, 3 e 4 dedicam-se às discussões da pesquisa. O Capítulo 2, intitulado
“As Forças Armadas e o corpo: a utilização da gymnastica nos processos de formação militar
(1890-1908)” dedicou-se a analisar os processos de intensificação das preocupações e ações
com o desenvolvimento físico dos militares e da população civil como instrumento para
criação de um povo mais forte e preparado para a defesa nacional, elemento integrante dos
projetos para a nova nação brasileira que se buscava construir com a República.
O Capítulo 3 “Uma nova estrutura para as Forças Armadas brasileiras: os impactos das
influências estrangeiras e o papel do esporte entre os militares (1908-1915)” aborda os
aspectos que fomentaram a busca por influências militares estrangeiras nos anos iniciais do
século XX que, além de ter como objetivo introduzir novas estruturas no interior das FFAA
brasileiras, contribuiu de forma direta para a ampliação da especialização do treinamento do
corpo e a aproximação com as práticas esportivas. Este trecho da pesquisa ainda discute os
fatores que fomentaram a criação das Ligas Esportivas nas FFAA no ano de 1915.
O Capítulo 4 desta dissertação, intitulado “Organização Esportiva Militar no Brasil:
uma análise comparada das ações da Liga de Sports da Marinha e da Liga Militar de Football
em seus primeiros anos de atuação (1916-1922)” procurou realizar um estudo do modelo de
liga adotado por cada uma destas instituições, seus principais objetivos e atividades
desenvolvidas em seus anos iniciais de atuação, culminando com uma análise da participação
dos militares na organização dos Jogos Esportivos do Centenário. Este evento foi a primeira
experiência em jogos multiesportivos internacionais no país e teve papel fundamental na
mudança das perspectivas de atuação das Ligas Esportivas Militares. A ação nos Jogos, tanto
em atividades na esfera de organização como no processo de concessão de atletas para a
delegação nacional, fomentou um novo movimento na Marinha e no Exército que objetivava
melhorias no processo de preparação esportiva. Estes novos objetivos propiciaram a
contratação de treinadores especializados, a criação de Escolas de Educação Física para
formação de monitores com função de divulgar as diferentes modalidades e a também a
inserção das Ligas Militares entre as entidades esportivas reconhecidas nacionalmente pela
Confederação Brasileira de Desportos.
28

2
AS FORÇAS ARMADAS E O CORPO:
A UTILIZAÇÃO DA GYMNASTICA
NOS PROCESSOS DE FORMAÇÃO
MILITAR (1890-1908)
29

No mundo moderno, a questão do treinamento é de fundamental importância para as


Forças Armadas no cumprimento de suas funções constitucionais. Para atingir a
eficácia no desempenho de suas missões, o treinamento é um importante
coadjuvante, permitindo exercitar, ao máximo, todas as tarefas a serem executadas,
antes de, realmente, entrar em ação (RIBAS, 2007, p. 55).

As preocupações com o preparo técnico e físico dos militares brasileiros ganharam


maior projeção com o advento da República. A nação brasileira que se buscava formar
deveria ser forte, treinada e pronta para se inserir no âmbito das maiores nações do planeta.
Para isso, o projeto idealizado para este novo país passava por questões de modernização que
envolviam não somente os aspectos técnicos e jurídicos, mas também os processos de
formação e preparação dos cidadãos e daqueles responsáveis pela garantia dos poderes
constitucionais, da lei e da ordem: os militares.
As Forças Armadas brasileiras participaram de forma significativa em diversos
momentos da história do Brasil. Em fins do século XIX, este grupo estava posto nas maiores
ações e discussões políticas do país, sendo personagens centrais em diversos embates travados
neste campo, além de terem desempenhado papel significativo na virada política realizada em
1889 com a queda da Monarquia e a Proclamação da República. Compreender a atuação e as
perspectivas adotadas por estas instituições neste momento é ponto fundamental para a
identificação dos interesses que motivaram maiores preocupações com o preparo do corpo,
sendo efetivadas aproximações com as atividades físicas e esportivas na virada daquele
século.
Neste ponto da pesquisa, as análises se dedicam a perceber quais foram os
motivadores das preocupações com o corpo e as medidas tomadas para a melhoria da
preparação dos militares, inicialmente através da inserção da ginástica e de alguns esportes
praticados como forma de treinamento, sem um caráter competitivo. Estas ações eram parte
integrante dos projetos de reorganização e revitalização das FFAA planejados para os anos
iniciais da República. Este esclarecimento faz-se necessário, pois ao longo deste capítulo
serão discutidos os contextos que propiciaram uma maior aproximação entre os militares e as
atividades físicas, sendo este o ponto de partida para o desenvolvimento do movimento
esportivo nas FFAA que culminaria com a fundação das Ligas Esportivas na década de 1910 e
os processos de organização de competições de forma sistemática. Para a melhor
compreensão das funções destinadas às atividades físicas dentro destes projetos maiores,
destaco também a necessidade de apresentar em linhas gerais as principais ações
desenvolvidas com objetivo de implantação de melhorias para as FFAA em suas diferentes
áreas: materiais, técnicas e de formação. A discussão dos projetos de reestruturação do EB e
30

da MB possibilita uma interpretação mais ampla do efetivo papel das atividades físicas e do
esporte entre os militares neste período inicial da República brasileira.

2.1 Os militares e a Proclamação da República: novo papel na sociedade, novas


preocupações.

Os processos que deram origem à República no Brasil já foram analisados e debatidos


por diferentes correntes ao longo do último século, cada uma delas lançando luz sobre os
personagens e acontecimentos que, segundo seu ponto de análise, possibilitavam uma melhor
compreensão dos fenômenos.29 Como afirma Emilia Viotti da Costa
a proclamação da República é o resultado, portanto, de profundas transformações
que se vinham operando no país. A decadência das oligarquias tradicionais, ligadas à
terra, a Abolição, a imigração, o processo de industrialização e urbanização, o
antagonismo entre zonas produtoras, a campanha pela federação contribuíram para
minar o edifício monárquico e para deflagrar a subversão (2010, p. 453).

Este novo perfil que se configurava no país alcançou também as FFAA com as ideias
republicanas defendidas de maneira recorrente entre alguns grupos destas instituições, sendo a
República vista como a solução para os problemas do país. Associado a este fator, a visão de
que os militares deveriam ser os verdadeiros salvadores da pátria intensificava-se desde a
Guerra do Paraguai e se ampliava nas corporações à medida que estas se institucionalizavam
(COSTA, 2010).
A participação das FFAA na Guerra do Paraguai é apontada por diversos autores como
um marco no processo de reorganização destas instituições. Nascimento (2010) afirma que,
após esta experiência militar, ficou clara a necessidade de instituir o serviço militar
obrigatório e melhorar os procedimentos de formação e preparação técnica dos soldados em
face aos constantes problemas de manuseio de materiais e grande inexperiência dos
voluntários que serviram nos combates. Neves ainda afirma que
a partir da Guerra do Paraguai (1865-70), finalmente, o Exército ganhou outra
dimensão na sociedade brasileira. A guerra contra Solano López, apesar de exitosa,
chamou a atenção para as debilidades da corporação diante de um aparato militar
modernizado como o paraguaio. Surge daí a necessidade de aparelhamento das
forças armadas segundo novos padrões de eficiência e técnicas de combate. […]
Diferentemente de países como Inglaterra e França, que àquela altura enveredavam
por um caminho industrializante, a economia nacional estava ainda inteiramente
voltada para o comércio de exportação de produtos primários e importação de
manufaturas. É nesse contexto que começam os militares a reclamar a ruptura do
modelo agrário exportador e a estabelecer a relação entre indústrias estratégicas e de
armamentos. A conscientização dos militares para o problema do “atraso” brasileiro

29
Para maiores discussões sobre estas diferentes correntes, ver COSTA, 2010.
31

alterou radicalmente o padrão de relacionamento do Exército com as elites civis do


Império. Os jovens oficiais que antes se pronunciavam sobre questões tocantes à
vida política do país – o fim da escravatura, a educação, a construção de ferrovias, a
imigração e o desenvolvimento da indústria, além da moralidade na administração
dos negócios públicos – aferravam-se agora contra o próprio regime monárquico
(2010, p. 472).

Além da nova visão sobre a necessidade de modernização das FFAA brasileiras, as


experiências nesta batalha vieram a contribuir ainda no campo da saúde e da atividade física.
Leonardo da Silva e Victor Melo (2011) analisaram os escritos do médico Eduardo Augusto
Pereira de Abreu, segundo cirurgião do Exército e filho do Comendador Plácido Antônio
Pereira de Abreu,30 que foi enviado ao Uruguai em 1865 em meio aos acontecimentos da
Guerra do Paraguai. O doutor Pereira de Abreu permaneceu por dois meses na região e
realizou extensas observações sobre os soldados no front que renderam uma obra onde
detalhava e discutia aspectos que lhe pareciam significativos. Um dos aspectos trabalhados foi
a questão do preparo do corpo dos soldados, discutido em texto específico “Estudos
higiênicos sobre a educação física, intelectual e moral do soldado: escolha do pessoal para a
boa organização do nosso Exército” do ano de 1867. Neste trabalho o doutor defende o
estabelecimento de exames para o afastamento dos que tivessem estrutura física não
qualificada para a atividade militar, priorizando o corpo saudável e o treinamento, pontos
fundamentais para o bom soldado em sua visão. Pereira de Abreu ainda defendia a utilização
da ginástica como instrumento de “preparação física e manutenção do vigor”, além de “ser
capaz de proteger os adolescentes dos ‘hábitos ociosos’, e enfatizava sua relação com a
educação de um jovem que, viril e fisiologicamente sadio, estaria pronto para servir à pátria”
(SILVA e MELO, 2011, p. 344-345).
As dificuldades enfrentadas na guerra possibilitaram avaliações em diferentes aspectos
das atividades militares brasileiras. Vidigal, discutindo as principais consequências para o
poder naval brasileiro ao final do conflito, aponta que
Dos cerca de 160 mil brasileiros que tomaram parte na guerra, 50 mil perderam a
vida e cerca de mil ficaram inválidos. Da mesma forma que em outros conflitos no
século XIX, as altas taxas de mortalidade foram uma consequência das péssimas
condições de higiene reinantes e da má alimentação das tropas, facilitando a
propagação de doenças que, mais que os combates, causaram os óbitos. […]
Infelizmente, o avanço tecnológico na construção naval que teve lugar durante o
conflito não teria continuidade, já que as dificuldades financeiras do País impediram
que a Esquadra se renovasse. O Brasil não acompanhou as mudanças que tiveram
lugar no resto do mundo e veria, a partir do fim da Guerra do Paraguai, o seu Poder
Naval se deteriorar inexoravelmente, o que só iria se reverter com a efetivação do
Programa Naval de 1906 (2009, p. 13).

30
“Plácido Antônio Pereira de Abreu - barbeiro de dom João VI, criado de quarto de dom Pedro I, tesoureiro da
imperatriz Leopoldina” (SILVA e MELO, 2011, p. 338).
32

A necessidade de ampliação e melhor treinamento dos militares evidenciada pelas


experiências no Paraguai motivou a busca por recrutamento de homens nos chamados Tiros
de Guerra, associações civis onde técnicas de tiro ao alvo eram treinadas e passaram a ser
utilizadas como uma “reserva” para o Exército. Como afirma Nascimento, “já em 1896 criou-
se a Confederação Brasileira como forma de aproximar os jovens das classes média e alta do
serviço militar” (2010, p. 9).
Para que se possa compreender a dinâmica das FFAA e seu papel no processo de
Proclamação da República, vê-se necessária uma caracterização destas instituições naquele
momento, identificando quem são seus integrantes, como são organizadas e que papel
garantiam diante da sociedade brasileira do período.
O Exército Brasileiro, no início do século XIX, preservava ainda a estrutura do
Exército Português que tinha seu oficialato composto basicamente por jovens nobres. No
entanto, ainda na década de 20 daquele século, para que fosse possível sua sobrevivência, foi
necessário que se relaxassem os critérios de nobreza passando a ser incorporados também
como cadetes “os filhos de oficiais das forças de linha, das milícias, das ordenanças e de
pessoas agraciadas com o hábito de ordens honoríficas” (CARVALHO, 2006, p. 16). Ao
longo do século XIX, esse processo se intensificou e o recrutamento passou a ser realizado
entre os descendentes dos próprios oficiais, entre grupos de renda mais baixa e posição social
mais modesta.
Não existem bons dados sobre a origem social dos oficiais durante a Primeira
República. Mas, das várias biografias e autobiografias publicadas, pode-se perceber
que a quase totalidade dos líderes tenentistas, por exemplo, era proveniente de
famílias pobres. [...] Alguns, como os Távora, confessadamente entraram para o
Exército como o único caminho disponível para continuarem os estudos, dada a
insuficiência das rendas familiares (CARVALHO, 2006, p. 17).

Se entre o oficialato do Exército as posições sociais foram gradativamente de nobres


para as camadas de rendas mais baixas, entre as praças a predominância sempre foi de
indivíduos pobres. Em 1913, Leitão de Carvalho afirmou que os principais integrantes das
fileiras do EB ainda eram “a) nordestinos afugentados pelas secas; b) os desocupados das
grandes cidades que procuravam o serviço militar como emprego; c) os criminosos mandados
pela polícia; d) os inaptos para o trabalho. Era, segundo ele, uma seleção invertida”
(CARVALHO, 2006, p. 20).
Nas primeiras décadas do século XX, surgiu um movimento dentro do EB que tinha
por principal objetivo programar ações para modernizar a instituição e melhorar a qualidade
de seus recursos humanos. Este grupo ficou conhecido como “Jovens Turcos” e apresentava
fortes influências europeias, já que a maioria havia acompanhado o Exército Alemão entre os
33

anos de 1906 e 1912 em estágio. Uma das principais defesas deste grupo era o
estabelecimento do sorteio militar, entre todos os grupos sociais, como forma de melhorar a
qualidade dos integrantes da instituição seguindo modelos europeus que já utilizavam esta
ferramenta (CARVALHO, 2006).
O caso da Marinha do Brasil foi um pouco diferente no que se refere ao recrutamento
de oficiais. Apesar de também existirem dados precários, verifica-se um caráter mais
acentuado com relação à nobreza. Durante o Império, a Marinha prosseguiu com parâmetros
de recrutamento muito similares aos estabelecidos no regulamento da Academia Real de
Marinha, de 1782, que determinava que os candidatos a guarda-marinha deveriam ser fidalgos
ou filhos de oficiais da Marinha ou do Exército. Esta realidade se estendeu até a Primeira
República, quando Tobias Barreto, em 1917, afirmou que “as famílias ricas queriam fazer dos
filhos doutores em direito, medicina ou engenharia, e, fora isso, só talvez oficial da Marinha”
(CARVALHO, 2006, p. 19).
Já no caso das camadas mais baixas da hierarquia militar, o caso naval não era muito
diferente do Exército. A composição básica dos marinheiros, como afirmado em Relatório do
Ministério da Marinha de 1911, tanto no Corpo de Marinheiros Nacionais como as escolas de
Aprendizes Marinheiros, era de presos pela Polícia enviados para serem recrutas
(CARVALHO, 2006).
Além da composição das FFAA, outro fator interno foi importante no envolvimento
dos militares no processo de Proclamação da República: a formação destes oficiais. As
preocupações com a intelectualidade no Exército, por exemplo, eram crescentes na década de
1880, sendo esta geração de oficiais, no geral, mais instruída que as anteriores e com carreiras
construídas basicamente em áreas urbanas. Os escalões superiores, no entanto, eram
compostos basicamente por “veteranos da Guerra do Paraguai que se sentiam depreciados
pelo regime e pela sociedade – até os alunos das escolas militares e os oficiais subalternos
ridicularizavam suas medalhas de guerra” (MCCANN, 2009, p. 28-29).
34

As ideias republicanas encontravam, neste momento, maior difusão entre os jovens


oficiais e alunos da Escola Militar, enquanto a Monarquia ainda era defendida nos escalões
superiores. Por não ter ainda uma missão claramente definida, o processo de formação nas
escolas do Exército era focado em humanidades e ciências teóricas, deixando as práticas
militares em plano significativamente inferior. Estes currículos não proporcionavam a
formação de uma força profissional e os militares oriundos deste processo, ao concluir o
curso, comumente requeriam ser chamados de “doutor” ou “doutor tenente”, enfatizando
muito mais sua formação em bacharel em matemática ou ciências físicas e naturais do que a
condição de militar. O que a Escola formava, na realidade, eram bacharéis de farda e não
militares prontos para desempenhar as funções de defesa do território e garantia da lei e da
ordem. Ao lado destes jovens bacharéis-oficiais, havia outro grupo de militares de patentes
mais altas e mais velhos, chamados de “tarimbeiros”, veteranos da Guerra do Paraguai ou das
guerras internas, e muitos sem curso na Escola Militar (CARVALHO, 2006; COSTA, 2010;
MCCANN, 2009).
Como afirma Carvalho,
se Benjamin Constant e Euclides da Cunha eram exemplos do primeiro tipo de
oficial, Deodoro era a personificação do segundo.
As relações entre os dois grupos eram difíceis. Deodoro dizia que seu único
benfeitor fora Solano Lopez, a quem devia sua carreira militar; os bacharéis, ao
contrário, adeptos do pacifismo positivista, desprezavam as façanhas bélicas e
consideravam a Guerra do Paraguai um desastre. [...] Unia, no entanto, os dois
grupos, a farda. O esprit de corps era, por certo, muito mais desenvolvido entre os
tarimbeiros do que entre os bacharéis. Na Questão Militar, toda calcada na alegação
dos “brios feridos” da corporação, a iniciativa foi dos tarimbeiros. Mas os bacharéis
de farda, embora algo apaisanados, se viram forçados a aderir à corporação como
único ponto de apoio disponível diante de sua marginalização social (2006, p. 26).

No caso da Marinha do Brasil, o treinamento era em parte semelhante ao Exército. O


predomínio de ensino das ciências teóricas e matemáticas também era presente na Escola
Naval. No entanto,
lá não houve a invasão positivista, fator de mobilização política na Escola Militar.
[...] Além disso, os alunos da Escola Naval eram submetidos a isolamento físico
muito maior. De 1867 a 1882, por exemplo, a escola funcionou a bordo de um
navio. A partir desse último ano, foi transferida para a Ilha das Enxadas [RJ] onde
permaneceu até 1938. Para seus alunos era quase impossível invadir as ruas da
cidade sempre que houvesse agitações políticas, como faziam os colegas do Exército
(CARVALHO, 2006, p. 26).
35

Duas outras entidades foram importantes no processo de disseminação das ideias


republicanas entre os militares: o Clube Naval e o Clube Militar.31 O primeiro foi criado em
1884 com a união de 26 oficiais sobre a presidência do Capitão-de-Fragata Luis Felipe
Saldanha da Gama. Os objetivos do Clube Naval eram possibilitar um local onde os oficiais
da Marinha pudessem se reunir para estudo e realizar exercícios físicos a fim de melhorar o
manejo de armas.32 Neste ambiente, as ideias abolicionistas e republicanas tiveram espaço e
tomaram corpo, tal como ocorreu no Clube Militar, criado em 1887. No entanto, este segundo
não era uma instituição exclusiva de Força, sendo definido como suas finalidades
§1º) Estreitar os laços de união e solidariedade entre os oficiais das diferentes
classes do exercito e da marinha; §2º) Desenvolver o gosto pelo estudo dos diversos
ramos da instrução profissional, por meio de palestras e conferências militares;§3º)
Defender pela imprensa e junto aos poderes do Estado os direitos e legítimos
interesses da classe militar (CASTRO, 1995, p. 127).

Estes clubes se tornaram terreno fértil para as aspirações da oficialidade subalterna que
retornou da Guerra do Paraguai “consciente de sua importância na vida nacional, estava
desolada com a corrupção que permeava a vida pública e com o descaso com que era tratada,
e mostrava disposição para a ação política, sentindo-se incumbida de uma missão salvadora”
(MOURA, 2007, p. 22).
Como foi possível perceber, o perfil e as influências presentes nas FFAA naquele
momento foram decisivos para suas ações no movimento político pela República. Um fator
também significativo para a adesão, especificamente de alguns do grupo de tarimbeiros, foi o
processo de punições impostas a militares que se posicionaram publicamente contra algumas
políticas do governo imperial e o não cumprimento da retirada das acusações por parte do
Ministério da Guerra, mesmo com a ordem do Imperador. Estas tensões internas na instituição
fomentaram grande insatisfação com o ministério e com o governo, gerando um movimento
que visava derrubar o então Gabinete imperial, mas de forma alguma tinha em pauta por fim à
Monarquia. De acordo com McCann,

31
A criação de clubes, associações profissionais, religiosas, foi uma tendência no século XIX. Como mostra
Sevcenko (1998), nos anos iniciais da República brasileira já eram identificados clubes de música, como o Clube
das Violetas, clubes esportivos de futebol e de automóveis. Na virada para o século XX, já se registrava a criação
de associações cientificas, religiosas, culturais, recreativas, desportivas, profissionais, de classe, beneficentes
com diferentes objetivos. Após a fundação das associações, deveriam ser realizadas reuniões para elaboração de
estatutos para reger suas atividades (JESUS, 2007). Seguindo este movimento de criação de associações, os
militares fundaram os clubes Naval e Militar.
32
O Clube Naval foi fundamental no processo de criação da Liga de Sports da Marinha, no ano de 1915, doando
não somente sua sede para a realização de reuniões como fez empréstimos para que a entidade pudesse iniciar
suas atividades. Este processo será debatido no Capítulo 4 desta dissertação.
36

a República nasceu de uma contradição. Como um ato ilegal, de traição, pode criar
uma ordem política legal e segura? O artigo 15 dos artigos de guerra do Exército
determinava o enforcamento como punição por motim ou traição e inclusive por ter
conhecimento de tais atos e não os impedir. Portanto, os oficiais e praças que
participaram dos acontecimentos de 15 de novembro de 1889 haviam decidido
transgredir a lei que governava suas vidas. Muitos testemunhos indicam que a
intenção inicial, sem dúvida a de Deodoro da Fonseca, era substituir o gabinete
imperial em exercício, mas, antes de encerrar-se o dia, Deodoro foi manipulado para
que proclamasse a República. O relato usual afirma que ele vacilou até o último
instante (2009, p. 36).

Grupos que defendiam a República identificaram nesta crise entre os militares um


importante espaço para a realização de um movimento para a derrubada da Monarquia.
Apesar das divisões e dos conflitos internos, os militares tiveram a representatividade
progressivamente ampliada ao longo da segunda metade do século, principalmente após a
Guerra do Paraguai e passaram a ser compreendidos como importantes peças neste processo
para a República, deixando-se de lado os estranhamentos entre civis e militares em prol deste
objetivo. Como afirma Emilia Viotti da Costa (2010), os grupos republicanos eram
desorganizados e pouco articulados e, sem o suporte dos militares, não teriam força política
para efetivar o movimento. Seguindo estas perspectivas,
em 11 de novembro, Rui Barbosa, Benjamim Constant, Aristides Lobo, Bocaiúva,
Glicério e o coronel Solon reuniram-se na casa de Deodoro com o fito de convencê-
lo a tomar partido. Mais uma vez, civis e militares conspiravam juntos contra o
trono. Em 15 de novembro de 1889 a Monarquia era derrubada por golpe militar e
proclamava-se a República (COSTA, 2010, p. 491).

Para que o movimento fosse possível, foram conjugadas forças de três grupos
principalmente: parte do Exército, fazendeiros do Oeste Paulista e integrantes das camadas
médias urbanas. Estes grupos, historicamente, demonstravam interesses e visões distintas
sobre questões políticas e econômicas. Uniram-se em torno de um objetivo comum, mas suas
divergências logo se manifestariam no processo de estabelecimento do novo regime político,
marcando os primeiros anos da República com grandes turbulências. Esta República brasileira
foi categorizada como consequência de uma crise do projeto de sociedade baseado “nos
interesses materiais e na visão de mundo das classes ligadas à agricultura escravista e
exportadora e de seus aliados no comércio, finanças e burocracia, e sintetizado no Estado
monárquico centralizado” (LEMOS, 2006, p. 1).
Construído sobre contradições, tentando equilibrar interesses políticos e econômicos
de grupos distintos, o movimento republicano encontrou nas FFAA sua efetiva possibilidade
de concretização. A aspiração por mudanças, mas com permanências estrategicamente
pensadas garantiu entre os militares a transição de regime político sem grandes
transformações econômicas ou sociais. Como afirma Lemos,
37

ainda que divididas, as Forças Armadas se tornaram um ator político protagonista


tanto por seu papel institucional de garantia de uma transição isenta de ameaças
revolucionárias quanto pelo envolvimento de muitos de seus membros no processo
político prático. Se entendida como um importante episódio da modernização
capitalista tardia da sociedade brasileira, a implantação da ordem republicana surgira
concentrada na definição de um novo formato de Estado, capaz de garantir a unidade
nacional sem violentar na raiz a força dos focos de poder regionalizados. Na falta de
um partido político de âmbito nacional ou de instituições que fizessem a mediação
entre os diversos setores postulantes à direção política do país, as Forças Armadas
cumpriram esse papel (2006, p. 1-2).

Enfim concretizada a partir do movimento de 15 de novembro de 1889, a República


dos Estados Unidos do Brasil passava ao controle dos militares que, com o poder em mãos,
não se mostravam dispostos a se desfazer dele em prol dos interesses civis. No interior das
próprias instituições militares este poder gerou uma onda de ideias de que estes poderiam agir
e intervir quando achassem necessário. Este ideário originou rebeliões em quartéis,
regimentos e escolas, por diferentes motivações, além de conflitos internos entre generais,
entre generais e almirantes, entre a polícia e o Exército. O equilíbrio destas tensões internas e
externas demoraria ainda algum tempo a se estabelecer (CARVALHO, 1987; COSTA, 2010).
No governo provisório estabelecido após a proclamação, Deodoro da Fonseca assumiu
o cargo de Presidente da República se mantendo até 1891. O período inicial da República foi
bastante conturbado entre os militares gerando severos descontentamentos e entraves. Os
conflitos entre as Forças envolviam, além de questões de opção política, medidas
administrativas que beneficiavam as instituições de forma desequilibrada. “O governo
republicano aumentara os soldos militares de forma desigual, promovera oficiais do Exército
em número maior do que na Marinha, afora os cargos políticos que contemplaram os
primeiros muito mais do que os segundos” (CUNHA, 2011, p. 2).
O projeto de nação idealizado pelo EB envolvia uma perspectiva nacional. Como
afirma Cunha (2011, p. 2), apesar de ter seus contingentes fundamentalmente no Rio de
Janeiro e Rio Grande do Sul, “a presença do Exército era sentida por todo o país e, pouco a
pouco, incorporou a visão fundamentadora de seu papel, ademais o de mantenedor da unidade
territorial, num quadro de formação do Estado-Nação”.
No caso da Marinha, os projetos de modernização gerados a partir das aspirações
republicanas não eram únicos ou coesos e apresentavam tanto “continuidades como
descontinuidades, bem como diferentes visões, e os ideais republicanos de modernidade,
muitas vezes, somente existiam em discursos e modelos” sendo valorizados mais os aspectos
materiais do que de pessoal (ALMEIDA, 2010, p. 148).
38

Característica fundamental para a estrutura das FFAA, as questões disciplinares foram


alvo de discussão já no início do Governo Provisório sendo lançada atenção por parte dos
ministros militares. Empreendendo tentativas de modernização da legislação judiciária militar,
“foi baixado (16/11/1889) decreto que aboliu os castigos corporais na Marinha e reduziu o
tempo de serviço militar obrigatório. As duas medidas buscavam eliminar tradicionais focos
de insatisfação entre os marinheiros” (LEMOS, 2006, p. 2-3). Em contrapartida, com vistas a
“desestimular aventuras subversivas, foi baixada (23/12/1889) uma medida que ameaçava os
indivíduos que conspirassem contra a República e o seu governo com julgamento por uma
comissão militar e punição por crime de sedição” (LEMOS, 2006, p. 3).
No entanto, as ações de “suavização” dos castigos disciplinares não agradou aos
oficiais da Marinha do Brasil. Lemos ainda aponta que
a pressão de oficiais levou o Governo a rever a abolição dos castigos físicos e a criar
a Companhia Correcional (12/4/1890). Considerava-se que “o castigo severo” era
“uma necessidade reconhecida e reclamada por todos os que exercitam a autoridade
sobre o marinheiro”. A nova unidade da Marinha se destinava a isolar e punir
sumariamente marinheiros de “má conduta habitual” em casos que não exigissem a
formação de Conselho de Guerra, primeira instância da Justiça Militar. As sanções
previstas iam de “prisão e ferro na solitária, a pão e água”, a “chibatadas”. O
objetivo era “corrigir” o praça no prazo de três meses, findo o qual ele retornaria à
sua unidade de origem. Se resistisse a corrigir-se, sofreria “maior castigo que os
combinados no presente regulamento”, o qual ficaria “ao prudente arbítrio do
comandante”, portanto, por fora das instâncias formais da Justiça Militar (2006, p. 3-
4).

O aspecto disciplinar no interior dos navios ainda era um tema de atenção e debates
pois, com os processos de modernização das estruturas navais empreendidas após a Guerra do
Paraguai e a introdução de navios a vapor com operação mecânica, passou-se a necessitar de
mão de obra com maior especialidade, algo difícil na Marinha por suas características de
composição já anteriormente discutidas. Discutindo a disciplina militar, Adriana Bellintani
argumenta que
a disciplina é um dos aspectos doutrinários que mantém a força coesa, permitindo
que o poder hierárquico não seja quebrado. Está diretamente relacionada à
obediência e à servidão militar; ela é o élan de sustentação da estrutura militar […]
Não há disciplina sem submissão, independentemente de ser tempo de paz ou de
guerra; em qualquer circunstância, as ordens são acatadas pelos subordinados de
acordo com o grau da cadeia hierárquica (2009, p. 137).

Este sentido de submissão característico da disciplina militar era o argumento utilizado


para a imposição dos castigos corporais, uma vez que as tripulações dos navios eram
compostas comumente por indivíduos com histórico de problemas de comportamento. O
trabalho realizado nos navios a vela, tradicionais na Marinha do Brasil até fins do século XIX,
exigia “verdadeiros ‘homens fera’ recrutados tradicionalmente pela polícia e ‘adestrados’ por
uma disciplina rigorosa que compreendia diferentes formas de castigos corporais”
39

(ALMEIDA, 2010, p. 148). No entanto, com a mecanização e necessidade de maior


especialização no treinamento, estes “homens fera” foram substituídos por um novo tipo de
pessoal, oriundo comumente das Escolas de Aprendizes Marinheiros e com aversão às
medidas disciplinares de castigo corporal. A resistência dos altos escalões em aceitar o fim
destas antigas práticas somado às aspirações de melhores condições de trabalho e rendimentos
por parte deste novo perfil de marujo, com melhor formação técnica e intelectual, culminaria
em uma rebelião que marcou a história da Marinha do Brasil: a Revolta da Chibata ou Revolta
dos Marinheiros do ano de 1910.
A necessidade por melhorias materiais passou a ser mais evidente após as dificuldades
enfrentadas na Guerra do Paraguai, mas estes investimentos não foram imediatos. Com a
República, as reclamações por maiores investimentos por parte dos Ministros da Marinha se
intensificaram, ano após ano, em seus relatórios ministeriais. Assim,
o final do século inaugura uma retomada dos investimentos na Armada brasileira.
Dotar a República de uma Marinha poderosa, que garantisse visibilidade ao país e a
presença de sua bandeira no exterior, além de um lugar hegemônico na América do
Sul e a defesa do território nacional, torna-se uma necessidade primordial, sobretudo
durante o período em que Rio Branco ocupa o Ministério das Relações Exteriores
entre 1902 e 1912 (ALMEIDA, 2010, p. 150).

As preocupações em se tornar a grande potência militar na América do Sul se


justificavam, já que países como Argentina e Chile passaram a intensificar seus investimentos
em material bélico e em assemelhar suas estruturas a de grandes potências militares europeias
(ALMEIDA, 2010; NASCIMENTO, 2010).
O processo de profissionalização dos militares brasileiros somente se intensificou a
partir das influências estrangeiras no século XX, notadamente da Missão Militar Francesa de
1919, apesar de tentativas constantes de estabelecimento do serviço militar obrigatório33 e de
reformas desde a década de 1870. A adoção de missões estrangeiras para reformar e
modernizar a estrutura material e de pessoal das FFAA não foi uma exclusividade do Brasil.
Em fins do século XIX e início do século XX as grandes potências militares do período,
especialmente França e Alemanha, voltaram suas atenções para a América Latina
identificando potenciais mercados para sua indústria bélica. Argentina e Chile receberam
grupos de militares alemães com objetivos de modernização desde a década de 1880, já no
Brasil, após uma disputa34 entre defensores da influência alemã e francesa, optou-se pela
segunda no final da década de 1910 (LUNA, 2007; NASCIMENTO, 2010).

33
O Serviço Militar Obrigatório estabelecido somente em 1916 apesar de este instrumento ser previsto já na
Constituição de 1891 e de a Lei do Serviço Militar Obrigatório datar de 1908 (NASCIMENTO, 2010).
34
Estas disputas serão discutidas ainda neste Capítulo 2.
40

O processo de modernização das Forças Armadas idealizado para a República passava


também por questões ligadas à formação e ao ensino. O Colégio Militar foi criado em 1889
em meio às transformações pelas quais passava o Exército objetivando uma especialização do
processo de profissionalização dos militares com a ampliação e diversificação do ensino.
Como afirma Cunha (2011, p. 1), o Exército passou a assumir “o papel de prover o ensino
secundário aos jovens que quisessem seguir a carreira das armas, em virtude da pouca
qualificação de seu efetivo”. Esta instituição teria ainda como função principal incutir “na
infância brazileira o gosto pelas armas”.35 De acordo com seu regulamento aprovado pelo
Decreto N°. 371 de 02 de maio de 1890, o curso seria composto por 16 disciplinas
envolvendo aspectos teóricos e práticos. O artigo 24 do regulamento ainda destacava que
Art. 24. Além das disciplinas que foram especificadas, o curso do collegio
comprehenderá o ensino das seguintes materias: educação moral, direitos e deveres
do cidadão e do soldado, noções praticas de disciplina, economia e administração
militar, nomenclatura e manejo de armas em uso, tiro ao alvo, esgrima e evoluções
das tres armas, desde a escola do soldado até a do batalhão, do esquadrão e da
36
bateria, natação gymnastica e musica.

Como é possível perceber através deste trecho do documento, os interesses na criação


desta instituição de ensino envolviam não somente incutir o gosto pelas armas, mas
efetivamente iniciar um processo de preparação de verdadeiros “cidadãos-soldados”,
inserindo inclusive um tópico onde seus direitos e deveres fossem claramente identificados. A
união das duas figuras (o cidadão e o soldado) em um só tópico de ensino possibilita a
percepção de que neste momento, para os militares, não haveria distinção entre elas. Todo
bom cidadão seria, por consequência, um soldado em potencial pronto a defender a nação em
momento de necessidade. Vale destacar que havia ainda outro fator nesta associação soldado-
cidadão: a masculinidade. Neste momento, o papel da mulher na sociedade não permitia sua
participação em nenhuma das duas instâncias. Nas FFAA era vetada a entrada de mulheres,
não sendo esta capaz de ser “soldado”; na vida política também não havia espaço garantido,
uma vez que não era previsto o voto feminino, limitando sua cidadania. Portanto, todo
cidadão seria sim um bom soldado, desde que fosse homem.

35
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra, 1890, p. 22.
36
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra, 1890, anexo 93-94 (grifo meu).
41

No processo de preparação destes novos indivíduos, não somente o ensino teórico era
priorizado. As preocupações com o corpo forte e preparado eram expressas a partir da
inserção das disciplinas de gymnastica e natação no programa do Colégio.
Este argumento do soldado-cidadão era um importante instrumento de afirmação
militar e seria utilizado ao longo dos primeiros anos da República para a defesa das melhorias
na preparação dos militares. Este novo militar, mais preparado e ativo politicamente era o
desejo principal das FFAA ao assumir o comando da República brasileira sendo uma das
bases de seus projetos para a nova nação.
As reformas nos processos de ensino alcançaram também as Escolas Militares já
existentes no país. A justificativa para esta reformulação dos currículos foi apresentada por
Deodoro da Fonseca e Benjamin Constant no texto que introduz o regulamento que reorganiza
as escolas do Exército.
O Generalissimo Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisório dos
Estados Unidos do Brazil, constituído pelo Exercito e pela Armada em nome da
Nação:
Considerando que é de urgente e indeclinavel necessidade aperfeiçoar e completar,
tanto quando possível, o ensino nas escolas destinadas a instrucção e educação
militar, de modo a attender os grandes melhoramentos da arte da Guerra conciliando
as suas exigencias com a missão altamente civilisadora, eminentemente moral e
humanitaria que de futuro está destinada aos Exercitos do continente sul-americano;
Considerando que o soldado, elemento de força, deve ser de hoje em diante o
cidadão armado, corporificação da honra nacional e importante cooperador do
progresso como garantia da ordem e da paz publicas, apoio intelligente e bem
intencionado das instituições republicanas, jamais instrumento servil e maleavel por
uma obediencia passiva e inconsciente que rebaixa o carater, aniquila o estimulo e
abate a moral;
Considerando que, para perfeita comprehensão deste elevado destino no seio da
sociedade, como o mais solido apoio do bem, da moralidade e da felicidade da
patria, o militar precisa de uma succulenta e bem dirigida educação scientifica que, o
preparando para com proveito tirar toda a vantagem e utilidades dos estudos
especiaes de sua profissão, o habilite, pela formação do coração, pelo legitimo
desenvolvimento dos sentimentos affectivos, pela racional expansão de sua
intelligencia, a bem conhecer seus deveres, não só militares como, principalmente
37
sociaes.

Este documento apresenta as principais visões a respeito do papel dos militares nesta
nova sociedade, compreendidos como uma missão civilizadora, moral e humanitária,
expandindo inclusive esta “missão” para os demais Exércitos do continente. Este novo
Exército, com outras funções políticas e sociais buscava imprimir a ideia de que cada cidadão
deveria ser (e se ver) como um soldado honrando a pátria, sendo o processo de capacitação e
preparação fundamental para o fortalecimento das instituições militares. Esse novo ensino
deveria contemplar a mudança deste “soldado força” para o “cidadão armado”, consciente de
seus deveres e direitos e não “instrumento servil e maleável por uma obediência passiva e
37
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra, 1890, anexo, p. 33.
42

inconsciente”. No entanto, apesar do discurso defender esta conscientização e abandono desta


“obediência passiva”, no interior das instituições militares, em todas as esferas, a disciplina
sempre foi um ponto fundamental do estabelecimento das ações, como foi debatido
anteriormente. O uso da força e dos castigos corporais ainda eram discussões em pauta no
século XX. Alguns artigos do Código Disciplinar da Armada de 1890 proibiam, por exemplo,
34 - Representar contra qualquer punição antes de cumprir o castigo que lhe tiver
sido imposto; […]
38 - Dirigir aos superiores representações ou manifestações collectivas;
39 - Discutir, pela imprensa, assumptos attinentes á disciplina militar, ou altercar,
por esse meio, com outro ou outros militares;
40 - Autorizar, promover ou assignar petições collectivas entre militares;
41 - Tomar parte em jogos de parada ou azar;
42 - Fazer commercio qualquer que elle seja;
43 - Casar-se: o official - sem prévia communicação ao seu commandante, e as
38
praças - sem que este lhe haja concedido licença.

Como o texto do Código afirma o “militar cidadão”, consciente, sem obediência


passiva, não poderia se defender de uma punição antes de cumprir a pena; não poderia discutir
questões relacionadas à disciplina; não poderia se unir com outros companheiros para pleitear
solicitações coletivas; além de também não poder se casar sem ser autorizado. Este é um
exemplo das muitas contradições e incoerências neste período inicial da República brasileira.
Contradições estas que também serão identificadas nas análises das relações com o esporte.
Fica claro, no entanto, que as aspirações dos militares residiam em uma maior
aproximação dos civis de suas atividades a fim de engrossar suas fileiras e, através de
melhorias técnicas e de formação, fortalecer as instituições.

38
BRASIL. Decreto n°. 509 de 21 de junho de 1890. Crêa o Codigo Disciplinar para a Armada.
43

2.2 Para um soldado mais forte e preparado, uma formação melhor: medidas para
reformulação do processo de treinamento dos militares brasileiros.

Benjamin Constant, participante ativo no movimento republicano, assumiu no


Governo Provisório a pasta do Ministério da Guerra e, logo após ser substituído em 1890 por
Floriano Peixoto, a do Ministério da Instrução Pública, Correios e Telégrafos. Nesta segunda
função, idealizou uma reforma no ensino que ficou conhecida como Reforma Benjamin
Constant que tinha como
princípios orientadores [...]: liberdade e laicidade do ensino e gratuidade da escola
primária. A organização escolar estruturava-se da seguinte forma:
a) escola primária organizada em dois ciclos: 1º grau para crianças de 7 a 13 anos; 2º
grau para crianças de 13 a 15 anos;
b) escola secundária com duração de 7 anos;
c) ensino superior reestruturado: politécnico, de direito, de medicina e militar
(PALMA FILHO, 2005, p. 50).

O Ministro, além de sistematizar os diferentes níveis de ensino, buscava defender o


espaço das aulas de gymnastica e exercícios militares nos dois ciclos da escola primária, com
exigência da existência de um ginásio para exercícios físicos e pátio para jogos. Estabelecia
também a gymnastica como item do currículo da Escola Normal, órgão responsável por
fornecer os docentes para a escola primária. O ensino secundário seria responsabilidade do
Gymnasio Nacional que também garantia espaço curricular destinado às atividades ginásticas,
evoluções militares e esgrima durante os sete anos de ensino.39
A intensificação das preocupações com o espaço da atividade física, através da
destinação de espaços curriculares no cotidiano educacional tanto nas instituições militares
como em meio civil, estava inserido no projeto maior de formação de um povo mais forte e
preparado para defender sua nação. Este momento, no entanto, foi um período de
intensificação das ações. As relações dos militares brasileiros com a prática da gymnastica e
de esportes datam de meados do século XIX, quando estas atividades passaram a fazer parte
dos currículos de formação das escolas militares.
As escolas de formação de oficiais das duas Forças, ainda em meados do século XIX,
já haviam estabelecido a obrigatoriedade da prática de atividades físicas e esportivas de forma
regular. Conforme Decreto n°. 2.116, de 01 de março de 1858 que aprovou o regulamento que
reformava a Escola Militar da Corte, a Escola de Aplicação do Exército e a Escola de
Infantaria e Cavalaria da província de São Pedro do Rio Grande do Sul, os alunos dos cursos

39
BRASIL. Decreto n°. 981 de 08 de novembro de 1890. Approva o Regulamento da Instrucção Primaria e
Secundaria do Districto Federal.
44

teriam em seus ensinos práticos aulas de tiro, equitação militar e “hipiátrica”, natação e
esgrima.40 No mesmo ano, o Decreto n°. 2.163 de 01 de maio reorganizou a Academia de
Marinha tornando-a Escola de Marinha e dentre suas reformulações curriculares, inseriu como
item comum do currículo aos aspirantes de todos os anos a prática de esgrima uma vez por
semana, ginástica uma vez por semana e natação duas vezes por mês e aos domingos antes da
missa.41
Após o ano de 1858, quando se empreendiam
modificações e reestruturações das escolas militares, sempre foi explicitamente
considerada a necessidade de ensino e prática de atividades físicas, o que sem
sombra de dúvida tornou as Forças Armadas pioneiras em tal preocupação. A
valorização dos exercícios físicos, provavelmente pela sua utilidade na manutenção
da boa forma do combatente e pela crença de que era de utilidade na
disciplinarização da tropa, não é somente observável nas Forças Armadas brasileiras
(MELO, 2007c, p. 114).

Percebe-se a aproximação dos militares não somente das atividades ginásticas, mas
também de práticas que possibilitassem o desenvolvimento de habilidades fundamentais para
o exercício militar no período, práticas que posteriormente passariam a ser realizadas também
em caráter esportivo como a natação, a esgrima e a equitação. Este processo acompanhou um
movimento crescente na sociedade brasileira no século XIX com preocupações com a saúde e
a higiene. Como afirmam Silva e Melo
nos primeiros anos do século XIX, as cidades brasileiras - entre elas o Rio de
Janeiro, a capital – apresentavam condições deficientes de saneamento e eram
constantemente agredidas por epidemias. A partir do segundo quartel da centúria,
em meio às crescentes preocupações com a saúde, uma das iniciativas foi o
aperfeiçoamento da formação do médico e a reformulação da Faculdade de
Medicina do Rio de Janeiro. Entre as inovações, implementou-se a exigência de
apresentação de teses para a concessão do título de doutor. Algumas dessas teses se
debruçaram sobre a educação física, que ainda não era concebida como disciplina
escolar, constituindo antes um conjunto de cuidados ligados à higiene, à puericultura
e também, de forma geral, à prática de atividades físicas. Manoel Pereira da Silva
Ubatuba, em 1845, apresentou o trabalho Algumas considerações sobre a educação
física; no ano seguinte, Joaquim Pedro de Mello defendeu a tese Generalidades
acerca da educação física dos meninos; em 1852, Antonio Francisco Gomes
submeteu a julgamento Influência da educação física do homem; e, no decorrer do
século XIX, muitos outros exemplos poderiam ser citados (2011, p. 2).

O aumento das atenções com as questões relacionadas com a educação physica neste
momento do século XIX envolvia conjunto de ações englobando higiene e atividades físicas.
No entanto, a partir de meados do século tais atividades foram gradativamente incorporadas
aos currículos das principais instituições de ensino do país, sendo iniciado este processo pelas

40
BRASIL. Decreto n° 2.116, de 01 de março de 1858. Aprova o Regulamento reformando os da Escola de
aplicação do exercito e do curso de infantaria e cavalaria da Província de S. Pedro do Rio Grande do Sul, e os
estatutos da Escola Militar da Corte.
41
BRASIL. Decreto n° 2.163, de 01 de maio de 1858. Reorganiza a Academia de Marinha em virtude da
autorização concedida no parágrafo 3º. do artigo 5º. da Lei n. 862 de 30 de julho de 1856.
45

escolas de formação militar. A defesa pela ampliação desta disciplina no sistema de ensino ao
longo daquele século baseava-se nos benefícios que as atividades físicas sistematizadas
trariam para o corpo e mente dos jovens. No meio militar, esta defesa era reforçada pelas
observações dos cuidados de instituições militares de outros países com os processos de
preparação do corpo dos combatentes, considerando os exercícios físicos como um dos
melhores instrumentos para a manutenção da forma e da disciplina das tropas. Este “olhar”
para o estrangeiro trouxe diversas influências para a estruturação da educação física no Brasil.
A adoção do método alemão de ginástica pelo Exército Brasileiro ainda no século XIX e a
tradução para o português do “Novo guia para o ensino da ginástica nas escolas públicas da
Prússia” no ano de 1870 pode ser citado como um dos exemplos destas influências. Com o
crescimento da prática da ginástica nas instituições militares ao longo do oitocentos, muitos
de seus membros passaram a atuar no meio civil como instrutores de ginástica nas escolas,
uma vez que ainda não existiam escolas de formação em Educação Física no país naquele
momento e os militares eram os principais promotores destas práticas no Brasil (SILVA e
MELO, 2011).
As discussões sobre a necessidade de intensificação na educação física em meio civil
iniciaram-se ainda no Império, com as propostas de Rui Barbosa em 1882 ao apresentar o
projeto nº. 224 “Reforma do Ensino Primário e Várias Instituições Complementares da
Instrução Pública”, onde defende a criação de uma escola de formação de professores de
Ginástica. Segundo Rui Barbosa,
a ginástica não é um agente materialista, mas, pelo contrário, uma influência tão
moralizadora quanto higiênica, tão intelectual quanto física, tão imprescindível à
educação do sentimento e do espírito quanto à estabilidade da saúde e ao vigor dos
órgãos. Materialista de fato é, sim a pedagogia falsa, que, descurando o corpo,
escraviza irremissivelmente a alma à tirania odiosa das aberrações de um organismo
solapado pela debilidade e pela doença. Nessas criaturas desequilibradas, sim, é que
a carne governará sempre fatalmente o espírito, ora pelos apetites, ora pelas
enfermidades (BARBOSA, 1946, p. 80).

