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Os avanços do bem-estar animal na


suinocultura brasileira: uma revisão
Teórica

Jade Pellenz
UNESP

Carlos Alexandre Oelke


UNIPAMPA

Luigi Faucitano
Agriculture & Agri-Food Canada

'10.37885/220207923
RESUMO

A ciência do bem-estar animal originou-se na década de 1960 provavelmente motivado


pela publicação do livro “Animal Machines” de Ruth Harrison, onde foi exposto para socie-
dade a condição de vida dos animais de produção intensiva naquela época. Em resposta,
foi formado o comitê “Farm Animal Welfare Advisory Council” (FAWAC), a partir disso
foram criadas as cinco liberdades. Desde então as pesquisas referentes a bem-estar
animal começaram a se desenvolver, e algumas práticas e legislações sobre a criação
de animais foram mudadas em todo o mundo. O objetivo dessa revisão é compilar as
principais informações sobre os avanços do bem-estar animal na suinocultura brasileira.

Palavras-chave: Bem-Estar, Suínos, Legislação, Saúde Única.

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INTRODUÇÃO

O bem-estar animal é fundamental para garantir uma vida digna aos animais, além de
refletir na produtividade. Pois, um animal que possui suas necessidades físicas, psicológicas
e sociais atendidas tende a produzir melhor e não sofrer com estresse crônico ou agudo, que
é prejudicial à saúde dos animais. Visto que, muitos estressores modificam diversas funções
fisiológicas, por exemplo reprodução, crescimento e resistência a doenças (ANDRADE;
PINTO; OLIVEIRA, 2006).
O bem-estar animal pode ser definido como “o estado físico e mental de um ani-
mal em relação as condições em que vive e morre” de acordo com o código terrestre da
OIE (OIE, 2022).
Os princípios que orientam o bem-estar animal são as 5 liberdades, sendo elas:

√ Livre de fome e sede;


√ Livre de medo e angustia;
√ Livre de desconforto;
√ Livre de dor ou injúria;
√ Livre para expressar seus comportamentos naturais.

O bem-estar animal está intimamente relacionado a saúde única. Devido a essa co-
nexão, existe um conceito novo de “One Welfare”, ou seja, “Um bem-estar”. Esse conceito
traz uma abordagem holística sobre o bem-estar humano, animal e ambiental (DIAS, 2022).

Figura 1. Interrelação entre bem-estar humano, animal e ambiental.

Fonte: R. Garcia Pinillos et al. Veterinary Record (2016).


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O One Welfare ou Um bem-estar está pautado em 5 seções:

√ Secção 1 – As conexões entre o abuso e a negligência de animais e humanos;


√ Secção 2 – As implicações socias do bem-estar animal aprimorado;
√ Secção 3 – Saúde e bem-estar animal, bem-estar humano, segurança alimentar e
sustentabilidade;
√ Secção 4 – Intervenções assistidas envolvendo animais, seres humanos e meio
ambiente;
√ Secção 5 – Sustentabilidade: conexões entre biodiversidade, meio ambiente, bem-
-estar animal e bem-estar humano (PINILLOS, 2018).

Portanto, o bem-estar animal é uma demanda que aborda aspectos científicos, culturais,
econômicos, sociais e políticos (OIE, 2022).
Dessa forma, o objetivo dessa revisão é abordar de que forma se aplica o bem-estar
animal dentro da suinocultura brasileira. Ao longo desse capítulo serão abordados alguns
assuntos relacionados ao bem-estar dos suínos e a instrução normativa (IN) 113 de 16 de
dezembro de 2020 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).

DESENVOLVIMENTO

A IN 113 de 16 de dezembro de 2020 estabelece as boas práticas de manejo e bem-


-estar animal nas granjas de suínos de criação comercial. Essa normativa estabelece prazos
para adequação da produção sob o ponto de vista de bem-estar animal. As instalações, os
manejos e densidades foram readequados para as diferentes categorias de suínos.

