Você está na página 1de 180

©Kristel Ralston 2020.

A vingança errada.
Todos os direitos reservados.

SafeCreative N. 2010085571133

Design da capa: Karolina García Rojo.


Tradução e revisão: R. M. Vieira e Vanessa R. Thiago

Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida, armazenada em um


sistema ou transmitida de qualquer forma ou por qualquer meio eletrônico,
mecânico, fotocópia, gravação ou outros meios, sem a permissão expressa do
proprietário dos direitos autorais.

Esta é uma obra literária de ficção. Lugares, nomes, circunstâncias,


personagens são o produto da imaginação do autor e seu uso é fictício;
qualquer semelhança com a realidade, estabelecimentos comerciais (lojas),
situações ou eventos são pura coincidência.
Í N D I C E
ÍNDICE
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
EPÍLOGO
SOBRE A AUTORA
Meus agradecimentos especiais a Jacqueline Cruz, Karolina García e
Andrea Gutiérrez! Obrigada meninas, por seus comentários!

As minhas leitoras que estão em diferentes partes do planeta, muito


obrigada por seu apoio. Sem vocês, não seria possível continuar escrevendo
romances com finais felizes.
C A P Í T U L O 1

Maine, Estados Unidos.

Estava escuro em Ogunquit, uma bela cidade litorânea no estado do


Maine. Era um local turístico com uma comunidade relativamente pequena.
As luzes das casas à beira-mar estavam acesas, e o ar salgado de verão
impregnado com o cheiro do mar flutuava de um lado para o outro. Naquela
noite de julho, aproveitando as boas condições climáticas, os amigos de
Rachel Galloway a convenceram a ir à praia.
As autoridades locais haviam emitido uma proibição que impedia
fogueiras nas praias da região. Talvez tenha sido exatamente isso que
motivou Mitch, Roger, Lynda e Tamera a ficarem mais empolgados com a
ideia de realizar o plano. Pela primeira vez em muito tempo, Rachel
concordou em deixar seu lado cauteloso. Afinal, só se tinha dezenove anos
uma vez na vida.
Com a graciosa agilidade que a caracterizava, Rachel colocou sapatos
confortáveis para se proteger das pedras e vestiu as roupas de verão que
costumava usar: shorts e blusa de algodão levemente justa. Acostumada a
viver, desde os três anos, em um lugar ensolarado com praia, Rachel cuidava
muito de sua pele branca. Com o cabelo ruivo e os olhos azuis, parecia
exótica e não faltavam pretendentes, mas ela não estava interessada em
nenhum. Os beijos tolos que compartilhou com os meninos locais, foram-lhe
indiferentes. Além disso, em sua mente, tinha outra prioridade.
Rachel não queria ficar e morar naquela pequena comunidade. Ogunquit
era o lugar que a adotou desde que ha três anos quando, depois de um
episódio desastroso que a separou de sua irmã mais velha, Piper, e se mudou
para morar com a única família que restara: sua tia Ariel. Doía lembrar e a
enchia de ódio como, de um momento para o outro, tudo o que conhecia se
interrompeu por uma injustiça que enviou Piper para a prisão.
Rachel sentia falta de Chicago, de suas grandes lojas, bibliotecas,
restaurantes, de sua amiga Delaney, mas, acima de tudo, queria se livrar das
fofocas típicas de um lugar com pouca população. Não estava interessada em
saber o que os outros estavam fazendo com sua vida em Ogunquit.
Estabeleceu todas as suas expectativas profissionais para quando retornasse a
Chicago.
Queria uma vida anônima em uma cidade onde apenas seu talento
profissional pudesse se sobressair. Ansiava conquistar os mercados
financeiros. E tinha se candidatado, várias semanas atrás, à Universidade de
Chicago para estudar administração. Cada dia sem resposta era uma agonia.
Tentava permanecer otimista, mas preferia não se iludir demais, caso o
resultado não fosse o esperado. A vida lhe tirou tanto que Rachel preferia ser
pragmática. E esse pragmatismo era o que a impedia de enlouquecer
esperando a resposta de Chicago.
O vento noturno bagunçou seus cabelos. Endireitou o rabo de cavalo e
respirou fundo. O ar marinho era revitalizante.
Não podia reclamar da natureza ao seu redor, porque gostava muito. E o
mais provável é que fosse, além de sua tia Ariel, o que mais sentiria falta se
conseguisse voltar logo para Chicago.
—Não será algo arriscado? —ela perguntou quando seus amigos
começaram a entrar em uma área onde havia poucas casas. Rachel olhou para
um lado e para o outro, tentando não tropeçar. Já tinham andado um bom
trecho.
— Claro que não, Rachel. Vamos fazer a fogueira lá — Roger
Moorehouse disse, apontando o dedo indicador para uma espécie de clareira.
O garoto era um sardento mal humorado. — Antes teremos que passar pela
área onde estão as cinco casas mais distantes.
—Isso seria invadir propriedade privada— Rachel respondeu cruzando os
braços.
Lynda, a garota mais popular do grupo, olhou para ela franzindo a testa.
— A praia é pública.
— Sim, mas a maré aumentou um pouco e, para não correr riscos, teremos
que atravessar alguns jardins, que não são públicos.
— Isso não é problema — Mitch respondeu. Seu pai era o dono do único
supermercado da região, além de um cassino cinco estrelas muito visitado por
quem queria apostar grandes quantias em um local discreto e seguro.
— Chega de falar gente, vamos seguir em frente — Tamera interveio,
uma morena que gostava de ser líder de torcida do time de futebol americano
local. Pegou Rachel pelo braço para incentivá-la a continuar andando. — Está
tudo bem. Vamos fazer marshmallows e depois vamos para casa e é isso.
— Só espero que não tenhamos problemas — Rachel sussurrou seguindo
os passos que Roger estava marcando para todos.
Caminharam mais alguns minutos, passaram furtivamente por alguns
jardins particulares e depois continuaram até chegarem ao terreno.
Sem nenhum esforço, acenderam a fogueira e passaram muito tempo
conversando e rindo das anedotas da temporada, até que, sem perceber,
pouco a pouco a força do fogo diminuiu. Era uma noite relaxada, e Rachel
estava feliz por ter deixado de lado sua relutância. Comeram biscoitos com
marshmallows, alguns refrigerantes e quando Tamera tirou algumas salsichas
da bolsa, todos riram, mas sim, ninguém negou o convite quando o aroma
tostado da comida invadiu seus sentidos.
Por volta das onze da noite, recolheram o lixo e o armazenaram em sacos.
Os sacos de lixo foram distribuídos entre os garotos e, juntos, seguiram o
caminho de volta. A lua estava em todo o seu esplendor e parecia guiá-los.
Embora nenhum fosse estúpido. Todos tinham lanternas. O céu estrelado
iluminava o firmamento, mas não o caminho.
—Ei vocês! — gritou uma voz autoritária que de repente pareceu bastante
próxima. Assustados, os meninos se entreolharam. — Não podem andar pela
praia a essa hora! — insistiu a voz do desconhecido.
O grupo de amigos se virou ao mesmo tempo, quando uma lanterna muito
potente os iluminou. A mesma luz foi para o lugar onde estavam fazendo a
fogueira, porque não estavam tão longe. Rachel estreitou os olhos. Não, não
era uma lanterna potente, mas as luzes de uma patrulha de polícia que estava
fazendo uma ronda nos arredores da praia.
Os jovens se entreolharam. E começaram a correr.
— Parem! — ordenou outra voz impetuosa. Nenhum dos dois agentes
conseguiu fazer com que os meninos obedecessem. — Roger Moorehouse, eu
te identifiquei, espere até eu colocar minhas mãos em você!
Ninguém se virou ou parou. Afastaram-se e cada garoto começou a cuidar
de seu próprio pescoço. Rachel sentiu-se desorientada, assustada e com medo
de cair de cara e bater no rosto em uma ponta rochosa e se machucar durante
a corrida. “Isso é o que acontece comigo por ser tola e aventureira”, pensou
com relutância. Correu na areia instável até ficar sem fôlego. Sabia que os
policiais estavam atrás deles, mas Rachel continuou correndo. Estava
desesperada porque não sabia onde estavam seus amigos, exceto pelas
lanternas que se acendiam e se apagavam.
Graças aos flashes das lanternas, conseguiu vislumbrar uma espécie de
rocha gigante. Ela se escondeu atrás e tentou diminuir a respiração, como se
isso pudesse denunciá-la.
Alguns segundos depois, ele ouviu os policiais passarem, muito perto de
seu esconderijo, com um jogo de luzes dançando na areia escura. Quando
Rachel pensou que estava a salvo da perseguição, se agachou por alguns
segundos com as mãos nos joelhos. Com a cabeça baixa e curvada na areia,
tentou recuperar o fôlego.
Depois de ter certeza de que não estava em perigo, olhou para cima e
deixou seu esconderijo.
Viu uma das casas da área, pensou em procurar um atalho e encurtar
caminho até que pudesse sair à rua. Todas aquelas casas foram projetadas
com duas portas principais. A que dava para a praia e a do jardim nos fundos
que dava para a rua. Essa não poderia ser a exceção.
Aliviada por ter encontrado uma solução para voltar para casa sã e salva,
começou a andar rapidamente. O vento estava frio e ela não usava nada além
de roupas de praia. Costumava ser precavida, mas à noite as temperaturas
mudavam muito.
Uma vez que se escondeu no jardim daquela pitoresca casa de dois
andares, ela esperou. Aguçou o ouvido, observando qualquer movimento
próximo. Silêncio absoluto.
Respirava lentamente, como se respirar com força pudesse criar algum
problema. Odiava ser paranoica, mas tinha levado um bom susto. Avançou
pausadamente por um beco lateral do jardim quando algo enroscou sua blusa.
O arranhão que sentiu na pele a fez soltar um gemido nervoso e agudo.
Acendeu a lanterna e apontou para um gancho de aço e pontudo. Se soltou
dele, mas um lado de sua blusa rasgou. Passou o dedo pelo corte. Sangue.
Não era um corte profundo, sentiu, embora estivesse sangrando e queimando
como mil demônios. Mordeu o lábio para não reclamar. Um pequeno grito
durante a noite poderia passar despercebido, mas dois não. Esperava que os
donos da casa continuassem em silêncio. As luzes estavam apagadas e não
havia barulho.
Caminhou cuidadosamente pelo corredor e entrou no jardim. Faltava
pouco para chegar à rua. Apenas tinha que dar mais alguns passos, sair do
quintal da casa e abrir a porta. A frente iluminou. Um cadeado. Ela era boa
com grampos de cabelo. Tirou os grampos que seguravam a cabeleira e, ao
fazê-lo, um manto ondulado caiu pelas costas. Não lhe importava. Só queria
ir para casa e limpar a ferida. Agora lembrava por que nunca ouvia seu lado
aventureiro e por que preferia mantê-lo letárgico.
Dolorida e irritada, lutou com o cadeado, murmurando insultos baixinho.
O cadeado não abria. Parecia enferrujado, como se a saída para a rua não
fosse usada há muitos anos. Olhou em volta se guiando com a lanterna. Se
usasse a pá que estava no canto do pátio poderia abrir o cadeado e sair mais
rápido. Era uma ideia perfeita, pensou.
Começou a caminhar em direção à esquina, mas em vez de encontrar ar
fresco, seu corpo tropeçou em uma fortaleza dura e inconfundivelmente viva.
Ela ia gritar quando uma mão grande e dura se fechou sobre a boca, enquanto
outra a agarrou pelo braço, dobrando-o atrás das costas, antes de forçá-la a
caminhar para pressioná-la sem qualquer consideração contra o que devia ser
uma cerca de metal.
Tentou gritar, mas estava firmemente presa. Seu rosto grudou no metal.
Ela apertou a mandíbula como se assim pudesse conter a queimação e as
lágrimas que estavam lutando para sair por causa da dor da pressão que
aquela coisa exercia sobre ela.
— Se não parar de chutar vou jogá-la no chão, mas não antes de quebrar
seu braço sujo— disse uma voz masculina ronca e forte, às suas costas. —
Agora cale a boca.
O hálito quente perto de sua orelha inquietou Rachel. “E se aquele
estranho a estrangulasse?” Em pânico, e diante da ameaça, parou de se
defender. Mas não parou de tentar se soltar. Uma tentativa inútil, porque a
força daquele homem era superior. Podia sentir seu poder emanando da
posição em que estava. Ele nas suas costas, e ela, completamente indefesa
sem nenhum som. Acreditava que o impacto daquele selvagem ao atingi-la,
sem nenhum tipo de consideração, contra a cerca de metal teria hematomas.
— Vou soltar sua boca — disse o homem. — Se tentar me morder ou
gritar, vou te levar do jeito que está até a delegacia. Agora vai se acalmar?
Rachel assentiu profusamente.
— Bom —disse, abrindo os dedos suavemente. Ela respirou fundo,
tentando acalmar os nervos. Uma tarefa muito complicada, já que o estranho
continuava segurando-a, colado às suas costas. —Quem é e por que está me
roubando?
— Eu... eu não estou roubando — sussurrou apenas com o ar em seus
pulmões. — Meu… meu nome é Rachel…
Michael já havia notado que era uma garota. Mas mulher ou homem, um
ladrão era o mesmo tipo de escória.
Ele procurava um chaveiro em seu escritório quando notou luzes saindo do
beco lateral. Sem pensar duas vezes, silenciosamente desceu para o pátio e,
quando viu o intruso tentando abrir o cadeado da porta dos fundos que dava
para a rua, não hesitou em agarrá-lo por trás para surpreendê-lo e empurrá-lo
contra a porta sem consideração. Podia tê-lo atingido e deixá-lo sem ar, até
mesmo disparado, mas a última coisa que queria era ser acusado de
homicídio. Já tinha problemas suficientes.
A área em que ele morava em Ogunquit era muito tranquila, é por isso que
ele concordou em ficar em sua casa de férias naquela praia e que havia
recebido como herança há muito tempo. Os invasores geralmente não
rondavam, e a polícia mantinha a área sob controle porque era uma área
exclusiva e de poucas visitas.
—Rachel — repetiu o nome como se estivesse digerindo. Ele não a soltou
completamente. — Quantos anos tem?
— Dezenove... — engolindo seco. — Me... me deixe ir?
— Não. Pelo menos não até me dizer o que fazia aqui a esta hora—
respondeu calmamente. Ela não representava um perigo. Sentiu o calor do
corpo da garota, e gostou de como se acomodava entre seus braços. Era um
pensamento estúpido, mas não podia evitar.
Rachel, relutantemente, fez um breve resumo do que tinha acontecido
momentos atrás. Odiava ter que dar explicações. A mão de Michael se moveu
sobre o lado machucado para soltar o braço, e ela gemeu de dor.
Ele se afastou imediatamente quando sentiu algo viscoso entre os dedos.
Não precisava perguntar para saber do que se tratava. Sem hesitar, ele a
pegou nos braços e a levou para dentro de casa. Os protestos de Rachel não
importaram nem um pouco.
Empurrou com o ombro a porta que dava para o beco, entrou na casa e
acendeu a luz da sala. Deixou a garota no sofá. Afastou-se para finalmente
ver o rosto que até então era desconhecido.
Quando olhou para Rachel, ficou surpreso. “Uma preciosidade”, foi seu
primeiro pensamento. Ela tinha uma boca com lábios carnudos que pareciam
fazer biquinho facilmente, olhos azuis e cabelos ruivos ondulados que caíam
abaixo dos ombros. Notou a blusa rasgada e manchada de sangue.
Amaldiçoou baixinho.
Rachel olhou para ele, nervosa. Era um homem muito bonito. Sua atração
não estava na perfeição de suas características, mas na combinação viril de
todas elas. Não era nada parecido com os amigos magros que tinha, nem suas
pretensões de iam à academia acreditando serem ilusoriamente em forma e
musculosos. O homem que estava diante dela, observando-a com a mesma
atenção, usava calça cinza, uma blusa preta e estava com os cabelos
despenteado. A roupa destacava sua forma atlética.
A maneira como usava cabelo preto, alvoroçado, em contraste com
impactantes olhos verdes, impressionavam. E ela se considerava uma mulher
difícil de impressionar. Não se lembrava de vê-lo no mercado local ou em
reuniões locais.
—Sou Michael — Se apresentou com um sorriso ao notar o estudo que
Rachel fazia sobre ele. — Se machucou em outro lugar além do lado?
“Em que confusão se meteu?”, pensou inquieta. Talvez esse Michael
parecesse inofensivo, mas assassinos em série também não eram?
— Não... não. Apenas o lado e alguns arranhões menores — mentiu. Não
eram arranhões insignificantes, porque ardiam. Ela não estava reclamando,
então pensou em aguentar a dor. Afinal, quem era o culpado por estar nessa
situação além de si mesma?
— Bem. Espere um momento aqui. Não tente fugir. Foi um pouco
insensata por estar vagando na praia há esta hora. Poderia ter caído nas
pedras escorregadias e batido sua cabeça— ele a repreendeu.
— Mas...— Rachel começou a protestar, mas as palavras não saíram.
Estava confusa. Michael já se afastava pelo corredor, então não teve chance
de ser ouvida de qualquer maneira.
Apesar da dor, Rachel relaxou contra o sofá macio. A sala era revestida de
madeira e dava uma decoração de bom gosto. Poderia dizer que esse Michael
era um homem com muitas possibilidades financeiras.
Tentou se levantar para ver mais detalhes de uma linda cerâmica em um
aparador, mas ao se mexer, sentiu um puxão no lado ferido. Logo ouviu os
passos de Michael e preferiu ficar onde estava.
Michael chegou equipado com um pequeno kit de primeiros socorros.
Sentou-se ao lado da garota e, ao fazê-lo, não teve saída a não ser se
aproximar dela.
— Vou precisar que tire essa blusa — pediu indiferente.
Ela engoliu seco.
— Eu não...
— Não estou tentando seduzi-la, Rachel. Se eu quisesse, você saberia —
ele expressou com uma voz firme e pragmática. — Pegue— lhe estendeu
uma camisa azul que tirou de sua cômoda — se for sensata, notará que esta
blusa está rasgada. Entendeu? — Ela assentiu. — Bem. Vou fazer um
curativo na sua ferida e depois indicar onde fica o banheiro para que possa se
trocar. Tudo bem?
Ela assentiu novamente e olhou para ele. Não tinha escolha senão confiar.
— Enquanto cuido da ferida, você aplica um pouco de álcool desinfetante
no algodão para poder limpar as mãos e os braços.
— Está bem... — Murmurou. Odiava receber ordens, mas discutir era
inútil. Além disso, ele estava certo e ela estava machucada.
Quando os dedos de Michael levantaram sua blusa, ela sentiu um
formigamento que jamais experimentou com outro garoto. Apertou o tecido
logo abaixo do sutiã com dedos trêmulos, ele não fez nenhuma tentativa de se
sentir tocado pelo gesto de pudor. Rachel o viu fazer uma careta ao
contemplar a ferida.
— Tenho que limpá-la bem. Shhh, está tudo bem — comentou enquanto
fazia o curativo e a sentiu respirar fundo pela aplicação na área ferida com
água oxigenada. — Arde um pouco, eu sei, mas preciso desinfetar primeiro.
Ainda bem que não precisa levá-la à clínica para levar pontos. Em que estava
pensando?
— Não estava pensando evidentemente — respondeu. Fez uma careta
quando ele aplicou mercúrio cromo. Segundos depois, ele colocou uma gaze.
Ela, modestamente, abaixou a blusa rasgada e suja. Agradeceu-lhe com um
murmúrio. Ele assentiu em resposta.
Ficaram se olhando.
Ele limpou a garganta.
— O banheiro fica naquele canto — apontou com o dedo — pode se
trocar com calma. — Ela pegou a camisa que ele lhe entregou. — Vai.
—Obrigada.
No espelho do banheiro, Rachel reprimiu um gemido. Parecia uma
daquelas loucas de rua. Não é à toa que Michael inicialmente pensou que
fosse um ladrão. Lavou as mãos e o rosto cuidadosamente. Arrumou o cabelo
da melhor maneira possível em uma espécie de coque. “Pelo menos parece
menos lamentável”, pensou.
Quando voltou para a sala, ele a esperava no sofá. Parecia grande demais
para aquele assento. Ela sorriu timidamente e sentou-se ao lado dele. O mais
longe que pôde.
—Melhor?
—Sim, obrigada— murmurou, olhando os botões da camisa de Michael
que estava vestindo. Ficava muito comprida. Chegava até os joelhos. Com
essa roupa mais parecia que estava nua. — Estou um pouco melhor...
— Fico feliz.
Michael estava perdido naqueles olhos azuis, e aparentemente ela sentiu a
mesma conexão. Ele começou a se aproximar lentamente, como se temesse
que Rachel corresse como uma coelhinha assustada. Ela não se afastou.
Cautelosamente, Michael passou a mão pelo cabelo, acariciou-o e sentiu a
respiração de Rachel se agitar. Não de dor.
— Você é muito bonita. Já te disseram isso alguma vez?
— Acho que não deveria me dizer essas coisas — ela sussurrou, inalando
o perfume masculino. Os homens costumavam lisonjeá-la, mas os dispensava
com aborrecimento. Desta vez, a proximidade de Michael estava causando
formigamento em sua pele. — Eu... eu não te conheço. E acho melhor eu ir.
— Acho que já percebeu que não vou te machucar. Na verdade, fiz
exatamente o oposto. Fiz seu curativo, certo? — Ela, em resposta, assentiu,
mordendo o lábio inferior. Michael, vendo que ela ficava em silêncio, sorriu.
— Vamos ver— contou com os dedos — entrou na minha propriedade, te
disse meu nome e te fiz um curativo. A esta altura já deve saber que não sou
nenhum psicopata ou assassino em série. Eu acho que isso conta —
comentou com humor.
Ela sorriu para ele, sem conseguir evitar. Ele a imitou, e Rachel ficou sem
fôlego.
— Não sei quantos anos você tem —murmurou. “Qual era o problema?
Não deveria estar se levantando para ir para casa? Seus amigos certamente
pensavam que teria escapado e encontrado o caminho de volta. E se algo
acontecesse com ela, eles não tinham como saber”.
— Muito mais que você — rio, não sem antes abandonar o cabelo macio
para tocar as bochechas coradas. — Vinte e nove anos, Rachel.
—Oh.
—Sim, oh — disse sem perder o sorriso.
— Bem... talvez você não seja muito velho — ela sussurrou prestes a se
lançar naquela promissora selva verde de seus olhos que parecia hipnotizá-la.
— Eu tenho dezenove...
Michael riu de novo. Rachel era a criatura mais deliciosa que lembrava ter
visto em um longo tempo. Não ia ser cínico. Era impossível que ela soubesse
de sua existência ou planejasse conhecê-lo com algum objetivo astuto.
Os relacionamentos que ele teve ao longo de sua vida o ensinaram que
algumas mulheres só investiam em sua fortuna. Ele só entregava o que estava
disposto a dar. E que, pelo menos para o sexo feminino, era sexo e algumas
saídas por um curto período de tempo, para que não tivessem muitas ilusões.
— Como exatamente você acha que eu não sou muito velho? — ele
perguntou inclinando-se para Rachel incapaz de se conter. Beijou o pescoço
macio. Foi um beijo que ela mal sentiu, mas o suficiente para fazê-la tremer.
—Michael...— Murmurou quando sentiu a boca masculina atrás da
orelha. — Não te conheço, eu nunca... eu nunca...— Ela o sentiu sorrir
contra sua pele. — Eu...
—Sim? — ele perguntou, pegando o rosto dela com a mão esquerda. Suas
bocas estavam perfeitamente alinhadas. — Me deixará te beijar nem que seja
uma vez?
Ela lambeu os lábios com a língua em um gesto inconscientemente
sensual. Ele conteve um gemido.
—Agora é quando está me seduzindo? — Rachel se atreveu a perguntar,
lembrando o que ele havia dito enquanto fazia o curativo momentos atrás.
Ele sorriu e depois piscou para ela. Rachel prendeu a respiração.
— Anseio por te beijar como nunca antes com qualquer mulher —
Michael sussurrou, passando o polegar sobre o lábio inferior macio e rosado.
— Você sente o mesmo desejo que eu de experimentar nossas bocas juntas,
Rachel?
C A P Í T U L O 2

Sem pensar no que realmente estava fazendo, ela acariciou o dedo de


Michael timidamente com a língua. Como uma resposta silenciosa, Rachel
deu uma mordida suave na ponta do polegar. Viu os olhos verdes se
transformarem em ondas selvagens, despenteados e prontos para varrer a
primeira coisa em seu caminho.
O instinto disse a Rachel que essa era sua primeira experiência com o
desejo mais primitivo que podia experimentar. Longe de sentir medo, seu
corpo vibrou com uma ânsia desconhecida, mas tão forte que ela não se
importava com mais nada. Apenas Michael e a promessa que viu em seu
olhar intenso. Queria descobrir o que exatamente era.
—Um beijo...— ela respondeu olhando para ele. — Sim... eu desejo o
mesmo.
Michael não hesitou, fechou a distância e colou os lábios nos de Rachel,
até que instintivamente ela abriu-os para ele. Seu coração disparou quando
provou aquela boca quente e inocente. Ele a agarrou gentilmente pela nuca
para aprofundar o beijo. Ele explorou seu interior sem deixar nada. Sentiu-a
hesitante, mas ele guiou-a com presteza, e a Rachel deixou-se levar com
ímpeto.
Seduziu aquela boca de tal forma que logo a ouviu soltar um gemido de
prazer. Encorajado pela resposta, cuidando para não machucar o lado ferido,
Michael deslizou a mão sob a camisa até chegar ao sutiã. Ele sentiu-a tensa,
mas em nenhum momento tentou empurrá-lo ou se livrar de suas carícias. Era
a permissão que necessitava para continuar.
Ele nunca tinha tocado uma pele tão suave. Sob a luz era da cor da areia
tostada. Guiou os dedos para o fecho frontal do sutiã e, com as costas da mão,
garantiu que, durante o processo, pudesse tocar os mamilos eretos.
—Michael... — sussurrou quando sentiu como ele liberava seus seios.
— Quero beijar você inteira — confessou afastando os lábios por alguns
segundos.
Rachel tinha as pupilas dilatadas, os lábios inchados por seus beijos e as
bochechas rosadas. Michael enfiou a mão sob a blusa de Rachel e pegou um
mamilo entre os dedos. Olhando para ela, ele apertou-o. Vê-la se contorcer e
morder o lábio inferior foi uma das coisas mais eróticas que ele já tinha
testemunhado. Era como se uma flor estivesse se abrindo para o sol. Michael
agarrou totalmente o peito. Cabia perfeitamente em sua palma. Ele fez o
mesmo com o outro seio, enquanto ela respirava pesadamente.
— Eu gosto do que você me faz sentir — ela disse hipnotizada pelos
olhos verdes e a sensualidade de suas carícias.
— Isso é bom, querida. Vai me deixar te provar, linda Rachel?
— É que isto parece irreal...— Ela murmurou absolutamente presa nas
redes daquele homem que tinha acabado de conhecer. Deveria recusar. Qual
era o problema? Era como se Michael tivesse a capacidade de deslocar seu
mundo. Algumas pessoas poderiam chamar de atração fulminante à primeira
vista, mas ela se atrevia a chamar de loucura. — Nunca experimentei essa
emoção que parecesse me queimar... com ninguém... e... eu gosto.
Curiosamente isso despertou em Michael uma ridícula sensação de
possessividade. Era uma completa desconhecida. “A luxúria às vezes brinca
com seu bom senso”, lhe disse uma vozinha.
— Você pode me parar quando quiser — respondeu sinceramente, ainda
tocando seus seios. A pele era tão macia que estava morrendo de vontade de
prová-la com os lábios. Beijou a boca quente e surpresa de Rachel. — O peso
dos seus seios é maravilhoso. Você é tão sensível— declarou, antes de tirar a
camisa pela cabeça. Ela o ajudou a fazer isso.
Ficou absorto, olhando para ela. Linda não era uma palavra para descrevê-
la. Essa garota foi feita para o prazer.
— Eu...— tentou se cobrir de novo, mas ele não permitiu. Antes que ela
pudesse protestar, se inclinou para pegar um mamilo com os lábios. Ele
chupou, olhando-a nos olhos, e ela prendeu a respiração. — Oh...
Ela nunca imaginou que poderia estar em uma circunstância como essa.
Era tão erótico ver Michael beijando e lambendo seus seios; sua pele morena
e a dela da cor da areia tostada pareciam uma combinação impressionante.
Ela se recostou, apoiando-se nas palmas das mãos, para que ele tivesse
melhor acesso. Deixou-o beijar tudo o que queria, porque a sensação era
maravilhosa. Não queria que parasse.
— Quero te tocar... também quero te fazer sentir o que você me faz
sentir... — expressou quando as mãos ávidas friccionavam sua carne e a boca
intercalavam as carícias sobre seus mamilos rosados.
— E como eu faço você se sentir? — perguntou antes de tirar a camisa e
deixá-la de lado.
Michael era lindo, Rachel pensou com admiração. Era um pouco ingênua
quando se tratava do sexo oposto, mas não era cega. Sua pele formigava e o
recanto mais íntimo do seu corpo parecia molhado, aquela parte que ela
costumava ignorar quando se sentia excitada, o que não era muito frequente.
Mas agora, o que ela mais queria era que aquele homem a tocasse, queria
explorar aquela sensação avassaladora que era o orgasmo. Não aquele que
costumava vir dado por sua própria mão. Não. Ela queria aquelas mãos fortes
e ao mesmo tempo macias, lhe dando prazer. Sentiu-se quente. Ofegante.
Excitada.
— Como se estivesse embriagada...— respondeu acariciando seu torso nu
timidamente. —Você sente o mesmo?
Ele riu.
— Bebemos o mesmo vinho.
—Sim...— respondeu tocando sua bochecha, enquanto ele se inclinava
para beijá-la novamente.
Michael a deixou saber que a queria quando a dureza de seu membro
atingiu a coxa de Rachel. Geralmente, ele era um homem bastante contido.
Não costumava ter aventuras sem pensar bem, mas aquela garota havia
nublado seu cérebro.
—Michael? — ela murmurou ofegante, quando ele acariciou seus seios
com uma mão, enquanto a outra esfregava seu sexo sobre tecido da bermuda.
— Diga-me algo mais sobre você...
— Sou advogado — ele sussurrou contra sua boca, mordiscando seus
lábios com ternura. — Às vezes eu amo minha profissão, às vezes eu odeio
— manifestou com sinceridade movendo a mão mais para baixo,
pressionando e girando os dedos com precisão. — Trabalho para uma
empresa muito importante.
—Oh, mudou-se então recentemente para Ogunquit? Porque nunca te vi—
disse tentando não perder a cabeça completamente. Falar ajudava a evitar
sentir-se menos pressionada pelas sensações.
— Esta é a minha casa de férias — ele disse sem maiores explicações.
—Então não ficará aqui por muito tempo?
Michael parou de tocá-la. Ela acariciou seus cabelos, gostou da sensação
daqueles fios grossos e macios ao mesmo tempo.
— Acho que você pergunta por que tem medo de me encontrar amanhã no
supermercado e sente vergonha pelo que estamos fazendo aqui — expressou
brincalhão.
—E o que exatamente estamos fazendo? — ela ofegou, tremendo e dando-
lhe um sorriso tímido, enquanto os dedos inquietos acariciavam seu abdômen
e depois passavam pelo bíceps forte.
— Estou beijando você e descobrindo como seu corpo é bonito. E você?
— Deixando você fazer isso, porque a verdade é que eu gosto das
sensações que desperta em mim... Mas...
—Ah, aqui vem os “mas” — sorriu. Inclinou-se para beijar o canal que
separava seus seios de mamilos rosados.
—Nunca pensei...— respirou fundo. — Odeio advogados — comentou
lembrando de sua irmã.
Essa frase o fez reconsiderar. A verdade é que ele estava no meio de um
caso complexo e foi por isso que ele veio à sua casa de férias, para pensar. O
divórcio de Ingrid, recém assinado há duas semanas, estava começando a
marcá-lo de uma maneira indescritível. Não era justo que ele seduzisse
Rachel. Um completo estranho, mas ao mesmo tempo a única mulher em um
longo tempo que conseguiu despertar um instinto de ternura e paixão em
igual proporção. Sua vida era muito complicada.
Michael franziu a testa e se afastou, não sem dificuldade, dando-lhe a
escapatória de seus braços. Ela sorriu nervosa e confusa com a repentina
frieza dele. Sem olhar para ele, ela pegou o sutiã e o ajustou aos seios. Depois
vestiu a camisa. Cheirava a Michael. Limpo, viril, sensual. Não teria gostado
de seu corpo e por isso deixou de tocá-la de um momento para o outro? — se
perguntou de repente.
— Muita gente odeia advogados — comentou ele, alheio à sensação de
rejeição que começava a se produzir em Rachel. — Mas às vezes não temos
muito por onde escolher. Nós fazemos o nosso trabalho. Eu tento, pelo menos
eu, ser o mais justo possível. Algumas vezes eu consigo, outras vezes... sou
vencido nos tribunais. A vida é assim. Você nem sempre pode vencer...—
expressou em um tom distante.
—Por quê? — olhou para baixo.
Ele estreitou os olhos, intrigado.
—Por que não pode ganhar sempre nas Cortes? —perguntou.
Rachel riu com timidez e baixou o olhar.
— Esquece... —murmurou. Ela se abraçou. De repente sentia frio.
Então, Michael entendeu. Soltou uma risada franca.
—Por que deixei de te tocar? — Ela assentiu mordendo o lábio inferior.
— Bem, Rachel, embora eu mal possa esperar para deixá-la completamente
nua e fazer você sentir como seu corpo vibraria enquanto eu te tocasse e você
atingisse o orgasmo— lhe acariciou o rosto com reverência — é muito
jovem. E eu acho que sendo virgem, você merece mais do que uma noite com
um estranho que só pode lhe oferecer um momento em que provavelmente
deseja muito mais de sua primeira experiência sexual.— disse à queima-
roupa e com total franqueza olhando nos olhos dela.
Ela não precisou perguntar como diabos ele sabia que ela era virgem, ele
acabara de confessar a ela contando sua falta de experiência durante o
interlúdio apaixonado.
— Eu acho que sim — Rachel respondeu, olhando-o inquieta. — Ou é
porque não gostou de me tocar e...? — indagou com insegurança. Michael
tinha um tipo de aura magnética que a convidava a querer se refugiar naquele
espectro de atração que parecia gritar entre eles. Parecia que seu corpo havia
sido possuído por outra força que não a sanidade e a estava empurrando
apenas para sentir, e não pensar. “Afinal, o que havia de errado em sentir?”,
se perguntou com um leve sorriso.
—Gostar é pouco— lhe tomou a pequena mão e a guiou contra sua
ereção. — Sente isso? — Ela assentiu — Parece tão difícil porque você está
em um nível muito além de apenas gostar, e isso é algo que raramente
acontece comigo com outra mulher. Acredita em mim?
—Eu... sim... — gaguejou, ficando vermelha. Deixou cair a mão. Teria
gostado de explorar aquele volume que parecia quente e duro através das
calças de tecido. Ele estava lhe dando uma chance de sair de lá. “Pelo menos
um dos dois estava pensando”, Rachel disse para si mesma para consolar sua
curiosidade sensual não saciada.
—Bem. — Com dificuldade, Michael se levantou. Ele passou as mãos
pelos cabelos. Rachel estava olhando para ele com aqueles grandes olhos
impregnados de inocência e curiosidade. O desejo que despertava nele era
muito forte. Não podia se deixar levar dessa maneira. — Eu não estou te
rejeitando. Acho que estou fazendo a coisa certa, mesmo que me mate a
possibilidade de deixar de te tocar como desejo.
Ela engoliu em seco e deixou escapar uma risada nervosa.
— Alguém tinha que usar a razão, eu acho. — Ficou em pé. — Espero
que não me peça para devolver sua camisa— disse tentando aliviar o ar
denso e carregado de sensualidade não consumada.
Michael assentiu.
— É melhor chamar um táxi para você voltar para casa — disse em um
tom mais cortante do que gostaria.
Rachel ajeitou as roupas da melhor maneira possível.
—Obrigada... —murmurou.
Sem conseguir evitar, ele se aproximou do sofá e levantou o seu queixo
com o dedo.
— Não acho que seduzir você seja o melhor para qualquer um de nós.
Amanhã você se arrependeria. Você é linda e eu sei que qualquer homem
com sangue quente nas veias perceberia isso apenas olhando para você,
mesmo que fosse à distância.
—E você Michael? Também se arrependeria? — ela perguntou
encorajada.
Ele sorriu com uma mistura de pesar e cinismo.
— Provavelmente não. Tenho mais experiência que você.
Ela gentilmente afastou a mão dele.
— Posso ter dezenove anos, mas sei o que estou fazendo —
descaradamente interrompeu. Sua parte íntima palpitava, sabia que estava
úmida, e seus seios estavam sensíveis e desejosos depois das carícias da boca
e dos dedos de Michael.
Ele inclinou a cabeça para o lado.
—Você sabe, pequena e deliciosa Rachel? — perguntou comovido pela
determinação no olhar azul. Era toda inocência e desafio. Não queria arruiná-
la. Pelo menos uma vez na vida, ele estava determinado a não ser egoísta.
— Não sou uma criança — respondeu irritada com o tom
condescendente. Não tinha o direito de se divertir pela primeira vez na sua
vida sem os seus bem conhecidos limites pessoais?
Michael a olhou de cima a baixo.
— Não. Não é criança. Você é perfeita — ele murmurou se afastando,
então pegou o telefone com força e ligou para a empresa de táxi local. Disse à
operadora o endereço, e logo desligou para virar-se para a jovem: — Em dez
minutos seu táxi estará aqui. Espere um momento enquanto eu vou pegar
minha carteira. Eu acho que você não trouxe dinheiro, certo?
— Não há necessidade, posso dizer para esperar quando chegar em casa e
pagar...— disse. Mas ele já estava subindo as escadas.
Minutos depois, Michael a acompanhou até o carro. Abriu a porta.
Antes de embarcar, Rachel virou-se para ele.
—Michael... —sussurrou — Não vou te ver de novo, certo?
Ele encolheu os ombros.
— Amanhã voltarei à cidade onde moro. É melhor você se cuidar. Desejo-
lhe uma boa vida, Rachel. E obrigado por compartilhar um momento comigo
— ele expressou acariciando sua bochecha com ternura.
— Eu... você também... boa sorte.
Michael se inclinou e deu-lhe um beijo rápido, mas profundo nos lábios.
— Vá agora, antes que eu me arrependa das minhas boas intenções...
Ela olhou para ele por um momento antes de assentir e começar a se
acomodar dentro do táxi. Observou-o pela última vez. Ele assentiu com um
meio sorriso.
Michael fechou a porta e ficou olhando o carro desaparecer na escuridão
da noite. Não podia explicar que sentiu no corpo, como se algo estivesse
sendo arrancado. Como se acabasse de perder algo valioso, e não soubesse
discernir do que se tratava.

***
Rachel acordou no dia seguinte com um sorriso. Durante toda a madrugada
pensou em Michael. Seus lábios pinicavam quando pensava aqueles beijos.
Seus mamilos incharam quando ela se lembrou do ardor daquela boca sobre
eles, mas sabia que tinha sido apenas a experiência de uma noite.
Pegou o celular e viu várias chamadas perdidas de Tamera. Escreveu-lhe
dizendo que a noite não teve contratempo. Sua amiga respondeu que, no
final, nenhum deles acabou detido na delegacia. Conseguiram um acordo
com os agentes e prometeram não fazer fogueiras nas praias da região.
Rachel deixou o telefone depois de se despedir de Tamera e foi tomar o
café da manhã. Não ia contar a ninguém sobre Michael. Seria o seu segredo.
“Uma louca aventura juvenil para contar aos meus netos.” Embora a verdade
é que teria gostado de experimentar em profundidade a sensação de voar
sobre chamas e se sentir invencível. Teria gostado de sentir a pele vibrar com
os cinco sentidos enquanto as mãos e o corpo de Michael a levavam a
experimentar algo que jamais havia conseguido com nenhum outro homem.
Com um suspiro, chegou ao patamar da escada. Viu sua tia. Sorriu.
— Bom dia, filha. Senti você chegar tarde. Foi tudo bem? — perguntou
Ariel com um olhar radiante de carinho.
Ariel Galloway era viúva, e cuidava de sua sobrinha há três anos. Seu
único irmão, Shelton, e sua esposa Hilary, haviam morrido anos atrás em um
doloroso acidente em uma rodovia em sua cidade natal, Chicago. Não tinham
mais família.
— Sim tia. Chegou carta da minha irmã?
Ariel, com seus cabelos loiros e mechas grisalhas, negou.
— Sinto muito, Rachel...
— Oh — sussurrou misturando o açúcar no café. Sentia falta de Piper.
Sua irmã era dez anos mais velha e a mimava muito. Ou ao menos costumava
fazer isso quando era livre. Tinham sido felizes juntas. Seus pais morreram
quando ela tinha onze anos e Piper, vinte e um, sua irmã ficou responsável
por ela. Tudo ia bem até o dia em que um infame incidente as separou,
obrigando-a a sair de Chicago para pedir abrigo a sua tia, que não tinha
filhos. Ariel a recebeu de braços abertos e sempre lhe dera conselhos e o
amor que precisava. — Sinto falta dela... ainda acredito em sua inocência.
Ariel suspirou. Essa era a eterna discussão entre as duas. Sua sobrinha,
Piper, havia sido condenada a vários anos de prisão por tráfico de drogas,
uma acusação que a magoou, mas como jornalista aposentada ela conhecia
certas informações às quais Rachel não tinha acesso, nem jamais teria. Não
podia mostrar as fotos que um amigo seu da DEA possuía. Algumas fotos
que foram decisivas para a condenação de Piper.
Viver com Rachel não era difícil. Infelizmente, as memórias de uma
menina de onze anos, que tinha permissão para viver em reuniões de adultos
e fazer o que quisesse, não eram fáceis de contradizer ou confrontar o que era
realidade. Piper era descuidada, uma má tutora para sua irmã, e praticamente
a fazia ir de festa em festa, mantendo-a acordada até tarde da noite. Rachel,
em sua pouca idade, na época, não sabia que nessas festas eram feitos
contatos para a entrega de drogas. Pior foi saber que aqueles vestidos
maravilhosos, o apartamento de luxo e o motorista que a levara para a escola
particular cara foram pagos com dinheiro sujo.
—Vai querer torradas com geleia ou manteiga? — perguntou mudando de
assunto, enquanto deixava um prato sobre a mesa.
— Geleia. — Olhou em volta como se estivesse procurando algo. — Tia,
não cancelou a assinatura do Chicago Tribune, certo?
— Claro que não. Eu sei o quanto é importante para você saber o que
acontece naquela cidade — comentou enquanto is buscar o jornal. Ao voltar
da sala deixou o exemplar junto ao prato de Rachel, e logo se sentou à mesa
com uma xícara de chá. — Vejo você particularmente feliz hoje. Algo que
deseja compartilhar? — Perguntou tomando um gole de Irish Breakfast Tea.
— Eu me diverti muito ontem à noite — respondeu, esperando não ter
corado. Tomou um gole de café e pegou o jornal. — O tempo está bom hoje,
então acho que vou dar um passeio na praia. Sabe? Tenho que voltar para
Chicago...
— Eu entendo muito bem, querida. Você é uma garota maravilhosa, e eu
sei que ficará bem onde quer que more. Sempre poderá voltar. Esta é a sua
casa também — estendeu a mão sobre a mesa e apertou a de Rachel. —
Nunca esqueça, Rachel. — Olhou pela janela da sala de jantar, com vista
para a praia. — Há um sol lindo. Se for sair, faça-o logo, antes que o sol fique
mais intenso.
Rachel rasgou o embrulho de plástico que cobria o jornal e começou a
folhear as páginas. Ele se divertiu comentando algumas notícias para a tia
Ariel, ao mesmo tempo que dava conta das três torradas. Abriu a seção
Celebridades. Não entendia como as pessoas pomposas tinham a necessidade
de anunciar seus compromissos e bobagens em um jornal. Não sabiam
apreciar a intimidade?
Folheou as fotografias. Até que uma chamou sua atenção. A mão dela
tremia. Levou os dedos até a boca, nervosa. “Não, não podia ser.”
—Rachel? O que aconteceu? Você de repente empalideceu.
Leu a legenda novamente pela quinta vez, caso tivesse se confundido.
Nem a foto mudou de lugar, nem a legenda se corrigiu.
—Na… nada, tia. Uma foto boba que me surpreendeu é isso — respondeu
tentando minimizar a importância. Mas o papel queimava em sua mão e seus
olhos ardiam com as lágrimas que não pretendia derramar. Esteve a ponto de
fazer amor com o carrasco de sua irmã.
Raymmond e Francine Bechmenton, de Western Springs, têm o prazer de
anunciar o noivado de sua única filha, Lara Bechmenton, com Douglas
Whitmore, filho de Jack e Louisa Whitmore, de Park Ridge, e irmão de
Michael Whitmore...
“Michael Whitmore.”
O homem que devia odiar com todas as suas forças em vez de estar
pensando naquele beijo, naquelas mãos... Droga!
Tinha vontade de quebrar algo. Ir até ele e esbofeteá-lo.
“Com que desculpa? Não tinha nenhuma”, ela disse a si mesma derrotada.
Não tinha como reconhecer Michael. Vários anos se passaram desde o
julgamento. Um julgamento a que nunca foi porque sua irmã havia pedido;
implorou em lágrimas, dizendo-lhe que um tribunal não era o lugar para ela.
Mas principalmente por segurança, porque entre os acusados ​havia pessoas
perigosas e Piper disse que preferia não a expor a ser conhecida.
Relutantemente, Rachel a obedeceu.
Agora ela se arrependia de ter feito, porque se tivesse participado do
julgamento, teria visto Michael em primeira mão, e nunca, jamais, teria
permitido que ele colocasse um único dedo em seu corpo. Nem ela, tão
estúpida, se permitiria praticamente se derreter.
— Deveria ter me deixado ver os jornais e a televisão durante o
julgamento, tia...
Ariel franziu a testa.
—Por que esse comentário? — quis saber rodeando a mesa, mas Rachel
protegeu o jornal como se pudesse queimar a sua tia, tanto como sentia que
essas páginas estavam queimando a ela.
—Nada— disse na defensiva, e ficando de pé. — Ontem à noite dormi um
pouco inquieta. Você sabe que eu estou esperando a resposta da universidade.
—É só isso?
—Sim, sim... não se preocupe com nada.
Ariel suspirou e voltou ao seu lugar.
— Tudo bem, querida...
De acordo com o que sua tia lhe contou há algum tempo, no assunto de sua
irmã estiveram envolvidos dois filhos de famílias muito ricas que tinham
influências. Influências que não utilizaram para tirar seus filhos ilesos, porque
segundo a tia Ariel todos os envolvidos receberam sentença, mas sim foram
usadas para deter a imprensa. E tinham conseguido. Mas Piper Galloway,
sem fortuna, foi a presa fácil com a qual os jornalistas não mostraram
piedade.
Gemeu por dentro.
Sentiu que tinha traído Piper. Ela estava prestes a pedir a esse homem para
não parar de tocá-la! Aquele bastardo que usara aquelas mãos para elaborar
documentos que condenaram sua irmã.
— Tia, você se lembra do julgamento de Piper? — perguntou com voz
trêmula.
— Nós já conversamos sobre isso... você acabou de me dizer que...
— Por favor, tia, é muito importante — interrompeu e sentou-se
novamente. Ariel suspirou. — Você se lembra do advogado que a enviou
para a cadeia? — continuou.
— Era uma equipe de advogados. Não apenas um.
—Sim, mas...
— Um tal Whitmore. Agora não lembro o primeiro nome dele... teria que
lembrar — respondeu franzindo a testa.
— Não, não é necessário. Eu só queria confirmar —murmurou. O que
teria esperado? Que por um milagre do destino não fosse Michael? Era uma
completa idiota.
— Rachel, você está agindo de forma estranha.
— Eu preciso sair um pouco — disse com uma voz estrangulada. Ela
pressionou o jornal no peito. Como se isso também protegesse sua tia de algo.
— Vou seguir o seu conselho e ir à praia por um tempo.
Ariel olhou para ela interrogativamente.
—Tudo bem... — ela respondeu não totalmente convencida. — Você
planeja levar o jornal?
— Para terminar de ler, sim. Obrigada pelo café da manhã, eu te amo tia,
Ariel. — Deu-lhe um beijo na bochecha enrugada pelo tempo. E logo subiu
ao seu quarto.
Pouco tempo depois, Rachel saiu de casa.
Uma vez que encontrou um lugar distante na praia, sozinho, ela chorou
com raiva. Um dia, ela encontraria uma maneira de afundar publicamente
Michael Whitmore, exatamente como ele havia feito com Piper, conseguindo
que um tribunal a considerasse injustamente culpada. Privando as duas de
uma vida juntas.
***
Três semanas depois, Rachel Galloway recebeu a carta da Universidade de
Chicago. Foi aceita no curso de administração. “Talvez o destino não seja tão
cruel, afinal”, ela pensou enquanto sorria com a carta de admissão na mão, e
o abraço de Ariel a protegendo.
C A P Í T U L O 3

Nove anos depois.