Em outro trecho de sua obra, Barbosa afirma que a ginástica seria


fundamental para a reconstituição de um povo cuja virilidade se depaupera, e
desaparece de dia em dia a olhos vistos, é, ao mesmo tempo, um exercício
eminentemente, insuperavelmente moralizador, um germe de ordem e um vigoroso
alimento da liberdade. Dando à criança uma presença ereta e varonil, passo firme e
regular, precisão e rapidez de movimento, prontidão no obedecer, asseio no
vestuário e no corpo, assentamos insensivelmente a base de hábitos morais,
relacionados pelo modo mais íntimo com o conforto pessoal, e a felicidade da futura
família; damos lições práticas de moral, talvez mais poderosas do que os preceitos
inculcados verbalmente (BARBOSA, 1946, p. 98-99).
46

Os discursos de Rui Barbosa defendiam a educação física como um elemento


formador de caráter, de moral, disciplinador e instrumento fundamental para a formação de
um povo produtivo e ordenado. Os benefícios da educação física, então, foram mais
frequentemente divulgados como um dos caminhos para criação do povo forte, saudável e
equilibrado que republicanos e militares almejavam.42
Mesmo com a proposta desde 1882, a ampliação das atividades ginásticas no ensino
brasileiro intensificou-se nos anos finais do século XIX. Para ilustrar este processo, em 1890
(ano da Reforma de Ensino Benjamin Constant) a disciplina de “gymnastica e natação” ou
somente “gymnastica” foi identificada como parte integrante do currículo da Escola Militar da
Capital, Escola Militar do Ceará, Escola Militar do Rio Grande do Sul, Colégio Militar,
Escola de Artífices do Arsenal de Guerra do Pará, Corpo de Marinheiros Nacionais, Escola
Naval, Gymnasio Nacional, Escola Normal, Escola Mixta da Quinta da Boa Vista, Escola
Mixta de Santa Cruz, Instituto Nacional dos Cegos. Todas estas instituições possuíam em seu
corpo docente a vaga de instrutor de ginástica, função corriqueiramente desempenhada por
militares neste período mesmo nas instituições civis de ensino.43

42
“É a partir da defesa que faz esse político brasileiro, que o discurso sobre a ginástica sueca ganha visibilidade.
Rui Barbosa era defensor do método de Ling também porque nele estavam inseridos a formação moral, higiênica
e disciplinadora, além de ser uma prática científica, já que era constituída de pesquisas nas áreas de fisiologia,
anatomia e biologia. O papel da ginástica tocava em quatro importantíssimos pontos sociais: o higiênico, o
moral, o estético e o econômico. Respeitados como leis, esses pontos deviam estar em equilíbrio numa sessão de
ginástica, pois favoreceriam a harmonia do corpo humano” (MORENO, 2003, p. 57).
43
BRASIL. Diário Oficial da União de 26 de janeiro de 1890, seção 1, p. 9; BRASIL. Diário Oficial da União de
05 de fevereiro de 1890, seção 1, p. 1; BRASIL. Diário Oficial da União de 19 de maio de 1890, seção 1, p. 1-4;
BRASIL. Diário Oficial da União de 21 de maio de 1890, seção 1, p. 1-7; BRASIL. Diário Oficial da União de
21 de maio de 1890, seção 1, p. 8; BRASIL. Diário Oficial da União de 24 de maio de 1890, seção 1, p. 3;
BRASIL. Diário Oficial da União de 31 de maio de 1890, seção 1, p. 1-9; BRASIL. Diário Oficial da União de
12 de agosto de 1890, seção 1, p. 4; BRASIL. Diário Oficial da União de 23 de agosto de 1890, seção 1, p. 8;
BRASIL. Diário Oficial da União de 28 de setembro de 1890, seção 1, p. 8; BRASIL. Diário Oficial da União de
06 de dezembro de 1890, seção 1, p. 1-7.
47

2.3 Primeiras atuações na divulgação esportiva: os militares, o remo e o turfe.

Os militares incorporaram as práticas esportivas não somente como parte de seus


treinamentos funcionais. Algumas modalidades eram corriqueiramente praticadas por oficiais
e praças tanto do Exército como da Marinha, estando alguns inclusive envolvidos nos
processos de divulgação e organização destes esportes.
Membros da Marinha, especificamente da Armada, por exemplo, foram importantes
para difusão e organização do remo na sociedade carioca. Antes mesmo dos primeiros clubes
de regatas surgirem, a Marinha já organizava competições entre seus militares (MELO,
2007c). Esta prática passou a ser defendida como integrante do projeto de modernização da
sociedade e concebida como uma “estratégia de controle corporal e de adequação da
população aos novos valores que estavam sendo forjados” (MELO, 2010a, p. 42). Esta
atividade, disseminada entre diferentes grupos sociais, era ressignificada por cada um deles,
alcançando desde elites às camadas populares. Como afirma Melo,
parece mais produtivo considerar que houve um processo de interpenetração e
circularidade cultural. Se algo das representações encaminhadas pelas elites foi
incorporado pelas camadas populares, também os dirigentes dos clubes tiveram que
considerar e se adequar a certas solicitações populares, mesmo que não se deva
negar o quão fortes foram as ações de controle de difusão de símbolos (2010a, p.
43).

A intensificação da prática do remo na sociedade carioca acompanhou um movimento


crescente de busca por hábitos saudáveis e modernos ao ar livre, em contraponto às atividades
“desorganizadas” e “confusas”, sempre como tentativa de associar o novo, o moderno, à
ambiência republicana. A defesa da disciplina, do controle e da ordenação social fazia parte
do projeto de país moderno que se idealizava após a República, integrando-se de forma
efetiva aos ideais militares de nação. Neste novo perfil de sociedade que se buscava construir,
alguns esportes ganharam maior projeção por serem manifestações que garantiam o controle
do corpo, da mente e das emoções, itens entendidos como fundamentais nos indivíduos
integrantes de uma sociedade moderna e desenvolvida do final do século XIX.
A cidade do Rio de Janeiro, como sede do governo imperial e, após a República,
capital federal do Brasil, foi a porta de entrada da maioria das influências europeias, inclusive
as práticas esportivas. Suas características de cidade litorânea favoreceram a introdução e
difusão, principalmente, das atividades ligadas ao mar como o remo, o hábito de tomar banhos
de mar e a natação. Posteriormente, as práticas de iatismo também ganharam projeção na
cidade. Outros sports ligados às elites aristocráticas brasileiras já se configuravam bastante
difundidos no século XIX no Rio de Janeiro. Desde meados daquele século, o turfe já se
48

apresentava organizado e com modelos fixos de competição. Os páreos realizados nos


hipódromos atraiam atenção de grande parcela da sociedade, incluindo muitos apostadores, já
que uma das características da prática era o jogo de apostas. As arquibancadas dos
hipódromos, separadas de acordo com os grupos sociais, estavam sempre cheias na cidade do
Rio de Janeiro, pioneira na atividade, e diversas outras como São Paulo, Belém, Curitiba,
Porto Alegre, Recife, Juiz de Fora, Campos, Pelotas e Petrópolis (MELO, 2007c).
A ampliação da prática esportiva na sociedade criou um movimento de
reconhecimento social. Não somente praticar o esporte tornou-se símbolo da civilidade, mas
também a ação de participar assistindo às competições ganhou status nesta sociedade.
Passaram a ser reais encontros sociais com regras rígidas de conduta, vestimenta e etiqueta,
seguindo os padrões de “sociedade civilizada”. Um dos esportes que garantia estas
características era o turfe, que se manteve como o principal esporte ao longo de quase todo o
século XIX, entrando em certo declínio na virada do século. O primeiro clube exclusivamente
esportivo fundado na cidade do Rio de Janeiro era um clube de turfe, fundado em 1849 após
dois anos de discussões com o nome de “Club de Corridas”. No entanto, este não foi o
primeiro contato da população carioca com as corridas de cavalo. Desde a década de 1810
imigrantes ingleses que vieram acompanhando a Família Real Portuguesa instituíram a prática
na Praia de Botafogo, atividade já habitual na Inglaterra. Existem registros de corridas de
cavalo a partir desta década, destacando-se que em 1825 a prática já se encontrava bastante
difundida. A institucionalização da atividade, no entanto, só se iniciou a partir da iniciativa do
grupo criador do Club de Corridas, entre eles militares como Major Suckow e Luiz Alves de
Lima e Silva, então Conde de Caxias e atualmente Patrono do Exército Brasileiro. No final do
século XIX o turfe chegou a ter cinco hipódromos funcionando simultaneamente na cidade do
Rio de Janeiro, o que denota a grande aceitação da prática (MELO e MAIA, 2005).
As atividades desenvolvidas nos hipódromos e suas características esportivas eram
observadas pelos militares do Exército e passaram a ser utilizadas até mesmo como analogias
para a explicação de atividades profissionais. O Alferes Enéas P. Pires publicou um artigo na
Revista Militar em 1904 intitulado “Combate de cavallaria contra a infantaria”. No
documento, o militar discutia a necessidade de melhor organizar as fileiras de atiradores e de
evitar a queda dos cavalos. Para exemplificar sua explanação, afirmava que “este phenomeno
é facilmente observado nos hyppodromos; ahi o temos visto por varias vezes, e nem o jockey
e nem o próprio cavallo puderam evital-o”.44 O uso de termos e elementos específicos do

44
PIRES, Enéas P. Combate de cavallaria contra infantaria. Revista Militar, ano VI, 1904, p. 166.
49

esporte para ilustrar situações do cotidiano militar pode ser destacado como um importante
sinal da aproximação que ocorria neste final do século XIX e início do século XX entre os
militares e as práticas esportivas.
A importância da montaria e dos cavalos era significativa no século XIX, o que
explica em parte essa grande aceitação. Este era o principal meio de transporte nas cidades,
seja de pessoas ou produtos. Ao longo do século XIX, especialmente na década final, o
processo industrial fez crescer as modificações nas zonas urbanas introduzindo processos de
urbanização e sanitarização que englobavam em suas propostas a ampliação das ruas,
melhorias nas redes de esgoto e abastecimento de água e introdução de meios de transporte
mais eficientes e confortáveis (ARAUJO, 1995).
A busca por “novos ares” para a cidade, com ruas mais largas, áreas amplas e praças
que favorecessem a circulação de ar e melhoria das condições higiênicas da cidade, foi o
principal objetivo em fins do século XIX. A introdução de linhas de ferrovia que ligavam a
área central da cidade às freguesias mais distantes como Queimados e Sapopemba (atual
Deodoro) favoreceu um fluxo de ocupação dos subúrbios em regiões cortadas por tais
transportes, gerando um afastamento dos grupos mais pobres das áreas centrais, após a
extinção dos cortiços, para estas áreas da cidade. Além do trem, outro meio de transporte que
mudou significativamente a dinâmica da cidade foi o bonde. Este transporte ligava diferentes
regiões da cidade ao centro, principalmente as áreas das zonas central e sul da cidade, já neste
momento ocupadas preferencialmente pelos grupos mais abastados. Este transporte garantiu
um acesso mais rápido e regular, tornando estas regiões pontos bastante procurados para fins
de lazer e divertimento (ABREU, 1987).
Com a introdução destes novos meios, os transportes utilizando animais,
principalmente os cavalos, perderam sua significância nesta nova sociedade. Como aponta
Melo sobre os cavalos,
se no século XIX ele era fundamental como meio de transporte e para carregamento
de produtos, a chegada da eletricidade o substituiu, a ele relegando, na cidade, um
espaço único como forma de diversão. Quando as cidades começam a se modernizar
e desenvolver uma cultura tipicamente urbana, os cavalos passam a ser símbolos
muitas vezes incômodos de um passado rural (2007c, p. 155).

Nesta nova sociedade onde se valoriza a saúde, a higiene e os bons hábitos, as


atividades físicas e esportivas ao ar livre passaram a ganhar mais espaço. Uma área da cidade,
favorecida pela ligação ao Centro por meio do bonde, passou a ser a grande busca de famílias
de diferentes grupos sociais no final do XIX. A zona sul e suas praias, propícias aos banhos
de mar, tornaram-se ponto de encontro principalmente nos finais de semana ampliando-se a
50

prática ao longo do século XX. Na primeira década deste século, os banhos de mar figuraram
quase que semanalmente nos periódicos de circulação na cidade que tratavam de assuntos
sociais. Em diversas edições da revista Careta45 do ano de 1908 encontramos inúmeras
páginas dedicadas a relatar as atividades das famílias cariocas nas praias da zona sul.
Assim como o turfe, o remo também iniciou seu processo de institucionalização com a
criação de diferentes clubes. No Rio de Janeiro, desde meados do século XIX, surgiram clubs
de regata que promoviam seus “páreos” (utilizando a mesma nomenclatura do turfe para suas
competições), nas regiões litorâneas da cidade.46
Estes dados nos destacam o perfil de organização e ampliação destas práticas
esportivas na cidade do Rio de Janeiro em fins do século XIX e início do século XX. As
diferentes modalidades, após o estabelecimento, passaram por processos de normatização e
institucionalização que acompanhavam as tendências de ordenação presentes em diferentes
setores da sociedade. Nesse processo de sistematização das atividades físicas e introdução de
atividades esportivas, podemos destacar que o esporte que contou com grande atuação na MB
no processo de difusão na cidade do Rio de Janeiro foi, sem dúvida, o remo.

45
O periódico Careta foi criado por Jorge Schmidt e identificado desde sua primeira edição em 06 de junho de
1908 como uma publicação da “Kosmos”, outra revista circulante à época criada pelo mesmo Jorge Schmidt em
1904 de apresentação requintada e conteúdo erudito e destinada a um público mais restrito por seu alto custo de
2.000 reis. A Careta seria um projeto oposto à Kosmos com trato e diagramação mais simples e temáticas
destinadas a um público mais geral, alcançando a diferentes grupos sociais por seu preço mais acessível de 300
reis (DIMAS, 1983 apud NOGUEIRA, 2010). No ano de 1908 seu preço semanal para a capital era de 300 reis e
demais estados de 400 reis. A assinatura anual custava 15.000 reis e a semestral, 8.000 reis. Como evidência de
seus objetivos de maior alcance na sociedade, o editorial da primeira edição da Careta de 06 de junho de 1908
definia a revista como uma publicação direcionada “ao Público, ao grande e respeitável Público com “P”
grande”. A revista circulou entre 1908 e a década de 1980 com períodos de interrupção nos anos 60 e 70. No
período analisado, a revista era publicada em preto e branco, tinha em torno de 36 páginas e apresentava sempre
em sua capa uma caricatura de personalidade da política ou da sociedade brasileira. Logo após, seguia-se uma
sequência de 04 a 05 páginas de anúncios, muitos com fotogravuras ou ilustrações com grande apelo visual. Essa
sequência de páginas integrais destinadas aos anúncios se repetia ao final das edições, com a reserva de mais
uma média de 05 páginas para este fim. (Anúncios dos mais diferentes artefatos do cotidiano: roupas, chapéus,
sapatos, águas perfumadas, óleo de fígado de bacalhau, xarope contra coqueluche, espartilhos, tecidos, apólices
de seguro, fósforos, líquido para limpeza dos dentes, tônicos, relógios, sabonetes, pianos). Como afirma
Nogueira (2010, p. 63) “a revista ilustrada Careta marcou época não somente por ser representativa de uma
cidade que se queria símbolo de modernidade, mas por ser a própria publicação representante da evolução
técnica que mudaria de certa forma os paradigmas do jornalismo literário do momento em questão”.
46
As primeiras tentativas datam de 1862, quando surgiram o grupo Regata e o British Rowing Club, este
composto basicamente por ingleses residentes na cidade. Entretanto, a primeira associação estruturada ligado ao
remo foi criada em 1867: o Club de Regatas. Deste ano até o final do século, surgiram mais inúmeros clubes
ligados à prática: Club de Regatas Guanabarense (1873); Club Náutico Saldanha da Gama (1876); Paquetaense
(1884); Cajuense (1885); Internacional (1887); Union des Canotiers e Fluminense (1892); Club de Regatas
Botafogo, Grupo de Regatas da Escola Militar, Club de Regatas Luiz Caldas, Sul Americano e Veteranos do
Remo (1894); Gragoatá, Icaraí e Flamengo (1895); Natação e Regatas (1896); Boqueirão do Passeio (1896);
Caju (1897); São Cristóvão e Vasco da Gama (1898); Guanabara (1899); Náutico e Internacional de Regatas
(1900) (MELO, 1999).
51

De acordo com Licht et al (2005), existem registros de realização de regatas a remo na


Baía de Guanabara desde o ano de 1851, promovidas por membros da aristocracia. No
entanto, a partir de 1862 iniciaram-se competições de remo organizadas pela Marinha do
Brasil. Neste ano foram realizadas duas regatas na Enseada de Botafogo com a participação
de diferentes tipos de barcos. A realização de regatas promovidas pela Marinha passou a se
expandir não somente no Rio de Janeiro, mas também em outras áreas onde estava presente e
atuante no país. No ano de 1863 foram realizadas regatas na enseada de Botafogo, além da
Regata Imperial, em 1865, com assistência do Imperador D. Pedro II no Rio Grande-RS, em
comemoração à rendição do General Estigarriba durante a Guerra do Paraguai. Neste
momento “deve ser considerada como relevante a adesão de importantes personalidades da
Armada (Marinha), que passaram a exaltar o remo como uma prática louvável” (MELO,
2001, p. 67).
Com a chegada dos militares no poder após a República, este esporte ganhou mais
destaque entre as instituições e as regatas passaram a ser realizadas com maior frequência pela
MB, como nos anos de 1892, em homenagem ao Almirante Barroso, e 1893, em benefício das
vítimas do Encouraçado Solimões (GARRIDO e LAGE, 2005; SOEIRO, 2003).
Em 1895 ocorreu uma tentativa de criação de uma entidade representativa dos clubes
de remo, com a união dos clubes Botafogo (1894), Union de Cantioners (1892), Luiz Caldas
(1894), Gragoatá (1895) e Icarahy (1895) para este fim. No entanto, os dois primeiros anos
foram sem atividades pela inexperiência dos envolvidos e baixa adesão de clubes. No ano
seguinte, o Clube Naval iniciou um processo de organização de provas de remo a partir da
criação de um estatuto e código de regatas para o campeonato de remo do Rio de Janeiro
(MELO, 2007c, p. 157).
A partir de 31 de julho de 1897, sob a presidência do Capitão-Tenente da Marinha do
Brasil Eduardo Ernesto Midosi, oficializou-se a criação da União de Regatas Fluminense, com
a entrada de outros três clubes: o Clube de Regatas do Flamengo (1895), Grupo de Regatas
Praia Vermelha (1896) e Veteranos do Remo (1894). Esta instituição regulamentadora
posteriormente se tornaria o Conselho Superior de Regatas com a finalidade de organizar os
clubes de regatas existentes no Rio de Janeiro.47 No ano seguinte, em 05 de junho de 1898,
realizou-se o “Primeiro Campeonato Náutico Brazileiro”, na enseada de Botafogo – RJ,
organizado pela União de Regatas Fluminense tendo em sua plateia o presidente da República
Prudente de Moraes (LICHT et al, 2005, p. 213).

47
PORTO, Santos. O sport náutico no Brazil. Revista Marítima Brazileira. 2o. Semestre de 1901, p. 6-19.
52

A União de Regatas Fluminense, três anos após sua fundação, passou por uma
reformulação e teve alterada sua nomenclatura para Conselho Superior de Regatas (02 de
março de 1900). Essa mudança ocorreu por uma tentativa de dominar as sociedades de
regatas, controlando a organização do remo. O código do Conselho Superior de Regatas
apontava que seus objetivos eram representar o Sport náutico brasileiro, defendendo seus
interesses e promovendo seu engrandecimento. Propunha a abrangência do código a todos os
clubes de regatas existentes no país, desde que suas propostas fossem integralmente aceitas.
No entanto, com a existência de outras instituições regulamentadoras do esporte em outros
estados, como o Comitê de Regatas do Rio Grande do Sul, criado em 1894, e clubes que não
manifestavam interesse em ter um Conselho regulamentador fora de seus estados, esta
tentativa de unificação do controle do remo não teve o sucesso esperado pelos idealizadores.
No entanto, esta tentativa persistiu com a alteração em 29 de novembro de 1902 de seu nome
para “Federação Brazileira de Sociedades de Remo”, reforçando a perspectiva unificadora do
remo nacional almejado pela instituição carioca (REEBERG, 2007). Este esporte foi apontado
como um dos significativos no processo de criação de entidades regulamentadoras do esporte
no país. De acordo com Victor Melo “se o turfe estabeleceu pioneiramente os parâmetros do
que deveria ser a organização esportiva, o remo reformulou-a e aperfeiçoou-a” (2007c, p.
140).
O então Capitão-Tenente Eduardo Ernesto Midosi dirigiu a entidade de 1897, sua
efetiva fundação, até 1906. Seguiram-se na presidência inúmeros representantes militares,
tanto do Exército como da Marinha, ressaltando a significância destes grupos para o fomento
da organização esportiva no Brasil. Em 1906 ocorreu também a criação do Yacht Club
Brazileiro, com o auxílio da Marinha do Brasil, que fez despontar outro importante esporte
marítimo: o iatismo. Sua influência no desenvolvimento do esporte e do clube foi direta,
sendo inclusive seu primeiro Comodoro48 o então Ministro da Marinha, Almirante
Alexandrino Faria de Alencar, que criou uma competição com seu nome a fim de chamar a
atenção dos jovens praticantes para as “coisas do mar” (ALMEIDA, 1997; GARRIDO, 2007).
Como foi possível destacar até aqui, Marinha do Brasil e Exército Brasileiro
participaram do processo de regulamentação de modalidades esportivas no Rio de Janeiro.
Suas atuações, através de oficiais engajados na causa esportiva, contribuíram para a
divulgação das práticas auxiliando na difusão dos esportes entre o público em geral. Muitas
praças e oficiais das FFAA passaram a se envolver na prática esportiva competitiva,

48
Equivalente a um diretor ou presidente.
53

inicialmente fora de suas organizações militares, já que não existia até meados da década de
1910 nenhuma entidade esportiva no interior das instituições militares.
Neste ponto faz-se necessário o destaque de uma contradição identificada ao longo da
pesquisa. O Exército Brasileiro tem, desde sua formação, como uma das armas mais
tradicionais a Cavalaria. A equitação, portanto, foi prática corriqueira entre seus militares
desde o início da formação da instituição por motivos já pontuados, mas que merecem nova
menção. Os cavalos eram o principal meio de transporte no século XIX e, inclusive em
combates militares, eram ainda largamente utilizados no Brasil. Em meio civil, no entanto, a
equitação e a propriedade de animais de grande porte eram atividades ligadas à aristocracia
rural, principalmente pelos altos custos de manutenção e tratamento dos animais. Como foi
comentado no início desta parte no processo de caracterização das FFAA brasileiras no
período em análise, o EB era composto basicamente por camadas menos abastadas da
sociedade e mais próximas do cotidiano citadino. Os membros da aristocracia, ao buscar o
militarismo, comumente direcionavam-se para a Marinha do Brasil.
O remo, atividade extremamente ligada à cidade e aos critérios “modernos”
defendidos à época, teve maior aproximação e aceitação por parte dos militares da MB,
muitos inclusive envolvidos na organização da modalidade e competidores em clubes no meio
civil desde meados do século XIX. Identifica-se, portanto, uma “inversão” nas aproximações
com as modalidades esportivas: integrantes do Exército, relacionados ao cotidiano da cidade,
ligaram-se ao turfe e à equitação, atividades típicas da aristocracia rural; enquanto isso, os
militares da Marinha, comumente aristocráticos, aproximaram-se do remo, esporte do
ambiente urbano. Esta breve explanação sobre as aproximações com modalidades esportivas
distintas por parte de cada uma das instituições militares demonstra apenas um espectro das
inúmeras contradições que compunham a sociedade brasileira neste momento.
54

2.4 Tensões políticas e busca constante por reformas: as Revoltas da década de 1890 e os
projetos de melhorias para as FFAA.

Os anos iniciais da República Brasileira, apesar de fecundos no campo das propostas


de melhoria e tentativas de estabelecimento de novos paradigmas de modernidade para o país,
no campo político foram caracterizados por intensas disputas entre as elites. Os tênues
objetivos em comum que uniram estes diferentes grupos no momento de proclamação da
República, passaram a necessidades bastante distintas após a finalização do movimento. As
disputas por espaço e representatividade marcaram o Governo de Deodoro. Suas medidas de
concessão de privilégios a colegas de farda contrariavam tanto os militares da Marinha, que
aspiravam por mais espaço político, como os civis que temiam o estabelecimento de um
governo militar ditatorial (COSTA, 2010).
Neste quadro de instabilidade política, aproximava-se o fim do Governo Provisório e
as eleições previstas para 1891 para escolha de presidente e vice-presidente pelo Congresso.
O então presidente Deodoro da Fonseca verificou o declínio de sua popularidade com a
manifestação de muitos opositores que acabaram por indicar Prudente de Morais para a
presidência e Floriano Peixoto para vice. No entanto, entre os militares havia apoiadores que
defendiam que Deodoro assumisse o governo a força, caso outro candidato fosse escolhido.
Ao lado de Deodoro, candidatava-se para vice o Almirante Eduardo Wandenkolk, que foi
derrotado. Após ter sido eleito pelo Congresso e tendo como Vice Floriano Peixoto, Deodoro
buscou equilibrar as tensões, mas seus opositores mantinham-se atuando intensamente. Então,
sentindo-se pressionado,
no dia três de novembro de 1891, deu um golpe, fechou o congresso e decretou
estado de sítio, a fim de neutralizar qualquer reação e tentar reformar a Constituição,
no sentido de conferir mais poderes ao executivo. Seu empreendimento foi um
fracasso. Na manhã do dia vinte e três de novembro, a esquadra, revoltada sob o
comando do contra-almirante Custódio de Melo, intimou o governo a depor-se.
Deodoro não resistiu e passou o poder ao Marechal Floriano Peixoto, vice-
presidente da República (ALMEIDA, 2004, p. 196).

Este movimento empreendido pela Esquadra ameaçava bombardear a cidade do Rio de


Janeiro e tinha objetivo de pressionar a saída de Deodoro do cargo. Ficou conhecido como
primeira Revolta da Armada, sendo a segunda realizada pouco tempo depois, no ano de 1893.
Com a renúncia do presidente, o Vice Floriano Peixoto assumiu o cargo, mas o
ambiente político não melhorou e o governante encontrou muitas resistências. Como
“antídoto” para estes constantes embates, o novo presidente adotou a postura dura, irredutível,
que o fez ficar conhecido como “Marechal de Ferro”. Existiam grandes opositores do
55

Marechal entre os grandes escalões militares. No entanto, Floriano


com toques nacionalistas e populares, […] angariou o apoio da jovem oficialidade e
da população urbana da capital para as suas propostas modernizadoras, que previam
a reestruturação do sistema bancário, o estímulo à indústria, a construção de estradas
de ferro e a expansão da educação – quase todas contrariadas pelas oligarquias
políticas dos grandes proprietários (NEVES, 2010, p. 474).

Os problemas de Floriano, mesmo com o apoio popular, não finalizaram e as


divergências se manifestavam em diferentes grupos, inclusive dentro de seu partido
(Republicano Paulista), composto por muitos cafeicultores paulistas que não viam com bons
olhos sua postura autoritária, e também entre os militares. Um de seus maiores oponentes era
o Almirante Wandenkolk (candidato a vice-presidência que perdeu o cargo para Floriano) que
não reconhecia o direito do Vice-Presidente assumir o governo e exigia a convocação de
eleições imediatas sob a pena de seu grupo se mobilizar para realizar um novo golpe. Como
tentativa de amenizar esta efervescência política, defendia-se a realização de novas eleições
presidenciais. No entanto, a tentativa não se concretizou e Floriano se manteve na Presidência
até 15 de novembro de 1894 (ALMEIDA, 2004; MCCANN, 2009; NEVES, 2010).
O governo de Floriano Peixoto enfrentou muitos problemas políticos internos em
grande parte ocasionados por sua postura inflexível. Suas ações criaram “dissensão e rancor
nas fileiras republicanas. Sua insistência em depor todos os presidentes dos estados, que
haviam apoiado Deodoro na crise de novembro, desencadeou a violência regional em muitas
partes do país” (MCCANN, 2009, p. 51).
Um dos mais importantes conflitos ocorreu no sul do país por questões de sucessão ao
governo e se prolongou por mais de dois anos e ficou conhecida como Revolução Federalista.
No entanto, o conflito de maior destaque no governo Floriano foi a chamada segunda Revolta
da Armada. Membros das FFAA, insatisfeitos com a permanência de Floriano do poder
contrariando uma determinação da Constituição Federal49 redigiram em 1892 o “Manifesto
dos Treze Generais”, documento onde 13 oficiais generais50 da Marinha e do Exército
exigiam que Floriano deixasse a presidência e que novas eleições fossem realizadas. Floriano
reagiu rapidamente mandando prender alguns e reformar outros alegando insubordinação por
parte dos militares (MCCANN, 2009; SILVA e ARIAS NETO, 2010).
49
“Art. 42 - Se no caso de vaga, por qualquer causa, da Presidência ou Vice-Presidência, não houverem ainda
decorrido dois anos do período presidencial, proceder-se-á a nova eleição”. BRASIL. Constituição da República
dos Estados Unidos do Brasil, 24 de fevereiro de 1891.
50
Oficiais signatários do documento: Marechal José de Almeida Barreto, Vice-Almirante Eduardo Wandenkolk,
General de Divisão José C. de Queirós, General de Divisão Antônio Maria Coelho, General de Divisão Cândido
José da Costa, Contra-Almirante José Marques Guimarães, General de Brigada João Nepomuceno de Medeiros
Mallet, Contra-Almirante Dionísio Manhães Barreto, General de Brigada Dr. João Severiano da Fonseca,
Contra-Almirante Manuel Ricardo de Cunha Couto, General de Brigada João José de Bruce, General de Brigada
José Cerqueira de Aguiar Lima, General de Brigada João Luís de Andrade Vasconcelos (MARTINS, 1995).
56

Em meio a esta crise, o então Ministro da Marinha Almirante Custódio de Mello,


renunciou ao cargo e iniciou um movimento para forçar a saída de Floriano tendo apoio de
outros membros da Marinha como Luis Felipe Saldanha da Gama, diretor da Escola Naval.
Como afirma McCann (2009, p. 56) “em 06 de setembro de 1893, véspera do dia da
independência, os conspiradores do almirante Mello tomaram quinze navios de guerra e nove
embarcações comerciais e tentaram, sem êxito, cortar o acesso ao Rio pela Estrada de Ferro
Central do Brasil”. Floriano, no entanto, não se preocupou com as ameaças da revolta, que
eram efetivamente sérias. A Esquadra revoltada bombardeou a cidade do Rio de Janeiro e os
fortes entraram em conflito. No entanto, o grupo de militares da Marinha atuantes pelo
governo, sob comando do Almirante Jerônimo Gonçalves “desbaratou, com o apoio na
artilharia de terra, a frota rebelada. Saldanha e seus comandados apinhavam-se agora, no
tombadilho de duas naus portuguesas” (SODRÉ, 2010, p. 224).
As consequências deste conflito para a Marinha foram destacadas no Relatório
Ministerial de 1894, afirmando que este movimento,
si trouxe funestas consequências para a nação em geral, mais do que a todos
prejudicou o Ministério da Marinha, cujas repartições e estabelecimentos ficaram
desorganisados, cujos corpos foram dissolvidos e cujo material foi consumido e
51
estragado, ora pelos próprios revoltosos, ora pelas necessidades de defesa.

Se a força já passava por problemas que eram constantemente destacados, solicitando-


se reforma desde os navios até as escolas de formação, após esta revolta estas solicitações se
tornaram ainda mais constantes. Ainda em 1901, o Relatório52 apontava a necessidade de
maiores investimentos a fim de viabilizar obras e reparos necessários desde os conflitos de
1893 e alcançar, novamente, o posto de marinha forte entre as nações da América do Sul. O
documento destaca que o momento não era propício para comparar “a esquadra de outrora e a
que possuímos actualmente”, mas sim entre “a que possuímos e as que possuem outras nações
da América do Sul”. Esta preocupação é destacada pela observação de processos de
reaparelhamento que vinham sendo realizados pelas marinhas do Chile, da Argentina. No ano
seguinte, em 1902, o relatório53 fez um comparativo entre os investimentos empreendidos
pelo Chile e pelo Brasil entre 1891 e 1900. O governo chileno, neste período, teria investido
em média, 24.576:000$000 anuais adquirindo unidades de combate, realizando obras em
portos militares, construindo depósitos de carvão, além de criar um regimento de artilharia
para defesa de costas. Já o Brasil, no mesmo período, despendeu 28.657:181$651 anualmente,

51
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha, 1894, p. 3.
52
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha, 1901, p. 5.
53
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha, 1902, p. 3-4.
57

em média, e somente adquiriu navios de 27.179 toneladas de deslocamento para o aumento de


seu poder naval. Mesmo com valor maior de investimentos, prosseguiu o Ministro, a Marinha
brasileira ficou muito aquém da chilena em termos de aumento efetivo do poder naval.
Os problemas estruturais das FFAA eram constantemente destacados nos relatórios
dos Ministérios da Guerra e da Marinha submetidos ao governo federal. Tanto as dificuldades
de material como as defasagens no processo de preparação de soldados e marinheiros eram
temas recorrentes nestes documentos. O treinamento dos militares era sempre apontado como
um grave problema sendo este fator atribuído à falta de uma instrução profissional adequada,
tanto nos aspectos técnicos quanto práticos. O relatório do Ministério da Marinha do ano de
1892 defendia que a má organização das escolas de aprendizes e a falta de navios preparados
para as instruções práticas dificultava aos jovens a aprendizagem da “arte do marinheiro e
adquirirem as qualidades physicas e moraes indispensáveis ao homem do mar”.54 Como
solução para estes problemas, defendia-se a reforma das escolas e estabelecimento de viagens
de instrução. Ainda no início da década seguinte a preparação se mostrava problemática,
sendo tema de discussão no Relatório do ano de 1900, quando afirmava-se a necessidade de
aumento das viagens de instrução pois, segundo os dados do relatório, era mais dispendioso
para os cofres do governo manter os navios atracados do que em viagem. Além disso, “é do
marinheiro, desse factor intelligente e preparado, que depende o bom êxito da manobra. Si a
escola em terra dá ao aprendiz-marinheiro a devida theoria, o navio no mar dá-lhe a pratica
indispensável”.55 O Exército Brasileiro também defendia a necessidade de viagens para a
melhor preparação de seus militares. Em edição da Revista Militar do ano de 1900, relatou-se
aspectos da primeira viagem de instrução do Estado-Maior do Exército em serviço de
campanha. No artigo intitulado “Uma viagem do Estado-Maior no Chile”,56 aponta-se como
necessidades do EB naquele momento
1o.) Habituar officiais ao serviço de guerra, collocando-os em situações idênticas as
que se apresentam em campanha e fazendo-os applicar sobre o terreno os methodos
e soluções dos problemas tácticos, que aprenderam theoricamente;
[...]
3o.) Nestas expedições o estado-maior experimenta a robustez physica e o preparo
intellectual dos officiaes.

54
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha, 1892, p. 40.
55
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha, 1900, p. 4.
56
Revista Militar, Uma viagem do Estado-Maior no Chile, ano II, 1900, p. 48.
58

Acompanhando as preocupações com os conhecimentos táticos e técnicos da guerra,


destaca-se também a busca pela melhoria do físico, do corpo dos militares. As observações
sobre como os exércitos estrangeiros realizavam seus processos de preparação e como eram
organizados enquanto estrutura eram temas recorrentes em todas as edições da Revista Militar
analisadas para este trecho da pesquisa.57 Nestes documentos foram publicados extensas
traduções de revistas militares do exterior onde eram detalhados os procedimentos, atos e
contingentes dos exércitos de países da Europa, América, Ásia e África.58 Estas notas eram
utilizadas para reafirmar a necessidade de maior especialização das FFAA brasileiras a partir
destes modelos de exércitos vistos como exemplos de sucesso. Além disso, este
acompanhamento possibilitava a percepção do nível do EB em relação aos demais exércitos
em atuação no mundo naquele momento.59
O problema na formação dos militares foi sempre presente nos relatos oficiais dos dois
Ministérios (Marinha e Guerra). No Relatório do ano de 1894, o Ministro da Guerra, por
exemplo, apontou que, apesar das tentativas constantes de reformas nos processos de
instrução militar com reestruturação dos regulamentos dos estabelecimentos de ensino, o
resultado não estava de acordo com o desejado.
Os programmas de ensino eminentemente theoricos, a pouca importância ligada a
instrucção propriamente militar, a diffusão pelos alumnos de estudos meramente
especulativos, de theorias philosophicas, com prejuízo da instrucção de que mais
carece o militar; a multiplicidade de escolas, a duplicada de programmas e até a de
um mesmo curso, o de artilharia, revelando tudo isto falta de unidade de ensino, são,
60
em rápidos traços, a causa da decadência da instrucção militar entre nós.

57
Para este segundo Capítulo, foram analisadas as edições de janeiro a dezembro dos anos de 1899, 1900, 1901,
1902, 1903, 1904, 1905, 1906 e 1907; e as edições de janeiro, fevereiro e março do ano de 1908 já que no acervo
da Biblioteca Nacional não foram localizadas as edições de abril a dezembro deste ano. Como afirma Oliveira
(2011, p. 59) “a ‘Revista Militar’ foi extinta em 1908, quando o EME passava por uma intensa reorganização.
No seu lugar foi criado, em 1911, o Boletim Mensal do Estado Maior do Exército, que até 1923 ocuparia o lugar
de periódico oficial da corporação”. Não consegui localizar a data de encerramento das publicações. A ausência
das edições de abril a dezembro de 1908 pode ser em decorrência da finalização da revista ou da falta destes
documentos no acervo.
58
Nos relatos da Revista Militar do período entre 1899-1908, foram publicados artigos sobre a estrutura dos
exércitos dos seguintes países: Portugal, Alemanha, Rússia, Grã-Bretanha, Itália, Espanha, França, Suíça, Suécia,
Servia, Dinamarca, Romênia, Hungria, Áustria, Bélgica, Estados Unidos, Chile, Equador, Uruguai, Peru,
Argentina, Colômbia, Bolívia, Guatemala, México, Japão, China, Turquia, Marrocos e Egito.
59
Os artigos ainda exploravam temáticas como as diferentes formas de criptografia de mensagens utilizadas
pelos exércitos nesta virada do século XIX para o XX. Em 1899, o artigo “Sobre sistemas esteganographicos”
afirmava-se que neste sistema eram avaliados a formação de criptografia em hieróglifos egípcios; inscrições
cuneiformes de Persépolis na Babilônia e de Ninive; inscritos de cavernas na Índia; movimentos da Lycia e dos
túmulos da Etruria; os processos de taquigrafia no alfabeto morse; alfabeto beneditino; alfabeto romanini;
alfabeto franc-masson; além de sistemas numéricos e literários. Revista Militar, ano I, 1899.
60
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra, 1894, p. 14.
59

A necessidade de maior militarização das escolas de formação e de investimentos para


o reaparelhamento das FFAA eram componentes de projetos ligados à visão que estas
instituições expressavam sobre as suas funções neste novo Brasil. As ideias sobre o papel das
FFAA nesta nova República eram constantemente reforçadas em seus documentos oficiais. O
Relatório do Ministério da Guerra do ano de 1896 defendia que o aumento da importância e
dos investimentos nas instituições militares era uma característica dos países civilizados e que
com melhor estrutura poderiam desenvolver com maior eficácia suas funções de “garantia da
estabilidade, de ordem e desenvolvimento social”.61 Ter Forças Armadas fortes e preparadas
seria, então, um dos caminhos para a inserção do Brasil no cenário das sociedades modernas e
civilizadas. Estas necessidades de reforma na estrutura das instituições foram evidenciadas
mais claramente com as derrotas militares em conflitos internos enfrentadas na década de
1890 pelas FFAA, gerando não somente um problema interno de organização, mas também
um desprestígio político das instituições.
As derrotas na Revolta da Armada e na Revolução Federalista no sul do país
enfraqueceram os anseios dos militares em prosseguir no governo. Desgastado pelos
constantes embates e doente, Floriano chegou ao fim do mandato em 1894 e, com a eleição de
Prudente de Morais para a presidência, encerrou-se o ciclo de militares no poder desde a
Proclamação da República. No entanto, as influências florianistas prosseguiram durante o
governo do primeiro presidente civil que assumiu em 15 de novembro de 1894 (ARQUIVO
NACIONAL, 2009; SODRE, 2010).
O governo do novo presidente marcou o início da representação das oligarquias,
especialmente aquelas ligadas ao café. Este novo perfil de governo enfrentou muitas
oposições políticas lideradas
por militares florianistas e pelo grupo dos ‘jacobinos’ que lutavam pela consolidação
do poder republicano; pelo Partido Monarquista, que buscava se reorgarnizar; e por
parcela dos setores médios da população, descontente com o governo de um
presidente civil (ARQUIVO NACIONAL, 2009, p. 14).

61
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra, 1896, p. 3.
60

Além das instabilidades políticas ocasionadas por este extenso grupo de opositores, o
governo ainda precisou lidar com os incidentes da Guerra de Canudos (1897)62. A intensidade
dos conflitos preocupou os políticos da capital federal, ainda sob as lembranças dos recentes
problemas da Revolta da Armada e da Revolução Federalista. Ao perceber a irredutibilidade
do movimento em Canudos às forças policiais e aos contingentes militares encaminhados à
região, Manuel Vitorino, vice-presidente que substituía Prudente de Morais por motivo de
doença desde novembro de 1896,
concordou em mandar contra Canudos uma terceira expedição, integrada por cerca
de 1.281 soldados do Exército, sob o comando do coronel Antônio Moreira César,
que fora governador militar de Santa Catarina e responsável pelo fuzilamento e
degola dos prisioneiros durante a guerra civil no Sul do país (1893-1895) […] os
militaristas, partidários radicais do marechal Floriano Peixoto, cujo falecimento em
29 de junho de 1895 privara-os de um líder, depositavam suas esperanças e
esperavam, provavelmente, que ele, ao regressar vitorioso de Canudos, aceitasse
liderar um golpe de Estado contra o governo dos “casacas”, o poder civil,
considerado débil na defesa da república. Nem os 1.281 soldados, comandados pelo
coronel Moreira César, a quem os sertanejos deram o apelido de “corta-cabeças”,
com quinze milhões de cartuchos e setenta e três tiros de artilharia, conseguiram,
contudo, esmagar o movimento de Antônio Conselheiro. Completamente
desbaratada, em 3 de março de 1897, a terceira expedição também foi, com o seu
comandante, coronel Moreira César, morto por duas balas, e a notícia desencadeou
no Rio de Janeiro e em São Paulo violenta agitação em que os radicais da república,
os florianistas, não só invadiram e depredaram os jornais monarquistas como
assassinaram um dos seus diretores, o coronel Gentil de Castro […] (BANDEIRA,
2005, p. 7).

A derrota desta terceira expedição e morte do provável líder de uma reação ao governo
intensificou os descontentamentos dos militares vendo neste episódio um “fortíssimo
argumento para questionar a legitimidade dos verdadeiros princípios de um governo que não
conseguia proteger suas instituições contra os defensores da restauração monárquica”
(HERMANN, 1996, p. 3). A referência aos monarquistas é em decorrência da associação que
se fez à época entre os objetivos do movimento que originou os conflitos em Canudos e uma
reação de grupos a favor do retorno à Monarquia.

62
“A eclosão do conflito em Canudos, no interior da Bahia, motivado pela questão do corte da madeira e
liderado por Antônio Vicente Mendes Maciel, conhecido como Antônio Conselheiro, que, pregando uma vida
ascética, havia atraído ao seu redor uma comunidade de quase trinta mil sertanejos. A revolta foi vista como uma
reação monárquica, apesar de seu caráter messiânico e regional. A derrota das tropas baianas levou o presidente
do estado a solicitar o envio de tropas federais. O fracasso de duas expedições e as mortes de seus comandantes
republicanos gerou uma onda de protestos e de violência na cidade do Rio de Janeiro. Os florianistas
organizaram-se em milícias fardadas e assassinaram alguns monarquistas cariocas. Somente com a devastação
do arraial de Canudos, ocorrida em agosto de 1897, por uma expedição militar federal composta por oito mil
homens, e após o atentado sofrido por Prudente de Morais, cometido por um soldado vitorioso em Canudos, deu-
se fim à crise p político-institucional, com o restabelecimento da ordem republicana” (ARQUIVO NACIONAL,
2009, p. 14.)
61

Este evento em Canudos foi expressivo para as FFAA, pois ilustrou as graves
deficiências que ainda persistiam. Apesar de toda a defesa por modernização e maiores
investimentos, a defasagem técnica e material ainda era muito significativa (SODRE, 2010).
Neste mesmo ano de 1897 ocorreu ainda a chamada Revolta da Escola Militar. De
acordo com Sodré (2010) este movimento foi motivado por decisões do governo em enviar
para o Rio Grande do Sul as armas e munições que pertenciam à Escola. No entanto, o próprio
autor destaca que, em essência, essa revolta se fermentava nos grupos florianistas que
almejavam mobilizar uma reação ao governo. O levante não contou com o respaldo das forças
policiais e de outros militares, como se imaginava, e recuou (BANDEIRA, 2005).
Já de volta ao governo desde março de 1897, Prudente de Morais precisou lidar com
toda a instabilidade com os militares pelos efeitos das revoltas e também com problemas
internos em seu próprio partido, o Partido Republicano Federal, que tinha em sua presidência
Francisco Glicério. Neste mesmo ano o partido passou por uma cisão política que ocasionou
uma colisão entre o então Presidente da República e Glicério (FREIRE, 2000).
Mesmo com o panorama de agitação política e conflitos eclodindo no país, o ideal de
modernização era um dos objetivos comuns destes diversos grupos divergentes em tantos
outros pontos. A necessidade de estabelecimento de parâmetros específicos para a melhoria
do preparo do corpo do homem republicano era expressa através da divulgação de textos e
materiais traduzidos de outros países, destacando os benefícios e a necessidade de ampliação
da educação física de forma efetiva no Brasil. Já em 1892, no Diário Oficial da União de 01
de abril, foi traduzido e publicado o texto “A educação physica moderna” que tinha como
objetivo divulgar as ações bem sucedidas dos franceses no processo de inserção da educação
física no cotidiano de sua população.63 As buscas por divulgar os benefícios da prática da
ginástica entre os jovens e efetivamente implantá-la no ensino brasileiro, seguindo os padrões
já existentes em diversos países europeus, prosseguiram ao longo da década de 1890. Em
1894, já no governo civil de Morais, o Dr. Vicente de Souza, professor do Gymnasio
Nacional, apresentou um relatório ao Ministro do Interior sobre comissão no exterior
realizada a fim de permanecer em estágio no ensino secundário da França. Em trecho do
relatório publicado no Diário Oficial da União de 02 de agosto de 1894,64 o médico debate a
aplicação da ginástica no ensino francês e afirma que

63
BRASIL. Diário Oficial da União, 01 de abril de 1892, seção 1, p. 6-7.
64
BRASIL. Diário Oficial da União, 02 de agosto de 1894, seção 1, p. 4-6.
62

o fim da gymnastica nao e crear artistas, amestrados em exercícios difficeis e


perigosos, mas formar homens que por trabalho progressivo e methodico, por
exercicios razoavelmente graduados, cheguem ao desenvolvimento, saude e robustez
do corpo. [...] E não so do curso regular e hygienico da gymnastica se ocupa a
autoridade francesa, espontaneamente e incessantemente secundada pelo espirito
popular, sinao tambem da esgrima; do exercicio de florete, do sabre e da espada de
combate. [...] É um ensino esse que eu desejaria ver applicado por obrigatório nas
escolas primarias, no Gymnasio Nacional e nos cursos profissionaes. Assim o
desejaria, em nome da hygiene escolar e do incontestavel resultado beneficio para
grande massa de anemiados e de lymphaticos, para numerosos doentes por ausência
ou descuido dos exercicios physicos. Não ha quem com vantagem conteste que em
nossa população nacional, ha milhares de individuos de saude precaria, sem energia
physica, sem resistencia a oppor ao clima, trabalhando sempre na desassimilação
organica, incapazes de romper com os habitos de todo contrarios a educacao e a
expansão da forca muscular. [...] Para actuarem em sentido inverso a esses
preconceitos de possança e saude bastaria entrarem a exercer essa força e essa
resistencia, e veriam como os invadiria o cansaço; como os dominaria a fadiga.
Que se entregassem gradualmente, ordenadamente aos exercicios de gymnastica e de
esgrima, e chegariam, em curto período, a corrigir e rectificar o emprego da
actividade organica. [...] Que ao corpo se de cuidadosamente todo esse conjuncto de
elementos para sua inteira vitalidade; que aos órgãos e os systemas da economia
humana se prestem todas as condiçoes para a evolucao das forças e, ao lado destas, o
cerebro, irrigado francamente, abundantemente guardara correctas as suas funçoes
psychicas. Para a mentalidade sa e vigorosa a preliminar indispensavel e inadiavel é
a cultura physica pelo exercicio, que actua em todo o organismo, desde os centros
nervosos ate aos apparelhos de eliminação. A maxima epicurista mens sana in
corpore sano será inscripto, em cada edificio de educaçao official ou privada; será
bem applicada no codigo de instruçao, quando o Estado, ainda tutor ou o preceptor
livre tenha chegado a convicçao pela doutrina exposta e defendida por physiologista,
por hygienistas, por pedagogos. Que os competentes queiram realisar esse plano de
educaçao popular ainda olhado com indiferença ou suspeiçao.
Eis, Sr. ministro, quando tive por opportuno dizer em desempenho do honroso
encargo a mim confiado pelo governo da Republica.
Capital Federal, abril de 1894 - Dr. Vicente de Souza.

