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Tema 8- Bem-estar animal aplicado à produção de suínos e aves

Bem-estar animal é um termo amplo que inclui uma somatória de


elementos que contribuem para a qualidade de vida do animal, levando-
os a um estado de harmonia com o seu ambiente, caracterizado por
condições físicas e fisiológicas adequadas (HURNIK, 1992). Um animal
está em bom estado de bem-estar se ele está saudável, confortável, bem
alimentado, seguro, hábil para expressar seu comportamento normal, e
não estiver sofrendo estados desagradáveis de dor, medo ou aflição. O
bem-estar animal requer: prevenção de doença, tratamento veterinário,
manejo nutricional e instalações adequadas, e finalmente um abate ou
eutanásia humanitário.
Há décadas, tal terminologia vem sendo descrita por diversos
autores que utilizam diferentes definições para interpretá-la. Broom
(1986) definiu bem estar de um indivíduo como sendo seu estado em
relação às suas tentativas de se adaptar ao seu ambiente. Hughes (1976)
definiu o termo bem-estar da seguinte forma: “É um estado de completa
saúde física e mental, em que o animal está em harmonia com o
ambiente que o rodeia”.
O conceito oficial de bem-estar animal foi citado pela primeira
vez em 1965 pelo Comitê Brambell, um grupo denominado pelo
Ministério da Agricultura da Inglaterra para avaliar as condições em
que animais eram mantidos no sistema de criação intensiva . Em
1967, o Conselho de Bem -Estar de Animais de Produção (Farm
Animal Welfare Council - FAWAC) estabeleceu os princípios das
cinco liberdades, as quais os animais devem ter:
- Livres de fome, sede e desnutrição: os animais devem ter acesso a água
limpa e alimentação de boa qualidade para a assistência de sua condição
física.
- Livres de desconforto: os animais devem ser acondicionados à
ambientes que sejam apropriados e confortáveis;
- Livres de dor, injúria e doenças: os animais devem possuir
disponibilidade de prevenção, de diagnóstico e de tratamento;
- Livres para expressarem comportamento natural: os animais dever ter
para socialização interespecífica ou intraespecífica.
- Livres de medo e estresse negativo: devem ser minimizadas situações
de estresse e condições devem ser disponibilizadas para tratamento de
saúde mental dos animais.
Como frequentemente afirmado, bem-estar animal é um termo
que se origina na sociedade para expressar preocupações éticas sobre a
qualidade de vida experimentada pelos animais (DUNCAN, 2005).
Segundo Warris & Brown (2000), as pessoas desejam comer carne com
"qualidade ética", isto é, carne oriunda de animais que foram criados,
tratados e abatidos em sistemas que promovam o seu bem-estar, e que
sejam sustentáveis e ambientalmente corretos.
A cerca de alguns anos, em vários países, principalmente os
europeus mais desenvolvidos, ocorreu o surgimento de grupos ligados
à defesa dos direitos dos animais que se manifestam contra algumas
formas de criação muito intensivas como a criação de galinhas
poedeiras em baterias de gaiolas, ou a manutenção de fêmeas suínas em
celas parideiras individuais. Práticas essas, que impedem a liberdade de
movimentos ou possibilidade de interação com os indivíduos da mesma
espécie (MENESES, 1999).
A avaliação do bem-estar animal na exploração agrícola pode
envolver aspectos ligados às instalações quanto ao meio ambiente como
a distribuição de água e de comida, existência de camas, possibilidades
de movimento, descanso, contacto com outros animais, reprodução,
temperatura, ventilação, luz, espaço disponível ou tipo de pavimento
(MENESES, 1999).
Conjuntamente, na definição das condições de bem-estar animal
tem-se adotado indicadores fisiológicos, comportamentais, de saúde e
produtivos (COSTA-E-SILVA et al., 2009). Exemplos desses indicadores
seriam, o dano físico, a dor, o medo, o comportamento, a redução de
defesas do sistema imunológico, e surgimento de doenças (MENESES,
1999). Para compor, em definitivo, o que atenderia as necessidades
animais quanto ao bem-estar, diversas áreas profissionais se ligam
nessa elaboração. Assim, um pesquisador em zootecnia atentaria para
os índices produtivos, um médico veterinário para a saúde animal, um
etologista para a possibilidade de o animal realizar uma gama de
atividades comportamentais próprias da espécie em questão e, por fim,
de acordo com os resultados obtidos por estes profissionais, seriam
construídas as ferramentas para proporcionar esse bem-estar.
Os animais de produção podem ser criados em diferentes sistemas
de criação. Segundo Millen (1980) são identificados três sistemas
principais de criação: extensivo, intensivo misto ou semi-intensivo.