Illinois, Estados Unidos.

O vento gelado e a forte nevasca eram características da cidade de


Chicago. Seus cidadãos estavam acostumados a isso. Os estrangeiros,
amantes da cultura, arte e negócios de elite, desfrutavam da cidade, mas
ficavam mortificados com as baixas temperaturas que caíam em uma das
cidades mais emblemáticas dos Estados Unidos.
Nos escritórios da Salmann & Buckend, um prestigiado escritório de
advocacia localizado na East Randolph Street, os luxos decoravam os
escritórios de seus advogados. Esses luxos incluíam aquecimento
ultramoderno que funcionava como um encanto. Isso poderia explicar
Michael Whitmore, o sócio mais jovem.
Nove anos atrás, sob pressão e sacrifício pessoal, Michael havia sido
promovido. O advogado-chefe, Dereck Salmann, apoiou-o na votação do
conselho de sócios que podia dar-lhe ou não, o passe a fazer parte da elite
profissional de uma das melhores firmas legais de toda Chicago.
Aos trinta e oito anos de idade, Michael havia se tornado um dos
advogados mais respeitados, tal como o foram seu avô e seu pai em seus
tempos de exercício legal. Eles ficaram desapontados quando os informou de
sua decisão de deixar a firma da família, W&W, para se juntar à Salmann &
Buckend. Ele considerou que era a melhor decisão depois daquele terrível
caso que o levou a deixar o direito penal e se aventurar na área bancária e
financeira.
Agora, pela janela de seu escritório confortável, ele podia ver como os
flocos de neve caíam simulando um cobertor macio e branco sobre a cidade.
Ele tinha o mundo a seus pés, mas sua alma estava vazia. A única mulher que
alcançou seu coração não estava mais ao seu lado.
Olhou pela última vez a cidade que se abria diante dele, tentando recuperar
a pouca paciência com a sua cliente da manhã. Ele se virou com um sorriso.
Aquele sorriso profissional que ele estudara no avô e depois no pai.
—Senhora Stevenson — disse à sua cliente com o seu tom amável —
após estas duas horas de reunião, reitero que a firma não pode pegar o seu
caso. Lamento.
A mulher era elegante, sofisticada e acreditava que o dinheiro comprava
tudo. Inclusive a possibilidade de internar a mãe em uma clínica psiquiátrica,
quando os relatórios médicos não revelavam que tivesse o quadro de
bipolaridade e esquizofrenia que estava tentando usar como argumento. A
equipe de investigação da Salmann & Buckend havia trabalhado na
investigação e concluiu que Henrietta Stevenson era uma piranha financeira
com muitas dívidas e pouco senso de humanidade. Mas como os valores
abstratos não eram utilizáveis ​nos tribunais, recorriam aos números
vermelhos de suas contas bancárias. Não seria uma cliente solvente, nem um
caso que traria prestígio.
Não havia riscos no escritório.
— Estou lhe oferecendo uma quantia ultrajante como honorários,
Michael. Como pode me recusar? — ela perguntou com uma voz estridente.
Uma voz acostumada a ser satisfeita. Henrietta aproximou-se e o sacudiu
levemente pelo braço. — Me ouviu?
Ele apertou os lábios. A mulher de setenta anos afastou a mão
rapidamente.
— Eu ouvi seus argumentos. Estudei seu caso, também minha equipe
legal, mas não podemos representá-la. Não há evidências conclusivas que
indiquem que sua mãe tenha um quadro mental que envolva perigo ou que
deva ser internada em uma clínica. Além disso, minha competência não é o
direito de família, mas sim banco e finanças.
— Meu marido trabalha com esta firma há mais de cinco anos, ele me
disse que podia vir aqui e me atenderiam como mereço. Está me rejeitando,
Sr. Whitmore! — expressou como se tivesse recebido a maior afronta de sua
vida.
— O senhor Edward é um inestimável cliente para nós, mas ao que parece
confundiu meu cargo e especialidade. Em todo caso...
Nesse exato momento, Angelique Cooper, a advogada que liderava a área
de direito de família e direito civil, entrou. A convenção anual dos sócios da
sede da empresa nos Estados Unidos estava sendo organizada e Angelique
havia sido designada para coordenar a equipe de eventos em conjunto com
recursos humanos. Ela, observando o cenho franzido de seu chefe, o
questionou com os olhos. Quando Michael assentiu, ela entrou no escritório.
Uma interrupção nunca pareceu mais oportuna para Michael.
—Vai me ajudar ou não? — perguntou Henrietta perdendo a compostura e
movendo o salto de seus Jimmy Choo com irritação sobre o tapete do
escritório. — Essa herança será dada à caridade. Minha mãe está louca.
Perdeu o juízo!
Michael, em vez de discutir, abriu um sorriso encantador.
— O que acha de apresentarmos novamente seus argumentos à advogada
Cooper, senhora Stevenson? Ela é mais versada em assuntos familiares do
que eu — disse olhando para Angelique. Com cabelos e olhos castanhos, a
garota era um grande talento para litigar várias áreas no tribunal. — Estou
certo de que ela atenderá a todas as suas preocupações e poderá fornecer
conselhos inestimáveis.
Henrietta fez uma careta e relutantemente pegou sua bolsa Hermès azul
clara.
— Me acompanhe, por favor — disse Angelique antes de deixar o
luxuoso escritório.
— Claro que você sim saberá atender uma cliente — Henrietta disse
quando a porta estava terminando de fechar atrás dela.
Uma vez sozinho, Michael tomou um gole de whisky e esfregou a testa.
Fechou os olhos por alguns segundos e depois ligou para o irmão para
confirmar que iria naquela noite celebrar o aniversário da cunhada. Lara era
uma mulher encantadora e, com seu caráter doce, conseguiu domar o seu
irascível irmão mais novo, Douglas. Não só isso, mas ela concebeu dois
filhos preciosos que eram a adoração da família. Michael amava loucamente
aquele par de gêmeos diabinhos de cinco anos, Alan e Moses.
Ele se considerava um homem familiar, mas gostava muito dos prazeres da
solteirice. Nos fins de semana, costumava visitar Heidi, a mulher com quem
mantinha um relacionamento de conveniência. Ela o acompanhava a eventos
sociais, e ele fornecia os caprichos que desejava. Estavam juntos há seis
meses e o sexo era bom. Complementavam-se em alguns aspectos, mas ele
não se sentia preparado para se casar, não de novo e menos com ela. E esse
era um tema que Heidi começando a abordar de forma pouco sutil e
recorrente.
O Michael mal tinha tempo para descobrir uma forma de a deixá-la ou de
arranjar uma substituta que aceitasse uma troca física como uma saída, mas
nada além disso. Ele tinha um caso muito difícil em mãos com dois grandes
bancos de Chicago, e no qual ele tinha trabalhado por mais de quatro meses.
As próximas duas semanas seriam cruciais. Um rompimento, por mais
superficial que fosse o relacionamento ou o vínculo, e ainda mais consciente
do caráter chorona de Heidi, não estava nos planos no momento. Preferia
aproveitar um pouco mais o lazer de uma boa sessão de sexo depois de um
dia agitado, a se complicar no meio das responsabilidades que estava
carregando.
Dirigiu seu Bentley Mulsanne Speed, edição Beluga, no meio da noite fria,
para a casa de seu irmão. Heidi não o acompanhava a reuniões familiares.
Isso se aplicava a todas suas amantes. Era a maneira mais clara de definir
distâncias e os termos com clareza.
Deixou a jaqueta do terno preto Brioni “Vanquish II” no carro. Depois,
desamarrou o nó da gravata roxa com listras finas combinando com o terno,
que teve o mesmo destino que a jaqueta. Mais relaxado, sem as amarras que
costumava usar, andou pelo caminho de cascalho até chegar à porta da casa
de dois andares de Douglas.
O sorriso em seu rosto, combinado com um presente Gucci
cuidadosamente embrulhado, aumentou quando ele viu seus sobrinhos
correndo. Ambos o rodearam com suas mãos. Um em cada perna.
—Tio Mike! Tio Mike! Mamãe fez bolo de morango para o aniversário.
Ele sorriu e olhou para cumprimentar sua família.
— É mesmo?
—Sim! Mas papai diz que não podemos tocar em nada até que as pessoas
encarregadas de colocar mais comida cheguem — Moisés respondeu. Loiro e
olhos verdes, ele era um malandro de primeira classe.
Michael fechou a porta e caminhou com os sobrinhos ao seu redor, e ele,
respondendo-os com frases feitas para incentivá-los a conversar ainda mais.
— Acho que merece um bom presente por suportar esse idiota —
Michael disse ao cumprimentar Lara. — Feliz aniversário, Lara.
O riso cantado da bela morena de olhos azuis não demorou. — Obrigada,
Mike!
—Onde está a princesa da casa? — perguntou à cunhada, referindo-se à
sobrinha, Galia. Ela era uma garota divertida e divertida e tomava conta da
situação.
— Ela está um pouco resfriada e adormeceu.
— Oh, espero que melhore logo.
— Ela perguntará por seu presente habitual. — Michael sorriu e tirou do
bolso um saco de chicletes de morango que Galia amava. Entregou-os para
Lara. — Ela vai ficar louca por perder a festa, mas acima de tudo, por você
não ter lhe dado os chicletes pessoalmente. Estamos contentes de poder
contar contigo hoje, sei que é muito ocupado.
—Oh, vamos, querida— Douglas interrompeu, olhando para a esposa.
Então ele apertou a mão do irmão — quando esse malandro quer, arruma
tempo para a família. A menos que esteja, com sua conquista da vez. — Ele
começou a rir, mas imediatamente ficou em silêncio quando viu o olhar
severo que sua mãe, Louisa, deu a ele. — Em todo caso, o serviço de bufê
que contratamos é o melhor.
Louisa Whitmore aproximou-se com seu marido, Jack, para abraçar o filho
mais velho.
—Faz tempo que não te vejo, Mike — disse com carinho. — A festa é no
pátio de trás, mas preferimos jantar em família mais cedo para conversar um
pouco.
— Parece bom para mim, mãe, mas não vou poder ficar muito tempo.
Tenho um caso importante que estou preparando.
— Não teria muita dificuldade em preparar casos se não tivesse deixado a
firma da família — A voz firme e ressonante de Jack entrou na conversa.
— Por favor, não vamos ao mesmo assunto — disse Louisa. — Deixe o
rapaz desfrutar de uma noite sem sua inquisição legal. Tudo bem?
Relutantemente, Jack assentiu.
— Vamos tomar uma bebida, pai. O que você acha? Talvez eu possa usar
algumas dicas suas— acrescentou Michael. — Tenho que lidar com alguns
de seus conhecidos no tribunal em breve. Ninguém poderia me dar pontos de
vista melhores do que você.
Esse comentário fez os olhos cinzentos de Jack brilharem. Ele gostava de
se sentir útil e sentia falta de exercer a profissão. Ele sofria do coração e o
estresse envolvido em lidar com casos complexos não lhe fez bem. Havia se
aposentado há um ano, apenas dois meses após a morte do avô de Michael.
Agora, a W&W estava nas mãos de Douglas e de três outros brilhantes
advogados que não eram da família.
— Isso mesmo, vão ao escritório — Louisa respondeu, aliviada por
Michael não ter começado uma discussão com o pai, como costumava
acontecer. Se virou para Douglas: — Por que não os acompanha? Sei que
você pode ajudar a resolver qualquer bagunça.
Douglas riu, sabendo que sua mãe queria que ele impedisse que o caráter
forte de Michael aparecesse com o choque de critérios profissionais que
costumava ter com seu pai.
— Farei isso por você, mamãe. Mas tente não deixar Lara cuidar de nada.
Ok?
— É apenas meu aniversário...— a esposa de Douglas protestou.
— Exatamente querida — ele disse antes de beijar sua linda esposa. —
Então hoje não quero te ver preocupada com nada além de se divertir com
suas amigas que estão para chegar e ter um bom momento com a família.
Você me promete?
— Somente se você me prometer que fará seu irmão viciado em trabalho
ficar até o final da festa ou pelo menos dançar com minhas amigas.
— Meu Mike precisa de um pouco de diversão, ele trabalha demais —
acrescentou Louisa. Sabia o quão devastador foi o divórcio de seu filho e,
embora quisesse curar seu coração, sabia que isso era feito pelo tempo ou por
uma mulher especial que conseguisse penetrar na armadura rígida que
Michael havia construído. — Certo, Douglas?
O advogado mais jovem dos Whitmore deu de ombros. Ele sabia que seu
irmão era muito bem-sucedido com as mulheres e que certamente não faltava
diversão na cama, mas esse era um detalhe que não podia ser discutido com
uma mãe. Exceto quando aquela mãe era uma romântica incurável e há muito
tentava brincar de cupido com o mulherengo de seu irmão.
—Com certeza, mãe. — Então ele olhou para sua esposa — Querida, farei
o possível para que fique um pouco mais, tem alguma amiga que possa lhe
apresentar...?
Lara riu e Louisa revirou os olhos antes de se afastar para cuidar de seus
netos.
—Seu irmão não está saindo com aquela especialista em cerâmica?
—Heidi Antholl. Faz quase seis meses, mas eu sei que é assediado por ela.
—Ele te disse?
— Eu o conheço, e o tempo médio de duração com seus amantes são de
no máximo meio ano. — Encolheu os ombros. — O dia em que meu irmão
se apaixonar novamente será um evento que vale a pena ver.
— Talvez nenhuma de minhas amigas tenha potencial para convencê-lo.
Douglas franziu a testa.
—E isso por quê?
Lara sorriu e abraçou o marido.
— São todas casadas.
Com uma gargalhada, Douglas foi se juntar a seu pai e irmão, mas não
antes de beijar sua esposa conscientemente de que ninguém estava
observando-os. Esperava que Michael algum dia pudesse superar a traição de
Ingrid.

***
Vinte e oito anos de idade, uma promissora carreira como contadora e
tinha que se vestir como bailarina do Moulin Rouge, pensou com humor.
Rachel se olhou de lado no espelho. Ela não gostava de se sentir exposta. Não
quando o traje, em uma versão moderna do que usavam no famoso cabaré de
Paris, consistia em uma tanga de lantejoulas mal coberta por uma longa cauda
de penas de pavão falsas.; um sutiã combinando que permitia que seus seios
parecessem mais volumosos que o normal; maquiagem que ela nunca usaria
em sã consciência; um cocar alto e elegante (pelo menos foi o que sua melhor
amiga havia lhe dado) e uns saltos estilo can-can muito chique. Uma
combinação um tanto bizarra, mas que parecia um Moulin Rouge moderno,
não tinha dúvida.
— Rachel, por favor, faça o seu melhor. Se esta cliente ficar satisfeita,
então recomendará meu serviço a suas amigas— Delaney Garth disse,
assoando o nariz. Havia contraído um resfriado.
— Já estou vestida, acho que não consigo ficar mais ridícula— disse
olhando a sua amiga com seus luminosos olhos azuis. — A que horas seu
motorista passa me pegar, Del?
Com cabelo preto, ao contrário do avermelhado de Rachel, Delaney Garth
era uma beleza morena. Parecia uma modelo da Victoria’s Secret.
Rachel costumava dizer a Delaney que as roupas bonitas que se
encaixavam como uma luva em sua amiga, nunca ficariam bem nela. Por
exemplo, aquela roupa que, em vez de fazê-la parecer sensual, parecia mais
uma oferta luxuriosa de prazeres e experiências sensuais que ela
absolutamente não oferecia.
Delaney riu. Tomou o comprimido para a febre e logo se deitou no sofá da
sala olhando para Rachel. Eram como irmãs. Passavam as férias juntas, a
menos que uma delas tivesse namorado, e geralmente no verão costumavam
ir a Kentucky, ao rancho que a família Garth tinha nos arredores de
Louisville.
As duas moravam no mesmo prédio no centro de Chicago, na região de
Gold Coast. Estavam indo muito bem financeiramente, então morar em um
dos condomínios mais caros da cidade não era problema. Rachel morava no
décimo segundo andar e Delaney no nono.
A única vez em que deixaram de morar nas proximidades foi quando
Delaney ficou noiva de um engenheiro eletrônico muito promissor, cinco
anos atrás. O garoto, Mauricio McCormann, morrera de um aneurisma
repentino e, desde então, Del preferia um pouco de solidão e se dedicava ao
seu negócio de organizar festas temáticas para solteiros. Como a daquela
noite, que se chamava Desejo no Moulin Rouge.
— Já te expliquei a dinâmica — respondeu, recolhendo as pernas no sofá
acolchoado. — Jim passará te pegar em alguns minutos. Quando chegar, não
desça do caminhão da empresa, mas também Jim ajudará com instruções
adicionais. Dançar é a coisa mais importante.
— Que clichê esse requisito — Rachel resmungou, colocando as mãos
nos seios. — Olhe isso, Del! Quase transbordam — gemeu com
aborrecimento —, sou tamanho 10, não oito, como você.
Delaney riu e então um acesso de tosse tomou conta dela.
— Ajuste um pouco a fantasia, para não parecer vulgar. Eu acho que você
deveria usar roupas um pouco mais apertadas para mostrar suas curvas.
Rachel revirou os olhos.
— Já é difícil mantê-las na linha com a academia. Ufff. De qualquer
forma, continue com a explicação antes que eu decida arruinar a empresa, não
cumprindo seu compromisso— ameaçou falsamente com um sorriso.
— Pegue este tema com filosofia. Escute. Depois que Jim te ajudar, você
canta e dança, então se aproxima do aniversariante e lhe dá um abraço.
—O quê?! Você não me disse isso.
— É só um abraço, Rachel. Não vai propor que ele durma com você.
—E depois o quê?
— Você se despede e desaparece com Jim, que a trará de volta para casa.
— Ou posso simplesmente me engasgar com todas a comida dessa festa
— disse cruzando os braços.
— Pelo menos, fará algo diferente do que permanecer no escritório com
números até o teto e analisando as estratégias de expansão da empresa que te
explora.
Rachel deixou cair os braços para os lados, mas não antes de passar uma
nova caixa de lenços de papel para a amiga, vendo que a última havia
acabado na lata de lixo.
— O ritmo de trabalho é difícil e sou perfeccionista. Não me explore, Del,
não exagere.
— Ah, é verdade, eu tinha esquecido que o chefe é louco por você e o que
ele quer é que fique mais tempo até que esteja convencida de que são o casal
perfeito.
Paul Eckhart, chefe de Rachel, era lindo. Por que negar? Ele era apenas
cinco anos mais velho que ela e era o principal advogado e o vice-presidente
executivo da empresa de fabricação de plásticos industrial mais procurada.
Echkart Enterprises.
Paul às vezes era muito irresistível. Ele nunca a pressionou, no entanto,
deixou suas intenções claras. Ela teve dificuldade em subir, os contatos de
Delaney eram inestimáveis ​para conseguir entrevistas de emprego, e ela não
queria jogar tudo fora por uma atração.
O mérito acadêmico funcionou após essas entrevistas de emprego e
recebeu várias ofertas de emprego. Eckhart Enterprises foi a melhor. Estava
na empresa havia seis anos e uma oportunidade que ela não queria destruir
devido a um caso com o chefe quando havia outros garotos tão interessantes
ou bonitos como Henry Duncan.
— Eu estou saindo com Henry, caso não se lembre — esclareceu. Já fazia
um mês que estava saindo com o carismático médico de internato. Se
conheceram através de amigos em comum. Gostava de Henry, e mesmo
tendo apenas cinco encontros desde que ele a convidou para saírem juntos,
ela gostava da ideia de vê-lo novamente. — Antes que pergunte, não estamos
saindo de forma exclusiva, embora tenhamos conversado sobre isso e,
aparentemente, ele, assim como eu, não tem tempo para flertar com várias de
uma só vez, quando gosta de uma em específico.
— Gosto do Henry, mas sinto que lhe falta uma faísca. Não parece
perfeito demais...?
— Eu acho que saí com muitos cretinos, então a resposta é "não". Se eu
encontro um homem celestial, por que devo reclamar se é perfeito demais?
— Mmm... talvez porque a longo prazo não há desafios ou metas para
estimular você se tudo é tão plano. Ao menos...— parou de falar quando viu
Rachel olhando para ela com impaciência. Del encolheu os ombros. Olhou
para o relógio. — Sem mais sermões, desculpe.
Rachel se aproximou e sentou-se ao lado de sua amiga.
— Eu não entendo assim, Del. Acho que depois do resultado horrível do
meu relacionamento com Ian, prefiro um relacionamento calmo. Henry
parece ideal para mim. Ela me trata como uma rainha e sabe me ouvir.
— Também na cama?
Rachel não pôde evitar de corar.
— Nós não chegamos a isso...
Delaney levantou uma sobrancelha.
— Então ainda há coisas a debater sobre o "perfeito" Sr. Duncan. Certo?
—Del! — disse rindo. — Você é impossível.
— Mas você me ama, então é melhor você ir. E lembre-se de que você
deve dançar ao ritmo da música sugestivamente...
—... e cantar como se fosse Marilyn Monroe — Rachel completou antes
de se levantar e pegar sua bolsa. Então ela vestiu o casaco.
— Você é minha esperança — Delaney disse piscando um olho.
— Ou seu bode expiatório.
Delaney sorriu.
— Você sabe que Elizabeth se demitiu para morar na periferia com sua
mãe doente, e eu não posso cobrir a vaga mesmo que seja a dona da empresa
por razões óbvias. — E como se seu corpo quisesse confirmar, naquele
momento espirrou.
— Só não esqueça que no próximo fim de semana me deve uma manicure
e um corte de cabelo. E, é claro, podemos incluir a Piper no pacote... se é que
consigo convencê-la.
Delaney revirou os olhos.
— Se esse é o pagamento que você deseja, aceite-o como garantido. Piper
precisa ser mimada um pouco mais em relação aos caprichos femininos —
disse com um aceno de cabeça. — Agora, nesta despedida de solteiro, haverá
apenas quarenta pessoas. Jim cuidará de você o tempo todo, caso alguém
tente pensar que é mais do que apenas uma dançarina do Moulin Rouge
fazendo um número especial. Ok?
— Ótimo. Eu vou indo — expressou quando o interfone no apartamento
de Delaney tocou. As duas sabiam que os seis apitos só eram dados pelo
motorista, Jim. — Vou levar esse saquinho de biscoitos de amêndoas. Estou
com fome e até terminar o número não poderei engolir nada. Até maaais! —
Fechou a porta atrás de si e foi pressionar o botão de chamada no elevador do
prédio.
Piper Galloway havia saído da prisão quatro meses atrás, depois de ser
julgada por um juiz por bom comportamento e por ajudar com pistas para que
a polícia pudesse localizar um dos mais procurados de uma gangue de
pequenos traficantes que trabalhavam no país e nas escolas de Chicago.
Rachel ainda estava ansiosa para saber quantos anos sua irmã perdeu de viver
por culpa de Michael Whitmore, mas a ideia de se vingar dele não saia de sua
mente.
Implicitamente ela e sua irmã concordaram não falar do tempo na prisão,
muito menos sobre o processo judicial. Rachel não gostou da ideia, mas
deixaria a irmã seguir seu próprio ritmo e, talvez, ao longo dos anos, pudesse
começar a se abrir e conversar. Apesar de saber que Michael morava em
Chicago, ela estava muito ocupada abrindo espaço para si mesma no mundo
profissional para procurá-lo.
No entanto, o pensamento de ver Michael humilhado continuava a
assombrá-la. Sua irmã estava melhor, mas não era a mesma garota alegre que
se lembrava. Ela acreditava no Karma. Sabia que cedo ou tarde faria que
Whitmore enfrentasse o seu...
C A P Í T U L O 4

—Tio Mike! — Moses disse quando viu a quantidade de comida que a


equipe de bufê havia distribuído no pátio da casa. — Tio Mike! — insistiu
quando viu que seu tio estava conversando com sua mãe e outros convidados.
Não teve preguiça e começou a caminhar decisivamente em sua direção, mas
não antes de arrastar seu irmão gêmeo, Alan, pela mão.
—O que aconteceu, tampinha? — Michael perguntou enquanto olhava nos
olhos excitados de seu sobrinho. Bagunçou o cabelo levemente. A criança
não hesitou e apontou para longe, para uma abertura no fundo da tenda.
Michael estreitou os olhos. Não viu nada além dos garçons andando de um
lado para o outro, o DJ e convidados que pareciam muito animados com o
aniversário de Lara.
—Lá, tio Mike!
— Não vejo nada além da tenda, Moses — respondeu sorrindo para o
garoto.
Em menos de uma hora, a tenda azul estrategicamente colocada no amplo
quintal havia sido preenchida. Acostumados ao frio da cidade, as lareiras
externas eram mais do que suficientes para aquecer os convidados. Havia
cerca de cinquenta pessoas.
Lara e Douglas gostavam de comemorar seus aniversários. Michael, desde
seu divórcio, preferia pegar um avião e curtir uma praia paradisíaca com uma
mulher bonita e esquecer que foi em um dia de seu aniversário em que seu
casamento se tornou um inferno.
— Deixe seu tio em paz, querido — interveio Lara.
Douglas abraçou a esposa e a beijou na bochecha.
— Papai, é que chegou um bolo gigante! — exclamou a criança mexendo
as mãozinhas. — Eu quero comer tudooo.
Os adultos sorriram.
— Eu também quero comer! — Alan gritou, sempre apoiando o que seu
irmão fazia ou dizia, que era mais velho por só dois minutos.
De repente as luzes se apagaram. Os convidados soltaram exclamações de
ansiedade. O único que não estava inquieto era Douglas. Havia contratado o
melhor mágico de Las Vegas porque sabia que Lara adorava esse tipo de
show. Abraçou a esposa e sussurrou em seu ouvido: — Surpresa, querida!
Aproveite a apresentação de Jasper Blake.
— Você é o máximo — Lara murmurou, sorrindo.
Pouco a pouco, luzes fracas começaram a surgir do fundo da tenda.
Michael finalmente concordou com os gêmeos quando viu um bolo gigante
chegar. Seu irmão tinha o costume de sempre sair com alguma bobagem para
ver Lara sorrir. Às vezes, se perguntava se acreditaria em um relacionamento
de longo prazo novamente. Mas não era um pensamento que tirava seu sono.
Enquanto continuasse desfrutando de prestígio profissional e de uma mulher
que entendesse seu acordo de prazer e conveniência, o resto não lhe
importava nem um pouco.
Douglas não sabia como seria o truque do famoso mago californiano, mas
continuou a brincadeira rindo enquanto várias velas se acendiam
simultaneamente ao redor do bolo de três andares. Aquele artefato era tão
grande que cabia uma pessoa dentro.
A música de feliz aniversário começou a tocar com acordes de guitarra.
Uma banda de músicos improvisava, e o DJ, observava o número. Nesta
ocasião, os convidados aplaudiram quando o bolo ficou no centro do pátio,
movido por dois garçons vestindo smoking e gravatas vermelhas.
—Você foi brilhante desta vez— murmurou Michael rindo, enquanto
Douglas franzia a testa ao não ver Blake em nenhum lugar. Lara observava
com entusiasmo. Moses e Alan estavam com os olhos arregalados. — Vamos
ver que truque de mágica sai nesta apresentação.
Em resposta, Michael recebeu um grunhido de seu irmão.
A tampa superior do bolo se abriu em meio a um turbilhão de serpentinas.
Momentos depois, uma modelo começou a subir com um sorriso
resplandecente. “Curvas de matar e um corpo feito para pecar”, Michael
pensou engasgando com o licor que estava bebendo no momento em que a
mulher exótica apareceu por completo.
— Claro que Jasper Blake está saindo agora — Douglas murmurou cada
vez menos convencido. Acenou para sua mãe, e ela levou os pequenos com
discrição. As crianças protestaram, mas o olhar fulminante da avó as
silenciou. Louisa podia ser doce, mas também muito severa quando
necessário.
— Não entendi nada — murmurou Lara, já não havia riso. Franziu a testa.
— Espero que não tenha pensado em fazer uma despedida de solteiros no
meu aniversário.
— Isso é exatamente o que parece — Michael interveio, cutucando seu
irmão gentilmente nas costelas.

***
Rachel não imaginou que teria claustrofobia quando Jim lhe disse para
ficar dentro do bolo falso até ouvir as primeiras notas da banda cantando uma
melodia. Assim que recebeu o sinal e a tampa do bolo foi aberta, ela ativou a
alavanca interna que levantava uma pequena plataforma. Quando vislumbrou
um grupo de pessoas curiosamente silenciosas, se agarrou ao seu papel e
silenciosamente amaldiçoou Del. Que diabos era essa festa? Tinha mulheres,
algo bastante estranho se era uma despedida de solteiro e o aniversário do
referido homenageado.
Como se isso não bastasse, as roupas que essas pessoas usavam pareciam
metros e metros de tecido quando comparadas às suas roupas.
Definitivamente ia matar Delaney. Mas o show tinha que continuar, e se ela
entendeu mal a mensagem e sim era a festa ou uma piada ou qualquer coisa
pela qual tinham pagado sua melhor amiga, então não podia deixar de fazer a
apresentação. Arruinaria a reputação de Delaney. Não poderia fazer isso com
ela.
Tomou coragem e deu a mão a Ronald, um dos garçons que estava no
show, que a ajudou a descer as escadas laterais que tinham colocado abaixo
com um mecanismo elétrico na estrutura. Armou-se de coragem e entoou a
canção de feliz aniversário. Não tinha a melhor voz, mas ao menos era
afinada.
Quando terminou de cantar, uma música sensual ao estilo francês
começou. A essa altura, ela já havia percebido que sua melhor amiga a havia
enviado para a casa errada. Não sabia o que fazer, então decidiu sair o mais
rápido que essas plataformas permitiam. Estava vivendo um grave erro
logístico.
— Não tenho ideia de onde está Bronson — Rachel disse pegando o
microfone com força, enquanto sentia as pernas tremendo. Usou a voz mais
firme que pôde. — Imagino que certamente o encontro em outra festa — riu
nervosa — de qualquer forma, independentemente do que comemoramos
hoje, bem, feliz aniversário! — ela exclamou antes de se virar e caminhar
rapidamente pela abertura traseira da tenda.
Oh, Deus. Ela se afastou o mais rápido que pôde até chegar a um ponto
distante. Procurou em sua bolsa o telefone. Ligou para Delaney.
—Que diabos, Delaney?! Esta não era uma despedida de solteiro do noivo
nem seu aniversário— ela mal soltou Del respondeu.
—Ah?
A Rachel encontrou uma cadeira bastante caindo aos pedaços, mas servia.
Quando se sentou, sentiu sua bunda congelar. Ela fez um gesto para Jim
esperar por ela, o homenzinho assentiu, enquanto a equipe de Delaney movia
o bolo gigante em direção ao caminhão.
—Acorde de uma maldita vez! — exigiu, mais mortificada do que
irritada. — Acabei de sair do seu famoso bolo e encontrei uma família
atordoada, enquanto me contorcia em um traje dois números menor, cantando
como se não houvesse amanhã e olhando para o nada porque não havia
Bronson, mas alguns rostos rosados, risos dissimuladas e tosses afetadas.
Nunca tinha passado tanta vergonha em público.
—Oh, raios! Espera um segundo...— Delaney procurou na gaveta do
criado-mudo para localizar sua pasta de trabalho. Ligou a lanterna do iPhone.
— Não é 833 W Webster Avenue o endereço?
Rachel cobriu o fone e pediu a um dos garçons que passava para lhe dizer
o endereço exato da casa. Quando ele comentou, ela abaixou a cabeça e
deixou escapar um gemido de frustração.
—Del... esta é a 866... —resmungou.
—Oh… OH, DEUS! — Delaney gemeu fechando os olhos. — Vão exigir
um reembolso mais o dobro do dinheiro por quebra de contrato —sussurrou
desesperada.
— E quanto a mim? Acabo de passar o maior ridículo da minha vida e
nem é o endereço certo. — Delaney ia responder, mas Rachel continuou: —
Não se atreva a dizer que eu tome isso como lição!
Incapaz de evitar, cansada e com dor de cabeça, Delaney riu alto. Rachel
se contagiou. Del pediu desculpas, mas estava claro que a amiga desse
Bronson Clark, e que havia contratado sua empresa, a processaria na melhor
das hipóteses.
— Não ia fazer tal coisa... amanhã terei que lidar com uma cliente irritada
— queixou-se cobrindo a cabeça com o cobertor.
— Terá o que merece —sussurrou Rachel. — Agora vou tirar esta
fantasia, antes que pegue uma pneumonia.
— Sinto muito, Rachel.
A ruiva suspirou.
— Imagino que seja uma boa história contar aos meus filhos um dia, e
vou rir com você e com o seus.
—Viu? isso é tomá-lo como lição — Delaney respondeu pensando na
explicação que deveria dar no dia seguinte. Ela estendeu a mão e apagou a
luz. — Desculpe mesmo, Rachel. Jim vai te levar para casa.
— Acho que é muito tarde — sussurrou observando o motorista de
Delaney se afastar. Não podia gritar que a esperasse. — Acho que Jim pensa
que quero perambular por aí nessa festa. Eu disse para ele me esperar, mas...
—Foi embora?
— Está fazendo isso.
— Grite que eu pago horas extras!
— Acho que me fiz de idiota o suficiente por hoje, Del.
— Ok... eu te envio um táxi?
— Não se preocupe. Vou trocar de roupa e depois eu mesma pedirei.
Esses tipos de mansões geralmente têm banheiros de hóspedes na parte de
trás.
— E piscina... —murmurou Delaney. — Estou dormindo…
— Sim, vá descansar. Até amanhã.
Rachel colocou o telefone na bolsa e esperou em silêncio, ouvindo o riso
das pessoas na tenda. Provavelmente, estavam tirando sarro do que
aconteceu. Com resignação, pegou uma pequena mala na qual usava suas
roupas habituais para trocar de roupa. Encontrou uma pequena casa de
hóspedes nos fundos, no lado oposto da casa. De onde estava, podia ver as
sombras dentro da tenda.
A porta da casinha estava aberta. Obervou o interior e, quando encontrou o
banheiro, entrou. Tirou o rabo de pavão e relutantemente o guardou.
Demorou vinte minutos para tirar a roupa.
A maquiagem não podia tirar, mas tudo bem, faria isso em casa. Vestiu
jeans, botas pretas até à panturrilha, blusa cinza, lenço branco e jaqueta de
couro para protegê-la do frio. A imagem no espelho era menos embaraçosa
do que a que ela certamente deixou entre os convidados a alguns metros de
distância dela.
Sorriu e abriu a porta de repente. Pegou seus pertences e caminhou até a
entrada principal, apenas para encontrar uma figura recortada pela luz. Gritou
e derrubou as coisas no chão. Se preparou para correr, mas a voz que ouviu a
deixou plantada.
— Uau, a dançarina do... Moulin Rouge? — perguntou o homem que
durante anos, muitos anos, assombrou sua cabeça. Ela o reconheceu quando
ele se aproximou e a luz escassa do ambiente iluminava aquele rosto
cinzelado por algum mestre renascentista. — Eu estava procurando por você,
porque ninguém explica o que aconteceu.
— Uma missão louvável que você recebeu — disse com o coração
acelerado. Não podia acreditar no que estava acontecendo.
Michael Whitmore continuava sendo extremamente atraente. Muito bem
barbeado e com aqueles deslumbrantes olhos verdes não era fácil ignorar. O
traje casual destacava seus músculos. Lembrava dele sarado. Agora tinha uma
figura mais ampla e masculina. Irradiava força e virilidade. Desejou dar um
tapa em si mesma por fazer análises que não correspondiam. Não com um
homem assim.
— Por sorte, vi uma cauda de pavão se afastando pelo grande quintal da
minha família— olhou-a de cima a baixo — e que agora já desapareceu.
Curioso, não acha?
Rachel encolheu os ombros. Não estava preparada para enfrentá-lo.
Improvisava, e esperava estar fazendo bem. Não queria lhe jogar tudo o que
pensava na cara dele. Pareceria uma louca saída do manicômio mais próximo.
Que piada do destino era aquela?
— Um equívoco estratégico da dona da Party Themes, sem dúvida —
respondeu. A voz não tremeu. Deveria invocar a fúria que manteve por tantos
anos, mas quem atendeu seu chamado emocional foi o desejo de sentir se
aqueles lábios sensuais continuavam a se beijar tão bem quanto no passado.
— E você é...? — perguntou fingindo ignorância. Por nada no mundo teria
confundido aquele rosto.
Michael sentiu que o rosto era vagamente familiar, mas não conseguia se
lembrar de onde. Perguntar se eles já haviam se conhecido antes era uma
frase feita para flertar, e ele tinha idade suficiente para interagir com uma
mulher dessa maneira. Não teria procurado por ela se Lara, morrendo de rir,
não tivesse pedido por isso. Sua cunhada queria uma explicação. Seu irmão
estava mortificado, e seu pai, Jack, não parava de provocá-lo dizendo que era
ele, e não Douglas, que havia arranjado a surpresa para Lara.
À distância, considerara a mulher à sua frente bonita, mas de perto... ele
não podia descrevê-la. A imagem daquele corpo, envolto em glitter e roupas
provocantes, permaneceria impregnada por muito tempo.
—Michael Whitmore — ele disse estendendo a mão para Rachel. Ela não
hesitou em apertá-la, mas afastou-a rapidamente, como se tivesse tocado um
ferro em chamas. — Sou o cunhado da homenageada. Você se importaria de
explicar o que aconteceu? Meu irmão está muito indignado, porque
aparentemente sua surpresa se tornou zombaria.
Ela não era a favor de explicar nada a ninguém, exceto àquele homem que
havia destruído sua vida familiar. Tentou se acalmar.
— Minha amiga, a quem estou fazendo o favor de substituir, confundiu o
número da casa. Aparentemente a festa para a qual me vesti hoje é em outro
lugar —respondeu. — Gostaria de me desculpar com sua cunhada. Espero
que...
— Bobagem, sem desculpas. Lara é uma mulher muito relaxada a nesse
sentido. Se divertiu. Acho que a mais mortificada é você. E stou errado? —
perguntou. Sem pensar no que estava fazendo, ele estendeu a mão e colocou
no lugar um grampo de cabelo que ameaçava escorregar dos cabelos lisos de
Rachel. Instintivamente, ela recuou. — Desculpe, não queria incomodá-la —
acrescentou ao ver sua reação.
— Não gosto que estranhos se aproximem de mim assim. Você me pegou
de surpresa, porque eu estava saindo...— Ele se afastou. — E sim, claro que
estou mortificada. Imagine planejar ir a uma despedida de solteiros e acabar
seminua no pátio de uma família aparentemente conservadora.
Michael soltou uma longa risada. O som era requintado, como o melhor
chocolate enquanto derretia na boca. Quente e tentador.
— Minha família não é conservadora, mas esse tipo de surpresa é tão
estranha que é impossível que não aflorem os sorrisos. Está com pressa?
Ela queria fugir, mas ia aguentar. Agora que tinha Michael em carne e
osso, aproveitaria a oportunidade que o destino lhe dava.
— Faz um pouco de frio. Gostaria de falar primeiro com sua cunhada e
depois pedir que você me dê uma taça de algo para me ajudar a tirar o frio.
Michael assentiu.
— Claro. —Sorriu. — Devo estar perdendo minhas habilidades como
advogado, porque ainda não perguntei como você se chama dançarina do
Moulin Rouge.
Então não se lembrava dela, pensou Rachel. Não conseguia entender por
que esse ridículo lhe causara um ligeiro desconforto. Por que deveria se
lembrar dela? Quase uma década se passou.
—Verônica Marsh — disse rapidamente. Tinha que inventar uma maneira
de descobrir sua fraqueza e fazê-lo sentir a dor da perda e da desolação. Só
então sentiria que tinha conseguido fazer algo por Piper. Por sua família.
Agora tudo o que contava era o golpe de sorte do destino. E tiraria vantagem
disso.
— Prazer em conhecê-la, Verônica — Michael disse, alheio as suposições
da mulher sensual que tinha ao seu lado. Rachel não estava mentindo.
Verônica era seu nome do meio e o sobrenome era o nome de solteira de sua
mãe. Em teoria, ainda era ela. Certo? — Tenho certeza que minha família e
amigos vão gostar muito de ouvir o que aconteceu.
Sem lhe dar tempo, Michael se inclinou e pegou a bagagem leve de
Rachel. Ela olhou para ele pronta para discutir, mas preferiu não fazer isso.
Deixou que a guiasse até um beco lateral e logo deixou seus pertences em
uma salinha privada.
Sem dizer uma palavra, ele a levou para a festa, onde os donos da casa
estavam. Era o começo do fim para Michael Whitmore, Rachel pensou com
um sorriso deslumbrante que o belo advogado confundiu com o prazer que
acreditava que sua companhia lhe causava.