O trecho do relatório ilustra as grandes preocupações do governo com os cuidados


dedicados ao preparo do corpo naquele momento. Enviado a observar o ensino de educação
física na França, o autor destaca as importantes ações realizadas pelo governo francês neste
campo e defende que os objetivos do exercício não devem residir na formação de artistas ou
especialistas em tais atividades, mas sim ser utilizado como instrumento para o
desenvolvimento da saúde e do corpo forte. Estes argumentos retomavam as defesas da
necessidade de um povo mais robusto, preparado e saudável. A introdução das atividades
gymnasticas e da esgrima no cotidiano escolar era a grande defesa do Dr. Vicente de Souza,
argumentando que esta ação poderia corrigir os problemas ocasionados pela falta de exercício
do corpo, como “saude precaria, sem energia physica, sem resistencia a oppor ao clima,
trabalhando sempre na desassimilação orgânica” e se tornar o grande impulsionador da
evolução das forças físicas e psíquicas, já que segundo seus estudos, o cérebro seria altamente
beneficiado pelos exercícios ao ser mais irrigado e que “para a mentalidade sa e vigorosa a
preliminar indispensavel e inadiavel é a cultura physica pelo exercício”. O relatório reforça as
63

proposições já defendidas desde a Reforma Benjamin Constant em 1890 de inserir a ginástica


no dia a dia escolar desde as turmas primárias, objetivando iniciar a criação deste “povo forte”
o mais breve possível.
A divulgação dos benefícios da prática esportiva através dos instrumentos oficiais
(relatórios ministeriais, diários oficiais) era constante. No entanto, identificou-se artigo que
buscava não somente destacar os proveitos destas práticas para o indivíduo, mas também seus
perigos. Em 29 de Janeiro de 1898, foi publicada uma análise desenvolvida a partir da
tradução de um texto do British Medical Journal comparando o nível de acidentes entre os
praticantes de futebol, equitação e ginástica da Academia Militar de West-Point. O texto sem
autoria destacava que
Os resultados condemnam eloquentemente o foot-ball: entre as 84 pessoas que se
dedicam a esse jogo, houve 51 accidentes, determinando perda de 277 dias; em 181
individuos que se exercitam em equitação houve 17 accidentes, occasionando a
perda de 11 dias; finalmente nos 106 homens que trabalham em gymnastica, houve
apenas nove accidentes com a perda de 11 dias.
Não somente os accidentes pelo foot-ball são muito mais frequentes, mas tambem
são mais graves, porquanto a perda de dias occasionada pelo foot-ball é de 5,1, para
a equitação 3,4 e para a gymnastica 1,02. Mas o que evidencia o perigo desse jogo é
o numero total dos dias de incapacidade para o trabalho causada para cada homem
pelos accidentes; esses numeros são os seguintes: para o foot-ball 8,01, para a
equitação 0,31, para a gymnastica 0,15. Em resumo, as probabilidades de accidentes
são 18 vezes maiores no football do que na equitação e 20 vezes maiores do que nos
exercicios gymnasticos; o numero de dias perdidos é 26 vezes superior nos
accidentes devidos ao football do que nos occasionados pela equitação e 50 vezes
65
superiores aos determinados pela gymnastica.

Este texto traz à luz uma preocupação ainda não evidenciada nas fontes até este
momento: os riscos da prática esportiva. No entanto, estes riscos não foram destacados por
preocupações imediatas com a saúde ou bem estar dos indivíduos, mas sim os prejuízos que
poderiam ocasionar às engrenagens profissionais e produtivas pelo tempo de ausência em seus
postos de trabalho que os acidentes poderiam gerar.
Ao longo das discussões realizadas até este ponto, foi possível perceber que o estímulo
à prática esportiva através da divulgação de seus benefícios e de suas vantagens no processo
de preparação de um povo mais forte passou por diferentes governos militares e civis desde a
proclamação da República. Os ideais de modernização do Brasil, passando também pelas
questões ligadas à formação física, intelectual e moral dos indivíduos, eram propostas comuns
aos diferentes governos estabelecidos, não sendo encontradas grandes discrepâncias nas
divulgações sobre estas práticas.

65
BRASIL. Diário Oficial da União de 29 de Janeiro de 1898, seção 1, p. 7-8.
64

2.5 Oligarquias no poder, desprestígio militar: o problema da formação segue em


debate.

Ao final do século XIX, ocorreu uma nova mudança no governo federal com a saída
de Prudente de Morais e eleição de Campos Salles no ano de 1898. Com o presidente, iniciou-
se uma nova lógica política onde os partidos nacionais perderiam sua força e as decisões
seriam baseadas nas relações entre os interesses políticos estaduais e o governo federal,
sistema que ficou conhecido como “política dos governadores”, ou “política dos estados”
(VENEU, 1987). Esta nova organização inaugurada por Campos Salles possibilitou um
“período de paz oligárquica, baseado em uma combinação de cooptação e repressão,
interrompido apenas em 1922, quando se deu a primeira revolta tenentista” (CARVALHO,
2002, p. 61).
Este sistema minimizou os conflitos que existiam entre as oligarquias, e também entre
os militares, em busca do poder. No entanto, neste processo ocorreu uma predominância de
grupos de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul no comando do governo federal, fato
que desagradou às outras unidades da federação brasileira. Como afirmam Ferreira e Pinto,
no condomínio oligárquico em que se transformou a política brasileira havia
oligarquias de primeira e segunda grandezas, além dos chamados estados satélites.
Como resultado concreto deste modelo vigente durante grande parte da Primeira
República os conflitos políticos, embora não eliminados, foram minimizados e as
sucessões presidenciais marcadas por disputas controladas, sendo o candidato da
situação aquele que a priori tinha garantida sua eleição salvo alguns momentos
excepcionais, conforme ocorrido na disputa presidencial de 1909/1910 que deu
origem à Campanha Civilista (2006, p. 5).

Neste novo sistema, os militares e militaristas perderam seu espaço e “caíram no


ostracismo político” com a perda de prestígio progressiva desde a Revolta da Armada e da
Guerra de Canudos (RODRIGUES, R., 2011a, p. 5-6).
Mesmo com o enfraquecimento político, as necessidades de modernização e melhorias
para as FFAA continuavam sendo constantemente reafirmadas nos relatórios dos ministérios
militares. Comentando o projeto de reorganização das instituições de formação do Exército, o
Ministro da Guerra Marechal Mallet em seu Relatório do ano de 1899 defendia a necessidade
deste processo, pois “alem de proporcionar maior diffusão da instrucção pelo Exército, [...]
será esse projecto de incomparável utilidade para a disciplina, visto accentuar o principio da
hierarchia militar, evitando a promiscuidade de oficiais e praças na mesma escola”.66 A
separação dos níveis hierárquicos também foi tema de discussão na Revista Militar do ano de

66
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra, 1899, p. 16-17.
65

1899. O artigo “Bases para a reorganização do Exercito”, de autoria do Coronel F. Abreu


Lima, Chefe da 2a. Seção, defendia que todo o projeto de reorganização deveria se basear no
meio de obter soldados: o recrutamento. Este processo estaria estruturado em três níveis:
oficiais, praças e reservas do exército. O autor destaca que “dizem as autoridades militares
que nos exércitos se devem distinguir dous mundos: de officiaes e praças. Os officiaes se
constituem os profissionaes na sciencia militar; as praças representam os simples operários
que executam os trabalhos de guerra”.67
Esta preocupação com a mistura entre oficiais e praças perpassa todas as esferas de
organização das FFAA, sendo também um ponto de discussão importante no processo de
estruturação das atividades esportivas, como veremos ainda neste trabalho no Capítulo 4.
A falta de preparo físico e técnico dos militares continuava sendo um problema que
chamava a atenção dos Ministérios da Guerra e da Marinha e inspirava maiores investimentos
por parte do governo. No mesmo documento citado acima, o Coronel Abreu Lima ainda
reforçava que o processo de especialização das instituições militares, assim como a formação
de seus oficiais, deveriam acompanhar a evolução científica dos Exércitos. Para isso, dever-
68
se-ia “fechar a porta aos que vierem sem ser pelo caminho das escolas militares”. Esse
debate constante por melhores condições de treinamento para os militares brasileiros era uma
busca por assemelhação com as grandes potências armadas do período. Por meio dos estudos
da estrutura destas instituições, como já destacado, projetava-se a renovação das FFAA
brasileiras. O Major Engenheiro Dias de Oliveira, em publicação da Revista Militar de 1901
sobre a organização e ações do Exército Alemão destacava as principais vantagens deste
exército e afirmava que
o official d’ estado-maior não deve somente desenvolver o espírito, completar a
instrucção, já pelo útil jogo da guerra, a resolução de themas tácticos, conferencias,
já pelos trabalhos d’ inverno ou de viagens d’ estado-maior. É-lhe igualmente
necessário desenvolver as qualidades physicas, tonificar e robustecer o organismo,
para supportar com vantagem a inclemência da vida em campanha, como convem a
um homem de guerra. Por isso o official alemão, alem das grandes manobras do
outomno, dedica-se com paixão aos diversos gêneros de exercícios physicos, como a
gymnastica, o cyclismo, a equitação, as marchas de guerra e as demais úteis e
69
atraentes diversões creadas pelo sport moderno.

67
LIMA, F. Abreu. Bases para a reorganização do Exercito. Revista Militar, ano I, 1899, p. 167.
68
ibidem, p. 167.
69
OLIVEIRA, Dias de. O Exercito Alemão. Revista Militar, ano III, 1901, p. 188-189.
66

Pode-se afirmar que a necessidade de maior preparo físico era um ponto de discussão
para todos os níveis hierárquicos das FFAA. Como destacado nas documentações analisadas
até aqui, seja para os soldados ou marinheiros, seja para os oficiais de Estado-Maior, havia
sempre a defesa de uma maior dedicação às atividades ginásticas e esportivas como um
instrumento de preparação importante para a construção de instituições militares mais fortes.
Acompanhando os ideais de modernização técnica, alguns elementos inicialmente
esportivos passaram a ser vistos como potenciais instrumentos para a atividade militar. A
bicicleta (ou velocípede) foi um deles. O ciclismo era, como referenciado no trecho da
Revista Militar destacado acima, uma prática esportiva vista como contribuinte da preparação
dos militares. Desde os anos iniciais da República estes novos instrumentos para a prática da
ginástica recebiam atenção das publicações oficiais em relação aos seus benefícios. Em 1892,
o Diário Oficial da União publicou no dia 06 de janeiro um texto nomeado “O velocipede”.70
Este artigo tinha como objetivo apontar os grandes benefícios que este instrumento poderia
trazer aos seus praticantes, afirmando ser “o velocipede um dos artefactos mais modernos de
gymnastica ambulatoria e que ha trazido ao homem civilisado uma nova alegria e um novo
instrumento de saude”. Ele deveria ser utilizado por todos, exceto os que tivessem algum
problema no coração ou doenças do aparelho respiratório, sendo não somente uma
“gymnastica salutar, mas é medicina soberana” para os sedentários, os de “vida mole” e
aqueles que tivessem “pulmões fracos”. O trabalho ainda defendia que o velocipedismo
deveria ser praticado ao ar livre, e afirmava que
ao vermos o velocipedista montado em seu cavalo de aço, invejamol-o por ser tão
ligeiro o vehiculo em que elle assenta, que nos parece um homem transformado em
passarro; e quando depois se põe em movimento e deixa ficar atraz, na sua corrida
vertiginosa, os bipedes que transitam a pé ou a carro, então interrogamo-nos
estupefactos, porque o homem demorou até ao seculo XIX a invenção de um meio
71
de transporte tão elegante quanto economico e ligeiro?

Em defesa do velocipedismo ainda era destacado que pernas, troncos e braços eram
tonificados pelos movimentos de pedalar e manter o equilíbrio. As funções respiratórias
também melhorariam, de acordo com uma pesquisa realizada na Alemanha que media a
capacidade respiratória dos velocipedistas antes e após a prática, reforçando que haveria
“augmento singular no volume de ar introduzido no peito”. Como vantagem complementar,
destacou-se o seguinte:

70
BRASIL. Diário Oficial da União, 06 de janeiro de 1892, seção 1, p. 6.
71
BRASIL. Diário Oficial da União, 06 de janeiro de 1892, seção 1, p. 6.
67

no exercicio do velocipede tem-se uma outra vantagem. Devendo levantar muito as


coixas, chegamos a fazer, mesmo sem proposito, uma pressão no ventre e d'ahi
resulta evitar-se a circulação do ventre e dos movimentos intestinaes. E assim
combate-se indirectamente a constipação do ventre, previnem-se as hemorahoidas
72
ou por ventura curam-se estas.

Mantendo a visão dos benefícios do ciclismo e acrescentando a possibilidade de


utilizá-lo como um instrumento militar, Tenório de Albuquerque publicou na Revista Militar
em 1901 o artigo “Cyclismo nas Tropas” 73 onde defendia a adoção da bicicleta nos batalhões
militares pela grande agilidade que poderia imprimir e por ser “um nobre exercício”.
Albuquerque afirmava que “qualquer que seja o meio de locomoção, quer encarado sob o
ponto de vista militar, quer civil, deve obdecer além de outras condições, a de ter grande
velocidade, de modo a poder no minimo tempo percorrer uma distancia dada”. Para
exemplificar sua proposição, o autor comenta que uma mensagem poderia ser enviada a pé ou
a cavalo e que dificilmente um destes dois meios conseguiria ultrapassar a velocidade de 20
quilômetros por hora (“que nem mesmo os cavalos árabes são capazes de obter”) e que, sendo
assim, a bicicleta estaria em vantagem. Ao longo do artigo, relata-se ainda que, ao se
comparar o animal com a machina algumas vantagens seriam observáveis em segmentos de
orientação específica de cunho militar. Estas comparações realizadas pelo autor foram
compiladas no Quadro 1.

72
BRASIL. Diário Oficial da União, 06 de janeiro de 1892, seção 1, p. 6.
73
ALBUQUERQUE, Tenório de. Cyclismo nas tropas. Revista Militar, Ano III, 1901, p. 437-446.
68

Quadro 1. Comparativo vantagens e desvantagens de utilização de bicicletas e cavalos. 74


Item Avaliado Bicicletas Cavalos
Conforto e Domínio “O bom cyclista está tão bem “[…] como o cavalleiro sobre o
sobre a machina […]” cavallo”

Tempo menor para se tornar um Tempo muito maior para se tornar


bom ciclista. um bom cavalheiro.

A bicicleta só realiza as manobras O cavalleiro depende da vontade


que o ciclista determina e deseja. do animal para sua condução e
nem sempre domina suas
derivações de direcionamento.

As quedas são menos prejudiciais As quedas são mais lesivas a


a quem pilota. quem cavalga.
Preço e manutenção “Uma boa machina militar, O gasto com forragem e arreios
segundo vimos em catalogos, que se estragam é maior que os
custa um pouco menos que um gastos com a bicicleta que exige
cavallo […]” apenas de cuidados com a
limpeza.
Danos e Estragos A máquina pode estragar com O cavalo pode adoecer e irá parar
mais facilidade e neste caso nada com a sua função, assim como a
se gasta enquanto esta parar. quebra da machina, mas passará a
gerar um custo maior para sua
recuperação.

De acordo com Albuquerque, a utilização primária da bicicleta levaria a inúmeras


vantagens sobre o cavalo, mas não em todas as situações, pois caso contrário ter-se-ia no lugar
de cavalarias, in totum, grupos de ciclistas para os combates militares. Para a adoção da
bicicleta era necessário levar em consideração, além da agilidade e dos custos, as condições
dos terrenos (subidas de taludes, entranhas de florestas, montanhas e campos), transporte de
cargas, entre outras aplicações que mereciam estudos em relação ao seu uso. O autor destaca
ainda que a utilização do cavalo era bastante conhecida, enquanto que a bicicleta era uma
novidade no país, e que, mesmo em países europeus como França e Alemanha, a sua
aplicação ocorria moderadamente, visto que as tropas não marchavam apenas em estradas
reaes ou em um “méro passeio hygienico pelas ruas de Berlim, marcha como se fosse para
uma guerra, em qualquer terreno, e esses exercicios não duram um dia nem dous, differem
apenas da guerra real, talvez por não haver mortos nem prisioneiros”.75 Finalizando,
Albuquerque defendia que

74
ALBUQUERQUE, Tenório de. Cyclismo nas tropas. Revista Militar, Ano III, 1901, p. 437-446.
75
Ibidem, p. 440.
69

a bicycletta se não vem formar uma nova arma, nem por isso deixa de participar da
velocidade da cavallaria, sendo em tudo o mais o cyclista, o verdadeiro infante, e
n’essas condições, parece-nos que perfeitamente, e com mais vantagem do que
qualquer uma d’elas, poderá desempenhar certos serviços, embora em número
restricto. É exacto que nem todo terreno se presta as marchas cyclistas, mas de’ahi
não se deve concluir, pensamos nós, que ella nem ao menos mereça ser
experimentada. Os cyclistas marcham em suas machinas e quando o terreno não se
prestar, continuam a pé, com a machina as costas, e em vez de cyclistas, haverá uma
força de infantaria, nada mais simples. É isto que temos lido e temos visto em
gravuras e se o soldado francez, inglez, allemão, ou de qualquer outra nação póde
fazer isso, o soldado brazileiro também póde, a questão é querer.76

A defesa da utilização de elementos esportivos como instrumentos de preparação para


a atividade militar não ficou restrita ao EB. Como já comentado, os militares da Marinha do
Brasil atuaram de forma efetiva no processo de divulgação e organização do remo na
sociedade carioca. Os interesses dos militares em destacar os benefícios desta prática, no
entanto, não se restringiam somente aos aspectos de saúde e modernidade característicos da
época. O entusiasmo dos militares em divulgar as atividades pode ser identificado nas ideias
expostas e defendidas pelo Capitão-Tenente Santos Porto, autor do artigo “O sport náutico no
Brazil” publicado na Revista Marítima Brasileira na edição do 2o. Semestre de 1901. O autor
se apresenta como oficial de Marinha e sócio do Clube Naval desde seus primeiros dias de
formação e defendia uma maior aproximação da instituição dos clubes de regata do Rio de
Janeiro e que o Clube Naval empreendesse ações mais efetivas para o desenvolvimento das
regatas a Vela também, até aquele momento pouco exploradas. Segundo Santos Porto, “em
nenhum porto as condições serão mais vantajosas para ella”.77 No entanto, o artigo ainda traz
elementos muito importantes para compreendermos os interesses da Marinha em defender um
maior desenvolvimento da modalidade Remo, integrando esta prática aos seus ideais de
“cidadão” para a República brasileira neste momento inicial do século XX. Os trechos abaixo
ilustram o pensamento do autor sobre os benefícios do remo para a construção de uma
sociedade mais forte e preparada para enfrentar todas as dificuldades, inclusive no que se
refere à defesa do território nacional, principalmente sua parte costeira.
[...] Em boa hora, felizmente, sentiu a nossa mocidade que no sport náutico
encontraria as melhores e mais salutares distracções e, impulsionada por admirável
enthusiasmo começou a fundar ao longo do littoral novos clubs, centros de animação
e actividade.
[...]
Mas não é somente a regeneração das nossas forças, uma modificação nos nossos
habitos; é também uma obra de defesa nacional.
Diante dos crescentes dispêndios com a manutenção das forças de mar e terra
permanentes, cujo objetivo é garantir a paz, espíritos bem intencionados teem
inscripto na sua bandeira, que se deve educar o povo de modo a transformal-o em
legiões de soldados na hora, em que possa perigar a integridade da nação.

76
ALBUQUERQUE, Tenório de. Cyclismo nas tropas. Revista Militar, Ano III, 1901, p. 446.
77
PORTO, Santos. O sport náutico no Brazil. Revista Marítima Brazileira. 2o. Semestre de 1901, p. 11.
70

A situação do Brazil não é, porem, a dos estados europeos. Lutas futuras, si


infelizmente tivermos, terão que se liquidar sobre o mar ou ao longo de nossas
costas, e para que os futuros voluntários, a nação em armas prompta a defender os
seus lares, o possam fazer com segurança e vantagem, é preciso que o povo se
eduque sob este ponto de vista, no amor das cousas do mar, seguros os nossos
estadistas de que, todo o auxilio prestado é um elemento de trabalho da defesa
nacional.
Não basta que <<cada cidadão seja um soldado>> é preciso que <<cada cidadão seja
um marinheiro, na mais lata accepção d’essa palavra>>.78, 79

A necessidade de um povo forte e preparado passou a ser um importante ponto de


discussão nesta nova sociedade brasileira que se buscava construir e norteou ações nas esferas
educacionais, políticas e materiais. Como foi possível perceber nos trechos destacados acima,
a Marinha do Brasil, através de seu principal instrumento de divulgação na época, a Revista
Marítima Brasileira (RMB), buscava evidenciar suas perspectivas sobre esta necessidade
emergente de maior preparação do corpo deste novo cidadão, que deveria ser acima de tudo
um soldado-cidadão, ou como defende o autor, um cidadão marinheiro.
As questões de defesa da integridade da nação ainda aparecem nas declarações sobre
os benefícios do remo. Ao afirmar que a adoção do esporte náutico pela população brasileira
“não é somente a regeneração das nossas forças, uma modificação nos nossos hábitos; é
também uma obra de defesa nacional”, o autor evidencia pontos fortes do projeto da Marinha
para o povo brasileiro. A necessidade de formação de indivíduos para a defesa da nação que
estivessem habituados ao mar foi o principal argumento utilizado ao longo do artigo para
destacar os benefícios que tais práticas poderiam trazer para o país como um todo, já que, em
trecho seguinte, afirma-se que
A situação do Brazil não é, porem, a dos estados europeos. Lutas futuras, si
infelizmente tivermos, terão que se liquidar sobre o mar ou ao longo de nossas
costas, e para que os futuros voluntários, a nação em armas prompta a defender os
seus lares, o possam fazer com segurança e vantagem, é preciso que o povo se
eduque sob este ponto de vista, no amor das cousas do mar, seguros os nossos
estadistas de que, todo o auxilio prestado é um elemento de trabalho da defesa
nacional.

Ao evidenciar estes aspectos dos esportes náuticos, o artigo não somente buscou
aproximar os seus militares destas atividades, como também a juventude em geral. Estes
argumentos foram elaborados com objetivo de enfatizar a necessidade do "amor das cousas do
mar" na tentativa de atrair esta juventude para as atividades militares, já que as FFAA
enfrentavam sérios problemas quanto ao número de integrantes, estando seus efetivos sempre

78
PORTO, Santos. O sport náutico no Brazil. Revista Marítima Brazileira. 2º. Semestre de 1901, p. 6-19.
79
O artigo ainda prossegue apresentando a situação naquele momento dos clubes de remo do Rio de Janeiro e os
preparativos para o campeonato de 1901 e apontava como uma importante evolução a fundação do Conselho
Superior de Regatas, tendo em sua presidência um representante da Marinha, o Capitão-Tenente Eduardo
Ernesto Midosi.
71

abaixo das necessidades expressas nos planejamentos anuais. Atrair a mocidade para seus
corpos era imperativo e inúmeros argumentos e estratégias eram utilizadas, inclusive por meio
da prática esportiva (CANCELLA, 2012c).
No ano seguinte, 1902, a RMB voltou a publicar um artigo sobre os benefícios e a
necessidade da juventude brasileira se aproximar das práticas náuticas. A matéria sem autoria
“Campeonato de 1902 - Clube de Natação e Regatas” argumentava que
ao historiador contemporâneo, que estudar a evolução da nossa nacionalidade, que
pretender definir as causas do nosso desenvolvimento, não escapará certamente o
influxo poderoso prestado pelo cultivo do sport náutico entre nós.
Accentuar que essa sympathia dos moços actuaes pelos exercícios vigorosos, em que
adquirem não só linhas mais firmes e mais bem lançadas, como hábitos de
resistência as fadigas e contra-tempos tem produzido resultados tão precisos, que os
mais alheiados dessas cousas delles facilmente se apercebem, é fornecer ao
historiador contemporâneo dados para a apreciação do nosso problema de nação
nova, e que tradições antigas sopitavam o desenvolvimento.
Pelas suas condições physicas, pela abundancia de portos e pela sua extensa costa, o
Brazil é uma nação marítima. Marítimos são os mais promptos e rápidos meios de
communicação, marítima é a grande parte da população, pois se acha condensada
n’uma facha de terreno beirando a linha da costa, marítima é a nossa ascendência –
os grandes navegadores portuguezes.
E se durante muitos annos os brazileiros andaram arredios do mar, no dia em que
para elle, para a sua conquista uma corrente se formasse, fatalmente essa corrente
engrossaria, até formar legiões.
Essa epocha se avisinha. Hoje a ninguém passam indifferentes as festas esportivas
marítimas, e desperta mesmo grande enthusiasmo a do campeonato annual, em que
os clubs apparelhados por mais regulares exercícios enviam os seus campeões a
conquista da victoria.
Para nós officiaes de marinha essa corrente de symphatia pelos exercícios vigorosos
é de inestimável alcance, porque la encontraremos um viveiro abundante de moços
fortes, habituados ao mar, e aos trabalhos, no dia em que a Pátria ameaçada chame a
postos seus filhos para defenderem-na. Nesse dia então essa mocidade toda affeita as
lutas, nessa aprendizagem continua, mais forte, mais rija, tem para secundar o seu
enthusiasmo pela pátria o pulso mais vigoroso e o olhar mais excitado.
A Revista Marítima Brazileira exulta com as festas do sport náutico. Como no anno
findo ella desejaria registrar a situação dos clubs de regatas. Na impossibilidade de
fazel-o por não ter obtido as informações que insistentemente solicitou limita-se ao
club vencedor do campeonato de 1902, honrando as suas paginas com o retrato dos
campeões, que triumpharam, e a photo-gravura da embarcação vencedora.80

A matéria prossegue apresentando o vencedor do Campeonato daquele ano de 1902, o


Clube de Natação e Regatas, por meio de fotografias e dos regulamentos do clube. Este trecho
inicial transcrito acima reforça os ideais defendidos no ano anterior de que a prática do
esporte náutico, no caso o remo, seria um “celeiro” de construção de homens fortes,
preparados para a defesa nacional e habituados ao mar, atendendo aos interesses militares
navais já que, como o autor afirma, o Brasil era uma nação essencialmente marítima. Como
afirmado, os oficiais viam com grande simpatia a prática dos esportes náuticos, pois eles
seriam um “viveiro abundante de moços fortes, habituados ao mar, e aos trabalhos, no dia em

80
Revista Marítima Brazileira. Campeonato de 1902. 2o. Semestre de 1902, p. 381-388.
72

que a Pátria ameaçada chame a postos seus filhos para defenderem-na”. O esporte, nesta
interpretação, seria um importante instrumento preparatório para as funções militares em
batalhas marítimas.
O autor ainda realiza algumas observações teóricas e metodológicas que atraem a
atenção. Logo nos primeiros parágrafos, destaca que o objetivo do texto era elaborar subsídios
para o historiador daquele tempo sobre os aspectos de desenvolvimento da nacionalidade
brasileira e evidenciar os benefícios da prática do esporte náutico para o povo. Esta
preocupação com o levantamento dos dados e, especialmente, a menção do papel do
historiador com atenções voltadas para o esporte ainda no ano de 1902 merece destaque, uma
vez que este objeto (o esporte) foi apenas recentemente inserido entre as temáticas de análise
da História, como já discutido na introdução deste trabalho.
Ainda tratando de aspectos intrínsecos à pesquisa histórica, no trecho final do texto
analisa a problemática de acesso a fontes e nos evidencia que as dificuldades não são
características exclusivas das atividades dos historiadores da atualidade. Ainda no ano de
1902, apesar das solicitações que afirmou realizar, o autor do artigo destaca que a ausência de
algumas informações sobre os clubes se efetivou pela não disponibilidade dos documentos
solicitados.
A exultação dos esportes náuticos e o forte discurso de estímulo marcaram a postura
de favorecimento e divulgação destas práticas por parte da Marinha do Brasil. Vale lembrar
que neste momento, anos iniciais do século XX, não existia qualquer entidade
especificamente relacionada com o esporte na estrutura das FFAA brasileiras, fato que
somente ocorreu em 1915, em ambas as instituições (EB e MB) com a criação da Liga Militar
de Football e da Liga de Sports da Marinha. Neste período, os militares participavam das
atividades e competições esportivas nos clubes civis das modalidades.
As preocupações com a maior divulgação e melhor estruturação para a prática do
esporte náutico não ficaram restritas à MB. Atenções com o esporte fizeram parte do grande
“pacote” de melhoramentos urbanos empreendidos nos anos iniciais dos novecentos,
principalmente na capital federal, como veremos no próximo item.
73

2.6 Povo forte e cidade renovada: os projetos do governo Rodrigues Alves e suas
relações com o esporte e as FFAA

Em 1902 o Presidente Campos Salles foi substituído por Rodrigues Alves, após vitória
nas eleições daquele ano. Seu governo foi marcado, em grande medida, por suas ações de
modernização da capital federal, objetivos concretizados pelos projetos de reurbanização do
então prefeito e engenheiro Pereira Passos. Como afirma Malaia, a cidade precisava destas
mudanças
para ser inserida na esfera das grandes cidades do mundo. Não só avenidas foram
alargadas, cortiços derrubados, bondes elétricos instalados, novas áreas urbanizadas,
como também os esportes foram dinamizados. Estes também eram símbolos da
civilização, atividades cotidianas das grandes cidades européias e norte-americanas.
Durante a reforma, uma atenção especial foi dada aos esportes, principalmente ao
remo, com a construção do Pavilhão de Regatas, na Lagoa Rodrigo de Freitas
(2008a, p. 2).

Neste novo projeto para a capital, as atividades de lazer públicas garantiram atenção
no processo de reorganização urbana. A construção do Pavilhão de Regatas pode ser
referenciada como uma das ações empreendidas neste campo. Melo destaca que
podemos observar na cidade o desenvolvimento e melhor estruturação de um
mercado de diversões, que incluía espetáculos musicais e teatrais, os primeiros
momentos de nosso cinema e o crescimento das práticas esportivas, onde se destaca
o remo. Ele é fundamentalmente um esporte conduzido e apreciado pelas camadas
médias em formação (profissionais liberais, gente do comércio e primeiros
industriais). Sua identidade se constrói em oposição ao turfe, muito relacionado à
aristocracia de origem rural (2006, p. 5).

O prefeito Pereira Passos, neste novo espectro de ações para promoção de atividades
de lazer, passou a se aproximar do remo a partir de 1903 e inseriu em seus projetos a
construção de um espaço que possibilitasse a melhor alocação dos barcos utilizados na
prática, privilegiando as áreas da zona sul da cidade. A construção da “Avenida Beira-Mar era
uma de suas prioridades, nada como celebrar tal avenida simbólica com um divertimento
moderno e civilizado como o remo” (MELO, 2006, p. 12). O Pavilhão de Regatas foi
construído na praia de Botafogo na altura das ruas D. Carlota e São Clemente, no ano de 1905
(vide Figura 1). O espaço, inicialmente projetado para ser um local fixo de realização de
regatas, por sua privilegiada localização passou a se tornar um centro de divertimentos para as
elites. Com sua estrutura em estilo eclético, espaço para bandas, buffet, bares com orquestra,
passeios de barco pela Baia de Guanabara, casa de chá e luz elétrica, o que garantia seu
funcionamento noturno, o Pavilhão se transformou em importante espaço cultural da cidade,
auxiliando na divulgação da prática esportiva que motivou sua construção (MELO, 2011).
74

Durante o governo Rodrigues Alves, não somente os processos de reurbanização da


cidade foram empreendidos. As ações de reorganização e reaparelhamento das FFAA
voltaram ao cenário de preocupações nacionais, principalmente após o conturbado ano de
1904 no Exército Brasileiro com a Revolta da Escola Militar. Este movimento tinha como um
dos objetivos reconquistar espaço político derrubando o governo oligárquico que se
estabeleceu após a saída dos militares da presidência. Os líderes da revolta tentaram mobilizar
as Escolas Militares da capital para tal ação, tendo êxito somente na Escola Militar do Brasil
na Praia Vermelha, já que na Escola Preparatória de Realengo o mobilizador foi interceptado
pelo então comandante da escola General-de-Brigada Hermes da Fonseca antes de alcançar
seus objetivos. O movimento, que contou com 300 estudantes da Escola Militar, foi suprimido
após confrontos entre os rebelados e as tropas legalistas da Chefia de Polícia. Após esses
incidentes, as ideias de reforma já em discussão na instituição se intensificaram associando a
necessidade de melhorias e maior rigidez no processo de formação com o estabelecimento do
serviço militar obrigatório (MCCANN, 2009).
Hermes da Fonseca, por suas ações no controle do levante entre seus comandados, foi
nomeado pelo Presidente Rodrigues Alves Comandante do 4º. Distrito Militar, do qual fazia
parte a capital, ainda em 1904. Dois anos após, com a eleição de Afonso Pena para a
Presidência da República, Hermes foi nomeado Ministro da Guerra e iniciou projetos e ações
para reforço das tropas e melhorias do aparato do Exército. Estas ideias de reforma e a
necessidade de criação de um corpo de reserva militar preparado para atender ao país em
situações de conflito impulsionaram a aprovação de um projeto de lei de 1906 que tornava o
serviço militar obrigatório, sendo aprovada tal lei em 1908 (MCCANN, 2009). Como parte
deste projeto previa-se ainda “aquisição de armamentos e uma reorganização completa do
ensino militar, visando atender à necessidade histórica de quadros bem formados para a
corporação” (CUNHA, 2011, p. 4).
A urgência das melhorias no pessoal militar foi apontada como a prioridade para o
Exército no Relatório do Ministério da Guerra de 1903. O então Ministro Marechal Argollo
foi bastante enfático ao afirmar que
a primeira medida que se impoe, aquella que mais esforco exige, pois tem que
vencer preconceitos e modificar ate certo ponto a indole do nosso povo, mas da qual
depende a dignificação da profissão militar é tornar uma realidade o serviço militar
obrigatorio nas fileiras. Emquanto não conseguirmos levar ao espirito dos nossos
compatriotas ou pela educação ou por força de lei, a convicção de que um dos
principaes deveres é pagar o imposto de sangue, que não pode injustamente recahir
sobre os desprotegidos da sorte, o Brazil não será uma nação realmente forte e
respeitada. 81

81
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra, 1903, p. 5.
75

Esta afirmação do então Ministro e as ações com foco educativo justificavam-se pelo
grande problema de formação dos indivíduos que optavam pelo serviço militar, ponto de
incômodo para o EB desde o século XIX. Como afirma Cunha
a aversão dos civis ao serviço militar, levando a um “voluntariado” saído das fileiras
de desempregados, redundava numa grande dificuldade de preencher os efetivos de
praças que se mantiveram, invariavelmente, abaixo do número autorizado pelo
governo. Quanto ao recrutamento de oficiais, a depreciação social atribuída ao
Exército durante o Império foi atenuada com os governos militares e a profusão de
promoções que os acompanhou, se tornando um atrativo para os filhos das camadas
médias emergentes. Outrossim, a oportunidade de educação gratuita, para os que não
tinham posses, atraía jovens para o corpo de oficiais possibilitando a ascensão social
(2011, p. 4).

Os projetos de revitalização na Marinha do Brasil também foram retomados nos anos


iniciais do século XX. As primeiras propostas surgiram com o Ministro da Marinha Júlio
César de Noronha acompanhando os anseios modernizadores do então Presidente da
República. O chamado “Projeto de 1904” defendia a compra de navios menores e com custo
mais baixo82 e, apesar de ter sido aprovado no Congresso e tornado lei, passou por críticas por
prever navios com tonelagem muito baixa. Este projeto não saiu do papel e seu sucessor na
pasta da Marinha em 1906, o Almirante Alexandrino de Alencar,83 buscou opções para a
mudança das propostas iniciais e a passagem da encomenda dos navios para os recém-
lançados dreadnoughts ingleses, encouraçados mais potentes e com maior tonelagem. Houve
intenso debate entre os defensores da proposta de Noronha e as novas aspirações de
Alexandrino. Diante da situação, o Ministro ordenou a elaboração de um novo projeto,
mantendo, contudo, características e os créditos ao projeto de 1904. As novas propostas
ficaram conhecidas como “projeto ‘Rumo ao mar’ do almirante Alexandrino e , em 1907, foi
dada a ordem para a construção dos dreadnoughts Minas Gerais e São Paulo, de mais de
18.000 toneladas de deslocamento” (ALMEIDA, 2010, p. 7).
Como afirma Martins Filho,
o novo plano se concentrou em três encouraçados do tipo dreadnought, classe de
navios inaugurada em 1906 na Inglaterra. Sua marca registrada era a padronização
do calibre dos canhões, concentrados em torres rotatórias avante e a ré, ou seja,
podiam disparar contra alvos inimigos localizados à frente e atrás da embarcação,
além do disparo usual, em ambos os bordos. Outra característica desse tipo de navio
era a velocidade, que no modelo fabricado para a Marinha brasileira chegava a vinte
e um nós a plena força de seus motores de vapor a turbina. Velocidade e potência de
fogo exigiam dimensões imensas. Com mais de 150 metros de popa a proa, o Minas
deslocava 19 mil toneladas (2008, p. 1).

82
O projeto de Noronha previa a aquisição de “três couraçados inicialmente inspirados na classe britânica
Triumph, com 13 mil toneladas de deslocamento, além de três cruzadores couraçados” (MARTINS FILHO,
2008, p. 1).
83
Este foi o primeiro dos três períodos em que Alexandrino de Alencar ocupou o Ministério da Marinha: 1906-
1910, 1913-1918 e 1922-1926.
76

O terceiro encouraçado previsto no projeto, o Rio de Janeiro, acabou sendo vendido


para a Turquia por desistência do governo brasileiro. O programa final adquiriu para a frota
brasileira dois dreadnoughts, dois scouts e dez destroyers que foram entregues ao país a partir
de 1908 (ALMEIDA, 2010).
Com projetos de modernização e reaparelhamento em andamento, tanto MB quanto
EB ainda enfrentavam um grave problema quanto à composição de suas fileiras. A defasagem
entre a necessidade numérica expressa pelos planejamentos e o efetivo do Exército era
grande. Como exemplo, para o ano de 1904 previa-se 28.000 homens em suas fileiras, mas o
número real era de 15.000 apenas. Como alternativa para solucionar o problema, buscou-se
colocar em atividade um instrumento previsto na Constituição de 1891, o de recrutamento
militar estabelecido através de sorteio. O caso da Marinha não era muito diferente. Como já
pontuado anteriormente, as praças eram comumente indigentes, condenados, homens pobres
que eram recrutados a força para completar os quadros navais devido ao baixo número de
voluntários84 que buscavam o serviço militar. No mesmo ano de 1904, as previsões para o
efetivo eram de 4.000 homens, mas seu número real era de apenas 2.661, com defasagem de
mais de 1.000 homens e apenas 67% de suas fileiras preenchidas (ALMEIDA, 2010;
NASCIMENTO, 2010).
Dentro das ações de modernização da Marinha, algumas atenções específicas sobre o
processo do treinamento e formação de seus militares foram enfatizadas. Suas escolas de
aprendizes marinheiros passaram por reformulações de regulamento entre 1885 e 1907,
havendo especial destaque para as questões físicas. O curso tinha a duração de três anos e os
militares não poderiam deixar a MB por nenhuma outra razão que não fosse a incapacidade
física ou mental. Entre as mudanças no currículo, em 1907 as aulas de doutrina cristã
passaram a não ser mais exigência e as aulas de aritmética e língua portuguesa foram
intensificadas. O regulamento aprovado no ano de 1907 ainda previa a existência, em todas as
escolas de aprendizes marinheiros de
utensilios requisitados pelo jogo de esgrima, um pateo ou area contendo todos os
apparelhos para o exercicio de, gymnastica, embarcações apparelhadas
convenientemente para exercidos de remos e bordejos á vela, devendo ser as
mesmas em numero suficiente para exercicio de metade dos aprendizes que
comportar a escola.85

84
Vale destacar ainda que “muitos dos voluntários eram de fato coagidos pelas autoridades policiais, sobretudos
a partir das brechas abertas pelo código penal da República de 1890, que punia, em seus artigos 399 e 404, a
‘vagabundagem’, a ‘capoeiragem’ e a ‘mendicância’. Segundo os termos da lei, a pessoa em uma dessas
situações poderia ficar detida por alguns dias e se engajava a encontrar uma ocupação, que podia ser o
enquadramento militar” (ALMEIDA, 2010, p. 12-13).
85
BRASIL. Diário Oficial da União de 24 de março de 1907, Seção 1, p. 7.
77

Além destas, destacavam-se ainda as preocupações com a formação técnica com a


inserção de oficinas, como a carpintaria (ALMEIDA, 2010).

2.7 Forças Armadas: “grandes escolas de educação physica, intellectual e moral da


mocidade”

O Almirante Alexandrino de Alencar assumiu a pasta da Marinha no governo do


mineiro Afonso Pena, eleito em 1906 para suceder o paulista Rodrigues Alves de quem havia
sido vice-presidente. Pena não era o nome de preferência do então presidente, que tinha como
primeira indicação Bernardino de Campos. No entanto, após três presidentes paulistas
(Prudente de Morais, Campos Sales e Rodrigues Alves), ocorreu uma forte reação contra a
escolha do governo e o nome do vice-presidente mineiro ganhou força para a candidatura
(PAES, 2006). Ao assumir o governo, Afonso Pena tinha como objetivos a continuidade dos
programas de melhorias nas ferrovias e portos, as ações de reorganização das FFAA e os
projetos de saneamento e colonização do interior do país, liderados pelo Marechal Rondon.
Seu governo ainda foi marcado pela opção de selecionar para seus ministérios políticos
jovens, fazendo-os ficar conhecidos como “Jardim de Infância”. O presidente não completou
seu mandato, tendo falecido em junho de 1909 (CRHRB, 2012).
Os ministérios da Guerra e da Marinha, ocupados respectivamente por Hermes da
Fonseca e Alexandrino Faria de Alencar, prosseguiram as atividades de reaparelhamento e
reorganização das FFAA, projetos intensificados no governo Afonso Pena. As atenções de
ambas as instituições recaíram tanto sobre os aspectos materiais, como com relação ao pessoal
militar. O Ministro da Marinha Almirante Alexandrino em seu relatório do ano de 1906
reforçava a necessidade urgente de maiores investimentos nas escolas de formação, uma vez
que o processo de aquisição de novos navios para a Marinha já estava encaminhado. O
Almirante defendia no documento a popularização das vantagens que as escolas de aprendizes
ofereceriam às famílias “menos abastadas” e reforçava a melhoria das condições materiais e
higiênicas já que faltavam elementos tanto para a “educação intellectual e physica, como de
ensino profissional e technico”.86

86
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha, 1906, p. 6.
78

No ano seguinte, em 1907, Alexandrino destacou em seu relatório os três pontos


principais de atuação no processo de reorganização da Marinha: melhorias na eficiência da
esquadra, com a aquisição de novos navios; educação do pessoal, com a ampliação das
escolas de aprendizes, reformulação dos currículos das escolas de formação de praças e
oficiais e o estabelecimento das manobras práticas nos navios e viagens de instrução; e as
reformas na administração da força naval.87 Com estas ações, a Marinha do Brasil finalmente
iniciou a reforma que se defendia desde o século XIX.
Os projetos desenvolvidos para o Exército espelhavam-se nos modelos de organização
das forças estrangeiras. Como já destacado, estes modelos eram constantemente divulgados na
Revista Militar sendo sempre reforçado que o EB precisava de reestruturações que levassem
em conta um processo de maior profissionalização de seus militares. Na edição de 1906 da
Revista Militar, o Capitão do Estado-Maior de Artilharia Liberato Bittencourt destacou no
artigo “Princípios geraes de organização dos exércitos” os 12 temas que devem ser levados
em conta neste processo:
1- Principio da nacionalização das forças;
[...]
2- Principio da unidade de organização;
[...]
3- Principio da rapidez de mobilização;
[...]
4- Principio da rapidez de concentração;
[...]
5- Principio do constante effectivo de guerra;
[...]
6- Principio da unidade de direção;
[...]
7- Principio da uniformidade dos serviços militares;
[...]
8- Principio de elevação moral;
[...]
9- Principio de afastamento político;
[...]
10- Principio de educação physica, intellectual e moral: organisar os exércitos de
modo a serem elles grandes escolas de educação physica, intellectual e moral da
mocidade. O serviço pessoal e obrigatório por um lado e um sábio systema de
educação intellectual e pratica por outro bastarão ao desejado alvo. Tanto valera
adiantar que este décimo principio decorre naturalmente da existência de dous outros
– o da nacionalização das forças e da unidade de direcção. E si subsiste isolado, é
porque, isoladamente considerados, aquelles dous princípios não lhe explicam
satisfactoriamente o objectivo alevantado e patriótico;
11- Principio do mínimo dispêndio;
[...]
12- Principio da victoria provável.88

87
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha, 1907, p. 3.
88
BITTENCOURT, Liberato. Princípios geraes de organização dos exércitos. Revista Militar, ano VIII, p. 341-
348.
79

O destaque para a função de ser “grandes escolas de educação physica, intellectual e


moral da mocidade”, atribuídos ao Exército, enfatiza os ideais sobre a necessidade de uma
sociedade envolvida com as atividades militares, com as ações de defesa da pátria. No artigo,
o Capitão Bittencourt ainda defende que a atenção criteriosa a estes 12 princípios seria o
caminho para uma boa e efetiva organização militar, já que, segundo ele, estes elementos
contemplariam todas as questões militares fundamentais para uma nação. Esta perspectiva do
Capitão acompanhava, em grande parte, as discussões sobre a necessidade de um novo
formato para o EB, mais operativo e menos teórico, seguindo os modelos adotados pelas
grandes potências militares como França, Alemanha e Estados Unidos. 89
As ações de revitalização das FFAA desenvolvidas na primeira década do século XX
foram amplamente divulgadas na imprensa carioca. Ao observar as edições do ano de 1908
das revistas ilustradas Careta e Fon-Fon90, percebe-se o destaque das publicações para estas
atividades. O ano de 1908 foi marcado pela publicação da Lei nº. 1.860, de 04 de Janeiro de
1908 que regulava o alistamento e sorteio militar e reorganizava o Exército estabelecendo que
todo cidadão brasileiro de 21 a 44 anos completos seria obrigado ao serviço militar, por
voluntariado ou através de sorteio, sendo a duração do serviço na primeira linha de nove anos
com até dois na ativa e mais sete na sua reserva. As fileiras ativas do Exército seriam
constituídas por dois grupos: sorteados e voluntários especiais.91, 92

89
BITTENCOURT, Liberato. Princípios geraes de organização dos exércitos. Revista Militar, ano VIII, p. 341-
348.
90
A Fon-Fon, assim como a Careta, era uma revista ilustrada de publicação semanal, inicialmente dirigida por
Lima Campos, Gonzaga Duque e Mário Pederneiras até 1914 e posteriormente por Álvaro Moreyra e Hermes
Fontes e circulou de 1907 a 1945. Trazia no perfil, segundo Nogueira (2010, p. 14), um “certo esnobismo
urbanizante, ansiado pelo seu público leitor mais cativo: a elite burguesa letrada.” Como a Careta, surgiu em
uma fase de mudança na forma de produzir da imprensa brasileira quando o método artesanal foi substituído pelo
industrial aproximando este segmento dos novos padrões e características da sociedade burguesa, seguindo os
modelos dos periódicos europeus. A revista Fon-Fon preocupava-se em registrar a vida sócio-cultural brasileira,
destacando amplos espaços para as atividades dos cavalheiros e damas da sociedade, “assim, da maneira leve,
irônica, cômica ou lírica das crônicas, a Fon-Fon, fazendo o registro da vida mundana carioca, das notas sociais,
da euforia da Belle Époque no Rio, contribuiu para documentar esse período tão instigante da história do Brasil”
(ZANON, 2005, p. 30). No ano de 1908 seu preço semanal para a capital era de 400 reis e demais estados de 500
reis. A assinatura anual custava 18.000 reis e a semestral, 10.000 reis. A revista Fon-Fon trazia em sua capa
principal, no período analisado neste trabalho, diferentes temáticas trabalhadas através de ilustrações
representando personalidades, questões sociais ou políticas. Também apresentava páginas integrais de anúncios
(anúncios de relojoarias, lojas de tecidos, charutos, cervejaria, chapéus, leite maltado, tônicos, sabonetes, chás,
licores, loteria, apólices de seguro, pianos, remédios, Maison de roupas refinadas, Gillete, chocolate e cacau
solúvel, máquina de fazer pão, sucos diversos, cintas abdominais, espartilhos) e muitas fotografias do cotidiano
da cidade.
91
BRASIL. Lei nº 1.860, de 04 de Janeiro de 1908. Regula o alistamento e sorteio militar e reorganiza o
Exercito. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/legin/fed/lei/1900-1909/lei-1860-4-janeiro-1908-580934-
publicacaooriginal-103780-pl.html>. Acesso 20 jul. 2011.
92
As condições de alistamento dos “voluntários especiais” foram regulamentadas por decreto específico sob nº.
6.850 de 20 de Fevereiro de 1908. Este decreto aprovava as instruções que fixavam as forças de terra para o
exercício de 1908 estabelecendo o recrutamento de “voluntários especiais” para a composição e ampliação das
tropas e Tiros do Exército. Poderiam ser admitidos somente brasileiros natos ou naturalizados, até 21 anos
80

Em seu relatório referente ao ano de 1907 e concluído em junho de 1908, o Ministro


da Guerra Hermes da Fonseca destacava os grandes benefícios para as fileiras do Exército
trazidos pelo regulamento do sorteio militar. Segundo o Marechal, o regulamento foi recebido
com
symphatia e geraes applausos pelo povo e especialmente pela mocidade estudiosa,
que desde então tem affluido aos quartéis do Exercito para receber a instrução
militar, indispensável ao cumprimento oportuno do seu dever cívico de defender a
integridade da Pátria e a manutenção das instituições nacionaes.
[...]
O interesse do Governo não é perturbar os interesses do povo, e sim montar esse
grande apparelho da defesa que é o alistamento militar e fazel-o funccionar
permanentemente, não tanto para obter soldados para o serviço ordinário de
guarnição, pois não nos faltam voluntários, mas para que no momento preciso, sem
entrave nem confusão, se possa chamar ás armas a Nação inteira.93

Esta “adesão” da mocidade relatada pelo Ministro foi tema de diversas matérias na
imprensa carioca. A primeira página da revista Careta de 06 de junho de 1908 apresentava
uma foto ocupando quase meia página, na vertical, com fotografia de um rapaz fardado e em
posição de continência abaixo do título “Reorganização do Exército” e legenda que
identificava o retratado como Luiz Bergamm indicando que seria o voluntário que teve a
“virtude de vestir a honrosa farda do Exército”, destacando ainda que o jovem era integrante
de uma família ilustre.94
Nas 30 edições da revista Careta e 30 edições da Fon-Fon publicadas no segundo
semestre de 1908, foram localizadas inúmeras referências aos “voluntários especiais”. No dia
06 de junho de 1908, a Fon-Fon publicou uma matéria de 03 páginas chamada “A Vida
Militar” sobre o cotidiano do 1º. Batalhão de Infantaria do Exército mostrando o cotidiano do
quartel (dormitórios, rancho, instrução de recrutas, exercícios de esgrima, viaturas).95 A

(menores dessa idade somente com autorização da família), não podendo se alistar os casados, viúvos com filhos
ou os arrimos de família e indivíduos que tivessem sido condenados por crime previsto no parágrafo único do
art. 46 do Código Penal da Armada. Neste período, o Código Penal da Armada era aplicado também às fileiras
do Exército. O artigo em referência neste decreto, determina que “Art. 46. A pena de degradação se haverá como
pronunciada pela sentença que impuser a pena principal, nos crimes que tornarem o condenado indigno de
pertencer ao serviço militar.Parágrafo único. Para este efeito consideram-se crimes que acarretam indignidade:
os cometidos contra a independência e integridade da Pátria (arts. 74, 75 e 76); os de traição e covardia. (arts. 81,
82 e 84); os de revolta ou motim (arts. 93 e 94 parágrafo único); e roubo (arts. 156, 157, 158 e 159)”. Os
voluntários e engajados também não poderiam se casar enquanto estivessem cumprindo o serviço de 03 anos.
Para a categoria de “voluntários especiais”, o decreto trazia elementos distintivos que os dispensava de pernoitar
nos quartéis ou permanecer tempo além daquele destinado aos exercícios (exceto em casos de manobra onde
ficariam no regime militar comum), determinava abono de faltas para aqueles que fossem alunos de escolas
superiores e estivessem em manobra. Em caso de manobras, estes seriam organizados em unidades especiais.
BRASIL. Decreto nº 6.850, de 20 de Fevereiro de 1908. Approva as instrucções para a execução dos arts. 3º o 4º
da lei n. 1767, de 31 de outubro de 1907, que fixa as forças de terra para o exercicio de 1908. Disponível em:
<http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=6 1292> . Acesso 12 jul. 2011.
93
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra, 1907, p. 3; p. 5.
94
Revista Careta 06 de junho de 1908, p. 9.
95
Revista Fon-Fon 06 de junho de 1908.
81

esgrima, já presente no cotidiano dos militares desde o século anterior, passou a ocupar
espaço de divulgação na imprensa entre as principais atividades dos novos militares. Na
semana seguinte, mais uma matéria com duas páginas inteiras apresentando os jovens
voluntários especiais do Exército com imagens da cerimônia de juramento a bandeira, desfile
do Batalhão de Infantaria e uma foto de topo de página dos sete primeiros voluntários
especiais, alunos das escolas superiores, que se alistaram no Exército.96 A Careta também
publicou algumas fotografias sobre esta temática mostrando os processos de treinamento,
formatura dos voluntários e apresentação dos novos militares antes de serem distribuídos
pelas fileiras do Exército.97
Assim como a reorganização do Exército, o processo de renovação técnica na Marinha
também recebeu atenção da imprensa. As revistas Careta e Fon-Fon dedicaram espaço para
apresentar a “Reorganização da Marinha” com fotografias do novo Cruzador Minas Gerais
em construção no porto de New Castle na Inglaterra, desde suas primeiras estruturas até o
lançamento ao mar.98 O papel do Ministro da Marinha Almirante Alexandrino de Alencar foi
destacado através de notas intituladas “O reorganizador da Armada” onde aparecia posando
ao lado da família e de seus oficiais subordinados.99
As festas em comemoração a Batalha Naval do Riachuelo, celebradas
tradicionalmente pela Marinha em 11 de junho, foram amplamente noticiadas nos dois
periódicos, com fotografias ocupando páginas inteiras com os participantes das festas e os três
vencedores do Concurso de Tiro da Marinha Nacional realizado na comemoração.100 A
disputa de caráter esportivo do Concurso de Tiro foi noticiada como uma das partes mais
importantes das comemorações da data magna da Marinha do Brasil101, evidenciando o já
significativo papel das competições esportivas entre os militares da MB naquele momento.