– Quanto as instalações: Todos os suínos devem ter fácil acesso aos comedouros e
bebedouros, dessa forma com o objetivo de minimizar brigas. Ademais, os mesmos
devem ser livres de arestas cortantes e projetados para minimizar sujidades.
– Os pisos das instalações devem ser projetados para evitar escorregões, lesões e
quedas. O piso totalmente ripado é aceito, desde que tenha espaçamento uniforme
e drenagem adequada, exceto em instalações de matrizes em grupo, esta deve
conter um espaço para descanso com piso compacto.
– O manejo do ambiente tem que permitir a renovação de ar e remoção periódica de
dejetos, a fim de evitar gases tóxicos como amônia e gás carbônico.
– A luz necessita ser suficiente para investigar o ambiente visualmente, além do que
precisa obedecer a um ciclo diário mínimo de oito horas de luz continua e seis horas
de escuro. A luz natural é obrigatória em instalações climatizadas e as fontes de luz
artificiais devem estar despostas de uma maneira que não incomode os animais. 123
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– A exposição dos suínos a barulhos provenientes de maquinários ou outras fontes
devem ser minimizadas ao mínimo possível para evitar medo e estresse dos ani-
mais.
– Todas as fases de produção precisam conter área hospitalar e enriquecimento am-
biental. Outrossim, o estresse por frio ou calor deve ser minimizado e se existir risco
de estresse térmico para os animais além da sua capacidade adaptativa, a granja
deve dispor de tecnologias que minimizem esse desconforto.
– O embarcadouro nas granjas deve ter uma inclinação menor ou igual a 25° graus do
solo e o mesmo deve ser projetado para minimizar quedas, lesões e escorregões.
– O produtor rural e os colaboradores devem realizar contato positivo com os animais
e evitar ao máximo um contato agressivo que cause medo e estresse. Os suínos
necessitam ser conduzidos de forma calma, em grupos e com equipamentos ade-
quados, sendo eles, lonas, chocalhos, tabuas. Fica proibida a conduta agressiva e
o uso de bastões elétricos. Os suínos também devem ser conduzidos e manejados
por pessoas capacitadas.
– Na categoria de leitões se destaca a proibição da identificação por mossa (figura 2)
até 2030.

Figura 2. Desenho esquemático da mossa.

Fonte: EMBRAPA (2022).

– O desbaste de dente fica restrito a somente um terço do dente e somente em casos


de lesões no aparelho mamário da fêmea e face dos leitões.
– O corte de cauda deve ser evitado, mas tolerado com cauterização, equipamentos
com adequada manutenção e higienização, apenas um terço da cauda, com orien-
tação do médico veterinário, feita por pessoas capacitadas e até o terceiro dia de
vida preferencialmente. Após esse período deve ser feito somente com anestesia e
analgesia.
– Além disso, a castração cirúrgica deve ser feita somente com analgesia e anestesia
até 2030, independentemente da idade dos suínos.
– Os leitões deverão ser desmamados com idade média de 24 dias até primeiro de
janeiro de 2045. Após o desmame, deverão ser alojados em um local seco e lim-
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po regularmente. A mistura de leitões, se necessária, deverá ser feita logo após o
desmame. No alojamento, a densidade deve ser adequada para igual ou superior a
0,27m² por animal em leitões até 30kg de peso vivo. Os leitões de creche ou recria
acima de 30kg de peso vivo deve atender o limite máximo de 100kg por m².
– Na categoria dos machos ficou estabelecido que os mesmos devem ser alojados de
forma que evite o isolamento social, ou seja, precisa ter contato visual ou táctil com
outros suínos. As baias devem ter no mínimo 6m² e com enriquecimento ambiental
até 2045. A normativa também traz que os machos em treinamento para coleta de
sêmen precisam ser treinados com condicionamento positivo e não pode usar estí-
mulos adversos.
– Na categoria de fêmeas suínas, é necessário transferi-las para o setor de mater-
nidade no mínimo dois dias antes do parto. Na maternidade é permitido o uso de
gaiolas, porem as gaiolas devem obedecer às dimensões que evitem o desconforto,
ou seja, a fêmea não pode tocar as barras superiores e laterais da gaiola quando
estiver em pé.
– Também ficou estabelecido que as fêmeas devem ser alojadas em grupo (figura 3)
após 35 dias de gestação até 2045. As densidades do alojamento em grupo são:
iguais ou superiores a 1,50m² para cada marrã e de no mínimo 2,00m² de área útil
para cada matriz.

As mudanças relacionadas ao manejo abordadas na IN 113 tem grande impacto no


conceito de One Welfare conforme foi abordado na introdução.

Figura 3. Matrizes em alojamento coletivo após 35 dias de gestação na granja Miunça – DF/ Brasil.

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Fonte: Arquivo Pessoal.