***
Michael observava a ruiva com prazer. Era vibrante e seu sorriso parecia
preencher a festa. Lara e Douglas aceitaram a situação de bom grado, assim
como outros convidados que vieram ver o riso de Jack Whitmore enquanto
Verônica falava sobre a trapalhada de uma tal Delaney.
O telefone vibrou no bolso, tirando-o de seus devaneios. Quando ele viu
que era Heidi, ignorou a ligação, silenciando-o. Guardou o celular
novamente.
Com as mãos nos bolsos se apoiou contra o batente da porta corrediça que
dava para o pátio. Amava sua família. Daria qualquer coisa por eles, em
especial por seus sobrinhos. Esses diabinhos eram sua fraqueza. Quando
notou o olhar de Verônica, como se estivesse procurando por ele, Michael se
aproximou.
— Sua família é muito gentil —disse ao vê-lo—, mas é hora de me retirar.
Amanhã eu tenho que ir ao escritório e acordar tarde não está nos meus
planos.
—Eu posso te levar para casa? — ele perguntou sem acreditar que tinha
feito essa pergunta. Poderia ter sugerido chamar um táxi, mas não levá-la
como se fosse um maldito encontro. O que diabos havia de errado com ele?
Rachel hesitou. Olhou discretamente ao redor e notou que aqueles que
estavam ouvindo a sua história sobre Delaney, a gripe e a confusão estavam
agora ouvindo Lara. Gostou da dona da casa imediatamente e de Douglas
também. Este último era uma espécie de réplica ligeiramente mais jovem de
Michael, mas com uma personalidade mais calma e características menos
fortes. “Pelo menos eles tiveram a chance de crescer juntos”, pensou com
ressentimento. Isso a fez lembrar que a última coisa que ela deveria sentir por
essa família era simpatia. Muito menos com Michael.
— Ok, obrigada —murmurou. A ideia era conhecer o inimigo em seu
terreno, e por esse motivo, e nenhum outro, aceitou que a levasse para casa.
O trajeto estava cheio de notas de Jazz. Era o tipo de música que Rachel
gostava muito. Ela se dedicou a apreciar a melodia. contou-lhe banalidades, e
ela respondeu com outras. Foi uma conversa agradável, e se irritou ao
reconhecer que ele podia ser encantador. Ela não precisava encontrá-lo de
nenhuma forma, o que queria era descobrir uma fraqueza. Uma maneira de
alcançá-lo e machucá-lo.
O carro elegante estacionou em frente à porta do prédio da Rachel. Antes
que ela pudesse sair, ele saiu e abriu a sua porta. Agora parecia que era um
cavalheiro? Sei!
— Obrigada Michael. Acho que, como falei a Delaney, será uma boa
história para contar aos meus filhos. E você, talvez aos seus — disse com um
sorriso forçado, enquanto tirava as chaves da bolsa e ele deixava a mala no
portal. Aos seus pés.
— Talvez —sorriu. — A que horas você sai do seu escritório amanhã? É
sábado, acho que você não vai ficar o dia todo. Ou sim?
O olhar intenso que lhe deu fez suas pernas tremerem. Só um pouco. Eram
aqueles olhos que a assombraram todos esses anos. Um beijo que nunca tinha
esquecido. O toque de sua boca em seus seios. Suas experiências sexuais não
haviam sido ruins, no entanto, ela estava convencida de que com ele teriam
sido melhores.
— Provavelmente às quatro da tarde. Como eu disse, a empresa em que
trabalho tem muitos projetos constantemente. Eu sou a responsável pela
equipe de coordenação de negócios. Têm que me consultar, e eu, informar
relatórios.
— Uma mulher independente e inteligente. Eu gosto — disse acariciando
sua bochecha. — Eu acho que desde que você não precisa substituir ninguém
dançando como uma garota do Moulin Rouge— Rachel não pôde deixar de
rir. Ela odiava que fosse tão fácil se sentir confortável com ele —, poderia
sair para jantar comigo.
Então ela teve uma faísca. A maneira de alcançar um homem era de duas
formas. A primeira não funcionaria, pois não sabia cozinhar. A segunda, sim,
que poderia conseguir. Gostava de sexo tanto quanto qualquer mulher em sã
consciência. E apesar de nunca ter tentado, estava convencida de que poderia
separar sentimentos e prazer. Não poderia ser tão difícil, poderia?
Seduziria Michael. Faria com que se apaixonasse por ela, e quando isso
acontecesse, então o humilharia na frente de quem mais lhe importava. O tipo
de homem como Michael não podia suportar desprezo social. Ela sabia disso
melhor do que ninguém. Não é de surpreender que, durante todo esse tempo
vivendo em Chicago, conheceu muitas pessoas que se encaixavam em grande
parte no tipo de pessoa que Whitmore chamaria de "amigos".
— Poderia —respondeu com um objetivo claro em mente —, tudo bem
se você passar para me pegar amanhã às sete?
Michael assentiu. Se sentia exultante. Queria, acima de tudo, beijá-la.
Seduzi-la e se envolver em seu perfume feminino. Mas antes tinha que falar
com Heidi. Não era o tipo de homem que poderia estar com uma mulher,
independentemente das condições de seu relacionamento, enquanto beijava
ou dormia com outra pessoa. Ele não pretendia ir contra seus próprios
princípios masculinos, por mais tentado que estivesse. Tinha aprendido que
deixar-se levar pelas emoções constituía uma perda de tempo.
Na manhã seguinte, sua primeira atividade de fim de semana seria terminar
com Heidi. Para o inferno com convites para eventos que já haviam aceitado
juntos. Levaria Verônica e aproveitaria ao lado dela. O destino tinha as
maneiras mais deliciosas de surpreendê-lo, e ele estava mais do que satisfeito
com aquela linda ruiva.
— Parece bom. Descanse, Verônica — murmurou muito perto de seus
lábios.
Ela pensou que Michael a beijaria. Teria jurado que essa expressão de
tortura e desejo era mútua. Enganou-se. Não deixou transparecer sua
decepção quando no último instante, ele se desviou e deu um beijo em sua
bochecha.
Quando Michael se afastou, o vento frio cobriu o calor daqueles lábios.
—Eu... obrigada.
Com uma piscadela, Michael foi embora.
Quando fechou a porta do seu apartamento, Rachel se repreendeu
severamente. Podia desejar esses beijos, mas não se deixar levar pelas
emoções. Devia lembrar-se de seu propósito. Quem tinha vantagem e sabia
controlar-se ganhava o jogo. Um jogo, neste caso, que Michael nem
suspeitava estar jogando e perderia de maneira monumental.
C A P Í T U L O 5

Michael não conseguia acreditar como, em menos de vinte e quatro horas,


ele passara de expectante a desesperado. Andava de um lado para o outro na
sala de emergência. Seus sobrinhos sofreram um acidente ao voltar do treino
de beisebol no sábado no ônibus da equipe infantil. Embora Alan não
jogasse, sempre acompanhava seu irmão. Eram inseparáveis, mesmo que não
compartilhassem passatempos.
Uma das vinte crianças que estava no ônibus acabara de falecer. O grito de
dor da mãe fez o Michael arrepiar-se. Sua família estava em choque e
aguardava notícias do médico. Estavam no hospital há horas.
Moses foi o mais atingido, pois estava do lado da janela quando o
caminhão de refrigerante derrapou na neve e bateu naquele lado. Alan foi
jogado contra um dos assentos adjacentes e recebeu uma forte pancada.
Segundo o que disseram, o motorista do ônibus infantil, assim como o do
caminhão de refrigerantes, morreram pelo impacto.
O hospital em que se encontravam era aquele em que Michael costumava
fazer doações regulares para várias pesquisas médicas. Quando a equipe
médica soube que seu sobrinho estava hospitalizado, lhe deram uma sala
privada para ele e sua família.
Eu estava nervoso. Aterrorizado. Essas duas crianças ocupavam um lugar
muito importante em sua vida. Sentia uma profunda pena por seu irmão.
Jamais tinha visto Douglas tão abatido.
— Sr. e Sra. Whitmore — disse a Dra. Anastasia Collins entrando na
sala.
O rosto da mulher denotava tranquilidade. Não era preciso que dissessem
ao Michael que chegavam más notícias. Algo dentro dele gritava. Sentiu
Louisa agarrada firmemente ao seu braço, e Jack tentava controlar a sua
angústia apertando a mandíbula. O pior para Michael foi observar seu irmão e
cunhada com rostos desolados, levantando-se quando o médico os chamou.
—Quais as notícias? — perguntou Douglas, que suspendeu seu voo para
Delaware por causa de um caso com uma multinacional ao saber do acidente.
Lara olhava suplicante para a médica, como se assim pudesse receber as
notícias pelas quais ansiava: que seus filhos estavam fora de perigo. — Não
nos deixe esperando —suplicou.
A pequena Gália agarrou-se à mão da mãe. Ela apertou seus dedinhos com
carinho e angústia ao mesmo tempo.
— Moses vai se recuperar. Precisará de intervenção cirúrgica, pois seu
braço esquerdo está quebrado na altura do pulso. Precisaremos da sua
autorização por escrito. — Entregou-lhes alguns formulários que o casal
prontamente pegou em suas mãos, começaram a preenchê-los e depois
entregaram ao especialista. — Ele é pequeno, seus membros são flexíveis e a
recuperação não vai demorar muito. — Os pais assentiram.
—E Alan? — Michael perguntou em voz baixa.
Embora estivesse acostumada a dar más notícias, para a Dra. Collins, ver o
rosto de desespero e dor nos pais continuava sendo devastador. Tratava seus
pacientes como se fossem de sua própria família. Era um erro, dizia o seu
marido, mas Anastasia não podia evitar.
— Sinto muito... o garoto entrou em coma. — Isso foi o suficiente para
Lara desmoronar nos braços de Douglas com um gemido de partir o coração.
— Estamos monitorando, e o prognóstico é reservado.
—Mesmo para a família? — Michael queria saber, enquanto puxava Galia
para o seu lado, como se a garota pudesse lhe dar forças.
— Por enquanto é assim. À medida que evolui vamos informando —
respondeu. — Tenho que ir para a sala de cirurgia para organizar a cirurgia
do Moses. — Leu rapidamente os formulários para verificar se os Whitmore
não tinham esquecido de assinar nenhum dos papéis. Uma vez satisfeita, ela
assentiu. — Notificarei detalhes, mas não é uma intervenção arriscada.
Quando a doutora saiu, Gália puxou a mão de Michael. Ele a olhou.
—Alan vai ficar bem, tio?
— Devemos manter a esperança de que assim será. Que tal você vir
comigo para tomar uma xícara de chocolate quente, princesa? — perguntou,
ciente de que seu irmão, seus pais e cunhada eram incapazes de expressar
suas preocupações na frente da menina.
Galia, com seus lindos cabelos ondulados da cor da noite mais escura e
olhos verdes brilhantes como os de Michael, olhou para os pais. Eles
assentiram com um sorriso que não alcançou seus olhos. Mas a pequena de
nove anos não precisava notar isso.
— Claro tio Mike.

***
O Hospital Saint Cleare não era estranho para Rachel. Seus pais foram
hospitalizados em estado crítico quando sofreram o acidente. Passou vários
dias nos arredores da sala, até que lhe disseram que não os veria novamente.
Toda vez que pensava nos quatro dias tempestuosos vividos, inalando o
cheiro de desinfetante, ficava mal.
Quando recebeu a mensagem de Michael, dizendo que estava em uma
emergência familiar naquele hospital, ela perguntou se havia algo que
pudesse fazer. Ele respondeu que não era necessário, pois já tinha o suficiente
tentando confortar sua família. Uma parte, a que não estava ligada às suas
intenções de se vingar daquele homem, a levaram a seguir para o centro
médico. Descobrir que eram dois inocentes em uma sala de emergência, a
comoveu.
A saúde de dois pequeninos não precisava fazer parte de seu plano.
Deixaria de lado por esse dia ou até que Michael estivesse totalmente
recuperado. Um inimigo caído pelo destino não representava a mesma vitória
como se a queda fosse causada por ela. Claro que não?
Se os papéis estivessem invertidos, e fosse Michael quem estivesse
buscando vingança, não teria agido como ela? A vingança de um homem e
uma mulher era diferente? Ela não acreditava.
—Como disse que se chama? — a estranha perguntou com uma voz
nasalada. — Não te vi em nenhuma das festas em que Michael e eu
costumamos ir.
—Verônica — respondeu cruzando os braços na sala de espera. Já havia
enviado uma mensagem para Michael dizendo que estava no hospital. Sentia
náuseas e vontade de fugir, mas não era uma covarde. Estar lá a fez enfrentar
seus medos, o passado, e também a lembrava do porquê estava sendo gentil
com os Whitmore.
A mulher sorriu.
— Sou Heidi, a namorada de Michael — expressou estendendo-lhe os
dedos de manicure perfeita e cheia de decorações douradas. Não parecia de
mau gosto. A mulher exalava sofisticação por cada poro. — Vim o mais
rápido que pude. Descobri por acaso — começou a contar sem que ninguém
lhe perguntasse —, porque uma das enfermeiras é minha amiga. Michael é
tão reservado. Coitadinho, não acha? Tão sobrecarregado que não teve
oportunidade de me avisar— disse com um beicinho.
— Coitadinho, sem dúvida —Rachel respondeu com um resmungo. O
canalha tinha namorada e pretendia sair para jantar com ela. Não deveria
sentir um pingo de raiva. Era sobre essa tal de Heidi atrapalhando seus
planos, e nada mais do que isso, certo?
— Como você ficou sabendo? — perguntou a mulher olhando de um lado
para outro.
—Casualidades do destino — Rachel disse com um sorriso.
Quarenta minutos mais tarde, o inconfundível porte de Michael apareceu
frente a Rachel. Apesar do cansaço óbvio e dos cabelos despenteados, ele
parecia tão bonito quanto se lembrava. Ela sentiu vontade de se levantar e
abraçá-lo para oferecer conforto, mas se conteve. Pensou que Michael
abraçaria Heidi sem se importar com mais nada, por isso a resposta a sua
presença a pegou desprevenida.
—O que está fazendo aqui Heidi? Hoje de manhã, deixei bem claro que
tínhamos terminado.
Rachel desviou o olhar.
— Mas pensei que tinha dito isso apenas porque estava sobrecarregado
pelo trabalho. Nosso acordo é mais do que conveniente para nós dois, querido
— sussurrou sorrindo, enquanto colocava sua mão no peitoral da camisa
azul. Passou as unhas vermelhas pela costura do pescoço.
Ele afastou as mãos dela com firmeza.
—Pensou errado, Heidi —respondeu. — Agradeço a solidariedade, mas
preferiria que estivesse fora deste momento familiar.
—E essa garota é quem? — perguntou com ressentimento não
dissimulado, olhando a Rachel.
Rachel olhava para o teto. Como se não fosse com ela a conversa. Estava
arrependida de ter ido ao hospital. Estava se passando por idiota. Quem lhe
explicou os inconvenientes de se vingar sem conhecer o terreno?
— Verônica é bem vinda. Já conhece minha família — Michael
respondeu, muito desconfortável. Eu não tinha tempo para lidar com Heidi e
não tinha ideia de como ela descobriu.
— Não me diga... que surpresa. Ela é minha substituta? — perguntou,
pegando sua bolsa Gucci com firmeza e olhando-o com raiva.
— Nenhuma mulher é uma substituta para outra, especialmente quando
não há amor, Heidi.
— Apenas sexo — lisonjeou a mulher, antes de olhar para Rachel com
raiva e sair com pressa da sala de espera.
Michael passou os dedos entre os cabelos.
— Sinto muito, Veronica. Normalmente não costumo tratar ninguém
assim, mas Heidi e eu...
— Oh, não precisa me explicar —mentiu. — Eu vim sem ser convidada.
Então, se você prefere ficar sozinho, a verdade é que eu entendo. Só pensei
que talvez precisasse de companhia— riu sem alegria —, às vezes tendo a
supor situações em minha mente que, bom, não são precisamente as mais
adequadas.
Michael olhou para ela.
— Agradeço que tenha vindo. Eu preciso de um sopro de ar fresco e um
sorriso genuíno. Tem sido horas muito difíceis— ele disse se aproximando.
Sem pensar no que fazia, Rachel encurtou mais a distância, para abraçá-lo.
O calor que emana de Michael a envolveu. Sentindo aqueles braços fortes ao
seu redor, ela começou a se sentir confortável. Não era o que precisava,
quando voltou a si, se afastou.
—Houve uma evolução na saúde de seus sobrinhos? —quis saber.
Ao sentir a mudança nela, não disse nada. Ele franziu os lábios enquanto
se lembrava de seus sobrinhos.
— Moses está na sala de cirurgia. Alan em coma.
—Oh... sinto muito mesmo, Michael. — Lembrou que aqueles dois
pequenos estavam pulando de um lado para outro no dia anterior. Sentiu
pesar por ambos. — Comeu alguma coisa durante todo esse tempo?
Ele negou.
— Meus pais acabaram de sair para se trocar e descansar, mas meu irmão
e sua esposa continuam aqui. Quando disse a eles que a dançarina do Moulin
Rouge estava aqui, sorriram. —Rachel riu. — É o primeiro sorriso em mais
de dez horas. Pelo menos é um sinal de que vir foi uma ótima ideia. Obrigado
Verônica. É melhor eu comer alguma coisa antes de desmaiar por falta de
comida e ter que acrescentar mais uma preocupação...
Ela não queria a gratidão de Michael, porque isso gerava um peso leve,
muito leve, de consciência. Mas será que ele tinha peso na consciência ao
condenar uma mulher inocente à prisão? Claro que não!
—O que acha se formos tomar um café? Seu sobrinho ficará na sala de
cirurgia por um tempo, e não será legal que o tio não possa vê-lo por falta de
forças
Ele assentiu e começaram a caminhar em direção à saída.
Na mente de Rachel se conjuravam várias imagens que estavam longe das
que tinha de Michael. Em dois dias e poucas horas, ele parecia de tudo menos
esse inescrupuloso, ruim e desalmado advogado que ela acreditava. Mas se
ele aprendeu alguma coisa ao longo dos anos, não foi para se deixar levar
pelas primeiras impressões. Precisava continuar cavando.
— Imagino que no final, sim teremos nosso jantar...— Michael
murmurou sorrindo para ela e tirando-a de seu devaneio. — Com um toque
diferente, nada mais.
Ela devolveu o sorriso.
— Você já sabe que os planos mudam de um momento para o outro.
— Exceto pela intenção por trás deles — continuou com voz rouca,
observando-a enquanto abria a porta do restaurante que estava em frente ao
hospital. Era um Wendy´s, mas não estava indo a lugar algum fora do
perímetro de onde sua família estava.
—Tem certeza? —Rachel perguntou, enquanto entravam na fila para
pedir.
—Totalmente — ele respondeu, seu olhar fixo nos olhos azuis da garota.
Pelo menos a ideia de flertar com ela o afastou das preocupações da
família. Quando o inferno que ele estava atravessando passasse, tinha toda a
intenção de seduzir Veronica Marsh, sem importar como os planos haviam
mudado.
C A P Í T U L O 6

Rachel chegou em casa pronta para tomar um banho com a sensação de


que estava sendo tola se preocupando com o bem-estar dos Whitmore. A
maneira amorosa com que todos pareciam se apoiar gerou uma emoção
agridoce. Aquelas cenas familiares eram tudo o que ansiava e tudo que
acreditava ter sido roubado de sua vida. Michael.
Quando estava na frente da TV com uma tigela de pipoca, recolheu as
pernas no sofá confortável e ligou o canal de notícias. Zapeou. De má
vontade, desligou a tela e fechou os olhos.
Ela estava adormecendo quando o som do interfone a acordou e, ao
mesmo tempo, fez a tigela de pipoca cair no chão, esparramando o conteúdo.
Amaldiçoou. Olhou para a hora. Quase meia noite. Que demônios?
— Abra por favor. É Piper.
Não pensou duas vezes. Apertou o botão e esperou que a irmã entrasse no
elevador. Piper nunca a visitava. Sempre esperava que ela fizesse isso
primeiro. De modo geral, sua irmã se tornou renegada, rebelde e, embora
ainda fosse carinhosa, os sinais de afeição eram poucos em comparação com
o que costumava ser antes.
Dizia que a experiência na prisão era muito difícil para qualquer um ouvir,
e pior, vivê-la. Preferia manter longe do conhecimento de Rachel as vivências
que desejava manter no passado. Parte dessa rebeldia foi rejeitar a oferta de
sua irmã mais nova de ficar e morar em seu apartamento. Preferia estar em
um bairro não tão seguro, mas pagar por tudo sozinha.
—Piper! — Rachel exclamou ao vê-la. Assustou-se ao notar quão abatida
parecia. — Entra. Por que não se agasalhou? — perguntou chocada ao vê-la
tremer. Aproximou-se da lareira e aumentou a quantidade de pedaços de
madeira.
Silenciosa, e sem esperar para ser convidada, Piper se deitou no sofá.
— Tenho problemas — ela anunciou de forma simples e olhando para sua
irmã mais nova. Ela odiava ter que pedir ajuda, mas naquela noite um amigo
dela a procurou para comentar sobre uma notícia que a deixava nervosa. Não
podia esperar o dia seguinte.
Rachel sentiu seu coração encolher. O fato de sua irmã ter chegado até ela
era suficiente para saber que algo sério estava acontecendo.
— O que aconteceu? O que você precisa? — ela perguntou agachada na
frente da irmã e segurando as mãos com carinho.
— O homem que denunciei permanece livre, porque não foram capazes de
encontrar uma maneira de sustentar as acusações para prendê-lo. — Rachel
abriu e fechou a boca novamente. — Estou em liberdade condicional porque
o juiz me julgou pelo meu bom comportamento na prisão e pelas informações
que lhe dei sobre um traficante. Esses dados eu consegui graças aos contatos
que fiz na prisão. Se esse mafioso me encontrar vai me matar.
—Há quanto tempo sabe que começaram a tentar organizar este plano de
gerar provas sólidas com sua informação...? — perguntou com um tremor em
sua voz.
— Cerca de sete horas atrás. Liguei para o número que você me deixou,
mas não atendia a chamada.
— Sinto muito. Estava em um compromisso. Como você sabe tudo isso o
que o pessoal da polícia está pensando e tal? — perguntou intrigada.
Piper suspirou. Sua irmã era tão inocente.
— Rachel, eu estive na prisão. Estive cercada por pessoas
verdadeiramente inescrupulosas. Comida especial, como doces ou coisas que
raramente nos davam, às vezes era trocada por informações externas ou
favores para os membros da família. Quando minha colega de cela sabia que
eu sairia por bom comportamento, também me disse que precisava de algo
mais para garantir minha saída.
— Que oferecesse informações à polícia.
— Exatamente. Eu sempre jurei que não sabia de nada...
— Porque você é inocente.
Piper suspirou.
— Nesse tipo de situação, a inocência não tem nenhum papel. Você tem
que aprender a resolver os ângulos e fazer alianças às vezes, Rachel. Se na
prisão encontrasse alguém que conhecesse a quem eu pudesse ter denunciado
ou não durante o julgamento, você estaria pondo flores em meu túmulo neste
momento. — Rachel fez uma careta. — Depois que você sai da cadeia ou
visita esse mundo, às vezes as pessoas desse mundo continuam a assombrá-
la. Alguns falam e sabem quem você é... outros esperam que você caia no
mesmo círculo que eles... é complicado irmãzinha.
Rachel apertou levemente as mãos de Piper.
— E que diferença fez desta vez para que falasse...?
— Meu bom comportamento e perfil impecável na prisão chamaram a
atenção da diretora Martha Forrester. Ela me tinha em alta estima. Não sei
como, mas Martha conseguiu que a juíza revisse meu caso novamente. Então
com as informações de Stacy, minha companheira de cela, aumentei minhas
possibilidades.
— E quanto a Stacy, o que ela trocou... ou o que você trocou em troca
dessas informações?
— Stacy era a amante de um dos inimigos de Emilio Gordov. O traficante
que as autoridades estão procurando como se ele fosse uma moeda de ouro.
Portanto, não foi fácil para Stacy saber onde estava Gordov.
—Estando na cadeia podem ter sexo...?
— Rachel, acho que não faz sentido falar sobre truques, questões sexuais
etc. que são elaboradas dentro de uma prisão. O que preciso de você é que me
arranje um bom lugar para me esconder.
—Aqui? — perguntou a ruiva.
— Isso colocaria você em perigo. Não tem outro lugar?
— Você pode passar a noite aqui, e amanhã eu ligo para Delaney. Ela
deve conhecer alguns lugares. Tudo bem?
Com o calor finalmente inundando seus ossos, Piper assentiu. Ela se sentia
um pouco culpada por colocar sua irmã em seus rolos, mas não tinha mais
ninguém a quem recorrer agora.
—Sim.
De repente, o sorriso de Rachel aumentou.
— E a casa de tia Ariel no Maine? Certamente ficará feliz em vê-la!
Piper franziu o cenho. Ariel era uma intrometida. Ela nunca se dera bem
com aquela tia antiquada. Mas sabia que Rachel morou com ela, então pelo
menos não deveria falar mal da irmã de seu pai.
— Prefiro ficar por perto caso meu oficial responsável pela minha
liberdade condicional queira me encontrar. Não quero problemas.
Rachel se sentou. Cruzou os braços olhando para sua irmã.
— Tia Ariel é uma pessoa muito amorosa, Piper. Tenho certeza de que ela
vai adorar saber que você vai visitá-la.
— Me dê um tempo, por favor. Eu ainda estou me adaptando a viver em
liberdade. Pensei que nunca fosse sair dessa pocilga. — Esse comentário
suavizou o rosto de Rachel. — Vamos um passo de cada vez. Tudo bem?
—Sim, tudo bem. Venha, vou te mostrar onde você pode dormir hoje. Mas
tenho uma dúvida. O que acontece com a proteção de testemunhas?
— Desisti dela, porque era iminente que apanhassem esse cretino.
—Piper!
A garota fechou os olhos com força. Talvez seu juízo estivesse lhe dando
uma alternativa errada. Acreditava estar livre de qualquer truque em sua ânsia
de esquecer os dias de condenada. No pouco tempo em que esteve nas ruas
novamente, conseguiu fazer amizades vergonhosas para a sociedade, mas
com boas conexões nos mundos inferiores. Um de seus antigos amigos de
classe alta, daqueles anos em que tudo parecia correr bem quando ela se
recuperara da morte de seus pais, a reconheceu na cafeteria moderna, onde
trabalhava como garçonete.
Theo Vanekkis era encantador, mas também perigoso quando provocado.
Sempre se comportou bem com ela. E naquela ocasião na cafeteria, ele
perguntou sobre sua vida. Piper não tinha problemas em contar se lhe
perguntassem, menos se fosse um homem como Theo que geralmente não
julgava os outros... apenas os usava a seu favor.
Theo garantiu que poderia cuidar dela. Se recusou. Piper entendia que a
atração entre os dois era latente, sempre foi assim, mas agora não queria
dever nada a ninguém. Já tinha pago um alto preço por ser idiota. Tudo o que
ela queria era que Emilio fosse pego, para que pudesse encontrar uma
maneira de talvez sair dos Estados Unidos e começar uma nova vida.
— Estou cansada. Trouxe algumas coisas, caso você não estivesse em
casa e precisasse ir a algum lugar mais barato. Eu gostaria de tomar um
banho e dormir um pouco sem acreditar que alguém vai cortar meu pescoço a
qualquer momento — disse com voz impregnada de tédio. Passou os dedos
pelos cabelos longos, que agora pareciam desleixados e cortados ao nível da
orelha.
Rachel abraçou Piper. Esta resistiu um pouco, mas logo lhe devolveu o
gesto.
— Você é minha irmã e eu faria qualquer coisa por você.
— Eu sei. Você é a única coisa que pesa na minha consciência —
sussurrou com um sorriso que não tinha vínculo com a alegria, e mais com a
sensação de remorso.
— Não seja tola, Piper. Nada do que aconteceu teve a ver com você e sim
com injustiças. — Enganchou seu braço com o de sua irmã. — Vamos, é
hora de descansar. Amanhã farei o café da manhã porque é seu aniversário.
Comprei uma coisa para você e espero que goste!
— Não precisava...
— Bah, é claro que precisava. Você é minha irmã e se algo que eu gosto é
poder ficar novamente com você.
— Você é muito boa.
— Não pense que é a única que mudou — disse com a voz séria de
repente.
Piper encolheu os ombros. Não tinha vontade de analisar sua irmã mais
nova.
— Claro que não... — murmurou com um bocejo.

***
Os gêmeos haviam recebido alta após quinze dias de angústia para os
Whitmore. Geralmente, os processos para sair do coma podiam levar meses,
anos, e os médicos garantiam que era quase um milagre que o pequeno
acordasse depois de duas semanas, apesar dos golpes sofridos. Na casa de
Douglas e Lara, apesar de ter todos os recursos necessários para cuidar das
crianças, a angústia era latente. Os avós das crianças tentaram tornar os dias
agradáveis, mas a lembrança de estar prestes a perder aqueles dois querubins
nunca parava de assombrá-los.
A família Whitmore não poupou despesas e trouxe amigos especialistas
da Suíça e da França. Dada a boa relação de Michael com os dirigentes do
hospital, permitiram que os médicos estrangeiros aderissem à equipe de
cuidados das crianças. Monitoramento, exames constantes e atenção
preferencial no final haviam valido a pena. E, claro, a natureza do universo
tinha contribuído com a mão dos médicos.
No meio da crise familiar, Michael se sentiu sobrecarregado porque o
escritório estava lotado. Entretanto, tinha saído uma vez mais com Veronica
depois daquela primeira noite que se viram no hospital. Então ela teve que
viajar para Washington DC para coordenar um projeto com sua empresa e
não voltaria até o dia seguinte.
Conversavam ao telefone o máximo possível, embora às vezes isso fosse
complicado por ocupações mútuas. E cada dia que passava, Michael ansiava
se deixar levar pelo riso fácil ou as respostas inteligentes da ruiva. Não era o
mesmo que falar ao telefone por algumas horas do que fazê-lo pessoalmente.
Ele gostava de ouvi-la, sentir a vibração de sua risada e imaginá-la em seus
braços.
Era uma sensação estranha desejar conhecer mais uma mulher, porque
depois de Ingrid, conhecer o básico sobre alguém, era suficiente. No entanto,
a energia sedutora e misteriosa que envolvia Verônica o deixava intrigado.
Desejava descobrir cada parte desse delicioso corpo com suas mãos e
desfrutar a seu lado.
Finalmente fariam um jantar completo naquela noite, depois de tanta
conversa por telefone e mensagens de texto, raramente se falavam pelo
Skype. Ansiava terminar com a maldita papelada de sua escrivaninha e
delegar aos assistentes legais as tarefas pertinentes. Ser sócio tinha uma
grande vantagem, mas também o nível de responsabilidade era alto.
— Michael, você tem uma reunião com Charlie Guildford em vinte
minutos — seu assistente disse no interfone. — Há um caso importante que
acabou de chegar ao escritório.
—Que tipo de caso, falaram sobre a área de atuação?
A mulher olhou para ele, impotente.
— Criminal.
—Não trabalho nessa...
— Chefe, são palavras de um dos sócios principais. Não mate o
mensageiro — interrompeu com seu sorriso de assistente eficiente bem paga.
— Essa é a área de referência, mas também tem a ver com questões bancárias
e financeiras.
— Ok, obrigado.
Michael soltou um suspiro alto.
Minutos depois, ele se aproximou da sala de reuniões. Eram seis horas da
tarde. Ele não gostou nada de ter sido convocado para discutir um assunto
que o fez renunciar ao escritório de advocacia de família anos atrás. Não
queria passar por esse processo novamente.
A porta da elegante sala com vista para o rio se abriu diante dele. Cinco
dos doze parceiros da subsidiária da Salmann & Buckend em Chicago já
estavam sentados. Fizeram um gesto de saudação.
— Olá, Michael — disse Eileen Roberts, uma das poucas sócias que
dirigia a área de Lei Criminal. Como forma de cumprimento, Michael acenou
para os sócios. — Entendemos que, no passado, levou um caso de drogas
amplamente divulgado na mídia e com sucesso retumbante. Em nosso
trabalho habitual, não tivemos que lidar com a impressora aos montes, pois já
sabe que nossos casos são de um determinado tipo e tentamos o máximo de
discrição possível. No entanto, o cliente em potencial que veio pedir nossa
representação legal pode ser um pouco... controverso. Eles o acusam de
tráfico de drogas, e ele tem uma gangue de "colaboradores". No entanto, não
vincularíamos com parte do seu negócio. De fato, ignoramos os detalhes e
preferimos continuar assim.
Desconfortável, ele se mexeu na cadeira. Essa ridícula linha entre legal e
não legal, sob a qual seus colegas se amparavam nesse tipo de possível
cliente, criou um atrito moral que ele odiava experimentar.
— Não quero ter nada a ver com um cliente deste tipo — respondeu
firmemente. — Talvez eu tenha vencido um caso complexo no passado, mas
o custo pessoal que paguei foi muito alto. Não espero que entendam, embora
ache apropriado expô-lo. E não aconselho que comecemos com clientes com
antecedentes como esses apenas porque têm negócios "legais" e é por isso
que exigem um grupo de advogados encarregados de assessorar.
Um leve murmúrio foi gerado na sala. Michael era um dos poucos sócios
que nunca se incomodou em esconder seu desconforto ou seu ponto de vista,
independentemente de quem estivesse ao seu redor. Esse fator foi primordial
quando Dereck Salmann decidiu colocá-lo como candidato a membro, anos
atrás.
— Precisamos mostrar que continuamos liderando Chicago, Michael. Que
continuamos sendo os melhores, independentemente da atual crise que está
pressionando para reduzir outras empresas— interveio Mikos Arthemis, um
grego nacionalizado americano que era mais afiado que a espada. — Só
representaríamos este cliente em seus negócios legais como disse Eileen. O
pagamento a receber seria muito alto. As empresas legais na cidade estão
perdendo clientes e receita. Esse cliente não nos causaria nenhum
inconveniente moral, porque, como Eileen já mencionou, cuidaríamos dos
seus negócios que estão em ordem.
Ao redor da mesa, o clima era de expectativa.
Michael tamborilou com os dedos na madeira.
—O que acha Dereck? — indagou o advogado de olhos verdes. A opinião
do homem que o colocara no topo da empresa era essencial.
—Como Mikos lhe disse, embora eu tenha sido responsável pela área de
Direito Penal, sua contribuição será útil, no entanto, o que o cliente em
potencial deseja ajuda se concentra na área de bancos e finanças, que é sua
especialidade, por uma questão de suas políticas e alguns problemas de
contratos que você também costuma ter em questões de direito civil. Por
outro lado, Michael, Dereck não pode estar aqui hoje porque tinha que
atender uma entrevista com o juiz Robinson, o do tribunal de menores —
Eileen respondeu. — No entanto, ele acabou de enviar um e-mail informando
que, o que você decidir, deve ser respeitado. Faremos isso, mas não antes de
expressar a você que sua ajuda seria importante. Não apenas por causa de sua
experiência, mas você tem carisma com a mídia e isso seria essencial caso
houvesse muita publicidade quando vazasse, porque certamente vazará, que
uma das grandes empresas de Chicago está trabalhando com um cliente de
perfil... complexo — terminou com seu tom equânime e tranquilo.
— Quem é a pessoa que está solicitando nossos serviços? — Michael
perguntou, sentindo a tensão tomar conta de suas costas. O incomodou
quando seus colegas ficaram misteriosos e circunspectos.
—Emilio Gordov.
Esse nome era bem conhecido na cidade, Michael pensou. Era um
traficante de menores de idade, mas exercia uma influência brutal sobre
grupos vulneráveis, como estudantes de escolas particulares, que podiam
pagar a ingestão de drogas de tempos em tempos. Diziam nas ruas que Emilio
Gordov costumava não ser muito contemplativo quando se tratava de cobrar
uma dívida, e quando o traíam, não tinha piedade.
A polícia nunca conseguiu reunir evidências sólidas contra ele, nem
testemunhas que quisessem dar detalhes ou informações, e é por isso que
Gordov continuava nas ruas com a fachada de manter negócios legítimos.
Neste último caso, as autoridades não puderam fazer nada, porque os salões
de beleza e os distribuidores de produtos de beleza estavam em ordem. A
polícia não tinha como provar que o financiamento de muitos desses negócios
vinha do dinheiro do tráfico, a menos que houvesse alguém corajoso o
suficiente... ou estúpido, para dar uma dica que conseguisse descobrir Gordov
no meio da uma tarefa ilegal e detê-lo.
—Colocamos em votação a ideia de aceitar Gordov como cliente ou não?
— Mikos perguntou sutilmente, e olhando para Michael. Este último,
assentiu. Para que existia a democracia, senão...?
Trinta minutos depois, Gordov entrava pela porta.
Michael havia perdido a votação e a firma ia trabalhar com o conhecido
traficante.
Magro e baixo, com uma pele clara e olhos que pareciam um fosso preto
sem fundo, só de olhar Gordov causava calafrios. O homem deu um passo à
frente com dois guarda-costas ao seu lado, e o que parecia ser seu advogado
de serviço habitual. Com um gesto, ele dispensou todos, exceto o advogado.
— Senhores, apresento-lhes Emilio Gordov — Eileen disse, depois de
apertar a mão do homenzinho. — A polícia está tentando verificar a
legalidade de seus negócios de Salão e distribuidores de produtos de beleza,
então precisam de assessoria para saber se tudo está em ordem e poder
mostrá-lo com documentos, se necessário.
— Então aceitaram o desafio de me representar — perguntou Gordov
com um sorriso tão falso como o dente de ouro que substituía o canino
esquerdo.
Mikos assentiu. Eileen apresentou-o rapidamente à Junta de Sócios.
— Então devo agradecer — expressou com tom de suficiência e
confortavelmente sentado em uma das poltronas da sala. — Eu gostaria de
avisá-los de uma situação incômoda da qual espero também se encarreguem...
como meus futuros advogados.
— Quanto mais transparente for o nosso relacionamento, Sr. Gordov,
melhor ficaremos — disse Michael sem poder evitar.
O olhar calculista de Gordov foi imediatamente para Michael. Estreitou os
olhos e depois sorriu em reconhecimento.
— Ah, você é o advogado que lidou com um caso de destaque aqui em
Chicago há mais de uma década. Eu tinha trinta e oito anos na época, fiquei
surpreso que você era tão jovem, advogado Whitmore.
Michael não sabia se deveria ficar ofendido ou lisonjeado por seu trabalho
transcender ao ponto de ser reconhecido por um homem perigoso como
Gordov.
—Gostaria de nos contar sobre o que deseja nos alertar, Sr. Gordov? —
Michael respondeu sem fazer nenhuma alusão à menção do passado.
Emilio olhou para o seu advogado de cabeceira. Ele assentiu.
— A polícia, em uma caça às bruxas, pretende me prender. Está
procurando pistas sobre os meus negócios. Aparentemente, há alguém que
acabou de ser libertado há alguns meses à custa da minha reputação.
Que cinismo, Michael pensou consigo mesmo.
— E quem é a pessoa que forneceu essas pistas sobre você? — Michael
perguntou com resignação. — Talvez possamos encontrá-la e resolver o
problema. Sem conflito para ambas as partes— ele disse secamente.
Emilio olhou para ele e antes de responder, pouco a pouco, seu sorriso
aumentou. Um calafrio percorreu a espinha de Michael.
— Uma amiga sua do passado, advogado, Piper Galloway.
C A P Í T U L O 7