96
Revista Fon-Fon 13 de junho de 1908.
97
Revista Careta 15 de agosto de 1908; Revista Careta 12 de setembro de 1908; Revista Careta 19 de setembro
de 1908.
98
Revista Careta 25 de julho de 1908; Revista Careta 01 de agosto de 1908; Revista Careta 12 de setembro de
1908; Revista Careta 10 de outubro de 1908; Revista Fon-Fon 05 de dezembro de 1908.
99
Revista Careta 17 de outubro de 1908; Revista Careta 26 de dezembro de 1908.
100
Revista Careta 13 de junho de 1908; Revista Careta 20 de junho de 1908; Revista Fon-Fon 20 de junho de
1908.
101
A Batalha Naval do Riachuelo, ocorrida durante a Guerra do Paraguai ou Guerra da Tríplice Aliança, foi
finalizada no dia 11 de junho de 1865 com o Brasil assumindo o controle dos rios da região e a quase destruição
da esquadra paraguaia e foi um momento decisivo para o desfecho do conflito. Esta batalha passou a ser
considerada uma das vitórias mais relevantes da história marítima brasileira e a data de 11 de junho tornou-se a
data magna, a mais importante comemoração da Marinha do Brasil (VIDIGAL, 2009).
82

A chegada do Cruzador Amélia de Portugal com a comitiva que representaria o país na


Exposição Nacional realizada naquele ano e a viagem de circunavegação realizada pelo
Navio-Escola Benjamin Constant102 da Marinha do Brasil foram também alvo da imprensa.
Os eventos em homenagem aos portugueses como almoço no Corcovado com aspirantes
brasileiros, “senhoritas” e integrantes do Clube Naval; evoluções, formaturas e tiros de
canhão realizados na Escola Naval; almoço a bordo do Cruzador oferecido ao Ministro de
Portugal; e visita dos oficiais da Marinha Portuguesa a Fortaleza de Villegagnon para
observação de exercícios e partida de futebol realizada pelos marinheiros brasileiros
ocuparam páginas inteiras das edições com fotografias.103
Os navios estrangeiros que vieram para a Exposição Nacional foram retratados pelos
periódicos (Esquadra Inglesa, Navio Belga), dando destaque aos eventos realizados em
homenagem aos oficiais da Esquadra Inglesa como almoço nas Paineiras e visita ao
Corcovado; uma partida de futebol entre um time brasileiro e um composto por oficiais
ingleses realizado no campo do Fluminense Football Club; corrida de cavalos realizada no
Jockey Club em homenagem aos oficiais ingleses; além de uma matinê realizada a bordo do
capitânea104 da Esquadra Inglesa, o Good Hopes, com visita do Presidente da República. Foi
também noticiada a instalação de posto de correspondências montado pela Associação Cristã
de Moços para atender aos marinheiros ingleses.105
Outro evento que recebeu destaque foi o torneio de football realizado entre Brasil e
Argentina no campo do Fluminense Football Club, sendo apresentadas imagens nas duas
revistas desde a chegada do time argentino ao país, diversas fotos da partida, passeios dos
argentinos a Petrópolis e almoço em homenagem aos visitantes oferecido no Itamaraty.106
As regatas realizadas no ano de 1908 e os principais clubes também tinham espaço nas
publicações. A Careta de 13 de junho apresentou fotos da regata realizada em Botafogo em
montagens ocupando meia página da edição. Em outubro, novembro e dezembro a revista
ainda publicou mais imagens das últimas regatas do ano de 1908 e do Clube de Regatas São

102
Viagem realizada ao redor do planeta, atracando em portos de diferentes continentes com os alunos do quarto
ano da Escola Naval, último ano de formação que era realizado com atividades práticas a bordo do Navio-
Escola.
103
Revista Careta 01 de agosto de 1908; Revista Careta 08 de agosto de 1908; Revista Careta 22 de agosto de
1908; Revista Careta 12 de setembro de 1908; Revista Careta 19 de setembro de 1908; Revista Fon-Fon 08 de
agosto de 1908; Revista Fon-Fon 15 de agosto de 1908; Revista Fon-Fon 22 de agosto de 1908
104
Capitânea é o navio onde o Comandante da Esquadra segue a viagem e de onde as ordens para ação dos
demais navios são emitidas.
105
Revista Careta 12 de dezembro de 1908; Revista Fon-Fon 05 de dezembro de 1908; Revista Fon-Fon 12 de
dezembro de 1908; Revista Fon-Fon 19 de dezembro de 1908.
106
Revista Fon-Fon 11 de julho de 1908; Revista Fon-Fon 18 de julho de 1908; Revista Careta 11 de julho de
1908; Revista Careta 18 de julho de 1908.
83

Cristóvão. Fon-Fon também dedicou espaço nas edições para imagens das competições
realizadas no Pavilhão de Regatas e sobre eventos nos clubes.107
Outras atividades esportivas também receberam destaque dos dois periódicos com a
publicação de fotografias como as Corridas no Jockey Club e no Derby Club108, Concursos de
Tiro realizados em Realengo109, a Corrida de Automóveis realizada em Itapecerica,
identificada pela Fon-Fon como a “Primeira corrida de automóveis no Brasil”110, Corrida de
Touros realizada em Santa Rita do Passa Quatro111, Concurso de Esgrima organizado pelo
Clube Força e Coragem de São Paulo112 e uma partida de Basketball realizada entre as alunas
em inauguração de escola modelo na cidade de Vitória no Espírito Santo.113
Os destaques para as ações dos militares neste ano podem ser identificadas como
desdobramentos das medidas iniciadas ainda nos anos de 1905/1906. A visibilidade dedicada
aos processos de reorganização e reaparelhamento de EB e MB tinham como objetivo a
construção de uma imagem forte e estruturada para estas instituições. É importante destacar a
significativa importância dada ao esporte, em fins da primeira década do século XX, pelos
militares inserindo estas atividades no cotidiano das instituições não somente em seus
treinamentos funcionais e para manutenção do corpo, mas também como elemento
comemorativo e de confraternização tanto entre suas corporações como com militares
estrangeiros. Ao receberem visitas oficiais, tanto Exército como Marinha além dos
tradicionais jantares e bailes, passaram a promover partidas de futebol, regatas e apresentação
de exercícios. O esporte passou de elemento de preparação de “novos soldados” em meio à
população, para um instrumento de “diplomacia” para com nações amigas.
O período analisado neste Capítulo 2, compreendido entre o início da República e os
anos finais da primeira década do século XX foi marcado pela maior aproximação dos
militares das práticas de atividade física e esportiva de forma sistematizada, sendo estas
defendidas principalmente como ferramentas de preparação do corpo dos soldados e dos
cidadãos para uma melhor defesa do território. Neste sentido, o esporte e a gymnastica
passaram, ao longo da primeira década do século XX, a ocupar outros espaços no interior da
estrutura das instituições. A prática esportiva ganhou formas de ferramenta de atração da

107
Revista Careta 12 de setembro de 1908; Revista Careta 03 de outubro de 1908; Revista Careta 14 de
novembro de 1908; Revista Careta 05 de dezembro de 1908; Revista Fon-Fon 20 de junho de 1908.
108
Revista Careta 20 de junho de 1908; Revista Careta 08 de agosto de 1908.
109
Revista Careta 18 de julho de 1908.
110
Revista Careta 01 de agosto de 1908; Revista Fon-Fon 08 de agosto de 1908.
111
Revista Careta 19 de dezembro de 1908.
112
Revista Fon-Fon 28 de novembro de 1908.
113
Revista Fon-Fon 05 de dezembro de 1908.
84

juventude para as FFAA, elemento disciplinador, instrumento diplomático, além de práticas


de recreação e lazer.
Esta transição se desenrolou ao longo da primeira década, mas se intensificou
significativamente em meados dos anos 1910, quando o processo de organização destas
práticas iniciou sua efetiva estruturação dentro das FFAA com a fundação das Ligas
Esportivas Militares. Estas entidades passaram a ser responsáveis pela divulgação e
organização das atividades esportivas entre os militares tanto no interior dos quartéis como
nas participações de seus membros em competições civis.
O Capítulo 3 deste trabalho dedica-se a discutir como algumas influências estrangeiras
foram incorporadas no processo de aprimoramento das ações com relação ao preparo das
FFAA brasileiras e possibilitaram novas perspectivas com relação ao esporte e à educação
física e os fatores internos e externos que fomentaram a criação das Ligas Esportivas nas
FFAA no ano de 1915.
85

3
UMA NOVA ESTRUTURA PARA AS
FORÇAS ARMADAS BRASILEIRAS:
OS IMPACTOS DAS INFLUÊNCIAS
ESTRANGEIRAS E O PAPEL DO
ESPORTE ENTRE OS MILITARES
(1908-1915)
86

3.1 O olhar para o estrangeiro: influências externas no processo de organização das


Forças Armadas brasileiras no início do século XX.

As influências estrangeiras nas FFAA brasileiras na primeira década do Novecentos


eram identificadas em diferentes esferas de atuação. As aproximações com Forças Armadas
estrangeiras foram realizadas tanto pelo Exército como pela Marinha através de períodos de
observação de suas atividades e processos de organização (como é possível perceber por meio
dos relatos em suas revistas institucionais desde o século XIX) e das ações realizadas em
visitas oficiais a outros países e recepções de Forças amigas em território nacional.
Em meio às ações de reestruturação das FFAA brasileiras empreendidas nos primeiros
anos do século XX, o “olhar” para o estrangeiro foi um movimento constante, uma vez que os
modelos de organização e treinamentos dos militares da Europa, América e Ásia eram
observados com vistas a elaborar um modelo adequado à realidade nacional. Neste processo
de aproximações, o Exército Brasileiro passou a estudar a possibilidade de buscar oficiais
estrangeiros para implementar ações de modernização em suas estruturas estabelecendo
renovações de ordem material e técnica. Sobre este ponto, Luna afirma que
a prática de convidar oficiais para fazer estágios de maior ou menor duração no
corpo de tropa ou cursos de especialização inseria-se no conjunto de iniciativas
sistemáticas e de longo curso dos países desenvolvidos que visavam à conquista de
posições privilegiadas na venda de armas e equipamentos, no estabelecimento de
eventuais alianças militares estratégicas e na disputa por mercados (2007, p. 2).

Seguindo esta perspectiva de aproximação com prováveis potências no Cone Sul, a


Alemanha, que já mantinha presença entre as FFAA de Argentina e Chile desde fins do século
XIX, emitiu convite em 1905 ao EB, por parte do Imperador Guilherme II, para o envio de
oficiais para estagiar junto a seus militares. O convite foi apoiado pelo Barão do Rio Branco,
então Ministro das Relações Exteriores do Brasil (LUNA, 2007). Esta proposta foi veiculada
também em países não envolvidos no acordo, mas com possível interesse nas repercussões
desta aproximação. A nota a seguir foi publicada no jornal The Washington Times, periódico
norte-americano, em 23 de maio de 1905114
Brazilian Army Officers will train in Germany
Rio de Janeiro Brazil May 23
The German legation has made communication to government In this name of the
Emperor William that the Brazilian officers would be well received by the imperial
army on their being sent to Germany complete their course of military instruction
The officers are Capt Arturo Sarmento and Lieutenants Melo, Mattos, Constancia
Deschamps, Estellita Werner, Benito Marinso and Manuel Busregard.

114
Jornal The Washington Times, 23 de maio de 1905, p. 6.
87

Segundo Luna (2007) foram enviados ao estágio junto aos militares alemães três
turmas de oficiais brasileiros. A primeira realizou os treinamentos entre 1906 e 1908. As duas
turmas seguintes foram enviadas em 1908 e 1910. Vale destacar que no ano de 1908, ano de
conclusão da primeira turma e envio da segunda, ocorreu a primeira visita oficial do Ministro
da Guerra Marechal Hermes da Fonseca à Alemanha. Estes grupos de oficiais que estagiaram
entre 1906 e 1912 no Exército Alemão receberam a alcunha de “jovens turcos”. Ao
retornarem ao país, passaram a defender a implantação da estrutura militar germânica no EB
divulgando as práticas aprendidas durante o estágio e as qualidades técnicas e de
equipamento. O objetivo dos alemães era o envio de uma missão militar ao Brasil, como já
haviam feito na Turquia, para reformar o Exército. Estas aspirações, no entanto, traziam
preocupações ao alto escalão hierárquico que via nas renovações um caminho para a redução
das projeções e destaques pessoais. Como forma de reforçar seus propósitos, o então Ministro
da Guerra Marechal Hermes da Fonseca foi convidado pelo Imperador Guilherme II para
assistir a uma série de exercícios militares no ano de 1908.115 Esta visita recebeu espaço
importante em alguns periódicos em circulação no período, sendo noticiados os eventos de
partida e chegada do Marechal, além de atividades realizadas pelo Ministro e sua comitiva
naquele país em duas revistas ilustradas que circulavam na cidade do Rio de Janeiro. Na
revista Careta, o destaque maior foi dedicado às cerimônias de partida e chegada dos militares
brasileiros, sendo publicadas fotografias destes eventos nos dias 15 de agosto e 07 de
novembro daquele ano. Já a Revista Fon-Fon reservou espaço para apresentar os aspectos da
partida do Marechal; suas atividades na Alemanha observando as paradas e manobras
militares do Exército; visitas a fábricas de armamento e canhões; e as festividades em sua
homenagem no retorno ao Brasil.116 “Nunca um oficial brasileiro recebera tantas
considerações da parte de uma grande potência […] depois desta viagem, Hermes da Fonseca
teria assumido o compromisso de contratar uma missão alemã para instruir o Exército
brasileiro” (DOMINGOS, 2001, p. 199).
As aproximações entre brasileiros e alemães passaram a preocupar também os
militares franceses, uma vez que França e Alemanha eram grandes concorrentes na venda de
materiais bélicos. Como afirma Luna,

115
Mais tarde, sob esta influência, o Marechal Hermes realizou as primeiras grandes manobras militares em
Realengo.
116
Revista Careta 15 de agosto de 1908; Revista Careta 07 de novembro de 1908; Revista Fon-Fon 03 de
outubro de 1908; Revista Fon-Fon 10 de outubro de 1908; Revista Fon-Fon 24 de outubro de 1908; Revista
Fon-Fon 07 de novembro de 1908.
88

picuinhas e boatarias foram veiculadas em jornais franceses, alemães e brasileiros. O


jornal Lé Brésil, por exemplo, anunciou que o Marechal Hermes da Fonseca não
visitara a França, que, na época, também realizava suas manobras de guerra, porque
o itinerário de sua viagem fora determinado pelo Kaiser, o que causou nos circuitos
oficiais franceses uma impressão desagradável (2007, p. 4).

Diante deste quadro de clara disputa por influência militar, dois anos depois, em 1910,
já como presidente eleito, mas ainda não empossado Hermes da Fonseca visitou novamente a
Alemanha no mês de setembro. Neste mesmo ano, no mês de agosto, também havia visitado a
França e cumprido extensa agenda de compromissos oficiais. No entanto, ao contrário do que
se esperava e do que os jornais brasileiros, alemães e franceses tentavam defender, após
assumir a presidência nenhum dos países europeus foi privilegiado na disputa, ficando as
decisões sobre a vinda de uma missão militar estrangeira suspensas durante todo o seu
mandato (1910-1914). As discussões sobre o tema, no entanto, prosseguiram com o destaque
pela necessidade de renovação no EB seguindo a estrutura alemã de forma acirrada pelos
“jovens turcos” (LUNA, 2007).
Em paralelo a estas discussões e buscando não ficar fora da disputa, ainda em 1905 os
militares franceses haviam recebido o convite para enviar uma missão para atuar na Força
Pública de São Paulo. Este convite tinha como objetivo o fortalecimento das polícias
estaduais por parte das oligarquias locais na busca por resgatar o prestígio e o controle sobre
estas corporações, progressivamente perdidos desde a Guerra do Paraguai. Apesar de as
negociações terem se desenvolvido de forma rápida, o Exército Francês não apresentou
grande entusiasmo em enviar uma missão para uma Força Policial. Segundo Manuel
Domingos (2001), seus reais objetivos eram a entrada no Exército Brasileiro e
estabelecimento de sua estrutura militar naquela instituição, mas como discutido
anteriormente o EB estava em processos de aproximação com os militares alemães. O
Ministério de Negócios Estrangeiros da França, no entanto, resolveu atender ao pedido do
então Embaixador brasileiro na França, Toledo de Piza (membro da oligarquia paulista), com
vistas a estabelecer uma infiltração em um “Estado muito próspero”, conforme suas
declarações. Sendo assim, foi encaminhada uma missão coordenada pelo Coronel Paul
Balagny para atuar em São Paulo no ano de 1906 (DOMINGOS, 2001).117

117
Neste mesmo período, as preocupações com o processo de formação em Educação Física entraram em pauta
nos debates legislativos. Em 1905, o deputado amazonense Jorge de Morais apresentou projeto ao Congresso
Nacional propondo a criação de duas escolas de Educação Física, sendo uma civil e a outra militar. Previa ainda
o envio de oficiais de terra e mar para a Europa e América do Norte para se especializarem na área. Declarava a
necessidade de se adquirir terrenos para a realização de jogos ao ar livre e a instituição da ginástica sueca e jogos
ao ar livre no Ginásio Nacional, Colégio Militar e Escola de Aprendizes e Marinheiros. Entretanto, apesar de ter
sido aprovado o projeto não foi concretizado (GRUNENNVALDT, 2006).
89

Os franceses iniciaram suas atividades junto a Força Pública de São Paulo e, após sua
chegada, passaram a buscar apoio junto ao General Luiz Mendes de Morais, provável
substituto de Hermes da Fonseca na pasta da Guerra. As ações realizadas em São Paulo foram
utilizadas como propaganda das possibilidades de atuação e das contribuições que uma
missão francesa poderia estabelecer no EB (DOMINGOS, 2001).
Focando na temática de estudo deste trabalho, pode-se destacar esta atuação dos
militares franceses em São Paulo como um marco importante para as relações entre esporte,
educação física e militares no Brasil. Como desdobramentos das renovações implementadas
pela Missão Francesa, foi criada a primeira Escola de Educação Física do país com o objetivo
de formar monitores para divulgar a prática de esporte e atividade física. Publio e Catalano
(2005) transcreveram o documento que oficializou a criação da Escola de Educação Física da
Força Pública de São Paulo que inicialmente foi nomeada de “Curso de Esgrima e Ginástica”
e esteve sob a direção do Capitão do Exército Francês Delphin Balancier. A sede da Escola
foi estabelecida próximo ao rio Tietê, espaço tradicional de concentração dos clubes
esportivos paulistas desde o final do século XIX. O documento de criação, Aviso da 3a. Seção
nº 185 de 03 de março de 1910, foi publicado na Ordem do Dia nº. 52 do Comando do 1°
Batalhão da Força Pública e tinha o seguinte teor
Senhor Comandante Geral da Força Pública. Declaro-vos em referência ao Ofício nº
330 de 14 do mês passado que fica creado um Curso de Esgrima e Gymnastica,
destinado aos officiais da Força Pública do Estado, devendo serem tomadas as
providências para instalação do respectivo apparelho em sala adrede preparada.
Saúde e fraternidade. (Assinado) W.Luiz (PUBLIO e CATALANO, 2005, p. 414).

A oficialização da criação da primeira Escola de Educação Física do Brasil veio a


consolidar as influências recebidas pela presença do Exército Francês desde 1906. As
atividades e treinamentos desenvolvidos eram divulgados para a sociedade em geral através
de notícias publicadas na imprensa enfatizando a importância das atividades físicas neste
período. No início do século XX, as preocupações com estas atividades ocupavam espaço nos
periódicos, tal como os eventos sociais e as cerimônias das diferentes forças militares do país.
A experiência da Missão Francesa pela Força Pública de São Paulo não passou em branco. A
revista Careta, no dia 13 de junho de 1908,118 publicou matéria relatando a experiência da
Força Pública de São Paulo com as propostas da Missão Francesa chefiada pelo Coronel Paul
Balagny, representado a cavalo em imagem ao lado do Tenente-Coronel Pedro Arbues. O
destaque de página inteira para as atividades demonstra a importância atribuída pela revista à
chegada deste grupo de oficiais franceses na Polícia de São Paulo.

118
Revista Careta 13 de junho de 1908, p. 8.
90

Estas influências estrangeiras tanto no Exército quanto na Força Pública de São Paulo
auxiliaram na implantação das ações para um maior profissionalismo nestas instituições,
envolvendo além de mudanças nas estruturas internas, reforma de regulamentos e inserção de
novas práticas, a intensificação das preocupações com as atividades físicas. A criação da
Escola de Educação Física em São Paulo é um exemplo deste novo movimento.
No caso da Marinha do Brasil, a aproximação com influências estrangeiras na área da
atividade física ocorreu de uma forma um tanto inusitada. No ano de 1908 o Navio-Escola
Benjamin Constant realizou uma viagem de circunavegação ao redor do globo como parte da
conclusão do curso de oficiais da MB. Ao chegar ao Oriente, no trajeto entre Honolulu e
Yokohama, o navio encontrou e resgatou 22 japoneses que haviam naufragado próximo à Ilha
Wake no Pacífico que foram levados de volta ao país de origem pelo navio brasileiro. Este
evento fez com que a viagem do Benjamin Constant recebesse destaque da imprensa com
publicação de diversas notas acompanhadas de fotografias, tanto na revista Careta como na
Fon-Fon, divulgando as celebrações realizadas pelo Império Japonês aos militares brasileiros.
No entanto, as publicações tiveram enfoques distintos. Enquanto a primeira publicou imagens
em plano geral do navio, com os oficiais brasileiros e os japoneses resgatados posando a
bordo, apenas acompanhada de legendas sem matérias explicativas mais completas, a Fon-
Fon publicou matérias completas sobre partes da viagem, com fotografias dos locais por onde
o navio passou, como o Estreito de Magalhães e Havaí, e a recepção dos militares brasileiros
no Japão inclusive trajando os tradicionais kimonos em cerimônia do chá oferecida aos
oficiais. Pelas ações de resgate dos náufragos japoneses, o comandante do navio Capitão-de-
Fragata Antonio Coutinho Gomes Pereira recebeu a medalha de ouro do mérito naval
japonês.119, 120
Esta visita ao Japão e as aproximações estabelecidas resultaram na vinda de alguns
japoneses a bordo do Benjamin Constant em seu retorno ao Brasil. Os asiáticos aproveitaram
a viagem para introduzir junto à tripulação brasileira a prática do jiu-jitsu, arte marcial de
origem japonesa. O retorno do navio ao país com estes convidados foi noticiada na revista
Careta do dia 19 de dezembro de 1908. Com imagens ocupando página inteira, a publicação
destacava a vinda do professor Sada Miyako, seu ajudante M. Kakihara e Sensuke He, que se
tornou criado de bordo do Benjamin Constant após ter sido resgatado na Ilha Wake. Além das
fotografias dos cavalheiros, a revista ainda publicou duas fotos onde os marinheiros

119
Revista Careta 01 de agosto de 1908; Revista Careta 17 de outubro de 1908; Revista Careta 19 de dezembro
de 1908; Revista Fon-Fon 01 de agosto de 1908; Revista Fon-Fon 29 de agosto de 1908; Revista Fon-Fon 10 de
outubro de 1908
120
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha de 1908, p. 5.
91

brasileiros recebiam lições de jiu-jitsu a bordo do navio com os nomes das técnicas aplicadas:
o koshimago e o kesagatame (vide Figura 1).121
Após sua chegada ao país, o professor Sada Miyako passou a dar lições de jiu-jitsu na
Fortaleza de Villegagnon. Logo no ano seguinte à sua chegada, Miyako protagonizou um
evento interessante para a história do esporte nacional. Em exibição da arte marcial japonesa
no Pavilhão Paschoal Segreto, no Rio de Janeiro, o locutor anunciou que o lutador convocava
um desafiante. O praticante de Capoeira Francisco da Silva Ciríaco, conhecido na cidade
como Macaco Velho, aceitou o convite e, em um movimento muito rápido, golpeou o japonês
sendo declarado vencedor do combate (INOUE, 2009). A realização do curioso combate foi
noticiada na imprensa em diferentes periódicos, como o Jornal do Comércio de 02 de maio de
1909122 e a Revista Careta de 29 de maio de 1909. No jornal foram publicadas duas notas
sobre o evento. A primeira informava que “sportman japonez do tão apreciado jogo jiu-jitsu
foi hontem vencido pelo preto campista Cyriaco da Silva, que subjugou o seu contendor com
um passo de capoeiragem”. No mesmo jornal, em um pequeno box no canto direito da página
em meio aos anúncios de “vende-se” e “preciza-se” foi publicada uma nota divulgando os
serviços prestados por Miyako como treinador de jiu-jitsu.
JIU-JITSU: Mr. Sada Miyako, professor contratado para leccionar jiu-jitsu na
marinha brasileira, encarrega-se de dar licções particulares e a domicílio; cartas para
123
a rua Gonçalves Dias n. 73, ou para a Fortaleza de Willegaignon.

121
Revista Careta 19 de dezembro de 1908, p. 21-22.
122
Jornal do Commercio, 02 de maio de 1909, p. 7; p. 19.
123
Jornal do Commercio, 02 de maio de 1909, p. 19.
92

Figura 1: Fotografias em sequência com as imagens de Sada Miyako e seu ajudante M. Kakihara; Sensuke, o
criado de bordo; e os marinheiros apresentando os golpes koshimago e kesagatame.
Fonte: Revista Careta, 19 de dezembro de 1908, p. 22.
93

As aproximações com militares e modelos de FFAA do exterior prosseguiram nos


anos iniciais da década de 1910. Neste período o país passava mais uma vez por um
movimento intenso no campo da política. Nilo Peçanha, vice-presidente de Afonso Pena,
assumiu o governo em 14 de junho de 1909 por ocorrência do falecimento do presidente.
Ficou no cargo até 15 de novembro de 1910 quando passou a presidência ao Marechal
Hermes da Fonseca, eleito após o conturbado pleito daquele ano. Os debates durante a
campanha eleitoral giraram em torno de Rui Barbosa e Hermes da Fonseca, sobrinho de
Deodoro da Fonseca e ministro da Guerra no governo de Afonso Pena. Neste contexto de
disputas,
Paulistas e mineiros, que durante anos estiveram unidos em torno de um mesmo
candidato, fazendo a conhecida “política do café com leite”, desta vez estavam em
lados opostos. Hermes da Fonseca foi apoiado por Minas Gerais, pelo Rio Grande
do Sul e pelos militares, enquanto o candidato Rui Barbosa recebeu o apoio de São
Paulo e da Bahia. A campanha de Rui Barbosa ficou conhecida como “campanha
civilista”, ou seja, como uma oposição civil à candidatura militar de Hermes da
Fonseca. O estado de São Paulo proporcionou os recursos financeiros necessários à
campanha de Rui Barbosa, que percorreu o país procurando o apoio popular, fato
inédito na vida republicana brasileira (ARQUIVO NACIONAL, 2009, p. 32).

O Marechal Hermes da Fonseca foi o primeiro militar a ser eleito presidente de forma
direta, após esta acirrada disputa com Rui Barbosa. Seu governo foi marcado por inúmeras
tensões em diferentes regiões do país. Logo nos primeiros meses no cargo, o Marechal
precisou lidar com um movimento de levante de marinheiros no Rio de Janeiro, além de
conflitos no sul do país e a eclosão da guerra de proporções mundiais na Europa em 1914.
Estes acontecimentos e seus desdobramentos para as FFAA brasileiras serão discutidos no
tópico a seguir.
94

3.2 Revoltas e tensões: os Marinheiros, o Contestado e a Primeira Guerra.

O movimento de levante de marinheiros no Rio de Janeiro que marcou o período


inicial do governo do Marechal Hermes, entre diversas reivindicações, buscava a extinção dos
castigos físicos ainda existentes na Marinha do Brasil. O movimento ficou conhecido como
Revolta dos Marinheiros ou Revolta da Chibata e, de acordo com Cláudio da Costa Braga
(2010), teve fortes influências da agitada campanha presidencial daquele ano. O autor
comenta que a “Campanha Civilista” empreendida por Rui Barbosa levou a exaltações nos
ânimos em todo o país e afirma que
Mais parecia uma campanha pró ou contra militares, sendo estes enxovalhados das
mais vis acusações, insultos e agressões, [...] tudo isso muito bem explorado pela
imprensa sensacionalista, vindo a influenciar, de forma perniciosa, a hierarquia e
disciplina na Armada e no Exército (BRAGA, 2010, p. 39, grifo do autor).

Sobre as origens do movimento, Nelson Werneck Sodré afirma que este foi
desencadeado por conta das condições de trabalho na MB naquele momento, entre elas:
Alimentação deficiente, sobrecarga de trabalho e, principalmente, castigos corporais,
foram as causas próximas do motim. Casos esparsos já haviam ocorrido,
devidamente sonegados ao conhecimento geral; agora o caso era gravíssimo:
poderosas naves de guerra dominadas pelos marinheiros assestavam os seus canhões
para a terra exigiam para a tropa treinamento humano. A rebelião surgiu quando um
marinheiro sofreu o castigo de 250 chibatadas e foram sacrificados, de início, alguns
oficiais e praças. (SODRÉ, 2010, p. 243).

Como aponta o autor, as rebeliões foram desencadeadas pela insatisfação dos grupos
com a punição de 250 chibatadas imposta contra o marinheiro Marcelino Rodrigues, do
Encouraçado Minas Gerais. Liderado pelo também marinheiro João Candido, o movimento
de rebelião iniciou em novembro de 1910 e envolveu diversos navios da Marinha do Brasil
onde os marinheiros assassinaram ou fizeram reféns os oficiais comandantes e tomaram as
embarcações até que suas reivindicações fossem atendidas. Segundo a carta ultimato enviada
ao Presidente da República em 22 de novembro de 1910 pelos revoltosos, as principais
solicitações dos marinheiros eram o fim dos castigos corporais na Marinha, o aumento do
soldo, melhorias na educação dos marinheiros e a efetivação da tabela de serviços diários
(BRAGA, 2010).
Entre os navios tomados pelos marinheiros estavam os Encouraçados Minas Gerais e
São Paulo, frutos do programa de reaparelhamento da Marinha e com alto poder de fogo. José
Murilo de Carvalho (1995), analisando a revolta, afirmou que este poder de destruição dos
navios rebelados causou grande pânico na sociedade carioca, uma vez que alguns tiros e
granadas chegaram a ser disparados contra a cidade.
95

A revolta dos marinheiros recebeu da imprensa um nome e um rosto: João Candido.124


Como aponta Tania Ferreira (2010),
O marinheiro João Cândido foi a face visível da Revolta da Chibata na imprensa da
época, seja pelo seu papel durante a rebelião, ou pelo reconhecimento que seus
companheiros da Armada lhe deram (MOREL, 2008). Personagem discutido e
identificado com destaque também nos meios militares, do governo, parlamentares,
e da população em geral deu um novo destaque aos indivíduos envolvidos em
movimentos populares do Rio de Janeiro da Primeira República. Marco Morel
destaca no livro citado que “em cinco dias o marujo gaúcho transformou-se, de
ilustre desconhecido, na maior celebridade do Brasil naquele momento, atraindo
sobre ele não só entusiasmo, solidariedade e admiração, mas também implacáveis
ódios, vinganças e difamações que o acompanhariam por toda vida. Atestam isso a
quantidade de fotos, charges e artigos publicados em destaque nos principais jornais,
os discursos na Câmara Federal e no Senado, diálogos registrados nas ruas, casas e
cafés. [...] (FERREIRA, 2010, p. 18).

Os conflitos se desenrolaram entre 22 e 26 de novembro de 1910 na cidade do Rio de


Janeiro. Inúmeras tentativas de acordo foram efetivadas pelo governo com os marinheiros nos
navios rebelados. Uma reação armada contra os navios revoltosos chegou a ser planejada e
autorizada, mas foi suspensa pelo governo na madrugada do dia 25 de novembro (BRAGA,
2010).
O Ministro da Marinha, em seu relatório anual de 1910, apresentou análises sobre a
revolta e informou que ocorreram levantes das guarnições dos Encouraçados Minas Gerais,
São Paulo, Deodoro e do Scout Bahia. O documento ainda detalha todas as ações durante a
revolta e informa que ao final os revoltosos foram anistiados e seguiram servindo nos mesmos
navios onde se rebelaram. Nem os oficiais ficaram satisfeitos com essa decisão, pois
determinava a não punição de uma grave quebra na disciplina e na hierarquia militar; nem os
revoltosos ficaram contentes, pois temiam represálias.125
A imprensa dedicou espaços a noticiar as repercussões da rebelião. A revista Careta,
por exemplo, dedicou quase uma edição inteira em 03 de dezembro de 1910 com a publicação
da matéria “Os últimos echos da rebelião” com fotografias de todas as etapas do movimento
com imagens dos líderes, dos navios envolvidos, dos confrontos realizados.126 A imagem de
João Candido ocupou espaço na publicação e como aponta José Murilo de Carvalho, o
marinheiro foi inclusive “promovido a almirante pela imprensa, para ódio dos oficiais da
Marinha” (CARVALHO, 1995, p. 72). A edição da revista Careta de 10 de dezembro daquele

124
José Murilo de Carvalho o descreve como “um crioulão alto e forte e feio, boca enorme, maçãs salientes,
trinta anos de idade em 1910. Filho de ex-escravos, pai alcoólatra, entrara para a Marinha em 1895 com 15 anos.
Em 1910 ainda era semi-analfabeto, lia mas não escrevia. Nos 15 anos de engajamento, fora promovido a cabo,
mas por mau comportamento tinha sido rebaixado a marinheiro de primeira classe. Envolvera-se em lutas
corporais com colegas e espancara outros. Em 1909, dera uma chibatada em um grumete que, em represália, o
esfaqueara nas costas” (CARVALHO, 1995, p. 70).
125
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha de 1910, p. 4-24.
126
Revista Careta 03 de dezembro de 1910, p. 8-9, 13-14, 16-17, 21-22, 25-26.
96

ano publicou em sua capa o novo “almirante” da Marinha, o “almirante negro” a bordo do
navio com dois marinheiros prestando continência em sua passagem. (vide figura 2).

Figura 2. O “Almirante Negro”.


Fonte: Revista Careta 10 de dezembro de 1910, p. 1 (capa).
97

Ao final dos conflitos, foi designado novo comandante para o Minas Gerais que
recebeu o comando das mãos do “Almirante Negro” João Candido (SODRE, 2010). Apesar
da anistia concedida pelo Congresso aos revoltosos do movimento de novembro, os oficiais
de Marinha não se conformavam com esta decisão e a rebelião do Batalhão Naval em 09 de
dezembro foi utilizada como justificativa para a prisão de João Candido e dos demais
marinheiros envolvidos no movimento, “apesar de ter ficado ao lado do governo durante a
última revolta, de ter mesmo ordenado o bombardeio do quartel de fuzileiros, enquanto os
oficiais do Minas Gerais abandonavam covardemente o posto” (CARVALHO, 1995, p. 72).
Estas rebeliões de 1910 tiveram impactos sobre as questões de hierarquia e disciplina
na Marinha do Brasil. A quebra destas determinações, com a revolta do grupo mais baixo na
escala hierárquica contra os oficiais e comandantes, inclusive com a morte de alguns deles, foi
um marco na história da instituição. As reações ao movimento de novembro chegaram a
considerar a destruição dos navios, caso fosse necessário, para debelar os revoltosos:
Desde o primeiro momento uma forte corrente dentro da Marinha e do Governo
defendia uma reação militar contra os revoltosos. Uns chegavam a defendê-la
veementemente, indo até às últimas consequências, com a destruição dos
encouraçados se preciso fosse. Não suportavam a desonra a que estavam
submetendo uma das mais briosas instituições nacionais, a Marinha de Guerra, com
a quebra de seus dois sustentáculos, a “hierarquia e disciplina” (BRAGA, 2010, p.
160).

As preocupações com a manutenção da disciplina e do respeito à hierarquia passaram


a ser ainda mais um ponto fundamental para as FFAA brasileiras. Estes movimentos
evidenciaram a fragilidade nestas relações e a necessidade de intensificar a determinação dos
espaços sociais e políticos de atuação no interior das instituições militares. Neste sentido,
estas experiências são compreendidas como influências importantes nas decisões tomadas no
processo de organização das práticas esportivas nas FFAA ainda em meados da década de
1910. Ao analisar os modelos adotados pelas Ligas Esportivas Militares, é possível perceber a
incorporação e o reforço das determinações da hierarquia e disciplina militar como elementos
de distinção na gestão e na participação esportiva tanto no EB como na MB, evidenciando que
estas separações e a limitação dos espaços de atuação dos degraus mais baixos da hierarquia,
seja em qualquer área, passaram a ser ainda mais importantes após estes movimentos rebeldes
de 1910.
O governo Hermes da Fonseca ainda foi marcado por mais dois conflitos: a Guerra do
Contestado, no sul do país; e a Primeira Guerra, conflito armado internacional. As relações de
Hermes com as oligarquias foram intensas ao longo de seu governo. As ações de intervenção
nos estados efetivadas pelo presidente não agradaram aos grupos dominantes regionais e
98

evidenciaram novas formas de organização militar “irregular” utilizadas por estas lideranças
locais: “os bandos de jagunços, recrutados em regiões em que predominavam absolutas as
relações feudais” (SODRE, 2010, p. 247).
A chamada Guerra do Contestado foi um conflito na região entre os atuais estados de
Paraná e Santa Catarina onde foi necessária a intervenção das FFAA e, segundo Sodré (2010),
o Exército atuou com força e violência para conter o movimento, que teve as seguintes
características:
Em 12 de setembro de 1912, foi deflagrada uma rebelião de caráter messiânico, na
região de litígio entre os atuais estados do Paraná e Santa Catarina, conhecida como
zona do Contestado. As tropas do governo do Paraná iniciaram o primeiro confronto
na cidade de Irani. Entre os 23 sertanejos mortos, estava o beato José Maria, líder do
movimento que pretendia fundar uma “monarquia celestial” na região. Na área sob a
sua influência não era aceita a cobrança de impostos nem permitida a propriedade da
terra. Após vários conflitos armados, nos quais morreram cerca de vinte mil pessoas,
a rebelião foi liquidada em 1915, já no governo de Venceslau Brás. (ARQUIVO
NACIONAL, 2009, p. 36).

A intensidade dos conflitos e a incapacidade das autoridades locais de conter os


grupos rebeldes geraram a criação de um Comando especial para atuar na repressão. Para a
função de comandante foi nomeado o General Fernando Setembrino de Carvalho. De acordo
com Rogério Rodrigues,
Em termos legais a nomeação de Setembrino de Carvalho e a consequente
submissão dos governadores a autoridade militar buscava anular o espectro político
da ação e incluí-la dentro da lógica de campanha de guerra. [...] Consciente da
embaraçosa missão que receberia, Setembrino de Carvalho articulou nova proposta
de intervenção no Contestado. Ao invés de Estado de sitio, propunha declarar Estado
de guerra, ou em suas palavras, ao invés de uma intervenção política, propunha-se
uma intervenção eminentemente militar. [...] A opção foi radical, mas atendia
perfeitamente aos interesses do exército no momento. Isso porque a corporação
clamava pela modernização dos seus quadros e pela implementação da lei do sorteio
militar. Uma guerra no sul do Brasil colocaria o exército em evidência e
possibilitaria experimentar equipamentos e estratégias, além de que serviria para
desviar uma ação de matiz política para o militar em face de uma disputa que se
estendia por anos entre os dois estados. Não pode ser ignorado, a favor dessa
proposta, o fato de que no calor dos acontecimentos a presidência da República está
representada por um oficial do exército: o Marechal Hermes da Fonseca (1912-
1914). (RODRIGUES, R. 2011b, p. 73-74).

Cláudio Calaza (2009) afirma que neste conflito ocorreu o primeiro uso militar da
aviação no continente americano. Importante destacar que a aviação no Brasil, até este
momento, estava ligada às práticas esportivas. Como afirma Moreira (2005), a aviação iniciou
como esporte sendo seus pioneiros conhecidos como sportman, caso de Santos Dumont,
brasileiro que entrou para a história como “pai da aviação”. Seus feitos foram registrados pela
Fédération Aéronautique Internationale atribuindo-lhe o título de sportman e primeiro
aeronauta com recordes certificados no mundo. Santos Dumont chegou a seguir para os
Estados Unidos, em 1904, para participar nos Jogos Olímpicos de Saint Louis em
99

competições de balonismo, mas por falhas no equipamento o objetivo não se concretizou. No


ano seguinte recebeu do Comitê Olímpico Internacional o “Diploma Olímpico” pela
constituição do novo esporte: a aviação.
Ainda no início do século XX foram fundados os primeiros clubes esportivos de
aviação no Brasil: os aeroclubes. No dia 14 de outubro de 1911 foi fundado o Aeroclube
Brasileiro, considerado o precursor da aviação no país, com participação direta de militares no
processo de formalização de suas atividades, uma vez que seu primeiro presidente foi o
Almirante José Carlos de Carvalho. (AECB, 2011).
No entanto, apesar de iniciar com caráter esportivo, esta nova atividade rapidamente
passou a ser alvo de interesse dos militares por seus grandes potenciais para observação aérea
de zonas de combate. Ainda no início do século XX há registros da utilização de aeronaves
em combate na Guerra Ítalo-Turca, em 1911, quando um piloto italiano fez um voo de
reconhecimento em 23 de outubro daquele ano sobre as posições do Exército inimigo na
região de Trípoli. “Nove dias depois, ocorreu o primeiro bombardeio feito por aeroplano em
toda a história, quando outro piloto italiano lançou quatro granadas sobre posições turcas.”
(NAVARRO, 2006, p. 1)
Enquanto Santos Dumont se posicionava inicialmente contra o uso dos aeroplanos
para fins militares, os irmãos Wright, norte-americanos, consideravam a atividade militar
como um das mais importantes aplicações do instrumento. Em 1908, assinaram contrato com
o governo norte-americano para o desenvolvimento de um avião militar com capacidade de
transporte para duas pessoas e velocidade de 64 km/h, entregando a primeira unidade cerca de
um ano depois. Ainda em 1910 iniciaram-se as experiências para inserir armamentos nos
aviões, sendo o alemão August Euler detentor da primeira patente para instalar uma
metralhadora em uma aeronave. (NAVARRO, 2006).
No Brasil, desde 1911, as edições da publicação oficial do EB, o Boletim Mensal do
Estado Maior do Exército, já discutiam a possibilidade do uso da aviação em combates. As
edições de 1911 e 1912 iniciaram a ênfase nos debates pela utilização de aeroplanos, balões e
dirigíveis por Exército e Marinha em combate bélico, vislumbrando estudos sobre peso dos
armamentos e número de tripulantes, por exemplo.
O primeiro uso militar do avião no Brasil, como já pontuado, ocorreu durante os
conflitos no Contestado. As aeronaves utilizadas foram concedidas pelo Aero Clube ao
Exército Brasileiro e adquiridas através do então Tenente do Exército Ricardo Kirk, que
cursou a Escola de Aviação como aluno do italiano Ernesto Darioli e se especializou na École
d‘Aviotion d‘Ètampes, na França, recebendo seu brevet em 22 de outubro de 1912. Nesta
100

viagem o Tenente realizou a aquisição dos aviões para o Ministério da Guerra brasileiro que
ficaram sob responsabilidade do Aero Clube. A decisão pelo uso dos aviões partiu do General
Setembrino de Carvalho que, quatro dias após assumir o Comando de Operações na região do
Contestado,
enviou uma mensagem ao ministro da Guerra requisitando o emprego de aeroplanos
no conflito. O dia era 16 de setembro de 1914, apenas oito anos decorridos do vôo
do 14 bis de Alberto Santos Dumont no Campo de Bagatelle, na França. Somente
dois dias depois o general constituiria seu Estado-Maior da campanha. Nesse
momento, transcorriam na Europa as frentes iniciais da Primeira Guerra Mundial,
onde os aviões já eram intensamente testados nas batalhas, atestando suas
potencialidades. [...] Sob forte apoio da opinião pública cinco aviões foram
embarcados de trem rumo ao Sul. Durante a viagem, uma falha na alimentação da
locomotiva provocou fagulhas pela chaminé que atingiram o vagão de combustíveis
e provocaram uma explosão que desencadeou um trágico incêndio na composição,
resultando na destruição de duas aeronaves. (CALAZA, 2009, p. 434; p. 438).