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– Durante o período de pré-parto as fêmeas devem receber o material de enrique-
cimento ambiental para que possam realizar o comportamento de nidificação, ou
seja, fazer o ninho.
– Na normativa também ficou estabelecido que as granjas têm até 2045 para ajustar
suas instalações de tratamento de efluentes para suportar dejetos provenientes de
enriquecimento ambiental.

ENRIQUECIMENTO AMBIENTAL

A maior parte da criação intensiva de suínos é feita em ambientes estéreis (EFSA,


2007). Os ambientes estéreis ou monótonos atendem as necessidades dos produtores,
mas não dos suínos (MARCHANT-FORDE et al., 2018). Uma vez que, instalações sem
nenhum tipo de atrativo ou conforto para os animais são mais fáceis de higienizar e de ma-
nejar os animais, portanto otimizando a produção. Além disso, esses ambientes monótonos
não permitem que os suínos expressem seus comportamentos naturais (WEERD et al.,
2009). Os suínos são animais sociais que passam a maior parte do seu tempo usando seu
focinho e boca para forragear e explorar o ambiente (MARCHANT-FORDE et al., 2018). A ini-
bição do comportamento natural pode induzir a um comportamento anormal, por exemplo
canibalismo (BROOM, 1998).
Uma estratégia utilizada para atenuar os efeitos do ambiente estéril é incorporar enri-
quecimento ambiental. O conceito clássico de enriquecimento ambiental segundo Newberry
et al. (1995) é a alteração do ambiente para garantir uma melhora do funcionamento biológico
dos animais. Segundo Faucitano e Goumon (2018) o enriquecimento ambiental pode ser
definido também como um maior contato com humanos e o hábito de manejo.
Na suinocultura, o enriquecimento ambiental é um grande desafio porque devem ser
seguros para os animais, de fácil higienização e em quantidade suficiente para não gerar
disputas ou frustrações nos suínos. Ademais, os suínos se acostumam e rapidamente per-
dem o interesse pelo enriquecimento ambiental (GUY et al., 2013).
Além disso, o enriquecimento ambiental não deve diminuir o desempenho zootécnico
dos animais, como por exemplo, no estudo de Bezerra et al. (2019) em que suínos alojados
em ambiente enriquecidos com correntes e garrafas tiveram respostas fisiológicas (cortisol
salivar) compatíveis ao estresse e um menor ganho de peso. Portanto, a introdução de
enriquecimento ambiental para suínos deve ser feita de forma cuidadosa e com base na
literatura cientifica.
Uma alternativa é o uso de brinquedos (Figura 5), que podem ser confeccionados com
materiais da própria granja ou comprados, além de apresentarem resultados satisfatórios
nas pesquisas e ser um promotor de bem-estar promissor, ainda precisa de mais estudos
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na área para determinar qual a melhor forma de utiliza-los (FOPPA et al., 2014). Estudos
recentes, mostram que suínos tem o nível de interesse pelos enriquecimentos ambientais é
dependente das características e apresentação dos objetos, também possuem maior interes-
se por objetos mastigáveis e destrutíveis, por exemplo a madeira (BEAUDOIN et al., 2019).

Figura 5. Brinquedo para enriquecimento ambiental na baia de leitões.

Fonte: SCHIPPERS (2022).

Outro exemplo de enriquecimento que vem sendo utilizado na suinocultura é a palha


(Figura 4). A palha pode diminuir comportamentos inadequados, como a caudofagia, confor-
me mostra o estudo de Zwicker et al. (2015) em que suínos em ambiente enriquecidos com
palha direcionam seu comportamento para a palha, ao invés de direcionar para outros animal
da baia. Assim como, a palha atende todos os critérios definidos por WEERD et al. (2009)
como bem sucedidos para cumprir o objetivo de enriquecimento ambiental. Experimentos
recentes também demostraram que o enriquecimento com palha tem efeitos positivo no
desempenho dos animais, como no estudo de Faucitano et al. (2020) em que suínos de
terminação enriquecidos com palha eram mais pesados, mais fáceis de manejar para o
carregamento e originaram uma carne menos exsudativa.

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Figura 4. Alojamento de terminação enriquecido com palha de arroz na granja Umburana – DF/ Brasil.

Fonte: Arquivo pessoal.