Piper havia encontrado uma propriedade por um bom preço graças a


Delaney. Agora estava mais segura, pelo menos Rachel esperava isso. Pediu
a Piper que comunicasse quaisquer detalhes e que se pudesse solicitar o apoio
da polícia para proteção de testemunhas, deveria fazer isso. Ainda bem que
Piper não se opôs, e já tinha um policial designado o tempo todo até que
conseguissem colocar Gordov na sala de interrogatório da polícia e reunir
evidências sólidas para que pudessem prendê-lo.
Com isso em mente e odiando que sua irmã continuasse a viver os
fantasmas de seu confinamento, Rachel se vestiu para o jantar naquela noite.
Depois de dias sem se verem, apenas se comunicando por telefone,
finalmente ela e Michael finalmente concordaram em sair um dia.
Não sabia se a adrenalina correndo por ela era pela ideia de seduzir
Michael ou do fato de que temia que o plano saísse do controle. Não que ela
pudesse se qualificar como uma amante especialista. Sim, teve alguns
encontros apaixonados, mas não o bastante para atender às expectativas de
um homem que provavelmente teria prática suficiente para não se deixar
impressionar.
Não ia voltar atrás. Usaria o que tinha ao seu alcance. Se tinha aprendido
alguma coisa com o passar do tempo era realçar seus traços quando
necessário.
Passou as mãos sobre o tecido macio do vestido preto levemente ajustado.
Usava pequenos ornamentos brilhantes, como se fossem uma estela de
constelações em miniatura, à altura do peito. O vestido era em decote em V,
chegava até o joelho. O sutiã não tinha alças, pois parte da parte das costas
ficava exposto. A calcinha também era preta, mas de seda tipo biquíni.
Usava cinta liga. Sim. Esta era a ocasião perfeita para usar uma. O único
ponto que destoava do preto que usava nas roupas naquela noite eram as ligas
vermelhas. Se sentia atrevida. Vingativa. Sensual. Era uma mistura que
aumentava a expectativa do que poderia ou não acontecer depois do jantar.
Pegou um lenço vermelho e amarrou no pescoço. Em seguida, colocou um
suéter leve e, por cima, o casaco grosso para o inverno. Em vez de botas
usava saltos altos da marca Miu Miu. Um pequeno luxo, mas estava
gostando.
Aplicou um pouco de Blush, batom e delineador azul escuro para realçar a
cor dos olhos. Esse era o efeito que queria causar: uma mistura e impacto
entre o sensual e o inocente.
Quando a campainha do interfone tocou, estava tão concentrada se
olhando no espelho e ponderando, Rachel deu um pulo. Colocou a mão no
coração. Uau, um advogado pontual! Pensou sarcasticamente antes de pegar
sua bolsa preta e atender.
—Verônica— Michael disse a título de saudação.
Aquela voz enviou muitas faíscas quentes por sua espinha, deslizaram por
sua pele, perfurando o tecido, e foi como uma carícia nua. Tremeu. Ela não
estava acostumada com ele a chamando assim, e a verdade é que gostava.
Como se estivessem jogando um jogo proibido. E, até certo ponto, era.
—Olá, descerei num…
— Queria te perguntar se você se importaria se eu subisse por um
momento —interrompeu.
Rachel engoliu a seco.
— Claro, pode subir. É o décimo segundo andar. — Apertou o botão do
interfone para abrir a porta da frente do prédio, e Michael pudesse pegar o
elevador. No dia seguinte ao primeiro encontro com a família Whitmore,
Rachel instruiu Saul, o homenzinho que cuidava da recepção, que se Michael
Whitmore perguntasse sobre Veronica Marsh, se referia a ela. Diante do olhar
questionador de Saul, ela apenas piscou e agradeceu. Por que teria que dar
explicações para alguém?
Michael não achava possível que sua abstinência de Verônica pudesse ser
sustentada por mais tempo. Depois do dia horrível no escritório, a última
coisa que queria era ter que lidar com pessoas e restaurantes, embora tivesse
prometido levá-la para jantar.
A própria ideia de se misturar com a garota Galloway novamente, mesmo
que indiretamente, fazia seu estômago revirar. Tinha sido uma época
sombria, aquela de anos atrás. Piper era muito jovem para ter desperdiçado
sua vida. A justiça fez a sua parte, sim, embora isso não tenha tirado dele a
sensação de ter roubado sua juventude.
Quando Verônica abriu a porta, Michael quase deixou a língua de fora,
literalmente. Que mulher! Estava de tirar o fôlego. Só de vê-la dissipou todo
o sabor amargo que experimentou no escritório. Ele precisava esquecer todas
as preocupações, e Verônica era perfeita para esse propósito.
A exuberante ruiva conseguia minar seus sentidos de precaução. Nem
mesmo com Ingrid, sua ex-esposa, a atração foi tão visceral ao conhecê-la
como com Verônica. Algo lhe dizia que a conexão que sentia com ela era
conhecida por sua memória celular. Ou talvez o estresse do dia estivesse
cobrando seu preço.
—Você está incrível —ele disse com sinceridade.
— Obrigada, você também está muito bem — respondeu contendo
palavras que poderiam ser mais eloquentes para descrevê-lo, mas procurou
não elevar seu ego. Porque, vamos ver, quem disse modelo de GQ só em
passarelas e sessões de fotos? Parado ali em seu terno sob medida, sem
gravata e com três botões desabotoados de sua camisa impecável, Michael
Whitmore dava a impressão de estar posando para uma revista feminina. Mas
estava sozinho. Na entrada do seu apartamento. Esperando-a. A ela.— Te
ofereço algo de beber? — perguntou antes de convidá-lo a entrar e fechar a
porta atrás.
— Se tiver um pouco de whisky seria bom — ele respondeu seguindo-a
para a sala.
—O vinho é uma opção? — perguntou indecisa. Não costumava beber
whisky, mas um bom vinho servia para dissipar seu estresse quando atingia
pontos insustentáveis.
Michael abriu um sorriso.
— Uma excelente opção. Obrigado.
Ela assentiu e foi até a cozinha.
O olhar do advogado percorreu o apartamento. Era acolhedor. O piso em
parquet. Calefação central. Ele conhecia a área. Era seguro e alguns lugares
ao redor eram muito caros. Aquele bairro não ficava muito longe de sua casa,
na região do Lincoln Park.
Gostou de ver que havia uma prateleira cheia de pequenos elefantes
coloridos. Imaginou que fosse um hobby de colecionador, já que os quatro
andares estavam lotados. Havia uma fotografia do que ele presumiu serem
seus pais ainda jovens com duas meninas. Ele ia se aproximar para ver
melhor, mas Verônica logo voltou.
— Aqui está, sirva-se, por favor — disse ao voltar com a taça e entregá-
la. Ele se recostou contra o sofá e deu um gole. — Sua expressão está um
pouco séria. Novidades com seus sobrinhos?
Ele negou.
Verônica se acomodou ao seu lado, embora mantendo a distância.
— Os gêmeos estão em boa forma e se recuperando. Minha sobrinha,
Gália, é a enfermeira designada por vontade, ela adora seus irmãos. Já que
estou com você esta noite, a verdade é que nada pode ser melhor —
respondeu olhando-a nos olhos. Tomou mais um gole do vinho e, em seguida,
estendeu a taça até deixá-la na mesa de centro. Percebendo que Verônica
havia deixado um espaço considerável entre eles, sorriu para ela. — Eu não
mordo, sabia? — disse brincando.
Ela retribuiu o gesto, mas por dentro era um poço de inquietude. Sentia-se
como se estivesse tentando imitar um pavão quando na realidade era um
cisne comum e selvagem. Quanto tempo conseguiria manter essa atitude de
confiança? Sabia, pelo olhar de Michael, que a desejava. Tinha que se armar
de coragem. O show já havia começado.
— Eu sei —respondeu. — Se demorarmos muito perderemos a nossa
reserva, ou é um tipo de restaurante que as mantém por muito tempo depois
do horário acordado pelo cliente?
Ele ficou olhando para ela. Não disse nada. Aproximou-se aos poucos. Ela
não se mexeu. Não podia depois de tudo. Ela estava encurralada e, mesmo
que pudesse, nem suas pernas nem seu corpo ousavam se desconectar da
atração que a prendia ao sofá para esperar o próximo movimento de Michael.
Ele tirou a taça das mãos dela e a colocou de lado. Podia respirar o
perfume floral do perfume de Verônica. Os olhos azuis brilharam de surpresa
quando a distância que os separava diminuiu de um momento para outro,
deixando-os separados por poucos centímetros. Michael não perdeu o
lampejo de saudade no olhar feminino. Teve um leve déjà vù. Sentiu como se
a mesma circunstância já tivesse acontecido. Em outro momento de sua vida.
— Acho que os donos do lugar não vão se importar, Verônica. No
entanto, sabe quem se importaria se eu não te beijasse agora? — murmurou
praticamente sobre os lábios rosados.
—Michael...— ela sussurrou rodeada pelo perfume masculino de uma
fragrância amadeirada, misturado com um traço de loção pós-barba. O calor
de sua voz a envolveu.
—Exato — disse com voz rouca, estendendo a mão para acariciar a
bochecha suave. — E você, preciosa Verônica, também se importaria?
O que disse naquele momento ia mudar o resto do curso do vínculo que
tinham. Era a hora de ouvir Delaney. Ela disse para deixar a vida se vingar
com o tempo, e que tudo o que Piper tinha ou não feito não era da conta dela,
exceto o julgamento e seus altos e baixos. Pediu-lhe que deixasse o advogado
em paz, a menos que estivesse realmente atraída por outros motivos que não
fosse a vingança. Rachel apagou as palavras de Delaney de sua mente. Ela
nunca entenderia o que sentia uma pessoa a quem tinham tirado tudo.
Michael merecia ser colocado em seu lugar. Naquele momento tinha que
continuar com seu propósito. Ganhe sua confiança e, gradualmente, destrua
suas barreiras. Se durante esse interlúdio aproveitar, melhor ainda, mas não
perderia a perspectiva. Ela era uma mulher pragmática, e assim pretendia
continuar.
Nesse momento, com Michael olhando-a com aquele olhar abrasador, só
pensava na coceira que sentia em seus lábios diante do desejo de ser beijada.
Os seios estavam um pouco mais pesados ​e os mamilos pareciam eretos
contra o tecido do sutiã sem alças. A sensação de leve umidade que se
aninhava entre suas pernas era mais vívida, assim como a batida louca de seu
coração. Sentia como se o tempo tivesse voltado, e aquela garota de dezenove
anos finalmente fosse receber o que tinha desejado no momento que um
Michael mais jovem, a beijou.
— M e importaria... muito — ela expressou, cativada por aqueles intensos
olhos verdes.
A resposta de Michael foi roubar seu fôlego com a perícia de sua boca.
Apalpar seus lábios com a língua e mordê-los para, diante de uma expressão
de assombro de Rachel, logo penetrar aquela cavidade que guardava os
segredos de seus beijos. O sabor de seus anseios e a tentação de sua língua.
Tinha experimentado o que era ter níveis de álcool nas alturas, mas Rachel
não se lembrava de sentir seu mundo desvanecer, o barulho da rua principal
era inexistente e só podia ouvir o som das respirações pesadas fundirem-se
em um beijo sem trégua.
Deslizou a mão suavemente, desamarrando o lenço vermelho. Ela o ajudou
a fazer isso, e aplicaram o mesmo exercício, enquanto se beijavam, com o
resto da roupa de frio. Tirou o casaco, o suéter, deixando-a somente com o
vestido. Frenética e ansiosa, Rachel enredou os dedos no cabelo macio de
Michael, agarrando-se e vibrando ao ritmo de seus lábios ardentes. Sentiu a
mão quente correr sobre seus ombros e deslizar pelas costas pela abertura do
vestido.
—Deus! — exclamou em descrença. — Pretendia ficar exposta assim em
um restaurante comigo?
Ela não pôde deixar de rir.
— Estava contando que talvez pudesse decidir deixar o restaurante no
primeiro prato. — Ele se afastou. Olhou para os lábios femininos inchados.
—Não? — perguntou flertando.
—Claro que sim, Verônica — ele respondeu enquanto observava os dedos
elegantes da garota desabotoar sua camisa. — Dias se passaram e odiei
minha maldita carga de trabalho por não poder ver você antes. Eu a quero
loucamente.
—Mmm… Então vou me certificar que você saiba que é mútuo —
confessou antes de abrir sua camisa cara e apreciar o corpo esculpido de
Michael ao máximo. Ela o tocou com admiração. Era um homem bonito e
masculino.
Michael se sentiu preso ao toque daquelas mãos suaves, e seu sexo vibrou
contra o tecido de suas calças. Não podia mais perder tempo com
preliminares, mesmo que desejasse. Também não queria passar como um
idiota, mas Verônica era irresistível. Não sem arrependimento, ele quebrou o
calor do contato, pegou sua mão e engasgou quando finalmente percebeu a
cinta-liga.
—O quarto? —perguntou apressado. Esse gesto arrancou uma gargalhada
de Rachel. — Não acho nada engraçado.
Ela apontou para o corredor, depois para a direita. A segunda porta, ao
lado do escritório.
— Parece um homem das cavernas.
Com o ombro, Michael empurrou a porta branca.
— Sinto-me muito primitivo neste momento com você, Verónica — disse
com voz rouca, antes de se acomodar com ela na cama deixando-a embaixo
do seu corpo. A camisa tinha ficado na sala. Tinha o dorso nu, e a fricção do
tecido do vestido preto com sua pele ardente era uma experiência
interessante. — Agora, vamos tirar esta peça irritante — murmurou
inclinando-se para deixar um beijo na clavícula. — Ela inconscientemente
arqueou as costas. — Ah, um ponto sensível.
—Muito… — ela respondeu, passando as unhas pelos músculos dos
braços, até chegar aos ombros. Era tão forte. — Gosto do seu corpo.
— E a mim que uma mulher seja tão franca em suas opiniões —
respondeu deslizando para baixo o zíper do vestido do lado esquerdo. Os
quadris de Rachel se moveram, ajudando-o até que ele a deixou de lingerie.
Ele soltou um assobio de apreciação enquanto jogava os sapatos rapidamente.
Sem nenhum problema tirou os de Rachel, e os jogou no chão acarpetado.
— Beije-me— ela pediu em meio ao farfalhar dos lençóis de seda branca.
Michael se perdeu no sabor daquela mulher que fazia voar seu desejo
como Ícaro ao Sol. Sentia-se capaz de chegar ao céu mais longínquo com o
impulso gerado pela possibilidade de um prazer iminente. As mãos de Rachel
voaram para o cinto, o jogou de lado entre risos e beijos. A calça de Michael
logo seguiu com o mesmo destino.
Em igualdade de condições de vestimentas, se entreolharam com olhos
brilhantes de desejo, respiração difícil e lábios ligeiramente inchados. No
entanto, era a parte sul de ambos, aquela primitiva e ávida, que estava
desesperada. Michael se inclinou para beijá-la, se acomodando entre suas
pernas, separando-as lentamente com as mãos. Em um ato reflexo, as pernas
de Rachel envolveram a cintura masculina. Ele se moveu contra a suavidade
que sentia, aquele ponto central e medular onde logo desejava se perder, e
que ainda estava coberto pelo tecido de seda.
—Você é tão sexy, Verônica...
E cada vez que ele dizia aquele nome, era um lembrete a Rachel de que ela
não podia permitir que o desejo lhe tirasse a razão. Havia uma razão pela qual
estava seduzindo e se permitindo ser seduzida. Não devia tirar isso da mente,
embora isso não a impedisse de desfrutar.
—Assim como você— sussurrou perdida naquele momento na mão que
arrancava a calcinha, para depois jogar as ligas em todos os lugares. A mão
grande e quente circulou seus quadris e depois subiu para remover o sutiã. —
Oh... —ofegou quando ele agarrou seu mamilo esquerdo. Ele o beliscou
suavemente antes de sua boca substituir os dedos.
—Deliciosa... melhor do que qualquer sobremesa. — Ele circulou a aréola
com a língua e, em seguida, chupou com força o mamilo. Os quadris de
Rachel se remexeram, sua cabeça caiu para trás e suas unhas cravaram nas
costas musculosas de Michael. — Mmm... saborear você é o paraíso,
Verônica— ele sussurrou, enquanto aplicava a mesma deliciosa carícia no
outro mamilo e sua mão estava ocupada massageando o seio que sua boca
havia deixado livre e úmido. Sua pélvis não parava de esfregar contra a área
mais sensível de Rachel. Estava tão excitado que se tonava dolorosamente
prazeroso.
— Desejo...
— Eu sei baby, mas vamos devagar.
— Acho que não — resmungou, pressionando os dedos na carne de
Michael.
Em resposta, ele deu uma risada rouca. Rachel deixou escapar um gemido
ofegante quando sentiu o dedo de Michael deslizar entre suas dobras
femininas. Estava inchado e úmido de desejo. Ele adorava aquela suavidade o
suficiente para lubrificá-la mais profundamente. Quando teve certeza de que
ela estava pronta, roçou sua boca com a dele e então penetrou a carne tenra
com um dedo.
O pequeno grito de prazer que soltou fez o sexo de Michael pulsar inquieto
dentro de sua cueca boxer azul escura. Contendo o desejo de deslizar para
dentro de Verônica, ele continuou acariciando-a com os dedos. Com o
indicador e o dedo do meio ele entrou e saiu do canal úmido, enquanto o
polegar brincava com o clitóris. Sua boca fazia magia sobre a dela, mas às
vezes se movia para os seios sensuais, percorrendo-os com ávida luxúria. Os
sons guturais de aprovação diante de suas carícias, o deixaram louco.
— Essa cueca. Tire. Agora— implorou, mas naquele instante ele escolheu
acelerar os movimentos de seus dedos para impulsioná-la na jornada onde ela
encontraria a liberação.
O prazer cegante invadiu cada célula do corpo curvilíneo de Rachel. O
orgasmo varreu seus sentidos e deslizou como lava incandescente em sua
pele. Seu grito abalou Michael profundamente, e antes que ela pudesse voltar
da sensação de cegueira, ele tirou a cueca boxer, inclinou-se para o lado da
cama para tirar um preservativo do bolso da calça e logo voltou para ela.
— Trapaceiro— Rachel sussurrou, vendo o sorriso travesso de Michael.
— Eu precisava ver você chegar... — ele murmurou sem fôlego —, agora
prepare-se para voar novamente— disse ele, antes de entrar com um gemido
agradável entre suas coxas.
Os beijos eram primitivos e exigentes. As carícias das mãos de ambos
apertavam, acariciavam e apropriavam de forma territorial cada parte que
tocavam. As estocadas de Michael foram fortes e suaves as vezes. Ela seguiu
a batida dos quadris masculinos e se remexia em busca de repetir o êxtase do
prazer.
Suados e excitados, sentiram o orgasmo quando Rachel pressionou os
calcanhares contra as nádegas de Michael, empurrando-o mais para dentro
dela. Ele se lançou às profundezas com um impulso possessivo. Chegou até o
centro de Rachel, preenchendo-a como nenhum homem jamais conseguiu.
Ela começou a experimentar o abandono irreparável que se abriu diante dela,
tentando se livrar da voz interior, cínica e estridente que zombava de sua
crença de que o que ela compartilhou naquele momento com Michael ainda
era apenas um meio para um fim. Um último impulso de Michael apagou sua
lógica e em troca a empurrou para o abismo que ela preferia, o da satisfação
sexual.
—Verônica— Michael gemeu em um som gutural quando sua essência
saiu totalmente, deixando-o exausto e satisfeito.
O melhor orgasmo de sua vida.
Michael não poderia descrever de outra maneira. Sua cabeça ainda estava
girando. Os dedos acariciaram o cabelo macio de Verônica. Ele respirou o
cheiro dela. Ainda com o rosto enterrado naquele pescoço delicioso, ele
soltou o ar lentamente. Ela devolveu a carícia.
Com cuidado, Michael se afastou.
Rachel foi protestar, mas se conteve a tempo. Não podia pedir ou exigir
nada além do prazer. Era ridículo o vazio que sentiu quando o sentiu fora de
seu corpo. Se ela fosse honesta consigo mesma, ela não poderia evitar a
verdade. Foi a melhor sessão de sexo que já teve… desde sempre. Isso
claramente disparou seus alarmes. Devia recuperar o fôlego. Que ele se
afastasse a ajudava. Quem queria abraços e carícias? Ela, não, é claro. Pelo
menos não de Michael.
—O banheiro? — ele perguntou, tirando-a de suas reflexões um pouco
contraditórias.
Rachel apontou o dedo para a porta do canto de seu quarto. Antes de se
afastar, Michael se inclinou e beijou sua bochecha.
—Já volto, querida.
Ela ficou com os olhos no teto.
Sentia como se um furacão tivesse arrasado seu corpo. Ele não tinha
deixado de beijar um único canto de sua pele. Comportou-se com
generosidade e preferiu que ela tivesse prazer, para depois conseguir o dele.
Isso não era esperado de Michael. Na verdade, ela estava preparada para ter
na cama um homem que teria preferido o prazer dele primeiro e depois, se
possível, o da amante.
Ouviu a água correndo. Alguns minutos depois, Michael, muito
confortável em sua nudez, voltou para o lado dela. Antes que pudesse dizer
qualquer coisa, ele a beijou. Um beijo longo e apaixonado.
— Tudo bem? — ele perguntou antes de se deitar e puxar Verônica para
o seu lado. Ela era uma mulher muito receptiva e sensível. Segurá-la em seus
braços foi como se deixar envolver pelo veludo mais requintado.
— Mais do que bem, se quer saber — respondeu acariciando sua
bochecha —. Foi ótimo.
— Isso nem mesmo descreve — murmurou olhando para ela. — Posso
fazer uma pequena confissão, Verônica?
—Diga.
— Eu não sei por que, mas sinto que te conheço...
— Existem muitas pessoas que criam uma conexão com o sexo — disse
com a voz cautelosa. Tentou que seu corpo não ficasse tenso. — Não pensa
assim?
— Muitos anos atrás eu conheci uma garota que tinha cabelo ruivo como
o seu — ele continuou com um tom que denotava um certo toque de
nostalgia. — Talvez eu tenha imaginado isso porque os acontecimentos
daquela noite foram um tanto confusos. Ela era um sopro de ar fresco e
inocente naquela época— disse acariciando o ombro dela com ternura. Ela
tentou não tremer ao toque. — De alguma forma, pareço ver algo dela em
você. Sem a intenção de ofender e menos comparando. — Rachel negou com
a cabeça como se tivesse dito uma bobagem. — Provavelmente estou
divagando — expressou como uma brincadeira. — Você está certa em olhar
para mim com uma cara confusa...
Rachel franziu a testa. Seu coração batia forte. Embora estivesse
convencida de que não havia como ele saber quem ela era…
—E é a sua memória tão vívida? — questionou desenhando as
sobrancelhas de Michael com o indicador de sua mão esquerda.
Michael acariciou sua bochecha.
— Às vezes penso que se a encontrasse de novo provavelmente a
reconheceria.
—Tanto te marcou?
Ele, com um movimento ágil, a colocou facilmente sob seu corpo, uma
mão em cada lado de seus quadris. Ao contrário do que aconteceu em outras
experiências sexuais de Rachel, desta vez ela se sentiu muito confortável com
sua nudez na frente de Michael.
— Eu a encontrei em um momento em que minha vida estava uma
bagunça. Conhecê-la foi como uma lufada de ar fresco. — Ele se inclinou e
esfregou o nariz de Rachel com o seu. — Exatamente como aconteceu com
você.
—Por que foi uma época desastrosa? —Quis saber. Era o que a Rachel de
quase uma década atrás teria desejado saber sobre o estranho que abalou seu
mundo emocional por algumas horas, apenas para cair de cara no amanhecer.
Como uma piada de mau gosto.
Michael apertou a mandíbula. Ele não era daqueles que compartilhavam
problemas pessoais com suas amantes, mas algo sobre aquela garota o fez
fazer isso. Para querer confiar. O lado profissional, o advogado nele,
provavelmente o socaria por ser tão idiota e não analisar melhor os ângulos.
Mas estava cansado de racionalizar tudo.
Seus relacionamentos eram quentes na cama, mas frio fora dela. Por isso, e
depois de tantos anos, sentia que era hora de ter um relacionamento sólido.
Casar, nunca. Ingrid o deixou marcado. No entanto, um relacionamento era
um progresso. E sentia que com a ruiva linda dava pra começar. Ele gostava
de sua sinceridade e abertura. Agradeceu ao universo que os endereços da
empresa que Delaney dirigia foram trocados, mandando Verônica para sua
casa.
— Divorciei-me. Tinha acabado de deixar a firma da minha família e isso
me afastou do meu pai e do meu avô...
Ela franziu a testa. Esticou os dedos e acariciou o cabelo de Michael.
—Pelo seu divórcio?
— Foi uma mistura de várias situações. Eu decidi tirar um tempo longe de
Chicago. Eu fui a uma praia. Uma propriedade que minha avó paterna deixou
de herança para mim quando eu era pequeno, no Maine. Para meu irmão
Douglas, deixou um rancho em Kentucky.
— Entendi...
—Mesmo? — perguntou com um sorriso.
Ela assentiu.
—O divórcio foi tão grave?
— Acho que Ingrid e eu éramos tolos demais para querer nos casar. Nós
éramos jovens. Tínhamos o mundo aos nossos pés, mas nunca percebi que ela
se sentiria presa e restringida pelo quão exigente meu trabalho de repente se
tornou.
—Estiveram casados muito tempo?
Ele negou.
— Três anos. Tempo suficiente para ela decidir que era melhor se divertir
com um colega advogado concorrente na cama, antes de me dizer de frente
quais eram suas necessidades.— ele expressou com um tom de decepção.
—Caramba... sinto muito, Michael.
— É passado.
— Então eu imagino que seus pais amavam muito sua ex-esposa, de modo
que a família também se ressentia.
—Não... minha família não tinha nada a ver com Ingrid, mas por causa de
um caso que eu tinha que cuidar. Antes me dedicava a praticar o Direito
Penal. Agora eu tenho bancos e finanças.
— Um caso de que...? — ela perguntou de uma maneira que parecia
educada, mas não tão interessada quanto ela realmente se sentia. Queria saber
tudo.
Michael deixou escapar um suspiro.
— Uma traficante de drogas muito jovem para desperdiçar sua vida. —
Antes que Rachel pudesse se comprometer a cavar mais fundo, os lábios de
Michael pairaram sobre os dela. — Vamos parar de falar sobre o passado.
Você é meu presente e adoro aproveitar meu tempo— ele murmurou contra
os lábios provocantes — Além disso, há coisas mais interessantes para fazer
no resto da noite.
Ela riu. Foi uma risada tensa, porque Michael tinha acabado de confirmar
que ele era o culpado do encarceramento de Piper. Uma parte dela teria
desejado que ele fosse inocente. Não havia como voltar atrás. Ele começaria a
se abrir com ela, pouco a pouco, e então poderia mergulhar em alguma ponta
solta de Michael e usá-la para seu proveito.
— Eu adoraria conhecê-las, então. — Ele deu a ela um sorriso malicioso.
— Em todo caso, agora você tem a resposta, era apenas o sentimento
parecido com o que teve com aquela garota e é por isso que você pensou que
já tinha me visto antes — disse.
Michael mordeu o lábio inferior, puxando-o entre os dentes. Então ele
voltou à boca e provou intensamente. Agitados e excitados novamente, eles
se observaram intensamente. O olhar dela, além da paixão, continha
determinação. De Michael, luxúria e promessas de fogo.
— Você não se compara com ninguém, Veronica. É única e eu quero
fazer com que sinta de novo— garantiu com firmeza. Ele se inclinou para
que ela pudesse sentir sua ereção começando a ficar mais forte. — Parece
uma boa continuação esta noite? — ele perguntou lambendo seu mamilo, e
olhando para ela com seus penetrantes olhos verdes.
Rachel soltou um gemido de desejo e se mexeu contra os lençóis. O calor
que emanava do corpo de Michael funcionou como um ímã sobre ela.
— É a melhor continuação que desejei em muito tempo — ronronou. E
não estava mentindo de jeito nenhum.
C A P Í T U L O 8

O único vestígio de que seus lençóis queimaram de prazer até altas horas
da manhã era o cheiro de Michael. Uma combinação mortal de colônia cara e
virilidade. Com um sorriso bobo no rosto, Rachel estendeu a mão e sentiu o
lado vazio de seu amante. Ele a acordou há uma hora porque tinha um
compromisso urgente para atender. Ele se despediu com um beijo que
anunciava promessas.
Esfregou as pálpebras.
Naquela manhã tinha uma reunião com Paul. O contrato para o qual
haviam trabalhado em Washington, D.C., aparentemente seria finalizado e
teriam que fazer uma revisão final do orçamento. O investimento em
materiais poderia triplicar, então ter um fornecedor que oferecesse qualidade
e produtos a preços de atacado era essencial. O fornecedor local não
conseguiria se abastecer, pois o pedido do cliente da África do Sul seria
contínuo e em quantidades que batiam os recordes trimestrais a que estavam
acostumados na empresa.
Não sem preguiça, Rachel foi ao banheiro e entrou no chuveiro.
A memória do que ela e Michael haviam feito no início da manhã a
invadiu como uma nuvem quente. Passou um sabonete com aroma de rosa
suave sobre seu corpo. Quando suas mãos passaram sobre seus seios, os
acariciou e apertou seus mamilos com os dedos, pensando em como ele a
acariciou horas atrás...
—Demônios! Deixa de ser idiota, Galloway — disse em voz alta,
retirando as mãos. Ela agarrou o frasco de shampoo com força e aplicou uma
quantidade generosa em seu cabelo avermelhado. Esfregou a cabeça como se
não houvesse amanhã, tentando deixar no couro cabeludo a raiva por desejar
algo que sabia que era temporário e tinha um só fim.
Chegando ao escritório, Rachel caminhou rapidamente em direção ao
escritório de seu chefe.
Elegante e confiante, Paul Eckhart era um chefe muito generoso e zeloso,
mas ao mesmo tempo não permitia que nenhum funcionário perdesse de vista
que ele era o responsável. As pequenas janelas do escritório permitiam que a
sala não fosse ofuscada pelo inverno sombrio da cidade. A iluminação fraca e
o aquecimento, combinados com a decoração, criaram um ambiente luxuoso
e confortável.
—Paul? — Rachel chamou da porta.
Ele estava ao telefone, mas acenou para ela entrar. Ela se acomodou na
cadeira azul em frente a Paul. Rachel olhou para suas anotações até que
finalmente, quinze minutos depois, seu chefe encerrou a ligação.
— Rachel, desculpe. Trouxe o orçamento? —ele perguntou com um
sorriso. O olhar de Paul era da cor do petróleo, assim como seu cabelo
penteado com estilo. Sua aparência era imponente, mas não de uma forma
que deixaria sua subordinada favorita louca.
Ela assentiu. Tirou os arquivos impressos.
— Enviei as informações para o seu email, mas imprimi para mim para
que possamos verificar os dados. — Paul abriu o arquivo em seu
computador. — Como pode ver, conseguimos reduzir o investimento em
materiais, mas não o número de clientes. Continuamos a manter a qualidade
dos nossos produtos e também, se já fecharmos negócio com a África do Sul,
ao contratar um novo fornecedor nos beneficiará para distribuir a produção de
forma mais equitativa, manter os custos baixos para o cliente e melhorar os
nossos lucros.
Continuaram conversando por quase meia hora. Não só em relação ao
cronograma de trabalho, orçamentos e estratégias, mas também em relação a
cada um dos sete executivos especialistas que estavam sob a responsabilidade
de Rachel. Duas xícaras de café e alguns doces depois, Paul recostou-se no
assento e sorriu.
— Sempre fico surpreso com sua capacidade de sintetizar e explicar
perfeitamente.
Desconfortável com o elogio, ela acenou com a cabeça.
— Você me contratou há seis anos para isso, entre outras coisas, eu acho
— disse. Sabia que Paul podia ser intimidante quando queria e também que
não gostava de seus funcionários, especialmente aqueles que dirigiam uma
equipe de pessoas como Rachel, abaixassem a cabeça ou fugissem de um
desafio. Ele gostava da frontalidade. E essa era uma característica que a
jovem especialista em negócios admirava. — De acordo com os números
comparativos com a estratégia que aplicamos no ano passado?
— Totalmente, e acho que a modificação que fez desta vez deu resultados
como acabei de dizer. A propósito, Rachel, há uma viagem em curso.
—África do Sul? — perguntou franzindo a testa. Ela costumava viajar
para reuniões em várias cidades dos Estados Unidos, mas não era tão
frequente, só que o tempo de ausência costumava se estender por até uma
semana.
Ele negou.
—Las Vegas —respondeu—. Há um potencial parceiro que quer injetar
capital, o que seria útil, embora não seja necessário. É um bom contato
indistintamente dos resultados da conversa. É só uma entrevista, mas você
tem uma capacidade inata para saber se se pode confiar ou não em um
empresário. Eu gostaria que você viesse comigo. Você traz sua assistente?
Uma viagem. Sem a equipe completa. Com Allison, sua assistente, que era
uma mulher na casa dos 60 anos e preferia dormir cedo a acompanhá-la às
reuniões noturnas. Ela sabia que Paul não faria nada que ela não permitisse,
ainda assim...
— É uma ordem ou uma pergunta? — respondeu com um sorriso que não
tinha nada a ver com flerte.
Paul se inclinou e colocou as mãos sobre a mesa.
— Uma pergunta, Rachel. Eu deixei muito claro que eu amo sua
companhia, além do plano de trabalho. E você também sabe que eu nunca
faria nada que pudesse prejudicar sua carreira nesta empresa. Você é
eficiente, inteligente e bonita. Este último nada tem a ver com o seu perfil
profissional ou com o fato de eu ter te contratado. E a anterior é uma pergunta
por que, assim que sairmos da reunião com esse empresário, pretendo
convidá-la para jantar comigo. Fui claro, direto e sincero?
Rachel não pôde deixar de rir. Talvez tenha sido isso que a atraia em Paul.
Não achava que estava tudo bem dormir com um homem e sair com outro.
—Como sempre — respondeu — Mas eu não estou disponível. — Não ia
contar ao chefe sobre sua vida privada, mas pretendia colocar de lado a
questão da atração mútua de uma vez por todas. — Queria dizer que sim,
mas, Paul, minha profissão é transcendental para mim e eu não gostaria que,
se algo não der certo, vir trabalhar na empresa em vez de ser uma motivação,
seja um calvário.
Paul ficou em silêncio por um tempo.
— Tinha de tentar — disse com um amplo sorriso. — Merece um
aumento salarial pelo teu excelente desempenho no último ano. Vou enviar
um comunicado aos recursos humanos. Está bem?
Ela ficou atordoada, até que seu cérebro se reconectou.
—Bem, obrigada...
— Pelo contrário. — Seu tom era calmo e em nenhum momento pareceu
ter ficado desapontado com a rejeição de Rachel. — Por favor, elabore uma
lista dos últimos contratos que fechamos e faça uma projeção com base na
estratégia de expansão corporativa. Entre em contato com o departamento de
investimentos e fusões, eles devem fornecer a você um relatório completo
sobre despesas e receitas fora de sua área, a fim de expor a este empresário da
Califórnia o que ele teria na mesa no caso de eu decidir me juntar a ele como
sócio.
— Claro. — Era a quarta ocasião, em seis meses, que ele a convidava
para sair. E estava convencida de que era a última.
Ela foi até a porta, e seu chefe já estava no telefone falando em francês
com alguém que com certeza prometeu alguma renda extra para a Eckhart
Enterprises. Rachel sorriu e fechou a porta atrás de si.
“Paul é uma figura e tanto.”

***
Michael olhou entediado para o homem à sua frente. Tentou não revelar
suas preocupações ou desconfiança. Salmann & Buckend não representava
mafiosos, traficantes de drogas ou similares. O segundo sócio sênior a bordo,
Eugene Matthews, decidiu aceitar a votação do conselho e o contrato com
Gordov foi assinado.
—Eugene disse a ele que o contrato que assinei com este escritório de
advocacia tem a ver com minhas atividades comerciais relacionadas com
cabeleireiros e distribuidores de produtos de beleza? Negócio legítimo,
advogado Whitmore — ele disse com uma voz afetada pelo consumo
excessivo de cigarro.
Michael conteve uma resposta mordaz.
— Claro, minha equipe está revisando a papelada com seu advogado para
que eles possam nos repassar informações. E enquanto nos colocamos em dia
na firma sobre esses assuntos, pode me explicar sobre o que são as acusações
contra você da parte da senhorita Galloway? Assim poderíamos chegar a um
acordo com ela — ele respondeu com uma paciência que não tinha.
— Advogado, meu interesse é não ter nenhum tipo de comunicação com
aquela verme que quer me ver preso sem motivo. Como expliquei, preciso
que fortaleçam minha situação junto à comunidade por meio das atividades
legais que realizo para que a polícia pare de tentar reunir provas falsas contra
mim.
— Para reforçar seu perfil na sociedade, digamos especificamente na
polícia, é necessário que não haja intimidação ou extorsão a senhorita
Galloway.
—Tenta me ensinar?
Michael cerrou a mandíbula.
— Minha função é aconselhá-lo, senhor Gordov. Imagino que a minha
colega, Eileen, lhe tenha informado previamente dos prós e contras de Ações
que vão contra o quadro da legalidade. Uma das desvantagens é que seríamos
forçados a rescindir seu contrato assinado recentemente...
Gordov estreitou os olhos. Então relaxou contra o assento. Ele abriu a
lapela de seu caro terno vermelho em tons extravagantes e tirou um charuto.
Demorou para acendê-lo. Aspirou um sopro e logo a deixou sair lentamente.
— Só trabalho para o bem-estar da minha família. Tenho um filho de 15
anos. Quero dar-lhe um exemplo e uma boa vida. Minha esposa morreu há
dois anos de pneumonia. Por que deveria querer privar meu filho de seu pai,
advogado?
— Queria deixar claro e registrado que lhe fiz esta sugestão.
Gordov estendeu a mão e colocou as cinzas no cinzeiro. Deu outra tragada
no charuto.
— Uma vez resolvida a questão, o que gostaria neste momento é que um
dos meus inquilinos, que se recusa a abandonar o local que alugo há quatro
anos, seja avisado de que já é hora de desocupar o local. Legalmente claro. O
contrato de aluguel foi cancelado, por conta de uma das cláusulas, já que ele
deixou de pagar o aluguel há seis meses. Já sabe, ninguém gosta de se sentir
ridicularizado. Quero fazer da maneira certa, com os documentos em mãos.
Michael brincava com a caneta-tinteiro Tebaldi's Crew 60th White Gold.
Era um daqueles pequenos luxos que gostava de desfrutar. O mundo das
máfias, independentemente dos negócios que dirigiam, era perigoso. Gordov
tinha conexões em todas as esferas da vida e essas conexões podiam incluir
qualquer pessoa. Não tinha dúvidas de que um homem astuto como ele já
havia intimidado altos funcionários em instituições respeitadas. Todos tinham
coisas sujas e o tipo de gente como Gordov possuía informantes que se
encarregavam de cavar o suficiente para ter munição que servia como gancho
e intimidação.
— A advogada Angelique Cooper cuidará de sua papelada. Ela será o
vinculo, e comigo tratará apenas de detalhes específicos e claramente
relacionados a questões bancárias e investimentos precisos.
Gordov acenou com a cabeça e levantou-se.
—Sabe por que escolhi este escritório de advocacia, Michael? Posso
chamá-lo pelo primeiro nome, certo?
—Pode. — Ele também se levantou e ajustou o terno.
— Eu sei que é um homem muito inteligente, Michael, mas também sei
que saberá como lidar com a garota Galloway se necessário.
—Podemos dizer que não tenho contato com a senhorita Piper Galloway?
— perguntou sem responder à alusão anterior. Por acaso esse valentão
achava que estava tratando com alguém de sua laia? Vá esperando!
— Podemos dizer — Emilio expressou condescendentemente — que
independentemente de onde a Srta. Galloway esteja, meu interesse não é
encontrá-la... mas para evitar que a polícia tente me encurralar como um
criminoso. — Este último foi expresso em tom sarcástico, deixando claro que
tinha consciência de que o encontro estava sendo gravado e que, mesmo que
não fosse, nunca admitiria o tipo de negócio que realizava a quem ele não
queria
— Não trato de casos relacionados a assuntos penais, informo-lhe, só
estou aqui para o que tem a ver com contratos, bancário e financeiro.
Especialmente o último.
— Entendido. De qualquer forma, achei muito instrutivo cumprimentá-lo.
— Parte do meu trabalho é atender novos clientes ou que requeiram uma
reunião. Sendo Salmann & Buckend seu escritório de advocacia
representativo, pode confiar em nós. Caso contrário, será impossível ajudá-
lo... em qualquer exigência futura.
Emilio soltou uma gargalhada. Era áspera. Diabólica.
— Não confio nem na minha sombra, Michael. — Deixou uma mão sobre
a maçaneta da porta de vidro da sala de reuniões principal —. Agradecerei
que leve a representação de meus negócios legais da melhor maneira
possível. Tem que tirar vantagem das coisas positivas. Não acha?
— Qualquer incidente particular sobre Piper Galloway teria que ser
tratado diretamente com a advogada Eileen Roberts. Eu só estou em um
manejo, como expliquei, periférico da área bancária que lhe compete. O
assunto dos contratos será tratado pela advogada Cooper.
Emilio inclinou a cabeça para o lado. Tinha o rosto marcado de cicatrizes.
Uma varíola mal curada.
— Agradeço as informações esclarecedoras.
—Senhor Gordov — Michael chamou, ajustando sua gravata Tom Ford.
O referido olhou para ele com relutância. — Como advogado deste escritório,
devo deixar claro que, caso você me forneça qualquer informação que possa
estar associada a atividades, ações ou atos ilegais, tenho o dever moral e
constitucional de levá-lo às autoridades.
O homenzinho de origem hispano-marroquina aproximou-se dele. Ele era
muito mais baixo do que Michael, mas mesmo assim era sua aura de perfídia
e hostilidade que o fez ser visto como um homem maior.
— Valorizo ​muito a vida das pessoas... Michael. Bom Dia — disse.
Então saiu.
Michael ficou de pé por muito tempo.
Era uma ameaça, mas ele não temia. Tentaria estar o mais longe possível
do maldito Gordov e de tudo que tivesse a ver com o nome Galloway. É
quase como se uma maldição estivesse atrás dele.

***
Três semanas. Rachel não conseguia acreditar que o tempo havia passado
tão rápido. À medida que conhecia Michael, ela ficou entre a escolha de
confessar quem era e dizer que o odiava e não queria saber mais nada dele,
ou se aprofundar nas conversas para extrair mais informações. Este último
teria feito Michael suspeitar de seu interesse tão marcado por seu passado.
Não devia esquecer que ele era um advogado. Tinha que andar com cuidado
com essa corporação.
Durante esse tempo, ele a convidou para sair. Ele o apresentou a Kyle
Bronson, seu melhor amigo de todos os tempos, e cuja filha de dez anos era
afilhada de Batismo de Michael. Foram dançar e ela ficou surpresa que, até
na pista de dança, Michael era muito habilidoso.
As noites eram outra realidade. A forma de fazer amor foi se tornando
mais intensa, possessiva, apaixonada. Sentia-se subjugada pela maneira que
tinha de tocá-la e fazê-la chegar ao limite, e novamente começar até altas
horas da noite.
Quase estabeleceram uma espécie de rotina. Eles se viam todos os dias. Ao
anoitecer. Michael, a cada dois ou três dias, ficava para passar a noite em seu
apartamento, e ela fazia o mesmo, de vez em quando, na casa dele. Ela
adorou conhecer a casa em que ele morava. Lincoln Park era uma área
clássica e aconchegante.
A casa de Michael tinha dois andares. Uma varanda que convidava a
querer passar a tarde e salões muito espaçosos. Não havia decoração em
excesso. Tudo estava organizado. A cama de Michael era confortável e
deixava muito espaço para se movimentarem. Ela descobriu que estava
gostando da companhia desse homem, e os sentimentos que estava
começando a sentir a perturbavam.
Não fez nenhum progresso em sua investigação, embora tentasse ler nas
entrelinhas em suas conversas com Michael. Era impossível que esse homem
fosse tão transparente. Não acreditava que fosse possível. Tinha que ter algo.
Continuar indefinidamente ao seu lado, como sua amante, era uma idiotice.
Precisava se afastar um pouco. No entanto, a simples ideia de nunca mais
fazer sexo com Michael novamente causava uma leve pontada em seu peito.
Sim, ela sabia do que se tratava. Era a sensação de culpa por não ter
encontrado resultados logo. Que outra coisa, se não isso?
Por outro lado, Henry havia ligado há cinco dias.
Tomaram um café, e Henry confessou que se sentia inseguro porque ela
dificilmente retornava suas mensagens. Então decidiu ser sincera. Disse-lhe
que estava saindo com alguém e pediu desculpas por não ter se atrevido a
falar com ele antes. Henry era um doce, lhe disse que quem quer que esse
homem, era um sortudo.
E então Rachel se sentiu como um nada. Em que ponto da equação deixou
de ser uma pessoa ciente dos outros? Como ela poderia ter esquecido que ela
e Henry estavam saindo? Bem, havia uma maneira de explicar com um nome,
um sobrenome e algumas posições sexuais muito engenhosas que...
—Ei! Você está comigo ou na lua? — Delaney perguntou estalando os
dedos na frente de sua melhor amiga.
Rachel olhou para Delaney com um sorriso. Além do trabalho árduo que
tinha, Del não tinha estilo para se divertir muito. Depois de tudo organizava
festas a toda hora e isso era muito esforço. Mas se não falhava a memória,
Del acabara de lhe dizer que queria sair para dançar. Em uma terça à noite!
—Tem certeza Del? Você tem uma reunião com sua cliente estrela amanhã
e certamente você precisa de todas as suas ideias... sóbria— perguntou com
uma risada.
Delaney revirou os olhos.
— Eu acho ótimo que Bianca queira se comprometer a cada sete meses,
Rachel. Em seguida, terminar o noivado. E isso beneficia meu negócio.
— E fez uma despedida de solteira, e uma festa de comemoração por ter
deixado aquele...
— Bastardo e egoísta mulherengo — disseram ao mesmo tempo entre
risos.
Tinham pedido comida italiana. Canelones de pangora em molho de quatro
queijos. Uma daquelas iguarias que podiam pagar, bem pelo menos aquela
que queimava muito bem seus carboidratos e não tinha que se preocupar de
que não lhe coubesse o sutiã. Algo que a Rachel não podia dizer, mas
também não ia ficar como aquelas mulheres absurdas com água e laranja,
privando-se de uma boa comida. Por outro lado, Michael não tinha queixas
sobre suas curvas, na verdade, ele as reverenciava a cada beijo e…
—Rachel! Em que planeta você está? Mal tomou duas taças de vinho. Não
é motivo para tanto. Ou você já perdeu o bom hábito?
Sentadas à mesa, com um copo de vinho na mão, estavam na verdade mais
bêbadas do que animadas para se vestir e festejar. Rachel gostava de entrar no
jogo com sua melhor amiga. Já sabia que Del era uma bêbada ruim. Depois
de quatro taças, estava fora do ar. E já tinha tomado seis.
— Claro que não. Eu bebo regularmente, mas tenho muito trabalho e às
vezes você sabe que começo a descobrir como resolver as coisas fora do
escritório —mentiu.
—Ah! Como se eu não te conhecesse. Agora o que você está fazendo,
Rachel? — perguntou de repente, apontando para ela com um garfo cheio de
macarrão — Confessa.
Rachel riu da maneira como Del entortava os olhos.
— Não sei o que quer dizer — respondeu, dando conta do último pedaço
de seu prato. Estava delicioso — É tarde — olhou para o relógio de pulso em
sua mão esquerda — e amanhã eu tenho que trabalhar. Vou para meu
apartamento para descansar.
Delaney deixou cair o garfo estrepitosamente sobre o prato. Colocou o
cotovelo na mesa e apoiou o queixo na palma da mão. Olhou para Rachel
com desconfiança.
— Uma das vantagens de estar meio bêbada é que você fala sem papas na
língua.
— Quando foi diferente estando sóbria? — perguntou com uma risada.
— Eu vi isso, Rachel.
—Eh?
— Eu sei que é Michael Whitmore. Outra noite cheguei quase às onze da
noite e o vi no elevador. Ele não me conhece, claro. Mas o único botão que
estava apertado era o 12º andar. Sabe quem vive nesse andar?
—Del…
—Exato! Seu! Minha melhor amiga que, por três semanas, ou quem sabe
quantas mais na verdade, tem escondido o namorado de mim.
— Ele nao…
— Não me interrompa. Eu reconheceria aquele homem em qualquer lugar.
Sabe por que Srta. Galloway? — Rachel não se preocupou em responder —.
Porque o único interesse que eu sei que você tem por ele está ligado à
vingança, por isso você guarda um recorte de sua fotografia. Daquele velho
jornaleco de dez anos atrás. Como é possível que tenha guardado algo assim?
—E como você poderia ter visto isso? — perguntou furiosamente. Nunca
ficava zangada com Delaney, mas não deixava esses detalhes à vista do
público.
— Porque uma noite, quando fiquei para dormir no seu apartamento,
encontrei você chorando e jurando que o faria pagar por tê-la decepcionado.
— Isso aconteceu há muito tempo, mal tinha voltado do Maine.
—Tanto faz! Como é que você conseguiu fazer amizade com ele? E por
Deus, não ouse dizer que não pode me dizer nada porque estou bêbado. O
álcool pode fazer com que eu aperte os olhos e fale a 2 mil por minuto, mas
meu cérebro está funcionando de forma consistente e não tive apagamento de
memória.
Rachel cruzou de braços. Fulminou-a com o olhar. Já que Delaney não ia
desistir e não queria brigar por besteiras, ela decidiu confessar tudo. Esteve
jorrando palavras por quase vinte minutos. Quando terminou sentiu que um
grande peso havia saído de seu corpo. Respirou fundo e logo soltou o ar
ruidosamente.
— Bem… — Del murmurou. Tinha se acalmado. Não sobrou nada em
seu prato, nem sobrou nada na garrafa —. Acho que você cometeu um erro,
Rachel.
—Por quê?
— Você não é uma mulher que pode dormir com um homem que não se
importa.
— Eu me importo, porque seu vínculo comigo tem um fim.
— Você tem um coração de ouro, e se Michael descobrir que você o está
usando…
—Então o que? Ele arruinou minha família, a única coisa que restava para
mim. Eu tive que viver três anos fora da minha cidade natal. Longe de todos
os meus amigos aqui em Chicago, de você, Del. A única coisa que farei é
encontrar um motivo para retribuir a afronta.
— Mas nem sabe que é culpado. Ele era apenas um advogado fazendo seu
trabalho.
— Oh ele é, claro que é culpado. Na primeira noite em que estivemos
juntos, me contou sobre Piper. Não disse o seu nome, mas foi o caso da
minha irmã. Chama fazer o trabalho incriminando uma pobre garota e fazê-la
pagar por crimes que não cometeu?
— E se o seu plano não funcionar?
— Eu não pensei que não poderia funcionar.
Delaney olhou para ela com pesar.
— Se encontrasses algo que magoasse Michael e a sua família. Depois de
divulgá-lo, você realmente se sentiria melhor? Acha que faria justiça a Piper?
¿ Piper, uma mulher adulta, quase onze anos mais velha que você, que
quando você era criança sabia melhor do que ninguém o que estava fazendo?
— Espero que você não tente me dizer que minha irmã é culpada —
acusou-a.
Del se levantou. Pegou os pratos e os colocou na máquina de lavar louça.
—Não, Rachel. O que estou tentando dizer é que você está cometendo um
erro grave, porque está travando uma batalha que não é sua. Se Piper é
inocente e quiser provar que foi presa por injustamente, ela encontrará um
jeito. Te pediu ajuda? —Rachel negou—. Exato. Ela só quer deixar o passado
para trás, mas aparentemente você insiste em voltar a ele e alimentar um
rancor irracional.
—Eu perdi minha família! O culpado tem que sentir o que eu senti. A
desolação que experimentei tantos anos! — exclamou perdendo a paciência
—. Não pode me entender porque você sempre teve a sua. Todos felizes.
Alegres. Sem problemas de reputação e menos de dinheiro.
— Mas eu perdi o Mauricio Rachel — ela respondeu suavemente,
lembrando-se do homem com quem pensava em se casar, se a morte não o
tivesse levado embora de repente —. Cada pessoa experimenta a dor e a
perda de um ente querido de maneira diferente, mas isso não significa que dói
menos ou mais que o que você sentiu...
Isso a fez reconsiderar. Estava sendo injusto com Del.
— Desculpe...
— Apenas pense no que você faz. Depois de atingir seu objetivo, as
consequências podem não ser o que você espera. — Ela se aproximou de
Rachel, abraçou-a e sua amiga retribuiu o gesto — Eu termino de recolher
aqui. Vá descansar.
—Del.
— Está tudo bem, Rachel, sério. Amanhã farei uma viagem ao rancho da
família. Meu avô tem oitenta e oito anos. Fiquei de organizar a festa. Será
sábado à noite. Muitos amigos, bebidas e bem...
— Uau, uma grande celebração.
—Gostaria de vir? Minha família ficará feliz em vê-la. Será uma festa
bonita.
— Acho que não, Del. Tenho assuntos pendentes...
Del assentiu.
— Claro. Descanse Rachel.
Rachel ia dizer mais alguma coisa, mas preferiu pegar suas coisas e ir para
casa.
C A P Í T U L O 9

O show de blues terminou em meio a aplausos do público.