Entretanto, o uso bélico da aviação foi empreendido de forma precipitada e não obteve
os resultados esperados. Sem preparações prévias ou atenções a planos estratégicos para a
atuação e manutenção das aeronaves, a única efetiva aplicação deste instrumento foi o de
reconhecimento aéreo da região em conflito em janeiro de 1915. Com o avanço dos combates
em terra, esta missão de reconhecimento foi ordenada e colocou um “ponto final na iniciativa
dos aviões no Contestado”, uma vez que ocorreu o grave acidente aéreo que levou à morte o
piloto da aeronave Tenente Ricardo Kirk (CALAZA, 2009, p. 438).
O uso dos aviões como instrumento de reconhecimento foi aplicado por diferentes
exércitos, como o inglês e o francês, durante a Primeira Grande Guerra (1914-1918)
aperfeiçoando-se a prática ao longo do conflito com modelos de aeronave com novas funções
como bombardeios com bombas lançadas a mão pelo co-piloto e armamento para alvejar os
inimigos, como a metralhadora. (NAVARRO, 2006).
O processo de inserção da aviação nas FFAA brasileiras se efetivou com a criação da
Escola de Aviação Naval, primeira escola de aviação militar do país, oficializada pelo Decreto
n°. 12.167 de 23 de agosto de 1916127, assinado pelo então presidente Wenceslau Braz. A
divulgação da aviação na Marinha do Brasil se intensificou a partir da criação da Escola,
tendo inclusive como ilustre visitante Santos Dumont, no ano de 1917, conforme noticiado na
revista Careta de 03 de fevereiro daquele ano. As imagens publicadas retratam sua visita à
Escola de Aviação da Marinha, realizando inclusive um sobrevoo sob a ponte Almirante

127
BRASIL. Decreto n° 12.167 de 23 de agosto de 1916. Crêa sem augmento de despeza, as escolas de Aviação
e de Submersíveis.
101

Alexandrino de Alencar128 na Ilha das Cobras (RJ) como passageiro do Tenente Delamare a
bordo do Hydroplano C1. 129
Ao longo das duas décadas seguintes, 1920 e 1930, a aviação militar adquiriu cada vez
mais características de instrumento para combates e proteção do território, deixando um
pouco de seu caráter esportivo inicial, porém sem extinguir esta aplicação ficando ela a cargo
dos Aeroclubes espalhados pelo Brasil. Com o crescimento da prática da aviação tanto na
Marinha como no Exército, passou-se também a ter maior preocupação com a preparação
física dos pilotos a fim de melhorar o poderio aéreo, sendo também discutida a
implementação de exercícios e do esporte para os pilotos com vistas ao preparo do corpo
(MOREIRA, 2005)
A experiência nos conflitos do Contestado mais uma vez evidenciou as dificuldades
enfrentadas pelas FFAA brasileiras naquele momento. Seguia-se discutindo a necessidade de
reestruturação, mas para isso era necessário o apoio do Congresso para liberação das verbas.
De acordo com McCann (2009), a eclosão da Primeira Guerra amedrontou tanto as elites
nacionais que o governo aprovou um orçamento para as FFAA que possibilitava a
implantação dos projetos de reorganização.
O problema do recrutamento seguia preocupando as lideranças militares, como foi
possível perceber nos relatórios ministeriais tanto da Marinha como do Exército publicados
neste período. Pinheiro et al (2006) afirmam que o sistema de recrutamento realizado até 1916
não possibilitava o processo de modernização que tanto se almejava por garantir recursos
humanos de má qualidade. A solução para esta problemática, segundo as percepções da
época, seria o estabelecimento do sorteio universal, mas a resistência a este sistema era grande
em diferentes esferas da sociedade (políticos, imprensa e até operários).
As necessidades de recrutamento mais efetivo e de treinamento especializado
passaram a ser uma discussão ainda mais urgente com a eclosão dos conflitos da Primeira
Grande Guerra na Europa. Inicialmente o Brasil manteve-se em posição de neutralidade no
conflito, conforme o Decreto n°. 11.037 de 04 de agosto de 1914 assinado pelo presidente

128
A ponte pênsil Almirante Alexandrino de Alencar ligava a Ilha das Cobras, onde ficavam o Hospital Central
da Marinha, o Batalhão Naval e outros estabelecimentos da Marinha, ao continente. Foi inaugurada em 1915 e
recebeu o nome do Ministro da Marinha que ordenou sua construção. A ponte era dotada de um transportador
volante que percorria seus 288m de comprimento conduzindo cargas, e até 400 pessoas em pé. Com a
transferência do Arsenal de Marinha para a ilha e a construção de um novo Depósito Naval, a ponte pênsil já não
atendia às necessidades, razão pela qual foi necessário substituí-la pela ponte Arnaldo Luz, no ano de 1930.
Atualmente, a Ilha das Cobras ainda é ligada ao 1º. Distrito Naval, situado no continente, pela ponte Arnaldo
Luz, que já completou mais que 70 anos de uso.
129
Revista Careta 03 de fevereiro de 1917, p. 12.
102

Hermes da Fonseca. Os Boletins do Estado-Maior do Exército, ao longo do ano de 1914,


publicaram inúmeras notas sobre a guerra analisando diferentes aspectos do conflito.
Ainda em 1914, o Marechal passou o cargo de presidente ao seu vice, Venceslau Brás
que foi eleito naquele ano para o posto. Após assumir o governo, Brás adotou “uma austera
política financeira para enfrentar a redução drástica das exportações brasileiras, devido à
desorganização do mercado internacional provocada pela Primeira Guerra Mundial”
(ARQUIVO NACIONAL, 2009, p. 41).

3.3 Reformar e recrutar para aprimorar.

A questão do ensino militar sempre foi um ponto debatido e discutido nos diferentes
meios de divulgação das ações das FFAA brasileiras desde os anos iniciais da República. A
necessidade de reformar os métodos e processos de treinamento, além de melhorias materiais,
era defendida como o caminho para se estabelecerem melhorias efetivas no interior das
instituições militares. O Aviso do Ministério da Guerra de 19 de maio de 1911, publicado no
Relatório do Ministério da Guerra de 1911, reforçava a necessidade de reformas no sistema de
ensino militar, enfatizando a questão das instruções práticas como um fator fundamental a ser
considerado nesta reorganização.130 O Boletim Mensal do Estado Maior do Exército de
novembro deste mesmo ano de 1911 publicou na coluna Notas Editoriais um texto intitulado
“A reforma no Ensino Militar” debatendo novamente as necessidades de reestruturação da
formação dos militares no Brasil. O artigo de autoria do Major João Vespúcio de Abreu e
Silva, relator da Comissão responsável pelo projeto de reforma, afirmava que era fundamental
o desenvolvimento das aptidões físicas paralelamente às habilidades profissionais no processo
de formação dos militares brasileiros e, para justificar sua afirmação, apresentava os modelos
de ensino nas FFAA francesas, alemãs e argentinas.131
Seguindo neste mesmo sentido, o Relatório do Ministério da Marinha de 1913 discutia
as questões de formação dos oficiais indicando que a melhoria da qualidade nesse processo
era fundamental para o crescimento da Marinha. Como afirmou o Ministro Almirante
Alexandrino de Alencar “formar o official é, pois, formar a própria marinha; esta é o seu
reflexo”. Reforçava-se, então, a necessidade de intensificar os processos de treinamento e
aperfeiçoamento dos oficiais. No caso da formação de inferiores e marinheiros, o relatório

130
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1911, Anexo B, p. 49.
131
Boletim Mensal do Estado Maior do Exército, vol. II, n°. 2, novembro de 1911. Ministério da Guerra,
Imprensa Militar: 1911, p. 105.
103

afirmava que para a boa instrução era necessário que se iniciasse o treinamento na “mais tenra
idade”. Sob este argumento, reafirmava o valor das escolas de aprendizes como
indispensáveis ao desenvolvimento de bons marinheiros. O Ministro ainda justificou que não
havia abandono da situação dos marinheiros, como afirmavam algumas análises do
movimento de 1910, e apontou a criação de diversas escolas de aprendizes entre 1906 e 1910
em todo o país, ampliando-se o número já existente, destacando que
[...] Estas escolas de aprendizes, tomando crianças de 12 a 16 annos, preparavam-nas
em noções elementares do navio de guerra, obras do marinheiro, rumos de agulha,
gymnastica, exercícios de toda a sorte, inclusive o jogo do foot-ball, para
desenvolver-lhes o physico e adaptar-lhes a intelligencia ao estudo mais elevado, nas
escolas modelo.[...]132

A indicação clara à prática de ginástica e do football entre os aprendizes marinheiros


nos evidencia a efetiva inserção destas atividades no cotidiano dos militares da MB nas
diferentes esferas hierárquicas. Ao identificar a menção às práticas esportivas ao lado das
disciplinas técnicas e profissionais como um dos itens indispensáveis para a boa formação dos
militares, é possível a interpretação de que neste momento o esporte e a ginástica já garantiam
espaço assegurado no processo de treinamento e formação dos integrantes da Marinha do
Brasil.
Além da ênfase na necessidade de melhoria nos processos de treinamento, discussão
presente nos relatórios e revistas institucionais das FFAA brasileiras desde os anos iniciais da
República como já vimos nos debates até este ponto, havia ainda outra questão que seguia na
“ordem do dia”: os contingentes e o processo de recrutamento. O Relatório do Ministério da
Guerra de 1910 apontou que uma das maiores dificuldades na organização do EB naquele
momento era o recrutamento.133 No relatório anual deste mesmo Ministério de dois anos
depois, 1912, discutiu-se a questão do contingente necessário para as FFAA brasileiras,
apontando que o efetivo para tempo de paz previsto na lei orçamentária não era compatível
com as funções constitucionais estabelecidas para estas instituições, de acordo com as análises
do EB. O documento ainda fez um comparativo com o número de soldados por milhar de
habitantes em tempo de paz de alguns países:134

132
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha de 1913, p. 196.
133
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha de 1910, p. 32.
134
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1912.
104

Quadro 2: Comparativo do número de soldados por milhar de habitantes em tempo de paz.

País Número de soldados por milhar de habitantes


França 13,2
Alemanha 8,7
Áustria 7,2
Rússia 6,5
Itália 6,1
Inglaterra 4,6
Japão 3,5
México 2,2
Brasil 1,1

O documento aponta esses dados como base para afirmar que o contingente de 25 mil
do Exército Brasileiro não era suficiente para atender às necessidades do país, com seus então
21 milhões de habitantes e extenso território. Como proposta para mudar este panorama,
reforçava a urgência em aumentar o contingente a fim de possibilitar para a nação brasileira,
em relação à defesa, “uma era nova, toda feita de calma, tranquilidade e confiança”.135 No
relatório do ano seguinte o Ministério da Guerra seguia apontando as dificuldades de se ter o
contingente mínimo estabelecido pela diminuição progressiva dos voluntários. Neste sentido,
reforçava a necessidade da efetiva realização do sorteio militar em todas as regiões.136
Sobre a legislação relativa ao recrutamento militar no Brasil137, Frank McCann afirma
que “depois de ser aprovada, em 1908, a lei permanecera engavetada porque o Congresso
cortara tão drasticamente o orçamento do Exército que o pequeno efetivo autorizado era
preenchido por voluntários” (MCCANN, 2009, p. 229).
Rogério Rodrigues, ainda sobre as novas determinações de recrutamento militar
brasileiro a partir de 1908, aponta que
Entre 1908 e 1916 muito se debateu, contestou e defendeu a citada lei. O auge dessa
discussão aconteceu no ano de 1914, período que coincidia com a incidência da
Primeira Guerra Mundial na Europa. O momento era estratégico para os discursos
militaristas, pois garantia maior visibilidade às forças armadas e animava os
sentimentos nacionalistas na sociedade. Nesse contexto o exército aparecia como
uma das poucas instituições legítimas capazes de defender a nação das mazelas
políticas e sociais. [...] O que se almejava era instituir o serviço militar obrigatório
no Brasil, reequipar belicamente o exército, melhorar a formação dos oficiais por
meio da contratação de instruções militares estrangeiras, bem como melhorar as
condições físicas das instalações militares no país [...] (RODRIGUES, R., 2011b, p.
77).

135
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1912, p. 6.
136
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1913, p. 4-5.
137
BRASIL. Lei nº 1.860, de 4 de Janeiro de 1908. Regula o alistamento e sorteio militar e reorganiza o
Exército.
105

Uma das ferramentas utilizadas pelas FFAA para aproximar e atrair os jovens para
suas atividades eram as Sociedades de Tiro espalhadas por todo o país. Estas instituições
atuavam não somente com os exercícios de tiro, mas garantiam aos sócios uma instrução
completa de soldado de infantaria138 e eram organizadas e normatizadas pela Confederação de
Tiro Brasileiro. As associações de Tiro foram propostas com o objetivo de possibilitar
aproximações entre os militares e a sociedade civil. A fundação da Confederação de Tiro
Brasileira como entidade para organizar as associações em todo o país e atuar no fomento
destas atividades não teve êxito imediato, mas ao ser reativada por Hermes da Fonseca em
1906 quando ocupava a pasta da Guerra, passou a ampliar gradativamente o número de
associações federadas (PINHEIRO et al, 2006). Em 1910, ano de regulamentação de seus
estatutos, a Confederação contava com 137 sociedades confederadas. O Decreto n°. 8.083 de
25 de junho de 1910 que aprovou seu regulamento e os estatutos das sociedades de tiro
incorporadas, determinou que a entidade nacional estava subordinada ao Ministério da Guerra
e dependente na parte técnica do Departamento da Guerra. Segundo o decreto,
[...] Art. 2º. A Confederação de Tiro Brasileiro é a reunião de todas as sociedades
nacionaes de tiro de guerra que preencherem e acceitarem as condições estabelecidas
neste regulamento.
Art. 3º. O fim da Confederação é methodizar a instrucção militar nas sociedades de
tiro, auxiliar e encorajar os esforços destas sociedades e promover a incorporação de
outras, de modo que cada município tenha, pelo menos, uma [...].139

Os relatórios do Ministério da Guerra dos anos seguintes informavam sobre as


atividades da Confederação de Tiro e os processos de ampliação (ou não) do número de
sociedades confederadas. No relatório de 1911, comunicou-se que o numeral de federados
havia passado para 195 naquele ano, indicando um importante crescimento dos “celeiros” de
potenciais militares pelo país.140 Já o relatório de 1912 apontou um declínio das sociedades de
tiro pela falta de interesse da juventude por suas atividades, mas ainda assim informou a
entrada de 22 sociedades na Confederação de Tiro.141 Sobre estas sociedades, McCann afirma
que
Após o surto de entusiasmo pela aprovação da lei do serviço militar obrigatório em
1908, os Tiros declinaram em número e atividade, por duas razões: primeira,
quando a lei não foi implementada, muitos dos que se haviam alistado com o intuito
de escapar do serviço militar ativo não viram necessidade de continuar; segunda,
políticos locais haviam usado aquelas sociedades como expedientes para conseguir
votos (2009, p. 228).

138
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1917.
139
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1910, Anexo A, p. 37.
140
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1911, p. 13.
141
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1912, p. 36-37.
106

O Relatório do Ministério da Guerra de 1915 afirmava que a maior necessidade do


Exército naquele momento seguia sendo a execução do serviço militar obrigatório. A base de
observação para esta afirmativa era o conflito da Primeira Grande Guerra.142 Mesmo após a
efetivação deste modelo de recrutamento, Frank McCann analisa que
O sistema do serviço militar obrigatório, conquistado a duras penas, revelou-se
muito diferente do que seus proponentes haviam esperado. Desde o início [...] o
número de homens que se recusaram a responder ao chamado do país foi maior que
o dos que se apresentaram. De 1917 até 1929 foram sorteados 619753 nomes, dos
quais 75286 foram dispensados e 409111 não se apresentaram, restando apenas
135354 para ingressar nos quartéis. [...] O sonho de que o serviço militar
obrigatório forneceria um exército qualificado que, por sua vez, geraria uma reserva
numerosa, treinada e mobilizável foi abalado pelas realidades brasileiras.
(MCCANN, 2009, p. 295)

O mesmo relatório referenciado acima ainda discute que somente o aumento dos
contingentes não era o suficiente para a garantia da defesa nacional. Era necessário que se
dispensassem atenções com as questões de armamento, munição, fardamento, viaturas. Os
equipamentos estavam em situação complicada, pois as encomendas feitas a algumas nações
estrangeiras não foram entregues em função da ocorrência dos conflitos na Europa. O
relatório ainda destacou que o processo de instrução e educação das tropas vinha melhorando
significativamente, graças à dedicação de oficiais e aspirantes envolvidos nestas atividades.143
Com o novo panorama mundial marcado pelo conflito armado, o estabelecimento de
diretrizes mais claras para os processos de treinamento passaram a ser uma preocupação ainda
mais importante. A Portaria de 02 de maio de 1914, publicada no Relatório do Ministério da
Guerra de 1914, por exemplo, determinava as instruções para a esgrima de baioneta a ser
utilizada no EB como forma de uniformizar os processos de treinamento e preparação dos
militares.144 Esta necessidade de maior especialização fomentou a criação de manuais de
instrução que eram vendidos para a disseminação das normas físicas. O Aviso n°.1 de 11 de
março de 1916 do Ministério da Guerra, por meio do Departamento Central, normatizava o
processo de venda das publicações do EB. Dentre os inúmeros títulos constavam: “Esgrima de
Espada”, “Instrução de Esgrima de Lança”, “Regulamento de Ginástica para infantaria e
tropas a pé”, “Regulamento de Ginástica para tropa montada”.145 Com estas publicações,
buscava-se estabelecer uma diretriz de preparação física dos integrantes do Exército
Brasileiro. Neste mesmo período foram também normatizadas as novas determinações sobre

142
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1915.
143
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1915.
144
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1914, Anexo B, p. 35-41.
145
Boletim Mensal do Estado Maior do Exército, vol. XI, n°. 1, janeiro de 1916. Ministério da Guerra, Imprensa
Militar: 1916.
107

os índices físicos mínimos para o ingresso na instituição indicando um maior rigor e


preocupação com o corpo das tropas militares brasileiras.146
No próximo tópico, serão discutidos os principais métodos de ginástica defendidos
pelas FFAA na década de 1910 e as ações de promoção da prática esportiva no período
anterior à fundação das Ligas Esportivas Militares.

3.4 Os militares, as “ginásticas” e o esporte antes da fundação das Ligas Esportivas.

Com o processo de ampliação das práticas esportivas e da ginástica ao longo dos anos
iniciais do século XX, foi identificada uma crescente necessidade de profissionais para a
função de instrutores em todo o país, principalmente após a introdução da ginástica como item
dos currículos das escolas civis e militares. Neste novo cenário profissional, retomaram-se os
debates sobre a criação de escolas de formação em Educação Física (EF) por todo o país
visando à preparação de profissionais para atuação nestes novos espaços de trabalho
(PUBLIO e CATALANO, 2005).
A partir das observações da experiência de estabelecimento da primeira escola de
formação de monitores de educação física na Força Pública de São Paulo, sob influência da
Missão Francesa que estava instalada, iniciou-se na Marinha do Brasil uma discussão sobre a
criação da Escola de Gymnastica no Corpo de Marinheiros Nacionais. Esta instituição teria
como objetivo a formação de monitores de ginástica com responsabilidade de divulgar os
jogos e a ginástica sueca pelas escolas e navios. Esta proposta foi defendida pelo Tenente
Alfredo Colônia em artigo publicado na Revista Marítima Brasileira no 4º. Trimestre de 1910,
destacando o reforço na preocupação com a condição física dos militares. No entanto, este
projeto não teve aplicação imediata e a efetiva criação da Escola só foi concretizada 15 anos
depois, já sob a coordenação da Liga de Sports da Marinha.147
Neste momento era possível identificar três principais correntes de influências
estrangeiras nos modelos de ginástica e esportes praticados no Brasil: alemão, sueco e francês.
O método alemão de ginástica já era presente no Brasil desde o século XIX quando foi
traduzido o manual “Novo guia para o ensino da ginástica nas escolas públicas da Prússia” no
ano de 1870. Suas propostas ganharam ainda mais força no Exército Brasileiro através da

146
O Aviso do Ministério da Guerra n°. 1.113 de 27 de novembro de 1916 alterou o índice de robustez de 25 cm
para 33 cm e a altura para 154 cm.
147
COLONIA, Alfredo. Introdução das atividades gymnasticas na Marinha do Brasil. Revista Marítima
Brasileira, 4º bimestre de 1910, p. 7-16.
108

defesa de adoção desta metodologia por parte dos grupos de oficiais “jovens turcos” pelas
experiências com estas práticas em território germânico durante os estágios realizados entre
1906 e 1912.
O destaque para as grandes qualidades físicas dos militares alemães e a eficácia do
método aplicado por eles para o preparo e desenvolvimento do corpo eram o argumento
comumente utilizado. Renato Soeiro (2003, p. 29) afirma que “O método Alemão [...] pensava
a prática da ginástica com forte caráter militar, como forma de manter o povo 'forte e
saudável'. Com forte teor de civismo e patriotismo, estava diretamente ligado aos movimentos
nacionalistas alemães”. Corroborando esta definição, Carmen Lucia Soares (2004) comenta
que a Escola Alemã de ginástica surgiu como uma ferramenta de defesa da pátria pautada em
um espírito nacionalista sob o argumento de que para se efetivar a unidade do país seria
necessário que seus homens e mulheres fossem fortes, saudáveis e robustos. Acreditava-se
que este desenvolvimento físico somente seria possível por meio da prática de uma ginástica
com bases científicas (biológicas, fisiológicas e de anatomia). A ginástica deveria ser
organizada pelo governo e ministrada diariamente para homens, mulheres e crianças e seria
um “meio educativo fundamental da nação, disseminando cuidados higiênicos com o corpo e
com o espaço onde se vive” (SOARES, 2004, p. 53).
Além do método alemão ainda era recorrente no Brasil a defesa das vertentes suecas e
francesas. O método sueco de ginástica, criado no início do século XIX, preocupava-se com a
execução correta dos exercícios para o desenvolvimento e robustecimento dos diversos órgãos
do corpo humano, buscando-se o espírito corretivo das formas. Soares afirma que o método
foi criado para
extirpar os vícios da sociedade, entre os quais o alcoolismo, o método sueco de
ginástica se colocava como o instrumento capaz de criar indivíduos fortes, saudáveis
e livres de vícios, porque preocupados com a saúde física e moral. Esses eram os
indivíduos necessários, já que seriam úteis a produção e a pátria. Bons operários,
uma vez que por esta época a Suécia dá início ao seu processo de industrialização, e
bons soldados, uma vez que a ameaça de guerras estava sempre presente. Pehr
Henrick Ling (1776-1839), poeta e escritor, propõe um método de ginástica
impregnado de nacionalismo e destinado a regenerar o povo, formar, enfim, homens
de bom aspecto que pudessem preservar a paz na Suécia. Seu método ou escola de
ginástica se baseia na ciência, deduzindo de uma análise anatômica do corpo uma
serie racional de movimentos de formação. Ling considerava que a sua ginástica
poderia ser dividida em 4 partes, de acordo com os diferentes fins visados. Assim,
ela poderia ser: a) Ginástica pedagógica ou educativa [...]; b) Ginástica militar [...];
c) Ginástica médica e ortopédica [...]; d) Ginástica estética [...] (SOARES, 2004, p.
57-58).
109

O artigo do Tenente Alfredo Colônia na Revista Marítima Brasileira de 1910 defendia


a implantação na Marinha do Brasil do método sueco de ginástica, afirmando que
Os antigos exercícios de gymnastica athletica allemã tem sido substituídos pelos
methodos scientificos da gymnastica sueca. Hoje, em toda parte onde se pratica
verdadeiramente a arte de embellezar e de enrijecer o corpo os apparelhos e
methodos violentos de Friederich Jahn estão sendo, mesmo na própria Allemanha,
substituídos pelos jogos ao ar livre e pela gymnastica creada pelo anatomo-
physiologista sueco Pedro Henrique Ling. [...]. Há pouco tempo foi ella iniciada na
nossa Escola Naval, onde com todo o critério é executada sob a direcção de um
professor competente. Coube ao Couraçado Minas Gerais introduzir a bordo dos
nossos navios o methodo de Ling, o qual já esta sendo praticado também no
Batalhão Naval.148

Argumentando sobre os benefícios da ginástica sueca, o autor informa a introdução


oficial do método junto à MB não somente nos batalhões e escolas, mas também a bordo dos
navios, iniciando o processo pelo recém incorporado Minas Gerais, fruto do programa de
reaparelhamento iniciado na década anterior. A chegada do navio ao país foi festejada com
uma cerimônia com a presença do Almirante Alexandrino de Alencar, Ministro da Marinha, e
do Marechal Hermes da Fonseca, naquele momento ainda Ministro da Guerra.149 Ao longo do
artigo, o Tenente Colônia ainda discute os benefícios do método sueco e dos sports ingleses
em relação à ginástica atlética (método alemão). O autor defende que
Os exercícios gymnasticos alem de serem inferiores aos jogos na quantidade de
exercício ainda o são como qualidade. [...] De facto, nos jogos de campo como no
football, golf, lawn tennis, cricket, etc., e na natação, no rowing, o executante tem
occasião de accionar grande quantidade de músculos ao mesmo tempo, de modo que
não há nelles o defeito grande da fadiga localisada;[...] Os jogos têm ainda esta boa
qualidade, são recreativos, agradam mais e podem ser feitos sem sacrificio; antes,
pelo contrario, todos conhecem o prazer com que as crianças se preparam para as
suas partidas de sport. É este estado moral de alegria, de prazer que, diz Spencer, faz
augmentar o beneficio material sobre o corpo. Os jogos desenvolvem a iniciativa, a
confiança em si, o espírito de ordem e de disciplina, sem os quaes nunca um partido
poderá vencer o adversário.150

As afirmações dos benefícios do sport e do método de Ling são os argumentos


utilizados pelo militar para a necessidade da ampla divulgação destas práticas na Marinha a
partir da implantação da Escola de Ginástica para formar monitores que atuariam nestas
funções, onde “após este curso os alumnos diplomados monitores de gymnastica, seriam
distribuídos pelos navios e escolas, onde, sob a fiscalisação do medico de cada um destes
logares, ensinariam a gymnastica sueca, a esgrima e dirigiriam os jogos”.151 Como já
discutido, este estabelecimento de ensino não foi implantado até o ano de 1925, mas as ideias

148
COLONIA, Alfredo. Introdução das atividades gymnasticas na Marinha do Brasil. Revista Marítima
Brasileira, 4º bimestre de 1910, p. 7; 9.
149
Revista Careta 23 de abril de 1910.
150
COLONIA, Alfredo. Introdução das atividades gymnasticas na Marinha do Brasil. Revista Marítima
Brasileira, 4º bimestre de 1910, p. 12.
151
ibidem, p. 16.
110

defendidas pelo autor do artigo apresentam algumas das discussões que seguiam em pauta
sobre a educação física no Brasil.
A terceira proposta de metodologia de ginástica que garantia espaço no país neste
período era a francesa. Ao observar este método é preciso considerar que
a França é o berço das concepções liberais clássicas de educação, concepções essas
que incluíam também o exercício físico como elemento indispensável a educação do
“Homem universal”. [...] Na França, a ginástica integra a ideia de uma educação
voltada para o desenvolvimento social, para o qual são necessários homens
completos. [...] E nesta perspectiva que a ginástica será organizada não somente para
militares, mas também para toda a população, colocando-se como uma prática capaz
de contribuir para a formação do homem “completa e universal”. [...] Para seu
fundador, D. Francisco de Amoros y Ondeano (1770-1848), a ginástica na França
deveria abranger a prática de todos os exercícios que tornam o homem mais
corajoso, mais intrépido, mais inteligente, mais sensível, mais forte, mais habilidoso,
mais adestrado, mais veloz, mais flexível e mais ágil, predispondo-o a resistir a
todas as intempéries das estações, a todas as variações dos climas, a suportar todas
as privações e contrariedades da vida, a vencer todas as dificuldades, a triunfar de
todos os perigos e de todos os obstáculos que encontre, a prestar, enfim, serviços
assinalados ao Estado e a humanidade. (SOARES, 2004, p. 60-61).

Este método foi utilizado na base de organização da primeira Escola de Educação


Física do Brasil, fundada em São Paulo na Força Pública a partir das ações da Missão Militar
Francesa. Em 19 de abril de 1913 a revista Careta publicou uma extensa notícia sobre estas
ações da Missão Francesa dando destaque para as instruções físicas implementadas como a
prática do boxe, do jiu-jitsu, ginástica e ciclismo com imagens retratando diferentes processos
de treinamento.152 As propostas francesas de atividade física seriam também posteriormente
adotadas pelo Exército Brasileiro com a chegada de outro grupo de militares para uma
segunda Missão no ano de 1919.
No entanto, neste momento inicial da década de 1910, as influências alemãs no EB
ainda eram muito marcantes. O Boletim Mensal do Estado Maior do Exército em 1912
publicou no item “Informação” uma nota de autoria do Capitão de Artilharia Emilio Rosauro
de Almeida que estava servindo no 6º. Regimento de Artilharia da Prússia apresentando o
modelo de incorporação e treinamento do soldado alemão. No relato havia um item exclusivo
para a ginástica onde o autor afirmava que

152
Revista Careta 19 de abril de 1913, p. 39-48.
111

[...] A gymnastica não é ensinada unicamente a um restrito numero de indivíduos


para serem exhibidos em occasião de festa, não; porém, conscientemente praticada
para dar ao soldado a conveniente destreza e desenvolvimento physico
indispensáveis ao officio e, isto é conseguido plenamente no espaço de cerca de
cinco mezes da data de incorporação. Mal se descobre nos lestos e robustos soldados
os bisonhos alistados de outubro.
Divide-se a gymnastica em três partes: exercício livre, exercício de apparelho e
exercício a cavalo.
[...] Esta providencia rudimentar mas indispensável não era observada em nosso
tempo na Escola Militar; resultado – 90% de cada turma de alumnos não fazia uma
flexão, alias a gymnastica era tida em menosprezo.153

Em edição do mesmo Boletim publicada no ano seguinte, o Segundo-Tenente Estevão


Leitão de Carvalho divulgou um artigo com notas sobre a infantaria alemã onde destacava
também as atenções dedicadas ao preparo do corpo dos soldados pela Alemanha
Marchas de Instrução – Gymnastica
É pela cuidadosa cultura muscular, praticada nos constantes exercícios e sports, que
se consegue dar ao soldado alemão essa rigorosa firmeza com que elle executa os
movimentos da ordem unida e a agilidade e destreza que o caracterizam na ordem
dispersa os exercícios de gymnastica propriamente ditos se juntam a esgryma de
bayoneta e aos jogos sportivos. A esgryma de bayoneta começa a ser ensinada nas
últimas semanas do período de instrução individual e faz parte do programma do
exame de recrutas [...] Dentre os jogos sportivos é o football o preferido, ainda que
outros sejam também praticados.154

Ao longo das edições de 1911, 1912, 1913 e 1914 foram publicados inúmeros
relatórios destes oficiais que estagiaram junto ao Exército Alemão. Com a divulgação destes
relatos, exaltava-se a metodologia de preparação dos militares alemães sendo sempre
enfatizada a necessidade de implementação de melhorias no processo de treinamento dos
brasileiros seguindo estes modelos de sucesso.
O esporte e a ginástica seguiram fazendo parte das celebrações de datas importantes
para as FFAA brasileiras, como nas execuções de exercícios de esgrima no aniversário do
Colégio Militar155; na festa militar com apresentação de manobras e exercícios de ginástica
realizada em São Cristovão com presença do Marechal Presidente156; e na festa realizada pelo
Exército em homenagem a Marinha no campo de São Cristovão com a presença do Presidente
da República e exibições de exercícios militares e ginásticos pelo Colégio Militar e Escola de
Grumetes157. Estas práticas também eram item comum das festividades realizadas em visitas

153
Boletim Mensal do Estado Maior do Exército, vol. IV, n. 1, outubro de 1912. Ministério da Guerra, Imprensa
Militar: 1912, p. 75-78.
154
Boletim Mensal do Estado Maior do Exército, vol. V, n. 5 e 6, maio e junho de 1913. Ministério da Guerra,
Imprensa Militar: 1913, p. 551-552.
155
Revista Careta 14 de maio de 1910, p. 23.
156
Revista Careta 18 de janeiro de 1913, p. 8-9.
157
Revista Careta 21 de junho de 1913, p. 28-29.
112

oficiais de Forças estrangeiras ao país, como na realização de exercícios de baioneta em visita


de oficiais da Marinha Portuguesa em 1910.158
A defesa pela intensificação constante da prática de atividades esportivas e das
ginásticas fazia parte dos projetos de reformulação da organização das FFAA brasileiras.
Estas ações acompanhavam também o movimento de ampliação destas práticas na sociedade
em geral, uma vez que o esporte passou a fazer parte do cotidiano social e cultural das cidades
brasileiras ao longo dos anos iniciais do século XX.
A formação dos clubes esportivos ampliou-se desde fins do século XIX nas diferentes
modalidades já praticadas no Brasil. Inicialmente, envolviam prioritariamente três esportes na
cidade do Rio de Janeiro: turfe, primeiro esporte institucionalizado no país, remo, seu
sucessor, e o futebol (DACOSTA, 2005).
A partir da divulgação sobre as práticas esportivas nos periódicos analisados para esta
pesquisa foi possível perceber que as competições mais comuns no período envolviam as
seguintes modalidades: turfe, regatas a remo e vela, futebol, water polo, natação e tiro. A
partir da década de 1910, alguns esportes que estavam em processo de ampliação de
divulgação passaram também a ocupar espaços nas publicações como o jiu-jitsu, o boxe, o
motociclismo, a aviação e o lawn tennis. Outras práticas como a Caça a Raposa (grupos a
cavalo buscando encontrar a pessoa que foi designada como raposa) e a Pega do pato
(lançamento de um pato na água para ser capturado pelos nadadores) também garantiram
espaço de destaque com notícias acompanhadas de fotografias em edições da Revista
Careta.159
Outras notas sobre a atuação dos militares em diferentes modalidades esportivas foram
publicadas em suas revistas institucionais e nas publicações da imprensa. A revista Careta,
em março de 1912, por exemplo, publicou a notícia “The Rio de Janeiro knockout boxing
group” apresentando imagens de homens treinando boxe com a legenda “sócios preparando os
muques para resistir às intervenções militares”.160 A mesma revista, no ano seguinte, divulgou
a participação da Escola Naval em competição de remo em páreo específico para os
militares.161
A revista institucional do EB, o Boletim Mensal do Estado Maior do Exército, dedicou
espaço ao longo das publicações dos anos de 1911 e 1912 para uma coluna chamada “Pela
Cavallaria”, onde divulgava orientações sobre adestramento e equitação, utilizando elementos

158
Revista Careta 22 de janeiro de 1910, p. 28-30.
159
Revista Careta 02 de março de 1912, p. 29; 03 de agosto de 1912, p. 17.
160
Revista Careta 16 de março de 1912, p. 35.
161
Revista Careta 16 de agosto de 1913, p. 17.
113

da hipologia162 com imagens trabalhadas em planos cartesianos simulando os movimentos a


serem realizados, além de notas sobre concursos de hipismo e ciclismo no Brasil e no
exterior.163, 164
O Boletim do EB ainda publicou inúmeras notas descrevendo os prêmios, vencedores
e cerimônias dos campeonatos de tiro e dos raids militares. Estas competições eram as mais
detalhadas nos boletins com regulamentos, mapas de percurso, instruções, premiações.165
Existem também registros da participação de militares da Marinha no primeiro campeonato de
Basket-Ball, organizado pela Associação Cristã de Moços em 1915.166 Além destas
atividades, o Livro Histórico do Departamento de Esportes da Marinha ainda afirmou que
“Era comum, nas festas que ordinariamente se realizavam, a inclusão de números jocosos,
como pau de sebo, corrida de pato e outras brincadeiras”.167
Sendo assim, neste contexto de ampliação das práticas esportivas no Rio de Janeiro, os
militares passaram a se envolver com modalidades antes não contempladas, como as descritas
acima. Como foi possível discutir até este ponto, tanto os integrantes da Marinha como do
Exército participavam prioritariamente de competições ou apresentações de esgrima, tiro,
natação e remo (práticas comuns no cotidiano militar nos processos de treinamento para
praças e oficiais), além do futebol que já se apresentava como uma modalidade em grande
ascenção nos anos iniciais do século XX. As FFAA não ficaram “alheias” a este processo de
difusão e passaram a incorporar esta prática tanto em seus quartéis e navios como em suas
festividades oficiais, conforme já discutido. O caso da expansão do futebol por diferentes
regiões da cidade e incorporação da prática por diferentes grupos sociais neste período foi
analisado por João Malaia. O pesquisador afirma que

162
Ciência ou estudo sobre cavalos ou suas utilizações (SILVA, 2009).
163
Boletim Mensal do Estado Maior do Exército, vol. IV, n°. 2, fevereiro de 1913. Ministério da Guerra,
Imprensa Militar: 1913.
164
Boletim Mensal do Estado Maior do Exército, vol. II, n°. 1, outubro de 1911. Ministério da Guerra, Imprensa
Militar: 1911, p. 79.
165
Boletim Mensal do Estado Maior do Exército, vol. VII, n°. 6, junho de 1914. Ministério da Guerra, Imprensa
Militar: 1914, p. 469.
166
Livro Histórico do Departamento de Esportes da Marinha, Vol. II, Histórico Liga a C.E.M., p. 1.
167
Livro Histórico do Departamento de Esportes da Marinha, Vol. II, Histórico Liga a C.E.M., p. 1.
114

O próprio processo de urbanização e reforma da cidade do início do século XX foi


decisivo para a difusão do futebol pelos subúrbios cariocas. A expansão urbana
levava a população de baixa renda para os subúrbios, com espaço suficiente para a
improvisação dos campos de futebol. [...] Diferentemente do turfe e do remo, o
futebol não precisa de muito capital para a sua organização. A prática é barata, os
instrumentos (a bola, as traves, a rede para as metas) eram relativamente baratas e
campos, no subúrbio não era dos mais difíceis de se arranjar. Dezenas de clubes
começaram a se organizar nesse período, clubes com mensalidades mais baratas que
variavam de 1$000 a 2$000, contra 10$000 de clubes como o Fluminense. As ligas
que organizavam o futebol de subúrbio também eram muito mais acessíveis. A Liga
Suburbana de Football, fundada em 1912, cobrava 10$000 por mês e 20$000 de taxa
de inscrição, no ano de 1919 (MALAIA, 2008a, p. 5).

A prática do futebol inicialmente foi associada a clubes já existentes, principalmente


de criket e regatas, ampliando o quadro de atividades de tais associações esportivas. Não
houve, portanto, um movimento de institucionalização específico para o futebol. As estruturas
já existiam e incorporaram mais uma prática esportiva. Neste movimento surgiram diversos
times de futebol dentro de clubes brasileiros: em 1895 o São Paulo Athletic Club incorporou o
futebol; em 1898, o Colégio Mackenzie de São Paulo criou um time predominantemente
brasileiro; em 1899 o Sport Club Vitória, clube de criket da Bahia, incorporou o futebol; em
1900 criou-se o Sport Club Rio Grande, no Rio Grande do Sul. Como é possível observar, o
futebol conseguiu rapidamente ser incorporado nas mais diferentes regiões brasileiras a partir
dos clubes esportivos já existentes nestas localidades (HELAL, SOARES e SALLES, 2005).
No Rio de Janeiro, os primeiros clubes de futebol foram fundados a partir de 1902. O
primeiro clube foi o Fluminense Football Club (1902), seguido por Bangu Atlético Club
(1904), América Football Club (1904) e Botafogo Football Club (1904). O crescimento do
número de clubes neste início do século iniciou um processo de estruturação das atividades e
competições dos clubes, uma vez que o esporte já garantia grande público nas exibições e
encontrava-se bastante difundido entre os diferentes grupos da sociedade como forma de
lazer. Com este processo de ampliação, identificou-se a necessidade de organização de uma
Liga de Futebol no Rio de Janeiro, aos moldes do que já existia em São Paulo e na Bahia,
para organização de competições entre os clubes de futebol do Rio de Janeiro e Niterói.
Criou-se, então, em 08 de junho de 1905 a Liga Metropolitana de Football, com participação
dos seguintes clubes: Football Athletic Club, Fluminense Football Club, Botafogo Football
Club, América Football Club, Bangu Atlético Club, Sport Club Petrópolis, Rio Cricket and
Athletic Association e Paysandu Cricket Club. De acordo com a Federação de Futebol do
Estado do Rio de Janeiro, “os dois últimos tornaram-se membros em dezembro, mas são
considerados fundadores da Liga” (FFERJ, 2009).
115

Após assembleia realizada em 18 de fevereiro de 1907, e sem qualquer menção ao


motivo, a Liga mudou de nome e passou a se chamar Liga Metropolitana de Sports Athleticos
(LMSA), com as mesmas responsabilidades de coordenar as ações relativas ao futebol
carioca, tendo como dirigentes os membros da diretoria dos clubes mais ricos do Rio de
Janeiro: Botafogo, Fluminense, América e Flamengo (SILVA e SANTOS, 2006; MALAIA,
2010).
Neste processo de ampliação da prática do futebol, alguns militares passaram a
integrar equipes dos clubes da cidade do Rio de Janeiro. Este era o caso do então Tenente da
Marinha Benjamin Sodré, conhecido no meio futebolístico como Mimi Sodré, que
representou, entre 1910 e 1916, os clubes cariocas do América e do Botafogo e foi um dos
fundadores da Liga de Sports da Marinha em 1915. A edição da revista Careta de 27 de junho
de 1914 retratou uma partida de futebol do Botafogo dando grande destaque ao gol da vitória
efetivado por Benjamin Sodré, oficial da Marinha e sportmen do clube.168 (vide figura 3).

Figura 3: Imagens publicadas na Careta dando destaque ao gol da vitória feito pelo Tenente Benjamin Sodré
para o Botafogo.
Fonte: Revista Careta 27 de junho de 1914, p. 16.

168
Revista Careta 27 de junho de 1914, p. 16.
116

Seguindo as tendências de regulamentação da prática esportiva, na década de 1910


foram empreendidas iniciativas para criação de uma instituição única para regulamentar os
esportes no Brasil. A Liga Metropolitana de Sports Athleticos, fundada em 1907, propôs a
convocação de uma reunião, em 1914, realizada na sede da Federação Brasileira das
Sociedades de Remo para criação de tal instituição. Uniram-se aos representantes da Liga
integrantes de algumas das principais entidades esportivas do período, como o Aero Club
Brasileiro, o Automóvel Club Brasileiro, Centro Hípico Brasileiro, Club Gymnastico
Portuguêz, Commissão Central de Concursos Hípicos, Jockey Club Brasileiro e a Federação
Brasileira de Sociedades de Remo, naquele momento também responsável pelo controle do
pólo aquático e da natação, além do remo, no Rio de Janeiro (REEBERG, 2007). Esta reunião
teve como resultado a fundação da Federação Brasileira de Desportos, que após dois anos
alteraria o nome para Confederação Brasileira de Desportos. O regulamento da instituição
apontava como objetivo dirigir todas as federações, ligas e clubes das diferentes modalidades
esportivas do país. De acordo com Rúbio (2005), este trecho do referido regulamento deixa
clara esta expectativa:
Art. 1º - A Confederação Brazileira de Desportos, fundada em 08 de junho de 1914,
com a denominação de Federação Brazileira de Sports, é constituída por todas as
Federações, Ligas e Clubs, que nos Estados dirigem os respectivos desportos.
Paragrapho 1º - Em cada Estado e no Distrito Federal, à proporção do
desenvolvimento desportivo, existirão três instituições, uma do desporto terrestre,
outra de desporto aquático e a terceira de desportos aéreos, e só estas serão filiadas à
Confederação.
Paragrapho 2º - À Confederação poderão ser filiadas sociedades desportivas
isoladas, desde que no respectivo Estado não exista outra sociedade do mesmo
desporto.
Art. 2º - A C.B.D. terá as seguintes atribuições:
1º - Representar os desportos nacionaes junto aos poderes constituídos.
2º - Representar os desportos nacionaes no estrangeiro.
3º - Promover o desenvolvimento e congraçamento dos desportos.
4º - Servir de tribunal de última instância para derimir as questões que surgirem
entre federações ou sociedades desportivas directamente filiadas.
5º - Procurar uniformizar os regulamentos e códigos desportivos.
6º - Fazer convenções, tratados e relações com sociedades desportivas estrangeiras

O processo de estruturação de entidades reguladoras esportivas no interior das FFAA


acompanhou este movimento crescente na sociedade brasileira desde fins do século XIX. A
necessidade de criação de instituições para reger a organização do esporte intensificou-se pelo
aumento dos clubes em diferentes modalidades esportivas no país. Como já discutido, apesar
de inúmeros esportes já serem praticados corriqueiramente entre praças e oficiais da Marinha
e do Exército, até 1915 não existia nenhuma forma de regulamentação institucional destas
práticas em nenhuma das duas Forças.
117

O Capítulo 4 desta dissertação dedica-se a discutir, de forma comparativa, os modelos


de liga esportiva adotados por cada uma das instituições militares, seus principais objetivos e
atividades desenvolvidas em seus anos iniciais de atuação, culminando com uma análise da
participação dos militares na organização dos Jogos Esportivos do Centenário de 1922 e seus
desdobramentos para a relação dos militares com a prática esportiva e com a Educação Física.
118

4
ORGANIZAÇÃO ESPORTIVA
MILITAR NO BRASIL: UMA
ANÁLISE COMPARADA DAS AÇÕES
DA LIGA DE SPORTS DA MARINHA
E DA LIGA MILITAR DE FOOTBALL
EM SEUS PRIMEIROS ANOS DE
ATUAÇÃO (1916-1922)
119

4.1 Atuação das Ligas Esportivas Militares: fundação e primeiras ações de promoção do
esporte.

A organização esportiva tendo como base a criação de ligas foi um movimento


constante em fins do século XIX e início do século XX em todo o mundo, não estando o
Brasil distante deste processo. As ligas esportivas podem ser compreendidas como
instituições responsáveis pela administração dos interesses dos clubes das diferentes
modalidades, atuando como normatizadoras das práticas através de regras combinadas e
aceitas pelas equipes integrantes das ligas. As primeiras ligas esportivas fundadas no mundo
foram a Liga Inglesa de Futebol e a Liga Norte-Americana de Beisebol, ambas no ano de
1871 (MALAIA, 2010).
João Manuel Malaia, comentando o processo de fundação de ligas e federações
esportivas no Brasil nas décadas iniciais do século XX, afirma que
o esporte foi traduzido, codificado e monopolizado por esse pequeno grupo que
fazia com que os incentivos governamentais, econômicos e políticos fluíssem apenas
para seus clubes e federações, e marginalizava todos aqueles que deixassem de
seguir os modelos de práticas esportivas controladas por essas entidades. O Estado
elegia tais entidades e dava a elas o título de “entidades oficiais”, responsáveis pela
representação do país em competições internacionais [...]. (2011a, p. 72).