Porém, ela deve ser utilizada de acordo com as necessidades de produção porque
ela pode oferecer um desafio ao suíno na questão da introdução de patógenos, bloqueio do
sistema de drenagem dos dejetos e o uso em altas temperaturas (HORBACK et al., 2016).
Altas temperaturas também podem ser um limitante não só para o uso de palha, mas
também para a produção como um todo. O estresse térmico é um importante limitante de
ingestão para suínos (CA et al., 1998). Portanto, é necessário implementar alternativas para
essa problemática, como o uso de instalações climatizadas.

INSTALAÇÕES CLIMATIZADAS

O Brasil apresenta um clima tropical na maior parte do país, esse clima quente, favo-
rece o desconforto térmico de muitas espécies. Pois, os animais costumam ter uma zona
de termoneutralidade (figura 6) para desenvolver suas funções fisiológicas da forma mais
eficiente possível. Segundo Rigo et al. (2019), o animal gasta menos energia para manter
a homeostase quando criados em um ambiente adequado, além disso seu desempenho e
bem-estar não são afetados.

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Figura 6. Zona de termoneutralidade para suínos de acordo com a fase de produção.

Fonte: Beker et al. (2020).

O desconforto térmico causa estresse em suínos (HALE et al., 2017). Esse estresse
pode ser potencializado pelo fato de suínos possuírem glândulas sudoríparas subdesen-
volvidas e tecido subcutâneo espesso (GUO et al., 2018). Em vista disso, é necessário
que as instalações proporcionem um ambiente adequado para os suínos, ou seja, uma
melhor ambiência.
Dentre as opções de climatização das instalações estão os ventiladores, exaustores,
resfriamento de piso, resfriamento evaporativo, pressão positiva ou pressão negativa. Essas
opções de climatização são usadas, principalmente na maternidade, pelo fato de o calor ser
um limitante de consumo de ração pelas porcas. Além de diminuir o tempo de ingestão de
alimentos (RICCI et al. 2018). Essa redução de consumo tem um impacto direto no desem-
penho das porcas e dos leitões, portanto, justifica-se o uso de tecnologias de resfriamento
eficientes na maternidade.
O sistema de resfriamento adiabático evaporativo é muito útil na suinocultura porque
é um modelo muito eficiente para climas quentes e com baixo custo (RONG et al., 2017).
Esse método funciona da seguinte maneira: O ar quente externo percorra por um material
umedecido e dessa forma aconteça a evaporação da água e a perda de calor do ar (RONG
et al., 2017). Um dos modelos de placas de resfriamento, é o modelo de colmeia (Figura 7),
que em relação a outros apresentou melhor eficácia de resfriamento do ar como no estudo
de Rigo et al. (2019), em que o sistema de resfriamento adiabático, modelo pad cooling,
amenizou os fatores climáticos desfavoráveis mesmo que sem uma homogeneidade de
temperatura dentro do galpão.

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Figura 7. Sistema de climatização em maternidade na granja Miunça – DF/Brasil.

Fonte: Arquivo Pessoal.

A suinocultura brasileira possui muitas realidades diferentes, consequentemente


cada produtor deve adaptar as tecnologias de climatização de acordo com sua realidade.
Entretanto, fornecer somente conforto térmico não é suficiente para garantir que todas as
necessidades dos animais sejam atendidas.
Outro agente estressor de suínos é a privação de comportamento básicos, por exemplo
se virar, comum nas fases de gestação e maternidade por causa das gaiolas. As gaiolas de
gestação já têm um prazo para serem substituídas por gestação coletiva, conforme a IN 113.
Porém, não foi definido nenhum prazo de adequação para as gaiolas de maternidade na
legislação brasileira.

GAIOLAS DE PARIÇÃO ADAPTADAS AO BEM-ESTAR

As gaiolas de parição e lactação restringem as fêmeas suínas de expressarem seus


comportamentos naturais e, consequentemente essa restrição tem um grande impacto no

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bem-estar animal. Portanto, muitos estudos estão voltados para testar sistemas alterna-
tivos nessa fase.
A união europeia é o bloco comercial mais adiantado em relação legislações de bem-
-estar (MAPA, 2020). A legislação 2008/120/CE dispõe de importantes ajustes para fêmeas
lactantes, além de outras categorias. Nas celas de maternidade foi estabelecido que a
gaiola de parição deve possibilitar que a porca se movimente livremente, ou seja, possa se
virar e expressar seus comportamentos naturais, mas precisa ter dispositivos de proteção
para os leitões.
As gaiolas adaptadas para proporcionar uma maior movimentação das porcas (figura
8) ainda são incomuns no Brasil. Por outro lado, os consumidores e o mercado interna-
cional podem pressionar os produtores para adequar ao bem-estar as instalações de ma-
ternidade também.