O salão principal do hotel Waldorf Astoria Chicago estava lotado. Os
ingressos custavam dois mil dólares cada. Os rendimentos iriam diretamente
para uma organização sem fins lucrativos dedicada a ajudar mulheres
resgatadas de redes de tráfico de seres humanos em Illinois.
Grandes empresários se reuniram para mostrar seu lado altruísta e, entre
essas pessoas influentes, também se destacaram os advogados dos mais
prestigiosos escritórios de advocacia da cidade. No final do dia, Kyle ligou
para Michael para avisar que seu voo estava atrasado e que não poderia
comparecer ao evento. Perguntou se não se importaria de levar sua esposa,
Zayda, já que era uma das mulheres organizadoras do evento e não queria
que ela passasse um momento ruim sozinha.
Michael não hesitou. Kyle nunca falhou com ele. Gostaria acompanhando
Rachel, mas ela estava em uma viagem de negócios em Los Angeles, então
não poderia vê-la por alguns dias. Não podia negar que sentia falta dela, mas
também não queria se apressar em nada. Queria deixar que seguisse o curso
de acordo com o rio.
—Michael? — perguntou uma voz atrás dele. Zayda subiu ao palco
agradecendo publicamente aos músicos que vieram de Nova York.
Ele se virou. A última pessoa que esperava encontrar era sua ex-esposa.
Desde o momento em que se reuniram para assinar os papéis do divórcio no
escritório de advocacia no setor jurídico para o qual Kyle trabalhava,
Gunsther & Shadowiks, nunca mais a viu. A sua separação foi civilizada.
Quando Ingrid tentou consertar as coisas, pedindo perdão, ele recusou. Para
quê? Ela havia violado o princípio fundamental de um casamento: respeito e
lealdade.
Apesar de ter assinado o divórcio, Ingrid continuou procurando por ele,
tentando reconquistá-lo. Uma noite ela apareceu em sua casa, recém-
adquirida na época, vestida com as roupas de Eva. Ele era um homem com
todos os sentidos ativos, e sua ex-mulher tinha um corpo lindo. Por que negar
o óbvio? No entanto, sua integridade como pessoa e sua autoestima não lhe
permitiam ceder aos seus impulsos. Ele a dispensou graciosamente, e essa foi
a última vez que Ingrid tentou se aproximar dele.
—Ingrid — ele disse como forma de saudação.
Usava um vestido azul claro, justo, em um corte de sereia. Ela ainda tinha
aquela figura espetacular e o cabelo loiro ondulado e brilhante até os ombros.
Lábios rosados ​e olhos castanhos expressivos eram sua marca registrada.
— Há quanto tempo — comentou com um sorriso tímido —. Está com os
Bronsons esta noite?
— Com Zayda, sim.
— Eu gostaria de cumprimentá-la pessoalmente — respondeu olhando
para o palco — A sala está muito cheia. Onde está o Kyle?
— Voando para cá — disse com um tom cortante. Não era mal educado.
Não sentia nada por sua ex-esposa, mas tampouco podia desprezá-la
deixando-a com a palavra na boca — O que o traz para o evento de gala? —
perguntou. Ele se lembrava claramente de que Ingrid odiava qualquer coisa
que tivesse a ver com galas ou eventos beneficentes.
Ela corou.
— Estou com o meu marido. Casei novamente há um ano...
— Parabéns, Ingrid. Agora tenho que ir com Zayda, sou seu
acompanhante de hoje. Foi bom te ver...
—Espera — disse pegando-o pelo antebraço. Michael olhou para ela —
Eu me casei há um ano. Meu esposo... foi um acordo comercial pelos
negócios hoteleiros da minha família — continuou com a voz triste, mas
tentava dissimular— O casamento tem prazo de validade. Até que as
empresas consigam aumentar seu capital por fusões que não me interessam.
Oito meses mais continuarei casada...
— Não sei como isso pode me interessar, Ingrid. De verdade.
— Michael, a cada dia que passa, lamento como me comportei com você.
Pela maneira como eu estraguei nosso casamento.
— Ingrid, isso não faz sentido. É um absurdo que a primeira coisa que
você faça quando me vê depois de tantos anos seja falar de um casamento
que está na história.
O olhar de arrependimento da mulher não comoveu Michael.
— Eu entendo... eu só...— encolheu os ombros —. Acho que estava
tentando fazer algo que estava esperando há muito tempo... e era para falar
com você. Desculpe, Michael. Eu me sentiria mal se minhas ações te
marcaram ao ponto de desconfiar das mulheres e dos relacionamentos.
— Não precisa se desculpar — ele disse secamente — Minha vida
privada e meus sentimentos não dizem respeito a você. Já faz muito tempo e
não temos nada em comum. Boa sorte na sua vida e continue aproveitando o
evento.
Ela sorriu sem alegria.
— É um bom partido. Espero que a mulher que realmente te conquista
saiba disso.
—Uma dança, senhores! — exclamaram do palco interrompendo a
resposta que Michael tinha na língua. — Uma cortesia do grupo estrela de
Nova York, o Golden Loop. Obrigado por vir esta noite. Aproveitem esta
música no verdadeiro estilo do blues!!
Todos os presentes, que estavam de pé, sorriram entre si. Houve
murmúrios e, de uma forma bastante rápida, logo eles estavam em pares. Um
fotógrafo se aproximou de Michael e Ingrid foi absorvida por um grupo de
pessoas que a reconheceram como a esposa de um importante empresário
canadense. Ingrid não teve escolha a não ser olhar tristemente para o ex-
marido, apertar sua mão e se permitir ser cercada por bajuladores que
conheciam sua imensa fortuna. Segundos depois, seu lindo marido por
contrato estava ao seu lado, lembrando-a de que ele era seu presente e que
nunca mais consertaria seu passado.
— Uma foto para o Chicago Tribune? — perguntou um fotojornalista,
tirando Michael de sua surpresa.
—Eh...
— Claro — Zayda entrou na conversa, aparecendo de repente, para
grande alívio de Michael. Posaram para a foto, sorrindo — Ele é o advogado
Michael Whitmore e eu sou Zayda Bronson, uma das organizadoras do
evento.
— Anotado, senhora — disse guardando a caderneta para depois colocar
as legendas na foto — Será lançado na edição de amanhã. Digital e impresso.
Quando o fotógrafo desapareceu, Michael já estava dançando com Zayda e
grato por sua presença oportuna. Estiveram conversando sobre tudo um
pouco. A esposa de Kyle era um encanto, e tinha tirado seu melhor amigo da
liga de mulherengos da cidade. É um grande mérito ter roubado o coração do
patife do Kyle.
A dança terminou e Michael esperou que Zayda se despedisse de todos.
Quase às quatro da manhã, se dirigiram para a casa dos Bronson.
—O que Ingrid queria? — Zayda perguntou, olhando para Michael com
seus olhos verdes escuros. — Acho que foi uma sorte que o fotógrafo do
Chicago Tribune não os fotografou juntos...
Michael soltou uma gargalhada, enquanto estacionava na casa de seus
amigos de toda a vida. Apagou as luzes do carro. Olhou para Zayda.
— Foi muito oportuno você estar por perto. Acho que seu presente de
aniversário pode melhorar este ano. —Zayda riu — Contou-me um pouco
sobre ela e se desculpou comigo.
A esposa de Kyle deu um assobio deselegante que fez Michael rir.
— Eu não sabia que compareceria, sabe? Na verdade, nós convidamos
muitas pessoas, mas eu não cuidei exatamente dos convites. Só cuidei da
música e dos arranjos florais do salão.
Michael fechou os olhos.
— Minha visita ao evento foi inesperada, enfim, como está minha
afilhada?
O sorriso de Zayda sumiu um pouco.
— Já sabe que é uma menina muito ativa, mas faz três dias está apática.
Parece decaída. Não gosto de vê-la assim.
— Será questão de lhe dar mais vitaminas, porque essa diabinha da
Michelle é incansável.
— Tem razão, e além disso seu aniversário é este fim de semana. Faremos
um churrasco com algumas de suas amiguinhas da escola. Você está mais do
que convidado. tenho certeza que o esquecido do Kyle não te disse.
— Sabe como é nosso bom Kyle com sua memória para eventos — disse
de bom humor — Tenha certeza que estarei lá.
— Boa noite, e obrigada, Michael —Zayda se despediu.
—Espera — disse o advogado. A esposa de Kyle virou-se. Michael
abaixou o vidro —. Você se importa se eu trouxer uma pessoa comigo?
—Uhhh, isso significa que estamos saindo com alguém que não se chama
Heidi, ou Lady, ou algum nome ridículo. Certo?
—Muito engraçado.
Naquele momento, Kyle apareceu na porta. E ele apertou a mão de
Michael. Ao vê-lo, Zayda sorriu amplamente.
— Claro que você pode, afinal, assim minha filha ganhará um presente de
aniversário duplo.
—Conte com isso.
Michael apertou a mão de seus amigos e seguiu o caminho para casa.

***
Olhou para o Chicago Tribune novamente. A mulher era incrivelmente
bonita. Ele não comentou sobre aquele evento de gala. Afinal, por que
deveria avisá-la? Ela não tinha motivos para ficar com ciúmes. Michael não
era seu marido nem seu namorado, apenas... O que era? Seu encontro
exclusivo para sexo e longas conversas? Era um pouco complicado colocar
um rótulo, pois embora aparentemente estavam saindo com exclusivo, ele
não tinha estabelecido nenhum limite.
Colocou o exemplar de lado. Olhou para o quadro de cortiça em seu
escritório que tinha algumas fotos de seus pais, sua irmã e alguns momentos
importantes de sua vida. Ela havia passado dois dias em Los Angeles, em
tantas reuniões, uma após a outra, que não se lembrava de que estava viva até
chegar ao seu quarto de hotel e terminar com as garrafas de bebida do
frigobar.
Ao sair do escritório teria que comprar um presente de aniversário para a
afilhada de Michael. Os amigos sempre eram uma boa fonte de informação e
os espaços familiares eram propícios a isso.
Há uma semana que não tinha notícias da Piper. Isso a preocupava, embora
soubesse que a polícia era muito eficiente no momento de proteger
testemunhas. Ou informantes, no caso de sua irmã. Talvez Piper ficasse feliz
em acompanhá-la à loja de brinquedos e eletrônicos. Claro, não pensava
gastar uma fortuna no presente, mas tampouco queria dar qualquer porcaria à
garotinha.
Desceu de elevador até o estacionamento, onde seu carro estava. Saiu a
toda pressa do estacionamento, e se dirigiu ao apartamento onde sua irmã
morava. Na área do Hyde Park. Os preços do aluguel eram acessíveis, e pelo
menos Piper concordou em deixá-la pagar a metade do aluguel. Um avanço e
tanto, Rachel pensou.
Quando encontrou o prédio de cinco andares, estacionou.
O oficial encarregado de proteger Piper, Dalton Callaway, a revistou e
questionou até que teve certeza de que ela poderia passar sem causar nenhum
dano físico a Piper. Gostou de saber que sua irmã estava segura. Quando ela
abriu a porta, o rosto de surpresa era mais que perceptível.
—Rachel... tudo bem?
— Claro. Sei que tem o dia de folga hoje, então queria saber se gostaria de
vir comigo fazer compras.
O olhar de Piper adquiriu um brilho especial.
—Sério?
—Claro! Tenho uma festa de aniversário de uma menina de dez anos e
gostaria que me acompanhasse para escolher o presente. Está ocupada?
Piper soltou uma gargalhada.
— Dalton cuida das minhas costas. E de fato, ele tem que vir comigo.
Parte do sistema de segurança.
— Claro que ele vem com a gente —disse extasiada diante da ideia de
passar o dia com sua irmã, que raramente se permitia não só um sorriso, mas
sair de casa para outros lugares que não fosse a cafeteria onde trabalhava.
Rachel a compreendia.
Passaram a tarde fazendo compras no Water Tower Place, um Shopping
Center de oito andares para enlouquecer qualquer cliente que quisesse
aproveitar o tempo na Michigan Avenue. O humor de Piper melhorou a
medida que entrava em uma e outra loja.
As irmãs experimentaram sapatos, blusas, entraram na Sephora e gastaram
uma boa quantia em maquiagem. Na verdade, Rachel gastou, e Piper deixou-
se mimar. Aos poucos, parecia que suas barreiras iam enfraquecendo e ela
tentava ser um pouco a mesma de muitos anos atrás. Pelo menos com sua
irmãzinha.
Exaustas e com um sorriso no rosto, saíram para deixar as sacolas no
carro. Em seguida, encontraram um lugar para comer e sentaram-se para
encher as veias de energia. Ou pelo menos esperavam com um milk-shake de
Butterfinger e um delicioso e gorduroso, hambúrguer. Elas o devoraram com
gosto. Conversaram sobre os últimos lançamentos de filmes. Piper contou a
ela sobre as histórias engraçadas na cafeteria, e Rachel sobre Paul, mas nunca
mencionou Michael.
— Deveria sair com alguém, Rachel. É tão jovem e bonita. Você me
lembra muito a mamãe...— Piper disse, limpando a boca com um
guardanapo. — Por que não aceita sair com esse tal de Paul?
— Ele é meu chefe como eu te disse. Realmente acha que eu pareço com a
mamãe? — ela perguntou ansiosamente passando os dedos pelos cabelos.
—Sim perguntou com saudade passando os dedos sobre o cabelo... Eu os
carrego com carinho em minha memória. Rachel, eu pensei em sair da
cidade.
—O quê? Não pode estar falando sério! Mal saiu da prisão, preciso de
você, por favor, Piper... além disso, têm que deter Gordov. Quem sabe o que
ele faria com você se te visse ou mandasse aqueles bandidos...
O tom desesperado de Rachel levou Piper a pegar a mão de sua irmã.
Apertou os seus dedos com carinho.
— Estou feliz que você veio me ver hoje. Rachel... é difícil para mim te
dizer isso, porque eu sei que você se preocupa muito.
—Você é minha única família... e tia Ariel! Mas ela está longe. Não quero
te perder.
— Rachel, Gordov está me procurando. — Isso a deixou sem palavras,
então Piper continuou — Dalton está ciente, assim como seu parceiro,
Edward, que faz as rondas noturnas postado na porta do meu apartamento. Já
comentei com você que às vezes a informação nas ruas voa. Sei que tem
perguntado sobre mim. Hoje não estava de folga, fui forçada a me demitir
pela segurança dos donos que foram tão bons comigo.
—Mas...
— Ouça, irmãzinha. Gordov contratou um escritório de advocacia para
defendê-lo e colocar seus negócios em ordem. Não tenho dinheiro para me
defender caso ele tente algum truque, e acredite, aquele traficante é capaz de
tudo. Não quero voltar para a prisão, não quero voltar a passar pelo inferno.
— Piper baixou o olhar.
— Rachel, eu sei que estão procurando por mim. Eu não sou uma idiota. E
Dalton e Edward me explicaram muito bem como essa situação funciona. Por
isso não saio de casa. Entende? Tenho que ser cuidadosa.
—Acha que nos seguem agora?
Ela negou.
— Estar perto de mim coloca você em perigo. Por favor não me procure
de novo, Rachel.
— Eu tenho dinheiro — ela disse desesperada — Agora eu tenho uma
conta especial e boa. Eu posso pagar qualquer escritório de advocacia que
você quiser. O melhor, Piper.
— Sim, mas há algo que nenhum advogado pode evitar.
—Como o que...? Que o pessoal do Gordov possa plantar provas falsas?
O olhar triste da Piper encolheu o coração da Rachel.
— Me matar é mais fácil que ter todo esse trabalho.
Rachel sentiu um frio gelado correr pelas costas.
—Qual firma está representando Gordov, Piper?
— Uma das grandes.
— Se descobrir, me enviará uma mensagem dizendo?
Piper franziu a testa.
—Para que você precisa dessa informação, Rachel? Pode perguntar a
Dalton, às vezes eles me colocam em alerta. São boas pessoas. Não me
julgam.
— Não tem por que, é inocente. — Piper não discutiria com a irmã, já
sabia que costumava ser teimosa — Além disso, preciso dessas informações
porque assim poderia encontrar os concorrentes e contratá-los para você.
A ex-presidiária soltou as mãos da irmã e reclinou as costas no apoio
macio.
— Não será necessário. Esta será a última vez que nos veremos. Amanhã
mudarei de endereço e assim continuarei até que esta confusão se resolva.
Não tente me fazer mudar de ideia ou argumentar.— Rachel afundou em sua
cadeira. — É o melhor para nós duas. Ou pelo menos até que a polícia
encontre uma maneira de pegar Gordov e meu pescoço esteja seguro. Entrarei
em contato por mensagem de texto no seu telefone. Sempre, como até agora,
de um número diferente.
Rachel sentia vontade de chorar. Gritar.
—Como saberei onde está ou se está bem?
Piper sorriu.
— Eu deixarei você saber, embora não explicitamente. Você é muito
inteligente.
Sentindo uma mistura de desamparo e raiva, algo muito semelhante ao que
experimentou anos atrás, Rachel dirigiu até a casa onde Piper estava
hospedada. Dalton os seguiu de perto em um carro que não chamava a
atenção.
Ela tentou conter as lágrimas quando Piper a abraçou, dizendo que se
veriam novamente em breve e não perderiam as esperanças de que as coisas
se resolvessem. Esperou que sua irmã fechasse a porta. Avançou
discretamente até onde se encontrava Dalton.
— Policial, posso te fazer uma pergunta? — disse em voz baixa.
O homem de um metro e noventa de músculos intimidadores assentiu.
— Por compaixão, por favor me diga qual escritório de advocacia Gordov
contratou. Sabe disso, certo? — Dalton ficou em silêncio —. Por favor,
policial, Piper é minha única família. Sei que estou lhe perguntando algo que
não é usual, que não me daria essa informação em hipótese alguma, mas
apenas peço que se coloque no meu lugar. Piper é minha irmã. Perdemos
mais de uma década. Ajude-me, diga-me qual empresa representa Gordov.
Quando ela estava prestes a perder as esperanças, a voz profunda do
policial, apenas para Rachel ouvir, emergiu.
—Salmann & Buckend.
— Obrigada —murmurou com um nó na garganta que pouco a pouco se
desfez.
Uma vez em seu carro, Rachel olhou para a caixa de fones de ouvido Beats
que comprou para a afilhada de Michael. Estava furiosa. E com essa raiva
ligou o motor de seu carro e arrancou a toda pressa.
C A P Í T U L O 1 0

Michael odiava ter que trabalhar em casa, mas também não tinha vontade
de ficar até de madrugada no escritório. Nesse caso, não teve outra opção,
principalmente quando acabava de receber uma solicitação direta de Dereck
sobre um caso em que ambos trabalhavam relacionado à fusão de dois
grandes bancos da cidade. Escolheu ir para seu escritório pessoal. A casa
estava silenciosa e tentou deixar livros de suporte legal para eventualidades
ou urgências.
Por volta das dez da noite, ouviu uma batida na porta. Franziu a testa e
deixou de lado a caneta. Estava com as mangas da camisa dobradas e uma
calça de corte chinês preta, descalço. O chão era acarpetado, então preferiu
deixar seus sapatos no quarto para trabalhar à vontade. E sempre com uma
xícara de café fumegante, embora a que tinha já estivesse bem fria devido à
concentração excessiva. Quando isto acontecia, perdia a noção do tempo.
Se não fosse por aquela batida, poderia ter ficado até as quatro da
madrugada sem se dar conta.
Relutantemente, ele se levantou. Esfregou os olhos. A temperatura externa
estava abaixo de zero, mas ele estava muito confortável com o aquecimento
em casa. Olhou pelo olho mágico da porta. Abriu imediatamente.
— Bem, que surpresa agradável, Verônica — ele disse com um sorriso
sincero. Michael franziu a testa quando abriu a porta para ela e, em vez de
dizer qualquer coisa, o cumprimentou com um aceno ridículo. — Verônica?
Ela ainda não respondeu, mas estava olhando para ele. E quando seus
olhos se encontraram, tirou o lenço. O par de luvas e em seguida a jaqueta de
couro. Tirou o elástico que prendia seu cabelo avermelhado brilhante. Ela se
inclinou em direção às botas, sem se importar que o decote em V do vestido
azul deixasse seus seios e sutiã praticamente à vista sem grandes obstáculos,
deslizou o zíper lateral de cada uma e depois as colocou de lado. Com
parcimônia e decisão, tirou a legging preta, deixando as pernas livres. O
vestido era bem curto visto assim.
Michael sentiu sua ereção começar a crescer.
— Acho que o silêncio faz parte da sua sedução, certo? — ele perguntou
se aproximando. Com seus braços, acariciou os braços nus dela. Ela sentiu
sua pele arrepiar.
O sorriso de Rachel tinha tudo a ver com raiva e pouco a ver com luxúria,
mas essa não foi a interpretação de Michael. E bem no fundo dela, Rachel
sabia que uma linha tênue de diferenciação entre as duas a empurrou para a
casa do advogado sexy. Estava ciente de que não poderia conter a raiva em
seu rosto e apenas sentiu que havia uma maneira de expulsar seus demônios
sem estragar seu plano.
— Espero que neste exato momento a última coisa que você queira falar
tenha a ver com minhas estratégias vindo aqui — Rachel disse colocando as
mãos em volta do pescoço para deslizar o zíper do vestido, que caiu como
uma nuvem de seda aos seus pés descalços.
A risada rouca de Michael se transformou em uma expressão de
admiração. Ele segurou seu rosto com uma mão e acariciou seu lábio inferior
com o polegar. Aquela pequena mulher tinha um jeito de deixá-lo louco. Que
homem com sangue nas veias não gostava de ser surpreendido numa sexta à
noite por uma mulher que o incitava ao prazer?
— Você é linda Verônica — expressou antes de beijá-la.
Ela não cedeu à suavidade que ele tinha intenção de oferecer. Pelo
contrário, se agarrou aos seus lábios e devorou com raiva e intensidade
aquela boca. Enterrou seus dedos no cabelo de Michael e quando ele
equiparou seu impetuoso ardor, suas línguas se encontraram, suas gargantas
gemeram de ansiedade e seus corpos se moveram juntos até que avançaram
para a área mais próxima para se acomodarem. O tapete da sala do piano à
direita.
Não houve risos, não houve palavras. Era apenas a troca mais básica e
primitiva de desejo feroz. Rachel praticamente arrancou sua camisa. Botões
se espalharam pelo chão. A calcinha de seda cinza e o sutiã combinando logo
caíram de lado. Arruinados. Ambos rolaram no tapete grosso em um
emaranhado de mãos, línguas e lábios.
Nus e suados, eles se beijaram e se arrastaram a alturas inimagináveis ​de
tentação. As mãos de Rachel masturbavam o longo e grosso pênis de
Michael, enquanto ele chupava seus seios sem qualquer dúvida, não se
importando com nada mais do que ouvi-la gemer, enquanto seus dedos
mergulhavam nas dobras molhadas, sem penetrá-la, apenas molhando-a,
tentando-a.
Rachel mordeu o ombro de Michael, ele não reclamou e intensificou suas
carícias nos seios dela e começou a deslizar os lábios pelo pequeno canal que
os separava. Ela foi forçada a liberar seu sexo, e antes que pudesse reclamá-
lo, Michael segurou suas mãos, acima de sua cabeça.
—Me solte! — pediu se contorcendo.
Ele a silenciou tomando sua boca, possuindo-a insistentemente.
— Nada disso, veio procurar prazer, certo? — ele perguntou, ofegante e
olhando para ela com a respiração instável. Ela estava em pé de igualdade,
mas seu olhar feroz, determinado a tomar as rédeas, a separava dele. Michael
estava alheio ao vulcão de emoções que operava em Rachel.
Ela se moveu sob seu peso. Era muito forte. Droga. O que ela queria era
deixá-lo louco, não que o contrário acontecesse.
—Me solte! Eu não quero que você esteja no controle — sentenciou,
virando a boca e movendo os quadris para tentar fugir, mas ele era mais ágil e
se posicionou entre as pernas dela. Seu sexo vibrante bem na entrada do
vértice mais íntimo de Rachel — Michael...— disse com um tom exigente e
determinado, que se perdeu no mar de desejo que estava por trás de suas
palavras.
— Impossível responder isso quando você está debaixo mim — ele
sussurrou contra seus lábios, antes de penetrá-la com uma única estocada.
Rachel parou de lutar. Ela foi dominada pela força, o cheiro mais exótico
que dois corpos sexualmente compatíveis produziam, e a maneira hábil como
ele a penetrou. Observou enquanto ele sorria, focado e determinado a agradá-
la. Ela odiava ter que aceitar o quão fraca era ao seu toque. E o quanto
gostava.
Pegando-a pelas nádegas para melhor posicioná-la ao entrar, Michael
continuou a balançar seus quadris, sentindo-a responder, tensa. Cerrou os
dentes, determinado a dar-lhe prazer primeiro, porque o prazer de Verônica
era o dele. Quando a sentiu ficar mole em seus braços, com um grito de
libertação se derramou dentro dela, e então enterrou o rosto no pescoço
delicado que exalava a essência de Verônica e seu perfume.
Vários segundos se passaram antes que Michael se recuperasse e se
afastasse dela. Com os olhos fechados, tentando conter as lágrimas, Rachel
sentiu seu corpo perder o contato mais íntimo com ele. Tentou recuperar o
fôlego. Ouviu-o procurando as roupas. Ela queria seduzi-lo novamente,
mostrar a ele que não poderia dominá-la que seus encontros sexuais não
poderiam ser mais poderosos do que seu desejo de se vingar dele.
—Verônica? — ele perguntou em um sussurro. Estendeu a mão e
acariciou sua bochecha. Estava úmida. — Querida, o que foi? Foi muito
brusco?
Ela virou a cabeça para não olhar para ele.
Droga. Por que suas lágrimas escolheram transbordar naquele momento?
Não deveria ter sido levada pela fúria quando deixou a casa de sua irmã. O
melhor seria ter ido para a academia. Descarregar a frustração e o sentimento
inconfundível de impotência injusta na aula de kickboxing das nove horas,
teria sido mais coerente, mas quando se tratava de sua família, ou do que
restou dela, não podia ser assim.
Não havia conseguido provar nada. Só o quanto era fraca enquanto tentava
não ser. Cada beijo, cada sussurro e palavra de Michael parecia penetrar sob
sua pele. Como um doce veneno que a consumia e ela gostava da tortura sutil
e deliciosa. Estava perdida.
— Verônica... fale comigo — ele pediu, acariciando as pálpebras
fechadas com o polegar.
Ela finalmente olhou para ele.
— Oi...
— Oi linda. Quer falar sobre isso?
— Sobre o quê? — perguntou querendo se fazer de desentendida.
Michael pegou um dos seios de Verônica e massageou suavemente,
olhando nos olhos dela.
— Uma mulher sexy vem à minha casa. Às dez da noite. Ela me
surpreende ao se despir no corredor e então me convida com seu corpo para
me deixar seduzi-la... se em troca eu esbanjar o mesmo prazer. Com esses
seios lindos— para provar que era, inclinou-se para beijar o mamilo que sua
mão acariciava — e a pele de seda, uns lábios enlouquecedores. — Inclinou-
se para beijá-la, longa e ternamente. — Também possui um lugar espetacular
feito para me perder com deleite. — Exemplificou suas palavras deslizando a
mão até o sexo de Rachel, e ao senti-la molhada, penetrou-a com seus dedos
hábeis.
—Michael, não...
—Michael, sim— respondeu e durante um longo tempo, nenhum dos dois
disse nada.
Ela se permitiu ser acariciada, beijada e mimada. Ele percorreu cada canto.
Cada pequena curva de seu corpo. Ele a fez pedir mais e não permitiu que ela
desse. Foi extremamente carinhoso. Girou-a sobre si mesma. Ele passou a
mão sobre sua barriga, enquanto ela movia avidamente sua bunda em direção
ao sexo ereto contra suas nádegas. Michael entrou nela por trás, sentindo não
apenas a suavidade de seu sexo inchado e úmido, mas também acariciou seu
traseiro arrebitado com a pele aveludada. Verônica era toda suavidade para
ele. Os sons vindos de sua garganta eram suaves, mas já haviam perdido
aquele fio de impetuosidade.
Antes de atingir o orgasmo, Michael se acomodou e pediu que ela se
deitasse de costas. Ele olhou para ela. Não havia rastro de lágrimas. Apenas o
brilho do desejo.
— Obrigada por ter vindo querida, sua companhia me faz bem — ele
sussurrou ternamente contra seus lábios, enquanto deslizava de volta para
dentro dela, para alcançarem o orgasmo juntos.

Horas depois, ainda nua, na cama de Michael, Rachel distraidamente


acariciou sua bochecha com o rastro de uma barba de três dias. Estava
dormindo. Ou assim ela acreditava, até que ele a surpreendeu com um
sorriso. Depois de terem feito amor duas vezes na sala do piano, eles
repetiram no balcão da cozinha. Ele redimensionou o conceito de sobremesa
noturna, quando a fez tocar o céu com a boca, apreciando-a de uma forma
que a fez corar. Em seguida, fizeram de novo contra a parede do banheiro,
enquanto a água caía em seus corpos.
No final, com uma calma que a apavorou, se entregaram ao desejo na
cama de Michael. Não se cansava dela, nem ela dele. Pareciam dois viciados
tentando não consumir a dose diária, mas sucumbiam não só a uma dose, mas
a quantas lhes fosse possível conseguir. Essa última vez era a que mantinha
seu cérebro inquieto e seu coração a ponto de sair do peito. Batia mais rápido
que de costume. Esse encontro havia mudado algo. Se olhasse nos olhos era
como se a alma transparecesse, mais íntimo que o próprio ato sexual.
— Você ainda não me disse o que há de errado, Verônica — disse
Michael.
Ela se rendeu ao inevitável. Mentir. Mais uma vez, faria a diferença? Ela
não estava com ele porque o queria, longe disso, mas porque tinha que
encontrar uma maneira de fazê-lo sofrer tanto ou mais do que ela.
— Eu tive um dia horrível no trabalho.
— Tanto para seduzir seu amante como se fosse o último dia de vida na
Terra? — perguntou com uma gargalhada. Ela deu-lhe um empurrãozinho
com o punho sobre o poderoso braço. — Quer falar sobre isso?
Rachel negou.
—Não importa.
— É importante para mim, porque nunca vi um olhar tão confuso em
você. Também não acho que seja uma das mulheres que chora no orgasmo.
Isso fez Rachel rir.
— Antes que aqueles dias difíceis cheguem, meus hormônios estão um
pouco alterados e, portanto, o humor muda — respondeu sentindo-se idiota
por um comentário tão machista, em uma mulher que proclamava alguns
postulados do feminismo, mas, não seria sensato usar certos detalhes a seu
favor? — Estou cansada.
A risada rouca ecoou no peito de Michael.
— Não me diga...
—Bobo — respondeu corando.
— Eu gostaria que você ficasse... o trabalho foi uma loucura. Chegou bem
na hora quando estava prestes a entrar em colapso. Dormir com você me dá
paz— expressou sinceramente.
Um leve nó de culpa, embora Rachel não entendesse de onde vinha, se
formou em sua garganta.
— Eu vou ficar... Fale-me sobre o seu trabalho, talvez para que possa se
livrar do fardo.
— Uma fusão de dois bancos importantes e ao mesmo tempo um caso de
narcotráfico que não teria porque pegar.
Rachel franziu o cenho.
— Por que não?
—Deixei de praticar a lei para lidar com casos terminais há muitos anos.
Pouco mais de uma década. Uma experiência não muito agradável.
— A garota que você disse que era muito jovem para ir presa?
Ele assentiu.
— Piper Galloway. Não pude provar sua inocência.
— Era esse o seu papel? — Ela perguntou, fingindo ignorância.
— Não, não era. Mas parece que tenho algum carma com esse caso. Está
atrás de mim — ele disse acidamente.
Por um segundo, Rachel foi levada por uma curiosidade que nada tinha a
ver com sua irmã. Michael pareceu realmente arrependido de repente. Ele não
era o tipo de mostrar negatividade. Às vezes era cabeça dura quando havia
um assunto sobre o qual era insistente e acreditava estar certo, ou quando
falava de política, mas de modo geral, Rachel percebeu que ele era um
homem muito equilibrado.
Não era difícil falar com Michael, muito menos querer confessar seus
arrependimentos para que ajudasse a carregá-los ou esquecê-los. Mas talvez
fosse esse o charme que o ajudou em sua profissão. Que advogado não usava
o charme, quando tinha, como um bom recurso? Tolo quem não fazia.
— Além dessa experiência, o que mais aconteceu nesses anos? — Ela
perguntou suavemente, entrelaçando seus dedos com os de Michael.
— Enquanto trabalhava no caso, ainda era casado com Ingrid. Isso foi
antes de trabalhar para a Salmann & Buckend.
— Onde?
— Na empresa da família. Meu pai e meu avô a tocavam. Então, como nós
três éramos bastante habilidosos, ajudávamos uns aos outros em casos
criminais. Douglas estava prestes a se formar em direito e se casar com Lara,
então ele não foi muito útil durante aqueles meses — respondeu ele. — Às
vezes, precisava investir muitas horas. Havia noites em que não voltava para
casa. Acho que Ingrid se cansou.
— As infidelidades?
Ele assentiu.
— No dia do julgamento, quando estava voltando para casa, e a sentença
havia sido proferida, me vi cercado por uma nuvem de interesse da mídia e de
vários escritórios de advocacia. Ninguém estava apostando que um advogado
tão jovem poderia lidar com um caso que parecia fácil no início, mas depois,
como vários filhos de políticos locais importantes estavam envolvidos,
tornou-se um maremoto confuso que tentou comprar a consciência da
empresa de minha família. Isso não aconteceu.
— Entendi...
— Voltando para casa naquela noite, encontrei Ingrid na minha sala
fazendo sexo com um colega que era da concorrência. Não sei se foi uma
forma de ela ficar excitada ou retaliar, nunca soube e nem estou interessado
agora, mas foi o ponto que levou ao colapso o nosso casamento.
— Glória e inferno ao mesmo tempo — Rachel murmurou.
— Sim. Algo assim... Meus amigos eram incondicionais. Principalmente
Kyle, lembra?
Rachel concordou.
— Muito agradável. Não lembro o sobrenome dele ...
— Bronson.
— Eu sabia que a mulher que vi no Chicago Tribune outro dia era bastante
familiar para mim — disse ela, pensativa.
Michael se virou, puxando Rachel para se colocar em cima dela. Ele
esfregou seus narizes e sorriu para ela.
—Zayda Bronson, esposa de Kyle. Foi algo de último minuto, porque Kyle
estava atrasado com seu vôo, então ele me pediu para acompanhar sua
esposa. Não pude recusar, afinal de contas, eles foram ótimos... — Um brilho
de travessura apareceu nos olhos verdes — você estava com ciúme, talvez?
Isso tem alguma coisa a ver com você me surpreendendo hoje, além do dia
ruim? — Ele perguntou rindo.
Rachel ergueu uma sobrancelha.
— Não seja presunçoso, Michael. Não é como se você visse sua ex-mulher
e descobrisse que ainda a amava.
A mão masculina pressionou possessivamente o quadril macio.
— Uau, você é muito perceptiva ou tem um dom para a clarividência e não
me contou? — Rachel franziu a testa. — Curiosamente, Ingrid me abordou.
Nós nos encontramos no baile de gala para caridade. Não sinto nada por ela.
Foi bom reafirmar, mas não foi algo que ficou em dúvida.
— E ela...?
— Não sei como é, mas ela está casada de novo. Somos responsáveis ​
pelas consequências de nossas ações. Sempre soube e assumo. Não somos
infalíveis — disse ele sério. — Eu apenas tento fazer meu trabalho bem. Isso
é tudo. Ingrid é meu passado. Você é meu presente, Verônica.
Rachel engoliu em seco. Todas as palavras, os sussurros eram para
Verônica, não para Rachel. E ela, embora fosse a mesma, se sentia uma
pessoa diferente. Uma impostora. E era.
— Você ficou muito séria...
Michael balançou a cabeça e seu cabelo, já emaranhado pelas carícias de
Rachel, foi mais um pouco bagunçado.
— Pareceu apropriado resolver esse problema com você.
— Por quê?
Encolheu os ombros. Não era muito bom em explicar suas próprias
emoções, o que não acontecia com quando estava no tribunal ou em algum
assunto relacionado à lei.
— Hoje estou me deixando levar — respondeu com uma piscadela. Então
a pegou e a rolou sobre ele. — Como agora, por exemplo.
— Oh... — ela disse quando sentiu a ereção de Michael crescer contra sua
bunda. Apoiada com as palmas das mãos no peito forte e firme, ela abaixou a
cabeça. Em raras ocasiões, um homem permitia que se sentisse ela mesma na
cama. Nunca se sentiu tão livre como com Michael. —Te entendo...
— Você entende? — Ele perguntou, voltando ao seu tom brincalhão.
— Aprendo facilmente a me deixar levar.
Ele riu e acariciou seu cabelo, colocando-o atrás da orelha.
— Você é linda, Verônica. Me sinto sortudo por ter te conhecido e ter o
prazer de te beijar e ter você em meus braços.
— Michael, às vezes você diz coisas muito certas — disse ela com um
arrepio percorrendo sua espinha quando ele baixou as mãos de seu cabelo
para segurar seus seios, acariciar seus mamilos e, em seguida, deslizar a mão
direita para descansar no vértice úmido de suas dobras. —Ah...
— Vamos tentar fazer esses pequenos sons sexys se repetirem... mais uma
vez... cavalgue-me, Verônica. — Ela se acomodou nele, sentindo o prazer de
seus sons de aprovação até que ele estivesse aninhado dentro dela. — Possua-
me como eu fiz com você — murmurou. Não o desapontou naquela noite.
C A P Í T U L O 1 1

O churrasco das crianças estava a todo vapor. A maioria dos convidados


tinha menos de doze anos. Brincando na área onde ficava a televisão e alguns
conhecidos jogos de tabuleiro, as crianças pareciam bastante entretidas
enquanto esperavam a comida ser servida. Não tinham feito a reunião no
exterior por razões óbvias, então os Bronsons contrataram um bufê para
entregar a comida com calma.
Michael chegou com Rachel uma hora depois. Ambos usavam jeans, que
nela ficavam estupendos, em sua opinião, que pela primeira vez em muitos
anos apareceu com uma mulher pelo braço no círculo que considerava mais
íntimo. E nele, na opinião de Rachel, o preto da calça jeans servia como uma
luva e aquela camiseta que marcava cada músculo a tentava.
— Bem-vinda! — Kyle e sua esposa disseram ao mesmo tempo. — É bom
ter você em casa, Verônica. Kyle olhou para seu melhor amigo. — Como vai,
Mike — ele disse dando-lhe um abraço seguido de um tapinha no ombro. A
típica saudação masculina.
Naquele momento uma garota muito simpática se aproximou. Um pouco
de cabelo despenteado voava sobre seus ombros. Seu sorriso era largo e
contagiante. Ela estendeu os braços para Michael com expectativa. Os
Bronsons riram quando seu amigo pegou a garota, dando-lhe beijos.
— Minha afilhada favorita! — Ele exclamou, deixando-a no chão. — Feliz
aniversário, querida — ele remexeu no bolso — aqui está, espero que você
faça bom uso disso.
Com o brilho que dava a emoção de cada aniversário em que ganhar a
idade era trancedental, Michelle Bronson abriu o envelope. Seus olhos se
arregalaram, olhando para o envelope às vezes e para seu padrinho.
— O que é? — Rachel perguntou baixinho.
— É uma ordem de compra para ir ao shopping com uma cota de
quinhentos dólares na seção de eletrônicos... — Michelle respondeu. —
Nossa! Isso é incrível — ela exclamou, antes de abraçar Michael com ternura.
Rachel sorriu.
— Posso não ser melhor do que Michael — disse ela, olhando para a
garota e seu amante — mas espero que corresponda a algo que você goste na
loja de eletrônicos. — Ela entregou a menina uma bolsa muito fofa com tons
de roxo.
Curiosa, como era sua característica, a menininha de olhos azuis abriu o
pacote.
— Os melhores presentes do dia! — Ela olhou para seus dois convidados.
Obrigada... — comentou, esperando que Rachel lhe dissesse o nome dela.
— Verônica — disse ela, usando seu nome do meio e aquele com o qual
havia se acostumado.
— Você é a namorada do meu padrinho?
Os Bronsons tossiram baixinho, mas Michael agarrou Rachel pela cintura
e beijou sua bochecha.
— Sim, princesa, ela é minha namorada, o que você acha? — Ele
respondeu naturalmente. Não pensava em rótulos há muito tempo, mas desta
vez saiu sem problemas. E parecia que estava tudo bem. Algo dentro dele
dizia que Verônica estava se tornando mais do que apenas uma mulher com
quem ele estava namorando. Não era igual às outras.
— É muito bonita.
Rachel corou.
— Eu concordo com você — Michael respondeu, olhando para Rachel
antes que os Bronsons os levassem para dentro de casa para apresentá-los a
outros adultos, e Michelle foi se juntar às amigas para mostrar seus presentes.
Longe de se sentir uma intrusa, Rachel se sentiu muito confortável. Os
Bronsons eram um casal divertido e falante. Ela costumava ser muito
perceptiva e, portanto, podia dizer com certeza absoluta que algo estava
incomodando Zayda. Seu sorriso parecia natural, mas sentiu algo mais por
trás dele. Não porque a conhecesse, já que esta era apenas a segunda vez que
se viam em muitas semanas desde que ela estava com Michael, mas porque
aprendera no trabalho a ler as pessoas para que pudesse lhes vender as ideias
que tinha na cabeça. Uma estratégia que aplicava à sua vida pessoal.
Infelizmente, não poderia dizer que Michael poderia ser incluído nesse grupo.
Ele era um enigma, exceto quando queria deixar de sê-lo por vontade própria.
— O que acha das crianças? — Eddie perguntou a Michael com uma
gargalhada quando ficou evidente que era muito bom com eles. Naquele
momento, o advogado estava segurando o filho de três anos de Eddie. —
Acho melhor você não responder pelo óbvio do que seria sua resposta e, em
vez disso, aceitar uma oferta para ser babá de vez em quando.
Todos riram.
Naquele exato momento, Rachel juntou-se à risada, mas na verdade sentiu
um aperto terrível no peito. Michael era um contraste encantador. Rude para
ganhar, charmoso para convencer, doce para beijar, apaixonado para fazer
amor, generoso para ensinar e paciente com as crianças. Em que momento ela
se perdeu para se permitir começar a ter empatia por ele? Mais do que
empatia. Doía. Doía acreditar que algo mais do que ódio pudesse existir em
sua alma por Michael Whitmore. Precisava de Delaney. Precisava se afastar.
— Veronica, você é especialista em negócios de investimento e expansão?
— Alguém perguntou atrás dela em um tom muito delicado, forçando-a a
desviar o olhar de Michael enquanto ele jogava o filho de Eddie no ar antes
de entregá-lo ao papai. Ela respirou fundo e se virou com um sorriso.
Era Annelise, uma decoradora de interiores interessada em investir em um
novo negócio. Foi muito sutil, mas a verdade é que Rachel não se importava
em dar conselhos grátis enquanto estava tentando evitar que suas emoções
começassem a gritar. Tudo era válido, contanto que não mencionasse o que
experimentava em relação a Michael. Ela não podia... tão simples.
— Sim... Sim.
— Desculpe, mas gostaria de lhe fazer uma pergunta.
— Ah, tudo bem, se a gente puder se divertir e ajudar ao mesmo tempo,
acho que nos encontrarmos no aniversário da Michelle valeu muito a pena.
— Como você é simpática, sabe... — Assim começou uma longa e
agradável conversa, na qual Annelise também lhe contou alguns truques para
tornar os espaços muito mais amplos e claros, mesmo quando não havia
espaço suficiente para isso em um apartamento.
Outros convidados logo se juntaram à conversa, fazendo contribuições e
então o tema mudou as fofocas do espetáculo para continuar para o lado das
eleições presidenciais iminentes. Enquanto ela conversava com um grupo,
seus sentidos a alertaram de que Michael a estava observando de perto.
Gostou disso. Devia se beliscar. Impossível evitar sentir aquele ímã que
parecia atraí-la de uma forma diferente de seus motivos principais.
Após a refeição, que foi tão deliciosa que Rachel pediu para repetir a
sobremesa, perdeu Michael de vista. Eles estavam naquela reunião animada
por quase quatro horas e, por mais divertido que fosse, precisava ficar
sozinha por um tempo. Disfarçadamente, quando as pessoas com quem
estava conversando voltaram sua atenção para um assunto da aeronáutica, ela
decidiu sair em busca de Michael.
Entrou no corredor. Estava vazio. Foi até a sala de estar onde as crianças
estavam se divertindo. Ela pensou que Michael poderia estar na cozinha ou
algo assim, então decidiu esperar por ele em um sofá ao lado de onde os
outros convidados estavam. Um lugar discreto que vira quando passou pela
sala, no momento em que entrou na casa.
Estava passando pela escada para o segundo andar quando ouviu a voz de
Michael. Se deteve. Não era sua intenção ser intrometida, então aproveitou a
oportunidade para ir ao banheiro mais próximo. Fechou a porta e, antes de
deixar a água correr para enxaguar as mãos, talvez fosse o destino ou alguma
piada pérfida, mas pode ouvir, não claramente, mas perto o suficiente, o que
estava sendo dito do outro lado.
Ela o ouviu falar com firmeza.
— Quem é, Zayda? — Ele perguntou.
— Vannia, a filha dos Latzovskis. Você se lembra? Anos atrás, quando...
— Sim, quando fomos para Aspen e eu ainda era casado com Ingrid. Não
me lembro o que o rapaz fazia, mas você me disse Kyle, que ele era seu
cliente.
— Problemas imobiliários. Foi tratado por outro advogado, mas em tese eu
cuidei disso, sim.
— Olaf também é chef em um dos melhores restaurantes de Chicago.
Sambuka —Zayda apontou. — Você acha que pode fazer alguma coisa?
Houve uma parte da conversa, que Rachel perdeu porque o barulho ao
redor dela de repente ficou muito alto quando várias crianças passaram
correndo. Colocou sua orelha a parede e foi capaz de continuar com a
próxima parte. Esperava que eles pudessem tecer uma parte na outra, para
não perder a coerência.
— Sim, claro. — Ela ouviu Michael dizer.
— Michelle não sabe que sua amiguinha precisa de um transplante de
fígado. Eles estão procurando um doador fora da família. Infelizmente não
teve sorte com seus pais porque...
— ...não são os pais biológicos — Kyle completou com pesar.
— Que circunstância terrível — disse Michael.
— A esposa de Olaf é estéril. Então, adotaram Vannia quando ela tinha
três meses. É a adoração... é a melhor amiga de Michelle, do balé. Por favor,
Michael, faça algo para que possa subir na lista de receptores de doadores de
fígado no hospital.
— Você contribui para o Hospital Saint Cleare como um doador regular,
certo? — Kyle entrou na conversa, olhando para ele com pesar. Sabia como
era difícil pedir aquela consulta a Michael, mas a verdade é que Vannia
piorava a cada dia, desde que tudo começou com sintomas que pareciam
gripe. Não era. Quando os Latzovskis chegaram com Vannia ao hospital, com
olhos e pele amarelados, fizeram exames de sangue e consultas de
acompanhamento por vários dias. No final, os médicos disseram que ela
precisava de um transplante de fígado.
— Sim, por vários anos. — Michael coçou o queixo. — Quanto tempo
leva o teste de compatibilidade? Seria necessário reunir vários...
— Não, Michael. Ouça, os testes duram 48 horas ou mais, e não há como
perder tempo. Além disso, neste caso, o fígado não é mais de uma pessoa
viva, mas apenas... —Michael assentiu. — De qualquer forma, é urgente
agora — Zayda interrompeu, apertando a mão do marido. Ela está na lista de
espera, em terceiro lugar. Precisa chegar ao número um logo. Embora se um
fígado chega para os dois primeiros ou um da lista for compatível, ela pode
ser salva. O fígado possui oito lóbulos. Com um lóbulo transplantado para
Vannia, ela sobrevive.
— Uau — disse Michael, surpreso com a informação. Percebeu como seus
amigos estavam envolvidos. — É um assunto delicado para mim...
Kyle e Zayda se entreolharam, esperançosa e tristemente.
— Ocorreu-nos perguntar a você há um tempo, quando falava sobre a
saúde de seus sobrinhos e que eles foram para o mesmo hospital — disse
Zayda. — Michael, esta questão é talvez a mais importante. Você é um
doador anônimo ou seu nome está na lista nominal?
— Como a resposta que lhes dou influencia?
— Você poderia falar com o gerente geral do hospital. Passar a...
Rachel não sabia dizer o que mais Zayda havia dito do outro lado da
parede, porque várias crianças escolheram aquele momento para passar
correndo gritando e rindo. Mas isso não importava mais, porque acabara de
encontrar o motivo que estava procurando por todas aquelas semanas. Um
motivo para se vingar de Michael. O uso de privilégios para influenciar a lista
de doadores de um hospital.
Era moralmente inapropriado. Desaprovado por privilegiar a vida de uns
sobre os outros por dinheiro. Claro que algum meio de comunicação gostaria
muito de saber disso e até a própria Salmann & Buckend. O fato de um de
seus sócios estar exposto também afetava a reputação do escritório.
Rachel se sentiu mais aliviada. Michael não influenciava em suas
emoções, foi apenas um pequeno deslize. Algo normal, claro. Ela era humana
e a vibração sexual misturada com a emoção de saber que ela finalmente faria
justiça a Piper foi o que experimentou quando viu Michael com aquela
criança em seus braços. Tinha tudo sob controle.
— Verônica?
Ela se virou. Tinha acabado de sair do corredor onde ficava o banheiro.
Rachel sorriu para ele sem um pingo de culpa por ouvir a conversa e, claro,
ele também não saberia.
Michael olhou para ela com um rosto afável, ao contrário dos Bronsons
que estavam um tanto preocupados. Nenhum deles suspeitou que ela
soubesse o porquê.
— Eu estava procurando por você, Michael, onde você estava se
escondendo? — perguntou com um sorriso, tentando manter o rosto neutro.
Ele a pegou pela cintura e a puxou.
— Conversando com nossos anfitriões. Eles parecem ter alguns negócios a
resolver, e você sabe — ele a beijou na bochecha — os advogados trabalham
incansavelmente.
O comentário fez os Bronsons rir, e logo a atmosfera que parecia de tensão
no casal se dissipou.
— Claro, e você é muito empreendedor — Rachel respondeu com um tom
irônico que passou despercebido quando se misturaram com os pais dos
amiguinhos de Michelle na sala de estar.
***
Correu com vontade tentando colocar sua inquietação na esteira. O suor
escorria por seu corpo e aos poucos a ansiedade foi se dissipando. A música
techno tocava em seus fones de ouvido. Ela estava alheia a tudo o que
acontecia ao redor da academia. Como se estivesse em uma pista de atletismo
imaginária cuja única competidora fosse ela mesma.
Estava na esteira há trinta minutos em velocidade constante e em um
programa de montanha para corredores profissionais. Algo que ela não era,
claro. De vez em quando, ficava mais cansativo tentar acompanhar o que a
máquina simulava com uma subida de montanha.
Apesar de acordar às quatro da manhã, vestir-se na velocidade da luz e
dirigir nas ruas aparentemente vazias de Chicago, o local estava quase cheio.
Rachel imaginou que fossem funcionários de escritório com um dia difícil
pela frente.
Em seu caso era diferente. No dia em que ela descobriu que Michael
estava usando sua influência financeira para beneficiar uma pessoa doente em
detrimento de outra, teve uma revelação pessoal ainda pior. Estava
apaixonada por ele. Não sabia em que momento estúpido perdeu o controle
que tinha nas mãos.
Depois da festa de Michelle, eles pararam em um restaurante japonês,
tiveram uma conversa engraçada sobre filmes e é claro, como era o Michael,
a política não ficou de fora. Quando chegaram ao apartamento dela, Rachel
estava exausta. Mas pensou em se livrar dos demônios do dia, a confusão que
sentia, fazendo sexo com ele.
Ela ficou surpresa que Michael parecia entendê-la e conhecê-la de uma
forma surpreendente. Quando começou a beijá-lo, a beijou de volta, é claro,
mas no momento em que desabotoou sua camisa, Michael segurou seu rosto.
— O que está acontecendo com você? Por que você sente a necessidade de
escapar hoje e usar a luxúria como o caminho perfeito?
Suas perguntas a deixaram em silêncio. Disse-lhe então que não estava
acostumada a ter um relacionamento em que as partes fossem mutuamente
generosas em todos os aspectos. Sem saber como, começou a contar a ele
sobre seu relacionamento anterior. Nunca falou sobre o cretino de seu último
ex-namorado. Mas desta vez o fez. Sobre a maneira como menosprezava as
necessidades dela frente as dele, a maneira como tentava se sentir superior
aos amigos à custa de ela se sentir mal. E o mais nojento de tudo, quando o
encontrou em seu quarto roubando dinheiro, sabendo que não era a primeira
vez. Uma verdadeira jóia de parceiro.
— Sinto muito, Verônica... sinto muito que você tenha passado por algo
assim. Mas de que maneira, isso que me contou afetou o dia de hoje? Algo a
lembrou do comportamento daquele idiota?
A resposta foi sorrir para ele e comentar que estava feliz por tê-lo
encontrado e perceber que os homens, como as mulheres, não eram todos tão
canalhas ou tolos. Essa era uma verdade completa. Por um lado, porque a
vida lhe deu a possibilidade de vingar-se dele como sempre desejou e, por
outro, porque nunca experimentou as emoções que Michael lhe despertava.
Sua resposta fez Michael rir alto.
— Então, se for assim, permita-me provar que sua teoria é verdadeira,
porque a verdade é, senhorita, estou muito mais feliz de que, em uma certa
noite, uma mulher sexy do Moulin Rouge tenha ido à casa do meu irmão. —
E isso foi a última coisa que ela ouviu naquela noite, antes de se perder no
toque de Michael.
Continuou correndo.
Sentia-se como se estivesse forçando as pernas. Este não era seu ritmo de
exercício habitual. Michael logo estaria fora de seu sistema. Era só questão de
tempo.
C A P Í T U L O 1 2