Apesar das diferenças entre os formatos de ligas adotados pelos países, estas
entidades, na estrutura econômica do esporte, seriam aquelas com maior poder. Stephen
Hardy (1986) comentando o poder das ligas sobre as decisões no processo de gestão afirma
que para a efetivação de um produto comercializável no mercado esportivo é necessário que
exista um departamento central (ligas) com poder administrativo para coordenar as atividades
das “empresas individuais” (clubes) dentro de uma rede que possibilite sistemas estáveis de
competição para a geração de um produto (jogo) que atenda ao mercado. Neste sentido, as
ligas, federações e confederações esportivas assumem o papel de normatizadoras e
controladoras das ações dos clubes no processo de gestão e as relações entre eles na geração
do produto a ser apresentado ao mercado.
As ligas esportivas teriam como atribuição organizar as regras de funcionamento,
definindo questões como tamanho dos estádios; quantidade de competições a serem
realizadas; número de jogadores que cada clube poderia contratar e questões relacionadas a
transferências; e atuando como um verdadeiro cartel, excluindo ou inserindo times de acordo
com seus interesses visando à maximização dos lucros e monopólio do mercado (MALAIA,
2008b).
120

Como já apontado, o processo de estruturação dos esportes em torno de ligas chegou


também às FFAA ainda nas décadas iniciais do século XX. No tópico a seguir serão
analisados os formatos de organização esportiva adotados pelas entidades diretoras do esporte
nas FFAA brasileiras, assim como suas principais iniciativas de atuação nos primeiros anos de
funcionamento.

4.1.1 Fundação e regulamentação institucional das Ligas Esportivas Militares

Entre 1915 e 1920 o Exército contou com uma liga esportiva criada com o intuito de
atuar na organização do futebol: a Liga Militar de Football (LMF). A criação de uma liga
monoesportiva específica desta modalidade justificava-se por vários militares do EB
participarem de equipes dos principais clubes do Rio de Janeiro, promovendo também
competições amistosas entre os regimentos onde serviam. De acordo com Ribeiro (2009), por
iniciativa do Tenente Francisco Mendes, atleta do Fluminense Football Club foi instalado um
campo ao lado do 1º. Regimento de Artilharia Montada, na Vila Militar para a realização de
partidas.
Já na Marinha do Brasil as ações de organização esportiva se iniciaram com
características distintas. Em 25 de novembro de 1915 um grupo de oficiais efetivou a
fundação da Liga de Sports da Marinha (LSM), primeira entidade de direção do esporte na
MB, e desde suas primeiras determinações focou no desenvolvimento de diferentes
modalidades, garantindo um caráter poliesportivo.
As duas entidades, LMF e LSM, buscaram junto aos seus respectivos Ministérios o
processo de reconhecimento de suas fundações e propostas de atuação junto aos militares de
cada uma das Forças. A LMF foi reconhecida institucionalmente através de Aviso do
Ministério da Guerra nº. 966 de 22 de junho de 1915:
Ministério da Guerra - Nº. 966. - Rio de Janeiro, 22 de junho de 1915.
Sr. chefe do Departamento da Guerra - Declaro-vos que permito o funccionamento
da “Liga Militar de Football”, cujo projecto de estatutos a este acompanha, sendo
facultado ao pessoal dos corpos do Exercito nella se inscrever. Saúde e fraternidade.
José Caetano de Faria.169

169
BRASIL. Diário Oficial da União de 29 de junho de 1915, seção 1, p. 5.
121

A partir da autorização do Ministério da Guerra, a LMF passou a tomar medidas para


a divulgação do futebol entre o pessoal dos corpos do Exército e a inscrição na referida Liga e
participação em suas atividades era facultativa.
A LSM foi criada oficialmente em 25 de novembro de 1915, conforme a data da ata de
fundação. No entanto, sua regulamentação institucional foi a partir da publicação da Ordem
do Dia do Ministério da Marinha nº. 01 de 04 de janeiro de 1916 onde o Ministro Almirante
Alexandrino Faria de Alencar autorizava o funcionamento da LSM com o seguinte disposto:
Sr. Chefe de Estado Maior da Armada, declaro-vos, para fins convenientes, que,
approvados os intuitos da Liga de Sports da Marinha, fundada por officiais com o fim
de concorrer para o desenvolvimento physico do pessoal da Armada, por meio dos
jogos e exercícios, com campeonatos annuaes, resolvi permittir que a citada Liga se
corresponda com as autoridades da Marinha, em relação ao que for necessário a seus
fins, e que as autoridades lhe facilitem os meios de acção, sem prejuízo para o
serviço, fazendo-se os jogos sob direção da referida Liga e seus representantes nos
navios, corpos, estabelecimentos, ficando a acção destes últimos sujeita a approvação
dos respectivos comandantes. Saúde e fraternidade. Assignado Alexandrino Faria de
Alencar.170

Como referenciado no documento, o objetivo de autorização de funcionamento da


LSM era o “desenvolvimento physico do pessoal da Armada, por meio de jogos e exercícios”,
e para tal as autoridades navais deveriam facilitar seus meios de ação para a organização das
atividades esportivas. Neste documento identificam-se algumas regulamentações partindo do
Ministério da Marinha sobre os processos de organização e participação nas atividades,
destacando a necessidade de autorização dos comandantes (oficiais superiores) para que seus
subordinados participassem das atividades da Liga e que esta instituição deveria se
corresponder com as autoridades navais para a comunicação de suas propostas, fato este
somente possível por se configurar como uma iniciativa de oficiais (envolvendo também
oficiais superiores), já que os processos de comunicação e correspondência também deveriam
respeitar a ordem hierárquica (CANCELLA e MATARUNA, 2012b).
Ao longo das investigações documentais para a elaboração desta pesquisa, não foi
possível ter acesso aos registros específicos da LMF, tais como atas de reuniões ou relatórios.
No entanto, identificou-se uma publicação de imprensa que era utilizado como órgão oficial
de divulgação das atividades de inúmeras associações esportivas, entre elas a Liga Militar de
Football: o jornal “O Imparcial”.171, 172

170
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha de 1916. Anexo A, p. 01.
171
O Imparcial 01 de outubro de 1915, p. 9.
172
Como define Luca (2006), a categoria de fontes de imprensa “jornal” se caracteriza por ser uma publicação
diária em folhas separadas. O jornal em análise “O Imparcial” foi fundado por José Eduardo de Macedo Soares
após sua saída da Marinha do Brasil com o financiamento feito por seu irmão, José Carlos de Macedo Soares. O
jornal foi criado para apoiar a campanha de Rui Barbosa à presidência da República em 1909. O periódico foi
utilizado largamente para a defesa das propostas de Barbosa e o ataque ao principal adversário político, o
122

Neste periódico foram publicados os processos de organização e resultados de partidas


realizadas entres os regimentos do EB; convocações de esportistas e da diretoria para
reuniões; atas de conselho. Neste sentido, as ações realizadas pela LMF (entre 1915 e 1920) e
da Liga de Sports do Exército (entre 1920 e 1922) foram analisadas a partir das publicações
sobre estas entidades no referido jornal.
Ainda em seu primeiro ano de atuação, em 06 de novembro de 1915, foi publicado em
seu jornal de divulgação oficial a convocação de jogadores do Exército, de acordo com a
seguinte determinação
O uniforme official da Liga Militar fica assim: calça e camisa branca, escudo
encarnado vivo – com as iniciaes brancas – L. M. F. B.
Quem fornece o uniforme acima é a Liga Militar, no dia e na hora do jogo, portanto,
os jogadores indicados devem levar as chuteiras e as meias pretas.
Sabemos que no dia 21, por occasião de uma festa sportiva a ser realizada no campo
do Fluminense, será travado um encontro entre o scratch do Exército e um outro da
Armada. Será um jogo digno de ser apreciado.173

Nesta convocação já se evidenciam as primeiras ações de divulgação da LMF: a


elaboração de um uniforme específico a fim de facilitar a identificação dos jogadores do EB e
a promoção de um jogo entre estes e uma equipe da Armada.
A Liga de Sports da Marinha, desde sua fundação em 1915 até 1940 quando foi extinta
para a criação do Departamento de Educação Física da Marinha, atuou na organização das
atividades esportivas na MB. Suas ações iniciais foram a programação de competições
internas de natação, pólo aquático e futebol, ainda em 1915, como instrumento de divulgação;
comunicação oficial às autoridades navais superiores da criação da Liga; e solicitação ao
Ministro da Marinha para assumir a direção dos sports de bordo, conforme registrado na ata

Marechal Hermes da Fonseca. Foi ainda instrumento em campanhas contra os governos de Epitácio Pessoa e
Artur Bernardes. (BIBLIOTECA NACIONAL, 2012; SILVA, 1998). A apresentação do periódico Diário
Carioca, outro jornal fundado por Macedo Soares, na Hemeroteca Digital Brasileira organizada pela Biblioteca
Nacional informa que “Preso por ordens do primeiro [Marechal Hermes], Macedo Soares promoveu, em O
Imparcial e ao lado do Correio da Manhã, Época e A Noite (cujos diretores também haviam sido detidos),
intensa campanha em favor da liberdade de imprensa. Em 1922, por ocasião da primeira rebelião tenentista
(episódio conhecido como “Os 18 do Forte”), já no governo de Epitácio Pessoa, José Eduardo voltou a ser preso.
Solto meses depois, seu jornal seria novamente fechado por ordem do novo presidente, Artur Bernardes, a quem
também fazia oposição. José Eduardo então se exilou na Europa com a mulher e filhas para retornar alguns anos
depois, já durante o governo de Washington Luís, e fundar o Diário Carioca (BIBLIOTECA NACIONAL,
2012). Este periódico, como já comentado, era o órgão oficial de publicação de diversas entidades esportivas
cariocas. Além do esporte já garantir seu espaço de divulgação na imprensa nas primeiras décadas do século XX,
esta atuação do jornal se deve, em parte, ao apreço de seu fundador e diretor pelo esporte. José Eduardo de
Macedo Soares foi dirigente esportivo e chegou a presidir a Confederação Brasileira de Desportos entre 1921 e
1922 (CABO e HELAL, 2010).
173
O Imparcial 06 de novembro de 1915, p. 9.
123

da 1ª. Sessão da Diretoria, datada de 16 de dezembro de 1915 na sala de conferências do


Clube Naval.174 (CANCELLA, 2011a).
Os processos de organização interna das LEM foram definidos ainda nos momentos
iniciais de suas atividades. Os modelos de gestão adotados tanto pela LMF como pela LSM
tinham como principal característica a estruturação em torno de diretorias com funções
administrativas e de organização das competições esportivas.
Já na reunião de fundação da LSM, realizada em 25 de novembro de 1915 na sede do
Clube Naval, foram estabelecidas questões relacionadas ao seu processo de organização
administrativa. Definiu-se que ela seria comandada por um sistema de Diretorias, sendo três
com funções de gestão e diretorias específicas para a organização das modalidades esportivas
que compunham o quadro de atividades; sócios com características pré-definidas com
possibilidade de votação nas questões internas da LSM; além da designação de representantes
da entidade nos navios, corpos e estabelecimentos da Marinha que teriam função de divulgar
as atividades da Liga entre a tripulação e coordenar as ações de organização e inscrição dos
esportistas nas competições. Os cargos de Diretor-Presidente, Diretor-Secretário e Diretor-
Tesoureiro foram definidos e ocupados ainda nesta primeira reunião dos oficiais. O Capitão-
de-Corveta Adalberto Nunes, por indicação dos presentes, foi nomeado Diretor-Presidente da
LSM, sendo acompanhado pelo Capitão-Tenente Alberto de Lemos Basto na função de
Diretor-Secretário e o Primeiro-Tenente Alfredo Sinay para Diretor-Tesoureiro. O pavilhão da
Liga também foi tema de discussão nesta primeira reunião, ficando a cargo do Primeiro-
Tenente Gustavo Goulart a elaboração de opções para a “bandeira”. As propostas foram
analisadas pelos presentes e votou-se pela adoção, por escolha da maioria, da “bandeira
constituída por uma âncora vertical feita a risco preto sobreposta com um salvavidas circular
vermelho, sobre o qual se vêm em preto as iniciaes do nome da Liga, estando este conjunto
sobre um campo branco”.175 (CANCELLA e MATARUNA, 2012a).
As definições e nomeações dos diretores dos diferentes jogos a serem coordenados
pela Liga foram realizadas em sua segunda reunião de diretoria. Para dirigir os “Serviços de
Remo” da LSM foi convidado o Capitão-de-Corveta Amphilóquio Reis, já para os “Serviços
de Vela”, convidou-se o Primeiro-Tenente Eleazar Tavares, e para os “Serviços de Football”,

174
“1ª. Sessão da Directoria de 16 de dezembro de 1915”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha
- Volume I - Anexo I.
175
“Reunião de officiaes para fundação da Liga de Sports da Marinha”. Livro Histórico Departamento de
Esportes da Marinha - Volume I - Anexo I.
124

o Segundo-Tenente Benjamim Sodré176, ficando também responsável de realizar combinações


para utilizar campos particulares pela LSM. O Primeiro-Tenente Gustavo Goulart, autor do
pavilhão da Liga, recebeu a responsabilidade de realizar estudos para a construção de um
campo de football na Ilha das Cobras e havendo a possibilidade espacial, combinar a cessão
do espaço com o Engenheiro Chefe do Novo Arsenal que estava sendo construído naquela
ilha.177
Para ser “consórcio” (sócio) da LSM eram exigidas algumas características
específicas. Na 1ª. Assembleia de Representantes, realizada em 24 de dezembro de 1915,178
foi definido quem poderia fazer parte da Liga como sócio. As opções colocadas em votação
eram: oficiais honorários da Armada, professores e dentistas civis com honras, aspirantes de
Marinha, sub-comissários e sub-maquinistas. Após a votação definiu-se que poderiam integrar
a LSM: oficiais honorários, dentistas e professores com honras e guardas-marinha alunos.
Com esta definição, caracteriza-se a participação na Liga a partir dos níveis hierárquicos
(oficiais, suboficiais e praças), priorizando-se o oficialato e seus assemelhados (caso dos
professores civis e dentistas), excluindo do processo decisório de gestão do esporte na MB
todos os demais integrantes da Força (marinheiros, cabos, sargentos e suboficiais).
As diretorias da Liga eram escolhidas a partir do voto individual entre os sócios,
ocorrendo votação para os cargos de Diretor-Presidente, Diretor-Tesoureiro e Diretor-
Secretário, assim como os suplentes. Este processo era realizado durante as Assembleias
Gerais, como registrado em Ata da 1ª. Assembleia Geral de 20 de novembro de 1916 para a
escolha do corpo diretivo para o ano de 1917.179 Apesar do processo “democrático” de
escolha, somente poderiam se candidatar aos cargos de direção os sócios da Liga que, por sua
vez, eram compostos por oficiais e guardas-marinha, conforme determinações definidas desde
1915.180 Desta forma, aos suboficiais e praças era permitida apenas a participação nas
competições, desde que devidamente autorizada por seus Comandantes.181

176
Benjamin Sodré, também conhecido como Mimi Sodré, foi jogador de futebol e representou, entre 1910 e
1916, os clubes cariocas do América e do Botafogo.
177
“2ª. Sessão da Directoria de 20 de dezembro de 1915”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha
- Volume I - Anexo I.
178
“1ª. Assembleia de Representantes de 24 de dezembro de 1915”. Livro Histórico Departamento de Esportes
da Marinha - Volume I - Anexo I.
179
“1ª. Assembleia Geral de 20 de novembro de 1916”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
180
“1ª. Assembleia de Representantes de 24 de dezembro de 1915”. Livro Histórico Departamento de Esportes
da Marinha - Volume I - Anexo I.
181
As relações da hierarquia militar com o processo de organização esportiva tanto na Marinha como no
Exército serão discutidas em tópico específico ainda neste Capítulo 4.
125

As determinações sobre uso de uniformes para a prática esportiva na MB foram


definidas ainda no início de 1916. O Aviso n°. 2 de 02 de janeiro de 1916 publicado no
Relatório do Ministério da Marinha informava a autorização para uso de trajes específicos
para a prática de exercícios e jogos esportivos promovidos pela LSM:
Permitte que o pessoal da Armada use nos exercicios sportivos os trajes próprios
desses exercícios
Snr. Chefe do Estado Maior da Armada – Para vosso conhecimento e devidos
effeitos. Declaro-vos que resolvi permittir que o pessoal de vários corpos da Armada
use em jogos e exercícios sportivos que forem feitos sob a direcção da Liga dos
Sports da Marinha os trajes próprios a esses exercícios.
Os officiaes que servirem de juizes e directores desses jogos poderao trazer, com os
uniformes navaes, os respectivos distinctivos. Saúde e Fraternidade. Alexandrino
Faria de Alencar. 182

No caso da LMF, os registros localizados sobre a organização interna da entidade


foram publicados pelo jornal “O Imparcial”, seu órgão de divulgação oficial como
anteriormente informado. A edição deste periódico de 19 de março de 1916 divulgou uma ata
da reunião de diretoria realizada na Liga Militar de Football. No documento foram
estabelecidas as funções e a estruturação da LMF. Conformou-se que o campeonato militar
teria como destinação principal desenvolver o futebol no EB, fazendo parte da instrução de
ginástica. As competições deveriam ser realizadas entre os corpos de cada guarnição e,
quando possível, por mais de uma guarnição em conjunto. A administração da LMF ficou
assim definida:
Tem por objectivo dirigir e promover a realização do campeonato de football. Será
gerida por uma directoria composta por seis officiaes do Exercito. Será eleita por
votação secreta, entre os instructores dos corpos concorrentes em reunião convocada
e presidida pela directoria já existente. Se não houver directoria, dirigirá os trabalhos
da eleição o instructor mais graduado presente á sessão. A directoria será composta
de: um presidente, um vice-presidente, dois secretários e dois thesoureiros; cada um
destes membros terá as seguintes attribuições: Presidente:
a) Convocar e presidir as sessões de directoria;
b) Assignar todos os papeis de responsabilidade e o expediente;
c) Ouvidar esforços junto as autoridades militares no sentido de facilitar a
realização deste campeonato;
d) Representar a Liga em todas as opportunidades e usar o voto de qualidade,
quando preciso;
Vice-Presidente: Assumir, sempre que for preciso, a direcção da Liga, nos
impedimentos do presidente.
Secretario: Redigir as actas das reuniões de directoria, assignando-as com o
presidente e encarregar-se de toda a correspondência da Liga.
O primeiro substitue o vice-presidente e o segundo substitue o primeiro.
Thesoureiros: Arrecadar e guardar todo e qualquer valor da Liga, assignar com o
presidente todo o papel de sahida e entrada de valores, apresentando mensalmente
um balancete do movimento financeiro da Liga a directoria.
O segundo substituirá o primeiro.
A Directoria terá mandato annual terminando este um mez antes do inicio do
campeonato. Neste mesmo dia será empossada a nova directoria, que receberá
também todos os bens e haveres pertencentes a Liga. Cada directoria ao deixar o

182
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha de 1916, anexo A, p. 1.
126

mandato apresentara um balancete detalhado do seu movimento, o qual será lido na


sessão de posse, a que deverão comparecer todos os instructores dos corpos que
apresentarão a nova directoria suas credenciaes officiaes, habilitando-os como
taes.183

O estatuto definia que o campeonato de futebol seria realizado entre corpos do EB,
sempre iniciando em maio de cada ano, com equipes constituídas por praças tendo como
instrutor um oficial que seria o elemento de contato com a Liga e responsável pela disciplina e
guia para a aprendizagem. Mais uma vez a hierarquia militar foi utilizada como definidora dos
espaços de atuação e atribuições dos militares. Os corpos deveriam inscrever junto à Liga os
militares que fariam parte de suas equipes, assim como os uniformes que seriam utilizados e
as dimensões de seu campo. Era obrigatório que cada corpo que se inscrevesse para participar
do campeonato tivesse um campo oficial em condições de ser utilizado para seus matches.
Previa-se ainda a existência de uma comissão de futebol formada por três oficiais
indicados pela diretoria da Liga entre os instrutores que apresentassem conhecimentos
teóricos e práticos sobre o esporte. A equipe vencedora do campeonato organizado pela
entidade teria direito ao título de campeão do ano, um troféu e medalhas simbólicas cujo valor
dependeria das condições financeiras da Liga. Cada um dos corpos participantes tinha
obrigação de contribuir com uma “média quantia” (valor não definido no estatuto) para os
fundos de reserva da LMF. Ao final do campeonato, de acordo com as determinações, seria
realizada uma partida entre o time campeão e um formado pelos melhores jogadores dos
outros times e o lucro das entradas seria utilizado para a confecção de medalhas do time
campeão. Os estatutos publicados em 19 de março de 1916 em “O Imparcial” datavam,
segundo a publicação, de 18 de dezembro de 1915. Foram assinados pela comissão de futebol
composta pelo 2º. Tenente Francisco Mendes da Silva Sobrinho, 2º. Tenente José de Almeida
Figueiredo, Aspirante Hugo Bezerra e Aspirante Raul Lima. Evidencia-se também, como na
LSM, a composição da direção da LMF somente com integrantes do oficialato do EB.
Na edição de 20 de novembro de 1915, o mesmo jornal publicou uma nota sobre as
festas em comemoração ao dia da bandeira realizadas no EB. Entre as atividades, ocorreu uma
partida de futebol e a entrega da premiação para os campeões militares de 1915. Nesta mesma
edição, foi transcrito o discurso realizado pelo Tenente Castelo Branco na cerimônia, onde o
oficial destacou que

183
O Imparcial 19 de março de 1916, p. 10.
127

A Liga Militar tem grande satisfação de communicar neste momento sublime para
nós todos que amamos o sport, que a mocidade militar tal qual como a civil, sabem
jogar e interpretar com todas as regras o sport predilecto da terra de Jorge V.
Logo no começo da creação da Liga Militar encontramos, como era natural, alguns
obstáculos que foram logo desapparecendo por parte daqueles que não
comprehendiam o grande jogo inglez.
Hoje contamos na mocidade militar com mais de um terço da sua totallidade, quer
no quadro de officiaes, quer no das praças de pret, e o ideal é contar com a
totallidade; precisamos de homens fortes e valentes, destemidos e extraordinários.
Precisamos preparar os nossos jovens militares para as grandes lutas e para a
civilização da nossa pátria.184

Em seu discurso, o Tenente Castelo Branco enfatizou a dificuldade de se estabelecer


uma liga esportiva dentro da estrutura do EB, mas destacou que as ações da entidade
possibilitaram a remoção das barreiras inicialmente encontradas. O oficial ainda reforçou que
o apreço pelas práticas esportivas, neste caso específico o futebol, seria um dos elementos
fundamentais para o pleno desenvolvimento da mocidade civil e militar com um grande
número de praticantes em todos os níveis hierárquicos do EB (“quer no quadro de officiaes,
quer no das praças de pret”). Destacou ainda que este esporte seria um importante instrumento
de preparação dos jovens militares para as batalhas e para o processo de civilização da pátria.
Esta ideia de “civilização” por meio do esporte foi um dos argumentos de introdução e
legitimação destas práticas no país ainda no século XIX. A busca pelos aspectos modernos e
civilizados europeus, como já discutido neste trabalho, foi um dos elementos mobilizadores
para a aproximação com o esporte. A referência do Tenente Castelo Branco que os brasileiros
já eram capazes de compreender as regras e jogar o “sport predilecto da terra de Jorge V”
evidencia a ainda presente ideia de que a partir da assemelhação aos hábitos europeus o Brasil
poderia ser considerado uma nação civilizada. Nicolau Sevcenko, analisando estas influências
europeias e as mudanças sociais e culturais no Rio de Janeiro na virada do século XIX e anos
iniciais do século XX, discutiu o que se chamou de “civilização esportiva” e as relações
estabelecidas pela sociedade carioca com o esporte e a educação física naquele momento.
Sobre este ponto, o autor afirmou que
Essa expressão “civilização esportiva” portanto não deve ser entendida como se
referindo exclusivamente à prática generalizada de diferentes modalidades de
esporte, mas à generalização de uma ética do ativismo, a ideia de que é na ação e
portanto no engajamento corporal que se concentra a mais plena realização do
destino humano. [...] Era a eletricidade passando para os corpos, imprimindo-lhes a
compulsão do movimento, da ação, fosse espontânea, fosse mecânica, fosse em
coordenação de massas. A educação física se torna obrigatória nas escolas, mas as
pessoas se exercitam voluntariamente em academias, associações atléticas e na sua
própria casa. [...] Os clubes pululam, com o destaque para o futebol, mas
envolvendo todos os esportes. (SEVCENKO, 1998, p. 568-569).

184
O Imparcial 20 de novembro de 1915, p. 9.
128

A adoção do modelo de liga monoesportiva, desenvolvendo apenas a modalidade


futebol, foi justificada em um artigo intitulado “Liga Militar: O football e o Exército”,
publicado no jornal “O Imparcial” em 22 de janeiro de 1920. Neste artigo foram destacadas as
visões da Força com relação aos benefícios que a prática do futebol poderia garantir aos
militares. O trecho a seguir evidencia os principais argumentos utilizados e é fundamental
para compreendermos a opção pelo desenvolvimento desta modalidade por parte dos militares
do EB.
E, se a educação do soldado actual pode chegar ao ponto de lhe proporcionar meios
para a pratica de acções tão bellas quão dignificadoras, capazes de – qual poderoso e
sympathico iman – auxiliar a approximação dos meios civil e militar, por processo
tão commodo e agradavel, é caso de se appellar para as altas autoridades militares
que o são intelligentes e patriotas, e para a moderna geração dos novos e
esperançosos officiaes afim de que, por seus auspiciosos e necessarios auxílios, dêm
a educação physica dos moços militares o grande e inestimavel valor que interessa a
defesa nacional, quando orientada a sua pratica, com methodo, persistência e
desassombro, tendo como objectivo incentivar e desenvolver outras qualidades
importantes do soldado, taes como: coragem, agilidade, golpe de vista, resolução
prompta, camaradagem, disciplina do temperamento, resistência as fadigas e
intemperies, amor ao corpo da tropa, ao Exército e á Pátria (Regulamento de
gymnastica, artigo 95). Como se vê, é, pois, o football, o desporto do soldado, por
excellencia! É elle, dentre todos os desportos, o que melhor unifica todas as
vontades; o que melhor disciplina os temperamentos, modificando os vários
instinctos dos que praticam: o que melhor desenvolve o sentimento da força, dentro
da nobreza! É no revigorar, com elle, o physico da mocidade brazileira, civil ou
militar o seja, cultivemos com amor, as bellas qualidades moraes que nos inspiram
os seus empolgantes torneios: Mens sana in corpore sano. E ninguém, de boa fé,
pode negar as vantagens que adveriam para o Exercito, para a militarização do povo
e até para o sorteio militar se, pelo menos, a maioria dos corpos possuíssem turmas
de soldados capazes de, em diversos pontos do nosso caro Brazil e pelos mesmos
honrosos processos, colherem louros eguaes aos que vem de obter, de modo
dignificante o glorioso team do 1º. Regimento de artilharia montada.185

A partir destas declarações e argumentos apresentados é possível verificar que, de


acordo com as concepções expressas pelo regulamento de ginástica do EB, o futebol era
identificado como o esporte com maior capacidade de desenvolver as características
desejáveis ao soldado naquele momento. O artigo chegava a afirmar que a prática desta
modalidade seria um grande auxílio no processo de militarização do povo e até mesmo para o
sorteio militar, uma vez que os jovens que praticassem o esporte já ingressariam nas FFAA
com o preparo físico necessário para o desempenho das atividades.
É preciso também considerar que estes argumentos utilizados em defesa do futebol
seguiam o momento de popularidade desta modalidade no Rio de Janeiro nas décadas iniciais
do século XX. Neste sentido, Sevcenko afirma que

185
O Imparcial 22 de janeiro de 1920, p. 8.
129

A segunda grande febre desportiva do Rio de Janeiro veio com o futebol e logo se
tornou ainda mais intensa do que as regatas. Inicialmente difundido entre as elites,
ele seria adotado com enorme entusiasmo pelos grupos populares que, com base em
suas tradições rítmicas e lúdicas, relacionadas a destreza do uso dos pés e
movimentos do corpo e da cintura, construiriam sua própria versão do esporte
britânico, mais para a diversão e o carnaval que para a agressividade, disciplina
tática e objetiva (1998, p. 581).

Portanto, não somente os benefícios elencados em relação às determinações do


Regulamento de Ginástica do EB podem ser considerados ao analisar a adoção do modelo de
liga monoesportiva de futebol. O aumento do número de clubes e praticantes desta
modalidade, além do crescimento do interesse dos espectadores e da imprensa, criando uma
ambiência de promoção deste esporte, também precisam ser levados em consideração, como
discute Fabio Franzini:
[...] o futebol, pouco mais de duas décadas depois de lançar suas raízes entre nos,
unia o pais e proporcionava uma vivida manifestação popular de orgulho patriótico.
Na bela expressão de Nicolau Sevcenko “era a descoberta de uma vocação” [...].
(FRANZINI, 2009, p. 129).

A questão do serviço militar e as necessidades de maior envolvimento da sociedade


com as ações militares, apontadas no artigo do Tenente Castelo Branco, ainda eram pontos
complexos na segunda década do século XX. O Relatório do Ministério da Guerra
apresentado em 1916 seguiu reafirmando a necessidade do estabelecimento do serviço militar
obrigatório. O documento ainda destacava a educação física como algo fundamental para o
bom preparo da nação. As inúmeras isenções de voluntários para o serviço militar por sua
incapacidade física chamavam a atenção das autoridades militares, que reforçavam:
É um dever chamar a attenção para este facto, que indica a necessidade de dedicar-se
maior cuidado á educação physica, parecendo-me urgente que se torne obrigatório
nas escolas o ensino de uma gymnastica racional, como a sueca, não para fazer
acrobatas, mas homens fortes e vigorosos.186

Celso Castro (1997, p. 2) comenta que “o sorteio militar foi finalmente iniciado em
1916 e, nas décadas que se seguiram, o serviço militar temporário foi se tornando cada vez
mais obrigatório para a maioria da população jovem, o que levou à modificação do perfil da
tropa”. A Liga Militar de Football foi aprovada pelo Ministério da Guerra como uma das
ferramentas para o auxílio neste processo de melhoria do desenvolvimento físico do pessoal
militar. Em 15 de junho de 1919, “O Imparcial” publicou uma nota narrando as origens desta
entidade esportiva e exaltou as colaborações do Capitão Castelo Branco informando que este
oficial, então Tenente, idealizou em 1915 junto a um grupo de oficiais a criação de um liga
esportiva com objetivo de desenvolvimento físico dos jovens militares. Seus companheiros

186
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1916, p. 6.
130

neste empreendimento foram os tenentes Mendes Sobrinho, Silva Fonseca, J. de Almeida


Figueiredo e Raul Vasconcellos, fundando nas dependências do Clube Militar a LMF dando a
presidência ao então Coronel Chrispim Ferreira.187
No caso da entidade analisada em perspectiva comparativa à LMF a opção por
modalidades se desenrolou de forma diferente. A Liga de Sports da Marinha, conforme já
discutido, atuava desenvolvendo diferentes modalidades junto a seus militares. Suas
competições esportivas eram realizadas entre os grupos que representavam os navios e
estabelecimentos da Marinha, entre estes e equipes do EB, além de participações em
competições com equipes civis. Os registros de organização de competições da LSM para o
período entre 1915 e 1928 evidenciam o quadro de modalidades institucionalizadas na
Marinha, a partir das ações de sua liga na organização de competições, fomento de
participação e divulgação. Neste período, a LSM organizou e participou de eventos enviando
equipes nas modalidades Vela, Natação, Water polo, Remo, Futebol, Retinidas, Cross
Country, Atletismo, Cabo de Guerra, Basquetebol, Esgrima e Tiro.188
Como já apresentado, não foi possível ter acesso ao longo da pesquisa a registros
específicos do funcionamento da LMF, não havendo, portanto, possibilidades de análises
sobre determinados aspectos de sua organização, como, por exemplo, as movimentações
financeiras da instituição. No entanto, para o caso da LSM o acesso às atas de Diretoria da
entidade possibilitou a observação de como se efetivava a manutenção de suas atividades do
ponto de vista financeiro.
A manutenção da LSM iniciou a partir de doações de entidades e pessoais. Como
destacado da Ata de fundação da Liga, as ações de planejamento iniciaram-se com o apoio do
Clube Naval que tendo “approvado a ideia, e solicitado do Conselho Director autorização para
fazer a Liga donativos de Rs 1:200$000, e que essa autorização seria pelo mesmo conselho
discutida em sua próxima reunião”.189 Ao longo das atas de reunião do primeiro ano de
atividade não foram mencionados valores definidos de contribuição de sócios ou de
pagamento de inscrição nos eventos. Somente em janeiro de 1917 registrou-se a primeira
declaração de cobrança de inscrições para participação no campeonato de water polo para
oficiais a se realizar naquele ano: “Cada jogador pagará 3$000 de inscripção, com que entrará

187
O Imparcial 15 de junho de 1919, p. 9.
188
Cf. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha - Volume I - Anexo I (1915-1920); Livro Histórico
Departamento de Esportes da Marinha - Volume I - Anexo II (1920-1922); Livro Histórico Departamento de
Esportes da Marinha - Volume I - Anexo III (1922-1924); Livro Registro de Competições (1923-1928).
189
“Reunião de officiaes para fundação da Liga de Sports da Marinha”. Livro Histórico Departamento de
Esportes da Marinha - Volume I - Anexo I.
131

até começarem os jogos. O team vencedor receberá 07 medalhas de prata”.190 No mês


seguinte, em fevereiro de 1917, registra-se ainda uma resolução tomada pela LSM a fim de
estimular os sócios a realizar suas contribuições: “resolveo-se relevar, aos sócios atrasados de
suas contribuições em 1916, o pagamento das mesmas, desde que paguem as do ano
corrente”.191 Com estas medidas buscava-se o aumento nas verbas da Liga com objetivo de
cobrir as despesas com a aquisição de materiais esportivos e de uso administrativo, conforme
declarado nesta mesma ata onde foram autorizadas as despesas para aquisição de uma bola de
futebol para o treinamento do scratch-team; de papel de carta; de impressão de “impressos”
para relação dos times de futebol e water polo; e de envelopes para memorandum.192
Nas atas não há descrição detalhada dos gastos ou dados de entrada ou saída de
valores, exceto em trechos onde o Diretor-Tesoureiro consultou, em primeira ocasião, a
possibilidade de investir o capital da Liga, registrando-se que “foi estudada a melhor
collocação para o capital em caixa pertencente a Liga, ficando o Diretor Thesoureiro
encampado de estudar em que condições pode elle ser colocado na seção de empréstimos do
Club Naval”.193 Em uma segunda sessão, em dezembro de 1916, informou-se que “por
proposta do Diretor Thesoureiro foi resolvido depositar na Secção de Empréstimos do Club
Naval, a juro de 7% ao anno, a quantia de um conto de reis (1:000$000)”.194
Como já destacado, não há maiores detalhamentos sobre as entradas e saídas
financeiras da LSM nos documentos analisados. No entanto, realizando um comparativo com
as rendas de uma Liga Esportiva civil em atividade no mesmo período e na mesma localidade
(cidade do Rio de Janeiro), é possível perceber que as verbas da LSM encontravam-se
distantes das movimentações financeiras das demais entidades de organização esportiva.
Como exemplo, a Liga Metropolitana de Desportos Terrestres, em registro do relatório de
1917-1918 arrecadou mais de 02 contos de réis somente com o recolhimento de 10% sobre 06
jogos realizados pelo Fluminense Football Clube na 1ª. Divisão de 1917 (MALAIA, 2010).

190
“Sessão de Diretoria de 05 de janeiro de 1917”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
191
“Sessão de Diretoria de 03 de fevereiro de 1917”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
192
“Sessão de Diretoria de 03 de fevereiro de 1917”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
193
“Sessão de Diretoria de 02 de junho de 1916”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
194
“Sessão de Diretoria de 26 de dezembro de 1916”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
132

No processo de organização das competições a LSM buscava sempre solicitar junto


aos órgãos públicos ou entidades esportivas a concessão de espaços para a realização de suas
atividades. Ainda nos primeiros meses de atuação, a entidade realizou um “dia de sports
terrestres”195 em espaço cedido pelo Clube Botafogo por intermédio do sócio Segundo-
Tenente Benjamin Sodré, que na época era esportista de futebol do clube. Decidiu-se ainda
que, para o evento, seria definido número fixo de duas praças participantes por navio ou corpo
inscrito, mas um número livre de oficiais ou suboficiais.196 Mais uma vez a questão da
hierarquia utilizada como definidora das ações no processo de gestão do esporte na Marinha.
Ainda com relação ao processo de aquisição de espaços para realização de seus
eventos, a LSM buscava acionar órgãos federais e municipais para a cessão de campos
públicos para suas atividades. Como registrado nas sessões de Diretoria de 02 e 27 de junho
de 1916, a entidade buscou informações sobre um terreno na Praia Vermelha para a
construção do campo de futebol da Liga. No entanto, em consulta ao Ministério da
Agricultura foi informado que tal espaço entre a Inspetoria de Pesca e a Escola de Estado
Maior do Exército havia sido cedido para a construção da Faculdade de Medicina. A
Diretoria, devido às dificuldades de obtenção do espaço na Praia Vermelha, resolveu estudar a
possibilidade de alugar algum campo das sociedades de futebol.197
Sem sucesso na primeira tentativa de aquisição de um campo público para a realização
de seus eventos, a LSM passou a cogitar a possibilidade de alugar campos privados das
sociedades de futebol do Rio de Janeiro para tal fim. No entanto, ainda em setembro de 1916
prosseguia utilizando espaços no interior de seus quartéis para as competições, espaços sem as
condições físicas necessárias, conforme detalhado na reunião do dia 12 de setembro de 1916,
O Diretor Secretario transmithio as observações do Diretor de Football quanto ás
más condições do campo da I. Das Enxadas e do Batalhão Naval, e sua indicação no
sentido de se obter para os jogos a se realizar o campo Municipal da Praia do
Russell.
Resolveo-se a este respeito officiar ao Sr. Inspetor de Mattas e Jardins da Prefeitura
pedindo o uso do campo nos domingos pela manha e 5as feiras a tarde, e ao Sr.
Ministro da Guerra pedindo a cessão de uma barraca para mudança de roupa dos
jogadores quando os jogos forem no mesmo campo.198

195
No programa do evento, previa-se a realização de torneio de futebol, cabo de guerra (segundo as regras do
torneio Initium), corridas a pé de 100 metros e 1.000 metros, salto em altura e salto em distância, torneio de
shoots, concurso de retinidas.
196
“4ª. Assembleia de Representantes de 19 de abril de 1916”. Livro Histórico Departamento de Esportes da
Marinha - Volume I - Anexo I.
197
“Sessão da Diretoria de 02 de junho de 1916” e “Sessão da Diretoria de 27 de junho de 1916”. Livro
Histórico Departamento de Esportes da Marinha - Volume I - Anexo I.
198
“Sessão da Diretoria de 12 de setembro de 1916”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
133

Seja por falta de verbas para o aluguel de espaços próprios para as atividades ou por
valer-se da posição de Liga Esportiva no interior de um órgão público federal (Marinha do
Brasil), a LSM buscava sempre alternativas para a organização de suas ações que não
envolvessem o pagamento de despesas de aluguel.
Este é um ponto importante de destaque entre as duas Ligas em análise. A LMF, de
acordo com as determinações de seu estatuto, exigia que cada regimento que se inscrevesse
para a participação nas competições organizadas por ela tivesse um campo de futebol em
dimensões oficiais para a realização de suas partidas. No caso da Liga da MB, ficava sob
responsabilidade da entidade a busca de concessão ou aluguel dos espaços para as suas
competições.
A LSM adotou ainda um sistema de premiações para suas competições que envolvia a
doação de taças e medalhas por indivíduos ou instituições e também a cobrança de quantias
aos próprios participantes dos eventos destinadas especificamente à confecção das
premiações. Somente as primeiras taças a serem disputadas em 1916 foram adquiridas pela
Liga em uma estratégia da gestão voltada ao processo de divulgação de suas atividades. Na 3a
Sessão da Diretoria, em 06 de janeiro de 1916 ocorreu a discussão sobre a compra das taças
para os campeonatos estabelecidos para o ano de 1916. Ficou definido que seriam realizados
os campeonatos de vela, remo, water polo, natação e futebol, devendo ser adquiridas 05 taças
de prata e que as taças fossem “expostas em casa commercial e no Arsenal de Marinha para
propaganda da Liga”.199
Em março deste mesmo ano, no processo de organização do torneio de water polo
para oficiais, determinou-se a cunhagem de moedas para os vencedores a ser realizada com os
recursos monetários dos oficiais inscritos na competição.200 No entanto, este processo de
cobrança de valores dos participantes por vezes não era cumprido, gerando a não entrega das
premiações acordadas para as competições. Na reunião de Diretoria de 22 de fevereiro de
1917, foi informado um comunicado do Primeiro-Tenente Attila Monteiro Aché de que não
haviam sido entregues as medalhas ao time vencedor do campeonato de water polo do ano de
1916. Como alternativa, o oficial sugeriu que as medalhas fossem confeccionadas por conta
dos vencedores do torneio. A diretoria aceitou a proposta e justificou que as medalhas não

199
“Sessão da Diretoria de 06 de janeiro de 1916”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
200
“Sessão da Diretoria de 31 de março de 1916”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
134

haviam sido entregues porque os sócios não fizeram as contribuições financeiras que seriam
utilizadas para a cunhagem.201
Como já abordado anteriormente, o processo de premiação na LMF também seguia o
modelo de distribuição de troféus e medalhas. No entanto, a própria Liga do Exército, de
acordo com as determinações de seus estatutos, deveria custear a confecção das premiações.
No entanto, esta entidade também elaborou uma estratégia para arrecadar verbas para este
fim: a realização de partida de futebol entre o time campeão do ano e um formado pelos
melhores jogadores dos outros times com o lucro das entradas sendo revertido para a
confecção de medalhas do time campeão.
Além dos aspectos quanto à organização esportiva na Marinha e no Exército
discutidos até este momento, há um ponto importante para as discussões deste trabalho que
interferiu diretamente nas ações de gestão do esporte entre os militares: as determinações da
hierarquia e da disciplina das FFAA. As aplicações destes critérios nas definições esportivas
no EB e na MB e suas influências na estrutura organizacional das Ligas Esportivas Militares
serão discutidas no tópico a seguir.

4.1.2 A prática esportiva e a hierarquia militar: conviver, mas nunca descer à


familiaridade.

As instituições militares brasileiras são organizadas em torno de dois conceitos


basilares: hierarquia e disciplina. Segundo o Estatuto dos Militares,202 a “hierarquia militar é a
ordenação da autoridade, em níveis diferentes, dentro da estrutura das Forças Armadas” e a
disciplina a “rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos, normas e
disposições que fundamentam o organismo militar”, devendo ser respeitadas em todos os
níveis e instâncias da vida dos militares, dentro e fora dos quartéis. Apesar de este Estatuto
datar da década de 1980, suas definições sobre hierarquia e disciplina remetem-se a aspectos
de organização interna já presentes nos códigos disciplinares que estruturavam as Forças
Armadas brasileiras ainda no século XIX, como o Código Disciplinar da Armada de 1890.203

201
“Sessão da Diretoria de 22 de fevereiro de 1917”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
202
BRASIL. Lei nº 6.880, de 09 de dezembro de 1980. Dispõe sobre o Estatuto dos Militares. Disponível
em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6880.htm>. Acesso 12 jun. 2011.
203
BRASIL. Decreto nº. 509 de 21 de junho de 1890. Crêa o Codigo Disciplinar para a Armada.
135

Estes aspectos definem os processos de interação pessoal e profissional nas


instituições militares, sendo estendidos a todas as atividades realizadas, caracterizando as
estruturas de distinção a partir dos “círculos hierárquicos”, organizados em três níveis
principais: Oficiais (Oficiais Generais, Oficiais Superiores, Oficiais Intermediários e Oficiais
Subalternos), Suboficiais e Praças (Sargentos, Cabos, Marinheiros, Soldados). O convívio
social e as atividades profissionais dos militares devem respeitar esta hierarquização, estando
os subordinados sempre em obrigação de cumprimento disciplinar para com seus superiores.
A não obediência da cadeia hierárquica e do cumprimento das normas e determinações dentro
dos critérios da disciplina pode acarretar sanções, desde uma advertência até a prisão,
dependendo da circunstância e do posto ou graduação do militar.
A rigorosa observância destes critérios de organização perpassou a história das
instituições militares brasileiras desde suas formações, ainda no século XIX. Em todas as
atividades desenvolvidas, desde suas funções institucionais de defender a pátria até as
interações sociais corriqueiras, os critérios de hierarquia e disciplina precisavam ser seguidos
com a máxima atenção. No caso da prática esportiva entre os militares nos anos iniciais de
atuação das Ligas, estes critérios também estiveram presentes.
A composição das equipes esportivas e a participação nas competições apresentavam
fortes características de separação entre os diversos círculos hierárquicos que organizam o
pessoal militar das FFAA. Tanto na Liga de Sports da Marinha como na Liga Militar de
Football (e posteriormente Liga de Sports do Exército), foi possível identificar declarações
textuais reforçando a necessidade de manter-se na prática esportiva a distinção entre oficias,
suboficiais e praças, não sendo bem recebida a convivência entre estes grupos, mesmo que
apenas durante as participações no esporte.
Os regulamentos para as competições da LSM eram discutidos em reuniões com seu
corpo diretivo. Na ata da 2ª. Assembleia de Representantes, de 27 de dezembro de 1915,
registrou-se o processo de organização das primeiras competições, definindo-se a criação de
categorias para oficiais, suboficiais e praças nas competições de natação, remo e vela. Para as
competições de water polo e futebol, levantaram-se questões sobre a composição mista das
equipes, havendo grupos a favor e contra. Após a votação, a Liga a priori defendeu o
estabelecimento de equipes mistas. No entanto, o Diretor-Secretário Capitão-Tenente Alberto
de Lemos Basto, informou que
136

[...] a intenção da Directoria é estabelecer logo que possa os campeonatos de foot


ball e water polo e que, para permitir que todos os navios tomem parte nestes jogos
se estabelecer campeonatos separados para officiaes, sub officiaes e praças o que, ao
menos ao principio, não e possível, pensa propor que o campeonato de foot ball seja
204
desde já estabelecido para as praças [...].

Apesar de inicialmente defender a participação esportiva em conjunto entre oficiais e


praças, a LSM enfrentou resistências internas significativas. Na sessão de Diretoria 15 de
janeiro de 1916 discutiram-se as bases para os campeonatos de water polo e natação. Neste
documento, foi informado aos diretores que
os senhores comandantes da 3a Divisão Naval e N.E. Benjamin Constant prohibiram
aos seus subordinados a organização de partidas mixtas, isto é, compostas de pessoal
de várias categorias militares, e sendo intenção da Diretoria, já manifestada, que os
teams de water polo para o campeonato possam ser mixtos, a semelhança do que foi
anunciado para o torneio de fevereiro, resolveo-se adiar a discussão e organização de
tais bases, assumpto principal da reunião de hoje, e bem assim que o mesmo Sr.
Presidente tomara a incumbência de procurar conciliar as tendências das duas
referidas autoridades com as ideias da Diretoria. 205

Esta questão voltou à discussão na sessão de 13 de fevereiro, uma vez que as


inscrições para o torneio que se realizaria no dia 20 de fevereiro foram poucas, “devido a
difficuldade de organização de teams mixtos devido as prohibições de vários commandantes”
o que fez com que a diretoria decidisse por adiar o torneio para 12 de março pelas
dificuldades de formar tanto times mistos como somente de oficiais, e “sendo intenção da
Directoria que esse jogo seja de officiaes no primeiro torneo a fazer-se, resolveu-se: pedir
autorização a Assembleia de Representantes para organizar dous teams combinados de
officiaes para esse torneo”.206
Na 3ª. Assembleia de Representantes, realizada em 19 de fevereiro de 1916, a questão
da composição mista das equipes surgiu novamente nas discussões. Ao ler a proposta de
organização do campeonato de water polo, o Diretor-Secretário informou que o campeonato
seria
disputado por teams de praças. Alem dos jogos do campeonato o Diretor de Water
Polo organisará tantos teams quantos poder, combinados ou não, de officiaes e sub-
officiaes separadamente, para jogarem e determinarem em cada categoria um team
vencedor, com o fim de desenvolver o gosto por este jogo. A proposta foi aceita sem
207
discussão.