Figura 8. Gaiolas adaptadas para maior movimentação das porcas na granja Miunça – DF/Brasil.

Fonte: Arquivo pessoal.

Essas gaiolas que permitem maior movimentação das fêmeas, ou seja, adaptadas ao
bem-estar animal possuem muitos modelos. Porém, os modelos mais vistos são os de lateral
removível, em que uma ou ambas laterais são afastadas para proporcionar espaço para as
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porcas se virarem. Entretanto, é necessário que as baias tenham barras de proteção para
os leitões, além de escamoteadores, bebedouros e comedouros. Essas barras de proteção
ajudam a evitar o esmagamento.
Uma das maiores preocupações dos produtores em adotar as gaiolas adaptadas é em
relação a mortalidade dos leitões (RAMONET et al. 2018). Visto que, uma das justificativas
de prender as fêmeas em gaiolas é para a proteção de leitões. Todavia, a literatura traz
diversos estudos sobre o uso dessas gaiolas e mortalidade sem chegar a um consenso.
Alguns estudos relatam uma maior mortalidade, como de Condous et al. (2016) em
que notou uma maior mortalidade de leitões durante o parto sem confinamento. Contudo,
existem alternativas para contornar essa problemática. Muitos estudos científicos preconizam
a contenção da porca por um curto período de tempo para minimizar a mortalidade (CHOI
et al. 2020, GOUMON et al. 2018, HOBEL et al. 2018). Esses estudos não notaram diferença
estatística na mortalidade de leitões entre gaiolas de maternidade convencionais e gaiolas
adaptada ao bem-estar animal. Um dos fatores que podem explicar a ausência de diferença
estatística na mortalidade de leitões em celas de lateral removível pode ser devido ao fato
que a restrição de movimentos da porca é importante para a uniformização dos leitões, ou
seja, todos leitões conseguem ter a oportunidade de mamada (BORBA et al. 2020).
Outro benefício de não restringir as porcas durante o período de lactação ou a maior
parte dele é que elas ficam mais ativas. Segundo Bresmann et al. (2018) porcas com mais
espaço são mais ativas e possuem um maior repertório comportamental. Outro comporta-
mento que pode ser observado nessas gaiolas é a maior interação das fêmeas com seus
leitões e com as porcas alojadas ao lado de suas celas.
Além disso, alguns estudos conseguem demonstrar por meio de respostas fisiológicas
que fêmeas com mais espaço são menos estressadas. No estudo de Goumon et al. (2018)
porcas em gaiolas de lateral removível apresentaram menos IgA. A imunoglobulina IgA pode
ser um marcador de estresse não invasivo em suínos (MUNETA et al., 2010).
Portanto, a literatura cientifica já demonstrou que gaiolas adaptadas ao bem-estar são
capazes de aliviar o estresse das porcas e também manter índices produtivos semelhantes
ao das gaiolas convencionais. Dessa forma, espera-se que no futuro o Brasil publique alguma
normativa que contemple também adequações em gaiolas de maternidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A suinocultura brasileira não é completamente homogênea, ou seja, existem granjas


de diversos tamanhos, diferentes níveis de tecnologia e nichos econômicos. Portanto, é
necessário adaptar as tecnologias e as pesquisas que favorecem o bem-estar animal para
realidade de cada produtor e dessa forma tornar a suinocultura brasileira mais sustentável.
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O bem-estar animal avançou muito no Brasil nos últimos anos, principalmente após a
publicação da IN 113, porém os prazos de adequação ainda são muito longos e não con-
templa todas as instalações, ao contrário de normativas de outros países, por exemplo, do
bloco econômico da união europeia.
As melhorias em instalações, como por exemplo, enriquecimento ambiental, climatiza-
ção, celas de laterais removíveis são importantes ferramentas para favorecer o bem-estar.
Entretanto, devem ser utilizadas junto a outras estratégias com colaboradores qualificados,
biodigestores e outros sistemas que minimizem o impacto nos recursos naturais para tam-
bém abordar o conceito de One Welfare.
Os profissionais das áreas das agrárias ou saúde tem um papel fundamental em im-
plementar os conceitos de One Welfare ou bem-estar único para garantir uma produção de
alimentos mais sustentável.

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)

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