Os sistemas de criação extensivos compreendem as formas de
criação de animais à solta, não havendo preocupação com produtividade
e economicidade, sendo mais uma forma de cultura extrativa ou de
subsistência, onde não há controle técnico sobre a criação
(NICOLAIEWSKY et al., 1998). No caso dos sistemas de criação intensivo
de animais, Millen (1980) descreve como sendo uma atividade
agropecuária feita em área muito reduzida, com técnicas avançadas e de
alta produtividade. Neste tipo de criação os fatores produtivos e
econômicos são os mais levados em consideração. Por fim, os semi-
intensivos poderão ser enquadrados como as formas de criação
intermediárias entre os sistemas extensivo e intensivo.
A suinocultura atual, inclusive a brasileira, é feita sob dois regimes
principais: o intensivo e o extensivo. No regime intensivo, os animais são
criados em instalações geralmente fechadas, de ambiente controlado,
com grandes restrições de espaço e em pavimentos artificiais. Nas
explorações feitas de forma extensiva, os animais são criados ao ar livre,
em grandes áreas, com grande liberdade de movimentos, que podem
ainda dispor de abrigos simples. Na criação intensiva ou industrial,
condições artificiais de criação promovem variadas restrições, privando
esses animais do contato com o ambiente natural aos mesmos, sendo as
situações de estresse regularmente freqüentes. Diferentemente, na
criação extensiva, os animais passarão a vida em contacto com o solo,
podendo assim fossar, chafurdar, explorar o ambiente e desenvolver
outros comportamentos que lhe são próprios (MENESES, 1999).
A exploração intensiva para suínos feita sob regime de
confinamento é um exemplo de sistema que comumente provoca
frustrações a esses animais por restringir aos mesmos seu
comportamento original. A cerca disso, alguns comportamentos
anômalos são comumente destacados, como a mordedura das barras de
celas parideiras por fêmeas gestantes, ou a impossibilidade das porcas
em parto e cria de se moverem ou elaborarem um ninho para os leitões,
por ausências de materiais adequados para isso (SILVA, 1999). Outra
manifestação de estresse evidenciada por criadores é a tendência de
suínos na fase de engorda, em que são criados em grupo, morderem as
caudas uns aos outros. A insuficiência de estímulos naturais seria,
portanto a causa principal destes e outros esteriótipos (MENESES,
1999).
Contra isso, duas grandes vertentes de conduta a favor de
promover o bem-estar animal podem ser destacadas. Uma delas é o
chamado "enriquecimento ambiental", que consiste em introduzir
melhorias no próprio confinamento, com o objetivo de tornar o
ambiente mais adequado às necessidades comportamentais dos animais
(MACHADO FILHO & HÖTZEL, 2000). São exemplos de medidas
direcionadas ao enriquecimento ambiental a colocação de objetos, como
correntes e "brinquedos", o uso de palha sobre piso, o aumento da área
mínima por animal em terminação, a separação das áreas de excreção e
descanso, a adoção de gaiolas parideiras com espaço suficiente para a
matriz virar-se, dentre outros. Quando aplicadas, estas medidas são
capazes de reduzir sintomas de monotonia, agressões, canibalismo e
permitir desenvolvimento de comportamentos próprios à espécie como
fossar e construção de ninhos pelas fêmeas no final da gestação.
A outra vertente seria repensar os sistemas de criação como um
todo, ou propor sistemas criatórios alternativos. Um dos melhores
exemplos vistos hoje na suinocultura e que vem sendo adotado em
vários países, seria o sistema intensivo de criação de suínos ao ar livre,
conhecido como SISCAL. A criação através do SISCAL tem apresentado
bom desempenho técnico com baixo custo de implantação e
manutenção, número reduzido de edificações, facilidade na implantação
e na ampliação da produção, mobilidade das instalações e redução no
custo de medicamentos.
O SISCAL caracteriza-se por manter animais em piquetes, nas
fases de reprodução, maternidade e creche, cercados com fios, e, ou,
telas de arame eletrificado com corrente alternada e por guardar as
mesmas características da criação de porcos a céu aberto, utilizando-se
de cabanas como abrigos (NICOLAIEWSKY et al., 1998). Contudo, o
sistema não abrange as fases de crescimento e terminação, que
compreende animais na faixa de peso entre 25 a 100 kg, quando estes
são criados em regime de confinamento. Dentro do sistema intensivo de
criação de suínos ao ar livre são observadas variações como quanto ao
tamanho do piquete, número de porcas por cabana e tipos de
comedouro. Nesse sistema, a ocorrência de problemas
comportamentais é muito menos evidente.