204
“2ª. Assembleia de Representantes, de 27 de dezembro de 1915”. Livro Histórico Departamento de Esportes
da Marinha - Volume I - Anexo I.
205
“4ª. Sessão de Directoria de 15 de janeiro de 1916”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
206
“Sessão de Directoria de 13 de fevereiro de 1916”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
207
“3ª. Assembleia de Representantes de 19 de fevereiro de 1916”. Livro Histórico Departamento de Esportes da
Marinha - Volume I - Anexo I.
137

Definiu-se ainda nesta mesma Assembleia a realização do campeonato de natação com


03 provas: uma para oficiais, uma para suboficiais e uma para praças, todas de 250 metros.
Neste caso, a discussão recaiu sobre a questão do quantitativo de participantes de cada nível
hierárquico que cada navio, corpo ou estabelecimento poderia inscrever na competição. Após
duas propostas, foi aprovado o quantitativo de somente duas praças por navio para a
participação nas competições.
A partir destas discussões, adotou-se na LSM a postura de organização de competições
distintas para oficiais, suboficiais e praças em todas as modalidades, mantendo a estrutura
hierárquica como definição da participação esportiva. Com esta organização, evitava-se não
somente que oficiais e praças, por exemplo, competissem uns contra os outros, mas também
que competissem lado a lado nos esportes coletivos. Esta questão surgiu novamente em 1917,
a partir de uma consulta do Representante da Liga no Contratorpedeiro Mato Grosso sobre a
participação mista em competições esportivas. Sobre isto, respondeu-se que
[...] não é, pela Liga, permittido nem prohibido os officiaes jogarem junto com as
praças em exercício em jogo publico; que, por varias autoridades navaes tendo sido
prohibido o jogo em commum, a Liga nunca os fez; que vários commandantes os
permittem, ao menos com caracter de instrucção em ensino; e que, de qualquer
modo, os Representantes devem sujeitar sua acção de directores de sports as ordens
e orientação de seus commandantes; que as ordens do dia, sobre a Liga, não se
referem a este ponto.208

No entanto, ao longo da vida da LSM desde sua fundação, em 1915, até 1940, quando
foi extinta, foram organizadas competições anuais em diversas modalidades sempre com a
determinação de provas distintas para oficiais, suboficiais e praças. Apesar da não proibição
das composições de equipes mistas por parte da Liga, não havia também fomento de tais
práticas como consequência dos conflitos internos com comandantes nas primeiras ações da
LSM ainda no ano de 1916.209
No caso da Liga de Sports do Exército, a primeira normativa localizada sobre a
composição mista de equipes foi identificada em Aviso do Ministério da Guerra n°. 23 de 14
de outubro de 1922, assinado pelo então Ministro João Pandiá Calógeras. Este aviso tratava
sobre uma consulta do Comandante da 9ª. Companhia de Metralhadoras Pesadas se seria lícita
a participação de um oficial junto com praças em uma festa pública náutica de remo. Em
resposta a consulta, determinou-se

208
“Sessão de Directoria de 31 de março de 1917”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
209
Cf. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha - Volume I - Anexo I (1915-1920); Livro Histórico
Departamento de Esportes da Marinha - Volume I - Anexo II (1920-1922); Livro Histórico Departamento de
Esportes da Marinha - Volume I - Anexo III (1922-1924); Livro Registro de Competições (1923-1928).
138

a) Que o regulamento interno dos serviços geraes, sem cogitar propriamente de


casos relativos aos jogos sportivos, manda que “o superior deve tratar seu
subordinado com estima, consideração e bondade, sem nunca descer a
familiaridade”;
b) Que a observância de círculos, fora do serviço onde estejam separados os
officiais graduados, e as simples praças, mostra a inconveniência de qualquer
promiscuidade;
c) Que não devem ser usados entre indivíduos que fazem parte dos círculos
differentes os jogos de dependem sobretudo de agilidade e do emprego de força
physica, taes como foot-ball, o Box, a luta romana e outros;
d) Que será de inteira vantagem que os homens, uma vez incorporados ao exercito,
se tornem ágeis e fortes, pelo cultivo dos jogos sportivos mais aconselhados;
entretanto, a pratica delles, em promiscuidade completa, traz serio prejuízo a
disciplina, não podendo guardar compostura que devem ter officiaes e praças em
quaesquer situações em que se encontrem; e,
e) Que, em taes condições, não é permittido aos officiaes tomar parte em torneios
sportivos, ao lado de praças, afim de disputarem em commum quaesquer provas.
Saude e Fraternidade – Calogeras. 210

Em outra consulta sobre a mesma temática, 1° Tenente da Companhia de Carros de


Assalto Antonio Carlos Bittencourt buscava informações sobre como deveriam ser
estabelecidas as relações entre os círculos hierárquicos no processo de treinamento e prática
de esportes. Em resposta, o então Ministro da Guerra determinou que
Em solução á mesma consulta, vos declaro, para conhecimento do consulente que a
disposição do aviso n. 23, de 14 de outubro de 1922 ao commandante da 2ª
Circunscripção Militar não restringe a actuação dos officiaes nos jogos e exercicios
de treinamento das praças, desde que não sejam feitos em publico; que convem,
entretanto, que nas competições desportivas officiaes nas unidades ou
estabelecimentos militares, na Liga de Sports do Exercito, consignadas no capitulo
X dos seus estatutos, approvados pelo de n. 376 de 2 de junho do dito anno, e nas
suas congêneres militares ou civis, os.officiaes e praças disputem provas distinctas
para uns e outros afim de evitar a concorrencia entre mestres e discipulos,
estimulando assim, estes últimos, o que já está sendo observado na mencionada
Liga. Saude e fraternidade. --Setembrino de Carvalho.211

O uso do termo “promiscuidade” na especificação sobre as aproximações entre oficiais


e seus subordinados ressalta o rigor na aplicação dos círculos hierárquicos no EB. Tratadas
como promiscuidade e inconvenientes, as participações de oficiais e praças lado a lado em
competições esportivas eram reprimidas no Exército, desde os anos iniciais da LSE,
estendendo-se à década de 1920. O mesmo se verifica na LSM a partir da manutenção das
competições distintas, como anteriormente comentado. O rigor com relação às separações
hierárquicas passa por questões disciplinares comuns às FFAA, sendo uma constante no
processo de organização esportiva nas duas instituições. Estas similaridades são justificadas
por serem considerados os basilares da organização militar os critérios de hierarquia e
disciplina e devendo a subordinação ser respeitada em todos os níveis e instâncias da vida dos
militares, dentro e fora dos quartéis.

210
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1922, Anexo AB, p. 136-137.
211
BRASIL. Diário Oficial da União de 28 de fevereiro de 1926, seção 1, p. 7.
139

Sendo as FFAA essencialmente disciplinadoras em suas ações, seguindo a concepção


ampla de relações de poder, o transporte desta configuração para as interações travadas no
momento da prática esportiva não nos apresenta surpresa. No entanto, as rigorosas distinções
e distanciamentos oficialmente normatizados para atividades que, a princípio, não se
enquadram entre as ações institucionais destas Forças e, portanto, podem ser identificadas
como atividades paralelas ou recreativas, reforçam as questões relacionadas à organização
política destas instituições e sua estrita relação com as bases da hierarquia e da disciplina.
Estes fatores seriam, portanto, definidores não somente das atribuições e subordinações no
interior do organismo institucional, mas também dos locais políticos e sociais por onde
poderiam transitar os indivíduos e as interações permitidas ou “promíscuas”, como o então
Ministro da Guerra João Pandiá Calógeras definiu a prática de esporte entre oficiais e praças
do Exército Brasileiro (CANCELLA, 2012b).
A partir da análise dos documentos é possível concluir que mesmo a prática esportiva
sendo introduzida como forma de “desenvolvimento físico”, a participação nas referidas
atividades mostrava-se inteiramente enquadrada e definida pelos critérios hierárquicos
estruturadores das instituições militares, aplicando-se à participação nas competições as
mesmas prerrogativas e obrigações presentes nas demais áreas de atuação dos militares
brasileiros.

4.1.3 A Taça Flamengo

No mês de junho de 1917, a Liga de Sports da Marinha e a Liga Militar de Football


receberam a doação de uma taça que iniciou a disputa de uma competição específica entre
Marinha e Exército que se prolongou até a década de 1920. Na sessão da Diretoria de 27 de
junho de 1916, registrou-se “officio de 19 do corrente, recebido a 24, do Clube de Regatas
Flamengo (C.R. Flamengo), declarando oferecer uma taça para ser disputada annualmente
entre Exercito e Marinha, e pedindo o comparecimento de um representante da Liga no dia
21, para fixar as fases da disputa”.212 A disputa da chamada “Taça Flamengo” foi a primeira
competição organizada pela LSM, em parceria com a LMF e o C.R. Flamengo, onde há
referência direta à cobrança de ingressos para espectadores.

212
“Sessão da Diretoria de 27 de junho de 1916”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
140

Com relação ao jogo contra o Exercito, em disputa da taça offerecida pelo C.R.
Flamengo, com consta a acta da sessão de 27 de junho do anno passado, o Director
Secretario communica que fixou com o 1o Secretario da Liga Militar de Football, ao
referendum das respectivas directorias, as seguintes bases para a disputa deste anno:
1o. Os teams serão de praças; 2o. O arbitro será indicado pelo Club do Flamengo e
aceito por ambas as Ligas; 3o. Si o jogo terminar em empate o desempate será feito
em outro dia segundo o modo que se combinará; 4o. A renda liquida dos portões será
dividida assim: 50% do Club offertante; 25% a cada uma das Ligas; 5o. Os
secretários das duas Ligas ficaram com poderes plenos das duas Directorias para
combinarem os detalhes de encontro e as fixarem com o C.R. Flamengo. Foram
unanimente approvadas estas bases. Resolveo-se mais com relação ao mesmo
assumpto: convocar o Conselho Director para o dia 22, as 4 ½ pm, com o fim de
solicitar autorisação de organisar um scratch team para jogar contra o Exercito, visto
que de tal não cogitar os Estatutos; e, apos a autorisação referida, convidar o Cap.
Tenente Soares de Pinna para organisar o scratch team, e dar os mais passos
necessários com relação ao caso.213

Como a LSM adotava o modelo de liga poliesportiva, foi preciso uma adaptação em
seu processo de organização interna. Sua estrutura inicial tinha como objetivo organizar
competições entre os vários navios, corpos e estabelecimentos da Marinha, não sendo
previsto, a princípio, a formação de times para disputas com equipes de fora da instituição.
Para a preparação para esta competição, foi definido que a LSM poderia “formar scratch-
teams com jogadores da Liga nos casos em que ella deva corresponder a convite para jogos
contra outras instituições idôneas, por não estar isto previsto nos estatutos”.214 Scratch teams
seriam equipes formadas por jogadores que normalmente competem em lados diferentes, ou
seja, times combinados compostos por jogadores de times diversos. Com o início desta nova
modalidade de evento, a Liga passou a converter-se também em clube, quando participante de
competições com equipes externas com seus scratch teams.
Conforme apresentado no trecho do documento que definia os termos de organização
da competição, as rendas dos portões seriam divididas em três partes: 50% para o C.R.
Flamengo e 25% para cada uma das Ligas Militares. A primeira disputa da Taça Flamengo foi
realizada em 29 de abril de 1917 e seu resultado, divulgado na sessão da Diretoria da LSM de
02 de maio do mesmo ano.

213
“Sessão da Diretoria de 19 de janeiro de 1917”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
214
“Sessão do Conselho Diretor de 22 de janeiro de 1917”. Livro Histórico Departamento de Esportes da
Marinha - Volume I - Anexo I.
141

Venceo o team da Liga de Sports da Marinha, que bateo o do Exercito por 4x1. No
torneio de cabo de guerra, que se fez no mesmo dia entre teams de Exercito e
Marinha, tomaram parte, pela Marinha, Batalhão Naval, Bahia, Benjamin Constant e
Flotilha de Submersíveis. Nas eliminatórias da Marinha venceo o C. Bahia, que
jogou a final contra o team do 2o. Reg. de Infantaria, vencedor nas finaes, alias,
eliminatórias do Exercito. Foram na mesma occasião executados exercício de
gymnastica sueca, pela C. Minas Geraes e um de esgryma de bayoneta, pelo
Batalhão Naval. Compareceram a festa os Srs. Presidente da Republica, Ministro da
Marinha e varias pessoas de posição official convidadas. Todos as demais pessoas
pagaram entrada.215

Este evento ainda gerou uma discussão intensa entre Exército e Marinha na
organização da segunda edição, no ano de 1918. Nas sessões de Diretoria da LSM dos dias 12
de março, 22 de março e 25 de março de 1918 registraram-se os debates sobre a disputa. Em
12 de março, foi recebida autorização para a realização da Taça Flamengo, contra o Exército,
nos mesmos termos da competição do ano anterior, a ser realizado no campo do Flamengo.
Na ata de 22 de março, foi registrado que a Diretoria, em comunicação telefônica com o
Capitão Castelo Branco, 1o. Secretario da Liga Militar de Football, soubera que a LMF tinha
a intenção de não enviar seu time para o campo do Flamengo no dia combinado para realizar a
disputa da Taça. As justificativas seriam pelas más condições do campo e por não poder
reunir um bom time para a competição, tendo a pretensão de adiar o jogo e publicar notícias
nos jornais informando a não realização da partida. A Diretoria da LSM, na mesma
comunicação, disse ao representante da LMF que seria melhor nada noticiar nos jornais, por
achar a LSM que seria o caso de uma comunicação direta entre as Ligas e porque o jogo
deveria sim ser realizado, já que as combinações e convites oficiais já haviam sido feitos,
inclusive ao Sr. Presidente da República. No entanto, mesmo sendo solicitada a não
comunicação na imprensa do cancelamento do jogo, em 21 de março de 1918 na página 9 do
“O Imparcial” foi divulgada uma nota da LMF informando que não seria mais realizada a
disputa da Taça Flamengo daquele ano.216
Após discussão com os diretores da LSM presentes na reunião, ficou aprovada a
manutenção da realização do jogo e não aceitar o adiamento proposto pela LMF, mandando o
seu time a campo na data combinada. O Diretor-Presidente ainda informou que iria tomar
providências para desfazer os convites oficiais realizados e que, em comunicação com o C.R.
Flamengo, foi confirmada a disponibilidade do campo para a realização do evento no dia 24.
Em 25 de março, registrou-se que os diretores da LSM e seu time compareceram no dia 24 ao
campo do Flamengo para o torneio agendado. O time da Liga Militar de Football não

215
“Sessão da Diretoria de 02 de maio de 1917”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
216
O Imparcial 21 de março de 1918, p. 9.
142

compareceu e foi registrado um atestado pelo C.R. Flamengo sobre o fato. Resolveu-se oficiar
a LMF informando que a LSM mandou a campo seu time no dia 24 e remeter a LMF uma
fatura de sua parte das despesas contraídas em comum pelas duas Ligas para a realização da
disputa da Taça Flamengo.217
Nas atas seguintes não há retorno de debate sobre a competição não realizada, mas os
episódios relatados acima demonstram certa animosidade entre as duas Ligas Militares no
processo de organização da disputa de 1918. No entanto, um aspecto significativo foi a
manutenção do evento, mesmo sabendo da intenção de não comparecimento declarada pela
Liga do EB, em vista dos custos já despendidos para a preparação da competição. Além disso,
mesmo com a não realização, a cobrança, ao menos em tese, da parcela que seria de obrigação
do Exército apresenta-se como uma forma de penalidade financeira pelo não cumprimento de
um compromisso esportivo (CANCELLA e MATARUNA, 2012c).
Como já destacado, a Taça Flamengo foi disputada, segundo os registros localizados,
até 1924 e nas edições seguintes recebeu atenções da imprensa, como na publicação de fotos
na revista Careta das equipes participantes de Marinha e Exército nos anos de 1920 e 1921.
(vide figuras 4 e 5).

Figura 4: Fotografias publicadas na revista Careta da Festa Esportiva Militar realizada entre Exército e Marinha
no campo do Clube de Regatas Flamengo – Taça Flamengo 1920. Fonte: Revista Careta 30 de outubro de 1920,
p. 20.

217
“Sessão da Diretoria de 12 de março de 1918”, “Sessão da Diretoria de 22 de março de 1918”, “Sessão da
Diretoria de 25 de março de 1918”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha - Volume I - Anexo I.
143

Figura 5: Fotografias publicadas na revista Careta da Festa Esportiva Militar realizada entre Exército e Marinha
no campo do Clube de Regatas Flamengo – Taça Flamengo 1921. Fonte: Revista Careta 15 de outubro de 1921,
p. 22.
144

Logo após estes desdobramentos sobre a Taça Flamengo de 1918, a LSM entrou em
um período complicado no processo de gestão do esporte na Marinha. Em ata sem data,
registrou-se a solicitação de desligamento do Capitão-Tenente Lemos Basto da Diretoria da
Liga por ter que se ausentar e partir em comissão na Divisão de Operações de Guerra. A
sessão anterior havia ocorrido em 23 de abril de 1918. A ata seguinte, também sem data,
informava a necessidade de convocar novas eleições de diretoria, seguindo os estatutos, e
previa o agendamento para 17 de fevereiro. No entanto, em 25 de fevereiro de 1919 registra-
se uma ata de reunião onde foi justificada a não realização da eleição por ausência absoluta de
sócios nas duas convocações de Assembleia Geral realizadas. O então Diretor-Secretário
Armando Pinna informou que “os directores presentes resolveram continuar a testa da
administração, de modo a não deixar morrer a Liga, até que se podesse proceder uma nova
eleição”.218
Nos registros, a nova ata de sessão de Diretoria data de 02 de junho de 1919,
informando sobre o retorno da Divisão de Operações de Guerra e apresentando o desejo da
diretoria da LSM de organizar uma “festa sportiva militar” em homenagem a tripulação que
regressava a se realizar no C.R. Flamengo. Após as discussões, ficou definido o programa
com jogo de bola; corrida da serpente; jogo de dado; cabo de guerra para marinheiros, navais
e reserva; corrida de obstáculos; esgrima de baioneta; ginástica sueca; match de futebol entre
marinheiros e navais e a execução do hino nacional.219
Como o planejado, no retorno da Divisão Naval de Guerra a MB realizou uma festa
comemorativa onde foram realizados jogos esportivos organizados pela LSM. A revista
Careta publicou nas edições de 14 de junho, 21 de junho e 28 de junho de 1919 fotografias de
diferentes aspectos da recepção da Divisão Naval. Uma das imagens retratava os militares que
a integraram, fazendo referência na legenda ao Capitão-Tenente Lemos Basto que se afastou
da diretoria da LSM pela convocação para esta comissão; imagens das crianças das escolas
municipais que estiveram presentes no evento; fotografias da festa sportiva promovida pela
LSM aos marinheiros que regressaram da guerra com as partidas de futebol realizadas entre
os marinheiros nacionais e o Batalhão Naval e os diferentes grupos presentes na festa a bordo
do Encouraçado Minas Gerais.220

218
“Sessão da Diretoria de 23 de abril de 1918”, “Sessão da Diretoria de 25 de fevereiro de 1919”. Livro
Histórico Departamento de Esportes da Marinha - Volume I - Anexo I.
219
“Sessão da Diretoria de 02 de junho de 1919”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo I.
220
Revista Careta 14 de junho de 1919, p. 16; Revista Careta 21 de junho de 1919, p. 23; Revista Careta 28 de
junho de 1919, p. 16.
145

Figura 6: Fotografias publicadas na Revista Careta retratando as competições esportivas realizadas no festival
em homenagem ao retorno da Divisão Naval de Guerra. Fonte: Revista Careta 21 de junho de 1919, p. 23.
146

4.1.4 O novo contexto: necessidades de ampliação das atividades físicas a partir


das observações das experiências na Primeira Grande Guerra.

Em meio aos processos de organização esportiva e divulgação de práticas para o


desenvolvimento físico nas FFAA, os militares brasileiros precisaram lidar com uma nova
situação que se estabelecia em panorama internacional. Em 1914 já havia sido deflagrado o
conflito na Europa que teve proporções mundiais. Em momentos iniciais, o Brasil manteve-se
em neutralidade diante do cenário que se estabelecia. No entanto, por ocorrência de um ataque
a navios brasileiros, esta posição neutra se reverteu.
Em 3 de abril de 1917, submarinos alemães torpedearam o navio Paraná, que estava
próximo à costa francesa. Em represália, o governo confiscou todos os navios
alemães ancorados em portos brasileiros. Após o afundamento do navio brasileiro
Macau, pelos alemães, Venceslau Brás assinou, em outubro desse ano, a declaração
de estado de guerra contra a Alemanha, o que foi acompanhado por manifestações
antigermânicas em todo o país. (ARQUIVO NACIONAL, 2009, p. 42).

O Decreto n°. 3.361 de 26 de outubro de 1917 reconhecia e proclamava o estado de


guerra iniciado pelo Império Alemão contra o Brasil. Neste novo cenário de conflito, as
preocupações do EB sobre o processo de preparo dos nossos militares se intensificaram e as
ações de divulgação e apelo para a sociedade se envolver com as FFAA se ampliaram. O
Relatório do Ministério da Guerra de 1917 afirmava que a ocorrência da guerra na Europa e a
observação das consequências enfrentadas pelos países que não eram militarmente fortes
favoreceram uma maior aceitação do serviço militar em meio civil e a divulgação de uma
forte propaganda patriótica liderada pela Liga de Defesa Nacional. Destacou ainda o aumento
significativo das sociedades de tiro entre 1915 e 1917, passando a 564 entidades que
realizavam não somente os exercícios de tiro, mas garantiam aos sócios uma instrução
completa de soldado de infantaria.221
Neste sentido, o Relatório do Ministério da Guerra de 1918 afirmava que o Brasil
estava em perigo por sua grande extensão territorial e poucas áreas povoadas ante as grandes
nações europeias que guerreavam naquele momento. Como forma de atenuar estes perigos e
as fragilidades, o documento reconhecia como única saída a confirmação de uma solida
organização militar. O ensino militar era reforçado como a origem dos grandes chefes e
responsáveis pela defesa do país e, visando um aperfeiçoamento da formação, defendia-se a
vinda de uma missão militar estrangeira para estabelecer as reformas necessárias,
principalmente com foco em reverter o quadro de ensino eminentemente teórico que ainda

221
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1917.
147

permanecia estabelecido, apesar das inúmeras tentativas de incutir caráter mais prático nas
atividades de formação ao longo do tempo.222
As preocupações com a melhor estruturação no EB já estavam evidentes nas
publicações do Boletim do Estado-Maior do Exército e dos Relatórios Ministeriais ao longo
dos anos iniciais do século XX. Nestes documentos eram apresentados muitos relatos técnicos
sobre a guerra, maquinários utilizados, táticas militares, estruturas de exércitos. Visando este
processo de especialização do preparo, a partir das observações dos modelos estrangeiros de
instituições militares, foi realizado o estudo para a convocação de uma missão militar
estrangeira para atuar junto ao EB. Como discutido no Capítulo 3, o EB havia enviado
diversos grupos para realização de estágios junto ao Exército Alemão na década de 1910. Ao
serem intensificadas as discussões sobre a contratação da missão militar, os chamados “jovens
turcos” (jovens oficiais que passaram por este processo de formação na Alemanha) defendiam
intensamente as aproximações com o exército germânico. Como afirma Luna (2007), os
debates sobre qual modelo militar deveria ser adotado no Brasil (francês ou alemão)
ganharam força com a eclosão da Primeira Guerra e envolviam governo, órgãos legislativos e
a alta cúpula militar.
A imprensa foi utilizada largamente para que cada um destes grupos defendesse seus
pontos de vista sobre os benefícios de maiores aproximações com França ou Alemanha
naquele momento de conflito armado mundial. Os jovens turcos, como já pontuado, faziam
campanha para que uma missão germânica fosse adotada no Brasil sob os argumentos de que
estes seriam os militares mais bem treinados e aparelhados do mundo naquele momento. No
entanto, com o desenrolar dos conflitos na Europa, a opção alemã começou a perder força
principalmente após o incidente de torpedeamento de navios brasileiros por parte da esquadra
alemã que acabou por obrigar o Brasil a deixar a posição de neutralidade no conflito em 1917
e passou a atuar “ao lado da França, Inglaterra, dos Estados Unidos e de outras nações aliadas.
Assim, após o término da Primeira Guerra, a opção dos jovens turcos se tornou inviável e o
Brasil contratou uma missão militar francesa para modernizar o seu Exército” (LUNA, 2007,
p. 10).

222
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1918, p. 24-31.
148

A partir da publicação do Decreto n° 3.741 de 28 de maio de 1919 ficava autorizada a


contratação da Missão Militar Francesa para atuar junto ao EB. Com o estabelecimento desta
perspectiva de preparação militar, o esporte e a instrução física passaram a receber maior
destaque no Exército. As preocupações com o corpo eram parte do projeto de reestruturação
proposto para o EB. O General Gamelin, comandante da missão, enfatizou em uma de suas
primeiras conferências no Brasil, ainda em 1919, que era necessário que os brasileiros
fizessem esforços para a melhoria de suas FFAA:
esforço físico: pelo gosto dos esportes, dos exercícios; esforço intelectual: em todos
os domínios: ciências, artes, literatura, atividades de toda ordem e esforço moral:
pela união e subordinação de cada um ao interesse geral. (GAMELIN, 1919 apud
BELLINTANI, 2009, p. 352).

Nesta nova dinâmica inserida no Exército Brasileiro, além de serem estabelecidas


inovações na doutrina militar, novos conceitos sobre a generalização da prática esportiva e da
educação física passaram a figurar no cotidiano dos militares seguindo as diretrizes da Escola
de Joinville Le Pont. (SILVA, 1947; MARTINS, CUNHA e SOEIRO, 2007).
Sobre as concepções de autoridades do EB a respeito da vinda desta Missão, Ferreira
Neto afirma que
Pandiá Calógeras e Setembrino de Carvalho se uniram pronunciando-se favoráveis à
entrada da Missão Francesa na Escola Militar de Realengo. O primeiro reivindica
que “é preciso colocar a Escola sob o influxo da Missão, a fim de assegurar ao
quadro de oficiais homogeneidade intelectual”. Dirá o segundo: “é cada dia mais
urgente fazer-se sentir, de modo direto [...] a influencia pessoal dos instrutores
franceses” (Motta, 1976, p. 316). Não há dúvida em se afirmar que as reformas de
1918 e 1919 foram elaboradas sob a influência dos oficiais que haviam estagiado no
Exército Alemão. É deles a ultravalorização dos assuntos especificamente militares,
de caráter prático, as normas para matriculas, a instituição da Missão Indígena, e,
também, a resistência à presença dos franceses na Escola Militar. (1998, p. 29)

O estabelecimento da Missão tinha como objetivos a efetiva aplicação da lei do


serviço militar, renovações materiais e reformas educacionais estabelecendo a ênfase no
ensino profissional, como já comentado. No âmbito da educação física e do esporte, Soeiro
(2003) afirma que o modelo introduzido tinha como inspiração o adotado na Escola Joinville
Le Pont. O autor ainda aponta que “os conteúdos do método francês são os jogos […], a
ginástica, predominantemente utilizada na instrução física militar, que, por sua vez, compõem
a lição de educação física […], os esportes individuais e os esportes coletivos (SOEIRO,
2003, p. 37)
No início da década de 1920, já sob esta nova influência do modelo francês de
educação física, a LMF passou por reformulações para que outras modalidades esportivas
pudessem ter maior desenvolvimento no interior do EB. Neste sentido, a Liga Militar de
149

Football teve a nomenclatura alterada para Liga de Sports do Exército (LSE) e teve seus
estatutos aprovados por Aviso do Ministério da Guerra nº. 534 de 31 de julho de 1920.223
Observando os registros dos resultados das competições da LMF divulgados no “O Imparcial”
entre 1915 e 1919, é possível identificar a atuação dos militares do EB predominantemente na
modalidade futebol, sendo exceção as competições da “Taça Flamengo” contra a Marinha
onde eram realizadas disputas de futebol, cabo de guerra e corrida de estafetas (competição
realizada entre 1917 e 1924). No entanto, no final da década de 1910, de acordo com a análise
dos registros de competições e correspondências da Liga de Sports da Marinha, já foi possível
identificar a participação de equipes do EB no Campeonato Acadêmico de Escolas Superiores
(Escola Naval e Escola Militar) nas modalidades de water polo e natação, sendo registradas
edições deste campeonato entre 1919 e 1924, evidenciando um processo de ampliação das
ações esportivas.224
Com a fundação da Liga de Sports do Exército, o Coronel Estellita Werner225 assumiu
a presidência da entidade e outras modalidades passaram a fazer parte das competições do EB,
mas ainda em pequena diversidade. O jornal “O Imparcial” de 24 de dezembro de 1921, por
exemplo, noticiava ações da LSE em futebol, natação e corridas a pé.226 Os registros de
competições da LSM declaravam a participação de equipes do EB nos seguintes eventos:
disputa da “Taça Muniz Barreto” em torneio de Futebol entre a Escola Naval e a Escola
Militar no ano de 1921; participação em festa atlética organizada pela Confederação
Brasileira de Desportos (competições entre as ligas afiliadas, a Liga de Sports do Exército e a
Liga de Sports da Marinha) no mesmo ano de 1921; em “competições atléticas” em 1922 e
1923 disputadas entre Fluminense Football Club, Escola Naval e Escola Militar (corrida
100m, corrida 200m, corrida 400m, corrida barreira 110m, corrida 1500m, corrida 5000m,
salto com vara, salto em distância, salto em altura, lançamento de peso, lançamento de disco,
lançamento de dardo, 400m relay race227, 1600m relay race); além de torneios de tiro e
esgrima nos anos de 1923 e 1926.228

223
BRASIL. Diário Oficial da União de 06 de agosto de 1915, seção 1, p. 10.
224
Cf. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha - Volume I - Anexo I (1915-1920); Livro Histórico
Departamento de Esportes da Marinha - Volume I - Anexo II (1920-1922); Livro Histórico Departamento de
Esportes da Marinha - Volume I - Anexo III (1922-1924); Livro Registro de Competições (1923-1928).
225
O Coronel Estellita Werner era integrante do grupo de oficiais que passou por treinamentos junto ao Exército
Alemão no início do século XX.
226
O Imparcial de 24 de dezembro de 1921, p. 8.
227
Corrida de revezamento.
228
Cf. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha - Volume I - Anexo I (1915-1920); Livro Histórico
Departamento de Esportes da Marinha - Volume I - Anexo II (1920-1922); Livro Histórico Departamento de
Esportes da Marinha - Volume I - Anexo III (1922-1924); Livro Registro de Competições (1923-1928).
150

A entrada na década de 1920 foi marcada por importantes conquistas na história


esportiva do Brasil. O país participou pela primeira vez dos Jogos Olímpicos com uma
delegação nos Jogos de 1920 na Antuérpia (Bélgica) e já nesta primeira edição três medalhas
foram conquistadas por atletas brasileiros. Além disso, dois anos mais tarde, em 1922, foram
realizados os Jogos Olímpicos Latino-Americanos na cidade do Rio de Janeiro e os militares
brasileiros tiveram papéis fundamentais nas conquistas e realizações destes dois eventos.
Portanto, no próximo item serão discutidas as experiências das FFAA e de suas ligas
esportivas no processo de preparação e realização destes eventos e os desdobramentos destas
vivências para o esporte e a educação física nas Forças Armadas brasileiras.

4.2 Militares nos Jogos Olímpicos: a primeira representação brasileira nos Jogos da
Antuérpia de 1920 e os Jogos Olímpicos do Centenário.

4.2.1 Os militares nos Jogos da Antuérpia.

O Brasil iniciou suas participações em Jogos Olímpicos no ano de 1920 na Antuérpia


(BEL) com militares da Marinha e do Exército em sua representação nacional. Esta edição foi
a primeira realizada no pós Primeira Grande Guerra e retomou a sequência de eventos de
quatro em quatro anos, uma vez que os Jogos planejados para ocorrerem em Berlim 1916 não
se efetivaram em decorrência do início dos conflitos. Já nesta primeira participação três
medalhas foram conquistadas por atletas brasileiros, todas na modalidade Tiro: um ouro
individual com o então Tenente Guilherme Paraense, uma prata individual com o Dr. Afrânio
Antônio da Costa e um bronze na disputa por equipes.
Os Jogos foram realizados entre os dias 20 de abril e 12 de setembro de 1920 com
participação de 29 delegações nacionais e 2.626 atletas (65 mulheres e 2.561 homens) em 154
provas de diferentes modalidades (IOC, 2012).
A “embaixada brasileira” para os Jogos Olímpicos da Antuérpia era formada por
sportmen e dirigentes das modalidades de Natação, Saltos, Water Polo, Remo e Tiro, sob
presidência do Dr. Roberto Trompowsky.229

229
Correio da Manhã, 03 de julho de 1920, p. 6.
151

Os brasileiros integrantes da equipe de Tiro passaram por etapas seletivas entre maio e
junho de 1920 no processo de preparação para os Jogos da Antuérpia. O Tenente Guilherme
Paraense e o Dr. Afrânio da Costa foram os primeiros nomes a serem confirmados para a
equipe por terem alcançado nas provas eliminatórias de revólver e de fuzil pontuações
superiores a 520 pontos.230 Em 18 de junho de 1920 foram realizadas as últimas eliminatórias
no stand do Revólver Club no Rio de Janeiro para a formação da equipe que representaria o
Brasil. Foram classificados 11 atiradores, dentre os quais seriam escolhidos os sete
representantes brasileiros, já que este era o número máximo de integrantes por nação que
poderiam ser inscritos por definição do Comitê Olímpico Internacional.231
Ao final das seletivas, a equipe foi assim composta: chefe de equipe e sportmen Dr.
Afrânio da Costa; sportmen: Primeiro-Tenente Guilherme Paraense, Primeiro-Tenente
Demerval Peixoto, Segundo-Tenente Mario Machado Maurity, Sebastião Wolf, Dr. Fernando
Soledade e Dario Barbosa.232
As conquistas das medalhas de prata do Dr. Afrânio da Costa e de ouro do Tenente
Guilherme Paraense foram largamente noticiadas em jornais locais e nacionais, ocupando, por
exemplo, as primeiras páginas do Correio da Manhã entre os dias 04 e 08 de agosto de 1920.
Ao regressarem da Europa, os medalhistas individuais e os demais integrantes da equipe de
Tiro que conquistaram a medalha de bronze (Fernando Soledade, Dario Barbosa e Sebastião
Wolf) foram amplamente homenageados por suas conquistas para o Brasil como uma
recepção e entrega de prêmios realizadas no Fluminense Football Club pela Liga de
Defesa.233 No conjunto de homenagens, o Decreto n°. 15.160 de 07 de dezembro de 1921
abriu créditos para pagamento de premiações aos medalhistas olímpicos e demais integrantes
da equipe de Tiro nos Jogos da Antuérpia 1920.

230
Correio da Manhã, 09 de junho de 1920, p. 5.
231
Correio da Manhã, 18 de junho de 1920, p. 6.
232
Correio da Manhã, 02 de junho de 1920, p. 5; Correio da Manhã, 25 de junho de 1920, p. 2; Correio da
Manhã, 27 de junho de 1920, p. 6; Correio da Manhã, 03 de julho de 1920, p. 6.
233
Revista Careta de 29 de janeiro de 1921, p. 26.
152

Figura 7: Equipe de Tiro nos Jogos Olímpicos da Antuérpia: Fernando Soledade, Tenente Guilherme Paraense,
Afrânio Costa, Tenente Mário Maurity e Dario Barbosa. Fonte: DACOSTA, 2005.

Além dos medalhistas no Tiro, os militares ainda foram representados no pólo


aquático e na natação por integrantes da MB. Durante o tempo que ficaram na Bélgica, a
tripulação do Encouraçado São Paulo realizou jogos recreativos entre os marinheiros que
serviam no navio. A imagem a seguir, extraída do Atlas do Esporte no Brasil, registra a
realização destes jogos recreativos com o navio atracado no porto da Antuérpia, na Bélgica,
no ano de 1920. Este navio ainda transportou, em seu retorno ao Brasil, o Rei Leopoldo da
Bélgica em início às comemorações do Centenário da Independência do Brasil.

Figura 8: Jogos Recreativos de marinheiros a bordo do São Paulo. Fonte: DACOSTA, 2005.
153

Em 12 de maio de 1920 foi publicada no “O Imparcial” a notícia da chegada no Brasil


do enviado extraordinário do Comitê Olímpico Internacional Sr. Elwood Brown, que foi
responsável pela organização dos Jogos Interaliados de 1919234 no Pershing Stadium em Paris
e seguia em viagem de divulgação do movimento olímpico pela América do Sul. Em sua
passagem, Brown tinha previstas visitas e reuniões com membros da CBD e do Comitê
Olímpico Nacional, além de uma palestra proferida na sede da Associação Cristã de Moços
cujo tema era “O que o Brazil poderá fazer nos jogos olympicos?”.235
Nesta visita pela América do Sul, o Sr. Brown realizou estudos sobre a possibilidade
de se estabelecer no continente um Comitê Organizador dos Jogos Atléticos Sul Americanos,
composto por um representante de cada país do continente, e com função de realizar jogos
continentais a cada dois anos. Este comitê deveria ter a estrutura baseada no Comitê Olímpico
Internacional em Lausanne. Foi proposto que o primeiro evento neste formato fossem os
jogos previstos para serem realizados em 1922 em comemoração ao centenário da
Independência do Brasil. Com esta organização, o esporte mundial passaria a ter um
calendário estruturado: campeonatos nacionais anuais, eventos continentais a cada dois anos e
os Jogos Olímpicos de quatro em quatro anos.236

4.2.2 As Ligas Esportivas Militares e os Jogos do Centenário de 1922.

Como apresentado nas primeiras análises deste Capítulo 4, as atividades


desenvolvidas pelas duas ligas esportivas militares nos primeiros anos de atuação ficaram
mais restritas à organização e divulgação do esporte no interior de seus estabelecimentos,
havendo participação em alguns eventos civis na condição de convidadas pelos clubes e
entidades diretivas do esporte. No entanto, a partir de 1921 as aproximações e o
reconhecimento oficial das atividades dos militares passaram a se intensificar durante os

234
Com o fim dos conflitos da Primeira Guerra em 1918, as Forças Armadas envolvidas nos eventos iniciaram o
processo de desmobilização e retorno para seus países. Como forma de celebração da vitória dos Aliados,
Elwood S. Brown, Diretor do Departamento de Atletismo da YMCA, escreveu ao Coronel Bruce Palmer,
membro da equipe do General John Pershing, informando que a entidade poderia organizar em conjunto com as
FFAA competições esportivas entre os aliados como forma de celebração e reforço dos hábitos saudáveis entre
os militares. Após discussões e acordos, os Jogos Interaliados, o primeiro evento esportivo internacional no pós-
guerra10, foram realizados em junho de 1919 em Paris com a participação de 18 nações e 1.500 atletas militares
em 24 diferentes modalidades. A realização deste evento e a participação dos militares norte-americanos no
processo de organização evidenciam a importância do esporte no contexto das atividades destas FFAA ao longo
dos anos iniciais do século XX (TERRET, 1999).
235
O Imparcial 12 de maio de 1920, p. 8.
236
O Imparcial 26 de maio de 1920, p. 7.
154

processos de organização das festas esportivas que seriam realizadas no ano de 1922, dentro
das comemorações do Centenário da Independência do Brasil que incluíam uma Exposição
Internacional e Jogos Esportivos (SARMENTO, 2006).
Com relação à Exposição de 1922, Marly Motta afirma que
Para cumprir o objetivo de “ser a expressão da vida econômica e social do Brasil em
1922”, a Exposição Nacional se comporia de 25 seções representativas das
principais atividades do país: educação e ensino; instrumentos e processos gerais das
letras, das ciências e das artes; material e processos gerais da mecânica; eletricidade;
engenharia civil e meios de transporte; agricultura; horticultura e arboricultura;
florestas e colheitas; indústria alimentar; indústrias extrativas de origem mineral e
metalurgia; decoração e mobiliário dos edifícios públicos e das habitações; fios,
tecidos e vestuários; indústria química; indústrias diversas; economia social; higiene
e assistência; ensino prático, instituições econômicas e trabalho manual da mulher;
comércio; economia geral; estatística; forças de terra e esportes. [...] Na Avenida das
Nações, que se estendia do antigo Arsenal até o Palácio Monroe (onde funcionava o
bureau de informações), alinharam e os palácios de honra das representações
estrangeiras - Argentina, México, Inglaterra, Estados Unidos, França, Itália,
Portugal, Dinamarca, Suécia, Tchecoslováquia, Bélgica, Noruega e Japão - sendo
que alguns desses países ainda construíram “mostradores” para a exposição de seus
produtos industriais na Praça Mauá (Bélgica, Portugal, Estados Unidos, França,
Itália e Tchecoslováquia). (MOTTA, 1992, p. 67-68).

Os preparativos para as Festas Comemorativas pelo Centenário da Independência do


Brasil iniciaram-se bem antes do ano de 1922. Focando as observações sobre os jogos
esportivos, são identificadas em 1921 as primeiras ações envolvendo o planejamento do
evento. No mês de fevereiro daquele ano iniciaram-se atividades de preparação por parte da
Comissão Executiva dos Festejos do Centenário. A organização dos Jogos Esportivos ficou
sob responsabilidade da Confederação Brasileira de Desportos (CBD), conforme os termos
publicados no Diário Oficial da União de 03 de março de 1921
Ministério da Justiça e Negócios Interiores - Directoria do Interior-2ª. secção - Rio
de Janeiro, 25 de fevereiro do 1921.
Sr. Presidente da Confederação Brasileira de Desportos – Do programma official da
commemoração do Centenário da Independência, consta a celebração dos jogos
olympicos nesta capital, devendo ser promovida a representação, nos mesmos, de
todas as formas e de todos os núcleos principais do Sport nacional. Relativamente a
esse numero do programma, a Commissão Executiva em secção de 21 de fevereiro
corrente resolveu commeter a essa Confederação o encargo de organizar o plano e
dirigir a realização dos jogos athleticos e sportivos devendo a respectiva directoria
agir em accordo com a dita Commissão e entender-se com esta sobre as
providencias que se tornarem necessárias para o bom êxito dos projectados festejos.
237
Apresento-vos os meus protestos de alta estima e consideração. – Alfredo Pinto.

237
BRASIL. Diário Oficial da União de 03 de março de 1921, seção 1, p. 2.
155

Conforme o acordo, a instituição receberia do governo federal um crédito de 300


contos de réis, em duas parcelas, para custear o processo de organização dos jogos.
(SARMENTO, 2006). Para a realização das provas das competições previstas, era necessária
a preparação de um espaço apropriado, um stadium com padrões internacionais. Em abril de
1921 foi publicada nota no jornal “O Imparcial” informando a concessão de um terreno na
Praia Vermelha ao Clube de Regatas Flamengo para construção de um stadium para as
festividades do centenário.238 Em junho do mesmo ano, o jornal voltou a noticiar sobre o
processo de concessão comunicando que, além do terreno, o governo ainda concederia um
empréstimo de 1.000:000$000 (mil contos) para serem aplicados nas obras.239
Ainda no mês de março daquele ano, além da designação da CBD como responsável
pela organização do evento, a Comissão Executiva notificou o Ministério da Marinha e o
Ministério da Guerra sobre a realização dos “jogos olympicos athleticos e sportivos de toda
natureza, nos quaes devem tomar parte os mais importantes nucleos do sport nacional” e que,
por sua grande relevância, teriam por certo que membros da Marinha e do Exército iriam
“tomar parte em algumas das projectadas pugnas”, devendo informar à Comissão Executiva
do Centenário todas as providências que fossem necessárias para tal participação.240, 241
Em 16 de março de 1921 o Ministro da Guerra emitiu o Aviso nº. 177 comunicando ao
Chefe do Departamento de Pessoal da Guerra que o Exército tomaria parte nos jogos
esportivos do Centenário nas modalidades esgrima, tiro, natação, corrida a pé, gymnastica e
equitação. Para a preparação dos representantes, estava nomeando uma Comissão com
responsabilidade de “organizar os differentes programmas de trenamento dos jogos acima e,
bem assim, das provas preparatorias a se realizarem este ano”. Este grupo teria
responsabilidade congregar elementos de pessoal e materiais para a realização das atividades,
verificar junto ao Ministério informações e providências necessárias e buscar entendimento
com as confederações esportivas e o Clube Militar para realizar ações conjuntas em todos os
esportes. Foram nomeados para a comissão:242

238
O Imparcial 06 de abril de 1921, p. 12.
239
O Imparcial 30 de junho de 1921, p. 8.
240
BRASIL. Diário Oficial da União de 03 de março de 1921, seção 1, p. 2.
241
BRASIL. Diário Oficial da União de 06 de março de 1921, seção 1, p. 3.
242
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1921, Anexo B, p. 30.
156

Director geral, coronel Antenor Santa Cruz Pereira de Abreu;


Secretario geral, capitão Antonio da Silva Rocha;
Primeira sub-comissao – Esgrima
Major Augusto Cesar Rodrigues e 1º. Tenente Oswaldo da Rocha
Segunda sub-comissao – Tiro
Capitao João Freire Jucá e 1º. Tenente Dermeval Peixoto;
Terceira sub-comissao – Natação e corrida a pé
Capitão Francisco Pereira da Silva Fonseca e 1º. Tenente Benjamin Constant
Moutinho da Costa;
Quarta sub-comissao – Equitação
Major Benedicto Olympio da Silveira, capitães de Mareuil, de Paul, Dieulouard e
Euclydes de Oliveira Figueiredo e 1º. Tenente veterinário Severo Barbosa;
Quinta sub-comissao – Gymnastica
Tenente-coronel Manoel Bourgard de Castro e Silva e 1º. Tenentes Antonio José
Ozorio e Arnaldo Bittencourt.

A participação da Liga de Sports da Marinha foi definida em maio de 1921, através de


um acordo entre o Chefe do Estado-Maior da Armada e o Ministro da Justiça, indicando que a
LSM deveria resolver diretamente com a CBD as questões relacionadas à participação nas
festividades esportivas do Centenário.243 Ao longo do ano de 1921 tanto o EB quanto a MB
realizaram competições e treinamentos preparatórios entre seus militares, como os “trabalhos
244
preparatórios para as festas hippicas do centenário” , o “campeonato militar de natação e
245 246
corridas a pé” , o “torneiro preparatório de tiro de guerra nacional” . Em novembro de
1921 a CBD enviou convite às suas ligas filiadas, à LSM e à LSE para participação em uma
festa atlética a se realizar no dia 11 de dezembro daquele ano como eliminatórias para a
representação nacional nos jogos.247
Ao longo do ano de 1921, o jornal “O Imparcial” publicou diversas notícias sobre o
processo de preparação para os Jogos Athleticos Sul Americanos de 1922, desde o processo de
aquisição de materiais, construção de espaços para realização das competições, ações
realizadas pelos clubes esportivos em todo o país e seletivas para escolha dos representantes
brasileiros no evento.248

243
“Sessão da Diretoria de 14 de maio de 1921”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo II.
244
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1921, Anexo B, p. 79.
245
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1921, Anexo B, p. 125.
246
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra de 1921, Anexo B, p. 126.
247
“Sessão da Diretoria de 28 de novembro de 1921”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo II.
248
O Imparcial 30 de março de 1921, p. 9; O Imparcial 31 de março de 1921, p. 9-11; O Imparcial 06 de abril de
1921, p. 9, 12; O Imparcial 07 de abril de 1921, p. 9; O Imparcial 09 de abril de 1921, p. 9; O Imparcial 12 de
abril de 1921, p. 9; O Imparcial 15 de abril de 1921, p. 9; O Imparcial 20 de abril de 1921, p. 8; O Imparcial 22
de abril de 1921, p. 8; O Imparcial 23 de abril de 1921, p. 11; O Imparcial 24 de abril de 1921, p. 10; O
Imparcial 26 de abril de 1921, p. 9; O Imparcial 27 de abril de 1921, p. 9; O Imparcial 30 de abril de 1921, p. 7;
O Imparcial 01 de maio de 1921, p. 8; O Imparcial 05 de maio de 1921, p. 9; O Imparcial 07 de maio de 1921, p.
11; O Imparcial 14 de maio de 1921, p. 9; O Imparcial 20 de maio de 1921, p. 9; O Imparcial 22 de maio de
1921, p. 11; O Imparcial 02 de junho de 1921, p. 9; O Imparcial 03 de junho de 1921, p. 9; O Imparcial 06 de
junho de 1921, p. 9; O Imparcial 11 de junho de 1921, p. 9; O Imparcial 13 de junho de 1921, p. 10; O Imparcial
157

No início de 1922 uma nova presidência assumiu a o controle da CBD e verificou que
o valor dispensado pelo governo federal a esta instituição para a organização dos Jogos não se
achava mais em seus cofres. As dificuldades financeiras e a instabilidade interna retiraram sua
credibilidade para a organização do evento, fomentando diversas opções para sua realização
ao longo do ano. Algumas alternativas divulgadas foram a transferência da sede dos Jogos
Esportivos para São Paulo ou entregar a organização e controle das verbas para o Fluminense
Football Club. Após meses de conversações, Governo Federal e CBD entraram em acordo e
foi concedido novo empréstimo àquela instituição, devendo ser restituído através das rendas
dos Jogos (MORAES, 2009). Nestas circunstâncias, as Ligas Esportivas Militares foram
acionadas a convite da CBD para auxiliar na organização, passando a Comissão Militar das
Provas Esportivas do Centenário a participar no processo de preparação dos jogos.
Já em janeiro de 1922, as reuniões da Comissão Central Executiva dos Jogos do
Centenário da Confederação Brasileira de Desportos definiram as formas de atuação das
Ligas Militares na organização dos Jogos. Ficou a cargo da LSM a aquisição dos “Materiais
flutuantes” necessários, devendo a compra realizada pelo Ministério da Marinha com a
liberação de 200 contos de réis para as despesas relacionadas à participação da Força nos
Jogos. A partir destas determinações, resolveu-se, conforme a ata da LSM de 08 de janeiro de
1922, buscar informações sobre treinadores de atletismo, natação e esgrima para preparação
dos esportistas para os Jogos e ativar a construção de pistas para a prática de atletismo na Ilha
das Enxadas.249
Com relação aos espaços para a realização do evento, o jornal “O Imparcial” de 18 de
janeiro de 1922 publicou uma matéria reforçando a necessidade de construção do stadium
para os Jogos do Centenário e justificando que sem isto não haveria possibilidade de receber
os primeiros Jogos Athleticos Sul-Americanos, propostos pelo Comitê Olímpico Internacional
(COI). O autor comenta que seria uma situação vexatória para o país caso não conseguisse
finalizar o estádio para receber o evento e ter que declinar da solicitação do COI. Como
argumentos, afirmava-se que o espaço construído seria utilizado não somente nos Jogos de
1922, mas também seriam realizados anualmente jogos atléticos nacionais, demonstrações e
festas escolares e militares; exposições e qualquer outro fim a que fosse designado pelo

16 de junho de 1921, p. 10; O Imparcial 17 de junho de 1921, p. 9; O Imparcial 18 de junho de 1921, p. 9; O


Imparcial 25 de junho de 1921, p. 9; O Imparcial 30 de junho de 1921, p. 8; O Imparcial 05 de julho de 1921, p.
10; O Imparcial 06 de julho de 1921, p. 9; O Imparcial 08 de julho de 1921, p. 9; O Imparcial 20 de julho de
1921, p. 9; O Imparcial 11 de setembro de 1921, p. 8-9.
249
“Sessão da Diretoria de 08 de janeiro de 1922”. Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo II.
158

governo. Os custos da obra, segundo as discussões da matéria, seriam recuperados em 50%


ainda no ano de 1922 com as rendas dos eventos esportivos.250
João Manuel Malaia afirma, com relação do processo de construção do estádio que
O Ministro da Fazenda, Homero Batista, chegou a assinar um despacho para que o
Flamengo ocupasse provisoriamente o local “com todas as suas bemfeitorias,
accessorios e edificações compreendida entre a Urca e a Praia da Saudade”, porém o
clube não deu prosseguimento ao projeto (2011b, p. 6).