Kyle e Michael não apenas compartilhavam seu amor pela lei na


faculdade, mas também faziam parte do time de futebol americano da
Universidade de Chicago, uma das mais prestigiadas dos Estados Unidos.
Entre os esportes de que também gostavam estava a natação, e é por isso que
agora os dois eram membros de um clube de advocacia de alta elite que era
basicamente um centro de contatos.
O mini estádio fechado onde ficava a piscina aquecida estava um pouco
vazio quando os dois amigos chegaram, ao meio-dia. Era hora do almoço.
Então, depois que Kyle bateu Michael por alguns metros na água, os dois
saíram para comer alguma coisa antes de voltar para o escritório. Pequenos
luxos que quem tinha carreira consolidada e fama de aço no meio jurídico
podia se dar, embora o que sem dúvida mais pesasse tivesse muito a ver com
a grande quantidade de dinheiro que suas horas faturáveis ​geravam aos
respectivos escritórios de advocacia.
— Boa-tarde cavalheiros. Estão prontos para fazer o pedido? — Perguntou
o garçom, aproximando-se dos dois amigos. Ambos assentiram e disseram o
que queriam. — Em um momento tudo estará pronto. Com licença. — O
garçom saiu.
— Acho que vir hoje não foi por acaso, não é, Kyle?
Ele negou.
— Há uma grande probabilidade de que operem Vannia muito em breve.
Duas vagas na lista de espera. O primeiro fígado a chegar correspondeu aos
dois primeiros receptores. Seus pais estão muito confiantes de que ela logo
subirá na lista, porque seu sistema está ficando cada vez mais fraco. Os
médicos dão esperança, mas nessas questões ninguém sabe o que pode
acontecer. Somos simples humanos... mas pelo menos pouco resta para
chegar ao primeiro lugar de receptores de fígado no hospital.
O rosto de Michael se iluminou com um sorriso. Por dias ele foi
atormentado pela impossibilidade de ser capaz de ajudar os Bronsons. Se
aprendeu alguma coisa, foi que a ética na profissão era um bem muito
precioso e inestimável. Era amigo do diretor do Hospital Saint Cleare, mas
seus laços não não podiam passar certas barreiras profissionais, como a que
envolvia a manipulação de lista de receptadores de órgãos. E mesmo que
pudesse, a verdade é que era tão injusto quanto difícil não poder mudar sua
opinião a respeito. Talvez uma das coisas mais importantes que aprendeu
com seu avô e seu pai foi manter a integridade acima de tudo.
— Esta é uma notícia fantástica. Infelizmente, no caso de Vannia, para se
salvar... outra pessoa tem que morrer e assim doar o órgão de que necessita.
— Ele passou a mão pelo queixo. — Como a vida e as decisões são
complexas... Kyle, você não tem ideia do que passei tentando pensar em uma
saída para Vannia, estou feliz...
Kyle ergueu a mão, gesticulando para que ela esperasse. Michael ficou em
silêncio.
— A verdade é que eu queria aproveitar o dia de hoje para me desculpar
com você em meu nome e de Zayda. — Michael olhou para ele, intrigado,
esperando que ele continuasse. — Nunca deveríamos ter colocado você em
posição de debater entre sua integridade e a possibilidade de influenciar as
chances de vida de uma pessoa. Seria um longo debate se ainda estivéssemos
na faculdade — disse ele com um meio sorriso — mas esta é a vida real, e eu
estava louco. Sinto muito, Michael.
Michael pegou seu copo de Pepsi e deu alguns goles.
— Quando você está desesperado ou realmente se preocupa com algo ou
alguém, principalmente quando se trata de alguém tão pequeno e vulnerável
como a amiga de Michelle, acho que as desculpas não são válidas e os
recursos para obter ajuda são incontáveis. No dia em que soube que meus
sobrinhos estavam no hospital, quis movimentar o máximo de contatos
possível, sem me importar com nada, para que fossem atendidos
imediatamente e pelos melhores especialistas. Claro, não foi necessário
porque a equipe médica foi impecável. — Ele recostou-se do banco. —
Talvez se eu estivesse no seu lugar, provavelmente teria feito o mesmo.
Embora mais tarde eu tenha percebido que talvez isso o tivesse colocado em
uma posição difícil de assumir. Tudo bem, Kyle. Diga a Zayda para não se
preocupar.
— Obrigado cara.
— Não por isso.
A comida estava magnífica. Afinal o clube tinha uma estrela Michelin.
Como não, com o alto custo da assinatura mensal? Aos poucos, o restaurante
foi enchendo. Ternos de grife elegantes, perfumes caros e carros luxuosos no
estacionamento eram detalhes que deixavam claro com que tipo de clientes os
proprietários lidavam.
Depois de pagar a conta, encontraram uma antiga colega de trabalho de
Kyle, dos seus primeiros dias de profissão, na saída. Seu nome era Sylvia
Bancroft. Sua área de especialização era o divórcio, e ela costumava brincar
sobre isso com frequência. Eles se davam muito bem e, de fato, Sylvia era
uma das melhores amigas de sua esposa, Zayda.
— Uau, Sylvia, que surpresa! Achei que você estava morando em
Memphis.
Com olhos castanhos e cabelos loiros escuros, a advogada não passou
despercebida aos olhos masculinos. Com um caráter moderado e uma voz
cativante, ela costumava ser a escolha favorita de muitos de suas amigas de
classe alta para conseguirem um divórcio compatível com seu sofrimento.
Embora nem tudo fosse dinheiro, Sylvia também se oferecia para ajudar
mulheres vítimas de abuso em uma instalação de baixa renda em Chicago.
— Eu estive lá por três meses por um assunto pessoal, mas estou de volta.
Na verdade, há duas semanas tentei me juntar à loucura desse clima de
Chicago.
Kyle riu.
— Você se lembra de Michael Whitmore? — Ele perguntou brincando e
deu um tapa no homem do amigo.
Sylvia estreitou o olhar, fingindo não se lembrar. De repente, ela estalou os
dedos.
— Padrinho do seu casamento e sócio na Salmann & Buckend — disse
ela, olhando para o advogado de olhos verdes. — Claro que me lembro, o
menino é a sensação na cidade. — Ela sorriu para ele e Michael riu. — Como
vai, Mike? Pena que não nos encontramos com mais frequência, acho que sua
empresa precisa de uma advogada para chutar alguns traseiros na área de
direito da família... divórcios para ser mais específica.
— Sylvia, como sempre, tão afiada. Certamente estamos perdendo muito
dinheiro com suas habilidades no tribunal e trabalhando para outra empresa.
— Ha! Não hesite, amigo. A propósito, meu pai me contou um pequeno
segredo, e foi muito bom nos encontrarmos. Eu ia pedir que minha assistente
ligasse, mas que maneira melhor do que entregar a mensagem pessoalmente.
Não era segredo para ninguém que Sylvia era filha de um banqueiro
bilionário, Dwayne Brancroft II. Que era um cliente da firma de Michael.
— Que segredo é esse? — Kyle perguntou, coçando a têmpora.
— Parece um segredo profissional para mim — disse Michael sério.
Sylvia encolheu os ombros.
— Lembre-se de que minha mãe também trabalha no banco, então se eu te
contasse, Kyle, não estaria violando nenhum acordo, já que os negócios do
meu pai não têm nada a ver comigo. — Ela mudou seu foco de atenção sem
perder o sorriso suspeito. — Ou estou errada, Michael? — perguntou,
olhando com esta última frase para o advogado que era especialista em
bancos e finanças.
— Teoricamente... não.
Sylvia soltou aquela risada alegre.
— Bem, eu não estou interessado em debates jurídicos quando acabo de
almoçar, então me diga ou terei que interrogar meu amigo — disse Kyle.
— Se coloca nesses termos... Hoje vai ser fechada a fusão do banco da
minha família, Tangler Bank Chicago e VSQ Bank. Nós o compramos. —
Kyle ergueu as sobrancelhas. — E o advogado que lidera a fusão é Michael.
Então meu pai organizou um jantar em casa depois de amanhã para
comemorar a operação.
— Uau, Michael! Parabéns. Fico feliz que você tenha esse grande caso
para o seu currículo... não há mais nada comentado no mundo financeiro
atualmente — disse Kyle. — Eu não teria descoberto se não tivéssemos
encontrado Sylvia.
— Que sorte — disse Michael, revirando os olhos.
Sylvia deu-lhe um leve empurrão no ombro.
— De qualquer forma, rapazes, estou tão feliz em ver vocês, mas o que
vocês acham? Hoje tenho uma cliente esperando por mim. E primeiro devo
comer alguma coisa. Você sabe, para ter energia para tornar o seu divórcio
menos doloroso.
— Para quem? — Michael perguntou brincando.
— Para o marido, claro... menos para o bolso, com certeza. — Os três
riram. — Michael, meu pai ficaria muito animado com sua vinda. Por favor,
reserve um espaço em sua programação para dentro de 48 horas. Não parece
tão impossível. Certo?
Michael sorriu.
— Se prometer não me torturar com aquele papo sobre a necessidade de
fazer uma defesa adicional em algum caso, eu aceito.
— Prometido — disse ela. Então se virou para Kyle. — Já que estou com
vontade de fofocar um pouco com Zayda e gostaria de conversar com você
com menos pressa como agora, acha que poderia vir? Assim você mostra a
Michael como chegar à casa dos meus pais.
— Será um prazer, Sylvia. E parabéns pelos negócios da família —
respondeu Kyle.
— Se isso beneficiasse minhas próprias finanças, eu o apreciaria de forma
mais efusiva — disse a bela mulher de um metro e setenta com aquela
centelha vivaz que a caracterizava. — Até mais, pessoal. — Com isso, os três
se despediram.
Sylvia e Michael flertaram um pouco. As coisas não aconteceram e eles
permaneceram amigos. Era inevitável que eles se distanciassem, tentando não
se encontrar, já que ambos compartilhavam amigos em comum, como Zayda
e Kyle. Afinal, era um tanto estranho ver que ela tentara seduzi-lo e ele a
rejeitara com elegância; e então aconteceu o inverso. Algum tempo depois, as
águas voltaram ao seu curso, e se encontrarem era tão agradável quanto antes.
No final, foi um caso aos vinte e poucos anos.
Quando o divórcio de Michael veio mais tarde, foi justamente Sylvia quem
o ajudou a evitar que sua ex-mulher ficasse com sua fortuna. Foi a primeira
vez que ela defendeu um cliente em questões de divórcio. Ela sempre
defendeu o lado feminino, mas para Michael abriu uma exceção.
E foi antes de Sylvia conseguir a decisão do divórcio que ele conheceu
aquela linda garota. Essa brisa de vento fresco e inocente. Talvez a única
coisa que ele tivesse feito bem naquela época, onde tudo parecia estar
predisposto a criar atrito.
Naqueles dias, suas contradições pessoais, em relação aos casos que não
admitiam erros, o enlouqueciam. Não porque soubesse que estava fazendo
algo antiético ou ilegal, mas porque seguia as regras, sua consciência gritava
com ele que talvez as leis aplicadas em um caso fossem muito severas. Com
temas de assassinato, estupro e outras violências, ele acreditava que deveria
haver uma punição mais dura. Sobre questões de tráfico de drogas, não
apelava por indulgência, embora soubesse que muitas dessas pessoas eram
vítimas de extorsão e ameaças. Não era o denominador comum, mas sua
percepção pessoal.
Era por causa dessa percepção que o caso Piper Galloway o preocupava
tanto. A garota era muito jovem. Sua forma de responder foi direta,
inteligente e sensata. Quando ela foi considerada culpada e sentenciada, o
rosto esperançoso de Piper foi desfocado por um cheio de terror. Um terror
que só era aparente para ele, já que a garota era adepta de manter uma
aparência de calma. Os olhos não mentiram.
Esse olhar de Piper o assombrava.
Ele pegou o caso nas últimas etapas, quando foi criado o circo da mídia. A
empresa de sua família, a W&W, não conseguia lidar com a agitação dos
jornalistas o tempo todo. No caso, havia filhos de personalidades
proeminentes de Chicago envolvidos, incluindo o cliente que a W&W
concordou em defender, Elías Fussel.
Elías recebeu alguns anos de prisão, cinco, porque fez um acordo com o
Ministério Público para encontrar outros envolvidos em troca de leniência na
sentença. Piper teve defensor público, uma vez que não tinha recursos
econômicos para pagar um bom advogado. Infelizmente, aquele que a
defendeu não fez bem o seu trabalho.
Michael acreditava que poderia ter conseguido uma condenação abaixo
dos 25 anos, mas para azar de Piper, no meio de todo o rebuliço do caso,
houve uma morte. Ela disse que estava tentando ajudar a menina e por isso
sua blusa tinha gotas de sangue quando as encontraram em uma fábrica semi-
abandonada. O júri não acreditou. O tráfico de drogas e assassinato em
segundo grau foi a decisão contra Piper.
Michael acompanhou de perto o modo como a jovem deixou de ser a
mulher nervosa para, à medida que o julgamento avançava, se transformar em
uma fonte inamovível de energia e esperança. Até que o júri votasse e ela
soubesse que nunca mais seria livre...
O caso Piper Galloway pesava sobre ele, mas sabia que ainda havia uma
maneira de redimir sua consciência. Ele a redimiria por aquele Michael que
teria dado uma chance à garota se pudesse. Por aquele Michael que não teve
escolha a não ser ir com toda a artilharia para levá-la para a cadeia.
C A P Í T U L O 1 3

Rachel sabia que Michael estava fechando o contrato de fusão do banco no


final da tarde. Ele era muito cuidadoso com as questões profissionais e
mantinha segredo sobre as informações que podia dar a ela. Ela o entendia e
não o pressionava, exceto quando havia detalhes que poderiam ter algo a ver
com o passado de Piper. E, no entanto, Michael sabia até que ponto poderia
se comprometer nessa questão e em qualquer outra.
Naquela noite, eles combinaram de assistir a um filme em casa. Não era o
melhor que ela poderia ter imaginado, mas o frio estava mais forte na cidade,
então não tinha vontade de estar do lado de fora. Suportar a pressão do ritmo
de trabalho de Paul, ajudar Delaney a preparar uma despedida de solteira
porque sua amiga estava precisando de uma equipe extra, executar seus
planos com Michael e tentar quebrar o estresse na academia estavam prestes a
deixá-la louca. E isso sem falar que ela não sabia nada sobre sua irmã mais
velha. Precisava saber onde ela estava, mas Piper claramente a deixou saber
que lhe diria algo o mais rápido possível.
Queria que fosse uma noite memorável. A última entre ela e Michael. Ele
tinha dado a ela a chave de sua casa. Uma demonstração de total confiança,
segundo Zayda.
Quando teve a oportunidade de falar a sós com a esposa de Kyle, dias atrás
na festa de Michelle, ela disse que, devido à infidelidade de Ingrid, Michael
decidiu ter relacionamentos esporádicos, embora um pouco longos. Que
costumava sair com mulheres que nunca apresentou a seus parentes. E
quando tinha que apresentá-las aos amigos, não era voluntário, mas apenas
quando se encontravam por coincidência.
Mulheres que queriam a mesma coisa que ele: prazer sem compromisso,
Zayda lhe dissera. Também garantiu a ela que sempre que essas mulheres
tentavam alterar o plano acordado, Michael as deixava. Era a rotina normal.
Portanto, Zayda confessou, estava intrigada por Michael a ter levado para a
festa de sua afilhada, mas, além disso, ele ter feito isso voluntariamente.
A conversa com Zayda não aliviou sua carga. Ao contrário. Parte dela
queria envergonhá-lo, fazê-lo sentir dor... outra, ela precisava dizer que o
amava, que estava apaixonada por ele. Mas essa última parte não tinha voz ou
voto, pois Rachel havia enviado uma hora atrás a carta que mudaria tudo.
Usou o serviço local, por isso levaria exatamente o tempo que ela precisava
para ter uma última lembrança com ele.
Quando ouviu a chave de Michael abrindo a fechadura da casa, Rachel se
assustou. Com um passo rápido, olhou-se no espelho da sala da casa. Cabelo
solto. Olhos levemente maquiados. Não estava usando batom. Estava
descalça. Vestia jeans e uma blusa de manga três quartos com pequenos
quadrados em tons de azul e vermelho.
— Olá, querida — disse quando a viu, no momento em que ela saiu para
encontrá-lo. Michael gostou de saber que poderia encontrar essa mulher linda
e vital em casa. Talvez devesse encontrar o momento certo para pedir-lhe que
morrasse com ele. Gostou da ideia de vê-la rondando por sua casa cada vez
mais. Verônica o confortava e o excitava de uma forma que nenhuma outra
mulher jamais havia conseguido. Era especial e a queria apenas para si.
Foram esses tipos de pensamentos, raros desde o divórcio, que fizeram
Michael acreditar que talvez fosse hora de deixar sua fobia de compromisso
para trás. — Amo saber que você se sente tão confortável aqui — murmurou
beijando-a.
Ela sorriu.
— Não é assim?
— Claro — respondeu contra aqueles lábios que se moldaram tão bem aos
dele. Ele a beijou suavemente, saboreando-a. Ela suspirou, e Michael tomou
aquele suspiro como uma mensagem de boas-vindas para explorá-la em
profundidade.
A língua de Michael acariciou-a intimamente, Rachel agarrou sua camisa
para se equilibrar. Como se fosse um colete salva-vidas. Mas não queria
sanidade. Ela queria se perder nas ondas que estavam começando a afogá-la
de necessidade. Queria sentir isso mais perto. Como se aquela noite fosse o
fechamento de suas possibilidades. E em grande medida, era.
Michael desabotoou os botões da frente de sua camisa. Com o peito
subindo e descendo sem descanso, ela pensou em fazê-lo até que se viu
exposta diante dele.
— Você é tão linda — ele sussurrou, acariciando o contorno de seus seios
com as costas da mão. —Sua pele é macia e eu amo cada canto dela. —Ele se
inclinou para beijar seu pescoço. Rachel inclinou a cabeça para trás para dar a
ele melhor acesso à sua pele. Ele mordiscou o lóbulo da orelha dela e
começou a deixar um rastro de beijos molhados, mordidas leves e tentadoras.
— Michael...
— Sim, querida, eu sei — disse habilmente tirando o sutiã. — Que homem
de sorte eu sou por ter você, Verônica.
Ela não conseguiu dizer mais nada, enquanto as mãos de Michael se
enchiam com seus seios. Ele os acariciava com reverência e lhe dava prazer
com aquela boca experiente. Chupou, lambeu e adorou de uma forma que
acreditava que teria o orgasmo mais rápido de sua vida de um momento para
o outro com apenas a boca de Michael em seus seios.
Rachel não conseguia ficar parada. Precisava da pele de Michael. Sentir.
Gostava do contraste dos peitorais recobertos por pêlos incipientes, numa
linha que descia sensualmente até se perder na parte mais íntima deste
homem vigoroso. As sensações de seu toque eram tão intensas que ela sentiu
o coração bater freneticamente.
— Gosto do seu toque — confessou.
— Tanto quanto gosto do seu, querida. A propósito... você se importa se
nos apressarmos um pouco hoje? — Michael perguntou, devorando sua boca
com avidez enquanto eles tropeçavam pela casa juntos. Ele a encostou em
uma parede de vidro que dividia a sala principal de uma menor. — Você me
deixa louco e eu não vou ser capaz de esperar...
— Se você não se apressar, provavelmente vou torturá-lo mais tarde... —
Ela respondeu, removendo o cinto. Ele a ajudou a tirar. Suas calças caíram,
assim como as de Rachel. As mãos de Michael percorreram cada curva
feminina.
Ele pegou a perna dela e a ergueu contra seu quadril, para que pudesse
sentir, não dentro dela, mas sim para que tivesse consciência do que aquilo
estava fazendo nele. Michael estava apaixonado por ela. Ele não podia negar
a si mesmo.
— Não é possível... — Michael engasgou, desta vez pegando-a pelas
nádegas apertadas e erguendo-a de tal forma que seu sexo estava a apenas
alguns milímetros da entrada mais íntima de Rachel. —Segure meus ombros
com força, querida.
— Michael, agora, por favor... eu preciso de você agora — ela pediu,
puxando o lábio inferior com os dentes, sentindo a fricção de seus corpos à
beira da ebulição. Os olhos de Michael brilharam como Mercúrio. Ele estava
respirando pesadamente. As pernas de Rachel estavam emaranhadas em torno
de seus quadris.
Ele não a fez esperar mais e, com um impulso travesso, se ancorou nela.
— Deus, mulher... — ele gemeu, empurrando e se movendo
freneticamente com Rachel. — Você é tão... que prazer primoroso eu sinto
com você...
Michael acelerou o balanço de seus quadris. Os corpos úmidos pelo
esforço pareciam estar prestes a explodir. Convulsivamente, ambos sentiram
a eletricidade de um orgasmo monumental. Eles não foram inibidos de
gemer. Ele disse a ela exatamente como se sentia, e ela fez o mesmo.
Parecia que havia bebido duas garrafas inteiras de vinho. Ele estava
bêbado de prazer. E quando o corpo dela conseguiu se recuperar um pouco,
ele a tomou nos braços e se deitaram na cama mais próxima. Que acabaram
de notar, é claro, já que, aparentemente, tudo que Michael tinha visto era o
ponto de apoio mais próximo, uma parede de vidro.
Incapaz de evitar, Rachel soltou uma risada. Ele ergueu uma sobrancelha.
— O que foi?
— Estamos loucos...
— Eles dizem que a loucura é melhor desfrutada como casal.
Ele se levantou e foi ao banheiro no piso inferior. Lavou-se um pouco,
depois jogou um lenço de papel para Rachel.
— Você não precisa fazer isso — ela sussurrou, corada, quando ele a
inclinou para trás. É muito...
— Íntimo? — Michael perguntou com um sorriso. — Depois de tudo o
que fizemos juntos, parece-me que cuidar dessa parte é tão íntimo quanto
estar enterrado bem no fundo do seu corpo.
Depois de um tempo, os dois tomaram banho no suntuoso aposento do
proprietário da bela mansão. Aproveitaram mais do que a água quente e o
jato de várias intensidades. Eles se entregaram e depois se beijaram.
Beijar Michael era uma das coisas que Rachel mais gostava, e apostava
que ele também, já que poderiam passar muito tempo se divertindo assim.
Claro, nunca ficavam só nisso. Mas os beijos do homem conseguiram colocar
seus sentidos em órbitas psicodélicas. Algo que valia a pena experimentar.
— Michael? — Ela o chamou quando ele fechou ligeiramente os olhos.
Estavam deitados na cama. — Seu triunfo hoje merece ser comemorado —
sussurrou.
Ele abriu uma pálpebra e sorriu.
— Eu acho que acabei de fazer isso.
— Ah! Muito engraçado. — riu. — Concordamos em ver um filme, mas
acho que fiquei com um pouco de fome. Talvez não fosse ruim sair. Você
está a fim?
— De fazer amor com você de novo? — Ele perguntou, removendo o
lençol com o qual ela havia se coberto, e então agarranda-o sob seu corpo nu.
— Michael, estou falando sério.
Ele sorriu, beijou seus lábios com ternura. Olhou nos olhos dela por alguns
segundos, antes de segurar seu rosto com a mão e acariciá-lo.
— Eu te amo, Verônica — disse ele de repente. Surpreendendo a si mesmo
e a ela.
Logo a surpresa de Michael deu lugar à certeza. Todas aquelas semanas.
Cada dia e cada noite que ele estivera com Verônica tinha sido especial.
Poderia colocar um rótulo no relacionamento, poderia levar muitos meses ou
anos para defini-lo, mas tudo o que estava convencido era que a amava. Dizer
isso em voz alta só tornava tudo mais real. Não se sentiu assustado ou
preocupado. Sentiu que, desta vez, era a coisa certa a fazer.
Rachel não conseguia acreditar no que estava ouvindo. Michael estava
lentamente minando suas defesas. Colocando-a, sem saber, em uma
encruzilhada entre a lealdade a sua família e seu próprio coração.
— Michael... — ela murmurou, olhando para ele com olhos brilhantes.
Ele inclinou a cabeça.
— O que quer me dizer? Michael, você me assusta ou Michael, é melhor
calar a boca? — Ele perguntou com um sorriso, embora por dentro estivesse
ansioso. Verônica havia conseguido minar seus medos e transformá-los em
algo colorido e menos espinhoso.
— Achei que você fosse um dos homens que evitava compromissos —
disse ele em resposta.
Michael não desanimou. Esfregou o nariz contra o dela.
— Não sei quando aconteceu — confessou com um sorriso. — Ou talvez
eu sempre soube que você era uma desculpa conveniente para deixar meu
coração voltar à vida.
Ela o olhou com ternura, mas também com algum medo. Ele a pegou
desprevenida.
— A verdade, Michael, é que eu...
O telefone começou a tocar insistentemente. Ele o ignorou.
— Você..? — Ninguém costumava ligar para ele em casa, a menos que
fosse uma emergência real. Como quando aconteceu o acidente de seus
sobrinhos. Lembrando-se do ocorrido, ele se afastou de Rachel, que sentiu
um grande alívio por dentro. — Sinto muito, querida, deixe-me atender,
talvez seja uma emergência — disse ele antes de pegar o telefone.
— Acho que quem ligou não entende os momentos privados — Rachel
murmurou antes de sair da cama para se vestir.
Precisava se proteger. Precisava sair e deixar o frio congelante de Chicago
golpea-la. Juntou suas roupas e foi ao banheiro. Jogou água no rosto. Olhou
para aquela imagem que parecia estranha para ela. Não havia traços de raiva.
Também não queria vingança. Estava apenas olhando para uma mulher
assustada com o tamanho de suas emoções. Uma mulher que agora se
arrependia do que fizera naquela manhã no almoço do escritório.
Se o universo não fosse tão cruel, talvez aquela carta se perdesse no
correio local. Se tivesse sorte, Pablo Chestein, um amigo que trabalhava para
uma revista jurídica local, também encontraria a carta. Com tantos milhares
de cartas, como não pensar nessa possibilidade?
Colocou as mãos na pia.
Tudo saiu do controle. Ela estava apaixonada por um homem que não
deveria causar tantos curtos-circuitos emocionais, que parecia estabilizar o
que estava torcido, desafiar seus pensamentos e hipóteses convencionais,
acariciá-la como se nunca se cansasse dela, mas acima de tudo, um homem
que quando dizia que a amava deixava tudo em seus olhos para confessar,
para que soubesse que não estava mentindo. Em vez disso ela...
Ela saiu com a intenção de confessar a Michael que o amava também. Que
era a garota da praia, de anos atrás. Irmã de Piper Galloway. Que estava
magoada com a separação de sua família, mas que depois de todo aquele
tempo juntos sabia que ele estava apenas fazendo seu trabalho. Que era difícil
aceitar a dor de sua família, mas que também tinha sido uma idiota por tentar
se vingar dele. Por tentar construir justiça com uma injustiça como a que ela
cometeu ao julgá-lo sem conhecê-lo... como o conhecia agora.
Porque agora sabia que era um homem íntegro, generoso, apaixonado e
com alto senso de ética. Porque já havia perdido muito na vida. E ela não
podia perdê-lo.
***
Enquanto ouvia Dereck, Michael começou a sentir a raiva tomar conta de
seu corpo. Os músculos de seu pescoço ficaram tensos. Cerrou os maxilares,
enquanto o homem que o havia elevado por meio de seu voto de confiança
lhe dava a notícia. Como isso aconteceu?
Ele nem conhecia aquela garota... Coincidência de sobrenome? Seu
cérebro estava em branco. Os advogados não acreditavam em coincidências a
nível profissional, muito menos quando acontecia este tipo de coisas. Uma
carta anônima sangrenta.
— Não sei de onde veio isso, Dereck — disse ele calmamente. Ele queria
quebrar tudo ao seu redor. — Mas antes de aceitar o que os outros dizem,
parece-me que você deveria me dar o benefício da dúvida...
— Não estou acusando você, filho. Estou lhe dizendo exatamente o que
diz a carta. Eu entendo que existe uma cópia. Aqui diz. Legal Strengs é a
publicação para a qual foi enviada.
Michael passou as mãos pelos cabelos.
— Diabo.
— Você quer falar comigo sobre essa coisa do Hospital Saint Cleare?
Michael explicou que era um doador anônimo do Hospital Saint Cleare.
Que ele não fez nada do que foi acusado. Contou sobre o caso Vannia e a
conversa com os Bronsons, sem dar muitos detalhes. Apenas deixando claro
que era uma mentira que ele tivesse usado seus recursos para interferir na
decisão de uma lista de receptores de órgãos. Que parecia antiético e que
nunca, mesmo que pudesse influenciar, faria isso, porque não era justo
brincar de Deus com a vida das pessoas, decidindo quem era ajudado
primeiro e quem não era.
Ao relatava as informações para Dereck, um frio gelado começou a se
formar em suas veias. De repente, o filme que parecia claro uma vez
desbotou para o preto, para dar vida a outra versão. Uma versão que o fazia
parecer um completo idiota.
— Você deveria estar me parabenizando por aquela fusão multimilionária
da empresa — ele respondeu com desdém. Como se Dereck fosse o culpado.
— Fiz isso por transferência bancária com o seu bônus — disse ele, sem
mudar seu tom firme e amigável de costume. —Se houver a possibilidade de
outro destinatário desta carta, então, meu caro amigo, você precisa de uma
reunião com a equipe de relações públicas da firma para tomar medidas de
contingência... mesmo que seja mentira o que diz este documento. Eles não
mencionam a garota aqui, aliás. Espero que possa fazer a cirurgia.
Pelo menos foi isso que lhe foi concedido, Michael pensou com desdém.
— Entrou na lista de espera. Por esses dias será operada. Em qualquer
caso, Dereck, obrigado por me ligar...
Dereck deu uma risada seca.
— Claro. Era isso ou você receberia uma possível ligação daquela revista.
Em todo caso, garoto, espero que você resolva. Pode afetar a empresa e você
sabe muito bem que não é algo que eu possa permitir. Embora, é claro, vamos
defendê-lo.
— Obrigado pelo seu voto de confiança.
— Eu conheço quem eu contrato. Não deixe que essas notícias o deixem
amargurado com o triunfo de hoje com Bancroft. É a operação do ano. Eles
ligaram da Breaking Legal Deals. Eles querem fazer seu perfil. É uma grande
coisa. Bruce conseguiu isso.
— O estagiário de relações públicas?
— Uma contratação permanente em andamento. O menino tem potencial.
Eu disse a ele hoje que fechamos o negócio com Bancroft e ele me disse que
tinha um amigo naquela revista. Você sabe que nem todo mundo anda ombro
a ombro com jornalistas que são peculiarmente taciturnos. A ideia me
pareceu boa, desde que os detalhes da operação sejam mínimos e você
concorde. Em qualquer caso, espero que aconteça.
— Não vai se alguma coisa for publicada na Legal Strength sobre o
assunto de meu suposto suborno em um certo hospital — respondeu ele com
amargura.
— Espero que tudo corra bem. A propósito, Dwayne me ligou para me
convidar para jantar em sua casa. Aparentemente, ele convocou os seis
advogados que participaram como seus assistentes juridicos, e nós dois, por
motivos óbvios. Vejo você lá depois de amanhã...
Michael sabia que, embora Sylvia o tivesse convidado, se Dereck lhe
dissesse que era para ir, era uma ordem. E embora não gostasse de aceitar
ordens de ninguém, ele sentia um profundo apreço e respeito pelo sócio
sênior da Salmann & Buckend.
— Conte com isso, Dereck.
Ele passou vários segundos com o telefone na mão. O som da linha já
desocupada vibrando. Antes de colocar o dispositivo na base do carregador,
ele passou a mão pelo pescoço. Pegou sua boxer, vestiu-a e então suas calças
na sequência.
—Michael — ela chamou atrás dele —quem era?
Algo no olhar feminino o alertou. Foi uma certeza que o atingiu como um
golpe violento no peito. Todas as peças se encaixaram lentamente. Como um
filme em câmera lenta. Muito cafona, claro, porque era a vida dele.
Ele respirou fundo várias vezes. Virou-se, os punhos cerrados.
Ela engasgou quando encontrou a força total daqueles olhos verdes frios.
Colocou a mão no peito. De repente, teve vontade de vomitar e correr.
— Michael... — ela insistiu suavemente, vendo a expressão feroz em seu
rosto. Tinha um mau pressentimento.
Ele avançou para ela com toda a força de sua raiva fervendo por todos os
poros. Sem camisa, com músculos tensos, Michael a intimidou. Não havia
sinal do homem que há poucos minutos confessou a uma mulher que a
amava. Que fez amor com ela da maneira mais sensual, arrebatadora e
intensa. Que a beijou com desejo e amor.
— A questão seria diferente. Quem é você, de verdade? Rachel Galloway
ou Veronica Marsh?
C A P Í T U L O 1 4

O coração de Rachel parecia um personagem de Lewis Carrol no mundo


confuso de Alice. Queria correr, mas parou. E quando parava tinha que
continuar correndo. Engoliu em seco. Uma dor surda apertou suas costelas.
Como se etivesse em uma camisa de força.
— Michael...
— Estou esperando você me responder e parar de repetir meu nome —
disse ele, olhando para ela com desdém.
Rachel estava vestida, mas nunca se sentiu tão nua. Ela se abraçou.
Ninguém era mais culpada do que ela.
— Há uma explicação muito coerente — respondeu quando fez seu
cérebro reagir e se coordenar com as cordas vocais. — Veronica é meu nome
do meio. Marsh, o nome de solteira da minha mãe. Rachel Veronica
Galloway — ela sussurrou.
Michael estreitou o olhar.
— E eu te conheci antes, certo? — Ele perguntou retoricamente com
escárnio. — Uma jovem inocente de dezenove anos. Virgem. Embora eu
provavelmente estivesse errado em minhas suposições... ou talvez não. — Ele
deu de ombros e Rachel olhou para ele com pesar, lembrando-se daquela
noite há tantos anos. — Você deve ter rido de mim quando eu estava falando
com você sobre você, nem menos!
— Não...
— Eu acho que a primeira vez que você teve um homem, ainda lembrava
de mim. Certas impressões não são apagadas. — Rachel pensou que ele devia
ter estudado como ofender com os olhos, porque a maneira como a olhava era
ofensiva. Como se fosse um pedaço de carne à venda. Como se fosse barata...
— Podemos parar de nos enganar e você vai me deixar chamá-la pelo seu
nome.
Ela engoliu a dor que suas palavras lhe causaram.
— Verônica também é...
— Sim, sim, seu nome do meio. No final das contas, a questão é que você
é uma mentirosa.
Isso fez Rachel reagir.
— Você mandou minha irmã para a cadeia! — gritou. — Você destruiu
minha família. A única que me restava viva: minha irmã. Meus pais
morreram e tudo que eu tinha era Piper. Agora, nem isso. Você está
defendendo Gordov, o homem que provavelmente irá procurar minha irmã
para machucá-la por ser quem deu informações à polícia para que tivessem
provas e assim conseguissem capturá-lo. Sempre há um policial que não sabe
calar a boca e fala mais do que o necessário sobre o que acontece dentro da
cadeia, sendo facilmente comprado pelo narcotrafico.
— Como diabos você sabe quem é meu cliente? — Ele perguntou com a
mandíbula cerrada.
— Assim como você tem meios de encontrar informações para poder
argumentar com fatos sólidos para suas audiências ou negociações, também
tenho os meus. As Galloways são engenhosas.
Ele deu uma risada amarga.
— Claro... Galloway. Diria que estou pagando carma — disse ele com
uma risada cruel. —Pelo menos valeu em espécie.
— Você não tem que me ofender — disse ela com firmeza e magoada com
o insulto. —Tudo o que fez foi voluntário. Vontade mútua das partes.
A risada cruel que saiu da garganta de Michael gelou o sangue de Rachel.
Sem querer, ela deu um passo para trás e a parte de trás dos joelhos bateu na
beirada do colchão da cama.
Caiu para trás e ele pairou sobre ela. Rachel se apoiou nos cotovelos e
tentou se levantar, mas Michael não deixou. Ele não se afastou. E pela
posição em que ela estava, ele era mais intimidante.
— E seu primeiro teste de campo foi bancar a garota inocente no Maine,
certo? — Ele perguntou ferozmente. Estava tão desapontado. Dolorido. Mau-
humorado. Frustrado. Ele estava cego. Muito ocupado acreditando que ela era
diferente.
— Eu não sabia quem você era até chegar em casa e ver o jornal com sua
foto, Michael. O noivado de Lara e do seu irmão...
— Por que esperar uma década? —perguntou com a boca muito perto dela.
— Estava ocupada tentando encontrar uma vida para mim e abrindo
espaço no mundo do trabalho. Nem todos nós nascemos com uma colher de
ouro na boca.
— Até convenientemente uma noite você veio para a festa errada? Você se
ofereceu a mim, assim que percebeu a oportunidade, de encontrar uma
maneira de me machucar? Que plano infantil e estúpido!
Ela cerrou os punhos.
— Delaney não pretendia confundir os endereços... Minha irmã foi
condenada por um crime que não cometeu. Ela passou anos longe de mim.
Perdi três anos da minha vida em Chicago. Longe dos meus amigos. As
coisas que toda a minha vida eram familiares para mim, para passar para um
estado que me era estranho. Minha tia Ariel me deu apoio incondicional. Mas
a raiva que eu levava por dentro era muito grande. Piper não me deixou ir ao
julgamento. Eu tinha apenas onze anos, Michael, e então minha tia Ariel
voou para Chicago para se juntar a nós. Ela garantiu que eu não tivesse
acesso a nada relacionado ao que estava acontecendo na mídia... ela me
protegeu. Até que foi impossível para uma menina de onze anos não
encontrar uma maneira de conseguir o que queria. — Ela tentou empurrá-lo
com as mãos, mas era como tentar mover uma parede de pedra. — Minha
irmã foi condenada. Por você. Por você, droga! — Ela gritou com ele com
lágrimas não derramadas. — Todos caíram como abutres na presa mais fácil.
Uma pessoa que não tinha recursos para pagar um bom advogado. Então você
e todo aquele circo decidiram executá-la. Eles a humilharam publicamente na
mídia. Era a primeira página dos principais jornais. Rebaixaram seu bom
nome. E por que? Só porque teve o azar do filhos de alguns políticos
importantes estarem envolvidos? Por que eram seus amigos? Porque aqueles
garotos ricos não queriam se meter em encrencas, mas para uma garota sem
influência ou sem os cofres cheios ninguém daria nem um centavo? —
continuou com ressentimento e toda a dor que o passado lhe causou.
Michael pegou Rachel pelos pulsos e os encostou no colchão. Um de cada
lado da cabeça de cabelos ruivos.
— Não, Rachel. Porque sua irmã era culpada — ele respondeu ferozmente.
Maldita hora em que se deixou cegar por aquela garota. Ruiva. E aqueles
olhos azuis que pensava ter esquecido, agora entendia por que sentia que
conhecia Verônica... Rachel ou qualquer que seja o nome dela. — E ela
poderia ter tido uma defesa melhor, mas conseguir isso não foi problema
meu. Meu trabalho era levar a cabo o caso que meu avô havia iniciado.
— Seu avô...? — perguntou, respirando com dificuldade. Ela não
conseguia fugir de Michael. Ele a prendeu firmemente contra o colchão. Seu
cheiro, sua pele e sua voz eram uma combinação letal, especialmente quando
aquela fórmula uma vez causou estragos com desejo, mas agora eles
causavam sua dor.
— Ele adoeceu e teve que abandonar o caso do nosso cliente, aquele que
acusou sua irmã, no último minuto. Portanto, como meu pai estava
trabalhando em outro cliente, tive que absorver o assunto e aceitar o que meu
avô deixou para trás em um tempo recorde de dez dias. A etapa final do
julgamento. Quando tudo parecia mais louco — ele respondeu com firmeza,
lembrando como estava estressado naquela época. A traição de Ingrid. Seu
divórcio. E uma noite inesperada, Rachel... — Então, estudei sobre sua irmã
em profundidade para poder argumentar a favor de meu cliente. Só terminei
um trabalho que meu avô não conseguiu por causa de sua condição médica.
— Isso não isenta você de ter sido a pessoa que mandou minha irmã para a
prisão... — ela disse o interrompendo, e o olhando com desafio.
— Julgou uma pessoa sem saber a verdade. Brincou todos esses anos com
suposições na cabeça, mas nunca se preocupou em descobrir a verdade. Em
aprofundar sua pesquisa. Pegou a primeira coisa que apareceu na mídia. Você
leu tudo?
— O advogado que ferrou com minha irmã é Michael Whitmore. Isso é o
que li na mídia! — disse, sem admitir que sim, que havia se deixado levar
pelos pedaços que alimentaram sua raiva. — Não conheço outro que seja
advogado. Tem olhos verdes. Cabelo preto. Presunçoso. Arrogante. Injusto.
Ele deu a ela um meio sorriso. Não tinha um pingo de alegria.
— Você sabe, Rachel Galloway? Só porque talvez no passado aquela
jovem de olhos azuis fosse um refúgio no meio das águas turvas da minha
vida, vou lhe contar algo que de repente a faça colocar as coisas em
perspectiva.
Ela ergueu o queixo em desafio. Sabia que a batalha estava perdida. Tinha
feito tudo errado. E ele tinha motivos suficientes para estar com raiva.
— Meu avô, o advogado que você disse que colocou sua irmã na prisão,
aquele que buscou todos os argumentos, as evidências, revisou os acordos e a
defesa final, se chamava Michael Joseph Whitmore. Talvez seja bom você
checar com seu amigo jornalista a quem você enviou uma cópia da carta que
Dereck Salmann recebeu hoje. — Rachel foi abrir a boca para dizer que a
carta para o amigo estava em sua casa e antes que tudo fosse de mal a pior,
ela havia decidido não enviá-la. Michael continuou —Você está presa em seu
próprio jogo.
— Não sei o que você quer dizer... — ela sussurrou com a voz fraca.
— Você acabou de fazer comigo exatamente o que a fez sentir raiva e dor
pelo passado: você cometeu uma injustiça em seu julgamento e agiu em
conformidade. Você encontrou a oportunidade, mas não parou para refletir
sobre a situação. E todas essas malditas semanas você mentiu para mim. E
tudo por deixar-se envolver em uma batalha anacrônica que cabia a Piper
lutar, não você. E nem mesmo ela, porque já está livre. Você queria jogar
comigo, mas cometeu um erro terrível.
— Você está defendendo Gordov...
— Você está errada de novo. Mas não preciso discutir assuntos do meu
escritório com uma mulher que não significa nada para mim.
— Michael...
— Uma garota pode correr o risco de ser retirada da lista de receptores, e
você será a culpada se o seu maldito amigo da Legal Strenght publicar as
mentiras que você forjou!
— Eu ouvi você — ela disse calmamente. — Você é um doador de
hospital.
As mãos de Michael sacudiram as dela, pedindo-lhe que calasse a boca.
— Você ouviu o que mais lhe convinha e juntou suas idéias — respondeu
ele com um bufo. —Novamente.
— Simplesmente aconteceu.
— Aparentemente, as coincidências abundam no seu caso — ele zombou.
— Me enganei. Eu admito. Sinto muito — ela murmurou, perdida naquele
mar azul que estava agitado e convulsionado.
Michael entrelaçou os dedos nos dela. Não foi uma demonstração de afeto.
Nem de sedução. Apenas uma forma de deixá-la saber o quão próximos eles
estiveram recentemente, mas também como um gesto que antes era
apaixonado agora representava controle. Ele estava no controle da situação e
ela havia perdido tudo.
— Senhorita Galloway, existe algo chamado doador anônimo. Portanto,
seu amigo da revista vai ganhar um bom processo caso ele use você como
fonte de informação. Se Vannia Latzovski for excluída dessa lista de
receptores, acredite, não hesitarei em ir contra você.
— Eu nunca mencionei a garota na carta, Michael...
— Não é sobre isso, droga! É que você fez exatamente o mesmo que
Ingrid. Você repetiu o padrão dela.
— Não me pareço com sua ex-mulher — disse com raiva. —Não me
compare a ela.
— Ambas são iguais. Mentirosas. Só existe uma mentira, a única coisa que
muda é sua magnitude. Você foi mais longe. Você violou minha confiança. A
dos meus amigos e da casa deles. Você cometeu muitas infrações.
— Você não é um carcereiro, nem eu sou uma prisioneira. Eu não estou no
tribunal. Então pare de tentar me ensinar. Eu já disse que sinto muito. Estava
errada e admito.
— Não, você não é prisioneira de ninguém além de você mesma e do seu
passado — disse ele, apertando os dedos nos dela. Como se temesse que
fugisse naquele momento... e como se de alguma forma também quisesse que
desaparecesse entre os dedos para não ter que ver o rosto envergonhado, os
lábios pálidos e o olhar confuso e arrependido.
— Michael, eu não mandei aquela carta... eu só... — ela murmurou. Não
podia mais... não podia defender o que não era possível. Michael estava certo.
Doeu-lhe saber que sua idiotice tinha consequências. E nem mesmo teve sua
vingança. Uma vingança errada. Uma estupidez absoluta que acabava de
privá-la da possibilidade de estar com o único homem que amava em seu
coração, mas aquele que não a queria mais perto dele. Não mandei a carta...
— insistiu.
— Meu chefe confia em mim. Não posso dizer o mesmo de mim, em
relação a você. — Ele a soltou e se afastou. Espero que você tenha
aproveitado sua pequena farsa. Obrigada pelo sexo, a verdade é que foi
divertido.
— Michael, não diga algo de que possa se arrepender. Eu entendo que
você está com raiva. E eu tenho muitas coisas para assimilar... mas...
— Fora da minha casa. Fora da minha vida. Nunca mais quero ouvir você,
Rachel Galloway. Ou qualquer que seja o seu nome ou como deseja ser
chamada.
Ele disse o nome dela como um insulto. A maldita carta chegara mais
cedo, ela pensou. Que hora para o serviço de correio nacional ser mais
eficiente.
Rachel se levantou devagar. Deus. A dor que sentia foi quase física. Como
se a mão de um gigante estivesse apertando seus pulmões e sangrando seu
coração. Mordeu o lábio inferior tentando conter um soluço. Tinha perdido. E
foi tudo culpa sua... Por que Michael disse que Piper era culpada?
— Michael... — ela disse em um tom quase inaudível. Ela precisava
perguntar sobre Piper, mas sabia que teria que encontrar as respostas sozinha.
Desta vez, apenas sem ver seu ponto de vista.
Ele a olhou friamente, mas teve que fazer um esforço sobre-humano para
não tomá-la nos braços e beijá-la até que tudo estivesse apagado. Até que
fossem apenas os dois novamente. Maldita seja. Gostaria de nunca ter
atendido aquela ligação de Dereck.
— Minha mãe sempre me ensinou a ser um cavalheiro com as mulheres —
disse ele, interrompendo-a. — Portanto, tentarei honrar esse ensinamento.
Tente não me levar mais ao limite. Tenho trabalho amanhã e coisas
importantes para fazer — ele insistiu quando a viu hesitar.
Ela se aproximou. Não pensou no que estava fazendo. Timidamente,
encurtou a distância cada vez mais. Ele parecia uma parede impenetrável de
gelo puro. Rachel abraçou sua cintura, mas Michael não levantou um dedo.
— Michael... — Olhou para ele. — Sinto muito por como as coisas
aconteceram. Gostaria de te dizer, mas não encontrei tempo para isso... e
quando fiz isso, percebi que era tarde demais... Pode me perdoar?
— Você poderia ter feito isso se não tivesse alcançado este ponto?
— Só quando eu soube que estava apaixonada por você... que te amo. Eu
percebi que odiar você era odiar a mim mesma, que tentar machucar você era
um efeito que seria replicado em mim — ela finalmente disse. Se não havia
nada a ganhar, também não tinha nada a perder confessando o que sentia no
fundo de sua alma.
Ele a empurrou suavemente, mas com firmeza.
— Rachel, e quando esse milagre aconteceu? — Ele perguntou,
zombando.
Ela não conseguiu conter as lágrimas que inundaram seus olhos. Rolaram
por suas bochechas macias.
— Me desculpe por ter demorado tanto. Me desculpe, eu estava errada e
traí sua confiança. Lamento o plano absurdo que elaborei sem sucesso e
lamento ter aproveitado a oportunidade de conhecê-lo de modo a não fazer
isso realmente e para encontrar desculpas para magoá-lo ou prejudicá-lo, em
vez de encontrar motivos para saber mais sobre você. Embora o que eu
soubesse me fez amá-lo. Embora eu não possa vê-lo novamente, não lamento
ter me apaixonado por você. É a única coisa da qual não me arrependo. —Ela
deu dois passos para trás e se dirigiu para a porta do quarto, virou-se e olhou
para ele com tristeza. — Tente não me odiar tanto, Michael — ela sussurrou.
Ele apertou a mandíbula.
— Por que eu deveria odiar alguém que nunca amei?
Isso foi como um tapa em Rachel.
Michael se desprezava, mas não conseguia controlar o rancor que ela lhe
causara. A raiva corria por suas veias. Durante todo o tempo soube que
Rachel era a garota do passado. A memória difusa existia e poderia nunca ter
sido esclarecida se não tivesse recebido a ligação de Dereck. Que idiota tinha
sido todo esse tempo. Como ele se deixou ser cegado por uma mulher pela
segunda vez?
Não era nem mesmo a tentativa de Rachel de envergonhá-lo na frente dos
outros. Ele poderia facilmente se defender com argumentos sólidos, assim
como faria com a equipe de relações públicas da empresa da qual era sócio.
Nesse caso, o que ele desprezava era a traição de sua confiança. A
possibilidade de ter conseguido ferir o círculo íntimo que ele tanto amava:
seus amigos e sua família.
— Você disse agora que...
Ele cruzou os braços. Olhou-a de cima a baixo de uma forma grotesca. Os
gestos poderiam perfurar o corpo como se fossem uma lança envenenada?,
ela se perguntou. Mal conseguia respirar. Precisava fugir antes que fizesse
algo terrível como implorar a ele para tentar colocar as coisas de volta nos
trilhos. Mas o que foi quebrado nunca voltaria ao seu estado original, não
importa o quão boa a cola fosse. Sabia disso.
— Talvez seja algo que nós, homens, costumamos dizer depois de uma
boa foda... ou quando queremos repetir — disse ele. — Você sabe, Rachel,
uma mulher dura uma temporada. A novidade acaba, e mais uma temporada,
a candidata será outra.
O sorriso de Rachel, que tentava ser otimista quando era lógico que estava
derrotada, comoveu Michael profundamente. No entanto, ficou indiferente à
parte que o impelia a abraçá-la, a dizer-lhe que era mentira que era só uma
boa trepada porque nunca seria, que ele a adorava, mas que precisava de
tempo para compreender, assimilar e perdoar. A parte pragmática, consciente
e sem emoção o convidou a ficar onde estava. Tal foi sua decepção que
obedeceu a isso.
— Sim... acho que é assim que as coisas funcionam às vezes. — Ela não se
defendeu. Não havia nada para fazer naquela casa. Nessa vida. Nesse
coração. Olhou para ele, mas seus olhos não eram mais brilhantes, nem seu
rosto era o brilho que o caracterizava. — Adeus Michael... desculpe...
Uma vez na sala de estar, ela pegou sua bolsa. Precisava se recompor para
dirigir. Caminhou com cautela. Abriu a porta do carro e entrou. Antes de
começar, ergueu os olhos. Com um suspiro triste e resignado, pisou no
acelerador.
Quando Michael ouviu o motor do carro de Rachel se afastando, até que
não pudesse mais ser ouvido no silêncio da noite, ele se sentou no chão com
as costas contra uma das paredes de seu quarto. Ele abaixou a cabeça e
permaneceu nessa posição por muito tempo. Ele havia encerrado o processo
de fusão do ano em Chicago, mas nunca uma vitória teve um gosto tão
amargo.
C A P Í T U L O 1 5