Na avicultura de corte os sistemas intensivo e semi-intensivo são
os mais empregados. Assim como na suinocultura, o regime intensivo
causa estresse intenso, tendo como conseqüência respostas fisiológicas
e comportamentais que podem causar sérios problemas à saúde e bem-
estar dos animais (SILVA et al., 2003). Os animais criados em sistemas
intensivos são impedidos de realizar diversas atividades naturais ao seu
comportamento, como os hábitos de ciscar, empoleirar-se e tomar
banho de terra. Devido a isto, vários comportamentos anormais são
verificados como agressões através de bicadas e canibalismo e por estes
motivos, o sistema de criação semi-intensivo é considerado como uma
alternativa. De acordo com Santos et al. (2010), o sistema,
informalmente conhecido como "tipo caipira", trata-se de um modelo de
produção diferenciado, de baixa densidade, crescimento lento e abate
tardio. Os animais têm acesso direto ao pasto, consumindo insetos e
forragens típicas da sua cadeia alimentar. Isto lhe confere textura, cor e
sabor diferenciado, e com menos gordura na carcaça. Mostra-se ainda
como um sistema menos agressivo ao meio ambiente e às aves, afetando
positivamente na saúde e bem-estar animal.
Na avicultura de postura o sistema de criação mais adotado
atualmente é o de baterias de gaiolas. Esse sistema é caracterizado por
um conjunto de gaiolas distribuídas em vários níveis. É compatível com
alta tecnologia como arraçoamento automático, esteiras para a retirada
de fezes, programação eletrônica de coleta de ovos automatizada e é
utilizado geralmente em galpões de grande capacidade de alojamento
das aves. A criação das aves em gaiolas permitiu aumentar a densidade
de alojamento das poedeiras e reduzir investimentos em equipamentos
e custos com a mão-de-obra. As gaiolas dispensam o uso da cama,
proporcionando benefícios para as aves e os , pois eliminam o contato
com as fezes, evitando a coccidiose e verminoses, e melhoram o
ambiente de trabalho, com a diminuição dos níveis de poeira e amônia
(ROCHA et al., 2008). As gaiolas previnem o consumo dos ovos pelas
galinhas, já que estes rolam para o aparador após a postura, ficando
longe do alcance das mesmas. No entanto, gaiolas comumente utilizadas
representam uma preocupação para o bem-estar, pois impedem as aves
de apresentarem comportamentos naturais, causando estresse. O
limitado espaço ainda restringe a movimentação e as atividades das
aves, contribuindo para a “osteoporose por desuso”, que torna o osso
mais frágil e susceptível a fraturas dolorosas (ROCHA et al, 2008).
Vista as limitações demonstradas pelo atual sistema em relação ao
bem-estar desses animais, a legislação internacional de bem-estar de
aves poedeiras estabeleceu um conjunto de mudanças, nas instalações e
no manejo das aves, visando à melhor adaptação aos novos requisitos
do mercado. Dessas mudanças, que já vêm ocorrendo em alguns países,
surgem os sistemas alternativos para a criação de aves poedeiras, tais
como o sistema chamado de “gaiolas enriquecidas”, e os sistemas de
semiconfinamento, que poderão proporcionar às aves uma área com
cama e poleiro, além de disponibilizar ninho para a postura (BARBOSA
FILHO et al. 2007).
No sistema onde há o uso de gaiolas enriquecidas, as mesmas
podem conter poleiros, ninhos, banhos de areia e dispositivos de
desgaste das unhas.
No sistema de criação semiconfinado os animais são mantidos em
galpões com piso, similares aos galpões empregados para a criação de
frangos de corte, ou podem ter parte do piso perfurado com grades que
separam as aves de suas fezes. Pode apresentar um ou mais níveis, que
devem conter cama, ninhos e poleiros. Por apresentarem maior espaço,
e a possibilidade das aves desenvolverem suas atividades normais, este
sistema pode ser demonstrado como a mais eficiente alternativa quando
o emprego do bem-estar animal integra o modelo produtivo.
O bem-estar deve estar envolvido em todas as etapas produtivas,
caso contrário o nível produtivo esperado por aqueles animais poderá
ser comprometido. Animais de corte com peso inferior, má conformação
de carcaças, aves de postura botando ovos com casca fina são exemplos
de animais explorados em ambientes que não garantem de algum modo
o bem-estar necessário aos mesmos. Com isso, demonstrar que o bem-
estar resulta em um produto de melhor qualidade é um grande incentivo
para melhorar a forma com que os animais são criados, manuseados e
abatidos.

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