Estas dificuldades enfrentadas fizeram com que fosse considerado o investimento no


estádio já existente na cidade, o do Fluminense Football Club, utilizado para o Campeonato
Sulamericano de Futebol de 1919 a fim de colocá-lo em condições de receber este evento de
porte internacional. Em 25 de abril de 1922 foram divulgadas as decisões tomadas em
conjunto pela Comissão Executiva dos festejos do centenário, a CBD e o Fluminense sobre o
direcionamento das ações para organização das competições atléticas. Foi decidido formar
uma comissão especial com a função de coordenar as atividades sob a presidência do Coronel
Santa Cruz. O governo ainda teria mais um representante nesta comissão, o Capitão-Tenente
Lemos Basto da LSM. Os demais representantes eram Cesar Rabello, Oswaldo Gomez,
Roberto Trompowsky, Fred Brown, Antunes de Figueiredo, Renato Pacheco, Celio de Barros
e Amadeu Macedo.251
As bases de organização dos Jogos do Centenário definidas pela CBD foram
publicadas na revista Ilustração Brasileira na edição de março de 1922.252 Segundo o
documento, poderiam participar do evento “súditos” de nações latino-americanas que fossem
considerados amadores de acordo com os regulamentos internacionais de cada esporte. A
condição de amador deveria ser reconhecida pela federação nacional do Brasil e pelas
federações de cada país que enviasse concorrentes e os participantes poderiam ser latino-
americanos por nascimento ou naturalizados. O programa dos jogos deveria ser estabelecido
em comum acordo com todos os países participantes, ficando a cargo da CBD realizar o
esboço do programa a ser analisado e aprovado. As inscrições seriam gratuitas e deveriam
chegar a CBD até 30 de junho de 1922 e a listagem nominal dos atletas até 31 de julho do
mesmo ano. As premiações definidas pelas bases eram medalhas e diplomas para os três
primeiros colocados de cada prova e eventuais troféus ou taças que fossem oferecidas teriam
as provas para disputa definidas pela CBD. As delegações deveriam custear as despesas de
viagem, não tendo a organizadora do evento quaisquer responsabilidades quanto a este ponto.

250
O Imparcial de 18 de janeiro de 1922, p. 7.
251
O Imparcial 25 de abril de 1922, p. 7; Ilustração Brasileira, maio de 1922, p. 84.
252
Ilustração Brasileira, março de 1922, p. 72-74.
159

A LSE, também integrante da Comissão Militar das Provas Esportivas do Centenário,


recebeu a atribuição de “dirigir os esportes hípicos, o atletismo, o tiro, a esgrima, o futebol e o
pentatlo moderno, pela primeira vez disputado na América do Sul” (SOEIRO, 2003, p. 35).
Ainda no ano de 1922, a LSM aprovou a contratação de técnicos para esgrima,
atletismo, natação e saltos d’água. As contratações de técnicos estrangeiros para estes cargos
foram tratadas em parceria com as representações do país em outras regiões, através de adidos
navais, e instituições estrangeiras com sedes no Brasil como a Associação Cristã de Moços
(ACM). O primeiro profissional a ter contrato firmado com a LSM foi o norte-americano
Hebden Corsam para ocupar a função de treinador de natação e saltos e teve sua contratação
mediada pela Associação Cristã de Moços do Rio de Janeiro e Nova York, sendo seu contrato
com a LSM assinado pelo Sr. H. Sims, da ACM-Rio, representante jurídico no Brasil deste
treinador. Também com auxílio desta instituição foi efetivada a contratação do professor de
atletismo, sendo convocado para a função o também norte-americano Robert Fowler. Já o
professor de esgrima, o italiano Giovanni Abita, foi contratado por intermédio do adido naval
em Roma.253
Esta busca por instrutores norte-americanos pode ser compreendida como uma
influência das aproximações estabelecidas entre a Marinha do Brasil e o governo dos Estados
Unidos no processo de estudo da possibilidade de instalação de uma Missão Naval com
integrantes da US Navy no Brasil. Esta necessidade foi identificada ainda em fins da década
de 1910, com o novo contexto militar mundial imposto pelos conflitos na Europa. As
discussões sobre a necessidade de melhoria e ampliação da esquadra brasileira se
intensificaram. O Relatório do Ministério da Marinha de 1917, por exemplo, afirmava que os
acontecimentos da guerra evidenciavam as defasagens e insuficiências da MB em garantir a
defesa do extenso território brasileiro no caso de uma ofensiva.254 Ao final dos conflitos na
Europa, iniciaram-se os estudos para a possível adoção de uma missão militar estrangeira na
Marinha com objetivo de introduzir as melhorias e alterações necessárias para a redução das
defasagens identificadas, visto as análises positivas das ações de reforma e modernização que
vinham sendo empreendidas no EB por ocorrência da Missão Militar Francesa desde 1919.
Para a MB foram observadas as marinhas que poderiam trazer maiores ensinamentos aos
oficiais brasileiros: a inglesa e a norte-americana. Foi escolhida então a segunda pela maior
familiaridade dos nossos oficiais pelas diversas temporadas que passaram junto aos oficiais da

253
“Sessão da Diretoria de 03 de fevereiro de 1922”, “Sessão de Diretoria de 13 de fevereiro de 1922” e “Sessão
de Diretoria de 30 de março de 1922” - Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha - Volume I -
Anexo II.
254
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha de 1917.
160

US Navy em diferentes ocasiões em cursos ou reparos de navios, além da já marcante


presença de oficiais norte-americanos na Escola Naval de Guerra como mestres.255 Sobre a
escolha da missão, Garcia afirma que
O contrato foi assinado em Washington, em 6 de novembro de 1922. [...] o propósito
da Missão era meramente o de cooperar com as autoridades brasileiras para
assegurar uma boa organização naval naquele país, melhorando os métodos de
trabalho, treinando e instruindo oficiais, assim como elaborando planos para o
aperfeiçoamento da Marinha. [...] (2003, p. 183-184).

Após a chegada dos professores estrangeiros para o treinamento dos esportistas


militares, instituíram-se aulas fixas semanais de natação e atletismo para praças que seriam
preparados para as competições, formalizando o processo de preparação e treinamento e não
somente as organizações de eventos esportivos na Marinha do Brasil. Na ata da sessão da
diretoria de 15 de março de 1922, por exemplo, destaca-se a informação de que “já se acha no
Rio de Janeiro o Sr. Hebdem Corsan, treinador de natação contractado pela LSM com o qual
já se combinou um horário de treino para aspirantes e praças no banheiro256 da I. das
Enxadas”.257
O Exército Brasileiro também intensificou a preparação de seus sportmen para a
participação nos Jogos. Até o ano de 1922, a esgrima era praticada por alguns grupos de
oficiais e raros civis. Pelas necessidades identificadas nas ações relacionadas aos Jogos, o EB
contratou um treinador especialista em esgrima da Escola de Joinville Le Pont, Andre Gautier,
para treinar os oficiais já praticantes da modalidade pela escassez de tempo para preparação
de novos esportistas (AZEVEDO, 1936).
As preocupações com a preparação dos esportistas e atuação no processo de
organização dos Jogos intensificaram-se a partir de maio de 1922 quando o Coronel Estellita
Werner, então presidente da LSE, assumiu concomitantemente a presidência da Comissão
Militar das Provas Esportivas do Centenário.
Despacho do Ministério da Guerra
Nomear o coronel de cavallaria Estellita Augusto Werner presidente da Comissão
Militar das Provas Sportivas do Centenário da Independência do Brasil, sendo
258
exonerado de dito cargo o coronel de infantaria Izidro de Souza Figueiredo.

255
BRASIL. Relatório do Ministério da Marinha de 1921, p. 5-13.
256
“Banheiro” como sinônimo de “piscina”.
257
“Sessão da Diretoria de 15 de março de 1922” - Livro Histórico Departamento de Esportes da Marinha -
Volume I - Anexo II.
258
BRASIL. Diário Oficial da União de 02 de maio de 1922, Seção 1, p. 12.
161

Ainda no contexto das relações entre as Ligas Militares e a CBD, destaca-se uma
importante discussão sobre a situação destas em comparação às demais ligas e clubes
existentes no país. Mesmo com representatividade esportiva desde 1915, tanto no meio militar
como no civil, as ligas militares não tinham filiação à CBD, entidade nacional de organização
dos esportes naquele momento. Até 1922, a Liga de Sports da Marinha e a Liga de Sports do
Exército participavam das competições organizadas pela entidade na condição de convidadas.
A partir deste ano, identifica-se uma aproximação maior da CBD das ligas militares pelas
necessidades de apoio na organização dos Jogos do Centenário. Durante os meses de abril e
maio de 1922 registraram-se debates sobre a participação dos esportistas militares nas
competições promovidas pela CBD, sendo-lhes vetado tomar parte em alguns jogos nacionais
por serem estes exclusivamente para entidades federadas. A LSM e LSE resolveram, em
acordo, pleitear junto à CBD a “questão do amadorismo das praças” e apresentar um projeto
ao Conselho da instituição visando um acordo sobre o devido reconhecimento de suas
atividades e esportistas. Após a apreciação da proposta, efetivou-se em 03 de julho de 1922 a
assinatura do acordo de filiação das Ligas Militares (LSM e LSE) à CBD.259
Como já destacado, no processo de preparação para os Jogos do Centenário a LSM e a
LSE organizaram diversas competições atléticas e aquáticas a fim de selecionar elementos
capazes de representar a Marinha e o Exército Brasileiro nos Jogos. Os meios de imprensa
eram utilizados para divulgar as atividades desenvolvidas pelos militares com relação aos
jogos esportivos, como na publicação do jornal “O Imparcial” de 27 e 30 de julho de 1922 de
que as LEM promoveram competições para “avaliar os valores dos homens para as
eliminatórias” para a composição da equipe de atletismo, na Ilha das Enxadas.260, 261
Segundo Moraes (2009), as ações dos militares, além do campo da preparação dos
esportistas e contratação de treinadores especializados, também se efetivaram na concessão de
locais para realização das provas dos Jogos do Centenário. Os espaços para treinamento de
natação no Arsenal de Marinha e atletismo na Ilha das Enxadas e as dependências da Vila
Militar, recebendo competições de tiro e pentatlo moderno, destacaram-se como contribuições
dos militares à organização do evento. Para as demais modalidades, após diversas propostas,
definiu-se que competições de tênis, pólo aquático, esgrima e futebol seriam sediadas no
estádio do Fluminense Football Club. Já basquete, lutas de boxe e algumas competições de
hipismo seriam realizadas na Rua Paissandu, na sede do Clube de Regatas Flamengo. Para a

259
“Sessão da Diretoria de 16 de maio de 1922” e “Sessão da Diretoria de 12 de julho de 1922”. Livro Histórico
Departamento de Esportes da Marinha - Volume I - Anexo II.
260
O Imparcial 27 de julho de 1922, p. 9.
261
O Imparcial 30 de julho de 1922, p. 9.
162

realização das competições de natação dos Jogos, o Governo Federal financiou a construção
de uma piscina na Praia Vermelha (MORAES, 2009; NOLASCO, PAVEL e MOURA, 2005).
Entretanto, segundo o Diário Oficial da União de 05 de setembro de 1922 onde foi
publicado o “Programa Definitivo Geral das Festas Commemorativas”, os programas oficiais
dos Jogos do Centenário publicados na Revista Ilustração Brasileira de setembro de 1922 e no
jornal “O Imparcial” em setembro de 1922, as provas das modalidades e os locais de
realização seguiram de acordo com a tabela a seguir.262

Quadro 3: Provas e locais de realização nos Jogos do Centenário de 1922


Esporte/Prova Local
Atletismo Stadium
Atletismo Militar Estádio do Exército
Atletismo Naval Stadium
Basquetebol Fluminense
Boxe Stadium
Cabo de Guerra Stadium
Esgrima (latino-americano) Fluminense
Esgrima Militar Fluminense
Futebol Stadium
Futebol Militar (Taça Flamengo) Stadium
Futebol – Jogos Internacionais Navais Campo do Botafogo
Hipismo – Provas militares Flamengo
Hipismo – Provas senhoras e senhoritas Flamengo
Hipismo (latino-americano) Estádio do Exército/Derby Club/Jockey Club/Flamengo
Hipismo Cross Country 20km C. Santa Cruz
Maratona Stadium
Natação (latino-americano) Piscina do Stadium
Natação Naval Piscina da Urca
Pentatlo Stadium / Fluminense
Regatas a Vela Naval Baia de Guanabara
Remo Naval Praia de Botafogo
Saltos – Jogos Internacionais Navais Piscina da Urca
Tênis Fluminense / Stadium
Tiro ao Veado (latino-americano) Estádio do Exército
Tiro ao vôo – armas livres (latino-americano) Estádio do Exército
Tiro armas livres pistola 9mm Fluminense
Tiro de carabina (latino-americano) Fluminense
Tiro de fuzil de guerra (latino-americano) Estádio do Exército
Tiro Fuzil, Pistola Internacional Militar Estádio do Exército
Tiro Naval Estádio do Exército
Tiro Revolver de Guerra (latino-americano) Estádio do Exército
Tiro Revolver de Guerra Militar Estádio do Exército
Voleibol Stadium
Water Polo (latino-americano) Piscina
Water Polo Naval Piscina

262
Dados para compor a tabela extraídos dos programas publicados no jornal “O Imparcial” de 03 de setembro
de 1922, p. 3; 10 de setembro de 1922, p. 3; 12 de setembro de 1922, p. 3; Revista Ilustração Brasileira de
setembro de 1922; BRASIL. Diário Oficial da União de 05 de setembro de 1922.
163

Interessante verificar que os programas divulgados na imprensa diferenciavam as


competições latino-americanas e as militares. Isto se deu porque, dentro do quadro geral de
competições planejadas para os Jogos do Centenário foram realizados eventos específicos
pelas LEM para as delegações militares que estavam em visita ao Brasil. Ainda neste Capítulo
estas competições entre as FFAA brasileiras e as visitantes serão melhor observadas.
Em meio ao envolvimento na organização dos Jogos, o ano de 1922 foi bastante
movimentado para as FFAA brasileiras. Passando por um processo de modernização e
reorganização, Exército e Marinha estiveram durante o ano envolvidos com a construção de
novos quartéis, incorporação de navios e treinamentos de tropas, além do movimento na
Aviação Militar com o acompanhamento do famoso “Raid Aéreo Lisboa Rio”.263 Toda essa
movimentação se desenvolvia durante os preparativos para os Festejos do Centenário e as
discussões políticas das eleições presidenciais de 1922. O panorama político brasileiro neste
momento estava dividido, tendo alguns grupos grande resistência com relação à candidatura
de Artur Bernardes para o mais alto posto do país, principalmente no interior do Exército
Brasileiro após o episódio das “cartas falsas”.264 Este evento aliado ao descontentamento dos
militares do EB com o governo de Epitácio Pessoa, também por posturas contrárias ao
interesse militar (como a colocação de um civil na pasta do Ministério da Guerra),
fomentaram no baixo oficialato do Exército um movimento de resistência ao governo que
estava por assumir o comando do país (CANCELLA, 2012a).
No mês de março daquele ano, mesmo com todas as resistências, Artur Bernardes foi
eleito e teve a posse marcada para novembro. Em junho o ainda Presidente Epitácio Pessoa
estabeleceu intervenção na sucessão estadual em Pernambuco sendo duramente criticado pelo
Marechal Hermes da Fonseca, em resistência às ações do governo. Como resposta, o
presidente ordenou a prisão do Marechal e imediato fechamento do Clube Militar, instituição
da qual era presidente, em 02 de julho. Com esta ação de Epitácio, a até então resistência do
Exército ao governo se transformou em levante na madrugada 05 de julho em diferentes
regiões:

263
Travessia do Atlântico realizada em um avião Fairey III-D pelos aviadores da Marinha Portuguesa Sacadura
Cabral e Gago Coutinho, com saída em 30 de março e chegada, muito festejada e noticiada, no Rio de Janeiro
em 17 de junho de 1922.
264
Supostas cartas escritas por Artur Bernardes publicadas na imprensa em outubro de 1921, onde o ex-
presidente Marechal Hermes da Fonseca foi chamado de “sargentão sem compostura”, com acusações ao
Exército e ofensas ao militar, então presidente do Clube Militar, gerando grande desconforto no EB.
164

na capital federal, levantaram-se o forte de Copacabana, guarnições da Vila Militar,


o forte do Vigia, a Escola Militar do Realengo e o 1° Batalhão de Engenharia; em
Niterói, membros da Marinha e do Exército; em Mato Grosso, a 1ª Circunscrição
Militar, comandada pelo general Clodoaldo da Fonseca, tio do marechal Hermes. No
Rio de Janeiro, o movimento foi comandado pelos “tenentes”, uma vez que a
maioria da alta oficialidade se recusou a participar do levante. (CPDOC, 2011).

No Forte de Copacabana a resistência permaneceu mais intensa, gerando um


bombardeio entre os rebeldes e as forças legalistas, incluindo os Encouraçados Minas Gerais e
São Paulo que tentaram, sem sucesso, efetivar a rendição dos militares rebelados. Em 06 de
julho, firmes no propósito de manter a resistência, os revoltosos deixaram o Forte e seguiram
pela Avenida Atlântica rumo ao confronto direto com as tropas do governo. Os chamados “18
do Forte”, apesar das controvérsias quanto ao real número de participantes desta marcha,
foram debelados e gravemente atingidos pelas tropas, restando sobreviventes apenas os
tenentes Siqueira Campos e Eduardo Gomes. O Congresso, por estes episódios, se reuniu
prontamente e decretou estado de sítio no país (AQUINO et al, 2007).
Apesar de estes eventos afetarem gravemente o Rio de Janeiro, as preparações para as
Festas de setembro não foram interrompidas. A imprensa, cerca de duas semanas após o
ocorrido, já não mais noticiava deixando seu espaço para as belas construções e o início da
chegada das delegações para os Jogos Esportivos. O cronista Lima Barreto, em texto
publicado na Revista Careta de 30 de setembro de 1922265, aponta que a população carioca
não se identificava com os festejos do Centenário, criticando as comemorações que, segundo
ele, não tinham qualquer significado importante diante das dificuldades políticas e
econômicas enfrentadas pelo país. No entanto, o próprio autor se corrige ao dizer que
[...] de forma que nos não festejamos os cem annos de nossa independência política.
O que nos fazemos é transformar o Rio de Janeiro num grande campo de luctas de
box e corridas de cavallos. Disse no começo destas breves linhas que o povo não se
associava as festas do Centenário. Enganei-me. Às esportivas, elle se associa de bom
266
grado. À ellas, às de luminárias e às paradas militares. [...]

Em 13 de setembro, “solenemente” no campo do Fluminense Football Club, realizou-


se a abertura dos Jogos com uma grande “parada desportiva”, aos moldes da parada militar
realizada no dia 07 de setembro, tendo os militares também posição na parada desportiva,
com suas representações participantes dos Jogos do Centenário devidamente fardadas com
uniforme de gala.267 (vide figura 9).

265
Esta foi uma das últimas contribuições do autor para a revista, falecendo em 01 de novembro de 1922.
266
Revista Careta de 30 de setembro de 1922, p. 24.
267
Revista Fon Fon 23 de setembro de 1922; Revista da Semana 23 de setembro de 1922.
165

Figura 9: Fotografias da parada desportiva do Centenário ocupando página inteira da Revista da Semana, com
destaque na primeira fotografia para o Tenente Guilherme Paraense, campeão mundial de revólver ao lado de
Alberto Fontan, campeão mundial de fuzil. Fonte: Revista da Semana 23 de setembro de 1922, p. 28.
166

A participação dos sportmen brasileiros nos Jogos destacou-se em alguns esportes


como a natação, com as conquistas de Jorge Mattos em 5 provas; no water-polo ficando com
a primeira colocação; na esgrima, com as conquistas dos Tenentes Oswaldo Rocha no florete
e Celio Ramalho no sabre; no pentatlo moderno268, pela primeira vez disputado no país, com
Luís Bianchi; além das conquistas do futebol no V Campeonato Sulamericano da modalidade
(MORAES, 2009; DACOSTA, 2005).
A preparação e realização dos Jogos Esportivos do Centenário envolveram diferentes
grupos da sociedade, mobilizando grandes investimentos em infra-estrutura para a realização
das competições esportivas, além da aplicação de grandes verbas e tempo na preparação dos
recursos humanos (tanto esportistas quanto os profissionais envolvidos na organização). Por
sua grande demanda, o evento é considerado por Silva (2006) como um dos primeiros
Megaeventos Esportivos sediados no Rio de Janeiro. De acordo com o autor:
Nesta ocasião, os clubes esportivos, entidades militares e órgãos do governo federal
e local foram mobilizados para inserir os Jogos na vida da cidade, o que foi
conseguido com sucesso. [...] Este evento combinou Jogos Militares Internacionais
com Campeonatos Esportivos Internacionais. [...] O número de espectadores dos
Jogos, ainda segundo a ACM, chegou a 162.000 pessoas, quantitativo expressivo
para a época, pois a assistência representou cerca de 15% da população da cidade,
montante jamais atingido posteriormente. Em suma, os Jogos de 1922 no Rio de
Janeiro consistiram num megaevento esportivo considerando os meios mobilizados
e a participação da população local, embora não tenham sido reconhecidos até
recentemente como tal (SILVA, 2006, p. 17).

Dentro dos “Jogos Olímpicos Latino-Americanos” foram realizados os Jogos


Internacionais Militares com a participação de diversas nações como Argentina, Chile,
Paraguai, Uruguai, Venezuela, que participariam dos esportes terrestres. O país ainda recebeu
delegações dos Estados Unidos, Grã- Bretanha, México, Japão, Portugal e Bélgica para
participação nas competições aquáticas organizadas pela LSM (TORRES, 2005). Conforme
declarado em relatório do Departamento de Esportes da Marinha e o jornal “O Imparcial” de
10 de agosto de 1922, o programa dos jogos internacionais navais foi composto pelas
seguintes provas:

268
Modalidade até a década de 1950 dominada no país quase exclusivamente por militares consiste na disputa
em cinco provas essencialmente ligadas à rotina militar: tiro, esgrima, natação, hipismo e corrida.
167

Quadro 4: Programa dos Jogos Internacionais Navais 269, 270


1º.) Vela
2º.) Remo: escaleres a 12 remos para praças com patrão oficial – 2.000m; canoas a 4 remos
para oficiais – 1.000m; canoas a 4 remos para suboficiais e inferiores – 1.000m
3º.) Provas aquáticas
- Natação: 100m nado livre, 100m costas, 200m nado livre, 200m braçada francesa, 400m
nado livre, 1.500m nado livre, 800m turmas (4x 200m nado livre).
- Saltos de 3m, 5m e 10m.
- Water Polo
4º.) Cabo de Guerra para praças
5º.) Tiro: Revólver para oficiais 50m; Carabina para suboficiais e inferiores 300m; Carabina
para praças 300m.
6º.) Provas Atléticas
- Corrida: 100m, 200m, 400m, 800m, 1.500m, 5.000m, 110m com barreiras
- Saltos: distância; altura; com vara.
- Lançamentos: Peso; Disco; Dardo; Retinida.
7º.) Futebol

Em nota sobre os Jogos Internacionais Navais, o jornal “O Imparcial” informou que


estavam inscritos para participação as seguintes delegações das marinhas estrangeiras:
Argentina (Regata a Remo – praças); Japão (Atletismo, Cabo de Guerra, Regata a Remo –
praças, Tiro); Estados Unidos da América (Atletismo, Retinida, Cabo de Guerra, Competição
Aquática, Regata a Remo – oficiais, Regata a Remo – suboficiais, Regata a Remo – praças,
Regata a Vela, Tiro); Inglaterra (Atletismo, Retinida, Futebol, Cabo de Guerra, Competição
Aquática, Water Polo, Regata a Remo – oficiais, Regata a Remo – suboficiais, Regata a Remo
– aspirantes, Regata a Remo – praças, Tiro); Uruguai (Atletismo, Futebol, Competição
Aquática, Regata a Remo – praças, Regata a Vela); Brasil (Atletismo, Retinida, Futebol, Cabo
de Guerra, Competição Aquática, Water Polo, Regata a Remo – oficiais, Regata a Remo –
suboficiais, Regata a Remo – aspirantes, Regata a Remo – praças, Regata a Vela, Tiro);
Portugal (Cabo de Guerra, Competição Aquática, Regata a Remo – suboficiais, Regata a
Remo – praças).271

269
O Imparcial 10 de agosto de 1922, p. 8.
270
Livro Histórico do Departamento de Esportes da Marinha – Histórico Liga a C.E.M., Vol. II, Cap. 1, p. 01.
271
O Imparcial 08 de setembro de 1922, p. 8.
168

Em 09 de setembro de 1922 foi publicada uma nota no mesmo jornal informando que
todos os oficiais, suboficiais e praças das marinhas estrangeiras teriam entrada gratuita em
todos os locais onde estivessem ocorrendo provas da Liga de Sports da Marinha. Já os sócios
da LSM teriam ingressos para si e suas famílias que deveriam ser retirados na sede da Liga.272
Os registros da Marinha do Brasil sobre o evento relatam que:
Em 1922, a Liga de Esportes da Marinha levou a efeito a serie de Jogos
Internacionais Navais do Centenário da Independência, por delegação do Ministério
da Marinha, organizando um vasto programa de sete grandes competições das quais
participaram as Marinhas de Guerra dos seguintes países: Brasil, Estados Unidos,
Inglaterra, Japão, Uruguai, Argentina, Portugal e México. Foram vencedores:
Vela – Brasil
Remo – Brasil
Football – Brasil
Aquática – Brasil
Tiro – Brasil
Cabo de Guerra – Inglaterra
Atlética – Inglaterra
Resultado Final: Inglaterra – 87 pontos
Brasil – 86 pontos.273

Os eventos organizados pela LSE para as delegações militares que presentes tiveram
seus resultados publicados no Diário Oficial da União de 17 de outubro de 1922. Segundo o
relatório, foram realizadas as seguintes provas: corridas rasas de 5.000 metros, 3.000 metros,
1.500 metros, 800 metros e 200 metros; corrida de escalada de 200 metros; corrida de postas
de 400 metros, 1.600 metros; lançamento de granada de mão em alcance; corrida de grupos
em 400 metros seguida de lançamento de granada; lançamento de granada em precisão,
alcance e velocidade; lançamento de granada de mão em precisão; salto em altura com
impulso; salto em distância com impulso; salto em vara; passagem em cabo área.274 O
Tenente Guilherme Paraense, campeão olímpico no Tiro nos Jogos da Antuérpia de 1920
também conquistou o primeiro lugar nos Jogos do Centenário.275

272
O Imparcial 09 de setembro de 1922, p. 8.
273
Livro Histórico do Departamento de Esportes da Marinha, Vol. II, Histórico Liga a C.E.M., p. 1.
274
BRASIL. Diário Oficial da União em 17 de outubro de 1922, seção 1, p. 15-16.
275
O Imparcial 12 de setembro de 1922, p. 3.
169

Figura 10: Fotografias dos campeões de Tiro, de provas de atletismo e boxe dos Jogos do Centenário. Em
destaque na foto com número 5 o marinheiro Góes Neto, classificado como o melhor pugilista do Brasil.
Fonte: Revista da Semana 30 de setembro de 1922, p. 30.
170

Como forma de reconhecimento dos feitos esportivos de seus militares, o EB, através
do Aviso n°. 883 de 04 de novembro de 1922 do Ministério da Guerra autorizou que oficiais e
praças utilizassem nos uniformes as medalhas conquistadas nas provas de Tiro dos Jogos do
Centenário, conforme solicitação do presidente da Liga de Sports do Exército.276 Estas
medalhas foram também viabilizadas pela LSE, conforme a publicação abaixo:
Ao Sr. director da Casa da Moeda - N°. 156 - Communicando que o Sr. ministro
autorizou o preparo dos cunhos e das medalhas a que fizeram jus vencedores das
provas militares do Centenario, fornecidos, porém, o ouro e a prata e pagas as
despezas pela Liga de Sports do Exercito.277

Após a atuação na organização dos Jogos do Centenário, um novo momento foi


iniciado nas duas instituições (EB e MB) surgindo preocupações não somente com a
divulgação dos benefícios da prática esportiva, mas também no processo de formação
daqueles responsáveis por esta promoção no interior das forças.
As ações para a criação de Escolas de Educação Física com responsabilidade de
formação de monitores para divulgação da prática de atividade física e esportiva inaugurou
uma nova fase nas relações entre as FFAA. O próximo tópico apresenta de maneira
introdutória as medidas tomadas pelas instituições militares brasileiras para o
desenvolvimento da formação em Educação Física no país, sendo este movimento
compreendido como desdobramentos das atividades desempenhadas na organização esportiva
entre 1915 e 1922.

4.2.3 As Escolas de Educação Física das Forças Armadas

Ao final dos Jogos Latino-Americanos, de acordo com Ribeiro (2009), identificou-se a


inferioridade dos esportistas militares brasileiros, utilizando como justificativa a falta de
preparação física dos representantes do país nos Jogos. Como alternativa para este problema,
elaborou-se a proposta de adoção no Exército de uma única referência para a Educação Física
(EF), que até aquele momento se dividia entre influências alemãs e francesas. Decidiu-se,
então, estabelecer como referencial o manual instrução física desenvolvido no EB com auxílio
de membros da Missão Francesa em 1921, que deveria ser difundido através de uma Escola
de EF, por meio da formação de instrutores com a missão de disseminar tais instruções no

276
Relatório do Ministério da Guerra, Anexo B, p. 143.
277
BRASIL. Diário Oficial da União de 17 de novembro de 1923, seção 1, p. 14.
171

interior da Força e também no meio civil. Este Regulamento de Instrução Física Militar,
direcionado ao Exército e baseado nas diretrizes da Missão Militar Francesa, determinava que
O presente regulamento baseia-se nas leis physiologicas que regulam o crescimento
e o densenvolvimento do homem e nos methodos preconizados em França para a
preparação physica dos soldados. Tal tem sido a excellencia dos resultados obtidos
com esses methodos, que haverá certamente interesse em applicalos no Brasil, quer
para a educação das creanças até 16 annos, quer dos adultos. O methodo seguido por
este regulamento é simples e accessivel a todos, e os processos empregados são
bastante variados e flexiveis para se adaptarem a todas as constituições.
Comprehende diversos grupos de exercicios,correspondendo cada um delles a uma
classe de soldados de um determinado valor physico e physiologico. [...] O fim da
instrucção physica militar é adaptar o soldado a sua funcção de combatente,
desenvolvendo-lhe o valor physico, por um treinamento comedido e racional,
apropriado aos meios disponiveis nos corpos de tropa. O presente regulamento tem
por fim indicar um methodo geral, simples e accessivel a todos, cujos processos
assas variados e flexiveis são adaptaveis a todas as constituições.[...].278

Seguindo as tendências da instrução, foi enviado um projeto de criação de um Centro


de Educação Física, aprovado por portaria do Ministro da Guerra de 10 de janeiro de 1922,
que determinava as instruções para o estabelecimento do Centro Militar de Educação Física
no Exército.
[...] O “Centro Militar de Educação Physica” (C.M.E.P.) destina-se a dirigir,
coordenar e diffundir o novo methodo de educação physica militar e suas
applicações desportivas.
2. A instrucção no C.M.E.P. comprehende três cursos:
a) Curso de educação physica para officiaes (primeiros e segundos tenentes);
b) Cursos de educação physica para sargentos (primeiros, segundos e terceiros
sargentos dos corpos de tropa);
c) Curso de demonstração para officiaes (capitães, majores e tenentes-coroneis).
[...] 31. O centro militar de educação physica funccionará inicialmente na Villa
Militar, junto á escola de sargentos de infantaria, cujo commandante será director do
centro.
32. Além dos cursos permanentes referidos no n. 2, haverá dois outros de existência
transitória:
a) curso de officiaes instructores e sargentos monitores;
b) curso de desportos athleticos para as festas do centenário. Aquelle terá duração de
um mez e destina-se ao aperfeiçoamento de officiaese sargentos em condições de
serem instructores e monitores de instrucção do C.M.E.P.; este tem por fim preparar
o pessoal do exercito que concorrerá ás festas commemorativas do centenário da
independência do Brasil.279

No entanto, a efetiva instalação do Centro somente se realizaria em 1929 com a


criação do Curso Provisório de Educação Física. Este curso foi estabelecido após a visita do
Presidente da República Dr. Washington Luis à Escola de Sargentos da Infantaria da Vila
Militar, em companhia do Ministro da Guerra General Nestor Sezefredo dos Passos. Esta
visita surpreendeu as autoridades pelas atividades realizadas com os alunos da Escola pelo
Tenente Inácio de Freitas Rolim e pelo Tenente Médico Virgílio Alves Bastos, lançando a

278
BRASIL. Decreto nº 14.784, de 27 de Abril de 1921. Approva o Regulamento de Instrucção Physica Militar,
destinado a todas as armas.
279
Relatório do Ministério da Guerra de 1922, Anexo B, p. 4, 7.
172

determinação de criação do Curso Provisório de Educação Física, que ficaria sob


responsabilidade dos referidos oficiais (SOEIRO, 2003). O curso teve a duração de um ano
letivo com turma formada por 10 oficiais, 28 Sargentos e 20 professores públicos do Distrito
Federal, que lecionariam a Educação Física principalmente na Escola Normal. (CASTRO,
1997).
Também seguindo estas tendências, retomaram-se na Marinha do Brasil as discussões
para estabelecimento de uma Escola de Educação Física na Liga de Sports da Marinha com a
elaboração de propostas e envio ao Ministro da Marinha Veiga Miranda, que manifestou
interesse e ordenou estudos para sua implantação (GARRIDO e LAGE, 2005).
Em 1925 foi criada a Escola de Educação Física da LSM com funcionamento inicial
na Ilha das Enxadas. O curso tinha como finalidade formar monitores de atletismo para atuar
nas escolas, corpos e navios da Marinha e “promover a cultura physica do respectivo pessoal
e o ensino da technica dos jogos sportivos”. O regulamento determinava a duração do curso
de dois anos compreendendo as disciplinas de Educação Física, Esgrima, Natação e jogos
aquáticos, Jogos de Pista e campo, Boxe e Noções de anatomia e Pedagogia.280
Garrido e Lage (2005) defendem que
a qualificação profissional dos monitores habilitava-os a atuar também no meio
civil; tal participação foi significativa no desenvolvimento do esporte e da Educação
Física da época. Memorando do Ministro da Marinha criou então o destacamento da
Ilha das Enxadas, com a missão de efetuar a conservação e manutenção do material
esportivo, das pistas e piscinas, desta forma esquematizando fisicamente a primeira
Organização Militar voltada ao esporte e Educação Física.

Após a criação da Escola de Educação Física da LSM, as atenções para as atividades


físicas e esportivas se intensificam. Em 1926, foi estabelecida uma determinação do Ministro
da Marinha que tornou a Educação Física obrigatória. De acordo com publicação da Revista
Marítima Brasileira de dezembro de 1926,
O Sr. Ministro da Marinha determinou que seja officialmente regulamentada a
Educação Física na Marinha, de acordo com as seguintes instruções:
“Será obrigatória nos navios da Esquadra e nos Corpos a prática dos exercícios
seguintes: diariamente, pela manhã, gymnastica de corpo livre; nos tempos
permitidos pelas praxes já estabelecidas, remo, natação, water-polo, corrida a pé,
box, tiro ao alvo e basket-ball. O comparecimento às provas de remo, vela, natação e
tiro ao alvo será obrigatória para todos os navios e corpos”.

280
BRASIL. Aviso do Ministério da Marinha nº 2.757 de 22 de julho de 1925.
173

A partir desta determinação, a prática esportiva passou a ser não somente uma
atividade recreativa, mas um compromisso dos militares tanto nos treinamentos diários como
nas competições internas promovidas entre os navios e corpos da Marinha do Brasil. No ano
de 1928 foi publicada a notícia da formatura da primeira turma de monitores da Escola de
Educação Física da Marinha. A Revista Marítima Brasileira do 5º. Bimestre de 1928 informa
que os alunos foram diplomados após dois anos de atividades. O curso foi tecnicamente
dirigido por dois profissionais contratados que já eram instrutores da Liga de Sports da
Marinha desde 1922. Robert Folwer, professor de natação, atletismo, box e regras do sport; e
Giovanni Abita, professor de esgrima. gymnastica, relacionada à Educação Física, pedagogia
sportiva e elementos de anatomia.281
Este novo momento de preocupações com a formação e o aperfeiçoamento dos
militares envolvidos com a instrução física e esportiva tanto no EB como na MB evidencia o
processo transformação nas percepções sobre as funcionalidades do esporte ao longo do
período em análise nesta dissertação (1890-1922), passando das atividades ginásticas no
interior dos quartéis com a função de melhoria do corpo ao esporte competitivo em nível de
representação internacional e ações de formação e divulgação da prática esportiva a partir das
escolas de Educação Física.

281
Os sports na Marinha de Guerra do Brasil. Revista Marítima Brasileira, 5º. Bimestre de 1928, p. 525-541.
174

5
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
175

Ao longo desta dissertação buscou-se analisar de modo comparativo o processo de


introdução e organização das práticas esportivas na Marinha do Brasil e no Exército Brasileiro
nas três primeiras décadas da Primeira República enfocando seu papel de preparo do corpo,
promoção de hábitos saudáveis e moralmente desejáveis.
Como discutido e analisado em diferentes pontos do trabalho, a relação entre o esporte
e as FFAA brasileiras não se desenvolveu de forma isolada ou ocasional. Este processo se
desenrolou acompanhando o movimento de difusão das práticas esportivas na sociedade
brasileira que se intensificava naquele momento.
As análises realizadas no Capítulo 2, contemplando o recorte temporal inicial desta
pesquisa compreendido entre os primeiros anos da República e o final da primeira década do
século XX, possibilitaram a interpretação de que o esporte foi defendido inicialmente, tanto
por militares do EB como da MB, como forma de treinamento do corpo para melhoria do
desempenho em suas atividades funcionais e instrumento de preparação física de seu pessoal.
Este movimento de elaboração de argumentos para defesa da prática da ginástica e do esporte
de forma sistematizada nos diferentes grupos hierárquicos militares ocorreu, principalmente,
pela verificação dos grandes problemas de preparo físico enfrentados ao longo dos conflitos
em que as FFAA brasileiras estiveram envolvidas desde meados do século XIX. Ao longo do
final do século XIX e início do século XX a necessidade de ampliação destas práticas passou
a ser enfatizada e divulgada pelas Forças por meio de seus periódicos institucionais sendo
aconselhada não somente para os militares, mas também para a população em geral a fim de
aproximar a juventude civil das atividades das FFAA e preparar, através do esporte, grupos de
“soldados-cidadãos” ou “cidadãos-marinheiros” prontos a defender sua pátria quando
necessário.
Estes argumentos foram divulgados através de suas publicações institucionais (revistas
militares e relatórios ministeriais) com vistas a difundir os benefícios destas práticas para a
formação dos militares brasileiros. Também foram efetivadas medidas normativas para a
legitimação destas atividades, como a formulação (ou reformulação) de currículos
educacionais e legislações específicas que introduziam a ginástica e o esporte como item
obrigatório e fundamental da formação e das atividades cotidianas dos militares.
176

Os modelos de organização de FFAA estrangeiras também foram largamente


analisados e debatidos pelos militares brasileiros do Exército e da Marinha com vistas a
definir as estruturas a serem adotadas pelas nossas instituições. Como foi possível discutir ao
longo dos capítulos, o “olhar” para o estrangeiro foi um movimento constante durante todo o
período em análise e as aproximações se intensificaram a partir de grupos de militares que
vieram atuar no Brasil, caso das missões francesas de 1906 e 1919 e da missão naval
americana; e também por meio dos grupos de oficias brasileiros que estiveram no exterior em
processos de treinamento, como os estágios dos oficiais do EB na Alemanha. Estas ações
repercutiram diretamente no direcionamento das ações e preocupações destas instituições com
relação ao esporte e à atividade física, uma vez que em diferentes períodos, sob diferentes
influências estrangeiras, as FFAA do Brasil adotaram métodos e modelos distintos com
relação ao desenvolvimento do esporte e da ginástica no interior de suas organizações
militares.
Inicialmente vistos como instrumentos de preparação do corpo dos soldados e dos
cidadãos para uma melhor defesa do território, o esporte e a ginástica passaram, ao longo da
primeira década do século XX, a ocupar outros espaços no interior da estrutura das
instituições. A prática esportiva ganhou também formas de instrumento diplomático, elemento
disciplinador, ferramenta de atração da juventude para as FFAA, além de práticas de
recreação e lazer.
Esta transição se desenrolou ao longo da primeira década, mas se intensificou
significativamente em meados dos anos 1910, quando o processo de organização destas
práticas iniciou sua efetiva estruturação dentro das FFAA com a fundação das Ligas
Esportivas Militares. Este processo acompanhou as tendências de regulamentação das
instituições esportivas que se destacava na sociedade brasileira naquele momento. Estas
entidades passaram, então, a ser responsáveis pela divulgação e organização das atividades
esportivas entre os militares tanto no interior dos quartéis como nas participações de seus
membros em competições civis.
A criação das Ligas teve como objetivo organizar e normatizar a participação nas
competições utilizando os parâmetros da hierarquia e da disciplina militar como definidores
dos espaços de atuação. As FFAA são entidades essencialmente disciplinadoras em suas ações
e ao longo das análises foi identificado o transporte desta configuração para as relações e
interações travadas no momento da prática esportiva, mesmo estas atividades não sendo, a
princípio, parte do quadro de ações institucionais destas forças e, portanto, identificadas como
atividades paralelas ou recreativas.
177

Portanto, a hierarquia militar e a disciplina, elementos basilares de organização das


FFAA, foram também fatores definidores dos locais políticos e sociais de atuação no âmbito
da prática de esporte entre oficiais e praças, como discutido em tópico específico deste
trabalho.
As análises sobre os processos de introdução das atividades esportivas entre as FFAA
brasileiras e das primeiras ações das Ligas de Exército e Marinha evidenciaram uma transição
em três fases: inicialmente a prática das atividades ginásticas restritas ao interior dos quartéis;
um segundo momento com o processo de divulgação de tais práticas também em meio civil
através da atuação como instrutores nas escolas e dirigentes e esportistas em entidades de
diferentes modalidades; e uma terceira fase com a organização e regulamentação de
competições esportivas a partir da fundação de suas LEM. O processo de criação e atuação
das ligas foi bastante similar, tendo como diferença fundamental, no entanto, os modelos
adotados: liga monoesportiva, no caso do EB com enfoque praticamente exclusivo ao futebol
até a década de 1920; e liga poliesportiva, no caso da MB com dedicação já inicial a diversas
modalidades. No entanto, o processo de organização interna destas entidades seguiu
características bastante semelhantes, com a estruturação administrativa em torno de diretorias
eleitas pelos sócios de cada uma das ligas com os cargos diretivos ocupados apenas por
oficiais, ficando as demais camadas hierárquicas fora do processo decisório sobre as ações
esportivas das FFAA.
As iniciativas de fomento das práticas de atividade física e esporte entre os militares
brasileiros foi intensificado ao longo da década de 1920 por meio das ações de suas Ligas
garantindo espaço para estas práticas não somente com os objetivos de preparação do corpo e
treinamentos militares, mas também para a participação em competições esportivas nacionais
e internacionais chegando a ter representações em Jogos Olímpicos.
O início da década de 1920 marcou o momento de maior organização das ações no
campo da promoção de eventos esportivos e processos de treinamento nas LEM a partir de
suas atuações nos Jogos Esportivos do Centenário. Após esta participação, um novo momento
foi iniciado nas duas instituições com maiores preocupações com a formação e o
aperfeiçoamento dos militares envolvidos com a instrução física e esportiva tanto no EB como
na MB. Este movimento evidencia um processo de mudança nas percepções sobre as
funcionalidades do esporte ao longo do período em análise nesta dissertação (1890-1922). Das
atividades ginásticas no interior dos quartéis com a função de melhoria do corpo; passando
pelo uso do esporte como elemento de aproximação com a sociedade civil e recrutamento
militar; chegando ao esporte competitivo formalizado, inclusive com participação decisiva em
178

competições internacionais, os militares incorporaram a prática da atividade física


sistematizada e do esporte como parte de suas vivências cotidianas.
A fundação das Escolas de Educação Física de EB e MB inaugurou um período de
aprofundamento destas relações, marcando um novo ciclo de atuação das Ligas Esportivas
Militares no panorama esportivo e educacional brasileiro, momento este que requer análises
mais específicas em pesquisas futuras.
Este estudo, portanto, pretende contribuir de forma direta para os dois campos que
colocou em diálogo: a História Militar e a História do Esporte. No caso do primeiro, como
afirma Parente (2009), as possibilidades de estudo têm sido ampliadas de maneira
significativa nos últimos anos, tanto nos objetos como nos processos de análise. No entanto,
discussões específicas sobre práticas físicas ou esportivas ainda não haviam sido
empreendidas até o momento de início desta pesquisa. É possível afirmar que esta dissertação
inaugura uma nova “área de interesse” dentro dos estudos militares: a História do Esporte
Militar no Brasil, passando a abrir inúmeras possibilidades de discussão sobre as relações
entre as FFAA e o esporte, tema em grande destaque na contemporaneidade especialmente
pelas intensas aproximações e processos de desenvolvimento do esporte militar empreendidas
nas últimas décadas do século XX e anos iniciais do século XXI.
Já no caso da História do Esporte, esta dissertação opera iniciando o preenchimento de
uma ainda existente lacuna de conhecimento sobre as relações dos militares com o fenômeno
esportivo ao longo do século XX no Brasil e suas ações de divulgação e promoção destas
atividades tanto no interior de suas instituições como no meio civil.
Portanto, não esgotando as discussões possíveis, mas sim iniciando as análises desta
nova “área de interesse” em ascensão, vislumbra-se um amplo campo de possibilidades de
pesquisa nesta temática e a necessidade de que as análises sigam sendo desenvolvidas a fim
de compreender os caminhos traçados por cada uma das FFAA na relação com o esporte e a
Educação Física ao longo do século XX, debatendo as transições da prática das ginásticas nos
quartéis ao alto rendimento, realidade do esporte militar nos anos 2000.
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