Várias semanas depois...

Piper geralmente não saía de casa a menos que fosse ao supermercado ou a


uma loja que a mantivesse discreta. Tentou ser mais discreta desde que
descobriu que a estavam seguindo. A vizinhança em que ela se abrigava
ficava bem distante das áreas convencionais onde podiam procurá-la. Até
tingiu o cabelo de preto. Sempre quis fazer isso, mas agora era uma desculpa.
O principal oficial encarregado de protegê-la, Dalton, a acompanhava o
tempo todo, assim como mais dois policiais discretos que perambulavam pelo
bairro. Não entrou em contato com sua irmã por vários dias, e nunca pensou
que seu autoexílio duraria tão pouco. Em pouco tempo, desfrutaria da
tranquilidade novamente. Não podia acreditar.
A polícia prendeu Gordov dias atrás e ela sentiu que sua vida estava sendo
devolvida.
— Estou realmente impressionada — disse ela ao homenzarrão que se
tornara quase um amigo por várias semanas. Isso, se Dalton não fosse tão
fechado. — Eu simplesmente não acredito. — Tinha visto a notícia e ainda
estava pirando.
— Um de seus inquilinos estava farto de que tentassem despojá-lo de seu
negócio que fora tão difícil de construir por meio de um contrato
propositalmente adulterado. Aparentemente, ele não foi o único afetado —
comentou Dalton.
— E essa é a evidência mais forte?
O homem cruzou os braços. Ele sabia que Piper estava tentando arrancar
informações, mas desta vez ele não poderia dar a ela mais do que todos
sabiam. Só podia lhe dar a certeza de que, desta vez, a possibilidade de
Gordov ir atrás dela era extremamente baixa, e as chances de não ser preso
dessa vez eram praticamente nulas. Seus contatos o mantiveram bem
informado, mas ele não podia revelar mais do que o necessário.
— A prova está nas mãos da polícia, Piper. É sobre um inquilino
descontente que teve a coragem de ir à polícia e entregar o que precisavam
para prendê-lo. Eu não posso te falar sobre as provas, apenas dizer que é
muito sólida.
— Eles o pegaram por seus negócios legais, então — ela murmurou em
voz alta, ao terminar de fechar a mala. Não tinha muitos pertences, mas a
simples ideia de ir ver a irmã a deixava feliz. Talvez elas pudessem começar
de novo. Não seria fácil para ela, na prisão sofrera muito com a solidão e a
raiva, mas colocaria tudo de lado. Era uma nova vida. E ela queria tentar
recuperar a alegria de outros tempos, viver um presente melhor.
— Você nunca sabe quais surpresas a vida traz.
— Agora você está livre para ir. Não está em perigo.
— Retaliação...? — Ela perguntou, mordendo o lábio inferior.
— Não acredito. O alvo provavelmente será outra pessoa ou pessoas.
Certamente agora eles nos informarão que temos que ser resignados para a
custódia de testemunhas. Imagino que encontrarei esse inquilino antes de
você — disse ele com um sorriso. Um gesto muito raro para o policial. —
Você fez sua parte, Piper. Suas informações serão de grande utilidade em um
futuro próximo, mas já está livre. —Dalton ajustou sua jaqueta. Se você ainda
quiser mudar sua identidade, você poderá...
— Não — ela interrompeu gentilmente. —Acho que vou ficar e tentar
reconstruir minha vida como Piper Galloway.
— Você precisará notificar seu oficial de condicional sobre quaisquer
medidas que tomar.
— Eu vou — disse com um sorriso. — Obrigada, Dalton, e obrigada a
seus colegas por me protegerem todas essas semanas.
— Boa sorte, Srta. Galloway.
Com um aceno de cabeça, o homem saiu e a deixou terminar de organizar
sua bagagem. Estava se mudando para um novo lugar, mais animado. Afinal,
ela tinha muito tempo livre para procurar anúncios no jornal.
Dalton a acompanhou, há cinco dias, quando acabava de se espalhar a
notícia da prisão de Emilio Gordov, para se encontrar com sua nova senhoria.
A princípio, a senhora relutou ao confessar que era ex-presidiária, mas a
intervenção de Dalton, dizendo que podia confiar nela e que, se precisasse,
lhe seria fornecido o número de telefone do oficial de condicional, amenizou
a situação. A mulher finalmente concordou em alugar a casa de hóspedes
com todo o conforto que ela tinha.
E Piper Galloway estava pronta para recomeçar.
***

Olhou para o relógio de parede como se fosse a coisa mais importante do


mundo.
Fazia três meses desde a última vez que ela viu Michael. Desde então sua
vida foi muito diferente. Mais apagada e agindo como um autômato. Mas
pelo menos sua irmã Piper parecia ser o que era de novo ou pelo menos
estava tentando, e elas estavam passando mais tempo juntas. Teve que
confessar seu relacionamento com Michael e sua vingança fracassada. Piper a
surpreendeu quando disse que ele a visitou na casa onde agora morava.
— Como ele encontrou você, Piper?
— Os advogados têm seus métodos e eu não perguntei. Fiquei surpresa ao
encontrá-lo na porta da suíte onde moro. Foi uma visita confidencial, mas
você é minha irmã e queria que soubesse que sinto muito pelo dano que
causei ao fazer você pensar que eu era inocente, por não esclarecer...
desculpe, Rachel.
— Isso não importa mais, Piper. — Quando Rachel ligou para Ariel,
desesperada por conselhos de uma mulher mais sábia e adulta, sua tia
confirmou que Piper era culpada. Que havia evidências, mas não poderia
revelar os dados específicos, apenas assegurava-lhe que Piper era culpada.
Sua tia foi compreensiva quando Rachel disse que ela havia cometido um
grande erro com Michael, e Ariel também se desculpou por não ter pensado
que neto e avô tinham os mesmos nomes. — O que conta é saber que você
está disposta a reconstruir sua vida e que não há mal-entendidos. Agora você
está livre e vamos tentar recuperar a experiência que nos faltou...
— Eu era culpada, merecia ir para a cadeia, mas não era uma assassina. Eu
deveria ter contado quando você insistia em minha inocência. — Ela pegou
suas mãos com amor, apertando-as como costumava fazer quando Rachel
tinha medo de dormir sozinha à noite quando era mais nova. — Nunca pensei
que você tivesse esses sentimentos de raiva e ressentimento. Michael
Whitmore é um bom homem, Rachel. E não foi ele que me mandou para a
prisão se podemos ser objetivas.
— Seu avô...
Piper assentiu com firmeza.
— Ele defendeu seu cliente, Rachel, às minhas custas, sim. Mas é a vida.
Era o seu trabalho.
— Você fala como se não guardasse rancor...
— Não acho que o ressentimento vai me devolver o tempo que perdi por
ser uma idiota. Talvez um dia eu possa te contar minha história, mas por
enquanto irmãzinha, prefiro deixá-la onde é melhor: no baú de memórias
esquecidas. Não há nada para resgatar. Prefiro olhar para frente e continuar
uma vida nova. Nem todos nós temos uma segunda chance de melhorar e ver
a luz do dia.
— Ele te contou sobre mim? — perguntou sem esconder seu tom
esperançoso.
— Ele me disse que a conheceu. Não entrou em detalhes pessoais... Ele foi
me dizer que por meio do conselho dos advogados da firma Salmann &
Buckend as pessoas que decidiram denunciar Gordov para levá-lo a
julgamento, falaram com a polícia. Michael me disse que era uma forma de
me fazer justiça.
— A você?
Piper assentiu olhando sua irmã nos olhos.
— Sabia que no passado não tinha dinheiro para contratar um bom
advogado e que minha defesa foi ruim. Que podia conseguir um acordo, mas
ninguém me ofereceu. Não tive oportunidade de negociar. Ele fez seu
trabalho e disse que sentia que me devia algo. Apenas para sua consciência,
pessoal, não profissional. Então me disse que queria que eu soubesse que seu
avô estava apenas seguindo o que outro advogado teria feito: defender seu
cliente. E como foi ele quem foi designado para representá-lo quando
adoeceu, não poderia desapontá-lo no tribunal. Certamente não.
— Entendo...
— Sua maneira de compensar sua consciência pessoal desta vez foi
insistir para que seu escritório mudasse de rumo. Agora Salmann & Buckend
representam os inquilinos de Gordov. Aqueles que têm negócios honestos na
propriedade daquele cretino. Não vão julgá-lo por tráfico de drogas, mas
quem sabe se vão encontrar alguém que queira testemunhar contra aquele
valentão e aumentar suas acusações. Vão julgá-lo por extorsão e falsificação
de documentos.
— Contratos de locação...
— Exato. Então Gordov foi recusado como cliente da Salmann &
Buckend, e agora aquele bandido contratou um concorrente da empresa de
Michael.
Rachel não pôde deixar de sorrir.
— Michael vai ganhar.
— Ele não vai aceitar o caso, outra equipe jurídica o fará. Ele me disse que
havia um conflito de interesses e não queria saber sobre esse assunto com
Gordov. Mas sim, acho que se ele liderasse a defesa desses inquilinos ele
ganharia... Você o ama, certo?
— Piper... eu já te disse o que aconteceu.
— Delaney é uma boa amiga, Rachel. Talvez você deva ouvir o conselho
dela, que é o mesmo que vou lhe dar. Vá falar com ele. Vai perdê-lo. Faça
alguma coisa, Rachel.
— Ele não me ama, Piper. É evidente que ele já se esqueceu de mim...
— Se fosse assim, então ele não teria vindo me ver. Ele teria se dissociado
completamente de qualquer coisa com o nome Galloway na frente dele. Pense
nisso.
Rachel voltou à realidade quando o despertador de seu celular começou a
tocar. Exatos três minutos. Já suspeitava do óbvio, e confirmá-lo só a deixava
mais infeliz, mas ao mesmo tempo a enchia de energia renovada com a
perspectiva de ter algo que nunca poderia ser tirado dela.
Pegou a tira.
Duas linhas.
Ela olhou para o teste de gravidez com nostalgia.
Gostaria que as circunstâncias fossem diferentes. Pelo menos ela teria o
amor incondicional de sua filha ou filho. Ela tomava a pílula e Michael
sempre usou proteção. Não iria reclamar desta vez. Aceitou o que estava
acontecendo com seu corpo.
Nas últimas semanas, ela estava cansada e, ainda assim, estava
prolongando suas horas de trabalho no escritório. Trabalhava como uma
louca, a ponto de acreditar que o atraso da menstruação tinha a ver com o fato
de estar pulando refeições ou se esforçando demais. Até que Delaney olhou
para ela de perto e perguntou o que diabos havia de errado.
Isso foi pela manhã, quando se encontraram no elevador.
— Pelo amor de Deus, Rachel! Você não pode deixar o que aconteceu te
deixar com essas olheiras. Você está comendo bem?
— Não. Eu mal tenho tempo. Chegaram novas propostas comerciais para
estudar e tenho que enviar meus comentários ao Paul.
— Existe a possibilidade de você estar grávida? Outro dia, na festa do
filho de Myrna, praticamente adormeceu e ontem desmaiou sem motivo
enquanto fazia pudim. Suspeito que não tenha nada a ver com comida... em
parte.
— Del...
— Faça o maldito teste o mais tardar amanhã. Se não ouvir de você,
acredite em mim, vou subir e fazer você se sentar no banheiro.
Isso a fez rir, mas ela sabia que Del falava sério.
O que iria fazer agora? Perguntou-se enquanto tirava a roupa e entrava no
chuveiro. Semanas atrás, ele tinha ido ao cinema com Delaney, depois jantar.
Encontraram alguns amigos em um restaurante na cidade, e ela se viu cercada
de afeto e boas vibrações. Tanto que se ouviu rindo às gargalhadas e curtindo
a noite.
No entanto, ficou surpresa ao ver Michael à distância. Do outro lado do
restaurante, na ala mais cara. Ele não estava sozinho. Uma mulher alta e
distinta estava em seu braço.
Doeu o indizível vê-lo com outra mulher. Sentiu frio por dentro, porque o
amava a tal ponto que sentia que iria consumir suas forças. Mas ele decidiu
recomeçar. Exatamente como ele disse que faria... uma temporada uma
mulher, outra temporada, alguém diferente.
O mais justo era tentar falar com Michael e dizer que ele seria pai. Não
queria nada material dele ou de sua família. Apenas desejava que seu filho
tivesse a possibilidade de ter o sobrenome do homem que o gerou. Deixá-lo
saber que ele pertencia a um pai e uma mãe, e que o conceberam com amor,
embora nunca pensassem que poderiam ser pais. Seu bebê fora concebido
com amor, e essa era a verdade.
A água acariciou seu corpo.
Colocou as mãos na barriga lisa. Ele supôs que seria uma daquelas
mulheres que mal tinha barriga até os seis meses.
Precisava saber há quanto tempo estava grávida. Iria marcar uma consulta
com seu ginecologista no dia seguinte. Odiava ir a consultórios médicos
particulares, embora odiasse muito mais hospitais. Por enquanto, tentaria
assimilar a realidade de sua condição e buscar todas as informações
necessárias para cuidar bem de si mesma. Piper e Delaney ficariam muito
felizes em descobrir que seriam tias. E sua tia Ariel, tia-avó.
Talvez num futuro próximo fosse melhor visitar sua tia no Maine. Poderia
falar com Paul e pedir uma licença. Trabalhar na praia. Por que a internet
existe? Suas férias antecipadas. Paul era muito compreensivo a esse respeito.
Ou pelo menos esperava que fosse...
Uma vez que esclarecesse sua situação no escritório e informasse Michael
sobre sua gravidez, ela se esforçaria para tentar reconstruir sua vida amorosa
longe dele. Mesmo que isso lhe custasse. Mesmo que doesse.
Ela precisava ver além de suas memórias com Michael Whitmore. Não
poderia passar o resto de sua vida tentando juntar os pedaços de um
relacionamento quebrado. Ora, uma pequena pessoa que crescia dentro dela
merecia uma mãe forte e determinada. Não iria decepcioná-la.

***

Na primeira noite em que tentou acreditar que poderia virar a página, viu
sua nemesis em um restaurante. Ficou doente ao ver Rachel rindo com o
grupo de amigos ao seu redor. Porque ele merecia criar aqueles sorrisos e, em
vez disso, suas últimas palavras a fizeram chorar. Ele deveria ter guardado
aquelas palavras dolorosas para quando a raiva se dissipasse. Rachel
confessou que o amava. Ela não o tinha visto, tinha certeza. E talvez fosse
melhor assim. Só depois de pensar muito, no dia em que recebeu o
telefonema de Dereck, a declaração dela ficou ancorada em sua memória.
A desconfiança que sentia com Ingrid parecia ter redobrado, e quando ele
acreditou que poderia acreditar em uma mulher novamente, Rachel não era
quem dizia ser... Procurá-la não estava em seus planos, nem tampouco
esquecê-la.
Douglas e Lara disseram que ele deveria se colocar no lugar de Rachel,
que embora suas intenções não fossem as mais nobres, no final ela acabou se
apaixonando por ele. As palavras dos Bronsons foram um pouco mais duras
quando descobriram o que aconteceu, mas a mensagem foi a mesma de sua
família: tente consertar a situação e encontre uma forma de resgatar o que
havia acontecido.
Sua mãe, de quem ele menos esperava palavras porque não lhe contara
nada em particular, insistiu com ele para que esperasse até que ela tivesse
tempo para se organizar. E se ela procurasse por ele, que falasse. Disse-lhe
que cada um tinha o seu tempo e para não esquecer o mais importante:
procurar sempre se colocar no lugar do outro. Com aquelas palavras diretas e,
ao mesmo tempo, de caráter geral, ela deu-lhe as respostas de que ele
precisava.
Quanto à situação no escritório, o relatório Breaking Legal Deals havia
dado a ele uma exposição significativa e isso resultou em novos clientes.
Dereck ficou satisfeito, mas eles não tocaram no lado filantrópico de Michael
novamente. A revista aproveitou o ângulo da juventude de Michael, a
tradição familiar de trabalhar na área jurídica, para a qual entrevistaram pai e
irmão como testemunhos, e claro, também houve perguntas sobre questões
políticas que Michael respondeu com sabedoria.
Apesar das muitas atividades que sua profissão geralmente envolvia, ele
não havia parado de pensar em Rachel. O amor demorou muito para morrer.
O dele estava bem vivo, espancado, mas ansioso para bater com força
novamente. Ele sentiu que sua consciência estava em paz com o passado.
Estava pronto para seguir em frente. Mas ele não queria fazer isso sem
Rachel.
Três meses sem poder tocá-la. Fazer um tour pelo seu corpo. Ouvir o som
de sua voz cantando e desfrutar de seus gemidos quando juntos eram um.
Mas o que mais sentia falta era poder falar com ela. Rindo da maneira como
queria defender causas que estavam fora de seu controle. A maneira como
seu senso de humor funcionava...
Sair com Saphire, uma bela artista plástica, foi um erro. A garota era
inteligente e sua conversa divertida, mas depois de ver Rachel naquela noite,
sabia que estava perdido. Aquela ruiva o havia arruinado para qualquer
mulher desde o dia em que cruzou a sua vida,
C A P Í T U L O 1 6

— O advogado Whitmore não pode vê-la, senhorita. Já te disse várias


vezes. Está ocupado em uma sessão importante. Marque uma consulta e volte
depois.
— Liguei de manhã. E fiz com que me colocassem na lista de clientes. Sua
colega —Rachel enfiou a mão na bolsa e puxou o telefone — Alisson Parks.
Ela marcou para mim. Verifique a lista. Rachel Galloway. — Teria sido mais
fácil para ela ligar para Michael em seu telefone pessoal, mas temia que ele
ignorasse sua ligação. Vê-lo pessoalmente, no único lugar onde permaneceria
calmo, foi a solução que considerou mais viável. Não contava com uma
recepcionista negligente em um escritório de advocacia que cobrava tantos
milhões de dólares por ano.
— Oh, Alisson saiu mais cedo com afastamento do médico. Deixe-me ver.
— A mulher demorou. Ela leu o que parecia ser um relatório eletrônico,
então voltou sua atenção para Rachel. — Desculpe, seu nome não consta,
Srta. Galloway. É um representante de alguma empresa?
Rachel controlou o desejo de dizer a ela se sua incompetência era fingida
ou natural.
— Não, eu não represento nenhuma empresa. É pessoal — respondeu.
Rachel estava na recepção dos escritórios da Salmann & Buckend.
Precisou de toda a coragem para procurar o homem que a considerava apenas
mais uma em sua lista de encontros sexuais, e que havia deixado bem claro
que não queria ouvir falar dela novamente.
Desta vez, pretendia fazer a coisa certa. Não iria esconder sua gravidez
dele. Então, esperou que a mulher parasse de olhar para ela como se fosse
surda por não querer se mover. Estava cansada, algo que acontecia muito
com ela ultimamente. A ginecologista disse em sua consulta pela menhã que
ela estava grávida de três meses e meio. Que não corria perigo, que tudo
estava em ordem, mas precisava consumir mais ferro.
Ela fez o primeiro ultrassom. Não conseguiu conter as lágrimas quando viu
a imagem de seu filho na tela. O médico perguntou se ela gostaria que
imprimisse, e Rachel perguntou se era possível ficar com duas. A
ginecologista deu-lhe o que havia pedido no final da consulta.
— Diga a ele que Rachel Galloway precisa vê-lo. E é urgente.
A mulher de cabelos pretos e olhos âmbar esboçou um sorriso impregnado
de orgulho. Tudo nesses escritórios exalava elegância e opulência. Algumas
paredes eram revestidas de madeira escura e o chão acarpetado. Não à toa que
era um dos escritórios de advocacia mais prestigiosos de Chicago.
— Você e muitos outros têm negócios urgentes, Srta. Galloway. O
advogado está muito ocupado e tenho ordens expressas para não interrompê-
lo.
— Você pode dizer a ele que eu vim, por favor? — Ela disse desistindo,
depois de tentar ser anunciada para Michael por vinte minutos.
— Eu vou dizer.
Rachel apertou os lábios. Duvidava que sua mensagem chegasse, então iria
esperar por ele em casa. Ela ainda tinha a cópia das chaves.
— Obrigada —murmurou e se dirigiu ao elevador.
Rachel apertou o botão para chamá-lo.
As portas se fecharam e ela respirou. Felizmente, não tinha os sintomas
típicos da gravidez. Exceto pelo sono ou pela pressão que de vez em quando
caia. Mas ela não tinha aquelas tonturas irritantes ou vontade de vomitar.
Comia normalmente. Embora os sutiãs parecessem não sustentar seus seios o
suficiente. Eles haviam inchado um pouco. Sua cintura se mantinha, mas ela
sentiu que aos poucos os jeans e as saias que antes eram perfeitos, agora
apertavam um pouco.
Delaney e Piper enlouqueceram quando contou a elas. Primeiro gritaram
de alegria, depois se lembraram da história com o pai do bebê e insistiram
que deveria ir procurá-lo imediatamente. Sua tia Ariel disse que ela seria
bem-vinda em sua casa sempre que quisesse e que esperava que o processo
de gravidez fosse maravilhoso. As palavras de tia Ariel a atingiram como um
bálsamo. Afinal, era a coisa mais próxima que tinha de uma mãe.
Quando chegou ao andar térreo do prédio, ficou surpresa. Michael estava
na frente dela. Esperando para pegar o elevador que ela estava saindo. Ele a
olhou surpreso. Se havia pessoas por perto, Rachel mal notou sua existência.
Seus sentidos estavam cheios dele.
Michael estava tão deslumbrante em seu terno sob medida. Cabelo
ligeiramente despenteado. Imaginou que estivera passando os dedos pelos
cabelos escuros com insistência, no meio de algum tipo de reunião
estressante ou conversa complicada. Era um gesto inerente a seus momentos
estressantes.
— Vai subir? — Perguntou a uma pessoa que estava esperando Rachel sair
ou ficar no elevador.
Finalmente ela reagiu, negou e se afastou.
Um grupo de pessoas a rodeou para entrar no elevador. Quando as portas
se fecharam atrás dela, apenas Michael sobrou. O corredor do saguão que
levava aos três elevadores estava vazio, exceto por eles.
— Olá... — ela disse finalmente, sorrindo timidamente.
Michael olhou para ela. Estava bonita. Ele se perguntou até que horas
estava trabalhando. Apesar da maquiagem simples, o traço das olheiras era
visível. Havia ganhado um pouco de peso, mas encaixava-se perfeitamente
nela.
— Oi, Rachel — respondeu ele. Havia muitas coisas que ele tinha que
dizer e explicar a ela. Para seu pesar, Dereck e Eugene esperavam por ele no
andar de cima. Os dois queriam fazer uma proposta para ele ser o sócio que
abriria um novo escritório em Nova York. Queriam transferi-lo, pois era um
dos poucos sócios que tinha clientes em três estados do país. Tinha saído para
uma reunião às três da tarde e, quando voltou, recebeu um telefonema de sua
secretária dizendo-lhe para não esquecer a reunião das cinco e meia.
— Marquei um horário pela manhã. E a recepcionista esta tarde me disse
que você estava em uma reunião — ela sorriu — mas não soube me dizer que
era fora do escritório e por isso ela não podia ligar para você. Eu...
— A recepcionista que substitui Alisson é um caos. Agora tenho uma
reunião com meus sócios — respondeu ele. —Você está bem?
Ela assentiu.
— Eu sei que você me disse que não queria saber de mim, que eu não
deveria voltar para te procurar e...
— Michael Whitmore, nada mais e nada menos! — Uma agradável voz
feminina exclamou, interrompendo-a.
Michael e Rachel se viraram ao mesmo tempo.
— Sylvia, o que você está fazendo aqui? — Ele perguntou com um grande
sorriso. A advogada se aproximou e deu-lhe um abraço. Também um beijo
que Michael devolveu. — Achei que você disse que não colocaria os pés
neste prédio até que eu tivesse uma oferta firme de trabalho — disse ele,
brincando.
A bela advogada riu. Ela se afastou para chamar o elevador.
— Um assunto de cliente com seu amigo Ferguson. Aquele do direito
trabalhista. Um assunto complicado e ele é o representante do marido da
minha cliente.
Michael riu. Outro divórcio a favor de Sylvia, pensou ele. Ela era uma
ótima advogada.
— Bem, boa sorte. Não vai ser difícil.
— Mulheres determinadas, é o que a lei precisa neste país — ela sorriu.
Michael se virou para Rachel.
— Esta é Sylvia Bancroft. Uma velha amiga.
Sylvia sorriu para Rachel. Esta última se tornou mais perceptiva, talvez
por causa da gravidez, mas as vibrações ao seu redor eram mais fáceis de
interpretar. E a ideia de que entre Michael e aquela mulher houve, ou havia,
algo mais do que apenas amizades não lhe era estranha. Ela não tinha o
direito de reclamar nada. Devia se lembrar com firmeza de que viera para dar
a notícia a Michael e que poderia ser grata por ele estar falando com ela.
Talvez porque não tivesse outra escolha, como ela esperava, ao procurá-lo em
seu local de trabalho.
— Oi, Sylvia. —Sorriu, o que menos queria era isso.
— Encantada. Você também é advogada? — Foi nesse momento que um
dos elevadores abriu. —Bem, eu tenho que subir ou Ferguson vai fazer
picadinho de mim. Você está saindo ou chegando? — Sylvia perguntou a
Michael.
— Tenho uma reunião com os sócios principais. — Inferno, Michael
pensou. Ele não podia desprezar Dereck e Eugene. Era muito raro que ambos
tivessem uma agenda correspondente. Essa reunião foi planejada com três
semanas de antecedência.
— Não vai demorar muito para o que vim dizer a você — Rachel
interrompeu.
Sylvia, do elevador, disse ao amigo para se apressar. Ele acenou com a
mão para ela lhe dar alguns segundos.
— Escute, Rachel... — Michael respondeu, totalmente perturbado com a
situação — Eu tenho que ir àquela reunião. Não pode ser adiada.
Rachel não iria deixá-lo dispensá-la. Tinha vindo com uma intenção e toda
a vontade de cumprir o que tinha de fazer.
— Eu só queria que você soubesse que estou grávida, Michael. E se você
duvida que é o pai, não tenho nenhum problema em fazer o teste de
paternidade quando o bebê nascer. — Ela remexeu em sua bolsa e tirou o
ultrassom da manhã. —Para você, para caso queira renunciar a isso ou me
mandar para o inferno... de novo. Não quero nada de você, nem de sua
família. Nada. Mas meu bebê merece seu sobrenome. É tudo. E se você não
estiver disposto a admitir, irei levá-lo ao tribunal para que isso aconteça. E
cumprirei a ameaça.
Michael olhou para ela, estático. Ele não reagiu. Tinha acabado de receber
um balde de água fria. O papel fotográfico em sua mão parecia queimar.
Passou a mão pelo rosto e olhou para o ultrassom. Não conseguia descrever
como se sentia.
Segundos depois, quando ele foi capaz de focar seu olhar, percebeu duas
coisas. A primeira, que Rachel havia saído do prédio. E em segundo lugar,
que Sylvia havia largado o elevador e estava ao seu lado com uma mão em
seu ombro.
— Você está bem? Que novidades...
Naquele instante, uma ideia lhe ocorreu. Talvez não fosse a mais brilhante,
mas conhecendo Rachel era um caminho coerente.
— Sylvia, o que acha de redigir um contrato de casamento?
— Então essa é a mulher que virou sua vida de cabeça para baixo, hein? —
perguntou sem esperar resposta e com um sorriso. Vamos discutindo isso no
elevador antes que Ferguson pense que tem uma vantagem. E respondendo à
sua pergunta, sou a melhor advogada para redigir contratos de casamento que
você poderá obter em toda Chicago.
— Fico feliz em ouvir isso — respondeu ele.
Se ela pensava que, ao dar a ele a notícia tremenda sobre sua futura
paternidade, como se estivesse explicando uma simples mudança na estação
do tempo, ele iria ficar calmo, Rachel estava muito enganada. Faria parte da
vida do bebê. Sabia que era seu, não precisava de nenhum teste de
paternidade. Rachel poderia tê-lo enganado com seu nome ou sobrenome,
mas não com seu corpo, e nem com a ideia de ser mãe. Ela era orgulhosa e
sabia que, depois da maneira como a expulsou de casa, era preciso muita
coragem para procurá-lo para comunicar a notícia. Ela não ia escapar de sua
vista tão facilmente.
Ele não achava que a ideia de se casar novamente poderia surgir em seu
horizonte, já que negou terminantemente a possibilidade depois de Ingrid.
Mas, uma vez que a palavra casamento surgiu de seu sistema, pareceu cada
vez mais apropriada. Ele iria se vingar de Rachel de uma forma que ela nunca
esqueceria.

***
Missão cumprida, Rachel pensou com as pernas trêmulas, antes de tirar o
casaco e colocá-lo no sofá de seu apartamento. Ele a olhou exatamente como
esperado. Com descrença e indiferença. Não deveria doer que Michael
preferisse ficar com essa Sylvia, em vez de se interessar mais por seu filho ou
filha. Claro, ele provavelmente pensou que não era dele. Ela fez bem em
dizer a ele que estava disposta a fazer um teste para que ele esclarecesse
qualquer dúvida.
De manhã, teve uma reunião com seu chefe. Paul concordou em lhe dar
férias. Quando lhe disse que estava grávida, seu rosto não demonstrou
surpresa. Paul se levantou e deu um abraço nela. Disse-lhe que contasse com
o seu apoio para qualquer eventualidade, visto que era muito apreciada na
empresa e ele não queria que ela deixasse de contribuir como profissional.
Não fez perguntas sobre o pai de seu filho, nem mencionou a possibilidade
de apoiá-lo de uma... maneira mais pessoal. Algo que Rachel apreciou, na
verdade. Como havia previsto, desde o último convite de Paul para sair, ele
não mencionou um interesse romântico por ela novamente.
No final da reunião, tinha um mês de férias acumuladas dos últimos dois
anos, mas Paul insistiu que se houvesse uma emergência, precisava que ela
trabalhasse no Skype ou Facetime. A empresa ainda deveria a Rachel mais
algumas semanas de férias, já que ela costumava tirar cinco dias devido à alta
demanda por papelada.
Agora ela gostava de ter se dedicado tanto ao escritório. Um mês era o
suficiente para tentar organizar sua vida em seu próximo papel de mãe.
— Não se preocupe, meu tesouro, você e eu vamos ser felizes — disse
acariciando o local onde essa nova vida crescia. — Agora, vamos sair de
férias. O que você acha disso?
Ela poderia se virar sozinha.
Tinha uma conta bancária muito saudável, tendo economizado muito
durante os anos de trabalho. Poderia sustentar seu filho sem depender
financeiramente de ninguém, muito menos de um homem. Mas estava
disposta a levar Michael ao tribunal se ele não concordasse em reconhecer o
bebê como seu. Essa nova sensação de proteção com a criatura crescendo em
seu corpo era nova e também revigorante.
***
— Rachel, abre a porta, tenho uma surpresa para você —disse Delaney.
Vestida com um roupão, veio até à porta. Sua melhor amiga tinha a mania
de bater com os dedos, e fazer todo o escândalo possível, em vez de tocar a
campainha.
— Espero que um dia possa usar a campainha como uma pessoa normal
— respondeu dando-lhe um abraço —. Como você está?
— Eu deveria te perguntar isso, porque você tem meu sobrinho ou
sobrinha por aí — disse com um sorriso. Estava carregando uma bolsa
bastante pesada em uma das mãos —. Sabe o que é isto? — perguntou
enquanto Rachel fechava a porta.
— Bem, disse que era uma surpresa, então o que você acha?
Delaney riu de sua pergunta boba..
— Bem, vamos celebrar a gravidez com sorvete, salgadinhos e um jantar
como Deus planejou em um dos melhores restaurantes de Chicago. Liguei
para Piper e concordou em ir para o restaurante. Ela não pode vir para casa
porque disse que deve terminar uma tarefa. — Encolheu os ombros —. Não
sei que mania sua senhoria pegou que agora resulta é sua pessoa favorita.
Rachel olhou para sua amiga com carinho. Não a julgava e lhe dava todo
seu apoio. Era maravilhoso saber que contava com ela.
— Prefiro que ela a aprecie e a faça saber que pode progredir, do que
minha irmã ficar amarga ou preocupada com sua segurança ou liberdade.
Delaney se moveu familiarmente pela cozinha. Pegou duas tigelas
coloridas, colheres e um pires. Colocou as compras de lado e começou a
servir as guloseimas. Minutos depois, ela se acomodou no sofá e pediu a
Rachel para se juntar a ela. Esta não esperou e começou a devorar os doces.
— Está com fome, hein?
— Ultimamente tudo que tem muitas calorias me agrada — disse com
uma risada —. Acho que posso parar de me preocupar com o limite. No final,
eu não acho que o bebê se importa se sua mãe rola as escadas ou se mantém
no peso.
— Você é muito trágica. Precisa de um pouco de chantilly para se adoçar
mais —respondeu com um sorriso —. Eu teria gostado de te acompanhar na
ecografia.
— E também... que pena que você teve que receber os fornecedores da sua
empresa justo hoje. — E entregou a sua amiga a foto do ultrassom.
—Awww, que emoção, Rachel. — Ele notou o sorvete de framboesa com
baunilha —. Seguiu meu conselho?
—Sim, mas o cretino não reagiu. Ele me encarou como se, em vez de dizer
que seria pai, eu tivesse dito que a Terra era o terceiro planeta mais próximo
do Sol. Entreguei a ele uma cópia do ultrassom.. —Suspirou—. Não importa.
Quando meu bebê nascer, cuidarei de tornar a vida de Michael miserável até
dar a ele seu sobrenome.
— Eu acho que o homem está digerindo a informação.
— Del, acha que podemos parar de falar sobre Michael Whitmore esta
noite? Sério, a ideia de comer sobremesas enquanto falamos sobre ele vai me
fazer devolver todas essas calorias.
Delaney sorriu.
— Ok então, eu tenho algo para te contar.
—Sim? —perguntou com expectativa—. Um garoto à vista, finalmente,
Del?
Ela assentiu.
— Concordei em sair com Fabrizzio.
—O italiano dono de um restaurante na área de South Loop?
—Sim… —murmurou corando.
Fabrizzio Orsinni era um menino de Roma que trabalhava como
fornecedor para Delaney, quando seus clientes queriam algo italiano na festa
temática. O homem era um sol, mas ela estava tão absorta em seu trabalho
que não queria namorar ninguém. No entanto, Fabrizzio foi persistente de
uma forma encantadora.
Na tarde anterior, ele havia trazido para ela uma musse de chocolate
branco e uma rosa para seu escritório, pediu que ela lhe desse uma chance
única de convencê-la de que a química que eles realmente existiam e que
precisavam explorá-la. Que ele seria paciente, mas que, por favor, desse-lhe a
oportunidade de se abrir com para conhecê-lo melhor. Delaney não poder
recusar. E não precisamente porque o mousse de chocolate branco era seu
favorito, mas porque depois de saborear esse doce, Fabrizzio a olhou com
intensidade e teve a delicadeza romântica de perguntar se lhe permitia beijá-
la.
Delaney praticamente derreteu em seus braços. E pela primeira vez em
muitos anos se sentiu viva. Queria explorar novamente as suas emoções com
um casal. E apesar de levar muito tempo para se apaixonar de novo, a ideia
de dar uma chance a Fabrizzio, sentia que era o que precisava seu coração.
— É maravilhoso, Del. Estou feliz por você!
— Quero ver você feliz de novo, Rachel. Seja como for, agora vai se
vestir, um delicioso jantar nos espera.
—No restaurante do Fabrizzio? — perguntou, estreitando os olhos com
desconfiança.
Del encolheu os ombros.
— É uma boa desculpa para vê-lo sem pensar que estou muito interessada.
Com uma gargalhada, a primeira em todo o dia, a Rachel foi vestir-se para
sair. No dia seguinte começavam suas férias e tinha que tomar um avião. Mas
essa noite pensava desfrutar a noite com sua irmã e sua melhor amiga.

***
Com nostalgia, da janela do táxi, Rachel observou como o centro de sua
cidade natal ficava para trás pouco a pouco. Havia amanhecido com bom
tempo, e por isso se entendia menos neve. Tinha quatro horas e vinte minutos
de viagem do Aeroporto Internacional de Chicago Midway até o Aeroporto
Internacional de Jetport de Portland, para então tomar outra rota, desta vez
por terra, que a levaria até Ogunquit. Sua tia Ariel estava esperando por ela.
Pagou ao taxista, e se alegrou de que o terminal não estivesse tão cheio.
Pegou um carrinho e colocou suas malas nele. Avançou para o balcão,
entregou o formulário de check-in para o assistente; então, apenas ela e suas
malas permaneceram. Olhou para o seu relógio de pulso. Faltavam quarenta
minutos para embarcar. Foi sentar-se perto de uma máquina de venda
automática de bebidas e comprou um refrigerante.
Seu celular tocou. Era Piper no WhatsApp.
“Tudo bem?”
Oi, Piper. Sim. Acho que cheguei com bastante antecedência.
“Diga olá para tia Ariel, embora ela não me ame muito.”
Não fale besteiras. Ela me disse que espera encontrar você em algum
momento.
“Vejo você na volta. Tente dar outra chance à vida, pois tenho certeza que
ela dará a você. Ok?”
Piper, quando fica enigmática, fico com cãibras.
“ Ha, ha, ha. Boa viagem!”
Diga a Delaney para não se esquecer de pagar ao meu senhorio o aluguel
do mês, por favor. Depositei o dinheiro para ela em sua conta.
“Eu direi. Tchau Rachel.”
Tchau.

***
Não aceitou a transferência para Nova York. Ele estava confortável em
Chicago e era onde pretendia continuar. Dereck e Eugene estavam céticos
quanto à sua recusa em se mudar para outra cidade com o triplo do bônus
trimestral, além de um Ático em Manhattan. Michael sabia quais eram suas
prioridades agora e isso não era crescer financeiramente, porque já tinha tudo
o que queria. Ou quase tudo…
Enquanto dirigia pela cidade, ele ligou o rádio.
Conduziu tentando conter a ansiedade. Estacionou no edifício de Rachel.
Pressionou o elevador e esperou que chegasse. Apertou o botão do piso doze.
O elevador parou no nono andar. Uma menina pequena e de rosto expressivo
entrou.
Olhou para ele com curiosidade. Então a viu esboçar um sorriso. Esperava
que no prédio não houvesse maníacos.
—Michael Whitmore, certo? —ela perguntou.
Ele franziu a testa e assentiu.
— Acho que sei mais sobre você do que deveria. Eu sou Delaney Garth, a
melhor amiga de…
—Rachel — ele completou, apertando a mão que a garota estendia —.
Gostaria de ter conhecido você em outras circunstâncias. Tenho algo
importante para falar com sua amiga.
Um largo sorriso apareceu na expressão da garota..
—Eu ia subir para pegar algumas coisas que deixei outro dia... Sinto muito
pelas coisas que aconteceram entre vocês, mas se quer saber, não concordei
com as ideias de Rachel desde o início. No entanto, estaria mentindo se
dissesse que não a entendo. Ela sofreu muito. Ela foi retirada da família desde
pequena, de formas muito duras. Não a justifico…— encolheu os ombros,
mantendo um tom otimista —. Que discurso para quem acaba de te conhecer.
Desculpe às vezes eu falo um pouco demais…
Michael riu. O elevador parou. Ele segurou a porta para ela e Delaney saiu.
— Uma característica que você compartilha com Rachel.
— Temo que não vai encontrá-la hoje.
Delaney pegou uma chave e abriu o apartamento de sua amiga. Ambos
entraram.
Michael aspirou o aroma floral que lhe era tão conhecido e experimentou
um vazio inexplicável. O vazio que tinha invadido cada dia e noite desde que
Rachel saiu de sua vida. Não era dado ao sentimentalismo, entretanto, só
acreditou retornar à vitalidade de sempre quando ela se apresentou no dia
anterior, tão segura e ao mesmo tempo tão nervosa, tão forte e tão vulnerável.
Cada vez que lembrava o modo em que a tinha ferido com suas palavras,
se amaldiçoava. Não podia acreditar que quis prejudicar alguém que amava.
Porque amava essa mulher. Com uma força que era capaz de varrer os
resquícios da decepção e a vulnerabilidade.
Se fosse outra pessoa que tivesse ido procurá-lo após o rompimento do
relacionamento, em vez de olhá-la com surpresa, ele a teria feito a segurança
retirá-la. Como ele fez uma vez com Heidi. Para um homem acostumado a
acompanhar os eventos e antecipar potenciais fracassos, a chegada de Rachel
foi como um redemoinho.
— É sábado e é meio-dia. Eu conheço a rotina... — passou a mão pelo
cabelo — ou conhecia a rotina de Rachel. Meses se passaram desde…
— Partiu o coração dela, Michael. Apesar de tudo, ela se apaixonou por
você. E embora você tivesse motivos para estar com raiva, as palavras que
disse não eram certas.
—Eu sei.
— Se ela não estivesse grávida nunca a veria novamente. — Ele já sabia.
E a própria ideia era insuportável. Eles tinham que conversar. Muito sério.
Ele não estava indo a lugar nenhum. Rachel Galloway iria ouvi-lo —. Não
vai encontrá-la aqui. Saiu de Chicago — disse olhando-o com severidade.
— Como assim saiu de Chicago? — ele perguntou sem controlar a
confusão em sua voz —. Partiu a trabalho ou para sempre? Para onde foi?
— Não acho que ela queira que você saiba.
Michael avançou até Delaney.
— Ouça, Del. Posso te chamar assim, certo?? — A garota assentiu —.
Bem. O fato é que Rachel perdeu o direito de voto quando decidiu jogar
comigo. Também quando deu a entender que poderia pensar que o filho que
está carregando não é meu e acreditar que me contentaria em apenas registrar
meu sobrenome. Como se eu não soubesse que meu senso de lealdade para
com minha família é o mais importante! — ele disse impotente.
— Você não pode culpá-la…— respondeu cruzando os braços —. Suas
palavras não foram exatamente encorajadoras. Principalmente porque você
não quer mais ouvir falar dela. Além disso, Rachel não é sua família... ela é
apenas... a futura mãe de seu filho.
Michael odiava que lhe dissessem a verdade, mas tinha que admitir que a
garota estava apenas explicando o óbvio. Ele olhou para Delaney.
—Rachel é a mulher que eu amo. E com quem pretendo me casar. Será
parte da minha família. E ela será minha. Então, se não quer que eu sequestre
Rachel e a leve para Las Vegas para me casar com ela, sem lhe dar a chance
de ser sua principal dama de honra, é melhor me dizer onde ela está.
—Por que acha que vai se casar com você? — respondeu de volta. O
pensamento de que não poderia ter um casamento como o que as duas haviam
sonhado a machucou. É muito rasteiro —. É orgulhosa. Não vai querer ver
você…
O sorriso confiante e satisfeito fez Delaney franzir a testa..
— Eu vou cuidar disso, Del. Então, onde ela está?
—Não vai fugir para Las Vegas com ela então…?
— Só se você responder à minha pergunta e parar de pensar tanto.
Delaney fez uma careta.
— Na casa de sua tia Ariel em Ogunquit — disse relutantemente.
— Vamos nos dar bem, Del. Prazer em conhecê-la. No veremos no
casamento. — Então ele saiu do apartamento, assobiando.
C A P Í T U L O 1 7

Poderia responder as chamadas. Também mensagens de texto. Mas não


tinha vontade de falar com Michael. Quando seu bebê nascesse, só então,
diria algo a ele. Agora tudo era calma ao seu redor e preferia manter dessa
maneira.
Ver sua tia Ariel lhe fez muito bem. Desde que vivia em Chicago só tinha
ido ao Maine quatro vezes. E agora já contava cinco dias desfrutando do
silêncio e de saudar alguns conhecidos da área. Muitos já tinham vários
filhos, outros, tinham migrado para outras cidades. De modo geral, a área
quase não teve mudanças significativas.
Suspirou. Embora seu nível de estresse fosse baixo, seu coração doía. Não
houve uma única noite que deixou de ansiar pelo calor de Michael. A
sensualidade da sua voz. O som da sua risada. Esperava que o tempo fizesse
seu trabalho. Embora por agora tenha sido muito difícil.
O sol estava desaparecendo do firmamento e a brisa fria só podia ser
eliminada com a taça de chocolate quente que sua tia preparava. Era a
melhor. Deu vários goles e deixou escapar um som de prazer. Era o chocolate
mais rico que existia.
—Como está querida? — Ariel perguntou saindo para a varanda. Seu
cabelo estava completamente branco. Ela se recusava a tingi-lo. Dizia que era
uma mulher orgulhosa de seus anos e consciente de suas experiências. Não
queria escondê-los.
Sentou-se na cadeira de balanço que estava junto à da Rachel. Uma
pequena lareira externa estava acesa.
— Ficar longe da agitação da cidade me faz bem — estendeu a mão e
pegou a mão de sua tia —, é bom ver você de novo, tia Ariel. Tantas coisas
aconteceram.
— Experiências e ensinamentos. Por que não entrou em contato com o
pai do bebê? Eu vi o anseio em seu olhar cada vez que esse telefone toca.
Agora que sabe a verdade, pois talvez possa recompor as peças.
Rachel olhou para o mar.
— Não temos nada a nos dizer. Ou pelo menos ele disse tudo quando me
expulsou de sua vida. Tal como te contei. — Tinha omitido alguns detalhes,
é claro.
— Sim, filha, foi cruel ao te falar como o fez. As mentiras, não importa
como as considere, causam dano. Você mentiu para ele. Talvez ele queira se
desculpar.
Rache riu sem alegria. Balançou calmamente na cadeira antiga e
confortável. Tinha um cobertor grosso sobre os joelhos.
— Ou talvez pretenda procurar um modo de me devolver a afronta.
— Seja objetiva. Como você teria reagido se os papéis tivessem sido
invertidos e ele tivesse fingido ser outra pessoa para tentar te machucar?
Ambos cometeram erros… A decisão é sua sobre o que fazer. Estou aqui
sempre que precisar de mim. —Sorriu—. Vai ficar muito tempo aqui fora?
Por que não vai dar um passeio pela praia?
— Me conhece bem, tia. Sabe que aqui é o único lugar do mundo onde
caminhar sozinha é um verdadeiro prazer.
— Vou sair para fazer compras. Preciso de algumas coisas.
— Não se preocupe, eu cuido do forte — disse com um sorriso, antes de
levantar-se para ir para a praia —. Estarei de volta em breve.
— Não tenha pressa, filha.
***
Se ele tivesse pensado que a casa ficaria uma bagunça por causa do guarda
negligente, Michael teria contratado uma empresa de limpeza a tempo. Não
havia ninguém disponível nas proximidades quando chegou, então passou o
primeiro dia arejando e limpando a casa de praia. Precisava de uma boa
camada de tinta, mas foi encomendada por uma nova empresa da área. Muito
eficiente, devia reconhecer.
Enquanto as melhorias na casa estavam sendo aplicadas, ele estava
hospedado no Taj Majal Maine Beach Stars. O melhor hotel de Ogunquit. A
rede havia inaugurado o hotel três anos antes, empregando vários residentes.
Ou aqueles eram os elogios que os funcionários diziam a todo o momento.
Agora, dois dias depois, a casa estava com pintura nova, brilhando e
cheirando a limão. E, claro, ele demitiu o guardião. Estava despachando as
solicitações da firma de seu antigo escritório, mas procurava não se perder
nos detalhes, pois para isso havia encarregado Angelique da equipe de
assistência jurídica que trabalhavam em sua área de prática profissional.
A frustração o consumia desde que chegara a Ogunquit. No entanto, ele
não foi capaz de fazer nada a respeito, porque primeiro precisava organizar a
propriedade. E agora que tudo parecia em ordem, era sua vez de colocar seu
plano em ação. Uma revanche que teria o prazer de realizar.
Rachel não estava atendendo suas ligações. Nem respondia as mensagens.
Isso não o surpreendeu, mas também não o impediu de ficar frustrado. Tinha
seu plano pronto. Então saiu para pegar o carro que havia alugado e se
dirigiu à casa de Ariel Galloway.
Não era difícil, em um lugar com poucos habitantes, encontrar o endereço
da casa de outrem. Qualquer um assinalaria e ajudaria. O bom dessas
pequenas cidades é que criavam um vínculo de confiança e proteção entre os
habitantes locais. O ruim, porque todos queriam se intrometer nos seus
negócios como se tivessem o direito de fazer isso.
Ele dirigiu até uma área isolada. Havia poucas casas. A mulher na
recepção disse a ele que Ariel estava com sua sobrinha que acabara de chegar
de Chicago. Que a casa era branca com um telhado azulado e da elevação da
estrada podia ver uma pequena parte de uma varanda com um longo
ornamento de conchas de ostra que sacudiam com o vento.
— Se andar alguns passos, pode até ter uma bela vista da praia em frente.
É uma curta distância. É uma das propriedades mais bonitas da região. — a
mulher disse. Ele agradeceu e deu uma gorjeta a ela como faria qualquer
pessoa em um hotel nas grandes cidades.
Quando viu a propriedade, desligou o motor. Respirou profundamente,
deixando-se invadir pelo ar puro da natureza. Longe da poluição e do barulho
constante dos carros. Estava vestido com um jeans preto, tênis e uma camisa
azul de mangas compridas. Por cima, vestia um suéter para combinar com o
jeans. Ele não estava com frio, mas preferia evitar pegar um resfriado.
Saiu do carro e começou a andar. O céu estava laranja. Logo anoiteceria.
Ele parou quando viu uma mulher à distância. Era inconfundível, porque seu
coração começou a bater rápido. O cabelo avermelhado parecia brilhar como
chamas vivas ao sol. Quantas vezes ele acariciou aquele cabelo, inalou seu
perfume e contemplou sua dona nua em sua cama.
Atravessou a rua estreita e logo alcançou a areia.

***
Rachel sentiu a areia sob seus pés. Gostava daquela sensação tão natural.
A praia estava vazia. As ondas estavam quebrando nas proximidades, mas a
maré estava baixa, então poderia aproveitar pacificamente sem temer que
uma onda surpresa a molhasse.
Usava um vestido rosa pardo de mangas compridas e gola redonda,
acentuado logo abaixo dos seios. Abria em A, para lhe dar mobilidade.
Perguntava-se quando sua barriga começaria a crescer.
Na mão esquerda carregava as sandálias e, para se aquecer, vestia uma
elegante jaqueta de couro preta. O cabelo estava voando sobre os ombros. No
dia anterior, o cortou em camadas, e estas delineavam seu rosto de uma
maneira diferente. Ela se sentia diferente e sua imagem refletia isso.
Sentia alegria ao caminhar no meio da natureza. Sentou-se em um tronco
de madeira que estava à vista e olhou para o oceano. Isso a acalmava. Ela
fechou os olhos e se concentrou no som das ondas.
— O mar também me acalma. Eu não venho aqui há muito tempo —
disse uma voz muito familiar para Rachael. Dolorosa demais. Não acreditava
que de tanto pensar nele, estivesse imaginando-o. O que fazia ali?
Abriu os olhos pouco a pouco.
— É um lugar que sentia falta — ela respondeu, voltando o olhar para o
mar. Tentando conter o batimento acelerado do seu coração. O desejo de se
levantar e se jogar em seus braços, de senti-lo envolvendo-a com sua força.
Em troca, ela permaneceu desconfiada. Cautelosa —. Quando eu era
adolescente e tinha um dia ruim, costumava vir aqui.
Michael tirou as mãos dos bolsos.
—Posso me sentar? —perguntou.
— Acho que ainda vivemos em um país livre — respondeu, olhando para
o mar.
Ele permaneceu em silêncio. A seu lado. Seus dedos pareciam arder com o
desejo de abraçá-la. Sacudi-la. Fazê-la reagir a ele de algum modo. Odiava
ver essa mulher passiva e muito calma. Precisava encontrar aquela Rachel
impulsiva e desafiadora.
—Não quer saber por que estou aqui?
Rachel soltou um suspiro abatido. Estava morrendo de vontade de saber o
que estava fazendo fora do escritório em uma terça-feira.
— A cho que você e eu não temos o direito de perguntar nada um ao outro.
— Desta vez, desviou o olhar do mar e fixou-o naqueles lindos olhos verdes
—. Você deixou claro. Só fui ao seu escritório para dizer o que eu achava
justo que você soubesse — encolheu os ombros — sem mentiras, sem
truques. — Voltou o olhar para o horizonte. Porque era mais seguro e menos
angustioso que ter o homem que amava, e que não a amava, a seu lado.
— O panorama marinho é bonito, mas prefiro que a pessoa com quem falo
me olhe durante a conversa.
Rachel deu uma risada apagada. Ignorou seu pedido.
— Não está em posição de expressar suas preferências e esperar que eu
me importe, Michael. Eu não sei o que você está fazendo aqui. Também não
me interessa. Você está arruinando meu momento pessoal. — Ela se
levantou abruptamente. Michael a imitou —. Não tenho nada que pertença a
você. Meu bebê é meu.
— A autoconcepção é um novo método? — ele perguntou
sarcasticamente.
— Preciso voltar para casa e jantar. Adeus, Michael. — Ignorou a
provocação.
Michael estendeu a mão e segurou Rachel pelo braço. Ela apertou a
mandíbula. Ele esperou que ela o olhasse. Demorou vários segundos para
conseguir isso. O rugido das ondas começava a fundir-se com a noite que se
aproximava.
— Eu vim porque você me deve algo.
— O que seria, por exemplo? — ela perguntou sem se afastar dele,
embora tentasse. Ele passou os braços em volta dela e puxou-a contra seu
corpo. Rachel ofegou.
— Tempo. O tempo em que você fingiu ser outra pessoa com outras
intenções. Quero que me dê três meses de seu tempo e tente reparar o
passado. Por isso vim. Porque temos uma dívida pendente.
—E quem disse que posso ter interesse em te dar tempo?
Michael não queria fazer desse modo, mas jogaria essa carta rasteira.
— Sua tia Ariel não é muito especialista em questões legais, sabia? —
Isso trouxe um brilho de interesse em Rachel. Então Michael continuou,
sentindo um grande alívio de que isso teria funcionado. Como se vingar dela
se não a tinha em seu terreno? — Eu vejo que não. Talvez seja por sua idade,
mas sua casa tem problemas em seu título de propriedade. Apesar de ter
pagado a hipoteca inteira e aparentemente a casa ser dela, há um herdeiro
que, se descobrir, pode reivindicar a casa como dele, porque o vendedor que
assinou com sua tia há muitas décadas foi antiético. Ele a enganou. A casa
pertencia a uma pessoa que aparentemente morreu sem herdeiros, e a
propriedade foi abandonada. O vendedor fez alguns ajustes inescrupulosos e
vendeu a propriedade para sua tia. Mas aquele antigo proprietário tinha um
herdeiro. Eu acho que ele gostaria muito de saber que tem uma linda casa de
frente para o mar.
Rachel se soltou com raiva.
—E quando você teve tempo para fazer tal investigação, Advogado
Whitmore?
— Eu vejo que agora tenho toda a sua atenção. — Seria uma perda de
tempo confessar que, antes de partir para o Maine, contratou um detetive
particular para procurar qualquer informação que pudesse ser útil sobre Ariel
Galloway. A propriedade não era esperada. Mas a informação era bem-vinda,
porque agora funcionava para ele —. Fico feliz em notar.
— Minha tia é a pessoa mais importante para mim. Não se atreva a mexer
com ela de forma alguma.
— Ou o quê?
Apontou-o com o dedo indicador, brandindo-o no ar como se fosse uma
espada.
— Vou gastar todo o meu dinheiro para lutar pelos seus direitos.
— Não queria que a mãe do meu filho vivesse na miséria.
— Você é um idiota absoluto. Existe para me machucar. Quando vai
parar? — estalou e começou a andar com pressa.
Michael a seguiu rapidamente. Ele estava morrendo de vontade de ver as
mudanças que ocorreram em seu corpo, porque parecia o mesmo de sempre.
Exceto seu cabelo. Tinha cortado. Combinava com ela. Era uma mulher
bonita. Queria saber como ela se sentia durante a gestação. Colocar a cabeça
naquela barriga que carregava dentro o milagre da vida e tentar ouvir o seu
filho. Cuidar dela. Mas ele não se apressaria.
Rachel colocou as sandálias na varanda e subiu correndo as escadas. Abriu
a porta de seu quarto e entrou no chuveiro tentando fechá-la com força.
Quarenta minutos depois, vestida e mais serena, ela saiu. Quando desceu para
a sala de estar, Michael estava sentado esperando por ela como se esta fosse
sua casa. Por que a tia Ariel não voltava logo para expulsá-lo?
— Quando você concorda em me dar seu tempo —disse—. Essa é a
resposta para sua pergunta na praia, Rachel Verônica Galloway.
Ela deixou cair as mãos.
Ela estava linda com o cabelo penteado para trás, sem uma gota de
maquiagem. Com a calça jeans que estava usando e a blusa lisa, ele podia
sentir a mudança em seus seios e um leve alargamento de seus quadris.
Estava mais arredondado. De um jeito sexy pra caralho.
—Ou senão?
— Já te expliquei.
— Chantagem, heim? — ela disse se abraçando. Michael encolheu os
ombros. Ela sentiu que não tinha outra saída —. É sua maneira de se vingar
de mim como queria fazer com você? É um daqueles que segue a lei de
Talião. "Olho por olho, dente por dente”?
Ele riu.
— Se você quiser colocar essas palavras, então que seja. A revanche é
doce. Você sabe?
— Explique-me o que você quer, Michael — cortou. Odiava esse tom
arrogante nele. Vê-lo de novo era reviver sua angústia.
— Quero que fique comigo durante uma semana na minha casa de praia.
— A época das concubinas terminou há muito tempo. E se não acredita
nisso, então se enganou de mulher.
Ele sorriu.
— Não me deixou terminar meu comentário, Rachel. — Ela apertou a
mandíbula —. Eu quero que você venha para minha casa. E acima de tudo
quero que conversemos.
— É isso que estamos fazendo... Oh não, não é verdade! Você esta me
chantageando.
— Você colocou as palavras, não eu. Em todo caso, você me deve tempo.
E eu quero essa semana. Estou trabalhando do escritório. Não tenho
assistente e há muitas coisas para despachar.
— E você acha que eu sou uma empregada disposta?
— Se você resistir a trabalhar para mim por uma semana, prometo que
nunca mais ouvirá falar de mim. Exceto para dar ao bebê o sobrenome, o dia
em que nascer. Estarei em todos os aniversários, nas apresentações da escola,
nos seus momentos importantes, nas festas de Natal e na chegada do ano
novo. Você acha que pode? Afinal, é um negócio justo.
Rachel olhou para ele com desconfiança.
— Posso lidar com muitas coisas, mas também tenho que verificar meus
problemas do escritório de vez em quando. Estou de férias e prometi a Paul
que ficaria alerta para qualquer eventualidade. Além disso, não entendo o que
você faz no Maine, quando deveria estar em seu novo prédio trabalhando.
Michael se levantou.
— Tirei férias bem merecidas, mas prefiro trabalhar um pouco para não
perder o ritmo. E já que casualmente coincidimos — ele disse
zombeteiramente —, parece justo pedir-lhe que trabalhe para mim. Eu vou te
pagar, claro que vou, e há também o assunto do meu silêncio conveniente
sobre a propriedade de sua tia Ariel. — terminou com sarcasmo.
—Você fez esta viagem para a Costa Leste, podendo ir a outros lugares
mais interessantes e vivos, só porque encontrou uma maneira de me fazer
pagar por ter mentido para você, por ter mandado aquela carta para Dereck…
? Sua vingança é que trabalhe para você e me humilhar? É isso? — perguntou
com os olhos cintilantes de cólera —. Deve me desprezar muito para ter tido
tanto trabalho, Whitmore.
Ele inclinou a cabeça.
— Só pedi a sua ajuda e, em troca desse tempo de ajuda que acho justo,
dadas as nossas circunstâncias, vou pagar-lhe como se fosse uma semana de
trabalho.
— Você me disse que não queria saber mais sobre mim e agora está
pedindo meu tempo. Ou você fumou uma substância ilegal ou está
começando a perder a sanidade.
— Não é vingança Rachel — disse se aproximando e erguendo o queixo
dela para que olhasse nos olhos dele. Evitou responder ao seu comentário,
porque essas respostas seriam dadas mais tarde, muito mais tarde —. É uma
revanche. Há uma grande diferença.
Ela tirou-lhe a mão. Não porque seu tato não lhe agradasse, ao contrário.
Queimava-lhe e enviava flashes de fogo a suas entranhas; excitou aquela
parte dela tão tola que não podia deixar de desejá-lo quando estava perto dele.
Como se seus hormônios estivessem ligados a um interruptor que os deixava
loucos e incontroláveis. «Corpo traiçoeiro.»
— Esclareça-me, por favor, oh advogado magnânimo — respondeu com
altivez.
Michael se inclinou até que seus lábios quase se tocassem. Quase.
— A vingança é amarga, mas a revanche é doce, Rachel. — Ele se
afastou e sorriu —. Muito doce. — Caminhou até a porta —. Te vejo
amanhã. Chegue às dez da manhã. A senhora Arondale cozinha. Não espero
que você faça isso, é claro.
—É claro — ela respondeu relutantemente.
C A P Í T U L O 1 8

Nos primeiros quatro dias, Rachel não teve problemas em ajudar Michael.
Ele não mencionou nenhum assunto que causasse centelhas de desconforto.
Era direto e na verdade levava um ritmo de trabalho ágil, por isso ela podia
despachar tudo com prontidão. Não era déspota nem tentava fazê-la sentir-se
inadequada quando não entendia algum termo legal ou não conseguia
entender algum escrito muito especializado.
Não se lembrava como era a casa de Michael no Maine, mas gostou de
como estava decorada. Limpa e pintada. Aparentemente recentemente,
porque ainda em alguns cantos o aroma da pintura era um pouco perceptível.
Ou o mais provável era que seus afinados sentidos estivessem mais alertas
aos aromas, que antes da gravidez.
Michael não estava tentando se aproximar mais do que deveria. Ele não a
tocou, mas ela sentia seu olhar quando pensava que não percebia. Quando lhe
pedia que o ajudasse com algum tema de número, tinha que aproximar-se, e o
aroma de sua habitual colônia a enlouquecia. Afastava-se dele com prontidão.
Parecia uma tortura, mas ele, jamais tentava nada. Às sete da tarde,
convidava-a para jantar, conversavam de coisas banais, e logo ela ia à casa de
sua tia Ariel.
Sua tia não se surpreendeu quando lhe disse que Michael estava nos
arredores, e tão somente lhe sugeriu que desfrutasse de suas férias. Estava
surpresa que sua tia não tinha mais nada a dizer, porque geralmente Ariel
tinha opiniões muito marcadas. Talvez estivesse cansada de escutá-la penar
pelos corredores nas noites ou na manhã observar seu rosto inquieto e
indeciso sobre o novo dia que a esperava.
— Rachel, hoje eu tenho um almoço ao meio-dia. Você acha que poderia
terminar de organizar a pasta que está na minha mesa? São fax que me
enviaram. Muitos e agora mesmo tenho que ir pegar uma encomenda antes do
almoço…
—Ok.
***
O relógio marcou cinco da tarde, e Michael não tinha voltado. Naquele dia
em particular, não estava se sentindo muito bem. Foi até a cozinha pegar um
copo de água. E isso pareceu acalmá-la. Voltou à sala e removeu os troncos
para a lareira. Não havia aquecimento central, e isso era algo de que gostava,
embora em várias ocasiões, no final da tarde, Michael reclamasse.
Os dias pareciam passar muito rápido. Em setenta e duas horas, ela nunca
veria Michael novamente. Ela se perguntou se tinha imaginado suas
intenções. Era estranho. Ele a confundia. Agia de um modo inesperado,
enquanto ela lentamente mergulhava na angústia de querer sair. Se não fosse
por sua tia Ariel, teria recusado aceitar o estúpido pedido de Michael. Além
disso, com quem poderia ter um almoço estando tão longe de Chicago? Não,
não, não.
Colocou de lado o ferro da lareira e se afastou. Nesse momento, a porta da
frente se abriu e Michael apareceu. Ele estava vestindo uma camisa azul e
calças de um tom mais escuro. Estava muito elegante.
— Oi! Tudo em ordem? — perguntou deixando o casaco no cabide ao
lado da porta—. Faz um frio demoníaco.
Ela sorriu.
— Sim. Terminei o que você pediu. Estava atiçando o fogo, e… — disse,
e cortou de repente. Uma leve tontura. Já tinha ocorrido anteriormente, então
não deu importância —. Hoje terminei mais cedo. — A tontura voltou. Desta
vez, estendeu a mão para se encostar-se à parede da lareira, mas sua mão saiu
do controle. —. Eu… Michael…
Ele reagiu imediatamente, conseguiu segurá-la antes que ela pudesse se
queimar ou se machucar. Pegou-a nos braços. O sofá parecia muito
desconfortável, então subiu as escadas de dois em dois com ela. Abriu a porta
de seu quarto com o ombro e colocou-a no centro da cama.
—Rachel? —chamou-a.
Deus, como era horrível. Tudo estava girando. Manteve os olhos fechados.
Não se lembrava de ter tomado café da manhã. Ou sim? Iogurte e frutas. Nem
pretendia se transformar em uma baleia com a desculpa de que comia por
dois. Não, obrigado. Devia estar saudável, não inflada como um balão.
—Mmm —gemeu. Porque não se calava e a deixava em paz? Só queria
manter os olhos fechados mais um pouco, de repente sentia-se confusa, tonta,
e esperava que os hormônios não a traíssem e começasse a chorar. Porque
estava muito sensível, e a presença desse homem complexo, a deixava pior.
—Querida, abra os olhos. Consegue?
«Michael a havia chamado, “querida”? Certeza e estava, mais que
desmaiada, demente.»
— Eu não sei o que aconteceu comigo… — sussurrou abrindo os olhos.
Encontrou Michael curvado sobre ela —. Já pode se afastar — disse com
suavidade e tom combativo. Era a forma de defender-se dele —. Não vou
morrer na sua casa, nem vão te processar por...
—Rachel, chega — apelou —. Vou chamar o médico.
Ela o pegou pelo pulso.
— Não. Às vezes isso acontece comigo. A ginecologista disse que não é
anormal, talvez meu açúcar no sangue tenha caído um pouco… Michael,
posso ficar aqui… — Rachel murmurou em desespero —. Por favor,
Michael… eu…
Ele soltou um suspiro.
—Me assustou… Tem certeza que não quer que eu chame o médico local?
— Ela negou —. Então, para ter certeza de que você está bem e o bebê
também, por favor, passe a noite em casa.
Ela negou de novo profusamente e tentou se sentar. Ele a deteve colocando
a mão no braço. Rachel se deixou cair sobre os travesseiros.
— Tenho que ir, amanhã me sentirei melhor, e voltarei. Só restam três
dias de nosso acordo, assim que…
— Foda-se os três dias, Rachel. Por que diabos você acha que eu estou
neste lugar perdido da minha cidade habitual?
—Para se vingar…?
Michael a olhou. Esticou a mão como se quisesse acariciar seu rosto, mas
se conteve.
— Nunca tive que lutar pelo amor de nenhuma mulher. Sempre tive
alguém que quis, porque na realidade, nunca amei. Praticamente chantageei
Delaney para que me dissesse onde estava no sábado que fui te buscar no seu
apartamento. Eu estava com raiva, indefeso. Você tocou no assunto da sua
gravidez e fiquei impressionado. Não reagi a tempo e com certeza você
entendeu errado.— Ela apenas assentiu com a cabeça, não podia acreditar no
que estava ouvindo —. Rachel… vim por você. Porque eu sei que te
machuquei muito. Que te magoei com minhas palavras naquela noite. E ao
fazer isso, infligi uma tortura monumental a mim mesmo. Porque também
menti para você…
—Eu… não sei o que lhe dizer.
— Apenas me escute e depois decida o que fazer… —Ela assentiu—.
Queria falar com você na praia, mas sei que está magoada comigo. Mereço
que não queira saber de mim. Eu te tratei mal, e sinto mais do que você
pensa. Vir ao Maine e pedir seu tempo foi uma ousadia da minha parte.
Chantageá-la com a casa de Ariel também, mas me diga uma coisa. Teria
vindo a minha casa, teria concordado em falar comigo, quando você não
atendeu minhas chamadas ou mensagens? — Rachel negou, comovida pelas
palavras de Michael, por aquele olhar tão determinado quanto desesperado.
Era um olhar que nunca existiu nele —. Então organizei tudo no escritório e
mal consegui voar para este local. Para te ver. Por você. Porque preciso que
saiba que te amo, Rachel. Que trabalhe para mim foi uma forma de tentar
interagir com você. Que não se sentisse desconfortável, mas vejo que não
consegui…
—Michael…
Ele olhou para ela com fervor, pegou sua mão.
— Eu menti para você quando disse que era apenas mais uma aventura,
mais uma de muitas. Você nunca poderia ser. No dia em que entrou na minha
vida, independente do seu nome ou identidade, você me arruinou para
qualquer outra mulher.
— Te vi no restaurante com outra e… — sussurrou movendo o polegar
sobre os dedos de Michael que agarravam os seus.
— Mais uma bobagem para adicionar à minha lista de erros.
—Ela e você…?
— Não, eu não dormi com ela. — Deixe o ar escapar —. Tenho estado
tão ocupado tentando te esquecer, com mais horas faturáveis ​do que o
normal no escritório, que a última coisa que pude fazer foi ter energia para
tentar estar com outra mulher que não seja você.
—Porque estou grávida?
Michael olhou para baixo. Ele se inclinou para mais perto dela e segurou
seu rosto com a palma da mão esquerda.
—Porque eu te amo, Rachel. Te amo. Estou louco por você. Tão louco que
sou capaz de fazer coisas estúpidas como vir e pintar esta maldita casa, para
tentar te lembrar daquela noite quando te conheci. Aquela noite foi especial
para mim e espero que de alguma forma tenha sido para você. Porque esse foi
o nosso começo, porque eu não quero que tenhamos um fim se não juntos.
— Se eu não tivesse vindo para ver você, então nunca teríamos nos
encontrado novamente.
— As hipóteses não nos fizeram bem, então não vamos pensar no que
teríamos feito, mas no que vamos fazer.
—E isso o que é…? — ela perguntou mordendo o lábio inferior.
— Em primeiro lugar, quero que saiba que não guardo rancor de você.
Que entendo o seu passado, as suas motivações e que sei que não foram as
mais sinceras ao se aproximar de mim. Mas assim pude te encontrar de novo
e nunca vou terminar de agradecer. Minha preciosa Rachel de olhos azuis.
Em segundo lugar, quero que me perdoe e diga que podemos tentar
novamente… por favor — disse com fervor.
—A parte em que te digo que te amo, que jamais deixei de fazer isso, e
que estou apaixonada por você, não te interessa?
O sorriso de alívio e amor que Rachel viu em Michael fez seu coração
disparar. Como se estivesse voltando ao seu ritmo normal. Não de uma forma
monótona e abatida. Vibrou em seu peito novamente com vigor renovado.
Ele se inclinou para ela, e a beijou. Rachel o recebeu com um suspiro, que
era metade alívio metade libertação. O beijo de Michael foi pura necessidade
e amor. Ao encontrarem suas bocas de novo, depois de mais de três longos
meses, o mundo pareceu estourar ao redor. A dimensão e a força do amor que
sentiam um pelo outro era uma fervorosa onda que arrastava qualquer outra
emoção que houvesse no meio.
Michael desejava fazer mais do que beijá-la, mas tinha um assunto
pendente. Vários na realidade, e muito importantes. Com relutância se
afastou e uniu sua testa com a dela.
—Muito, minha vida —respondeu—. Antes tem algo que pensei em te dar
no final da semana. Na verdade, eu preparei antes de voar para cá.
—Sim?
Ele assentiu e saiu do quarto por alguns minutos.
Ela esperou que Michael voltasse. A incerteza e a curiosidade a
dominaram, mas também um alívio indescritível porque, finalmente, três
longos meses de solidão e angústia estavam chegando ao fim.
Ele se aproximou e entregou a ela um documento de duas páginas.
— Por favor, leia.
Rachel se acomodou na cama. Sentada bem perto dele, como se o calor
que emanava de Michael pudesse aquecer sua alma inteira. Ela gostou de tê-
lo ao seu lado.
Quando ela olhou para baixo para continuar o próximo parágrafo, Rachel
não conseguia acreditar no que estava escrito. Virou a página e viu que havia
duas pessoas assinando aquele acordo. Michael, cuja assinatura já estava
carimbada, e ela.
Olhou para ele.
— Um contrato de casamento em que, no caso de você quebrar suas
promessas, posso usar este documento para tirar toda a sua fortuna… Coloca
as contas nos nomes de ambos… — deixou os papéis na mesa de cabeceira
—.Por que Michael?
— Porque terei tudo o que realmente me faz feliz se você concordar em
ser minha esposa.
Lágrimas de alegria brotaram sem esperar. Enxugou-as com as costas da
mão. E cruzou os braços fingindo indignação.
— Bem, eu não ouvi você pedir, Advogado Whitmore —sussurrou.
Ele riu com alívio.
— Que tolo de minha parte. Hoje tive que fazer uma diligência e acho que
foi uma boa ideia. — Saiu um momento e voltou com uma caixa de veludo.
Ajoelhou-se junto a Rachel, pegou sua a mão e olhou-a com todo o amor que
sentia —. Rachel Verônica Galloway, me daria a honra de tirar esta horrível
solidão e encher meus dias com você, com este bebê — colocou a mão na
barriga da Rachel — e os que chegarem, suportando minha teimosia e todo o
amor que sinto por você, convertendo-se em minha esposa?
O riso banhou o quarto.
— Sim, claro que aceito ser sua esposa — sussurrou com lágrimas de
alegria rolando por suas bochechas, enquanto ele deslizava o anel em seu
dedo —. É lindo — Disse rodeando o pescoço de Michael com os braços —.
Te amo.
—E eu a você, querida.
Ele ia beijá-la, mas Rachel se afastou. Michael franziu a testa.
—Tanta certeza tinha de que eu diria sim ou que te perdoaria?
Michael sorriu e esfregou o nariz com o de Rachel. Ele deu-lhe um beijo
suave e profundo que a fez querer mais.
—Na verdade, aprendi que com você não tenho nada certo e não vou
deixar de trabalhar no nosso relacionamento para que não duvide do meu
amor. E em segundo lugar, querida, vai se casar com um advogado. Se eu não
preparasse minha defesa e meus testes, como acha que eu ganharia a vida?
Ela riu.
— Talvez mostrando a sua futura esposa o quanto você sente falta dela —
ela murmurou com sensualidade, enquanto Michael começava a beijar seu
pescoço, suas bochechas, ao mesmo tempo em que ela sentia aquelas mãos
hábeis despi-la aos poucos.
— Isso que pretendo fazer — respondeu. Ele a despiu lentamente,
absorvendo cada mudança —. Seus seios estão maiores — se inclinou para
beijá-los com reverência, chupou os mamilos eretos esperando as carícias de
sua língua hábil — e têm um gosto maravilhoso. — Rachel enterrou os dedos
no cabelo de Michael e gemeu enquanto ele a acariciava com as mãos, com a
boca, com o corpo. —. Aqui esta o nosso bebe — sussurrou beijando o
ventre com pequenos beijos insistentes cobrindo cada canto — quero que
saiba sempre que o seu pai e a sua mãe o conceberam com amor —
sussurrou olhando para Rachel, que devolveu o olhar com entusiasmo.
— Estou muito chorona… —murmurou.
— Espero que esse mito de que mulheres grávidas tendem a se interessar
mais por sexo do que o normal seja verdade.
Rachel soltou uma risada que se transformou em um gemido quando
Michael deslizou sua calcinha e a calça jeans, deixando-a totalmente exposta
a ele.
— Meu Deus, você é tão sexy.
—Michael… vou parecer uma baleia em breve — murmurou quando um
sorriso malicioso apareceu nos lábios masculinos.
— Vai parecer uma mulher amada e satisfeita sexualmente — disse com
uma risada antes de descer pelo corpo da Rachel beijando tudo. Quando
chegou até seu sexo coberto ligeiramente por pelos avermelhados ele piscou
um olho e logo o tomou com sua boca —. Mmm… não sabe quanto senti
falta de seu sabor — comentou antes de mergulhá-la num turbilhão de
sensações.
A boca de Michael fez magia em seu sexo. Sentiu a língua lhe dando
prazer e suas grandes e quentes mãos em seus mamilos, apertando-os com
intensidade. Era doloroso e gostoso ao mesmo tempo. Estava sensível, e em
poucos minutos um grito de satisfação saiu de sua garganta gemendo o nome
de Michael. Arqueou as costas e fechou os olhos deixando-se consumir,
enquanto ele a acompanhava com leves carícias na viagem de volta à
realidade.
Rachel suspirou e sorriu.
— Olá trapaceiro…— ela sussurrou quando ele se inclinou para beijá-la.
— Olá princesa. Acha que eu deveria fazer algo sobre isso?
Ela riu.
— Você poderia começar por se despir e me deixar retribuir o favor.
— Sempre tão pró-ativa em igualdade de direitos — respondeu e uma
entusiasmada Rachel tirou a sua camisa. Olhos azuis brilharam de amor e
desejo.
Michael estava nu e a prendendo em seus braços. Pele à pele. Fazendo
com que sentisse com seus beijos o quanto a desejava, com suas mãos o
quanto a adorava e com suas palavras tudo o que carregava em seu coração.

***
Horas mais tarde, quando a noite dominava o firmamento, ela o olhou.
Parecia estar completamente adormecido, mas estava certa de que não era
assim. Não quando o polegar de Michael acariciava os dedos de sua mão.
—Você ainda quer revanche…? — perguntou se inclinando para beijar o
ombro de Michael. Então lhe deu uma mordidinha.
Ele a olhou de relance com um sorriso em seus lábios. Nunca se saciaria
dela.
— Claro querida, eu te disse, a revanche é tão doce — ele respondeu
antes de surpreendê-la com um beijo, para então se perder nela com ternura e
paixão.
E P Í L O G O

Cinco anos depois…

Desde que se casaram em uma elegante cerimônia em Chicago, Rachel e


Michael Whitmore passavam as férias de verão em sua casa no Maine.
Tinham ampliado com mais quartos e agora era mais acolhedora, e claro,
tinha aquecimento central. Embora Rachel tenha insistido em acender a
lareira do jeito antigo. Michael só a agradava porque era seu lugar favorito
para fazer amor com ela, enquanto seus filhos ficavam com Ariel por duas ou
três noites. Era a única maneira de ter algum tempo de casal.
Os trabalhos dos Whitmore em Chicago continuavam a ser exigentes.
Rachel foi promovida a vice-presidente de negócios e quando soube que Paul
ia se casar, ofereceu-se para lhe dar a despedida de solteiro organizada por
Delaney, é claro.
Antes da cerimônia de casamento, Michael conversou com Ariel sobre a
situação da propriedade onde morava. Ele organizou os papéis para que no
futuro não houvesse mais problemas. A tia de Rachel pediu desculpas pelo
que aconteceu com sua sobrinha, mas ele disse que todo revés trazia uma
recompensa e neste caso era o amor de Rachel.
Delaney teve o prazer de organizar a festa de despedida de solteira de sua
melhor amiga. Pelo menos ela sabia que a palavra de Michael era confiável,
já que não fugiu para Las Vegas com a amiga como temia. Ser a dama de
honra era divertido, porque ela realmente passava a maior parte da noite
certificando-se de que a bebida não fosse desperdiçada. Ou seja, aproveitou
as grandes quantidades de álcool. Seu cúmplice de aventura? Fabrizzio. Eles
se casariam no verão seguinte! Não podia acreditar que a vida tinha lhe dado
outra chance no amor.
Piper não poderia estar mais feliz por sua irmã. Sua vida mudou e seu
nome foi inocentado em relação a acusação de assassinato. A acusação de
tráfico de drogas permaneceria em seu arquivo, mas não fazia mais parte
dela. Michael era um cunhado incrível, e quando alguns esnobes se
recusaram a comparecer à festa de noivado de sua irmã por ter como parente
uma ex-presidiária, ele mandou devolver os presentes de casamento que
haviam dado e retirou o convite. Ele garantiu que, enquanto ela e Rachel
estivessem em sua família, nunca permitiria desprezo de ninguém. Como isso
não era um pedaço de cunhado?
Rachel teve uma conversa dolorosa com a irmã. Ela lamentou saber que
Piper era responsável pela distribuição de pequenas quantidades de drogas
em algumas universidades. Argumentou que estava fazendo isso porque era a
única maneira de compensar financeiramente as lacunas que sentia por ter
perdido os pais tão repentinamente e impedir que o serviço social levasse
Rachel por não ter o apoio financeiro necessário. Nunca pensou em sua tia
Ariel, e no final, suas ações acabaram apenas separando-as. Sobre a acusação
de assassinato, Piper confessou a Rachel que ela nunca poderia tirar a vida de
ninguém, não importa o quanto precisasse de dinheiro, e que o que ela
realmente fez foi tentar conter o sangramento de sua amiga. Infelizmente, foi
quando a polícia a encontrou. Foi um incidente confuso, lamentável e
doloroso.
Emilio Gordov teve um julgamento que durou várias semanas. Aos poucos
a polícia encontrou tudo o que precisava para levá-lo para a cadeia. Sua
sentença foi de quarenta anos. No final, não foi apenas extorsão, falsificação;
a polícia obteve testemunhas e provas sólidas para acrescentar homicídio,
tortura e tráfico de drogas. Poderia apodrecer na prisão.
Rachel conheceu Vannia. A menina, agora uma adolescente, era vibrante e
saudável. O transplante foi um sucesso. Os pais de Vannia logo se
envolveram mais no círculo de amigos dos Whitmore.
Os Bronsons a receberam em seu círculo de amigos, e todo o incidente que
a separou de Michael por três longos meses foi esquecido. O mesmo
aconteceu com a família Whitmore, que a acolheu com o carinho que um
membro do mesmo sangue poderia receber. Não só ela, mas Piper também.
—O que você acha? — perguntou Michael abraçando sua esposa,
enquanto os dois observavam as ondas das praias de Ogunquit da areia.
Seus filhos, Camille, de cinco anos, e Andrew, de dois, corriam pela areia
brincando sob os cuidados de suas tias: Ariel, Piper e Delaney. As três faziam
uma festa tentando competir para agradar aqueles diabinhos.
Rachel colocou a cabeça no ombro do marido.
— Estou feliz. Sinto-me com muita sorte.
— Não tanto como eu ao ter conseguido que se casasse comigo.
Ela riu, se afastou e o olhou com um gesto brincalhão.
—Está competitivo, senhor Whitmore?
— Se cada dia ao seu lado não fosse um desafio, minha vida seria chata.
Eu gosto de crescer ao seu lado, Rachel.
— Isso é porque quero que seja um homem melhor — respondeu
sorrindo.
— Tento ser a melhor versão de mim, para você — ele disse olhando nos
olhos dela.
A risada de seus filhos ao longe se misturou com o clamor do mar.
— Você sempre diz as coisas certas…— sussurrou se permitindo ser
beijado.
Foi um beijo intenso e cheio de promessas para o momento em que o céu
se encheu de estrelas e o silêncio invadiu sua casa de praia.
— Isso é só porque eu casei com a mulher certa para o meu coração.
S O B R E A A U T O R A

Uma escritora de romances equatoriana e ávida leitora do gênero, Kristel


Ralston é apaixonada pelas histórias que acontecem entre palácios e castelos
na Europa. Embora gostasse de sua profissão como jornalista, decidiu dar
outro enfoque a sua carreira e ir ao velho continente para estudar um
mestrado em Relações Públicas. Foi durante sua estadia na Europa quando
leu vários romances que a cativaram e a impulsionaram a escrever seu
primeiro manuscrito. Desde então, nem sua variada biblioteca pessoal nem
sua agenda semanal carecem de livros desse gênero literário.
Seu romance "Lazos de Cristal" foi um dos cinco manuscritos finalistas
anunciados no II Concurso Literário de Autores Indie (2015), patrocinado
pela Amazon, Diario El Mundo, Audible e Esfera de Libros. Este concurso
recebeu mais de 1.200 manuscritos de diferentes gêneros literários de língua
espanhola de 37 países. Kristel foi a única latino-americana entre os cinco
finalistas do concurso.
A autora também foi finalista do concurso de novelas românticas Leer y
Leer 2013, organizado pela Editorial Vestales da Argentina, e é co-
administradora do blog literário Escrever Romance. Kristel Ralston publicou
vários romances como Um acordo inconveniente, O preço do passado, Brilho
de Luar, Laços de cristal, Em seus termos, O último risco, Retorno a você,
Um capricho do destino, Desafiando o coração, Além do pôr do sol, Um
orgulho bobo, entre outros. Uma prestigiosa publicação do Equador a indicou
como uma das Mulheres do Ano de 2015 na categoria Arte por sua obra
literária.
Kristel atualmente mora em Guayaquil, Equador, e acredita firmemente
que os sonhos se tornam realidade. Nas horas vagas, gosta de escrever
romances que convidem o leitor a nunca parar de sonhar com finais felizes.

Instagram @KristelRalston

Você também pode gostar